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O INSTITUTO DA DESAPROPRIAÇÃO NA ATUALIDADE – ANÁLISE
DOUTRINÁRIA E JURISPRUDÊNCIAL.
NOGUEIRA . Thiago Fuster NOGUEIRA1
FERREIRA. FRANCISCO RAFAEL2
Sumário: Resumo; 1 Introdução; 2 Desapropriação – Traço histórico; 2.1.1
Conceito; 2.1.2 Fundamentos ou Pressupostos da Desapropriação; 2.1.3
Competências; 2.1.3.1 Competência Legislativa; 2.1.3.2 Competência Declaratória;
2.1.3.3 Competência Executória; 2.1.4 Espécies de Desapropriação; 2.14.1
Desapropriação Ordinária; 2.1.4.1.1 Desapropriação por Necessidade ou Utilidade
Pública; 2.1.4.1.2 Desapropriação por Interesse Social; 2.1.4.2 Desapropriação
Extraordinária ou Sancionatória; 2.1.4.2.1 Desapropriação por descumprimento da
função social da propriedade; 2.1.4.2.2 Desapropriação para reforma agrária;
2.1.4.2.3 Desapropriação Confisco; 2.1.4.3 Desapropriação Indireta; 2.1.4.4
Desapropriação por Zona; 2.1.5 Objeto da desapropriação; 2.1.6 Bens insuscetíveis
de desapropriação; 2.1.7 Retrocessão; 2.1.8 Desvio de finalidade e tredestinação
lícita; 2.1.9 Prazo de caducidade; 2.1.10 Imissão provisória na posse; 2.1.11
Indenização justa e prévia, juros compensatórios e juros moratórios; 3Conclusão; 4
Referências.
Resumo:
O presente estudo tem por objetivo uma breve análise do instituto da desapropriação
vigente em nosso ordenamento jurídico, abordando desde sua origem histórica, até assuntos
de grande discussão na doutrina, como o caso da natureza jurídica do instituto da retrocessão,
pois apesar da jurisprudência já ter se posicionado sobre tal assunto, alguns autores defendem
posições divergentes. Para tal foram utilizadas como fonte de consulta, a vasta legislação
existente acerca do tema, a posição que nossos principais doutrinadores possuem acerca do
tema e também procurou-se mostrar o posicionamento de nossos Tribunais, principalmente de
nossas cortes superiores uma vez que indispensável para que se obtenha uma visão mais
apurada acerca de tema tão tradicional e ao mesmo tempo contemporâneo em nossas vidas.
Palavras-chave: Desapropriação. Indenização. Função Social. Reforma Agrária.
1 INTRODUÇÃO
Objetivou-se explorar o tema da desapropriação presente em nosso ordenamento
jurídico, tema este instigante e sempre presente em nosso ordenamento jurídico, inclusive no
1Graduado em Direito pelo Centro Universitário Dr. Edmundo Ulson – UNAR. Advogado.
[email protected] 2 Especialista em Direito Ambiental e Urbanístico, Especialista em Direito do Estado, Professor do Centro
Universitário “Dr. Edmundo Ulson” UNAR. [email protected]
2
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Brasil, até mesmo antes de nossa Constituição Imperial de 1824. A desapropriação hoje se
reveste de importância soberba, uma vez que é o único meio que o Estado dispõe de
efetivamente fazer com que se cumpra a função social da propriedade, motivo pelo qual o se
faz imprescindível o aprofundamento sobre o presente tema. Tal estudo abrangeu desde a
definição do que vem a ser desapropriação, suas espécies, definição de indenização justa e
prévia, além das hipóteses em que a desapropriação é efetuada para punir seu proprietário, as
chamadas desapropriação sancionatórias.
Visando obter um ponto de vista neutro sobre o assunto foi efetuada uma consulta
prévia sobre a indispensável legislação que engloba o tema, tendo como exemplo o Decreto-
lei nº3.365/41, conhecido como Lei Geral das Desapropriações, a Lei nº 8.629/93, eu regula a
reforma agrária, o importante Estatuto da Cidade, lei nº 10.257/01, dentre outras. Também foi
pesquisado a posição que nossos mais ilustres doutrinadores possuem a respeito do tema,
incluindo nessa lista os chamados doutrinadores mais “tradicionais” como Hely Lopes
Meirelles, Celso Antônio Bandeira de Mello e José dos Santos Carvalho Filho e Maria Sylvia
Zanella Di Pietro, até a posição de um dos mais “atuais” doutrinadores de direito
administrativo que é o Doutor Alexandre Mazza. Também e não menos importante buscou-se
sobre os temas mais relevantes a posição jurisprudencial, incluindo ai as posições de nossas
cortes superiores, dentre elas o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.
Por fim cumpre mencionar que o objetivo de tal estudo se verifica na importância do
tema da desapropriação, sendo este instituto uma das maneiras do Estado intervir na
propriedade privada, e o conhecimento sobre tal assunto possui elevada importância uma vez
que todos podemos eventualmente ser alvo de uma desapropriação, por isso a importância do
presente estudo, ainda mais com a possibilidade infelizmente comum do Estado valer-se da
desapropriação indireta, portanto mais um motivo para ressaltar a importância de instituto da
desapropriação e seus reflexos em toda a sociedade.
2 DESAPROPRIAÇÃO – TRAÇO HISTÓRICO
Historicamente, a desapropriação surgiu em nosso ordenamento ainda no tempo do
Império com a publicação do Decreto de 21 de maio de 1821, que já disciplinava o instituto
da desapropriação, porém em 1824, com a instituição da Constituição do Império do Brasil,
em seu artigo 179, item 22 que assim previa “E' garantido o Direito de Propriedade em toda a
sua plenitude. Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso, e emprego da Propriedade
do Cidadão, será elle préviamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em
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que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.” (DA
SILVA, 1998)
O instituto se repetiu em todas as constituições que foram editadas em nosso país, a
saber, na Constituição de 1891, em seu artigo 72, §17 que assim previa “O direito de
propriedade mantem-se em toda a plenitude, salvo a desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, mediante indenização prévia”. (DA SILVA, 1998)
Na Constituição de 1934, em seu artigo 113, item 17, assim previa: “É garantido o
direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na
forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á
nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como
guerra e comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade
particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito à indenização ulterior”. Aqui
verificamos uma evolução no instituto da desapropriação, onde se verifica a presença de
atributos que incidem inclusive nos dias atuais, dentre eles, a indenização justa e prévia,
utilidade ou necessidade pública, além do instituto da requisição administrativa, que conforme
verificamos anteriormente se realizava por meio da desapropriação. (DA SILVA, 1998)
Já a carta constitucional de 1937, assim preceituava: “O direito de propriedade, salvo a
desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia. O seu
conteúdo e os seus limites serão os definidos nas leis que lhes regularem o exercício”. Clara
alusão ao Decreto-lei 3.365/41, que se tornou o diploma legal fundamental das
desapropriações em geral, especialmente aquelas que têm por finalidade a necessidade ou
utilidade pública, devido à sua importância ficou conhecido como “Lei Geral das
Desapropriações”. (DA SILVA, 1998)
As Constituições de 1946 e 1967, ao referirem a desapropriação praticamente
repetiram o mesmo mandamento da constituição de 1934, pois em ambas se verificava os
requisitos da justa e prévia indenização em dinheiro. Ponto controvertido foi o referente à
política de reforma agrária, uma vez que, ao definir que a indenização devia ser em dinheiro,
tal fato emperrou a reforma agrária em nosso país, chegando mesmo a ser quase esquecida.
(DA SILVA, 1998)
Devido a essas conseqüências dramáticas, que através de um Ato Institucional, a
Constituição foi modificada, e a partir desta mudança, foram instituídas as chamadas TDA’s
(Títulos da Dívida Agrária), que possibilitou ao Governo, o pagamento das indenizações
provenientes em interesse social para fins de reforma agrária em TDA’s. (DA SILVA, 1998)
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A desapropriação para reforma agrária foi disciplinada pelo Decreto-lei nº 554, de
25/04/96, depois revogado pela Lei complementar nº 76, de 06/07/93, que hoje
disciplina a matéria, introduzidas pela Lei Complementar nº 88, de 23/12/96. (DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella, p. 158, 2009.)
A respeito do pagamento na desapropriação de interesse social para fins de Reforma
Agrária, vejamos o julgado abaixo que ilustra com precisão o tema, senão vejamos:
DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. PAGAMENTO
EM TDA'S. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF.
REDUÇÃO DE HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. VALORES
DA INDENIZAÇÃO. COBERTURA VEGETAL. EXPLORAÇÃO ECONÔMICA.
JUROS COMPENSATÓRIOS. CABIMENTO. MEDIDA PROVISÓRIA 1.577/97.
IMISSÃO NA POSSE ANTERIOR. PERCENTUAL DE 12% AO ANO.
PRECEDENTES. CUMULATIVIDADE COM JUROS MORATÓRIOS.
POSSIBILIDADE. SÚMULAS 12 E 102/STJ. PRECEDENTES. Supremo Tribunal
de Justiça, Processo: REsp 1007774 CE 2007/0271303-0 Relator(a): Ministro
FRANCISCO FALCÃO, Julgamento: 14/10/2008, Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA
TURMA, Publicação: DJe 29/10/2008.
Já nossa atual carta magna, embora preveja expressamente o direito de propriedade
privada em seu art. 5º, XXII, e no art. 170, II, a desapropriação vem prevista em vários
dispositivos, dentre eles: art. 5º, inciso XXIV, art. 22, inciso II, art. 182, §3º e 4º, e inciso III,
e ainda o art. 184. (DA SILVA, 1998)
Neste diapasão verificamos a posição de Carvalho Filho, (2009), que preceitua: em
nosso ordenamento, a propriedade é considerada um direito fundamental prevista no art. 5º,
inciso XXII de nossa Constituição. Mas como todos sabem, não existem direitos
fundamentais absolutos e até mesmo a propriedade deve atender a sua função social, também
prevista no artigo 5º, inciso XXIII. Diante do exposto é lícito ao Estado intervir na
propriedade privada quando esta não estiver cumprindo sua função social, isto porque o
Estado atue em nome de toda a coletividade.
Neste mesmo sentido prevê Diógenes Gasparini (2011) ao afirmar que em nossas
constituições sempre existiram o direito a propriedade inerente ao particular e o direito de
desapropriar inseparável do Estado, todos sempre conviveram juntos e em harmonia em nosso
ordenamento jurídico.
Ainda parafraseando Carvalho Filho (2009) as intervenções do Estado na propriedade
privada subdividem-se em duas categorias básicas, de um lado temos as intervenções
restritivas que como já estudamos restringem o direito de propriedade do particular sobre seu
bem, mas não o fulmina totalmente, apenas impõe certas restrições que este possui o dever de
suportar. Já á intervenção supressiva, é aquela em que o Estado transfere o bem do particular
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para o seu patrimônio, ou o transfere a terceiros, sempre com base na necessidade/utilidade
pública e interesse social.
2.1.1 Conceito
A doutrina se apresenta de maneira uníssona a respeito da conceituação sobre a
desapropriação sendo que neste ponto não existe nenhuma grande divergência que merca ser
explorada. Trata-se de transferência compulsória de propriedade particular para o Poder
Público ou seus delegados, sob o fundamento da necessidade, utilidade pública ou interesse
social, mediante o pagamento de indenização prévia, justa e em dinheiro. Trata-se da regra
geral nas desapropriações, ou seja, indenização prévia, justa e em dinheiro, porém, em
determinadas situações o pagamento será feito em títulos da dívida pública, de emissão
autorizada pelo Senado, resgatáveis em até dez anos, ou em títulos da dívida agrária
resgatáveis no prazo de vinte anos. (MEIRELLES, 2009)
Logo, podemos conceituar desapropriação como:
[...] um procedimento, pelo qual o Poder Público (em sentido amplo, abrangendo
pessoas políticas e Administração Indireta) ou seus delegados (envolvendo
concessionárias, permissionárias e outras pessoas delegadas), iniciando-se por
prévia declaração de utilidade pública, necessidade pública e interesse social,
impõem ao proprietário (não necessariamente, mas geralmente um particular,
podendo ser outro ente público ou sob seu controle) pessoa física ou jurídica, a
perda ou retirada de bem de seu patrimônio, substituindo-o pela justa indenização
que, em regra, será prévia, e em dinheiro, salvo as exceções previstas na
Constituição Federal, bem esse que se incorporará, também em regra, ao
patrimônio do expropriante. (ARAÚJO, Edmir Netto de, p. 1072, 2010.)
Para Da Silva (1998), a desapropriação é uma forma originária de aquisição da
propriedade a disposição do direito público, uma vez que apta a remover legalmente os
entraves em relação à execução dos serviços públicos.
Já para o mestre Bandeira de Mello (2009), trata-se de procedimento através do qual o
Poder Público, fundado em necessidade pública, utilidade pública ou interesse social,
compulsoriamente despoja alguém de certo bem móvel ou imóvel, normalmente adquirindo-o
para si, em caráter originário, ou seja, o bem ingressa o patrimônio público livre e
desimpedido de quaisquer ônus, mediante indenização prévia, justa e pagável em dinheiro,
salvo nos casos de certos imóveis urbanos ou rurais, em que, por se encontrarem em
desacordo com a função social legalmente caracterizada para eles, a indenização far-se-á em
títulos da dívida pública, resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, preservado seu valor
real.
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Alexandre Mazza (2011), autor da nova geração de professores de direito
administrativo nos apresenta conceito aparentemente similar, mas senão vejamos, a
desapropriação trata-se de procedimento administrativo pelo qual o Estado transforma
compulsoriamente bem de terceiro em propriedade pública, com fundamento na necessidade
pública, utilidade pública ou interesse social, pagando indenização prévia, justa e em dinheiro
nos casos das desapropriações ordinárias, e em títulos da dívida pública na desapropriação
urbanística, títulos da dívida agrária, na desapropriação para reforma agrária, e nenhuma
indenização no caso da desapropriação confisco.
Carvalho Filho (2009) também se posiciona neste sentido, definindo a desapropriação
como o procedimento de direito público pelo qual o Poder Público transfere para si, por
razões de utilidade pública ou de interesse social, propriedade de terceiros, normalmente
mediante pagamento de indenização.
Por fim e não menos importante, vejamos a posição de Diógenes Gasparini (2011)
acerca da definição de desapropriação, para o conceituado autor, trata-se de um procedimento
administrativo onde o Estado, adquire de maneira compulsória a propriedade de alguém, para
si ou para outrem mediante utilidade/necessidade pública ou interesse social com indenização
justa prévia e em dinheiro, salvo os casos em que a própria constituição elenca como
sancionatórios ou especiais, nestes casos a indenização será paga em títulos da dívida pública
(CF, art. 182, §4º, III) ou em títulos da dívida agrária (CF, art. 184).
2.1.2 Fundamentos ou Pressuposto da Desapropriação
De acordo com Diógenes Gasparini (2011), três são os fundamentos legais da
desapropriação: o fundamento político, constitucional e legal. O fundamento político segundo
o autor seria basicamente o Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado. O
constitucional pode ser genérico ou específico, sendo como fundamento genérico o previsto
nos artigos 5º, XXII e 170, III ambos da Constituição Federal que ressalta a importância da
função social da propriedade; já o fundamento específico seria o constante nos artigos 5º,
inciso XXIV, 182, §4º, III e 184 e parágrafos todos da Constituição Federal. Por fim, no
fundamento legal que estão previstos em diversos diplomas legais expedidos pela União para
regular a matéria, são eles:
a) Decreto-Lei nº 3.365/41, Lei Geral das Desapropriações; b) Lei nº 4.132/62
desapropriação por interesse social; c) Lei nº 8.629/1993 reforma agrária (Cap. III, Tít. VII,
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da CF); d) Decreto-Lei nº 1.075/70, imissão de posse; e) Lei nº 9.785/99; f) MP n. 2.183-56,
de 24-8-2001.
Alexandre Mazza (2011) possui posição semelhante, à acima exposta, senão vejamos.
Para o autor o fundamento político da desapropriação consiste no poder de suprimir
compulsoriamente a propriedade privada, tal poder é inerente do domínio eminente
(dominium eminens), poder conferido ao Estado sobre todos os bens situados em seu
território, ou seja, uma parcela da soberania do Estado. (grifos do autor)
Continuando, o autor defende que a competência expropriatória encontra sustentáculo
também no Princípio da Supremacia do Interesse Público Sobre o Privado e na necessidade de
todo imóvel se adequar aos ditames de sua função social e ainda que os fundamentos jurídico-
político não se confundem com os três fundamentos normativos da desapropriação
encontrados no artigo 5º, inciso XXIV da Constituição Federal3. (MAZZA, 2011)
Evoluindo em tema deveras importante, verificamos que Maria Sylvia Zanella Di
Pietro (2009) aduz ainda que nossa carta magna traz como pressupostos da desapropriação a
necessidade publica, a utilidade pública e o interesse social (artigos 5º, inciso XXIV e
184). (grifos do autor)
Ademais, continua a autora nos brindando com a definição das três possibilidades de
desapropriação anteriormente elencadas, sendo que existe necessidade pública quando a
Administração se vê diante de um problema impreterível e urgente, que não pode ser
removido nem procrastinado, e cuja solução somente se encontra na desapropriação e
incorporação do bem particular ao domínio do Estado. Já verificamos a hipótese de utilidade
pública quando a aquisição pelo Estado do bem particular é conveniente, vantajosa ao
interesse coletivo, aqui não existe a situação de urgência verificada acima. Por fim verifica-se
o interesse social quando o Estado se vê diante das injustiças sociais, ligadas diretamente às
camadas mais pobres da população, tal espécie de desapropriação visa à melhoria na
qualidade de vida, distribuição de riquezas e atenuação das desigualdades na sociedade.
No mesmo sentido temos a posição de Carvalho Filho (2009) que somente considera
legítima a desapropriação que preencha os requisitos da utilidade pública, necessidade pública
e interesse social.
Define o autor que ocorre a utilidade pública quando a transferência do bem
particular se mostra conveniente à Administração, que assim o faz. Verifica-se a necessidade
3 XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por
interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta
Constituição;
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pública quando ocorre uma situação de emergência, cuja solução somente se satisfaça com a
desapropriação do bem particular; por fim ocorre o interesse social quando se verifica uma
grave violação à função social da propriedade, sua destinação e uso para o bem coletivo,
nesses casos o poder público tem por objetivo eliminar de alguma forma às desigualdades
coletivas. Segundo o autor, o exemplo mais marcante de desapropriação para fins de interesse
social é o da reforma agrária ou de assentamento de colonos. (CARVALHO FILHO, 2009
grifos do autor)
O fundamento legal genérico das espécies de desapropriação acima expostas encontra-
se no artigo 5º, inciso XXIV da Constituição Federal (utilidade/necessidade pública, interesse
social) e em leis e decretos esparsos, como por exemplo, o Decreto Lei 3.365/1941, chamado
de lei geral das desapropriações, que regula as desapropriações por utilidade e necessidade
pública. Temos ainda a lei nº 4.132/62, que regula os casos de desapropriação por interesse
social, isso sem contar as modalidades de desapropriação sancionatórias que se encontram
previstas nos artigos 183,§4º, III (desapropriação urbanística), 184 (desapropriação para fins
de reforma agrária), ambos da Constituição Federal. (CARVALHO FILHO, 2009)
2.1.3 Competências
Antes de adentrarmos nas espécies de desapropriação propriamente ditas e suas
características convém mencionarmos as três espécies de competências existentes e suas
ramificações em nosso direito, sendo que nesse ponto toda a doutrina e jurisprudência
apontam para o mesmo caminho, não havendo divergências.
Segundo Carvalho Filho (2009) no procedimento administrativo que precede a
desapropriação passa pela análise de três espécies de competências, quais sejam, a
competência legislativa, a competência declaratória e a competência executória, sendo que
qualquer violação nas competências acima mencionadas enseja a nulidade do decreto
expropriatório, mas senão vejamos. (grifos do autor)
2.1.3.1 Competência Legislativa
A competência legislativa é exclusiva da União, conforme inteligência do artigo 22,
inciso II da Constituição Federal4, tal competência consiste na produção de normas a respeito
da matéria, logo verificamos que tal matéria é privativa da União, ou seja, somente esta tem o
4 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
II - desapropriação;
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poder de criar regras jurídicas novas sobre desapropriação. A Constituição Federal no artigo
22, parágrafo único5 admitiu que lei complementar viesse a autorizar os Estados a legislar
sobre questões específicas das matérias sujeitas à competência privativa da União. Tal
competência é condicionada, isto é, somente se consumará quando for editada lei
complementar autorizadora. (CARVALHO FILHO, 2009)
Competência Privativa da União e Desapropriação Por invasão da competência
privativa da União para legislar sobre desapropriação (CF, art. 22, II), o Tribunal
julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do
Distrito Federal para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 313
da Lei Orgânica do Distrito Federal, que dispõe que as desapropriações dependerão
de prévia aprovação da Câmara Legislativa daquela unidade da federação. Entendeu-
se que o dispositivo impugnado extrapola o procedimento previsto no Decreto-Lei
3.365/41 e que a decisão político-administrativa de desapropriar um bem titularizado
pelo particular é matéria de alçada do Poder Executivo. Precedentes citados: RE
24139/SP (DJU de 20.5.55); Rp 826/MT (DJU de 14.5.71); ADI 106/RO (DJU de
9.12.2005). ADI 969/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.9.2006. (ADI-969) 6
2.1.3.2 Competência Declaratória
Tal espécie de competência se presta a declarar a utilidade pública ou o interesse
social do bem, com vistas à futura desapropriação. Aduz o autor (CARVALHO FILHO,
2009) que declarar utilidade pública ou interesse social de um bem, significa um primeiro
indício por parte do Estado no sentido de que determinado bem interessa ao Estado, seja para
ingressar em seu patrimônio (utilidade/necessidade pública) ou que tal bem seja destinado a
terceiro (interesse social).
Tal espécie de competência é concorrente da União, dos Estados, do Distrito Federal,
dos Municípios e dos Territórios, e se encontra prevista no art. 2º7 do Decreto-lei nº 3.365/41.
Tal regra engloba todas as pessoas federativas, porque cabe a estas valorar sobre os casos de
utilidade pública e de interesse social que propiciam a desapropriação, porém, como toda
regra, esta comporta exceções, desse modo atribui-se competência para declarar utilidade
pública ao DNIT (Departamento Nacional de Infra Estrutura), cuja natureza é a de
autarquia administrativa, com intuito de ser promovida desapropriação visando à
implantação do Sistema Nacional de Viação8. (CARVALHO FILHO, 2009)
5 Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. 6 Informativo STF nº 442, set/2006
7 Art. 2
o Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos
Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. 8 Lei nº 10.233/2001 – Art. 82. São atribuições do DNIT, em sua esfera de atuação:
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10
No mesmo sentido foi a competência atribuída à ANEEL – Agência Nacional de
Energia Elétrica, também uma Autarquia Federal, que possui competência declaratória com
objetivo de serem desapropriadas áreas para a instalação de concessionários e permissionários
de energia elétrica9 (CARVALHO FILHO, 2009)
No tocante ao interesse social, verificamos que se a desapropriação se destinar à
reforma agrária a competência para a declaração expropriatória é exclusiva da União
Federal, conforme inteligência do artigo 184 e parágrafos da CF/8810
. Já a espécie de
desapropriação para atender fins urbanísticos, a competência declaratória para declarar a
desapropriação é exclusiva do Município, conforme previsto expressamente no artigo 182,
parágrafo IV, inciso III da Constituição Federal11
. (CARVALHO FILHO, 2009)
2.1.3.3 Competência Executória
Tal espécie de competência significa a atribuição para promover a desapropriação, dar
andamento, dar cabo, finalizar a desapropriação, ou seja, providenciar todas as medidas e
exercer todas as atividades que venham a conduzir a efetiva transferência da propriedade.
Prevê o artigo 3º do Dec.-lei 3.365/41 que assim preleciona expressamente: “Os
concessionários de serviços públicos e os estabelecimentos de caráter público ou que
exerçam funções delegadas de poder público poderão promover desapropriações mediante
autorização expressa, constante de lei ou contrato”. Verificamos que a intenção do
legislador foi permitir que o maior número de pessoas delegadas pudessem conduzir a
desapropriação visando ao seu término, desde que expressamente autorizadas pelos entes que
promoveram a declaração expropriatória (União, Estados, Municípios). Abrangem desde as
entidades da administração indireta (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia
mista e fundação), cuja delegação é de natureza legal, e os concessionários e permissionários
de serviço público.
IX – declarar a utilidade pública de bens e propriedades a serem desapropriados para implantação do Sistema
Federal de Viação; 9 Lei nº 9.074/95 – Art. 10. Cabe à Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, declarar a utilidade pública,
para fins de desapropriação ou instituição de servidão administrativa, das áreas necessárias à implantação de
instalações de concessionários, permissionários e autorizados de energia elétrica. (Redação dada pela Lei nº
9.648, de 1998) 10
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que
não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com
cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua
emissão, e cuja utilização será definida em lei. 11
III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo
Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o
valor real da indenização e os juros legais.
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2.1.4 Espécies de Desapropriação
A doutrina elenca aproximadamente algo em torno de sete modalidades de
desapropriação, sendo que todas possuem características especiais que as diferem umas das
outras, sendo que basicamente podemos elencar as seguintes espécies:
a) Desapropriação ordinária: engloba as desapropriações por necessidade e
utilidade pública e interesse social – fundamento legal: art. 5, inciso XXIV da
CF/88, sendo que o pagamento da indenização é prévio e em dinheiro;
b) Desapropriação extraordinária ou sancionatória: nesta modalidade verificamos
a desapropriação urbanística prevista no artigo 183, §4º, inciso III, da CF/88, a
desapropriação para fins de reforma agrária, prevista no artigo 184 da CF/88,
em ambas as espécies o pagamento da indenização se dá através de títulos da
dívida (pública ou agrária); e por fim temos a desapropriação confisco prevista
no artigo 243 da CF/88, onde não existe pagamento de indenização;
c) Desapropriação indireta: é uma modalidade de desapropriação que não existe
previsão na legislação, ocorre quando o Estado pratica o chamado esbulho
possessório, ou seja, o Estado sem valer-se de decreto expropriatório expedido
pelo chefe do executivo invade área de um particular e inicia determinada
construção sem sua anuência. A indenização neste caso converte-se em perdas
e danos se foi dada utilidade pública ao imóvel;
d) Desapropriação por zona: é uma modalidade especial de desapropriação onde
se desapropria o imóvel necessário à desapropriação e seu entorno que terá
duas finalidades específicas a serem detalhadas no decreto expropriatório, a
primeira é a desapropriação do entorno visando futura ampliação do objeto
expropriado, e a segunda é a desapropriação do entorno visando aproveitar a
valorização que a obra pública trará na vizinhança, seu fundamento legal está
no artigo 4º do Decreto lei 3.365/4112
;
e) Desapropriação de bens públicos: é a possibilidade de entes de nível
hierarquicamente superior desapropriar bens de entes inferiores, ou seja, se dá
sempre na vertical e de cima para baixo, ou seja, União possui legitimidade
para desapropriar Estados e Municípios, Estados desapropriam Municípios, seu
12
Art. 4o
A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se
destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em conseqüência da realização do serviço. Em
qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis
à continuação da obra e as que se destinam à revenda.
12
12
fundamento legal está previsto expressamente no artigo 2º, §2º do Dec.-lei
3.365/4113
·. (CARVALHO FILHO, 2009, DI PIETRO, 2009, MAZZA, 2011)
Aprofundaremos a seguir nas principais modalidades de desapropriação que merecem
um aprofundamento devido às suas características intrínsecas que as diferem das demais, a
saber.
2.1.4.1 Desapropriação ordinária
São aquelas espécies de desapropriação previstas no artigo 5º, inciso XXIV da
Constituição Federal, que assim prevê: “A lei estabelecerá o procedimento para
desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou interesse social, em tais espécies de
desapropriação o pagamento é sempre mediante justa e prévia indenização em dinheiro,
ressalvados os casos previstos nesta Constituição.” Esta é a regra geral nas desapropriações,
onde a indenização é justa, prévia e em dinheiro conforme acima ressaltado. (CARVALHO
FILHO, 2009)
2.1.4.1.1 Desapropriação por Necessidade ou Utilidade Pública
Possui como norma regulamentadora o Decreto-Lei nº 3.365/41, considerado a Lei
Geral das Desapropriações que dispõe em seu artigo 5º os casos de Desapropriação por
Utilidade Pública. (CARVALHO FILHO, 2009)
Alexandre Mazza (2011) em sua obra faz uma distinção um tanto quanto salutar
acerca das desapropriações por necessidade e utilidade pública. Isto porque no Decreto-Lei nº
3.365/41 em seu artigo 5º, estão previstas somente as hipóteses de desapropriação por
utilidade pública, nada mencionando, tal diploma legal acerca das desapropriações por
necessidade pública. Entretanto, segundo entendimento do autor, as desapropriações por
necessidade pública pressupõem uma situação de emergência e estariam elencadas nas alíneas
a, b e c14
do citado artigo 5º. Já o restante envolveria um juízo de conveniência e oportunidade
por parte da Administração Pública, tais casos se enquadrariam nas hipóteses de
desapropriação por utilidade pública.
13
§ 2o Os bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão ser desapropriados
pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização
legislativa. 14
a) segurança nacional; b) defesa do Estado; c) socorro público em caso de calamidade.
13
13
2.1.4.1.2 Desapropriação por Interesse Social
Conforme precisamente elucida Hely Lopes Meirelles (2009) na desapropriação por
interesse social, os bens desapropriados não integram o patrimônio público, mas sim são
trespassados a terceiros a fim de satisfazer os anseios da coletividade.
Os casos de desapropriação por interesse social estão previstos no art. 2º da Lei
4.132/62, dentre eles podemos destacar resumidamente o aproveitamento de todo bem
improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e
consumo dos centros de população a que deve ou pode suprir por seu destino econômico; a
construção de casas populares; a manutenção de posseiro sem terreno urbano onde, com a
tolerância expressa ou tácita do proprietário, tenham construído sua habitação, formando
núcleos residenciais de mais de dez famílias. (GASPARINI, 2011)
Conforme ressaltado acima, a desapropriação por interesse social visa privilegiar
certas camadas sociais em geral as menos favorecidas economicamente atuando como meio
de eliminação das desigualdades sociais. (GASPARINI, 2011)
2.1.4.2 Desapropriação Extraordinária ou Sancionatória
Tais modalidades de desapropriação constituem uma espécie de sanção ao proprietário
do imóvel objeto do decreto expropriatório, isto porque nos três casos aqui mencionados, seu
pagamento se dá: 1- em títulos da dívida pública, nos casos da desapropriação urbanística de
competência do Município; 2- em títulos da dívida agrária, quando da desapropriação para
fins de reforma agrária, de competência da União; 3- nenhuma indenização a ser paga no caso
da desapropriação confisco, por tratar-se da utilização da terra para o plantio de psicotrópicos.
(DI PIETRO, 2009)
2.1.4.2.1 Desapropriação por descumprimento da função social da propriedade
urbana
Também conhecida como desapropriação para a observância do Plano Diretor do
Município (MEIRELLES, 2009), desapropriação por descumprimento da função social da
propriedade urbana (DI PIETRO, 2009), desapropriação urbanística (CARVALHO FILHO,
2009, MAZZA, 2011), não obstante a diversidade de nomenclatura, todas se referem ao
mesmo instituto que será devidamente explorado a seguir.
14
14
O fundamento legal da desapropriação urbanística está previsto no artigo 182, §4º,
inciso III, da Constituição Federal, sendo que tal modalidade de desapropriação é de
competência exclusiva do Município(s), uma vez que tem por objeto, imóveis urbanos que
desatendam a sua função social15
. (MAZZA, 2011)
A função social do imóvel está prevista na lei nº 10.257/01, que regulamenta os
artigos. 182 e 183 da Constituição Federal estabelecem as diretrizes gerais da política urbana
e dá outras providências. Preceitua o §2º do artigo 182 da CF/88 que a propriedade cumpre
sua função social quando atende às exigências previstas no Plano Diretor, que tem por
objetivo garantir a coletividade qualidade de vida, justiça social e desenvolvimento das
atividades econômicas. (MAZZA, 2011)
Porém antes do Município efetuar a desapropriação no imóvel que venha a desatender
à sua função social, deve atender ao comando constitucional previsto no artigo 182, §4º,
incisos I e II, somente restando infrutíferas as providências abaixo mencionadas é que
Município deve proceder à desapropriação:
a) Exigência de promoção do adequado aproveitamento: o Poder Público notifica
o proprietário que seu imóvel se encontra em desacordo com o previsto no art.
5º, §1º, I do Estatuto da Cidade16
, sendo tal notificação averbada na matrícula
do imóvel;
b) Ordem de parcelamento e edificação compulsórios: o proprietário notificado
para dar destinação social há seu imóvel deve no prazo de um ano protocolar o
projeto no órgão municipal competente17
e dois anos para iniciar as obras no
imóvel18
;
c) IPTU progressivo no tempo: se o proprietário do imóvel não atender ao
disposto acima, incidirá sobre seu imóvel o IPTU progressivo no tempo, no
qual haverá um aumento na alíquota deste imposto pelo prazo máximo de
cinco anos consecutivos19
, sendo que o valor de tal alíquota deverá dobrar a
15
Lei nº 10.257/01 – Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades
dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas,
respeitadas as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.
16 § 1
o Considera-se subutilizado o imóvel:
I – cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em legislação dele decorrente; 17
§ 4o Os prazos a que se refere o caput não poderão ser inferiores a:
I - um ano, a partir da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão municipal competente; 18
II - dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do empreendimento. 19
Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5
o desta
Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5
o desta Lei, o Município procederá à aplicação
15
15
cada ano, respeitado o limite máximo de 15%20
. Exemplo: 1º ano: alíquota de
1%, 2º ano: alíquota de 2%, 3º ano: alíquota de 4%, 4º ano, alíquota de 8% e 5º
ano: alíquota de 15%;
d) Somente depois de observado todo este procedimento é que estará autorizado o
Município a efetuar a desapropriação do imóvel, que deverá ser paga através
de títulos da dívida pública21
, com emissão aprovada pelo Senado, resgatáveis
no prazo máximo de até dez anos. (DI PIETRO, 2009, MAZZA, 2011)
2.1.4.2.2 Desapropriação para reforma agrária
Também conhecida na doutrina como desapropriação por descumprimento de função
social da propriedade rural (DI PIETRO, 2009), tal modalidade de desapropriação é de
competência exclusiva da União, e possui natureza sancionatória, uma vez que somente se
aplica ao imóvel rural que desatender à sua função social. (MAZZA, 2009)
A função social do imóvel rural se encontra prevista expressamente no artigo 186 da
Constituição Federal, e no artigo 2º, §1º, do Estatuto da Terra (lei nº 4.504/64). Pra tal
instituto, uma propriedade somente cumpre com sua função social, quando cumpre
simultaneamente os seguintes requisitos:
a) Favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam,
assim como de suas famílias;
b) Mantém níveis satisfatórios de produtividade;
c) Assegura a conservação dos recursos naturais;
d) Observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre
os que a possuem e a cultivem. (MAZZA, 2011)
do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração
da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos. 20
§ 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art.
5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de
quinze por cento. 21
Art. 8o Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a
obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel,
com pagamento em títulos da dívida pública.
§ 1o Os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federal e serão resgatados no prazo de até
dez anos, em prestações anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de
seis por cento ao ano.
Art. 182, §4º, III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente
aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas,
assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
16
16
A Constituição Federal, em seu artigo 18522
proíbe expressamente a desapropriação de
propriedades produtivas e da pequena e média propriedade rural, desde que seu proprietário
não possua outra. Verificamos aqui algumas peculiaridades da lei acerca da desapropriação
para fins de reforma agrária:
Uma propriedade pode não estar cumprindo sua função social e não vir a ser
desapropriada, pois a Constituição proíbe a desapropriação de propriedades produtivas.
A pequena e média propriedade rural podem ser desapropriadas, desde que seu
proprietário possua outra, afastando aquela imagem de que somente os grandes latifúndios são
objeto de desapropriação para fins de reforma agrária. DI PIETRO, 2009, MAZZA, 2011)
O pagamento dessa espécie de desapropriação é feito em títulos da dívida agrária,
resgatáveis em até 20 anos23, sendo que o pagamento das benfeitorias úteis e necessárias
deverá ser feito em dinheiro24. (DI PIETRO, 2009)
2.1.4.2.3 Desapropriação confisco
Esta modalidade de “desapropriação” possui previsão legal no artigo 243 da
Constituição Federal, e como tal é denominada de confisco, pois não prevê nenhum tipo de
indenização ao expropriado. Prevê o dispositivo constitucional: “As glebas de qualquer região
do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente
expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de
produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem
prejuízo de outras sanções previstas em lei.” (CARVALHO FILHO, 2009)
Esclarece Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009), não é qualquer cultura de plantas
psicotrópicas que enseja a esse tipo de desapropriação, mas apenas aquelas que sejam ilícitas,
incluídas no rol elencado pelo Ministério da Saúde. De acordo com o parágrafo único do art.
2º da lei 8.257/91, a autorização para a cultura de plantas psicotrópicas será concedida pelo
órgão competente do Ministério da Saúde, atendendo exclusivamente a finalidades
terapêuticas e científicas.
22
Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:
I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;
II - a propriedade produtiva. 23
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que
não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com
cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua
emissão, e cuja utilização será definida em lei. 24
§ 1º - As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.
17
17
Ainda aduz a autora que no parágrafo único do artigo 243 da CF/88, prevê o confisco
de todo e qualquer bem que possua valor econômico e venha ser apreendido em decorrência
do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o qual deverá ser revertido para instituições
e pessoal especializado no tratamento e recuperação de viciados e no aparelhamento e custeio
de atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas
substâncias. (DI PIETRO, 2009)
2.1.4.3 Desapropriação Indireta
Nas sábias palavras do mestre Hely Lopes Meirelles (2009), trata-se esbulho da
propriedade particular e como tal não encontra suporte jurídico ou legal. Trata-se de uma
desapropriação de fato, entretanto uma vez dado destinação publica ao bem “desapropriado”,
somente cabe ao particular buscar uma indenização por perdas e danos, sendo insuscetível de
reintegração.
Aduz ainda Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009) que a desapropriação indireta é
aquela que se realiza sem a observância do procedimento legal, por tal razão costuma ser
equiparado ao esbulho, motivo pelo qual cabem as ações possessórias para evitar a destinação
pública do bem esbulhado. Adverte, entretanto a autora que se o particular nada fizer para
impedir a realização da obra em sua propriedade, e esta venha ter uma destinação pública, não
poderá mais reivindicar o bem esbulhado25
, cabendo-lhe apenas mover a ação pertinente para
o caso em tela, que seria a ação de indenização por desapropriação indireta.
Alexandre Mazza (2011) sustenta a mesma posição em sua obra, afirmando ser a
desapropriação indireta uma espécie de esbulho possessório praticado pelo Estado, que invade
área particular sem contraditório ou indenização. Tal modalidade de desapropriação encontra
proibição expressa na Lei Complementar nº 101/200026
.
Sustenta ainda o ilustre autor que ao proprietário cabe a ação judicial de indenização
por desapropriação indireta, sendo que o prazo prescricional para tal ação é de quinze anos,
mesmo prazo previsto pelo Código Civil de 2002 para a usucapião extraordinária, pois se
ultrapassado tal prazo, o Estado estiver com a posse mansa e pacífica caberá a este propor a
ação de usucapião visando adquirir a propriedade do bem para si. (MAZZA, 2009)
25
Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de
reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada
procedente, resolver-se-á em perdas e danos. 26
Art. 46. É nulo de pleno direito ato de desapropriação de imóvel urbano expedido sem o atendimento do
disposto no § 3o do art. 182 da Constituição, ou prévio depósito judicial do valor da indenização.
18
18
2.1.4.4 Desapropriação por zona
Possui previsão expressa no artigo 4º do Decreto-lei nº 3.365/4127
e permite a
ampliação da expropriação às áreas que se valorizem extraordinariamente em decorrência da
realização de alguma obra ou serviço público. Tais áreas, segundo o autor, poderão ser
vendidas a terceiros, visando à obtenção de recursos financeiros, satisfazendo assim o
chamado interesse público secundário. Importante mencionar que o decreto expropriatório
deve mencionar quais áreas serão expropriadas e quais serão consideradas excedentes, sob
pena de nulidade do decreto expropriatório. (MEIRELLES, 2009)
No mesmo sentido se manifesta Alexandre Mazza (2011), ao afirmar que a
desapropriação por zona é aquela que recai sobre área maior do que a necessária, visando
absorver futura valorização dos imóveis vizinhos em decorrência da obra realizada.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009) apresenta em sua obra as seguintes
características da desapropriação por zona, a saber: abrange área contígua necessária ao
desenvolvimento posterior da obra a que se destine; ou as zonas que se valorizarem
extraordinariamente em conseqüência da realização do serviço.
2.1.5 Objeto da desapropriação
Para Diógenes Gasparini (2011) todo e qualquer objeto que tenha valor econômico
pode ser objeto de expropriação pelo Estado, desde que não proibido por lei, como, por
exemplo, os bens públicos da União, que são inexpropriáveis por força de lei. O ilustre autor
se fundamenta no disposto no artigo 2º do Decreto-Lei 3.365/41 que assim prevê “mediante
declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União,
Estados, Municípios e Distrito Federal.
No mesmo sentido temos a opinião de Carvalho Filho (2009) para tal autor pode ser
objeto de desapropriação qualquer bem que possua valoração patrimonial conforme
consignado no art. 2º da Lei Geral de Desapropriações. Defende, assim, que são expropriáveis
bens móveis, bens imóveis, bens corpóreos e bens incorpóreos, como por exemplo, as coes
de determinada empresa.
Já Alexandre Mazza (2011), também com base no art. 2º do Decreto-Lei 3.365/41, vai
além tal autor prevê que a força expropriante do Estado pode recair sobre: a) bens imóveis, b)
27
Art. 4º A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se
destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em conseqüência da realização do serviço. Em
qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis
à continuação da obra e as que se destinam à revenda.
19
19
bens móveis, c) semoventes, d) posse, e) usufruto, f) domínio útil, g) subsolo, h) espaço
aéreo, i) águas, j) ações de determinada empresa, k) bens públicos, l) cadáveres.
2.1.6 Bens insuscetíveis de desapropriação
Para Carvalho Filho (2009), as exceções a força expropriante se divide em duas
categorias, as chamadas impossibilidades jurídicas e as impossibilidades materiais.
Concluindo o autor, as impossibilidades jurídicas são aquelas previstas na própria lei
como uma espécie de barreira a força expropriante do Estado, como exemplo podemos citar o
art. 185 da Constituição Federal que prevê que a propriedade produtiva não pode ser objeto de
reforma agrária. Já as impossibilidades materiais decorrem da própria natureza de certos
bens, que se tornam inviáveis de serem desapropriados, como, por exemplo, a moeda
corrente, pois se trata do próprio meio de pagamento da indenização, os direitos
personalíssimos como a honra, a liberdade, a cidadania e as pessoas jurídicas por serem
sujeitos e não objetos de direitos.
Alexandre Mazza (2011) em sua obra prevê que a regra geral é a desapropriação,
somente em casos especialíssimos encontramos alguns bens que não estão sujeitos à força
expropriante do Estado, tornando-se assim insuscetíveis de desapropriação, dentre eles: a)
dinheiro, b) direitos personalíssimos, c) pessoas, d) órgãos humanos, e) desapropriação para
reforma agrária: pequena e média propriedade assim definida em lei, assim como a
propriedade produtiva.
2.1.7 Retrocessão
O instituto da retrocessão seja talvez, na desapropriação um dos objetos de maior
discussão na doutrina acerca da natureza jurídica de tal instituto, a doutrina varia muito sobre
tal tema, sendo que atualmente existem três correntes acerca do tema, sendo uma a mais
amplamente utilizada pela jurisprudência, mas senão vejamos.
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009) o instituto da retrocessão nada mais é
do que o direito que tem o expropriado de exigir de volta seu imóvel caso o mesmo não tenha
o destino previsto no decreto expropriatório que o desapropriou.
Em sua obra, Hely Lopes Meirelles (2009) aduz que a retrocessão trata-se de uma
obrigação imposta ao expropriante de oferecer o bem ao expropriado, mediante devolução do
valor da indenização, quando se verificar que não houve a destinação prevista no decreto
expropriatório.
20
20
No mesmo sentido verificamos que se posiciona Alexandre Mazza (2011) ao afirmar
que a retrocessão trata-se de uma reversão do procedimento expropriatório, devolvendo-se o
bem ao antigo dono, pelo preço atual, se não lhe for atribuída uma destinação pública.
Atualmente, praticamente toda a doutrina é uníssona ao afirmar que o Código Civil de
2002 regulou o tema da retrocessão em seu artigo 519, a saber: “Se a coisa expropriada para
fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não tiver o destino para que
se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado
direito de preferência, pelo preço atual da coisa.” (CARVALHO FILHO 2009, DI PIETRO,
2009, MAZZA, 2009, MEIRELLES, 2009)
Questão interessante, conforme dito anteriormente acima é a respeito da natureza
jurídica da retrocessão se esta possui natureza real ou pessoal. Explica Alexandre Mazza
(2011) que os defensores da corrente que trata a retrocessão ser de natureza real, permitiria ao
antigo proprietário exercer o direito de seqüela sobre o imóvel, ou seja, de persegui-lo onde
quer que se encontre além do fato de tal direito transmitir-se aos herdeiros, sucessores e
cessionários. Porém tal posição é minoritária, continua o autor, sendo que atualmente a
posição majoritária defende possuir a retrocessão direito de natureza pessoal, de o antigo
proprietário adquirir o bem caso este não receba uma destinação pelo poder expropriante.
Hely Lopes Meirelles (2009) afirma a retrocessão ser uma obrigação pessoal de
devolver o bem ao expropriado (direito de preferência) quando não se verificar o destino
previsto no decreto expropriatório, caso o expropriante não observe tal disposição caberá ao
expropriado pleitear perdas e danos28
.
Em posição contraditória encontramos Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Celso Antônio
Bandeira de Mello (2009), que defendem a tese da retrocessão possuir natureza real, o que
permitiria o expropriado reivindicar o próprio bem expropriado. Aduz a autora que o Código
Civil não poderia infringir um dispositivo constitucional (art. 5º, XXIV), sendo que, caso o
bem não venha a receber uma destinação pública, desaparece a justificativa para a alienação
forçada. (DI PIETRO, 2009)
Não obstante, vejamos o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça acerca de
tema tão relevante:
RECURSO ESPECIAL - RETROCESSÃO - DESVIO DE FINALIDADE
PÚBLICA DE PARTE DO BEM DESAPROPRIADO - CONDENAÇÃO DO
28
Decreto-lei 3.365/41 – Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem
ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação,
julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.
21
21
MUNICÍPIO RECORRIDO AO PAGAMENTO DE PERDAS E DANOS -
MATÉRIA DE DIREITO - RECURSO ESPECIAL PROVIDO. Cuida-se de ação
ordinária de retrocessão, com pedido alternativo de indenização por perdas e danos,
contra o Município de Maria da Fé-MG, ao fundamento de que parte da área
expropriada não foi aplicada à qualquer finalidade pública. Acerca da polêmica
existente na caracterização da natureza jurídica da retrocessão, há três correntes
principais existentes: a que entende que retrocessão é uma obrigação pessoal de
devolver o bem ao expropriado; a que caracteriza a retrocessão como direito real,
direito à reivindicação do imóvel expropriado; e a que considera existente um direito
de natureza mista (pessoal e real), cabendo ao expropriado a ação de preempção ou
preferência (de natureza real) ou, se preferir, perdas e danos. Na lição de Celso
Antônio Bandeira de Mello, harmônica com a jurisprudência pacífica desta egrégia
Corte, "o pressuposto do instituto da retrocessão (seja concebida como mero direito
de preferência, seja como direito real) só tem lugar quando o bem foi desapropriado
inutilmente". Dessa forma, não cabe a retrocessão se ao bem expropriado foi dada
outra utilidade pública diversa da mencionada no ato expropriatório. In casu, porém,
do exame acurado dos autos ficou demonstrado o desvio de finalidade de parcela do
bem expropriado, que restou em parte abandonado, foi destinado a pastagens e à
plantação de hortas, sem restar caracterizada qualquer destinação pública. Como
bem ressaltou o r. Juízo de primeiro grau, "pelo exame da prova coligada nos
presentes autos, entendo-se esta pelo laudo pericial e depoimentos testemunhais, vê-
se que, de fato a área remanescente do imóvel desapropriado não foi utilizada pelo
Poder Público, ou seja, àquela área não fora dada destinação pública, ainda que
diversa da que ensejou o processo expropriatório". No mesmo diapasão, o d. Parquet
estadual concluiu que se caracteriza, "claramente, o desvio de finalidade na conduta
do Administrador Público que, além de desapropriar área infinitivamente maior do
que a efetivamente utilizada, ainda permitiu que particulares dela usufruíssem,
prejudicando, à evidência, o direito dos autores". Este signatário filia-se à corrente
segundo a qual a retrocessão é um direito real. Na espécie, contudo, determinar a
retrocessão da parte da propriedade não destinada à finalidade pública, nesta via
extraordinária, em que não se sabe seu atual estado, seria por demais temerário.
Dessa forma, o município recorrido deve arcar com perdas e danos, a serem
calculados em liqüidação por arbitramento. A hipótese vertente não trata de matéria
puramente de fato. Em verdade, cuida-se de qualificação jurídica dos fatos, que se
não confunde com matéria de fato. Recurso especial provido em parte, para
determinar a indenização por perdas e danos da área de 44.981 m2, que não foi
aplicada a qualquer finalidade pública. Superior Tribunal de Justiça; Processo:
REsp 570483 MG 2003/0074207-6; Relator(a): Ministro FRANCIULLI
NETTO; Julgamento: 08/03/2004; Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA;
Publicação: DJ 30.06.2004 p. 316; RSTJ vol. 191 p. 215.
2.1.8 Desvio de finalidade e tredestinação lícita
O desvio de finalidade na desapropriação recebe o nome de tredestinação que
conforme explica Carvalho Filho (2009, p. 841), significa “destinação desconforme com o
plano inicialmente previsto.” Ou seja, o Estado atuando de maneira ilícita, transfere a terceiro
o bem desapropriado, permitindo que alguém se beneficie com esta transação, ignorando o
previsto no decreto expropriatório. Ocorre um desvio de finalidade no exercício do ato
administrativo, pois inexiste utilidade/necessidade pública ou o interesse social, e uma
vontade de beneficiar terceiro determinado em detrimento do sacrifício de outrem.
22
22
Bastante elucidativa a posição de Hely Lopes Meirelles (2009, p. 628) sobre a questão
da tresdestinação, pois segundo o autor o desvio de finalidade se consolida na “necessidade
ou utilidade pública do bem para fins administrativos ou no interesse social da propriedade
para ser explorada ou utilizada em prol da comunidade, é o fundamento legitimador da
desapropriação”. Continua ainda o autor defendendo a impossibilidade de haver expropriação
para beneficiar interesse privado de pessoa natural ou entidade particular onde não estejam
presentes os pressupostos da utilidade ou necessidade pública e do interesse social.
Explica ainda que o desvio de finalidade possui expressa previsão legal, que se
encontra no parágrafo único, alínea “e”, do artigo 2º da lei nº 4.717/6529
, onde o desvio de
finalidade é causa expressa de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público que são
combatidos via ação popular. (MEIRELLES, 2009) Aduz inclusive ilustre autor sobre a
possibilidade de ocorrência do chamado desvio de finalidade lícito, mais conhecido como
tredestinação lícita:
O desvio de finalidade ocorre, na desapropriação, quando o bem expropriado para
um fim é empregado noutro sem utilidade pública ou interesse social. Daí o chamar-
se, vulgarmente, a essa mudança de destinação, tredestinação (o correto seria
tresdestinação, no sentido de desvio de destinação), para indicar o mau emprego do
bem expropriado. Mas deve-se entender que a finalidade pública é sempre genérica
e, por isso, o bem desapropriado para um fim público pode ser usado em outro fim
público sem que ocorra o desvio de finalidade. Exemplificando: um terreno
desapropriado para escola pública poderá, legitimamente, ser utilizado para
construção de um pronto-socorro público sem que isto importe desvio de finalidade,
mas não poderá ser alienado a uma organização privada para nele edificar uma
escola ou um hospital particular, porque a estes faltaria finalidade pública
justificadora do ato expropriatório (MEIRELLES, 2009, p. 629)
Aliás, no mesmo sentido já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça, uma vez que
conforme brilhantemente explicado acima por Hely Lopes Meirelles, a finalidade pública é
sempre genérica, sendo que esta de maneira alguma é absoluta, devendo moldar-se aos
anseios da coletividade.
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR
UTILIDADE PÚBLICA. AÇÃO DE RETROCESSÃO. DESTINAÇÃO DIVERSA
DO IMÓVEL. PRESERVAÇÃO DA FINALIDADE PÚBLICA.
TREDESTINAÇÃO LÍCITA. 1. Não há falar em retrocessão se ao bem expropriado
for dada destinação que atende ao interesse público, ainda que diversa da
inicialmente prevista no decreto expropriatório. 2. A Primeira Turma desta Corte,
no julgamento do REsp 710.065/SP (Rel. Min. José Delgado, DJ de 6.6.2005),
firmou a orientação de que a afetação da área poligonal da extinta "Vila Parisi" e
áreas contíguas (localizadas no Município de Cubatão/SP) — cuja destinação inicial
era a implantação de um parque ecológico —, para a instalação de um pólo
Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: e) o desvio de
finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou
implicitamente, na regra de competência.
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industrial metal-mecânico, um terminal intermodal de cargas rodoviário, um centro
de pesquisas ambientais, um posto de abastecimento de combustíveis, um centro
comercial com 32 módulos de 32 metros cada, um estacionamento, e um
restaurante/lanchonete, atingiu, de qualquer modo, a finalidade pública inerente às
desapropriações. 3. Recurso especial desprovido. RECURSO ESPECIAL Nº
968.414 - SP (2007/0157034-6), RELATORA: MINISTRA DENISE ARRUDA,
RECORRENTE: PEDRO PEREIRA DE SOUSA E CÔNJUGE, ADVOGADO:
JOSÉ EDGARD DA SILVA JUNIOR E OUTRO(S) RECORRIDO: MUNICÍPIO
DE CUBATÃO, ADVOGADO: FÁBIA MARGARIDO ALENCAR DALÉSSIO E
OUTRO(S).
2.1.9 Prazo de caducidade
Quando se trata de desapropriação verificamos a existência de diversos prazos
prescricionais, a saber:
Na desapropriação por interesse social, prevista na lei nº 4.132/62, seu artigo 3º
estabelece que tal modalidade de desapropriação possui prazo de caducidade é de dois anos30;
Já na desapropriação para reforma agrária prevista na lei nº 8.629, em seu artigo 16, o
prazo de caducidade31 é de três anos;
Na desapropriação urbanística, prevista na lei nº 10.257/01 o Município tem o prazo
de cinco anos32 para proceder ao aproveitamento do imóvel, caso não se verifique o
cumprimento de tal prazo, cabe ao expropriado a retrocessão. (DI PIETRO, 2009)
Na desapropriação indireta predomina o entendimento de que o prazo prescricional
para a propositura da ação de indenização por desapropriação indireta se dá em quinze anos,
sendo este o mesmo prazo previsto para a usucapião extraordinária. (MAZZA, 2011)
Nos demais casos, a prescrição se dá em cinco anos, conforme previsto expressamente
no artigo 10º do Decreto-lei nº 3.365/41 (DI PIETRO, 2009)
2.1.10 Imissão provisória na posse
Como normalmente a desapropriação é uma manifestação da Supremacia do Interesse
Coletivo sobre o privado, muitas vezes se faz necessário desde logo penetrar no imóvel,
quando não muito a situação de urgência seja tão premente que o Poder Público não pode
aguardar todo o trâmite da ação expropriatória. Nestes casos a legislação admite a figura da
30
Art. 3º O expropriante tem o prazo de 2 (dois) anos, a partir da decretação da desapropriação por interesse
social, para efetivar a aludida desapropriação e iniciar as providências de aproveitamento do bem expropriado. 31
Art. 16. Efetuada a desapropriação, o órgão expropriante, dentro do prazo de 3 (três) anos, contados da data
de registro do título translativo de domínio, destinará a respectiva área aos beneficiários da reforma agrária,
admitindo-se, para tanto, formas de exploração individual, condominial, cooperativa, associativa ou mista. 32
Art. 8o Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a
obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel,
com pagamento em títulos da dívida pública.
§ 4o O Município procederá ao adequado aproveitamento do imóvel no prazo máximo de cinco anos, contado a
partir da sua incorporação ao patrimônio público.
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imissão provisória na posse, situação em que o Poder público é imitido na posse antes mesmo
do término da ação expropriatória. Além dele, encontramos expressa previsão legal na lei
geral das desapropriações, que prevê a possibilidade de imissão provisória na posse em seu
artigo 1533
. (CARVALHO FILHO, 2009)
Inclusive prevê a lei geral de desapropriações que poderá ocorrer à imissão provisória
na posse, independente de citação do réu, encontramos tal previsão no artigo 15, parágrafo
1º34
, sendo que não há que se falar em ilegalidade de tal dispositivo ou não recepção pela
nossa Constituição Federal, uma vez que o próprio STF editou súmula neste sentido, a STF
Súmula nº 652 de 24/09/2003 que assim prevê: “Não contraria a Constituição o art. 15, § 1º,
do Dl. 3.365/41 (Lei da Desapropriação por utilidade pública).” (MEIRELLES, 2009)
2.1.11 Indenização justa e prévia, juros moratórios e juros compensatórios
O pagamento da desapropriação deve se dar através de uma indenização justa prévia e
em dinheiro, esta é a regra nas desapropriações, com exceção dos casos onde o pagamento é
feito com títulos da dívida (publica ou agrária). Assim necessário determinar o conceito de
justa indenização. Segundo Hely Lopes Meirelles (2009), indenização justa é aquela onde o
valor aferido corresponde ao valor real do bem expropriado, abrangendo também os danos
emergentes e lucros cessantes. Prévia porque deve ser paga antes da definitiva perda da
propriedade. (MAZZA, 2011)
Os juros compensatórios, segundo o autor, são devidos desde a efetiva ocupação do
imóvel (imissão na posse), e calculados na base de 12% ao ano. Já os juros moratórios
somente serão devidos se houver atraso no pagamento da condenação, por tal motivo esses
juros são cumuláveis, uma vez que se destinam a indenizações diferentes, sendo que os
compensatórios cobrem lucros cessantes pela ocupação do bem, já os juros moratórios
destinam-se a cobrir a renda do dinheiro não pago no tempo devido. (MEIRELLES, 2009)
Os juros moratórios são devidos na proporção de 6% ao ano, contados a partir de 1º de
janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ter sido feito. (MAZZA,
2011)
3 CONCLUSÃO
Pretendeu-se com a presente pesquisa proporcionar uma exposição geral e resumida,
mas ao mesmo tempo objetiva e edificante sobre o instituto da desapropriação e suas
33
Art. 15. Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o art. 685 do
Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens; 34
§ 1º A imissão provisória poderá ser feita, independente da citação do réu, mediante o depósito:
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principais características presentes em nosso ordenamento jurídico atual. Visando obter tais
resultados, optou-se por uma descrição dos principais tópicos existentes no instituto, desde
sua definição, passando pelo “nascimento” do instituto em nosso ordenamento jurídico,
passando por sua competência, as espécies de desapropriação, a possibilidade de imissão
provisória na posse, até mesmo o instituto da retrocessão. O resultado obtido com a pesquisa
satisfaz os requisitos mínimos que o tema abarca, devido à tamanha extensão do instituto em
todos seus aspectos, constituindo em uma referência ao leitor que procura uma rápida leitura
sobre o tema da desapropriação, e também constitui de base de estudos para o leitor de prcra
aprofundar suas pesquisas em tema tão fascinante.
4 REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Edmir Netto de - Curso de Direito Administrativo / Edmir Netto de Araújo. - 5.
ed. - São Paulo: Saraiva, 2010.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio – Curso de Direito Administrativo / Celso
Antônio Bandeira de Mello – 26 ed. – São Paulo: Malheiros, 2009.
CARVALHO FILHO, José Dos Santos - Manual de Direito Administrativo / José dos
Santos Carvalho Filho. - 22. ed. - Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella - Direito Administrativo / Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
- 22. ed. - São Paulo: Atlas, 2009.
DA SILVA, Edson Jacinto – Desapropriação no Direito Positivo Teoria – Legislação
Jurisprudência / Edson Jacinto da Silva – Editora de Direito, 1998.
GASPARINI, Diogenes - Direito Administrativo / Diógenes Gasparini. - 16ª ed. Atualizada
por Fabrício Motta - São Paulo: Saraiva, 2011.
JUSTEN FILHO, Marçal - Curso de Direito Administrativo / Marçal Justen Filho. - 4. ed.
rev. e atual. - São Paulo : Saraiva, 2009.
MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo / Alexandre Mazza. - São Paulo:
Saraiva, 2011.
MEIRELLES, Hely Lopes - Direito Administrativo Brasileiro / Hely Lopes Meirelles. - 35.
ed. - São Paulo: Malheiros, 2009.