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O OCASO DO PT NA CRISE DA ERA DA REDEMOCRATIZAÇÃO Coletânea Paulo Timm (org) Para uso em sala de aula Porto Alegre abril 2015 “Que os príncipes não se queixem dos erros cometidos pelo povo sujeito à sua autoridade, pois esses erros resultam inteiramente da negligência e mau exemplo dos próprios príncipes” Maquiavel in “O Príncipe” Um fenômeno só vai além de si mesmo por meio de sua determinação. Aquilo que permanece totalmente indeterminado é sempre dito uma vez mais, como um substitutivo para tanto, assim como gestos que, repelidos de seus objetos de ação, são realizados sempre uma vez mais num ritual sem sentido. Adorno in Dialética da NegaçãoZahar, 2009 pg 104 Especialista em fazer o marketing do otimismo sem projeto, Lula foi uma espécie de Eike Batista da política. Também encantou multidões e, com isso, arrastou grande parte da esquerda. Entre os atores políticos, ela será a maior perdedora. Ao longo da história, a esquerda resistiu a diversas tentativas de aniquilação, vindas de fora para dentro. Ao aderir ao lulismo que abria aos seus quadros generosas oportunidades de ascensão social e poder ela se deixou sucumbir por um processo inédito, lento e profundamente corrosivo: a dissolução de dentro para fora, pela perda de seus valores fundamentais. Embora abrigado em legendas de esquerda, o lulismo sempre foi, na essência, um movimento conservador, que reduziu a idéia de justiça social apenas à dimensão do consumo individual e à conquista de votos a ela associada. O fortalecimento da coisa pública e das instituições republicanas, o desenvolvimento moral, intelectual e cultural das pessoas e o aperfeiçoamento do ambiente social em que

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O OCASO DO PT NA CRISE DA ERA DA REDEMOCRATIZAÇÃO

Coletânea – Paulo Timm (org) – Para uso em sala de aula

Porto Alegre – abril 2015

“Que os príncipes não se queixem dos erros cometidos pelo

povo sujeito à sua autoridade, pois esses erros resultam

inteiramente da negligência e mau exemplo dos próprios

príncipes”

Maquiavel in “O Príncipe”

Um fenômeno só vai além de si mesmo por meio de sua

determinação. Aquilo que permanece totalmente indeterminado é

sempre dito uma vez mais, como um substitutivo para tanto, assim

como gestos que, repelidos de seus objetos de ação, são realizados

sempre uma vez mais num ritual sem sentido.

Adorno in “Dialética da Negação” – Zahar, 2009 – pg 104

“Especialista em fazer o marketing do otimismo sem projeto, Lula foi uma espécie de Eike Batista da política. Também encantou multidões

e, com isso, arrastou grande parte da esquerda. Entre os atores políticos, ela será a maior perdedora.

Ao longo da história, a esquerda resistiu a diversas tentativas de aniquilação, vindas de fora para dentro. Ao aderir ao lulismo – que

abria aos seus quadros generosas oportunidades de ascensão social e poder – ela se deixou sucumbir por um processo inédito, lento e

profundamente corrosivo: a dissolução de dentro para fora, pela perda de seus valores fundamentais.

Embora abrigado em legendas de esquerda, o lulismo sempre foi, na essência, um movimento conservador, que reduziu a idéia de justiça

social apenas à dimensão do consumo individual e à conquista de votos a ela associada. O fortalecimento da coisa pública e das

instituições republicanas, o desenvolvimento moral, intelectual e cultural das pessoas e o aperfeiçoamento do ambiente social em que

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se dá a convivência humana - que são essenciais em qualquer projeto progressista – sempre estiveram fora de seu horizonte ideológico.”

César Benjamin -Cientista político, jornalista, editor e político brasileiro. Durante a Ditadura Militar Brasileira, participou da luta armada contra o regime,

foi perseguido e exilado. Co-fundador do Partido dos Trabalhadores, foi também filiado ao PSOL, tendo se desligado dos dois partidos. Trecho do

artigo ‘É pau, é pedra, é o fim de um caminho’. Revista piauí, nº 103, Abril, p. 16

INDICE

Introdução

PARTE I -Pano de Fundo:

O Brasil extrativo –James Petras-2013

Os partidos também morrem = Tiago Ribeiro

As revoluções de Dilma Roussef - Wanderley G. dos

Santos

ELEIÇÕES 2010 – OS PARTIDOS : O CENÁRIO HISTÓRICO RECENTE DA ESQUERDA BRASILEIRA - Paulo Timm - 2010

A hora e a vez do duende de Garcia Lorca - Paulo

Timm –06 fevereiro 2015-02-05

O antes e depois de Dilma na economia - Ueslei

Marcelino/Reuters

PARTE II – Analises

O segundo momento dos partidos pós-79 - Maria Inês Nassif (2011)

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A mais maldita das heranças do PT – Eliane Brum

O choque da realidade - André Lara Resende

2014 e o Futuro do PT: Novas Eleições Críticas? – Claudio Couto

O momento antropofágico do Brasil - por Wanderley Guilherme dos Santos

'GOVERNO DILMA-2 CAMINHA PARA A AUTODESTRUIÇÃO' R.KOTSCHO

Urgente, falta uma ponte entre o apelo e a rua – Saul Lebon

Qual é a crise política brasileira hoje? - William Nozaki*

A revolta da classe média - Renato Janine Ribeiro

O Brasil perdeu o medo do PT – l..F. Pondé

País será testado por turbulências e impasses - André Singer

Dilma, a direita perplexa e a esquerda indignada – Gilberto Maringoni

Atestado de óbito do PT, do PP e de outros - Juremir

Machado

Afundação e refundação do PT – Jorge Hori

A segunda refundação do PT - Demetrio Magnoli

Lula, a missão - Merval Pereira

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“Assistimos ao começo do fim. O PT tende a virar um

arremedo do PMDB” - Frei Betto -

Oposição e reconstrução - Fernando Henrique Cardoso

GERAÇÃO 68 FOI DE VITORIOSA A DERROTADA –

R.KOTSCHO

Pesquisa do PT mostra derretimento de base social e

causa 'perplexidade - POR PAINEL FOLHA

Decepção com o discurso de Lula a militantes - Carlos

Bandeira:

Boulos: O Mito Lula e o Fracasso do Lulismo Democracia, entendimento e o fator Temer - Paulo Fábio

Dantas Neto

CONVERSAS NA JANELA: REINVENTAR A POLÍTICA E COCRIAR A DEMOCRACIA -PT está em novo recomeço ou no fim?– Tarso Genro

O nome da crise – Paulo Arantes

Esquerda marxista discute sair do PT – Esquerda Marxista

Projeto da ESQUERDA MARXISTA ao Diretorio Nacional PT

Resolução D.N.PT – Financiamento

O golpe de mão do Juiz Moro contra o PT – Maria I.Nassif

Triângulo da morte – Eliane Cantanhêde

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Ex-ministro de Lula e Dilma, Lupi diz que PT ‘roubou

demais’ e ‘se esgotou’

Entrevista Demétrio Magnoli: "O PT, para se manter no

governo, teve de abrir mão do poder"

A História o absolverá? - Alfredo Bosi

Mediocridade de Lideranças Políticas - - Milton Temer

É pau, é pedra, é o fim de um caminho- Cesar Benjamin

Jorge Viana, Senador (PT-AC) - "O MODELO DE COALIZÃO ESTÁ COM VALIDADE VENCIDA"

O PT precisa mudar – Tarso Genro

O “panelaço” das varandas não vai sair da cena política – Fernando Brito

Integra do discurso de Lula na celebração dos 35 anos do PT

Depoimentos

O 5º Congresso do PT e a falta de rumos, por Aldo

Fornazieri

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O gráfico que melhor explica a ascensão e queda do petismo no

Brasil

Cresce o numero de filiados ao PT

Meu último artigo antes do desastre – J.C.Assis

Outras

O moderno e o PT - ..

O Lulismo vive seu momento mais difícil - Valéria Nader e

Gabriel Brito

O vácuo de Poder- Luiz Nassif –

O buraco negro do PT – Wanderley G. dos Santos

Discurso de Vladimir Safatle bloqueia a reflexão - Antônio David

Entrevista Lincoln Secco – O erro do PT

Entrevista Paul Singer –O PT corre o risco de perder bases

Congresso do PT aprova resolução sem críticas diretas à política

econômica – Redação do SUL21

A esquizofrenia de um Partido – EL PAIS

Maria Victória Benevides Socióloga fundadora do PT diz que partido

‘esgarçou a bandeira da ética’

Estamos no volume morto –Lula

O PT e os capitalistas - Paulo Ghiraldelli

O PT e DILMA – REJEIÇÃO –

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WAGNER – PT ERROU AO NÃO FAZER R.POLITICA EM 2003

O buraco negro do PT - Wanderley G. dos Santos

Frente de esquerda para quê? Vladimir Safatle

Discurso de Vladimir Safatle bloqueia a reflexão - Antônio David

ROMPIMENTO ENTRE LULA E DIRCEU - Carlos Newton.

'O PT perdeu parte do sonho e da utopia', afirma Lula -

Ana Fernandes –

A tragédia que nos ameaça – V.Pomar

Que frente queremos? G. Boulos

A hegemonia imperfeita – M.Aurelio Nogueira

Aliança Maldita deu no que deu – Hamilton

CADÊ A ESQUERDA? Mino Carta

Crise discursiva do PT: entre tabus e autoproclamação –

Joana Salém Vasconcelos

Porque odiar o PT – Duvivier

Há 20 anos o PT só pensa em eleições - .J.P.Stedile

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Cadê a esquerda – Mino Carta

Crise discursiva do PT: entre tabus e autoproclamação -

Joana Salém Vasconcelos

As manifestações de abril – Paulo Timm

A prisão de Vacari

O PT perdeu a narrativa - Azedo

Fim do consenso – Matias Spektor

Deputados do PT cogitam desfiiação coletiva – FSP 11

março

A esquerda precisa superar o PT - José Antonio Lima

Entrevista - Lincoln Secco : O PT ainda não entendeu o

"antipetismo"?

Análise/Mauricio Dias - PT: muito além do divã

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I - PANO DE FUNDO

Brasil: O capitalismo extractivo e o grande salto para trás

• Por James Petras em 01 de agosto de 2013

Enviar por e-mail O Brasil testemunhou um dos mais gritantes retrocessos sócio-económicos da moderna história mundial: de uma dinâmica nacionalista de industrialização para uma economia exportadora primária.

James Petras é professor Emérito de Sociologia da Universidade de Binghamton, Nova Iorque

Entre meados da década de 1930 e meados da década de 1980, o Brasil cresceu a uma taxa média de cerca de 10% no seu sector manufactureiro, em grande medida com base em políticas intervencionistas do estado, subsídios, protecção e regulação do crescimento de empresas públicas nacionais e privadas. Mudanças no “equilíbrio” entre o capital nacional e estrangeiro (imperial) começaram a verificar-se a seguir ao golpe de 1964 e aceleraram-se após o retorno da política eleitoral nos meados da década de 1980. A eleição de políticos neoliberais, especialmente com a

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eleição do regime Cardoso em meados da década de 1990, teve um impacto devastador sobre sectores estratégicos da economia nacional: a privatização generalizada foi acompanhada pela desnacionalização dos altos comandos da economia e a desregulamentação maciça de mercados de capitais [1] . O regime Cardoso preparou o cenário para o fluxo maciço de capital estrangeiro nos sectores agro-mineral, financeiro, seguros e imobiliário. A ascensão das taxas de juro, como exigido pelo FMI, o Banco Mundial e o mercado especulativo imobiliário elevaram os custos da produção industrial. A redução de tarifas de Cardoso acabou com subsídios à indústria e abriu a porta a importações industriais. Estas políticas neoliberais levaram ao declínio relativo e absoluto da produção industrial [2] .

A vitória presidencial do auto-intitulado “Partido dos Trabalhadores”, em 2002, aprofundou e expandiu o “grande retrocesso” promovido pelos seus antecessores neoliberais. O Brasil reverteu para tornar-se um exportador primário de commodities, como soja, gado, ferro e minérios que se multiplicaram, as exportações de material de transporte e manufacturas declinaram [3] . O Brasil tornou-se uma dos principais exportadores de commodities extractivas do mundo. A dependência do Brasil das exportações de commodities foi ajudada e compensada pela entrada maciça e a penetração de corporações imperiais multinacionais e de fluxos de financeiros por bancos além-mar. Os mercados além-mar e os bancos estrangeiros tornaram-se a força condutora do crescimento extractivo e da morte industrial.

Para ter um melhor entendimento da “grande reversão” do Brasil de uma dinâmica nacionalista-industrializante para uma vulnerável dependência imperial conduzida pela extracção agro-mineral, precisamos resumidamente rever a economia política do Brasil ao longo dos últimos cinquenta anos a fim de identificar os “pontos de viragem” decisivos e a centralidade da política e da luta de classe.

Modelo militar: Modernização a partir de cima

Sob a ditadura militar (1964-1984) a política económica era baseada numa estratégia híbrida enfatizando uma tríplice aliança do estado, do capital estrangeiro e do capital privado nacional [4] centrada primariamente em exportações industriais e secundariamente e commodities agrícolas (especialmente produtos tradicionais como o café).

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Os militares rejeitaram o modelo nacionalista-populista baseado em indústrias do estado e cooperativas camponesas do deposto presidente Goulart e puseram em vigor uma aliança de capitalistas industriais e agronegócio. A cavalgar uma onda de mercados globais em expansão e beneficiando da repressão do trabalho, a compressão de salários, subsídios abrangentes e políticas proteccionistas, a economia cresceu a dois dígitos desde o fim da década de 1960 até meados da de 1970, o chamado “Milagre brasileiro” [5] . Os militares, se bem que afastando quaisquer ameaças de nacionalizações, puseram em vigor um certo número de regras de “conteúdo nacional” e ampliaram a dimensão e âmbito da classe trabalhadora urbana, especialmente na indústria automotiva. Isto levou ao crescimento dos sindicatos de trabalhadores metalúrgicos e posteriormente do Partido dos Trabalhadores. O “modelo exportador” baseado na indústria leve e pesada, de produtores estrangeiros e internos, tinha base regional (Sudeste). A estratégia de modernização aumentou desigualdades e integrou os capitalistas “nacionais” a multinacionais imperiais. Isto preparou o terreno para o início das lutas anti-ditatoriais e o retorno da democracia. Partidos neoliberais ganharam hegemonia com a viragem para políticas eleitorais.

Políticas eleitorais, a ascensão de neoliberalismo e a ascendência do capitalismo extractivo

A oposição eleitoral que sucedeu aos regimes militares esteve inicialmente polarizada entre uma elite liberal, adepta do livre mercado agro-mineral e aliada a multinacionais imperiais e, por outro lado, um bloco nacionalista de trabalhadores, camponeses, trabalhadores rurais e classe média baixa. Trabalhadores militantes constituíam a CUT, camponeses sem terra o MST e ambos juntaram-se à classe média para constituir o PT. [6]

A primeira década de política eleitoral, 1984-94, foi caracterizada pelo puxa e empurra entre o capitalismo estatista residual herdado do regime militar anterior e a emergente burguesia do “livre mercado” liberal. As crises de dívida, hiper-inflação, corrupção sistémica maciça, o impedimento do presidente Collor e a estagnação económica enfraqueceram gravemente os sectores capitalistas estatais e levaram à ascendência de uma aliança do capital agro-mineral e financeiro, tanto de capitalistas estrangeiros como locais, ligada a mercados além-mar. Esta coligação retrógrada encontrou o seu líder politico e o caminho do poder com

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a eleição de Fernando Henrique Cardoso, um antigo académico de esquerda que se converteu em fanático do mercado livre.

A eleição de Cardoso levou a uma ruptura decisiva com as políticas nacionais estatistas dos sessenta anos anteriores. As políticas de Cardoso deram um impulso decisivo à desnacionalização e privatização da economia, elementos essenciais na reconfiguração da economia do Brasil, e à ascendência do capital extractivo [7] . De acordo com quase todos os indicadores, as políticas ultra-liberais de Cardoso levaram a um precipitado grande salto para trás, concentrando rendimento e terra, e aumentando a propriedade estrangeiro de sectores estratégicos. A “reforma” da economia de Cardoso a expensas do trabalho industrial, da propriedade pública, dos trabalhadores sem terra provocou greves generalizadas e ocupações de terra [8] . A “economia extractiva”, especialmente a abertura de sectores lucrativos na agricultura, mineração e energia, ganhou espaço a expensas das forças produtivas: a posição relativa da manufactura, tecnologia e serviços avançados declinou. Em particular, os ganhos do trabalho como um todo declinaram como percentagem do PNB [9] .

A taxa de crescimento médio da indústria declinou para uns magros 1,4%. O emprego no sector industrial caiu em 26%, o desemprego subiu para mais de 18,4%, o “sector informal” subiu de 52,5% em 1980 para 56,1% em 1995 [10] .

A privatização de empresas públicas como a Telebrás, firma gigante e lucrativa de telecomunicações, levou ao despedimento maciço de trabalhadores e à subcontratação de trabalho com salários mais baixos e sem benefícios sociais. Sob Cardoso, o Brasil tinha as mais altas taxas de desigualdade (coeficiente de Gini) entre todos os países do mundo.

Cardoso utilizou subsídios do estado para promover o capital estrangeiro, especialmente nos sectores da exportação agrária e mineral, enquanto pequenos e médios agricultores ansiavam por crédito. O seu programa de desregulamentação financeira levou à especulação com divisas, lucros maciços e inesperados para bancos da Wall Street quando o regime elevou as taxas de juro em mais de 50% [11] . A bancarrota de agricultores levou ao seu despojamento pelos capitalistas agro-exportadores. A concentração de terra assumiu uma viragem decisiva quando 7% dos grandes proprietários que possuíam fazendas de mais de 2000 hectares

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aumentaram a dimensão das suas terras de 39,5% para 43% das terras agrícolas brasileiras [12] .

Durante os oito anos de Cardoso no governo (1994-2001) houve um tsunami de investimento estrangeiro: mais de US$50 mil milhões entraram no país só nos primeiros cinco anos – dez vezes o total dos 15 anos anteriores [13] . Companhias agro-minerais de propriedade estrangeiras entre as principais companhias estrangeiras (em 1997) representavam mais de um terço e continuavam a crescer. Entre 1996-1998 multinacionais estrangeiras adquiriram oito grandes firmas de alimentos, mineração e produção metálica [14] .

As políticas neoliberais de Cardoso abriram a porta amplamente para a tomada de indústrias críticas e sectores bancários pelo capital estrangeiro. No entanto, foram os presidentes do “Partido dos Trabalhadores” que vieram a seguir, Lula da Silva e Rousseff, que completaram o Grande Salto para Trás da economia brasileira ao se voltarem decisivamente para o capital extractivo como a força condutora da economia.

Do neoliberalismo ao capital extractivo

As privatizações de Cardoso foram apoiadas e aprofundadas pelo regime Lula. A ultrajante privatização de Cardoso da mineradora Vale do Rio Doce por uma fracção do seu valor foi defendida por Lula; o mesmo se passou com a privatização de facto da companhia petrolífera estatal Petrobrás. Lula abraçou as políticas monetárias restritivas, acordos de excedente orçamental com o FMI e seguiu as prescrições orçamentais dos directores do FMI [15] .

O regime Lula (2003-2011) adoptou as políticas neoliberais de Cardoso como um guia para promover a reconfiguração da economia do Brasil em benefício do capital estrangeiro e interno, agora assente no sector primário e de exportação de matérias-primas. Em 2005 o Brasil exportou US$55,3 mil milhões em matérias-primas e US$44,2 mil milhões em bens manufacturados; em 2011 o Brasil triplicou suas exportações de matérias-primas para US$162,2 mil milhões enquanto suas exportações de manufacturas aumentaram para uns meros US$60,3 mil milhões [16] .

Por outras palavras, a diferença entre o valor das exportações de matérias-primas e de manufacturas aumentou de US$13 mil milhões para mais de US$100 mil milhões nos últimos cinco anos

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do regime Lula. A desindustrialização relativa da economia, o desequilíbrio crescente entre o sector extractivo dominante e o sector manufactureiro ilustra a reversão do Brasil para o seu “estilo colonial de desenvolvimento”.

O capitalismo agro-mineral, o estado e o povo

O sector exportador do Brasil beneficiou-se enormemente com a ascensão dos preços das commodities . O principal beneficiário foi o sector exportador agro-mineral. Mas o custo para a indústria, transporte público, condições de vida, investigação e desenvolvimento e educação foi enorme. As exportações agro-minerais proporcionarem grandes receitas para o estado mas também extrairam-lhe grandes subsídios, benefícios fiscais e lucros.

A economia industrial do Brasil foi afectada desfavoravelmente pelo boom da commodities devido à ascensão no valor da sua divisa, o real, em 40% entre 2010-2012, a qual aumentou o preços das exportações de manufacturas e diminuiu a competitividade dos produtos manufacturados [17] . As políticas de “mercado livre” também facilitaram a entrada de bens manufacturados mais baratos da Ásia, particularmente da China. Enquanto as exportações primárias para a China deram um salto, o sector manufactureiro do Brasil, particularmente bens de consumo como têxteis e calçados, declinou entre 2005 e 2010 em mais de 10% [18] .

Sob os regimes Lula-Rousseff, a extrema dependência de um número limitado de commodities levou a um declínio agudo nas forças produtivas, medido pelos investimentos em inovações tecnológicas, especialmente aqueles relacionados com a indústria [19] . Além disso, o Brasil tornou-se mais dependente do que nunca de um único mercado. De 2000 para 2010 a importações chinesas de soja – a principal exportação agrícola – representaram 40% das exportações do Brasil; as importações chinesas de ferro – a exportação mineira chave – constituem mais de um terço do total das exportações daquele sector. A China também importa cerca de 10% das exportações brasileiras de petróleo, carne, celulose e papel [20] . Sob os regimes Lula e Rousseff, o Brasil reverteu para uma economia quase mono-cultural dependente de um mercado muito limitado. Em consequência, o arrefecimento da economia da China levou como era de prever a um declínio no crescimento do Brasil para menos de 2% de 2011 para 2013 [21] .

Brasil: Paraíso económico do capital financeiro

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Sob as políticas de mercado livre do Partido dos Trabalhadores, o capital financeiro entrou a jorros no Brasil, como nunca antes. O investimento directo estrangeiro saltou de cerca de US$16 mil milhões em 2002, durante o último ano do regime Cardoso, para mais de US$48 mil milhões no último ano do governo de Lula [22] . A carteira de investimento – na maior parte de tipo especulativo – subiu de US$5 mil milhões negativo em 2002 para US$67 mil milhões em 2010. Entradas líquidas de investimento directo estrangeiro (IDE) e investimentos de carteira totalizaram US$400 mil milhões durante 2007-2011, a comparar com os US$79 mil milhões durante o período anterior de cinco anos [23] . Investimentos de carteira em títulos de altos juros retornaram entre 8% e 15%, o triplo e o quádruplo das taxas na América do Norte e Europa. Lula e Dilma são presidentes poster da Wall Street.

De acordo com os indicadores económicos mais importantes, as políticas dos regimes Lula-Dilma foram as mais lucrativas para o capital estrangeiro além-mar e os investidores nos sectores agro-minerais primários na história recente do Brasil.

O modelo agro-mineral e o ambiente

Apesar da sua retórica política em favor da família agricultora, os regimes Lula-Dilva têm estado entre os maiores promotores do agro-negócio na história política brasileira. A maior fatia de recursos do estado foi concedida à agricultura, finanças e grandes proprietários rurais. De acordo com um estudo, em 2008/2009 pequenos proprietários receberam cerca de US$6,35 mil milhões, ao passo que o agro-negócio e grandes proprietários rurais receberam US$31,9 mil milhões em financiamento e crédito [24] . Menos de 4% dos recursos do governo e de investigação foi destinada à agricultura familiar e explorações agro-ecológicas.

Sob Lula, a destruição das florestas tropicais verificou-se a um ritmo acelerado. Entre 2002 e 2008 a vegetação da região do Cerrado foi reduzida em 7,5% ou mais de 8,5 milhões de hectares, principalmente por corporações do agro-negócio [25] . O Cerrado brasileiro é uma das regiões de savana mais biologicamente ricas do mundo, concentrando-se na região centro-leste do país. De acordo com um estudo, 69% da terra de propriedade de corporações estrangeiras está concentrada no Cerrado do Brasil [26] . Entre 1995 e 2005 a fatia de capital estrangeiro no sector cerealífero agro-industrial saltou de 16% para 57%. O capital estrangeiro capitalizou com as políticas neoliberais sob Cardoso,

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Lula e Dilma deslocando-se para o sector do agro-combustível (etanol), controlando cerca de 22% das companhias brasileiras de cana-de-açúcar e etanol [27] – e rapidamente invadindo a floresta amazónica.

Desflorestação da Amazónia. Entre Maio de 2000 e Agosto de 2005, graças à expansão do sector exportador, o Brasil perdeu 132 mil quilómetros quadrados de floresta devido à expansão de grandes proprietários de terra e multinacionais dedicados à criação de gado, soja e madeira [28] . Entre 2003 e 2012, mais de 137 mil quilómetros quadrados foram desflorestados, crime ajudado por multibilionários investimentos do governo em infraestrutura, incentivos fiscais e subsídios.

Em 2008 o dano à floresta tropical amazónica aumentou 67%. Sob pressão de indígenas, camponeses, trabalhadores rurais sem terra e movimentos ecológicos o governo entrou em acção para restringir a desflorestação. Ela declinou de um pico de 27.772 quilómetros quadrados em 2004 (o segundo, apenas inferior ao de 1995, sob Cardoso, com 29.059 km2) para 4.656 km2 em 2012 [29] .

A criação de gado é a principal causa da desflorestação na Amazónia brasileira. Estimativas atribuem mais de 40% a grandes capitalistas e corporações multinacionais de processamento de carne [30] . Os principais investimentos em infraestrutura dos regimes Lula-Dilma, principalmente estradas, haviam aberto anteriormente terras florestais inacessíveis a empresas corporativas de gado. Sob Lula e Dilma, a agricultura comercial, especialmente a soja, tornou-se o segundo maior contribuidor para a desflorestação da Amazónia.

Acompanhando a degradação do ambiente natural, a expansão do agro-negócio foi acompanhada pelo despojamento, assassínio e escravização de povos indígenas. A Comissão Pastoral da Terra, da Igreja Católica, informou que em 2004 a violência latifundiária atingiu o seu mais alto nível em pelo menos 20 anos – o segundo ano do mandato de Lula. Os conflitos subiram de 1.801 em 2004, quando em 2003 foram 1.690 e em 2002 foram 925 [31] .

Segundo o governo, corporações de gado e soja exploram pelo menos 25 mil brasileiros (principalmente índios despojados da sua terra e camponeses sem terra) sob “condições análogas à escravidão”. As principais ONGs afirmam que o número verdadeiro

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poderia ser dez vezes superior àquele. Mais de 183 fazendas foram inspeccionadas em 2005 libertando 4.133 escravizados [32] .

Mineração: A fraude da “privatização” da Vale, agora poluidora número um

Cerca de 25% das exportações do Brasil são constituídas por produtos minerais – o que destaca a crescente centralidade do capital extractivo na economia. O minério de ferro é o minério de maior importância, representando 78% do total das exportações mineiras. Em 2008, o ferro representou US$16,5 dos rendimentos da indústria, num total de US$22,5 mil milhões [33] . A vasta maioria das exportações de ferro está dependente de um único mercado – a China. Quando o crescimento da China diminui, a procura declina e a vulnerabilidade económica do Brasil aumenta.

Uma firma, privatizada durante a presidência Cardoso, a Vale, através de aquisições e fusões controla quase 100% da produção das minas de ferro do Brasil [34] . Em 1997 a Vale foi vendida pelo estado neoliberal por US$3,14 mil milhões, uma pequena fracção do seu valor. Ao longo da década seguinte ela concentrou seus investimentos na mineração, estabelecendo uma rede global de minas e mais de uma dúzia de países na América do Norte e do Sul, Austrália, África e Ásia. O regime Lula-Dilma desempenhou um papel importante para facilitar a dominância da Vale no sector mineiro e o crescimento exponencial do seu valor. O valor líquido da Vale hoje é de mais de US$100 mil milhões mas ela paga uma das mais baixas taxas de imposto do mundo, apesar de ser a segunda maior companhia mineira do mundo, o maior produtor de minério de ferro e o segundo maior de níquel. Os royalties máximos sobre a riqueza mineral subiram de 2% para 4% em 2013 [35] . Por outras palavras, durante a década do governo “progressista” de Lula e Dilma, a taxa fiscal era um sexto daquela da conservadora Austrália, que mantém uma taxa de 12%.

A Vale tem utilizado os seus enormes lucros para diversificar operações mineiras e actividades relacionadas. Ela liquidou negócios como o aço e a celulose vendendo-os por US$2,9 mil milhões – aproximadamente o preço pago por todo o complexo mineral. Em vez disso concentrou-se na compra de minas de ferro de competidores e literalmente na monopolização da produção. A Vale expandiu-se no manganês, níquel, cobre, carvão, potassa, caulim, bauxita; comprou ferrovias, portos, terminais de contentores, navios e pelo menos oito centrais hidroeléctricas; dois terços das

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suas centrais hidroeléctricas foram construídas durante o regime Lula [36] .

Em suma, o capitalismo floresceu durante o regime Lula com lucros recorde no sector extractivo, perigo extremo para o ambiente e deslocamento maciço de povos indígenas e produtores em pequena escala. A experiência mineira da Vale sublinha as poderosas continuidades estruturais entre o regime neoliberal de Cardoso e o de Lula: o primeiro privatizou a Vale a preço de saldo, o último promoveu a Vale como o produtor e exportador monopolista dominante de ferro, ignorando totalmente a concentração de riqueza, lucros e poderes do capital extractivo.

Em comparação com o crescimento geométrico dos lucros de monopólio do sector extractivo, os miseráveis dois dólares por dia de Lula e Dilma, dados como subsídio para reduzir a pobreza, dificilmente permitem classificar este regime como “progressista” ou de “centro-esquerda”.

Se bem que Lula e Dilma estejam embevecidos com o crescimento do “campeão mineiro” do Brasil (a Vale), outros não estão. Em 2002, a Public Eye, um grupo de direitos humanos e ambientais, deu à Vale um “prémio” como a pior corporação do mundo: “A Vale Corporation actua com o maior desrespeito pelo ambiente e direitos humanos no mundo” [37] . Os críticos citaram a construção da barragem de Belo Monte, da Vale, no meio da floresta tropical amazónica como tendo “consequências devastadoras para regiões com biodiversidade única e tribos indígenas” [38] .

O sector mineiro é capital intensivo, gera poucos empregos e acrescenta pouco valor às suas exportações. Ele tem degradado á água, a terra e o ar; afectado desfavoravelmente comunidades locais, despojado comunidades índias e criado uma economia de altos e baixos.

Com o acentuado arrefecimento da economia chinesa, especialmente o seu sector manufactureiro em 2012-14, os preços do ferro e do cobre caíram. As receitas de exportação do Brasil declinaram, minando o crescimento geral. É especialmente importante que a canalização de recursos para infraestruturas destinadas aos sectores agro-minerais resultou no esgotamento de fundos para hospitais, escolas e transporte urbano – os quais estão de deprimidos e proporcionam um serviço fraco a milhões de trabalhadores urbanos.

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O fim do “mega ciclo” extractivo e a ascensão de protestos em massa

O modelo de orientação extractiva do Brasil entrou num período de declínio e estagnação em 2012-2013 quando a procura mundial – especialmente na Ásia – declinou, sobretudo na China [39] . O crescimento flutuou em torno dos 2%, mal acompanhando o crescimento populacional. A classe baseada neste modelo de crescimento, especialmente o estrato reduzido de investidores estrangeiros de carteira, mineração monopolista e grandes corporações do agro-negócio, os quais controlam e arrecadam a maior parte das receitas e lucros, limitou os “efeitos gotejamento” (“trickle down effects”) que os regimes Lula-Dilma promoveram como a sua “transformação social”. Se bem que alguns programas inovadores tenham sido iniciados, o acompanhamento e a qualidade dos serviços realmente deteriorou-se.

O número de camas para pacientes em hospitais declinou de 3,3 por 1000 brasileiros em 1993 para 1,9 em 2009, o segundo mais baixo da OCDE [40] . As admissões em hospitais financiados pelo sector público caiu e as longas esperas e baixa qualidade são endémicos.

O gasto federal no sistema de saúde tem caído desde 2003, quando ajustado à inflação, segundo o estudo da OCDE. A despesa pública em saúde é baixa: 41%, a comparar com 82% no Reino Unido e 45,5% nos EUA [41] . A polarização de classe inerente ao modelo extractivo agro-mineral estende-se às despesas do governo, impostos, transportes e infraestrutura: financiamento maciço para rodovias, barragens, centrais hidroeléctricas para o capital extractivo, contra gastos inadequados e em declínio para transportes públicos, saúde pública e educação.

As raízes mais profundas dos levantamentos em massa de 2013 estão localizadas na política de classe de um estado corporativo. Os regimes Cardoso e Lula-Dilma, ao longo das últimas duas décadas, seguiram uma agenda elitista e conservadora, amortecida pela política clientelista e paternalista que neutralizou a oposição em massa durante um período de tempo extenso, até que a rebelião em massa e os protestos à escala nacional desmascararam a fachada “progressista”.

Publicistas de esquerda e sabichões conservadores que saudaram Lula como um “progressista pragmático” ignoraram o facto de que

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durante o seu primeiro mandato o apoio do estado à elite do agro-negócio foi sete vezes maior do que a oferecida aos agricultores familiares que representavam aproximadamente 90% da força de trabalho rural e proporcionavam a maior parte dos alimentos para consumo local. Durante o segundo mandato de Lula, o apoio financeiro do Ministério da Agricultura ao agro-negócio durante a safra 2008.09 foi seis vezes maiores do que os fundos concedidos ao programa de redução da pobreza de Lula, o altamente publicitado programa “Bolsa Família” [42] . Ortodoxia económica e demagogia populista não são substitutos de mudanças estruturais substantivas, envolvendo uma reforma agrária ampla que abranja 4 milhões de trabalhadores rurais sem terra, assim como uma renacionalização de empresas extractivas estratégicas como a Vale a fim de financiar agricultura sustentável e preservar a floresta tropical.

Ao invés disso, Lula e Dilma saltaram em força para o boom do etanol: “açúcar, açúcar por toda a parte” mas sem nunca perguntar, “Que bolsos enchem?” A crescente rigidez estrutural do Brasil, sua transformação numa economia capitalista extractiva, potenciou e ampliou o âmbito da corrupção. A competição por contratos mineiros, concessões de terra e projectos gigantes de infraestrutura encoraja as elites dos negócios agro-minerais a pagarem ao “partido no poder” a fim de assegurar vantagens competitivas. Isto se verificou particularmente com o “Partido dos Trabalhadores” cuja liderança executiva (destituída de trabalhadores) era composta de profissionais em ascensão, aspirando a posições na classe da elite que encarava os subornos nos negócios para o seu “capital inicial” como uma espécie de “acumulação inicial através da corrupção”.

O boom das commodities, durante quase uma década, encobriu as contradições de classe e a extrema vulnerabilidade de uma economia extractiva dependente de exportações de bens primários para mercados limitados. As políticas neoliberais adaptadas à promoção de exportações de commodities levaram ao influxo dos bens manufacturados e enfraqueceram a posição do sector industrial. Em consequência, os esforços de Dilma para renovar a economia produtiva a fim de compensar o declínio das receitas de commodities não funcionaram: estagflação, excedentes orçamentais em declínio e enfraquecimento da balança comercial praguejaram a sua administração precisamente quando a massa de trabalhadores e da classe média estão a pedir uma redistribuição de recursos em grande escala, de subsídios ao sector privado para investimentos em serviços públicos.

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As fortunas politicas de Rousseff e do seu mentor, Lula, foram construídas sobre os frágeis fundamentos do modelo extractivo. Eles falharam em reconhecer os limites do seu modelo, muito menos em formular uma estratégia alternativa. Uma colcha de retalhos de propostas, reformas políticas, retórica anti-corrupção face aos protestos de milhões de pessoas que se estendem a todas as grandes e pequenas cidades do país não resolve o problema básico de desafiar a concentração de riqueza, propriedade e poder de classe da elite agro-mineral e financeira. As suas aliadas multinacionais controlam as alavancas do poder político, com e sem corrupção e bloqueiam quaisquer reformas significativas.

A era do “Populismo Wall Street” de Lula está acabada. A ideia de que altas receitas provenientes das indústrias extractivas podem comprar lealdades populares através do consumismo, financiado pelo crédito fácil, está ultrapassada. Os investidores da Wall Street já não louvam mais os BRICs como um novo mercado dinâmico. Como é previsível eles estão a transferir seus investimentos para actividades mais lucrativas em novas regiões. Quando a carteira de investimentos declina e a economia estagna, o capital extractivo intensifica sua pressão dentro da Amazónia e com terrível preço por parte da população indígena e a floresta tropical.

O ano de 2012 foi um dos piores para os povos indígenas. Segundo o Conselho Indigenista Missionário, filiado à Igreja Católica, o número de incidentes violentos contra as comunidades índias aumentou 237% [43] . O regime Rousseff deu aos índios o menor número de títulos legais à terra do que qualquer presidente desde o retorno da democracia (sete títulos). A esta taxa, o estado brasileiro levará um século para titular os pedidos de terra das comunidades índias. Ao mesmo tempo, em 2012, 62 territórios índios foram invadidos por latifundiários, mineiros e madeireiros, 47% mais do que em 2011 [44] . A maior ameaça de despojamento vem de projectos como a mega barragem de Belo Monte e centrais hidroeléctricas gigantes promovidas pelo regime Rousseff. Quando a economia agro-mineral vacila, as comunidades índias estão a ser esmagadas (“genocídio silencioso”) a fim de intensificar o crescimento agro-mineral.

Os maiores beneficiários da economia extractiva do Brasil são os principais traders de commodities do mundo os quais, à escala mundial, embolsaram US$250 mil milhões ao longo do período 2003-2013, ultrapassando os lucros das maiores firmas da Wall Street e cinco das maiores companhias automobilísticas. Em

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meados de 2000, alguns traders desfrutaram retornos de 50 a 60 por cento. Mesmo em 2013 eles estavam numa média de 20-30% ( Financial Times , 4/15/13, p. 1). Especuladores de commodities ganharam mais de 10 vezes o que foi gasto com os pobres. Estes especuladores lucram com flutuações de preços entre localizações, com oportunidades de arbitragem proporcionadas pela abundância de discrepâncias de preços entre regiões. Traders monopolistas eliminaram competidores e os impostos baixos (5-15%) aumentaram a sua mega riqueza. Os maiores beneficiários do modelo extractivista Lula-Dilma, ultrapassando mesmo os gigantes agro-minerais, são os vinte maiores traders -especuladores de commodities.

Capital extractivo, colonialismo interno e o declínio da luta de classe

A luta de classe, especialmente sua expressão em greves conduzidas por sindicatos e trabalhadores rurais localizados em acampamentos que lançam ocupações de terras, declinou drasticamente ao longo do último quarto de século. O Brasil durante o período que se seguiu à ditadura militar (1989) foi um líder mundial em greves, com 4000 em 1989. Com o retorno da política eleitoral e a incorporação e legalização dos sindicatos, especialmente na estrutura de negociações colectivas tripartidas, as greves declinaram para uma média de 500 durante a década de 1990. Com o advento do regime Lula (2003-2010) as greves declinaram ainda mais, para 300-400 por ano [45] . As duas maiores centrais sindicais, CUT e Força Sindical, aliadas ao regime Lula, tornaram-se adjuntas virtuais do Ministério do Trabalho: sindicalistas asseguravam posições no governo e as organizações recebiam grandes subsídios do estado, ostensivamente para treino e educação do trabalhador. Com o boom das commodities e a ascensão das receitas do estado e rendimentos de exportações, os governos formularam uma estratégia do gotejamento, aumentando o salário mínimo e lançando novos programas anti-pobreza. Nas zonas rurais, o MST continuava a pedir uma reforma agrária e empenhado em ocupações de terras mas a sua posição de apoiar criticamente o Partido dos Trabalhadores em troca de subsídios sociais levou a um declínio agudo nos acampamentos a partir dos quais lançar ocupações de terras. No arranque da presidência de Lula (2003) o MST tinha 285 acampamentos, em 2012 tinha 13 [46] .

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O declínio da luta de classe e a cooptação dos movimentos de massa estabelecidos coincidiram com a intensificação da exploração capitalista extractiva do interior do país e o violento despojamento das comunidades indígenas. Por outras palavras, a exploração acrescida do “interior” pelo capital agro-mineral facilitou a concentração de riqueza nos grandes centros urbanos e nas áreas rurais estabelecidas, levando à cooptação de sindicatos e movimentos rurais. Portanto, apesar de algumas declarações retóricas e protestos simbólicos, o capital agro-mineral encontrou pouca solidariedade organizada entre o trabalho urbano e os índios despojados e trabalhadores rurais escravizados na Amazónia “arrasada”. Lula e Dilma desempenharam um papel chave na neutralização de qualquer frente unida nacional contra as depredações do capital agro-mineral.

A degeneração das principais confederações trabalhistas é visível não só com a sua presença no governo e com a ausência de greves como também na organização dos comícios anuais de trabalhadores no 1º de Maio. Os mais recentes virtualmente não incluíram qualquer conteúdo político. Há espectáculos de música, temperados com lotarias oferecendo automóveis e outras formas de entretenimento consumista, financiados e patrocinados por grandes bancos privados e multinacionais [47] . Esta relação entre a cidade e a Amazónia lembra com efeito uma espécie de colonialismo interno, no qual o capital extractivo subornou uma aristocracia do trabalho como aliado cúmplice para a sua pilhagem das comunidades do interior.

Conclusão: Com movimentos de massa, o modelo extractivista está sob sítio

Se a CUT e a Força Sindical estão cooptadas, o MST está enfraquecido e as classes de baixo rendimento receberam aumentos monetários, como e por que movimentos de massa sem precedentes emergiram em simultâneo numa centena de grandes cidades e outras menores por todo o país?

O contraste entre os novos movimentos de massa e os sindicatos foi evidente na sua capacidade para mobilizar apoio durante os dias de protesto de Junho-Julho/2013: os primeiros mobilizaram 2 milhões, os últimos 100 mil.

Manifestação em S. Paulo. O que precisa ser esclarecido é a diferença entre os pequenos grupos locais de estudantes (

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Movimento Passe Livre , MPL) que detonaram os movimentos de massa com base num aumento em tarifas de autocarros e os gastos faraónicos do estado com a Copa do Mundo (campeonato de futebol) e as Olimpíadas e os movimentos de massa espontâneos que questionaram as políticas orçamentais do estado e as prioridades na sua totalidade.

Muitos publicistas dos regimes Lula-Dilma aceitam sem questionamento as verbas orçamentais atribuídas a projectos sociais e de infraestrutura, quando de facto apenas uma fracção é realmente gasta na medida em que são roubadas por responsáveis corruptos. Exemplo: entre 2008-12 foram destinados R$6,5 mil milhões para transporte públicos nas cidades principais mas só 17% foi realmente gasto ( Veja, 17/07/2013). Segundo a ONG “Contas Abertas”, ao longo de um período de dez anos o Brasil gastou mais de R$160 mil milhões em obras públicas que não estão concluídas, nunca deixaram a prancheta de desenho ou foram roubadas por responsáveis corruptos. Um dos mais notórios casos de corrupção e má administração é a construção de 12 quilómetros de metro em Salvador, com a condição estabelecida de que seria completado em 40 meses ao custo de R$307 milhões. Treze anos depois (2000-13) as despesas aumentaram para cerca 1000 milhões de reais e escassos 6 km foram completados. Seis locomotoras e 24 carruagens compradas por 100 milhões de reais decompuseram-se e a garantia dos fabricantes expirou ( Veja, 17/07/2013). O projecto foi paralisado por acções de sobrefacturação corrupta envolvendo responsáveis federais, estaduais e municipais. Enquanto isso, 200 mil passageiros são forçados a viajar diariamente em autocarros decrépitos.

A corrupção profunda que infecta toda a administração Lula-Dilma conduziu a um vasto fosso entre os apregoados feitos do regime e a deteriorada experiência diária da grande maioria do povo brasileiro. O mesmo fosso existe em relação às despesas para preservar a floresta tropical amazónica, as terras dos índios e para financiar os programas anti-pobreza: responsáveis corruptos do PT desviam fundos para financiar suas campanhas eleitorais ao invés de reduzir a destruição ambiental e reduzir a pobreza.

Se a riqueza do boom no modelo extractivo agro-mineral “filtrou-se” para o resto da economia e elevou salários, isso fez-se de um modo muito irregular, desigual e distorcido. A grande riqueza concentrada no topo encontrou expressão numa espécie de novo sistema casta-classe no qual transporte privado – helicópteros e heliportos –

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clínicas privadas, escolas privadas, áreas de recreação privadas, exércitos de segurança privada para os ricos e abastado foram financiados por subsídios promovidos pelo estado. Em contraste, as massas experimentaram um agudo declínio relativo e absoluto em serviços públicos nas próprias experiências essenciais da vida. A ascensão no salário mínimo não compensada por 10 horas de espera em apinhadas salas públicas de emergência, transportes irregulares e sobrelotados, ameaças pessoais diárias e insegurança (50 mil homicídios). Pais que recebem a esmola anti-pobreza enviam seus filhos para escola decadentes onde professores mal pagos correm de uma escola para outra mal atendendo suas classes e proporcionando um fraco aprendizado. A maior indignidade para aqueles que recebem esmolas de subsistência foi dizerem-lhes que, nesta sociedade de classe-casta, eles eram “classe média”; que faziam parte da imensa transformação social que retirou 40 milhões da pobreza, quando se arrastavam para suas casas com horas de tráfego, retornando de empregos cujo salário mensal pagava uma partida de ténis num clube de campo da classe alta. A economia extractiva agro-mineral acentuou todas as desigualdades sócio-económicas do Brasil e o regime Lula-Dilma acentuou esta diferença pela elevação das expectativas, ao afirmar o seu cumprimento e a seguir ignorar os impactos sociais reais na vida diária. As verbas orçamentais em grande escala do governo para transporte público e promessas de projectos para novas linhas de metro e comboio foram adiadas durante décadas pela corrupção em grande escala e a longo prazo. Os milhares de milhões gastos ao longo de anos renderam resultados mínimos – uns poucos quilómetros completados. O resultado é que o fosso entre as projecções optimistas do regime e a frustração das massas aumentou amplamente. O fosso entre a promessa populista e o aprofundamento da clivagem entre classes sociais não será encoberto por lotarias sindicais e almoços VIP. Especialmente para toda uma geração de jovens trabalhadores que não estão presos às antigas memórias do Lula “metalúrgico” um quarto de século antes. A CUT, a FS, o Partido dos Trabalhadores são irrelevantes ou são percebidos como parte do sistema de corrupção, estagnação social e privilégio. A característica mais gritante da nova onda de protesto de classe é a divisão geracional e organizacional: trabalhadores metalúrgicos mais velhos ausentes, jovens trabalhadores não organizados dos serviços presentes. Organizações locais e espontâneas substituem os sindicatos cooptados.

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O local de confrontação é a rua – não o lugar de trabalho. As reivindicações transcendem salários monetários – as questões em causa são o salário social, padrões de vida, orçamentos nacionais. Em última análise os novos movimentos sociais levantam a questão das prioridades de classe nacionais. O regime está a despojar centenas de milhares de residentes em favelas – um expurgo social – para construir complexos desportivos e acomodações de luxo. As questões sociais permeiam os movimentos de massa. A sua independência organizativa e autonomia sublinham o mais profundo desafio a todo o modelo extractivista neoliberal; muito embora nenhuma organização ou liderança nacional tenha emergido para elaborar uma alternativa. Mas a luta continua. Os mecanismos tradicionais de cooptação fracassam porque não há líderes identificáveis para subornar. O regime, a enfrentar o declínio dos mercados de exportações e dos preços das commodities, e profundamente comprometido com investimentos não produtivos de muitos milhares de milhões de dólares nos jogos, tem poucas opções. O PT perdeu há muito a sua vanguarda anti-sistémica. Seus políticos estão ligados a e financiados por bancos e elites agro-minerais. Os líderes sindicais protegem seus feudos, suas deduções mensais automáticas e seus estipêndios. Os movimentos de massa das cidades, tal como as comunidades índias da Amazónia, terão de encontrar novos instrumentos políticos. Mas ao tomarem o caminho da “acção directa” eles deram o primeiro grande passo.

Bibliografia:

[1] James Petras and Henry Veltmeyer Cardoso’s Brazil: A land for Sale (Lanham, Maryland: Rowman and Littlefield 2003/Chapter 2. [2] ibid Chapter 1. [3] James Petras, Brasil e Lula – Ano Zero (Blumenau: EdiFurb 2005) Chapter 1. [4] Peter Evans, Dependent Development: The Alliance of Multinational State and Local Capital in Brazil (Princeton NJ : Princeton University Press 1979). [5] Jose Serra “The Brazilian Economic Miracle” in James Petras Latin America from Dependence to Revolution (New York: John Wiley 1973) pp. 100 – 140. [6] Brasil e Lula op cit. Ch. 1 [7] Cardoso’s Brazil Ch. 5 [8] ibid, Ch.3 and 6

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[9] ibid, Table A.12, p. 126 [10]iIbid, Ch. 3. [11] ibid, Ch. 1, 2. [12] ibid, Ch. 5 [13] ibid, Ch. 2. [14] ibid, Table A. 6. [15] Brasil e Lula, Ch. 1. [16] Brazil Exports by Product Section (USD) www.INDEXMUNDI.com/trade/exports/Brazil [17] Peter Kingstone “Brazil ‘s Reliance on Commodity Exports threatens its Medium and Long Term Growth Prospects” www.americasquarterly.or/icingstone . [18] Brazil Exports op cit. [19] Kingstone op cit. [20] Kingstone op cit. World Bank Yearbook 2011. [21] Financial Times, 3/26/13, p. 7. [22] Brazil’s Surging Foreign Investment: A Blessing or Curse? VSITC Executive Briefing on Trade Oct. 2012. [23] ibid [24] rainforests:mongabay.com/amazon_destruction [25] Ibid. [26] Bernard Mancano Fernandes and Elizabeth Alice Clements “Land Grabbing, Agribusiness and the Peasantry in Brazil and Mozambique ” Agrarian South (April 2013). [27] Rainforests op cit. [28] Rainforests op cit. [29] Rainforests op cit. [30] ibid [31] Jose Manual Rambla “La agonia de los pueblos indigenas, buera de la agenda reivindicativa de Brasil” rebellion.org/notice, 5/7/13. [32] Rainforests ibid p. 8 [33] Brazil Mining, www.e-mj.com/index.php/reatures/850-Brazil-,mining . [34] Wikipedia Vale, en.wilkipedia.org/wiki/vale_miningcompany . [35] The Economist, June 2, 2013. [36] Wikipedia, p. 9. [37] Guardian, Jan. 27, 2012. [38] ibid [39] Financial Times, July 13, 2013, p. 9. [40] Financial Times, July 1, 2013. [41] ibid [42] Rainforest op cit.

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[43] ibid [44] ibid [45] Raul Zibechi, “El fin del consenso lulista” rebellion 7/7/13 [46] Ibid. [47] Ibid.

Original: James Petras, 21 Julho 2013 Fonte: Diário Liberdade, 30 Julho 2013

Uma lição grega: os partidos também

morrem

TIAGO BARBOSA RIBEIRO - 03.02.2015

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OS

As eleições gregas levaram o Partido Socialista grego (PASOK) praticamente à extinção. Este partido dominou a paisagem política do país desde o fim da ditadura e teve seis maiorias absolutas entre 1981 e 2007. Foi um pilar do sistema político grego até que a sua resposta à crise, decalcando o pensamento e a ação dos partidos da Direita, conduziu ao colapso da Grécia (queda de 25% do PIB) e à autodestruição do PASOK. Hoje é a 7.ª força política grega.

O PASOK tornou-se dispensável perante o eleitorado grego porque deixou de oferecer respostas alternativas no quadro dos valores da social-democracia e os socialistas votaram maioritariamente no Syriza.

O drama do PASOK acompanha a implosão da Esquerda democrática filiada na Internacional Socialista em tantos outros países europeus, mas a derrota começou muito antes.

Iniciou-se pela crença de que havia uma adesão mais ou menos perene a partidos sistémicos, mas os vínculos emocionais por acontecimentos marcantes (ex: transição democrática, adesão à UE, etc.) contam cada vez menos. Por outro lado, muitos partidos socialistas assumiram a sua própria derrota ideológica antes de perderem nas urnas, aceitando gerir um sistema socioeconómico cada vez mais desigual em vez de o transformar.

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A cedência ao realismo impossibilista dos partidos da Direita levou muitos socialistas a uma mera gestão das circunstâncias no quadro das regras impostas por terceiros, estranhas aos seus valores. Aí foram incapazes de perceber a armadilha em que se colocaram perante os liberais, reproduzindo uma angustiante falta de respostas. Quantos socialistas não olham para a função governativa nos limites estritos das balizas do tratado orçamental e de regras europeias que, como todas as regras e tratados, devem ser alterados quando deixam de servir os povos?

Ora, o PASOK deixou de cumprir a sua função histórica ao assimilar o eco do falso extremismo perante medidas que há poucos anos seriam consideradas sociais-democratas: maior regulação pública, reversão de privatizações de setores estratégicos, aumento do salário mínimo, mais progressividade fiscal, impostos pesados sobre grandes fortunas, forte taxação de heranças, reestruturação de dívida usurária que abafa o desenvolvimento.

Pensando como a Direita, os socialistas do PASOK acabaram a governar como a Direita, formatando-se aos maneirismos dos eurocratas. Preferiram abdicar de transformar as relações entre capital e trabalho (em favor deste), anulando o seu papel nas sociedades modernas. Com isso deixaram de ser úteis como instrumento de mudança social para muitos socialistas gregos, que votaram no Syriza com uma genuína expectativa de mudança.

Os socialistas do PASOK não são caso único e cabe a outros confirmar a mesma sentença ou escrever outro desfecho.

Sim, os partidos também morrem.

* MEMBRO DA COMISSÃO NACIONAL DO PS

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As revoluções simultâneas de Dilma Rousseff

Santos vai na contramão de todas as análises pessimistas e identifica no presente uma série de transformações em curso, muitas das quais silenciosas, mas todas profundas e reais.

O tempo das revoluções simultâneas

Por Wanderley Guilherme dos Santos, cientista político.

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A Lei de Responsabilidade Fiscal de Fernando Henrique Cardoso foi um dos últimos atos da república oligárquica brasileira, atenta à estabilidade da moeda e fiadora de contratos. Necessária, sem dúvida, mas Campos Sales, se vivo, aplaudiria de pé em nome dos oligarcas. Mas já não ficaria tão satisfeito com que o veio a seguir. Depois de promover drástica rearrumação nas prioridades de governo, o presidente Lula instaurou no país uma trajetória de crescimento via promoção social deixando para trás, definitivamente, a memória de Campos Sales e de seus rebentos tardios. Milhões de famílias secularmente atreladas às sobras do universo econômico foram a ele integradas como ativos atores e consumidores. Desde agora, para desgosto de alguns e expectativa de todos os demais, a história do Brasil não se fará sem o concurso participante do trabalho e das preferências desse novo agregado a que chamamos de povo.

Com Dilma Rousseff instalou-se a desordem criadora, aquela que não deixa sossegada nenhuma rotina nem contradição escondida. Não há talvez sequer um segmento da economia, dos desvãos sociais e das filigranas institucionais que não esteja sendo desafiado e submetido a transformação. Da assistência universal à população, reiterando e expandindo a trilha inaugurada por Lula, à reformulação dos marcos legais do crescimento econômico, à organização da concorrência, à multiplicação dos canais de troca com o exterior, ao financiamento maiúsculo da produção, aos inéditos programas de investimento submetidos à iniciativa privada, a sacudidela na identidade nacional alcança de norte a sul. A cada mês de governo parece que sucessivas bandeiras da oposição tradicional tornam-se obsoletas. Já eram.

O tempo é de revoluções simultâneas, cada qual com seu ritmo e exigências específicas, o que provoca inevitáveis desencontros de trajetos. Uma usina geradora de energia repercute na demanda por vários serviços, insumos, mão de obra, criando pressões, tensões, balbúrdias. Li em Carta Maior (9/4/13) que a Associação Brasileira de Tecnologia para Equipamentos e Manutenção informa que, no Brasil, convivem hoje 12.600 obras em andamento e agendadas até 2016. Ainda segundo a mesma fonte, das 50 maiores obras em execução no planeta, 14 estão sendo realizadas no país. Claro que os leitores não serão informados pela mídia tradicional. A monumental transformação do país, que não precisa apenas crescer, mas descontar enorme atraso histórico, produz entrechoques das dinâmicas mais díspares, o que surge, na superfície, como desordem conjuntural. É, contudo, indicador mais do que benigno. Mas disso os leitores só são informados em reportagens e manchetes denunciando o que estaria sendo o atual desgoverno do país. Qual…

Os melhores informativos do estado geral da nação encontram-se nos portais do IBGE, do IPEA e afins. Os antigos jornalões apequenaram-se. São, hoje, nanicos.

Wanderley Guilherme dos Santos é cientista político. Ás quintas, publica a coluna Cafezinho com Wanderley Guilherme.

Fonte - http://www.ocafezinho.com/2013/05/30/as-revolucoes-simultaneas-de-dilma-rousseff/

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Do Brasil Econômico "Ainda é cedo para cravar a vitória de Dilma" Eduardo Miranda e Octávio Costa O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos não nega o favoritismo da presidenta, mas alerta que muita coisa pode acontecer

Neste ano em que seminários e debates lembrarão o cinquentenário do golpe militar de 1964, o cientista Wanderley Guilherme dos Santos será referência obrigatória. Seu texto "Quem dará o golpe no Brasil", publicado em 1962, acertou em cheio ao antecipar a derrubada do presidente João Goulart. Famoso desde aquela época, ele produziu uma obra respeitada no Brasil e no exterior. Em 2004 recebeu prêmio da Academia Brasileira de Letras pelo livro "O cálculo do conflito: estabilidade e crise na política brasileira" e, em 2011, assumiu a direção da Casa Rui Barbosa a convite da presidenta Dilma Rousseff.

Em entrevista ao Brasil Econômico, o professor aposentado de Teoria Política da UFRJ e fundador do Iuperj, apesar de sua capacidade de projetar os fatos, não se arrisca a fazer um vaticínio sobre a sucessão presidencial. "Ainda é cedo, falta muito tempo. Em 55, a UDN estava com a faca e o queijo na mão para ganhar a eleição, não fosse o suicídio de Getúlio Vargas. Não precisa do suicídio de ninguém, mas, de repente, tudo muda". A cautela não impede que ele reconheça o favoritismo de Dilma e diga que o quadro atual "não está fácil para a oposição", porque sempre que se faz uma crítica, "Dilma vai e cria um programa". Se há um desafio hoje para o governo, é o do investimento em infraestrutura e na inovação tecnológica, mas, em sua opinião, "esse é um bom problema". Quanto às manifestações e protestos previstos para a Copa do Mundo, o professor afirma que não representam de forma alguma ameaça à democracia. Ao contrário: as manifestações de rua, diz ele, mostram instituições democráticas fortes no país.

Em 2014, o golpe militar completa 50 anos. A democracia brasileira já está consolidada?

A democracia é um sistema aberto em constante ebulição, e é o único que permite manifestações explicitamente destinadas a substituí-la. Nenhum outro sistema permite isso. Absolutismo, obviamente não; ditadura, não; oligarquia, também não. Toda democracia com raízes fortes aceita, contempla e absorve esse tipo de manifestação. Na medida em que temos uma multiplicação acentuada de movimentos e protestos, isso não é indicador de fragilidade da democracia. Ao contrário, significa que você tem instituições democráticas fortes. Ninguém diz que as instituições democráticas estejam abaladas. As análises em jornais têm a ver com as perspectivas eleitorais, tanto da oposição quanto do governo. Portanto, quem está discutindo as possibilidades de vencer as eleições futuras está, consequentemente, preocupado com a disputa democrática. Não é como a Primavera Árabe, que levou à queda do regime.

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Qual é a diferença?

Todos os governos que sucederam a ditadura na Primavera Árabe foram extremamente frágeis, e todos já foram praticamente substituídos por outro tipo de ditadura. Por isso, é preciso não confundir o que acontece no Brasil como movimento de massas que acontece em outros regimes. A repercussão e o significado político deles variam, mas isso faz parte da abertura permanente do processo de democracia, que pode, por isso mesmo, sofrer atrasos, recuos, na medida em que essas instituições conseguem fazer com que conquistas democráticas percam vigência, como aconteceu nos Estados Unidos depois da queda das torres gêmeas. Lá, foi criado um ato patriótico, algo semelhante ao AI-5. Ele só não foi implementado totalmente. As pessoas são grampeadas e presas sem aviso prévio e podem ficar incomunicáveis o tempo que o governo julgar necessário, sem assistência jurídica. O ato patriótico é um AI-5 para uma democracia daquele tamanho e com aquela tradição. Esse é um recuo que as pessoas não mencionam, mas que também é possível em democracias, sem que elas desabem como um todo.

Como o sr. vê a lei antiterrorismo que pode surgir a partir da morte do cinegrafista Santiago Andrade?

Pode sair uma lei boa ou péssima. Tenho a impressão de que esse debate deve se estender, porque uma das formas benevolentes da democracia é não julgar as coisas no tempo quente, no calor dahora. Que sejam criadas comissões, que peçam vistas para termos uma discussão racional. Acho que agora não sairá lei nenhuma. Retomando a questão, acho que os movimentos no Brasil não são indicadores de fragilidade democrática. Precisamos distinguir, também, os movimentos brasileiros dos europeus, que são em função de desemprego e miséria, de uma perda de renda per capita impressionante na Espanha, em Portugal, na França, na Inglaterra, de taxas altíssimas de desemprego, com aumento da concentração econômica, aumento da desigualdade, algo que vem acontecendo nos Estados Unidos e que está deixando os teóricos assustados com essa polarização da América. No caso do Brasil, a motivação é heterogênea, enquanto lá todos são desempregados.

Em linhas gerais, quais seriam as motivações aqui?

Há uma motivação que, ao contrário de ser antidemocrática, é pela democracia, é pela inclusão no sistema. Há os grupos que querem a exclusão, como os Black Blocs. Estes não estão interessados em melhorar o sistema, eles querem atingir pela violência todas as instituições que são simbólicas do capitalismo. Por outro lado, rolezinho é inclusão, Movimento do Passe Livre também é inclusão. As pessoas que foram contra o arbítrio do Estado nunca tiveram medo de ir às ruas receosas de que esse arbítrio fosse cair em cima delas. Com o saldo destrutivo predatório negativo das passeatas, superior ao saldo positivo, as pessoas se afastaram, e tudo terminou com meia dúzia de gatos pingados.

A motivação seria, então, uma demanda pela inclusão?

São demandas dentro da democracia. Você pede educação melhor, saúde, segurança, e isso faz parte de todos os protestos do mundo democrático desde que a democracia existe

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Mas havia, também, um viés de insatisfação com a classe política. Parece que isso persiste.

A classe política é pessimamente avaliada no mundo inteiro por uma razão simples: as pendências e demandas de uma sociedade complexa não podem ser atendidas todas ao mesmo tempo. Tuberculose, por exemplo, não se cura com passeata. Contra a tuberculose é preciso ter vacinação, médicos. Essas questões não estão no final das manifestações. Há passeatas cujo final termina em vitória, porque são viáveis, mas há outras que trazem frustração a segmentos mais exacerbados. Aquilo que é emoção e vibração ao longo da passeata, quando chega na dispersão, vira frustração, como a dispersão num desfile de escola de samba. É preciso a inteligência e o entendimento de quem as organiza. É preciso entender que há demandas sociais que demandam muito tempo.

E cobra-se urgência dos políticos exatamente por isso?

Aqui e na Conchinchina. Os culpados são sempre os políticos, mas as pessoas esquecem que grandes projetos, como Bolsa-Família, mudança do esquema de partilhado petróleo, Mais Médicos, Minha Casa Minha Vida, tudo isso foi aprovado pelo Congresso, senão não poderia existir. Várias propostas do Executivo são melhoradas no Congresso, que trabalha nas comissões de Justiça, de Economia e por aí vai. As pessoas só veem o Congresso na hora do pinga-fogo. Os investimentos em saúde e educação no Brasil são brutais. Não estou convencido da justeza dessa medida de reservar uma porcentagem do óleo para educação e saúde, porque isso, daqui a pouco, estará mais ou menos resolvido, e precisaremos de mais dinheiro para políticas sociais, investimentos. Não sei se, nomédio prazo, essa medida será uma vitória de Pirro.

Há uma crítica sobre o nível dos parlamentares de hoje, ao mesmo tempo em que se diz que o Congresso é reflexo da sociedade...

São opiniões cíclicas. Há cerca de dois anos foi feita uma pesquisa sobre a imagem que o Congresso tinha de si próprio. E eles foram muito autocríticos, reconhecendo, ao mesmo tempo, o que fazem de bom. As casas legislativas na eleição de 1950 foram muito ruins porque permitiram toda aquela criação de golpes em 1954, foi um Congresso que não trabalhava, não produzia. Enquanto a UDN pedia golpe de estado, os governistas ameaçavam com os militares nacionalistas. Era péssimo. Durante o período ditatorial, então, nem tem comparação.

Existe, hoje, uma visão, principalmente no exterior, de que a economia brasileira está desandando. O que explica essa avaliação negativa?

O que vale é a versão. Quando você tem agências, como Standard & Poor's, e o Fed norte-americano, dizendo que só a Turquia é mais vulnerável que o Brasil, eu cobro do (Alexandre) Tombini uma resposta oficial do Banco Central, e não o que ele fez, que foi uma reunião fechada com a imprensa estrangeira. Ele precisa responder oficialmente. É falso o que o Fed está dizendo, mas o Tombini está contemporizando e o que está prevalecendo é aversão. Aí, você tem uma pesquisa mostrando a contradição dos cidadãos: 85% dizem que querem mudança, mas dizem também que melhorou de vida e que o ano que vem será melhor. Então, qual é amudança? É claro que a gente sempre pensa

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em mudança. Mas eu jamais deixaria de votar num partido porque ele está atrasado em saúde e educação, a não ser que eu veja que ele fez uma política errada. O número de universidades no país dobrou e há uma demanda pela qualidade dos professores. Mas as duas coisas não podem ser conseguidas ao mesmo tempo. Tudo isso cria espaço para demandas razoáveis. E isso não aparece na hora do voto.

Em sua opinião, a economia brasileira está bem?

A economia não está bem não por ausência de políticas. O presidente Juscelino Kubitschek, em 1960, não estava mais à altura dos problemas nacionais por conta do excelente governo que fez em 55. A pergunta, agora, é: depois de dez anos de inclusão social, os novos problemas criados estão sendo bem percebidos pelo governo? Depois do aumento da renda e da expansão econômica interna, o problema dos portos e das ferrovias adquire uma dimensão que não tinha dez anos atrás, porque isso não tinha importância. São novos problemas, resultado de dez anos de bom governo. Será que o governo está consciente e com planejamentos para a nova etapa? Eu não sei. E a oposição também não mostrou nada.

Três mandatos seguidos de PT não provocam uma fadiga?

Isso não é a lei da natureza. A Social Democracia Sueca ficou 40 anos no poder e foi capaz de resolver os problemas que ela própria foi criando por conta de suas políticas. O momento atual é de infraestrutura e inovação. O Brasil não podemais ficar tão dependente e abaixo na capacidade de gerar tecnologia.

O que deveria ser feito para gerar essa capacidade?

Não vejo solução no curto prazo. Não é falta de dinheiro também. Os grandes países com capacidade tecnológica fizeram um investimento maciço e aleatório em educação, já que nunca se sabe de onde surgirá a inteligência criadora. Os 10% do pré-sal poderiam ser transformados em financiamento de laboratórios de pesquisa nas universidades ou em isenção tributária para empresas que criam centros de pesquisas. Como é que pode o grupo Votorantim ou a Odebrecht não terem um centro de inovação e de pesquisa a fundos perdidos? Quando a União Soviética rompeu com a China, o primeiro movimento foi retirar 200 mil cientistas soviéticos que estavam trabalhando lá. Esse é o nervo exposto no mundo moderno. Passagem de ônibus, se resolve na passeata.

Como o senhor está vendo esse quadro de pré-candidatos à Presidência da República?

Ainda é cedo. Falta muito tempo. Em 55, a UDN estava com a faca e o queijo na mão para ganhar a eleição, não fosse o suicídio de Getúlio Vargas. Não precisa do suicídio de ninguém, mas, de repente, tudo muda.

As pesquisas apontam um grande favoritismo da Dilma.

Mas o Lula não tinha esse favoritismo no início da campanha e depois ganhou. A Dilma, na metade da campanha de 2010, também ganhou. Na hora do voto, é sempre complicado. Mesmo a classe média que está deslumbrada, gostando muito da Dilma, pode chegar na hora e votar diferente. Fiz um levantamento da margem de vitória de Collor para cá. Só Lula, em 2006, justamente depois do

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mensalão, teve 56% dos votos. A Dilma teve 53% de votos válidos. Não só aqueles que estão protestando vão deixar de votar, como também aquele cara que acha que as coisas melhoraram e podem melhorar mais, aí vota num Aécio, num Joaquim Barbosa. Portanto, ainda é cedo para cravar a vitória de Dilma. Eu não me arrisco, é difícil.

Falam que a oposição está fraca.

Não está fácil para a oposição. Você até pode criticar, mas o governo tem política em tudo. Quando falam alguma coisa, a Dilma não polemiza, ela vai e cria um programa. Não acho que Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) sejam incompetentes. Não acho tanta coisa da Marina, que é fechada, dogmática e não tem sensibilidade para nada além do seu universo. Não é esse o caso do Eduardo e do Aécio. Mas está difícil. Você vai ser contra o Mais Médicos? Agora, eles dizem que o Mais Médicos está sendo mal administrado, mas no início eram contra. E tudo tem seu tempo de maturação, não é a curto prazo. Uma hidrelétrica não surge de uma passeata. A oposição reclama da saúde, mas não tem nem foto nos jornais, é uma dificuldade para arrumar uma imagem com hospitais caindo aos pedaços. Hoje, os grandes temas são a falta de aeroportos, e isso é verdade. Mas são outros problemas, é infraestrutura, inovação.

Nas passeatas falou-se muito, também, de corrupção.

É umtema permanente na democracia. Lembrando meus tempos mais radicais, onde há mercadoria, há corrupção. Recolhi textos da Grécia Antiga, de Atenas. A origem do problema não está apenas na moral das pessoas, mas também no modo de interação. No nosso caso, temos um país que está mudando de pele sementrar no isolamento, sem entrar em quarentena. Até recentemente, o Brasil era oligárquico na sua estrutura e não estava preparado para ter políticas sociais. A primeira grande transformação é no período varguista, porque não havia instituições públicas para levar em frente essas políticas. O Brasil mudou de tamanho, mudou de complexidade e o Estado não estava preparado para isso, era um estado oligárquico. É uma classe política que está acabando e cobra muito caro pelo seu desaparecimento. É o fim de um grupo político comprometido como Estado atrasado. É claro que tem que bater (na corrupção), mas generalizam no discurso. É a versão, mas não é o fato.

Mas quando o Judiciário bate, dizem que ele está judicializando a política.

OJudiciárioestá passando dos limites. É da legislação estabelecida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que qualquer partido possa fazer coalizão com quantos partidos quiser. E eles fazem isso para ter tempo de televisão, um mercado bilionário, um show criado pelas leis. Olha a origem do mensalão: na hora de os partidos coligados terem um caixa 1, não pode. O partido líder da coalizão faz, então, o caixa 2. Ele financia as candidaturas dos que estão na coalizão, mas que não têm dinheiro. Quem fez isso? Quem condicionou dessa forma? O TSE. Passando para o Supremo Tribunal Federal (STF): há juízes bons lá, inclusive o ministro mais novo, o Roberto Barroso, que é excelente, honestíssimo. Mas, para ele, o que o Congresso deixa de fazer, o Judiciário tem que fazer. Não pode. Não decidir é autonomia e garantia que os legisladores têm. Entre as soberanias que eu, como eleitor, transfiro ao

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Congresso, está a de ele não decidir. O Judiciário só pode se manifestar quando convocado.

E as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins)?

Aí, tudo bem. Mas não é só isso. Eventualmente, eles aproveitam uma Adin e criam legislação - ou seja, ele (o Judiciário) legisla. E a grande maioria dos juízes que estão lá é a favor. O Ayres Britto era a favor, o Peluso era a favor, o Barroso é a favor, o Joaquim Barbosa também. A Carmem Lúcia não gosta dessa ideia. Isso é um problema democrático sério. A não ação não justifica a ação de terceiros.

Me parece que a opinião pública acaba apoiando a ação do STF.

É a urgência natural da população. Essas manifestações são compreensíveis, o que não quer dizer que todas tenham boas consequências. O povo também erra. Como não?

Como o sr. vê as manifestações que devem acontecer na Copa?

Vejo com apreensão por dois motivos. De um lado, há grupos que definitivamente vão provocar, receber e ter brutalidade, custe o que custar. Na realidade, até, faz parte da teoria dos Black Blocs. Eles querem pancadaria. Do outrolado, quando lei o que a polícia não está preparada, concordo, apesar de não ser especialista. Também não sei o que é uma polícia preparada para lidar com uma coisa como essa. Como tenho certeza do que um vai fazer, e não sei como o outro reage, eu temo.

Parece que vai ser algo como a final da Copa das Confederações, com cordão de isolamento, mas sem impedir a realização das manifestações.

Não faço ideia da magnitude do conflito, mas que vai ter conflito, vai. Não confio nos Black Blocs nem na polícia. O Black Bloc está dizendo que vai atacar as delegações. Você não tem uma polícia preparada para administrar isso.

Essa crise da representatividade trouxe o debate da reforma política. Em que medida o Congresso e o governo federal responderão a essa demanda?

Há grupos que querem introduzir o voto proporcional. Em que consiste a reforma política? Vamos mudar para o voto em lista? Sou contra. Não é que a reforma não avance, é que os legisladores são contra esse tipo de proposta. O voto em lista não é um avanço, mas um retrocesso. Se fizer como na Nova Zelândia, onde tem voto em lista, mas você pode votar nominalmente, eu sou a favor. Mas como você coloca ordem de preferência no voto em lista? A partir de 50, 60 candidatos, como você ordena? A não ser que, nesse voto em lista, se crie uma limitação de dez candidatos por partido. E aí você fica com oligarquias de representação. A competição eleitoral no Brasil é elevadíssima, na base de dez, onze candidatos por vaga. Outra opção é reduzir o número de partidos. Eu também sou contra, porque os grandes partidos não vão às fronteiras do Brasil. Nos últimos 15 anos, o Norte e o Centro-Oeste não faziam parte do país. O crescimento do eleitorado nessas regiões, na última década, é brutal. Acontece que os grandes partidos não vão lá criar diretório, porque o custo não vale a pena. Quem faz diretório lá são os chamados nanicos. Eles

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estão trazendo os conflitos para dentro da institucionalidade. Então, eu sou a favor dos nanicos. Eles não atrapalham em nada, nunca chegam na Câmara federal. E se chegam, não são maioria.

E o financiamento de campanha, cujo modelo o Supremo deseja mudar?

Não consigo ter opinião sobre isso. Acho que é um problema insolúvel. Tanto o financiamento público quanto o privado só para pessoas físicas - ao qual eu sou simpático - têm brechas. Para a lei, sempre há uma contra lei. Não tem jeito. O que eu sei é que, caso o sistema mude, novas reclamações surgirão. Eu realmente não consigo ver qual seria o menor dos males.

O senhor não acha que o modelo atual impede uma moralização da política?

Não gosto do financiamento por empresas. Mas também não acho que o problema da corrupção se deva só a isso. As pessoas esquecem que a corrupção não está só na política. O aparelho de Estado brasileiro é de tal modo burocratizado que você não consegue nada de graça, embora seja seu direito. Ninguém vai nas entranhas do Estado ver o que as grandes empresas têm que pagar para o burocrata fazer andar o processo. Essas empresas são corruptoras. Mas, ou corrompem, ou o processo não anda. Isso é grave no mundo inteiro. O problema do azeitamento da máquina política não é barato, em nenhum país. Nos Estados Unidos, não existe fundo orçamentário municipal. E nas pequenas cidades, uma das fontes fundamentais de receita são as multas de trânsito. Em microcidades cortadas por rodovias federais, há um rigor excessivo nas fiscalizações e uma série de multas é aplicada. Portanto, esse controle é muito complicado. O que não quer dizer que não se deva criar controles. Mas sem a perspectiva demiúrgica, ou evangélica, de que você vai conseguir um sistema imune; isso não é humano.

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ELEIÇÕES 2010 – OS PARTIDOS : O CENÁRIO HISTÓRICO RECENTE DA ESQUERDA BRASILEIRA

Paulo Timm - 2010

O ano de 1980 é um marco do atual sistema partidário do país, embora a Constituição de 1988 tenha consagrado os seus princípios básicos, dentre eles o amplo e irrestrito direito à organização político-partidária. Não há lugar no mundo onde haja

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maior liberdade para organizar um Partido Político. É que naquele ano, entrou em vigor a Reforma Partidária, associada à Lei da Anistia de 1979, as quais permitiram o retorno ao Brasil dos exilados, a libertação de alguns presos que ainda cumpriam pena com base na Lei de Segurança Nacional e a retomada do processo democrático. A Reforma Partidária de 1979 rompeu o muro que dividia o universo político entre dois Partidos – ARENA, pró regime militar e MDB, contra - , este já no limite de impor uma breve e fragorosa derrota eleitoral aos militares, permitindo a livre reorganização, principalmente de uma imensa “esquerda” abrigada na Oposição. Pensava com isto o General Golbery do Couto e Silva, o grande ideólogo da “abertura lenta, segura e gradual”, eminência parda do Governo Geisel (1974-1978), dividir a Oposição e, eventualmente, garantir mais alguns anos de “democrática” presença dos conservadores no poder. Anistia e reorganização partidária eram suas bandeiras. Mas o que ocorreu? Como a esquerda respondeu à essa estratégia?

Aqui desdobram-se as várias tendências da esquerda brasileira, em razão de sua particular visão da conjuntura e de seus objetivos estratégicos, dando origem ao atual quadro partidário.

A velha esquerda marxista-ortodoxa, com vários parlamentares e grande presença nas grandes cidades, isto é , o PCdoB e o Partidão (Partido Comunista Brasileiro, de Prestes) passam a condenar, com veemência, qualquer iniciativa de reorganização partidária, sob o argumento da tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES. Pretendem, contrariando a estratégia do regime vigente, impor uma derrota eleitoral campal a este regime daí saindo livre para um novo tempo. Mesmo com o direito à se reorganizarem em Partidos próprios, os comunistas permanecerão por muito tempo dentro do MDB, transformado agora (1980), por força da Reorganização Partidária, em P+MDB=PMDB. Alguns grandes líderes “independentes” da época como Miguel Arraes, em Pernambuco, e Pedro Simon, no RS, acompanham esta tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES. Arraes só sairá do PMDB anos depois para engrossar o Partido Socialista Brasileiro- PSB.

A esquerda não marxista – socialistas , trabalhistas, sindicalistas e religiosos - , ao contrário, entendem que, com a Anistia e com a Reforma Partidária, a ditadura entrava nos seus estertores e que havia necessidade de intervenção autonomamente organizada no processo de abertura, fora do âmbito liberal do PMDB. Aí se distinguiram três lideranças, cada uma em seu espaço próprio, com

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estilos próprios e horizontes próprios: Fernando Henrique Cardoso, desde poucos anos antes, já vinha propondo a criação de um moderno Partido Socialista no Brasil e chegou até a elaborar, com o apoio de Almino Afonso, Ex-Ministro do Trabalho de Jango e outros intelectuais de São Paulo ligados ao CEBRAP, um órgão de pesquisa e divulgação em ciências sociais, um Manifesto-Programa que chegou a ser discutido em várias partes do Brasil; Lula, no ABC, emergia como um grande líder de massas apoiado pelas comunidades de base de Igreja Católica e por segmentos mais radicais da esquerda marxista, há tempos desligados dos Partidos Comunistas, estes ávidos por uma liderança operária capaz de levar às “últimas conseqüências” (Revolução?) o projeto político de reorganização. Aos apelos de Brizola para a reconstrução do “trabalhismo”, respondia Lula em coro com estes setores: “Trabalhismo, não! Queremos um novo PARTIDO DOS TRABALHADORES, a salvo da manipulação populista do passado”; finalmente, Leonel Brizola, tendo saído de seu confinamento no Uruguai em 1978 apressava-se , já em junho de 1979 , com a “Carta de Lisboa”, em proclamar a reorganização, sob sua liderança do velho PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO, o PTB, do qual era , então, com a morte de Jango, o maior representante. FHC, Príncipe da Inteligência brasileira, Lula, o Senhor de um novo tempo e Brizola, detentor de um suposto manancial de votos sob a sigla do PTB, passam o ano de 78 e 79 articulando seus projetos. FHC , vendo as dificuldades para enfrentar a tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES é o primeiro a desistir do Partido próprio. Deixa a tarefa para o futuro, o que faz quando cria, já num outro cenário político internacional e nacional, o PSDB. Deixa sua posição clara num famoso artigo escrito na FOLHA DE SÃO PAULO, ainda em 1978, intitulado ‘ O CAMINHO DAS OPOSIÇÕES’, quando se alia taticamente aos comunistas cerrando fileiras com o ainda MDB, pelo qual concorrerá em sub-legenda ao Senado por São Paulo, obtendo cerca de um milhão de votos. Brizola e Lula não se entendem no projeto de reconstrução do PTB e se separam depois de inúmeras tentativas de diálogo. Brizola, na Europa, toca o seu barco, procurando o apoio da social-democracia européia, organizada em torno da II INTERNACIONAL SOCIALISTA, da qual foi um dos Vice-Presidentes até sua morte em 2004 e desafia a tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES, atacando o PMDB e a esquerda ortodoxa ali aninhada, que não lhe poupa também ácidas críticas denunciando-o como “agente do capital alemão a serviços do General Golbery”. Tempos difíceis para Brizola que, não obstante, insiste no PTB, com tímido apoio interno no Brasil. Lula, enfim, se

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determina a criar o PT, um partido representativo de uma nova esquerda, autenticamente operária, com apoio no sindicalismo combativo independente de São Paulo e da Igreja.

Esta introdução é importante para se compreender a dinâmica histórica que conduz à formação e desenvolvimento dos dois principais Partidos em confronte nestas eleições de 2010.

FHC, combativo socialista de idéias, surfa no PMDB, com forte apoio de Pedro Simon e do PMDB gaucho, torna-se Senador “de circunstância”, em decorrência da eleição do titular Franco Montoro (PMDB-SP) como Governador, em 1982, num espúrio procedimento que concedia a vaga para a sub-legenda mais votada, e daí se capitaliza politicamente para retomar o projeto adormecido do Partido Socialista, só que , já agora, sob a denominação Social Democrata . E o faz como uma dissidência “à esquerda” do PMDB, ganhando para sua causa nomes históricos da esquerda peemedebista como Euclides Scalco , no Paraná, João Gilberto, no Rio Grande do Sul e Sigmaringa Seixas, em Brasilia.

Brizola chega ao Brasil com o Programa do PTB na mala e imediatamente se credencia a legalizá-lo deixando, à porta do Superior Tribunal Eleitoral, em Brasilia, um grupo de correligionários, chefiados pelo fiel deputado federa Getúlio Dias (RS), entre os feriados do Natal de 1979 e o primeiro dia útil de 1980, com vistas a assegurar a primazia do protocolo. Já a estas alturas a também deputada IVETE VARGAS, sobrinha de Vargas, distancia-se de Brizola e também se apressa ao registro do “seu” PTB. Da pugna, sai ela vitoriosa, com o suposto apoio do Governo, deixando à Brizola o dilema de aderir (ao PTB –Ivete, mais tarde também conhecido como PTB-COBAL, pela presença de seus dirigentes neste órgão do Governo Federal) ou fazer novo Partido, o que faz a seguir, criando o PDT. Dele sairão as dissidências que formarão o Partido Verde e o Partido Socialista.

Lula, soberbo, não dá bola, nem pra FHC nem para Brizola e começa sua longa caminhada de construção do PT em escala nacional, passando, a partir de 1980 a participar como candidato à Presidente em todas as eleições. Neste, 2010, será a primeira que não participará depois que o instituto das Diretas foi retomado.

No decorrer dos anos 80 e aproximando-se a Constituinte a tese ortodoxa da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES cai por terra, visto ser inviável uma derrota campal aos conservadores, num contexto de franquia generalizada de direitos e liberdades individuais no país.

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Então os comunistas abandonam o PMDB, deixando no rastro um espaço que será ocupado por antigos defensores do regime militar e oportunistas de toda a espécie que acabam descaracterizando a sigla, e se organizam nos seus partidos o PCdoB e o PCB.

Chegamos, pois, em 1989, primeira grande eleição da qual Collor saiu vitorioso, com a atual estrutura partidária praticamente definida, em torno das seguintes candidaturas:

LEONEL BRIZOLA – PDT

MARIO COVAS – PSDB

ULYSSES GUIMARÃES-PMDB

LULA – PT

ROBERTO FREIRE – PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO

FERNANDO GABEIRA – PARTIDO VERDE

Este quadro da esquerda , modificado apenas pela mudança do nome do PCB depois do fim do regime soviético, que passa para PPS, ainda sob a liderança de Roberto Freire, é o que permanece até hoje.

Da antiga ARENA, Partido de sustentação do regime militar e que derrotou a Emenda das Diretas no ano de 1984, sairão vários filhotes: Primeiro o PDS, depois o PFL, depois a bifurcação entre os partidários de Maluf, que fundam o PP e os “éticos” que fundam o DEM, cuja maior expressão foi o Governador deposto e preso José Roberto Arruda, do Distrito Federal.

Do exposto pode-se concluir que o General Golbery, se bem tenha assegurado um ritmo lento e conservador à redemocratização no Brasil, não conseguiu, com a divisão das esquerdas, patente, garantir uma hegemonia duradoura aos conservadores. Pelo contrário, os conservadores, no Brasil, não só também se dividiram como, principalmente, se desgastaram tanto junto à opinião pública que suas respectivas agremiações não dispõem de nenhum governador e nem sequer se credenciam a apresentar candidatos próprios na grande maioria dos Estado e mesmo à Presidência. O Brasil de hoje, curiosamente, é em grau maior ou menor, de políticos que passaram grande parte de sua vida no exílio, na clandestinidade , na cadeia, ou simplesmente na Oposição.

***

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A hora e a vez do duende de Garcia Lorca

Paulo Timm – Especial para A FOLHA, Torres – 06 fevereiro

2015-02-05

Avaliação Dilma – Situação até dezembro 2014 – DATAFOLHA

Governo Dima é aprovado por 42% dos brasileiros, - DATAFOLHA -

AVALIAÇÃO DILMA – FEVEREIRO 2015 – DATAFOLHA

Governo Dilma cai para 23%

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http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/02/1586836-corrupcao-em-estatal-e-crise-economica-fazem-popularidade-de-dilma-despencar.shtml?cmpid=bnfolha

Se no final do ano o tempo já andava feio para a Presidente Dilma,

o mês da inauguração de seu segundo mandato foi simplesmente

tempestuoso. Alguns falam em janeiro negro: Muitos trovões e

alguns raios fulminantes, como a vitória do deputado Cunha

(PMDB-RJ) , adverso ao Planalto, à Presidência da Câmara dos

Deputados, efetivada no primeiro dia de fevereiro, mas gestada no

mês anterior. A ela sobreviria a implosão da Diretoria da

PETROBRÁS. E já não se pode dizer que o impeachment da

Presidente da República seja obra de meia dúzia de fanáticos e

conspiradores articulados à grande mídia. Desde que o jurista Yves

Gandra Martins divulgou seu parecer favorável a esta hipótese o

assunto já começa a ganhar foro de debate político, embora ainda

no nível das hipóteses jurídicas.

Mas afinal, o que está acontecendo no país? Trata-se apenas de

lambança ou estamos, mesmo , diante de uma crise que ameaça

transformar-se de pós-eleitoral em institucional?

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Há pouco tempo dizia-se que o problema de Dilma era...a própria

Dilma. Senhora da um temperamento difícil, avesso às negociações

políticas, teimosa, ela seria a responsável pelo tumulto nas altas

esferas do Poder. Ainda agora são visíveis as reclamações da

própria bancada do PT no Congresso à Presidente. Lentamente,

porém, vai-se percebendo que o problema não é a Dilma, embora

se admita que se Lula lá estivesse talvez houvesse mais campo de

manobra para a administração da crise. Um pouco como se

comparássemos o Presidente Dutra com o Presidente Vargas, no

curto interregno em que aquele ocupou o Catete (Palácio do

Governo, no Rio de Janeiro, entre 1946-50)...

O pano de fundo das dificuldades conjunturais está no esgotamento

do Ciclo da Redemocratização, o qual se consolidou na década de

1980: lideranças, partidos e processos políticos, sistema eleitoral,

todos abrigados sob a consigna ESPERANÇA E MUDANÇA, título,

aliás, do Programa do PMDB ao assumir o comando da Nova

República, com José Sarney na Presidência, em 1985. Naquela

época, cujo símbolo pode ser identificado com o Rock in Rio I, a

nação ansiava tanto por liberdades, como por transformações

econômicas que a aliviassem da penúria da inflação, a qual

agudizava a já perversa distribuição de renda, numa conjuntura de

estagnação. Ulysses Guimarães à frente do PMDB oferecia uma

frente democrática sob comando liberal, com os comunistas do

PCB e PCdo B sob suas asas, capaz de consolidar a democracia

mediante a Convocação de uma Constituinte capaz de impulsionar

reformas econômicas; Brizola e Lula o confrontavam, lançando-se

à construção do PDT e PT, respectivamente, oferecendo um

caminho propriamente popular , mais à esquerda, para a

consumação das mesmas tarefas. Fernando Henrique Cardoso,

sempre pretencioso de altos vôos, recém elegera-se para uma

cadeira num primeiro mandato eletivo como Senador, que viria a

ocupar em 1982 – graças ao instituto da espúria sub-legenda – e

não dava grandes pitacos. Todos, porém, eram detentores de

patrimônios políticos próprios e estavam fadados a fazer História.

Ulysses detinha um capital inicial da organização partidária, que se

revelaria mais promissor no curto e longo prazos do que naquele

que atravessou as décadas de 80 e 90. Brizola era o herdeiro do fio

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da História, que procurava revalorizar com seu inequívoco carisma

e que o levaria ao Governo do Rio em 1982; Lula era o patinho feio

do enredo, com sua trajetória de retirante nordestino, líder sindical

do ABC mas forte determinação em construir uma alternativa “dos

trabalhadores”, o PT. FHC, de longe, cevava seu capital nas franjas

da inteligência nacional.

Todos eles protagonizaram os últimos 40 anos e tiveram sua

oportunidade de mudar o país. Deixaram marcas profundas, com

exceção de Brizola, à parte sua dignidade pessoal, que legou à

posteridade um balcão de negócios. Ulysses nos brindou a

Constituição Cidadã e, surpreendentemente um Partido, malgré

tout, que se revelou às exigências da pós modernidade, hoje o mais

forte do país, com o controle do Senado e Câmara. FHC, com sua

social-democracia globalizada substitui-se, em 1994 e 1998, à

direita moribunda e conseguiu domar o tigre da inflação com um

programa conservador eficaz. Mudou, aliás, a face da direita no

país deixando seus fantasmas, como Maluf e Delfim Neto à sanha

da “governabilidade”. Lula, enfim, foi o grande vitorioso chegando a

Presidência em 2002, reelegendo-se em 2006 e fazendo por duas

vezes Dilma Roussef sua sucessora. Fê-lo graças a três vetores:

Uma conjuntura internacional favorável às exportações de

commodities, uma situação financeira interna estável, que lhe

propiciou margem à ação do Estado e à expansão do crédito às

empresas e famílias e a determinação no cumprimento de uma

Agenda Social elogiável e internacionalmente reconhecida.

Hoje, mercê até do protagonismo ativo de Ulysses, FHC e Lula, o

país é outro. E outra , também, a conjuntura internacional,

fundamental à nossa inserção dinâmica. A crise financeira de 2008

ainda não arrefeceu, a questão climática se acentuou, deixando

pouca margem aos que ainda nutriam desconfianças de que ela

abalaria o planeta, a geopolítica dos combustíveis derrubou o

petróleo a menos de US$ 50 o barril incendiando ânimos e

interesses. Nem mesmo a liga bolivariana na América Latina, nem

a criação dos BRICS com seus instrumentos financeiros

conseguem compensar as adversidades internacionais exigindo dos

países em desenvolvimento revigorados desafios.

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A tais desafios o PT e Dilma não estão conseguindo responder à

altura, perdendo-se no zigue-zague desconcertante de medidas

contraditórias. Sobre estes 50 tons de cinza da nova conjuntura

internacional e da crise interna sobrevêm as denúncias de

corrupção na PETROBRÁS, empresa chave do economia nacional.

Quem agüenta? Por muito menos Vargas se suicidou, Jânio

renunciou, Jango foi deposto e Collor foi defenestrado.

Aparentemente, agora, só o “duende de Garcia Lorca” poderá

salvar a situação. Ele aparece para surpresa da orquestra depois de

um erro e muda o clima do concerto. Quem sabe...?

***

Parte II – Crise

O antes e depois de Dilma na economia

Ueslei Marcelino/Reuters

Presidente Dilma Rousseff (PT) durante uma conferência de imprensa no Palácio da Alvorada, em Brasília

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http://exame.abril.com.br/economia/noticias/o-antes-e-depois-de-dilma-na-economia

João Pedro Caleiro, deEXAME.comSiga-me

São Paulo - Formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),Dilma Rousseff é a primeira presidente economista que o Brasil tem desde Fernando Collor.

A familiaridade com o tema, no entanto, não bastou (ou pesou contra) em áreas como juros e investimento. Enquanto isso, indicadores positivos de crescimento e comércio que vinham da Era Lula foram se evaporando ao longo do mandato de Dilma com Guido Mantega como ministro.

Apesar de ter conseguido manter o desemprego em níveis historicamente baixos e a renda em trajetória ascendente, Dilma vai começar seu segundo mandato com PIB parado, inflação no teto da meta e juros mais altos do que recebeu de seu antecessor.

Veja a seguir 9 indicadores econômicos do Brasil no ano antes da posse e ao longo dos 4 anos do primeiro mandato da presidente:

Crescimento do PIB

2010 7,5%

2011 2,7%

2012 1%

2013 2,3%

2014 0,1% - 0,2% (est.)

Dilma tomou posse após um ano com 7,5% de crescimento, mas a maior taxa desde 1986 acabaria se provando "uma espécie de último fôlego do padrão de crescimento anterior”, nas palavras de

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Otaviano Canuto, assessor-sênior do Banco Mundial para economias em desenvolvimento.

A presidente vai terminar seu primeiro mandato com média de crescimento na casa dos 1,5%, pior resultado desde Collor. O governo culpou a crise internacional e de fato, os últimos anos viram o esgotamento de duas grandes forças por trás do último ciclo de expansão do país: a alta das commodities e a festa da liquidez internacional.

Mas a desaceleração brasileira veio antes e foi mais forte do que no resto da América Latina - e enquanto isso, os Estados Unidos crescem no maior ritmo em uma década e a China continua desmentindo as previsões de um pouso forçado.

Desemprego (dez.)

2010 5,3%

2011 4,7%

2012 4,6%

2013 4,3%

2014 4,8% (nov.)

Por enquanto, a desaceleração da economia ainda não mexeu muito com o grande triunfo econômico do governo: a manutenção de taxas de desempregohistoricamente baixas e a continuidade da formalização do mercado de trabalho.

A geração de empregos já não tem a mesma força, mas a taxa continua baixa porque menos pessoas estão procurando emprego. Para 2015, as previsões até agora são de leve alta do índice.

Renda média (crescimento)

2010 5,9%

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2011 2,6%

2012 3,2%

2013 3,2%

2014 não disponível

O baixo desemprego e políticas sociais como o aumento do salário mínimo fizeram com que a renda das famílias continuasse subindo, nos anos Dilma, a uma taxa maior do que a expansão do PIB.

O grosso do aumento real ocorreu nas classes mais baixas, contribuindo para a redução da desigualdade (pelo menos nessa medida). De acordo com o índice Gini, a desigualdade está parada desde 2011.

Taxa de investimento

2010 19,5%

2011 19,3%

2012 18,1%

2013 18,4%

2014 17,4% (até setembro)

O Brasil tem uma taxa de investimento historicamente baixa, seja em comparação com países desenvolvidos como a Austrália (28%) ou emergentes como a Indonésia (34%). Isso sem falar na China, para quem o investimento é tão central que é até problema.

Aumentar este número está entre as chaves para vários desafios do país, como diminuir a inflação, resolver os gargalos de infraestrutura

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e aumentar o potencial de crescimento no médio e longo prazo. E nesse aspecto, o governo Dilma andou de lado, para o dizer o mínimo.

Os investimentos públicos não devem sair ilesos dos cortes no ano que vem, mas de qualquer forma, são apenas um "fermentozinho da massa", segundo o próprio ministro Joaquim Levy. A melhora desta taxa depende do investimento privado, que ainda deve esperar para ver para onde vai a política do segundo mandato.

Taxa Selic (fim do ano)

2010 10,75%

2011 11%

2012 7,25%

2013 10%

2014 11,75%

Por um tempo, pareceu que depois dos legados de estabilidade econômica de Fernando Henrique Cardoso e de inclusão social de Lula, o governo Dilma poderia deixar como marca a redução dos juros, que estão entre os mais altos do mundo.

A própria presidente elegeu o tema como bandeira e passou a pedir aos bancos privados que abaixassem suas taxas. Ao longo de 2012, a Selic sofreu sucessivos cortes e foi de 11% para 7,25%, uma baixa histórica.

Sem o devido apoio da política fiscal, no entanto, o Banco Central se viu obrigado a reverter o rumo, e hoje a Selic está no seu maior nível desde agosto de 2011. Pelo menos em seu primeiro mandato, Dilma vai entregar os juros mais altos do que recebeu.

Inflação

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2010 5,91%

2011 6,50%

2012 5,84%

2013 5,91%

2014 6,56% (12 meses até nov.)

A queda dos juros não foi para frente porque voltou a ameaça da inflação - outro índice que Dilma vai entregar pior do que recebeu.

A desaceleração econômica, o dólar baixo e a contenção de preços administrados como luz e gasolina não foram suficientes para impedir que a inflação ficasse longe do centro da meta por todo o governo e estourasse o teto por boa parte de 2014.

Para o ano que vem e os seguintes, o Banco Central promete uma política mais dura e conta com os cortes de gastos e aumentos de impostos prometidos pela nova equipe econômica.

Superávit primário

2010 2,8%

2011 3,1%

2012 2,4%

2013 1,9%

2014 0,56% (12 meses até outubro)

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Não é por acaso que a política fiscal foi o foco dos primeiros anúncios do novo ministro Joaquim Levy. Nos últimos anos, o uso da chamada "contabilidade criativa" e o crescimento do gasto corrente fizeram aumentar a despesa ao mesmo tempo em que a arrecadação cedia devido ao baixo crescimento e desonerações tributárias.

O resultado foi o abandono gradual de metas de superávit primário que culminou na manobra fiscal deste ano, quando o governo alterou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para transformar um déficit na prática em superávit no papel.

Cotação do dólar (fim do ano)

2010 R$ 1,66

2011 R$ 1,86

2012 R$ 2,04

2013 R$ 2,35

2014 R$ 2,69 (em 26/12)

Além da política fiscal, outro fator que puxou a inflação para cima foi o dólar. Na medida em que a recuperação americana tomou fôlego, cresceram as apostas de que o Banco Central americano iria começar a desmontar seu programa de compra de ativos (o que ocorreu este ano) e aumentar sua taxa de juros (o que deve ocorrer no ano que vem).

A perspectiva de mais ganhos nos EUA atraíram recursos que antes vinham fácil para os emergentes. Com isso, o dólar começou um novo ciclo de fortalecimentoque deve continuar.

No caso do Brasil, contaram também o fim da euforia com o país, a descrença na política econômica do governo e neste ano, as especulações próprias de ciclos eleitorais.

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Balança comercial (US$)

2010 20,2 bilhões

2011 29,7 bilhões

2012 19,4 bilhões

2013 2,5 bilhões

2014 déficit de 4 bilhões (até 19/12)

A perda de competitividade, o congelamento da agenda de reformas e o persistente custo brasil fizeram com que a demanda brasileira continuasse "vazando" para o exterior, com crescentes déficits em conta corrente e uma queda gradual da balança comercial.

A promessa é que o dólar mais forte torne os produtos brasileiros mais baratos na comparação internacional, dando um fôlego para a indústria e as exportações - mas isso ainda não ocorreu e o país deve fechar 2014 com seu primeiro déficit comercial desde 2000.

O segundo momento dos partidos pós-79

Maria Inês Nassif - 03/03/2011

Ahttp://www.valoronline.com.br/impresso/politica/100/392770/o-segundo-momento-dos-partidos-pos-79

Este é o segundo momento do quadro partidário brasileiro. O primeiro começou em 1979, quando a ditadura acabou com o bipartidarismo criado pelo Ato Institucional nº 2, de 1966, que extinguiu o quadro partidário anterior. A implosão da esquerda

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peemedebista, de um lado, em vários partidos; o esvaziamento eleitoral do PDS, legenda de apoio à ditadura, e a tentativa de formar "linhas auxiliares" de um governo ainda militar, de outro, definiram um quadro partidário com tendência à pulverização, tanto à esquerda como à direita.

O PMDB, esvaziado à esquerda, manteve sua centralidade política como herdeiro da oposição institucional ao regime durante algum tempo, quando boa parte do chamado grupo autêntico, que botou a cara para bater e correu riscos inclusive físicos de se opor à ditadura, migrava para outras legendas sem levar junto o prestígio do antigo partido.

Enquanto o centro oposicionista defendia manter a unidade em torno do PMDB, a esquerda, exceto os partidos comunistas, que ainda não haviam sido legalizados, procurou novos rumos. Vindos do exílio, Leonel Brizola e Miguel Arraes reuniram partidários e procuraram consolidar territórios próprios - Brizola, como herdeiro do velho petebismo, perdeu a legenda do PTB devido a

manobras legais do regime e fundou o Partido Democrático Trabalhista (PDT); Arraes, sem conseguir ganhar espaço dentro do PMDB, sua primeira escolha partidária, acabou tomando o PSB. PDT e PSB nasceram em torno de lideranças carismáticas e viveram sob o controle absoluto de Brizola e Arraes. O PT, que vinha da experiência do movimento sindical dos anos 80 e atraiu grupos

da esquerda mais radical e os movimentos de base da igreja progressista, teve uma origem menos personalista.

*Pulverização foi a marca de origem do quadro partidário*

O ex-governador de Pernambuco fez um herdeiro, o atual governador Eduardo Campos. Ele toca o PSB ao estilo do avô. Quando Brizola morreu, sem ter deixado sucessores naturais -

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embora vários de seus netos estejam na política -, jogou o PDT numa profunda crise. O brizolismo é uma opção política em extinção; o PDT, um partido sem rumo.

O PSB, todavia, foi levado pelo pragmatismo do avô Miguel Arraes, e agora pelo neto Eduardo Campos. Arraes manteve suas pretensões políticas dentro dos limites de Pernambuco e fez acordos para ampliar o partido em outros Estados. Manteve uma equação política de absoluta hegemonia na política pernambucana, quebrada pouco antes de sua morte por desgastes acumulados em

sucessivos períodos no governo; e controle total sobre as seções estaduais, que manipulava de acordo com os seus interesses regionais e nacionais.

Alianças reiteradas nas eleições proporcionais com o PT mantiveram o partido dentro dos limites mínimos de representação exigidos pela lei, depois derrubados pelo Supremo Tribunal Federal. Arraes atraiu, em São Paulo, a ex-prefeita Luiza Erundina, quando ela rachou com o seu partido de origem, o PT; na Bahia, levou um núcleo que sempre atuou junto ao PCdoB e que girava em torno da ex-prefeita Lídice da Mata. Erundina e Lídice mantiveram-se no PSB por absoluta falta de opção, mas tinham discordâncias acentuadas quanto à forma de condução do partido por Arraes. Voltam a entrar na linha de confronto com as articulações de Eduardo Campos para cooptação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, hoje no DEM. Não é uma adesão confortável

para quadros efetivamente socialistas do partido.

O pragmatismo do neto de Arraes tem mantido o partido em crescimento, embora sob constante crise de identidade. O PDT, acostumado a funcionar sob a batuta de um único líder, não tinha ninguém que minimamente desempenhasse o papel antes exercido por Brizola, nem mecanismos de decisão internos democráticos que o substituíssem. Os partidos comunistas, que ganharam

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identidade própria apenas após o governo José Sarney, quando foram legalizados, também sobreviveram na órbita de partidos maiores - o PCdoB ganhou representação parlamentar às custas de alianças proporcionais com o PT; o PCB, depois PPS, agora mantém essa equação com o PSDB, embora tenha

feito, no passado, algumas alianças com o PT.

O quadro partidário pós-Lula já é um segundo momento daquele formado pós-79, no final da ditadura. Os partidos que se consolidaram e polarizam na política nacional, o PT e o PSDB, vivem crises de identidade - o primeiro, por ser governo; o segundo, por estar a tanto tempo fora do poder federal.

Os pequenos partidos de esquerda, alguns perderam as lideranças que lhe davam rumo e outros, a organicidade dada por ideologias que entraram em crise no mundo e projetos de poder que foram assumidos pelo partido que exerceu a hegemonia sobre o bloco nas últimas décadas, o PT. A direita ideológica, em especial o DEM, montou uma estrutura partidária baseada em chefes políticos locais, e eles perderam espaço nas regiões mais pobres durante o governo Lula. Os líderes regionais não estão conseguindo se reaproximar dos velhos redutos - daí a tentativa de Kassab de driblar a lei para se encontrar, mais na frente, com um partido a sua esquerda, o PSB, e por meio dele compor a base do governo federal.

É um quadro que, por exaustão de algumas fórmulas tradicionais de organização partidária, tende a ser menos pulverizado. E vai ser concentrado rapidamente quando for proibida a coligação nas eleições proporcionais.

Exceto o PSB, por pragmatismo de Campos, os demais partidos de esquerda dependem da coligação proporcional para sobreviver. Da mesma forma, os pequenos partidos de direita aliados ao governo terão dificuldade de manter suas bancadas. Os médios e pequenos

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partidos de direita que se apoiam no PSDB estão com o mesmo problema. Já foram praticamente desalojados pela

derrota do candidato José Serra à Presidência. E têm dificuldades de sobreviver fora do poder. A aproximação deles ao governo era previsível.

Ainda assim, se a coligação proporcional for proibida, não há governo que os salve.

buscar

A mais maldita das heranças do PT

http://brasil.elpais.com/m/brasil/2015/03/16/opinion/1426515080_77

7708.html

ELIANE BRUM »

Mais brutal para o Partido dos Trabalhadores pode ser não a multidão que ocupou as ruas em 15 de março, mas aquela que já não sairia de casa para defendê-lo em dia nenhum

Leia mais artigos de Eliane Brum no EL PAÍS Brasil

O maior risco para o PT, para além do Governo e do atual mandato,

talvez não seja a multidão que ocupou as ruas do Brasil, mas a que

não estava lá. São os que não estavam nem no dia 13 de março,

quandomovimentos como CUT, UNE e MST organizaram uma

manifestaçãoque, apesar de críticas a medidas de ajuste fiscal

tomadas pelo Governo, defendia a presidente Dilma Rousseff. Nem

estavam no já histórico domingo, 15 de março, quando centenas de

milhares de pessoas aderiram aos protestos, em várias capitais e

cidades do país, em manifestações contra Dilma Rousseff

articuladas nas redes sociais da internet, com bandeiras que

defendiam o fim da corrupção, o impeachment da presidente e até

uma aterradora, ainda que minoritária, defesa da volta da ditadura.

São os que já não sairiam de casa em dia nenhum empunhando

uma bandeira do PT, mas que também não atenderiam ao chamado

das forças de 15 de março, os que apontam que o partido perdeu a

capacidade de representar um projeto de esquerda – e gente de

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esquerda. É essa herança do PT que o Brasil, muito mais do que o

partido, precisará compreender. E é com ela que teremos de lidar

durante muito mais tempo do que o desse mandato. MAIS INFORMAÇÕES

FOTOGALERIA Protestos neste domingo Uma multidão protesta contra o Governo Dilma Três grupos organizam os atos anti-Dilma, em meio a divergências Após 12 anos de governo do PT, parte da esquerda brasileira se vê

exilada 'Aos que defendem a volta da ditadura', por ELIANE BRUM 'Belo Monte: a anatomia de um etnocídio', por E. BRUM

Tenho dúvidas sobre a tecla tão batida por esses dias do Brasil

polarizado. Como se o país estivesse dividido em dois polos

opostos e claros. Ou, como querem alguns, uma disputa de ricos

contra pobres. Ou, como querem outros, entre os cidadãos contra a

corrupção e os beneficiados pela corrupção. Ou entre os a favor e

os contra o Governo. Acho que a narrativa da polarização serve

muito bem a alguns interesses, mas pode ser falha para a

interpretação da atual realidade do país. Se fosse simples assim,

mesmo com a tese do impeachment nas ruas, ainda assim seria

mais fácil para o PT.

Algumas considerações prévias. Se no segundo turno das eleições

de 2014, Dilma Rousseff ganhou por uma pequena margem –

54.501.118 votos contra 51.041.155 de Aécio Neves –, não há

dúvida de que ela ganhou. Foi democraticamente eleita, fato que

deve ser respeitado acima de tudo. Não existe até esse

momento nenhuma base para impeachment, instrumento traumático

e seríssimo que não pode ser manipulado com leviandade, nem

mesmo no discurso. Quem não gostou do resultado ou se

arrependeu do voto, paciência, vai ter de esperar a próxima eleição.

Os resultados valem também quando a gente não gosta deles. E

tentar o contrário, sem base legal, é para irresponsáveis ou

ignorantes ou golpistas.

No resultado das eleições ampliou-se a ressonância da tese de um

país partido e polarizado. Mas não me parece ser possível esquecer

que outros 37.279.085 brasileiros não escolheram nem Dilma nem

Aécio, votando nulo ou branco e, a maior parte, se abstendo de

votar. É muita gente – e é muita gente que não se sentia

representada por nenhum dos dois candidatos, pelas mais variadas

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razões, à esquerda e também à direita, o que complica um pouco a

tese da polarização. Além das divisões entre os que se polarizariam

em um lado ou outro, há mais atores no jogo que não estão nem em

um lado nem em outro. E não é tão fácil compreender o papel que

desempenham. No mesmo sentido, pode ser muito arriscado

acreditar que quem estava nos protestos neste domingo eram

todos eleitores de Aécio Neves. A rua é, historicamente, o território

das incertezas – e do incontrolável.

Na tese do Brasil polarizado, onde ficam os mais de 37 milhões que não

votaram nem em Dilma nem em Aécio?

Há lastro na realidade para afirmar também que uma parte dos que

só aderiram à Dilma Rousseff no segundo turno era composta por

gente que acreditava em duas teses amplamente esgrimidas na

internet às vésperas da votação: 1) a de que Dilma, assustada por

quase ter perdido a eleição, em caso de vitória faria “uma guinada à

esquerda”, retomando antigas bandeiras que fizeram do PT o PT; 2)

a de votar em Dilma “para manter as conquistas sociais” e “evitar o

mal maior”, então representado por Aécio e pelo PSDB. Para estes,

Dilma Rousseff não era a melhor opção, apenas a menos ruim para

o Brasil. E quem pretendia votar branco, anular o voto ou se

abster seria uma espécie de traidor da esquerda e também do país

e do povo brasileiro, ou ainda um covarde, acusações que

ampliaram, às vésperas das eleições, a cisão entre pessoas que

costumavam lutar lado a lado pelas mesmas causas. Neste caso,

escolhia-se ignorar, acredito que mais por desespero eleitoral do

que por convicção, que votar nulo, branco ou se abster também é

um ato político.

Faz sentido suspeitar que uma fatia significativa destes que

aderiram à Dilma apenas no segundo turno, que ou esperavam

“uma guinada à esquerda” ou “evitar o mal maior”, ou ambos,

decepcionaram-se com o seu voto depois da escolha de ministros

como Kátia Abreu e Joaquim Levy, à direita no espectro político,

assim como com medidas que afetaram os direitos dos

trabalhadores. Assim, se a eleição fosse hoje, é provável que não

votassem nela de novo. Esses arrependidos à esquerda

aumentariam o número de eleitores que, pelas mais variadas

razões, votaram em branco, anularam ou não compareceram às

urnas, tornando maior o número de brasileiros que não se sentem

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representados por Dilma Rousseff e pelo PT, nem se sentiriam

representados por Aécio Neves e pelo PSDB.

Esses arrependidos à esquerda, assim como todos aqueles que

nem sequer cogitaram votar em Dilma Rousseff nem em Aécio

Neves porque se situam à esquerda de ambos, tampouco se

sentem identificados com qualquer um dos grupos que foi para as

ruas no domingo contra a presidente. Para estes, não existe a

menor possibilidade de ficar ao lado de figuras como o deputado

federal Jair Bolsonaro (PP) ou de defensores da ditadura militar ou

mesmo dePaulinho da Força. Mas também não havia nenhuma

possibilidade de andar junto com movimentos como CUT, UNE e

MST, que para eles “pelegaram” quando o PT chegou ao poder:

deixaram-se cooptar e esvaziaram-se de sentido, perdendo

credibilidade e adesão em setores da sociedade que costumavam

apoiá-los.

Não há hoje uma figura nacional para ocupar o lugar de representação da

esquerda

Essa parcela da esquerda – que envolve desde pessoas mais

velhas, que historicamente apoiaram o PT, e muitos até que

ajudaram a construí-lo, mas que se decepcionaram, assim como

jovens filhos desse tempo, em que a ação política precisa ganhar

horizontalidade e se construir de outra maneira e com múltiplos

canais de participação efetiva – não encontrou nenhum candidato

que a representasse. No primeiro turno, dividiram seus votos entre

os pequenos partidos de esquerda, como o PSOL, ou votaram em

Marina Silva, em especial por sua compreensão da questão

ambiental como estratégica, num mundo confrontado com a

mudança climática, mas votaram com dúvidas. No segundo turno,

não se sentiram representados por nenhum dos candidatos.

Marina Silva foi quem chegou mais perto de ser uma figura com

estatura nacional de representação desse grupo à esquerda, mais

em 2010 do que em 2014. Mas fracassou na construção de uma

alternativa realmente nova dentro da política partidária. Em parte

por não ter conseguido registrar seu partido a tempo de concorrer

às eleições, o que a fez compor com o PSB, sigla bastante

complicada para quem a apoiava, e assumir a cabeça de chapa por

conta de uma tragédia que nem o mais fatalista poderia prever; em

parte por conta da campanha mentirosa e de baixíssimo nível que o

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PT fez contra ela; em parte por equívocos de sua própria

campanha, como a mudança do capítulo do programa em que

falava de sua política para os LGBTs, recuo que, além de indigno,

só ampliou e acentuou a desconfiança que muitos já tinham com

relação à interferência de sua fé evangélica em questões caras

como casamento homoafetivo e aborto; em parte porque escolheu

ser menos ela mesma e mais uma candidata que supostamente

seria palatável para estratos da população que precisava

convencer. São muitas e complexas as razões.

O que aconteceu com Marina Silva em 2014 merece uma análise

mais profunda. O fato é que, embora ela tenha ganhado, no

primeiro turno de 2014, cerca de 2,5 milhões de votos a mais do

que em 2010, seu capital político parece ter encolhido, e o partido

que está construindo, a Rede Sustentabilidade, já sofreu deserções

de peso. Talvez ela ainda tenha chance de recuperar o lugar que

quase foi seu, mas não será fácil. Esse é um lugar vago nesse

momento.

Há uma parcela politizada, à esquerda, que hoje não se sente

representada nem pelo PT nem pelo PSDB, não participou de

nenhum dos panelaços nem de nenhuma das duas grandes

manifestações dos últimos dias, a de 15 de março várias vezes

maior do que a do dia 13. É, porém, muito atuante politicamente em

várias áreas e tem grande poder de articulação nas redes sociais.

Não tenho como precisar seu tamanho, mas não é desprezível. É

com essa parcela de brasileiros, que votou em Lula e no PT por

décadas, mas que deixou de votar, ou de jovens que estão em

movimentos horizontais apartidários, por causas específicas, que

apontam o que de fato deveria preocupar o PT, porque esta era ou

poderia ser a sua base, e foi perdida.

O partido das ruas perdeu as ruas porque acreditou que não precisava

mais caminhar por elas

A parcela de esquerda que não bateria panelas contra Dilma

Rousseff, mas também não a defenderia, aponta a falência do PT

em seguir representando o que representou no passado. Aponta

que, em algum momento, para muito além do Mensalão e da Lava

Jato, o PT escolheu se perder da sua base histórica, numa mistura

de pragmatismo com arrogância. É possível que o PT tenha

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deixado de entender o Brasil. Envelhecido, não da forma desejável,

representada por aqueles que continuam curiosos em compreender

e acompanhar as mudanças do mundo, mas envelhecido da pior

forma, cimentando-se numa conjuntura histórica que já não existe.

E que não voltará a existir. Essa aposta arriscada precisa que a

economia vá sempre bem; quando vai mal, o chão desaparece.

Fico perplexa quando lideranças petistas, e mesmo Lula,

perguntam-se, ainda que retoricamente, por que perderam as ruas.

Ora, perderam porque o PT gira em falso. O partido das ruas

perdeu as ruas – menos porque foi expulso, mais porque se

esqueceu de caminhar por elas. Ou, pior, acreditou que não

precisava mais. Nesse contexto, Dilma Rousseff é só a personagem

trágica da história, porque em algum momentoLula, com o aval ativo

ou omisso de todos os outros, achou que poderia eleger uma

presidente que não gosta de fazer política. Estava certo a curto

prazo, podia. Mas sempre há o dia seguinte.

Não adianta ficar repetindo que só bateu panela quem é da elite.

Pode ter sido maior o barulho nos bairros nobres de São Paulo, por

exemplo, mas basta um pequeno esforço de reportagem para

constatar que houve batuque de panelas também em bairros das

periferias. Ainda que as panelas batessem só nos bairros dos ricos

e da classe média, não é um bom caminho desqualificar quem

protesta, mesmo que você ou eu não concordemos com a

mensagem, com termos como “sacada gourmet” ou “panelas Le

Creuset”. Todos têm direito de protestar numa democracia e muitos

dos que ridicularizam quem protestou pertencem à mesma classe

média e talvez tenham uma ou outra panelinha Le Creuset ou até

pagou algumas prestações a mais no apartamento para ter uma

sacada gourmet, o que não deveria torná-los menos aptos nem a

protestar nem a criticar o protesto.

Nos panelaços, só o que me pareceu inaceitável foi chamar a

presidente de “vagabunda” ou de “vaca”, não apenas porque é

fundamental respeitar o seu cargo e aqueles que a elegeram, mas

também porque não se pode chamar nenhuma mulher dessa

maneira. E, principalmente, porque o “vaca” e o “vagabunda”

apontam a quebra do pacto civilizatório. É nesses xingamentos,

janela a janela, que está colocado o rompimento dos limites, o

esgarçamento do laço social. Assim como, no domingo de 15 de

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março, essa ruptura esteve colocada naqueles que defendiam a

volta da ditadura. Não há desculpa para desconhecer que o regime

civil militar que dominou o Brasil pela forçapor 21 anos torturou

gente, inclusive crianças, e matou gente. Muita gente. Assim, essa

defesa é inconstitucional e criminosa. Com isso, sim, precisamos

nos preocupar, em vez de misturar tudo numa desqualificação

rasteira. É urgente que a esquerda faça uma crítica (e uma

autocrítica) consistente, se quiser ter alguma importância nesse

momento agudo do país.

Tão ou mais importante do que a corrupção, que não foi inventada pelo PT

no Brasil, é o fato de o partido ter traído algumas de suas bandeiras de

identidade

Também não adianta continuar afirmando que quem foi para as

ruas é aquela fatia da população que é contra as conquistas sociais

promovidas pelo governo Lula,que tirou da miséria milhões de

brasileiros e fez com que outros milhões ascendessem ao que se

chamou de classe C. Pessoas as quais é preciso respeitar mais

pelo seu passado do que pelo seu presente ficaram repetindo na

última semana que quem era contra o PT não gostava de pobres

nos aeroportos ou estudando nas universidades, entre outras

máximas. É fato que existem pessoas incomodadas com a

mudança histórica que o PT reconhecidamente fez, mas dizer que

toda oposição ao PT e ao Governo é composta por esse tipo de

gente, ou é cegueira ou é má fé.

Num momento tão acirrado, todos que têm expressão pública

precisam ter muito mais responsabilidade e cuidado para não

aumentar ainda mais o clima de ódio – e disseminar preconceitos já

se provou um caminho perigoso. Até a negação deve ter limites. E a

negação é pior não para esses ricos caricatos, mas para o PT, que

já passou da hora de se olhar no espelho com a intenção de se

enxergar. De novo, esse discurso sem rastro na realidade apenas

gira em falso e piora tudo. Mesmo para a propaganda e para o

marketing, há limites para a falsificação da realidade. Se é para

fazer publicidade, a boa é aquela capaz de captar os anseios do

seu tempo.

É também por isso que me parece que o grande problema para o

PT não é quem foi para as ruas no domingo, nem quem bateu

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panela, mas quem não fez nem uma coisa nem outra, mas também

não tem a menor intenção de apoiá-lo, embora já o tenha feito no

passado ou teria feito hoje se o PT tivesse respeitado as bandeiras

do passado. Estes apontam o que o PT perdeu, o que já não é, o

que possivelmente não possa voltar a ser.

O PT traiu algumas de suas bandeiras de identidade, aquelas que

fazem com que em seu lugar seja preciso colocar máscaras que

não se sustentam por muito tempo. Traiu não apenas por ter

aderido à corrupção, que obviamente não foi inventada por ele na

política brasileira, fato que não diminui em nada a sua

responsabilidade. A sociedade brasileira, como qualquer um que

anda por aí sabe, é corrupta da padaria da esquina ao Congresso.

Mas ser um partido “ético” era um traço forte da construção

concreta e simbólica do PT, era parte do seu rosto, e desmanchou-

se. Embora ainda existam pessoas que merecem o máximo

respeito no PT, assim como núcleos de resistência em

determinadas áreas, secretarias e ministérios, e que precisam ser

reconhecidos como tal, o partido traiu causas de base, aquelas que

fazem com que se desconheça. Muitos dos que hoje deixaram de

militar ou de apoiar o PT o fizeram para serem capazes de

continuar defendendo o que o PT acreditava. Assim como

compreenderam que o mundo atual exige interpretações mais

complexas. Chamar a estes de traidores ou de fazer o jogo da

direita é de uma boçalidade assombrosa. Até porque, para estes, o

PT é a direita.

A síntese das contradições e das traições do PT no poder não é a

Petrobras, mas Belo Monte

A parcela à esquerda que preferiu ficar fora de manifestações a

favor ou contra lembra que tão importante quando discutir a

corrupção na Petrobras é debater a opção por combustíveis fósseis

que a Petrobras representa, num momento em que o mundo

precisa reduzir radicalmente suas emissões de gases do efeito

estufa. Lembra que estimular a compra de carros como o Governo

federal fez é contribuir com o transporte privado individual

motorizado, em vez de investir na ampliação do transporte público

coletivo, assim como no uso das bicicletas. É também ir na

contramão ao piorar as condições ambientais e de mobilidade, que

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costumam mastigar a vida de milhares de brasileiros confinados por

horas em trens e ônibus lotados num trânsito que não anda nas

grandes cidades. Lembra ainda que estimular o consumo de

energia elétrica, como o Governo fez, é uma irresponsabilidade não

só econômica, mas socioambiental, já que os recursos são caros e

finitos. Assim como olhar para o colapso da água visando apenas

obras emergenciais, mas sem se preocupar com a mudança

permanente de paradigma do consumo e sem se preocupar com o

desmatamento tanto da floresta amazônica quanto do Cerrado

quanto das nascentes do Sudeste e dos últimos redutos

sobreviventes de Mata Atlântica fora e dentro das cidades é um erro

monumental a médio e a longo prazos.

Os que não bateram panelas contra o PT e que não bateriam a

favor lembram que a forma de ver o país (e o mundo) do lulismo

pode ser excessivamente limitada para dar conta dos vários Brasis.

Povos tradicionais e povos indígenas, por exemplo, não cabem nem

na categoria “pobres” nem na categoria “trabalhadores”. Mas, ao

fazer grandes hidrelétricas na Amazônia, ao ser o governo de Dilma

Rousseff o que menos demarcou terras indígenas, assim como teve

desempenho pífio na criação de reservas extrativistas e unidades

de conservação, ao condenar os povos tradicionais ao etnocídio ou

à expulsão para a periferia das cidades, é em pobres que são

convertidos aqueles que nunca se viram nesses termos. Em parte,

a construção objetiva e simbólica de Lula – e sua forma de ver o

Brasil e o mundo – encarna essa contradição (escrevi sobre isso

aqui), que o PT não foi capaz nem quis ser capaz de superar no

poder. Em vez de enfrentá-la, livrou-se dos que a apontavam, caso

de Marina Silva.

O PT no Governo priorizou um projeto de desenvolvimento

predatório, baseado em grandes obras, que deixou toda a

complexidade socioambiental de fora. Escolha inadmissível num

momento em que a ação do homem como causa do aquecimento

global só é descartada por uma minoria de céticos do clima, na qual

se inclui o atual ministro de Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo, mais

uma das inacreditáveis escolhas de Dilma Rousseff. A síntese das

contradições – e também das traições – do PT no poder não é a

Petrobras, mas Belo Monte. Sobre a usina hidrelétrica já pesa a

denúncia de que só a construtora Camargo Corrêa teria pagado

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mais de R$ 100 milhões em propinas para o PT e para o PMDB. É

para Belo Monte que o país precisaria olhar com muito mais

atenção. É na Amazônia, onde o PT reproduziu a visão da ditadura

ao olhar para a floresta como um corpo para a exploração, que as

fraturas do partido ao chegar ao poder se mostram em toda a sua

inteireza. E é também lá que a falácia de que quem critica o PT é

porque não gosta de pobre vira uma piada perversa.

A sorte do PT é que a Amazônia é longe para a maioria da

população e menos contada pela imprensa do que deveria, ou

contada a partir de uma visão de mundo urbana que não reconhece

no outro nem a diferença nem o direito de ser diferente. Do

contrário, as barbaridades cometidas pelo PT contra os

trabalhadores pobres, os povos indígenas e as populações

tradicionais, e contra uma floresta estratégica para o clima, para o

presente e para o futuro, seriam reconhecidas como o escândalo

que de fato são. É também disso que se lembram aqueles que não

gritaram contra Dilma Rousseff, mas também não a defenderiam.

Lembram também que o PT não fez a reforma agrária; ficou aquém

na saúde e na educação, transformando “Brasil, Pátria

Educadora” num slogan natimorto; avançou muito pouco numa

política para as drogas que vá além da proibição e da repressão,

modelo que encarcera milhares de pequenos traficantes num

sistema prisional sobre o qual o ministro da Justiça, José Eduardo

Cardozo, já disse que “prefere morrer a cumprir pena”; cooptou

grande parte dos movimentos sociais (que se deixaram cooptar por

conveniência, é importante lembrar); priorizou a inclusão social pelo

consumo, não pela cidadania; recuou em questões como o kit anti-

homofobia e o aborto; se aliou ao que havia de mais viciado na

política brasileira e aos velhos clãs do coronelismo, como os

Sarney.

Isso é tão ou mais importante do que a corrupção, sobre a qual

sempre se pode dizer que começou bem antes e atravessa a

maioria dos partidos, o que também é verdade. Olhar com

honestidade para esse cenário depois de mais de 12 anos de

governo petista não significa deixar de reconhecer os enormes

avanços que o PT no poder também representou. Mas os avanços

não podem anular nem as traições, nem os retrocessos, nem as

omissões, nem os erros. É preciso enfrentar a complexidade, por

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toda as razões e porque ela diz também sobre a falência do sistema

político no qual o país está atolado, para muito além de um partido

e de um mandato.

Há algo que o PT sequestrou de pelo menos duas gerações de

esquerda e é essa a sua herança mais maldita. E a que vai marcar

décadas, não um mandato. Tenho entrevistado pessoas que

ajudaram a construir o PT, que fizeram dessa construção um

projeto de vida, concentradas em lutas específicas. Essas pessoas

se sentem traídas porque o partido rasgou suas causas e se

colocou ao lado de seus algozes. Mas não traídas como alguém de

30 anos pode se sentir traído em seus últimos votos. Este tem

tempo para construir um projeto a partir das novas experiências de

participação política que se abrem nesse momento histórico muito

particular. Os mais velhos, os que estiveram lá na fundação, não.

Estes sentem-se traídos como alguém que não tem outra vida para

construir e acreditar num novo projeto. É algo profundo e também

brutal, é a própria vida que passa a girar em falso, e justamente no

momento mais crucial dela, que é perto do fim ou pelo menos nas

suas últimas décadas. É um fracasso também pessoal, o que suas

palavras expressam é um testemunho de aniquilação. Algumas

dessas pessoas choraram neste domingo, dentro de casa, ao

assistir pela TV o PT perder as ruas, como se diante de um tipo de

morte.

O sequestro dos sonhos de pelo menos duas gerações de esquerda é a

herança mais maldita do PT, ainda por ser desvendada em toda a sua

gama de sentidos para o futuro

O PT, ao trair alguns de seus ideias mais caros, escavou um buraco

no Brasil. Um bem grande, que ainda levará tempo para virar

marca. Não adianta dizer que outros partidos se corromperam, que

outros partidos recuaram, que outros partidos se aliaram a velhas e

viciadas raposas políticas. É verdade. Mas o PT tinha um lugar

único no espectro partidário da redemocratização, ocupava um

imaginário muito particular num momento em que se precisava

construir novos sentidos para o Brasil. Era o partido “diferente”.

Quem acreditou no PT esperou muito mais dele, o que explica o

tamanho da dor daqueles que se desfiliaram ou deixaram de militar

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no partido. A decepção é sempre proporcional à esperança que se

tinha depositado naquele que nos decepciona.

É essa herança que precisamos entender melhor, para

compreender qual é a profundidade do seu impacto no país. E

também para pensar em como esse vácuo pode ser ocupado,

possivelmente não mais por um partido, pelo menos não um nos

moldes tradicionais. Como se sabe, o vácuo não se mantém. Quem

acredita em bandeiras que o PT já teve precisa parar de brigar entre

si – assim como de desqualificar todos os outros como “coxinhas” –

e encontrar caminhos para ocupar esse espaço, porque o momento

é limite. O PT deve à sociedade brasileira um ajuste de contas

consigo mesmo, porque o discurso dos pobres contra ricos já virou

fumaça. Não dá para continuar desconectado com a realidade, que

é só uma forma estúpida de negação.

Para o PT, a herança mais maldita que carrega é o silêncio

daqueles que um dia o apoiaram, no momento em que perde as

ruas de forma apoteótica. O PT precisa acordar, sim. Mas a

esquerda também.

Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos

livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida

Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus

Desacontecimentos e do romance Uma Duas.

Site: desacontecimentos.com Email:[email protected]

om Twitter: @brumelianebrum

O choque da realidade

André Lara Resende -- O Estado de S. Paulo - 7 de fev 2015

O quadro político e econômico agrava-se desde o fim do primeiro

mandato de Lula. A revelação da sistemática compra de apoio ao

governo por meio de um esquema de desvio de recursos públicos -

o "mensalão" - foi um marco divisor. Ainda não estava claro o grau

do estrago que a ocupação do Estado por militantes e simpatizantes

viria a fazer, mas estava quebrado o encanto.

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A condução da política macroeconômica sofreu uma inflexão a

partir de 2008. Sob pretexto de praticar uma política anticíclica

keynesiana - que a grande crise financeira justificava nos países

centrais, mas não nos países periféricos -, acelerou-se o processo

de expansão dos gastos diretos e indiretos, explícitos e implícitos,

do setor público. A política macroeconômica perdeu toda a

racionalidade e tornou-se manifestamente voluntarista.

O desajuste fiscal e os desmandos administrativos, associados à

distribuição de benefícios demagógicos, de vantagens e subsídios,

ficaram mascarados pelo ciclo de alta das commodities, pelo o

ganho nos termos de troca com o exterior. O País cresceu

relativamente pouco, mas enriqueceu muito. A riqueza não depende

só do crescimento, mas também das expectativas. O valor dos

ativos, das empresas e dos imóveis, depende das expectativas.

Com as expectativas favoráveis, o aumento da riqueza foi muito

superior ao crescimento da renda. A reversão levará a uma

correspondente queda da riqueza.

No ano passado, a aceleração da piora nas condições tanto

econômicas como políticas não deu tempo para que as percepções

pudessem acompanhar o agravamento da realidade. As eleições

contribuíram para atrasar a convergência das expectativas. O clima

de campanha eleitoral tornou difícil separar os fatos da propaganda.

O País saiu das eleições dividido e com um fosso entre as

condições objetivas e a percepção da realidade. O choque da

realidade está agora em curso.

No ano passado, a economia não cresceu, o superávit fiscal

primário desapareceu e o déficit externo passou de 4% do produto

interno bruto (PIB). Apesar dos preços administrados defasados e

dos juros em alta, a inflação vai superar o teto da meta. A

infraestrutura está obsoleta e o racionamento de água e energia

elétrica será inevitável. A Petrobrás está paralisada, incapaz de

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acessar os mercados de capitais. Sua viabilidade está ameaçada.

Os investimentos privados devem colapsar.

A surpreendente nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da

Fazenda impediu que o ajuste das expectativas levasse a uma crise

cambial e financeira. Sua presença foi crucial para que a crise não

explodisse com toda a sua força logo nos primeiros dias do

segundo mandato de Dilma Rousseff. O PT poderia então explorar

mais facilmente a tese da sabotagem dos "mercados" a um governo

que acabara de ser democraticamente eleito. Isolado num Ministério

de inédita incompetência, Levy corre o risco em alguns meses se

defrontar com apenas duas alternativas: a demissão, diante da

inviabilidade política do ajuste necessário, ou a desmoralização.

Some-se às dificuldades macroeconômicas o racionamento de água

e energia para que as perspectivas se configurem dramáticas. O

racionamento racional deveria considerar as repercussões do corte

para os diferentes setores. Para minimizar o impacto sobre o PIB os

cortes deveriam ser definidos a partir da matriz de insumos-

produtos. Numa economia de guerra, que exija o racionamento de

bens essenciais, não é possível utilizar apenas o sistema de preços

para alocar recursos. O racionamento planejado exige, pois,

planejamento e execução centralizada, o que não pode prescindir

de autoridade e comando.

O País está acéfalo. O Executivo, atordoado e acuado, está

aparentemente preocupado exclusivamente em minimizar as

possibilidades de impeachment. Os quadros do serviço público

estão desmoralizados e desmotivados. A percepção popular do

Congresso Nacional, envolvido no esquema da corrupção

sistematizada pelo governo na Petrobrás, nunca foi tão negativa.

Desmoralizado com a população, o Legislativo corre ainda o risco

de colisão com o Judiciário. Não há novas lideranças nem sinais de

que possam surgir da política partidária, cujos canais estão

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entupidos. Dada a desmoralização da política, abre-se a

possibilidade de lideranças externas a ela, populistas e inimigas das

instituições.

A combinação da economia submetida a um racionamento drástico

com a falta de autoridade institucional é o caminho para se chegar

aos chamados "Failed States". Caminho que a Venezuela parece

ter começado a trilhar e no qual países como a Síria, o Iraque e o

Afeganistão, entre outros, estão avançados. Sem autoridade

institucional constituída e reconhecida, forças paralelas passam a

controlar o racionamento e os mercados negros. Numa fase aguda,

diante da revolta popular e da generalização dos saques, surgem

milícias armadas, inicialmente para vender segurança, mas que se

transformam em poderes paralelos.

Entre os "Failed States" e a situação brasileira ainda há uma grande

distância, mas mesmo que não sejamos pessimistas o horizonte

não é promissor. Na melhor das hipóteses, teremos quatro anos de

um governo acuado e paralisado, diante da pior crise política e

econômica em décadas. A possibilidade de um tumultuado

impeachment da presidente não pode ser descartada. Em tese,

basta o fundamento jurídico para o impeachment, mas na prática é

preciso o apoio político "das ruas".

Diante da gravidade do quadro, não é hora de dividir, mas de

reconciliar o País em torno de uma coalizão suprapartidária, com

apoio de todos os segmentos da sociedade. É preciso reconstruir o

Estado, resgatar a capacidade de formular e implementar políticas

para enfrentar a crise. Infelizmente, parecemos caminhar no sentido

oposto, o da radicalização da divisão do País.

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Economista, ex-presidente do BNDES

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Avaliação Pres. Dilma – 07 fevereiro 2015

2014 e o Futuro do PT: Novas Eleições Críticas?

por Cláudio Gonçalves Couto

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor do Departamento de Gestão Pública da Fundação Getúlio Vargas de

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São Paulo (FGV-SP) e eventual colunista de política do jornal Valor Econômico.

http://interessenacional.uol.com.br/index.php/edicoes-revista/2014-e-o-futuro-do-pt-novas-eleicoes-criticas-2/

O pleito de 2014 ocorreu em um cenário político consideravelmente modificado em relação ao de quatro anos antes, quando o presidente Lula, no auge de sua popularidade, elegeu com facilidade Dilma Rousseff e ajudou na vitória de um bom número de parlamentares e governadores petistas. Desta feita, a candidata à reeleição teve de lidar com uma situação política bem menos confortável do que aquela que lhe catapultou do quase anonimato eleitoral à Presidência da República. Essa mudança de ambiente, bem como as suas consequências pós-eleitorais, só podem ser compreendidas satisfatoriamente se considerarmos o terremoto sociopolítico que foram as manifestações deflagradas em junho de 2013. Elas tiveram um impacto avassalador sobre a popularidade presidencial, que despencou. Segundo o Datafolha, o governo era avaliado como ótimo ou bom por 65% dos brasileiros em janeiro de 2013, enquanto apenas 7% o avaliavam como ruim ou péssimo. No início de junho, esses números pioraram um pouco, mas continuavam muito bons: foram para 57% e 9%, respectivamente. Porém, ao final desse mesmo mês o impacto das manifestações ficou evidente: 30% de bom e ótimo (menos da metade de seis meses antes) e 25% de ruim e péssimo (uma avaliação negativa três vezes e meia maior) (http://datafolha.folha.uol.com.br/). Apesar de uma boa recuperação na virada do ano, quando chegou aos 41% de ótimo/bom e ficou entre 17% e 21% de ruim péssimo, logo a avaliação do governo voltou a piorar e só foi recuperada durante a campanha eleitoral, com o governo atingindo, às vésperas do segundo turno, 44% de aprovação e 19% de reprovação (ver a Figura 1). Iniciados nas primeiras semanas de agosto, os programas do Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE) contribuíram claramente para uma lenta, porém persistente, recuperação da imagem governamental. Inegavelmente, os programas na TV e no rádio foram eficazes como uma contrapropaganda governamental, diante da débacle causada pelas jornadas juninas e por anos seguidos de cobertura midiática desfavorável, como demonstrado nos levantamentos do Manchetômetro

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(http://www.manchetometro.com.br/). Na última pesquisa Datafolha antes do início do HGPE, a diferença entre a avaliação positiva e a negativa era de apenas +9%; às vésperas do segundo turno, ela havia aumentado substancialmente, para +25%. Esse foi um fator decisivo para que Dilma Rousseff reforçasse sua competitividade nas eleições presidenciais.

Movimentação na sociedade brasileira

Note-se, porém, que como todo terremoto, o abalo das jornadas juninas não pode ser explicado pelo balanço da superfície, mas pela movimentação das camadas subjacentes – sua causa real. E profundas movimentações ocorreram nas fundações da sociedade brasileira nos últimos 25 ou 30 anos, em boa medida graças à atuação e a transformações do Estado brasileiro nesse período. A Constituição de 1988 lançou as bases institucionais não apenas de nosso regime democrático – concluindo o processo de ampliação da participação eleitoral efetuado ainda durante o regime militar (Santos, 1985) – como de um estado de bem-estar social orientado para a universalização de algumas políticas (como saúde, educação e previdência) (Pessôa, 2014). Fixado esse patamar, ficou claro para o conjunto dos cidadãos que o acesso a certos serviços sociais tornou-se um direito inquestionável, restando, porém, irresolvida a questão de sua qualidade – algo que Renato Janine Ribeiro tem definido como se constituindo numa “quarta agenda democrática” (Ribeiro, 2014), que ganhou corpo nas jornadas juninas, quando se pediam serviços públicos “padrão Fifa”. Se a derrubada do regime autoritário foi a primeira das agendas democráticas a que alude Ribeiro, a segunda foi o combate à alta inflação. Tema mais candente durante os anos 80 e 90 do século passado, foi decisivo em ao menos quatro ciclos eleitorais: o de 1986, na esteira do efêmero sucesso do Plano Cruzado, quando garantiu ao PMDB uma acachapante vitória para o Congresso Constituinte e os governos estaduais; o de 1989, quando Fernando Collor se elegeu alegando ter na agulha uma única bala para matar o tigre inflacionário (a qual se revelou um tiro n’água); o de 1994, quando Fernando Henrique Cardoso foi eleito com base no sucesso – desta vez consistente – de mais um plano anti-inflacionário: o Real; e, finalmente, o de 1998, quando FHC foi reeleito como a garantia de que a tão almejada estabilidade monetária seria preservada. Estruturadas as bases da estabilidade da moeda e da modernização liberal do Estado brasileiro pelo governo tucano, abriu-se espaço para um aprofundamento da agenda de inclusão

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social proclamada pela Constituição de 1988, porém, levada a cabo apenas parcialmente. Afinal, mesmo estipulando-se certas políticas sociais como direitos assegurados e procedendo-se à sua institucionalização (como por meio das normas básicas do Sistema Único de Saúde, do Fundo de Desenvolvimento da Educação Fundamental e da Lei Orgânica da Assistência Social), ainda restavam por atacar os históricos e gritantes problemas da pobreza e da desigualdade no país. Foi essa a agenda preferencial dos governos petistas, em especial os dois de Lula. De fato, as gestões do PT foram bem-sucedidas na consecução dessa política, como se nota pela marcante redução da pobreza e da extrema pobreza (miséria) a partir de 2003. A desigualdade também caiu de forma significativa, porém, em intensidade menor (Figura 2).

Crescimento da “classe C”

Outra transformação crucial desses anos, relacionada às políticas redistributivas, foi o substancial crescimento da assim chamada “classe C” – essa camada situada a meio caminho entre os pobres e os segmentos a que se pode com propriedade denominar “classes médias”. Os estudos de Neri (2011) mostram a grande transformação sofrida pela sociedade brasileira quanto a esse aspecto. Ao se constituir no segmento majoritário da população brasileira (e, ipso facto, do eleitorado), esse estrato social eleva a incerteza das disputas eleitorais, pois se mostra muito menos fiel a qualquer partido ou liderança do que as camadas situadas abaixo ou acima dele, economicamente. Isso foi evidenciado durante as eleições de 2014 no comportamento desse eleitorado no primeiro turno. Enquanto os mais pobres se mantiveram solidamente fiéis a Dilma e os mais ricos sustentaram Aécio – apesar de um breve flerte com Marina –, os eleitores da “classe C” oscilaram de forma volátil entre os três principais candidatos (como se vê na Figura 4, na pág. seguinte). Por isto, pode-se dizer que foi, sobretudo, entre eles que a eleição se decidiu; eles se constituíram, de certa forma, em nossos “swing voters” na eleição presidencial. Os emergentes da “classe C”, supostamente grandes beneficiários das políticas redistributivas dos anos Lula, mostraram-se bem menos propensos a apoiar o governo petista do que os das classes D/E, pois enxergam menos no governo e mais em seus próprios méritos a causa de sua ascensão, como apontou uma pesquisa conduzida pelo instituto Datapopular (O Globo, 22/10/2014). Segundo esse levantamento, apenas 9% atribuem à ação do governo sua ascensão social. Trata-se de um segmento que, embora tenha emergido na escala do consumo, ainda é um usuário

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intensivo de serviços públicos como os de saúde e educação – o que fica patente em suas preocupações. Ainda de acordo com o levantamento do Datapopular, para 65% dos membros da classe C, a saúde pública era o principal problema do país. Por outro lado, logo em seguida apareciam os políticos (a corrupção), a violência e a inflação (com percentuais entre 63% e 59%). Assim, se tem cativado os mais pobres, o PT vê erodir continuamente seu prestígio junto às camadas médias (e mesmo as emergentes), cujas manifestações de insatisfação tendem a ser mais estridentes e capazes de serem vocalizadas pelos diversos meios de comunicação. Incluem-se aí as redes sociais, constitutivas de uma “subopinião pública”: menos estruturada em sua influência do que os grandes veículos de mídia, mas ainda assim constituindo ambientes de opinião, disseminação de ideias e reforço de convicções.

Escândalos de corrupção

Dentre os fatores que contribuíram para a perda de apoio do PT junto aos setores médios e os estratos mais afluentes figuram com destaque os seguidos escândalos de corrupção que acometeram os governos nacionais do partido – evidentemente, exponenciados por uma mídia que não lhe é nada simpática. Contudo, não devem ser desconsideradas também as transformações por que passou o país no âmbito econômico. Os benefícios do crescimento dos anos Lula não atingiram igualmente os diferentes setores da população: os mais pobres ganharam relativamente mais. E, durante o primeiro governo Dilma, a estagnação contribuiu para aprofundar um desgaste que já vinha se avolumando nesse setor da sociedade. A percepção de que teriam auferido ganhos econômicos menores veio associada à perda relativa de status social, já que se reduziram as possibilidades de diferenciação por meio do consumo com relação aos ascendentes. Essa perda de distinção atiçou o ressentimento de certas parcelas das classes médias estabelecidas, expresso em reiteradas demonstrações discriminatórias nas redes virtuais e em outros contextos de sociabilidade em que a licença para exprimir certas convicções se faz presente. Incapazes de seguir desfrutando da exclusividade que sua condição econômica diferenciada lhes proporcionava, direcionaram ao governo do período recente sua insatisfação, rejeitando-o. O desgaste junto às camadas médias teve pouca importância eleitoral nas eleições de 2010, quando um Lula triunfante, numa grande onda de popularidade escorada no bom desempenho da

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economia, elegeu sem grandes percalços Dilma Rousseff. As pesquisas de segundo turno do Datafolha à época mostravam a candidata petista sempre à frente de Serra, do PSDB, com ao menos 6% de vantagem. Na última pesquisa, figurou com 10%, que nas urnas se tornaram 11% dos votos totais. Já em 2014, a disputa foi bem mais renhida. Dilma chegou a figurar atrás de Aécio nas duas primeiras pesquisas do segundo turno e, quando virou, manteve-se apenas 4% à frente, os quais se tornaram 3% dos votos totais. Uma eleição bem mais difícil. É interessante notar o que ocorreu junto às camadas médias nessas duas eleições. Quando se considera a “classe C”, em 2010, Dilma sempre esteve à frente, mesmo que por pequena margem. Na última pesquisa antes da eleição, aparecia 6% à frente – uma margem menor do que a do eleitorado total. Já em 2014, Aécio figurou à frente nas três primeiras enquetes do segundo turno; nas três últimas eles seguiram empatados. Contudo, se observarmos o estrato social logo acima, a “classe B” (5 a 10 salários mínimos), a diferença entre as duas eleições é brutal. Em 2010, Dilma aparecia na última enquete perdendo por apenas 3%; em 2014, a diferença entre ela e Aécio foi de 20%. Em seu primeiro governo, Dilma não demonstrou a mesma ventura do antecessor e mentor. Desprovida de seu carisma e habilidade política, aferrada a certezas doutrinárias, autoritária no trato com os subordinados, centralizadora e apegada a detalhes do micromanagement, liderou um governo sem brilho. Após um flerte inicial com a classe média que com ela se identificava em virtude de sua extração social, experimentou as dificuldades dos escândalos de seu próprio governo, as muitas substituições de ministros, o declínio sensível do nível de atividade econômica e uma inflação persistentemente acima da meta; patinou nas relações com o Congresso e, quanto mais o mandato se aproximou do final, mais infidelidade colheu junto a sua base e mais necessitou dos votos de oposicionistas. Às mudanças estruturais de mais longo prazo, criadoras de dificuldades eleitorais para o PT, o desempenho governamental da presidente acresceu elementos conjunturais não menos problemáticos.

Desgastes, esgotamento

A elevada popularidade que lhe bafejou durante os dois primeiros anos de gestão se esvaiu num átimo, tão logo as manifestações de junho de 2013 ganharam corpo e tomaram as ruas. Mais do que a causa, as jornadas juninas (que se estenderam por outros meses) expressavam o esgotamento de mais um ciclo – desta vez,

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aparentemente, mais largo. A longa melhora do país iniciada na redemocratização (e aqui brevemente descrita) parece ter chegado a um ponto de inflexão. O progresso social e institucional, por vezes, gera um paradoxo: eleva as expectativas populares para um patamar que o próprio progresso não é capaz de satisfazer. Assim, o estancamento da melhora do país produziu uma frustração diretamente proporcional à elevação dos anseios que a melhora anterior suscitara. As eleições, assim, tornaram-se bem mais difíceis do que se poderia prever cerca de um ano e meio antes de sua realização – isto é, antes de junho de 2013. Nas regiões mais ricas do país, o PT sofreu um desgaste significativo, refletido na acachapante derrota em São Paulo e nos estados do Sul, bem como na redução de sua bancada na Câmara dos Deputados e no número de deputados estaduais. O desgaste é fator inegável, mesmo junto a certos segmentos da esquerda, o que ajuda a compreender o novo desempenho alentado de Marina Silva e o apoio à candidatura de Aécio Neves no segundo turno por parte de lideranças tradicionalmente identificadas com a esquerda.

Os quatro âmbitos da disputa

Embora as atenções maiores sempre se dirijam à eleição presidencial, é preciso levar em consideração os demais âmbitos em que se deu a disputa eleitoral em 2014: as eleições para governador, congressuais e para as assembleias legislativas. Se tomarmos como referência o cenário mais amplo, houve um considerável aumento da fragmentação: no Congresso, nas Assembleias e nas governadorias. Um número maior de partidos (e partidos menores, em particular) ganhou espaço em todas essas frentes. No que concerne especificamente ao PT, o partido, além de ter ganhado de forma apertada a disputa presidencial, perdeu terreno também nas demais disputas. Nas eleições para deputados estaduais, depois de ter experimentado um alentado crescimento de 2006 para 2010, aumentando em 18% suas bancadas nas assembleias (e tornando-se a agremiação com o maior número de deputados estaduais no país, 149), o PT experimentou um declínio ainda mais robusto do que fora seu crescimento: 28%. Com isto, regrediu a um patamar inferior ao que possuía em 2006 (apenas 108 deputados, contra 126 anteriormente) e voltou a ficar atrás do PMDB no número de parlamentares nas assembleias legislativas. Perda similar ocorreu na disputa para a Câmara dos Deputados, na qual o PT vem experimentando um quase que contínuo declínio

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desde 2002. Naquela eleição, o partido conquistou 91 cadeiras, caindo para 83 em 2006; recuperou-se parcialmente em 2010, quando elegeu 88 deputados, mas despencou em 2014, elegendo parcos 70 parlamentares: um declínio de 20%. Esse enfraquecimento do partido nas disputas para o legislativo reflete uma perda de votos generalizada em Estados mais populosos, em especial em São Paulo. Em 2010, o partido havia obtido 16,6 milhões de votos para deputado federal; em 2014, eles diminuíram para 13,6 milhões – uma redução de 18%. Outros partidos médios ou grandes, como PSDB, PMDB e PSB também caíram, mas menos. Muitos desses votos perdidos foram amealhados por uma miríade de partidos pequenos e alguns “novos médios”, como PSD e PRB, além dos recém-criados SD e Pros. A distribuição geográfica e social do voto petista teve acentuada, nas eleições de 2014, uma mudança iniciada já em 2006 para as eleições presidenciais, analisada, entre outros, por Hunter & Power (2007). A partir daquela eleição, o PT passou a ser claramente mais votado pelos mais pobres e nas regiões Norte e Nordeste. Essa divisão voltou a se manifestar em 2010 e aprofundou-se em 2014. Desta última feita, além das perdas na eleição presidencial, o PT também foi mais mal votado entre os ricos e os eleitores do sudeste nas disputas para o legislativo e as governadorias – com exceção de Minas Gerais. Essa situação fica nítida quando se observa um mapa do país colorido de acordo com as vitórias dos candidatos a governador de cada partido. O PT ocupa uma mancha contínua que sai de Minas Gerais, passa pela Bahia e pelo Piauí, chegando ao Ceará. Curiosamente, seu principal antagonista, o PSDB, ocupa outra mancha contínua, que se inicia no Paraná, passa por São Paulo e Mato Grosso do Sul, chegando a Goiás. Essa divisão geográfica encontra correspondência no tamanho do PIB gerido por cada partido: enquanto o PSDB governa 44% do PIB, o PT fica com apenas 16%, embora ambos governem o mesmo número de estados: cinco cada um. Esse contraste entre um partido que ganha em estados ricos e outro, que ganha nos pobres, fica mais evidente se observamos a diferença no PIB per capita administrado por cada partido (Figura 5). Assim, não apenas nas eleições presidenciais o PT foi mais votado entre os mais pobres e nas regiões mais pobres; o partido também se mostrou mais competitivo nessas regiões nas disputas para governador. Parece converter-se, assim, cada vez mais, num “partido dos pobres”. Isto pode vir a se tornar um problema para a agremiação.

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Qualunquismo e eleições críticas

Em artigo publicado no início de 2014, Marcus André Mello (2014) defendeu a ideia de que nas regiões mais pobres, mais do que um voto “lulista” (Singer, 2012), há um voto “qualunquista”. Segundo ele, esse eleitor, dada sua maior necessidade das políticas governamentais, tende a ser muito mais fiel ao governo do dia – qualquer que seja seu ocupante. Com efeito, votando no governismo, esse eleitor vota em “qualquer um” (qualunque, em italiano), o que explicaria, no passado, os votos fiéis ao PFL no Nordeste e, hoje, os votos no PT. Se estiver correta essa tese, o PT terá problemas no futuro próximo, caso as políticas que lhe diferenciaram continuem a produzir resultados. A redução do número de pobres tem como resultado a sua paulatina conversão em um estrato social menos fiel ao governo do dia e mais convicto da importância de seus próprios méritos na consecução de sua ascensão social. Paradoxalmente, o aprofundamento da redistribuição pode se mostrar um sucesso de política pública contraproducente do ponto de vista eleitoral. Por essa razão, para manter-se competitivo, o PT precisará, no próximo período, buscar uma reconciliação com os setores médios, formulando políticas e um discurso que sejam capazes de sensibilizar esses segmentos. Até pela sua dimensão (já constitui mais de 55% da população brasileira), é a classe C o destinatário mais natural dessa possível estratégia. Os cerca de 33% que ainda compõem as classes D/E são o esteio eleitoral que assegurou ao partido amplo sucesso em 2006 e 2010, assim como uma sobrevida em 2014. Pela sua própria perda de importância relativa, pode não se mostrar suficiente para a disputa de 2018 se o PT não for capaz de reforçar-se junto aos emergentes.

Eleições críticas?

Em um artigo clássico, V. O. Key (1955) estipulou a definição de eleições críticas. Elas são, segundo ele, “uma categoria de eleições em que os eleitores estão, pelo menos a partir de evidências impressionistas, preocupados com uma profundidade incomum; em que o grau de envolvimento eleitoral é, em termos relativos, bastante elevado; e em que os resultados decisivos da votação revelam uma alteração brusca da clivagem preexistente dentro do eleitorado. Além disso, e talvez esta seja a característica verdadeiramente diferenciadora deste tipo de eleição, o realinhamento manifestado na votação em tais eleições parece

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persistir por várias eleições subsequentes” (Key, 1955: 4). Com a conhecida inversão do mapa eleitoral até então vigente no país e a vitória eleitoral do PT no Nordeste e no Norte, as eleições de 2006 poderiam, à primeira vista, encaixar-se nessa categoria. Contudo, se tomarmos em consideração a tese do qualunquismo, de Marcus Melo, poderíamos supor que 2006 apenas repôs as coisas no seu devido lugar, dando ao novo governismo os votos que teriam, de qualquer forma, que ser seus. Por outro lado, se consideramos o posicionamento ideológico dos partidos, a conquista por uma agremiação de esquerda do eleitorado do Norte-Nordeste é uma novidade, podendo ser encarada como um realinhamento partidário. Entretanto, ela já encontrava correspondência na votação que o PT também angaria nas periferias dos grandes centros urbanos do Sul-Sudeste do país, junto ao eleitorado mais pobre das regiões mais ricas. O que as pesquisas de intenção de voto mostram de forma mais clara é que uma divisão eleitoral baseada na estratificação social tem-se aprofundado desde 2006. O problema é que essa estratificação social não está parada: as classes se movem e modificam sua participação no eleitorado. Sendo assim, é possível que 2006 tenha sido uma primeira eleição crítica, produzindo um realinhamento. Contudo, talvez venhamos a perceber mais à frente que 2014 iniciou um novo processo de realinhamento, resultante menos da adesão de certos estratos sociais a certos partidos, e mais como decorrência da mudança de peso relativo de cada um desses estratos na estratificação social brasileira. Curiosamente, observando-se a Figura 3, nota-se que 2006 foi justamente o ano em que se cruzaram as curvas de declínio das classes D/E e de ascensão da classe C. Se a “tesoura” continuar se abrindo e esses respectivos declínio e ascensão prosseguirem, aumentam as chances de que o realinhamento de 2006 comece a ser modificado outra vez mais. Isso se confirmando, na falta de uma readequação das estratégias do PT, o partido enfrentará sérias dificuldades nas próximas disputas nacionais e estaduais. Teriam então sido já estas disputas de 2014, eleições críticas?

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Referências:

Hunter, Wendy & Power, Timothy. “Rewarding Lula: Executive Power, social policy, and the Brazilian Elections of 2006.” Latin American Politics and Society, 2007, vol. 49, 1, pp. 1-30. Key, Jr, V. O. “A theory of critical elections”. The Journal of Politics, vol. 17, no 1, Feb. 1955, pp. 3-18. Neri, Marcelo Cortes. Os emergentes dos emergentes: reflexões globais e ações locais para a nova classe média brasileira. Rio de Janeiro: FGV/CPS, 2011. Melo, Marcus André. “Lulismo ou ‘qualunquismo’”. Valor Econômico, 15/01/2014. Disponível em http://www.valor.com.br/politica/3395814/lulismo-ou-qualunquismo. Acessado em 27/11/2014. Pessôa, Samuel. “Duas agendas na política econômica”. Folha de S. Paulo, 21/09.2014. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/colunassamuelpessoa/2014/09/1519388-duas-agendas-na-politica-economica.shtml. Acessado em 27/11/2014. Ribeiro, Renato Janine. “A quarta agenda democrática”. O Estado de S. Paulo, 21/06/2014. Disponível em http://alias.estadao.com.br/noticias/geral,a-quarta-agenda-democratica,1515637. Acessado em 27/11/2014. Santos, Wanderley G. dos. “A pós-revolução brasileira”. In Jaguaribe, Hélio (org.). Brasil sociedade democrática. Rio de Janeiro: José Olympio, 1985. Singer, André. Os Sentidos do lulismo – reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

O momento antropofágico do Brasil

Uma grave crise funcional do Estado eleva seus custos de maneira

intolerável

por Wanderley Guilherme dos Santos — publicado 30/12/2014

00:32

http://www.cartacapital.com.br/revista/830/o-momento-

antropofagico-do-brasil-

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4212.html?fb_action_ids=10154998948285534&fb_action_types=og

.recommends

Saturno devorando um filho, Francisco de Goya

Há um esbanjamento de despudor e ausência de autocrítica,

além da opacidade do governo

O governo só não cai por falta de colo hospitaleiro. Ainda bem, pois

escasseiam robustas lideranças democráticas capazes de

desmantelar, por simples presença, arranjos contra a legalidade. O

Legislativo distrai-se em conquistas predatórias ao apagar das luzes

do atual mandato. Os movimentos sociais organizados, outrora

valentes escudeiros de valores universais, empalideceram e a

multidão de siglas que desfilam em conclamações lembra os

“blocos do eu sozinho”. Em São Paulo, estado volta e meia em

conflito com o resto do País, a direita brega patrocina intervenções

surrealistas sem acordo prévio sobre o propósito da perturbação do

trânsito. Augustos integrantes da judicatura disputam o horário

televisivo com escaramuças entre bandos de traficantes. Há um

esbanjamento de despudor, ausência de autocrítica, intermináveis

confabulações pré-ministeriais, além da conhecida opacidade do

governo. Tudo a deixar a leve impressão de que os verdadeiros

espetáculos em um só ato, ou vários, estão em exibição alhures. A

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rotina pós-eleitoral, que deveria ser pacífica, está em ebulição à

revelia das autoridades recém-eleitas.

A insaciável antropofagia brasileira converteu o “impedimento”,

mecanismo de destituição de autoridades públicas, em alavanca

para a nomeação de ministros. Está aí o surpreendente novo

ministro da Fazenda que não me deixa mentir, embora condenado a

ser, ele próprio, deglutido: pelos conservadores, por ser Joaquim

Levy de menos, pela esquerda, por sê-lo de mais. Em qualquer

caso, é improvável que reconquiste a identidade pretérita. Ele e os

demais figurantes em processo de escolha governamental estão

sujeitos a ampla rejeição ao simples anúncio de que estão

cogitados para escalação. A fonte escaladora não transfere

segurança, mas doses da mesma controvérsia de que padece no

momento. Ninguém pode prenunciar qual a face do governo em,

digamos, seis meses.

A antropofagia continua na transformação do saudável pluralismo

organizacional democrático em máfias de concorrência coordenada,

com regras e procedimentos estabelecidos. É adulto de anos o

entrelaçamento entre competidores privados e nichos da burocracia

pública e ainda ignorada a extensão do sistema extrativista

assentado em extorsão e suborno. Hoje é a Polícia Federal que

determina a pauta relevante da política, precisamente pela elevada

taxa de imprevisibilidade quanto aos danos políticos e econômicos

gerados pelas investigações. A partidarização pretendida pela

oposição, na torcida pela declaração oficial de que o Partido dos

Trabalhadores está contaminado em estágio terminal pelo vírus da

corrupção, não prevalecerá. Já investigações paralelas começam a

revelar alguns dos escândalos a macular o longo predomínio tucano

no estado de São Paulo, e sabe-se que a era Aécio Neves, em

Minas Gerais, não foi um primor de lisura. Governo, oposição,

Legislativo, Judiciário, grupos de pressão eficazes (OAB, CNBB,

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jornalismo crítico sensato) terão de lidar, por bom tempo, com um

problema nada miúdo.

Não se trata de advogar uma anistia generalizada pela

comprovação da universalidade do delito. A oportunidade é singular

demais para exaurir-se na contabilidade de malfeitos partidários. Há

uma grave crise funcional do Estado brasileiro que eleva de

maneira intolerável os custos do governo e do crescimento

econômico. Consequentemente, aqui se joga com a continuidade

ou interrupção da distribuição iníqua dos sacrifícios inerentes à

trajetória de países emergentes. Os custos excessivos, o

sobrefaturamento, as propinas e mimos distribuídos não são, nem

apenas nem principalmente, uma agressão a acionistas e fideístas

dos bons propósitos de empresas gigantes, grandes ou médias.

Os recursos ilegalmente extraídos do Tesouro Nacional, por

empresários ou servidores públicos, apontam para uma das

habilidades antropofágicas de transformar o progresso material em

miséria social. Sim, os brasileiros poderiam usufruir um nível de

bem-estar superior se o Estado não fosse balcanizado entre grupos

de burocratas e máfias empresariais de concorrência controlada.

Se existissem países sem solução, o Brasil pertenceria, talvez, ao

grupo. Derrotados eleitorais tentam tornar sem efeito a derrota.

Poucos os ouvem, mas outros, com relativo poder causal, ameaçam

colocar sob suspeição o mandato dos vencedores. Esses escolhem

ignorar a possibilidade de que, segundo a lei vigente e as

conclusões da Polícia Federal, venha a ser impossível governar.

Isso, óbvio, se as conclusões forem aceitas tal e qual pelo Ministério

Público. Bem verdade ser praticamente impossível que o País pare

de funcionar e que a fantástica quantidade de obras em andamento,

das quais depende o futuro da população brasileira, seja interditada.

Mas há que resolver qual o destino dos implicados nos ilícitos.

Livres é que não poderão ficar.

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Igualmente improvável que as eleições de 2014 sejam anuladas.

Seria indigesto mesmo para alguns bons antropófagos. Mas é certo

também que o País não será governado segundo o plano original e

o Estado não obrará como dantes. Pois governar não se resume a

nomear ministros. Tampouco a exigir que prazos sejam cumpridos.

Mais do que a misteriosa reforma política, urge uma revisão

estrutural no modo de operação do Estado brasileiro, em seus

órgãos de controle não só a posteriori, mas de acompanhamento. E

se o governo paira, sem liderança política para além da

administrativa, seria cautelar ser informado de que ninguém está

livre da antropofagia.

KOTSCHO: 'GOVERNO DILMA-2 CAMINHA PARA A AUTODESTRUIÇÃO'

http://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/169116/Kotscho-

'Governo-Dilma-2-caminha-para-a-

autodestrui%C3%A7%C3%A3o'.htm

Segundo o jornalista, "pelo ranger da carruagem desgovernada, a oposição nem precisa perder muito tempo com CPIs e pareceres para detonar o impeachment da presidente da República", pois "o governo Dilma-2 está se acabando sozinho num inimaginável processo de autodestruição"

5 DE FEVEREIRO DE 2015 ÀS 12:54

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247 – O segundo governo da presidente Dilma Rousseff "está se acabando sozinho num inimaginável processo de autodestruição", afirma Ricardo Kotscho, em seu blog. Segundo ele, por isso mesmo a oposição nem precisa "perder muito tempo" em defesa do impeachment. Ao comentar a nona fase da Operação Lava Jato, deflagrada nesta quinta-feira 5, ele lamenta: "O que já está ruim sempre pode piorar". "É duro e triste ter que escrever isso sobre um governo que ajudei a eleger com meu voto, mas é a realidade", acrescenta o jornalista. Leia a íntegra: Governo Dilma-2 caminha para a autodestruição O que já está ruim sempre pode piorar. A Petrobras e o país amanheceram de pernas para o ar nesta quinta-feira.

Ao mesmo tempo em que a Petrobras ficava sem diretoria, após a renúncia coletiva da véspera, e sem ninguém saber o que será feito dela amanhã, a Polícia Federal está fazendo neste momento, nove da manhã, uma nova operação em quatro Estados, com mandados contra mais de 60 investigados na Lava-Jato, entre eles o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto.

Pelo ranger da carruagem desgovernada, a oposição nem precisa perder muito tempo com CPIs e pareceres para detonar o impeachment da presidente da República, que continua recolhida e calada em seus palácios, sem mostrar qualquer reação.

O governo Dilma-2 está se acabando sozinho num inimaginável processo de autodestruição.

A presidente teve todo o tempo do mundo para pensar em soluções para a Petrobras, desde que esta grande crise estourou no ano passado, mas só se dedicou à campanha pela reeleição e à montagem do seu novo ministério. Agora, tem apenas 24 horas para encontrar uma saída, antes da reunião do Conselho de Administração, que precisa nomear a nova diretoria amanhã para não deixar a empresa acéfala.

Pois não é que, em meio aos enormes desafios que seu governo enfrenta em todas as áreas da vida nacional, apenas 36 dias após o início no segundo mandato, Dilma encontrou tempo para promover a primeira mudança em seu ministério trazendo de volta o inacreditável Mangabeira Unger, folclórico ideólogo que queria construir aquedutos para transportar água da Amazônia para o sertão do nordeste, como lembrou Bernardo Mello Franco?

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Isolada, atônita, encurralada, sem rumo e sem base parlamentar sólida nem apoio social, contestada até dentro do seu próprio partido, como estará se sentindo neste momento a cidadã Dilma Rousseff, que faz apenas três meses foi reeleita presidente por mais quatro anos?

Ou, o que seria ainda mais grave, será que ela ainda não se deu conta do tamanho da encrenca em que se meteu?

É duro e triste ter que escrever isso sobre um governo que ajudei a eleger com meu voto, mas é a realidade. É preciso que Dilma caia nesta realidade e mude radicalmente sua forma de governar, buscando e não arrostando apoios, ouvindo pessoas fora do seu núcleo palaciano, como prometeu no discurso da vitória, antes que seja tarde demais.

Por um desses achaques do destino, foi marcada para amanhã, em Belo Horizonte, a abertura das comemorações dos 35 anos da fundação do PT, um partido que vi nascer e que vive hoje a pior crise da sua história, 12 anos depois de ter chegado ao poder central.

Está previsto um encontro reservado do ex-presidente Lula com a presidente Dilma. Cada vez mais distantes nos últimos meses, o que um terá para falar ao outro? Pode ser que a conversa comece com esta pergunta, que todos os petistas estão se fazendo: "Pois é, chegamos até aqui. E agora, camarada?"

Vida que segue.

Urgente, falta uma ponte entre o apelo e a rua

http://cartamaior.com.br/?/Editorial/Urgente-falta-uma-ponte-entre-o-

apelo-e-a-rua/32828

Se o PT, a esquerda em geral, os movimentos sociais e o

campo progressista não se entenderem a tempo de definir uma

agenda comum o juiz Moro o fará por eles.

por: Saul Leblon - - [

http://cartamaior.com.br/?/Editorial/Urgente-falta-uma-ponte-entre-o-

apelo-e-a-rua/32828#comentarios

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Soa angustiante a dissociação entre o gesto e o seu efeito.

Entre o apelo e o desdobramento.

Entre o alerta do abismo e a impotência para deter o comboio.

De novo, no evento dos 35 anos do PT, lideranças do partido, entre

elas a do ex-presidente Lula, expuseram diagnósticos corretos sobre

a ofensiva conservadora no país, denunciaram o golpe dissimulado,

como de hábito, faxina moralizante; conclamaram o partido a sacudir a

letargia, ir às ruas, lutar, resistir.

Porém... nada se move.

De novo Lula, Rui Falcão, Tarso Genro e outros falarão em novas

oportunidades; com já fizeram em ocasiões anteriores repetirão os

mesmos diagnósticos corretos de um golpe dissimulado em marcha, e

evocarão as ruas..

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Porém... nada se move.

Assim sucessivamente.

O anticlímax, para estreitar bastante a abrangência do retrospecto,

teve um sinal de alarme na campanha de 2014.

Em diferentes momentos, então, mas sobretudo após a morte

traumática do candidato do PSB, Eduardo Campos, em 13 de agosto,

a candidatura progressista esteve emparedada pela bateria

conservadora, a ponto de muitos darem o jogo como encerrado

e perdido.

No final de agosto esse conjunto formava um aluvião anti-Dilma.

Porém, nada se movia.

Nenhuma reação.

Era tão denso o horizonte da derrota que expoentes do colunismo

conservador ejaculavam precocemente divagações acerca do ‘pós-

lulopetismo’.

A candidata Marina Silva chegou a abrir 10 pontos de vantagem nas

enquetes sobre um hipotético 2º turno, no qual o Datafolha dava como

certa a sua presença.

Era uma dessas ladeiras de um sonho turbulento em que nada parece

deter a aceleração em plano inclinado rumo ao muro de pedra.

Em cinco de setembro, em meio ao clima de colisão com as urnas,

uma reunião de avaliação da campanha assistiu à intervenção de um

Lula endiabrado.

As reservas instintivas do retirante nordestino que saiu da seca para

ocupar a presidência do país por duas vezes mobilizaram-se em seu

organismo, à falta de outras formas de mobilização.

Desse arcabouço histórico/metabólico brotou um diagnóstico que

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sacudiu os brios de um comitê de campanha do PT e da militância,

até então atônitos com a aproximação veloz do desastre.

Em duas frases, Lula esquadrejou a areia movediça ao redor,

identificou um pedaço de chão firme e instalou uma alavanca para a

reação bem sucedida: ‘Nós ficamos economicistas; não nos faltam

obras, mas política’, disparou para prescrever o antídoto: ‘Temos que

demarcar o campo de classe dessa disputa: é preciso levar a política à

propaganda’.

A partir de então a essência radicalmente neoliberal embutida nas

candidaturas de Marina Silva e Aécio passou a ser floculada do

espumoso caudal dissimulado em ‘renovação’, ‘ética’ e ‘mudança’ .

O extrato obtido foi exposto à luz do sol. A sonolenta publicidade de

sabonete do horário eleitoral ganhou uma narrativa pedagógica,

determinada a tipificar um a um os riscos e alvos da agenda

conservadora.

Na mesma chave narrativa, a Presidenta Dilma passou a dar nomes

aos bois em debates, no rádio e na presença diária na TV.

Ponto número 1: Dilma falava diariamente com o país.

Ponto número 2: confrontava projetos.

Ponto número 3: discutia flancos ainda por enfrentar.

Ponto número 3: zelava pelo passado sem abstrair as lacunas

enormes do muito que o Brasil ainda deve aos brasileiros.

Ponto número 5: não o fez, mas se tivesse incorporado à discussão

os ajustes necessários à reordenação de um novo ciclo baseado no

investimento e no controle da inflação, o eleitor provavelmente

entenderia –desde que ...

Ponto número 6: ... desde que isso se fizesse acompanhar de

salvaguardas, prazos e contrapartidas, ademais da determinação de

dar à sociedade meios e estruturas para vigiar e assegurar a travessia

segura rumo a um novo estirão de crescimento com justiça social.

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O fato é que no breve interregno entre cinco de setembro quando Lula

explodiu sua indignação e a vitória final em 26 de outubro, o PT e o

governo fizeram o que nunca haviam feito e, incompreensivelmente,

não voltaram a fazer ainda.

O quê?

Estabeleceram um canal de conversa indispensável com a população

sobre um tema de interesse geral: o Brasil. A vida de sua gente, seus

trunfos e desafios –hoje, ontem e amanhã.

Fez-se ali um ensaio de repactuação da confiança mútua, sintonizada

no compartilhamento de compromissos e urgências.

Assistiu-se a um ensaio bem sucedido disso que Lula agora sugere

que o PT faça (leia o seu discurso no evento dos 35 anos do

partido; nesta pág.) .

Um manifesto de uma repactuação política do partido com a nação.

Carta Maior viu naquele jorro de desassombro da campanha de 2014

um ponto de ruptura com o abismo há muito temido.

‘A ficha caiu’, saudou-se.

No final de setembro, quando a vitória já não era mais um sonho de

vento , seria a vez da própria candidata Dilma reforçar essa impressão.

Em entrevista a um grupo de blogueiros, ‘sujos, ideológicos,

governistas’, como a eles se refere o colunismo isento, a candidata

explicitou o divisor que marcaria o seu segundo mandato:

‘Terei um embate (político) mais sistemático; não serei mais tão bem

comportada; me levaram para um outro caminho, que não era o que

eu queria’, disse então Dilma em testemunho sincero.

Menos de cinco meses depois, onde foi que tudo se perdeu?

Perdeu-se a ponto de retroagir à pasmaceira anterior ao cinco de

setembro de Lula, com o radical agravante de que Dilma agora ocupa

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a presidência da nação, de onde o conservadorismo fala abertamente

em retirá-la.

E não só fala: toma providências explícitas para isso.

Uma parte da recaída se deve à inércia traiçoeira de uma fórmula de

governo que se esgotou, sem que se tenha colocado nada em seu

lugar.

Como não existe vácuo em política, Eduardo Cunha se habilitou em

ocupar um pedaço do vazio.

Outros farão o mesmo. Moro é o Eduardo Cunha com crachá da

Polícia Federal.

E assim por diante.

Em três mandatos presidenciais sucessivos predominou a

determinação petista de restringir o confronto direto com os interesses

conservadores na faixa de segurança permitida por uma correlação de

forças adversa.

Mas a margem de manobra se esgotou

Em velocidade e intensidade proporcional à contração do PIB e à

pressão da crise mundial, definitivamente acampada no Brasil.

O que antes parecia uma contingência administrável, ainda que a um

custo político cada vez mais desgastante, acentua os contornos de um

esgotamento de ciclo.

O conjunto aguça o desgaste intrínseco à tarefa de administrar o

capitalismo ainda sem poder transforma-lo efetivamente.

A esquerda não pode cometer o simplismo de atribuir exclusivamente

a Dilma a origem do incêndio, apegando-se ao fato de ela não saber

como controla-lo.

A atonia de Brasília funde duas coisas.

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Revela a cota da responsabilidade do governo no agravamento da

crise.

Ao mesmo tempo reflete a dureza da encruzilhada que o Brasil tem

pela frente.

Não fosse assim, por que então nada se move mesmo, depois que

Lula, Falcão, Tarso e outros se desdobram em evocações pela

resistência?

O buraco negro conservador diuturnamente suga, reprocessa e

regurgita o imobilismo progressista intoxicando corações e mentes

com a tese desinteressadamente propalada por Serra: ‘Dilma não

chegará ao final do mandato’.

O Datafolha é o monitor de controle desse mutirão O relatório deste

domingo avisa ao comando central: ‘estamos indo bem’.

Sem dúvida: o vácuo de liderança e de agenda para enfrentar Moro,

Gandra e FHC, se alarga.

A letargia organizativa, ideológica e programática desagua na

angustiante desconexão entre o apelo e a resposta.

Entre o gesto e o efeito.

Pior que tudo.

A desconexão imobilizante revelou um punhal de aço cravado contra

as próprias costas.

O campo progressista não tem canais de comunicação para uma

urgente repactuação do futuro com a sociedade.

Hoje, nada se faz sem a mediação tóxica da emissão conservadora.

Quando Lula diz ‘temos que voltar às bases, o PT se tornou um partido

de gabinetes’, o que se veicula é a derrisão, não a gravidade da

autocrítica abraçada pelo maior líder progressista do país.

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Como é possível que um partido formado por franjas de toda a

esquerda, quadros de alta qualidade e distintas filiações, tenha

cogitado construir um Estado de Bem-estar social tardio, na oitava

maior economia do mundo –na era da livre mobilidade dos capitais

chantageadores-- sem dispor de canais pluralistas de comunicação?

Ou seja, sem espaço para afrontar o interdito neoliberal de Margareth

Tatcher: ‘Não há alternativa’.

Não apenas isso, mas o que virá ‘será doloroso’, sapateava

o editorial do Financial Times, antes das eleições, em que apregoava

a inevitabilidade de um conjunto de medidas ortodoxas, ‘ganhe quem

ganhar a eleição’.

Nua e cruamente, o diário londrino estava dizendo que o ciclo político

não comanda mais o ciclo econômico.

A menos que se reorganize para isso, tem clamado Lula e outros.

Sem uma repactuação política desassombrada, sobra a receita crua

do ajuste ortodoxo que, de tão postiça, teve que ser terceirizada por

Dilma a um centurião de confiança do mercado.

A tese do ‘estelionato eleitoral’ de Dilma abstrai esses pequenos

detalhes, ademais da asfixia policial ao redor da Petrobras, ( que

arrasta sozinha 13% do PIB), a queda de 50% nas cotações do barril

de óleo e a maior seca já vivida no país em 80 anos.

Uma tempestade perfeita estacionou nos céus de Brasília.

Por onde começar?

‘Temos a oportunidade histórica de elaborar um novo Manifesto do PT.

Isso exige humildade e coragem’, disse-o bem Lula na última sexta-

feira.

Falta agora o principal: correr riscos.

Adicionar ao enunciado a agenda capaz de erguer a ponte entre o

apelo e a resposta.

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Ou seja, definir aquilo que, efetivamente, ofereça uma razão forte,

crível, palpável para a letargia deixar o sofá do descrédito e ir às as

ruas, voltar às bases, cobrar, debater e pactuar o passo seguinte do

desenvolvimento brasileiro.

Se o PT, a esquerda em geral, os movimento sociais e o campo

progressista não se entenderem a tempo de definir uma agenda

comum –e não há tanto tempo assim, avisa o Datafolha-- o juiz Moro

o fará por eles.

Dando uma razão conservadora suficientemente catártica para

acelerar o passo de ganso da marcha regressiva em curso no Brasil.

As graves denúncias de Paulo Henrique Amorim

(assista: http://www.conversaafiada.com.br/tv-

afiada/2015/02/06/os-dias-e-as-noites-na-guantanamo-do-dr-

moro/ ) sobre as condições em que estão sendo extraídas as

‘delações premiadas’ da Lava Jato, bem como o parecer

’Gandra/FHC’ e a invasão da residência do tesoureiro do PT –antes de

convoca-lo a depor-- indicam uma determinação muito clara: ir além

do estado de direito.

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Reforma-Politica-e-

Corrupcao/4/32877

Qual é a crise política brasileira hoje?

março 18, 2015 /

William Nozaki*

Instabilidade e crise

Na última semana dois grandes conjuntos de manifestações ocuparam as ruas e as redes em diversas cidades do país. De um lado, vozes de apoio crítico ao governo Dilma, de outro lado, brados de oposição e repulsa contra a presidenta e o PT. Não resta dúvidas de que o Executivo precisa se movimentar rapidamente para refazer suas relações com os outros dois poderes da

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República e para retomar um diálogo mais estreito com a sociedade, apresentando uma agenda que dê conta de interagir com as novas demandas, expectativas e desejos expressos pelos diversos atores sociais. No entanto, dificuldades de duas ordens – conjunturais e estruturais – tem obstruído esse caminho.

Do ponto de vista conjuntural, esse primeiro trimestre tem sido marcado por sucessivos deslizes na construção da identidade do governo e pela dificuldade da presidenta Dilma em disputar e publicizar uma narrativa para o seu projeto de país. A composição ministerial ao absorver figuras como Joaquim Levy, Kátia Abreu e Gilberto Kassab deixou margem para impressões de construção de um governo contraditório; a morosidade na decisão sobre a substituição de Graça Foster na Petrobrás, somada aos vazamentos seletivos da Operação Lava Jato, impactaram negativamente o balanço da empresa e a imagem do poder decisório do Planalto; o anúncio do ajuste fiscal recessivo sem envolver uma pactuação mais ampla com empresariado e trabalhadores instaurou o clima de insegurança e austericídio; a derrota para Eduardo Cunha na disputa da presidência da Câmara, combinada às negociações malfadadas com o PMDB, trouxeram para dentro da base aliada a turbulência geral; tudo isso combinado ao lançamento de um lema de governo bastante vago, “Pátria Educadora”, e ao silêncio de dois meses da presidenta que evitou o diálogo com a imprensa.

Não podemos admitir, no entanto, a explicação fácil de que esse planetário de problemas é culpa simplesmente da inabilidade política da figura individual da presidenta, o quadro é bem mais complexo e parece explicitar os limites do próprio sistema político-econômico e de representação.

(i) A distribuição de ministérios na Esplanada está fatalmente sujeita às negociações em nome da governabilidade sem a qual, concordemos ou não, não se governa nos marcos da democracia representativa existente hoje, tal constatação só reforça a necessidade de realização de uma ampla reforma política; (ii) De modo análogo, diante do cenário de crise internacional e de desequilíbrio das contas públicas, a necessidade de um ajuste fiscal se impôs de maneira inequívoca, é bem verdade que o grau de contracionismo das medidas assim como sua maior incidência sobre os trabalhadores do que sobre os mais abastados precisam ser contestados, mas, uma vez mais, isso só reforça a necessidade

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de implementação de uma reforma tributária mais ampla; (iii) Por fim, os desvios de recursos da Petrobrás revelam um problema crônico do Brasil: a corrupção sistêmica como parte constitutiva do patrimonialismo que permeia o Estado, por meio de licitações contestáveis empresários corruptores açambarcam recursos públicos a fim de repassar verbas para o financiamento privado de políticos corruptos, tamanho descaramento precisa ser enfrentado com um enérgico pacote de combate à corrupção.

Há que se notar uma perversidade ainda maior, existe uma espécie de ciclo vicioso atando os três problemas levantados acima: o avanço do crescimento econômico com inclusão exige uma reforma tributária e a taxação do andar de cima da pirâmide social, mas como taxar os recursos de uma camada composta por banqueiros, empreiteiros e acumuladores em geral que são justamente os responsáveis pelo financiamento das campanhas eleitorais? Ou, por outra, a recuperação do desgaste das instituições de poder exige uma reforma política que renove a relação entre o Estado e a sociedade, mas como rever a representação e ampliar a participação se os responsáveis por aprovar tais medidas são, muitas vezes, justamente os que ascenderam ao poder por meio de relações problemáticas com o capital?

Os conservadores pragmáticos se resignam diante dos problemas impostos pela governabilidade e dessa forma acabam justificando a perpetuação do fisiologismo; os esquerdistas idílicos repetem o mantra da ruptura radical e tem muito compromisso teórico, mas nenhum compromisso prático, com as conquistas realizadas pela sociedade brasileira nas últimas décadas. Nos dois casos o que se revela é um preocupante desapego com o aperfeiçoamento e a republicanização da nossa democracia.

Representação e governabilidade

Nesse sentido, é importante reconhecer, o governo tentou ainda que de forma fracassada realizar uma disputa no parlamento pela presidência da Câmara, mas se viu enredado em uma situação complexa, dessas em que se tem que escolher entre o pior e o ruim. O pior seria apoiar Eduardo Cunha e aderir, sem resistências, ao padrão de patrimonialismo e conservadorismo que ele representa. O ruim seria ensaiar um esboço de resistência com um candidato próprio, ainda que com chances mínimas de vitória.

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Entre a acusação de conservador passivo e derrotado ativo o governo optou pela segunda. Vale registrar, essa decisão – pouco maquiavélica, mas republicana – explicitou o conflito no interior da base aliada entre PT e PMDB. Entendidas as coisas nesses termos, os impasses de Dilma são os impasses do sistema político brasileiro, mais ainda: parte dos insucessos do governo são exatamente porque, ainda que de forma desastrada, ele tentou enfrentar o tradicionalismo pemedebista, como, aliás, tem desejado parte da população. E se enfrentou optando não pela via da ruptura com o PMDB, mas sim pela disputa institucional da Câmara, é porque, premido pelas contradições da governabilidade, uma vez mais fez a opção pela disputa nos marcos da institucionalidade democrática.

A não compreensão sobre esse caminho joga água no preocupante avanço do conservadorismo e do autoritarismo. Na história do Brasil, não são raros os episódios em que os setores regressistas responderam às derrotas nas urnas com seus três instrumentos clássicos: o judiciário, as polícias e a grande imprensa.

Conservadorismo e autoritarismo

Como é sabido desde 2014, o parlamento eleito no Brasil é composto pelo maior número de legisladores milionários da nossa história republicana, no processo eleitoral que foi o mais custoso de nossa série democrática, resultando na eleição do maior número de empresários, bispos e pastores, militares e policiais, o resultado disso é o travamento das agendas progressistas, de defesa da igualdade e promoção das liberdades, e a ampliação de uma pauta regressista, em menos de 60 dias a bancada da família cristã, defensora dos bons modos e costumes, desengavetou e colocou em tramitação projetos de lei como o dia do orgulho hétero; a punição contra a heterofobia; o veto à adoção de crianças por casais homoafetivos; o impedimento do abortou mesmo nos casos já previstos por lei; a bolsa estupro. Ao que tudo indica os representantes do patriarcado elegeram as mulheres e o público LGBT como seus primeiros inimigos.

O poder judiciário também não parece desfrutar da lisura e da pompa manifesta pelos rituais da toga, haja vista a proposital morosidade de Gilmar Mendes em avaliar o projeto que propõe o fim do financiamento privado-empresarial de campanha, para não mencionar os inúmeros casos que diariamente surgem de juízes desferindo suas “carteiradas” histéricas ou ostentando pequenos

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poderes como no caso do magistrado que, além de desviar recursos dos cofres públicos, achou por bem desfilar com um dos carros do seu réu Eike Batista.

Do mesmo modo, as forças policiais conclamadas sob o pretexto da segurança pública instauram o medo promovendo o encarceramento seletivo e a violência sistemática, sobretudo, contra jovens, negros moradores das periferias das grandes cidades do país, não são poucos os casos de criminalização arbitrária, abordagem excessiva e chacinas bárbaras.

Por fim, o caso do partidarismo e da parcialidade da grande imprensa é latente: capas de revistas semanais e manchetes de jornais de circulação nacional fazem mais panfletagens atemorizantes do que coberturas jornalísticas que de fato informem. Uma passada de olhos pelo noticiário evidencia o imenso descompasso entre o número exponencialmente grande de matérias que atacam o governo quando comparado àquelas em muito menor quantidade que informam agendas possivelmente positivas. O silêncio na cobertura do escândalo internacional conhecido como SwissLeaks revela o corporativismo da nossa grande imprensa, fosse ela realmente comprometida com o combate à corrupção teria noticiado amplamente as crimes de desvio de recursos, sonegação fiscal e evasão de divisas cometidos pelos abastados brasileiros com polpudas contas em bancos suíços. É possível acreditar que alguma dessas instituições tem um compromisso sério com a democracia?

Democracia como Mais-Democracia

Os desafios para o próximo período não são miúdos, não há tempo para análises simplistas e respostas fáceis, o caminho para o futuro precisa ser construído pelo conjunto da sociedade brasileira em um grande pacto e com um amplo diálogo, o que só pode ser feito nos marcos de defesa e ampliação da democracia, sendo assim qualquer ameaça de impeachment ou pedido de volta à ditadura precisa ser recusado com veemência. Nesse quadro complexo, crivado por contradições, o próprio governo instituído é que se tem apresentado como o maior fiador da nossa democracia, por isso ele pode ser criticado, mas ele deve ser defendido. Os problemas da democracia só se resolvem com mais democracia.

* – William Nozaki é professor de economia da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

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Renato Janine Ribeiro: a revolta da classe média

Professor titular de Ética e Filosofia na USP. Escreve quinzenalmente no caderno PrOA[

http://zh.clicrbs.com.br/rs/entretenimento/noticia/2015/03/renato-janine-ribeiro-a-revolta-da-classe-media-4723680.html

21/03/2015 | 15h46

A classe média tomou as ruas. Tem motivos para isso. Cansou de

pagar impostos pelos serviços públicos que são educação, saúde,

transporte e segurança — e de além deles, pagar a escola dos

filhos, o plano de saúde, o carro e o segurança do condomínio ou

da rua. É difícil definir “classe média”, mas o essencial é que ela se

diferencia dos pobres, porque tem o necessário à vida e também

consegue saciar alguns sonhos de consumo. Daí que país rico seja

“país sem pobreza”, como diz um bordão de Dilma Rousseff: os

países em que o povo adquiriu dignidade. O problema é que, aqui,

a dignidade é negada pelo setor público. A classe média tem

motivos para protestar.

A revolta da classe média

Eu jamais endossaria o discurso ofensivo a essa classe, que alguns

colegas propalam. Jamais. Mas não quer dizer que a classe média

proteste no caminho certo. Tem razão para protestar, mas não em

protestar do modo que tem feito.

A classe média se sente roubada na cidadania. A ferida profunda

são esses serviços que ela paga duas vezes. Daí a culpar por esse

fracasso do Estado a corrupção, é só um passo. O roubo da

Petrobras é enorme. O que significa um único criminoso furtar 100

milhões de reais? Quem saberia o que fazer com tanto dinheiro?

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Quarenta Lamborghinis, vinte mansões? Ninguém consegue

desfrutar de tudo isso. O PT tem que exigir punição e expurgar de

suas fileiras quem se comprometeu nisso.

Mas o erro é limitar o mal-estar, o protesto, à corrupção. O furo está

embaixo. Primeiro que segurança pública é estadual, educação é

estadual e municipal, transporte público idem. Apenas saúde é que

além do Estado e do município, envolve a União. A dívida do poder

público com a sociedade não é de um partido só. E segundo:

mesmo nos sentindo sinta roubados, o roubo não explica tudo,

sequer nossos maiores problemas.

São Paulo continua à beira do colapso por falta d’água. A

privatização da concessionária pode ser a causa de seu não-

planejamento, mas isso não quer dizer que tenha sido corrupção

(no caso, do governo tucano). Foi uma escolha errada, não se

preparar para a seca. Merece castigo nas urnas. Mas roubo,

desonestidade, não foi.

Precisamos entender isso. Na democracia, linhas diferentes

disputam o poder. Um lado quer preservar salário e emprego, e com

isso talvez tenha errado ao subsidiar demais. O outro lado cortaria

subsídios, deixaria crescer o desemprego, talvez aumentasse a

produção, mas quem sabe? Poderia ainda assim dar errado. Mas

uma política dar errado não quer dizer que seja de ladrões.

Ou vejamos um dos problemas mais sérios do país, o incentivo ao

carro particular. Engole fortunas, que poderiam ir para o transporte

público e outros serviços também públicos. O carro polui, causa

doenças. Arrasa as cidades com viadutos e avenidas largas.

Deveria ser adesivado, como os cigarros: “machuca, mutila, mata”.

Mas é corrupção? Não necessariamente.

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A política má é o que mata mais. Isso, a classe média nas ruas não

percebe. Os protestos têm que melhorar de foco. Até para o

sucesso de quem protesta.

O outono do PT

O Brasil perdeu o medo do PT.

Luiz Felipe Pondé - [email protected] - 23/03/2015 02h00

Temos que reconhecer: chegamos ao fim de uma era. O PT vive seu outono. Melhor voltar para o pátio da fábrica onde nasceu e de onde nunca deveria ter saído. Há que se ter uma certa grandeza, mesmo no pecado (o desejo de poder é o pecado máximo de toda a política), e o PT se revelou incapaz até de pecar com elegância. Este outono do PT não se deve apenas às manifestações contra seu governo. Essas manifestações, diferentes das patrocinadas pelo "PT e Associados", manifestações com todos os tiques de política de cabresto e mazelas sindicalistas (passeata chapa branca), trazem algo de novo para o cenário, que deixa o "PT e Associados" em pânico. A tendência é a elevação da violência por parte da militância. O Brasil perdeu o medo do PT e da esquerdinha pseudo. As pessoas descobriram que o mal-estar com essa turminha não é coisa de "gente do mal" (não é coisa de gente do mal, é coisa de gente bem informada), como a turminha pseudo diz, mas sim que somaram 2 + 2 e deu 4: o PT é incompetente para governar. Afundou quase tudo em que tocou, seja municipal, estadual ou federal (e a Petrobras). Mas essa morte do PT significa mais do que o fim de um partido que será esquecido em cem anos. O fim do PT significa que o ciclo pós-ditadura se fechou. No momento pós-ditadura, a esquerda detinha a reserva de virtude política e moral, assim como de toda a crítica política e social. Ainda que a história já tivesse provado que todos os regimes de esquerda quebram a economia (como o PT quebrou a nossa) ou destroem a democracia (como os setores mais militantes do partido gostariam de fazê-lo). Vide o caso mais recente e mais próximo, a Venezuela: economia destruída (e com petróleo!) e democracia encerrada de uma vez por

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todas. Como será que nossa diplomacia, ridícula como quase tudo que o governo do PT toca, reagirá ao fato de ele, Maduro, ter se dado plenos poderes para matar e torturar em nome do socialismo? Resta pouco espaço para o governo. A tendência é que a presidente fale apenas a portas fechadas para plateias seletas por medo de tomar mais uma panelada. Com a economia em frangalhos, fica difícil para a presidente enterrar o petrolão em consumo, como seu antecessor o fez durante o escândalo do mensalão. Quando as pessoas estão felizes comprando é fácil fazer vista grossa à corrupção. Quando o bolso esvazia, o saco fica cheio. Dizer que a corrupção da Petrobras nada tem a ver com o partido no poder é piada. A ganância do novo rico (o PT) aqui mostra seus dentes: querendo enriquecer rápido, meteu os pés pelas mãos e com isso sacrificou a imagem de redentor que o partido tinha para grande parte da classe média. Ele ainda detém o controle de parte da população mais pobre (como a Arena no final da ditadura), mas logo perderá esse trunfo. É verdade que ainda muitos professores, estudantes, artistas, jornalistas e intelectuais permanecem sob a esfera de influência da "estrela mentirosa". Mas isso também vai passar na hora em que muitos deles perderem o medo de serem chamados de "reacionários". Reacionário hoje é quem se fecha ao fato de que a história andou e as pessoas já não têm mais medo do PT e da sua turminha. Infelizmente, o governo, diante da história que arromba a porta, parece um grupo de náufragos num barquinho, fugindo da traição que perpetrou, xingando a água, dizendo que as ondas são fascistas e que a tempestade é mal-intencionada. Não, quem discorda hoje do governo federal não é gente "fascista", é gente que viu que o projeto do PT para o Brasil acabou. É gente educada, bem preparada, autônoma e que está de saco cheio do tatibitate do PT. Sem líderes significativos, sem propostas que criem a credibilidade necessária para sair da lama, a melhor coisa que o PT pode fazer é pedir licença e sair de cena. Não acho que haja justificativa (ainda) para o impeachment, e devemos preservar as instituições. Mas a água passa debaixo da ponte. Quatro anos é tempo bastante para se afogar na vergonha. E, aí, a humildade será mesmo essencial, não? Sim, mas o PT é pura empáfia.

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País será testado por turbulências e impasses A hora da grande política Entrevista - André Singer – FOLHA 22mar15

Em respostas por escrito a questões da "Ilustríssima", o cientista político André Singer diz que o PT corre risco de desmoralização e que Dilma Rousseff paga o preço de uma campanha equivocada. Ele considera que surgiu uma nova direita capaz de ir às ruas, mas vê o perfil das manifestações do dia 15 como de centro. Folha - Muitos imaginavam que a presidente Dilma, uma vez reeleita, implementaria uma agenda de governo que aprofundasse opções políticas mais à esquerda. Não foi o que aconteceu. Ela optou por um ministério conservador e aderiu ao programa de ajustes defendido pela oposição. O que aconteceu? André Singer - Dilma Rousseff fez uma escolha de campanha equivocada. Hoje sabemos que o governo já tinha uma avaliação de que precisaria compor com o setor financeiro. Sendo assim, não deveria ter adotado o tom que adotou durante a competição eleitoral. Ainda na chamada pré-campanha, decidiu por destacar o seu passado heroico, com o slogan "coração valente". Depois, a partir da ascensão de Marina Silva, no final de agosto, empunhou um ponto de vista de esquerda e de ataque aos bancos, o qual lhe permitiu em pouco tempo desidratar a candidata do PSB. Por fim, quando o segundo turno ficou apertado, escolheu mostrar o caráter de classe da candidatura Aécio Neves. Vale lembrar, a título de ilustração, que ele foi chamado de "filhinho de papai", para mostrar de que lado estavam os pobres e de que lado estavam os ricos no pleito. A ideia (correta) de que o PSDB faria uma política econômica antipopular foi reiterada à exaustão. Tais opções acabaram por gerar uma falsa expectativa. Quando se olha a política econômica desde meados de 2013, percebe-se que ela já havia entrado em compasso defensivo. Os juros foram aumentados, o controle cambial, arrefecido. Persistiam as desonerações, mas esse era o lado menos avançado do ensaio desenvolvimentista tentado de maneira corajosa por Dilma, diga-se de passagem, entre 2011 e 2012. Na imprensa, circulavam informações, não desmentidas, de que as pressões por um ajuste recessivo haviam chegado ao coração do poder. A demissão de

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Guido Mantega em plena corrida eleitoral, aliás, foi um alerta do que viria pela frente. No entanto, o marketing tem seus efeitos. A maioria das pessoas não acompanha nem tem grande interesse por economia. Prevaleceu o entendimento de que havia compromisso profundo de Dilma com uma plataforma popular contra a opção preferida pelos banqueiros. Aí, não se passam nem sequer 24 horas da proclamação da vitória, e a presidente reeleita começa a buscar alguém do mercado financeiro para gerir a Fazenda. O eleitorado não costuma perdoar tal tipo de virada. Como você avalia as perspectivas no curto e médio prazos? Qual a chance de a presidente recuperar autoridade política e atravessar o deserto? Acredita na hipótese de impeachment ou renúncia? O quadro de curto e médio prazo é muito difícil e não há saída simples. A situação econômica já era ruim, pois houve estagnação em 2014. A presidente prometeu retomar o crescimento e, ao contrário, optou por um ajuste recessivo, o que aumentará o fosso em 2015, pelo menos. Uma coisa seria enfrentar um pouco de inflação, decorrente do aumento da energia, com a perspectiva de mais emprego e renda. Outra coisa é sentir o fantasma do desemprego e queda do salário real rondando por aí. Nessas condições, o mau humor com o governo cresce muito. Além disso, há uma segunda crise em curso, a qual potencializa a primeira. O escândalo da Petrobras tem, ao que parece, dimensão inédita. Os esquemas de financiamento de campanha são velhos e universais, não constituindo triste privilégio nem deste momento nem do Brasil. Isso não justifica nem alivia nada, mas precisa ser registrado. Porém a bola da vez é a Petrobras e o caso rende notícias cada vez mais fortes há um ano. Como este episódio se dá quase em cima das prisões do mensalão, que já foram algo espetacular, cria-se a impressão de que o Brasil está sendo literalmente saqueado. A soma das duas crises -- econômica e de corrupção -- gera uma situação terrível para o governo, até porque uma alimenta a outra. A Petrobras, e toda a cadeia produtiva em torno dela, ocupa um espaço importante no PIB. À medida que é afetada, ajuda a afundar mais a atividade econômica, o que enfraquece a presidente do ponto de vista político. Por outro lado, quando o governo está fraco, os agentes econômicos relutam em investir, com medo de instabilidade. Por fim, embora a presidente não tenha responsabilidade no esquema que existia na Petrobras, o escândalo

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cai no colo do Executivo. Cria-se, então, um círculo vicioso em que a fraqueza política gera mais dificuldade econômica e vice-versa. Como a presidente não tem responsabilidade no caso da Petrobras, não há qualquer base para impeachment e não acredito em renúncia. Então, teremos um período de impasse, turbulento e longo pela frente. É preciso ver com cuidado como os atores vão atuar nele. Chegou a hora da grande política, em que os partidos precisam ser partidos, os estadistas, ser estadistas, e a sociedade vai testar o próprio grau de maturidade. Como você avalia o papel do PMDB hoje, que parece com apetite para lançar candidato e assumir diretamente o poder? O partido poderia ocupar o lugar do PSDB em oposição ao PT ou se tornar uma espécie de terceira via conservadora? Por vias estranhas, mas bem brasileiras, o PMDB vem ocupando o lugar de partido de centro. Em geral, o partido centrista costuma ter grande apelo eleitoral, pois a maioria dos votantes, em condições normais, converge para o centro. Mas no Brasil, o PMDB tem sido um centro, desde 1989, eleitoralmente fraco, tanto é que desistiu de lançar candidatos à Presidência, e não creio que venha a fazê-lo, a menos que a situação mude muito em razão da crise. Como o PMDB tem espaço parlamentar, funciona como fiel da balança entre o PT e o PSDB no presidencialismo de coalizão. Nos últimos 20 anos, o partido se acomodou bem nessa posição. Embora tenha uma composição heterogênea, com políticos que vão da esquerda à direita, na prática funciona como moderador tanto das propostas do PT quanto do PSDB, o que é típico do centro. À medida que a crise tende a equilibrar os dois principais partidos, pois o PT caiu um pouco e o PSDB subiu um pouco, a força relativa do PMDB -- como fiel da balança -- cresceu. Não por acaso, o vice-presidente é do PMDB e tende a ter um protagonismo maior durante a crise. Apesar disso, não me parece que o PMDB tenha um projeto próprio nem que venha a ser o principal partido do campo conservador, no qual o PSDB está muito bem estabelecido. Não se deve esquecer que o PMDB está muito envolvido nas denúncias da Lava a Jato, o que dificulta o desenvolvimento de uma alternativa autônoma. O melhor que pode acontecer é o PMDB ter um papel positivo na busca de uma saída para a crise. Não adianta sonhar com partidos ideais. É preciso que funcionem os que existem. Há uma nova direita? Com que perfil? Você diria que o PT de certa forma reinventou a direita no Brasil? Existe, sim, uma nova direita, mas que, em alguns aspectos, é bem velha. Em outros, não.

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Vamos por partes. Em primeiro lugar, apareceram no cenário jovens de direita, o que há muito não existia. Desde os anos 1960, a juventude no Brasil inclinava-se à esquerda. Agora há uma divisão. Os sinais da novidade já estão no ar há uns dez anos, mas de repente virou uma massa capaz de ir para a rua, embora, na minha opinião, a maioria dos manifestantes do 15 de março devam ser de centro, e não de direita. Não foi o PT que reinventou a direita. Em parte, ela surgiu como reação às políticas do lulismo, que a direita detesta com todas as suas forças. Isso não é novo, já aconteceu no antigetulismo. A classe média tradicional mostrou que tem horror à ascensão social dos pobres. É um fenômeno sociológico e político. Chega a ser uma rejeição ao próprio povo brasileiro. Mas há também a lenta, porém contínua, penetração de valores neoliberais, o que, por sua vez, é um fenômeno internacional. Há uma hegemonia neoliberal no mundo que já dura mais de 30 anos. Isso explica o aparecimento de grupos de liberais extremados no Brasil, o que antes era visto como exótico. Tanto uma coisa quanto a outra -- antilulismo e liberalismo radical -- tendem a se concentrar em São Paulo, onde o capitalismo entra mais fundo, a globalização está mais presente e a classe média é maior. O PT nasceu também como promessa de mudança na cultura política. Com o tempo repetiu os mesmos vícios dos demais partidos e envolveu-se naquilo que o Lula costumava chamar de "maracutaias". Como o PT pode recuperar sua autoridade moral? De fato, o PT surgiu como um partido diferente dos outros e durante muitos anos foi coerente com essa diferença. Foi isso que lhe deu o impulso vital para crescer e chegar onde está. Ocorre que, a certa altura, o partido decidiu assumir uma série de compromissos que não estavam no programa original. A partir de 2002 surge o que eu chamo de "segunda alma", que orienta o PT desde então. Ao mesmo tempo, o partido conseguiu governar o Brasil por 12 anos, o que não é pouca coisa, mas foi perdendo energia moral. Agora chegou à grande encruzilhada. O escândalo da Petrobras, sobreposto e potencializando o do mensalão, representa um desafio maior para o partido, que corre o risco de completa desmoralização. Sempre convém lembrar que o governo passa, e o partido fica, e que o PT é uma instituição importante não só para os petistas mas para a democracia brasileira. A direita e parcelas da mídia estão aproveitando a situação para demonizar o PT, o que é um desserviço democrático. Todo aquele que cometeu crimes deve ser

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responsabilizado por eles, mas a direita democrática deveria entender que é fundamental existir no país um partido popular competitivo e capaz de governar. Uma coisa são as pessoas, outra, a instituição. Do seu próprio ponto de vista, para recuperar a autoridade moral, o partido precisaria tomar medidas duras de autorrevisão. Por exemplo, afastar de imediato todos os investigados, até que terminem os inquéritos. Teria que se colocar à frente do processo, em lugar de permanecer em uma postura defensiva que o está sangrando dia a dia, com reflexos de longo prazo. É necessário mudar rápido. Como você avalia as manifestações do último fim de semana? Foram manifestações grandes, particularmente em São Paulo, com um tom que me pareceu de protesto, porém, de certa maneira, moderado. Há grupos extremistas que pedem golpe militar, mas são pequenos. Mesmo o impeachment não parece ser o núcleo das manifestações, e sim a corrupção. Uma coisa que chama a atenção é o fato de que não existe propriamente uma reivindicação. O 15 de março foi mais um modo de extravasar o descontentamento, sem uma palavra de ordem clara. Nesse sentido, é um movimento que ainda não tem uma direção definida, como se fosse uma energia que flutua sem saber direito para onde ir. Se eu estiver certo, ela pode adotar diversas direções, a depender de quem a empolgue. O governo deveria utilizar essa indefinição para repactuar logo, com as diversas forças em cena, inclusive as que saíram às ruas no dia 13 de março, um modo de gerir a crise, cujo agravamento não interessa a ninguém, a não ser a quem aposte no quanto pior melhor.

Dilma, a direita perplexa e a esquerda indignada

Eleita pedalando um rosário de inverdades, Dilma busca

desesperadamente agradar os que queriam sua derrota e acaba por

desagradar quem possibilitou sua reeleição

por Gilberto Maringoni — publicado 23/12/2014 20:54

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ihttp://www.cartacapital.com.br/politica/dilma-a-direita-perplexa-e-a-

esquerda-indignada-

1211.html?fb_action_ids=10154979838235534&fb_action_types=og

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Roberto Stuckert Filho / PR

Dilma em 6 de dezembro, durante apresentação de oficiais-

generais promovidos nas Forças Armadas. O novo governo

deixa a esquerda indignada

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Não há golpe no método; o golpe no mérito está em marcha

Maldito bolivariano!

A reforma política é hoje uma saída real?

Por mais que examine, não consigo encontrar na história do Brasil o

caso de um governo recém-eleito suscitar um clima de fim de feira

na sociedade. Ao contrário. Uma nova gestão desperta sempre um

rosário de esperanças. Pode ser ilusório, mas tem sido quase uma

regra.

Há poucas expectativas positivas para o Brasil de 2015. O próprio

palácio do Planalto parece incentivar tais visões, para justificar a

adoção de medidas duras e impopulares.

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A impressão geral é que vão começar os últimos quatro anos de

uma administração que conseguiu a proeza de queimar parcela

significativa de seu capital político – obtido em uma campanha

acirrada e politizada – em dois meses.

O segundo mandato de FHC provocou sensação semelhante, no

início de 1999. Mas isso se deu após a posse. Como os mais velhos

se lembram, em janeiro daquele ano, o real, cotado em US$ 1,20 e

mantido artificialmente valorizado para possibilitar a vitória tucana,

chegou a US$ 3,20, em meio a uma aguda crise cambial.

Dilma, por sua vez, pouco sensível a diversos matizes da esquerda

que possibilitaram sua vitória, apressou-se, três dias após o

segundo turno, em emitir um sinal para o mercado financeiro. A

materialização se deu através de uma elevação de 0,25% na taxa

básica de juros. Um mês e meio depois, a diretriz foi reafirmada

com nova escalada de 0,5%.

O mantra da credibilidade

A partir da vitória, a fieira de acontecimentos é mais do que

conhecida. Em busca de um mantra apelidado de “credibilidade”, a

presidente chamou um executivo do mercado financeiro para a

Fazenda, a líder do agronegócio – suspeita de valer-se de trabalho

escravo – para a Agricultura, um industrial acusado de

superexplorar trabalhadores para o Desenvolvimento e um folclórico

ex-governador para a vice-presidência do Banco do Brasil. Outro

ex-mandatário estadual – que entrou na Justiça contra o piso

salarial dos professores – pode ir para a Educação.

No meio disso, promessas de ajuste fiscal duro, contração nas

contas públicas, continuidade na política altista dos juros e a

disseminação das dificuldades para o próximo ano.

Nada disso foi dito durante a campanha. Ao contrário.

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Ao longo da disputa, as baterias oficiais partiram para o confronto

com Marina Silva. A postulante do PSB planejava a independência

do Banco Central. Foi acusada de querer tirar a comida da mesa

dos brasileiros. Em seguida, a presidente tuitou que os tucanos

plantavam dificuldades para colher juros altos. Denunciou Armínio

Fraga, por este difundir o plano de reduzir repasses do tesouro para

bancos públicos.

Desenvolvimentismo eleitoral

Pessoas podem mudar de opinião, de acordo com as

transformações de seu entorno. Nada demais aí.

Mas mudanças bruscas, em se tratando de figuras públicas,

confundem e tendem a revoltar setores importantes da sociedade.

Marina e Aécio foram derrotados por explicitar o que fariam. Marina

foi massacrada por suas ligações com uma herdeira minoritária do

Banco Itaú.

Dilma está fazendo exatamente o que acusou seus oponentes de

perpetrar, caso fossem eleitos.

Ou seja, se os dois candidatos à direita pecaram por sinceridade,

Dilma chegou lá pedalando um rosário de inverdades.

Algo como Collor de Mello que, na campanha de 1989, acusou Lula

de querer confiscar a poupança dos brasileiros. Em palácio,

apressou-se em baixar exatamente esta medida.

Conduta deseducativa

Com tal comportamento, Dilma e o PT prestam um desserviço à

democracia.

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Uma das indicações das manifestações de junho de 2013 foi a

perda de legitimidade da institucionalidade. Políticos são

vulgarmente conhecidos por dizerem uma coisa e agirem de

maneira diversa. A candidata eleita está cumprindo o figurino à

risca.

O sentimento antipolítica que tomou conta das ruas abriu espaço,

um ano e meio depois, para os que desejam uma solução de força

ou uma amalucada intervenção militar para dar jeito no país.

Falar uma coisa em campanha e fazer outra no poder não ajuda

muito a aprimorar nossos costumes políticos.

Conquistas reais

Não vale a pena cair na argumentação rasa de que tudo isso seria

necessário para preservar 12 anos de conquistas sociais.

Várias das conquistas – que são reais – poderiam ser preservadas

se fossem constitucionalizadas. Bolsa Família e outros programas

poderiam ter se tornado uma Consolidação das Leis Sociais, algo

aventado em 2008, a exemplo da Consolidação das Leis do

Trabalho, aprovadas por Getulio Vargas, em 1943.

Problema de origem

Há um problema de origem na nova gestão.

Não se trata do fato de Dilma ter obtido sua vitória com menos de

três pontos percentuais de vantagem.

Mesmo que tivesse ganhado por um voto, estaria legitimamente

eleita. Jogo democrático é assim. Leva quem tem mais sufrágios.

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Seu vício de origem é que parte significativa de sua base social, o

proletariado urbano, se dividiu. Metade votou nela e metade em

Aécio.

A tarefa de qualquer líder com um pouco de política na cabeça seria

recompor sua base. Anunciar ações de impacto para atrair de volta

os que se afastaram.

Dilma faz o contrário. Já que falamos do senador alagoano,

voltemos ao personagem. Ela parece ter adotado um dos slogans

de Collor, com sinal trocado. O ex-presidente dizia em 1989 que

deixaria a direita indignada e a esquerda perplexa. A mandatária

deixa a esquerda indignada e a direita perplexa.

Economia desarranjada

Durante a campanha, a mídia, o capital financeiro e a direita em

geral – parte dela dentro da coalizão governista – alardearam que o

país estaria a beira do caos no terreno econômico. Que as contas

estariam desarranjadas, que a inflação estaria fora de controle e

que não conseguiríamos fechar o ano.

Por trás de tudo estaria um insondável intervencionismo da

presidente na economia.

O PT parece ter comprado esse peixe.

Afinal, o que há de tão errado na economia brasileira?

A inflação ficou o ano todo dentro da meta. Em nenhum mês saiu

do controle:

A dívida bruta do setor público está em 60% do PIB. A líquida, em

36%.

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O desemprego está em 5%, uma situação de virtual pleno emprego.

Cadê o desarranjo?

Isso não quer dizer que não existam problemas. O ponto é que a

economia não cresce. Não crescemos e a indústria perde fôlego e

espaço relativo na composição do PIB. Mas não é o problema em

si. É a materialização de outras disfunções sérias.

PIB medíocre

Nosso câmbio segue sobrevalorizado – o que provoca déficits

crescentes na balança comercial – e o preço do dinheiro é muito

alto. Por trás de tudo está uma taxa de juros inacreditável.

Os juros são nosso principal problema. Graças às taxas mais altas

do mundo, o câmbio se sobrevaloriza, nossos produtos perdem

competitividade, a balança comercial torna-se deficitária, o custo de

nossa dívida pública atinge a estratosfera e há um contínuo dreno

de recursos públicos para bolsos privados. Se nossa dívida é baixa

(estoque), seu financiamento não é (fluxo). O problema dos débitos

está nos juros.

Essa situação estrangula a economia. E o problema a ser atacado é

justamente aquele que o governo quer incentivar: a alta dos juros.

Sem baixar significativamente as taxas – e isso implica enfrentar

interesses poderosos – tudo o mais será perfumaria.

Agrados e desagrados

Dilma busca desesperadamente agradar os que queriam sua

derrota e acaba por desagradar os que possibilitaram sua reeleição.

Pode ser algo pouco perceptível agora, mas isso tende a alargar

seu pecado original, a divisão da base. Tende a levar ao desalento

os que foram às ruas nos últimos dez dias de campanha e

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acreditaram na possibilidade de o governo ir um pouco à esquerda.

Nada a ver com revolução, mas com uma pitada de

desenvolvimentismo.

A combinação desses fatores pode também gerar turbulências e

instabilidades em um governo que não tem aliados confiáveis, que

se vê às voltas com um megaescândalo de corrupção e que

enfrenta uma oposição cuja sanha golpista fica cada dia mais clara.

Não contente com os problemas da conjuntura, Dilma resolve criar

novos a cada semana.

Talvez ela saiba o que faz.

Este limitado redator não entendeu nada.

*Gilberto Maringoni é professor de Relações Internacionais da

UFABC. Foi candidato do PSOL ao governo de São Paulo, em 2014

Atestado de óbito do PT, do PP e de outros

Postado por Juremir Machado = CPOVO – POA em 24 de março de

2015 -

http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=7045

O PT acabou. Surgiu como uma utopia no final da ditadura militar. Quando o muro de Berlim caiu, levando com ele o socialismo totalitário do leste europeu, o PT continuou sendo, para os seus militantes, um sonho de socialismo democrático ou até mesmo de volta dos regimes populares autoritários. No surgimento do PT, eu tinha 18 anos e estava mais interessado no anarquismo e nas minhas colegas de faculdade. Quando o muro desabou, eu estava ainda mais interessado no anarquismo e em encontrar um jeito de conhecer Berlim, o que aconteceu com uma bolsa do Instituto Goethe. Tive muitas brigas com petistas, que ajudaram a pedir e conseguir minha cabeça uma vez. O meu horror ao stalinismo me

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fez desconfiar do PT durante muito anos. O mensalão só me fez ficar com o pé ainda mais atrás. Fui a primeiro a escrever Lulla. Aí percebi que estava jogando para a direita.

O bolsa-família, as cotas e O ProUni, entre outras iniciativas de inclusão da plebe, especialmente a não branca, ganharam o meu aplauso. Veio o petrolão. A lógica petista é algo como “roubamos como todos, mas fazemos algo pelos menos favorecidos”. Jamais a legitimei. Hoje, o PT está reduzido ao “apesar de”. Diante da falência ética do partido e do enterro de todos os seus ideais, com senadores históricos debandando – Marta Suplicy vai para o PSB e Paulo Paim ainda não se decidiu –, só resta ao petismo dizer que apesar de tudo fez mais do que todos pelos que tem menos. A teoria do “apesar de” é um atestado de óbito, uma confissão de culpa, um recibo passado a todos. O PT já era. Pode sobreviver como um simulacro, uma sombra, um fantasma, um rastro do que foi, mas nunca como o original.

Para se reerguer, terá de romper com a teoria do “apesar de”, inventar um ritual de refundação, talvez até mudando de nome para algo como PTR – Partidos dos Trabalhadores Refundado –, e romper com a mitologia que faz de José Dirceu e outros heróis sacrificados pela justiça e pelo aparato repressivo burgueses em luta pela causa proletária. A teoria do “apesar de” é complementada com a tese do “não tem outro jeito”: para ocupar o poder e transferir um pouco de renda para os mais pobre seria preciso jogar o jogo, dançar conforme a música, aceitar as regras da política. O PT achava que era mais esperto do que a raposa. Pode continuar no poder por mais algum tempo e até tentar trazer Lula de volta, mas nunca mais será o mesmo, salvo se aceitar ser outro e começar tudo de novo jogando ao mar a sua parte podre. Só a ruptura pode reinventá-lo. É racha ou implode.

O que diz o petismo para se defender: que para chegar o poder é preciso muito dinheiro. De onde tirá-lo se o financiamento das campanhas é privado e empresas não gastam se não for para ter retorno? Como ter maioria para governar sem fazer coalizões esdrúxulas e pagas? O atestado de óbito do PT é também o registro em cartório da morte das ilusões na política limpa. Fica assim: empresas podem até pagar a conta de partidos conservadores para que conservem seus interesses, mas quem pagaria a conta de um campanha contra esses interesses? O “apesar de” tentar voltar pela porta dos fundos. Deu.

Mas o PT não morre sozinho.

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Leva o PP com ele. O atestado de óbito do PP foi lavrado pelo deputado gaúcho Jerônimo Goergen. Depois de aparecer na lista Janot, Goergen declarou o fim do PP. Ex-partido da ditadura, o PP acostumou-se a viver como assombração. Nunca se importou em jogar Maluf ao mar. Saberá continuar como resquício de si mesmo. Se precisar, troca mais uma vez de nome.

Pela troca de nomes os mortos conquistam a vida eterna.

A senadora gaúcha Ana Amélia Lemos já pensa em sair do PP. O ar ficou insuportável.

O PSDB já nasceu morto-vivo. Nega a mulher de César: acha que pode ser honesto sem parecer.

A política brasileira é um enorme cemitério de partidos.

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Afundação e refundação do PT

http://iejorgehori.blogspot.com.br/

Jorge Hori - sábado, 28 de março de 2015

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O PT foi fundado como um partido popular, voltado para os "mais

necessitados" a partir de uma base de operários com carteira,

buscando maior independência sindical contrapondo-se ao

"peleguismo" promovido pelo Governo Federal.

Com a iniciativa de um grupo de lideranças sindicais de São Paulo

obteve o apoio de intelectuais, de segmentos da igreja católica,

além de dissidentes dos tradicionais partidos de esquerda e

sobreviventes da luta armada, ocupando um espaço vazio, dado o

sectarismo dos tradicionais partidos de esquerda.

O PT foi conquistando espaços políticos via eleitoral, liderados pela

sua principal figura, o carismático Luis Inácio Lula da Silva. Depois

de eleito deputado constituinte, sem uma atuação significativa a

menos da explosiva declaração de que a Câmara tinha "300

picaretas", concorreu por quatro vezes à Presidencia, sendo

derrotado em três delas.

Enquanto isso o PT foi conquistando espaços em Prefeituras e em

legislativos, com base numa proposta de estar voltado para as

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classes mais desfavorecidas: conquistando corações e mentes de

muitos eleitores. Mas insuficientes para eleger o Presidente, com

base nas suas propostas de ética e prioridade para os pobres.

Para viabilizar o seu projeto de poder mudou de rumos e, mesmo

sem abandonar o seu discurso popular passou a fazer acordos com

os "picaretas" do Congresso, mediante promessas de cargos,

verbas e recursos não contabilizados para financiar as campanhas.

Para formar os caixas, começou a adotar os mesmos mecanismos

dos demais partidos para captar recursos não contabilizados,

principalmente através dos contratos com as empresas de ônibus

urbanos.

Com um grande volume de recursos financeiros, para fazer frente

aos concorrentes, o PT venceu as eleições em 2002 e deu

continuidade aos esquemas de garantir do apoio de base dos

"picaretas" mediante mensalidades. Esse esquema veio a ser

descoberto, foi caracterizado como "mensalão" e derrubou os

principais líderes do PT, deixando impune só o seu principal líder:

Lula.

Essa "refundação" do PT levou a muitos petistas tradicionais a

deixarem o partido, que acabou limitado aos seus filiados e

militantes que apoiam os objetivos de atender mais à população

pobre e relevam as práticas heterodoxas, porque "todo mundo faz".

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Na eleição de 2014, muitos desses defectores voltaram a se reunir

em torno da candidata do PT, Dilma Rousseff, para derrotar o seu

principal adversário, o pesedebista Aécio Neves, que ameaçava

expressamente adotar as politicas ortodoxas baseadas na matriz

econômica monetarista, considerada pelo PT, como néo-liberal e

antipopular afetando a renda, os direitos dos trabalhadores e

apenas uma nova denominação do repudiado "Consenso de

Washington".

Apesar da vitória no Executivo, o PT não conseguiu uma vitória

consagradora no legislativo, ficando atrás do PMDB e dependendo

desse para a aprovação de medidas no Congresso.

Com o fracasso da chamada "nova matriz econômica" deixando um

legado de muitas dívidas e das contas públicas "estouradas" Dilma

mudou ou rumos, adotou a política econômica ortodoxa, tirando a

escada do PT.

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O PT está numa complexa encruzilhada. As suas bandeiras estão

comprometidas. A Presidente, eleita pelo PT, integrante do partido,

representando-a no poder, adotou um ajuste fiscal ortodoxo, com

profundos cortes nas despesas públicas, afetando - embora

desmentido formalmente - o atendimento prioritário da população e

mais ainda os de baixa renda,

Depois do mensalão o comprometimento do partido com o

"petrolão" tornou rota a sua bandeira de ética e combate à

corrupção. Essa é hoje a principal bandeira programática defendida

pela classe média nas ruas. Fora Dilma, Impeachment ou até

Intervenção Militar são reivindicações instrumentais para mudar o

Governo. E os movimentos de rua não aceitam mais o PT como

defensor dessa bandeira.

Sem lideranças fortes, exceto a presença de Lula, com uma direção

burocrática, sofrendo defecções de quadros, sem a bandeira da

ética, sem uma política econômica alternativa, o PT precisa se

reinventar, mudar, refundar, para não morrer de inanição eleitoral.

As proposições de se voltar prioritariamente para os que mais

necessitam, ou os mais pobres poderão não ser suficientes. O PT

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precisará inventar novas mensagens ou novos programas. A

condição principal é de credibiliadade.

A segunda refundação do PT

Demetrio Magnoli - 3/2/2003

A Internacional de Lula -2003

http://www.clubemundo.com.br/pages/revistapangea/show_news.asp?n=176&ed=1

Está em curso uma articulação para que o PT se torne membro efetivo da Internacional Socialista, da qual é observador, e para que Lula assuma a presidência da organização. O suíço Jean Ziegler, do Conselho Executivo da Internacional, explicou o sentido da articulação: “A esquerda na Europa não tem projetos claros, está totalmente desorganizada. Chirac é de direita, e Schröder se rendeu ao neoliberalismo”. Em Porto Alegre, durante o Fórum Social Mundial, o ex-presidente português Mário Soares, um dos ícones social-democratas, não deixou por menos: “A grande mudança no mundo, nos últimos tempos, foi a eleição do presidente Lula”. A Internacional Socialista foi reinventada por duas vezes. A primeira reinvenção ocorreu no início da Primeira Guerra Mundial (1914-18), quando a maioria da direção optou por uma linha de colaboração entre os partidos socialistas e os governos nacionais, suspendendo a agitação revolucionária. Com esse ato, completava-se o percurso de renúncia da Internacional à idéia de revolução e a integração dos social-democratas às democracias parlamentares. Em 1915, o revolucionário russo Lenin taxou os social-democratas de “reformistas” e “revisionistas”, anunciou a “falência da Internacional” e conclamou os revolucionários a se reunirem numa Internacional comunista. A segunda reinvenção ocorreu na década de 70, quando os partidos social-democratas europeus extirparam de seus programas as referências ao marxismo e proclamaram a sua adesão à economia de mercado. No quadro da Guerra Fria, a Internacional Socialista escolhia claramente o lado do

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Ocidente e procurava distinguir-se dos conservadores pelas propostas de edificação de um Estado de Bem-Estar Social. O alemão Willy Brandt, o francês François Miterrand, o sueco Olof Palme e o espanhol Felipe Gonzalez lideraram o “socialismo cor-de-rosa”, que conheceu a sua época de ouro. Mas a globalização contaminou os social-democratas, dissolvendo aos poucos a fronteira política que os separava dos conservadores. Na França e na Espanha, os governos social-democratas dilapidaram seu apoio popular empreendendo as reformas liberais que os conservadores não conseguiam realizar. Na Grã-Bretanha, Tony Blair virou de cabeça para baixo o venerável Partido Trabalhista, encampando teses ultraliberais, soldando uma aliança preferencial com os Estados Unidos e reunindo a direita socialista em torno da bandeira da Terceira Via. O desastre eleitoral de Lionel Jospin, na França, encerrou melancolicamente o ciclo do “socialismo cor-de-rosa”. A condução de Lula à presidência da Internacional materializa o projeto de uma terceira reinvenção da organização. A direção social-democrata mundial, carente de horizonte histórico e encurralada pela geopolítica de Bush, procura desesperadamente insuflar vida nova na Internacional Socialista. O projeto não se alicerça num novo programa, mas na canibalização do significado histórico da vitória do PT no Brasil. Do ponto de vista de Lula, a presidência da Internacional é uma oferta tentadora. No plano das instituições internacionais, serve para rodear o seu governo de um arco de apoios poderosos. No plano interno, pode funcionar como alavanca para uma refundação do PT, com a exclusão das correntes de esquerda que não se alinham às diretrizes do governo. Se a operação chegar ao seu desenlace, terá sido construída, de fato, a ponte entre Davos e Porto Alegre. Demétrio Magnoli é doutor em Geografia Humana pela USP.

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Lula, a missão

Merval Pereira – terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

http://gilvanmelo.blogspot.com.br/2015/02/merval-pereira-lula-

missao.html

- O Globo

Em recente conversa, o ex-presidente Lula disse a um interlocutor o

seguinte: "Vamos ter que passar dois anos comendo merda, para

depois tentar sair da crise. Mas nesse período tem que fazer

política, e a Dilma não faz".

Confirmado o diagnóstico com a recente pesquisa Datafolha

mostrando a popularidade da presidente Dilma no chão, Lula

resolveu trazer para si a tarefa de "fazer política" , e a primeira

providência foi liberar a informação de que, sim, será candidato a

presidente da República em 2018. Menos de dois meses do

segundo mandato de Dilma, e a candidatura de Lula já está na rua

para alimentar os militantes com uma expectativa de poder que a

cada dia fica mais escassa diante das diversas crises que envolvem

o governo , da economia à política. Lula em campanha, viajando

pelo país revivendo a Caravana da Cidadania dos velhos tempos , é

uma barre ir a política formidável a movimentos de

descontentamento na sociedade e a manobras políticas que

possam levar ao impeachment da presidente Dilma.

Com o decorrer do processo , veremos se a insatisfação popular

crescerá a ponto de in viabilizar a campanha de rua de Lula ou se

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ele ter á força suficiente para neutralizar as previsíveis

manifestações contrárias ao governo , nesses dois anos em que os

governistas terão que "comer merda ". Assim como fez no

mensalão, Lula começa sua campanha sobre o petrolão pregando

"humildade e coragem " no discurso em Belo Horizonte no

aniversário de 35 anos do PT . E, assim como em 2005, ele fala em

re construir o partido , voltar às suas origens . Na célebre reunião

na Granja do Torto em que ele se disse "traído", Lula lembrou a

fundação do PT em 1980: "(...) no início da re democratização

decidi criar um partido novo que viesse para mudar as práticas

políticas , moralizá-las e tornar cada vez mais limpa a disputa

eleitoral no nosso país. (...) Quero dizer a vocês , com toda a

franqueza , eu me sinto traído.

Traído por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento .

Estou indignado pelas revelações que aparecem a cada dia, e que

chocam o país. (...) eu não tenho nenhuma vergonha de dizer ao

povo brasileiro que nós temos que pedir desculpas ". Pois bem. Em

2015, Lula assume a mesma postura diante do petrolão: "Temos a

oportunidade histórica de elaborar um novo Manifesto do PT , capaz

de traduzir nossos compromissos para os dias de hoje e para os

próximos 35 anos ".

Ele propôs "o desafio " de resgatar os ideais dos anos de fundação

do partido , em 1980. "O Partido dos Trabalhadores surge da

necessidade sentida por milhões de brasileiros de intervir na vida

social e política do país para transformá-la . (...) O PT nasceu para

mudar". Mais uma vez Lula falou em traição: "Se alguém tiver traído

a nossa confiança, que seja julgado e punido , dentro da lei, porque

o PT , ao contrário dos nossos adversários , não compactua com a

impunidade ". Para Lula , o problema do PT é que ele "se tornou um

partido igual aos outros. Deixou de ser um partido das bases para

se tornar um partido de gabinetes . Há muito mais preocupação em

vencer eleições , em manter e re produzir mandatos, do que em

vitalizar o partido ". Lula citou a "militância paga" , sempre criticado

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pelo PT na "política tradicional". "(...) É nesse ambiente que alguns,

individualmente , cometem desvios que nos envergonham diante da

sociedade e perante a história do PT . (...) Penso que esse

processo chegou ao limite no PT", decretou Lula .

Estaria tudo certo se, a partir do mensalão, Lula tivesse comandado

uma refundação do PT, e o partido mudasse de atitudes. Como se

vê agora no petrolão, enquanto Lula discursava quase chorando no

mensalão, estava em curso um escândalo muito maior dentro da

Petrobras, e sabe-se lá onde mais. No intervalo entre o julgamento

do mensalão, com a condenação das principais lideranças petistas,

e o surgimento do petrolão , Lula mudou o discurso e chegou a

afirmar que o mensalão nunca existir a. Prometeu até mesmo se

dedicar a demonstrar ao povo brasileiro que tudo não passou de

uma farsa , coisa que nunca fez. Agora, ele encurtou o caminho: ao

mesmo tempo em que fala em reencontrar as raízes fundador as do

PT , Lula sugere que o caso do petrolão está sendo utilizado

politicamente para criminalizar seu partido . Essa atitude dúbia faz

parte do seu show, com o qual pretende neutralizar os efeitos das

crises política e econômica que envolvem o segundo mandato de

Dilma

“Assistimos ao começo do fim. O PT tende a virar um arremedo

do PMDB”

segunda-feira, 30 de março de 2015

Frei Betto -

• Ícone do PT , Frei Betto diz que a única saída para o partido

que governa o País há 12 anos é voltar às origens e buscar a

governabilidade com os movimentos sociais.

Thais Arbex – O Estado de S. Paulo

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Um mês depois de ser reeleita, a presidente Dilma Rousseff

recebeu Frei Betto e o Grupo Emaús, da Teologia da Libertação, no

Palácio do Planalto. Durante uma hora e vinte minutos, também na

presença do chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, ouviu uma

série de críticas e sugestões para que o governo continuasse

“implementando o projeto que tanto beneficia a sociedade brasileira,

principalmente os mais vulneráveis”.

A conversa, de acordo com ele, foi ótima. “Só que, de repente, vem

o Joaquim Levy com um ajuste fiscal penalizando, sobretudo, os

mais pobres. Quem assistiu ao filme Adeus, Lenin! pode fazer o

seguinte paralelo: se um cidadão brasileiro, disposto a votar na

reeleição da Dilma, tivesse entrado em agonia no início de agosto

de 2014 e despertasse agora, neste mês de março, no hospital e

visse o noticiário, certamente estaria convencido de que o Aécio

havia vencido a eleição”.

Frei Betto – que, com as comunidades eclesiais de base, ajudou a

fundar o PT e, como assessor especial do ex-presidente Lula,

coordenou o programa Fome Zero – diz que o que falta ao governo,

desde 2003, é “planejamento estratégico”. Segundo ele, que é

amigo do ex-presidente Lula há mais de 30 anos e conhece a

presidente Dilma desde a infância – “somos da mesma rua em Belo

Horizonte” –, em doze anos de governo, o PT não conseguiu tirar

do papel nenhuma reforma de estrutura prometida em seus

documentos originais e, ao chegar ao governo, “trocou um projeto

de Brasil por um projeto de poder, escanteou os movimentos

sociais” e ficou “refém desse Congresso, dependendo de alianças

espúrias”.

“Agora, seu grande aliado, o PMDB, se rebela e cria – com o

perdão da expressão – uma cunha renana para asfixiar o Poder

Executivo”.

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Qual a saída? “O PT ser fiel às suas origens. Buscar a

governabilidade pelo estreitamento de seus vínculos com os

movimentos sociais. Fora disso, tenho a impressão de que estamos

começando a assistir ao começo do fim. Pode até perdurar, mas o

PT tende a virar um arremedo do PMDB”, sentencia ele, que é autor

de 60 livros, entre eles A Mosca Azul (“uma reflexão sobre a história

do poder e a história do PT no poder”) eCalendário do Poder (“um

diário do Planalto”), ambos editados pela Rocco.

A seguir, os principais trechos da conversa com Frei Betto, que

recebeu a coluna no Convento Santo Alberto Magno, no bairro

de Perdizes, onde mora.

Como o senhor avalia o atual momento do País?

O Brasil está vivendo um momento de crise política e econômica.

Prevejo quatro anos de governo Dilma com muita turbulência,

manifestações, greves, impasses. E me pergunto se, em 2018, o

PMDB apoiará o candidato do PT. Como bom mineiro, desconfio

que não e não me surpreenderei se o PMDB lançar um candidato

próprio, com apoio do PSB e outros pequenos partidos. A questão é

que tivemos 12 anos de governo do PT que, na minha avaliação,

apesar de todos os pesares – e põe pesares nisso –, foram os

melhores da nossa história republicana, sobretudo no quesito

social. Efetivamente, 36 milhões de pessoas deixaram a miséria.

Hoje, os aeroportos deixaram de ser um espaço elitista. Se vamos

em um barraco de favela, lá dentro tem TV a cores, micro-ondas,

máquina de lavar, fogão, geladeira, telefones celulares, talvez um

computador e, possivelmente, no pé do morro, um carrinho que está

sendo comprado em 60, 90 prestações mensais. Porém, essa

família continua no barraco, sem saneamento, em um emprego

precário, sem acesso a saúde, educação, transporte público e

segurança de qualidade. O governo facilitou o acesso dos

brasileiros aos bens pessoais, mas não aos bens sociais.

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O que faltou?

Não tivemos, em doze anos, nenhuma reforma de estrutura,

nenhuma daquelas prometidas nos documentos originais do PT.

Nem a agrária, nem a tributária, nem a política. E aí poderíamos

acrescentar nem a da educação, nem a urbana. Em suma, o que

falta ao governo – e desde 2003 – é planejamento estratégico.

Como assim?

Governa-se na base dos efeitos pontuais, da administração de

crises ocasionais, porque o PT trocou um projeto de Brasil por um

projeto de poder. Permanecer no poder se tornou mais importante

do que fazer o Brasil deslanchar para uma nação justa, livre,

soberana e igualitária. Como é que um governo que pretende

desenvolver a nação brasileira cria um ministério que eu qualifico de

coral desafinado? O que tem a ver Joaquim Levy com Miguel

Rossetto? Kátia Abreu com Patrus Ananias? José Eduardo Cardozo

com George Hilton?

Em artigo publicado pouco antes das eleições, o senhor listou

13 razões para votar na Dilma. Agora, escreveu novo artigo, A

Farra Acabou, com críticas ao governo. O que mudou?

O que mudou é que, infelizmente, aquelas 13 razões não foram

abraçadas no segundo mandato de Dilma. A presidente montou um

ministério esdrúxulo, que não conseguiu nem sequer ter um projeto

de Brasil minimamente emancipatório, como era o Fome Zero.

Aliás, o próprio governo que o criou o matou, substituindo-o por um

programa compensatório chamado Bolsa Família – que é bom, mas

não tem caráter emancipatório. Todo o governo opera agora em

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função de um detalhe, não de um projeto histórico, que é o ajuste

fiscal. E penalizando os mais pobres, não o capital. Todas as bases

desse ajuste estão em cima da redução do seguro-desemprego, do

abono salarial, do imposto sobre o consumo. E nada em termos das

grandes heranças, dos royalties que saem do País, das grandes

transferências de dinheiro, dos brasileiros que têm dinheiro nos

paraísos fiscais. A conta vai ser paga por aqueles que já lutam com

dificuldade.

O senhor quer dizer que estamos em um caminho sem volta?

O grave do governo do PT – tendo sido construído e consolidado

pelos movimentos sociais – foi, ao chegar ao Planalto, ter preferido

assegurar sua governabilidade com o mercado e com o Congresso

e escantear os movimentos sociais. Hoje, eles são tolerados

ou, como no caso da UNE e da CUT, manipulados, invertendo o

seu papel. Com isso, o PT ficou refém desse Congresso,

dependendo de alianças espúrias. Agora, o seu grande aliado, o

PMDB, se rebela, cria – com o perdão da expressão – uma cunha

renana para asfixiar o Executivo. Se alguém me pergunta “qual é a

saída”? É o PT ser fiel às suas origens. Buscar a governabilidade

pelo estreitamento de seus vínculos com os movimentos sociais. Ou

seja, o segmento organizado, consciente e politizado da nação

brasileira. Fora disso, tenho a impressão de que estamos

começando a assistir ao começo do fim. Pode até perdurar, mas o

PT tende a virar um arremedo do PMDB. Creio que cabe hoje, ao

governo, fazer uma autocrítica séria.

Por meio dos movimentos sociais é que seria possível

recuperar a imagem do partido?

Exatamente. O PT precisa sair da posição de bicho acuado em que

se colocou. O partido, até hoje, não declarou se os envolvidos no

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mensalão são inocentes ou culpados; o partido, até hoje, não

declarou se ele, que governa o Brasil e, portanto, a Petrobrás, tem

ou não responsabilidade na devassa que está sendo feita na maior

empresa brasileira. O partido se afastou das bases sociais. Onde

estão os núcleos populares que, nos anos 80, encantavam todas as

pessoas que chegavam na zona leste de São Paulo, em uma

favela, e a dona Maria, orgulhosamente, mostrava um barracão que

era a sede do núcleo do PT? Onde está o trabalho de base, de

formação política? Embora não tenha sido militante do PT, mas

como ajudei a construir o partido por meio do trabalho pastoral, hoje

me pergunto: onde estão os líderes do PT que, aos fins de semana,

voltam para as favelas e periferias? Onde estão os líderes do PT

que não tiveram um assombroso aumento de seu patrimônio

familiar durante esses anos, a ponto de não se sentirem mais à

vontade em uma assembleia de sem-teto, em uma aldeia indígena,

em um fim de semana em um quilombola? Onde estão eles?

Existem. São raros. Não vou citar nomes, mas tenho profundo

respeito por militantes e dirigentes do PT que são muito coerentes

com aquele PT originário. Mas, infelizmente, eles são exceção.

Como disse recentemente a senadora Marta Suplicy, “ou o PT

muda ou acaba”.

É como já disse, o PT tem de mudar no sentido de voltar às suas

origens e às suas bases sociais. Acabar não vai, porque tem tantos

oportunistas que ingressaram no PT como rampa de acesso às

benesses do poder, que o partido tende, inclusive, a inchar de gente

que não tem nada a ver com as suas origens. Dou um exemplo:

curiosamente, coincidindo com o dia em que a presidente entrega à

nação um pacote anticorrupção, no estado do Rio um prefeito é

flagrado na corrupção. O que esse cidadão tem a ver com a história

de um partido que, ao nascer, se afirmou por três capitais: ser o

partido ético na política brasileira, ser o partido dos pobres e ser o

partido que, a longo prazo, construiria uma alternativa ao País, com

uma sociedade socialista? O PT abandonou os três capitais. Esse

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pessoal que não tem a ver com o PT viu que, sendo do partido, o

maná cai do céu. Fico me perguntando quantos outros exemplos

não devem existir por esse Brasil afora?

Poderíamos apontar um culpado por esse rumo diferente que o

partido tomou? O ex-presidente Lula?

Jamais, na minha análise – isso é um princípio – personalizo os

acontecimentos. Porque não acredito que a história humana seja

feita por meio de salvadores da pátria. É feita de movimentos e

processos sociais. É preciso que haja uma luta interna no PT muito

acirrada para que o partido seja minimamente coerente com suas

origens e propostas.

O senhor é a favor do “volta, Lula”? Ele poderia “salvar” o

governo desta atual crise?

Minha avaliação é que Lula só não será candidato à presidência em

2018 se morrer. Fora isso, tenho absoluta segurança de que ele

será candidato. Não foi ele que me disse isso, é apenas da minha

cabeça. Mas a questão não é “com o Lula voltando, as coisas vão

se resolver”. O problema é o rumo que o partido tomou e imprimiu

ao governo do Brasil. Há coisas extremamente positivas, mas a

expectativa era muito maior. Governo se faz com luta interna,

aprendi isso nos dois anos em que estive lá. Governo é como feijão,

só funciona na panela de pressão. Aquilo é um caldeirão em fervura

permanente. Mas é preciso que haja alguns segmentos dentro do

governo capazes de elaborar uma proposta estratégica a longo

prazo, que sirva de norte para as políticas. E isso não existe hoje.

O que existe?

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Um pacote de propostas pontuais. A falta de horizonte histórico no

projeto do governo, agravada pelo fim das ideologias libertárias

desde a queda do muro de Berlim, é o que explica por que o debate

político hoje desceu do racional para o emocional. É como briga de

casal. Quando se perde um projeto amoroso ou da família,

emoções afloram, insultos, ofensas, sentimento de ira e vingança,

porque não se tem horizonte. Quando esse horizonte histórico

existe, quando se tem projeto estratégico, o debate democrático fica

no nível da racionalidade, não da emocionalidade. Mas essa fúria

nacional que perpassa todos os ambientes só vai terminar se

houver alguma força política que aponte um projeto histórico.

Oposição e reconstrução

Fernando Henrique Cardoso - - O Estado de S. Paulo 2015 abril 5

• Deste governo pouco há a esperar, Tanto quanto

popularidade, falta-lhe credibilidade

Nas últimas semanas tenho dado entrevistas aos jornais e às TVs,

talvez mais do que devesse ou a prudência indicasse. Por quê? A

mídia anda à busca de quem diga o que pensa sobre o "caos" (a

qualificação é oficiosa, vem da Secretaria de Comunicação Social

da Presidência da República) em que estaríamos mergulhados e é

necessário que vozes da oposição sejam ouvidas.

A crise atual marca o fim de um período, embora ainda não haja

percepção clara sobre o que virá. Em crises anteriores as forças

opostas ao governo estavam organizadas, tinham objetivos

definidos. Foi assim com a queda de Getúlio em 1945, quando a

vitória dos Aliados impunha a democracia; idem na segunda queda

de Getúlio, quando seus opositores temiam a instauração da

"República sindicalista"; o parlamentarismo, igualmente, serviu de

esparadrapo para que Jango pudesse tomar posse; em 1964 as

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"marchas das famílias pela liberdade" aglutinaram as forças

políticas aos militares contra o populismo presidencial e,

posteriormente, entregaram-se a práticas autoritárias; deu-se o

mesmo, por fim, quando a frente de oposição, liderada pelo PMDB,

em aliança com dissidentes da antiga Arena, pôs fim ao regime

criado em 1964.

Em todos esses casos, previamente ao desenlace houve o

enfraquecimento da capacidade de governar e os opositores tinham

uma visão política alternativa com implicações econômicas e

sociais, embora se tratasse fundamentalmente de crises políticas.

Mesmo no impeachment de Collor, a crise era política e a solução,

idem. Naturalmente, ajustes econômicos foram feitos em

seguimento às soluções políticas, basta lembrar a dupla Campos-

Bulhões nos anos 1960. Ou, ainda, os Planos Cruzado e Real, que

se seguiram à Constituinte e à derrocada de Collor.

No que se distingue o "caos" atual? Em que ele é mais diretamente

a expressão do esgotamento de um modelo de crescimento da

economia (como também em 1964 e nas Diretas-Já), embora ainda

não se veja de onde virá o novo impulso econômico. Mais do que

uma crise passageira, o "caos" atual revela um esgotamento

econômico e a exaustão das formas político-institucionais vigentes.

Será necessário, portanto, agir e ter propostas em vários níveis.

Embora haja alguma similitude com a situação enfrentada na crise

de Jango Goulart, nem por isso a "saída" desejada é golpista e

muito menos militar. Não há pressões institucionais para derrubar o

governo e todos queremos manter a democracia.

Explico-me: a pretensão hegemônica do lulopetismo assentou-se

até a crise mundial de 2008 na coincidência entre a enorme

expansão do comércio mundial e a alta do preço das commodities,

com a continuidade das boas práticas econômicas e sociais dos

governos Itamar Franco-Fernando Henrique Cardoso. Essas

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práticas foram expandidas no primeiro mandato de Lula, ao que se

somou a reação positiva à crise financeira mundial. Ao longo do seu

segundo mandato, o lulopetismo assumiu ares hegemônicos e

obteve, ao mesmo tempo, a aceitação do povo (emprego elevado,

Bolsa Família, salário mínimo real aumentado) e o consentimento

das camadas econômicas dominantes (bolsa BNDES para os

empresários, Tesouro em comunicação indireta com o

financiamento das empresas, Caixa Econômica ajudando quem

precisasse).

Só que o boom externo acabou, os cofres do governo secaram e a

galinha de ovos de ouro da "nova matriz econômica" - crédito amplo

e barato e consumo elevado - perdeu condições de

sustentabilidade. Isso no exato momento em que o governo Dilma

pôs o pé no acelerador, em vez de navegar com prudência. Daí que

o discurso de campanha tenha sido um e a prática atual de

governo, outra. Some-se a isso a crise moral, na qual o petrolão

não é caso único.

As oposições devem começar a desenhar outro percurso na

economia e na política. Como a crise, além de econômica e social,

é de confiabilidade (o governo perdeu popularidade e credibilidade),

começam a surgir vozes por "um diálogo" entre oposições e

governo. Problema: qual o limite entre diálogo político e "conchavo",

ou seja, a busca de uma tábua de salvação para o governo e para

os que são acusados de corrupção? A reconstrução de uma vida

democrática saudável e uma saída econômica viável requerem

"passar a limpo" o País: que prossigam as investigações e que a

Justiça se cumpra. Ao mesmo tempo há que construir novos modos

de funcionamento das instituições políticas e das práticas

econômicas.

As oposições devem iniciar no Congresso o diálogo sobre a reforma

política. Em artigo luminoso do senador José Serra, publicado no

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Estadão de 26 passado, estão alinhadas medidas positivas tanto

para a reforma eleitoral como para práticas de governo. Iniciar a

proposta de voto distrital misto nas eleições para vereador em

municípios com mais de 200 mil eleitores é algo inovador (o

senador Aloysio Nunes fez proposta semelhante). Há sugestões de

igual mérito na área administrativa, como a criação da Nota Fiscal

Brasileira, e ainda a corajosa e correta crítica ao regime de partilha

que levou a Petrobrás a se superendividar. De igual modo o

senador Tasso Jereissati apresentou emenda moralizadora sobre o

financiamento das eleições, impondo tetos de doação de até R$

800 mil para os conglomerados empresariais e restrições de acesso

ao financiamento público para as empresas doadoras. Partidos que

até agora apoiam o governo, como o PMDB, também têm propostas

a ser consideradas.

Sei que não basta reformar os partidos e o Código Eleitoral. Mas é

um bom começo para a oposição, que, além de ir às ruas para

apoiar os movimentos populares moralizadores e reformistas, deve

assumir sua parte de responsabilidade na condução do País para

dias melhores. Deste governo há pouco a esperar, mesmo quando,

movido pelas circunstâncias, tenta corrigir os rumos. Tanto quanto

popularidade, falta-lhe credibilidade.

-------------------------

*Fernando Henrique Cardoso é sociólogo e foi presidente da

República

KOTSCHO: GERAÇÃO 68 FOI DE VITORIOSA A DERROTADA

HTTPS://MAIL.GOOGLE.COM/MAIL/U/1/#INBOX/14C8BA6020E7F

565

"Em algum ponto, nós falhamos. Não conseguimos repassar para as novas gerações valores como a solidariedade, a ousadia, o inconformismo, a capacidade de sonhar e mudar o estabelecido para a construção de uma sociedade mais generosa", diz o jornalista Ricardo Kotscho; "Ganhamos nas lutas do passado, mas

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fomos derrotados na construção do futuro. Por isso, chegamos ao final de um ciclo político, com a falência do chamado presidencialismo de coalizão da Nova República, esta zorra federal instalada em Brasília e tão distante do Brasil real, colocando em xeque o futuro da própria democracia representativa pela qual tanto lutamos"

27 DE MARÇO DE 2015 ÀS 11:45

FRACASSAMOS...

Ricardo Kotscho/Brasil 247 Faço parte da geração 68, como ficou conhecida a dos estudantes libertários que viraram o Brasil e o mundo de cabeça para o ar naquele ano do século passado, contestando todas as hierarquias e estruturas de poder, sem ter ideia de onde pretendiam chegar. Sabiam o que não queriam mais, mas não se entendiam sobre o que exatamente sonhavam colocar no lugar. Pintava de tudo naqueles movimentos estudantis, das barricadas de Paris às grandes passeatas no Rio _ comunistas, trotskistas, anarquistas, hippies do paz e amor, guerrilheiros urbanos, porra-loucas e insatisfeitos em geral. Tinha acabado de entrar na faculdade, na primeira turma da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, criada um ano antes. Voltei lá esta semana para participar de um debate junto com Heródoto Barbeiro, meu colega no Jornal da Record News, que comemorou na segunda-feira sua milésima edição no ar. Para mim, foi um verdadeiro choque cultural. Nada mais restava daquele agito permanente em que os alunos ficavam mais fora do que dentro das salas de aula, pintando cartazes e faixas, fazendo discursos inflamados contra o reitor, a polícia, os americanos, a ditadura militar, o diabo a quatro. Confesso que não tinha na época a menor consciência política e gostava mesmo era da farra, das festas, das paqueras, das intermináveis conversas no Rei das Batidas, um bar que existe até hoje na entrada da Cidade Universitária. Já trabalhava na época como estagiário do Estadão, o principal jornal brasileiro naquele tempo, onde tinha entrado no mesmo mês em que passei no vestibular. Como viajava muito para fazer reportagens, comecei a frequentar cada vez menos a faculdade, que não consegui terminar até hoje. Agora, ao entrar na sala, onde os alunos do professor Santoro já nos aguardavam, tive uma sensação estranha. Todos em silêncio,

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comportadamente sentados, pareciam esperar o início de uma missa. Do lado de fora, nenhum sinal ou som fazia lembrar a escola onde estudei quase meio século atrás. A ECA-USP velha de guerra, um dos principais focos dos confrontos dos anos 60, mais parecia a sede de uma repartição pública. Imaginava encontrar um clima bem diferente após as manifestações do Fla-Flu político dos últimos dias. Nos debates de que participei quando era aluno, os palestrantes passavam o maior sufoco. Eram contestados a todo momento. Desta vez, porém, depois de uma hora de conversa, me dei conta de que só Heródoto e eu falamos, sem ninguém nos interromper para discordar de nada. Até comentei isso para dar uma provocada na turma, que ficou só olhando para a minha cara como se eu fosse um extraterrestre. Com o entusiasmo de sempre, Heródoto falava das maravilhas das novas tecnologias e eu da minha paixão pela reportagem, relembramos fatos históricos, arriscamos previsões sobre o futuro da profissão. Quando chegou a vez das perguntas, ninguém tocou nas profundas crises que o país está vivendo em todas as áreas. Na verdade, nem eram perguntas, mas apenas comentários sobre teorias da comunicação e mercado de trabalho, algo bem limitado ao que costumam discutir em sala de aula. É como se não estivessem preocupados com o que acontece fora das fronteiras da universidade. À noite, na TV, quando comentamos nosso encontro na ECA, me dei conta de uma diferença fundamental que aconteceu neste meio tempo: somos de uma geração que dedicou boa parte de suas vidas à luta coletiva, queríamos mudar o país e o mundo, e fomos vitoriosos ao ajudar a derrotar a ditadura e a dar início a um processo de distribuição de renda, que tornou nosso país mais livre e menos injusto. Hoje, noto um comportamento mais egoísta, em que os jovens estão preocupados com a carreira e a próprio sobrevivência, na base do cada um por si e Deus por todos. Em algum ponto, nós falhamos. Não conseguimos repassar para as novas gerações valores como a solidariedade, a ousadia, o inconformismo, a capacidade de sonhar e mudar o estabelecido para a construção de uma sociedade mais generosa. Pior do que isso: não fomos capazes de criar novas lideranças, tanto que o país continua dividido entre FHC e Lula, trinta anos após a redemocratização do país, nem de manter vivo o espírito que mobilizou os movimentos sociais em torno das lutas pela anistia, pela Constituinte, pelas liberdades públicas. Ou alguém sabe quem são esses líderes que apareceram nas manifestações

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de março? De onde surgiram, quais são suas histórias, que representatividade têm, quais são seus projetos de país? Somos ao mesmo tempo vitoriosos e derrotados. Ganhamos nas lutas do passado, mas fomos derrotados na construção do futuro. Por isso, chegamos ao final de um ciclo político, com a falência do chamado presidencialismo de coalizão da Nova República, esta zorra federal instalada em Brasília e tão distante do Brasil real, colocando em xeque o futuro da própria democracia representativa pela qual tanto lutamos.

Pesquisa do PT mostra derretimento de base social e causa

'perplexidade'

POR PAINEL- HTTP://PAINEL.BLOGFOLHA.UOL.COM.BR/2015/04/06/PESQUISA-DO-PT-MOSTRA-DERRETIMENTO-DE-BASE-SOCIAL-E-CAUSA-PERPLEXIDADE/

06/04/15 02:00

Tremendo na base Pesquisas internas do PT revelaram que a crise do segundo mandato de Dilma Rousseff provocou um “derretimento da base social” do governo, nas palavras de um cacique da sigla. Trabalhadores e famílias beneficiadas por políticas de inclusão de gestões petistas dizem não tolerar mais a corrupção e reclamam que as medidas recentes do Planalto não condizem com as bandeiras defendidas na campanha. “Perplexos”, dirigentes dizem que o novo cenário “dificulta a reação” do partido.

Sem palavras A cúpula do PT tem feito reuniões periódicas em busca de um discurso para reconquistar os grupos tradicionalmente vinculados ao partido. Até agora, não conseguiram nenhuma fórmula mágica.

Prognóstico Em conversa recente com aliados, o ex-presidente Lula avaliou que a crise de popularidade de Dilma é “recuperável”, mas destacou que o governo precisa de mais “atitude”.

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Surfando A cúpula do PSDB vai definir na quarta-feira os moldes de uma campanha nacional de filiações ao partido para aproveitar a crise e a onda de manifestações contra o governo Dilma.Tucanos dizem ter encomendado pesquisas que apontam até um milhão de jovens com perfil alinhado à legenda.

Em reforma Na mesma reunião, o partido de Aécio Neves deve determinar uma intervenção em “dezenas” de diretórios do PSDB, em municípios em que o mineiro teve desempenho fraco na eleição presidencial. A ideia é trocar o comando do partido nesses locais e fortalecê-los antes da disputa municipal de 2016.

Fico? Vinicius Lages (Turismo) reuniu a cúpula do ministério na última quinta-feira e disse ter recebido determinações para continuar tocando as atividades da pasta, apesar das articulações de parte do PMDB para que Henrique Alves assuma o posto.

Médio prazo A reunião durou toda a tarde. A equipe traçou um cronograma de ações do ministério para os próximos três meses.

Recursos humanos Em dois eventos na semana passada, Lages teve que responder a autoridades e empresários que continuava no cargo —ao menos por enquanto.

Réquiem A executiva do DEM se reúne em Brasília na terça-feira para discutir a proposta de fusão do partido com o PTB. Dirigentes contrários à união se encontraram na última semana para tentar “enterrar” o projeto antes que ele ganhe corpo.

Na fila Aprovado há um mês, o depoimento de Alberto Youssef na CPI da Petrobras não tem data marcada. Deputados deixam o assunto de lado por temer que ele entregue negociatas com os políticos em sua própria casa.

Em dobro Eduardo Paes (PMDB) chamou de “farsa”, mas auxiliares ficaram tensos com a demissão de funcionários da Queiroz Galvão em obras da Olimpíada do Rio. Secretários temem que as empreiteiras aumentem a pressão sobre a prefeitura até o início de 2016, ano eleitoral.

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Classe Procuradores goianos ficaram furiosos com o artigo de Demóstenes Torres que diz que eles “têm padrão de vida superior ao meu”. Acusado de enriquecimento ilícito, o ex-senador teria recebido uma geladeira, um iPad e outros presentes de Carlinhos Cachoeira.

Foro Tucanos do Paraná decidiram reagir aos petistas que aventam a possibilidade de impeachment do governador Beto Richa (PSDB). “Eles têm motivos de preocupação: é do Paraná que saem as acusações de que o PT é o maior beneficiário do desvio da Petrobras”, provoca o deputado Valdir Rossoni (PSDB-PR).

TIROTEIO

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Não acho que os protestos sejam coisa de ‘coxinha’ ou da mídia. Já existia mídia no governo Lula e ele tinha 85% de aprovação.

DE CÂNDIDO VACCAREZZA, ex-deputado pelo PT-SP, sobre críticas feitas por petistas aos manifestantes e à imprensa em meio à crise do governo Dilma.

Decepção com o discurso de Lula a militantes

Carlos Bandeira: -publicado em 04 de abril de 2015 às 11:55

http://www.viomundo.com.br/politica/carlos-bandeira-decepcao-com-o-discurso-de-lula-a-militantes.html?fb_action_ids=935008623205419&fb_action_types=og.comments

Lula puxa freio de mão no começo da subida da ladeira por Carlos Bandeira Frustração. Foi essa sensação que tomou conta dos militantes dos sindicatos, movimentos populares e organizações de juventude combativos que participaram da plenária dos movimentos sociais na quadra dos bancários.

A proposta original da plenária era animar a militância para as batalhas, discutir uma plataforma e organizar as lutas do próximo período, para enfrentar a ofensiva dos setores conservadores.

Ou seja, o momento era de organizar a tropa para encarar a guerra declarada no dia 15 de março.

O discurso do ex-presidente Lula, no entanto, foi um banho de água fria, com a defesa intransigente do governo Dilma, sem apresentar nenhuma contrapartida para as forças progressistas. Em resumo, ele disse que as pautas dos movimentos popular não serão atendidas, mas mesmo assim devem sustentar o governo.

O economia brasileira passa por um momento bastante complicado, em um quadro de crise econômica mundial. No entanto, o governo tem apresentado como remédio medidas que representam perdas para os trabalhadores.

Qual a contribuição o capital financeiro, os especuladores, as grandes indústrias e redes do setor de serviços, enfim, os milionários darão para enfrentar a crise?

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Lula não de uma palavra sobre essa questão. Pelo contrário. Afirmou que o governo quer melhorar a vida dos mais pobres sem mexer no patrimônio dos mais ricos. Até mesmo a bandeira da reforma política, a dita prioridade do PT, não apareceu no discurso do ex-presidente.

Para sustentar esse discurso, Lula leu manchetes de grandes jornais que, em 2003 e 2007, anunciavam o fracasso do seu governo. Ou seja, quem apostar contra Dilma agora errará como fizeram aqueles que agiram dessa forma antes…

Depois de 12 anos, os governos liderados pelo PT não fizeram reformas que mudassem a correlação de forças na sociedade, como a reforma política, mudanças no Poder Judiciário, a reforma tributária e a democratização dos meios de comunicação.

O problema é que nessa década os inimigos das mudanças sociais se organizaram, ganharam músculos e colocam suas artilharias contra o governo, promovendo protestos de massa, em um quadro de crise econômica sem perspectiva de retomada.

A jornada de lutas das forças progressistas no dia 13 de março demonstrou o potencial do movimento sindical, popular e organizações de juventude de crescer em um cenário de enfrentamento.

Era o início de um processo de lutas, com uma perspectiva multiplicadora a nível nacional, que poderia mudar a correlação de forças, ganhar corpo e colocar a esquerda na ofensiva no médio prazo.

No entanto, Lula puxou o freio de mão no começo da subida da ladeira, minando o entusiasmo daqueles que desejam ir além da defesa do governo e querem ir pra cima dos inimigos do povo brasileiro.

Foi no sentido contrário, inclusive, do presidente da CUT Vagner Freitas, que afirmou que não se deve admitir corte de direitos, criticou os ajustes do governo e o papel do ministro Joaquim Levy, cobrou taxação sobre fortunas e limites às remessas de lucro para o exterior. O ex-presidente crê que será possível passar por essa violenta tempestade sem fazer enfrentamentos e anuncia de antemão que, nesses quatro anos de governo Dilma, nada será feito nesse sentido.

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Os governos Lula/Dilma resistiram até agora porque a direita evitou levar a guerra até as últimas consequências, à espreita para o melhor momento do bote. Agora, ela quer.

E não se vence uma guerra sem luta. Bandeiras brancas não derrotam tanques, canhões e mísseis. Nem o George Soros, as 7 Irmãs do Petróleo, a Globo, o Gilmar Mendes e o Sérgio Moro.

Leia também: Luciana Genro: Burguesia não quer golpe, nem impeachment de Dilma Boulos: O Mito Lula e o Fracasso do Lulismo ANTONIO ATEU

SEG, 06/04/2015 - 11:23

O MITO LULA E O FRACASSO DO LULISMO

O "lulismo" acabou "O lulismo não funciona mais", diz Boulos

"A política de conciliação se esgotou. Achar que se governa sem comprar brigar é uma ilusão. Dilma preferiu comprar briga com o povo" À frente do MTST, movimento de sem-teto que ganhou o protagonismo das ruas depois da onda de protestos de 2013, o filósofo Guilherme Boulos diz que o governo e o PT têm

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subestimado a insatisfação popular com a gestão Dilma Rousseff, que registrou aprovação de 12%, segundo pesquisa Ibope divulgada na semana passada.

Boulos afirma que a bandeira do impeachment pode se popularizar e coloca em xeque a capacidade de Dilma de manter-se no cargo até 2018, se o governo não recuar do ajuste fiscal.

O líder do MTST credita a baixa popularidade de Dilma às medidas na área econômica e não aos escândalos de corrupção e diz que se o governo deixar para agir só em 2016, quando a economia começar a se recuperar, talvez a presidente não esteja mais no comando do país para fazer isso.

Nas ruas, o MTST assumiu o tom crítico ao governo que já foi do MST. Presente em oito Estados, o movimento tem 40 mil famílias organizadas - metade desse contingente em São Paulo - e manteve-se distante dos protestos contra a presidente, por ver uma onda conservadora em ação. O grupo irá às ruas em ato contra a "direita" no dia 15, três dias depois do novo ato contra Dilma.

Boulos encontra-se com frequência com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e reuniu-se três vezes com Dilma. O último encontro foi neste ano. Tem interlocução também com o governo de São Paulo, comandado por Geraldo Alckmin (PSDB), e com o prefeito da capital paulista, Fernando Haddad (PT).

Formado em Filosofia pela USP, Boulos, com 33 anos, milita há 13 anos no MTST. No intervalo das dezenas de reuniões semanais que participa, o líder dos sem-teto, estudioso do francês Jacques Lacan, dá aula em um curso de especialização em Psicanálise. A seguir, a entrevista ao Valor, concedida na quarta-feira.

Valor: A pesquisa Ibope mostra que só 12% aprovam o governo. O que explica a dificuldade de Dilma? Guilherme Boulos: A insatisfação com o governo Dilma está mais relacionada às medidas econômicas do que propriamente à corrupção, à Lava-Jato. Nos últimos doze anos, a divulgação e a exploração midiática dos escândalos de corrupção foi frequente e não produziu quedas tão abruptas de popularidade. Dilma se elegeu com um discurso de aprofundar mudanças sociais, de não deixar uma política econômica neoliberal prevalecer. Assim que ganhou as eleições, fez o inverso. Foram três subidas consecutivas dos juros, uma declaração descabida sobre a abertura de capital da Caixa Econômica Federal, especularam a indicação do presidente do Bradesco para a Fazenda, teve o ajuste fiscal, programas sociais

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estão parados, ou seja, houve um sentimento de frustração popular, de traição em relação ao projeto eleito.

Valor: O ex-presidente Lula, com quem o senhor tem boa relação, defende o ajuste fiscal. Lula está no caminho errado? Boulos: Lula está errado nessa avaliação. Se precisava fazer ajuste, era para ter sido feito do outro lado. Por que não se fez ajuste taxando grandes fortunas, fazendo mutirão nacional contra a sonegação, auditoria da dívida pública? Não se joga a conta da crise no colo dos trabalhadores, dos mais pobres.

Valor: O ajuste que Dilma faz é diferente do que Lula fez em 2003? Boulos: Talvez a diferença tenha sido a do anúncio prévio (Carta aos Brasileiros). O ajuste de 2003 também foi anti-popular. A questão é que em 2003 o PT e o Lula tinham uma gordura política para queimar que não tem mais hoje. Dilma ganhou a eleição na margem. Já havia um nível de insatisfação popular colocado antes, com junho de 2013, a polarização do processo eleitoral. Em 2003 o modelo estava ascendendo e agora está se esgotando.

Valor: Essas medidas deviam ter sido feitas antes? Boulos: Não deviam ter sido feitas, nem os ajustes do governo Lula. A estratégia do PT que vigorou nesses doze anos foi de conciliação. Lula, em 2003, buscou construir um pacto no qual todos ganhavam, tanto os banqueiros quanto os trabalhadores. O que permitiu fazer uma política onde funciona o ganha-ganha? É ter crescimento econômico. Mas o crescimento começou a declinar brutalmente no último período. A política de conciliação não dá mais. Vai ter que cortar a fatia de alguém. Dilma preferiu cortar do lado de cá. Isso tem um preço. Manter a governabilidade na banca significa o risco de perdê-la nas ruas.

"Dilma preferiu cortar do lado de cá. Manter a governabilidade na banca significa o risco de perdê-la nas ruas"

Valor: Como manter os investimentos privados e, ao mesmo tempo, cortar do lado "da banca"? Boulos: Basta ter decisão política. A política de ficar conciliando se esgotou. O PT, a Dilma precisam entender isso. Este ano vamos ter recessão, que aprofunda reivindicações sociais. Tem uma deterioração do salário mínimo, da média salarial, a possibilidade de desemprego, redução de investimentos públicos. Achar que se governa sem comprar briga é uma ilusão. Dilma preferiu comprar briga com o povo.

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Valor: O lulismo acabou? Boulos: Ele se esgotou. Não tem mais condições de oferecer um projeto de mudança progressiva para a sociedade. As mudanças nesses doze anos de PT foram significativas, mas pontuais. Melhoraram a condição de vida dos mais pobres, mas sem mudar o cenário estrutural do país. O que permitiu empurrar até aqui foi um período de crescimento econômico e também impulsionado pelo investimento público, pelo crédito público, as estatais. O lulismo, como modelo de conciliação, não funciona mais.

Valor: Há um novo modelo sendo criado? Qual o rumo do governo? Boulos: O rumo que o governo ensaiou nesses três meses foi o de um ajuste neoliberal, que também é insustentável. Vai ser preciso fazer um novo projeto político. Não dá mais para haver avanço popular sem reformas estruturais. Qualquer governo que não se disponha a colocar isso estará refém de um caminho pela direita, conservador.

Valor: Que caminho o senhor vê para as próximas eleições? Boulos: Do jeito que as coisas estão, é difícil pensar em 2018. Tem que ver se esse governo termina 2015. Quando uma pesquisa diz que o governo tem 64% de ruim ou péssimo é uma insatisfação geral, inclusive no Nordeste. Quem está canalizando essa insatisfação nas ruas como foi o 15 de março? Fundamentalmente a classe média, não o povão. A classe média de algum modo sente a recessão, o ajuste fiscal, mas a sua pauta não é essa. A pauta é ainda mais conservadora do que do governo. O que está em jogo é uma saída à direita, conservadora, de perda de direitos sociais. Tem um governo impopular porque está fazendo ajuste, mas quem está nas ruas canalizando essa impopularidade está insatisfeito por outras razões e propõe uma saída talvez ainda pior do que o governo está propondo.

Valor: O 'povão' irá às ruas contra Dilma? Boulos: Se o governo insistir num caminho de aprofundar esse ajuste, de aprofundar as medidas impopulares, corre o risco de dar base social para iniciativas da direita, inclusive para o golpismo. Corre o risco de popularizar a bandeira do impeachment. A forma como tem que se combater esse processo é também combatendo esse ajuste fiscal. As manifestações tiveram um clima conservador. Não quer dizer que todos estavam lá eram de direita. Felizmente não. Mas teve um clima de anti-PT também e anti-movimento social, anti-greve, anti-organização popular, anti-direitos humanos. Isso foi muito forte no 15 de março. Ainda está circunscrita a um

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setor de classe média e com o clima muito direitista, mas pode mudar. Existe insatisfação social e um caldo social para que mude. É isso que o governo precisa compreender e recuar nesse ajuste.

Valor: Na crise do mensalão, Lula recorreu a movimentos sociais. O apoio social que sustentou o governo em 2005 é diferente de agora? Boulos: A situação é outra. Tem um grau de desgaste muito maior. Naquela época, ainda tinha carga de esperança muito forte. Isso não quer dizer que os movimentos sociais vão aceitar o golpismo. Não vamos aceitar. Mas não estamos dispostos a ir para as ruas defender o indefensável, defender um governo que protagoniza medidas impopulares. Há também mudança da postura da oposição. O PSDB adotou postura em 2005 de sangrar para levar em 2006. Não deu certo. Perderam em 2006. Eles estão calejados e passou a adotar um discurso cada vez mais ofensivo, que flerta com o golpismo. Temos quadros do PSDB no plenário do Congresso, nas redes sociais com um discurso que tenta construir legitimidade política para essa via. O cenário atual é muito mais preocupante do que era naquela época.

Valor: Qual a perspectiva para 2018? É possível construir uma Frente Ampla, como no Uruguai? Boulos: Neste momento não sabemos nem como vai terminar 2015. Se as manifestações de 12 de abril forem maiores que as de 15 de março, se outros setores, populares também começam a se movimentar mais nesse processo, é imprevisível o que vai acontecer nos próximos meses. Um dos erros do PT e do governo é o de subestimar esse grau de incerteza, fazer um pensamento de médio prazo e falar: 'vou fazer um ajuste severo agora e começo a recuperar a economia em 2016'. Talvez não dê tempo. Talvez em 2016 não seja mais você que esteja lá no governo para recuperar a economia.

Valor: O senhor vê chances reais de impeachment? Boulos: Não acho que atualmente seja o cenário mais provável, mas não deve ser subestimado. Se somar a mobilização expressiva numericamente do 15 de março com as articulações que estão sendo feitas pelo PMDB no Congresso com a perda de controle do Legislativo pelo governo, com a postura simpática a esse processo por parte importante da mídia e do Judiciário, dizer que não existe risco é ignorar os fatos.

Valor: Como o senhor analisa o PT nesse processo? O partido se afastou da base, perdeu o discurso?

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Boulos: O PT praticamente foi absorvido pelo governo e por um sistema político que tem o conservadorismo no seu DNA. A apropriação privada do público no seu DNA. No nosso sistema político quem não recebe financiamentos maciços das grandes empresas não concorre, não tem chance de ganhar. A partir do momento que entra nessa lógica, passa a aceitar muitas coisas. O PT foi o que mais recebeu das empreiteiras. Isso vai minando a possibilidade de o partido manter a autonomia política e direciona o projeto político a interesses que são de grupos econômicos. Pouco a pouco se perde qualquer potencial transformador.

Valor: Falta reação da esquerda? Boulos: Precisamos relativizar. As condições para o crescimento da direita e da esquerda no país são muito desiguais. O crescimento da direita está alicerçado em alguns dos principais meios de comunicação. É claro que a esquerda precisa dar uma resposta mais categórica, com unidade. Não é fácil porque há setores da esquerda que têm compromisso maior de fazer a defesa do governo e há outros que não, nos quais nós estamos. Mas ou a esquerda se unifica ou fenece. Não tem escolha. É preciso ter unidade para enfrentar o fortalecimento do conservadorismo.

Valor: O MTST não participou dos atos pró-Dilma nem dos contrários. O movimento irá às ruas? Boulos: Nossa postura não flerta com impeachment, com golpismo, com qualquer saída à direita para a crise que vivemos. Mas para defender o governo é preciso que ele se faça defensável. Se mandar projeto de lei de taxação das grandes fortunas, se liberar programas sociais, suspender o ajuste fiscal terá a nossa defesa. O MTST está chamando mobilizações de enfrentamento da conjuntura. Em 18 de março, paramos mais de 30 rodovias no Brasil contra o ajuste fiscal. Em 15 de abril, logo depois da manifestação do dia 12, faremos uma mobilização contra a direita e contra políticas de ajuste fiscal e de ataques a direitos sociais. O MTST não vai usar a tática avestruz, de deixar o mundo caindo e a gente falando de moradia. Vamos atuar nesse cenário.

"É imprevisível o que vai acontecer. Um dos erros do PT e do governo é o de subestimar esse grau de incerteza"

Valor: Como tem sido a relação com o governo federal? Em 2014, depois da ocupação Copa do Povo, o MTST se reuniu com Dilma, que anunciou investimentos para atender ao movimento. E agora? Boulos: O MTST mantém reuniões com o governo federal para apresentação das pautas. Isso não está em conflito com nossas

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lutas. Foram três encontros com Dilma, um neste ano. Construímos a agenda a partir do processo de mobilização. A pauta do governo federal está truncada pelo ajuste fiscal. Quando se diz que não vai lançar agora o Minha Casa, Minha Vida 3, mas só no final do ano, isso significa o bloqueio da construção de moradias nesse período. Hoje o MCMV é a única via de construção de moradia popular. Se o programa não é lançado, não se constrói casa, não tem solução para as ocupações. A negociação fica truncada por conta do ajuste fiscal.

Valor: O MTST tem sido recebido pelo governo Alckmin. Como é a relação com o governo de São Paulo? Boulos: A independência do MTST também dá credibilidade ao movimento. Pau que bate em Chico bate em Francisco. Os governos têm que ter clareza de que você não está fazendo o joguete eleitoral de ninguém. Somado a isso, está a capacidade de mobilização. Os governos quando recebem movimentos sociais, recebem porque o movimento soma força, pauta uma agenda política. Temos muito mais divergências com o governo Alckmin, com a visão dele, do PSDB do que com o PT, embora tenhamos divergências importantes com o governo do PT. Mas isso não pode pautar a luta reivindicativa. O MTST vai pressionar o governo Alckmin por políticas públicas, como pressiona o governo do PT.

Valor: O MTST participa de alguma instância de governo? Boulos: Não. É um princípio do MTST ter autonomia rigorosa.

Valor: Como o senhor analisa o governo do prefeito Haddad? Boulos: É melhor gestão de São Paulo desde Erundina, mas também com seus limites. Destacaria a forma como se conduziu o Plano Diretor de São Paulo, que abriu espaço para um plano menos moldado pelo mercado imobiliário. Foram considerados os interesses do mercado, mas outros também. Normalmente isso não acontece. Há um grau de enfrentamento com a especulação imobiliária e a política habitacional destinou 20% para o Minha Casa, Minha Vida Entidades. A prioridade do transporte público e as ciclovias são temas positivos. A gestão tem mais pontos positivos do que negativos.

Valor: E como explicaria a baixa aprovação do prefeito? Boulos: São muitas razões. Uma delas é que a gestão Haddad sofre um cerco midiático muito forte. Mas também se comunica pessimamente, tem uma capacidade de comunicação muito limitada. Outra razão é que, pelo caixa, não conseguiu implementar nenhuma grande obra de destaque, que caracterizasse a gestão.

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Há também um fortalecimento do antipetismo. São Paulo é o ninho desse fortalecimento. Vimos os votos que São Paulo deu a Aécio, a eleição em primeiro turno do Alckmin, a derrota do Suplicy e a eleição do Serra. Veja o papel de São Paulo no ato de 15 de março. Em São Paulo o antipetismo ganhou uma força como não ganhou em nenhum outro lugar. Isso naturalmente arranhou Haddad, que é do PT.

Valor: É possível manter uma força de esquerda em São Paulo?

Boulos: É um problema, porque não acreditamos que o PT seja de esquerda. O governo do PT não é um governo de esquerda. Agora o antipetismo é de direita. Isso gera um campo minado para a organização da esquerda em São Paulo. Inviabilizar não inviabiliza, porque a esquerda também tem base social, organização popular. Mas cria um clima de maior acirramento e de campo minado para a esquerda.

http://www.valor.com.br/politica/3992424/o-lulismo-nao-funciona-mais-diz-boulos

Democracia, entendimento e o fator Temer

http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1771

Paulo Fábio Dantas Neto - Abril 2015

O que esperar de uma elite política, após a irrupção indignada de numerosos cidadãos nas ruas? Que reveja seus roteiros de ação para reverter essa indignação. Numa democracia que mereça esse nome, isso não esvaziará as ruas permanentemente nem restringirá a política a um mero jogo de bastidores, entre elites e partidos. Ao

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mesmo tempo, nenhuma democracia se manterá como tal se dispensar elites e partidos.

Uma democracia que flui como um processo crescentemente inclusivo permite mudanças no papel dos vários atores, dentro e fora da sociedade política, bem como o acesso de novos atores às decisões ali tomadas. Para não perder pontes com os interesses e os valores dos representados, a representação política depende, numa parte, da dinâmica social e, em outra boa parte, da flexibilidade da elite dirigente, que se revela através da forma como ela revê suas estratégias.

O que esperar de partidos e lideranças políticas quando, em momentos de insatisfação social ou de dificuldades econômicas, o jogo democrático apresenta-se truncado pelos impasses habituais das táticas do varejo político, ou quando as crises até resultam, em parte, desse próprio varejo? Espera-se que os partidos atuem como instituições (corpo organizado de regras) e os líderes como estrategistas do atacado, para restabelecerem a fluência do jogo. Às vezes, a perturbação é tão grave que é preciso mudar as regras. Mas na maioria dos casos um bom pacto ajuda mais do que uma custosa cirurgia institucional.

Um equívoco da percepção moralista da política no atual contexto brasileiro é a demonização generalizada da nossa classe política e da sua vocação histórica para estabelecer pactos. É comum vê-los sempre como conchavos contra o povo, quando muitas vezes são apenas acordos para que o jogo democrático não trinque e outras vezes são até soluções mais amplas, que permitem que o jogo se abra à participação de novos atores. Se políticos são sempre um problema (em nossa terra e além-mar), nunca deixaram de ser, também, parte importante de soluções coletivas que o Brasil pôde encontrar, ao longo de sua história, para seus problemas, entre os quais o da garantia das liberdades.

Está aí, como emblema maior, a Constituição de 1988, obra da chamada classe política brasileira. Obra socialmente condicionada e não pura dedução doutrinária ou fruto de vontades arbitrárias. Liderada por Ulysses Guimarães, a Constituinte engendrou a Carta em boa parte sob o impulso das ruas e sob um roteiro forjado pela militância ativa da sociedade civil. Mas ela também coroou a estratégia de uma oposição institucional que, durante quase duas décadas (do contexto da edição do AI-5 à vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral), construiu — sem nem sempre ter

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consciência plena de que o fazia —, a partir do Parlamento e da organização do MDB, a frente democrática que, em sintonia gradual e crescente com a sociedade civil, isolou e afinal derrotou a ditadura. Desse modo, o 15 de março de 1985 foi, em vários sentidos, um contraponto histórico ao 31 de março de 1964.

O êxito da transição democrática deveu-se à combinação de luta e conciliação. Combinação que faltou em 64, quando, à direita e à esquerda, a luta exacerbou-se além do ponto conveniente e possível numa democracia. A conciliação foi rejeitada não só por radicalismos, como os de Lacerda e Brizola, como também pela complacência que encontraram em áreas não radicais, mas movidas por uma lógica imediatista. A conjunção de radicalismo, demagogia e imediatismo eleitoral tornou inaudíveis vozes democráticas lúcidas, como as de Tancredo Neves, Celso Furtado e San Tiago Dantas. Isso truncou o jogo da democracia e facilitou a ação dos golpistas. Houve conspiração? Claro, mas seu êxito não se explica pelo simples fato de ter havido.

É auspicioso que, no transcurso dos trinta anos do que seria a posse de Tancredo Neves, o 1985 tenha sido celebrado nas ruas, tendo o protesto e a luta como pontos de partida. Mas é preciso não perder de vista que daqui até o ponto de chegada não se terá uma linha reta. O “fora Dilma” tem a mesma índole primária do “fora FHC” do final dos 90: reflete menos uma solução política racional e mais a realidade de uma insatisfação difusa, instintiva, contra “tudo o que está aí”, estimulada, naturalmente, pela oposição da vez. Esse ponto de partida tornou-se visível, mesmo que a banda recalcitrante do petismo siga virando as costas à análise política realista e se escudando, contra todas as evidências, numa sociologia partidária das manifestações, enxergando nelas uma conspiração perpetrada por uma “elite branca e golpista”, que se pode, no entanto, contar aos milhões. Esse discurso perde fôlego todo dia, mas ainda encontra eco institucional em setores do governo e em falas do próprio Presidente do PT.

Ao contrário do ponto de partida, o de chegada é, de fato, invisível aos atores do presente. No entanto, se seu destino é atuar, eles não têm escolha: precisam fazê-lo, apesar das densas nuvens. Sem o script conciliador de 1985, que foi também (não se esqueçam os gregos e os troianos) tanto o do Plano Real, em 1993, como o da carta de Lula aos brasileiros em 2002, não chegaremos a um lugar

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melhor, enquanto a deriva pode nos levar a um não-lugar, do ponto de vista da democracia.

Esse receio não provém da presença de fardas e quepes no horizonte político. São, contudo, várias as roupagens que pode assumir um retrocesso institucional. Assim o receio se justifica, pois a avaliação realista de que a conciliação é o caminho, o método (embora não necessariamente o desfecho), não revoga a percepção, também realista, de que tem predominado, também nos ambientes políticos, o conflito entre o senso comum moralista e a lógica corporativa de um partido político. Seja por pragmatismo eleitoral ou por interesse patrimonialista, a elite política nacional (ao menos algumas de suas mais relevantes facções) flerta perigosamente com a silhueta de uma vala comum, onde a conjunção de crises ameaça jogá-la por inteiro.

Por outro lado, crises podem ter o papel pedagógico de atiçar o instinto coletivo de sobrevivência, próprio de elites políticas experientes no governo da sociedade, caso da brasileira. Talvez por isso o agravamento das crises esteja dando, mais recentemente, visibilidade a atores cuja estratégia mobiliza o entendimento como método. No começo dessa crise se ouviam, aqui e ali, suas vozes quase sussurrantes, perdidas num mar de desafios e bravatas. Agora cada vez mais frequentemente eles se dirigem ao centro da cena política e ocupam mais espaço no noticiário. Um desses atores tem se destacado, justificando, a meu ver, uma observação cuidadosa de seus movimentos. Trata-se do Vice-Presidente da República e também Presidente do PMDB, Michel Temer, a quem não tanto a virtù, mas a fortuna transforma em peça importante para a viabilização de um cenário em que o idioma do entendimento pode levar a um desfecho em que a crise é espantada por uma conciliação. Refiro-me a uma solução provisória do contencioso político, envolvendo um arco de partidos, do governo e das oposições, para permitir controle da economia e pavimentar um caminho institucional comum até as eleições de 2018. Tudo sem prejuízo da plena aplicação de soluções punitivas que os bem-vindos processos judiciais em curso encontrem para coibir a corrupção que apuram.

Cenários: Temer como um elo em si, ou para si

Erra sobre o PMDB quem lhe atribui lugar e papéis fixos na política brasileira. Hoje ele não se resume a ser o símbolo de um sistema supostamente moribundo (o presidencialismo de coalizão, que uma

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“reforma política” arquivaria) e de uma democracia dita “de fachada”, a ser superada a partir de agora por uma “verdadeira” democracia centrada nas ruas. E também não é simplesmente uma usina conspiratória profissional e astuta, que empareda o Governo e dificulta o ajuste fiscal para ser beneficiado pelo fracasso do primeiro e seu possível desdobramento: o impeachment da Presidente.

Michel Temer, o presidente do PMDB, não atua no momento com o mesmo script de Eduardo Cunha e Renan Calheiros, principais lideranças do partido no Congresso. O script de Temer é um obstáculo aos caminhos dos outros dois líderes, que jogam para enfraquecê-lo. Já Cunha e Renan atuam com o mesmo script, mas não chegam a formar uma dupla. Jogam paralelamente e autocentradamente. Não há liga política nem real cooperação entre eles. Esse “ultraindividualismo” — exacerbado, na atual conjuntura, pela necessidade de escaparem da operação Lava Jato — é o limite da liderança de ambos. Esse limite abre uma brecha através da qual pode surgir uma saída para o conjunto da elite política, ameaçada pela conjunção das crises econômica, política e moral que caracteriza o momento atual.

Não sei se será o governo ou a oposição (tucanos + PSB, PPS, etc.) quem entenderá primeiro que essa saída passa necessariamente pela atuação (e não pelo descarte) do PMDB “institucional”, entendimento que aconselha o fortalecimento de Temer e o esvaziamento do poder de Cunha e Renan, que não é sinônimo, vale dizer, de enfraquecimento do Congresso. Ao contrário, promove seu fortalecimento enquanto casa vocacionada à negociação e não à retaliação. Há sinais, embora ambíguos, nos dois campos políticos principais, de que algo começa a se mover na direção dessa compreensão.

O Governo pode vir a fazer (ou será que já faz?) de Michel Temer o canal de atendimento de algumas demandas das bases congressuais dos dois rivais do Vice na luta interna peemedebista, como também “terceirizar”, através dele, um diálogo com a oposição. Ambos os passos seriam voltados à aprovação do ajuste fiscal, negociação que nem a Presidente, nem seu ministro da Fazenda, nem Lula, muito menos o PT, estão conseguindo fazer avançar na velocidade requerida pela crise. Certo é que, se a aprovação da sua proposta de ajuste (mesmo com modificações) resultar dessa sua iniciativa política, o governo tem a ganhar, no

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mínimo, uma chance de recomeço e, a depender dos resultados econômicos de médio prazo, de recuperação da sua credibilidade e consequente produção de um discurso político novo para 2018, já que aquele inaugurado em 2002 chegou à exaustão. Chance para o governo, risco para a oposição. Segue o jogo.

Já o PSDB, no vácuo da inação do governo, ao lado de aprofundar sua articulação com o PSB e as forças sem partido que fizeram a campanha de Marina Silva, pode encontrar em Temer um emissário junto ao próprio governo para negociar condições de aprovação das medidas de ajuste na economia, ademais um desdobramento lógico do próprio programa eleitoral tucano de 2014. E também um emissário, junto a Cunha e Renan, para criar condições ao surgimento, no âmbito do Congresso, de uma proposta alternativa de ajuste que pode ser viabilizada por essas forças, no caso de fracasso de um entendimento bancado pelo Governo. Enfim, por “bem” ou por “mal”, ter protagonismo numa solução para a crise será um modo de a oposição mudar o disco: em vez de apenas replicar na cena política a agenda do Judiciário e do Ministério Público, construir uma agenda mais ampla, resgatando o discurso da campanha de Aécio Neves, que se pôs como candidato não só do PSDB, mas de um conjunto de forças que querem mudanças na orientação de governo, dentro dos marcos de uma institucionalidade democrática. A oposição tem a ganhar, no mínimo, o fortalecimento de uma frente eleitoral para 2018 e, no limite, uma conexão, hoje precária, ou inexistente, com as forças sociais que se movem nas ruas. Chance para a oposição, risco para o governo. E segue o jogo.

Em ambos os lados já há quem se disponha a correr os respectivos riscos e se mova para o diálogo, evitando assim o truncamento do jogo. A oposição tem, a princípio, mais facilidade e tempo para ir nessa direção, se quiser. O Governo está mais enredado com vetos e outros problemas na sua cozinha e também na defensiva, pelo receio de que o impeachment entre na agenda política, por agravamento da crise econômica, por desdobramentos da Lava-Jato ou pelos dois fatores juntos. Além disso, o tempo é adversário de todos os que querem entendimento, mas especialmente do Governo. Sem soluções politicamente encaminhadas, a Presidente terá dificuldades de enfrentar uma nova rodada de manifestações de rua, já agendada para 12 de abril. Depois dessa rodada as balizas do entendimento podem mudar, especialmente se as manifestações incorporarem mais fortemente, ao lado da corrupção,

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do “Fora Dilma” e do “Fora PT”, alguns temas derivados da situação econômica, capazes de criar pontes entre a classe média e os trabalhadores em geral.

Em ambos os lados há também quem jogue contra o diálogo e nesse caso não estão apenas Cunha e Renan, talvez os mais ousados atiradores. Várias lideranças importantes do PSDB — malgrado a pregação em contrário de FHC — cedem à tentação de um imediatismo curioso, que vê na corrupção petista o mote que lhe traria dividendos eleitorais mesmo sem eleições no horizonte imediato. E no PT, discursos de resistência ao ajuste fiscal e de “refundação” da democracia calçam a alternância de encenações meramente retóricas com operações políticas desastradas, no intuito de assegurar votos no futuro e postos no governo no varejo político de agora, mesmo que ao custo da inviabilização do governo no atacado.

Entre os dois campos Michel Temer se move mais do que todos, mas sem propor nada que pareça um jogo pessoal ou mesmo partidário. Ou melhor, todos sabem que ele joga, mas não se pode dispensar o sotaque institucional da sua fala nesse momento em que o centro político se esvaziou. Realista, ele tende a contribuir para um pacto incluindo governo e oposição, fortalecendo-se como mediador (não é razoável, aliás, supor que entrará em pacto com a oposição sem combinar isso com Dilma e/ou Lula). A não ser que a conciliação fracasse por recusa de um dos polos do contencioso em aceitar pactos a partir do Governo ou do Congresso.

Na ausência de conciliação a instabilidade aumenta exponencialmente, até porque o desdobramento da crise e da Operação Lava-Jato poderá terminar afetando a todos, mesmo que em graus diferentes.

Se a recusa ao pacto partir do PT e do Governo, não está escrito nas estrelas que no fim da linha de um pacto alternativo entre PMDB e a oposição estará o impeachment de Dilma e ascensão de Temer, embora isso possa ocorrer, se a crise econômica se agravar e um fato jurídico surgir. Mas também pode se prolongar o atual protagonismo do Congresso em convívio com um Executivo fraco. Até quando, não se pode prever.

Por outro lado, se a oposição ficar fora de um pacto bem-sucedido entre PT e PMDB, não se pode afirmar que esse pacto vá além do ajuste fiscal e sustente o governo por quatro anos. A volubilidade da

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relação pode alternar períodos de “sangramento” com operações de estancamento provisório, durante as quais o varejo político tende a correr ainda mais solto. Oimpeachment estará fora do script, mas nunca fora de cogitação.

De todos os cenários, porém, o que parece pior é o da ausência de pactos entre as facções da elite política e sua consequente inação, à espera da conclusão da Lava-Jato, ao som de slogans e panelas. Seria o sangramento contínuo que o senador Aloysio Nunes Ferreira evocou como praga ao governo e ao PT. Além de poder jorrar sangue, nesse cenário basta surgir uma mínima base jurídica para que paire uma névoa sobre o mandato presidencial e/ou o calendário eleitoral. E mesmo na hipótese de ambos serem respeitados, não se pode prever se algum partido chegará a 2018 em condição de se contrapor a uma solução outsider justiceira, tecnocrática ou midiática. Num cenário desses, e se a ele sobreviver o sotaque institucional de Michel Temer, oimpeachment ou a renúncia da Presidente podem surgir como alternativas preferíveis à inação. Temer não terá lutado por isso, mas, no jogo jogado, cavalo que passa selado é para ser montado.

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Paulo Fábio Dantas Neto é cientista político e professor da UFBA.

CONVERSAS NA JANELA: REINVENTAR A POLÍTICA E COCRIAR A DEMOCRACIA

A pauta dos promotores da Marcha do dia 12 se assemelha curiosamente à pauta proposta pelo "ex". Ambas são vazias de assuntos relevantes.

Se o Dia 12 propõe o afastamento de Dilma e o fim do Foro de São Paulo - o que exige legendas para iniciantes - a do "ex" propõe que uma reforma no PT, na já clássica e inútil pregação da "volta à sociedade" - o que também exige outro manual para iniciantes.

Desde 2012, pelo menos, escrevo por aqui que há uma crise na natureza do sistema político como um todo. Ele, de fato, é disfuncional.

Resumindo, quem vive o cotidiano do sistema político - a minoria - acorda, passa o dia e dorme pensando em apenas duas coisas: como carrear mais votos para as próximas eleições e como financiá-las.

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Não por acaso, os partidos se resumem a profissionais especialistas nas engrenagens institucionais, outros em montar clientelas e mais outros batendo de porta em porta de empresários atrás de dinheiro para financiar candidaturas. Longe da agenda de todos eles reunir gente que pensa, que quer melhorar as cidades, especialistas nas mais diversas áreas que são a razão de ser do Estado e dos governos.

Perder tempo querendo recuperar a funcionalidade dos partidos num mundo organizado em rede é como defender a volta das oficinas de artesãos para recuperar a cooperação.

Enquanto o mundo desaba à nossa volta o que falta é um "clic". Gente que se reúna, independente dos partidos e estruturas satélites do século XIX, compartilhe a agenda que pulsa em todos os lugares e dê a ela expressão institucional. Daí poderá sair um , dois , três, dezenas de líderes com autoridade e legitimidade para enfrentar este velho mundo, carcomido, ultrapassado, autorreferente e centrado nos seus próprios interesses.

Reformas política, do Estado, administrativa, tributária, repactuamento federativo, mais participação e colaboração popular, todos são temas relevantes, mas que não têm aderência com o atual sistema político.

Reinventar a política e cocriar a democracia. Podem traduzir de outro jeito, mas é isto.

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“O PT está em um novo recomeço ou está no fim”, diz Tarso

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“O PT está em um novo recomeço ou está no fim”, diz

Tarso

Em entrevista ao programa Diálogos, apresentado pelo jornalista Mário Sérgio Conti, na Globo News, defendeu que o PT precisa fazer as pazes com a sociedade civil. Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Da Redação Depois de utilizar sua conta no twitter para dar sinais de insatisfação com a condução política e econômica do Governo Dilma, Tarso Genro expôs, claramente, suas críticas durante entrevista ao programa Diálogos, apresentado pelo jornalista Mário Sérgio Conti na Globo News. Mesmo ressaltando sua fidelidade ao PT e afirmando que “o país estaria em uma situação bem pior se Dilma não fosse a presidenta”, o ex-governador do Rio Grande do Sul não poupou críticas aos correligionários que estão na administração e na direção partidária.

“O PT está em uma situação extremamente difícil. Ele tem pouca influência sobre o governo e esgotou seu debate interno, o debate interno não flui mais”, afirmou ao destacar que o partido fez um

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pacto de estabilidade pra “sobreviver na crise”. Sobre o futuro, Tarso disse que só sabe que o PT não está no meio: “ou está num novo recomeço, ou está no fim”.

Perguntado sobre o que precisa ser feito para que a sigla consiga superar a crise, o ex-ministro de Lula defendeu a organização de um movimento “de fora pra dentro”. “O PT tem que fazer as pazes com a sociedade civil, petista, democrática, de esquerda e não partidária também. Tem que ouvir intelectuais, empresários democráticos, ouvir militantes sociais e os novos movimentos sociais que surgem e trazer pra dentro dele uma dialética inovadora”.

Os exemplos citados foram a Frente Ampla do Uruguai e o recente processo de renovação do Partido Socialista de Portugal que definiu a escolha de seu presidente em uma votação que contou também com a participação de simpatizantes e não apenas filiados. “Coisas como essa nós temos que fazer para que o PT possa ter um novo vigor político e saia dessa estabilidade burocrática que se encontra hoje”. Em artigos recentes, o petista tem defendido a criação de uma frente de esquerda no Brasil, vinculada a um programa de governo.

Organizador da coalizão política que levou o PMDB para o Governo no começo do segundo mandato do presidente Lula, Tarso Genro relembrou a importância daquele movimento, mas considera que é hora do modelo ser revisto: “O sujeito derrotou o objeto. A coalizão criada para dar estabilidade para governar virou símbolo de instabilidade, imaturidade e de apropriação fragmentária do Estado em funções de interesses regionais e, as vezes, até subalternos”.

Tarso também foi duro ao comentar a condução da economia no Brasil e no mundo. Contrário às políticas de austeridade apresentadas pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy, o ex-governador disse que “a presidenta optou por um ajuste muito semelhante aos ajustes que estavam sendo propostos pelos adversários”. Segundo ele, a exceção é a Grécia, atual referência para a esquerda mundial. “A esquerda tem que colocar sua imaginação em funcionamento. Se é pra combater crises econômicas e financeiras com as mesmas receitas ortodoxas, então a esquerda perde a razão de ser”.

Sobre a operação Lava-jato, ressaltou que a descoberta do esquema de corrupção envolvendo empreiteiras vai servir para melhorar a Petrobras e lembrou que esquema começou antes do Governo Lula. “A corrupção, a violência, a destruição de populações, a apropriação de terras, os assassinatos fazem parte

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da evolução da sociedade capitalista”. Além de criticar corruptos e corruptores, Tarso criticou alguns responsáveis pelas investigações e pelo processo “que manipulam as informações contra o partido que está no Governo”.

Ao final, perguntado sobre a capacidade de Dilma de enfrentar a crise, em comparação com Lula, Tarso Genro resumiu dizendo que o ex-presidente “é um ser político integral, que ia da política para a gestão”, dando orientações constantes e públicas aos seus ministros. Já a atual presidente vai da gestão para a política. “Esse estilo teve eficácia no primeiro governo, mas agora tem a crise e a capacidade de gestão da presidenta está bloqueada por questões políticas”. “A presidenta tem que fazer mais política”.

SUL21.COM.BR|POR JORNALSUL21

Paulo Arantes: O nome da crise

Publicado em 10/04/2015 |

Postscriptum de Paulo Arantes.

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* Este texto foi escrito na primeira semana de abril de 2015 como postscriptumà entrevista “Entre os destroços do presente“ em que Paulo Arantes procurava fechar um diagnóstico das duas décadas de progressismo brasileiro a partir do clima de “polarização” que aparecia como saldo do processo eleitoral de 2014. Neste postscriptum, atento aos sismógrafos da “tempestade perfeita” que veio à tona nos “idos de março” anunciando a implosão, a poucos meses da posse, do governo Dilma, Arantes procura pensar o que significa a esta altura falar em “crise”.

* * *

Uma coisa é fechar o diagnóstico de toda uma época, nas minhas contas, os vinte anos do reinado FHC/Lula. Por mais que travem uma luta de morte por uma rapadura cada vez mais ingovernável, formaram um só bloco cujas raízes entrelaçadas remontam ao processo de saída da Ditadura, que por sinal acabou se confundindo com a derrocada de nosso meio século de modernização desenvolvimentista. A desintegração que seguiu foi provisoriamente estancada, porém num patamar social ainda mais rebaixado, mas ainda assim governável in extremis. Esse dique começou a se romper em Junho. Outra coisa imaginar o drama conclusivo que está se desenrolando agora sob nossos olhos. Não dava mesmo sequer para fantasiar que mal iniciado o segundo mandato, o governo Dilma estaria no chão, aplastado. A tal ponto que até mesmo a hipótese de umimpeachment se tornou uma turbulência que valeria mais a pena economizar, uma má ideia, na opinião da Economist de 28 de março, mas não a ponto de estancar a paranoia dos que temem que um ajuste em si mesmo insano, como provaram ser os regimes de austeridade impostos à periferia europeia, possa dar certo (sic) e se inicie uma recuperação sob medida para uma vitória eleitoral lá na frente. Daí a correria intempestiva, ora à frente, ora atrás das ruas em movimento. Seja como for, tamanha queda, e assim precoce e vertiginosa, jamais se viu. Mas não farei o diário da queda, nem recapitularei a escalada da crise que a precipitou. Como a saturação com todo tipo de palpite e especulação é geral, não vou nem de longe enfiar minha colher de pau na cozinha da conjuntura. Aliás logo estarão se multiplicando as inevitáveis reportagens investigativas sobre as grandes manobras que culminarão num desfecho que ainda ignoramos, embora desconfiemos que de qualquer modo não será uma saída para nenhum dos lados envolvidos nessa queda de

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braço. E se a queda que se avizinha, ou já aconteceu faz algum tempo, não for uma crise como as outras? Nunca se falou tanto em crise, há crise por todos os lados e para todos os gostos, geralmente no modelo esgotamento ou exaustão disso e daquilo, encavaladas e se reforçando mutuamente. Em todo caso, nessa avalanche de diagnósticos, possivelmente ofuscados ou manipulando as guerras culturais entre “petralhas” e “coxinhas”, ninguém se lembrou de reparar na falta de um ingrediente indispensável em todas as crises históricas do país, a subversão. E por uma razão muito simples e tenebrosa: ela foi extirpada com sucesso em 1964. Era essa a ideia, e de acordo com ela encaminhou-se a posterior legalização da nova esquerda, sendo a campanha de criminalização de agora o preço cobrado por aquele indulto. A crescente, inclusive em letalidade, gestão armada da vida social hoje obedece a uma outra racionalidade política, muito diversa do dispositivo militar de outros tempos, que dorme sossegado nos quarteis o sono da garantia da lei e da ordem, nos termos de uma Constituição que normalizou a relíquia arcaica do Golpe. Sem subversivos a caçar, salvo o resíduo amotinado de Junho, devidamente cadastrado pelas derrogações previstas nas brechas da lei, a crise pode até resvalar na anomia, cujas condições, segundo alguns observadores, estão dadas, mas decididamente se trata de uma crise sem inimigo, por mais que vermelhos e azuis queiram passar ao ato e se estripar. Crise sem inimigo: foi assim que nos anos 1990 alguns teóricos começaram a se referir às catástrofes desencadeadas por eventos extremos, “naturais” ou provocados por tecnologias de alto risco, querendo dizer com isso que estavam abandonando o paradigma militar predominante até então, ainda centrado na ideia de ameaças vindas de fora e percebidas como uma agressão desencadeada por agentes destruidores, sendo a crise, naquele modelo concebido ainda sob o efeito dos desastres coletivos da grande guerra e a paranoia da hecatombe nuclear, encarada como uma provação, a hora da verdade na qual a realidade oculta de uma coletividade se revelaria. Estaríamos assim, nesta crise sem subversivos de agora, como que diante de um evento extremo, a terra começando a tremer sob os pés de uma sociedade no entanto inteiramente pacificada desde a nossa última catástrofe, num outro março há 51 anos atrás. Disponho apenas de uma pista nesta primeira tentativa de identificação. Até onde sei, lá pelo fim do ano de 2013, o prognóstico de que uma tempestade perfeitaestava a caminho conheceu uma discreta difusão. Não pesquisei muito, mas parece

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que por essa época o ex-ministro Delfim Neto já anunciava em suas colunas que uma tempestade perfeita (ainda com aspas) se avizinhava, podendo desabar no primeiro semestre do ano seguinte caso não déssemos a devida atenção às “ameaças” das agências de rating de rebaixar a nota de crédito do país, sem falar no início do fim dos estímulos monetários americanos: em algum momento a “emergência” gerada explodiria num desequilíbrio fiscal, inflacionário e cambial que reduziria a pó a economia nacional. Essa “conspiração” obviamente objetiva de eventos simultâneos resultaria na tempestade perfeita que nos puniria sem dó nem piedade. Nesse meio tempo devo certamente ter deixado escapar outras menções do referido alto personagem a essa conjunção tempestuosa que continuaria a nos espreitar caso não nos “ajustássemos”. Uma ocorrência na primeira semana de março, ainda na condição de espada de Dâmocles, trazia por certo embutida a memória dadébâcle política e moral em curso. Para quem não se lembra, a frase tornou-se comum no inglês coloquial americano desde que um bestseller com esse título, depois transposto para o cinema, consagrou-a como sinônimo de evento desastroso produzido pela convergência excepcional de circunstâncias adversas, no caso gerador da metáfora, o naufrágio de um barco pesqueiro colhido em alto mar pela combinação catastrófica de três tempestades, nada mais nada menos. Um outro naufrágio, o do Lehman Brothers e sua constelação de megadesastres, generalizou de vez seu emprego na caracterização de uma crise aparentemente de novo tipo. Desde então assumiu também, segundo pude ler na Wikipédia, uma conotação hipotética do pior possível entre todos os cenários. De volta ao Brasil em “queda livre”, segundo matéria de capa da revista Exame. Lá pelo dia 20 de janeiro, um colunista de O Globo cravava: a “tempestade perfeita” que os mais agorentos previam já está soprando com força mal decorridas duas semanas do segundo mandato, como se poderia constatar apenas pela escalada negativa dos indicadores econômicos básicos, impostos, taxas, juros, tarifas e ameaça real de desemprego rondando. Uma semana depois era a vez do Estadão, mas agora adicionando novos ingredientes, pois a nuvem negra da tempestade perfeita no horizonte seria sobretudo social. Ou melhor,social e climática. Estava demorando a cair a ficha pois segundo consta o emprego original da expressão remonta a uma previsão um pouco mais estilizada de algum serviço metereológico norteamericano, variando apenas a data e o serviço concernido, reservando-se desde então a evocação do termo sempre que ocorrer uma combinação

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obviamente tempestuosa de muitos fatores. Há registros posteriores também quanto ao teor digamos literário da frase, como uma tempestade perfeita de aplausos ou de simpatia. Mas voltemos ao Estadão, ao resumo inspirado do articulista (José Roberto de Toledo): “enchente com falta d’água, calor excessivo com falta de energia, recessão com inflação, crescimento do desemprego com diminuição de benefícios a desempregados – tudo ao mesmo tempo”. Agora? Ou daqui a pouco, tanto faz, o que importa mesmo é que no mais tardar em 2016 essa combinação estará entrando em fase com uma outra tempestade perfeita, desta vez fabricada no copo d’água explosivo das guerras culturais travadas nas redes sociais durante o período de fúria eleitoral. O ponto cego dessa “tempestade social perfeita” encontra-se na dramática dissociação entre fenômenos climáticos cada vez mais intensos, num cenário de oscilações também cada vez mais frequentes entre extremos opostos, e a rotina de inoperância imediatista da casta governante. Devolvendo assim a metáfora à sua matriz, e deixando um pouco de lado o para-raios da crise em que o mandato recém inaugurado se convertera, a primeira nota inteligente encontrada na enxurrada de comentários dos jornalões e adjacências, repercutindo uma queda tão ansiada e cavada, identificava na imagem da crise como uma tempestade perfeita algo como uma mudança radical do “clima” da política – o “tempo” que politicamente está fazendo –, na medida em que, persistindo justamente essa dramática confluência de circunstancias, “o cenário político vai ser radicalmente mudado pelo cenário climático”, e quanto mais radical o novo “clima”, tanto mais irá perdendo valor tudo aquilo que for apenas médio, do estatístico ao político – conforme a conclusão daquela nota preciosa, sem dúvida temendo por sua vez algum surto berlusconiano nativo, nada improvável ante o cenário de anomia que se desenha. E como vimos ao longo da conversa anterior, num ambiente polarizado como o atual, mesmo assimetricamente, dado o eclipse total da esquerda, as situações intermédias tendem a sucumbir, sejam as indefectíveis obras de infraestrutura rotineiramente projetadas para mitigar efeitos no entanto extremos, seja analogamente ideias singelas de repactuações políticas, também receita nativa clássica. Ainda nesta mesma linha de caracterização de uma tempestade perfeita se formando pela conjunção dos dois extremos, o da reversão brusca e drástica das expectativas políticas e os sinais enviados para quem sabe decifrá-los pelo novo regime termodinâmico do planeta, cuja decodificação hesitante vai no limite alimentando um indefinido porém intenso sentimento de impotência,

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na exata acepção em que o evocamos lá atrás, a certa altura da nossa “entrevista”, a propósito da inibição de certas respostas humanas comensuráveis, no caso de uma chuva radioativa por exemplo, o sinal de alarme já soara para a jornalista Eliane Brum, descrevendo para o El País o desenrolar da campanha eleitoral em São Paulo e seu rol de dissociações cognitivas aberrantes, a principal delas a pulsão negacionista ante o colapso do abastecimento de água na região metropolitana, candidatos e gestores da desgraça disputando no máximo a autoria do nó no rabo do gato. A reeleição avassaladora do negacionista mor, que atravessou o primeiro turno repetindo “não vai faltar água” quando a água já faltava, é o fruto envenenado daquela impotência diante de uma crise do quê ninguém sabe ao certo. Segundo Eliane, o referido personagem foi de fato consagrado pela mesma negação da realidade que o eleitor queria confirmar, de sorte que venceu não apesar da crise da água mas também por causa dela, todos embalados pela mesma ilusão do controle. Como se trata de uma crença desesperada num futuro cuja data todos fantasiam, caminhões pipa com escolta policial farão parte daquele cenário político radicalmente mudado pelo cenário climático mencionado há pouco. Noutras palavras, um poder soberano de polícia, enquanto paradigma de governo das crises, será objeto de uma verdadeira demanda popular. Como meses depois, a demanda por intervenção, qualquer intervenção, desde que alguma coisa seja feita. Se há algo que deveria de fato assustar na atual crise com inimigo difuso, é a antevisão igualmente embaçada de uma passagem ao ato de todo esse sentimento de impotência. Mas adiantemos o relógio. As chuvas abundantes de fevereiro e março lavaram a alma inconstante de governantes e governados e fez sumir do radar da tempestade perfeita, enquanto metáfora maior da crise, a sinergia dos extremos climáticos e sociais, substituída por uma outra confluência de tempestades adversas comandadas pelo espetáculo jurídico, do qual até agora ainda mal se entreviu o prólogo policial.Quando o bordão voltou – na mesma semana em que o Brasil atolado foi capa da Economist, depois de enumerar as razões que poderiam levar o país ao precipício, o Time também concluía que o Brasil parecia viver uma tempestade perfeita… –, a chuva de escândalos estava de volta ao seu lugar cativo numa crise invariavelmente apresentada sempre como tridimensional. Como é descrita, por exemplo, numa entrevista do cientista político Marcus Melo. Novamente uma tempestade (desta vez política) perfeita em que convergem políticas de austeridade ceifando empregos, megaescândalos e gente na rua. Embora ainda não tenha recorrido

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à imagem da tempestade perfeita, um outro alto personagem, FHC, que não dá ponto sem nó tal como seu desafeto Delfim, vem multiplicando declarações e artigos semeados de recados do tipo “chegou a hora”, por enquanto apenas de “interrogação”, nos quais não faltam a indefectível enumeração dos três elementos em sinergia desastrosa: na última contagem, pela ordem, clamor da rua, avanço do processo judicial e mídia. Quanto à esquerda desmastreada, sente a tempestade mas ainda não a tinha nomeado, tal a obsessão conspiratória, acrescida da mágoa com a ingratidão de um sistema que a está expulsando pela porta de serviço, até que um artigo noBrasil de Fato, não resistindo ao bordão, colocou tudo, menos o novo “clima” da política, no copo d’água da tempestade perfeita, dos suspeitos de sempre, mídia golpista em primeiro lugar, ao inesperado reconhecimento de que no assim chamado campo popular reinam dúvidas, confusão e conflitos – a matéria é anterior aos 60% de desaprovação entre a renda familiar mensal de até um salario mínimo. E só. Mas não é pouca coisa admitir que desta vez o realejo do governo eternamente em disputa parece desafinar, tampouco o mantra da conspiração sai ileso, pois afinal a sabotagem parece vir de dentro, os infiltrados não são penetras mas convidados de honra. Mais uma vez, esse o ponto cego de uma crise não por acaso encarada como uma tempestade perfeita, que aos poucos vai deixando de ser um lugar comum nascido do jargão metereológico, na mesma medida em que a crise que ela anuncia já não corresponde mais ao antigo conceito de crise. Como se há de lembrar, um conceito dramático por excelência, cuja aclimatação como conceito de época foi reconstituída nos estudos clássicos de Koselleck. Para efeito de contraste, que não poderia ser maior, uma recapitulação sumária dessa translação cujo ponto de origem se encontra nalgum lugar de uma antiga superposição de significações provenientes de três esferas, jurídica, médica e teológica. Em qualquer uma delas, estão em jogo alternativas sem resto entre certo e errado, vida e morte, salvação e danação, exigindo escolhas decisivas. No roteiro que estamos considerando, durante um longo período a acepção médica prevaleceu sobre as demais, seu uso metafórico estendendo-se aos mais variados domínios desde o início dos tempos modernos, salvo o surpreendente retorno, embora secularizado, de sua acepção apocalíptica, para lidar com a novidade da Revolução Francesa enquanto revelação de um novo tempo, precisamente o de um mundo sacudido por crises que anunciam tanto um fim quanto uma passagem de época. Desde então, encarada como uma espécie de

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abertura teatral de todo um horizonte de expectativas, a ideia de crise passou a admitir diversas filtragens, ora como um encadeamento de eventos culminando num ponto decisivo a partir do qual é preciso agir, ora como um ponto único e final, a partir do qual o curso histórico do mundo não será mais o mesmo. Desde sempre nos reconhecemos neste quadro, ao qual Marx acrescentou (ou nele se inspirou) a ideia de que as crises são soluções violentas de contradições existentes: socialmente destrutivas mas mesmo assim “soluções”, é verdade que muito peculiares, nas quais se restabelece momentaneamente o equilíbrio rompido até a próxima erupção. Elas seriam o “negativo do capital”, na formulação bem conhecida de Jorge Grespan, e nesta condição, essencial na definição da temporalidade típica do regime social presidido pelo capital. Desde sempre quer dizer desde que este regime específico de historicidade (François Hartog etc.), se abriu a perdurou durante dois séculos de grandes esperas, ao longo das quais gerações antagonistas foram completando sua educação política pela espera ativa do ponto crítico de uma reviravolta. E se a rotina dessas crises recorrentes não for mais recuperadora? E se o estado crítico no qual se encontra o capitalismo hoje não apontar para qualquer saída digamos reguladora, para dizer o mínimo, tanto à esquerda ou muito menos à direita? Numa palavra, e se a crise, que não é de agora, for de um tipo totalmente novo? Pelo menos vai nessa direção Wolfgang Streeck, o sociólogo alemão ao qual recorri em mais de uma ocasião ao longo da “entrevista” feita ainda no escuro do apagão político que viria pela frente. Como se há de recordar, é dele a ideia duplamente herética de que o capitalismo está agonizando, mas que o seu fim é um processo e não um acontecimento disruptivo, e um processo destrutivo por incapacidade de autocontenção, uma vez desmantelados os mecanismos que historicamente exerciam tal função, como as falsas mercadorias trabalho, natureza e dinheiro, na distinção clássica de Polanyi, e mais, seu fim está chegando sem que nenhuma sociedade melhor e mais avançada esteja à vista e devidamente impulsionada por um sujeito portador da tarefa histórica de abrir-lhe caminho, o que suporia um grau de controle político sob o nosso destino comum com o qual não sabemos mais sequer sonhar. Sei que é duro de engolir, mas chega a ser quase intuitiva, quando se olha à volta, essa imagem de um sistema social em desmantelo crônico por razões internas e independentemente de uma alternativa viável. Mais duro de engolir enfim a ideia de que pode estar acontecendo da humanidade não se defrontar mais só com os problemas que pode resolver. Em tempo, isto não é o fim do

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mundo. Apenas o fim de dois séculos de espera “progressista”, encerrado justamente por uma crise de um novo tempo, por assim dizer empurrada com a barriga, ritualmente adiada pela compra de tempo, pela renovação dos prazos para o desastre, que ficará para a próxima vez etc. E no entanto, nada mais familiar do que esse cenário de inação, mal camuflada pela frenética proliferação de correções provisórias para gerir a multiplicação das crises de todo tipo no curto prazo. Salvo para aprofundar o estrago, como na concepção do capitalismo de desastre segundo Naomi Klein. Pela primeira vez (e última, por definição) Crise não é mais sinônimo de abertura de oportunidades, para agentes reformistas ou revolucionários, nem mesmo ou melhor, sobretudo, o aquecimento global enquanto janela de oportunidades para relançar a acumulação, muito menos, como argumenta a mesma Naomi Klein em seu último livro, a brecha para a reviravolta anticapitalista sonhada pela última vez, pois se é verdade que a mudança climática muda tudo, ela mudou também a natureza da crise, pois nesse cenário específico é ainda mais flagrante, nunca será demais repisar, a inoperância autodestrutiva geral. Definitivamente, não haverá mais um novo Agosto de 1914. Vamos encurtar, já que por esse atalho chegamos mais rapidamente ao meu ponto. Vejamos se não é o caso: ao enumerar e reunir numa confluência desastrosa as cinco doenças sistêmicas do capitalismo agonizante de hoje por motivo de enfraquecimento das restrições (tradicionais, institucionais e políticas) ao seu avanço desimpedido (estagnação, redistribuição oligárquica, pilhagem do setor público, corrupção endêmica e sistêmica, anarquia geopolítica global), penso que o nosso teórico (Wolfgang Streeck) está descrevendo o desenrolar concatenado de uma tempestade perfeita, cuja duração no entanto pode se estender por anos a fio até alcançar a marca fatal dos dois graus centígrados a mais que arrastaria consigo o que porventura sobrar até lá, por isso o sistema não pode parar de comprar tempo. Que é inteiramente outro, para início de conversa, sendo outro, como sugerido, literalmente, o “clima” da política, como mudou o da história, revista pelo prisma do tempo geológico do Antropoceno. Mas passemos. A outra metade do argumento viria da redescrição da mudança climática também como uma tempestade perfeita, cada vez menos metafórica, como na “tempestade para os meus netos”, de James Hansen. Para uma demonstração de A a Z, sobretudo no que concerne à inércia política, à dilatação indefinida dos prazos, Stephen Gardiner construiu um modelo de tempestades convergentes, alimentadas por uma tal assimetria de poder que torna os agentes relevantes

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cada vez mais vulneráveis a uma espécie nova daquela corrosão do caráter identificada por Richard Sennett no mundo do trabalho contaminado pelas estratégias perversas de investimento no capital humano. Tudo bem pensado, nos dois processos de agonia como tempestade perfeita, a do capitalismo e a mudança climática, dois metabolismos enfim reunidos num só bloco comido pela entropia, ainda falar em “crise” é apenas uma maneira de dizer para nos fazermos mal e mal entender, pois saiu de cena o personagem capaz de tomar decisões no ponto crítico máximo da crise, ou melhor, como a cena é de inoperância e muita gesticulação ao redor, este ponto de virada pode até dar o ar de sua graça porém inutilmente, tal a amplitude do “tétano do não-ir-adiante” que essa crise sem crises propagou. Feita a ressalva, podemos até compreender o vocabulário e a gramática da crise, mas o seu imaginário de fundo, histórico aliás, já não é mais o nosso. De um modo ou de outro, sabemos disso. Tanto que a imagem da tempestade perfeita se alastrou até a saturação, e como tal nos alcançou num momento em que logo faremos a experiência de que a hipótese de uma estagnação secular já é o “novo normal”, nas palavras de um oráculo financeiro em Washington, e sumidades neokeynesianas dizendo amém. Então é isso, a tempestade perfeita que está nos sacudindo é mais que uma simples metáfora para uma crise mais inusual do que as usuais, tanto é que compartilhada (argh!) por gregos e troianos, na verdade a sinalização em busca de um conceito comum. De sorte que a “seca” anunciada pelo regime de austeridade em que estamos entrando para valer, por exemplo, pode ser entendida igualmente como um evento tão extremo tal como a outra, a seca propriamente dita e que isto que pode parecer apenas um jogo de palavras, isto sim, “muda tudo”, como no título do livro em que Naomi Klein narra a guerra do capitalismo contra o planeta. Extravagancia? Pode até ser, nunca se sabe. Todavia não seria menor o disparate, imaginar ao contrário que a hora é agora, que chegou enfim a hora de tirar da cartola da crise um coelho novo porém idêntico ao falecido quando jovem. Não será demais insistir mais uma vez, agora na intenção da geração antagonista que irá literalmente respirar os ares de um outro planeta, que o clima da história também mudou, por isso a crise não comporta mais um momento ótimo de resolução, pois é uma longa tempestade perfeita. *** Paulo Eduardo Arantes é filósofo, professor aposentado do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP),

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onde lecionou entre 1968 e 1998. Publicou, entre outros, Hegel: a ordem do tempo (1981), Ressentimento da dialética (1996), Extinção (2007) e O novo tempo do mundo (2014). Coordenador da coleção Estado de Sítio da Boitempo, colaborou com O que resta da ditadura: a exceção brasileira, organizado por Vladimir Safatle e Edson Teles, com o ensaio “1964, o ano que não terminou”.

Comitê Central propõe uma nova orientação de

construção para a Esquerda Marxista

13/04/2015 - http:// www.marxismo.org.br/content/comite-central-propoe-uma-nova-

orientacao-de-construcao-para-esquerda-marxista

Esquerda Marxista

Nos dias 20 e 21 de abril ocorrerá a Conferência Nacional da Esquerda Marxista. Plenárias para a eleição de delegados estão ocorrendo em diferentes estados do país utilizando como base o informe político apresentado pelo Comitê Central (CC) da organização.

Esta conferência ocorre em uma situação política singular no Brasil e no mundo, que exige o aprofundamento de nossas análises e a

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adoção de novas táticas para intervenção na luta de classes. Este é o sentido do informe apresentado pelo CC, do qual buscaremos pincelar algumas questões centrais neste texto.

A marca da atual situação política é a crise pela qual passa o capitalismo, que traz consigo a instabilidade de todos os governos que se dedicam a salvar o sistema. De um canto a outro do mundo, principalmente a partir de 2011, vimos a explosão de mobilizações massivas de jovens e trabalhadores. A Primavera Árabe, o movimento Occupy e grandes manifestações contra o racismo e a violência policial nos EUA, Praça dos Indignados, greves gerais na Espanha, assim como em Portugal, Itália, França, Inglaterra etc. Na Grécia, mais de 30 greves gerais desde 2008. Esta é a expressão de que o proletariado mundial quer lutar contra os ataques, por conquistas, contra a opressão e a exploração do capitalismo.

Mas de tudo isso, devemos tirar algumas conclusões, como propõe o informe do CC. A primeira é de que essas grandes manifestações não estão se expressando por dentro dos partidos tradicionais da classe trabalhadora como ocorreu no passado. Não surgem neles correntes de esquerda, ao contrário, estes partidos estão ossificados e vão ainda mais à direita com praticamente todos seus componentes. Por isso partem os laços com as forças vivas da sociedade.

A segunda conclusão, que decorre da primeira, é de que a classe trabalhadora busca se reorganizar sob um novo eixo de independência de classe. A expressão mais evidente disso no último período foi o crescimento e a vitória do Syriza, na Grécia, e o surgimento e ascensão do Podemos, na Espanha. Mesmo com as deficiências e vacilações das direções desses partidos, o fato é que eles conseguiram arrastar parcelas significativas das massas, com um discurso mais à esquerda, diante da falência política dos partidos tradicionais da classe.

Esta situação política que varre o mundo chegou ao Brasil com as Jornadas de Junho de 2013, seguiu com o início das greves de massa em 2014 e com as eleições de 2014.

Ao mesmo tempo, diante da submissão e da covardia da direção do PT, os setores mais reacionários sentem-se à vontade para fazer seus ataques ao partido e ao conjunto da luta dos trabalhadores. A presidente é ameaçada de assassinato por Bolsonaro e nada faz, sedes do PT são alvo de ataques e pede-se para a polícia

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investigar. Sem contar a farsa do “julgamento do mensalão”, com dirigentes condenados sem provas e sem reação.

O partido é incapaz de convocar a militância às ruas por causa da própria política que aplica. A direção do PT dissemina a confusão e permite a reorganização da direita com sua política de colaboração de classes.

No entanto, a classe trabalhadora não está acuada, nem derrotada, ao contrário, está disposta ao combate. É o que mostrou este ano a greve dos operários da Volks, da Mercedes e da GM, a greve de professores do Paraná, dos garis, as diferentes greves que seguem pelo país.

Dilma e a direção do PT aplicam um estelionato pós-eleitoral e o governo vais mais à direita. A cada mobilização da pequena-burguesia e das classes médias, comandadas pela Rede Globo, curva-se ainda mais ao capital.

Lula, em plenária em São Paulo, em 31 de março, defendeu Dilma e a política de “ajustes” do governo dizendo com orgulho que em 2003 “eu fiz um ajuste maior do que esse”. Quem esperava que algum combate resultasse desta plenária, frustrou-se. Nenhuma fala contra as MPs 664 e 665, que retiram direitos trabalhistas e previdenciários, nem mesmo do presidente da CUT, que formalmente tem posição contrária a estas medidas.

Uma constatação impõe-se, a vanguarda de esquerda abandonou o PT e aprofunda-se o rompimento do partido com sua base social, a classe trabalhadora. A juventude já se retirou faz tempo. O governo afunda e o partido tenta manobrar com falsas perspectivas, reforma política, frente por reformas, frente ampla estilo Uruguai etc.

O fato é que a direção está destruindo o partido e não há nenhuma reação significativa ou real dentro do PT. Nenhuma. É como um organismo politicamente moribundo.

Nestas circunstâncias, o CC da Esquerda Marxista resolveu propor à Conferência Nacional a saída do PT. Os melhores militantes da classe e da juventude estão fora. O partido tomou o caminho do PASOK grego, do PS francês, entre outros. Nada mais há para fazer aí. Esta orientação abre as portas para um salto de construção da Esquerda Marxista e tem sido agarrada com muito ânimo pelos militantes e apoiadores.

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Como perspectiva imediata, apresentamos a proposta de uma Frente da Esquerda, uma Frente de intervenção na luta de classes, contra os ataques do governos e patrões, pelas reivindicações, buscando unir grupos, organizações, coletivos, movimentos e militantes que se mantém fiéis à luta de classes, à luta pelo socialismo.

Uma frente que não tem nada a ver com estas instituições podres sustentados pela direção do PT, que busque a unidade de jovens e trabalhadores que lutam por um novo mundo, livre da opressão capitalista, um mundo socialista. Junte-se a nós nesse combate!

Articulação de Esquerda apresentou

projeto de resolução ao Diretório Nacional

do PT

17 de abril de 2015 - http://www.pagina13.org.br/resolucoes-e-documentos-da-

ae/articulacao-de-esquerda-apresentou-projeto-de-resolucao-ao-diretorio-nacional-do-

pt/#.VTJJGCFViko

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PROJETO DE RESOLUÇÃO AO

DIRETÓRIO NACIONAL

apresentada pela tendência petista Articulação de Esquerda

O PT vive um momento decisivo de sua história. Ou mudamos a política do Partido e a política seguida atualmente pelo governo Dilma; ou corremos o risco de sofrer uma derrota profunda, que

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afetará não apenas o PT, mas o conjunto da esquerda política e social, brasileira e latino-americana.

Tivemos êxito em ampliar o bem-estar social – por intermédio da geração de empregos e aumento da massa salarial e do poder aquisitivo da população, bem como da adoção exitosa de programas de moradia, saúde e outros – e a soberania nacional, também através de uma política externa “altiva e soberana”. Fortalecemos o Estado, na contramão do Estado Mínimo neoliberal. Ampliamos certos direitos e conquistas democráticas. E são estes avanços que explicam nossas vitórias em quatro eleições presidenciais consecutivas.

Mas ao longo destes mais de 12 anos de presidência petista, não realizamos mudanças estruturais, que retirassem do grande capital o controle sobre as alavancas fundamentais da economia e da política brasileira.

Controlando estas alavancas, a oposição de direita, o oligopólio da mídia e o grande capital desencadearam uma ofensiva geral que inclui a desmoralização política e ideológica do petismo, o estímulo à sabotagem por parte de setores da base aliada, a pressão para que o governo aplique o programa dos que perderam a eleição, a mobilização nas ruas dos setores conservadores, a ameaça permanente de impeachment e a promessa de nos derrotar eleitoralmente em 2016 e 2018.

Hoje vivemos mais um destes momentos de definição entre dois caminhos para o Brasil: ou bem regressamos ao desenvolvimento conservador de viés neoliberal, com dependência externa, restrições às liberdades democráticas e aprofundamento da desigualdade social; ou bem avançamos em direção a um desenvolvimento de novo tipo, democrático-popular e articulado ao socialismo.

O Partido dos Trabalhadores defende que a solução para a crise política passa por mais democracia, não por menos democracia.

Por isto reafirmamos nossa defesa da Assembleia Constituinte, da reforma política, da participação popular e da legitimidade dos processos eleitorais. Se a oposição de direita quer nos derrotar, que se organize para disputar as eleições de 2016 e 2018

Pelos mesmos motivos, o PT defende tolerância zero com a facção golpista da direita. As articulações golpistas, especialmente as vindas de militares da ativa ou da reserva e de meios de

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comunicação, devem ser tratadas como determina a Constituição e a legislação nacional.

Para enfrentar a crise e a ofensiva conservadora em curso, nosso partido é chamado a cumprir pelo menos cinco grandes tarefas.

A primeira tarefa é ocupar as ruas. A oposição de direita controla parte importante do Judiciário, do Parlamento e do Executivo, em seus diferentes níveis. Agora está trabalhando intensamente para também controlar as ruas, utilizando para isto sua militância mais conservadora, convocada pelos meios de comunicação, mobilizada com recursos empresariais e orientada pelas técnicas golpistas das chamadas “revoluções coloridas”. Caso a direita ganhe a batalha de ocupação das ruas, não haverá espaço nem tempo para uma contraofensiva por parte da esquerda. Assim, a primeira tarefa de cada petista deve ser apoiar, participar, mobilizar e ajudar a organizar as manifestações programadas pelos movimentos e organizações das classes trabalhadoras. Assume particular importância a mobilização dos próximos dias contra a terceirização e a retirada de direitos dos trabalhadores e por reformas democrático-populares num 1º de Maio de lutas e de massas. A segunda tarefa é construir uma frente democrática e popular. Há várias iniciativas em curso, algumas delas sem o PT e em alguns casos até mesmo contra o PT. Nosso Partido deve procurar as forças que elegeram Dilma no segundo turno presidencial e que defendem as reformas estruturais, propondo a elas que se constitua uma frente popular em defesa da democracia e das reformas. O programa mínimo desta frente democrática e popular deve incluir a revogação das medidas de ajuste recessivo; a luta contra o PL 4330 e contra a redução da maioridade penal; o combate à corrupção; a reforma tributária com destaque para o imposto sobre grandes fortunas; a defesa da Petrobrás e da industrialização nacional; a ampliação das políticas públicas universais como saúde e educação; a reforma política e a democratização da mídia. A frente democrática e popular é essencial para derrotar o golpismo e libertar o governo da chantagem peemedebista. Mas o objetivo principal da frente democrática e popular é lutar por transformações estruturais, sendo para isto necessário construir instrumentos de articulação política e de comunicação de massas que nos permitam enfrentar e vencer o oligopólio da mídia. A terceira tarefa é mudar nossa estratégia. Se queremos melhorar a vida do povo, se queremos ampliar a democracia, se queremos afirmar a soberania nacional, se queremos integrar a

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América Latina, se queremos quebrar a espinha dorsal da corrupção, é preciso realizar reformas estruturais no Brasil, que permitam à classe trabalhadora controlar as principais alavancas da economia e da política nacional. Para isto, precisamos de uma aliança estratégica com as forças democrático-populares, com a esquerda política e social. Precisamos, também, combinar luta institucional, luta social e luta cultural. Recuperar o apoio ativo da maioria da classe trabalhadora, ganhar para nosso lado parte dos setores médios que hoje estão na oposição, dividir e neutralizar a burguesia, isolando e derrotando o grande capital transnacional-financeiro. Isso implica abandonar a conciliação de classe com nossos inimigos. A quarta tarefa é alterar a linha do governo. É plenamente possível derrotar a oposição de direita, se tivermos para isto a ajuda do governo. É possível derrotar momentaneamente a oposição de direita, até mesmo sem a ajuda do governo. Mas é impossível impor uma derrota estratégica à direita, se a ação do governo dividir a esquerda e alimentar a direita. Por isto, o 5º Congresso do PT deve dizer ao governo: que os ricos paguem a conta do ajuste, que as forças democrático-populares ocupem o lugar que lhes cabe no ministério, que a presidenta assuma protagonismo na luta contra a direita, contra o oligopólio da mídia e contra a especulação financeira.

A opção por ajuste que vai provocar recessão e segue a lógica de cortar “despesas” trabalhistas (MPs 664 e 665) e aumentar juros beneficia o setor financeiro e seus sócios, em detrimento do restante da sociedade.

Um país que crescia pouco ou não crescia, necessitava de outro tipo de “ajuste fiscal”. O Brasil necessitava e segue necessitando de um “ajuste fiscal” que transfira recursos da especulação para a produção, da minoria rica para a maioria trabalhadora. Só desta forma será possível combinar a recomposição da indústria – sem a qual não há crescimento nem desenvolvimento – com a ampliação do bem estar social.

Frente a tudo isto, é fundamental que o PT dispute à esquerda os rumos do governo da presidenta Dilma Rousseff, reivindicando o programa vitorioso no segundo turno da campanha presidencial e a seguinte plataforma de reformas estruturais: a) Reforma política, através de uma Constituinte exclusiva precedida de plebiscito oficial. Destacamos na reforma política a luta pelo fim do financiamento político empresarial, combinado a um

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combate permanente contra a corrupção na vida econômica e social, no Estado e nos partidos políticos;

Desde a eleição de Eduardo Cunha para dirigir a Câmara dos Deputados mais conservadora desde a redemocratização, estamos sofrendo uma ofensiva da direita no debate da reforma política. Na verdade, a direita mudou de tática sobre o tema. Se antes atuava para impedir a aprovação dos projetos da esquerda no Congresso Nacional, agora quer aprovar sua própria proposta de reforma política.

Este quadro reforça a centralidade da mobilização do campo democrático-popular por um plebiscito oficial que convoque uma Constituinte exclusiva e soberana do sistema político, sem prejuízo de avançarmos em medidas imediatas de uma reforma política popular, como a proibição do financiamento empresarial, o fim das coligações nas eleições proporcionais, o voto em listas partidárias, a paridade de gênero, a ampliação dos canais de participação popular, entre outros.

Para incidir nas próximas eleições, a direita trabalha com a meta de aprovar a contra-reforma política (PEC 352) no Congresso Nacional até o final de setembro e atua em jogo combinado com o ministro do STF Gilmar Mendes, que segura há mais de um ano uma Ação de Inconstitucionalidade (ADI 4650) de iniciativa da OAB que proíbe o financiamento empresarial. No STF, a ação já alcançou a maioria de 6 a 1 favorável à proibição. No entanto, se a PEC da contra-reforma for aprovada neste meio tempo, constitucionalizando o financiamento empresarial, corremos o risco da ação ser prejudicada. Daí a importância do movimento “Devolve, Gilmar”.

Desde 2013, o PT e a sua bancada têm posição contrária à PEC por considerá-la uma contrarreforma política, especialmente por constitucionalizar o financiamento eleitoral empresarial e por abandonar o sistema proporcional em favor do chamado “distritão”.

Neste momento é fundamental criarmos uma unidade entre as três principais campanhas pela reforma política que têm presença do campo democrático-popular – o Plebiscito Constituinte, a Coalizão e o projeto de iniciativa popular do PT. Preservando suas bandeiras próprias, estas três campanhas devem marchar unificadas contra o retrocesso da PEC da contrarreforma e pelo “Devolve, Gilmar!”.

Ao mesmo tempo, é mais do que oportuno para a presidenta Dilma, os movimentos sociais e partidos de esquerda resgatarem o programa vitorioso das urnas, que defendia uma reforma política

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democrática e a convocação de um plebiscito oficial para dar voz ao povo nas mudanças do sistema político.

b) Democracia na comunicação, com a Lei da Mídia Democrática e a implantação das principais resoluções da Conferência Nacional de Comunicação de 2009; c) Democracia representativa, democracia direta e democracia participativa, para que a mobilização e luta social influencie a ação dos governos, das bancadas e dos partidos políticos. O governo precisa dar continuidade à participação social na definição e acompanhamento das políticas públicas e tomar as medidas para reverter a derrubada da Política Nacional de Participação Social, objeto de decreto presidencial cancelado pela maioria conservadora da Câmara dos Deputados no dia 28/10/ 2014; d) Pauta da classe trabalhadora, incluindo a luta contra o PL 4330 (terceirização), a luta contra as MP 664 e 665, o fim do fator previdenciário, a implantação da jornada de 40 horas sem redução de salários, assim como as medidas indicadas por seis centrais sindicais em nota divulgada dia 13/1/2015. e) Reformas estruturais, com destaque para a Lei da Mídia Democrática, a reforma política, as reformas agrária e urbana, a universalização das políticas de saúde e educação, a defesa dos direitos humanos e a desmilitarização das Polícias Militares; f) Salto na oferta e na qualidade dos serviços públicos oferecidos ao povo brasileiro, em especial na educação pública, com reformas pedagógicas e curriculares no ensino básico, médio e universitário, regulamentando o Sistema Nacional de Educação (SNE) previsto no Plano Nacional de Educação (PNE); no transporte público; na segurança pública e no SUS, sobre o qual reafirmamos nosso compromisso com a universalização do atendimento e o repasse efetivo e integral de 10% das receitas correntes brutas da União para a saúde pública; g) Ampliação da importância e dos recursos destinados às áreas da comunicação, da educação, da cultura e do esporte, pois as grandes mudanças políticas, econômicas e sociais precisam criar raízes no tecido mais profundo da sociedade brasileira; h) Proteção dos direitos humanos, defender os direitos e a vida das mulheres, criminalizar a homofobia, enfrentar o racismo e os que buscam criminalizar os movimentos sociais, lutar contra a redução da maioridade penal. Afirmamos o compromisso com a revisão da Lei da Anistia de 1979 e com a punição dos torturadores. Assim como com a reforma das polícias e a urgente desmilitarização das PMs, cuja ineficiência no combate ao crime só

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é superada pela violência genocida contra a juventude negra e pobre das periferias e favelas; i) Soberania efetiva sobre as riquezas nacionais, entre as quais o Pré-Sal, e controle democrático sobre as instituições que administram a economia brasileira, entre as quais o Banco Central, a quem compete entre outras missões combater a especulação financeira que está por detrás das candidaturas da oposição de direita; j) Política de desenvolvimento de novo tipo, ambientalmente orientada, articulada com as reformas estruturais democráticas e populares (com destaque para as reformas urbana, agrária e tributária) e com nossa luta pelo socialismo. A quinta tarefa é mudar o próprio PT. Precisamos de um partido à altura dos tempos em que vivemos. Das direções até as bases, é preciso realizar transformações profundas. Precisamos de um partido para tempos de guerra.

O processo de construção de um partido dos trabalhadores exige uma constante correção de rumos, através da reafirmação de sua estratégia, da atualização das políticas e táticas, e do aprofundamento da democracia interna, tendo em vista preservar o partido daqueles métodos, hábitos e costumes que ameaçam destruí-lo ou deformá-lo totalmente.

É preciso que o PT volte a ser um partido que atua também nos anos ímpares e que sabe combinar luta social, luta cultural, construção partidária, com disputa eleitoral, ação parlamentar e governamental.

Isso implica que nosso 5º Congresso aponte tarefas imediatas ao PT como impulsionar a constituição de frentes democráticas e populares em todo o Brasil; construir uma política de comunicação de massas, articulando impressos (jornais e revistas), rádio, televisão e redes sociais; reconstruir sua rede de organizações de base, através da constituição de núcleos do PT nos locais de trabalho, de moradia, de estudo e setoriais temáticos; reorganizar seu trabalho de formação, do básico à formação de quadros dirigentes; eleger as direções partidárias nos congressos partidários, com o fim do PED e da influência das práticas eleitorais burguesas nos processos internos; organizar a atuação e a influência de massas do petismo entre os jovens, através de uma JPT militante e de massas; reafirmar a paridade de gênero e as cotas étnico-racial e de juventude na composição das direções partidárias; garantir a autossustentação financeira, eliminando a dependência do partido dos recursos financeiros doados pelo

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empresariado, seja para fazer campanhas eleitorais, seja para conduzir o cotidiano da vida partidária; fortalecer nosso trabalho de relações internacionais e colocar a política no comando e reafirmar o caráter de classe do Partido, reafirmando que PT pretende continuar sendo um partido socialista e da classe trabalhadora.

A luta contra a corrupção

Para cumprir estas tarefas, é preciso sair da defensiva. E sair da defensiva inclui enfrentar de outra forma o tema da corrupção.

Independentemente das razões que levaram a isto, o fato é que neste momento o PT está perdendo a batalha da opinião pública no que diz respeito ao tema corrupção.

Entender os motivos disto e adotar medidas para reverter esta situação tornou-se, hoje, uma das condições indispensáveis para nos tirar da defensiva política.

Para reagir a tais ataques, o PT precisa mudar radicalmente sua linha de defesa e seus contra-ataques.

Mas mesmo que modifiquemos a linha do governo, ainda assim reverter a situação dependerá de recuperarmos nossa credibilidade perante amplos setores das classes trabalhadoras. E para isto é preciso que o PT dê sinais inequívocos — para as classes trabalhadoras — de que reconhecemos ter cometido erros graves e que estamos corrigindo estes erros.

Este é o sentido principal das medidas apontadas abaixo: dialogar e recuperar a confiança de nossa base social.

Apoiar todas as investigações policiais e judiciais contra o mar de corrupção que as grandes corporações privadas capitalistas impuseram ao país, seja em relação à Petrobras, seja em relação à construção de rodovias, ferrovias, usinas hidrelétricas, obras públicas em geral etc.

Defender a mais ampla publicidade para todas as informações e a formação de uma “comissão de acompanhamento” constituída por instituições democráticas para acompanhar e cooperar com as investigações.

Declarar que a partir de agora o PT se recusa a receber contribuições de empresas privadas em suas campanhas eleitorais. Essa decisão independe de mudanças na legislação atual. Ou seja: será adotada mesmo que a lei continue permitindo a doação de

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recursos de empresas privadas a partidos políticos. Ao mesmo tempo, não receber mais recursos empresariais para financiar a atividade partidária.

Prosseguir lutando junto ao STF e no Congresso Nacional por uma legislação que proíba terminantemente tal tipo de contribuição corruptora. Mas, independentemente do que decidam a Justiça e o Congresso, nossas campanhas eleitorais e a ação cotidiana do Partido serão levadas avante sem este tipo de contribuições empresariais.

O PT formará um juízo político próprio acerca das pessoas envolvidas, evitando repetir o mesmo erro cometido em 2005, quando o Partido nem defendeu, nem puniu adequadamente os envolvidos, deixando esta tarefa para a Justiça, que seguiu critérios que como se viu não foram de modo algum neutros (como demonstra o caso do “mensalão” tucano).

Para formar seu próprio juízo, o Congresso do Partido nomeará uma Comissão Especial de Investigação, com mandato determinado, composta por militantes eleitos/as pelo voto dos delegados e delegadas ao 5º Congresso em votação nominal e secreta, para examinar todos os casos em que militantes petistas são acusados de desvios éticos e de corrupção.

Esta Comissão terá o poder de determinar liminarmente a suspensão da filiação partidária e o afastamento de atividades dirigentes, já no decorrer das investigações, cabendo à direção partidária aprovar o relatório da Comissão e determinar as punições que couber em cada caso.

Os resultados finais dos trabalhos desta Comissão serão apresentados publicamente, em plenárias com a militância partidária.

Concluídos os trabalhos da Comissão, ela se converterá em Corregedoria permanente.

Como qualquer partido, o PT está sujeito a ter nas suas fileiras pessoas que cedem à corrupção. Mas, diferente de certos partidos, o PT se antecipará em identificar e punir quem o faça. Entre outros motivos porque a corrupção é antagônica ao nosso projeto de sociedade.

São Paulo, 17 de abril de 2015

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Bruno Elias, Jandyra Uehara, Adriano de Oliveira, Rosana Ramos Share on facebookShare on twitterShare on emailMore Sharing Services10

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5. Refundar a escola - PÚBLICO www.publico.pt/sociedade/noticia/refundar-a-escola-1689648

4 dias atrás - Refundar a escola é uma necessidade para que os alunos encontrem na vida escolar a alegria do conhecimento.

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7. Tarso Genro ressuscita tese da refundação do PT - Poder ... poderonline.ig.com.br/.../tarso-genro-ressuscita-tese-da-refundacao-do-p...

o o

segunda-feira, 9 de setembro de 2013. Nota anterior · Todas as notas · Próxima nota · Partidos | 16:00. Tarso Genro ressuscita tese da refundação do PT ...

8. ROTEIRO DE DISCUSSÃO PARA A REFUNDAÇÃO DO PT ... https://criticasocialista.wordpress.com/.../roteiro-de-discussao-para-a-refu...

o Se fôssemos fundar um novo partido deveríamos nos debruçar sobre a elaboração de dois documentos: um programa e um estatuto. Acredito que o mesmo ...

9. Refundação Comunista – Wikipédia, a enciclopédia livre pt.wikipedia.org/wiki/Refundação_Comunista

o o

Logomarca da Refundação Comunista. ... fórum composto, em grande parte, por marxistas até então filiados ao Partido dos Trabalhadores. ... de Paris, anima os momentos avançados da Segunda Internacional, regenera-se na Revolução de ...

10. Nem continuísmo, nem desistência refundar o PT! - Carta ... cartamaior.com.br/?/Coluna/Nem-continuismo-nem...refundar-o-PT-/...

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o 8 de set de 2005 - Nem continuísmo, nem desistência - refundar o PT! ... A segundaresposta é garantir o direito dos militantes e filiados ativos - reduzido hoje ao ...

Falência do PT gera

instabilidade política

ESCRITO POR VALÉRIA NADER E GABRIEL BRITO, DA REDAÇÃO

SEGUNDA, 16 DE MARÇO DE 2015

http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10596%3Amanchete160315&catid=34%3Amanchete

ÍRESOLUÇÃO diretprorio nacional do PT

Conheça a nova resolução do Diretório

Nacional do PT

O documento vai ajudar o partido a conduzir a luta em defesa da democracia

17/04/2015 - 20h39 / Por Agência PT

24

A Executiva Nacional do PT definiu, durante a reunião com lideranças, nesta sexta-feira (17), em São Paulo, a nova resolução que guiará os próximos passos da legenda.

Entre as questões centrais, está a determinação para o partido não mais aceitar doações empresarias para custear campanhas

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eleitorais. A proposta que será detalhada e analisada no 5º Congresso Nacional do PT, marcado para acontecer entre os dias 11 e 13 de junho, em Salvador.

Outro ponto do documento convoca a militância a participar ativamente das mobilizações em defesa do governo. Para a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), é fundamental o partido a convocação dos militantes. “Vamos participar com toda a energia nos atos do dia 1º de maio”, disse Rosário.

A Executiva Nacional se posicionou também contrária ao PL 4330, a chamada Lei da Terceirização, contra a PEC 171, que determina a redução da maioridade penal, e a PEC 215, que altera a forma de demarcação das terras indígenas. Os representantes do partido definiram também a posição favorável ao projeto de lei da taxação de grandes fortunas e reafirmaram a luta pela reforma política e regulação da mídia.

Na avaliação do membro da Executiva Nacional, José Paludo (PT-SC), a reunião da conjuntura política foi importante porque o partido sofre atualmente com uma crise política. “Setores da mídia e judiciário tentam convencer a opinião pública que o PT é o responsável pela corrupção sistêmica do país. O partido sofre com acusações e prisões arbitrarias”, disse Paludo.

Leia a íntegra da Resolução:

RESOLUÇÃO POLÍTICA

O País assiste há semanas uma escalada das forças conservadoras. Esse movimento, de profundo caráter reacionário, se estende das instituições à disputa das ruas, da batalha de ideias e informações à manipulação de investigações policiais, da agenda econômica aos direitos civis. Seu propósito é indisfarçavel: derrotar a administração da presidenta Dilma Rousseff, revogar conquistas históricas do povo brasileiro e destruir o Partido dos Trabalhadores.

Esta ofensiva engloba os interesses políticos e de classe dos setores que perderam o comando do Estado em sucessivas batalhas eleitorais desde 2002, mas agora rearticulados para interromper o processo de mudanças iniciado pelo ex presidente Lula. Para tanto, tentam impor seu programa ao governo e ao país, banir a esquerda como alternativa de poder e criminalizar os

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movimentos sociais.

A oposição de direita, liderada pelo PSDB, busca fundir sua tática à ação dos grupos reacionários de caráter extraparlamentar, responsáveis pela convocação das camadas mais abonadas à mobilização contra o mandato constitucional da presidenta Dilma Rousseff. Cada dia fica mais clara a intenção golpista dessa política, encarnada por politicos aventureiros e bacharéis de plantão, que ensaiam processo de impeachment sem qualquer base jurídica ou legal.

A maioria conservadora no parlamento empenha-se na aprovação de contra-reformas que retiram direitos dos trabalhadores, preservam mazelas do atual sistema político e impõem retrocesso a avanços com relação a direitos civis, políticos e sociais. Além do caráter regressivo dessas medidas, revela-se a intenção de emparedar o governo e deixá-lo de mãos atadas em momento de gravidade da situação nacional.

Importantes empresas de comunicação, que efetivamente exercem o monopólio da produção e veiculação de informações, ocupam a linha de frente da empreitada restauradora. Abertamente, comandam a onda reacionária, estimulam o terrorismo econômico, convocam a ocupação das ruas contra o governo e procuram criar clima de condenação moral contra o PT a partir de notícias distorcidas sobre investigações de corrupção na Petrobrás. Corrupção nunca dantes combatida como nos governos do PT, que deve ser enfrentada implacavelmente nos marcos do Estado de Direito, mas não de forma seletiva, facciosa e espetaculosa. Por isso é que também exigimos a mais ampla e transparente investigação dos episódios envolvendo o HSBC e a chamada Operação Zelotes, de combate à corrupção e à sonegação fiscal.

Não faz parte da nossa história, da nossa tradição democrática, de nossa ética pública e de nossa prática na democracia brasileira a convivência e a conivência com a corrupção. Se algum dirigente ou filiado praticou corrupção não foi em nome dos petistas. E, se comprovadamente algum filiado incorreu em corrupção será expulso.

O PT liderou entre 2003 e 2014 as maiores e mais importantes iniciativas no combate à corrupção na história brasileira mais recentemente a Presidenta Dilma sintetizou e propôs ao parlamento

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cinco novas propostas que buscam cercar a impunidade dos corruptos no Brasil. Daí porque o PT luta pelo fim do financiamento empresarial das eleições, que renova na base os circuitos da corrupção no Brasil.

Ao mesmo tempo que lutamos pelo fim do financiamento empresarial decidimos que os Diretórios Nacional, estaduais e municipais não mais receberão doações de empresas privadas, devendo essa decisão ser detalhada, regulamentada e referendada pelos delegados(as) ao 5º. Congresso Nacional do PT.

O Partido revitalizará a contribuição voluntária, individual dos filiados, filiadas, simpatizantes e amigos. Tais definições são coerentes com nosso Estatuto, segundo o qual “arrecadação básica e permanente do Partido é oriunda de seus próprios filiados”. Ao mesmo tempo, condizem também coerentemente com a nossa defesa de uma reforma política democrática que ponha fim à interferência do poder econômico nas decisões políticas.

A prisão do companheiro João Vaccari, nas condições em que ocorreu, demonstra que o clima de ódio e revanche envolve também fatias da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário. Vamos assistindo, aos poucos, a transformação de indispensável processo de apuração e punição, relativo a desvios na principal estatal brasileira, em espetáculo de atropelos legais, politicamente manipulado a serviço das forças antipetistas. Mais que tudo, conforma-se um embrião de estado de exceção, violador dos mais elementares direitos fundamentais, cuja existência indigna, enoja e ofende a consciência democrática do País. E, por isso mesmo, antes que prospere, exige resposta corajosa da nossa militância.

O Partido dos Trabalhadores, diante deste cenário, concentrará o melhor de suas energias para construir, ao lado de outras correntes progressistas, junto com movimentos do campo e da cidade, uma frente político-social para a defesa da democracia, das pautas dos trabalhadores e das reformas estruturais.

Um novo pacto do campo democrático-popular é indispensável para disputar as ruas e as instituições contra o bloco conservador.

O Partido dos Trabalhadores reafirma que o programa para a unidade popular deve ter como eixos básicos a reforma política, com proibição do financiamento empresarial de campanhas; com a

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firme defesa dos direitos humanos com a criminalização da homofobia e a rejeição da PEC 215, que versa sobre a transferência da FUNAI para o Legislativo da responsabilidade pela demarcação das terras indígenas, quilombolas e unidades de conservação; bem como da PEC 371, que pretende reduzir a maioridade penal; a defesa da Petrobrás e do regime de partilha e de conteúdo nacional; a reforma tributária de caráter progressivo, com adoção de impostos crescentes sobre renda, patrimônio e ganhos financeiros; a democratização dos meios de comunicação, com o restrição dos monopólios de mídia; a expansão da reforma agrária; uma reforma urbana, com investimentos em mobilidade, moradia e saneamento; a adoção de um amplo programa de ampliação e melhoria dos serviços públicos.

Diante da tramitação da contra-reforma política (PEC 352), o PT reafirma sua posição congressual – em defesa de uma Assembléia Constituinte Exclusiva e Soberana, do financiamento público exclusivo, do voto em lista com paridade de gênero e da participação popular – e de sua objeção à constitucionalização do financiamento empresarial.

O Partido dos Trabalhadores apoia o empenho da presidenta Dilma Rousseff para enfrentar os problemas fiscais do Estado brasileiro, mas considera vital que a política econômica esteja voltada para impedir que os efeitos desse ajuste recaiam sobre as costas dos trabalhadores e tenham caráter recessivo. O Diretório Nacional, nesse sentido, considera fundamental o mais amplo diálogo do governo com a sociedade (sobretudo com os movimentos sociais e centrais sindicais).

O DN também orienta nossas bancadas no Congresso Nacional, que já vêm trabalhando nessa direção, a ajudar no aprimoramento das medidas propostas pelo Ministério da Fazenda, a partir do princípio de que o custo de retificação das contas públicas deve ser assumido pelos mais ricos. A este respeito orientamos todas nossas bancadas nos estados e municípios a serem porta-vozes desta política.

O Partido dos Trabalhadores considera que a principal batalha da conjuntura é a que está sendo travada contra o Projeto de Lei nº 4330, que expande a terceirização do trabalho para todas atividades econômicas, e se constituiu em um dos principais núcleos da política neoliberal. Sua aprovação definitiva

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representaria o mais rude golpe contra a classe trabalhadora desde a consolidação dos direitos trabalhistas em 1943. O Diretório Nacional recomenda, assim, que os parlamentares petistas continuem seu trabalho de resistência contra essa medida, buscando unidade com representantes de outros partidos, para impedir a aprovação deste projeto de lei.

O Diretório Nacional também considera fundamental a ampliação da mobilização sindical e popular contra a terceirização, nas ruas e nas redes, até que a pressão seja suficiente para estabelecer nova relação de forças nas duas casas legislativas.

A militância petista, em suas entidades ou através dos diretórios partidários, nos locais de estudo e trabalho, deve participar ativamente da organização e realização de todas as jornadas de luta convocadas pela CUT e demais organizações sindicais. Sobretudo, o engajamento e participação no 1o. de Maio unificado em todo o País, em defesa dos direitos da classe trabalhadora e da democracia. É um momento de cada diretório e núcleo do PT se organizarem para realizar discussões sobre a conjuntura e preparar cada militante para o debate e ação política.

É também o momento da militância participar das conferencias nacionais convocadas pelo nosso governo.

O Diretório Nacional conclama a presidenta Dilma Rousseff a assumir o papel de liderança na campanha contra a terceirização, como já tem agido na disputa contra a redução da maioridade penal, ao mesmo tempo que recomenda o veto presidencial caso o projeto de lei 4330 venha a ser acolhido pelo parlamento.

O Partido dos Trabalhadores reafirma apoio firme e decidido ao governo da companheira Dilma Rousseff, ressaltando que continuará, dentro do gabinete de coalizão, a representar os interesses das camadas populares e suas aspirações por mudanças. O Diretório Nacional convoca todos os companheiros à enérgica mobilização contra os agrupamentos empenhados em virar a mesa do jogo democrático e regredir ao modelo neoliberal.

O Diretório Nacional, ciente da necessidade de uma profunda avaliação sobre a orientação política praticada desde o governo Lula e da urgência de uma ampla reflexão sobre os desafios para a continuidade das reformas, conclama todos os militantes e amigos do PT ao máximo empenho nos debates do 5º Congresso Nacional

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e a transformá-lo em um grande momento de reafirmação da identidade e do vigor do principal partido da esquerda brasileira.

São Paulo, 17 de abril de 2015 Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores”

Conheça as teses inscritas para o Congresso do PT

O partido recebeu sete teses que vão fomentar os debates durante o 5º Congresso Nacional do PT. O evento acontecerá de 11 a 13 de junho, em Salvador (BA). Conheça todas elas e participe da discussão sobre o futuro do partido do País. MSG – TESE MUDAR MAIS POR UM NOVO CICLO DE MUDANÇAS DEMOCRÁTICAS N…

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PT.ORG.BR · 2.716 COMPARTILHAMENTOS ·31 DE

MARÇO DE 2015

Participe do grande debate preparatório para o Congresso do PT

O Partido dos Trabalhadores realiza o primeiro debate prévio para o 5º Congresso Nacional, na próxima quinta-feira (16), em São Paulo (SP). Com o tema “Neoliberalismo, pós-neoliberalismo e os desafios da construção do socialismo no Brasil”, dirigentes, militantes e simpatizantes debatem os rumos da…

Salvar

PT.ORG.BR · 62 COMPARTILHAMENTOS ·10 DE ABRIL

DE 2015

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PT teme até extinção da legenda após Lava

Jato, diz jornal

Salvar notícia - Ricardo Stuckert/Instituto Lula/Fotos Públicas

A presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (C) e o presidente do PT, Rui Falcão

Daniela Barbosa, de EXAME.comSiga-me

http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/pt-teme-ate-

extincao-da-legenda-com-lava-jato-diz-jornal

São Paulo – Qual a pior consequência que o PT pode ter

com a Operação Lava Jato? Segundo reportagem da Folha

de S. Paulo, desta segunda-feira, a cassação ou

inviabilização da legenda não é descartada por integrantes

do partido ouvidos pelo jornal.

De acordo com a Folha, o partido pode ser penalizado

financeiramente e teria que ressarcir os cofres públicos

pela corrupção da Petrobras. O valor da multa ainda não

foi divulgado, mas pode chegar à cifra de 200 milhões de

dólares.

O montante, de acordo com a Folha, é calculado pelos

próprios petistas com base nos valores que Pedro

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Barusco, ex-gerente de Engenharia da Petrobras, divulgou

em um depoimento de delação premiada à Justiça.

Ainda segundo petistas ouvidos pela Folha, se realmente

for aplicada, a multa teria o poder de destruir o partido.

A propina

Entre os anos de 2003 a 2013, o PT teria recebido entre

150 a 200 milhões de reais em propina de 90 contratos

firmados com a Petrobras, segundo estimativa de Barusco

O cálculo foi feito tendo em vista o que ele mesmo

recebeu no esquema de corrupção da estatal. De acordo

com o ex-gerente, João Vaccari Neto, ex-tesoureido do

partido preso na última quarta-feira, seria o responsável

pelo recebimento da propina destinada ao PT.

Sem doações

Na última sexta-feira, o PT anunciou que os diretórios

nacional, estaduais e municipais da sigla não vão mais

receber doações empresariais. A informação foi divulgada

por Rui Falcão, presidente do partido, que defende o fim

do financiamento empresarial de campanhas políticas.

A decisão foi anunciada um mês depois que a Operação

Lava Jato revelou que o financiamento empresarial de

campanhas eleitorais foi usado como um método para

maquiar propinas.

Neste contexto, o Congresso discute uma reforma política

que modifique as regras do financiamento de campanhas

eleitorais no país. Hoje, esse financiamento é misto: poder

público, pessoas físicas e empresas contribuem.

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O PMDB, principal aliado do governo na Casa, defende a

garantia das doações empresariais. Veja o que está

em jogo nesta discussão.

Veja o que a polícia já fez em cada

fase da Lava Jato

Confira cada etapa da operação que busca desarticular

organizações criminosas responsáveis por desvio de recursos

públicos e lavagem de dinheiro em larga escala

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1/13Paulo Whitaker/Reuters

FPA Nota de Conjuntura - Abril 2015

sex, 10/04/2015 - 15:33

FPA Nota de Conjuntura

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http://novo.fpabramo.org.br/content/fpa-nota-de-conjuntura-abril-2015

10 de abril de 2015

A política econômica do governo da Presidenta Dilma está no centro

da conjuntura.

As opções do ministro Levy têm características claramente recessivas.

Ainda que não se tenha anunciado o nível de contingencionamento

final que se fará do orçamento público, tudo aponta a que 40% do

ajuste será de aumento de tributos e que 60% será de cortes de

gastos.

Se tivermos em conta que 2014 já foi um ano ruim para a economia,

o resultado esperado (a “tendência contratada&rdquo com as

medidas que estão sendo adotadas será uma queda de

investimentose uma recessão, com o que isso significa de aumento

do desemprego e deterioração dos indicadores sociais.

Por isso, algumas análises apontam que esse “ajuste”, ao contrário do

que anuncia o ministro, provocará o “desajuste” da economia, sem

perspectivas de “quando” e “como” o país retomará o crescimento

econômico.

A questão política central é: se a principal disputa política é em torno

ao governo, com a direita liderada pelo PSDB querendo “sangrar” ou

mesmo o impeachment da presidenta, e as forças progressistas e de

esquerda buscando defender o resultado democrático das urnas de

outubro 2014, como o PT e seus aliados podem defender o governo

no momento que aplica uma política econômica com as

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características acima mencionadas?

Entre as forças da direita as duas opções apontam a (1) “sangrar” o

governo e impingir uma grande derrota ao PT em 2016, para avaliar

então o que fazer, ou (2) acelerar a conjuntura de derretimento do

apoio ao governo e tentar destruir a imagem do Lula de forma a

chegar ao impeachment a curto prazo.

Em algumas análises a “política de desajustes” do ministro Levy é um

“programa de destituição da presidenta da República” já que atinge

em cheio o apoio popular ao mandato presidencial.

Para deter o rumo pretendido pela direita é preciso que as forças

progressistas e populares mostram que haverá resistência. Como em

2005, a tentação golpista da direita só se deterá frente ao temor de

como o povo irá reagir. Mas para que esse cenário se configure o

povo deve sentir claramente que o governo federal e as forças

políticas e sociais que o apoiam estão do seu lado, isto é, do lado dos

direitos sociais conquistados e da defesa do nível de vida e condições

de trabalho da população.

Há uma percepção muito ampla de necessidade de correção de rota.

O sindicalismo cutista alerta para uma crise que se anuncia na

indústria quando a finais de abril terminarão os contratos

de layoff coincidindo com o aumento do desemprego no país.

Não somente por razões puramente econômicas o país passa por

dificuldades, mas também pelo impacto que está tendo a Operação

Lava jato sobre as empresas contratadas pela Petrobrás para seu

plano de investimentos. Boa parte dos setores de empresas de infra-

estrutura e indústria vinculadas à cadeia produtiva do petróleo estão

atravessando dificuldades e demitindo trabalhadores.

Na indústria em geral, o impacto recessivo conjuntural só não é

maior porque a desvalorização do real frente ao dólar (que não deve

recuar dos 3 R$ por 1 dólar) tem operado como uma barreira a

importações e dando algum alento a setores industriais

exportadores.

Foi informado que há movimentação de economistas e intelectuais na

elaboração de propostas de retomada do crescimento, alertando para

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o perigo de aplicar o ajuste impulsionado pelo ministro Levy em uma

economia em desaceleração – o que necessariamente levará à

necessidade de novos ajustes e aprofundamento da recessão.

É necessário combinar propostas concretas com ações políticas de

correção de rumo. Pelas características do ministro Levy (um

“ortodoxo” convicto, formado na Univ. de Chicago) e pela agenda

com que ingressou ao governo (o “ajuste” em curso), obviamente, sua

permanência é vista como contraditória com a mudança de rota.

Há nas próximas semanas uma agenda política e econômica

carregada que permitirá definir rumos no debate. A votação do PL

4330 das Tercerizações será um confronto claro entre uma agenda

conservadora, e outra em defesa dos trabalhadores. Até o 1o de Maio

deverá se configurar um cenário de maior clareza dos embates, de

forma a que nesse dia o ato central da CUT e os movimentos sociais

aliados possa apresentar uma plataforma alternativa.

É importante assinalar que a agenda de confrontação política é mais

ampla, e abrange diversas dimensões da vida social que são muito

sensíveis para a população. Assim, a iniciativa dos setores

conservadores do Congresso Nacional – liderados pelo presidente da

Câmara, Deputado Eduardo Cunha - está em tramitação a redução da

maioridade penal. E na opinião pública têm assumido grande

relevância o tema da violência que atinge a juventude negra das

periferias urbanas e a atuação das polícias militares.

Conjuntura Internacional

No período ganharam destaque novas denuncias de que o governo

dos EUA continua espionando o Brasil. A notícia publicada em jornais

americanos ainda não teve repercussão no Brasil.

Decisivo avanço se registrou na negociação do programa nuclear de

Irã com os 5+1 (os cinco países com direito a veto na ONU mais

Alemanha), pelo qual o país se submete a controles e os EUA e a

União Europeia retiram as sanções impostas. Importante a

repercussão tida no sentido de que “Brasil (Lula e Amorim) e a

Turquia tinham razão” já que o acordo repete a agenda negociada em

2010 por esse países com o Irã e que o governo Obama vetou. Isto é,

apenas se perdeu tempo para superar o impasse.

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As eleições regionais em Bolivia mostraram avanços do partido de

governo – o MAS – em alguns municípios importantes, mas também

derrotas como na cidade do El Alto, tradicional reduto eleitoral do

presidente Evo Morales.

Importante a incorporação da Palestina no Tribunal Penal

Internacional (TPI), com o qual crimes cometidos por Israel poderão

ser denunciados em essa instância.

Houve eleições regionais na França onde o principal resultado foi

uma “paulada” no governante Partido Socialista. Contrariamente ao

esperado, a extrema direita da Frente Nacional não conseguiu

nenhum governo regional. Foi a direita reorganizada sob direção do

ex-presidente Nicolas Sarkozy que teve o melhor desempenho.

Maria Inês Nassif: O golpe de mão do juiz Sérgio Moro contra o

PT

abril 22, 2015 - http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/04/maria-ines-nassif-o-golpe-de-mao-do-juiz-sergio-moro-contra-o-

pt/

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Veja também

João Auler, o executivo da Lava Jato que pode esclarecer supostas propinas ao PSDB0 23.abr

“Na dúvida”, Moro decide soltar cunhada de Vaccari 023.abr Lincoln Secco: o que a oposição quer é o impeachment de Lula 023.abr

Cria-se um clima político para legitimar desmandos judiciários, e os desmandos do Ministério Público ou da Polícia Federal são sistematicamente legitimados porque vêm respaldados em decisões judiciais. É uma roda-viva onde quem perde é sempre o futuro Por Maria Inês Nassif, na Carta Maior Não é banal o movimento que fazem a Justiça e o Ministério Público paranaense para inviabilizar um partido político nacional, o PT, ou qualquer outro que venham a botar no mesmo pacote – de preferência pequenos e ligados ao governo – para fingir que essa decisão não é uma perseguição ao partido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que venceu as eleições dos tucanos Geraldo Alckmin e José Serra, e da presidenta Dilma Rousseff, que ganhou dois pleitos dos tucanos José Serra e Aécio Neves, o último deles o ano passado. Isso faz parte de uma estratégia de intimidação tão assustadora que transfere para o aparelho judicial de um Estado que sequer tem relevância na política nacional as decisões sobre o futuro da política nacional e sobre a legitimidade do voto do eleitor brasileiro; e que dá a uma decisão judicial de primeira instância o direito de proscrever partidos políticos.

Nem nas ditaduras brasileiras isso aconteceu. Os partidos foram proscritos por atos federais. O PCB, por exemplo, foi colocado na ilegalidade em 1927, durante o estado de sítio decretado pelo presidente Epitácio Pessoa. Em 1966, todos os partidos brasileiros foram extintos por um ato institucional da ditadura militar iniciada em março de 1964. Somente em 1946 a Justiça tomou a decisão de tirar uma legenda do quadro partidário, o mesmo PCB, sob o argumento de que ela não professava a democracia. Ainda assim, a decisão partiu de uma instância máxima de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O absurdo jurídico de colocar um partido na ilegalidade pode ocorrer se o Ministério Público do Paraná pedir o indiciamento do PT, a pretexto de participação na Operação Lava Jato, e o juiz Sérgio Moro condenar o partido. Segundo matéria publicada pela Folha de S. Paulo, procuradores preparam a originalíssima peça, que respaldaria uma decisão judicial destinada a proscrever o PT. O instrumento da inviabilização do partido seria a aplicação de uma multa próxima dos R$ 200 milhões que um dos delatores da Operação diz que o partido recebeu de propina – e que, sem provas, nas mãos de qualquer procurador ou juiz minimamente neutros, seria apenas uma palavra, a do delator, contra a outra, a do delatado que nega o crime.

Um golpe de mão aplicado pela Justiça no quadro partidário brasileiro é, de fato, a inovação que a pouco neutra justiça paranaense pode legar para o país inteiro. Moro adora inovações, e segue os passos do inovador Joaquim

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Barbosa que, à frente do chamado Caso Mensalão, no Supremo Tribunal Federal, deixou de ser juiz e agiu como promotor, rasgou a Constituição, negou provas que inocentariam alguns réus e pediu a condenação de outros tantos sem provas, com o beneplácito do plenário da mais alta corte judiciária do país, com o aplauso da imprensa e as loas da oposição.

Todas as licenças poéticas do aparelho judicial paranaense, inclusive esta, vêm sendo amparadas pelos partidos de oposição, acalentada pela mídia conservadora, tolerada pelas instâncias superiores da Justiça e pelos órgãos de controle do Judiciário e do Ministério Público, a exemplo do que aconteceu no Mensalão. A estratégia é a mesma: cria-se um clima político para legitimar desmandos judiciários, e os desmandos do Ministério Público ou da Polícia Federal são sistematicamente legitimados porque vêm respaldados em decisões judiciais. É uma roda-viva onde quem perde é sempre o futuro. Porque, no futuro, sabe-se lá quem vai ser atingido por já legitimados desmandos judiciais que hoje vitimam o PT. A articulação política entre PF, Ministério Público e a Justiça já é um dado, e pode atingir no futuro outros inimigos políticos que forem escolhidos por eles.

O pensador Antonio Gramsci, ligado ao Partido Comunista Italiano, descreveu nos Cadernos do Cárcere as observações sobre o que ocorria naquela Itália convulsionada por uma cega adesão à liderança de Benito Mussolini. Lá pelas tantas, ele tenta entender como se formam as explosões de pânico, a contaminação coletiva por uma ideologia por meio do medo e da formação de sensos comuns – ideias-força sem necessariamente nenhuma racionalidade, mas de fácil aceitação, capazes de comover, envolver ou amedrontar. Os meios de comunicação são fundamentais na criação dessas mudanças culturais muito rápidas.

A teoria gramsciana merece também ser lembrada nesses turvos dias pelo papel que atribui a instituições do Estado, inclusive à Justiça. O Judiciário, segundo ele, é um aparelho ideológico de vocação conservadora, resistente a mudanças – inclusive as definidas pelo jogo democrático.

Como esse artigo não é acadêmico, só tomo a liberdade de citar o pensador rapidamente, na tentativa de entender o momento em que vivo eu, assustada, como outros tantos; e todos nós – alguns com medo, uns irados, outros tantos odientos, numa composição digna de uma arena romana. Nessa trama, é difícil diferenciar os cristãos dos leões.

Desde o Mensalão, Gramsci vai e volta em qualquer tertúlia política pela simples razão de que vivemos no meio de uma onda de comoção, pacientemente criada nos últimos anos, destinada a relativizar uma realidade em que as forças envolvidas em campanhas difamatórias, ações espetaculares, uso da máquina judicial, não conseguiram alterar uma realidade eleitoral, e ocupam os demais aparelhos ideológicos de Estado para consolidar uma hegemonia que se imponha sobre o voto. Tudo o mais – a formação de sensos comuns estapafúrdios, mas simples e claros; o papel da Justiça; o uso dos meios de comunicação na formação de um clima tão denso, tão áspero, tão inóspito, que pode ser apenas cortado com faca afiada – já é passado. Já foi, já produziu efeitos. O clima está criado.

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Resta aos democratas tentarem separar o que é espuma, o que é avanço indevido sobre direitos democráticos, do que é efetivamente justo. Essa é uma tarefa que fica muito difícil, porque o clima e o senso comum agem intencionalmente contra. O Brasil tem caminhado por sofismas, e Moro usa deles à perfeição. O clima de histeria criado contra o PT desestimula as pessoas comuns de defenderem governos por elas eleitos, com base no sofisma fincado num senso comum cevado pacientemente nos últimos anos, de que o partido é corrupto, e quem o defende está defendendo a corrupção; de que a Petrobras é de uso do petismo, e o petismo é corrupto, e por isso a Petrobras tem que ser inviabilizada economicamente; de que os corruptos delatores se tornam heróis se delatam o PT, mesmo não tendo credibilidade pessoal nem provas; que a Justiça, para eliminar um partido político, pode usar de que instrumento for, mesmo ao arrepio da lei, para prender e intimidar.

É tão irracional a “sofismação” da realidade e a consolidação de sensos comuns que é difícil entender por que, de repente, as pessoas tenham escolhido se destituir do direito à inteligência. Cair na armadilha dos sensos comuns criados pelo ódio impede a visão do óbvio. O tesoureiro do PT, João Vaccari, foi preso pelo juiz Moro porque arrecadou dinheiro legal para o PT, vindo de empresas implicadas na Operação Lava Jato. As empreiteiras que encheram os cofres do partido de dinheiro doaram igualmente para partidos de oposição, na mesma proporção. O raciocínio do juiz – segundo o qual dinheiro vindo de empresas fornecedoras da Petrobras, mesmo legal, transforma-se em crime porque foram conspurcados pela ação dessas empresas nas operações com a estatal – não vale para os outros. Não existe a mínima neutralidade nessa decisão.

A insanidade dos argumentos destinados a inibir a defesa do PT é outra coisa própria desse clima, a prova de que o país surfa na crista da onda de comoção. Por dois anos, desde a condenação de petistas no processo do Mensalão, criou-se um clima coletivo de ridicularização ou de raiva daqueles que ponderaram contra a ilegalidade de várias das decisões e condenações feitas pelo Supremo. O julgamento do Mensalão é uma mácula que a Suprema Corte brasileira demorará a se livrar. E a defesa que pessoas fizeram dos juízes que julgaram para atender o público e a mídia é uma mácula que a democracia brasileira terá de lidar daqui para a frente.

O juiz Moro, aquele do Paraná, ganhou um lugar na história do grupo político a que serve. Para a história do futuro, não terá deixado nenhuma contribuição jurídica, pelo simples fato de que rasgou a Constituição. A mídia tradicional, que ajudou a construir o clima duro que pesa sobre as nossas cabeças, deixará para o futuro a história de reconstrução do udenismo – um futuro em que poucos de seus veículos terão sobrevivido à hecatombe dos tempos modernos. A oposição partidária, pouquíssimo orgânica, será história, dificilmente futuro. E provavelmente isso também ocorrerá com as forças políticas levadas por essa onda de insanidade.

Isso, sim, será uma crise política com efeitos semelhantes ao de um tsunami.

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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Triângulo da morte –

Eliane Cantanhêde

O encantado balanço da Petrobrás desencantou, confirmando, agora em números, qual o primeiro e maior problema da principal companhia brasileira: a ingerência política. Foi ela, a ingerência política, que fechou o triângulo mortal da corrupção, do péssimo gerenciamento e do represamento artificial das tarifas. Deu no que deu

Essa conjunção maldita acabou com a saúde e com a imagem da Petrobrás no País e no mundo, mas o pior é que não foi uma exclusividade da Petrobrás, mas sim a marca dos anos do PT, particularmente dos anos Lula, nos órgãos públicos e nas estatais. Aparentemente, nada escapa.

Foi por interesses políticos que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a partir de sua posse, em janeiro de 2003, nomeou sindicalistas alinhados ao PT para a presidência da Petrobrás e para as diretoriais do Banco do Brasil, por exemplo, e fatiou os principais cargos da petroleira entre “companheiros” petistas e “operadores” dos partidos aliados. Só podia descambar para esse descalabro.

O resultado mais gritante no balanço anunciado na noite de quarta-feira é o das perdas de R$ 6,2 bilhões por causa da corrupção e, apesar de nada módico, esse total é visto com muita desconfiança por especialistas. Há quem imagine que a sangria foi ainda maior. Se você nomeia um diretor para abastecer as contas do PT e bolsos de petistas, outro para rechear as contas do PMDB e carteiras de pemedebistas, um terceiro para engordar as contas do PP e o patrimônio de pepistas, deveria saber o que estava fazendo. Tudo isso se embolou com o velho cartel de empreiteiras e com os doleiros de sempre e a consequência é: corrupção.

Mas há dois outros resultados irritantes no balanço apresentado pelo novo presidente da companhia, Aldemir Bendine. O segundo é o mau gerenciamento da empresa, o que não chega a ser surpreendente quando sindicalistas e apadrinhados se dão ao luxo de definir os investimentos da nossa Petrobrás para atender os interesses do Palácio do Planalto. É assim que surgem obras muito caras – e de potencial duvidoso – em Estados governados por amigos do rei. Sobressaem-se aí pomposas refinarias, agora abandonadas.

O terceiro resultado é o efeito corrosivo do represamento político dos preços da gasolina para postos e consumidor. Lula segurou para não arranhar a sua já imensa popularidade. Deu tão certo que ele continuou segurando para se reeleger, para eleger Dilma da primeira vez, para reeleger Dilma em 2014. O efeito foi ótimo para eles e péssimo para a Petrobrás.

Mais cedo ou mais tarde, essa conta chega para o consumidor/eleitor. E está chegando da forma mais perversa. Antes, o petróleo estava caro lá fora e a gasolina era barata aqui dentro. Agora, o petróleo está barato lá fora e a gasolina vai ficar mais cara aqui dentro. Senão, a conta não fecha, a credibilidade não volta, a “nova Petrobrás” anunciada em Nova York pelo ministro Joaquim Levy nunca vai aparecer.

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Até lá, a “velha Petrobrás” é o grande “case” dos dois governos Lula. Quem descrever todas as nomeações políticas, o gerenciamento político e a administração política de preços da Petrobrás vai conseguir contar como foram os anos do PT nas estatais brasileiras. Sem esquecer de contar o final da história: nas campanhas, o PT atribuiu aos adversários a intenção de privatizar a Petrobrás, mas é o próprio governo do PT que vai sair vendendo tudo o que puder da petroleira para diminuir o prejuízo. Vão ter de vender muito, porque a Petrobrás é a empresa mais endividada do mundo.

Detalhe constrangedor: foi justamente a ministra de Minas e Energia, depois chefe da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da Petrobrás do pior e mais obscuro período da Petrobrás que acabou sendo eleita para suceder Lula – e ainda foi reeleita. Só para completar, a sua grande marca era a de… gerentona.

Por Eliane Cantanhêde

Fonte: Estadão | 24/04/2015 02:02 | http://bit.ly/1Jqq7sb

domingo, 26 de abril de 2015

Ex-ministro de Lula e Dilma, Lupi diz que PT

‘roubou demais’ e ‘se esgotou’ • ‘Faxinado’ por suspeitas de irregularidades no Trabalho em

2011, presidente do PDT afirma em reunião do partido que

petistas ‘exageraram’ e reclama que conversa com a atual e o ex-

presidente é ‘qual o naco de poder que fica com cada um’

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA- Ex-ministro dos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma

Rousseff e um dos “faxinados” do mandato passado, o presidente

nacional do PDT, Carlos Lupi, disse que os petistas “roubaram

demais” e que o partido deles “se esgotou”. “O PT exauriu-se,

esgotou-se. Olha o caso da Petrobrás. A gente não acha que o PT

inventou a corrupção, mas roubaram demais. Exageraram. O projeto

deles virou projeto de poder pelo poder”, disse Lupi um dia após a

Petrobrás divulgar que a perda da estatal com a corrupção chegava a

R$ 6,2 bilhões.

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A declaração foi feita durante um encontro com correligionários na

quinta-feira, em São Paulo. O Estado teve acesso à fala de Lupi, que

foi confirmada pelo próprio dirigente pedetista.

Na conversa, o presidente do partido fez ressalvas a programas

simbólicos dos governos petistas, como o Bolsa Família. “Tirou

milhões da miséria, isso é bom para caramba. O Nordeste é outro

(avanço), é verdade. Quem não vê isso é mentiroso, nojento. Eu tenho

raiva deles. Mas (o governo) criou também uma dependência. Eu vejo

gente que não quer trabalhar para manter o Bolsa Família, isso está

errado. O programa tem que ser instrumento para tirar da miséria, não

para manter na miséria.”

Aos correligionários, Lupi também reclamou do tratamento dado pelo

PT ao PDT desde que as duas legendas formalizaram a aliança em

2006, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva disputava a

reeleição. “A conversa com o PT, com o meu amigo Lula e com a

presidente Dilma, é qual o naco de poder que fica com cada um. Para

mim, isso não basta. Eu não quero um pedaço de chocolate para

brincar como criança que adoça a boca. Eu quero ser sócio da fábrica,

eu quero ajudar a fazer o chocolate.”

Em um momento de autocrítica, o presidente do PDT disse que o

partido se “acomodou” por estar no poder, mas que, diante da

insatisfação demonstrada pela população nas ruas, o partido precisa

começar a buscar novos caminhos ou sofrerá as consequências no

futuro.

“Se a gente não acordar para isso, daqui a pouco a população vai

fazer como juiz de futebol: vai dar cartão vermelho para gente. Para

muitos, já está dando”, disse Lupi. De acordo com aliados do dirigente

pedetista, esse tem sido o tom usado por ele durante as reuniões com

as Executivas estaduais do PDT desde o início do ano.

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Segundo Lupi, o fato de nas últimas eleições candidatos como o

palhaço Tiririca (PR-SP) e o ex-jogador Romário (PSB-RJ) terem sido

eleitos para cargos no Legislativo demonstram o descontentamento

das pessoas com a figura do político tradicional. “O povo está fazendo

isso para sacanear a gente. Está dizendo: ‘Seus babacas, me

respeitem, porque senão olha o que eu vou fazer com vocês. Em vez

de votar em vocês, eu vou votar no Tiririca, vou votar no Romário’.”

Planos. Procurado pelo Estado, Lupi confirmou o teor do discurso

feito na quinta-feira. Ele nega que o PDT pense em deixar a base

aliada neste momento. Acomodado no Ministério do Trabalho – cujo

atual titular é Manoel Dias –, o partido conta hoje com 19 dos 513

deputados da Câmara e 6 dos 81 senadores.

Ex-ministro do Trabalho, Lupi deixou o governo Dilma em dezembro

de 2011, após uma série de denúncias de irregularidades envolvendo

integrantes da pasta. Apesar de o partido continuar no comando do

ministério até hoje, a relação entre PDT e PT está a cada dia mais

estremecida. Parte dos senadores do partido defende a saída imediata

da base do governo. Na Câmara, a bancada da sigla não tem mais

seguido a orientação do Palácio do Planalto na hora das votações.

Até agora, Lupi era apontado como o que mais resistia à ideia de

deixar a base aliada. Hoje, no momento em que o PT passa pela sua

maior crise desde que assumiu o governo, em 2003, o dirigente

trabalhista resume assim o seu sentimento: “A gente não quer ser um

rato, que foge do porão do navio quando entra a primeira água, mas

também não queremos ser o comandante do Titanic, que ficou no

barco até ele afundar”.

Demétrio Magnoli: "O PT, para se manter no governo,

teve de abrir mão do poder"

Sociólogo diz que a atual crise do governo Dilma marca o fim de um ciclo

iniciado por Lula

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por Rodrigo Lopes ZERO HORA 26 abril

Protesto contra o governo Dilma realizado em Porto Alegre no dia 15 de março

Foto: Ricardo Duarte / Agencia RBS

Uma das vozes atuais mais críticas aos governos do PT, o jornalista, sociólogo e geógrafo Demétrio Magnoli acredita que as manifestações de 2015 fecham um ciclo iniciado nas jornadas de junho de 2013, que culminaria na derrota do projeto político que ele chama de “lulopetismo”. A expressão combina as características próprias do personagem político Luiz Inácio Lula da Silva e os mandatos de Dilma. Com discurso cheio de ironia, que mistura argumentos baseados na análise de outros períodos históricos do país, o pesquisador motivou aplausos entusiasmados da plateia do 28º Fórum da Liberdade, realizado nos dias 13 e 14 de abril, em Porto Alegre.

Colunista de O Estado de S. Paulo e da Globonews, Magnoli especializou-se nas áreas de Relações Internacionais e Geografia Política. Entre seus principais livros estão O Corpo da Pátria e Uma Gota de Sangue e a coleção Liberdade versus Igualdade. Após a palestra no Fórum, ele conversou com o PrOA sobre o momento político do país e as relações com a América Latina.

Sociedades polarizadas, como a Venezuela, Honduras e o Paraguai, tiveram recentemente desfechos críticos na América Latina. A divisão no Brasil pode levar o país a um destino de ruptura da ordem constitucional?

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O Brasil estava polarizado. Neste momento, um ciclo terminou. O projeto político de reorganização do Estado conduzido pelos governos lulopetistas chegou ao fim. Existe um significado na entrega do poder econômico para Joaquim Levy e na entrega do poder político para o triunvirato do PMDB: Michel Temer, Renan Calheiros e Eduardo Cunha. O PT, para se manter no governo, teve de abrir mão do poder.

Qual o futuro dos protestos nas ruas?

Em 2013, o povo disse que não aceitava mais um Estado corrupto, que não usava os recursos públicos para as prioridades públicas: saúde e educação.O que as pessoas disseram nas ruas no dia 15 (de março de 2015) foi que esse Estado corrupto, que não aplica os recursos públicos onde deveria, é o Estado do PT. Eles completaram uma frase que começou a ser dita em 2013. Há uma ligação: a primeira foi genericamente contra a elite política, a segunda é contra um setor particular da elite política, que é o setor que está no governo. A manifestação do dia 15 completou o processo iniciado nas eleições: derrota do lulopetismo em todo Centro-Sul. O que o senhor acredita que vai acontecer? Impeachment ou um governo enfraquecido até o fim?

Os patetas que falam sobre intervenção militar são meia dúzia, cuja única função involuntária é oferecer algum discurso para o governo. Eles são o melhor discurso do governo, mas não têm a menor importância e são vaiados quando saem para a rua. Em uma democracia de massas, o impeachment exige mais do que a vontade de trocar de presidente. Exige uma violação da ordem jurídica do país, e não há provas de que Dilma violou a ordem jurídica. Há uma desconfiança que tem fundamento, mas não há prova. Sem isso, fazer o impeachment seria rebaixar a democracia brasileira à condição da democracia paraguaia, a uma democracia oligárquica, onde os chefes políticos no parlamento, no fundo, têm o poder total. Se você me perguntar se sou a favor do impeachment, respondo: sem uma prova muito nítida de que a presidente cometeu crime de responsabilidade, sou contra. A gente vai viver uma crise de poder do governo, que não é ruim. Estamos experimentando, depois de tantos anos, um Congresso cujas votações são incertas, como devem ser.

Inspirado em que o senhor cita a expressão “lulopetismo”?

Não é minha, muita gente fala, inclusive gente do PT. André Singer, por exemplo. Foi porta-voz do Lula e escreve tanto quanto eu lulopetismo. É uma expressão que visa mostrar que existe uma aliança entre duas coisas entrelaçadas, mas não idênticas. O lulismo não é igual ao petismo. Lula tem votos onde o PT não tem. Lula tem um discurso e uma relação política com o povo e com os empresários diferente da do PT. Mas Lula é do PT. Então, os três governos não foram petistas, foram lulopetistas. Lulopetismo é uma expressão analítica, não é uma crítica, não é um insulto.

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Lulopetismo lembra um sistema de governo criado para perdurar, como o stalinismo, o bolivarianismo, o trotskismo... É essa a intenção?

Não é nesse sentido. Sem dúvida que eles queriam uma hegemonia perene, mas não é nesse sentido. Não são governos petistas, tampouco puramente lulistas. O lulopetismo é uma expressão analítica e, eu insisto, analistas petistas, como o caso do André Singer, também a usam. Falando de relações internacionais. Uma crítica que se faz é que a política externa brasileira é uma diplomacia de governo, e não de Estado.

Só temos dois momentos na história do Itamaraty em que ele deixou de fazer uma política que representasse um certo consenso nacional. A chamada política externa independente de Santiago Dantas, no começo dos anos 1960, e o governo Lula, quando terceirizou o Itamaraty para o PT. A presença de Marco Aurélio Garcia lá revela essa terceirização, que produziu fracassos, o pior deles a Venezuela.

Mas foi justamente no governo Lula que o Brasil assumiu maior protagonismo: missões de paz no âmbito das Nações Unidas, reivindicação de reforma no Conselho de Segurança da ONU...

O Brasil estava dando passos muito além das suas pernas. Houve uma falta de priorização do que o Brasil queria. Lula agiu como se o país fosse uma potência mais importante do que de fato é. E Lula imaginou um mundo baseado em polos de poder antiamericanos. Ele chegou a imaginar que o Brasil seria um parceiro estratégico da China, quando o parceiro estratégico da China é os EUA. A política externa de Lula pecou por falta de uma estratégia coerente, de uma análise coerente do mundo e de uma perspectiva das limitações de poder no Brasil.

A História o absolverá?

Alfredo Bosi — publicado 08/04/2015 -

http://www.cartacapital.com.br/revista/843/a-historia-o-absolvera-1573.html

O PT tornou-se o bode expiatório fácil de todas as situações difíceis por que passa o Brasil, em um contexto internacional difícil

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Fevereiro de 1980, dia 10, uma aspiração difusa transforma-se em Partido

dos Trabalhadores

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“O PMDB se tornar uma força hegemônica é desastroso”

É muito provável que os manifestantes indignados com a corrupção que

envolveu alguns membros do Partido dos Trabalhadores não saibam que as

mazelas do partido constrangem e entristecem ainda mais profundamente os

seus antigos filiados ou simpatizantes que o viram nascer e crescer em um

contexto de luta democrática e esperança política.

Eis um ponto para reflexão: o PT tem uma história, o que está longe de ocorrer

com a maioria das agremiações partidárias que hoje fragmentam o cenário

político brasileiro. É uma história que honra os seus fundadores e desonra os

que traíram os seus valores. Sem nunca ter-me filiado, tive o privilégio de ver

esse acontecimento extraordinário na política brasileira que foi o entusiasmo

puro de homens e mulheres pertencentes às comunidades de base da periferia

(Osasco, Santo André, São Bernardo, São Caetano...) reunindo-se em casas

de família, salões paroquiais, centros de Direitos Humanos, sedes de

sindicatos independentes, salas de aula na universidade e em seminários

católicos e protestantes, classes de educação de adultos, salinhas de grêmios

de colégios, barzinhos de subúrbio... E reunidos em nome de um ideal que

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parecia ter soçobrado em 20 anos de ditadura: o ideal de uma democracia

política em busca de uma democracia econômica.

O novo partido, que saía formalmente de um encontro no Colégio Sion, em 10

de fevereiro de 1980, era antes uma aspiração difusa, porém intensa, do que

uma organização hierarquizada. Participar e debater eram verbos mais

importantes do que poder e mandar. Veja a lista dos fundadores: intelectuais

ilustres como Mário Pedrosa, Sérgio Buarque de Holanda, Antonio Candido,

Paul Singer e Jacob Gorender ao lado de sindicalistas, Lula e Henos Amorina,

Paulo Skromov e Jacó Bittar, líderes camponeses como Manuel da Conceição

ao lado de artistas da envergadura de Lélia Abramo, o maior dos educadores

brasileiros, Paulo Freire (representado por Moacir Gadotti) e uma das mais

belas figuras do jornalismo brasileiro, Perseu Abramo, ao lado do militante

Apolônio de Carvalho, combatente na Guerra Civil Espanhola e na Resistência

Francesa.

Pude conhecer também a humilde retaguarda do futuro partido: uma

comunidade popular em Vila Yolanda, bairro operário de Osasco. Aí se

reuniam para orar e debater as necessidades e os anseios dos migrantes

nordestinos acantonados na cidade. Era o momento forte do brotar de um

sentimento democrático que aspirava formular a equação (impossível?) de

fraternidade e participação política em pleno regime capitalista... Em torno de

um padre operário francês, Domingos Barbé, cujos dedos tinham sido

decepados na máquina da fábrica, discutiam um pouco de tudo: a oportunidade

das greves, a não violência ativa, a libertação da mulher, a educação dos

adolescentes, a péssima condução urbana, a avidez das empreiteiras, o poder

da mídia... E desejavam que eu lhes contasse a história do nosso Brasil e

falasse de literatura e (por que não?) de romances que mostrassem as dores e

os sonhos dos pobres. Escolhi Vidas Secas e percebi que eles se identificavam

com os migrantes que habitavam as páginas árduas e límpidas de Graciliano

Ramos.

Foram esses os fundadores anônimos do PT em Osasco. Domingos Barbé,

que vinha de uma França onde o laicismo era a religião republicana,

surpreendia-se e maravilhava-se com a possibilidade de criação de um partido

em que socialismo e cristianismo pudessem dar as mãos sem ódios

ideológicos seculares. Entregava-me listas de princípios que, cartesianamente,

considerava básicos para a constituição desse inacreditável partido sem

preconceitos. Nesse mesmo 1980 saía a primeira tradução brasileira de um

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vibrante ensaio de Rosa Luxemburgo, O Socialismo e as Igrejas – O

comunismo dos primeiros cristãos, opúsculo publicado pela primeira vez, em

1905, pelo Partido Social Democrata Polonês. As boas-novas pareciam

convergir.

A chegada ao poder terá desmentido os ideais daquele tempo que parecerá

mítico aos que não sentiram a alegria de conhecê-lo de perto? É o caso de

responder com objetividade: sim e não. Sim, porque há uma relação intrínseca

entre poder e abuso do poder, poder e corrupção, realidade que não é

absolutamente só brasileira, pois tem sido fartamente constatada nos países

capitalistas e estatistas de todo o mundo, sem exceção. No Brasil,

praticamente não há formas de democracia participativa, precisamente um dos

valores pregados pelos militantes do PT, a sua ausência é causa direta dos

desvios que tanto abalaram a confiança no partido. A seiva moral que se

transmite dos eleitores para os eleitos vai secando à medida que os últimos se

distanciam dos primeiros e se enleiam na teia da burocracia partidária.

Mas cuidado com as drásticas excomunhões! O PT que apoiou a gestão de

Erundina em São Paulo, o PT que deu à prefeita secretários como Paulo

Freire, Paul Singer e Marilena Chauí, foi um viveiro de propostas e ações

dignas de um governo popular. O ethos distributivista dos governos Lula e

Dilma tirou efetivamente da pobreza extrema 36 milhões de brasileiros, o que

eleitores das classes médias e altas envenenados pela orquestração midiática

recusam-se a admitir na sua cegueira de consumistas inveterados.

Hoje, em vista dos escândalos na Petrobras, o PT é o bode expiatório fácil de

todas as situações difíceis por que passa a economia brasileira em um

contexto internacional adverso. A parte de responsabilidade que lhe cabe é

hipertrofiada pela luta sem quartel a que estamos assistindo desde a última

campanha eleitoral. Mas, maior ou menor, essa responsabilidade tem de ser

apurada e cobrada pela nação. Será um justo purgatório, próprio do sim e do

não, mas não a punição infernal com que desejam castigá-lo os seus

adversários, maus perdedores no jogo democrático.

Alfredo Bosi é professor emérito de Literatura Brasileira da Universidade de

São Paulo e membro da Academia Brasileira de Letras. BRASIL ECONOMICO

MEDIOCRIDADE DE LIDERANÇAS POLÍTICAS

Milton Temer

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Sequela da despolitização promovida pelos doze anos de lulopragmatismo.

Quando o historiador, no futuro, tentar estudar as razões de ver a atual fase

política brasileira ter como "lideranças" de destaque sacripantas do nível de

Eduardo Cunha, Mendonça Filho, Gilberto Kassab, Paulinho da Força, na

sequência de Renan, Jucá e Sarney; apenas para citar alguns, e sem esquecer

os Zé da cueca Guimarães e Sibas Machado, vai ter dificuldade de explicar o

fenômeno sem se aprofundar nas contradições produzidas pela ascensão de

Luiz Inácio ao poder.

Porque a História não se constrói por acasos imprevisíveis. Eles podem até

ocorrer, mas não têm peso decisivo sobre a realidade objetiva em que a

sociedade realiza seu destino.

A facilidade com que se aprova a destruição de direitos trabalhistas

consolidados; com que se defende a diminuição da Petrobras na exploração do

nosso petróleo já descoberto; com que se aprova voto distrital sem nenhuma

discussão ou participação do ilustre eleitor; em que se trata da redução de

maioridade penal como forma de combater a violência crescente na mesma

proporcionalidade em que cresce a desigualdade social; tudo isso estabelece

um cenário de horrores. Um cenário em que o senso comum imbecilizado se

impõe de forma aterrorizante, abrindo espaços para experiências previsíveis de

um autoritarismo de novo tipo. De um autoritarismo que não dependerá mais

de tanques nas ruas, porque vai se impor pelo assentimento social majoritário,

com a cobertura e orientação diária do Jornal Nacional.

Ou seja; queiram ou não os incondicionais do lulopragmatismo, a

responsabilidade, pelas concessões de princípios programáticos; pelas

composições partidárias, abjetas e contraditórias, na formação de alianças

parlamentares; tem nome e endereço conhecidos. Nada disso ocorre por

inevitável, mas sim por decisão política. Por transformismo ideológico, que nos

roubou, na vitória de 2002, a possibilidade de o País dar um salto qualitativo na

sua ordem social. E os culpados pela tragédia não podem continuar a ser

deificados, a não ser por autoflagelação. Ou, pior, por cumplicidade.

Construir uma alternativa que se sobreponha a essa direita arcaica ou à sua

nova versão social-liberal é fundamental para a garantia de sobrevivência de

um processo incessante de democratização e produção de justiça social em

nosso Pais. Luta que Segue!! a despeito do pessimismo matinal.

É pau, é pedra, é o fim de um caminho

Revista PIAUI - Edição 103 > _tribuna livre da luta de classes > Abril de 2015

A crise, a dissolução da esquerda e o legado conservador do lulismo

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César Benjamin

Um dos estilos mais típicos da oratória antiga eram os chamados discursos epidícticos, nos quais o tribuno apenas enfatizava aquilo que as plateias esperavam ouvir. Tratava-se, principalmente, de elogiar o elogiável, exaltando as qualidades de um homem ilustre recém-falecido, enaltecendo uma cidade diante de seus habitantes, louvando qualidades abstratas, como a bondade e a justiça, e assim por diante.

Com o tempo, os grandes tribunos perceberam que não havia verdadeiro mérito nisso. Dedicaram-se, então, a buscar a perfeição da oratória na prática oposta, a de elogiar o feio, o ridículo ou até mesmo o abominável.

Luciano e Leão Baptista Alberto descreveram as virtudes da mosca. Polícrates louvou os ratos. Luíz Uviquílio enalteceu os gafanhotos. Clitério escolheu o caruncho. Favônio, as febres. Betubo, os mosquitos. Miguel Psellos, as pulgas. Sinésio, a careca. E André Amônio fez um antológico discurso em que descreveu as belezas do nada.

Tivesse eu esse talento, faria o elogio de Dilma Rousseff. Seria o elogio da nulidade.

Nunca se viu coisa igual: um governo que toma posse e não começa, que já no primeiro trimestre se desmoraliza e se arrasta de derrota em derrota, e cuja maior esperança é conseguir agonizar em praça pública por quatro anos, sem nada propor ao país. Não dará certo, é claro, embora ainda não saibamos como.

Há poucos meses, falar em crise era coisa de gente ranzinza. Hoje, é chover no molhado. Mas acho que as pessoas ainda não perceberam o tamanho e a complexidade da confusão em que nos metemos. Estamos diante de diversas crises, superpostas e combinadas, que apenas se iniciam. É coisa de grandes proporções. Dadas as características da sociedade brasileira atual, talvez venha a ser a mais grave crise da nossa história.

Sua dimensão evidente é o esgotamento da política econômica que prevaleceu nos doze últimos anos. Desde 2003 ouvimos a promessa de combinar desenvolvimento e justiça social, tendo o mercado interno, pela primeira vez, como o principal elemento dinâmico.

Depositários da memória desse meritório projeto, longamente amadurecido, os governos do Partido dos Trabalhadores anunciaram

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a novidade, mas não souberam levá-la adiante: abandonaram a agenda de reformas estruturais; descuidaram da expansão dos bens e serviços de uso coletivo; não conseguiram coordenar e executar os investimentos necessários em infraestrutura; praticamente só criaram empregos em setores de baixa produtividade; assistiram, sem reagir, à reprimarização da nossa pauta de exportações e à desindustrialização do país, fenômenos associados a uma inserção declinante no sistema internacional. Em vez de tratar desses assuntos difíceis – e decisivos –, a política econômica concentrou-se, cada vez mais, em artifícios voltados para aquecer a demanda no curto prazo.

A promessa de um ciclo longo de desenvolvimento centrado na expansão do mercado interno degenerou em uma bolha de consumo.

Essa experimentação econômica acabou. Como o peso das tentativas de distribuição de renda foi jogado sobre os gastos fiscais do Estado, o qual não se libertou da condição de refém da acumulação rentista, as finanças públicas foram para o buraco. E, como o sistema produtivo brasileiro não acompanhou a demanda – em grande parte, por uma política cambial irresponsável –, nossas contas externas também desandaram.

Com a economia estagnada, temos um déficit público de mais de 6% do Produto Interno Bruto e outro déficit de mais de 4% do PIB nas contas externas. Isso quer dizer que Estado e sociedade estão em uma espiral de endividamento, com o país parado. Foi preciso pisar fundo no freio. O crescimento, que era baixo nos últimos anos, será negativo em 2015, enquanto 2016 já parece longo prazo. Estamos entrando em uma recessão cuja duração e profundidade ainda desconhecemos.

Isso foi escondido até as eleições. Logo em seguida, o mesmo governo que, até ontem, se legitimava por meio da apologia do consumo passou a adotar – sem aviso, sem negociações e sem explicações – um conjunto de políticas que visam, antes de tudo, contrair bruscamente esse mesmo consumo. Não podia dar certo.

A segunda dimensão da crise, menos visível, é o esgotamento simultâneo dos quatro mecanismos usados na última década para promover alguma distribuição de renda.

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Os aumentos reais do salário mínimo, iniciados em 1994 e mantidos sem interrupção até 2014, ficarão doravante comprometidos pelo pífio desempenho do PIB e pelo aperto nas contas da Previdência Social.

As políticas de transferência de renda, centradas no programa Bolsa Família, atingiram seu teto de expansão, tanto em número de famílias beneficiadas quanto no valor dos benefícios. A precária situação fiscal do Estado não permite novos aumentos significativos.

Dado o nível de endividamento da população, o crédito se contrai pela primeira vez em doze anos.

O aumento da formalização do trabalho arrefece e dá lugar a um novo ciclo de desemprego ascendente, principalmente na indústria.

O distributivismo sem reformas atingiu seu limite. A recessão se encarregará de anular boa parte dos ganhos que o povo brasileiro obteve na última década, o que prenuncia uma crise social importante. As populações que aumentaram sua capacidade de consumo e viram nisso uma expressão acabada de ascensão terão muitos motivos para reagir às perdas que se avizinham. Não temos instituições que acolham e canalizem sua provável rebeldia, que ainda não se expressou (elas não estiveram significativamente presentes nas manifestações dos dias 13 e 15 de março).

A terceira dimensão da crise é especificamente política. O loteamento do Estado, com o consequente rebaixamento do Congresso Nacional e da própria ideia de política, tornou-se o principal mecanismo de construção da chamada governabilidade. Levado ao extremo, ele eliminou a capacidade de esse mesmo Estado conduzir empreendimentos complexos e de longa maturação, que são os mais importantes. A política afastou-se das grandes questões nacionais.

A governabilidade assim obtida no curto prazo é a contraface de uma tendência à ingovernabilidade no longo prazo, pelo acúmulo de desafios relevantes não enfrentados.

Como escrevi aqui em 2013, o longo prazo chegou: as disfuncionalidades desse tipo de política já superam, de longe, qualquer contribuição que ela possa nos dar. Não obstante, ela prossegue, pois o sistema funciona no piloto automático. Construímos um Estado ágil para premiar amigos e punir adversários, mas inoperante para liderar um projeto nacional.

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Nosso sistema político gira em falso. Governa a si mesmo, em vez de governar o Brasil. Presos nessa armadilha, tornamo-nos uma sociedade de vontade fraca, que não consegue canalizar sua energia para o que verdadeiramente importa. Sociedades assim perdem a capacidade de se desenvolver, ainda mais em um contexto internacional, como o atual, em que as disputas se acirram.

A esse quadro preocupante somam-se três crises específicas, mas muito relevantes.

A crise no abastecimento de água, principalmente em São Paulo, onde está nossa maior metrópole, nossa agricultura mais forte e nossa maior concentração industrial.

A crise do setor elétrico, que já se expressa na disparada das tarifas e em apagões sucessivos, e provavelmente exigirá novo racionamento de energia ao longo do ano.

A crise da Petrobras e da engenharia pesada, que – somadas à sua extensa cadeia de fornecedores – representam em torno de 10% do PIB. Ainda desconhecemos os efeitos da contração desses investimentos sobre o conjunto da indústria e o impacto da perda patrimonial desses setores sobre a higidez do sistema financeiro, dos fundos de pensão e de outros investidores institucionais, como o próprio Fundo de Amparo ao Trabalhador. Esse impacto especificamente financeiro, que permanece incubado e despercebido, poderá vir a causar, adiante, um dramático agravamento da crise que está começando.

Esgotaram-se, simultaneamente, a política econômica, a política social e a maneira de fazer política adotadas pelos governos do PT. A rigor, não estamos assistindo apenas ao fim de um ciclo, mas de dois. No olhar de curto prazo, desfaz-se a hegemonia que prevaleceu na política brasileira na última década e, com ela, começa a se desfazer a polarização do país em dois blocos, um liderado pelo PT, outro pelo PSDB, com o PMDB como força pendular.

Em um olhar mais abrangente, estendido no tempo, também chega ao fim o impulso ideológico e institucional que a sociedade brasileira ganhou na década de 80. A maioria do nosso povo já não se reconhece nos partidos, nas organizações da sociedade civil e nos movimentos sociais nascidos ou reestruturados no fim do regime

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militar, há mais de trinta anos. A sociedade mudou, e eles envelheceram.

Um ciclo longo da política brasileira está terminando. Entramos em voo cego. Será preciso reconstruir referências, o que não é fácil.

Especialista em fazer o marketing do otimismo sem projeto, Lula foi uma espécie de Eike Batista da política. Também encantou multidões e, com isso, arrastou grande parte da esquerda. Entre os atores políticos, ela será a maior perdedora.

Ao longo da história, a esquerda resistiu a diversas tentativas de aniquilação, vindas de fora para dentro. Ao aderir ao lulismo – que abria aos seus quadros generosas oportunidades de ascensão social, afluência material e poder –, ela se deixou sucumbir por um processo inédito, lento e profundamente corrosivo: a dissolução de dentro para fora, pela perda de seus valores fundamentais.

Embora abrigado em legendas de esquerda, o lulismo sempre foi, na essência, um movimento conservador, que reduziu a ideia de justiça social apenas à dimensão do consumo individual e à conquista de votos a ela associada. O fortalecimento da coisa pública e das instituições republicanas, o desenvolvimento moral, intelectual e cultural das pessoas e o aperfeiçoamento do ambiente social em que se dá a convivência humana – que são essenciais em qualquer projeto progressista – sempre estiveram fora de seu horizonte ideológico.

“Compre mais e vote em mim”, foi tudo o que Lula disse, durante anos, ao povo brasileiro. Na política, ele reorganizou e fortaleceu o antigo Centrão, a articulação do fisiologismo e das oligarquias, que agora controla de novo, com folga, o Congresso Nacional e ameaça engolir de vez todo o poder, num retrocesso que chegou a ser inimaginável depois do fim do regime militar.

Não me surpreende que o lulismo, ao fim e ao cabo, nos deixe como legado uma sociedade mais conservadora do que a que tínhamos doze anos atrás. Ao contrário, parece-me ser o desdobramento natural do que ele é. Ao mesmo tempo, nunca antes tivemos massas humanas tão grandes, tão concentradas e tão carentes de participação, consciência, organização e representação. Essa despolitização ampla, geral e irrestrita é o pior legado da maneira como o PT conduziu a nação na última década. Nesse contexto, em uma situação de crise aguda, tudo pode surgir.

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Tempo de crise, tempo de cacofonia. Quem não tem o que propor logo propõe criar novas regras e fazer novas leis, um debate vazio. Regras e leis são sempre burladas, quando não temos capacidade de definir nem mesmo meia dúzia de objetivos comuns que constituam um consenso básico em torno de si.

Mais do que de novas regras, precisamos de novos fins e valores. Isso, as instituições políticas que aí estão, maculadas pelo peso abusivo do poder econômico e pela disseminação do cinismo, não podem nos dar. O conteúdo da política é que precisa mudar.

Nossos políticos tornaram-se camaleões que a cada quatro anos se esforçam para se adaptar ao que a sociedade é, ou parece ser, conforme lhes ensinam as minuciosas pesquisas de opinião que encomendam. Sempre preocupados com os interesses da hora, são incapazes de despertar qualidades novas que estejam latentes.

O futuro que resulta do somatório de suas pequenas ações, fabricadas com sucessivas costuras de curto prazo, é apenas o prolongamento do presente. Não contém o caráter novo de um verdadeiro futuro. Ficamos andando em círculos, sem sair do lugar.

Precisamos encontrar gente nova, organizada de maneira nova, que, em vez de tentar se adaptar ao que a sociedade é, ou parece ser, aceite correr os riscos de anunciar o que ela pode vir a ser, para impulsioná-la.

É de uma discussão de projeto que se trata, e ela exige que tenhamos capacidade de recolocar questões fundamentais. Esse pode ser o melhor legado da crise.

Precisamos abandonar ninharias, como a polarização PT versus PSDB, nos libertar de preconceitos, como os que nos mantêm presos às organizações da esquerda tradicional, e revisitar fundamentos, buscando atualizar uma ideia de Brasil, agora em um cenário de grandes dificuldades.

O tempo está contra nós. Não virá nenhum golpe de Estado, pois ninguém minimamente relevante o deseja, a começar pelas Forças Armadas. Mas, se não reagirmos, poderemos nos tornar um Estado falido e uma nação inviável. Nem a nulidade de Dilma Rousseff, nem a

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esperteza de Lula, nem o oportunismo dos nossos políticos atuais – feitas algumas exceções de praxe – nos salvarão.

O que escrevi aqui, e muito mais, eu digo há muitos anos à esquerda. Só colhi isolamento e difamação. Não fico feliz em constatar que tinha razão. É pau, é pedra, é o fim de um caminho. Mãos à obra.

"O PT tem que se cuidar para não perder a vergonha"

BRASIL ECONOMICO - 04mai15

O vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC), diz que o seu partido se arrisca ao perder prestígio e respeito dos cidadãos, por repetir na política o que fazem outras legendas. "A gente tem que reconhecer que o PT se rendeu à zona de conforto de não promover mudanças na política", analisa. O senador defende que o PT avalie se carrega o atraso com certas alianças ou se está sendo carregado pelo atraso. "O atual modelo de coalizão está com a validade vencida. O custo da governabilidade é alto demais para quem governa".

Entrevista: Jorge Viana, Senador (PT-AC) e vice-presidente do Senado

"O MODELO DE COALIZÃO ESTÁ COM VALIDADE VENCIDA"

A família Viana tem história no Acre. Wilde, pai de Sebastião e Jorge, fez uma longa carreira política no estado antes de seus filhos se apoderarem do Palácio Rio Branco por quatro mandatos (Jorge, de 1998 a 2006 e Tião desde 2011). Engenheiro florestal, o senador Jorge Viana (PT-AC), vice-presidente do Senado, começou na política empunhando a bandeira do meio ambiente nos anos 80, ao lado de Chico Mendes, morto em 1988. Naquele período, fundou o Partido dos Trabalhadores no Acre e pavimentou o caminho que fez dele prefeito, governador e senador. Viana orgulha-se de pertencer ao PT, por acreditar que os governos Lula e Dilma "melhoraram a vida do povo". Mas faz mea culpa e reconhece que seu partido erra: "O PT se arrisca quando repete na política aquilo que os velhos partidos fazem. O PT tem que se cuidar para não perder a vergonha". Viana também tece duras críticas ao sistema político brasileiro: "O custo da governabilidade é alto demais para quem governa. Este modelo de coalizão está com a validade vencida".

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Deco Bancillon Edla Lula

Brasília

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-RN), disse que o pior do PT é o aparelhamento do governo. Como o sr. vê essa provocação?

O presidente Renan não bateu no PT. Ele bateu numa modelagem política que, inclusive, muitas pessoas o acusavam de praticar. Ele bateu muito no atual PMDB e fez uma dura crítica ao próprio ministro da articulação institucional da Presidência, que é o vice-presidente Michel Temer. Ele foi duro nessas críticas, ao dizer que o PMDB está seguindo um caminho de só pensar nos recursos humanos, em nomeações, e teria o risco de virar o partido da boquinha, segundo palavras dele. Mas é realmente importante que haja, neste momento, uma relação melhor entre PT e PMDB.

O que explica as constantes provocações de Renan, e também do presidente da Câmara, Eduardo Cunha?

O PMDB é um bicho de muitas cabeças. É um partido importante, ninguém governa sem o PMDB. Mas governar com o PMDB é muito difícil. Há vários líderes no partido, Temer é um grande líder, Renan é um grande líder, Eduardo Cunha outro, os ministros Eliseu Padilha Aviação Civil) e Henrique Alves Turismo) também. O que existe hoje é um jogo de pesos envolvendo o PMDB da Câmara e o PMDB do Senado, e isso aflora nesse posicionamento do presidente Renan. Há problemas nas relações PMDB-governo, mas há mais problemas entre eles mesmos, do PMDB. O presidente Renan é crítico, é duro. Cobra do governo, cobra da Câmara. Ganha prestígio no Senado quando propõe uma agenda que busque maior protagonismo para a Casa. E uma coisa a gente não pode deixar de reconhecer: o presidente Renan entrega a mercadoria. Ele assume compromissos e, na hora H, entra e ajuda a resolver aquilo que é de interesse do próprio governo. Claro, com a independência que o presidente do Senado precisa ter. Isso é importante. Já na Câmara, não vejo esse ambiente.

Falta cooperação entre os partidos para votar temas de interesse do país?

O presidente Renan, recentemente, disse algo interessante: o Congresso também é governo, governa o país. Eu acho que isso todos os congressistas têm que entender. Não podemos ficar cumprindo um papel, como a oposição tenta estabelecer, de que o Parlamento é o lugar de criar obstáculos, de dificultar a vida do governo. Porque, com isso, a oposição faz um desserviço ao Brasil. A oposição se apequenou muito, não tem protagonismo de nada. Hoje, a oposição tem apenas uma proposta: tentar impedir que o governo dê certo. Com isso, trabalha para que o Brasil não dê certo.

Há quem diga que o partido que faz oposição, de fato, é o PMDB. Como o sr. responde a isso?

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De alguma maneira isso tem razão. Eu também diria que, em alguns momentos, o papel que caberia à oposição no país acaba sendo exercido pela imprensa. Os jornais, as TVs, as novas mídias assumem um protagonismo que deveria ser assumido pela oposição, que está sempre a reboque de alguém ou de algum tema levantado pela imprensa. E olha que a oposição tem quadros importantes, mas eles não conseguem avançar em nada. O Aécio Neves é uma liderança importante, mas se apequena quando opta por um discurso de baixo nível. Poderia estar propondo grandes temas para o país debater. Aécio deveria falar menos e falar de temas importantes. A oposição parece não querer que 2014 acabe, mas 2014 acabou em 31 de dezembro. As eleições ficaram para trás. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) já deu o seu veredicto. Mas a oposição teima em querer que 2014 não termine e que 2015 não comece.

Semana passada, o TSE condenou o PT a pagar R$ 4,9 milhões por irregularidades na campanha da presidenta Dilma Rousseff em 2010. Essa nova condenação abre brecha para pedidos de impeachment da presidenta?

Hoje em dia, posições parciais, sejam do TCU (Tribunal de Contas da União), sejam do TSE ou de outros tribunais, são consideradas sentenças obrigatórias. Isso é lamentável. A oposição faz muito isso. Eu não tenho dúvida de que é uma irresponsabilidade alguns componentes da oposição (porque eu não posso generalizar) pedirem o impeachment da presidenta Dilma. Isso é um desserviço ao país. A oposição tem um papel muito importante nesta hora, em que o país precisa debater saídas para a crise econômica, saídas para voltar a crescer, para que a gente possa transformar a educação na maior prioridade, para que se tenha o desenvolvimento regional acontecendo. Mas não. A oposição insiste num discurso de uma nota só, desqualificado e sem nenhum protagonismo.

Como o governo deve reagir aos questionamentos pelo impeachment?

O que eu acho é que o governo tem que governar. Nós demoramos a entender isso, o que foi um erro. A presidenta Dilma errou, por exemplo, no timing de estabelecer um diálogo com a sociedade, após a eleição. Ela falava 10 minutos por dia no processo eleitoral. Depois, passou dois meses sem dar palavra nenhuma. Ficaram valendo só as versões de quem não se conformava com o resultado das eleições. Nós erramos ali.

E como fazer o governo deslanchar após essa paralisia que se viu nesses quatro meses?

Eu sei que a presidenta tem importantes e grandes projetos para o país, sobretudo na área de infraestrutura, que podem ser a melhor sustentação para a gente enfrentar a crise. Não se enfrenta a crise econômica com recessão. A gente tinha que seguir o exemplo dos EUA, que criaram mecanismos inteligentes de retomada de investimentos, de parcerias com o setor privado. A presidenta está fazendo isso, ao anunciar novas concessões, que não são privatizações. São concessões de serviços, com regras muito claras que contemplam portos, aeroportos, ferrovias.

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O governo precisa assumir seus próprios erros?

A gente tem que assumir esse atraso em fazer o segundo mandato deslanchar como um erro, porque se a gente não assumir que está errando em alguns aspectos, a gente não ganha confiança da sociedade, Na questão do ajuste econômico, que, no fundo, é uma tentativa de atravessar este momento, não temos sido muito felizes em estabelecer esse diálogo, apesar do esforço do ministro Joaquim Levy (Fazenda), do ministro Nelson Barbosa (Planejamento) e de outros ministros. Mas esse é um debate que a gente não pode perder. Se necessário, tem que falar toda semana em cadeia de rádio e TV, para poder traduzir esses ajustes para a sociedade.

O sr. acha que essas medidas provisórias do ajuste vieram na hora errada?

Vieram na hora certa. Isso dá confiança para os investidores, faz com que o Brasil seja respeitado pelas agências que analisam o risco. Mas elas vieram desacompanhadas de um bom discurso, de uma boa argumentação. No fundo, nós estamos fazendo ajustes que implicam na vida do andar de baixo. Elas vieram desacompanhadas de medidas do andar de cima. Nós tivemos um bom discurso durante a campanha. Agora, precisamos construir um bom discurso durante o governo. Por isso que eu penso que nós temos que reconhecer os erros, sem deixar de enfatizar tudo aquilo de bom que temos feito. Afinal, o PT foi líder desse projeto que mudou o Brasil. No fim, a história vai nos julgar bem, não tenha dúvida.

No fim, a história absolverá o PT?

Ela fará um justo julgamento, disso eu não tenho dúvidas. Mas nós estamos precisando ter um bom julgamento da sociedade agora. Tenho certeza de que a presidenta se sairá muito bem do seu segundo mandato, diferentemente do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que se saiu muito mal. Ela vai sair mais parecida com Lula do que com Fernando Henrique. Lula saiu extraordinariamente bem. Se ele quisesse fazer como fizeram outros líderes de partidos, como o PSDB, poderia ter mudado as regras do jogo para ficar mais tempo na Presidência. Não fez. Preferiu cumprir as regras do jogo. Então, esses são os legados que o PT deixa para o país. Muitas mudanças boas para a população e sempre respeitando as regras do jogo, de forma sempre muito republicana. Quem não tem sido republicano conosco são alguns setores da Justiça e da oposição.

Há algum complô desses setores para alijar o PT do poder?

Não diria que é um complô. Há um inconformismo, uma ação que beira o preconceito com os nossos governos. Tem uma parcela da elite, que mesmo tendo sido mais foi beneficiada durante os governos de Lula e de Dilma, não se conforma com a gente governando. O governo da presidenta Dilma tem dia e hora para acabar. Com isso, nós completaremos 16 anos governando o Brasil. Só que o ex-presidente Lula está livre e desimpedido. O maior líder do país está em plena forma física e intelectual e livre para, eventualmente, ser nosso convidado para ser candidato à Presidência em 2018. Eu acho que isso

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apavora a oposição. Deixa-os num processo depressivo, que faz com que percam a noção do papel que têm para desempenhar no país. E, obviamente, setores da elite empresarial também. Acho que nós até contribuímos para isso, com essa história de "nós e eles". Porque, no fim, nós governamos para todos.

As conquistas sociais estão em risco, por causa da debilidade da economia?

Não acredito que haverá retrocesso nesse aspecto, nem mesmo por causa de crise econômica. Aliás, nesta crise, nós temos que preservar aquilo que é fundamental. No Brasil, os empresários ganharam fortunas com a melhoria da capacidade de compra e de renda dos brasileiros. Se esse ciclo passou, temos que iniciar novo ciclo, que é gerar empregos qualificados e fortalecer nossa indústria. Para isso, precisamos modernizar relações de trabalho, de tributos, criar competitividade. O que não pode é querer, num momento de crise, resolver todos os problemas sacrificando os trabalhadores.

Atualmente, no Congresso, há várias medidas que reduzem direitos trabalhistas.

Há, de fato, medidas propostas por setores mais conservadores que não respeitam as mudanças que o Brasil experimentou nos anos 40, com Getúlio Vargas (que instituiu a Consolidação das Leis do Trabalho, CLT). Alguns setores propõem para o país medidas medievais. Nós precisamos modernizar a legislação trabalhista criada por Getúlio trazendo-a para o século 21, e não levando-a de volta ao século 19. Sinceramente, eu espero que não prospere nenhuma dessas intenções de querer danificar nossa política de conquistas sociais usando o argumento de crise econômica — e camuflando aí os verdadeiros objetivos de intolerância com esses pobres que agora andam de avião, que passam férias na praia. Isso é bom para o país e é bom, sobretudo, para a elite. É uma pena que algumas pessoas não vejam dessa forma.

O presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), defende que o Senado, como casa revisora do projeto da terceirização, não tenha que demorar tanto tempo para analisar o projeto. O sr. concorda com a avaliação dele?

O sr. Eduardo Cunha é presidente da Câmara; não é presidente do Senado, nem do Congresso. Então, eu acho que, nesse aspecto, para que haja harmonia no trabalho, o melhor é cada um no seu cada um. Não dá para o presidente Eduardo Cunha querer estabelecer o calendário do Senado. Dá para discutir pautas afins, isso é importante. O Senado vai aprovar a lei de terceirização, mas não pode ser do jeito que a Câmara quer. Não vamos aceitar o papel de apenas bater o carimbo numa proposta que veio com sérios problemas. Eles demoraram 12 anos para votar esse tema e agora querem pressa, aprovar do jeito que mandaram. Aquilo que abusa e passa do ponto tem que ser modificado no Senado. Permitir a terceirização de atividades-fim indiscriminadamente é inaceitável.

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Ao mesmo tempo em que há uma onda crescente de conservadorismo, parece ocorrer a perda de relevância do PT no cenário nacional. A que o sr. atribui isso?

Em geral, a política está muito desmoralizada. Todo mundo reclama que, nas últimas pesquisas, a avaliação do governo era de 13%, mas se esquece que a avaliação do Congresso era de menos de 9% — é muito pior. Eu acho que nós sofremos uma perda de relevância. O próprio PT, que ainda é o partido mais admirado do país, perdeu muito prestígio, nossa admiração caiu pela metade. E diminuiu em regiões nas quais gente tinha admiração alta. O duro é a gente ver que o PT enfrentou o problema do mensalão, enfrenta agora o problema da Lava Jato, tivemos tesoureiro preso e, independentemente do juízo de avaliação sobre esses episódios, acho lamentável que fique parecendo sempre uma ação contra o PT.

O interesse seria de desmoralizar petistas e de proteger políticos de outros partidos?

Não há dúvidas. O noticiário carrega na tinta quando algo supostamente envolve alguém do PT. Agora mesmo surgiu um novo depoimento de um delator (Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras) detalhando que pagou, através de uma empresa, R$ 10 milhões ao ex-presidente do PSDB Sérgio Guerra (falecido). Trata-se do mesmo delator que ganha tanto crédito junto à Justiça e à oposição. Não tem nenhum depoimento desse delator dizendo que deu tanto dinheiro para um político de qualquer outro partido.

Há pouca atenção da imprensa a esse assunto?

Foram R$ 10 milhões para o presidente do PSDB e isso não é notícia? Quer dizer então que o delator só é bom se acusar o PT ou alguém ligado ao PT? Mas se ele acusar alguém da oposição e, principalmente, do PSDB, então ele não tem crédito algum para estar acusando? Cadê a apuração? Ao mesmo tempo, há uma caça inaceitável ao ex-presidente Lula e à presidenta Dilma. Eu acho que há sérios problemas com componentes do Judiciário e da Polícia Federal. Tem, às vezes, situações que esbarram em posições políticas e partidárias.

O juiz Sérgio Moro teria motivações políticas?

Eu não posso fazer esse juízo do juiz Moro, porque eu não vi, não li e não me informei de qualquer atitude dele nesse sentido. Mas que tem gente envolvida nesse processo suspeita de estar fazendo mau uso das suas funções, e isso já foi inclusive denunciado pela própria imprensa, isso é um fato. Eu acho que é preciso dar apoio às investigações. Todos nós, como sociedade, temos que nos somar ao juiz Moro ou a qualquer outro juiz que queira fazer o combate à corrupção. Mas não podemos rasgar as leis e as garantias. Ninguém pode prender primeiro para ver se tem culpa depois. Isso significa uma antecipação não só de um julgamento, mas de uma condenação. Isso é rasgar a Constituição. E eu acho que o Supremo Tribunal Federal (STF) merece elogio, porque retomou um pouco a situação (ao livrar da cadeia nove executivos de

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empreiteiras da Lava Jato). Senão, o combate à corrupção será temporário e atenderá a alguns poucos interesses, que não são os interesses do país. Devemos ter mecanismos de combate à corrupção de forma permanente. Não podemos permitir que se destrua a principal empresa brasileira. A Petrobras é responsável por 3% do PIB brasileiro, tem 85 mil empregados, movimenta uma cadeia de quase meio milhão de trabalhadores. Vejo a ação de muitos e aquilo que sai no noticiário parecendo que querem é destruir a empresa, e não fazer apuração de ilegalidades que tenham sido cometidas. Se tirarmos a corrupção da Petrobras, vai ser muito bom para o Brasil. Gostei muito da vinda do novo presidente Aldemir Bendine à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Ele passou muita segurança de que a empresa está passando por um novo processo de governança, o que nos livra desse joguete de nomeações políticas dentro da Petrobras, e de mau uso que alguns diretores e funcionários de carreira fizeram na empresa.

Mas essas nomeações não foram feitas pelo PT, que é seu partido?

Foram feitas pelo governo do PT, que trabalha numa coalizão que é fruto dessa insensatez que o Brasil vive. Em que quem ganha, não consegue governar. Só consegue governar se mudar o discurso da campanha e se mudar a base aliada da campanha. Isso é a consequência mais perversa que temos dessa anarquia que virou o Brasil com o número de partidos, de financiamento empresarial de campanha. O maior crime que se comete no Brasil hoje é querer a permanência do financiamento empresarial de campanha. Falo com convicção, porque apresentei em 2011 um projeto propondo o fim do financiamento empresarial. Também apresentei um projeto propondo tornar crime o caixa 2 e apontando caminhos para fazermos a reforma política. A reforma não sai por conta dos maus políticos que estão instalados hoje na política brasileira, que não querem que mude porque, se mudar, parte deles será mudada.

Pode dar exemplos?

Há partidos que não querem a reforma política. Estamos caminhando para ser uma Argentina em números de partidos. Só perdemos para a Argentina, que já tem 70. Temos 30 partidos e mais 30 por vir. Para muitos, candidatura é algo empresarial. Alguns partidos são criados para fazer negócio, movimenta-se muito dinheiro, vende-se tempo de televisão. E isso é lamentável, porque a política é algo muito nobre. Está desmoralizada, mas é nobre. Fui governador do Acre, foi prefeito de Rio Branco. E tenho muito orgulho do trabalho que fiz. Ajudei a melhorar a autoestima do povo do Acre. Tenho muita satisfação por ter ajudado a promover mudanças no Acre tão boas quanto o presidente Lula e a presidenta Dilma promoveram no Brasil. Quando a política é exercida com bons propósitos, muda a vida das pessoas, muda a história de um país.

Mas muitos petistas hoje têm vergonha de dizer que são petistas...

A gente tem que reconhecer que o PT se rendeu ao financiamento empresarial de campanha e à zona de conforto de não promover mudanças na política. Nós usamos a política para promover mudanças no país com um alto custo. O PT

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precisa sempre se perguntar se nós estamos carregando o atraso com certas alianças, ou se é o atraso que está nos carregando. Se a resposta for a segunda, não compensa estarmos neste processo. Por enquanto, acho que dá para afirmar que nós estamos carregando o atraso porque, com todos os percalços, conseguimos mudar para melhor o Brasil.

Esse atraso a que o sr. se refere seria o PMDB?

Não me refiro ao PMDB, mas a algumas propostas que a gente vê. Temos que fazer um arco de alianças muito grande. Para governar, nos unimos a partidos que têm posições antagônicas ao que sempre pregamos. A alternativa seria a ingovernabilidade. O custo da governabilidade é alto demais para quem governa. Este modelo de coalizão está com a validade vencida. Temos que inventar outra maneira de ter governabilidade.

Que arrumação seria essa?

O PT adotou uma meia-medida que é a de não mais aceitar financiamento empresarial. Ótimo. Mas eu quero acrescentar a outra metade, que é proibir que qualquer candidato petista receba doações empresariais.

Alguns analistas apontam que esse compromisso feito pelo PT, de não aceitar financiamento privado, vai prejudicar o partido nas eleições municipais de2016. Há esse risco?

O PT se arrisca quando perde prestígio e o respeito do cidadão e dos seus filiados, quando repete na política aquilo que os outros partidos fazem. O PT tem que se cuidar para não perder a vergonha, porque é um partido que me orgulha. Tem que tomar atitudes como a defendida pelo Rui Falcão (presidente nacional do PT), de não aceitar financiamento empresarial. Não sei se serei candidato de novo algum dia. Se for, em respeito à história do PT, estabelecerei minhas regras, com ou sem reforma política. Uma delas é só aceitar recursos individuais do cidadão.

A senadora Marta Suplicy, ao deixar o partido, também falou em vergonha...

Com todo o respeito, a Marta Suplicy deveria assumir que está saindo porque tem um projeto pessoal, que não tem como realizar dentro do PT. Ela foi a pessoa que mais teve espaço no PT: foi prefeita, senadora, ministra duas vezes. Quem deu esse currículo a ela foi o PT.

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Notícias, Informações e Debates

sobre o Desenvolvimento do Brasil:

www.desenvolvimentistas.com.br

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Comentando o comentário do Luiz Carlos...Tania Faillace <[email protected]>

Em matéria de partidos, não vale a generalização, porque a maioria deles

perdeu sua identidade a partir de direções sem vinculação com os programas

originais, e essas

direções não deram satisfação a suas bases.

Isso foi procedido a partir, principalmente, do governo FHC, quando houve

acertos de cúpulas não revelados seja aos trabalhistas (PDT), aos comunistas

(PCdoB) e aos petistas (PT).

É nessa tecla que bato insistentemente para que se force a abertura daqueles

acordos fechados na década de 90, que, inclusive, permitiram que as

privatizações passassem sem obstáculos e sem revisão, apesar das posições

contrárias de todas as bases partidárias e das bases sindicais, e das bases

nacionalistas.

O centralismo, que é de praxe em todas as nossas organizações, inclusive

condomínios de prédios, permite que as cúpulas sequer peçam opinião às

bases sobre os acertos feitos, ou analisem suas consequências.

Como várias vezes já coloquei neste mesmo espaço, podem-se deduzir, pelos

seguimentos dos fatos e episódios, algumas das pressões então usadas.

Apenas que elas deveriam ter sido expostas ao coletivo.

Assinalo especialmente a criação de Raposa do Sol, a explosão na base de

Alcântara, e a desculpa fajutada da Embraer para explicar a queda do Boeing

da Gol anos mais tarde. Tudo sugerindo e mais que sugerindo, conspiração e

atentados.

E por que não seriam usados esses "argumentos" aqui, quando são usados no

mundo inteiro, quando há interesse dos países hegemõnicos ocidentais e seus

aliados do Oriente Médio?

Em relação ao governo brasileiro dos últimos anos, tratou-se de um des-

centralismo não constitucional, que permite o engessamento das políticas a

nível federal, mas sujeitas à aprovação do maior "saco de gatos" já imaginado

em termos de política de quaisquer países, da direita extremada à esquerda

assustada.

Tania Jamardo Faillace

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Não importa que tenha sido restrito aos bairros de elite e resultado de uma ação combinada pelas organizações de direita que se aninham nas redes sociais. O “panelaço” das varandas não vai sair da cena política Por Fernando Brito, do Tijolaço Não importa que tenha sido restrito aos bairros de elite e resultado de uma ação combinada pelas organizações de direita que se aninham nas redes sociais.

O “panelaço” das varandas não vai sair da cena política.

Veio para ficar, como o “Tea Party” não desapareceu nos EUA, como os partidos de extrema-direita ressuscitaram do pré- 2a. Guerra e da Guerra Fria na Europa, como acontece no Leste Europeu com partidos de inspiração – evidentemente negada, e nem sempre – nazista.

Claro que a insanidade e o ódio da mídia criaram a incubadora deste ovo da serpente.

Não cabe mais a fantasia de que um discurso de “inclusão” – em si correto – pôde se diluir naquela história de “um país de todos”.

Claro que este é o desejável, mas não é o real.

O Brasil não é um país das maiorias porque segue sendo uma capitania de poucos.

O PT conseguiu muito com esta “aceitação das regras do jogo”, jogo viciado; é inegável para qualquer um que veja os indicadores sociais do país.

Mas que cobraram seu preço.

Regras que, ao não serem contestadas e receberem o “aceite” acabaram transformando seus quadros em políticos “amaciados” à sua prática.

As decisões polêmicas das quais se fugiu foram trazidas a ordem do dia agora, que mais fraco ele – o PT – se encontra.

E contra ele.

Mas o PT e o Governo do PT continuam sonhando em “(re)conquistar a classe média”.

Mas isso depende de um cenário de afluência econômica que não está no radar de ninguém.

Muito menos a elite, que se beneficiou durante todos estes anos, sente que pode destruí-lo.

Parte da classe média, que a ele deve a ascensão , comporta-se como o filho pródigo, que a si atribui todo o mérito e sucesso.

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O PT vai ter de se acostumar à ideia de que será hostilizado pela direita, ainda que irracionalmente, porque jamais recusou-se a enfrentá-la aberta e decididamente.

"Já não pode ser “a esquerda que a direita gosta", lembrando a frase de Darcy Ribeiro.

A direita saiu do gueto e já pode ter seus amores próprios e transtornados.

Mas o povão passou a se sentir órfão, porque seu amor agora, só faz

acenos a outros.

Em quase seis meses, entre as medidas de arrocho – certamente necessárias – não há uma que pese sobre a elite financeira.

É preciso ter a clareza de ver que um governo de coalizão, no qual se tem de ceder – e hoje, de ceder muito – não se confunde com ter uma identidade política que o transcenda.

Identidade cujo nome é Luiz Inácio Lula da Silva.

É contra ele que se batem panelas.

Teoria e Debate

O PT precisa mudar, em que e por quê? | Teoria e Debate https://t.co/7bB83ilJabvia @sharethis

O PT precisa mudar, em que e por quê? | Teoria e Debate

O enfrentamento às inúmeras ações dos conservadores em tentar destruturar o PT e o governo Dilma, manifestadas e

amplificadas em várias frentes é...

SHAR.ES

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Tarso volta a criticar PT e diz que fará frente de esquerda no Rio em 2016

222 Glauber Gonçalves Do UOL, no Rio 14/05/201513h09

Ouvir texto

Sérgio Lima/Folhapress

Dedicado a um projeto que inclui estabelecer-se por um tempo no Rio de

Janeiro, o ex-governador do Rio Grande do Sul e um dos principais

pensadores do PT, Tarso Genro, externou desconforto com as medidas

econômicas levadas a cabo pelo governo Dilma Rousseff e voltou a criticar aos

rumos da sigla durante um debate sobre reforma política, na terça-feira (12), na

Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Discutindo o tema ao lado do

deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ), o petista declarou que o ajuste

fiscal em curso gera "um constrangimento impossível de ser digerido" pelo

partido.

Ministro da Educação e da Justiça no governo Lula, Tarso vai se dividir entre

sua residência em Porto Alegre e outra no Rio, onde pretende passar uma

semana por mês. Sem dar detalhes, ele defendeu a criação de uma "nova

frente política" de esquerda no país, com vistas às eleições de 2016 e 2018. A

ideia é reunir intelectuais, políticos de diferentes partidos e outros atores para

discutir os rumos da esquerda.

"Nós temos agora que atravessar uma eleição municipal, e o Rio de Janeiro

tem uma importância muito grande nesse processo, por aglutinar uma

candidatura popular e democrática que cria um simbolismo político novo para o

País", declarou Tarso durante o debate. "O Rio tem forças políticas dentro dos

partidos de esquerda com condições de promover uma nova unidade, uma

nova frente política para revigorar o projeto de esquerda. Vejo lideranças de

vários partidos capazes de fazer isso", disse, após o evento.

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Embora não tenha revelado quem procurará em sua estada no Sudeste, o ex-

governador gaúcho esteve reunido ontem, antes do debate, com Freixo,

parlamentar que, embora faça oposição ao governo federal, deu apoio à

reeleição de Dilma no segundo turno.

Em sua fala, próxima à visão de outros partidos mais à esquerda e distante de

posicionamentos que prevalecem hoje no PT e no governo federal, Tarso fez

novas críticas ao partido. "Nós, que somos minorias dentro do partido, não

temos ninguém a nos opor, porque não há hegemonia partidária hoje. Há um

condomínio administrativo e um partido em crise, que está se segurando para

não entrar numa depressão profunda", declarou. "Não existe grupo dirigente.

Existe um acordo de funcionalidade partidária e um projeto de estado vencido."

Para Tarso, o projeto desenvolvimentista iniciado no governo Lula cumpriu seu

ciclo e, portanto, está esgotado.

Ainda na seara econômica, Tarso defendeu que o Brasil precisa sair de uma

posição de "dependência subordinada" e estabelecer uma relação de

"cooperação recíproca" com o capital financeiro internacional. "Nós não

podemos imaginar que vamos nos retirar da ordem econômica e financeira

internacional. Isso não existe mais", disse o petista, que elogiou iniciativas

globais como o banco dos Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China

e África do Sul).

Ao reprovar as condições do ajuste fiscal em curso, Tarso propôs que o aperto

seja direcionado às classes mais altas e inclua medidas como a taxação de

grandes fortunas e de heranças e a reestruturação do Imposto de Renda.

"Se nós [a esquerda] não respondermos, no plano nacional, de que forma

vamos reorganizar o processo econômico do País [...], dificilmente vamos ter

condições de sair do tipo de ajuste que está sendo feito neste momento, que é

o ajuste tradicional e que gera, inclusive a nós do Partido dos Trabalhadores,

pelo menos da parte do partido da qual eu participo, um constrangimento

impossível de ser digerido", afirmou.

O ex-governador voltou a criticar os grandes veículos de comunicação, a quem

culpou de impedir os governos de esquerda de implementar seus projetos no

país. Ele se disse favorável a uma reforma do "sistema de comunicações do

País" com o objetivo de "acabar com o oligopólio da mídia".

Derrotado pelo peemedebista José Ivo Sartori na corrida pela reeleição ao

governo gaúcho no ano passado, o petista disse acreditar que a crise pela qual

seu partido passa vai gerar um impulso de renovação. "O PT está em crise,

mas não é uma crise terminal", afirmou, acrescentando que o momento que a

sigla atravessa está inserido num contexto global de dificuldades das

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esquerdas. "Aqueles que apostam que o PT é um partido que já desistiu de

compor o cenário nacional como um partido importante estão equivocados",

disse após o evento.

Defensor da tese de que o PT deveria ter sido "refundado", logo após o

escândalo do mensalão, Tarso voltou a tocar no assunto ao afirmar que o

partido nunca consultou seus afiliados sobre o tema. "Não o fez porque o

aparato burocrático para colocar esta discussão dentro do partido teria que

abdicar do seu poder decisório. Então enterraram o projeto refundacionista,

que agora está começando novamente a tomar fôlego", declarou.

Referindo-se aos casos de corrupção envolvendo o partido, ele atribuiu as

manifestações em reação aos escândalos, por parte do que chamou de

"classes dominantes", à contrariedade de tais grupos à políticas sociais

implementadas pelo PT.

"Eles são contra as ousadias dessas poucas reformas populares que foram

feitas", afirmou. "A classe média brasileira está se 'paulistinizando', está cada

vez mais paulista. O cara tem 50 mil no banco e acha que é o [Antônio] Ermírio

de Moraes. Ele não quer pobre perto dele, ele não quer o negro na

universidade, ele não quer aceitar a diversidade sexual [...] Pensa que é rico;

não sabe o que é riqueza", disse, arrancando risos do público, composto por

estudantes, professores e militantes de diferentes partidos.

Críticas ao PT

Nos últimos meses, o ex-governador gaúcho vem criticando o partido com

frequência nas redes sociais. Ele já falou por exemplo, sobre a "inércia" de

seu partido e do governo Dilma Rousseff na questão das dívidas dos

Estados e municípios. Genro afirmou no Twitter que o PMDB, que controla o

Congresso Nacional, tem projeto próprio e "esnucou" o governo federal.

Em outra ocasião, escreveu que o partido "está fora das decisões principais

do governo" Dilma. "Outra constatação, para o bem e para o mal: PT é cada

vez mais acessório no governo. Não é nem consultado para medida dessa

envergadura", postou em outra mensagem.

Íntegra do discurso de Lula na celebração dos 35 anos do PT

Texto integral do discurso escrito, sem os improvisos.

INSTITUTOLULA.ORG

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Hora de uma frente de esquerda com agenda alternativa

Em reunião da Executiva, Marcio Pochmann defende união e mobilização dos movimentos sociais para deter avanço das bandeiras da

direita CUT.ORG.BR|POR CUT NACIONAL

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Lulistas apontam isolamento de Dilma

Integrantes do antigo grupo de comunicadores do governo Lula acentua críticas à presidente Dilma Rousseff; ex-auxiliares dele no

Palácio do Planalto André Singer, Ricardo Kotscho e Franklin Martins, além de Bernardo Kucinsky, fazem... BRASIL247.COM|POR BRASIL 24/7

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Tarso Genro defende que PT investigue tesoureiro

O ex-ministro do governo Lula e ex-governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, defendeu nesta quinta-feira (5) que o PT avalie a

permanência do tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, na... WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR

KOTSCHO: 'GOVERNO DILMA-2 CAMINHA PARA A AUTODESTRUIÇÃO' http://www.brasil247.com/…/Kotscho-'Governo-Dilma-2-caminha…

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Com um conjunto de sete Teses, que expressam o pensamento das correntes e grupos

internos, o PT realizará seu 5º Congresso de 11 a 13 de junho, em Salvador. O ponto

que unifica todas as Teses é a crítica ao ajuste fiscal do governo. Até mesmo o grupo

majoritário do Partido, denominado CNB (Construindo um Novo Brasil), que apresenta a

tese “Manifesto” e se abriga na chapa “O Partido que Muda o Brasil”, faz críticas ao

ajuste fiscal.

Por ser o grupo que vem liderando o partido, convém proceder a uma análise das

proposições do CNB. O texto começa sob a égide do equívoco. Afirma que o “PT e seu

governo” são alvos de uma “ofensiva sem precedentes que busca, como objetivo último,

a destituição da Presidenta da República e a destruição do Partido dos Trabalhadores”.

Essa ofensiva é atribuída às forças que foram derrotadas nas eleições de 2014.

Reconhece-se que a maioria que elegeu Dilma “está perplexa e desmobilizada”. Em

seguida, o óbvio é posto em relevo: “O conservadorismo sempre esteve presente na

sociedade brasileira”.

De obviedade em obviedade, a Tese do CNB vai adiante construindo a própria

perplexidade do grupo que comanda o PT. O grupo não consegue entender o que

aconteceu no período que vai da vitória em 2014 até as manifestações contra o governo

e o partido em 2015. “Como doze anos de tão importante transformação social,

econômica e política no país puderam ser desconsiderados em um espaço de tempo tão

breve?”, indaga. Ao invés de construir uma história das mudanças das conjunturas e

dos erros do governo, sustenta que o que faltou foi uma narrativa dos sucessos.

Note-se que até aqui, nenhuma palavra é dita acerca do baixo crescimento no primeiro

mandado de Dilma, das contas públicas e externas no vermelho, da crise fiscal, da

inflação alta, dos antigos dirigentes do partido condenados no mensalação e do

escândalo da Petrobrás. A Tese se limita a dizer que a atual conjuntura não se limita

pelo ativismo da direita. “Seu entendimento exige análise mais complexa, que envolva

também o exame de responsabilidades que são nossas”.

O tema da corrupção só irá aparecer de forma mais significativa nos itens 44 a 49 da

Tese. A corrupção, no entanto, não é apontada como a principal causa da perda da

legitimidade do PT e do governo. Não é apontada como a causa do antipetismo que se

disseminou na sociedade ainda no decurso do processo eleitoral de 2014. Antes de

tudo, veiculam-se como principais causas da corrupção a falta de uma reforma política e

ao Presidencialismo de Coalizão, o que é apenas uma meia verdade. Um partido

honesto e comprometido com a república, com o que é o bem comum do povo, com a

virtude e com a necessidade de ter uma conduta política e administrativa exemplar, não

se corrompe, mesmo quando as instituições não são as melhores. Além de não

corromper-se, luta com todas as forças para melhorar as instituições, conduta que não

se viu no PT e nos governos petistas, que nunca se empenharam com todas as forças e

com mobilização social para realizar uma reforma política.

O texto reconhece que as denúncias de corrupção, “verdadeiras ou não”, golpearam

“duramente a imagem do Partido”. O desfecho desse reconhecimento é uma formulação

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confusa, que não explicita o que quer dizer: “Não podemos diluir nossas próprias

responsabilidades na geleia geral em que se transformou grande parte do mundo

político brasileiro”. Se acrescenta apenas que o PT precisa sair das “páginas policiais”.

Mas o leitor não fica sabendo se, de fato, o partido errou gravemente para estar nas

páginas policiais ou se as denúncias “são verdadeiras ou não”.

O fato relevante é que o que se diz sobre a corrupção não chega a ser uma autocrítica.

O que prevalece ainda é a culpa dos “outros” ou das instituições. Não há nenhum

reconhecimento de que o Partido não só se corrompeu do ponto de vista material, mas

também do ponto de vista dos princípios, pois assumiu a ideologia do “novo rico”, do

luxo, dos palácios e foi se afastando das ruas e das praças, cavando o fosso da

arrogância entre os ocupantes de gabinetes e palácios e a plebe. Registre-se que, mais

adiante, a Tese reconhece que o Partido se afastou dos movimentos sociais.

Para que Serve um Congresso

A Tese do CNB não parte daquilo que é central no atual momento do Brasil. Um centro,

configurado em torno de dois pontos: a) a crise de legitimidade das instituições; b) o

esgotamento do modelo de desenvolvimento econômico. Nesse sentido, a Tese do CNB,

a exemplo das demais, é conjunturalista. Não há um enfoque estratégico. A perda de

substância do PT se reflete também na qualidade das teses. No passado, o PT fez

Congressos muito mais robustos, muito mais significativos, que apontavam rumos

estratégicos para o Partido e para o país.

Um congresso partidário não pode ser concebido como um encontro qualquer. Um

congresso partidário deve ser visto como um momento especial na vida de um partido,

concebido como um encontro especial de filiados para estabelecer um acordo sobre os

temas gerais e estratégicos, de caráter mais permanente e que apontem para o futuro.

Precisa tratar de temas que têm uma perdurabilidade maior no tempo. Os enfoques

meramente conjunturais em um congresso sinalizam que o partido está extraviado e

dividido, incapaz de pôr-se em acordo naquilo que determina a sua existência.

Não resta dúvida de que há crise de legitimidade dos partidos, dos políticos e das

instituições. Instaurada em 2013, essa crise não foi superada pelas eleições de 2014. A

sociedade não se reconhece mais no atual sistema representativo. Nesse sentido, não é

só o PT e o governo que estão em crise, mas a oposição partidária também. Oposição

que sequer conseguiu falar nas manifestações anti-PT e anti-governo. A Tese do CNB

atribui, equivocadamente, uma força à oposição que ela não tem. Mesmo com o baixo

prestigio do governo Dilma, a oposição seria incapaz de sustentar por muito tempo uma

campanha pelo impeachment. É essa fraqueza que a fez recuar do intento.

A Tese do CNB também não reconhece os equívocos da política macroeconômica do

primeiro mandato. Equívocos como as desonerações fiscais, os empréstimos com juros

subsidiados concedidos pelo BNDES a grupos econômicos privilegiaidos, o modelo de

concessões, o desastroso modelo de contratações da Petrobrás etc. A própria política de

crescimento pelo incentivo ao consumo já havia se esgotado em 2010.

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O PT e o governo embarcaram na tese de que se havia produzido no Brasil uma “nova

classe média”, quando, o que houve, foi um crescimento da formalização de empregos

com baixos salários. O modelo de desenvolvimento, nascido com o Plano Real,

imbricado com a Constituição de 1988, continuado nos governos petistas, apresentava

sinais de esgotamento no final dos mandatos de Lula. Nem o campo do governismo e

nem o campo da oposição foram capazes de propor algo novo. No momento, não se

vislumbra forças políticas e lideranças capazes de repactuar um novo programa de

desenvolvimento do Brasil. O programa de TV do PSDB apresentado na semana passada

e as Teses do Congresso do PT são exemplos desse impasse. Não há nada de novo sob

o céu de anil.

Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

O gráfico que melhor explica a ascensão e queda

do petismo no Brasil

http://blog.estadaodados.com/caged/

4/05/2015 por Agência Estado em Jornalismo / Atualizado 25/05, 23:42 h

Mesmo enfrentando maior crise de sua história, PT tem

aumento no número de filiados

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(Ricardo Stuckert/ Instituto Lula)

Mesmo em meio à maior crise de seus 35 anos existência, assolado por denúncias de corrupção e desvios na Petrobras investigadas pela Operação Lava Jato, manifestações de rua e panelaços contra o partido e rejeição ao governo da presidente Dilma Rousseff, o PT registrou nos primeiros cinco meses deste ano um aumento considerável do número de filiados.

De acordo com dados do partido, foram 16.640 filiações até sexta-feira passada. O número é 81% maior do que as 9.187 adesões contabilizadas no mesmo período do ano passado.

‘Reação’

Para a direção do partido, o fenômeno pode ser visto como uma reação às investidas de grupos e movimentos “da direita” contra o partido nas ruas.

“Setores da base social do PT saíram em defesa do partido. Para eles, a forma de reagir é a filiação”, afirma o deputado estadual José Américo Dias, secretário nacional do Comunicação do PT.

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Só em abril, mês em que o ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto foi preso durante mais uma etapa da Operação Lava Jato sob suspeita de arrecadar dinheiro de propina para o partido por meio de doações de campanha e que 97 mil trabalhadores perderam seus empregos no Brasil, o PT ganhou 10.882 filiados, número 2.734% maior do que as 384 filiações registradas em abril do ano passado.

Segundo José Américo, outro fator que pode ter provocado o “fenômeno da filiação” é uma maior organização do partido nas redes sociais.

Preferência

O aumento do número de filiados registrado no período contrasta com a queda brusca da preferência do eleitorado pelo PT. O partido da presidente Dilma Rousseff continua sendo o mais querido do País, mas o porcentual de eleitores que dizem preferir o PT às demais legendas caiu de 22% em dezembro do ano passado para 12% em fevereiro deste ano, segundo o instituto Datafolha.

Esse índice de 12% na preferência é o menor nível já registrado pelo instituto. Em 2005, no auge do escândalo do mensalão, que atingiu o governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva, o porcentual era de 15%.

Apesar de enfrentar crises em vários flancos, os números do PT continuam a impressionar. O partido conta, atualmente, com 1.740.110 filiados e está organizado em 84% dos municípios brasileiros, com 3.206 diretórios municipais e 1.494 comissões provisórias. No ano passado, a legenda estava presente em 56% das cidades do Brasil. O número de dirigentes municipais chegou a 51.549. Além disso, cerca de 149 mil novos filiados aguardam na fila para fazer os cursos de formação política obrigatórios para a formalização das adesões ao partido.

Meu último artigo sobre política econômica até o

grande desastre SEX, 29/05/2015 - 11:41

Por J. Carlos de Assis

http://jornalggn.com.br/noticia/meu-ultimo-artigo-sobre-politica-economica-ate-o-grande-

desastre-por-jose-carlos-de-assis

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Estou comunicando ao Nassif, através deste artigo, que não mais escreverei sobre política

econômica neste blog até o cumprimento definitivo do grande desastre. O grande desastre a que

me refiro é o resultado da política econômica de Joaquim Levy, a sanha persecutória de empresas

dos promotores da Lava Jato e o carry over sobre 2015 da estagnação econômica do ano passado.

Ao todo, uma contração de no mínimo 5% do PIB, elevando a taxa de desemprego a algo como 15

a 20%.

Nada que eu viesse a escrever alteraria esse quadro. Nada que qualquer dos meus colegas

economistas progressistas vierem a dizer muda o nosso destino. A única mudança possível seria

uma virada de orientação de Joaquim Levy, ou uma decisão da Presidenta de removê-lo da

Fazenda ou, ainda, uma diretiva do PT para que ela respeite os compromissos históricos do partido

com o crescimento econômico. Claro que nada disso vai acontecer. Portanto o grande desastre é

inevitável. Passaremos, todos, pelo inferno, menos os bancos.

Economista tem uma profissão ingrata. Um bom economista que tem credibilidade

necessariamente é levado a sério, e portanto erra as projeções econômicas pessimistas que faz

porque os formuladores de política seguirão seus conselhos e evitarão o desastre anunciado. Um

economista sem credibilidade é irrelevante, independentemente do que anuncia. Um economista

de credibilidade que emite previsões erradas não é um bom economista. Decidi não me encaixar

em nenhuma dessas categorias. Virei assistente do desastre.

O Brasil e poucos países do mundo assistiram a uma contração de 5% do PIB com aumento do

desemprego, em algumas regiões, para até 20%. Pois bem, vai assistir agora. Teria sido muito

fácil evitar o grande desastre: o Senado na última terça feira poderia ter impedido o ajuste de

Levy e o induzido a demitir-se. A Presidenta, premida pelas circunstâncias, poderia nomear em

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seu lugar um progressista e reconstituir a política econômica no sentido da retomada. Mas o

Senado acovardou-se e eliminou a oportunidade de evitar o grande desastre.

Dado que tudo o que escrevo de política econômica é inútil vou-me dedicar a outros afazeres,

inclusive a alguns grandes projetos, como o Transul, que poderá ser preparado para entrar em

operação depois do grande desastre. Afastado da análise de política econômica, não terei que

suportar os dirigentes de oposição falarem em crescimento e em defesa dos trabalhadores e do

povo, quando foram, historicamente, os grades espoliadores das classes baixas, inaugurando as

políticas neoliberais que agora cinicamente criticam sem lhes dizerem o nome.

Esse Governo pode fazer muita coisa, pode enrolar, pode trair, pode manipular. Uma coisa ele não

poderá fazer: me obrigar a criticá-lo. Vai em frente, vou assistir a seu/nosso grande desastre,

levando para o fundo do poço o PT seus aliados de suposta esquerda e seus poucos intelectuais

orgânicos que ainda suportam as suas contradições. Aqui, no meu canto, não vou rir, mas não vou

chorar. Estou convencido que o desastre será tão grande que, depois dele, poderemos acertar as

contas conjuntas com os neoliberais e seus êmulos no PT.

*Jornalista, economista, professor, doutor pela Coppe-UFRJ, autor de mais de 20 livros sobre

economia política

O Moderno e o PT; complementos e análise

Por Marcelo Barbosa | Via Algo a Dizer

Após o êxito de seus governos, o PT precisa oferecer um projeto de nação ao país. Caso não consiga, a

legenda poderá cumprir a paráfrase de Lévis-Strauss, passando à decadência antes de atingir o apogeu.

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Concebido em aberta ruptura com a esquerda de tradicional implantação ao fim da década de 1970 – leia-se

comunistas e trabalhistas – o PT nasceu de costas para o Estado e de frente para a sociedade civil. As

questões capazes de mobilizar a legenda de Lula poucas vezes coincidiram com aquelas formuladas pelas

agremiações conduzidas então por personalidades como Prestes, João Amazonas ou ainda Brizola. Com isso,

toda uma rica agenda de lutas anterior ao marco da eclosão do ciclo das greves do ABC paulista, a partir de

1979, derivou para um papel secundário. Guardada no baú das relíquias, a questão nacional, sobretudo o papel

do Estado no combate aos vários níveis de subdesenvolvimento do país, cedeu protagonismo ao avanço de

uma pauta democrática essencialmente compreendida como cidadania econômica: aumento de salário, acesso

a terra, direito a moradia, entre outros itens afins. A idéia de construir o moderno com base no rompimento com

as formas de dependência de nossa periferia à dominação dos países centrais, pedra de toque das concepções

de construção do moderno da velha esquerda, encontrou pouco eco no interior do petismo.

Para o chamado PT das origens, nenhum sentido podia ser extraído da indagação acerca da busca do moderno

em uma sociedade de extrema concentração de renda, cuja passagem para o capitalismo monopolista de

Estado demandara a instalação de uma ditadura civil-militar, em 1964. Perseguindo essa ótica, empréstimo ao

pensamento uspiano – de Florestan Fernandes a Chico de Oliveira, entre muitos outros – o Novo e Velho

apareciam perfeitamente fundidos e entrosados na paisagem social brasileira. Eram molares da mesma

engrenagem. No caso brasileiro, a obtenção do posto de 6ª economia mundial surgira sem a necessidade de

ajustar contas com as instituições pré-capitalistas existentes, aí incluído o latifúndio. Em outras palavras, o

moderno já predominava em nossas relações sociais a reboque das tendências à urbanização e

industrialização. E mais. O desenvolvimento capitalista deflagrado nesse processo tornara mais agudas as

desigualdades de classe, região e renda, em todo território nacional. Conclusão: o tempo para a conquista de

objetivos intermediários como as reformas de base se esgotara. A luta pela conquista do socialismo vibrava na

ordem do dia.

A projeção dos pais fundadores do PT previa atitudes como o repúdio às alianças com o chamado centro

político, estando interditada, ainda, a possibilidade de apoio a qualquer coalizão de natureza pluriclassista. A

esquerda social caminharia antes só que mal acompanhada. De preferência, exaltando os valores da

democracia de base, da nitidez ideológica e da crítica à trajetória republicana brasileira. Ação política? A única

legítima consistiria na intervenção de baixo para cima, por meio dos instrumentos da vida associativa, a

exemplo dos sindicatos e das Comunidades Eclesiais. Mais revolucionário na retórica que na prática, essa

modalidade de petismo das origens deu forma a um grupo de práticas voltadas para a exaltação ao chamado

“poder local”, procedimento de evasão à real disputa do poder, mas que permitiu o acúmulo de forças da

legenda nas conjunturas de grande instabilidade verificadas durante os primeiros anos do processo de

redemocratização.

Os saudosistas do modelo de militância partidária presente na infância da atuação do PT defendem com ardor a

atitude empreendida pela legenda naqueles anos de formação. Por óbvio, promovem comparações. Com

alguma procedência, apontam o processo pelo qual o petismo se manteve unido e em crescimento ao longo das

décadas de 1980 e 1990, ao mesmo tempo em que a esquerda tradicional caminhava para a divisão e a perda

de prestígio. O problema desse argumento, no fundamental correto, reside na sua insuficiência: se o PT

encarnasse apenas a crítica aos contingentes da esquerda que o precederam, nem de longe poderia cumprir

um papel de destaque na vida pública brasileira. Ou seja, já em seus primeiros anos, vicejavam no terreno da

cultura política do PT as sementes de uma visão mais assente à complexidade de uma sociedade de traços

contraditórios como a nossa.

Personagem de sua própria história, o PT fez coexistir em seu projeto inúmeras identidades*. Algumas dessas

caracterizações, com vida curta. Outras vieram para ficar e firmaram-se no acervo de experiências

empreendidas pelo partido. Entre essas florações, uma classe de propostas que, diferindo da primeira das

constelações teóricas formuladas pela agremiação, exibia algum grau de diálogo com a questão proposta ao

início deste texto. Por esse ângulo, construir o moderno requeria o enfrentamento das oligarquias

patrimonialistas, o estamento parasitário responsável pelo atraso e a desigualdade de nossa formação social,

presente desde o período colonial. Em tal narrativa, o ponto de equilíbrio da atuação da esquerda devia se

deslocar para o combate à corrupção. Impunha-se, nessa ótica, atacar o método pelo qual as elites decadentes

se apropriavam – e se apropriam – das funções do Estado para reproduzir seus interesses particulares,

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entravando assim o acesso ao poder das camadas comprometidas com a democratização da vida pública, tais

como o proletariado moderno e o empresariado produtivo.

Com vistas a demarcar suas posições, esses setores do petismo buscaram distinguir seus pontos de vista da

parcela moralista e influenciada pela mídia monopolista. Com acerto, preferiam não ser confundidos com o

fenômeno tratado pela ciência política brasileira pela designação de “udenismo”. Não à toa, adotaram a defesa

de uma pauta liberal no que refere aos costumes, com ênfase na liberação das drogas ou ainda, a titulo de

ilustração, a defesa da descriminalização do aborto – nada obstante uma certa presença de militantes católicos

nestas correntes de opinião. Mantendo a coerência, jamais esconderam a sua solidariedade às chamadas

“minorias” que, na realidade, conformam grandes maiorias no vasto mosaico das relações sociais presentes no

país: mulheres, negros, grupos LGBT, índios, ambientalistas, quilombolas, entre outros.

Plural como as próprias camadas médias donde retira força, esse segmento do petismo, de igual maneira, nos

últimos anos, cresceu a ponto de espalhar sua influência para a fora da legenda da estrela, fecundando o

debate entre áreas do PSOL e da Rede Sustentabilidade, da senadora Marina Silva. Até mesmo no interior do

governo Dilma tais tendências assumiram papel de destaque na produção de ideias: a mais influente entre

muitas, a denúncia da “governabilidade” baseada no pacto PT-PMDB, fonte de paralisia (sic) e renúncia ao

enfrentamento com os setores ditos conservadores do patronato político brasileiro. Fortemente vinculado à

política, a prática desses agrupamentos pouco freqüenta o tema econômico. De uma maneira geral, pouco tem

a dizer, por fora da abstração de princípio, sobre a contradição que cinde a qualquer sociedade capitalista: o

antagonismo entre capital e trabalho.

Por fim, esse inventário, bastante ligeiro, por sinal, das respostas oferecidas pelo PT sobre o tema da

construção do moderno, não deve omitir a referência a um terceiro quadro de referências. Fenômeno recente,

tal posição conta pouco mais de uma década. Sua principal atitude se enuncia na busca pela recuperação

(seletiva) de alguns de elementos da cultura política anterior à fundação do partido de Lula. Sem renegar as

respostas fornecidas pelo PT das origens – repita-se a afirmação da identidade socialista, para uns ou a

denúncia do patrimonialismo, para outros – essa nova síntese supõe: forçar a passagem ao moderno implica

resolver a questão social. Cumpre, assim, impulsionar a unidade e a capacidade de mobilização das forças

comprometidas com a luta pela erradicação da desigualdade no país, marca constitutiva do atraso de nossa

formação social desde sempre. Inspirado no pensamento de autores como Celso Furtado, Darcy Ribeiro,

Nelson Werneck Sodré e Ignácio Rangel, entre outros, mas ao mesmo tempo incorporando contribuições atuais

como as de Conceição Tavares e Theotonio dos Santos, apenas para citar dois autores em atividade, esse

reforço de ideias à matriz original petista, pelo que tudo indica, tem por objetivo o aprofundamento contínuo dos

espaços de democracia política na sociedade. Mas, não apenas isso.

Trata-se, igualmente, de transformar o atual caráter das instituições de Estado, colocando-as a serviço dos

objetivos de um projeto de nação capaz de garantir a todos os brasileiros o exercício dos direitos e garantias

individuais e, sobretudo coletivos, em boa parte previstos no texto da Constituição da República, de 1988.

Caminho brasileiro para o socialismo, a implantação desse projeto nacional, de natureza não autárquica –

porque aberto à integração com a América Latina e África – impõe, no caso do PT, o manejo de três

ferramentas: um frente de centro-esquerda, um programa de reformas estruturais e uma estrutura partidária

democrática e transparente.

(*) As reconstituições do debate de ideias no interior do PT, nos termos propostos neste texto, atêm-se a linhas

gerais. Limitam o escopo da questão a um só tema: as estratégias de combate ao atraso estrutural do país.

Outros tópicos geraram diferentes tipos de clivagem, conforme o caso das controvérsias acerca das formas de

construção partidária, só para citar um dos contenciosos mais polêmicos. Por certo, outras sensibilidades em

relação ao moderno existiram – e persistem existindo – no interior da agremiação. Sendo certo, ainda, que há

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contingentes na estrutura partidária completamente alheios a este tipo de problema teórico. Para estas áreas –

presentes, em maior ou menor grau, em todas as tendências partidárias – trata-se apenas de reproduzir a

presença da legenda como máquina arrecadadora de votos. Os impasses verificados pelo anseio de definição

de uma cultura política adequada não tiram o sono desse tipo de militância já há muito perpassada pela

deformidade burocrática.

Gustavo Santos - Esse é um bom texto e mostra bem o maior problema do PT, desde seu início é um partido

mais focado na forma/ética (decisões a partir da base, democracia interna, respeito a diversas correntes,

respeito aos 10 mandamentos na forma de fazer política) do que em conteúdo (objetivos políticos a serem

conquistados): modelo econômico, reformas de base, protecionismo econômico, anti-imperialismo, direitos

trabalhistas rígidos, típicas do velho trabalhismo (o único conteúdo/objetivo comum no PT foi combater a

desigualdade).

Porém, como a forma sempre depende das circunstâncias, ela sempre será conspurcada em algum momento.

por isso a grave crise do partido em razão do “mensalão” por uma questão de forma/ética cristã, e pouca crise

no partido quando ele mudou os objetivos ao abraçar desde o primeiro mandato uma política econômica

neoliberal e que só um pouco rejeitada pela Dilma nos seus primeiros 2 anos, antes de voltar atrás e novamente

abraçar o neoliberalismo.

Íntegra em: http://www.desenvolvimentistas.com.br/blog/blog/2015/05/28/o-moderno-e-o-pt-complementos-e-

analise/

--

Rennan Martins - Jornalista e Editor do Blog dos Desenvolvimentistas

Da Redação

‘Lulismo vive seu momento mais difícil, mas não

podemos ainda decretar seu fim’

Por Valéria Nader e Gabriel Brito, da Redação; Colaborou Raphael Sanz

O cenário não poderia ser muito diferente para um governo que se elegeu sob marketing

eleitoral mentiroso e que já parece velho. Para complicar, nesse exato momento, dá mostras

de nem mesmo estar governando de fato. Para ajudar a compreender essa intrincada

conjuntura, o Correio entrevistou André Singer, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e

Ciências Humanas da USP e autor de importantes obras de interpretação sócio-política da

realidade nacional, dentre elas, aquelas que se destinam ao entendimento do fenômeno

chamado de ‘lulismo’.

Acompanhe também o Correio da Cidadania no Twitter e no Facebook.

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Os riscos do vácuo de poder no Brasil TER, 02/06/2015 - 06:00

ATUALIZADO EM 02/06/2015 - 18:46

Luis Nassif

Desde 1994 o poder, no Brasil, foi exercido por um duopólio: PSBD e PT. Com eles a Presidência da República conseguia unificar forças políticas e econômicas em torno de alguns consensos.

Através do Banco Central atendia-se às demandas de mercado; o presidencialismo de coalizão garantia o atendimento das demandas

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políticas; a estabilização de preços, primeiro, a inclusão social, depois, garantiam a legitimidade do Executivo.

Nem se considere que ambos os períodos foram virtuosos. No reinado do PSDB procedeu-se a um desmonte do Estado e a um crescimento exponencial da dívida pública. No reinado do PT manteve-se o câmbio apreciado, os juros elevados e a falta de um projeto de país.

Mas, em todo caso, em ambos os períodos se manteve a federação sob controle do Executivo, mesmo nas fases mais árduas, como no pós-maxidesvalorização cambial, do período FHC, ao julgamento do mensalão, no período Lula.

***

O que se observa, agora, é um esgarçamento inédito do poder, não apenas da presidência, mas dos dois partidos que revezaram-se na hegemonia política.

A consequência é uma multiplicação de jogadas oportunistas, esbirros de poder atropelando normas, regulamentos sociais, jurídicos e políticos.

Há semelhanças e diferenças em relação a 1964.

As semelhanças estão na fraqueza da presidência da República, nos movimentos raivosos da classe média e nas indecisões de Jango e Dilma equilibrando-se em tentativas mal elaboradas de contentar a base ou o establishment.

As diferenças estão na falta de um Carlos Lacerda e um Leonel Brizola botando mais fogo no circo; na ausência de princípios claros na oposição. Mas, principalmente, na falta de um protagonismo militar.

***

De fato, a presidência de um país continental, como o Brasil, ou se sustenta na força ou nos programas. Ou é temida ou respeitada.

Quando a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, com base em provas frágeis, invadem a casa de um governador, principal aliado de Dilma Rousseff, ou quando implantam escutas no Palácio, sem se preocupar com as consequências, é porque rompeu-se definitivamente o fio que sustentava a autoridade presidencial.

***

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Se não é temida, a autoridade presidencial também não é respeitada. A política foi terceirizada para o vice-presidente Michel Temer; a economia para Joaquim Levy. Não se vê um sinal mais concreto de preparação de uma agenda de desenvolvimento.

Cria-se o vácuo, então, no qual a ocupação do espaço político se dá na base do grito e das cotoveladas. Implanta-se a selvageria institucional, tendo como protagonistas personalidades do calibre de um Gilmar Mendes, Eduardo Cunha, Renan Calheiros.

No início, colocaram sob ameaça as conquistas civilizatórias na área dos direitos humanos. Agora, acenam com o próprio desmonte da unidade federativa brasileira, com a proposta de esvaziar a União em favor de estados e municípios.

***

A luta fratricida entre PT e PSDB é um perde-perde.

As duas principais lideranças das últimas décadas – Fernando Henrique Cardoso e Lula – são incapazes de articular propostas, unificar a base e colocar alguma ordem no seu terreiro.

FHC está cego pela oportunidade de liquidar com Lula, ainda que à custa do agravamento da crise. E Lula perde a cada dia o papel de interlocutor nacional, amarrado pela falta de propostas do PT e, principalmente, pela inação do governo Dilma.

***

Some-se a tudo isso políticas fiscal e monetária demolidoras, que ampliarão gravemente a recessão e o desemprego, e se terá um mapa do inferno pela frente.

O buraco negro do PT Wanderley G. dos Santos8 de maio de 2015

http://insightnet.com.br/segundaopiniao/?p=58

O Partido dos Trabalhadores está, talvez, em rota para se tornar um buraco negro no espectro partidário. Com velocidade de meteoro, a estrela do PT incendiou a política nacional dobrando o tamanho de sua representação à Câmara dos Deputados em duas eleições sucessivas, entre 1982 e 1990, e a porcentagens crescentes até 2002, quando ainda aumentou a bancada em 18%. Desde então o

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ritmo de crescimento diminuiu para 16,0%, em 2006, 17,0% em 2010, e não mais do que 13,0%, em 2014. A conquista de Assembleias Legislativas seguiu rumo instável com viés de baixa: 200,0% a mais de deputados estaduais em 1986, em relação a 1982, e 113%, na comparação 1990-1996. Daí em diante resultados erráticos levaram a crescimento negativo de -16,0% em 2006-2002, 7,0% positivos em 2010, e uma retração de -27,0% no contingente eleito em 2014. Eleições majoritárias para prefeituras revelam contínua redução da marcha: 120,0% de crescimento de prefeitos eleitos em 2004, 35,0% em 2008, e 15,0%, agora em 2012. Não obstante a estabilidade natural das representações partidárias, a estrela petista pode ser uma estrela apenas cadente ou entrar em colapso, esmagada pela gravidade de seu âmago. Com densidade eleitoral em declínio e expansão de um núcleo deteriorado a descoberto, arrisca-se à rejeição por parte de estamentos eleitorais que não lhe negaram apoio nem durante o episódio de flagrante caixa 2, transformado em ilícito penal pela mídia e um judiciário em surto de ressentimento e demagogia. Agora, não há escusas. O Partido dos Trabalhadores favoreceu e participou da predação de recursos públicos em escala de Primeiro Mundo. Mentiu e tergiversou como o fizeram primeiros-ministros e presidentes alhures. Evita liderar a necessária lavagem intestina do aparelho de Estado, mantendo seus simpatizantes reféns dos dedos em riste de terceiros, os dedos podres do conservadorismo. Não há porque exibir solidariedade a criminosos, vampiros das classes subalternas, fraudadores de bandeiras que não merecem. A redução do apoio eleitoral se iniciou, paradoxalmente, com a eleição de um presidente operário, fiador do combate à miséria. Escamotear os fatos equivale a desenhar uma trajetória em direção ao buraco negro. Evocar escândalos similares em outras sociedades constitui a mais distraída confissão do crime.

Discurso de Vladimir Safatle bloqueia a reflexão

publicado em 02 de junho de 2015 às 11:13

Antônio David

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Um fantasma ronda a esquerda: uma forma autoritária de pensar por Antônio David, especial para o Viomundo Não é de hoje que a esquerda brasileira vive às voltas com impasses. Por isso, deveríamos no mínimo fazer o esforço de tentar olhar para trás de maneira honesta e generosa, se quisermos entender os impasses em torno do “lulismo” e enfrentá-lo da melhor forma. Mas nem isso conseguimos.

Em seus mais recentes artigos, O que podemos? e Frente de esquerda para quê?, Vladimir Safatle insiste na tese de que os impasses da atual conjuntura reduzem-se à “falta de coragem” – uma maneira nova de dizer o velho bordão “falta de vontade política”. Segundo Safatle, enquanto a esquerda brasileira “não tem mais nada a oferecer de realmente novo e diferente do que vimos”, os espanhóis “não temeram procurar reinventar a força da política através de uma confiança renovada no povo”.

Safatle argumenta: “Se a esquerda quiser ter alguma razão de existência (pois é disso que se trata), ela deve começar por fazer uma rejeição clara do modelo que foi aplicado no Brasil na última década, seja no campo político, seja no campo econômico. O modelo lulista não chegou a seu esgotamento por questões exteriores, pressão da mídia ou inabilidades de negociação da senhora Dilma. Ele se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de criar nada de distinto do que foi feito”.

Atente-se bem para os termos empregados: “realmente novo e diferente”, “rejeição clara”. As palavras são fortes e contundentes. Todavia, por trás dessa aparente assertividade, há algo de lacunar no discurso de Safatle. A verdade, como sabemos, aparece melhor nos silêncios do discurso. Vejamos.

Tendo criticado a evocação de Lula por uma Frente de Esquerda, Safalte conflui: “não é a falta de direção que acomete a esquerda brasileira. É a falta de coragem”.

Afinal, de quem exatamente Safatle está falando? Do PT ou da esquerda no seu conjunto? No caso, a “esquerda brasileira” da qual fala Safatle envolve toda a esquerda – incluso a esquerda à esquerda do PT, incluso seu próprio partido, o PSOL?

À primeira vista, a pergunta parece conduzir à velha e inútil cultura da picuinha. Porém, abaixo da superfície, há uma questão de fundo.

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Se, como sustenta Safalte, o lulismo “se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de criar nada de distinto do que foi feito”, cabe indagar: quem o criou? Safatle não diz. Não é por acaso. Ao contrário do que Safatle sugere – sem, no entanto, dizer -, a estratégia do lulismo – pois é de uma estratégia que se trata – não foi criada pela mente (genial ou doentia) dessa ou daquela pessoa, desse ou daquele grupo, mas pelo confronto no interior do PT ao longo da década de 1990. Formulada no curso dessa década como resposta à derrota de 1989, essa estratégia é a síntese da luta interna travada no interior do PT. Vistas as coisas sob essa ótica, é necessário reconhecer, se quisermos de fato enfrentar os impasses do lulismo, que se a estratégia do lulismo guarda limites, deméritos, vícios, a esquerda brasileira no seu conjunto – no que se incluem as correntes que deram origem ao PSOL – é tão responsável pela estratégia do lulismo quanto àquelas que se mantiveram no PT.

Claro que essas correntes recusarão esse ponto de vista. Afinal, elas se opuseram à estratégia. Como podem então ser responsáveis? Tal como tratei longamente em outro artigo, na estratégia do lulismo está inscrita a incapacidade de as correntes que a ela se opuseram, seja enquanto estavam no PT, seja depois que saíram, de oferecer uma alternativa. Na ausência de alternativas, na recusa a discutir o que de fato merece ser discutido – estratégia –, tudo se resume a apontar os culpados. Para tanto, forjou-se uma narrativa: o campo majoritário fez filiações em massa; os congressos foram fraudados; a maioria esmagou a minoria. Sem dúvida, é mais cômodo olhar os acontecimentos históricos sob essa ótica.

No entanto, se nos perguntarmos a quem o discurso de Safatle é dirigido e com vistas a quê esse discurso é produzido, será que essa ótica ainda se sustenta?

Ao defender a tese de que o problema se resume a “falta de coragem”, Safalte está como que dando um recado. É como se estivesse dizendo: “Não percam tempo em discutir estratégia. Isso é pretexto. Quem discute estratégia quer no fundo desviar a atenção da questão central: ter ou não ter coragem”.

Se o que Safatle diz é verdade, livros como Os Sentidos do Lulismo, de André Singer, não têm valor algum. No fundo, trata-se de um grande blá-blá-blá que apenas desvia o leitor da questão central: ter medo ou ter coragem.

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Não admira que, para Safatle, correlação de forças mereça aspas. (Claro que, se questionarmos Safatle das razões pelas quais seu partido não logra realizar o sonho do triunfo eleitoral, para o qual declaradamente nasceu, imediatamente será evocada a correlação de forças desfavorável: não fosse a desigualdade do financiamento de campanha e do tempo de TV, tudo seria diferente).

Faço a ressalva: Safatle tem razão em parte. Todos sabemos haver fanáticos entre os que defendem o governo Dilma e o PT, para os quais a estratégia do lulismo é inquestionável.

De fato, estes usam e abusam da expressão correlação de forças. Para estes, nada é possível por conta da correlação de forças. Todavia, note-se bem que, ao recusar colocar a expressão no seu devido lugar – isto é, no interior de um debate sério sobre estratégia -, o que estes fanáticos fazem não é outra coisa senão… recusar discutir estratégia. No fundo, e ironicamente, a atitude dos defensores fanáticos governo Dilma e de Safatle é exatamente a mesma. Ambas as abordagens apenas atestam a incapacidade de parte da esquerda de oferecer alternativas à estratégia do lulismo. Qual é o segredo desse discurso?

Ao analisar o discurso do movimento integralista nos anos 1920 e 1930, Marilena Chaui constatou que se tratava de um discurso que trabalha com pontos fixos, ou seja, como verdades tomadas de antemão, sobre as quais o pensamento não se debruça. Com isso, o discurso integralista “não só permite economizar a reflexão acerca dos processos históricos, mas permite sobretudo assegurar ao destinatário um suposto conhecimento” prévio da realidade, com base na reafirmação e repetição de preceitos tomados de antemão, de modo que o discurso tenha “força persuasiva e até mesmo constrangedora”.

Chaui nota que o aspecto político dessa operação reside exatamente na exclusão da reflexão: “Unido e disperso, a imagem, espelho dos dados imediatos, exclui a reflexão e, simultaneamente, cria a ilusão de conhecimento, graças ao seu aspecto ordenador”. Trata-se, em suma, de uma forma autoritária de pensar.

Ao trabalhar com pontos fixos, tomados como verdades de antemão – “realmente novo e diferente”, “rejeição clara”, “falta de coragem” –, o discurso de Safatle cumpre exatamente esse papel: bloquear a reflexão. Como explicar que um discurso que se pretende mobilizador do pensamento realize-se como bloqueio à reflexão?

A pergunta deveria ser: a quem, afinal, o discurso de Safatle é dirigido?

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O discurso é dirigido à militância e aos simpatizantes do PSOL. Cumpre a função de coesionar essa militância. Assim como o discurso integralista, o discurso de Safatle “não só permite economizar a reflexão acerca dos processos históricos, mas permite sobretudo assegurar ao destinatário um suposto conhecimento” prévio da realidade, com base na reafirmação e repetição de preceitos tomados de antemão, de modo que o discurso tenha “força persuasiva e até mesmo constrangedora”.

Não tenho dúvida de que se trata de um discurso bem-sucedido e até mesmo útil em face do propósito de formar um exército de soldados – aliás, todos devidamente uniformizados. Os militantes e simpatizantes do PSOL ficarão felizes lendo os artigos de Safatle. Sentirão alívio. Terão a consciência apaziguada. Não terão de enfrentar o fantasma da crise interna que se abriria com a reflexão. Eles sabem que a estratégia do lulismo é um fracasso – aliás, sempre foi – e que a sua estratégia é a verdadeira, ainda que ela não possa ser exposta. E por que precisaria? Sua verdade é autoevidente, tão autoevidente que toda tentativa de reflexão sobre a estratégia não passa de pretexto e serve apenas para esconder o medo de fazer o que deve ser feito. Enfim, não há o que discutir: a culpa é dos outros, da sua “falta de coragem”. Nós estamos certos.

Estranho falar em reflexão quando nós da esquerda continuarmos a aceitar estruturas dirigistas, hierárquicas, hegemonistas e centralizadas.

ROMPIMENTO ENTRE LULA E DIRCEU AMEAÇA O PT E A

PRÓPRIA DILMA

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dirceu-ameaca-o

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Posted on junho 2, 2015

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dirceu-ameaca-o

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dirceu-ameaca-o

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-pt-e-a-propria-dilma/#comments>

Carlos Newton

Entre os vários desentendimentos que assolam o governo e o

PT, o

mais grave, sem qualquer dúvida, é o rompimento das relações

entre o

ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro José Dirceu.

Da

antiga amizade, nada restou. Como ambos estão ameaçados,

agora cada um deles

cuida da própria sorte e, para se salvar, estão trilhando o caminho

da

autodestruição.

O rompimento ocorreu em janeiro, quando Dirceu sentiu que a

situação

se complicava e logo estaria envolvido na Operação Lava Jato.

Como o PT e o

governo se mostravam completamente desarticulados, resolveu

procurar Lula

para armar um plano conjunto de defesa, como sempre fizeram,

inclusive no

caso de Rosemary Noronha, em que Dirceu participou diretamente

da montagem

de blindagem da segunda-dama de Lula, ajudou a selecionar os

quatro

escritórios para defendê-la, depois contratou mais um, e

acompanhava Lula e

Rosemary em reuniões com esses advogados, todos caríssimos, a

serem pagos

pelo caixa 2 do PT.

Dirceu telefonou ao Instituto Lula e pediu a Paulo Okamotto

que

agendasse um encontro dele com o ex-presidente. Mas acontece

que Lula não

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quis se reunir com ele, Okamotto começou a dar desculpas, até que

Dirceu

perdeu a cabeça a destratou o assessor. Isso aconteceu em janeiro.

Desde

então os dois ex-amigos estão rompidos.

SEGUNDO CAPÍTULO

Esta novela será demorada. Estamos apenas no segundo

capítulo. A

estratégia de Lula continua a mesma que usou no mensalão. Sua

intenção é

tirar o corpo fora e novamente culpar José Dirceu, para ter o mínimo

de

desgaste possível. Sonhar não é proibido. Mas as coisas mudaram

do mensalão

para cá, Dirceu não está disposto a pegar novamente cadeia. Seu

objetivo é

cumprir o resto da pena e se mudar para Portugal, tentar esquecer

o que

passou e curtir com a mulher e a filha o dinheiro que sobrou de

suas

“consultorias”. O mais provável, porém, é que Dirceu seja

novamente

condenado.

Se a situação de agravar, ele vai fazer delação premiada e

entregar

todo mundo, particularmente Lula, que hoje é seu inimigo nº 1. Na

entrevista

que concedeu há duas semanas ao repórter Daniel Pereira, da

Veja, Dirceu

ameaça claramente entregar Lula, que não tem condições de

demovê-lo, nada

tem a oferecer, porque também está envolvido até a alma.

Se Dirceu contar o que sabe, destruirá Lula, o PT e o governo

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Dilma.

Certamente é por isso que Lula já está até falando que não será

candidato em

2018. Depois que a bomba explodir, é melhor fugir para a Itália,

aproveitando a segunda cidadania que Dona Marisa Letícia

oportunamente

conseguiu, seguindo o belo exemplo de Henrique Pizzolato. E lá na

terra de

Fellini, a famiglia Silva então poderá dizer que la nave va…

EL PAÍS

ENTREVISTA | LINCOLN SECCO, HISTORIADOR »

“Maior erro do PT foi seguir estratégia lulista de conciliação permanente”

http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/10/politica/1433892923_403874.html

ENTREVISTA | LINCOLN SECCO, HISTORIADOR »

Autor de 'História do PT' diz que foi erro reabilitar protagonista do escândalo do mensalão

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Autor do livro "História do PT" (Ateliê Editorial), o professor da USP e historiador Lincoln Secco, diz que o partido que governa o país há pouco mais de 12 anos é mais burocrático e menos militante. Filiado a essa legenda, Secco afirma que a maior falha dos petistas foi desenvolver a estratégia lulista: a conciliação permanente.

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Pergunta. Como o senhor definiria o PT hoje? De esquerda, de centro-esquerda?

Resposta. Esquerda e direita são localizações no espaço político. Se você considerar os grandes partidos brasileiros, o PT é a esquerda que o país conseguiu ter. É a nossa esquerda institucional que aceita a ordem. Não é uma esquerda anticapitalista.

P. O que diferencia o PT dos demais partidos?

R. Basta olhar para a parcialidade com que a grande imprensa trata o PT para ver que há diferenças dele em relação aos demais. Você imaginaria alguém se preocupando com o congresso do PMDB? Ali não há tendências ideológicas, só conflitos de lideranças. O mesmo vale para o PSDB. O PT hoje é um partido que possui um jogo de lideranças ao lado da velha disputa de tendências ideológicas. Ele continua inovador: tem 50% de mulheres na direção e proibiu a reeleição por mais de duas vezes dos deputados.

P. Por que o partido se afastou de suas bases (sindicatos, igreja)?

R. Houve mudanças na própria base social do PT. Ela foi desmontada nos anos 1990. As duas instituições citadas sofreram com a terceirização e automação (no caso dos sindicatos mais importantes do PT, bancários e metalúrgicos) e com o ataque do papado à teologia da libertação (no caso das comunidades eclesiais de base). Ao lado disso, o PT cresceu em importância no Estado nos anos 1990, ocupando prefeituras, Governos estaduais e aumentando a bancada de deputados. O resultado

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só poderia ser um partido mais burocrático e menos militante.

P. Há quem defenda sua refundação. Isso é possível?

Os escândalos ligados ao PT estão todos os dias na televisão. Quase não há críticas ao governo do PSDB em São Paulo

R. Não. Desde o I congresso já se falava em refundação. A história não gira para trás. Hoje, tanto as alas esquerdistas quanto as de direita estão atreladas aos cargos públicos que o partido têm. O PT é grande demais para mudanças bruscas.

P. O senhor vê alguma diferença no tratamento da mídia dos Governos petistas com relação aos seus antecessores?

R. Há pesquisas conclusivas sobre isso em inúmeras teses universitárias. O laboratório de mídia da UERJ mostrou isso. É claro que quem está no governo é sempre mais atacado pela imprensa e com razão. Considerando o período que o PSDB esteve na presidência (1995-2002), ainda assim a grande imprensa foi mais desfavorável a [Luiz Inácio] Lula. Os escândalos ligados ao PT estão todos os dias na televisão. Quase não há críticas ao governo do PSDB em São Paulo. O mensalão petistalevou os líderes do PT à cadeia, já o chamado “mensalão mineiro” prescreveu. Aliás, o nome escolhido não foi “mensalão tucano”. Enfim, os próprios jornalistas que trabalham em reportagens e

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precisam sobreviver nesta imprensa sabem que seus patrões são parciais.

P. Quais as principais falhas dos governos do PT?

R. A maior foi a estratégia lulista. A da conciliação permanente. Ela foi útil para eleger Lula em 2002, mas ao contrário do que a direção petista acreditou, a reeleição de Lula se deu num ambiente de polarização social e política e a de Dilma Rousseff também. Lula fez um governo mais à esquerda depois da crise de 2005. No entanto, o lulismo adotou a tática de ser pragmático enquanto a oposição se tornou radical e ideológica. O outro erro foi a corrupção. Apesar da corrupção ser um ente do jogo político estabelecido e de eu achar injusto condenar o José Dirceu sem provas, ou só julgar empresários que doam ao PT e não a outros partidos, considero que foi um erro não ter sido radical numa reforma política que diminuísse a influência do poder econômico nas eleições. Hoje, isso é impossível. Mas quando Lula tinha altíssima popularidade era possível. É hipocrisia achar que uma empresa doa dinheiro a um partido por ideologia por isso teria que ser radical no ambiente exterior para ser também no interior. Não adianta punir seu tesoureiro se o modo de arrecadação continua o mesmo. Você o substitui e o próximo também vai para a cadeia. O PT poderia ter punido exemplarmente o seu tesoureiro Delúbio Soares, por exemplo. Eu o cito porque ele é réu confesso. Fez “caixa dois”. O PT o expulsou e, depois, o aceitou de volta. É um equívoco. Eu sei que não dá para exigir que líderes de esquerda sejam todos como o

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presidente [José] Mujica, mas precisam ao menos ter um comportamento público melhor do que os da direita. É sua obrigação. Não adianta dizer que todos fazem igual.

P. Quando surgiu o mensalão houve quem decretasse a morte do PT. O que não ocorreu. Mas quais os efeitos desse escândalo, na sua opinião?

R. Foi a maior crise da história do PT. Destruiu seu discurso sobre ética na política, que era forte nos anos 1990 e dirigido à própria classe média e abateu seus líderes históricos, exceto Lula. O PT só não acabou por causa de suas políticas públicas que lhe permitiram manter o apoio da classe trabalhadora.

P. Com a crise da Petrobras e a operação Lava Jato, reaparecem algumas pessoas que dizem acreditar no fim do PT. O PT caminha para seu leito de morte?

R. Em condições normais, o PT será superado quando surgir uma esquerda melhor do que ele. Ele representa uma opinião pública enraizada na sociedade civil, milhões de simpatizantes, movimentos sociais e a maior central sindical do Brasil. Como poderia acabar? Só uma ruptura institucional, como impeachment poderia derrubá-lo. O que pode acontecer no curto prazo é uma derrota eleitoral em 2016 e em 2018. Isto poderia fragmentá-lo e levá-lo a uma situação como a do PRD no México. Mas não seria um “fim”.

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O PT montou seu governo sobre um pacto social-rentista que melhora a vida dos muito pobres e garante superlucros ao sistema financeiro

P. No mensalão, o partido não excluiu seu tesoureiro, ao contrário. Agora, no caso Petrobras, também não. Por que o PT não pune quem se envolve com corrupção?

R. O PT só pode ser eleitoralmente competitivo se arrecadar recursos como os demais partidos. Portanto, se ele pune um, a justiça condena o próximo. É uma situação sem saída. Para muitos antigos petistas é um absurdo você ver dirigentes outrora socialistas se corromperem. Mas também é absurdo eles serem punidos pelo que todos os demais políticos fazem. Só que esta não pode ser uma desculpa para o PT. Ele precisaria ser radical agora, mas não vai ser. Como eu disse antes, ele não foi radical quando tinha apoio social para isso. Por que seria agora? A ideologia do lulismo diz o contrário: ele só tinha apoio porque não era radical. Eu posso responder: então porque, agora, com um governo que faz tudo o que o grande capital quer, ele não tem apoio?

P. Por que há uma forte onda antipetista atualmente? O senhor acredita em um confronto entre classes?

R. O antipetismo sempre existiu, especialmente em São Paulo. Aumentou em 2006, quando as políticas sociais de Lula incomodaram a classe média tradicional. E agora por causa dos efeitos retardados da crise econômica mundial. Veja que nada tem a

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ver com corrupção. Esse é o discurso que justifica o antipetismo. No auge do mensalão, Lula foi reeleito. Só que agora, ao lado do antipetismo há a fragmentação da base social petista porque a presidenta fez um ajuste fiscal contra sua própria base, atacando direitos sociais e trabalhistas. O PT montou seu governo sobre um pacto social-rentista que melhora a vida dos muito pobres e garante superlucros ao sistema financeiro. A classe média não ganha nada com isso. Há uma base material para sua insatisfação associada ao seu histórico medo da aproximação com os pobres. Com a economia em recessão e com uma nova classe trabalhadora gerada pelo próprio PT, é difícil manter a melhoria contínua de direitos sociais. Ela também acaba se inclinando para o antipetismo.

P. Em outras situações, alguns líderes defenderam que o partido poderia não ser cabeça de chapa em uma eleição presidencial. Desde a redemocratização do país, isso não ocorreu até hoje. Isso é possível na próxima eleição?

R. Seria um erro do PT e acredito que seja difícil acontecer. Não há no Brasil algo como aconcertacción no Chile. O Brasil não tem partidos historicamente estruturados e ideologicamente bem definidos. O PT é uma exceção. Na direita, o PSDB é o que mais se aproxima disso, mas jamais se aliaria ao PT.

P. A oposição tem chamado o PT de traidor do trabalhador. Essa discussão ocorre principalmente com a votação do pacote de ajuste fiscal. Por outro

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lado, os opositores, e boa parte da base governista, tem apoiado o projeto da terceirização. Quem, afinal, seriam os defensores e os inimigos dos trabalhadores?

R. A oposição é que não é (risos). O governo, de fato, cometeu estelionato eleitoral. A Dilma enganou as bases sociais do PT. É absurdo ela jogar a conta da crise no colo da classe trabalhadora. Tinha que fazer ajuste? Tinha. Então por que não taxar também as grandes fortunas e, especialmente, os bancos? Ela cometeu um erro que vai ficar na sua biografia. Será o Felipe González do PT. No PT o líder espanhol foi sempre visto como sinônimo de transformismo pelas alas mais à esquerda. O PT está numa situação difícil. Não pode apoiar essas medidas, mas não pode fazer oposição à presidenta.

O governo, de fato, cometeu estelionato eleitoral. A Dilma enganou as bases sociais do PT.

P. O PT é hoje um partido de líder único?

R. O PT teve que transferir a liderança de Lula para Dilma porque seus principais líderes foram derrubados pelos escândalos de 2005. Só que Dilma não é uma “petista histórica”, não tem base organizada no partido. Isso dificultou a substituição do Lula.

P. Por que há tantas correntes diferentes dentro do PT?

R. É o resultado de sua história. Desde a fundação o PT em 1980 admitiu a formação de correntes

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internas para se diferenciar do centralismo dos partidos comunistas. Mas na maior parte do tempo isso jamais inviabilizou a formação de uma maioria em torno do Lula.

P. Na sua opinião, Lula será candidato em 2018? Se não for ele, quem seria?

R. Difícil prever. Depende de como estará a avaliação do governo e do próprio Lula. Se ele estiver bem, será o candidato. Caso contrário vai apoiar outro nome. O PT tem ministros, governadores e até o prefeito de SP. Se ele for reeleito em 2016 se torna uma alternativa. Os que dizem que o PT será derrotado em 2018 tem só um wishful thinking (desejo). É até provável uma derrota petista, mas a oposição teria que ter um programa alternativo. E não tem.

Entrevista: Paul Singer : PT pode perder sua base social

Fundador do partido, economista critica ritmo do ajuste fiscal feito pelo governo

ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Fundador do PT, o economista Paul Singer teme que o partido perca o apoio de sua base social em razão do ajuste fiscal promovido pelo governo, que classifica como violento e desnecessário.

"De um governo do PT não se espera isso. O ajuste poderia ser feito ao longo de anos, e não ao longo de meses, e aumentando impostos para a elite", diz Singer, 83. Para ele, Dilma enfrenta uma

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"greve de investidores" e reage fazendo "concessão aos adversários".

Líder da histórica greve dos metalúrgicos em 1953, que parou a indústria paulistana por mais de um mês, Singer afirma que o setor sindical, a Igreja Católica e o MST manterão pressão para uma guinada à esquerda do governo.

Nascido na Áustria em 1932, Singer é hoje responsável pela Secretaria Nacional de Economia Solidária, do Ministério do Trabalho.

Folha - O que ocorre no Brasil hoje? Paul Singer - O que acontece é luta de classes. Trabalhadores assalariados e patrões capitalistas têm interesses opostos. Quando há relativamente pleno emprego, a vantagem é dos trabalhadores. Estou há 75 anos neste país e isso é absolutamente regular. Quando, ao contrário, se tem desemprego crescente, a inflação costuma ir para trás e as greves diminuem.

O país migra da primeira para a segunda situação? Sim. Foi uma opção do governo. Não gostei, não era necessário. Não vejo nenhum motivo de fazer esse ajuste a toque de caixa. É muito violento. O enorme aumento do desemprego é de assustar. Não creio que isso tenha sido imprevisto. Inclusive porque o governo cortou pagamentos. De um governo do PT não se espera isso.

O ajuste poderia ser feito ao longo de anos; não de meses. Faria uma coisa gradativa, cortando algumas coisas e aumentando impostos para elite, para os que podem pagar mais do que estão pagando. Outros países fazem isso.

Por que o governo optou pelo ajuste drástico? É uma política de redução do antagonismo entre governo e classe dominante, os capitalistas. Ainda com Lula, mas sobretudo com Dilma, o que ocorreu foi uma greve de investidores. O investimento praticamente caiu a zero. A explicação dos próprios capitalistas é de que eles não confiam. Uma desculpa, mas não é totalmente mentira.

Os anos anteriores foram positivos. Houve inflação, o que não é uma desgraça, mas um sintoma de que o país está avançando. O que se precisa fazer é defender os mais pobres da inflação. É Bolsa

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Família, salário mínimo reajustado. A classe rica não precisa: sobra dinheiro. O ajuste deveria prejudicar menos os trabalhadores.

Dilma fez o Brasil Sem Miséria. Ela não é contra os pobres, muito pelo contrário. Eu não teria entregue o cargo mais importante, depois da Presidência, ao Joaquim Levy. Ele é de direita. Podia fazer com gente do próprio PT.

Isso pode erodir a base política do PT? É meio inevitável, mas isso se acerta ao longo do tempo. O que me preocupa mais é que pode mudar a base social do PT. Que os setores mais prejudicados por essa política possam se afastar do PT. Que o PT acabe recorrendo a setores sociais que aceitam essa política, mas que não têm nada a ver com os propósitos originais do PT. No PT que eu conheço não tem quase ninguém que está gostando. Salvo se entender-se que essa não é uma política definitiva, mas para brecar uma ofensiva muito forte contra o governo, atribuindo ao PT todos os problemas do país. Uma concessão aos rivais.

Pode perder a base social? Pode. Há muitos partidos de esquerda no Brasil. O PSOL está aí e não aceita o que está sendo feito. O PT está convocando um congresso [11 a 14 de junho, em Salvador] e espero que isso seja discutido. Lula é o grande inspirador dessa política para Dilma --de aumentar juros, cortar crescimento, criar desemprego e reduzir inflação. Pode dar certo, como uma vez deu.

Partidos tradicionais de centro-esquerda na Europa têm sofrido revezes. A diferença entre o PT e os grandes partidos políticos europeus é que nós temos mais democracia interna. É isso que salva o PT. Pode salvar, não garanto. Tem uma boa chance de que faça a diferença. Os jovens certamente não aceitam essa mudança. Quem vai tentar empurrar o PT para uma outra via é a Igreja Católica, que é uma das mais progressistas que há no mundo. Mas haverá outros.

Não estou sozinho no PT no sentido de estar meio infeliz. Pelo que conheço do PT, a grande massa dos petistas não acompanha isso [ajuste].

O que o senhor espera do congresso petista? O congresso é muito oportuno. Um momento em que os militantes

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podem dizer o que pensam ao governo com franqueza. E podem ameaçar a retirada do apoio do PT ao governo, se ele não mudar. Isso não é chantagem. É uma discussão aberta. Não sei o que vai acontecer. Sei que há muita insatisfação no PT.

Congresso do PT aprova resolução sem críticas diretas

à política econômica

Ex-presidente Lula e presidenta Dilma Rousseff participaram quinta-feira à noite do 5º Congresso Nacional do PT, em Salvador. (Foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula)

Da Redação

O 5º Congresso Nacional do PT aprovou uma resolução final sem grandes novidades em relação aos principais temas debatidos no encontro: a política econômica do governo Dilma Rousseff, a atual política de alianças em nível federal, o financiamento das campanhas e o processo eleitoral interno do partido. Em entrevista coletiva concedida neste sábado, o presidente nacional da sigla, Rui Falcão, destacou a participação da militância no encontro e defendeu as resoluções aprovadas no congresso.

Foram apresentadas dezenas de emendas à resolução guia do 5º Congresso do PT. Algumas dessas emendas foram flexibilizadas, como as que falavam sobre a política econômica. Também houve a manutenção do Processo de Eleição Direta e se definiu um prazo de 90 dias para o Diretório Nacional realizar um seminário para debater a possibilidade de reformulação do processo das eleições internas.

Rui Falcão informou ainda que a decisão anterior sobre o financiamento empresarial de campanhas foi mantida, mas será

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remetida novamente ao Diretório Nacional. A legenda continuará a não receber recursos de empresas privadas em nível nacional. No entanto, conforme proposta defendida pelo secretário de Finanças do partido, Márcio Macedo, os diretórios estaduais e/ou municipais estão autorizados a seguir recebendo recursos de empresas privadas.

Apesar de muitas críticas à atual política econômica do governo federal, a resolução final do encontro aprovou uma versão bastante mitigada dessas críticas, limitando-se a dizer que “é preciso conduzir a orientação geral da política econômica para a implementação de estratégias para a retomada do crescimento, para a defesa do emprego, do salário e dos demais direitos dos trabalhadores, que permita a ampliação das políticas sociais”. As correntes agrupadas em torno da Mensagem ao Partido e outros grupos mais à esquerda queriam inclui no texto a defesa da alteração da política econômica, mas essa proposta acabou sendo rejeitada pela maioria.

Apesar de ter sido derrotada nas principais votações, a Mensagem ao Partido conseguiu articular um grupo de forças com potencial para construir uma nova configuração de forças no PT, conforme avaliação de suas lideranças. Um manifesto da Mensagem, com apoio de outras forças, foi assinado por 35 deputados federais e três senadores do PT – a maioria, portanto, da bancada parlamentar – a apresentou uma posição alternativa ao documento da atual direção partidária.

O debate sobre a política de alianças foi bastante acirrado e uma ala formada por grupos mais à esquerda do partido queria o rompimento com o PMDB e a construção de um novo tipo de governabilidade. Rui Falcão admitiu a existência de contradições em relação a essa política, mas rejeitou a ideia de romper alianças no Congresso Nacional com os parceiros que integram hoje a base de apoio do governo. Essa proposta saiu vitoriosa no encontro.

O presidente do PT defendeu, no 5º Congresso, a volta da CPMF, mas a proposta foi derrotada e retirada do texto base. A Carta de Salvador, texto guia do 5º Congresso, manteve o imposto sobre grandes fortunas e sobre grandes heranças. “As pessoas têm medo de falar de imposto. Eu prefiro fazer o debate, mas foi a decisão da maioria”, disse Rui Falcão.

O presidente estadual do PT-RS, Ary Vanazzi, criticou o resultado final do encontro. Em sua conta pessoal no Twitter, Vanazzi disse que “o PT perdeu a oportunidade de se firmar como partido de mudanças, não incide na política econômica e mantém a política de

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alianças”. A derrota da resolução apresentada pela CUT sobre política econômica é um duro golpe na relação do partido com os movimentos sociais”, disse ainda o dirigente do PT gaúcho.

A esquizofrenia de um partido Camisetas anti-Levy, palmas para Vaccari e protestos de rua da direita são contradições registradas no encontro do PT

PT quer recuperar terreno com militância sem falar de corrupção

ANTONIO JIMÉNEZ BARCA São Paulo 12 JUN 2015 - 18:32 BRT

HTTP://BRASIL.ELPAIS.COM/BRASIL/2015/06/12/POLITICA/1434144720_044023.HTML

Pelos saguões do hotel da praia do Rio Vermelho, em Salvador, onde acontece o V Congresso Nacional do PT, legenda de Luiz Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff, há militantes que passeiam com uma mensagem explícita na camiseta: "Fora o plano de Levy". O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é um liberal alheio ao partido, mas escolhido por Dilma, em janeiro, para conduzir o ajuste fiscal e a política econômica de corte de gastos que, na opinião dos dois, são necessários para que o país volte a crescer no próximo ano (no momento flerta com a recessão). As camisetas antiministro são um sintoma da peculiar esquizofrenia vivida pelo maior partido do Brasil, no poder há mais de 12 anos (oito com Lula e quatro com o primeiro mandato de Dilma).

Outro sintoma dessa contradição é a turbulenta redação do principal documento do congresso, a chamada Carta de Salvador, da qual foram retiradas, ao longo da semana, folha por folha, as críticas escritas em um primeiro momento contra a política econômica do Governo. A própria presidenta, há poucos dias, mandou um aviso de que não se pode criticar o ministro da Fazenda por tudo ("não se pode fazer isso, criar um Judas”) em um pronunciamento que, para especialistas, foi dirigido especialmente aos que estavam preparando o congresso.

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PT quer recuperar terreno com militância sem falar de corrupção Acuado por ajuste fiscal e crise, PT tenta afinar discurso em

congresso Lula: “Vamos mostrar que o PT está machucado, sim, mas bem

vivo”

“Maior erro do PT foi seguir estratégia lulista de conciliação permanente” O terceiro sinal de esquizofrenia de que padece o partido apareceu quando o presidente Rui Falcão aludiu ao tesoureiro João Vaccari, acusado de pertencer à trama corrupta da Petrobras e ter angariado

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dinheiro para o partido proveniente dos subornos das empresas que alardeavam contratos. Ao ouvir o nome de Vaccari, os participantes do Congresso aplaudiram. Entusiasticamente. Essa aclamação, que durou três minutos e serviu para redimir o tesoureiro, pelo menos aos olhos do partido, pode se compatibilizar mal com a promessa da presidenta Dilma Rousseff de perseguir a corrupção seja lá onde ela estiver.

Poderíamos falar de outra contradição: o PT, formação esquerdista de inspiração popular, perdeu o controle das ruas. As últimas manifestações de massa pertenceram aos adversários de Lula e Dilma Rousseff, que lotaram a Avenida Paulista. As centenas de militantes e os quadros dirigentes buscam nesse Congresso recuperar a pulsação vital das pessoas comuns. Mas isso às vezes é difícil quando se detém o poder por tanto tempo e a questão é discutida no salão de um hotel.

Socióloga fundadora do PT diz que partido ‘esgarçou a bandeira da ética’

Para Maria Victória Benevides, legenda perdeu sua base social e por isso tem responsabilidade pela alta rejeição

POR MARIANA SANCHES

11/06/2015 11:30 / ATUALIZADO 11/06/2015 12:36

HTTP://OGLOBO.GLOBO.COM/BRASIL/SOCIOLOGA-FUNDADORA-DO-PT-DIZ-QUE-PARTIDO-ESGARCOU-BANDEIRA-DA-ETICA-16412351

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SÃO PAULO - A socióloga Maria Victória Benevides, uma das ideólogas do PT e presidente da Comissão de Ética Pública do Planalto no primeiro governo Lula (2003-2006), se diz "muito triste" com a atual situação do partido e do governo. Aos 73

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anos, Maria Vitória qualificou a gestão Dilma como "combalida" e "fragilizada", em depoimento ao GLOBO feito às vésperas do 5º Congresso do partido que começa nesta quinta-feira, em Salvador, e que tem como objetivo debater novos rumos para a legenda.

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Ela declarou que o PT tem responsabilidade por seus quadros estarem sendo

vaiados, uma vez que a legenda "esgarçou a bandeira da ética", perdendo sua

base social. Segundo ela, o partido precisa rever e retornar seus princípios,

tese que defende ao lado de outros intelectuais do PT, como o sociólogo André

Singer. Abaixo, trechos do depoimento de Maria Vitória, que é professora da

Universidade de São Paulo (USP):

OS TRUNFOS DO PT

“Eu tenho muito orgulho de ter participado durante tanto tempo de um partido que quando chegou ao poder em 2003 iniciou programas sociais que fizeram a diferença para uma população tão desassistida até então. O PT desenvolveu uma política externa importante com uma cooperação Sul-Sul, estreitamento das relações com a África, independência em relação aos Estados Unidos. O Brasil conquistou uma posição de grande respeito no mundo e destaco também a questão do respeito aos direitos humanos”.

CORRUPÇÃO

“Mas algumas bandeiras foram deixadas para trás, sem dúvida. É aquela

questão do partido de esquerda que chega ao poder e quer resolver problemas

históricos em muito pouco tempo e atropela a ética, a transparência, a

participação. Tudo o que ocorreu que se reverteu em escândalos, a ação 470,

jocosamente chamada de mensalão. Eu não desculpo a corrupção. A bandeira

da ética tremulou por muito tempo no PT, mas se esgarçou. E levou ao

afastamento de muita lideranças, muita gente. E a maior tristeza que eu tenho

é o afastamento dos jovens e dos militantes que deram sangue, suor e lágrima

por esse partido. O PT ter chegado a essa situação em que as pessoas são

vaiadas, a Dilma é insultada. Acho que o partido tem responsabilidade sobre

isso e tem que rever isso tudo. O PT se afastou de suas bases, do orçamento

participativo, de participação popular. Eu, junto com outros intelectuais, como

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André Singer, defendo um retorno às origens no sentido de retomar princípios e

bandeiras”.

POLÍTICA ECONÔMICA

“Fiquei extremamente chocada com esse ministério formado no segundo

mandato de Dilma, a começar pelo Joaquim Levy que é contra tudo o que

partido sempre defendeu. Precisamos retomar temas cruciais que ficaram

muito mofinas nessas gestões petistas. Não se pode voltar ao que foi porque

muita coisa mudou com o governo Lula. Mas é preciso uma retomada radical,

séria dos princípios. Por outro lado não pode ser algo que já abale mais o já

combalido governo Dilma, que acho que se equivocou mas é respeitável. Esse

partido desenvolveu uma política econômica que, não sendo de esquerda, de

um partido que se apresentava como de esquerda, foi uma política em que

todos ganharam um pouco. Os muito pobres ganharam muito e os ricos

ganharam muito, haja vista o lucro dos bancos. A classe média foi a mais

penalizada e é por isso que tem reclamado tanto do governo Dilma, já muito

fragilizado”.

EXPECTATIVA COM GOVERNO DILMA

“O problema crucial do Brasil permanece sendo a desigualdade. A distância

entre os pobres e os ricos segue sendo abissal. O governo do PT melhorou

muito a casa do pobre da porta para dentro, mas da porta para fora a

desigualdade continuou sem atendimento de saúde, sem acesso à educação.

Essa era a expectativa com o governo Dilma, que não está sendo cumprida.

Estou muito triste com tudo isso, mas não desesperançosa, eu sou professora

logo sou otimista, não dá pra acreditar na educação como saída sem ser

otimista”.

Lula reconhece que Dilma mentiu na

campanha de 2014

87 Fernando Rodrigues - http://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2015/06/20/lula-

reconhece-que-dilma-mentiu-na-campanha-de-2014/

20/06/2015 12:06

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Lula fala a religiosos em seu instituto (18.jun.2015)

Ex-presidente: eu e Dilma estamos no “volume morto”

Petista faz relato sombrio sobre situação política

Para Lula, é “um sacrifício” convencer Dilma a viajar pelo país

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez na última quinta-feira

(18.jun.2015) um relato sombrio e muito duro sobre a atual situação política do

governo de Dilma Rousseff.

Num dos trechos de sua fala, reconheceu que a atual presidente mentiu

durante a campanha eleitoral de 2014:

“Tem uma frase da companheira Dilma que é sagrada: ‘Eu não mexo no direito

dos trabalhadores nem que a vaca tussa’. E mexeu. Tem outra frase, Gilberto

[Carvalho], que é marcante, que é a frase que diz o seguinte: ‘Eu não vou fazer

ajuste, ajuste é coisa de tucano’. E fez. E os tucanos sabiamente colocaram

Dilma falando isso [no programa de TV do partido] e dizendo que ela mente.

Era uma coisa muito forte. E fiquei muito preocupado”.

O PSDB fez programas duros contra o PT e Dilma. Em 10 de maio de 2015,

mostrou comerciais curtos nos quais brasileiros aparecem em situação de

desalento. Em 19 de maio, foram veiculadas as falas de Dilma na campanha de

2014, nas quais a petista promete não arrochar salários nem produzir

desemprego.

O encontro de anteontem (18.jun.2015) foi com padres e dirigentes de

entidades religiosas no auditório do Instituto Lula, segundo detalhadíssimo

relato das repórteres Tatiana Farah e Julianna Granjeia, do “O Globo''. Ao

descrever a conjuntura atual, o ex-presidente fez um desabafo:

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“Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, e eu estou no

volume morto. Todos estão numa situação muito ruim. E olha que o PT ainda é

o melhor partido. Estamos perdendo para nós mesmos”.

A expressão “volume morto” se refere à crise de abastecimento de água no

Estado de São Paulo. Para manter o fornecimento, o governo paulista recorreu

a uma reserva das represas conhecido como “volume morto”.

Como o encontro foi antes da prisões de sexta-feira (19.jun.2015) de

empreiteiros por causa da Operação Lava Jato, Lula não fez menções a esse

assunto.

Na conversa com religiosos, Lula deu um exemplo de como a situação está

delicada para o governo federal e para o PT. Mencionou uma pesquisa interna

do partido:

“Acabamos de fazer uma pesquisa em Santo André e São Bernardo, e a nossa

rejeição chega a 75%. Entreguei a pesquisa para Dilma, em que nós só temos

7% de bom e ótimo”.

Segundo Lula, ele teria dito a Dilma que o resultado da pesquisa não deveria

desanimá-la. “Isso é para você saber que a gente tem de mudar, que a gente

pode se recuperar. E entre o PT, entre eu e você, quem tem mais capacidade

de se recuperar é o governo, porque tem iniciativa, tem recurso, tem uma

máquina poderosa para poder falar, executar, inaugurar”.

Lula falou por cerca de 50 minutos, segundo o relato de “O Globo''. Reclamou

que o PT e o governo estão fazendo pouca política num momento de

dificuldades econômicas para o país.

“Na falta de dinheiro, tem de entrar a política. Nesses últimos 5 anos, fizemos

muito menos atividade política com o povo do que fizemos no outro período”.

O ex-presidente citou algumas vezes o ex-ministro Gilberto Carvalho,

interlocutor frequente do PT com movimentos religiosos. Carvalho, presente ao

evento de anteontem, participou do primeiro mandato de Dilma Rousseff, mas

viu seu papel dentro da administração federal ser desidratado. No momento,

está fora do governo.

“Gilberto sabe do sacrifício que é a gente pedir para a companheira Dilma

viajar e falar. Porque na hora que a gente abraça, pega na mão, é outra coisa.

Política é isso, o olhar no olho, o passar a mão na cabeça, o beijo”.

Lula falou mal do ambiente dentro do Palácio do Planalto: “Aquele gabinete

[presidencial] é uma desgraça. Não entra ninguém para dar notícia boa. Os

caras só entram para pedir alguma coisa. E como a maioria que vai lá é gente

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grã-fina… Só entrou hanseniano porque eu tava [sic] no governo, só entrou

catador de papel porque eu tava [sic] no governo”.

Para o ex-presidente, Dilma precisa “ir para a rua, viajar por esse país, botar o

pé na estrada”.

Sobrou também uma reprovação para os ministros petistas: “Os ministros têm

de falar. Parece um governo de mudos. Os ministros que viajam são os que

não são do PT. [Gilberto] Kassab [Cidades] já visitou 23 Estados”. Kassab, ex-

prefeito de São Paulo, é presidente nacional do PSD.

Para o titular da Casa Civil, Aloizio Mercadante, uma observação direta: “Pelo

amor de Deus, Aloizio, você é um tremendo orador. É certo que é pouco

simpático”.

“Falar é uma arma sagrada. Estamos há 6 meses discutindo ajuste. Ajuste não

é programa de governo. Em vez de falar de ajuste… Depois de ajuste vem o

quê?”. Para o ex-presidente, é necessário “fazer as pessoas acreditarem que o

que vem pela frente é muito bom”.

A reportagem de Tatiana Farah e de Julianna Granjeia, no jornal “O Globo'',

pode ser lida aqui.

O PT e os capitalistas

Published on 21/06/2015 by Paulo Ghiraldelli

http://ghiraldelli.pro.br/o-pt-e-os-capitalistas/

O PT nasceu para transformar o capitalismo brasileiro em um capitalismo com menos selvageria. Ainda que jamais tenha dito isso, queria sim ser um partido social-democrata mais próximo das origens da II Internacional, isto é, um grande partido de esquerda com base operária, capaz de construir algum tipo de socialismo democrático. As correntes leninistas e trotskistas sempre foram minoritárias no partido. A Igreja Católica com suas “comunidades de base” podia estar presente sob o manto da Teologia da Libertação. Intelectuais de várias tendências se achavam representados pela agremiação. O PT não era comunista. Nunca foi. Ao contrário, queria manter algo inédito nos partidos de esquerda aguerridos: a democracia interna efetiva. Durante algum tempo até conseguiu. Pouco tempo, mas que teve seus momentos gloriosos.

Tudo isso, hoje, foi pelos ares. O PT se meteu no funil do discurso moralista e este, em política, é sempre muito datado. Não deve ser feito. Pois ao menor sinal de corrupção interna, tudo se rompe. Os partidos não moralistas possuem

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mais chance de sobrevivência. O PT sobreviveu até muito com o discurso moralista. Mas acabou se aproveitando de tal discurso para institucionalizar a corrupção. Por algum tempo, muitos no PT acreditaram que, por terem sido os baluartes da defesa da possibilidade da política não corrupta (que poucos conseguiram fazer, com o Senador Suplicy à frente desses poucos, durante uma vida), então estavam liberados para até fazer alguma corrupção, que isso passaria sem que ninguém notasse. Afinal, em última instância sempre se poderia olhar no espelho e dizer que não havia “corrupção verdadeira”, pois as pessoas do partido não estavam lucrando, uma vez que tudo era feito para que o PT continuasse no poder e pudesse “salvar os pobres”.

Até esse PT do “rouba por boa causa” já se desfez. Delúbio o defendeu. Mas o tesoureiro posterior nem era isso, já fazia parte do “ganhar a eleição a qualquer custo”. Todo o sonho de uma militância de esquerda, talvez tão cabeça dura quanta a comunista, mas aparentemente menos estúpida, se arrebentou. Ora, então, os conservadores brasileiros deveriam estar comemorando. Estranhamente, não estão. Por quê?

Na verdade a devassa que a justiça – com Moro à frente – está realizando colocou na cadeia exatamente os homens que durante os últimos quarenta anos não estiveram nem um pouco a favor de qualquer tipo de socialismo, mas apenas tentando levar adiante um capitalismo de aprofundamento da distância social entre ricos e pobres. O PT não deu um tiro no capitalismo, mas deixou todos os capitalistas a descoberto; o PT os envolveu num novo esquema de corrupção e deu vida aos velhos esquemas já existentes. Essa contradição interna do partido, que é a de não saber ver no empresário senão aquele que é corrupto e tem que ser tratado dentro de esquema de corrupção, é que permitiu que a justiça, diferente daquela dos tempos de Sarney, Collor, Itamar e FHC, pusesse atrás das grades os homens mais poderosos do Brasil. Até mesmo os donos das construtoras que, desde a ditadura militar, comandaram o país, estão indo para a “delação premiada”.

Por uma ironia completa do destino, Barbosa (inicialmente petista) e agora Moro (que não importa a filiação), dois homens da lei, estão realizando tudo aquilo que as esquerdas pediam que se fizesse no Brasil. Éramos o país da impunidade dos ricos. Somos hoje o único país em que os ricos estão sendo realmente postos na cadeia. Tanto a direita quanto a esquerda parlamentar estão atônitas, não sabem o que fazer. As coisas estão andando à revelia dos partidos.

Não vamos ser socialistas ou capitalistas por conta disso. Essa revolução é secundariamente política. Mas após Moro terminar sua tarefa, sairemos com um sistema de justiça que deverá se refletir para sempre na política desse país. Teremos um dos ideais da esquerda realizado. Ao fim e ao cabo, o PT realizou uma de suas tarefas, ainda que contra si mesmo e, talvez, por meio de seu fim definitivo, que é ter colocado ao menos durante um momento os capitalistas principais do país na cadeia. É por isso que os conservadores não estão felizes com o fim do PT. Porque o PT vai acabar levando para o túmulo, junto com ele, alguns dos homens que os conservadores mais amavam – e ainda amam.

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Paulo Ghiraldelli, 57, filósofo, autor entre outros de Sócrates: pensador e educador (Cortez, 2015).

Datafolha e Vox Populi: o governo e o

PT no labirinto http://cartamaior.com.br/?%2FEditoria%2FPolitica%2FO-governo-e-o-PT-no-

labirinto%2F4%2F33787 - 21/06/2015 - Copyleft

O governo Dilma perdeu 32% de popularidade em menos de 6 meses. No

Nordeste, a avaliação ruim/péssimo foi de 16 a 58%.

Jeferson Miola

A recente pesquisa Datafolha não fornece somente resultados; traz alertas

preocupantes para o governo. O julgamento “ruim/péssimo” subiu 5%, perfazendo

65% dos pesquisados; e diminuiu em três pontos o percentual que considera o

governo Dilma “ótimo/bom” – subconjunto agora representado por apenas 10% dos

pesquisados. A classificação “regular” perdeu 3 pontos, ficando em 24%.

Quando terminou o primeiro mandato a presidente Dilma tinha 42% de

“ótimo/bom”, 24% “ruim/péssimo” e 33% de “regular” – como se percebe, uma

erosão de 32% na popularidade em menos de 6 meses.

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A rejeição do governo está relacionada a fatores econômicos factuais e concretos

da vida das pessoas: 53% consideram que a economia vai piorar, 77% que a

inflação vai aumentar e 73% que o desemprego vai crescer. A insatisfação

aumenta nos segmentos atingidos pela política recessiva, de juros altos, corte de

créditos e de investimentos.

A rejeição subiu consideravelmente no nordeste – era 16% “ruim/péssimo” em

dezembro/2014 e hoje atinge 58%. E, pela primeira vez, as maiores porcentagens

de rejeição ao governo são encontradas nos extratos de renda inferior. A perda de

popularidade do governo chegou nas regiões e segmentos sociais identificados

com o PT, justamente onde conseguia compensar a vantagem eleitoral do PSDB

em SP.

Recentemente o Instituto Vox Populi fez estudo para aferir o “Tamanho do ódio” ao

PT. A este respeito, se pode ler o artigo de Marcos Coimbra na Carta Capital e o

de minha autoria na Carta Maior – “O poder da mídia e o ódio ao PT”. Na

sondagem do Vox Populi, 12% dos pesquisados “detestam” o Partido, e cerca de

33% simpatizam com a sigla. A erosão da imagem do PT não é, como se nota, na

proporção que dizem ser.

O que explica a discrepância entre os resultados das duas pesquisas? Como se

pode entender que a rejeição do governo [65% “ruim/péssimo”] é cinco vezes

maior que a rejeição do PT [12% o “detestam”], que é o Partido da presidente?

O povo, de maneira geral, não associa Dilma com o PT como associa o Lula ou

outras figuras históricas ao Partido. Dilma chegou a ter sua imagem fortemente

associada ao Lula, considerado seu “criador e mentor”. Mas a imagem simbiótica

que existia entre ambos se esmaece cada vez mais. A população parece discernir

que Lula é Lula e que Dilma é Dilma, e que Lula está mais para o PT do que ela.

A crise econômica é uma profecia finalmente confirmada, e produz efeitos objetivos

na vida da maioria assalariada e de renda baixa e média da população, que

descola do governo, mas não necessariamente do PT – ao menos por enquanto –

porque provavelmente não identifica a condução econômica atual com o ciclo de

governos petistas iniciado em 2003.

Estamos num momento complexo, de confluência de várias crises e de múltiplas

falências políticas – tanto do governo como do PT. Os desdobramentos da nova

etapa da operação Lava Jato e a desaprovação das contas do governo pelo

Tribunal de Contas da União turvarão ainda mais o ambiente político, reagendando

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o tema do impeachment.

Cresce o consenso entre economistas – não só os heterodoxos, mas alguns

liberais – de que a condução econômica agravará a situação do país por um

período mais prolongado e agravando a recessão, causando desemprego com a

perda real do valor do salário.

As pesquisas parecem estar anunciando uma difícil encruzilhada, um estágio novo

dessa espiral destrutiva em que se encontram tanto o governo Dilma como o PT. É

o governo que puxa o PT para baixo ou é o PT que afunda o governo?

Em encontro com lideranças religiosas na sede do seu Instituto, Lula vocalizou o

sentimento de 11 entre cada 10 petistas. A opinião dele é reflexo da impaciência

com a catatonia que acomete a todos – o governo, o PT, o próprio Lula, as

direções partidárias, as vanguardas sociais e intelectuais – ou é uma rachadura na

relação do PT com o governo e, em especial, com a presidente Dilma?

Nesta espiral destrutiva que esfarela o PT, o governo e que compromete o futuro

da esquerda brasileira, é imperativo superar-se a catatonia e a paralisia e adotar

decisões corajosas impostas pela conjuntura, por mais duras e traumáticas que

possam ser num primeiro instante, para que possamos sair do labirinto.

Créditos da foto: Roberto Stuckert Filho/PR

WAGNER – PT ERROU AO NÃO FAZER R.POLITICA EM

2003

http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,para-wagner-pt-errou-ao-nao-votar-reforma-

politica-no-governo-lula,1700139

‘Lulismo vive seu momento mais difícil, mas não

podemos ainda decretar seu fim’

Por Valéria Nader e Gabriel Brito, da Redação; Colaborou Raphael Sanz

O cenário não poderia ser muito diferente para um governo que se elegeu sob marketing

eleitoral mentiroso e que já parece velho. Para complicar, nesse exato momento, dá mostras

de nem mesmo estar governando de fato. Para ajudar a compreender essa intrincada

conjuntura, o Correio entrevistou André Singer, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e

Ciências Humanas da USP e autor de importantes obras de interpretação sócio-política da

realidade nacional, dentre elas, aquelas que se destinam ao entendimento do fenômeno

chamado de ‘lulismo’.

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Redação: Av. Pedroso de Moraes, 677, Cj. 151, Pinheiros, São Paulo - SP, CEP: 05419-

000

Telefone: 11 - 3031 - 3297 Email - [email protected]

O buraco negro do PT Wanderley G. dos Santos8 de maio de 2015

http://insightnet.com.br/segundaopiniao/?p=58

O Partido dos Trabalhadores está, talvez, em rota para se tornar um buraco negro no espectro partidário. Com velocidade de meteoro, a estrela do PT incendiou a política nacional dobrando o tamanho de sua representação à Câmara dos Deputados em duas eleições sucessivas, entre 1982 e 1990, e a porcentagens crescentes até 2002, quando ainda aumentou a bancada em 18%. Desde então o ritmo de crescimento diminuiu para 16,0%, em 2006, 17,0% em 2010, e não mais do que 13,0%, em 2014. A conquista de Assembleias Legislativas seguiu rumo instável com viés de baixa: 200,0% a mais de deputados estaduais em 1986, em relação a 1982, e 113%, na comparação 1990-1996. Daí em diante resultados erráticos levaram a crescimento negativo de -16,0% em 2006-2002, 7,0% positivos em 2010, e uma retração de -27,0% no contingente eleito em 2014. Eleições majoritárias para prefeituras revelam contínua redução da marcha: 120,0% de crescimento de prefeitos

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eleitos em 2004, 35,0% em 2008, e 15,0%, agora em 2012. Não obstante a estabilidade natural das representações partidárias, a estrela petista pode ser uma estrela apenas cadente ou entrar em colapso, esmagada pela gravidade de seu âmago. Com densidade eleitoral em declínio e expansão de um núcleo deteriorado a descoberto, arrisca-se à rejeição por parte de estamentos eleitorais que não lhe negaram apoio nem durante o episódio de flagrante caixa 2, transformado em ilícito penal pela mídia e um judiciário em surto de ressentimento e demagogia. Agora, não há escusas. O Partido dos Trabalhadores favoreceu e participou da predação de recursos públicos em escala de Primeiro Mundo. Mentiu e tergiversou como o fizeram primeiros-ministros e presidentes alhures. Evita liderar a necessária lavagem intestina do aparelho de Estado, mantendo seus simpatizantes reféns dos dedos em riste de terceiros, os dedos podres do conservadorismo. Não há porque exibir solidariedade a criminosos, vampiros das classes subalternas, fraudadores de bandeiras que não merecem. A redução do apoio eleitoral se iniciou, paradoxalmente, com a eleição de um presidente operário, fiador do combate à miséria. Escamotear os fatos equivale a desenhar uma trajetória em direção ao buraco negro. Evocar escândalos similares em outras sociedades constitui a mais distraída confissão do crime.

Frente de esquerda para quê?

Vladimir Safatle — publicado 28/05/2015 04h58

http://www.cartacapital.com.br/revista/851/frente-de-esquerda-para-que-4260.html

Não é a falta de direção que acomete a ala progressista brasileira. É a falta de coragem, o que é muito mais grave

José Cruz/ Agência Brasil

Dilma transformou-se em uma Isabelita Perón do Cerrado

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A Nova República acabou

Se fosse o caso de fornecer uma analogia histórica para a situação atual do

Brasil, talvez o melhor a fazer seria voltar os olhos para a Argentina dos anos

1970. De certa forma, não há nada mais parecido com o atual governo Dilma

do que a Argentina de Isabelita Perón. Dilma transformou-se em uma Isabelita

Perón do Cerrado.

Uma presidenta refém de seus operadores políticos, impotente diante da

dissolução do acordo peronista entre setores da esquerda e setores

conservadores em torno da figura de seu finado marido, Juan Domingo Perón,

Isabelita foi a figura mais bem-acabada do esgotamento do ciclo de acordos,

avanços e paralisias que marcou o peronismo. Ao se deixar guiar pelos setores

mais conservadores do peronismo, Isabelita parecia uma morta-viva, a

encarnação de um tempo que já acabara, mas ninguém sabia como terminar.

Agora, imaginem que estamos na Argentina dos anos 1970 e Perón não

morreu. Como um fantasma, ele volta para tentar organizar a oposição contra o

governo que ele mesmo elegeu, federando as vozes dos descontentes com o

governo criado por ele mesmo e para o qual indicou vários ministros. Não, algo

dessa natureza não poderia acontecer na Argentina. Algo assim só pode

ocorrer no Brasil. Pois não é isso o que estamos vendo com um Lula

reconvertido a arauto da “frente de esquerda” juntamente com o resto do que

ainda tem capacidade de formulação no PT? O mesmo PT que, em um dia, vai

à televisão para afirmar seu compromisso com a defesa dos direitos

trabalhistas para, no dia seguinte (vejam, literalmente no dia seguinte) votar em

peso a favor de um pacote de medidas que visam “ajustar” a economia não

exatamente taxando lucros bancários exorbitantes, mas diminuindo os mesmos

direitos trabalhistas que defendera 24 horas antes.

Nesse contexto, o que pode ser uma frente de esquerda a não ser a última

capitulação da esquerda brasileira à sua própria impotência? Ou, antes, o

reconhecimento tácito de que a esquerda brasileira só pode oferecer o

espetáculo deprimente de discursos esquizofrênicos divididos entre o reino das

boas intenções e a dureza das decisões no “mundo real”? Acreditar que

aqueles que nos levaram ao impasse serão os mesmos capazes de nos tirar de

tal situação é simplesmente demonstrar como a esquerda brasileira vive de

fixações em um passado que nunca se realizou, que nunca foi efetivamente

presente. É mostrar ao País que a esquerda não tem mais nada a oferecer de

realmente novo e diferente do que vimos.

Se a esquerda quiser ter alguma razão de existência (pois é disso que se

trata), ela deve começar por fazer uma rejeição clara do modelo que foi

aplicado no Brasil na última década, seja no campo político, seja no campo

econômico. O modelo lulista não chegou a seu esgotamento por questões

exteriores, pressão da mídia ou inabilidades de negociação da senhora Dilma.

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Ele se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de

criar nada de distinto do que foi feito.

Insistiria ainda em como é falsa a ideia de que a esquerda brasileira está de

joelhos sem saber o que fazer. Há anos, vários setores progressistas têm

alertado para o impasse que agora vivemos. Há anos, várias pautas foram

colocadas em circulação, entre elas a revolução tributária que taxe a renda e

libere a taxação sobre o consumo, a democracia direta com poder de

deliberação, veto e gestão, o combate à especulação imobiliária através de leis

que limitem a propriedade de imóveis, a reforma agrária, a diminuição da

jornada de trabalho, a autogestão de fábricas e locais de trabalho, o salário

máximo, o casamento igualitário, as leis radicais de defesa da ecologia, o fim

da política de encarceramento sistemático, a exposição da vida financeira de

todos os que ocupam cargos de primeiro e segundo escalão, a punição

exemplar da corrupção, o fim do monopólio da representação política para

partidos. Não é a falta de direção que acomete a esquerda brasileira. É a falta

de coragem, o que é muito mais grave.

Discurso de Vladimir Safatle bloqueia a reflexão

publicado em 02 de junho de 2015 às 11:13

Antônio David

http://www.viomundo.com.br/politica/antonio-david-discurso-de-vladimir-safatle-bloqueia-a-reflexao.html

Um fantasma ronda a esquerda: uma forma autoritária de pensar por Antônio David, especial para o Viomundo Não é de hoje que a esquerda brasileira vive às voltas com impasses. Por isso, deveríamos no mínimo fazer o esforço de tentar olhar para trás de maneira honesta e generosa, se quisermos entender os impasses em torno do “lulismo” e enfrentá-lo da melhor forma. Mas nem isso conseguimos.

Em seus mais recentes artigos, O que podemos? e Frente de esquerda para quê?, Vladimir Safatle insiste na tese de que os impasses da atual conjuntura reduzem-se à “falta de coragem” – uma maneira nova de dizer o velho bordão “falta de vontade política”.

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Segundo Safatle, enquanto a esquerda brasileira “não tem mais nada a oferecer de realmente novo e diferente do que vimos”, os espanhóis “não temeram procurar reinventar a força da política através de uma confiança renovada no povo”.

Safatle argumenta: “Se a esquerda quiser ter alguma razão de existência (pois é disso que se trata), ela deve começar por fazer uma rejeição clara do modelo que foi aplicado no Brasil na última década, seja no campo político, seja no campo econômico. O modelo lulista não chegou a seu esgotamento por questões exteriores, pressão da mídia ou inabilidades de negociação da senhora Dilma. Ele se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de criar nada de distinto do que foi feito”.

Atente-se bem para os termos empregados: “realmente novo e diferente”, “rejeição clara”. As palavras são fortes e contundentes. Todavia, por trás dessa aparente assertividade, há algo de lacunar no discurso de Safatle. A verdade, como sabemos, aparece melhor nos silêncios do discurso. Vejamos.

Tendo criticado a evocação de Lula por uma Frente de Esquerda, Safalte conflui: “não é a falta de direção que acomete a esquerda brasileira. É a falta de coragem”.

Afinal, de quem exatamente Safatle está falando? Do PT ou da esquerda no seu conjunto? No caso, a “esquerda brasileira” da qual fala Safatle envolve toda a esquerda – incluso a esquerda à esquerda do PT, incluso seu próprio partido, o PSOL?

À primeira vista, a pergunta parece conduzir à velha e inútil cultura da picuinha. Porém, abaixo da superfície, há uma questão de fundo.

Se, como sustenta Safalte, o lulismo “se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de criar nada de distinto do que foi feito”, cabe indagar: quem o criou? Safatle não diz. Não é por acaso. Ao contrário do que Safatle sugere – sem, no entanto, dizer -, a estratégia do lulismo – pois é de uma estratégia que se trata – não foi criada pela mente (genial ou doentia) dessa ou daquela pessoa, desse ou daquele grupo, mas pelo confronto no interior do PT ao longo da década de 1990. Formulada no curso dessa década como resposta à derrota de 1989, essa estratégia é a síntese da luta interna travada no interior do PT. Vistas as coisas sob essa ótica, é necessário reconhecer, se quisermos de fato enfrentar os impasses do lulismo, que se a estratégia do lulismo guarda limites, deméritos, vícios, a esquerda brasileira no seu conjunto – no que se incluem as correntes que

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deram origem ao PSOL – é tão responsável pela estratégia do lulismo quanto àquelas que se mantiveram no PT.

Claro que essas correntes recusarão esse ponto de vista. Afinal, elas se opuseram à estratégia. Como podem então ser responsáveis? Tal como tratei longamente em outro artigo, na estratégia do lulismo está inscrita a incapacidade de as correntes que a ela se opuseram, seja enquanto estavam no PT, seja depois que saíram, de oferecer uma alternativa. Na ausência de alternativas, na recusa a discutir o que de fato merece ser discutido – estratégia –, tudo se resume a apontar os culpados. Para tanto, forjou-se uma narrativa: o campo majoritário fez filiações em massa; os congressos foram fraudados; a maioria esmagou a minoria. Sem dúvida, é mais cômodo olhar os acontecimentos históricos sob essa ótica.

No entanto, se nos perguntarmos a quem o discurso de Safatle é dirigido e com vistas a quê esse discurso é produzido, será que essa ótica ainda se sustenta?

Ao defender a tese de que o problema se resume a “falta de coragem”, Safalte está como que dando um recado. É como se estivesse dizendo: “Não percam tempo em discutir estratégia. Isso é pretexto. Quem discute estratégia quer no fundo desviar a atenção da questão central: ter ou não ter coragem”.

Se o que Safatle diz é verdade, livros como Os Sentidos do Lulismo, de André Singer, não têm valor algum. No fundo, trata-se de um grande blá-blá-blá que apenas desvia o leitor da questão central: ter medo ou ter coragem. Não admira que, para Safatle, correlação de forças mereça aspas. (Claro que, se questionarmos Safatle das razões pelas quais seu partido não logra realizar o sonho do triunfo eleitoral, para o qual declaradamente nasceu, imediatamente será evocada a correlação de forças desfavorável: não fosse a desigualdade do financiamento de campanha e do tempo de TV, tudo seria diferente).

Faço a ressalva: Safatle tem razão em parte. Todos sabemos haver fanáticos entre os que defendem o governo Dilma e o PT, para os quais a estratégia do lulismo é inquestionável.

De fato, estes usam e abusam da expressão correlação de forças. Para estes, nada é possível por conta da correlação de forças. Todavia, note-se bem que, ao recusar colocar a expressão no seu devido lugar – isto é, no interior de um debate sério sobre estratégia -, o que estes fanáticos fazem não é outra coisa senão… recusar discutir estratégia. No fundo, e ironicamente, a atitude dos

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defensores fanáticos governo Dilma e de Safatle é exatamente a mesma. Ambas as abordagens apenas atestam a incapacidade de parte da esquerda de oferecer alternativas à estratégia do lulismo. Qual é o segredo desse discurso?

Ao analisar o discurso do movimento integralista nos anos 1920 e 1930, Marilena Chaui constatou que se tratava de um discurso que trabalha com pontos fixos, ou seja, como verdades tomadas de antemão, sobre as quais o pensamento não se debruça. Com isso, o discurso integralista “não só permite economizar a reflexão acerca dos processos históricos, mas permite sobretudo assegurar ao destinatário um suposto conhecimento” prévio da realidade, com base na reafirmação e repetição de preceitos tomados de antemão, de modo que o discurso tenha “força persuasiva e até mesmo constrangedora”.

Chaui nota que o aspecto político dessa operação reside exatamente na exclusão da reflexão: “Unido e disperso, a imagem, espelho dos dados imediatos, exclui a reflexão e, simultaneamente, cria a ilusão de conhecimento, graças ao seu aspecto ordenador”. Trata-se, em suma, de uma forma autoritária de pensar.

Ao trabalhar com pontos fixos, tomados como verdades de antemão – “realmente novo e diferente”, “rejeição clara”, “falta de coragem” –, o discurso de Safatle cumpre exatamente esse papel: bloquear a reflexão. Como explicar que um discurso que se pretende mobilizador do pensamento realize-se como bloqueio à reflexão?

A pergunta deveria ser: a quem, afinal, o discurso de Safatle é dirigido?

O discurso é dirigido à militância e aos simpatizantes do PSOL. Cumpre a função de coesionar essa militância. Assim como o discurso integralista, o discurso de Safatle “não só permite economizar a reflexão acerca dos processos históricos, mas permite sobretudo assegurar ao destinatário um suposto conhecimento” prévio da realidade, com base na reafirmação e repetição de preceitos tomados de antemão, de modo que o discurso tenha “força persuasiva e até mesmo constrangedora”.

Não tenho dúvida de que se trata de um discurso bem-sucedido e até mesmo útil em face do propósito de formar um exército de soldados – aliás, todos devidamente uniformizados. Os militantes e simpatizantes do PSOL ficarão felizes lendo os artigos de Safatle. Sentirão alívio. Terão a consciência apaziguada. Não terão de enfrentar o fantasma da crise interna que se abriria com a reflexão. Eles sabem que a estratégia do lulismo é um fracasso –

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aliás, sempre foi – e que a sua estratégia é a verdadeira, ainda que ela não possa ser exposta. E por que precisaria? Sua verdade é autoevidente, tão autoevidente que toda tentativa de reflexão sobre a estratégia não passa de pretexto e serve apenas para esconder o medo de fazer o que deve ser feito. Enfim, não há o que discutir: a culpa é dos outros, da sua “falta de coragem”. Nós estamos certos.

Estranho falar em reflexão quando nós da esquerda continuarmos a aceitar estruturas dirigistas, hierárquicas, hegemonistas e centralizadas.

==

ROMPIMENTO ENTRE LULA E DIRCEU

AMEAÇA O PT E A PRÓPRIA DILMA

por Carlos Newton. Artigo publicado em 02.06.2015

Publicado originalmente na Tribuna da Internet -

http://www.puggina.org/artigo/outrosAutores/rompimento-entre-lula-e-dirceu-

ameaca-o-pt-e/3235

Entre os vários desentendimentos que assolam o governo e o PT, o mais

grave, sem qualquer dúvida, é o rompimento das relações entre o ex-

presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro José Dirceu. Da antiga

amizade, nada restou. Como ambos estão ameaçados, agora cada um deles

cuida da própria sorte e, para se salvar, estão trilhando o caminho da

autodestruição.

O rompimento ocorreu em janeiro, quando Dirceu sentiu que a situação se

complicava e logo estaria envolvido na Operação Lava Jato. Como o PT e o

governo se mostravam completamente desarticulados, resolveu procurar Lula

para armar um plano conjunto de defesa, como sempre fizeram, inclusive no

caso de Rosemary Noronha, em que Dirceu participou diretamente da

montagem de blindagem da segunda-dama de Lula, ajudou a selecionar os

quatro escritórios para defendê-la, depois contratou mais um, e acompanhava

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Lula e Rosemary em reuniões com esses advogados, todos caríssimos, a

serem pagos pelo caixa 2 do PT.

Dirceu telefonou ao Instituto Lula e pediu a Paulo Okamotto que agendasse um

encontro dele com o ex-presidente. Mas acontece que Lula não quis se reunir

com ele, Okamotto começou a dar desculpas, até que Dirceu perdeu a cabeça

a destratou o assessor. Isso aconteceu em janeiro. Desde então os dois ex-

amigos estão rompidos.

SEGUNDO CAPÍTULO

Esta novela será demorada. Estamos apenas no segundo capítulo. A estratégia

de Lula continua a mesma que usou no mensalão. Sua intenção é tirar o corpo

fora e novamente culpar José Dirceu, para ter o mínimo de desgaste possível.

Sonhar não é proibido. Mas as coisas mudaram do mensalão para cá, Dirceu

não está disposto a pegar novamente cadeia. Seu objetivo é cumprir o resto da

pena e se mudar para Portugal, tentar esquecer o que passou e curtir com a

mulher e a filha o dinheiro que sobrou de suas "consultorias". O mais provável,

porém, é que Dirceu seja novamente condenado.

Se a situação de agravar, ele vai fazer delação premiada e entregar todo

mundo, particularmente Lula, que hoje é seu inimigo nº 1. Na entrevista que

concedeu há duas semanas ao repórter Daniel Pereira, da Veja, Dirceu

ameaça claramente entregar Lula, que não tem condições de demovê-lo, nada

tem a oferecer, porque também está envolvido até a alma.

Se Dirceu contar o que sabe, destruirá Lula, o PT e o governo Dilma.

Certamente é por isso que Lula já está até falando que não será candidato em

2018. Depois que a bomba explodir, é melhor fugir para a Itália, aproveitando a

segunda cidadania que Dona Marisa Letícia oportunamente conseguiu,

seguindo o belo exemplo de Henrique Pizzolato. E lá na terra de Fellini, a

famiglia Silva então poderá dizer que la nave va...

* Jornalista

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'O PT perdeu parte do sonho e da utopia', afirma Lula

Ana Fernandes - Agência Estado

Ao discursar no instituto que leva seu nome, ex-presidente reclamou que

filiados pensam mais em cargos que no partido

São Paulo - Em evento promovido pelo instituto que leva seu nome, o ex-

presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso nesta segunda-feira, 22,

sobre a necessidade de o partido se renovar e atrair a juventude, com duras

críticas a posturas vistas hoje no partido que ajudou a criar. Segundo Lula, o

PT perdeu parte do sonho, da utopia.

"O PT perdeu um pouco do sonho, da utopia. A gente só pensa em cargo, em

ser eleito, ninguém trabalha de graça mais (pelo partido)", reclamou. "Estamos

querendo salvar nossa pele e nossos cargos ou criar um novo projeto?",

questionou.

No debate que recebeu o ex-primeiro-ministro da Espanha Felipe González, do

Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), Lula disse que pretende chamar

para palestras representantes dos novos partidos que vem surgindo na Europa,

como o Podemos.

"O PT era, em 1980, o que é hoje o Podemos. A gente nasceu de um sonho,

de que a classe trabalhadora pudesse ter vez e ter voz, e nós construímos

essa utopia", disse o ex-presidente, ao refletir sobre como recuperar essa

ideologia. "Há necessidade de repensarmos a esquerda, o socialismo e o que

fazer quando chegamos ao governo. Enquanto você é oposição é muito fácil

ser democrata você pode sonhar, pensar, acreditar, mas quando você chega

ao governo, precisa fazer, tomar posições."

Lula repetiu que o partido precisa se reaproximar da juventude e não deixar

que prospere o discurso que afasta as pessoas da política. "A gente precisa

rediscutir um pouco as utopias para fazer essa meninada sonhar, acreditar que

é possível, se não construir outro mundo, melhorar esse em que nós vivemos",

disse. "Como a gente pode falar em renovação se não tem um jovem aqui?",

questionou olhando para a plateia - selecionada pelo próprio Instituto Lula.

O ex-presidente voltou a reclamar da imprensa brasileira. "Aqui no Brasil, até o

direito de resposta não temos mais, leva 30 anos e quando sai é melhor nem

responder." Lula afirmou que nove famílias controlam praticamente todos os

veículos de comunicação e que o País está atrasado. "O Brasil está atrasado, a

regulação da mídia aqui é de 1962, não tinha nem fax. E se você fala sobre

isso, leva bordoada de tudo que é lado."

Democracia. Entre as reclamações, Lula afirmou que é mais difícil manter a

postura democrática depois que se chega ao governo. Mas disse que é

importante aprender a se manter no poder, mantendo as regras democráticas.

Sem citar sua sucessora, a presidente Dilma Rousseff, Lula exaltou iniciativas

do seu governo nessa área. "Nunca antes nesse País o povo exerceu tanto

democracia e participou tanto do governo como no meu governo", afirmou. E

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lembrou que sua gestão no governo federal promoveu 74 conferências para

decidir políticas públicas com movimentos sociais.

Uma das principais críticas de petistas ao governo Dilma é o afastamento da

base social do partido.

Apesar do comentário de que é difícil manter-se democrata no governo, o

petista afirmou que sempre soube que só seria eleito presidente pela via

democrática. E comparou seu caso ao de Evo Morales, que segundo destacou

Lula, também só chegou ao poder pelas urnas.

Lula defendeu ainda o Foro de São Paulo - grupo composto por partidos e

movimentos de esquerda da América Latina, criado em 1990. O Foro é um dos

temas mais criticados por movimentos anti-PT e anti-governo. "O Foro de São

Paulo foi criado com a ideia de educar a esquerda latino-americana a praticar a

democracia. Na Argentina, nem o Maradona unificava a esquerda. Hoje, os

partidos de esquerda participam de governos nesses países."

O ex-presidente falou sobre política internacional e comentou rapidamente

sobre ajuste, criticando o modelo que foi adotado em países como Grécia,

Espanha, Reino Unido. "O ajuste imposto lá só fez com que a dívida bruta

crescesse", afirmou.

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PT: a tragédia que nos ameaça

Wladimir Pomar

Sexta, 19 de Junho de 2015

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Havia esperanças, não apenas nas fileiras petistas, mas na esquerda em geral, que o quinto congresso do PT resultasse em mudanças substanciais, tanto em sua estratégia política quanto em seus métodos de organização e funcionamento interno. No entanto, numa dessas cegueiras que de vez quando acometem os partidos, estejam eles na esquerda ou na direita, a maioria dos delegados aprovou uma resolução, ou uma “carta”, que critica o passado, mesmo assim a meias, não discute o presente e promete o céu para o futuro.

Dizendo de outro modo, a maioria dos delegados, entre os quais se destacou a presente direção partidária, parece não enxergar o que está ocorrendo no país. Ignora que há uma ofensiva cerrada para liquidar o PT, utilizando-se principalmente das denúncias de corrupção. Tanto as denúncias que têm fortes indícios de verdade, como as que envolvem um ex-deputado do Paraná, quanto aquelas relacionadas com contribuições empresariais legalmente aceitas pelo partido, mas provavelmente originadas de “dinheiro sujo”.

Essa maioria não se deu conta que o PT, ao aceitar as contribuições empresariais, que antes combateu acertadamente, aceitou o beijo da morte. A contribuição empresarial aos partidos políticos, como afirmou o meliante Paulo Roberto Costa, é um adiantamento a serviços a serem prestados. Nessas condições, mesmo na hipótese de o partido jamais ter prestado serviços em troca dos “adiantamentos” recebidos, vale o que é considerado o método prevalecente em todos os demais partidos.

O PT passou a ser visto como igual aos demais. E há indícios de que alguns dirigentes e militantes também acharam normal adotar o método dos demais partidos e retribuir com “serviços” as contribuições empresariais. Nessas condições, ou o PT rompe com esse método, condena a contribuição empresarial para o partido e para seus candidatos, independentemente de a legislação a considerar “legal”, ou continuará com as veias abertas para ser sangrado pelo lado de lá.

Pouco adianta argumentar que todos os demais fazem o mesmo e não estão sendo perseguidos. Mesmo porque são os “demais” que estão operando para liquidar o PT. Nessas condições, é trágico que a maioria congressual tenha, até mesmo, revogado a meia sola adotada antes pelo diretório nacional do partido. Subordinou sua decisão ao que for aprovado no parlamento nacional, que tende a legalizar totalmente as contribuições empresariais a partidos e candidatos, e manter o sistema corruptor vigente.

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Para piorar, a maioria do congresso decidiu manter o apoio à política de ajuste fiscal do governo. Não está sequer olhando para as pessoas nas ruas. Isto é, para a massa de novos desempregados. Para o crescimento da criminalidade alimentada pela propaganda de consumo. Para as greves de professores por salários mais dignos. Para o fechamento de lojas, que parece uma onda avassaladora. Para a retração dos investimentos. E para a crescente descrença no governo e no partido que formalmente o dirige.

Como os três macacos da fábula, essa maioria não vê, não ouve e não tem o que falar para o povo. Acredita no milagre de um ajuste que não deu certo nos anos 1990. Ajuste que tende a conduzir ao mesmo buraco a que o Brasil foi levado no final daquela década. Com uma diferença importante. Naquela ocasião, em 1998, o sistema financeiro internacional, o FMI, o Banco Mundial e os governos que comandam as “redes produtivas globais” realizaram operação salvamento de FHC. Agora, quando o fracasso se tornar irrevogável, vão jogar sobre o governo Dilma, com Levy e tudo, a pá de cal.

O problema dessa tragédia, para as esquerdas em geral, gostem elas ou não do PT, é que se esvairá a experiência de um partido de massas capaz de disputar o governo federal e os governos estaduais e municipais, no quadro das regras do jogo estipuladas pela burguesia dominante. Isto representará um novo processo de dispersão das forças populares e da esquerda. Alargará ainda mais o caminho para a ofensiva já em curso, não só da direita troglodita, mas também da direita reacionária e conservadora, com imensos prejuízos para os trabalhadores e o povo em geral. O futuro radioso previsto pela maioria do congresso do PT se transformará num futuro desagregador e fragmentado.

Não é preciso voltar muito na história para apreender o que aconteceu quando o antigo PCB, nos anos 1950, entrou em caminho idêntico, perdeu a hegemonia na esquerda e implodiu, incapaz sequer de esboçar uma resistência mínima ao golpe militar de 1964. Ao todo, foram necessários mais de 20 anos para criar um novo instrumento de agregação das esquerdas e dar-lhe capacidade de luta e disputa da hegemonia na sociedade. É essa tragédia que nos ameaça novamente.

Em contraposição a tudo isso, há a boa notícia de que a minoria que se opôs à alienação da maioria do congresso do PT cresceu para 45% dos delegados votantes. Isso, pelo menos, indica que ainda há vida nesse partido. Se essa minoria souber unificar-se em torno das questões estratégicas e sensibilizar a verdadeira militância que continua existindo nesse partido, pode estar dando um passo importante para evitar a tragédia.

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Se, além disso, voltar-se para a reorganização dos núcleos de base do PT, para estimular o conjunto partidário a ouvir as camadas populares e intermediárias e participar ativamente de suas lutas e para transformar as lutas dispersas numa forte mobilização social, talvez a tragédia que nos ameaça seja evitada, e o PT volte a assumir o papel que se propôs em sua fundação.

Leia também:

Cavalo de pau para salvar o país

Meia sola não resolve

‘Lulismo vive seu momento mais difícil, mas não podemos ainda decretar seu fim’ – entrevista com Andre Singer

Que Frente queremos?

22/06/2015editorbrasilem5

Por Guilherme Boulos

A ofensiva conservadora, a crise do governo petista com seu ajuste

fiscal e a desarticulação da esquerda brasileira têm colocado em

vários espaços o debate da construção de uma frente. Que é

fundamental unificar a esquerda e retomar a mobilização popular

ninguém duvida. Agora qual frente queremos?

Recentemente, o ex-presidente do PSB Roberto Amaral defendeu

em artigo a criação de uma frente política e social para defender um

programa democrático, de desenvolvimento econômico e soberania

nacional.

Seu artigo não menciona o ajuste fiscal antipopular levado a cabo

pelo governo Dilma, nem tece qualquer crítica aos governos

petistas nos últimos 12 anos. Se queremos uma frente para unificar

a esquerda, esses pontos não podem ser omitidos.

Frente para defender o governo, em nome da ofensiva da direita, ou

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para começar a articular um projeto eleitoral para 2018 não é o que

a esquerda brasileira precisa. Uma frente como essa não teria

nenhuma capacidade de dialogar com a insatisfação social nem

oferecer saídas à esquerda para a crise atual.

Precisamos sim de uma frente que unifique o campo de esquerda

no Brasil. Mas de uma frente focada nos movimentos sociais, não

em manifestos e declarações de intenção, sem capacidade de

mobilização popular. Nosso principal desafio hoje é reconstruir um

ciclo de ascenso de luta de massas no país, capaz de alterar a

relação de forças.

Alternativas políticas não se constroem “a frio”, apenas porque a

conjuntura necessita delas. Se constroem no calor de mobilizações

amplas. Assim foi o Podemos na Espanha, que partiu da

mobilização de centenas de milhares nas ruas, os “indignados”.

Assim, em outras circunstâncias, foi o MAS na Bolívia, alternativa

política que nasce das heróicas mobilizações dos mineiros, dos

cocaleiros e das mobilizações territoriais como a guerra do gás.

Assim, aliás, foi o Partido dos Trabalhadores no Brasil, na década

de 1980. Seu impulso foram as grandes greves e o fortalecimento

da luta popular naquele período, que produziu importantes

instrumentos de luta dos trabalhadores.

A frente que precisamos hoje é social. Evidentemente deve

construir um campo político, com intelectuais e partidos de

esquerda. Mas seu foco deve ser a construção de amplas

mobilizações populares.

Além disso, essa frente não pode estar atrelada ao governo. Ao

contrário, deve buscar construir saídas pela esquerda à crise do

governo petista, sem temer criticá-lo em seus rumos. Criticá-lo pela

retomada de uma política econômica neoliberal e pela falta de

disposição política em enfrentar as reformas populares tão

necessárias ao Brasil. Com a mesma decisão com que deve

enfrentar o avanço das pautas conservadoras no Congresso e na

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sociedade.

Na construção de uma frente, os movimentos sociais brasileiros

devem se precaver de dois erros. O primeiro é, em nome da

ofensiva da direita, abster-se de enfrentar as políticas deste

governo. O outro é, em nome do enfrentamento ao governo,

subestimar a ofensiva da direita.

Uma frente ampla e unitária da esquerda deve ter a capacidade de

responder a estes dois grandes desafios, focando na retomada da

mobilização social.

A hegemonia imperfeita –

M.Aurelio Nogueira

http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-hegemonia-

imperfeita-imp-,1099698

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André Singer: Grito de alerta

Os resultados do Congresso do PT decepcionaram, mas nesta semana a Executiva do partido deu um passo para desatar o nó que, além de já ter

levado o partido ao volume morto, ameaça sufocá-lo de vez. Na resolução aprovada na quinta-feira, a direção partidária aponta que são "necessárias

medidas urgent…

WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR

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Aliança maldita

deu no que deu

ESCRITO POR HAMILTON OCTAVIO DE SOUZA

TERÇA, 23 DE JUNHO DE 2015 - HTTP://WWW.CORREIOCIDADANIA.COM.BR/INDEX.PHP?OPTION=COM_CONTENT&TASK=VIEW&ID=10887

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O povo brasileiro está pagando caro, agora, o preço de uma aventura política e eleitoral iniciada em 2002 quando a principal liderança do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, conduziu o partido a uma aliança com as forças tradicionais do empresariado e do conservadorismo nacional. Desde então, o que se viu foi o ataque paulatino às esquerdas, dentro e fora do PT, a completa domesticação dos sindicatos e movimentos sociais mais combativos na área de influência petista, a despolitização da luta de classes e uma escalada ainda incompleta de concessões ao capital, à direita e aos postulados do neoliberalismo. Anteriormente, os governos de Collor de Mello e de Fernando Henrique Cardoso já haviam bombardeado as atribuições do Estado, desmantelado a Constituição de 1988, retirado direitos dos trabalhadores e escancarado o país aos interesses mais mesquinhos e predadores dos capitais nacional e internacional. Vivemos o pior dos horrores de 1990 a 2002, com a liquidação do patrimônio público nos leilões das privatizações, com a “flexibilização” das leis trabalhistas e a entrega das atividades essenciais, entre as quais saúde e educação, ao jogo dos mercados. Mas, até então, amplos setores populares e a maioria das organizações sociais e de esquerda formavam as mais diferentes trincheiras da oposição. Os campos de delimitação entre esquerda e direita, progressistas e conservadores, defensores da soberania nacional e entreguistas, defensores do Estado prestador de serviços públicos e privatistas, ambientalistas e predadores dos recursos naturais, defensores dos direitos humanos e apoiadores da truculência punitiva contra os mais pobres e excluídos, estavam bem mais claros e definidos, sem a confusão de uma geleia geral. No entanto, a guinada iniciada pelo PT em 2002, com vistas exclusivamente às eleições e ao seu projeto particular de poder, contribuiu decisivamente para que, nos últimos 13 anos, não só boa parte do PT aderisse ao ideário do pensamento dominante, como também – ao não fazer o devido combate político pela esquerda – possibilitou que os setores carcomidos da direita, cautelosos desde o fim do regime militar, voltassem a ganhar desenvoltura e

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nova energia no seio das classes médias e dos assalariados em geral. Erros e desvios Qualquer análise honesta da conjuntura atual precisa obrigatoriamente considerar os graves erros e desvios políticos cometidos pela cúpula dirigente do PT, que, ao longo de anos, foi responsável pela metamorfose vivida pelo partido, a começar pelos abraços dados nos antigos inimigos dos trabalhadores, o abandono das bandeiras e das lutas socializantes, até assumir sem escrúpulo ou vergonha o papel de gestores da burguesia e operadores do aparelho de repressão do sistema. Ou alguém ainda tem dúvida de que o PT não seja um partido da ordem capitalista? Durante algum tempo – já no controle do governo federal –, os discursos e as práticas a favor do modelo político-econômico foram dourados com benesses sociais na direção de atendimento das parcelas mais miseráveis da população, na recuperação do salário mínimo, na redução da secular e gritante desigualdade. Tais programas evidentemente foram bem recebidos e conquistaram levas de agradecidos e apoiadores, enfim, uma base social a reconhecer os méritos da situação diante do descaso explícito dos governos anteriores. A economia chinesa ajudou, as relações sul-sul contribuíram e o consumo mantido artificialmente criou a sensação generalizada de que o Brasil era uma ilha de prosperidade num mundo destroçado pela crise do próprio sistema neoliberal. Vivemos entre 2008 e 2013, nos governos do PT, a grande ilusão do paraíso terrestre em que toda a sociedade e todos os brasileiros estavam ganhando: os pobres ganharam o Bolsa-Família, o Prouni, o FIES, o novo cálculo do salário mínimo baseado em PIB crescente; e os ricos ganharam nos impostos desonerados, nas obras e serviços superfaturados, nos empréstimos com juros subsidiados, no superávit primário garantido, na especulação imobiliária e na brutal transferência de renda possibilitada pelo juro elevado e o crédito incentivado. No final das contas, a tal política lulista, segundo a qual todos ganham, na verdade, dava aos pobres menos do que a décima parte do que era dado aos ricos. Por isso mesmo foram os ricos que quebraram o Estado brasileiro, que sugaram até o último tostão as reservas do BNDES, os repasses do Tesouro e os fundos que deveriam ter destinação exclusivamente social – entre eles o FAT e FGTS -, mas que foram destinados para tentar segurar a debandada do empresariado no momento em que a sangria dos recursos públicos chegou ao esgotamento. O colapso já estava evidente no início de 2014, mas em ano eleitoral o governo e a direção do PT optaram sem pestanejar pelo estelionato e deixaram a verdade sobre a crise para depois das eleições. Discurso e prática Entre o Dilma-1 e o Dilma-2, ficou evidenciado que o discurso dourado do PT para enganar os trabalhadores e os pobres estava sendo desmascarado pela prática – mais precisamente, pelas medidas do chamado “Ajuste Fiscal”, que

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nada mais fez do que cortar investimentos e programas da área social e vitaminar o superávit primário, com a elevação dos juros, que é o mecanismo que permite rápida transferência de renda da maioria da população e dos recursos públicos para os que especulam com o dinheiro, em especial o setor financeiro e os rentistas detentores dos títulos do Tesouro Nacional. Enquanto cortava verbas do FIES, restringia o Prouni com novas regras para o Enem e reduzia a 1/3 (um terço) os recursos do Pronatec, o governo anunciava novas linhas de crédito aos empresários pelo BNDES, Banco do Brasil e Caixa Federal. Enquanto deixava as universidades federais sem recursos nem mesmo para o pagamento dos serviços de limpeza, o governo anunciava pacote de privatização de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias, com financiamento público. Enquanto negociava ajuda para os grupos empresariais envolvidos no esquema de corrupção da Petrobras, o governo editava medidas provisórias para cortar seguro-desemprego, auxílio-doença e pensão por morte. Ao mesmo tempo em que trataram de alimentar sua aliança econômica com os banqueiros e os empresários, com inúmeros danos para os trabalhadores (perda de direitos trabalhistas, rebaixamento da massa salarial, informalidade e precarização no trabalho e, agora, aumento do desemprego), os governos do PT também priorizaram as suas alianças políticas com os partidos tradicionais, a começar do PMDB, mais PR, PRB, PP, PTB e outras siglas menores. Por isso mesmo não se pode dizer que tenha ocorrido alguma contradição entre a vitória de Dilma, em 2014, e o aumento das forças conservadoras no Congresso Nacional – dominado pelo reacionarismo evangélico, pelos ruralistas e pelas bancadas da truculência punitiva e policial contra qualquer avanço no campo dos direitos humanos, da cultura e do comportamento. A direção do Partido dos Trabalhadores, pelas opções que fez, pelo caminho que escolheu e pela aliança maldita com os donos do capital, é sim a grande responsável pela difícil conjuntura do país, com grave crise econômica e política e com acelerado agravamento da situação social. Só mesmo a mobilização e a articulação das organizações sociais combativas, dos setores populares e assalariados, dos sindicatos e partidos de esquerda, possibilitará a constituição de uma frente capaz de retomar o processo por uma sociedade justa, igualitária, livre e soberana. O Brasil precisa de projetos coletivos, inclusivos e voltados para a maioria do povo. Precisa de reformas estruturais, e não de meros paliativos que alimentam as ilusões efêmeras. Leia também: ‘Ajuste fiscal vai liquidar com os mais frágeis e concentrar a renda’ – entrevista com Guilherme Delgado Reforma Política proposta pelo atual Congresso eliminará de vez a voz da sociedade – entrevista com Chico Whitaker ‘Lulismo vive seu momento mais difícil, mas não podemos ainda

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decretar seu fim’ – entrevista com André Singer ‘Governo paga o preço pela ação despolitizadora do último período’ - entrevista com Gilmar Mauro, do MST ‘Hegemonia lulista pode estar se esfacelando’ – entrevista com Ruy Braga Falência do PT gera instabilidade política – entrevista com Ricardo Antunes Guilherme Boulos: ‘O modelo petista de governabilidade se esgotou’ Hamilton Octavio de Souza é jornalista e professor.

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Segunda, 10 de agosto de 2015

Por que odiar o PT http://www.ihu.unisinos.br/noticias/545520-por-que-odiar-o-pt

"Caros amigos que odeiam o PT: podem ter certeza de que odeio o PT tanto quanto vocês – mas por razões diferentes. Odeio porque ele cumpriu a promessa de continuidade. Odeio porque ele não rompeu com os esquemas que o antecederam. Odeio por causa de Belo Monte e do total descompromisso com qualquer questão ambiental e indígena. Odeio porque nunca os bancos lucraram tanto. Odeio pela liberdade e pelos ministérios que ele deu ao PMDB. Odeio pelos incentivos à indústria automobilística e à indústria bélica. Odeio porque o Brasil hoje exporta armas para Iêmen,Paquistão, Israel e porque as revoltas do Oriente Médio foram sufocadas com armas brasileiras. Odeio porque acabaram de cortar 3/4 das bolsas da Capes", escreve Gregorio Duvivier, ator e escritor, um dos criadores do portal de humor Porta dos Fundos, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 10-08-2015. Eis o artigo. A primeira vez que me deparei com uma urna eletrônica foi para votar no Lula. E Lula se elegeu, depois de três tentativas malfadadas. Lágrimas grossas escorriam pelo meu rosto: com a prepotência característica dos 16 anos, tive a certeza de que era o meu voto que tinha feito toda a diferença.

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A rua estava cheia de pessoas da minha idade que tinham essa mesma certeza. O Brasil tinha acabado de ganhar uma Copa do Mundo, mas a euforia agora era ainda maior: foi a gente que fez o gol da virada. Parecia que o Brasil tinha jeito, e o jeito era a gente –essa gente que nasceu de 1982 a 1986 e votava agora pela primeira vez.

Acabaram-se os problemas do Brasil – a gente chegou. Lembro das ruas cheias, das bandeiras do PT, lembro de abraçar desconhecidos na Cinelândia – Lula lá, brilha uma estrela. Logo vi que não era o meu voto que tinha feito o Lula se eleger, nem o dos meus amigos, nem o da minha geração. Quem elegeu o Lula – isso logo ficou claro – foi o José Alencar, os Sarney, o Garotinho, foi aquela Carta aos Brasileiros e a promessa de que o Lulinha era Paz, Amor e Continuidade. Sobretudo continuidade. Lula só alugou esse apartamento por quatro anos porque assinou um contrato de locação onde prometia entregar o imóvel i-gual-zi-nho. E Lula, por quatro anos, foi um inquilino dos sonhos –tanto é que renovou o contrato e ainda foi fiador da locatária seguinte. Fizeram algumas mudanças –as empregadas passaram a ganhar mais–, mas não fizeram o mais importante: uma desratização. Muito pelo contrário: os ratos de sempre fizeram a festa. Caros amigos que odeiam o PT: podem ter certeza de que odeio o PT tanto quanto vocês – mas por razões diferentes. Odeio porque ele cumpriu a promessa de continuidade. Odeio porque ele não rompeu com os esquemas que o antecederam. Odeio por causa de Belo Monte e do total descompromisso com qualquer questão ambiental e

indígena. Odeio porque nunca os bancos lucraram tanto. Odeio pela liberdade e pelos ministérios que ele deu

ao PMDB. Odeio pelos incentivos à indústria automobilística e à indústria bélica. Odeio porque o Brasil hoje exporta

armas para Iêmen,Paquistão, Israel e porque as revoltas do Oriente Médio foram sufocadas com armas brasileiras.

Odeio porque acabaram de cortar 3/4 das bolsas da Capes.

O PT é indefensável – cavou esse abismo com seus pés. Mas assim como não fomos nós que elegemos Lula,

engana-se quem vai às ruas e acha que está tirando Dilma do poder. Quem está movendo essa ação de despejo são

os ratos que o PT não teve coragem de expulsar.

“Faz 20 anos que a esquerda só pensa em

eleição”, alerta João Pedro Stedile

Em entrevista ao portal Sul 21, o coordenador nacional do MST questiona:

“Qual é o programa que essa classe média apresenta para sair da crise?

Golpe na Dilma! Mas isso não é programa, não resolve nenhuma das três

crises.”

24/08/2015

Por Marco Weissheimer,

Do Sul 21 - http://brasildefato.com.br/node/32752

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Há alguns meses, ou mesmo anos, João Pedro Stédile, uma das principais

lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), vem

repetindo algumas advertências dirigidas à esquerda brasileira, relacionadas à

evolução da conjuntura política nacional e internacional. Um dessas principais

advertências consiste em alertar sobre a importância de não resumir a luta

política à luta eleitoral e de não sucumbir às armadilhas da política tradicional,

como abraçar o financiamento privado de campanhas como um método natural

de fazer política. A crise política iniciada após a reeleição de Dilma Rousseff e

a ofensiva da oposição e dos setores mais conservadores do país com o

objetivo de derrubar a presidenta eleita pelo voto popular recolocou essas

advertências na ordem do dia.

Na última sexta-feira, Stédile esteve em Porto Alegre para participar de um

debate na abertura do 14º Congresso Estadual da Central Única dos

Trabalhadores (CUT). Em entrevista ao Sul21, ele falou sobre a conjugação de

três crises no presente – econômica, política e social –, sobre as

movimentações de seus principais protagonistas e seus possíveis

desdobramentos. E apontou aquele que considera ser o principal desafio da

esquerda neste período: “Construir força popular organizada. A esquerda

desaprendeu a fazer trabalho de base, de conscientizar o povo, de fazer

pequenas reuniões. Faz 20 anos, que a esquerda só pensa em eleição”, disse

Stédile.

Sul21: Na última semana, tivemos uma nova série de manifestações

contra e a favor da presidenta Dilma Rousseff e a denúncia oferecida

contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-

RJ). Na tua opinião, como esses eventos influenciam no atual clima de

instabilidade política que marca a conjuntura nacional?

“Até agora, só foram para a rua os militantes" | Fotos: Guilherme

Santos/Sul 21

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João Pedro Stédile: O Brasil está vivendo um período muito confuso e

complexo onde, a cada semana, surgem fatos que complicam mais ainda a

leitura da conjuntura na qual inserem esses dois episódios que citou na tua

pergunta. Essa complexidade, na avaliação do MST e dos movimentos sociais

como um todo, deve-se ao fato de estarmos vivendo um período que conjugou

três crises.

Temos uma crise econômica, que afeta a economia brasileira que não cresce

há dois anos e deve ficar ainda mais uns dois sem crescer, com um forte

processo de desindustrialização que já se reflete inclusive na classe

trabalhadora, com aumento do desemprego e diminuição do salário médio.

Temos também uma crise social, cuja ponta do iceberg apareceu nos protestos

de junho de 2013. O governo adotou uma retórica de diálogo, porém, todos

aqueles problemas sociais que eram substrato para as mobilizações de junho,

nenhum deles se resolveu, pelo contrário. Os problemas da moradia, do

transporte público, do acesso à universidade, todos eles se agravaram. Essa

crise social ainda não eclodiu, está latente, mas existe. E, por fim, temos uma

crise política cuja origem é o sequestro da democracia brasileira feito pelos

capitalistas por meio do financiamento privado das campanhas eleitorais. As

dez maiores empresas do país financiaram cerca de 70% dos parlamentares,

processo este que gerou os Cunha da vida e os seus 300 aliados. Hoje, a

população não se reconhece nos políticos. Diversas pesquisas de opinião

apontam os políticos com o menor índice de credibilidade. Então, temos uma

dicotomia aí. O que acontece na política não reflete na sociedade, ou só reflete

negativamente.

Todos os dias nós temos evidência dessas três crises. Se lermos o Valor

Econômico, por exemplo, veremos os reflexos da crise econômica. Se

consultarmos os movimentos populares ouviremos relatos de todos eles sobre

os problemas sociais que vem se avolumando. E, na política, é o que você

citou. Todo dia temos fatos novos.

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Sul21: E quais são, na sua avaliação, os possíveis desdobramentos dessa

conjugação de crises?

A dificuldade para sair dessa crise geral é que as classes ainda não se

puseram de acordo sobre o que fazer. Seria preciso criar um novo bloco

histórico e social que se constituísse numa maioria capaz de encontrar a saída.

Isso, em geral, se materializa em períodos eleitorais. O problema é que nós

acabamos de sair de uma eleição. Então, nós vamos levar quatro anos,

durante todo o governo Dilma, para encontrar essa maioria. Essa é a

dificuldade.

Nessas tentativas de saída de crise, o que está sendo mais ou menos

sinalizado? A burguesa, no sentido clássico do termo, mais conhecida como os

empresários ou o poder econômico, já apresentou a sua proposta de saída.

Não é um programa formalizado, mas vem sendo apresentado em suas

reuniões e discursos. Essa proposta consiste em realinhar a economia

brasileira aos Estados Unidos, que foi um pouco o que aconteceu em 1964. A

ideia é que os americanos venham para cá, invistam e tirem a economia da

crise, ampliando o mercado para as empresas brasileiras que entrariam de

maneira subalterna numa relação com a economia industrial norte-americana.

Em segundo lugar, consiste em diminuir o papel do Estado, que hoje se

expressa nas propostas de cortar gastos sociais, de diminuir o número de

ministérios, de diminuir os gastos com a Previdência, etc. Tudo isso é firula

para voltar a velha tese de que o mercado é que resolve. Em terceiro lugar, é

diminuir o custo da mão de obra. Esse é o programa deles, que ainda não pode

ser explicitado, pois, em sua essência, esse programa é o neoliberalismo, que

foi derrotado nas últimas quatro eleições. Eles não podem simplesmente

apresentá-lo de novo. Precisam dourar a pílula.

Então, a burguesia está fazendo esse movimento para tentar construir uma

maioria em torno do seu programa. Como fazem isso? Pautando essas

propostas no Congresso Nacional. Todas as iniciativas do bloco do Eduardo

Cunha caminham na direção desse programa: diminuir custo, diminuir Estado,

privatizações, abrir a economia e reaproximá-la com os Estados Unidos. Além

disso, também pautaram o Judiciário e a grande mídia comercial, da qual a

Globo é a grande porta-voz. Esse movimento representa o maior grau de

unidade que eles conseguiram até agora, com manifestações da Firjan

(Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), do Renan Calheiros, presidente

do Senado, e com setores do PSDB. Tenho absoluta convicção, pela recente

entrevista do Mendonça de Barros, que Serra e Alckmin, embora não possam

aparecer publicamente, concordam com esse programa. Mas eles não podem

aparecer.

“A esquerda desaprendeu a fazer trabalho de base, de conscientizar o

povo"

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Sul21: Você referiu o movimento que vem sendo articulado pelo grande

empresariado e seus braços políticos para a superação da crise. E

quantos aos demais setores da sociedade, é possível vislumbrar alguma

movimentação que busca saídas para os atuais impasses?

Nós temos outro segmento, que é a chamada classe média, ou pequena

burguesia como denominava Marx. Estamos falando aqui daquela classe

média que o Marcio Pochmann menciona no Atlas da Exclusão Social, que,

pela renda que tem, representa entre 5 e 10% da população e que sonha um

dia em virar burguesia. Qual é o programa que essa classe média apresenta

para sair da crise? Golpe na Dilma! Mas isso não é programa, não resolve

nenhuma das três crises. Por isso que a burguesia, que é mais esperta, está

dizendo para eles: Calma, vocês podem ficar latindo aí na Paulista, em

Copacabana, mas isso não é saída para a crise.

O próprio Temer disse isso para eles quando afirmou que não adiantava

colocá-lo no lugar da Dilma, pois a crise tem outras raízes. Pelo contrário, se

houvesse um golpe institucional, se criaria uma quarta crise, uma crise

institucional, que levaria os movimentos sociais e populares para as ruas. Isso

desarrumaria todas aquelas regras do Estado burguês que, apesar da crise

política, todo mundo segue respeitando. Se isso acontecesse, por que não

poderíamos, por exemplo, pedir o impeachment do Sartori ou do Alckmin, cujas

campanhas também foram financiadas por empresas privadas. Então, a saída

dessa classe média é burra. A nossa sorte, e a deles também, é que

representam uma parcela muito pequena da sociedade. É por isso que as

mobilizações deles não aumentam. E tem que ser feitas sempre no domingo,

né? É muito mais um festival, ao qual eles têm direito, do que propriamente

uma luta política.

Do lado de cá, temos a classe trabalhadora, que não está conseguindo

apresentar um programa de saída para a crise. Neste momento, as direções de

organizações como CUT, UNE, MST, os movimentos de luta pela moradia,

estão tentando unificar uma agenda. O que conseguimos construir de unidade

até aqui é um programa defensivo contra o golpe, em defesa dos direitos,

contra o neoliberalismo, ou seja, é uma defesa do passado, não é avançar

como nós queremos. Então, para a classe trabalhadora também está sendo

difícil construir um programa propositivo capaz de retomar a ofensiva na

direção das mudanças que defendemos. Essa é uma dificuldade real e é neste

ponto em que nós estamos.

Sul21: Quais as perspectivas de superar essa dificuldade?

Espero que, nos próximos meses consigamos avançar na direção desta

unidade da classe trabalhadora para construir um programa, não defensivo,

mas que apresente propostas para a saída das crises econômica, política e

social. Talvez já tenhamos uma maior unidade no tema da crise política, com a

defesa de uma Reforma Política construída por meio de uma Assembleia

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Nacional Constituinte. Este Congresso não fará essa reforma e os partidos não

têm força para aprová-la no cenário atual. No fundo, a saída de um programa

construído pela classe trabalhadora vai depender de um componente que ainda

não está no cenário, que é a classe trabalhadora se mobilizar e ir para a rua.

Até agora, só foram para a rua as mediações, os militantes. A grande massa

segue sentada em casa assistindo tudo pela televisão. Por isso que as nossas

mobilizações também têm mantido o mesmo tamanho.

Contudo, essa massa e as nossas mediações têm uma arma potente que ainda

não foi usada: a greve geral, que afeta diretamente o lucro dos capitalistas. A

perspectiva de parar a produção um dia, dois dias, uma semana, coloca em

pânico a burguesia. No fundo, esse é o maior medo que eles têm. Por isso não

querem ver o circo pegar fogo, pois a lona cairia também sobre as suas

cabeças.

Sul21: Você mencionou algumas organizações há pouco que estão

tentando unificar uma agenda comum e não mencionou nenhum partido

político entre elas. Considerando que o partido que vem governando o

Brasil há 13 anos atravessa uma série crise política e os demais partidos

de esquerda parecem não ter força para apresentar uma alternativa, a

conjuntura está convocando os movimentos sociais a assumir um maior

protagonismo, a exemplo do que ocorreu na Bolívia há alguns anos?

É evidente que os partidos políticos no Brasil, tanto os da burguesia quanto os

da esquerda, estão em crise. Os da burguesia foram substituídos pela Globo.

Quem dirige ideologicamente as ideias da direita no Brasil é a Globo. Os

dirigentes partidários da direita brasileira estão completamente desmoralizados.

Estão aí os Eduardo Cunha, os Ronaldo Caiado da vida. E a esquerda precisa

fazer uma autocrítica séria porque caiu só no eleitoralismo e, mesmo nesta

esfera, não se preocupou em defender uma reforma política. Ao invés disso,

fez o jogo da burguesia, abraçando o financiamento privado das campanhas e

caindo na arapuca que a Lava Jato expressa. Se não mudarmos as regras

políticas, não vai ser de dentro dos partidos que virá a solução. Os partidos já

estão enlambuzados. Uma reforma política rejuvenesceria os partidos mas

estes não têm força para colocar massa na rua em defesa dessa reforma.

Então, isso só poderá ser feito por meio de uma ampla coalizão de todas as

forças populares, com todas as formas de mediação de que a classe

trabalhadora dispõe, sejam pastorais, sindicatos, movimentos populares,

partidos, etc.

Agora não é o momento de discutir quem vai ser protagonista, mas sim de

juntar todas as forças para fazer um debate na sociedade e junto às nossas

bases sobre quais são as saídas para a crise que está posta e é inegável. Eu

não sei como será essa saída. Isso dependerá da correlação de forças e da

dinâmica da luta de classes. Acho muito ruim queremos copiar algum exemplo.

Tenho visto algumas pessoas dizendo que temos seguir o exemplo do

Podemos, da Espanha, ou do Syryza, da Grécia. A história da Espanha é outra

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e o Tsipras durou apenas três meses. Então, cada país tem a sua dinâmica e

nós, brasileiros, teremos que inventar a nossa. A ousadia que nos cabe é

inventar. Quando quisemos copiar, erramos. Quisemos copiar o modelo do

financiamento privado de campanhas. Deu no que deu. O componente principal

da ousadia que precisamos ter é que precisamos levar esse debate para as

massas e fazer com elas se mobilizem e decidam ir para as ruas, criando uma

efervescência, um novo dinamismo na política brasileira. No meio dessa

efervescência, também vão surgir novos líderes. Não adianta ficar olhando

para trás e procurando onde estão os líderes do passado. A dinâmica da luta

de classes vai

forjar novas

lideranças e novas

formas de

organização

também.

Sul21: Na tua

opinião, há um

avanço de ideias

e valores

conservadores

no Brasil, de uma

direita mais

orgânica e

extremada, ou é

muita fumaça o

que está

aparecendo nas

ruas?

Eu acho que é muita fumaça. Nas raízes do povo brasileiro há energias muito

saudáveis. O povo brasileiro é solidário, trabalhador e digno. Agora, essa

fumaça é resultado da hegemonia ideológica da burguesia nos meios de

comunicação. A Globo é a principal responsável pela projeção desses falsos

valores, desse negativismo que afirma que todo mundo é corrupto. Ela projeta

essas ideias e valores todos os dias, em suas novelas, em seus noticiários. Aí

devemos buscar a causa dessa fumaça que esconde a realidade. E nós não

temos meios de comunicação de massa alternativos. Ficamos lutando em

trincheiras, com uma página aqui, um boletim ali. Não temos um meio de

comunicação nacional que consiga fazer esse debate com a sociedade. O que

está faltando na sociedade brasileira é debate sobre os seus problemas e suas

possíveis soluções.

Sul21: Neste momento, há vários grupos se reunindo e discutindo a

necessidade de formação de novas frentes de esquerda e de setores

progressistas da sociedade. Esses grupos vêm conversando entre si?

“A dificuldade para sair dessa crise geral"

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Do ponto do vista do diagnóstico, todo mundo está com a mesma leitura, ou

seja, que a crise é grave, complexa e vai demorar. Mas não há unidade quanto

às possíveis saídas. Não tem um programa. Como estão se movendo as

forças, acredito que teremos várias frentes. Nós estamos colocando energia na

construção de uma que já tem nome, a Frente Brasil Popular, que junta

partidos tradicionais, movimentos populares, a UNE, o Levante Popular da

Juventude, as pastorais, entre outras organizações. Nós vamos fazer uma

conferência nacional dia 5 de setembro em Belo Horizonte para ver se

avançamos em nosso programa. Mas acredito que outros grupos de esquerda

vão formar outras frentes, alguns porque tem uma vocação mais eleitoral e

querem tirar proveito dessa crise do PT.

No entanto, não creio que uma frente de esquerda limitada em sua base social,

por mais clareza ideológica que tenha, consiga acumular força. Agora, mais do

que saber para onde tu tem que ir, é preciso ter força social acumulada. E, em

períodos de crise, para ter essa força social acumulada, é preciso contar com

todos os que querem mudanças, sem exclusão ideológica. No caso da Frente

Brasil Popular, o espectro de forças com que estamos trabalhando é quem

votou na Dilma no segundo turno, que não são poucos. Se conseguirmos

aglutinar numa frente cerca de 54 milhões de brasileiros, teremos uma força

suficiente para impulsionar mudanças dentro do governo e se preparar para o

pós-Dilma.

Sul21: Uma última questão. Se fosse possível definir numa frase o

principal desafio que a esquerda brasileira tem hoje, qual seria ela na tua

opinião?

Construir força popular organizada. A esquerda desaprendeu a fazer trabalho

de base, de conscientizar o povo, de fazer pequenas reuniões. Faz 20 anos,

que a esquerda só pensa em eleição. Temos que parar um pouco de pensar

em eleição. Não que a eleição não seja importante. Claro que é importante,

pois faz parte da democracia. Nós temos feito bons diálogos com o Tarso

(Genro) no sentido de que a esquerda precisa recuperar mais o Gramsci.

Como viveu num momento de crise do movimento operário italiano, ele tem

reflexões que são apropriadas para o período que estamos vivendo. Entre as

várias contribuições de Gramsci, uma delas é essa visão de que na luta por

mudanças sociais, a luta de classes se manifesta em todos os espaços da vida

social. Aparece numa rádio comunitária, num sindicato, num bairro, numa

igreja, num jornal, numa fábrica, no comércio, numa praça. Todos são espaços

de disputa. E nós, no passado recente, reduzimos tudo isso à disputa eleitoral.

Precisamos preparar a classe trabalhadora para que ela possa disputar, com

as suas ideias, todos os espaços da vida social, pois tudo isso é poder político,

não só o governo. Para isso, precisamos também recuperar o trabalho de

formação de militantes, que a esquerda abandonou. Há uma juventude aí que

está a ver navios. A formação política é o casamento permanente entre luta de

massas e formação teórica. E a esquerda não fez nenhuma das duas coisas

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neste último período. A luta de massa foi reduzida à eleição e a formação

teórica foi abandonada. Felizmente, a direita está recolocando em nossa pauta

a importância da luta de massa. Se não formos para a rua disputar com eles,

eles vêm pra cima de nós.

Será a novíssima República – e que república!

****

Christian Edward Cyril Lynch é professor assistente do Departamento de

Direito Público da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador

bolsista da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). Reside atualmente na

cidade do Rio de Janeiro. Seu eletrônico é [email protected].

MINO CARTA: CADÊ A ESQUERDA?

Ele quer que o PT se penitencie. A penitência dele deveria vir em dobro por Mino Carta — Carta Capital

Houve tempo em que o PT foi crível, mas o tucanato nunca enganou Meus inquietos botões permitem-se a dúvida: não teriam mentido inúmeros nativos que se apresentavam como esquerdistas convictos? Responde, indiretamente, a peremptória afirmação de quem entende superada a questão e obsoleta a indagação dos botões, ambas a cheirar a bolor, como a exalar de um velho baú abandonado no sótão. Batem na mesma tecla desde a queda do Muro de Berlim. De minha parte, fico com a lição do Norberto Bobbio, e ouso a constatação de que coincide (estranhamento? Surpreendentemente?) com a palavra de papa Francisco: intransponível a dicotomia entre luz e treva, bem e mal, Deus e Diabo, se quiserem, ser de esquerda significa defender a igualdade, pois a liberdade por si só acaba por valer somente para poucos. Tanto mais no Brasil da casa-grande e da senzala, ainda de pé, implacáveis. Penso em José Dirceu e em tantos outros, que ganharam fama de guerrilheiros da igualdade ao sabor de ideologias mais ou menos contingentes. Penso nos rebeldes que hoje pretendem voar com as asas inúteis do tucano, ou na patética turmeta da chamada Libelu, mais fanáticos do que o fanatismo no seu empenho medieval. Entre estes milita certo Antonio Palocci, ainda dará o que

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falar além do que já se falou. Grande Operador, como P. C. Farias, mas este, ao menos, nunca se disse de esquerda. Quando, do alto da boleia de um caminhão, José Dirceu exibia às calçadas a camisa ensanguentada do estudante assassinado pela ditadura, cerca de 50 anos atrás, acreditava na fé que aparentemente o movia? Não me atiro a negar. Nego, porém, qualquer semelhança entre aquele e o atual, lobista do banqueiro Daniel Dantas e outros graúdos. O mesmo Dantas que já ofereceu apoio ao jornalista (jornalista?) criador do site 247, o preferido do PT, embora ele tenha passado boa parte da vida a agredir o próprio partido e seus governos, sem hesitar em mentir, omitir e inventar. E ainda lhe pagam os serviços. Figura central, e sempre protegida neste enredo trágico, o fantasmagórico DD, inatingível, cabe suspeitar, porque dono dos segredos da República. Houve, em tempos tucanos, quem pretendesse torná-lo ministro, declinada a oferta com a seguinte observação: “Serei mais útil no bastidor”. Márcio Thomas Bastos, apressadamente santificado, sabia disso tudo, bem como José Dirceu, que pressionou para que o disco rígido do Opportunity capturado pela Operação Chacal fosse jogado ao lixo. Foi atendido. Se me dissessem, faz 35 anos, que o PT no poder se portaria como todos os demais partidos (partidos?) brasileiros, excluiria a possibilidade. Não havia, então, qualquer dúvida de que o partido nascia à esquerda, e valia confiar em quem o fundava. Que sobrou daquela plataforma ideológica, daquele programa, corajoso e justo? A imagem de uma agremiação à deriva, esmagada por seus erros e pelo vácuo de quadros, incapaz de definir uma linha diferente, oposta mesmo, àquela dos clubes recreativos dos donos do poder. Neste momento, não como petista que nunca fui, como cidadão simplesmente envolvido nos destinos do País e como jornalista honesto, declaro espanto e desalento, diante de um espetáculo em que se mesclam incompetência e cobiça. Elementar, chã, primitiva, a cobiça dos falsos líderes. Sejamos claros, contudo: a traição do PT a si mesmo estava desenhada desde o primeiro mandato de Lula e CartaCapital não deixou de registrá-la. Quanto ao tucanato, Fernando Henrique à testa, nunca me enganou. Neste exato instante, o ex-presidente social-democrata (social-democrata?) pede que o PT pecador faça ato de contrição, aquele que lhe caberia em dobro: durante seu governo FHC quebrou o País três vezes, aumentou a dívida e esvaziou suas burras, comprou votos parlamentares para se reeleger e comandou a maior bandalheira-roubalheira da história. Agora não hesita em desenrolar sua versão a respeito do encontro que não houve com Lula. Mais uma aula de hipocrisia e desfaçatez.

Texto: / Postado em 10/08/2015 ás 16:58

Crise discursiva do PT: entre tabus

e autoproclamação

JOANA SALÉM VASCONCELOS - 07 agosto 2015

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O mais recente programa televisivo do PT, veiculado no dia 6 de agosto, confirma que diante da “crise econômica” e da “crise política”, deflagrou-se no partido uma acelerada e profunda “crise discursiva”. Como era de se esperar, a imagem de Lula foi largamente explorada como última boia de salvação. Entretanto, sem poder preservar-se do clima de desencanto, Lula também aparece sem novidades. Grosso modo, a crise econômica “faz parte”, o ajuste “eu também fiz”, a crise política é “intriga da oposição”. Ao invés de reinventar-se com transparência e combate, o discurso petista se tornou uma versão muito piorada de si mesmo, cada vez mais defensivo e inofensivo. Enquanto na esfera econômica lança mão daquele manjado festival de autoproclamações, na esfera política, acumulam-se os tabus, que só oxigenam o conservadorismo. A habilidosa construção da propaganda lulista na primeira década de governo PT/PMDB conseguiu emplacar uma marca de sucesso, discursivamente alicerçada na ideia de que pela primeira vez na história do país alguns problemas estavam sendo resolvidos. Há que se reconhecer que, apesar de autoproclamatório, o bordão “nunca antes na história desse país” não era uma pura fantasia das elites petistas, transformadas por seus marqueteiros bilionários em incríveis peças cinematográficas. Pensar isso seria simplesmente subestimar a população brasileira, que reforçou sua preferência por três eleições seguidas (2006, 2010, 2014). Tal bordão, linha essencial do discurso petista, possuía algum lastro na realidade, sintonizando-se com uma percepção difusa de melhora das condições gerais de vida da população, especialmente os mais pobres. O fato é que as classes trabalhadoras brasileiras, desde 1964 até 2004, foram governadas por forças políticas profundamente antipopulares. Desde Jango não se sentia os efeitos do aumento real de poder de compra dos mais pobres. Mesmo que as políticas sociais do neoliberalismo petista tenham sido superficiais e não tenham alterado a estrutura da segregação social no Brasil, seus impactos foram percebidos pela subjetividade popular como um gigantesco salto adiante, uma mudança extremamente concreta, tecendo um vigoroso laço de confiança que ligou o discurso petista às massas. Agora, diante dos olhos destes milhões de trabalhadores, o lulismo está virando fumaça. Conforme a crise econômica chegou, a distância entre a dura realidade do capitalismo periférico brasileiro e a fantasiosa percepção sobre o suposto controle que o lulismo teria de sua própria estratégia só cresceu. É possível dizer que a propaganda lulista foi de uma enorme desonestidade intelectual do PT. Como insistiu André Singer, o lulismo foi uma combinação entre virtú e fortuna. A janela de oportunidades não foi aberta pelo PT, mas, sim, aproveitada pelo

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partido. Por meio dela, o neoliberalismo foi declinado a social-liberalismo, mas as condições históricas que o permitiram não estavam e nunca estiveram sob controle. A desonestidade intelectual petista foi alçar a si próprio ao papel de messias, protetor dos pobres e dos oprimidos, produzindo uma fantasia farsesca de que o capitalismo brasileiro alcançava a autodeterminação pelas mãos mágicas de um metalúrgico (às vezes pergunto-me se a cúpula petista realmente acredita nisso). Enquanto isso, aprofundava-se o caráter primário-exportador da nossa economia, cegada pela inflação de commodities, modernizava-se nossa posição neocolonial no sistema econômico mundial e perpetuava-se religiosamente o pagamento dos abusivos juros da dívida pública, esta a verdadeira espinha dorsal da corrupção que assalta nosso Estado. Tudo era comemorado com ufanismo, inclusive a queda dos juros, o que durou menos de um ano e meio. O chamado ensaio desenvolvimentista de Dilma evaporou ao menor sinal de “greve dos investidores”. Houve quem acreditasse que a burguesia industrial brasileira poderia ser menos rentista... Enfim, em um arranjo institucional que só poderia existir no quadro de um crescimento econômico excepcional, alavancado de fora para dentro pelo efeito-China, o PT rendeu-se às exigências do peemedebismo, que também se beneficiou da liderança extraordinariamente carismática para coordenar suas chantagens nos bastidores. Agora o arranjo da governabilidade ruiu, junto com o crescimento econômico. Contudo, o PT não notou que seu discurso, tanto quanto sua estratégia, tornou-se obsoleto. Prossegue sua ladainha de autoproclamações e recrudescem-se os tabus. No programa de TV, nenhuma palavra sobre reforma política ou Operação Lava Jato, o oxigênio da crise política. Nenhuma palavra, como sempre, sobre o monopólio das comunicações, veículos panfletários da crise política. Nenhuma palavra sobre a redução da maioridade penal na “pátria educadora”, resultado direto da crise política. Nada sobre o PL das terceirizações, principal retrocesso no horizonte da classe trabalhadora brasileira. Nenhuma palavra sobre as “mais mudanças” que marcaram as peças de marketing do estelionato eleitoral vivido em 2014. Obviamente, enfim, nenhuma palavra sobre os “investimentos” do dinheiro dos cidadãos brasileiros nos juros da dívida pública, que alcançaram mais do que a soma de todos os investimentos em programas sociais, educação e saúde públicas - números estes que fazem parte do arsenal de autoproclamação. O lastro real da autoproclamação petista se corrói a uma velocidade impensável. Ao mesmo tempo, a multiplicação dos tabus cria as condições de um trágico suicídio político. Ao obstruir o debate sobre os verdadeiros problemas do país e os poderosos interesses que deveriam ser enfrentados para resolvê-los, o PT joga água no moinho do conservadorismo, que está destinado a derrotá-lo. Quanto mais demonstra subserviência diante das exigências da governabilidade peemedebista, quanto mais alardeia que o ajuste neoliberal é a única e inevitável saída, mais insufla e fortalece seus

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supostos inimigos. A crise discursiva do PT é reflexo de que a fantasia lulista só não se desfez para o petismo. Tal crise discursiva só poderia ser superada com uma verdadeira mudança de estratégia. Mas a cúpula do partido está narcisicamente obcecada pelo retrovisor. Ainda enxerga como obra sua algo que só foi possível devido a um extraordinário golpe de sorte da conjuntura. Acredita com tanto afinco na estratégia lulista que não consegue admitir seu esgotamento, destinando-se a tornar-se uma imitação piorada e fracassada de si mesmo. Leia também: Não basta Nota – coluna de Wladimir Pomar ‘A depender de governo e oposição, caos social vai se aprofundar’ – entrevista com historiador Marcelo Badaró A fórmula mágica da paz social se esgotou – Paulo Arantes, especial para o Correio “O mais provável é o governo Dilma se arrastando nos próximos três anos e meio” – entrevista com o deputado federal Chico Alencar Lava Jato faz avançar a luta contra a impunidade – artigo do jornalista Hamilton Octavio de Souza Joana Salém Vasconcelos é historiadora.

A publicação deste texto é livre, desde que citada a fonte e o endereço eletrônico da página do Correio da Cidadania

AS MANIFESTAÇÕES DE 12 DE ABRIL

Abril 2015

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Manifestação Av. Paulista SP – abril12 – 250 mil

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A cara das manifestações de 12 de abril

Paulo Timm

“Um bom pacto ajuda mais do que uma custosa cirurgia institucional”.

Paulo Fábio Dantas Neto, professor da Universidade Federal da Bahia

“A análise instigante do cientista político baiano ajuda a que se entenda,

por exemplo, que o “fora Dilma” de hoje não contém em si nenhum passo

à frente. As manifestações que têm se sucedido no País estão soltas no

ar, carentes de cálculo racional e politização. Alimentam-se mais de

decepção, ressentimento e frustração do que de busca de saídas

coletivas.”

Marco Aurelio Nogueira – abril 12 ESP

http://politica.estadao.com.br/blogs/marco-aurelio-nogueira/crise-do-

governo-dilma-excita-as-ruas-e-desafia-a-elite-politica-do-pais/

“Bem sei que se trata de caminho longo e difícil. Não se pode esquecer

que na vida política o essencial é fixar um objetivo claro para o bem da

comunidade, e lutar por ele. Não é deixar as coisas como estão, para ver

como ficam”.

Fábio Konder Comparato é jurista e professor emérito da USP http://www.cartacapital.com.br/revista/843/uma-triste-nulidade-1714.html

“Não se trata do número de pessoas que as manifestações de hoje reuniu. Menos gente nas ruas não significa menor insatisfação; ao

contrário, pode até significar um aumento da desesperança, o

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represamento de uma revolta que pode retornar mais forte depois de algum tempo”

Marina Silva in

“As ruas, sempre as ruas” publicado –http://bit.ly/1FzzLY0

A maior parte dos protestos recentes, caracterizados pela

convocatória via internet e redes sociais, a exemplo dos Indignados

da Espanha, do Occupy Wall Street e as manifestações de 2013,

fracassaram. Mais progressistas ou mais conservadores, esses

movimentos têm algumas características comuns: são marcados

por forte conteúdo antipolítico e antipartidário e são avessos à

liderança e à organização. As redes sociais se apresentam, assim,

como a potência e, ao mesmo tempo, como o limite desses

movimentos.”

Aldo Fornazieri in “O esvaziamento das manifestações e o triunfo da mesmice”

- HTTP://JORNALGGN.COM.BR/NOTICIA/O-ESVAZIAMENTO-DAS-MANIFESTACOES-E-O-TRIUNFO-DA-MESMICE-POR-

ALDO-FORNAZIERI#.VSUQV58-IEO.FACEBOOK

Depositam-se hoje, vejam só, o grosso de muitas esperanças sobre Michel Temer. Conseguirá o vice, discreto e profissional, colocar ordem

na lambança de modo a recuperar a paz da “bagunça organizada” que já tivemos? Não se sabe, ainda. Mas, mais que isto, é certo, não fará. O

presente se conforma nessa besta híbrida do presidencialismo sem poder e do parlamentarismo sem credibilidade à deriva no labirinto

aparentemente sem saída. O que pode um Temer se não enxergar que, pelo menos por enquanto, há apenas um túnel no fim da luz?

Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.

In “O sistema híbrido, a tempestade e seus responsáveis” -

http://qualidadedademocracia.com.br/2015/04/13/o-sistema-hibrido-a-

tempestade-e-seus-responsaveis/

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Apresentação Manifestações abril 2015_v1.pdf

DOCS.GOOGLE.COM

*

Abre-se, doravante, a avalanche de avaliações das manifestações

de hoje, 12 de abril. Múltiplas interpretações. Uma coisa é verdade:

O movimento, em torno de um milhão de pessoas em todo o país,

não foi um fiasco , nem foi um arrasador protesto. Deixa sua marca.

Claro que cada um dos lados - Opositores e Governistas - vai

procurar enaltecer ou subestimar, respectivamente, o movimento,

de acordo com seus interesses. Aos analistas, nem aplausos nem

velas, apenas tentar compreender e situar o evento no contexto

mais geral de insatisfações populares, evidente no país de junho

de 2013.

O caráter, primeiro, das manifestações é nitidamente anti-Dilma e

anti-PT, portanto , claramente político. Não tem direção política

definida, não tem apoio da sociedade civil organizada e tem como

mecanismo de mobilização as redes sociais. Parece com os

movimentos Occupy e Indignados, mas corre pela direita.

Para o Governo, que procurou subestimar o movimento, retirando-o

do acompanhamento pelo Palácio do Planalto e da interferência da

Presidente no processo, as manifestações demonstram menor

ímpeto do que no mês anterior. Ampara=se o Governo não só nas

estatísticas de presença popular aos eventos, bem menores do que

no mês anterior, como no fato de que as pesquisas de opinião, hoje

divulgadas, mostram um congelamento na queda do apoio à

Presidente, em torno de 13%. Ou seja, o Governo, depois de queda

vertiginosa de apoio, se estabiliza na baixa. Divulga-se, entre-

dentes, que o governo se prepara melhor para futuras

manifestações em seu apoio, evitando, dias antes, divulgação de

medidas controversas , as quais poderiam embaraçar eventuais

participantes, e mobilizando melhor as forças de apoio.

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Os organizadores regionais da manifestação, diversos ao longo do

país, ainda não se manifestaram, mas sabe-se que evitarão novas

manifestações a curto prazo. Devem ter sentido o baque...Aécio

Neves fez uma nota de praxe, sem novidades, ainda marcada pelo

ressentimento da derrota. Zero à esquerda. Marina Silva, mais

equilibrada, retoma o apoio à mobilização como fundamento de

uma nova Política que preconiza.

Quanto à mídia, transcrevo um depoimento irretocável do jornalista

Alberto Villas no Facebook:

"Os jornalistas da GloboNews mostraram hoje que são meio jornalistas e meio atores. Mantiveram a chama do entusiasmo acesa durante todo o dia, tentando convencer os telespectadores que estavam cobrindo o maior acontecimento do

planeta, enquanto cinegrafistas custavam a driblar alguns cartazes pra não espantar o público e juntar gente numa mesma imagem, pra convencer que o

Brasil inteiro estava nas ruas. Não deve ter sido fácil mostrar que aquele fósforo aceso tratava-se do maior incêndio da história. Os analistas, dispenso

comentários. A GloboNews perdeu a cabeça, o juízo e a noção do ridículo. Erraram a mão. Um vexame jornalístico. Nunca tinha visto nada parecido

antes, desde a minha primeira matéria, como foca, pro jornal ‘Estado de Minas’, em 1971."

De uma forma geral, resta, portanto tentar situar melhor as

manifestações e apontar algumas de suas dimensões.

A conjuntura nacional é marcada, claro, por dois fatos interligados:

Um descrédito generalizado do brasileiro nas instituições públicas,

notadamente na Presidente Dilma, forçando-a ao recuo de entregar

as rédeas do Governo para estranhos no ninho, seguindo, nisso,

os conselhos de setores mais experientes do Partido, como o

Presidente Lula. Verifica-se, também, em conseqüência disto tudo

um enfraquecimento do próprio PT, não só em protagonismo, como

em termos de preferência dos eleitores, já em torno de 10% quando

já chegou a perto de 30%, e de filiados. Enfraquecimento não só no

próprio Governo, como na capacidade para orientá-lo. É sabido que

a Direção Nacional do PT, diante do quadro atual, estava a propor

um deslocamento do Governo em sentido inverso, à esquerda, em

busca de uma nova aliança. Esqueceu-se, porém, esta direção de

“combinar com os russos”, como diria o Garrincha diante dos apelos

de Feola. Ou seja, de dizer como isto se faria e como isto ensejaria

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algum tipo de Governabilidade. Governar, enfim, nos marcos

institucionais, com vistas à manutenção e aprofundamento da

democracia, não é o mesmo que organizar uma marcha de

descontentes. Exige rigor teórico, consistência tática e capacidade

de liderança. Concordando com Luiz Eduardo Soares, numa

inspirada postagem no site Gramsci e o

Brasil:http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1775).

, citada por Marco Aurélio Nogueira : “Na melhor das hipóteses, a

ideia de que a saída da crise está à esquerda somente tem como

efeito a reprodução de um discurso bipolarizado que se vale do

simbolismo do “nós” contra “eles” para manter a política em estado

de tensionamento moral e turbulência.”

O momento é particularmente crítico porque finaliza um longo

período cujas origens estão no final do regime militar, quando se

projetaram dois grupos liderados , respectivamente por Lula , à

esquerda, e FHC, a direita. Ambos , com efeito, conduziram e

representaram grande mudança no perfil histórico destas

expressões. Velhos personagens de um e outro lado foram

sepultados , destacando-se, sobretudo Leonel Brizola, que ainda

tentou disputar , com ambos, a liderança da transição política. Não

conseguiu. Perdeu em 1989 e veio a falecer cinco anos depois,

ficando seu Partido à deriva. Outras expressões menores, Roberto

Freire, à esquerda e ,tanto Marco Maciel como Paulo Maluf, à

direita, foram reduzidos à coadjuvantes do próprio projeto tucano.

O PCdoB mereceria uma reflexão mais profunda, pois não se

dissolveu no PT. Soube manter sua identidade e vem crescendo ao

longo das duas últimas décadas. Caso à parte...Mas coube, enfim,

a Lula e FHC, ainda dominantes no cenário nacional, mudar tudo-

Partidos, lideranças, alianças - ainda que avalizados, à distância

pelo PMDB . Este perdeu a capacidade para liderar o processo e

abdicou sabiamente de qualquer papel hegemônico desde 1994.

Mas continuou sendo o maior Partido nacional, com maior número

de Prefeitos e expressiva presença no Congresso Nacional. E onde

há uma crise, lá está ele como fiel da balança. Sempre o PMDB. Na

Republica do Sarney . Na Constituinte. No impeachment do Collor.

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Na barra dos Governos FHC e LULA. E novamente agora, na crise

da Dilma, quando assume a articulação política da governabilidade.

Com a fragilização do PT, o momento fica mais tenso e

imprevisível. Tudo indica que abrirá o espaço para uma reafirmação

do PMDB, que não só já tem o comando virtual do país, como

passa a ter uma alternativa para PRESIDENTE: Temer. Ele seria o

que Paulo Fábio chama de “solução virtuosa” de um novo e grande

arco na pavimentação de um caminho institucional comum até as

eleições de 2018 . Para tanto ele – Michel Temer - deverá fortalecer

seus laços com Renan Calheiros na tentativa de frear o ímpeto do

Presidente da Câmara, E.Cunha. Socialmente, esta grande pugna

ainda pouco perceptível, representaria um enfrentamento entre o

centro cosmopolita da cidade somado às velhas oligarquias

regionais com o turbilhão ascendente das massas suburbanas,

susceptíveis ao canto retrógrado das consignas criacionistas,

machistas e autoritários.

Com isso, o país volta ao que sempre foi: um imenso transatlântico

singrando a modernização pelo centro conciliador. O risco da

radicalização poderia levar, à esquerda, à “bolivarização”, ou , pela

direita , ao Golpe, ambos muito pouco prováveis, não só porque não

chegamos a uma situação de completa anomia e desgoverno, como

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talvez porque subsistam, ainda que em forma fragmentária e com

expressão mais permissivista do que libertária, fundamentos

democráticos na nossa cultura: instituições , costumes, aspirações.

A classe média, que fez a Abolição, que proclamou a República,

que deu o conteúdo tenentista à Revolução de 1930, que sustentou

a modernização industrial nos Anos Dourados e que engrossou a

redemocratização liberal entre 1974 e 1988, deverá ter, novamente,

um papel decisivo neste destino e, como sempre, tenderá para o

centro, beneficiando o PMDB. Não por acaso, aliás, a Presidente

Dilma começa , ainda que intimidada, a afirmar que o projeto social

do Brasil é se transformar num país de classe média. O

deslocamento do eixo de Poder para o PMDB e para o centro,

porém, não se traduz como fascismo, como pretendem alguns.

embora nele estejam inscritas algumas concessões conservadoras,

sobretudo no campo trabalhista. Veja-se, por exemplo, a indignação

do Senador Cristovam Buarque, do PDT-DF, diante do fato de seu

próprio Partido haver votado a favor do projeto da terceirização.

Aliás, aos que condenam em bloco a elite política nacional, como

incapaz de responder às exigências de crise atual, é sempre bom

lembrar, como faz Marco Aurélio Nogueira, cientista político, em

várias de suas análises que esta elite não é nem monolítica, nem

atua como manada. Há nuances, clareiras e tendências em seu

seio, particularmente no maior dos Partidos, o PMDB, até mesmo

pela sua natureza como articulador de interesses, ao estilo pós-

moderno, mais do que síntese ideológica e programática. A

democracia, enfim, apesar das bandeiras anti-Dilma das

manifestações, ainda não está em causa no país. E os excessos

verificados em muitas das inscrições nestas manifestações, entre

elas o inquietante aplauso a Bolsonaro no Rio de Janeiro,

respondem muito mais a surtos localizados de histeria anti-petista

dos alguns participantes, do que um sentimento, seja do coração da

nação, seja da classe média como um todo, seja dos próprios

segmentos conservadores que hoje a detém os seus cordéis do

país: Congresso Nacional, Grande Imprensa, PSDB, para não falar

da maior liderança da Oposição, FHC.

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A dura verdade para os manifestantes de 12 de abril é que, se de

um lado conseguem reiterar que há insatisfação popular contra

Dilma e seu Governo petista, por outro, fracassaram em seu intento

de mobilizar a classe média contra a Presidente sem o apoio de

lideranças expressivas da sociedade. A consigna “Fora Dilma” ,

implícita no impeachment não colou. Paradoxalmente, os brasileiros

estão exigindo mudanças, mas que não passam pelo passa-

moleque do golpe branco. Como sentencia Mino Carta em sua

crônica sobre as manifestações: “é tolo e irresponsável quem

acredita que “foradilma” é o “abracadabra” de um sortilégio que

redime o Brasil.” Ou como diz Fábio Konder Comparato, jurista e

professor emérito da USP http://www.cartacapital.com.br/revista/843/uma-triste-nulidade-

1714.html :

“ a via cirúrgica, do tipo impeachment da presidenta ou golpe

militar, não só é ineficaz como deletéria.”

Brueghel – Cegos

É importante ressaltar nesse refluxo das manifestações de rua as

diferenças, não só conjunturais do momento atual com 1964, em

plena Guerra Fria, quando o pavor ao comunismo era muito mais

epidérmico, como com o contexto nacional. Em 1964 as “Marchas

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com Deus pela Pátria e Liberdade”, que se constituíram no gatilho

para o golpe militar, foram apoiadas pela Igreja, pela grande

imprensa e pelo Partidos de Oposição, algo totalmente distinto dos

dias de hoje. Aldo Fornazieri, Cientista Político, aponta, também

uma importante diferença entre as marchas dos “coxinhas” e a dos

“caras pintadas” que ajudaram a derrubar Collor da Presidência:

“Tanto a Campanha das Diretas quanto o impeachment de Collor foram mobilizações que tiveram duas singularidades inteiramente

diferentes desses protestos de 2015: 1) foram lideradas por organizações da sociedade civil e por partidos políticos e tinham líderes legítimos, reconhecidos pelo povo; 2) elas articulavam as mobilizações de rua com objetivos institucionalmente postos: a

emenda das Diretas e o processo de impeachment no Congresso. Ou seja, aquelas manifestações tinham a possibilidade de produzir mudanças políticas e institucionais reais. Outra diferença daquelas manifestações em relação às de 2015 é que elas eram marcadas

com um conteúdo progressista e democratizar, enquanto que as de agora têm vieses retrógrados (defesa do golpe militar) e

conservadores (críticas a políticas sociais).”

Aldo Fornazieri in “O esvaziamento das manifestações e o triunfo da mesmice”

- HTTP://JORNALGGN.COM.BR/NOTICIA/O-ESVAZIAMENTO-DAS-MANIFESTACOES-E-O-TRIUNFO-DA-MESMICE-POR-

ALDO-FORNAZIERI#.VSUQV58-IEO.FACEBOOK

Em resumo , como diz Marco Aurélio Nogueira :” Há no quadro atual pressões paralisantes, de caráter defensivo, e pressões mobilizadoras, que de algum modo podem potencializar a participação cidadã. Estas últimas ganharam alento com as manifestações de 15 de março e de hoje, 12 de abril, dando a sensação de que as ruas tenderiam a encurralar o governo. O problema é que os vetores de mobilização ainda não se combinaram com perspectiva política democrática, empurrando os cidadãos para atitudes de mágoa, frustração e ressentimento, facilmente capturadas por forças mais conservadoras e autoritárias, à direita e à esquerda.” As manifestações de rua da Oposição, enfim, cumprem um papel, mas não engatilham nenhuma saída à vista. Daí porque tendam a arrefecer e talvez até desaparecer num futuro próximo. Na crua realidade da Política e das instituições o momento de hoje é substancialmente diferente daquele de março ou abril, já a caminho de um encaminhamento até 1918. O ideal seria que atravessássemos um trecho de transição, como o do

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Governo Itamar Franco, de congelamento de conquistas sociais e transparência nos processos de corrupção e de administração na esfera federal, eis que aí está o olho do furacão, tal como propõem Marco Aurélio Nogueira, Luiz Eduardo Soares e Paulo Fábio Dantes, segundo este último :

“O futuro a buscar é uma governança transparente, rigorosamente refratária à corrupção, aberta à participação, respeitando os direitos históricos dos trabalhadores, comprometida com a pauta humanista,

os direitos humanos, os direitos dos indígenas, com a sustentabilidade e a redução das desigualdades, e refratária a

improvisações irresponsáveis de efeitos destrutivos, sob a forma de um capitalismo de Estado ou de um projeto populista

desenvolvimentista”.

Isto dificilmente acontecerá. A terra se move, sibilaria Galileu,

secundado pelas três Leis de Newton. A sociedade, em tempos de

crise, mais ainda. Todos gostariam de garantir seu quinhão, mas

isto dificilmente acontecerá. Uma pena! Salve-se, entretanto, a

democracia. É de seu aprofundamento, em meio ao turbilhão de

conflitos, que surgirão horizontes e lideranças.

Vaccari Neto é condenado a 15 anos de prisão na

Lava Jato

Por CdB em setembro 21, 2015

Por Redação, com Reuters – do Rio de Janeiro:

O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi condenado a 15 anos e 4 meses de prisão pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa no âmbito da operação Lava Jato, informou a Justiça Federal do Paraná nesta segunda-feira.

Na mesma ação penal, o juiz Sérgio Moro decretou pena de 20 anos e 8 meses de detenção para o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque pelos mesmos crimes.

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Segundo a denúncia, Vaccari intermediou repasses para o PT de R$ 4,2

milhões por meio do esquema de desvio de recursos da estatal

Duque e Vaccari foram acusados pelo Ministério Público Federal de envolvimento em esquema bilionário de pagamento de propinas em licitações para obras da estatal.

Segundo a denúncia, Vaccari intermediou repasses para o PT de R$ 4,2 milhões por meio do esquema de desvio de recursos da estatal. O ex-diretor da estatal, por sua vez, foi acusado de receber mais de R$ 36 milhões em propina.

“Entende este Juízo que a associação criminosa em questão perdurou pelo menos até a saída de Renato Duque da Diretoria de Serviços da Petrobras, em abril de 2012, tendo havido pagamento de propina no mês imediatamente anterior”, disse Moro em seu despacho divulgado pela Justiça Federal.

Também foram condenados, entre outros envolvidos, o ex-gerente da estatal Pedro Barusco e o doleiro Alberto Yousseff, que fizeram acordo de delação premiada com a Justiça e terão penas definidas nos acordos fechados com a força-tarefa da Lava Jato.

A operação Lava Jato investiga um escândalo de corrupção envolvendo a Petrobras, outras empresas e órgãos estatais com a participação de funcionários das companhias, políticos e partidos.

Brasil, corrupção, João Vaccari Neto, Lava jato, Renato Duque

Vaccari Neto é condenado a 15 anos de prisão na Lava Jato adicionado

por CdB em setembro 21, 2015

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O roteiro do suicídio político do PT, que vai custar caro à esquerda

publicado em 26 de novembro de 2015 às 11:26

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http://www.viomundo.com.br/opiniao-do-blog/o-roteiro-do-suicidio-politico-do-pt-

que-vai-custar-caro-a-esquerda.html

Um vai em 2016, o outro em seguida… por Luiz Carlos Azenha Como escrevemos anteriormente, aqui e no Facebook, o mar de lama da Samarco teve também uma dimensão simbólica.

Explicitou que a captura das instituições públicas brasileiras pelo poder econômico é absoluta.

A Samarco disse que a lama não era tóxica, que estava “monitorando” a enxurrada, etc. etc.

A empresa e uma de suas controladoras, a Vale, assumiram papeis que cabiam ao Estado, dentre os quais distribuir água.

Das autoridades não saiu um pio, a não ser pelo anúncio de multas milionárias que afinal não serão pagas.

O governo de Minas cassou a licença para a Samarco operar em Mariana, como se ela ainda fosse capaz de fazê-lo.

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Duas decisões judiciais tomadas no caso favoreceram a empresa: uma rapidíssima liminar para desbloquear a ferrovia por onde passa minério e o habeas corpus preventivo que impede a prisão do presidente da Samarco.

Toda uma bacia hidrográfica destruída, praias e oceano poluídos…uma verdadeira catástrofe.

Enquanto isso, quatro jovens foram presos por “crime ambiental”: sujaram de lama um corredor do Congresso.

É óbvio que esta múltipla falencia de orgãos engloba o PT e o governo Dilma.

Um breve roteiro do suicídio político, incluindo apenas fatos recentes:

1. Ganhar uma eleição e governar com o programa econômico alheio;

2. Colocar toda a conta da austeridade nas costas dos trabalhadores;

3. Propor uma lei antiterrorista que, lá adiante, em 2018, servirá para a direita demolir os movimentos sociais, permitindo a ela aprofundar ainda mais, se necessário, a depressão econômica do Levy.

Para completar, Delcídio do Amaral, denunciado aqui e aqui como homem que articulava barbaridades contra o Brasil e os movimentos sociais, é flagrado em conluio com um banqueiro para evitar uma delação premiada. Por mais que seja um petista de DNA tucano, é o líder do governo Dilma no Senado!

A partir dos depoimentos, a mídia fará, obviamente, o que sempre fez: criminalizar alguns e poupar os seus.

Mas o suicídio político é do PT. Por exemplo, ao sugerir que sua bancada votasse pela soltura de Delcídio.

Para todos os efeitos, 25 de novembro é o dia em que o PT se afogou em público, sob os olhares dos 300 picaretas do Congresso.

O que virá? A delação do Cerveró, possivelmente do próprio Delcídio, do banqueiro Esteves… um efeito em cascata que vai arrastar gente graúda, com o efeito prático de paralisar o governo Dilma.

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, um quadro de primeira qualidade, acusou o baque numa entrevista ao Estadão: “Quando você tem um sonho de transformar a sociedade em favor da igualdade e você se desvia para se apropriar de recursos ou para beneficiar quem quer que seja, você está cometendo dois crimes: o primeiro é colocar a mão em recurso público, o segundo, você está matando um projeto político”.

Uma delicada nota de falecimento.

Quanto à esquerda que sobreviver ao PT, tem encontro marcado com a lei antiterrorismo logo ali adiante. A não ser que, como o PT, priorize os gabinetes.

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O PT perdeu a narrativa

http://blogdoazedo.blogspot.pt/2015/12/o-pt-perdeu-narrativa_30.html?spref=fb

Nas Entrelinhas: Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense - 30/12/2015

A força do Estado já não resolve o problema eleitoral do partido, que se afasta

de suas bases populares

Não satisfeita com a demissão de Joaquim Levy, a cúpula petista intensificou a

pressão sobre o novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, para que faça

uma mudança no rumo da economia. O porta-voz das críticas foi o mesmo que

detonou o ex-ministro, Rui Falcão, que preside o partido. Quando verbaliza

ataques ao governo, o petista torna público o que ex-presidente Luiz Inácio

Lula da Silva fala nos bastidores.

Falcão afirma que o governo precisa adotar medidas para devolver à

população a confiança perdida. Mira a base eleitoral do PT, que se esvai por

causa da crise econômica, do isolamento politico da legenda e do escândalo da

Petrobras. Em luta pela sobrevivência, o PT tenta resgatar a velha narrativa

classista que levou a legenda ao poder. Não é fácil, porque o discurso eleitoral

não corresponde à prática no poder.

Intitulado “Uma nova e ousada política econômica para 2016”, o artigo de

Falcão no site do PT define a estratégia para sobreviver ao escândalo da

Operação Lava-Jato, barrar o impeachment e evitar o desastre eleitoral

anunciado. Trata-se de forçar a presidente Dilma Rousseff a gastar as reservas

internacionais do país para baixar os juros e anabolizar a economia,

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aumentando os gastos públicos e facilitando os créditos para consumo, mesmo

que a receita da União esteja em queda.

Os governadores petistas Fernando Pimentel, de Minas Gerais, e Wellington

Dias, do Piauí, pressionam a presidente Dilma a abrir os cofres para ajudar os

estados. Para isso, fazem coro até com governadores de oposição. Os

prefeitos Fernando Haddad, de São Paulo, e Luiz Marinho, de São Bernardo,

joias da coraa petista, também estão em sérios apuros e cobram a liberação de

verbas federais. O primeiro corre o risco de não se reeleger; o segundo,

dificilmente fará o sucessor.

O rombo das contas do governo em novembro foi de R$ 40,05 bilhões, o que

coloca em risco a surreal meta de déficit fiscal de R$ 120 bilhões, aprovada

para livrar a presidente Dilma das pedaladas fiscais. Malabarismos contábeis

com créditos e empréstimos do Banco do Brasil, Caixa Econômica e Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social estão sendo feitos pelo

Tesouro para mascarar o rombo.

No lugar do ajuste fiscal, o PT propõe o programa “Por um Brasil justo e

sustentável”, elaborado pelo economista Márcio Porchman, da Fundação

Perseu Abramo, em parceria com entidades, como a Central Única dos

Trabalhadores (CUT) e o Movimento dos Sem Terra (MST). O fato de o partido,

recentemente, ter organizado manifestações em apoio a Dilma elevaram o

cacife da legenda junto ao governo.

Entretanto, o discurso de Nelson Barbosa ao tomar posse na Fazenda, no qual

anunciou a intenção de promover reformas na Previdência e trabalhista,

frustrou as lideranças que foram às ruas em defesa do governo.

Lava-Jato

O PT busca uma nova narrativa para se manter no poder. A força do Estado já

não resolve o problema eleitoral do partido, que se afasta suas bases

populares. Cada vez é mais difícil mobilizar os militantes petistas não-

encastelados no governo.

Construída com base em quatro vertentes – sindicalistas, militantes de antigas

organizacões de esquerda, integrantes de comunidades eclesiais de base e

intelectuais do meio acadêmico —, a estrutura do PT foi progressivamente

controlada por políticos profissionais e seus “operadores”, em detrimento dos

quadros dedicados às políticas públicase e aos movimentos sociais.

Esse processo desaguou numa sucessão de escândalos, que comprometeram

irremediavelmente a imagem do partido, com a prisão e condenação de

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lideranças emblemáticas da legenda. O pior ainda está por vir. Doações de

campanha milionárias, em troca do superfaturamento e do desvio de recursos

da Petrobras, levarão a legenda ao banco dos réus. Grande parte desse

dinheiro foi parar nas campanhas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na

disputa de 2006, e da presidente Dilma, em 2010 e 2014.

Fim do consenso

07/01/2016 - http://www1.folha.uol.com.br/colunistas/

matias spektor

Este ano completamos três décadas de democracia ininterrupta, o mais longo

ciclo do gênero em nossa história.

O processo começou sofrido: entre 1985 e 1993, a sociedade amargou um

fracasso atrás do outro. A partir de 1994, porém, o país pegou no tranco.

A chave que destravou o progresso foi a construção de um consenso

fundacional entre as elites governistas. Lento e cheio de conflitos, o consenso

terminou desenvolvendo raiz profunda.

Era um bicho de cinco patas: (1) Política macroeconômica para acabar com a

inflação mesmo quando o emprego, o crescimento e o gasto público

sofressem. (2) Política social para erradicar a pobreza extrema, na cartilha do

Banco Mundial. (3) Centralização das políticas públicas em Brasília e o fim da

farra fiscal dos governadores. (4) Construção de coalizões governistas

gigantescas (porque a indisciplina e as defecções são inerentes à base aliada).

(5) Política externa talhada para regionalizar o capitalismo brasileiro na

América do Sul, por meio de grandes obras e do crédito à aquisição de ativos

no exterior.

Aquele consenso produziu vitórias eleitorais em 1994, 1998, 2002, 2006 e

2010. No período, restaurou o otimismo no país porque o brasileiro passou a

viver melhor. Do consumo diário de proteínas ao acesso ao crédito bancário,

da mortalidade infantil à posse de telefones, da possibilidade de viajar de avião

a contar com água tratada em casa, o cidadão ganhou.

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Políticos de corte populista, cujo êxito dependia de hiperinflação e

irresponsabilidade fiscal, começaram a lutar para sobreviver. Perdeu o atraso,

ganhou o progresso.

Houve áreas em que o consenso não pegou. A luta contra a violência que

resulta em estatísticas análogas às de uma guerra civil. A reforma para reduzir

a fragmentação do sistema partidário. O combate à corrupção endêmica. A

facilitação do acesso à Justiça. Nessas áreas, quando houve avanço, a

liderança não foi da classe política, mas resultado da pressão popular ou da

sociedade civil organizada.

De lá para cá, o consenso se desfez. Suas fissuras originais se alargaram sem

chance de reversão.

O mensalão e o petrolão expuseram o método para gerir a base aliada. A "nova

matriz econômica" enterrou o consenso sobre a inflação e o gasto público,

jogando no chão ainda o princípio da responsabilidade fiscal. Lava Jato,

Odebrecht, Petrobras e BNDES minaram o consenso por trás da diplomacia

regional. A política social do consenso ficou sem fonte de financiamento.

O próximo ciclo virtuoso demandará um novo consenso suprapartidário. É obra

para muitos anos. Feliz ano novo e mãos à obra.

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Deputados do PT cogitam fazer desfiliação

coletiva

CATIA SEABRA DE SÃO PAULO

11/04/2016 - http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/04/1759527-deputados-

do-pt-cogitam-fazer-desfiliacao-coletiva.shtml?cmpid=compfb

Com a simpatia do ex-ministro Tarso Genro, 26 deputados federais do PT

discutem o desembarque coletivo do partido após as eleições municipais de

outubro. Esses descontentes representam quase a metade da bancada do PT

hoje em exercício na Câmara de Deputados: 57.

O movimento inclui nomes como os de dois ex-presidentes da Casa —Arlindo

Chinaglia (SP) e Marco Maia (RS)— e da ex-ministra Maria do Rosário (RS). A

desfiliação começou a ser organizada no segundo semestre de 2015, tendo

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como ponto de partida a criação da tendência Muda PT, que somava 35

deputados à época.

Originalmente, esses insatisfeitos se valeriam de uma janela aberta para que

parlamentares deixassem seus partidos sem perda de mandato, mas essa

brecha foi fechada em 31 de março.

A saída não foi explorada por causa do avanço do processo de impeachment

de Dilma Rousseff no Congresso. Com o risco de afastamento da presidente,

os petistas tiveram que concentrar seus esforços na defesa do mandato de

Dilma. Daí a decisão de retomar o debate após a corrida municipal.

Até lá, será possível mensurar os danos sofridos pelo partido e suas

perspectivas para as eleições de 2018.

"Nossa prioridade é defender o governo", afirma Maria do Rosário.

Segundo articuladores do movimento, o ex-líder do governo Henrique Fontana

(RS) também integra o grupo numa aliança com Tarso Genro.

No Rio Grande do Sul, Tarso organiza a criação de um novo partido, que

poderia servir de porta de saída para petistas desiludidos com a atual direção

da sigla.

Deputados estaduais gaúchos ligados a Fontana já avisaram a seus

apoiadores a decisão de sair do PT depois das eleições. A hipótese foi

aventada numa reunião com Tarso há cerca de 20 dias.

"Alertei nesta conversa que agora nossa tarefa é enfrentar o impeachment. E

que só depois das eleições municipais esse assunto teria pertinência", afirma

Tarso, sem descartar a possibilidade.

Fontana, no entanto, nega qualquer articulação: "Estou filiado ao PT há 27

anos e desautorizo qualquer especulação em meu nome".

Petistas ligados ao movimento temem que a explicitação de seus nomes

prejudique a defesa do governo Dilma, num momento tão decisivo. Eles

alegam que a maior fonte de descontentamento está nos caminhos escolhidos

pelo partido desde a explosão do escândalo do mensalão. Os descontentes

criticam práticas adotadas pela tendência CNB, que controla a sigla.

DISPUTAS LOCAIS

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Além do desgaste na imagem do PT, disputas internas e locais ditam a decisão

de saída. O prefeito de Embu das Artes (SP), Chico Brito, anunciou na quinta-

feira (7) sua desfiliação sob o argumento de que não poderia apoiar

exclusivamente o candidato petista à sua sucessão. Na cidade, foi acusado de

privilegiar um adversário.

Com sua saída, chega a 25 o número de prefeitos que deixaram o PT no

Estado de São Paulo, berço da sigla –um terço dos 72 eleitos em 2012.

O maior desfalque foi em Osasco (SP), onde o prefeito Jorge Lapas trocou o

PT pelo PDT. Ao se desfiliar, Lapas levou com ele todos os partidos então

aliados ao PT e uma fatia significativa da base petista. Ele também compôs

com o DEM. Na saída, culpou o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha,

condenado no mensalão.

"João Paulo lidera um grupo do partido que só me atrapalhou. Sofri o desgaste

do partido nessa crise e nunca tive reconhecimento", disse.

A esquerda precisa superar o PT

A esquerda não votou em Dilma para ter duas semanas de governo

progressista

por José Antonio Lima — publicado 06/05/2016 13h10, última

modificação 06/05/2016 16h46

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Lula Marques / Agência PT

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Dilma Rousseff em encontro com movimentos sociais em agosto de 2015

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"O governo Dilma é extremamente repressivo"

No ocaso de seu governo, Dilma Rousseff produziu o que a imprensa chamou

de “pacote de bondades” para a esquerda. Destravou a reforma agrária e

o Minha Casa Minha Vida Entidades, destinou novas áreas a comunidades

quilombolas, liberou recursos para a promoção da igualdade racial e assinou

decreto que permite o uso do nome social em crachás por servidores LGBT.

Para o campo progressista brasileiro, essas medidas deveriam deixar uma

única lição: é hora de superar o PT.

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No tempo comandado pelo PT, o Planalto realizou muitos feitos importantes,

sendo o mais relevante deles alçar o combate à miséria e à pobreza à

condição de central na disputa política. Depois que o governo comandado

pelos petistas retirou o Brasil do mapa da fome das Nações Unidas, é

improvável que outra sigla consiga chegar ao Palácio do Planalto (pelo voto)

sem apontar soluções para nossas profundas desigualdades sociais e

regionais.

Paralelamente, o PT produziu uma quantidade significativa de decepções. A

corrupção, expressa no “mensalão” e escancarada pela Operação Lava Jato, é

a maior delas, mas não se pode esquecer que o partido abriu mão de uma

série de reformas estruturais, referendou a política de encarceramento em

massa vigente e implantou um modelo de desenvolvimento que, além de

alienante, não reconhece óbvios limites sociais e ambientais.

No que diz respeito a sua base social, o governo do PT também produziu

danos profundos. Como reconheceu o próprio Lula em fevereiro de 2015,

quando a sigla completou 35 anos, o PT “deixou de ser um partido das

bases para se tornar um partido de gabinetes”.

O abandono da disputa ideológica abriu caminho para o conservadorismo que

hoje perpassa os mais diversos estratos da sociedade e o resultado desta

transformação produziu um vácuo na esquerda. Assim, hoje, as bases

esquerdistas se encontram desestruturadas.

Nos mandatos de Lula, a estratégia de levar os conflitos sociais para dentro do

governo fez CUT, MST e UNE serem colocados para dormir e perderem boa

parte da significância que tinham anteriormente.

Com Dilma, a relação passou a ser de hostilidade aberta. Alguns casos são

simbólicos, como a entrega do Ministério das Cidades ao Partido Progressista

(antítese de seu próprio nome) e, depois, para o PSD, em um cenário de déficit

habitacional crescente e a entrega do Ministério da Agricultura à ruralista Kátia

Abreu.

Além do governo, o PT também desprezou o campo progressista. Em 2013, a

chegada do pastor Marco Feliciano (PSC-SP), para quem os africanos são

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amaldiçoados, à presidência da Comissão de Direitos Humanos só foi possível

pois a bancada petista não priorizou a comissão, como fez por anos.

Na última década e meia, as tentativas de aglutinar as bases progressistas em

torno do PT só foram realizadas em período eleitorais, como os de 2010 e

2014. Muito pouco.

Quando estava segura no cargo, logo após sua reeleição, Dilma optou pelo

estelionato eleitoral e, às vésperas do Ano Novo de 2015, soltou duas medidas

provisórias de um ajuste fiscal de fato necessário, mas que pelo mérito e pela

falta de diálogo foi percebido como responsável por afetar sobretudo os

trabalhadores.

Diante do avanço do processo de impeachment, a busca pelas bases foi

refeita, em torno do #nãovaitergolpe. A campanha naufragou e, na hora da

derrocada, o governo produziu sua “guinada progressista”. Por trás dela, há

uma estratégia de três pontos para manter o PT como partido hegemônico na

esquerda.

Por um lado, busca-se marcar a diferença para o projeto neoliberal-

conservador que foi derrotado nas urnas e chegará ao poder por meio de

Michel Temer. Por outro, fomenta-se a narrativa da direita golpeando a

esquerda, e com o PT como sinônimo de esquerda, não parte dela. Por fim, a

intenção é aglutinar o campo progressista novamente ao redor do PT para o

próximo ciclo eleitoral, que terá início imediatamente após a chegada de Temer

ao Planalto.

A partir do afastamento de Dilma, a esquerda precisará escolher um de dois

caminhos. O primeiro é seguir orbitando ao redor do PT e de seus feitos

positivos. Em um cenário no qual as vozes petistas capazes de fazer a

autocrítica do partido estão fora das posições de liderança, essa alternativa

parece ser um abraço de afogados.

O segundo caminho é o da renovação, que rejeite o antipetismo histérico,

respeite os feitos do PT, faça as muitas autocríticas necessárias e passe por

uma constatação bastante simples: a esquerda não votou em Dilma Rousseff

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para ter duas semanas de governo progressista e não pode se contentar com

isso.

No cenário posto, a esquerda precisa rechaçar a fama de perdulária (é

possível, como o petista Fernando Haddad vem demonstrando em São Paulo)

e entender a necessidade de fazer o Estado caber dentro do Orçamento.

É isso o que capacitará o Estado para interferir quando necessário, em

especial na defesa dos direitos humanos e no estabelecimento de políticas

redistributivas.

Em março de 2015, em entrevista a CartaCapital, o professor da USP Lincoln

Secco fez um diagnóstico interessante. “O PT é a esquerda que o Brasil

conseguiu ter”, disse ele. Está claro que, daqui para frente, o programa petista

não é mais suficiente.

Entrevista - Lincoln Secco

O PT ainda não entendeu o "antipetismo"?

http://www.cartacapital.com.br/politica/o-pt-ainda-nao-entendeu-o-antipetismo-7998.html

Para professor da USP, autor de "A história do PT", o partido erra ao se

comparar com os governos anteriores e demonizar a classe média

por Renan Truffi — publicado 10/03/2015 17h25, última

modificação 12/03/2015 16h59

inShare41

Ricardo Stuckert/ Instituto Lula

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O PT, de Lula e Dilma, parece não ter entendido que o pacto de conciliação de

classes só era possível quando a economia estava crescendo, diz especialista

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Para Eduardo Cunha, tese de impeachment é golpe

Dez anos depois de ter seus principais líderes envolvidos no “mensalão”, o

Partido dos Trabalhadores vê mais dirigentes serem diretamente acusados na

Operação Lava Jato. Apesar de a polêmica desgastar ainda mais a imagem

petista, para Lincoln Secco, professor de História da Universidade de São

Paulo e autor do livroA história do PT, o grande problema do partido é a base

cada vez maior do antipetismo, crescente principalmente entre as classes

médias. “[Esse sentimento está] traduzido pelo discurso anticorrupção,

‘antiaparelhismo’ do Estado, por mais que sejam noções que se aplicam

também a governo anteriores. Mas não basta o PT dizer isso porque o partido

já está no poder há 13 anos”.

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Em entrevista a CartaCapital, Secco explica como o modelo de gestão petista,

baseado no pacto de conciliação de classes, “deixou uma margem de manobra

crítica para os setores médios”. “O erro do PT é esse. O partido jamais quis

acirrar a luta de classes, mas o modelo de governo que ele constituiu, que

elevou uma parte das classes pobres socialmente, acirraria inevitavelmente a

luta de classes”.

Leia a entrevista na íntegra abaixo:

CartaCapital: O governo Dilma foi alvo no último fim de semana de

um 'panelaço' em bairros ricos e de classe média alta. Em resposta, o partido

divulgou nota sobre o que chamou de “ato orquestrado pela burguesia”. Como

o senhor enxerga esse processo pelo qual o PT passa em seu quarto mandato

presidencial? Acha que o partido está em negação dos fatos?

Lincoln Secco: Em primeiro lugar não é uma ação orquestrada da grande

burguesia porque nós temos visto indícios, até mesmo na grande imprensa, de

que não há uma preferência dos estratos sociais mais ricos pelo impeachment.

Obviamente que existem pequenos grupos que organizam manifestações. O

que o PT talvez não tenha entendido é que existe um sentimento difuso na

sociedade desde 2005 [época do “mensalão”] que é o antipetismo, traduzido

pelo discurso anticorrupção, ‘antiaparelhismo’ do Estado, por mais que sejam

noções que se aplicam também a governo anteriores. Mas não basta o PT

dizer isso porque o partido já está no poder há 13 anos.

CC: Há ainda justificativa para falar de ‘burguesia’ depois de uma eleição tão

polarizada? O senhor não acha que o PT não percebeu ainda que perdeu uma

parte de seu eleitorado?

LS: O modelo de governo do PT está calcado em uma conciliação de classes,

especialmente entre os muito ricos e os muito pobres. Isso deixou uma

margem de manobra crítica, enorme, para os setores médios, que não

ganharam nada nos governos Lula e Dilma. E é esperado que pessoas que

emergiram das classes mais pobres para aquilo que o próprio Lula chamou de

“nova classe média” acabe incorporando os valores da classe média

tradicional. Isso forma uma base cada vez maior para o antipetismo. Nas

últimas eleições, esse estrato social, que eu prefiro chamar de nova classe

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trabalhadora, se dividiu. Uma parte ficou fiel ao projeto do PT e outra parte

migrou para o PSDB.

CC: O PT parece não saber como responder a tudo isso. Como o senhor avalia

a postura do partido neste tipo de situação, do ponto de vista do diálogo com a

sociedade? Historicamente, o partido sempre teve problema na comunicação?

LS: O PT sempre teve, na verdade, uma dificuldade de acesso à grande

imprensa. Quem forma a imagem do PT não é ele, são os meios de

comunicação de massa, que têm uma predisposição de crítica maior em

relação ao PT. Ficou demostrado já [a postura da mídia] em pesquisas tanto no

período em que o PT fazia oposição ao governo Fernando Henrique Cardoso

como no período em que se tornou governo. Mas historicamente o PT nunca se

interessou nem em informar sua militância e nem em constituir um aparato de

imprensa, uma necessidade histórica do partido.

CC: O 'panelaço' surgiu também em meio à divulgação da lista da Operação

Lava Jato. De novo o PT está envolvido em um grande escândalo de

corrupção. Como o senhor analisa esse novo episódio na história do partido?

LS: Em primeiro lugar, a lista do Janot não citou nenhum grande nome do PT.

Com exceção do Antonio Palocci, que é um nome histórico, mas que já estava

inativo politicamente. Então na verdade o potencial destrutivo das acusações

atuais sobre o PT é bem menor que em 2005. Acontece que, em 2005, o Lula

estava em final de mandato. Então a oposição esperava que sangrando o Lula

até as eleições seria suficiente para retirá-lo do poder. Agora a Dilma está no

início de mandato. Isso significa que ela vai ter um governo de crise nessas

acusações durante quatro anos. Isso que é terrível para o partido.

CC: Vai ter que resistir ao sangramento por muito mais tempo...

LS: E as lideranças de 2005 eram lideranças de primeiro time do PT. Dois ex-

presidentes do partido foram para a cadeia. Acredito que não haja paralelo em

nenhum partido socialdemocrata do mundo. E também um ex-presidente da

Câmara dos Deputados. Pelo menos até agora não é a mesma coisa.

CC: Como biógrafo do PT, qual análise o senhor faz individualmente dos

nomes do partido envolvidos na Lava Jato?

LS: O Palocci já havia passado por um transformismo ideológico no início dos

anos 1990. Quando foi prefeito de Ribeirão Preto (SP), ele defendeu

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privatizações, escandalizou o partido num momento em que o PT era mais

radical. Teve uma trajetória sempre envolta em mistérios, para usar um

eufemismo. Mas o [senador] Lindberg [Farias] é um quadro neopetista errático.

Saiu do PCdoB, se dirigiu ao trotskismo, e então se aproximou do PT. Ele não

é um quadro histórico do partido. Tanto a [senadora] Gleisi Hoffman [PT-PR]

como Humberto Costa [PT-PE] são quadros até que históricos, mas regionais.

A Gleisi foi ministra da Casa Civil, mas não tem a importância que aqueles

quadros do PT que caíram em 2005 tiveram. É por isso que acho que o

problema do PT não está na lista. O problema está nesse sentimento negativo

até para a democracia, que está se apossando de parte da sociedade, de que

é preciso retirar a presidenta através da força ou impeachment. Quando a

gente sabe que não existe nenhuma razão para impeachment no Brasil. Esse é

um sentimento difuso.

CC: Sobre o escândalo, parece que toda a raiz é o financiamento privado de

campanha, um dos temas mais importantes da reforma política. Como o senhor

enxerga o fato dessa bandeira não ter sido prioridade para o PT durante muitos

anos e agora explicar a participação do partido no escândalo?

LS: Depois de junho de 2013, o PT se voltou novamente para a defesa da

reforma política. A própria presidenta lançou uma proposta, que foi sabotada

por pessoas de seu próprio partido na época. E há setores minoritários do PT

que fizeram no ano passado uma campanha de marcha pela reforma política.

Mas a direção do PT sempre fica em compasso de espera: apoia timidamente

e espera a reação da sociedade. Eu acho que o escândalo atual teria como

uma saída, por parte do PT, a defesa radical agora do financiamento público de

campanha porque o escândalo está especialmente ligado a isso. Está

especialmente ligado ao financiamento privado de campanha, mas não há

clima no Congresso para uma reforma política desse tipo. É mais fácil

acontecer uma contrarreforma.

CC: Como essa que o Eduardo Cunha (PMDB) tem tentado emplacar...

LS: Isso mostra que, na verdade, os escândalos se sucedem, obviamente com

um ilícito real no fundo, mas só adquirem expressão pública porque são usados

como arma política. No caso, contra o PT. Não quer dizer que não haja ilícito,

mas acontece que isso reduz o debate político a um nível mais baixo. Quer

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dizer, nós não estamos mais debatendo se o projeto social-rentista do governo

Lula era correto ou não. Se o PSDB tinha alternativas. Se os dois partidos são

parecidos ou não. Nós estamos debatendo crime. Quer dizer, a política está

nas páginas policiais.

CC: O senhor acredita que essa nova crise do partido tem relação com o fato

do PT ter perdido seus grandes quadros em 2005? O PT vive uma crise de

quadros?

LS: Sem dúvida, o PT foi decapitado em 2005. Sobrou o Lula, que nunca foi

uma pessoa que se importou em dirigir o partido. Lula sempre falou para fora.

Ele deixava a tarefa de falar para dentro para o José Dirceu. Então isso

aconteceu com a perda de José Genoino, Dirceu, João Paulo e até em certa

medida o afastamento do Palocci. Tudo isso fez com que o partido ficasse

acéfalo. Não há mais quadros daquela geração com a mesma grandeza. Agora

o problema é que o PT não tem renovação de quadros. É sobretudo um partido

de governo que se afastou das suas bases sociais. Isso já é até um chavão,

todo petista reconhece. E pelo menos 80% dos quadros atuais do partido são

pessoas que entraram depois que o Lula chegou ao poder. Pessoas que nem

sempre têm os valores do PT do passado. Existem também aqueles que já

eram dirigentes do PT no passado e se tornaram neopetistas. Ou seja, têm um

discurso republicano oco para fora e uma prática carreirista, com nepotismo e

favorecimento próprio.

CC: O fato de alguns petistas definirem a Dilma mais como um quadro do PDT

do que do próprio partido é reflexo disso? Isso explica a crise entre governo e

as correntes internas da legenda?

LS: O problema da Dilma é que ela não é nem um quadro histórico do PT, nem

tem a dimensão do Leonel Brizola. Ela não pode fazer um governo

personalista, “acima das classes sociais”, como fez o próprio Lula, em certa

medida, porque ela não tem passado histórico e nem mesmo a competência

política. Mas eu acredito que o problema não está nela, o problema está na

economia que não sustenta mais aquele pacto social rentista que manteve o

governo Lula. Está também na dificuldade que o PT tem de governar nesse

presidencialismo de coalizão.

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CC: O senhor acha que o PT errou ao não fazer a luta de classes por acreditar

que esse “pacto” em que todos ganhavam não teria fim?

LS: É difícil dizer o quanto o partido errou. Na verdade, [o pacto] era um rumo

que o partido tomou no fim dos anos 1990 ao fazer alianças para governar para

todas as classes sociais. Não foi uma decisão tomada num dado momento. Foi

uma evolução histórica de um setor majoritário do partido. Agora esse modelo

só conseguia se sustentar enquanto a economia estava crescendo. O que o PT

talvez tenha se equivocado era não prever o momento em que o cobertor se

tornaria curto para cobrir todo mundo. Só que nesse momento ele teria que

fazer opções, mas as opções levariam à radicalização. E a radicalização é tudo

aquilo que o petismo governista jamais quis. Então é uma situação

aparentemente sem saída. Radicalizar significaria na verdade taxar grandes

fortunas, prejudicar o grande capital e transferir recursos para serviços públicos

que beneficiassem a própria classe média, que é tão descontente com o

governo petista. Mas essa seria uma decisão que acirraria a luta de classes e

abriria um horizonte muito incerto para o partido. Conhecendo dirigentes do PT,

eles jamais ficariam com isso.

CC: Mas, pelo antipetismo manifestado em ocasiões como essa do ‘panelaço’,

não acirrar a luta de classes não evitou que isso acontecesse...

LS: Você matou a charada. O erro do PT é esse. O partido jamais quis acirrar a

luta de classes, mas o modelo de governo que ele constituiu, que elevou uma

parte das classes pobres socialmente, acirraria inevitavelmente a luta de

classes. A luta de classes vai se acirrar independente da vontade do PT. Pela

vontade do PT é que ela não aconteça, e que haja conciliação. Então não é um

partido preparado para um radicalismo que existe hoje na sociedade. Até

porque o PT já foi no passado, mas desde 2002 tem mantido os movimentos

sociais ligados a eles adormecidos. E já surgiu uma nova militância nas ruas,

tanto à direita, que é menor e mais desorganizada, quanto à esquerda, que é

mais organizada, que não tem mais nada a ver com o PT. Então eu acho que,

embora a gente não possa comprovar ainda, junho de 2013 deu a certeza a

esses estratos médios críticos ao PT que o partido não consegue mais colocar

seu exército nas ruas, para usar a expressão do Lula. O PT foi expulso das

ruas em junho, ficou indeciso entre a condenação e o apoio. Enfim, junho foi o

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primeiro movimento de massa desde as greves do ABC e as Diretas Já da qual

o PT não participou.

CC: Então, ao manter adormecido os movimentos sociais ligados ao partido, o

PT ajudou a criar movimentos populares capitaneados pela classe média

tradicional? O governo Dilma deveria ter iniciado suas ações de olho na classe

média?

LS: Para lidar com a classe média tradicional, o PT teria que ter feito outro tipo

de governo. Um governo que atendesse parte em desejo dos setores médios,

que reclamam que pagam muitos impostos e tem serviços públicos ruins. E, ao

mesmo tempo, fazer o que ele fez. Levar os mais pobres a um padrão de vida

decente. Mas o PT não fez isso no seu governo. Só fez uma parte. A outra

coisa é que o PT tinha que ter deixado de demonizar a classe média no seu

discurso. Esse vasto setor público, do mundo corporativo, de pequenos

comerciantes, é enorme em São Paulo, por exemplo. O PT teve um discurso

agressivo contra aqueles que, em tese, queria conquistar. A classe média não

é necessariamente reacionária, como o PT diz. Na história do Brasil, ela já teve

um comportamento reacionário como, por exemplo, nas vésperas do golpe de

1964, mas se deslocou à esquerda no final dos anos 1970 e sustentou grandes

mobilizações nos anos 1980. Tinha até uma certa simpatia pelo PT. Então não

é algo imutável, mas o PT não tem capacidade de operação política para

mudar isso a curto e médio prazo.

CC: Além do antipetismo crescente, o governo Dilma parece já ter conseguido

perder credibilidade junto a seus próprios eleitores. O senhor acha que existe

caminho de volta para essa guinada neoliberal?

LS: O problema da Dilma é que ela foi rápida demais. Isso pareceu um

estelionato eleitoral para as pessoas que nem são petistas, mas se engajaram

na sua campanha com medo da vitória do PSDB. Ela, em pouco tempo,

renegou tudo o que havia dito em sua campanha eleitoral. Mas o PT tem uma

base social mais abaixo, digamos assim, que é fiel. Ela não é maioria na

sociedade brasileira, mas ela é bastante numerosa. Pessoas muito pobres, até

com toda razão, temem a queda do governo Dilma porque isso significaria para

elas a queda daquilo que elas conquistaram. O problema é que essa camada

social, mais pobre e mais fiel, ela não foi representada na arena política. Não

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foi organizada pelo próprio PT. É um outro equívoco do PT. Jamais ter tentado

organizar essa nova base social.

CC: Como o senhor enxerga o futuro do PT depois dessa trajetória, incluindo

“mensalão” e Lava Jato e o antipetismo? O partido tem condições de se reciclar

independentemente de vitória ou derrota em 2018?

LS: Em primeiro lugar, se o Lula de fato for candidato em 2018, ele seria a

salvação do partido, mesmo que não seja eleito. Certamente ele mobilizaria a

sociedade em torno da campanha do PT. Se o PT levar à frente os indícios de

renovação que tem aprovado no Congresso, como, por exemplo, a limitação do

número de mandatos de seus parlamentares, coisa que a gente tem dúvida se

vai acontecer, pode ser que o partido continue tendo importância política e

ideológica. Mas essas coisas são incertas. Geralmente, diante das crises, a

gente tem visto que os dirigentes do PT primeiro se escondem e jogam ao mar

aqueles que aparecem na lista. Independentemente do que as pessoas

possam achar do escândalo de 2005, cabia ao partido naquele momento ou

condenar totalmente aqueles dirigentes ou defendê-los. Do ponto de vista

político, a saída para o PT deveria ter sido acirrar a luta política e defender os

dirigentes. Mas simplesmente o PT agiu de forma errática. Dirigentes se

escondendo...o caso do Delúbio Soares é paradigmático porque ele foi expulso

do PT e depois voltou. Como é que o partido pode explicar uma coisa dessa?

Se ele foi expulso, não deveria mais retornar ao partido. Naquele momento, o

partido considerou que ele era uma pessoa que feria os preceitos éticos.

CC: É a mesma postura que o partido tem tomado diante das denúncias da

Lava Jato...

LS: Você compara a nota do PSDB e a nota do PT [sobre o caso]. Salvo

engano, a nota do PSDB defende o [Antonio] Anastasia. O PT não defende os

seus deputados que estão na lista. Então a primeira coisa que o partido deveria

fazer é dizer que acredita na inocência dos seus senadores. Mas não faz isso.

O PT, claro, é também um partido muito dividido. Sempre há no partido aqueles

que esperam lucrar com a queda do outro. Mas acontece que em um momento

de crise tão grave como esse e tendo já a experiência do que foi o "mensalão",

o PT deveria, no mínimo, fazer uma defesa pública das pessoas que

apareceram na lista.

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CC: Então, fazendo uma análise da história do partido, o senhor acha que o PT

ainda é um partido de esquerda?

LS: Eu acho que o PT é a esquerda que o Brasil conseguiu ter. Entre os

grandes partidos, que tem significação política-eleitoral no Brasil, o partido é

partido da esquerda. Obviamente que se a gente pudesse falar de partidos

nanicos aí sim, existem partidos com um programa mais radical. Mas no jogo

político que interessa o PT é o partido que a esquerda conseguiu ter. Ele vive

uma crise que tem raízes no ambiente político em que atua, na sua trajetória

histórica, mas também no ambiente da América Latina. Não é à toa que o

governo Maduro está em crise na Venezuela. Há uma crise econômica que

está deteriorando as bases desse pacto social-rentista. Governos que pregam

ideais de esquerda, mas fazem políticas sociais e econômicas visando a

conciliação de classe. O caso da Venezuela é mais radical porque lá se prega

o socialismo mas se mantém o capitalismo.

CC: Durante o fim de semana, foi noticiado ainda que o governo Dilma

Rousseff teria tentado se aproximar do ex-presidente Fernando Henrique

Cardoso com o objetivo de se unir nesse momento de crise. Para o senhor,

qual o significado por trás dessa postura?

LS: Esse sempre foi o sonho de consumo de uma ala do PT, desde os anos

1990. O José Genoino, o Eduardo Jorge, quando era do PT, sempre

defenderam essa aproximação. A própria Luiza Erundina. No momento em que

o Fernando Henrique se tornou ministro do governo Itamar, houve muita

pressão interna no PT para que o partido apoiasse o governo e fizesse uma

aliança com o Fernando Henrique. Também era o sonho de alguns tucanos.

Você deve se lembrar que o Fernando Henrique chegou a dizer uma vez que o

problema do PT e do PSDB é que eles comandavam setores atrasados. Uma

aliança entre os dois, que eram partidos modernos, era impossível devido à

polarização ideológica que já havia. Eu acredito que esse talvez seja um sonho

da Dilma. Nos últimos anos o PT e o PSDB se tornaram inimigos

irreconciliáveis, mas a Dilma não é um quadro histórico do PT. Talvez ela

sonhe uma saída dessa crise com uma aproximação do PSDB. Agora ela está

fazendo um mandato biográfico. Ao contrário do partido, que, como partido,

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precisa sempre pensar na luta pelo próximo mandato. E ao contrário do próprio

Lula também, que tem pretensões de voltar a ser presidente. Mas só que essa

aproximação é bastante improvável. Já que a pergunta é: o que os tucanos

ganhariam com isso?

Análise/Mauricio Dias - PT: muito além do divã

http://www.cartacapital.com.br/revista/828/pt-muito-alem-do-diva-8984.html

Miúda reflexão a respeito da decadência dos nossos partidos.

Serão mesmo partidos?

por Mauricio Dias — publicado 29/11/2014 09h37

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Valter Campanato/Agência Brasil

Às vésperas de iniciar o 13º ano instalado no Palácio do

Planalto, o PT cai numa fossa de aparente fundo existencial

O diálogo não basta

Às vésperas de comemorar a posse de Dilma e iniciar o 13º ano instalado no

Palácio do Planalto, o Partido dos Trabalhadores, tomado pelos problemas

políticos, caiu numa fossa de aparente fundo existencial. Profissionais

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especializados foram contratados para descobrir as razões pelas quais parte

considerável da população foi tomada por um sentimento de ódio ao partido.

Talvez não seja uma pergunta cuja resposta dependa só de Freud.

Após 35 anos de luta bem-sucedida, naturalmente com erros e acertos, tornou-

se o mais importante partido político brasileiro liderado por Lula, também o líder

político mais influente do País.

A pesquisa, encomendada à empresa Marissol, será de âmbito nacional. O

resultado servirá de base para os debates finais do 5º Congresso Nacional do

partido, marcado para junho, em Salvador, na Bahia. O trabalho pretende

identificar se o antipetismo está concentrado em São Paulo ou espalhado pelo

País.

O resultado da eleição presidencial é uma evidência de que o problema vai

muito além de São Paulo: Dilma obteve 54 milhões, 499 mil e 901 votos

(51,64%); o tucano Aécio beliscou o calcanhar da petista: 51 milhões, 041 mil e

10 votos.

Há um sentimento nas entranhas do PT de que parte da culpa é de Dilma.

Falam de suposta antipatia da presidenta. É preciso ser lembrado que a eleição

não era um concurso para eleger a “Miss Simpatia”.

Há outro indicador, mais consistente, apoiado nas pesquisas do Ibope sobre a

preferência partidária, feito ao longo dos últimos 20 anos (tabela).

Embora haja um número excessivo de partidos registrados no Tribunal

Superior Eleitoral, apenas três influem decisivamente no Congresso: PT, PMDB

e PSDB.

O mês de março de 1994 é uma data marcante. Pela primeira vez o PT

superou o PMDB. O PSDB, com a vitória de FHC, atingiu 5 pontos e, no fim

dos oitos anos do tucano no poder, o partido nunca superou a preferência de

10% do eleitorado. É um partido de quadros sem enraizamento na sociedade.

Nesse período, PT e PMDB disputavam palmo a palmo a preferência.

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O PT é o mais cotado. A vitória de Lula, em 2002, alavanca o partido. Em 2010,

chega a ter a preferência de 33% dos eleitores. O PMDB varia em torno de 15

pontos e o PSDB, em 2007, atinge o pico de 9%.

A política sucumbe aos escândalos e os partidos entram em declínio junto aos

eleitores. Ninguém escapa. O PT despencou de 25%, em 2013, para 16%, em

2014. O PMDB tem, em toda a sua história, o menor índice de preferência do

eleitorado: 2%. O PSDB conseguiu 5%.

Os partidos, medidos pela preferência do eleitor, estão em declínio.