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- - o DESENVOLVIMENTO PSICOAFETIVO: A RELAÇAO MAE-FILHO E O CONTEXTO SOCIAL (THE PSICHOLOGICAL ANO AFFECTIVE OEVELOPMENT: THE MOTHER-KIO RELATIONSHIPANO SOCIAL CONTEXT) Olhou o mundo a seu redor, como se o enxergasse pela primeira vez. Belo era o mundo! Hennan Hesse RESUMO opresente trabalho trata do Desenvolvimento Humano, no aspecto psicoafetivo, tendo por base as relações familiares e o contexto social, em interação com osfatores constitucionais. Na abordagem do tema, procuramos demonstrar a influência das relações sociohistóricas, estabelecidas nas fases mais pre- coces do desenvolvimento, sobre o delinear da per- sonalidade, do potencial psicoafetivo e cognitivo do sujeito. Palavras-chave: Desenvolvimento, Relação mãe-fi- lho, Sociedade. ABSTRACT The present essay concerns to the Human Development, in its psychological and a.ffective aspects, on the basis of family relationships and interation bettween the constitutional factors and the social contexto In that approach we tryed to demonstrate the influence of the social and historical relations, defined since the starting phases of the developing processo Also, it looks to draw the personality by developing the psycological, a.ffective and cognitive dimensions ofthe self. Keywords: Development, Mother-Kid relationship, Society. o CONCEITO DE INFÂNCIA o conceito moderno de infância segundo GaIlatin (1978), veio firmar-se por volta do século XVIII, du- I Médica homeopata, com Residência em Psiquiatria e especialização em Psicoterapia. Formação em Psicanálise, Psicodrama e Terapia Familiar Sistêmica. Mestre em Educação. FRANCINETE AL VES DE OLIVEIRA GIFFONI I zentos anos depois que o filósofo francês Montaigne lançara suas primeiras idéias a respeito da criança. A autora afirma que o significado da infância vem se trans- formando através dos tempos, e aponta o século XVII, como marco histórico, devido às mudanças pelas quais passou a humanidade, naquele período, com relação à estruturação familiar, aos papéis e valores sociais. A no- ção de "criança", a partir daí, passa a conceber a inser- ção desta no contexto familiar e social. Na busca de uma delimitação desta fase da vida que antecede à idade adulta, utilizaremos o parâmetro da temporal idade, relacionando-a à natu- reza e a cultura, segundo a concepção de Bernard (1983), que relaciona natureza à idéia de constituição e desenvolvimento, com referência também ao esta- do otiginal da humanidade e aos traços essenciais da natureza humana. O autor estabelece uma acepção de infância, adequada à abordagem pedagógica, fazen- do a combinação entre uma teoria da cultura e as rela- ções desta cultura com a natureza humana. Dentro desta perspectiva, a noção de ' crian- ça", com aplicabilidade na pedagogia, deriva das con- cepções culturais vigentes em determinado contexto. Para Bernard (1983: 99) A pedagogia não considera a educação a partir da criança, mas a criança a par- tir da educação concebida como cultura. A pedago- gia, então, considerando as emanações culturais, elabora uma representação de infância, à qual incor- pora os conceitos essenciais do saber pedagógico. Nesta representação, figuram as transforma. ões o or- ridas no período de desenvol irnento, na interação entre natureza e cultura. Bernard (1983) enfatiza a influência das rela- ções sociais como fator de desenvolvimento, e analisa o processo interativo que en 01 e o adulto em contraposição à criança. O meio social se encarregará de lhe proporcionar as condições para o crescimento EDUCAÇÃO EM DEBATE· FORTALEZA· ANO 21 • V 2 • NQ38 • p. 125-132 • 1999· 125

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- -o DESENVOLVIMENTO PSICOAFETIVO: A RELAÇAO MAE-FILHO EO CONTEXTO SOCIAL(THE PSICHOLOGICAL ANO AFFECTIVE OEVELOPMENT: THE MOTHER-KIORELATIONSHIPANO SOCIAL CONTEXT)

Olhou o mundo a seu redor, como se o enxergasse pelaprimeira vez. Belo era o mundo!

Hennan Hesse

RESUMO

opresente trabalho trata do DesenvolvimentoHumano, no aspecto psicoafetivo, tendo por base asrelações familiares e o contexto social, em interaçãocom osfatores constitucionais. Na abordagem do tema,procuramos demonstrar a influência das relaçõessociohistóricas, estabelecidas nas fases mais pre-coces do desenvolvimento, sobre o delinear da per-sonalidade, do potencial psicoafetivo e cognitivo dosujeito.

Palavras-chave: Desenvolvimento, Relação mãe-fi-lho, Sociedade.

ABSTRACT

The present essay concerns to the HumanDevelopment, in its psychological and a.ffectiveaspects, on the basis of family relationships andinteration bettween the constitutional factors and thesocial contexto In that approach we tryed todemonstrate the influence of the social and historicalrelations, defined since the starting phases of thedeveloping processo Also, it looks to draw thepersonality by developing the psycological, a.ffectiveand cognitive dimensions ofthe self.

Keywords: Development, Mother-Kid relationship,Society.

o CONCEITO DE INFÂNCIA

o conceito moderno de infância segundo GaIlatin(1978), veio firmar-se por volta do século XVIII, du-

IMédica homeopata, com Residência em Psiquiatria e especialização em Psicoterapia. Formação em Psicanálise, Psicodrama e TerapiaFamiliar Sistêmica. Mestre em Educação.

FRANCINETE AL VES DE OLIVEIRA GIFFONI I

zentos anos depois que o filósofo francês Montaignelançara suas primeiras idéias a respeito da criança. Aautora afirma que o significado da infância vem se trans-formando através dos tempos, e aponta o século XVII,como marco histórico, devido às mudanças pelas quaispassou a humanidade, naquele período, com relação àestruturação familiar, aos papéis e valores sociais. A no-ção de "criança", a partir daí, passa a conceber a inser-ção desta no contexto familiar e social.

Na busca de uma delimitação desta fase davida que antecede à idade adulta, utilizaremos oparâmetro da temporal idade, relacionando-a à natu-reza e a cultura, segundo a concepção de Bernard(1983), que relaciona natureza à idéia de constituiçãoe desenvolvimento, com referência também ao esta-do otiginal da humanidade e aos traços essenciais danatureza humana. O autor estabelece uma acepção deinfância, adequada à abordagem pedagógica, fazen-do a combinação entre uma teoria da cultura e as rela-ções desta cultura com a natureza humana.

Dentro desta perspectiva, a noção de ' crian-ça", com aplicabilidade na pedagogia, deriva das con-cepções culturais vigentes em determinado contexto.Para Bernard (1983: 99) A pedagogia não consideraa educação a partir da criança, mas a criança a par-tir da educação concebida como cultura. A pedago-gia, então, considerando as emanações culturais,elabora uma representação de infância, à qual incor-pora os conceitos essenciais do saber pedagógico.Nesta representação, figuram as transforma. ões o or-ridas no período de desenvol irnento, na interaçãoentre natureza e cultura.

Bernard (1983) enfatiza a influência das rela-ções sociais como fator de desenvolvimento, e analisao processo interativo que en 01 e o adulto emcontraposição à criança. O meio social se encarregaráde lhe proporcionar as condições para o crescimento

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e esenvolvirnento nos aspectos biológico e social, as-egurando, inicialmente, a existência da criança, aten-

dendo às suas necessidades naturais como, porexemplo, de alimento e agasalho, bem como as neces-sidades psicoafetivas e cognitivas. No primeiro caso,especialmente quanto às necessidades biológicas ime-diatas, a relação adulto-criança faz-se no sentido doadulto para a criança. Quanto às trocas afetivas ecognitivas, diferentemente, ocorre uma relação de re-ciprocidade, que flui tanto do adulto para a criança,quanto desta para o adulto. Desta forma, o autor con-sidera que as noções de fraqueza e dependência, asso-ciadas à criança, não podem ser assumidas pelapedagogia, num sentido absoluto e sim, devem serincorporadas a uma visão dialética das interações en-tre a criança e o meio, em cada fase evolutiva. A cri-ança recém-nascida, por exemplo, para ele, apresentauma dependência biológica real, condicionada à fisi-ologia ainda em maturação, e, também uma depen-dência afetiva, encontrando-se socialmente frágil einacabada No decorrer da infância, no entanto, ela vaiabsorvendo as diversas influências culturais, tornan-do-se, gradativamente, mais independente e apta aparticipar da sociedade de forma mais consciente,influenciando por sua vez, os processos sociais.

A criança não ésomente fraca, impotente, depen-dente. É também, em razão dessafraqueza mesma,exigente. Dirige ao adulto certo número de solicita-ções, de início, essencialmente vitais e inconscien-tes, depois, cada vez mais afetivas, sociais,conscientes. O adulto reage a seus apelos emfun-ção de suas próprias necessidades, de seus proble-mas, de seus conflitos, de sua personalidade, etc.Da mesma forma, a sociedade responde às exigên-cias irfamis emfunção de seus modos deprodução,de sua organização, de suas estruturas (Bemard,1983: 107).

Vemos aí a importância das respostas dadaspelo adulto e pela sociedade às demandas da persona-lidade em formação. Dependendo do tipo e da inten-sidade destas respostas, adulto e sociedade modulamo grau de impotência e o nível de exigências da criança.

Sua personalidade se constrói sob a influên-cia da ação dos adultos e da sociedade: a cri-ança não pode abster-se destes, mas, por essamesma razão, não pode, ao mesmo tempo, nãoquerer abster-se deles e é inevitavelmente le-vada a rejeitar algumas de suas influências(Bemard,1983: 108).

No dinamismo destas relações entre adulto ecriança, sociedade e criança, é que se vão definindo oslimites do conceito de infância. Podemos apreender doprocesso de desenvolvimento humano, um antagonis-mo dialético em que se alternam e complementam adependência e a autonomia, de forma que a criançainicialmente imita o adulto e o segue, para, posterior-mente ser capaz de opor-se a ele, criando e re-criando arealidade, enquanto ganha individualidade.

MATURAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Podemos considerar o princípio da vida de umser humano, como um período marcado por intensadependência e imaturidade biopsicológica, e, emborapareça paradoxal, este mesmo ser, que apresenta ex-trema fragilidade na infância poderá atingir, na ida eadulta, altos níveis de especificidade e complexidade

Segundo Grunspun (1985: I), maturação L~sequência dos processos evolutivos pelos quais passao ser humano, desde a concepção até a maturid -de. Ele demonstra que, a cada fase do processo íe

amadurecimento somático, efetivam-se mudanças, .eacordo com a programação genética individual. A es-tas fases correspondem certas necessidades, que _criança lança no ambiente, sob forma de demanda:implícitas ou explícitas.

Do nascimento até os dois anos de idade, as-sume importância o amadurecimento do sistema ner-voso, condição para que a criança possa evoluirgradualmente do sensorial ao psíquico. A partir dsegundo ano de vida,já se observa uma certa organi-zação na estrutura psíquica, intensificando-se as tro-cas comunicacionais, afetivas e cognitivas com orneiUm aspecto a ser ressaltado é o de que o desenvolvi-mento somático segue uma certa padronização da es-pécie, enquanto o psiquismo se desenvolve segundleis que dependem de uma dinâmica psicoafetiva espe-cial entre mãe e filho, do encontro entre o psiquismadulto e diferenciado da mãe e o potencial psíquicdo bebê. Estágios mais satisfatórios de desenvolvi-mento serão atingidos, quanto maior a capacidade damãe em dar e receber afeto, de ter empatia e atende-às diversas necessidades do filho.

A PSICOGÊNESE

As origens da vida psíquica prendem-se ao te-cido primordial das relações afetivas, estabelecidas pre-cocemente. O recém-nascido, não tendo uma estrutura

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de ego organizada, nem consciência do próprio corpoe da própria existência, vive em estado sem i-indiferenciado, confundido com o corpo da mãe, numasimbiose, onde predomina a regência dos marcadoresbiológicos, regulando os processos de sobrevivênciamais imediata. Os primeiros passos para a formaçãoo mundo subjetivo da criança são, portanto, aquelesados no aconchego dessa relação mãe-filho, sob a

influência do contexto circundante. Desta forma, o ser. redominantemente biológico, e totalmente dependenteai se plasmando, gradativamente, em um seriopsicossocial, autônomo.

As características de individualidade desenvol-'em-se pela ativação do potencial genético herdado,

_ aças ao minucioso processo de elaboração, entre in-ivíduo e ambiente, onde se cruzam incessantementefilogênese e a ontogênese. E, como se dá a possibili-

cade de cada ser formado tornar-se único e, cada vezais diferenciado dos demais, ao longo da vida?

A natureza, sabiamente, coloca no próprio pro-cesso de maturação das estruturas neurológicas, a exi-gência que cada recém-nascido seja cuidado de perto.Esta determinação biológica condiciona o estabeleci-

ento de uma relação exclusiva e íntima entre o bebê_ a mãe (ou pessoa cuidadora). Disto resulta que cada_ .ança vá adquirindo características próprias; únicas,zma vez que cada relação mãe-filho também é única,_specífica. E é a partir desta unidade simbiótica inici-

. que o psiquismo do bebê vai se delineando, emforma individual, estruturando-se, pouco a pouco

_ a, em seguida, ganhar autonomia. Desta maneira,.c. natureza garante que um ser humano jamais será::: ai a outro.

A vontade, a autonomia e as capacidades- gnitivas da figura materna são fatores importantes

processo de formação da personalidade da criança,a vez que a mãe, de certa forma, empresta o seu ego

a moldagem do ego do bebê. Se ela tem um egoestruturado, esse bebê terá maiores chances de tam-

rem adquirir uma boa estruturação psicoafetiva, especi-almente quando o meio social oferece condições-. 'oráveis, colaborando com o processo.

O nível de empatia que a mãe consegue esta-_ lecer desde cedo, é fator preponderante para as aqui-

.ões afetivas e cognitivas de uma criança. Isto porque~ mãe exerce o papel de decodificar os primeiros si-- '5 fisiológicos, como por exemplo, o choro, que podese desencadeado por sensação de fome, frio, dor ouzesconforto. Identificando a origem do choro, dando-

e uma resposta adequada, a mãe, com a repetição-..,- experiências, transmite ao bebê segurança e auto-szima, ensinando-o a perceber, a com unicar-se e, atra-

vés de comportamentos cada vez mais específicos,complementar a relação. O aporte emocional da mãe(ou pessoa cuidadora), a forma de lidar com a crian-ça, ficam incorporados no psiquismo sob forma demarcas mnêmicas, juntamente com as sensações li-gadas à alimentação e aos primeiros cuidados. Tudoisso refletirá diretamente no desempenho afetivo ecognitivo que o indivíduo terá durante a vida.A partir do potencial genético herdado, o desenvolvi-mento psicoafetivo da criança dependerá da com bina-ção destes diversos fatores: a forma como é estimuladopela pessoa da mãe, as relações familiares, os valoresculturais presentes na sociedade. O biológico e o socialentrelaçam-se num processo que envolve rnaturaçãoe aculturação. Isto significa que, para que se dêem asprimeiras aquisições afetivas e cognitivas, faz-se ne-cessário o amadurecimento das funções fisiológicasbásicas como ocorre por exemplo, nas fases deamamentação e do controle dos esfíncteres. E, emseguida, assumindo prioridade, o amadurecimento dasfunções psíquicas superiores, como a capacidade deatenção e percepção. É através destas, que o egoincipiente do bebê capta os elementos da estruturaegóica da mãe, para a formação de sua estrutura psi-cológica básica e capta também, simultânea eseqüencialmente, as emanações culturais de seu ambi-ente familiar, escolar e social.~

DA DEPENDENCIA À AUTONOMIA -VIGOTSKY, WALLON E PIAGET

A formação de um ser humano, independente,como vimos, tem início numa relação de dependência,a simbiose mãe-filho. O modelo psicoafetivo maternofuncionando como matriz, é a base sobre a qual se as-senta o alicerce da personalidade da criança, em cons-trução. Este processo, aparentemente linear e rigidamentedeterminado, transcorre dentro de uma teia de "n" fa-tores, imbrincados e correlacionados, com os quais searticulam, dialeticamente, a espontaneidade e acriatividade, brotando do âmago de cada novo ser. Essaconjugação dialética entre a imitação e a oposição, pos-sibilita a ampliação das potencial idades humanas, e aprogressiva individuação .

A noção que o indivíduo tem de um Eu, vai sedefinindo, durante a infância, podendo já ser percebidapor volta do segundo ano de vida. Esta noção é a cons-ciência da própria identidade, que vai assumindo con-tornos cada vez mais nítidos e se redefinindo nas diversasfases da infância até a vida adulta, graças às interações

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Vigotsky (1984), dentro de uma perspectivapsicológica, de traços mais culturalistas, fala da trans-formação de um construto biológico num ser socio-histórico. Evidencia a importância da capacidadeperceptiva e de elaboração mental do material senso-rial captado, em cada fase do desenvolvimento do in-divíduo, sob a regência das leis gerais da evoluçãocultural da humanidade. Dedicou-se ao estudo dosaspectos tipicamente humanos do comportamento, ede como estes se desenvolvem no indivíduo, dentrode determinado contexto sociohistórico. Ele considerao processo de maturação como um fator secundáriopara o desenvolvimento de capacidades humanas maiscomplexas. A noção corrente de maturação comoum processo passivo não pode descrever, de for-ma adequada, os fenômenos complexos (Vigotsky,1984:21). A experiência social teria um papel pre-ponderante, levando a modificações na estrutura in-terna, responsável pelas operações intelectuais dacriança. Refere-se aí, à capacidade do ser humano deutilizar a linguagem, e assim, representar vivências,analisar experiências passadas, presentes, comunicar-se a respeito dessas vivências e experiências e, sobre-tudo, criar e planejar ações futuras.

Na ótica vigotskiana, a fala assume um papelespecial, nas questões relativas ao desenvolvimento,funcionando como elemento de ligação do indivíduoao ambiente. A capacidade de utilização dos signos,permitiria ao homem a elaboração e preservação deum conjunto de processos simbólicos emergentes doviver em sociedade, nos mais diversos contextos, trans-cendendo as limitações da inteligência prática, tam-bém observada nos animais.

Embora a inteligência prática e o uso de sig-nos possam operar independentemente emcrianças pequenas, a unidade dialética des-ses sistemas no adulto humano constitui a ver-dadeira essência no comportamento humanocomplexo (Vigotsky, 1984:26)

A criança se utilizaria da fala para a realiza-ção de atividades práticas, que se tornariam cada vezmais complexas, a cada fase do desenvolvimento, esuas potencialidades humanas seriam gradativamenteampliadas.

Essa unidade de percepção, fala e ação, que,em última instância, provoca a internalização docampo visual, constitui o objeto central de qual-quer análise da origem das formas caracteristi-camente humanas de comportamento (Vigotsky,1984:28)

A cultura seria o legado resultante destasvivências, acumuladas ao longo do processo de de-senvolvimento dos indivíduos, e, por extensão, doprocesso de evolução da humanidade.

Estudando os mecanismos psíquicos do pen-samento, desenvolveu um método para tentar com-preender como são formados os primeiros conceitos.Utilizou-se de experimentos com duplo-estímulo, emque apresentava à criança duas séries de estímulos,uma com objetos da atividade diária da criança e outracom os signos que servem para organizar estes obje-tos. A partir destes estudos conclui que:

A formação do conceito é seguida pela suatransferência para outros objetos; o indivíduoobservado é induzido a utilizar os novos ter-mos para falar dos objetos diferentes dos blo-cos experimentais e a definir seu significadodeforma generalizada (Vigotsky, 1979:81).

Ele afirma que, por volta do segundo ano devida, a criança geralmente já apresenta um nível dematuridade neuropsíquica que possibilita a complexaatividade das funções intelectuais envolvidas no pro-cesso de formação dos conceitos. Ela já teria um cer-to domínio da atenção e da lógica, manifestando acapacidade de fazer comparações. Estes atributos sãofatores indispensáveis para a assimilação do signifi-cado das palavras. Graças a eles, o psiquismo abstraida experiência concreta elementos que vai isolando,comparando com outros, a fim de chegar a uma sínte-se, a ser cotejada com novas análises.

Durante os dois primeiros anos de vida, a cri-ança vai se apropriando da palavra, ligando-a à es-trutura do objeto em si, antes de fazer uma utilizaçãosimbólica, através do processo acima descrito. Como amadurecimento psíquico e o aporte cultural ad-quirido, a estrutura externa do signo, que é a pala-vra, vai sendo internalizada,juntamente com o sentidosimbólico.

O conceito, portanto, de forma genérica, éum construto mental, representativo da realidade ex-terior, formado por signos (palavras) que são incor-porados gradativamente no psiquismo, através de umprocesso, em que o sujeito participa com sua estru-tura psíquica, no encontro com os estímulos do am-biente. Os signos são instrumentos de intermediaçãoentre a mente e seu contexto, possibilitando a inter-comunicação. Através dessa comunicação, e tambémde sua participação criativa, a criança vai organizan-do e orientando seu comportamento, enquanto vai setornando um adulto.

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o processo de individuação é, portanto, aque-le, através do qual, a criança vai deixando o estado dedependência e assumindo uma diferenciação grada-tiva, até chegar à condição de indivíduo. ParaVigotsky(1984), o ponto de partida é o biológico, parase chegar ao social e dá-se concomitantemente ao pro-cesso de formação do conceito, que acontece no inte-rior do psiquismo, mas sofre a influência da cultura.Assim, a palavra se transforma de signo em símbolo.

A tarefa da cultura, por si só, porém, não ex-plica o mecanismo de desenvolvimento quetem por resultado aformação do conceito. Oinvestigador deve tentar compreender as re-lações intrínsecas entre as tarefas externas ea dinâmica do desenvolvimento e considera agênese dos conceitos como função do cresci-mento cultural e social global da criança afetanão apenas o conteúdo, mas também o seumodo de pensar (Vigotsky, 1979:81).

A compreensão de como se transformam asvivências individuais em símbolos culturais é um dosimportantes legados deste autor. Para ele, o aprendi-zado, que é um processo aparentemente externo, ocorreno despertar de processos internos, que ~rotam nainteração social. Numa brincadeira, por exemplo, aação desempenhada torna-se pouco a pouco uma re-gra internalizada, que proporciona comunicação epassa a ter significado social. Sobre essa ação, o su-jeito pode desenvolver sua imaginação, buscar prazere, no contato com os outros, aprender a adiar a satis-fação, ter auto-controle, relacionar-se. No bebê, atra-vés do afeto e das repetições simbólicas das atitudesdos adultos, impregnadas de cultura, gradativamenteocorrem novos aprendizados que ampliam as chancesde um desenvolvimento satisfatório.

A maturação neuro-psíquica e as interaçõessociais possibilitam a formação dos conceitos e aconsequente organização dos aprendizados afetivos ecognitivos. A tarefa da educação seria a de comple-mentar aquilo que a criança estivesse necessitando emseu aprendizado individual, para continuar cada vezse formando enquanto ser, se individualizando. Aescola seria então um espaço para a organização decertos conhecimentos, auxiliando neste processo dedesenvolvimento dos indivíduos.

Veremos agora algumas importantes contri-buições de Wallon (1981), que, veio também situar-seepistemologicamente, entre a pedagogia e a psicolo-gia, trazendo dentre suas contribuições teóricas, aênfase na importância da afetividade como fator pre-

cedente às aquisições cognitivas. Em seus estudos deneurologia, evidencia a plasticidade do sistema ner-voso e as relações entre o movimento e o psiquismoe o impacto da linguagem sobre o desenvolvimento.Em incursões pelo terreno da antropologia, mostra aimportância de se observar a criança, em diversoscontextos, conforme. refere Galvão (1995:34)

Para Wallon, a comparação entre sociedadesdistintas favorece que se apreenda a influên-cia de técnicas, instrumentos e conhecimen-tos, ou seja, do meio cultural, sobre odesenvolvimento do sujeito.

Wallon (1971) considera o ser, como "geneti-camente social". Isto significa que ele se comunica,desde os primórdios da vida, através dos contatosafetivos iniciais, na simbiose mãe e filho, onde estabe-lece uma relação de cunho essencialmente emocional.

Assim, temos, no primeiro estágio da psico-gênese, uma afetividade impulsiva, emocio-nal, que se nutre pelo olhar, pelo contato fisicoe se expressa em gestos, mímica e posturas(Wallon, in Galvão, 1995:45).

Ele desenvolveu a "teoria da emoção", inspi-rada em Darwin, onde o aspecto biológico dá origemao emocional e ao social. É, por exemplo, através dochoro, (emoção) que o bebê mobiliza a atenção daspessoas, no sentido de satisfazer suas necessidades.A emoção, nesta perspectiva, pode ser vista como ins-trumento de sobrevivência típico da espécie humana.A manifestação emocional, afetiva, estaria ligada auma socialização, existente,já, desde o início da vida,representando o vínculo com o grupo.

A teoria psicogenética walloniana destaca ofator afetividade como fundamental no processo dodesenvolvimento humano. O Início deste desen 01 i-mento dá-se no período que ele denominou impulsi-vo-emocional e que se estende ao longo do primeiroano de vida. E, neste período, de exuberância motorae emocional, a criança tem oportunidades de aquisi-ção, incorporação e também expressão, partindo deum "eu corporal" para um "eu psíquico " construin-do-se à medida que vai se diferenciando. Podemos con-siderar que, nesta concepção, o cognitivo se assentarána base construída pelo afeti o. Analisando Wallon,Dantas refere que:

O processo que começou pela simbiose fetaltem no horizonte a individualização (...) Não

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há nada mais social do que oprocesso atravésdo qual o indivíduo se singulariza, constrói suaunicidade. Quando ele superou a dependênciamais imediata da interpessoalidade, prosseguealimentando-se da cultura, isto é, ainda do ou-tro, sob a forma, agora, do produto do seutrabalho (1990: 97).

É importante ressaltar também a ênfase dadaà cultura e à linguagem como instrumentos para a evo-lução do pensamento da criança, na teoria walloniana.Galvão (1995: 41), lembra que, para ele, O simplesamadurecimento do sistema nervoso não garante odesenvolvimento de habilidades intelectuais maiscomplexas. Para que se desenvolvam, precisaminteragir com alimento cultural, isto é, linguagem econhecimento. Por outro lado, mesmo que o sistemanervoso já tenha atingido sua maturação orgânica de-finitiva, para Wallon, as funções psíquicas podem con-tinuar em processo de especialização, evoluindo. E,um outro aspecto peculiar, que queremos salientar é ode que, nesta abordagem, o desenvolvimento não évisto de forma estratificada e linear. Do pensamentode Wallon, entende Galvão (1995:41) que: O ritmo peloqual se sucedem as etapas é descontinuo, marcadopor rupturas, retrocessos e reviravoltas. Estas etapassão caracterizadas pelo conjunto de necessidades einteresses da criança, de forma que, em cada idade, seestabelecem relações específicas entre o indivíduo eo ambiente. São considerados importantes, os aspec-tos físicos do espaço onde vive a criança, as pessoasmais próximas, a linguagem utilizada por estas e acultura em si, enquanto contexto onde se dá o desen-volvimento. E, assim, apesar deste desenvolvimentoobedecer a certas leis constantes, ele transcorre comdinâmica e ritmo próprios, quando se considera cadacriança, de forma contextualizada. De início, os fatoresorgânicos têm um peso maior, obedecendo essencial-mente às determinações biológicas, e progressivamen-te, a influência do meio cultural assume a regência,torna-se mais decisiva na aquisição de condutas psi-cológicas superiores, como a inteligência simbólica(Galvão, 1995:40)

Em seu estadiamento, Wallon (in: Galvão,1995) considera a altemância entre fases com predo-minância afetiva e cognitiva, totalizando cinco estágios:impulsivo-emocional, sensório-motor e projetivo,personalista, categorial e adolescente.

A fase inicial do desenvolvimento, o primei-ro ano de vida, corresponde ao estágio impulsivo-emocional, que não começando cognitivamente, temna emoção o elo entre a criança e o ambiente. O mo-

vimento do bebê atua sobre o meio humano, provo-cando reações e, dessa forma estabelece-se a expres-são e a comunicação. Daí dizer que este bebê, desdeo início, é um ser social. Até o terceiro ano transcor-rem os estágios sensório-motor e projetivo com a bus-ca de exploração do espaço e manipulação de objetos.Seu marco é o desenvolvimento da função simbólica eda linguagem, quando o ato motor converte-se em atomental. No período personalista, entre os 3 e 6 anos,as relações interpessoais assumem prioridade, em de-trimento da atividade cognitiva. A apropriação dos sig-nos se dá pelo elo com as pessoas que os detêm. Asinterações sociais possibilitam a construção da perso-nalidade e a definição da consciência de si. A imitaçãodá lugar à crise de oposição, no jogo entre o "sim" e o"não" . O estágio categoria I tem início a partir dos 6anos, quando já devem estar consolidados a funçãosimbólica e a diferenciação da personalidade. É umafase em que o progresso intelectual, direciona as rela-ções com o meio, especialmente para o espectocognitivo. O último estágio é a fase adolescente, des-crita por Wallon (in: Galvão, 1995:44-45)

No estágio da adolescência, a crise pubertáriarompe a "tranqüilidade" afetiva que caracteri-zou o estágio categorial e impõe a necessidade deuma nova definição dos contornos dapersonali-dade,desestruturadosdevido às modificações cor-porais resultantes da ação hormonal. Esteprocesso traz à tona questões pessoais, morais eexistenciais, numa retomada da predominânciada afetividade.

Ele chama de "predominância funcional" aaltemância entre os aspectos afetivos e cognitivos, ecada um dos cinco estágios do desenvolvimento, porele descrito.

Piaget (1997) faz, de certa forma, um contra-ponto os autores citados acima, quando trata como igu -mente cognitivas todas as fases do desenvolvimemEm sua teoria da psicogênese postula que, desde o iní-cio da vida, o bebê já tem uma gestualidade instrume -tal dirigida para conhecer o mundo. Construiu a idéiade um "sujeito epistêmico", cujos processos de pensa-mento já se encontram presentes na infância, indo até zidade adulta, diferindo apenas quanto aos mecanism =mentais utilizados por este sujeito, para tentar entende-o mundo, nas diferentes etapas da vida.

Desde antes da formação da linguagem (.quanto à estrutura dos conhecimentos, vê-seque estes se constituem no plano da própr.

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ação, com suas bipolaridades lógico-matemáti-ca efisica (..) e uma longa evolução será neces-sária até sua subjetivação em operações (piaget,1978:10)

Ele mostra tanto a criança como o adulto numprocesso ativo de contínua interação com o ambientee, que, nesta interação, a adaptação à realidade exter-na depende basicamente do conhecimento.

o que se propõe a epistemologia genética épois pôr a descoberto as raizes das diversas va-riedades de conhecimento, desde as suas formasmais elementares, e seguir sua evolução até osníveis seguintes, até, inclusive, opensamento ci-entífico (piaget,1978:3)

Dedicou-se portanto, a estudar como o orga-nismo conhece o mundo, considerando que, só o co-nhecimento possibilita ao homem um estado deequilíbrio interno, a partir do qual se adapta ao ambi-ente. O desenvolvimento seria a construção de estru-turas lógicas que capacitam o indivíduo para atuarsobre o mundo, e, cada vez mais, conhecê-lo em di-ersos níveis de complexidade.

o conhecimento não poderia ser concebi-do como algo predeterminado nas estrutu-ras internas do indivíduo, pois que estasresultam de uma construção efetiva e con-tínua (Piaget, 1978:3)

Na teoria piagetiana, a tarefa principal do::esenvolvimento mental no primeiro ano de vida com-reende a organização das primeiras impressões

sensoriais. A criança recebe um equipamento gene-. amente herdado, e forma estruturas mentais com- quais organiza suas sensações e estados internos.

~sta estrutura biológica muda e se adapta com o tem-. ,com o desenvolvimento de novas estratégiasmentais, que lhe possibilitam a resolução de proble-mas. Em cada fase da infância, ela atinge novas for-

as de organização mental e transita constantementede um estado de desequilíbrio para um estado de equi-líbrio, cujo funcionamento mental é de nível maissuperior. Na adolescência, deverá ter atingido umcerto patamar intelectual que perdurará durante todaa idade adulta.

O desenvolvimento intelectual envolve umaequilibração progressiva, uma passagem contí-nua de um estado de menor equilíbrio

para um estado de equilíbrio superior. :L-sim, do ponto de vista da inteligência. éfácil se opor a instabilidade e incoerên-cia relativas às idéias infantis à sistema-tização de raciocínio do adulto. No campoda vida afetiva, notou-se muitas vezes,quanto o equilíbrio dos sentimentos au-menta com a idade. E,finalmente tambémas relações sociais obedecem à mesma leide estabilização gradual (Piaget,1997:13)

Piaget (1997) centraliza seu conceito de in-teligência no desenvolvimento gradativo dos proces-sos de simbolização. Afirma que o desenvolvimentocognitivo é observado a partir do nascimento e queos desenvolvimentos atingidos subseqüentemente têmsuas bases estabelecidas na infância. A criança nas-ce com um conjunto de reflexos e mecanismos ina-tos que caracterizam o período sensório-motor. Estesmecanismos modificam-se, de acordo com os estí-mulos do ambiente, sendo, no entanto, condicionadosa um estadiamento, de forma que, cada estágio pre-para as estruturas para o próximo, num processo quesegue, inexoravelmente, até a formação dos símbolos.

Segundo Menezes (in: Leite, 1997, 142-3),para Piaget, a ação da "sociedade" ou da "vida social",mo influenciaria o desenvolvimento de maneira uni-forme e contínua. A influência do contexto social seriadiferenciada em cada fase, resultando na socializaçãodo pensamento, no período das operações formais,onde o individual e o social estariam em equivalên-cia. O processo de desenvolvimento consistiria, emsuma, na evolução do pensamento egocêntrico para osociocêntrico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando a acepção de Bernard 198.», emque a criança emerge da cultura, de onde re ebe estí-mulos para as transformações naturais, rumo à au o-nomia, chegamos às concepções atualmente a eino campo da psicologia e da pedagogia, o e aseria o período vivenciado entre a fase e indife-renciação afetivo-cognitiva e o ai orecer da persona-lidade. Consideramos, no entanto a dificuldade realde delimitação, quanto às dimensões de espa o e tem-po que a infância assumirá na vida de cada indivíduo,em cada contexto cultural. O conceito de infância,conforme estamos compreendendo, evoca ainda oparadoxal binômio: dependência-independência, e en-

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volve as noções de necessidade, poder, capacidade eaptidão da criança com relação aos papéis sociais, his-toricamente determinados.

Nestes moldes, vemos o ser humano, aolongo de seu desenvolvimento, interagindo, posicio-nando-se, individual ou socialmente, construindo umcentro próprio de referência, a personalidade. E, aconstrução deste arcabouço psicológico, a nossover, assenta-se no alicerce afetivo da família, ondeos potenciais genéticos herdados misturam-se, ini-cialmente, com o amálgama psicoafetivo da mãe(ou pessoa cuidadora), sofrendo, a seguir, a influ-ência das interações sociais mais próximas (pa-rentes, escola). Ressaltamos, no decorrer de todoo processo de desenvolvimento, a influência dosvalores presentes no contexto sociohistórico, numsentido mais amplo.

Dentro deste contexto, os elementos primi-tivos da linguagem, como gestos, posturas, atitudes,da infância à idade adulta, vão se agregando,gradativamente à sua correspondente estrutura sim-bólica, num processo que resulta na incorporaçãodos valores culturais, sob forma de representaçõesinternas. Daí, concluímos que, graças às experiên-cias afetivas e cognitivas vividas pelo sujeito nasfases mais precoces da vida, mediadas pela lingua-gem, ocorrem as transformações evolutivas indivi-duais e sociais.

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