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História em quadrinhos História em quadrinhos Sua primeira manifestação é a curta e divertida Norman vs. America – de autoria de Charles Platt (o próprio autor registra como inspiração uma ideia de John T. Sladek, autor de Alien Territory e The Lost Nose: A Programmed Adventure, an- tigas obras dessa leitura interativa) – publicada na coletânea Quark/4, em 1971, sendo a única história em quadrinhos em meio a tantos outros textos de ficção de (hoje) autores consagrados como Larry Niven, Philip José Farmer, Michael Moorcock, entre outros. Classificada pelo pró- prio autor como programmed comic strip (algo como “história em quadrinhos programada”), essa pequena HQ apresenta ao leitor o seduzido Norman, o qual chega a Nova York em busca de sucesso e enriquecimento fácil. O leitor é quem decidirá quais as melhores escolhas para que se consiga atingir o sonho americano. A Disney lançou vários títulos de Mickey e companhia nessa modalidade, posteriormente, alguns até traduzidos para o português. E ngana-se quem pensa que a maior inte- ratividade que uma HQ pode oferecer a seu leitor é sua adaptação para filme ou jogo de videogame. Apesar de raras manifestações, HQ-jogos fazem sua aparição de tempos em tempos como o monstro do lago Ness “vem à superfície” instigar curiosos. Muito provavelmente esse híbrido de his- tória em quadrinhos com leitura não linear foi resultado da combinação de livros interativos de leitura não sequencial (como as séries Pick- -a-Path, Choose Your Own Adventure, Fighting Fantasy, só para citar algumas) com a nona arte. Passados esses casos isolados, a primeira série de HQ-jogo que o mundo conheceu foi Diceman. Nessa série o leitor vivia aventuras em quadrinhos e controlava personagens com missões a cumprir como o Juiz Dredd, o feiticeiro Nêmesis, o furioso bárbaro Slaine, o robô de batalha ABC Warrior, o investigador Rick Fortune (o próprio Diceman), o soldado Rogue Trooper, o grande deus do prazo (é isso mesmo!) Torquemada e até mesmo o ex- -presidente Ronald Reagan. Nessa série, valores numéricos e estratégias eram um adicional à mera escolha de como a aventura seguiria. No Brasil, uma única manifestação desse tipo foi conhecida. A série de gibis d’A Aven- turas dos Trapalhões apostou em dois HQ- -jogos numa série paralela, a Especial RPG. Essa gerou os gibis A ilha dos dinossauros e Em busca do ioiô sagrado, ambos em 1993, com roteiro de Marcelo Cassaro – um dos “patronos” do RPG nacional. Depois deles, um grande hiato de publicações quadrinísti- cas interativas, até uma nova onda surgir com Seu Turno (2012) – com o apoio do PROAC (Programa de Apoio Cultural do Estado de São Paulo) – e Last RPG Fantasy (2012) – pri- meiro trabalho do tipo publicado sob finan- ciamento coletivo (o popular crowdfunding). Além disso, o Brasil teve a primeira tradução de um HQ-interativo para o português extra- -Disney: o intrigante Captive (2016). Na própria academia novos HQ-jogos têm mostrado seu potencial para esse gênero ain- da tão desconhecido, como A Cura e Qual Caminho?, além de outros que estão por vir. Seja faturando premiações, vencendo edi- tais de concurso, traduzindo o que há de melhor lá fora ou surgindo de experimentos acadêmicos, o certo é que o leitor sairá ga- nhando, não importa o modo. Torcemos para que nossos novos talentos consigam o apoio necessário para que seus trabalhos não sejam eternos TCCs arquivados. UMA HISTÓRIA EM QUADRINHOS EM QUE VOCÊ É O HERÓI NO BRASIL, UMA ÚNICA MANIFESTAÇÃO DESSE TIPO FOI CONHECIDA. A SÉRIE DE GIBIS D’A AVENTURA DOS TRAPALHOES APOSTOU EM DOIS HQ-JOGOS NUMA SÉRIE PARALELA, A ESPECIAL RPG HQ-jogo © Reprodução 28 29 PEDRO PANHOCA DA SILVA UNESPCIÊNCIA | JULHO 2018 JULHO 2018 | UNESPCIÊNCIA Pedro Panhoca da Silva é mestrando em Literatura do programa de Pós-Graduação em Letras da Unesp – Câmpus de Assis. Atualmente é professor de Leitura e Produção de Textos da Fundação Hermínio Ometto (UNIARARAS).

odução HQ-jogoturas dos Trapalhões apostou em dois HQ--jogos numa série paralela, a Especial RPG. Essa gerou os gibis A ilha dos dinossauros e Em busca do ioiô sagrado, ambos

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Page 1: odução HQ-jogoturas dos Trapalhões apostou em dois HQ--jogos numa série paralela, a Especial RPG. Essa gerou os gibis A ilha dos dinossauros e Em busca do ioiô sagrado, ambos

História em quadrinhosHistória em quadrinhos

Sua primeira manifestação é a curta e divertida Norman vs. America – de autoria de Charles Platt (o próprio autor registra como inspiração uma ideia de John T. Sladek, autor de Alien Territory e The Lost Nose: A Programmed Adventure, an-tigas obras dessa leitura interativa) – publicada na coletânea Quark/4, em 1971, sendo a única história em quadrinhos em meio a tantos outros textos de ficção de (hoje) autores consagrados como Larry Niven, Philip José Farmer, Michael Moorcock, entre outros. Classificada pelo pró-prio autor como programmed comic strip (algo como “história em quadrinhos programada”), essa pequena HQ apresenta ao leitor o seduzido Norman, o qual chega a Nova York em busca de sucesso e enriquecimento fácil. O leitor é quem decidirá quais as melhores escolhas para que se consiga atingir o sonho americano. A Disney lançou vários títulos de Mickey e companhia nessa modalidade, posteriormente, alguns até traduzidos para o português.

E ngana-se quem pensa que a maior inte-ratividade que uma HQ pode oferecer a

seu leitor é sua adaptação para filme ou jogo de videogame. Apesar de raras manifestações, HQ-jogos fazem sua aparição de tempos em tempos como o monstro do lago Ness “vem à superfície” instigar curiosos.

Muito provavelmente esse híbrido de his-tória em quadrinhos com leitura não linear foi resultado da combinação de livros interativos de leitura não sequencial (como as séries Pick--a-Path, Choose Your Own Adventure, Fighting Fantasy, só para citar algumas) com a nona arte.

Passados esses casos isolados, a primeira série de HQ-jogo que o mundo conheceu foi Diceman. Nessa série o leitor vivia aventuras em quadrinhos e controlava personagens com missões a cumprir como o Juiz Dredd, o feiticeiro Nêmesis, o furioso bárbaro Slaine, o robô de batalha ABC Warrior, o investigador Rick Fortune (o próprio Diceman), o soldado Rogue Trooper, o grande deus do prazo (é isso mesmo!) Torquemada e até mesmo o ex--presidente Ronald Reagan. Nessa série, valores numéricos e estratégias eram um adicional à mera escolha de como a aventura seguiria.

No Brasil, uma única manifestação desse tipo foi conhecida. A série de gibis d’A Aven-turas dos Trapalhões apostou em dois HQ--jogos numa série paralela, a Especial RPG. Essa gerou os gibis A ilha dos dinossauros e Em busca do ioiô sagrado, ambos em 1993, com roteiro de Marcelo Cassaro – um dos “patronos” do RPG nacional. Depois deles, um grande hiato de publicações quadrinísti-

cas interativas, até uma nova onda surgir com Seu Turno (2012) – com o apoio do PROAC (Programa de Apoio Cultural do Estado de São Paulo) – e Last RPG Fantasy (2012) – pri-meiro trabalho do tipo publicado sob finan-ciamento coletivo (o popular crowdfunding). Além disso, o Brasil teve a primeira tradução de um HQ-interativo para o português extra--Disney: o intrigante Captive (2016).

Na própria academia novos HQ-jogos têm mostrado seu potencial para esse gênero ain-da tão desconhecido, como A Cura e Qual Caminho?, além de outros que estão por vir.

Seja faturando premiações, vencendo edi-tais de concurso, traduzindo o que há de melhor lá fora ou surgindo de experimentos acadêmicos, o certo é que o leitor sairá ga-nhando, não importa o modo. Torcemos para que nossos novos talentos consigam o apoio necessário para que seus trabalhos não sejam eternos TCCs arquivados.

UMA HISTÓRIA EM QUADRINHOS EM QUE VOCÊ É O HERÓI

NO BRASIL, UMA ÚNICA MANIFESTAÇÃO DESSE TIPO FOI CONHECIDA. A SÉRIE DE GIBIS D’A AVENTURA DOS TRAPALHOES APOSTOU EM DOIS HQ-JOGOS NUMA SÉRIE PARALELA, A ESPECIAL RPG

HQ-jogo© Reprodução

28 29

PEDRO PANHOCA DA SILVA

UNESPCIÊNCIA | JULHO 2018 JULHO 2018 | UNESPCIÊNCIA

Pedro Panhoca da Silva é mestrando em Literatura do programa de Pós-Graduação em Letras da Unesp – Câmpus de Assis. Atualmente é professor de Leitura e Produção de Textos da Fundação Hermínio Ometto (UNIARARAS).