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Revista da Escola de Administração - UFRGS - ano 3 - n o 8 Revista da Escola de Administração - UFRGS - ano 3 - n o 8 O JOGO DO AVANÇO

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R e v i s t a d a E s c o l a d e A d m i n i s t r a ç ã o - U F R G S - a n o 3 - n o 8R e v i s t a d a E s c o l a d e A d m i n i s t r a ç ã o - U F R G S - a n o 3 - n o 8

O JOGO DOAVANÇO

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n e s t e n ú m e r o

3 E d i t o r i a lA chave do progressoPor João Luiz BeckerDiretor da EA/UFRGS

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17 G e s t ã oLuxo ou requisito básico?Por Paulo A. Zawislak

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204 F a t o s & O f í c i o sUniversidades gaúchasdiscutem sustentabilidade

CAPAO JOGODO AVANÇO

ADMINISTRAÇÃO NO MILÊNIO é uma publicação da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande doSul Tiragem: 5.000 exemplares | Endereço: Rua Washington Luiz, 855 - Porto Alegre - RS - Brasil - CEP 90010 - 460Fone: (51) 3316.3536 | Fax: (51) 3316.3991 | Homepage: www.ea.ufrgs.br | E-mail: [email protected]: Prof. João Luiz Becker | Vice-diretor: Prof. Paulo César Delayti Motta | Diretor CEPA: Prof. FernandoBins Luce | Vice-diretor: Luiz Carlos Ritter Lund | Coordenador PPGA: Prof. Paulo Antônio Zawislak | Coordenadora-substituta: Profa. Edi Madalena Fracasso | Coordenação de Comunicação Social: Prof. Roberto Lamb e MárciaBarcelos Silva | Produção e edição: Anamara Bolsson Reportagem: Sílvia Lisboa | Fotos: Gil Cafrune Gosch |Diagramação: Luciano Seade | Impressão: Nova Prova |

F i n a n ç a s

P e s q u i s aUm avanço para a agriculturaPor José Antônio Martinellie Luiz Carlos Federizzi

T e c n o l o g i aLaboratório inova em pesquisaPor Lírio Shaeffer

Capa: Montagem de Luciano Seade sobre fotos de Gil C. Gosch

6Inovar éo desafio

Dominar o riscoPor Roberto Lamb

12 P e r f i lA escolhada Soprano

22 D e s e n v o l v i m e n t oCapital estrangeiro e inovaçãoPor Dirk Boehe

E n t r e v i s t aEduardo Campos, Ministro daCiência e da Tecnologia

19 C o m u n i d a d eResidência social para o 3º setorPor Rosinha Machado Carrion

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A chave do progressoCaros le i tores ,

É inegável que o progresso é movido pela inovação. Perío-dos históricos se delimitam por conquistas impulsionadas porações inovadoras. As navegações marítimas e a expansão mer-cantil na Idade Média, assim como as revoluções industriaisocorridas nos séculos XVIII e XIX são exemplos eloqüentes. Oque dizer, então, da revolução da eletrônica no século XX, quecatapultou a humanidade ao futuro em pouco mais de uma dé-cada? A mola mestra do desenvolvimento científico, econômicoe social, portanto, é a inovação.

A universidade moderna tem papel relevante neste cenário.Estimula e fomenta a inovação, estuda e pesquisa os processos eapresenta também seus resultados. Na Escola de Administraçãoda UFRGS a pesquisa sobre o tema ensejou, ainda na década de90, a criação do Núcleo de Gestão da Inovação Tecnológica (Nitec),reunindo professores e alunos com o objetivo de ampliar conheci-mento e apoiar novos estudos e iniciativas. No curso de gradua-ção, a inclusão da disciplina Gestão da Inovação possibilita aosfuturos administradores o embasamento teórico necessário parao gerenciamento de novas oportunidades e negócios nas empre-sas. Recentemente, foi criada a Residência Social, uma oportuni-dade de os alunos de graduação exercitarem seu aprendizado nagestão de instituições voltadas ao terceiro setor. É pioneiro no RS,inédito no país.

Com sua postura sempre inovadora, a EA, responsável tam-bém pela primeira iniciativa de formação continuada no Estado,

e d i t o r i a l

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desenvolvendo o hoje tradicional modelo de curso de pós-gra-duação lato sensu, e pioneira na criação do mestrado profissio-nal e interinstitucional, demonstra a inquietação e a busca inces-sante pelo avanço, objetivo de toda ação empreendedora. Não éum movimento isolado na Universidade Federal do Rio Grandedo Sul. Nesta edição, dois relevantes artigos comprovam a con-tribuição da Faculdade de Agronomia e da Escola de Engenhariapara o aperfeiçoamento da produção. As pesquisas e os resulta-dos obtidos por aquelas unidades acadêmicas da UFRGS sãoabsolutamente inovadores. São apenas dois exemplos, há muitomais.

Diante desta constatação, e em um momento em que o paísse prepara para ver aprovada sua primeira Lei da Inovação, nadamais oportuno do que abordar o assunto e buscar exemplos desucesso, idéias brilhantes que não vingaram, descobrir os entra-ves e as dificuldades enfrentadas pelas empresas para inovarem.Uma vez observado por diferentes prismas, o assunto mereciaser ainda mais aprofundado. Foi o que fizemos. Uma entrevistaexclusiva com o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Cam-pos nas próximas páginas desta Administração do Milênio aque-ce o debate sobre inovação, um antigo assunto sempre em vogaquando o objetivo é o progresso e o crescimento.

Boa leitura!Prof. João Luiz Becker

Diretor da EA/UFRGS

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f a t o s & o f í c i o s

CANADENSE DÁ AULA INAUGURAL NA ESCOLAA aula inaugural do segundo semes-

tre na Escola de Administração daUFRGS, realizada em 23 de agosto pas-sada, foi ministrada por uma das maioresautoridades em trabalho e estresse da atu-alidade. Estelle Morin, doutora em Psico-logia do Trabalho pela Universidade deMontreal e professora titular da HEC, noCanadá, falou sobre “O Sentido do Tra-balho nos Tempos Modernos”. Em suaapresentação destacou a necessidade deo trabalho individual contribuir com a so-ciedade, ser moralmente correto, dar aprazer a quem o executa, garantir auto-nomia nas decisões, ser reconhecido epossibilitar relacionamentos positivos.

O público, formado por calouros, alu-nos de graduação, pós-graduação e pro-fessores, acompanhou o debate que seseguiu à palestra, com a participação dasdoutoras Maria José Tonelli, da PUC-SP e Valmíria Piccinini, professora da EAe coordenadora do Grupo Interdisciplinarde Estudos da Inovação e do Trabalho(GINEIT). Estelle Morin é fundadora doCentro de Pesquisa e de Intervenção peloTrabalho, Eficiência Organizacional eSaúde (CRITEOS), no Canadá, mem-

ABERTA SELEÇÃO PARAMESTRADO E DOUTORADO

O Programa de Pós-Graduação (PPGA) da Escola de Administraçãoda Universidade Federal do Rio Grande do Sul vai receber, entre 13 e 29de outubro próximo, inscrições de candidatos para a seleção aos cursos demestrado acadêmico e doutorado, que se iniciam em 2005. Para participaré necessário a aprovação e obtido, no mínimo 300 pontos no Teste daANPAD. As entrevistas se realizarão entre 22 e 30 de novembro e serãochamados os melhores classificados por área no Teste da ANPAD emlimite a ser definido por cada uma das áreas. O resultado final, com adivulgação dos candidatos selecionados, está previsto para 15 de dezem-bro. Mais informações nos sites http://www.ppga.ufrgs.br/pos_graduacao/mestrado/academico/mestr.acad.asp ou http://www.ppga.ufrgs.br/pos_graduacao/doutorado/doutorado.asp

Candidatos interessados em obter isenção de taxa de inscrição (R$ 65)deverão preencher formulário específico na Secretaria do Programa dePós-Graduação da EA, Rua Washington Luis, 855, no período de 1° a 8 deoutubro, das 9 às 12h, e das 14 às 17h. Mais informações pelo fone (51)3316-3536.

Estelle Morin falou sobre ot rabalho na atual idade

bro do Comitê Diretor da Rede de Saú-de e da Segurança no Trabalho, deQuebec, e do Conselho da AssociaçãoCanadense para a Pesquisa sobre o Tra-balho e a Saúde (CARWH). Tem diver-

sos livros publicados e artigos. Juntamen-te com as professoras Valmíria e MariaJosé integra a rede internacional que re-aliza pesquisas sobre trabalho no Brasile no Canadá.

SEMINÁRIOEM BOSTON

O diretor da Escola de Adminis-tração, professor João Luiz Becker,participou em agosto passado emBoston, EUA, do Colloquium onParticipant Centered Learning(CPCL) na Harvard Business School.O seminário, com duração de umasemana, abordou o método de ensinopor casos, seu uso em sala de aula ea forma de escrever um bom caso.

A EA participa anualmente des-se encontro com o objetivo deoportunizar a atualização permanentede seu corpo docente e como formade ampliar o leque de alternativas di-dáticas e pedagógicas. Em 2003, oprofessor Luís Felipe Nascimentoparticipou como representante da Es-cola de Administração.

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f a t o s & o f í c i o s

A Coordenação Geral de Coo-peração Internacional da CAPESe o Fund for the Improvement ofPostsecondary Education - FIPSE,Departamento de Educação dosEstados Unidos, aprovou projeto doprofessor Antonio Carlos GastaudMaçada, da Escola de Administra-ção da UFRGS, para intercâmbiode alunos de graduação. A partirde 2005, alunos da EA poderão plei-tear bolsas de estudos naUniversity of North Carolina atWilmington, Florida AtlanticUniversity e College of Charleston,e alunos norte-americanos virão es-tudar na Escola de Administração.

BOLSAS PARAGRADUAÇÃONOS EUA

SEPARANDO O JOIO DO TRIGOOs cursos de MBA no Brasil estão sob discussão desde junho último. Um

grupo de instituições de primeira linha, públicas e privadas, entre as quais a Escolade Administração da UFRGS, criou a Associação Nacional dos MBA (Anamba).A entidade está definindo critérios básicos de avaliação, como grade curricular,qualificação de professores e carga horária para conferir um selo de qualidadeaos cursos que atenderem aos requisitos mínimos. Por falta de regulamentaçãono Brasil qualquer curso de pós-graduação brasileiro pode ser qualificado comoMBA, sem que tenha nenhuma similaridade com o tipo de programa desenvolvi-do nas melhores escolas dos Estados Unidos e da Europa. Entre as entidadesparticipantes da Anamba estão Ibmec Educacional, Fundação Instituto de Admi-nistração (FIA) da USP, ESPM, FISP, CEDEP e Escola de Administração daUFRGS, representada pelo professor Paulo Zawislak, coordenador do Programade Pós-Graduação.

Um evento inédito reúne as oito mai-ores universidades gaúchas no próximodia oito de setembro em Porto Alegre.A conferência “A Universidade Frenteaos Desafios da Sustentabilidade - UmDebate sobre a Construção do Futuro”,vai contar com a participação do Minis-tro da Educação, Tarso Genro, do Se-cretário Executivo do Ministério do MeioAmbiente, Cláudio Langone, da reitorada UFRGS, Wrana Panizzi e da consul-tora da Unesco, Debra Rowe, daOakland Community College, EUA.

O objetivo da conferência é discutira inclusão do desenvolvimento sustentá-vel como uma das missões da universi-dade. “Será que nossos alunos estão pre-parados para promover o desenvolvimen-to sustentável ou repetem velhos mode-los?”, indaga o organizador do evento,professor Luis Felipe Nascimento, daEscola de Administração da UFRGS.Segundo ele, é necessário alterar as prá-ticas sobre o assunto nas universidades.

Participam da conferência comopainelistas Naná Medina, Fernando

UNIVERSIDADES GAÚCHAS VÃODEBATER SUSTENTABILIDADE

Almeida, Ronaldo Motta, MarcosSorrentino, Arthur Shaker e FernandoAlmeida, estudiosos e representantes deentidades que defendem o desenvolvi-mento sustentável.

O outro objetivo do encontro é inse-rir as instituições de ensino superior doEstado na campanha da Unesco, “Dé-cada da Educação para aSustentabilidade”, que será desenvolvi-da globalmente entre 2005 e 2014.

O evento é uma iniciativa do Núcleode Inovação Tecnológica – GestãoAmbiental (Nitec-GA) da Escola de Ad-ministração e do Grupo Interdisciplinarde Gestão Ambiental (Giga) da UFRGSe tem a participação da Feevale, Pucrs,UCS, Uergs, Ufsm, Unisc, Unisinos eUnivates. O apoio institucional é daUnesco, Cebds, Federação das Indús-trias do RS e do Senai/RS e o patrocínioda Finep, CNPq, Copesul e Refap.

Uma exposição de posters sobreEducação, Meio Ambiente eSustentabilidade e a divulgação dos ven-cedores do Concurso Fotográfico “Per-

FALHA NOSSAEm 2004, iniciaram o Mestrado Profissional na Escola de Administração daUFRGS executivos das empresas: Amapá do Sul, Sonae, Telet, Springer Carrier,Fockink, Vantage, HP, CGD, Agências Marítima Orion, GVT, Gens, BancoMatone, Bertolini, Distribuidora de Livros D. Quixote, Worldstudy, Ibase, Peri-tos Associados, Itaipu Binacional, Maxiquim e Calçados Bibi, diferentementedo divulgado na edição de outono da revista Administração do Milênio.

Nascimento coordena oevento, que tem o apoioda Unesco e será abertopelo Ministro Tarso Genro

ceba seu Ambiental através de umClick!” encerram o evento. Com entra-da franca, a conferência se realiza noSalão de Atos UFRGS. Informações nosite www.unistentavel.ea.ufrgs.br oupelo fone: (51) 3316-3814.

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Falta de planejamento e derecursos dif iculta o crescimento dainovação nas empresas brasi lei ras

Silvino Geremia é uma exceção no Brasil. Nadécada de 60, o empresário de São Leopoldo, noRio Grande do Sul, decidiu produzir bombas hidráu-licas. O talento para perceber as necessidades dosclientes e desenvolver idéias levou-o a criar umabomba para poços artesianos de curtumes. A con-cepção inicial era alemã, mas Geremia aperfeiçooutanto o equipamento original que em pouco temposuperou o modelo inspirador. Em seguida, começoua fabricar bombas especiais para o setor viticultor,que enfrentava problemas com o transporte do vi-nho em carros-pipa. Foi nesse embalo que sua famachegou aos escritórios da Petrobras. A gigante es-tatal bateu na porta do empresário para pedir umanova bomba que sugasse com maior eficiência opetróleo das entranhas da Terra. “Meu trabalho coma Petrobras foi pioneiro no mundo”, orgulha-se.Geremia ficou rico, milionário. Suas inovações fo-ram tão bem sucedidas que a empresa foi vendidaapós a oferta irrecusável de uma multinacional.

Este raro hábito de pensar em soluções e aplicá-las em condições competitivas de mercado ainda éuma preocupação de poucos no Brasil. Também écondição indissociável do avanço das empresas edo crescimento econômico do país. Assim como oempresário gaúcho, é preciso vender tecnologia,soluções criativas e de alto valor agregado para ga-rantir rentabilidade às empresas. Um país sem esteobjetivo torna-se dependente da tecnologia e da ino-vação estrangeira. E paga caro por isto.

Este é o quadro brasileiro, salvo casos isoladoscomo o de Geremia. Sua antiga empresa, a Bom-bas Geremia, está entre os 32% das companhiasbrasileiras consideradas inovadoras pela PesquisaIndustrial sobre Inovação Tecnológica (Pintec) doInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)e analisada pela Associação Nacional de Pesquisa,Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Ino-vadoras (Anpei).

O levantamento, realizado entre agosto de 2003e maio deste ano com cerca de 72 mil empresas,diagnostica a debilidade do setor da inovação nopaís em comparação a outros países. Na Alema-nha, 60% das empresas são classificadas como ino-vadoras. Portugal tem um índice de 42%.

Este é, claramente, um problema financeiro.Num país que enfrenta sucessivas crises econômi-cas, é natural o receio das empresas de investir emum setor no qual o retorno é incerto no curto prazo.Mas o problema também é cultural. “O ambientenão é favorável para a inovação. O Brasil trabalhano curto prazo, tudo é momentâneo, há pouco pla-nejamento”, afirma Olívio Ávila, diretor executivoda Anpei.

Na opinião de Paulo Zawislak, coordenador doPrograma de Pós-Graduação em Administração(PPGA) da Escola de Administração da UFRGS,as empresas brasileiras seguem um ditado importa-do dos campos de futebol: em time que se está ga-nhando não se mexe. “Isso não se aplica ao setorempresarial. Há sempre espaço para inovar, sejaem processos ou em produtos. É por isso queestamos muito aquém dos países desenvolvidos”,afirma. Isso explica porque as empresasmultinacionais que atuam no país têm mais voca-ção para investir em novos produtos e processos doque as companhias genuinamente nacionais, comocomprova a pesquisa do IBGE. Segundo o levanta-mento, 62% das empresas estrangeiras são consi-deradas inovadoras ante 30% das brasileiras.

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INOVAR ÉO DESAFIO

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Confusão criativaO Brasil é um país que ainda confunde in-

venção com inovação, Thomas Edison comHenry Ford. O inventor da lâmpada elétrica mu-dou o mundo, certamente, mas era um homemisolado, interessado em expandir os limites daprópria criatividade e desenvolver patentes quepoderiam mudar a humanidade, independente dasua viabilidade comercial. Edison acabou milio-nário com suas patentes, é verdade, mas estedestino foi mais uma conseqüência da sua voca-ção do que um fim em si próprio. Ford se inspirouno modelo de produção dos matadouros e adap-tou a fórmula para viabilizar a fabricação de au-tomóveis em larga escala, viabilizando assim seuscustos de produção. Também acabou alterandode vez os rumos do século XX.

A lição de Ford para as empresas foi ter pensa-do em um sistema inovador que não se refletia ne-cessariamente no produto final. Mudou os meca-nismos de produção da empresa, ao contrário deEdison, que estava interessado apenas no objeto fí-sico do seu invento. “Não existe inovação antes doproduto ou serviço chegar ao comércio. Inovação éuma invenção com exploração comercial. Ter umapatente não basta. Para ser inovação, tenho quelicenciar o produto”, ensina Edi Madalena Fracas-so, coordenadora do Núcleo de Gestão da Inova-ção Tecnológica (Nitec) da Escola de Administra-ção da UFRGS.

A preocupação em alterar significativamente um

processo, um produto ou um sistema dentro de umaempresa para chegar a uma inovação - como fezHenry Ford - é o caminho para o sucessocorporativo. No entanto, segundo o estudo da Anpei,67% das empresas não dão importância para pro-cessos internos de pesquisa e desenvolvimento(P&D), que são, na maioria das vezes, a origemdas inovações. “Isso foi uma constatação terrível.Para quase 70% das empresas que fizeram pelomenos uma inovação entre 1998 e 2000, inovar nãoé um fator importante, isto é, não têm consciênciada importância da inovação. Imagine aquelas quenão inovam?”, questiona o diretor da entidade.

A ausência de cultura inovadora no Brasil tam-bém é resultado de uma evolução histórica. Atéos anos 90, havia forte proteção de mercado nopaís. As empresas só tinham o trabalho de com-prar tecnologia de fora e produzir no Brasil. Nãoexistia competição entre produtos brasileiros e es-trangeiros.

Com a abertura econômica em 1990, começoua concorrência e expôs-se o atraso do Brasil noquesito inovação. A hiperinflação de 3000%, aliadaà acachapante burocracia e à política tributária bra-sileira, formou uma bomba gerencial para os em-presários. E a inovação foi relegada ao segundoplano. “Trabalhava-se para o dia seguinte”, lembraÁvila. “Falta falar do futuro. Pensar num produtoque começa a ser pensando hoje para chegar aomercado daqui a dois anos é impensável. Li umatese de mestrado que analisava quanto os empre-sários conseguem pensar no longo prazo. O pesqui-sador descobriu que 90% da sua amostra só conse-guia pensar três meses para frente, que é o tempodo fluxo de caixa”, lamenta.

Caro e raroMas como, então, fazer com que mais empre-

sários pensem seus negócios como fazia SilvinoGeremia? “Uma das formas de inovar é ter dentrodas próprias empresas um centro de P&D”, lem-bra a professora Edi Fracasso. Na Coréia do Sul, ogoverno resolveu incentivar o setor quando perce-beu que os centros eram mais eficientes – e maisbaratos – do que financiar a criação de grandesestruturas governamentais.Estimulou pequenas emédias empresas a criarem centros de pesquisa pró-prios. Em 1999, havia somente 40 centrostecnológicos no país. Hoje, os coreanos comemo-ram a instalação de 10 mil centros de pesquisa es-palhados pelo país. Tudo aconteceu em menos deuma década.

O BRASIL AINDA CONFUNDEINOVAÇÃO COM INVENÇÃO

Silvino Geremia e ofi lho Alecssander inovamcom bombas para i r r igar

lavouras de arroz

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papel das empresas transformar ciência emtecnologia, não das universidades”, afirma Edi.

Num mar de restrições domésticas, a saída parainovar é, na maioria das vezes, comprar tecnologiado Exterior. O problema é que a empresa não de-senvolve competência para criar suas própriastecnologias, tampouco para pensar melhorias. Fica-se totalmente dependente desse modelo e as em-presas pagam um alto preço por isso.

Zawislak observa que uma empresa precisa detrês condições básicas para evitar a importação detecnologia: informação do mercado, conhecimentointerno e criatividade. “Sem esses três pilares épraticamente impossível inovar hoje em dia”, ex-plica. Segundo o professor, as empresas precisamcriar mecanismos para lidar com a enxurrada deinformação. Além disso, é necessário acompanhartodos os passos dos consumidores, que podemmudar de opinião ou embarcar numa nova modada noite para o dia.

Algumas soluções são conhecidas do setorcorporativo, como as pesquisas de marketing, osCRMs (Costumer Relationship Management), osServiços de Atendimento ao Consumidor (SAC) eas ferramentas de Business Intelligence (BI). “Nãoimporta o mecanismo usado para inovar, é impres-cindível que seja feito esse esforço”, destaca.

Exceções à regra A gaúcha Aeromot, fabricante de motoplanadores,

encontrou sua fórmula para inovar com a participa-ção em feiras internacionais e em listas de discussãodos aficionados em aviões. O caminho inusitado foi econtinua sendo a salvação da empresa para escapardo moribundo mercado da aviação brasileira.

Hoje, os motoplanadores da Aeromot são certifi-cados dentro dos mais rigorosos padrões mundiais ecompetem em igualdade com os aparelhos de gigan-tes estrangeiras. A competência da empresa con-quistou a exigente Federal Aviation Agency (FAA),dos Estados Unidos, que dispensou tradicionais for-necedores.

“Tenho uma equipe jovem que está sempre meatualizando dos novos métodos de gestão, das novi-dades técnicas. Em tecnologia, quem pára regride”,afirma Cláudio Viana, fundador da Aeromot.

Como não há hoje um apoio governamental des-te porte no Brasil, só resta ao setor corporativobancar do próprio bolso os comitês de inovação. E,de novo, as dificuldades financeiras tiram o entusi-asmo dos empresários. “O problema é que inovardessa forma é caro, ou seja, é cada vez mais res-trito às grandes empresas”, lamenta a professorada EA/UFRGS. Programas tão bem sucedidos comoo da Coréia ainda não deslancharam no Brasil.

Para se ter uma noção da dificuldade de implan-tação de linhas de programas governamentais, ape-nas quatro empresas apresentaram os PDTIs (Planode Desenvolvimento Tecnológico Industrial) nos últi-mos quatro anos. Em formulários, os empresários so-licitam benefícios fiscais junto ao governo para finan-ciar projetos inovadores. A baixa procura pelo incen-tivo vem do excesso de burocracia e também pelodesconhecimento. “A maioria das empresas desco-nhece os estímulos dados à inovação. E quando asleis são usadas, há tantas cláusulas que os empresá-rios se afastam. Desafio uma empresa de médio por-te que conheça todos os incentivos para inovação ousaiba preencher todos os requisitos exigidos. A situa-ção é muito pior do que se imaginava”, preocupa-seOlívio Ávila.

Além das dificuldades burocráticas de se encon-trar financiamento público para os projetos de ino-vação, o empresário também está desamparado nosetor privado. “Há falta de financiamento e de capi-tal de risco”, adverte a professora Edi Fracasso.“Em países com tradição de investir em projetos debase tecnológica, como os Estados Unidos, são far-tos os investimentos em inovação”, lembra.

A professora lamenta que nem o conhecimentogerado nas universidades consegue ser absorvidopelas empresas brasileiras porque os laboratórios pro-duzem ciência. E há uma grande distância entre ateoria (a ciência) e a tecnologia (a prática), que é aparte do processo que interessa às empresas. “É

Claudio Viana,fundador daAeromot, tem naequipe jovem a forçapara a atual ização e a inovação

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Ironicamente, é no setor público que o Brasilvai tentando solucionar sua crise de criatividade.No campo legal, a salvação pode ser a nova Lei daInovação, que está em fase final de tramitação noCongresso (leia mais na página 11). A propostabásica do novo texto é desonerar as empresas queinvestirem em inovação. No entanto, o governo tentalimitar os incentivos a quatro setores: microeletrônica,programas para computadores, remédios, máquinase equipamentos pesados. De acordo com o minis-tro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, ogoverno optou por beneficiar estes grupos de em-presas porque vê nelas maior potencial para inova-ção e desenvolvimento nas próximas décadas.

Na área administrativa, o setor público tem pelomenos um bom exemplo de como é possível pensara inovação nas empresas. A Petrobras vem intensi-ficando seu processo de inovação desde meadosda década de 90, quando o monopólio do setorpetrolífico no Brasil terminou. “A Petrobras tem umapolítica em que a tecnologia não é considerada umnegócio. Existe para uso próprio da companhia.Chegamos à conclusão de que é melhor inovar in-ternamente para evitar que outras empresas copi-em nossos projetos e para preservar os mercadosem que atuamos”, explica a pesquisadora MariaFátima Ludovico. “Por isso, temos uma políticaagressiva, saímos patenteando tudo”.

Historicamente, o foco em investimentos emP&D e inovação dentro da Petrobras sempre este-ve restrito a pequenas melhorias em processos eprodutos. A estatal inovava dentro do escritório e asmudanças não chegavam ao consumidor. Porém,no ano passado, esta cultura se alterou com o lan-çamento da gasolina Podium, a primeira inovaçãoda história da empresa voltada para o ponto de ven-da. Isso só foi possível graças a experiência acu-mulada na Fórmula 1 dentro da parceria da empre-sa com a equipe inglesa BMW Williams.

Ciclo virtuosoEm tese, com a quebra do monopólio nos anos

90, os preços e os rendimentos da estatal não per-mitiriam mais investimentos em inovação. Mas aempresa viu na mudança do mercado uma chancepara se reciclar. A decisão da companhia foi nadireção oposta do que se previa. Após a quebra domonopólio, a primeira providência tomada foi ummovimento de mobilização à inovação. “A meta eraestar permanentemente introduzindo ou melhoran-do produtos, processos e serviços”, diz Hilton Pe-reira de Almeida, gerente de avaliação e desempe-nho do Centro de Pesquisa (Cenpes).

A empresa criou um ciclo virtuoso nos escritóri-os: todo protótipo concebido pelo setor de pesquisadeveria passar pela área de negócios com objetivode testar se a inovação teria sucesso comercial. Em1998, a Petrobras criou três comitês para definir as

prioridades entre os inúmeros projetos de pesquisaexistentes na estatal. As idéias são concebidas emoutros 30 grupos de projetos. “O objetivo dessestrês comitês é decidir prioridades, ou seja, quais pro-jetos serão tocados adiante, conforme o planejamen-to estratégico da empresa, os cenários econômicose a análise da concorrência”, explica a pesquisado-ra da companhia. A ênfase foi concedida a trêssetores considerados estratégicos: gás e energia, ex-ploração e produção e abastecimento.

Como existem 30 grupos pensantes dentro daPetrobrás, projetos e idéias não faltam. Funcionamcomo a cabeça de Silvino Geremia, o empresáriogaúcho que soube aliar a visão empresarial ao ta-lento para pensar em soluções criativas. Sua traje-tória é exemplo – e exceção – do início ao fim. Asidéias continuam a saltar da sua cabeça. Após ven-der a Bombas Geremia para uma multinacional,Silvino caiu em depressão. Não tinha mais o queinventar. Foram dois anos de sofrimento. O psicólo-go recomendou que voltasse a fazer o que gostava.Ajudou o filho Alecssander a abrir uma nova fábri-ca, a Higra. Agora produz bombas para irrigar ar-rozais. Criou uma solução que evita a erosão dosolo e, portanto, não prejudica o meio ambiente. Onovo negócio já o colocou frente a frente com osucesso. Como todos deveriam estar fazendo.

A Petrobras inovainternamente paraevi tar que outrasempresas a copiem,garant indo apreservação domercado emque atua

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O DESVIODO SUCESSO

Há uma linha que divide os sonhadores dos rea-lizadores. O engenheiro Oskar Coester certamentecruzou esta linha. Sua grande paixão, o Aeromóvel,foi transformada em realidade. O protótipo do veí-culo está estacionado desde 1983, na Avenida Lou-reiro de Silva, em Porto Alegre. Trata-se de um ve-ículo de massa para os centros urbanos movido a ar,como se fosse um barco à vela de cabeça para bai-xo. Ocupa pouco espaço físico, não polui, é econô-mico, é veloz o suficiente, é seguro, transporta até300 pessoas de cada vez. Talvez o Aeromóvel fos-se hoje o paradigma para o transporte público demassa no mundo inteiro se fosse inventado em ou-tro país, em outra época, em outras circunstâncias.

Mas a desilusão de Oskar é que o veículo nãoganhou as grandes cidades e não transporta milhõesde pessoas todos os dias, como era possível imagi-nar em 1983. Está imóvel na pista de testes da ave-nida porto-alegrense e, eventualmente, leva curio-sos e potenciais investidores de uma ponta a outrada linha de 1,2 quilômetros. Os investidores perma-necem apenas potenciais e os curiosos satisfazem odesejo de conhecer o evento inovador após desem-barcarem do vagão. E só.

Exceto por um trajeto de três quilômetros im-plantado em Jacarta, na Indonésia, o Aeromóvel nãopassa de um projeto interessante com grande po-tencial. Ensina que, para realizar um sonho, não ésuficiente construir o protótipo e vê-lo funcionando.É preciso cruzar outra fronteira: aquela que separao protótipo do sucesso comercial. No caso da in-venção de Oskar, há uma série de razões que po-dem explicar o fracasso do Aeromóvel. “No deta-lhe mora o Diabo”, arrisca o engenheiro. Um des-ses, sem dúvida, foi o abandono do projeto pelo go-verno federal.

O protótipo da Avenida Loureiro da Silva foi fi-nanciado pela antiga Empresa Brasileira de Trans-portes Urbanos (EBTU), na gestão de JorgeFrancisconi. Em 1979, o diretor da EBTU conce-deu US$ 4 milhões para o início do projeto. No anoseguinte, um pequeno protótipo do Aeromóvel fezsucesso na tradicional Feira de Hannover, na Ale-

manha, dando relativa fama ao seu inventor. Estavatudo dando certo: havia dinheiro em caixa, apostado poder público, interesse internacional na idéia eaté uma proposta milionária da gigante Thyssen, nãoaceita. “Hoje eu sei que foi uma burrada”, lamentaCoester ao lembrar do motivo pelo qual não vendeuparte do projeto aos finlandeses. O engenheiro foivítima de um clima nacional, das circunstâncias. Nadécada de 80, o país estava fechado para a tecnologiae investimentos internacionais. O regime militar in-centivava o nacionalismo em todas as áreas. Coesterpreferiu deixar o projeto sob controle 100% brasilei-ro. Entretanto, a fidelidade do Brasil não foi recípro-ca. Houve uma troca no comando do Ministério dosTransportes e Eliseu Resende, o novo ministro,engavetou as diretrizes do antecessor, CloraldinoSevero. Era o fim do apoio público ao projeto.

O inventor ainda ganhou mais US$ 2 milhõesem 1985 da Finep. Foi o suficiente para concluir oprotótipo, mas não para viabilizar o projeto em largaescala. Daí em diante, o Aeromóvel deixou de pros-perar para se tornar uma esquisitice de Porto Ale-gre. Coester, entretanto, não abandonou a idéia: “Erae ainda é um sonho”. Sua empresa, trabalha emdiversos projetos e ele segue tentando negociar aviabilidade do Aeromóvel no mundo. No final dadécada de 90, o engenheiro trocou parte dos direitosnas patentes internacionais por uma parceria cominvestidores sauditas. O veículo começou a ser tes-tado na Flórida, nos Estados Unidos, mas emperrouem questões legais.

Mesmo inovador, oAeromóvel segue estacionadona pista de testes no centrode Porto Alegre

Coester , c r iadordo Aeromóvel ,não abandona osonho deviabi l izar op r o j e t o

O veículo só foi implantadoem Jacarta, na Indonésia

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No final de julho, a inovação deu seu primeirogrande passo para virar lei no Brasil. A Lei da Ino-vação Tecnológica foi aprovada pela Câmara dosDeputados e seguiu sob aplausos do ministro daCiência e Tecnologia, Eduardo Campos (leia en-trevista nessa edição) para ser apreciada pelo Con-gresso.

Dois pontos do projeto são especialmente im-portantes. O primeiro é o que oficializa a possibili-dade de haver recursos não-reembolsáveis para seinvestir em inovação. Isso deve resolver o proble-ma das pequenas e médias empresas, hoje comenormes dificuldades de obter crédito para pesqui-sa devido ao alto custo. Segundo estudo da Associ-ação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento eEngenharia das Empresas Inovadoras (Anpei), aspequenas companhias precisam oferecer inúmerasgarantias para obter um financiamento, já que a ino-vação é sempre encarada como uma operação dealto risco para os órgãos financiadores.

A outra medida deve ajudar na disseminação da

INOVAÇÃO VAI VIRAR REGRAinovação por permitir ao governo a contratação deempresas que desenvolvam projetos específicos deinteresse público. É o mesmo modelo usado pelaNasa nos Estados Unidos. A Agência Espacial Ame-ricana contrata o serviço e aposta na criatividade deterceiros quando precisa desenvolver e dar anda-mento a um projeto.

Do ponto de vista da relação universidade-em-presa, a nova lei também deve trazer importantescontribuições. Segundo Márcio Luiz de AndradeNetto, consultor do Fórum Permanente das Rela-ções Universidade – Empresa, a legislação facilita-rá o acesso às patentes, hoje feito por meio de umprocesso licitatório burocratizado. As novas regrastambém prevêem que os pesquisadores das univer-sidades públicas, que atualmente estão limitados adesenvolver pesquisas em empresas por causa dadedicação exclusiva às instituições de ensino, tenhammais flexibilidade para participar de projetos de ino-vação junto à iniciativa privada. “A lei não é a solu-ção, mas é um grande passo”, afirma Netto.

Principais medidas previstas na Lei da Inovação:

Flexibiliza as atividades das instituições e asrelações de trabalho das instituições científicase tecnológicas por meio de:! Contratação de pessoal em caráter excepcio-

nal para atuar em projetos específicos depesquisa;

! Afastamento temporário dos pesquisadorespara colaborar em projetos de pesquisa cominstituições e empresas;

! Licenciamento do pesquisador para constituircom as Empresas de Base Tecnológicas (EBT’s)

Estabelece regime de comercialização dasinovações geradas nas instituições científicas etecnológicas:! Contratos de transferência de tecnologia com

empresas e licenciamento para a exploraçãocomercial das inovações;

! A propriedade intelectual e os ganhos econômi-cos decorrentes (royalties) serão compartilha-dos com a EBT e outras instituições, inclusivecom os pesquisadores (os ganhos não seincorporam ao seu salário);

! A patente obtida pela instituição e pelopesquisador será considerada para efeitos daavaliação do mérito, tanto quanto os artigospublicados;

! A instituição científica e tecnológica deverádispor de um núcleo de inovação tecnológica

para orientar o patenteamento e o licenciamentoda tecnologia;

! Institui mecanismos de apoio ao inventor inde-pendente para tornar viáveis inovações deinteresse da sociedade.

Cria mecanismos para favorecer o ambienteinovativo empresarial:! Permite a utilização de recursos financeiros,

humanos e materiais da União para tornar viávela cooperação entre empresas em arranjos pré-competitivos;

! Permite a participação da União na criação decentros de pesquisa voltados para atividadesinovadoras em conjunto com as empresas;

! Faculta a utilização, pelas empresas, de labora-tórios e equipamentos das instituições científi-cas e tecnológicas;

! Institui o regime de preferência de compra debens e serviços para as EBT´s e empresasinovadoras;

! Amplia os incentivos fiscais vigentes de micro epequenas empresas para as EBT´s (ex: Simplestecnológico);

! Garante às EBT´s tratamento prioritários emprogramas de financiamento governamental;

! Autoriza a União a contratar empresas paradesenvolvimento de projetos de elevado riscotecnológico;

! Autoriza a instituição de fundos mútuos deinvestimentos em EBT´s.

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A diversificação, embora “mola propulsora” docrescimento durante décadas, colocou a empresafrente a um novo desafio. A multiespecialidade tor-nava a empresa morosa para dar respostas à clien-tela cada vez mais exigente. Sua vocação inovado-ra estava em perigo, ou como prefere traduzirJanaína Miotti, coordenadora corporativa de Re-cursos Humanos e Marketing da Soprano, “estavafrente a uma grande oportunidade de mudar”. Aempresa não deixou passar.

Em meados da década de 90, a Soprano pro-moveu uma segunda revolução. Desta vez, a mu-dança foi na gestão dos negócios. “Precisávamosnos organizar para crescer ordenadamente”, afir-ma a coordenadora. A administração verticalizadadas linhas de produtos foi substituída pela horizon-tal. “Apesar de as linhas de produtos serem com-pletamente diferentes entre si, os processos de fa-bricação tinham muita sinergia. Foi isso que apro-veitamos com a mudança”, explica Janaína. A com-panhia avaliou quais processos eram repetidos esimplificou a manufatura. Hoje, as sete unidadesde negócios produzem em cinco manufaturas e osentregam por meio de dois centros de distribuição.Ou seja, a manufatura de metálicos chega a aten-der cinco segmentos diferentes, como o de fecha-duras, materiais elétricos, acessórios para móveis,ferragens especiais e equipamentos hidráulicos.

Para monitorar o retorno dessas mudanças eprojetar a empresa no futuro, a companhia utiliza abadalada ferramenta do Balance Scorecard (BSC).Segundo Janaína, a empresa encontrou uma surpre-endente facilidade para lidar com os indicadores daferramenta que traduz operacionalmente os planosestratégicos. “Sabemos exatamente onde e comoqueremos chegar. Não ficamos enredados em umamontanha de números como é comum acontecerna implantação do sistema”, afirma.

A ESCOLHADA SOPRANO

Como a inovação transformouuma fabricante de acordeões

em uma gigante multifacetada

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Existem basicamente três tipos deempresas. Há as que permanecem du-rante anos fabricando o mesmo tipo deproduto ou oferecendo o mesmo tipode serviço, com a idéia fixa de que sealgo deu certo no passado o futuro seráautomaticamente promissor. São rarasas sobreviventes hoje. Outras sabemque o mundo dá voltas e estão sem-pre correndo atrás de novidades, ana-lisando tendências, atentas às críticase anseios dos clientes. O terceiro epequeno grupo tem outro diferencial:são visionárias, antecipam as neces-sidades dos consumidores antes mes-mo de os próprios perceberem. A

Metalúrgica Soprano faz parte deste ter-ceiro e privilegiado rol corporativo.

Não fosse essa postura de estar sempre aten-ta às mudanças do mercado, a empresa seria hojeuma pequena e anacrônica fabricante de acordeões– ou melhor, não passaria de uma lembrança dosdourados anos 50. A virada da Soprano se deu emdois momentos, ambos guiados pela inovação.

O primeiro foi no final da década de 60, 12 anosdepois de sua fundação, quando a empresa abando-nou a produção de gaitas prevendo que o rock androll ia invadir a cena, como prometiam os fãs emdelírio dos Beatles. Dito e feito. A Soprano deu adeusao ramo musical e as guitarras passaram a embalarirremediavelmente as pistas de dança no mundo in-teiro, aposentando os acordeões.

Desde então, a empresa passou a usar a com-petência em metalurgia para fabricar ferragenspara portões e acessórios para o setor moveleiro.Aos poucos, foi conquistando outros mercados,fabricando cadeados, fechaduras, cilindros hidráu-licos, filmes, resinas, utilidades domésticas.

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Inovação de dentro para foraDo ponto de vista comercial, o novo design

organizacional baseado em processos trouxe ga-nhos surpreendentes. Os profissionais das sete uni-dades de negócios da empresa deixaram de se en-volver tanto com a área técnica e foram para asruas farejar as tendências e as necessidades dosclientes. “Os engenheiros não podem ficar mui-to tempo dentro da fábrica”, determina a coor-denadora.

O primeiro fruto desse trabalho foi a fechaduraMetalix, que embora mantenha a palavra metal nonome, é produzida em plástico de engenharia. “Tí-nhamos dois problemas a solucionar quando se ini-ciou a pesquisa da Metalix. O primeiro era de cu-nho ambiental: precisávamos fabricar fechadurasque não gerassem tantos rejeitos. O segundo foiuma necessidade do mercado: as fechaduras dascasas de praia enferrujavam rapidamente com amaresia”, relata.

O produto resolveu todos esses problemas emais um pouco. O preço caiu consideravelmentepor causa do material e da simplificação do pro-cesso e manufatura. O mecanismo interno daMetalix tem apenas três peças ante as 22 das fe-chaduras tradicionais. Com a inovação, a Sopranoganhou o Prêmio Finep em 1998.

Um outro exemplo é a fechadura dupla trava,concebida depois de uma conversa dos engenheirosda Soprano com policiais. A equipe queria entenderporque era tão simples arrombar portas de aço.Descobriu que os ladrões chutavam com força aparte inferior e entravam facilmente por essa aber-tura. A solução da Soprano foi desenvolver umafechadura dupla que é acionada com uma única cha-ve e engana o assaltante, escondendo o engate infe-rior da trava do lado de dentro da porta.

Apoio à criatividadePara não perder esse conjunto de idéias gestadas

dentro da empresa, a Soprano implantou no ano pas-sado uma intranet. “Era comum engenheiros parti-ciparem de feiras no Exterior e elaborarem relatóri-os riquíssimos que ficavam guardados em uma ga-veta”, conta Janaína. Além de trazer uma bibliotecadigital com todo o conhecimento gerado dentro efora da Soprano, o portal também permite que osfuncionários consultem a agenda de seus chefes emarquem reuniões on-line. “Quem vê de fora, achaque a empresa é uma loucura com tantas áreas di-ferentes. Mas aqui dentro o trabalho é super afina-do”, constata. A harmonia é tanta que, este ano, aSoprano comemora meio século de história em quefunciona por música.

Com duasunidades no RSe uma em PE,a Soprano deveinagurar apróxima no MatoGrosso do Sul

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PORTADORDO FUTURO

Eduardo Campos, ministro da Ciência e da Tecnologia, comanda mais do que umapasta. É o capitão de um setor sempre relegado ao segundo plano por governos brasi-leiros. O investimento e o incentivo à inovação e à tecnologia é considerado hoje oempurrão mais importante para tirar o Brasil da categoria dos que fornecem apenasmatéria-prima. Uma viagem que começa agora e só chegará ao destino final em anos,talvez décadas.

O Brasil é o maior exportador de soja, um dos maiores produtores de carne, temtradição em vender algodão, laranja, café e açúcar para outros países. No entanto, amaior marca de subprodutos da soja não é brasileira. A fama da melhor carne aindapertence aos argentinos. O café da Colômbia é mais famoso do que o brasileiro.

Em séculos de história capitalista, o Brasil não foi capaz de desenvolver aquilo queverdadeiramente dá dinheiro: agregar valor aos produtos que exporta. A participação dogoverno federal neste processo é fundamental para facilitar o investimento das empresasneste setor. O Executivo pode aliviar a pressão dos impostos em determinadas áreas eflexibilizar a legislação para aqueles empresários que desejam inovar.

Em entrevista exclusiva à revista MilênioMilênioMilênioMilênioMilênio, Eduardo Campos fala sobre os planos dogoverno para o setor da inovação, principalmente no que é considerado prioritário:software, fármacos, semicondutores e microeletrônica e bens de capital. São as apostaspara o futuro. Pelo menos na gestão do jovem senador do PSB, que há sete meses ocupaa pasta, depois que Roberto Amaral perdeu o posto.

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MILÊNIO - Quando o senhor assumiu,qual era a situação do Ministério?

MINISTRO EDUARDO CAMPOS - Tantoquanto agora, encontrava-se no centro das aten-ções do presidente Lula. Cuidamos de melhor inte-grar as ações da própria administração federal ecom nossos parceiros externos – governos estadu-ais, universidades e instituições públicas e privadasde pesquisa – de forma a contribuir, com ações es-tratégicas de ciência, tecnologia e inovação, para aretomada sustentável do desenvolvimento nacional.

MILÊNIO - Quais os pontos-chave do Pla-no Estratégico do MCT para o quadriênio

2004/2007?MINISTRO - O plano estratégico é composto

de três eixos. O primeiro, vincula a nossa ativida-de às prioridades da política industrial, que identifi-cou quatro setores estratégicos: software,fármacos, semicondutores e microeletrônica e bensde capital. Ao lado desses foram selecionadas, ain-da, áreas consideradas “portadoras de futuro”, nasquais o Brasil tem competência de ponta instala-da: biotecnologia, nanotecnologia e biomassa. Osegundo eixo é o que denominamos “objetivos es-tratégicos nacionais”, que inclui a retomada do pro-grama espacial, a continuidade e a ampliação doprograma nuclear, a integração da região amazô-

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nica ao território nacional por meio de ações deC&T; e o apoio da C&T à política externa do País.O terceiro eixo é o da inclusão social, com ênfaseem programas e ações voltados para o desenvol-vimento sustentável da região do semi-árido e acriação dos Centros Vocacionais Tecnológicos(CVTs).

MILÊNIO - Em seu discurso de posse, osenhor afirmou que sua gestão não iria cobrarmais verbas para a área e que buscaria a me-lhor aplicação dos recursos. Isso foi seguidoà risca?

MINISTRO - Naquele momento precisávamospotencializar os recursos existentes, integrando osinvestimentos do governo federal com os esforçosdos Estados, bem como do orçamento de outrosministérios. Isso já está acontecendo na aplicaçãodos recursos dos fundos setoriais. Neste ano sãoR$ 600 milhões para os fundos, R$ 100 milhõesacima do orçado no ano passado. Para otimizar aaplicação dos recursos foi criada uma secretariatécnica formada pelos presidentes dos comitêsgestores dos 13 fundos setoriais vinculados ao MCT.Já lançamos um conjunto amplo de chamadas pú-blicas para seleção de projetos de pesquisas emciência e tecnologia. Para isso, serão liberados R$300 milhões dos fundos setoriais neste ano, e aindaR$ 80 milhões em 2005. Serão destinados R$ 8milhões para o Programa Brasileiro de Biodiesel eR$ 13 milhões para investimento em ciência etecnologia na Amazônia.

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MILÊNIO - Ainda em seu discurso, o se-nhor disse que iria tentar consolidar parceriasantigas com os vizinhos da América Latina edo Mercosul e intensificar conversas com aUnião Européia, China, Rússia e Índia. O quefoi feito até aqui? Que parcerias antigas o Mi-nistério tinha com esses países?

MINISTRO - Estamos consolidando parceri-as antigas e aprofundando a integração com ou-tros países. Temos muitos acordos internacionais,sobretudo na área espacial. Com a Argentinaestamos em negociação para desenvolver o Sa-télite Argentino-Brasileiro de Informações sobreAlimentos, Água e Ambiente, o SABIA 3. Estáem discussão também o lançamento do fogueteCiclone-4, resultado de acordo entre o Brasil e ogoverno da Ucrânia. Temos a bem-sucedida par-ceria com a China, no programa CBERS – Saté-lite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres. O pro-grama já lançou dois satélites, em 1999 e 2003, ejá está definido o desenvolvimento e o lançamen-to de mais dois. Com a Rússia, avançam os pri-meiros entendimentos na área espacial. Finalmente,está sendo consolidada uma cooperação científi-co-tecnológica com a França.

MILÊNIO - Quais projetos já implantadoso senhor destacaria como de suma importân-cia para o desenvolvimento do País?

MINISTRO - No momento, os projetosprioritários são os que articulam o MCT com a polí-tica industrial, tecnológica e de comércio exterior.Pelo peso estratégico, são igualmente relevantes osprogramas nuclear e espacial, de biotecnologia e denanotecnologia e as pesquisas na Amazônia.

MILÊNIO - Qual sua opinião sobre a Leide inovação? Garante, de fato, condições paraimpulsionar a inovação no País? O que aindaprecisa ser melhorado?

MINISTRO - A Lei é um marco legal paraviabilizar o desenvolvimento tecnológico e intensifi-car o ambiente da cultura de inovação nas institui-ções de pesquisa e nas empresas nacionais. Tere-mos capacidade de alargar o trabalho da universida-de e dos centros de pesquisa do País com o setorprodutivo. O texto que está no Congresso atende ospreceitos de uma legislação coesa, eficiente e efi-caz para a inovação. Entretanto, a Lei é apenas uminstrumento inicial para implantação de uma culturainovadora no País.

“A LEI É UM INSTRUMENTO PARAIMPLANTAR A CULTURA DA INOVAÇÃO”

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MILÊNIO - Como a inovação será priorizadana nova política industrial? Ela tem sido criticadapor destacar apenas quatro setores.

MINISTRO - A inovação é o eixo central danova política industrial do País. Ao priorizarsoftware, semicondutores e microeletrônica,fármacos e bens de capital o objetivo é fomentar ainovação em áreas que enfrentam gargalostecnológicos para crescer. Em software, o Brasiltem um mercado interno estimado em US$ 7,7 bi-lhões. Exportamos apenas US$ 100 milhões e im-portamos quase US$ 2 bilhões. O objetivo é au-mentar as exportações brasileiras para US$ 2 bi-lhões até 2007. Em semicondutores já estamos lici-tando o Centro de Excelência em Tecnologia Avan-çada (Ceitec), em Porto Alegre. Os investimentosem fármacos e bens de capital também contribui-rão para o desenvolvimento sustentável, reduzindoimportações e recuperando setores estratégicos.

MILÊNIO - A inovação, por sua natureza,é um campo que necessita intensa atualização.O senhor acredita que os órgãos governamen-tais têm agilidade suficiente para acompanharesse ritmo? É possível o poder público se an-tecipar aos acontecimentos e formular solu-ções para facilitar a inovação no Brasil?

MINISTRO - O objetivo do governo federal éampliar os investimentos em ciência e tecnologia de1% para 2% do PIB, o que inclui ações de pesquisae desenvolvimento nas empresas nacionais, alémdos investimentos públicos diretos em institutos euniversidades. A grande importância da Lei é co-meçar a construção de uma cultura de inovação,com a percepção de que a empresa nacional deveser uma empresa inovadora e que as universidadese instituições de pesquisa podem contribuir. O go-verno está buscando viabilizar os recursos. Só esteano são R$ 15 bilhões para ações da Política Indus-trial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE).O governo também está preparando um projeto delei para a criação de um regime de incentivos fis-cais à inovação tecnológica pelas empresas.

MILÊNIO - A Lei de Inovação dá um tra-tamento diferenciado para as pequenas e mé-dias empresas? A Associação Nacional dePesquisa, Desenvolvimento, Engenharia dasEmpresas Inovadoras (Anpei) publicou umestudo em que acusa de omissas as políticasgovernamentais em relação as PMEs...

MINISTRO - A Lei vai beneficiar especialmenteas micro, as pequenas e as empresas nascentes quenão tiveram acesso até hoje à capacidadetecnológica das universidades públicas e institutosde pesquisa. A Lei estabelece um ambiente propí-cio ao desenvolvimento de novos produtos e de pro-cessos, por meio do fomento financeiro direto aosprojetos das empresas nacionais. O projeto privile-gia a empresa tecnológica de pequeno porte.

MILÊNIO - A aproximação empresa-uni-versidade está sempre na pauta do dia. O go-verno anterior iniciou um projeto para facilitaressa interação. Como está esse projeto hoje?

MINISTRO - É um dos pontos principais emdiscussão no projeto de lei da inovação. Há passosimportantes para uma relação como até hoje nuncaaconteceu entre instituições públicas de pesquisa eempresas brasileiras. A Lei tende a viabilizar ainteração e o fluxo de pesquisadores. Uma das di-ferenças do texto atual em relação ao projeto ante-rior é a regularização da relação entre instituiçõespúblicas de pesquisa, fundações de apoio e o pes-quisador para prestação de serviços de consultoriaespecializada. Foram incluídas bolsa de estímulo àinovação para projetos entre instituições públicasde pesquisa e empresas, remuneração pecuniáriapara prestação de serviços pelas instituições públi-cas de pesquisa às empresas e participação nosganhos advindos da transferência de tecnologia.

MILÊNIO - Como vai funcionar o Grupode Trabalho Antipirataria no MCT? Quantoserá destinado para o projeto e por que o MCTdecidiu se envolver na luta contra a fabricaçãode produtos ilegais?

MINISTRO - O Grupo vai propor ações estra-tégicas para inibir a pirataria de CDs por meio dodesenvolvimento tecnológico. A idéia teve impulsodepois de um encontro com o cantor Ralf, que apre-sentou uma proposta de tecnologia antipirataria,barateando os custos da fabricação de CDs. O Gru-po de Trabalho já apresentou um relatório. Entre asações recomendadas ficou definido que o MCTdisponibilizará, ainda em 2004, R$ 500 mil para pes-quisas nacionais, visando o desenvolvimento detecnologias antipirataria.O projeto prevê umacontrapartida das gravadoras e dos fabricantes.

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“OS INVESTIMENTOS EM C&T DEVEMPASSAR DE 1% PARA 2% DO PIB“

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g e s t ã o

Nos últimos dez anos o termo inova-ção ganhou definitivamente as manche-tes. Da literatura especializada às cam-panhas publicitárias, a inovação vem sen-do referida de modo crescente. São pro-dutos, processos e serviços inovadores.Resta a pergunta: ficamos, nós no Bra-sil, mais inovadores?

A resposta, infelizmente, é “não”.Passados não dez, mas 30 anos, o Brasilainda ocupa uma posição coadjuvante,para não dizer figurante, no cenário dodesenvolvimento tecnológico. Dados doOCDE e do Ministério de Ciência eTecnologia, relacionando gastos em pes-quisa e desenvolvimento (P&D) e PIBper capita de diversos países e do Bra-sil, apontam que, nas últimas três déca-das, o Brasil estagnou numa posição in-ferior a 1% de gasto de P&D e a US$ 5mil em PIB per capita. Só para termosuma idéia do atraso, a Coréia do Sul pas-sou de valores menores do que estes nosanos 70 para algo em torno, respectiva-mente, de 2,5% (quase valores ameri-canos!) e US$ 15 mil atualmente. Sendoque países mais avançados já beiram 3%de gastos em P&D, obtendo rendas percapita médias anuais de US$ 30 mil.

Pior do que isso é o fato de realizar-mos gastos em tecnologia (o que é dife-rente de gastar em inovação) valores quese aproximam desses 3%. Ou seja, aeconomia brasileira, talvez como qual-quer outra economia razoavelmente di-nâmica, tem necessidade, sim, de inves-tir em novidades. Apenas não o faz poresforço próprio, o faz baseado na cren-ça de “economizar tempo” ao comprartecnologia pronta (os investimentos anu-ais, em geral, têm girado em torno de 2 a3% do PIB). Ao que se soma, então, o

LUXO OUREQUISITO BÁSICO?

1% de despesa em P&D. Uma coisa,infelizmente, não substitui a outra. Nãogeramos mais valor, apenas o adiciona-mos. O que fica nítido nestes dados é,justamente, uma relação positiva entregastar em desenvolvimento tecnológico,agregar valor e, com isso, gerar riqueza.Em outras palavras, quem inova, ganha!

Inovar é, de modo geral, gerar algonovo na cadeia de valor, desde um novoproduto até um atendimento diferencia-do, e ser aceito pelo mercado. Ou seja,há o reconhecimento dos clientes de queo esforço da empresa gera soluções va-liosas. Lembremos que o cliente nãodetém competência nem eficiência, re-correndo às empresas para tanto.

Vejamos, então, sob o prisma da em-presa. Gerar algo novo, além da expec-tativa, é a grande alternativa para garantire ampliar sua posição no mercado. Cli-entes com novas necessidades precisamde novas soluções. Empresas com no-vas soluções ganham novos clientes.Enfim, uma empresa, para ser competi-tiva, deve inovar.

Mas como inovar? Como ser inova-dor?

Por trás de toda inovação há sempreuma atividade de inovação. Haverá sem-pre um conjunto de ações baseadas natransformação criativa das informaçõese do conhecimento disponíveis em apli-cações que agreguem valor, em produ-tos que façam a diferença para o clien-te, em operações que tornem a empresadiferente!

A atividade de inovação pode tomarcorpo de diferentes maneiras. Pode sereventual e informal. Nestes casos, éreativa, busca novas soluções a partir deinformações e conhecimentos tácitos, em

que a intuição talvez seja o maior guiada criatividade. Ou pode ser recorrentee formalizada. Neste caso, estaráembrenhada na visão estratégica daempresa. A todo instante, haverá, no seioda cadeia de valor da empresa, diferen-tes projetos sendo imaginados, executa-dos e dando resultados negativos e posi-tivos.

Os projetos são, por assim dizer, umaespécie de unidade de medida da ativi-dade de inovação. Identifique um proje-to e você terá identificado um embriãoda inovação. Não há projeto, por maissimples, que não se baseie, justamente,na busca de informações, na organiza-ção de conhecimento e, com criatividade,na criação de algo novo (senão para omercado, pelo menos para a empresa).Todo projeto, e por decorrência toda ati-vidade de inovação, está fundado em trêselementos-chave: o aprendizado emer-gente (afinal, é de esforço inerente aoprojeto que nascem muitas das novida-des), a colaboração contínua entre aspartes internas e externas, e o desenvol-vimento integrado de soluções em todosos elos da cadeia de valor.

Por essas razões, a inovação nãodeve ser considerada luxo ou privilégiode algumas empresas. Empreender demodo recorrente projetos (no plural!) e,com eles aprender, colaborar e integraré viável para toda e qualquer empresa.É um requisito básico para acompetitividade.

Paulo ZawislakProfessor da EA / UFRGS

Coordernador do PPGA / UFRGSDoutor pela Universidade Paris VII

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f i n a n ç a s

A inovação financeira nos mercadosé parte do processo inovador. O merca-do é uma das manifestações da pós-modernidade; atribuímos-lhe substan-tividade quando nada mais é do que amanifestação nos preços do processodecisório individual, supostamente raci-onal, mas movido por crenças e receios.É preciso compreendê-lo para criar osinstrumentos financeiros compatíveiscom os riscos assumidos no processo deinvestimento que funda a competiti-vidade.

Quando refletem informações con-sideradas relevantes pelos agentes eco-nômicos, os preços dos ativos seguemum caminho aleatório, imprevisível, poisa cada momento vão repercutir o que seespera acontecer no futuro, o que mudacom a chegada de novas informações.A incerteza que caracteriza o mercadofinanceiro, quando passível de atribuiçãode algum grau de probabilidades, é o quechamamos de “risco”. A gestão do riscolida com o conhecimento de probabilida-des. A inovação financeira tem esses doiscomponentes: por um lado a raciona-lidade no campo das probabilidades e poroutro a irracionalidade de comportamen-tos imprevisíveis. Mas o comportamen-to, quando agregado, pode ser tratado emodelado.

DOMINAR O RISCO

A inovação decorre também da con-sideração de incentivos, com o que sereduz a incerteza. Boa parte da inova-ção financeira nos anos 80 e 90 do sé-culo XX teve esse foco. Exemplos: dívi-das com opções de resgate antecipadoe as dívidas com opções de conversãoem capital. Isto tende a reduzir a per-cepção de riscos e reduzir o custo docapital – tanto mais caro quanto maior orisco percebido - e permitir o financia-mento em prazos e montantes compatí-veis com o ciclo do investimento.

Grande parte da chamada inovaçãofinanceira está no campo dos derivati-vos, instrumentos cujo valor decorre dovalor de outros ativos subjacentes, porexemplo, um contrato a termo de dólar,cujo valor depende da cotação do dólar.Os derivativos financeiros muitas vezesforam referidos como um perigo: dizia-se que poderiam trazer grandes riscosao mercado (embora sejam concebidospara reduzir riscos).

Os casos do banco inglês Bahrings eda filial norte-americana da alemãMettalgeselschaft foram emblemáticos.No Bahrings, um operador assumiu po-sições em mercados futuros de tal mon-ta que as chamadas de margem foramsuperiores ao capital do banco, que aca-bou falido. A Metallgeselschaft vendeu

contratos futuros de petróleo de longoprazo, amparando-se em operações decurto prazo; quando a situação de pre-ços trouxe risco, a direção alemã deter-minou a liquidação de todas as posições,com grande prejuízo.

Uma olhada atenta mostra que emambos os casos não foram os derivativosas causas dos problemas. No Bahrings afalta de controles internos permitiu ope-rações que comprometiam a sua conti-nuidade. Na Mettalgeselschaft, osgestores realizaram prejuízos em posiçõesque poderiam ser revertidas se adminis-tradas. Num caso, falta de controle, nooutro, reação exagerada.

Casos como estes contribuíram parao desenvolvimento de conceitos novoscomo o de valor em risco, o VaR, de Valueat Risk. O VaR procura responder: quala perda máxima possível para nossasposições, dentro de um dado nível deconfiança e dentro de determinadoprazo, mantidas as atuais condiçõesde mercado? Concebido para ogerenciamento do risco financeiro demercado, o VaR é hoje aplicado tambémpara outros riscos, como o riscooperacional e o risco de crédito.

Esforços consistentes têm sido fei-tos para estender o VaR para ogerenciamento do risco em empresasem geral. Novos instrumentos derivati-vos têm surgido como resultado da am-pliação de conhecimentos em métodosmatemáticos e estatísticos, com novosinstrumentos decorrendo de descober-tas feitas no ano. Como nos beneficia-mos disso? Refinadores de petróleo comcontratos futuros não precisam repas-sar aos distribuidores as altas sazonaisdo petróleo à vista, porque têm preçosprotegidos e isso reduz a volatilidade dospreços finais. Derivativos podem redu-zir a volatilidade dos preços decommodities agrícolas. Derivativos declima já são oferecidos em alguns mer-cados, permitindo outras formas de ga-rantias para o agronegócio. Mas a ino-vação por si só não existe: é precisoque o mercado a compreenda para pro-porcionar liquidez aos instrumentos; ino-vação é conhecimento.

Roberto LambProfessor da EA/ UFRGS

Mestre pela [email protected]

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c o m u n i d a d e

O Projeto Residência Social é umaatividade de extensão criada em abrilpassado, na Escola de Administração daUFRGS, e nasceu de uma parceria coma Universidade Federal da Bahia/UFBA,em torno do Programa de Desenvolvi-mento e Gestão Social / PDGS. Tem umadupla missão: retribuir à sociedade o in-vestimento em seus jovens, aooportunizar-lhes o ensino universitáriogratuito, e o de suprir a lacuna entre oconhecimento acadêmico e os desafiosque a complexa realidade brasileira co-loca aos profissionais que desejam atuarna gestão de Programas e Projetos So-ciais. É um projeto dinâmico e efetiva-mente coletivo, e está obrigando seusparticipantes a rever conceitos e a re-correr a outras disciplinas, como a An-tropologia e a Sociologia Clínica, para oatendimento do objetivo.

Criou-se um espaço para que estu-dantes de graduação e pós-graduaçãoatuem em organizações sociais sem finslucrativos, contribuindo para a supera-ção de problemas que ameaçam asustentabilidade das entidades. Proces-so esse que, pela especificidade das or-ganizações implica, muitas vezes, cons-truir soluções participando de redes for-madas por atores sociais dotados de ló-gicas distintas, como movimentos soci-ais, Ongs, poder público, centros de for-mação, sindicatos e empresas privadas.

Este projeto é aberto à comunidadeUFRGS e se constitui em uma oportuni-dade de partilhar o saber em coletivosde produção - o que em Administração

RESIDÊNCIA SOCIALPARA O 3º SETOR

se poderia chamar de micro empresasolidária. A categoria de “Residente”,ou seja, de quem assumiu o compromis-so de um contato semanal de trabalhocom as organizações e de participar dereuniões quinzenais, - as quaiscomumente assumem a forma de umseminário de formação - é, hoje, consti-tuída exclusivamente por estudantes degraduação e de pós-gradução da Escolade Administração. Está aberto, contudo,à participação de estudantes de outrasunidades e de outras universidades quebuscam, por meio de um processoestruturado (a metodologia da Residên-cia), e em situação de grupo (aquele for-mado pelos Residentes), contribuir paraa construção de uma sociedade maishumana e mais justa e a investir em suaprópria formação como Gestor Social.

No caso da Escola de Administração,a Residência nasceu no NúcleoInterdisciplinar de Pesquisa e Estudossobre o Terceiro Setor (NIPETS), cujacoordenadora é a responsável pela par-ticipação do Brasil no Programa Inter-nacional de Pesquisa Produção de Ri-queza em Contexto de Precariedade:Comparação Norte-Norte, Sul-Sul,atualmente em curso com o apoio daUNESCO e com a participação do Ca-nadá e vários países da Europa e daÁfrica. Em função disso, o trabalho dosresidentes se apoiou, num primeiro mo-mento, no diagnóstico de situação decor-rente da pesquisa empírica realizada noâmbito do Projeto Interinstitucional dePesquisa Inovações em Economia So-

cial e Solidária, que responde pela par-ticipação do Brasil no Programa, com oapoio do Conselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tecnológico/CNPq. É também este o órgãofinanciador das despesas básicas daResidência.

Não menos importante é o apoio dasPró-Reitorias de Pesquisa e de Exten-são da UFRGS ao viabilizar financeira-mente a participação de bolsistas de ini-ciação científica no projeto. Além disso,o projeto se viabiliza pelo trabalho, pelagarra e pela crença de alunos da gradu-ação e de pós-graduação da UFRGS,como Beatriz Hellwig, Igor Valentim(Coordenção do Apoio Técnico), JorgeDoval, Pedro de Almeida Costa, Mariade Fátima Fortes, Deise Ferraz, DouglasHagel Martins, André de Oliveira Lopes,Gisele da Silva e Alessandra Pess. Elesacreditam na possibilidade de mudar omundo.

Para aqueles que desejarem maisinformações sobre a Residência, ocontato pode ser feito através dose.mails: [email protected] [email protected]

Rosinha Machado CarrionProfessora da EA/ UFRGS

Coord. do Projeto de ResidênciaSocial e do Núcleo Interdisciplinar

de Pesquisa e Estudos sobre oTerceiro Setor

Doutora pela [email protected]

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t e c n o l o g i a

Um dos objetivos do atual governo éaumentar o volume de exportações dopaís. No primeiro trimestre de 2004, en-tre os principais produtos exportados peloBrasil destacaram-se o minério de ferroe seus concentrados, vendidos para Chi-na, Alemanha, Japão e Coréia do Sul.Por ordem de volume e importância se-guiram-se óleo bruto de petróleo, soja,farelo e resíduos da extração do óleo desoja, automóveis, aviões, carne de fran-go, pastas químicas de madeira, partes epeças para veículos. A participação deprodutos metálicos manufaturados e aca-bados restringiu-se a componentes paraa indústria automobilística. Em váriasoutras áreas há a necessidade de ummaior desenvolvimento no país para quese deixe de exportar minérios e se passea exportar produtos manufaturados comum maior valor agregado.

A indústria de fabricação por con-formação mecânica (forjamento,estampagem e metalurgia do pó) é umaárea estratégica para se reverter estasituação. O pólo metal-mecânico no RioGrande do Sul, responsável por uma dasmaiores arrecadações do Estado, é peçaimportante neste contexto. O desenvol-vimento de tecnologia na área de pro-cessos de fabricação por conformaçãomecânica é fundamental para que nos-sas empresas tenham maioragressividade e competitividade paraexportação dos produtos aqui produzidos.

O Laboratório de TransformaçãoMecânica (LdTM) da UFRGS, que atuanesta área desde 1982, vem obtendo re-sultados inovadores exatamente nas eta-pas de fabricação dos produtos metáli-cos obtendo melhores propriedades me-

LABORATÓRIOAVANÇA EM PESQUISA

cânicas e eliminando operações caras.Além disso, dedica especial atenção aoestrito controle da forma e das dimen-sões dos produtos obtidos, garantindocom isso mais qualidade.

Uma contribuição decisiva neste sen-tido é a análise de chapas metálicas,empregadas por uma infinidade de em-presas que a transformam em compo-nentes para a área de informática,biomédica, utensílios domésticos e indús-tria automobilística. Outro projeto desen-volvido pelo Laboratório envolve trêstécnicas inéditas para a estampagem dechapas metálicas, o que evitará em umfuturo próximo a importação do materi-al. Em função dessa experiência, já foidesenvolvido para o Hospital das Clíni-cas um eletrodo para encefalograma comchapas finas de aço inoxidável.

Como técnica ainda não comercial,mas igualmente inovadora, o Laborató-rio desenvolveu chapas “sandwiche”,com a parte externa metálica (aço oualumínio) e o núcleo com espuma metá-lica, já empregada pela indústriaautomotiva no Exterior. No Brasil nin-guém ainda produz.

Outro avanço alcançado, com a qua-lificação de professores e o interesse ea participação de alunos da Engenharia,é a simulação em computador de peçascomplexas (tridimensionais). Auxiliamosa indústria a abandonar o tradicional pro-cedimento de “tentativa-e-erro” no pro-cesso de forjamento. As operações defabricação e a otimização podem seravaliadas antecipadamente, evitando in-vestimento em ferramentas de alto cus-to. Além disso, o processo garante a ob-tenção de peças de acordo com as exi-

gências de qualidade. Também desen-volvemos o forjamento de precisão quenão exige aquecimento. Micro peçasforjadas é o mais recente desafio para afabricação de componentes para a in-dústria eletroeletrônica.

Na metalurgia do pó, um dos proces-sos em que avançamos é a Moldagemde Pós Metálicos por Injeção para a pro-dução de peças complexas para a áreamédica. Essas peças são normalmentefabricadas com aço inoxidável, mas re-centemente busca-se o uso de titânio esuas ligas para próteses e implantes. Ain-da no Brasil muitos materiais biomédicostêm componentes fabricados porusinagem com enormes riscos para fra-turas prematuras e desgaste, uma vezque falta um controle mais rigoroso naqualidade de empresas e hospitais queos consomem. Um projeto avançadonesta área no LdTM trata da fabricaçãode “stents” usado em artérias ou outrosvasos condutores do corpo humano.

Desta forma, a universidade inova empesquisa e avança em soluções que be-neficiam diretamente a indústria, qualifi-cam a produção e contribuem para re-verter um quadro ainda desfavorável emrelação aos negócios internacionais.

Lírio SchaefferProfessor Titular do Depto

de Metalurgia / UFGRSCoordenador do Laboratório de

Transformação Mecânica do Centrode Tecnologia

Doutor pela Universidade Técnicade Aachen

[email protected]

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p e s q u i s a

O aumento gradual de manchas ne-gras nos grãos de cevada e de aveia pro-duzida Rio Grande do Sul chamou a aten-ção de professores da Faculdade deAgronomia da UFRGS no início dos anos90. O problema causado por fungos afetaa qualidade da produção, dificulta acomercialização e provoca prejuízos aosprodutores. Uma ampla pesquisa se ini-ciou à época em uma parceria do De-partamento de Fitossanidade e Plantasde Lavoura da Faculdade de Agronomiada UFRGS para buscar a solução. Em1999, o processo de clareamento degrãos, de autoria de dois professores eum aluno doutorando da UFRGS, foipatenteado sob o número 9905040-4INPI/RS. É uma das inovações comacentuada repercussão econômica quenasceu dentro da universidade e chegouàs lavouras.

A incidência do problema – no casoda aveia, a mancha é causada pelo fungoPyrenophora avenae, e a mancha dogrão da cevada, causada por Bipolarissorokiniana - vêm aumentando a cadaano. São conseqüências da expansão daárea cultivada (a aveia em especial), daprática da rotação de cultura utilizada nosistema de plantio direto no sul do Brasil eda inexistência de um controle efetivo, sejagenético ou químico.

Esses fungos associam-se às semen-tes, causando manchas que depreciamcomercialmente o produto. Economica-mente, as moléstias causam perdas di-

UM AVANÇO PARAA AGRICULTURA

retas ao agricultor porque a indústria re-jeita o grão manchado, quer seja peloaspecto escuro de flocos, farinhas oufarelos, quer seja pela ação indesejadadesses patógenos em processos como ode malteação, ou ainda, pelos riscos daprodução de toxinas ao homem e/ouanimais. Como conseqüência, a indús-tria oferece um menor valor de compraao produtor que, por sua vez, abandonaa cultura, comprometendo a própria In-dústria ou forçando-a a importar grãosde outros países e a repassar esses cus-tos ao consumidor. Desta forma, com-promete-se o eficiente sistema de plan-tio direto com a rotação de culturas, afe-tando a produção de grãos. Além disso,o trigo, o milho e a soja também têmsido afetados por moléstias.

Atualmente, um dos métodos maisutilizados para resolver o problema é oemprego de fungicidas que, entretanto,não têm reduzido a incidência das man-chas. O processo de clareamento dosgrãos, desenvolvido nos laboratórios daUFRGS, consiste na remoção das man-chas escuras pela imersão dos grãos e/ou sementes numa solução química porum período de tempo variável. O resul-tado é a eliminação das manchas, semalteração das propriedades químicas oubiológicas dos grãos. O método tambémrevelou uma ação fungicida ebactericida. Experimentos posterioresrevelaram uma ação ainda mais ampla,erradicando ou reduzindo significativa-

mente vários outros patógenos em aveiae trigo.

Esta tecnologia tem aplicação imedi-ata, uma vez que hoje dificilmente sãoproduzidos grãos sem manchas. Alémdisso, o processo é prático, rápido, eco-nômico e agrega valor à cadeia produti-va. No caso da cevada, o processo per-mite também a diminuição de fungos ebactérias durante o processo demalteação, que no sistema atual compro-mete a qualidade do malte, acarretandoperdas no processamento e nacomercialização. Com ação fungicida ebactericida, o processo se destaca pelaampla ação e alta eficiência no controlede patógenos nas sementes, o que con-trasta com a ausência atual de produtoseficazes no mercado. Hoje, a tecnologiautilizada pela indústria restringe-se à re-moção parcial das manchas por um pro-cesso mecânico. A eficiência, no entan-to, é muito limitada, uma vez que aumentasignificativamente a quebra dos grãossem a limpeza adequada.

O processo desenvolvido nos labo-ratórios da Faculdade de Agronomiaapresenta baixo custo e ausência detoxicidade e está bem definido. Não hálimitação para sua utilização imediata,podendo, inclusive, ser empregado paragrãos e sementes de outras culturas.Desta forma, garante-se mais valor aosgrãos, viabiliza-se a produção dos agri-cultores e se mantém o fornecimentopara a indústria com padrão de qualida-de do mercado externo.

Deve-se destacar, contudo, que estainovação é conseqüência da infra-estru-tura instalada dos Laboratórios dos De-partamentos de Fitossanidade e de Plan-tas de Lavoura, e da competência e qua-lificação técnica de profissionaisespecializados e alunos da Pós-Gradua-ção, envolvidos no planejamento e exe-cução das pesquisas realizadas nos últi-mos oito anos.

Jose Antonio MartinelliProfessor da Agronomia / UFRGS

PhD. University of [email protected]

Luiz Carlos FederizziProfessor da Agronomia/ UFRGS

PhD. University of California,Davis

[email protected]

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d e s e n v o l v i m e n t o

Que as empresas multinacionais decapital estrangeiro têm fundamental im-portância no desenvolvimento econômi-co do Brasil, atuando nos setores maisdinâmicos da economia e representandocerca de 50% do PIB brasileiro, é sabi-do. O que não se sabia, até então, é queestas empresas investem, em média,mais em pesquisa e desenvolvimento noBrasil do que as empresas nacionais(PINTEC, 2002).

Certamente, a chamadadesnacionalização da economia brasilei-ra após a abertura econômica contribuiupara esse fato, porque as empresas bra-sileiras mais inovadoras se tornaram alvode aquisições por multinacionais estran-geiras, sendo a MetalLeve (Mahle),Procomp (Diebold) ou Atlas (Schindler)alguns dos exemplos mais ilustres. Tudoindica, então, que a relevância das sub-sidiárias de multinacionais para o forta-lecimento das capacidades tecnológicasno Brasil é inquestionável.

No entanto, pouco se sabe sobre opapel e as funções dessas subsidiáriasnas atividades de inovação tecnológicade suas matrizes. Para elucidar estas eoutras questões foi realizada, entre abrile julho de 2004, uma pesquisa nacionalsobre as atividades de desenvolvimentode produto nas subsidiárias no Brasil.

Os dados obtidos sugerem uma forteexpansão nos últimos três anos por duasrazões: crescimento dos mercados e au-mento da participação das subsidiáriasbrasileiras em projetos globais da matriz.Parece surpreendente, apesar dos limi-tes do mercado consumidor brasileiro,haver um aumento nas atividades dedesenvolvimento de produtos no país. En-tretanto, percebe-se que as subsidiáriasnão realizam atividades de inovação ex-clusivamente para o mercado brasileiro,embora este absorva em torno de 70%dos novos produtos. São as subsidiáriasvoltadas para o mercado externo que têm

CAPITAL ESTRANGEIRO E INOVAÇÃO

ampliado as atividades.Além das crescentes exportações,

uma das razões para o aumento da pes-quisa e do desenvolvimento dasmultinacionais em países como o Brasilé o offshoring, o deslocamento de ati-vidades inovadoras de países de alto cus-to para países de baixo custo de mão deobra, constituindo uma das oportunida-des de desenvolvimento mais atraentespara países como o Brasil. De fato, emtorno de 40% dos executivos responde-ram que suas unidades de desenvolvi-mento de produtos são as mais competi-tivas em termos de custo dentro damultinacional. Alguns observaram queestão se capacitando para vender seuconhecimento a outras subsidiárias e àmatriz, e apontam como vantagens “aagilidade e os custos”. Pode parecer ines-perado, mas as multinacionais têm per-cebido as oportunidades do Brasil antesdas empresas nacionais.

Há também a outra face da moeda.Um dos respondentes assinalou que “nacompetição entre laboratórios, o Brasiltem sido prejudicado principalmente de-vido aos custos adicionais para trazerequipamentos de laboratórios de outrospaises que potencialmente poderiam es-tar transferindo suas atividades para o

Brasil”. Esses custos adicionais, gera-dos pelos impostos de importação, emmuitos casos têm inviabilizado ooffshoring de atividades que exigemmaiores investimentos em equipamentose laboratórios. Este problema pode sercontornado utilizando a infra-estrutura delaboratórios em institutos de pesquisa euniversidades brasileiros. De fato, asempresas multinacionais mantêm namédia mais vínculos com as instituiçõesde pesquisa do país do que as empresasnacionais (PINTEC, 2002).

A realização conjunta de pesquisasvisando à criação de novos conhecimen-tos, entretanto, é poucas vezes o princi-pal objetivo. Reflexo disso é o reduzidonúmero de cientistas na maioria das sub-sidiárias. Segundo dados da amostra,apenas 2% dos funcionários com dedi-cação exclusiva na área de desenvolvi-mento de produto são doutores.

Os resultados da pesquisa indicamque as matrizes das multinacionais nãosão responsáveis pela fraca cooperaçãotecnológica com instituições de pesquisado país. A maioria das subsidiárias temautonomia para firmar acordos na áreade desenvolvimento de produto, mas abremão das oportunidades e limita as possi-bilidades de desenvolver produtos paramercados mais exigentes. Isto é tantomais preocupante quanto concorrenteságeis, pró-ativos e generosos em subsí-dios como Cingapura, Irlanda ou China.Esses governos sabem que vale a penaapostar na contratação de engenheirose cientistas, desenvolver fornecedoresde alta qualidade e exportar produtos eserviços com maior valor agregado.

Dirk BoeheMestre pela Universidade

Livre de Berlim,Doutorando em Administração

/PPGA/EA/[email protected]

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