O pensamento de Karl Marx, uma breve introdução

Sociologia geral

Faculdade Piaget - Suzano - 1º semestre de 2020Profº Me Antonio Gracias Vieira Filho

Obra utilizada para preparação desta apresentação

Os textos presentes nos slides foram retirados de/resumidos a partir de:

LALLEMENT, Michel. História das ideias sociológicas: das origens aos contemporâneos. Volume único. Petrópolis (RJ), Vozes, 2018. Foi consultado o capítulo 3, Parte II (Gêneses), Teorias sociais e socialismo, páginas 91 a 119.

IMPORTANTE: Os slides marcados com um asterisco [*] indicam texto idêntico ou muito próximo ao original.

Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895)

Parte 1: Conhecendo a vida e a obra de Karl Marx

1.1 Pequena biografia;1.2 Principais obras;1.3 Introdução ao pensamento marxista;1.4 Por que tantos ataques ao pensamento de Marx?1.5 Origens do pensamento de Marx.

1.1 Pequena biografia de Karl MarxNa imagem ao lado: Friedrich Engels (esquerda), Karl Marx e as filhas de Marx. Sentadas, da esquerda para direita: Jenny Caroline (1844–1883), Jenny Julia Eleanor (1855–1898) e Jenny Laura (1845–1911). A foto é da década de 1860, circa 1864. Domínio público.

Para biografia de Marx, consultar Lallement, 2018:91-92.

Pequena biografia de Karl Marx [1] - Pp. 91-92*● 1818: Nasce em Trier, no Reino da Prússia (atualmente a cidade faz parte

da Alemanha), filho de pais de origem judaica que se converteram ao luteranismo;

● 1836-1841: Por um breve tempo, frequenta cursos de direito e de filosofia na Universidade de Bonn. Posteriormente, passa a estudar na Universidade de Berlim, de maior seriedade intelectual;

● 1841: Defende tese de doutoramento em Filosofia, na Universidade de Jena (Alemanha). Título: A diferença da filosofia da natureza em Demócrito e Epicuro;

● 1842: Encontra um jovem industrial que o faz descobrir a situação econômica e dos trabalhadores da Inglaterra: Friedrich Engels. Marx e Engels serão amigos e parceiros de trabalho intelectual por toda a vida;

Pequena biografia de Karl Marx [2] - Pp. 91-92*

● Como jornalista, atua em A Gazeta Renana, jornal liberal que é crítico do poder prussiano – por conta disso, o jornal é proibido em 1843. Marx trabalhou no jornal primeiro como colaborador e, depois, como redator-chefe;

● 1843: Casa-se com uma jovem aristocrata, Jenny von Westphalen (1814-1881);

● Após o fechamento do jornal, realiza uma série de viagens que marcará sua vida. Vive em diferentes países:○ 1843-45: França (Paris);○ 1845-48: Bélgica (Bruxelas);○ 1848-49: Alemanha (Colônia);○ 1849-83: Inglaterra (Londres);

Pequena biografia de Karl Marx [3] - Pp. 91-92*

● Funda, durante o período em Paris, os Anais franco-alemães;

● 1847: Adere à Liga dos Justos (posteriormente Liga dos Comunistas), uma associação dos operários alemães que tinham emigrado para a França, Suíça e Inglaterra;

● 1864: Marx e Engels contribuem para a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores;

● 1883: Falece em Londres, aos 64 anos de idade;● Marx teve uma vida marcada por dificuldades financeiras e,

em várias oportunidades, Engels ajudou o amigo.

1.2 Principais obras

Ao lado, capas das edições brasileiras do Manifesto Comunista (1848) e d’O Capital, Livro 1 (1867).

Nos dois casos, as capas são de edições da Boitempo Editorial: respectivamente de 1998 e 2011.

Produção intelectualMarx realizou uma vasta produção intelectual, que transformou o pensamento social, econômico e político de todo o planeta. Suas reflexões se transformaram ao longo da vida, ora inclinadas à filosofia, ora dedicadas a uma reflexão crítica que propunha uma intervenção direta na realidade. Podemos dividir suas publicações em três fases:

● Jovem Marx (1839 a 1850);

● Transição (1852 a 1856);

● Fase adulta (1857 a 1880).

Principais obras [1]

Para os propósitos deste curso, vamos destacar duas obras, uma de sua juventude e outra da fase adulta, respectivamente.

● 1848: Manifesto Comunista. Uma obra com características panfletárias em que realiza uma análise da situação política da Europa e das lutas dos trabalhadores. Marx esclarece o que propõe o movimento comunista, o papel da classe trabalhadora e define uma estratégia para transformação da realidade;

Principais obras [2]● O Capital. Esta é a obra máxima de Marx, na qual se dispõe a

dissecar o modo de produção capitalista e seu regime de acumulação e exploração. Marx irá se dedicar, até o fim da vida, à redação de seus quatro volumes:○ Livro I: O processo de produção do capital (1867);○ Livro II: O processo de circulação do capital (1885);○ Livro III: O processo global da produção capitalista (1894);○ Livro IV: Teorias da mais-valia (1905).

Observação importante: Os Livros II, III e IV foram publicados postumamente. Os volumes II e III foram editados por Engels e o IV pelo filósofo Karl Kautsky (1854–1938).

1.3 Introdução ao pensamento marxista

Introdução ao pensamento marxista [1]Marx era um sociólogo? Podemos dizer que Marx foi um sociólogo antes mesmo da sociologia se constituir como campo científico.

Além disso, podemos afirmar, com certeza, que ele foi:● Historiador; ● Filósofo; ● Economista; ● Jornalista; ● Revolucionário.

Introdução ao pensamento marxista [2]Marx produziu uma obra intelectual que pode ser considerada uma das mais importantes da história recente da humanidade. Dedicou-se à compreensão dos mecanismos de funcionamento do capitalismo, compreendendo-o como um modo de produção. Ao longo dessa tarefa, Marx descreveu os processos de formação de valor, produção de mercadorias, exploração do trabalho e controle de uma determinada classe social (a burguesia) sobre outra (o proletariado). Demonstrou as contradições do capitalismo e suas consequências.

1.4 Por que tantos ataques ao pensamento de Marx?

Por que tantos ataques ao pensamento de Marx? [1]

Marx propunha a transformação das relações sociais, pela via revolucionária, para substituição do capitalismo por um outro modo de produção - primeiro o socialismo e, depois, o comunismo. Como parte desse processo, seria necessário eliminar a dominação da burguesia sobre o proletariado - de modo violento, se preciso. O impacto do seu pensamento se fez sentir, de modo decisivo, desde meados do século XIX até o início do XXI. Ainda hoje, muitos pensadores, movimentos sociais e partidos políticos se definem como herdeiros de sua obra.

Por que tantos ataques ao pensamento de Marx? [2]

Muitas vezes, a obra de Marx sofre ataques panfletários - inclusive por conta de sua apropriação por movimentos sociais e políticos. Os termos comunista ou socialista podem ser percebidos como xingamentos - por parte de certas alas do pensamento conservador, pelos ideólogos do neoliberalismo ou por pessoas que não compreendem sua produção intelectual. Por outro lado, aqueles que se definem como marxistas também realizam, em alguns casos, uma apropriação simplória de seu esquema de compreensão do mundo.

Por que tantos ataques ao pensamento de Marx? [3]

Nosso papel, nestas aulas, é o de compreender sua leitura dos grandes processos históricos, econômicos e políticos, bem como perceber a forma como influenciou as ciências humanas e sociais. Devemos utilizar suas publicações como subsídios para ampliar o alcance de nosso entendimento do mundo.

Ao iniciar uma trajetória de formação intelectual, é de fundamental importância buscar a diversidade, com diferentes metodologias de análise da realidade. Somente após o contato com múltiplas escolas de pensamento estaremos aptos a escolher aquela que faz mais sentido para cada um de nós.

1.5 Origens do pensamento de Marx

Origens do pensamento de Marx: a contribuição de Hegel [1]

Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) foi um importante filósofo alemão, nascido em Berlim. Entre vários outros conceitos, ficou conhecido pela dialética hegeliana e influenciou diversos pensadores. Hegel teve impacto decisivo na obra de Karl Marx.

Retrato de Hegel, realizado por Jakob Schlesinger em 1831. Domínio público.

Origens do pensamento de Marx: a contribuição de Hegel [2]*

A dialética hegeliana:

1. Afirmação → proposição de uma tese; 2. Negação → desenvolvimento das contradições à tese

proposta, antítese; 3. Negação da negação → aprofundamento da análise e

das contradições entre tese e antítese, com posterior reconciliação do ser, síntese. [P. 93, grifos meus]

Origens do pensamento de Marx: o materialismo histórico*

O materialismo histórico propõe que o modo de produção da vida material determina, em última instância, o conjunto da vida social, política e espiritual. Em outras palavras, do modo de produzir coisas emana a organização da nossa vida em sociedade, com suas instituições e relações sociais. O materialismo rejeita o idealismo e a metafísica e concentra no mundo material, objetivo e sensível o repertório de explicações sobre os processos sociais. Ao materialismo soma-se a compreensão e análise da história, dos percursos realizados pela humanidade, com destaque para suas lutas, contradições e relações de produção e exploração.

Origens do pensamento de Marx: o fator econômico*

Marx orienta sua compreensão do mundo pelo materialismo histórico-dialético e, conforme visto anteriormente, concentra-se no modo de produção. Ao constituir seu modelo de explicação da realidade desse modo, destacando que o social, o político e o espiritual emanam do modo de produzir, ele estabelece, por conseguinte, a centralidade do fator econômico sobre os demais. Assim, embora não veja no econômico um elemento determinista, ele avalia que este possui uma propriedade determinante sobre outros aspectos do real - política, cultura, espiritualidade, etc. [Para este slide e o anterior, ver materialismo na Wikipedia e Lallement, p. 100, grifos meus]

Origens do pensamento de Marx: uma síntese

1. Materialismo: Marx está interessado no mundo real/material, nas condições objetivas de produção e exploração econômica. Ele se recusa a ficar preso apenas ao campo das ideias e rejeita abordagens de caráter metafísico;

2. Histórico: pois quer compreender o desenvolvimento do modo de produção ao longo da história;

3. Dialético: para compreensão do mundo material, com ênfase em seus aspectos econômicos, Marx vai se debruçar sobre as contradições do modo de produção.

Parte 2: Conceitos fundamentais

2.1 Alienação;2.2 Ideologia;2.3 Fetichismo/Fetiche da mercadoria;2.4 A centralidade da noção de trabalho.

2.1 Alienação

O conceito de alienação [1] - P. 98*

Em seus Manuscritos econômicos e filosóficos de 1844, Marx elenca, assim, diversas formas de alienação ligadas ao trabalho efetuado no quadro do modo de produção capitalista. O trabalho alienado torna, antes de mais nada, o indivíduo estranho ao produto de seu trabalho, objeto do qual se vê espoliado para o lucro do empregador. Pelo fato de ser, além disso, coagido e forçado, e não deixar nenhum espaço de liberdade, o trabalho se torna uma camisa de força para o operário. [Grifos meus]

O conceito de alienação [2] - P. 98*Este [o operário] se encontra cada vez mais separado da própria atividade produtiva. Por outro lado, a concorrência organizada pelo capitalista no mercado de trabalho esgarça a comunidade dos trabalhadores. Quebrada assim a solidariedade, cada indivíduo se encontra isolado dos outros. O trabalho alienado acarreta, enfim, a cisão entre o operário e o Homem enquanto ser genérico. O trabalho, essência do Homem, fica reduzido, desde então, a puro meio de subsistência. [Grifos meus]

O conceito de alienação [3] - P. 98*

Marx acredita que o trabalho constitui a própria essência da atividade humana. Trabalhando, o ser humano não somente transforma a natureza, mas se transforma também a si mesmo. Ora, no modo de produção capitalista, longe de poder realizar-se plenamente por um trabalho livre e gratificante, o operário se vê despojado! [Para toda discussão sobre alienação, ver Lallement, 2018:96-98]Assim, o operário não é livre para trabalhar com o que deseja e nem como deseja, de modo que ele não consegue se identificar com o produto de seu trabalho. E, além disso, nunca recebe um salário equivalente ao valor que produz. [Grifos meus]

O conceito de alienação [3]

Linha de montagem da Ford em 1913. Em uma linha de montagem, o trabalhador não cria produtos: ele apenas monta partes.

Fura-greves sendo escoltado para fora das docas de Seattle (EUA) durante greve em 1934.

2.2 Ideologia

O conceito de ideologia [1] - P. 99*

Por mais importante que pareça na problemática inicial, a ideia de alienação vai sendo aos poucos posta de lado no curso da trajetória intelectual de Marx.

Sob a sua pena, daí em diante, são os temas da ideologia e, depois, do fetichismo da mercadoria que se mobilizam para ajudar a compreender as relações reais que se travam no seio do modo de produção capitalista. [Grifos meus]

O conceito de ideologia [2] - P. 99*Marx utiliza o termo “ideologia” e lhe atribui uma carga crítica. Sua definição está vinculada às ideias de dissimulação e de disfarce da realidade.

Em A ideologia alemã (1846), ele explica que, à semelhança da imagem invertida em fotografia, a ideologia é uma imagem deformada da vida real. Com ela, a prática social se torna opaca devido às representações imaginárias dos próprios seres humanos. A ideologia perturba as relações de produção. Oculta a luta de classes. Mais que um amálgama de ideias falsas, constitui uma verdadeira arma a serviço da dominação social. [Grifos meus]

O conceito de ideologia [3]

O conceito de ideologia trata, portanto, de modos/mecanismos/processos/esquemas de leitura e entendimento da realidade que, longe de gerarem uma compreensão precisa a seu respeito, a envolvem numa densa neblina.

A ideologia sempre oferece uma vista confusa, parcial e distorcida das relações sociais - sobretudo aquelas que dizem respeito à dominação e exploração.

O conceito de ideologia [4] - A matrix?

Imagem do filme Matrix (1999).

2.3 Fetichismo/Fetiche da mercadoria

Fetichismo/Fetiche da mercadoria [1] - P. 99*

O fetichismo da mercadoria, por fim, caracteriza não tanto o disfarce da vida social mas a mistificação que deixa sua marca nas próprias coisas. Temos a impressão - assevera Marx, em O capital - que uma mercadoria qualquer se compreende por si mesma e possui vida própria. Na realidade, por trás de um bem que se vai trocar por outro bem se ocultam não somente um dispêndio de trabalho, mas, sobretudo, determinada relação social. [Grifos meus]

Fetichismo/Fetiche da mercadoria [2]

Quando olhamos para uma mercadoria - uma cadeira, caneta, veículo, etc - observamos tal objeto mas não nos damos conta de que ele não surgiu, de forma repentina e espontânea, à nossa frente. Uma mercadoria é o resultado da junção de matérias-primas, trabalho intelectual, trabalho físico e uma série de relações sociais. Tais relações envolvem:● A exploração do trabalho proletário por parte de um

capitalista/burguês;● Todas as situações de violência e dominação relativas a esse

processo de exploração.

Fetichismo/Fetiche da mercadoria [3]

Só uma cadeira?

A produção de uma cadeira compreende:● A extração da madeira;● Em caso de extração ilegal, pode ter ocorrido a

invasão de uma reserva indígena ou área de proteção ambiental;

● A exploração do trabalho de um lenhador e do trabalho de quem atua em uma madeireira;

● O projeto da cadeira e sua execução;● A venda da cadeira em um mercado;● Todos os acidentes ocorridos e riscos laborais

envolvidos em toda essa cadeia produtiva;● O lucro dos donos da madeireira, da loja, etc.

2.4 A centralidade da noção de trabalho

A centralidade da noção de trabalho [1] - P. 107*

Em uma fase superior da sociedade comunista, quando houverem desaparecido a escravizadora subordinação dos indivíduos à divisão do trabalho e, por conseguinte, a oposição entre o trabalho intelectual e o trabalho corporal; quando o trabalho houver se tornado não apenas o meio de viver, mas ainda a primeira necessidade vital; quando, com a plena realização universal dos indivíduos, as forças produtivas houverem aumentado, e todas as fontes da riqueza cooperativa jorrarem com abundância –, só então será possível escapar de uma vez para sempre do estreito horizonte do direito burguês, e a sociedade poderá inscrever em seus estandartes: “De cada um, segundo suas capacidades; a cada um segundo suas necessidades”. MARX, Crítica do programa de Gotha, 1875/1891.

A centralidade da noção de trabalho [2] - P.108*

Na esteira de Adam Smith e David Ricardo, os dois mais célebres representantes dessa escola [a economia política clássica], Marx não tem dificuldade em reconhecer que o trabalho constitui o fundamento do valor dos bens. Diversamente porém destes últimos, postula que o trabalho se nos apresenta sob um duplo aspecto: como trabalho concreto (o trabalho tal qual se manifesta de maneira diferente em cada atividade de produção e produz valor de uso) e como trabalho abstrato (o dispêndio de energia comum a todo trabalhador).

A centralidade da noção de trabalho [3]

Marx acredita que o trabalho é a mais importante das atividades humanas. Ele confere sentido e propósito à vida dos indivíduos, é capaz de domar a natureza e transformar a realidade. E o trabalho, por tais características, deveria ser livre, uma fonte de satisfação e realização.

No entanto, no modo de produção capitalista, o trabalho encontra-se alienado: explorado, parcelado, vazio de sentido, serve apenas para que o indivíduo receba o suficiente para reproduzir suas forças. De elemento central para criação humana, passa a ser protagonista nos processos de exploração.

Parte 3: Aprofundamento teórico

3.1 Teoria do valor;3.2 Mais-valia; 3.3 Classes sociais; 3.4 Luta de classes.

3.1 Teoria do valor

Teoria do valor [1] - Pp. 108-109*

Marx mostra que o valor de um bem pode ser expresso quantitativamente pelo tempo de trabalho socialmente necessário para a sua produção, ou seja, o tempo “exigido por todo trabalho, executado com o grau médio de habilidade e de intensidade em condições que, relativamente a determinado meio social, são normais” (O capital, livro I).

Armado com essa teoria do valor, Marx sente-se no dever de radiografar o modo de produção capitalista. Indica, primeiro, que o valor não pode ser reduzido ao preço. [grifos meus]

Teoria do valor [2] - Pp. 108-109*

O preço não tem sentido a não ser em referência à moeda, “equivalente geral” que facilita a troca das mercadorias. A transformação mercadoria/moeda está, aliás, no cerne da lógica do modo de produção capitalista. Este último tende menos, com efeito, ao crescimento absoluto dos objetos do que a um aumento contínuo da quantidade de valor.

Em outras palavras, a ação dos capitalistas se assimila ao ato de colocar em movimento múltiplas formas de capital (industrial, comercial, financeiro) com o objetivo de valorizá-las.

Teoria do valor [3] - Pp. 108-109*Esta lógica está realmente atuando desde a gênese do modo de produção capitalista. A partir da acumulação primitiva, processo sangrento realizado desde o fim da Idade Média por meio de guerras, monopólios comerciais, expropriações…, o capitalismo se metamorfoseou: inicialmente mercantil, atingiu depois a sua maturidade industrial. Neste novo quadro histórico, a lógica das trocas não é mais um circuito Mercadoria-Dinheiro-Mercadoria (M-D-M), onde o ser humano produz e vende para adquirir outras mercadorias. Ela se acha agora submetida a um imperativo constante de valorização: o ser humano compra para vender e efetuar um lucro. É o circuito D-M-D' (com D' > D).

3.2 Mais-valia

O conceito de mais-valia [1] - Pp. 109-111*

Mas como é que os capitalistas podem, no fim das contas, obter um valor D' superior àquele [D] que investiram inicialmente?

O segredo reside na mais-valia e na exploração, dois pivôs do modo de produção capitalista do qual Marx se esforça por desvelar a existência e o mecanismo. [P.109, grifos meus]

O conceito de mais-valia [2] - Pp. 109-111*

A mais-valia corresponde à diferença entre o valor de uso da força de trabalho e o seu valor de troca (o salário). Ora, o salário pago permite exatamente a reprodução equivalente à força de trabalho; esta última produz, portanto, um valor superior ao que custa a sua utilização pelo capitalista. Como o trabalho dos assalariados não recebe uma remuneração à altura do seu resultado e os detentores dos meios de produção se apropriam da mais-valia, então - assim conclui Marx - verifica-se a exploração. [P. 109, grifos meus]

O conceito de mais-valia [3] - Pp. 109-111

Suponhamos que um determinado trabalhador produz uma cadeira em 10 horas de trabalho. Seu empregador, obviamente, não irá lhe pagar o equivalente a essas 10 horas. O valor pago será sempre menor que aquele contido no produto final. A cadeira contém o valor de 1o horas, mas o indivíduo receberá, por exemplo, apenas 4. Assim, seu trabalho tem um valor de uso equivalente a 10 horas, mas um valor de troca de apenas 4. Ao se apropriar da diferença de 6 horas, o capitalista consuma a extração de mais-valia sobre o operário. A retribuição financeira, portanto, longe de fazer justiça ao valor criado, serve apenas para que o indivíduo consiga reproduzir sua força de trabalho.

O conceito de mais-valia [4] - Pp. 109-111*

Essa usurpação está no âmago dos conflitos de classes. Ela desestabiliza um sistema atravessado por contradições (o desenvolvimento das capacidades de produção não é acompanhado por um aumento proporcional da procura…) e que não se acomoda, contrariamente às afirmações dos economistas clássicos, a qualquer princípio de desenvolvimento equilibrado. [P. 109]

3.3 Classes sociais

O conceito de classes sociais [1] - Pp. 102-108*

Na época em que o “jovem” Marx escreve, as classes são essencialmente definidas a partir da distribuição de renda. Nesse contexto, Marx se contenta de início a opor uma classe urbana a uma classe rural.

Mas ele afina rapidamente o seu esquema de análise e adota um critério decisivo de demarcação: o lugar dos indivíduos nas relações de produção. [P. 104, grifos meus]

O conceito de classes sociais [2] - Pp. 102-108*

A oposição capital/trabalho é, por outros termos, o princípio nodal da estruturação em classes sociais. A apropriação privada dos meios de produção e a utilização desses meios de produção com o fim de explorar os assalariados é o que distingue propriamente os capitalistas. Como não possuem nenhum outro meio de sobreviver, os assalariados se veem forçados, por seu turno, a vender a sua força de trabalho. Esta é a lei do capital. [P. 104, grifos meus]

O conceito de classes sociais [3] - Pp. 102-108*

Mais explicitamente ainda, Marx enumera três critérios determinantes na definição de uma classe social:● O lugar nas relações de produção (papel

desempenhado na produção, circulação e distribuição das riquezas);

● A participação nos antagonismos sociais (que se manifesta na luta pelo poder político);

● E a consciência de classe. [P. 104, grifos meus]

O conceito de classes sociais [4] - Pp. 102-108*

A consciência de classe nasce de dois processos fundamentais:

● A progressiva superação da concorrência entre operários e● A organização autônoma e independente da classe operária.

Servindo-se da linguagem hegeliana, ele distingue as classes em classe em si (conjunto de indivíduos que têm interesses objetivos de classe comuns, mas sem terem consciência disso) e classe para si (grupo dotado de uma consciência de si). [P. 104, grifos meus]

O conceito de classes sociais [5] - Pp. 102-108*

Desse modo:

● Burguesia: proprietária dos meios de produção;● Proletariado: aqueles que, sem a posse dos meios de

produção, são obrigados a vender sua força de trabalho.

Na pena de Marx, é o que tentamos demonstrar, o capital não se reduz a uma dimensão puramente material, mas designa uma relação social, relação historicamente constituída e que tende a se estender cada vez mais na sociedade capitalista. [P. 104, grifos meus]

3.4 Luta de classes

A luta de classes [1]

Os conflitos e disputas entre capital e trabalho, burguesia e proletariado, exploradores e explorados são, para Marx, uma força fundamental do processo histórico. A luta entre as classes sociais está presente no âmago do modo de produção capitalista, é uma de suas grandes contradições. Para sua superação, ele acredita que cabe ao proletariado romper as cadeias de exploração estabelecidas pela burguesia e dar início à revolução. Esta permitirá a superação do atual modo de produção e o estabelecimento de um estágio transitório, o socialismo, que deverá resultar, posteriormente, no comunismo.

A luta de classes [2]

A luta de classes na prática: operários da Volkswagen aderem à greve dos metalúrgicos do ABC em 1979. Foto: Fernando Pereira/CPDoc JB.

Parte 4: O legado de Marx

4.1 Uma proposta de transformação revolucionária das sociedades capitalistas;4.2 O legado de Marx nas ciências humanas e sociais.

4.1 Uma proposta de transformação revolucionária das sociedades

capitalistas

Desenvolvimento do modo de produção segundo Marx - Pp. 101-102*

1. Comunidade primitiva: não existe ainda propriedade privada; 2. Regime escravista: surge a dominação do homem sobre o

homem; 3. Regime feudal: a propriedade permanece fundiária [posse de

terras] e começam a ganhar vigor as forças produtivas; 4. Modo de produção capitalista: propriedade privada dos meios de

produção; 5. Socialismo: estágio de transição revolucionária, com a

socialização dos meios de produção, o enfraquecimento do Estado e a ditadura revolucionária do proletariado;

6. Comunismo: desaparecimento do Estado e organização autônoma da sociedade. [Grifos meus, p. 101]

Sobre a superação da sociedade capitalista

Inspirados pelas proposições das obras de Marx, uma série de movimentos sociais, partidos políticos e grupos revolucionários foram formados e mobilizados para transformação da sociedade. A busca pela superação do modo de produção capitalista, seguindo postulados marxistas, motivou várias tentativas de transformação das sociedades entre os séculos XIX e XXI. Assim, a história recente da humanidade produziu uma série de experimentos do chamado socialismo real. Tais experiências ocorreram na União Soviética, China, países do Leste Europeu, etc. E ainda assistimos a tentativas que se desenrolam em locais como Cuba ou a Venezuela.

Revoluções, a partir de 1917, que reivindicam, em variados graus, a influência do pensamento marxista

● 1917: Revolução Russa de outubro de 1917, que implantou o socialismo na Rússia e posteriormente deu origem à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas;

● 1936-1939: Revolução e República Espanhola;● 1949: Revolução comunista chinesa;● 1959: Revolução cubana (em sua segunda fase);● 1976: Reunificação do Vietnã;● 1979: Revolução Sandinista na Nicarágua.

Partidos e movimentos sociais que reivindicam a influência do pensamento marxista

● No Brasil: PSOL, PSTU, PCO, PCdoB, PCB, PT, MST, MTST, entre outros;

● No mundo: em muitos países há partidos políticos - socialistas ou comunistas - que reivindicam inspiração nas teses de Marx. Do mesmo modo, movimentos sociais e políticos, com diferentes graus de organização, possuem tal orientação.

O legado político de MarxO que se quer demonstrar é que a obra de Marx deixou marcas profundas na história. A sua proposição de superação da ordem capitalista pela via revolucionária, para posterior implantação do socialismo e comunismo, inspirou - e ainda inspira - revoluções, partidos políticos e movimentos sociais. Embora os experimentos socialistas realizados não tenham alcançado, de modo geral, resultados satisfatórios, os fatores que os inspiraram continuam presentes. A exploração do trabalho, as desigualdades sociais e a luta de classes permanecem, marcando as contradições do modo de produção capitalista.

4.2 O legado de Marx nas ciências humanas e sociais

O legado teórico/intelectual

Marx nos deixou uma forma de entender o mundo - pelo materialismo histórico-dialético - e uma crítica profunda dos problemas do modo de produção capitalista. Seus trabalhos deram origem a uma nova forma de compreender as relações sociais e sua influência se estende por variados campos do conhecimento: história, economia, sociologia, política, educação, direito, geografia, filosofia, etc. O chamado pensamento marxiano possui extrema relevância até os dias atuais. Também há uma enorme quantidade de pensadores que devotaram seu trabalho à crítica das teses estabelecidas por Marx.

Alguns autores influenciados pela obra de Karl Marx:

● Theodor W. Adorno ● Louis Althusser ● Walter Benjamin ● Guy Debord ● Antonio Gramsci ● David Harvey ● Max Horkheimer ● Fredric Jameson● Caio Prado Júnior (Brasil)

● Vladimir Lenin ● György Lukács ● Rosa Luxemburgo ● Herbert Marcuse ● Nicos Poulantzas ● Leon Trotsky ● Slavoj Žižek● Florestan Fernandes (Brasil)● Jacob Gorender (Brasil)

Bibliografia e créditos adicionais

Obra utilizada para preparação desta apresentação

Os textos presentes nos slides foram retirados de/resumidos a partir de:

LALLEMENT, Michel. História das ideias sociológicas: das origens aos contemporâneos. Volume único. Petrópolis (RJ), Vozes, 2018. Foi consultado o capítulo 3, Parte II (Gêneses), Teorias sociais e socialismo, páginas 91 a 119.

IMPORTANTE: Os slides marcados com um asterisco [*] indicam texto idêntico ou muito próximo ao original.

Bibliografia consultada

GIDDENS, Anthony & SUTTON, Philip W. Conceitos essenciais da Sociologia. Segunda edição. São Paulo, Editora Unesp, 2017.

MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. Livro 1: O processo de produção do capital. São Paulo, Boitempo Editorial, 2011 [1867].

MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. Manifesto Comunista. São Paulo, Boitempo Editorial, 2005 [1848/1890].

Créditos adicionais

Imagens do slide 31:● Foto da linha de montagem da Ford, 1913. Domínio público;● Foto do trabalhador fura-greves sendo escoltado: Port of Seattle

photo. Ronald E. Magden Collection.

Imagem do slide 40 (cadeira): reprodução da internet para fins educacionais.

Muito obrigado por sua atenção!

Profº Me Antonio Gracias Vieira Filho

Contato: antoniofilho@facpiaget.com.br

Visite: www.sociologiadagestao.com