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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO O VALOR DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIAL ANTONIO ROBERTO DE GODOY FILHO Itajaí (SC), novembro de 2010.

O VALOR DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIALsiaibib01.univali.br/pdf/Antonio Roberto de Godoy Filho.pdf · INQUÉRITO POLICIAL ... alcance temático e de abordagem para a atividade

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA UNIVALI CENTRO DE CINCIAS SOCIAIS E JURDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O VALOR DA PROVA PRODUZIDA NO INQURITO POLICIAL

ANTONIO ROBERTO DE GODOY FILHO

Itaja (SC), novembro de 2010.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA UNIVALI CENTRO DE CINCIAS SOCIAIS E JURDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O VALOR DA PROVA PRODUZIDA NO INQURITO POLICIAL

ANTONIO ROBERTO DE GODOY FILHO

Monografia submetida Universidade do Vale do Itaja UNIVALI, como

requisito parcial obteno do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc. Carlos Roberto da Silva.

Itaja (SC), novembro de 2010.

AGRADECIMENTO

A todas as pessoas que fazem parte do meu

crculo familiar, amo muito vocs, a todos os

professores desta instituio de ensino e aos

meus caros colegas de classe!

Ao Doutor Carlos pela ajuda e solicitude

constante, e por me aceitar como seu orientando.

Que Deus o abenoe!

TERMO DE ISENO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideolgico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itaja, a coordenao do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itaja (SC), novembro de 2010.

Antonio Roberto de Godoy Filho Graduando

PGINA DE APROVAO

A presente monografia de concluso do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itaja UNIVALI, elaborada pelo graduando Antonio Roberto de Godoy Filho,

sob o ttulo O Valor da Prova Produzida no Inqurito Policial, foi submetida em

[Data] banca examinadora composta pelos seguintes professores: Carlos

Roberto da Silva e Ary Capella Neto, e aprovada com a nota.

Itaja (SC), novembro de 2010.

Carlos Roberto da Silva Orientador e Presidente da Banca

Antonio Augusto Lapa Coordenao da Monografia

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CPP Cdigo de Processo Penal Brasileiro STF Supremo Tribunal Federal P. Pgina Ed. Edio V. Volume RT Revista dos Tribunais Cf. Conforme CF Constituio Federal CRFB Constituio da Repblica Federativa do Brasil Art. Artigo Rel. Relator Min. Ministro DJU Dirio de Justia da Unio STJ Superior Tribunal de Justia TJSP Tribunal de Justia de So Paulo

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o autor considera estratgicas

compreenso do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Inqurito Policial

Um procedimento de investigao administrativa, em sentido estrito, que

mediante a atuao da polcia judiciria guarda finalidade de apurar a

materialidade da infrao penal, cometida ou tentada, e a respectiva autoria, ou

coautoria para servir ao titular da ao penal condenatria.1

Polcia Judiciria

A polcia judiciria ser exercida pelas autoridades policiais no territrio de suas

respectivas circunscries e ter por fim a apurao das infraes penais e da

sua autoria (art. 4, do Cdigo de Processo Penal).

Prova

Todo meio legal, usado no processo, capaz de demonstrar os fatos alegados em

juzo. A prova deve ter como objetivo principal o convencimento do juiz.2

1 TUCCI, Rogrio Lauria. Prescrio Penal, Priso e Liberdade. Ed. Saraiva: 1980.

2 GUIMARES, Deocleciano Torrieri. Dicionrio Juridico. 2ed. So Paulo: Rideel, 1998.

SUMRIO

RESUMO ......................................................................................... VIII

INTRODUO ................................................................................... 1

CAPTULO 1 ..................................................................................... 3

1. INQURITO POLICIAL....................................................................................... 3 1.1 ASPECTO HISTRICO................................................................................................................................ 7

1.2 LUZ DO DIREITO COMPARADO ........................................................................................ 11 1.3 NATUREZA JURDICA .............................................................................................................................. 14

CAPTULO 2 .................................................................................... 17

2. SISTEMAS PROCESSUAIS E PROCEDIMENTO POLICIAL........ .................. 17 2.1. SISTEMA ACUSATRIO, INQUISITRIO E MISTO .............................................................. 17 2.1.1. SISTEMA INQUISITRIO ..................................................................................................................... 18 2.1.2. SISTEMA ACUSATRIO: O SISTEMA BRASILEIRO. ....................................................................... 19 2.1.3. SISTEMA MISTO ....................................................................................................................... 22 2.2 PAPEL DA POLCIA JUDICIRIA. .......................................................................................... 24 2.3. INSTAURAO DO INQURITO POLICIAL .......................................................................... 34

CAPTULO 3 .................................................................................... 39

3. VALOR PROBATRIO DO INQURITO POLICIAL ...................................... 39 3.1.DAS PROVAS NO INQURITO POLICIAL .............................................................................. 39 3.1.2. ATIVIDADE PROBATRIA ................................................................................................................... 43

3.2.DO CONTRADITRIO E DA AMPLA DEFESA ....................................................................... 47 3.2.1. AMPLA DEFESA ................................................................................................................................... 48 3.2.2. DO CONTRADITRIO ........................................................................................................................... 50

3.3. O VALOR DA PROVA PRODUZIDA NO INQURITO POLICIAL .......................................... 52

CONSIDERAES FINAIS .............................................................. 60

REFERNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 66

RESUMO

A presente monografia tem como objetivo avaliar o valor da

prova produzida no inqurito policial, sendo o seu objetivo geral de conceber o

conceito, o aspecto histrico, natureza jurdica, origem e a sua aplicao e

diferenas no direito comparado. No segundo captulo, abordando sistemas

processuais: acusatrio, misto e inquisitivo, alm disso, o papel da polcia

judiciria: competncia e atribuies, aps, explanar-se- a instaurao do

inqurito policial. No terceiro captulo, tratando das provas no inqurito policial,

dos princpios do contraditrio e da ampla defesa, da atividade probatria e do

valor que essas provas (produzidas no inqurito policial) tm, em tese, para se

condenar a outrem.

INTRODUO

A presente Monografia tem como objeto o valor da prova

produzida no inqurito policial.

O seu objetivo produzir uma monografia para a obteno

do grau de bacharel em direito.

Para tanto, principiase, no Captulo 1, tratando do conceito,

aspecto histrico, natureza jurdica, origem e o seu panorama consoante o direito

comparado.

No Captulo 2, tratando de sistemas processuais: acusatrio,

misto e inquisitivo. Alm disso, o papel da polcia judiciria: competncia e

atribuies. Por fim, a instaurao do inqurito policial.

No Captulo 3, tratando das provas no inqurito policial, dos

princpios do contraditrio e da ampla defesa. No final, ser abarcado o tema do

valor da prova produzida no inqurito policial.

O presente Relatrio de Pesquisa se encerra com as

Consideraes Finais, nas quais so apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulao continuidade dos estudos e das reflexes

sobre o valor da prova produzida no inqurito policial.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipteses:

1. O inqurito policial um procedimento administrativo,

preparatrio e inquisitivo.

2. O inqurito policial no indispensvel ao ajuizamento

da ao penal.

2

3. invivel haver uma condenao embasada,

exclusivamente, em prova inquisitorial.

Quanto Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigao3 foi utilizado o Mtodo Indutivo4, na Fase de Tratamento de

Dados o Mtodo Cartesiano5, e, o Relatrio dos Resultados expresso na presente

Monografia composto na base lgica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Tcnicas do Referente6, da Categoria7, do Conceito Operacional8 e da Pesquisa

Bibliogrfica9.

3 [...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

4 [...] pesquisar e identificar as partes de um fenmeno e colecion-las de modo a ter uma percepo ou concluso geral [...].PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 104.

5 Sobre as quatro regras do Mtodo Cartesiano (evidncia, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurdica. 5 ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

6 [...] explicitao prvia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temtico e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa. PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 62.

7 [...] palavra ou expresso estratgica elaborao e/ou expresso de uma idia. PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 31.

8 [...] uma definio para uma palavra ou expresso, com o desejo de que tal definio seja aceita para os efeitos das idias que expomos [...].PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 45.

9 Tcnica de investigao em livros, repertrios jurisprudenciais e coletneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Prtica da Pesquisa jurdica e Metodologia da pesquisa jurdica. 10 ed. Florianpolis: OAB-SC editora, 2007. p. 239.

Captulo 1

INQURITO POLICIAL

Acerca dessa temtica, consoante a explanao do

doutrinador Djalma Eutmio de Carvalho, inqurito policial um procedimento

administrativo, consubstanciado num conjunto de diligncias realizadas pela

polcia judiciria, com o intuito de elucidar as infraes penais e sua autoria.

No que concerne ao relato exposto, corrobora Nogueira:

O inqurito policial uma pea investigatria porque se

destina a fazer investigaes sobre o fato criminoso e seu

autor. No tem rito preestabelecido para sua elaborao,

mas deve obedecer a certa ordem, com o interrogatrio do

indiciado depois de colhidas certas provas. Tambm

chamado inquisitivo por causa da discricionariedade da

autoria que comanda as investigaes.10

Da mesma forma, Mondin:

[...] Inqurito policial, apreciado em seus vrios aspectos, o

registro legal, formal e cronologicamente escrito, elaborado

por autoridade legitimamente constituda, mediante o qual

esta autentica as suas investigaes e diligncias na

apurao de infraes penais, das suas circunstncias e dos

seus autores.11

10

NOGUEIRA, Paulo Lucio. Curso Completo de Processo Penal. 11ed. So Paulo: Saraiva, 2000. p 26. 11

MONDIN, Augusto. Manual de Inqurito Policial. So Paulo: Sugestes Literrias, 1990. P. 5

4

Ao se analisar o conceito de inqurito policial, nota-se que

um procedimento administrativo, preparatrio e inquisitivo, presidido pela

autoridade policial, e constitudo por um complexo de diligncias realizadas pela

polcia, no exerccio da funo judiciria, com vistas apurao de uma infrao

penal e identificao de seus autores.12

Em rpidas, porm precisas palavras, Vlter Kenji Ishida

leciona o significado da palavra inqurito, prescrevendo: inqurito vem de inquirir,

indagar. 13

Corrobora para este conceito de inqurito policial, Romeu de

Almeida Salles Jnior: O inqurito todo procedimento policial destinado

reunio de elementos acerca de uma infrao penal. 14

No mesmo liame, Jos Geraldo da Silva, o inqurito tem por

escopo apurao dos fatos, suas circunstncias e definio da autoria do delito,

com vistas a servir de base Ao Penal e s providncias cautelares.15

Nesse sentido, o inqurito policial, no passa de mero

expediente administrativo, que visa apurar a prtica de uma infrao penal com a

delimitao da autoria e as circunstncias em que a mesma ocorrera, sem o

escopo de infligir pena a quem seja objeto desta investigao.16

Ademais, o conjunto dos atos praticados pela Polcia

acerca do fato reputado criminoso e dos responsveis pela prtica do mesmo. O

inqurito policial se destina a instruir a propositura da ao penal. Deve proceder

ou servir de base ao processo repressivo. O inqurito policial um processo

meramente administrativo, que no est adstrito s frmulas do processo em

geral; pois tem existncia parte, assim como est a cargo de funcionrios

especiais.17

Alm disso, o Inqurito Policial a formalizao de toda a

investigao levada a efeito pela Polcia Civil; o procedimento legal que se

12

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4 ed. So Paulo: Saraiva, 2009.p.104. 13

ISHIDA, Vlter kenji. Processo Penal. So Paulo: Atlas, 2009, p. 43. 14

SALLES JUNIIOR, Romeu de Almeida. Inqurito Policial e Ao Penal. 7 ed. So Paulo: Saraiva, 1998, p. 15. 15

SILVA, Jos Geraldo. O Inqurito Policial e a Polcia Judiciria. 2ed. So Paulo: De Direito, 1996 16

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 14ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.p.17. 17

ROSA, Inocncio Borges da.Processo Penal Brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1942.p.110.

5

destina a reunir todos os elementos e circunstncias de um fato delituoso, com

concluso clara e possvel de autoria e materialidade.18

Em sntese, entende-se que o inqurito policial o conjunto

de diligncias realizadas pela Polcia Judiciria para a apurao de uma infrao

penal e sua autoria, para que o titular da ao penal possa ingressar em juzo,

pedindo a aplicao da lei ao caso concreto.19

Ademais, com supedneo no preconizado por Lopes Jnior:

A funo de filtro processual contra acusaes infundadas

incumbe, especialmente, chamada fase intermediria, que serve

como elo entre a investigao preliminar e o processo ou no

processo. Sem embargo, esse apenas um momento

procedimental em que se realiza um juzo de valor, mais

especificadamente, de pr-admissibilidade da acusao, com

base na atividade desenvolvida anteriormente e no material

recolhido. inegvel que o xito da fase intermediria depende

inteiramente da atividade preliminar, de modo que transferimos a

ela o verdadeiro papel de evitar as acusaes infundadas.20

Trata-se de uma instruo provisria, preparatria,

informativa, em que se colhem elementos por vezes difceis de obter na instruo

jurdica, como auto de flagrante, exames periciais etc.21

No intuito de complementar, o conjunto de diligncias

realizadas pela Polcia visando a investigar o fato tpico e a apurar a respectiva

autoria.22Porquanto, constitui-se numa pea meramente investigatria, escrita,

18

THOM, Ricardo Lemos, 1961. Contribuio prtica de polcia judiciria. Florianpolis: Ed do Autor, 1997.p.87. 19

SALLES JNIOR, Romeu de Almeida. Inqurito Policial e Ao Penal. 7ed. So Paulo: Saraiva, 1998.p.3. 20

LOPES JNIOR, Aury Celso. Sistemas de Investigao Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2002.p.46. 21

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 82. 22

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Cdigo Processo penal Comentado. 8 ed. So Paulo: Saraiva, 2005. p. 27.

6

sigilosa, destinada a obter elementos do fato delituoso e da respectiva autoria

para fundamentar a ao penal.23

De acordo com o preceituado por Jos Frederico Marques, o

inqurito, como conjunto de atos procedimentais, o instrumento formal da

investigao realizada pela polcia judiciria para instruir os rgos da

acusao.24 Inqurito Policial, in genere, todo procedimento legal destinado a

reunio de elementos preliminares acerca de uma infrao penal. a instruo

extrajudicial.25

Por fim, constitui-se por um conjunto de diligncias

realizadas pela polcia judiciria para apurao de uma infrao penal e de sua

autoria, a fim de que o titular da ao penal possa ingressar em juzo (CPP,

art.4). Trata-se de procedimento persecutrio de carter administrativo presidido

pela autoridade policial, e supervisionado pelo Ministrio Pblico (custos legis).

23

NOGUEIRA, Paulo Lucio. Curso Completo de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 1987. P. 64 24

MARQUES, Jos Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. 1d. Campinas: Bookseller, 1998.p. 148 25

ACOSTA, Walter P. O Processo Penal. 18ed. Rio de Janeiro: Coleo Jurdica, 1989.p.30.

7

1.1. ASPECTO HISTRICO

O termo inquisitio advm do verbo inquirir, procurar

informaes, indagar. Da a forma substantiva inqurito. Com a emancipao da

legislao brasileira, produto da emancipao poltica, j em 1841 havia lei

disciplinando os trabalhos de investigao policial dos crimes, suas circunstncias

e seus autores. Mas s trinta anos depois, por meio do Decreto n. 4.824, que

regulamentou a Lei n. 2.033, criou-se o inqurito policial com esse nomen jris.26

Ademais, nos idos de 1870, emergiu o decreto n. 4.824 de

22 de novembro de 1871; o art. 42 daquele diploma legal instituiu no Brasil o

inqurito policial, estabelecendo a separao entre a Polcia e o Poder Judicirio,

exarando o seguinte conceito: O inqurito consiste em todas as diligncias

necessrias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstncias e

de seus autores e cmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito.27

Com o surgimento da Repblica, houve a restaurao da

pea inquisitria. Mas, na dcada de 30, principiou-se nova campanha, que se

destinava substituio do processo policial de inquisio. Todavia, o Decreto-Lei

n. 3.689, de 03 de outubro de 1941, introduzindo o novo, e atual CPP (Cdigo de

Processo Penal), manteve-o, reservando-lhe todo o Ttulo II de seu texto.

Dessa forma, o pretendido juzo de instruo poca,

limitaria a funo policial, nos moldes do sistema policial ingls: a autoridade

policial teria misso meramente apuratria das provas. Na exposio de motivos

do atual Cdigo de Processo Penal, o Ministro da Justia, Francisco Campos,

justifica a preferncia pela conservao do inqurito policial, argumentando:

O preconizado juzo de instruo, que importaria limitar a funo

da autoridade policial a prender criminosos, averiguar a

materialidade dos crimes e indicar testemunhas, s praticvel

sob a condio de que as distncias dentro do seu territrio de

jurisdio sejam fcil e rapidamente superveis. Para atuar

proficuamente em comarcas extensas, e posto que deva ser

excluda a hiptese de criao de juizados de instruo em cada

26

MEHMERI, Adilson. Inqurito Policial (dinmica). So Paulo: Saraiva. P. 3, 4 e 5. 27

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4 ed. So Paulo: Saraiva, 2009.

8

sede do distrito, seria preciso que o juiz instrutor possusse o dom

da ubiqidade.

Uma das vantagens do Inqurito Policial est explcita no

seguinte excerto da Exposio de Motivos, a seguir:

ele (o Inqurito Policial) uma garantia contra os apressados e

errneos juzos, formados quando ainda persiste a trepidao

moral causada pelo crime ou antes que seja possvel uma exata

viso do conjunto dos fatos.

Na atual conjuntura, prevalecem os argumentos favorveis

existncia do inqurito policial. Desse modo, vale citar a Exposio de Motivos do

Cdigo de Processo Penal que leciona:

[...] Por que, ento, abolir-se o inqurito preliminar ou instruo

provisria, expondo-se a justia criminal aos azares do

detetivismo, s marchas e contramarchas de uma instruo

imediata e nica? Pode ser mais expedito o sistema de unidade

de instruo, mas o nosso sistema tradicional, com o inqurito

preparatrio, assegura uma justia menos aleatria, mais

prudente e serena.

Assim, infere-se que pode ser mais fcil abolir o inqurito

policial e instruir o processo apenas em juzo, no entanto, o inqurito policial

exerce a funo semelhante a um filtro processual, ou seja, rene elementos

suficientes acerca da autoria e da materialidade, para viabilizar o ajuizamento da

ao penal cabvel.

9

Pode-se dizer que, desde a Antiguidade, sempre houve o

processo investigatrio para apurao dos delitos, suas circunstncias e seus

autores.

O magistrado Guilherme de Souza Nucci leciona:

Passou a ser funo da polcia judiciria a sua elaborao. Apesar

de seu nome ter sido mencionado pela primeira vez na referida Lei

n. 2.033, suas funes, que so da natureza do processo criminal,

existem de longa data e tornaram-se especializadas com a

aplicao efetiva do princpio da separao da polcia e da

judicatura. Portanto, j havia no Cdigo de Processo de 1832

alguns dispositivos sobre o procedimento informativo, mas no

havia o nomen jris de inqurito policial. 28

Segundo Fustel de Coulanges, entre os antigos atenienses

j se delineava uma espcie de inqurito para apurar a probidade individual e

familiar daqueles que eram magistrados, dez dos quais chamados de

estnomos, que eram encarregados do servio policial (A cidade antiga, 7. Ed.,

Clssica Ed., v. 2, p. 151). Seria um tipo de sindicncia, de carter investigativo,

sem a presena de contraditrio.

No direito romano, esse processo comeou a ser

aprofundado no tocante s suas caractersticas, com o nomem juris de inquisitio,

ou seja, trabalhos investigatrios para se apurar as circunstncias do crime e

localizar o criminoso. Tratava-se de uma delegao de poderes feita pelo

magistrado prpria vtima ou parentes, que se transformavam em acusadores. 29

Essa inquisitio estendia-se ao acusado, concedendo-lhe o

direito de promover tambm inquisies, em busca de elementos inocentadores.

Por isso, se dizia contraditrio o processo.

28

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol 1.25ed. So Paulo: Saraiva, 1999.p. 62. 29

MEHMERI, Adilson. Inqurito Policial (dinmica). So Paulo: Saraiva, 1992.

10

S mais tarde, com a plena publicizao do jus puniendi,

que essa funo passou a ser exclusiva de agentes pblicos, formalmente

revestidos de poderes legais.

Por derradeiro, o Estado, sem querer abrir mo de seu

direito de punir, admitiu, contudo, a necessidade de autocontrole, isto , um meio

pelo qual esse poder repressivo encontrasse limites. Surgindo o reconhecimento,

segundo o qual a pena s poderia ser aplicada depois de submetido o indiciado a

um procedimento, mais ou menos formal, para a apurao dos fatos. Obteve-se o

definitivo amadurecimento da inquisitio.

11

1.2. LUZ DO DIREITO COMPARADO

Quanto ao inqurito policial luz do direito comparado

ressalta Antnio Evaristo de Moraes, em linhas gerais, que coexistem dois

sistemas no tocante s atribuies da Polcia e do Ministrio Pblico, na fase das

investigaes preliminares, correspondente ao nosso inqurito policial. De um

lado, h o sistema ingls, pelo qual a colheita preparatria de provas confiada

to s polcia. De outro, na maioria dos pases da Europa continental, cabe ao

Ministrio Pblico dirigir e at efetuar, diretamente, as investigaes.

30

Entre os dois sistemas, ingls e o continental, o legislador

ibrasileiro optou por aquele que estabelece uma diferenciao de tarefas, ou seja,

o sistema ingls que, incumbe polcia a realizao do inqurito, ainda que

admitida certa vigilncia por parte do Ministrio Pblico, a quem foi atribuda

funo de promover a ao pblica, pela Constituio da Repblica Federativa do

Brasil. No Cdigo de Processo Penal Portugus est estabelecido, em seu artigo

262, item 1, o conceito bem aplicvel a nosso direito:

O inqurito policial compreende o conjunto de diligncias que

visam investigar a existncia de um crime, determinar os seus

agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as

provas, em ordem deciso sobre a acusao.

Vale ressaltar que h vrios sistemas aliengenas que, ao

priorizar em suas reformas processuais o fortalecimento do Ministrio Pblico,

passaram a permitir de maneira ampla a investigao criminal pelo Parquet.

(LOPES JNIOR, 2001).

No sistema ingls, a polcia detm o poder de conduzir as

investigaes preliminares. Por sua vez, no sistema continental, o Ministrio

Pblico conduz a investigao criminal.

30

DE MORAES, Antnio Evaristo. As funes do ministrio pblico e o inqurito policial. P. 170 e 171. Disponvel em: . Acesso em: 23 de abril de 2010.

12

No sistema continental, encontramos como exemplo, a

Espanha, a Alemanha, a Frana e Portugal, que sero objeto de explanao mais

detalhada, a seguir:

Na Frana, a apurao das infraes penais cabe polcia

judiciria que age sob a direo do Ministrio Pblico. To logo tomam

conhecimento de uma infrao penal, os policiais procuram o Ministrio Pblico a

fim de obterem um "visto" para iniciarem as investigaes. medida que as

diligncias vo avanando, o Oficial ou o Agente de Polcia devem ter o cuidado

de prestar contas das investigaes ao titular da ao penal. 31

Na Espanha, as investigaes preliminares esto a cargo do

Juiz de Instruo que tem o Ministrio Pblico como seu auxiliar, e este tem como

auxiliares subordinados a polcia judiciria. J em Portugal, a "instruo

preparatria" secreta e fica a cargo do Promotor, estando a polcia judiciria na

posio de rgo auxiliar do Ministrio Pblico.32

Na Alemanha, a investigao preliminar est a cargo do

Ministrio Pblico, que dever investigar no s os atos que possam incriminar o

autor da infrao penal, como tambm os atos que possam eximi-lo da

condenao.

Ainda, em relao Alemanha. investigao preliminar tem

por fim apenas fornecer elementos para a propositura da ao penal e poder

recolher provas indicadas pelo sujeito passivo desde que relevantes para

determinar as conseqncias jurdicas do fato, mas apesar disso, o procedimento

secreto no podendo nem o imputado nem seu defensor assistir s diligncias

salvo algumas excees. 33

Na Repblica Democrtica da Alemanha (Deutschland

Bundesrepublik), a fase mediana obtida por meio duma audincia onde

permitido o contraditrio, analisado se cabvel a ao penal. A resoluo

tomada por um tribunal, o mesmo rgo que no caso de propositura da ao a

julgar. Alm disso, na Alemanha no existe o princpio da defesa tcnica

necessria para todos os juzos penais no Brasil.

31

Idem, Ibidem. 32

Idem, Ibidem. 33

Idem, Ibidem.

13

Em Portugal, o cdigo de processo penal portugus atual

entrou em vigor em 1988, e foi reformado em 1995 para se moldar ao Cdigo

Penal.

A investigao preliminar chamada de inqurito e est a

cargo do Ministrio Pblico que conta com a assistncia da polcia judiciria.

Existe tambm nesta fase a figura do juiz garantidor da instruo, garantindo a

legalidade e atuando tambm na colheita de provas, procedendo ao primeiro

interrogatrio etc., desde que sofra requisio do Ministrio Pblico, da polcia, do

assistente de acusao ou do sujeito passivo. Este juiz no poder atuar na fase

processual e tem o poder de deciso quanto pronncia (propositura da ao

penal) ou arquivamento. 34

Ademais, em Portugal, o inqurito tem o prazo mximo de 6

meses em caso de estar o sujeito passivo preso e de 8 meses se estiver em

liberdade; nos delitos mais graves os prazos so respectivamente de 8 e 12

meses e se limita colheita de provas que somente podero ser utilizadas para a

propositura da ao penal, no tendo utilidade na fase processual. Diverso do

sistema brasileiro em que, de regra, o prazo para concluir o inqurito policial,

consoante o art. 10 do CPP de 10 dias contados da data em que se executar a

ordem de priso, se preso preventivamente, ou em flagrante. Sendo de trinta dias

este prazo se o indiciado estiver solto, mediante fiana ou sem ela.35

Desse modo, o sistema adotado no Brasil o ingls, isto , a

polcia judiciria age com autonomia. Todavia, tem seus atos e atividades

supervisionadas pelo Ministrio Pblico.

Assim, neste subitem, foram analisadas as semelhanas e

diferenas no tocante aos procedimentos para a consecuo da persecuo

penal, por meio do inqurito policial em alguns sistemas penais aliengenas,

faltando abordar a natureza jurdica do inqurito policial.

34

Idem, Ibidem. 35

Idem, Ibidem.

14

1.3. NATUREZA JURDICA

A respeito da natureza jurdica da pea inquisitiva (inqurito

policial), consoante o doutrinador Djalma Eutmio de Carvalho a natureza jurdica

do inqurito policial o ato administrativo vinculado em que o delegado no tem

qualquer poder discricionrio quanto abertura do inqurito, forma de sua

conduo e o seu arquivamento. A abertura do inqurito policial um ato

administrativo vinculado. O meio de sua conduo o prescrito em lei e o seu

arquivamento solicitado pelo membro do Ministrio Pblico. 36

O inqurito policial formado por peas escritas (reduzidas

a termo). Porque procura investigar as infraes penais e respectiva autoria, o

inqurito apresenta a peculiaridade do sigilo. De fato, de nada valeria como pea

investigatria, se todos os seus atos devessem ser pblicos. O sigilo dever ser

resguardado pela prpria autoridade que o preside, sempre que necessrio para a

cabal apurao do fato criminoso (art. 20 do CPP).37

Segundo o art. 20, caput, do CPP: A autoridade assegurar

no inqurito o sigilo necessrio elucidao do fato ou exigido pelo interesse da

sociedade, ou seja, deve ser sigiloso.

O sigilo na fase inquisitiva uma medida cabvel, pois, caso

venha ocorrer a divulgao das atividades policiais investigatrias, poderia tal

divulgao criar srios embaraos ao esclarecimento do delito e sua autoria, com

a destruio de vestgios, intimidao e suborno de testemunhas, ocultao de

armas e instrumentos utilizados, bem como o comprometimento do trabalho de

pesquisa levado a termo pela polcia.38

uma pea sigilosa. No s no interesse das investigaes,

mas tambm do acusado e da prpria sociedade, durante a realizao do

36

CARVALHO, Djalma Eutmio de. Curso de Processo Penal. 2 ed. So Paulo: Forense, 2010. p. 40, 41 e 42. 37

DEMERCIAN, Pedro et. Al. Curso de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 2004. p 61. 38

SILVA, Jos Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6ed. So Paulo: Malheiros, 2002. P. 174

15

inqurito policial deve ser guardado certo sigilo, pois sua feitura incompatvel

com o princpio do contraditrio.39

O carter inquisitivo do inqurito policial confere autoridade

policial a discricionariedade de deferir ou no eventuais diligncias requeridas

pelo ofendido ou pelo prprio investigado. Em se tratando de diligncia

requisitada pelo Ministrio Pblico ou pelo Juiz de Direito, a autoridade policial

no poder recusar seu atendimento.40

O sigilo, tambm, uma garantia para o indiciado, pois, nos

atestados de antecedentes que forem solicitados autoridade policial, neles no

podero constar quaisquer anotaes referentes instaurao de inqurito contra

o requerente, salvo no caso de existir condenao anterior (pargrafo nico do

art. 20, CPP). H, porm, uma exceo ao sigilo: o advogado poder examinar

em qualquer repartio policial, mesmo sem procurao, autos de flagrante e de

inqurito, findos ou em andamento, ainda que conclusos autoridade, podendo

copiar peas e tomar apontamentos (art. 7, XIV, da Lei n. 8.906/94).

Foi elaborada a smula vinculante n. 14 pelo STF em 02 de

fevereiro de 2009, cujo contedo o seguinte: direito do defensor, no interesse

do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, j documentados

em procedimento investigatrio realizado por rgo com competncia de polcia

judiciria, digam respeito ao exerccio do direito de defesa.

Destarte, quando o acesso ao inqurito policial for denegado

pela autoridade policial, atualmente, o interessado dispe de dois remdios:

habeas corpus perante juiz criminal competente ou reclamao constitucional

perante o STF. Salienta-se que o ato investigatrio j dever ter sido produzido,

ou seja, j estar documentado no procedimento investigatrio pelo rgo com

competncia de polcia judiciria.

O processo, como procedimento, inclui tambm o inqurito.

No h erro, como por vezes se afirma em chamar o processo ao inqurito. Deve

se subentender que a palavra no esta usada para significar relao processual,

que, de regra, se inicia com a acusao. Pode acontecer que a relao

39

NOGUEIRA, Paulo Lucio. Curso Completo de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 1987. p41 40

DEMERCIAN, Pedro et. Al. Curso de Processo Penal. So Paulo: Saraiva, 2004. p 61.

16

processual se instaure ainda na fase do inqurito - o caso mais freqente deste

fenmeno pela decretao da priso preventiva (arts. 13, IV, e 311 do CPP).41

No h no inqurito nem contraditrio, nem ampla defesa.

Sendo classificado pela doutrina como inquisitrio. No mais, o inqurito policial

procedimento administrativo. No processo, pois no se constitui em relao

trilateral, j que o investigado no parte do procedimento que feito

unilateralmente. Porm, classific-lo como procedimento administrativo, no

significa dizer que no devam ser resguardados, no seu desenrolar, os direitos

fundamentais do investigado.

Nesse sentido, a autoridade policial, o magistrado e o

Ministrio Pblico, exercendo o controle externo da polcia, devem zelar para que

a investigao seja conduzida de forma a evitar, o quanto possvel, afrontas aos

direitos do investigado, sempre com o objetivo de equilibrar o interesse social em

que o Estado desvende a prtica de um dano aos seus bens e interesses mais

relevantes com a necessidade de respeitar os direitos e liberdades fundamentais

de cada indivduo.

Por fim, a natureza do inqurito fundamentalmente

inquisitiva, no havendo nele o contraditrio. Nessa fase da persecuo criminal,

marcada pelo sigilo, o cidado indiciado, conforme dito, no propriamente

sujeito de direito, mas apenas objeto de investigao, respeitando-se as garantias

constitucionais.42 Desse modo, far-se- necessria uma explanao

pormenorizada acerca dos procedimentos adotados no inqurito policial e demais

circunstncias relevantes.

41

MORAIS, Bismael B. Direito e polcia, uma introduo polcia judiciria. So Paulo: Atlas, 2003.p. 229. 42

MATOS, Joo Carvalho de. Prtica Processual Penal. So Paulo: Editora de Direito, 1998.p 65.

17

Captulo 2

2. SISTEMAS PROCESSUAIS E PROCEDIMENTO

POLICIAL

2.1. SISTEMA ACUSATRIO, INQUISITRIO E MISTO

O processo penal se apresenta, atravs da histria, sob trs

formas diferentes conhecidas como: acusatria, inquisitiva e mista.43

Quanto aos sistemas processuais penais existentes no mundo:

Historicamente, o processo penal conheceu trs sistemas: o inquisitrio, acusatrio e misto. O que se leva em conta qual o papel do juiz: o de apenas julgar ou tambm o de acusar. Portanto, a referncia principalmente histrica, ou seja, em determinado perodo, os julgamentos eram feitos de modo mais arbitrrio e depois foram paulatinamente sendo mais garantidores do direito de defesa do ru.44

Destarte, verifica-se a existncia histrica de trs sistemas processuais, e por isso, passar-se- a um exame pormenorizado do assunto abrangido por este item, a seguir:

43

TORNAGHI,Helio. Curso de Processo Penal. Volume 1.4ed So Paulo: Saraiva, 1987. P. 8. 44

ISHIDA, Vlter Kenji. Processo Penal. So Paulo: Atlas, 2009.p.19.

18

2.1.1. SISTEMA INQUISITRIO

No sistema inquisitivo se encontra mais uma forma

autodefensiva de administrao da justia do que de um genuno processo de

apurao da verdade. Tem suas razes no Direito Romano, quando, por influncia

da organizao poltica do Imprio, se permitiu ao juiz iniciar o processo de ofcio.

Revigorou-se na Idade Mdia diante da necessidade de afastar a represso

criminal dos acusadores privados e alastrou-se por todo o continente europeu a

partir do sculo XV diante da influncia do Direito Penal da Igreja e s entrou em

declnio com a Revoluo Francesa.45

Nele inexistem regras de igualdade e liberdade processuais,

o processo normalmente escrito e secreto e se desenvolve em fases por

impulso oficial, a confisso rene elemento suficiente para a condenao,

permitindo-se inclusive a tortura etc.46

Sigiloso, sempre escrito, no contraditrio e rene na

mesma pessoa, as funes de acusar, defender e julgar. O ru visto neste

sistema como mero objeto da persecuo, motivo pelo qual prticas como a

tortura eram frequentemente admitidas como meio para se obter a prova-me: a

confisso.47

Alm disso, esse sistema processual teve o seu apogeu na

Idade Mdia e sofreu seu declnio durante a Revoluo Francesa. Exemplo

assente no direito processual penal brasileiro at o advento da Constituio

Federal de 1988, o processo judicialiforme um exemplo de processo inquisitrio,

em parte, composto pelos processos sumrios das contravenes e da Lei n

4.611/65, revogados tacitamente pelo art. 129, I, da CF/88, que possibilitavam o

incio da ao penal por portaria do magistrado. Misturava-se ento a funo de

acusar e julgar.48

45

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 43. 46

Idem, Ibidem. 47

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.41. 48

ISHIDA, Vlter Kenji. Processo Penal. So Paulo: Atlas, 2009.p.19 e 20.

19

2.1.2. SISTEMA ACUSATRIO: O SISTEMA BRASILEIRO

O sistema acusatrio tem suas razes na Grcia e em Roma,

instalado com fundamento na acusao oficial, embora se permitisse,

excepcionalmente, a iniciativa da vtima, de parentes prximos e at de qualquer

do povo. No Direito Moderno, tal sistema implica o estabelecimento de uma

verdadeira relao processual com o actum trium personarum. Estando em p de

igualdade o autor e o ru, sobrepondo-se a eles, como rgo imparcial de

aplicao da lei o juiz.49

O sistema acusatrio contraditrio, pblico, imparcial,

assegura ampla defesa; h distribuio das funes de acusar, defender e julgar

a rgos distintos.50

Nesse sistema, a prova dos fatos compete s partes. O juiz

no toma a iniciativa de apurar coisa alguma, at porque os fatos no

controvertidos no precisam ser provados; as partes tm disponibilidade do

contedo do processo; domina a publicidade e a oralidade; o ru pode aguardar a

sentena em liberdade;51

Sistema acusatrio: entregam a investigao preliminar ou

instruo diretamente ao promotor, que se torna o encarregado de preparar a

acusao que ele mesmo apresentar.52

O inqurito no processo, constituindo-se simplesmente

num procedimento administrativo. Como no poderia deixar de ser, seu carter

inquisitivo, tendo o presidente do inqurito poderes discricionrios (limitados pelo

Direito), mas no arbitrrios, para conduzir as investigaes.53

Nesse sentido, ensina Djalma Eutmio de Carvalho:

49

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 43. 50

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.40. 51

TORNAGHI, Helio. Curso de Processo Penal. Volume 1.4ed So Paulo: Saraiva, 1987. P. 11. 52

BINDER, Alberto M.Introduo ao Direito Processual Penal. Traduo: Fernando Zani. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003,p.179. 53

GARCIA, Ismar Estulano. Procedimento Policial: inqurito. 9ed. Goinia: AB, 2002.p 8.

20

O processo penal brasileiro tem como princpio a forma

acusatria. Quanto ao inqurito policial, o que h um

procedimento administrativo inquisitivo, mas o processo-crime

propriamente dito essencialmente acusatrio, principalmente

depois do fim do procedimento judicialiforme.54

Assim, no Brasil adotado o sistema acusatrio, com

uma fase preliminar de investigao que constitui, em regra, o inqurito policial.

Diz-se "em regra" porque por fora legal o inqurito policial no indispensvel

para a propositura da ao penal (artigo 4.o, Pargrafo nico, CPP), podendo ser

substitudo por outras peas informativas ou mesmo por procedimentos

investigatrios atribudos a outras autoridades administrativas que no as

policiais. Tal posicionamento o majoritrio na doutrina ptria.

Alm disso, com o advento da Lei 9.099/95, criou-se para as

infraes penais de menor potencial ofensivo o chamado "Termo

Circunstanciado" que, em tese, substitui o inqurito policial55.

Sobre o sistema de garantias processuais vigentes,

depreende-se:

A unilateralidade das investigaes preparatrias da ao penal

no autoriza a polcia judiciria a desrespeitar as garantias

jurdicas que assistem ao indiciado, que no mais pode ser

considerado mero objeto de investigaes (STF, HC 73271-2, Rel.

Celso de Mello, DJU, 4.10.1996,p.37100).

Quanto potencialidade ofensiva do inqurito policial e uma

possvel argio de nulidade ou interrupo, entende-se:

A fase inquisitorial, sujeita s averiguaes preliminares da

autoridade policial, muitas vezes inicia-se por meio de meras

delaes e informaes imprecisas e, depois, constitui-se em

54

Idem, Ibidem.p.21. 55

CARVALHO, Djalma Eutiimio de. Curso de Processo Penal. 2 ed. So Paulo: Forense, 2010. p 41 E 42.

21

acurado corpo probatrio, apto a desencadear o consequente

processo criminal. No bastasse isso, trata-se de procedimento

administrativo ao qual no se pode emprestar a complexa

potencialidade ofensiva, a ponto de gerar-lhe pretendida nulidade

ou interrupo sem motivo justificado (STJ, 5 T.,RHC 12.387,

Rel. Jos Arnaldo da Fonseca, j. 17.6.2003, DJU,

25.8.2003,p.324.).

Compreende-se a distino entre os modelos inquisitivo e o

acusatrio do processo penal, como a separao ntida de papis entre acusador,

julgador e defensor, alm de conferir ao acusado um status diferenciado, como

titular de direito e no objeto da persecuo.56

Dentre os direitos do autor da infrao, esto os seguintes: o

direito constitucional de permanecer calado, o de presuno de inocncia at o

trnsito em julgado da sentena penal condenatria, o de no ser submetido

tortura, tratamento desumano ou violador de sua dignidade.

Destarte, define-se o sistema acusatrio como uma relao

processual triangular, conforme a posio majoritria dos seguintes

doutrinadores: Bulow, Wach, Chiovenda e Calamandrei. A triangularizao do

processo ocorre com a citao vlida do autor da infrao. Ressalte-se a diviso

das funes de acusar, defender e julgar (caracterstica predominante desse

sistema).

56

CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo Penal Luz da Constituio. p. 62.

22

2.1.3. SISTEMA MISTO

Com relao ao sistema misto h uma fase inicial inquisitiva,

na qual se procede a uma investigao preliminar e a uma instruo preparatria,

e uma fase final, em que se procede ao julgamento com todas as garantias do

processo acusatrio.57

Para alguns autores (Helio Tornaghi e Mougenot Bonfim), a

persecuo penal no Brasil mista (corrente doutrinria minoritria), j que se

compe de dois momentos ou fases:

Uma primeira fase, do inqurito policial, apresentar-se-ia

essencialmente inquisitiva, sigilosa e no contraditria, figurando a pessoa do

sujeito ou indiciado como mero objeto da investigao.

Uma segunda fase, aps o encerramento do inqurito

policial, com o oferecimento da denncia ou queixa e com a instaurao da

relao processual, quando passariam a vigorar as garantias constitucionais das

partes e, em especial, do acusado.58

No entanto, este o entendimento doutrinrio minoritrio,

prevalecendo o entendimento no sentido de ser o inqurito policial dispensvel e

mero procedimento administrativo, vela-se apenas da ao penal em diante.

Entende-se que o sistema processual vigente no Brasil o acusatrio, como

explanado no item anterior, tal corrente doutrinria a majoritria.

Em outro exemplo, os princpios do sistema inquisitivo eram

consagrados na fase da instruo preparatria: o processo dirigido por um

magistrado, desenvolvia-se por escrito, secretamente e sem ser contraditrio. A

defesa era nula durante a instruo preparatria. Na sesso de julgamento,

tornava-se acusatrio o processo: oral, pblico e contraditrio. O sistema misto

teve reflexos bem acentuados em quase toda a Europa, penetrando em todas as

partes sob o manto imperial de Napoleo.59

O sistema misto ou sistema acusatrio formal constitudo

de uma instruo inquisitiva (de investigao preliminar e instruo preparatria) e

57

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.41. 58

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4ed. So Paulo: Saraiva, 2009.p.30. 59

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol 1.25ed. So Paulo: Saraiva, 1999.p. 74.

23

de um posterior juzo contraditrio (de julgamento). Embora as primeiras regras

desse processo tenham sido introduzidas com as reformas da Ordenana

Criminal de Luiz XIX (1670), a reforma radical foi operada com o Code

dInstruction Criminelle de 1808, na poca de Napoleo, espalhando-se pela

Europa Continental no sculo XIX. 60

ainda o sistema utilizado em vrios pases da Europa e da

Amrica Latina (Venezuela). No direito contemporneo, o sistema misto combina

elementos inquisitivos e acusatrios em maior ou menor medida, segundo o

ordenamento processual local e se subdivide em duas orientaes, segundo a

predominncia na fase do procedimento escrito ou oral, o que, at hoje, matria

de discusso.61

Para Alberto Binder, no sistema misto o juiz de instruo

presente na fase investigatria:

[...]Encarrega o juiz de instruo da investigao ou andamento

do sumrio. Uma vez que este termine de reunir as provas envia o

sumrio ao promotor, para que seja requerido por ele a abertura

do julgamento (acusao).62

Por fim, no sistema misto ou inquisitivo reformado

(sinnimo): tambm entrega a investigao ao juiz para que realize um instruo

formal e depois, sobre a base deste sumrio remetido ao promotor, este

(Promotor de Justia/Procurador da Repblica) requeira a abertura de um

julgamento oral e pblico. Ademais, salienta-se que o sistema processual penal

brasileiro no tem qualquer semelhana com o sistema misto, conforme explicado

acima.

60

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 44. 61

Idem, Ibidem. 62

BINDER, Alberto M.Introduo ao Direito Processual Penal. Traduo: Fernando Zani. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003,p.179.

24

2.2. PAPEL DA POLCIA JUDICIRIA

A polcia o instrumento da Administrao, a Polcia uma

instituio de direito pblico, destinado a manter a paz pblica e a segurana

individual.63

O termo polcia deriva do latim politia, que procede do grego

politeia, originariamente traz o sentido de organizao poltica, sistema de

governo e, mesmo governo. Assim, por sua derivao, em amplo sentido, quer o

vocbulo exprimir a ordem pblica, disciplina poltica, segurana pblica,

institudas, primariamente, como base poltica do prprio povo.64

Exerce funo auxiliar a justia (da a designao); atua

quando os atos que a polcia administrativa (polcia de segurana) pretendia

impedir no foram evitados. Possui finalidade de apurar as infraes penais e

suas respectivas autorias, a fim de fornecer ao titular da ao penal (Ministrio

Pblico) elementos para prop-la (art. 4, do CPP).65

A polcia, com o sentido que hoje se lhe empresta rgo

do Estado incumbido de manter a ordem e a tranqilidade pblicas surgiu, ao

que parece, na velha Roma. noite, os larpios, aproveitando a falta de

iluminao, assaltavam a velha urbs, e seus crimes ficavam impunes, porque no

eram descobertos. Para evitar essa situao, criaram os romanos um corpo de

soldados que, alm das funes de bombeiros, exerciam as de vigilantes

noturnos, impedindo, assim, a consumao de crimes. Ao tempo do imprio,

quando se desenvolveu a cognitio extra ordinem, havia, em Roma, funcionrios

incumbidos de levar as primeiras informaes sobre a infrao penal aos

Magistrados. Eram os curiosi, os irenarche, os stationarii, os nuntiadores, os digiti

duri, que desempenhavam papel semelhante ao da nossa Polcia Judiciria.66

Acrescentando a isso, em Roma, o termo polcia era

conceituado como a ao do governo de manter a ordem pblica, a paz social e o

63

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 87. 64

SILVA, De Plcido. Vocabulrio Jurdico. 24 ed. Rio de Janeiro, 2004. p. 1054. 65

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.68. 66

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, voume 1. 27 ed. Ver. E atual. So Paulo: Saraiva, 2005. p. 190.

25

bem comum. Hoje, considerada como um rgo estatal incumbido de

resguardar a segurana de todos os cidados.

Polcia Administrativa: aquela que tem por objeto as

limitaes impostas a bens jurdicos individuais, limitaes essas que visam

assegurar completo xito da administrao.67

Segundo o ordenamento jurdico do Pas, Polcia cabem

duas funes: a administrativa (ou de segurana) e a judiciria. Com a primeira,

de carter preventivo, ela garante a ordem pblica e impede a prtica de fatos

que possam lesar ou pr em perigo os bens individuais ou coletivos; com a

segunda, de carter repressivo, aps a prtica de uma infrao penal recolhe

elementos que o elucidem para que possa ser instaurada a competente ao

penal contra os autores do fato.68

Tornaghi, citado por Manoel Messias Barbosa, explana

sobre a necessidade do inqurito policial:

O inqurito policial assegura uma ao penal bem fundada. Como

seria possvel mov-la sem a prova da materialidade do fato e,

pelo menos, indcios de autoria? Como cogitar-se da

responsabilidade de algum sem o pressuposto da imputao

fsica do fato tpico ao acusado? O acautelamento do local da

infrao para que no se perca ou desvirtue o corpo de delito; a

apreenso dos instrumentos do crime e dos objetos que lhe

estejam ligados; a audio do ofendido e do indiciado; o

reconhecimento das pessoas e coisas; a acareao entre aqueles

cujas declaraes divergem; a realizao de pericias; a

identificao do indiciado; a averiguao de sua vida pregressa; a

reproduo simulada dos fatos e todas as demais diligncias

feitas durante o inqurito servem de alimento propositura da

ao penal e ao desenvolvimento do processo.69

67

Idem, Ibidem. 68

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 79. 69

Apud BARBOSA, Manoel Messial. Inqurito Policial: Doutrina Prtica, Jurisprudncia. 4ed. So Paulo: Mtodo, 2004p.27.

26

A fase inquisitiva h de predominar na fase inicial da

persecuo penal, pelos motivos a seguir expostos:

A busca da verdade real no pode estar obstaculizada, sendo

uma rocha a contrapor a investigao, dentre outras, a

implantao, na forma vista no processo judicial, do contraditrio e

da ampla defesa na fase inicial da persecutio criminis. O

inquisitivo h de predominar nesse primeiro momento.70

O princpio que rege a atividade policial o da no-

exclusividade, ou seja, admite-se que mais de um rgo apure as infraes

penais, o que, ademais, de interesse pblico.71

Como mencionado, a competncia da polcia para o

inqurito no exclui a de autoridades administrativas s quais a lei cometa a

mesma funo (art.4, pargrafo nico). Por outro lado, para apurao de crimes

contra a economia popular, contra a sade pblica, ou crimes funcionais, h

autoridades administrativas incumbidas de proceder a inqurito; assim ocorre com

as autoridades militares, mesmo quando seus subordinados cometerem crime

comum. Qualquer desses inquritos ter efeito semelhante ao policial, pois servir

de lastro ao penal.72

Se, por exemplo, uma lei atribuir s autoridades

alfandegrias o poder de investigar contrabandos ou descaminhos, elas podero

fazer inquritos. Se outra lei conceder s autoridades estatais ou at mesmo aos

particulares a funo de investigar os crimes nelas determinados, elas tero

tambm esse poder, ou melhor, tais agentes tero o poder de investigar aquela

infrao, no o de proceder a abertura de inqurito policial! (atribuio exclusiva

das autoridades policiais).73

H uma relao interessante entre as aes penais e a

instaurao do inqurito policial, como exemplo, quando a lei prev

70

PINTO, Adilson Jos Vieira. O Inqurito Policial Luz dos Direitos e Garantias Individuais da Constituio Federal de 1988: Revista Brasileira de Cincias Criminais. So Paulo, n. 27. 1999.p.255. 71

LIMA, Marcellus Polastri. O Ministrio Pblico e a Persecuo Criminal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997.p.55. 72

ACOSTA, Walter P. O Processo Penal. 20ed. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1990.p.35. 73

TORNAGHI, Hlio. Curso de Processo Penal. 4ed. So Paulo: Saraiva, 1987.p.29.

27

expressamente que determinado crime somente se apura mediante queixa,

determina para ele a ao penal privada. Nessa hiptese, o inqurito tambm s

pode ser instaurado mediante a iniciativa da vitima.74

Alm disso, a autoridade judiciria e o Ministrio Pblico s

podero requisitar a instaurao do inqurito se fizerem encaminhar, junto com o

oficio requisitrio, a representao, nos casos em que a ao seja pblica

condicionada representao do ofendido.75

Nesse sentido, h casos em que para ensejar a abertura de

inqurito policial e/ou da ao penal, faz-se necessria a requisio do Ministro da

Justia, como exemplo, crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do

Brasil e crime cometido contra a honra do Presidente da Repblica ou Chefe de

Governo estrangeiro.

J quanto ao penal pblica incondicionada, a mera

requisio da autoridade judiciria, do Ministrio Pblico, requisio do Ministro

da Justia (nos casos previstos em lei) ou at mesmo a delao por parte de

qualquer um do povo, dar incio ao inqurito policial, nos casos em que a pena

seja superior a dois anos (Lei n. 9.099/95, art. 69).

Quanto competncia da polcia judiciria, destinada a

investigar os crimes que no puderam ser prevenidos, descobrir-lhes os autores e

reunir provas e indcios contra estes, no sentido de lev-los ao juzo e,

consequentemente, a julgamento; a prender em flagrante os infratores da lei

penal a atender s requisies das autoridades judicirias. Assumem a, o carter

de rgo judicirio auxiliar.76

A polcia judiciria exercida pela polcia federal e civil,

tambm denominada de Polcia Repressiva, eis que atua aps a consumao do

ato ilcito. Assim, competncia da polcia federal: apurar as infraes penais

contra a ordem poltica e social ou em detrimento de bens, servios e interesses

da Unio ou de entidades autrquicas e empresas pblicas, assim como outras

infraes cuja prtica tenha repercusso interestadual ou internacional e exija

represso uniforme, segundo dispuser a lei, prevenir e reprimir, em todo o

territrio nacional, o trfico ilcito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando

74

Idem, Ibidem.p.91 75

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.82. 76

SILVA, De Plcido. Vocabulrio Jurdico. 24 ed. Rio de Janeiro, 2004. p. 35.

28

e o descaminho, exercer a polcia martima, area e de fronteiras, bem como

exercer, com exclusividade, as funes de polcia judiciria da Unio (art.

144,1, I a IV, da CRFB/1988).

A polcia civil apura as infraes que no forem da alada da

Polcia Federal e no constiturem ilcitos militares (art. 144 4, da CRFB/1988).

Alm de presidir o inqurito, poder a autoridade policial

mandar liberar o preso em flagrante, nos casos em que ele se livra solto e nas

infraes de menor potencial ofensivo, desde que presentes os requisitos legais.

Tambm poder liberar bens apreendidos, mas, to somente nos casos previstos

em lei.

Deve, ainda, nos termos do art. 13 do CPP: fornecer s

autoridades judicirias as informaes necessrias instruo e julgamento dos

processos; realizar as diligncias requisitadas pelo juiz ou pelo Ministrio Pblico;

cumprir os mandados de priso expedidos pelas autoridades judicirias;

representar pela decretao da priso preventiva e temporria, nos casos

previstos em lei; cumprir cartas precatrias expedidas na rea de sua

circunscrio.

Quando se fala em competncia da autoridade policial,

est se utilizando a expresso no sentido comum, referindo-se s suas

atribuies, no se confundindo com a competncia dos rgos jurisdicionais.

A distribuio das atribuies entre autoridades policiais

feita, de acordo com o lugar da consumao da infrao (ratione loci), em

obedincia lei processual que alude ao territrio das circunscries, conforme

se l no art. 4 do CPP. Uma autoridade policial pode avanar a circunscrio de

outra, desde que repercuta em sua competncia, j que os atos inquisitrios no

esto sob a gide do art. 5, LIII, da CF, que se refere apenas ao processo pela

autoridade judiciria competente.

E o art. 22 do CPP no d azo a outro entendimento: No

Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrio

policial, a autoridade com exerccio em uma delas poder, nos inquritos a que

esteja procedendo, ordenar diligncias em circunscrio de outra,

independentemente de precatrias ou requisies, e bem assim providenciar,

29

at que comparea a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em

sua presena, noutra circunscrio.

Se, na circunscrio no existir Polcia Federal, a autoridade

estadual poder autuar em flagrante em relao aos delitos eleitorais ou os

previstos na lei antitxicos (trfico transnacional ou interestadual) e outros de

competncia da polcia federal.

No tocante s diligncias previstas no art. 6 do CPP, Logo

que tiver conhecimento da prtica da infrao penal, a autoridade policial dever:

dirigir-se ao local, providenciando para que no se alterem o estado e

conservao das coisas, at a chegada dos peritos criminais; apreender os

objetos que tiverem relao com o fato, aps liberados pelos peritos criminais;

colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas

circunstncias; ouvir o ofendido.

Por fim, ordenar a identificao do indiciado pelo processo

datiloscpico, se possvel, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes.

Averiguar a vida pregressa do indiciado sob o ponto de vista individual, familiar e

social, sua condio econmica, sua atitude e estado de nimo, antes e depois do

crime e durante ele. E quaisquer outros elementos, que contriburem para a

apreciao do temperamento e do carter do agente.

Em leis especiais, admite-se que haja agente policial

infiltrado em organizaes criminosas para efetuar investigaes de delitos, por

meio de autorizao judicial, em qualquer fase da persecuo penal, inclusive

durante a fase pr-processual (cf.art. 2, V, da Lei n. 9.034/1995 e art. 53, I, da Lei

n. 11.343/2006).

H atividades tipicamente policiais e muitas vezes

imprescindveis apurao do crime e de sua autoria, que no constam das

atribuies do Ministrio Pblico. Seus membros no foram preparados para elas,

no se submetem a provas fsicas para ingressar na carreira, no recebem aulas

para utilizao de armas de fogo. O Ministrio Pblico tem o poder de requisio,

30

previsto na Constituio e nas leis. Pode investigar, at mesmo em funo da

titularidade da ao penal de iniciativa pblica.77

Nesse sentido, preceitua a jurisprudncia do Supremo

Tribunal Federal:

O Ministrio Pblico no tem poderes para realizar diretamente

investigaes, mas sim requisit-las autoridade policial

competente, no lhe cabendo, portanto, inquirir diretamente

pessoas suspeitas da autoria de crime, dado que a conduo do

inqurito policial e a realizao das diligncias investigatrias so

funes de atribuio exclusiva da polcia judiciria (cf. Informativo

STF n. 307, 9-5-2003 RHC 81.326-DF).

Em sentido contrrio, define a deciso recente e inovadora

do Superior Tribunal de Justia:

Poder Investigativo do Ministrio Pblico: - A questo acerca da

possibilidade do Ministrio Pblico desenvolver atividade

investigatria objetivando colher elementos de prova que

subsidiem a instaurao de futura ao penal, tema

incontroverso perante esta eg. Turma. Como se sabe, a

Constituio Federal, em seu art. 129, I, atribui privativamente, ao

Ministrio Pblico promover a ao penal pblica. Essa atividade

depende, para o seu efetivo exerccio, da colheita de elementos

que demonstrem a certeza da existncia do crime e indcios de

que o denunciado seu autor. Entender-se que a investigao

desses fatos atribuio exclusiva da polcia judiciria, seria

incorrer-se em impropriedade j que o titular da ao o rgo

Ministerial. Cabe, portanto, a este, o exame de necessidade ou

no de novas provas colheitas de provas, uma vez que, tratando-

se o inqurito de pea meramente informativa, pode o MP

entend-la dispensvel na medida em que detenha informaes

77

COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Sobre a posio da polcia judiciria na estrutura do direito processual penal brasileiro na atualidade. Revista Brasileira de Cincias Criminais. So Paulo:n 26,p.213-320,1999.p.218.

31

suficientes para a propositura da ao penal. Ora, se o inqurito

dispensvel, e assim o diz o art. 39, 5., do CPP, e se o

Ministrio Pblico pode denunciarcom base apenas nos

elementos que tem, nada h que imponha a exclusividade s

polcias para investigar os fatos criminosos sujeitos ao penal

pblica. A Lei Complementar n. 75/90, em seu art. 8, inciso IV,

diz competir ao Ministrio Pblico, para o exerccio das suas

atribuies institucionais, realizar inspees e diligncias

investigatrias. Compete-lhe, ainda, notificar testemunhas (inciso

I), requisitar informaes, exames, percias e documentos s

autoridades da Administrao Pblica direta e indireta e requisitar

informaes e documentos a entidades privadas. Ordem

denegada (STJ, 5 Turma, HC 27113/MG, rel. Min. Jorge

Scartezzini, j. 17-06-2004, DJ,29 set. 2003,p.293).

Todavia, a doutrina no unssona no sentido de ser o

Ministrio Pblico competente para proceder a investigaes criminais,

prevalecendo a tese favorvel s investigaes realizadas pelo Ministrio Pblico.

Com relao funo investigatria a polcia judiciria

impede que desapaream as provas do crime e colhe os primeiros elementos

informativos da persecuo penal, com o objetivo de preparar a ao penal.

Estamos, pois, em face de atividade puramente administrativa, que o Estado

exerce, no interesse da represso ao crime, como prembulo da persecuo

penal. A autoridade policial no juiz: ela inter partes (parte). Cabe-lhe a tarefa

de coligir o que se fizer necessrio para a restaurao da ordem jurdica violada

pelo crime, em funo do interesse punitivo do Estado.78

Bonfim entende, que encerrado o procedimento

investigatrio ou exaurido o prazo legal, a autoridade policial dever encerrar o

inqurito policial:

Concluda a investigao, seja pelo esgotamento do prazo

determinado em lei, ou entendendo estarem exauridas as

investigaes, pela determinao e concluso de todas as

78

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, voume 1. 27 ed. Ver. E atual. So Paulo: Saraiva, 2005. p. 191.

32

diligncias que poderiam ter sido realizadas com vistas

apurao da infrao penal objeto do inqurito, a autoridade

policial dar por encerrado o inqurito policial.79

Em relao ao termo final do inqurito, este poder ocorrer

de duas formas. Normalmente, ocorre com o relatrio da autoridade policial (CPP,

art. 10, 1 e 2). O encerramento anormal ocorrer quando for concedida ordem

de habeas corpus pelo Poder Judicirio, determinando o trancamento do inqurito

policial com fundamento no art. 648, I, do CPP (falta de justa causa), nas

seguintes hipteses: atipicidade do fato investigado; extino da punibilidade;

indiciado menor.80

O relatrio, ou seja, o resumo das diligncias escrito pela

autoridade policial (delegado de polcia) no deve encerrar qualquer juzo de

valor. Exemplo: dizer que em um caso especfico a situao indica o

arquivamento do inqurito policial, a autoridade policial dever providenciar a

remessa, juntamente com os instrumentos do crime e outros objetos, ao juiz

competente.81

Havendo diligncias tidas como indispensveis, o Promotor

de Justia requerer o retorno dos autos delegacia de polcia de acordo com o

teor do art. 16 do CPP. S pode ser empregado estando o indiciado solto, sob

pena de excesso de prazo para oferecimento da denncia. Caso o inqurito esteja

concludo, esteja preso e haja necessidade de uma diligncia, podem-se adotar

os seguintes procedimentos: o promotor retm os autos do inqurito e se

comunica diretamente com a autoridade policial; ou o promotor retm o inqurito

e, por exemplo, toma o depoimento da testemunha diretamente.82

Em sntese, a polcia judiciria e a Justia Penal se

integram, ou seja, a polcia elementar para a feitura de uma sentena justa e

ponderada. As caractersticas da polcia judiciria so a iniciativa, a atividade, a

investigao. Persegue a atividade criminosa. Dela tem a primeira notcia. Colhe

provas. Inicia sua atuao quando o homem d o primeiro passo na consumao

do delito, e acaba quando o juiz toma conhecimento do fato por meio da

79

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4ed. So Paulo: Saraiva, 2009.p.131. 80

ISHIDA, Vlter kenji. Processo Penal. So Paulo: Atlas, 2009, p. 53. 81

Idem, Ibidem. 82

Idem, Ibidem.

33

denncia. A polcia judiciria dispe de funcionalismo especializado, recursos em

pessoal, laboratrios, transportes. Mas, infelizmente, no detm a prerrogativa da

independncia funcional, o que, por vezes, pode comprometer a lisura das

investigaes levadas a cabo.

Por fim, a polcia exerce suas funes bsicas atravs dos

atos de polcia judiciria, visando apurao da verdade real. Ante a notcia

criminis, deve comprovar a materialidade do delito, as circunstncias em que

ocorreu e levantar os indcios de sua autoria. O inqurito policial o principal

instrumento de que dispe consecuo de seus fins. O aprimoramento de sua

execuo constitui exatamente o aperfeioamento da segurana pblica e a

melhoria da garantia da comunidade social.83

83

BARBOSA, Manoel Messias. Inqurito Policial: doutrina prtica, jurisprudncia. 4 ed. So Paulo: Mtodo, 2004. p. 16/17.

34

2.3. A INSTAURAO DO INQURITO POLICIAL

Manoel Messias Barbosa aduz que "a doutrina ensina,

quase de modo unnime, que o inqurito policial consiste em investigao do fato,

da sua materialidade e da autoria, ultimada pela denominada polcia judiciria.

Assim, ostentando-se como um procedimento administrativo persecutrio de

instruo provisria, destinado a preparar a ao penal".84

Nesse sentido, corrobora Salles Jnior:

Inqurito Policial o procedimento destinado reunio de

elementos acerca de uma infrao penal. o conjunto de

diligncias realizadas pela Polcia Judiciria, para apurao de

uma infrao penal e sua autoria, para que o titular da ao penal

possa ingressar em juzo, pedindo a aplicao da lei ao caso

concreto.85

necessrio neste ponto atentar para o fato de que o

inqurito policial no deve ser conceituado somente sob o ponto de vista que

destaca sua funo de fornecer elementos ao titular da ao penal (Ministrio

Pblico). Na realidade, o inqurito policial serve no somente para embasar a

futura ao penal, como tambm, em certos casos, para demonstrar exatamente

o inverso, ou seja, a desnecessidade ou no cabimento de uma eventual ao

penal. O inqurito um instrumento imparcial, no vinculado futura acusao,

podendo em seu bojo trazer elementos de interesse da defesa do suposto autor

da infrao. Reduzi-lo a fornecedor, de elementos ao titular da ao penal

manietar sua verdadeira funo, muito mais ampla e relevante consecuo da

Justia.

Por isso, prefere-se a conceituao de Adilson Jos

Vieira Pinto23 que afirma que o inqurito policial "pode ser definido como sendo o

84

BARBOSA, Manoel Messias. Inqurito Policial: doutrina prtica, jurisprudncia. 4 ed. So Paulo: Mtodo, 2004. p. 16/17. 85

SALLES JUNIOR, Romeu de Almeida. Inqurito Policial e Ao Penal. 7ed. So Paulo: Saraiva, 1998.p.08.

http://www.conteudojuridico.com.br/?colunas&colunista=371_Eduardo_Cabette&ver=340#_ftn23#_ftn23

35

procedimento administrativo de polcia judiciria, que por intermdio de

investigao, visa confirmao da existncia ou no de uma determinada

infrao penal, suas circunstncias e o estabelecimento da correspondente

autoria."

No sistema brasileiro a instaurao do inqurito de

atribuio da Autoridade Policial, podendo ainda ser objeto de requisio pela

Autoridade Judiciria ou pelo Ministrio Pblico. J com relao conduo das

investigaes, h atribuio especfica da Autoridade Policial (Delegados de

Polcia de Carreira), conforme artigo 144, 4o., CF. 24 A atuao do Ministrio

Pblico na fase de investigao criminal externa e intermediada pela Autoridade

Judiciria, sendo que tambm pode haver requerimentos de diligncias pelo

ofendido, indiciado ou advogado diretamente Autoridade Policial nos termos do

artigo 14 do CPP.

Nos crimes de ao penal pblica incondicionada, o

inqurito instaurado: de ofcio; a requerimento do ofendido (delatio criminis);

mediante requisio do Ministrio Pblico ou do Juiz; atravs de notitia criminis

(espontnea: prestada por qualquer do povo; coercitiva: em caso de priso em

flagrante). As trs primeiras hipteses esto previstas nos incisos I e II do art. 5

do CPP; a ltima est prevista no 3 do art. 5 do CPP.

Nos crimes de ao penal pblica condicionada

representao ou requisio do Ministro da Justia e nas aes exclusivamente

privadas somente pode ser iniciado o inqurito, se houver representao da

vtima, requisio do Ministro da Justia ou requerimento da vtima,

respectivamente. O inqurito pode ser iniciado, assim, de ofcio, mediante

requisio, requerimento ou delao, representao e por auto de priso em

flagrante delito.

H casos em que para ensejar a abertura de inqurito

policial e/ou a ao penal, faz-se necessria a requisio do Ministro da Justia,

como exemplo, crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil e

crime cometido contra a honra do Presidente da Repblica ou Chefe de Governo

estrangeiro.

http://www.conteudojuridico.com.br/?colunas&colunista=371_Eduardo_Cabette&ver=340#_ftn24#_ftn24

36

O inqurito policial, em caso de crime de ao pblica

incondicionada, pode ser instaurado de ofcio pela autoridade policial quando o

conhecimento ocorre direta e indiretamente, enquanto a autoridade pblica est

no exerccio de sua atividade funcional.86

Inicialmente, a autoridade deve proceder de acordo com o

art. 6 do CPP, embora no preveja a lei um rito formal nenhuma ordem prefixada

para diligncias que devem ser empreendidas pela autoridade. Ela indica, porm,

as diligncias que, regra geral, devem ser efetuadas para que a autoridade possa

colher ao vivo os elementos da infrao, devendo por isso agir com presteza,

antes que mude o estado das coisas no local do crime ou desapaream armas,

instrumentos ou objetos do delito, enfim, colhendo as provas que sirvam para a

elucidao dos fatos e as circunstncias.87

A vtima pode representar ou requerer a abertura de

inqurito em crimes de ao privada perante o magistrado ou representante do

Ministrio Pblico. Acatando tal requerimento, tais autoridades podem requisitar a

abertura de inqurito, o que obrigar a autoridade policial a instaur-lo.

O prazo para a apresentao de requerimento de abertura

de inqurito, nas aes penais de iniciativa privada e nas pblicas condicionas

representao de 6 (seis) meses (prazo decadencial), a partir do dia em que a

vtima ou seu representante tomou conhecimento de quem foi o autor da infrao

penal (art. 38, do Cdigo de Processo Penal).

Na hiptese de indeferimento desfundamentado ou

ilegal. O ofendido ter duas opes: 1 recorrer ao Chefe da autoridade Policial

(Delegado Chefe da Polcia Civil, Secretrio de Segurana Pblica,

Superintendente da Polcia Federal etc.); 2 requerer ao Juiz Criminal ou ao

Promotor de Justia que requisite a abertura do inqurito, no podendo o

delegado indeferir a sua abertura.

O juiz ou promotor pode no cumprir o disposto no

1 do art. 5 do CPP, quando requisitar a abertura de inqurito policial. Nessa

hiptese, cabe autoridade enviar-lhe ofcio para que supra o vcio. No sendo

86

MIRABETE, Julio Fabbrini. Cdigo de Processo Penal Interpretado. 11ed. So Paulio: Atlas, 2003.p. 94. 87

NORONHA, E. Magalhes. Curso de Direito Processual Penal. So Paulo: Saraiva, 1997.p.25.

37

sanado o vcio, a autoridade policial dever iniciar as investigaes, mesmo

assim, sob as penas da lei.

Os requerimentos, as requisies e o auto de priso em

flagrante so peas iniciais do inqurito policial. Nos demais casos a autoridade

policial deve baixar a portaria para a instaurao do procedimento. A portaria

uma pea singela, na qual a autoridade policial consigna haver tido cincia da

pratica de crime de ao pblica incondicionada, declinando, se possvel, o dia,

lugar e o prenome e nome da vtima, e conclui determinando a instaurao do

inqurito. Mas se impede, porm, a instaurao de inqurito policial referente a

crime cuja autoria ignorada, eis que no mbito do procedimento que se devem

proceder s investigaes para sua identificao.88

Se o crime for de ao pblica, mas condicionada

representao do ofendido ou do seu representante legal (CPP, art. 24), o

inqurito no poder ser instaurado seno com o oferecimento desta. a

manifestao do princpio da oportunidade, que informa a ao penal pblica

condicionada at o momento do oferecimento da denncia (CPP, art. 25). A

autoridade judiciria e o Ministrio Pblico s podero requisitar a instaurao do

inqurito se fizerem encaminhar, junto com o oficio requisitrio, a representao.89

Com relao prescindibilidade do inqurito, este no

indispensvel para que se oferea a denncia, em havendo prova da

materialidade e indcios suficientes de autoria o rgo ministerial poder prop-la.

Neste liame reflexivo, extrai-se da jurisprudncia ptria:

INQURITO. DISPENSABILIDADE. (STF). "No essencial ao

oferecimento da denncia a instaurao de inqurito policial,

desde que a pea acusatria esteja sustentada por documentos

suficientes caracterizao da materialidade do crime e de

indcios suficientes de autoria". (RTJ, 76/741)".

Imagine, por exemplo, se houver no mbito da Receita

Federal procedimento administrativo fiscal, constatando a existncia de crime

contra a ordem tributria ou sonegao fiscal, somente aps o seu encerramento,

88

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 88. 89

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p.81 e 82.

38

em ltima instncia, que as peas do respectivo procedimento sero enviadas

ao Ministrio Pblico (art. 83, da Lei n 9.430/96), dentre outras.90

Com efeito, sem um mnimo de prova da autoria e da

materialidade do delito, colhida pelos meios legais, o rgo acusador no tem

interesse de agir. E se, mesmo assim, propuser ao penal, dever ser trancada

a ao penal, atravs de habeas corpus preventivo, caso o juiz no rejeite

liminarmente a ao penal, da o porqu da existe da existncia do inqurito

policial.91

Destarte, infere-se que o inqurito policial no se trata de

pea obrigatria propositura da ao penal, tendo em vista a possibilidade de o

Ministrio Pblico, em havendo indcios suficientes de autoria e prova da

materialidade ofertar a denncia.

Aps a explanao sobre os sistemas processuais, dos

modos de se iniciar o inqurito policial, das atribuies e procedimentos da polcia

judiciria, analisar-se- o valor conferido s provas produzidas no inqurito

policial, ou melhor, o valor probatrio que essas possuem.

90

CARVALHO, Djalma Eutiimio de. Curso de Processo Penal. 2 ed. So Paulo: Forense, 2010. P. 45. 91

Idem, Ibidem, p. 46.

Captulo 3

3. VALOR PROBATRIO DO INQURITO POLICIAL

A doutrina discute acaloradamente acerca da possibilidade

de que elementos probatrios colhidos durante o inqurito policial sejam utilizados

como fundamento para a condenao do ru em juzo. Isto, principalmente, em

virtude do carter inquisitivo desse procedimento preliminar, a que no se aplicam

em sua integralidade, as regras inerentes aos princpios do contraditrio e da

ampla defesa.92

3.1 DAS PROVAS NO INQURITO POLICIAL

O inqurito policial no ato de manifestao do Poder

Jurisdicional, mas mero procedimento informativo formao da opinio delicti do

titular da ao penal, os vcios por acaso existentes nessa fase no acarretam

nulidades processuais, isto , no atingem a fase seguinte da persecuo penal.

A irregularidade poder, entretanto, gerar a invalidade e a ineficcia do ato

inquinado, v.g., do auto de priso em flagrante como pea coercitiva; do

reconhecimento pessoal, da busca e apreenso etc.93

Assim, h uma importante classificao das provas, quanto

possibilidade de se repetirem em juzo, em repetveis e irrepetveis. As

primeiras, como o prprio nome indica, podem ser realizadas novamente sob a

gide do princpio do contraditrio em juzo (v.g., a confisso, o reconhecimento

de pessoa, o interrogatrio e oitiva de testemunhas). J as provas irrepetveis so

aquelas que no podem ser renovadas na fase processual, uma vez que

possuem carter definitivo (v.g., exame de leses corporais, em que os vestgios

desaparecero).94

92

BONFIM, Edilson Mougenot.Curso de Processo Penal. 4ed. So Paulo: Saraiva,2009.p.139. 93

Idem, Ibidem.p.129. 94

Idem, Ibidem.p.139

40

Quanto eventuais nulidades no inqurito, extrai-se da

jurisprudncia ptria:

INQURITO POLICIAL. NULIDADES: A jurisprudncia dos

Tribunais Superiores j assentou o entendimento no sentido de

que, enquanto pea informativa, eventuais nulidades que estejam

a gravar o inqurito policial em nada repercutem no processo do

ru, momento no qual, afirme-se, ser renovado todo o conjunto

de prova (STJ, 6 T.,RHC 11.600/RS, rel. Min. Hamilton

Carvalhido, j. 13-11-2001,DJ,1 set. 2003).95

As provas colhidas no inqurito policial s servem para

formar a opinio delicti. Devem, pois, ser renovadas em juzo, sob o crivo do

contraditrio, salvo em regra, as provas cautelares de natureza pericial, que, em

geral, no h como renov-las em juzo. Mas, se forem realizadas sem a

observncia das formalidades legais ou por peritos suspeitos ou impedidos, nada

impede que seja argida sua nulidade na defesa prvia e, se possvel, seja

requerida a realizao de outra percia (contraditrio diferido).

O indiciamento ato complexo da autoridade policial,

dividindo-se em trs partes (art. 6, V,VIII, IX, tratados no item 9, supra): deve o

delegado, inicialmente, interrogar o suspeito, com observncia, no que for cabvel,

do previsto para o interrogatrio judicial, devendo a leitura do respectivo termo ser

presenciada por duas testemunhas. Aps, ser ordenada a identificao do

investigado e, finalmente, elaborada a folha de vida pregressa deste.96

Meios de prova so as coisas ou aes utilizadas para

pesquisar ou demonstrar a verdade: depoimento, percia, reconhecimentos etc.

Como no processo penal brasileiro vige o princpio da verdade real, no h

limitaes dos meios de prova.97

A prova ser ilegal toda vez que violar normas legais ou

princpios gerais do nosso ordenamento, sejam eles de natureza material ou

95

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal.16ed.So Paulo: Saraiva, 2009.p. 77. 96

Idem, Ibidem.p.129 97

MIRABETE, Jlio Fabbrini. Processo Penal. 17 ed. So Paulo: Atlas, 2005. p. 277.

41

processual. Quando violar o direito material ser ilcita e quando violar o direito

processual ilegtima.

Em juzo as provas so regidas por princpios diversos,

destacando-se entre eles o da oralidade (normalmente as provas so produzidas

oralmente); o princpio da comunho das prova (produzida a prova, esta pode ser

aproveitada tanto pela Acusao, como pela Defesa, e inclusive, obviamente, pelo

Juiz); o do contraditrio (produzida a prova, a parte ex adversa tem todo o direito

constitucional de poder se manifestar sobre ela).98

Quanto aos vcios do inqurito, em regra, no afeta a ao

penal respectiva. A desobedincia s formalidades legais pode tornar ineficaz o

ato em si. Exemplo: se o flagrante foi nulo, nula ser a confisso dada pelo ru no

flagrante. Consequentemente, o juiz no poder considerar o ru autor do delito,

com base apenas na confisso feita no auto de priso em flagrante.

Consoante a jurisprudncia, no possvel decretar a

nulidade de um inqurito policial, pelos seguintes fundamentos:

Inqurito policial. Ausncia de interrogatrio do indiciado. Fato que

no acarreta a nulidade da ao penal. Por ser o inqurito

policial procedimento meramente administrativo, instrumento de

esclarecimento para a propositura da ao penal, a falta de

interrogatrio do indiciado nesta fase no acarrreta a nulidade da

ao penal (TJSP, 7 Cm., AP287.208-3/5-00,Rel.Djalma

Lofrano, j. 12.1.2000,RT,776/576).

Assim, no h problema algum se o inqurito contiver vcios,

ressalvada hiptese de nulidade do flagrante, no do inqurito, pois os atos

perpetrados nesta fase no acarretaro posterior nulidade da ao penal,

tratando-se de instrumento de esclarecimento, para a propositura da ao penal.

98

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Cdigo Processo P