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OU ENCARE edição especial

O Pasquim - Música de Resistência na Ditadura

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Essa é uma publicação fictícia elaborada para a disciplina História da Comunicação, do curso Comunicação e Multimeios, da Universidade Estadual de Maringá. Editores: Beatriz Colnago, Giulliana Dias Pereira e Phill Natal. Capa: Giulliana Dias Pereira. Diagramação: Phill Natal.

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OU ENCARE

edição especial

os movimentostropicália No ano de 1967, em plena vigência da ditadura militar no Brasil, surge a Tropicália, com o objetivo de criar “algo diferente de tudo”, “como pertencente a uma outra dimensão”, negando – e, porque não, rompendo com – quase toda a música popular já existente no país. Esse movimento de

contracultura expressava sua ânsia de rebeldia nas vestimentas, nos discursos e na própria postura dos integrantes, sendo, portanto, muito mais que uma mera reunião de acordes dissonantes. O grupo-núcleo contava com Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa, Tom Zé, Os Mutantes (Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias) e Rogério Duprat. Nara Leão, José Carlos Capinan, Torquato Neto e Rogério Duarte também tiveram alguma influência no movimento, fazendo aparições esporádicas, inclusive na gravação do primeiro álbum, o disco-manifesto –Tropicália ou Panis et Circencis, lançado em 1968.

mpb Música Popular Brasileira é um gênero musical que surgiu nos finais dos anos 60 no Brasil, alavancado pelo movimento musical da Bossa Nova, que encontrava-se em declínio. No contexto brasileiro, a época era de efervescência política, cultural, econômica diante do poder totalitário, o Golpe de 64, a ditadura militar, manifestações, censura, protestos, movimentos estudantis, a contracultura. A MPB foi utilizada também como crítica velada da injustiça social e da repressão governamental, muitas vezes baseadas em uma oposição de cunho progressista à cena política caracterizada pela ditadura militar, a concentração da propriedade da terra, e imperialismo. Os artistas e o público da MPB foram em grande parte ligados aos estudantes e intelectuais, fazendo com que mais tarde a MPB fosse conhecida como “a música da universidade. O que possibilitou a grande acesso a esse novo estilo musical foram os festivais transmitidos pelos canais de televisão da época e, dentre os principais artístas estavam Chico Buarque, Maria Bethânia, Elis Regina e Geraldo Vandré.

ai-5

Liberdade

reuniões

Roupa

Internet

Não poderia usar camisetas com o

rosto do Che Guevara, por

exemplo.

Não poderia andar em grupos,

participar de protestos, organizar

reuniões e festas.

Não poderia acessar Redes

Sociais, escrever em Blogs, etc.

Não poderia cantar ou ouvir músicas com conteúdo político ou

falar mal do presidente da

república.

Coisas que não poderiamser feitas se o ai-5 ainda

estivesse em vigor

curiosidadesCHICO BUARQUE O cantor ficou exilado na Itália, entre 1969 e 1970, quando voltou mandou para avaliação da censura a canção “Apesar de Você”, sem muita esperança que fosse aprovada e não só foi, como não sofreu nenhum corte. Chico Buarque a gravou imediatamente e vendeu mais de 100 mil cópias, porém, a história não terminou bem. Um jornal comentou que a música fazia referência ao presidente Médici, o que fez com que o exército brasileiro invadisse a fábrica da

Philips e aprendesse todos os discos, destruindo-os depois. Em 1973, mais uma canção passou pelo veto, “Cálice”, sendo proibida de ser cantada e gravada, mas o baiano Gilberto Gil decidiu desafiar a ditadura e cantou a composição de Chico Buarque em um show para estudantes. Foi uma forma de homenagear o estudante, Edson Luís de Lima Souto, que tinha sido morto pela ditadura em março de 1968. Na segunda vez que a música de Chico, proibida pelos militares de ser cantada, ia ser apresentada pelo compositor e Gilberto Gil, eles tiveram o microfone desligado, isso aconteceu durante o evento chamado “Phono 73”, promovido pela gravadora Polygram. Se tratou de um recuo da organizadora do festival para não ter problmeas com os militares. Chico Buarque chegou a adotar, no início da década de 1970, o pseudônimo Julinho de Adelaide para ter suas músicas aprovadas. Com esse nome, conseguiu passar a música “Acorda, Amor, um clara referência à repressão policial do regime.

ESCOLA DE SAMBA SALGUEIRO Nem mesmo as escolas de samba ficaram imunes à censura do regime militar. A Acadêmicos do Salgueiro, escola que renovou a estética dos desfiles do carnaval carioca, foi a primeira a enfrentar o olhar vigilante da ditadura, em 1967, com o enredo “A História da Liberdade no Brasil”, do carnavalesco Fernando Pamplona. Segundo o pesquisador e historiador do carnaval Haroldo Costa, em seu livro “Salgueiro, 50 Anos de Glória”, os agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), a polícia política do regime, tinham cadeira cativa nos ensaios da escola, devido ao tema.

TAIGUARA Outro nome que se opôs fortemente a ditadura militar foi o cantor Taiguara, que passou a ser observado pelos militares em 1971. Em 1973, teve um álbum com 11 músicas proibidas. Depois desse episódio, se exilou em Londres e gravou um LP todo em inglês, mas não pode lançá-lo, a sua gravadora, EMI, recebeu um veto da polícia federal brasileira. Taiguara não se deu por vencido e recorreu ao chamado Conselho Superior de Censura, era o ano de 1982, conseguindo que o seu álbum fosse totalmente liberado, sem cortes.

GERALDO VANDRÉ A perseguição aos cantores brasileiros continuou por parte dos militares, e aquele que passou a ser considerado o inimigo número 1 da ditadura foi Geraldo Vandré, que teve a sua canção “Pra Não Dizer que Falei das Flores” como hino contra o sistema opressor. Alguns historiadores afirmam que foi essa a canção que

impulsionou a criação do AI 5, que a proibiu de ser executada e só voltou a ser ouvida em 1979. E claro, o seu autor, Geraldo Vandré, também foi obrigado a se exilar, entre os anos de 1969 e 1973.

NEY MATOGROSSO Em 1973, explodiu a banda Secos&Molhados. Ney Matogrosso, João Ricardo e Gerson Conrad, que subiam aos palcos com os rostos pintados. O estilo andrógeno de Ney Matogrosso, que se apresentava sem camisa e com roupas decoradas com plumas e mais o seu rebolado fez com que a censura ficasse de olho neles, considerado um problema à moral e bons costumes da época. Ficou então, proibido que as câmeras focassem o cantor.

você sabia?

O Bêbado e a Equilibrista

ComposiçãoAldir Blanc

e João Bosco

Caía a tarde feito um viadutoE um bêbado trajando lutoMe lembrou CarlitosA lua tal qual a dona do bordelPedia a cada estrela friaUm brilho de aluguel

E nuvens lá no mata-borrão do céuChupavam manchas torturadasQue sufoco!Louco!O bêbado com chapéu-cocoFazia irreverências milPra noite do BrasilMeu Brasil!

Que sonha com a volta do irmão do HenfilCom tanta gente que partiuNum rabo de fogueteChoraA nossa Pátria mãe gentilChoram Marias e ClarissesNo solo do Brasil

Mas sei que uma dor assim pungenteNão há de ser inutilmenteA esperançaDança na corda bamba de sombrinhaE em cada passo dessa linhaPode se machucar

Azar!

IntérpreteElis Regina

A esperança equilibristaSabe que o show de todo artistaTem que continuar

interpretação

Gravada em 1979, esta música de João Bosco (melodia) e Aldir Blanc (letra), retrata uma época marcante da história do Brasil e tornou-se um hino à anistia no período final da ditadura militar iniciada no golpe de 1964. Este texto é um discurso de denúncia e esperança: O “Bêbado” é a classe artística, representada pelo seu símbolo-maior, Carlitos, personagem de Charles Chaplin, com toda sua aura de liberdade e utopia. A “Equilibrista” representa aquele fio de esperança que estava surgindo, a democracia. Desta forma, ambos, a classe artística e a esperança de democracia tinham que se equilibrar em suas “cordas-bambas” para poderem atingir seus objetivos. “E um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos”… O “traje de luto” simboliza o estado no qual a classe artística encontrava-se na época, pela falta de liberdade de criação. Invariavelmente, todo fim de tarde sugere melancolia e tristeza, uma vez que estamos saindo da claridade do dia para a escuridão da noite. Aldir Blanc utilizou esta imagem para representar a situação na qual vivia o Brasil. Além de quê, sabe-se que as sessões de torturas eram realizadas nos porões do DOI-CODI durante a noite. Dentro do texto, o protesto contra as torturas que ocorriam na calada da noite fica evidente. Para saudar essa noite do Brasil, só se justificava se fosse na alegria etílica de um bêbado. Somente num estado de loucura poderia se reverenciar aquela realidade. O nacionalismo aparece nas entrelinhas com o Hino Nacional. “A nossa pátria, mãe gentil” abrigava as esposas e mães que choraram por seus filhos e maridos. A primeira entidade organizada para lutar pela anistia foi o MFA – Movimento Feminino pela Anistia, criado em 1975. O texto também fala dos exilados, como foi o caso do sociólogo Betinho, irmão de Henfil, e relembra as mortes do jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manuel Fiel Filho ao citar os nomes de suas esposas, Maria e Clarisse, respectivamente. Este texto traz a voz de alguém que num momento de consciência, acorda para um mundo totalmente adverso, observa o que está à sua volta, o céu da cidade, um bêbado, o cair da tarde. Tudo é estranho e triste. Mesmo assim há uma esperança que não abandona a sua missão. Por isso pode-se vislumbrar a liberdade e sonhar com ela, mesmo quando os olhos só vêem a opressão. Fica claro no texto que o desejo de liberdade sempre vai estar no coração do homem. Esta é a sua arte.

DIRCEU, J., PALMEIRA, V., BASTOS, S., BECKER, P., & ROITMAN, A. Abaixo a ditadura. Editora Garamond, 1998. MACHADO, Marcelo. Tropicália. Bossa Nova Films, 2012. PINHEIRO, Manu. Cale-se-MPB e a ditadura no Brasil. Livros Ilimitados, 2011. SOARES, Gláucio Ary e D’ARAÚJO, Maria Celina (orgs.), 21 Anos de Regime Militar: Balanços e Perspectivas. Rio de Janeiro, FGV Editora, 1994. WERNECK, Humberto; BUARQUE, Chico; DA COSTA AGUIAR, João Baptista. Chico Buarque: Tantas palavras: Todas as letras. Companhia das letras, 2006.

ExpedienteEssa é uma publicação fictícia elaborada para a disciplina História da Comunicação do curso Comunicação e Multimeios da Universidade Estadual de Maringá. Editores: Beatriz Colnago, Giulliana Dias Pereira e Phill Natal. Capa: Giulliana Dias Pereira. Diagramação: Phill Natal.