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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PÂMELA ROBERTA DE OLIVEIRA O PAPEL DO ENFERMEIRO NO PROCESSO EDUCATIVO EM SAÚDE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CONCEPÇÕES DE EDUCADORES E ENFERMEIROS Cuiabá - MT 2013

O PAPEL DO ENFERMEIRO NO PROCESSO EDUCATIVO EM … · Educação em Saúde. Educação Popular. Cuidado de Enfermagem. 9 ABSTRACT The kindergartens’ environments are auspicious

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

    INSTITUTO DE EDUCAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO

    PMELA ROBERTA DE OLIVEIRA

    O PAPEL DO ENFERMEIRO NO PROCESSO EDUCATIVO

    EM SADE NA EDUCAO INFANTIL: CONCEPES DE

    EDUCADORES E ENFERMEIROS

    Cuiab - MT

    2013

  • 1

    PMELA ROBERTA DE OLIVEIRA

    O PAPEL DO ENFERMEIRO NO PROCESSO EDUCATIVO EM

    SADE NA EDUCAO INFANTIL: CONCEPES DE

    EDUCADORES E ENFERMEIROS

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-

    Graduao em Educao da Universidade

    Federal de Mato Grosso, como requisito para a

    obteno do ttulo de Mestre em Educao, na

    rea de Concentrao Educao, Linha de

    Pesquisa Movimentos Sociais, Poltica e

    Educao Popular.

    Orientadora: Profa. Dra. Maria da Anunciao

    Pinheiro de Barros Neta

    Cuiab MT

    2013

  • 2

  • 3

    MINISTRIO DA EDUCAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO PR-REITORIA DE ENSINO DE PS-GRADUAO PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO Avenida Fernando Corra da Costa, 2367 - Boa Esperana - Cep: 78060900 -CUIABA/MT Tel : 3615-8431/3615-8429 - Email : [email protected]

    FOLHA DE APROVAO

    TTULO : " O papel do enfermeiro no processo educativo em sade na educao infantil:

    concepes de educadores e enfermeiros"

    AUTORA : Mestranda Pamela Roberta de Oliveira

    Dissertao defendida e aprovada em 14/03/2013.

    Composio da Banca Examinadora:

    _____________________________________________________________________________

    ____________

    Presidente Banca / Orientadora Doutora Maria da Anunciao Pinheiro Barros Neta Instituio : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO Examinadora Interna Doutora Daniela Barros da Silva Freire Andrade Instituio : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO Examinadora Externa Doutora Marilene Marzari Instituio : FACISA Examinador Suplente Doutora Rosa Lucia Rocha Ribeiro Instituio : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

    CUIAB,14/03/2013.

  • 4

    DEDICATRIA

    minha famlia: minha me, pelas suas oraes e

    palavras de conforto; ao meu filho, Daniel, por

    ser meu estmulo na superao dos obstculos; a

    minha filha de corao, Mayssa, pelo apoio

    durante a jornada; ao meu companheiro, Rodrigo,

    pelo apoio; em nome da compreenso e da

    aceitao da necessidade de estar neste curso e

    ausente nos momentos em que mais necessitaram

    de mim, durante os trs ltimos anos.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    Agradeo a Deus, pelo seu infinito amor e bondade comigo.

    A minha Luz nesta jornada, Profa. Dra. Maria Anunciao Pinheiro Barros

    Neta - Obrigada por ter me aceitado como sua orientanda! Obrigada pela sua pacincia e

    bondade!

    s amizades, (em especial Carla Sprizo Ponce), que foram construdas aqui

    no PPGE/IE/UFMT, que fizeram parte desse meu crescimento, tanto intelectual

    quanto humano, amizades que levarei para sempre comigo. Carla, nada do que eu aqui

    descrever conseguir transpor a minha imensa gratido. Obrigada por pegar em minhas

    mos e me levantar, por ser amiga, companheira, confidente, por me estimular a

    continuar minha jornada.

    secretaria do Programa de Ps-Graduao em Educao (PPGE) do Instituto

    de Educao (IE) da UFMT/Cuiab, pelo acolhimento, carinho e respeito aos

    Mestrandos, Doutorandos, Professores e visitantes do PPGE. Obrigada pela dedicao!

    Profa. Dra. Marilene Marzari, pela gentileza de aceitar o meu convite e

    fazer parte da minha histria. Pelas contribuies no estudo, pelo auxlio, companheirismo,

    pelo carinho e educao sem igual.

    Profa. Dra. Rosa Lcia Rocha Ribeiro e a Profa. Dra. Daniela Barros da

    Silva Freire Andrade, pela gentileza de aceitar meu convite e fazer parte da realizao

  • 6

    do meu sonho e pelas contribuies importantes na construo e na finalizao deste

    trabalho.

    Aos docentes do Curso de Enfermagem do Campus Universitrio do Araguaia

    CUA/UFMT, pelo apoio e companheirismo durante essa jornada.

  • 7

    Todas as pessoas esto presas numa mesma teia

    inescapvel de mutualidades, entrelaadas num nico

    tecido do destino. O que quer que afete um diretamente,

    afeta a todos indiretamente. Eu nunca posso ser o que

    deveria ser at que voc seja o que deve ser. E voc

    nunca poder ser o que deve ser at eu seja o que devo

    ser.

    (Martin Luther King)

  • 8

    RESUMO

    Os ambientes das escolas infantis so locais propcios para a disseminao de vrias doenas

    infecciosas, prprias da infncia, cuja incidncia agravada pela idade, baixa imunidade,

    tamanho do grupo, hbitos de higiene e grau de contato ntimo entre crianas e pessoas que

    prestam servios nelas. A Educao em Sade uma prtica comumente desenvolvida por

    vrias instituies e profissionais da rea, no seu cotidiano de trabalho, principalmente pelo

    Enfermeiro. O objetivo desta pesquisa compreender o papel desse profissional, no processo

    educativo em sade na Educao Infantil de Barra do Garas /MT. Trata-se de uma pesquisa

    de abordagem qualitativa, com objetivo descritivo e exploratrio. Utilizou-se como tcnica de

    levantamento de dados a entrevista gravada (gravao de voz), com roteiro semiestruturado.

    O estudo foi desenvolvido em seis CMEIs, uma CMEF e CMEI, duas CMEFs e uma EMEF.

    Participaram do estudo seis diretoras, cinco coordenadoras, sete professoras da Educao

    Infantil e sete enfermeiros do Programa de Estratgia de Sade da Famlia. Durante a anlise

    dos dados, emergiram as seguintes categorias: a atuao do Enfermeiro na Educao Infantil,

    na perspectiva da lgica biomdica; o trabalho interdisciplinar na Educao Infantil; a atuao

    do Enfermeiro na Educao Infantil, por meio da pedagogia de projetos; a ausncia/presena

    do Enfermeiro nas instituies de Educao Infantil; o conflito dos Educadores com os temas

    de sade; o cuidar e o educar na Educao Infantil aes compartilhadas ou divididas entre

    setores da Educao e Sade; a formao do Enfermeiro, consequncias de sua atuao

    profissional na educao popular e sade e o mtodo de trabalho na Educao Infantil. Os

    resultados revelaram a latente necessidade, cada vez mais crescente, da integrao dos saberes

    entre educadores e profissionais da sade, no apenas Enfermeiros, na luta por um processo

    educativo em sade que valorize a unio do cuidar e do educar, na infncia, em detrimento

    das posturas higienistas e dos discursos vinculados ao mercado de trabalho. Espera-se que as

    parcerias se fortaleam entre o Setores da Sade e da Educao, com a participao ativa dos

    cidados de cada rea, no processo de tomada de deciso, referente s condies de sade e de

    vida.

    Palavras-chave: Educao Infantil. Educao em Sade. Educao Popular. Cuidado de

    Enfermagem.

  • 9

    ABSTRACT

    The kindergartens environments are auspicious places to spread several common infectious

    diseases during childhood, whose incidence is worsen by age, immunity, group size, hygiene

    habits and degree of personal contact between children and those who provide these services

    in the schools. Health Education is a practice commonly developed by several institutions and

    professionals in their daily work, especially by the Nurse. The objective of this research is to

    understand the role of the Nurse in health education process in kindergarten in Barra do

    Garas / MT. This is a qualitative study with descriptive and exploratory aim. A recorded

    interview (voice recording) with semi-structured guide was used as a technique for gathering

    data. The study was conducted in six CMEIs, one CMEF and CMEI, two CMEFs and one

    EMEF. The participants were six directors, five coordinators, seven teachers of Early

    Childhood Education and seven nurses from Family Health Strategy Program. The following

    categories emerged during data analysis: the role of the nurse in the daycare / pre-school in

    the logic biomedical perspective; the interdisciplinary work in daycare / preschool; role of the

    nurse in the daycare / pre-school through pedagogy of project, the absence / presence of the

    nurse in the daycare / preschool; conflict of Educators with health issues; the caring for and

    the educating in daycare / preschool - divided or shared actions between Education and Health

    sectors, training for nurses, consequences of their professional performance in popular

    education and health and the working method of child education. The outcomes revealed a

    latent necessity, increasingly crescent, the integration of knowledge among educators and

    health professionals, not only nurses, in the fight for an education process in health which

    enhances the union of the caring for and the educating the children at the expense of hygienist

    postures and of discourses linked to the labor market. the partnerships between the Health and

    Education sectors are expected to be strengthen, with the active participation of the citizens in

    each area, in the process of decision making, related to health and life.

    Keywords: Early Childhood Education. Education in Health. Popular Education. Nurse

    Caring.

  • 10

    LISTA DE ILUSTRAES

    Mapa: localizao da cidade de Barra do Garas MT...........................................................50

    Foto: Barra do Garas...............................................................................................................50

  • 11

    LISTA DE TABELAS

    Tabela I Quantidades de alunos matriculados em creches e pr-escolas no municpio

    de Barra do Garas/MT............................................................................................................51

    Tabela II Identificao profissional dos sujeitos da pesquisa...............................................56

  • 12

    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    CMEI Centro Municipal de Educao Infantil

    CMEF Centro Municipal de Ensino Fundamental

    EMEF Escola Municipal de Ensino Fundamental

    USF Unidade de Sade da Famlia

    PSF Programa de Sade da Famlia

    ESF Estratgia de Sade da Famlia

    SUS Sistema nico de Sade

    CAAE Certificado para Apresentao de Apreciao tica

    TCLE Termo de Consentimento Livre Esclarecido

    CONEP Conselho Nacional de tica e Pesquisa

    CNS Conselho Nacional de Sade

    CNS Conferncia Nacional de Sade

    PSE Programa de Sade na Escola

    AMEPPE Movimento de Educao Popular Integral Paulo Englert

    GTIs Grupo de Trabalho Intersetorial

    GTI F Grupo de Trabalho Intersetorial Federal

    EPS Escola Promotora de Sade

    CIESE Comisso Intersetorial de Educao e Sade na Escola

    PNPS Programa Nacional de Promoo da Sade

    LDBEN Leis de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    LDB Leis de Diretrizes e Bases da Educao

    OMS Organizao Mundial de Sade

    HPA Protection Agency for Health - (Agncia Britnica de Proteo Sade)

    NOBs Normas Operacionais Bsicas

    CEDAPS Centro Desenvolvimento Apoio Programa Sade

  • 13

    SUMRIO

    OS CAMINHOS QUE JUSTIFICAM ESTE ESTUDO.........................................................13

    CAPTULO I ORIGENS DAS CRECHES E PR-ESCOLAS E AS CONCEPES

    DO CUIDAR E EDUCAR.....................................................................................................17

    1.1 Luzes sobre a origem e o papel das creches e das pr-escolas...........................................17

    1.2 Cuidar e Educar na Educao Infantil: breve passagem pelas mltip................................24

    CAPTULO II HISTRICO DA PROMOO DA SADE PBLICA..........................28

    2.1 Concepes de promoo da sade: resgate histrico........................................................28

    2.2 Promoo da sade na escola: sntese do Programa Sade na Escola PSE

    segundo o manual do Ministrio da Sade e do Ministrio da Educao................................44

    2.3 Promoo da sade na creche.............................................................................................48

    CAPTULO III AS CONCEPES DOS EDUCADORES E ENFERMEIROS..............49

    3.1 Local da pesquisa Barra do Garas/MT...........................................................................49

    3.2 Instituies pesquisadas......................................................................................................51

    3.3 Aspectos ticos...................................................................................................................54

    3.4 Sujeitos da pesquisa............................................................................................................56

    3.5 Metodologia de anlise dos dados......................................................................................60

    3.5.1 A atuao do Enfermeiro na Educao Infantil na perspectiva da lgica biomdica......61

    3.5.2 Trabalho interdisciplinar na Educao Infantil................................................................64

    3.5.3 Atuao do Enfermeiro na Educao Infantil por meio da pedagogia de projetos.........68

    3.5.4 Ausncia/presena do Enfermeiro nas instituies de Educao Infantil.......................70

    3.5.5 O conflito dos Educadores com os temas de sade........................................................73

    3.5.6 Cuidar e educar na Educao Infantil aes compartilhadas ou divididas entre

    educao e sade......................................................................................................................76

    3.5.7 A formao do Enfermeiro e suas consequncias na sua atuao profissional

    na educao popular e sade....................................................................................................78

    CONSIDERAES FINAIS...............................................................................................82

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...............................................................................86

    APNDICES E ANEXOS....................................................................................................93

  • 14

    OS CAMINHOS QUE JUSTIFICAM ESTE ESTUDO

    O interesse pelo tema Educao e Sade surgiu, a partir de experincias como

    Enfermeira Assistencial junto s comunidades indgenas residentes no Parque Nacional do

    Xingu/MT Alto Xingu - quando vivenciamos diferentes situaes, envolvendo o cuidado

    com a sade infantil, no apenas do ponto de vista assistencialista, mas tambm com um olhar

    integral, em que se priorizavam aes transformadoras, na promoo da sade e na preveno

    de morbimortalidades infantis.

    Essas experincias mostraram, naquele contexto, as causas de tantas doenas

    afetarem muitas crianas, sendo que poderiam ser facilmente evitadas com a prtica de aes

    simples, no cotidiano, como: a higienizao das mos, dos alimentos, do corpo, do ambiente,

    a escovao correta dos dentes, entre outros cuidados, como as orientaes para preveno de

    acidentes domsticos, ou na mata.

    A vivncia junto aos indgenas despertou-nos para a docncia a qual se efetivou

    quando de nosso ingresso no Curso de Enfermagem, no Campus Universitrio do Araguaia,

    como professora substituta e, recentemente, como professora efetiva. A nossa experincia

    como professora fez com que aumentasse ainda mais o interesse pela Educao em Sade.

    Como professora substituta, fomos levadas a orientar as prticas de estgios dos discentes, no

    que diz respeito ateno primria sade, quando os alunos realizavam diferentes aes,

    visando preveno e promoo da sade em creches, escolas, asilos, presdios, grupos de

    apoio a diferentes classes e grupos sociais.

    Atualmente, na condio de docente efetiva e, ministrando a Disciplina

    Enfermagem na Sade da criana e do adolescente, sentimos a necessidade de desenvolver

    o Projeto de Extenso Universitria - Amigos da Creche. Com esse Projeto, passamos,

    juntamente com os estudantes extensionistas, a desenvolver aes educativas para a promoo

    em sade com crianas que frequentam uma Creche, na periferia de Barra do Garas-MT.

  • 15

    Nesse contexto, percebemos a necessidade de aprofundar os estudos voltados s aes

    educativas transformadoras, no que diz respeito preveno de doenas e na promoo da

    sade infantil, reconhecendo na Educao Infantil (creches e pr-escolas) um espao propcio,

    no apenas para a Educao, mas, tambm, para desenvolver multidisciplinar e integralmente

    a ateno criana.

    A nossa vivncia junto a essas populaes fez com que surgissem alguns

    questionamentos, tais como: Qual a importncia da orientao para a sade, na Educao

    Infantil? A orientao em sade pode melhorar a qualidade de vida das crianas? Qual o papel

    do enfermeiro na orientao para a sade das crianas? Por que a sade to pouco

    trabalhada na Educao Infantil? Ser que as crianas que recebem orientao em sade

    podem influenciar na promoo da sade coletiva?

    Desses questionamentos surgiu o problema que nos propomos a pesquisar: Qual a

    concepo a respeito do papel do enfermeiro, no processo educativo em sade, na Educao

    Infantil, sob a tica dos Educadores e Enfermeiros do municpio de Barra do Garas/MT?

    O Objetivo Geral deste estudo compreender as concepes sobre o papel do

    Enfermeiro no processo educativo em sade, em creches e pr-escolas, sob a tica dos

    Educadores e Enfermeiros.

    Os Objetivos Especficos so: conhecer o trabalho do Enfermeiro, junto s creches e

    pr-escolas do municpio de Barra do Garas/MT; entender como o Enfermeiro se v dentro

    do processo educativo em sade na Educao Infantil e revelar as concepes dos

    Diretores(as), Coordenadores(as) e Professores(as) sobre o papel do enfermeiro, no contexto

    da promoo da sade nas instituies de Educao Infantil.

    Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, com objetivos descritivos e

    exploratrios. Segundo Minayo (2006), a pesquisa qualitativa responde a questes muito

    particulares, preocupando-se, nas cincias sociais, com um nvel de realidade que no pode

    ser quantificado.

    Assim, essa forma de abordagem possibilita conhecer o papel do enfermeiro no

    processo educativo para sade, em creches e pr-escolas, sob a tica dos Educadores e

    Enfermeiros. Tendo como premissa que nem tudo quantificvel e que a relao que os

    sujeitos estabelecem com o processo de cuidar, dentro das escolas, nico, o estudo demanda,

    portanto, uma anlise profunda e individualizada.

    Segundo Tobar e Yalour (2001) mtodo significa caminho e permite ao pesquisador

    desviar-se menos de seus objetivos, todavia, no garante os resultados, mas o acesso a eles.

  • 16

    No universo das pesquisas qualitativas, a escolha de mtodo e tcnicas para a anlise

    de dados deve proporcionar um olhar com vrias faces sobre a totalidade dos dados

    recolhidos, ou seja, sobre o corpus da pesquisa. Campos (2004) diz que tal fato se deve,

    invariavelmente, pluralidade de significados atribudos aos produtos de tais dados, ou seja,

    ao seu carter polissmico, numa abordagem naturalstica.

    Percorrer os caminhos da Educao Infantil uma tarefa rdua ao Enfermeiro

    bacharel. Compreender e estudar o seu prprio papel, dentro do contexto educacional, , no

    mnimo, complexo, uma vez que o tema que permeia este estudo exige do pesquisador um

    olhar multifacetado e uma indiferena aos seus prprios anseios e percepes. O corpus desta

    pesquisa interdisciplinar e, portanto, deve ser analisado como tal.

    O significado atribudo ao papel do enfermeiro na creche e pr-escola plural e, ao

    mesmo tempo, nico, pois nas entrelinhas de cada fala se revelava uma particularidade mpar.

    E, ainda, extrair a qualidade do corpus da pesquisa fundamental para uma anlise mais

    prxima de sua totalidade. Assim, a anlise dos dados tambm foi diferenciada, com teor

    cientfico, mas, sem anunciar um mtodo especfico.

    Para o investigador qualitativo, tal momento reveste-se de suma importncia, pois a

    desconsiderao de um em detrimento do outro, pode coloc-lo frente situao de negao

    completa da subjetividade humana, ou, por outro lado, a imposio de seus prprios valores, o

    que prejudicaria metodologicamente a pesquisa. Assim, deve-se encontrar um equilbrio na

    anlise de contedo entre o formalismo metodolgico e o subjetivo.

    De acordo com Malheiros (2011), fato que as pessoas observam o mundo de

    formas desiguais, interpretando subjetivamente as mais diversas situaes. A abordagem

    qualitativa permite ao pesquisador a compreenso dos diversos fenmenos das cincias

    humanas, aproximando-o das interpretaes pessoais de uma realidade objetiva; essa

    interpretao que compe os dados das pesquisas qualitativas.

    Godoy (1995, apud MALHEIROS, 2011) estabelece algumas caractersticas para a

    pesquisa qualitativa: o ambiente natural fonte dos dados; fortemente descritiva; orientada

    pelo significado que as pessoas do aos fenmenos e tem enfoque indutivo.

    Para Malheiros (2011) e Gil (2007), a pesquisa qualitativa busca descrever as

    caractersticas de uma populao ou fenmeno, enquanto a pesquisa exploratria tem como

    principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a

    formulao de problemas mais precisos, ou hipteses pesquisveis para estudos posteriores.

    O Local da pesquisa foi o municpio de Barra do Garas/MT.

  • 17

    Participaram deste estudo Diretores, Coordenadores e Professores da Educao

    Infantil e Enfermeiros dos programas de Estratgia de Sade da Famlia ESF.

    Assim, pretendemos, no primeiro captulo, abordar, de forma breve, a histria das

    creches e das instituies de Educao Infantil e as dimenses envolvidas no cuidar e no

    educar nesse nvel de educao, no Brasil.

    O segundo captulo trata dos temas sobre promoo da sade, na perspectiva

    histrica at a atualidade, com uma abordagem superficial sobre o Programa Sade na Escola

    (PSE) e promoo da sade na creche.

    O terceiro captulo traz a apresentao dos sujeitos da pesquisa e a metodologia, bem

    como a apresentao e a discusso das categorias emersas das concepes dos sujeitos sobre o

    papel do enfermeiro na Educao Infantil.

    Nas consideraes finais, pontuamos os resultados do estudo, avanos e desafios da

    participao do Enfermeiro no processo educativo em sade na Educao Infantil.

  • 18

    CAPTULO I - ORIGENS DAS CRECHES E PR-ESCOLAS E AS

    CONCEPES DO CUIDAR E DO EDUCAR

    O objetivo deste captulo fazer um contexto histrico das creches e das principais

    polticas pblicas voltadas Educao Infantil, bem como as Leis e Portarias que

    contriburam para o avano dessa histria. Tambm, refletir, brevemente, sobre as dimenses

    do cuidar e do educar, no contexto das creches e pr-escolas, no esquecendo o papel do

    Enfermeiro na promoo da sade na Educao Infantil.

    1.1 LUZES SOBRE A ORIGEM E O PAPEL DAS CRECHES E PR-ESCOLAS

    Para Santos (2004), ao longo da histria vrios caminhos foram sendo percorridos

    pela Educao Infantil e sempre relacionados com a concepo de infncia de cada poca.

    Inicialmente, ligada viso assistencial e, atualmente, fazendo parte da primeira etapa da

    Educao Bsica no Brasil.

    O mesmo autor diz que a primeira creche citada na literatura foi fundada na Frana,

    na regio dos Vosges, em 1770, destinada a assistir lactentes de famlias de camponeses.

    Fundada por um pastor da igreja local, contava com o auxlio de jovens da localidade que

    ajudavam nos cuidados com as crianas. Gradativamente, surgiram outras e, no ano de 1846,

    em Paris, havia 14 creches.

    Kuhlmann Jr. (2011) explica que as instituies pr-escolares foram difundidas,

    internacionalmente, a partir da segunda metade do sculo XIX, como parte de um conjunto de

    medidas que formam uma nova concepo assistencial. A creche, para as crianas de zero a

    trs anos, foi vista como muito mais do que um aperfeioamento das Casas de Expostos, pelo

  • 19

    contrrio, foi apresentada em substituio ou oposio a elas, para que as mes no

    abandonassem suas crianas.

    Santos (2004) organiza historicamente a expanso e o crescimento dessas

    instituies, fora do Brasil, da seguinte forma:

    1. Em Portugal, a primeira creche foi estabelecida, por volta de 1840; outras foram

    sendo organizadas, particularmente, em centros da Gr-Bretanha e demais pases da Europa.

    2. Em 1907, Maria Montessori passa a envolver-se com a educao da criana

    pequena e funda, em Roma, a primeira Casa Dei bambini para abrigar, aproximadamente,

    cinquenta crianas normais, carentes, filhos de desempregados.

    3. Houve crescimento do atendimento pr-escola, aps a Segunda Guerra Mundial,

    em funo de as mulheres ingressarem no mercado de trabalho.

    4. Nos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial, em 1941, criaram-se

    muitas creches para filhos dos empregados da indstria da guerra, mas, ao final da guerra,

    com a retirada do apoio governamental, as vagas decresceram.

    5. Em 1946, na Frana, constavam 360 creches coletivas; em 1970, 697 creches

    coletivas e 110 familiares; em janeiro de 1975, 883 creches e 284 familiares e elas

    continuaram a crescer.

    6. Na dcada de 50, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, comeou-se a

    questionar se a creche seria fonte de desadaptao de crianas, privadas do convvio materno,

    e s em 1960 provou-se, com o resultado de algumas pesquisas, que as creches no eram to

    prejudiciais como se afirmava anteriormente.

    7. Na Itlia, assim como na maioria dos pases Europeus, os servios de atendimento

    criana pequena desenvolveram-se, a partir dos anos 70, depois de uma forte presso por

    reformas; surge, ento, nessa poca, uma Lei estabelecendo creches para crianas at trs anos

    de idade e outra, ampliando escolas maternais pblicas para crianas de trs a seis anos.

    8. Na Inglaterra, no ano de 1991, eram, geralmente, organizaes privadas, sem fins

    lucrativos, que desempenhavam o papel mais significativo e inovador no setor de creches

    ressaltamos que Estados Unidos e Inglaterra atribuem a responsabilidade pela educao da

    criana exclusivamente famlia.

    9. Pases Escandinavos, a Austrlia, a Nova Zelndia e Israel, assim como alguns

    pases ex-socialistas, por exemplo, a Hungria, apresentam uma proposta de responsabilidade

    compartilhada entre a famlia e o Estado.

  • 20

    10. Por fim, o autor destaca Cuba, entre os pases da Amrica Latina, que mais

    avanou em relao pr-escola 89,9% das crianas cubanas, at seis anos, obtm ateno

    educativa.

    Finalizando este breve histrico internacional da criao de creches, faremos o

    percurso da criao das creches e pr-escolas no Brasil.

    De acordo com Ribeiro (2007), da antiguidade at o Brasil Colnia, a educao das

    crianas era realizada, em casa, pelos pais, que passavam os valores de gerao a gerao.

    Kishimoto (2001) ressalta que, em 1554, durante a colonizao, a criana de 0 a 6

    anos era uma preocupao, sobretudo para a igreja. O Padre Anchieta foi um dos

    protagonistas dos cuidados com as crianas, pois em uma de suas cartas a Portugal, menciona

    um orfanato que abrigava crianas rfs vindas de Portugal.

    Ribeiro (2007) diz que, nesse perodo, a instruo era passada pelos Padres, por

    meio da catequese, cujo objetivo principal era a converso dos indgenas f catlica e ao

    trabalho. Em um trecho do regimento da poca, fica claro o incio da organizao escolar, no

    Brasil Colnia, totalmente vinculada poltica portuguesa.

    Segundo o autor citado acima, posteriormente, o padre Manoel da Nbrega inclui os

    filhos dos colonos, rfos, mamelucos e filhos de cacique nos regimentos da educao, de

    forma diversificada, de acordo com os interesses e capacidades de cada um. A principal meta

    era ensinar a ler e a escrever, com aprendizado da lngua portuguesa, da doutrina crist,

    disciplinas obrigatrias e aulas de canto e msica instrumental, que eram opcionais. Por um

    lado, aprendiam gramtica, por outro, tinham o aprendizado profissional e agrcola, passado

    um para a populao indgena (trabalho manual, mo de obra) e outro, para a populao

    branca (trabalho intelectual, religioso). Esses ensinamentos eram direcionados apenas aos

    homens, uma vez que a educao feminina era restrita s boas maneiras e afazeres

    domsticos.

    Durante esse perodo, a assistncia sade dos pequenos era, basicamente, de ordem

    filantrpica, religiosa, mdica e higinica, voltada para a assistncia social, principalmente

    das crianas abandonadas, rfos, pobres, dentre outros.

    Com o incio do processo de industrializao capitalismo _ houve uma maior

    necessidade de alfabetizao dos colonos, assim, surgem as escolas para a instruo primria,

    em 1772. A partir desse momento, a nobreza portuguesa comeou a sentir a necessidade de

    ensinamentos por professores formados, especialistas, denominados diretor geral, podendo

    lecionar apenas se possussem uma licena, sendo inseridos na nobreza e pagos pelo Estado,

    iniciando, assim, o ensino pblico no Brasil, porm de maneira muita restrita. Para Saviani

  • 21

    (2005) esse novo modelo de educao tinha como base as ideias laicas inspiradas no Iluminismo

    racionalista.

    Segundo Kuhlmann Jr. (2011), as primeiras propostas de instituies pr-escolares,

    no Brasil, datam de 1899. Foi nesse ano que ocorreram dois fatos importantes: fundou-se o

    Instituto de Proteo e Assistncia Infncia (IPAI) do Rio de Janeiro, instituio pioneira e

    de grande influncia, que, posteriormente, abriu filiais por todo o pas; foi o ano de

    inaugurao da creche da Companhia de Fiao e Tecidos Corcovado (RJ), a primeira creche

    brasileira para filhos de operrios de que se tem registro.

    Outra entidade de assistncia famlia era o Patronato de Menores, que, segundo

    Kuhlmann Jr. (2011), foi fundado por juristas brasileiros, em 1906, no Distrito Federal. Essa

    instituio fundou a Creche Central, em 1908, e, em 1916, foi fundada a Assistncia de Santa

    Thereza.

    Santos (2004) menciona a Lei 837, de 23 de janeiro de 1985 Legislao do

    Sistema Estadual de Creches no estado do Rio de Janeiro, que considera creche toda

    instituio, ou estabelecimento prestador de servio famlia, por meio da ateno global s

    necessidades bsicas da criana da faixa etria de trs meses a seis anos.

    Essa Legislao, no momento, conta com as inovaes da LDB/96 (BRASIL,1996)

    que ampliou as discusses sobre creche em todo o pas.

    Santos (2004) pontua historicamente a criao e o crescimento das creches:

    1. Em So Paulo, as primeiras creches datam de 1909, e atendiam filhos dos

    operrios das indstrias em 1931, a creche Catarina Labour foi fundada com o objetivo de

    atender crianas carentes.

    2. O incio das atividades da Rede de Creches de So Paulo data dos anos 60,

    destacando-se a criao de creches pelo Plano Urbanstico Bsico de 1969, com a criao das

    Administraes Regionais e da Secretaria do Bem-Estar Social. Paralelamente, aconteceu a

    mobilizao da sociedade civil em torno da expanso do nmero de creches e de outros dois

    protagonistas (o movimento popular nos bairros e o movimento feminista, que, somados,

    deram origem ao Movimento da Luta por Creches).

    3. Em So Paulo, at o ms de julho de 2000, a rede contava com 726 creches, entre

    pblicas municipais e conveniadas.

    4. No estado de Minas Gerais, em Belo Horizonte, a Associao Movimento de

    Educao Popular Integral Paulo Englert AMEPPE - iniciou suas atividades em 1980.

  • 22

    No obstante, Kuhlmann Jr. (2011, p. 87) acrescenta que a creche no era defendida

    de forma generalizada, pois trazia tona conflitos, tais como a defesa da atribuio de

    responsabilidade primordial me, na educao da pequena infncia; dessa forma,

    As novas instituies no eram apenas um mal necessrio, mas

    representavam a sustentao dos saberes jurdico, mdico e religioso no

    controle da elaborao da poltica assistencial que estava sendo gestada, e

    que tinha na questo da infncia seu principal pilar. Cada saber apresentava

    as suas justificativas para a implantao de creches, asilos ou jardins de

    infncia.

    Kuhlmann Jr. (2011) explica as trs influncias bsicas que podem ser identificadas

    na composio de foras que participaram da elaborao das polticas para a infncia: mdico-

    higienista, jurdico-policial e a religiosa.

    1. Mdico-higienista: A dcada de 1870 foi marcada pela influncia mdico-

    higienista nas questes educacionais. Nesse perodo, inaugurava-se a era bacteriolgica, com

    avanos significativos para a medicina, principalmente na rea de sade da criana

    (pasteurizao do leite, avanos no combate mortalidade infantil, consultas de lactantes,

    etc). Na Educao, alguns mdicos direcionaram suas atividades profissionais e polticas

    educao primria e infantil. As creches funcionavam como laboratrios para os mdicos,

    como na creche anexa Escola Domstica de Natal (RN). A participao das mulheres na

    assistncia era estabelecida numa linha de auxiliares dos homens.

    2. Jurdico-policial: Surge o tema da chamada infncia moralmente abandonada.

    [...]determinados aspectos das vida dos operrios tais como habitao, a educao, etc.

    no so vistos como direitos do trabalhador mas como mrito dos que se mostrem mais

    subservientes (p.93). A pobreza torna-se uma ameaa tranquilidade das elites, portanto,

    seus filhos tinham maior dificuldade de acesso aos bens culturais. Em 1916, Evaristo de

    Moraes publicou um livro Criminalidade da infncia e da adolescncia; segundo o autor , as

    causas da criminalidade estava ligada a fatores individuais, hereditrios e sociais. A

    Antropologia e a Sociologia informavam o Direito nas propostas relacionadas famlia, ao

    trabalho e criminalidade infantil, visando renovao das instituies educacionais, sob a

    influncia dos setores jurdicos, como os internatos e escolas disciplinares.

    3. Religiosa: Os religiosos apresentavam a Igreja como um sustentculo da

    sociedade capitalista e sua experincia secular na caridade no deveria ser desprezada.

  • 23

    oportuno abordar alguns aspectos da legislao relacionados Educao Infantil,

    no contexto do pas, pois, para Santos (2004), a vida infantil entra em cena sob a tica do

    amparo e da assistncia e no, do direito. No pretendemos aqui fazer uma anlise profunda

    de Leis, Legislaes e Portarias, pelo contrrio, apenas discutir as principais transformaes e

    avanos que as elas representaram para a Educao Infantil no nosso pas.

    Santos (2004) lembra que os textos que aparecem no corpo das Constituies

    Federais de 1891 e 1937 mencionam a figura coerente do Estado Novo, em relao ao amparo

    infncia, como cuidado e no, dever; como amparo e no, direito. Ainda, a Constituio de

    1946 e1967 e a da junta militar de 1969 introduzem, pela primeira vez, a noo de que uma

    Lei prpria providenciaria a assistncia infncia, mas continuava existindo a figura do

    amparo.

    Um importante marco para a Educao Infantil, segundo Aranha (1996), foi a

    Constituio Federal de 1988 (BRASIL, 1988a) que traz o atendimento em creches e pr-

    escolas s crianas de zero a seis anos. A partir das linhas mestras dessa Lei Magna,

    estabelece-se a nova LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional). Aranha

    lembra que a LDB anterior, Lei no 4.024/1961, levou 13 anos para ser aprovada (de 1948 a

    1961).

    Todavia, antes da atual Constituio entrar em vigor, ressalta-se que, nas dcadas de

    70 e 80, segundo Santos (2004), muitos profissionais passaram a atuar na rea da criana, com

    enfoque para as sadias, em diversas reas do saber. Em maio de 1988, o Ministrio da Sade

    lana, por meio da Portaria 321 (BRASIL, 1988b), as Normas para construo e Instalao de

    Creches, que esto em vigor at a presente data.

    A Portaria 321 menciona que a [...] creche destina-se a crianas de trs meses a

    quatro anos, tendo em vista que essa faixa etria requer um cuidado mais individualizado

    (BRASIL, 1988b, p. 1). Nela so traadas as diretrizes, com destaque para o espao fsico, a

    serem observadas para a construo de instituies para a Educao Infantil. O documento

    no apresenta restries para inovaes e estabelece requisitos mnimos para assegurar

    melhores condies ao crescimento e desenvolvimento da criana. O cuidado individualizado

    um ponto de partida para inovaes das prticas pedaggicas e de cuidados, tendo em vista

    que a infncia uma etapa importante no desenvolvimento humano e que cada criana tem

    sua singularidade.

    Vale ressaltar que a LDB/96 (BRASIL, 1996) inclui a educao infantil como

    primeira etapa da educao bsica e visa atender crianas de zero a seis anos. Dez anos

    depois, foi aprovada a Emenda Constitucional N 53 (BRASIL, 2006), de 19 de dezembro de

  • 24

    2006, que alterou a faixa etria a ser atendida pela educao infantil, que passou a ser de zero

    a cinco anos de idade. Com isso, as crianas de seis anos passaram a fazer parte da segunda

    etapa da educao bsica.

    Segundo Santos (2004), a Constituio Federal de 1988 traz algum avano

    Educao Infantil, pois incorpora o amparo e a assistncia sob a figura do dever do Estado.

    Essa constituio inaugurou o direito da criana at seis anos Educao Infantil, ou seja,

    imps ao Estado um dever, traduzindo o desejo da sociedade que h muitos anos lutava e se

    manifestava em prol dos direitos das crianas.

    Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educao, a LDB, Lei no 9.394 (BRASIL,

    1996), a Educao Infantil tem como finalidade o desenvolvimento integral da criana at seis

    anos de idade, em seus aspectos fsico, psicolgico, intelectual e social, completando as aes

    da famlia e da comunidade.

    Cabe ressaltar que Santos (2004) menciona acontecimentos importantes, oriundos da

    LDB/96: a qualificao do educador, o registro na Secretaria de Educao e o credenciamento

    de todos os equipamentos de Educao Infantil e o Referencial Curricular Nacional para a

    Educao Infantil. Atualmente, as creches so de responsabilidade da Secretaria de Educao

    dos municpios, e, de acordo com o Art. 18 da LDB/96, pertencem aos sistemas municipais de

    ensino, podendo ser mantidas tanto pelo Poder Pblico quanto pela iniciativa privada.

    Diante do exposto, percebemos que, no Brasil, temos entidades voltadas para a

    questo da Educao Infantil e Leis e Portarias para orientar as aes nessa rea, no entanto,

    para Santos (2004), a vigncia da Lei no garante a efetividade da ao, no atendimento

    criana. Sobre isso, Santos (2004, p 15) justifica que [...] os recursos financeiros para este

    atendimento no esto claros na prpria legislao nem para a comunidade educacional e

    tampouco para as autoridades dos setores pblicos.

    Aps esse breve histrico, pensamos ser necessria uma pequena reflexo sobre os

    conceitos de Educao Infantil. Segundo Lopes, Mendes e Faria (2005), organizadoras do

    Proinfantil, a Educao Infantil pode englobar todos os ensinamentos que uma criana

    adquire, durante a infncia, em diferentes contextos: em casa, na comunidade, quanto nas

    creches, pr-escolas ou escolas.

    Corroborando, Kuhlmann, (2003, p.469) diz que:

    Pode-se falar de Educao Infantil em um sentido bastante amplo,

    envolvendo toda e qualquer forma de educao da criana na famlia, na

    comunidade, na sociedade e na cultura em que viva. Mas h outro

    significado, mais preciso e limitado, consagrado na Constituio Federal de

  • 25

    1988, que se refere modalidade especfica das instituies educacionais

    para a criana pequena, de 0 a 6 anos de idade. Essas instituies surgem

    durante a primeira metade do sculo XIX, em vrios pases do continente

    europeu, como parte de uma srie de iniciativas reguladoras da vida social,

    que envolvem a crescente industrializao e urbanizao.

    Desse modo, encaixando-se nesse contexto, emergem dois conceitos para uma nova

    reflexo dentro da Educao Infantil: o Cuidar e o Educar. Ser que podemos pensar nesses

    conceitos separados? So mltiplas as dimenses que permeiam essas palavras? Buscamos,

    desse modo, responder essas questes.

    1.2 CUIDAR E EDUCAR NA EDUCAO INFANTIL: BREVE PASSAGEM PELAS

    MLTIPLAS FCIES

    Waldow (2004) acredita que o processo de cuidar interativo entre ser que cuida

    para e com o ser que ou ser cuidado. O significado do cuidar algo a ser investigado no

    interior de cada pessoa. O enfoque cultural significa e demonstra os comportamentos de

    cuidar, em diferentes culturas e grupos sociais, e correspondem ao modo de ser de cada

    indivduo.

    Segundo Santos (2004), a creche umas das instituies mais antigas, destinadas ao

    cuidado e educao de crianas, na faixa etria de 0 a 6 anos. Ligada viso assistencial,

    somente com a LDB 9394/96 passou a fazer parte da primeira etapa da Educao Bsica, no

    Brasil, no final do sculo XX.

    De acordo com Quirino e Santos (2004), as escolas infantis so instituies criadas

    para oferecerem condies que propiciem o crescimento e o desenvolvimento integral e

    harmonioso da criana. Para realizao desse objetivo faz-se necessrio que todos os

    profissionais que atuam na creche estejam voltados para sua consecuo. nesse contexto

    que ganha nfase a equipe de sade que deve estar atenta para prevenir e intervir, em qualquer

    situao que traga consequncias desfavorveis sade, tanto das crianas quanto dos

    servidores.

    De acordo com os mesmos autores, os ambientes das escolas infantis so um local

    propcio disseminao de vrias doenas infecciosas prprias da infncia, cuja incidncia

    agravada pela idade, pela baixa imunidade, tamanho do grupo, hbitos de higiene e grau de

    contato ntimo entre crianas e pessoas que prestam cuidados.

  • 26

    Nesse sentido, trazemos para nosso discurso uma citao de Campos (2009, p.32)

    sobre a poltica da creche que respeita os direitos fundamentais da criana: As creches tm

    por objetivo educar e cuidar de crianas at 6 anos de idade.

    Para Bento (2012), o trabalho realizado por creches e pr-escolas deve ser educativo

    e visa garantir tambm assistncia, alimentao, sade e segurana s crianas. Quando a

    criana adentra o espao de Educao Infantil, traz consigo experincias ricas aprendidas com

    seus familiares e a comunidade em que vive. Entretanto, nesse espao que passa a conviver

    com outras crianas e adultos at ento desconhecidos. Cabe, entre outras atribuies, a esse

    espao de educao cuidar do bem-estar da criana, desde sua higiene at seu emocional.

    Cuidar e educar nessa etapa da vida so dimenses inseparveis e fundamentais para o pleno

    desenvolvimento e realizao do ser humano.

    O Referencial Curricular Nacional para a Educao Infantil, (BRASIL, 1998, p. 23 e

    24) criado pelo Ministrio da Educao, prope a indissociabilidade das aes de cuidar e

    educar crianas de 0 a 6 anos idade, sem hierarquizar os profissionais ou a instituio que

    atuam com as crianas pequenas. De acordo com o referencial, educar e cuidar significam,

    respectivamente:

    [...] propiciar situaes de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas

    de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das

    capacidades infantis de relao interpessoal, de ser e estar com os outros em

    uma atitude bsica de aceitao, respeito e confiana, e o acesso, a educao

    poder auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriao e

    conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estticas,

    na perspectiva de contribuir para a formao de crianas felizes e saudveis.

    [...] parte integrante da educao, embora exigir conhecimentos, habilidades

    e instrumentos que extrapolam a dimenso pedaggica, ou seja, cuidar de

    uma criana em um contexto educativo demanda integrao de vrios

    campos de conhecimentos e a cooperao de profissionais de diferentes

    reas.

    Nesse contexto, observamos tambm a indissociabilidade do cuidar e do educar nas

    Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao Infantil, (BRASIL, 2010b, p.17):

    Na observncia das Diretrizes, a proposta pedaggica das instituies de

    Educao Infantil deve garantir que elas cumpram plenamente sua funo

    sociopoltica e pedaggica [...] assumindo a responsabilidade de

    compartilhar e complementar a educao e cuidado das crianas com as

    famlias [...].

  • 27

    Nesses documentos, podemos notar a proposta de integrao entre o cuidar e o

    educar na Educao Infantil. fato que, para tal materializao, exige-se um esforo

    interdisciplinar e uma compreenso dos profissionais que fazem parte da equipe

    interdisciplinar (Educadores e profissionais da sade), das mltiplas dimenses do cuidar e do

    educar. Nesse sentido, Ruiz (2009) afirma que o desenvolvimento integral da criana s pode

    se materializar, a partir da superao da dicotomia cuidar/educar e, consequentemente, por

    meio da integrao desses dois processos. No se concebe mais uma educao que divide o

    ser humano, privilegiando apenas o aspecto cognitivo em detrimento do afetivo e tambm do

    social e do motor.

    Para complementar nossa discusso, Saupe e Bud (2006) explicam que, na dcada

    de 70, a Psicloga norte-america Bettye Caldwell estabeleceu a relao direta entre o cuidado

    e a educao, formando o termo, a partir das palavras inglesas education (educao) e care

    (cuidado). Comeou a ser utilizado no Brasil, em 1990, na rea da Educao Infantil, como

    proposta de integrao entre as diversas necessidades da criana, sendo o cuidado e a

    educao vistos como funes complementares e indissociveis. Na enfermagem, foi utilizado

    como conceito nuclear na proposio de uma Pedagogia do Cuidado.

    Ainda, Saupe e Bud (2006, p. 328) definem o termo Educare:

    [...] designa educao e provm de: e ou ex, que significa de dentro de, para

    fora, e ducere, que significa tirar, levar. Etimologicamente, portanto, a

    educao entendida como o processo de tirar de dentro de uma pessoa algo

    que j est dentro dela, ou levar para fora da pessoa aquilo que est presente

    nela mesma.

    Sobre a diversidade de sentidos da palavra cuidado, Arajo (2002) diz que Theresa

    Montenegro concebe o cuidado como o conjunto de atividades que se referem

    individualidade da criana, e designa o sentido de ateno s suas necessidades emocionais,

    respeito a seu ritmo de desenvolvimento e aprendizagem, e s suas diferenas; critica

    fortemente as vises que separam a funo da creche (cuidado) e da pr-escola (educao),

    bem como aquelas que atribuem estritamente famlia o ato de cuidar (entendido como

    amparo e assistncia), reiterando que ambas as funes (cuidado e educao) devem estar

    integradas, tanto nas creches como nas pr-escolas.

    Nessa perspectiva, voltamos o nosso olhar aos profissionais da sade, no contexto do

    cuidado na Educao Infantil. Sobre isso, Pires (2005) diz que se faz necessrio aos

    Enfermeiros a politicidade do cuidado que reside na intrnseca ambivalncia da ajuda que,

  • 28

    sendo poder, tanto domina como liberta fazeres humanos. O trip emancipativo do cuidar,

    entendido como o conhecer para cuidar melhor, cuidar para confrontar, cuidar para

    emancipar, contextualizado no capitalismo e adaptado ao processo educativo em sade, pode

    se constituir numa referncia capaz de democratizar poderes, por meio do fortalecimento da

    autonomia de sujeitos.

    Ainda, segundo o mesmo autor, a sade humana est relacionada e interdepende do

    processo educativo em sade, caracterizado como a dinmica de produo de aes na

    capacidade de aprendizagem e reconstruo de conceitos, compreenses, hbitos,

    intervenes, cultura, e valor referente sade das pessoas; envolve tanto a formao de

    profissionais quanto as prticas por eles desenvolvidas.

    O Enfermeiro o profissional que carrega, na essncia de sua prtica, o cuidado com

    a sade humana, a valorizao da subjetividade dos diferentes sujeitos assistidos em todos os

    grupos sociais. O papel de cuidador foi atribudo a ele, ao longo dos sculos, e se perpetua at

    a atualidade, quando o holstico representa sua mais profunda expresso.

    Para Silva et al. (2010), o papel do enfermeiro destaca-se dentro dessa tica, a partir

    da aproximao da promoo da sade com o processo de vida, o ato de cuidar das condies

    de sade e doenas dos indivduos e da comunidade, prioriza abordagens participativas,

    visando um enfoque integral e no meramente assistencial. Portanto, as prticas educativas

    em sade no se restringem ao profissional de sade e aos servios de sade, mas devem ter

    neles o seu lcus.

    Assim, finalizamos este captulo e convidamos prxima reflexo sobre a promoo

    da sade, tendo em vista sua indissociabilidade da sade humana, principalmente sua

    importncia para a infncia. Promover a sade na infncia intrnseco s instituies de

    Educao Infantil, sendo responsabilidade dos profissionais, independente se Educador ou

    Enfermeiro, materializar esse exerccio na rotina do atendimento criana. Promover a sade,

    na infncia, a nosso ver, mais do que cuidar, tambm educar, compreender as funes da

    creche e da pr-escola, transpondo os muros da antiga viso de amparo e assistncia que

    macularam a Educao Infantil, ao longo da histria.

  • 29

    CAPTULO II - HISTRICO DA PROMOO DA SADE PBLICA

    Objetivamos, neste captulo, abordar o histrico da construo das polticas pblicas

    de promoo da sade humana, bem como trazer alguns tpicos mais relevantes, de acordo

    com o Manual do Ministrio da Sade sobre o Programa Sade na Escola PSE_ tendo em

    vista que ele envolve, em suas aes, a Educao Infantil. No pretendemos aqui avaliar a

    efetividade de suas aes, ou aprofundarmos nessa leitura, pois esse no o objetivo principal

    do estudo. Tambm faremos algumas consideraes sobre a promoo da sade nas creches e

    pr-escolas.

    2.1 CONCEPES DE PROMOO DA SADE: RESGATE HISTRICO

    Para discutir a promoo da sade necessrio o entendimento do processo ocorrido

    nas ltimas dcadas acerca do tema sade e o seu conceito, buscando clareza sobre sua

    concepo, at alcanar a definio de promoo da sade e, posteriormente, pensar em

    como promov-la. Muitos autores se perguntam: O que um indivduo saudvel? Existe um

    lugar adequado para se promover a sade, ou uma idade ideal? Que polticas pblicas

    promovem a sade? As respostas a essas questes esto no entendimento de suas concepes

    e do processo que levou ao conceito.

    De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educao Infantil

    (BRASIL, 2010b), o processo histrico de um pas constitudo pelas suas necessidades

    econmica, poltica, cultural e social e influenciam diretamente no modo de vida de uma

    sociedade e, consequentemente, no setor da sade, modificando-a de forma individual e

    coletiva.

    Para Ferreira e Buss (2001), a partir do incio da dcada de 60 do Sec. XX, o mundo

    comeou a realizar intensos debates na rea poltica e social da sade, buscando a superao

  • 30

    do modelo at ento voltado apenas para a cura. Esses debates abriram porta para inmeros

    acontecimentos que marcaram o campo da sade e de sua promoo, em muitas partes do

    mundo.

    No Brasil, segundo os mesmos autores citados acima, at esta dcada, a sade pouco

    evoluiu e a assistncia era basicamente curativa, sendo ofertada apenas classe trabalhadora

    que contribua para a Previdncia Social; os demais cidados dependiam das casas de

    caridade, amparadas por irms e pessoas que eram renegadas da sociedade, como as

    prostitutas.

    Segundo Monken e Barcellos (2007), a partir da dcada de 1970, com a intensificao

    do processo de globalizao, as grandes transformaes sociais, polticas e culturais, e as

    mudanas do paradigma biomdico e do perfil epidemiolgico da populao, a concepo de

    promoo da sade teve uma crescente influncia no processo de formulao das polticas

    pblicas, em diversos pases do mundo.

    De acordo com as Diretrizes Curriculares para a Educao Infantil (BRASIL, 2010) e

    Buss (2000), no Brasil, a sade passou por um processo de redemocratizao social, voltado

    para uma poltica pblica de incluso, e os primeiros projetos de ateno primria, conhecida

    como medicina comunitria, nas cidades de Montes Claros (MG), Papucaia e Niteri (RJ),

    surgiram com o Movimento Sanitrio.

    De acordo com Chiesa, Francolli e Nogueira (2010), o sistema antigo se organizava

    em torno do tratamento da doena, primeiramente, pelo fato de que ela tinha apenas uma

    nica causa, ou seja, era atribuda a uma entidade ou ser, conhecida como teoria da

    unicausalidade, e, posteriormente, com o avano da tecnologia e a descoberta de

    microorganismos, a teoria passou a se chamar de teoria da multicausalidade, ou seja, existem

    vrios fatores que podem causar uma doena.

    O conceito de promoo da sade vem sendo elaborado, de forma gradual, com a

    participao de vrios segmentos polticos e sociais de muitos pases, que participaram de

    encontros, assembleias e conferncias, ao longo dos ltimos 35 anos de histria.

    Buss (1998) e a Agncia para a Promoo da Sade da Irlanda do Norte - HPA -

    propem um esquema cronolgico do desenvolvimento do campo da Promoo da Sade,

    para melhor entendimento e visualizao de todo esse processo, no perodo de 1974 a 2000:

    1974 Informe Lalonde: Uma nova perspectiva sobre a Sade dos Canadenses.

    1976 Preveno e Sade: Interesse para todos, DHSS (Gr-Bretanha).

    1977 Sade para Todos no Ano de 2000 30Assemblia Mundial de Sade.

    http://www.epsjv.fiocruz.br/pdtsp/index.php?s_livro_id=6&area_id=2&autor_id=&capitulo_id=14&sub_capitulo_id=23&arquivo=ver_conteudo_2http://www.epsjv.fiocruz.br/pdtsp/index.php?s_livro_id=6&area_id=2&autor_id=&capitulo_id=24&sub_capitulo_id=74&arquivo=ver_conteudo_2

  • 31

    1978 Primeira Conferncia Internacional sobre Ateno Primria de Sade

    Declarao de Alma Ata.

    1979 Populao Saudvel, (EUA).

    1980 Relatrio Black sobre as Desigualdades em Sade, (Gr-Bretanha).

    1984 Toronto Saudvel em 2000 Campanha lanada no Canad.

    1985 Escritrio Europeu da Organizao Mundial da Sade: 38 metas para a

    Sade na Regio Europeia.

    1986 - Carta de Otawa: I Conferncia Internacional sobre Promoo da

    Sade (Canad).

    1987 Lanamento pela OMS do Projeto Cidades Saudveis.

    1988 II Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade, sobre

    Polticas Pblicas Saudveis, em Adelaide, Austrlia.

    1988 Reunio Internacional promovida pela OMS em Riga (URSS): De Alma-

    Ata ao ano 2000 Reflexes no meio do caminho.

    1989 Documento da OMS sobre promoo da sade em pases em

    desenvolvimento: Uma chamada para a Ao.

    1990 Cpula Mundial das Naes Unidas sobre a Criana (Nova York).

    1991 III Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade, sobre

    Ambientes Favorveis Sade, em Sundsval, Sucia.

    1992 Conferncia das Naes Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

    (Rio 92).

    1992 Conferncia Internacional sobre promoo da sade na regio das

    Amricas (Colmbia) - Declarao de Santa F de Bogot.

    1993- I Conferncia de Promoo da Sade do Caribe (Trinidad e Tobago)

    Carta do Caribe para a Promoo da Sade.

    1993 - Conferncia das Naes Unidas sobre os Direitos Humanos (Viena).

    1994 Conferncia das Naes Unidas sobre Populao e Desenvolvimento

    (Cairo).

    1995 Conferncia das Naes Unidas sobre a mulher (Pequim).

    1995 - Conferncia das Naes Unidas sobre o Desenvolvimento Social

    (Copenhague).

    1996 - Conferncia das Naes Unidas sobre Assentamentos Humanos (Habitat

    II) (Istambul).

  • 32

    1996 Cpula Mundial das Naes Unidas sobre Alimentao (Roma).

    1997 IV Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade, no Sculo

    XXI, em Jacarta, na Indonsia.

    1998 Resoluo da Assemblia Mundial de Sade (Promoo da Sade).

    2000 V Conferncia Internacional sobre Promoo da Sade, Mxico.

    Neste estudo discutiremos somente os momentos mais relevantes para a

    compreenso da trajetria da Promoo da Sade.

    Como foi visualizado, o processo de Promoo da Sade, segundo Becker (2001) e

    Scliar (2007), teve seu incio em 1974, no Canad, pelo Informe Lalonde, com o enfoque:

    Uma Nova Perspectiva na Sade dos Canadenses, que procurava melhorar a distribuio de

    gastos em sade, at aquele momento destinado ao cuidado mdico curativista e com

    resultados poucos significativos. Nessa poca, as principais causas de adoecimento e morte,

    no pas, tinham sua origem em trs componentes: a biologia humana, o meio ambiente e o

    estilo de vida. Porm, segundo Lalonde, o conceito de campo rene quatro componentes: a

    biologia humana, que envolve a herana gentica e os processos biolgicos inerentes vida,

    incluindo os fatores de envelhecimento; o meio ambiente, que inclui o solo, a gua, o ar, a

    moradia, o local de trabalho sobre o qual o indivduo exerce pouco ou nenhum controle; o

    estilo de vida, que o conjunto de decises que a pessoa toma em relao a sua prpria sade,

    como fumar, ou deixar de fumar, beber, ou no, praticar ou no exerccios e a Organizao da

    Ateno Sade que significa selecionar prioridades quanto disponibilidade, quantidade e

    qualidade dos recursos destinados aos cuidados com a sade.

    Esses conceitos foram incorporados, de acordo com Ferreira e Buss (2001), aos

    determinantes sociais, durante a elaborao do Stimo Programa de Trabalho da OMS (1984 -

    1989), ocorrido na 34 Assemblia Mundial da Sade.

    Chiesa, Francolli e Nogueira, (2010) e Ferreira e Buss (2001) mencionam que, em

    1978, ocorreu a I Conferncia Internacional sobre Ateno Primria de Sade, que

    constituiu na Declarao de Alma Ata, movimento que formalizou as bases estabelecidas no

    Informe Lalonde, fazendo com que a Organizao Mundial de Sade (OMS) estabelecesse

    como meta sade para todos at o ano 2000. Apesar de manterem alguns conceitos

    baseados na preveno e na cura da enfermidade, a declarao aumentou a viso e abriu

    caminhos para uma nova forma de cuidar em sade, de cujo processo a populao pudesse

    participar, representando um avano, em termos de polticas e estratgias, voltadas para a

    ateno primria em sade, na tentativa de superar o modelo curativista vigente.

  • 33

    Abaixo, esto citados alguns trechos da declarao, de acordo com Ferreira e Buss

    (2001 p.35), deixando evidente uma mudana de pensamento, no qual j se buscava a

    promoo da sade e a relao dela com outros fatores sociais, ambientais, econmicos e

    polticos, mencionados no documento:

    I. A conquista do mais alto grau de sade exige a interveno de muitos

    outros setores sociais e econmicos, alm do setor sade;

    III. A promoo e proteo da sade da populao indispensvel para o

    desenvolvimento econmico e social sustentado e contribui para melhorar a

    qualidade de vida e alcanar a paz mundial;

    IV. A populao tem o direito e o dever de participar individual e

    coletivamente na planificao e na aplicao das aes de sade;

    VII-1. A ateno primria de sade , ao mesmo tempo, um reflexo e uma

    conseqncia das condies econmicas e das caractersticas socioculturais

    e polticas do pas e de suas comunidades;

    VII-3. Compreende, pelo menos, as seguintes reas: a educao sobre os

    principais problemas de sade e sobre os mtodos de preveno e de luta

    correspondentes; a promoo da aportao de alimentos e de uma nutrio

    apropriada; um abastecimento adequado de gua potvel e saneamento

    bsico; a assistncia materno-infantil, com incluso da planificao

    familiar; a imunizao contra as principais enfermidades infecciosas; a

    preveno e luta contra enfermidades endmicas locais; o tratamento

    apropriado das enfermidades e traumatismos comuns; e a disponibilidade

    de medicamentos essenciais;

    VII-4. Inclui a participao, ademais do setor sade, de todos os setores e

    campos de atividade conexas do desenvolvimento nacional e comunitrio,

    em particular o agropecurio, a alimentao, a indstria, a educao, a

    habitao, as obras pblicas, as comunicaes e outros, exigindo os

    esforos coordenados de todos estes setores;

    VII-5. Exige e fomenta, em grau mximo, a auto-responsabilidade e a

    participao da comunidade e do indivduo na planificao, organizao,

    funcionamento e controle da ateno primria de sade.

    Os referidos autores explicam que, nesse perodo, na Amrica Latina, a promoo da

    sade, de forma sutil, era associada apenas aos estilos de vida voltados para a ateno

    individual e de culpabilidade do prprio indivduo, com relao a sua sade ou doena.

    De acordo com Ferreira e Buss (2001), em 1980, havia uma diviso de pensamentos

    e discusses sobre o tema sade; de um lado, pregava-se uma abordagem individual; do

    outro, a falta dela era associada iniquidade social, com destaque para a medicina preventiva

    e social, aplicadas no campo da sade.

    No ano seguinte, Ferreira e Buss (2001) mencionam que foi realizada, no Canad, a

    Primeira Conferncia Nacional de Sade, integrando a classe social ao estilo de vida, como

    determinantes da sade. Nessa ocasio, ampliou-se a viso de promoo da sade, passando

  • 34

    de estilos de vida para relaes com os fatores sociais e ambientais. Em 1984, realizou-se

    outra conferncia canadense Alm do Cuidado da Sade na qual foram pautados dois novos

    conceitos: o de poltica pblica saudvel e o de cidade ou comunidade saudvel. Ela avanou

    no conceito de empoderamento e participao social, na qual a promoo era realizada pelo

    envolvimento da comunidade e relacionou esse conceito com a sade ambiental, conceitos

    que sero discutidos mais adiante, para melhor entendimento do estudo.

    Posteriormente, fruto de mobilizaes, na Amrica Latina, durante as dcadas de 70

    e 80, em decorrncia do regime autoritrio e da crise econmica, Ferreira e Buss (2001) citam

    um marco da reforma em sade no Brasil, a 8 Conferncia Nacional de Sade (CNS),

    realizada em Braslia-DF, em 1986, tendo como tema Democracia Sade. A conferncia

    tinha como objetivo descentralizar o sistema vigente e a implantao de polticas voltadas

    para o cuidado com a vida (BRASIL, 1986b).

    Buss (2000) afirma que a conferncia veio para firmar os interesses da Reforma

    Sanitria brasileira e para ampliar a sade, alm da classe formal de trabalho e garantir os

    demais direitos humanos e de cidadania, propostas que formalizaram os fundamentos do

    Sistema nico de Sade - SUS.

    Essa conferncia, segundo representou uma conquista social, reconhecida e

    transformada em texto constitucional (BRASIL,1988a), no qual a sade foi definida como

    resultante de um conjunto de fatores interligados, sendo resultante das condies de

    alimentao, habitao, educao, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer,

    liberdade, acesso e posse da terra e acesso aos servios de sade.

    A partir desses conceitos, foram realizadas outras conferncias, cinco de carter

    mundial/internacional, ocorridas em Ottawa (1986), Adelaide (1988), Sundsvall (1991),

    Jakarta (1997) e Mxico (1999), respectivamente, e duas de carter sub-regional em Bogot

    (1992) e Port of Spain (1993). Cada conferncia avanou no sentido de alcanar os objetivos

    da promoo da sade.

    Com base nesses fatos e na crise poltica que estava ocorrendo, como resposta ao

    momento de autoritarismo, em 1986, aconteceu a I Conferncia Internacional sobre

    Promoo da Sade, ocorrida em Ottawa, Canad, que definiu e ampliou mais o conceito

    de sade proposto anteriormente, integrando promoo concepo de sade. A Carta de

    Otawa foi um marco histrico na ampliao do conceito de Promoo da Sade discutido,

    anteriormente, na Conferncia de Alma Ata, em 1978. O Projeto Promoo da Sade

    (BRASIL/MS, 2002, p. 60) define:

  • 35

    Promoo da sade o nome dado ao processo de capacitao da

    comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e sade,

    incluindo uma maior participao no controle deste processo. Para atingir

    um estado de completo bem-estar fsico, mental e social os indivduos e

    grupos devem saber identificar aspiraes, satisfazer necessidades e

    modificar favoravelmente o meio ambiente. A sade deve ser vista como um

    recurso para a vida, e no como objetivo de viver. Nesse sentido, a sade

    um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais, bem como

    as capacidades fsicas. Assim, a promoo da sade no responsabilidade

    exclusiva do setor sade, e vai para alm de um estilo de vida saudvel, na

    direo de um bem-estar global.

    De acordo com Chiesa, Francolli e Nogueira (2010), essa conferncia caracterizou a

    Promoo da Sade como um processo de capacitao individual e coletiva da populao para

    atuar sobre sua prpria sade, em busca de uma melhor qualidade de vida, unindo a

    comunidade, o setor sade e o governo, na responsabilidade sobre a sade de todos, buscando

    a equidade. Esses avanos tiraram um pouco o foco da cura da doena, direcionando a ateno

    para os seus determinantes sociais.

    Ainda, segundo os autores acima, de acordo com o documento, os requisitos ou

    condies bsicas de sade so: paz, habitao, educao, alimentao, renda, ecossistema

    estvel, recursos sustentveis, justia social e equidade. O documento tambm demonstrou

    que o desenvolvimento social, econmico e pessoal, assim como fatores polticos,

    econmicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biolgicos podem melhorar, ou

    prejudicar a sade.

    Ainda segundo o mesmo Projeto (BRASIL, 2002), as aes de promoo da sade

    tm como objetivo tornar essas condies cada vez mais favorveis para uma melhor

    qualidade de vida, objetivando a reduo das desigualdades em relao sade da populao,

    disponibilizando oportunidades e recursos para atingir a igualdade, tendo como base slida:

    ambientes favorveis, acesso informao, a experincias e habilidades na vida, bem como

    oportunidades que permitam fazer escolhas por uma vida mais sadia. Para isso necessria

    uma interao entre governo, setor da sade e outros setores sociais e econmicos,

    organizaes voluntrias e no governamentais, autoridades locais, indstria e mdia, cada um

    atuando, de acordo com as necessidades de cada pas, estado e regio, levando em

    considerao sua poltica, cultura e economia.

    Pela importncia de tal documento faz-se necessria uma explanao sobre cinco

    campos de atuao para a promoo da sade, a fim de que se possam alcanar os objetivos

    da Alma Ata, sendo eles: a construo de polticas pblicas saudveis; criao de ambientes

  • 36

    favorveis sade; desenvolvimento de habilidades; reforo da ao comunitria e

    reorientao dos servios de sade.

    A construo de polticas pblicas saudveis foi o tema da conferncia, dois anos

    aps o encontro em Otawa, em 1986, na cidade de Adelaide. O tema e a conferncia sero

    discutidos, posteriormente, neste estudo.

    Segundo Buss (2003), a criao de ambientes favorveis sade trata tanto da

    preservao dos recursos naturais, quanto dos ambientes modificados pelo homem. A

    conferncia de Otawa (1986) coloca que a conservao dos recursos naturais e a preservao

    do meio ambiente deveriam ser uma estratgia de promoo da sade e uma responsabilidade

    do mundo.

    Os estudos de Monken e Barcellos (2007) dizem que, para auxiliar na concretizao

    dessa estratgia, foi criado, no Brasil, o Estatuto da Cidade (BRASIL/Lei federal 10.257, de

    10 de julho de 2001), que define o Plano Diretor Municipal como um instrumento bsico na

    orientao da melhor forma possvel e saudvel de ocupar os espaos do municpio. O plano

    viria a diminuir as desigualdades, pois distribui as terras, de forma urbanizada e regularizada,

    o que contribui para o desenvolvimento sustentvel das cidades brasileiras.

    Para Buss (2003), o reforo da ao comunitria, tambm chamado de

    empowerment comunitrio, o poder tcnico e a conscincia poltica da populao na tomada

    de decises para a melhoria de vida e da sade. Para isso, Batistela (2007) e O Projeto

    Promoo da Sade (BRASIL, 2002) afirmam que a populao precisa ter acesso

    informao e condies para a aprendizagem e apoio financeiro adequado.

    Os autores acima dizem que o desenvolvimento de habilidades pessoais um dos

    campos mais polmicos e criticados, pois se, por um lado, imprescindvel a divulgao de

    informaes sobre diferentes aspectos relativos sade de modo que a populao tenha

    como orientar suas condutas por outro, quando essa perspectiva adotada como o prprio

    conceito de promoo, opera-se um reducionismo que empobrece a potencialidade de seu

    alcance.

    Segundo a Carta de Otawa, esse desenvolvimento pessoal e social deve ser feito

    por meio da divulgao de informao, de educao para a sade e da intensificao das

    habilidades vitais. Alm disso, necessrio preparar as comunidades para o enfrentamento de

    doenas crnicas e causas externas, a fim de que possam fazer suas prprias escolhas para

    terem uma melhor sade. Essa capacitao deve ser realizada nas instituies de ensino,

    creches, nos lares, nos locais de trabalho e em outros espaos comunitrios, formando o que

    conhecemos, atualmente, como educao em sade.

  • 37

    Seguindo a mesma linha de raciocnio a reorientao dos servios de sade se baseia

    na responsabilidade de todos, como indivduos, cidados, profissionais, gestores, grupos,

    comunidades pela promoo da sade nos seus servios, trabalhando juntos para alcanar um

    nvel melhor de sade. Esto os gestores responsveis em prover melhores servios,

    respeitando as peculiaridades culturais, apoiando as necessidades individuais e comunitrias

    para uma vida mais saudvel, abrindo canais entre o setor sade e os setores sociais, polticos,

    econmicos e ambientais. Tudo isso em parceria com a pesquisa em sade, melhor

    capacitao dos profissionais, para uma atuao integral.

    A Carta de Ottawa continua sendo o principal marco de referncia da promoo da

    sade, em todo o mundo, e passa por um processo de comprovao, por meio de documentos,

    oriundos das diversas conferncias espalhadas pelo mundo, com foco na promoo.

    Devido importncia desse documento para a sade, torna-se necessrio descrever

    as estratgias-chave, descritas por Ferreira e Buss (2001):

    a responsabilidade internacional que prev que os pases mais desenvolvidos

    assegurem que suas prprias polticas resultem em impactos positivos sobre a sade das

    naes em desenvolvimento;

    a nfase em polticas relativas sade da mulher, alimentao e nutrio, ao

    controle do tabaco e do lcool e criao de ambientes favorveis;

    a procura de equidade, visando superar a pobreza e lograr um desenvolvimento

    sustentvel, com o pagamento da dvida humana e ambiental acumulada pelos pases

    industrializados;

    o respeito biodiversidade, tendo em vista a interdependncia entre os seres vivos e

    as necessidades de futuras geraes, com especial referncia aos povos indgenas e sua

    possvel contribuio ambiental;

    a ampliao dos determinantes da sade, com a considerao de fatores

    transnacionais, a integrao da economia global, os mercados financeiros e o acesso aos

    meios de comunicao;

    a promoo da responsabilidade social com o empoderamento da populao e o

    aumento da capacidade da comunidade para atuar nesse campo;

    a definio de espaos/ambiente para a atuao no processo de promoo da sade

    (escolas, ambientes de trabalho, etc.) e o intercmbio de informaes sobre a efetividade de

    estratgias nos diferentes ambientes/territrios;

    o impulso cultura da sade, modificando valores, crenas, atitudes e relaes que

    permitam a produo e utilizao de ambientes saudveis;

  • 38

    a convocao e mobilizao de um grande compromisso social para assumir a

    vontade poltica de fazer da sade uma prioridade;

    a construo de alianas e coordenao, especialmente com os meios de

    comunicao que desempenham importante papel por seu considervel poder e prestgio na

    formulao de polticas e programas que influem na sade da populao.

    Fundamentado em todo o encontro e seguindo as estratgias propostas, acreditava-se,

    em 1978, que Sade para todos no ano de 2000 seria uma realidade.

    Segundo Ferreira e Buss (2001), a II Conferncia Mundial de Promoo da

    Sade, realizada em 1988, na cidade de Adelaide, na Austrlia, tinha como tema Polticas

    Pblicas Saudveis. Nessa oportunidade, vrios setores sociais deveriam formular polticas,

    levando em considerao a sade como bem essencial e sua responsabilidade pelas decises,

    dando-lhe a mesma ateno como a que dada para a economia, pois, investir em sade, no

    presente, significa maior produtividade no futuro, tudo isso tendo como foco a melhoria de

    vida e trabalho da populao, para a superao das desigualdades.

    De acordo com a Carta, todos os pases desenvolvidos tm a obrigao de promover

    a equidade, criando polticas voltadas para todos os campos da sociedade, priorizando a

    ateno para os grupos que vivem em desvantagem social, desprivilegiados e vulnerveis.

    Alm disso, devem reconhecer, como peculiar, a cultura de povos indgenas, minorias ticas e

    imigrantes, que devem ter acesso igualitrio aos servios de sade. Esses servios devem estar

    sob avaliao, para que se possa medir e difundir o impacto dessas polticas na sade,

    deixando esses dados disponveis para a populao, dando educao e meios para que ela

    entenda o significado de todo o processo descrito, ajudando na reformulao de polticas

    pblicas saudveis, seguindo as transformaes crescentes no campo social, econmico e das

    inovaes tecnolgicas.

    Nessa conferncia foram identificadas quatro reas de ao para uma vida mais

    saudvel, de acordo com o Projeto Promoo da Sade (BRASIL, 2002) e Ferreira e Buss

    (2001):

    Sade da mulher: as mulheres so as principais promotoras da sade, em todo o

    mundo, devendo ser reconhecidas financeiramente e respeitadas politicamente; assim, urge

    propor que os pases comecem a desenvolver planos nacionais para a promoo de polticas

    pblicas voltadas sade da mulher, tendo igualdade de direitos na diviso de trabalho

    existente na sociedade; prticas de parto baseadas nas preferncias e necessidades;

    mecanismos de apoio trabalhadora, como: apoio a mulheres com crianas, licena-

    maternidade e para acompanhamento dos cuidados a filhos doentes, entre outras.

  • 39

    Alimentao e nutrio: garantir o acesso universal e quantidade de alimentos de boa

    qualidade, criar polticas de alimentao e nutrio integradas a mtodos de produo e

    distribuio de alimentos, nos setores pblico e privado, para atingir preos equitativos. Os

    pases devem articular aes diretas, em todos os nveis, para aumentar o poder de compra no

    mercado de alimentos e assegurar que os estoques, sob sua responsabilidade e controle,

    garantam ao consumidor acesso rpido a uma alimentao mais saudvel (incluem-se a,

    tambm, os estoques de alimentos em e para hospitais, escolas, abrigos e locais de trabalho).

    Tabaco e lcool: alertar a todos os governos para o elevado potencial humano

    perdido por doenas e mortes causadas pelo uso do fumo e consumo abusivo do lcool. Os

    governos devem se comprometer em desenvolver polticas pblicas voltadas sade, traar

    metas nacionais significativas para reduzir a produo de tabaco e distribuio de lcool,

    assim como do marketing e do consumo, para o ano 2000.

    Criao de ambientes favorveis: a administrao e gesto ambiental devem proteger

    a sade humana dos efeitos adversos, diretos e indiretos, de fatores biolgicos, qumicos e

    fsicos; devem ainda reconhecer que homens e mulheres so parte do complexo ecossistema

    universal e que a preservao dos recursos naturais deve ser uma das prioridades para os

    governos.

    Em sntese, o citado Projeto (BRASIL, 2002) e Ferreira e Buss (2001) afirmam que,

    para que todas essas metas sejam alcanadas, necessria uma cooperao internacional na

    construo de polticas pblicas saudveis, junto com o compromisso global para uma sade

    pblica adequada para todos.

    No Brasil, a Constituio Federal de 88 acrescenta mais um fator na concepo de

    sade, tornando-a um direito de todos e dever do Estado, fator este que fez surgir muitas

    outras mudanas no setor da sade. Porm, essa conquista ainda passa longe da realidade de

    muitas pessoas, uma vez que os servios de sade no esto preparados poltica e

    tecnicamente para atuarem, de acordo com a referida legislao. Sabemos que essa conquista

    s se efetivar, quando o modelo biomdico, voltado s aes curativas e assistenciais, passar

    por um processo de reorganizao. Entretanto, Batistella (2007) acredita que a promoo da

    sade uma possibilidade de mudar esse contexto.

    Buss (2000) explica que, na dcada de 1990, no Brasil, houve uma reestruturao do

    sistema de sade, com a constitucionalizao do Sistema nico de Sade SUS; para

    reafirmar os princpios promocionais da constituio, foi criada a Lei Orgnica de Sade, e

    organizados os Conselhos de Sade, com participao popular, composio paritria e

    representao intersetorial, alm da criao de programas para Agentes Comunitrios de

  • 40

    Sade, do Programa Sade da Famlia PSF - e das Normas Operacionais Bsicas NOBs.

    Assim, debates sobre sade e municpios saudveis colocam o sistema para andar.

    Scoli e Nascimento (2003) dizem que a III Conferncia Internacional sobre

    Promoo da Sade que ocorreu, em 1991, na cidade de Sundsvall, na Sucia, voltou sua

    ateno para temas Ambientes Favorveis Sade, com nfase na sade ambiental e ecologia,

    guiados pelo princpio da equidade. Buss (2000) diz que essa conferncia ampliou a

    conscincia dos indivduos, para a preservao do meio ambiente, para se evitar um desastre

    ambiental.

    Corroborando, o Projeto Promoo da Sade (BRASIL, 2002) e Ferreira e Buss

    (2001) afirmam que foram elaborados quatro aspectos para um ambiente favorvel e promotor

    de sade:

    A dimenso social para a qual as mudanas na forma de vida das pessoas, o

    isolamento social, em consequncia da vida virtual, com perda de valores tradicionais e da

    herana cultural, podem ameaar a sade.

    A dimenso poltica que requer dos governos a garantia da participao

    democrtica nos processos de deciso e a descentralizao dos recursos e das

    responsabilidades, compromissados com os direitos humanos.

    A dimenso econmica que requer o reescalonamento dos recursos e o

    desenvolvimento sustentvel, o que inclui a transferncia de tecnologia segura e correta.

    O reconhecimento da capacidade e do conhecimento das mulheres esse

    reconhecimento deve ocorrer em todos os setores, inclusive nos setores poltico e econmico.

    Alm dos aspectos citados, Ferreira e Buss (2001) mencionam quatro estratgias de

    ao em sade pblica que visam promover a criao de ambientes favorveis, em nvel da

    comunidade: reforar a defesa da proposta por meio de aes comunitrias, particularmente

    dos grupos organizados de mulheres; capacitar comunidade e indivduos a ganhar maior

    controle sobre sua sade e ambiente, por meio da educao e maior participao nos

    processos de tomada de deciso; construir alianas para a sade e os ambientes favorveis, de

    maneira a reforar a cooperao entre as campanhas e estratgias nas reas da sade e do

    ambiente e mediar os interesses conflitantes na sociedade, de modo que se possa assegurar o

    acesso igualitrio a ambientes favorveis sade.

    Em sntese, ficou evidente, at o momento, em todas as conferncias, a busca pela

    equidade, a participao popular e a importncia da informao baseada na educao para

    aumentar o poder de deciso da populao, na hora de escolher o melhor meio para se

    desenvolver a qualidade de vida.

  • 41

    Chiesa, Francolli e Nogueira (2010) dizem que, na Amrica Latina, foi realizada a

    Conferncia Internacional de Promoo da Sade, em Santaf de Bogot, na Colmbia,

    em 1992, que mostrou a precariedade das condies de vida das pessoas no continente e

    buscou a incluso e a transformao das relaes, de forma a que se mantivessem os

    interesses econmicos e sociais para o bem-estar de todos.

    Segundo o Projeto Promoo da Sade (BRASIL, 2002), em 1993, foi assinada a

    declarao de Santaf de Bogot, intitulada "Promoo e Igualdade", por 21 pases,

    representantes do continente americano, afirmando que esses pases buscam o bem-estar

    geral, no qual o desenvolvimento e a sade andam em conjunto. Para o sucesso de suas aes,

    a solidariedade e a equidade so fundamentais.

    Ainda, na mesma ocasio, algumas estratgias foram definidas, com base nas

    propostas da Carta de Ottawa, a fim de colocar em prtica os elementos da promoo da

    sade: estimular a cultura da sade, modificar valores, crenas, atitudes e relaes para

    facilitar opes saudveis e melhor longevidade, com a criao de ambientes sadios; colocar

    em evidncia as polticas de promoo da sade para garantir o acesso universal aos servios

    de ateno; modificar os fatores condicionantes para morbimortalidade, por meio da formao

    da conscincia da populao a respeito da importncia da sade; tornar a sade uma

    prioridade, por meio da vontade poltica, da mobilizao, fazendo-a um compromisso social,

    na tentativa de modificar as relaes sociais, eliminando a marginalidade, a iniquidade, a

    degradao ambiental e o mal-estar que elas produzem.

    De acordo com Buss (2000) e o documento brasileiro citado (BRASIL, 2002), em

    Jakarta, na Indonsia, em 1997, a IV Conferncia Internacional de Promoo da Sade

    teve como destaque o reforo da ao comunitria, voltada para a participao popular,

    atuando na melhoria da qualidade de vida da sociedade e o surgimento de novas parcerias

    com os setores pblicos e privados. Foram destacados os mtodos de promoo da sade

    baseados na combinao das cinco estratgias preconizadas pela Carta de Ottawa, tendo mais

    eficcia que os mtodos centrados em um s campo, alm da ampliao do campo de

    execuo de suas estratgias, tornando-as mais integrais e com maior campo de atuao, como

    cidades, comunidades locais, escolas e trabalho.

    A V Conferncia Internacional de Promoo da Sade foi realizada, segundo

    Chiesa, Francolli e Nogueira (2010), na Cidade do Mxico, em 2000, onde houve uma

    discusso para o fortalecimento dos determinantes sociais, econmicos e ambientais em

    sade, voltados para a promoo da sade, para garantir a equidade e a melhoria de vida.

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    A partir dessas conferncias, obteve-se maior nfase da promoo da sade, tendo

    maior reconhecimento poltico. Segundo a Organizao Pan-Americana de Sade -OPAS, a

    promoo da sade foi posta como prioridade e definida como a soma das aes da

    populao, dos servios de sade, das autoridades sanitrias e de outros setores sociais e

    produtivos, dirigidas para o desenvolvimento de melhores condies de sade individual e

    coletiva.

    Em 2005, segundo Westphal (1994), ocorreu em Bangkok, na Tailndia, a VI

    Conferncia Global de Promoo da Sade, momento em que foram colocadas em pauta as

    influncias positivas e negativas da globalizao, relacionadas sade.

    Para Buss (2000), a concepo atual de promoo da sade s se desenvolveu com

    mais fervor nos ltimos vinte anos, em consequncia das Conferncias Internacionais sobre

    Promoo da Sade, realizadas nos ltimos 12 anos, e elas foram primordiais para

    desenvolver as bases conceituais e polticas do tema.

    Ainda, nessa linha de raciocnio, o mesmo autor acima diz que o conceito de sade se

    torna fundamental; ele passou da ausncia de doena ou enfermidade, para um completo

    estado de bem-estar fsico, mental e social, conceito este fundamentado no modelo biomdico,

    no qual o corpo era visto como uma mquina, sendo, ento, objeto de uma viso mais

    holstica, que v o indivduo de forma completa, inserido em um meio social.

    Aps esse breve contexto histrico sobre sade e promoo da sade vamos

    conceitu-la de acordo com a OMS que, por sua vez a define, segundo a Agncia de

    Promoo da Sade da Irlanda do Norte HPA (2004), como um processo no qual as pessoas

    possuem maior controle sobre sua sade e seus determinantes, ampliando esse conceito para o

    campo social e poltico, e reconhecendo a sua participao, individual e coletivamente, o que

    essencial para melhorar a sade e sustentar as aes de sua promoo .

    Assim, promover sade desenvolver meios para as pessoas garanti-la, ou capacit-

    las para isso, tendo maior autonomia nas decises, de acordo com sua vontade e seu bem-

    estar, s que em articulao com todos os outros setores sociais, criando meios favorveis de

    lazer, oportunidade de emprego e educao permanente, apoio social, condies adequadas de

    habitao e saneamento, alimentao e nutrio adequadas ao acesso aos cuidados de sade.

    considerada pela CEDAPS (2012) um direito humano fundamental, e s se constroem

    ambientes favorveis sade ou saudveis, por meio de: educao de qualidade; servios de

    sade; ar limpo, natureza, saneamento; segurana e paz; transporte; moradia; alimentao;

    recr