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O Impacto Social da Pandemia Estudo ICS/ISCTE Covid-19 Abril 2020 Pedro Magalhães Rita Gouveia Rui Costa Lopes Pedro Adão e Silva coord.

O Impacto Social da Pandemia - ics.ulisboa.pt · Distribuição da amostra por grau de instrução mais elevado que completou Ensino superior 75,5% (8691) Ensino secundário 21,3%

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OImpactoSocialdaPandemia

EstudoICS/ISCTECovid-19

Abril2020

PedroMagalhães RitaGouveia

RuiCostaLopes PedroAdãoeSilva

coord.

ÍNDICE

SumárioExecutivo 2

1. Fichatécnica 5

2. Caracterizaçãodaamostra 6

3. Confiançanarespostaàpandemia 7

4. Fontesdeinformação 14

5. Expectativasfaceàduraçãodasrestrições 19

6. Estadodeemergência 23

7. Rendimentos 27

8. Gruposvulneráveis 32

9. Preocupaçõesemrelaçãoaofuturo 47

2

SumárioExecutivo

• Este relatório baseia-se num inquérito online sobre a Pandemia Covid-19 e os seus

impactosemdiversasesferasdavidadaspessoasquevivememPortugal.Oinquéritofoi

realizado entre 25 e 29 de março de 2020, junto de uma amostra de cerca de 11.500

inquiridos, não representativa da população residente em Portugal. Por essa razão, este

relatório não procura fazer inferências descritivas para qualquer população, mas sim

concentrar-seemdoisaspetosprincipais:1)asrelaçõesentredeterminadosatributosdos

inquiridoseassuasopiniõesecomportamentos;e2)oseudiscursodireto,emrelaçãoa

algumasperguntasderespostaabertaincluídasnoinquérito.

• Nestaamostra, umadas variáveismais fortementeassociadaàprevalênciadediferentes

opiniões e atitudes é a situação económica dos inquiridos. Pese embora maiorias

expressivas dos inquiridos afirmarem ter “muita” ou “alguma” confiança nas respostas

dadas à pandemia pelas diferentes autoridades, são, em particular, os inquiridos que já

viviam commaiores dificuldades económicas antes da pandemia que tendem a revelar

menorconfiança.Sãotambémestesinquiridosquemmenosconfianasfontestradicionais

de informação, os que mais dizem estar a ter dificuldades em lidar com as restrições

trazidas pelo estado de emergência e os que mais afirmam já terem sido afetados

financeiramentepelacrise.

• Em consonância com isto, o discursodiretodos inquiridos sobre asmaiores dificuldades

queestãoasentircomasatuaisrestriçõesapontacommuita frequênciaparaproblemas

económicos,especialmenteporpartedetrabalhadoresporcontadeoutremqueficaram

desempregados, de trabalhadores independentes que deixaram de ter atividade e de

pequenosempresáriosque tiveramde fechar a atividade: “onossopequenonegócioem

riscodedesmoronar”;“sereimaisum‘velhodebaixodaponte’”;“absolutamenteempânico

sobreofuturo”,sãoalgumasexpressõesquedãocontadocontextoatual.

• Para além dos problemas económicos e da situação de desempregado ou em “férias

forçadas”,queestãofortementeassociadosamaioresdificuldadesemlidarcomasatuais

restrições, há também escalões etários onde essas dificuldades são sentidas mais

fortemente:osmaisjovensdetodos(16-24anos)eosinquiridosentreos35eos44anos

3

com agregados familiares mais numerosos e filhos menores. Os primeiros mencionam

frequentementeoisolamentoeafaltadeliberdadeeconvíviocomofontedefrustraçãoe

angústia (no que são acompanhados por alguns inquiridos mais velhos, divorciados ou

viúvos). Os segundosmencionam frequentemente a dificuldade em conciliar, no espaço

doméstico,otrabalho,avidafamiliareaeducaçãodosfilhos.Finalmente,encontra-seem

todas as idades e condições uma preocupação recorrente com vários aspetos da saúde

mental(estadosdepressivos,stresseansiedade).

• Os inquiridosmais jovens (16-34 anos) distinguem-se dos restantes de váriospontos de

vista: para além de tenderem a termenos confiança na resposta das autoridades e em

quasetodasasfontesdeinformação,tendemtambémadefendermedidasmaisrestritivas

paralidarcomapandemiae,aomesmotempo,aconsiderarqueasrestriçõesterminarão

mais cedo, apontando para final de abril ou maio. No seu discurso direto, emerge

frequentemente a preocupação com a falta de cumprimento das regras atualmente em

vigor e com a importação de casos, uma desconfiança em relação ao senso comum da

generalidade da população e a conveniência em adotar práticas e comportamentos de

paísesondeocombateàpandemiaterásidomaisbem-sucedido.

• Aincerteza(“nãoseiatéquandoasatuaisrestriçõesvãodurar”)eacrençanopiorcenário

(“atéaofimdoanooumais”)sobreaduraçãodasatuaisrestriçõessãomaioresentreos

mais velhos e aqueles que têmmaiores dificuldades económicas. No discurso direto, as

preocupações manifestadas sobre o futuro são de vários tipos e combinam várias

dimensões em simultâneo. Assim, por um lado destacam-se as preocupações quanto à

saúde, incluindo os receios de contaminação, a saúde dos próprios e dos seus entes

queridos e a capacidade de resposta dos serviços de saúde. Por outro, também

prevalecem, sobretudo para quem está em idade ativa, as preocupações económicas—

perda de emprego (para os trabalhadores por conta de outrem ou trabalhadores

independentes)ousobrevivênciadasempresas(paraosempresários)—easpreocupações

coma educação, nomeadamente coma escola dos filhos, o comprometimentodos seus

projetosescolareseoseuacessoaoensinosuperior.Nas franjasmais jovensdaamostra

destaca-se tambéma preocupação como acesso ao ensino superior, assim como coma

conclusão dos cursos e a entrada no mercado de trabalho. Importa notar que outras

4

preocupaçõessãotransversais,nomeadamente,asquetêmavercomasaúdemental,os

efeitosdoconfinamentosocialeadificuldadeemlidarcomaincerteza.

Naúltimasemanadeabrildecorreráumanovarondadeinquiriçãodesteinquéritoonline,focada

em acompanhar a evolução dos impactos sociais da pandemia junto dos inquiridos que

participaramnaprimeiraronda.

5

1. Fichatécnica Este relatório baseia-se num inquéritoonline que decorreu entre os dias 25 e 29 demarço de

2020.OinquéritofoicoordenadoporumaequipadoInstitutodeCiênciasSociaisdaUniversidade

deLisboa(ICS-ULisboa)edoISCTE-InstitutoUniversitáriodeLisboa(ISCTE-IUL).Aamostraobtida

é uma amostra “bola de neve” ou “guiada pelo respondente”: o inquérito foi inicialmente

partilhado através das redes sociais Facebook e Twitter e de correio eletrónico pelos

coordenadores do estudo e pelas instituições a que pertencem junto de uma amostra não-

aleatóriadeindivíduos,tendosidodepoispartilhadopelosrespondentesqueoentenderamfazer.

Por outras palavras, é uma amostra de conveniência, restrita a inquiridos que têm acesso à

internet,equenãopermitequesefaçaminferênciassobrequalquerpopulação,talcomo,por

exemplo, a população portuguesa. Dito de outra forma, todos os resultados baseados nesta

amostraeapresentadosnesterelatóriotêmumvalorestritamenteexploratório,nãodevendoser

interpretados como representando, com um grau de incerteza possível de ser estimado, os

atributosdequalquerpopulação.

Contudo, a investigação existente mostra também que este tipo de amostra, apesar de

inadequado para inferir sobre a prevalência de quaisquer atributos numa população, preserva

frequentemente relações entre variáveis, em comparação com o que sucede com amostras

desenhadasparaseremrepresentativas.1Logo,ao longodeste relatórioenfatizaremosaanálise

dasrelaçõesentrevariáveis,confrontando-as,semprequepossível,comestudosanterioresque

utilizaram amostras representativas. Foram recolhidas11.508 respostas a este inquérito, tendo

sidovalidadasasrespostasdosinquiridoscom16oumaisanosdeidadequechegaramaofinaldo

questionáriodemorandomaisdetrêsminutos(mesmoquetenhamoptadopornãorespondera

algumasperguntas).

Equipadeinvestigação:

Coordenação:PedroMagalhães(ICS-ULisboa),RitaGouveia(ICS-ULisboa),RuiCostaLopes(ICS-ULisboa)ePedroAdãoeSilva(ISCTE-IUL).AnaNunesdeAlmeida(ICS-ULisboa),JoãoFerrão(ICS-ULisboa),JoãoMourato(ICS-ULisboa),JoséSantanaPereira (ISCTE-IUL), José Sobral (ICS-ULisboa), Karin Wall (ICS-ULisboa), Luís Cabrita (ISCTE-IUL) e PaulaVicente(ISCTE-IUL).

1Ver,porexemplo,Bhutta,C.B.(2012).Notbythebook:Facebookasasamplingframe.SociologicalMethods&Research,41(1),57-88.

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2. CaracterizaçãodaamostraAs tabelas abaixodescrevemalgumasdas principais características da amostra de conveniência

recolhidanesteinquéritoonline.

Tabela2.1.DistribuiçãodaamostraporsexoMasculino 42,7%(4909)Feminino 56,1%(6457)Prefironãoresponder 0,4%(48)Recusa 0,8%(94)Tabela2.2.Distribuiçãodaamostraporescalõesetários16-24anos 9,8%(1125)25-34anos 12,1%(1389)35-44anos 21,2%(2438)45-54anos 22,8%(2629)55-64anos 15,9%(1833)65anosoumais 16,6%(1907)Recusaresponder 1,6%(187)Tabela2.3.DistribuiçãodaamostraporgraudeinstruçãomaiselevadoquecompletouEnsinosuperior 75,5%(8691)Ensinosecundário 21,3%(2447)3ºciclooumenos 2,4%(273)Recusaresponder 0,8%(97)Comparandoascaracterísticasdestaamostradeconveniênciacomasestimativasconhecidaspara

apopulaçãoresidenteemPortugalcom16oumaisanos,destacam-se:

- uma ligeira sobrerrepresentação das mulheres nesta amostra, na ordem dos 3 pontos

percentuais(Tabela2.1);

- uma sub-representaçãonesta amostra dosmembros do escalão etário entre os 16 e 24

anos (de cercade2pontospercentuais) e, emespecial, dosmembrosdoescalão com65

anosoumaisanos(decercade8pontospercentuais)(Tabela2.2);

- umamuito forte sobrerrepresentação nesta amostra dos inquiridos que completaram o

ensino superior, comuma correspondente e igualmente forte sub-representação dos que

completaram o 3º ciclo ou menos (Tabela 2.3). Este é o principal enviesamento desta

amostra,queeraprevisíveltendoemcontaaforma“boladeneve”comofoiconstruída.

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3. ConfiançanarespostaàpandemiaMaioriasexpressivasdos inquiridosafirmamter “muita”ou“alguma”confiança (poroposiçãoa

“pouca” ou “nenhuma”) nas respostas dadas à pandemia pelo Presidente da República (Figura

3.1), primeiro-ministro (Figura 3.2), ministra da Saúde (Figura 3.3) e diretora-geral da Saúde

(Figura3.4).Contudo,comoestaamostraonlinenãoérepresentativadapopulaçãoportuguesa,

torna-semais relevante observar a que fatores está associada umamaior oumenor confiança

depositada nos detentores destes cargos. A idade é umdesses fatores:quantomais jovens os

inquiridos,menorapercentagemdaquelesqueconfiamnarespostaqueestasautoridadesdão

à pandemia. A confiança dos inquiridos também diminui à medida que declaram que tinham

maioresdificuldadesemvivercomo rendimentoqueauferiamantesdapandemia.Finalmente,

entreosinquiridosqueseposicionamideologicamenteàdireita,aproporçãodaquelesquedizem

confiarémaisbaixa,especialmentenoquetocaàdiretora-geraldeSaúde,àministradaSaúdee

aoprimeiro-ministro.

Opadrãoderespostassobreaconfiançanasforçasdesegurançaeproteçãocivil(Figura3.5)ou

nopessoaldoServiçoNacionaldeSaúde(Figura3.6)éumpoucodistintodoqueseencontranos

casosanteriores.Porumlado,aassociaçãoestatísticaentredificuldadeseconómicaseconfiançaé

menor.Poroutro,aassociaçãocomoposicionamentoideológicodesaparece.Poroutraspalavras,

nestaamostra,quandopassamosdecargospolíticosconcretosparainstituiçõescomoas“forças

desegurança”ou“oServiçoNacionaldeSaúde”,aconfiançaaumentaetorna-semaisdifusado

pontodevistasocialepolítico.Dito isto, importanotarqueaténestesúltimoscasosévisívela

menorconfiançadosmaisjovensedosquesentiammaioresdificuldadeseconómicas.

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Figura3.1:

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"Confortável"

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"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadoPresidentedaRepúblicaàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(68%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura3.2:

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Mulheres

Homens

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Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

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"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadoprimeiro-ministroàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(77%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura3.3:

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Mulheres

Homens

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Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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Instrução

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadaministradaSaúdeàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(62%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura3.4:

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Mulheres

Homens

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25-34

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Até3ºciclo

Secundário

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"Algodifícilviver"

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadadiretora-geraldaSaúdeàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(68%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura3.5:

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Mulheres

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16-24

25-34

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Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadasforçasdesegurançaeproteçãocivilàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(83%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura3.6:

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-25 -20 -15 -10 -5 0 5 10 15 20

Mulheres

Homens

16-24

25-34

35-44

45-54

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65+

Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

Sim

Não

Esquerda(0-4)

Centro(5)

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Instrução

Rend

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Está"muito"ou"algo"confiantenarespostadopessoalmédico,enfermagemetécnicosauxiliaresdoSNSàpandemiaDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(93%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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4. Fontesdeinformação Umamaioriaexpressivadosinquiridosafirmater“muita”ou“alguma”confiançanasinformações

prestadaspelasfontesnoticiosastradicionais:televisão (Figura4.1)eimprensaescrita(Figura4.2).

No entanto, estes níveis de confiança elevados não são uniformes entre todos os grupos de

inquiridos:os indivíduosmais jovensecommenoresníveisdeescolarização tendemaconfiar

menos na televisão e na imprensa. Entre os indivíduos com menores níveis de instrução, a

confiança na imprensa escrita chega a estar quase 20 pontos percentuais abaixo damédia da

amostra. Algo semelhante, ainda que em menor grau, é observável entre os inquiridos com

maiores dificuldades económicas, sendo que a confiança nestesmeios de informação aumenta

quantomais“confortáveis”aspessoassesentemcomoseunívelderendimento.Finalmente,em

termos ideológicos, tendem a ser os indivíduos que se consideram de esquerda a ter maiores

níveis de confiança na informação prestada pela imprensa escrita, não havendo grandes

diferençasideológicasnoquetocaàconfiançanainformaçãotelevisiva.

Emcontrastecomoquesucedecomainformaçãotransmitidaatravésdasfontestradicionais,são

aqueles com maiores dificuldades económicas e (especialmente) com menores níveis de

instruçãoque reportammaior confiançanas redes sociais como fontes de informação (Figura

4.3). A mesma inversão acontece quando dividimos os inquiridos ideologicamente: existe uma

maiordesconfiançafaceàsinformaçõesprovenientesdasredessociaisentreosindivíduosquese

consideramdeesquerda.Poroutrolado,éentreascamadasmaisjovensdapopulação(entreos

25 e os 34 anos) que a fiabilidade da informação proveniente das redes sociais é mais

questionada.Ditoisto,anãosernocasodainstrução,asdiferençassãopoucoexpressivas.

Por fim, o nível de confiança nas informações dadas por amigos e familiares gera diferenças

grandesentreosgruposemanálise(Figura4.4):aidadeéofatormaisdiferenciador,sendoqueos

maisvelhosconfiammuitomaisnosseusamigosefamiliaresqueosmaisjovens.Existe,portanto,

uma relação negativa entre a idade e a confiança nas informações veiculadas por amigos e

familiares. É também entre os inquiridos com menor grau de escolaridade que observamos

maior confiançanas informaçõesde amigos e família. Por fim, os indivíduosquepertencema

gruposderiscotendemaconfiarmaisnasinformaçõesdadaspelassuasrelaçõespessoaisdoque

aquelesquenãopertencemaqualquergrupoderisco.

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Figura4.1:

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Tem"muita"ou"alguma"confiançanatelevisãocomofontedeinformaçãoDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(78%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura4.2:

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Mulheres

Homens

16-24

25-34

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55-64

65+

Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

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"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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Tem"muita"ou"alguma"confiançanaimprensaescrita(jornaiserevistas)comofontedeinformaçãoDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(78%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura4.3:

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"Confortável"

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"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

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lógica

Tem"muita"ou"alguma"confiançanasredessociaiscomofontedeinformaçãoDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(12%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

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Figura4.4:

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Até3ºciclo

Secundário

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"Confortável"

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Instrução

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ideo

lógica

Tem"muita"ou"alguma"confiançanosseusamigosefamília(nãoprofissionaisdesaúde)comofontesdeinformaçãoDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(60%),empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

19

5. Expectativasfaceàduraçãodasrestrições

Comoobjetivodecompreenderasexpectativasdaspessoasemrelaçãoàduraçãodasrestrições

atuaisassociadasàpandemia,colocámosaseguintepergunta:“Quantotempoachaquevamos

ter de esperar até se voltar a uma vida normal sem as atuais restrições de rendimento,

mobilidadeevidaquotidiana?”.Apergunta tinhaseisopçõesde resposta: “Atéao fimdeabril,

“Atéaofimdemaio”,“Atéaoverão”,“Atéaofinaldoano”,“Atédaquiaumanooumais”e“Não

seidizer”.Agregámosasopçõesemquatro categorias: 1)duração curta (“Atéao fimdeabril e

“Atéaofimdemaio”);2)duraçãomédia:atéaoVerão;3)duraçãolonga(“Atéaofinaldoano”e

“Atédaquiaumanooumais”);e4)duraçãoincerta(“Nãoseidizer”).

Cercadeumterçodaamostraconsideraqueasrestriçõesatuaisdurarãoatéaofinaldoverão.No

entanto,os restantes inquiridosdividem-seemtrês tiposdeexpectativasquantoàduraçãodas

restrições:unsapontamparaumaduraçãocurta(atéfimdeabriloufimdemaio),outrosestimam

umaduração longa (até ao final do anoou até daqui a umanooumais) e, finalmente, outros

ainda não sabem dizer uma data específica para o término das restrições, expressando uma

duração incerta. De forma a perceber que fatores contribuem para tal diversidade social,

analisámosavariaçãodosdiferentestiposdeexpectativafaceàduraçãodasrestriçõesatuaisem

funçãodaidade,sexo,instrução,rendimento,pertençaaogrupoderiscoeníveldedificuldadea

lidarcomasrestrições. Importareferirque,seguindoa lógicadoRelatório,nosfocamosapenas

nos desvios de cada grupo em relação ao resultado da totalidade da amostra em pontos

percentuais, quer relativamente à categoria de duração longa (21%), quer para a categoria de

duraçãoincerta(18%).

Um primeiro dado relevante é o facto de todos estes fatores sociais – idade, sexo, instrução,

rendimento, pertença ao grupo de risco e nível de dificuldade a lidar com as restrições - se

associarem significativamente com as expectativas dos inquiridos quanto à duração das

restrições. Mas são a idade, o sexo e a instrução do inquirido que apresentam a associação

estatísticamaisforte.

No gráfico relativo à expectativa de duração incerta (Figura 5.1), verificamos que é entre as

mulheres,os inquiridosmaisvelhos(commaisde55anos),comníveisde instruçãomaisbaixos

20

(atéao3ºciclo),quepertencemaogrupode risco, comdificuldadeseconómicasequesentem

que está a ser difícil lidar com as restrições atuais, que encontramos umamaior percentagem

daquelesquenãosabemdizerquandoacabarãoasrestrições.

JánaFigura5.2,quemostraosdesviosdecadagrupoemrelaçãoàtotalidadedaamostranoque

tocaàexpectativadeduraçãolonga,éentreaspessoascommaisde65anoseaquelasemidade

ativa(entreos35eos44)queencontramosummaiornúmerodeinquiridosquerespondemque

as restrições vão ser de longa duração, por oposição aos inquiridos mais jovens (aqueles que

entretantosedestacamnacategoriadecurtaduração).Poroutro lado,sãooshomens,maisdo

queasmulheres,eosinquiridoscomoensinosuperior,queapresentamumamaiorprobabilidade

deestimarqueas restriçõesvãoserde longaduração (poroposiçãoaos inquiridoscomonível

básicoe secundário,osquais têmumamenorpropensãoparaestimarumaduração longa).No

que toca a outros fatores, verificamos que é entre as pessoas com grandes dificuldades

económicas e que pertencem ao grupo de risco que encontramos uma maior proporção de

pessoasqueachamqueasrestriçõesvãoduraratéaofimdoanoouatédaquiaumano.

21

Figura5.1:

3

-3

-8

-5

-4

1

6

6

16

3

-1

-3

1

6

4

-1

-1

3

-10 -5 0 5 10 15 20

Mulheres

Homens

16-24

25-34

35-44

45-54

55-64

65+

Até3ºciclo

Secundário

Superior

"Confortável"

"Razoável"

"Algodifíciloumuitodifícilviver"

Sim

Não

Fácil

Difícil

Sexo

Idade

Instrução

Rend

imen

todo

inqu

irido

Perten

cea

grup

ode

risco?*

Dificuldade

comas

restriçõe

s

Nãoseidizeratéquandoéqueasrestriçõesatuaisvãodurar(duraçãoincerta)Desviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(18%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

22

Figura5.2:

-2

2

-5

0

2

0

-3

3

-4

-5

1

0

-1

2

1

-1

0

0

-6 -5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3

Mulheres

Homens

16-24

25-34

35-44

45-54

55-64

65+

Até3ºciclo

Secundário

Superior

"Confortável"

"Razoável"

"Algodifíciloumuitodifícilviver"

Sim

Não

Fácil

Difícil

Sexo

Idade

Instrução

Rend

imen

todo

inqu

irido

Perten

cea

grup

ode

risco?*

Dificuldade

comas

restriçõe

sAchaqueasrestriçõesatuaisvãoduraratéaofinaldoanoouatédaquiaumanooumais(duraçãolonga)Desviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(21%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

23

6. EstadodeemergênciaNesta amostra, cercadenoveem cadadez inquiridos consideramqueo estadodeemergência

decretado pelo Presidente da República no dia 18 demarço de 2020 era necessário. Contudo,

quando se pronunciam sobre até que ponto as restrições implementadas eram adequadas ou

seriam ainda necessárias maiores restrições, as opiniões dos inquiridos dividem-se. Neste

contexto,érelevanteanalisarosfatoresqueaumentamoureduzemaprobabilidadededefender

que seriamnecessáriasmais limitaçõespara lidar comapandemia, bemcomoasnarrativasde

quemexpressatalopinião.

O sexo, a idade, os níveis de instrução, o rendimento e o posicionamento na escala esquerda-

direita são fatores quemais se associam com a probabilidade de considerar necessárias mais

restrições (Figura 6.1). De facto, à medida que aumentam a idade, a escolaridade e os

rendimentosdosinquiridos,diminuiapropensãoparaadefesademaioreslimitações.Paraalém

disso, quem se posiciona ideologicamente ao centro ou à direita apresenta uma maior

probabilidadede afirmarque seriamnecessáriasmais restrições. Por fim, oshomens tendema

expressarmenosestaposiçãoqueasmulheres.Pertenceraumgrupoderisconãotemqualquer

relaçãocomaopiniãosobreestetema.

24

Figura6.1:

4

-5

10

3

4

1

-4

-10

10

9

-3

-3

2

5

9

1

-1

-9

12

8

-15 -10 -5 0 5 10 15

Mulheres

Homens

16-24

25-34

35-44

45-54

55-64

65+

Até3ºciclo

Secundário

Superior

"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

Sim

Não

Esquerda(0-4)

Centro(5)

Direita(6-10)

Sexo

Idade

Instrução

Rend

imen

todo

inqu

irido

Perten

cea

grup

ode

risco?*

Posiç

ão

ideo

lógica

"OEstadodeEmergênciaeranecessárioeaindasãonecessáriasmaisrestrições"Desviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(46%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

25

Algumas pessoas que defendem a necessidade de mais restrições destacam o facto de o

isolamento social não estar a ser respeitado, em particular pelosmais idosos: “ainda existem

pessoas a não cumprir com o que foi decretado, principalmente idosos, e, portanto, deve-se

«apertar»aindamaisasmedidas,talcomofezaChina”(H,20anos,solteiro,ensinosecundário).

Estaperspetivaétantogenérica–“vemospessoasquenãorespeitamosoutrosacontinuarema

andar normalmente nas ruas sem terem necessidade de ir trabalhar” (H, 57, casado, ensino

secundário) – como decorrente da observação do comportamento de pessoas próximas, como

amigas que “continuam a sair e a passearem-se como se nada fosse” (M, 46, solteira, ensino

superior),ouclientes,comodestacaafuncionáriadeumquiosque:“aspessoasnãovêmcomprar

osjornais(bemessencial),massimparajogareparatabaco.Evêmváriasvezesaodia…”(M,25,

solteira, ensino secundário). Defende-se, por isso, o confinamento obrigatório, visto que “a

quantidadedepessoasque são vistas emgruposna ruaprovaque confiar no senso comumda

populaçãonãoépossível”(M,28,solteira,ensinosuperior).

Outraspessoasexpressampreocupaçãocomumaprovávelimportaçãodecasos,defendendo,por

conseguinte, o “controlo de fronteiras aéreas, terrestres e marítimas, impondo quarentena

obrigatóriaaquemchegasse”(M,18,solteira,ensinosecundário).Háquemafirmequedevemos

seguiroexemplodospaísesasiáticos“quesetêmdefrontadocomovírushámaistempoecom

maior sucesso (e.g. China eCoreiado Sul), por oposiçãoaospaíses cujo sistemasde saúde têm

colapsado pelo elevado número de infetados (e.g. Itália, Espanha)”, compreendendo que “a

quarentena obrigatória e o encerramento das fronteiras (limitando, consequentemente, a

importação de contágio) são os melhores métodos para evitar a propagação do vírus” (H, 24,

solteiro, ensino superior). Seria então necessário “encerrar fronteiras e só deixar passar

mercadoriaessencial”,vistoque“fecharportoseestradasedepoisdeixarabertosaeroportosé,no

mínimo,ridículo”(H,32,solteiro,ensinosecundário).

Outros inquiridosaindaconsideramqueserianecessárioumencerramentomaisabrangentede

empresas e serviços, visto que “há pessoas que continuam a ter de ir para trabalhos que não

contribuem para a satisfação de necessidades básicas, como quem trabalha em empresas

financeiras, pondo em risco a sua saúde e a das pessoas que vivem com elas” (H, 20, solteiro,

ensinosecundário).Vistoque“aindaexistemmuitosserviçosnãoessenciaisabertosqueobrigam

ostrabalhadoresasairdecasa”(M,24,solteira,ensinosuperior),considera-seque“desdequese

26

tenha em atenção que a economia não pode parar, e que há bens ematérias-primas que não

podemfaltar,hámuitosserviçosquepodiamfechar”(H,23,solteiro,ensinosuperior).Háquem

defenda o encerramento completo das “fábricas de produtos não essenciais”, visto causar

preocupação o facto de que “algumas pretendem ficar com os colaboradores a fazerem

manutenção”(M,45,casada,ensinosecundário).Maioresincentivosaoteletrabalhosãotambém

vistos comonecessários, dadoque “nem todosospostosde trabalhoestãoa colaborar comos

funcionáriosdemodoadaremcondiçõesparaqueotrabalhoapartirdecasasejapossível”,sendo

váriosos“casosdepessoascujoempregoestálongedeseconsiderarumserviçomínimoeainda

para mais têm facilidade de promover o seu serviço por teletrabalho e não o fazem” (H, 22,

solteiro,ensinosecundário).

Quanto às superfícies de venda de bens alimentares, há quem considere que “há demasiados

supermercados a funcionar” e que “deveria funcionar apenas o essencial para que os

trabalhadores não estivessem tão sujeitos a apanhar o vírus” (M, 22, solteira, ensino superior),

mantendo-seabertos“apenas1,2,3(consoanteoconcelho)estabelecimentosdestetipo”(H,23,

solteiro, ensino secundário). Com o propósito de evitar açambarcamentos, defende-se que “a

venda de bens essenciais deveria ser controlada para não haver situações de disparidade” no

acesso(H,20,solteiro,ensinosuperior),nomeadamenteatravésdaimplementaçãodeumsistema

que estipule “horas para se deslocaremao supermercado”,assim comoo registo do “nome de

cadapessoaquesedirigelá”(M,28,solteira,ensinosecundário).

Por fim,háquemafirmequeseriamnecessáriasmedidasmaisrestritivasemtermoshigiénico-

sanitários,faltando“tornarobrigatórioousodemáscaraedeluvasempúblico”(H,19,solteiro,

ensino secundário). Neste âmbito, é particularmente eloquente o seguinte testemunho: “Dia

28/03/2020,com5.170infetadosconfirmadose100mortosconfirmadosnopaís,continuaahaver

umagrandequantidadedeirresponsáveis(…)semportarluvas,mascarilha,nemqualquermedida

deproteçãoquerparasiquerparaosoutros”(H,35,uniãodefacto,ensinosuperior).

27

7. Rendimentos Comotemsidosalientadopublicamente,estaéumacrisedesaúdepúblicaquepodeafetartodaa

população, mesmo existindo grupos de risco. Contudo, os efeitos económicos e sociais da

pandemia são assimétricos e essa assimetria tenderá a aumentar ao longo do tempo. Pese

emboraosdadosdesteinquéritoteremsidorecolhidosaindanumafaseinicialdapandemia,logo

depoisdetersidodecretadooestadodeemergência,ossinaisdoimpactodiferenciadodoponto

devistadosrendimentos jáeramvisíveisentreos inquiridos(cercadeumquartoreconheceter

vistoentretantoasuasituaçãofinanceiraafetada).

Nestaamostra,aquelesqueforamobrigadosatirar“fériasforçadas”,assimcomoosqueforam

despedidos,declaramdesproporcionalmentetervistoasuasituaçãofinanceiraafetada (Figura

7.1).Note-sequeodesviofaceàmédiadaamostraentreestesdoisgruposémuitosignificativo:

24pontosacimaparaquemtevedetirar“fériasforçadas”e59pontosparaaquelesqueseviram

numasituaçãodedesemprego.Registe-sequeesteinquéritonãoreflete,ainda,onúmeromuito

expressivo de pedidos de lay-off entretanto submetidos e que no início de abril de 2020 já

abrangemmaisdemeiomilhãodetrabalhadores.

Seoníveldeinstruçãodosinquiridosnãopareceterinfluenciadoaperdaderendimentosquase

imediata, omesmo já nãoé verdadequando se tomaem consideração a situaçãodo inquirido

antesdacrise.Sãoprecisamenteaquelesque,antesdodeflagrardapandemia,jáseencontravam

numasituaçãomaisdifícildopontodevistaeconómicoquedeclaramtersidomaisafetados.Se

entrequemdeclaravaterumasituaçãofinanceira“razoável”antesdacriseodesviofaceàmédia

épequeno(apenasdoispontos),quemafirmouquejáera“algodifícilviver”comoqueganhava

foibastantemaisafetado(umdesviode31pontos).Particularmenteimpressivoéodesviode57

pontos para aqueles para quem já era “muito difícil viver” antes da chegada do coronavírus.

Mesmonumafasemuitoinicial,sãoosindivíduosemsituaçõeseconómicasmaisprecáriasque

estãoasermaisafetadosfinanceiramentepelacrise.

28

Figura7.1:

-8

0

-4

24

59

3

0

3

-1

-10

2

31

57

-20 -10 0 10 20 30 40 50 60

Nãotrabalha

Igual

Teletrabalho

Fériasforçadas

Fuidespedido

Estudante

Até3ºciclo

Secundário

Superior

"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

Sitp

rofissio

nalatual

Instrução/escolarid

ade

Rend

imen

todo

inqu

irido

Pessoascuja"situaçãofinanceirajáfoiafetada"Desviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(24%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março

29

Aanáliseàsperguntasabertassobreoimpactoimediatodacrisenosrendimentosdemonstraque,

independentementedeosinquiridosdeclararemteremounãojásidoafetadoseconomicamente

pelacrise,todosrefletemjáosefeitosmateriaisdapandemia.Aspreocupaçõescomareduçãode

rendimentossãotransversais,mesmoparaquemafirmaqueoseurendimentofamiliartemdado

paraviverconfortavelmente:“Aformacomomeafetouaindaéreduzidaenãopreocupante.Sou

senhoria e os meus inquilinos pediram-me para passar a renda para metade do que está

contratualizado. A senhora perdeu o emprego e omarido já não tem amesma quantidade de

trabalho,peloqueoseurendimentobaixoumuito.Ocasodeleséqueédramático.Nãoomeu”

(M, ensino superior). Situações de precariedade, desemprego, lay-off, perdas de rendimento e

incerteza, que abundam entre quem confessa sentir dificuldades, também se fazem sentir no

universo dos que afirmam viver confortável e razoavelmente, afetando, por vezes, de forma

diversificada, todo o agregado familiar, como dá conta este relato: “Aminha filha trabalha na

hotelaria/restauraçãoefoi-lhereduzidoovencimentopara66%eenviadaparacasajáhámaisde

umasemana.Aomeufilhofoisuspensaaprogressãonacarreira,foiinformadoqueoaumentode

vencimentoprevistoparaopróximomêsnãoiriaacontecerefoi-lheretirado85%doprémioanual

queiriarecebernofinaldestemês.Tenhoumalojaquefuiobrigadoafecharetenhoquesuportar

osmesmoscustosdiretos”(H,ensinosuperior).

Hádiversostraçoscomunsaosváriosgruposderespostas,poisencontram-seprofissionaisliberais

epatrõesemtodoseles,porexemplo,masnãodeixadeserinteressantemencionarqueogrupo

queseafirmaconfortávelsecaracterizaporpossuirhabilitaçõesacadémicasalgomaiselevadase,

correlativamente, os que manifestam sentir dificuldades são os que apresentam um capital

escolar menor, encontrando-se os que declaram que os rendimentos têm dado para viver

razoavelmentenumaposiçãointermédia.Entreosquevivemconfortávelourazoavelmente,estão

indivíduosligadosàatividadeempresarialouprovenientesdasatividadesdeprofissionaisliberais

melhoresremuneradas,comoéocasodaadvocaciaoudamedicina,senhoriosdeimóveiseainda

váriosquepossuemrendimentosprovenientesdeaplicaçõesfinanceiras.Nocasodosqueestãoa

viver com dificuldades está-se, por vezes, perante a perda total de rendimentos de pequenos

patrões – restauração, turismo, cabeleireiros –, de pessoas envolvidas no aluguer de quartos a

turistas,trabalhadoresporcontaprópria,precários,gentedosetordasarteseespetáculos–mas

também profissionais liberais.Muitas das vezes, as dificuldades financeiras têm uma dimensão

prospetiva,masmanifestam-se tambémnadificuldadeem cobrar por trabalhos já faturados.A

30

precariedade,combinadacomumapluralidadedefontesrendimentosquepermitia,deforma

complementar, a subsistência, revela-se, agora, demasiado frágil, mesmo para quem tem

qualificaçõessuperiores:“Soutrabalhadorindependenteeprestadordeserviçosnaáreacultural

atrabalharparamuseus.Todosestesespaçosestãoencerrados,comatividadessuspensasesem

perspetiva de futuro. Nestemomento não estou a trabalhar, não tenho qualquer rendimento e

estoucomdificuldadeemreceberovalorcorrespondentea trabalhosdesenvolvidosno iníciodo

anoejáfaturados”(H,ensinosuperior).

Do ponto de vista das declarações, é tão relevante o laconismo dramático de quem se afirma

“desempregado” - “Fiquei sem trabalhar e sem rendimentos” (H, ensino superior) ou “Não

trabalho, não recebo” (H, ensino secundário) –, comonarrativasmais detalhadas sobre as suas

dificuldadesemmatériaderendimentos(“estouarecibosverdes,semvencimentobaseesóem

função de comissões de intermediação bancária. Com as quedas dos mercados, os clientes

resgataramamaiorpartedasaplicaçõespeloqueomeurendimentodeverácairpelomenos80%.

Acompanheira,tambémarecibosverdes,vaipassarareceber,nomáximo,os438eurosdeIAS.É

umaperdasuperiora75%”(H,ensinosuperior).Frequentemente,perpassapelostestemunhosa

forma como a crise toca em particular famílias recompostas, onde a guarda dos filhos é

partilhada: “O pai das crianças ficou sem atividade devido a esta situação e praticamente sem

rendimentos. A pensão de alimentos dos filhos deixou de existir” (M, ensino superior). Em

situaçõesparalelas,reemergemosavóscomorespostaderetaguardaparafazerfaceàfragilidade

económicadequemestáem idadeativa,à imagemdoqueaconteceuemcriseanteriores,mas

comadiferençade,destafeita,osmaisvelhosfazerempartedogrupoderisco:“Euaindavivoem

guardapartilhada,numasemananaminhamãecomomeupadrastoenoutracomomeupai(na

casadosmeusavóspaternosporqueomeupainãotemcondiçõesparaeuviverdiariamentecom

ele).Tivedeirparaosmeusavós,temporariamente(ambosjásãoreformados),porqueaminha

mãenãopodetrabalhar”(M,ensinosecundário).

Temos,apesardetudo,enumafasemuitoinicialdoimpactodacrise,umquadrodiferenciadode

situações. Mas deve-se sublinhar que estas declarações provêm de um universo onde não se

encontram representados, ou estão claramente sub-representados, grupos sociais que ocupam

lugaresextremosnoespaçosocial,comoograndepatronato,osgestoresmaisbemremunerados,

porumlado,eostrabalhadoresmanuais,poroutro.

31

32

8. Gruposvulneráveis

Entreosportuguesesexistemgruposdepessoasparaquemavivênciadestapandemiarepresenta

particularesdesafios:aspessoasquepertencemaosgruposderiscoeaspessoasquetêmmais

dificuldadesemlidarcomasrestriçõesimpostasnoâmbitodoestadodeemergência.Estasecção

procura perceber quem são estas pessoas e, posteriormente, auscultar emmaior profundidade

aquelasquecongregamestasduasdimensõesdevulnerabilidade.

!.#.GruposdeRisco:Quemsão?

ADireção-GeraldaSaúdeinformouapopulaçãoportuguesaqueaspessoascommaisde

70 anos e com doenças crónicas pré-existentes (e.g. diabetes) e/ou com sistema imunitário

comprometidofazempartedoschamadosgruposderisco.Nestasubsecçãoprocuramosperceber

queoutrosfatoresestarãoassociadosàpertençaaestesgrupos.Porexemplo,osexo,aidade,o

nível de instrução, o rendimento e o estado civil serão fatores que podem aumentar a

probabilidadedeumapessoaterindicadopertenceraumgrupoderisco(Figura8.1)?

Defacto,apropensãoparapertenceraestesgruposémaiorentreoshomensmaisvelhos,com

menoresrendimentoseviúvos.

Aescolaridadeétambémumfatorparticularmenteassociadoaosgruposderisco,sendoqueos

quetêmníveisdeinstruçãomaisbaixoscompõemmaioritariamenteestesgrupos.

Finalmente, entre os que dizem viver sozinhos é igualmente maior a probabilidade de os

inquiridosconsideraremquepertencemagruposderisco,sendoclaroo impactodo isolamento

navulnerabilidadedestaspessoas.

33

Figura8.1:

-4

5

-16

-16

-14

-8

2

47

19

1

-1

-1

1

-2

3

-11

-8

7

7

39

10

-2

-20 -10 0 10 20 30 40 50

Mulheres

Homens

16-24

25-34

35-44

45-54

55-64

65+

Até3ºciclo

Secundário

Superior

"Confortável"

"Razoável"

"Algodifícilviver"

"Muitodifícilviver"

Solteiro/a

Uniãodefacto

Casado/a

Divorciado/a

Viúvo/a

sim

não

Sexo

Idade

Instrução

Rend

imen

todoinqu

irido

Estado

civil

Vive

soznho

Pessoasqueafirmarampertencera"gruposderisco"Desviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(26%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março*Grupoderisco:>70anosouhipertensão,problemascardíacosourespiratórios,diabéticosouimunodeprimidos

34

!.#.Gruposcomdificuldadesalidarcomasrestrições:Quemsão?

À declaração do estado de emergência seguiu-se um conjunto de restrições indicadas pelo

Governo. Cerca de um terço dos inquiridos deste estudo revela estar a ter algumas oumuitas

dificuldadesemlidarcomestasrestrições.Quemsãoessaspessoas?

O rendimento, a idade, a instrução, a situação profissional e o perfil do agregado familiar são

fatores determinantes da dificuldade que os inquiridos sentem atualmente em relação aos

condicionamentosquotidianos(Figura8.2).

Sãoasmulheresentre35e44anos, e cujo rendimentoéhabitualmenteparcoparaa vivência

normal, quem mais dificuldade sente em gerir as atuais restrições. No extremo oposto, são

homens,commaisde65anosecomrendimentosquelhespermitemviverdeformaconfortável,

que menos dificuldades revelam em relação às atuais restrições. De notar ainda que,

relativamente à idade, as pessoas mais jovens afirmam estar a ter mais dificuldades com as

restriçõesdoquetodososrestantesescalõesetários(àexceçãodaspessoascom35a44anos).

Aoníveldoagregadofamiliar,sãoos indivíduosdosagregadosmaisnumerososecomcrianças

menoresqueestãomaisrepresentadosentreaquelesqueapresentammaisdificuldadeemgerir

esteestadodeemergência.Emoposição,osmenosrepresentadossãoosquevivemsozinhos.

Umaanálisedasituaçãoprofissionaldosquemaisdificuldadesapresentamrevelaquequemnão

trabalha ou está reformado expressa menor dificuldade em lidar com a atual situação. Pelo

contrário,asmaioresdificuldadessãosentidasporquemestavadesempregadoantesdoinícioda

pandemia,porquemestudaouporquemsofrededoençaou invalidez.Quantoàspessoasque

realizavamtrabalhodoméstico,apesardeosdados indicaremquerevelamterdificuldadescom

maior frequência, sãoumgrupoqueafirmaramcommuitopouca frequênciaestaraser“muito

difícil”.

Finalmente,enoquedizrespeitoaoimpactodapandemianacondiçãolaboralatual,ogrupoque

revelamaioresdificuldades incluiosque foramdespedidose,emmenorgrau,osqueentraram

em“férias forçadas”. Pelo contrário, a situaçãodemenordificuldadeé sobretudoexpressapor

quem se encontra em regime de teletrabalho, ainda que as respostas abertas sobre este tema

revelemqueeste grupo inclui pessoasqueapreciamestenovoestilode trabalhomas também

outrasqueestãoaterdificuldadesextremasemlidarcomestanovarealidade.

35

Étambémimportantedestacarquesãoaquelesquenãopossuemoensinosuperiorquemaiores

dificuldadesrevelamnocontextoatual.

36

Figura8.2:

2-3

4-2

60

-3-6

23

-1

-53

1217

-51

30

5-3

14334

-76

-66

-110

244

-10 -5 0 5 10 15 20 25

MulheresHomens

16-2425-3435-4445-5455-6465+

Até3ºcicloSecundário

Superior

"Confortável""Razoável"

"Algodifícilviver""Muitodifícilviver"

simnão

sim(maisde4)não(até4)

simnão

trabalhopagoestudar

desempregadoembuscadesempregadosembusca

doençainvalidezreformadodoméstico

NãotrabalhaIgual

TeletrabalhoFériasforçadasFuidespedido

Estudante

Sexo

Idade

Instrução

Rend

imen

to

doinqu

irido

Vive

soznho

Ag

regado

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meroso

Tem

crianças

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ores

SitP

rofissio

nal(antes

pand

emia)

SitP

rofissio

nal

atual

Pessoasquedizemquetemsido"relativamente"ou"muitodificil"lidarcomasrestriçõesDesviodecadagrupoemrelaçãoaoresultadoparaatotalidadedaamostra(32%)empontospercentuais

Recolha:25-29Março

37

!.#.Duplamentevulneráveis:Oquedizem?

A análise dos dados qualitativos nesta subsecção foca-se apenas nas respostas dos grupos que

configuram uma situação extrema, i.e. as pessoas que pertencem aos grupos de risco e que,

simultaneamente, afirmam estar a ter as maiores dificuldades para lidar com as restrições

impostas no âmbito do estado de emergência, correspondendo a uma percentagem muito

reduzida da amostra. Estas respostas representam o cenário de quem está a passar pelas

situaçõesmaisdramáticas.

Este Inquérito foi lançado dez dias depois do fecho das escolas e uma semana depois da

declaração do estado de emergência. Ou seja, já tinha passado tempo suficiente para que os

indivíduos e as famílias sentissem há vários dias o impacto, no trabalho e no quotidiano, do

afastamentosocialefamiliar,daslimitaçõesàmobilidadeeaoconsumo,edofechodemúltiplas

atividadeseconómicas,sociaiseculturais.Tambémjásesabiaqueasexpectativasiniciais,deuma

quarentena de uma ou duas semanas, se tinham alterado. As previsões apontavam para um

tempoprolongadoeexigentedecombateàpandemia, reforçandoa incerteza relativamenteao

futuro.

Foi neste contexto, de adaptação inicial a restrições recentes, mas cujo impacto já tinha

consequênciasgravesevisíveisnopaísenoquotidiano,queos inquiridosresponderamsobreo

apoioquetêmounãoparalidarcomofactodepertenceremaumgrupoderiscoesobreaforma,

relativamentefáciloudifícil,comoestavamalidarcomasrestriçõesimpostas.

Sobreoapoiodaspessoasquepertencemagruposderisco:

Os inquiridos que pertencem a grupos de risco e dizem ter apoio suficiente são quase todos

apoiadospelosfamiliaresquefazempartedoseuagregadodoméstico:

“Souumapessoaderisco,emfunçãoapenasdaminha idade.Masfelizmentetenhotido

umgrandeapoiodetodaaminhafamília”(H,68,casado,avivercommulherefilha).

“Omeumarido,airaosupermercadoeàfarmácia”(M,50,casada,avivercomomarido).

Mais raramente, alguns inquiridos têm o apoio de um familiar próximo que não vive com eles

(sobretudo filhos/as),deuma IPSSqueprestaserviçosdeapoiodomiciliário,deuma instituição

local(juntadefreguesia/município),deumaempregada,deamigosouvizinhos.Sóumapessoaa

viversozinhaéquedizrecorreràscomprasonline.

38

“Tenhooapoiodaminhafilha.Fazemosalistadoqueprecisamos…”(M,62,casada,aviver

comomarido).

“Tenho o apoio de um sobrinho neto me faz as compras de supermercado. De resto,

emboracomalgumadificuldade,consigogerirodiaadiasemproblemasdemaior”(H,90,

viúvo,aviversozinho).

“Para além do apoio domiciliário, tenho uma empregada que me faz as compras e é

particularmentedelicadacomaminhamãe”(H,72,solteiro,avivercommãede97anos).

“Umaamigaquemefazascompras,depoisvousóàportadelaapanharascompras”(M,

39,uniãodefacto,avivercomparceiro).

Porvezes,referem-seadoistiposdeapoio:

“TenhooapoiodafamíliaeapoiostelefónicosdaCâmaradoconcelhoderesidência,ainda

nãoutilizados”(H,82,aviversozinho,apoiadoporumafilhaqueviveperto).

Verifica-se assim que na primeira linha dos apoios estão os familiares que fazem parte do

agregado doméstico da pessoa em risco. No entanto, as redes de solidariedade também se

alargam, sobretudo para as pessoas a viver sozinhas ou em casal, a familiares em linha

descendente e aos colaterais e, mais raramente, a instituições locais, a uma empregada e a

pessoas amigas ou vizinhas. No entanto, como se constata no ponto seguinte, os resultados

tambémmostramqueexistempessoassemnenhumarededeapoio.

Osinquiridosquedizemnãoterapoiosuficientereferemafaltadeváriostiposdeapoio:falta

deapoiono teletrabalho, faltadeapoiopara ir às comprasounaentregadecompras, faltade

apoio financeiro, faltadeapoiopsicológico, faltadecompanhia, faltadeatendimentoporparte

dosserviçosdesaúde,faltadetransporteparairaohospitalfazertratamentos.

“(Faltade)apoioparairbuscaroquepreciso.Vou-meexporasituaçõesderiscoporquese

nãocomermorro,oumorrodevírusoudefome”(H,35,solteiro,aviversozinho).

“Faltadecompanhia”(H,viúvo,aviversozinho).

“(Faltade)apoiofinanceiro.Naminhacasaeueaminhamulhersomosdiabéticos,omeu

filhomenor e aminha sogra commais de 70 anos está connosco, temos problemas de

alimentação”(H,43,uniãodefacto,avivercomparceira,filhos,sobrinhoesogra).

“Apoio na doença, estive 15 dias em fibrilhação e taquicárdia e não me atrevi a ir às

urgências. (…) preciso de medicação e no hospital não atendem o telefone” (M, 64,

divorciada,aviversozinha).

39

Sobreasdificuldadesemlidarcomasrestriçõesatuais:

Comoobjetivodecompreendermelhorasdificuldadesdaspessoasquepertencemaosgrupos

derisco,analisámosasrespostasdosqueafirmamtermuitadificuldadeemlidarcomasrestrições

impostaspeloestadodeemergência.Colocava-seaseguinteperguntaaberta(paraquemtivesse

respondidoque“temsidomuitodifícil”):“Podefalar-nosumpoucomaissobre isto?Oquetem

sidomais fácileoquetemsidomaisdifícil?” Interessavaperceberasprincipaisdificuldadesea

diferenciaçãodopontodevistada idade,dogénerooudascondiçõesdevida. Importavaainda

identificarosprincipaiscenáriosdefragilidadeoudevulnerabilidade.

Encontramos nestes inquiridos uma vivência/perceção sombria e pessimista do impacto da

pandemiaedasrestriçõesdeladecorrentesnavidadodia-a-dia,associadatambémàexperiência

deumtempomonótonoesempreigualeàsensaçãodeclausuraedeconfinamentoaumespaço

fechado,quaseprisional.Aspessoasquedizemtermuitadificuldadeemlidarcomasrestrições

têmumsentimentodeque“tudoédifícil”nomomentoatual,equeoquotidiano,tendomudado

radicalmente, já não representa necessariamente aquilo que se entende habitualmente por

“viver”:

“Tudotemsidomaisdifícil”(M,38,solteira,avivercomamigos).

“Distopia absoluta. Fechou praticamente tudo. O elétrico 28 anda vazio. Vejo o

mundodaminhajanela.Edomundovirtual”(M,56,solteira,sozinhacomgato).

“Estamosnumavidaquenãoéviver”(H,67,casado,aviveremcasal).

“Numa situação destas não existe algo que seja fácil, porque envolve grandes

alteraçõesnasnossasvidas,quersejaanível laboral,anível familiarousocial”(M,

65,divorciada,aviversozinha).

Falamtambémdaestranhezadeumtempodiferente,deumritmodevidaquepareceser

sempreigual,queseconstróiemtornoderotinasque,antes,estavamrelacionadascoma

vidadomésticanofimdesemana:

“É como se fosse sempre domingo, são as refeições, é estar com os filhos, eles a

estudar online, basicamente como se fosse um grande fim de semana, que nunca

acaba”(M,62,casada,avivercommaridoe3filhosestudantes).

40

Emfamíliacomfilhoséestasensação,deumdomingocheiodetarefasqueserepetediaapós

dia,quevaipesandonaconsciênciaenocorpo,ouseja,comoveremosmaisadiante,nasaúde

mentalefísica.Paraoutros,opesodotempoeamonotoniadarotinasãointensosporquese

vive sozinho,ouemcasal, habituados cadaumà sua liberdade,no trabalhoenas saídas.À

vivênciadotempopesadoacresceentãoosentimentodeclausura,deconfinamentosolitário

que,paraalguns,simbolizaaprisão:

“Odifíciléasensaçãodeprisãosemdataprevista,criaumacertaansiedade“(M,74,

casada,avivercommarido).

“Nada é fácil. A prisão é difícil em todas as dimensões” (H, 64, divorciado, a viver

sozinho).

“Émuitodifícilestarfechadoemcasa”(H,35,solteiro,aviversozinho).

Paraalguns,excecionalmente,estasensaçãodeumtempodiferenteé,parajá,menosmonótono

e pesado, porque significa a criação de uma rotina nova num espaço diferente (por exemplo,

foram viver para a aldeia, com outros familiares, em sítios onde podiam ter mais liberdade e

espaçoparaestaraoarlivre).Paraesses,tudoéconsideradomuitodifícilporqueexistemoutras

fontesespecíficasdegrandepreocupaçãoeansiedade:gravidezavançada,separaçãoforçadade

familiaresidososemrisco.

Nos inquiridos que dizem termuita dificuldade em lidar com as novas restrições, encontramos

cinco grandes categorias de dificuldades, sendo que, curiosamente, o que não aparece como

difícil, podendo até pode ser considerado como mais fácil, é sobretudo: abastecer-se, a

alimentação, deixar de consumir. Para alguns, a vida em família (relações interpessoais entre

aquelesquevivemjuntos)tambéméfácileatécompensadora;paraoutros,astensões,sobretudo

quandoasfamíliassãonumerosaseoespaçodehabitaçãoexíguo,sãotambémdifíceis.

Entreascincograndescategoriasdedificuldades,encontramostrêsprincipaisdificuldadesquese

repetemnasrespostasanalisadaseseencontramfrequentementeassociadasumasàsoutrasno

discursodosinquiridos:

a) Afaltadeconvíviosocialefamiliar

São mulheres sozinhas, divorciadas ou viúvas, algumas que já convivem com a solidão e o

isolamentohámuitotempo:

41

“Sintoafaltadosmeusfilhosedosmeusnetos”(M,69,divorciada,aviversozinha).

“Émuitodifícilasolidãoqueoviversozinhasempreacarretaequeagorapioroumuitopela

faltadeconvíviosocial”(M,82,viúva,aviversozinha).

Mas são sobretudo mulheres e homens mais novos, para os quais esta situação exige uma

adaptaçãorepentina,provocandotambémumsentimentoderutura:

“(omaisdifícilé)Aprivaçãodaliberdadedecirculaçãoedeconvívio(…)eaeliminaçãodo

direitoderesistência”(H,23,solteiro,avivercomospais).

“(omaisdifícilé)“nãopoderestarcomosamigoseomeunamorado”(M,18,solteira,a

vivercomospaiseairmã).

“O mais difícil é sem dúvida o afastamento total do convívio com os nossos amigos e

famíliaenãopodermosmanifestarosnossoscarinhos”(M,46,solteira,avivercomafilha).

Emcasosexcecionais,aindamaisdifíceis,existeumaseparaçãoforçadadafamília,comonocaso

deumprofissionaldaáreadasaúde:

(omais difícil é) “estar separado daminhamulher e daminha filha, estão em casa dos

meussogros”(H,51,casado,agoraaviversozinho).

b) Asaúdementalemrisco

Osproblemasdesaúdementalsãoreferidosporinquiridosdetodasasidadesecondições,sendo

apresentadas como as principais causas: a ansiedade, andar sempre preocupado/a, omedo, o

pavor,opessimismo,umestadodepressivoanterioràpandemia,adificuldadeemmanteruma

rotina estável, a falta de concentração ligada à preocupação, o stress ligado à necessidade de

estudar ou trabalhar durante muitas horas em casa, a privação de exercício físico e o

confinamento,osconflitosfamiliares.

“É difícilmanter a saúdemental devido à ansiedade” (M, 41, casada, a viver com

maridoesogros).

“Difícilé,obviamente,adestruiçãoanímicaemental,resultantesdoencarceramento

aqueaspessoasforamobrigadas”(H,72,casado,avivercomamulher).

“A dificuldade principal é psicológica devido ao pessimismo com que encaro a

situação”(H,82,viúvo,sozinho).

“Omaisdifíciléacondiçãomentalefísica,estavaasairdeumadepressão”(M,72,a

vivercommãeidosa).

42

“Oqueémaisdifícil éa saúdemental,porqueémuito stressanteestardemasiado

tempo a estudar assim, os professores não compreendem que estamos numa fase

atípica”(H,19,solteiro,avivercompaiseirmãos).

“A relação familiar é difícil e confinadano apartamento émuito doloroso” (M, 66,

casada,avivercommarido).

“O meu marido trabalha na construção, sai todos os dias, fico ansiosa” (M, 56,

casada,avivercommarido).

“É o pavor, aflige-me ouvir as notícias, tenhomedo de contrair a doença” (M, 58,

casadaavivercommarido).

“Adoençaeamorteestãosemprepresentes”(M,61,casada,avivercommaridoe

filha).

“Passoodiaadormireadeprimir”(M,24,solteira,avivercommãeepadrasto).

“É a saúdemental e a condição física para superar estas dificuldades que afetam

psicologicamenteaspessoasquenãoestãopreparadasparaestacatástrofe(M,50,

viúva,sozinha).

“Terafamílialongeeestarsemprepreocupada”(M,40,avivercommarido).

Existemmedos, preocupações e estados de alma que estão a afetar diretamente, segundo os

inquiridos, a sua saúdemental (o seu “sistemapsicológico”).Mais raramente, alguns inquiridos

referemummal-estarpsicológicomaisgeral,relacionadocomosofrimentodosoutros,semse

referiràsuaprópriasaúdemental.

“Aminha grande dificuldade em lidar como que se está a passar, é saber o sofrimento

porque estão a passar milhares de pessoas, especialmente os idosos indefesos” (H, 78,

casado,avivercommulherefilha).

c) Rotinasperturbadas

Asociologiadoquotidianosublinhaaimportânciacrucialdasrotinasenquantopilarfundamental

do bem-estar coletivo e individual. Inquiridos de todas as idades e género, mas não tanto os

inquiridosacimados70anos,referemqueémuitodifícilterdefazerumaadaptaçãoaumarotina

diferente, de não poder fazer o habitual. O habitual que é mais referido, sobretudo pelos

inquiridos de condição social elevada, é a rotina dos passeios, dos eventos culturais, das

caminhadas ao ar livre e a frequência do ginásio. Mas os inquiridos também referem outras

mudançasda rotinadiária, comoo factodenãopoderem iraocaféoubeberumcopocomos

43

amigos.Osestudantesreferemadifíciladaptaçãoàsaulasnãopresenciais,semcontactocomo

professoreoscolegas.

“Oque temsidomaisdifíciléa faltadeatividade físicaeadificuldadeemmanter rotinas

habituais,porestarconfinada”(M,47,casada,avivercommaridoefilha).

“(omaisdifícilsão)asrotinasquetinha,estarcomosamigos,irbeberumcafé,sãotónicos

davidaquemefazemfalta”(H,65,casado,avivercommulherefilho).

“O teletrabalho não é difícil, o que tem sidomais difícil sem qualquer dúvida émanter a

condição física e mental, para mim indissociáveis da prática regular em ginásio” (M, 24,

solteira,avivercomonamorado).

“Alteraram-se as rotinas, quer sociais, quer da nossa liberdade e quer afetivas. Estamos

numavidaquenãoéviver”(H,67,emuniãodefacto,avivercomparceira).

Encontramosaindaoutrasduascategoriasdedificuldades,queafetamindivíduosoufamíliascom

situaçõesespecíficas.

d) Oproblemadaconciliaçãofamília-trabalho

Para um grupo mais restrito de inquiridos, sobretudo os que vivem em famílias com filhos

menores (casal com filhos, famílias monoparentais) e/ou em famílias complexas, com várias

geraçõesemcoresidência,ésobretudoaconciliaçãoentreavidaprofissionaleavidafamiliarque

émaisdifícildegerir.Sãomaisasmulheresdoqueoshomensareferiresteproblema.Ostress

ligadoàsrotinasalteradastemavercomofactodeterdetrabalharecuidaraomesmotempo,

sejade criançasmenores, sejade idosose filhosmenoresaomesmo tempo. São inquiridasem

teletrabalhoquetêmdeapoiarostrabalhosescolaresdecriançasoudecuidaraomesmotempo

deumidosoacamadoefilhosmenores,equesentemasuacapacidadeedisciplinahabitualde

trabalhoalteradaepostaemcausa.Paraalgunsjovenstambémémuitodifícilconciliaroestudoe

a vida familiar, devido, por exemplo, à exiguidade do espaço da casa de família e à falta de

privacidade.

“Omaisdifíciléterdetrabalhareterdedarapoioaosmiúdosnastarefasqueosprofessores

enviametambémdar-lhesaulasemcasacomosmateriaisquepodemos”(M,40,casada,a

vivercommaridoe3filhos,emteletrabalho).

“(omaisdifícilé)amanutençãodacapacidadedetrabalhoeobem-estarpsicológicocomeça

a ficar em causa. (…) Vivo sozinha com omeu filhomenor. Tenho de assegurar todas as

44

compras e todas as tarefas domésticas. Não é fácil conjugar isso com o teletrabalho

(dispondo de recursos insuficientes para o efeito), com a necessidade de acompanhar

diariamenteomeufilhoeosmeuspaisquevivemlongeetêmambosmaisde70anos”(M,

45,solteira,avivercomfilhomenor).

“Nocasodeumacasapequenacomestudantesuniversitáriosenosecundário,eadultosa

trabalharecomconferências,torna-semuitodifícilotrabalho.Paraalémdaconstantefalta

deprivacidade”(M,18,solteira,avivercompaiseirmãs).

“(omaisdifícilé)Afamíliaemcasa.Umajovemaestudar,umaidosacompatologiasvárias,

muito ansiosa com tudo o que se passa, omarido com doença crónica e que continua a

trabalharefazascompras,eutambémcomváriaspatologias,professoraemexercício.No

conjunto tudo muito difícil de articular (...) Faço tarefas domésticas, trato da mãe

dependente,douaulasusandoplataformasdigitais,corrijoastarefaspropostasaosalunos,

doufeedbackaosdirectoresdeturma,elaborodocsvários,façoasrefeições(M,61,casada,

avivercommarido,mãeefilha).

e) Disrupçãonorendimentoenaatividadeprofissional

Osproblemasdedisrupçãonaatividadeprofissionalenos rendimentosestão relacionadoscom

situaçõesde trabalhadorespor contadeoutremque ficaramdesempregados,de trabalhadores

independentesquedeixaramdeteratividade,depequenosempresáriosquetiveramdefechara

atividade. Mais raramente, inquiridos que já estavam desempregados ou tinham trabalhos

precárioseirregulares.

Sãoinquiridosquefalamnãosódedificuldadesmastambémdeum“desmoronar”davidadevido

à falta brusca de rendimentos e à incerteza do futuro. Aparecem as palavras “nada”,

“desmoronar”,“nãosaberoquefazer”(impotência),“semmeiodesustento”,“ficardebaixoda

ponte” (sem abrigo). Dos relatos constata-se que são inquiridos em idade ativa e menos

instruídos.

“Trabalhadorindependentenaáreadosespectáculos,técnicodeluz.Actividadeprofissional

reduzidaa0.Semapoios,nada”(H,46,solteiro,avivercomopai).

“Todos os trabalhos foram suspensos, já não consigo sustentar-me e por isso tive de vir

morarnasaladeumasenhoraidosaquemeacolheu,umavezquearendadequartosem

Lisboaestámuitoaltaesemempregonãotenhocomopagara rendadomêseosgastos

45

pessoais. Trabalhava por recibos verdes que eram emitidos a cada dois meses, logo não

tenho nenhum benefício do governo” (M, 34, solteira, a viver como hóspede em casa de

pessoaidosa,emtrocadepequenosserviços).

“Temosumrestauranteetivemosquefechar.Comovamospagarascontas?”(M,41,união

defacto,avivercomparceiro).

“Onossopequenonegócioestáemriscodesedesmoronar.Seoestadodeemergêncianão

acabaremAbril,Portugalvaiservendidoaospedaços.Vouterdevendertudooquetenho”

(M,49,casada,avivercommaridoe3filhos).

“Nãohátrabalhoacimados45anos,tenhoquase50esóapanhobiscateserecibosverdes,

outroscontratossemvaloralgumparacertosserviços.Vivocommeuspaisqueusufruemde

800 euros e o estado, quando solicitei umRSI, diz queosmeuspais podem-me sustentar,

errado(…).Finaldahistória,sereimaisum«velhodebaixodaponte»”(H,49,divorciado,a

vivercompais).

“(omaisdifícilsão)problemaspulmonareseimunocomprometida,trabalhonumlocalcom5

milpessoas.Tivedefazeraescolhadedeixardeiraotrabalhoquandopercebiquejánãoera

seguroparamimsairdecasa,muitomenosparaaqueleambientedetrabalho.Nãotenho

conseguidoobterisolamentoprofilácticopeloqueestousemremuneraçãoeabsolutamente

empânicosobreofuturo”(M,28,solteira,avivercomparceiroesogros).

“O meu marido é trabalhador independente e está sem trabalhar. As contas chegam na

mesmaeomeuempregotambémelepodeestaremrisco,ficareimuitoprovavelmentesem

trabalho”(M,40,casada,avivercommaridoe3filhos).

“Estar 24 sobre 24 horas com5 pessoas em casa não é nada fácil e ver-me semmeio de

sustentoaindaagravamais,umavezquesouformadoraeaformaçãoestásuspensa”(M,

36,casada,avivercommarido,mãe,avó,irmão).

Paraalémdestascincograndesáreasdedificuldade,sãotambémreferidas,deformapontual,as

seguintesdificuldades: lidarcom“aproibição,serobrigado”;apreocupaçãocomo factode“as

crianças estarem sem escola, prejudicando o futuro delas”; o facto de “estar a trabalhar e não

podercumprirasrestrições”(riscoparasaúde,referidosobretudopeloshomens);o“difícilacesso

aoSNSeaoscuidadosde saúde”;a faltadeapoionaalimentação (homem idosoquenãosabe

cozinharenãotementregaemcasa).

46

Podemosdizerqueasrestriçõescriamdificuldadesdeadaptaçãoinicial(noconvívio,notrabalho,

nasrotinashabituais,nobem-estarfísicoemental)atodososindivíduosefamíliasquepertencem

agruposderiscoetêmmuitadificuldadeemlidarcomasatuaisrestrições.Noentanto,constata-

sequeo impactoatingeos inquiridosdeummodoprofundamentedesigual.Dascincoáreasde

vulnerabilidade identificadas,é importantechamaraatençãopara trêsáreasque revelamuma

vulnerabilidadeacrescida.Asaúdemental,osproblemasdeconciliaçãodasfamíliascomfilhos

menores,eosproblemasdosqueviramosseusrendimentoseoseuemprego/negóciospostos

emcausa.

47

9. PreocupaçõesemrelaçãoaofuturoRelativamenteàpandemia,quaissão,entre25e29demarçode2020,asmaiorespreocupações

dosinquiridosfaceaofuturo?Aperguntaderespostaabertaaestaquestãotrazaodecimauma

grande variedade de receios. Saúde e emprego destacam-se pela quantidade esmagadora de

referências.Masestãolongedeserasúnicas:desdobram-seemváriasdimensões,interligando-se

comoutrosdomíniosdoquotidiano.

Há quem, apesar de tudo, diga “não pensar muito nisso”. “Procuro viver o dia-a-dia” (H, 38,

casado, ensino superior). “Prefiro viver um dia de cada vez” (M, 66, união de facto, ensino

superior).Alguémescreve:“Ofuturopassa-seacadainstantedavida.Ficarpreocupadonãomuda

nada.Émelhorseguiremfrente,umdiaapósooutro”(H,68,casado,ensinosuperior).

Oumesmoquemdeclarenãoestarmuitopreocupado. Porque reconhece em si qualidades de

grande resiliência: “Não estou muito preocupada porque sempre fui empreendedora e sempre

passei por situações difíceis. Encontrarei novas formas de trabalho” (M, 38, solteira, ensino

superior). Porque a sua fé lhe transmitiu a lição para suportar a crise: “Nadame preocupa. A

minhaesperança,coloco-aunicamenteemDeuseestastribulaçõesnãomeafetamporqueeujá

asesperavaporqueleioaBíblia”(H,60,solteiro,ensinosuperior).

Oretratoparamuitos,porém,ébemmaisperturbador.Apreocupação,dramática,comasaúde

física. A saúde do próprio, muito referida pelos mais velhos: “O que me preocupa mais é ser

contaminado”(H,79anos,casado,ensinosuperior).“Aminhasaúde.Tiveumcancro.Aindatenho

que fazer mais umas cirurgias” (H, 68, união de facto, ensino superior). A saúde dos seus

familiares-ocônjuge,osmaisvelhos,paiseavós,sobretudo.Nãosópelaperigosidadedadoença

em certas franjas de risco, como pelo receio do colapso do SNS: “Aminhamaior preocupação

neste momento é se alguém da minha família / amigos tiver de ir para um

hospital…independentementedeestarcomcovid.Oshospitaisestãonumestadocaótico”(M,51,

solteira, ensino superior). “Queo SNSnão tenha capacidades (humanas emateriais) para fazer

faceàsconsequênciasdapandemianopaís”(M,46,divorciada,ensinosuperior).

Ladoa ladocomasaúde,apreocupaçãocomaperdadeemprego (“desemprego,desemprego,

desemprego”),salário,reforma,oquenecessariamentecomprometeopagamentoderendasde

48

casa,asprestaçõesdeempréstimosaobanco,aeducaçãodosfilhosou,mesmo,asobrevivência.

Para os mais desfavorecidos, a pressão é no curtíssimo prazo: “Não conseguir pagar todas as

despesasinerentesnopróximomês”(M,43,uniãodefacto,ensinobásico).“Nãoterdinheiropara

pagar a renda da casa “ (M, 53, união de facto, ensino secundário). Para muitos, e mesmo

licenciados, o receio de perder o emprego ou de a empresa não sobreviver na tempestade:

“Situação laboral, trabalhocomotrabalhadora independenteenãoseicomoserádepoisnemse

tereitrabalho”(M,37,uniãodefacto,ensinosuperior).“Preocupa-meofactodeterdepagaros

meus funcionários e osmeus fornecedores e os empréstimos ao banco, numa altura em que a

atividadeeconómicaestáparadasemutentesnãotenhofaturação,nãotenhoformadeassegurar

ocumprimentodasobrigações”.(H,50,casado,ensinosuperior).

Sehápessoas,comoasanteriores,queselecionamapenasasaúdeouoempregocomofocodos

seusreceios,amaioriarefere-osemsimultâneo.“Julgoqueaspreocupaçõesdetodosnósé…que

nãoadoeçaequemantenhaopostodetrabalho”(H,52,casado,ensinobásico).“Agora,apanhar

o vírus e transmiti-lo. Depois, corte de rendimento e eventual perda de emprego” (H, 48,

divorciado,ensinosuperior).“Amortedepessoaspróximas.Asobrevivênciadaempresadomeu

namorado,ondeeutambémtrabalho.Medidasdeausteridadenospróximosanos”(M,40,união

facto,ensinosuperior).“Afaltademedicamentos,insulinas,etc.easituaçãolaboraldomeufilho

jáquealojaemquetrabalhanumcentrocomercialfechouevaipassarpelasfériaselay-off”(H,

62, casado, ensino superior). Um homem de 69 anos, casado, com ensino superior ilustra

exemplarmenteestaassociação:“Oquemaismepreocupa.1)Aminhamulherqueteveumcancro

etemdeserseguidaeofactodeelaterasma;2)Osmeustrêsnetos;3)Aminhafilhaeomeu

genroqueestãosemrendimentosetemdespesaselevadasparapagardasuavidadodia-a-dia;4)

Aspessoasquevãoficarsemtrabalhoesemsesaberquandoovoltarãoater”.

“A saúde da minha família” é a prioridade, sobretudo para as mulheres. As preocupações

centradas na família mais próxima são intensas em todas as franjas inquiridas. O sentimento

intergeracionaldeproteçãoeamparoérealmentemuitoforte.Depaisparafilhos,deavóspara

netos,desdelogo.“Ofactodetrabalharsemqualquertipodeprotecçãoindividual,epoderavir

contaminaraminhamulherefilhos”(H,44,casado,ensinobásico).“Preocupo-mecomosfilhose

osnetos.Umafilhalicenciadaemgestãoficoudesempregadahádoisdias.Foidespedidaporque

teimou que devia trabalhar em teletrabalho e empresa despediu-a” (H, 81, divorciado, ensino

49

superior). “Oquemepreocupa sãoosmeus filhos: umestá emigrado, a empresa fechouagora

(ReinoUnido);outro ficou sematividade (falso reciboverdenumginásio); eomaisnovoestáa

estudarnaUniversidade.Aquiemcasavamosencolherasdespesasparapodermosajudá-los”(M,

53,casada,ensinosuperior).“Nãoverosnetoseosmaispequenosnãoperceberem(avótambém

estásdeférias?Entãoandacá).Nãoaguentarpsicologicamenteoisolamento.Aspessoasquesó

ganhamquandotrabalham(continuoapagaràempregadaquevinhacáduasvezeseagoranão

vem, mas sou a única pessoa que lhe paga). A possibilidade de as deslocações serem

drasticamente reduzidas e osmeus filhos que estão fora deixarem de vir cá com frequência. A

possibilidadedeaUEsedesfazer (vergonhosafaltadesolidariedadeparacomItáliaeEspanha”

(M,64,casada,ensinosuperior).

Mastambémdefilhosparapais,denetosparaavós.“Temotermosdeviverlongedosidosospor

muitosmeses” (M,36,uniãode facto,ensinosuperior). “Nãoveraminha famíliaousequer ter

perspectivadevisitá-los”(M,23,solteira,ensinosuperior).“Queroqueosmeuspaisestejamem

segurançaparanãoapanharemovíruseachomuitodifícilconseguircontrolarisso.Osmeuspais,

apesar de verem as notícias, continuam a expor-semuito. Precisamos de uma vacina e de um

tratamentoeficazescommáximaurgência”(M,45,uniãodefacto,ensinosuperior).“Nãopoderir

veraminhafamílianaAlemanha.Lásuspenderamunsexamesdomeupaiquenemsabesevai

continuar a quimioterapia (...). Os meus sogros precisam de assistência, e de presença: o meu

sogro por ter uma doença degenerativa e a minha sogra porque tem dificuldades físicas para

convivercomeleenão tempaciência (elaprecisadeapoio)...Daquiuns tempos,aCovid-19vai

esgotarosnervosdaspessoasejuntamentecomasquestõesfinanceiraseostressdotrabalhoe

dagestãodoquotidianoécapazdeportodagenteemesgotamentoaomesmotempo.Eserácada

vez mais difícil encontrar um ombro para ser reconfortado, uma pessoa que ouça os nossos

problemasequeconsiganosdarenergia,etc.”(M,41,uniãodefacto,ensinosuperior).

As preocupações com a escola dos filhos são uma constante e tipicamente afloradas pelas

mulheres, atentas a várias dimensões do problema. A pandemia pode comprometer projetos e

sucesso escolar da geraçãomais jovem. “O futuro de filhas e netos. Escola, empregos” (M, 68,

casada, ensino superior). “Primeiro a saúde de todos nós. O ingresso daminha filha no ensino

superior.A continuidadedo cursodomeu filhonaFaculdadedeDireito” (M,60, casada,ensino

superior).“Apreparaçãodascriançasparaopróximoanolectivoeasaúdedomeupai”(M,42,

50

casada,ensinosuperior).“Ofuturodomeufilhoquetemapenas17anos.Estáaterminaro12º

anoeaquererentrarparaafaculdade”(M,49,divorciada,ensinosuperior).“Preocupa-meomeu

filhoterdemudardeescolapornãopoderpagaramensalidadedaescolaactual”(H,41,casado,

ensino superior). Para além do comprometimento da progressão escolar, há pais que temem

pedagogicamentepeloconfinamentodosfilhosemcasa–privadosderelaçõesafetivasparaalém

dasda casa, deatividadesextracurriculares. “Preocupa-meomeu filho, as relações familiares e

sociaisqueestáaperder.Preocupa-meaminhacondiçãoprecáriadetrabalhoeaminhasanidade

mental”(M,35,uniãodefacto,ensinosuperior).“Aescolaeodesportoqueosmiúdosfazem,não

podervisitarmãe,nãosaberquandoeseistovaiterfim”(M,49,casada,ensinosuperior).

Do lado dos filhos, as franjasmais jovens de inquiridos, esse receio é igualmente expresso.

Qualificação escolar, realização de estágios profissionais estão em suspenso. “Esta situação

poderáimporaltainstabilidadelaboralaosmeuspais,aomeutrabalhoeaodesenvolvimentoda

minha atividade educacional (estudante de doutoramento)” (H, 30, união de facto, ensino

superior).“ComoéquevoufazerexamesnaUniversidade?”(M,21,uniãodefacto,secundário).

“Não conseguir acabar o curso da faculdade” (M, 21, união de facto, ensino superior). “A

suspensãodoestágiodaordemdosadvogados.Estounasegundafasee ia jáfazeroexameem

Junho”(F,26,uniãodefacto,ensinosuperior).

Emboramenos frequentemente referidos (o estado de emergência fora declarado dias antes),

surgemjáosreceioscomasconsequênciasdoisolamento,daincertezasobreasaúdemental.Em

diferentes franjas etárias. “Deixar de ter sanidademental” (H, 74. casado, secundário). “Saúde

mentalminhaedacriança,peloconfinamentoefaltadeconvíviocomamigos,avós,primos,etc.”

(H,41,casado,ensinosuperior). “Nãosercapazdeaguentar,psicologicamente,a"eternização"

deste tempo de absoluto isolamento social” (H, 66, casado, ensino superior). “Incerteza e

sofrimentopsíquico” (M,59, casada,ensinosuperior). “Preocupa-menãoconseguir fazerplanos

paraofuturo,étudomuitoincerto”(M,27,solteira,ensinosuperior).“Preocupa-menãosabero

quevirá”(M,34,casada,ensinosecundário).“Otempoparecequeestáparado.Com77anosde

idadejánãotenhomuitotempoparaperder...”(M,77,viúva,ensinosuperior).“Asaúdemental

daspessoas.Sintoqueestáumpânicoinstaladoequepassaramatermedodetudo”(M,21,união

defacto,ensinosuperior).

51

As reticências em torno do controlo do Estado sobre a vida ou o movimento das pessoas

despontamaquieali.“Tenhopreocupaçõesacercadosprecedentesqueseestãoaabrirdoponto

devistapolítico,deformasdecontrolosocial.Aeconomianãomepreocupatanto”(H,43,casado,

ensino superior). “Preocupam-me sobretudo as pessoas que têm vidas precárias, o provável

aumentodadesigualdadesocialequeocontrolo,sobaformadedados,sobreavidadaspessoas,

seestendaparaalémdaquiloqueénecessário” (M,47, casada,ensino superior).Aprivaçãoda

liberdade de circular livremente também levanta preocupação: “Preocupa-me principalmente a

liberdade de podermos ir para qualquer lado sem restrições” (M, 43, casado, ensino superior).

“Estarprivadodepodercircularnaviapúblicacomtotalliberdadenaspróximassemanas”(H,75,

casado,ensinobásico).

Num horizonte menos próximo, a um nível macro e mais abstrato, alguns inquiridos (os mais

escolarizados)receiamosimpactosglobaisdapandemiaeaproveitamomomentopara“parare

pensar”sobreoestadodaUniãoEuropeia,domundoedoplaneta.Atéporquenadalhesgarante

quenãohajanovossurtosdovírus.“A incertezaquantoà imunidadedegrupoquetravesurtos

futuros”(M,52,casada,ensinosuperior).“Preocupa-mequesetornenumasituaçãosemsolução

ou repetitiva” (M, 43, casada, ensino superior). “Não haver uma previsão de fim à vista. As

segundaseterceirasvagasdadoença”(M,36,solteira,ensinosuperior).

Assim, há quem refira impactos económicos, sociais, devastadores da pandemia, e o facto de

estarmosperanteumaencruzilhadademudança:“Alteraçõesnomododevida,nofuncionamento

democrático das sociedades, aceitação da perda de liberdade em troca de segurança” (M, 63,

divorciada,ensinosuperior).“AdestruiçãodaeconomiaeaUE/BCEnãoestaremafazernadado

queénecessárioparaqueaeconomianãosejadestruída”(H,53,uniãodefacto,ensinosuperior).

“Apandemianãovaiacabartãocedoeporissoasrestriçõestambémnão.Estevírustrouxemais

doqueproblemasdesaúde.NovaEuropa,criseeconómica,novosnegócios,negóciosquefecham,

novas relações laborais, novas formas de trabalho, novas relações sociais...” (M, 42, união de

facto, ensino secundário). “Será que vamos conseguir dar resposta a uma doença tão

avassaladora? As estruturas, a economia, as desigualdades sociais, a natureza, como vamos

sobreviver?Pensoquechegouahoradepensarquetemos,queaindaépossívelmudarosnossos

comportamentos, o sistema económico que foi sendo desenvolvido assente no esgotamento de

recursos naturais, no consumismo exacerbado e nas desigualdades sociais. Desejomuito que o

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momentodifícil queestamosvivendonão sejaemvão. Sóassimpoderemos terum futuromais

justo,maissustentável,maissolidário”(M,64,casada,ensinosuperior).

Finalmente,apreocupaçãocomasustentabilidadedoplaneta,dacasacomum.Umavisãocrítica

darelaçãoentreoshumanoseaTerra,umapeloànecessidadedeque“tiremos lições”doque

estáaocorreremudemosdeestilosdevida.“Esperoqueamãenaturezanosestejaadaruma

grande lição, espero que o mundo acorde para pensarmos melhor o futuro neste maravilhoso

planetaepassarmosaviveràvelocidadedaTerraenãoàvelocidadedodinheiro”(H,49,casado,

ensino superior). “Numa escala mais global, preocupa-me que não haja a consciência - das

pessoas edos seusgovernantes em todoomundo - dequeestas epidemias sãoo resultadoda

ocupaçãoeexploraçãoeconómicadasregiõesmaisvirgenseselvagensdoplaneta,estamosa ir

longe demais; as alterações climáticas facilitam a proliferação de germes, isto também me

preocupa. Preocupa-me que não haja a consciência de que temos mesmo que mudar de

paradigma”(M,51,uniãodefacto,ensinosuperior).“OHomemvaiterquelidarcomestetipode

surtos.Vaisurgircadavezmaisdoençasnovassemtratamentodeprevençãooucura.Vivemosna

eradasbactériasevíruscausadospelapoluiçãoecondiçõesatmosféricas.OpróprioHomemcom

assuasacçõesquotidianaséqueestáadegradaroplaneta”(M,36,casada,ensinosuperior).“O

factodenãoaproveitarmosomomentoparainflectiranossaeconomiafocando-aecentrando-a

noHomemenaSustentabilidadedoPlaneta”(H,63,casado,ensinosuperior).