Upload
others
View
0
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE BIGUAÇU CURSO DE DIREITO
O MINISTÉRIO PÚBLICO E O CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL
GABRIEL ANNONI CARDOSO
Biguaçu, Junho de 2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO DE BIGUAÇU CURSO DE DIREITO
O MINISTÉRIO PÚBLICO E O CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL
GABRIEL ANNONI CARDOSO
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Msc. Celso Wiggers
Biguaçu, Junho de 2008
2
AGRADECIMENTOS
Aos familiares e àqueles que, fazendo parte de
minhas relações, auxiliaram-me com o afeto e
toda consideração.
Ao meu orientador, Professor Celso Wiggers, pelo
ensinamento desprendido, pela atenção, pela
certeza e confiança depositadas na conquista
dessa etapa.
Aos colegas de turma, pela alegria da convivência
do dia-a-dia, pelo crescimento que juntos tivemos,
na cumplicidade e na diversidade de opiniões,
pela busca da construção de um saber.
Aos colegas de trabalho e ao Promotor de Justiça,
Dr. Alexandre Herculano Abreu, da 30ª
Promotoria de Justiça da Comarca da Capital,
pelo apoio e compreensão durante a realização
deste trabalho.
À Direção do Curso de Direito – Campus Biguaçu,
primeiramente, na gestão da Professora Msc.
Helena Nastassya Paschoal Pitsica e,
posteriormente, pelo Professor Msc. Alceu de
Oliveira Pinto Júnior.
Ainda, por fim, aos professores do Curso de
Direito, pela disponibilidade na edificação da
relação de ajuda, por terem sido imprescindíveis
em meu processo de aprendizagem, para chegar
até aqui, concluído!
3
DEDICATÓRIA
A Deus, pelo nosso pai, que o exaltou, e lhe deu o
nome que é sobre todo nome, no céu e na terra,
Jesus, rei dos reis, príncipe da paz...
Aos meus pais, José Martins Cardoso e Miriam
Ferreira Annoni, cúmplices e grandes
incentivadores desta conquista, os quais, com
amor e paciência, souberam compreender os
infindáveis momentos de minha “ausência”,
necessários à conclusão deste trabalho.
Aos meus queridos avós, Nelso Alberi Annoni e
Norma Ferreira Annoni, Nelson Cardoso ( in
memoriam) e Melchiades Maria Martins Cardoso,
pelo amor, carinho, respeito, perseverança e
confiança no sustento dessa minha trajetória.
A maioria de nós está repleta de modelos sociais
de felicidade. Todos queremos, sem sombra de
dúvida, ser certos e adequados. E, assim, nos
obrigamos a agir contra os impulsos de nossa
verdadeira natureza. Pensamos fazer o melhor,
acabamos por nos conduzir ao vale do desajuste
e da dor. Até que a audácia de uma alma forte e
lúcida, como a de minha companheira, Jaqueline
Faleiros da Cunha, mostrou-me que o verdadeiro
vencedor é aquele que tem a coragem de calar o
mundo em si e caminhar pelo seu próprio
coração.
4
A preocupação com o controle externo da polícia,
baseia-se na constatação de uma realidade onde à
violência policial expressiva corresponde o incremento
da desconfiança e do medo da população nos agentes
institucionais. Essa situação tem corroído a imagem da
corporação junto à sociedade, reforçando, ainda mais, o
estigma profissional. (Anália Soria Batista – Sociedade
e Estado, Brasília, v. 21. n. 1 p. 236, jan./abr 2006).
5
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Biguaçu, Junho de 2008.
Gabriel Annoni Cardoso Graduando
6
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Gabriel Annoni Cardoso, sob o
título O Ministério Público e o controle externo da atividade policial, foi submetida
em 17 de junho de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes
professores: [Nome dos Professores] ([Função]), e aprovado com a nota [Nota]
([nota extenso]).
Biguaçu, Junho de 2008.
Professor Msc. Celso Wiggers Orientador e Presidente da Banca
Professora Msc. Helena Paschoal Nastassya Pítsica Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
7
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ministério Público
“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis” (artigo 127, caput).1
Polícia
“Polícia é o vocábulo que designa o conjunto de instituições, fundadas pelo
Estado, para que, segundo as prescrições legais e regulamentares estabelecidas,
exerçam vigilância para que se mantenham a ordem pública, a moralidade, a
saúde pública e se assegure o bem-estar coletivo, garantindo-se a propriedade e
outros direitos individuais”.2
Controle externo da atividade policial
“O controle externo da atividade policial deve ser compreendido como um
conjunto de normas que regulam a fiscalização exercida pelo Ministério Público
em relação à polícia, na prevenção, apuração e investigação de fatos tidos como
criminosos, na preservação dos direitos e garantias constitucionais dos presos
que estejam sob responsabilidade das autoridades policiais e na fiscalização do
cumprimento das determinações judiciais”.3
1 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
2 Criminalidade e violência: Ministério da Justiça, v. I, 1980, p. 19 a 33 apud Alvaro Lazzarini in A segurança pública e o aperfeiçoamento da polícia no Brasil in Revista A Força Policial, nº 5
jan./mar. 1995, p. 8.
3 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 1ª ed. (ano 2002), 5ª tiragem. Curitiba: Juruá, 2006, p. 63.
8
SUMÁRIO
RESUMO ...........................................................................................11
ABSTRACT .......................................................................................12
INTRODUÇÃO ..................................................................................13
CAPÍTULO 1 O MINISTÉRIO PÚBLICO ...........................................16
1.1 HISTÓRIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS..........17
1.2 O MINISTÉRIO PÚBLICO NO BRASIL – NOÇÕES HISTÓRICAS ..................19
1.3 O MINISTÉRIO PÚBLICO NAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL .....................22
1.3.1 O Ministério Público e a Constituição do Império de 1824 ......................23
1.3.2 O Ministério Público e a Constituição da República de 1891..................23
1.3.3 O Ministério Público e a Constituição da República de 1934..................24
1.3.4 O Ministério Público e a Constituição da República de 1937..................25
1.3.5 O Ministério Público e a Constituição da República de 1946..................25
1.3.6 O Ministério Público e a Constituição da República de 1967..................27
1.4 O MINISTÉRIO PÚBLICO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 .......................................................................28
1.4.1 Conceito de Ministério Público....................................................................30
1.4.2 Função do Ministério Público ......................................................................32
1.4.3 Organização e atribuição do Ministério Público .......................................35
1.4.4 Princípios Institucionais do Ministério Público ........................................36
1.4.4.1 Unidade ........................................................................................................37
1.4.4.2 Indivisibilidade ............................................................................................38
1.4.4.3 Independência funcional ...........................................................................39
1.4.4.4 Promotor Natural ........................................................................................40
1.4.5 Garantias do Ministério Público ..................................................................41
1.4.5.1 Garantias institucionais.............................................................................42
1.4.5.1.1 Autonomia funcional ................................... Erro! Indicador não definido.
1.4.5.1.2 Autonomia administrativa ........................... Erro! Indicador não definido.
1.4.5.1.3 Autonomia financeira .................................. Erro! Indicador não definido.
1.4.6 Garantias e vedações aos membros do Ministério Público ....................43
9
CAPÍTULO 2 DA POLÍCIA ................................................................49
2.1 DA SEGURANÇA PÚBLICA – NOÇÕES GERAIS ...........................................49
2.2 DA POLÍCIA – NOÇÕES HISTÓRICAS ............................................................52
2.2.1 Conceito de Polícia .......................................................................................58
2.2.2 Divisão tradicional das Polícias ..................................................................60
2.2.2.1 Polícia Administrativa ................................................................................62
2.2.2.2 Polícia Judiciária ........................................................................................64
2.2.3 Das espécies de Polícia e sua destinação .................................................68
2.2.3.1 Polícia Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal....................70
2.2.3.2 Polícia Civil e Polícia Militar ......................................................................74
2.2.3.3 Guarda Municipal .......................................................................................76
CAPÍTULO 3 O CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL
PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ..........................................................79
3.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS NO BRASIL ..................................................82
3.1.1 Precedentes da atual Lex Magna ................................................................82
3.1.2 A Carta de Curitiba ........................................................................................84
3.1.3 A Origem da expressão controle externo ..................................................85
3.2 CONCEITO E FINALIDADE DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ...............................................................86
3.3 NATUREZA DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL PELO
MINISTÉRIO PÚBLICO ............................................................................................91
3.4 LEGISLAÇÃO VIGENTE DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ...............................................................92
3.4.1 Artigo 129 da atual Lex Magna ....................................................................93
3.4.2 Lei Orgânica do Ministério Público da União ............................................93
3.4.3 Lei Orgânica Nacional do Ministério Público ............................................96
3.4.4 Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina .........98
3.5 INSTRUMENTOS PARA O EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO DA
ATIVIDADE POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ....................................... 100
3.5.1 Investigação direta pelo Ministério Público............................................ 101
3.5.2 Requisição de instauração de inquéritos policiais e respectivas
diligências ............................................................................................................. 103
10
3.5.3 Livre ingresso nas Delegacias de Polícia e em qualquer recinto público
ou privado ............................................................................................................. 104
3.5.4 Fiscalização de estabelecimentos prisionais ......................................... 105
3.5.5 Acesso a quaisquer documentos relacionados com a atividade-fim
policial ................................................................................................................... 106
3.5.6 Requisitar à autoridade competente a adoção de providências para
sanar a omissão indevida ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso
de poder ................................................................................................................ 107
3.5.7 Promoção de Ação Penal .......................................................................... 108
3.5.8 Promoção de Ação Civil Pública .............................................................. 108
3.5.9 Ter ciência imediata da prisão de qualquer pessoa .............................. 109
3.5.10 Impetração de habeas corpus ................................................................ 110
3.6 LIMITES AO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA EXERCER O CONTROLE
EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL ................................................................. 111
3.7 OBSTÁCULOS ENFRENTADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO NO
EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL ................ 113
CONCLUSÃO ..................................................................................117
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .........................................121
ANEXOS..........................................................................................127
11
RESUMO
CARDOSO, Gabriel Annoni. O Ministério Público e o controle externo da atividade policial. 2008. 140 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI), Biguaçu, 2008.
Este trabalho destinou-se à análise do controle externo da
atividade policial, exercido pelo Ministério Público, o qual possui previsão no
artigo 129, inciso VII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
e está inserido na legislação infraconstitucional, pela Lei Orgânica do Ministério
Público da União, Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e Leis Orgânicas
dos Ministérios Públicos Estaduais. Com este propósito, fez-se uso do método de
investigação dedutivo. Ao longo da explanação, constatou-se que, introduzida no
rol de funções ministeriais, a fiscalização da atividade policial caracteriza-se como
uma expressão do sistema de freios e contrapesos, adotado pelo constituinte de
1988, visando à garantia da harmonia entre os independentes Poderes do Estado.
Assim, sem relação de subordinação hierárquica, a Instituição Ministerial cabe
controlar a legalidade e regularidade da atividade-fim promovida pela Polícia Civil
e Militar, sempre que no exercício do múnus de Polícia Judiciária, com fins de
persecução penal. Pela análise da doutrina e legislação pátria, bem como das
manifestas opiniões dos operadores do direito a respeito do tema, traçou-se o
perfil desta função fiscalizatória ministerial, analisando-se sua abrangência, seus
limites e os principais obstáculos enfrentados para sua completa aplicação
prática, conforme determina o mencionado mandamento constitucional. Concluiu-
se que o controle externo pelo Ministério Público apresenta-se como um
instrumento imprescindível para a fiscalização do trabalho das Polícias, devendo
respeitar os direitos fundamentais do cidadão e as demais normas legais. Deste
modo, visa melhorar as investigações e ainda contribuir para evitar omissões e
eventuais abusos nas atividades investigatórias.
Palavras-chave: Ministério Público. Polícia. Controle
externo da atividade policial.
12
ABSTRACT
CARDOSO, Gabriel Annoni. The Public Prosecution and the external control of the police activity. 2008. 140 f. Work of Conclusion of Course (Course of Law of the University of the Valley of Itajaí - UNIVALI), Biguaçu, 2008.
This work was destined to analysis the external control of the
police activity, exercised by the Public Prosecution in the article 129, incise VII, of
the Federal Republic Constitution of Brazil of 1988, and it´s inserted in the
infraconstitucional legislation, Organic Law of the Public Prosecution of the Union,
National Organic Law of the Public Prosecution and Organic Law of the State
Public Prosecution. Therefore, it was made of the deductive investigation method.
Along the explanation, it was verified that, introduced in the list of ministerial
functions, the police activity fiscalization is characterized as an expression of the
system of brakes and counterbalances, adopted by the representative of 1988,
seeking to the warranty of the harmony among the independent Powers of the
State. Thus, without relation of hierarchic subordination, the Ministerial Institution
fits to control the legality and regularity of the end activity of the Civil and Military
Policy, whenever in the exercise of the duty of Judiciary Policy, with objective to
criminal persecution. Analyzing the doctrine and homeland legislation, as well as
of the opinions of the operators of the law about the theme, the profile of this
ministerial function fiscalization was drawn, being analyzed sweats inclusion, their
limits and the main obstacles faced for them completes practical application, as it
determines mentioned constitutional commandment. In finally, could be said that
the external control for the Public Prosecution comes as an indispensable
instrument for the fiscalization to control the work of the Police, but always
respecting the citizen's fundamental law and the other legal norms. This way, it
have as objective improve the investigations and still to contribute to avoid
omissions and eventual abuses in the investigate activities.
Key-word: Public Prosecutor. Police. The external control of
policeman´s activity.
13
INTRODUÇÃO
O objetivo institucional da presente pesquisa é produzir uma
monografia para a obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI, Campus Biguaçu. Como objetivo geral, dedica-se a
analisar a função controladora do Ministério Público sobre as atividades policiais,
com a abordagem de sua legalidade, limitação e relevância no Estado
Democrático de Direito. Quanto aos objetivos específicos, elaboraram-se os
seguintes: a. Conhecer a realidade da Instituição Ministerial, no que diz respeito à
sua história, conceito, função, organização e atribuição, princípios, garantias e
vedações; b. Apresentar noções gerais sobre a Polícia – Segurança Pública, bem
como sua historicidade, conceito, divisão tradicional, espécies de Polícia e sua
destinação; e c. Verificar como é realizada a função controladora do Ministério
Público sobre as atividades policiais.
A justificativa da escolha do tema consubstancia-se na
questão polêmica que vem sendo discutida entre doutrinadores e tribunais de
todo país, que entendem estar havendo um confronto direto entre as instituições
da Polícia Brasileira e do Ministério Público, no tocante ao exercício do controle
externo da atividade policial, sendo este um assunto atual e relevante, que
desperta interesse não só à comunidade jurídica, como a toda sociedade
brasileira.
Diante dessa situação, e mediante o amparo da Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988 e das legislações infraconstitucionais,
coloca-se a seguinte pergunta de pesquisa, a qual norteou o desenvolvimento do
trabalho: “Por que o Ministério Público não exerce a sua prerrogativa
constitucional de forma mais intensa em relação ao controle externo da atividade
policial?”
Para responder a esse questionamento, elaborou-se a
seguinte hipótese: Primeiramente, existe a necessidade de uma integração entre
os órgãos estatais responsáveis pela investigação criminal (polícia) e pela
posterior acusação em juízo (Ministério Público), para fortalecer a ação penal e a
14
função jurisdicional não ficar prejudicada. Assim, em relação aos obstáculos
enfrentados pelo Parquet, pode-se citar como principal, a informalidade com que
é tradicionalmente exercida a atividade policial, especialmente no que se refere
ao processamento do inquérito e investigação, o que acaba prejudicando
intensamente tanto o controle interno quando o externo desta atividade.
No desenvolvimento deste trabalho, adota-se o método
dedutivo, partindo-se da formulação dos problemas gerais, na busca de posições
científicas que os sustentem ou neguem, apontando-se, ao final, a predominância
ou não das hipóteses mencionadas.
No que diz respeito à investigação, usa-se a técnica do
referente, das categorias e do conceito operacional, com auxílio da pesquisa
bibliográfica, da revisão doutrinária em obras jurídicas e legislações pertinentes.
Cabe mencionar que o rol de categorias e conceitos
operacionais estão listados em glossário, no início deste trabalho, onde os
conceitos operacionais das categorias têm a opção de estar contidos na
introdução, no decorrer do trabalho, ou em glossário. Pretende-se, com isso,
estabelecer um acordo semântico em torno das palavras utilizadas, permitindo,
assim, uma melhor compreensão das idéias expostas no conjunto da pesquisa.
Para beneficiar o desenvolvimento do presente estudo, o
percurso teórico realizado foi distribuído em três capítulos, e estes em
subcapítulos, fazendo com que a abordagem da temática proposta siga uma
seqüência lógica.
Para tanto, apresentar-se-á no capítulo 1, a figura do
Ministério Público, como sendo uma instituição de extrema importância no Estado
Democrático de Direito, cuja finalidade é proteger um interesse público, que ora
está ligado a pessoas determinadas (direitos individuais disponíveis, quando
atingirem relevância social, e individuais indisponíveis), ora a grupos de pessoas
determinadas ou determináveis (direitos coletivos), ora a grupos não
determináveis (direitos difusos) e ora a toda a coletividade. Neste capítulo, ainda,
será realizado um breve panorama em relação à história da Instituição Ministério
Público, identificando e expondo fatores que possam atribuir um melhor
15
entendimento a respeito do desenvolvimento do Parquet. Explicar-se-á também, a
respeito de sua origem no Brasil, com uma rápida retrospectiva da mesma nas
Constituições brasileiras anteriores à atual vigente, bem como a sua função,
organização e atribuição, princípios institucionais, garantias e vedações aos
membros do Ministério Público.
Assim como foi explanado na presente pesquisa, um
capítulo específico dedicado à Instituição do Ministério Público, não poderia a
Polícia Brasileira ficar desprovida de igual dedicação, uma vez que, para melhor
entendimento do tema proposto, faz-se necessário identificar, no segundo
capítulo, a distinção das atribuições conferidas pela Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 a essas Instituições, a fim de que se possa adentrar
no objetivo principal do atual estudo, qual seja, o controle externo da atividade
policial pelo Ministério Público.
No Capítulo 3, tratar-se-á sobre o controle externo da
atividade policial pelo Parquet, o qual, de acordo com o artigo 129, inciso VII, da
atual Lex Magna, será feito na forma de Leis Complementares da União e dos
Estados. No aspecto Federal, cita-se a Lei Complementar n. 75/1993 (Lei
Orgânica do Ministério Público da União), e no âmbito Estadual, a Lei
Complementar n. 197/2000 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de
Santa Catarina).
No entanto, é importante ressaltar que a Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, não define com precisão o objeto de
incidência deste controle, sendo que, por embasamento doutrinário e análise das
Legislações Orgânicas do Ministério Público, afirma-se que estão sujeitas ao
controle externo pelo Ministério Público, a Polícia Civil e Militar, sempre que no
exercício do múnus de Polícia Judiciária.
Encerra-se o trabalho com a Conclusão, na qual serão
apresentados pontos essenciais destacados no decorrer da pesquisa, seguidos
da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o controle
externo da atividade policial exercido pelo Ministério Público.
16
CAPÍTULO 1
O MINISTÉRIO PÚBLICO
Atualmente, nos diversos órgãos da justiça brasileira, as leis
são aplicadas para que sejam dirimidos inúmeros conflitos que surgem entre os
membros da sociedade. Assim, a cada minuto são praticados inúmeros crimes no
país.
Como poderia estar a sociedade presente para auxiliar em
todos esses acontecimentos? Obviamente, não pode a sociedade, sem algum tipo
de representação, tomar ciência desses intermináveis eventos ocorridos no país.
Diante disso, nasce a instituição do Ministério Público, a qual é responsável pela
fiscalização da aplicação da lei – custo legis, como também na garantia dos
direitos sociais e individuais indisponíveis.
O Poder Constituinte originário, com o intuito de organizar a
atividade jurisdicional, institucionalizou atividades profissionais (públicas e
privadas), atribuindo-lhes o status de funções essenciais à Justiça, tendo
estabelecido, nos artigos 127 a 130, da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, o Ministério Público.4
Neste sentido, o artigo 127, caput, da atual Lex Magna,
define que o Ministério Público é, in verbis:
Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático
e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.5
4 Cf. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 10. ed. rev., atual. e ampl – São
Paulo: Editora Método, 2006, p. 447.
5 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado
Federal. 1988.
17
Todavia, antes de se adentrar no estudo de seu conceito,
mister se faz a apresentação histórica de seu surgimento.
1.1 HISTÓRIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
A definição do momento exato da origem histórica do
Ministério Público é uma tarefa árdua, uma vez que existe uma grande
divergência de opiniões entre os doutrinadores a respeito de qual seria a primeira
manifestação da denominada Instituição do Ministério Público.6
Segundo registros históricos, o Ministério Público é uma
Instituição que surgiu há mais de quatro mil anos na figura do funcionário real do
Egito, conhecido como magiaí. Em conformidade com textos descobertos nas
escavações, tal funcionário era a língua e os olhos do rei, sendo incumbido de
algumas atribuições, tais como: castigar os rebeldes, reprimir os violentos,
proteger os cidadãos pacíficos, acolher os pedidos do homem justo e verdadeiro,
perseguir o homem malvado, mentiroso e ouvir as palavras da acusação,
indicando as disposições legais que se aplicavam ao caso.7
Paulo Rangel complementa:
Nessa época, o comandante da cidade exercia o papel de
acusador público, fazendo as vezes do, hoje, Ministério Público. A
análise dessa corrente, que vê no Egito a origem do Ministério
Público, é feita através da atenção que no Egito se dava ao direito
processual, fazendo nascer aí uma função tipicamente
fiscalizadora.8
6 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 37.
7 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 3. ed. rev., ampl. e atual. à luz da LOMPU, da LONMP e da LOEMP. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 2.
8 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2. ed. rev.
ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p 123.
18
Entrementes, alguns autores ainda afirmam estar na
Antigüidade Clássica as raízes do Ministério Público, como por exemplo, os
éforos9 de Esparta, os Tesmótetas10 gregos, os personagens romanos dos
advocati fisci11, como também do censor, que era a figura do magistrado
responsável por defender a moralidade pública e fazer o censo dos cidadãos.
Cabe mencionar, ainda, que havia os procuratores caesaris.12
Não obstante os achados históricos serem atribuídos à
Antigüidade Clássica, a corrente mais aceita é a de que a origem do Ministério
Público surge do direito francês, como explica Paulo Rangel:
[...] a origem mais precisa da instituição está no direito francês, na
figura dos procureurs du roi (procuradores do rei), nascendo e
formando-se no judiciário francês. Na França, era vedado que os
Procuradores do Rei (les gens du roi) patrocinassem quaisquer
outros interesses que não os da coroa, devendo prestar o mesmo
juramento dos juízes. Foi na Ordenança de março de 1302, de
Felipe IV, chamado de o Belo, Rei da França, o primeiro diploma
legal a tratar dos Procuradores do Rei. Os reis demonstravam,
através de seus atos, a independência que o Ministério Público
tinha em relação aos juízes, constituindo-se em verdadeira
magistratura diversa da dos julgadores, pois os Procuradores do
9 Havia também, por volta do século VII a.C., a instituição dos éforos, cinco magistrados
anualmente eleitos, na cidade grega de Esparta, que formavam um Tribunal idealizado para controlar os atos dos dois reis espartanos e dos gerontes (câmara com 28 membros, escolhidos entre cidadãos espartanos com mais de 60 anos). Todos estes, basicamente, se responsabilizavam pela execução da legislação e pelo exercício da acusação penal, o que ensejou a interpretação de que poderiam ser antepassados do Ministério Público (SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Ministério Público: aspectos históricos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 229, 22 fev.
2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4867>. Acesso em: 09 set. 2007).
10 Em campos da Grécia Antiga, no século VIII a.C., existiram os tesmótetas. Eram os tempos da
oligarquia grega, onde o governo passou a ser exercido por um Arcontado, conselho no qual seis de seus membros exerciam as funções de fiscais da execução das leis atenienses. Estes seis, retirados dentre os arcontes, eram os tesmótetas (SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Ministério Público: aspectos históricos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 229, 22 fev. 2004. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4867>. Acesso em: 09 set. 2007).
11 Os fisci advocatum, os procuratores caesaris e o praetor fiscalis, eram funcionários que geriam
os bens e receitas imperiais. Confiscavam o patrimônio de romanos condenados, possuindo competência para a persecução criminal em nome do Império Romano. (SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Ministério Público: aspectos históricos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 229, 22 fev.
2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4867>. Acesso em: 09 set. 2007).
12 Cf. RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005,
p 123.
19
Rei dirigiam-se aos juízes do mesmo „assoalho‟ (Parquet em
francês) em que estes estavam sentados, porém, o faziam de pé.
Daí a expressão cunhada ao Ministério Público de que ele era a
Magistratura de pé (Magistrature debout).13
No mesmo diapasão, Enos da Costa Palma ressalta:
Felipe, o Belo, procurando robustecer a posição do „Procurador do
Rei‟, antes mero mandatário judicial para questões fiscais, dá-lhe
independência em relação aos juízes, determinando inclusive que
passasse a ter assento no „parquet‟, isto é, no estrado ao lado dos
juízes. A esta altura, o „Procurador do Rei‟ já exercia o controle do
processo e o poder de requerer a pena. Configurava-se o embrião
maior do nosso atual Promotor de Justiça.14
Em relação ao significado da expressão Ministério Público,
cabe ressaltar que o termo francês Parquet (assoalho), haurido da tradição
francesa, se incorporou ao vocabulário jurídico para mencionar o fato de os
agentes do rei (les gens du roi), antes de assumirem o grau de magistrados
ficavam sobre o assoalho das salas de audiência. Portanto, chamava-se
“magistratura de pé” (magistrature débout), conferido às “pessoas do rei” (les
gens du roi).15
1.2 O MINISTÉRIO PÚBLICO NO BRASIL – NOÇÕES HISTÓRICAS
A origem do Ministério Público brasileiro sofreu influência
direta do direito lusitano, com as Ordenações Afonsinas (1446), Manuelinas
13
RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005, p
123-124. (mantida a grafia da fonte)
14 PALMA, Enos da Costa. Programa de princípios institucionais do Ministério Público. 1. ed.
Rio de Janeiro: Líber Júris Ltda, 1986, p. 35.
15 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 7. ed. rev. e atual. até a Emenda
Constitucional n. 53/2006 – São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1118.
20
(1521) e, por fim, as Filipinas (1603), sendo que nestas duas últimas, ocorreu o
surgimento da figura do Promotor de Justiça.16
A respeito, Paulo Rangel:
As „Ordenações Afonsinas‟ formaram a primeira grande
codificação portuguesa, realizada por D. Afonso, que, embora não
se refira ao Ministério Público, serviu de base para o nascimento
da ordem jurídica brasileira, pois, descoberto meio século depois,
o Brasil sofreu forte influência jurídica de seus mandamentos.17
Em relação às Ordenações Manuelinas, Hugo Nigro Mazzili
e Amaro Alves de Almeida Filho, ambos citados por Guimarães, esclarecem que
as mesmas traziam, no Livro I, o Título XI, que tratava “Do Procurador dos nossos
feitos”, o Título XII, do mesmo livro, que disciplinava a respeito do “Promotor da
Justiça da Casa da Sopricaçam” e o Título XXXIV, que, por sua vez, trazia os
requisitos para ser “Promotor da Justiça”:
O promotor de justiça deve ser letrado, e bem entendido para
saber espertar, e aleguar as causas, e razões que pera lume, e
clareza da Justiça, e pera inteira conservaçam della convem, ao
qual mandamos que com grande cuidado, e diligencia requeira
todas as causas que pertencerem à Justiça, e conservaçom de
nossa jurisdiçom, em tal guisa, que por sua culpa, ou negligencia
nom pareça Justiça, nem nossa jurisdiçom seja deturpada; porque
fazendo o contrário, a Deos no outro mundo, e a nós neste dará
disto conta.18
Dando seqüência aos passos das codificações portuguesas,
segundo Antônio Cláudio da Costa Machado, fala-se da chamada Ordenações
Filipinas, de 1603, onde o Promotor de Justiça era nomeado pelo rei e chamava-
se “Promotor de Justiça da Casa de Suplicação”, tendo como atribuição legal:
16
Cf. RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005,
p 124.
17 RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005, p
124.
18 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 40 (mantida a grafia da fonte).
21
[...] requerer tôdas as cousas que tocam à Justiça, com cuidado e
diligência, em tal maneira que por sua culpa e diligência não
pereça; [...] formar libelos contra os seguros, ou presos, que por
parte da justiça hão de ser acusados na Casa de Suplicação pôr
acordo da Relação.19
Portanto, pode-se afirmar que surge, pela primeira vez, a
função fiscalizatória do Ministério Público e o seu papel de acusador.
O primeiro texto legislativo elaborado no Brasil, a tratar da
figura do Promotor de Justiça, foi o diploma de 09 de janeiro de 1609, que
disciplinava a composição do Tribunal da Relação do Brasil, sediado na Bahia,
onde o papel de Procurador da Coroa e de Promotor de Justiça era exercido por
um dos dez desembargadores que compunham o Tribunal.20
No Brasil Império, em 1832, surgiu o Código de Processo
Criminal do Império, que tratou, em seus artigos 36 a 38, a respeito da nomeação
e funções dos Promotores de Justiça e, a posteriori, a Lei n. 261, de 03 de
dezembro de 1841, reformulou este Código, destinando o Capítulo III aos
Promotores Públicos.21
A respeito do Código de Processo Criminal do Império,
Antônio Cláudio da Costa Machado explica que o artigo 37 deste diploma dava
como atribuição ao Promotor de Justiça:
[...] denunciar os crimes públicos e policiais, o crime de redução à
escravidão de pessoas livres, cárcere privado ou homicídio ou
tentativa, roubos, calúnias, injúrias contra pessoas várias, bem
como acusar os delinqüentes perante os jurados, solicitar a prisão
e punição dos criminosos e promover a execução das sentenças e
mandados judiciais (§ 2º); dar parte às autoridades competentes
19
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. A Intervenção do Ministério Público no Processo Civil Brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 15-16. (mantida a grafia da fonte).
20 Cf. RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005,
p 125.
21 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 41-42.
22
das negligências, omissões e prevaricações dos empregados na
administração da justiça (§ 3º).22
Contudo, somente em 1890, após a Proclamação da
República, o Ministério Público recebeu, pela primeira vez no Brasil, o tratamento
de Instituição, por meio do Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, e do
Decreto n. 1.030, de 14 de novembro do mesmo ano. Tratando-se do Ministério
Público, seguiram outros Decretos, tais como o de n. 2579, de 16 de agosto de
1897, o Decreto n. 9.263, de 28 de novembro de 1911, e o Decreto n. 16.273, de
20 de dezembro de 1923.23
Em relação ao Decreto n. 848/1890, Magno Alexandre
Moura enumera alguns destaques, tais como:
1) A indicação do Procurador-Geral pelo Presidente da República;
2) a função do procurador de cumprir as ordens do Governo da
República relativas ao exercício de suas funções e de promover o
bem dos direitos e interesses da União (art. 24, alínea c).24
É importante destacar, ainda, a evolução da Instituição
frente às Constituições do Brasil, análise que brevemente passa-se a destacar.
1.3 O MINISTÉRIO PÚBLICO NAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL
Raulino Jacó Brüning esclarece, em sua obra, que: “até a
Independência do Brasil, em 1.822, a Justiça como um todo (incluindo a atuação
do Ministério Público) praticamente nada evoluíra, porque desde 1.603 era regida
pelas Ordenações Filipinas, estanques, sem atualização”.25
22
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. A Intervenção do Ministério Público no Processo Civil Brasileiro. 1998, p. 17-18 (mantida a grafia da fonte).
23 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 42.
24 MOURA, Magno Alexandre F. Escorço Histórico do Ministério Público. Revista do Ministério
Público. Alagoas, n. 11:99-108, jul./dez. 2003, p. 102.
25 BRÜNING, Raulino Jacó. História do Ministério Público Catarinense. Florianópolis: Habitus,
2001, p. 63.
23
A propósito, afirma o autor:
A modernização iniciou quando, ainda em 1.822, em agosto, por
ato do Príncipe Dom Pedro (governou o Brasil de 1822 a 1831), foi
abolida a tortura e certas penas graves, como o açoite, o confisco
e outras sanções cruéis e infamantes.26
1.3.1 O Ministério Público e a Constituição do Império de 1824
A primeira Constituição do Brasil nasceu em 1824 e não
tratou do Ministério Público durante o Império, limitando-se, apenas, na
abordagem da figura do procurador de Coroa e Soberania Nacional, que era
quem realizava a acusação no juízo dos crimes.27
Nessa linha de raciocínio, esclarece Hugo Nigro Mazzilli:
Da primeira Constituição, a do Império (25-3-1824), vale evocar
seu art. 48, dispositivo esse situado no capítulo „Do Senado‟: „No
juízo dos crimes, cuja acusação não pertence à Câmara dos
Deputados, acusará o procurador da Coroa e Soberania
Nacional‟.28
1.3.2 O Ministério Público e a Constituição da República de 1891
A respeito do tema, Jádel da Silva argumenta:
A Constituição Republicana de 1891 não cuidou do Ministério
Público como Instituição. Apenas, na Seção referente ao Poder
Judiciário, se referia ao Procurador-Geral da República, dizendo
que „O Presidente da República designará, dentre os Membros do
Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República,
26
BRÜNING, Raulino Jacó. História do Ministério Público Catarinense. 2001, p. 63.
27 Cf. RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2005,
p 127.
28 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p.13.
24
cujas atribuições se definirão em lei‟ (artigo 58, § 2º). Passaram os
Estados a organizar o seu Ministério Público, fazendo de seus
membros simples agentes da confiança dos governos locais.29
1.3.3 O Ministério Público e a Constituição da República de 1934
Com a Constituição de 1934, o Ministério Público foi
guindado à condição de Instituição, nos seus artigos 95 a 98, que traçam normas
gerais de sua organização.30
Sobre o assunto, Alexandre de Moraes assim se pronuncia:
A Constituição de 1934 preocupou-se mais profundamente com o
Ministério Público, regulando-o no Título I (Da organização
Federal), Capítulo VI (Dos órgãos de cooperação nas actividades
governamentaes), Secção I (Do Ministério Público). Entre
importantes normas, a Constituição Federal previu a existência de
Ministérios Públicos na União, no Distrito Federal e Territórios, e
nos Estados, a serem organizados por lei (art. 95). Além disso, o
Chefe do Ministério Público, no âmbito federal (Procurador-Geral
da República), passou a ser nomeado pelo Chefe do Poder
Executivo, sem a necessidade de fazer parte do Poder Judiciário,
porém, com os mesmos vencimentos deste. A Carta
Constitucional também previu a estabilidade e vedações aos
membros do Ministério Público, e a necessidade de concurso
público para o ingresso à carreira.31
Cabe, ainda, ressaltar os artigos 95 ao 9832, da Constituição
da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934.
29
SILVA, Jádel da. O Ministério Público. Origens históricas e perspectivas atuais. Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Ano 1 - Jan./jun. 1978, vol. 1, p. 55.
30 Cf. GONÇALVES, Edilson Santana. O Ministério Público no Estado Democrático de Direito.
Fortaleza: ABC Fortaleza, 2000, p. 38.
31 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 513.
32 “Art 95. O Ministério Público será organizado na União, no Distrito Federal e nos Territórios por
lei federal, e, nos Estados, pelas leis locais. § 1º - O Chefe do Ministério Público Federal nos Juízos comuns é o Procurador-Geral da República, de nomeação do Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos estabelecidos para os Ministros da Corte Suprema. Terá os mesmos vencimentos desses Ministros, sendo, porém, demissível ad nutum. 2º - Os Chefes do Ministério Público no Distrito Federal e nos Território
25
1.3.4 O Ministério Público e a Constituição da República de 1937
A Constituição de 1937 repetiu o silêncio já constatado na
Constituição de 1891, diminuindo a previsão constitucional do Ministério Público,
apenas fazendo breves referências no título em relação ao Poder Judiciário, em
especial, ao Supremo Tribunal Federal, prevendo, assim, a possibilidade de
interposição de recursos pelo Ministério Público, bem como estipulou a cláusula
do chamado “quinto constitucional” na composição dos Tribunais Superiores.33
Os artigos 99 e 10534, da Constituição Federal, de 10 de
novembro de 1937, determinavam quem seria o Chefe do Ministério Público e
quantos lugares seriam preenchidos na composição dos Tribunais.
1.3.5 O Ministério Público e a Constituição da República de 1946
Segundo Raulino Jacó Brüning: “a Constituição de 1.946
colocou o país no rumo do regime democrático (e federativo) e marcou também a
independência do Ministério Público como instituição”.35
serão de livre nomeação do Presidente da República dentre juristas de notável saber e reputação ilibada, alistados eleitores e maiores de 30 anos, com os vencimentos dos Desembargadores. § 3º - Os membros do Ministério Público Federal que sirvam nos Juízos comuns, serão nomeados mediante concurso e só perderão os cargos, nos termos da lei, por sentença judiciária, ou processo administrativo, no qual lhes será assegurada ampla defesa. Art 96 - Quando a Corte Suprema declarar inconstitucional qualquer dispositivo de lei ou ato governamental, o Procurado Geral da República comunicará a decisão ao Senado Federal para os fins do art. 91, nº IV, e bem assim à autoridade legislativa ou executiva, de que tenha emanado a lei ou o ato. Art 97 - Os Chefes do Ministério Público na União e nos Estados não podem exercer qualquer outra função pública, salvo o magistério e os casos previstos na Constituição. A violação deste preceito importa a perda do cargo. Art 98 - O Ministério Público, nas Justiças Militar e Eleitoral, será organizado por leis especiais, e só terá na segunda, as incompatibilidades que estas prescrevem”. (BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934 . Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao.htm>. Acesso em: 27 fev. 2008).
33 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 513.
34 “Art 99. O Ministério Público Federal terá por Chefe o Procurador-Geral da República, que
funcionará junto ao Supremo Tribunal Federal, e será de livre nomeação e demissão do Presidente da República, devendo recair a escolha em pessoa que reúna os requisitos exigidos para Ministro do Supremo Tribunal Federal”. “Art 105. Na composição dos Tribunais superiores, um quinto dos lugares será preenchido por advogados ou membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, organizando o Tribunal de Apelação uma lista tríplice”. (BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 10 de novembro de 1937. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_04/Constituicao.htm> Acesso em: 27 fev.
2008).
26
Colhe-se da obra de Hugo Nigro Mazzilli que:
Já a Constituição democrática de 18 de setembro de 1946 voltou
a dar relevo à instituição, conferindo-lhe título próprio (arts. 125 a
128). Previu-se a organização do Ministério Público da União (art.
125) e dos Estados (art. 128); a escolha do procurador-geral da
República, dentre pessoas que preenchessem os mesmos
requisitos de ministros do Supremo Tribunal Federal (art. 126);
cometeu-se à instituição a representação da União (art. 126,
parágrafo único); fixaram-se as regras de ingresso na carreira sob
concurso, asseguraram-se as garantias de estabilidade e
inamovibilidade (art. 127), bem como instituiu-se o princípio de
promoção entrância a entrância (art. 128). Em dispositivos
esparsos cuidou-se de cometer ao procurador-geral da República
a representação de inconstitucionalidade (art. 8º, parágrafo único),
e ainda se impôs a obrigatoriedade de ser ouvido o chefe do
Ministério Público nos pedidos de seqüestro de verbas públicas
(art. 204, parágrafo único); de outro lado, fixou-se a competência
do Senado para aprovar a escolha do procurador-geral da
República (arts. 63, I, e 126), como ainda para processá-lo e julgá-
lo nos crimes de responsabilidade (art. 62, II), enquanto se deferiu
ao Supremo Tribunal Federal a competência para processá-lo e
julgá-lo nos crimes comuns (art. 101, I, b). Foi assegurada a
participação do Ministério Público na composição dos Tribunais
(arts. 103 e 124, V).36
Alexandre de Moraes complementa:
Importante previsão era a do art. 127, que proclamava três
importantes regras: concurso público, estabilidade e
inamovibilidade. Assim, ficou determinado que os membros do
Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios
ingressariam nos cargos iniciais da carreira mediante concurso e
após dois anos de exercício, não poderiam ser demitidos senão
por sentença judiciária ou mediante representação motivada do
35
BRÜNING, Raulino Jacó. História do Ministério Público Catarinense. 2001, p. 152.
36 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 14.
27
chefe do Ministério Público, com fundamento em conveniência do
serviço.37
Cabe, ainda, informar que o Ministério Público também
participava da composição do Tribunal Federal de Recursos, que era composto
por nove juízes, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a
escolha pelo Senado Federal, sendo que dois terços entre magistrados e um
terço entre advogados e membros do Ministério Público, respeitando os requisitos
do artigo 99.38
1.3.6 O Ministério Público e a Constituição da República de 1967
Sem trazer grandes mudanças, a Carta de 1967 apenas
recolocou as disposições acerca do Ministério Público dentro do Poder Judiciário
(Capítulo VIII – Do Poder Judiciário; Seção IX – Do Ministério Público). Porém,
cabe informar que tal alteração foi revogada pela Emenda Constitucional n. 01/69
– em verdade, tratava-se da Carta de 1969 decretada por uma junta militar –, que
novamente trouxe o Ministério Público para o capítulo referente ao Poder
Executivo (Capítulo VII – Do Poder Executivo; Seção VII – Do Ministério Público).
Em 1977, ainda por intermédio de Atos Institucionais, passou a prever a edição de
Lei Complementar para o estabelecimento de normas gerais para a organização
dos Ministérios Públicos Estaduais.39
No mesmo sentido, Uadi Lammêgo Bulos disserta:
Com a Emenda Constitucional n. 1/69, o Ministério Público passou
a integrar o Capítulo do Poder Executivo (arts. 94 a 96), com
aumento de atribuições do chefe da Instituição, que poderia ser
nomeado e demitido, livremente, pelo Presidente da República.
Mais tarde, a Emenda Constitucional n. 7/77 deu nova redação ao
art. 96, prevendo a existência de lei complementar, de iniciativa do
presidente, para estabelecer normas gerais a serem adotadas na
37
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 514 (mantida grafia da fonte).
38 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 514.
39 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 515.
28
organização do Parquet estadual. Nesse ínterim, conferiram-se
mais poderes ao procurador-geral da República.40
1.4 O MINISTÉRIO PÚBLICO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
trata do Ministério Público no capítulo “Das funções essenciais à Justiça”,
definindo as suas funções institucionais, as garantias e as vedações de seus
membros. Porém, é no aspecto cível que a Instituição adquiriu novas atribuições,
ressaltando a sua atuação na tutela dos interesses difusos e coletivos – meio
ambiente, consumidor, patrimônio histórico, turístico e paisagístico; pessoa
portadora de deficiência; criança e adolescente; idoso; comunidades indígenas e
minorias ético-sociais. Assim, tornou o mesmo como uma espécie de Ouvidoria
da sociedade brasileira.41
Salienta Uadi Lammêgo Bulos:
A Carta de 1988 pode ser apelidada de a Constituição do
Ministério Público. Do ângulo constitucional positivo, nunca se viu
tanta atenção ao Parquet como agora. Na votação histórica, de 12
de abril de 1988, os constituintes aprovaram, em 1 º Turno, por
350 votos favoráveis, doze contrários e vinte e uma abstenções, o
texto contendo os atuais preceitos relativos à instituição. [...] Os
princípios e as garantias a que estão sujeitos os seus membros, a
forma de nomeação e a autonomia dos procuradores-gerais, as
funções institucionais, as normas fundamentais delineadoras dos
caracteres da instituição foram predispostos em técnica jamais
vista antes. Até o poder de iniciativa das leis, em certas matérias,
atribuíram-lhe (art. 169), sem falar da capacidade de elaborar sua
proposta orçamentária, com base nos limites impostos pela Lei de
Diretrizes Orçamentárias. Não se lhe deu, contudo, a faculdade de
iniciar proposta orçamentária, o que é da alçada do orçamento
geral, submetido ao Legislativo pelo Executivo. [...] Seja como for,
40
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1119.
41 Cf. MOURA, Magno Alexandre F. Escorço Histórico do Ministério Público. Revista do
Ministério Público. 2003, p. 104.
29
pela primeira vez um texto constitucional brasileiro disciplinou,
enfaticamente, a estrutura orgânico-funcional da instituição, as
principais regras relativas ao seu funcionamento e atribuições.
Nesse ponto, o trabalho dos constituintes Plínio de Arruda
Sampaio, Theodoro Mendes, Fábio Feldman, dentre outros,
merece registro.42
Na seqüência, em consonância com a atual Constituição da
República Federativa do Brasil, foi editada a Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de
1993, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispondo a
respeito de normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados.
E, ainda, cabe lembrar com fundamental importância, a Lei Complementar
Federal n. 75, de 20 de maio de 1993, que trata a respeito das organizações,
atribuições e estatuto do Ministério Público da União.43
De acordo com os ensinamentos de Uadi Lammêgo Bulos:
Inexistem dúvidas acerca da posição sobranceira do Ministério
Público no contexto institucional brasileiro. Isto, contudo, não lhe
subtrai a condição de instituição vinculada ao Poder Executivo, o
que jamais significa depreciar a sua independência. Ao contrário,
seus membros integram a categoria de agentes políticos. Atuam
sem ingerências externas, porque possuem responsabilidades
constitucionais próprias, além de outras previstas em lei. Subme-
tem-se a critério seletivo, via concurso público de provas e títulos,
no que não estão sujeitos ao regime estatutário comum. São
escolhidos e investidos, no cargo, por normas específicas, as
quais Ihes regulam, também, a conduta e o processo pelo
cometimento de delitos funcionais e de responsabilidade.44
O Supremo Tribunal Federal ainda se manifesta:
Não se trata de quarto poder, como pretendem alguns. É engano
se pensar que o alargamento de suas funções é o bastante para
tal conclusão. Também é equivocada a postura de alguns, no
sentido de invocarem o seu locus constitucional. Ora, pouco
42
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1120 (mantida a grafia da
fonte).
43 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 516.
44 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1121.
30
importa a posição tópica do Parquet, se o conteúdo normativo da
Seção I, do Capítulo III, está posta neste ou naquele lugar. No
dizer do Ministro Rodrigues Alckmin, „a questão da colocação
constitucional do Ministério Público entre os Poderes é uma
questão de somenos, pois o verdadeiro problema é a sua
independência‟. De fato, garantida a autonomia da instituição,
torna-se despiciendo o problema, cujo interesse passa para o
âmbito das especulações teóricas.45
1.4.1 Conceito de Ministério Público
Conforme a lição de Hugo Nigro Mazzilli:
Não deixa de ser interessante anotar que, na sua etimologia, a
palavra „ministério‟ se prende ao vocábulo latino manus e aos
derivados ministrar, ministro, administrar – daí a ligação inicial aos
agentes do rei (les gens du roi), pois seriam a mão do rei (hoje,
certamente, para manter a metáfora, a mão da lei).46
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
ampliou consideravelmente os poderes conferidos ao Ministério Público. Nos
moldes do artigo 127 da referida Constituição, conforme já destacado
inicialmente, este órgão tornou-se instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado (sem pertencer ao Poder Judiciário), incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático, e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis.47
Nesse vértice, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
Como Instituição essencial à função jurisdicional do Estado, o
Ministério Público ocupa espaço destacado na aplicação da
Justiça em nosso País. Não mais se admite a prestação
45
STF, RTJ, 147:120-130 (apud BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007,
p. 1121).
46 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 9 (mantida a grafia da fonte).
47 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 518.
31
jurisdicional em sua plenitude, sem a intervenção efetiva do
Ministério Público nas causas que interessam à sociedade. O
termo 'essencial', empregado pelo constituinte, é bastante claro e
estabelece esta necessidade de participação do Ministério Público
na prestação jurisdicional. Com isso, o Estado-Judiciário não pode
prestar a jurisdição, olvidando do Ministério Público nas causas
pertinentes definidas em lei, sob pena de não-valia da própria
atuação do Judiciário. [...] O termo „essencial‟, empregado pelo
constituinte, é bastante claro e estabelece esta necessidade de
participação do Ministério Público na prestação jurisdicional,
olvidando do Ministério Público nas causas pertinentes definidas
em lei, sob pena de não-valia da própria atuação do Judiciário.48
Logo, o Ministério Público está incumbido da defesa dos
interesses sociais e individuais indisponíveis. Isto significa que a atuação desta
Instituição deve estar sempre voltada a garantir aos cidadãos o pleno exercício de
seus direitos, sejam eles sociais – interesses difusos e coletivos - sejam eles
individuais indisponíveis.49
Assim, a atuação do Ministério Público visa proteger um
interesse público, que ora está ligado a pessoas determinadas (direitos individuais
disponíveis, quando atingirem relevância social, e individuais indisponíveis), ora a
grupos de pessoas determinadas ou determináveis (direitos coletivos), ora a
grupos não determináveis (direitos difusos) e ora a toda a coletividade.50
Em relação a esta finalidade da atuação institucional, cabe
mencionar que a mesma vem repetida no primeiro artigo da Lei Complementar
Federal n. 75, de 20 de maio de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público da
União - LOMPU), da Lei Federal n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei
Orgânica Nacional do Ministério Público - LONMP), e da Lei Complementar
Catarinense n. 197, de 13 de julho de 2000 (Lei Orgânica Estadual do Ministério
Público - LOEMP).
48
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 45.
49 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 520.
50 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 213.
32
1.4.2 Função do Ministério Público
A atual Constituição da República Federativa do Brasil
ampliou as funções do Ministério Público, tornando-o um defensor da sociedade,
tanto na esfera penal, com a titularidade exclusiva da ação penal pública, quanto
no campo cível, como fiscal dos demais Poderes Públicos e defensor da
legalidade e moralidade administrativa, inclusive com a titularidade do inquérito
civil e da ação civil pública.51
De forma exemplificativa, a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 elencou as principais funções do Ministério Público
em seu art. 12952.
A esse propósito, Uadi Lammêgo Bulos resume com
clareza:
[...] Na área penal, deu-se-Ihe o encargo privativo de interpor a
ação penal pública; o controle externo da atividade policial, na
forma da lei complementar; o poder de requisitar diligências
investigatórias; a determinação de instaurar inquérito policial; o
dever de indicar os fundamentos jurídicos das manifestações
processuais. No campo cível, a constituição garantiu-Ihe, além do
direito de promover ações interventiva e de inconstitucionalidade -
como sói no regime pregresso -, o direito de defender, em juízo,
interesses das populações indígenas, outorgando-se-Ihe, também,
51
Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 520.
52 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei; II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição; V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei
complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas”. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal:
Senado Federal. 1988 (grifou-se).
33
a missão de promover inquéritos cíveis e ações civis públicas para
a proteção do patrimônio público e social, o meio ambiente etc.53
Importa mencionar que este rol foi alargado pela Lei
Orgânica Nacional do Ministério Público, nos termos do artigo 2554.
Ainda em relação às funções, cabe mencionar o artigo 8255,
da Lei Complementar Estadual - Catarinense n. 197/2000.
53
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1121.
54 “Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e
em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público: I - propor ação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais face à Constituição Estadual; II - promover a representação de inconstitucionalidade para efeito de intervenção do Estado nos Municípios; III - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; IV - promover o inquérito civil e ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos; b) para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem; V - manifestar-se nos processos em que sua presença seja obrigatória por lei e, ainda, sempre que cabível a intervenção, para assegurar o exercício de suas funções institucionais, não importando a fase ou grau de jurisdição em que se encontrem os processos; VI - exercer a fiscalização dos estabelecimentos prisionais e dos que abriguem idosos, menores, incapazes ou pessoas portadoras de deficiência; VIl - deliberar sobre a participação em organismos estatais de defesa do meio ambiente, neste compreendido o do trabalho, do consumidor, de política penal e penitenciária e outros afetos à sua área de atuação; VIII - ingressar em juízo, de ofício, para responsabilizar os gestores do dinheiro público condenados por tribunais e conselhos de contas; IX - interpor recursos ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça; X – (VETADO); XI – (VETADO)” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
55 “Art. 82. São funções institucionais do Ministério Público, nos termos da legislação aplicável: I -
promover a defesa do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis; II – promover a representação destinada a intervenção do Estado nos Municípios para assegurar a execução de lei, ordem ou decisão judicial; III - propor ação direta de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, inclusive por omissão; IV - promover, privativamente, a ação penal pública; V - impetrar „habeas corpus‟ e mandado de segurança; VI - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, para: a) a proteção dos direitos constitucionais; b) a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica e aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, individuais homogêneos, difusos e coletivos relativos à família, à criança, ao adolescente, ao idoso e às minorias étnicas; d) a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas, fundacionais ou entidades privadas de que participem; e) a proteção de outros interesses individuais indisponíveis, individuais homogêneos, sociais, difusos e coletivos; VII - exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhes o respeito: a) pelos poderes estaduais ou municipais; b) pelos órgãos da Administração Pública estadual ou municipal, direta ou indireta; c) pelos concessionários e permissionários de serviço público estadual ou municipal; d) por
34
O exame detalhado de todas as funções ministeriais
precisaria de um estudo exclusivo, sendo que, neste trabalho, reservar-se-á
espaço de destaque apenas para uma delas, que é o controle externo da
atividade policial, pertencente ao campo de atuação na esfera criminal pelo
Ministério Público. Portanto, tendo em vista ser o tema central desta abordagem,
esta função será tratada com maior ênfase no terceiro capítulo.
entidades que exerçam outra função delegada do Estado ou do Município ou executem serviço de relevância pública; VIII - exercer a fiscalização dos estabelecimentos prisionais e dos que abriguem idosos, crianças, adolescentes, incapazes ou pessoas portadoras de deficiência; IX - responsabilizar os gestores de dinheiro público por contas irregulares ou ilegalidade de despesa e prática de atos de improbidade administrativa; X - manifestar-se nos processos em que sua participação seja obrigatória por lei e, ainda, quando entender cabível a intervenção em razão de interesse público, para assegurar o exercício de suas funções institucionais, não importando a fase ou o grau de jurisdição em que se encontrem os processos; XI - interpor recursos; XII - promover, além da ação civil pública, outras ações necessárias ao exercício de suas funções institucionais, em defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, interesses individuais homogêneos, especialmente quanto à ordem econômica, à ordem social, ao patrimônio cultural, à probidade administrativa e ao meio ambiente; XIII - promover outras ações necessárias ao exercício de suas funções institucionais, nelas incluído o mandado de injunção, sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à cidadania, quando difusos ou coletivos os interesses a serem protegidos; XIV - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas; XV – promover a ação para declaração da indignidade ou incompatibilidade para o oficialato e perda do correspondente posto ou patente, e para perda da graduação dos praças da Polícia Militar; XVI – realizar audiências públicas sobre temas afetos a sua área de atuação, visando dirimir, prevenir conflitos e buscar soluções, envolvendo a sociedade civil e os setores interessados; XVII - exercer o controle externo da atividade policial, civil ou militar, podendo, dentre outras medidas administrativas e
judiciais: a) ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais; b) ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade de polícia judiciária, ou requisitá-los; c) requisitar à autoridade competente a adoção de providências para sanar a omissão ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder; d) requisitar à autoridade competente a abertura de inquérito sobre a omissão ou fato ilícito ocorridos no exercício da atividade policial, determinando as diligências necessárias e a forma de sua realização, podendo acompanhá-las e também proceder diretamente a investigações, quando necessário; e) acompanhar atividades investigatórias; f) recomendar à autoridade policial a observância das leis e princípios jurídicos; g) requisitar à autoridade competente a instauração de sindicância ou procedimento administrativo cabível; h) exigir comunicação imediata sobre apreensão de adolescente; i) avocar inquérito policial em qualquer fase de sua elaboração e requisitar, a qualquer tempo, as diligências que se fizerem necessárias; § 1º O controle externo da atividade policial será exercido tendo em vista: I - o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, aos princípios informadores das relações internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei; II - a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público; III - a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder; IV - a indisponibilidade da persecução penal; V - a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública; VI - outros interesses, direitos e valores relacionados ao exercício da atividade policial”. (SANTA CATARINA. Lei Complementar Estadual nº 197/2000 – Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br>. Acesso em: 1º de abril de 2008) (grifou-se).
35
1.4.3 Organização e atribuição do Ministério Público
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
em seu artigo 12856, afirma que o Ministério Público abrange o Ministério Público
da União, que, por sua vez, se subdivide em: Ministério Público Federal; Ministério
Público do Trabalho; Ministério Público Militar; Ministério Público do Distrito Federal
e Territórios; e existe também o Ministério Público dos Estados.57
A atual Carta Magna, ainda, em seu artigo 128, § 5º,
descreve que as Leis Complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é
facultada aos respectivos procuradores-gerais, estabelecerão a organização, as
atribuições e o estatuto de cada Ministério Público.58
Segundo Hugo Nigro Mazzili:
[...] a Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, e a Lei
Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, correspondem,
respectivamente à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e à
Lei Orgânica do Ministério Público da União.59
56 “Art. 128. O Ministério Público abrange: I - o Ministério Público da União, que compreende: a) o
Ministério Público Federal; b) o Ministério Público do Trabalho; c) o Ministério Público Militar; d) o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios; II - os Ministérios Públicos dos Estados. § 1º - O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução. § 2º - A destituição do Procurador-Geral da República, por iniciativa do Presidente da República, deverá ser precedida de autorização da maioria absoluta do Senado Federal. § 3º - Os Ministérios Públicos dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios formarão lista tríplice dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução. § 4º - Os Procuradores-Gerais nos Estados e no Distrito Federal e Territórios poderão ser destituídos por deliberação da maioria absoluta do Poder Legislativo, na forma da lei complementar respectiva. § 5º - Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público” [...] (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal, 1988).
57 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado
Federal, 1988.
58 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado
Federal, 1988.
59 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 243.
36
No que diz respeito à criação de lei que organize o Ministério
Público da União, Hugo Nigro Mazzilli ainda explica que a competência é
concorrente, alegando que:
Embora a Constituição fale em iniciativa privativa do presidente
para lei de organização do Ministério Público da União, idêntica
iniciativa é facultada ao procurador-geral da República: há, pois,
iniciativa concorrente de ambos para a lei que deve estabelecer a
organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da
União. Privativa é só a iniciativa do presidente da República para
a lei que cria normas gerais para os Ministérios Públicos dos
Estados e do Distrito Federal e Territórios.60
A propósito, leciona o autor:
[...] leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é
facultada aos respectivos procuradores-gerais, minudenciarão a
organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério
Público, devendo os Estados observar as normas gerais fixadas
na lei federal referida no art. 6.1, § 1º, II, d, da Constituição.61
1.4.4 Princípios Institucionais do Ministério Público
A própria Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, no §1º do artigo 12762, descreve três princípios institucionais básicos, que,
ao lado daqueles identificados pela doutrina, servem de diretrizes para a
organização e atuação do Ministério Público.
Alexandre de Moraes, sobre o tema, disserta:
60
MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 243.
61 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 244 (mantida a grafia da fonte).
62 “Art.127. [...] §1º São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e
a independência funcional”. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
Distrito Federal: Senado Federal. 1988. Cabe ressaltar que este mesmo parágrafo foi reproduzido na LONMP, onde consta no parágrafo único de seu art.1°).
37
Os princípios institucionais do Ministério Público devem ser
analisados e interpretados em relação a cada um dos ramos do
Parquet – MPU (com suas quatro previsões: MPF, MPT, MP / DF
e MPT) e MPEs – uma vez que inexiste hierarquia entre eles, mas
tão-somente distribuição constitucional de atribuições.63
Contudo, não se pode deixar de citar, por fim, o princípio do
Promotor Natural que, apesar de não constar expressamente no artigo 127, § 1º,
da atual Constituição da República Federativa do Brasil, fora reconhecido
existente e determinada sua observância necessária, nos moldes do
entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal.64
Neste passo, passa-se à análise dos princípios
mencionados.
1.4.4.1 Unidade
Consoante aos ensinamentos de Uadi Lammêgo Bulos,
inexiste unidade entre o Parquet Federal e os Ministérios Públicos Estaduais.
Assim, não há que se falar em unidade entre o Ministério Público de um Estado e
de outro, nem entre os diversos ramos do Ministério Público da União. É que o
princípio da unidade só incide no âmbito de cada Ministério Público.65
Não é outro o entendimento de Alexandre de Moraes:
A unidade significa que os membros do Ministério Público
integram um só órgão sob a direção única de um só Procurador-
geral, ressalvando-se, porém, que só existe unidade dentro de
cada Ministério Público, inexistindo entre o Ministério Público
63
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6
ed. atualizada até a EC nº 52/06 – São Paulo: Atlas, 2006, p. 1679.
64 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 83.
65 Cf. BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1087-1088.
38
Federal e os dos Estados, nem entre o de um Estado e o de outro,
nem entre os diversos ramos do Ministério Público da União.66
No mesmo vértice, o Supremo Tribunal Federal entendeu,
com base no princípio da Unidade do Ministério Público, que:
[...] o ato processual de oferecimento da denúncia, praticado, em
foro incompetente, por um representante, prescinde, para ser
válido e eficaz, de ratificação por outro do mesmo grau funcional e
do mesmo Ministério Público, apenas lotado em foro diverso e
competente, porque o foi em nome da instituição, que é una e
indivisível.67
1.4.4.2 Indivisibilidade
O princípio da indivisibilidade decorre do próprio corolário da
unidade, isto é, o membro do Ministério Público não pode ser subdividido
internamente em inúmeras instituições autônomas e desvinculadas entre si.
Sendo assim, o Parquet não se vincula ao processo no qual oficia, podendo ser
substituído por outro, conforme o que dispuser a lei.68
Sobre este princípio, Valter Foleto Santin pontua:
A indivisibilidade significa que a instituição é um todo indivisível é
único o ofício de Ministério Público, podendo um membro ser
substituído por outro da mesma carreira e ramo (membro do
Ministério Público Federal por outro membro do mesmo ramo;
membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, por outro
membro do Ministério Público de São Paulo, não do Paraná nem
66
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 518.
67 STF – Pleno – HC 85.137/MT, Rel. Min. Cezar Peluso – Informativo STF nº 402, p. 4 e
Informativo STF nº 401, p. 2 (apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2006, p. 1679).
68 Cf. BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1088.
39
de outro Estado, vice-versa), sem que interfira no desempenho
das funções.69
O Superior Tribunal de Justiça ainda contribui:
O Ministério Público é uno e indivisível, mas apenas na medida
em que os seus membros estão submetidos a uma mesma chefia.
Essa unidade e indivisibilidade só dizem respeito a cada um dos
vários Ministérios Públicos que o sistema jurídico brasileiro
consagrou.70
1.4.4.3 Independência funcional
A Instituição Ministério Público é independente na realização
de suas atribuições, não ficando sujeito às ordens de qualquer órgão, somente
devendo prestar contas de seus atos à Constituição, às leis e à sua consciência.71
Este princípio encontra-se presente, exemplificadamente, na
redação do artigo 28, do Código de Processo Penal, pois, se o Procurador-Geral
de Justiça discordar da promoção de arquivamento do Promotor de Justiça,
poderá, o mesmo, oferecer denúncia, determinar diligências, ou mesmo designar
outro órgão ministerial para oferecê-la, mas nunca poderá determinar que o
proponente do arquivamento inicie a ação penal. Assim, pode-se afirmar que nem
seus superiores hierárquicos podem determinar-lhes ordens no sentido de agir de
certa maneira dentro de um processo.72
A esse respeito, Valter Foleto Santin assim se manifesta:
69
SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. Bauru, São Paulo:
EDIPRO, 2001, p. 198.
70 STJ, ROMS 5563/RS, rel. Min. César Asfor Rocha, 1ª Turma, decisão: 21-8-1995, DJ1,
de 16-10-1995, p. 34609 (apud BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 5. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional n. 39/2002 – São Paulo: Saraiva, 2003, p. 1088).
71 RTJ 147/142 (apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação
constitucional. 2006, p. 1680).
72 Cf. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional.
2006, p. 1680.
40
A autonomia funcional ou independência funcional garante a
liberdade de atuação do órgão do Ministério Público, sem sofrer
influência hierarquicamente superior. O membro atua livremente
no caso concreto, de acordo com as regras legais e a sua
consciência, sem direcionamento vinculativo e compulsório dos
órgãos superiores, para que possam servir aos interesses da lei e
não aos dos governantes. Agem conforme a sua convicção fática
e jurídica. A hierarquia é apenas administrativa, não podendo o
chefe da instituição determinar como deva agir o membro
oficiante, muito menos em qual sentido. A chefia do Procurador-
Geral é administrativa, não funcional.73
Destaca-se, também, a lição do Supremo Tribunal Federal:
É indispensável que o Ministério Público ostente, em face do
ordenamento constitucional vigente, especial posição na estrutura
do poder estatal. A independência institucional constitui uma das
mais expressivas prerrogativas político-jurídicas do parquet, na
medida em que lhe assegura o desempenho em toda a sua
plenitude e extensão, das atribuições a ele conferidas.74
1.4.4.4 Promotor Natural
Como já ressaltado, não se pode deixar de citar, por fim, o
princípio do Promotor Natural. Apesar de não ter sido expressamente relacionado
no artigo 127, § 1º, da atual Carta Magna, a verdade é que o Plenário do Supremo
Tribunal Federal já reconheceu a existência desse princípio, por maioria de
votos.75
O Supremo Tribunal Federal conceitua o princípio do
Promotor Natural:
73
SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 199.
74 STF, Tribunal Pleno, ADIMC 789, rel. Min. Celso de Mello, decisão: 22-10-1992, Em. de
Jurisp., v. 1693-02, p. 196; DJ1, de 26-2-1993, p. 2356 (apud BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1088).
73 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 83.
41
O postulado do Promotor Natural, que se revela imanente ao
sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de
designações casuísticas efetuadas pela chefia da Instituição, a
figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma
garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro
do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício
pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria
coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em
quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se
justifique a partir de critérios abstratos e predeterminados (sic),
estabelecidos em lei. A matriz constitucional desse princípio
assenta-se nas cláusulas da independência funcional e na
inamovibilidade dos membros da Instituição. O postulado do
Promotor Natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-
Geral que, embora expressão visível da unidade institucional, não
deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo hegemônico
e incontrastável. Posição dos Ministros Celso de Mello (relator),
Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Carlos Velloso. Divergência,
apenas, quanto à aplicabilidade imediata do princípio do Promotor
Natural: necessidade da interpositio legislatoris para efeito de
atuação do princípio (Ministro Celso de Mello); incidência do
postulado, independentemente de intermediação legislativa
(Ministros Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Carlos Velloso.
Reconhecimento da possibilidade de instituição do princípio do
Promotor Natural mediante lei (Ministro Sydnei Sanches). Posição
de expressa rejeição à existência desse princípio consignada nos
votos dos Ministros Paulo Brossard, Octávio Gallotti, Néri da
Silveira e Moreira Alves.76
1.4.5 Garantias do Ministério Público
Cabe informar que as garantias constitucionais do Ministério
Público foram-lhe conferidas pelo legislador constituinte, com o intuito do pleno e
independente exercício de suas funções, e serão divididas no presente estudo em
garantias institucionais e garantias aos membros do Ministério Público.77
76
STF – HC nº 67.759/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, RTJ 150/123, RTJ 148/181 (apud, MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2006, p. 1683).
77 Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 524.
42
Ainda cabe ressaltar uma passagem de Uadi Lammêgo
Bulos a respeito:
Evidente que as garantias do Ministério Público, suas funções e
garantias constitucionais, configuram cláusulas imodificáveis (art.
60, § 4º). Não há sentido em derrubar as vigas mestras do Parquet
que, com a reconstrução da ordem constitucional, emergiu sob o
signo da legitimidade democrática. „Ampliaram-se-Ihe as
atribuições; dilatou-se-Ihe a competência; atendeu-se, finalmente,
a antiga reivindicação da própria sociedade civil. Como o Mi-
nistério Público não constitui órgão ancilar do Governo, instituiu o
legislador constituinte um sistema de garantias destinado a
proteger o membro da instituição e a própria instituição, cuja
atuação configura a confiança de respeito aos direitos individuais
e coletivos, e a certeza de submissão dos Poderes à lei‟.78
1.4.5.1 Garantias institucionais
1.4.5.1.1 Autonomia funcional
A autonomia funcional, fazendo parte da instituição como um
todo e abrangendo todos os órgãos do Ministério Público, está descrita no artigo
127, § 2º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, uma vez
que, ao cumprir os seus deveres institucionais, o membro da instituição não se
submeterá a nenhum outro poder, seja Legislativo, Executivo ou Judiciário, órgão,
autoridade pública, entre outros. Portanto, deve apenas observar a Constituição,
as leis e a sua própria consciência.79
1.4.5.1.2 Autonomia administrativa
Pedro Lenza explica:
78
STF, Min. Celso de Mello, RTJ, 147:161 (apud BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1130).
79 Cf. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 453.
43
Prevista no art. 127, § 2º, a autonomia administrativa consiste na
capacidade de direção de si próprio, autogestão, auto-
administração, um governo de si. Assim, o Ministério Público
poderá, observado o disposto no art. 169, propor ao Poder
Legislativo a criação e a extinção de seus cargos e serviços
auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de
provas e títulos, a política remuneratória e os planos de carreira,
enfim, sua organização e funcionamento.80
1.4.5.1.3 Autonomia financeira
Descrita no art. 127, § 3º, ao Ministério Público assegurou-se
a capacidade de elaborar sua proposta orçamentária dentro dos limites dispostos
na lei de diretrizes orçamentárias, podendo, assim, de forma autônoma,
administrar os recursos que lhe forem destinados.81
Pedro Lenza, em seu livro, afirma que:
Assim como fixado para a magistratura [...] a EC n. 45/2004
regulamentou o procedimento de encaminhamento da proposta
orçamentária do Ministério Público e solução em caso de inércia.
Proibiu, outrossim, a realização de despesas ou a assunção de
obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na lei de
diretrizes orçamentárias, exceto se previamente autorizadas,
mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais (art.
127, §§ 4º, 5º e 6º).82
1.4.6 Garantias e vedações aos membros do Ministério Público
Aos membros da Instituição, importa destacar que a
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 determinou o respeito a
80
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 453.
81 Cf. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 453-454.
82 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 454 (mantida a grafia da
fonte).
44
certas garantias, que são: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de
vencimentos dos promotores; todas visando à defesa do Estado democrático de
Direito e dos direitos fundamentais.
Como bem registra Alexandre de Moraes, tais garantias
constitucionais do Ministério Público foram-lhe atribuídas pelo legislador
constituinte com a finalidade do pleno e independente exercício de suas
funções.83
Em relação à vitaliciedade, Pedro Lenza explica:
Adquire-se a vitaliciedade após a transcorrência do período
probatório, ou seja, dois anos de efetivo exercício do cargo,
tendo sido admitido na carreira, mediante aprovação em concurso
de provas e títulos (art. 128, § 5º, I, “a”). A garantia da
vitaliciedade assegura ao membro do Ministério Público a perda
do cargo somente por sentença judicial transitada em
julgado.84
Alexandre de Moraes complementa:
O membro vitalício dos Ministérios Públicos dos Estados somente
perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado,
proferida em ação civil própria, nos seguintes casos: prática de
crime incompatível com o exercício do cargo, após decisão judicial
transitada em julgado; exercício da advocacia; abandono do cargo
por prazo superior a trinta dias corridos.85
Cabe ressaltar, porém, que, de forma excepcional, o membro
do Ministério Público poderá não ser vitalício, mesmo que já tenha ultrapassado o
estágio probatório, preservando tão-somente a garantia da estabilidade. Isso
ocorre em relação aos membros do Ministério Público, admitidos antes da
promulgação da atual Constituição da República do Brasil, que optarem pelo regime
anterior, no que disser respeito às garantias e vantagens, observando-se quanto às
83
Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 524 (mantida a grafia da fonte).
84 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 454.
85 Cf. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional.
2006, p. 1702.
45
vedações a situação jurídica da própria data da promulgação da Carta Magna
(ADCT, art. 29, § 3º).86
Pedro Lenza conceitua a inamovibilidade:
O membro do Ministério Público não poderá ser removido ou
promovido, unilateralmente, sem a sua autorização ou
solicitação. Excepcionalmente, contudo, por motivo, de interesse
público, mediante decisão do órgão colegiado competente do
Ministério Público (no caso, o Conselho Superior do Ministério
Público), por voto da maioria absoluta de seus membros, desde
que lhe seja assegurada a ampla defesa, poderá vir a ser
removido do cargo ou função (art. 128, § 5º, I, “b”, modificado pela
EC 45/2004).87
Não é diferente o entendimento de Alexandre de Moraes:
Uma vez titular do respectivo cargo, o membro do Ministério Público
somente poderá ser removido ou promovido por iniciativa própria,
nunca ex officio de qualquer outra autoridade, salvo em uma única
exceção constitucional por motivo de interesse público, mediante
decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto
da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa.88
Ainda, em conformidade com o artigo 128, § 5º, I, “c”89, da
atual Constituição da República Federativa do Brasil, fica assegurado ao Parquet
86
Cf. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional.
2006, p. 1703.
87 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 454 (mantida a grafia da
fonte).
88 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional.
2006, p. 1704 (mantida a grafia da fonte).
89 “Art. 128. O Ministério Público abrange: § 5º - Leis complementares da União e dos Estados,
cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros: I - as seguintes garantias: c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
46
a garantia da irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º90, e
ressalvado o disposto nos artigos 37, X e XI91, 150, II92, 153, § 2º, I93.
Assim, tem-se que os subsídios dos membros do Ministério
Público não poderão ser reduzidos, lembrando-se que está assegurada a
irredutibilidade nominal, não se garantindo a corrosão inflacionária.94
90 “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política
de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Vide ADIN nº 2.135-4) § 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
91 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento) XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado
Federal. 1988).
92 “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
93 “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: § 2º - O imposto previsto no inciso III: I -
será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
94 Cf. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 454-455.
47
No que tange ao alcance da garantia constitucional da
irredutibilidade de vencimentos, o Supremo Tribunal Federal já estabeleceu tratar-
se de cláusula que: “veda a redução do que se tem”.95
Dessa forma, no mesmo entendimento, como mencionado
pelo Ministro Celso de Mello:
Irredutibilidade de vencimentos: Em relação ao alcance da
garantia constitucional da irredutibilidade de vencimentos, o STF já
estabeleceu tratar-se de cláusula que "veda a redução do que se
tem" (RTJ104/808). Dessa forma, como salientado pelo Ministro
Celso de Mello, "o Supremo Tribunal Federal, tendo presente a
concreta abrangência desse postulado fundamental, enfatizou que
'a garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos (...)
torna intangível o direito que já nasceu e que não pode ser
suprimido' (RTJ 118/300, Rei. Min. Carlos Madeira), pois, afinal, a
garantia da irredutibilidade incide sobre aquilo que, a título de
vencimentos, o servidor já vinha percebendo (RTJ 112/768, Rei. Min.
Alfredo Buzaid). Cumpre ter presente, neste ponto, a sempre
relembrada decisão desta Suprema Corte, em período no qual a
garantia em causa somente dizia respeito aos membros do Poder
Judiciário, na qual se assentou, concernentemente ao tema em
debate, que 'o que a irredutibilidade veda é a diminuição, por lei
posterior, dos vencimentos que o juiz, em exercício antes de sua
vigência, estivesse recebendo' (RTJ45/353, 355, Rei. Min. Evandro
Lins). Esse entendimento -impõe-se enfatizar - tem sido reiterado
em diversos pronunciamentos dessa Corte Suprema, nos quais,
por mais de uma vez, já se proclamou que a garantia constitucional
da irredutibilidade de vencimentos proíbe que o estipêndio funcional
seja reduzido ou afetado, por ato do Poder Público, em seu valor
nominal (RTJ 105/671, 675, Rei. Min. Soares Munoz)" (STF - Pleno
- Adin n° 1.396-3/SC - Medida liminar - Rei. Min. Celso de Mello,
Diário da Justiça, Seção I, 2 fev. 1996).96
Mais uma vez tentando desatrelar o membro do Ministério
Público de qualquer força influente, o constituinte estabeleceu para o Ministério
95
RTJ 104/808 (apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2006, p. 1707).
96 STF - Pleno - Adin n° 1.396-3/SC - Medida liminar - Rei. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça,
Seção I, 2 fev. 1996 (apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2006, p. 1707) (mantida a grafia da fonte).
48
Público vedações de algumas atividades que poderiam de qualquer forma
atrapalhar ou infamar o ofício do Parquet. Estão elas descritas no artigo 128, §5º,
inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que são: a.
receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou
custas processuais; b. exercer a advocacia; c. participar de sociedade comercial,
na forma da lei; d. exercer, ainda que em indisponibilidade, qualquer outra função
pública, salvo uma de magistério; e. exercer atividade político-partidária, salvo
exceções previstas na lei.97
Como ilustração, cabe transcrever uma decisão proferida
pelo Supremo Tribunal Federal a respeito do exercício da advocacia e
autodefesa:
Impossibilidade do exercício da autodefesa técnica por
membro do Ministério Público: STF – „A Turma, por maioria,
deferiu habeas corpus contra decisão do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro que recebera a denúncia oferecida
contra promotora de justiça, uma vez que a resposta à denúncia
fora apresentada pela própria denunciada, atuando em causa
própria. Considerou-se que as funções do Ministério Público são
incompatíveis com o exercício da advocacia (Lei n° 8.906/94, art.
28, II), ainda que atuando em causa própria‟.98
Apresentada a instituição do Ministério Público, e sendo o
objeto de estudo desta pesquisa a análise de uma de suas funções, qual seja, o
controle externo da atividade policial e a efetividade da atuação do Parquet,
conforme já ressaltado anteriormente, direcionar-se-á, portanto, o seguinte
capítulo ao estudo da Polícia Brasileira.
97
Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 531.
98 STF - 2
a T. - HC n° 76.671/RJ - Rei. Min. Nelson Jobim, decisão: 9-6-1998. informativo STF, n°
114 (apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2006, p. 1708) (mantida a grafia da fonte).
49
CAPÍTULO 2
DA POLÍCIA
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
em seu artigo 129, inciso VII, descreve tão somente que o Ministério Público
exercerá o controle da atividade policial, sem definir se esta atividade policial é
somente da Polícia Judiciária (Polícia Civil), ou refere-se também à Polícia
Preventiva (Polícia Militar).99
Respeitando a atual Lex Magna, as Leis Orgânicas do
Ministério Público e as doutrinas pertinentes, pode-se afirmar que estão sujeitas
ao controle externo pelo Ministério Público, a Polícia Civil e Militar, sempre que no
exercício do múnus de Polícia Judiciária, com fins de persecução penal,
abrangendo também, a fiscalização quanto às ilegalidades ou abusos de poder
cometidos pela autoridade policial ou seus agentes.100
Desta forma, cabe apresentar, neste capítulo, então, um
panorama a respeito de todos os tipos de Polícias existentes no Brasil, sejam elas
Preventivas ou Repressivas.
2.1 DA SEGURANÇA PÚBLICA – NOÇÕES GERAIS
Em uma sociedade que se busca o respeito pela
democracia, a segurança pública visa garantir a proteção dos direitos individuais e
assegura o pleno exercício da cidadania. Conforme bem destaca Alexandre de
Moraes, a atual Constituição da República Federativa do Brasil preceitua que a
99
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 87.
100 Cf. LOCATELLI, Paulo Antônio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial.
Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 59.
50
segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos é
exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
patrimônio, sem, contudo, reprimir-se abusiva e inconstitucionalmente a livre
manifestação de pensamento.101
Não é diferente o entendimento de Uadi Lammêgo Bulos:
Como a convivência harmônica reclama a preservação dos
direitos e garantias fundamentais, é necessário existir uma
atividade constante de vigilância, prevenção e repressão de
condutas delituosas. Daí a razão de ser da segurança pública do
Estado, isto é, manter a paz dentro da adversidade, pois é dentro
do embate de interesses antagônicos que emerge o seu poder
fundamental, qual seja, o de procurar manter o equilíbrio nas
relações sociais.102
Neste sentido, a segurança pública é tratada no artigo
144103, caput, da atual Carta Magna.
Alexandre de Moraes ainda faz uma ressalva, explicando
que a Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988 concedeu
aos Municípios o direito, através do exercício de suas competências legislativas, a
constituir Guardas Municipais com o objetivo de proteger os seus bens, serviços e
instalações, conforme prescrito em lei, sem, contudo, reconhecer-lhes a
possibilidade de exercício de Polícia Ostensiva ou Judiciária.104
Destaca José Afonso da Silva, que a “segurança pública”
consiste numa situação de preservação ou restabelecimento dessa convivência
social que permite que todos gozem de seus direitos e exerçam suas atividades
101
Cf. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 675.
102 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 2007, p. 1175.
103 “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares [...] § 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme a lei dispuser” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
104 Cf. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação
constitucional. 2006, p. 1817.
51
sem perturbação de outrem, salvo nos limites de gozo e reivindicação de seus
próprios direitos e defesa de seus legítimos interesses. Trata-se, assim, de uma
atividade de vigilância, prevenção e repressão de condutas delituosas.105
Emerson Clayton Rosa Santos, não obstante, observa:
As forças de segurança buscam aprimorar-se a cada dia e atingir
níveis que alcancem a expectativa da sociedade como um todo,
imbuídos pelo respeito e à defesa dos direitos fundamentais do
cidadão e, sob esta óptica, compete ao Estado garantir a
segurança de pessoas e bens na totalidade do território brasileiro,
a defesa dos interesses nacionais, o respeito pelas leis e a
manutenção da paz e ordem pública. Paralelo às garantias que
competem ao Estado, o conceito de segurança pública é amplo,
não se limitando à política do combate à criminalidade e nem se
restringindo à atividade policial.106
Assim, a segurança pública, enquanto atividade
desenvolvida pelo Estado é responsável por empreender ações de repressão,
oferecer estímulos ativos para que os cidadãos possam conviver, trabalhar,
produzir e se divertir, protegendo-os dos riscos a que estão expostos.107
Agora, passa-se ao estudo desta que vem significar, como
lembra o autor, a atividade administrativa tendente a assegurar a ordem, a paz
interna, a harmonia e, mais tarde, o órgão do Estado que zela pela segurança dos
cidadãos, sendo, atualmente, portanto, órgão a que se atribui, exclusivamente, a
função negativa, ou seja, a função de evitar a alteração da ordem jurídica.108
105
SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 11ª ed. São Paulo: Malheiros. 2003, p. 753-754.
106 SANTOS, Emerson Clayton Rosa. Conceito de segurança pública. Disponível em:
<http://br.monografias.com/trabalhos2/seguranca-publica/seguranca-publica.shtml>. Acesso em: 18.11.2007.
107 Cf. SANTOS, Emerson Clayton Rosa. Conceito de segurança pública. Disponível em:
<http://br.monografias.com/trabalhos2/seguranca-publica/seguranca-publica.shtml>. Acesso em: 18.11.2007.
108 Cf. SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 2003, p. 754.
52
2.2 DA POLÍCIA – NOÇÕES HISTÓRICAS
Inicialmente, conforme bem recorda Rodrigo Régnier
Chemim Guimarães, para enveredar com segurança pela história, impõe-se
delimitar o campo desejado e consultar os historiadores que abordem o tema
escolhido. Em que pese esta preocupação, é certo que os pesquisadores
costumam considerar as questões históricas sob os mais variados enfoques e
abordagens, imprimindo-lhes nuances e perspectivas próprias. Tal divergência
também se apresenta no surgimento da Polícia, quando os doutrinadores não
revelam uma linha de tratamento uniforme. Não obstante a esta uniformidade,
ainda assim, apresentam-se de forma resumida, breves noções históricas quanto
ao seu surgimento.109
Em relação a existência de formas primitivas de Polícia,
cabe transcrever a lição de Luiz Carlos Rocha:
O faraó Menés já declarava ser a polícia o principal e maior bem
de um povo. Na mesma linha de pensamento, os hebreus
dividiram a cidade de Jerusalém em quatro partes, denominadas
„quarteirões‟, designando um agente de polícia para cuidar de
cada um destes „quarteirões‟. No entanto, foi entre os romanos
antigos, com o reinado de Augusto César, que a polícia passou a
ser organizada, com chefes de polícia preventiva e repressiva dos
incêndios, escravos, fugitivos, furtos, roubos, vadiagem, ladrões
habituais ou reincidentes, em suma, das classes perigosas.
Segundo Pestana, os romanos não admitiam a presença de
soldados dentro das cidades, por entender que suas presenças
poderiam constituir ameaça às suas liberdades e assim é que
resolveram criar uma polícia com a finalidade de manter a ordem
interna. É, pois, precisamente entre os romanos que se vislumbra
a adoção do termo politia „no sentido de manter a ordem pública, a
tranqüilidade e a paz interna‟. No tempo do Império Romano, já se
encontravam funcionários encarregados de informar os
magistrados a respeito da ocorrência de determinado crime,
detalhando suas circunstâncias, chamados de curiosi, irenarche,
stationarii, nuntiatores e os digiti duri, agindo como arremedos dos
109
Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 21.
53
modernos policiais.110
Contudo, o termo Polícia ganha nova concepção na Idade
Média, onde, o Príncipe tinha o poder de arrecadar tributos, denominado este de
ius policei, considerado necessário na busca da boa ordem da coisa pública. E
assim, explica Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
No século XIV, tanto a França quanto a Alemanha adotaram o
termo „polícia‟ para designar, nos moldes gregos antigos, a
atividade e os fins estatais. Diferentemente dos franceses, os
alemães vão um pouco além na utilização do termo, e passam a
valer-se da expressão „Estado Polícia‟. Nesta época, o Poder de
Polícia, ou seja, o Poder de Estado, concentrava-se nas mãos do
Príncipe que, desconsiderando o ser humano como portador de
direitos e arvorando-se como representante divino, decidia o
destino dos homens. Adotava-se, então, um sistema processual
de cunho eminentemente inquisitório, concentrando todo o poder
de investigar e julgar nas mãos de um único órgão.111
Não obstante, é com o surgimento do Estado liberal (e o
homem passando a ser sujeito de direitos e não mais mero objeto) que o conceito
de Polícia passa a ser marcado como sinônimo de manutenção da ordem e da
segurança. Logo, o Estado somente interviria, com seu Poder de Polícia, em
caso de ameaça à ordem da coletividade. Segundo ressalta o autor, surge aqui a
noção jurídica do Poder de Polícia, próxima dos moldes de sua atual
compreensão.112
Cabe ressaltar, seguindo as orientações de João Mendes de
Almeida Júnior, o conceito que a Assembléia Nacional Francesa tinha de Polícia
em 1791:
A polícia, considerada em suas relações com a segurança pública,
110
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 22 (mantida a grafia da fonte).
111 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 23.
112 Cf. GORDILLO, Agustín A. Estúdios de Derecho Administrativo. Buenos Aires: Editorial Perrot,
1963, p. 11, apud BEZNOS, Clovis. In: Poder de Polícia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979,
p. 16.
54
deve preceder à ação da justiça; a vigilância deve ser o seu
principal caráter; a sociedade considerada em massa é o objeto
essencial de sua solicitude. [...] A polícia é administrativa ou
judiciária. A polícia administrativa tem por objeto a manutenção da
ordem pública em cada lugar e em cada parte da administração
geral. Ela tende principalmente a preveni r os delitos. A policia
judiciária investiga os delitos que a polícia administrativa não pôde
evitar que fossem cometidos, colige as provas e entrega os
autores aos tribunais incumbidos pela lei de puni-los.113
No Brasil, a primeira manifestação de "Polícia" foi trazida
pelos portugueses e conforme os ensinamentos de Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães:
Vigiam em Portugal as chamadas Ordenações Afonsinas, as
quais tratavam a polícia e a magistratura de maneira unitária,
preponderando, inclusive, a atividade policial sobre a judicial.
Aliás, ambos não passavam de longa manus do Rei de Portugal.
Logo em seguida, em 1521, vieram as Ordenações Manuelinas.
Neste início da colonização do Brasil, apesar de todo o poder ser
exercido em nome do rei, na prática, eram os governadores das
cidades que cumulavam as funções de polícia, de acusação e
julgamento, todas concentradas, como recomendava o sistema
inquisitório da época. Embora formalmente estivessem vigorando
ao tempo das capitanias hereditárias, as Ordenações Manoelinas
não constituíam a fonte do Direito aplicável no Brasil, pois o
arbítrio dos donatários, na prática, é que impunha as regras
jurídicas. Ao capitão era dada a faculdade de nomear ouvidor, o
qual conhecia das apelações e agravos de toda a capitania e de
ações novas até dez léguas de distância onde se encontrasse.114
Destarte, foi o Alvará de 10 de maio de 1808, no entanto,
que criou Intendência Geral de Polícia da Corte e do Estado do Brasil, para o
cumprimento de normas da legislação criminal, utilizando a palavra 'delegado'
para designar a autoridade policial da Província.115
113
ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. O Processo Criminal Brasileiro. 4. ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1959, v. 1, p. 249 (mantida a grafia da fonte).
114 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 24.
115 THOMÉ, Ricardo Lemos. Contribuição à prática de polícia judiciária. 1997, p. 15-16.
55
Nesse sentido, Ricardo Lemos Thomé destaca:
A história policial brasileira tende à compreensão de que houve
um rápido amadurecimento quanto à legislação processual penal,
abreviando-se os caminhos percorridos pela pátria-mãe. De fato,
quando da edição do Alvará de 10 de maio de 1808 (que instituiu
no Brasil a Polícia Judiciária, o Delegado de Polícia e seus
agentes), Portugal já havia passado por longa experiência
legislativa com as Ordenações Afonsinas, Filipinas e
Manuelinas.116
Sobre o assunto, também leciona Valter Foleto Santin:
Nas Ordenações Filipinas acham-se os primeiros passos que
levariam à futura criação dos órgãos estatais de polícias. O
serviço de polícia era exercido gratuitamente por moradores,
divididos em quadras ou quarteirões e controlados pelos alcaides
e depois pelos juízes da terra.117
Após a proclamação da independência do Brasil, com a
edição da Lei de 13 de outubro de 1827, os cargos de comissários e cabos de
Polícia foram extintos, surgindo, assim, figura assemelhada à do atual Delegado
de Polícia, a ser exercida, no entanto, por um juiz de paz, fazendo com que a
Polícia ainda não se dissociasse da magistratura.118
A questão deve ser analisada até mesmo de forma inversa,
isto é, a magistratura é que tinha atuação dependente da Polícia, que de resto era
representativa da vontade do imperador. Este, ao exercer o Poder Moderador,
podia destituir os magistrados ou alterar-lhes a sentença condenatória.119
116
THOMÉ, Ricardo Lemos. Contribuição à prática de polícia judiciária. Florianópolis: Ed. do
Autor, 1997, p. 19.
117 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 50.
118 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 26.
119 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 26.
56
Conforme Epitácio Torres, o Código de Processo Criminal
do Império, que entrou em vigor no ano de 1832, tratou da matéria, em seus
artigos 6, 16º e 18º, nos seguintes termos:
Segundo o novo Código, teria cada distrito um juiz de paz, um
escrivão, um inspetor para cada quarteirão e tantos oficiais de
justiça quantos fossem necessários. Cada termo teria um
conselho de jurados, um juiz municipal, um promotor público e
outros auxiliares da justiça. Haveria também em cada comarca um
juiz de direito, e nas cidades maiores até o máximo de três juízes
de direito, dentre os quais um seria chefe de polícia.120
Assim, a Polícia e a Magistratura confundiam-se num único
órgão, ambos atuando em nome e sob o comando maior, agora do Imperador do
Brasil.121
A Intendência Geral da Polícia foi extinta com a reforma do
Código de Processo Criminal do Império, pela Lei n. 261, de 03 de dezembro de
1841, e foi criado, assim, o cargo de Chefe de Polícia em cada uma das
províncias da Corte, tendo, cada um destes chefes, seus respectivos delegados e
subdelegados, nomeados pelo imperador. Os Chefes de Polícia continuavam a
ser escolhidos entre os desembargadores e juízes de Direito.122
A lei referida anteriormente foi regulamentada pelo Decreto
n. 120, de 31 de janeiro de 1842, estabelecendo-se, pela primeira vez, a divisão
da Polícia em Administrativa e Judiciária. Cabe observar a explicação de Joaquim
Canuto Mendes de Almeida, a respeito do sistema então vigente:
Esse regime - como se vê - tripartia o papel da polícia, que era
autoridade judiciária, e polícia administrativa e de polícia judiciária:
os Chefes de Polícia, seus delegados e subdelegados, tinham
todas as atribuições policiais e, dentre as jurisdicionais, a de
formar a culpa aos delinqüentes. Durante cerca de trinta anos o
120
TORRES, Epitácio. Polícia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1978, p. 32 (mantida a grafia da fonte).
121 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 27.
122 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 27-28.
57
Brasil viveu este estado de coisas, não sem protestos e projetos
legislativos de reforma, que culminaram na Lei 2.033, de
20.09.1871, após discussões que, nas duas casas do parlamento
imperial, suscitou, sobretudo, a questão da diferença das funções
policiais e judiciárias, da separação da polícia e da judicatura.123
A propósito, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães disserta:
Como visto, nesta mesma fase histórica, já com o Código de
Processo Criminal do Império de 1832, foram traçadas as
primeiras linhas da sistematização da investigação policial, a qual,
com o advento da Lei 2.033, de 20.09.1871, regulamentada pelo
Dec.-lei 4.824, de 28 de novembro de 1871, ganhou o nome -
ainda hoje utilizado - de inquérito policial. [...] Com a queda do
império e a promulgação da Constituição Republicana de 1891,
surgiu outro fato marcante na evolução da Polícia brasileira,
quando, na esfera da Justiça Federal, não mais foi autorizada a
existência de Polícia Judiciária com o direito de iniciativa de
pronunciamento, nem com função decisória, com os Estados-
membros passando a ter administração própria e autônoma, e
resultando nas organizações policiais estaduais, o que perdurou
até 1937, com a promulgação da nova Constituição da República
que trouxe a reunificação da legislação processual penal.124
Entretanto, em 1902, com o advento da Lei n. 947, de 29 de
dezembro, a Polícia foi novamente reestruturada, subdividindo-se em: Civil e
Militar, a qual, mesmo após inúmeras alterações legislativas, encontra-se
presente ainda hoje.125
Ainda sobre o tema, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães
salienta que:
Por fim, não se pode esquecer o papel desempenhado pela
polícia brasileira no recente passado de exceção nascido em
1964, que, seguramente, contribuiu de forma marcante para a
123
ALMEIDA, Joaquim Canuto Mendes de. Princípios Fundamentais do Processo Penal. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1973, p. 64 (mantida a grafia da fonte).
124 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 28.
125 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 29.
58
atual situação de violência e corrupção no seio de parcela
significativa da polícia brasileira. [...] Como é sabido, durante a
ditadura militar, a polícia brasileira serviu ao regime e acabou
criando uma mentalidade de ação em prol da chamada Segurança
Nacional, justificadora de toda e qualquer ação arbitrária por parte
dela própria.126
A evolução continuou até que a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 delineou a estrutura básica do sistema policial
brasileiro, no Capítulo III (Segurança Pública), em seu artigo 144127, no qual,
atualmente, estabelece que a segurança pública será exercida através das
Polícias Federal, Rodoviária Federal, Ferroviária Federal, Civis, Militares e Corpos
de Bombeiros Militares. A par destes órgãos, a Constituição ainda autoriza a
criação de Guardas Municipais.128
Assim, Valter Foleto Santin finaliza, posicionando-se a
respeito da Polícia na atualidade:
Atualmente, a palavra polícia é empregada para designar a
instituição, corporação ou órgão incumbido de manter o
cumprimento da lei, a ordem e a segurança pública e de reprimir e
perseguir o crime.129
2.2.1 Conceito de Polícia
Rodrigo Régnier Chemim Guimarães ensina que a palavra
"Polícia", etimologicamente, é oriunda das Cidades-Estado da Grécia Antiga,
onde as atividades governamentais eram chamadas de "politéia", também
126
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 32.
127 Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares [...] § 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme a lei dispuser” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
128 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 31.
129 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 48.
59
originária de "polis", ou seja, cidade. Entretanto, não se evidenciava o emprego do
termo "Polícia", eis que os gregos não vislumbravam a necessidade de uma
estrutura policial, pois inexistia a propriedade privada, tudo pertencendo às
Cidades-Estado. O emprego do termo politia, assim, estava mais vinculado à idéia
de governar.130
A Polícia, instrumento da Administração, é uma instituição
de direito público, destinada a manter e a recobrar, junto à sociedade e na medida
dos recursos de que dispõe, a paz pública ou a segurança individual.131
Já Rodrigo Régnier Chemim Guimarães define "Polícia",
como sendo a função administrativa estatal que tem como escopo a manutenção
da ordem pública, a fim de que se possa viver harmoniosamente em sociedade,
atuando de forma preventiva e repressiva no combate aos desvios de conduta
dos cidadãos.132
Segundo José Geraldo da Silva:
[...] em amplo sentido, quer o vocábulo exprimir a ordem pública, a
disciplina política, a segurança pública instituídas, primariamente,
como base política do próprio povo erigido em Estado; e, em
sentido estrito, quer o vocábulo designar o conjunto de instituições
fundadas pelo Estado para que, segundo as prescrições legais e
regulamentares estabelecidas, exerçam vigilância para que se
mantenham a ordem pública, bem como a sua segurança. 133
Já para Alexandre de Moraes, Polícia é:
[...] a atividade da administração pública dirigida a concretizar, na
esfera administrativa, independentemente da sanção penal, as
limitações que são impostas pela lei à liberdade dos particulares
ao interesse da conservação da ordem, da segurança geral, da
130
Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 21-22.
131 Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Atlas. 2005, p. 79.
132 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 34.
133 SILVA, José Geraldo da. O Inquérito Policial e a Polícia Judiciária. São Paulo: Livraria e
Editora de Direito, 1994, p. 48.
60
paz social e de qualquer outro bem tutelado pelos dispositivos
penais.134
Pimenta Bueno, seguindo este entendimento, também
afirma que “a Polícia é a instituição estatal destinada a manter a ordem pública, a
segurança pessoal, a propriedade e assegurar os direitos individuais”.135
Enfim, Valter Foleto Santin afirma que:
Atualmente, a palavra polícia é utilizada para denominar a
instituição, corporação ou órgão encarregado de manter o
cumprimento da lei, da ordem e da segurança pública e de
reprimir e perseguir o crime. [...] A polícia é a instituição estatal
destinada à manutenção da ordem e dos bons costumes,
encarregada de preservar a tranqüilidade dos cidadãos e do
patrimônio, dentro da noção de prestação de serviços de
segurança pública, incumbida da prevenção, repressão e
investigação de infrações penais. [...] Portanto, a polícia é o
instrumento para a consecução da obrigação estatal de prestar
segurança pública, com a participação do povo, para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
do patrimônio. Dentre os direitos individuais garantidos
encontram-se os atinentes à inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à segurança e à propriedade (art. 5º, caput, CF),
inseridos na prestação de segurança pública estatal, feita pela
polícia. Os entes policiais existem para proteger o cidadão, sua
incolumidade e patrimônio e manter a ordem pública. Também
são direitos sociais (art. 6º, CF).136
2.2.2 Divisão tradicional das Polícias
Pedro Lenza explica que a atividade policial divide-se em
duas grandes áreas: administrativa e judiciária, sendo que a primeira – Polícia
Preventiva (ou ostensiva), atua preventivamente, evitando que o crime aconteça,
134
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 2004, p. 653.
135 GOMES, Amintas Vidal. Novo manual do delegado. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p.1.
136 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 50-51.
61
na área do ilícito administrativo, e a segunda – Polícia Repressiva, atua
repressivamente, depois de ocorrido o ilícito penal.137
Valter Foleto Santin ensina que:
A Polícia Administrativa limita os excessos da liberdade, protege
as situações individuais e procura manter o equilíbrio social. O seu
poder visa coibir as atividades nocivas aos interesses sociais ou
que infrinjam as disposições legais ou regulamentares, estranhas
à alçada criminal. Esta policia é de profissões, de associações, de
liberdade de pensamento e censura, de comunicações, de
construções e de vizinhança, dos serviços chamados de utilidade
pública e sanitária. A restrição à liberdade e à propriedade se faz
por meio de fiscalização, prevenção e repressão, agindo a
Administração coercitivamente. [...] A Polícia Judiciária seria
encarregada de investigação criminal e de auxiliar o Judiciário e o
Ministério Público, no cumprimento de mandados e requisições.138
Celso Antônio Bandeira de Mello distingue a Polícia
Administrativa da Polícia Judiciária com base no caráter preventivo da primeira e
repressivo da segunda. A Polícia Administrativa se predispõe unicamente a
impedir ou paralisar atividades anti-sociais enquanto a judiciária se preordena à
responsabilização dos violadores da ordem jurídica.139
Não é diferente o entendimento de Maria Sylvia Zanella Di
Pietro:
A principal diferença que se costuma apontar entre as duas está
no caráter preventivo da polícia administrativa e no repressivo
da polícia judiciária. A primeira terá por objetivo impedir as ações
anti-sociais, e a segunda, punir os infratores da lei penal. A
diferença não é, no entanto, absoluta, pois a polícia administrativa
tanto pode agir preventivamente (como, por exemplo, proibindo
o porte de arma ou a direção de veículos automotores), como
pode agir repressivamente (a exemplo do que ocorre quando
apreende a arma usada indevidamente ou a licença do motorista
137
Cf. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 2006, p. 483.
138 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 51.
139 Cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed., São Paulo:
Malheiros, 2006, p. 791.
62
infrator). No entanto, pode-se dizer que, nas duas hipóteses, ela
está tentando impedir que o comportamento individual cause pre-
juízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer que a
polícia administrativa é preventiva. Mas, ainda assim, falta precisão
ao critério, porque também se pode dizer que a polícia judiciária,
embora seja repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei
penal, é também preventiva em relação ao interesse geral, porque,
punindo-o, tenta evitar que o indivíduo volte a incidir na mesma
infração.140
Diante da breve distinção das duas grandes áreas da
atividade policial – administrativa e judiciária, tratar-se-á, a seguir, de analisar, de
forma específica, a Polícia Administrativa.
2.2.2.1 Polícia Administrativa
Segundo Hely Lopes Meireles, a Polícia Administrativa:
[...] atua preventivamente sobre os bens e as atividades que
afetam a comunidade, incidindo direta e repressivamente sobre as
pessoas que atentam contra as instituições e a sociedade ou
agridem individualmente qualquer de seus membros.141
Portanto, a Polícia Aministrativa limita os excessos da
liberdade, protege as situações individuais e procura manter o equilíbrio social,
sendo que seu poder visa a coibir as atividades nocivas aos interesses sociais ou
que infrinjam as disposições legais ou regulamentares, estranhas à alçada
criminal. Essa é a Polícia de profissões, de associações, de liberdade de
140
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Altas, 2004, p.
112 (mantida a grafia da fonte).
141 MEIRELES, Hely Lopes. (Apud COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Sobre a posição da
polícia judiciária na estrutura do direito processual penal brasileiro da atualidade. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: RT, 1998, p. 215).
63
pensamento e censura, de comunicações, de construções e de vizinhança, dos
serviços chamados de utilidade pública e sanitária.142
José Cretella Júnior informa que:
A polícia administrativa é também denominada polícia preventiva.
Exerce atividades a priori, antes dos acontecimentos, procurando
evitar que as perturbações se verifiquem. [...] A polícia
administrativa tem por escopo impedir as infrações da lei (sendo
nesta parte preventiva) e sustentar a ordem pública em cada lugar,
bem como em toda a parte do reino, assegurar a ordem e
segurança públicas, a proteção dos direitos concernentes à
liberdade, à vida e à propriedade, e, bem assim, a prevenção dos
delitos, por meio de ordens e determinações a tal fim dirigidas. À
polícia administrativa ou preventiva incumbe, em geral, a vigilância,
proteção da sociedade, manutenção da ordem e tranquilidade
públicas, bem assim assegurar os direitos individuais e auxiliar a
execução dos atos e decisões da Justiça e da Administração.143
Logo, sua atuação está ligada à imposição de limitações a
bens jurídicos individuais, especialmente a liberdade e a propriedade, em prol da
garantia do êxito da administração.144
Para Manuel Pinheiro:
[...] a polícia administrativa não apura as infrações penais, antes visa
prevenir que elas aconteçam. Não participa, como a polícia
judiciária, da persecução criminal, colaborando com o órgão
acusador e o órgão JLirisdicional. Nem por isso o Ministério Publico
pode deixar de acompanhar a sua atividade, por força da missão
que lhe foi expressamente confiada no a n. 129, inciso II da
Constituição Federal [...] Inegável que a atividade policial ad-
ministrativa, que tem como finalidade a preservação da ordem
pública e da inco-lumidade das pessoas e do património, é um
serviço da mais alta relevância pública. Assim, incumbe ao Parquet
142
Cf. ROCHA, Luiz Carlos. Organização policial brasileira: Polícia Federal, Polícia Rodoviária
Federal, Polícia Ferroviária, polícias civis, polícias militares, corpos de bombeiros militares, guardas municipais. 1991, p. 02.
143 CRETELLA JR., José. Direito Administrativo brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 556.
144 Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. São Paulo: Saraiva, 1980,
p. 37-38.
64
zelar para que os procedimentos policiais preventivos atendam aos
ditames da legalidade e respeitem os direitos fundamentais
consagrados na Lei Maior.145
Em face de todo o exposto, Celso Antônio Bandeira de Mello
finaliza dissertando que:
[...] pode-se definir a polícia administrativa como a atividade da
Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos,
de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na
forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante
ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo
coercitivamente aos particulares um dever de abstenção
("nonfacere") a fim de conformar-lhes os comportamentos aos
interesses sociais consagrados no sistema normativo.146
Explanado a respeito da Polícia Administrativa, passa-se,
agora, a analisar a Polícia Judiciária.
2.2.2.2 Polícia Judiciária
A Polícia Judiciária, em contrapartida, é denominação dada
ao órgão policial, a que se comete a missão de averiguar a respeito dos fatos
delituosos ocorridos ou das contravenções verificadas, a fim de que sejam os
respectivos delinqüentes ou contraventores punidos pela prática das infrações
cometidas. Esta é repressiva, porque, não se tendo podido evitar o mal
(preventivamente), por não ter sido previsto de modo efetivo, ou por qualquer
outra circunstância, procura, então, pela investigação dos fatos, recolher provas,
descobrir autores e entregar-lhes às autoridades judiciárias para que cumpram a
lei.147
145
PINHEIRO, Manuel (Apud MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008).
146 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 2006, p. 791.
147 Cf. OLIVEIRA, Joél Bino de; LOPES, Rogério Antonio. Teoria e prática da polícia judiciária à
luz do princípio da legalidade. 2. ed. (ano 2002). 4. tir. Curitiba: Juruá, 2006, p. 15.
65
Assim, a Polícia Judiciária é auxiliar dos órgãos
jurisdicionais penais na repressão ao crime que ocorreu, apesar de toda a
vigilância realizada. Sua atuação é determinada pelas leis processuais penais,
que conferem às autoridades policiais garantias dos vários interesses que se
entrechocam na persecutio criminis, além de certa discricionariedade quando do
exercício de suas funções.148
Conforme menciona Paulo Alves Franco:
Polícia Judiciária é o órgão que atua na repressão ao crime, isto é,
após o crime acontecer. A função da Polícia Judiciária é apurar a
infração penal e a sua autoria. [...] é exercida pelas autoridades
policiais, que são os Delegados de Polícia. As autoridades
policiais podem ser estaduais ou federais. [...] A Polícia Judiciária
é auxiliar da Justiça. É ela quem colhe todas as informações,
procede às investigações sobre a infração penal, apura a sua
autoria e envia os autos ao Juízo competente para que o Promotor
possa promover a ação penal.149
No mesmo diapasão, Valter Foleto Santin sustenta que:
A função de polícia judiciária é exercida para auxiliar o Judiciário e
o Ministério Público, tendo em vista que essas instituições não
possuem corpo policial próprio para desempenhar a execução de
atividades técnico-criminais e de coerção legal, que exijam
servidores especializados em segurança pública, no cumprimento
de mandados e requisições de informações e diligências,
previstas no art. 13, I a III, do Código de Processo Penal. Estas
hipóteses legais são exemplificativas, não exaustivas. Tais
ativídades policiais podem ser na execução de mandados de
condução coercitiva, prisão cautelar e por condenação, busca e
apreensão de documentos e objetos, quebra de sigilo de
comunicações, localização de pessoas e realização de outras
diligências necessárias, antes, durante ou depois da ação penal.
Essas atividades são de auxílio, de cooperação, de ajuda; são
complementares, auxiliares, subsidiárias.150
148
Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. 1980, p. 38.
149 FRANCO, Paulo Alves. Inquérito policial. São Paulo: Sugestões Literárias, 1992, p. 01-02.
150 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 59.
66
Cabe ressaltar, contudo, que a autoridade policial não julga
e não atua inter partes, cabendo-lhe sim a tarefa de reunir o que se fizer
necessário para a restauração da ordem jurídica violada pelo delito. Não é órgão
jurisdicional em que pese a expressão Polícia Judiciária.151
Fernando Capez resume, afirmando que a Polícia Judiciária
“possui a finalidade de apurar as infrações penais e suas respectivas autorias, a
fim de fornecer ao titular da ação penal elementos para propô-la.”152
Destarte, o artigo 4º, do Código de Processo Penal153,
refere-se à Polícia Judiciária determinando que a atividade policial deva ser
exercida dentro de limites territoriais (cada autoridade atuando em sua
circunscrição), embora preveja exceções (podendo uma invadir a circunscrição de
outra, no caso, por exemplo, de uma perseguição a um delinqüente, que, saindo
daquela em que cometeu o crime, passa à outra, quando de sua fuga).154
Não se pode deixar de recordar que, ao exercer sua função
precípua, a Polícia Judiciária deve observar sempre os direitos humanos
fundamentais, previstos no artigo 5º155, da Constituição da República Federativa
151
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2000, p. 160.
152 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 12 ed. São Paulo: Saraiva. 2005, p. 68.
153 “Art. 4º - A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas
respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria” (BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.Acesso em: 1º
de abr. 2008).
154 NORONHA, Edgard de Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 28. ed. atualizada por
Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 22.
155 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
67
do Brasil de 1988, e o respeito aos princípios que informam a persecução
penal.156
Em relação à natureza de sua atividade, registra-se que
existem duas correntes doutrinárias. A primeira a define como um procedimento
cautelar, enquanto o entendimento divergente a apresenta como simples
procedimento administrativo.
Defendendo o segundo entendimento, tem-se Guilherme de
Souza Nucci, que afirma ser sua atividade um conjunto de diligências para a
apuração da infração penal e de sua autoria, ou, em outras palavras, “um
procedimento preparatório da ação penal”, sendo, então, procedimento
persecutório de caráter meramente administrativo.157
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; [...] XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens; XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; [...] XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano; [...] XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal; XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; [...] LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei; LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial; LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança; LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel; LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder; LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
156 Cf. GUASQUE, Luiz Fabião. O Ministério Público e o controle externo da atividade policial.
Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1996, p. 141.
157 Cf. NUCCI, Guilherme de Souza (Apud CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 12 ed.
São Paulo: Saraiva. 2005, p. 67).
68
Já José Frederico Marques, em contrapartida, entende que a
atividade administrativa, por meio da qual é exercido o Poder de Polícia, se dá em
processo cautelar, visando a assegurar, enfim, os meios e os resultados do
processo definitivo, evitando-se, assim, as conseqüências do periculum in mora
(perda dos elementos de convicção do delito).158
A propósito, ainda leciona o autor:
[...] a Polícia Judiciária não está subordinada, hierarquicamente e
administrativamente, às autoridades Indiciarias e às do Ministério
Público. Há, no entanto, relações funcionais no âmbito da Justiça
Penal, em que a própria autoridade policial se subordina ao
Judiciário e ao Ministério Público, uma vez que a polícia incumbe
preparar a ação penal, de que este último é o órgão competente
para propô-la. Essa subordinação deriva dos vínculos que são
criados na regulamentação do processo penal.159
Assim, tem-se que a Polícia Judiciária é órgão da
administração que exerce o Poder de Polícia nos delitos, cuja atividade preventiva
da Polícia Administrativa não fora suficiente, sendo sua finalidade auxiliar o
judiciário, (na busca dos delinqüentes e da materialidade e das demais
circunstâncias do fato típico), trazendo as evidências necessárias para a
propositura de Ação Penal pelo Ministério Público, procedimento conhecido,
enfim, como inquérito.160
2.2.3 Das espécies de Polícia e sua destinação
Conforme os preceitos de Valter Foleto Santin, pode-se
afirmar que todas as Polícias têm obrigação constitucional de prestar serviços de
segurança pública para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio – art. 144, caput. Portanto, nessa tarefa, há a divisão de
Polícias ostensivas e não ostensivas; as ostensivas são as Polícias Rodoviária e
158
Cf. MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. 2000, p. 160.
159 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2000, p. 167.
160 Cf. MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2000, p. 172.
69
Ferroviária Federais e as Militares (art. 144, §§ 2°, 3° e 5°), com trabalho de
prevenção e repressão de crimes; já as Polícias não ostensivas são a Polícia
Federal e as Polícias Civis (art. 144, §§ 1° e 4°, CF), que têm campo de atuação
mais amplo: prevenção, repressão, investigação e cooperação judiciária.161
Dessa maneira, ensina o autor:
A Constituição Federal traça as funções e destinações das polí-
cias no art. 144162. O regramento constitucional trata do exercício
da Segurança Pública pelos órgãos policiais estatais. Todos os
órgãos policiais típicos (polícia federal, polícia rodoviária federal,
polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos
de bombeiros), além da guarda municipal, são usados e destinam-
se ao cumprimento do dever estatal de prestar os serviços de
segurança pública, sem prejuízo do exercício do "direito e
responsabilidade de todos" retratado na possibilidade de
participação do povo.163
161
Cf. SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 53.
162 “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; § 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais. § 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais. § 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. § 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil. § 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. § 7º - A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades. § 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. § 9º A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal.
1988).
163 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 54.
70
2.2.3.1 Polícia Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal
A respeito do tema, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
A Polícia Federal destina-se a apurar os chamados „crimes de
natureza federal‟, ou seja, crimes praticados em detrimento da
ordem política e social; crimes que lesem bens, serviços ou
interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas
públicas; e aqueles cuja prática tenha repercussão interestadual
ou internacional e exija repressão uniforme, conforme disposição
legal, como, por exemplo, no caso dos crimes contra o sistema
financeiro nacional e mesmo no combate à criminalidade
organizada. Neste último aspecto, considerando o exagerado
crescimento dos crimes violentos ocorridos no país no ano de
2001 e início de 2002 e, principalmente, diante da intensa
repercussão na mídia nacional do crime de seqüestro que resultou
na morte do Prefeito da cidade paulista de Santo André, Celso
Daniel, o Presidente da República editou a Medida Provisória 27,
de 24.01.2002, regulamentando esta possibilidade de atuação
investigativa da Polícia Federal, quando verificada a prática de
crimes de seqüestro, cárcere privado e extorsão mediante
seqüestro, se o agente foi impelido por motivação política ou
quando praticado em razão da função pública da vítima, bem
como nos casos onde se verifique crimes de formação de cartel
ou qualquer violação aos direitos humanos, assim definidos em
tratados internacionais firmados pelo Brasil.164
A Polícia Federal tem como função repreender o tráfico
ilícito de entorpecentes e drogas afins, bem como o contrabando e descaminho,
além de estar-lhe afeto o exercício das funções de Polícia Marítima e de
fronteiras. A sua atuação abrange todo o território nacional.165
O ilustre Promotor de Justiça ainda ensina:
Na apuração das infrações penais supra referidas, a Polícia
Federal exerce, com exclusividade, as funções de Polícia
Judiciária da União. Neste sentido, muito se tem dito a respeito do
164
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 31-32.
165 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 32.
71
que se entenda por „exercer, com exclusividade‟, como dispõe o
inc. IV, do § 10, do art. 144, da Constituição da República. [...] É
certo que o dispositivo constitucional quis que as funções de
Polícia Judiciária da União somente fossem exercidas pela
Polícia Federal. Desta conclusão, simples e óbvia, extrai-se
outra, ou seja: que as Polícias Civis e Militares, ou até
mesmo o Exército, não podem exercer as atividades de
Polícia Judiciária da União.166
Nesse diapasão, destaca Valter Foleto Santin:
O dispositivo referido trata com maior amplitude da policia federal,
prevendo como sua destinação quatro funções: (1) a apuração de
infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento
de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades
autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações
cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e
exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; (2) prevenir
e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes, o contrabando e o
descaminho, sem prejuízo de ação fazendária ou de outros
órgãos públicos; (3) exercer as funções de polícia marítima,
aérea, portuária e de fronteiras; e (4) exercer, com exclusividade,
as funções de polícia judiciária da União (art. 144, § 1°, I a IV,
CF).167
Resumindo, a Polícia Federal exerce o papel de Polícia
Judiciária da União, agindo sempre com o objetivo de apurar os fatos e a autoria
de crimes federais, excetuando-se os crimes militares.
A Polícia Rodoviária Federal, órgão também classificado no
artigo 144, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, como a
instituição responsável pela segurança pública, está incumbida de efetuar o
patrulhamento ostensivo das rodovias federais. As suas atribuições estão
detalhadas no Decreto n. 1.655, de 03 de outubro de 1995, que prescreve:168
166
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 32.
167 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 60.
168 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 33.
72
A Polícia Rodoviária Federal foi criada pelo presidente
Washington Luiz no dia 24 de julho de 1928, através do Decreto
nº 18.323 - que definia as regras de trânsito à época, com a
denominação inicial de „Polícia de Estradas‟. Mas somente em
1935, Antônio Felix Filho, o „Turquinho‟, considerado o 1º
Patrulheiro Rodoviário Federal, foi chamado pelo administrador
Natal Crosato, a mando do Engenheiro-Chefe da Comissão de
Estradas de Rodagem, hoje DNIT, Yeddo Fiúza, para organizar os
serviços de vigilância das rodovias Rio-Petropólis, Rio São Paulo
e União Indústria.169
Em relação às competências dessa Polícia, as mesmas
estão amparadas pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no
seu artigo 144, pela Lei n. 9.503 (Código de Trânsito Brasileiro), pelo Decreto n.
1.655, de 03 de outubro de 1995, e pelo Regimento Interno, aprovado pela
Portaria Ministerial n.122, de 20 de março de 1997.170
Deste modo, além do patrulhamento ostensivo das rodovias
federais, a Polícia Rodoviária Federal, conforme Decreto supramencionado e do
Regimento Interno, tem, ainda, as seguintes atribuições:
[...] exercer os poderes de autoridade de polícia de trânsito,
cumprindo e fazendo cumprir a legislação e demais normas
pertinentes, inspecionar e fiscalizar o trânsito, assim como efetuar
convênios específicos com outras organizações similares [...] -
aplicar e arrecadar as multas impostas por infrações de trânsito e
os valores decorrentes da prestação de serviço de estadia e
remoção de veículos, objetos, animais e escoltas de veículos de
cargas excepcionais, executar serviços de prevenção,
atendimento de acidentes e salvamento de vítimas nas rodovias
federais [...] - realizar perícias, levantamento de locais, boletins de
ocorrências, investigações, testes de dosagem alcoólicas e outros
procedimentos estabelecidos em leis e regulamentos,
imprescindíveis à elucidação dos acidentes de trânsito [...] -
credenciar os serviços de escoltas, fiscalizar e adotar medidas de
segurança relativas aos serviços de remoção de veículos, escoltas
169
BRASIL. Polícia Rodoviária Federal. Disponível em:
<http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/index>. Acesso em 28 de novembro de 2007.
170 BRASIL. Polícia Rodoviária Federal. Disponível em:
<http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/index>. Acesso em 28 de novembro de 2007.
73
e transporte de cargas indivisíveis [...] - assegurar a livre
circulação nas rodovias federais, podendo solicitar ao órgão
rodoviário a adoção de medidas emergenciais, bem como zelar
pelo cumprimento das normas legais relativas ao direito de
vizinhança, promovendo a interdição de construções, obras e
instalações não autorizadas; executar medidas de segurança,
planejamento e escoltas nos deslocamentos do Presidente da
República, Ministros de Estado, Chefes de Estado e diplomatas
estrangeiros e outras autoridades, quando necessário, e sob a
coordenação do órgão competente; efetuar a fiscalização e o
controle do trânsito e tráfico de menores nas rodovias federais,
adotando as providências cabíveis contidas na Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
colaborar e atuar na prevenção e repressão aos crimes contra a
vida, os costumes, o patrimônio, a ecologia, o meio ambiente, os
furtos e roubos de veículos bens, o tráfico de entorpecentes e
drogas afins, o contrabando, o descaminho e os demais crimes
previstos em leis; o realizar concursos públicos, outros processos
seletivos, cursos, estágios, formação, treinamentos e demais
atividades de ensino na área de sua competência.171
Já no que diz respeito à Polícia Ferroviária Federal, salienta-
se que também é um órgão incluso no artigo 144, da atual Constituição da
República Federativa do Brasil, possuindo funções semelhantes às da Polícia
Rodoviária Federal, uma vez que, ao invés de efetuar o policiamento ostensivo e
investigações nas Rodovias Federais, exerce suas funções junto às ferrovias
federais.172
Rodrigo Régnier Chemim Guimarães ainda assegura que
“excluídos os crimes de alçada federal, nos Estados-membros a Polícia é
exercida pelas denominadas Polícia Civil e Polícia Militar”.173
171
BRASIL. Polícia Rodoviária Federal. Disponível em:
<http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/index>. Acesso em 28 de novembro de 2007.
172 BRASIL. Polícia Rodoviária Federal. Disponível em:
<http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/index>. Acesso em 28 de novembro de 2007.
173 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 33.
74
2.2.3.2 Polícia Civil e Polícia Militar
Já em relação à Polícia Civil, Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães argumenta que:
As Polícias Civis, a exemplo da Polícia Federal, estão subordina-
das ao Poder Executivo e, mais precisamente, inseridas no
contexto das Secretarias Estaduais da Segurança pública. [...] São
dirigidas por Delegados de Polícia e a elas incumbem as funções
de Polícia Judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as
militares. [...] A carreira de Delegado de Polícia é precedida de
prévio concurso público e exigido o grau de Bacharel em Direito
para os candidatos. No entanto, em algumas localidades do País,
e até mesmo em Estados considerados mais estruturados, ainda
se verifica a existência do „Assistente de Segurança‟, vulgarmente
chamado de „Delegado calça-curta‟, pessoa não habilitada
formalmente em concurso público, de regra sem preparação
jurídica alguma, indicada para exercer a função em razão de
ligações políticas locais.174
A Polícia Civil exerce, assim, as funções da chamada Polícia
Repressiva, e atua no combate da criminalidade após a verif icação de sua
ocorrência.175
A propósito, comenta o autor:
Diferente papel é desempenhado pelas Polícias Militares, que atu-
am preventivamente, marcando presença ostensiva nos espaços
públicos, a fim de, com a simples presença física do Policial
Militar, intimidar as ações criminosas [...] Na prática, ambas as
funções - de prevenção e repressão - acabam sendo exercidas
pelas duas corporações, variando apenas a intensidade.176
174
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 33.
175 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 33.
176 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 34.
75
O artigo 7º do Código de Processo Penal Militar afirma, em
síntese, que a Polícia Judiciária Militar é exercida por diversas autoridades, sendo
elas as seguintes:
a) pelos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, em
todo o território nacional e fora dele, em relação às forças e
órgãos que constituem seus Ministérios, bem como a militares
que, neste caráter, desempenhem missão oficial, permanente ou
transitória, em país estrangeiro; b) pelo chefe do Estado-Maior
das Forças Armadas, em relação a entidades que, por disposição
legal, estejam sob sua jurisdição; c) pelos chefes de Estado-Maior
e pelo secretário-geral da Marinha, nos órgãos, forças e unidades
que lhes são subordinados; d) pelos comandantes de Exército e
pelo comandante-chefe da Esquadra, nos órgãos, forças e
unidades compreendidos no âmbito da respectiva ação de
comando; e) pelos comandantes de Região Militar, Distrito Naval
ou Zona Aérea, nos órgãos e unidades dos respectivos territórios;
f) pelo secretário do Ministério do Exército e pelo chefe de
Gabinete do Ministério da Aeronáutica, nos órgãos e serviços que
lhes são subordinados; g) pelos diretores e chefes de órgãos,
repartições, estabelecimentos ou serviços previstos nas leis de
organização básica da Marinha, do Exército e da Aeronáutica; h)
pelos comandantes de forças, unidades ou navios;177
Assim, nota-se que esse artigo, transcrito acima, não inclui
diretamente a Polícia Militar; porém, na prática, esta também exerce as funções
de Polícia Judiciária Militar, conforme os ensinamentos de Jorge César de Assis:
[...] dentro do conceito genérico de Comandantes de Forças,
referidos na letra “h”, deste artigo, estão o Comandante-Geral, o
Chefe do Estado Maior, os Comandantes Regionais e os
Comandantes de Unidades, tanto das Polícias Militares quanto
dos Corpos de Bombeiros Militares.178
No mesmo vértice, Valter Foleto Santin esclarece:
Três instituições policiais constitucionais (polícia federal e as polí-
177
BRASIL. Código de Processo Penal Militar. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>.Acesso em: 1º de abr. 2008.
178 ASSIS, Jorge César de. Código de Processo Penal Militar Anotado. 2. ed. Curitiba: Juruá,
2006, p. 33.
76
cias civis e militares) possuem finalidades de apuração de
infrações penais e exercício de funções de polícia judiciária (art.
144, § 1°, I e IV e § 4°) e cinco (polícias federal, rodoviária e
ferroviária federais e militar e guarda municipal) destinam-se à
prevenção de crimes ou policiamento ostensivo (§ 1°, 11 e 111, §§
2°, 3°, 5° e 8°).179
Em conformidade com o artigo 144, parágrafo 5º180, da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, à Polícia Militar,
incumbe, ainda, a execução de atividades de defesa civil, através dos Corpos de
Bombeiros.181
2.2.3.3 Guarda Municipal
A atual Constituição da República Federativa do Brasil
possibilitou, aos Municípios, a criação das Guardas Municipais, destinadas à
proteção dos bens, serviços e instalações municipais.182
Neste aspecto, muita discussão já se verificou nos
Municípios que criaram as suas Guardas Municipais. Em relação ao campo de
sua atuação, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães explica:
Mais uma vez a prática revela-se conflitante com a mera
disposição legal, na medida em que, o que vem efetivamente
ocorrendo, é que a presença da Guarda Municipal nas ruas, não
raras vezes, vem fazendo com que a mesma acabe atuando de
forma a prevenir e, até mesmo, reprimir a prática de crimes outros
que não aqueles relacionados com bens, serviços e instalações
179
SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 55.
180 “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos [...] § 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
181 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 35.
182 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 36.
77
municipais - como disciplina a Constituição da República -,
imiscuindo-se, assim, em primeira análise, nas funções
inicialmente reservadas às Polícias Militar e Civil.183
A respeito da questão, destaca-se o entendimento do
Superior Tribunal de Justiça:
A guarda municipal, a teor do disposto no § 8°, do art. 144, da
CF/88, tem como tarefa precípua a proteção do patrimônio do
Município, limitação que não exclui nem retira de seus integrantes
a condição de agentes da autoridade, legitimados, dentro do
princípio de auto-defesa da sociedade, a fazer cessar eventual
prática criminosa, prendendo quem se encontra em flagrante
delito, como de resto facultado a qualquer do povo pela norma do
art. 301 do CPP. Nestas circunstâncias, se a lei autoriza a prisão
em flagrante, evidentemente que faculta - também - a apreensão
de coisas, objeto do crime. Apenas o auto de prisão em flagrante
e o termo de apreensão serão lavrados pela autoridade policial.184
Em face das circunstâncias que envolvem a criminalidade de
rua, a Guarda Municipal acaba atuando como Polícia Repressiva, contribuindo
para amenizar a violência no país, agindo, como destacou o Superior Tribunal de
Justiça, em nome do princípio maior de autodefesa da sociedade.185
Nesse sentido, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães leciona:
Neste aspecto, inclusive, o Senado Federal já aprovou a Proposta
de Emenda Constitucional 87/99, de autoria do Deputado Federal
José Eduardo Dutra, e com a redação alterada por sugestão do
Senador Artur da Távola, prevendo que as Guardas Municipais se
destinarão não somente à proteção dos bens, serviços e
instalações do Município, mas também à proteção de sua
população, conforme disciplinará outra lei federal [...] Com a
possível promulgação da Emenda Constitucional acima referida,
183
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 36.
184 BRASIL. Recurso Ordinário em Habeas Corpus 7.916 – SP – STJ – 6ª Turma – Rel. Min.
Fernando Gonçalves – j. em 15.10.1998 – improvido – votação unânime, in DJU, Seção, 1, de 09.11.1999. Disponível em: <http://www.stj.gov.br> Acesso em: 08 de março de 2008 (mantida a grafia da fonte).
185 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 36.
78
surgirá, agora de direito, um novo corpo policial capaz de contri-
buir para a diminuição da violência e da criminalidade, tanto de
forma preventiva, quanto repressiva, com a vantagem de estar
com sua atividade centralizada num único Município. De qualquer
sorte, surgirão conflitos naturais de atribuição, que somente a lei e
o tempo poderão dirimir, cabendo o alerta de René Dotti, para que
se evitem os abusos de Prefeitos na condução das suas
polícias.186
Explanado a respeito da Segurança Pública e seus diversos
órgãos, passa-se, na seqüência, ao terceiro e último capítulo, que tratará do
objeto de estudo desta pesquisa – o controle externo da atividade policial e a
efetividade da atuação dos membros do Ministério Público.
186
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 37.
79
CAPÍTULO 3
O CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL PELO
MINISTÉRIO PÚBLICO
Em relação às inovações constitucionais e alterações na
legislação processual penal no Brasil, um dos temas que vem causando inúmeras
controvérsias e polêmica, quanto à sua interpretação e aplicação, é o exercício
do controle externo da atividade policial, atribuição constitucional conferida ao
Ministério Público.
O Promotor de Justiça, Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães, esclarece:
Cumpre ressaltar, inicialmente, que o relacionamento do Ministério
Público com a Polícia, em nosso País, já existia a nível
infraconstitucional, antes mesmo do advento da Constituição da
República de 1988, através das inúmeras disposições contidas no
Código de Processo Penal e na antiga Lei Complementar n° 40/81.
Ou seja, de uma forma ou de outra, o Ministério Público já exercia
relativo controle sobre a atividade policial, ainda que, antes da
citada Carta Magna, tal controle não viesse explicitamente
disciplinado na lei, como agora estipulado e ampliado no art. 129,
VIl187, da Constituição da República.188
Em virtude dessa disposição expressa, muitas críticas vêm
surgindo - grande parte delas provenientes da própria Polícia, no sentido de não
aceitar a atividade constitucional do Ministério Público, procurando polemizar a
187
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] VII - exercer o controle externo da atividade policial [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
188 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 41.
80
questão e deturpar o real significado do controle externo da atividade policial, a
razão de sua existência e a forma de se efetivá-lo.189
A respeito dos “controles”, Valter Foleto Santin resume com
clareza:
Todos os órgãos públicos devem possuir controles para maior e
melhor vigilância, fiscalização, segurança, regularidade, eficiência e
qualidade dos serviços públicos, para acompanhamento da correção
e lisura do comportamento dos servidores públicos, em prol do inte-
resse da sociedade. Controle significa ato de vigilância, verificação
administrativa, fiscalização, inspeção, supervisão e exame minucioso
exercido sobre as atividades de pessoas, órgãos e departamentos.190
Assim, com mais de uma década após a promulgação da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ainda vivencia-se uma
grande dificuldade no trato do tema do controle externo da atividade policial, seja
para conceituá-lo, seja para delimitar o seu exercício.
Nesse sentido, Carlos Alexandre Marques, Promotor de
Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional do controle externo da
atividade policial de Goiás, ressalta que:
Pois bem, função constitucional introduzida pela Carta de 1988, o
controle externo da atividade policial ainda hoje é um terreno pouco
explorado pelo Ministério Público, seja porque as discussões sobre
seu alcance mais dividem do que somam, seja porque ainda se
tenta definir com clareza e praticidade o seu modo de exercício.
Bom lembrar que muitos colegas do Ministério Público não querem
nem assumir tal papel por achá-lo repugnante e de risco, chegando
ao ponto de prever a contaminação negativa da instituição,
trazendo para nós os vícios dos organismos policiais. De sorte que
há argumentos vários para cada uma dessas posições de rejeição
ao controle externo, que partem tanto do próprio Ministério Público
como também, e principalmente, da Polícia. Todavia, todos esses
argumentos (a maioria de fundo corporativo ou de defesa ou
disputa de nichos de poder) sucumbem quando confrontados com
189
Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 42.
190 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 70.
81
o preceito constitucional que prevê o controle externo da atividade
policial, por sinal estabelecido de modo genérico, e que atribui ao
Ministério Público a titularidade da ação penal pública, verdadeira
parcela da soberania do Estado e de manifestação do jus
puniendi.191
No mesmo sentido, cabe mencionar uma transcrição a
respeito da polêmica que o tema suscita, na lição de Waldo Fazzio Júnior:
Quando o constituinte de 1988 atribuiu ao Ministério Público o
controle externo da alividade policial (art. 129, inciso Vil), não lhe
conferiu uma autorização ou um poder (Kann-Formulierung) mas
uma determinação de dever (Muss-Bestimmimgen). [...] A
atribuição do controle externo da atividade policial ao Ministério
Público não é simples programação constitucional abstrata. Trata-
se da imposição concreta de um dever material que não comporta
juízos discricionários de oportunidade e conveniência. [...] Com
efeito, a plenitude do exercício da legitimação ativa para a ação
penal pública não se satisfaz com o mero repasse de elementos
probatórios ao órgão jurisdicional. O exercício material pleno da
legitimação ativa na ação penal pública reclama o controle da
investigação como antecedente lógico e necessário para viabilizar
a dedução da pretensão punitiva. Titular é o que detém o título, é
o dominus, sendo natural que controle os atos preparatórios, que
instruirão sua postulação, tanto sob o aspecto extrínseco da
legalidade como no plano substancial da eficácia e da
objetividade. Ora, o inteiro cumprimento de uma imposição
constitucional não se contenta com o simples desempenho formal
de uma atividade; reclama exercício suficiente. [...] Por derradeiro,
ao imperativo constitucional de controlar a atividade policial
imposto ao Ministério Público, corresponde o direito subjetivo
pessoal, cujo titular é qualquer cidadão, de exigir que o "parquet"
o faça.192
191
MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008 (mantida a grafia da fonte).
192 FAZZIO JR., Waldo. O Ministério Público e o dever constitucional do controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público do Estado de Sergipe, n. 12, 1997, pp. 100-102
(mantida a grafia da fonte).
82
Entretanto, para cumprir cum laude esse papel, faz-se
necessário um comprometimento intenso do Ministério Público com a investigação
criminal, pois a este interessa diretamente o êxito do trabalho policial de coleta de
provas. Assim, para que uma ação penal tenha sucesso, é imprescindível ocorrer
uma estreita ligação com a eficiência demonstrada na fase investigatória, isto é,
quanto maior o rol de indícios, circunstâncias e elementos de prova coletados na
fase de inquérito policial, mais segurança terá o Promotor de Justiça de formar a
sua convicção para o arquivamento ou para a propositura da ação penal pública.193
Todavia, antes de se adentrar no estudo de seu conceito,
mister se faz uma apresentação breve da história de seu surgimento.
3.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS NO BRASIL
3.1.1 Precedentes da atual Lex Magna
O relacionamento do Ministério Público com a Polícia
Judiciária, antes da promulgação da atual Constituição Brasileira, vinha disciplinado
somente no âmbito infraconstitucional, que, inicialmente, estava inserido no próprio
Código de Processo Penal, nas Leis extravagantes e, a posteriori, onde adquiriu
maior força, com a Lei Complementar Federal n. 40, de 14 de dezembro de 1981 –
antiga Lei Orgânica Nacional do Ministério Público.194
De acordo com os ensinamentos de Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães, o artigo 5º, inciso II, do Código de Processo Penal Brasileiro, ressalta
que:
[...] nos crimes de ação penal pública, o inquérito policial será
iniciado, dentre outras maneiras, através de requisição do Ministério
Público, o que implica dizer que a Polícia Judiciária está obrigada a
193
MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008.
194 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 49.
83
instaurar o respectivo inquérito policial, quando instada a tanto pelo
Ministério Público. E, aqui, cumpre assinalar que o Ministério
Público, quando requisita a instauração do inquérito policial, não
está solicitando ou requerendo, mas sim, determinando a
instauração do mesmo, sob pena de a autoridade policial, em tese,
incorrer em crime de prevaricação, a menos que tal determinação
seja manifestamente infundada.195
Assim, cabe informar que os artigos do Código de Processo
Penal fornecem a idéia do controle externo exercido pelo Ministério Público junto à
Polícia, quando afirmam que:
[...] o inquérito policial pode ser iniciado através de requisição do
Ministério Público, cabendo a este a possibilidade de requisitar
diligências que entender necessárias, tendo poder para decidir
sobre o destino a ser dado ao inquérito, ao analisar se este
preenche as condições para o oferecimento de ação penal ou se
deve ser arquivado; não estando o Ministério Público atrelado ao
mesmo para formar sua opinião sobre o caso.196
A propósito, comenta o autor:
Ainda que a autoridade policial não queira instaurar o inquérito
policial, ouvir determinada pessoa ou colher determinada prova
(por achar desnecessário), deve fazê-lo se for instada a tanto, de
forma fundamentada, pelo Ministério Público. [...] Tal poder nada
mais é, na prática, do que exercer um controle sobre a atividade
policial, especificando quais medidas a Polícia deve tomar para obter
melhores resultados em sua investigação.197
Em relação à prática, cabe ressaltar que o papel
desempenhado pelo Ministério Público sempre foi o de custos legis, ou melhor,
fiscal da lei, e, em princípio, o de aplicação correta da lei pelas Polícias Repressiva
195
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 50 (mantida a grafia da fonte).
196 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 52.
197 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 52.
84
e Preventiva, objetivando impedir que abusos fossem cometidos e que a lei fosse
desrespeitada.198
3.1.2 A Carta de Curitiba
As discussões sobre o capítulo destinado ao Ministério
Público, na nova Carta, ganharam repercussão no 1º Encontro Nacional de
Procuradores-Gerais de Justiça e Presidentes de Associações do Ministério
Público do Brasil, realizado em julho do ano de 1986, na cidade de Curitiba, cujo
resultado ficou intitulado em um documento chamado “Carta de Curitiba”.199
No que diz respeito à “Carta de Curitiba”, em entrevista para
a Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, Hugo Nigro Mazzilli teceu
alguns comentários:
Aprovada a Carta de Curitiba - a matriz do Capítulo do MP na
Constituição -, São Paulo propôs uma moção no sentido de que
deveríamos assumir o compromisso de defender o texto na
Constituinte. O acordo saiu. Esse é o principal valor da Carta de
Curitiba: foi o primeiro documento de consenso sobre um projeto
de MP uniforme para o Brasil.200
Não se poderia deixar de mencionar o relacionamento
estabelecido na “Carta de Curitiba” entre a Instituição do Ministério Público com a
Polícia, que prescreveu o seguinte: “são funções institucionais privativas do
Ministério Público: [...] b) promover a ação penal pública e supervisionar os
procedimentos investigatórios, podendo requisitá-los e avocá-los; [...].201
198
Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 54.
199 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 55.
200 MAZZILLI, Hugo Nigro. Entrevista concedida ao CEAF - Centro de Estudos e Aperfeiçoamento
Funcional da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, in: Plural - Boletim Informativo do CEAF/Escola Superior do Ministério Público, ano 5, n. 25, Disponível em:
<www.mp.sp.gov.br>. Acesso em: 25 de março de 2008 (mantida a grafia da fonte).
201 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 56 (mantida a grafia da fonte).
85
O ilustre Promotor de Justiça, Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães concluiu:
Tal redação dava maior amplitude ao exercício efetivo do controle
da atividade policial na medida em que possibilitava ao Ministério
Público a supervisão dos procedimentos investigatórios. O termo
„supervisão‟ vem do verbo „supervisar‟, que, segundo ensina
Aurélio202, significa: „dirigir, orientar ou inspecionar em plano
superior‟. Assim, o inquérito policial continuaria sendo executado
pela autoridade policial, porém, sob a direção do Ministério Público,
que orientaria o seu curso e poderia avocá-lo quando entendesse
prudente e necessário à melhor investigação.203
3.1.3 A Origem da expressão controle externo
Ibsen Pinheiro, um dos constituintes da atual Constituição da
República Federativa do Brasil, foi incumbido, na época, de participar da redação
do texto relacionado ao Ministério Público, e assim relata:
Não foi fácil chegar ao novo perfil da instituição. Eu sei porque
estava na Constituinte e, designado pelo líder Mário Covas,
coordenei a elaboração do texto dos arts. 127, 128 e 129 que
compõem a seção do Ministério Público na Constituição Federal,
conduzindo, também, a pesada negociação que a precedeu, não
apenas entre as lideranças políticas, mas muito mais com as
corporações interessadas, especialmente as polícias civil e
militar, a magistratura e a advocacia. [...] Logo, o perfil do Ministério
Público que aí está não é casual, nem acidental, mas produto de
muita reflexão, muito entendimento, algumas concessões de
partes a partes (daí a diferença no mecanismo de provimento do
cargo de Procu-rador-Geral na União e nos Estados, assim como a
expressão "controle externo da atividade policial")[...].204
202
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 617.
203 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 56 (mantida a grafia da fonte).
204 PINHEIRO, Ibsen. Ministério Público Novo de Guerra, in Observatório da Imprensa, Caderno da
Cidadania, p. 1-2. Disponível em: <www.observatoriodaimprensa.com.br> Acesso em: 25 mar. 2008 (grifou-se).
86
Em relação à análise da origem da expressão “controle
externo da atividade policial”, adotada pelo Constituinte de 1988, cabe destacar,
com extrema relevância, conforme os ensinamentos de Rodrigo Régnier Chemim
Guimarães, que:
[...] esta ampliou a possibilidade de atuação do Ministério Público
junto aos organismos policiais, mas deixou a desejar no aspecto de
clareza e objetividade de redação [...] perdeu-se oportunidade de
avançar ainda mais nesta questão, deixando-se de adotar o texto
originalmente elaborado na „Carta de Curitiba‟, que propiciaria maior
e melhor forma de atuação conjunta do Ministério Público com a
Polícia e significativa melhoria na investigação criminal.205
Assim, concluso o breve histórico a respeito do controle
externo da atividade policial, passa-se, então, para a análise do seu conceito,
natureza e espécies.
3.2 CONCEITO E FINALIDADE DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
Para Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
O Constituinte de 1988 não definiu o que seja, exatamente, o cha-
mado „controle externo da atividade policial‟, deixando para o
legislador infraconstitucional a tarefa de conceituá-lo, através de leis
complementares, ou seja, das leis orgânicas dos Ministérios
Públicos da União e dos Estados da Federação. [...] Assim, o
conceito de „controle externo‟, por ora, vem sendo tratado mais no
plano doutrinário, do que legislativo, onde são evidenciadas
algumas tentativas de se enunciar o significado do preceito.206
205
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 56.
206 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 63.
87
Inicialmente, é importante entender a compreensão
etimológica da expressão. Começa-se, então, pela origem da palavra “controle”, e
quem dá a lição é Hugo Nigro Mazzilli:
Em vernáculo, a expressão „controle‟, advinda do francês
contrôle, significa ato de vigilância e verificação administrativa;
domínio ou governo; mais especificamente, ato de fiscalização,
inspeção, supervisão, exame minucioso exercido sobre as
atividades de pessoas, órgãos, departamentos, como seja a
própria fiscalização financeira ou orçamentária; significa ainda o
próprio corpo de funcionários encarregados de velar pela
observância das leis e regulamentos, notadamente em matéria
financeira.207
Em relação aos termos “externo” e “atividade policial”, os
quais complementam o termo referenciado anteriormente (externo), faz-se
necessário transcrever os ensinamentos de Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
O termo „externo‟, por sua vez, implica em dizer que é exercido por
órgão distante da estrutura da Polícia. [...] E „atividade policial‟, duas
palavras aqui indissociáveis, resume-se no contato e na
investigação de situações criminosas propriamente ditas, no
cuidado com as pessoas tidas sob sua custódia (sejam presos
provisórios ou condenados definitivamente) e no cumprimento de
determinações judiciais (a exemplo do cumprimento de mandados
de prisão, busca e apreensão, dentre outras medidas judiciais).208
Realizada esta análise etimológica, cabe informar que o
sistema existente na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
estabelece, para todas as funções do Estado, a existência do controle de uma
instituição por outra, ou seja, é a aplicação da fórmula jurídica de freios e
contrapesos (checks and balances), que contribui para o bom funcionamento do
Poder Público, bem como se considera um pressuposto essencial para a garantia
dos direitos fundamentais dos indivíduos, sendo este considerado, por muitos,
como a solução para manter respirando o Estado Democrático de Direito, tipo de
207
MAZZILLI, Hugo Nigro. O Ministério Público na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva,
1989, p. 243 (mantida a grafia da fonte).
208 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 64.
88
organismo no qual voluntariamente o Brasil filiou-se conforme descreve o artigo
1º209 da nossa atual Lei Maior.210
Não é diferente o entendimento do Promotor de Justiça de
Santa Catarina, Paulo Antonio Locatelli:
A Constituição da República de 1988, conhecida como Cons-
tituição Cidadã, estabelece diversos sistemas de controle, os
quais visam ao equilíbrio entre os Poderes do Estado, sendo a
sociedade a maior beneficiada pela eficácia desses sistemas. O
Controle Externo da Atividade Policial pelo Ministério Público
integra essa diretriz de freios e contrapesos, característica do
Estado Democrático de Direito, em que os Poderes e instituições
públicas são independentes e harmónicos entre si, no entanto,
são controlados externamente de forma recíproca.211
Francisco Taumaturgo de Araújo Júnior explica que o artigo
129, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conferiu, ao
Ministério Público, o exercício do controle externo da atividade policial, com o
objetivo de fiscalizar a atividade da Polícia, na missão de apurar as infrações penais,
para que o inquérito seja revestido de elementos fortes para contribuir na
propositura da ação penal e ao próprio processo penal, bem como para que a
atividade policial caminhe respeitando o princípio da legalidade. Cabe salientar que
o Parquet exercerá o controle externo da atividade-fim da Polícia e não dos policiais,
pois estes estão sujeitos a um controle interno, exercido por órgãos
hierarquicamente superiores.212
209
“Art.1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito
Federal: Senado Federal. 1988).
210 MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos
de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008.
211 LOCATELLI, Paulo Antonio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial.
Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. v. 3, n. 6, maio/ago. 2005 –
Florianópolis, p. 55.
212 ARAÚJO JÚNIOR, Francisco Taumaturgo de. Controle Externo da Atividade Policial, o
outro lado da face. Disponível em <http://www.pgj.ce.gov.br/artigos/artigos.asp?iCodigo=34v>
Acesso em 16 de abril de 2008.
89
Com outro posicionamento, Edison Miguel da Silva Jr. analisa
o controle externo da atividade policial pelo Ministério Público como:
[...] um controle de legalidade na apuração das infrações penais
pela polícia judiciária em defesa do cidadão e obrigatoriedade da
persecução penal que não foi criado pela Constituição de 1988. É
inerente às próprias funções ministeriais de 'fiscal da lei'. A
novidade de 1988 foi elevar o controle de legalidade a preceito
constitucional por ser uma necessidade social e anseio da
sociedade brasileira. Dessa forma, o controle externo existia antes
mesmo da atual Constituição e independe de lei nova que imponha
tal ônus aos membros do parquet. Este controle de legalidade não
é originário da Constituição de 1988, mas intrínseco às funções
ministeriais e os instrumentos legais para a sua efetivação
encontram-se espalhados na legislação em vigor.213
Assim, pode-se entender como controle externo da
atividade policial o conjunto de normas que regulam a fiscalização executada
pelo Ministério Público sobre a atividade policial, seja na prevenção, seja na
apuração e investigação de fatos tidos como criminosos, seja na preservação
dos direitos e garantias constitucionais dos presos que estejam sob
responsabilidade das autoridades policiais, bem como na fiscalização do
cumprimento das determinações judiciais.214
Rodrigo Régnier Chemim Guimarães explica:
Com isto não se quer afirmar que a figura do Delegado de Polícia
não tenha mais razão de ser. Pelo contrário, o Delegado continuará
executando as diligências investigatórias necessárias, apenas que
sob o controle de um órgão externo: o Ministério Público, destinatário
final da atividade da polícia judiciária.215
213
SILVA JR., Edison Miguel da. Controle Externo da Atividade Policial e Legislação Vigente (apud MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008).
214 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 64.
215 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 65.
90
Desta feita, oportuno ressaltar que este sistema de
fiscalização não implica uma relação de hierarquia e subordinação entre o
Ministério Público e a Polícia, até porque, aquele deve ater-se às atividades-fim
da Polícia Judiciária, de forma a possibilitar a efetividade dos direitos
fundamentais da pessoa, assegurados na Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988.
Para Geraldo do Amaral Toledo Neto:
O controle externo deve ser entendido como um instrumento de
realização do jus puniendi. Seu objetivo é dar ao Ministério
Público um comprometimento maior com a investigação criminal
e, consequentemente, um maior domínio sobre a prova produzida,
a qual lhe servirá de respaldo na denúncia, sempre na busca dos
elementos indispensáveis para a instrução do processo.216
No mesmo sentido, Hugo Nigro Mazzilli salienta:
Examinando-se as diversas formas de controle externo
instituídas pela Constituição, e buscando a primordial finalidade
da atuação ministerial, chegamos à conclusão de que, com esse
dispositivo, intentou o constituinte de 1988 criar um sistema
precípuo de fiscalização, um sistema de vigilância e verificação
administrativa, teleologicamente dirigido à melhor coleta dos
elementos de convicção que se destinam a formar a opinio
delictis do promotor de justiça, fim último do inquérito policial.217
Desta forma, a finalidade do controle externo é aumentar a
possibilidade de fiscalizar as atividades policiais, por um órgão estatal não
pertencente à estrutura policial e, ao mesmo tempo, encarregado da ação penal e
da defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Cabe informar, ainda,
que a destinação da fiscalização do trabalho policial está diretamente ligada à
melhoria do trabalho investigatório, evitando, assim, eventuais omissões, abusos
216
TOLEDO NETO, Geraldo do Amaral. O Ministério Público e o efetivo controle da atividade policial. Jus Navigandi. Teresina, ano 6, n. 55, mar. 2002. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2812>. Acesso em: 31 mar. 2008 (mantida a grafia da fonte).
217 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 244 (mantida a grafia da fonte).
91
e irregularidades nos registros de ocorrências policiais, na movimentação de
inquéritos policiais, bem como na própria atividade investigatória.218
3.3 NATUREZA DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL PELO
MINISTÉRIO PÚBLICO
Em relação à prática do exercício do controle externo da
atividade policial, adotar-se-á a divisão deste controle em ordinário e
extraordinário, conforme explicado por Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
Assim, a primeira espécie de controle externo da atividade policial, é
denominada de controle externo ordinário, consistente naquela
atividade ministerial exercida corriqueiramente, seja através dos
controles realizados na verificação do trâmite dos inquéritos
policiais, e consequente cumprimento de diligências requisitadas,
seja através de visitas periódicas (ao menos mensais) às
Delegacias de Polícia e organismos policiais, a fim de verificar a
regularidade dos procedimentos policiais e da custódia dos presos
que porventura se encontrem no local. [...] Este controle externo
ordinário, a princípio, pode ser exercido por todos os Promotores de
Justiça ou Procuradores da República, com atribuições criminais,
salvo se houver determinação expressa em sentido contrário nas
respectivas leis orgânicas dos Ministério Públicos Estaduais ou for
disciplinado de forma diversa por Ato do Procurador-Geral de
Justiça.219
Em relação ao controle externo extraordinário, este dar-se-á
quando da verificação de um ato ilícito cometido por alguma autoridade policial no
exercício de suas funções. Assim, o exercício do controle externo da atividade
policial implicará na instauração de procedimento administrativo investigatório no
âmbito da Promotoria de Justiça, para apurar possível abuso da autoridade
policial.220
218
Cf. SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 77.
219 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 65 (mantida a grafia da fonte).
220 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 65.
92
A propósito ressalta o autor:
É de se considerar aqui, ser o investigado policial, tendo a prática
demonstrado que, não raras vezes, ele está propenso a adotar
condutas intimidatórias aos Membros do Ministério Público no
equivocado entendimento que isso possa evitar a apuração integral
do fato contra si pendente.221
Assim, entende-se prudente a atuação de uma Promotoria
Especializada, a exemplo, pode-se citar o Estado de Santa Catarina, que possui
algumas Promotorias de Justiça que detêm esta atribuição específica de exercer o
controle externo da atividade policial, tais como: a 2ª Promotoria de Justiça da
Comarca de Tubarão, a 8ª Promotoria de Justiça da Comarca de Itajaí, entre
outras.222
3.4 LEGISLAÇÃO VIGENTE DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE
POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
Na legislação atual, as disposições acerca do controle
externo da atividade policial estão distribuídas entre diversas codificações, tais
como: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a Lei
Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público
da União), a Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público) e a Lei Complementar n. 197/2000, de 13 de julho de 2000 (Lei
Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina).
221
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 65.
222 Cf. SOUZA, Sandro Ricardo de. Aspectos controvertidos do controle externo da atividade
policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Florianópolis:
Procuradoria Geral de Justiça e Associação Catarinense do Ministério Público, v.3, n.6, 2003, p.71.
93
3.4.1 Artigo 129 da atual Lex Magna
A atual Constituição Federal da República Federativa do
Brasil dispõe que é função institucional do Ministério Público exercer o controle
externo da atividade policial, na forma da lei complementar da União e dos
Estados, que devem estabelecer a organização, as atribuições e o estatuto da
instituição. 223
Importa salientar que a norma do primeiro dispositivo é de
eficácia limitada, uma vez que não possui aptidão para produzir os seus efeitos
essenciais de imediato, dependendo da regulamentação de Lei Complementar
para alcançá-los.224
Sobre este dispositivo, discorre Fauzi Hassan Choukr:
Trata-se de norma que guarda equivalência a muitas outras
encontradas na mesma matriz, como temos na Constituição
espanhola, italiana e portuguesa. Na verdade, nada mais é que
uma decorrência lógica do figurino acusatório tantas vezes
mencionado, onde o Ministério Público, titular da ação penal
pública, tem na polícia judiciária sua longa manus.225
3.4.2 Lei Orgânica do Ministério Público da União
Acatando à determinação constitucional, a Lei Orgânica do
Ministério Público da União (Lei Complementar n. 75/1993) regulamenta o
exercício do controle externo da atividade policial, estabelecendo mecanismos de
223
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério [...] VII – exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar no artigo anterior [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
224 Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 2005, p. 20.
225 CHOUKR, Fauzi Hassan. O relacionamento entre o Ministério Público e a Polícia
Judiciária no Processo Penal Acusatório. Disponível em: <http://www.mp.pe.gov.br/index>.
Acesso em: 24 de março de 2008 (mantida a grafia da fonte).
94
controle in genere, objetivando coletar elementos probatórios seguros, para a
instauração da ação penal.226
O Ministério Público da União tratou do assunto em seu
artigo 3º227. Portanto, no artigo 9º, prevê que o tal controle será exercido por meio
de medidas judiciais e extrajudiciais, o que exemplifica citando:
I – ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais.228
Esse dispositivo visa permitir que o membro do Parquet
tenha plena ciência das condições materiais e humanas, em que são
desenvolvidos tanto os trabalhos investigativos, quanto de segregação, em
respeito aos direitos fundamentais.229
II – ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim
policial; III – representar à autoridade competente pela adoção de
providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou
corrigir ilegalidade ou abuso de poder.230
Esse inciso explica que o controle externo da atividade
policial pelo Ministério Público não significa uma subordinação hierárquica. No
âmbito funcional, caso o promotor de justiça verifique a ocorrência de quaisquer
226
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 2005, p. 20.
227 “Art. 3º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial tendo em
vista: a) o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, aos princípios informadores das relações internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei; b) a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público; c) a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder; d) a indisponibilidade da persecução penal; e) a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública”. (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível
em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
228 BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da
União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
229 Cf. FREITAS, Manuel Pinheiro. Controle externo da atividade policial: do discurso à prática.
Coleção Centros de Apoio Operacional. Ministério Público do Estado de Goiás, 2006, p.17.
230 BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da
União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
95
faltas disciplinares, tendo esse órgão ministerial atribuições de controle externo,
tem que se dirigir aos superiores hierárquicos do funcionário público faltoso
(Delegado de Polícia, Escrivão, Investigador, Carcereiro), indicando, então, as
falhas e as providências que entender cabíveis, para que a autoridade
administrativa competente possa agir.231
IV – requisitar à autoridade competente a instauração de inquérito
policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da
atividade policial.232
Nesse vértice, cabe informar que o descumprimento da
exigência ministerial pode possibilitar a deflagração de ação penal, se existente o
dolo específico de satisfazer interesse ou sentimento pessoal, nos moldes do
descrito no artigo 319233 do Código Penal, que trata do crime de prevaricação.234
V – promover a ação penal por abuso de poder.235
Partindo do mesmo preceito, o artigo 10236, da mencionada
lei, também prevê a obrigatoriedade da imediata comunicação, pela autoridade
federal ou do Distrito Federal e Territórios ao Ministério Público, da prisão de
231
MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 235.
232 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 235.
233 “Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra
disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa” (BRASIL. Código Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º de abr. 2008).
234 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 235.
235 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 235.
236 “Art. 10 - A prisão de qualquer pessoa, por parte de autoridade federal ou do Distrito Federal e
Territórios, deverá ser comunicada imediatamente ao Ministério Público competente, com indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos documentos comprobatórios da legalidade da prisão” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
96
qualquer pessoa, com indicação do lugar onde se encontra, bem como da cópia
dos documentos comprobatórios da legalidade da segregação.
Essa providência facilita a fiscalização do cabimento da
prisão e, como consequência, possibilita a proteção à liberdade do segregado
pelo Parquet, bem como dá margem ao controle exercido posteriormente da
instauração ou não do respectivo inquérito policial.237
3.4.3 Lei Orgânica Nacional do Ministério Público
A Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, conhecida por Lei
Orgânica Nacional do Ministério Público, estabelece as normas gerais de
organização dos Ministérios Públicos Estaduais, de modo a aproximá-los e evitar
aversões entre si, gerando, assim, uma identidade nacional da instituição.238
Valter Foleto Santin explica:
[...] a Lei Federal nº 8.625, de 1993, que traçou as normas gerais
do Ministério Público dos Estados não tratou propriamente da
função institucional de exercício do controle externo, restando
para normatização pelas leis complementares estaduais [...]239
Pode-se citar, como exemplo, o artigo 41, onde a lei
ordinária prevê o direito da Instituição Ministerial examinar, em qualquer
repartição policial, autos de flagrante ou inquérito, findos ou em andamento, ainda
que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos (inciso
VIII) e de ter acesso ao indiciado preso, a qualquer momento, mesmo quando
decretada a sua incomunicabilidade (inciso IX).240
237
Cf. FREITAS, Manuel Pinheiro. Controle externo da atividade policial: do discurso à prática. Coleção Centros de Apoio Operacional. Ministério Público do Estado de Goiás, p.19.
238 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Manual do Promotor de Justiça. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1991,
p. 133.
239 SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 74.
240 “Art. 41 - Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: [...] VIII - examinar, em qualquer repartição policial, autos de flagrante ou inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à
97
Destarte, cabe ainda informar que se encontra previsão
acerca da mesma temática no artigo 10, ao prescrever que compete ao
Procurador-Geral de Justiça designar membros do Ministério Público (inciso IX)
para acompanhar inquérito policial ou diligência investigatória (alínea “e”).241
Por derradeiro, observa-se a redação dada no artigo 26242,
que facultou ao Parquet, a requisição de diligências investigatórias e a
instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, podendo inclusive
acompanhá-los, desde que respeitado o descrito no artigo 129, inciso VIII243 da
autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos; IX - ter acesso ao indiciado preso, a qualquer momento, mesmo quando decretada a sua incomunicabilidade [...]” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
241 “Art. l0. Compete ao Procurador-Geral de Justiça: [...] IX - designar membros do Ministério
Público para: [...] e) acompanhar inquérito policial ou diligência investigatória, devendo recair a escolha sobre o membro do Ministério Público com atribuição para, em tese, oficiar no feito, segundo as regras ordinárias de distribuição de serviços [...]” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
242 “Art. 26 - No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: I - Instaurar inquéritos civis
e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em lei; b) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridade federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e entidades da administração direta, indireta ou funcional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) promover inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior; II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou processo em que oficie; III - requisitar à autoridade competente a instauração de sindicância ou procedimento administrativo cabível; IV - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no art. 129, inciso VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los; V - praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório; VI - dar publicidade dos procedimentos administrativos não disciplinares que instaurar e das medidas adotadas; VIl -sugerir ao Poder competente a edição de normas e a alteração da legislação em vigor, bem como a adoção de medidas propostas, destinadas à prevenção e controle da criminalidade; VIII - manifestar-se em qualquer fase dos processos, acolhendo solicitação do juiz, da parte ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse em causa que justifique a intervenção [...]” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível
em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
243 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] VIII - requisitar diligências
investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
98
atual Lex Magna. Estas prerrogativas também são concernentes à fiscalização e
acompanhamento das atividades da Polícia Judiciária.244
Em relação aos dispositivos mencionados acima, vislumbra-
se a utilização de diretriz idêntica àquela adotada pela Lei Orgânica do Ministério
Público da União, abordada anteriormente, uma vez que, também prevê, ainda
que esparsamente, mecanismos para seu exercício.
A omissão desta Lei Orgânica em tratar com maior detalhes
a respeito do tema, fica suplementada diante da ordem nela contida para a
aplicação subsidiária das normas da Lei Orgânica do Ministério Público da União
aos Ministérios Públicos dos Estados, como prevista no seu artigo 80245. Deste
modo, as disposições da Lei Complementar n. 75, de 1993, acerca do controle
externo da atividade policial, também se aplicam aos Ministérios Públicos
Estaduais, sem qualquer prejuízo.246
3.4.4 Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina
No Estado de Santa Catarina, a matéria foi tratada por meio
da Lei Complementar n. 197/2000, a Lei Orgânica do Ministério Público
Catarinense.247 Dentre outras previsões, a referida lei descreve como função
institucional do Ministério Público exercer o controle externo da atividade policial,
244
Cf. DECOMAIN, Pedro Roberto. Comentários à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público. Florianópolis: Obra Jurídica, 1996, p. 351.
245 “Art. 80 - Aplicam-se aos Ministérios Públicos dos Estados, subsidiariamente, as normas da Lei
Orgânica do Ministério Público da União” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
246 Cf. FREITAS, Manuel Pinheiro. Controle externo da atividade policial: do discurso à prática.
Coleção Centros de Apoio Operacional. Ministério Público do Estado de Goiás, p.19.
247 Cf. SOUZA, Sandro Ricardo de. Aspectos controvertidos do controle externo da atividade
policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Florianópolis:
Procuradoria Geral de Justiça e Associação Catarinense do Ministério Público, v.3, n.6, 2003, p.72.
99
civil ou militar, conforme estabelece o inciso XVII, do seu artigo 82248, podendo,
dentre outras medidas judiciais ou administrativas:
a) ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais; b)
ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade de polícia
judiciária, ou requisitá-los; c) requisitar à autoridade competente a
adoção de providências para sanar a omissão ou para prevenir ou
corrigir ilegalidade ou abuso de poder; d) requisitar à autoridade
competente a abertura de inquérito sobre a omissão ou fato ilícito
ocorridos no exercício da atividade policial, determinando as
diligências necessárias e a forma de sua realização, podendo
acompanhá-las e também proceder diretamente a investigações,
quando necessário; e) acompanhar atividades investigatórias; f)
recomendar à autoridade policial a observância das leis e
princípios jurídicos; g) requisitar à autoridade competente a
instauração de sindicância ou procedimento administrativo
cabível; h) exigir comunicação imediata sobre apreensão de
adolescente; i) avocar inquérito policial em qualquer fase de sua
elaboração e requisitar, a qualquer tempo, as diligências que se
fizerem necessárias [...]. 249
Cabe ressaltar ainda, que esta lei também se preocupa em
mostrar o objetivo fundamental do controle externo, qual seja, proteger os
fundamentos do Estado Democrático de Direito, os objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil, os princípios informadores das relações
internacionais, bem como os direitos assegurados na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 e na lei (inciso I), preservar a ordem pública, a
incolumidade das pessoas e do patrimônio público (inciso II), prevenir e corrigir
ilegalidade ou abuso de poder (inciso III), respeitar o princípio constitucional da
248
“Art. 82. São funções institucionais do Ministério Público, nos termos da legislação aplicável: [...] XVII - exercer o controle externo da atividade policial, civil ou militar [...]” (SANTA CATARINA. Lei Complementar Estadual nº 197/2000 – Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
249 SANTA CATARINA. Lei Complementar Estadual nº 197/2000 – Lei Orgânica do Ministério
Público do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br>. Acesso em: 1º
de abril de 2008.
100
indisponibilidade da persecução penal (inciso IV), outros interesses, direitos e
valores relacionados ao exercício da atividade policial (inciso VI).250
Em suma, tem-se que a fiscalização do controle externo da
atividade policial objetiva proteger os direitos fundamentais da pessoa, em
respeito aos mandamentos constitucionais, e, para tanto, oferece um rol
exemplificativo de medidas de que pode se utilizar o membro do Parquet.251
3.5 INSTRUMENTOS PARA O EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO DA
ATIVIDADE POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
Atualmente, muitas críticas têm surgido, por parte da Polícia,
que resiste em aceitar a atividade constitucional do Ministério Público, procurando
polemizar a questão e deturpar o efetivo significado do controle externo da
atividade policial, a razão de sua existência, e os mecanismos para se efetivá-
lo.252
Existem vários instrumentos legais à disposição do
Ministério Público para efetivar o exercício do controle externo da atividade
policial. Em regra geral, a maioria desses instrumentos estão previstos em leis de
âmbito nacional e, portanto, podem ser utilizados, indistintamente, tanto pelo
250
“Art. 82. São funções institucionais do Ministério Público, nos termos da legislação aplicável: [...] XVII - exercer o controle externo da atividade policial, civil ou militar [...] § 1º O controle externo da atividade policial será exercido tendo em vista: I - o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, aos princípios informadores das relações internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei; II - a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público; III - a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder; IV - a indisponibilidade da persecução penal; V - a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública; VI - outros interesses, direitos e valores relacionados ao exercício da atividade policial”. (SANTA CATARINA. Lei Complementar Estadual nº 197/2000 – Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br>. Acesso em: 1º
de abril de 2008).
251 Cf. FONTANELLA, Ricardo. Controle Externo da Atividade Policial. Disponível em:
<http://www.mp.rr.gov.br/Intranet/pageDirectory/artigos/controleexterno.pdf>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
252 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 42.
101
Ministério Público da União, quanto por quaisquer dos Ministérios Públicos
Estaduais.253
Procurar-se-á, neste sentido, proceder a uma breve análise
dos instrumentos de aplicação nacional, mais com o objetivo de elencá-los do
que, propriamente, detalhá-los, tendo em vista que existem tópicos, os quais, por
si sós, já serviriam de objeto de uma nova monografia em separado.
3.5.1 Investigação direta pelo Ministério Público
Cabe destacar, como um dos principais instrumentos legais
para o exercício do controle externo da atividade policial, a possibilidade de o
Ministério Público instaurar procedimentos administrativos investigatórios para
apuração de infrações penais, principalmente quando os criminosos sejam as
próprias autoridades policiais.254
Essa possibilidade, como destacado por Rodrigo Régnier
Chemim Guimarães:
[...] é garantida constitucionalmente, através dos incs. I e VI, do
art. 129255, da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, e esmiuçada na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público
(art. 26256), Lei Orgânica do Ministério Público da União (arts. 7° e
253
Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 115.
254 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 115.
255 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei: [...] VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva" (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
256 “Art. 26. “No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: I - instaurar inquéritos,
civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: a)
expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Policia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas em lei; b) requisitar informações, exames periciais e documentos de órgãos e entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) promover inspeções e diligências investigatórias junto às autoridades, órgãos e entidades a que se refere a alínea anterior; II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou
102
8°257) e nas diversas Leis Orgânicas dos Ministérios Públicos
Estaduais.258
A propósito leciona o autor:
Este instrumento legal é importantíssimo para o desempenho do
controle externo da atividade policial na medida em que se tenha
notícia de faltas ou abusos de autoridade por parte das Polícias. É
salutar que, nesses casos, a par de outros tantos, o Ministério
Público não fique aguardando providências das próprias Polícias
em investigar e responsabilizar administrativamente seus agentes,
mas sim, promova, de imediato, a necessária investigação para
assegurar-se da veracidade, ou não, da notícia de abuso de poder
que lhe chegue ao conhecimento. [...] Para tanto, será necessária a
instauração do que se usou denominar „procedimento
administrativo investigatório‟ no âmbito da própria Promotoria ou
Procuradoria da República encarregada. Este procedimento, a
exemplo do que acontece com as investigações em geral, não
obedece a um rito próprio, mas poderá adotar as normas
pertinentes ao inquérito civil e ao Código de Processo Penal no
que forem aplicáveis. Por exemplo: adotar a sistemática de
instauração dos inquéritos civis, através de Portarias, com o
regular registro das mesmas em livro próprio na Promotoria, e de
requisições de documentos seguindo a linha dos inquéritos civis e,
por outro lado, adotar o Código de Processo Penal no que diz
processo em que oficie: [...] V - praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório”(BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993.
Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008). (grifou-se).
257 “Art. 7°. Incumbe ao Ministério Público da União, sempre que necessário ao exercício de suas
funções institucionais: I - instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos correlatos: (...) Art. 8°. Para o exercício de suas atribuições o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: I – Notificar testemunhas e requisitar sua condução
coercitiva, no cave de ausência injustificada; II –requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta; III – requisitar da Administração Pública serviços temporários de seus servidores e meios materiais necessários pare a realização de atividades especificas; IV – requisitar informações e documentos a entidades privadas; V – realizar inspeções e diligências investigatórias; VI – ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicilio; VlI - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar; VIII – ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a serviço de relevância pública; IX – requisitar o auxílio de força policial" (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível
em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008) (grifou-se).
258 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 115.
103
respeito à oitiva das testemunhas, interrogatório do investigado e,
também, em caso de arquivamento do procedimento administrativo
investigatório.259
3.5.2 Requisição de instauração de inquéritos policiais e respectivas
diligências
Outro importante instrumento à disposição do Ministério
Público, para o efetivo exercício do controle externo da atividade policial, é o
direito de requisitar a instauração de inquéritos policiais, bem como a realização
de diligências a serem cumpridas pela autoridade policial, na apuração das
infrações penais.260
Os dispositivos legais estão inseridos no artigo 129, inciso
VIII261, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no artigo 26,
inciso IV262, da Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e nos
259
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 116.
260 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 116.
261 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] VIII - requisitar diligências
investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,
Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
262 “Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: [...] IV - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no art. 129, inciso VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível
em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
104
artigos 5°, inciso II263 e artigo 13, inciso II264, ambos do Código de Processo
Penal.265
Nas lições de Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
Nesta questão, é importante de novo ressaltar que o Ministério Pú-
blico, quando está requisitando providências da autoridade policial, o
está fazendo de maneira impositiva, isto é, não se trata de um
pedido, mas de verdadeira determinação. A autoridade policial deve,
necessariamente, cumprir a requisição, sob pena de incidir em crime
de prevaricação, a menos que a ordem seja manifestamente
ilegal.266
3.5.3 Livre ingresso nas Delegacias de Polícia e em qualquer recinto público
ou privado
No exercício do controle externo da atividade policial é
disposto ao Ministério Público o livre ingresso nas Delegacias de Polícia e em
qualquer recinto público ou privado, ressalvada a garantia constitucional de
inviolabilidade do domicílio, a teor do que prescreve o artigo 41, inciso VI, letras
"b" e "c"267, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e no artigo 9°, inciso
I268, da Lei Orgânica do Ministério Público da União.269
263
“Art. 5º. Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: [...] II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo” (BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>.Acesso em: 1º de abr. 2008).
264 “Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: [...] II - realizar as diligências requisitadas pelo
juiz ou pelo Ministério Público” (BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>.Acesso em: 1º de abr. 2008).
265 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 116.
266 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 116.
267 “Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: [...] VI - ingressar e transitar livremente: [...] b) nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, tabelionatos, ofícios da justiça, inclusive dos registros públicos, delegacias de polícia e estabelecimento de internação coletiva; c) em qualquer recinto público ou privado, ressalvada a garantia constitucional de inviolabilidade de domicílio” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993.
105
Assim, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães comenta:
Esta prerrogativa é, de suma importância na efetivação do
exercício do controle externo da atividade policial, pois que não é
dado à autoridade policial impedir o acesso do membro do
Ministério Público ao interior das Delegacias de Polícia ou de
qualquer outro órgão a ela vinculado, como, por exemplo, o
Instituto Médico Legal ou o Instituto de Criminalística. Assim, o
Ministério Público tem condições de, em casos de denúncias de
abuso de poder da Polícia, ocorridos ou que estejam
ocorrendo no interior de estabelecimentos policiais, impedir
que o mesmo prossiga, identificar, in loco, os responsáveis e
tomar imediatamente as medidas cabíveis.270
3.5.4 Fiscalização de estabelecimentos prisionais
Ao Ministério Público está assegurado o direito de fiscalizar
os estabelecimentos prisionais, inclusive as cadeias públicas. Este instrumento
tem seu amparo legal no artigo 25, inciso VI271, da Lei n. 8.625/1993 (Lei Orgânica
Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
268 “Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio
de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: I - ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
269 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 117.
270 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 46.
271 “Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público: [...] VI - exercer a fiscalização dos estabelecimentos prisionais e dos que abriguem idosos, menores, incapazes ou pessoas portadoras de deficiência” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
106
Nacional do Ministério Público), e no artigo 68, parágrafo único272, da Lei n.
7.210/1984 (Lei de Execuções Penais).273
Rodrigo Régnier Chemim Guimarães pontua que:
Ao possibilitar a visita a estabelecimentos prisionais pelo
Ministério Público, o legislador conferiu a essa Instituição um
poder-dever de zelar por aqueles que se encontram recolhidos à
prisão, fiscalizando o correto cumprimento da pena, além de
impedir que alguém venha a ser preso ilegalmente, e que abusos
possam ser cometidos contra os encarcerados. [...] Assim, a
qualquer instante está o membro do Ministério Público
autorizado a proceder vistorias nos estabelecimentos prisionais,
não podendo à autoridade policial impor condições (como, por
exemplo, incomunicabilidade do preso) ou fixar horários e limites
a essas visitações, a teor do artigo 41, IX, da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público.274
3.5.5 Acesso a quaisquer documentos relacionados com a atividade-fim
policial
Este direito encontra-se consubstanciado no artigo 9°, inciso
II275, da Lei Orgânica do Ministério Público da União (aplicada subsidiariamente
aos Ministérios Públicos Estaduais) e no artigo 41, VIII276, da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público.277
272
“Art. 68. Incumbe, ainda, ao Ministério Público: [...] Parágrafo único. O órgão do Ministério Público visitará mensalmente os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio”. (BRASIL. Lei de Execuções Penais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 1º de abr. 2008).
273 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 46.
274 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 46.
275 “Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio
de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: [...] II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial”. (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
276 “Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: [...] VIII - examinar, em qualquer repartição policial, autos de flagrante ou inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à
107
Sobre o tema, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães salienta:
Entende-se por „documentos relativos à atividade-fim policial‟ todos
aqueles que se refiram a investigações de infrações penais, ainda
que possam se resumir a meros indícios ou boletins de ocorrência e
não tenham sido juntados aos autos de inquérito policial, bem como
aqueles referentes aos presos que, porventura, estejam custodiados
e sob guarda policial, além dos diversos livros de registro
obrigatórios em cada Delegacia de Polícia.278
3.5.6 Requisitar à autoridade competente a adoção de providências para
sanar a omissão indevida ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso
de poder
Este dispositivo está transcrito no artigo 26, inciso III279, da
Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, e no artigo 9°, inciso III280, da Lei
Orgânica do Ministério Público da União.281
Rodrigo Régnier Chemim Guimarães ainda explica:
Ao constatar qualquer espécie de omissão, ilegalidade ou abuso de
poder por parte da Polícia, além de proceder à investigação criminal
autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
277 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 46.
278 GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo
Ministério Público. 2006, p. 118.
279 “Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: [...] III - requisitar à autoridade competente a instauração de sindicância ou procedimento administrativo cabível” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível
em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
280 “Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio
de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: [...] III - representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
281 Cf. GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Cad. Min. Pub. 1998, p. 46.
108
pertinente, pode o Ministério Público requisitar à autoridade
competente - geralmente à Corregedoria da Polícia - a instauração
de procedimento administrativo, a fim de que sejam adotadas
medidas visando adequar e responsabilizar o infrator.282
3.5.7 Promoção de Ação Penal
Constatada uma infração penal praticada por autoridade
policial, além de requisitar a adoção de medidas no âmbito administrativo, deve o
Ministério Público, depois de realizada a investigação, e presentes os requisitos
essenciais a ação, promover a ação penal respectiva.283
Em relação à fundamentação legal, cabe destacar, além do
artigo 129, inciso I284, da atual Carta Magma, o artigo 9°, inciso V285, da Lei
Orgânica do Ministério Público da União.
3.5.8 Promoção de Ação Civil Pública
A propósito, Rodrigo Régnier Chemim Guimarães:
Outra providência que pode e, se for o caso, deve ser tomada pelo
Ministério Público, quando do exercício do controle externo da
atividade policial, é a adoção de medidas judiciais também no âmbito
cível, a exemplo do que já se disse quando da necessidade de
282
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 120.
283 MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos
de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 15 abr. 2008.
284 “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei [...]” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
285 “Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio
de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: [...] V - promover a ação penal por abuso de poder” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
109
instaurar ação penal pública, ingressando com ação civil pública
contra o agente policial ímprobo, valendo-se da Lei de Improbidade
Administrativa (Lei 8.429/92), que, além de ser mais ampla do que
os tipos penais existentes, prevendo casos de improbidade por
fatos e condutas não tipificadas criminalmente, possibilita a aplicação
de uma série de sanções civis e administrativas (e não penais, como
equivocadamente insistem alguns poucos), que podem resultar
desde a perda dos bens ilicitamente acrescidos ao património do
agente, como também aplicação de multa civil, ressarcimento do
dano causado, até a perda da função pública e suspensão dos
direitos políticos até oito anos, dentre outras.286
3.5.9 Ter ciência imediata da prisão de qualquer pessoa
Outro instrumento do Ministério Público, no exercício do
controle externo da atividade policial, vem descrito no artigo 10287, da Lei Orgânica
do Ministério Público da União, e consubstancia-se no dever imposto à autoridade
policial de comunicar, imediatamente, ao Ministério Público, a prisão de qualquer
pessoa, indicando o lugar onde se encontra preso e anexando cópias dos
documentos comprobatórios e justificadores dessa prisão.288
286
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 2006, p. 121-122.
287 “Art. 10. A prisão de qualquer pessoa, por parte de autoridade federal ou do Distrito Federal e
Territórios, deverá ser comunicada imediatamente ao Ministério Público competente, com indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos documentos comprobatórios da legalidade da prisão” (BRASIL. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público da União. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008).
288 Cf. SILVA JR., Edison Miguel da. Controle Externo da Atividade Policial e Legislação
Vigente apud MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 15 abr. 2008.
110
3.5.10 Impetração de habeas corpus
Por fim, com fulcro no artigo 5°, inciso LXVIII289, da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, e artigo 32, inciso I290, da
Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, é autorizado ao Ministério Público
impetrar habeas corpus em favor de quem se encontre injustamente preso.
Assim, são estes os instrumentos de que dispõe o Ministério
Público, em nível nacional, para o exercício do controle externo da atividade
policial. Porém, ainda cabe lembrar que existem instrumentos disponíveis para o
Ministério Público com aplicabilidade regional na Lei Complementar n. 197/2000,
de 13 de julho de 2000 - Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa
Catarina, conforme transcrito no item 1.4.2 do primeiro capítulo.
É importante, também, ressaltar a lição de Valter Foleto
Santin:
O controle do Ministério Público pode ser exercido por verificação e
fiscalização das notícias-crimes, instrumentos de registro de
ocorrências, providências adotadas, andamento de investigações,
tramitação de inquéritos e procedimentos e cumprimento de
requisições do Ministério Público, que se inserem nas funções de
investigação e de cooperação com autoridades do Ministério Público
e judiciárias. As atividades de prevenção, repressão e que afetem ao
direito do cidadão de receber efetivamente os serviços de segurança
pública podem ser submetidas a controle externo do Ministério
Público. Também é possível o controle das atividades policiais por
289
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988).
290 “Art. 32. Além de outras funções cometidas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e demais leis, compete aos Promotores de Justiça, dentro de suas esferas de atribuições: I - impetrar habeas-corpus e mandado de segurança e requerer correição parcial, inclusive perante os Tribunais locais competentes” (BRASIL. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº 8.625/1993. Disponível em:
<http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
111
fiscalização da detenção de presos e execução de pena de
condenados.291
Diante do exposto, pode-se afirmar que o controle externo
da atividade policial é feito atualmente de forma principiante na maior parte do
país. Praticamente, restringe-se à fiscalização dos inquéritos policiais, durante a
sua tramitação, pelos pedidos de prazo e por requisições ou requerimentos de
diligências.292
3.6 LIMITES AO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA EXERCER O CONTROLE
EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL
Cabe informar que a fiscalização exercida pelo Ministério
Público sobre a Polícia não se confunde com subordinação hierárquica desta em
relação ao Parquet, pois representaria um descumprimento ao princípio da
separação dos poderes, tal como define o jurista Hugo Nigro Mazzilli:
Por certo não é intuito do legislador criar verdadeira hierarquia ou
disciplina administrativa, subordinando a autoridade policial aos
agentes do Ministério Público. Certamente, aludido controle
externo não importará poder disciplinar do Ministério Público sobre
a polícia.293
Para este autor, as faltas disciplinares não são abrangidas
pela fiscalização do Ministério Público, que as deverá informar aos superiores
hierárquicos do funcionário público faltoso, indicando as falhas e sugerindo as
providências que entender cabíveis.294
291
SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 78.
292 Cf. SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. 2001, p. 79.
293 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 246.
294 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. 1996, p. 247.
112
No mesmo diapasão, manifesta-se Luiz Fabião Guasque:
O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público não
significa ingerência que determine a subordinação da polícia
judiciária ao Parquet. Mas a prática de atos administrativos por
este, de forma a possibilitar a efetividade dos direitos
fundamentais da pessoa assegurados na Carta de 1988, conforme
o dever jurídico que lhe é imposto pelo art.127, caput, da lei
maior.295
Isso também é depreendido do narrado posicionamento de
Francisco Taumaturgo de Araújo Júnior:
Como expresso no ordenamento Constitucional, o Ministério
Público exercerá o controle externo da atividade policial e não dos
policiais, pois estes estão sujeitos a um controle interno,
desenvolvido pelos órgãos hierarquicamente superiores. Controla-
se, assim, a atividade-fim da polícia, onde há interesse do
Ministério Público.296
No entanto, pode-se afirmar que o alcance do controle
externo da atividade policial se encerra na fiscalização dos aspectos extrínsecos
de legalidade dos atos procedimentais exercidos pela Polícia. Ao realizar os atos
investigatórios em desacordo com as normas legais, a Polícia ficará sujeita às
providências do Ministério Público, que as tomará, não de modo auto-executório,
mas as requererá perante o órgão competente do Poder Judiciário.297
Em relação ao limite de abrangência da fiscalização do
Parquet sobre o trabalho policial, ainda convém mencionar que a legitimidade da
295
GUASQUE, Luiz Fabião. O Ministério Público e o controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1996, p. 141.
296 ARAÚJO JÚNIOR, Francisco Taumaturgo de. Controle Externo da Atividade Policial, o
outro lado da face. Disponível em <http://www.pgj.ce.gov.br/artigos/artigos.asp?iCodigo=34v>.
Acesso em: 16 de abril de 2008.
297 Cf. COSTA, José Armando da. Manual de polícia judiciária. Rio de Janeiro: Forense, 1999,
p.401.
113
vigilância alcança tanto a atividade da Polícia Civil quanto Militar, sempre que
relacionadas ao exercício do múnus de Polícia Judiciária.298
3.7 OBSTÁCULOS ENFRENTADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO NO
EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL
Em que pese a existência de normas legais, que prevêem a
fiscalização externa da atividade policial pelo Ministério Público, os membros do
Parquet deparam-se com obstáculos que dificultam, sobremaneira, o exercício
desta função.
Dentre os principais desses problemas, destaca-se a
informalidade com que é tradicionalmente exercida a atividade policial,
especialmente no que tange ao processamento do inquérito e investigação, que
prejudica tanto o controle interno quanto o externo. A falta de normatização
específica, acerca da forma do procedimento administrativo destinado a
documentar a investigação, impede sua fiscalização, porquanto não há como se
vigiar aquilo que não é devidamente documentado, especialmente nos casos em
que o acompanhamento presencial é inviável.
Sobre o tema, opina Carlos Alberto Araújo:
É imprescindível para a institucionalização do serviço público
policial que a atividade de investigação seja formalizada em
certidões de diligências que retratem a investigação em seus
detalhes, a fim de que a memória da investigação seja da
instituição policial e não do agente ou autoridade policial.
Inquéritos policiais não podem brotar depoimentos, sem uma
semeadura clara, sem relatórios institucionais que permitam a
298
Cf. LOCATELLI, Paulo Antônio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 59.
114
seqüência do trabalho por qualquer agente ou autoridade e,
ainda, os controles interno e externo.299
Ademais, a informalidade do trabalho policial facilita a
instalação da criminalidade no aparelho estatal ao possibilitar a desinformação, a
infidelidade dos dados e a manipulação administrativa no que tange à realização
ou não de determinada diligência ou investigação ou, pior ainda, “construção de
inquéritos eleitos ou privilegiados”.300
Carlos Alberto Araújo ainda assevera que:
A polícia, na sua atividade-fim, que é a produção de base para o
exercício da ação penal pelo Ministério Público, a completa
institucionalização do inquérito policial será reconhecida como
alicerce do respeito da sociedade, como instituição aberta, de
uma legalidade transparente, assim alcançando a justificação e a
confiança social.301
O mesmo problema é enfrentado no estado catarinense,
conforme noticia o Promotor de Justiça Paulo Antonio Locatelli:
Percebe-se que a falta de um controle administrativo interno mais
eficiente nas Delegacias de Polícia dificulta o conhecimento da
situação fática e o efetivo controle. Verifica-se que inexiste no
momento por parte da Secretaria de Estado de Segurança Pública
[...], como também pela Corregedoria e Chefia da Polícia Civil,
normatização determinando quais os registros que deverão existir
junto às Delegacias. [...] O regramento sem dúvida traria reflexo
na eficácia do Controle Externo da Atividade Policial pelo
Ministério Público Catarinense.302
299
ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Florianópolis: Procuradoria Geral de Justiça e
Associação Catarinense do Ministério Público, v.3, n.6, 2003, p. 27.
300 ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista
Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 22.
301 ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista
Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 23.
302 LOCATELLI, Paulo Antônio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial.
Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003. p. 61.
115
Outro aspecto polêmico em relação ao tema é a falta de
previsão de punição para o não-cumprimento das requisições ministeriais, quando
derivadas da sua atividade fiscalizatória. Ante a grande possibilidade de atingir a
completa ineficácia, se faz necessária a confecção de legislação “que confira ao
Ministério Público o poder de requisitar – conditio sine qua non – o saneamento
das ilegalidades e irregularidades da atividade policial de persecução penal” .303
Com o respectivo embasamento legal – necessário ante a
inexistência de sujeição hierárquica entre Ministério Público e a Polícia – deve ser
estabelecida uma relação jurídica interinstitucional, com a previsão de poderes e
deveres entre uma instituição controladora e uma instituição controlada,
atribuindo-se meios sólidos para o exercício da analisada função fiscalizatória.304
No Estado de Santa Catarina, grande parte das Promotorias
de Justiça ainda não tem atribuição para exercer o controle externo da atividade
policial. Porém, seria necessário, para o bom andamento, que este controle fosse
incluído dentre as atividades desenvolvidas. Esta inclusão se procederia por ato da
Administração Superior, atribuindo às Promotorias a função deste controle. Pode-se
citar, como exemplo, uma comarca com cinco Promotores de Justiça atuando na
área criminal, como júri, juizados especiais criminais e crimes comuns, todos de
forma concorrente e disjuntiva, estariam legitimados a exercer os atos de controle.305
Cabe mencionar os ensinamentos do Promotor de Justiça
Catarinense, Paulo Antonio Locatelli:
Para edificar-se de forma sólida e contundente, deve o solo a ser
construído o conceito da operacionalização do controle ser firme,
inatingível de sofrer erosão. Deve o Promotor atuante não ceder a
temeridade do confronto, pois o ódio irracional e a incompreensão
de certos segmentos policiais não deverão servir de empecilho e
deverão ser prontamente repelidos. Para isso, impõe-se uma
303
ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 23.
304 ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista
Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 23.
305 Cf. LOCATELLI, Paulo Antônio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial.
Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 58.
116
construção gradual, ininterrupta e duradoura do controle externo
da atividade policial. Superar obstáculos, dissipar preconceitos, inibir
a possível aversão causada pela função, além de incitar o
conhecimento interno da polícia também é prioritário. Nem sempre
o exercício do controle externo será compatível com a expectativa
advinda da consciência do Promotor de Justiça, gerada por sua
própria convicção e fomentada pela instituição. É preciso
compreender que o controle externo sofre limitações. A restrição
advém do inconformismo de quem é controlado, num histórico de
omissão do exercício dessa função principalmente pelo critério
estrutural e orçamentário. As corporações tendem a se unir,
impedindo a fiscalização e muitas vezes, infelizmente, agentes são
acobertados sob o manto das instituições, quando na realidade
deveriam ter sua postura corrigida.306
A propósito, o autor finaliza:
Conceber um Ministério Público ao mesmo tempo atuante,
sensível aos clamores sociais, eficaz no cumprimento do dever de
exercer o controle externo da atividade policial e compreensível
quanto às dificuldades enfrentadas pelas polícias, mas sobretudo,
firme e austero na rotina de zelar pela moralidade e legalidade dos
atos policiais, é o grande desafio que emerge da nossa rotina
diária e que precisamos enfrentá-lo com disposição e galhardia.
Cumpre informar que será colocado no Anexo 1, ata da 5ª
reunião da comissão de estudos do controle externo da atividade policial – Centro
de Apoio Operacional Criminal – Ministério Público – SC e no Anexo 2, Acórdãos
do Superior Tribunal de Justiça, ambos em caráter informativo e exemplificativo,
que tratam a respeito do tema ora desenvolvido.
Após a descrição e análise dos tópicos constantes neste
capítulo, passa-se, a seguir, às conclusões a que se chegou com o referido
estudo.
306
LOCATELLI, Paulo Antônio. O Ministério Público e o Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. 2003, p. 58-59.
117
CONCLUSÃO
Com o intuito de promover uma reflexão e uma continuação
dos estudos a respeito do tema apresentado, cabe agora tecer algumas
considerações finais a respeito da função controladora do Ministério Público sobre
as atividades policiais, com a abordagem de sua legalidade, limitação e relevância
no Estado Democrático de Direito.
Atualmente, o Brasil vem se deparando com um aumento
assustador dos índices de abusos, arbitrariedades e, conseqüentemente, da
impunidade, conforme demonstrado pela mídia e demais meios de comunicação.
O excesso de trabalho e o escasso quadro funcional, de que dispõe a Polícia,
dificultam a realização adequada de sua atividade-fim, propiciando, assim, num
excessivo número de resultados insatisfatórios.
Ademais, pode-se afirmar que a instituição policial é
bastante suscetível à instalação da corrupção entre seus agentes, haja vista a
ampla liberdade com que exerce suas atividades, decorrente da ausência de
normatização que imponha uma forma específica para tanto.
Nesse contexto, a instituição do Ministério Público aparece
como um essencial instrumento de combate à ineficácia da atividade investigativa,
porquanto, com base no artigo 129, inciso VII, da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, lhe foi cometida a legitimidade para exercer o
controle externo da atividade policial.
Deste modo, ao fiscalizar a atividade policial, o membro do
Ministério Público age como verdadeiro ator do mecanismo de cheks and
balances, zelando pela garantia dos direitos fundamentais dos indivíduos e das
demais normas legais, ao passo que inicia o devido processo legal para a
responsabilização pelos eventuais abusos por ela praticados, coibindo assim, a
sua própria ocorrência.
118
A atribuição de tal função ao Ministério Público se justifica
em virtude de inúmeras garantias a ele conferidas, tais como: vitaliciedade,
irredutibilidade de subsídio, inamovibilidade e independência funcional, todas
previstas nos artigos 127 e 128, §5º, inciso I, da atual Lex Magna. Portanto, a
Instituição Ministerial tem a imparcialidade necessária para o pleno desempenho
desta função fiscalizadora, motivo por que é, por excelência, o responsável pela
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis.
Outro motivo que confere razoabilidade à referida
legitimação é a estreita ligação existente entre as funções do Ministério Público e
da Polícia Investigativa. A função primordial desta última é exatamente coletar e
apresentar ao Parquet, os elementos suficientes para embasar a eventual
propositura de ação penal pública, cuja titularidade é exclusiva do Ministério
Público.
Destarte, ao possibilitar a fiscalização do Parquet sobre as
atividades exercidas pelo autor das diligências investigativas, representa corolário
do sistema acusatório adotado pela Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, haja vista o resultado das pesquisas se destinar a formar a opinio
delicti do Promotor de Justiça. Por certo, não seria coerente que o titular exclusivo
da ação penal pública, que se utiliza das provas coletadas no curso do inquérito,
fosse impossibilitado de verificar a lisura com que foram praticados os atos da
persecução penal em sua fase inicial.
Relativamente à aplicabilidade dos dispositivos legais que
prevêem a fiscalização da atividade policial pelo Ministério Público, foi observado
que ainda há um longo caminho para a sua efetiva implementação.
Dentre os obstáculos enfrentados, ficou claro que um dos
mais significativos na atualidade é a informalidade com que é tradicionalmente
conduzido o inquérito policial. A inexistência de previsão da obrigatoriedade, para
a manutenção de registros precisos das diligências realizadas pela autoridade
policial, bem como dos eventos criminosos de que toma conhecimento, por
119
exemplo, tornam praticamente impossível que seja controlada sua legalidade,
assim como dos atos que lhes sejam decorrentes.
De nada adianta atribuir ao Ministério Público função de
tamanha responsabilidade, se não há um contexto que colabore com esta
perspectiva.
O aumento assustador da violência, decorrente do avanço
da criminalidade, hoje assistido por uma sociedade brasileira indefesa, precisa de
um Ministério Público mais atuante no campo penal, que acompanhe o momento
da coleta dos indícios probatórios do crime e assegure, com brilhantismo, o seu
papel de dominus litis.
Em conclusão, tem-se que a fiscalização externa da
atividade policial é imprescindível para garantir um policiamento eficiente,
evitando, o crescimento da violência policial, que vem preocupando, cada vez
mais, os cidadãos, os próprios policiais, os governantes, os jornalistas e os
cientistas sociais. Isto ocorre, em razão de ser ela praticada por agentes do
Estado, que têm a obrigação constitucional de garantir a segurança pública, a
quem a sociedade confia a responsabilidade do controle da violência. Assim,
estabelecida a discricionariedade pertencente à função policial, o controle do
policial no seu trabalho diário torna-se um desafio para todas as instituições
policiais do mundo, ainda mais em função da tendência crescente à
descentralização.
Portanto, fica evidente a necessidade de se criar uma
legislação que, além de exemplificar os meios para que se pratique a vigilância,
preocupe-se em preparar a fundação das bases, e, verdadeiramente, permitir que
se cumpra o disposto na atual Constituição da República Federativa do Brasil.
Muito há para ser feito até que se mostrem claros e induvidosos os limites do
controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. Vale aqui salientar
que o exercício dessa função constitucional não significa a supressão dos
organismos policiais, nem a sua subserviência hierárquica. O quadro normativo
brasileiro não permite e não aponta para isso. Ao invés, o aludido controle deve
ser lido e compreendido como controle externo da atividade-fim policial, mas que
120
deve ser feito nessa seara com toda a firmeza e rigor, buscando maior interação e
eficiência dos órgãos encarregados da segurança social, porém, sem jamais
corroborar atitudes ilegais ou de violência em desfavor do indivíduo ou da
comunidade.
Diante do exposto, é possível se afirmar, então, que tanto o
objetivo geral quanto os objetivos específicos foram alcançados, acreditando-se
que o trabalho venha a servir de importante instrumento para que os organismos
jurídicos e governamentais continuem implementando ações que objetivem ao
cumprimento da função controladora do Ministério Público sobre as atividades
policiais, com a abordagem de sua legalidade, limitação e relevância no Estado
Democrático de Direito.
Ao concluir esta etapa final do trabalho, enfatiza-se que a
experiência adquirida por meio de leituras, aplicação dos instrumentos escolhidos
e da análise do conteúdo, proporcionou um grande desafio ao graduando, que
poderá produzir bons frutos àqueles que se propuserem a dar continuidade a uma
pesquisa com o referencial teórico e os instrumentos aqui utilizados.
121
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
ALMEIDA, Joaquim Canuto Mendes de. Princípios Fundamentais do Processo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1973.
ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. O Processo Criminal Brasileiro. 4. ed. Vol. 1. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1959.
ARAÚJO, Carlos Alberto. O Controle Externo da Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Florianópolis: Procuradoria
Geral de Justiça e Associação Catarinense do Ministério Público, v.3, n.6, 2003.
ARAÚJO JÚNIOR, Francisco Taumaturgo de. Controle Externo da Atividade
Policial, o outro lado da face. Disponível em <http://www.pgj.ce.gov.br/artigos/artigos.asp?iCodigo=34v> Acesso em 16 de abril de 2008.
ASSIS, Jorge César de. Código de Processo Penal Militar Anotado. 2. ed.
Curitiba: Juruá, 2006.
BEZNOS, Clovis. Poder de Polícia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979.
BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º de abr. 2008.
______. Código de Processo Penal Militar. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º de abr. 2008.
______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Distrito Federal: Senado Federal. 1988.
______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao.htm>. Acesso em: 27 fev. 2008.
______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 10 de
novembro de 1937. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_04/Constituicao.htm> Acesso em: 27 fev. 2008.
122
______. Lei Complementar Federal nº 75/1993 – Lei Orgânica do Ministério
Público da União. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_detalhe.asp?20secao_id=58>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
______. Lei de Execuções Penais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 1º de abr. 2008.
______. Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei federal nº
8.625/1993. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_lista.asp?campo=1375> Acesso em: 27 fev. 2008).
______. Polícia Rodoviária Federal. Disponível em: <http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/index>. Acesso em 28 de novembro de
2007.
______. Recurso Ordinário em Habeas Corpus 7.916 – SP – STJ – 6ª Turma – Rel. Min. Fernando Gonçalves – j. em 15.10.1998 – improvido – votação unânime, in DJU, Seção, 1, de 09.11.1999. Disponível em: <http://www.stj.gov.br> Acesso
em: 08 de março de 2008.
BRÜNING, Raulino Jacó. História do Ministério Público Catarinense.
Florianópolis: Habitus, 2001.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 7. ed. rev. e atual. até a
Emenda Constitucional n. 53/2006. São Paulo: Saraiva, 2007.
______. Constituição Federal anotada. 5. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional n. 39/2002. São Paulo: Saraiva, 2003.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
CHOUKR, Fauzi Hassan. O relacionamento entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária no Processo Penal Acusatório. Disponível em <http://www.mp.pe.gov.br/index>. Acesso em 24 de março de 2008.
COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Sobre a posição da polícia judiciária na estrutura do direito processual penal brasileiro da atualidade. Revista
Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, RT, 1998.
COSTA, José Armando da. Manual de polícia judiciária. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
123
CRETELLA JR., José. Direito Administrativo brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2000.
DECOMAIN, Pedro Roberto. Comentários à Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público. Florianópolis: Obra Jurídica, 1996.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Altas, 2004.
FAZZIO JR., Waldo. O Ministério Público e o dever constitucional do controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público do Estado de Sergipe, n. 12, 1997.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 617.
FONTANELLA, Ricardo. Controle Externo da Atividade Policial. Disponível em:
<http://www.mp.rr.gov.br/Intranet/pageDirectory/artigos/controleexterno.pdf>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
FRANCO, Paulo Alves. Inquérito policial. São Paulo: Sugestões Literárias, 1992.
FREITAS, Manuel Pinheiro. Controle externo da atividade policial: do discurso à prática. Coleção Centros de Apoio Operacional. Ministério Público do Estado de Goiás, 2006.
GOMES, Amintas Vidal. Novo manual do delegado. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
GONÇALVES, Edilson Santana. O Ministério Público no Estado Democrático
de Direito. Fortaleza: ABC Fortaleza, 2000.
GUASQUE, Luiz Fabião. O Ministério Público e o controle externo da atividade
policial. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1996.
GUIMARÃES, Rodrigo Régnier Chemim. Controle externo da atividade policial pelo Ministério Público. 1ª ed. (ano 2002), 5ª tiragem. Curitiba: Juruá, 2006.
______. Cad. Min. Pub. Paraná, Curitiba, v. 1, n. 2, nov. 1998.
LAZZARINI, Álvaro. A segurança pública e o aperfeiçoamento da polícia no Brasil. Revista - A Força Policial, nº 5 jan./mar. 1995.
124
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 10. ed. rev., atual. e ampl
– São Paulo: Editora Método, 2006.
LOCATELLI, Paulo Antonio. O Ministério Público e o Controle Externo da
Atividade Policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. v. 3, n. 6, maio/ago. 2005, Florianópolis.
MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. A Intervenção do Ministério Público no Processo Civil Brasileiro. 2. ed. São Paulo Saraiva, 1998.
MARQUES, Carlos Alexandre. Controle externo da atividade policial: natureza e mecanismos de exercício. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 44, ago. 2000.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1598>. Acesso em: 26 mar. 2008.
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 2. ed. Vol. 1, Campinas: Millennium, 2000.
MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime Jurídico do Ministério Público: análise da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, aprovada pela Lei n. 8.625, de 12 de
fevereiro de 1993. 3. ed. rev., ampl. e atual. à luz da LOMPU, da LONMP e da LOEMP. São Paulo: Saraiva, 1996.
______. O Ministério Público na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989.
______. Manual do Promotor de Justiça. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1991.
______. Entrevista concedida ao CEAF - Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, in: Plural -
Boletim Informativo do CEAF/Escola Superior do Ministério Público, ano 5,
n. 25, Disponível em: <www.mp.sp.gov.br>. Acesso em: 25 de março de 2008.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed., São Paulo: Malheiros, 2006.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6. ed. atualizada até a EC nº 52/06 – São Paulo: Atlas, 2006.
______. Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
125
MOURA, Magno Alexandre F. Escorço Histórico do Ministério Público. Revista do
Ministério Público - Alagoas, n. 11:99-108, jul./dez. 2003.
NORONHA, Edgard de Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 28. ed.
atualizada por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2002.
OLIVEIRA, Joél Bino de; LOPES, Rogério Antonio. Teoria e prática da polícia judiciária à luz do princípio da legalidade. 2. ed. (ano 2002). 4. tir. Curitiba:
Juruá, 2006.
PALMA, Enos da Costa. Programa de princípios institucionais do Ministério
Público. 1. ed. Rio de Janeiro: Líber Júris Ltda, 1986.
PINHEIRO, Ibsen. Ministério Público Novo de Guerra, in: Observatório da Imprensa, Caderno da Cidadania, p. 1-2. Disponível em: <www.observatoriodaimprensa.com.br> Acesso em: 25 mar. 2008.
RANGEL, Paulo. Investigação Criminal direta pelo Ministério Público: visão crítica. 2. ed. rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
ROCHA, Luiz Carlos. Organização policial brasileira: Polícia Federal, Polícia
Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária, polícias civis, polícias militares, corpos de bombeiros militares, guardas municipais. São Paulo: Saraiva, 1991.
SANTA CATARINA. Lei Complementar Estadual nº 197/2000 – Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.mp.sc.gov.br>. Acesso em: 1º de abril de 2008.
SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na investigação criminal. Bauru, São Paulo: EDIPRO, 2001.
SANTOS, Emerson Clayton Rosa. Conceito de segurança pública. Disponível
em: <http://br.monografias.com/trabalhos/seguranca-publica.shtml>. Acesso em 18.11.2007.
SILVA, Jádel da. O Ministério Público. Origens históricas e perspectivas atuais. Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Ano 1, Vol. 1, Jan./jun. 1978.
SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 11. ed. São
Paulo: Malheiros, 2003.
126
SILVA, José Geraldo da. O Inquérito Policial e a Polícia Judiciária. São Paulo:
Livraria e Editora de Direito, 1994.
SOUZA, Sandro Ricardo de. Aspectos controvertidos do controle externo da
atividade policial. Atuação – Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense. Florianópolis: Procuradoria Geral de Justiça e Associação Catarinense do Ministério Público, v.3, n.6, 2003.
SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Ministério Público: aspectos históricos. Jus
Navigandi, Teresina, ano 8, n. 229, 22 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4867>. Acesso em: 09 set. 2007.
THOMÉ, Ricardo Lemos. Contribuição à prática de polícia judiciária. Florianópolis: Ed. do Autor, 1997.
TOLEDO NETO, Geraldo do Amaral. O Ministério Público e o efetivo controle da atividade policial. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 55, mar. 2002. Disponível
em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2812>. Acesso em: 31 mar. 2008.
TORRES, Epitácio. Polícia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1978.
TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. São Paulo: Saraiva, 1980.
127
ANEXOS
128
ANEXO 1 – ATA DA 5ª REUNIÃO DA COMISSÃO DE ESTUDOS DO
CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL – CENTRO DE APOIO
OPERACIONAL CRIMINAL – MINISTÉRIO PÚBLICO - SC
129
ANEXO 2 – ACÓRDÃOS