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O NOVO EXODO NO DEUTERO-ISAÍAS - PARADIGMA E
ANAMNÉSIS DE SALVAÇÃO
DANIEL MARTINS SOTELO
SÂO PAULO 1996
1
RESUMO
O Dêutero-Isaías continua a seduzir os leitores e pesquisadores da ciência vetero-testamentária. Após as descobertas do século passado e deste século, a obra isaiana fascina seus leitores em muitos sentidos. O debate sobre a formação e composição do Dêutero-Isaías mostrou avanços. Mas, a discussão ainda continua, passando, principalmente: pela redação final, pelas inserções posteriores, pela formação do miolo e pela moldura dêutero-isaiana. As seções mais discutidas são: os textos sobre Ciro, o persa, e os textos sobre o Servo Sofredor. Na formação literária, a mixação, de poesia e da prosa, é constante. A construção teológica é mais forte que a histórica. O motivo do êxodo, ao qual está dedicada esta dissertação, é um tema muito importante em Dêutero-Isaías, profeta na Babilônia de 550 a 539/8 a. C. Este novo êxodo situa-se na perspectiva da promessa, da salvação. Os profetas antes do exílio anunciavam o castigo e só depois a salvação. O Dêutero-Isaías começa pela promessa. O novo êxodo é um paradigma e é anámnesis, é promessa e salvação. A recordação do antigo êxodo no Dêutero-Isaías tem a função de mostrar que este novo êxodo será muito maior, fenomenal, fantástico. É a transformação e a superação do antigo êxodo. É o que se vê em: Isaías 41,1-11; 42,16-21; 49,7-12; 51,9-14; 52,7-12; 55,12-13. Na exegese destes textos fica evidenciado que o novo êxodo no Dêutero-Isaías anuncia a promessa e a salvação. Esta promessa vem pela libertação da opressão da Babilônia, através da saída, da caminhada pelo deserto transformado e da chegada a Sião com o anúncio de que todas as nações presenciariam este acontecimento.
2
Dedico este trabalho para o Dr Milton Schwantes diretor e mentor da monografia
defendida na Faculdade Nossa Senhora da Assunção no ano de 1996.
O agradecimento também vai para este MESTRE dos mestres.
Aos membros da Banca, ao Dr Beni dos Santos que agora é bispo na grande São
Paulo e ao meu amigo ex-dominicano Domingos Zamagna por sua perspicácia e
coleguismo.
3
Dedico aos meus pais em ZAKHORIYM: Ramon Sotelo Guerra Abba e Maria
Encarnacion Rodrigues Martinez que tiverem seus nomes mudados porque não
sabiam direito o idioma português, só falavam o espanhol, e que seus nomes
foram transformados por um funcionário sem escrúpulos ou por ignorância num
cartório do interior paulista,
Aos meus irmãos que de doze restam apenas cinco mulheres e três homens,
Aos meus netos, neta e filhos, às mulheres que passaram em minha vida
amorosa.
4
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 1 O CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DE 550 A 539/8 a. C.
1.1 O ANTIGO ORIENTE E JUDÁ
1.2 A QUEDA DA ASSÍRIA EM 722 a. C.
1.3 A BATALHA DE MEGIDO
1.4 O DOMÍNIO EGÍPCIO NA ÁREA DE MEGIDO E CARQUEMIS
1.5 A PRIMEIRA DEPORTAÇÃO DOS JUDAÍTAS PARA A BABILÔNIA
1.6 A SEGUNDA DEPORTAÇÃO DOS JUDAÍTAS PARA A BABILÔNIA
1.7 AS CONSEQUENCIAS DA QUEDA DE JERUSALEM
CAPÍTULO 2 AMBIENTE SÓCIO-HISTÓRICO DO DEUTERO-ISAÍAS
2.1 OS ANTECEDENTES HISTÓRICOS
2.2. OS ANTECEDENTES DO DEUTERO-ISAÍAS
2.2.1 A história do tempo do Deutêro-Isaías
2.2.2 A mensagem do Deutêro-Isaías
2.3 A SITUAÇÃO DOS EXILADOS NA BABILÕNIA
2.4 A VIDA NO EXÍLIO
2.4.1 O trabalhador Judaita e o trabalho compulsório
2.5 O DEUTERO-ISAÍAS NO CONTEXTO BABILÔNICO
2.5.1 o Isaías da Babilônia
2.6 A QUEDA DA BABILÔNIA E O FIM DO IMPÉRIO NEOBABILÔNICO
CAPÍTULO 3 ESTRUTURA DO LIVRO DO DEUTERO-ISAÍAS
5
3.1 A FORMAÇÃO DO DEUTERO-ISAÍAS
3.1.1 A história da pesquisa do Deutêro-Isaías
3.1.1.1 O Deutêro-Isaías conforme Bernhard Duhm
3.1.1.2 O Deutêro-Isaías conforme Brevard S. Childs
3.1.1.3 O Deutêro-Isaías conforme Claus Westermann
3.1.1.4 O Deutêro-Isaías conforme Roy F. Melugin
3.1.1.5 As tradições históricas no Deutero-Isaías
3.1.1.6 Comparações entre Brevard S. Childs, Claus Westermann e Roy F.
Melugin
CAPÍTULO 4 O MOTIVO DO EXODO NO DEUTERO-ISAÍAS
4.1 OS ANTECEDENTES DO MOTIVO DO EXODO NO DEUTERO-ISAÍAS
4.2 O NOVO EXODO COMO PARADIGMA E ANAMNESIS EM DEUTERO-
ISAÍAS
4.3 O NOVO EXODO COMO SALVAÇÃO EM DEUTERO-ISAÍAS
4.4 O EXODO NO DEUTERO-ISAÍAS COMO NOVO EXODO
CAPÍTULO 5 O MOTIVO DO EXODO NOS TEXTOS DO DEUTERO-ISAÍAS
5.1. ISAÍAS 40,1-11
5.1.1 O texto em Hebraico
5.1.1.1 Tradução
5.1.1.2 Questões exegéticas
5.1.1.3 O motivo do Êxodo
5.2. ISAÍAS 43,16-21
5.2.1 O texto em Hebraico
5.2.1.1 Tradução
5.2.1.2 Questões exegéticas
5.2.1.3 O motivo do Êxodo
5.3. ISAÍAS 49,7-12
5.3.1 O texto em Hebraico
5.3.1.1 Tradução
6
5.3.1.2 Questões exegéticas
5.3.1.3 O motivo do Êxodo
5.4 ISAÍAS 51,9-14
5.4.1 O texto em Hebraico
5.4.1.1 Tradução
5.4.1.2 Questões exegéticas
5.4.1.3 O motivo do Êxodo
5.5 ISAÍAS 52,7-12
5.5.1 O texto em Hebraico
5.5.1.1 Tradução
5.5.1.2 Questões exegéticas
5.5.1.3 O motivo do Êxodo
5.6 ISAÍAS 55,12-13
5.6.1 Texto em Hebraico
5.6.1.1 Tradução
5.6.1.2 Questões exegéticas
5.6.1.3 Motivo do Êxodo
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
7
INTRODUÇÃO
O motivo do êxodo tem-se desenvolvido a contento na América
Latina, principalmente na Teologia da Libertação. Gustavo Gutiérrez1 emprega o
tema para demonstrar a hermenêutica da libertação. Não somente usa o êxodo
como também o segundo êxodo da Babilônia em sua teologia. Rubem Alves, em
sua obra, trata estes êxodos como paradigma da libertação2. Contudo, quem mais
trabalhou exegeticamente os temas do êxodo e do Servo Sofredor, dando uma
abordagem quanto à forma, ao conteúdo e à composição do Deutêro-Isaías, foi
Carlos Mesters3.
O motivo do êxodo é um tema fascinante dentre muitos temas
discutidos na obra isaiana.
O motivo do êxodo na teologia bíblica e na exegese está longe de
estar esgotado nas pesquisas do Primeiro Testamento. Faz parte de uma ampla
discussão e que muitas vezes permeia todos os níveis das teorias e das
hipóteses4 e das práticas.
A discussão continua e por certo continuará por duradouros
períodos. Sabemos, porém, de antemão, que esta idéia do êxodo ocorre tanto no
Antigo Testamento como, também, no Novo Testamento5. Num estudo
1GUTIERREZ, Gustavo. Teologia da libertação. Editora Vozes, Petrópolis, Rio de Janeiro, 1985, 5a. edição, p.130-176.2ALVES, Rubem. Cristianismo, opio o liberación. Ediciones Sígueme, Salamanca, 1973, p.54-159,180-240.3MESTERS, Carlos. A missão do povo que sofre - Os cânticos do Servo de Deus no livro do profeta Isaías. Editora Vozes/CEBI, Petrópolis, 1981, p.194.4VIRGULIN, Stefanus. O Dêutero-Isaías. in: FABRIS, Rinaldo. Problemas e perspectivas das ciências bíblicas. Edições Loyola, São Paulo, 1993, p.178-194. Ver também a obra de SARNA, Naum. Exploring Exodus, the Heritage of Biblical Israel. Schocken Books, New York, 1987, p.277.5CROATTO, José Severino. Êxodo: uma hermenêutica da liberdade. Edições Paulinas, São Paulo, 1981, p.35-73.
8
pormenorizado podemos detectar que o tema percorre toda literatura
intertestamentária; encontrando-se inserido em toda a literatura apócrifa,
pseudoepígrafe como na patrística.
O retorno dos cativos, após 538 a.C., não foi em massa, mas
devagar e aos poucos. Muitos nem retornaram. Os Judaítas começaram a fazer a
viagem de regresso, peregrinando em direção à terra prometida. O segundo
êxodo, mencionado pelo Deutêro-Isaías, fala de uma nova passagem pelo
deserto, uma nova travessia e enfim a chegada a Jerusalém. Esta idéia de êxodo
está, pois, presente, efetivamente na mensagem em vários relatos do nosso
profeta.6
Existe substancial bibliografia sobre o Deutêro-Isaías, desde autoria,
formação, composição, análise literária, temática, tradições desenvolvidas ao
longo da obra, e teologia do autor no exílio7.
A discussão em torno da obra isaiana começou no século XII d.C.
com um teólogo e filósofo judeu medieval chamado Ibn Ezra, quem colocou pela
primeira vez em dúvida a unicidade do livro de Isaías e consequentemente afirmou
a existência de vários escritores. Quatro séculos depois, em 1789, Johann
Christian Doederlin, seguindo a sugestão feita em 1873 por seu patrício Johann
Gottfried Eichhorn, inicia a teoria da separação do livro de Isaías. Passou-se a
enfatizar que o Deutêro-Isaías deveria ser separado das outras partes dos outros
Isaías. Bernhard Duhm afirmou a tese da existência das várias partes de Isaías,
como: o Isaías Segundo e o Trito-Isaías. Postulou também, que os outros textos
6Na discussão do período histórico baseio-me em algumas obras de História de Israel, como por exemplo: SOGGIN, José Alberto. Storia d’Israel. Paideia Editrice, Brescia, 1984, p.375-389; JAGERSMA, Hans. A History of Israel in the Old Testament Period. SCM Press, London, 1988, v.2, p.74-191; DONNER, Herbert. Geschichte des Volkes Israel und seiner Nachbarn. Vandenhoeck und Ruprecht, Göttingen, 1984, v.2, p.381-390 (tradução bem posterior em português por Editora Sinodal); FOHRER, Georg. História da Religião de Israel, Paulinas, São Paulo, 1984.7WIENER, Claude. Êxodo de Moisés - caminho para hoje. Edições Loyola, São Paulo, 1974, p.87-122.
9
do livro de Isaías foram elaborados e reescritos por um grupo dos discípulos de
Isaías, que passou a ser denominado de: círculo de discípulos de Isaías8.
A tese sobre a separação do livro de Isaías foi amplamente aceita
em toda a pesquisa: Isaías 1-39 foi denominado de Isaías de Jerusalém, ou
também de Primeiro Isaías; Isaías 40-55 (objeto de nossa pesquisa) foi
denominado de Deutêro-Isaías ou “Isaías Júnior” (Carlos Mesters)9 ou ainda o
Isaías da Babilônia; e por fim, Isaías 56-66 de Trito-Isaías.
Ainda hoje as descobertas de Bernhard Duhm continuam em
evidência e vigor, contudo conservadores e fundamentalistas insistem ainda na
unicidade do livro do profeta Isaías e que o profeta é o autor-escritor de toda obra.
Isto ocorre, seguidamente. Nós assumimos as posições da crítica literária, da
redação, da forma e da história, que determinou a divisão do livro do profeta
Isaías10.
Vimos que a bibliografia sobre o Deutêro-Isaías é grande. Porém, as
obras específicas sobre a temática do êxodo e o novo êxodo não são frequentes.
Numa revisão bibliográfica, é possível avaliar uma ou duas dezenas de artigos
sobre o assunto que analisam o êxodo e o novo êxodo como tipologia, simbologia
e analogia desta idéia11.
8MUILENBURG, James. The book of Isaiah 40-66. in: Interpreters Bible, v.5, Abingdon Press, Nashville, 1957, p.381-422.9MESTERS, Carlos. A missão do povo que sofre - Os cânticos do Servo de Deus no livro do profeta Isaías. Editora Vozes/CEBI, Petrópolis, 1981, p.194. Os calvinistas de origem holandesa radicados nos Estados Unidos da América editaram pela Bernhard Williams Eerdmanns de Michigan compõem a facção fundamentalista e editaram vários livros sobre o profeta Isaias, como exemplo cito: YOUNG, Eduard J. Isaiah, a commentary. Eerdmanns Publishing Company, 1965, 3vol; YOUNG, Eduard J. Studies in Isaiah. London, Tyndale, 1954; WALLIS, Oswald T. The Unity of Isaiah. Philadelphia, The Presbiterian and Reformed Publishing Company, 1950, p.170.10MELUGIN, Roy. The formation of Isaiah 40-55. Beiheft zur Zeitschrift für die alttestetamentliche Wissenschaft. v.141, Walter De Gruyter, Berlin/New York, 1976, p.77-174.11Os artigos citados na bibliografia final referem-se ao êxodo como os de: ANDERSON, Bernhard W. Exodus tipology in second Isaiah. in: Bernhard W. Anderson e Walter
10
Entende-se o novo êxodo ou segundo êxodo como uma
rememoração dos acontecimentos ocorridos no êxodo do Egito. Pensa-se que a
menção do êxodo traz a recordação dos fatos anteriores, porque tem um
determinado objetivo teológico. O Deutêro-Isaías leva o povo a recordar os
acontecimentos anteriores, trazendo à memória do povo o processo salvífico de
Javé. A bibliografia disponível induz a concluir que em determinados textos na
obra do Deutêro-Isaías se processa a recordação do Egito. Javé retirará o povo da
Babilônia. Porém, no primeiro êxodo, o líder era Moisés, aqui neste êxodo da
Babilônia o auxílio vem de um estrangeiro ungido por Javé, para retirar o seu povo
da escravidão. Logo, o novo êxodo não terá um só guia semelhante a Moisés12.
O êxodo será, conforme as narrativas dêutero-isaiânicas,
maravilhoso, espetacular e milagroso. Os prodígios serão maiores que os milagres
e as pragas no Egito. O povo não vai receber os mandamentos e sim uma nova
profissão de fé no retorno. O cântico de Miriam será substituído pelo cântico de
vitória. A salvação é iminente e mais rápida. Javé não é o guerreiro do êxodo do
Egito. No Dêutero-Isaías, Deus é o Criador e o transformador de tudo e de todas
as coisas. Na obra isaiana está inserida uma teologia da criação e da história,
para mostrar que a salvação irá acontecer para criar novas todas as coisas. O
juízo de Deus suscitará o persa Ciro, para destruir as nações escravizadoras de
Judá. O Deutêro-Isaías desdobra-se em duas partes para demonstrar as etapas
de salvação:
Harrelson. Israel’s Prophetic Heritage. Harper and Brothers, New York 1962, p.177-195; BEADUET, Roland. La Typologie de l’Exode dans le Second Isaie, Estudes Theologiques. Press de l’Universite de Laval, Quebec, 1963, p.11-21; BLEKINSOPPP, Joseph. Alcance e profundidade da tradição do êxodo no Dêutero-ISaías Is.40-55. in: Concilium, dezembro 1966 (nr.10), Livraria R.Morais, Lisboa/Recife, 1966, p.37-46.; WIENER, Claude. O Dêutero-Isaías. in: O profeta do novo êxodo. Cadernos Bíblicos, v.7, Edições Paulinas, São Paulo, 1984, 2a. edição, p.84. WIENER, Claude. Êxodo de Moisés. São Paulo, Loyola, 1974, p.148; ZIMMERLI, Walter. Il nouvo Esodo. in: Rivelazione di Dio. Editrice Jaca Book, Milano, 1975, p.175-185.12WIENER, Claude. Êxodo de Moisés. São Paulo, Loyola, 1974, p.87-122.
11
a) Javé é o Todo-Poderoso para conceder a seu povo regresso à sua
terra - Is 40-48.
b) A nova fase será a de reconstrução da terra - Is 49-55.
A salvação de Judá não significa apenas o fim da escravidão, mas
também o perdão da culpa. A bondade de Javé é a manutenção da aliança e da
promessa do povo de Deus (Is, 40,1, 48,8; 43,1).
O presente trabalho foi conduzido visando, através de uma análise
dos textos, reler e reinterpretar o motivo do êxodo em Deutêro-Isaías. Este motivo
insere-se num contexto maior da teologia do Deutêro-Isaías: o êxodo como motivo
da teologia da salvação. O alvo do trabalho é o tema do êxodo, mas pretendemos
também demonstrar que o novo êxodo é uma teologia da salvação.
CAPÍTULO 1 O CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DE 550 a.C. a 539/8 a. C.
12
A situação deste período mostra que, por onde o dominador
Nabucodonosor passou, houve destruição de Jerusalém, houve desolação no
templo. O povo que ainda acreditava e tinha alguma esperança na não conquista
por parte dos invasores desesperou. Infelizmente existem poucos documentos que
comprovam certos pormenores. Mas, para o período que prenuncia a invasão e a
destruição por parte da Babilônia, em Jerusalém há registros de tais
acontecimentos.
Os anos difíceis de 609, 597 e 587/6 a.C. são descritos de formas
diferentes tanto no Antigo Testamento em 2 Reis 24 e 25 como em Jeremias e
Lamentações; nas crônicas babilônicas e em alguns óstracas - material epigráfico
em hebraico - e em alguns selos13. Os conflitos na política e em vários setores da
vida pública e religiosa afloraram em Jerusalém. A luta pelo poder foi imensa.
Assim, alguns grupos tentaram a resistência contra a Babilônia e até organizaram
a insurreição. Enquanto que, outro grupo aceitava a dominação estrangeira,
gerando a partir daí uma luta entre os próprios Judaítas. O profeta Jeremias
iniciou a luta com o anúncio da pregação em 627 a.C.. Falava dos presságios de
catástrofe que o povo não conseguia enxergar. Este discurso rendeu-lhe a
denominação de: Jeremias, o profeta do desastre (Jr 7,15).
O rei Joaquim iniciou seu reinado em 609 a 598 a.C., vivenciando a
ebulição e mudanças no seu reinado, provocadas pela dominação egípcia e a
ameaça babilônica. Em 605 a.C., o rei se livra da ameaça e da guerra egípcio-
babilônica em Carquemis e no Eufrates. Nabucodonosor foi herdeiro natural de
Nabopolassar quem derrotou o egípcio Neco. Estes fatos retratam o contexto da
época e encontram-se registrados em Jr 46,2 e nas crônicas dos reis babilônicos
durante os reinados de Nabopolassar e Nabucodonosor14.
13TADMOR, Haim. Época del Primer Templo, el cautiverio babilónico y la restauración. in: Haim H. Ben Sasson. História del pueblo judío. V.1, Alianza Editorial Madrid, 1988, p.186-200.14PRITCHARD, James. La sabiduría del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Barcelona, 1966, p.239-243.
13
1.1 O ANTIGO ORIENTE E JUDÁ
O Antigo Oriente próximo sofre profundas transformações ao passar
de uma conjuntura política implantada pelo Império Assírio ao domínio do Império
Babilônico, refletindo-se na economia e arrecadação de impostos e tributos que
eram feitos pelos assírios pessoalmente. Os babilônios colocam seus
governadores e pessoal especializado para fazer a arrecadação. Na implantação
da dominação dos povos, os assírios faziam a transmutação de populares de um
local para o outro para dificultar as fugas e as reorganizações. Os babilônios
localizavam as populações de diferentes nacionalidades num mesmo local e
separavam os especialistas para realizarem seus trabalhos nas cidades e suas
construções, nas irrigações, nas plantações, ruas e estradas. No caso dos
judaítas, eles foram levados as pessoas pertencentes à elite de Jerusalém.
Neste ambiente histórico da época, Judá está reduzida e dominada.
O reino do norte, Israel, havia sido dominado e destruído pelas várias incursões
assírias. O reino do sul, Judá, vivia em clima de tensão e de apreensão em função
da situação da ameaça da política reinante em seus domínios e ao seu redor.
Sabia-se que a qualquer momento Judá podia ser invadida e conquistada.
Nabucodonosor II estava rondando os domínios na vizinhança, e já havia
dominado locais estratégicos próximos. Inclusive havia afugentado o Egito e
lutado na batalha de Carquemis. A Assíria estava sob o domínio babilônico desde
605-56l a.C. Joaquim e posteriormente Zedequias procurou apoio no Egito com
desaprovação dos profetas que viram a eminente invasão e dominação. Os reis
que se apoiaram em aliados contra a Babilônia viram Jerusalém ser sitiada em
597 a.C. e ser conquistada em 587/6 a.C. Para melhor compreensão deste
período, é necessário conhecer um pouco da vizinhança de Judá.
14
1.2 A QUEDA DA ASSÍRIA EM 722 a.C.
O Império Assírio começa a desmoronar e sucumbe perante a sua
própria grandeza. Na Babilônia, as revoltas e lutas pelo poder favorecem a
ascensão de Nabucodonosor II ao trono. Na mesma situação o maior inimigo da
Babilônia, o Egito, surge em plena recuperação, e também como inimigo da
Assíria. A XXª Dinastia assume o poder no Egito no período de 660 a.C., sob a
influência de psaméticos.
Apesar desta efervescência política no Antigo Oriente Próximo, com
a mudança de poder no Egito e na Assíria, a mudança de vassalos só ocorre em
650 a.C.. As tropas assírias deixam o Egito sossegado, e este invade o antigo
território da Filistéia. Isto parece coincidir exatamente com uma invasão dos
assírios na Síria e Sidônia.
No período de 626 a.C., a revolta na Babilônia contra a Assíria surte
algum efeito positivo. O caldeu Nabopolassar assume o poder e faz uma aliança
importante com os medos, contudo ainda não ocorre o final do poder da Assíria. O
sumo sacerdote de Haran, Assur-Ubalit II, é proclamado rei da Assíria e se
mantém a duras penas, por pouco tempo, como governador de Nínive em 610-609
a.C.
O Egito, por sua vez, permanece aliado da Assíria até o fim das
intempéries. Assur-Ubalit II, depois da queda de Haran em 610 a.C., recebe apoio
do Faraó Neco, com armas, com a brigada egípcia e um exército formado por
mercenários estrangeiros. O resto da tropa de Assur-Ubalit II tenta resistir e
reconquistar Haran, mas cai fulminado diante do poderio das tropas babilônicas.
Em 608 a.C., o faraó Neco faz uma campanha na Palestina e o rei Josias de Judá
morre neste confronto em oposição feita na batalha de Megido.
15
Desta forma o império assírio chega ao fim. O faraó Neco está
enfraquecido devido às batalhas anteriores e aos auxílios prestados aos seus
aliados. Judá começa a pagar tributos em forma de impostos aos egípcios,
cobrados pelas alianças efetuadas com seus vizinhos em troca da proteção
recebida.
1.3 A BATALHA DE MEGIDO
Megido é um ponto de ligação de dois caminhos: o primeiro vai de
Siquém a Hazor e o outro de Acco, Hazor a Damasco. A cidade é um interposto
na rota comercial. Este caminho depois dos importantes que começam no Golfo
de Ácaba, dirige-se a Damasco, passando pelas serras da Transjordânia. Megido
é uma cidade que faz encruzilhada destes caminhos e destas rotas comerciais e
ponto estratégico.
Na batalha de Megido o rei Josias se defronta com o rei faraó Neco.
Esta batalha teve conseqüências importantes para a vida posterior em Judá. Após
a queda de Haran, o faraó Neco se lança ao ataque na Palestina e no Eufrates.
Ele se utiliza da via das caravanas comerciais da Cisjordânia. Esta rota comercial
é a antiga estrada para se chegar aos locais de comércio da época. No meio desta
rota ficava a principal cidade-estado das caravanas que era Megido. Neste local, o
rei Josias de Judá foi se defrontar com o faraó Neco na batalha que resultou em
sua derrota e morte e no pagamento de tributos aos egípcios (confira 2 Reis
23,29). Megido tornou-se a base militar avançada e de apoio para o Egito. De lá
os egípcios controlavam a situação política e a arrecadação de impostos15.
15SCHWANTES, Milton. História de Israel local e origens. Polígrafo, v.7, fasc.1, Comissão de Publicações da Faculdade de Teologia da IECLB, São Leopoldo, 1984, p.25-28. Ver também TADMOR, Haim. The period of the first Temple, the Babylonian Exile and the Restoration. in: H. H. Sasson. A History of the Jewish People. Weidenfeld and Nicholson / Dvir Publishing House, London/Tel Aviv, 1969/1976, p.91-182.
16
Embora os relatos da batalha de Megido permitam visualizar a
amplitude do conflito, ficam questões como: por que Josias entra em conflito com
faraó Neco? Por que o Antigo Testamento se refere pouco a este fato? Seria a
influência profética pró-babilônica? Ou seria influência do rei Josias na redação
dos livros do Antigo Testamento? As questões não são devidamente comentadas
no Antigo Testamento.
Josias via no confronto entre os Egípcios e os Babilônicos a
superioridade do poder babilônico. Acreditava que não seria incomodado pelos
egípcios. Pensava que os babilônios, vencendo os egípcios, ficariam livres do
incômodo do pagamento dos impostos aos egípcios. Desta forma livre e
independente, Judá estaria com a paz garantida, como o profeta Jeremias
predissera (Jr 24). O rei Josias não atendeu o profeta Jeremias e seu anúncio do
perigo de retaliações. Apesar de o profeta mostrar esta situação, ele, contudo, não
atentou para a ameaça egípcia. Não atendeu a seu apelo e a sua repreensão.
Josias foi defrontá-lo em Megido. Nesta “batalha” o rei de Judá morre (2 Rs
23,29).
Neco parte depois para Carquemis e novas conquistas. Carquemis
era um grande centro econômico neste período, localizado ao norte da Assíria.
Começa, então, o avanço da Babilônia e suas conquistas na Palestina em
confronto com o Egito.
1.4 O DOMÍNIO EGÍPCIO NA ÁREA DE MEGIDO E DE CARQUEMIS
O Egito tinha certo controle sócio-econômico nesta região, em função
de suas bases militares e de arrecadação de tributos nas cidades de Megido e de
Carquemis. Neco parte para o leste em direção ao crescente fértil. Encontra e se
confronta com os babilônios que vem para a Palestina. Nesta luta e na
demonstração de poder por parte dos dois impérios nenhum dos dois sai
17
vencedor, nesta ocasião. Neco não consegue conquistar Haran dos assírios. Esta
cidade mais tarde entrará em colapso e será dominada pelos babilônios. 16
O faraó Neco firmou seus pés sobre a Síria e também na região de
Canaã. Existem inscrições a este respeito em textos egípcios17. O Egito chegou a
governar a Fenícia e Judá por breve tempo18.
Após a morte de Josias, Jeoacaz assume o poder em Judá e se
torna rei (2 Rs 23,30). Jeoacaz não é o filho mais velho do rei Josias para assumir
o trono de Judá. Jeoacaz permanece no poder apenas por três meses (609/8) e o
faraó Neco em sua campanha na Palestina submete-o em Ribla e o deporta para
o Egito. Jr 22,10-22 fala destas injustiças e da reação dos judaítas a essa
vassalagem e que o rei Salum (Jeoacaz) não retornaria a Judá. O faraó entroniza
outro e muda seu nome para Jeoaquim (2 Rs 23,31-34). Neste tempo, o faraó
Neco submete todas as cidades-estado, próximas de seus vassalos, Amarna e
algumas cidades de Judá.
1.5 A PRIMEIRA DEPORTAÇÃO DOS JUDAÍTAS PARA A BABILÔNIA
A primeira deportação ocorreu em 597 a.C., quando Nabucodonosor
estava diante das portas de Jerusalém. Joaquim havia resistido e vai para o
cativeiro com a primeira leva de judaítas para a Babilônia. Ele foi rei de Judá por
três meses apenas em 587 a.C. Nabucodonosor nomeia em seu lugar o tio
Matanias, que governa em Judá por onze anos: 598/7-587/6 a.C.19
16TADMOR, Haim. Época del templo, el cautivero babilónico y la restauración. In: SASSON, H.H.Ben. Historia del pueblo judío. v.1, Alianza Editorial, Madrid, 1988, p.186-200.17WILSON, John A. Textos históricos egípcios. In; PRITCHARD, James (editor). La sabiduría del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Barcelona, 1968, p.239-243.18PRITCHARD, James. Op. cit., p. 239-243.19PRITCHARD, James. La sabiduría del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Barcelona/Madrid, 1966, p.239-243.
18
Os anais babilônicos20 mostram que Nabucodonosor, além de
colocar outro rei em Judá, levou prisioneiros judaítas para a Babilônia. Os
prisioneiros faziam parte da casa real e da elite jerusalimitana. Joaquim
permanece prisioneiro na Babilônia. Em 2 Rs 25,27-30 e Jr 52,31-34 se vê que o
rei permaneceu prisioneiro por trinta e sete anos. Foi perdoado por Evil-Merodac,
o sucessor de Nabucodonosor em 561-560 a.C..
Nabucodonosor, além de levar os cativos da casa real, transportou
vários especialistas como: funcionários do estado e do templo, artesãos, ourives e
milícia. Ele também levou todos os tesouros do templo e do palácio real para esta
terra distante (2 Rs 24,13). Nesta leva inclui-se o sacerdote Ezequiel (Ez 1,1-3)
que se torna profeta em terra estranha. Jr 52,28 se refere a três mil e vinte e três
cativos, enquanto que 2 Rs 24,16 fala de dez mil prisioneiros. Mesmo não sendo
possível especificar com exatidão os dados disponíveis, o número de prisioneiros
deve ter sido elevado.
Os desacordos sobre os números de deportados são enormes.
Também não há unanimidade sobre as datas em que Jerusalém caiu nas mãos
dos babilônios, podendo ter ocorrido no verão de 587 a.C. ou ainda no verão de
586 a.C.. Como o sistema cronológico babilônico difere da forma cronológica
judaíta, as tentativas de precisar datas absolutas tornam-se questionáveis.
Jeremias e Ezequiel datam alguns eventos em conexão com o cativeiro de
Jeoaquim (Ez 33,21) ou com relação aos reinados dos reis babilônicos (2 Rs 25,8;
Jr 52,12). Assim se dá a queda final de Jerusalém e o início do cativeiro na
Babilônia.
1.6 A SEGUNDA DEPORTAÇÃO DOS JUDAÍTAS PARA A BABILÔNIA21
20 JAGERSMA, Hans. Op. cit., p.203-221.21 JAGERSMA, Hans. Op. cit., p.203-221.
19
O cativeiro na Babilônia a partir de 586 a.C. passa a ser uma
realidade dura na vida dos exilados. Esta realidade reflete-se em vários níveis na
vida dos judaítas. Este cativeiro vai se prolongar por quase meio século. A
adaptação no exílio vai ser difícil, o trabalho duro, o serviço a Javé e o culto são,
em grande parte, abandonados. Vão ocorrer mudança e evolução da língua. A
conservação da língua por escrito vai determinar os aspectos da vida do exilado.
Neste período de exílio a remodelação da vida e a criação de novas
formas religiosas sofrem a influência e o sincretismo dos babilônios. Serão
preponderantes tanto na criação literária dos judaítas como na forma religiosa.
Surge a preocupação pela história da vida do povo, a criação de uma teologia, a
recopilação da história do próprio povo. Em certo sentido, o exílio auxiliou na
criação literária, na preservação dos ritos e dos cultos.
Existem registros destas preocupações no Antigo Testamento como
em 2 Rs 25. A obra literária começava por enfocar os próprios acontecimentos do
povo. Assim, a criação da obra historiográfica deuteronômica é um sinal desta
preocupação. Sabemos também muita coisa do exílio pela obra dos profetas como
é o caso do profeta Jeremias e do escrito de Lamentações e de Salmos. As
narrativas proféticas que mais tratam destes acontecimentos são do profeta
Ezequiel que atuou na própria Babilônia.
Tanto Ezequiel como o Dêutero-Isaías são os profetas no exílio.
Contudo, os textos mais explícitos sobre o exílio se encontram na obra do profeta
em questão: o Dêutero-Isaías (Is 40-55) que atua especificamente no período de
550-529 a.C.
1.7 AS CONSEQÜÊNCIAS DA QUEDA DE JERUSALÉM
20
Fica difícil demonstrar e estimar as conseqüências da queda de
Jerusalém e o fim do Estado judaíta. O fim da dinastia davídica tem
conseqüências trágicas, pois a falta de sua ideologia muito bem organizada cria
problemas para a reorganização da vida jerusalimitana. A dinastia se tinha
enraizado, a figura de Davi permanecia indelével presente na esperança de
reorganização da vida em Judá. A esperança da vinda do tempo de salvação
estava inculcada no pensamento e na ideologia davídica.
A perda de identidade e de independência trouxe marcas
insuperáveis para a vida do povo que permaneceu em Judá. Os babilônicos, ao
contrário dos assírios, tinham outro método e prática de deportação dos
conquistados. As transposições de grupos étnicos feitos pelos assírios são
abandonadas pelos babilônicos. Na Babilônia os grupos permanecem juntos e em
coesão trabalham e mantém a identidade. Na Assíria, se misturava os grupos para
dificultar a reorganização da vida pessoal e étnica.
Os exilados na Babilônia refazem a sua vida. Eles se reorganizam e
inclusive reescrevem a história do povo. Existe um florescimento literário, ritual e
cultual. Observa-se o surgimento de blocos literários do Antigo Testamento e das
releituras de vários textos do Antigo Testamento neste período. A mudança do
pensamento profético é organizada neste período. A mudança do pensamento
profético também ocorre na Babilônia com o Dêutero-Isaías.
Nos profetas anteriores como Isaías, Amós e Miquéias, a mensagem
ainda é de condenação pelo pecado cometido e o exílio é o pagamento deste
pecado. Enquanto isso Ezequiel e o Dêutero-Isaías já falam de salvação e não de
condenação de Javé. Os períodos que vão da deportação até a época do
livramento com o persa Ciro são de suma importância para a vida dos exilados em
Judá. Como eles sobreviveram à catástrofe, houve o tempo necessário para a
reorganização da vida coletiva em Judá. Ocorre a organização até a fraca
independência política e a preservação da identidade do povo. Os dois profetas,
21
Ezequiel e o Dêutero-Isaías, mostram a evolução teológica e literária, o retorno à
história e à religião do exilado em Judá.
CAPÍTULO 2 O AMBIENTE SÓCIO-HISTÓRICO DO DÊUTERO - ISAÍAS
Este capítulo discorre sobre o período de 550 a.C., fazendo uma
aproximação ao ambiente sócio-histórico de Dêutero-Isaías. Para uma perfeita e
22
necessária compreensão necessária se torna a esboçar a situação decorrente
deste período de 550 a.C., em relação ao período das deportações dos exilados
para a Babilônia, essencialmente as deportações de 597 e de 587/6. Queremos
determinar os judaítas que foram deportados nestes períodos. Para onde foram os
deportados, como viviam, como trabalhavam e como era o Império babilônico
neste período? Como ocorreu o declínio deste Império e como deu início ao novo
império persa e sua ascensão?22
2.1 OS ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Passaram-se vários períodos de altos e baixos desde a ascensão e
sucessão ao trono de Salomão e seu modo de expandir o seu território. Os
problemas causados por sua política expansionista provocaram um clima de
revanche por parte de seus vizinhos. A política continuada de seus sucessores de
taxação e de tributarismo e bitributarismo levaram a um enfraquecimento da
população em suas reservas e na produção de bens. No comércio e no campo
houve um empobrecimento que foi culminar na dominação dos citadinos sobre os
campesinos.
Os sucessores de Salomão provocaram a divisão do reino do Norte
com a capital em Samaria e o Reino do Sul com o governo de Jerusalém. Mesmo
com as ideologias de “reforma”, ocorridas no período de Ezequias e Josias, a
situação de dominação sócio-política continuou. Mesmo no período de opressão
assíria e suas formas de imperialismo, não se suscitou mudança nos governos do
22 Esta situação é pouco desenvolvida em algumas obras da História de Israel, como: BRIGHT, John. História de Israel. Edições Paulinas, São Paulo, 1981, 2a. edição, p.436-505; AHLSTROM, Gösta. The History of Ancient Palestine. Fortress Press, Minneapolis, 1993, p.741-812; HAYES, John H. e HOOKER, Paul K. A new chronology for the kings of Israel and Judah. John Knox Press, Atlanta, 1988, p.85-98.
23
Norte e do Sul. Após a destruição do Norte e com a invasão dos Assírios, o Sul
continuou com sua política tributária enfraquecendo o povo.23
2.2 OS ANTECEDENTES DO DÊUTERO-ISAÍAS
James Muilenburg24 desenvolve a situação histórica deste período
como sendo importante para entender o pensamento e a atividade do Dêutero-
Isaías. Conforme este autor, por trás do pensamento do profeta está implícita a
história da aliança e da promessa davídica, a tradição de Sião e outras tradições
como a própria história do Antigo Oriente Próximo. Isto fica evidente quando o
profeta menciona e reelaboram as leituras das tradições do Antigo Israel, como a
tradição de Abraão e a queda das nações (Assíria, do Egito, de Jerusalém e da
Babilônia). Contudo o profeta destaca o surgimento de um novo império que traria
benefícios para o povo escolhido.
Os acontecimentos históricos deste período podem ser esboçados
da seguinte maneira: a morte do último rei da Assíria em 613 a.C. e a invasão e
destruição de Jerusalém por Nabucodonosor II, o maior rei da Babilônia em 587/6
a.C.. Na seqüência reina Nabonides até a queda da Babilônia em 538 a.C.,
quando surge o novo império persa com o rei Ciro.
2.2.1 A HISTÓRIA DO TEMPO DO DÊUTERO-ISAÍAS
23 BRIGHT, John. História de Israel. Edições Paulinas, São Paulo, 1981, p.436-440.24 MUILENBURG, James. The Book of Isaiah 40-66. In: Interpreters Bible, v.5. Abingdon Press, Nashville, 1957, p.381-422; MILLER, John Maxwell e HAYES, John H. A history of Ancient Israel and Judah. SCM Press, London, 1986, p.416-437; NORTH, Martin. Historia de Israel. Ediciones Garriga, Barcelona, 1966, p.237-273; FOHRER, Georg. Storia d’Israele. Paideia Editrice, Brescia, 1980, p.201-231.
24
Claus Westermann inicia seu “Isaías 40-66 a commentary”25,
narrando a situação histórica deste período. O tempo da atividade do Dêutero-
Isaías situa-se entre a queda e a destruição de Jerusalém em 587/6 a.C., até a
queda da Babilônia e seu império em 539 a.C. As partes mais evidentes de sua
mensagem coincidem com o fim deste período, provavelmente em torno de 550
a.C., ano em que começam as campanhas vitoriosas de Ciro, o persa. Outro autor
como Joaquim Begrich, mostra que o Deutêro-Isaías pode ser fixado nestas datas,
por diferentes estágios de sua mensagem, contudo, para Claus Westermann, isto
pode ser duvidoso. Pois para Claus Westermann, o conteúdo dos capítulos 40-55
mostra que a atividade deste se estende por longo tempo, talvez por várias
décadas. Os esboços destes eventos políticos neste período são bem conhecidos,
diferentes dos resultados apresentados por Brevard S. Childs.
Para este período histórico, Claus Westermann mostra que o império
babilônico somente permaneceu forte enquanto Nabucodonosor II esteve no poder
de 604 a 562 a.C. Depois da destruição de Jerusalém em 587/6 a.C. e da
destruição de Tiro em 585 a.C., o império enfraqueceu e só após treze anos de
investimento na região, consegue alguns bons resultados. O profeta Jeremias
52,30 mostra que a Babilônia fez campanhas posteriores contra Judá, fazendo
deportações, fato este registrado no Antigo Testamento. Em 586 a.C., marcha
contra o Egito. A Babilônia enfraquece com a morte de Nabucodonosor II e com a
ascensão de Nabonides, o último rei da Babilônia em 556-539 a.C.
As mudanças no trono da Babilônia pioram a situação. Nabonides
era descendente de sacerdote devoto da deusa Lua SIN. Restaura o templo em
Haran, luta contra o poderoso sacerdote de Marduk na Babilônia. Todos estes
procedimentos corroboram para que a Babilônia caia cada vez mais. Nabonides
fez de Tema, no deserto árabe, a sua capital e permanece no trono por oito anos,
nos quais seu filho Sheshbazzar assume o poder na verdade.
25 WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66 a commentary. Westminster Press, Philadelphia, 1969, p.16-17.
25
No reino da Média, um reino rival da Babilônia, Afaxares tem o poder
e faz de Ecbatana sua capital. Seu reino se estende de Halys até a fronteira com a
Lídia. Seu filho, o sacerdote Astyages, em 585-550 a.C., se torna vassalo de Ciro,
o rei persa, em Ashan. Em 550 a.C., Ciro conquista Ecbatana, e se torna rei de
toda esta região. Em 546 a.C., Ciro conquista Sardis e Lídia e o Deutêro-Isaías
parece aludir a tais fatos em Isaías 41,2-3 e em 45,1-3. Algum tempo depois a
Babilônia faz um pacto com a Lídia e com o Egito. No cilindro de Ciro há indícios
que tanto o sacerdote de Marduk como alguns textos babilônicos aludem à
invasão de Ciro como sendo uma ação libertadora26.
Porém em 539 a.C., as tropas de Ciro aportam nas entradas da
cidade da Babilônia e o império babilônico “todo-poderoso” cai por terra (Is 47 e Jr
50-51). O Império Persa assume o poder, e se torna senhor de todo o Antigo
Oriente Próximo. Assim demarca a ascensão do império babilônico e atuação de
um profeta: o Deutêro-Isaías.
Judá durante o exílio é mostrado no Deutêro-Isaías através dos
eventos mundiais, os quais são atestados por seus textos e muitos outros textos
de profetas como Ezequiel e Jeremias. Durante o exílio, o profeta Jeremias
(52,28-30) refere-se ao número de exilados como sendo quatro mil e seiscentos
prisioneiros, não incluídas mulheres e crianças. Outros números são citados em
outros textos com doze mil ou ainda quinze mil, que podem constituir um número
simbólico.
Entretanto o exílio a tradição oral vai dar lugar para a tradição escrita,
a língua passa por mudança e evoluções, o serviço na sinagoga tem o seu espaço
vital.
Considerando as poucas referências específicas sobre o profeta
Deutêro-Isaías, quanto à sua pessoa, seu nome, Claus Westermann, com seus
26 PRITCHARD, James. La sabiduría del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Barcelona, 1969, p.243-246.
26
estudos, contribuiu muito para um maior conhecimento do profeta Isaías. No
prólogo do livro, em 40,6-7, há uma revelação sobre o chamado, o tempo de
duração e atuação do profeta, mostrando, ainda, que ele constitui parte da
descendência profética pré-exílica.
O Dêutero-Isaías se identifica como profeta do povo, chamado para
pregar através de seu próprio lamento. A queda de uma nação tem como
resultado o pecado do povo e a salvação dos exilados como promessa divina. Os
que vão ao exílio pertencem aos sobreviventes que conhecerão a justiça divina. A
insistência do Dêutero-Isaías na solidariedade com seu povo é muito importante
para compreender o próprio Dêutero-Isaías.
Em sua mensagem, em sua pregação mostra que foi colocada a
palavra de Javé em sua boca. Deixa claro que é o próprio Javé que está falando
no lugar dele, isto não ocorre nos profetas anteriores.
O clamor do Dêutero-Isaías também tem suas repercussões no
cânon do Antigo Testamento. O Salmo 90 tem como base Is 40,7. A linguagem
característica do Dêutero-Isaías é a ligação da sua profecia com as afinidades do
livro. A familiaridade do profeta com os Salmos é muito grande. O serviço de
adoração dos exilados pode ser visto neste caso. A semelhança dele com o
profeta Ezequiel, que usou o sacerdócio em sua proclamação, são muito grandes.
O Dêutero-Isaías está, também, conectado com os cantores do templo, com o
meio cultual, com o povo em sua vida e com os Salmos.
2.2.2 A MENSAGEM DO DÊUTERO-ISAÍAS
A mensagem do Dêutero-Isaías representa a profecia vivida durante
o exílio na Babilônia. O principal objetivo da profecia do Dêutero-Isaías é a
27
salvação. A queda de Jerusalém é fruto do juízo de Javé. A característica
marcante do Dêutero-Isaías consiste no anúncio da salvação. O profeta foi
comissionado para falar a palavra de Deus após o julgamento numa situação
particular, na qual esta é a palavra de Deus.
O centro da mensagem do Dêutero-Isaías é, pois, o oráculo de
salvação ou a promessa desta. O grito de lamento: “Não tenhais medo” tem como
base a promessa divina da graça dada em resposta ao lamento individual. A
proclamação de salvação vem complementar o lamento. Algumas vezes isto se
encontra associado à promessa da salvação. Outras vezes o Dêutero-Isaías fala
da mensagem de salvação na linguagem do Salmo de Louvor. O oráculo
concernente a Ciro (Is 45,1-8; 45,13). Que é o suporte de todo o livro está
totalmente relacionado com a mensagem de salvação. Javé é mostrada como o
único Deus apesar do desastre do povo escolhido de 586 a.C. No oráculo contra a
Babilônia em 46,1; 47 são evidenciadas a queda dos deuses da Babilônia. Existe
um hino de louvor, o que significa o cumprimento da proclamação de salvação (Is
7).
Portanto, a forma das palavras de salvação do Dêutero-Isaías
constitui a promessa ou o oráculo de salvação. A palavra de salvação recebe sua
forma peculiar na sua origem no culto. Conforme colocado por Joachim Begrich27,
o oráculo de salvação no Dêutero-Isaías é um oráculo sacerdotal de salvação. A
resposta comunicada pelo sacerdote no lamento individual é também a promessa
de salvação. O sacerdote garante que Deus ouviu as súplicas do povo ou do
indivíduo. A proclamação do Dêutero-Isaías muda do juízo para a salvação que
vai ser cumprida de fato. O Dêutero-Isaías é, portanto um evangelho é a alegria
manifestada. Os exilados retornarão. Isso ocorrerá numa exultação e num regozijo
para os indivíduos, as nações, os desertos e todos os habitantes. Haverá alegria
para os que estão nos lugares ermos e desabitados, nas montanhas e para as
27 BEGRICH, Joachim. Studien zu Deuterojesaja. Christian Kaiser Verlag, München, Theolhische Bücherei, v.20, 1963, p.153-160.
28
árvores. Todos se alegrarão. A proclamação de salvação não é endereçada a um
indivíduo somente. Notamos, então, que a salvação é para o exilado.
2.3 A SITUAÇÃO DOS EXILADOS NA BABILÔNIA
A situação dos exilados não é muito conhecida. Os judaítas
permanecem assentados na Babilônia em locais e bases de trabalho. Na realidade
não são prisioneiros, mas estão livres a serviço do governo babilônico nestas
localidades. Alguns textos do Antigo Testamento nos dão a idéia sobre a vida
destes exilados, como os locais onde eles permanecem e vivem. O rio Quebar e
Tel Abib é mencionado em Ez 1,3; 3,15. Outros locais referidos são: Tel-Melah,
Tel-Harsa, Querbu, Adan e Immer mencionados em Esd 2,59; Ne 7,16. Algumas
informações são dadas pelos próprios babilônicos28. Nomes judaicos e javistas
mostram que a presença judaíta era uma realidade na Babilônia. Ez 40-48 mostra
que a visão do novo templo juntamente com o Sl 137,5 designa o retorno e a
presença destes exilados nestes locais.
Muitos judaítas que prosperaram nem retornariam à pátria, adotando
o exílio como novo local de vida. Fontes babilônicas confirmam que os judaítas
obtiveram boa posição no comércio e no trabalho. Arquivos de Nippur mostram
nomes judaítas que vieram a fazer grandes e importantes negócios na Babilônia29.
Muitos exilados permaneceriam nestes locais.
Outros fatores marcaram a vida do exilado: a criação da instituição
do sábado, a recordação das antigas tradições e das leis de Lv 19,3, que tratam
dos anciãos, também é desta época. A vida religiosa não está muito clara. A
28 PRITCHARD, James. La sabiduría del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Barcelona, 1969, p.221-222.29 idem, p. 221-222.
29
prática religiosa deve ter sofrido uma influência sincretista. Criam-se as sinagogas
e outras formas de adoração.
2.4 A VIDA NO EXÍLIO DA BABILÔNIA
A vida no exílio foi intensa. Os exilados numa nova situação vivencial
passam por sérios problemas de adaptação em terra estranha. A saudade e a
rememoração dos fatos ocorridos em Jerusalém e no desterro transformam os
exilados em nostálgicos por excelência. O Sl 137 demonstra isto: a frustração e a
esperança na salvação futura.
Evidentemente, a cultura, a religião, as idéias se mesclam e são
influenciadas pelos babilônicos. Na esfera cultural isso se nota na literatura e na
historiografia. Exemplos nós temos nas histórias do dilúvio e da criação de pessoa
e do mundo que influenciaram na construção das imagens no Antigo Testamento.
Gn 1,1-2,4a que trata da criação é um relato influenciado por narrativas
babilônicas.
Nas atividades literárias as influências mais marcantes estão na obra
literária do escrito sacerdotal. Também o código de santidade em Lv 17-26 e as
suas afinidades com o profeta Ezequiel pode ser observado. A formulação de um
novo ritual, de formas sacrificiais, da adoração, e as leis sacrificais de Lv 1-7
denotam tal influxo no profeta do exílio.
Quanto à vida e ao trabalho veremos a seguir.
2.4.1 O TRABALHADOR JUDAÍTA E O TRABALHO COMPULSÓRIO
30
As crônicas babilônicas noticiam que neste período deportados eram
usados como trabalhadores30. Existia uma diferença entre o trabalhador escravo e
o compulsório. O trabalho era diferente no caso do trabalho forçado do
compulsório. Este último era praticado por cidadãos e por cativos. Eles eram
convocados em certas ocasiões anualmente para trabalharem a serviço da casa
real como: nas construções de palácios e do templo, nos serviços militares, na
guerra, nas colheitas do rei, e em outros afazeres na nação.
Nas construções de Nabucodonosor os trabalhos específicos
consistiam em construções de canais e de irrigação no período da seca e na
proteção nas enchentes. A construção de palácios para as festas e para o
descanso de verão e inverno. A residência do rei, como a residência do deus
Marduk e do templo precisavam ser mantidas. Notícias encontradas mencionam
que os jardins do palácio, as muralhas das cidades, para a proteção durante uma
invasão, foram construídos. Os babilônios se especializaram nas construções e
utilizaram o betume para as infiltrações e as casas se tornaram mais resistentes e
eficazes31.
2.5 O DÊUTERO-ISAÍAS NO CONTEXTO BABILÔNICO
O Dêutero-Isaías atuou durante o exílio, mais especificamente
durante o governo de Nabonides em 550-539 a.C.32 A sua obra está conectada
com os acontecimentos finais do império neobabilônico e a tomada da cidade da
Babilônia por Ciro. O grande problema é descrever a pessoa deste profeta
anônimo e totalmente desconhecido. Dependendo da interpretação, talvez Is 40,1-
30 D. J. WISEMAN. Nebuchadrezzar and Babylon. Oxford University Press, Oxford, 1991, 4a, edição, p.43-78.31 JAGERSMA, Hans. Op. cit., p.180-191.32 NEWSONE JR, James D. By the waters of Babylon. T&T Clark, Edinburgh, p.69-123.
31
11 ou o cântico do Servo Sofredor possam fornecer subsídios quanto à pessoa,
vida e obra do profeta. Contudo ainda não se chegou a uma unanimidade sobre a
interpretação dos Cânticos de Javé, se deve ser interpretada coletivamente ou
individual.
Sabemos que as profecias deste profeta e a escatologia são dirigidas
aos exilados da Babilônia. Os acontecimentos sociais e políticos demonstram que
suas palavras de consolo e de salvação são dirigidas a esse período. Os referidos
acontecimentos também influenciaram a sua mensagem, pregação e teologia. Is
45,1 chama o rei Ciro de escolhido. O tema essencial desta profecia é o anúncio
de que o sofrimento do povo chegará a um fim e bom termo. O poder de Deus
acabará com o cativeiro como no primeiro êxodo e guiará o povo de retorno a
Sião.
Os anúncios da salvação e do novo êxodo constituem a evidente
ação criadora de Javé. Ele anuncia a libertação e o retorno do povo da Babilônia
para Jerusalém através de atos maravilhosos, e de atitudes espetaculares: a
transformação do deserto para a passagem do povo.
2.5.1 O ISAÍAS DA BABILÔNIA 33
O Isaías da Babilônia também é denominado de Segundo Isaías ou
como Carlos Mesters prefere de Isaías Júnior34. Ele é assim chamado para
diferenciar do Primeiro-Isaías ou do Isaías de Jerusalém e do Terceiro ou Trito-
Isaías. A discussão sobre a figura e a personagem começou na Idade Média e
33 MESTERS, Carlos. A missão do povo que sofre - Os cânticos do Servo de Deus no livro do profeta Isaías. Editora Vozes, Petrópolis, 1981, p.11-22.34 PRITCHARD, James. Op. cit., p.243.
32
teve um grande incentivo a partir dos estudos de Johan G.Eichhorn em 1783. Esta
discussão não terminou35.
Este Isaías está relacionado à frustração dos judaítas, à esperança
no retorno da comunidade e à mensagem de conforto. Um escolhido de Javé
libertará o povo do exílio. Na nova administração do governo de Nabonides, os
judaítas que trabalham na Babilônia e que serviam seus dominadores viram na
escalada militar persa uma estranha forma de esperança. Não só os judaítas,
como os próprios babilônicos sacerdotes de Marduk acreditaram que Ciro traria
boas novas. Os sacerdotes, cujo culto a Marduk fora negligenciado, e os
comandantes militares e os chefes burocráticos viram nestas deslocações da
milícia persa um fim iminente do império neobabilônico. A esperança foi
reacendida em lados opostos: nos judaítas e nos sacerdotes de Marduk, que não
mais suportavam o governo e o culto estrangeiro da deusa lua Sin. Os sacerdotes
de Marduk glorificam a entrada e possessão da cidade pelo governante persa. 36
O Isaías da Babilônia traz uma mensagem de consolo. Is 40,21-26
tratam da mensagem do “Santo de Israel” em luta e contraposição com os outros
deuses. Is 41,2-4 mostram o poder de Ciro, o persa. Todos os reis e príncipes se
prostrariam diante dele. Assim, este profeta anônimo anuncia a libertação do
cativeiro babilônico, e o retorno a Sião através do deserto transformado.
2.6 A QUEDA DA BABILÔNIA E O FIM DO IMPÉRIO NEOBABILÔNICO37
O Império Babilônico em pouco tempo se tornara um grande império.
Começou a se desmoronar com a morte e luta pelo poder deixado por
35 JAGERSMA, Hans. Op. cit., p.191-192.36 DUHM, Bernhard. Das Buch Jesaja em, Goettinger Handkommentar zum Alten Testament. Goettingen, Vandenhoeck und Ruprecht, 1982, 2a. edição, p.20-28.37 Idem, p.20-28.
33
Nabucodonosor II. A dinastia não se prolongou por muito tempo. O seu filho Awil
Marduk (no Antigo Testamento é chamado de Evil Merodac) sucede-o. Este chega
a governar durante um período breve de 561-560 a.C. O genro de Nabucodonosor
II chamado Neriglissar assume o poder tirando a vida e conseqüentemente o
governo de Evil-Merodac. Neriglissar se autonomeou rei da Babilônia. Jr 39,3-13
menciona-o como um dos generais de Nabucodonosor II na destruição de
Jerusalém em 587/6 a.C. No período de seu governo, exatamente em 557 a.C.,
teve algum sucesso militar, porém logo é sucedido por seu filho Labash Marduk.
Este permanece no poder apenas três meses. Uma revolução interna coloca fim a
esta tentativa de instaurar uma nova dinastia.
Surge então no cenário Nabonides, assumindo o poder e se tornando
rei. Ele governou por um razoável período, 555-539/8 a.C., quando se encerra o
período do império neobabilônico. A mãe de Nabonides possivelmente foi
sacerdotisa da deusa da lua Sin no templo de Haran, o que lhe facilitou em muito
na ascensão ao trono. Ele mesmo encorajou ao culto a esta deusa em todo o
império durante seu governo. Isto criou certas rivalidades do governante com os
sacerdotes do deus Marduk. Foi que levou a que estes agradecessem ao seu
deus pela chegada do novo império e de um novo governante, dominando o
mundo de então: Ciro, o persa. Is 44,28 e 45,1 denotam que tanto os babilônios
como os judaítas estão agradecidos pela vinda de um novo imperador. O final do
império babilônico ocorreu em 539/8 a.C., quando a armada persa adentra as
portas da Babilônia. Não houve resistência, inclusive Ciro foi auxiliado por judaítas
e sacerdotes de Marduk para tomar o poder. Ciro é visto como o libertador: Is
45,1-3 denominam Ciro de escolhido de Javé, que libertaria o povo judaíta do
cativeiro.
34
CAPÍTULO 3 ESTRUTURA DO LIVRO DO DEUTERO-ISAÍAS
Na estrutura do livro do Dêutero-Isaías nós dedicaremos à história da
pesquisa do livro. Como é que surgiu a discussão em torno dos descobrimentos e
da separação deste livro? Como é que alguns autores específicos vêem a
35
situação atual desta obra, o período histórico, social e político da época?
Analisaremos a literatura em torno da obra e como se deu sua formação, divisão e
a atual composição que está no cânon bíblico.
3.1 A FORMAÇÃO DO DÊUTERO-ISAÍAS
3.1.1 A HISTÓRIA DA PESQUISA SOBRE O DÊUTERO-ISAÍAS
A história da pesquisa mostra que os grandes descobrimentos nas
ciências bíblicas começam no século XIX, todas envoltas pela égide do
racionalismo, com o auxílio do método histórico-crítico que trouxe uma
contribuição excepcional à interpretação bíblica. Isto auxiliou e tornou a ciência
bíblica mais eficaz. O livro do Dêutero-Isaías passou a ser o mais pesquisado.
Vejamos como se deu esta pesquisa em torno desta obra.
3.1.1.1 BERNHARD DUHM38
Na pesquisa sobre o profeta Isaías, o grande mérito cabe ao
lançamento do Comentário de Isaías de Bernhard Duhm39, em 1892. Este
comentário deu origem às descobertas sobre a composição da obra do livro de
Isaías. Bernhard Duhm foi o primeiro a separar o livro do profeta Isaías em: Isaías
de Jerusalém, que também foi denominado de Isaías histórico ou primeiro Isaías;
o Segundo Isaías, denominado de Dêutero-Isaías e o Terceiro ou Trito-Isaías. No
Dêutero-Isaías ele descobriu como unidades especiais, os Cânticos do Servo
Sofredor de Javé. Trabalhou acentuadamente na crítica literária e histórica do
Dêutero-Isaías, como nos outros Isaías, mostrando a importância desta obra.
38 BUDDE, Karl. Das Buch Jesaja Kap 40-66. Tübingen, J.C.Mohr, 1909, 3a. edição, Handkomentar zum Alten Testament, p.609-71, op. cit., in: James Muilenburg, op. cit., p.399.39 BEGRICH, Joachim. Studien zu Deuterojesaja. Christian Kaiser Verlag, München, Theologische Bücher, v.20, 1963, p.68-80.
36
Seus estudos ainda estão em evidência sem modificações depois de um século de
pesquisa.
Outro grande pesquisador ao lado de B. Duhm, o qual trouxe
notáveis contribuições à pesquisa do Dêutero-Isaías, foi Karl Budde40. Após estas
pesquisas, as grandes descobertas sobre o Dêutero-Isaías ficaram restringidas a
um pequeno círculo de estudiosos como: Joachim Begrich41 e Karl Elliger42, que
mostraram a independência do Primeiro Isaías, e a dependência do Dêutero-
Isaías em relação ao Trito-Isaías. Depois destes pesquisadores, surgem Eberhard
von Waldow43, Claus Westermann44, Roy Melugin45, Klaus Kiesow46 e outros47.
3.1.1.2 O DÊUTERO-ISAÍAS CONFORME BREVARD S. CHILDS48
Para este autor o Dêutero-Isaías faz parte de um todo. Apesar de a
crítica haver separado o livro de Isaías em três, este e outros autores continuam
considerando-o como uma unidade e um bloco de um só autor49.
40 ELLIGER, Karl. Deutero-Jesaja. In: Seine Verhältnisse zu Tritojesaja. Em Berträge zur Wissenschaft Alten und Neuen Testament, v.11, 1933, p.109-213.41 WALDOW, Eberhard von. The message of Deutero-Isaias. In: Interpretation, 221 (1968), p.259-87.42 WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-48 a Commentary. In: Old Testament Library, Westminster Press, Philadelphia, 1969, p.3-30.43 MELUGIN, Roy F. The formation of Isaiah 40-55. Walter der Gruyter, Berlin/New York, em Beiheft zur Zeitshrift für die Altestamentliche Wissenschaft, 1976, p.141.44 KIESOW, Klaus. Exodutexte in Jesajabuch. Literankritische und motivgeschichtlische Analysen. Orbis Biblicas et Orientalis, v.24, Universitätsverlag Freiburg / Vandenhoeck und Ruprecht, Freiburg/Goettingen, 1979, p.13-175.45 Para a história da pesquisa da ciência bíblica pesquisei a obra de: KRAUS, Hans Joachim. Geschichte der historich kritischen erfoschung des Alten Testament. Neukirchen Vluyn, Neukirchen, 1969, p.193-327.46 Para a outra parte sobre o Dêutero-Isaías consultei a obra de CHILDS, Brevard S. Introduction to the Old Testament as Scriptures. Fortress Press, Philadelphia, 1989, 6a. edição, p.311-333 e sua mais recente obra: CHILDS, Brevard. Biblical theology of the Old and the New Testament. Fortress Press, Philadelphia, 1992, p.162-167.47 CHILDS, Brevard S. op. cit., p.325-330.48 CHILDS, Brevard S. op. cit., p.325.49 CHILDS, Brevard S. op. cit., p.321-22.
37
Brevard S. Childs analisando outros autores, tanto católicos como
protestantes conservadores ou não, mostrou a reação dos mesmos quanto à
divisão da obra isaiana. Os autores conservadores se apegam em determinados
fundamentos para mostrar a indivisibilidade da obra de Isaías:
a - O contexto literário do atual livro de Isaías atribui a totalidade do
livro ao próprio profeta Isaías. A tradição apóia e atribui a autoria ao profeta. Esta
ênfase está relacionada à afirmação de autoridades rabínicas, do Novo
Testamento e do período patrístico.
b - Estes autores afirmam a similaridade da linguagem e do estilo, e
insistem em que vários conceitos sustentam a autoria e a unidade da obra literária.
As diferenças existentes, eles explicam pela intenção do autor em alterar a
descrição e a narração dos fatos. Isto é fundamentado no dogma da inerência e
da inspiração bíblica.
c - A atividade sobrenatural divina e da própria profecia fez com que
o autor previsse os acontecimentos do século V a.C., em pleno século VIII a.C.
Brevard S. Childs traz em sua análise inicial uma visão panorâmica
das opiniões diversas de especialistas sobre o Dêutero-Isaías, mas a sua opinião
não foge à regra dos próprios autores citados. Após as análises destes autores,
ele inicia um novo bloco de análise de outros pesquisadores, vistos em nosso
trabalho, tais como: Claus Westermann e Roy F. Melugin. A sua análise destes
autores mostra que os mesmos fizeram descobertas extremadas que os anteriores
não haviam visto em suas obras.
Outra questão muito discutida são os Cânticos do Servo Sofredor.
Recebem considerações do autor. Para o próprio Brevard S. Childs o mais
importante em todo o debate é a unidade literária e a composição conjunta do
Segundo e do Trito-Isaías. Ele entende que a obra é só de um autor:
38
3.1.1.3 O DÊUTERO-ISAÍAS DE CLAUS WESTERMANN 50
Conforme Claus Westermann, a proclamação pode ser combinada
com a disputa profética. Em Is 49,14-26, o lamento contra Sião anuncia a
reconstrução da cidade (Is 19,16s), o retorno dos exilados (Is 49,18-21s), à
extensão do seu território (Is 49,19) e a ruptura do poder que escraviza Israel. A
proclamação é combinada com: o lamento comunitário, a proclamação e a época
da salvação. O livro termina com a proclamação da saída da Babilônia e a jornada
de retorno para a terra através do deserto (Is 55,22).
A pregação do Dêutero-Isaías traz uma linguagem usada no louvor a
Deus. No salmo de louvor ou hino de louvor, a divina majestade é o tema das três
primeiras secções de Is 40,12. 17-18. 24-25. Há o contraste da glória de Deus
com a pobreza da fé de Israel. Na quarta secção (Is 40,27-31) transmite-se a
mensagem de conforto à nação. A forma de louvor a Deus também inclui títulos
usados para o próprio Deus. Este louvor é uma maneira de descrever a si próprio.
Isto é encontrado nos anúncios dos discursos de juízo e nos oráculos de Ciro (Is
41,4; 43,10-13; 43,15; 44,24-28; 45,3b; 45.12,18-21; 46.4,9; 48.12-15). Estes
textos também contêm o louvor ao criador e ao Senhor da história na forma de
auto-anúncio. O Dêutero-Isaías expressa ainda a aflição de seu povo, a visão de
Deus como uma nova grandeza e majestade. Fala do Deus único, verdadeiro e
poderoso e de uma nova libertação miraculosa.
No oráculo de Ciro em 44,24-28 nos deparamos com as seguintes
séries de oposições: “O nosso Redentor” no v.24a, a verdade das profecias
antigas em v.26a e a reconstrução das ruínas da cidade de Jerusalém em v.26b.
50 WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66 a commentary. Old Testament Library, Westminster Press, Philadelphia, 1969, p.3-30.
39
O louvor a Deus se funde com a proclamação de salvação, constituindo outra
característica fundamental da teologia do Dêutero-Isaías.
Outra forma muito importante do Dêutero-Isaías é a pregação
através da polêmica. O ataque se dirige às nações e aos deuses estrangeiros e
vai contra os outros profetas. O Deus de Israel luta com os outros deuses para
mostrar qual é o verdadeiro Deus: o Deus de Israel. Existem precursores
teológicos nas afirmações do Dêutero-Isaías em sua pregação profética sobre
Ciro. Como no Primeiro Isaías ele fala do rei da Assíria, enquanto que Jeremias
fala do rei da Babilônia. E o Dêutero-Isaías se refere a Ciro, o persa. Porém, aqui
algo novo acontece. Enquanto que nos outros profetas é assegurado o juízo de
Deus, no Dêutero-Isaías é assegurado a salvação que vem por um estrangeiro.
A polêmica do Dêutero-Isaías contra as nações nos discursos de
juízo é evidente no confronto de Javé com Israel seu povo (43,22-28; 50,1; 42,18-
25). Estes textos falam realmente da disputa. Os discursos de juízo contra Israel
sobre os pecados presentes e os pecados passados foram perdoados. Nestes
casos, o Dêutero-Isaías difere dos profetas tradicionais pré-exílicos. Os outros
profetas não anunciaram o perdão, o Dêutero-Isaías fala deste perdão dos
pecados (40,1; 43,25). A salvação é dada e acompanhada do perdão.
Os cânticos de louvor ou de clamor de exultação em 42,10-13; 44,23;
48,8-20; 49,13; 51,3(?); 52,9 e 54,1 testificam desta salvação.
A mensagem do Dêutero-Isaías, mesmo sendo semelhante a dos
demais profetas pré-exílicos no que se refere à chamada para a decisão, se
destaca por sua mensagem de salvação. Ele conclama ao louvor e à exultação a
Javé nos cânticos de louvor. Este júbilo indica a resposta da fé. Estes cânticos de
louvor que estão inseridos no Dêutero-Isaías mostram que no Antigo Testamento
o louvor pode tomar o lugar que no Novo Testamento se chama de fé.
40
Os cânticos do Servo de Javé são considerados como cânticos
genuínos. Eles são encontrados em 42,1-4; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-53,12. Estes
cânticos usam outros termos já aplicados no Antigo Testamento ao rei, ao profeta
ou ao homem justo individual. O servo é o mediador, à semelhança de Moisés,
que também foi designado por Deus como servo de Deus. Em toda a profecia, o
termo “servo” pode ser encontrado, principalmente em profecias que precedem o
Dêutero-Isaías, inclusive em Jeremias, profeta antes do Dêutero-Isaías e do exílio.
O sentido do Servo Sofredor Vicário tem por ofício mediar e se expande para o
conceito posteriormente, dando aos gentios a salvação vinda dele.
3.1.1.4 O DÊUTERO-ISAÍAS CONFORME ROY F. MELUGIN 51
O autor inicia o seu trabalho com a formulação do problema e do
método que vai utilizar em sua pesquisa. Na primeira parte ele analisa através do
criticismo da forma e da história da forma o que os diversos autores fizeram em
suas análises do Dêutero-Isaías. Estes autores foram os primeiros a aplicarem os
métodos supracitados na pesquisa do Dêutero-Isaías. Depois Roy Melugin passa
a discutir autor por autor, as suas hipóteses de trabalho para depois apresentar a
sua própria hipótese:
“Os desacordos talvez não podem afetar o assunto se eles
diferem meramente em detalhes. Mas suas diferenças são
fundamentais. Eles discordam sobre a natureza real do
processo da composição. O profeta não fala em pequenas
declarações que revelam as estruturas da tradição oral do
discurso? Ou como o artista criou suas próprias formas?
Estamos diante de um colecionador? Ou temos um longo
poema? Que método de análise pode ser usado? É o
criticismo da forma apropriado? Ou podemos como James
Muilenburg ver uma estrutura de estrofes? Pesquisadores
51 MELUGIN, Roy F. The formation of Isaiah 40-55. Walter der Gruyter, Berlin/New York, Beiheft zur Zeitschrift für die Altestestamentliche Wissenschaft, v.141, 1976, p.1-7.
41
recentes nos legaram estas questões, sendo que todas
podem ser reduzidas a uma só: qual a natureza da poesia e
o arranjamento do corpus do Dêutero-Isaías? A questão é o
assunto deste livro” 52.
Na parte seguinte ele discute então a questão do método. “A questão
acerca da natureza da poesia e do arranjamento do Dêutero-Isaías é a primeira
questão do problema do método. Nosso ensaio tem produzido dois métodos
opostos de aproximação empregados por James Muilenburg. O método de Claus
Westermann pode ser visto em parte como uma síntese entre os dois métodos,
assim merece um lugar como alternativa” 53.
Roy F. Melugin passa a analisar os métodos aplicados por James
Muilenburg e Claus Westermann e fazer a sua aproximação entre a crítica da
forma e o criticismo da forma. A conclusão que ele chega a partir desta discussão
é:
“Esta crítica tem por propósito não demolir a posição de
James Muilenburg. A sua contribuição é muito grande para
ser facilmente destruída. Portanto, a análise acima indica que
se tem passado sobre o criticismo de maneira precipitada.
Talvez possamos concordar ultimamente com Claus
Westermann de que a criatividade do profeta é dominante na
análise da crítica da forma constituindo um valor marginal...
Começamos então com a tarefa da análise da forma...
Inquirimos sobre o arranjamento do corpus do Dêutero-Isaías
como um todo. Será que o presente arranjamento do texto é
significante querigmaticamente ou artisticamente? Ou temos
um arranjo que é só mecânico? O plano do livro reflete tanto
a questão da forma como do arranjamento” 54.
52 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.7.53 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.7.54 MELUGIN, Roy F. op.cit., p.10.
42
As partes principais da obra de Roy F. Melugin começam daqui por
diante. Na primeira parte ele investiga “a análise dos gêneros literários em
Dêutero-Isaías” começando com os “discursos de salvação”. Ele parte da
pesquisa dos discursos pelo “oráculo sacerdotal de salvação” 55.
Em sua conclusão sobre os discursos de salvação, o autor escreve:
“Se os oráculos do Dêutero-Isaías sobre a certeza de
salvação são imitações é admitido não como certo, mas está
claro que eles exibem um gênero que pode ser isolado do
seu contexto pela forma. Agora tornando ao restante do
discurso de salvação do Dêutero-Isaías, eles manifestam um
gênero? Ou temos vários gêneros? São todas unidades? Ou
são, como Claus Westermann sugere, partes de uma longa
composição poética?” 56
No final deste capítulo Roy F. Melugin analisa as outras formas de
discurso de salvação como: “Não tenha medo”, a “Heilsankündigung” (oráculos de
certeza de salvação) e, por fim, “os anúncios de salvação” como o anúncio do
futuro. Depois disto vem a pesquisa dos textos do Dêutero-Isaías para a
comprovação daquilo que foi feito: 41,17-20 e 42,14-17; 46,1-4; 51,17-23; 55,1-7
para fundamentar a sua análise da metodologia proposta no início57.
Na seqüência, Roy F. Melugin discute os “discursos de disputa”. Ele
mostra que “o fundamental problema em nosso estudo do Dêutero-Isaías é se a
crítica da forma ilumina a estrutura do texto... Temos examinado os discursos de
salvação” 58. O autor passa a analisar o problema dos discursos numa perspectiva
55 MELUGIN, Roy F. op.cit., p.12-22.
56 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.22.57 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.22-27.58 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.28.
43
histórica e a aplicar a análise da crítica da forma. Assim ele escolhe alguns textos
do livro do Dêutero-Isaías para fundamentar o seu trabalho: 40,12-17; 40,18-
24.25-26; 46,5-11; 40,27-31; 45,9-13; 44,24-28; 48,1-11; 42,18-25. Conclui
dizendo que este capítulo mostrou os resultados de que a “estrutura dos discursos
de disputa do Dêutero-Isaías é de sua própria criação” 59.
A discussão posterior passa pela análise do “discurso de juízo” onde
este autor vê os processos entre Javé e Israel. O autor parte da via histórica e faz
uma exegese de determinados textos como: 43,22-28; 50,1-3. Depois ele analisa
os processos entre Javé e as outras nações na perspectiva histórica e na análise
da crítica da forma60. Deste modo a sua conclusão é que “a tentativa de mostrar os
discursos de juízos do Dêutero-Isaías - o processo entre Javé e Israel e o
processo entre Javé e as nações - são em longa medida formados pelas próprias
mãos do profeta. Ao certo, em alguns destes discursos podemos ver a clara
imitação de formas particulares usadas pelo profeta de forma absoluta (44,6-8;
43,22-28)... “Portanto, o Dêutero-Isaías sempre usa o discurso de juízo para o
propósito de disputa” 61.
O próximo desenvolvimento do autor consiste do estudo dos
“Cânticos do Servo de Javé”. Por fim, ele apresenta a parte essencial de sua obra,
que são os arranjamentos das unidades do gênero literário do Dêutero-Isaías.
Estes são determinantes na sua maneira para entender a composição da obra
dêutero-isaiana. Para este autor o Dêutero-Isaías foi composto da seguinte
maneira:
a - 40,12-44,23 (esta secção ele subdivide em 40,12-31; 41,1-42,13;
42, 4-44,23)
59 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.44. Para uma melhor compreensão ver a sua análise completa nas p.28-44.60 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.45-63.61 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.63.
44
b - 44,24-49,13 (o autor subdivide em 44,24-48,21 e 49,1-6.7.8-
12.13)
c - 49,14-55,13 (subdividida em 49,14-52,12 e 52,12-55,13).
Roy F. Melugin analisa secção por secção e conclui da seguinte
forma:
“Em nossa pesquisa da formação de Is 40-55 foi colocado o
debate entre estes autores que analisaram os capítulos do
Dêutero-Isaías como uma coleção de fórmulas originalmente
separadas. A conclusão é que a obra é de um só autor... O
resultado final de nossa análise indicou, então, que iniciamos
com os gêneros como uma unidade básica... Tenho tentado
demonstrar as dificuldades com a criticada forma e que Is 40-
55 foi composto de poemas longos, construídos a partir de
um complexo entretecido de elementos de vários gêneros...
Is 40-55, então é uma coleção de unidades independentes
originalmente, mas o arranjo é querigmático” 62.
3.1.1.5 AS TRADIÇÕES HISTÓRICAS NO DÊUTERO-ISAÍAS
a) A tradição do êxodo. Esta é a mais importante de todas as
tradições. Para o Dêutero-Isaías, esta tradição é até a mais importante na história
de Israel. No Dêutero-Isaías, por sua vez, o êxodo é o coração de sua mensagem
aos exilados na Babilônia. As passagens que mostram estes fatores essenciais
são: 43,16-21 e a proclamação de salvação em 51,9-52,3. Esta reminiscência do
êxodo é aplicada à partida da Babilônia em 52,11, na qual o profeta anuncia o
retorno pelo deserto, miraculosamente transformado. O profeta se refere às
antigas peregrinações no deserto em 43,19; 55,12; 41,11; 49,9 sob a liderança de
Javé. O lugar que o Dêutero-Isaías dá ao êxodo é notável.
62 MELUGIN, Roy F. op. cit., p.175.
45
b) A tradição profética. Dêutero-Isaías, o profeta da salvação,
tem afinidades com os profetas pré-exílicos da ruína, mas com uma diferença
fundamental, anuncia a salvação e o perdão. Os outros anunciavam a ruína.
c) A tradição dos salmistas. O Dêutero-Isaías revela também
afinidades com o saltério. O oráculo de salvação constitui uma resposta ao
lamento. O salmo de louvor tem características semelhantes aos oráculos de
louvor no Dêutero-Isaías. Como por exemplo, em Is 40,12-31 e nos Sl 39; 49; 90.
3.1.1.6 COMPARAÇÕES ENTRE BREVARD S. CHILDS, CLAUS
WESTERMANN E ROY F. MELUGIN63
Os autores acima citados elaboram um trabalho de fôlego sobre o
Dêutero-Isaías. Talvez sejam os trabalhos atuais mais completos sobre a obra
dêutero-isaniana. Fazem um retrospecto analítico de toda a situação desde o
século passado até o momento da pesquisa elaborada. Inicia como análise das
obras desde Bernhard Duhm até os mais recentes trabalhos. Concentramo-nos
nas obras de Claus Westermann, passando por Hugo Gressmann, Karl Elliger,
Sidney Smith, Ludwig Köhler, Joachim Begrich, James Muilenburg e por fim Hans
Eberhard von Waldow.
A obra de Roy F. Melugin está dividida em duas grandes partes: a
primeira analisa os gêneros literários e a segunda analisa a disposição dos textos
através da obra. A primeira trata dos discursos de salvação, dos discursos de
disputa e dos discursos de juízo ou de julgamento. Na segunda se elabora as
secções do Dêutero-Isaías.
63 MELUGIN, Roy F. The formation of Isaiah 40-55. Walter der Gruyter, Berlin/New York, Beiheft zur Zeitschrift für dir Altestamentlische Wissenschaft, v.141, 1976, p.10-175; WESTERMANN, Claus, op. cit., p.3-30; CHILDS, Brevard S. op. cit., p.320-322.
46
O primeiro capítulo desta obra retrata a questão da crítica da forma
na pesquisa de toda a literatura profética, com ênfase na obra isaiana. Tem como
base as obras de autores importantes como: Hermann Gunkel, Sigmund
Mowinckel, Hans Walter Wolff, Walther Zimmerli e Claus Westermann. Estes
foram os pioneiros a separarem e isolarem os discursos proféticos. A
“Formgeschichte”/história da forma e a “Gattung”/gênero determinaram as
pesquisas sobre os discursos proféticos. As várias tentativas de se estabelecerem
os gêneros literários dos profetas pré-exílicos determinaram a pesquisa do
Dêutero-Isaías, que tinha um corpus de coleções de discursos separados e que
Claus Westermann os classificou da seguinte forma: promessa (Verheissungen),
exortação (Mahnworte) e as formas não proféticas de discurso essencialmente
hínicos, identificados em 1914 por Hugo Gressmann64.
Ludwig Koehler65, em 1923, viu no Dêutero-Isaías uma coleção de
unidade, que na realidade consistem em imitações das formas orais do discurso
profético. Portanto, os gêneros literários tradicionais foram modificados e serviram
como material-base sobre a qual o profeta ou o escritor exerceu seu poder
poético.
Tanto para Hugo Gressmann quanto para Ludwig Koehler o Dêutero-
Isaías foi composto originalmente em discursos separados. Eles não se
preocuparam depois com a questão do rearranjamento e dos reagrupamentos das
coleções destes discursos.
Sigmund Mowinckel, em 1931, mostrou que o Dêutero-Isaías era
formado por uma coleção independente de expressões cultuais. Depois pesquisou
o arranjamento destas coleções. Segundo ele, os discursos foram arranjados
conforme os temas similares e a conexão de frases (estribilhos). Cada discurso foi
64 GRESSMANN, Hugo. Die literarische Analyse ind Dutero-Jesaja. In: Zeitschrift für die Altstestammentliche Wissenschaft, v.34 (1914), citado por Roy F.Melugin, op.cit., p.2. 65 KOEHLER, L. Deutero-Jesaja Stillkritisch Untersucht. Zeitschrift für die Altstestammentliche Wissenschaft, v.37, 1932, Berlin citado por Roy F.Melugin, op. cit., p.2
47
colocado em seu contexto sobre a forma de associação com o discurso
precedente. O significado mecânico desta associação não tem significado para a
compreensão total da mensagem profética. A hipótese de Sigmund Mowinckel foi
revivida posteriormente por outro pesquisador da obra de Isaías que foi Karl
Elliger.
Karl Elliger, em 1933, reviveu as hipóteses de Sigmund Mowinckel
concordando que o Dêutero-Isaías é uma coleção de expressões originalmente
separadas. Concordando também que essas coleções foram reagrupadas e
rearranjadas com um significado especialmente teológico. O discípulo do Dêutero-
Isaías arranjou estes discursos por assuntos, os quais manifestam estas coleções
com continuidade de pensamento. Karl Elliger viu neste texto o processo como
resultado de agrupamento formando uma unidade da mensagem profética, mais
do que unidade formais.
Assim notamos que houve um trabalho árduo de pesquisa e de
utilização de método histórico-crítico.
Joachim Begrich66, em 1934, aplicou seus estudos críticos ao
Dêutero-Isaías. Examinou o fundamento e a estrutura de cada gênero literário. Ele
não trabalhava com a categoria geral da promessa (Verheissung) como descrição
da mensagem de condenação feita pelos profetas anteriores. No Dêutero-Isaías, a
mensagem é escatologizada, a aplicação da promessa de salvação é mais
interessante. Após uma análise detalhadamente elaborada da visão do processo
de transmissão no Dêutero-Isaías viu que a imitação de uma forma de oráculo de
salvação foi usada pelo sacerdote em resposta ao Salmo de Lamento. Da mesma
forma os oráculos ou os discursos de juízo e o discurso de disputa eram gêneros
nos quais se identificou os discursos comumentes empregados no procedimento
legal, ou seja, eram os discursos na porta da cidade.
66BEGRICH, Joachim. Studien zu Deuterojesaia. Theologische Bücherei, 20, Christian Kaiser Verlag, München, 1963, p.81-92
48
Os autores anteriores, Hugo Gressmann, Ludwig Koehler, Joachim
Begrich acreditavam que o discurso do Dêutero-Isaías era uma imitação literária
dos gêneros da tradição oral. Por que nas circunstâncias do exílio o discurso do
Dêutero-Isaías não circulara oralmente? O Dêutero-Isaías usou as formas dos
discursos costumeiramente empregados nos círculos não proféticos da imitação
do processo legal de composição.
Toda esta pesquisa, elaborada por Joachim Begrich, criou um novo
caminho alternativo para a discussão do Dêutero-Isaías, continuada por H.
Eberhard von Waldow67.
Este não concorda com seu antecessor de que os discursos são
imitações literárias de uma forma pré-estabelecida de discurso oral. Em sua
opinião o Dêutero-Isaías foi um profeta cúltico e o oráculo de salvação é um
gênero genuíno profético. O discurso originou-se no culto. Assim eles não são
imitações de formas de discursos que foram utilizados na porta da cidade como
forma de juízo legal.
Surgiu, na escola norte-americana, outro especialista sobre o
Dêutero-Isaías, que contribuiu com aspectos interessantes no estudo em questão,
James Muilenburg68. Ele veio trazer novas alternativas especiais dentro da
pesquisa dêutero-isaniana. O seu trabalho mostrou que o Dêutero-Isaías tem um
estilo de escrita diferente, que a estrofe sempre começa com uma expressão
muito utilizada como: “Veja”, “Eis que”. Estas expressões são uma característica
da denominada forma do estilo imperativo e pode significar o começo de uma
nova estrofe. A estrofe sempre tem introduções no estilo hebraico de métrica, tem
conclusões e repetições de palavras.
67WALDOW, H.E. von. “The message of Deutero Isaiah”. Interpretation, 22(1968), p.259-287. Do mesmo autor podemos ver: Der Traditionsgeschichtliche Hintergrund der prophetischen Gerichtsreden. Beiheft zur Zeitschrift für die Alttestamentliche Wissenschaft, n.85, Alfred Toepelmann, Berlin, 1963, p.170.68MUILENBURG, J. Isaiah 40-66. IDB, v.5, New York, Abingdon Press, Nashville, 1956, p.381-422.
49
James Muilenburg trabalhou as situações do anúncio do conselho
celestial de Javé; a vinda de Javé sobre os inimigos de Israel; o pastor que
apascenta e conforta seu povo como um rebanho; Javé é o criador de todas as
coisas. Israel é o povo de Javé como Deus e também o seu próprio servo; a
promessa de redenção é dada aos escolhidos; Ciro é o eleito que conquista a
Babilônia e liberta o povo de Israel; as nações ouvirão que Javé é Deus de Israel e
por fim a vinda do rei e o clamor que “Javé é o Rei de Israel” é colocado na boca
de todas as nações.
A pesquisa em torno do Dêutero-Isaías tem um ponto marcante com
o comentário de Claus Westermann. Este trabalhou intensivamente as questões
do discurso de disputa e o anúncio de salvação que foram reagrupados de acordo
com a estrutura do salmo de lamento. Roy F. Melugin divide o seu escrito de
forma estrutural da seguinte maneira:
Na primeira parte, Roy F. Melugin discute a situação dos discursos
de salvação, classificando-os em oráculo sacerdotal de salvação e em outras
formas. O primeiro é introduzido pela fórmula clássica: “Não tenham medo”. Esta
frase tem um endereço direto, uma expressão da proximidade da ajuda de Javé,
sempre utilizada na forma nominal e a expressão de que Javé dá ouvido às
súplicas que são apresentadas. Enfim, existe o anúncio do futuro no verbo
imperfeito e Javé é o sujeito. Porém podem ocorrer outras fórmulas conhecidas.
Como exemplo no texto de 43,16-21 onde o “Não tenha medo” converte-se na
fórmula “Não me lembrarei das coisas velhas” e em Is 55,8-13 o discurso de
salvação é mudado para o discurso de disputa.
H. Eberhard von Waldow trabalhou a estrutura do discurso da
seguinte forma:
1. Uma introdução
50
2. Uma fórmula de mensageiro ou chamado de atenção seguido de
“Não tenham medo”.
3. Um endereçamento direto, onde:
a - a declaração da intervenção de Javé começa com uma
expressão do conteúdo geral, tendo usualmente Javé como sujeito, seguido pela
elaboração da intervenção de Javé com a deidade como sujeito gramatical no
perfeito ou no imperfeito e a substanciação da intervenção freqüentemente não
presente.
b - a declaração das conseqüências da intervenção de Javé,
uma declaração na qual Javé não é mais o sujeito, estando sempre no imperfeito.
c - o propósito da intervenção de Javé.
Nas outras formas de discursos de salvação, ocorrem os oráculos de
certeza de salvação, o anúncio de salvação. Estas têm como base a criatividade
poética:
a. Em 41,17-20 e 42,14-17 encontramos:
1. A referência à queixa
2. O anúncio da intervenção de Javé expressada no imperfeito e Ele
como sujeito
3. A elaboração do anúncio da intervenção de Javé expressada no
imperfeito e Ele como sujeito.
b. Em 46,1-4 observa-se a fusão de dois gêneros: cântico da vitória e
o discurso de salvação.
c. Em 51,17-23 o derivado do discurso é usado no conforto do
lamento.
51
d. Em 55,1-5 ocorre o discurso da imitação do gênero sapiencial com
a convocação à refeição. Este mostra o aspecto da essência da vida. O comer e o
beber têm raízes na sabedoria.
I - Os discursos de disputa têm como estrutura: uma estrutura básica,
que tem como ponto de partida o que fala e o seu oponente, a conclusão que é o
resultado lógico do argumento baseado no ponto de comum acordo. Este discurso
é pouco usado na literatura profética, pouco comum nos outros profetas, mais
utilizado no discurso sapiencial. Como exemplo nós podemos citar:
a. 40,12-17 tem como base uma série de questões retóricas
introduzidas por “quem?”, terminando como “Eis que!”
b. 40,18-24; 40,5-11 e 46,5-11 possuem uma estrutura estereotipada.
A questão: “Quem é comparável ao deus como Eu?”, tem outra descrição
sarcástica dos ídolos fabricados. Os profetas vêm ou perguntam sobre o culto e às
vezes aparecem com questões retóricas ou com imperativos ou lembrados de
todas as situações do povo com o estilo participial do hino.
c. 40,27-31 possui um discurso de disputa com o estilo de salmo
individual de lamento e esta disputa possui uma estrutura no estilo litúrgico com
um argumento contra a queixa cúltica.
d. Is 45,9-19 o discurso ocorre com formas de questões retóricas,
refletindo a incredulidade de quem fabrica um objeto de ídolo, que pode ser
inferior ao próprio objeto fabricado.
e. Em 44,24-28 pode ser um hino ou também um discurso de
mensageiro que foi incorporado ao estilo de auto-pregação ou ainda uma disputa
discursiva. Tem uma introdução ao estilo de auto-pregação ou ainda uma disputa
discursiva. Tem uma introdução hínica anterior e uma composição poética, mas
52
possui cláusulas participais que são oposições de pregações. Encontra-se nele
um oráculo ao rei.
f. Em 48,1-11 possui uma mistura da segunda pessoa do singular e
plural. É uma disputa, onde ocorre a expressão “Coisas novas e coisas velhas”.
Parece-se com a narrativa etimológica encontrada no Pentateuco. Tem um estilo
narrativo. É uma fusão de vários estilos.
g. Em 41,18-25 é um salmo de lamento. Os autores Claus
Westermann e Roy F. Melugin falam que aqui ocorre a reflexão criativa do
Dêutero-Isaías.
II - Os discursos de juízo ou os relatos de julgamento. Eles existem
como expressões de julgamento entre Javé e o povo de Israel. O juízo ocorre
entre Javé e as outras nações. Estes discursos eram comuns nas situações dos
relatos poéticos e são imitações dos discursos orais feitos no portão da cidade. Os
discursos de juízo profético são imitações das formas dos discursos legais. Eram
comuns nas situações dos relatos proféticos e são imitações dos discursos de
juízo cúltico ou do festival da renovação da aliança. A estrutura deste discurso
começa com a reprovação, a acusação; depois a declaração da inocência do
acusado; logo em seguida vem a contra-acusação do acusado; e, por fim, a
chamada para a decisão ao juízo. Esta fórmula é a mais comum encontrada no
processo entre Javé e o povo de Israel, assim:
a. 43,22-28 reflete o discurso usado no procedimento legal no portão
da cidade.
b. 50,1-3 é um poema que reflete o divórcio de Javé do país; é uma
reação contra a fé do povo que tem se separado de Javé.
III - O processo entre Javé e as nações. Claus Westermann e Roy F.
Melugin mostram que os discursos foram também elaborados a partir do discurso
53
de juízo, anunciados no portão da cidade como forma da corte ou da assembléia
dos anciãos para julgar a culpa ou a inocência dos povos.
Conforme Claus Westermann, este discurso de juízo é encontrado no
Dêutero-Isaías como disputa entre Javé e as nações. Ele é uma forma derivada de
um gênero que tem seu fundamento na vida de Israel. Este discurso reflete o
processo entre Javé e os deuses de todas as nações. Os oponentes de Javé são
convocados ao processo. Javé argumenta seu caso num estilo altamente
estereotipado. Utiliza-se a expressão “quem?” e a descrição na primeira pessoa
com um estilo de hino de auto-louvor como na questão do estilo de auto-louvor e
por fim tem um final com “eis que”.
A parte mais discutida do Dêutero-Isaías nos dias atuais é a secção
dos Cânticos do Servo Sofredor de Javé. Não é necessário entrar em maiores
detalhes. Esta secção foi muito pesquisada e talvez é a mais debatida69. Existe
uma vasta pesquisa sobre o assunto.
1. 42,1-4 constitui o primeiro hino. É um discurso de Javé sobre o
servo. Começa a frase com “eis que” e indica a eleição do servo de Javé.
2. 42,5-9 é o segundo hino, fala do compromisso do servo.
3. 49,1-6 constitui o terceiro hino, este é um salmo de agradecimento
individual que inclui o comissionamento de um rei e do profeta.
4. 50,4-11 representa o quarto hino e é o lamento de dor que
contrasta a missão do servo e sua experiência. Tem uma linguagem jurídica e é
um salmo de lamento.
5. Finalmente, temos Is 52,13-53,12 o quinto hino. Este é um salmo
de agradecimento integrado com um salmo de lamento e a exaltação do servo.
Roy F. Melugin, no final de sua obra, se dedica à composição das
unidades dos gêneros literários do Dêutero-Isaías. Este trabalho representa a sua
69GORGULHO, M. L. O Servo de Yahweh nos escritos do Dêutero-Isaías. Tese de doutorado, PUC/RJ, 2v, 1989, p.618.
54
tese e sua conclusão sobre a estrutura literária do Dêutero-Isaías. Ele segue
Claus Westermann em vários momentos: a associação verbal, a associação
temática e a associação do ambiente do Dêutero-Isaías.
A estrutura básica do Dêutero-Isaías pode ser resumida da seguinte
forma. Is 40-55 é composta de várias etapas: 40,1-11 é a estrutura do corpo inteiro
como se fosse uma miniatura do resto do livro. É um tipo de esboço ou resumo da
obra. Este esboço foi empregado intencionalmente como prólogo da coleção. Este
texto permanece como uma unidade e como a vocação do profeta. Foi elaborado
depois um epílogo com ligação ao prólogo.
Ficou evidente neste capítulo que a composição do Dêutero-Isaías
em sua fase final teve uma elaboração de um redator que juntou a primeira parte à
terceira, ficando no meio o Isaías da Babilônia. Assim a estrutura do Dêutero-
Isaías ou Isaías 40-55 tem uma estrutura básica composta pelo prólogo e o
epílogo, tendo um miolo que é um entretecido de uma obra poética incomparável.
Este prólogo 40.1-11 reflete a estrutura de um corpo inteiro que foi
retratado em uma miniatura e que foi empregado intencionalmente como prólogo
de uma vasta coleção. Esta é a opinião de Claus Westermann. Os versos de 40
como prólogo têm um complexo de um chamado poético e se insere no contexto
de vários outros chamados, de outros profetas como Is 6. Este relato é um relato
unificado, uma reflexão e guarda uma unidade literária. Is 40,1-11 tem em si
outras unidades literárias que foram juntadas formando um todo (J Begrich: v.1-2;
3-5; 6-8; 9-11).
O epílogo de Is 55,6-13 corresponde ao começo do corpo do livro do
Dêutero-Isaías (Is 40,1) que é muito semelhante ao prólogo principalmente a 55,6-
13. Como no prólogo pode-se separar em várias unidades e composições o
epílogo também tem esta forma de se apresentar. Is 55,6-13 pode ser separado
em v.6-7 correspondente a uma pequena tora sacerdotal, que é a maneira de uma
55
chamada profética sacerdotal semelhante a Is 6;1 Rs19 e o próprio texto citado de
Is 40,1-11.
Conforme Roy F. Melugin houve uma justaposição de unidades de
gêneros individuais. O arranjamento deste fundamento parece estar bem claro.
Houve um modelo satisfatório de uma progressão mecânica deste arranjamento.
Porém, achar este fundamento e designar estas evidências e como se procedeu
este fundamento do arranjamento das unidades é muito difícil. Reconstruir a
história da formação desta coleção e reconstruir estágio após estágio como foi
produzido Is 40-55 é quase impossível. As hipóteses surgem como: a construção
artística, o uso da linguagem dentro das unidades dos gêneros, o caminho nas
quais estas unidades formam um contexto relacionado com a história. A forma do
pensamento e a relação com a poesia. O significado que é demonstrado pelas
imagens e os jogos de palavras, as repetições de sons, a forma do poema em
geral, ajuda a explicar como foi formado este complexo de Is 40-55.
A progressão da formação do texto contribui para a explicação do
significado e da formação. Os capítulos tiveram uma construção retórica e que
ajudou na composição final deste Dêutero-Isaías. Por isso tanto a prólogo como
os epílogos demonstram como surgiu e como se formou esta composição e este
arranjamento na obra final. Se o prólogo e o epílogo foram rearranjados, juntados
em unidades posteriores, o corpo deutero-isaianiano foi obra de várias etapas.
Como exemplo, tomamos o texto de Is 41,1-7 como ilustração disto que está
sendo feito sobre a unidade de gênero.
A forma de discurso convence imediatamente a uma compreensão
parcial do significado da unidade. O escritor poeta dá uma figura de um resumo de
um julgamento: “Ouçam-me... vamos enfrentarmos em juízo”(41,1). Este tom
resume o julgamento ou processo final desenvolvendo o processo de Javé contra
as nações e de Javé contra Israel. Em 46,1-4 repete-se as palavras e as imagens
para significar que o poema está em progressão, estas, repetições refletem o
contraste entre os deuses que serão destruídos e Javé que destruiu também
56
liberta o povo. A figura dos deuses impotentes que poderão ser destruídos o povo
e libertados conforme a vontade de Javé.
A reconstrução hipotética da história da redação ou da forma
demonstra que o rearranjador imitou estes escritos. Esta descoberta atual no texto
evidência que a construção foi arranjada por um eminente poeta que usou uma
linguagem especial da poesia e trabalhou artisticamente este material.
A reconstrução do texto deutero-isaiano oferece uma amostragem
importante para o nosso estudo. Desde o prólogo ou o epílogo e mesmo os textos
selecionados na exegese favorecem e auxiliam a análise do exílio e a pregação do
êxodo novo e a libertação dos judaítas. Apesar da variedade de gêneros literários
sendo oráculos, as invectivas, os ditos de disputa e os processos de julgamentos
foram arranjados favoravelmente de uma maneira que este material seja
entendido pelo leitor como uma mensagem de libertação, de salvação e de novo
êxodo.
Rolf Rendtorff escreve preciosamente sobre esta situação,
“apesar de sua forma anônima em que permanece Is 40-55,
o texto manifesta uma independência marcada e uma
coerência de forma e de expressão teológica. Os textos de
vários gêneros todos eles servem a um propósito de
permanecer que é formulado tanto no prólogo como em
outros textos conclamar os judaítas que estão vivendo no
exílio e que o exílio está no fim, que Javé os trará de volta
por um caminho no deserto para Jerusalém e os guiará como
livres do exílio como um pastor solícito. Isto também é
confirmado no epílogo. A palavra de Javé virá sobre os
exilados e que estes estarão livres para retornarem ao lar em
alegria no júbilo da criação”.
57
Finalizamos esta parte, mostrando que as concepções do Dêutero-
Isaías obtidas com os trabalhos de Brevard S. Childs, Claus Westermann, Roy F.
Melugin, mesmo que díspares, nos dão uma estrutura básica e completa sobre a
formação da obra isaiana. Apesar de Brevard S. Childs e de Claus Westermann
vincularem o Trito-Isaías ao Dêutero-Isaías, e que R. F. Melugin faça a leitura
somente de Is 40-55, concluímos com a maioria: que o Dêutero-Isaías é o
composto de uma estrutura básica: um prólogo, um miolo-centro e um epílogo,
conforme as ponderações apresentadas.
O seu miolo é dividido literariamente em três etapas: os discursos de
disputa, os discursos de juízo e os cânticos do Servo Sofredor de Javé.
Após as considerações feitas até aqui e indispensáveis ao perfeito
entendimento do Dêutero-Isaías, podemos dedicar-nos ao estudo pormenorizado
e ao objeto e do presente trabalho, o motivo do êxodo no Dêutero-Isaías. Dentro
da estrutura discutida do Dêutero-Isaías, existem textos que vamos analisar na
perspectiva do motivo do êxodo. Escolheremos somente os textos explicativos do
êxodo, e faremos uma leitura a partir da ótica latino-americana70.
Desta maneira a promessa e o anúncio de libertação são repetidos
com muitas palavras no início e no fim e também em vários textos do Dêutero-
Isaías, como no miolo do livro.
Procuramos no próximo capítulo especificar a questão do motivo do
êxodo no Dêutero-Isaías. Por isso foi necessário especificar a análise da
composição do livro do Dêutero-Isaías para entrar nesta nova fase. A ligação da
composição com o motivo do êxodo parte de que os textos inseridos e à sua
composição são importantes para determinar a próxima fase. A análise histórica e
70CERESKO, A.R. Introduction to the Old Testament, a Liberation Perspective. Orbis Books/Geofrey Chapman, 1992, New York/London, p.189-201,232-243.
58
literária da obra do Dêutero-Isaías determina e análise do motivo do êxodo e do
novo êxodo.
CAPÍTULO 4 O MOTIVO DO ÊXODO NO DEUTERO-ISAÍAS
O presente capítulo analisa as pesquisas vétero-testamentárias
realizadas sobre o motivo do êxodo no Dêutero-Isaías. A primeira parte se refere a
análise da bibliografia sobre o tema do êxodo, seguido por uma análise do texto
bíblico para melhor compreensão desta temática. Os textos escolhidos do
Dêutero-Isaías serão tematicamente estudados. Será conduzida uma análise
literária dos textos escolhidos do Dêutero-Isaías passo a passo, e será feita, uma
exegese dos textos para conhecer como o profeta enfrenta este tema. A exegese
básica terá como ponto de partida os resultados já elaborados pela ciência bíblica
e as descobertas feitas na ótica latino-americana.
4.1 ANTECEDENTES
A bibliografia pesquisada sobre o êxodo no Dêutero-Isaías traz
resultados muito controvertidos.
59
Um trabalho filológico, exegético, histórico bem fundamentado, tem
no ensaio e Klaus Kiesow71.
Esta obra oferece uma análise literária dos textos que denotam o
tema do êxodo.
Na primeira parte da obra, o autor estuda a situação do tema com a
colocação do problema. Na segunda parte, o autor identifica os textos que serão
analisados: 40,1-11; 43,16-21; 49,7-12; 51,9-14; 52,7-12; 55,12-13, mais os textos
do Primeiro Isaías (cap. 35) e do Terceiro Isaías (62,10-12). Conforme Klaus
Kiesow os textos que fazem parte do Dêutero-Isaías são os mais importantes.
Na última parte ele analisa a hermenêutica dos textos que denotam o
êxodo e faz a contextualização: o balanço da crítica da redação, o motivo do
êxodo, o seu emprego, um resumo e a perspectiva teológica dos textos.
Na parte inicial da obra, o autor mostra que o êxodo é um tema
central de toda teologia. As teologias européias, como a teologia da libertação,
utilizam o motivo do êxodo. A teologia européia através da teologia da esperança
com Jürgen Moltmann72 e na filosofia social com Ernst Bloch trabalhou o êxodo em
perspectivas diferentes, mas dando ênfase neste tema73.
Na elaboração da sua teologia da salvação, Klaus Kiesow mostra
que certos textos do livro de Isaías 40-55 falam explicitamente do êxodo do Egito,
da travessia do mar e da peregrinação pelo deserto74.
71KIESOW, Klaus. Exodustexte im Jesajabuch, literarkitische und motivgeschichtiliche Analysen. Editions Universitaire/Vandenhoeck und Ruprecht, Fribourg/Göttingen, 1979, p. 1-22.72MOLTMANN, Jürgen. Teologia da esperança. São Paulo, Editora Herder, 1971, p.363-395.73BLOCH, Ernest. El ateismo en el cristianismo. Taurus Ediciones, 1983, p. 79-112.74KIESOW, Klaus. op. cit. p. 9-22
60
Acerca do motivo do êxodo em Dêutero-Isaías, Klaus Kiesow
enumera vários autores como sendo os pioneiros no assunto citado: Jacques
Guillet75, Walther Zimmerli76, Bernhard Anderson77, Joseph Blenkinsopp78, Carol
Stuhlmueller79, Dieter Baltzer80. Estes autores consideram que os seguintes textos
mencionam a idéia de êxodo: 40,1-11; 43,16-21; 49,7-12; 51,9-12; 52,7-12; 55,12-
13; 62,10-12 e Is 35 81. Outros textos não tão explícitos sobre o novo Êxodo
constituem no máximo a quantia de treze e que os autores deixam de relacionar
uns e mencionar outros diminuindo a relação a seis textos: Is 40,1-11; 43,16-21;
49,7-12; 51,9-12; 52,7-12; 55,12-1382·. Klaus Kiesow analisa oito destes textos:
seis do Dêutero-Isaías, um do Primeiro Isaías e um do Trito-Isaías.
Conforme o próprio Klaus Kiesow o motivo do êxodo é um pomo de
discórdia entre os comentaristas do Dêutero-Isaías:
“O alcance e o significado do motivo do êxodo em Is 40-55
foram analisados de várias maneiras desde a virada do
século83. Os resultados em sua maioria encontram-se
registrados em comentários. A indagação, em quais textos o
motivo do êxodo deve ser atestado? Reflete a primeira
75GUILLET, Jacques. Le theme de la marche an desert dans l’Ancien Testament et le Nouveau Testament. In: Recherches de Science Religieuse 36 (1949), p.164-181.76ZIMMERLI, Walter. Il nuovo esodo. In: Rivelazione di Dio. Editrice Jacca Book, Milano, 1975, p.175-185.77ANDERSON, Berhard. Exodus tipology in second Isaiah. in: Bernhard Anderson e Walter Harrelson. Israel’s Prophetic Heritage. Harper and Brothers, New York, 1962, p.177-195.78BLENKISOPP, Joseph. Alcance e profundidade da tradição do êxodo no Dêutero-Isaías Is.40-55. In: Revista Concilium no. 10, dez(1996), Livraria Morais, Lisboa/Recife, p.37-46.79STUHLMUELLER, Carol. The creative redemption in Deutero-Isaiah. Pontifício Instituto Bíblico, Rome, 1970.80BALTZER, Dieter. Ezequiel und Deuterojesaja. Beiheft zur Alttestamentliche Wissenschaft, Berlim, v.121, 1971, p.12-24.81KIESOW, Klaus. op. cit., p.17.82KIESOW, Klaus. op. cit., p.17.83WIENER, Claude. O Dêutero-Isaías. São Paulo, Edições Paulinas, 1984, p.50-52. Êxodo de Moisés. São Paulo, Loyola, 1974, p.50, 79, 122, 142.
61
particularidade do uso do motivo do “novo êxodo”. Esta não é
a questão de um complexo temático fechado84. Os textos
distribuídos em freqüentes análises, as quais nem sempre
podem ser interpretados de uma maneira equivocada” 85.
O motivo do êxodo por sinal tem freqüentemente causado diversas
interpretações e os textos do Dêutero-Isaías em análise demonstram que motivos
isolados têm uma estreita ligação do êxodo do Egito sendo recordados no exílio
da Babilônia:
“Motivos isolados algumas vezes estão em nítida relação
como o milagre do mar dos caniços e a caminhada no
deserto. Em outras situações estão isolados ou usados num
contexto diferente (compare o motivo da passagem a seco
no mar em relação com a correnteza em 51,10 com 42,15 e
Is 50,2; o motivo da dádiva da água em 43,20 com 44,3).
Este motivo não deixou dúvidas de uma real alusão ao êxodo
do Egito” 86.
A disparidade de interpretações leva o autor a concluir que:
“Nesta difusa situação dos textos, muitos autores tratam com
uma admirável liberdade, as diversas “provas documentais”
para uma saída da Babilônia e para um regresso dos
exilados, a construção de uma estrada de Javé e a entrada
de Jerusalém, o dom da água e os rios, o cultivo da
plantação no deserto e a reconstrução do país não tem
textos semelhantes no primeiro êxodo, o desenvolvimento
84CROATTO, José Severino. Êxodo uma hermenêutica da liberdade. São Paulo, Paulinas, p.35-74.85KIESOW, Klaus. op. cit., p.17.86KIESOW, Klaus. op.cit., p.17
62
ilustra isto através da comparação com o Pentateuco e
aplicá-lo à situação do exílio” 87.
Klaus Kiesow complementa a situação do êxodo em Dêutero-Isaías
citando outro autor A. Zillessen que descreve da seguinte maneira:
“O exílio da Babilônia é uma equivalência do cativeiro do
Egito. Os sinais de castigo como seca, falta de água, de ar
são lembranças das pragas do Egito. A saída não é sigilosa,
apressada, mas deve constituir uma festiva procissão,
acompanhada pelo próprio Javé que, como na primeira
caminhada, estava presente na nuvem e no fogo... O milagre
no mar dos caniços deve-se repetir na obstrução da água e a
feliz travessia..., sendo porém maior que todos os antigos
acontecimentos, tem o seu ápice com: a estrada ou caminho
maravilhosamente preparada seguindo por montanhas
rebaixadas, as profundezas do deserto aterrados... e a
caminhada através de tremendos acontecimentos da
natureza, a maravilhosa transformação do deserto em uma
terra rica em água e nutrientes, em uma abundante e
verdejante vegetação. Os povos vizinhos e distantes, os
animais selváticos louvam e exaltam as maravilhas de
Deus”88.
K. Kiesow mostra que esta característica dos textos do Dêutero-
Isaías violenta um pouco as características originais e diferem do primeiro êxodo.
A interpretação se fosse rigoroso deveria compor o texto como se desenrola no
primeiro êxodo. O Dêutero-Isaías não leva a pressupor a tomada da terra e a
conquista que se segue no primeiro êxodo após a viagem pelo deserto. O
87KIESOW, Klaus. op.cit., p.1888KIESOW, Klaus. op.cit., p.18-19
63
Dêutero-Isaías somente mostra um novo êxodo, uma nova caminhada, um novo
retorno: o de Javé a Sião.
No final das contas o que o Dêutero-Isaías faz é relembrar a Gola e
mostrar aos indecisos que a nova Gola iniciou e a antiga terminou. A mensagem
destas narrativas é composta para lamentar ou convocar os exilados para o
retorno. Esta lembrança era um sinal de um ritual, de uma festa de ano novo para
que o povo jamais se esquecesse da esperança da saída do exílio89.
4.2 O NOVO ÊXODO COMO PARADIGMA E ANÁMNESIS EM DÊUTERO-
ISAÍAS90
O primeiro êxodo é interpretado no segundo êxodo. O segundo
êxodo é um paradigma e uma anámnesis do primeiro êxodo. O êxodo babilônico é
um paradigma do êxodo do Egito. O segundo êxodo é uma reelaboração teológica
do primeiro êxodo. Um êxodo relata a história e o outro a teologia91.
O Dêutero-Isaías, conclama os prisioneiros de Babel a voltarem à
pátria 40,3-5,9-11. Descreve a saída da terra da Babilônia com o olhar posto no
êxodo de Israel do Egito. A saída de Babel será muito mais maravilhosa porque
acompanha maiores prodígios de Deus. O deserto, através do qual será
construída a magnífica estrada plana, se transforma, pelo poder de Yahweh -
assim anuncia o profeta numa arrojada visão - em um paraíso. O Senhor mesmo,
qual pastor solícito, guiará o seu povo, apagará a fome e a sede e, guiando e
protegendo os exilados no caminho de volta, será a sua vanguarda e a
89KIESOW, Klaus. op.cit., p.19-2090WIENER, Claude. O Dêutero-Isaías - O profeta do novo êxodo. São Paulo, Paulinas, 2a.edição, p.9-17,50-51; LACK, Remi. L’universo simbolico del secondo Isaias (40-55). In: Leiture Struturalista dell’Antico Testamento. Borla Edizioni, Roma, 1978, p.38-64; LACK, Remi. Symbolique du Livre d’Isaie. Biblical Institute Press, Analecta Biblica, 59, Roma, 1973, p.77-121.91 Claude Wiener, op.cit., p.9-17.
64
retaguarda. As grandiosas imagens com seus traços particulares e o termo de
comparação, em segundo plano, para realçar o esplendor do novo êxodo. Assim
Claude Wiener descreve o êxodo no Dêutero-Isaías de maneira lúcida e
perspicaz92.
O profeta Dêutero-Isaías ou o profeta do novo êxodo recorda o
primeiro êxodo da seguinte maneira em 43,18: “não vos lembreis das coisas
antigas, nem considereis as coisas passadas”. Sempre se refere ao êxodo do
Egito. E ainda ele mostra em outras passagens a maneira diferente do primeiro
êxodo: “Eis que faço novas todas as coisas, que está saindo à luz, porventura não
o percebeis? Eis que porei um caminho no deserto, e rios no ermo” (Is 43,19). No
primeiro êxodo o caminho passava pelo mar e pelo deserto, no segundo êxodo o
caminho passará pelo deserto.
Um detalhe importante é que, no primeiro êxodo, o cerne da questão
é a profissão de fé dos israelitas que permaneceu como a ação salvadora de Deus
na travessia do mar dos caniços. O Dêutero-Isaías usou o acontecimento do
êxodo como o protótipo da ação salvadora de Deus, como exemplo, a
prefiguração da salvação eminente.
Gerhard von Rad mostra em sua teologia que a pregação do
Dêutero-Isaías está estreitamente vinculada com o acontecimento da época da
vinda de Ciro e que a sua mensagem tem sido formada de três tradições da
profecia anterior: a tradição do êxodo, a tradição de Davi e a de Sião. O primeiro
plano de sua visão do futuro o ocupa, sem lugar de dúvidas, a tradição do êxodo.
De todos os atos salvíficos que Javé em favor de Israel, este se acha de tal
maneira no centro de tudo que o profeta só pode representar-se no acontecimento
salvífico futuro como um novo êxodo93.
92 Claude Wiener, op.cit., p.50 (grifos meus)93 RAD, Gerhard Von. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo, Aste, vol.II, 1986, 2a.edição, p.230 (citação livre).
65
Conforme Gerhard von Rad,
“o Dêutero-Isaías conhecia muito bem todas as tradições
antigas de Israel e principalmente a tradição do primeiro
êxodo. Em várias oportunidades o Dêutero-Isaías menciona
este êxodo em sua obra. O profeta do novo êxodo transforma
todas as tradições do antigo Israel com base na tradição do
novo êxodo. Exemplos destas tradições podem ser
mencionados: a tradição de Abraão em 41,8; 51,1, ou a
figura Jacó em 43,22. Nestas tradições dos patriarcas
começa a história da salvação. Tudo isto conduz ao novo
êxodo. Ele mostra ainda que a tradição da cidade de Sião-
Davi é enfatizada na construção da vida do retorno “pois o
êxodo leva até uma cidade da qual Javé tem saído como
protetor, que será reconstruída de novo” 94.
Para Gerhard von Rad, o êxodo e o novo êxodo são uma história da
salvação e da tradição. Javé será o Nagib, o chefe de Israel, que conduzirá o povo
pelo deserto, o caminho de volta a Sião (55,4). Também ele será o goel, o
redentor e resgatador e o criador do novo Israel, do novo êxodo95. Os verbos
“criar” e “resgatar”, conforme Gerhard von Rad, designam o momento da salvação.
O Dêutero-Isaías é o único profeta a tratar do motivo da criação entre
todos os demais profetas. Para este profeta o autêntico acontecimento salvífico é
o êxodo e o retorno à terra destes exilados, com a vinda do próprio Javé, que
acompanhará o seu povo. O motivo do êxodo nada mais é que aquilo que Gerhard
von Rad designa: um equivalente histórico-salvífico da primeira saída de Israel do
Egito. Javé saiu como um guerreiro em outro tempo contra o Egito 42,13. Neste
novo êxodo, com uma diferença: sem mortes e destruição e sim com a paz sairão
da Babilônia. Javé dará de beber milagrosamente a seu povo com a água no
94 RAD, Gerhard Von. op. cit., p.231.95 RAD, Gerhard Von. op. cit., p.231.
66
deserto em Is 48,21. Pois este novo êxodo será muito mais maravilhoso que o
antigo, pois desta vez as pessoas não sairão depressa e escondida. Esta idéia da
pressa era um elemento importante nas antigas tradições do êxodo (Ex 12,11; Dt
16,3). Javé pessoalmente conduzirá o povo de retorno a Sião.
Claude Wiener96 mostra que a lembrança do deserto, com suas
grandezas, permaneceram, sem dúvida, profundamente gravadas na memória de
Israel. E, quando Israel se encontra de novo em terra estranha, surge de novo a
esperança de voltar à terra dos antepassados. Esta volta será à imagem da
marcha de outrora através do deserto. Este é o tema constante de Is 40-55: a
nova marcha no deserto será tão maravilhosa que fará esquecer a marcha de
outrora (43,16. 18. 19). O passado e o futuro se misturam nessas evocações
(48,20-21). Como outrora no deserto na coluna de nuvem e na coluna de fogo, o
próprio Senhor conduzirá a marcha de Israel 52,12. Pois, afinal de contas, é de
uma vinda de Deus que se trata. Mais ainda do que regressar à sua terra, Israel
deve se preparar para acolher o Senhor que vem; instalar-se no deserto é marchar
junto com ele, é encontrá-lo97.
Claude Wiener, ao afirmar que o Dêutero-Isaías faz uma conexão
com o primeiro êxodo para relacionar os dados do segundo êxodo, mostra a
alusão ao começo de sua história de forma clara: a alusão a princípio refere-se
realmente ao contexto do êxodo. Primeiro faz uma evocação de um passado de
vergonha e de ultrajes, com destaque para dois períodos importantes, que ele
denomina de: período da “adolescência” que se refere ao tempo do êxodo no
Egito descrito em Jr 2,2, e a vergonha do tempo presente certamente não é “o
exílio no Egito quando a nação ainda não tinha esposo”, mas sim o pecado, que
iniciou no tempo do êxodo. Estas idéias podem ser notadas no profeta Os 9,10 e
mais fortemente em Ez 23,3 e Sl 78,12-18. O tempo da “viuvez” se refere à vida
96 WIENER, Claude. O êxodo de Moisés. São Paulo, Edições Loyola, 1974, p.122.97 Idem. p.122-127.
67
sem o esposo. O exílio foi uma conseqüência do pecado de Israel a ser pago na
Babilônia98.
Na verdade, Claude Wiener quer dizer com isto que “o primeiro
êxodo e o novo êxodo” é para Israel, desde sempre, a lembrança fundamental
destes acontecimentos. A saída do Egito é o fato ao qual Israel deve a sua
existência como povo, povo salvo e povo do Senhor.
Outros autores analisados99 concordam em designar o novo êxodo
como forma de recordação, tanto nos outros profetas como também no Novo
Testamento, que se reportam a esta rememoração (Am 3,1; 5,25; Os 2,17; Mq
6,4-5; Jr 2,2-3; Ez 20; Ag 2,6; Sl 18; 68; 77; 78; 105; 106; 114; 136 e 137).
Estas citações mostram as recordações do passado e são para
testar a memória do povo. Fazem com que a memória esteja sempre viva quanto
aos acontecimentos futuros. O novo êxodo será melhor que o primeiro êxodo, pois
fará esquecer as coisas passadas. O próprio profeta do Dêutero-Isaías usa esta
linguagem e uma terminologia especial para designar este novo êxodo como uma
recordação do antigo. Este novo êxodo é uma nova criação. Não haverá
necessidade de recordar as coisas antigas. Deus irá recriar criar de novo o povo
de Israel. O êxodo é o ato criador da nova história de Israel e do próprio povo de
Israel.
Como no primeiro êxodo se tem a criação da história e a criação do
povo de Israel através da fé javista, no segundo êxodo se tem a recriação do povo
de Israel: o novo Israel que cantará e louvará a Javé, o seu Deus.
98 Ibidem. p.122-127.99 BLENKINSOPP, Joseph. Alcance e profundidade da tradição do êxodo no Dêutero-Isaías 40-55. In: Concilium. Dez, 1966, p.37-48; ZIMMERLI, Walther. Il nuovo esodo nella predicazione dei due grande profeti dell’esilio. In: Rivelazione di Dio (tradução de Gottes Offenbarung, Christian Kaiser Verlag, Muenchen, 1963), Editrice Jacca Book, Milano, 1975, p.175-185; ANDERSON, Bernhard. Exodus tipology in Second Isaiah. op. cit, p.177-195; WIENER, Claude. op. cit., p.122-127.
68
CONCLUSÃO
Exemplos das lembranças destas tradições do êxodo podem ser
esboçados da seguinte maneira:
A A promessa aos patriarcas
1 - Isaías lembra o nascimento de Israel desde Abraão que Javé chama e o
abençoa em 41,8; 51,1 -2.
2 - A outra parte da história de Israel começa com o pecado de Jacó: o primeiro
patriarca citado por Isaías em 43.27 também está correspondente em Os 12,3. A
benção aos descendentes é reiterada em 48,18-19 que também inclui o dom da
terra, o milagre da fertilidade de Israel em 49,19-21; 54,1-3 citando Gn 28,14 e por
fim a mediação do benefício de salvação de outras nações em 42,6-7 citando Gn
12,2-3.
B A libertação do êxodo no Egito
1) Javé liberta o seu povo em 40,10; 51,9; e 52,10. A glória de Javé é vista pelo
povo no antigo êxodo (Ex 16,7) e agora tem sido vista por todas as nações em Is
40,5.
2) Não há alusões às pragas do Egito em Dêutero-Isaías, nem referências à
páscoa. Somente a menção de que o povo não precisaria sair depressa como fez
antigamente no Egito, citações em Is 52,12 e em Dt. 16,3; Ex 12,11.
3) Durante o êxodo Javé seria o protetor do povo; temos as citações em Is 52,l2
ou Ex 13,21-22 e Ex 14,19-20.
4) Javé guerreira pelo povo em Is 42,13 citando Ex 15,3; Ele sairá vencedor da
batalha em Is 51,9-10 citado de Ex 14,25. Ele derrotaria os carros e os cavaleiros
69
em Is 43,16-17 citado de Ex 14.28e 15,10-21. Acabariam com os opressores de
Israel, Is 49,24-26; 51,22-23 citado de Is 52,3-6.
5) O novo êxodo será acompanhado de um cântico como cântico de vitória de
Míriam em Is 42,10-13 citado de Ex 15,21.
C A jornada através do deserto
1) Javé prepara o caminho pelo deserto e guia o povo em Is 40,3-5; 42,16;43
citando em Is 11,16; 35,8-l0.
2) Pelo caminho o povo terá alimentação e a bebida necessária em Is 41,17-20;
43,19-21; 49,10. Ele fará jorrar água pelo deserto como ocorreu na rocha de
Meribá em Is 48,21 citado de Ex 17,27; Nm 20,8. O deserto será transformado em
Is 49,9-11; 55,13 são citados em Is 35,6-7.100
D A nova entrada na terra prometida
1- Javé guiou seu povo pelo deserto a Sião e a terra foi dividida entre as tribos de
acordo a Is 49,8
2- O novo Israel consistira na confederação tribal que se reunira na Babilônia e na
dispersão a Sião, a cidade santa em Is 52,1.
No esboço anterior notamos que o Dêutero-Isaías faz uma história da
história de Israel partindo dos patriarcas até o fim do cativeiro da Babilônia, a
saída deste e a chegada a Sião, a cidade santa de Davi. O Dêutero-Isaías
relembra as leis passadas, alude às tradições, a criação e a nova criação até a
transformação da natureza em Is 51,3 citando Ez 28,13. Na criação fala do tempo
da criação primeira a nova criação da terra e do céu em Is 40,12-31; 42,5; 44,24;
45,9-13, 18; 48,13; 51, 13-16. Para o Dêutero-Isaías a nova criação será da
100 NAVARRO, Enrique Farfan. El desierto tranformado, una imagem deuteroisaniana de regeneracion. Pontificio Instituto Bíblico, Analecta Bíblica: 130, Roma, p.275. A obra se refere a transformação do deserto no Dêutero-Isaías.
70
criação fora do caos (em Is 45,18-19), fala da soberania de Javé na criação de
todas as coisas se põe em conexão com a história. A criação está também
relacionada com a redenção.
A criação está em relação com a história da salvação. Deus nestes
textos é entendido como o criador e soberano. Fica claro também a tradição de
um novo começo e um novo fim. Não só cosmológico como também teológico que
é a mensagem do próprio Dêutero-Isaías. Esta é uma tipologia real da história de
Israel. O êxodo é uma garantia de que Javé redimirá o seu povo e que os eventos
demonstrados têm um propósito de sabedoria e de poder para o cumprimento da
vontade de Deus. Esta mensagem tem como objetivo a proclamação de que Javé
é o Senhor de seu povo e principalmente o Senhor de suas histórias.
4.3 O NOVO ÊXODO COMO SALVAÇÃO EM DÊUTERO-ISAÍAS101
A saída do Egito é o encontro fundamental da fé de Israel em Javé. É
uma confissão de fé. Essa relação com a fé se cristalizou na Bíblia. Na realidade
os relatos querem demonstrar que o pecado levou o povo ao exílio no Egito e na
Babilônia. A recondução ao deserto nas Escrituras mostra o pagamento e o
perdão destes pecados. A retirada destes locais de escravidão, o perdão dos
pecados conferido ao povo é o motivo desta salvação.
Profetas como Os 2,16-17; Jr 31,31 e Ez 20,32-34 se referem ao
novo êxodo como uma forma de condenação pelos pecados. Nem sempre o novo
êxodo tem como características a condenação. O novo êxodo não tem como
características a condenação. O profeta Dêutero-Isaías, em várias oportunidades,
através de passagens magistrais, mostra que o deserto e o exílio são etapas da
salvação propostas por Javé. Por isso ele é identificado como o profeta da
salvação. Em Ezequiel, o novo êxodo, vem descrito como o grande “Dia de Javé”.
101 Sigo como exemplo o trabalho de Walther Zimmerli op. cit., p.175-185.
71
Nele o povo no Egito não é condenado a trabalhos forçados (Ez 34,41). A ira de
Javé demonstra que o povo foi condenado à escravidão para que a força de Javé
seja demonstrada na libertação do povo da escravidão.
O cenário que vem depois da saída do cativeiro, a caminhada e a
peregrinação pelo deserto, manifesta a Salvação. A expressão em Ezequiel do
“deserto do Egito”(Ez 20,36) é a evocação das coisas passadas e a estranha
expressão deste mesmo profeta “o deserto dos povos”(Ez 20,36) para evocar a
caminhada à terra prometida. As tradições do deserto evocam, pois, os juízos
divinos nos confrontos com o pecado do povo. Haverá um juízo denominado de
“Dia de Javé”, onde o povo estará face a face com ele.
Para Walther Zimmerli102 o êxodo e o novo êxodo em Ezequiel
significam: vida e morte. Vida no momento em que o povo é libertado e tem como
recompensa o retorno à terra prometida. A morte seria a negação de tudo isto na
perspectiva escatológica do profeta.
Desta forma o profeta reconhece e demonstra a futura ação salvífica
de Javé. Assim sendo, Javé tem três prerrogativas com suas ações salvíficas:
como rei, como juiz e como pastor. O rei soberano liberta Israel, o juiz que julga as
nações opressoras e o próprio povo de Israel em seus pecados, e de pastor
conduzindo o povo pelo deserto em retorno à terra prometida.
O profeta Dêutero-Isaías é o profeta da salvação, tem uma
linguagem diferente para expressar o novo êxodo. Ele traz um discurso figurado
que é um discurso. Em sua obra abundam as palavras criadas para demonstrar
estes episódios, imagens construídas e alusões dos grandes eventos que para ele
é o novo êxodo. Esta é a sua mensagem central: o novo êxodo é uma salvação. O
texto de Is 47 nos mostra os exilados na terra da deportação. Javé abaterá a
102 ZIMMERLI, Walther. Op. cit., p.180-185.
72
Babilônia, humilhará os deuses estrangeiros em 46,1-3; enviará os destruidores
que acabarão com os escravizadores em 43,14-46.
Para o Dêutero-Isaías o segundo êxodo na Babilônia, será muito
mais maravilhoso. O profeta começa a mostrar suas diferenças em relação aos os
outros profetas. Notamos que existe no Dêutero-Isaías uma criatividade como
escritor. A diferença entre o profeta Ezequiel e o Dêutero-Isaías está em que
Ezequiel fala do “deserto dos povos” (Ez 20,36) para designar o retorno à pátria,
que na linguagem do Dêutero-Isaías corresponde a “através do deserto”. Ezequiel
não mostra os milagres. O Dêutero-Isaías designa a transformação do deserto e o
primeiro êxodo mostra a nuvem, ao anjo, a coluna de fogo.
Javé no Dêutero-Isaías tem a imagem do pastor que guia o povo,
protege e cuida do rebanho, para que nada aconteça a ele: Is 40,11 citando Gn
33, 13; Sl 23. Aquele que conduz à fonte das águas em 49,10 é o pastor que
atravessa o deserto e que é vitorioso como um guerreiro na batalha em 42,13. Ele
é quem tem como prêmio levar e entregar salvo o povo no cap. 40. Para isso há a
necessidade de se manifestar a glória de Javé para que todos reconheçam que
Javé é o salvador. Isto não é mostrado por outros profetas anteriores ou
posteriores.
Assim sendo, as figuras de alto e baixo, montanhas e outeiros.
Massa e Meribá, a criação e nova criação, as colinas e as depressões, terra árida
e a terra fértil, designam sempre a grandeza de Javé em transformar todas as
coisas. A nova criação à semelhança do novo êxodo se dará será no deserto. Os
morros serão aplainados, as montanhas rebaixadas, os vales aterrados. Haverá a
água no deserto e no ermo. As árvores estarão florescendo, rios correndo. Tudo
isto faz parte desta nova criação e do novo êxodo. Tudo: homens, nações,
natureza, povos, animais do campo, as árvores, as montanhas glorificarão a Javé
(41,19; 55,13; 42,10-14; 43,20; 55,12).103
103 NAVARRO, Enrique Farfan. op. cit., p.186-204.
73
Enquanto os outros profetas falam de juízo, de pecado e da
condenação de Javé, o Dêutero-Isaías fala de retorno e da salvação. Enquanto os
outros falam do retorno à escravidão e ao deserto, o Dêutero-Isaías fala da saída,
da graça, da glória de Javé, do louvor prestado a ele pela salvação, admiração
dos remidos e da salvação dos povos.
4.4 O ÊXODO EM DÊUTERO-ISAÍAS COMO O NOVO ÊXODO
O Dêutero-Isaías privilegia as tradições encontradas no Pentateuco;
tradições por ele reinterpretadas e reelaboradas conforme a mensagem
querigmática de sua profecia. Tradições como dos patriarcas, de Moisés, da
libertação, do êxodo do Egito, de Davi e de Sião são veiculados em sua pregação.
O profeta enfatiza a tradição do êxodo. Encontramos em seus textos expressões
para designar estas tradições na sua pregação: coisas antigas-coisas novas, um
caminho no mar, um caminho no deserto, o caminho nas águas - rios no deserto,
coisas primeiras - coisas do futuro, um caminho no deserto - uma senda na
estepe.
Estas comparações servem para mediar e nortear a sua mensagem
alenta aqueles que estão distantes da pátria. Os escritos de Dêutero-Isaías
servem para fortificar a fé dos que vacilam no Deus que os desamparou. Auxilia e
ajuda os exilados a relembrarem de Javé mesmo no cativeiro. Mostra que Javé
salvará o povo e o colocará a caminho de volta para Jerusalém.
O êxodo da Babilônia será, na comparação do êxodo do Egito, muito
mais maravilhoso, fenomenal e milagroso. Como houve milagres na saída do
Egito, haverá milagres na saída da Babilônia. Não acontecerão as pragas como
ocorreu no Egito e a destruição dos inimigos de Israel. Em compensação os
74
milagres do novo êxodo serão a transformação do deserto para a passagem do
povo em retorno à pátria. As árvores, as montanhas, as colinas baterão palmas. O
deserto será transformado com a irrigação, com rios no ermo, florescerão as flores
e as árvores do campo. No deserto seco nascerão os rios, no lugar do espinheiro
crescerá o cipreste, no lugar da sarça a murta.
O êxodo no Dêutero-Isaías, comparado com o primeiro êxodo, será
diferente nos acontecimentos e nas maravilhas. Existem semelhanças nos
acontecimentos e nas maravilhas. Existem semelhanças de acontecimentos,
porém existem também muitas diferenças. No primeiro êxodo, havia a
intermediação de Moisés para retirar o povo. Neste segundo êxodo o próprio Javé
com seu braço forte tirará o povo. Javé guiará o povo na retaguarda e na dianteira.
Não guiarão então: as nuvens, a fumaça e o fogo, nem o sol e a lua servirão para
iluminar e ajudar o povo a se orientar. Ele mesmo guiará o povo para a terra
prometida.
A relação de um êxodo para o outro está na transformação da
própria natureza e a sua função na vida do povo. Esta natureza tem uma função e
importância imediata nas narrativas dos dois êxodos. A natureza influencia e
privilegia a situação do homem oprimido e escravizado. A contraposição do
deserto midbar com as águas mayim fica evidente na comparação dos dois
êxodos. O primeiro êxodo privilegia o deserto, a caminhada por ele, sua travessia,
a peregrinação durante quarenta anos, os mandamentos lidos no deserto, o Deus
no Sinai.
O segundo êxodo privilegia a transformação do deserto: endireitar o
caminho tortuoso, aterrar os vales, aplainar as montanhas, fazer uma estrada
através do deserto. O povo jubilante juntamente com a natureza “passeia” pelo
deserto em direção ao Sião. Sião é uma instituição e uma tradição davídicas. No
primeiro êxodo as tradições são mosaicas: Moisés é o baluarte desta narrativa. No
segundo êxodo Sião é o representante desta tradição.
75
Sião é a cidade que receberá os eleitos jubilosos e libertados do
cativeiro do êxodo babilônico. No primeiro êxodo após a travessia do Jordão, fica
evidente a posse da terra prometida. No segundo êxodo a cidade de Sião
receberá os remanescentes, os eleitos de Javé, mas não haverá luta e a posse
pela terra prometida. A idéia permanece que a terra é de Javé e
conseqüentemente dos exilados que retornam.
A idéia dos dois êxodos contrapõe o mar, a água e o deserto. Sendo
assim a idéia do seco e do úmido que está no início da criação parece estar
presente.
O seco e o úmido se contrapõem nos dois êxodos. A travessia é a
seco no primeiro êxodo. Caminha-se pelo deserto. O deserto é sinônimo de
aridez, de seco. No segundo êxodo se atravessa o deserto transformado de seco
em rios de águas. Existe uma contraposição seco-úmido104 nos dois êxodos. O
mar está seco e o deserto está irrigado. O deserto transformado é o novo êxodo.
O deserto sempre foi tido como o ideal de vida. Em algumas
narrativas o ideal do deserto está relacionado com o paraíso. A localização
geográfica do paraíso está no meio da aridez do deserto. No meio do deserto está
o oásis, o oásis é o paraíso no deserto tanto para caravanas como para qualquer
tentativa de sobrevivência no deserto. No Antigo Testamento encontra-se também
= a saída de Abraão de Ur para a terra prometida no deserto. A fuga de Abraão e
de José para o Egito pelo deserto.
As narrativas dos evangelhos mostram o deserto como o início de
tudo: a pregação de João Batista começa no deserto, o anúncio sobre a atuação
de Jesus está no deserto; a vinda de Jesus começa pelo deserto; a tentação de
Jesus ocorre no deserto; a fuga de Jesus e sua família para o Egito seguem pelo
deserto; a conversão de Paulo no caminho de Damasco é um evento do deserto.
104 CASALIS, Mathieu. O seco e o úmido: uma análise semiológica dos mitos da criação e do dilúvio. In: Estudos Teológicos, no. 3, v.24 (1984), São Leopoldo, p.250-281.
76
O êxodo do Dêutero-Isaías é o novo êxodo, é a teologia do novo
êxodo e a teologia do caminho a teologia da transformação do deserto, e a
teologia da salvação. O êxodo no Dêutero-Isaías é o centro teológico da
mensagem deste profeta desconhecido. Este é o profeta, que em seu gênio
literário, combina a poesia, o hino e a proclamação profética de modo (sui generis)
em sua época. Enquanto os profetas anteriores anunciam a catástrofe, a ruína, a
destruição por causa do pecado do povo, este profeta exílico, pelo contrário,
anuncia a salvação, a saída do cativeiro babilônico, o perdão dos pecados e o
retorno a Sião. O êxodo sintetiza através dos hinos e da poesia toda a alegria e o
júbilo da salvação do povo retornando à pátria. Este profeta utiliza linguagens
figuradas que são retiradas da natureza para mostrar esta situação de salvação.
CONCLUSÃO
Nesta parte fizemos uma reflexão sobre o motivo do êxodo em
Dêutero-Isaías. Notamos através da pesquisa que o assunto a ser debatido existe
muito tempo. Apesar de a discussão ser antiga, novos resultados foram obtidos
em tempos recentes. Os antecedentes da pesquisa são claros. O tema do êxodo e
do novo êxodo não chegou ao final e a um consenso geral. Tanto a teologia
européia como a latino-americana pesquisaram o tema e chegaram a resultados
diferentes.
O motivo do êxodo em Dêutero-Isaías foi usado como símbolo,
tipologia, como paradigma e anámnesis. Então ficou evidente que o êxodo
primeiro é refletido no segundo êxodo. Que o segundo êxodo relembra as
tradições vétero-testamentárias como a promessa aos patriarcas, a libertação do
Egito, a jornada através do deserto, e a entrada em Sião - terra prometida. Que o
novo êxodo é aplicado como salvação dos judaítas pelo profeta. Que o êxodo é o
novo êxodo e diferencia-se em vários aspectos do primeiro êxodo = a
77
transformação do deserto para a passagem do povo sob a autoridade e direção de
Javé.
Este capítulo serve de base para apreendermos os resultados
obtidos por outros especialistas sobre a temática do novo êxodo. O capítulo ajuda-
nos a analisarmos no próximo a escolha e a exegese de textos em Dêutero-Isaías.
Os resultados obtidos aqui serão ou não comprovados na próxima secção. A
temática desenvolvida no anterior será demonstrada em frente.
78
CAPÍTULO 5 O MOTIVO DO ÊXODO NOS TEXTOS DO DEUTERO-ISAÍAS
Neste capítulo procuraremos fazer uma exêgese de textos
escolhidos no Dêutero-Isaías. Texto que enfatizem o tema do êxodo e do novo
êxodo. Os textos foram escolhidos conforme a sua importância implícita e explícita
sobre o tema do êxodo.
Os textos em número de seis que demonstram temática são: Is 40,1-
11; 43,16-21; 49,7-12; 51,9-14; 52,7-12 e 55,12-13. Em primeiro lugar serão
expostos os textos e as traduções dos mesmos. Em segundo lugar as questões
exegéticas mais importantes. Em terceiro lugar as questões teológico-exegéticas.
Será feito comentário acerca do texto para evidenciar o motivo do êxodo. Uma
conclusão dos resultados obtidos em cada exêgese do texto escolhido. Este
capítulo tem como ênfase a amostragem do motivo do êxodo nos textos
escolhidos.
5.1 Isaías 40,1-11 105
105 Utilizo os comentários de: WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66. A commentary. Philadelphia Westminster Press, 1969; CROATTO, José Severino. Isaias, La palabra profetica y su relectura hermeneutica. La liberacion es posible. v.2: 40-55, 1994, p.5-17; MACKENZIE, John Louis. Second Isaiah Doubleday. New York, 1968; BONNARD, Pierre E. Le second Isaie. Paris, J. Gabalda, 1972, p.83-92. Os textos originais são de Hans Peter Huger, da BHS.
79
5.1.1 OTEXTO EM HEBRAICO
לב ־ על דברו אלהיכם׃ יאמר עמי נהמו נהמו
כי עונה נרצה כי צבאה מלאה כי וקראו ירושלם
לקחה מיד יהוה כפלים בכל ־ חטאתיה׃ קול קורא
לאלהינ׃ מסלה בערבה ישרו יהוה דרך במדכרפנו
העקב והיה ישפלו וגבעה וכל־הר ינשא כל־גיא
למישור והרכסים לבקעה׃ דבר׃ ונגלה כבוד יהוה וראו
כל ־ בשר יחדו כי פי יהוה קול אמר קרא ואמר מה
אקרא כל ־ הבשר חציר וכל־חסדו כציצ השדה׃ יבש
יבש יהוה נשבה בו אכןחציר כי רוח חציר נבל ציד
יקום לעולם׃ ל הר־גבה חציר נבל ציץ ודבר־אלהיו
עלי לך מבשרת ציון הרימי בכח קולך מבשרת ירושלם
הרימי אל ־ תיאי אמרי לערי יהודה היה אלהיכם׃ הנה
שכרו אתו ופעלתו לפניו׃ כרעה עדרו ירעה בזרעו יקץ
טלאים ובחיקו ישא עלות ינהל׃
5.1.1.1 Tradução
v. 1 “Consolai, consolai o meu povo, diz o Senhor”.
80
v. 2 “Falai ao coração de Jerusalém e dizei-lhe em alta voz, que a sua iniqüidade
está expiada, que ela recebeu da mão de Javé em dobro, por todos os seus
pecados”.
v. 3 “Uma voz chama: No deserto abri um caminho para Javé; na estepe aplainai
uma vereda para o nosso Deus”.
v. 4 ”Todo vale seja aterrado, todo monte e toda colina sejam nivelados, todos os
lugares escarpados sejam transformados em planícies, e os lugares elevados seja
aplainados”.
v. 5 “Então a glória de Javé seja manifestada e toda a carne o verá, pois a boca de
Javé o disse”.
v. 6 Eis uma voz que diz: “Clama, ao que pergunto: Que ei de clamar?”. Toda a
carne é erva e toda a sua graça como flor do campo.
v. 7 Seca-se a erva e murcha a flor, quando o sopro do Senhor sopra sobre elas.
(na verdade o povo é erva).
v. 8 Seca-se a erva, murcha-se a flor, mas a palavra de nosso Deus permanece
para sempre.
v. 9 Sobe a um alto monte, mensageiro de Sião; eleva a sua voz com o vigor
mensageiro de Jerusalém; ergue a sua voz e não te mais; e dize às cidades de
Judá: “Eis aqui o vosso Deus”.
v. 10 Eis que o Senhor Javé: Ele vem com poder, o seu braço lhe assegura o
domínio, eis que com ele o seu salário, diante dele a sua recompensa.
v 11 Como um pastor, apascenta Ele o seu rebanho com seu braço reúne os
cordeiros, os levará nos seus braços, conduz com carinho as ovelhas que
amamentam.
5.1.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS106
Este texto apresenta algumas dificuldades de análise.
106 Sigo aqui o livro de WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66 a commentary. Philadelphia, Westminster Press, 1969, p.33-36.
81
Primeiro, o texto está relacionado com 57,7-12. Alguns comentários
explicitam que v.1-2 é um prólogo e que a secção subseqüente de v.3-4, refere-se
ao motivo do êxodo e que a parte posterior de v.6-8 trata da vocação do Dêutero-
Isaías como se dá no Primeiro-Isaías no texto de 6,1-13.107 Claus Westermann diz
que os v.3.4.9 e os que antecedem e os que complementam esta perícope são
termos típicos de uma vocação profética. Nestes versos, ocorrem como em outras
secções, imperativos e exclamativos referindo-se ao retorno do exílio babilônico.
O texto de Is 40.1-11 pode ser dividido em quatro secções:
a - v.1-2 chama-se de prólogo
b - v.3-5 são as exclamações para o retorno do exílio
c - v.6-8 a vocação pela exclamação
d - v.9-11 a exclamação por Sião e por Jerusalém, as cidades de Judá.
Existem repetições enfáticas no v.1 como: “consolai”, semelhantes
ao termo: “desperta” de Is 51,9. Temos igual a repetição destes mesmos termos
em 51,17. Outra repetição é o triplo hinnein “eis que” em Is 40,9-11 que aparece
outras vezes.
Numa análise estrutural teríamos o seguinte esquema em forma do
conjunto:
a - v.1-2 prólogo
b - v.3-5 retorno pelo deserto
b’ - v.6-8 chamado pela exclamação (grito)
a’ - v.9-11 exclamação por Sião e Jerusalém.
O prólogo de 40.1-2 rompe por completo com o Primeiro Isaías.
Começa desta forma uma nova fase, um novo assunto, uma nova linguagem, uma
nova situação histórica. Podemos destacar no v.1a linguagem de reforço
encontrada também em outras passagens já assinaladas. O “consolai, consolai” é
107 WESTERMANN, Claus. Op. cit., p.33.
82
um termo ligado à misericórdia e à libertação do “meu povo” é encontrado no v.1b
como linguagem de reforço e ênfase. No v.2 deve-se destacar essencialmente o
termo “Jerusalém” que é o local exato para onde irão os exilados libertos de
retorno. Esta cidade e Sião referem-se ainda 1a construção da ideologia davídica.
O v.2c mostra que a iniqüidade do povo foi expiada. Que foi pago em dobro os
pecados que são encontrados no v.2d. Javé condena o povo ao exílio pelos
pecados cometidos.
Nos v.3-5 encontramos a narrativa do retorno dos exilados pelo
deserto. José Severino Croatto108 denomina esta secção de “o motivo do
caminho”. O v.3 designa o deserto como caminho. A distância referente ao trecho
em linha reta da Babilônia até Jerusalém está cheia de percalços e de acidentes
geográficos. O autor do Dêutero-Isaías sabia muito bem de todos estes fatores.
Assim sendo mostra que as colinas deveriam ser rebaixadas e transformadas em
planícies como a no v.4b, o vale deveria ser aterrado no v.4a, a direção para a
terra prometida cheia de curvas deveria ser endireitada no v.4c, e os lugares com
depressões deveriam ser aterrados no v.4d. Tudo isto se refere ao que deveria ser
chamado de “caminho de Javé”.
No v.5 há a manifestação da glória de Javé, que poderia ser
traduzida neste caso por poder (Qebod). No deserto será manifestada esta glória
ou poder (v.5a). Todos os seres contemplarão esta glória e com ela todas as suas
maravilhas do v.5b, pois a boca do Senhor está dizendo destas maravilhas (v.5c).
José Severino Croatto mostra que os v.6-8 fazem parte da
“linguagem sapiencial de comparação” 109. Encontramos a comparação do uso do
vegetal e da carne como figura de linguagem. Compara-se o homem (carne) como
uma coisa passageira e pequena (a erva - um vegetal). Este é um paradigma para
108 CROATTO, José Severino. Isaías 40-55. Buenos Aires, La Aurora, 1994. (uso o original em espanhol, mas está sendo traduzido pela Editora Vozes), p.13-17.109 CROATTO, José Severino. Op. cit., p.39.
83
designar a eternidade de Deus em contraste com a vida humana que é passageira
(v.6,7a,b.8).
O v. 7c é um acréscimo posterior (“na verdade o povo é erva”). A
expressão “nosso e vosso Deus” aparecem em cada uma das três secções: v.1-2;
v.3-5; v.6-8. Parece conectar uma parte com a outra. Pode também designar a
diferenciação entre o Deus de Israel e os deuses estrangeiros da Babilônia.
Clamor por Sião e as cidades de Judá (v.9-10) é a última parte da
secção do texto e designa a situação do mensageiro para mostrar o Deus de Sião,
em seu poder e domínio (v.10). No v.11 existe uma figura do pastor que é muito
comum em outros profetas (exemplo em Jr 23, 3; Ez 34,1). A expressão de “a voz
alta” também aparece na primeira parte. Parece uma figura de retórica; enfatiza-se
com as repetições Is 40,1-11 é uma poesia.
5.1.1.3 O MOTIVO DO ÊXODO
Os v.1-2 nos dão a idéia de Jerusalém como se fosse a esposa de
Javé. Isto ocorre outras vezes no próprio texto do Dêutero-Isaías, como em: o que
mais nos chama atenção nesta secção é a expressão “milícia” do v.2b. Neste
período, os cativos (neste caso os exilados) eram usados em alguns períodos
pelos conquistadores como soldados, combatentes ou até mesmo no trabalho
compulsório.110
A expressão: “consolai, consolai”, significa que está terminando o
exílio, a escravidão no sentido restrito e que a prática da vassalagem o trabalho
forçado, o serviço militar estará findando.
“O pecado no sentido social e econômico e as “iniqüidades” foram
expiadas em dobro. Todos estão mais do que pagos. A compreensão da divina
110 CARDOSO, Ciro Flamarion. O trabalho compulsório na Antiguidade. São Paulo, Editora Ática, 1984, p.14-18.
84
retribuição ainda está presente no Dêutero-Isaías. Apesar do recado, a retribuição
de Javé, o pagamento com o cativeiro, o sofrimento no exílio a libertação será
iminente (56,11,26). A libertação do cativeiro na Babilônia é uma questão de
momentos. Na política estará sobressaindo outra potência, outro reino. Este
império era usado por Javé para a destruição da potência opressora. Esta
potência destruiria a Babilônia dando auxílio e a libertação ao povo de Israel.111
Os v.3-5 são os de maior importância. Na secção anterior é mostrada
a preparação de Jerusalém e dos exilados. Os v.3-5 designam a preparação do
caminho de retorno, de um novo êxodo. Pode-se pensar no retorno do povo
exilado de forma literal e como outros pensam de um retorno espiritual. Como não
aconteceu de fato um retorno em massa. Esta espiritualização cria um novo112
problema, mas também a forma de um retorno histórico que não se deu de forma
integral.
“Nesta passagem o tema é o caminho, que se supõe da
Babilônia à Jerusalém.... O texto está construindo uma vez
mais com imagens literárias que, não obstante, respondem à
realidades experimentais.... Não sei chegar à Jerusalém por
via reta, senão por um caminho alternativo pela via
setentrional, onde existem vales e montanhas, que
necessitam ser aplainadas.... Deus se manifestará como
energia (poder) (termo mais correto para a tradicional
“Gloria”) para traduzir o hebraico 113.
Os judaítas são representados pelo escritor como na linguagem
sapiencial de comparações (vegetais) que ocorrerem outros textos do próprio
profeta (Is 40,6-8) para denotar a fraqueza humana 114.
111 CROATTO, José Severino. Op. cit., p.15.112 Idem, p.15.113 Ibidem, p.15.114 Ibidem, p.16.
85
Nestes v.6-8 encontramos um diálogo diferente dos demais
encontrados. Nas secções anteriores temos o indivíduo como mensageiro, nesta
parte é o próprio Javé/Deus o mensageiro. Aqui aparece uma novidade ainda não
encontrada: o intermediário como uma imagem elaborada, a erva e a flor para
representar a vida humana que é efêmera. O v.7 se parece muito com o v.24 do
mesmo capítulo. Ao nível ideológico há uma comparação entre o deus Marduk, o
deus nacional da Babilônia em contraposição com o Deus de Israel. Elohiym. Este
é mais poderoso que o outro deus por fazer a libertação e realizar o caminhar do
povo pelo deserto.
Os v.9-11 mostram uma nova mensagem. Esta mensagem é uma
mensagem profética: “sobe a um alto monte” e “eleva a tua voz”. O v.9 tem uma
linguagem de reforço para a mensagem do v.7 onde está presente o Deus de
Israel. A mensagem é de boas novas 115.
Em toda a perícope de Is 40,1-11 ocorre a cena da libertação e do
retorno do povo colinas e cidades de Judá serão as testemunhas destas façanhas.
O mensageiro vem de um local distante do deserto. O v.3 continua a mensagem
teológica, todos os ouvintes devem escutar o que Deus tem a dizer. No livro do
Êxodo, no primeiro êxodo, Javé libertou o povo do Egito com seu poder e com o
seu braço forte. No v.l0 repete-se a imagem novamente do poder e do braço forte
de Javé. A libertação em Isaías será: “ele vem com poder, e seu braço poderoso
lhe dará todo o domínio”.
O v.l0b mostra que Javé dará o pago, a retribuição aos opressores, o
que difere muito do v.2b, que, por seu turno, refere aos exilados. No v.11,
encontra-se a figura do pastor, o Senhor é o pastor, que livrará o povo e os
apascentará. Para que através do deserto haja alguém capaz de conduzir o povo
e somente Javé pode fazer este trabalho: “com pastor apascentará o seu
rebanho”, “com seu braço forte, reúne o rebanho”, “conduzirá com seus braços” e
115 Ibidem, p. 16.
86
“levará com carinho as ovelhas que ainda amamentam”. Isso difere do primeiro
êxodo, pois lá era Moisés que levava e guiava o povo.
O texto analisado da base para interpretações como = o novo êxodo
é uma anámnesis, um paradigma, uma comparação. O novo êxodo aqui repete o
primeiro êxodo como a teologia do caminho. Como no primeiro a passagem e a
marcha pelo deserto.
CONCLUSÃO
O texto anuncia o fim da escravidão na Babilônia e o começo de um
novo êxodo. Os exilados retornarão a Jerusalém e esta cidade deverá anunciar ás
outras cidades de Judá que Deus vem como um pastor que conduz o rebanho
liberto e conduzirá o povo de volta pelo deserto sob a proteção. O exílio findou, a
escravidão terminou, é a mensagem do texto. A idéia do primeiro êxodo está
implícita neste novo êxodo: á saída, o caminho pelo deserto, o retorno e a
chegada a Sião. Tudo isto que ocorreu no primeiro êxodo deve ocorrer no
segundo êxodo. A libertação do primeiro será menos magnífica que o segundo
êxodo.
Como aconteceu no primeiro êxodo, os milagres estão presentes no
segundo: no primeiro a passagem pelo mar (Ex 14,17) neste pelo deserto. O
presente do maná para a alimentação do povo (Ex 16,10) não tem correlato no
segundo; a manifestação de Javé do Sinai é substituída pela manifestação de
Javé no Deserto e em Jerusalém no templo. Assim será o segundo êxodo descrito
pelo caminho no deserto.
5.2 Isaías 43,16-21116
5.2.1TEXTO EM HEBRAICO
116 WESTERMANN, Claus. Isaiah, a commentary. Westminster Press, Philadelphia, 1969, p.126-129.
87
נתיבה׃ עזים ובמים דרך בים הנותן יהוה כה אמר
ישכבו בל־יקומו יחדו ועזו וסוס חיל ־ המוציא רכב
דעכו כפשתה כבו׃ אל ־ תזכרו ראשנות וקדמניות אל
־ תתבננו׃ הנני עשה חדשה התה תצמח הלוא תדעוה
אף אשים במדבר דרך בישמון נהרות׃
נתתי ־ כי יענה ובנות תנים השדה חית תכבדני
במדבר מים נהרות בישימן להשקות עמי בחירי׃ עם ־
זו יצרתי לי תהלתי יספרו׃ 5.2.1.1 TRADUÇÃO
v. 16 Assim diz o Senhor, que abriu o caminho no mar e uma senda nas águas
impetuosas;
v. 17 Os que lança os carros e cavalos, o exército com poder, caiam para não se
levantarem, se apagaram como a mecha que se extingue.
v. 18 Não lembrais das coisas passadas, nem penseis nas antigas;
v. 19 Olhai, eis que se fez algo novo, e está brotando; não o reconheceis? Abrirei
um caminho pelo deserto, nos rios secos.
v. 20 Me glorificarão as feras selvagens, chacais e avestruzes, porque oferecerei
água no deserto, rios no ermo, para acabar com a sede do meu povo, de meu
eleito.
v. 21 O povo que eu modelei, para proclamar o meu louvor.
88
5.2.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS
Numa análise estrutural temos a seqüência seguinte:
A. Abrirei um caminho pelo deserto, nos rios secos
B. Glorificar-me-ão as feras selvagens, chacais e as avestruzes
A’ Porque oferecerei água no deserto, rios nos ermos, para acabar
com a sede de meu povo, de meu eleito
B’ O povo que eu modelei, para proclamar o meu louvor.117
O texto poderia ser denominado de “o caminho no deserto”. Esta
secção está relacionada literariamente com 41,17-20 e com 42,14-17, que podem
ser classificados literariamente como “proclamação da salvação”.118 Conforme
Claus Westermann, a estrutura desta proclamação de salvação pode ser dividida
em:
a - lamento
b - proclamação de salvação
c - retorno de Deus
d - intervenção de Deus
e - o fim está próximo.
José Severino Croatto119 faz uma análise desta secção e encontra
nela um quiasmo:
A. v.19 c,d. abrirei um caminho pelo deserto, nos rios secos ...
nos rios secos ...
B. v.20 a,b. me glorificarão as feras selvagens,
chacais e avestruzes ...
A’ v. 20 c, d, e, f. porque oferecerei água no deserto, rios nos ermos,
para acabar com a sede de meu povo, de meu
eleito...
117 CROATTO, José Severino. op. cit., p.55-56.118 WESTERMANN, Claus. op. cit. p.126-129.119 CROATTO, José Severino. op. cit., p.45-58.
89
B’ v. 21 a, b. o povo que eu modelei, para proclamar o meu louvor.
O texto oferece uma citação quase literal de Ex 6,6 e também pode
ser encontrado nos salmos. O v.17a segue a descrição em Êxodo. Literalmente o
v.17 é também um Salmo. Parece que se refere a uma confissão de fé. Tem uma
natureza hínica.
Nos v.18-19a mostram-nos que o povo se esqueceu dos
acontecimentos primeiros descritos nos v.16-17, que é o êxodo. Neste aspecto
Javé realizará coisas novas “eis que faço novas coisas”, e mostra ainda que o
novo êxodo corresponda ao primeiro êxodo que vai ressurgir de novo. Existe uma
conexão imediata com o texto de Dt 6 e do Sl 78, que são as memórias do povo
que incitavam a recordar a lei de Israel: recordar, transmitir e proclamar. Porém
facilmente o povo se esquecera dos acontecimentos anteriores. Os atos salvíficos
do primeiro êxodo caíram no esquecimento.
O v.19b é um texto explícito sobre o novo êxodo: “abrirei um caminho
pelo deserto, nos rios secos”. Continua e completa 40,3.
O texto mostra as maravilhas proclamadas para acontecerem no
deserto: “as feras selvagens darão glórias: os chacais e as avestruzes”. O milagre
continua de uma forma ainda maior: “a água no deserto, e os rios nos lugares
ermos”, “para acabar com a sede de meu povo, meu eleito”. Fica assim
demonstrado como estes milagres descritos no primeiro êxodo era destruir para
salvar. No segundo êxodo é criar para salvar.
O v.21 mostra o resultado do novo êxodo. Tudo isto deve ser para a
glória, para proclamar o louvor a Javé. A expressão: “o povo que eu modelei”
refere-se à criação de todas as coisa e à criação do homem à imagem e à sua
semelhança como em Gn 2. O texto dá o resultado de uma nova criação. O novo
êxodo ultrapassa o primeiro êxodo. Com exceção do texto anterior sobre o novo
90
êxodo, este texto tem uma nova forma literária, é diferente dos demais. O texto é
uma poesia com início de um discurso de proclamação de salvação.
5.2.1.3 MOTIVO DO ÊXODO
A recordação do primeiro êxodo é para mostrar como será o segundo
êxodo. Este será de fato a promessa de salvação do exílio babilônico. No v.16
existe um tipo de Javé que é o salvador em contraposição ao Javé do v.17 que é o
destruidor dos inimigos do povo de Israel. Como ele destruiu os inimigos no Egito,
ele salva Israel na Babilônia. A promessa de destruição agora é para os
opressores atuais.
No v.18 temos um reforço dos acontecimentos dos v.16-17. A
pergunta é uma questão retórica, talvez para mostrar como o povo havia se
esquecido das maravilhas. Não se estava mais enxergando a realidade que
estava brotando e que aconteceria, a respeito de coisas que estavam muito
visíveis aos seus olhos. O v.19a mostra e também enfatiza tudo isto: “olhai, eis
que faço algo novo e que está brotando, não o percebeis?”.
O v.19b traz a idéia do que vai acontecer “será aberto um caminho
no deserto, e rios secos nos ermos”. Isto é descrito para ficar evidente a
grandiosidade de Deus que faz tanta coisa, a ponto de o povo não se lembrar
destes fatos. Porém, o profeta é aquele que faz o povo rememorar os fatos
através da pregação e do anúncio: “a voz alta sobre o monte”. O Dêutero-Isaías é
o profeta que faz lembrar o povo das maravilhas, dos atos portentosos de Javé.
Ele é o profeta do novo êxodo, é o profeta da salvação.
No v.20a Javé através do profeta, mostra que, se o povo se
esqueceu, não se lembra mais de nada, se o povo não presencia a Qebod
Yahweh, então são convocados os animais do deserto para que mostrem e
anunciem a glória de Javé: “glorificar-me-ão as feras selvagens, os chacais e as
91
avestruzes”. No v.20b Javé oferece um milagre que é “colocar a água no deserto,
rios nos ermos, para acabar com a sede de meu povo, de meu eleito”. Isto faz
lembrar as águas amargas do deserto do Sinai que se transformam em água
potável, as águas de Meribá e o milagre de Moisés fazendo jorrar água da rocha
no primeiro êxodo. O Dêutero-Isaías usa a tradição de uma forma muito
interessante para rememoração dos fatos que acontecerão.
CONCLUSÃO
Este texto explicita que o cativeiro acabará: porque a Babilônia será
destruída, o povo eleito se esquecerá do primeiro êxodo, pois está surgindo um
novo êxodo. Haverá uma nova libertação da servidão da Babilônia. O êxodo
descrito em Ex 6,6 serve como base e modelo da tradição da fé de Israel para a
construção da teologia do Dêutero-Isaías. Interessante é a transformação do
deserto: irrigação, aplainar, endireitar, aterrar são as figuras mais fortes. Tudo isto
será feito para a passagem do povo pelo deserto.
O texto mostra ainda que se deva esquecer todos os acontecimentos
antigos e prestar a atenção nas novas coisas que estão para se realizarem. O
novo êxodo a nova criação nas novas coisas que estão para se realizarem. O
novo êxodo é uma nova criação.
O hino designa os acontecimentos salvíficos do êxodo. O texto que
ocorre em 40,22 e também nos Sl 104,2; 136,5 referem-se e alude ao êxodo
antigo como presente. Aqui os 16-17 expressam o êxodo, a salvação de Israel por
Javé “que abre bem caminho nas águas (antigo) e no deserto (novo). A linguagem
de reforço é “não vos lembreis das coisas antigas”, mas, a libertação do exílio vem
expressar em símbolos que retomam a tradição do êxodo e do deserto. O êxodo é
um acontecimento arquetípico de novos acontecimentos. O êxodo aqui ensina a
olhar para o futuro manifestado no presente e pela esperança.120
120 CROATTO, José Severino. op. cit., p.58.
92
O novo êxodo representa como lembrança a travessia, a luta contra
os inimigos. Ele pede ao exilado não ficar pensando nas coisas passadas e
prestar atenção na salvação futura.
5.3 Isaías 49,7-12121
5.3.1 O TEXTO EM HEBRAICO
כה אמר־יהו גאל ישראל קדושו לבזה ־ נפש למתעב
גוי לעבד משלים מלכים וקמו שרים וישתחוו למען
יהוה אשר נאמן קדש ישראל ויבחרך׃ כה אמר יהוה
בעת רצון עניתיך וביום ישועה עזרתיך ואצרך ואתנך
שממות׃ נחלות להנחיל ארץ להקים עם לברית
לאמר לאסורים צאו לאשר בחשך גלו על־דרכים ירעו
יכם שרב ־ ולא ירעבו ־ שפיים מרעיתם׃ לא ובכל
ינהגם ועל ־ מבעי מים ינהלם׃ ושמש כי ־ מרחמם
ושמתי כל ־ הרי לדרך ומסלתי ירמון׃ הנה ־ אלה
121 Sigo os comentários de Claus Westermann. Isaiah a commentary. Philadelphia Westminster Press, 1969, p.212-216; CROATTO, José Severino. Isaías 40-55. 1994 (uso o original e está sendo traduzido pela Editora Vozes), p.120-129; SCHOECKEL, Luiz Alonso. Os profetas - v-2, Edições Paulinas, São Paulo, 199p.
93
מרחוק יבאו והנה ־ אלה מצפון ומים ואלה מארץ
סינים׃
5.3.1.1 TRADUÇÃO
v.7 Assim diz o Senhor: redentor e Santo de Israel, ao desprezado, ao abominado
das nações, ao escravo dos opressores: Te verão os reis e se levantarão,
príncipes se prostrarão, por que o Senhor é fiel, porque o Santo de Israel te
elegeu.
v.8 Assim diz o Senhor: no tempo da graça te ouvi, no dia da salvação te socorri,
guardar-te-ei e te constituirei aliança do povo; para restaurares a terra, para
repartires as heranças assoladas.
v.9 Para dizeres aos cativos: Saí, aos que estão em trevas: “Vinde à luz”; ainda
pelos caminhos pastarão; terão pastos nos prados desnudos(desertos);
v.10 Não passarão fome nem sede, não lhes fará dano o sol nem a clamaria,
porque o que deles se compadece os guiará, os conduzirá aos mananciais das
águas.
v.11 Transformei todos os meus montes em caminhos e as minhas veredas serão
levantadas.
v.12 Eis que estes virão de longe, e eis que aqueles que do norte e do ocidente e
aqueles outros da terra de Sinim.
5.3.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS
A análise de Klaus Kiesow difere da de José Severino Croatto e de
Luiz Alonso Schoekel, porém é semelhante a de Claus Westermann. Klaus Kiesow
e Claus Westermann mostram que devido às semelhanças de 42,5-9 e 42,1-4, os
textos compõem à mesma perícope de 49,7-12. Estes textos dão ênfase retórica
da proclamação da salvação. Em Is 49,7-12 contém várias adições posteriores.
94
Tem relatos de transposição e de omissões em sua formação122. O v.8 é uma
adição posterior que foi inserida posteriormente no texto.
Claus Westermann propõe uma estrutura narrativa deste texto da
seguinte maneira:
v.7a possui uma introdução com uma indicação de um lamento comunitário
v.8a é uma proclamação da intervenção divina
v.8c-12 é uma proclamação da intervenção divina
v.7c é o objeto de admiração reconhecida pelos reis e pelos príncipes
Claus Westermann afirma que o v.7b foi uma passagem escolhida. O
redentor e o Santo de Israel são dois títulos para o Deus de Israel. O texto ainda
explicita um povo oprimido (servo de governadores) e o desprezo das nações.
O editor final de Is 49,1-6 aplicou a concepção de servo como um
atributo da desgraça. A partir de Is 49,7-12 endereça uma proclamação de
salvação.
O v.8 mostra em suas primeiras palavras endereçadas ao opressor e
ao desprezado das nações que existe uma promessa de salvação para o povo
escolhido. Este verso começa com um louvor a Deus, respondendo ao lamento
das nações. Começa desta forma, neste verso, a intervenção de Deus para a
libertação do povo, o estabelecimento na terra com o v.8c. Fala da liberdade dos
cativos no v.9. O v.11.12 dependem do v.8a.
Na seqüência os v.9b-10b trazem a proclamação de salvação, dando
uma descrição de como será a jornada de retorno à pátria. Usam também a figura
122 “Again, editors are almost unanimous that Is 49,7-12 contain additions and that we have to take account of transplantations, and also omissions.” “De novo, os editores são sempre unânimes que Is 49,7-12 contém adições e que temos tomado relatos com transposições e também omissões.” WESTERMANN, Claus, op. cit., p.213.
95
de um pastor que conduzirá o rebanho com cuidado, como ocorreu no texto
anterior de Is 40,11.
O fundamento do êxodo está relacionado com “o início da história da
nação, repete suas imagens de forma menos explícita como em Is 40.1-11”, afirma
categoricamente Claus Westermann. Os relatos dos atos miraculosos de Deus
são como alimento e a bebida, o guia pelo caminho no deserto. Claus
Westermann mostra que o v.11 é uma seqüência dos v.9a, b e do v.10, posterior,
ele descreve a jornada de volta à pátria.
Paul Volz e Christopher North123 estão corretos em afirmar que este
v.12 dá a visão de “Deus como motivo” central em reunir os desprezados. Deveria
vir após o v.18 do mesmo capítulo, nesta própria secção. A questão do nome
próprio do país denominado de Sewnin ou Sinin pode ser lido como Syone
(Assuã) no sul do Egito (Ez 29,10; 30,6). Este local foi conhecido através de
papiros descobertos em Elefantina no próprio Egito.
O v.7b mostra o objeto da ação presente de Deus, que tem agido por
Israel e sobre os povos. Pasmados e admirados os reis e príncipes serão as
testemunhas de Javé para as nações e para os exilados em relação aos
acontecimentos que viriam e que o povo não está enxergando. Este êxodo
também é uma poesia.
5.3.1.3 O MOTIVO DO ÊXODO
O termo goel “redimir” do v.7 é de importância. O redentor era aquele
que pagava o preço estipulado por lei a um escravo ser libertado, ou por dívida de
um parente próximo a ser pago, ou mesmo alguém da família a ser resgatado de
uma dívida ou da escravidão. Aqui Javé é o redentor e está pagando, redimindo o
escravo Israel da dívida da escravidão babilônica, como foi feito também no Egito.
123 op. cit., in: MUILENBURG, James. op. cit., p.390-394.
96
O v.7 menciona ainda “o desprezado, o abominado das nações e o escravo dos
oprimidos”. Isto vem corroborar tudo o que foi dito anteriormente. Esta libertação
redentora seria em breve, pois o vento no perfeito indica um acontecimento não
distante no futuro.
A libertação de fato deveria ocorrer e seria visto e testemunhado por
reis e por príncipes. Estes presenciariam a fidelidade de Javé. Claro está que há
referência ao motivo do novo êxodo à semelhança do primeiro êxodo do Egito. A
dimensão deste texto que está ligada à façanha do profeta em demonstrar que
Israel transmitiria aos povos, sendo visto por outras nações. Javé seria conhecido
e contemplado por todos por intermédio da libertação do povo da escravidão
babilônica.
O v.8 diz que: “e te constitui aliança do povo”. Isto reforça a idéia
anterior. Na realidade tudo isto está ligado ao fato de que o texto é um hino de
louvor, mas que seu final mostra a reconstrução da pátria: “para restaurares a
terra” e também “para repartires a herança desolada”. A menção está ligada à
distribuição da terra em herança às doze tribos em Josué. Tanto Jerusalém como
as outras partes por onde Nabucodonosor passou ficou desolada. Este deveria
pagar o preço desta redenção para reconstruir e redividir novamente a pátria. Fica
evidente que a idéia de retorno está implícita. O v. 9a aponta para os cativos, os
escravos, sendo-lhes dada a libertação. Terão numa figura pastoril, retorno e a
alimentação pelo caminho de volta à terra prometida. O v.10 complementa tudo
isto. Não passarão nem fome nem sede.
O fato do novo êxodo é o reflexo do primeiro: o maná no deserto foi a
alimentação para não passarem fome, a água na rocha jorrando para não
passarem sede. Assim será no segundo êxodo no retorno da Babilônia. Neste
verão evidencia-se ainda a teologia do caminho e do retorno como no primeiro
êxodo. Isto também ocorre nos textos de Is 40,3; 43,16; 49,11. Todos estes versos
discorrem acerca do motivo do caminho, onde será a passagem construída por
97
Javé, para Ele e seu povo caminharem até chegarem em Sião. No primeiro êxodo,
Javé caminha com o povo através do deserto, sendo este guiado pela nuvem, pelo
fogo, e por outros fenômenos da natureza. Neste êxodo as coisas maravilhosas
são mais fenomenais: o aplainar as montanhas, os montes e as colinas, endireitar
o caminho tortuoso, aterrar os vales. Estas figuras são fortes, pois são impossíveis
de se realizarem naquela época no deserto.
Finalizando, o v.12 nos mostra que haverá um retorno em massa
para a terra prometida: virão de longe, do norte e do ocidente, da terra de Sinin
(Egito). Será uma caminhada muito longa. Deveria ter uma estrada especial que
confluenciasse com Jerusalém. Portanto, na história nada disto ocorreu. Tudo isto
é repetido da temática retirada do primeiro êxodo, que vai ocorrendo em cada
texto proposto na análise do êxodo no Dêutero-Isaías. Esta repetição nos versos é
um reforço retórico na teologia do motivo do novo êxodo.
CONCLUSÃO
Neste texto ficou evidente que os judaítas, apesar de serem
desprezados pelas nações, serão contemplados com grande espanto por todos os
reis e os príncipes da terra pela salvação. Pois o Senhor reverterá a sua sorte e
tirará o povo da escravidão da Babilônia para a liberdade em Sião. Se houver
dentre o povo alguém que esteja desanimado, Deus promete salvá-lo. Ainda que
sua pátria esteja devastada será reconstruída e repovoada. A idéia da
transformação do deserto é para que o povo retorne à pátria. O segundo êxodo se
evidencia a partir do v.9 “saí” e nos v.11-12 quando se transmitem as
transformações que ocorrerão no deserto. Os montes se transformarão em
caminhos planos. Os que retornarão: “eis que virão de longe... do norte... do
ocidente... e da terra de Sinin...”.
98
A libertação está próxima e a chegada a Sião será breve. Duas
expressões claras referentes aos escravos e opressores v.7, no dia da salvação te
socorri. Javé irá guardar e constituir aliança com o povo para restaurar a terra,
repartir as heranças assoladas. Javé diz aos cativos: “saí e ele remirá todos no
caminho atravessando o deserto em direção à Jerusalém”. A perícope elabora a
lembrança da transformação do deserto e como Javé guiou o povo, guiará agora
no deserto em retorno à Sião.
5.4 Isaías 51,9-14124
5.4.1 O TEXTO EM HEBRAICO
עורי עורי לבשי ־ עז זרוע יהוה עורי כימי קדש דרות
עולמים הלוא את ־ היא המחצבת רהב מחוללת תנין׃
הלוא את ־ היא המחרבת ים מי תהום רבה השמה
ישובון יהוה ופדויי גאולים׃ ים דרך לעבר ־ מעמקי
ששון ראשם ־ על עולם ושמחת ברנה ציון ובאו
ושמחה ישיגון נסו יגון ואנחה׃ אנכי אנכי הוא מנחמכם
מי ־ את ותיראי מאנוש ימות ומבן ־ אדם חציר ינתן׃
ותשכח יהוה עשך נוטה שמים ויסד ארץ ותפחד תמיד
כונן להשחית היום מפני חמת המציק כאשר ־ כל
תאית חמת המציק׃ מהר צעה המציק כאשר כונן
124KIESOW, Klaus. op. cit., p.6-27; ver também Claus Westermann, op. cit., p.238-247.
99
להשחית ואיה המת המציק׃ מהר צעה להפתח ולא ־
ימות לשחת ולא יחסר לחמו׃
5.4.1.1 TRADUÇÃO
v.9 Desperta, desperta. Arma-te de força, braço do Senhor: desperta como nos
dias passados, como nas gerações antigas; não és tu aquele que abateu o Egito,
e feriu o monstro marinho?
v.10 Não és tu aquele que secou o mar, as águas do grande abismo? O que fez
no fundo do mar um caminho, para que passassem os remidos?
v.11 Assim voltarão os remidos do Senhor, e virão a Sião com júbilo, perpétua
alegria lhes coroará as cabeças; o regozijo e alegra os alcançarão, e deles fugirão
a dor e o gemido.
v.14 O exilado cativo depressa será libertado, lá não morrerá nem descerá à
sepultura, o seu pão não lhe faltará.
5.4.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS
Esta perícope talvez seja dentre as analisadas a que mais se refere a
tradições do Antigo Testamento e do primeiro êxodo. Autores como Klaus Kiesow
propõe que o texto contenha apenas o que ocorre tradicionalmente em 51,9-14.
Por seu turno Claus Westermann faz divisões deste texto como sendo Is 51,3
como um fragmento de um hino de louvor. As secções subseqüentes de 51,9-52,3
faz parte de uma perícope maior. Os textos propostos acima estão inseridos nesta
perícope global.
100
Klaus Kiesow125 mostra esta secção como sendo uma unidade. Esta
unidade de Is 51,9-14 é dividida nas secções: v.9-11 e 12-14. Repete-se nesta
perícope a mesma mensagem do: “desperta”, “desperta”, “desperta”.
Os textos mais explícitos sobre o motivo do êxodo são: v.9-11 e o
v.14 que se referem a este motivo. Os textos repetem a mesma idéia do tema do
primeiro e do segundo êxodos. Como podemos notar, o Sl 74.12-15 se assemelha
ao texto de Isaías. Estes dois textos tratam de antigas tradições mitológicas como:
das origens do mar, da força e do braço do Senhor.
Na parte de v.9b-10 se percebe uma linguagem mitológica através de
um hino, que talvez tenha sido uma forma de polêmica contra a religião babilônica,
contra os deuses estrangeiros. Esta é uma recordação da passagem através do
mar dos caniços.
O v.11 deve estar fora de seu local verdadeiro e, assim sendo, é um
acréscimo posterior, uma citação de 35,10. O que mais chama a atenção no v.9a
é o fato de pedir que se “arme de força” e que o “braço do Senhor” tenha o poder
e a força. Estes termos designam que a libertação deve estar próxima e será
utilizada a força, o poder de Javé para esta libertação. Lembram as guerras de
Javé em outras passagens do Antigo Testamento, como em Is 6; 7; 8; 11; 12. Há
rememoração dos antigos fatos do primeiro êxodo: “desperta como nos dias
antigos” ou “como nas gerações passadas”. Os textos demonstram que o Senhor
“destruiu o Egito e feriu o monstro marinho”. Aparece a idéia teológica no fato de
ferir o “monstro marinho”. Temos a idéia da mitologia babilônica: o conforto do
Deus de Israel com os deuses da Babilônia configura este texto.
O v.10 repete o antigo êxodo “secar o mar” para que o povo pudesse
passar a pé. “O que dez um caminho no fundo do mar para que os remidos
pudessem atravessar”, repete a idéia de Ex 14,15-25, especialmente os v.21-22.
125 KIESOW, Klaus. op. cit., p.6-27.
101
O v.11 é um texto fora do seu contexto, fora do local adequado.
Reflete um cântico de vitória. É uma ideologia de Sião como que representasse o
cântico de vitória de Mirian ou Débora.
O v.14 quando menciona “o exilado cativo depressa será libertado”,
evidencia a pressa da salvação-libertação do povo, imagem repetida do êxodo de
sair depressa do Egito comendo ervas amargas e pães asmos. Este v.4 está
ligado ao fim do cativeiro babilônico. Fala do início da luta de Ciro, o persa, contra
o império Babilônico. O profeta reflete historicamente os fatos referidos
anteriormente.
5.4.1.3 O MOTIVO DO ÊXODO
Nesta seção de Is 51,9-14126, o motivo do êxodo inicia na própria
perícope. O v.1 refere-se a esta idéia: ouvi-me vós aquele que procura a justiça e
a Javé. Nesta perspectiva o v.9 encontra a lembrança “das gerações antigas”
referindo-se ao êxodo do Egito: “não és tu aquele que abateu o Egito e feriu o
monstro marinho?” O v.10 refere-se de novo ao êxodo primeiro: “o que secou o
mar, as águas do grande abismo? Aquele que fez o caminho no fundo mar para
que passassem os remidos?” A última palavra deste verso fala dos “remidos”.
Quem são estes? Os escravos resgatados, comprados. No sentido do êxodo são
os salvos ou libertos da escravidão dos opressores estrangeiros. O que faz este
verso e o v.11 é realmente mostrar o cântico da lembrança dos “resgatados de
Javé que retornarão à Sião” cantando, com alegria e júbilo.
O v.13 mostra que Javé destruirá o tirano e no v.14 está o ápice da
libertação: “o exilado cativo depressa será libertado”. A idéia do v.13 é que os
exilados não permanecerão no exílio: “lá não morrerá, lá não descerá à
sepultura...”.
126 CROATTO, José Severino. op. cit., p.145-155.
102
Nesta secção fica evidente a idéia de paradigma e a anámnesis que
será através do júbilo, da alegria e da lembrança do mar, da água, do deserto.
Porém a idéia mais forte é a lembrança de que o exilado será depressa libertado
(v.14).
CONCLUSÃO
O êxodo neste trecho descreve a mera recordação do primeiro êxodo
do Egito. Mostra que o Deus que abateu os egípcios tem o poder para abater os
babilônicos e para salvar os judaítas. Como feriu o mostro marinho, que secou o
mar, as águas do grande abismo e que fez passar os remidos pelo fundo domar,
também trará os resgatados da Babilônia a Sião. Eles virão alegres e cantando.
Este é um hino de louvor à libertação da Babilônia.
Necessário se torna, então, a preparação para o novo êxodo. O
caminho deve ser preparado para o retorno, para a vinda do Servo Sofredor.
Como os remidos passaram pelo mar a seco, pelo fundo do mar, poderão passar
pelo deserto seco transformado em rios, água, as colinas rebaixadas, os vales
aterrados, os caminhos tortuosos endireitados, as aves, e os animais do campo
glorificando, cantando ao Senhor Javé.
5.5 Isaías 52,7-12127
5.5.1 O TEXTO EM HEBRAICO
127 SCHOECKEL, Luiz Alonso. Profetas. Ediciones Cristiandad, v-2, Madrid, 1980, p.93-398 (sobre o Dêutero-Isaías existe uma tradução portuguesa pela Edições Paulinas, 1989).
103
מה ־ נאוו על ־ ההרים רגלי מבשר משמיע שלום
מבשר טוב משמיע ישועה אמר מלך אלהיך׃ קול יחדו
ירנו כי עין בעין יראו בשוב יהוה ציון׃ פצחו רננו יחדו
חרבת ירושלם כי ־ נחם יהוה עמו גאל ירושלם׃ חשף
־ זרוע קדשו לעיני כל ־ הגים וראו כל ־ יהוה את
אפסי ־ ארץ את ישועת אלהיו׃ סורו סורו צאו משם
טמא אל ־ תגעו צאו מתוכה הברו נשאי כלי יהוה׃ כי
לא בחפזון תצאו ובמנוסה לא תלכון כי ־ הלך לפניכם
יהוה מאספכם אלהי ישראל
5.5.1.1 TRADUÇÃO
v.7 Que formosos são os pés sobre os montes daqueles que anunciam as boas
novas, que faz ouvir a paz, que anuncia coisas boas, que faz ouvir a salvação, que
diz a Sião: o teu Deus reina!
v.8 Eis o gritos dos teus atalaias! Eles erguem a voz juntamente exultam; porque
com seus próprios olhos distintamente vêem o retorno a Sião.
v.9 Rompei em júbilo, exultais a uma só voz, ò ruínas de Jerusalém, porque o
Senhor consolou o seu povo, e remiu a Jerusalém.
v.10 O Senhor desnudou o seu santo braço à vista de todas as nações; e todos os
confins da terra verão a salvação do nosso Deus.
v.11 Retirai-vos, retirai-vos, saí de lá, não toqueis cousas imundas; saí do meio
dela, purificai-vos, os que levais os utensílios do Senhor.128
128 o v.11 fala do ritual da purificação. Mostra o seu conhecimento do escritor sacerdotal.
104
v.12 Porquanto não saireis apressadamente, nem ireis fugindo; porque o Senhor
irá adiante de vós, e o Deus de Israel será a vossa retaguarda.
5.5.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS
Claus Westermann129 divide esta secção em duas partes com os
títulos. Seu Deus é rei Is 52,7-10 e o “retirai-vos” de forma (dupla) está presente
em Is 52,11-12. Estas duas secções fazem parte de um longo poema composto
(51, 9-52,3) que tem por intenção mostrar o fim da lamentação de Israel. O texto
posterior é um hino de exultação à esta resposta ao lamento. O v.9 é um hino que
se assemelha a outros hinos, como Is 42, 10-13; 44, 23; 45, 8, 48, 20; 49,13, 51,
3. Porém o texto é uma conclusão desta secção. Tendo a mesma estrutura e os
mesmos vocábulos. No texto está o clamor transformado em regozijo.
Nesta parte, o Dêutero-Isaías é realmente um grande poeta;
conforme o tratamento dado por vários autores ao texto: Luiz Alonso Schoekel130,
José Severino Croatto131 fazem este tratamento. Foi mostrado que na secção de
40,9-14. Deus é o pastor de Israel. Existe aqui uma guinada muito grande: Deus é
o rei de Israel. Há uma transposição de pastor para rei. Esta mudança de direção
do pastor para o duro rei é de suma importância: no v.8 o rei vem liderando uma
procissão triunfal a esta cidade.
No v.10a o rei vem sobre os seus inimigos com a vitória. No v.7 ele
vai subir ao trono com júbilo conforme faziam os reis em sua entronização.
Conforme Sigmund Mowinckel132, o texto seria uma espécie de
festival de entronização do rei. Este festival era conhecido tanto em Israel como
pelos vizinhos e em todo Antigo Oriente Próximo. Para o próprio Sigmund
129WESTERMANN, Claus. op. cit., p.249-253.130 SCHOECKEL, Luiz Alonso. op. cit.131 CROATTO, José Severino. op. cit., p.90.132 MOWINCKEL, Sigmund. The Psalms in Israel Worship. Basil Blackwell, Oxford, 1982, p.106-139.
105
Mowinckel este texto seria um hino da ideologia real, e que tem paralelos no
antigo Israel. Por isso existe um esquema especial para entender o texto:
A. A exaltação do rei forma o fundamento dos v.7-l2 e é assimilado
como se fosse a mensagem de salvação.
B. Estes versos descrevem não um ato de culto mas um ato de Deus
na história em que Ele libertou Israel e reservou o seu destino. A ascensão ao
reinado de Deus no v.7b está bem junto com a sua compaixão no v.9. No Dêutero-
Isaías e nos Salmos estas narrativas mostram que o poder soberano de Deus
sempre vem com sua divindade.
Na realidade, o v.7 tem uma citação semelhante em Dt 1,10, onde o
verbo na’ah pode significar tanto “ser formoso” como que no tempo qual tem o
sentido de “adornar”. A expressão designa a formosura dos pés do mensageiro.
Para o povo de o exílio ouvir a mensagem do Dêutero-Isaías deve ser algo
especial.
Esta é a linguagem demonstrada pelo profeta Dêutero-Isaías para designar a sua
mensagem: as boas novas do mensageiro.
O v.8 mostra o mensageiro propriamente dito. O mensageiro que
anuncia em voz alta. A mensagem do retorno de Javé e a visão do mesmo são
centrais nestes versos para a compreensão da mensagem.
Os v.9-10 designam as boas novas dos mensageiros. Notamos que
isto vem corroborar com o estilo típico do profeta isaiano.
A força de Javé neste texto mostra que os remanescentes no exílio e
na diáspora babilônica estavam sofrendo, mas que deveriam agora irromper em
júbilo e exultação com cânticos, porque até os confins da terra verão a salvação e
a glória de Deus.
106
No v.10 existe uma metáfora do “braço de Deus” que vem da
linguagem própria deste profeta. Mostra esta metáfora que o poder e a força vêm
de Javé para salvar. Pode ser entendido literalmente também como no primeiro
êxodo: a força é mesmo militar.
Os v.11-12 mostram outras características da mensagem do profeta
isaiano. Falam da salvação e da libertação do povo. Uma coisa nova surge nesta
mensagem e nesta teologia do profeta. Encontra-se aqui inserida uma linguagem
sacerdotal levítica das coisas imundas, impuras, das leis da purificação. O povo
em seu trono se deverá purificar. O mais importante destes versículos refere-se ao
primeiro êxodo. No outro êxodo se deveriam comer as ervas amargas e sair de
pressa, neste novo êxodo pelo contrário, não há motivo para sair depressa, nem
fugir como foi feito anteriormente. Deus irá adiante guiando e na retaguarda
protegendo, cuidando para que nada aconteça ao povo.
O texto ainda tem um interesse especial nas práticas cultuais. Isto
aconteceu no período dos profetas Ezequiel e de Jeremias. No Dêutero-Isaías não
foi visto em texto anterior. Este texto fala da santidade de Javé, das impurezas dos
deuses e das práticas cúlticas a deuses estranhos. Talvez o texto refere-se aos
vasos de purificação ou a outros utensílios usados nos atos de culto, como
podemos notar nos seguintes textos: 2 Cr 36,7-10; Ex 12,11; 13,21; Dt 1,30-33;
16,3. Os textos de Isaías referem-se ao primeiro êxodo. Isto fica evidente que
neste texto analisado fala sobre o novo êxodo.
Os exilados devem sair devagar, em paz e segurança sob a liderança
e a proteção de Deus. Ao contrário, no antigo êxodo saíram depressa e em
guerra. Luiz Alonso Schoekel analisando este texto mostra que deveria fazer parte
de uma procissão litúrgica. Conforme este autor, o verbo “sair” é o verbo do êxodo
e também do novo êxodo. José Severino Croatto133 subdivide esta secção como
133SCHOECKEL, Luiz Alonso. op. cit., p.326-328.
107
uma unidade maior. As subdivisões podem ser equacionadas da seguinte maneira
v.1-12; v.3-6; v.7-l2, este sendo o centro.134 Claus Westermann vê neles o motivo
central deste texto e deve ser o novo êxodo.135
Esta secção difere de todas as anteriores. Temos repetições em
abundância pela descrição de fatores teológicos e retóricos. No v.7 evidencia-se a
expressão “teu Deus reina”. Nesta parte do verso, temos a ambientação da
proclamação da mensagem profética. No v.7 os mensageiros sobem em um
monte alto ou numa colina, levanta-se a sua voz, e grita ou proclamam a
mensagem. O texto ainda fala dos pés e não da voz do mensageiro que transmite
a paz e as boas novas de salvação.
O v.8 segue a idéia do anterior. Ele mostra o clamor das atalaias que
gritavam e louvavam porque anteviram o retorno a Sião com o Senhor. Este verso
é uma seqüência do v.7. O v.9 é onde se mostra o júbilo e a exultação de um coro
muito engraçado, “as ruínas, os montões de pedras de Jerusalém dando louvor.” A
cidade Jerusalém, os seus muros, o templo, foram colocados abaixo e sob ruína
na devastação da invasão babilônica. Porém Javé convoca um coro de pedra para
entoar louvor, porque ele quer “consolar o seu povo e o reuni-lo em torno de si em
Jerusalém”. O termo “consolar” aparece constantemente no texto isaiano em 40,1.
O termo “remir” designa o pagamento da dívida ou uma quantia estipulada para a
libertação da escravidão e aparece neste texto outra vez.
O v.10 tem uma figura interessante sobre o desnudar o seu “santo
braço à vista de todas as nações”, referindo-se a Javé. Deus parece alguém que
numa briga arregaça as mangas da camisa para poder brigar melhor. Pode
significar também a demonstração do poderio de uma nação. Pode ser também
que isso relembra idéia do primeiro êxodo, onde Moisés era o instrumento
intermediário de Javé que lutava com os egípcios e o poder militar de Faraó.
Neste êxodo, Javé é quem brigará por Israel. Este verso ainda mostra a figura da
134 KIESOW, Klaus. op. cit., p.160-166.135 WESTERMANN, Claus. op. cit., p.249-252.
108
intervenção divina sobre os fatos políticos. Javé julgava as nações opressoras que
oprimem o povo escolhido.
Na complementação deste verso é mostrado que todas as nações e
todos os confins da terra verão a salvação de Javé. Os v.11-12 fazem parte de
uma unidade literária e por assim dizer de uma unidade teológica. Começa com a
influência da literatura delas principalmente da lei da purificação elaborada na
secção do “Código de Santidade” em Lv 14-27. Este “não tocar coisa imunda”, “saí
do meio dela”, significa que estão no meio da impureza, de uma nação impura.
Isso tornava necessário fazer o rito da purificação, pois todos estão contaminados.
Aqueles que carregam os utensílios do templo do Senhor, os sacerdotes, devem
dar o exemplo da pureza.
O v.12 repete o livro do Êxodo. Ao contrário do primeiro êxodo aqui
não há necessidade de escapar depressa como foi no Egito, fugir do exército para
não morrer. Neste novo êxodo se podia sair tranqüilamente e em paz. Pois Deus
iria guiando o povo. Como aconteceu no primeiro êxodo, no novo êxodo o Senhor
irá à dianteira e na retaguarda amparando e protegendo o povo eleito.
5.5.1.3 MOTIVO DO ÊXODO
Na secção o motivo do êxodo é anunciado pelos mensageiros e as
atalaias. Estes mensageiros anunciam em voz alta “o retorno à Sião”. Este
anúncio é feito com exultação. Todos os povos e os exilados serão com os
próprios olhos o regresso do Senhor à Sião. Por enquanto o texto fala somente do
retorno de Javé e não do povo.
O v.7 anuncia as boas novas, a paz e a salvação. O v.8 designa o
retorno de Javé. O v.9 pede que todos exultem em júbilo, inclusive as ruínas de
Jerusalém, por que uma grande coisa irá acontecer: Javé consolou o povo e remiu
109
Jerusalém. O v.10 é o mais forte na apresentação do êxodo. Ele faz lembrar que
Javé com seu poder e força (Qebod) retirará o povo da escravidão. Como fez no
primeiro êxodo, no novo também utilizará a força para libertar os exilados. Todas
as nações presenciarão que Javé é poderoso e libertador. A salvação de Javé
será vista em todos os confins da terra.
O retorno deverá ser após a purificação de todos. No primeiro êxodo
era para fugir, comer ervas amargas. Neste novo êxodo era para purificar-se de
todas as impurezas. Os sacerdotes “os que carregam os utensílios do Senhor”
deveriam ser os primeiros a dar o exemplo na retirada do exílio para Jerusalém. O
v.12 é uma rememoração do primeiro êxodo e que o novo seria de forma
diferente. Não era para fugir nem sair depressa, porque o Senhor cuidará de
todos. Ele irá à dianteira e na retaguarda cuidando da saída e do caminho dos
exilados.
CONCLUSÃO
O texto de Is 54,7-12 mostra a saída do exílio da Babilônia. O texto
incita o povo a se permanecer limpo, puro. Não podiam tocar coisas impuras.
Começando pelos sacerdotes. Aqueles que usam os utensílios do templo. Os que
carregariam as coisas sagradas que possuíam no exílio, deveriam levar para
Jerusalém. Estas coisas deveriam permanecer puras. Os sacerdotes como os
utensílios deveriam se purificar. O povo, sacerdote, e os utensílios deveriam sair
do meio da impureza. Dirigindo pelos caminhos preparados por Javé, o povo que
recebeu as boas novas, a salvação ou libertação anunciada estão proclamando o
reino de Deus.
O regozijo, o júbilo e a exaltação de Jerusalém destruída devem ser
pelos feitos de Javé que se dirige à Jerusalém em companhia do povo restaurado.
Deus caminha com o povo, redime o povo e deverá se instalar com Ele em Sião. A
110
idéia também aqui é de lembrança do poder de Javé na primeira libertação e de
seu poder nesta segunda libertação.
5.6 Is 55,12-13136
5.6.1 TEXTO EM HEBRAICO
והגבעות ־ בשמחה תצאו ובשלם תובלון ההרים כי
־ כף׃ ימחאו ־ עצי השדה וכל יפצחו לפניכם רנה
יעלה הדס יעלה ברוש תחת הסרפד תחת הנעצוץ
והיה ליהוה לשם לאות עולם לא יכרת׃
5.6.1.1 TRADUÇÃO
v.12 Porque saireis com alegria e em paz sereis guiados; os montes e os outeiros
romperão em cânticos diante de vós, e todas as árvores do campo baterão
palmas.
v.13 Em lugar do espinheiro crescerá o cipreste, e em lugar da sarça crescerá a
murta, e será isto para a glória do Senhor, e memorial eterno que jamais será
extinto.
5.6.1.2 QUESTÕES EXEGÉTICAS
O texto pode ser um epílogo sobre a proclamação de uma partida, a
saída da Babilônia para a Palestina. Parece uma liturgia processional. A alegria é
retratada por um hino de louvor para um retorno importante. O texto relatado pode
ser denominado de um hino escatológico de louvor ou simplesmente pode ser 136 CROATTO, José Severino. Op. cit., p.7-12.
111
chamado de cântico de uma procissão de retorno. As criaturas de toda a natureza
darão louvor à glória de Javé. Este louvor é encontrado em alguns Salmos. O final
de um livro composto pelo Dêutero-Isaías. O relato mostra a redenção e o
redentor lado a lado. A parte mais importante literariamente é o v.12a. O verbo
que denota o êxodo é “sair” que significa o sentido do novo êxodo: a saída do
cativeiro.
Este trecho analisado deve ser entendido como um epílogo do livro
isaiano em conexão com o seu prólogo em Is 40,1-11. O final de Isaías é Is 55,1-
13 denominado o livro da consolação.
O próprio autor, José Severino Croatto137 define este epílogo como
contendo partes distintas: os v.1-3a secção que ele denomina de chamada ao
banquete; os v.3b-5 denominado de promessa da aliança; os v.6-9 chamado de a
busca de Javé. O final do texto é de nosso interesse, os v.12-13 designam o novo
êxodo. O trecho representa a saída da Babilônia, com um clima de festa e de
júbilo, o caminho do retorno todo enfeitado para a passagem dos caminhantes.
Estes teriam como companhia os montes, as árvores, os outeiros, dançando e
batendo palmas. Este é o processo final da libertação.
5.6.1.3 MOTIVO DO ÊXODO
Os textos anteriores referem-se ao motivo do êxodo. Este texto não
foge à regra. Ele é igual a todos os textos analisados. Na realidade o v.12 é um
hino de louvor, fala de coisas extraordinárias. Na linguagem isaiana os milagres do
primeiro êxodo se transformam em atos portentosos e mais miraculosos. Notamos
as figuras usadas na natureza: as árvores batendo palmas, os montes e os
outeiros entoando cânticos de louvor. No v.13 os milagres são mais concretos na
natureza como: crescer em lugar do espinheiro o cipreste, em lugar da sarça
florescer a murta, isto é a transformação da vegetação. O reflorestamento do
137 Idem, p.7-12.
112
deserto é notificado neste local. O deserto jamais comportaria tal situação naquela
época, plantas que cresciam e não valiam para nada, crescer estas plantas num
local onde é permitido rios nos ermos, é um verdadeiro milagre. Hoje podemos ver
isto em vários lugares, aquilo que o profeta deutero-isaiano preconizava pode ser
visto na atualidade. Somente com a irrigação seria possível o deserto ser
transformado. O milagre da tecnologia hoje é visível naquela época somente pelo
milagre.
O Dêutero-Isaías conclui que todas as coisas descritas devem ser
para a exultação de Javé. Pelos fatos de libertação e a transformação do deserto
(v.13).
CONCLUSÃO
Os verbos “sair com alegria” e “ser guiados em paz” deixa bem
evidente a saída do exílio. Os verbos mostram o novo êxodo, pois no primeiro
êxodo mostra o “sair depressa” e não o “sair com alegria”. No primeiro êxodo fala
de ser guiado pela nuvem, fogo, sol, lua e não da paz (shalom). No primeiro êxodo
não aparecem as metáforas dos montes e dos outeiros cantando e batendo
palmas.
Estas metáforas designam a alegria da libertação da Babilônia.
Mostra o texto a transformação do deserto num paraíso e isto designa a imagem
espetacular da libertação e o retorno para Jerusalém. Este texto de Is 55,12-13 é
muito importante para entendermos o novo êxodo. Este texto é o final, a conclusão
do livro e o início da caminhada dos libertados. A marcha aqui descrita é uma
procissão triunfal. Ele não mostra o local da saída e da chegada, porém, mostra a
alegria da salvação.
No texto de Is 40,1-11 existem quatro secções que enfatizam a
nossa temática do novo êxodo:
113
a - Nesta primeira secção composta de v.1-2 denominado de
prólogo, ocorre um duplo “consolai” que tem por objetivo enfatizar o fim do êxodo.
O cativeiro está chegando ao fim. Esta expressão: “consolai” designa ainda o
amor de Javé pelos exilados e que a vassalagem está por terminar, para iniciar o
novo êxodo. O “consolai” tem como prerrogativa mostrar que a libertação está
próxima e o êxodo em seu início.
b - A segunda divisão é a secção de V. 3-5, que complementa a
secção anterior. A primeira determina que o povo se anime e a segunda convoca
o povo a caminhar pelo deserto.
Tanto uma como a outra enfatizam o retorno e o fim do cativeiro. As
duas mostram que o ânimo e o consolo exigem um esforço para o retorno que se
dará após o exílio. Esta secção mostra ainda a preparação de todas as coisas.
Esta preparação procura deixar o exilado alegre pela libertação. E que o retorno
não constituirá uma caminhada pelo deserto, mas deve ser aguardado com a fé e
a esperança.
Chegou o fim do cativeiro. Agora importa aos exilados ter fé e ânimo
para enfrentar a caminhada de retorno. Neste sentido o êxodo e o novo êxodo
coincidem. Tanto em um como no outro a glória de Javé está presente nas
narrativas. Esta secção mostra que o novo êxodo é sinônimo do “motivo do
caminho”.138
O deserto é a passagem dos exilados.
O caminho de retorno é grande e difícil. Caracterizado por acidentes
geográficos. Impossível de seguir em linha reta. Os exilados passarão por este
caminho através de sua transformação. As colinas rebaixadas, os vales aterrados,
os caminhos tortuosos endireitados.
138 MESTERS, Carlos. A missão do povo que sofre. Os cânticos do Servo Sofredor no livro do profeta Isaías. Editora Vozes/CEBI, Petrópolis, 1981, p.49-107.
114
Este é o caminho que Javé oferece aos exilados em seu retorno. Esta
linguagem do profeta designa a grandiosidade do novo êxodo. Os milagres que
deveriam ocorrer transformariam o deserto. O novo ou segundo êxodo seria mais
magnífico que o primeiro êxodo. Este êxodo será mais importante que o anterior.
Tudo isto deveria ocorrer para que a glória de Javé fosse
manifestada. No deserto e na caminhada dos exilados o poder e a glória de Javé
se tornariam mais visíveis. Todos contemplariam a glória de Javé e as suas
maravilhas.
c - Na terceira secção de v. 6-8 ocorre um diálogo entre Javé e o seu
mensageiro o profeta. A mensagem é exposta em forma de antítese. Esta antítese
é “uma linguagem em forma sapiencial de comparação”. Nesta secção compara-
se o homem como algo passageiro, como a erva. Um vegetal pequeno, um
arbusto de pouca duração. Constituindo assim um paradigma, para mostrar a
importância do povo de Javé sendo liberto da escravidão.
O opressor nada pode fazer para segurar os exilados presos que
serão libertos. O opressor é passageiro, seu poder acaba, mas o poder e a glória
de Javé permanecem eternamente. Javé liberta e destrói os destruidores que são
passageiros. “Não temas” o opressor passará como uma erva. “Consolai, confiai”
na promessa libertadora de Javé dada aos exilados.
d - Esta última secção de V. 9-11; e a convocação das cidades de Sião e
Jerusalém que estejam também preparadas para receberem os exilados libertos.
Os mensageiros convocam a todas as cidades para presenciar a glória e o poder
de Javé. Javé o todo-poderoso é como um dócil pastor que guiará seus
escolhidos. Exilados, libertos, em direção à cidade santa.
115
Este texto parece demonstrar uma figura retórica. A ênfase retórica
está nas repetições como marca característica do profeta. O texto é uma poesia
que inaugura uma nova etapa de libertação. O mensageiro vem do deserto
anunciando os grandes feitos miraculosos e salvadores de Javé à Sião. Este grito
do porta-voz anuncia a vitória, a libertação. Vitória do povo e de Javé sobre o
opressor. Libertação de Javé com seu poder. O anúncio fala da vinda de Javé à
frente de uma procissão guinado o povo pelo deserto em liberdade. Todos estão
salvos.
O texto analisado evidência o motivo do êxodo. Is. 40,1-11 chama a
atenção pelas expressões que denotam o poder e a salvação, dando início ao
novo êxodo. Como no início chama a atenção à idéia de que Jerusalém é a
esposa de Javé, os exilados são os filhos escolhidos de Javé. A expressão
“milícia” designa exatamente a força e o poder de Javé para salvar. A expressão
pode dar a idéia também de que os cativos eram recrutados pelos conquistadores
como combatentes e no trabalho compulsório. Neste caso específico os exilados
estão trabalhando nos campos e trabalhos dos babilônicos.
A expressão: “consolai” é para pedir aos exilados a paciência, a
força, a esperança até que o exílio acabe. O fim da escravidão no sentido restrito
está chegando. O duplo: “consolai” designa a promessa de salvação aos exilados.
A milícia e o trabalho forçado acabaram.
José Severino Croatto comentando este texto escreve: “O pecado no
sentido social e econômico e as “iniqüidades” foram expiadas em dobro. Tudo.
Tudo está pago. A compreensão da divina retribuição está presente no Dêutero-
Isaías. Apesar do recado, a retribuição de Javé, o pagamento com o cativeiro, o
sofrimento no exílio, a libertação será iminente. A libertação do cativeiro na
Babilônia é uma questão de momento. Na política estará sobressaindo outra
potência, outro reino. Este novo império será usado por Javé para a destruição da
116
potência opressora. Esta potência destruirá a Babilônia dando auxílio e a
libertação ao povo de Israel”.
Este texto evidencia então o tema do fim do êxodo. O êxodo acabou.
Inicia-se a nova fase que é a libertação e o retorno para Sião.
Is. 40, 1-11 é um texto importante para a compreensão do motivo do
êxodo. Como no texto de v. 1-2 narra a preparação de Jerusalém e dos exilados,
Na secção de v. 3-5 narra a preparação do caminho para o retorno. O início do
novo êxodo, a salvação dos exilados é evidencias claras deste texto.
Alguns autores pensam num retorno de Israel como um retorno
espiritual. De fato este retorno não aconteceu em massa, Nem todos retornaram a
Jerusalém. Pode-se pensar que esta interpretação é uma forma de
espiritualização. A forma de um retorno histórico na realidade não se deu de forma
integral. O importante é que evidência o texto o tema do êxodo: o consolo, o
anuncio da libertação, como seria a retorno, Javé guiaria o povo, o caminho seria
modificado para a passagem do povo, e todos presenciariam a grandeza do poder
de Javé, e a chegada do povo a Sião.
“Nesta passagem o tema é o caminho, que se supõe da
Babilônia ã Jerusalém... O texto está construído uma vez
mais com imagens literárias que, não obstante, respondem
as realidades experimentais... Não se chega a Jerusalém por
via reta, senão por um caminho alternativo pela via
setentrional, onde existem vales e montanhas, que
necessitam ser aplainadas... Javé se manifestará como
energia (o termo mais correto no original para traduzir o
hebraico é: poder)”.
117
O texto declara o fim do êxodo, início da libertação e a preparação da
caminhada de retorno. Declara de forma diferente de outros profetas e outros
textos que a libertação dos exilados será pela força de Javé. Que o próprio Javé
anunciará este grande feito do êxodo. A mensagem aqui é de boas novas de
salvação.
Em toda a perícope de Is 40,1-11 ficou indicado o tema do êxodo. No
texto ocorre a cena da libertação e do retorno do povo. Colinas, cidades de Judá
serão como testemunhas de Javé aos povos a libertação dos exilados. Todos os
povos o verão o retorno do povo salvo. No primeiro êxodo, Javé libertou o povo do
Egito com seu poder e com seu braço forte. Nesta perícope ocorre a idéia do
poder e do braço forte de Javé (40,10). Que Javé dará a retribuição aos
opressores do povo escolhido, tudo em dobro. O texto evidência a salvação, o
novo êxodo como recordação, como anámnesis. Este texto é um paradigma do
motivo do êxodo. A recordação é a teologia do caminho e da salvação.
O texto analisado anuncia o fim da escravidão na Babilônia e o
começo do novo êxodo, Os exilados retornarão a Jerusalém e esta cidade será
testemunha às outras cidades que Javé vem como pastor conduzindo o seu povo
pelo deserto sob sua proteção. O Exílio findou, a escravidão terminou. A idéia do
primeiro êxodo repete-se em Is 40, 1-11.
A importância deste texto e de sua análise e da exêgese é para
mostrar que o êxodo é anuncio da salvação do povo exilado, de sua saída da terra
opressora, da caminhada pelo deserto. O êxodo novo serve como base para a
compreensão da pesquisa sobre do motivo do êxodo. O texto evidência que o
novo êxodo é salvação. Que o profeta Dêutero-Isaías anuncia o novo êxodo como
salvação efetuada ao povo escravo na Babilônia, O texto demonstra que a
salvação é uma faceta do novo êxodo. O novo êxodo é a pregação da salvação e
não de condenação como os profetas pré-exílicos faziam. O Dêutero-Isaías é um
profeta da salvação e do novo êxodo.
118
CONCLUSÃO
“O motivo do êxodo em Dêutero-Isaías” implica numa compreensão
maior: “o novo êxodo como salvação” dos exilados na Babilônia. Isto ocorre num
período entre o final do século VI e início do século V a.C. (em 586 a.C. foi a ida
dos exilados, 550 a 539 o reino de Nabonides e início do império persa com Ciro).
O profeta Dêutero-Isaías anuncia uma mensagem de esperança, de promessa e
de salvação ao povo exilado. Esta mensagem é de conforto e consolo.
O tema do êxodo é um fio condutor que leva a esperança ao povo
escolhido desde o livro do Êxodo no Antigo Testamento e perpassa todo Novo
Testamento em vários escritos. O livro dos Salmos e outros escritos fazem uma
releitura deste tema importante do Antigo Testamento de forma preciosa. O Novo
Testamento acompanha o Antigo Testamento desenvolvendo o tema do êxodo em
escritos como o Evangelho de João, nos sinóticos e no Apocalipse. Este tema
acompanha toda a Bíblia como releitura da vida e da travessia pelo deserto.
Coloca Jesus nesta itinerância a vagar pelo deserto, como se ele fosse testado
para se tornar um indivíduo maduro e preparado para qualquer acontecimento na
sua missão de salvar os exilados. Jesus aguarda a sua hora (Evangelho de João)
e se prepara orando, jejuando no deserto para que no momento certo de sua
atuação liberte todo o povo da escravidão.
A presença do tema nos dois testamentos constitui uma teologia.
Cada texto faz a sua interpretação nova do êxodo do Egito e da Babilônia,
tornando-se este um paradigma da libertação como salvação do cativeiro.139
Para tanto o tema do êxodo em Dêutero-Isaías continua a ser uma
verdadeira fonte rica a ser explorada na exegese e na teologia. Na pesquisa
exegética moderna foi feita uma estatística e se demonstrou que o interesse pelas
139 ALVES, Rubem. Cristianismo, ópio o liberacion. Ediciones Sigueme, Salamanca, 1973, p.54-159 e 180-240.
119
fontes da obra isaiana é incomparável com os demais escritos
véterotestamentários.140 Já não se pode dizer o mesmo do tema do êxodo no
Dêutero-Isaías, que é diferente da pesquisa do êxodo no Êxodo.141
O livro do profeta Isaías começou a ser dividido por um autor
medieval que viu em sua estrutura elementar uma diferença gritante quanto a
terminologia, a época e a história discorrida em todos os 66 capítulos. Notou que a
formação estilística do livro em sua completude era conflitante. Isto ocorreu no
século XII com o filósofo judeu Ibn Ezra que começou a colocar em dúvida já na
sua época a unidade literária e composicional do livro de Isaías como um todo.
Chegou à conclusão de que Isaías não constituía um e sim vários escritos e
escritores que compuseram a sua totalidade final. O livro na realidade refletia
vários períodos históricos diferentes.
No século XVIII dois teólogos, seguindo em pistas elaboradas por Ibn
Ezra: Johann Gottfried Eichhorn e Johann Christian Doederlin (1789) começaram
a desmembrar e fomentar a teoria da separação do livro do profeta Isaías. Esta
obra então foi dividida aleatoriamente em três partes. Reunindo na primeira parte
de Isaías os capítulos 1-39, sendo denominado de Isaías de Jerusalém ou
Primeiro-Isaías. A segunda parte da obra agrupou os capítulos 40-55 e foi
denominado de Dêutero-Isaías ou Isaías da Babilônia ou ainda Isaías Júnior (por
Carlos Mesters). Por fim, a parte final dos capítulos 56-66 denominado de Trito-
Isaías.
Autores posteriores viram outras discrepâncias ainda no Primeiro
Isaías 1-39 e notaram a existência de um apocalipse em Is 14-27. O Primeiro
Isaías ficou assim dividido em: Is 1-13; 14-27; e por fim 28-39. Alguns capítulos do
Primeiro Isaías e do Trito-Isaías como o 35 e 62 passaram a ser considerados
140 CHILDS, Brevard S. Introduction to the Old testament as Scripture. Fortress Press, Philadelphia, 1989, 6a.ediçäo, p.311-338.141 KIESOW, Klaus. Exodus texte im Jesajabuch literakritische und Motivgeschirctliche Analysen. Editions Universitaires, Fribourg, Suisse / Vandenhoeck und Ruprecht, Goettingen, 1979, p.168-203.
120
como pertencentes ao Dêutero-Isaías para vários autores. A pesquisa sobre a
estrutura do Dêutero-Isaías ajuda a demarcar os textos que mostram o tema do
Êxodo.
A VIDA SOCIAL DOS JUDAÍTAS EM JERUSALÉM E NO EXÍLIO DA
BABILÔNIA
Os habitantes de Jerusalém e das imediações, como também os
camponeses são os que permanecem na terra, para o pagamento de tributos,. Os
camponeses são obrigados a produzirem mantimentos e os frutos da terra para
pagarem os tributos aos babilônicos. Desta situação dos que permaneceram no
campo, muitos passaram por dificuldades. Devido as dívidas produzidas, pelo
sistema econômico, e por não produzirem o necessário se endividaram. Tiveram
que vender seus bens, vender seus familiares e algumas vezes se venderem para
pagarem as suas dívidas142.
Tanto os que permaneceram na leva de 597 a.C., de 587/6 ou depois
tiveram que permanecer para produzir e pagar os tributos devidos. Jer 40,7 fala
dos pobres da terra. São aqueles que se empobreceram e começaram a vagar por
não terem trabalho, o que produzir e o que pagar se tornando escravos não só dos
babilônicos como também de seus credores judaítas.143
Pouca coisa foi produzida nesta época difícil de opressão. Em
Jerusalém no período do exílio não se produziu literariamente quase nada. Ao
contrário do que foi produzido no exílio na Babilônia.144
142 ALBERTZ, Rainer. A history of Israelite religion in the Old Testament Period. - From exile to the Maccabeus. Vol 2, Westminster John Knox Press, Louisville, 1994, p.369-436.143 ALBERTZ, Rainer. op. cit., p.399-347.144 Idem, p.375-387.
121
A situação dos exilados na Babilônia era diferente. Os que foram
levados ao exílio eram aristocratas, das classes mais altas. Eram ourives,
arquitetos, engenheiros, carpinteiros e uma mão de obra especializada. Estes
foram levados com o propósito de trabalharem nos locais em que Nabucodonosor
queria. Era o trabalho de irrigação, de construções de palácios de verão e de
inverno, nas plantações, nas cidades e nos palácios.
A produção intelectual era livre. E este período é o mais fértil na
literatura judaíta. Produziram-se as obras mais importantes da Babilônia Hebraica
como: a Ob H Dtr, Ob H Cr, o próprio Dt e suas releituras dos profetas e de outros
escritos, alguns profetas como o Dêutero-Isaías, Ez, partes de Jr. As leis cultuais e
sacrificiais, a instituição do sábado, a sinagoga e muitas formas de adoração na
Babilônia.145
A ESTRUTURA DO DÊUTERO-ISAÍAS.
A estrutura do Dêutero-Isaías, porém em comparação com os outros
Isaías ficou mais ou menos coeso, com três grandes secções: I - Is 40,12 -44, 23;
II - Is 44,24-49, 13 e por fim, III - Is 49,14-55, 13. Dentro desta estrutura existe um
prólogo em Is 40,1-11 e um epílogo em Is 55,6-13, fazendo desta uma moldura.
Esta estrutura fica bem clara com a inserção da faceta histórica deste profeta na
Babilônia no exílio.146 No início da obra deutero-isaiana mostra os antecedentes
históricos do exílio que foram registrados por outros livros do Antigo Testamento
(2 Rs, Jr).
cO Dêutero-Isaías em sua estrutura relata somente os
acontecimentos do exílio da Babilônia; da vida do povo em terra estranha, do
trabalho compulsório, dos assentamentos nos canais de irrigações, nas
plantações e construções. Estes acontecimentos são registrados nos anais dos
babilônicos e dos Persas sob Ciro.147
145 Ibidem, p.369-436.146 KIESOW, Klaus. op. cit., p.20-27.147 WISEMAN, Donald J. Nebuchadnezzar and Babylon. OUP, Oxford, 1991, p.43-78; PRITCHARD, James. La sabiduria del Antiguo Oriente. Ediciones Garriga, Madrid, 1969.
122
O sofrimento do povo levou o profeta a anunciar o novo êxodo. Este
anúncio é o êxodo como salvação, tema que é releitura do antigo êxodo no Egito
que se repetirá em grande escala e com maior intensidade. O êxodo do Dêutero-
Isaías é elaborado de uma forma totalmente diferente do êxodo do Egito. Esta
releitura é encontrada em diversas passagens do Antigo e do Novo Testamento,
Salmos, Mateus, João e o Apocalipse registram estes fatos para mostrar a igreja
num verdadeiro êxodo peregrinando pela terra.
O trabalho forçado, o trabalho especializado levou os judaítas a uma
espécie de privilégios na Babilônia. O relato de componentes da classe alta como:
ourives, carpinteiros, engenheiros e arquitetos para o trabalho especializado.
Assim é descrito a situação de indivíduos que fizeram fama e riqueza e que jamais
voltariam à terra prometida. Pelo contrário encontramos os indivíduos que ficaram
na miséria nas imediações de Jerusalém. Trabalhadores que permaneceram e
tinham que pagar os pesados tributos para o opressor. Camponeses que se
endividaram, tiveram que vender os seus bens e muitas vezes os familiares e a si
próprio para pagar o tributo devido.
Nesta estrutura notamos que o tema do êxodo no Dêutero-Isaías fica
mais evidente, principalmente se o entendermos através dos textos como viviam
os exilados.
O MOTIVO DO ÊXODO NO DÊUTERO-ISAÍAS
O motivo do êxodo no Dêutero-Isaías é um fio condutor na teologia
bíblica e na exegese do Antigo Testamento e do Novo Testamento. Este tema
acompanha os primórdios da fé de Israel, o início da fé javista. Acompanha os
israelitas desde o início da formação como povo, até chegar às releituras feitas
nos evangelhos sinóticos, em João e no Apocalipse.
123
Este motivo do êxodo foi acompanhado de pesquisa, de exegese e
de aplicação de métodos os mais variados possíveis. Inclusive a teologia latino-
americana elabora desta perspectiva uma leitura importante e uma hermenêutica
fundamental deste tema.
O motivo do êxodo, tanto no livro de Êxodo como no Dêutero-Isaías
passou por vários tipos de leitura e óticas diferentes, sendo analisado como: a
leitura do primeiro mundo, a leitura espiritualista e a leitura social. Tanto uma
como a outra pode ser um modo reducionista, porém a leitura feita pela teologia
latino-americana pode ser considerada a mais abrangente. A leitura do tema do
êxodo no Dêutero-Isaías lança luzes no êxodo, como salvação, lembrança,
memória ou paradigma.
O êxodo no Dêutero-Isaías é a interpretação, constitui a leitura do
primeiro. Este êxodo no Dêutero-Isaías é denominado de novo êxodo. Claude
Wiener o denomina o Dêutero-Isaías de profeta do novo êxodo.148 Este profeta
conclama os exilados através de sua pregação a voltarem para Jerusalém. Ele
descreve a saída da Babilônia de uma forma mais magnífica e maravilhosa do que
a saída do Egito. Recorda alguns acontecimentos nele e reinterpretam outros
fatos, tomando alguns exemplos do antigo êxodo como paradigma e anámnesis. A
travessia do deserto ilustra esta consideração: no primeiro êxodo esta travessia
está ligada aos acontecimentos de milagres como a água da rocha, as codornizes
e o maná. No novo êxodo está a transformação do deserto, das montanhas, dos
vales, rios com correntezas no deserto.
No primeiro êxodo Javé protegia o povo com o sol, a lua, o fogo, a
nuvem, o anjo. No novo êxodo Ele mesmo será a retaguarda e a dianteira do povo
guardando e protegendo para que nada aconteça. Estas imagens têm traços
particulares e formas de comparação, tudo é colocado, palavras e termos, para
que o novo êxodo seja realçado. O profeta do novo êxodo é o criador de uma
148 WIENER, Claude. op. cit., p.9-17.
124
linguagem metafórica incrivelmente sem precedentes. Ele mesmo em suas
palavras anuncia que o povo deve esquecer as primeiras coisas e não considerar
as que se passaram (Is 43,18), porém mostra que o novo êxodo difere do antigo
em esplendor e magnificência. O anúncio é: “eis que faço nova todas as coisas,
que está saindo à luz, porventura não o percebeis? Eis que porei um caminho no
deserto, e rios nos ermos.” (Is 43,19)
A recordação é um marco triunfal do profeta do novo êxodo e
também é uma superação com as coisas novas. As antigas coisas foram
fenomenais, porém as novas coisas superam em toda superlatividade. A forma de
recordar é superar e este superar mostra que o recordar é salvar.149
O novo êxodo no profeta é também a salvação. Salvar do exílio
babilônico. O salvar como em outros relatos ou narrativas não é salvar do pecado
ou da condenação, mas salvar do exílio. Salvar é libertar, retornar à pátria,
caminhar em direção à Sião. Javé não é guerreador, mas o salvador. Ele salva
como rei, como juiz e como pastor. Rei que é soberano para libertar Israel, juiz
que julga Israel e os povos opressores, que conduz como pastor solícito pelo
deserto em retorno à pátria.
O êxodo em Dêutero-Isaías é o novo êxodo. Este profeta do novo
êxodo parte de tradições e da fé antiga de Israel para reformular, superar o antigo
êxodo e demonstrar o novo êxodo. Ele recupera as tradições dos patriarcas,
Moisés, o êxodo do Egito, Davi e Sião. A partir destas tradições ele anuncia e
enuncia sua pregação do novo êxodo.
AS ANÁLISES DE TEXTOS DO NOVO ÊXODO
Os textos de Is 40,1-11; 43,16-21; 49-7, 12; 51,9-14; 52,7-12; 55,12-
13 foram analisados a partir da tradução, de questões exegéticas, do motivo do
149 RAD, Gerhard von. op. cit., p.231.
125
êxodo e uma conclusão. Esta análise deu-nos condições de analisar texto por
texto, fazer exegese e notar que o motivo do êxodo é evidente. A partir desta
análise as conclusões sobre o motivo do êxodo são:
1 - O povo foi levado ao cativeiro porque abandonou o esposo Javé.
O marido alisa a esposa. Mas Is 40,1-11 mostra que este aplainamento está
terminado. O duplo: “consolai, consolai” demonstra o fim do exílio. O retorno será
breve e a caminhada pelo deserto será transformada. A idéia de um novo êxodo
que supera o antigo êxodo.
2 - Em Is 43,16-21 através do hino designa que o exílio acabará. O
estrangeiro inimigo será destruído, o povo deverá esquecer o antigo êxodo e
somente pensar no novo êxodo. O paradigma do novo êxodo, do êxodo do Egito é
anunciado neste texto. Este hino relata os acontecimentos salvíficos do novo
êxodo. A salvação de Israel por Javé que abre um caminho nas águas (o antigo
êxodo) e abre um caminho no deserto transformado (novo êxodo). A mensagem é
para não lembrar ou esquecer o êxodo antigo, pois este novo êxodo será tão
maravilhoso que superará tudo.
3 - Em Is 49,7-12 relata que Javé é o redentor de Israel que redimirá
o desprezado e abominado, os escravos dos opressores. Este redentor redime o
povo e transforma a natureza e reúne os dispersos de todos os lugares da terra. O
v.12 narra esta reunião: visão de longe, do norte e do ocidente e da terra de Sinim.
4 - Em Is 51,9-14 narra a destruição dos inimigos. Como abateu os
egípcios, abaterá os inimigos deste exílio. Aquele que secou o mar, as águas do
grande abismo, o monstro marinho destruído. Desta forma o redentor redimirá e
retornará a Jerusalém com alegria, júbilo e regozijo. Relata que o exilado será
libertado.
126
5 - Em Is 52,7-12 relata a grandeza daquele que anuncia as boas-
novas. As boas-novas é o ouvir a paz, a salvação, o retorno à Sião. Todos devem
exultar: ruínas, montes, pois Javé consolou e remiu Jerusalém. Javé libertou e
reuniu seu povo de todos os confins da terra. Narra o sair do exílio e a purificação
daqueles que retornarão a Sião.
6 - Em Is 55,12-13 relata o sair com alegria e ser guiado em paz. A
natureza participará com cânticos e palmas para saudar os libertos do exílio.
O NOVO ÊXODO
A literatura sobre a temática do novo êxodo no Dêutero-Isaías não
facilita a pesquisa.150 A situação do tema do novo êxodo como salvação é pouco
difundida. A questão é equacionar a crítica literária à teologia, à história e à
exegese do tema do novo êxodo. A difusão da exegese no primeiro mundo difere
e em muito da nossa exegese latino-americana.151
O que encontramos em circunstâncias anteriores152 os trabalhos
analisados sobre o tema do êxodo no Dêutero-Isaías tiveram um papel importante,
porém os trabalhos fizeram tipologia deste tema.153 Na exegese latino-americana
ficou evidenciada a interpretação do motivo do êxodo no Dêutero-Isaías como
paradigma e anámnesis.154 Na exegese latino-americana os textos mais
escolhidos sobre o tema do êxodo no Dêutero-Isaías são: Is 40,1-11; 43,16-21;
49,7-12; 51,9-14; 52,7-12; 55,12-13. Estes textos são os que denotam com maior
intensidade e traz no bojo a esperança da salvação com a mensagem do novo
êxodo.155
150 KIESOW, Klaus. op. cit., p.20-27.151 ANDERSON, Bernhard. op. cit., p.177-195; ALVES, Rubem. op. cit., p.180-240.152 WIENER, Claude. op. cit., p.122-127.153GUILLET, Jacques. op. cit., p.164-181.154 GUTIERREZ, Gustavo. op. cit.; ALVES, Rubem. op.cit., p.130-176.155 CROATTO, José Severino. Op. cit., p.7-12.
127
O novo êxodo no Dêutero-Isaías diferentemente do êxodo do Egito
constitui linguagem própria do profeta Dêutero-Isaías. O Dêutero-Isaías criou uma
literatura, teceu e costurou os gêneros litúrgicos e hínicos. Esta forma traz uma
linguagem figurada ao mostrar a travessia do deserto, a transformação do deserto,
a construção de uma via expressa do exílio para o povo dirigir-se à Sião.
Esta linguagem usada pelo profeta Dêutero-Isaías constrói de
maneira diferente uma teologia do caminho. Caminho este que terá as montanhas
rebaixadas, os vales aterrados, os caminhos tortuosos endireitados. Esta
transformação é usada para encorajar, facilitar o retorno do povo do exílio em
direção à antiga pátria. Linguagem esta que foi figurada e escatologizada na
realidade não foram cumpridas. Esta é uma linguagem que tem por objetivo dar
força à esperança de salvação. O novo êxodo é o antítipo do antigo êxodo no
Egito. Porém o Dêutero-Isaías usa o primeiro êxodo, vê e reinterpreta-o. Nos
textos analisados vemos as semelhanças e as diferenças existentes entre os dois
êxodos.
O novo êxodo no Dêutero-Isaías difere do primeiro da seguinte
maneira: Javé liberta o povo Is 40,10; 51,9; 52,10. A sua glória é vista pelo povo
no antigo êxodo em Ex 16,7 e será presenciada por todas as nações. Não há
alusões das maldições no Egito em Dêutero-Isaías, nem a páscoa, mas a menção
de um texto do Êxodo em que o povo: sairia devagar, em paz, alegre e sem
pressa, e sem comer ervas amargas relatadas em Is 52,12; Dt 16,3; Ex 12,1. No
êxodo Javé será o protetor do povo em Is 52,12; Ex 13,21-22; Ex 14,19-20. Javé
guerreia pelo povo e vence a batalha (Is 43,13; Ex 15,2; Is 51,9-10 e Ex 14,25. Ele
derrotará cavalos e cavaleiros (Is 43,16-17 e Ex 14,18; 15,10-21). Destruiria os
opressores de Israel em Is 49,24-26; 51,22-23 e Is 52,3-6.
O novo êxodo será com cânticos de júbilo e de vitória. Como na
vitória de Miriam, Is 42,10-13 e Ex 15,21. A jornada pelo deserto, o caminho
128
preparado e o povo guiado em Is 40,3-5; 42,16; 43,19 e Is 11,16; 35,8-10. O povo
no caminho receberá comida e bebida em Is 41,17-20; 43,19-21, 49,10. Jorrará
água no deserto como em Meribá em Is 48,21; Ex 17,27; Nm 20,8. O deserto
transformado Is 49,9-11; 55,13; Is 35,6-7. A nova entrada na Terra prometida será
através de uma majestade de Javé, do deserto a Sião e a terra redividida (Is 49,8)
e o novo Israel consistirá na confederação tribal que se reunirá na Babilônia e na
dispersão a Sião, a Cidade Santa (Is 52,1).
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