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http://www.companyweb.com.br/lista_artigos.cfm?id_artigo=120 Seja o Líder que as Empresas Precisam É ético, ajuda os colegas, serve em vez de ser servido. E, pode crer, não tem vergonha de dizer que depende da equipe para crescer... O lider espiritualizado Por Daniela de Lacerda* O moço sorridente que está na foto ao lado coordena um time de 385 pessoas numa multinacional francesa do setor de alimentação. Como chefe, no entanto, ele está mais preocupado em servir a seus funcionários do que em dar ordens. Seu maior propósito é ajudar sua equipe a se desenvolver, alinhando suas necessidades e valores aos da empresa. Com essa filosofia, ele e seu time superaram as metas previstas para o ano passado e estimam uma performance ainda melhor em 2005. Diretor-geral da Sodexho Pass no Brasil, o mineiro Sergio Chaia, de 40 anos, é um dos rostos da chamada liderança servidora, a grande tendência em gestão para os próximos anos. O movimento é capitaneado por executivos que não têm vergonha de levar a palavra amor para o mundo corporativo e acreditam que o sucesso profissional passa pela consciência de seu papel no mundo. Soa singelo demais para você? Pois saiba que é essa postura que vai garantir a competitividade das empresas nos próximos anos. E quem não perceber sua importância corre o risco de ficar fora do mercado. Quem decreta é o guru norte-americano James C. Hunter, autor de O Monge e o Executivo, primeiro lugar no ranking dos livros de carreira mais vendidos no Brasil, com 100 000 exemplares comercializados até o fechamento desta edição. "Muitos executivos acham que, porque estão no comando, seus funcionários é que têm de servi-los. Mas isso já não funciona. Hoje, as empresas precisam contar com o coração, a mente e o espírito dos seus colaboradores. E só se consegue isso quando o líder deixa de lado o desejo de poder e serve, em vez de ser servido", afirma James (leia entrevista exclusiva com o autor nas páginas seguintes). O modelo pregado pelo consultor não é novo, mas só agora vem ganhando força, como um reflexo do crescente movimento de espiritualidade nas organizações. Essa corrente é uma resposta à alarmante crise existencial que assola o universo corporativo. Muitos profissionais já não se satisfazem apenas com a perspectiva de bater metas e receber um gordo bônus no fim do ano. Não querem mais atuar numa empresa que tem valores tão diferentes dos seus. Não estão mais dispostos a abrir mão da vida pessoal. Só que essa é, muitas vezes, a realidade que encontram na empresa. "Hoje, os profissionais precisam ver sentido no que fazem. Mas os modelos reducionistas do passado mostram-se incompetentes para responder a essas questões existenciais", afirma Jair Moggi, diretor da consultoria Adigo, em São Paulo, e co-autor de dois livros sobre o tema: Como Integrar Liderança e Espiritualidade (Negócio Editora) e O Espírito Transformador (Editora Antroposófica). Nesse cenário turbulento, a espiritualidade desponta como um caminho para uma relação mais saudável entre os funcionários e as empresas em que atuam, considerando o trabalho como parte de algo que transcende os aspectos materiais e contempla, também, as dimensões psíquicas, sociais e espirituais. "As pessoas buscam alguma coisa que diminua a tormenta do cotidiano e as impeça de serem tragadas pelo mundo do trabalho", explica o filósofo e consultor Mário Sérgio Cortella, que também é professor titular do departamento de teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Detalhe: Cortella tem sido um dos mais requisitados palestrantes para executivos do país. Quando passa do plano das idéias para a prática, esse movimento espiritual se reflete em produtividade, criatividade e inovação. "Quando estão conscientes do seu papel na empresa e na sociedade, gostam do que fazem e acreditam nos valores da organização, os profissionais se sentem muito mais felizes e motivados", afirma Sergio Chaia, da Sodexho Pass. Por isso mesmo, cabe ao novo líder incentivar o desenvolvimento espiritual de sua equipe. Caso contrário, a empresa corre o risco de perder talentos para os concorrentes ou -- se conseguir segurar os funcionários na casa -- ver os resultados despencarem. "As empresas vencedoras sabem que a inovação e a ambição vêm do coração. Se você não trabalha com o coração, não é competitivo como deveria ser. E o mercado já não tem espaço para isso", diz Sergio. A HORA DA VIRADA Hoje essa percepção faz parte do dia-a-dia de Sergio. Mas houve um tempo em que não era bem assim. Há alguns anos, ele foi chamado à sala do então vice-presidente de recursos humanos da Sodexho Pass para a América do Sul, Plínio Romitto Júnior, e ouviu o seguinte: "Você é brilhante, mas tenta canalizar o reconhecimento para você mesmo. E isso é um problema. Porque o seu brilho nada mais é do que a soma do trabalho de sua equipe". Em princípio, Sergio resistiu à crítica. Depois ficou com raiva de si mesmo por não ter percebido logo isso. E, em seguida, começou a repensar toda sua forma de trabalhar. Hoje, ele não tem dúvidas de quem é o centro das atenções nessa história: o seu time. Tanto que não gosta de falar em primeira pessoa sobre qualquer aspecto relacionado ao trabalho. "Tudo é feito em conjunto. Eu dependo das pessoas mais do que elas dependem de mim. É um fato. Então, nada mais lógico que eu tenha de servi-las, para que tenham condições de fazer bem o seu trabalho", afirma. Esse modo de ver a vida profissional também faz parte do conceito de espiritualidade que guia o paulista Marcos Cominato, de 46 anos, diretor de recursos humanos da filial brasileira da Nokia, fabricante de celulares finlandesa. "Espiritualidade é a consciência de que não viemos ao mundo para nos auto-satisfazer, mas para nos colocarmos a serviço das outras pessoas. E isso não significa um ato isolado. É uma postura para as 24 horas do dia", afirma o executivo. Segundo ele, essa atitude vem como conseqüência da harmonia entre as quatro dimensões que formam o ser humano: racional, social, emocional e

O lider espiritualizado

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É ético, ajuda os colegas, serve em vez de ser servido. E, pode crer, não tem vergonha de dizer que depende da equipe para crescer...

O lider espiritualizado

Por Daniela de Lacerda* O moço sorridente que está na foto ao lado coordena um time de 385 pessoas numa multinacional francesa do setor de alimentação. Como chefe, no entanto, ele está mais preocupado em servir a seus funcionários do que em dar ordens. Seu maior propósito é ajudar sua equipe a se desenvolver, alinhando suas necessidades e valores aos da empresa. Com essa filosofia, ele e seu time superaram as metas previstas para o ano passado e estimam uma performance ainda melhor em 2005. Diretor-geral da Sodexho Pass no Brasil, o mineiro Sergio Chaia, de 40 anos, é um dos rostos da chamada liderança servidora, a grande tendência em gestão para os próximos anos. O movimento é capitaneado por executivos que não têm vergonha de levar a palavra amor para o mundo corporativo e acreditam que o

sucesso profissional passa pela consciência de seu papel no mundo. Soa singelo demais para você? Pois saiba que é essa postura que vai garantir a competitividade das empresas nos próximos anos. E quem não perceber sua importância corre o risco de ficar fora do mercado. Quem decreta é o guru norte-americano James C. Hunter, autor de O Monge e o Executivo, primeiro lugar no ranking dos livros de carreira mais vendidos no Brasil, com 100 000 exemplares comercializados até o fechamento desta edição. "Muitos executivos acham que, porque estão no comando, seus funcionários é que têm de servi-los. Mas isso já não funciona. Hoje, as empresas precisam contar com o coração, a mente e o espírito dos seus colaboradores. E só se consegue isso quando o líder deixa de lado o desejo de poder e serve, em vez de ser servido", afirma James (leia entrevista exclusiva com o autor nas páginas seguintes). O modelo pregado pelo consultor não é novo, mas só agora vem ganhando força, como um reflexo do crescente movimento de espiritualidade nas organizações. Essa corrente é uma resposta à alarmante crise existencial que assola o universo corporativo. Muitos profissionais já não se satisfazem apenas com a perspectiva de bater metas e receber um gordo bônus no fim do ano. Não querem mais atuar numa empresa que tem valores tão diferentes dos seus. Não estão mais dispostos a abrir mão da vida pessoal. Só que essa é, muitas vezes, a realidade que encontram na empresa. "Hoje, os profissionais precisam ver sentido no que fazem. Mas os modelos reducionistas do passado mostram-se incompetentes para responder a essas questões existenciais", afirma Jair Moggi, diretor da consultoria Adigo, em São Paulo, e co-autor de dois livros sobre o tema: Como Integrar Liderança e Espiritualidade (Negócio Editora) e O Espírito Transformador (Editora Antroposófica). Nesse cenário turbulento, a espiritualidade desponta como um caminho para uma relação mais saudável entre os funcionários e as empresas em que atuam, considerando o trabalho como parte de algo que transcende os aspectos materiais e contempla, também, as dimensões psíquicas, sociais e espirituais. "As pessoas buscam alguma coisa que diminua a tormenta do cotidiano e as impeça de serem tragadas pelo mundo do trabalho", explica o filósofo e consultor Mário Sérgio Cortella, que também é professor titular do departamento de teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Detalhe: Cortella tem sido um dos mais requisitados palestrantes para executivos do país. Quando passa do plano das idéias para a prática, esse movimento espiritual se reflete em produtividade, criatividade e inovação. "Quando estão conscientes do seu papel na empresa e na sociedade, gostam do que fazem e acreditam nos valores da organização, os profissionais se sentem muito mais felizes e motivados", afirma Sergio Chaia, da Sodexho Pass. Por isso mesmo, cabe ao novo líder incentivar o desenvolvimento espiritual de sua equipe. Caso contrário, a empresa corre o risco de perder talentos para os concorrentes ou -- se conseguir segurar os funcionários na casa -- ver os resultados despencarem. "As empresas vencedoras sabem que a inovação e a ambição vêm do coração. Se você não trabalha com o coração, não é competitivo como deveria ser. E o mercado já não tem espaço para isso", diz Sergio. A HORA DA VIRADA Hoje essa percepção faz parte do dia-a-dia de Sergio. Mas houve um tempo em que não era bem assim. Há alguns anos, ele foi chamado à sala do então vice-presidente de recursos humanos da Sodexho Pass para a América do Sul, Plínio Romitto Júnior, e ouviu o seguinte: "Você é brilhante, mas tenta canalizar o reconhecimento para você mesmo. E isso é um problema. Porque o seu brilho nada mais é do que a soma do trabalho de sua equipe". Em princípio, Sergio resistiu à crítica. Depois ficou com raiva de si mesmo por não ter percebido logo isso. E, em seguida, começou a repensar toda sua forma de trabalhar. Hoje, ele não tem dúvidas de quem é o centro das atenções nessa história: o seu time. Tanto que não gosta de falar em primeira pessoa sobre qualquer aspecto relacionado ao trabalho. "Tudo é feito em conjunto. Eu dependo das pessoas mais do que elas dependem de mim. É um fato. Então, nada mais lógico que eu tenha de servi-las, para que tenham condições de fazer bem o seu trabalho", afirma. Esse modo de ver a vida profissional também faz parte do conceito de espiritualidade que guia o paulista Marcos Cominato, de 46 anos, diretor de recursos humanos da filial brasileira da Nokia, fabricante de celulares finlandesa. "Espiritualidade é a consciência de que não viemos ao mundo para nos auto-satisfazer, mas para nos colocarmos a serviço das outras pessoas. E isso não significa um ato isolado. É uma postura para as 24 horas do dia", afirma o executivo. Segundo ele, essa atitude vem como conseqüência da harmonia entre as quatro dimensões que formam o ser humano: racional, social, emocional e

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espiritual. "Um profissional realizado, de alta performance, só consegue chegar a esse patamar se tiver os quatro aspectos em equilíbrio", diz Marcos. Antes de tentar colocar isso em prática, no entanto, é preciso entender o que significam cada uma dessas dimensões. Quem explica é a psicóloga Bene Catanante, sócia-diretora da consultoria Com Ciência Recursos Humanos e autora do livro Gestão do Ser Integral (Editora Gente). Segundo ela, a dimensão racional é a que usamos para definir nossos objetivos. Já a social significa que somos interdependentes e, por isso, precisamos aprender a conviver com a diversidade. A dimensão emocional está ligada ao impacto que nossas ações provocam nos outros, enquanto a espiritual significa crer em algo que transcende o material e dá sentido à vida. Se você consegue integrar e otimizar todos esses aspectos, como diz Marcos, o resultado naturalmente é visto no trabalho. É o que vem descobrindo a paulista Sônia Cruz, de 40 anos, gerente de relacionamento com clientes corporativos da Telefônica, grupo espanhol de telecomunicações, em São Paulo. À frente de uma equipe de 600 pessoas, Sônia sentia que era focada demais no trabalho e acabava deixando outros aspectos de sua vida em segundo plano -- o que, naturalmente, gerava uma grande angústia. Em busca de autoconhecimento, Sônia passou a fazer terapia e, recentemente, também começou a freqüentar um grupo de oração, que realiza palestras sobre temas ligados ao bem-estar. Os primeiros resultados já estão aí. No trabalho, ela hoje consegue enxergar oportunidades onde antes via problemas. "Estou mais serena. Antes ficava muito ansiosa diante de situações adversas", reflete. Ela também vem exercitando seu perfil de servidora. "Alguns dos nossos profissionais estavam acostumados a apenas executar. Não se identificavam com os objetivos comuns. Hoje sei que o meu papel é fazer com que eles vejam significado no que fazem e sintam-se donos do negócio. Com isso, todo mundo sai ganhando", afirma. PONTO DE PARTIDA Histórias como a de Sergio, Marcos e Sônia são exemplos de que, ainda que timidamente, o movimento da espiritualidade vai tomando corpo nas organizações brasileiras. Tanto que o tema já faz parte de processos de orientação de carreira. Marcos Aranha, sócio da consultoria One Wish For You, em São Paulo, dedica um módulo do seu programa de coaching exclusivamente para a espiritualidade. "Estimulamos o profissional a se questionar sobre por que está aqui", diz Marcos. O conceito também faz parte dos programas de gestão desenvolvidos para empresas por consultores como Jair Moggi, da Adigo. "Alguns executivos já perceberam que, para alcançar bons resultados, a organização precisa considerar as pessoas que estão por trás disso", afirma Jair. "Há 20 anos, eu seria chamado de louco por trabalhar conceitos espirituais nas empresas. Hoje é diferente. Não saio batendo na porta das empresas para vender consultoria. Elas vêm buscar esse serviço porque funciona." Entre seus clientes estão empresas como Caramuru Alimentos, Matel e Petrobras. Tem mais. A espiritualidade também vem sendo levada em consideração na seleção de executivos. "Procuro indicar, entre os candidatos que apresento às organizações, profissionais que vejam a empresa como um ser vivo e encarem a liderança como uma forma de acrescentar algo positivo para as pessoas e para o mercado", diz Laís Passarelli, diretora da Passarelli Consultores, em São Paulo, uma das principais empresas de seleção de executivos no Brasil. São profissionais como esses que estão abrindo caminho para a mudança. "As empresas que procuram harmonizar as relações de forma genuína, e não para ficar bem na foto, estão consolidando o modelo de gestão do futuro", afirma Jair Moggi. Mas o movimento ainda está só começando. Alguns executivos torcem o nariz para o tema e acham que isso não passa de um modismo inconseqüente. Outros até defendem a espiritualidade no trabalho, mas falam muito mais do que fazem. "No dia-a-dia, a maioria das relações profissionais continua a ser pautada por paradigmas do passado", diz Marcos Aranha. Um dos maiores problemas, segundo Jair, é o fato de que alguns profissionais estão muito presos à visão materialista e não conseguem trabalhar com a pergunta: "Por que não?". Outro ponto que provoca resistência é o fato de que muita gente considera a espiritualidade um sinônimo da religiosidade. "Isso assusta muitos executivos, que logo pensam em altares e velas em plena empresa", diz Floriano Serra, diretor de RH e qualidade de vida da Apsen Farmacêutica e autor do livro A Terceira Inteligência (Editora Butterfly). É bom deixar claro, portanto, que no universo corporativo esses conceitos não se confundem. A religiosidade pode até ser um caminho para a espiritualidade. Mas não obrigatoriamente. Aliás, obrigação é algo que não combina com espiritualidade. Nessa área, não existem fórmulas que valem para todos os funcionários e empresas. Muito menos regras a serem obedecidas cegamente. "Se você trata a espiritualidade como uma imposição, qualquer movimento nesse sentido tem pouquíssimas chances de dar certo", afirma Sergio Chaia. O QUE É ESPIRITUALIDADE * Significa a capacidade de pensar, sentir e agir com base na crença de que existe algo maior do que os aspectos materiais. * Representa a busca de significado para o papel do ser humano na empresa, na família, na sociedade (e o conseqüente equilíbrio dessas várias dimensões). * É uma postura de vida, não envolve rituais. * Tem elementos comuns a todas as religiões, como amor, esperança, liberdade, igualdade etc. RELIGIOSIDADE * Representa várias correntes (religiões) que conduzem à espiritualidade. * Baseia-se na forma como os fundadores de cada religião viam o mundo. * Envolve rituais e costumes. * Ganha novas vertentes de acordo com os contextos históricos e culturais. EM VEZ DE FALAR, FAÇA Se o crescimento espiritual se reflete em produtividade, cabe ao líder promover esse desenvolvimento. Mas como é que isso funciona na prática? Pedimos a Sergio Chaia, diretor-geral da Sodexho Pass, para contar um pouco da experiência de sua equipe nessa área. O trabalho parte do princípio que o crescimento espiritual representa uma maior consciência do papel do colaborador não só na empresa, mas em todas as esferas da sua vida. Para estimular essa consciência, a Sodexho Pass promove atividades que conduzem a uma reflexão sobre os objetivos e os valores dos profissionais. * Semanalmente, são realizadas sessões de ioga e meditação, que estimulam o autoconhecimento.

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* A empresa também incentiva o desenvolvimento espiritual por meio da responsabilidade social. Com isso, o funcionário: - ajuda o outro a se desenvolver; - reforça a consciência de que faz parte do todo e pratica a lei da reciprocidade (que diz que suas ações acabam voltando para você); - minimiza seus próprios problemas e adota uma postura mais positiva. * Os objetivos e resultados de cada área são trabalhados com transparência. Isso fortalece a sensação de pertencimento. "As pessoas sentiam falta de saber para onde a empresa estava indo", diz Sergio. * Os profissionais têm autonomia (e assumem essa responsabilidade). A Sodexho Pass acredita que as pessoas fazem mais e melhor quando sentem que contribuíram com seu esforço. * Cada conquista é celebrada, partindo-se do princípio de que o que move o homem é o reconhecimento. * Em vez de falar, os líderes fazem. Dessa forma, levam o funcionário a refletir sobre essas ações, encontrando suas próprias respostas. * O respeito à diversidade é a base detodo o relacionamento profissional. SO SE FALA NISSO * Em abril, a espiritualidade é tema do Global MindChange Forum, evento sobre a mudança de consciência das organizações, que será realizado em São Paulo. * O Ibap Educação Empresarial, em Salvador, vem realizando palestras e seminários sobre a espiritualidade nas empresas desde 1995 e, este ano, planeja um novo evento sobre o tema. * Em março, a espiritualidade no trabalho foi alvo de um encontro de profissionais de RH realizado na Câmara Americana de Comércio (Amcham), em São Paulo. * Nos Estados Unidos, o assunto também vem mobilizando o mercado. Em março, o Babson College, tradicional pólo de empreendedorismo, promoveu a oitava edição do International Symposium on Business & Spirituality ("Simpósio Internacional sobre Negócios e Espiritualidade"). * O Instituto Metanexus, também nos Estados Unidos, criou um fundo de investimento para pesquisas sobre o capital espiritual nas organizações e abriu inscrições para o programa. POR QUE OS PROFISSIONAIS ESTÃO EM CRISE Apesar de os conceitos espirituais nas organizações já serem discutidos há vários anos, só agora eles estão realmente ganhando força. O motivo é simples: os profissionais chegaram a uma situação-limite e simplesmente não estão agüentando mais. "Há uma forte demanda por outra relação com o trabalho. As pessoas não querem mais se sentir desumanizadas e pagar o preço de perder sua identidade, de perder o encanto da vida", diz o filósofo Mário Sergio Cortella. Esse movimento que está explodindo agora é o reflexo de um longo processo de quebra de vínculos, como explica o consultor Jair Moggi, da Adigo. A humanidade rompeu a relação com a terra, que, em vez de ser venerada como era antigamente, passou a ser destruída. O homem também quebrou os laços de sangue, desvalorizando a ligação com a família. Desfez-se de normas e tradições que garantiam sua estabilidade. E desligou-se de Deus, como mostra a grande crise por que passam as religiões. Como conseqüência de todo esse processo, veio uma angústia profunda e um expressivo questionamento existencial, que agora resulta numa tentativa de resgate desses vínculos -- de uma forma mais consciente e particular, por meio da espiritualidade. Nesse contexto, a empresa tem um papel decisivo. "Qual a única entidade que pode destruir ou consertar o mundo hoje?", pergunta Jair. "Não é mais a Igreja, um líder carismático ou um partido político. É a organização." Segundo ele, o universo corporativo é o principal pólo de aprendizagem dos nossos tempos e, por mais que se esforcem, as universidades estão sempre um passo atrás em relação à realidade corporativa. "As organizações são grandes palcos cármicos, onde as pessoas se encontram para aprender umas com as outras. O melhor case que você pode estudar está acontecendo ao seu lado", afirma o consultor.

POR QUE OS PROFISSIONAIS ESTÃO EM CRISE Apesar de os conceitos espirituais nas organizações já serem discutidos há vários anos, só agora eles estão realmente ganhando força. O motivo é simples: os profissionais chegaram a uma situação-limite e simplesmente não estão agüentando mais. "Há uma forte demanda por outra relação com o trabalho. As pessoas não querem mais se sentir desumanizadas e pagar o preço de perder sua identidade, de perder o encanto da vida", diz o filósofo Mário Sergio Cortella. Esse movimento que está explodindo agora é o reflexo de um longo processo de quebra de vínculos, como explica o consultor Jair Moggi, da Adigo. A humanidade rompeu a relação com a terra, que, em vez de ser venerada como era antigamente, passou a ser destruída. O homem também quebrou os laços de sangue, desvalorizando a ligação com a família. Desfez-se de normas e tradições que garantiam sua estabilidade. E desligou-se de Deus, como mostra a grande crise por que passam as religiões. Como conseqüência de todo esse processo, veio uma angústia profunda e um expressivo questionamento existencial, que agora resulta numa tentativa de resgate desses vínculos -- de uma forma mais consciente e particular, por meio da espiritualidade. Nesse contexto, a empresa tem um papel decisivo. "Qual a única entidade que pode destruir ou consertar o mundo hoje?", pergunta Jair. "Não é mais a Igreja, um líder carismático ou um partido político. É a organização." Segundo ele, o universo corporativo é o principal pólo de aprendizagem dos nossos tempos e, por mais que se esforcem, as universidades estão sempre um passo atrás em relação à realidade corporativa. "As organizações são grandes palcos cármicos, onde as pessoas se encontram para aprender umas com as outras. O melhor case que você pode estudar está acontecendo ao seu lado", afirma o consultor.

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Faça como Jesus Por Daniela de Lacerda Monge e o Executivo (Editora Sextante) está se tornando febre no mundo corporativo. Já foram vendidos 100 000 exemplares no Brasil. E tem até diretor de multinacional distribuindo o livro para seu time de gerentes. O autor dessa proeza é o consultor norte-americano James C. Hunter, que conta a história de um executivo em busca de soluções para seus dilemas pessoais e profissionais durante uma temporada num mosteiro beneditino. A saída proposta pelo autor é a chamada liderança servidora, que se baseia na teoria de que liderar significa servir. O tema fez tanto sucesso que já rendeu um segundo livro, The World's Most Powerful Leadership Principle How to Become a Servant Leader ("O mais poderoso princípio da liderança Como se tornar um líder servidor"). Lançado em 2004 nos Estados Unidos, o título

também foi comprado pela Sextante e deve chegar ao Brasil em 2006. Pregando a filosofia do líder que serve, James não só conquistou muitos leitores, mas também grandes clientes, incluindo a Força Aérea Americana e empresas como American Express, Merck, Nestlé e Procter & Gamble. Em entrevista exclusiva a VOCÊ S/A, o consultor falou sobre a espiritualidade no escritório, disse que é preciso amar o colega de trabalho e que os novos líderes devem buscar inspiração num homem que não tinha poder nenhum, não fez MBA, nunca assistiu a uma palestra de Tom Peters nem sequer pisou numa empresa. "O maior líder de todos os tempos foi Jesus Cristo", afirma. Descubra por quê. O QUE OS NOVOS LIDERES PRECISAM APRENDER COM JESUS CRISTO? James Hunter Liderança representa a sua capacidade de influenciar pessoas a agir. E nisso Jesus era imbatível. Ninguém pode negar que esse homem exerceu uma grande influência no planeta. Não é um ponto de vista religioso. É um fato. Uma vez que concordamos sobre isso, passamos para o segundo ponto dessa conversa. Se Jesus tinha tanta influência, nós devemos prestar atenção no que ele tinha a dizer sobre liderança. Por que ele era muito bom nisso. E o que ele falava era o seguinte: as pessoas devem seguir você de livre e espontânea vontade. Isso significa exercer a liderança por meio da autoridade, e não do poder. Quando você usa o poder, você obriga as pessoas a fazerem a sua vontade, por conta da posição que você ocupa. Quando usa a autoridade, as pessoas fazem o que você quer de boa vontade, por sua influência pessoal. Esse é o único meio de contar com o coração, a mente e o espírito dos profissionais. POR QUE A EMPRESA PRECISA TER O CORAÇÃO, A MENTE E O ESPIRITO DO FUNCIONARIO? J H Muitas vezes as organizações usam apenas as pernas, braços e mãos dos funcionários. Digo que, nesse caso, a empresa conta com eles do pescoço para baixo. E o resultado é o seguinte: os profissionais se tornam apáticos. Perdem o interesse, a criatividade, a excelência. E isso não é competitivo no mercado globalizado. Para ser bem-sucedida, é preciso contar com os profissionais do pescoço para cima. Por que é exatamente isso o que os concorrentes estão tentando fazer. COMO CONQUISTAR OS FUNCIONARIOS DO PESCOÇO PARA CIMA? J H Esse processo passa pelo conceito de espiritualidade. Isso significa reconhecer que podemos encontrar um significado maior no que fazemos do que simplesmente operar uma máquina oito horas por dia. E o líder tem um papel muito expressivo nesse contexto. Cabe a ele lembrar às pessoas que o que elas fazem é muito importante, ajudá-las a ver sentido no seu trabalho e a se desenvolver. Em resumo, cabe ao líder servir. Quanto mais servimos, mais bem-sucedidos nós somos. E vice-versa. Recente pesquisa do Gallup mostra que dois terços dos funcionários que deixam seus empregos na verdade estão se demitindo de seus chefes e não das empresas. E a espiritualidade está influenciando esse movimento. As pessoas param e pensam: "Há algo mais do que trabalhar 40 anos para um chefe que não me entende nem valoriza. Quero que minha vida seja mais do que isso". A liderança baseada no poder está entrando em colapso. E a conseqüência é uma forte pressão, nas corporações, pela formação de líderes que atendam às novas demandas dos profissionais. As organizações não podem perder seus talentos. A TEORIA DA LIDERANÇA SERVIDORA FOI FORMALIZADA NA DÉCADA DE 70. POR QUE SO AGORA GANHOU FORÇA NAS EMPRESAS? J H Depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos não tinham concorrentes no mercado internacional, porque grande parte do mundo civilizado estava em ruínas. Então, as empresas podiam contar com seus funcionários apenas do pescoço para baixo. Henry Ford costumava dizer: "Por que tenho de ter a pessoa inteira se preciso apenas de um par de mãos? Não preciso que ela pense". Nós pagamos um preço por isso. Anos depois da guerra, alguns dos países que tinham sido destruídos, como o Japão, começaram a se reconstruir. E o que eles nos ensinaram é que você tem de contar com pessoas engajadas. Hoje, poucas empresas adotam a fórmula "do pescoço para baixo". Porque isso não é competitivo. Algumas das empresas mais bem-sucedidas no mercado norte-americano seguem o conceito da liderança servidora. Dê uma olhada na lista das companhias mais admiradas dos Estados Unidos, publicada em março deste ano pela revista Fortune. Entre as empresas que ocupam as seis primeiras posições, quatro exercem essa prática: Starbucks (3o lugar), Wal-Mart (4o lugar), Southwest Airlines (5o lugar) e FedEx (6o lugar). Gostaria de dizer que isso acontece pelos motivos certos, mas a realidade é a seguinte: as velhas fórmulas já não funcionam. E quem não percebe isso simplesmente está sendo jogado para fora do negócio. EM O MONGE E O EXECUTIVO VOCE DIZ QUE O LIDER DEVE AMAR SUA EQUIPE. QUAL A REAÇÃO DOS EXECUTIVOS A ESSA TEORIA? J H Eu realmente questionei a idéia de incluir a palavra amor no meu modelo de liderança servidora. Passo 95% do meu tempo falando para homens de negócios na América corporativa e imaginava que, se mencionasse o amor, as pessoas não iriam me contratar. Mas isso é apenas uma questão de ignorância. A língua inglesa, em particular, destruiu a definição clássica de amor. Nós associamos essa palavra a sentimento. Mas o que importa é o comportamento. O verdadeiro amor significa espontaneamente servir o outro e ajudá-lo a se tornar o melhor que ele pode ser. Esse é o grande teste da

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liderança. Quando as pessoas partem, elas estão melhores do que quando chegaram? Elas cresceram? Se desenvolveram? São profissionais melhores? Ajudá-las a fazer isso exige amor -- o que não significa ser bonzinho. Algumas vezes, amar significa "abraçar". Em outras, "bater". Em O Monge e o Executivo, menciono que a esposa do personagem John Daily não gosta muito dele em alguns momentos. Assim como acontece com a minha. Mas isso não quer dizer que ela não me ama. Ela continua paciente, gentil, comprometida. Ainda está no jogo. E é isso o que precisamos entender. Amar é uma escolha. QUAL A MAIOR DIFICULDADE QUE O LIDER ENFRENTA PARA APRENDER A AMAR E A SERVIR? J H O principal desafio é vencer o ego. Isso atrapalha muito. Mas é só uma questão de educação. Muita gente não tem idéia do que é a liderança servidora. Pensam que a liderança está ligada ao poder, porque foi o que aprenderam. Era assim que o seu pai agia. Que o seu

chefe agia. Agora, é preciso ver a liderança de uma outra forma. Esse é o primeiro passo. Mas é preciso muito mais. Concordar intelectualmente com esse conceito é uma coisa. Fazer disso parte da sua vida é bem diferente. E o ego é uma das coisas que mais dificulta esse processo. No fim, é uma questão de escolha: você vai ser um líder servidor ou um líder que serve a você mesmo? Várias pessoas ainda preferem servir a elas mesmas. Mas isso está mudando.

Aprenda a servir Por Marcos Gusmão O princípio é bíblico: amar ao próximo. E isso independe se o próximo é um colega preguiçoso, um dos seus subordinados encrenqueiros ou, acredite, seu chefe. É, o verbo amar pode parecer forte demais para o contexto corporativo e para o papel do líder. Mas não é. A pessoa apropriada para assumir a liderança manifesta seu amor agindo, naturalmente, como facilitadora do processo de engajamento e desenvolvimento da organização. Em outras palavras: não visa apenas aos resultados. O foco do líder deve estar nas pessoas que fazem o resultado da empresa acontecer. Afinal, uma corporação é um sistema orgânico, não mecânico. O fato é que anda todo mundo sobrecarregado de trabalho, poucos se mantêm motivados e alguns até desistem de buscar significado maior para o que fazem no escritório. "Está todo mundo de saco cheio", resume Vicky Bloch, diretora da DBM no Brasil, uma das mais respeitadas especialistas do país em relações humanas nas empresas. Por isso, esse novo jeito de lidar com a equipe se expande como um sopro de esperança e abre espaço para que pessoas bacanas -- dispostas, entre outras coisas, a perder tempo para ouvir, de verdade, o que os outros têm a dizer -- cresçam quando assumem posição de liderança. Aliás, o trabalho do líder nem deveria aparecer, somente o da sua equipe. É tão profunda essa transformação que se exige dos chefes a disciplina de investir tempo para refletir sobre seu papel e sua missão de vida. Ou seja, o que está sendo proposto aos gerentes e diretores é que vivenciem um processo de autoconhecimento contínuo. E que se façam periodicamente duas perguntas básicas: "A quem eu sirvo?" e "Com que objetivo?". "É preciso ter maturidade emocional para adotar essa postura de vida", diz Vicky. Para as empresas, esse papo veio a calhar. "Essa nova liderança, aplicada em diferentes organizações, se revelou uma arma poderosa para desenvolver o potencial e os valores intrínsecos do ser humano", diz o professor Robson Marinho, coordenador do mestrado em liderança da Universidade Santo Amaro, de São Paulo. Robson representa no país a entidade Robert K. Greenleaf Center for Servant-Leadership, uma sociedade internacional sem fins lucrativos sediada em Indianápolis, nos Estados Unidos, berço do conceito de líder servidor no mundo dos negócios. Robert K. Greenleaf (19041990), que passou a maior parte de sua vida profissional na AT&T, usou pela primeira vez a expressão "liderança servidora" em um ensaio publicado em 1970. Depois da AT&T, ele atuou, durante 25 anos, como consultor em várias instituições, como Fundação Ford, Universidade de Ohio e MIT (Massachusetts Institute of Technology), nos Estados Unidos. A mensagem que ele transmitia e que o centro perpetua fala de empresas tratando funcionários e clientes com justiça -- e em profissionais estimulados em seu crescimento pessoal. Enfim, um mundo onde os líderes são incapazes de frustrar a confiança de quem quer que seja. Essa nova liderança implica atender às necessidades de muitos, não de poucos. Mas como isso é possível? Para ser um líder comprometido com as pessoas, segundo o guru americano, é necessário passar por uma mudança interior, cujo resultado vai ser a incorporação de pelo menos cinco atitudes em sua vida: 1 OUVIR SEM JULGAR Antes de dar conselhos ou fazer pré-julgamentos, é preciso ouvir com atenção as preocupações e necessidades das pessoas com quem trabalha. Unir-se a elas na busca de soluções, portanto, é fundamental. 2 SER AUTENTICO Deve-se admitir abertamente seus pontos fracos e suas limitações. Quando o líder tem essa postura a respeito de sua própria vulnerabilidade, as pessoas aprendem a confiar nele e a respeitá-lo como uma pessoa verdadeira e coerente. 3 TER SENSO DE COMUNIDADE Hoje, faz bem criar na equipe um clima de companheirismo e amizade, como se todos pertencessem a uma família em que se partilham as emoções, tristezas e alegrias, preocupações e vitórias, intercalando as exigências do trabalho com momentos de comemoração e lazer. A época do gelo profissional, em que as pessoas eram tratadas à distância, já passou. 4 PARTILHAR PODER Mais do que delegar funções, o líder deve dividir com a equipe o poder de ter iniciativa e tomar decisões, mesmo com o risco de vê-la cometer alguns equívocos. 5 VALORIZAR O DESENVOLVIMENTO DAS PESSOAS Cada integrante da equipe tem um valor próprio, uma experiência própria e um potencial próprio a ser desenvolvido, tanto no sentido pessoal quanto profissional. O investimento nesse potencial humano é um compromisso do líder. Quando as pessoas crescem, a empresa cresce junto com elas. Na prática, ao ser incorporadas, essas atitudes levam as pessoas a ter sucesso em tarefas desafiantes. Ninguém mais se sente sozinho no escritório, e isso faz toda diferença. Uma experiência bem-sucedida é da Nutrimental, de São José dos

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Pinhais, arredores de Curitiba. No início dos anos 90, o faturamento da companhia caiu 70 pontos percentuais, quando ela perdeu um contrato de fornecimento de merenda escolar para a rede pública de ensino. Houve cerca de 1 000 demissões. Para reverter esse quadro, a direção buscou inspiração na liderança servidora. Foi introduzido também, em 1997, o conceito de "investigação apreciativa", criado pelo consultor americano David Cooperrider. Ele afirma que é melhor fortalecer os pontos positivos em vez de ir à caça dos pontos negativos. Essa idéia é disseminada no país pela entidade Espiritualidade e Liderança para Organizações Saudáveis (Elos), de São Paulo. O controller da Nutrimental, Joselito Mendes de Oliveira, paranaense de 43 anos, vivenciou todo esse processo. "Vencemos os desafios e nunca mais a empresa foi a mesma", afirma. A receita bruta cresceu 130% entre 1997 e 2004, alcançando 154 milhões de reais. A empresa passou a fabricar cereais matinais, barras energéticas e biscoitos. Também se abriu ao varejo e foi disputar mercado com a Nestlé e Kellog's. Nos corredores, os diretores passaram a ser chamados de "patrocinadores executivos". "Assim, ficou mais claro o que as pessoas esperam dos executivos, ou seja, que eles não tentem dirigi-las", diz Bruna Pachelli, coordenadora de gestão de pessoas da Nutrimental. A implantação da liderança servidora na Nutrimental levou um ano. Ao longo dos 12 meses, cerca de 700 funcionários puderam falar o que pensam de verdade para seus chefes. "Foi difícil e um dos líderes pediu demissão porque só queria impor suas vontades", conta Joselito. Pai de três filhos, o controller usa as novas teorias em casa. "Agora pergunto aos meus filhos como eles podem repetir uma nota boa em uma disciplina em que não vão bem." Uma lição aprendida pelos executivos da Nutrimental é que se tornar um novo líder exige um processo de aprendizado de dentro para fora. Por isso, prescinde que cada um decida mudar por si só. "No fundo, a liderança servidora está apenas um pouco mais evoluída em uns do que em outros", diz Elaine Saad, diretora da Right Saad-Fellipelli. Irá alcançá-la quem conjugar a consciência dessa missão com o desenvolvimento de competências para realizá-la. E a missão -- que fique registrado -- é levar as pessoas a crescer e a desenvolver o que têm de melhor. Os treinamentos convencionais de liderança não dão conta desse recado. Hoje, os cursos tendem a abordar muito mais o conceito de poder do que a capacidade de reconhecimento de competência que leva um grupo de profissionais a atingir seus objetivos. Por essa razão, a baiana Magda Beck, 38 anos, buscou um solução alternativa. Gerente da área de gestão de projetos do departamento de gestão de risco e compliance do Bradesco, em São Paulo, a executiva matriculou-se no Programa de Desenvolvimento de Líderes em Relações Conscientes, da Elos. "Nos encontros com outros gerentes e diretores buscamos inspiração para encontrar uma nova forma de olhar a carreira e as pessoas", diz. Magda aprendeu a controlar seus impulsos de autoritarismo e passou a admitir publicamente que é uma pessoa sensível e espiritualizada -- e que quer trabalhar com gente como ela. "Encontrei suporte do comando do banco e agora reproduzo os conceitos de espiritualidade e liderança no meu trabalho", afirma Magda. É essencial que o ambiente no escritório respeite as pessoas como elas são, pois assim se valoriza a diversidade e ela favorece esse tipo de mudança. "Se as companhias não se prepararem para ter esse tipo de ambiente, perderão os líderes especiais e uma enorme vantagem competitiva", avisa Elaine, da Right Saad-Fellipelli. SOLTE O VERBO O novo líder costuma demonstrar interesse pela equipe estimulando o diálogo verdadeiro entre as pessoas. Confira abaixo sete perguntas que ajudam a dar um novo sentido à comunicação entre chefe e subordinado: * Quais necessidades você tem aqui que nós não conhecemos? * Se você pudesse mudar alguma coisa na empresa, o que mudaria? * O que preciso fazer para ser um líder melhor? * Como a empresa e eu podemos dar mais assistência a você? * Você gosta do que faz aqui, por que não me diz quais são suas metas para os próximos 12 meses? * Como tem sido o feedback das suas colocações e queixas? * Quais obstáculos você encontra para melhorar sua performance? Fonte: The World's Most Powerful Leadership Principle, de James C. Hunter INSPIRAÇÃO BRASILEIRA O guru norte-americano Robert K. Greenleaf definiu a liderança servidora como um modo amplo e profundo de ver a vida e o trabalho. Nas empresas onde esse novo conceito é aplicado, a antiga forma de comando "de cima para baixo" é, fatalmente, desprezada. Em seu lugar nasce uma cultura corporativa mais igualitária. Na companhia aérea americana Jet Blue, esse jeito diferente de tocar os negócios tem inspirado lealdade dos empregados e até mesmo dos clientes. Em entrevista à edição em inglês da Harvard Business Review, publicada em março, David Neeleman, CEO e fundador da Jet Blue, afirma que se esforça para eliminar as diferenças de status entre os funcionários e servi-los melhor. Por essa razão, David tem mesa e cadeira do mesmo tipo das usadas por qualquer um do escritório. Os executivos não têm vagas de estacionamento reservadas e o café servido na cozinha é o mesmo para todo mundo. "Eu digo aos meus pilotos que há pessoas que fazem mais dinheiro na empresa do que outras, mas isso não significa que você deve ostentar essa condição", diz David na entrevista. Os passageiros da companhia também são tratados sem distinção de classes dentro dos aviões. David teve o insight para servir em vez de ser servido após uma forte experiência de vida no Brasil. Ele esteve por aqui, há 20 anos, para um trabalho voluntário numa favela no Rio de Janeiro. O executivo, na época um recém-formado pela Universidade de Utah, descobriu um enorme prazer em ajudar as pessoas. Hoje, sempre que tem oportunidade, ele atende clientes diretamente, carrega sua própria bagagem durante as viagens e costuma alugar um carro padrão mediano. O CEO incorporou tanto os princípios da liderança servidora que apoiou a criação do Jet Blue Crewmember Crisis Fund. Todos na empresa dão dinheiro para o fundo. Os recursos ajudam funcionários em situação de emergência. Por exemplo, quando um deles precisa ir a uma sessão de quimioterapia, a empresa paga a babá para cuidar do seu filho. Isso é servir. Por essas e outras, a empresa de David cresce ano a ano enquanto outras companhias aéreas americanas vão voando baixo em direção à bancarrota.

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A cruzada da IBM Por José Eduardo Costa Neste momento, a IBM está fazendo um dos movimentos mais ousados de sua história de 94 anos. Não se trata apenas de mudar para garantir o lugar que ocupa atualmente como número um no setor de tecnologia da informação. É uma questão de sobreviver, no longo prazo, num cenário que se renova a cada instante. E, para isso, a multinacional americana está reformulando seu modelo de gestão. Está ficando para trás um sistema engessado e burocrático que não se ajusta mais à agilidade necessária a uma empresa de tecnologia. Ao longo das décadas, esse jeito de trabalhar foi podando a criatividade dos funcionários e tornando os líderes distantes e intocáveis. O reflexo natural disso foi perda de competitividade e desmotivação generalizada. No novo modelo, saem as regras e entram três valores que

funcionam como pilares: confiança e responsabilidade individual, inovação e dedicação ao sucesso do cliente. "A cultura corporativa é a segunda alma da pessoa. Hoje, nosso maior desafio é incutir esses valores no dia-a-dia dos funcionários", diz Paulo Portela, diretor de recursos humanos da IBM no Brasil. O fato é que a mudança já está em andamento e os primeiros coelhos estão apenas saindo da cartola. Desde que a primeira faísca da gestão de valores foi detonada, em julho de 2003, as pesquisas periódicas de clima interno apontam um aumento no nível de satisfação dos colaboradores. De 2002 para 2004, o índice de satisfação dos funcionários, medido pela IBM, cresceu oito pontos. O resultado faz sentido, considerando que desde o início a companhia envolveu todo o time em uma operação titânica. Capitaneada pelo atual CEO mundial, Sam Palmisano, a IBM se jogou numa verdadeira cruzada: ouvir, via intranet, todos os 350 000 funcionários sobre qual o significado da IBM para eles e a que valores cada um associava o nome da empresa. Nos três dias em que a discussão se seguiu, foram postados cerca de 10 000 comentários. O resultado dessa consulta foi processado durante seis meses. A síntese dessa história são os três valores que devem nortear a vida dos profissionais da IBM nas próximas décadas. Para acompanhar a implantação dessa nova filosofia em todos os 165 países em que a gigante azul está presente, Sam nomeou, em abril de 2004, a executiva francesa Laurence Guihard-Joly. Há 21 anos na IBM, Laurence tem como missão trabalhar em iniciativas para dar vida aos três valores e melhorar o clima interno. "Tenho conversado com executivos da IBM no mundo todo. E o envolvimento deles no projeto é notável. A última pesquisa mostrou que 67% de todos os funcionários entendem quais são os novos valores. Por outro lado, apenas três em cada dez sabem de que forma aplicar isso no dia-a-dia", disse Laurence a VOCÊ S/A, quando visitou o Brasil no mês passado. É por isso que a IBM está investindo em treinamento. Em 2004, foram gastos 700 milhões de dólares com esse item no mundo todo. LIBERDADE DE AÇÃO Numa estrutura baseada em valores, os profissionais são chamados a decidir, em todas as esferas. "Estamos preparando gerentes e diretores para lidar com autonomia e para ser mais tolerantes com os erros. Afinal, se queremos pessoas ousadas e inovadoras, os chefes têm de ser mais condescendentes", diz Paulo Portela, diretor de RH da empresa. A idéia é que o gerente assuma o papel de parceiro que identifica as necessidades da equipe e a treina para alcançar o melhor resultado para todos. "As pessoas passam a ser orientadas para atingir metas coletivas", diz Paulo. Isso não significa que a IBM está deixando de lado as avaliações individuais de desempenho e os prêmios para quem apresenta a melhor performance. Ao contrário, os gerentes, afirma Paulo, têm liberdade para decidir se desejam pagar os top performances com salários até acima dos praticados no mercado. A gerente de vendas, Elaine Mendonça, 30 anos, incorporou rapidamente a nova filosofia de trabalho. A IBM tem um evento anual chamado Tech Day, no qual exibe para vários clientes seus produtos e serviços. Dias antes do evento, Elaine teve a idéia de apresentar para todos os departamentos o histórico de uma grande rede de supermercados com quem a IBM queria ampliar seus negócios. Ela bolou uma apresentação sobre as necessidades do cliente para que cada área pudesse "customizar" seus produtos, de acordo com os interesses da rede de supermercados. Resultado: no dia do evento, a IBM fez um excelente acordo e Elaine ganhou muitos pontos. Outra questão que está sendo revista é o tipo de profissional que a empresa deseja contratar. E esse é um ponto crítico, pois a companhia está em expansão no mundo todo. Somente no Brasil, 2 400 vagas deverão ser preenchidas neste ano. Daqui para frente, proatividade, flexibilidade e capacidade de aprendizado contínuo são competências fundamentais para quem deseja fazer parte do time. Há dois anos na IBM, o especialista de vendas Luís Babolin, 23 anos, reúne algumas dessas competências. Todo começo de mês, ele passava horas analisando planilhas contábeis que demonstravam seus resultados em vendas no mês anterior. A tarefa tomava quatro dias de trabalho. Para dar fim ao serviço burocrático, Luís criou uma planilha no computador que faz todos os cálculos automaticamente. Agora toda a tarefa leva pouco mais que algumas horas. "Depois que vi que o programa realmente dava resultado, encaminhei a planilha para o time de vendas. O pessoal gostou tanto que já começou a usar", diz. MAIS PRESENTE NA SOCIEDADE Esse relacionamento de parceria também está mudando a forma como a gigante azul se relaciona com a sociedade. "Queremos ser vistos como uma empresa focada em valores", diz Vera Dias, executiva de comunicação. O projeto social de maior expressão hoje na IBM se chama On the Man Community. Funciona assim: todo funcionário que trabalha como voluntário de uma ONG pode cadastrar essa organização na IBM. A exigência é que ele leve toda a documentação da organização para que a empresa cheque sua legalidade e a qualidade do serviço prestado à comunidade. Se, no final de um ano, o funcionário disser (isso mesmo, basta a palavra dele) que trabalhou 40 horas para a instituição, a ONG pode receber de 3 500 a 7 000 dólares, dependendo da área de atuação. Como se vê, a gestão por valores é um processo que está transformando a IBM por dentro e por fora. Se vai dar certo? Para o consultor carioca Augusto Carneiro, da Zaitech, o maior risco desse tipo de gestão é criar uma cultura extremamente homogênea. "E, num lugar onde não há debate, não há troca de idéias nem inovação, pois todos pensam da mesma forma", diz o consultor. Laurence, a executiva que é o braço operacional da missão, não tem dúvida sobre o que está em jogo: "Acreditamos cegamente que estamos transformando a IBM num local melhor para se trabalhar. Mas não é só. Queremos

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criar a melhor companhia para o investidor e a empresa mais confiável aos olhos da comunidade. E somente uma IBM orientada por valores pode conseguir, simultaneamente, estes objetivos", diz Laurence. COM A PALAVRA, O CEO Há 31 anos, Sam Palmisano começou na IBM como vendedor. Em 2002, ele se tornou o presidente da empresa. Desde então, deu início a uma campanha para transformar a gigante azul numa companhia guiada por valores. Veja por que ele defende essa mudança: " Muitas pessoas se tornaram céticas. Perderam a fé de que uma companhia pode operar à base de credos. Eu acredito que estamos criando algo totalmente novo, que se estenderá muito além de nosso tempo. No passado, os computadores da IBM eram nosso maior ativo. Hoje, vivemos na era do conhecimento e as pessoas são o nosso patrimônio. Por conta de um modelo em que as ordens são ditadas de cima para baixo, a IBM se tornou uma empresa burocrática. Fomos sepultando a capacidade de inovação das pessoas. Somente com uma gestão focada em valores é possível unir e motivar uma força de trabalho tão grande quanto a da IBM. " OS VALORES NO DIA-A-DIA O maior desafio da IBM hoje é transformar seus valores em ações. Alguns exemplos mostram que a companhia está dando os primeiros passos VALOR: Confiança e responsabilidade COMO ELE SE TRADUZ EM AÇÃO: Quatro em cada dez IBMistas trabalham fora do escritório. * VALOR: Inovação COMO ELE SE TRADUZ EM AÇÃO: A empresa está treinando os gerentes para serem mais tolerantes ao erro. Os funcionários são incitados a criar mais. VALOR: Sucesso do cliente COMO ELE SE TRADUZ EM AÇÃO: Os vendedores têm maior liberdade para acertar preços, fechar prazos e negociar como vão entregar o produto.

Fonte: Revista Você S/A - Edição 82 - Abril de 2005

Data da publicação no Web site da CompanyWeb 25/05/2005

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Origem: http://www.companyweb.com.br/lista_artigos.cfm?id_artigo=120 Acessado em 25/11/09 ás 21h20