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Senac Ambiental Ano 21 N. 4 • 2013 Desafios da Política Nacional de Resíduos Sólidos Ricardo Abramovay: “Brasil perde R$ 8 bilhões pela precariedade da reciclagem” A situação de catadores e profissionais de limpeza urbana Ano 21 • N° 4 julho/dezembro 2013 ISSN 2238-6807 O futuro não precisa ir para o lixo

O futuro não precisa ir para o lixo - Departamento Nacional · Ficha elaborada pela Gerência de Documentação Técnica do Senac/DN. foto: Thinkstock. ua edição especial ... Boa

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Senac Ambiental

Ano 21 N. 4 • 2013

Desafios da Política Nacional de

Resíduos Sólidos

Ricardo Abramovay: “Brasil perde

R$ 8 bilhões pela precariedade da

reciclagem”

A situação de catadores e

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urbana

Ano 21 • N° 4

julho/dezembro 2013 ISSN 2238-6807

O futuro não precisa ir

para o lixo

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Senac – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

Departamento NacionalAv. Ayrton Senna, 5.555, Barra da TijucaRio de Janeiro - RJ - Brasil - 22775-004

www.senac.br

Conselho NacionalAntonio Oliveira Santos

Presidente

Departamento NacionalSidney Cunha

Diretor-geral

A revista Senac Ambiental é uma publicação semestral produzida pelo Gerência de Marketing e Comunicação do Senac Nacional. Os artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores. Sua reprodução em

qualquer outro veículo de comunicação só deve ser feita após consulta aos editores.

Contato: [email protected]

ExpEdiEntE

EditorFausto Rêgo

Colaboraram nesta ediçãoCarolina Massote, Francisco Luiz Noel, Gabriel Fonseca, João Roberto Ripper,

Luiz Claudio Marigo, Mário Moreira e Verônica Couto

EditoraçãoGerência de Marketing e Comunicação

Projeto gráfico e diagramaçãoCynthia Carvalho

Produção gráficaSandra Amaral

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Senac ambiental / Senac, Departamento Nacional. – n. 1 (1992)- . – Rio de Janeiro : Senac/Departamento Nacional/Gerência de Marketing e Comunicação, 1992- . v. : il. color ; 26 cm.

Semestral. Absorveu: Senac e educação ambiental. ISSN 2238-6807.

1. Educação ambiental – Periódicos. 2. Ecologia – Periódicos. 3. Meio ambiente – Periódicos. I. Senac. Departamento Nacional.

CDD 574.505

Ficha elaborada pela Gerência de Documentação Técnica do Senac/DN.

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Uma edição

especial

Editorial

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Tema da Conferência Nacional do Meio Ambiente, a Política Nacional de Resíduos Sólidos – transformada em lei há três anos, depois de duas décadas de negociações – estabelece princípios e atribui responsabi-lidades a todos os integrantes da cadeia produtiva de bens de consumo.

Os desafios são imensos. Por isso dedicamos ao tema boa parte desta edição. Falamos da Conferência Nacional e do fim dos lixões, analisamos a situação de catadores e pro-fissionais responsáveis pela limpeza urbana, conversamos com Ricardo Abramovay, que é uma das vozes mais conceitua-das no debate sobre o proble-ma do lixo.

Mas também temos lindas reportagens sobre a pesca ar-tesanal na fronteira Brasil-Uru-guai e o espetáculo de rara beleza da floração da piúva, no Pantanal.

Boa leitura!

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12Entrevista

Contra a sociedade do desperdício

Professor do Departamento de Economia da USP, Ricardo Abramovay defende a gestão

responsável do ciclo de vida dos produtos e o fim da cultura do

desperdício.

Sumário

6Capa

Sólidos desafiosEm sua quarta edição, Conferência

Nacional do Meio Ambiente produziu 60 propostas para

implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

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20Trabalho

Risco diárioProfissionais de limpeza urbana enfrentam condições insalubres

e convivem com alta taxa de acidentes no trabalho. Modelo

de coleta do lixo é o grande responsável.

40Flora

Primavera pantaneiraEspetáculo raro e que dura apenas

alguns dias, floração da piúva é uma das mais espetaculares

manifestações da natureza.

58Educação Ambiental

Conhecimento na bagagemPor que jovens brasileiros foram

buscar na Austrália especialização em disciplinas relacionadas a meio

ambiente e sustentabilidade

48Comunidades

Pesca artesanal resisteAgronegócio e avanço da

monocultura de arroz reduzem espécies de peixe nas lagoas Mirim e dos Patos, na fronteira do Brasil

com o Uruguai.

68Ecoturismo

Nas águas do Velho ChicoPasseio à foz do rio São Francisco

é um dos mais bonitos e emocionantes do país. Cenário

encanta pela beleza e pela diversidade.

30Reciclagem

Lixo que rendeAo delegar responsabilidades aos produtores de resíduos sólidos, legislação beneficia catadores.

Apesar das dificuldades, setores envolvidos com reciclagem são

otimistas.

36Notas

74Estante Ambiental

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Capa

Dentro de casa, o lixo se acumula e incomoda. É um estorvo. Quando a lata chega ao limite da capacida-de, você retira o saco (de plástico, geralmente) e leva os resíduos, devi-damente embalados, para o lado de fora. Vão se juntar a outros saquinhos semelhantes dos seus vizinhos. O lixo ainda incomoda, mas agora um pouco menos, já que está na rua. O caminhão da prefeitura passa e faz a coleta. Pronto, o problema acabou.

Acabou?

Sólidos desafiosFim dos lixões em 2014 está

mantido. Mas ainda é preciso criar mecanismos para gerar riqueza a partir do que sobra

do consumo.

Fausto Rêgo

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Política Nacional de Resíduos Sólidos

O lixo nosso de cada dia pode ir para o “lado de fora”, mas permanece – inevitavelmente – dentro do planeta. Por isso, mais do que providenciar uma destinação adequada para os resíduos que geramos, devemos en-contrar maneiras de reduzi-los.

Nos últimos dez anos, a população brasileira cresceu quase 10%. Nos úl-timos seis, o lixo produzido no país passou de 213 mil toneladas por dia para 273 mil toneladas por dia. Dados da Associação Brasileira de Empre-sas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) mostram que o Brasil gerou 64 milhões de toneladas de resíduos em 2012, dos quais 37,5% não tiveram destinação adequada. A Abrelpe estima que seria preciso in-vestir R$ 6,7 bilhões para o país cole-tar e destinar adequadamente todos os resíduos sólidos que produz.

O que fazer com os resíduos sólidos é um dos maiores desafios ambientais. No Brasil, após mais de duas décadas de muita negociação, a Política Na-cional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi finalmente aprovada há três anos, na forma da Lei 12.305/2010.

Em seu artigo primeiro, a PNRS re-sume seus objetivos: “disciplinar a gestão integrada e o gerenciamento dos resíduos sólidos, fazendo uso

de princípios, objetivos e instrumen-tos que a viabilizem e atribuindo responsabilidade aos geradores, ao poder público e às pessoas físicas ou jurídicas responsáveis, direta ou indi-retamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão de resíduos só-lidos.”

O texto se fundamenta em três con-ceitos básicos [mais informações no box]:

• gestão integrada (com a coordena-ção de ações de caráter nacional, es-tadual, microrregional, intermunicipal e municipal);

• responsabilidade compartilhada (que estabelece a divisão de respon-sabilidades entre todos os setores da sociedade, fomentando a reavaliação de padrões de consumo e a redução de possíveis impactos ambientais);

• logística reversa (mecanismo que gera obrigações, especialmente do setor empresarial, quanto ao reco-lhimento de produtos e embalagens após o consumo, de modo a reasse-gurar seu reaproveitamento no mes-mo ciclo produtivo ou sua inserção em outros ciclos).

A PNRS estabeleceu metas para eli-minação dos lixões (terrenos onde todo tipo de resíduo é depositado a céu aberto, sem qualquer controle, proteção ao meio ambiente ou pre-ocupação com as normas de saúde pública), determinou a elaboração

Lixão de Gramacho, no Rio de Janeiro, está hoje desativado. PNRS mantém para 2014 o prazo para o fim dos lixões em todo o país

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de planos de metas do poder públi-co nos âmbitos nacional, estadual e municipal, bem como a adoção de planos de gerenciamento de re-síduos sólidos na iniciativa privada. Além disso, formaliza a inclusão dos catadores de materiais recicláveis ou reutilizáveis nas cadeias de logística reversa e coleta seletiva.

Olhando para o futuro próximo, a PNRS é um passo decisivo para que o Brasil cumpra uma das metas do Pla-no Nacional sobre Mudanças Climá-ticas, que tem como objetivo reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa: obter um índice de re-ciclagem de resíduos de 20% já em 2015.

Nova riquezaNos três anos que se seguiram à cria-ção da PNRS, sua implementação progrediu muito lentamente em um país tão grande e complexo como o nosso. A elaboração dos planejamen-tos regionais ainda não é realidade em todos os estados e se concretizou apenas em aproximadamente 10% dos municípios. É preciso avançar.

Um dos autores de Lixo zero – ges-tão de resíduos sólidos para uma sociedade mais próspera, Ricardo Abramovay, professor da Faculda-de de Economia da Universidade de São Paulo (e nosso entrevistado nesta edição, veja a partir da página 12), defende a PNRS, mas alerta que, embora previsto na lei e necessário, o fechamento dos lixões (e sua subs-tituição por aterros controlados) é uma medida tímida. Imprescindível mesmo, afirma, é reduzir o que joga-mos fora e gerar riqueza a partir da-quilo que sobra do consumo. Esse é o mecanismo capaz de desencadear verdadeira transformação.

Abramovay considera importante o reconhecimento do trabalho dos catadores, mas acha que as grandes corporações devem ser responsáveis pelos sistemas de coleta e recupera-

ção dos resíduos gerados pelo consu-mo dos produtos que fabricam, assim como já ocorre em países desenvol-vidos.

O sistema de logística reversa tor-nou-se, após a aprovação da PNRS, obrigatório em algumas cadeias pro-dutivas consideradas prioritárias: des-carte de medicamentos; embalagens; óleos lubrificantes e seus resíduos; lâmpadas e aparelhos eletroeletrôni-cos. Mas há que se resolver a questão dos custos de coleta, destinação e transporte. Hoje o cenário mostra um jogo de empurra. A iniciativa privada reluta em absorver o custo em de-trimento de maior rentabilidade. E a população, de maneira geral, rejeita a cobrança da “taxa do lixo”, o que não impede que esse custo seja repas-sado ao consumidor de forma subli-minar, embutido em outros tributos. Desoneração fiscal e concessão de incentivos tributários para viabilizar a implantação da PNRS podem ser a solução, como já destacou recente-mente a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Em artigo publicado no jornal O Es-tado de São Paulo, em julho, o jorna-lista especializado em meio ambiente Washington Novaes é categórico: as

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Legislação estabelece necessidade de mecanismos

para recolhimento de embalagens pós-consumo

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Três conceitos “A gestão integrada dos resíduos sólidos inclui todas as ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, incluindo os planos nacional, estaduais, microrregionais, intermunicipais, municipais e os de gerenciamento. Os planos de gestão sob responsabilidade dos entes federados devem tratar de questões como coleta seletiva, reciclagem, inclusão social e participação da sociedade civil durante a elaboração, implementa-ção e monitoramento, estabelecendo meios de controle e fiscalização da sua implementação e operacionaliza-ção. A gestão integrada envolve também os resíduos de serviços de saúde, da construção civil, de mineração, de portos, aeroportos e fronteiras, industriais e agrossilvopastoris.

A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos abrange fabricantes, importadores, distri-buidores e comerciantes, consumidores e titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos. Está relacionada com a não geração, redução, reutilização e reciclagem, conforme o artigo 9º da PNRS – estabelecidos na ordem de prioridade na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos. Tanto a redução da geração de resíduos sólidos, do desperdício de materiais, da poluição e dos danos ambientais quanto o estímulo ao desenvolvimento de mercados, produção e consumo de produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis são objetivos da responsabilidade compartilhada. Isso envolve toda a sociedade na discussão de temas como a reavaliação dos padrões de consumo, reciclagem de materiais, oportunidade de novos negócios com viés socioambiental, ecodesign, diminuição dos impactos ambientais inerentes ao nosso modo de vida e inclusão social.

A logística reversa engloba de forma sistêmica diferentes atores sociais na responsabilização da destinação ambientalmente adequada dos resíduos sólidos. Gera obrigações, especialmente do setor empresarial, de rea-lizar o recolhimento de produtos e embalagens pós-consumo, assim como reassegurar seu reaproveitamento no mesmo ciclo produtivo ou garantir sua reinserção em outros ciclos produtivos. De acordo com a PNRS, o sistema de logística reversa tornou-se obrigatório para as seguintes cadeias de produtos: agrotóxicos, seus resíduos e embalagens; pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; produtos eletroeletrônicos e seus componentes. A partir de acordos setoriais firmados entre o poder público e o setor empresarial, os sistemas de logística reversa serão estendidos a produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando, prioritariamente, a viabilidade técnica e econômica da logística reversa, bem como o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados.”

Fonte: Texto orientador da Conferência Nacional do Meio Ambiente – Resíduos Sólidos

indispensáveis transformações de-mandarão muito esforço. “Não há alternativas a não ser a sujeira, a de-gradação de áreas urbanas e o des-perdício”, vaticinou.

ConferênciaA importância desse assunto levou o governo federal a dedicar ao tema a quarta edição da Conferência Nacio-nal do Meio Ambiente, realizada de 24 a 27 de outubro, em Brasília (DF). O processo preparatório envolveu uma extensa mobilização que levou à organização de 643 conferências municipais ou microrregionais (que envolveram, ao todo, 3.652 municí-

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Edição especialDiante da importância e do tama-nho dos desafios que a questão do lixo impõe à nossa sociedade, esta edição da revista Senac Ambiental aprofunda a discussão sobre alguns dos principais temas que envolvem a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Acompanhe nas próximas páginas!

pios) e outras em cada unidade da federação, além de conferências li-vres e um encontro virtual que reuniu mais de 200 mil pessoas de todo o país. O evento nacional foi a maior conferência ambiental já realizada no Brasil, com a participação de 1.130 delegados e representações de go-vernos, empresários e organizações da sociedade civil.

Das mais de 3.500 propostas en-caminhadas pelas conferências prepara tó rias, 60 foram aprovadas pela Conferência Nacional, igualmen-te distribuídas entre os quatro eixos de atuação em que ela foi estrutu-rada. No eixo Produção e Consumo Sustentável, ações voltadas para a produção de alimentos sustentáveis e segurança alimentar. Em Redução dos Impactos Ambientais, ideias so-bre coleta seletiva e compostagem orgânica dos resíduos. No eixo Gera-ção de Trabalho, Emprego e Renda, defesa do trabalho decente, destina-ção de recursos e investimentos em cooperativas de materiais recicláveis e desoneração tributária das coope-rativas. Por fim, no eixo Educação Ambiental, capacitação de agentes e professores de educação ambiental e fortalecimento das comissões inte-rinstitucionais de educação ambien-tal. O documento com todas as pro-postas está disponível no site www.conferenciameioambiente.gov.br.

LixõesNa abertura do encontro, a minis-tra Izabella Teixeira ratificou agosto de 2014 como prazo para o fim dos lixões. Dirigindo-se aos prefeitos e seus representantes, lembrou a ne-cessidade de cada município apre-sentar seu plano de ação e foi en-fática: “Acabar com os lixões não é apenas cumprir prazos, é transformar os catadores em empreendedores”. Segundo ela, essa categoria deverá ter cada vez mais espaço nas políticas públicas ambientais. Não por acaso, a ideia de desenvolvimento sustentá-

vel com inclusão social foi marcante no documento aprovado ao final do encontro.

Há resistência, porém, em boa parte dos municípios, sob a alegação de falta de estrutura e recursos para a instalação de aterros sanitários. A Frente Nacional dos Prefeitos defen-de a extensão do prazo conforme a realidade de cada município e argu-menta que mais de dois terços dos governantes eleitos em 2012 não estavam no cargo quando a lei foi aprovada, responsabilizando as ges-tões anteriores. A legislação prevê sanções que podem levar à inelegibi-lidade dos atuais prefeitos.

Segundo o Instituto de Pesquisa Eco-nômica Aplicada, 50,5% dos municí-pios brasileiros ainda convivem com os lixões. Esse percentual é muito maior nas regiões Nordeste (89,1%), Norte (84,6%) e Centro-Oeste (72,7%) e consideravelmente menor no Su-deste (18,4%) e no Sul (15,3%).

Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, destacou a

atuação dos catadores

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EntrEviSta

Contra a sociedade do “jogar

fora”

Professor do Departamento de Economia da USP, Ricardo Abramovay

defende a responsabilidade compartilhada na gestão de

resíduos

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é um passo im-portante, mas não vai resolver sozinha todos

os problemas do país em relação ao lixo que pro-

duz. Autor de livros sobre a questão ambiental – e Lixo zero:

gestão de resíduos para uma sociedade mais próspera é o mais recente –, o professor Ricardo Abramovay, do Departamento de Economia e do Instituto de Relações Internacio-nais da Universidade de São Paulo, entende que há princípios éticos que devem permear a PNRS para que o Brasil enfrente a cultura do descarte e do desperdício e passe a gerir de forma responsável o ciclo de vida de seus produtos.

Quem suja deve se responsabilizar pelo que faz, ele afirma. Isso inclui os gastos com separação do lixo, coleta, transporte e reaproveita-mento. O consumidor, por sua vez, deve compreender que o custo re-

sultante das medidas necessárias à gestão adequada dos resíduos sóli-dos é pago de forma indireta: com preservação dos recursos naturais, cidades mais limpas e maior quali-dade de vida. “O desafio mais im-portante”, anuncia, “é fazer no setor de embalagens, eletrônicos, pilhas e lâmpadas aquilo que já se faz com pneus, baterias automotivas, óleos lubrificantes, embalagens de óleos lubrificantes e embalagens de agro-tóxicos: o setor privado (em coor-denação com o setor público, claro) organiza e paga pelo recolhimento e pela destinação correta dos rema-nescentes daquilo que ofereceu ao consumidor”.

Senac Ambiental – O prazo para implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos termina em 2014, mas algumas das suas diretrizes ainda permanecem no papel. Ainda é razoável imaginar que a PNRS será integralmente implementada nesse período? Que expectativa podemos ter em relação a isso?

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Ricardo Abramovay – Seria ilu-sório imaginar que a gestão dos resíduos sólidos vai mudar da água para o vinho numa certa data. É um processo. O que tem data – e isso provavelmente não será cumprido – é o fim dos lixões, dos aterros controlados, e a generalização dos aterros sanitários. Em 2007, lixões e aterros controlados recebiam 60% dos resíduos brasileiros. Hoje isso baixou para 40%. Os maiores municípios conseguiram avançar na implantação dos aterros sanitá-rios. Para pequenos municípios é mais difícil, pois exige a formação de consórcios que supõem mudar a lógica com a qual se encara o tema. Mas acabar com os lixões não é o mais importante na PNRS. Este é o mínimo dos mínimos para uma so-ciedade do século 21. Mas nem de longe é o desafio mais importante.

Senac Ambiental – E quais os grandes desafios para o Brasil em relação à PNRS?

Ricardo Abramovay – O funda-mental é que o Brasil deixe de ser uma sociedade do “jogar fora” e se converta em uma sociedade saudá-vel na maneira como gere o ciclo de vida de seus materiais. Este é um princípio ético, um valor sub-jacente à PNRS. Os remanescentes do consumo devem ser reinseridos e revalorizados por sua nova inser-ção na vida econômica sob a forma de bens e serviços que agreguem valor aos materiais que até então eram considerados lixo. Isso supõe a responsabilidade compartilhada, como diz a lei. O ponto de partida desta partilha está na revelação de custos socioambientais hoje ocul-tos. O princípio tem de ser o do poluidor pagador. A empresa que

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Hoje os lixões e aterros sanitários ainda recebem

40% dos resíduos gerados no país

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oferece um produto ao consumidor tem de responder pela organização e pelo pagamento do sistema que vai permitir que esse bem seja devi-damente coletado e reaproveitado, transformado em nova fonte de ri-queza. Isso vai onerar o consumi-dor, claro, que passará a pagar por um custo cuja gratuidade, até aqui, se exprimia em destruição de ecos-sistemas, em cidades sujas, rios e mares poluídos. O desafio mais importante é fazer no setor de em-balagens, de eletrônicos, de pilhas e lâmpadas aquilo que já se faz com pneus, baterias automotivas, óleos lubrificantes, embalagens de óleos lubrificantes e embalagens de agro-tóxicos: o setor privado (em coor-denação com o setor público, claro) organiza e paga pelo recolhimento e pela destinação correta dos rema-nescentes daquilo que ofereceu ao consumidor.

Senac Ambiental – A gestão ade-quada do lixo implica mudanças no modelo econômico, no estilo de vida e nos padrões de consumo. Isso leva tempo e demanda inves-timento em educação. Em que é possível avançar em curto e médio prazos?

Ricardo Abramovay – Nos países que mais avançaram nessa direção, esse investimento foi feito pelo pró-prio setor privado. Na política euro-peia de Ponto Verde [mais informa-ções no box], as empresas pagam campanhas publicitárias interes-santes que levam informação preci-sa ao consumidor sobre o que ele deve fazer com seus resíduos. Dizer que o consumidor não coopera por razões culturais é um equívoco. Se houver informação em campanhas inteligentes e orientação precisa nos próprios produtos, o consumi-dor tende a ter um comportamento

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ilGalpão de cooperativa de reciclagem no Distrito Federal: gestão adequada do lixo é um dos maiores desafios

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adequado. Mas o mais importante é a orientação da PNRS de que haja redução, ou seja, de que se pro-duza cada vez menos embalagens. Esta é uma discussão fundamen-tal: sempre que pudermos fazer em casa aquilo que compramos, haverá um ganho social imenso. Muitos produtos, hoje, poderiam ser ofe-recidos de forma compacta, desde que o consumidor fosse orientado a acrescentar-lhes, por exemplo, água na hora de sua utilização. Reduzir a quantidade de embalagens e conce-ber um tipo de design que se volte para uma desmontagem e uma reu-tilização fáceis e economicamente viáveis (no caso dos eletrônicos, isso é fundamental) são desafios que vão exigir muita inovação, mas que podem nos conduzir a uma so-ciedade melhor na maneira de uti-lizar os materiais de que depende.

Senac Ambiental – O senhor tem afirmado que a atuação do setor privado é essencial para o sucesso da PNRS. O que impede as grandes empresas de adotar no Brasil práti-cas de coleta e recuperação de re-síduos que já executam em outros países?

Ricardo Abramovay – Os países que estão conseguindo reduzir a produção de resíduos e ampliar a reciclagem obedecem a quatro de-terminações básicas. Em primeiro lugar, o setor privado arca com os custos da logística reversa. Espe-rar que o pagamento da reciclagem venha das prefeituras é perpetuar a sociedade do desperdício. Esta foi a conclusão a que chegou uma recém-criada organização norte-a-mericana chamada Recycling Re-invented, que conta com apoio da gigante global Nestlé Waters. Quem

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Custo ambiental: destinação inadequada

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tem de organizar e pagar pela cole-ta seletiva é o setor privado.

A segunda determinação é que se formem organizações públicas e não estatais, sob a direção do setor privado (como já existe no Brasil para pneus, embalagens de agrotóxicos e óleos combustíveis) e que colocam em funcionamento esta logística reversa e fazem as campanhas de informação para os consumidores.

A terceira determinação é que o consumidor tem um papel decisi-vo, não apenas separando os ma-teriais de maneira adequada, mas pagando de forma clara e visível a coleta de seus resíduos. A dema-gógica abolição da taxa do lixo no Brasil e sua demonização foram perdas importantes para a política pública, pois escondem os custos no imposto territorial e impedem que se beneficiem aqueles que fa-zem gestão mais adequada.

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Para Abramovay, a ação dos catadores é fundamental. “Não é admissível que continuemos mandando riqueza para o lixo”, afirma

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Por fim, o Estado tem um papel fundamental em articular toda esta política e estabelecer metas para que ela seja levada adiante.

Senac Ambiental – Lixo também pode ser fonte de riqueza? De que forma estamos avançando nesse aspecto?

Ricardo Abramovay – O Brasil perde hoje, anualmente, oito bi-lhões de reais pela precariedade da reciclagem. O objetivo tem de ser lixo zero. Não é admissível, num mundo que caminha para escas-sez de materiais e onde a econo-mia pressiona a oferta de serviços ecossistêmicos, que continuemos mandando riqueza para o lixo, mesmo que seja para aterros sani-tários.

Senac Ambiental – Qual o valor da reciclagem no contexto da re-dução de resíduos, já que ela não contesta a cadeia de consumo?

Ricardo Abramovay – Quando os custos da reciclagem começarem de fato a ser pagos pelo setor pri-vado (e, consequentemente, pelos consumidores), as pessoas passa-rão a se questionar a respeito da maneira como os produtos são em-balados. Portanto há um potencial de contestação quanto à cadeia de consumo. Contrariamente a uma imagem comum, o Brasil não é uma sociedade de reciclagem. O papel dos catadores é fundamen-tal, como é fundamental que eles se organizem melhor e seu traba-lho seja mais valorizado, o que co-meça a acontecer. Esta valorização não pode vir apenas do que eles vendem. Ela tem de vir também do serviço ambiental de retirar das ruas produtos que iriam provocar danos imensos. Alguns desses produtos (latinhas, por exemplo) têm valor. Outros, não. Mas é es-sencial pagar para que estes que têm pouco valor também sejam destinados à reciclagem.

Ponto VerdeConforme a legislação europeia so-bre gestão de embalagens e seus resíduos, os embaladores e impor-tadores são responsáveis pela desti-nação adequada, pós-consumo, dos materiais que produzem e comer-cializam. Dessa forma, ou cuidam autonomamente desse processo ou entregam a tarefa a terceiros devida-mente licenciados.

Surgiu daí uma iniciativa chamada Ponto Verde, desenvolvida pela orga-nização Packaging Recovery Organi-sation Europe (PRO Europe), baseada em Bruxelas, na Bélgica. A entidade foi criada em 1995, reunindo um gru-po de fabricantes de embalagens que assumiu o compromisso com a co-leta seletiva, o reaproveitamento e a reciclagem de seus produtos.

A PRO Europe criou a chancela Pon-to Verde, que tem status de refe-rência de padronização e qualidade no processo de coleta, separação e reciclagem de embalagens usadas. Os países que aderem ao sistema firmam acordos com empresas certi-ficadas, as quais ficam responsáveis por todo o processo de descarte ou reaproveitamento, e estabelecem metas de reciclagem e destinação adequada.

Saiba mais em www.pontoverde.pt e www.pro-e.org.

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Lixeiro, gari, coletor de lixo, traba-lhador da limpeza urbana ou, em palavras ecologicamente corretas, coletor de resíduos sólidos. As de-nominações variam, assim como as formas de recolhimento do lixo e as condições de segurança e saúde dos brasileiros que atuam na atividade – estimados em 225 mil pessoas pelo Ministério das Cidades. Diariamente, chova ou faça sol, eles coletam mais de 150 mil toneladas de resíduos, que somam volume superior a 55 milhões de toneladas por ano. Mas, apesar da função de utilidade públi-ca, esses trabalhadores nem sempre recebem a devida atenção no debate ambiental, ao contrário dos catado-res, associados a temas de apelo po-pular como a reciclagem e a inclusão social.

Prova de que os coletores merecem um olhar mais atento dos governos e da sociedade é a grande ocorrência de acidentes de trabalho na catego-ria, uma das mais afetadas pelo pro-blema na economia formal. Em 2011, foram 6.588 casos – 18 por dia – re-gistrados na coleta de resíduos não perigosos, de acordo com o Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (AEAT) lançado no ano passado pelo

Risco diário

Modelo de coleta de lixo é o grande responsável pela

taxa de acidentes envolvendo profissionais de limpeza

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Ministério da Previdência Social. O AEAT 2011 mostra que a taxa de in-cidência de acidentes entre os cole-tores é de 65,66 por mil vínculos pre-videnciários. É uma das mais altas exposições ao risco no mercado de trabalho, contra média nacional de 18,13 casos por mil trabalhadores.

Cortes e perfurações nas mãos, mes-mo com uso de luvas, são ocorrên-cias típicas entre os coletores. Eles também sofrem ferimentos em ou-tras partes do corpo, entorses e que-das. Algumas podem levar à morte, como nos casos em que caem do estribo dos caminhões compacta-dores. No Sindicato dos Trabalha-dores em Empresas de Prestação de Serviços de Asseio e Conservação e Limpeza Urbana de São Paulo, o di-retor do Departamento de Saúde do Trabalho, João Capana, alerta que o número real de acidentes supera o das estatísticas. “Chega ao dobro, se consideramos as subnotificações,

os acidentes ocorridos no serviço público e aqueles que não tiveram benefícios da Previdência”, afirma.

As mortes no trabalho foram pelo menos três de janeiro a outubro de 2013. Em março, no município para-naense de Ponta Grossa, o coletor Carlos Eduardo Felipe Alves de Sou-za, 22 anos, morreu atropelado por um compactador da empresa Ponta Grossa Ambiental quando o moto-rista deu marcha a ré. No mês de junho, em Teresópolis (RJ), Luiz Fer-nando Pereira Barbosa, 28 anos, da Sellix Ambiental, teve morte instan-tânea sob o caminhão após a quebra do suporte em que se pendurava. Outro que morreu atropelado pelo compactador, em agosto, em Cri-ciúma (SC), foi Júlio Cesar Líbero, 35 anos, ao escorregar e ser colhido por uma das rodas dianteiras do veiculo, da empresa JC Lopes.

Quanto aos cortes e perfurações, grande parte decorre da negligência

Coletores estão entre as cate-gorias com mais altos índices de acidentes de trabalho

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da população ao acondicionar vidro quebrado, lâminas, agulhas de se-ringas e outros objetos perfurantes nos sacos plásticos, que se tornaram marca do descarte de lixo no Brasil. “Não é comportamento comum pensar no gari. As pessoas não se preocupam com o fato de que o lixo vai ser movimentado por alguém”, queixa-se na Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janei-ro (Comlurb) o coordenador especial da Diretoria Técnica e de Logística, Gustavo Puppi. Além de luvas de borracha nitrílica, resistente a per-furações, e uniformes reforçados, a empresa – a maior do país – é das poucas que fornecem borzeguins com palmilhas de metal, para evitar que objetos pontiagudos furem os pés dos garis.

Tolerância ao riscoAutor de tese de doutorado sobre segurança e saúde dos coletores e perito do Ministério Público do Tra-balho em Mato Grosso do Sul, o en-genheiro Luiz Carlos Alves da Luz la-menta a tolerância social em relação aos riscos na rotina dos coletores de lixo. “Há uma falsa ideia de que não existem coisas viáveis economi-camente que possam ser feitas para que sejam melhoradas as condições de trabalho daqueles que lidam com resíduos sólidos, principalmente na coleta domiciliar. Isso resulta em uma aceitação tácita das condições de labor vividas por eles”, lamenta.

Luz, que apresentou a tese em 2011, com dados colhidos em Campo Grande e no município paulista de Penápolis, constatou que 76% dos acidentes com coletores estavam relacionados a cortes ou perfura-ções – e 7%, provocados por agu-lhas de seringas. As partes do corpo mais atingidas foram mãos, pernas e joelhos. “Ao acondicionar inade-quadamente o resíduo perfurante ou cortante, a população torna-se a principal responsável pelos aci-

dentes com os coletores”, critica. Quanto ao risco biológico, 65% das enfermidades e dores relatadas pe-los trabalhadores se referiam a mico-ses, sarnas e larva migrans cutânea (o popular bicho geográfico).

Em face da vulnerabilidade da ca-tegoria frente aos riscos – alguns inerentes à coleta manual –, cresce entre gestores do setor, sindicalistas e estudiosos a defesa da mecaniza-ção do recolhimento de lixo nas ci-dades brasileiras, a exemplo do que é feito em muitas da Europa e dos Estados Unidos. Na base do mode-lo está a coleta em prédios, ruas e comunidades por meio de contêine-res, esvaziados mecanicamente nos compactadores, cabendo aos garis a operação do sistema, sem con-tato com os resíduos. Pioneira na conteinerização semiautomatizada, iniciada no Rio há 15 anos, a Com-panhia Municipal de Limpeza Urba-na (Comlurb) distribuiu aos cariocas, em 2012, 50 mil desses recipientes. São feitos de plástico e têm capaci-dade para 240 litros.

Outra rota tecnológica que desponta no Brasil é o uso de contêineres me-tálicos de alta capacidade, erguidos e despejados nos compactadores por dispositivo de carregamento la-teral. Adotado em vários locais de Porto Alegre e das cidades gaúchas de Caxias do Sul, Santa Maria, Pelo-tas, Venâncio Alves e Bagé, o siste-ma foi lançado no país em 2007 pela empresa chilena Themac, subsidiária de um grupo industrial da Itália. No Rio, 200 desses contêineres, cober-tos, com 3,2 mil litros, estão sendo testados pela Comlurb em comuni-dades de baixa renda.

“A conteinerização combina a segu-rança do trabalhador com a produti-vidade. É muito mais rápido do que catar saco de lixo no chão e jogar no caminhão”, diz o coordenador Gus-tavo Pupp, da companhia carioca, que coleta sete mil toneladas de lixo

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domiciliar por dia. Em São Paulo, o diretor sindical João Capana, técnico em segurança do trabalho, também defende avanços tecnológicos que dispensem o coletor do manuseio do lixo. “A conteinerização é a me-lhor saída. Enquanto o trabalho for feito de forma manual, os riscos es-tarão aí”, adverte.

Diagnóstico nacionalNa falta de números totalizantes so-bre a coleta no país, o retrato mais aproximado da realidade em que

trabalham os coletores aparece no Diagnóstico do Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos 2011, do Ministério das Cidades. Divulgado em junho, como parte do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, o trabalho reúne dados de 2.100 mu-nicípios, onde viviam 130 milhões de pessoas – 67,7% da população dos 5.565 municípios brasileiros. Nas áreas urbanas, a coleta de resíduos domiciliares atendia 98,4% dos mo-radores, tendo na dianteira a Região Sul, com 99,4% de cobertura, e na retaguarda a Norte, com 94,8%.

A participação voluntária no Diag-nóstico sugere que as 2.100 prefei-turas – a maioria, de pequeno porte – possuem níveis mínimos de coleta dos resíduos sólidos e de gestão das informações geradas no serviço. Na média, o volume de lixo domiciliar e público coletado por dia foi de 0,96 quilo por morador urbano, somando 113 mil toneladas diárias no univer-so pesquisado, correspondentes a 41,5 milhões de toneladas no ano. Projetando o cálculo para as áreas urbanas de todo o país, o Ministério estimou o recolhimento de 151,6 mil toneladas de lixo por dia, totalizando 55,3 milhões de toneladas no ano.

Na coleta dos resíduos nos 2.100 municípios, foram utilizados 16.896 veículos, dos quais 6.513 (38,5%) eram caminhões compactadores. Os basculantes, de carroceria comum e baús somaram 7.412 (43,9%); os tratores com reboque, 1.959 (11,6%); os caminhões poliguindastes, 428 (2,5%); os veículos de tração animal, 413 (2,4%); e as embarcações, 171 (1%). De acordo com o Diagnóstico, as empresas privadas eram proprie-tárias de 4.579 (70,3%) compactado-res, 4.264 (57,5%) outros caminhões e 274 poliguindastes (64%), contro-lando uma frota de 9.888 (58,5%) veí-culos de todos os tipos.

No manejo do lixo, segundo o Minis-tério das Cidades, foram mobiliza-dos 225.532 trabalhadores em todo

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o Brasil em 2011. A maioria esteve a serviço das empresas privadas: 120.892 (53,6%). Somados os contin-gentes das companhias particulares e das prefeituras, o Sudeste concen-trava 117.104 trabalhadores; o Nor-deste, 46.096; o Sul, 30.646; o Cen-tro-Oeste, 17.938; e o Norte, 13.748.

Falta de padrõesPelas peculiaridades da profissão, a Federação Nacional dos Trabalha-dores em Serviços, Asseio e Con-servação, Limpeza Urbana, Ambien-tal e Áreas Verdes defende que os padrões de segurança e saúde na coleta de lixo tenham norma regu-lamentadora especial do Ministério do Trabalho e Emprego. A proposta, feita com base em manual de segu-rança da Comlurb, foi acolhida em setembro pela Comissão Tripartite Paritária Permanente do Ministério, composta por representantes das centrais sindicais, confederações patronais e governo.

“Cada lugar do Brasil coleta de uma maneira diferente. Em alguns, ain-da usam tração animal; em outros, os trabalhadores são transportados com o lixo em caminhões basculan-

tes. Há situações em que os veículos são muito altos para os coletores e as lixeiras também. Propomos uma padronização, pois tudo isso são fa-tores de acidentes”, explica o sindi-calista João Capana, acrescentando adversidades que resultam de pro-blemas de conservação das cidades brasileiras: “Além de ter de correr com o saco de lixo, o gari sofre com as calçada e ruas esburacadas, que provocam entorses e quedas”.

A exemplo da maioria das categorias profissionais, a dos coletores tem re-gras de segurança e saúde espalha-das por várias normas regulamenta-doras do Ministério do Trabalho. A natureza insalubre da profissão é prevista na NR 15; os parâmetros ergonométricos para equipamentos e instalações, na NR 17; as medi-das especiais para o trabalho a céu aberto, na NR 21; as condições sa-nitárias e de conforto nos locais de trabalho, na NR 24; e as precauções obrigatórias para o recolhimento de lixo hospitalar, na NR 32. Na defesa de uma norma específica, sindicatos

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dos coletores invocam o exemplo dos trabalhadores de matadouros e frigoríficos, que contam desde abril com uma NR especial, a 36.

Profissão esquecidaUm dos fatores associados às condi-ções de trabalho sofríveis no setor é a delegação do serviço a empresas privadas em muitos municípios. “O fato de serem trabalhadores tercei-rizados faz que a precarização do trabalho e a preocupação com as questões de segurança e saúde dei-xem muito a desejar”, diz, na capital paulista, a psicóloga Tereza Luiza Ferreira, chefe do Serviço de Socio-logia e Psicologia da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro). O sindicalista João Capana obser-va, porém, que em muitos casos “a terceirização tem se mostrado mais eficiente” para os coletores, compa-rada ao despreparo e à escassez de recursos de pequenas prefeituras.

Há mais de duas décadas dedicada ao tema, Tereza conta que, nos anos 1990, a abordagem ambiental da co-leta dos resíduos sólidos ofuscava completamente a realidade enfrenta-da pelos profissionais do setor. Um dos estudos de que ela participou foi o levantamento dos riscos ocu-

pacionais na coleta em São Paulo. A pesquisa reuniu dados de 2002 a 2010 e subsidiou o Ministério Públi-co do Trabalho (MPT) em inquérito que resultou numa ação civil pública em favor de medidas para melhorar a rotina dos garis paulistanos.

A incidência do alcoolismo entre os profissionais chamou a atenção da psicóloga da Fundacentro logo nos primeiros contatos, em 1990. “Nos perguntávamos por que os coletores bebem tanto. A questão nos levou a perceber o sofrimento, a invisibilida-de, as dores no corpo, a vergonha, a exclusão do trabalhador”, lembra. Tereza começou estudando o signi-ficado do trabalho com o lixo. “Eles lidam com aquilo que não tem mais utilidade para os outros, que não tem mais valor. A vida desses tra-balhadores denuncia a relação e a associação histórica do lixo com su-jeira, pobreza, prostituição e morte.”

Em 2011, Tereza montou a exposi-ção fotográfica Coletores de Lixo: Arriscando, Brincando e Limpan-do, no Centro Técnico Nacional da Fundacentro, no bairro de Pinhei-ros – endereço elegante por onde os trabalhadores da limpeza urbana só haviam passado antes para reco-lher o lixo. Formada por 40 painéis legendados com falas dos coleto-res, a mostra estimulou a reflexão pública sobre seus sentimentos e percepções, marcados por vivências de marginalização social. O conteú-do também resultou numa cartilha sobre a realidade dos coletores e a importância de a população embru-lhar em papel os vidros quebrados, agulhas e latas, a fim de evitar aci-dentes na coleta.

Expressão da desvalorização histó-rica do trabalho dos coletores foi o episódio em que uma falha técnica no jornal da TV Bandeirantes levou ao ar, em 31 de dezembro de 2009, uma alusão depreciativa do jorna-lista Boris Casoy a garis que haviam

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No Brasil, ainda é predominante o acondicionamento em sacos plásticos

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desejado feliz ano novo aos teles-pectadores. “Dois lixeiros desejando felicidades do alto de suas vassou-ras! O mais baixo na escala do tra-balho”, disse o apresentador. Pelo comentário, pelo qual se desculpou depois, Casoy e a emissora foram condenados pela 8ª Câmara de Di-reito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a pagar in-denização de R$ 21 mil, por danos morais, a um dos coletores ofendi-dos, Francisco Gabriel de Lima.

Discussão judicialA ação civil pública aberta pelo MPT em São Paulo, no ano de 2010, colo-cando na berlinda a Prefeitura e as concessionárias Ecourbis Ambiental e Logística Ambiental de São Paulo (Loga), que recolhem as 10 mil tone-ladas de lixo domiciliar produzidas diariamente na cidade, continua em tramitação no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2° Região. Em outubro, a Prefeitura, as empresas e o Ministério Público examinavam laudo pericial sobre a situação atual da coleta. Partiu das concessioná-rias a solicitação de nova perícia, sob o argumento de que a ação foi instaurada com base num quadro de segurança e saúde superado pelas empresas.

As adversidades flagradas pelo MPT entre os coletores paulistanos na dé-cada passada incluíam desde a falta de equipamentos de proteção indi-viduai (EPIs), como luvas, uniforme e botas apropriadas, até a realização de refeições em meio ao ambiente de trabalho, passando por jornadas de até 12 horas sem remuneração extra. Como não houve acordo com as empresas em torno de soluções, o Ministério Público não só cobrou providências, mas também pediu ao TRT a punição das concessionárias com a aplicação de multa indeniza-tória de R$ 10 milhões.

Representante da Ecourbis no Sindi-cato das Empresas de Limpeza Ur-

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Contêiner de alta capacidade está sendo testado no município do Rio de Janeiro

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bana no Estado de São Paulo (Selur), o superintendente de administração da empresa, Adalberto dos Santos Oliveira, afirma que “a realidade mudou muito” nas condições de trabalho dos coletores paulistanos. ”As empresas chegaram à conclu-são de que o investimento em ações preventivas é mais produtivo, além de mais barato”, afirma, chamando atenção para o aumento da preo-cupação com segurança e saúde na gestão das concessionárias. No caso da Ecourbis, Oliveira diz que a em-presa tem priorizado 15 itens relacio-nados à prevenção de acidentes e à promoção da saúde dos coletores e motoristas.

Responsável pelo recolhimento do lixo na populosa área sudeste da ca-pital paulista desde 2004, a Ecourbis é uma das gigantes do setor na Amé-rica do Sul. Criada em 2004 pelo gru-po Queiroz Galvão, emprega 2,4 mil trabalhadores em duas grandes ba-ses do serviço de coleta, nos bairros de Itaquera e Campo Limpo. Opera duas estações de transbordo e, no bairro São Mateus, um aterro sani-tário que recebe sete mil toneladas diárias de resíduos. De acordo com o superintendente de administração, a concessionária tem sido rigorosa no fornecimento dos recursos materiais para a proteção dos coletores e, ao mesmo tempo, investido em ações lúdicas de conscientização para evi-tar acidentes na coleta e nos deslo-camentos.

“O coletor só pode se deslocar até o setor dentro da cabine do caminhão. Se for pego fora do padrão, está su-jeito a advertência e até demissão”, assinala Oliveira, para acrescentar que a empresa instalou cintos de segurança adicionais nas cabines, para proteção do trio de coletores de cada veículo. Em parceria com fabricantes, a Ecourbis desenvolveu luvas e calçados especiais de alta resistência, além de fornecer jaque-tas de inverno e filtro solar para os

coletores. Além de recorrer a vídeos para difundir conceitos de seguran-ça, a empresa dinamizou a Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho, criou gincana asso-ciada ao tema e lançou o prêmio mensal Acidente Zero, sorteando brindes entre os coletores que não se acidentam. “Eles se dedicam mui-to para não haver acidentes”, diz o superintendente.

No sindicato dos coletores paulista-nos, o dirigente João Capana reco-nhece que as condições de seguran-ça melhoraram e que o tratamento aos trabalhadores foi “mais humani-zado”, mas ressalva que os proble-mas decorrentes da coleta manual permanecem, gerando acidentes e sobrecarregando os coletores. “O modus operandi continua o mesmo, quando a saída para a questão da segurança e da saúde é a conteine-rização. O volume de lixo aumentou e o coletor está trabalhando mais. Defendemos a diminuição da carga horária, pois não dá para o trabalha-dor correr mais de 30 quilômetros por dia subindo e descendo do ca-minhão”, reclama.

Exemplo catarinensePor conta da atuação do MPT, Floria-nópolis tornou-se exemplo na ado-ção de soluções para o transporte dos garis. Em 2010, Na condição de ré em ação na Justiça do Trabalho, a Companhia Melhoramentos da Ca-pital (Comcap), vinculada à Prefei-tura, firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) e descentralizou a logística do serviço, erradicando os riscos que os coletores corriam nos estribos dos caminhões em estra-das de alta velocidade. De pé, agar-rados em suportes da carroceria, eles se arriscavam em percursos de até 50 quilômetros entre a sede da empresa, no bairro continental do Estreito, e locais como o Costão do Santinho e Rio Vermelho, no norte da ilha.

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A Comcap ativou três bases regio-nais de operação, onde os coletores que moram em cada região passa-ram a tomar os caminhões, des-locando-se no estribo apenas em trajetos de baixa velocidade, de uma rua a outra. “Acabamos com 80% dos riscos que corriam os garis”, salienta o presidente da companhia, Ronaldo Freire. “Investimos na segurança e ainda obtivemos ganho de tempo na operação, embora o grande objetivo tenha sido a proteção do ser huma-no”. Em trajetos mais longos, os ga-ris viajam em trio na cabine, com o motorista, ou em Kombis.

No quesito salário, a Comcap tam-bém se destaca, ao lado de Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo. Na ca-pital catarinense, a remuneração do coletor iniciante soma R$ 2 mil men-sais, contados salários, adicional de insalubridade, gratificações e bene-fícios como vales-refeição e trans-porte. Dos 394 garis, 205 atuam na coleta convencional, 55 na seletiva e os demais em outros serviços. No contingente, em que 129 completa-ram o ensino médio e 37 têm esse nível incompleto,123 trabalhadores

possuem de dez a 20 anos de casa e 117 têm pelo menos cinco anos. Caso raro no setor em todo o país, sete garis exercem postos de chefia – entre eles, Lidnei Machado Rodri-gues, gerente do Departamento de Coleta de Resíduos Sólidos.

Embora exemplos de respeito a nor-mas de segurança humanizem a ro-tina dos coletores, perdura o proble-ma de fundo da coleta à brasileira: o modelo manual. “Em nosso país, quando se fala em pequenos gera-dores de resíduos sólidos, predo-mina o acondicionamento em sacos plásticos, incluindo as sacolas de su-permercados, dispostos na frente de residências ou pontos de comércios para que sejam coletados. Isso difi-culta a coleta mecanizada e, devido à pequena distância entre os pontos de coleta, favorece a utilização de veículos com estribos”, salienta o en-genheiro Luiz Carlos Alves Luz. Por causa do descarte do lixo em sacos na porta de casas e lojas, o desafio do Brasil é mudar hábitos culturais e modelos de coleta, a fim de livrar dos riscos os coletores de resíduos sólidos.

Coleta mecanizada proporciona maior

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A geração de lixo é uma preocupa-ção recorrente nos grandes centros urbanos. A gestão do enorme vo-lume de resíduos é um velho e co-nhecido problema, que, no caso do Brasil, ainda parece longe de uma solução. No estado do Rio de Ja-neiro, com 92 municípios, existem apenas 11 aterros controlados, que recebem o lixo de 16 municípios1.

O prejuízo fica não somente para as gerações futuras, mas também para as atuais, como afirma a pro-fessora Katia Dantas, da Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que usa o exemplo do deslizamente de terra no Morro do Bumba, no município de Niterói, há três anos, para alertar sobre o perigo do acúmulo de gás metano. “Poucas pessoas sabem por que não se deve ocupar um ater-ro”, diz.

Katia coordena o programa Recicla CT, no Centro Tecnológico da UFRJ, e ressalta que a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que foi dis-cutida durante 19 anos, é um avanço significativo na gestão da reciclagem no país. Para a professora, o resumo 1 Fonte: bit.ly/lixorj

Lixo que rende

Política delega responsabilidades aos

produtores de resíduos sólidos e beneficia catadores

Carolina Massote

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de toda a questão da reciclagem re-side no inciso VII do artigo 3º da lei: a destinação final ambientalmente adequada. Ela aponta a causa da de-mora para a aprovação da lei:

“Na PNRS, fica estabelecida a res-ponsabilidade de cada parte na ges-tão de resíduos sólidos. Assim, as empresas que lucram com a geração de lixo têm a obrigação de contribuir com a logística reversa”.

A logística reversa, de acordo com o site do Ministério do Meio Ambiente, constitui “instrumento de desenvol-vimento econômico e social carac-terizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresa-rial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação”.

Sancionada em 2010, a PNRS es-tabeleceu também uma hierarquia para a gestão de resíduos sólidos. Assim, há uma ordem de priorida-de no seu reaproveitamento: não geração, redução, reutilização, re-ciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambiental-mente adequada dos rejeitos.

Lançado em 2007, o Recicla CT pos-sibilitou a existência de um centro

de triagem dentro da universidade, para onde todo o lixo coletado é le-vado. A vantagem é grande, já que se poupam viagens de caminhão com o grande volume de material produzi-do semanalmente.

A Fundação Coordenação de Proje-tos, Pesquisas e Estudos Tecnológi-cos (Coppetec), da UFRJ, contratou dois catadores de lixo para auxiliar no processo de triagem. Um deles é Mônica Auxiliadora, que trabalhou como catadora durante seis anos e desde 2010, com carteira assinada, ocupa o cargo de agente ambiental – embora o nome desse posto ainda não esteja no quadro oficial da ins-tituição.

Antes de ser contratada pela fun-dação, Mônica atuava em grandes eventos. Ela explica que, nessas ocasiões, por exemplo, empresas que atuam com a reciclagem costu-mam contratar cooperativas de ca-tadores para deixar os locais limpos. Em geral, a prefeitura não participa de nenhuma etapa no processo de limpeza desses espaços. Mônica es-tima que um turno de quatro a seis horas renda aos catadores cerca de R$ 100, além de R$ 130 para o ca-tador líder.

Segundo ela, materiais de polipropi-leno, como as latinhas de alumínio,

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são os mais procurados pelos ca-tadores de lixo, em detrimento de outros tipos de materiais, como o poliestireno, muito usado para fabri-car garrafas e sacos plásticos. “O po-liestireno rende pouco, por isso nin-guém está comprando a tonelada. Isso resulta em um prejuízo enorme para o meio ambiente”.

A professora Katia Dantas completa: “Em outros países, pode-se cometer o erro de pensar que o Brasil recicla muito, porque 98% das latinhas de alumínio são recicladas. Os grandes recicladores, como a Alemanha e a Holanda, reciclam 60% do seu ma-teiral. É simples amassar e carregar as latinhas, além do lucro que elas dão. Mas esse percentual não se re-pete com os outros materiais”.

Cooperativas fortalecem profissãoA UFRJ obedece ao Decreto 5.940, que institui a separação dos resíduos recicláveis descartados por órgãos da Administração Pública Federal, direta ou indiretamente, na fonte geradora, bem como sua destinação a associa-ções e cooperativas de catadores de materiais recicláveis. O transporte é financiado pela Prefeitura. Assim, o material segue dali, semanalmente, para a Cooperativa Popular Amigos do Meio Ambiente (Coopama).

Localizada no bairro da Maria da Graça, no subúrbio do Rio, a Coopa-ma foi fundada em 2003 e conta com 63 catadores, que organizam o ma-terial que chega diariamente ao lo-cal. A média diária de lixo recebido é de oito toneladas. O diretor adminis-trativo, Luiz Carlos Fernandes, conta que, além das instituições públicas, o material chega de residências, con-domínios e empresas.

“A maior dificuldade que temos hoje é com o transporte”, afirma. “O ma-terial é muito, mas contamos com apenas um caminhão. Às vezes te-mos de recorrer ao aluguel de trans-porte. Embora algumas empresas e moradores colaborem trazendo o material, nós temos de buscá-lo na maior parte das vezes.”

O diretor também diz que alguns luga-res não fazem a coleta seletiva antes de enviar o material para a Coopama. Por isso a contaminação do material e o lixo orgânico são também fatores negativos e um risco para a realização do trabalho dos catadores.

A Cooperativa recebe material ele-trônico e faz o chamado “desman-che”, separando plástico e metal. O destino final são empresas que tra-balham com reciclagem.

As consequências da implantação da lei já foram sentidas em alguns

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setores de profissionais que lidam com a coleta de lixo. O Movimento Nacional dos Recicladores de Mate-riais Recicláveis (MNCR), por exem-plo, aponta mudanças significativas após a sanção da PNRS, como a preocupação com a inclusão so-cioprodutiva de catadores de mate-riais recicláveis, estabelecendo par-cerias formais com as cooperativas e associações da classe.

No entanto, apesar dos avanços ob-tidos com a lei, ainda há muito a ser feito. Ainda de acordo com o MNCR, a legislação abre uma brecha que desvirtua seus princípios: a possibi-lidade de adoção de incineradores de lixo como destino final. A incine-ração, de acordo com a assessoria do movimento, é uma tecnologia incompatível com a reciclagem, pois compete diretamente com os pro-gramas de recuperação e necessita de um investimento altíssimo du-rante a contrução dos equipamen-tos e em toda sua vida útil em ma-nutenção e prevenção de acidentes. Além disso, o processo prejudica a saúde, pois produz gases que cau-sam câncer.

“A vida dos catadores de lixo, defi-nitivamente, melhorou nos últimos anos”, afirma Nilza Soares, técnica em Pesquisa Ambiental e consulto-ra da Coopama. “Hoje, no município do Rio de Janeiro, existem 18 a 20 cooperativas que contratam catado-res que vieram do Jardim Gramacho [onde, até bem pouco tempo atrás, funcionava um lixão]. Eles ganham melhor agora”.

Nilza afirma que, embora a classe ainda não tenha alcançado o pata-mar ideal, ela caminha para isso. “Até a implantação da PNRS e do decreto 5.940, as leis que diziam algo a res-peito do catador eram basicamente aquelas sobre saneamento básico”, diz. “É de interesse do Governo Fe-deral que essas pessoas saiam da categoria abaixo da linha da pobre-za, e ele tem demonstrado grande preocupação em relação à classe”.

A técnica destaca que os catadores têm participado de debates, e a so-ciedade vem pressionando cada vez mais as instituições para que elas cumpram seu papel e ajudem na reciclagem do lixo produzido. Nilza,

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O Instituto Estadual do Ambiente (Inea) também promove ações para fomentar a reciclagem. O Programa Coleta Seletiva Solidária atua capacitando gestores públicos para a implantação de progra-mas municipais de coleta. Também mantém linhas de ação volta-das para órgãos públicos e catadores.

O Inea é um órgão executivo da Secretaria do Ambiente do Es-tado do Rio de Janeiro que mantém vários projetos e programas de melhoria à gestão de resíduos nos municípios. Como forma de fortalecimento desses projetos e programas, tendo como base a Política Nacional de Resíduos Sólidos, foi lançado em setembro o Pacto pela Reciclagem, reunindo, além do Coleta Seletiva Solidá-ria, mais seis programas que promovem iniciativas relacionadas à reciclagem.

De acordo com a assessoria do órgão, o programa oferece asses-soria a 65 municípios do estado. Vinte deles chegaram a implantar os seus programas municipais de coleta seletiva solidária. Nessas cidades, o material reciclável é coletado por intermédio do serviço municipal e doado às cooperativas de catadores.

porém, também aponta problemas: “Embora a Companhia Municipal de Limpeza Urbana, hoje, esteja desti-nando diretamente resíduos para as cooperativas, a empresa ainda não faz coleta seletiva. Então, muitas ve-zes, o lixo orgânico chega junto com o lixo reciclável e o contamina.”

De acordo com Nilza, a maior parte dos municípios brasileiros não fez o plano de estabelecimento – e aqueles que já o providenciaram não o fize-ram de maneira clara. “Não existe ain-da um sistema de coleta eficiente no

Rio de Janeiro. Por enquanto, apenas alguns bairros da Zona Sul e da Zona Norte fazem coleta seletiva.”

Apesar do atraso, os setores envol-vidos com a reciclagem expressam otimismo após a implantação da PNRS. “A política é uma referência da legislação para a organização dos municípios. A competência é deles. Agora é esperar para que saia do pa-pel e vire prática”, afirma a professo-ra Katia Dantas.

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COP-19: acordo frustrante

Mais uma Conferência das Nações Unidas sobre o Clima – a COP-19, realizada em Varsóvia, na Polônia, no final de novembro – terminou sem grandes razões para entusias-mo. O encontro foi marcado por uma atitude radical das organizações da sociedade civil, que abandonaram o evento antes do fim, em protesto contra o rumo das negociações.

Houve acordo em torno da criação de um mecanismo de perdas e da-nos para auxiliar as nações mais vul-neráveis a eventuais consequências de eventos provocados pelas mu-danças climáticas, como furacões e inundações. Também foi estabeleci-do um fundo mundial para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação das florestas, o REDD, de modo que os países que preser-varem suas áreas verdes sejam re-compensados financeiramente.

De qualquer forma, foi estabelecido um roteiro para um possível acordo sobre redução de emissões de car-bono na próxima Cúpula, marcada para daqui a dois anos, em Paris, na França. Mas os 195 países parti-cipantes preferiam adotar o termo “contribuições”, em vez de “compro-missos”, ao se referir às propostas que apresentarão em 2015.

Mais informações em bit.ly/copvarsovia.

Nível do mar em altaA revelação de que o aumento do nível do mar, neste século, tem sido o dobro da média registrada no século passado é mais um dado a confirmar os efeitos preocupan-tes das mudanças climáticas no planeta. A média de elevação atual é recorde: 3,2 milímetros por ano, de acordo com a Organização Me-teorológica Mundial, que divulgou a notícia em novembro, durante a COP-19 (mais informações sobre o evento na nota “COP-19: acordo frustrante”). As consequências são piores para as cidades litorâneas, que tornam-se ainda mais vulne-ráveis a grandes tempestades e tufões.

A organização apontou ainda que as temperaturas também estão igualmente elevadas. Este ano já é o sétimo mais quente da história desde o início das medições, em 1850, considerando apenas os pri-meiros nove meses de 2013. Neste período, temperaturas recordes fo-ram aferidas em países como Aus-trália, China, Coreia do Sul e Japão.

Concentração recorde de CO2

Em relatório divulgado no final de setembro, o Painel Intergoverna-mental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), formado por especialistas vinculados à Organização das Na-ções Unidas (ONU), alertou para a concentração recorde de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. As consequências, cada vez mais, tendem a ser o aumento do nível dos oceanos e maior incidência de eventos climáticos extremos, como secas, nevascas, grandes tempesta-des e furacões.

Este é o quinto relatório divulgado pelo IPCC desde 1990. Os cientistas – entre os quais estão alguns brasi-leiros – buscam chamar a atenção de governos e da sociedade global para a grande ameaça provocada pela ação humana com as emissões resultantes da queima de combus-tíveis fósseis. O diagnóstico aponta para um aumento de pelo menos 1,5oC na temperatura média do pla-neta até o final deste século.

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Menos automóveis em Barcelona

Incentivar caminhadas, estimular o uso de bicicletas e do transporte coletivo é o caminho para reduzir em 30% a quantidade de veículos nas ruas de Barcelona nos próxi-mos cinco anos. O município está desenvolvendo um plano de mobili-dade urbana com medidas específi-cas para cada tipo de transporte. O estopim dessa iniciativa foi a multa de cerca de meio milhão de euros aplicada pela Comissão Europeia por não cumprimento da norma de qualidade do ar.

A ideia é incentivar a carona soli-dária, desenvolver um sistema que torne a passagem mais barata para quem usar ônibus com mais fre-quência, criar vias exclusivas para os coletivos, ampliar calçadas e ci-clovias, além de integrar o uso de bicicletas com o transporte público.

Contaminação: os dez maisUm dos dez locais mais poluídos do mundo fica na América do Sul: é o rio Matanza-Riachuelo, na Argentina, contaminado pelos resíduos lançados por cerca de 5 mil indústrias. A lista, divulgada no início de novembro, inclui ainda países como Rússia, Indonésia, Bangladesh e Gana. O levantamento foi feito pelo Blacksmith Institute, organização que se dedica a projetos de despoluição em países em desenvolvimento e está baseada em Nova York, nos Estados Unidos. De acordo com a entidade, a contaminação ambiental põe em risco a saúde de aproximadamente 200 milhões de pessoas em todo o planeta.

Veja a lista dos dez lugares mais poluídos (divulgada em ordem alfabética de país) e, entre parênteses, as substân-cias nocivas encontradas:

Rio Matanza-Riachuelo, Argentina (compostos orgâ-nicos voláteis, em especial o tolueno)

Hazaribagh, Bangladesh (cromo)

Lixão Agrobloshie, Gana (chumbo, cãdmio e mercúrio)

Rio Citarum, Indonésia (chumbo, cádmio, cromo e pesticidas)

Kalimantan, Indonésia (cádmio e mercúrio)

Delta do rio Níger, Nigéria (petróleo)

Dzershinsk, Rússia (sarin, chumbo, fenóis e subprodu-tos tóxicos)

Norilsk, Rússia (metais pesados)

Chernobyl, Ucrânia (radio-nuclídeos)

Kabwe, Zâmbia (chumbo)

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Malária: 3,4 bilhões ainda

vivem em áreas de risco

O Relatório Mundial sobre a Malária 2013, divulgado em dezembro pela Orga-

nização Mundial da Saúde (OMS), registra avanços signi-ficativos no combate à doença e estima que, com o au-mento das medidas de prevenção e controle, 3,3 milhões de vidas teriam sido salvas desde 2000. Em 2012, porém, cerca de 207 milhões de casos foram diagnosticados, com aproximadamente 627 mil mortes – das quais a maioria é de crianças com idade inferior a 5 anos. De acordo com o documento, quase 3,4 bilhões de pessoas ainda vivem em áreas de risco, em especial na África e no sudeste asiático.

Sobre o Brasil, o relatório faz a previsão de que o país – hoje responsável por 52% dos casos da doença e 59% das mortes registradas no continente americano – conseguirá reduzir em 75% os casos de malária até 2015.

A OMS anunciou que está desenvolvendo uma estratégia global para o controle e a erradicação da malária a ser adotada no período de 2016 a 2025. O fundo global para controle da doença passou de 100 milhões de dólares, em 2000, para dois bilhões de dólares, em 2012.

Copa motiva investimento em

parques nacionais O Governo Federal promete investir R$ 10,4 milhões para obras de emergência em 16 parques nacionais, com o objetivo de atrair mais turistas e oferecer confor-to aos visitantes, aproveitando o período da Copa do Mundo de futebol, em 2014. A iniciativa é resultado de uma parceria entre os ministérios do Meio Ambiente e do Turismo.

Entre as unidades de conservação con-templadas estão o arquipélago de Fernan-do de Noronha (PE), o Parque Nacional da Tijuca (RJ), o Parque Nacional do Iguaçu (PR), a Chapada dos Veadeiros (GO), o Par-que Nacional de Brasília (DF) e a Chapada dos Guimarães (MT) .

Para o ministro do Turismo, Gastão Vieira, esse investimento deve aumentar a com-petitividade do turismo brasileiro. “Nesse primeiro momento, é um banho de loja, uma tentativa de dar mais conforto ao tu-rista. Tivemos quase sete milhões de visi-tantes nos parques nacionais. Precisamos nos preparar para tratar o turista bem”, explicou.

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Brasil assume presidência do

C-40O Brasil assume em fevereiro a presidência do grupo C-40, que reúne prefeitos de algumas das principais metrópoles mundiais para discutir e propor medidas ca-pazes de combater as mudanças climáticas. A escolha foi anuncia-da em novembro: o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, será o sucessor do prefeito de Nova York, Michael Bloomberg. A transmissão do cargo ocorre durante a próxima reunião do grupo, a ser realizada em Joanesburgo, na África do Sul.

Durante a Rio+20, o C-40 anun-ciou o compromisso de reduzir em 1,3 bilhão de toneladas suas emissões de gases do efeito es-tufa até 2030, o que talvez tenha sido a principal notícia de toda a conferência. O prefeito do Rio vai liderar gestores de 58 cidades que compartilham conhecimento e ex-

periências em busca de modelos mais sustentáveis. Apenas três ci-dades brasileiras fazem parte des-sa composição – além do Rio, São Paulo e Curitiba estão no grupo.

Segundo Paes, chegar à presidência da C-40 é uma oportunidade fan-

tástica. “O Rio é a primeira cidade de um país em desenvolvimento do hemisfério sul a assumir a presidên-cia do C-40. Cada vez mais, as ci-dades assumem um protagonismo maior. O processo de intercâmbio entre elas é fundamental”, afirmou.

Michael Bloomberg e Eduardo Paes

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O Pantanal Mato-grossense é mun-dialmente conhecido por sua riqueza faunística, que atrai turistas de todo o mundo. Essa grande planície inun-dável de 160 mil quilômetros quadra-dos abriga cerca de 130 espécies de mamíferos, 550 de aves, 180 de rép-teis e 50 de anfíbios. Devido a suas paisagens abertas, que permitem boa visibilidade, e à grande quanti-dade de indivíduos de cada espécie, essa profusão de animais é facil-mente observada a qualquer hora do dia. Mesmo à noite, durante as “fo-cagens” – excursões em caminhões abertos para observação da fauna noturna –, é possível avistar vários animais. Uma viagem de Porto Jofre a Poconé pela rodovia Transpanta-neira durante a madrugada, quando a estrada está praticamente deserta, pode proporcionar a observação de uma onça-pintada, alguns cachor-ros-do-mato, um mão-pelada, um tapiti (o coelhinho selvagem brasi-leiro) ou uma anta, por exemplo. A fama do Pantanal como um lugar pri-vilegiado para observação de fauna é merecida, mas parcial, injusta com suas paisagens e sua flora, que são subestimadas e relegadas a um pla-no menor.

Primavera pantaneiraEspetáculo raro e que dura apenas alguns dias, floração

da piúva é uma das mais espetaculares manifestações

da natureza

Texto e fotos: Luiz Claudio Marigo

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A flora pantaneira exibe pelo menos 3.500 espécies de plantas e diver-sas paisagens: rios, baías (lagoas) com aguapés e as vitórias-régias características do Pantanal –Victoria cruziana (não a mesma espécie da Amazônia), corixos, campos abertos, capões de mata e florestas ao lon-go dos rios, matas secas parecendo caatingas, carandazais (formações de palmeiras-carandá, Copernicia alba, muito semelhantes aos car-naubais da Caatinga), babaçuais, cambarazais (florestas de cambarás, Vochysia divergens), paratudais (flo-

restas de ipês-amarelos, Tabebuia aurea) e os piuvais (florestas de ipês-rosa, Tabebuia ipe).

Na planície do Pantanal, a lua cheia nasce no horizonte, como quando a avistamos surgindo no mar. Nes-ses dias, ela desponta no leste, em oposição ao pôr-do-sol. A paisagem ainda recebe a luz do sol quando a lua surge, redonda e enorme, entre as árvores esparsas nos campos naturais de capim-mimoso, a for-rageira nativa da região. As árvores preservadas pelo fazendeiro tradi-cional são as piúvas, como são lo-calmente chamados os ipês-rosas. Onde predomina o capim-mimoso, o fazendeiro do Pantanal não intro-duziu o capim braquiária, de origem africana. Para aumentar as pasta-gens, eliminou as matas e deixou o capim-mimoso expandir-se. Mas nas pastagens pantaneiras o homem evi-tou derrubar as piúvas.

Segundo Harri Lorenzi, em seu li-vro Árvores Brasileiras, volume 3, a piúva é uma árvore de grande porte, a mais alta do Pantanal, crescendo até 30 metros de altura. Tem tron-co reto e cilíndrico, com diâmetro entre 50 centímetros e um metro e quarenta e de casca grossa, parda-centa, com fissuras longitudinais. “É uma espécie característica e exclusi-va das florestas ripárias do Pantanal Mato-grossense, onde é frequente e abundante”. A piúva impressiona

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pela bela arquitetura de sua exu-berante copa, com galhos fortes e longos que se espalham em todas as direções. É uma planta que gos-ta de sol e água e, embora sendo vegetação primária, encontrada no meio das matas que crescem ao longo dos rios, “tem a capacidade de regeneração em áreas abertas”. Essa característica da piúva torna-a a espécie dominante dos campos do Pantanal, e sua espetacular floração, quando deixa cair todas as folhas e cobre-se de flores cor-de-rosa em formação densa, torna-a uma espé-cie extremamente ornamental para o paisagismo.

A paisagem pantaneira dos piuvais quase poderia ser considerada uma obra de paisagismo. É uma paisagem construída, formada pelos hábitos conservacionistas do pantaneiro, mas sem a intenção explícita de criar um cenário para o ser humano, – sem um design ou um plano para formar aquele visual. Ela acontece assim, simplesmente. Quase 83% da área do Pantanal permanece em ex-celentes condições de conservação. Isto se deve muito mais à dificuldade de modificar uma região que é inun-dada periodicamente e à sua aptidão para a pecuária extensiva, que não exigiu a formação de pastagens ar-tificiais – fato logo percebido pelo fazendeiro do Pantanal, no início da ocupação desse bioma.

A paisagem das piúvas escreve a his-tória do Pantanal, sua colonização e cultura. Segundo André Thuronyi, fa-zendeiro e dono da pousada Araras Eco Lodge, na rodovia Transpanta-neira, o ipê-rosa é uma madeira de lei e, como a aroeira (Myracrodruon urundeuva), era utilizado para a cons-trução de currais, pontes, mourões de cerca, casas e mobiliário. O pan-taneiro evita derrubar as piúvas, pois preza pela conservação de seus re-cursos naturais. “A aroeira teve seu corte proibido, mas o ipê ainda pode ser utilizado pelas fazendas para uso próprio, embora não comercialmen-te. E quando o fazendeiro manda passar o trator nos campos para abrir mais pastagens, ele orienta o tratorista para poupar os brotos de piúvas que nascem espontanea-mente, pois vai precisar delas mais tarde.” Não há nenhuma intenção estética, nenhum projeto artístico de paisagismo, apenas uma visão utili-tária. Mas isso é conservação da na-tureza – conservação dos recursos naturais para futura utilização eco-nômica. Quem poderia prever que iria resultar em tanta beleza?

Ao ver uma piúva toda coberta de flores – e só de flores –, a tendência do observador é ajoelhar-se em ado-ração a tanta beleza e majestade. No entanto, somente em alguns anos, e durante alguns dias apenas, num pe-ríodo de duas semanas no máximo,

Tuiuiús (acima) constroem ninhos gigantescos em

piúvas, cujas flores servem de alimento para os bugios

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centenas de piúvas vestem a planície pantaneira de rosa. É uma das mais espetaculares manifestações da na-tureza brasileira.

É possível que a floração simultânea das piúvas seja uma resposta das árvores ao estresse hídrico a que são submetidas durante a secura prolongada. Um comportamento se-melhante ao das plantas do Cerrado, que florescem após os incêndios pe-riódicos da região, também na estia-gem. Nessa época, levanta-se uma poeira fina, que paira sobre o Panta-nal, e as matas perdem suas folhas, assumindo um aspecto pardacento ou acinzentado. Nas formações de mata seca, encontradas ao longo da rodovia Transpantaneira, destacam-se cactos e bromélias espinhentas, lembrando as vegetações do Chaco paraguaio e da Caatinga nordestina.

Mas em poucos dias a paisagem modifica-se com a brotação das flo-res das piúvas. Irrompe a primavera pantaneira.

A floração das piúvas coincide com a época de nidificação das aves no Pantanal. Como se o intenso man-

to cor-de-rosa que cobre a planície saudasse, com a cor da maternidade, a renovação da vida.

Se há ninhos pendentes em seus galhos, as piúvas adornam esses ninhos com buquês de várias flores juntas, em forma de corneta, que pa-recem anunciar a glória da tempora-da. É o que acontece com os ninhos pendentes dos graveteiros, aves da mesma família do joão-de-barro.

Os ornitólogos Dalci Maurício Mi-randa de Oliveira e Roberto Bran-dão Cavalcanti, num estudo em três épocas consecutivas de re-produção de tuiuiús no Pantanal de Poconé, entre 1995 e 1997, as-sinalaram que, ao longo da rodo-via Transpantaneira, os casais de tuiuiús usaram 13 diferentes espé-cies de árvores para construir seus gigantescos ninhos, mas 78% deles estavam em forquilhas de piúvas. E sob as grandes construções feitas pelos tuiuiús geralmente encon-tram-se os lares de vários casais de caturritas, o único representan-te da família das araras, papagaios e periquitos que constroem seus

A grandiosidade da piúva fica nítida na foto acima, comparando-a com a figura do homem ao seu lado

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próprios ninhos. Todos os outros psitacídeos utilizam ocos de árvo-res ou cavidades em rochas, barran-cos ou cupinzeiros para nidificar.

As araras-azuis-grandes não ani-nham nas piúvas, que não apresen-tam ocos favoráveis a seus ninhos, mas chamam a atenção do obser-vador quando pousam em seus galhos e contrastam o azul-cobal-to de sua plumagem com as flores cor-de-rosa. Uma pousada espe-cializada em turismo de observa-ção de aves na Transpantaneira instalou ninhos artificiais de caixas de madeira para atrair a nidificação das araras-azuis-grandes em piú-vas, pois em seus limites não exis-tem as espécies que proporcionam ocos apropriados para elas ani-nharem. As araras aceitaram esses ninhos e agora deslumbram os tu-ristas com sua presença, pois são aves que logo se acostumam com a proximidade dos homens, quando não ameaçadas ou perturbadas.

Vários animais alimentam-se das flores das piúvas. Diversos insetos apícolas procuram o néctar das flo-res para produzir mel, assim como diversas espécies de beija-flores, que necessitam de alimentação de forte teor energético. Papagaios-verdadeiros, papagaios-galegos e diversos periquitos comem as flores. Também próximo à rodo-via Transpantaneira observam-se diversas espécies de cracídeos – de uma família de aves pareci-das com seus parentes distantes, os faisões asiáticos – em bandos, comendo as flores das piúvas. Principalmente na beira dos rios, são aracuãs-do-pantanal, jacus-de-barriga-castanha, cujubis e ja-cutingas-de-garganta-azul. É tão intensa a predação das flores das piúvas por essas aves, impedindo a formação dos frutos, que alguns ornitólogos afirmam que as po-pulações das piúvas são afetadas pela ação dessas aves.

Mas não são apenas as aves que se alimentam das flores das piúvas. Também os bugios regalam-se com suas flores, aproveitando o sabor adocicado de seu néctar. E quan-do as flores caem das árvores, são os cervos-do-pantanal, os veados-campeiros e mateiros, o gado e os cavalos-pantaneiros que vêm se re-galar com as flores no solo.

Até o homem come piúvas! Não as flores, mas a casca das árvores. O pantaneiro acredita que, fervida, a casca combate o câncer e o extrato da entrecasca é depurativo, bacte-ricida e bom para o estômago. O cerne contém lapachol (ou ipeína), que supostamente inibe tumores e alivia a dor.

Caminhando nas matas e nos cam-pos do Pantanal, ou descendo os rios em canoas com motor de popa, é possível observar aves de todas as espécies sobre as piúvas floridas. Nas matas, o urutau, um mestre do disfarce, ave noturna de cerca de 50 centímetros de comprimento, passa os dias pousado em segura camufla-gem sobre os galhos de piúvas, com as quais sua plumagem se confunde perfeitamente. Na beira dos rios, bi-guatingas, gaviões de diversas espé-cies e bandos de biguás fazem das piúvas seus lugares de pouso.

As piúvas são um símbolo do Panta-nal, mas não são as únicas árvores capazes de transformar sua paisa-gem. Também os ipês-amarelos, os paratudos (Tabebuia aurea), formam grandes conjuntos – os paratudais – que se cobrem de amarelo duran-te as floradas, que ocorrem mais ou menos na mesma época das piúvas. São um pouco menores do que elas, atingindo até 20 metros de altura, e mais delgados. Sua madeira é tam-bém menos resistente que a das piúvas. Em sua utilização medicinal, serve para tudo (daí seu nome): des-de a cura de verminoses até proble-mas estomacais, diabetes, febres e inflamações.

Novateiro

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De julho a setembro, antes das piú-vas e dos paratudos florescerem, os cambarás (Vochysia divergens) pintam as margens dos rios de amarelo. São milhares de árvores em formação compacta. Sobrevoando o Panta-nal, as florestas parecem um tapete verde e amarelo. Os cambarás não perdem as folhas durante a floração e suas inflorescências crescem ver-ticalmente na copa. O efeito, para quem observa as árvores do alto, como num sobrevoo, é de uma de-licada textura. A espécie é endêmica das várzeas da bacia dos rios Para-guai e Araguaia.

Na mesma época, a primavera pan-taneira brinda o visitante com ou-tras florações. Árvores isoladas nas pastagens, de copa alta e estreita com até 18 metros de altura, os lou-ros-brancos (Cordia glabrata), ou lou-ros-pretos, ou claraíbas, apresentam pequenas flores totalmente brancas, formando floradas compactas, que duram várias semanas. Abrem suas flores na mesma época que as piú-

vas e, como elas, sua floração acon-tece também depois que as árvores deixam cair todas as folhas, o que provoca forte impacto visual.

Nas matas ciliares ou em terrenos bem alagados ao longo dos rios, a canafístula (Albizia inundata), ou bi-guazeiro, ou timbó-branco, de cinco a oito metros de altura, mostra flo-res delicadas, esbranquiçadas, de beleza sutil. Já o novateiro, ou pau-de-novato (Triplaris brasiliana), é uma planta dioica: as flores masculinas e as femininas apresentam-se em in-divíduos diferentes. As árvores com flores femininas são exuberantes e apresentam grandes cachos com-pactos de flores vermelhas, que con-trastam com o verde da vegetação ribeirinha. O conjunto dessas inflo-rescências é extremanente decora-tivo. As flores masculinas são mais discretas, amareladas e menores. No interior do tronco oco do pau-de-novato vivem formigas, o que lhe empresta outros nomes populares: pau-formiga e formigueiro. “Pau-de-

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novato” indica que a pessoa inexpe-riente que encostar na árvore sofrerá com o ataque das formigas.

Ao lado dos novateiros, também em terrenos alagados na beira dos rios, as abobreiras (Erythrina fusca), ou suinãs, ou açacuranas, exibem suas flores alaranjadas, mas mantêm as folhas – ao contrário de outros mulungus, espécies do gênero Ery-thrina. Ao longo dos rios Paraguai e Cuiabá, na altura da Estação Ecoló-gica Taiamã e do Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense, as abo-breiras oferecem um espetáculo que rivalizaria com as piúvas, embora ocorram em formações distintas.

As paisagens do Pantanal ainda são pouco conhecidas pelos turistas, sejam estrangeiros ou brasileiros. A abundância da fauna tende a nos cegar para a beleza das paisagens e da flora. Ou talvez não tenhamos educado nossa sensibilidade para perceber e compreender a paisa-gem. Começamos a publicar guias

de identificação de aves, de répteis, de mamíferos, mas não temos ainda a preocupação de relacionar, visual e pictoricamente, esses grupos de ani-mais com o ambiente em que vivem.

Em última análise: deveríamos ob-servar os atores, mas também o pal-co de suas performances.

Araras azuis

Piúvas ao pôr-do-sol

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ComunidadES

Pescadores artesanais resistemAgronegócio e avanço

da monocultura de arroz reduzem espécies de peixe nas lagoas Mirim e dos Patos, na

fronteira com o Uruguai

Texto e fotos: João Roberto Ripper

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Quando venta muito no município de Lagoa Mirim, “vai dar mar”, di-zem os pescadores da colônia Z16, na Vila do Porto, município de Santa Vitória do Palmar, no Rio Grande do Sul. Mesmo que ainda seja inverno, eles saem para pescar. Algumas ve-zes, é impossível, e aí o jeito é espe-rar o dia seguinte e curtir a família ou consertar redes e barcos. O porto tem apenas uma avenida, a Getúlio Vargas, e três ou quatro ruas, a maio-ria com casas bem coloridas e de muro baixo. Cerca de 90 pescadores artesanais vivem nessa comunidade de Lagoa Mirim, na fronteira entre o Brasil e o Uruguai, a 20 quilômetros do arroio Chuí.

Binacional, a Lagoa Mirim é cercada por quatro municípios brasileiros: Rio Grande, Santa Vitória do Palmar,

Arroio Grande e Jaguarão. Cada um deles com pelo menos dois distritos. Alguns são pequenas comunidades. Os pescadores sabem que não é fácil sobreviver de pesca na Lagoa Mirim, a maior lagoa de água doce do Brasil. Os mais antigos contam que, em poucas décadas, sumiram da Lagoa, pelo menos, cinco espé-cies de peixe. A competição também é muito grande, pois são seis mil trabalhadores que vivem da pesca artesanal nas lagoas dos Patos e Mi-rim. Além disso, a lavoura de arroz é ávida consumidora e poluidora das águas. A resistência dos pescadores às transformações socioambientais só consegue manter as comunida-des na atividade pesqueira porque existe um sentimento de bem-querer e de pertencimento ao território e à profissão. Esse afeto é evidente no uso medicinal de plantas e peixes, no domínio de técnicas e sistemas de manejo da pesca, nas crenças religiosas e nas tradições culturais. É claro que também nas histórias, muitas histórias. Afinal de contas, nenhum lugar ou pessoa tem apenas uma história.

Lá, na divisa entre os dois países, as atividades de pesca artesanal e agri-cultura de subsistência são comuns a centenas de pescadores-agriculto-res, homens e mulheres. A natureza mistura banhado, Mata Atlântica,

Gauchinho e sua esposa, Cleci, pescam juntos. Ela diz que o barco também é a casa deles

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praias e dunas. Em harmonia com essa natureza, vivem os ribeirinhos, que retiram da lagoa o sustento de suas famílias. Eles guardam uma grande sabedoria sobre a vida das águas e nas águas. Por exemplo, que peixe-rei filhote, assim que é pescado, deve voltar pra água; que gordura de jacaré pode ser usada no tratamento de doenças respiratórias; que cabeça de peixe fervida é remé-dio pra enxaqueca; que banha de la-garto é boa contra dores reumáticas e que óleo de capivara é bom para o câncer.

A maioria dos pescadores artesanais aprendeu sua profissão com seus pais ou familiares próximos. São histórias passadas de avô para neto há centenas de anos que garantem a existência dessa cultura ribeirinha. É no exemplo e nas histórias contadas que se forma a consciência ambien-tal do pescador. Na luta diária pela sobrevivência, o pescador artesanal vai acumulando uma fantástica sa-bedoria das coisas da terra, do céu e da água. A relação com a natureza é fundamental para a vida e para a sua própria identidade. Hoje, ela faz parte do sistema ecológico da re-gião, representando a dimensão do ser humano no grande ciclo da vida, na imensidão da maior lagoa de água doce do Brasil.

É de pai pra filho. A criança, muitas vezes, vai cedo pescar ou assistir ao trabalho dos pais, observando a arte de estender a rede e depois colher. Os filhos estão acostumados com barco e rede e veem a mãe tratar dos peixes, muitas vezes dentro da embarcação.

O Rio Grande do Sul ocupa o quarto lugar entre os estados produtores de pesca artesanal, atividade que, no Brasil, ainda é grande, com cerca de 12 mil pescadores licenciados pelo Ministério da Pesca e Aquicultura.

Os pescadores respeitam a pirace-ma, período em que os peixes de-

sovam, também conhecido como época de defeso, que se estende de novembro ao fim de janeiro. Em fe-vereiro, a pesca é novamente libera-da, mas em Santa Isabel só se volta a pescar depois da festa da padroeira, Nossa Senhora dos Navegantes, co-memorada no dia 2 de fevereiro.

Incentivo Como contrapartida por ficarem três meses sem trabalho, o Governo Fe-deral concedeu aos pescadores o benefício de um seguro-desemprego no valor de um salário mínimo por mês.

O Programa Nacional de Fortale-cimento da Agricultura Familiar (Pronaf) foi expandido em 1999 aos pescadores artesanais, facilitando o crédito para a compra de artefatos de pesca, motores e embarcações.

Personagens, lendas e histórias Nas localidades do estado onde vivem comunidades pesqueiras existem muitas histórias, e algumas viram mitos ou lendas. Uma delas é a da maldição do padre, que, para alguns, serve como explicação para a escassez de peixes e os alagamen-tos sofridos todos os anos na Vila de Santa Isabel, município de Arroio Grande, às margens da Lagoa Mirim. Diz a lenda que, depois que o padre

Mara Alice, que começou a pes-car aos 15 anos e precisou parar

para cuidar da filha doente

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foi assassinado na igreja da localida-de, a fartura de peixes começou a diminuir e as enchentes se tornaram mais frequentes.

Segundo o pescador Gauchinho, um dos líderes da comunidade, é neces-sário que, além de uma consciência social e ecológica, se tenha fé no próprio trabalho, pois “quem pesca sem convicção não tira peixe”. Gau-chinho, cujo nome é Vorni dos San-tos da Silva, tem 55 anos e pesca em companhia de sua esposa, Cleci Ma-chado da Silva, de 48. Muitas vezes, voltam com o barco cheio e muita traíra. Nas férias escolares, quem os acompanha é a filha, Marcelly Ma-chado da Silva, 11 anos. Eles pescam e, na volta, Cleci já vem limpando o peixe. É comum irem num dia e vol-tarem no outro; por isso, segundo a pescadora, o barco é também a casa deles. Gauchinho e sua companheira procuram mais os banhados da la-goa para pescar.

Além de ser a maior lagoa de água doce do país, a Lagoa Mirim é tam-

bém a segunda maior da América Latina. Os mais velhos, mestres na arte da pesca, afirmam que em poucas décadas desapareceram, pelo menos, cinco espécies de pei-xe. Conforme conta Gauchinho, isto aconteceu principalmente devido à construção, em 1977, da Barragem de São Gonçalo, entre a Lagoa dos Patos e a Lagoa Mirim, impedindo, desde então, que a água salgada es-coasse para a lagoa.

“São as lavouras de arroz que se beneficiam da dessalinização das águas. Elas consomem cerca de 12 milhões de litros por hectare plan-tado”, conta. Segundo ele, “quase todo mundo planta com a água da Mirim, e muito banhado foi reduzido a arroz. De 15 anos pra cá, termina-ram os mananciais”, denuncia Gau-chinho.

Entre a capital, Porto Alegre, e o mu-nicípio de Arroio Grande fica a Esta-ção Ecológica do Taim, onde jacarés, capivaras e outros animais podem ser vistos de um lado e de outro da

Pescadores reclamam que algumas espécies de peixes já

desapareceram da região

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pista. A unidade de conservação ga-nhou o título de Reserva da Biosfera pela Organização das Nações Uni-das para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e é conhecida como ponto de pouso e nidificação (construção de ninhos) de aves migratórias vin-das das regiões ártica e antártica. A estação é um viveiro natural de ani-mais e vegetais da região Sul.

As espécies mais comuns de peixe na Lagoa Mirim são o jundiá, o pin-tado, o trairão, a viola, a corvina, o cascudo e o peixe-rei. O mais de-sejado de todos é a traíra, que tem, aproximadamente, 40 centímetros. Considerada o peixe mais valioso, dela se extraem os miúdos, tidos como uma iguaria saborosa. A bo-checha do peixe é comercializada pela cooperativa de pescadores para as cidades ao redor, mas não chega ao interior do estado ou à capital. Um dos pratos típicos da culinária local, feito com molho de tomate e creme de leite, é o estrogonofe de bochecha de traíra, servido quente, com arroz e batata.

Nos meses de agosto e setembro, o vento na Lagoa Mirim, no sul do Rio Grande do Sul, pode chegar a 100 quilômetros por horas. O peixe fica gelado e, mesmo tendo caído na rede, não estraga rápido. Com isso, o pescador ganha 72 horas para co-lher o que pescou. Assim, em dias de ventania, os pescadores mais experientes aconselham a esperar em casa e acessar a internet para saber se, no dia seguinte, o vento vai amenizar. No verão, isso não acontece. Quem não colher rápido perde o peixe.

Na vila dos pescadores, enquanto aguardam uma calmaria, os profis-sionais consertam redes e barcos, limpam peixes e fazem outros bisca-tes para completar a renda.

A lagoa anda baixa, reclamam vários pescadores, alegando que as águas andam paradas e há pouco oxigênio

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para os peixes. A traíra, que sempre se reproduzia nos banhados de en-costa, aos poucos vai perdendo seu lugar de desova por causa da gran-de quantidade de canais artificiais produzidos pelos monocultores de arroz.

Na comunidade do Porto, em San-ta Vitória do Palmar, Evanilda Rolim Termezana, de 63 anos, é uma das lideranças da comunidade. Hoje aposentada, Dona Nina, como é co-nhecida, é filha de pais pescadores. “Comecei a pescar com 23 anos e assim fui até 2002, quando peguei uma forte bursite e me aposentei por invalidez. Hoje trabalho com ervas medicinais e ajudo os pescadores, atendendo gratuitamente”, conta.

Nina relata que, em certa época, cuidou de um senhor conhecido na região por Castelhano. “Ele tinha o pé condenado e já havia marcado para amputar no hospital, quando me chamaram. Higienizei seu pé e, todos os dias, colocava ervas medi-cinais. Ele ficou bom!”, diz ela, com alegria.

Para a líder e cuidadora dos pesca-dores, a comunidade precisava ter apoio para poder estender a pirace-

ma por um ano, a fim de recuperar os peixes. “Essa barragem aí às ve-zes amola a gente, porque diminui a água da lagoa. Os granjeiros, com suas bombas, sugam a água, os ma-nanciais estão diminuindo”, reclama. Muito prestativa, Dona Nina adora receber visitas, abre sua casa e aco-lhe as pessoas. “Sempre fui assim, desde mais nova. Talvez por isso tenha sido a primeira presidente da Associação de Pescadores de Santa Vitória, em 2000”, conta.

Outra personagem importante é Mara Alice Rodrigues, de 50 anos, exemplo de garra e coragem para toda a comunidade. Ela, que come-çou a pescar com 15 anos, tem sete filhos naturais e um adotivo. Preci-sou abandonar a pesca para cuidar da filha Lilian Rodrigues, que sofreu um acidente e foi escalpelada pelo motor de um barco. “Não posso deixa-la só. É um cuidado intenso, e tenho de me dedicar também ao filho dela, pois depois do acidente o marido foi embora e desde então vivemos com o salário mínimo que o governo dá para minha filha, com o bolsa-família e com biscates de fazer algumas redes”. Por causa de um coágulo no cérebro, os médicos

Comunidade de Porto, em Santa Vitória do

Palmar, quer estender a piracema por um ano

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não garantem que a filha viva muito tempo. “Mas vou ficando perto dela, porque, mesmo nesse estado, é uma alegria vê-la viva e ver crescendo sa-dio meu neto Jordano, de 12 anos. Ganhei mais um filho, filho-neto”, diz. “No início, minha filha vivia de sonda e mamadeira e não andava. Hoje, já anda. O acidente afetou o cérebro dela, que chegou a ser dada como morta, diz Maria Alice, que conta com um grande aliado: Coco-ta, seu papagaio.

Mais depoimentosCom 71 anos, Natálio Almada pesca desde os seis. Não teve filhos, mas adotou uma menina que hoje está grande. Nascido e criado em Santa Vitória, Natálio se aposentou aos 65 anos. “Pesquei de rede, de caico, de tudo que é jeito. Agora crio minha horta, faz cinco anos que não pesco mais. Pescava com meu irmão, que também se aposentou e está com 72 anos. Pesca entra no coração da gente e nunca mais esquecemos. É uma vida dentro da nossa vida”, co-menta, saudoso.

Cristiano Lopes Brum tem 40 anos e várias vezes é acompanhado na pesca por sua mulher, Maria Jandi-ra Correia Borges, de 30 anos. Para eles, os meses de inverno são os mais difíceis para a pesca, por causa do frio intenso na região. Ele explica que no Uruguai tem mais peixe por-que ainda há muito banhado para os animais se criarem, ao passo que no lado brasileiro o prejuízo é maior de-vido ao crescimento dos granjeiros produtores de arroz, que estão cons-truindo canais e desviando água da lagoa.

“Se desse uma boa chuva, os peixes apareceriam, mas, com a falta de chuva e as granjas puxando a água, tem dia que o peixe nem aparece. Está tudo mudando, até o clima, e o peixe diminuindo. Outro dia a gente pegou só três jundiás e umas poucas tainhas”, explica.

Comunidade de Santa Isabel, em Arroio Grande

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Seu depoimento é reforçado por ou-tro pescador, Rudinei Lopes Brum, irmão de Cristiano, de 42 anos. “Hoje temos pouco peixe e não exis-tem mais todos os tipos de peixe de antes, pois a lagoa não está permi-tindo, o banhado diminuiu muito a reprodução.” Ele também admite que o fenômeno ocorre por causa dos granjeiros. Segundo afirma, é comum, na época da colheita, en-contrar vários peixes mortos nos banhados de arroz – traíra e peixes miúdos. “Antigamente eu coloca-va dez redes e recolhia cem quilos de peixe. Hoje, minha mulher e eu colocamos 40 redes pra colher, no máximo, 20 quilos”, lamenta. Para Rudinei, a situação é tão grave que o pescador até vive melhor na época da piracema, com o salário mínimo que recebe do governo.

Pescador mais antigo na Colônia Nossa Senhora dos Navegantes (conhecida como Z16), Lobão Ori-val dos Santos, em atividade há 37 anos, conta que tirou seu docu-mento como pescador aos 16 anos, mas aprendeu a pescar com os pais, quando garoto. Ele explica que a co-lônia tem 179 sócios cadastrados. Mais de 60, porém, devem à associa-ção, que engloba várias comunida-des – nove em Vila Anselmo, dez na Vila Cariri, sete na Vila Manoel, 12 na Vila Machado, 90 em Vila do Porto e Vila Hermenegildo e de 10 a 15 que pescam no mar.

Para o tesoureiro da associação, a Barragem de Pelotas poderia apre-sentar um nível mais fechado, que levantaria a água na Lagoa Mirim e também nos banhados. Quando Lobão começou a pescar, existiam arroios naturais e muito mais ba-nhados onde as espécies podiam se reproduzir. Hoje, porém, o pescador observa que os banhados são es-cassos e existem inúmeros canais artificiais que desviam água. “Tudo isso fez nossa lagoa ficar alta, e ela está sempre derramando água para

o oceano. Na costa da Lagoa, na área do porto, tudo era banhado. Nas cheias, a gente viajava entre seis e sete horas dentro dos banhados. Isso acontecia até 15 anos atrás. Hoje, passa jipe por lá. A gente pes-cava até 400 quilos de jundiá. Hoje, nem o sarandi. Onde era o banha-do tem três grandes cortes de água desviada pelos canais dos granjei-ros. Além desses problemas, o mais grave é que a lagoa, aos poucos, vai sendo aterrada”, lamenta.

Lobão conta ainda que dunas de areia se formavam nos lagos. Com os canais, as dunas foram sugadas, desmanchadas pela água da lagoa. “Hoje, sumiram muitos tipos de pei-xe”, constata.

A vida dura e cheia de incertezas leva os pescadores a desejarem um futu-ro melhor para os filhos. Por isso valorizam muito a escola. Cristiano e Ma-ria Jandira têm dois filhos – Jéssica, de 15 anos, e André, de 12. O casal se esforça muito pra que os dois sigam nos estudos. “Eles têm de estudar. Às vezes é bravo deixar os dois sozinhos para irmos trabalhar. Colocamos re-des em 15 locais diferen-tes. Pescador não tem dia nem hora, tem é que pescar.”

Já o casal Rudinei Lopes Brum e Sílvia Daniello Gomes, 36 anos, tem cinco filhos. Quatro já na escola, além de Larisse, de cinco meses. Natural de Pelotas (RS), Rudinei, que vive há 22 anos em Santa Vitória do Palmar, recorda que já saía para pescar aos cinco anos. “Eu me criei pescando, mas quero que meus fi-lhos sejam criados estu-dando”.

A maioria dos pescadores aprendeu o ofício com os pais

ou familiares próximos

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EduCação ambiEntal

O que leva um universitário a sair do Brasil para estudar disciplinas rela-cionadas ao meio ambiente? E por que a Austrália é um dos destinos preferidos?

Interessados em aprimorar o inglês e em aprofundar sua formação cur-sando uma pós-graduação, jovens brasileiros não desanimam diante da distância, do preço das passagens e do alto custo de vida e estão cada vez mais elegendo a terra dos can-gurus como seu lar temporário.

A Austrália é o segundo melhor país do mundo para viver, segundo o Ín-dice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 2011 da Organização das Nações Unidas. Perde apenas para a Noruega. O IDH considera não apenas dados econômicos, mas também a expectativa de vida, a saúde e as condições de vida das populações.

Segundo o governo australiano, o belo país de proporções continen-tais situado na Oceania, a mais de 13 mil quilômetros daqui, é a terceira nação de língua inglesa mais popular entre aqueles que buscam educação

Conhecimento na bagagem

Por que jovens brasileiros buscam na Austrália

especialização em disciplinas relacionadas ao meio ambiente

Gabriel Fonseca

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fora de sua terra natal. E o Brasil fi-gura entre os dez países com mais estudantes na Austrália.

As saudades de casa, da família e dos amigos, as dificuldades de adap-tação e as diferenças culturais não desanimam os jovens, que se valem do fato de ser uma nação multiét-nica, que recebe gente de todos os continentes.

Fabiana e os animais marinhos

Uma das linhas de pesquisa mais fortes na Austrália é a que envolve o meio ambiente e as tecnologias ver-des. Foi justamente o campo em que Fabiana Moreira desenvolveu sua pesquisa quando cursou doutorado em Ecologia Marinha na Universida-de de Sydney (USYD). Fundada em 1850, a USYD está entre as oito mais produtivas em termos de pesquisa no país. Localizada no coração da maior cidade do país e capital do estado de Nova Gales do Sul, abriga quase 50 mil alunos de 120 países.

Fabiana formou-se em Biologia Ma-rinha na Universidade Santa Cecília, em Santos, litoral de São Paulo. De-pois, fez um mestrado pelo Progra-ma de Pós-graduação em Ciência Ambiental (Procam) da Universidade

de São Paulo (USP), um projeto de colaboração entre a Universidade do Estado de São Paulo (Unesp) de São Vicente, o Instituto Oceanográfico, a USP e o Procam. Ao terminar o mestrado, Fabiana sentiu vontade de aprimorar o inglês e continuar seus estudos ambientais. E não pensou duas vezes: “Queria estudar onde pudesse manter meu estilo de vida e minhas atividades esportivas. Pra-tico surfe, e a Austrália é uma das mecas desse esporte. Também não considerei outro país, pois eu tinha o objetivo de estudar com alguns pesquisadores que viviam em Syd-ney, como Tony Underwood e Ross Coleman, entre outros.” Outro fator-chave para a decisão foi que os estu-dantes podem trabalhar legalmente 20 horas semanais no país, o que não ocorre nos Estados Unidos, por exemplo.

Segundo Fabiana, o processo seleti-vo para a bolsa na USYD foi longo e burocrático. Ela precisou fazer uma extensiva prova de inglês acadêmi-co e também teve avaliado todo seu histórico escolar da graduação, do mestrado e de publicações científi-cas. Todos os documentos tiveram de ser traduzidos para o inglês por tradutor juramentado. Para organizar e enviar a documentação, a pesqui-sadora contou com o auxílio gratuito de uma agência paga por universida-des australianas para auxiliar candi-datos a cursos no país.

A dedicação de Fabiana deu frutos. Ela ganhou uma bolsa financiada pela USYD que cobria todas as mensalida-des. Além disso, ainda contava com um auxílio de cerca de 500 dólares por semana. O dinheiro era suficien-te para cobrir as despesas da vida simples que ela levava em Sydney. Já no segundo ano de PhD, Fabiana começou a trabalhar como tutora no curso de graduação em Ciências Biológicas na própria USYD. Com o dinheiro extra, conseguiu comprar um carro e fez uma poupança.

Fabiana Moreira usa o barco da universidade para fazer coletas na baía de Sydney

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O curso que ela fez no laboratório do Centro de Pesquisas de Impac-tos Ecológicos em Cidades Costeiras teve como objetivo mostrar os im-pactos de um sistema de refrigera-ção de ar que diversos prédios usam ao redor da Baía de Sydney e sugerir aprimoramentos para esse sistema. Muitos grandes prédios comerciais, e até residenciais, na cidade, incluin-do a famosa Ópera de Sydney, são baseados num sistema de refrigera-ção que utiliza a circulação da água do mar em canos ao redor do pré-dio. Funciona da seguinte maneira: a água do mar é sugada da baía e passa por um complexo de canos espalhado por todos os ambientes do prédio. A água do mar tem baixa temperatura e resfria os ambientes por onde passa. O grande problema é que, com a água, o encanamento carrega pequenos animais marinhos, entre eles os moluscos, o que acaba entupindo os canos e prejudicando a refrigeração. Uma das maneiras que as empresas encontraram para resolver a perda de efetividade do sistema de ar-condicionado foi jo-gar cloro na água para espantar os animais. O cloro é uma substância extremamente poluidora e, ao in-teragir com a água do mar, forma novos compostos ainda mais con-taminantes.

Fabiana trabalhou pesado em cam-po durante três anos e meio. Debai-xo de sol ou chuva, frio ou calor, ela pegava o pequeno barco da univer-sidade para fazer coletas semanais em meio à movimentada Baía de Sydney. Recolhia pequenos animais e amostras de água para fazer uma análise aprofundada no laboratório da universidade.

Apos o término do curso, a saudade da família falou mais alto e a pesqui-sadora decidiu voltar ao Brasil com o marido. E começou, então, um pós-doutorado no Instituto Oceanográfi-co da USP. Ela ressalta a importância dos estudos na Austrália: “A pesqui-sa, lá, possibilitou meu aperfeiçoa-mento em desenhos experimentais para a avaliação de impactos am-bientais. Esse conhecimento é fun-damental para desenvolver projetos voltados para o uso sustentável dos recursos naturais, que podem ter di-versos focos. Na Austrália, o projeto era relacionado ao impacto do uso da água do mar para resfriar e aque-cer prédios comerciais e residenciais costeiros. Agora desenvolvo um pro-jeto relacionado ao monitoramento de resíduos sólidos e plásticos na costa brasileira.”

A Universidade de Sydney: primeira a ser fundada no país e uma das melhores até hoje

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Wander e a diversidade genética

dos peixes Quem também pesquisa a preserva-ção do ecossistema marinho é Wan-der Godinho, que saiu de Fortaleza para estudar na Universidade Ma-cquarie, em Sydney. O objetivo do estudante cearense, mestre em En-genharia de Pesca pela Universida-de do Ceará, é avaliar a diversidade genética de populações de peixes de recife. Ele explica por que escolheu a Austrália: “Eu sabia que qualquer bom trabalho realizado com eco-logia marinha aqui teria relevância mundial. Também considerei os Es-tados Unidos, mas os programas de bolsa na Austrália e a possibilidade de trabalhar na Grande Barreira de Corais eram bem interessantes.”

Inicialmente, Wander deixou a enso-larada Fortaleza para estudar inglês, mas já tinha em vista fazer contatos com universidades australianas para um possível doutorado. Depois de nove meses estudando inglês em período integral, conseguiu um es-tágio voluntário na Universidade Macquarie. Voltou, então, ao Brasil e candidatou-se a uma vaga para doutorado na instituição sem ter concluído ainda o mestrado brasi-leiro. Para sua surpresa, conseguiu o objetivo. “Passei meu primeiro ano na Austrália trabalhando também no meu mestrado para a Universi-

dade Federal do Ceará e ainda tive de desenvolver as primeiras ativida-des do doutorado australiano. Uma loucura!”, diz Wander, recordando o aperto que passou.

Outras dificuldades lembradas por Wander foram o idioma, especial-mente quando lidava com trâmites burocráticos, e os termos técnicos do mundo da pesquisa – além do frio no inverno. “Estou acostumado com os 300 dias por ano de sol e calor de Fortaleza. Ainda me sinto um pouco desconfortável aqui”, desabafa.

A Universidade Macquarie foi criada em 1964 e tem investido muito em pesquisa. Atualmente, é considerada a nona melhor da Austrália e é cada vez mais disputada pelos estudan-tes. Ela mantém convênios com mais de 370 instituições de pesquisa e en-sino em 53 países.

O objetivo da pesquisa de Wander é estudar barreiras biogeográficas ao longo da costa leste australia-na e avaliar a diversidade genética de populações de peixes recifais entre parques marinhos no esta-do de Nova Gales do Sul. “No meu doutorado, abordei um tema ligado à evolução de peixes marinhos e a processos históricos que explicam a distribuição das espécies na Austrá-lia. Meus resultados são importan-tes por mostrarem a influência das correntes marinhas e da topografia das praias na distribuição dos pei-xes recifais e o porquê da atual dis-

O biólogo Wander Godinho na Baía de Chowder, aonde leva

seus alunos para atividades educacionais no mar

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tribuição por tamanho das espécies desses peixes nos variados ecos-sistemas marinhos. Minha pesquisa poderá servir de comparação para o estudo de peixes marinhos pelo mundo e revelar padrões de evolu-ção talvez diferentes do que encon-trei para a Austrália.”

O estudante tem uma rotina intensa: divide seu tempo entre a preparação dos manuscritos de seu doutorado para serem publicados, o trabalho na universidade como tutor nas dis-ciplinas Evolução & Biodiversidade e Ecologia & Genética, além de traba-lhar na Land’s Edge, uma empresa que desenvolve atividades de recrea-ção e educação ao ar livre com es-tudantes de escolas de Sydney. “Sou contratado como biólogo marinho para simular atividades científicas com os estudantes. Isso envolve mergulho com os alunos em praias locais para que eles possam compa-rar a relação entre números de ouri-ços e quantidade de algas e peixes que encontram. Daí eles aprendem a metodologia de trabalho cientí-fico e, no final, a gente comenta os resultados. É interessante ver que a maioria dos alunos se mantém foca-da no trabalho, algo difícil para uma faixa etária que vai de 12 a 15 anos”, explica Wander.

O cearense quer ficar por mais al-gum tempo na Austrália: “Volto ao

Brasil para a Copa do Mundo em 2014. Mas, por enquanto, desejo desfrutar mais da vida segura que tenho aqui. No entanto, não des-carto a possibilidade de desenvol-ver um pós-doutorado em parceria com universidades brasileiras. Após o doutorado, pretendo continuar na área de educação, com a meta de desenvolver programas de conserva-ção ambiental.”

Felipe e a contaminação dos

manguesFormado pela Universidade Oswal-do Cruz, o químico e pesquisador Felipe Valini trocou São Paulo pela Austrália para aprimorar o inglês. Em Brisbane, na costa leste, tentou vaga como voluntário no laboratório do Departamento de Geologia da Universidade de Queensland (UQ), uma das melhores do país. Não con-seguiu a vaga, mas acabou sendo convidado a participar dos trabalhos de pesquisa. O brasileiro teve de se desdobrar para adquirir um conheci-mento que não tinha, mas foi assim que acabou desenvolvendo sua linha de pesquisa em geoquímica.

Ao contrário de outros mestran-dos, Felipe não achou muito difícil o processo de admissão na UQ. Ele acredita que a paixão por estudar e pelo seu objeto de estudo são primordiais para um bom começo. Além disso, é preciso encontrar um professor que tenha uma linha de pesquisa que o estudante admire e fazer muitos contatos para checar as possibilidades de bolsa de estudos. Nem todos os professores podem oferecer bolsa, algo fundamental para que os estudantes tenham con-dições financeiras de viver no país.

Felipe investigou a contaminação de mangues por metais pesados, problema que atinge a bela Baía de Moreton, na costa leste australiana,

O químico Felipe Valini trocou Brisbane por Canberra para desenvolver painéis de energia solar mais eficientes

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e muitas outras pelo mundo afora. O estudo foi pioneiro na região. “Fui a primeira pessoa a fazer um mapea-mento para verificar quais as locali-dades com mais altas concentrações de metais pesados. Fiz levantamento em 46 pontos da baía, onde traba-lhei muito colhendo amostras de solo e água”, conta o pesquisador.

Brisbane, onde a pesquisa foi de-senvolvida, é a terceira maior cidade do país e uma das regiões de maior crescimento econômico. Os impac-tos da urbanização acelerada são sentidos com intensidade e os man-guezais da baía estavam visivelmente afetados. O mangue é um ecossiste-ma muito delicado e importante para o equilíbrio da cadeia alimentar, um verdadeiro berçário para os animais marinhos. A poluição afeta peixes, caranguejos e, consequentemente, a pesca e o turismo, atividades impor-tantes ao redor da baía.

Os resultados encontrados na pes-quisa de Felipe bateram de fren-te com os divulgados anualmente

pelas autoridades da região. Felipe alega que estes só incluem dados biológicos e não consideram metais pesados na análise, nem a conta-minação do solo. Regiões com mui-tos metais pesados na água foram consideradas limpas segundo as análises da prefeitura. Os principais responsáveis pela contaminação dos manguezais locais são as refinarias e indústrias instaladas no entorno da baía, sem falar no lançamento na água de produtos domésticos como detergentes e desinfetantes. “A argi-la do mangue é muito frágil, porque os grãos minúsculos que a formam atraem os metais pesados e se fun-dem com eles. O mangue funciona como uma esponja”, afirma o pes-quisador. O próximo passo de Felipe será publicar os resultados na mídia científica e esperar que a prefeitura se pronuncie sobre possíveis ações para conter a contaminação dos manguezais.

O mestrado de Felipe já rendeu fru-tos além dos manguezais: ele se mu-

Felipe trabalhando em campo na Baía de Moreton, em Brisbane

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dou para a capital do país, Canberra, para trabalhar no desenvolvimento de produtos que vão melhorar a eficiência de painéis de geração de energia solar. “Desenvolvemos novas tecnologias que utilizam novos com-ponentes químicos e vão gerar mais energia com menor preço.”

Priscila e as ostras A bióloga Priscila Gonçalves se gra-duou e fez mestrado em biologia celular na Universidade Federal de Santa Catarina antes de se aventu-rar pelas terras australianas. Ela se inscreveu no programa Ciências sem Fronteiras, do governo brasileiro, e conseguiu uma bolsa para estudar no exterior. O programa é uma ini-ciativa do Ministério da Ciência, Tec-nologia e Inovação e do Ministério da Educação.

Com sinal verde após receber a bolsa de estudos, começou a parte mais complicada: organizar os pa-péis para obter uma vaga no curso de doutorado na Universidade Mac-

Priscila Gonçalves estuda os impactos do CO2 em ostras

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quarie, a mesma de Wander. Todo o processo durou cerca de dez meses e consumiu alguns milhares de dó-lares. “Você precisa da tradução ju-ramentada de todos os documentos acadêmicos, de cartas de recomen-dação de pesquisadores e profes-sores com quem tenha trabalhado previamente e exame de proficiência em inglês, além de um projeto de pesquisa definido e do aceite do seu atual orientador”, informa a bióloga. E não se pode esquecer de tirar o visto de estudante.

“É necessário planejamento finan-ceiro antes mesmo de começar”, recomenda Priscila, que atualmente está no segundo ano do doutorado em Ciências Biológicas. Sem uma bolsa de estudos, os alunos estran-geiros teriam de pagar por ano cerca de 30 mil dólares australianos (apro-ximadamente 55 mil reais).

A Austrália chamou atenção da dou-toranda pela crescente preocupação com a conservação de ecossistemas marinhos e pelo alto investimen-to em pesquisas na área ambiental tanto por parte de instituições go-vernamentais como de empresas e associações privadas vinculadas ao setor. Outros aspectos interessan-tes, segundo ela, são a qualidade do ensino dos cursos de pós-gradua-ção, o renome dos pesquisadores e a ótima estrutura dos laboratórios.

O projeto de doutorado da brasileira aborda os impactos de níveis eleva-dos de gás carbônico (CO2) em popu-lações de ostras nativas. Por meio de programas de melhoramento genéti-co, foram selecionadas populações de ostras de rápido crescimento e resistência a enfermidades. Elas tam-bém mostraram maior tolerância às condições de alta temperatura e bai-xo pH (nível de acidez) da água. Isso pode ser resultado de uma adaptação genética às condições ambientais. “Estou comparando os resultados com os efeitos observados em po-

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pulações selvagens da mesma espé-cie. As análises estão sendo feitas tanto em nível celular quanto mole-cular e têm por objetivo investigar a base molecular para uma potencial adaptação às mudanças climáticas. Além disso, também investigamos a resposta de ostras expostas a níveis elevados de CO2 ao longo de três ge-rações, a fim de observar se os efeitos do baixo pH da água se tornam mais amenos ou mais severos em ostras provenientes do cruzamento de adul-tos já previamente expostos a essa nova condição”, explica Priscila.

Mesmo vinculada à Universidade Macquarie, todos os experimentos e análises da doutoranda estão sendo desenvolvidos no Instituto de Ciên-cia Marinha de Sydney (Sims), na pa-radisíaca Baía de Chowder – mesmo local aonde Wander leva estudantes para atividades de observação e pesquisa no mar. O Sims tem convê-nio com cinco das mais importantes universidades de Sydney e os alunos destas instituições podem usar à vontade sua estrutura de laborató-rios e tanques para as pesquisas.

Priscila afirma que o tipo de pes-quisa que desenvolve na Austrália é pouco explorado no Brasil, apesar da grande diversidade marinha do país e da crescente preocupação com a conservação da costa brasi-leira: “Estudos dessa natureza têm grande importância tanto no nível científico, por causa da adaptação e extinção de espécies marinhas, quanto na ciência aplicada e tam-bém na aquicultura.

A volta ou não ao Brasil ainda não passa pela cabeça da bióloga. Ela diz que tudo depende de bolsas, finan-ciamentos e oportunidades. “Me-didas como o aumento do número de bolsas e da qualidade do ensino

das pós-graduações no Brasil, bol-sas de estudo com valor compatível aos pós-graduandos em ciência e tecnologia, maior financiamento de projetos de pesquisa, novas ofer-tas de concursos públicos, além do reconhecimento das atividades científicas e da regulamentação da profissão podem auxiliar no retorno de estudantes que estudam fora ao país”, sugere.

Os quatro entrevistados desta re-portagem são apenas gotas num oceano de profissionais que querem fazer diferença no mundo e contri-buir para a construção de um desen-volvimento sustentável. Todos eles concordam que para ter sucesso na carreira acadêmica no exterior é preciso ter muita força de vontade, disposição, competência, paciência, foco e paixão pelo objeto de estudo. “A biologia é tão mágica e tão com-plexa que cada novo questionamen-to, cada nova observação se torna motivo de inspiração para novos projetos. E a partir destes surgem novas perguntas e ideias. É um ciclo inspirador que rende muitos frutos.”, garante a apaixonada Priscila.

A bióloga usa o laboratório do SIMS para analisar o

material coletado

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Quem viaja ao Nordeste a passeio normalmente pensa em se estirar em alguma praia paradisíaca, mas nem só de mar vive a região. Ainda pouco explorado pelos turistas, o passeio à foz do rio São Francisco, divisa natural entre Sergipe e Ala-goas, é daqueles que ficam na lem-brança para o resto da vida.

O programa é um dos muitos te-souros ecoturísticos abundantes no território nacional. Durante aproximadamente três horas, o vi-sitante se deslumbra e se emocio-na com as belezas e a diversidade do cenário.

Para quem visita a região, o mais indicado é hospedar-se na alagoa-na Penedo, a cerca de 160 quilô-metros de Maceió. A cidade fica às margens do São Francisco, e quem chega para conhecê-la não deixa de se admirar com as águas do Velho Chico movendo-se lenta e majestosamente rumo ao Ocea-no Atlântico, 30 quilômetros mais abaixo. O impacto é ainda maior para quem chega ao cair da tarde,

Nas águas do Velho

ChicoPasseio à foz do rio

São Francisco é um dos mais bonitos e emocionantes

do país

Mário Moreira

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já que o sol se põe do lado oposto, em terras sergipanas.

De Penedo, são 25 quilômetros pela rodovia AL-101 até Piaçabuçu, de onde partem os barcos para a foz do São Francisco. Os hotéis de Penedo costumam reservar o pas-seio com a cooperativa dos bar-queiros do município vizinho.

O mais fácil e prático, principal-mente para quem está com crian-ças, é comprar os ingressos para os barcos que abrigam 40 turistas. A tarifa custa R$ 35 por pessoa [valor de setembro], mas é possível contratar embarcações menores e exclusivas, com preços a combinar.

Paisagens variadasUma vez a bordo, é hora de, literal-mente, deixar-se levar pelo rio. O barco desliza suavemente e, pouco a pouco, o turista vai descobrindo uma variedade de ecossistemas nos 13 quilômetros percorridos até a foz.

Nos primeiros 20 minutos, o que predomina em ambas as mar-gens são os coqueirais típicos do Nordeste. É nesse trecho do São Francisco que se avistam as “bor-boletas”, pequenas embarcações

semelhantes às jangadas, com velas quadradas e coloridas.

À medida que o barco vai descendo o rio, os coqueiros começam a es-cassear, dando lugar a vastos man-guezais. Aqui e ali, nos intervalos do mangue, em locais de vegetação ar-bustiva, surgem pequenas cabanas de palha e casebres de pau-a-pi-que usados por pescadores para se abrigar durante os meses de verão – no inverno, quando chove mais e o rio enche, aquelas margens ficam inundadas. O rio ali é largo, chegan-do a atingir quatro quilômetros de uma margem à outra.

Mais alguns minutos, já no trecho final, o que passa a predominar são praias e dunas de areia branca. É quando se pode finalmente avistar o encontro do Velho Chico com o mar, depois de mais de 2.800 quilô-metros desde a nascente, na Serra da Canastra, em Minas Gerais.

É um momento grandioso, em que a placidez do rio contrasta com a força das ondas do Atlântico que vêm em sentido contrário. A maioria das embarcações turísticas estanca cerca de 200 metros antes, já que as condições naturais normalmente não recomendam navegar pela foz.

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Os coqueirais predominam nas margens. O passeio de barco percorre 13 quilômetros até a foz

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Em compensação, há uma parada de cerca de uma hora para banho nas águas mornas do São Francis-co, junto ao Pontal do Peba, a parte alagoana da foz. No pontal, além de dunas, há uma lagoa onde também é possível banhar-se. Na faixa de areia entre a lagoa e o rio, barra-quinhas vendem comidas típicas e artesanato da região.

À direita, próximo ao lado sergipa-no, as ruínas de um pequeno farol construído em 1876 e já engolido pelas águas testemunham como o mar avançou rio adentro nos últi-mos 140 anos.

AssoreamentoEssa imagem, por sinal, faz pensar no impacto que poderá ter sobre o Velho Chico o projeto de transposi-ção das suas águas, cujas obras es-tão em andamento. O plano prevê a retirada de 1,4% da vazão garan-tida pela barragem de Sobradinho e sua destinação a 390 municípios do agreste e do sertão nordestino, por meio da construção de dois canais

(eixos Norte e Leste) que levarão a água do São Francisco para outros rios da região. A estimativa do go-verno federal é garantir o abasteci-mento a 12 milhões de habitantes.

Uma das críticas feitas ao projeto é a de que a retirada de parte da água, mesmo em proporção peque-na, pode vir a afetar a profundidade do rio e a biodiversidade no Baixo São Francisco, prejudicando a ativi-dade pesqueira na região e a qua-lidade de vida da população local. Mesmo antes do término das obras de transposição, pescadores de Piaçabuçu já reclamam que a fauna fluvial vem sendo invadida por es-pécies marinhas.

Neste ano, uma expedição com-posta por pesquisadores de cinco universidades federais do Nordes-te comprovou que o assoreamento do São Francisco entre Alagoas e Sergipe já ocasiona a existência de trechos onde é possível caminhar no leito, algo impensável décadas atrás.

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PenedoNão é somente a vista do rio São Francisco que torna Penedo uma das cidades mais interessantes para serem visitadas em Alagoas. Seu bem preservado centro histórico é tombado pelo Instituto do Patrimô-nio Histórico e Artístico Nacional e merece a atenção do turista por pelo menos um dia.

Hoje com cerca de 60 mil habitantes, a vila de Penedo surgiu em meados do século 16, quando o então dona-tário da Capitania de Pernambuco, Duarte Coelho, buscava um local próximo à foz do São Francisco para demarcar os limites da região e instalar um ponto de apoio para o comércio e também de vigilância contra eventuais incursões fluviais de invasores. Numa curva do rio, en-controu um rochedo elevado, a cer-ca de 30 metros de altura em relação

à margem, e ali instalou o núcleo que daria origem à cidade (“penedo” sig-nifica rochedo ou penhasco).

Em 1637, os holandeses, que já ocu-pavam parte do Nordeste, tomaram Penedo e ali construíram um forte, onde se instalaram. O muro externo da fortificação constitui atualmente a parede de um restaurante que ofe-rece uma linda vista do São Francis-co. Os portugueses só recuperaram Penedo oito anos depois.

Hoje, quem visita a cidade pode admirar diversos prédios históricos. Dentre as igrejas, destacam-se a de Nossa Senhora da Corrente e a de Nossa Senhora dos Anjos.

A primeira, erguida em 1765, fica em uma praça no início da avenida que margeia o São Francisco. Em estilo barroco, foi construída para ser a capela particular da família do aboli-cionista português André de Lemos

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Igreja de Nossa Senhora dos Anjos, cuja construção teve início em 1660

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Ribeiro. Além do bonito altar-mor dourado e dos coloridos azulejos que adornam as paredes do interior, a igreja tem uma peculiaridade: na parede junto a um altar lateral, há um esconderijo onde Lemos Ribeiro mantinha escravos fugidos.

Na mesma praça localiza-se o Paço Imperial, onde o imperador d. Pedro II ficou hospedado em sua visita à cidade, em 1859. O bonito prédio abriga um museu, com objetos de decoração dos séculos 18 e 19.

A Igreja e Convento de Nossa Se-nhora dos Anjos, restaurada nos últimos anos, começou a ser cons-truída em 1660 e tem fachada típica daquela parte do Nordeste, com adornos de pedra em formato de conchas. Seu interior é ricamente decorado. O claustro do convento também vale a visita.

Na parte mais alta da cidade, lo-caliza-se a bonita praça Barão de Penedo, rodeada de construções históricas, como a catedral de Nos-sa Senhora do Rosário, a Casa de Aposentadoria e o Oratório dos Condenados.

Outro prédio interessante é o Tea-tro Sete de Setembro, inaugurado em 1884 e que abriga espetáculos teatrais e musicais. A fachada con-tém quatro estátuas representando as deusas gregas da poesia, da pin-tura, da música e da dança.

Para quem se interessa pela história da região, outra dica é a Fundação Casa do Penedo, com bom acervo histórico e iconográfico sobre a vida no Baixo São Francisco.

No mais, é sair pelas ruas à pro-cura de belos casarões em estilo colonial. Não será difícil encontrar vários.

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Meio ambiente & químicaPérola de Castro Vasconcellos

Senac SP, 2013144 páginas

Mais um volume (o de número 20) da Série Meio Ambiente, esta obra nas-ceu de uma demanda bastante atual: a discussão do impacto que nossos hábitos de consumo provocam no meio ambiente. Assim, o livro acaba por provocar reflexões muito opor-tunas acerca da preocupação com

a possibilidade de estarmos che-gando a uma situação-limite.

Em uma análise que com-preende a formação da Terra e sua transformação pelo ser humano, a pro-

fessora Pérola de Castro Vasconcellos nos ensina, com

simplicidade e clareza, os pro-cessos químicos característicos

do planeta em que vivemos e inerentes ao nosso modo de vida.

É um livro para todos que se interessam por química

e, sobretudo, para os que bus-cam um estilo de vida sustentável.

Ele nos permite compreender os efeitos de nossos maus hábi-

tos, para então modificá-los.

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Tempestades dos meus netos: mudanças climáticas

e as chances de salvar a humanidadeJames HansenSenac SP, 2013

368 páginas

Os verões cada vez mais quentes, re-gistrados em diversos pontos do glo-bo terrestre, são resultado do aque-cimento global? A onda de calor que atingiu a França em 2003, a escassez de chuvas que afetou a Amazônia em 2005 e 2010, as temperaturas extre-mas registradas em Moscou, na Rús-sia, também em 2010 e a seca que atingiu os estados norte-americanos do Texas e de Oklahoma em 2011 são consequências desse fenômeno?

As variações climáticas que ocorrem na natureza podem ser bastante am-plas – e a relação direta entre fenô-menos extremos e aquecimento glo-bal não é unânime no meio científico –, mas para James Hansen – pesqui-sador e diretor do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Nasa, um dos cientistas que mais têm alertado os dirigentes políticos sobre o aque-cimento da Terra – os impactos da mudança climática já estão sendo sentidos aqui e agora. E pior: reve-lam-se piores do que ele mesmo já havia previsto anteriormente.

Tel.: (11) 2187-4450www.editorasenacsp.com.br

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Representação que gera resultadoPromove o Desenvolvimento SocialIncentiva o espírito cooperativoImpulsiona a Transformação Nacional

As novas marcas do Sistema CNC - Sesc - Senac mudaram. E foram premiadas.

O case “Novas marcas CNC - Sesc - Senac, a sinergia da

transformação” foi o vencedor nacional na categoria Comunicação

de Marca da 39ª edição do Prêmio Aberje.

Presentes em todo o País, CNC - Sesc - Senac compõem um dos

maiores sistemas sociais do mundo, responsável por um conjunto

integrado de ações em prol do desenvolvimento econômico e

social. Uma referência no fortalecimento do comércio de bens,

serviços e turismo.

Essa conquista reconhece a parceria das agências Packaging

Brands e Ogilvy Brasil e o esforço coletivo das pessoas que fazem

parte do Sistema CNC - Sesc - Senac em inovar na busca de uma

nova identidade para representar a transformação.

Acesse os nossos sites e saiba mais sobre o nosso posicionamento:

www.cnc.org.br

www.sesc.com.br

www.senac.br

O case “Novas marcas CNC-Sesc-Senac,

a sinergia da transformação” foi o vencedor nacional na

categoria Comunicação de Marca da 39ª edição do

Prêmio Aberje.