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CAROLINE ANDRÉIA GARRIDO MAROLA O TEATRO NA EDUCAÇÃO FORMAL: PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS X TEÓRICOS DO ENSINO DE TEATRO Trabalho de Conclusão de Curso apresentada como exigência para obtenção do Título de Especialista em Educação e Psicopedagogia, ao Programa de Pós-Graduação na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Orientador: Prof(a). Dr(a). Maria Silvia P. L. da Rocha PUC-CAMPINAS 2007

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CAROLINE ANDRÉIA GARRIDO MAROLA

O TEATRO NA EDUCAÇÃO FORMAL:

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS X

TEÓRICOS DO ENSINO DE TEATRO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentada como exigência para obtenção do Título de Especialista em Educação e Psicopedagogia, ao Programa de Pós-Graduação na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, Pontifícia Universidade Católica de Campinas.

Orientador: Prof(a). Dr(a). Maria Silvia P. L. da Rocha

PUC-CAMPINAS

2007

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À Maria do Carmo Corrêa Stein Dias que me

ensinou, na prática, o valor do ensino do teatro e “a dor e o

prazer” de contribuir para a formação de uma sociedade mais

humana.

A minha mãe, Geni, exemplo de amor e força.

Ao meu pai, Sérgio, exemplo de dedicação e persistência.

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AGRADECIMENTOS

O processo, de pensamento e construção deste trabalho, foi penoso

pelo conflito entre o pouco tempo para estudo e aprofundamento e o muito

interesse e respeito ao tema escolhido.

Por terem compartilhado desse sentimento e da troca de idéias,

agradeço a minha turma da Especialização em Educação e Psicopedagogia, em

especial à Maria do Carmo J. Lencioni que, muitas vezes, me acalmou com a

certeza de que fazia um bom trabalho (mesmo sem tê-lo lido) e a João Batista que,

com bom humor, se tornou meu parceiro nas dificuldades com o calendário.

A minha família pela ajuda e paciência, pela contribuição na

administração do meu tempo e pela preocupação amorosa com minha saúde física

e mental – “meus parafusos continuam no lugar”! Ao meu marido Yuri pelos

desafios a minha concentração e a minha gramática.

Aos meus professores pela sabedoria, experiência, desprendimento e

prazer em ensinar, principalmente ao Nino e à Maria Silvia que me instigaram com

a abertura de novos horizontes de conhecimento.

Agradeço, sobretudo, aqueles profissionais da educação que, mesmo

com as dificuldades e estímulos negativos que encontram ao longo da estrada do

ensino, continuam trabalhando com responsabilidade, respeito e dignidade.

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RESUMO

Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização em Educação e

Psicopedagogia, trata-se de pesquisa documental que busca abrir a discussão em

torno do ensino do teatro na educação formal da maneira como é proposto pelos

Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e para Ensino Médio.

As propostas encontradas nesses documentos são debatidas com base em textos

fundamentais de grandes teóricos do ensino do teatro. Os temas principais para

discussão são: o conteúdo a ser ensinado e de que maneira e com que

profundidade fazê-lo, como são tratados os aspectos sócio-culturais e, se há uma

visão interdisciplinar no seu ensino.

Trazer ao conhecimento do profissional da educação a importância do

contato com tais documentos do Ministério da Educação e do desenvolvimento de

uma visão crítica e embasada quando da leitura dos mesmos. Aberta a discussão

pode-se reavaliar as práticas de ensino nas escolas em torno da disciplina Arte e,

principalmente, da revalidação dos trabalhos de teatro – como linguagem de ampla

comunicabilidade, rica em especificidades e que faz parte da História e do

desenvolvimento humano.

Termos de indexação: arte-educação, teatro, Parâmetros Curriculares Nacionais.

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ABSTRACT

Work of Conclusion to the Development Course in Education and Psychopedagogy

is about documentary research that it search to open the quarrel around the teach

of the theatre in the formal education in the way as it is considered by the National

Curricular Parameters for Fundamental Education and High School. The proposals

found in these documents are debated on the basis of basic texts of great

theoreticians of the education of the theatre. The main subjects for quarrel are: to

be taught content and how and with that depth to make it, as is treated the partner-

cultural aspects and, if has an interdisciplinary vision in its education.

To bring to the knowledge of the professional of the education the importance of the

contact with such documents of the Ministry of the Education and the development

of a critical and based vision when of the reading of the same ones. Opened the

quarrel it can be reevaluated the practical ones of education in the schools around

disciplines Art and, mainly, of the revalidation of the theatre works – as language of

ample communicability, rich in specificities and that it is part of History and the

human development.

Index terms: art-education, theatre, National Curricular Parameters.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

2. BASE TEÓRICA

2.1. Teoria sócio-cultural do desenvolvimento humano

2.2. Os autores

2.3. Histórico do Teatro na escola

2.4. Os conteúdos do ensino de Teatro

2.5. Aspectos sociais e culturais de seu ensino

2.6. A Interdisciplinaridade

2.7. Comentário

3. METODOLOGIA

4. RESULTADOS

4.1. PCNs Arte – Ensino Fundamental

4.2. PCNs Arte – Ensino Médio

4.3. Análise Comparativa dos PCNs

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

7. BIBLIOGRAFIA DE APOIO

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1. INTRODUÇÃO

Durante minha experiência como professora de Arte da Rede Estadual

de Ensino, notei uma grande dificuldade entre os profissionais da educação para

definir, orientar e compreender o ensino da disciplina em questão. O teatro faz

parte dos conteúdos de Arte e sempre foi tido como atividade de livre criação,

instrumento de ilustração de outras disciplinas, ou mesmo parte fundamental das

festas de fim de ano.

O enfoque dessa pesquisa foi esclarecer, partindo de leitura atenta dos

Parâmetros Curriculares Nacionais, o verdadeiro valor atribuído ao ensino do teatro

dentro da disciplina Arte e dentro da escola, como se propõe sua relação com as

demais disciplinas e a forma e conteúdo a serem trabalhados, segundo propostas

do MEC. Partindo da história do ensino da Arte nas escolas brasileiras e através de

autores citados nos próprios PCNs, pude verificar os equívocos e avanços das

propostas dirigidas aos professores.

Por meio dessa discussão, a intenção é a de propiciar informação e

instigar o senso crítico dos professores para que esses possam buscar novos

parâmetros no processo de ensino-aprendizagem na área. A idéia é levantar um

debate em relação às propostas do Governo e às bases do pensamento do teatro

na educação. Sanando algumas dúvidas e trazendo novos questionamentos,

esperamos contribuir para impulsionar a ação do professor.

Os textos tradicionais da teoria do teatro nos propõem uma visão sobre

a importância do teatro na educação e na formação do indivíduo ora com base em

Piaget, ora com base em Vygotsky. Tomando por base as idéias gerais a teoria

sócio-cultural de desenvolvimento humano, pude explorar as principais visões e

interpretações de seu ensino.

Porém, a grande preocupação aqui foi valorizar a visão dos teóricos e

educadores da área do teatro que puderam, em seu trajeto de pesquisa

desenvolver um forte laço com a prática, já que essa se torna imprescindível para a

compreensão ampla dessa área de conhecimento.

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Mesmo trabalhando como professora de Arte há cerca de cinco anos,

nunca tive oportunidade de discutir com meus colegas de área os Parâmetros

Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e para o Ensino Médio - textos

base para um adequado planejamento escolar. Essa prática de não discussão de

documentos fundamentais na estruturação do sistema de ensino é semelhante em

todas as escolas, talvez pelo texto apresentar uma visão distanciada da realidade

escolar, talvez pela pouca acessibilidade ao material, talvez por falta de interesse

das principais partes envolvidas no bom andamento do ensino – o professor, os

gestores (diretores e coordenadores) e o próprio governo.

O desafio de trazer à tona um texto praticamente morto fez com que

minha pesquisa se voltasse para o público interessado no ensino de Arte, e em

especial do teatro. A análise dos PCNs foi feita com base em três critérios

fundamentais:

• conteúdos a serem trabalhados no ensino de Teatro,

destacando a profundidade e a complexidade dos mesmos;

• aspectos sociais e culturais vinculados ao seu ensino;

• interdisciplinaridade, como e a que disciplinas o teatro

pode e/ou deve ser trabalhado.

Tais pontos são fundamentais para prática do professor: o que, como e

por que trabalhar o teatro dentro da escola são questões a serem refletidas a partir

da leitura desse texto. Espero que a discussão chegue às Reuniões Pedagógicas

nas unidades de ensino, para que o ensino de teatro possa ter o alcance que ao

longo da história da humanidade esta arte mostrou ter.

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2. BASE TEÓRICA

O trabalho foi embasado nas teorias dos grandes escritores sobre

teatro e educação: Viola Spolin, Richard Courtney e Ingrid Koudela. Traçarei de

início alguns dados fundamentais da biografia dos autores escolhidos e aí será

possível encontrar os motivos que me levaram a escolhê-los. De antemão, é bom

que se saiba que estes são autores explorados pelos próprios teóricos da

educação no Estado de São Paulo, constando da Bibliografia dos Parâmetros

Curriculares Nacionais aqui trabalhados.

Para que possamos compreender e discutir as idéias principais desses

teóricos é importante que conheçamos um pouco as bases de pensamento sobre o

desenvolvimento humano que mais aparecem nesses textos. Para tanto será

apresentada, primeiramente, um breve resumo sobre a teoria sócio-cultural do

desenvolvimento humano que tem como seu principal teórico Vygotsky. Em cada

tópico apresentado serão colocadas as principais idéias desses pensadores.

2.1 Teoria sócio-cultural do desenvolvimento humano

Vygotsky teve uma ampla visão da relação entre o homem e a

sociedade, partindo da idéia de que as questões sociais são fundamentais na

formação intelectual e da personalidade humana.

Ao nascer a criança começa a ter indícios de que é o outro que

atenderá em suas necessidades básicas. Na observação dos que estão a sua volta

capta as primeiras regras da comunicação – existe uma organização: enquanto um

fala o outro espera e só após o término da fala do primeiro, o segundo se

manifesta. Através de um conjunto de sinais e de esboços de fala, vai percebendo

uma coerência entre sinais dados e respostas recebidas.

Nesse processo se inicia o desenvolvimento da linguagem e da

aquisição da cultura – entende-se por cultura todo o repertório de vivências e

atividades específicas de cada comunidade regida por regras implícitas e próprias

para o bem social.

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As pessoas se desenvolvem como participantes das comunidades

culturais. Seu desenvolvimento só pode ser compreendido à luz das

práticas e das circunstâncias culturais de suas comunidades, as quais

também mudam (ROGOFF, 2005, p.15).

O desenvolvimento da linguagem é ponto crucial para o

desenvolvimento psicológico saudável segundo a teoria histórico-cultural. Luria,

outro importante teórico deste pensamento, esclarece em muitos dos seus estudos

o valor da palavra no desenvolvimento humano: “a palavra codifica nossas

experiências” (LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000). A transmissão e o

aprofundamento da história social e cultural de um povo e de toda a humanidade

só são possíveis através da palavra, sendo ela o grande diferencial entre humanos

e outros animais. L.S. Vygotsky ligou a questão do desenvolvimento da palavra com a do

desenvolvimento da consciência. Para ele, a palavra constitui-se em um

aparelho que reflete o mundo externo em seus enlaces e relações

(LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000).

Acredita-se que a palavra surge, na história da humanidade, vinculada

às práticas laborais. Com o intuito de organizar o trabalho e suas etapas dentro de

um grupo, o homem foi criando uma linguagem própria, nomeando os objetos e

ações envolvidas em cada processo. Durante muitas gerações o caráter simpráxico

da palavra era suficiente para o desenvolvimento da comunicação social, até

porque os grupos eram extremamente pequenos, fechados e ligados a um tipo

específico de atividade prática – todas aquelas envolvidas na sobrevivência.

As comunidades foram se ampliando e diversificaram-se as atividades:

as atividades e funções se tornaram tanto mais complexas quanto pôde o homem

se comunicar e organizar em sociedade. Aí, já era possível encontrar a crença e os

rituais que utilizavam da linguagem verbal e não-verbal – danças, gestos,

representações – para a comunicação com os “deuses”.

Portanto, a importância da palavra está na origem das atividades

coletivas e das funções sociais, sem o conhecimento da linguagem e a

comunicação entre os pares a organização social e o desenvolvimento da “idéia”

não existiriam. O desenvolvimento psicológico do homem se tornou mais complexo

à medida que a linguagem passou de um caráter simpráxico para um caráter

sinsemântico – aquele no qual a palavra carrega, não apenas a imagem do objeto,

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mas todo o contexto em que o objeto está inserido dentro de uma multiplicidade de

significados e outros contextos. Com a aparição da linguagem como sistema de códigos o homem

adquire algo assim como uma nova dimensão da consciência, nele se

formam imagens subjetivas do mundo objetivo que são dirigíveis. Isto

consiste na principal conquista que o homem obtém com a linguagem

(LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000).

Então, o homem tem na palavra, na linguagem, o carro chefe de seu

desenvolvimento. Através da linguagem o aprendizado de novas habilidades se

torna possível; a linguagem corporal, que no início do desenvolvimento da criança

é fundamental, acompanha o homem em toda sua história pessoal. No princípio o

ato de apontar o objeto e pronunciar um som faz com que a criança promova uma

ligação direta, ela se apossa do gesto, balbuciando, para se comunicar com o

outro, e só após a maturação de seu aparelho vocal é capaz de dominar e utilizar

apenas a palavra.

Para que o desenvolvimento da criança se concretize é imprescindível

a interferência de um parceiro mais experiente. De acordo com a teoria histórico-

cultural o ser humano é um potencial aprendiz e o será ao longo de sua história

pessoal podendo ou não desenvolver habilidades e conhecimentos de acordo com

seu interesse real e o auxílio de outro que já tenha desenvolvido tal conhecimento.

Vygotsky já definia através dessa idéia o papel fundamental do

aprendizado, tanto formal como informal, para o desenvolvimento psicológico

humano: O aprendizado é mais do que a aquisição de capacidade para pensar; é a

aquisição de muitas capacidades especializadas para pensar sobre

várias coisas (VYGOTSKY, 1994, p.108).

Todavia é no aprendizado formal, ou escolar, que se focaliza a

questão, pois se percebe a importância do ser parceiro ao desenvolvimento do

sujeito estar consciente de seu papel e estar preparado para refletir, reavaliar e

redefinir sua função no processo. O pensamento anterior espelha o que diz Smolka

(1989): A atividade mental é assim mediada, e essa mediação impregna cada

movimento, cada ato humano, constituindo a dimensão sígnica e

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significativa da experiência humana (SMOLKA, 1989 apud ROCHA, 2000,

p.38).

Fica claro que qualquer vivência social pode trazer à criança uma

possibilidade de desenvolvimento real à medida que convive com adultos, crianças

mais velhas ou mais experientes e estão em constante desafio frente ao mundo de

descobertas motoras e intelectuais. Porém, vem se discutir o papel de um

mediador especializado: o professor ou educador. Somando à sistematização da

mediação do educador está a forma explícita de suas interferências, deixando claro

à criança a prontidão e preparo desse mediador.

Cito acima o preparo e prontidão pois faz parte indissociável do

aprendizado da criança o envolvimento desta com o que é proposto, ou seja, para

que a criança de fato aprenda e se desenvolva é necessário que haja um interesse

real e esta se envolva com o processo de aprendizagem. Nesse contexto é

imprescindível que o educador esteja pronto e preparado para uma suposta

investigação da própria criança, ou que pelo seu preparo possa identificar os reais

interesses de um determinado grupo de crianças.

Na citação a seguir pode-se tomar como exemplo o brinquedo (o

brincar) tido como ponto de partida para a análise e esclarecimento da importância

do preparo e prontidão do educador: É essencial saber como controlar o brinquedo de uma criança, e, para

fazer isto, é necessário saber como submetê-lo às leis de

desenvolvimento do próprio brinquedo (LEONTIEV, 1989 apud ROCHA,

2000, p.47).

2.2 Os autores

O principal motivo que me fez optar por esses autores citados nos

PCNs é a profunda ligação que fazem, durante sua vida e obra, entre teoria e

prática. Reconhecidos como importantes teóricos da área contribuíram, em todo o

mundo, para uma nova visão do teatro na educação e para o resgate do mesmo

como manifestação simbólica complexa, capaz de favorecer o desenvolvimento

humano.

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Viola Spolin (1906-1994) foi uma mulher envolvida de todas as

maneiras com o teatro. Professora de Teatro, diretora e atriz reconhecida

internacionalmente por seu livro “Jogos Teatrais”, em que propõe um sistema de

treinamento para o ator. Seu trabalho inicial se assemelha ao trabalho de

assistente social, fazendo parte do grupo de recreação que atendia as famílias

migrantes dos Estados Unidos durante o Programa de Desenvolvimento (WPA

Project implantado a partir de 1935) com a idéia de promover o bem estar social. A

diversidade cultural encontrada fez com que Spolin percebesse a importância de

um sistema que ultrapassasse as barreiras étnico-culturais.

Começou, então, a desenvolver novos jogos que focassem no

indivíduo, criativamente adaptando e destacando o conceito de jogo na capacidade

individual de auto-expressão. Em 1975, lançou “Jogos Teatrais” que de maneira

simples transmitia complicadas convenções e técnicas teatrais em forma de jogos,

passando a ser introduzido nas salas de aula. O conhecimento prévio e a idade se

tornaram irrelevantes, pois a atuação (jogar) acontecia naturalmente.

Experienciar é penetrar no ambiente, é envolver-se total e organicamente

com ele. Isto significa envolvimento em todos os níveis: intelectual, físico

e intuitivo. Dos três, o intuitivo, que é o mais vital para a situação de

aprendizagem, é negligenciado (SPOLIN, 2003, p. 03).

Ingrid Dormien Koudela (1948) é Professora Doutora em Teatro pela/na

Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP),

coordenadora de um importante grupo de discussão em Teatro-Educação - Grupo de Trabalho em Pedagogia do Teatro e Teatro na Educação da ABRACE (Associação Brasileira de Artes Cênicas). Vem expandindo seu trabalho de

ensino e pesquisa na área através de projetos ligados à Secretaria Municipal de

Educação de São Paulo contribuindo na formação continuada de professores de

Arte. Foi consultora do MEC na elaboração dos PCN - Parâmetros Curricular

Nacionais na área de Teatro para o Ensino Fundamental e membro da CEEARTES

- Comissão de Especialistas de Arte, órgão do MEC/SESU Secretaria de Ensino

Superior, onde coordenou a elaboração do documento Diretrizes Nacionais para o

Ensino do Teatro (1996-1997).

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A imaginação dramática, sendo parte fundamental no processo de

desenvolvimento da inteligência, deve ser cultivada por todos os métodos

modernos de educação. Embora a imitação e o jogo estejam diretamente

relacionados com o processo de pensamento e com o desenvolvimento

da cognição, a imaginação dramática é um fator-chave – é ela que

interioriza os objetos e lhes confere significado (KOUDELA, 2002, p.28).

Richard Courtney (1927) é professor de teatro, acadêmico em teatro e

especialista internacional em drama infantil. Lecionou Teatro por muitos anos em

escolas da Inglaterra. Como professor universitário trabalhou com Peter McLaren,

um dos líderes fundadores da Pedagogia Crítica (braço norte-americano da

Pedagogia de Paulo Freire). Sendo um respeitado teórico do Teatro publicou uma

centena de artigos, livros e reportagens sobre o tema do teatro na educação, arte-

educação e crítica e história do Teatro.

Se o jogo dramático é tão importante fator na vida das crianças como

concluímos, a Educação Dramática exige que centremos nele o processo

educativo. Devemos examinar todo o sistema educacional sob essa luz –

os currículos, os programas, os métodos, e a filosofia sobre a qual estão

fundamentados. Em todos os casos, devemos começar da atuação: com

crianças pequenas, o espontâneo faz-de-conta improvisado e inerente a

todas elas; com os mais velhos e adultos, a imaginação que lhes permite

pensar dramaticamente – pois tanto o pensamento criativo quanto o

aprendizado de memória são baseados na identificação interiorizada

(COURTNEY, 2003, p.287).

Percebendo a grandeza dos trabalhos já realizados por esses teóricos

podemos imaginar o grande desenvolvimento que o ensino de Teatro teve nos

últimos 50 anos. Com fim de elucidar tal desenvolvimento trago um breve histórico

do ensino de teatro nas escolas públicas brasileiras e como ele aparece

atualmente.

Perceberemos que o pensamento desses autores se alicerça na prática

artística como forma genuína de aprendizado, envolvendo os alunos na busca por

conhecimento. A profundidade dessa idéia poderemos acompanhar no

desenvolvimento deste capítulo. É importante conhecer as transformações

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ocorridas na idéia do ensino de Arte e do teatro ao longo da história educacional

brasileira a partir do séc. XX.

Vygotsky (1896 – 1936) nasceu e viveu na Rússia onde desenvolveu

sua teoria de desenvolvimento humano que está profundamente ligada com o

desenvolvimento da linguagem e que defende a idéia de que o homem é um ser

social. Por sua formação eclética e sua vasta rede de interesses intelectuais pode-

se entender o caminho que o levou ao desenvolvimento dessa teoria: formou-se

em literatura e direito na Universidade de Moscou e mais tarde estudou medicina.

Em seus estudos associou à psicologia experimental os conhecimentos

em neurologia e fisiologia, os primeiros trabalhos tratam da psicologia da arte e nos

sugere os mecanismos pelos quais a cultura se torna parte da natureza do homem.

Seu principal feito foi o de conseguir explicar a transformação dos processos

psicológicos elementares em processos complexos dentro da história.

2.3 Histórico do Teatro na escola

O ensino de teatro na escola foi transformado a partir do Movimento

Escola Nova que se iniciou em 1920, já que não se têm registro do teatro fazer

parte do currículo do ensino formal antes dessa data, e ganhou força em 1932 pela

divulgação de seu Manifesto. O grupo defendia a idéia da Educação como bem

social e que deveria ser pensada em relação ao seu processo e não apenas aos

resultados a serem obtidos.

Os conteúdos foram então repensados e atividades físicas, manuais e

lúdicas ganharam espaço nos currículos. A idéia do professor como guia e da

criança como grande desbravador do próprio conhecimento fizeram das atividades

lúdicas e de criação um momento para se libertar a criatividade. Ao incorporar esse

conceito do teatro como momento de livre criação, de manifestação espontânea da

criança passou-se aos valores e conhecimentos próprios do teatro. Em 1954, Peter

Slade publicou o livro “O Jogo Dramático Infantil” que posiciona o teatro na escola

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como momento de catarse emocional do qual a criança necessita; a partir disso, os

valores emocionais do teatro ficam em destaque.

No ano de 1961, o ensino das artes foi introduzido oficialmente pela lei

4.024/61 que instituía a disciplina arte dramática que buscava o ensino dos

fundamentos básicos do teatro. Porém a partir do Golpe Militar de 1964 o teatro

passou a ser visto como algo a ser evitado e as escolas interromperam o seu

ensino. Durante esse período a disciplina recebeu o nome de educação artística,

devendo conter em seu conteúdo todas as linguagens da arte a serem ensinadas

de maneira integrada em apenas duas horas/aula semanais. Em geral, as

atividades desenvolvidas nesta disciplina enfatizavam muito mais a aprendizagem

de produção de objetos decorativos do que a imaginação e o trabalho com as

emoções, possível em práticas teatrais.

A lei 5.692/71 publicada em 1971 pegou a todos de surpresa e exigia

que um único professor licenciado em educação artística – curso que só passou a

existir, em nível superior, três anos depois – ministrasse as aulas. O déficit de

professores formados na área fez com que as escolas optassem por adaptar seus

currículos oferecendo ora desenho geométrico (conteúdo de matemática), ora

aulas com o professor de educação física. Essa prática ainda pode ser observada

em muitas escolas brasileiras.

Com fim de repensar o espaço e a forma do ensino de arte nas escolas

foi fundada em 1980 a Federação de Arte-Educadores do Brasil (Faeb). A

Federação reunia pesquisadores em arte e educação, professores das diversas

linguagens artísticas e animadores culturais e se tornou importante instrumento de

reivindicação da categoria. Tudo levava a crer que em 1988, com a publicação da

nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) o ensino de arte voltaria a esclarecer a

participação do ensino das diversas linguagens da Arte na escola brasileira. Porém

um episódio burocrático pôs praticamente abaixo todas as reivindicações da Faeb:

o texto aprovado da Lei nº 9.394/96 (a nova LDB) anula vários artigos do texto

original e deixa em seus artigos referentes apenas a palavra arte sem especificar

se o ensino é de uma ou mais artes e quais.

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Esse grande golpe deixou a disciplinas de Arte ainda à mercê de

leituras equivocadas e possíveis adaptações na sua prática. Há uma tentativa de

reparação que pode ser observada a partir de 1997 quando se publicou os

Parâmetros Curriculares Nacionais Arte para Ensino Fundamental e em 2000, os

PCNs Arte para o Ensino Médio. Tais publicações são essenciais para se repensar

e discutir o ensino de Arte, porém não têm ainda o respeito que a Lei impõe.

2.4 Os conteúdos do ensino de Teatro

Os conteúdos de Teatro e a maneira de transmiti-los diferem em certos

detalhes de um autor a outro. Porém todos concordam que os elementos básicos

do teatro devem ser trabalhados com os alunos desde a idade escolar inicial e que

a prática deve ser o principal instrumento para o aprendizado.

A autora Viola Spolin enfatiza a complexidade do ensino do teatro

dentro da sua prática, como algo que necessita de grande entrega e envolvimento

dos participantes da ação. Os elementos da técnica teatral e das convenções que

fazem parte desse universo são absorvidos organicamente ao longo do processo

do jogo, tornando o aprendizado prazeroso e rico. É através do Jogo Teatral que se

aprende. Um elemento essencial aqui é o FOCO que ao invés de estreitar a visão

dos participantes liberta-os para criar.

FOCO – os exercícios são instrumentos contra a artificialidade; estruturas

criadas para despertar a espontaneidade – ou talvez uma estrutura

cuidadosamente construída para isolar inferências. Importante no jogo é

a bola – o FOCO, um problema técnico, às vezes um duplo problema

técnico que mantém a mente (um mecanismo de censura) tão ocupado

fazendo com que o gênio (espontaneidade) aconteça sem querer (TUNG,

1965 apud SPOLIN, 2003, p.28).

O Jogo Teatral não têm como finalidade a criação dramatúrgica e sim a

experimentação de estados corporais e emocionais, de ambientes e espaços

diversificados e da relação com o tempo de maneira inusitada. Quando se alcança

o envolvimento total é que aparece a criação do que é proposto como foco do jogo.

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Outro ponto essencial para Viola é a INSTRUÇÃO dada pelo professor

durante o jogo; essa deve buscar no aluno uma resposta orgânica sem redirecionar

a sua ação somente fazer com que seu FOCO e sua energia se mantenham

durante o jogo. Essa função de instruir o jogo, inicialmente trabalhado pelo

professor, pode e deve ser repassada aos alunos do grupo, essa atitude provoca

interessantes modificações na relação professor-aluno e traz ao aluno uma

compreensão diferenciada e aprofundada sobre a atividade.

A AVALIAÇÃO também é colocada por Spolin como elemento

essencial, na medida em que aprofunda as experiências a partir de questões

referentes à permanência e exploração do FOCO estipulado no início do jogo. Aqui

são expostas as diferentes visões do jogo, de quem vivenciou e de quem observou,

buscando possíveis soluções para as dificuldades encontradas.

Professor/instrutor, procure atentar para como ou quando você está

desviando as questões de avaliação para respostas com expectativas –

seu próprio ponto de vista. A avaliação verdadeira, que está baseada no

problema (FOCO) a ser solucionado, elimina críticas e julgamento de

valores e dissolve a necessidade de o professor/jogador e/ou

jogador/aluno dominar, controlar, fazer preleções e/ou ensinamentos.

Esta interação e discussão objetiva entre jogadores e grupos de

jogadores desenvolvem confiança mútua. Forma-se um grupo de

parceiros e todos estão livres para assumir responsabilidades pela sua

parte do todo, jogando (SPOLIN, 2003, P.33).

A partir desses elementos essenciais as propostas de jogo vão

tornando seu foco mais complexo e transmitindo, através da vivência prática,

elementos teóricos e técnicos fundamentais para o conhecimento da área. São

assim transmitidos conhecimentos de interpretação, cenografia, sonoplastia,

iluminação em todos os seus aspectos formais a partir da prática. No processo de

elaboração e construção desses elementos de cena é que se aprende sobre eles.

A apreciação estética também é enriquecida através da experiência prática e de

posteriores conversas sobre pontos positivos e negativos observados no resultado

final.

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O pensamento de Ingrid Koudela segue a mesma linha de Viola - o ato

de experienciar continua sendo fundamental para o aprendizado -, mas o enfoque

dado ao ensino da Arte do teatro é na formação do indivíduo. Nos primeiros

momentos de seu livro “Jogos Teatrais” cita o autor Peter Slade, também estudioso

do teatro na educação:

No Drama, isto é, no FAZER e LUTAR, a criança descobre a vida e a si

mesma através de tentativas emocionais e físicas e depois através da

prática repetitiva que é o jogo dramático. As experiências são pessoais e

emocionantes, e podem se desenvolver em direção a experiências de

grupo. Mas nem na experiência pessoal nem na experiência de grupo

existe qualquer consideração de teatro no sentido adulto, a não ser que

nós a imponhamos (SLADE, 1978 apud KOUDELA, 2002, p.21-22).

A autora propõe uma reflexão profunda sobre os conteúdos a serem

trabalhados na disciplina teatro, detectando dois pensamentos comuns e perigosos

a respeito da área: ou o teatro como conteúdo programático que deve trabalhar os

textos e técnicas clássicas, ou como livre expressão. Deve-se atentar para a

importância de um ensino responsável do teatro que traz em si o peso de ser a

mais antiga manifestação simbólica humana.

Se considerarmos que o símbolo elaborado pelo indivíduo através da

imitação, do jogo, do desenho, da construção com materiais possui

significado lógico, sensorial e emocional, podemos concluir que, pelo

contrário, a educação artística constitui o próprio cerne do processo

educacional. Os instrumentos semióticos podem ser utilizados com

objetivos sérios de aprendizagem e propiciar respostas altamente

organizadas, que as crianças ainda não são capazes de devolver através

do pensamento racional e do discurso (KOUDELA, 2002, p. 29-30).

Como vimos, Ingrid Koudela enfatiza a importância na formação do

indivíduo que tem a prática artística, Richard Courtney, em seu livro “Jogo, Teatro e

Pensamento”, acrescenta aí uma forte rede teórica que procura enlaçar e

enriquecer o conhecimento abordado pela área com as demais áreas da linguagem

e do pensamento. E também chama nossa atenção para a importância de uma

educação do sensível:

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[...] precisamos proporcionar uma educação que habilite os homens para

desenvolverem suas qualidades humanas. É esta a maior necessidade

de nosso tempo. A crescente especialização de nossa sociedade

científica tende a não se concentrar nas qualidades essencialmente

humanas. Tanto em nossa educação quanto em nosso lazer precisamos

cultivar o “homem total” e nos concentrarmos nas habilidade criativas do

ser humano. A imaginação dramática deve ser ajudada e assistida por

todos os métodos modernos de educação (COURTNEY, 2003, p. 04).

A partir daí, Courtney traça um histórico da importância e do ensino do

teatro, desde a Grécia Antiga, em diversas sociedades comprovando o valor

histórico do teatro. Em seguida apresenta diversas teorias do desenvolvimento que

dão ao jogo e, consequentemente ao teatro, fundamental importância.

Portanto, para todos os autores pesquisados, mesmo tendo vertentes

diferentes de pensamento, o jogo teatral é a ferramenta que deve ser usada com o

intuito de conseguir o envolvimento necessário dos alunos e fazê-los participar do

aprendizado que daí decorre.

Encontramos também na teoria sócio cultural do desenvolvimento

humano uma importante observação sobre os conteúdos a serem ensinados em

teatro:

Alguns pedagogos se pronunciam terminantemente contra a arte teatral

infantil baseando-se nos perigos referentes ao desenvolvimento

prematuro da vaidade, a afetação, etc. E, efetivamente, o teatro das

crianças, quando pretende reproduzir diretamente as formas do teatro

adulto, constitui uma ocupação pouco recomendada para as crianças.

Começar com um texto literário, memorizar palavras estranhas como

fazem os atores profissionais, palavras que nem sempre correspondem

com a compreensão e os sentimentos das crianças, freiam a criação

infantil e transformam as crianças em repetidores de frases alheias

obrigadas pelo livreto (VYGOTSKY, 1987, p. 87-88).

Vygotsky expõe o erro que muitos educadores, ainda hoje, são levados

a cometer: o ensino de teatro como preparo de textos clássicos e/ou adultos para

apresentação aberta ao público. O autor enxerga no processo de criação do teatro

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o potencial para o aprendizado infantil, além de ser o principal expoente para a

criatividade da criança em se tratando de uma linguagem que engloba as demais

em sua elaboração – para a criação de uma peça teatral temos que criar também,

o texto, o cenário, a música, os gestos, etc. E aí, então que reside o aprendizado,

tanto no desenvolvimento e aprimoramento dos conhecimentos na área como da

criatividade.

[...] a criação cênica deve constituir sempre o auge do trabalho realizado

em todo o período precedente; todo teatro infantil, ao cumprir este

objetivo concreto, não pode renunciar a sua função de educação estética;

todo teatro infantil (...) deve conter determinados elementos de criação

artística (RIVIOS apud VYGOTSKY, 1987, p. 90).

2.5 Aspectos sociais e culturais de seu ensino

De maneira geral os autores concordam que a prática é o melhor meio

para se tratar as questões sociais, já no que diz respeito à cultura alguns falam em

preservar e buscar as raízes culturais e outros trabalham apenas de forma

acultural, desvinculando a atividade teatral de qualquer vínculo específico regional

e tratá-la como produto da humanidade. Quando se trata do jogo teatral o enfoque

é este, é explorado o brincar como atividade natural do homem.

Como as propostas de Viola Spolin estão focadas em atividades

corporais diversificadas, trata-se de um objeto “acultural”, que não propõe ou parte

de uma cultura pré-determinada e sim, tem a capacidade de se adequar, adaptar a

qualquer universo cultural – o jogo, o “brincar” está presente em todas as culturas.

É importante esclarecer que Spolin não têm ligações teóricas diretas com

Vygotsky. As questões sociais também estão no jogo, pois este subentende a

participação de pares criativos e “vibrantes”. Relações entre parceiros de jogo,

entre platéia e palco, entre papéis desempenhados em determinadas atividades

vão tratar diretamente de relações sociais comuns, corriqueiras, cotidianas que

devem ser respeitadas e enriquecidas durante o jogo.

Por causa da natureza dos problemas de atuação, é imperativo preparar

todo o equipamento sensorial, livrar-se de todos os preconceitos,

interpretações e suposições, para que se possa estabelecer um contato

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puro e direto com o meio criado e com os objetos e pessoas dentro dele.

Quando isto é aprendido dentro do mundo do teatro, produz

simultaneamente o reconhecimento e contato puro e direto com o mundo

exterior. Isto amplia a habilidade do aluno-ator para envolver-se com seu

próprio mundo fenomenal e experimentá-lo mais pessoalmente. Assim, a

experimentação é a única tarefa de casa e, uma vez começada, como as

ondas circulares na água é infinita e penetrante em suas variações

(SPOLIN, 2003, p. 13)

Durante o jogo, as relações humanas vão sendo trabalhadas de

maneira espontânea, a estrutura social é experimentada na prática e ganha novo

patamar para reflexão. Mesmo quando o aluno desempenha o papel do instrutor,

repensando a questão da autoridade e da responsabilidade, experimenta uma

transformação na sua reflexão e ação em relação aos colegas, professores,

responsáveis em casa e até mesmo em relação às autoridades políticas. Mesmo o

simples fato do trabalho de Viola Spolin partir do jogo já o torna uma “questão

social” a ser resolvida, pois são jogos de regras que devem ser defendidas por

todos os participantes.

Qualquer jogo digno de ser jogado é altamente social e propõe

intrinsecamente um problema a ser solucionado – um ponto objetivo com

o qual cada indivíduo deve se envolver, seja para atingir o gol ou para

acertar uma moeda num copo. Deve haver acordo de grupo sobre as

regras do jogo e interação que se dirige em direção ao objetivo para que

o jogo possa acontecer (SPOLIN, 2003, p. 05).

Koudela procura sempre valorizar a experiência teatral em si; até

mesmo quando procura tratar de questões cotidianas, acredita que a

criança/adolescente traz elementos do seu cotidiano, mas o transforma no palco ou

quando está no jogo:

O jogo teatral não é uma extensão da vida corrente. A improvisação de

uma situação no palco tem uma organização própria, como no jogo. O

menino não estava simplesmente imitando, mas trabalhava com o

problema de dar realidade aos objetos. O volante, o rádio, os freios, as

marchas não foram explicados verbalmente mas se tornaram concretos

através da ação (KOUDELA, 2003, P. 44-45).

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Através desse pensamento Ingrid nos quer demonstrar que o teatro

tem sua significação própria dentro do universo real. As experiências são

aproveitadas, mas não com âmbito catártico: a criança simplesmente faz uso de

elementos observados na realidade, no seu mundo, para fazer valer a realidade do

palco.

Para Courtney, não há possibilidade de qualquer manifestação

expressiva do homem ser acultural, a questão sócio-cultural é intrínseca a qualquer

produção artística. O autor busca na Psicologia, Antropologia e Sociologia

justificativas para tal afirmação. Segundo ele a sociedade encontra sua própria

expressão no teatro:

Sendo uma atividade social, o teatro está intrinsecamente ligado às

origens da própria sociedade. Todo o âmbito do jogo dramático (da peça

à representação teatral) pode ser observado em cada sociedade

civilizada, variando de acordo com o desenvolvimento da civilização. De

certa maneira, as origens da sociedade são as origens do teatro porque é

pela personificação e identificação que o homem, em toda a história,

relacionou-se com os outros (COURTNEY, 2003, p. 135).

Como a comunicação é um processo social primário o teatro se torna

vital por seu grande potencial comunicativo. Além desse aspecto fundamental

existem outros: para todos os teóricos a vivência das situações, comuns à

sociedade, no jogo teatral faz parte de um aprendizado social, nesse pode-se

discutir e modificar à sua maneira a realidade vivida pelos alunos.

Tal experiência pode ter o valor catártico para alguns autores, é o que

encontramos naqueles que se baseiam nos princípios de Aristóteles para o qual

assistir a uma tragédia e experienciar os sentimentos que essa despertava (medo e

piedade) purgam os homens das emoções impuras.

Uma tragédia[...] é a imitação de uma ação que é importante, e também,

em possuindo magnitude, é completa em si mesma, em linguagem e

acessórios agradáveis, cada uma de suas formas empregadas

separadamente nas partes da obra, não de forma narrativa mas

dramática; com incidentes despertando piedade e medo, recurso para

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efetuar sua catarse de tais emoções (ARISTÓTELES, 1920 apud

COURTNEY, 2003).

Porém para os autores que trabalhamos aqui o maior valor é o da

possibilidade de reflexão frente à representação de significados sócio-culturais e

personificações de perfis psicológicos fundamentais e, aprendizado da técnica,

representatividade comunicativa e histórica do teatro.

Primordialmente as manifestações teatrais estavam ligadas a rituais e,

mesmo modificando o seu foco inicial na crença religiosa, o teatro continua sendo

sagrado, na medida em que carrega símbolos e linguagem carregada de

significado. Podemos através do teatro, identificar e compreender as bases de uma

sociedade – tanto na estrutura do jogo teatral como da criação, encontramos um

microcosmo semelhante em suas características hierárquicas, organizacionais e de

socialização. Portanto deve-se considerar nas manifestações dos alunos os

símbolos – corporais, verbais, visuais - que carrega em decorrência de sua

vivência em sociedade.

Não há como falar sobre os aspectos sociais e culturais no ensino do

teatro sem lembrar de Vygotsky, tanto que antes mesmo de citá-lo encontramos

suas idéias. Quando Courtney defende o teatro como fundamental na construção

dos princípios do próprio homem e na passagem desses, ou quando nos fala de

sua importância na formação da linguagem está embebido nas idéias vygotskianas.

Vygotsky se apóia na grandeza da linguagem teatral, que agrega a

linguagem falada, corporal, simbólica e estética comunicando ao homem o sentido

global - em sua profundidade de significados objetivos e subjetivos - da questão

exposta, para justificar a valorização de seu papel na educação.

A criança mimetiza as impressões externas que percebe do meio que a

rodeia. Com a força de seu instinto e sua imaginação, cria situações e

ambientes que proporcionam uma vida para improvisar impulsos

emocionais (heroísmo, desenvoltura, abnegação). A fantasia infantil não

se detém à atmosfera de sonho, como acontece para os adultos. A

criança quer tornar real em ações, em imagens vivas, tudo o que pensam

e sentem (PETROVA apud VYGOTSKY, 1987).

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O universo social que circunda a criança se reflete, toma vida na ação

criativa do teatro, essa experiência é riquíssima para que se compreenda e

experimente os papéis atribuídos aos adultos, em sociedade. Da mesma maneira

são transmitidos e compreendidos fundamentais valores culturais, éticos e morais.

Também em Vygotsky encontramos a idéia da catarse vivenciada frente a uma

obra de arte, assim como Aristóteles, como elemento importante na educação.

A arte é o social em nós, e, se o seu efeito se processa em um indivíduo

isolado, isto não significa, de maneira nenhuma, que as suas raízes e

essência sejam individuais. [...] O social existe até onde há apenas um

homem e as suas emoções pessoais. Por isto, quando a arte realiza a

catarse e arrasta para esse fogo purificador as comoções mais íntimas e

mais vitalmente importantes de uma alma individual, o seu efeito é um

efeito social. [...] A arte introduz cada vez mais a ação da paixão, rompe o

equilíbrio interno, modifica a vontade em um sentido novo, formula para a

mente e revive para o sentimento aquelas emoções, paixões e vícios que

sem ela teriam permanecido em estado indefinido e imóvel (VYGOTSKY,

1999, p. 315-316).

2.6 A interdisciplinaridade

Essa é a questão mais polêmica e complicada para se trabalhar dentro

das escolas. A visão tradicional do teatro como maneira de diversificar e

descontrair o trabalho com determinados conteúdos de diversas disciplinas ainda é

a idéia mais difundida do que seria a interdisciplinaridade do teatro no ensino

formal. Porém todos os autores trabalhados nessa pesquisa trazem visões

interessantes e complementares sobre essa questão.

Spolin trata diretamente da interdisciplinaridade do teatro dentro da

escola, mas enxerga seus exercícios como facilitadores na construção de um foco

propício para a aprendizagem de determinados conteúdos; propõe que o jogo seja

usado por todos. Nesse caso, o teatro emprestaria seu conteúdo essencial para o

trabalho em outra disciplina. “O conhecimento teria uma exatidão maior se viesse

da estimulação do próprio aprendizado.”

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Courtney divide a mesma opinião quanto à utilização do jogo teatral

como método de ensino:

A Educação Dramática é não apenas o modo de encarar o processo

educacional (uma filosofia), ou o modo de ajudar o desenvolvimento

individual (uma psicologia) ou assistir o indivíduo em sua adequação ao

meio (uma sociologia); é a maneira fundamental na qual o ser humano

aprende – e, assim, é o mais efetivo método para todas as formas de

educação (COURTNEY, 2003, p. 278).

A autora Ingrid Koudela se preocupa em defender a questão

essencialista do ensino da Arte. Pela longa experiência e observação do ensino

dessa linguagem no Brasil teme o retorno ao processo de tomar o teatro como

simples instrumento pedagógico. Porém, admite que deva haver uma aliança entre

as áreas comuns à Linguagem com intuito de enriquecer os conhecimentos em

particular e ampliar a compreensão do universo histórico, social e cultural do teatro

(da Arte).

Richard Courtney faz uso de múltiplos conhecimentos para nos falar

sobre a importância do teatro, para ele a linguagem teatral é muito mais do que

simplesmente uma técnica de arte a ser apreendida e reproduzida. O teórico

acredita estar depositado no teatro toda a significação da humanidade na medida

em que é a expressão mais pura.

Se o teatro está entrelaçado às crenças fundamentais do homem da

maneira como se infere da abordagem sociológica, esse fato terá

certamente sua influência sobre todo o conjunto de campos análogos de

estudo: como o homem se posicionou com relação ao universo (filosofia e

religião); as diferentes interpretações que o homem deu ao mundo a cada

período (história) e como isso se relaciona com sua compreensão do

teatro e das formas dramáticas (crítica teatral); como o homem observou

o funcionamento de seus próprios processos mentais (psicologia) e a

relação destes com a criação artística (estética) (COURTNEY, 2003, p.

190).

Nesse sentido fica claro que, para Courtney, a interdisciplinaridade é

essencial também na escola. Somente trabalhando dessa maneira o aluno pode,

por exemplo, entender a linguagem humana como manifestação multidimensional e

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compreender que os fatos históricos estão retratados e preservados através

dessas manifestações. O aluno precisa ter uma visão profunda e ampla, não

apenas pontual, para aprender e se tornar um indivíduo consciente.

Mais ainda, Courtney acredita que o teatro possa ser um grande elo

para todos os conhecimentos humanos, funcionando como método e ferramenta.

Tanto no processo de seu ensino, como na construção dos elementos necessários

para sua concretização final – o espetáculo teatral.

[...] a Educação Dramática é uma disciplina acadêmica abrangente.

Utiliza como instrumento todos os ramos do aprendizado que se

relacionam com o impulso dramático. Utiliza ecleticamente toda e

qualquer disciplina em um corpo unificado de conhecimentos, de maneira

a que possa nos ajudar a compreender a natureza da experiência. Reúne

muitos aspectos dos estudos até então não relacionados: aspectos da

filosofia, pois temos de examinar por que educamos nossas crianças

dessa maneira; da psicanálise, para entender os símbolos utilizados

pelas crianças e os motivos subliminares no contexto do jogo; da

sociologia, pois atuar é uma atividade social que inclui a interação dos

indivíduos; da psicologia social, porque imitação, identificação,

desempenho de papéis e tudo o mais está diretamente ligado à atuação

do homem em seu meio; da cognição e psicolingüística, pois o

relacionamento entre a formação do conceito e linguagem influencia

diretamente o método dramático de aprendizagem. E, ao aproximar-se do

teatro, aspectos de matemática, física, engenharia, estética e outros

campos de estudo vêm ampliar o nosso raio de ação (COURTNEY, 2003,

p. 58).

Na obra de Vygotsky não encontramos uma referência direta sobre a

interdisciplinaridade, porém podemos entendê-la em suas entrelinhas. O autor trata

da Arte sempre como linguagem e a conecta com as demais linguagens do

homem, assim como uma rede indissolúvel de transmissão de significados. Porém,

defende a arte como linguagem mais completa e, de fato nela, em especial o

teatro, trabalha todo tipo de linguagem: escrito, falada, corporal e sinestésica.

Dois quadros idênticos foram apresentados a dois grupos de crianças

pré-escolares, de mesma idade e nível de desenvolvimento. A um grupo

foi solicitado a dramatização do quadro – o que indicaria seu grau de

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captação imediata do conteúdo; ao outro grupo foi solicitado descrever o

quadro em palavras, uma tarefa que requereria um recurso de

compreensão conceitualmente mediada. Descobriu-se que os “atores”

reproduziram o sentido da situação da ação representada enquanto que

os “narradores” enumeraram objetos isolados (VYGOTSKY, 1962 apud

COURTNEY, 2003, p. 277).

Da mesma maneira que outros autores, Vygotsky acredita que através

do jogo o aprendizado se dá de forma mais efetiva: só se aprende com aquilo que

se tem interesse real e com o que se envolve. Portanto, o jogo teatral pode e deve

ser usado como ferramenta de ensino de qualquer disciplina escolar.

2.7 Comentários

É possível verificar uma forte aliança entre os autores e encontrar

muitas idéias complementares nas teorias apresentadas. O mais importante aqui é

perceber a defesa do grande potencial educativo existente no teatro, o que bastaria

para tê-lo como disciplina obrigatória. Além de possibilitar o aprendizado de outras

disciplinas de maneira mais interessante e eficaz.

Porém um fator relevante é a questão dos aspectos sociais e culturais

que traz alguma divergência entre os teóricos. Mesmo acreditando que o jogo

teatral é um importante meio para experienciar os papéis sociais e recriá-los, não

indica segundo Spolin que o jogo carregue, em si, características culturais da

sociedade na qual a criança está inserida, acreditando ser o jogo um elemento da

cultura propriamente infantil – de todas as crianças, independente do país, poder

aquisitivo, grau de escolaridade.

Já somos capazes de debater essa idéia: mesmo brincando, jogando,

de maneiras semelhantes as crianças apresentam traços da sua apreensão do

mundo ao redor. Há nos jogos aspectos únicos de significado e interpretação para

cada criança, a partir do seu universo de vivências sócio-culturais.

Os trabalhos de teatro na escola devem levar em consideração tais

peculiaridades e também possibilitar a vivência, em jogo, a partir de novos

parâmetros sócio-culturais. Os conteúdos específicos do teatro não devem ser

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deixados em segundo plano, porém seu aprendizado se dará, de melhor maneira,

durante os jogos e criações teatrais.

Há concordância em relação ao necessário envolvimento, prazer e

relevância do que deve ser ensinado, pois o aprendizado ocorre através daquilo e,

cujo conteúdo, possui um significado particular para quem aprende. Os elementos

técnicos e as convenções vão sendo expostos ao longo do processo de criação, na

medida em que se fizerem necessários.

Teremos, na seqüência, novos elementos para debate, já que

encontraremos maior contradição em relação às idéias e propostas apresentadas e

as teorias que embasam o pensamento do teatro na educação.

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3. METODOLOGIA

Esta monografia trata-se de uma pesquisa documental que se debruça

na leitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e para

Ensino Médio tendo como ponto de discussão a maneira como esses documentos

tratam a questão do ensino de teatro dentro da disciplina de Arte. Os aspectos

detalhados aqui são: os conteúdos propostos para o ensino de teatro; como

integram os aspectos sociais e culturais; e se há e como exploram a

interdisciplinaridade.

As bases usadas para confrontar as idéias dos PCNs foram textos

fundamentais de grande importância no universo teórico do teatro na educação que

fazem parte, inclusive, da bibliografia dos próprios documentos analisados. São

autores com forte ligação com a prática teatral e larga experiência com o ensino do

teatro.

Primeiramente foi feita a coleta do material a ser pesquisado:

Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e Parâmetros

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEF e PCNEM) e de materiais

ligados a ele como a Lei de Diretrizes e Bases e o PCN+ EM. Após a leitura de

todos esses materiais foi levantada uma bibliografia específica da área de teatro a

partir de autores citados na elaboração dos documentos lidos. Foram encontrados

alguns livros e textos que constam daquela bibliografia e outros dos mesmos

autores que permitiram uma maior profundidade na compreensão de seu

pensamento.

Antes de realizar a análise tive a curiosidade de verificar como era o

acesso a esse material – fundamental para discussão e para o planejamento

escolar. Verifiquei que as unidades escolares estaduais não têm em seu acervo

nenhuma documentação pertinente a isso, não encontrei nem os PCNs, nem a Lei

de Diretrizes e Bases. Fui informada que na sede da Diretoria de Ensino os

professores podem encontrar tais materiais, mas esse material não deveria estar

nas escolas?

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Achei fundamental que se conhecesse a história da formação e da

produção desses autores e, para tanto, pesquisei em livros e sites a biografia dos

mesmos. Durante a leitura dos livros e textos foram identificados os pontos

fundamentais para se debater as questões propostas. Enquanto me concentrava

na busca de informações sobre os temas a serem discutidos foi feito uso de novos

materiais bibliográficos. Tais materiais de apoio serviram para esclarecer algumas

informações técnicas e terminológicas encontradas nos livros pesquisados.

Houve preocupação, durante a elaboração do texto, em manter a

estrutura usada na apresentação dos PCNs a mais fiel possível, tendo grande

parte dos textos sido reescrita com uma linguagem mais adequada para o

entendimento e interpretação dos leitores. Essas alterações de linguagem foram

feitas também nos textos e livros para discussão que têm, muitas vezes, uma

linguagem técnica e de difícil compreensão.

O texto da pesquisa, então, foi escrito com uma linguagem de fácil

compreensão para os profissionais da área da educação. Outras informações de

fundamental conhecimento forma acrescentadas, como um breve histórico sobre a

arte e o teatro na educação.

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4. RESULTADOS

Será apresentado um quadro detalhado das propostas dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCNs) de Arte, com ênfase em Teatro, para Ensino

Fundamental e Ensino Médio. A partir da leitura dos PCNs foi possível traçar uma

comparação entre o proposto e o esperado para os diferentes graus de ensino. Foi

observado o tratamento que o ensino de Arte - Teatro em relação a: complexidade

e profundidade de seus conhecimentos, aspectos sociais e culturais de seu ensino,

interdisciplinaridade.

A estrutura dos PCNs é a mesma: primeiro se apresenta a idéia geral

do ensino de Arte no contexto educacional apresentado. Na seqüência, temos os

objetivos gerais e os conteúdos a serem ensinados; os conteúdos são

subdivididos, porém gerais para todas as áreas de Arte. Então, ao final, é proposta

uma reflexão sobre a avaliação e seu valor no aprendizado da Arte, explicitando os

ideais de avaliação.

Tive uma preocupação especial em manter a estrutura que o MEC

apresenta à leitura dos profissionais da educação. Acredito que a própria

apresentação do texto dos PCNs já nos indica uma visão importante por parte de

quem elabora as propostas educacionais. Portanto, a repetição e a linguagem

pouco aberta à reflexão são apenas reproduzidas aqui neste capitulo, ainda que

tenham havido algumas mudanças na linguagem para melhor entendimento dos

leitores.

4.1 PCNs Arte – Ensino Fundamental

Na apresentação dos objetivos gerais do Ensino de Arte para o Ensino

Fundamental a proposta é a de que o aluno deva desenvolver conhecimentos

estéticos e artísticos para que possa produzir arte individualmente ou com seus

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colegas se tornando um cidadão interessado na produção artística de diferentes

culturas ao longo da História, sendo crítico e sensível para tais.

Para tanto, o professor deve ter a preocupação de que, no curso do

Ensino Fundamental, o aluno possa:

• experimentar e explorar as possibilidades de cada linguagem artística;

• compreender e utilizar a arte como linguagem, mantendo uma atitude de

busca pessoal e/ou coletiva, articulando a percepção, a imaginação, a

moção, a investigação, a sensibilidade e a reflexão ao realizar e fruir

produções artísticas;

• experimentar e conhecer materiais, instrumentos e procedimentos

artísticos diversos em arte (Artes Visuais, Dança, Música, Teatro), de

modo que os utilize nos trabalhos pessoais, identifique-os e interprete-os

na apreciação e contextualize-os culturalmente;

• construir uma relação de autoconfiança com a produção artística

pessoal e conhecimento estético, respeitando a própria produção e a dos

colegas, sabendo receber e elaborar críticas;

• identificar, relacionar e compreender a arte como fato histórico

contextualizado nas diversas culturas, conhecendo, respeitando e

podendo observar as produções presentes no entorno, assim como as

demais do patrimônio cultural e do universo natural, identificando a

existência de diferenças nos padrões artísticos e estéticos de diferentes

grupos culturais;

• observar as relações entre a arte e a realidade, refletindo, investigando,

indagando, com interesse e curiosidade, exercitando a discussão, a

sensibilidade, argumentando e apreciando arte de modo sensível;

• identificar, relacionar e compreender diferentes funções da arte, do

trabalho e da produção dos artistas;

• identificar, investigar e organizar informações sobre a arte,

reconhecendo e compreendendo a variedade dos produtos artísticos e

concepções estéticas presentes na história das diferentes culturas e

etnias;

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• pesquisar e saber organizar informações sobre a arte em contato com

artistas, obras de arte, fontes de comunicação e informação (PCN Arte,

1998, p.48).

Os conteúdos do PCNs para EF têm o mesmo objetivo da formação de

cidadãos que se situem culturalmente. O critério da seleção dos conteúdos está na

importância à promoção da formação cultural e à participação em sociedade.

Então, as escolhas visam a inserção do aluno na História Cultural da Humanidade,

tanto como possível criador, dando-lhe conhecimento e possibilidades de

experimentação necessária para tal, quanto como apreciador mostrando-lhe os

diferentes elementos estéticos, artísticos e simbólicos presentes nas obras de

diferentes civilizações.

Os conteúdos são divididos em três eixos do conhecimento: produzir,

apreciar e contextualizar.

Produzir: possibilitar ao aluno que desenvolva um fazer

artístico através de informações e experimentações das linguagens da Arte

dadas pelo professor.

Apreciar: desenvolvimento de uma percepção crítica das

informações estéticas e artísticas fornecidas pelo universo cotidiano comum

e pelo universo direcionado para Arte. Compreensão da interpretação e

decodificação das diferentes produções artísticas.

Contextualizar: localizar a sua produção, dos colegas e da arte

dentro de um contexto sócio-histórico.

Busca-se, através dessa tríade, a compreensão da Arte como

conhecimento amplo que situa-se no campo dos sentidos conectado à percepção,

sensação e cognição.

Eles poderão perceber, imaginar, recordar, compreender,

aprender, fazer conexões e formar idéias, hipóteses ou teorias pessoais

sobre seus trabalhos artísticos e de outros, assim como sobre o meio em

geral, pois situam a arte nas culturas em diversos tempos da história e

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situações sociais e sabem perceber, distinguir e argumentar sobre

qualidades (PCN Arte, 1998, p. 50).

A idéia da contextualização vai além: pretende que o aluno perceba a

relevância da interação com o conhecimento e com os colegas para o domínio

reflexivo do saber artístico.

A escolha dos conteúdos é apontada com ênfase nos objetivos de cada

proposta. De maneira geral, os conteúdos dão ênfase à formação do aluno como

ser sócio-cultural que compreende a arte de seu tempo e de seu povo, se aventura

na produção e apreciação de arte.

Mais adiante, os PCNs especificam esses conteúdos dando destaque à

importância da informação e instrumentalização dos conhecimentos artístico-

culturais.

• a arte como expressão e comunicação dos indivíduos;

• elementos básicos das linguagens artísticas, modos de articulação

formal, técnicas, materiais e procedimentos na criação em arte;

• produtores de arte: vidas, épocas e produtos em conexões;

• diversidade das formas de arte e concepções estéticas da cultura

regional, nacional e internacional: produções e suas histórias;

• a arte na sociedade, considerando os artistas, os pensadores da arte,

outros profissionais, as produções e suas formas de documentação,

preservação e divulgação em diferentes culturas e momentos históricos

(PCNs Arte, 1998, p. 52).

Além das propostas de conteúdos do conhecimento artístico, os PCNs

sugerem alguns conteúdos relativos a atitudes e valores que se justificam como

objetivos comportamentais. Atitudes como respeito às produções artísticas,

desprendimento na própria criação, incentivo a uma postura autocrítica e

autoconfiante nas produções pessoais, posicionamento crítico na apreciação,

valorização das diversas manifestações culturais, reconhecer a importância do

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contato com a Arte, estão listados como tópicos a serem observados e trabalhados

pelos professores.

Em relação à avaliação, os PCNs traçam maneiras de se realizar um

diagnóstico do aprendizado em Arte. A avaliação pode ser realizada no processo

de aprendizagem: pode-se verificar os conhecimentos prévios dos alunos e

acompanhar a interação e o desenvolvimento do aluno nas propostas oferecidas.

No que diz respeito aos conhecimentos específicos da Linguagem

Teatral, os PCNs levam em consideração a base teórica dada no início,

respeitando os objetivos e conteúdos gerais da disciplina Arte.

A apresentação do conteúdo Teatro é iniciada com a idéia de que sua

importância, para adultos e adolescentes, está na possibilidade de conhecer e

confrontar várias culturas em momentos históricos diferentes por meio de uma

produção artística coletiva. A importância do fazer teatral está na busca de

alternativas criativas e imaginativas pelos alunos para construção de cenas, com

objetivo de refinar a percepção sobre eles mesmos e sobre situações do cotidiano.

Os autores dos PCNs entendem que a representação dramática faz

parte da natureza humana: “provavelmente diz respeito à necessidade humana de

recriar a realidade em que vive e de transcender seus limites” e relaciona esse

processo com a imitação, simbolização e jogo na infância. Nesse caso, focaliza-se

mais precisamente o “jogo de construção”:

O jogo de construção não é uma fase da evolução genética mas sim um

instrumento de aprendizagem com o qual a criança opera, promovendo o

desenvolvimento da criatividade, em direção à educação estética e praxis

artística. O jogo teatral é um jogo de construção em que a consciência do

“como se” é gradativamente trabalhada, em direção à articulação de uma

linguagem artística — o teatro (PCNs Arte, 1998, p. 88).

Através do teatro, o aluno faz novas descobertas de idéias,

sentimentos, atitudes, e desenvolve sua capacidade de socialização pelo contato

com novos pontos de vista, ampliando sua capacidade de dialogar. Também se

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explora a relação entre palco e platéia, pois é o trabalho criador tendo que dialogar

com as regras do próprio teatro.

Segundo os PCNs, o texto inicial do trabalho do ator é “escrito” pela

linguagem gestual, e a construção desse texto pelos alunos é um exercício de

observação riquíssimo que, aos poucos, compõe o banco de gestos para um ator

crítico. O estudo do teatro se amplia ao conhecimento de sua história, da

cenografia, dramaturgia, encenação. Os PCNs propõe, a fim de explorar essas

temáticas, que se façam pesquisas bibliográficas e de observação.

A integração entre apreciação e produção artística deve ser mantida e

toda prática de teatro deve ter como base a observação, a pesquisa e o

entendimento de que os textos dramáticos, as formas de representação e as

formas cênicas têm tradições inseridas em diversas épocas e culturas que podem

ser objeto de estudo e transformações no contexto presente do aluno.

A cultura do próprio adolescente deve ser considerada, porém há de se

propiciar informações que lhe dêem condições de avaliar, opinar e interpretar o que

vê e para que interaja em sociedade com maior propriedade.

Assegura-se que o jovem se identifica com a narrativa dramática e

esse fator facilita sua aproximação com os conteúdos que permitam uma visão

crítica, importante numa sociedade de consumo que divulga seus produtos fazendo

uso dessa linguagem. O universo da mídia e propaganda é interessante como

objeto de pesquisa e permite um rico exercício de observação.

Por meio do exercício e da pesquisa chega-se à argumentação crítica,

buscando esclarecer os modos de construção e os códigos pelos quais a

ficção é veiculada. Ir ao teatro e/ou assistir às programações de ficção,

mediada ou não, amplia a criação de um discurso próprio e organizado,

passando a ser aprendizado imprescindível, prática deliberada e

operante, a que os jovens podem se dedicar (PCNs Arte, 1998, p. 90).

Assim é finalizada a introdução ao ensino de teatro e iniciam-se os

direcionamentos mais específicos para seu ensino na escola.

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Dentro dos objetivos, encontramos as diretrizes principais do trabalho

do educador em teatro para alunos de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental. Não

é apresentada nenhuma novidade em relação aos pontos levantados até então:

o teatro como uma linguagem múltipla com dimensões

históricas, artísticas, estéticas, social e antropológica que devem ser

compreendidas;

compreender as influências - cultura local, costumes e crenças,

organização dos papéis sociais - na construção da linguagem teatral;

saber improvisar com os elementos dessa linguagem, adaptar

às condições materiais da escola e da comunidade as suas produções

teatrais;

apropriar o vocabulário tanto para a apreciação de trabalhos

realizados na escola e fora dela, como na composição dos próprios

personagens;

reconhecer as características estéticas predominantes dos

estilos tradicionais da História do Teatro em diferentes produções

contemporâneas;

Há, também, destaque de outros objetivos que valorizam a

documentação sobre teatro e o conhecimento da mesma, o acompanhamento das

produções teatrais, conhecimento das possibilidades profissionais do universo do

teatro e o reconhecimento da prática teatral como desenvolvimento da

solidariedade social.

Em resumo, os conteúdos propõem que se encare o teatro de maneira

global: como comunicação e produção coletiva; como apreciação; como produto

histórico cultural. As propostas são amplas, porém sempre focando o teatro como

linguagem e conteúdo que, em si, bastam. Os principais pontos dos conteúdos a

serem explorados buscam que o aluno participe de improvisações, visando à

exploração de novos espaços na criação de papéis e de ação dramática;

reconheça e saiba utilizar capacidades expressivas e criativas que constroem

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significado na atividade teatral; identifique e possa aprofundar os elementos

fundamentais na construção da cena teatral: “atuantes/papéis, atores/personagens,

estruturas dramatúrgicas/peça, roteiro/enredo, cenário/locação”.

Além de exercitar a observação e transposição do universo físico e

cultural circundante, realizar adaptações de roteiros a partir de outros materiais

escritos (notícias, mitos, fatos históricos, narrativas populares de diversas culturas

e épocas, contos e história), observar e analisar constantemente as propostas e

cenas dos colegas, através de formulação escrita e verbal, compreender o teatro

como instrumento “que favorece a identificação com outras realidades

socioculturais, interagir e reconhecer a diversidade cultural encontrados na criação

teatral de diferentes culturas.

Compreender e distinguir as diferentes maneiras de

“construção das narrativas e estilos: tragédia, drama, comédia, farsa,

melodrama, circo, teatro épico”.

Compreender e analisar as formas regionais, nacionais e

internacionais de teatro, “esclarecendo suas tradições, características e

modos de construção”.

Pesquisar e ler textos dramáticos e identificar estruturas,

personagens, conflito, estilos e gêneros teatrais.

Freqüentar e pesquisar o movimento teatral na comunidade,

cidade, estado, país e internacional, “para observar o trabalho de atores,

diretores, grupos regionais e a crítica de espetáculos”.

Consultar e levantar “em centros de documentação, arquivos

multimídias, acervos e em bancos de textos dramáticos sobre o teatro,

nacional e sobre a dramaturgia universal”.

Critérios de Avaliação

Os critérios de avaliação dos alunos na disciplina Arte com ênfase em

Teatro deve certificar que o aluno:

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sabe improvisar e atuar em situações de jogo, utilizando as

capacidades corporais e vocais;

está “capacitado para criar cenas escritas ou encenadas,

reconhecendo e organizando os recursos para a sua estruturação”;

está capacitado a opinar com clareza e critérios

fundamentados sobre atividade teatral; identifica “momentos importantes na

história do teatro, da dramaturgia local, nacional ou internacional, refletindo

e relacionando os aspectos estéticos e cênicos”;

valoriza “as fontes de documentação, os acervos e os arquivos

da produção teatral”.

4.2 PCNs Arte – Ensino Médio

Os PCNs para o Ensino Médio vinculam a Arte à Área de Linguagens,

Códigos e suas Tecnologias o que já nos indica uma visão mais integrada,

interdisciplinar e contextualizada do ensino da arte. Essa percepção é confirmada

ao longo da introdução “O sentido do aprendizado na área” que nos expõe as

propostas de modificações em relação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB, Lei n.º 9.394/96).

A indicação para mudanças qualitativas é a de sistematizar um

conjunto de “disposições e atitudes” para ampliar a participação do aluno no mundo

social. A partir dessa intenção vê-se como necessário um aprofundamento no

conceito acerca do conceito da Linguagem, e o PCNs esclarece que esta, por sua

natureza, é transdisciplinar sendo objeto de estudo de várias áreas como a

Filosofia, Psicologia, Antropologia, Sociologia, Epistemologia, História entre outras.

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A Linguagem é considerada como capacidade humana de “articular

significados coletivos e compartilhá-los, em sistemas arbitrários de representação,

que variam de acordo com as necessidades e experiências da vida em sociedade.

A principal razão para qualquer ato de linguagem é a produção de sentido”. Sendo

uma herança social envolve os indivíduos e regula as estruturas emocionais,

perceptivas e mentais pelo seu simbolismo.

A linguagem permeia o conhecimento e as formas de conhecer, o

pensamento e as formas de pensar, a comunicação e os modos de

comunicar, a ação e os modos de agir. Ela é a roda inventada, que

movimenta o homem e é movimentada pelo homem. Produto e produção

cultural, nascida por forças das práticas sociais, a linguagem é humana e,

tal como o homem, destaca-se pelo seu caráter criativo, contraditório,

pluridimensional, múltiplo e singular, a um só tempo (PCNEM –

Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p.5).

Os sinais e suas possíveis combinações socialmente partilháveis na

interação verbal são organizados como dados perceptivos em sistemas simbólicos.

O aluno deve conhecer as linguagens humanas, considerando todas as variações

– verbal, visual, gestual, áudio-visual entre outras – na estrutura simbólica da

comunicação, essas linguagens constitui sistemas arbitrários de sentido e

comunicação. Na sociedade as normas das linguagens se auto-estruturam ao

serem partilhadas e negociadas.

A compreensão da linguagem como um todo permite uma participação

ativa e cidadã em sociedade. Com o objetivo de atingir tal participação, são

apresentadas as competências a serem trabalhadas dentro da Área, entre elas:

“Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes

linguagens como meios de organização cognitiva da realidade pela constituição de

significados, expressão, comunicação e informação”: vincular o aluno ao caráter

intrasubjetivo, intersubjetivo e social da linguagem ao trabalhá-la não apenas em

seus aspectos formais; tomar consciência de seu papel no processo histórico

reconhecendo no passado uma herança social, e ser crítico em relação a

representatividade e construção das verdades instituídas.

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O exame do caráter histórico e contextual de determinada manifestação

da linguagem pode permitir o entendimento das razões do uso, da

valorização, da representatividade, dos interesses sociais colocados em

jogo, das escolhas de atribuição de sentidos, ou seja, a consciência do

poder constitutivo da linguagem (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas

Tecnologias, 2000, p. 07).

“Analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos das

linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função,

organização das manifestações, de acordo com as condições de produção e

recepção” (pág. 08). Conhecer as diferenças históricas, estilísticas e funcionais da

produção de linguagem, comparando os recursos expressivos intrínseco a cada

manifestação e as razões das escolhas, isso permite que o aluno possa diferenciá-

las e interrelacioná-las, percebendo a ampla possibilidade da linguagem.

Em uma situação de ensino, a análise da origem de gêneros e tempos,

no campo artístico, permite abordar a criação das estéticas que refletem,

no texto, o contexto do campo de produção, as escolhas estilísticas,

marcadas de acordo com as lutas discursivas em jogo naquela

época/local, ou seja, o caráter intertextual e intratextual (PCNEM –

Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 08).

“Confrontar opiniões e pontos de vistas sobre as diferentes

linguagens e suas manifestações específicas.” (pág. 08) Para dar ou não validade

a uma teoria sobre a linguagem, é fundamental conhecê-la e dispor-se a analisá-la

e compreendê-la, pois toda teoria é embasada ou transgressora em relação ao

pensamento da época em que surge. Isso nos leva a refletir sobre o que estará

envolvido nas construções lingüísticas atuais; estimular o debate, o diálogo a

pesquisa para o encontro dessas respostas auxilia o aluno a construir um ponto de

vista articulado com o objeto de estudo. A partir dessa busca e dessa construção

de sentido, o aluno toma posse de suas idéias e pode compartilhar com maior

fluência e clareza seu ponto de vista.

“Respeitar e preservar as diferentes manifestações da linguagem

utilizadas por diferentes grupos sociais, em suas esferas de socialização; usufruir

do patrimônio nacional e internacional, com suas diferentes visões de mundo; e

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construir categorias de diferenciação, apreciação e criação.” (pág. 09) É através da

linguagem que se constrói uma identidade social, pelas suas características

comunicativas, formativas e informativas é instrumento valioso para esses fins. O

grande elo entre as vivências dos alunos e as manifestações de outros grupos está

compreendido na maneira e nos motivos de transmissão dessas culturas.

As linguagens se utilizam de recursos expressivos próprios e expressam,

na sua atualização, o universal e o particular. Pertencer a uma

comunidade, hoje, é também estar em contato com o mundo todo. As

práticas sociais deverão estar cada vez mais próximas da unidade para

os fins solidários (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias,

2000, p. 09).

O aluno compreende a sua e as demais linguagens como legítimas

quando percebe que as diferenças estão relacionadas aos interlocutores do

processo comunicativo, às escolhas discursivas que realizam e aos recursos

expressivos utilizados; tal conhecimento contribui para que o aluno supere a visão

preconceituosa.

“Utilizar-se das linguagens como meio de expressão, informação e

comunicação em situações intersubjetivas, que exijam graus de distanciamento e

reflexão sobre os contextos e estatutos de interlocutores; e saber colocar-se como

protagonista no processo de produção/recepção.” Ao compreender que o homem

se utiliza da linguagem, para fins comunicativos, por meio de manifestações

expressivas próprias de seu grupo social, o aluno pode sempre se fazer

compreensível através de uma análise reflexiva e elaboração consciente de seu

discurso.

Mais algumas competências são apresentadas com vistas na

compreensão mais formal da utilização da língua materna (Língua Portuguesa), da

língua estrangeira e das novas tecnologias. Acredito não ser essencial para este

trabalho o aprofundamento nessas questões.

Após a apresentação geral dos conhecimentos da Área da Linguagem,

Códigos e suas Tecnologias, o PCNs nos apresenta com detalhes um a um.

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Conhecimentos de Arte

A Arte no Ensino Médio deve buscar que os alunos apropriem-se dos

saberes culturais e estéticos presentes nas práticas de produção e apreciação

artísticas para que tenham uma formação completa como cidadãos. O PCNEM -

Arte tem como objetivo esclarecer as diretrizes gerais para a promoção do

conhecimento da arte aos adolescentes, jovens e adultos que cursam o Ensino

Médio.

As diretrizes a serem apresentadas buscam “contribuir para o

fortalecimento da experiência sensível e inventiva dos estudantes, e para o

exercício da cidadania e da ética construtora de identidades artísticas”. Há uma

preocupação direta com a compreensão da Arte como conhecimento “humano

sensível-cognitivo”, voltado para um fazer e um apreciar reflexivos que levem em

consideração a história e o contexto social da produção.

Antes de traçar os objetivos gerais, o PCNs faz uma retrospectiva

sobre a história do ensino de arte no país. Repassa os episódios iniciais quando o

ensino se resumia ao Desenho Geométrico ou Técnico e o Canto Orfeônico e nos

leva a pensar nos movimentos iniciais de mudança nos anos 60 e 70. A partir de

1971, segundo a Lei no 5.692, a arte passou a ser considerada como “experiência

de sensibilização e como conhecimento genérico” deixando de ser reconhecida

como conhecimento humano, histórico e importante para a educação do aluno.

Esse quadro permanece pelos anos 80 e 90, período em que as escolas têm

variadas atividades de práticas “artísticas” desvinculadas de qualquer preocupação

teórica e estética no campo da música, teatro, dança e artes plásticas.

Em 1982 foram organizadas as Associações de Arte-Educadores em

vários Estados do país que reuniam professores, educadores e artistas

preocupados com a situação da Arte nas escolas. Vários Congressos Nacionais e

Internacionais sobre Arte e Educação forma realizados e neles aconteciam

discussões a respeito dos cursos de Arte; esses grupos lutaram para que a Arte

estivesse presente nos currículos da Educação Básica no Brasil e na Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, Lei no 9.394.

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Para a construção desse documento houve estudos, pesquisas,

discussões que levassem a propostas que tratassem da Arte em sua

complexidade. O próprio fato de fazer parte da Área de Linguagem, Códigos e suas

Tecnologias a Arte é vista particularmente pelos seus aspectos estéticos e

comunicacionais. Conhecimento humano do âmbito sensível-cognitivo, por meio do

qual manifestamos significados, sensibilidades, modos de criação e comunicação

sobre a natureza e a cultura.

As experiências estéticas de homens e mulheres estendem-se a vários

âmbitos de seu existir, de seu saber, de sua identidade, enfim, de seu

humanizar-se. Em processos de produzir e apreciar artísticos, em

múltiplas linguagens, enraizadas em contextos socioculturais, as pessoas

experimentam suas criações e percepções estéticas de maneira mais

intensa, diferenciada (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas

Tecnologias, 2000, p. 48).

Apesar de ser um conteúdo que se estrutura para a comunicação, sua

particularidade está na construção dessas idéias que são elaboradas de maneira

sensível, imaginativa, estética por seus produtores. A maneira de expor esse

“conjunto sensorial de idéias” é ponto culminante para que se efetive a

comunicação, o conhecimento de como criar esse discurso sensível – através de

imagens, gestos, sons – é construído ao longo de vivências interpessoais e

intergrupais, dentro da diversidade sócio-cultural prevalecente, ao longo da história.

Os alunos podem, na escola, desenvolver saberes que facilitem a

compreensão e envolvimento em decisões estéticas, apropriando-se de “saberes

culturais e contextualizados referentes ao conhecer e comunicar arte e seus

códigos”. Para tanto, os estudantes devem ter melhor conhecimento das “práticas e

teorias de produção, apreciação, reflexão das culturas artísticas em suas

interconexões e contextualizações socioculturais”.

Por isso, a concretização e apreciação de produtos artísticos pelos

alunos requer aprender a trabalhar combinações, reelaborações

imaginativas – criativas, intuitivas, estéticas – a partir de diversos

elementos da experiência sensível da vida cotidiana e dos saberes sobre

a natureza, a cultura, a história e seus contextos. É na travessia dessas

mútuas e múltiplas influências entre reelaborações imaginativas da arte e

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experiências com as realidades culturais em que vivem que os

adolescentes, jovens e adultos da escola média vão desvelando o sentido

cultural da Arte e de seus conhecimentos para suas vidas (PCNEM –

Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 49).

No Ensino Médio, será interessante para o aluno descobrir que as

relações do fazer e apreciar artístico são reconstruídas ao longo da história. E que

entre os fatores que influenciam nessas mudanças está a maneira como as

pessoas interligam aspectos materiais disponíveis na sociedade, de signos

perceptivos e simbólicos relacionados a natureza e a cultura, e “expressões-

sínteses de sentimentos, de emoções” vivenciados no mundo sócio-cultural.

Os estudantes que freqüentam a escola média, ao desenvolverem

fazeres artísticos por meio das linguagens e códigos da música, artes

visuais, dança, teatro, artes audiovisuais podem aprender a desvelar uma

pluralidade de significados de interferências culturais, econômicas,

políticas atuantes nessas manifestações culturais (PCNEM – Linguagem,

Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 49-50).

Competências e habilidades a serem desenvolvidas em Arte

Os traços gerais dados pelo PCNs aqui serão apresentados; porém, ao

se tratar das especificidades de cada linguagem artística, verificaremos apenas as

propostas para o ensino de teatro.

O desenvolvimento das competências em Arte está diretamente ligado

à prática dos modos de fazer artístico e das “maneiras de fazer apreciações e

fruições em cada linguagem da Arte ou em várias possibilidades de articulação”.

Para uma compreensão mais ampla, há necessidade de que essas práticas sejam

acompanhadas de pesquisa, reflexão, troca de idéias e contextualização histórica e

sócio-cultural.

A escolha do que será trabalhado em cada série do Ensino Médio deve

ser cuidadosa e procurar conteúdos que envolvam os estudantes e possibilitem um

“exercício de colaboração artística e estética com outras pessoas com as quais

convivem, com a sua cultura e com o patrimônio artístico da humanidade”. A

apresentação dos conteúdos escolhidos deve ser feita de maneira viva e instigante.

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O intuito do processo de ensino-aprendizagem de Arte é, assim, o de

capacitar os estudantes a humanizarem-se melhor como cidadãos

inteligentes, sensíveis, estéticos, reflexivos, criativos e responsáveis, no

coletivo, por melhores qualidades culturais na vida dos grupos e das

cidades, com ética e respeito pela diversidade (PCNEM – Linguagem,

Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 50).

“Realizar produções artísticas, individuais e/ou coletivas, nas

linguagens da arte analisando, refletindo e compreendendo os diferentes

processos produtivos, com seus diferentes instrumentos de ordem material e ideal,

como manifestações socioculturais e históricas”. Por meio dessa competência

espera-se que o aluno possa compreender o fazer artístico em toda a sua

complexidade, não só na técnica como no pensamento que envolve todo processo

de criação artística.

Ao longo do processo de criação, é necessário que se realizem

constantes análises, reflexões e, muitas vezes, adaptações do projeto inicial. As

mudanças podem ser feitas tanto nas questões materiais – que no caso de uma

criação teatral são os gestos, por exemplo - quanto aos elementos mais formais

que envolvem as idéias do artista.

No caso do ensino de teatro, as competências dos alunos

caracterizam-se por saber: criação de possibilidades expressivas com os

elementos próprios do teatro – corpo, face, voz, movimento, gesto; improvisar,

interpretar e atuar personagens, tipos, coisas, situações; compreender a relação

palco/platéia e atuar sob esse acordo; pesquisar, analisar e adaptar textos visando

a montagem teatral.

“Apreciar produtos de arte, em suas várias linguagens,

desenvolvendo tanto a fruição quanto a análise estética, conhecendo, analisando,

refletindo e compreendendo critérios culturalmente construídos e embasados em

conhecimentos afins, de caráter filosófico, histórico, sociológico, antropológico,

psicológico, semiótico, científico e tecnológico, dentre outros” (p. 52).

É esperado que, além de criar, os alunos sejam capazes de apreciar,

porém devem aprender a realizar uma apreciação crítica e reflexiva. Para que

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possam ser críticos é preciso que saibam reconhecer os elementos trabalhados e

as maneiras exploradas pelo artista. Espera-se que os alunos se tornem

competentes para apreciação em teatro: “observar trabalhos teatrais como

participantes espectadores e pesquisar em acervos de memória outras

experiências significativas de artistas e técnicos de teatro que se relacionem com

suas experiências e preocupações” (p. 54).

“Analisar, refletir, respeitar e preservar as diversas manifestações da

arte – em suas múltiplas linguagens – utilizadas por diferentes grupos sociais e

étnicos, interagindo com o patrimônio nacional e internacional, que se deve

conhecer e compreender em sua dimensão sócio-histórica” (p. 54).

O fundamental dessa competência é que o aluno seja capaz de

contextualizar as produções artísticas que realiza e as que aprecia. Percebendo a

influência sócio-histórica na construção da cultura, o aluno desenvolve o sentido da

construção das identidades e convivência com as diversidades culturais.

“Valorizar o trabalho dos profissionais e técnicos das linguagens

artísticas, dos profissionais da crítica, da divulgação e circulação dos produtos de

arte”. (pág. 54)

Além de apreciar e produzir, é importante que o aluno seja capaz de

valorizar as manifestações artísticas de grupos sociais diferentes em tempo e

espaço diversificados, atentando para as qualidades específicas de cada uma e

respeitando a sua manifestação.

Com o intuito de valorizar as produções de teatro os alunos devem:

aprofundar seus conhecimentos da história e estética do teatro, para distinguir a

linguagem e os códigos cênicos; valorizar toda rede de profissionais e técnicos

envolvidos na produção teatral e na crítica e divulgação da mesma. Os PCNs

salienta a importância de permanente aperfeiçoamento do professor de Arte para

que a qualidade do trabalho seja coerente com as propostas.

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Na finalização do PCNEM – Área de Linguagens, Códigos e suas

Tecnologias há um pequeno capítulo “Rumos e Desafios” que nos traz reflexões

interessantes sobre a prática nessa Área do conhecimento.

A fala, a escrita, os movimentos corporais, a arte estão intimamente

ligados à cognição, à percepção, à ação, sendo expressões da cultura.

Todos os sistemas procuram tornar os significados comunicáveis. As

linguagens se afastam no plano da expressão, constituindo formas

próprias de manifestação, e voltam a se encontrar no plano do conteúdo,

pano de fundo da construção humana dos símbolos (PCNEM –

Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 64).

Para o sucesso na comunicação o aluno deve dominar todo o código,

inclusive em suas manifestações mais subjetivas que exijam reflexão e

distanciamento da situação. A apreciação e produção artística integram a área na

perspectiva de recuperar as “formas instituídas de construção do imaginário

coletivo”. Dessa maneira, o contexto sócio-cultural e histórico é compreendido

como fundamental para o entendimento da produção de significado.

A interação entre as diversas linguagens que compõem a Área é

sugerida para que se alcance uma maior inter-relação dos sistemas de linguagem,

porém sem deixar as especificidades de cada uma. O professor também deve ter

uma postura de interação, abrindo espaço para discussão e crítica das

manifestações dos grupos sociais em que os alunos estão inseridos.

4.3 Análise Comparativa dos Parâmetros Curriculares Nacionais

Inicialmente gostaria de comentar a maneira que enxergo cada PCN,

ponderando as questões teóricas do pensamento geral do MEC para a Educação

Básica em relação ao aprendizado em Arte.

No Parâmetro Curricular Nacional para o Ensino Fundamental

encontramos uma visão mais técnica do ensino de Arte que é tratada como

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conhecimento vasto a ser explorado em todo o seu conteúdo técnico, histórico,

cultural, documental, apreciativo. Não há menção a qualquer relação com outras

linguagens ou disciplinas escolares. A estrutura pela qual o PCNEF é apresentada

não deixa espaço para reflexão, discussão e possíveis mudanças; tendemos a

perceber as propostas como metas a seguir.

No PCNs para Ensino Médio, o ensino de Arte passa a ter um caráter

de formação de identidade e contextualização sócio-histórica; as questões técnicas

da produção e apreciação em arte também são conteúdos exigidos. A preocupação

com a esfera cognitiva e com a linguagem vêm em primeiro plano, começando pelo

fato de Arte fazer parte da Área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias dentro

do PCNs. A apresentação do PCNEM nos instiga a discussão, favorecendo a

reflexão do material proposto.

Verifico na leitura de ambos os Parâmetros um indicativo pioneiro, que

deve ser valorizado: tratar a Arte como área essencial do conhecimento humano a

ser trabalhada na escola, de maneira madura e responsável. Sabendo da trajetória

do Ensino da Arte dentro das escolas brasileiras nota-se aí um enorme avanço, em

que a Arte não mais é tratada como acessório às demais disciplinas ou como

disciplina decorativa.

Nesse aspecto, percebo no PCNs do Ensino Médio maior maturidade e

equilíbrio, tratando os conteúdos de Arte em seus aspectos e elementos

particulares, mas também, relacionando-os com os demais conteúdos da Área na

qual está inserida – área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Isso deve

permitir aos alunos uma visão mais contextualizada da própria Arte, entendendo-a

como produção intrínseca da Humanidade. De maneira geral, identifico na

elaboração do texto do PCNEM um maior respeito às propostas e idéias do MEC,

porém propiciando um aprofundamento nas questões da prática de ensino na Área.

No PCNs para o Ensino Fundamental podemos encontrar um grande

aprofundamento nos conteúdos que devem ser trabalhados, porém falta coerência

com as próprias propostas. Fala-se tanto em contextualização e essa idéia só é

trabalhada nos conteúdos quando se trata de contextualizar uma obra de arte em

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seus aspectos formais e históricos após sua apreciação, não em relação à história

da Humanidade ou à produção de linguagem. Mesmo com o alto grau de detalhes

dos conteúdos propostos vejo como grave a falta de uma exploração das questões

cognitivas e de contextualização da Arte.

Em relação ao ensino específico do Teatro encontramos - nos dois

PCNs - a mesma estrutura de trabalho: saber fazer, saber apreciar, saber

contextualizar. Para ambas a pesquisa, a vivência e a noção da construção

histórico-social da Arte são fundamentais para o aprendizado na área. Podemos

identificar nas propostas do PCNEF para Teatro um detalhamento maior sobre o

que se deve/pode trabalhar nos conteúdos e o que se deve procurar alcançar nos

objetivos; há um investimento em promover um conhecimento aprofundado na

Área.

No PCNEM a consciência para um trabalho com teatro (arte) de

maneira mais natural e prazeroso pode ser percebida na maneira como se colocam

as propostas – não exigem um aprofundamento teórico e prático tão intenso como

no PCNEF – visando sempre que os conhecimentos específicos sejam

contextualizados na construção simbólica dos próprios alunos. Além de reforçar, no

final de seu texto, a importância do aprimoramento e valorização do próprio

professor de arte.

Devemos levar em consideração ainda, o tempo destinado ao trabalho

da disciplina Arte e, especificamente do teatro, em cada contexto escolar. Durante

o Ensino Fundamental (quatro anos) e o Ensino Médio (três anos) são destinadas

duas aulas semanais para Arte e, enquanto as Leis de Diretrizes e Bases da

Educação nos cobra o ensino de todas as linguagens da Arte (música, artes

visuais, teatro e dança), não encontramos nas unidades de ensino profissionais

formados nas diversas linguagens da arte.

Após analisar a estrutura e as idéias gerais dos PCNs e aproveitando

os comentários já feitos, faremos a análise dos temas propostos como foco da

pesquisa. O primeiro item importante é a profundidade e complexidade dos

conteúdos a serem ensinados para cada faixa escolar.

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Pudemos observar no PCN para o Ensino Fundamental a existência de

grande profundidade e complexidade técnica e teórica do conteúdo artístico teatral.

As propostas envolvem detalhamentos exigidos de profissionais da área e buscam

um constante aperfeiçoamento do aluno como fazedor da arte, pesquisador e

apreciador – um apreciador com opiniões formadas dentro de profundo estudo dos

elementos formais da produção teatral, formação de um crítico de arte.

Os aspectos sociais e culturais são trabalhados no PCNEF apenas na

associação com a produção ou na pesquisa teatral. O aluno deve, com a

orientação do professor, procurar em acervos públicos e bibliotecas, dados que

contribuam para o seu conhecimento histórico e para contextualização sócio-

cultural do espetáculo teatral que assistiu, da peça que leu, deseja montar ou que

foi proposta pela professora.

Não encontramos no PCNEF qualquer idéia ou proposta de

interdisciplinaridade, mesmo que parta do conteúdo estudado pela disciplina Arte-

teatro.

O PCN para o Ensino Médio já nos mostra uma idéia mais próxima da

interdisciplinaridade desde o início de sua apresentação, classificando o ensino do

teatro (dentro da disciplina Arte) como parte fundamental da Área de Linguagens,

Códigos e suas Tecnologias. Durante a leitura do texto, podemos perceber

algumas interferências de outras áreas do conhecimento, deixando a cargo do

professor optar ou não por realizar uma ligação direta dentro da escola e com

outros professores.

Outro fator fundamental nesse PCN é a questão sócio-cultural que

aparece como estruturante na redação do documento. É a partir do contexto sócio-

cultural que o MEC posiciona a Arte na área de linguagem e códigos, como parte

integral na construção de significados na sociedade. Portanto, considera que as

produções teatrais têm um laço essencial com as circunstâncias históricas e

sociais nas quais foram realizadas, incluindo as que são produzidas pelos alunos

no contexto escolar. Tais aspectos devem ser trabalhados com os alunos com o

intuito de conscientizá-los de seu papel na produção, preservação e transmissão

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de cultura e como ser social dentro de uma estrutura política da qual é participante

e formador.

Em relação aos conteúdos propostos pelo PCNEM podemos identificar

os mesmos traços encontrados no PCNEF – o ensino de elementos técnicos e

teóricos por meio do fazer, pesquisar e apreciar -, porém há preocupação de que

sejam conteúdos escolhidos a partir do que conhecimento do grupo social a que

estarão sendo propostos. Deve-se considerar o universo sócio-cultural do aluno e

envolvê-lo na busca do conhecimento artístico-teatral, esse é adquirido no decorrer

do processo de criação e apreciação.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Gostaria de, antes de me posicionar especificamente sobre a discussão

proposta, citar um trecho do livro de Ricardo Japiassu, Metodologia do Ensino de

Teatro, no qual faz uma referência ao pensamento de Vygotsky. Acredito que seja

a idéia primeira desse trabalho na medida em que tenta nos lembrar do importante

papel do ensino de Teatro, dentre as Artes, para a formação do indivíduo.

As artes, entendida como formas humanas de expressão semiótica, ou

seja, como processos de representação simbólica para comunicação do

pensamento e dos sentimentos do ser humano, fizeram com que seu

valor e importância na formação do educando fossem concebidos em

novas bases. Sabe-se, hoje, que a principal característica que distingue o

ser humano das outras espécies animais é o uso social de signos para a

comunicação, controle, organização e transformação de seu

comportamento. Esse uso dos símbolos como instrumentos psicológicos

afeta de forma irreversível o funcionamento mental humano, bem como a

estrutura das relações entre pessoas intra e intercultural (Vygotsky, 1987

e 1998 apud JAPIASSU, 2003, p.22).

Lembrado, então, a fundamental importância da Arte, no nosso caso,

especialmente do teatro na formação psico-social do aluno, podemos começar a

pontuar algumas questões que vêm sendo expostas neste trabalho, desde o início.

Mesmo sem analisar o material já me depararei com um erro crasso no

sistema de ensino, que pode ser formulado pela seguinte pergunta: como os

Parâmetros Curriculares Nacionais e Leis de Diretrizes e Bases não chegam à

escola? Mesmo sendo um material essencial para a construção de uma proposta

pedagógica consciente, para discussões em Planejamento Anual e mesmo em

reuniões pedagógicas a maioria dos profissionais da área desconhecia o conteúdo

dos documentos.

Depois de constatar essa falha, pude perceber outro equívoco grave:

algumas das propostas dos PCNs eram incompatíveis ou ignoravam as Leis de

Diretrizes e Bases e outros pareceres e decretos do Ministério da Educação e da

Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. É o que encontrei, por exemplo,

nos PCNs EM e EF, nos quais há uma grande barreira na relação de

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interdisciplinaridade ou de transdisciplinariedade - nem são citadas - , mas que são

propostas que fazem parte de diversos pareceres do MEC como: Parecer

CNE/CEB no4, de 29 de janeiro de 1998 (que trata das Diretrizes Curriculares para

o Ensino Fundamental) e o Parecer CEB no 15, de 1 de junho de 1998 (trata das

Diretrizes Curriculares do Ensino Médio). O ideal seria encontrarmos um equilíbrio

entre o conteúdo “em simesmado” e o diálogo entre conteúdos de outras

disciplinas.

Tal preocupação em demasiado aprofundamento teórico e prático na

área para as crianças, pré-adolescentes e adolescentes do Ensino Fundamental

pode tornar os alunos até mesmo arredios aos conhecimentos em Teatro. É o que

nos alerta Richard Courtney: “Educação Dramática, portanto, não implica em

treinar as crianças para o palco”, pois há um exagero em algumas novas teorias de

resgate do teatro, encontramos isso em certa medida nos PCNEF.

Mesmo com algumas especificidades em suas teorias, pudemos

concluir, a partir da unanimidade dos autores, que só se aprende com prazer e

envolvimento; em outras palavras e mais diretiva na nossa questão central: o teatro

só se aprende através do jogo, o jogar é similar ao brincar. Conhecendo ainda as

propostas dos PCNEF e as idéias do MEC de que se trabalhe todas as linguagens

da Arte durante os nove anos do EF, onde poderemos encontrar um momento para

“gostar” de Arte?

O contato com a Arte deve se dar de maneira mais prazerosa e natural,

trazendo aos poucos elementos que façam os alunos refletir sobre questões

condizentes com sua faixa etária e com seu universo cultural. O grande desafio é

fazer com que a Arte faça parte da vida desses alunos e que eles possam

compreendê-la em sua amplitude teórica, prática, histórico-social e que possam

participar da construção de significados artísticos e estéticos.

As propostas do PCNEF buscam um aperfeiçoamento técnico e teórico

em todas as áreas da Arte - vimos apenas a do teatro e já nos parece um currículo

digno de curso universitário – de alunos que iniciaram a sua alfabetização, que

acabaram de sair do Jardim, do Pré onde a brincadeira era possível, estimulada.

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As muitas linguagens artísticas que devem ser trabalhadas agora como

“disciplinas” que carregam todo um peso teórico; até momentos atrás, eram

tratadas como recreação, parte do cotidiano ou lazer na vida das crianças.

Além desses fatos, as condições das escolas para o trabalho com Arte

– não há material, espaço ou profissionais, pois eles são formados apenas em uma

das linguagem da Arte – ,torna inviável, ou até, impossível o trabalho aprofundado

proposto pelos PCNs, tanto em relação aos profissionais quanto ao tempo

disponível – como trabalhar todas as linguagens da Arte com todo o

aprofundamento desejado em tão pouco tempo?

As linhas gerais dos PCNs são respeitadas, porém levadas a

interpretações diferentes. Acredito ser valiosa a parceria que o PCN para o Ensino

Médio faz com as diferentes Linguagens que foram criadas, elaboradas e lapidadas

pelo homem ao longo de sua História. O que mais me instigou no PCNEF foi: há

uma desvinculação ou pouco interesse nas questões cognitivas e de linguagem

nas quais está mergulhado o universo da arte e da estética. É essencial que a

compreensão dessas linguagens seja trabalhada paralelamente na escola, no

intuito de enriquecer a construção da própria linguagem dos alunos e da

compreensão do universo em que vivem.

Encontramos nos PCNEM uma ligação forte entre as linguagens,

porém ainda não há sugestão, insinuação ou estímulo à interdisciplinaridade;

poderíamos considerar que ambos PCNs falham nesse aspecto.

Em relação à distribuição temporal e profundidade de conteúdos em

teatro propostos para o Ensino Médio, acredito que haja uma maior coerência e

maturidade. Os conteúdos são todos trabalhados a partir do interesse e do

universo dos alunos, como meio de identificação sócio-cultural e de envolvimento

em prol dos conhecimentos específicos da linguagem teatral. Porém, ainda há a

proposta de se trabalhar todas as linguagens artísticas e, são apenas duas aulas

semanais, por três anos de ensino. Ainda há o agravante de que algumas escolas

optam por substituir as aulas de Arte do último ano por “alguma disciplina mais

importante para o vestibular”, como o que ocorre nas escolas particulares e

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públicas que substituem essa aula por aulas de física, matemática, química ou

biologia.

Essa relação com o ensino de arte-teatro ainda não foi superada e as

aulas ainda são vistas como desperdício de tempo. Na escola onde leciono há

turmas do 3o ano do Ensino Médio sem aula de Arte; toda vez que cruzam comigo

pelos corredores me questionam o por quê.

Também encontramos no PCNEM uma proposta mais elaborada em

relação aos aspectos sociais e culturais, tanto das questões da própria disciplina

como dos alunos. A área em que se “encaixa” o ensino do teatro é tratada como

estrutura fundamental da construção da humanidade como a conhecemos,

reforçando a comunicação como elemento diferencial da sociedade humana e

diferente nas comunidades nas quais se divide.

Essa diversidade deve ser respeitada e trabalhada em sala de aula; as

idéias centrais dessas culturas trazidas pelos alunos são transformadas em

alicerces para o conhecimento a ser adquirido. Lapida-se, aprofunda-se e valoriza-

se o que é a base para construção de significado.

Percebemos que há muitos avanços na concepção de uma idéia de

ensino de Arte e, especialmente de teatro ao longo desse último século. Temos

inúmeros teóricos trabalhando para criar teorias profundamente enraizadas no

pensamento científico de diversos campos do conhecimento, com o intuito de

envolver a todos na recuperação do que é, ou pode ser, a melhor estratégia para

se ter um aprendizado atraente, envolvente, capaz de ensinar o que é essencial - o

conhecimento cognitivo, capacidade de solucionar problemas e a capacidade de

criar, sem deixar de lado o respeito e valorização do grupo e o respeito e

reconhecimento da própria identidade.

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7. BIBLIOGRAFIA DE APOIO:

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