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Gonzaga Filho Página 1

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 2

O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho

1999

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 4

Para o meu primo-irmão

FRANCISCO FERREIRA DE MIRANDA

Que viveu entre nós

De 1955 á 1998.

Dedicação total aos meus filhos:

PÂMELA CRISTIANNE

e

PABLO NERUDA

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 6

Í N D I C E 001. Pai Nosso

002. Rosa Sem Espinhos

003. Meu Pai

004. O Sol Que Caiu

005. A Rosa

006. Devaneios, Um Sonho Real

007. Meus Filhos

008. Pâmela

009. Neruda

010. Sou

011. Uma Sombra No Espelho

012. Vi... Vendo

013. Maçã Apodrecida

014. Fecha-se o Círculo

015. Como Um Canário

016. Sou Apenas Números

017. Ex-Magnata

018. Sonhos e Sonos

019. Paradise

020. Eu, A Simplicidade

021. Meu Perdão

022. Ícaro Sonhador

023. Pirata Cigano

024. O Meu Carnaval

025. Alma

026. Que Alma

027. Que Calma

028. Que Exala

029. Que Fala

030. Que Cala

031. Enfim

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Gonzaga Filho Página 7

032. Penúrias

033. Eu Queria Que...

034. Antes Me Explique o Hoje

035. Barquinho de Papel

036. Deserto Pensante

037. Trapo Humano

038. De Volta Ao Mar

039. Os Filhos Do Meu Sapato

040. Amálgama

041. A Sombra Do Acordeom

042. Gericordel

043. Beto, O Analfa

044. Capim Novo

045. Berrante Triste, O Aboio Do Adeus

046. Vaqueiro Tem Sentimentos

047. Namoro De Vaqueiro

048. Vaqueiro Relaxado

049. Mas Doutô...

050. Pedido De Casamento Matuto

051. Resposta De Dona Ontonha

052. O Porquê Do Por Quê

053. Letargia

054. Sobrevivo

055. Tempo Desperdiçado

056. Vale Dos Répteis

057. Caos Da Vida

058. Condor Errante

059. Palavras

060. Tudo Que Tenho é Nada

061. Sem Teto, Sem Abrigo

062. Perdido No Hoje

063. Pedras Sobre Pedras

064. Tradição

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Gonzaga Filho Página 8

065. Paladar

066. Olfato

067. Visão

068. Audição

069. Tato

070. Saia Do Meu Caminho

071. Ocaso Crepitante

072. Triste Feliz Ano Novo

073. Meu Diário

074. Verbo Chorar

075. Contraste

076. Obrigado, Amigo.

077. O Exilado

078. Estrela Radiante

079. Holocausto

080. O Sabor Do Nada

081. Bem-Te-Vi e Mau-Te-Vejo

082. Fuga

083. Ondas

084. O Sonho Acabou

085. Pequeno Sofredor

086. O Louco

087. Primeira Dimensão

088. Segunda Dimensão

089. Terceira Dimensão

090. Vida

091. Morte

092. Verdadeira Amiga

093. E Tudo Continua

094. Fim Da Estrada

095. Pano Macabro

096. O Anjo da Trombeta

097. Eu Te Abandonei

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Gonzaga Filho Página 9

098. Escuridão

099. Libra

100. Lembranças Renovadas

101. Bolhas De Sabão

102. Espere e Verás

103. Sonho Na Chuva

104. Um Velho Sonho

105. Dinheiro

106. Êxtase Das Estrelas

107. Cio Da Lua

108. Tara Do Sol

109. S. O. S OVNI

110. Acalanto Atômico

111. Filha Do Deus Sol

112. Meu Presente

113. Pelas Pernas De Vênus

114. O Canto De Um Feio

115. O Grande Artista

116. Q. I. Zero

117. Oh! Mestra.

118. O Professor

119. Para Entender

120. Civilização

121. Tzão

122. Traição Inesperada

123. Amor Proibido

124. Quando Setembro Vier

125. Pássaro Imigrante

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 12

NOTA DO AUTOR

Aqui estou tentando explicar a razão e o porquê de

escrever este livro, que para mim significa uma realização

pessoal.

Sei que não sou nenhum escritor de renome

nacional, que tenha pretensão de escrever algo digno de

fazer sucesso nos meios literários, mas sei que sou um

escritor. Medíocre ou não, sei que estou registrando algo

próprio, gerado pelos meus sentimentos e pelo meu

cotidiano.

Escrever um livro é um sonho que acalento desde o

meu tempo de criança e hoje estou realizando este sonho.

Portanto, aqui estou prefaciando o meu próprio

livro, livro esse que não sei se irá agradar ou não aos

leitores mais exigentes, mas tenho a certeza de satisfazer o

meu próprio ego.

Neste livro quero falar de temas como o amor,

falar de vida, saudades, recordações, problemas sociais e

políticos e para uma higiene mental, temos alguns poemas

matutos, para que assim possamos sorrir e esquecer os

problemas e as tristezas dos temas anteriores.

Espero que valha a pena o meu esforço e possa

chegar com as minhas mensagens de amor, até o coração

das pessoas que gostam de algo feito com o carinho

existente dentro de um ser humano sonhador, que levou

parte da vida em devaneios, mas com a consciência de que

estes devaneios, um dia se tornariam um sonho real.

Gonzaga Filho

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 14

Com carinho

À

Meu pai

Minha mãe

Meus irmãos e irmãs

Meus filhos e filhas

Meus netos e netas

Amo todos com devoção...

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Gonzaga Filho Página 15

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 16

PAI NOSSO

Pai Nosso que habita no Universo

Que criou os bons e os maus

Ponha no coração do homem

Somente a paz

Para que o mundo

Torne-se um sonho de amor

Pai Nosso, Arquiteto do Mundo

Que criou os homens de todas as raças

Ponha na mente do homem a união

Para que possa ter fim

Todos os conflitos raciais

Pai Nosso,

que do mundo fostes o criador

Rogo-te por mim

Pelos meus pais

Pelos meus filhos

Pelos meus amigos

Pelos meus inimigos, se eu os tiver.

Acabai com a violência

E dai-nos a paz

Amém

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 17

ROSA SEM ESPINHOS

Antes era apenas um botão

Aos poucos desabrochou

Hoje é uma bela rosa sem espinhos

Antes era uma menina

Aos poucos se tornou mulher

E hoje é uma linda senhora, minha mãe

Não sei quem mais se realizou

Neste jogo de amor

Se você Rosa-Mãe

Ou as pétalas que desprendestes

Mãe, rosa sem espinhos

Ao ninar-me com tuas canções

O teu hálito perfumado

Lembrava-me um jardim primaveril

Mãe, rosa de rara beleza

Em nenhuma floricultura

Alguém conseguirá encontrá-la

Ela é encontrada somente

No coração de um bom filho

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 18

MEU PAI

Lágrimas de cera substituem

Minhas lágrimas verdadeiras,

Já faz tanto tempo que você se foi

Que não consigo mais chorar.

Tranco-me em meus devaneios

E ponho-me a imaginar

Como seria a minha vida ao teu lado.

Deixaste-me tão pequeno

Que não recordo os teus abraços,

A tua voz, nem a cor dos teus olhos.

Não lembro tampouco as tuas mãos calosas

Em meu corpo a me embalar.

Mas hoje, meu pai,

Aquele pequeno fruto do teu amor

Cresceu e te ama.

Amo-te tanto, que para mim ainda vives.

Não, para mim você não morreu,

Está fazendo apenas uma viagem

Da qual não poderá mais retornar.

Mas, não se preocupe meu pai,

Breve estarei ao teu lado

Para juntos desfrutarmos

Das delícias da terra prometida por Deus.

Natal - RN

01-10-1999

Pelos 40 anos de sua viagem

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 19

O SOL QUE CAIU

O ser que saiu

O sol que caiu

Na solidão do mar

Coração a naufragar

Uma onda o despiu

E só...

Como um marinheiro

Sucumbiu

O mar não vai chorar

Amar o mar não vai amar

O céu sorriu e pariu

Nuvens brancas no céu

Surgiu

E eu

O ser que saiu

O sol que caiu

Como um nada

Na vida

Sumiu

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 20

A ROSA

Ser rosa

Garbosa

Babosa

Barbosa

É Rosa

Formosa

Talentosa

Saborosa

É Rosa

Tão prosa

Tão mimosa

Tão brilhosa

É Rosa

Glamorosa

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 21

DEVANEIOS, UM SONHO REAL

A beleza do ocaso

Inerente a chegada da noite

Faz-me mergulhar no vale dos devaneios.

Nem mesmo a brisa gelada

Que chega como um açoite,

Para despedir-se dos brilhantes

Raios dourados do sol,

Faz-me tremer a alma.

Vivo a fantasia do momento.

Vivo a fantasia de poder amar.

Vivo um sonho difícil, eu sei.

Mas o que seria de mim

Se não pudesse ao menos sonhar?

Fico feliz em poder sonhar.

O que me importa é amar

Ao menos em devaneios,

Pois um dia, quem sabe,

Estes devaneios poderão

Tornar-se um sonho real.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 22

MEUS FILHOS

Alcione, a que não é sambista

E sim, a que me conquista.

Alcione, fruto em flor

Foi o meu suspiro de amor.

Alcione, linda gazela

É fruto do meu amor

Tal qual a rosa amarela

Igual a ti, fruto em flor.

Aldivan, eu sou teu fã

Diz-me como é que vai.

Gêmeo, és como a maçã

Fruto adorado por teu pai.

Desejo que o amor

Em sua vida sempre esteja

Eu fico com a minha dor

Pedindo que Deus o proteja.

Aldilene, fruto da saudade

Foi gêmea por segundo

Completando minha felicidade

Quando estava eu no mundo.

Amo a ti e aos teus irmãos

Como amo o Criador

Vamos juntar as nossas mãos

Em uma corrente de amor.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 23

PÂMELA

Oh! Filha amada

Belo fruto de um amor

Para mim és uma fada

És a rosa que desabrochou

Tens nome de origem greco-latino

Pam-meli és todo mel

Pâmela, nome bem feminino

És muito doce, és parte do céu

19 de julho, final da noite

Viestes ao mundo chorando

E a alegria como um açoite

Em meu peito foi brotando

Nasceste tão bela, tão nua

Que tua pedra é o Rubi

Teu astro regente é a Lua

A musa que naquela noite eu vi

És do signo de Água

E Lírio-D’água é a tua flor

És o fim da minha mágoa

És o meu infinito amor

Verde-claro tua cor da sorte

Canceriana querida

És o fim da minha morte

És o princípio de uma nova vida

Nascestes no início de uma década

De um século que termina

De um novo tempo és a escada

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 24

Minha querida menina

E como tens nome de origem latina

Presta bem atenção

Esta frase que termina

Estes escritos de emoção

Aequam memento rebus in

Arduis servare mentem.

Lembra-te de manter o ânimo

Justo nos momentos mais difíceis

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 25

NERUDA

Faça-me o seu pedido

Filho por mim tão querido

És também um Neruda

Portanto fale, cante, escreva

Não deixe sua voz ficar muda

Não se iluda

O chileno tinha a praia

De areias vermelhas e rochas negras

Mas tu também tens o teu lugar

Que não é o paraíso das ilhas gregas

É um lugar cheio de emoção

É o lado rubro negro

Que existe em meu coração

Pablo Neruda

Tens o nome de um poeta

Não sei qual será o teu destino

Pois não sou nenhum profeta

Eternamente serás o meu menino

Desejo que sejas feliz

Com o que a vida te oferta

Aos 69 anos, em 23 de Setembro de 1973.

12 dias depois da queda de Salvador Allende,

Morria o grande poeta chileno Pablo Neruda,

O Prêmio Nobel de Literatura de 1991.

Seu último pedido:

“Enterrem-me na Ilha Negra,

Em frente ao mar que conheço,

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 26

A praia rugosa de pedras e ondas

Que meus olhos cansados não voltarão a ver”.

Somente em 12 de Dezembro de 1992

O seu pedido foi atendido.

E

Em 03 de Maio de 1994

Nasce o meu Pablo Neruda

Não o do Canto Geral

E sim, o do amor total

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 27

SOU

Sou canto

Sou encanto

Sou universo

Sou desencanto

Sou a lágrima do olho que chora

Sou o adeus daquele que vai embora

Sou a mansidão

Do ponteiro que fornece a hora

Sou o sabor ácido do limão

Sou a batida de um coração

Arco do Triunfo

Sou melancolia e solidão

Sou a águia altaneira

Sou a nau bucaneira

A violência

Sou uma sombra aventureira

Sou a fera ferida

Sou a alma indevida

Sou a morte esperada

Sou o semblante da vida

Sou os acordes de uma canção

Sou povo, sou nação

Sou opúsculo, sou crepúsculo

Sou verme...

Sou tudo, sou nada

Sou da vida a podridão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 28

UMA SOMBRA NO ESPELHO

Ah! Se eu fosse o espelho

Ah! Se eu fosse o reflexo

Mas, eu sou eu!

Sou concreto, sou real.

Ah! Como eu gostaria

De ser uma miragem

De ser uma imagem

Mas apesar do pavor

Sou real

E sofro por amor

Ah! Vida minha,

Minha vida.

Sou apenas uma sombra,

Quando eu queria

Ser apenas um reflexo.

Sou apenas

Uma sombra no espelho

Uma imagem sem nexo

Sem reflexo e sem sexo.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 29

VIVENDO

Vi tua silhueta recortada

Pelas curvas, formas e cores

Do vento, do tempo e do pensamento

Estou te vendo

Tão real, tão palpável

Que você se tornou uma miragem

Uma ilusão de ótica

Mas eu vou vivendo

Mesmo te querendo

Sei que te vi...

Sei que estou vivendo

E no ar o teu perfume

Reacende o fogo em mim

Sou um jardim, sou lume

O suave aroma do jasmim

Sei que estou vivendo

Sei que te vi... E não me rendo

E não me vendo

Mesmo sem querer

Mas sempre te querendo

Sei que estou vivendo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 30

MAÇÃ APODRECIDA

Pelas brumas do Avalon

Ou pelo perfume

Da revendedora do Avon

Volto ao tempo

Em tormento, em lamento.

Pelos cavaleiros da Távola Redonda

Ou pelo quadro da Gioconda

Continuo a regredir

Querendo saber o que é existir

Passo pelo liquidificador

Penetro na memória do computador

Entro em luta na lida

Para saber o que é a vida

Perco-me entre o vento e o tempo

A Minh’ alma jaz no esquecimento

Não sei se voo no turbo-motor

Ou nas asas de um condor

Mas, pilotando um caminhão

Voltei ao tempo de Adão

E em suas anotações esquecidas

Descobri que sou na vida

Apenas a maçã apodrecida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 31

FECHA-SE O CÍRCULO

Se o círculo é um “O”

Ou mesmo um zero

Não precisa de mim ter dó

Por não ter tudo que quero

Mas se o círculo é uma roda

Ou mesmo uma circunferência

Sei que sou mesmo um calhorda

Por não saber a diferença

O círculo da vida é vicioso

É nojento, é lodoso

É horripilante, é horroroso

É imundo e asqueroso

O círculo está se fechando

O mundo inteiro aguardando

Eu sozinho aqui sorrindo

Na imundície me consumindo

Que sabes do círculo da vida

Em tua cabeça demente?

Sei que o círculo é a semente

De uma existência ferida

E quando a vida é banida

Fecha-se o círculo

Entre o corpo e a alma perdida

E sozinho na vida apodrecida

Sendo uma imagem denegrida

Então, o que sabes da vida?

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 32

COMO UM CANÁRIO

Como um canário

Eu canto para não chorar

Na vida encarcerado

Sem poder voar

Como um canário

Vivo na infelicidade

Com comida, bebida e gaiola

Mas sem direito a liberdade

Como um canário

Eu morro no dia a dia

Sendo a cruz do meu calvário

Esta falta de alegria

É como um canário

Que vivo na tristeza

Mesmo tendo tudo na minha mesa

Falta-me a esperança

De poder ser livre

De poder voar

Sabendo que ninguém me alcança

Serei feliz e voltarei a cantar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 33

SOU APENAS NÚMEROS

Hoje sou apenas 1

Antes de nascer era 2

Dos irmãos sou o 3º

Os meus membros são 4

Na escola fui o 5º colocado

Comecei estudar aos 6 anos

E aos 7 já pintava o sete

Aos 8 sabia ler e escrever

E aos 9 já contava

Estórias para os 10 irmãos

Cresci 1.83 metros

Aí minha vida

Tornou-se apenas números

Hoje sou

Número da Identidade

Número da Reservista

Número do P I S

Número do C P F

Número do Título de Eleitor

Número da C T P S

Número da C N H

Número do Sindicato

E quando me aposentar

Serei apenas

Um número na fila do I N S S

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 34

E

Quando eu morrer

Serei apenas um zero a esquerda

E nada mais valerei

Pois na cruz do meu túmulo

Serei somente

Novos números

*21 – 10 – 1957

+------------------

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 35

EX-MAGNATA

Tempo passado

Tempo viver

Tempo presente

Tempo sofrer

Os dólares

Corriam entre os meus dedos

Em meu carro

Ao correr não sentia medo

Em minha casa

Nunca levantei tão cedo

Tinha carro, tinha casa

Tinha dinheiro e família

Um rei com coroa de lata

Vivendo uma vida devassa

Com Helena ou Marília

Sendo um puro magnata

O dinheiro acabou

A casa desmoronou

O carro abalroou

A família esfumaçou

Perdi a coroa de lata

De leão só tenho a pata

Quase virei psicopata

Por ser um ex-magnata

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 36

SONHOS E SONOS

Percorri a noite nebulosa da insônia

Nas asas mortíferas da morte

Na insanidade da imaginação insana

Encontrei os meus sonhos perdidos

Mergulhados no mais profundo sono

Oh! Quanto tempo perdido.

Perdido em busca de ilusões

Em busca de fantasias

De um homem que não adolesceu

E sim, adormeceu no passado.

Hoje este homem vive atormentado

Pelos fantasmas dos remorsos

Pura vida de sonhos mortos

E sonos moribundos

Realidade putrefata

Da vida morta do alter-ego

Não sei se sou eu

Esta pessoa que carrego

Encarnada em minhas entranhas

Não sei se é minha essa voz

Que se expande ao vento

Proferida por uma boca

Que faz parte de um corpo físico

Que nem mesmo sei se é meu

Sei que são meus

Somente os sonhos

Que se transformam em pesadelos

E o sono que me abandona

Nas noites nebulosas de insônia

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 37

PARADISE

Retornei a lugares comuns

Onde foi consumida a minha infância,

Visitei velhos companheiros

Hoje gordos e modorrentos,

A cal do tempo a tingir-lhes os cabelos.

Vaguei pela noite

Entre becos e vielas da favela

De um Vietnã esquecido.

Gritei o meu nome, o meu apelido,

Para encontrar no eco

A resposta de uma vida remota.

Procurei em cada esquina

Um instantâneo da minha mocidade,

Eu estava em busca

Do paraíso da juventude eterna

E fiquei estarrecido

Ao perceber que tudo havia mudado.

O menino barrigudo de fraldas encardidas,

Não mais existia.

Hoje ele é um policial.

É alto, forte e usa bigode.

Outros são profissionais liberais,

Outros morreram na marginalidade.

Aquela menina recém-nascida

Que tantas vezes coloquei no colo

E que me molhava com sua urina quente,

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 38

Não mais existe,

Agora ela é mãe.

Minha filha cresceu.

Ela é uma moça

E até me apresenta o namorado.

O que fazer? Nada posso fazer.

De repente descobri

Que já não sou mais o mesmo,

Que esta busca é inútil,

Que ainda não sou velho,

Mas que não sou mais tão jovem.

Descobri, porém,

Que o paraíso que procuro

Está dentro de mim,

Em meu ego,

Está dentro do meu lar

Ao lado dos meus filhos

E da mulher que amo.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 39

EU, A SIMPLICIDADE

Ninguém me entende

Ninguém procura entender

O meu modo de ser

Chamam-me de moleque

Somente porque gosto

De brincar com a garotada

Chamam-me de palhaço

Somente porque gosto

De provocar gargalhada

Moleque porque adoro criança

Palhaço porque adoro alegria

Por que me censuram tanto?

Olhem para mim

E sintam em meus gestos, a esperança.

Vejam em meus sorrisos, um novo dia.

Para que tristeza

Se temos a morte por certeza?

Ninguém me entende

Ninguém procura entender

O meu modo de ser

Ninguém busca meu lado positivo

Somente procuram o negativo

Para que possa servir de críticas.

Ninguém ao menos busca

Saber a maneira que vivo

E minhas qualidades artísticas

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 40

Ninguém me entende

Ninguém procura entender

O meu modo de ser

Porque vivo na simplicidade

E não desejo ver

O amor e a felicidade jamais

Neste mundo perecer.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 41

MEU PERDÃO

Não sou Deus para perdoar

Mas tu tens o meu perdão

Se sabes somente me odiar

Que Deus julgue teu coração

Me chamou de vagabundo

Safado e maconheiro

Somente porque conheço o mundo

Para ti, sou um desordeiro

Não te fiz nenhum mal

Não procurou me conhecer

Para ti sou um ser infernal

Mas nada tenho contra você

Tu tens o meu perdão

Nada tenho contra ti

Nada podes contra o meu coração

Vou continuar sempre aqui

Meu perdão é sincero

Pois de ti nada quero

O tempo passa e sua mágoa fica

Mas eu te perdoo, Dona Lica

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 42

ÍCARO SONHADOR

Sonhei que estava voando

Era um Ícaro com asas de pombo

Voava, voava, voava

E em busca da paz guerreava.

Sobrevoei o mundo da fantasia

Vi os planos da humanidade

Vi uma lágrima chorando

Vi uma língua gritando

Vi pobres vivendo felizes

Vi filhos respeitando os pais

Ah! Vi uma coisa que não esqueço jamais

Um país democrático de verdade

Sonhei que estava voando

Era um Ícaro com asas de pombo

Voava, voava, voava

Voava em busca da felicidade

E a encontrei tão feliz.

Que coisa linda é um sonhar de um Ícaro.

Mas de repente despertei...

Que cousa horrível é a realidade.

Oh! Morpheus,

Leva-me de volta ao mundo dos sonhos

Que como um Ícaro

Quero voltar a voar com asas de pombo

A procura da paz e da felicidade

Perdidas com o meu despertar.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 43

PIRATA CIGANO

Sou marinheiro

De um velho barco, o timoneiro.

Passo dia, mês e ano

Saqueando corações

Sou um pirata cigano.

Em cada porto que aportei

Um tesouro enterrei

Mas o tempo foi cruel

E deles não mais recordei.

Dois terços da minha vida

Perderam-se no mar

O pirata hoje chora

Por não ter a quem amar.

Quando clamo por amor

Me humilho e não me engano

Pois sei que é difícil alguém amar

Um velho pirata cigano.

O velho lobo do mar

Antes era um terror

Hoje vive a recordar

De tudo que no mar deixou.

O pirata se enganou

O cigano pereceu

O marinheiro chorou

O homem entristeceu

O barco naufragou

E o mar se enfureceu.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 44

O MEU CARNAVAL

Neste carnaval

Sou um Pierrô que te deseja com amor

És uma Colombina com seu jeito de menina

O mundo é o Arlequim

Com ciúmes de ti e de mim

Ciúme fatal que acabou o meu carnaval

Sou o Pierrô que chorou por seu amor

És a Colombina triste que imagina

Que o mundo é o Arlequim

Que levou nosso amor ao fim

Riu o Arlequim com o nosso fim

Chorou o Pierrô em sua dor

Sofre a Colombina tão fina

E o meu carnaval

Foi apenas um sonho

Não foi assim tão real

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 45

ALMA

Alma

Calma

Exala

Fala

Cala

Quem sou eu?

Ar que acalma - alma

Vento tempestade - calma

Manhã ensolarada - exala

Nada do nada - fala

Tarde sombria - cala

Alma

Calma

Exala

Fala

Cala

Quem sou eu?

Palavra sagrada - alma

Pensamento ilusão - calma

Carne apodrecida - exala

Grito de pavor - fala

Silêncio no túmulo - cala

Exala, sente no ar

O que fala, acalma a alma

Depois cala, cala

E tudo é silêncio na alma

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 46

QUE ALMA

Alma

Quem sou?

Como o ar que acalma

Eu sou alma

Como uma palavra amiga

Acalmando os conflitos

De outra alma

Como palavra sagrada

Eu sou alma

Deus fez o homem do pó da terra

E soprou em suas narinas dizendo:

“Do pó viestes e ao pó tornarás”

Está em Gênesis que desde então

O homem foi feito alma vivente

Então, eu sou alma.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 47

QUE CALMA

Calma

Quem sou?

Como vento e tempestade

Chegam em mim a raiva e o nervosismo

Com toda a sua fúria

E como acontece

Logo depois de todos os temporais

Chega em mim a calma

Como pensamentos e ilusões

Que afligem o meu dia a dia

E o meu ego continua calmo

Então, eu sou a calma.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 48

QUE EXALA

Exala

Quem sou?

Como a manhã ensolarada

Em que exala o suave aroma

Das flores do jardim

Como carne apodrecida

Após a vida fugir de mim

Sou todos os perfumes da vida

Como sou toda a podridão

Que se exala

Então, eu sou o que exalo.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 49

QUE FALA

Fala

Quem sou?

Como o nada do nada

Todas as palavras

Perdem-se com o tempo

Eu sou tudo que se fala

Como um grito de pavor

Que não passa de medo

Fraqueza e covardia

Eu sou tudo que se fala

Então, eu sou tudo que se fala.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 50

QUE CALA

Cala

Quem sou?

Como a tarde sombria

Em que a tristeza impera

Com a ausência do sol

Eu sou aquele que cala

Como silêncio no túmulo

Em que segredos e mistérios

Inteligências e experiências

São trancadas no cofre da eternidade

Eu sou aquele que cala

Então, eu sou aquele que cala.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 51

ENFIM...

Alma

Calma

Exala

Fala

Cala

Exala

Sente no ar o que fala

Acalma a alma

Depois cala, cala

E tudo é silêncio na alma

Enfim

Eu sou apenas um ponto

A mais na imensidão do Universo

E na Terra

Sou mais um na multidão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 52

PENÚRIAS

Ouço vozes tenebrosas

Em uma solidão sem fim

Barulhos de correntes

Fantasmas que chegam a mim

Sinto um cheiro fétido

Do desprezo vivido assim

Oh! Noites pavorosas

De torturante solidão

Adagas afiadas

A sangrar-me o coração

Que fiz ao nobre Senhor

Para viver tal aflição

São tantas desditas

A torturar minha mente

Sinto-me uma árvore daninha

Em meu ócio de doente

Sinto-me um cão vadio

Sofrendo de forma inclemente

Todas as penúrias que vivo

Nessas noites de terror

As lágrimas correm no rosto

Coração sangrando em dor

Tenho dúvidas se vale a pena

Continuar sentindo amor

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 53

Sono perdido e sonhos desfeitos

Tento adormecer

Mas vejo a noite se esvaindo

Vejo um novo amanhecer

Eu sofrendo calado

A espera de um novo anoitecer

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 54

EU QUERIA QUE...

Eu queria que...

Ao sentir a brisa fria que sopra

Lembrar-te do meu calor.

Ao ver uma gaivota voando

Lembrar-te da minha liberdade.

Ao perceber um facho de luz

Lembrar-te da minha esperança.

Ao ver um sorriso de uma criança

Lembrar-te da minha felicidade.

Ao ver um homem na labuta

Lembrar-te do meu ideal.

Ao presenciar o crepúsculo

Lembrar-te que estarei no amanhã.

Eu queria que...

Ao parar de chorar, sorrisses,

Pois um dia também chorei.

Pudesse amar como vos amo.

Pudesse resignar-se com a sua dor.

E pudesse a vida compreender.

Enfim, eu queria que...

O teu ser transpirasse amor

Como em meu corpo transpira.

Enfim,

Eu queria que estivesses ao meu lado

Como estou sempre ao teu.

Pois eu sou EROS,

O Deus do Amor.

O teu verdadeiro Deus.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 55

ANTES ME EXPLIQUE O HOJE

Antes era uma bela criança

Hoje é uma linda mulher

Antes eu era um moço irresponsável

Hoje sou romântico e saudosista

Antes eu era feliz ao teu lado

Hoje sofro por você

Antes eu não conhecia o amor

Hoje sofro por amar

Antes, por favor, explique-me o hoje

Antes eu desconhecia a poesia

Hoje sou um poeta sofredor

Antes a vida era sonhos e fantasias

Hoje ela mostra-me os espinhos

Antes você dizia me amar

Hoje digo que te amo

Antes menos que hoje

Hoje menos que amanhã

Antes, por favor, me explique o hoje.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 56

BARQUINHO DE PAPEL

É em meus sonhos de criança

O meu iate de luxo

No qual levo o meu amor a passear.

É o navio de guerra

Mais poderoso da minha esquadra

No qual navego milhas e milhas

Por outros oceanos

Em busca da paz mundial.

É em meus sonhos de criança

O transporte mais veloz

No qual viajo ao mundo da fantasia.

É a nau em que sou o comandante

A ditar ordens a marujada.

É depois da minha imaginação

A coisa mais pura nesse momento.

Barquinho de papel

Meus sonhos futuros

A doce melodia de ser criança

Mesmo depois de adulto

Barquinho de papel, meu doce barquinho

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 57

DESERTO PENSANTE

Como um deserto

Aqui estou quase que inanimado.

Como um deserto

O que me sobra de vida é o mínimo.

Movo-me como as cobras, víboras e lagartos

A arrastar-me na aridez da terra.

A falta de verde no deserto

É a minha falta de esperança.

A falta de água no deserto

É a minha sede de sabedoria.

A falta de árvores frutíferas

É a minha fome de amor.

O vento que sopra com violência

É a minha fúria incontida

Contra as injustiças sociais.

O que se salva no deserto é o abutre,

Que voa a espreita

Da próxima vítima da escassez.

O que se salva em mim é o pensamento,

Ele é livre.

Penso em busca de soluções

Mas, sou apenas um deserto pensante.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 58

TRAPO HUMANO

Não desejo piedade.

Não desejo que de mim sintam pena.

Este trapo também já foi feliz,

Sorriu, amou e foi amado.

Hoje é infeliz, taciturno e abandonado.

A vida é uma roleta

E no jogo da vida, tudo que se foi

Voltará um dia ao ponto de origem.

Não, não desejo piedade.

Desejo somente amor e paz.

Amor ao próximo como alento

E paz para que eu possa

Mesmo como um trapo humano,

Marginalizado,

Continuar a reerguer-me após cada tombo

E poder chegar ao final

Da minha missão terrena,

Mesmo sofrendo, mas sem revolta.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 59

DE VOLTA AO MAR

Voltar ao mar

Era tudo o que eu queria

Ver as ondas embaladas

Na mesma monotonia

Mesmo sabendo que cairia

Em profunda melancolia

Ficar longe da família

Do amor e do meu lar

Me faz ficar triste

Com vontade de voltar

Mas é enorme a força

Que me mantém sempre no mar

Ouvindo papos desagradáveis

De sujeitos esclerosados

Lembro-me do mundo exterior

Fora do qual estou encarcerado

Onde todos têm a mente suja

Com o pudor enclausurado

Os navios mudaram muito

Na era da tecnologia

Só não mudou a mente

Desta velha pirataria

Que vivem de maneira retrógrada

Na mais plena baixaria

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 60

Vejo com tristeza nos olhos

Minha juventude passar

Mas fico feliz com minha vida

Pois eu tenho a quem amar

Tenho um Deus Onipotente

Lêda, a mulher que eu amo

E a infinita imensidão do mar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 61

OS FILHOS DO MEU SAPATO

São calos da vida

Os filhos do meu sapato

Os sofrimentos constantes

De um moço em celibato

Os problemas sofridos

Por um brasileiro nato

São filhos do meu sapato

Este tormento sem dor

As agruras desmedidas

Esta lágrima incolor

A bela fêmea na paisagem

A quem olho com amor

O barulho que incomoda

Que não me deixa pensar

São filhos do meu sapato

Este doloroso penar

A musa deitada na areia

É quem me ajuda a rimar

O sol aquece-me o corpo

Com sua imensa claridade

São filhos do meu sapato

Toda intensa maldade

Dos que tentam destruir

A minha felicidade

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 62

São filhos do meu sapato

Este triste anoitecer

Os pensamentos terríveis

Que atormentam o meu viver

É o dia-a-dia fatídico

Vendo o nosso povo sofrer

Ver os políticos incapazes

Governando nossas vidas

São os filhos do meu sapato

Estas imensas feridas

Que me causam sofrimentos

De uma forma desmedida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 63

AMÁLGAMA

O que vejo pelo mundo

É difícil de entender

É político prometendo

Que tudo pode fazer

E o povo iludido vendo

Os filhos de fome morrer

É viagem para a França

Para receber condecoração

Sendo gasto o dinheiro do povo

Em passagens de avião

Enquanto sofre o trabalhador

Para poder comprar o pão

É nomeado imortal

Por mais pura ilusão

Somente orgulho velado

De vaidade no coração

Enquanto o filho do pobre

Não tem direito a educação

É gasta enorme fortuna

Em usina nuclear

Sem utilidade nenhuma

Só para o tempo acabar

Enquanto os brasileiros

Não tem assistência hospitalar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 64

Os jornais todos os dias

Trazem escândalos financeiros

Na TV a corrupção

É manchete o ano inteiro

Enquanto que os contribuintes

Já não sabem o que é dinheiro

É o Brasil em preto e branco

Pleiteando eleições

São políticos discursando

Disfarçando as armações

E o povo já cansado

De sofrer humilhações

Mas nesta imensa mistura

Deste país varonil

Existe uma grande esperança

Com destemor juvenil

De um dia nos orgulharmos

Do nosso imenso Brasil

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 65

A SOMBRA DO ACORDEOM

Quando eu era menino

Via sempre meu pai tocar

Em uma sanfona velha

Até o dia clarear

Animando sempre os bailes

Pra todo mundo dançar

Nisso o tempo foi passando

Eu sem pensar em trabalhar

Vivendo sempre de festa

Só me ligava em brincar

Não pensava no futuro

Que era certo chegar

Levando a vida na farra

Não procurei casamento

Vivendo sempre sozinho

No maior divertimento

Agora a velhice chegou

E junto o arrependimento

Hoje vivo lastimando

Toda hora e todo dia

Já estou velho e cansado

Na mais triste agonia

Sem poder mais trabalhar

E sem ter aposentadoria

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 66

Mas eu tenho esperança

Porque sei que Deus é bom

De perpetuar até a morte

O meu maravilhoso dom

De viver tocando bailes

Na sombra do acordeom

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 67

GERICORDEL

Eu sei que existe a tragédia

No ar, na terra e no céu

Mas quero falar de alegria

De coisas com sabor de mel

E de fatos interessantes

Eu quero ser o menestrel

Só quero falar de amor

Sem pensar na falsidade

E levar pra todo mundo

Com toda simplicidade

O que existe de mais belo

No coração da humanidade

Como é linda a primavera

Com as flores a perfumar

Como são belas as crianças

A sorrir e a brincar

Mas lindo mesmo na vida

É não saber odiar

Vamos amar o nosso próximo

Por toda a nossa existência

Praticando a caridade

Dando a nossa assistência

Foi para isso que Deus nos deu

Toda a nossa inteligência

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 68

Tanto faz ser branco e rico

Como ser preto e pobre

São cobertos pelo manto

Que ao mesmo tempo nos cobre

É sendo unidos com amor

Que na vida somos nobres

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 69

BETO, O ANALFA

Era o seu grande orgulho

Ser bastante trabalhador

Viver como besta de carga

E não ter nenhum valor

Para no ano inteiro

Só comer o que plantou

O seu nome era Beto

Nunca aprendeu a ler

Até a sua assinatura

Não sabia escrever

Porque nunca foi a escola

E nada queria aprender

Mas um dia em sua vida

Sentiu-se entristecido

Por não saber ler e escrever

Vivia com o coração ferido

Pensou logo em recuperar

Todo o seu tempo perdido

Matriculou-se em uma escola

Onde não tinha criança

Estudou com toda garra

Sempre tendo confiança

De um dia ser alguém

Jamais perdeu a esperança

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 70

Passaram-se os anos

Até a volta de Beto

Estudou tudo em línguas

Decifrou até dialeto

Mas o seu maior orgulho

É não ser mais analfabeto

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 71

CAPIM NOVO

Se alevanta o velho Pedro

Quando passa a menina

Alisa logo o cabelo

Que mais parece uma crina

E faz logo um resmungado

Com sua voz feia e fina

Saracoteia e balança

De maneira engraçada

Com toda força do peito

Ele fala pra moçada

Ainda dou duzentos contos

No rabo dessa safada

Todos ficam criticando

O velho fica danado

Bota todos pra correr

Debaixo do seu cajado

Dizendo pra todo mundo

Que é velho, mas não é capado

O velho Pedro fica zangado

Gritando puto da vida

Vai logo tirando a roupa

De forma bem atrevida

Deixando os “murchos” de fora

Bem no meio da avenida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 72

Fica trêmulo e gargareja

Da maneira de um corvo

Balançando pra toda gente

O seu saco, tripa e ovo

E diz que pra cavalo velho

O remédio é capim novo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 73

BERRANTE TRISTE, O ABOIO DO ADEUS

O berrante entristeceu

Nunca mais ele tocou

Sentindo falta das reses

Que a aftosa matou

A vaca preta Graúna

O grande touro Pastor

Bailarina e Franqueza

Alfinete e Coração

O bezerrinho Melaço

Água-Fria e Azulão

A mugir e a babar

Se contorcendo no chão

O berrante entristeceu

O vaqueiro se calou

O chocalho de Galega

Nunca mais se escutou

Até mesmo o passarinho

De tristeza não cantou

Vaqueiro pede as contas

Arruma a roupa e vai embora

Monta logo em seu cavalo

Se despede sem demora

Olhando para o curral

Onde a tristeza mora

Com os olhos cheios d’água

Vai embora o vaqueiro

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 74

Que tanto se acostumou

Com o belo gado faceiro

A quem ele tanto amava

E cuidava o ano inteiro

Olha o vaqueiro pro céu

Vê se dar para ver Deus

Ele quer explicação

Para os sofrimentos seus

E com um soluço abafado

Dá um aboio de adeus

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 75

VAQUEIRO TEM SENTIMENTO

Cavalo bom e mulher

É a minha perdição

Dançar e tomar cachaça

E correr gado em mourão

Namorar menina nova

Em festa de apartação

Fico alegre quando vejo

O gado gordo pastando

As vacas e os touros no pasto

Os bezerros escamuçando

E eu na minha alegria

Vou embora aboiando

Lembrando da triste seca

Que já ficou para trás

Hoje o inverno chegou

A verdura já satisfaz

O que Deus está fazendo

Homem da terra não faz

Antes das primeiras chuvas

O pasto era um deserto

O gado mago mugindo

O urubu rondando perto

A esperar que o gado morra

Pois o banquete era certo

Hoje o gado está bonito

Já tem água no barreiro

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 76

Já sumiu até as lágrimas

Dos olhos do vaqueiro

Hoje tudo é alegria

Tá feliz o fazendeiro

Quando é de manhãzinha

Muge o gado no curral

O vaqueiro se alevanta

No cantar do bacurau

Sorrindo e dando bom dia

Sem botar cara de mau

Fico contente seu moço

Com minha mão cheia de calo

Levanto de madrugada

Antes do cantar do galo

Boto o chapéu de couro

E vou selar o cavalo

Pego meu material

O parapeito e o gibão

Pego o par de esporas

E monto no alazão

Hoje é dia de ferrar

Os garrotes do patrão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 77

NAMORO DE VAQUEIRO

Menina moça bonita

Princesinha do sertão

Toda vez que vou passando

Tu acenas com a mão

Que pareces até um anjo

Da Virgem da Conceição

Sou vaqueiro tarimbado

Nascido em São Tomé

Já vi muito rosto bonito

Neste mundo de Noé

Que o diabo é quem se engana

Com essas manhas de mulher

Menina moça bonita

Me fale por caridade

Que foi que tu viu em mim

Já com toda essa idade

Com tantos rapazes mais moços

A andar pela cidade

Vivo a tanger meu gado

Pelas terras do sertão

A poeira é meu talco

O suor é o meu loção

Meu maior divertimento

É dar queda em barbatão

Tudo que tenho na vida

Para mim é um tesouro

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 78

Um cavalo alazão

Um velho chapéu de couro

Com parapeito e gibão

Minha vida vale ouro

Nunca namorei donzela

Nem pretendo namorar

Vou voltar para o sertão

Vou voltar a campear

Vaqueiro morre solteiro

Sem ter tempo de amar

E quando casa o vaqueiro

Depois vai se arrepender

A mulher passando fome

Vê o filho adoecer

Pois o dinheiro que ganha

Não dá nem para comer

Mas menina eu vou te falar

Uma coisa sem fingimento

Se meu ordenado tiver

Mais um pouco de aumento

Volto aqui em sua casa

E te peço em casamento

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 79

VAQUEIRO RELAXADO

O vaqueiro relaxado

Anda com a cara no chão

Vive a tomar cachaça

Já perdeu o seu gibão

Nunca mais foi convidado

Pra festa de apartação

Ficou curta a sua vista

E já treme a sua mão

Perdeu toda sua coragem

Tem medo de barbatão

Já perdeu tudo que tinha

Até o seu cavalo Tufão

A filha do fazendeiro

Ele trocou pelo balcão

Já bebeu até o dinheiro

Da sela do alazão

Hoje dorme nas calçadas

Lembrando do barracão

Ele hoje nem se lembra

Do seu gado no mourão

Do bezerro de Cigana

Nem do touro Azulão

Da vaca preta Graúna

Moça Branca e Coração

Das viagens a Marcoalhado

Não tem mais recordação

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 80

Tangendo o seu gado manso

Pelas terras do sertão

Aboiando onde passava

Na maior animação

Hoje se encontra doente

Olhos fundos e inchação

Sem recursos e sem amparo

Do seu antigo patrão

Só espera agora a morte

E de Deus o seu perdão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 81

MAS DOUTOU...

Mas doutou qui aligria

Eu sinto no intardicer

Juro pelas Ave Maria

Queu num sinto inveja de vosmicê.

Divagar eu vou tocando

Todo gado pro currá

Num cavalo bem baxêro

Eu me ponho a aboiá.

Abóio, abóio e num minfado

Purquê seio qui cabôco iguá a eu

Nasceu pra lutar cum gado.

Mas doutou se o sinhô visse

O queu vejo todo dia

Os barbatão se atracando

Os bizerrinho mamando

Ou uma vaca dando cria

Dunha coisa eu tinha certeza

Pra cidade o sinhô nunca ia.

Coisa bunita pra se oiá

Sem quarquer admiração

É o pouso do carcará

Ou o vôo do gavião.

O sinhô pricisa ver

A galinhada no terreiro

Do gavião só basta um piu

Que corre tudo ligeiro.

Isso tudo seu doutou

Queu lhe dixe, é de tardinha

Mas se o sinhô quizer eu vou

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 82

Le falar cuma é dimanhãzinha

O sinhô se alevanta

Antes do nascer do só

Toma um gole de café

Daquele qui amaiga iguá jiló.

Fai um cigarro de fumo

Desse qui nós chama brejeiro

Sai sortando a fumaça

Ca moças da cidade

Num pode nem sintir o chêro

Agora sim, seu doutou

Qui o sinhô vai pro currá

Pegá as vaca leiteira

Chamá os nome de cada uma

E butá os bizerro pra pojá.

Os nome delas eu digo

Vê si dá pra decorá.

Confeito e Bailarina

Subaúma e Fafá

Essa outa é Coração

É dunha raça valente chamada guzerá.

A cinzenta é Franqueza

Mas de franca num tem nada

Num dá mei lito de leite.

Sabe prumode o quê, doutou?

Esconde o leite, a safada!

É agora seu doutou

Qui mi dá animação

Tomá uma boa coalhada

Comer um naco de carne fritada

Na mantêga do sertão.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 83

Já falei tudo, doutou

Só num falei foi da noitinha

Mas falá tomém num vou

Mas le digo uma coisa bem baxinha

Me acredite se quizé

Mas vou deitá mais a muié

Foi conseio do veio meu avô

Que adespôs de toda luta

O matuto tem direito

A um troço chamado amor.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 84

PEDIDO DE CASAMENTO MATUTO

Dona Ontonha, aqui tou eu

Pra pidir Zefa im casamento

Num tenho nada na vida

A num ser, minha inxada

Um cachorro e um jumento.

Mas Dona Ontonha eu lha garanto

Pur Deus do céu se quizer

Queu morro de trabaiá

Mas cumida num vai fartá

Pra Zefa minha muié.

Da roça vai vim fejão

Girimum e macaxêra

Queu quero ver Zefinha

Bem gordinha e facêra.

Caça do mato nós tem tudo

Tijuaçú, preá e rolinha

Mas dinoite no deitá

Só quero mermo é Zefinha.

Agora tem uma cousa

Queu num posso aceitá

É adespôs queu a Zefa ingordá

Ela vinhé cum farsidade,

Oi Dona Ontonha,

Pur caridade, a Zefa eu posso matá.

Mas se Zefa fou dereita

Honesta e trabaiadoura

Aí sim, Deus me alivre

De trocá a minha Zefa

Pur outa mais pecadora.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 85

RESPOSTA DE DONA ONTONHA

Sivirino eu ti dou Zefa

Pra vosmicê si casá

Pra despôs do casamento

Vocês mi dá déis netinho

Prumode eu caducá.

Agora num pense vosmicê

Qué cum rôla e macaxêra

Qui tu vai dexar Zefinha

Bem gordinha e facêra.

Ela maga já é bunita

Num nega qué minha fia

O pai eu num seio quem é

Mas lha garanto

Quela foi minha úrtima cria.

Ingomadêra e lavadêra

Iguá a ela tu num vai incrontá

Só qué de mês im mês

Qui tua roupa ela vai lavá.

Mas Sivirino eu ti digo

Se Zefa fou farsa a tu

Num pricisa matá ela

Cuma se fosse rôla ou tijuaçú

Tu vorta cum ela pra eu

Queu num tenho raiva não

Tu adevove a minha fia

Queu ti dou meu coração.

Agora si tu quizé

Uma cousa mió ou mai bunita

Sabe quem vai ficá tisperando?

Eu, Toinha,

Cá muito já tá ti amando.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 86

O PORQUÊ DO POR QUÊ?

Por que temos que nascer?

Por que temos que comer?

Por que temos que beber?

Por que temos que adormecer?

Por quê?

Por que temos de acordar?

Por que temos de falar?

Por que temos de chorar?

Por que temos de andar?

Por quê?

Por que temos que amar?

Por que temos que trepar?

Por que temos que gozar?

Por que temos que calar?

Por quê?

Por que temos de mentir?

Por que temos de fingir?

Por que temos de sorrir?

Por que temos de fugir?

Por quê?

Por que temos que temer?

Por que temos que esquecer?

Por que temos que viver?

Por que temos que morrer?

Por quê?

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 87

LETARGIA

Não me movo...

Não presto atenção a nada...

O tempo passa e não percebo...

A vida passa e não vivo...

O sol é abrasador e não sinto calor...

A chuva é fria e não sinto frio...

O passante passa e eu fico...

O pombo pousa em meu ombro

E nada faço para afagá-lo...

O cão urina na minha perna

E nada faço para afastá-lo...

A comida é saborosa

Mas não sinto fome...

O suco está gelado

Mas não sinto sede...

Chega à noite e não sinto sono...

Nada sinto...

Nada sei...

Nada vejo...

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 88

SOBREVIVO

Das tempestades e trovoadas

Eu renasci e sobrevivo

Dos terremotos e calamidades

Eu renasci e sobrevivo

Sobrevivo

A vendavais e furacões

Maremotos e colisões

Só não sobrevivo

A inesperadas traições

A trágicas ilusões

A dor do amor em meu coração

Sobrevivo

A dor, ao pavor, ao calor,

Ao furor e ao terror

Só não sobrevivo

A perda de um amor

Das cinzas de um amor perdido

Eu renasço e sobrevivo

A bravura de homem do mar

Me faz viver, me faz voltar

Voltar para te amar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 89

TEMPO DESPERDIÇADO

Tempo desperdiçado

É sonhar com a felicidade

Pensar que alguém te ama

Pensar que trabalho enobrece

Pensar que o sol escurece

Sonhar ser feliz casado

Pensar que casado é feliz

Sonhar em ter tudo

Que na vida sempre quis

É tempo desperdiçado

Como é tempo desperdiçado

Pensar que o amor é eterno

Que a amizade é infinita

Que a lua é bonita

Que o sereno é sempre terno

Nada é eterno

Nem o cantar dos pássaros

Nem a tua fortaleza

Como não é eterna

A violência dos bárbaros

Nem a linda realeza

É tempo desperdiçado

Amar para viver

Viver para sonhar

Sonhar para amar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 90

VALE DOS RÉPTEIS

Veja você o que é a pré-história

Se na história contemporânea

Somos todos uma escória

Vivendo no vale dos répteis

Onde existem tiranossauros

O dinossauro vira bicha

É tubarão o brontossauro

E o povo é a lagartixa

O tigre dente-de-sabre

É o cofre que não se abre

Do rico miserável

Que age de forma abominável

A vida é vale

A vida é valeta

Nós somos os répteis

Atirados a sarjeta

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 91

CAOS DA VIDA

Ser vivo

Não é apenas existir

Ser vivo é viver

E compartilhar do caos da vida

É ouvir

O grito lancinante da gaivota

O choro estridente da criança

O apelo lamentoso de quem ama

É pegar em teus braços

Aquela que não te ama

Aquela que é amiga

Aquela que nada cobra

É ver

Além do teu alcance

Que não é amado

Que é um empecilho

Na vida de quem tu ama

É sentir no ar

Que é indesejável

Que não agrada a ninguém

Que já está ultrapassado

É poder falar que está vivo

Que ama a vida

E que apesar de tudo

Ama aquela que não te ama

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 92

CONDOR ERRANTE

Condor, ave altaneira

Tremula no infinito acima

Sendo ave aventureira

Igual a águia é de rapina

No alto do monte faz o ninho

Quase nunca pousa ao chão

Trata os filhotes com carinho

Tendo amor e dedicação

No mundo vive errante

Sem local onde pousar

É pássaro imigrante

Vive sempre a voar

Então...

Voa, voa como o pensamento

Vivendo apenas o momento

Vive, vive uma vida de aventura

Tratando todos com ternura

Ave altaneira

Oh! Condor

Que jamais irá cansar

De procurar o verdadeiro amor

Voa ave soberana

Pois é lindo o teu voar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 93

PALAVRAS

Palavras

São como folhas ao vento

No outono entristecido

Sem na vida um intento

E com o tempo esquecido

Palavras

São fumaças de uma fogueira

Que queima e apaga

São raízes de uma fruteira

De fruta bem amarga

Palavras

Saem da mesma boca que me beija

São partes pequenas da vida

É algo que o amante almeja

São pedras que causam ferida

Palavras

Palavras doces como o mel

Palavras que te levam ao inferno

Palavras amargas como o fel

Palavras são caminhos eternos

Que unem a terra e o céu

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 94

TUDO QUE TENHO É NADA

De que vale

O apertamento do apartamento

De que vale

Carro tão caro

De que vale

O poder de querer

De que vale

O estudo que estudo

De que vale

O dinheiro que tudo compra

E o ouro que nada vale

Para mim nada vale

Porque sem amor

Tudo que tenho é nada

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 95

SEM TETO, SEM ABRIGO

É como a cigarra

Que no verão levou a vida a cantar

E não trabalhou como a formiga

Pensando no inverno

E de repente

Sente-se no inferno

O inferno da vida

Que eu falo

É ficar sem teto e sem abrigo

Sem teto e sem abrigo

Sem trabalho e sem dinheiro

Ouça bem o que lhe digo

És os espinhos do cardeiro

E antes

Eras bom e inteligente

Trabalhador e muito capaz

Eras de grande valor

Para todos um bom rapaz

E hoje

És preguiçoso e vagabundo

Relaxado e sem pudor

Só prestas para o mundo

Para a família és pura dor

Ouça bem o que lhe digo

Ninguém é nada

Sem trabalho e sem dinheiro

Sem um teto e sem abrigo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 96

PERDIDO NO HOJE

Como uma dor inclemente

Penso na semente

Semente da vida

De um ser inocente

Radiante da vida

Eu sinto a ferida

De quem nasce agora

Como ave perdida

Nascer logo agora

Quando rompe a aurora

É perder-se no hoje

E jamais ir-se embora

Não nascer, meu amigo

É não sofrer o perigo

É jamais precisar

Nesta vida de um abrigo

Não necessita de nada

Como em um conto de fada

Aquele que jamais nascerá

Nesta vida esfacelada

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 97

PEDRAS SOBRE PEDRAS

Da sua riqueza

Do seu orgulho

Da sua avareza

Sei que nada irá restar

Pedras sobre pedras

Jamais irão sobrar

Pedras preciosas têm na mão

Muito luxo e muita orgia

Mas não tens um bom coração

Que te proporcione alegria

Pedras sobre pedras

Jamais irão restar

Da tua mesquinhez

Da tua altivez

Da tua honradez

Nada irá sobrar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 98

TRADIÇÃO

Ao cair dos ponteiros do relógio

As horas

Transformam-se em sementes do tempo

E nós?

Somos a matéria adubante

Para as flores incoerentes

Da felicidade ou infelicidade

Desta vida medíocre

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 99

PALADAR

Salgada é a palavra sal

Doce é a palavra mel

Amarga é a palavra fel

Sinto na boca

A podridão da palavra vida

O sabor

Putrefato da ferida

De uma vida tão vivida

E que já foi tão querida

Mas hoje a vida

É traição

Trai e é traída

Podre é a palavra vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 100

OLFATO

Sinto no ar

O aroma do strogonoff

O perfume da rosa

O cheiro suave da brisa

Mas expande-se no vento

O mau cheiro

Da lama da ingratidão

Da merda da falsidade

Do sangue da violência

Em completa sonolência

Caminho pela cidade

Cidade tão sofrida

Pela podridão afligida

Podre é a palavra vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 101

VISÃO

Vejo em minha frente

O surrealismo de Dali

O azul infinito do infinito

A bela loucura de Van Gogh

O verde do mar azul

O jardim florido tão bonito

Vejo ao meu redor

O menor abandonado

A fome e a miséria

Os conflitos raciais

A humanidade esquecida

A paz do mundo perdida

Podre é a palavra vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 102

AUDIÇÃO

Ouço ao vento e no tempo

A nona sinfonia de Bethoveen

O barulho do rock roll

A cadência do samba

O romantismo da serenata ao luar

Escuto com atenção

O lamento dos brasileiros

O gemido dos cancerosos

Os resmungos dos aidéticos

Os gritos

De uma Goiânia atingida

Porque

Podre é a palavra vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 103

TATO

Pego tão alegremente

Em uma criança sorridente

Pois é uma vida em semente

Em um buquê de rosas perfumadas

Para ofertar à namorada

Na mão amiga e confortante

Da amiga e amante

Mas,

Toco tão tristemente

Nas páginas dos jornais

De crimes e acidentes

Na matéria viva descolorida

Nas fotos da paz esmaecida

Nas pessoas tão corrompidas

Porque

Podre é a palavra vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 104

SAIA DO MEU CAMINHO

Afaste-se,

Saia do meu caminho.

Deixe-me caminhar livre,

Livre com liberdade de expressão.

Saia, afaste-se da minha vida,

Deixe-me viver a vida

Já desbotada, sem brilho e sem vida.

Saia do meu caminho

Deixe-me sozinho em minha dor.

Vida sem sabor

Vida em dissabor

Vida orgânica sem sentido

Com sentimento de culpa

Com invasão de pesadelos

Com avalanches de remorsos

Afaste-se.

Saia do meu caminho

Não necessito de falsas vozes.

Deixe-me morrer solitário

Em meio ao barulho do silêncio.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 105

OCASO CREPITANTE

Com o crepitar das chamas

Vejo o ocaso que se vai

O sol reflete na lama

E toda luz se esvai

Esvaindo-se crepitante

Fica o dia sem a vida

E na saudade angustiante

Penso em você minha querida

Tudo é belo nesse momento

Tudo é lindo nessa hora

E o meu maior tormento

É não ter você agora

O dia fica mais triste

Nesta negra escuridão

Meu coração se apavora

Gritando:

Triste ocaso da minha paixão

Sentindo arder no peito

A dor gritando

Nas chamas crepitando

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 106

TRISTE FELIZ ANO NOVO

Ano velho que partiu

Ano novo que chegou

Enquanto o filho sorriu

O velho pai chorou

Do ano velho a saudade

Dos meus filhos que ficou

No ano novo felicidade

Eu desejo com amor

Triste ano que se vai

Que só me deu decepção

Por não ter sido um bom pai

Sinto dor em meu coração

Sinto a vida me fugir

Afogando-me em agonia

Sinto o meu coração ferir

Neste fatídico último dia

Penso em ti, oh! Meu filho...

Meia noite

Ouço o cantar do galo

Escuto o alarido do povo

E em lágrimas me calo

Porque para mim está sendo

Um triste feliz ano novo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 107

MEU DIÁRIO

O meu diário está escrito

Nas vinte e quatro horas do dia

Na areia da praia em que ando

No verde mar que me banho

Nas árvores que fico a mirar

Nos pássaros que ouço a cantar

Na casa pobre onde moro

Na rapadura que com os dentes toro

Na rede que me ponho a balançar

Nos livros testemunhas do meu sonhar

Nas lágrimas que dos meus olhos descem

Nas tardes de inverno que escurecem

Nos peixes das pescarias de agosto

Nos meus gostos e desgostos

Na má língua da vizinha

Na vida que não é minha

Nas palavras lançadas contra mim

No suave aroma que sinto

Das rosas do meu jardim

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 108

VERBO CHORAR

Eu choro

Tu choras

Ele chora por nos ver chorar

Nós choramos por amor

Vós sois o filósofo que em belas

Palavras falou com ardor:

“O choro é uma maneira triste de sorrir”.

E Eles que sentem amor por ti

E com felicidade vêem a primavera florir

Simplesmente

Eles choram

Verbo chorar

É o verbo sorrir

É o verbo amar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 109

CONTRASTE

Alguém querido

No leito de um hospital

Alguém odiado

Em um palacete real

Um pobre homem e família

Atirado à sorte nas rodoviárias

O rico senhor e família

A passear nas Ilhas Canárias

Uma criança a chorar

Um adulto a sorrir

Os espinhos a machucar

As flores a florir

Tantos em tanta dor

Tantos pensando em matar

Poucos pensam no amor

Como contraste

Penso somente em amar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 110

OBRIGADO AMIGO

Obrigado amigo

Pelas críticas que me faz

A ferir o meu coração

A destruir a minha paz

Obrigado amigo

Pela sua maldade

Fazendo tudo que pode

Para acabar com a minha felicidade

Obrigado amigo

Quando de tua casa me corria

E eu sem leito e sem abrigo

Atirado à orfandade

De fome e frio morria

Obrigado amigo

Por tentar me derrubar

Pois é caindo muitas vezes

Que se aprende a caminhar

Obrigado amigo

E se um dia necessitar

Nesta vida de um abrigo

Não precisa relutar

Pode contar sempre comigo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 111

O EXILADO

Pranteastes em meu pranto

Sorristes em meu sorriso

Cantastes em meu canto

Amastes em meu paraíso

E como o sol no tardio ocaso

Mergulhastes no decote horizontal

da natureza

Para proteger-se do blackout noturno

da solidão

Com o calor dos raios solares

amaste-me

Chamando-me de amor

Sofro em minha dor

Choro como o sol na noite

Exilado do próprio dia

Que para brilhar tenta a anistia

Choro em êxtase sofredor

Exilado em nossa ilha de amor

Pranteio em meu pranto

Sofro em tua dor

Canto em teu canto

Amo em teu amor

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 112

ESTRELA RADIANTE

Noite de nefasta negritude

Sem cor e sem alento

Estrela radiante na altitude

Finge não ouvir o meu lamento

Estrela radiante tão airosa

Linda como a Vênus nua

Lembra a deusa formosa

Que baila a luz da lua

Estrela radiante divina

Iluminando a minha alma

Consolando a minha sina

Controlando a minha calma

Noite negra, negra noite

Estrela bela e radiante

Sofro no peito o açoite

Da loucura inebriante

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 113

HOLOCAUSTO

Mesmo que o buraco seja raso

Mesmo que o buraco seja fundo

Sei que na vida não me arraso

Pois conheço as manhas do mundo

Mesmo que eu morra agora

Mesmo que eu morra amanhã

Estarei contigo sem demora

No doce sabor da maçã

Mesmo que tu me desprezes

Mesmo que tu me ames

Peço a Deus que tu rezes

E tire os teus pecados infames

Mesmo que sejas amigo

Mesmo que sejas cruel

Estarás sempre comigo

A caminhar pelo céu

Mesmo que digas me amar

Mesmo que digas me odiar

O holocausto acontecerá

E todos irão acabar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 114

O SABOR DO NADA

O sabor do tudo

É o mesmo sabor do nada.

Depende de ti somente.

Vive a tua própria vida.

É totalmente independente,

De ninguém e de nada precisa.

Tem carro, casa, dinheiro,

Bom emprego e posição social.

Tem tudo, tem amigos bajuladores,

Tem nos teus braços

As mais belas mulheres da cidade.

As mentiras que fala

Para todos são grandes verdades.

É aí que sentes o sabor do tudo.

De repente...

Caístes em posição social.

Se tornaste um desempregado.

Perdestes carro, casa e o dinheiro.

Sumiu o dinheiro,

Sumiu os amigos que o bajulavam,

Sumiu também as mais belas mulheres,

E as mais feias também.

Até mesmo as verdades que fala

Não passam de grandes mentiras.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 115

É aí que sentes o gosto do nada.

Pois o sabor do nada

É o inverso do sabor do tudo.

A humanidade e a sociedade

Não dá o devido valor ao homem,

Pelo que ele é na realidade

E sim pelo dinheiro que ele tem.

Se tudo tem, o homem é alguém.

Se nada tem, o homem é ninguém.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 116

BEM-TE-VI E MAL-TE-VEJO

Bem-te-vi

Rico e altaneiro como o condor

Bem-te-vejo

Pobre e humilhado em sua dor

Bem-te-vi

Vivendo uma vida no céu

Bem-te-vejo

Sofrendo pela vida ao léu

Bem-te-vi

Pelos amigos adorado com amor

Bem-te-vejo

Pelos parentes desprezado em sua dor

Bem-te-vi

Pelos amigos sendo bajulado

Bem-te-vejo

Hoje em um velho quarto jogado

Bem-te-vi

No mundo sem parente

Mas dos amigos recebeu apoio

Mesmo quando estava doente

Bem-te-vejo

No seio da família

Sem qualquer consideração

Mas a todos perdoa em seu coração

Ontem eu bem-te-vi

Hoje eu mal-te-vejo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 117

FUGA

Fuga...

Uns fogem da prisão,

Outros fogem da vida.

Mas se a minha vida é uma prisão,

Eu sou um eterno fugitivo.

Vivo preso, encarcerado

Em labirintos de pensamentos.

Vivo preso, torturado

Por não encontrar resposta

Para a vida que levo.

Na ânsia de liberdade, escrevo,

Escrevo poemas, escrevo poemas

De amor, de ódio, de revolta.

Sinto vontade de chorar,

Sumir no horizonte,

Fugir da vida e não mais retornar

Ao outro lado do muro dessa prisão.

Fugir da vida

Pelos caminhos que traço com o lápis

Ou afogar-me em cada lágrima

Que rola em meu rosto

Neste momento de fuga.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 118

ONDAS

Ondas sobre ondas

Remotas saudades

Espumas brancas espumas

Lembranças felicidades

Velha nau a navegar

Ondas sobre ondas

Sempre a ondular

Mar bravio

Vento calmo

Simples ondas

Na praia a desmaiar

Noite escura

Lua bela

Velha nau a navegar

Marinheiro soluçando

Sem saber se viverá

A beleza de um porto

Mesmo a paz do orixá

Vida porto

Morte mar

Ondas sobre ondas

Até quando ficará

Marinheiro, marinheiro

Sempre, sempre a soluçar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 119

O SONHO ACABOU

O sonho acabou

O castelo caiu

A verdade chegou

A mentira sumiu

Nesta vida só vale quem tem

Milhões ou milhares

E não um vintém

O amor é matreiro

A felicidade é mentira

Deus é verdadeiro

Ele nos dá e também nos tira

Nos dá a vida

Nos dá a luz

Que vida sofrida

Como pesa minha cruz.

Vida desregrada

Amor infeliz

Isso a mim não agrada

Isso eu nunca quis

É como pintar aquarela

Com pincéis de arminho

Senhor, mate-me ou revele

Qual será o meu caminho

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 120

PEQUENO SOFREDOR

Pequeno sofredor

Fruto do sêmen perdido

Nasceu sofredor

Apesar de todo amor

Abandonado pela mãe

Meu Deus, quanto horror!

João, José, Genival,

Antonio, Francisco ou Raimundo

Qualquer que seja

O teu nome no futuro

Será a imagem do desprezo

Um bastardo a mais no mundo

Chora agora em sua inocência

Ao crescer pedirá clemência

Mas um dia chorará

O desprezo de um enjeitado

Humilhado em sua existência

Tantas juras de amor

A falsidade acabou

O sonho não realizou

Como resultado

Alguém respira aliviado

Jogando no mundo ao léu

Um pequeno fruto do céu

Enviado pelo Senhor

Hoje fruto desprezado

Um pequeno sofredor

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 121

O LOUCO

Por expressar o que sinto dentro se mim.

Por amar o meu próximo

E nem sempre dizer sim,

E sim, dizer não quando necessário.

Por dizer que amo,

Por me incompatibilizar com o regime

Todos me chamam de louco.

Quando digo está decepcionado

E descontente com a situação do país,

Com o desemprego e a miséria.

Por não aceitar como normal

Um pai com dois ou mais filhos,

Ganhar um mísero salário mínimo,

Do qual oitenta por cento é o aluguel

E os vinte por cento restantes destinam-se

A alimentação, educação,

Vestir e calçar de toda família,

Ficando proibido de adoecer,

Por falta de recursos para o medicamento.

Todos dizem que tenho ideais comunistas

Ou sou simplesmente um louco.

Por adorar a natureza.

Por o meu credo não ser comum no país,

Por não aceitar o erro e sim combatê-lo,

Por dizer a todos que riquezas, orgulho

E bens materiais nada valem.

E sim, o amor tem condições de reinar

Sobre todos os seres humanos

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 122

Nesta e na outra vida.

Sou considerado um louco.

Por não ler livros e revistas pornográficas,

Por os meus autores preferidos

Serem gênios como o imortal

Vinícius de Morais,

Que parabenizo “porque hoje é sábado”,

O poeta Carlos Drummond de Andrade,

O inesquecível Machado de Assis,

Pablo Neruda, o homem do “Canto Geral”,

Richard Bach com suas “Ilusões”,

Lobsang Rampa por sua “Terceira Visão”.

Sou apenas um louco.

Mas, se amar é loucura,

Se loucura for discordar dos erros,

Adorar literatura séria

E ter um credo diferente de todos.

Então eu grito com toda a força dos meus pulmões:

EU SOU LOUCO!

Se pensar no meu irmão de pátria,

Se pensar no futuro do meu país

E não aceitar as imposições do regime

Transformando todos em escravos,

For comunismo.

Então eu sou um partidário.

Se amar for crime,

Eu sou um criminoso.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 123

Mas nunca deixarei de ser “EU”

Para ser uma marionete,

Que manipulada somente obedece,

Para que todos os poderosos

Se satisfaçam a seu bel-prazer.

Comunista e criminoso

Assim posso ser chamado?

Por ter idéias livres

E coração cheio de amor,

Posso ser considerado um louco?

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 124

PRIMEIRA DIMENSÃO

Côncavo e convexo

Unidos

Jorro de esperma

Sentido

União de óvulos

Assim nasce

A primeira dimensão

Feto

Afeto

Recém parido

Sempre dialeto

Abre olhos, engatinha, anda, corre, salta a vida,

Fala, sente dor, tenta em vão o amor.

Adolescência, sonhos e fantasias,

Carências, sempre carências carentes.

Turbilhão na mente

Adulto somente sente

Adulto semente da dor

Ódio,

Ilusão,

Fim da primeira dimensão.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 125

SEGUNDA DIMENSÃO

Trinta, Quarenta, Cinquenta

Sexagenário em vão

Indigente ou não

Assim se inicia

A segunda dimensão

Pênis flácido, membro morto

Vagina murcha, caminho torto

Torturas, dor

Fracasso, solidão

Torna-se um cão

Cão desvalido que vai e que fica

Morto tão morto quanto à própria pica.

Suor, sangue, ódio, revolta, traição.

Sumo-Artífice da ignorância

Ultra-Mestra da incompreensão

Assim todos terminam

Na

segunda dimensão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 126

TERCEIRA DIMENSÃO

Tiro, facada,

Suicídio, natural

Desastre,

Mestre da arte

Morte,

Parado coração.

Close-up tridimensional

Mal, mau, mão, pão

Não sabe com quem lida

Não sabe o que é a vida

Vida que vive, vive a vida

Sofrendo, chorando

Mas nunca amando.

Enfim sós...

Carne apodrecida

Tumor fétido

Corroídos pelos vermes

Putrefato nas entranhas

Cousas estranhas

Jaz no esquecimento

Escuridão ou claro

Infinita vida

Soterramento

Assim todos acabam

Na terceira dimensão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 127

VIDA

Lua plácida

Banha semente

Vida cálida

Como alho-dente

Chega vida

Move homem

Bebê fala

Natureza treme

Pássaro cala

Nasce vida

Vida humana

Réptil nojo

Árvore lama

Bagagem bojo

Falar cantar

Sonhar dormir

S. O. S ajudar

Chorar sorrir

Sorrir ferida

Vida sempre

Sempre vida

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 128

MORTE

Sol escaldante

Queima túmulo

Morte arfante

Sob acúmulo

Bate morte

Para homem

Corre corte

Natureza geme

Pássaro canta

Lembra sêmen

Homem tampa

Ataúde sentem

Sempre cama

Eterno dormem

Calar calar

Orar parente

Pedir Supremo

Como salvar

Éter paraíso

Coração morto

Lábios sorriso

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 129

VERDADEIRA AMIGA

Eu tinha vários amigos e amigas

Mas, uma das minhas amigas era muito tímida,

Nunca me procurava para brincadeira.

Enquanto que os outros e outras,

Estavam comigo sempre a brincar.

Moravam todos em um mesmo edifício,

Por sinal muito bonito, onde se lia

Em letras douradas o nome do mesmo:

EDIFÍCIO VIDA

Todos se diziam grandes amigos.

Mas, um dia precisei do amparo,

Da ajuda de um amigo,

E saí em busca de todos.

Bati na porta de um velho amigo, o AMOR.

Ele não atendeu ao meu apelo.

Bati na porta do CONFORTO AOS AFLITOS.

Também não me atendeu.

Fui à procura do CARINHO.

E o mesmo a exemplo dos dois primeiros,

Não me abriu a porta.

Desisti e falei:

--- Vou à procura das minhas amigas, quem sabe elas me

atenderão!

Bati na porta da FELICIDADE, não me atendeu.

Bati na porta da PAZ, também não me ouviu.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 130

Oh! Que tristeza!

Somente resta-me ir à procura da minha amiga

Que mora no último andar deste edifício.

Mas, ela é tão tímida, tão reservada.

Não, acho que não devo incomodá-la; assim pensei.

Mas, mesmo assim a procurei.

Bati na porta da minha amiga do último andar

E que emocionante...

Ela abriu-me a porta com um sorriso nos lábios

E chorando emocionado, atirei-me em seus braços,

Libertando-me assim

Do cansaço dos degraus do EDIFÍCIO VIDA,

No delicioso abraço

Da minha verdadeira amiga, a MORTE.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 131

E TUDO CONTINUA...

Quando eu morrer

Tudo continuará a girar

Com a mesma intensidade do agora.

Os ponteiros dos relógios

Não irão atrasar nem um segundo

As rosas se abrirão com o mesmo perfume

Os animais entrarão no cio como antes

As árvores continuarão sempre verdes

A lua e as estrelas

Continuarão a brilhar no infinito

O sol continuará a aquecer o dia

As fábricas não irão parar a produção

Crianças continuarão a nascer

E os pássaros continuarão a cantar

Nada e nem ninguém irá parar após a minha morte

A vida é bela

A vida é vida

A vida não tem tempo para ser triste

Pois no momento da minha morte

Estarão nascendo novas vidas

E tudo continuará...

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 132

FIM DA ESTRADA

A vida é uma longa estrada

Cheia de caminhos retos

E caminhos tortuosos.

Ambos são recobertos de flores

E também de grandes espinhos,

Sonhos e desilusões.

Ao nascer

Caminhamos sobre as flores

E somos amados.

Na infância

Começam as decepções

E nem todos nos compreendem.

Somos adolescentes

E caminhamos pelos caminhos tortuosos

Da dúvida e da incompreensão.

Ao nos tornarmos adultos

São os caminhos tortuosos

E cheios de espinhos

Da responsabilidade com o lar,

Para com os filhos

E com a pessoa amada.

E, no entanto

Não existe nenhuma recompensa,

Nem mesmo a mínima consideração.

São somente os espinhos...

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 133

Bate a velhice em nossa porta e tudo piora.

Perdemos a visão em um todo

E deixamos de ser comandante

Para sermos comandados

Até mesmo pelos netos.

Perdemos a coordenação motora

E somos inválidos.

Somente conseguimos descansar

Ao atingirmos o fim da estrada.

A MORTE

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 134

PLANO MACABRO

Um plano macabro tenho na mente

Estou pensando em suicidar-me

Penso em mil maneiras

De completar o meu ato insano

Já pensei em várias maneiras

Enforcar-me?

Dar um tiro no ouvido?

Afogar-me?

Pular de um plano mais alto?

Jogar-me na frente de um carro?

Atear fogo em meu corpo?

Ou quem sabe, envenenar-me?

Tentarei me enforcar...

Amarrarei uma peça de elástico

Em um pé de abóbora

E verei o que acontecerá a minha vida

Se não der certo

Pegarei o revólver de brinquedo do meu filho

E darei um tiro no meu ouvido

Se falhar

Tentarei me afogar em um copo d’água

Quando alguém provocar uma tempestade

Se não morrer

Então pularei do 1º degrau

Da escada do edifício mais alto da cidade

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 135

Se mesmo assim eu escapar

Na primeira oportunidade

Me jogarei na frente do carro de controle remoto

Que meu filho costuma brincar

Ah! Já sei.

Jogarei água em meu corpo

E me incendiarei com o fogo da paixão

Não!

O que farei mesmo é me envenenar

Sugando a língua da mulher amada

E morrerei de amor

Só estou tentando isso

Porque amo a vida

E sou muito covarde para renunciá-la

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 136

O ANJO DA TROMBETA

O anjo da trombeta me avisou:

‘Segundo o Apocalipse de São João,

jamais o mundo será feliz”

Ah! Ah! Ah!

Eu gargalhei da miséria pouca.

O anjo da trombeta tornou a falar:

“Virá praga de gafanhotos

e todo o verde comerá”

Ah! Ah! Ah!

Eu gargalhei.

Pois não sou nenhuma árvore

e tampouco sou o Incrível Hulk.

O anjo da trombeta tornou a me avisar:

“Virão três noites de escuro

e tudo se fará trevas”

Ah! Ah! Ah!

Eu gargalhei.

Pois noite sem lua, toda ela é escura

e se acontecer de tudo se fazer trevas,

aí sim, se comprovará a eficácia

da energia elétrica e os geradores a diesel.

O anjo da trombeta me avisou pela última vez:

“Virão de mãos dadas, a fome, a peste e a guerra...”

Chuif! Chuif! Chuif!

Eu não consegui gargalhar.

Eu chorei e acreditei.

Eu vejo todo o continente africano

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 137

sofrendo as terríveis atrocidades

da fome, da peste e da guerra.

Vejo a Nigéria e Moçambique passando fome,

vejo a Iugoslávia destruindo

os seus irmãos kosovares em uma guerra imunda.

Sinto no pulsar do meu coração

todo o lutar,

todo o cantar guerreiro

de uma raça nagô,

em guerra com o mundo

que se corrompe em vão para comparar,

para libertar por inteiro

o complexo de cor de toda uma nação.

Eu acredito no anjo da trombeta.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 138

EU TE ABANDONEI

Gozei. Mas também sofri em teu poder.

Poder inebriante que me tornava viciado em você.

De manhã a noite, todos os dias da semana estavas

comigo,

tu eras para mim, a felicidade.

Nos dias frios de inverno, era você quem me aquecia.

Com você eu sentia mais apetite,

era contigo que eu criava coragem

para resolver todos os meus problemas.

Quando eu estava triste,

com desgosto, a pensar na vida,

era você quem me fazia esquecer de tudo.

Você me embalava e eu adormecia profundamente.

Nas festas tradicionais, casamentos, batizados,

aniversários, se eu era convidado

nós nos encontrávamos

e após a farra voltávamos juntos para casa.

Com você eu me tornava alegre,

não tinha tempo para tristezas, nem angústias.

Nas praias e nos clubes eu nunca ficava sozinho,

sempre estavas comigo.

Eu me recordo

que foi através de você que consegui

um grande número de amigos.

Ah! Como me diverti nesse tempo.

Mas eu te abandonei e não me arrependo.

Eu te abandonei,

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 139

Porque estavas a atrapalhar a minha vida.

Por tua culpa cheguei a perder vários empregos.

Por tua culpa tornei-me um irresponsável,

dormi na sarjeta,

passei fome e fui desconsiderado.

Foi através de você que obtive vários inimigos,

pois quando eu estava contigo tornava-me um brigão,

não respeitando homens e tampouco ambientes.

Foi por você que desprezei a minha família,

destruí o meu lar, esqueci mulher e filhos.

Foi por sua culpa

que perdi a confiança que todos me tinham,

julgando-me um homem indigno e não confiável.

Foi por sua culpa

que fui desprezado por todos.

Agora eu te abandonei.

Agora que estou sabendo que as alegrias

e o apetite que eu sentia contigo eram todos falsos.

Como eram falsos

os amigos que consegui através de você.

Hoje não preciso de você para tomar coragem

e resolver os meus problemas.

Hoje consegui respeito e confiança.

E o melhor,

consegui resgatar a minha autoestima.

Eu te abandonei.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 140

Nunca mais, você “Cachaça”

e nenhuma outra bebida da sua espécie,

mesmo com o menor teor alcoólico,

irá tornar o meu hálito fétido,

não me dará mais dores de cabeça nas ressacas,

e jamais me levará outra vez a lama,

a sarjeta,

a mais baixa categoria dos homens,

que é tornar-se um alcoólatra.

Sabe por quê?

Porque eu te abandonei.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 141

ESCURIDÃO

Sinto fugir dos meus olhos

o precioso tesouro que me resta.

Sinto que mergulharei na mais profunda escuridão.

Sinto que nunca mais poderei ver

as coisas simples que me cercam

e que se tornam as coisas belas

que enfeitam a vida,

colorindo e dando brilho aos nossos olhos.

Nunca mais verei o azul do céu.

As estrelas a brilhar no infinito.

A cara redonda da lua cheia.

Nunca mais poderei ver os pardais

alimentando os filhotes em seus ninhos.

As abelhas na colméia.

O verde do mar perdido no horizonte.

O peixinho dourado no aquário.

Não verei jamais, a cor dos shorts

que meus filhos estarão usando.

O sorriso inocente no rosto de uma criança.

As rosas vermelhas do meu jardim.

O verde das árvores.

O sorriso cínico daqueles que me odeiam.

O rosto triste daqueles que me amam.

Nunca mais verei o rosto da mulher amada.

O ocaso maravilha.

A morning star na madrugada.

Nem mesmo verei as gaivotas a voar

no azul do céu, a lembrar a liberdade.

O que me dói muito mais,

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 142

é não poder penetrar através dos livros,

em mundos maravilhosos e fascinantes,

como o mundo de José Lins do Rego,

como o mundo de Richard Bach,

o mundo fascinante de Dante Alighieri,

Miguel de Cervantes y Saavedra,

Luis de Camões e Eça de Queiroz,

o mundo sonhado de Jorge Luis Borges,

que teve os seus olhos mergulhados na escuridão,

mas teve a sorte de encontrar a Maria Kodama,

que se tornou a sua terceira visão.

Não poderei jamais voltar a ser criança

lendo as mensagens contidas nos livros

Pequeno Príncipe e o Menino do Dedo Verde

ou a me divertir a valer

com as aventuras dos personagens

do Walt Disney e Maurício de Souza.

Sim. Dói dentro do meu ser

perder o contato com as cores

e as letras do mundo que tanto amo.

Sinto fugir de mim, a minha visão,

fugindo aos poucos, mas fugindo de verdade.

O que farei para permanecer em contato

direto com as cores e as letras,

os sorrisos e caretas

e não cair jamais na mais completa escuridão?

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 143

LIBRA

És a eterna balança

Símbolo máximo da justiça

És também uma trança

Feita de chumbo e cortiça

Quando na vida se alcança

Toda lama e carniça

Não és libra esterlina

Não tens o mesmo valor

És como uma velha mina

Com cheiro fétido de bolor

Ou mesmo como a menina

Quando nega o seu amor

Não és como a libra de ar

Que rápido enche o pneu

Mas és como o esgar

De um triste rosto pigmeu

Ou mesmo o despertar

Do gigante Pirineu

Libra

És o meu signo

Minha sorte

Minha luta

Meu azar

Contigo sou fraco e sou forte

Não me permites sonhar

Mas no dia da minha morte

Com ou sem você

Sei que irei repousar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 144

LEMBRANÇAS RENOVADAS

Quando o corpo morre

Quando a vida esmaece

Quando o amor socorre

O santo homem aparece

Quando o homem na vida labuta

Quando o sol na vida aquece

Continua o amante em sua luta

E do amor jamais esquece

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 145

BOLHAS DE SABÃO

Pensamentos em voga

Em fatos e contradição

Vida infinita perdida

Frágil tão frágil

Qual bolhas de sabão

Ocaso, crepúsculo que já finda

Fim de tarde

Última estrofe de uma canção

Em uma tarde tão linda

O amor transborda no coração

Vida frágil, amarga vida

Existe sem nenhuma condição

Folha de outono ressequida

São lembranças que explodem

Qual bolhas de sabão

Homens no seu intenso labor

Vida na qual tem valor

Uivo sonoro de um cão

Parte infeliz de uma nação

Cala-se o sol de arrebol

Esquecem-se os problemas no futebol

E a noite desperta

Em uma praia deserta

Em uma hora incerta

Tão bela

Qual bolhas de sabão

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 146

ESPERE E VERÁS

Espere e verás

O trem bala passar

O girassol desabrochar

A guerra no mundo acabar

E Cubatão poder respirar

Espere e verás

Brizola ser eleito

Um Brasil sem defeito

A Seleção tomar jeito

E minha mãe ser prefeito

Espere e verás

O menor ser amparado

Os salários equiparados

Os ditadores deportados

E os políticos regenerados

Espere e verás

A vida ser maravilha

Brasília se tornar ilha

Dinheiro ser como ervilha

A mãe ser filha da filha

Espere e verás

A paz no mundo acontecer

Um novo Cristo nascer

O amor no homem crescer

E a humanidade no Apocalipse perecer

Espere e verás

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 147

SONHO NA CHUVA

Lá vem uma velha senhora

Mas que não é uma senhora velha

Debaixo de um guarda-chuva

Mas que não guarda chuva nenhuma

Com passos rápidos

De uma impressionante

Lentidão de lesma

Como um ciclone

Gira sobre si mesma

Olha a moda da vitrine

Sem ao menos

Olhar a vitrine da moda

E como a sonhar

No seu triste despertar

Fala para alguém

Que do seu lado desaparece

Ah! Se eu pudesse.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 148

UM VELHO SONHO

Continua em minha mente

O mesmo sonho.

Um velho sonho.

Um velho sonho

Que em sua Fuga,

Leva-me pelos caminhos

Que traço com o lápis

Ou afoga-me em suas lágrimas.

Um velho sonho

Que me transforma em um Ícaro Sonhador,

Voando com asas de pombo,

A ver coisas impossíveis neste mundo.

Um velho sonho

Que me transforma em Louco,

Incompreendido por todos,

Um louco que ama e chora os seus amores.

Um velho sonho

Que me transporta a uma Tarde de Outono,

Chorando o Amor Proibido,

A recordar as lembranças

Que Nem Mesmo o Tempo Apagou.

Um velho sonho,

Que na maior velocidade

Comandando o meu Barquinho de Papel

Leva-me a Cabo Frio, Macau e Japão.

Um velho sonho

Que me levou a ter Devaneios,

Mas que se tornou Um Sonho Real.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 149

DINHEIRO

Dinheiro

Mal que assola

Mal que isola

Mal que atola

Assola o mundo

Isola a fundo

Atola o imundo

Dinheiro

Início da dor

Início do amor

Início do pavor

Dor do plebeu

Amor do ateu

Pavor do liseu

Dinheiro

Sem ele não vivo

Sem ele sou passivo

De todos os males

Dos ricos ativos

Sem ele sou pobre

Com ele sou nobre

No mundo atual

Do bem e do mal

Sofre o rico por ganância

Sofre o pobre por ignorância

E

A humanidade como criança

Sofre o tempo inteiro

Em busca do dinheiro

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 150

ÊXTASE DAS ESTRELAS

Estrela que passa cadente

Alguém diz: ”Deus te salve!”.

Sem saber que de amor está ardente

Salve estrela matutina

Senhora de rara beleza

É também a vespertina

Olhando para o céu implicam

Com a minha imaginação

As estrelas que se multiplicam

Com suas luzes de alto brilho

Embriago-me de prazer

Do Universo sendo filho

Constelação de Escorpião

Alpha, Centauro e Sírius

Tem lugar no meu coração

Talvez fosse um OVNI a Estrela de Belém

No firmamento me inspiro

Procurando escrever bem

Mas é o lindo Cruzeiro do Sul

Que entra em êxtase nas estrelas

A fornicar no imenso céu azul

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 151

CIO DA LUA

Expande-se no céu tão linda

Tão fina, tão mulher

Aparecendo na tarde que já finda

Pelo sol ela é amada

Em seu cio desmedido

Pelas estrelas admirada

Venerada pelos amantes

Musa inspiradora dos poetas

Embriaga-me em instantes

Livre a girar no infinito

Vejo-te linda quando nova

Que em êxtase lanço meu grito

Esparramada no lençol de mar

Vejo-te bela já crescente

Sinto-me louco por te amar

E quando no céu está definhando

Em sua fase minguante

Definho também me preocupando

Mas cheia no céu é a minha alegria

É no teu cio mais impetuoso

Que escrevo a minha poesia

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 152

TARA DO SOL

Tão forte, eternamente másculo

É assim no fim da tarde

Na beleza do crepúsculo

Vem de mansinho na madrugada

E para toda a natureza

É quem toca a alvorada

Imenso disco avermelhado

Levantando-se do oceano

Deixa-me totalmente extasiado

Deleito-me ao observar com alegria

Que é um grande guerreiro

Pondo em fuga a triste bruma fria

É sua tara estar a pino

Para na praia bronzear

Homem, mulher e menino

Logo cedo procura adormecer

Por não ser nenhum notívago

Não ver o triste anoitecer

Mas é no crepúsculo que fito

Que sinto o quanto é belo

E escrevo o que não foi dito

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 153

S.O.S OVNI

S.O.S OVNI

Por favor, me tire daqui

Pois já não aguento mais

Me leve para um mundo de paz

Que seja Vênus ou Plutão

Júpiter, Saturno ou Urano

Pode ser que seja de Netuno um cidadão

Ou quem sabe mesmo um marciano

Eu quero voar

Eu quero amar

Eu quero poder falar

Por favor, OVNI me tire daqui

Me leve para ver a formosura

De uma Lua nua e crua

Eu quero suportar o calor

De um Sol de arrebol

Sabe o que eu quero mesmo ET?

É ver a Terra não explodir jamais

E eu juntinho a você

Curtindo o nosso mundo de paz

S.O.S OVNI, me tire daqui

Eu já não aguento mais

Me leve para um mundo de paz

Eu quero voar

Eu quero amar

Eu quero poder falar

Ah! Eu também vou para Mercúrio

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 154

ACALANTO ATÔMICO

Dorme terráqueo

Que as grandes potências vão mandar

Os poderosos mísseis atômicos

Para a Terra devastar

AH! AH! AH!

Dorme inocente

Que é você quem vai pagar

Pelo cérebro criminoso

Que criou a bomba H

AH! AH! AH!

Dorme criança

Não deseje ver o mundo acabar

Pelas mãos russas e americanas

Com uma guerra nuclear

AH! AH! AH!

Dorme humano

É triste o despertar

É melhor estar dormindo

Quando tudo começar

AH! AH! AH!

Durmam todos

Em seus sonhos de paz

Sonhos de paz

Seus sonhos de paz

Paz, paz, paz.

AH! AH! AH!

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 155

FILHA DO DEUS SOL

És singular

Neta de Zeus.

Filha de Apolo.

O dourado do sol

Está em seus cabelos.

A pureza do Olimpo

Está em seu corpo.

Tens a sabedoria de Minerva.

A bravura de Diana.

A impetuosidade de Marte.

Tudo se assemelha a ti

Como as doces e harmoniosas músicas

Que o deus Pan compunha em sua flauta.

És singular

Neta de Zeus.

Filha de Apolo.

Tens o encanto da Grécia Antiga

Em harmonia

Com a beleza de Vênus.

Retratas a paixão,

O amor e a desilusão.

Tens como anjo da guarda

Eros, um grande arqueiro,

Que a todos que olham para ti,

Ele consegue ferir.

És singular

Neta de Zeus.

Filha de Apolo, o Deus Sol.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 156

MEU PRESENTE

Desejo que estivesses ao meu lado

Para que eu a pudesse presentear

Gostaria de poder te dar

Os anéis de Saturno

O jade e as esmeraldas de Marte

E todo o ouro de Vênus

Gostaria de te dar

Um colar de pérolas

Confeccionado com as lágrimas

Da Vênus de Milo,

O original da Ilíada de Homero,

O manto de Cristo

Ou mesmo a harpa de Nero.

Dar-te-ia também,

A pena com que foi escrita a Bíblia,

A coroa do Rei Davi,

A estrela cadente do Natal,

Dar-te-ia o Olimpo

Até mesmo o Coliseu de Roma

Ou a lança do Deus Baal

Hoje eu te ofertaria

Os Jardins Suspensos da Babilônia,

O Colosso de Rodes,

O Farol de Alexandria,

As Pirâmides do Egito,

As Muralhas da China,

O Templo de Diana,

Os Papiros de Ransés I,

Os livros de magia de Merlin,

Te daria a espada do Rei Artur

Ou todo amor que existe dentro de mim.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 157

PELAS PERNAS DE VÊNUS

Na barriga da perna de Vênus

Eu engravidei

E no peito do pé

Seu leite eu suguei

Pelas pernas de Vênus

Criei novo alento

Andarei nove meses

Nas pernas de Vênus

Ouvindo as cantadas

Sendo acariciado

Em máximo estilo

Pelas mãos delicadas

Do belo Milo do Nilo.

Começarei a viver

Começarei a sonhar

E pelas pernas de Vênus

Viverei a sonhar

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 158

O CANTO DE UM FEIO

Sim, sou feio.

Sim, tenho uma voz pavorosa,

Minha comida é nojenta,

Minha casa é horrorosa.

Tu me chutas, me agrides

Por inocência ou maldade.

Bicho feio, horroroso, tu dizes,

Mas sei que na vida eu tenho utilidade.

Inseto asqueroso, animal profano,

Símbolo da bruxaria.

Eu não ligo e continuo pulando

Feliz em minha feiúra,

Fazendo parte da saparia,

Canto alegre a sinfonia.

Coach, Coach, Coach,

Salve o sapo nosso de cada dia!

Lagos e pantanais

São as minhas habitações,

Grilos, moscas e besouros

São as minhas lautas refeições.

E como parte da natureza

Que trago impressa no couro,

Para os que me compreendem

Não sou assim tão feio,

Até que sou um tesouro.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 159

O GRANDE ARTISTA

Quem pintou tão belo quadro

Que fascina os olhos meus?

Foi Deus, criança, foi Deus.

De azul pintou o céu,

De verde e azul pintou os mares,

De branco pintou as nuvens,

E com o verde pintou as árvores.

Quem foi este escultor

Que esculpiu tão bela obra,

Com tanta dedicação e amor?

Foi Deus, criança, O Supremo Criador.

Em seis dias fez o mundo,

E no sétimo descansou,

Fez a luz em um segundo

E a vida semeou.

E estas lindas canções,

Quem foi o compositor?

Elas alegram os corações

No mais intenso labor.

Canta o lindo rouxinol,

Canta o pequeno pardal,

Juntos a saudar o sol

Com bela canção real.

Tendo na natureza a corista

Que posou para o Grande Artista.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 160

Q.I ZERO

A inteligência é minha musa

O Q.I me acusa

E não aceita a recusa

De maneira tão escusa

Escrever é tudo que quero

Falar de tudo que venero

Daquilo que tudo espero

Mas o meu Q.I é zero

Escrever sobre o amor

Falar do meu temor

Explicar a minha dor

Com tudo que é luz e cor

Escrever frases sobre a vida

De forma bem colorida

E de maneira atrevida

Cicatrizar a ferida

Quero falar tudo que quero

Com todo aquele esmero

Nas frases que mesmo gero

Mas o meu Q.I é zero

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 161

OH! MESTRA

Minha professora, minha mestra

Responsável por minha educação

És o alicerce do meu futuro

No progresso da nação

Hoje como professora primária

Por teus alunos estimada

No amanhã ao me deixares

Recordarei com ternura

Da minha mestra amada

Teu sorriso de fada

Tua paciência ao me ensinar

Tuas palavras de sabedoria

Para sempre em minha mente

Sei que irão ficar

Se eu fosse um jardineiro

Rosas vermelhas eu te daria

Mas como sou teu aluno

Transmito-lhe apenas

O que contigo aprendi

Amor, dedicação e sabedoria.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 162

O PROFESSOR

Professor

Ensinaste-me com tantos erros

Que até hoje não encontrei o rumo certo

Olha,

Ensinaste-me que Washington

É a capital dos Estados Unidos,

Mas está errado...

Washington é o nome do meu vizinho.

Ensinaste-me que o Cruzeiro

Era a moeda oficial do Brasil.

Mas está errado...

Cruzeiro é um time de futebol mineiro

E o dólar é a moeda que tem valor no país.

Ensinaste-me também

Que no Brasil não existe preconceito racial.

Mas até hoje,

Não consegui ver um só negro na história

Sendo almirante, brigadeiro ou general.

Até mesmo nas novelas de televisão

Os negros somente aparecem como escravos.

E na Santa Igreja, tem negro cardeal?

Olha professor,

Ensinaste-me

Que o Brasil é um país independente.

Mas até hoje

Não consigo entender essa independência.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 163

Ensinaste-me também

Que aqui é o país do futebol,

Que o nosso idioma é o português

E que Brasil se escreve com “S”.

Mas está tudo errado...

Somente tenho visto craques

Jogando no futebol europeu.

No país quase tudo é escrito em inglês.

Shopping Center, delivery, surf, new wave, fashion

Hambúrguer, rock, soul, jeans,

E tantas coisas mais,

Que me deixam confuso,

Ao ver nossos compatriotas

Serem exportados para o exterior

Com rótulos nos ombros:

MADE IN BRAZIL

E pior,

É que me ensinastes

Que o amor era um substantivo abstrato.

Ledo engano.

O amor é concreto, é real.

Provoca saudades,

Machuca e faz doer.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 164

PARA ENTENDER

Entenda os males da vida

O que existe de errado

Para cicatrizar a ferida

Causada pelo pecado

Nunca cometa adultério

Em nome de um falso amor

Esse é o caminho do cemitério

Lugar digno do traidor

Não mentir jamais

Seja sempre verdadeiro

Assim viverás em paz

Ao lado de um companheiro

Nunca pensar em roubar

Algo do teu semelhante

Pois a culpa irá ficar

Estampada em teu semblante

Matar? Nem em pensamento

Não cometa atrocidade

Pois o remorso é um tormento

Que te afligirá bem mais tarde

Procurar sempre lembrar disto

Se queres bem viver

Siga as palavras de Cristo

Para uma vida plena merecer

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 165

CIVILIZAÇÃO

Que civilização é esta

Que fala de paz e constrói a guerra?

Será que é festa

Falar de amor e destruir a Terra?

Ninguém tem tempo para amar

Nem ao menos a mãe natureza

Vivem a poluir o ar, o mar

Destruindo toda a sua nobreza

Nem promessa com Santo Antônio

Para arrastar a cara no chão

Fará voltar à camada de ozônio

Que se destruiu com a poluição

Que civilização é esta

Que não dá flores ao seu semelhante?

Que civilização é esta

Que constrói a bomba nuclear,

Para apenas em um instante

Ver todo o nosso mundo acabar.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 166

TZÃO

Cárcere domiciliar onde vivo

Para não chorar

Dialogo com os meus livros.

E com alívio

Ponho-me a cantar:

“Soturno bate o coturno

Noturno do homem

Do turno diurno, que urro!”

Piano romântico a tocar

Eu solitário a ouvir

E de ti a me lembrar

Para distante sorrir

Escapa-me a vida entre os dedos

Penso em ti

Procuro-te em minha volta

De te perder sinto medo

Apago a luz e acendo o fogo da paixão

Teso está aceso o desejo

Braços, abraços, pernas, coxas,

Sexo, seios, cabeça, coração.

Tudo está na minha mente

Ame este que não mente

E por ti somente sente

Todo o seu corpo dormente

E de tezão está demente

Vamos seja mais clemente

Atenda o apelo deste doente

E com um ato bem valente

Dê apenas um passo em frente

E fale tão somente:

Sim, te amarei eternamente.

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 167

TRAIÇÃO INESPERADA

Traíste-me, oh! Infiel.

Eu que sempre confiei em você

Cuidado em ti eu tinha com carinho

Nunca te deixei jogada ao léu

Mas decepção me fez sofrer

E eu envergonhado estou sozinho

Não merecestes confiança

Tanto tempo estavas comigo

E eu te amava tanto

Amei-te nova como criança

Sendo sempre o teu amigo

De ti não me apartava

E você, oh! Infiel?

Traíste-me, oh! Miserável.

Aonde ia estava eu contigo

Era forte, muito bonita,

Famosa, por todos conhecida

Eu confiei em ti e te usei

Usei você para todos os fins

Para festas, passeios e badalação

Para encontros amorosos

Era você a predileta do meu coração

E hoje neste trágico dia

Quando de tudo eu sorria

Cantava, pulava e brincava

Aconteceu o que eu não esperava

Rasgou bem na costura do fundo

E envergonhado

Fiquei com o cú no mundo

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 168

Calça jeans, oh! Miserável.

Corri louco pela estrada

Tristonho e com vergonha

Da tua traição inesperada

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 169

AMOR PROIBIDO

Tua ingenuidade te faz bela

Tuas lágrimas são pérolas

Que transformam o teu rosto

Em uma arca de tesouro

Teu sorriso te transforma em fada

Teu olhar triste te faz tão meiga

És linda como a primavera

És linda como a inocência das crianças

És linda como o crepúsculo

Em uma tarde de outono

És linda como as heroínas dos contos de fadas

És bela por teu riso e choro

És bela por tua ingenuidade

Eu te amo, te amo, te amo.

Somente não sei expressar

Todo o amor que sinto por ti

Pois nenhum lápis poderá escrevê-lo

Nenhum papel poderá dar conta do recado

Nenhuma trena poderá medi-lo

Nenhuma balança poderá pesá-lo

O meu amor por ti é imenso

Tão imenso quanto à união dos oceanos

Mas prefiro amá-la em silêncio

Pois tu és um amor proibido

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 170

QUANDO SETEMBRO VIER

Quando setembro vier

Eu quero te encontrar sorrindo

Sorrindo como as flores

Que na primavera estão se abrindo

Quando setembro vier

Eu quero sentir da tua pele a maciez

Como o veludo da rosas

Que a primavera fez

Quando setembro vier

Eu quero te ouvir cantar

Cantar como os pássaros

Para o meu coração alegrar

Quando setembro vier

Eu quero te ver linda

Tão linda como a lua

Desta noite que já finda

Quando setembro vier

Dos teus lábios quero sentir o gosto

E em teus braços e abraços

Esquecer todos os desgostos

Os nervosismos e angústias

Do triste mês de agosto

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 171

PÁSSARO IMIGRANTE

O tempo não importa

À distância menos ainda

Pois um dia recordarás que conhecestes

Em contato direto com a natureza

Um pássaro imigrante

E tu, oh! Menina?

Ouvistes o canto do pássaro desconhecido

Canto de sabedoria

Canto de quem imigrou além

Muito além-mar

Com toda dedicação e compreensão

Reinante em seu coração

E o pássaro cantou

Próximo a uma rosa desconhecida

Como se a conhecesse há anos

Um dia o pássaro voou

Voou e voltou a imigrar

E para outras rosas cantar

E tu, oh! Menina?

Na plenitude de tua adolescência

Deverás compreender

Que nem mesmo o canto é eterno

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 172

O pássaro imigrante partiu

Em sua trilha de liberdade

Em busca de outras terras

Em busca de aventuras

Talvez até fatais

Mas levando no peito a saudade

De EDILSA, a rosa desconhecida

Dos verdes canaviais

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 174

GONZAGA FILHO

Luiz Gonzaga de Oliveira Filho, nascido no município

de Guamaré - RN em 21 de Outubro de 1957. Vem de família

simples, de origem pobre, mas bastante conhecida na região.

Seus avós maternos, José Rufino de Miranda e Ana Alves de

Miranda eram de Mangue Seco, distrito de Guamaré...

Filho de Luiz Gonzaga de Oliveira (Macau-RN) e

Maria Alves de Oliveira (Guamaré - RN), perdeu o pai em um

acidente no navio "Comandante Martini", onde trabalhava

como estivador em 01 de Outubro de 1959. Logo cedo, aos

nove anos de idade mudou-se para Natal onde começou a

trabalhar para ajudar no sustento de sua mãe e das duas irmãs.

Desde pequeno exerceu várias profissões: Engraxate, vendedor

de balas, vendedor de picolé, auxiliava os pescadores no Canto

do Mangue, trabalhou como jornaleiro, Office boy e mesmo

com muitas dificuldades, continuava a estudar, até que chegasse

a maioridade e fosse servir as Forças Armadas.

Logo depois surgiu a oportunidade de ir para a Marinha

Mercante, entrou na Fronape - Petrobras em 1979, onde teve

oportunidade de conhecer vários países e toda costa brasileira.

Depois vieram outras tantas companhias marítimas, onde

trabalhava na área das plataformas de petróleo (Off-Shore) em

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O SOL QUE CAIU

Gonzaga Filho Página 175

companhias estrangeiras como a Artur Levy, OSA, Smith

Lloyd, Pan Marine, Maersk. Ao afastar-se do serviço marítimo

em 1994, por motivo de saúde, foi que descobriu a arte por

mero acaso... Estando em estado depressivo, comprou telas,

pincéis e tintas e passou a rabiscar uma visão de um desenho

abstrato e daí surgiu a sua primeira tela “O Clone". Houve

elogios e desestímulos, críticas negativas e construtivas, mas

mesmo assim ele passava o tempo pintando e escrevendo

poesias...

Toda essa criação era encarada por ele como um

simples hobbie, nunca teve a pretensão de ser escritor ou artista

plástico. Ele dizia que ninguém o podia criticar, pois ele pintava

aquilo que não existia e como era ele quem criava, era

propriedade sua e que iria continuar pintando como já vinha

fazendo, com as cores dos sentimentos na tela de sua própria

alma.

Hoje afastado de suas funções marítimas, voltou a

morar em sua cidade natal Guamaré, onde desfruta de muita

paz e tranquilidade em sua casa na margem direita do Rio

Miassaba, tendo a visão deslumbrante dos manguezais. De onde

diz que nunca mais sairá. O que demonstra o amor que sente

pelas suas origens.

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Obras do Autor:

O Sol Que Caiu (Poesias) – 1999

Os Contos Que Canto (Poesias) – 2001

Luzes e Trevas (Poesias) – 2002

O Mar Me Contou (Contos) – 2004

Fragmentos (Poesias) – 2006

Nau Frágil da Vida (Romance) – 2008

Eu, Sobre a Paisagem (Poesias) – 2009

Orgias & Delírios (Contos) – 2010

Guamaré, Retalhos Poéticos (Poesias) – 2011

E-mail:

[email protected]

[email protected]

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