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São Paulo, 19 de julho de 2002. Ao Senhor José Mario Abdo Diretor Geral da ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica SGAN 603 módulo J Brasília/DF - 70830-030 Ref: PROPOSTAS SOBRE A AUDIÊNCIA PÚBLICA AP005/2002 Senhor Diretor, O Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, que reúne 21 organizações das várias regiões do Brasil, vem solicitar que seja avaliado por esta agência o documento anexo. O mesmo versa sobre a Audiência Pública AP005/2002 e suas necessárias alterações para a efetivação do direito do consumidor do serviço de energia elétrica. Devido á complexidade do assunto o documento traz as propostas em quatro grandes blocos temáticos:

1. Beneficiar os consumidores com o fator X 2. A base de ativos deve incluir apenas os essenciais à prestação de serviço aos

consumidores cativos 3. Respeito à modicidade tarifária 4. Acesso pleno à informação e publicidade de todas as etapas do processo

Lembramos que o tema é de grande interesse para os consumidores e que o Fórum e suas entidades acompanharão atentamente o processo de revisão tarifária. Colocamo-nos à disposição para eventuais esclarecimentos. Atenciosamente, Marilena Lazzarini Presidência do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor

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1. Beneficiar os consumidores com o fator X Propostas: 1. Avaliar criticamente o ganho de produtividade das empresas, excluindo fatores econômicos e

financeiros que não estejam diretamente relacionados com a produtividade 2. Submeter a metodologia de cálculo e os dados à audiências e consultas públicas O modelo de regulamentação econômica adotado, o price cap, consiste na estipulação, pelo regulador, de um preço limite a ser cobrado pelas concessionárias, que deve vigorar até a próxima revisão tarifária. Durante esse intervalo, o preço-teto é reajustado anualmente pelo Índice Geral de Preços (IGP), subtraído de um fator de produtividade (fator X). Adicionalmente, o regime price cap prevê o repasse para as tarifas dos custos não-gerenciáveis, provocados por eventos econômicos que fujam ao controle ou previsibilidade da concessionária. As pendências referentes a esses custos foram acertados no Acordo Geral do Setor Elétrico, que incluiu também o seguro apagão e as perdas estimadas das empresas pelas quais o consumidor está pagando. Esse método de regulação econômica deve incentivar as empresas a buscarem eficiência, pois elas se apropriam dos ganhos de produtividade obtidos entre as revisões tarifárias que sejam superiores ao fator X estabelecido pelo regulador. Para o consumidor o modelo deve permitir que eles também possam se apropriar de parte dos ganhos de produtividade obtidos pela concessionária, haja vista que quanto maior for o valor de X menor será o valor do reajuste anual das tarifas. A lógica da concessão dos serviços públicos não era apenas diminuir o déficit fiscal, mas permitir que os consumidores pudessem receber serviços mais baratos e melhores, proporcionados pela concorrência e pela eficiência dos prestadores, portanto os consumidores estão acompanhando com grande interesse os resultados deste trabalho. As empresas ganharam produtividade de fato: entre 1995 e 2000 a relação consumidores por empregado aumentou passou de 283 para 710, um aumento de 150%. Somente de 2000 para 2001, os balanços de oito das maiores distribuidoras (ELETROPAULO, LIGHT, COELBA, CPFL, BANDEIRANTE, CELPE e ELEKTRO, atendendo mais de 17 milhões de consumidores residenciais) mostram uma redução de quase 20% nas despesas com pessoal, ao mesmo tempo em que o número de consumidores aumenta. As vendas de energia por empregado aumentaram 180%, passando de 1.572 para 4.401 MWh/empregado entre 1995 e 2000. As perdas de energia, outra forma de aumento de produtividade, passou de 13,6% em 1995 para 12% em 20001. O racionamento pode ter ocasionado diminuição de receitas (que já estão sendo custeadas pelos consumidores), mas não afeta significativamente ganhos de produtividade e de eficiência como os expostos acima. Investimentos para aumentar a produtividade não são desculpas para que o fator X não seja aplicado ou seja diminuído, pois as empresas já se apropriaram desses ganhos ou o farão até a próxima revisão tarifária. Lembramos que faz parte do modelo incentivar as empresas a obter ganhos de produtividade, e os dados mostram que elas se aproveitaram disso. Mas também faz parte da proposta inicial que esses ganhos sejam partilhados com os consumidores. A revisão tarifária é o momento dos consumidores serem enfim beneficiados. 2. A base de ativos deve incluir apenas os essenciais à prestação de serviço aos consumidores cativos Propostas: 1. Utilizar o custo de reposição para cálculo da base de ativos

1 Dados tirados do BNDES: Informe Infra-estrutura no. 53, dezembro/00 e dos Cadernos de Infra-estrutura: Setor elétrico - ranking 2001 - Volume 1

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2. Excluir da base os ativos que não sejam utilizados para atender os consumidores cativos e incluir proporcionalmente aqueles que sejam utilizados para atender outras atividades da empresa

3. Excluir fatores típicos da atividade especulativa, ou de valorização de patrimônio decorrente de fatores alheios à atividade produtiva

Reforçamos a posição da nota técnica em não utilizar o valor de privatização das empresas como base para calcular a remuneração, já que ele incluiu expectativas de lucros e os próprios lucros operacionais que já foram apropriados pelas concessionárias. Os valores pagos, ou os valores mínimos fixados pelo governo são superestimados. Os valores pagos incorporaram o fluxo de caixa, o que significa que em seu cálculo foram incorporadas as estimativas de receitas futuras. É inaceitável que às concessionárias seja assegurada uma lucratividade sobre a receita que ainda vão usufruir. O “custo de reposição” é mais aceitável, pois não representa a remuneração sobre ganhos futuros, mas desde que seja devidamente considerada a depreciação e sejam excetuados da base os ativos que não sejam destinados exclusivamente às atividades de distribuição de energia elétrica aos clientes cativos, excluindo total ou parcialmente as estruturas que sirvam a outras atividades da empresa. Alguns exemplos dessas estruturas são: ! Áreas administrativas, gerenciais e diretorias que sejam usadas como suporte para outras

atividades da empresa, como comercialização de energia para clientes livres ou para serviços de infraestrutura como telecomunicações.

! Escritórios, equipamentos e estrutura dessas áreas. ! Estruturas superdimensionadas, principalmente em áreas administrativas e comerciais ! Muitos ativos ainda possuem valor de mercado mesmo quando antigos ou defasados. Este

valor deve ser descontado do total a ser depreciado. A base de ativos deve estar isenta de fatores típicos da atividade especulativa, ou de valorização de patrimônio decorrente de fatores alheios à atividade produtiva. Por exemplo, os ativos de uma empresa incluem imóveis, como edifícios e terrenos e que podem sofrer alteração de preço de mercado, decorrente do adensamento urbano, oferta de serviços urbanos, alteração da localização de infra-estrutura etc. Como conseqüência, a base de remuneração não deve ser alterada devido a variações nos preços dos terrenos. É importante também que a remuneração dos ativos considere as variações tecnológicas e os ganhos de produtividade. O avanço técnico permite que ocorra o crescimento da produtividade e da lucratividade sem que haja crescimento proporcional dos ativos. Na avaliação da rentabilidade das concessionárias deve-se tomar cuidado para não se confundir a rentabilidade geral da empresa, que inclui o endividamento que diversas empresas fizeram para adquirir outras distribuidoras, linhas de transmissão e geradoras, com a rentabilidade para atrair investimentos para a atividade de distribuição de energia aos consumidores residenciais. Enquanto a primeira é uma atividade empresarial que deve estar sujeita aos riscos típicos do mercado, a segunda é uma atividade essencial para o interesse público e para o desenvolvimento social. Se há a necessidade de uma remuneração do capital para atrair os investimentos necessários à ampliação do serviço e ao atendimento dos padrões de qualidade, devemos ter em mente que estamos tratando de um serviço público essencial, cuja exclusão afeta o desenvolvimento econômico e a própria dignidade humana. Falamos aqui da busca de equilíbrio entre interesse público e privado onde o consumidor não deve ser onerado em prol de monopólios privados, o cidadão deve ser protegido de uma lógica predatória de maximização de lucros. Um exemplo claro de como as empresas estão tentando repassar os riscos e custos de seus investimentos para o consumidor residencial cativo está no lucro operacional das empresas. Este resultado mostra o quanto a empresa recebe decorrente apenas da sua operação de venda de energia elétrica aos consumidores (incluindo pessoal, material, serviço de terceiros, taxas da ANEEL e o uso do sistema de transmissão) e antes das despesas financeiras (que podem decorrer de endividamento para aquisição de geradoras e outras empresas). Fazendo uma amostragem das

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maiores distribuidoras2, este lucro passou de 2,17 bilhões para 3,39 bilhões entre 2000 e 2001, um aumento de 56%. Entre 1998 e 2000 o lucro operacional total das 19 maiores distribuidoras3 aumentou de 3,15 para 5,84 bilhões, uma extraordinária elevação de 85,3%. As empresas estão obtendo lucros cada vez maiores e tentando transferir ao consumidor os custos de seus investimentos tipicamente empresariais, como a aquisição de novas empresas, ações para as quais elas devem arcar com os custos. Uma base superestimada acarretará ônus abusivos ao consumidor. A supervalorização dos mesmos levará ao aumento exagerado de tarifas para remunerar os investidores e fará com que sejam criadas não apenas exclusão de consumidores como distorções na economia e no próprio mercado de energia devido ao aumento do lucro monopolista sobre os consumidores cativos. Este lucro monopolista pode levar as empresas à práticas desleais de concorrência no mercado livre, como a criação de subsídios disfarçados na busca de oferecer melhores preços aos consumidores livres, prejudicando o consumidor cativo em particular e o mercado de energia como um todo. Ressaltamos ainda que as concessionárias estão contratualmente obrigadas a investir para a prestação adequada dos serviços, ou seja, um dado que possuíam desde o princípio. Portanto a lucratividade não deve servir como desculpa á falta de investimentos no serviço4. 3. Respeito à modicidade tarifária Propostas 1. O preço da energia elétrica deve ter uma evolução compatível com as condições sócio-

econômicas brasileiras. Deve ser respeitado o patamar máximo das tarifas reais, corrigidas por índices oficiais de preços.

2. As tarifas, em termos reais, devem sofrer decréscimo de forma continuada, em decorrência dos aprimoramentos técnicos e ganhos de produtividade.

3. Não devem ser seguidos critérios que conduzam ao descolamento da realidade interna, como a consideração da variação do dólar, que já são captados pelo IGP-M e são repassados aos preços, ou risco país, em que predomina a atuação de capitais especulativos.

O serviço de fornecimento de energia, além de ter natureza pública, é essencial, como pode-se inferir sua inclusão no artigo 21 da Constituição Federal, como definido explicitamente na Lei 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, define atividades essenciais e regula o atendimento das necessidades (artigos 10, 11) e no Código de Defesa do Consumidor (artigo 22). Pelas suas características de bem essencial, o acesso da população ao serviço deve ser o mais amplo possível, o que torna a questão da modicidade tarifária fundamental. Esse aspecto não é uma novidade, a Lei nº 8.987/95 (Lei de Concessões) declara no art. 6º que “toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato” e define que

2 Eletropaulo, Light, COELBA, CPFL, Bandeirante, Celpe e Elektro 3 Light, Eletropaulo, CPFL, CELG, COELBA, Escelsa, CERJ, Celesc, CEB, Celpe, Coelce, CPEE, Bandeirantes, Elektro (BNDES, Cadernos de Infra-estrutura - setor elétrico - ranking 2001 - vol. 1) 4 Tomando como exemplo o contrato da Eletropaulo Metropolitana: “Art. 6º. Constitui infração, sujeita à imposição da penalidade de multa do Grupo III, o fato de: III - não implementar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento tecnológico do setor elétrico, como estipulado contratualmente; IV - não realizar as obras necessárias à prestação de serviço adequado, assim como não manter e operar satisfatoriamente as instalações e os equipamentos correspondentes;(...)” “Art. 7º. Constitui infração, sujeita à imposição da penalidade de multa do Grupo IV, o fato de: IV - não participar financeiramente nos custos de novas ligações e aumento de carga, nos termos da legislação”

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“serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”. Tarifas elevadas dificultam o adimplemento por parte dos consumidores residenciais, principalmente os de baixa renda, o que acarreta a descontinuidade do serviço em virtude dos cortes, bem como impede o acesso de um maior número de consumidores a esse serviço. A modicidade das tarifas representa a possibilidade de acesso e efetiva utilização do serviço público de forma universal. A eletricidade é um fator indispensável a toda atividade humana. Por isso, toda e qualquer discussão e decisão relativas ao tema devem ser baseadas nestes princípios. É esperado e natural que as concessionárias persigam o equilíbrio econômico financeiro (EEF). Esse princípio não pode representar, no entanto, a abolição do Princípio da Modicidade (PM) e vice-versa. Deve ficar claro que não é esperado que os setores fornecedores dos serviços públicos em geral, e de energia elétrica, em particular, solucionem os problemas da desigualdade social no Brasil. Devem, no entanto, levar em conta as condições sócio-econômicas que caracterizam nosso país, de forma a não se constituírem em fatores de agravamento das desigualdades sociais e de aprofundamento da carência material dos segmentos de menor poder aquisitivo. O fornecimento dos setores de serviços essenciais, em geral, e de energia elétrica, em particular, devem levar em conta as condições sócio-econômicas como fator basilar de seu comportamento. Todo o processo decisório regulatório e empresarial não pode ser descolado do seu parâmetro basilar: as condições sócio-econômicas de sua população. Eximir-se das exigências desse parâmetro equivale a operar no vácuo sócio-econômico, o que quer dizer, fornecer um serviço como um fim em si mesmo, deixando de cumprir suas funções dentro da sociedade e da economia. Definição e caracterização da modicidade dos preços de energia elétrica Indicaremos como a modicidade pode ser definida. O princípio da modicidade não pode ser compreendido como um índice técnico imutável. Sua compreensão só é possível quando analisado dentro de um determinado momento, caracterizado pelas condições sócio-econômicas vigentes. O valor cobrado pelos serviços essenciais deve ser comparado ao poder de consumo da população. Em caso de crescimento do nível de renda das diversas parcelas da população, incluindo aquelas pertencentes aos estratos de menor poder aquisitivo, a decorrência será que eventuais valores crescentes dos serviços não implicarão necessariamente em menor poder aquisitivo. Caso contrário, ou seja, quando as tarifas aumentam mais que o poder aquisitivo, a implicação direta será o empobrecimento dos extratos inferiores da população. O custo de um serviço essencial não pode representar parcela crescente dos rendimentos dos consumidores. Dito de outra forma, o valor cobrado pelos serviços essenciais não pode crescer mais que o rendimento dos consumidores, em geral, e dos de menor poder aquisitivo, em particular. Alguns indicadores permitem verificar que o princípio da modicidade vem sendo afrontado ao longo dos últimos anos, adquirindo tom mais sombrio no período marcado pelas privatizações das concessionárias de energia elétrica. As informações constantes em boletim editado pelo Departamento Intersindical de Estudos Sócio Econômicos, permitem verificar alguns aspectos importantes. Metade dos 60,5 milhões de trabalhadores ocupados ganha até dois salários mínimos (dados de 1999). Na região nordeste, essa faixa salarial representa 75% dos trabalhadores ocupados. Na região brasileira mais rica, o sudeste, mais de 10 milhões de trabalhadores aufere até 2 salários mínimos1.

1 Boletim DIEESE. Edição especial. Maio de 2002. Segundo os dados da última Pnad - Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar –, de 1999, 14,7 milhões de trabalhadores ocupados ganham até um salário mínimo, o que corresponde a 24,4% do total de 60,5 milhões de ocupados. Esta participação chega a 50,1 % quando considerada a faixa até dois salários mínimos, o que representa 30,3 milhões de pessoas. No Nordeste, os trabalhadores ocupados que ganham até um salário mínimo representam 47,6 % do total, ou 7,3 milhões de ocupados. Na faixa até dois salários mínimos, a participação eleva-se para 3/4 dos trabalhadores ocupados.

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A capacidade de compra de energia elétrica pela maior parte da população brasileira pode ser verificada, por exemplo, pelo confronto do salário mínimo com a tarifa de energia elétrica.

GRÁFICO: Evolução da tarifa de energia elétrica (TM) e do salário mínimo (SM) entre 1963-1999 Fonte: Ilumina e DIEESE Pelo gráfico observa-se a oscilação do poder de compra do salário mínimo vis a vis o valor da tarifa de energia elétrica. Salta à vista a forte perda do poder aquisitivo do salário mínimo frente a esse serviço que ocorre a partir de 1991, e que se agrava ano após ano. Temos que, se mais da metade dos trabalhadores brasileiros recebe até dois salários mínimos, e o valor da tarifa cresce mais que o salário mínimo, está ocorrendo uma perda do poder aquisitivo dessa parte da população, devido às majorações das tarifas de energia elétrica. Dito de outra forma, parte substancial da população brasileira está sendo empobrecida devido às elevações das tarifas de energia elétrica. Outra forma de testar a aplicação do princípio da modicidade é através da participação dos gastos com energia elétrica dentro do orçamento das famílias. Pelos dados anteriores, dado que as tarifas sobem mais que o salário da maioria, os resultados não podem ser animadores. A tarifa de energia elétrica é um preço administrado, ou seja, é reajustado de acordo com contratos ou com a regulação governamental. Como os demais preços administrados, tem subido

No Sudeste, seja na faixa até um salário mínimo ou na faixa até dois, a participação é inferior a média nacional. Entretanto, o total dos que ganham até dois salários mínimos atinge 10,5 milhões de trabalhadores em números absolutos, equivalendo a 92% dos trabalhadores desta faixa no Nordeste, e 27% superior à soma do total de trabalhadores das demais regiões, nesta faixa salarial. A importância do salário mínimo torna-se ainda mais evidente quando se analisa a distribuição dos ocupados, segundo a posição destes na ocupação. Isto porque o peso da faixa dos que ganham até um salário mínimo é expressiva quando se considera os trabalhadores com inserção vulnerável no mercado de trabalho. É o caso dos empregados domésticos, dentre os quais 55,5% recebem até um mínimo, dos trabalhadores sem carteira assinada, com 39,9% recebendo o mínimo, dos trabalhadores por conta própria, dentre os quais 31,7% ganham um mínimo. Estas participações elevam-se para 87,4%, 71,5% e 55,5%, respectivamente, quando se considera os que ganham até dois salários mínimos

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acima dos índices inflacionários2. A inflação nestes oito anos registra uma taxa de 126%, segundo o Índice do Custo de Vida (ICV) calculado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos-DIEESE. Sua origem tem sido, principalmente os grupos de bens que não enfrentam as forças de mercado, como os administrados e os oligopolizados3. No período 1995-2002, as tarifas de energia elétrica apresentaram uma elevação superior a qualquer dos índices inflacionários ao consumidor. Tomando-se por exemplo o setor elétrico do Reino Unido, verifica-se que os gastos dos consumidores com a energia elétrica têm decrescido ao longo do tempo, o inverso do que acontece no Brasil. As estatísticas existentes apontam para uma diminuição real de 31% entre 1990, época de início da privatização no Reino Unido, e abril de 20024.

Aumentos de preço comparados (dezembro 94 = 100)

183,6

332,9

208,1

100,00

150,00

200,00

250,00

300,00

350,00

Jan/

95

Abr

/95

Jul/9

5

Out

/95

Jan/

96

Abr

/96

Jul/9

6

Out

/96

Jan/

97

Abr

/97

Jul/9

7

Out

/97

Jan/

98

Abr

/98

Jul/9

8

Out

/98

Jan/

99

Abr

/99

Jul/9

9

Out

/99

Jan/

00

Abr

/00

Jul/0

0

Out

/00

Jan/

01

Abr

/01

Jul/0

1

Out

/01

Jan/

02

Abr

/02

IPCA (IBGE)IPCA - Energia elétricaIGP-M

No Brasil, a evolução das tarifas tem seguido tendência inversa no período de privatização. Entre 1995 e junho de 2002, o índice de gasto médio com a energia elétrica elevou-se em 332,89% (IBGE), contra 183,58%, medido pelo IPCA/IBGE. É fundamental que a revisão das tarifas não agrave ainda mais as distorções que o setor elétrico vem sofrendo, o que justifica as presentes propostas.

2 Os preços administrados, aqueles que são reajustados por força de contrato ou regulados em negociações com o poder público, independentemente do que ocorre no mercado, têm influência significativa nos principais índices de inflação calculados no Brasil. É o caso das tarifas de energia elétrica e de saneamento, dos ônibus e táxis, dos combustíveis, dos correios e telefones, entre outros. Seu peso nos índices varia de 15%, como no Índice Geral de Preços (IGP), medido pela FGV-Rio, a 28,83%, caso do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE e que serve de referência para as metas de inflação. Segundo a gerente do sistema de índices de preços do IBGE, Eulina Nunes, a maioria dos preços administrados, no período do Real, variou muito acima do índice geral (Gazeta Mecantil, 27.05.2002) 3 “No bens administrados, observam-se taxas elevadas tanto nos serviços (259,6%) como nos produtos (205,0%). Este grupo engloba os serviços públicos como: energia, água e esgoto, telefonia, impostos e transporte coletivo e os produtos como: combustível e gás de cozinha”. 4 Electric Association, Reino Unido

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4. Acesso pleno à informação e publicidade de todas as etapas do processo Propostas: 1. Abrir audiências públicas descentralizadas nos estados antes da aprovação dos cálculos 2. Disponibilizar todos os dados fornecidos pelas empresas e utilizados nos cálculos da base de

ativos e do fator X 3. Alocar recursos financeiros às entidades de consumidores e da socieddade para que auditem

de forma independente as revisões tarifárias Ressaltamos como fator crucial para a supervisão da sociedade e para a atuação dos consumidores o acesso pleno à informação e aos dados que serão entregues pelas empresas e utilizados para o cálculo da base de remuneração e dos fatores de produtividade. Essa transparência é fundamental para o aprendizado da sociedade e o aperfeiçoamento da regulação dos serviços públicos de energia elétrica. Ademais de ser o direito à informação princípio consagrado na Constituição Federal e no Código de Defesa do Consumidor, é a própria Lei 8987/95 que dispõe ser direito do usuário receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais coletivos. Acrescente-se a isso as disposições das Leis 8159/91 e 19653/99, esta última sobre a improbidade administrativa. O ordenamento jurídico vigente portanto, exige a transparência do processo de reajuste de tarifas de energia elétrica, com a adequada informação ao consumidor. E esta exigência não é atendida simplesmente com a realização de audiências públicas. A divulgação dos documentos que embasam ou sustentam esses processos e suas decisões é premissa para sua efetiva transparência e para a própria prestação desse serviço público essencial. A falta de informação e transparência do processo representa afronta ao direito básico de informação e de transparência, previstos no Código de Defesa do Consumidor, na Lei de Concessões, nos contratos celebrados e em diversos outros diplomas legais.