O problema da participação política no modelo deliberativo de democracia

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Reference: MARQUES, F. P. J. A. O problema da participação política no modelo deliberativo de democracia. In: Revista de Sociologia e Política (UFPR. Impresso), v.20, n. 41, pp. 21-35. 2012. Text in Portuguese. Abstract in English. Title in English: THE PROBLEM OF POLITICAL PARTICIPATION WITHIN THE DELIBERATIVE MODEL OF DEMOCRACY. This paper discusses the premises of the deliberative model of democracy as they address the issue of political participation. We attempt to clarify what political participation means for those who use this model, while at the same time looking at some of the major critiques that have been directed toward it. Through a review of an important part of the literature, and without losing sight of earlier systematizations of democratic theory, three fundamental conditions for engendering participation according to this discursive model are pointed to: political institutions should create and offer citizens opportunities to participate in public input; improvement in people's socio-economic condition must be made; attention should be given to particular principles that have consistent regulatory influence on the interactions and arguments in question. This is followed by attention to the criticisms raised and flaws detected by deliberationism's detractors. At the end of the text, a summary of the strengths and weaknesses of the model is presented, along with a discussion of the problem of participation in contemporary democracies.Keywords: Participation; Deliberation; Democracy; Representation.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012

O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIAFrancisco Paulo Jamil Almeida MarquesRESUMOO trabalho discute as premissas do modelo deliberativo de democracia que lidam com a questo da participao poltica, no intuito de esclarecer no que consiste a participao de acordo com os parmetros discursivos. A partir da reviso de uma parcela importante da literatura contempornea em Teoria Democrtica, e sem perder de vista as sistematizaes anteriores em Teoria Poltica, so apontadas trs condies fundamentais para engendrar-se a participao de acordo com o modelo deliberativo: (a) as instituies polticas devem criar e oferecer aos cidados oportunidades de input de razes pblicas; (b) faz-se necessria uma melhora nas condies scio-econmicas dos indivduos; (c) preciso dar ateno a determinados princpios que atuam na regulao das interaes e dos argumentos que se encontram em debate. Em seguida, reflete-se acerca das crticas e das falhas apontadas pelos opositores do deliberacionismo. Ao final do texto, realiza-se um apanhado acerca dos limites e dos mritos do modelo em tela quanto discusso do problema da participao nas democracias contemporneas. PALAVRAS-CHAVE: democracia; participao poltica; deliberao pblica; discurso; representao.

I. INTRODUO1 Pode-se dizer que a vertente deliberativa da teoria democrtica teve origem, dentre outras contribuies, na confluncia de alguns dos princpios encontrados nos trabalhos mais recentes de John Rawls (1996) e de Jrgen Habermas (1997). Enquanto o filsofo norteamericano propunha uma reforma do liberalismo, sem deixar de reconhecer a primazia dos direitos e das liberdades individuais, Habermas partia da idia de um rearranjo das premissas da democracia radical, mesmo sem abrir mo, por exemplo, da necessidade de promover-se uma influncia mais acentuada da esfera civil no que concerne conduo dos negcios pblicos. Ainda que no se possa subsumir a polmica intelectual travada por esses dois pensadores em um nico tema, h razo em afirmar-se que, no1 O autor agradece s consideraes e crticas dos

final das contas, especificamente quanto ao grau desejvel de influncia da esfera da cidadania no processo de produo da deciso poltica sobre o que divergem os autores. Na perspectiva de Rawls, a Suprema Corte, no caso dos Estados Unidos (EUA), seria o ambiente por excelncia a abrigar a deliberao pblica, o que implica alcance limitado dos agentes envolvidos no processo discursivo. Por outro lado, a maioria dos autores deliberacionistas, inclusive Habermas, considera essencial uma maior participao dos cidados quando da produo da deciso poltica. nesse ponto em que se pode enxergar uma feio mais forte de democracia defendida por uma parcela dos estudiosos ligados deliberao2. Por trs da idia dos investigadores vinculados tendncia discursiva de que a participao deve2 Um primeiro ramo da teoria deliberativa, com uma

pareceristas annimos do texto ora apresentado, que colaboraram de modo fundamental para incrementar o argumento do texto. A Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) apoiaram, por meio de bolsa e de financiamento, a pesquisa que originou este trabalho.

projeo mais reformista do liberalismo, inspirada em Rawls, sustentado por autores como Joshua Cohen (1996) e Amy Gutmann e Dennis Thompson (1996; 2004). Outra subvertente, influenciada por Habermas e desenvolvida por filsofos como John Dryzek (1994; 2004), Seyla Benhabib (1996) e James Bohman (1996), preserva a necessidade de que haja alguma mudana de carter mais incisivo no arranjo democrtico para conferir maior legitimidade a esse regime de governo.Rev. Sociol. Polt., Curitiba, v. 20, n. 41, p. 21-35, fev. 2012

Recebido em 20 de maio de 2009. Aprovado em 1 de setembro de 2010.

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA ser alargada, encontra-se um motivo elementar: se a democracia deliberativa tem como uma de suas metas a busca por mecanismos de fortalecimento da legitimao do processo de produo da deciso poltica, nada mais natural que argumentar a favor do envolvimento dos cidados nas esferas discursivas que lidam com a res publica3. Nas palavras de John Dryzek: [...] os resultados [as decises polticas obtidas a partir das deliberaes] so legtimos na medida em que recebam o assentimento refletido por meio da participao em uma deliberao autntica da parte de todos aqueles sujeitos deciso em questo (DRYZEK, 2004, p. 41-42). preciso, entretanto, esclarecer no que consiste a participao poltica de acordo com os moldes deliberacionistas, bem como reconhecer as crticas mais candentes a essa concepo. Este o problema do presente artigo. Sabe-se que o modelo deliberativo argumenta em favor da intromisso da esfera civil nas prticas democrticas no apenas por meio daqueles procedimentos caractersticos da agregao das disposies eleitorais (mtodo de participao considerado suficiente por determinadas tradies em teoria democrtica, como o elitismo competitivo de Schumpeter (1942)), mas, tambm, a partir de contribuies substantivas, guiadas por princpios pr-estabelecidos. justamente graas a essa concepo disposta a complementar o que dizem perspectivas democrticas tradicionais que Marcos Nobre (2004) afirma ser a democracia deliberativa o modelo que institucionaliza o ideal de exerccio coletivo do poder poltico. Ao encerrar um conjunto de proposies direcionadas a fomentar aquilo que considera adequado do ponto de vista do funcionamento e da efetividade dos regimes democrticos, o3 A discusso sobre a idia de participao poltica mostra-

deliberacionismo destaca trs pontos fundamentais para refletirmos acerca da interface entre, de um lado, a participao da esfera civil e, de outro, a montagem institucional que rege a atividade cotidiana das democracias. O primeiro ponto tem a ver com o diagnstico a apontar uma insuficincia ou carncia de mecanismos institucionais de participao aptos a permitirem que os cidados possam, a partir de parmetros deliberativos, manifestarem-se, considerar as razes dos outros, ter suas razes examinadas e, por fim, tomar parte nas decises. Estudiosos a exemplo de Bernard Manin (1997) consideram que, na configurao das democracias modernas, no foi previsto um espao maior de interveno para o povo reunido em assemblia na produo da deciso poltica. Assim, os autores deliberacionistas defendem a necessidade de uma maior permeabilidade das instituies e das estruturas do Estado que esto sob tutela administrativa transitria dos representantes eleitos (BOHMAN, 1996; 1998; FUNG, 2005; DRYZEK, 2007; WARREN, 2007). Em segundo lugar, as possibilidades para a participao, no modelo deliberativo, no se referem apenas ao carter das ferramentas institucionais de input oferecidas, mas, tambm, s condies minimamente aceitveis (sobretudo aquelas de cunho scio-econmico) das quais devem usufruir agentes e cidados envolvidos no processo poltico (YOUNG, 2000). A terceira questo refere-se aos trmites internos dessa participao, isto , aos princpios que regulam e submetem tal participao a determinados constrangimentos procedimentais e substantivos. Para alm dos princpios de reciprocidade, publicidade e accountability mencionados por Amy Gutmann e Dennis Thompson (1996; 2004) (e explorados, em diferentes medidas, por Bohman (1996) e Arato (2002)), necessrio explicar em que termos os deliberacionistas defendem uma perspectiva de cooperao mtua tanto durante quanto depois do processo de produo da deciso poltica. Acredita-se que cada uma dessas questes merea uma avaliao e exposio mais apuradas, uma vez que poucos trabalhos na rea de deliberao pblica dedicam-se a realizar tal empreendimento de maneira conjunta (MUTZ, 2006). As pginas seguintes esforam-se, assim, para esclarecer os pressupostos deliberativos

se uma das mais candentes na teoria poltica contempornea. Sem perder de vista a profuso de investimentos epistmicos relacionados idia de participao, nem as distintas dimenses que cercam um conceito to polmico (tratado com maior profundidade em Held (1987), Cohen e Arato (1992), Bobbio (2000), Marques (2008), entre outros), quando este trabalho referese participao poltica ele lida especificamente com aquelas oportunidades de interveno no jogo poltico auferidas aos cidados por parte das instituies do Estado.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012quanto participao civil e apontar as principais dificuldades encontradas pelos crticos no que se refere promoo da participao nos moldes da teoria discursiva. II. A DEMOCRACIA DELIBERATIVA E A PROMOO DE MECANISMOS INSTITUCIONAIS FAVORVEIS PARTICIPAO Estudiosos, a exemplo, de Carole Pateman (1992), James Bohman (1996), Bernard Manin (1997), Jon Elster (1998), Benjamin Barber (2004), entre outros, por ressaltarem a importncia de idia de soberania popular para afirmar-se a consistncia do regime democrtico, consideram inadequada a corrente diviso do trabalho poltico entre esfera dos representantes e esfera civil. verdade que no se pode confundir, de um lado, os estudiosos vinculados s teorias da democracia participativa com, de outro lado, os autores a demonstrarem predileo pelas premissas deliberativas. No obstante a proximidade entre as duas abordagens (afinal, os deliberacionistas defendem a criao de oportunidades de participao e reformulam determinados ideais republicanos), elas acabam deixando clara uma tenso refletida, dentre outros aspectos, no padro considerado desejvel de interveno poltica da esfera civil, conforme ser destacado logo frente. Barber (2004) e sua strong democracy, por exemplo, operam em favor de formas mais diretas de interveno poltica em diversas instncias do Estado, o que nem sempre visto com bons olhos mesmo por autores discursivos influenciados pela teoria crtica, como Bohman4 . A convergncia argumentativa dos autores dessas duas linhagens, no entanto, d-se na constatao de que, ao longo do processo que deu origem montagem institucional das democracias liberais modernas, a esfera civil no foi prevista no arranjo da administrao do Estado como ente decisrio ou com influncia destacada4 De acordo com James Bohman: Nos aperfeioamentos

no processo de discusso dos negcios pblicos. O modelo democrtico de vis liberal acabou privilegiando, de modo a excluir outras modalidades mais fortes de participao, a capacidade dos cidados de, na posse de liberdades e direitos individuais, deputar mandatos em intervalos pr-estabelecidos5. a partir do contraponto a essa disposio liberal que a democracia deliberativa busca uma sada com vistas a recuperar, pelo menos parcialmente, a consistncia da idia de soberania popular e assegurar esfera civil um lugar de maior destaque na diviso do trabalho poltico. Tal empreendimento coaduna-se com a necessidade, defendida por certos tericos do modelo discursivo, de realizao de modificaes institucionais na configurao dos estados democrticos (BOHMAN, 1996; 1998; COHEN & SABEL, 1997; FUNG & WRIGHT, 2001; STEINER, BCHTIGER & SPRNDLI, 2001; CHAMBERS, 2003; WAMPLER & AVRITZER, 2004; FUNG, 2005; WARREN, 2007; AVRITZER, 2009). Amy Gutmann e Dennis Thompson (1996), por exemplo, defendem que as instituies do Estado tm a responsabilidade precpua de promover a deliberao pblica, no se admitindo a existncia de instncias em que razo, por um lado, e poder poltico, por outro, convivam separadamente. Para tais estudiosos, o funcionamento dos poderes Executivo e Legislativo (onde esto concentradas as capacidades de aprovar normas e efetivar as decises) costumeiramente no obedece a princpios de oferecimento de razes e justificativas pblicas a envolverem os cidados, o que um problema a ser consertado. Alm da carncia de oportunidades institucionais, os pensadores do modelo discursivo procuram lidar, tambm, com problemas atinentes apatia e ao cinismo poltico dos da esfera civil (BENNETT, 1986; ELIASOPH, 1998; MUHLBERGER, 2001; DRYZEK, 2007). O deliberacionismo defende, assim, que a nfase dessas modificaes e reformas institucionais, bem como a natureza dos mecanismos participativos por elas sugeridos, seja pensada de5 No se pode perder de vista, a esse ponto, a contribuio

delineados ao longo da ltima dcada, os proponentes da democracia deliberativa tm se distanciado das concepes participativas de democracia e de bem comum e se inclinado em direo s instituies, as quais eles originalmente rejeitaram enquanto ambientes de raciocnio pblico (BOHMAN, 1998, p. 400). Todas as citaes de trechos de trabalhos publicados originalmente em ingls foram traduzidas pelo autor deste texto.

clssica de Benjamin Constant (1985) acerca das diferenas entre a democracia dos antigos e dos modernos.

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA modo a satisfazer padres de engajamento que dem a entender aos cidados que suas contribuies sero efetivamente levadas em conta (consolidando-se o sentimento de eficcia poltica j estudado por Almond e Verba (1963), Verba, Schlozman e Brady (1995), Abers (2000), Delli Carpini (2000) e Coelho (2007)). Expostas, em linhas gerais, as dificuldades encontradas no plano institucional relativas implementao de padres deliberativos de participao da esfera civil, a questo pendente refere-se dinmica prtica que deve guiar a configurao (ou desenho, como preferem Warren (2007), Avritzer (2008) e Dryzek e Niemeyer (2008)) de mecanismos participativos. Isto , deve-se prover uma noo do que os autores deliberativos consideram adequado quanto ao desenho de ferramentas a serem empregadas pelos cidados no intuito de exercer maior influncia sobre o sistema poltico. Deliberacionistas como James Fishkin (1991; 2002), Bohman (1996), Gutmann e Thompson (1996; 2004) e John Gastil (2000) intercedem, mais cuidadosamente, pela anlise criteriosa dos mecanismos de participao a serem oferecidos aos cidados, uma vez que nem toda forma de interveno poltica pode ser considerada apta para preencher os requisitos deliberativos. James Bohman cita o caso de referendos como instrumentos de democracia direta que tm lugar em determinadas localidades do estado da Califrnia, Estados Unidos. Sem a devida orientao e formatao de um processo informativo e de debate pblico, tais referendos podem mais prejudicar do que contribuir com os regimes democrticos. Para o autor: [...] tais referendos so, muitas vezes, mais apelos discriminao popular e alienao poltica do que uma deliberao ampla da comunidade. Por causa da facilidade em prop-los, os referendos so to episdicos e no reflexivos quanto as atuais sondagens de opinio (BOHMAN, 1996, p. 245). Entre as ferramentas que atendem aos parmetros deliberativos, Bohman cita o emprego de balanos de impactos pblicos, elaborados por parte das instituies do Estado e de seus agentes, cuja funo seria expor de que forma as razes apontadas pelos cidados foram consideradas para a formatao de uma deciso (idem, p. 190). Gastil, por sua vez, sugere a criao de painis deliberativos (citizen panels), cuja dinmica favorece a existncia de um ambiente cooperativo e pblico de avaliao de razes e argumentos plurais, sobretudo a partir do provimento antecipado de informaes de qualidade (GASTIL, 2000, p. 137). Outro mecanismo promovido pelos autores do modelo aqui em questo com o objetivo de colher contribuies da esfera civil so as pesquisas deliberativas de opinio pblica. De acordo com James Fishkin (1991; 2002), essas pesquisas atuam de modo a selecionar uma amostra aleatria de cidados e a estimular a discusso entre eles aps um processo informativo. Em suma, pelo que se pde perceber, o modelo deliberativo privilegia um tipo especfico de participao pblica (e no aquela que ocorre de maneira isolada, com a qual se mostra satisfeito o liberal-elitismo de Schumpeter (1942)), que leve em considerao as diferentes razes erigidas por integrantes da esfera civil e da esfera poltica institucional. II.1. Representao e teoria deliberativa Nesse contexto de busca por maior abertura das instituies do Estado s contribuies da esfera civil, importante, todavia, deixar claro que os autores deliberativos no acenam reivindicando formas mais diretas de democracia, proposta tpica, como se mencionou anteriormente, de estudiosos tradicionais cujo argumento tambm se volta ao fortalecimento da participao (ARNSTEIN, 1969; BARBER, 2004). Obviamente, seria um erro ignorar as prprias diferenas internas aos autores deliberacionistas (e aqui no se est referindo, necessariamente, quelas linhas gerais de inspirao rawlsiana ou habermasiana a marcarem o debate interno ao modelo), mas o fato que, no obstante tais divergncias (SILVA, 2004), os investigadores vinculados a essa corrente de pensamento (sejam os cientistas polticos, sejam os filsofos) reconhecem a necessidade da representao6 para que o sistema poltico continue a funcionar sem deixar de lado a eficincia (reivindicao de cunho6 A inteno, aqui, no conferir um tratamento

aprofundado ao conceito de representao poltica em suas mais diferentes faces, mas, apenas, oferecer um panorama sobre as consideraes feitas por parte dos autores deliberativos no que concerne interface entre participao e representao poltica. Ou seja, pretende-se enfatizar a diferena entre autores participacionistas e

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012liberal, tratada com maior profundidade originalmente em Max Weber (1946)). Ressalte-se, ainda, a cautela atinente s demandas excessivas de tempo e engajamento que poderiam ser impostas aos cidados em contextos de deliberao pblica recorrente (BURKHALTER, GASTIL & KELSHAW, 2002; DRYZEK, 2004). Isso no significa, porm, que uma maior capacidade da esfera civil em atuar, sugerir, interferir, perquirir e cobrar justificativas de seus representantes pblicos deixe de ser uma meta plausvel. Nas palavras de Bohman: Em instituies que operam atravs de processos em larga escala espacial e temporal [] mais importante fazer uma diviso do trabalho mais democrtica do que aboli-la em nome da maximizao da participao direta dos cidados (BOHMAN, 1996, p. 242). Assim sendo, mesmo considerando a relao de causa e conseqncia entre o artifcio da representao e a restrio das oportunidades participativas dos cidados, os tericos deliberativos no esto dispostos a abrir mo de tal mecanismo, uma vez que ele garante, por exemplo, que vises desrespeitosas ou ilegtimas aos direitos e liberdades das minorias possuam atuao e conseqncia limitadas7 (BENHABIB, 1996; BOHMAN, 1996; COHEN, 1996; YOUNG,deliberacionistas por meio da compreenso distinta que eles tendem a apresentar quanto s prticas representativas da democracia. Para um exame mais detalhado da idia de representao, indica-se obras de autores como Pitkin (1987), Manin (1997) e Urbinati (2006). J especificamente quanto relao entre representao e teoria deliberativa, consulte-se Vitale (2007).7 Outra autora deliberacionista, Iris Marion Young,

2000). Chega-se, ento, ao argumento de que no h como abrir mo da representao poltica, mas que a realizao de tal artifcio precisa dar-se de modo a contemplar certos parmetros. De acordo com Gutmann e Thompson: Mais participao na poltica , em geral, algo desejvel [...] mas a representao, de alguma forma, est aqui para ficar. Pelo menos para o futuro prximo, a escala e a complexidade do governo moderno, incluindo qualquer tipo de democracia, requer uma medida significante de representao. [...] A democracia deliberativa no especifica uma nica forma de representao. Ela procura por modos de representao que apiem a troca de argumentos srios e moralmente sustentveis no interior dos corpos legislativos, entre legisladores e cidados e entre os prprios cidados (GUTMANN & THOMPSON, 1996, p. 130-132). A concepo desses autores montada na inteno de fazer com que os representantes atuem de modo mais aberto quando da formulao das decises, mas que possam, ao mesmo tempo, resistir presso da tirania da maioria de modo justificado. Dessa forma, a proposta de democracia deliberativa esfora-se em encontrar um caminho que, alm de no comprometer o bom funcionamento e a estabilidade do sistema poltico, no exija dos cidados um engajamento ativo e constante isto , um engajamento que no demande uma participao em tempo integral e de modo dedicado. Essa linha tnue entre requerer uma maior participao civil do que aquela prevista pelos modelos agregativos ao mesmo tempo em que se procura impor limites a tal participao mostra-se compatvel com aquelas idias que marcam os primrdios da vertente deliberativa, relativas reforma do liberalismo e s tentativas de conteno dos ideais dos democratas radicais. III. DAS CONDIES QUE DEVEM REGER A PARTICIPAO DOS CIDADOS NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA Enquanto os tericos identificados com o modelo participativo (PATEMAN, 1992; BARBER, 2004) procuravam estabelecer os fundamentos de sua concepo no to somente oferecimento de oportunidades de interferncia no processo de produo da deciso poltica (com fins pedaggicos, sobretudo), a impresso que se tem que, no modelo deliberativo, tal participao vista como algo natural. Isto , no se faz necessria, para a concepo discursiva, uma

sustenta a idia de que a representao necessria ao criticar os autores democratas radicais. Democratas radicais freqentemente desconfiam das instituies de representao poltica. [...] A representao, eles sugerem, aliena a vontade poltica ao custo do genuno autogoverno, debilita a habilidade da comunidade em funcionar como um instrumento regulador da justia e impede a evoluo de um pblico participante no qual a idia de justia pode criar razes. [...] A posio antirepresentativa [...] se recusa a encarar as realidades complexas do processo democrtico, e, de forma errnea, ope representao participao. A representao necessria porque a rede da vida social moderna muitas vezes liga a ao de algumas pessoas e instituies em um lugar com conseqncias em muitos outros lugares e instituies (YOUNG, 2000, p. 124).

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA defesa to enftica e contnua da participao dos cidados, a ponto de tal aspecto caracterizar a reivindicao por excelncia da tradio. nesses termos que, partindo-se dos pressupostos da democracia deliberativa, abre-se espao para discutir no simplesmente a importncia da participao (seu status reconhecido a priori), mas para esclarecer-se, paralelamente, em que parmetros, e por meio de quais instrumentos, deve-se dar tal interferncia. Um dos pontos mais ressaltados na concepo deliberativa refere-se necessidade de aperfeioamento das condies sociais dos cidados de modo a fortalecer-se o uso da razo pblica. Isso porque os cidados no podem ser considerados iguais quanto possibilidade de reivindicar demandas e apresentar razes se enfrentam dificuldades, por exemplo, para sobreviver com dignidade mnima (CONOVER, SEARING & CREWE, 2002; DUTWIN, 2003; DRYZEK & NIEMEYER, 2008). James Bohman (1996) argumenta, por exemplo, que uma deliberao pblica que no atente para as desigualdades sociais que definem o papel dos atores ao longo do processo poltico ser, necessariamente, falha. Para Bohman, exatamente a habilidade para se iniciarem atos deliberativos o que representa um patamar mnimo de diagnstico de igualdade poltica8. Assim, se h agentes que sequer conseguem fazer-se ouvir ou que no possuem as mnimas condies de iniciar uma contenda, pode-se questionar a legitimidade da deciso. A questo, em outras palavras, : como podem os mais pobres demandar melhores condies de vida e um estado de bem-estar que garanta, minimamente, um ambiente mais propcio participao poltica se no tm condies de iniciarem contendas reivindicatrias por si mesmos? Nesse mesmo sentido, lvaro de Vita (2004) defende a articulao de reformas institucionais e polticas pblicas adequadas, para proteger os interesses e elevar a voz dos mais vulnerveis (idem, p. 119).8 Ao analisar espaos deliberativos que contam com o

Gutmann e Thompson (1996), por sua vez, admitem a mesma dificuldade quanto s condies de atuao poltica dos cidados mais desfavorecidos. Os indivduos de alcance scioeconmico limitado so os menos propensos a tomarem parte na conduo dos negcios pblicos, tanto por serem acometidos por preocupaes de outras naturezas (a exemplo da prpria sobrevivncia financeira), quanto por, tendencialmente, contarem com capacidades diminutas de influncia junto a representantes polticos. Em suma, os deliberacionistas afirmam que uma pluralidade efetiva de argumentos ou uma verdadeira constelao de discursos (DRYZEK, 2004) apenas pode ganhar sustentao em um ambiente que favorea a interveno nos negcios pblicos de cidados originrios de diferentes realidades sociais. Da a necessidade de promoverem-se melhorias no bem-estar com vistas a aperfeioar a participao e a qualidade das deliberaes pblicas9. IV. DOS TRMITES INTERNOS REFERENTES PARTICIPAO DOS CIDADOS NA DELIBERAO PBLICA De acordo com Amy Gutmann e Dennis Thompson (1996; 2004), trs princpios regulam a operao das intervenes e das interaes polticas quando do processo de discusso de temas de natureza pblica , conformando, assim, um conjunto a orientar as condies sob as quais, idealmente, ocorre a participao deliberativa: reciprocidade, publicidade e accountability. Especificamente acerca da interferncia poltica da esfera civil, a premissa bsica da reciprocidade que os cidados devem demonstrar respeito uns pelos outros no que concerne ao trato pessoal e s posies defendidas em fruns pblicos. Tal patamar de respeito mtuo garante que, na pior das hipteses, obtenha-se uma discordncia civilizada entre as opinies diversas e, ademais, que os agentes em confronto possuam disposio de colocar-se no lugar do

envolvimento de cidados, Vera Schattan Coelho refora a perspectiva de que, caso no sejam apontados mecanismos para aliviarem-se determinados tipos de desigualdades, a qualidade da participao estar comprometida (COELHO, 2007, p. 79).

9 importante notar, em tal cenrio, a reverberao que

vem ganhando o debate entre Nancy Fraser e Axel Honneth (2003), dentre outros investigadores, sobre as noes de reconhecimento e redistribuio.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012outro para avaliar se sua proposta no atinge seus oponentes de maneira injusta. O ideal traado por Gutmann e Thompson, assim, que os cidados, ao pensarem para alm de suas necessidades individuais, voltem a cogitar aquilo que havia sido posto em segundo plano pelas teorias da escolha social e racional, isto , a noo de bem comum, construdo coletivamente. Para Gutmann e Thompson: Agregar o que os cidados querem individualmente, aquilo que a anlise poltica utilitarista faz melhor, no necessariamente produz o mesmo resultado do que pedir aos cidados para que considerem juntos o que eles querem coletivamente (GUTMANN & THOMPSON, 1996, p. 174). A conseqncia da reciprocidade para a participao dos cidados reflete-se, em suma, na exigncia de padres mnimos de civilidade cujo intento seja dar ouvidos a argumentos que, em um primeiro instante, podem mostrar-se nocivos quilo que determinados cidados tm em mente ou sua convivncia cotidiana. J o princpio da publicidade (idem; GUTMANN & THOMPSON, 2004) demanda, primordialmente, a observao do carter pblico das razes que os representantes e os cidados oferecem para justificar aes polticas. Dessa forma, razes formuladas no sentido de favorecer determinado indivduo, grupo ou, o que pior, orientadas a prejudicar injustamente outros agentes, por exemplo, no preencheriam os requisitos do princpio da publicidade. Uma das inspiraes para se fundamentar tal princpio, enfatize-se, pode ser encontrada em Kant, no seu Ensaio Paz Perptua. O ltimo princpio, o da responsabilizao (ou accountability), compreendido de maneira mais comum como o constrangimento imposto aos representantes pblicos em relao prestao de contas de suas aes e propostas, configurando um processo de troca e abertura para o aperfeioamento (ou mesmo reviso, caso o futuro assim prove necessrio) das razes (GUTMANN & THOMPSON, 1996; 2004; ARATO, 2002). Saliente-se, todavia, que a idia de accountability, na perspectiva da participao deliberativa, envolve, tambm, a presta o de contas a tinente s ra zes oferecidas por outros agentes envolvidos no processo de discusso dos negcios pblicos. Isto , os prprios cidados esto sujeitos a tal princpio ao apresentarem-se para tomar parte em contendas polticas10 . A meta final dos deliberacionistas ao defender esses trs princpios , na verdade, aperfeioar o processo de elaborao de razes e justificativas com vistas a alcanar-se um entendimento entre aqueles que tomam parte no debate pblico. De acordo com os autores arrolados at aqui, uma discusso na qual os agentes envolvidos portamse de maneira a contemplar, em suas formulaes, elementos concernentes s idias de reciprocidade, publicidade e accountability, tende a estabelecer os termos adequados para uma cooperao contnua (CHAMBERS, 2003). Isso quer dizer que o estabelecimento de princpios substantivos e procedimentais tpicos da proposta deliberativa coaduna-se no apenas com a busca de legitimao e justificao das decises originadas no processo de deliberao pblica, mas procura entrar em sintonia, tambm, com o comportamento ulterior dos agentes que tomam parte na discusso. No porque se constitui a vertente do pensamento democrtico que parece dominar o debate corrente, contudo, que a proposta de democracia deliberativa encontra-se livre de crticas. As principais objees referem-se aplicabilidade e ao alcance dos pressupostos deliberativos em um cenrio social to plural, complexo e, logo, repleto de dificuldades traos inegveis do cotidiano das sociedades democrticas contemporneas. Sendo assim, no se poderia deixar de reconhecer as ressalvas mais candentes a apontarem falhas, por exemplo, quanto engenharia deliberacionista cujo mote volta-se para a formulao de uma idia de participao poltica dos cidados. A seo a seguir explora tais crticas. V. DAS CRTICAS PERSPECTIVA DELIBERACIONISTA DE PARTICIPAO DA ESFERA CIVIL A reivindicao dos deliberacionistas, de terem formulado um modelo de democracia que demonstre consistncia terica e aplicabilidade

10 Luc Tremblay refora essa concepo ao afirmar que

participar no apenas tomar parte no processo decisrio, mas, tambm, ser responsvel pelo que foi decidido (TREMBLAY, 2001).

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA prtica, questionada por autores de distintas concepes concorrentes ao modelo discursivo (e at mesmo por autores internos a esse modelo), sendo o tema da participao civil um dos pontos mais polmicos a caracterizar tal disputa. Michael Walzer (1999), embora concorde com determinados diagnsticos elaborados pelo modelo deliberativo, tece algumas das crticas de maior relevncia. Ele comea por apontar que a proposta discursiva de democracia no reconhece de modo adequado que o processo poltico possui valores para alm do respeito recproco, da capacidade de reflexo, da abertura e da generosidade por parte dos agentes envolvidos nos debates (sobretudo aqueles ligados s instituies democrticas). Em outras palavras, Walzer ressalta que a poltica permeada por tenses (a exemplo da paixo e da crena em certas doutrinas, da coragem, da competitividade, da provocao, da barganha, da corrupo, dentre outros fatores) que vo de encontro participao racional to defendida nas sistematizaes iniciais dos deliberacionistas. Assim, nem sempre possvel praticar-se uma economia da discordncia moral (como querem Gutmann e Thompson (1996)), argumenta Walzer. No h como deixar de reconhecer que os indivduos so volveis, mudam de idia e de sentimentos, lanam mo de estratgias duvidosas do ponto de vista tico para obter vitrias polticas, nem sempre agem de maneira racional ou mostram disposio em colaborar. Walzer afirma, ento, que: As paixes desbotam; homens e mulheres se desengajam de compromissos particulares; interesses de grupos tomam novas disposies; o mundo d voltas. Mas certas discordncias profundas, como aquela entre Direita e Esquerda, so notavelmente persistentes, e formas locais de conflitos tnicos e religiosos esto, muitas vezes, assim intrincadas em uma cultura poltica natural aos participantes. [...] enquanto a legitimidade fortalecida se os bons argumentos podem ser feitos sobre os temas substantivos em questo, a vitria raramente obtida pela construo de bons argumentos (WALZER, 1999, p. 66-67). Outro receio de Walzer refere-se ao fato de que a busca insistente por um ambiente cooperativo nos processos de discusso a envolverem temas de concernncia pblica pode levar a um distanciamento ou a uma desconsiderao daquelas atividades que, essencialmente, nunca se voltaram para o alcance de concordncias ou entendimentos. Imagine-se, por exemplo, a disputa pelo voto em debates acalorados levados frente por adeptos de partidos colocados em lados opostos. Alm de ser pouco provvel um consenso, mesmo que parcial, acerca de como resolver certos problemas (uma vez que, em tais eventos, a meta no deixar-se convencer, mas, primordialmente, vencer uma contenda), a busca pela cooperao poderia levar a uma diminuio do estmulo dos cidados em defender suas perspectivas11 . Por ltimo, Walzer no nega que a deliberao tenha uma importncia particular, mas d a entender que ela funcionaria de modo mais adequado para as cortes judiciais do que para uma discusso ampla e inclusiva. Ao dizer que a deliberao no uma atividade para o demos, limitando, assim, a extenso da participao poltica em termos discursivos, o estudioso em tela duvida da capacidade deliberativa e cooperativa de um contingente de cidados numericamente representativo. Outro crtico da proposta deliberativa de democracia, Ian Shapiro (1999; 2003), refora a posio acerca da impraticabilidade da idia de economia da discordncia moral (GUTMANN & THOMPSON, 1996). Isso porque o autor no acredita que, por exemplo, um fundamentalista religioso aceite, pacificamente, os princpios deliberativos de discusso propostos por

11 Wilson Gomes (2005) tambm critica a busca pelo

entendimento e pela cooperao idealizada pelo modelo deliberativo. A ressalva de Gomes reside na considerao excessiva que Bohman oferece ao dilogo e ao comportamento cooperativo dos agentes em disputa no jogo poltico, o que acarreta uma desvalorizao da importncia e influncia de atividades como a barganha, as negociaes e demais conflitos tpicos de um ambiente competitivo como o da poltica (GOMES, 2005). William Simon tambm se junta aos crticos realistas da deliberao quanto possibilidade de alcanar-se o convencimento a partir do emprego do expediente discursivo. De acordo com esse autor: Gutmann e Thompson no tm muito que dizer acerca das questes estratgicas na deliberao na verdade, eles tendem a opor mentalidade estratgica mentalidade deliberativa. [...] onde seu oponente toma uma posio por m f, pode ser um equvoco deliberar. Ao tomar uma posio por m f eu quero dizer tanto se portar de modo conscientemente desonesto ou simplesmente no se estar aberto reflexo (SIMON, 1999, p. 52-53).

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012democratas como Gutmann e Thompson, exatamente porque muitos fundamentalistas no concordariam em abrir mo de determinadas crenas que caracterizam sua prpria natureza. O argumento de Shapiro delineado do seguinte modo: Eu acho difcil imaginar um fundamentalista impressionado por isso, particularmente quando ele se d conta de que qualquer reivindicao emprica que faa deve ser consistente com mtodos de indagao relativamente confiveis. [...] O modelo de Gutmann e Thompson funciona apenas para aqueles fundamentalistas que tambm so democratas falveis. Temo, eu, ser esta uma classe vazia e destinada a permanecer inabitada (SHAPIRO, 1999, p. 30-31). Ademais, a tentativa de aparar as arestas da discordncia que a democracia deliberativa pretende fazer emergir pode, na verdade, possuir efeito contrrio inteno de compreender-se os motivos dos outros 12 . Nas palavras de Ian Shapiro: Pode-se, razoavelmente, esperar que a deliberao enfatize a interao humana, mas isso pode acabar por revelar diferenas ocultas tanto trazer tina possibilidades ocultas de convergncia. Tudo depende de quais interesses essenciais estejam, de fato, em questo (idem, p. 31-34). J Russell Hardin (1999) mostra-se incomodado com a impreciso de determinadas propostas deliberativas. No intuito de demonstrar a pouca pertinncia de um conjunto de aspectos do modelo em questo, sobretudo no que se refere participao poltica dos cidados, Hardin pergunta-se, primeiramente: Quem so os deliberantes? E quais so os temas acerca dos quais se supe que eles deliberem? Se os cidados so os deliberantes e se as principais iniciativas pblicas ou falhas de iniciativas residem nas questes, ento, difcil imaginar uma democracia deliberativa de relevncia que no seja similar s vises dos defensores da democracia participativa (idem, p. 114-115). Hardin concorda com a premissa, tradicionalmente defendida por liberais como Schumpeter (1942) e Seymour Lipset (1981), de12 Cass Sunstein (2002) identifica o risco de polarizaes

que a maioria dos cidados possui pouco interesse em participar, bem como no deseja estar a par dos acontecimentos polticos. Por isso, mesmo acreditando que a deliberao uma pea importante, Hardin d a entender que ela no pode ser expandida em propores muito grandes a perigo de tornar-se ineficaz (HARDIN, 1999). Assim, outra crtica refere-se capacidade e disposio dos cidados em tomarem parte nas arenas argumentativas. lvaro de Vita (2004), ao corroborar algumas das idias de autores ditos realistas (dentre esses, podemos mencionar Dahl (2001) e Mouffe (2005)), garante que apenas aqueles indivduos j interessados tendem a integrar-se ao processo pblico de discusso, o que poderia fadar ao fracasso os princpios de modelos como o deliberacionismo e o participacionismo. Para esse autor, no se pode ignorar o deficit motivacional e cognitivo dos cidados referentes participao em debates de natureza poltica. A suposio de que os cidados devem deliberar sobre questes de poltica pblica ignora o dficit motivacional e cognitivo desses cidados para lidar com questes dessa natureza. [...] O mais provvel que s estejam motivados a isso aqueles que tm preferncias intensas sobre determinadas reas da poltica pblica [...] (VITA, 2004, p. 115-117). Vita observa, ainda, que a participao, tanto no deliberacionismo quanto no participacionismo, vista mais como um fim em si mesmo do que como um elemento importante para obterem-se decises de maior qualidade. Ou seja, ele questiona, ainda, a utilidade do envolvimento dos cidados nas discusses polticas. A crtica de lvaro de Vita parece ligada quela de Lynn Sanders (1997), cujo texto, denominado Against Deliberation, um dos mais recorrentes a investir conta a noo de democracia deliberativa, alega que, no obstante a boa vontade dos deliberacionistas em tentar dar um novo flego idia de soberania popular, necessrio (a) reconhecer o declnio na disposio dos cidados em participar (seja por desiluso e cinismo, seja por falta de condies materiais) e (b) duvidar da boa vontade daqueles que dominam a cena poltica em dar ouvidos aos argumentos de novos agentes deliberantes. Ou seja, mais uma vez, questionase a aplicabilidade dos parmetros propostos pelo modelo discursivo, sobretudo quando esto envolvidas as dimenses institucionais da poltica.

entre grupos uma vez que a deliberao esteja em curso, o que aponta para a necessidade de relativizarem-se os prospectos de cooperao e convergncia apontado pelos autores do modelo discursivo (SUNSTEIN, 2002, 176-177).

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA Algumas dessas crticas foram reconhecidas pelos autores da vertente deliberativa, que no hesitaram em admitir os limites de certas propostas e concepes, mas que, ao mesmo tempo, procuraram refutar determinados argumentos de seus pares quanto pouca plausibilidade prtica e terica atribuda ao modelo em questo. O tpico a seguir detalha como se d a polmica entre os deliberacionistas e seus crticos no que concerne participao dos cidados e ressalta omisses importantes com as quais este modelo deve de lidar no intuito de se mostrar consistente em termos de terica e prtica poltica. VI. O MODELO DELIBERATIVO E O RECONHECIMENTO DE SEUS LIMITES E AVANOS Mais uma vez, insiste-se na necessidade de reconhecerem-se certas gradaes testemunhadas em trabalhos de autores filiados vertente discursiva (no se pretende, aqui, esgotar a reviso dessas diferentes concepes). No entanto, a premissa daqueles estudiosos deliberacionistas mais preocupados com a revitalizao do conceito de soberania popular refere-se noo de que os resultados das decises polticas so legtimos apenas quando os cidados tm a chance de tomar parte no debate, oferecendo razes de carter pblico e refletindo criticamente sobre cada um dos pontos polmicos, na tentativa de encontrar convergncias e negociar as divergncias (HABERMAS, 1997). De acordo com John Dryzek (2004), entretanto, uma deliberao nesses termos dificilmente ocorreria em larga escala, reunindo milhes de cidados. Dryzek questiona, tambm, a viabilidade da participao nos moldes deliberativos na medida em que se constata certa indisposio da esfera civil em interferir nos negcios pblicos. [...] nas deliberaes do mundo real, a totalidade como certamente a maioria dos afetados no parece participar, tornando desta forma a democracia deliberativa vulnervel ao destronamento de suas pretenses de legitimidade. [...] a teoria pende por um tenro fio se sua viabilidade depende crucialmente de uma vasta maioria que sempre opta por no exercer os direitos e capacidades que so to fundamentais para a teoria [...] (idem, p. 41-42). Isso quer dizer que mesmo deliberacionistas a exemplo de John Dryzek reconhecem que nada pode dar a certeza de que os cidados, ainda que tenham mo mecanismos e oportunidades de participao adequados, tomaro parte no processo poltico ou seguiro os parmetros estabelecidos pelo modelo em tela neste trabalho13. Esse autor preocupa-se, ainda, em considerar a viabilidade de envolver-se um nmero to extenso de participantes nas deliberaes pblicas, conforme crtica dos realistas quanto concepo discursiva. Em resposta a crticas como aquelas apontadas por Hardin (1999) e Vita (2004), no entanto, Dryzek esfora-se em desvincular a produo de decises legtimas ao alcance de um nmero satisfatoriamente representativo de cidados. Ou seja, ele considera que o nmero de participantes na deliberao indeterminado, o que no implica restrio ou incluso de mais ou menos agentes na discusso dos negcios pblicos, contanto que a constelao de discursos possa receber contribuies de quaisquer das partes interessadas (DRYZEK, 2004, p. 54-55). O importante para Dryzek, nesses termos, no a capacidade numrica de apoio que determinada proposta pode arregimentar, mas, sim, que a reflexo dentre aqueles envolvidos gere uma competio discursiva ampla14 . Outra crtica dentre as mais recorrentes ao modelo deliberativo refere-se ao fato de que essa concepo no leva em conta a complexidade e a pluralidade de perspectivas nas democracias contemporneas (o que dificultaria o alcance de entendimentos). Assim, h tericos que tomam como um ideal irrealizvel a articulao entre complexidade social e organizao democrtica. James Bohman (1996), todavia, argumenta exatamente o contrrio, ao sustentar que so os regimes democrticos aqueles que conseguem lidar de maneira mais adequada com a questo da complexidade, ao estabelecerem uma ordem mais flexvel e aberta. As sociedades no democrticas,13 Ver, tambm, Barabas (2004). 14 Na verdade, para Dryzek: [...] participao e discusso

extensas no so, necessariamente, teis e podem, mesmo, exacerbar a complexidade e a paralisia na produo de polticas em vez de ajudar a lidar com elas (DRYZEK, 1994, p. 70). Ressalte-se que, nos ltimos anos, o autor vem desenvolvendo com maior profundidade a idia de representao discursiva (DRYZEK & NIEMEYER, 2008).

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 21-35 FEV. 2012continua o estudioso, tendem a dirimir os conflitos por meio da opresso, sem levar em conta diferentes ngulos acerca de um problema especfico, com o objetivo de preservar sua estabilidade. Ora, mas no parece aceitvel, diz Bohman, preservar tal estabilidade ao custo, por exemplo, da supresso de demandas diversas. Uma vez que se tenha estabelecido e justificado a necessidade de acesso das diversas demandas (inclusive aquelas oriundas de atores da sociedade) ao processo de produo da deciso poltica para fortalecer-se o carter da democracia, faz-se importante refletir, especificamente, acerca das crticas aos mecanismos de participao que a deliberao oferece para operar essas diferentes reivindicaes. Na defesa por ele construda, Bohman refora, primeiramente, o argumento de que exatamente para diminuir o potencial dos conflitos polticos que a democracia deliberativa e seus princpios possuem um papel relevante. Em segundo lugar, o autor reconhece que no se deve contar com a expectativa de que a deliberao resulte em cooperao, principalmente porque nem todos aqueles envolvidos no processo discursivo precisam concordar com cada lei particular ou deciso (por outro lado, isso no implica necessidade de abrir mo da tentativa de diminurem-se os focos de tenso trazidos pelas divergncias.). O importante , no final das contas, estabelecer termos de debate que permitam uma cooperao contnua em outras ocasies (idem). Isso significa, ento, que os tericos favorveis perspectiva da deliberao pblica rejeitam como sua aquela idia anteriormente a eles atribuda, de que o modelo apresenta como meta a busca por consensos. No necessrio, ento, que cada um concorde com cada lei, objetivo ou deciso particular. Porm, mais exigido dos cidados do que uma mera conformidade lei (idem, p. 183-184). J Gutmann e Thompson vo defender a proposta deliberativa de acusaes relativas persistncia em intrometer-se nos mais diversos eventos da vida poltica das sociedades. Os autores dizem no reivindicar que toda e qualquer lei ou poltica pblica sofra o mesmo tratamento deliberativo. Isso porque eles dizem reconhecer, por exemplo, dificuldades relativas ao tempo e urgncia com a qual devem ser tratadas determinadas decises. Porm, mesmo que uma determinada poltica no tenha sido fruto de um processo inteiramente deliberativo, deve levar-se em conta o requisito fundamental de que os representantes precisam fazer-se responsabilizveis em tempo integral, o que no invalida a exigncia de sustentao discursiva (GUTMANN & THOMPSON, 1999, p. 245-246). Para alm de outros problemas revelados medida que se procura introduzir e elaborar mecanismos de participao deliberativa, o fato que as crticas e as rplicas contribuem para aperfeioar, decisivamente, a proposta do modelo discursivo. Determinados posicionamentos apresentados em livros fundamentais para a concepo deliberacionista (BENHABIB, 1996; BOHMAN, 1996; GUTMANN & THOMPSON, 1996) foram revisados e, juntamente com esclarecimentos adicionais, vo compondo uma compreenso de democracia que rene contribuies de filsofos e de cientistas polticos. VII. CONCLUSES Este trabalho procurou oferecer uma sistematizao pouco recorrente nos estudos em teoria deliberativa, enfatizando aqueles requisitos e caractersticas que devem ser observados quando se procura compreender, em termos prticos e tericos, o que o modelo discursivo entende como adequado do ponto de vista da participao poltica dos cidados. Nem todos os investigadores deliberacionistas defendem com a mesma intensidade determinados aspectos atinentes teoria e s prticas democrticas. Contudo, muito do que se refere necessidade de promoo da participao poltica da esfera civil visto, pelo menos em linhas gerais, com algum consenso. Pode-se dizer, assim, que os autores filiados vertente aqui em questo defendem uma forma de participao que, no apenas em seu formato e desenvolvimento, mas, tambm, em suas conseqncias, respeite liberdades, direitos e opes individuais; tenha em mente espaos institucionais e efetivos de input, devendo tais inputs ser pautados pela discusso informada e por arrazoados cuja elaborao esteja subordinada a princpios de interao recproca, publicidade e transparncia; mantenha compromisso com a melhora nas condies sociais daqueles que tomam parte do processo poltico ou que so os alvos das polticas pblicas. No

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O PROBLEMA DA PARTICIPAO POLTICA NO MODELO DELIBERATIVO DE DEMOCRACIA bastasse tal meta ambiciosa, os deliberacionistas apontam-se como formuladores de um modelo que, ao mesmo tempo, atende a requisitos de plausibilidade terica e prtica, o que engendra uma srie de crticas (principalmente oriundas de autores ditos realistas), conforme apresentado. No h dvidas de que o modelo deliberativo de democracia possui relevncia no s ao representar um empreendimento recente em teoria democrtica, mas, tambm, por fazer convergir concepes polticas aparentemente irreconciliveis, como o liberalismo e o republicanismo. Deve-se ressaltar, contudo, que a concepo deliberativa continua a omitir o tratamento de determinadas questes. No que se refere participao poltica, especificamente, temas como o engajamento cvico e o capital social (enfatizados por Putnam (2000)) ou a importncia da cultura poltica de cada sociedade so raramente examinados com a acurcia desejvel. Assim, alm de especificar melhor a natureza da participao na deliberao pblica (quem participa, no que participa, por qual motivo participa, como participa, que resultados essa participao traz, entre outras questes), h um conjunto de temas adicionais com os quais os deliberacionistas tero de lidar na inteno de oferecer uma proposta efetivamente vivel de envolvimento dos cidados nas sociedades polticas contemporneas.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLTICA V. 20, N 41: 255-260 FEV. 2012 ABSTRACTS THE GLOBAL FIRESTORM OF LAW AND ORDER: ON PUNISHMENT AND NEOLIBERALISM Loc Wacquant This article reflects on the international reception of the book Prisons of Poverty as revelator of penal developments in advanced societies over the past decade. It shows that the global firestorm of law and order inspired by the United States that the book detected in 1999 has continued to rage far and wide. Indeed, it has extended from First- to Second-World countries and has altered punishment politics and policies around the globe in ways that no one foresaw and would have thought possible some 15 years ago. It extends the analysis of the role of think tanks (especially the Manhattan Institute) in the diffusion of US-style crime-fighting notions and nostrums in Latin America as one element of the international circulation of pro-market policy packages fostering the punitive management of poverty. It elaborates and revises the original model of the link between neoliberalism and punitive penality, leading to the analysis of state-crafting in the age of social insecurity developed in the book Punishing the Poor. KEYWORDS: Criminal Justice; Zero Tolerance; Think Tanks; Penal State; Policy Transfer; Neoliberalism; Globalization. * * * THE PROBLEM OF POLITICAL PARTICIPATION WITHIN THE DELIBERATIVE MODEL OF DEMOCRACY Francisco Paulo Jamil Almeida Marques This paper discusses the premises of the deliberative model of democracy as they address the issue of political participation. We attempt to clarify what political participation means for those who use this model, while at the same time looking at some of the major critiques that have been directed toward it. Through a review of an important part of the literature, and without losing sight of earlier systematizations of democratic theory, three fundamental conditions for engendering participation according to this discursive model are pointed to: political institutions should create and offer citizens opportunities to participate in public input; improvement in peoples socio-economic condition must be made; attention should be given to particular principles that have consistent regulatory influence on the interactions and arguments in question. This is followed by attention to the criticisms raised and flaws detected by deliberationisms detractors. At the end of the text, a summary of the strengths and weaknesses of the model is presented, along with a discussion of the problem of participation in contemporary democracies. KEYWORDS: Participation; Deliberation; Democracy; Representation. * * * CONVERGENCE AND CONTROVERSY ON INSTITUTIONAL CHANGE: TRADITIONAL MODELS IN COMPARATIVE PERSPECTIVE Flvio da Cunha Rezende At present there is a paucity of work that seeks to clarify what a neo-institutional theory of change is and what the fundamental elements to compare, evaluate and construct such a theory would be. The present paper proposes reflections on this issue. We carry out comparative analysis of four neoinstitutionalist theories of social change. We present points of convergence and controversy regarding the problem of endogeneity, the role of formal and informal institutions, typical explanatory patterns, causal mechanisms and the causal modes that typify different neo-institutional models. Our main goal is to understand how these four traditional approaches to change respond to the challenge to

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