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O ESTADO DA MACROECONOMIA Revoluções, Consensus e o Ensino da Macroeconomia para o Século XXI 1 Vivaldo M. P. Mendes ISCTE, Outubro 2001 1 Este texto foi editado em ”LaTex”. Esta linguagem faz a hifenização automati- camente, mas infelizmente ainda não consegue superar todos os pequenos truques da língua portuguesa. Tentei corrigir manualmente todos os pequenos lapsos de hifenização. Lamento se algum deles ainda continua presente no texto.

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O ESTADO DAMACROECONOMIA

Revoluções, Consensus e o Ensino daMacroeconomia para o Século XXI 1

Vivaldo M. P. Mendes

ISCTE, Outubro 2001

1Este texto foi editado em ”LaTex”. Esta linguagem faz a hifenização automati-camente, mas infelizmente ainda não consegue superar todos os pequenos truquesda língua portuguesa. Tentei corrigir manualmente todos os pequenos lapsos dehifenização. Lamento se algum deles ainda continua presente no texto.

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Conteúdo

Prefácio iii

1 Introdução 11.1 Revoluções, Contra—Revoluções e Consensus . . . . . . . . . . 21.2 Explosão de Publicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71.3 O Sucesso da Receita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

2 ”As” Duas Questões Fundamentais da Macroeconomia 132.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132.2 Ciclos Económicos de Curto Prazo . . . . . . . . . . . . . . . 14

2.2.1 Choques sobre ”fundamentals” . . . . . . . . . . . . . 152.2.2 Estrutura não—linear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152.2.3 ”Self Fullfilling Prophecies” . . . . . . . . . . . . . . . 18

2.3 Crescimento de Longo Prazo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

3 As Limitações do Velho Modelo Keynesiano 243.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243.2 Bloco IS—LM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

3.2.1 Função IS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253.2.2 Mercado Monetário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 323.2.3 Procura Agregada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

3.3 Oferta agregada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 383.3.1 O Modelo: Equações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 383.3.2 Expectativas Adaptativas . . . . . . . . . . . . . . . . 423.3.3 As limitações do modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

4 O Novo Modelo Keynesiano: O Consensus 524.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 524.2 O Novo Modelo IS—LM—CP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

4.2.1 A Nova Função IS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 594.2.2 A Nova Curva de Phillips . . . . . . . . . . . . . . . . 604.2.3 Mercado Monetário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 624.2.4 Exemplo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

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CONTEÚDO ii

5 Dinâmica, Crescimento e Produto Potencial 715.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 715.2 Sustentabilidade, Transição Dinâmica e Equilíbrio de Longo

Prazo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 735.3 Crescimento Endógeno vs Crescimento Exógeno . . . . . . . . 80

5.3.1 Modelo de Solow . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 825.3.2 Modelo de I&D com Externalidades . . . . . . . . . . 83

5.4 Convergência e Computação: Um Exemplo . . . . . . . . . . 88

6 O Programa Proposto 936.1 Objectivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 946.2 Pré-requisitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 966.3 Regimes de Aulas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 966.4 Pontos do Programa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

6.4.1 Ciclos Económicos de Curto Prazo . . . . . . . . . . . 96

6.4.2 Análise Macroeconómica de Longo Prazo . . . . . . . 976.5 Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 986.6 Equipa Docente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 986.7 Regimes de Avaliação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98

7 Considerações Pedagógicas 1007.1 Orientação do ensino . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1007.2 Aulas Teóricas vs Aulas Práticas . . . . . . . . . . . . . . . . 1027.3 Avaliações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1047.4 Material de apoio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

8 Considerações Finais 110

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Capítulo 1

Introdução

”What do we know about macroeconomics that Wicksell and Fisherdid not? ... The answer is very clear: We have learned a lot. Indeed,progress in macroeconomics may well be the success story of the 20thcentury economics.”Olivier Blanchard, 1999

A ”Macroeconomia” vive presentemente um período notável e, na minhaopinião, Olivier Blanchard está inteiramente correcto. Apesar de poder pare-cer estranho para alguns economistas, a macroeconomia é o grande sucessoda economia das últimas seis décadas. Neste relatório, vou tentar convencero leitor deste sucesso. Pretendo também chamar a atenção para o facto deque a macroeconomia moderna não se esgota no ensino do velho modeloIS—LM e que, por outro lado, a maioria dos programas curriculares a nívelintermédio descura de forma notória o ensino do crescimento económico delongo prazo.

A macroeconomia moderna assenta em cinco pilares fundamentais: (i)produto potencial, ao qual estão intimamente ligados a taxa natural de de-semprego e uma taxa de inflação que é o valor objectivo ou ”target” do bancocentral para esta taxa; (ii) hiato do produto efectivo relativamente ao pro-duto potencial; (iii) expectativas ”forward looking” dos agentes económicos,as quais deverão ter necessariamente em consideração a capacidade máximaprodutiva da economia no futuro; (iv) regras de política monetária que levamem consideração o hiato entre a taxa esperada de inflação e a taxa—objectivodo banco central; (v) políticas monetárias extremamente agressivas no com-bate à inflação. Como se pode ver, a relação entre os ciclos de curto prazo(PIB efectivo) e o longo prazo (PIB potencial) é crucial para se perceberbem a lógica entre os cinco pontos acima referidos. Como é que os alunospoderão entender a eficácia da política económica de curto prazo, se nãotiverem uma noção clara do que é o PIB potencial e de quais são os princi-pais factores que afectam a sua posição e crescimento no longo prazo? Como

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CAP 1. INTRODUÇÃO 2

é que podem perceber a razão que explica o facto da política monetária nãopoder ser eficaz no longo prazo, se não tiverem um conhecimento bastanterazoável sobre os factores determinantes do crescimento de longo prazo?

Existem três razões fundamentais para justificar a afirmação inicial deque a macroeconomia vive presentemente um período notável. Primeiro,após revoluções e contra—revoluções ao longo dos últimos trinta anos, estáperfeitamente claro hoje que um novo consensus já existe no seio das prin-cipais correntes da teoria económica. Segundo, a atestar este facto, estamosa assistir a uma explosão de produção de natureza científica e pedagóg-ica relacionada com este período de consolidação do novo consensus. Porexemplo, só neste ano saíram três novos livros—texto de macroeconomia in-termédia por reputados economistas a nível internacional. Terceiro, existehoje a convicção de que a aplicação dos princípios de política económica queresultam desta etapa da macroeconomia tem dado excelentes resultados.Nunca na história recente dos países da OCDE existiu um período em queo grupo como um todo pudesse usufruir de elevadas taxas de crescimento,baixas taxas de inflação, e (descontando a Europa) desemprego relativa-mente baixo. É hoje indiscutível que as recessões económicas são, por umalado, muito mais curtas em duração e intensidade, e, por outro lado, surgemcom muito menos frequência do que no passado, mesmo na década 60.

1.1 Revoluções, Contra—Revoluções e Consensus

Não será exagerado afirmar que desde o início do século passado (maisconcretamente, desde os anos 30), todas as principais revoluções e contra—revoluções que se têm verificado no seio do pensamento económico têm—sedesenvolvido fundamentalmente dentro daquilo a que designamos hoje pormacroeconomia. A revolução Keynesiana que se espalhou praticamente portodos os países ocidentais no pós II Guerra Mundial, depois o Monetarismo,os ”Novos Clássicos”, os ”Ciclos Económicos Reais” e os ”Novos Keyne-sianos”, para já não falar de Crescimento Exógeno da década de 60 e doCrescimento Endógeno da década de 90, todos foram desenvolvidos dentrodo tipo de abordagem da macroeconomia. Esta abordagem pretende explicaratravés da construção de um modelo geral aplicado a toda a economia, quera natureza dos ciclos económicos de curto prazo, quer os factores que ex-plicam o comportamento e evolução do produto no longo prazo (produtopotencial).

Por outro lado, após 50 anos de aceso debate entre as principais correntesde pensamento, existe neste momento a percepção clara que uma nova sín-tese está praticamente estabelecida entre as principais correntes teóricasdentro das escolas dominantes. Iremos ao longo deste texto designar estanova síntese por Novo Keynesianismo porque ela é claramente Keynesianano espírito, embora herde alguns aspectos cruciais do monetarismo, das

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CAP 1. INTRODUÇÃO 3

”expectativas racionais” e mesmo dos ”ciclos económicos reais”. Consistenuma conjugação lógica e consistente entre: (i) mercados imperfeitos dev-ido a rigidez de natureza nominal e real, (ii) a incorporação das expectativas”forward looking” dos agentes económicos ao nível dos vários mercados; e(iii) a quantificação dos principais impactos de choques sobre a economiacom base em modelos estocásticos de equilíbrio geral.

Para uma disciplina que praticamente não existia em meados da décadade 30, a evolução e a acumulação de conhecimento ao nível da macroecono-mia é de facto notável num escasso período de sessenta anos e sem a possi-bilidade de experiências de laboratório ao alcance de outras áreas científicas.Uma década passada após a publicação da ”Teoria Geral” de Keynes já ex-istia uma noção clara de dois campos de investigação bem distintos dentroda teoria e política económicas: a investigação com uma natureza micro-económica e uma outra de natureza macroeconómica.1

Devemos ter em consideração que a disciplina a que chamamos hoje”Macroeconomia”, apesar de ter sido iniciada com a publicação da ”TeoriaGeral” de Keynes em 1936, e de ter dado os primeiros esboços de formaliza-ção das principais ideias de Keynes (dispersas ao longo da ”Teoria Geral”por vários capítulos) pela mão de John Hicks em 1939, só em meados dadécada de 40 se começou a afirmar como uma corrente própria no seio dateoria económica. De facto, a primeira vez que o termo ”macroeconomia”surge utilizado no corpo de um artigo foi por Jacob Marschak em 1945, en-quanto que a primeira vez que o termo apareceu num título foi por LawrenceKlein em 1946. Nas Figuras 1.1 e 1.2 apresento uma imagem de cada umdos textos.

Portanto, entre meados dos anos 40, quando a disciplina se lançou comouma das áreas de investigação específica no âmbito da economia, e finais dosanos 60, quando a primeira noção de crise surgiu no seio do corpo teóricodominante – modelo IS—LM—AS sem expectativas – decorrem apenas cercade vinte e cinco anos. Este modelo básico era bastante limitado no trata-mento de, entre outros, mercado de trabalho, expectativas sobre preços e,consequentemente, sobre a própria eficiência da política fiscal e (sobretudo)política monetária. Estas limitações eram o próprio resultado da infância

1Note—se que com isto não pretendo dizer que toda a teoria económica se reduz àquiloque temos hoje em livros de texto de ”microeconomia” e ”macroeconomia”. No entanto,quando se analisa uma questão em termos económicos, ou fazêmo—lo do ponto de vistado comportamento de uma unidade económica ”micro” (um consumidor, uma empresa,um mercado), ou uma unidade económica ”macro” (um conjunto de consumidores, umconjunto de empresas, um conjunto de mercados etc.). Este método tem sido largamentedominante na economia ao longo de grande parte do século passado até aos nossos dias.Existe um conceito alternativo de meso—economia que pretende analisar o comportamentoeconómico ao nível dos sectores de actividade. No entanto, este tipo de análise aindanão está bem estabelecido dentro da teoria económica. Por exemplo, há quem o façanuma perspectiva de natureza ”microeconómica”, ao nível daquilo que é designado por”economia industrial”.

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CAP 1. INTRODUÇÃO 4

da disciplina na altura, bem como do enorme sucesso que a mesma teveao longo daquele período. Como as prescrições do modelo levavam a bonsresultados, não existiam incentivos para a sua reformulação.

No entanto, as limitações do mesmo teriam de ser, mais cedo ou maistarde, postas em cheque porque o modelo estava construido em bases poucosólidas. Por isso, foram proféticas as palavras de Edmund Phelps (1967)e Milton Friedman (1968) quando avisaram que este modelo básico levarianecessariamente a períodos de inflação bastante elevada e sem grandes bene-fícios ao nível da produção e do emprego. A validade desta previsão foi in-tegralmente demonstrada com acontecimentos que se desenrolaram durantetoda a década de 70 e parte dos anos 80 em praticamente todos os paí-ses economicamente desenvolvidos: elevada inflação, elevado desemprego, ebaixas taxas de crescimento económico.

Após vinte e cinco de crescimento económico elevado nas economias oci-dentais, cuja gestão estava totalmente sustentada nas prescrições do mod-elo Keynesiano dominante – ao ponto de um insuspeito conservador comoRichard Nixon declarar, na condição de presidente dos EUA na 1971 Stateof the Union Address ”I am a Keynesian ... by spending as if we were atfull employment, we will help to bring about full employment”2 – o modeloIS—LM—AS tinha chegado ao momento em que uma profunda revisão eraindispensável. Esta revisão levou cerca de duas décadas e meia para serimplementada e claramente sentida nos principais espaços onde a economiapode ser considerada como de importância fundamental: meios académicose instituições que conduzem a política económica. Certamente, levará maisalgum tempo até que esta nova ”cara” da macroeconomia chegue aos meiosde comunicação social de massas e ao leitor, ou político, menos informado.

Pelo meio ficaram quatro revoluções. Em finais da década de 60 surgiua revolução monetarista de Friedman e Meltzer, entre outros. Depois, foi arevolução das ”expectativas racionais” de Lucas, Sargent e Wallace que ar-rasou literalmente, em apenas uma década (anos 70), o espírito Keynesianoque tinha sido dominante até então. As limitações do modelo proposto porLucas e associados, e que tinha eclipsado totalmente o modelo Keynesiano,”temporary price misperceptions”, tornaram—se claramente visíveis no iní-cio dos anos 80 e levaram à revolução dos ”Real Business Cycles”, ou cicloseconómicos reais (doravante, RBC). Em termos de filosofia do funciona-mento da economia, tínhamos voltado à época pré—Keynes, já que a moedapassava a ser novamente um mero véu da actividade económica. Os cic-los económicos eram inteiramente causados por factores reais, os mercadoseram perfeitamente flexíveis, e os desequilíbrios nos mercados eram reacçõesracionais e optimizadoras dos agentes económicos aos choques.

2Vide Stein (1985), pag. 172—173.

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CAP 1. INTRODUÇÃO 5

Figura 1.1: A primeira vez que o termo ”macroeconomics” foi uzado notexto de um artigo. Marschak (1945).

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CAP 1. INTRODUÇÃO 6

Figura 1.2: A primeira vez que o termo ”macroeconomics” foi utilizado numtítulo. Klein (1946)

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CAP 1. INTRODUÇÃO 7

Apesar do grande sucesso da escola dos RBC – o qual foi devido à suacapacidade para reproduzir quantitativamente os principais factos estiliza-dos dos ciclos económicos com modelos económicos estocásticos e dinâmi-cos, baseados em equilíbrio geral dos mercados – as limitações eram bemevidentes. Porque razão seriam os choques reais negativos tão regulares,grandes e sistemáticos? Porque razão as recessões são mais curtas, e osperíodos de expansão mais longos? Porque razão as variações no volumede emprego não estão altamente correlacionadas com os choques reais? Porestas razões, e também pelo facto dos RBC não conceder nenhuma eficáciaà política monetária, enquanto que a eficácia desta política foi claramentevisível ao longo das duas décadas, estes modelos foram sendo progressiva-mente abandonados.

O novo consensus foi construido sobre os despojos de cinco revoluções,que se sucederam com uma rapidez impressionante: em cerca de 50 anos,passou—se de uma versão Keynesiana arcaica, para uma versão mais sofisti-cada, mais consistente, e por isso mais poderosa. Em menos de trinta anospassámos por monetarismo, novos clássicos, RBC, e novo Keynesianismo atéchegar a um patamar razoavelmente aceite pelas principais correntes. Paraum economista que tenha vivido este período, deverá ter sido um período decontradições, mas também reconfortante porque no fim de contas a macro-economia ajudou a moldar estas décadas de forma crucial. Talvez seja bomrelembrar aqui uma frase famosa de Keynes:

”The ideas of economists and political philosophers, both whenthey are right and when they are wrong, are more powerful than is com-monly understood. Indeed the world is ruled by little else. Practicalmen, who believe themselves to be quite exempt from any intellectualinfluence, are usually the slaves of some defunct economist.”

Quem teve a capacidade de compreender o Keynesianismo de RichardNixon, o monetarismo de Margaret Tatcher, o Keynesianismo travestido de”supply—side” de Ronald Reagan, a ”colagem” clara da política fiscal de BillClinton à política monetária de Alan Greenspan, o poder e credibilidadedo Banco Central Alemão ao longo das últimas décadas, o debate sobre os”verdadeiros” objectivos do Banco Central Europeu, etc., será que duvidadesta opinião de Keynes?

1.2 Explosão de Publicações

O segundo aspecto que atesta bem o estado de ebolição em que disciplinase encontra diz respeito ao grande volume de produção que se concentrounos últimos dois/três anos ao nível de ”surveys” e de livros de texto, ambosincidindo directamente sobre a revolução em curso. Certamente não serádifícil encontrar nas principais publicações da área, a nível internacional,

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CAP 1. INTRODUÇÃO 8

mais de 20 ”surveys” sobre o actual estado da macroeconomia nos últimosanos. Note—se que na maioria dos caso estes são escritos pelos próprioseconomistas que têm participado de forma mais activa na actual revolução.3

Quanto à publicação de livros texto, quer para nível de licenciatura, querpara níveis mais avançados (níveis de pós—graduação), a mesma tem sidotambém impressionante ao longo dos últimos anos. Restringindo o períodoapenas aos últimos dois anos, foram publicados nove (!) livros—texto ao ní-vel de pós—graduação dentro da área específica de macroeconomia. Estes são:Alan Drazen (2000): ”Political Economy in Macroeconomics”; Persson andTabellini (2000): ”Political Economics — Explaining Economic Policy”; Rod-seth (2000): Open Economy Macroeconomics; Gandolfo (2001): ”Interna-tional Finance and Open—Economy Macroeconomics”; Evans and Honkapo-hja (2001): ”Learning and Expectations in Macroeconomics”; Ljungkvistand Sargent (2001): ”Recursive Macroeconomic Theory”; Mark Nelson,(2001)̇: ”International Macroeconomics and Finance”; Grossman and Help-man (2001): ”Special Interest Politics”; e Taylor and Woodford (1999):”Handbook of Macroeconomics”.4

Por outro lado, e ainda na mesma categoria de livros, o redactor desterelatório tem conhecimento de pelo menos oito livros que estão já termina-dos, ou praticamente terminados. Estes podem ser encontrados nas ”home-pages” dos autores (vide bibliografia) e incluem: Semmler: ”Financial Mar-kets, Economic Activity and the Macroeconomy”; Woodford: ”Interest andPrices”; Williamson: ”Macroeconomic Theory”; McCallum: ”A Course inMacro and Monetary Economics”; Hansen and Sargent: ”Robust Controland Filtering for Macroeconomics”; Hansen and Sargent: ”Recursive Lin-ear Models of Dynamic Economies”; La Croix and Michel: ”A Theory ofGrowth: Dynamics and Policy in Overlapping Generations”; Semmler andGreiner: ”The Macroeconomy and Monetray and Fiscal Policies in the EuroArea”; e Chamley: ”Rational Herds in Macroeconomics”.

No que diz respeito aos livros—texto para níveis intermédios (licencia-turas), só no presente ano foram publicados três livros—texto inteiramentenovos sobre macroeconomia para este nível de ensino e por economistas

3Vejamos apenas alguns: Blanchard (2000), Woodford (1999), King (2000), Goodfriendand King (1997), Gali (1999) and Gali (2000), Clarida, Gertler and Gali (1999), Mankiw(2000), Mankiw and Reis (2001), McCallum (1999) McCallum and Nelson (1999) and(2001), Romer (1999) e (2000), Obstfeld and Rogo (2001), Lane (2000), Sarno (2001), eDittmar and Gavin (2000), entre outros.

4É de louvar o aparecimento pela primeira vez de livros de texto avançados para analisara ligação entre a ”escolha política” e a macroeconomia, como sejam os de Drazen, Perssonand Tabellini, e Grossman and Helpman. De louvar ainda três novos livros enfatizandoo problema da ”macroeconomia aberta”, como sejam os de Nelson, Gandolfo e Rodseth.Finalmente, dois livros sobre ”Learning and Expectations” e macroeconomia, como sejamo de Evans e Honkapohja e o de Chamley (vide parágrafo abaixo), uma área em que atéagora os livros—texto eram praticamente inexistentes, sendo a única excepção representadapor Sargent (1993 e 1999).

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CAP 1. INTRODUÇÃO 9

de grande reputação a nível internacional: ”Macroeconomics” por BradDeLong, da Universidade de Berkeley; David Miles (Imperial College) eAndrew Scott (London Business School) publicaram ”Macroeconomics -Understanding the Wealth of Nations”; e Stephen Williamson (Universityof Iowa) com ”Contemporary Macroeconomics”. Em 1999, Roger Farmer(University of California — Los Angeles) tinha—se antecipado com ”Macro-economics”. Como se pode ver na própria apresentação deste livro:

”This is the first intermediate-level text to genuinely fill the gap be-tween the macroeconomics taught to graduate students and the macro-economics traditionally taught to undergraduates. This edition beginswith the traditional IS-LM and AD-AS models that have been the sta-ples of undergraduate macro courses for decades. The second half ofthe book introduces newer, dynamic theories of macroeconomics, in-cluding various growth models. The result is a text that describes theemerging consensus view of macro.”

1.3 O Sucesso da Receita

Existe hoje a noção de que a política económica que está na base do novoconsensus, tem sido extremamente eficaz. Um economista do Banco Cen-tral Europeu, Athanasios Orphanides, escreveu uma série de artigos sobreeste período e um deles é bem sintomático da filosofia da nova época dapolítica económica: ”The Quest for Prosperity Without Inflation”.5 Temsido argumentado por vários economistas que o notável período de expansãoeconómica que muitos países da OCDE têm tido desde meados dos anos 80 éo resultado da implementação das medidas de política económica prescritaspelo novo consensus. Por exemplo, vide o argumento de Taylor (1998) paraexplicar o longo boom económico que os EUA obtiveram entre 1982 e recen-temente. Como Taylor demonstra, num período de dezoito anos a economiaamericana teve os dois mais prolongados períodos de expansão económicada história do país (49 trimestres), com uma breve recessão económica pelomeio que durou apenas três trimestres em 1990. Por outro lado, combinouesta expansão com baixas taxas de inflação, e com tendência à descida. VideFiguras 1.3 e 1.4. Não existe na história do país um outro período seme-lhante, nem nenhum período em que a política económica foi conduzida daforma como o tem sido ao longo da última década e meia. Para Taylor, foia prudência fiscal do período pós Reagan, e o rigor da política monetáriacom Paul Volker e Alan Greenspan que possibilitou elevado crescimentoeconómico, elevadas taxas de crescimento dos salários reais, com relativaestabilidade dos mercados e da inflação. Existiram outros períodos em quea economia conseguiu obter taxas de crescimento económico mais elevadas

5Vide Orphanides (2000).

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CAP 1. INTRODUÇÃO 10

1985 1990 1995 2000

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.01

.02G(RealGDP)

1985 1990 1995 2000-.01

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.01

.02 G(RealWages)

1950 1960 1970 1980 1990 2000

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.02

.04 G(RealGDP)

1950 1960 1970 1980 1990 2000

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.02

.04G(RealWages)

Figura 1.3: A conquista da prosperidade sem inflação nos EUA. O períodopós 82 bate qualquer outro período na história dos EUA em termos estabi-lidade e progresso económico. G(RealGDP) e G(RealWages) representam ataxa de crescimento do PIB real e dos salários reais.

inclusive – por exemplo, durante a década de 60 – mas as oscilações daactividade económica eram muito superiores àquelas que se têm verificadonas últimas décadas, e a frequência de recessões mais elevada também. ParaTaylor e outros economistas, esta estabilidade de preços com elevado cresci-mento económico é o segredo da nova política económica.

Organização do RelatórioO restante conteúdo deste relatório será organizado como se segue. No

capítulo 2 apresentamos as razões que no nosso entender justificam que umacadeira moderna de macroeconomia intermédia deve ir para além da análiseconvencional dos ciclos económicos de curto prazo, devendo dar tambémgrande importância ao crescimento económico de longo prazo.

Nos capítulos seguintes, capítulos 3 e 4, analisaremos os modelos macro-económicos dominantes que são normalmente utilizados para delimitar ostrâmites fundamentais que conduzem a política económica virada para agestão dos ciclos económicos de curto prazo. No capítulo 3 apresentamoso modelo standard Keynesiano que dominou praticamente toda a macro-economia desde a década de 40 até meados da década de 70. Perante a

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CAP 1. INTRODUÇÃO 11

1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000

.02

.04

.06

.08

.1

.12

"FED Funds Rate": 9.7%"FED Funds Rate": 4.8%

Indice Preços Implicito no PIB (trimestral)IPIPIB

Figura 1.4: Taxa de inflação nos EUA. Note—se as alterações na condução dapolítica monetária nos períodos pré e pós anos 80, bem como as tendênciasda inflação nestes períodos.

falta de melhor terminologia, designo este modelo por ”Velho Modelo Key-nesiano”. Apresentamos os pontos fundamentais do modelo e mostramosquais são as principais limitações (pelo menos 12) que levaram à ineficiênciado mesmo para explicar a evolução dos fenómenos económicos pós décadade 60. No capítulo 4, apresentamos o Novo Modelo Keynesiano. Devidoà dificuldade de explicar alguns dos aspectos principais deste novo modelounicamente através de uma descrição literária, somos forçados a recorrer aouso de alguma análise algébrica. No entanto, tentamos simplificar o maispossível e acreditamos que a leitura acabará por não ser pesada.

No capítulo 5 tento demonstrar que é perfeitamente possível ensinareconomia dinâmica a alunos de um segundo ano de uma licenciatura emeconomia. As exigências matemáticas não constituem um obstáculo signi-ficativo, e os ganhos para toda a restante parte da licenciatura são (na minhaopinião) enormes.

No capítulo 6 apresento o programa que proponho para uma cadeiraanual de macroeconomia de nível intermédio, a ser leccionada no segundoano de uma licenciatura em economia. No capítulo 7 teço algumas consi-derações de natureza pedagógica, focando os seguintes aspectos: princípiosgerais da orientação do ensino, a divisão entre aulas teóricas e aulas práticas,a carga horária semanal, avaliações e material de apoio à leccionação.

No capítulo 8 tento sintetizar aquilo que pretendi transmitir com este

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CAP 1. INTRODUÇÃO 12

longo relatório, esperando não ter abusado da paciência dos leitores com asua extensão.

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Capítulo 2

”As” Duas QuestõesFundamentais daMacroeconomia

2.1 Introdução

Não será nenhum exagero afirmar que uma parte bastante significativa doseconomistas portugueses (senão a larga maioria) continua a identificar aMacroeconomia com a apresentação de uma versão simples do velho mo-delo IS—LM, possivelmente aumentado de um bloco de oferta onde o fun-cionamento do mercado de trabalho pode ser analisado com (na maioria doscasos ”sem”) a incorporação de um processo de formação de expectativasadaptativas. A discussão e análise do crescimento económico de longo prazosão normalmente consideradas como elementos de outras áreas da teoriaeconómica.

No entanto, na minha opinião, esta perspectiva relativamente ao âmbitoda macroeconomia para a explicação dos fenómenos económicos contem-porâneos está errada, fundamentalmente por três razões:

1. A macroeconomia é uma disciplina recente no seio da teoria económicaem geral, estabelecendo—se no início dos anos 40, e em cerca de cinquentaanos passou por quatro revoluções. Estas revoluções foram contribuindocom alguns aspectos cruciais para a explicação dos fenómenos económi-cos modernos, os quais foram sendo acrescentados ao ”stock” de con-hecimento acumulado da macroeconomia. Estas novas contribuiçõesnão dizem respeito apenas a questões de natureza teórica. Estão tam-bém relacionadas com problemas práticos de mo-delização e de com-putação, os quais podem hoje ter respostas que eram impensáveis duasdécadas atrás devido, fundamentalmente, ao impressionante cresci-mento das capacidades computacionais.

13

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 14

2. Por estas razões, quer em termos teóricos, quer em termos empíricos ecomputacionais, o ensino (e investigação) da macroeconomia modernanão assenta hoje no velho modelo IS—LM aumentado da Curva dePhillips com expectativas adaptativas.

3. A macroeconomia não se resume à análise dos ciclos económicos decurto prazo como tem sido prática em Portugal, incluindo também oestudo das determinantes do crescimento económico de longo prazo.

Na nossa opinião, as duas questões fundamentais que a macroeconomiadeverá explicar são as seguintes: (i) Porque razão praticamente todas aseconomias apresentam uma taxa de crescimento de longo prazo relativa-mente estável? Ou seja, quais são as forças que fazem com que o logaritmodo PIB em valores absolutos (e em termos per capita também) tem um”trend” relativamente constante quando consideramos períodos de tempodilatados; (ii) Porque razão existem ciclos económicos de curto prazo? Istoé, o que faz com que existam pequenos desvios relativamente à trajectória delongo prazo da economia? A primeira questão incide sobre a análise do PIBpotencial e sobre os factores que condicionam ou favorecem o crescimentoeconómico de longo prazo. A segunda questão incide sobre a análise dosciclos económicos de curto prazo e sobre os factores que estão na base destesciclos bem como das políticas económicas destinadas a reduzir a amplitudedos mesmos.

Portanto, a crença instalada de que a macroeconomia deve incidir so-bretudo sobre o estudo do segundo tipo de problemas (os ciclos económicosde curto prazo), não está correcta do nosso ponto de vista. Hoje em dianem faz sentido estudar os ciclos económicos de curto prazo sem ter um co-nhecimento bastante relevante sobre o comportamento da tendência de longoprazo da economia. De facto, na macroeconomia moderna toda a análise dagestão dos ciclos económicos de curto prazo está totalmente dependente daposição relativa do PIB efectivo relativamente ao PIB potencial. Portanto,sem se perceber bem quais os factores que deverão ser levados em conside-ração para medir o posicionamento do PIB potencial, bem como os factoresque o fazem deslocar ao longo do tempo, como se pode implementar políticaseconómicas para gestão eficiente dos ciclos económicos de curto prazo? Nãovejo como.

2.2 Ciclos Económicos de Curto Prazo

Existe hoje a noção clara que os modelos que podem ser utilizados paraexplicar os principais factos estilizados dos ciclos económicos de curto prazosão fundamentalmente três: (i) choques sobre aquilo que normalmente sedesigna por ”economic fundamentals”, ou seja, sobre os aspectos da econo-mia que não dependem da interpretação subjectiva de cada um ou grupo

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 15

de agentes económicos; (ii) estrutura da economia é não—linear; e (iii) ”selffullfilling prophecies”.

2.2.1 Choques sobre ”fundamentals”

Se o comportamento de uma economia, por exemplo do PIB, pudesse serrepresentado por uma equação dinâmica, uma forma simples de a representarpoderia ser do tipo ”linear com choques”. Os choques poderão ser de váriotipo, como sejam, choques tecnológicos, choques resultantes da intervençãodo Governo e do Banco Central, choques institucionais, etc.. Este tipo decomportamento pode ser expresso pelo seguinte processo autorregressivo deprimeira ordem, linear e com um ”trend”

= 0 + 1 1 + 2 + , 0 1 6 1

sendo 0 1 2 parâmetros positivos, representa a tendência de longo prazoda variável (medida em valores logaritmicos) e é um ruído com mé-dia nula e variância constante (0 2) Na Figura 2.1 mostramos aevolução desta variável (medida em logaritmos) bem como os choques quea mesma recebe. Note—se que a estrutura desta economia não incorporaqualquer comportamento não—linear. No painel superior apresenta—se o lo-garitmo de ; no do meio encontra—se representada a taxa de crescimentoda variável (a qual é de 3% por período), enquanto que no último painel osdesvios da taxa de crescimento relativamente à sua tendência de longo prazoestão representados. Como se pode facilmente constatar esta figura apre-senta comportamentos bastante semelhantes (aparentemente) à realidadeque conhecemos das principais séries económicas.1

2.2.2 Estrutura não—linear

Uma forma alternativa para explicar o comportamento de uma grandezacomo o PIB, e das suas variações de curto prazo, pode residir na hipótesealternativa: a estrutura da economia é não—linear, e não existem quaisquerchoques sobre a mesma. Uma equação muito simples que permite mostrareste tipo de comportamento é do tipo

= 1 (1 1) 1

Na Figura 2.2 apresentamos o comportamento desta variável ao longo dotempo (painel inferior), e no painel superior encontra—se o estado de espaçosonde se pode facilmente constatar a complicação dinâmica que pode resultarde uma simples equação como a que foi apresentada acima.2 Note—se que

1Os restantes valores escolhidos são os seguintes: 0 = 1 5 1 = 0 6 2 = 0 03 Final-mente assumimos que (0 0 01)

2Assumimos que 1 = 3 88

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 16

0 5 10 15 20 25 30

2.5

2.75

3

3.25LY(t)

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200

0

.025

.05

.075DLY(t)

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200

-.025

0

.025

.05Residos

Figura 2.1: Os aspectos cruciais da evolu ção de uma economia hipotética:um ”trend” do PIB efectivo relativamente constante de longo prazo, LY(t);uma taxa de crescimento relativamente volátil no curto prazo, DLY(t); e osresíduos entre o PIB efectivo e a sua tendência de longo prazo parecendo oresultado de choques aleatórios.

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 17

0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 10

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

0.8

0.9

1y(

t)

0 20 40 60 80 100 120 140 1600

0.5

1

y(t)

y(t−1)

tempo

Figura 2.2: Os ciclos económicos como resultado única e simplesmente daestrutura não—linear da economia. Uma simples função logistica, sem qual-quer ruído externo, provoca ”caos” e comportamento irregular.

neste caso os ciclos económicos surgem única e simplesmente causados peladinâmica da estrutura interna da economia, não existindo qualquer choquede natureza exógena como no caso anterior.

A aplicação de modelos não—lineares na economia tem ganho grandepopularidade na última década. Existe hoje a convicção de que a maiorparte dos ciclos económicos em estruturas onde exista heterogeneidade deagentes, e onde as expectativas tenham uma relevância significativa para asdecisões dos agentes económicos, é pouco provável que os ciclos resultem demeros choques aleatórios, mesmo em mercados totalmente perfeitos. VideGuesnerie and Woodford (1990) para um notável tratamento desta questão.Mais recentemente o control de modelos económicos caóticos tem ganhoimportância significativa devido ao compreensível grande interesse em con-

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 18

trolar processos económicos por questões de natureza de política económica.Mendes e Mendes (2001) e (2002) mostram como o control de caos é fácil,poderoso, e bastante útil em termos económicos.

2.2.3 ”Self Fullfilling Prophecies”

A terceira alternativa para explicar os ciclos económicos de curto prazo con-siste na introdução de ”expectativas” ou mais correctamente ”beliefs” nofuncionamento da economia. Uma forma de explicar este processo numabase intuitiva é utilizar um termo usado por Keynes para justificar as on-das de optimismo e pessimismo dos empresários e, consequentemente, doinvestimento: ”animal spirits”. Mesmo que os ”fundamentais económi-cos” não se tenham alterado, um facto de natureza subjectiva pode porsi só espalhar—se por toda a economia e produzir alterações no resultado doprocesso económico.

Existe um exemplo muito simples para explicar este processo. Supo-nha que existe uma ”festa” que só se realizará caso um número mínimo depessoas comparecer. Se forem poucas as pessoas a comparecerem, a festadissolver—se—á espontaneamente, se o número for suficientemente elevado,acabará por atrair outras pessoas e a festa realizar—se—á. O problema éque nem todas as pessoas que poderão estar interessadas em comparecerpodem contactar umas com as outras, pelo que o ”haver festa” ou ”não haverfesta” depende unicamente dos ”beliefs” das pessoas interessadas. Do pontode vista económico, as mudanças súbitas de confiança dos agentes podemestar na base dos ciclos económicos e isto requer, portanto, a existência deagências que coordenem as interações entre os vários agentes envolvidos naactividade económica. O primeiro artigo onde se formalizou este aspectocom rigor na economia foi o de Cooper e John (1988), e o livro de Cooper(1999) oferece um tratamento alargado sobre o problema em questão.

O aspecto interessante é que um cenário como este pode ser facilmenteaplicado para explicar o comportamento do investimento e da elevada volati-lidade do mesmo ao longo dos ciclos económicos. Por outro lado, é bastantefácil explicar este processo do ponto de vista matemático. Para que o mesmotenha lógica, o modelo (ou seja, o comportamento) requer dois aspectosfundamentais: (i) não—linearidade acentuada; (ii) expectativas de naturezasubjectiva dos agentes. Suponha que o comportamento é caracterizado pelaseguinte equação:

=131 2

21

2

O tipo de equilíbrio que resulta deste comportamento não—linear de-pende grandemente das expectativas dos agentes envolvidos no processo.Vide Figura 2.3, onde a simulação foi efectuada com os seguintes parâme-tros: 1 = 1 2 = 3 No painel principal temos o diagrama de fases (ou

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 19

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 20

0.2

0.4

0.6

0.8

1

1.2

1.4

1.6

1.8

2

y(t−1)

y(t)

5 10 15 20

0

1

2

tempo

y(t)

Figura 2.3: ”Self Fullfilling Prophecies” e equilíbrios múltiplos. No painelmaior temos o processo de iteração entre e 1 . No pequeno paineltemos a série temporal associada a cada um dos resultados.

o processo de iteração até ao equilíbrio final), no pequeno painel apresen-tamos a evolução da variável ao longo do tempo. O resultado é bastanteinteressante já que existem três equilíbrios dinâmicos: (1 1) instável, (0 0)e (2 2) estáveis.

Supondo que o universo de agentes neste exemplo são empresas que sepretendem localizar num novo espaço (sendo o montante total de empresas 2mil), e que o processo só será implementado se a maioria ”acreditar” que asoutras também se deslocarão, então se apenas 0.88 desse universo ”acredi-tar” nessa possibilidade, o processo tenderá para (e acabará) num equilíbrioestável e dado por (0 0). Pelo contrário, se cerca de 1.12 do universo con-ceber a expectativa de que as restantes também se deslocam, todas elasacabarão por se mover para o novo espaço. Ou seja, neste caso o equilíbriofinal também é estável, mas só que é positivo sendo dado por (2 2). Temosaqui um exemplo curioso que permite explicar logicamente como pequenosaspectos de natureza ”psicológica” acabam por afectar de forma crucial oresultado de um processo económico. Ou seja, temos uma situação em que

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 20

meros ”beliefs” acabam por poder derrotar os ”fundamentais económicos”.As simulações que apresentámos acima referem—se a possibilidades hipotéti-

cas de representar os ciclos económicos de curto prazo, podendo estes seremo resultado de modelos lineares, de modelos não—lineares, e de não—linearescom expectativas. Para terminar esta introdução sobre alguns aspectos fun-damentais da modelização dos ciclos económicos de curto prazo, apresenta-mos de seguida a evolução do PIB real para os EUA desde 1947, vide Figura2.4. No painel superior temos o logaritmo do PIB real, e o filtro de Hodrick—Prescott para representar a tendência de longo prazo do mesmo (ou seja, oPIB potencial); no painel inferior são apresentados os resíduos que resultamda diferença entre o PIB efectivo e o PIB potencial. Estes resíduos nãosão mais do que a imagem dos ciclos económicos de curto prazo. Como sepode facilmente constatar, esta figura apresenta duas particularidades: (i)o PIB potencial tem aumentado ao longo do tempo a uma taxa média rela-tivamente constante; (ii) os ciclos de curto prazo são uma característica detodo o período, apesar da amplitude dos mesmos ter sido reduzida significa-tivamente depois do início dos anos 80; (iii) os ciclos mostram que períodosde boom encontram—se imediatamente seguidos de outros períodos de boom– o mesmo se passando relativamente a períodos de recessão – pelo queestes ciclos não parecem ser muito compatíveis com a explicação baseadameramente em choques aleatórios, quer eles sejam do lado da oferta, ou daprocura. Existe, aparentemente, muito mais estrutura nestes choques do quea tese dos choques sucessivos a ”baterem” na economia incessantemente.

2.3 Crescimento de Longo Prazo

Suponha agora que os alunos ficam a dominar bastante bem os problemastécnicos que podem surgir relativamente à análise de curto prazo. Ficama perceber muito bem as implicações que podem resultar do impacto dechoques aleatórios sobre a economia, da importância de comportamentosnão lineares, bem como dos aspectos extremamente interessantes que podemresultar para a economia da consideração do lado psicológico dos agenteseconómicos. Com estes instrumentos ficam conhecedores dos possíveis fac-tores que podem gerar ciclos económicos de curto prazo.

Mas quais são os factores que determinam a tendência de crescimentode longo prazo da economia? Será que se pode aumentar os gastos públicosde forma permanente no sentido de melhorar as condições médias de vidadas populações? É bom levar em consideração que os gastos públicos e im-postos são instrumentos de política económica de curto prazo, mas tambémsão factores determinantes da sustentabilidade da dívida pública no longoprazo! Quais são as condições que permitirão utilizar estes instrumentosfiscais sem comprometer a sustentabilidade da dívida pública? Estas sãoquestões cruciais para a macroeconomia, mesmo a nível intermédio, mas

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 21

1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000

7.5

8

8.5

9 LGDP hpLGDP

1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000

-.05

-.025

0

.025GDPResid

Figura 2.4: O PIB efectivo e potencial para os EUA. LGDP, hpLGDP, eGDPResid representam, respectivamente, logaritmo do PIB real, filtro deHoddrick—Prescott para obter a tendência de longo prazo, e o hiato entre oPIB efectivo e a sua tendência de longo prazo (ou ciclos económicos de curtoprazo).

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 22

que um programa que se restrinja à análise de curto prazo não dá qualqueresclarecimento. Por isso é indispensável que os alunos tenham um contactosignificativo com a análise económica dinâmica logo num dos primeiros anosda licenciatura. Caso isto não aconteça, não poderão perceber minimamentealgumas questões fundamentais do funcionamento de uma economia real.

Ultimamente temos observado que os livros de texto mais consagradosno mercado – por exemplo, o livro de Greg Mankiw ”Macroeconomics”,fourth edition (2000); Abel and Bernanke ”Macroeconomics”, third edition(2001); ou Blanchard ”Macroeconomics”, second edition (2001) – tentamresolver este problema colocando numa das partes iniciais dos livros algumtratamento de crescimento económico. No entanto, a apresentação resume—se única e simplesmente ao modelo de Solow e ao tratamento da convergênciaque resulta do mesmo. No meu entender isto é errado por uma simples razão:acaba por transmitir a ideia aos alunos que o crescimento de longo prazotem uma natureza totalmente exógena, que o problema da convergênciaeconómica é simples de resolver, e que a política económica nada pode fazerpara fomentar o crescimento de longo prazo. É fácil de perceber o perigo eo risco de um tratamento do problema nestes moldes.

Pode existir uma razão prática para explicar esta opção na maioria doslivros de texto. A maioria destes manuais são produtos já estabelecidos nomercado, feitos à alguns anos, e não é fácil reescrever partes significativas deum produto que ”já está acabado”. Por isso, altera—se um capítulo ou outro,mas a esmagadora parte do produto segue em frente, edição após edição.Por outro lado, e por experiência própria o digo, é bastante exigente (emtermos de tempo e esforço pedagógico) tornar as ideias dos novos modelosde crescimento acessíveis a alunos de um segundo ano de uma licenciaturaem economia. No entanto, é possível, e a prova disso está em que o redactordeste relatório, conjuntamente com Sofia Vale, tem um texto que tem sidousado na licenciatura de economia do ISCTE com grande sucesso.

Parece—me indiscutível que existe a falta de um tratamento adequadoà parte dinâmica no ensino da macroeconomia a nível intermédio. Paraatestar esta afirmação está o facto interessante de que somente no presenteano saíram três novos livros de texto em língua inglesa – já anteriormentereferidos3 – e por outro as críticas abertas à filosofia dos livros dominantes.Atente—se neste texto de suporte ao lançamento do livro de Brad DeLong, oqual tem por título: ”Mankiw vs DeLong on growth” e merece ser transcritonuma parte significativa do mesmo:

”Elsewhere on this website I have talked about the excellences ofGreg Mankiw’s Macroeconomics textbook. Here I want to put one of

3”Macroeconomics” por Brad DeLong, da Universidade de Berkeley; David Miles (Im-perial College) e Andrew Scott (London Business School) com ”Macroeconomics - Under-standing the Wealth of Nations”; e Stephen Williamson (University of Iowa) com ”Con-temporary Macroeconomics”.

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CAP 2. "AS"DUAS QUESTÕES FUNDAMENTAIS 23

its deficiencies vis-a-vis DeLong’s Macroeconomics textbook under themicroscope.

To put it bluntly, Mankiw does a lousy job of setting out the theoryand the facts of economic growth. On the facts, he spends 11 pageson ”growth facts” where we spend 30. On the theory, his theoreticalsections replicate the graduate-student treatment of the subject at alower level—and so introduce concepts like ”capital per e ective worker”that students find confusing, and yet fail to provide students withenough in-depth instruction to actually allow them to be comfortableusing the standard economic growth model to analyze economies.

Now this is not Greg Mankiw’s fault: it is the fault of history. Adecade ago Greg Mankiw introduced long-run growth into the interme-diate macroeconomics syllabus. But because each successor book mustbe close enough to its predecessor to serve the same market, he couldnot make growth a major focus of his book. Hence he tried to do toomuch in too little space.

But I do not su er from the same constraint. So I can do better.And below I outline eleven important points where I believe that thecoverage in my book’s growth chapters clearly dominates the coveragein Mankiw.”

Elucidativo? Devo acrescentar que até são amigos e dois abertos Key-nesianos de longa data. Espero ter chamado a atenção do leitor para oargumento de que uma maior atenção aos problemas do crescimento, bemcomo de outra análise dinâmica (por exemplo, da dívida pública e do sistemade segurança social), no ensino da macroeconomia a nível intermédio irá sermuito provavelmente um sinal do futuro. E bem precisados estamos, nemque seja para perceber melhor a própria eficácia da políticas económicas decurto prazo.

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Capítulo 3

As Limitações do VelhoModelo Keynesiano

3.1 Introdução

Como vimos no capítulo anterior, um modelo que pretenda explicar o com-portamento dos ciclos económicos de curto prazo, deve ser capaz de explicarporque razão uma economia não consegue eliminar os mesmos e assim re-duzir os efeitos negativos de crises económicas e booms. O velho modeloKeynesiano que colapsou na década de 70 pretendia explicar estes cicloscom base, fundamentalmente, na combinação da política fiscal e da políticamonetária, tendo ficado célebre pelas políticas do ”stop and go” das décadasde 60 e 70.

O modelo assentava em sete pontos fundamentais, os quais passamos adescrever de seguida:

1. Grande ênfase ao bloco IS—LM;

2. Expectativas adaptativas;

3. Pouca importância atribuída aos problemas de ”economia aberta”,apesar dos modelos de Mundell—Fleming serem bem conhecidos desdeo início dos anos 60;

4. O Banco Central controlava a massa monetária, não as taxas de juro;

5. A política fiscal era independente da política monetária e dos proble-mas de ajustamento da balança de pagamentos;

6. A análise do crescimento económico era praticamente (senão total-mente) ignorada;

7. A hipótese de ”Government Failure” (Falha de Governo) e as con-siderações de natureza política das escolhas sociais eram totalmenteignoradas.

24

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 25

Vamos analisar de forma necessariamente concisa os primeiros cinco pon-tos. O último não será objecto de discussão devido à já larga extensão dorelatório, no entanto, ele não pode ser esquecido porque é um elementofundamental para se perceber os verdadeiros contornos das revoluções quederrubaram o velho modelo Keynesiano.

3.2 Bloco IS—LM

O modelo era construido com base em hipóteses ad—hoc que remetiampara um comportamento mecânico dos agentes económicos, quer ao nível doconsumo, quer ao nível do investimento. Este comportamento levava nor-malmente a situações sub—óptimas do ponto de vista social (equilíbrio abaixodo pleno emprego), embora nada fosse referido sobre as razões específicasque condicionariam os agentes económicos a aceitarem uma situação de sub—optimalidade, quando deveriam pretender obter uma situação de equilíbrioao nível da plena utilização dos factores produtivos, do nível de investi-mento óptimo e, consequentemente, do nível máximo de consumo. Ou seja,o modelo assumia determinados comportamentos microeconómicos mas nãoos explicava de forma rigorosa, e também não explicava porque razão osagentes eram incapazes de reagir a situações de adversidade. Porque razãoa propensão marginal a consumir (pmc) seria constante, e bastante elevada,ao longo dos ciclos económicos de curto prazo?

3.2.1 Função IS

Por exemplo, a principal teoria explicativa do consumo das famílias as-sentava numa relação positiva entre o consumo e o nível do rendimentodisponível corrente, quando era perfeitamente evidente desde a década de50 que os argumentos de Modigliani e Friedman baseados nos ”ciclos devida” e ”rendimento permanente” eram muito mais poderosos. Estes novosargumentos permitiriam incorporar na função explicativa do consumo tam-bém factores como o nível do rendimento esperado no futuro e a taxa dejuro, os quais estavam claramente ausentes do velho modelo Keynesiano.Por outro lado, é hoje claramente evidente que a propensão marginal a con-sumir – um conceito fundamental de todo o modelo e da política económicaassociada ao mesmo – não é um factor psicológico exógeno, dependendo dociclo da actividade económica e do comportamento dos mercados financeiros(quanto maior for o nível de desenvolvimento dos mercados financeiros menortenderá a ser o valor da pmc). A função consumo era do tipo

= ( ) , 0 0 1 (3.1)

onde é o consumo medido em termos reais, representa o nível do produto,e os impostos em termos líquidos.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 26

Por outro lado, o investimento real das empresas era tido como umafunção linear e negativa do nível da taxa de juro. Utilizava—se os critériosdo VAL (Valor Actualizado Líquido) ou da TIR (Taxa Interna de Rentabi-lidade) para obter esta relação negativa, mas não se ia suficientemente longepara obter os verdadeiros impactos da consideração destas taxas sobre ocomportamento do investimento. Assim, situações onde as expectativassobre o nível de actividade económica futura pudessem levar a ciclos de”optimismo” ou ”pessimismo” e afectar de forma significativa a natureza demodelo bem comportado que se pretendia manter eram pura e simplesmenteignoradas. Ou seja, sendo o VAL e a TIR critérios fundamentalmente ”for-ward looking”, como o modelo básico era totalmente ”backward looking”,as implicações da importância daqueles critérios ficava camuflada pela in-capacidade do modelo em tomar em consideração as mesmas no seu seio.Poder—se—á também utilizar o nível da procura agregada ou rendimento paraexplicar o comportamento do investimento (o chamado ”efeito acelerador”),mas como é óbvio, o nível desta procura não será o nível esperado, massim o valor corrente do mesmo devido à incapacidade do modelo em lidarcom comportamentos forward looking. Assim, a equação que representaráo comportamento do investimento será

= ( ) , 0 0 e 0 0 (3.2)

sendo o nível da taxa de juro nominal.Considerando por agora uma situação de uma economia fechada, já que o

caso de economia aberta não é necessário para o argumento que pretendemosdesenvolver aqui, e utilizando a identidade fundamental da contabilidadenacional = + + , sendo o nível dos gastos públicos, podemos obterde forma imediata a expressão da Função IS

= ( ) + ( ) + (3.3)

Destas três equações poder-se-ão retirar quatro conclusões fundamentaispara a análise do modelo Keynesiano dominante até aos anos 70:

1. Não existe qualquer força ”forward looking” na determinação dobloco da IS. Ou seja, as expectativas sobre a evolução esperada da actividadeeconómica não afecta o nível da procura agregada: apenas variáveis correntesafectando o valor de variáveis correntes. Este ponto leva—nos à primeiragrande limitação do modelo:

Limitação 1 O modelo elimina a possibilidade de equilíbrios múltiplos e asconsequentes considerações em termos de escolhas de natureza política doequilíbrio obtido.

2. Restrição orçamental. Não existe qualquer restrição orçamental peloque a condução da política fiscal – e para além da política fiscal, toda

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 27

a política económica de gestão da procura agregada já que na função LMnão existe qualquer elo de ligação à restrição orçamental – é conduzidacomo se não existissem quaisquer restrições no que diz respeito a déficesorçamentais e à dívida pública. A evidência empírica do que se verificoudurante o período que compreende finais da década de 60 até meados dosanos 80, com um crescimento vertiginoso da dívida pública em percentagemdo PIB na maioria dos países, com elevadas taxas de inflação e elevadosdéfices externos em muitas economias (mesmo) da OCDE, revelou que acondução da política fiscal sem a consideração expressa de restrições não émuito saudável para o bom funcionamento da economia.

Não creio que a famosa frase de Thomas Sargent (1986) ”Inflation isalways and elsewhere a fiscal phenomenon” deva ser tomada literalmente.No entanto é bastante lógico que dentro de determinadas condições, aumen-tos de défices orçamentais devam provocar pressões inflacionistas. Podemosfacilmente demonstrar que isto se verifica, caso os défices orçamentais nãolevem a um aumento significativo da taxa de crescimento do produto (e aevidência não é favorável a esta hipótese), e caso parte deste défice sejafinanciado junto do Banco Central, o que acontecia em muitos países atémuito recentemente.

A restrição orçamental é dada em termos nominais por

+ = + +1 + +1 (3.4)

onde as novas variáveis significam o seguinte: , nível de preços; a dívidapública emitida, e montante total de moeda emitida pelo banco central(note que a variação corresponde ao financiamento do défice). Em termosreais a restrição pode ser simplificada como

= ( +1 ) ++1

sendo o montante de dívida pública em termos reais. Esta última equaçãosignifica que o Governo pode financiar o défice público ( ) através detrês formas: aumento das impostos líquidos ( ); emitir mais dívida públicaem termos reais ( +1 ) o que implica maiores custos financeiros parao Estado no futuro, ou pode aplicar o truque mágico de aumentar a massamonetária em termos reais (( +1 ) ). Como é óbvio, na maioriados casos os governos esgotavam as duas primeiras opções e viravam—sefacilmente para a terceira. Para um Governo pouco responsável e poucopreocupado com o bem estar da economia a médio e longo prazo, a úl-tima solução é como ”manna from heaven” porque pode gastar hoje semrestrições, retirando os benefícios políticos dessa sua atitude aparentemente”preocupada” com o boa saúde da economia. No entanto, o que faz é re-tirar de forma artificial recursos económicos às famílias (sobretudo às maispobres, aquelas que não conseguem ”fugir” à inflação via aquisição de ac-tivos financeiros) através do correspondente aumento de preços. Ou seja,

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 28

se ( +1 ) crescer bastante, isto implica normalmente maior inflaçãoatravés de uma aumento da procura agregada. Maior inflação implica au-mentos de , mas se se isto se verificar, então para que ( +1 )aumente e possa assim financiar o défice, o banco central tem de aumentarnovamente a massa monetária. Ou seja, o truque mágico consiste em queo Governo financia despesas públicas e não assume quaisquer responsabili-dades desta sua actuação para o futuro.

Obviamente que este problema ficaria bastante reduzido caso o aumentoda despesa de per si levasse a um aumento da taxa de crescimento económicoou a uma redução drástica da pobreza e de más condições sociais na econo-mia. Infelizmente, a evidência quanto ao crescimento económico é (aparente-mente) negativa. Por outro lado, os elevados défices levaram a um períodode elevadas taxas de inflação, e normalmente são os agentes económicos maispobres que mais sofrem com as mesmas, começando pelos seus salários reais.É ainda bastante questionável que as despesas públicas que estavam pordetrás da criação monetária seriam fundamentalmente gastos de naturezasocial, podendo em muitos casos ser apenas mais uma forma expedita detentar ”ganhar as próximas eleições” mais do que gerir de forma eficiente aeconomia.

Como facilmente se compreende, este tipo de financiamento foi a ”formamágica” bastante utilizada pela política económica do passado, mas cuja efi-ciência é hoje bastante questionável, quer em termos de eficiência económica,quer em termos de justiça social. Um modelo macroeconómico que não leveem consideração, de uma forma ou de outra, a restrição orçamental, corresérios riscos de praticar o mal em nome do bem.1

Limitação 2 O modelo sub—avalia bastante os problemas com défices orça-mentais. Não permite avaliar com rigor o impacto negativo de défices orça-mentais elevados sobre: inflação, perda de competitividade externa e eleva-dos défices externos, expectativas inflacionistas, e o ciclo vicioso das políticasdo ”stop and go” que tão maus resultados deram na década de 70.

3. As relações de comportamento são lineares. Caso as relações nãofossem lineares, por exemplo, o nível do consumo afastar—se—ia ao longo dotempo gradualmente do nível do rendimento disponível das famílias (ambosmedidos em valores absolutos), o que violaria um facto empírico inques-tionável: no longo prazo estas duas forças estão altamente correlacionadas,

1A versão que aqui apresentamos segue de perto os pontos fundamentais do argumentode Sargent e Wallace (1981) em termos do impacto de déficts orçamentais sobre a inflação.Esta é uma versão ”fraca”. Recentemente, tem sido desenvolvido uma outra versão maisforte do impacto. Na versão acima um banco central independente e credível resolve oproblema. Na nova ”Teoria Fiscal dos Preços” nem um banco central com tais atributosconsegue eliminar os efeitos inflacionistas de déficits orçamentais. Vide, por exemplo,Christiano and Fitzgerald (2000), Carlston and Fuerst (2000), Woodford (1996), Cochrane(1998) para uma exposição desta nova teoria. Críticas à teoria podem ser encontradas emBuiter (2001) e Niepet (2001).

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 29

Consumo e PIB nos EUA: 1947-2000

esca

lalo

garí

tmic

a

consumo

PIB

Figura 3.1: Consumo e PIB nos EUA, ambos medidos em termos reais.

embora no curto prazo os desvios tenham diferentes amplitudes consoanteestejamos em expansão ou em recessão económica. Nas Figuras 3.1 e 3.2apresentamos duas características fundamentais do consumo das famílias.Primeiro, no longo prazo, o consumo tende a ter uma taxa de crescimentosemelhante ao do PIB, o que confirma uma previsão do modelo convencional.Desta característica deveríamos retirar uma taxa de poupança das famíliasrelativamente constante no longo prazo. No entanto, esta dedução do mo-delo é facilmente refutada em termos empíricos, como se pode ver atravésda Figura 3.2 no que diz respeito aos EUA.

4. As relações de comportamento são demasiado simplistas e mecânicas.Por exemplo, no modelo Keynesiano básico o nível do consumo dependeapenas do nível do rendimento disponível das famílias, e como não podeexistir uma relação não linear entre as duas forças (por razões já explicadasno ponto anterior), então o consumo terá necessariamente de ser pró—cíclicoe as amplitudes das suas respostas aos choques deverão ser semelhantesàs que se verificam no produto. No entanto, isto não se verifica porqueexiste larga evidência de que o consumo é menos volátil do que o produto(embora seja pró—cíclico). Vide Figura 3.3. Daqui retiramos a noção deque as famílias pretendem fazer aquilo que se designa por ”consumptionsmoothing” ou ”alisamento do consumo” ao longo do tempo; ou seja emperíodos de recessão económica o consumo diminui percentualmente menosdo que o rendimento, e em períodos de expansão o consumo aumenta masmenos que o rendimento em termos percentuais. Devemos realçar que ateoria do rendimento permanente de Friedman (1957) ou o modelo dos ciclos

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 30

Taxa de poupança das famílias nos EUA: 1959-2000

Figura 3.2: A taxa de poupança das famílias nos EUA.

de vida de Modigliani (1963) permitem explicar o comportamento cíclico doconsumo muito melhor do que o modelo Keynesiano básico.

Uma situação semelhante verifica—se quanto ao comportamento do in-vestimento. Enquanto que a teoria do modelo IS—LM standard prevê umareacção do investimento aos choques muito similar à reacção do produto,vastos estudos empíricos têm demonstrado que o investimento, embora sejapró—cíclico, é de facto muito mais volátil do que o produto. Vide Figura3.4 para uma evidência clara deste resultado para os casos da Alemanha eEUA. Daqui podemos retirar mais duas conclusões importantes:

Limitação 3 O modelo Keynesiano básico não permite explicar o compor-tamento do consumo das famílias de forma satisfatória, e devemos lembrarque o consumo é de longe a maior componente do PIB na maioria dos países,representando em muitos deles rácios de 70% ou mesmo superiores.

Limitação 4 O modelo também não permite explicar o comportamento doinvestimento. Na realidade o investimento é muito mais instável do queo modelo Keynesiano standard prevê. Esta elevada volatilidade do investi-mento sugere que, não somente o custo do capital, mas também expectativasde futura rentabilidade, deverão constituir factores explicativos do compor-tamento do investimento. As expectativas podem gerar períodos de euforiae de pessimismo, os quais exacerbam as amplitudes dos ”business cycles”,levando a que o comportamento bastante volátil deste agregado possa serexplicado de forma mais satisfatória.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 31

ConsumoPIB

ConsumoPIB

Canadá Japão

Figura 3.3: Taxas de crescimento (dados trimestrais) do PIB e do Consumopara o Canadá e Japão. O consumo é pró—cíclico mas menos volátil do queo PIB.

Investimento

Investimento

PIB

PIB

Alemanha

EUA

Figura 3.4: O investmento é pro-cíciclo mas muito mais volátil do que oPIB. Exemplo: Alemanha e EUA.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 32

Limitação 5 A incapacidade do modelo em explicar satisfatoriamente ocomportamento do consumo e do investimento coloca sérias reservas à uti-lização das principais receitas do modelo em termos de política económica,quer política fiscal, quer política monetária. Por exemplo, se a propensãomarginal a consumir não é tão elevada nem tão estável ao longo dos cicloseconómicos como o modelo assume, então a utilização dos impostos sobreo rendimento como instrumento estabilizador fica bastante comprometida.Por outro lado, se o investimento não reage à taxa de juro como o modeloestipula, a eficácia da política monetária acaba por ficar também seriamenteafectada.

3.2.2 Mercado Monetário

No que respeita ao bloco do mercado monetário, o modelo considera umponto fundamental: o Banco Central tenta controlar a massa monetária,sendo o mercado a determinar o nível da taxa de juro através da inter-acção entre a procura e oferta de moeda. Existe um segundo aspecto quetem alguma importância para as principais prescrições de política monetáriaque resultam do modelo standard: o Banco Central deve ser independentedo Governo no sentido de gerir a política monetária sem pressões de opor-tunismo político, mas devido ao facto do modelo ser totalmente ”backwardlooking” os ga-nhos que resultam de uma política de combate à inflaçãopoderão ser apenas ”apanhados” pela metade.

Por exemplo, um Banco Central independente mas sem credibilidade, ébem diferente de um banco independente mas com credibilidade. Como apolítica monetária depende de forma crucial da questão da credibilidade –e como, por outro lado, a política fiscal tem hoje, no que diz respeito à suacapacidade para estabilizar os ”business cycles”, uma eficácia muito menordo que a que se julgava ter duas ou três décadas atrás (pelas razões já acimareferidas) – então, grande parte da capacidade de estabilização destes ciclosacaba por ficar largamente dependente da política monetária e da questãoda credibilidade dos bancos centrais. Não será, por isso, totalmente estranhoa esta discussão o facto de após um longo período de elevada inflação emtodos os países desenvolvidos (e em desenvolvimento), desde finais de 60até meados de 80, se ter assistido a um processo alargado a várias zonasdo globo para tornar os Bancos Centrais livres dos interesses estritamenteconjunturais do exercício do poder político e de opções eleitoralistas tãoprejudiciais ao bom funcionamento da economia.

No modelo standard Keynesiano o mercado monetário comportava—se daseguinte forma

= ( ) , 0 , 0 (3.5)

onde e representam, respectivamente, a oferta e a procura de moedaambas em termos reais. O modelo assume que o Banco Central tem poder

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 33

para controlar e através desta variável acaba por afectar a determinaçãode e de , bem como o nível de emprego.

As principais críticas que podem ser feitas a esta representação do equi-líbrio do mercado monetário, e do poder da política monetária sobre o sec-tor real da economia que está subjacente ao mesmo, são fundamentalmenteduas: (i) o Banco Central não consegue controlar de forma eficiente o ní-vel de , devendo para tal concentrar a sua acção no controle directo dastaxas de juro ( ); (ii) ao concentrar—se no controle ”directo” das taxas dejuro, o Banco Central deverá necessariamente tornar claro ao sector privadoquando, e em que circunstâncias, altera as taxas de juro; ou seja, quais sãoas regras que este banco impõe para que a alteração das taxas de juro nãopasse a ser um mero jogo discricionário no seio da actividade económica. Defacto o ponto (i) implica o ponto (ii) e ambos estão totalmente ausentes dovelho modelo Keynesiano IS—LM—AS.

Admita que o Banco Central não consegue controlar a massa monetária,o que pode acontecer por duas razões: ou porque a velocidade de circulaçãoda moeda é bastante instável ao longo do tempo – vide Figura 3.5 – ouporque existe incerteza sobre qual o agregado monetário que se deve contro-lar, e estes agregados comportam—se de forma diferente como se pode ver naFigura 3.6. Nesta situação, não somente o Banco Central tem dificuldadessérias em gerir os ciclos económicos de curto prazo, como pode inclusiveagir de forma contrária aos seus próprios objectivos, injectar liquidez naeconomia, em vez de a reduzir, ou inversamente.

Para evitar este tipo de situações, William Poole sugeriu em 1970 – numbrilhante artigo mas ”esquecido” durante mais de 20 anos, embora seja hojejá considerado como um marco na moderna teoria monetária – que o BancoCentral deveria tentar controlar a taxa de juro e não a oferta de moeda, sea variância dos choques sobre a procura real de moeda fosse superior àdos choques sobre a procura agregada. Isto pode ser facilmente ilustradonum gráfico em que se representa o equilíbrio no mercado monetário. Nopainel da esquerda da Figura 3.7 temos a situação em que o Banco Centralcontrola a oferta de moeda, onde verificamos que para uma mesma ofertapoderão existir três diferentes níveis da taxa de juro de mercado. Qual é averdadeira procura de moeda num dado momento de tempo? E qual a suataxa de variação, já que como vimos o multiplicador monetário é bastanteinstável e varia de agregado para agregado. No caso do painel da direita,estes problemas de incerteza quanto ao comportamento da procura de moedasão eliminados caso o Banco Central consiga controlar com rigor o nível dataxa de juro de mercado. A variável que passa a ser endógena é a própriaoferta de moeda que o sector bancário coloca à disposição do sector nãobancário, determinada pelo valor da sua procura.

É hoje largamente aceite que o Banco Central deverá controlar a taxa dejuro de curto prazo e não os agregados monetários. Como um ex—governadordo Banco Central do Canadá, Gerry Bouey, afirmou:

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 34

M0M4

Figura 3.5: A velocidade de circulaç ão da moeda não é constante. Exemplo:Reino Unido.

”We didn’t abandon the monetary aggregates, they abandonedus”

No entanto, a opção pelo control da taxa de juro de curto prazo coloca deforma imediata um novo problema: ”fixar” um preço no mercado, como sejauma taxa de juro, não é tarefa fácil e requer um sinal claro (ou ”fixing”)por parte do Banco Central para que não exista grande instabilidade nospreços. Por outro lado, é indispensável que os sinais que o Banco Centrallança para o mercado sejam inequívocos e credíveis. Daqui resultam trêsoutras implicações directas da escolha da taxa de juro como ”target”: (i)para que o Banco Central possa ser considerado como credível o mesmonão pode estar dependente do Governo e dos seus interesses em termosdo ciclo eleitoral; (ii) tem de ter uma posição forte de combate à inflação(”inflation targeting”), pois caso não o faça, acaba por ser a própria inflaçãoa guiar a taxa de juro de mercado através de patamares mínimos aceitesna economia para a taxa de juro real (esta relação é dada pela equação deFisher); e (iii) o Banco Central terá de possuir uma ”regra” para conduzir apolítica monetária, deverá torná—la clara e pública e deverá comprometer—sea respeitar integralmente essa mesma regra.

As principais implicações práticas desta nova abordagem da políticamonetária para o modelo standard Keynesiano são simples.

Limitação 6 Este modelo não permite mostrar porque razão ”inflation tar-

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 35

1990 1995 2000

-.01

0

.01

.02

.03GrowthM2 GrowthM1GrowthM3

200 400 600 800 1000 1200

2500

5000

7500 M3 x M1

-.005 0 .005 .01 .015 .02 .025

-.01

0

.01

.02

.03GrowthM1 x GrowthM2

-.01 0 .01 .02 .03

0

.005

.01

.015GrowthM3 x GrowthM1

Figura 3.6: Agregados monetários M1, M2 e M3 para os EUA. O primeiropainel cobre o período 1990—2000, os restantes 1959—2000.

r

M

r1

M

rMs

Dd0

r = r*

Dd2

Dd1

r0

r2

Dd0

Dd2

Dd1

Ms0Ms

2 Ms1

Figura 3.7: A política monet ária em dois extremos: control da massa mo-netária (esquerda) versus control da taxa de juro (direita) pelo Banco Cen-tral.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 36

geting” apresenta vantagens para a economia em termos da gestão dos cicloseconómicos de curto prazo.

Limitação 7 Não permite explicar porque é que ”regras” de condução dapolítica monetária, num cenário em que o banco central assume ”o com-promisso” de não tolerar inflação (ou outro objectivo por si escolhido), sãoclaramente superiores à condução da política monetária baseada numa ati-tude discricionária por parte do banco central.

3.2.3 Procura Agregada

Usando as equações relativas à função IS e função LM podemos obter afunção procura agregada, sendo esta dada pela expressão

= 1 + 1 (3.6)

sendo 1 2 parâmetros do modelo, enquanto que representa o nível daprocura autónoma neste modelo simples e é dada por = As prin-cipais conclusões são imediatas: (i) a política fiscal é eficaz, levando a umaexpansão da procura agregada de bens e serviços na economia caso se veri-fique um aumento dos gastos públicos ( ), ou uma diminuição dos impostoslíquidos ( ); (ii) a política monetária é eficaz, levando a um aumento daprocura através de uma expansão da oferta de moeda (em termos reais:

)As limitações do modelo convencional quanto à análise do lado da procura

já foram referidas nas duas sub—secções anteriores, quando discutimos afunção IS e a função LM. Portanto, torna—se desnecessário voltar a referi—lasnovamente. No entanto, convém realçar que a verdadeira dimensão das limi-tações referidas ficará bem mais clara quando introduzirmos na nossa análiseo funcionamento do mercado de trabalho. Será que se podem obter maioresníveis de procura agregada de forma permanente – e, consequentemente,maiores níveis de emprego – através da intervenção do Banco Central aonível da política monetária, ou do Governo através da política fiscal, comoo modelo aparentemente admite? Será que a célebre frase de Nixon ”I am aKeynesian ... by spending as if we were at full employment, we will help tobring about full employment”,2 a qual fornece bem a perspectiva dominanteno início da década de 70, é correcta para exprimir as verdadeiras poten-cialidades do modelo para explicar a eficácia da política económica? Comoiremos verificar, esta ideia de que o Governo e o Banco Central podem explo-rar de forma permanente um possível trade—o entre inflação e desemprego,mesmo no longo prazo, não é somente errada, é também bastante perigosacomo a década de 70 bem demonstrou.

2Vide Stein (1985)

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 37

Um outro aspecto importante consiste no facto de que, mesmo sem aintrodução do mercado de trabalho na análise do comportamento dos váriosmercados, a validade da eficácia das políticas fiscal e monetária pode serfacilmente posta em causa se introduzirmos também o mercado cambial nofuncionamento da economia. É conhecido desde o início da década de 60,através dos resultados de Robert Mundell e Marcus Fleming, que a famosatrilogia de Mundell impõe restrições críticas à eficácia daquelas políticas.Assim, uma economia não pode aspirar a ter políticas fiscais e monetáriasautónomas (ou independentes) caso se pretenda obter simultaneamente osseguintes três objectivos:

• câmbios fixos• livre mobilidade de capitais• control da massa monetária

Um destes objectivos terá de ”cair”. Caso se pretenda manter os primeirodois, a política monetária deixa de ser eficaz (um exemplo claro deste cenáriofoi, e é ainda, o processo de integração europeia desde o Tratado de Maas-tricht até à criação da moeda única). Caso se pretenda manter os doisúltimos, cairá o regime de câmbios fixos, como sucedeu com a libra inglesae com a lira em Setembro de 1992 quando tiveram que abandonar o SistemaMonetário Europeu (a libra ainda não regressou ao sistema).

Como é do conhecimento geral, Robert Mundell recebeu o prémio Nobelem Economia em 1999. Apesar dos modelos de Mundell—Fleming serem (naminha perspectiva) os modelos mais poderosos, dentro da filosofia do mo-delo básico Keynesiano, para explicar os ciclos económicos de curto prazo,eles nunca foram dominantes em livros de texto de macroeconomia a nívelintermédio. E por isso, não é de estranhar que estes modelos fossem normal-mente relegados para apêndices de capítulos onde se discutia os mercadoscambiais, ou não ultrapassassem a meia dúzia de páginas quando incluídosno texto fundamental. Penso que isto deve—se a duas razões.

Primeiro, durante as décadas de 70 e 80, as revoluções das ”Expectati-vas Racionais” e dos ”Ciclos Económicos Reais” tornaram a utilização dosmodelos de Mundell—Fleming considerada ”fora de moda” já que os mo-delos têm uma natureza fundamentalmente Keynesiana. Segundo, Mundelle Fleming anteciparam em cerca de 30 anos o acontecimento internacionalque iria levar ao enorme triunfo do modelo: o ECU, a integração europeia,e finalmente o Euro. Somente a partir do momento em que o processo deintegração europeia se tornou claramente irreversível, levando à criação deum regime de câmbios ”praticamente” fixos, e a moeda única no horizonte, éque muitos economistas perceberam bem a verdadeira dimensão do que doisbrilhantes economistas tinham defendido três décadas passadas. No entanto,as mensagens dos modelos de Mundell—Fleming são claras: quando se abre

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 38

a economia ao exterior, a eficácia da política monetária e da política fiscalterão de ser olhadas segundo uma nova perspectiva, a qual está em muitoscasos totalmente ausente da apresentação convencional do modelo Keyne-siano. Veja—se, por exemplo, o que acontece com os argumentos facilmenteencontrados em comentadores portugueses sobre a simetria imposta paraos défices orçamentais ao nível da UE: ” Porque razão todos os países daUE terão de ter um mesmo ”target” para o défice orçamental?”, ou ”Porquerazão o Banco Central português não intervém para provocar uma baixa nastaxas de juro, quando está eminente uma recessão económica?” (este últimaquestão diz respeito ao período entre 1992 e 1995). As limitações à políticafiscal e política monetária que explicam as razões de tais comportamentospor parte da UE e do Banco Central podem facilmente ser encontradas nosmodelos de Mundell—Fleming, mas não no modelo standard Keynesiano. 3

3.3 Oferta agregada

A primeira versão do modelo Keynesiano, a versão tipo Hicks—Hansen e quefoi largamente dominante durante a década de 50, incluía preços fixos. Trêsartigos foram fundamentais para a incorporação do mercado de trabalho,e consequentemente, de uma função preços ou oferta agregada no modelo:Modigliani (1944) introduziu a noção de função de produção e mercado detrabalho com rigidez salarial; Metzler (1951) apresentou a noção de expec-tativas, efeito de riqueza, bem como a restrição orçamental (embora estesaspectos nunca tenham sido dominantes no meio Keynesiano); enquanto quePhillips (1958) apresentou o conceito que ainda hoje domina grande partedas discussões macroeconómicas e que acabou por herdar o seu nome, ouseja, a Curva de Phillips.

3.3.1 O Modelo: Equações

Uma versão do modelo dominante com preços flexíveis pode ser simplificadaatravés de três equações que iremos explicar de seguida. A oferta de saláriopor parte das empresas resulta de um processo de maximixação de lucrosem situação de concorrência imperfeita e pode ser expressa

A = (1 + ) (3.7)3Não será de estranhar que muitos dos livros—texto dominantes na década de 70 e 80

não apresentassem qualquer referência ao modelo de Mundell—Fleming. Por exemplo, videBranson ”Macroeconomics”, 1st Edition, 1977, ou Robert Gordon ”Macroeconomics”, 1stEdition (1981). O único livro que sempre deu alguma ênfase ao modelo de Mundell—Fleming foi Dornbush and Fischer ”Macroeconomics”, desde a primeira edição (1978). Noentanto, o modelo era analisado nos dois últimos capítulos do livro (vide 1 e 2 edições).Um certo distanciamento ao modelo continua ainda a manter—se. Por exemplo, livrosmais recentes como o de Landsburg and Feisntone ”Macroeconomics”(1997), ou mesmoo de Barro e Grilli ”European Macroeconomics” (1994), sendo este último caso difícil decompreender até pelo próprio título.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 39

sendo A e , respectivamente, produtividade média (e marginal) dotrabalho, nível geral de preços, margem de mark—up sobre os custos mar-ginais, e salários nominais (ou custos marginais). Note—se que 0 reflecteuma situação de mercados imperfeitos, já que se assume que as empresasoperam numa situação de concorrência monopolística. A produtividade dotrabalho é constante, pois assumimos uma função de produção agregadalinear: = A = 1

A segunda equação apresenta o comportamento dos trabalhadores, sendodada por dois segmentos, dependendo da proximidade à situação de plenoemprego. Para simplificar estas duas situações podem ser representadas por

=

μmin +

¶abaixo do pleno emprego

(3.8)

= ˜ , pleno emprego

sendo ˜min , e , respectivamente, nível de trabalho oferecido (ou

nível de emprego), nível de emprego correspondente ao pleno emprego, ní-vel dos salários nominais pretendidos pelos trabalhadores, nível dos saláriosmínimos que os trabalhadores exigem em concertação social, e expectativassobre os preços que deverão vigorar no período corrente (uma forma mais ri-gorosa de expressar esta última variável será: = 1 ) 4 Das condiçõesacima pode—se facilmente concluir que a oferta de trabalho aumenta se ossalários reais esperados aumentarem, ou se os salários mínimos diminuírem.

O equilíbrio no mercado de trabalho é obtido através da igualdade dasequações (3.7) e (3.8), sendo as situações relativas ao equilíbrio abaixo dopleno emprego e no pleno emprego dadas, respectivamente, por

=

μmin +

A1 +

¶(3.9)

= ˜

Na situação abaixo do pleno emprego, o volume de emprego diminui seuma das seguintes situações se verificar:

• A produtividade do trabalho diminuir: A

• O rácio de preços efectivos sobre preços esperados diminuir:

4Esta expressão pretende mostrar que os agentes formulam expectativas em 1 ,( 1) sobre o nível de preços que deverá vigorar em , ( ). Ao longo do texto,poderemos utilizar uma ou outra dependendo das exigências de clareza e do contexto emque um assunto é discutido.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 40

L0* L

P e . wmin

W

A1t

st PW

B

aumenta

Ws0

Wd

Ws1

L1*

Figura 3.8: O impacto de um aumento na taxa de mark—up ( ) sobre oequilíbrio do mercado de trabalho. O resultado seria semelhante se os preços( ) diminuissem.

• O poder negocial dos trabalhadores levar a um aumento do nível dossalários mínimos: min

• O poder negocial das empresas levara a um aumento da taxa de mark—up:

Todas estas alterações encontram—se representadas graficamente nas Fi-guras 3.8 e 3.9.

A substituição da equação (3.9) na função de produção agregada dará oresultado

=

μmin A

¶com 1 0 2 0 3 0 4 0 Assumindo que os salários mínimose a margem de mark—up permanecem constantes, a oferta poderá crescerpermanentemente se a produtividade dos trabalhadores aumentar (A subir)ou se existir uma erosão permanente dos salários reais dos trabalhadores (ouseja, se aumentar permanentemente período, após período). Atente—se bem neste resultado: ceteris paribus, para que haja aumento na produção,da oferta de bens e serviços, e, consequentemente, do emprego é necessárioque se verifique uma descida dos salários reais dos trabalhadores.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 41

L*0 L

W

(P e . wmin)0

Wd0

WsP . A

L*1

(P e . wmin)1

Wd1

AB

Figura 3.9: O impacto de um aumento nos preços esperados ( ) ou nosalários minímos ( min) sobre o equilíbrio do mercado de trabalho.

Este resultado parece ser um pouco estranho em termos de intuiçãoeconómica porque, numa situação de expansão económica, parece ser maisrazoável que todos os agentes beneficiem dessa expansão, inclusive (e muitoparticularmente) os trabalhadores porque se verifica um aumento da procurade serviços do trabalho pelas empresas. Este ponto ficou conhecido como opuzzle de Dunlop—Tarshis.5 Devemos realçar que este resultado não é umamera particularidade do modelo específico que temos estado a apresentar.Pelo contrário, a sua inspiração pode ser encontrada na própria ”TeoriaGeral” de Keynes, e tem sido mantida como um dos alicerces fundamentaisdo modelo standard Keynesiano (senão mesmo ’o’ alicerce fundamental),através da chamada ”ilusão monetária” que leva a que os trabalhadores sepreocupem mais com os salários nominais do que com os reais.

A questão é tão crucial para o modelo que o próprio Keynes respondeu àsdúvidas de Dunlop e Tarshis num artigo – Keynes (1939) – que agora cos-tuma fazer parte como apêndice da ”Teoria Geral”. Curiosamente, Keynesnão reclamou vitória da sua teoria sobre os argumentos de Dunlop—Tarshis,mas terminou o artigo com uma recomendação clara, que incluía três pon-tos para clarificar em futura investigação empírica. Em 1939, Tarshis voltouatrás e aderiu à perspectiva contida na ”Teoria Geral” e, infelizmente, os

5Vide Dunlop (1938) e Tarshis (1938).

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 42

três pontos ficaram esquecidos no tempo durante várias décadas, enquanto omodelo standard dominou o mundo da macroeconomia a nível internacional.

Limitação 8 O modelo prevê que choques positivos sobre a procura agre-gada levem a aumentos da produção, dos preços, e consequentemente a umaumento do nível de desemprego. No entanto, isto só é possível através deuma diminuição dos salários reais. Portanto, os salários reais surgem nomodelo como contra—cíclicos, o que é facilmente refutado por larga evidênciaempírica.

3.3.2 Expectativas Adaptativas

Uma possibilidade ao alcance dos trabalhadores no sentido de superarem oproblema da ”ilusão monetária” reside na formulação de expectativas sobrea evolução dos preços e exigir aumentos dos salários nominais de acordo comessas expectativas. Este aspecto incongruente do modelo poderia ser elimi-nado com um tratamento adequado do processo que conduz à determinaçãodo nível de . Infelizmente, não somente o mesmo problema acaba por serconfirmado, como se torna ainda mais claro com o tratamento específico queo modelo dá ao problema da formulação de expectativas.

As críticas de Phelps (1967) e Friedman (1968) levaram à introdução doconceito de expectativas adaptativas as quais podem ser apresentadas por

= 1 +¡

1 1

¢, 0 (3.10)

onde é o factor de correcção do erro de expectativas cometido no período1 ou seja dá—nos a velocidade com que os erros do passado são corrigidos.

Existem três casos que são bastante relevantes para o processo de descriçãoda formulação de expectativas:

= 0 expectativas míopes0 expectativas adaptativas

expectativas ”racionais”

No caso das expectativas adaptativas os agentes económicos vão apren-dendo ao longo do tempo os erros que cometem e procuram corrigir osmesmos da melhor forma possível.6 No entanto, levam sempre algum tempoa detectar os erros que cometeram e, consequentemente, isto implica quelevarão também sempre algum tempo a reagirem a esses mesmos erros. Por-tanto, quanto maior for o valor do parâmetro maior será a velocidade comque os agentes se apercebem e corrigem os erros que cometeram no passado.

6Os artigos mais representativos que lançaram este tipo de expectativas na teoriaeconómica são os seguintes: Cagan (1956), Phelps (1967), Friedman (1968).

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 43

Assumir um processo de expectativas adaptativas apresenta vantagense desvantagens. Como vantagens óbvias da adopção deste comportamentopara prever a evolução esperada dos preços temos os seguintes argumentos:permitem evitar os efeitos nocivos da inflação sobre os salários, eliminam asubjectividade de medir ”expectativas”, e têm uma larga aplicabilidade.

Evitar os efeitos nocivos da inflação sobre os salários. Se osagentes económicos (neste caso os trabalhadores) não incorporassem os efeitosesperados da inflação sobre o seu comportamento no mercado de trabalhosofreriam uma descida dos seus salários reais em situações inflacionistas.Portanto, segundo os economistas que propõem este tipo de expectativas, osagentes económicos poderão ser iludidos por variações de preços mas apenastemporariamente, porque os agentes reagem àquelas variações ao longo dotempo.

Elimina a subjectividade de medir ”expectativas”. Variáveiseconómicas que tenham a forma de expectativas são extremamente difíceisde medir em termos objectivos devido as seu elevado grau de subjectivi-dade. Se falamos de expectativas, é muito provável que as mesmas sendoformuladas por diferentes agentes económicos sobre uma mesma variávelmacroeconómica produzam diferentes resultados. A natureza das expecta-tivas tem à partida um grau de subjectividade que não pode ser (aparente-mente) eliminado, no entanto, o processo das expectativas adaptativas per-mite grandemente reduzir esta subjectividade porque permite obter o valordo preço esperado para um dado ano como uma função apenas dos valoresdo preço efectivo desfasados no tempo.

Utilizando a equação (3.10), e resolvendo a mesma por iteração ”back-ward” para os períodos 1, 2, etc., obteremos

= 1 (1 ) 2 (1 )2 2 (1 )3 3

de onde se obtem

=X=0

(1 ) 1 (3.11)

Como pode ser facilmente constatado, a variável esperada na equação acimadepende apenas de variáveis observadas ou efectivas no passado (a subjec-tividade está eliminada). Por outro lado, o valor da variável esperada étotalmente ”backward looking”, ou seja , as decisões económicas dos tra-balhadores sobre as expectativas de inflação não incluem qualquer força dopresente, apenas forças do passado.

Este segundo aspecto relativo à equação (3.11) acaba por encarnar a prin-cipal filosofia do modelo básico Keynesiano e representa uma enorme limi-tação do mesmo para explicar os acontecimentos económicos mais recentes.Como inconvenientes das expectativas adaptativas, devem ser referidos os

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 44

10

11.5

13

14.5

16

1 5 9 13 17 21 25 29 33 37

9.5

10

10.5

11

11.5

12

12.5

1 5 9 13 17 21 25 29 33 3710

11

12

13

14

15

16

1 5 9 13 17 21 25 29 33 37

— Preço efectivo

— Preço esperado

(a) (b)

(c)

Figura 3.10: O erro sistemático na formulação de expectativas seguindo oprocesso adaptativo com = 0 6. Em (a) temos apenas um único choquesobre o nível de preços efectivos; em (b) temos choques mais frequentes; em(c) temos choques (uma subida) permanentes sobre o nível de preços.

seguintes aspectos: requerem grande quantidade de informação,7 produzemum erro sistemático, denotam irracionalidade dos agentes.

Erro sistemático. Pode ser facilmente demonstrado que no longo prazoos preços esperados só convergem para o preço efectivo (isto é, os erros dopassado serão inteiramente corrigidos e, portanto, anulados) se o preço efec-tivo sofrer um choque num determinado ano e depois permanecer inalteradoao longo do tempo. Isto implica que, se se verificar uma subida permanentedos preços efectivos (mesmo que pequena), os preços esperados estarão sem-pre abaixo dos efectivos se o processo de expectativas for o adaptativo. Videeste ponto através da Figura 3.10. Suponha uma dada economia onde numasituação inicial o nível de preços efectivos é de = 10, mantendo—se este con-stante por um determinado período de tempo. Nesta economia, os agenteseconómicos corrigem os erros do passado com um coeficiente = 0 6 e nasituação inicial o nível dos preços esperados é de = 10.

7Por uma questão de limitação de espaço, irei passar por cima desta primeira limitação,porque não é de facto a mais importante. Para mais detalhes, vide capítulo 10 do livrode Mendes e Vale (2002).

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 45

No caso acima apresentado, os trabalhadores são iludidos pela inflaçãomas apenas durante algum período de tempo – sofrendo uma perda dosseus salários reais temporariamente – já que ao fim de cerca de 5 ou 6 anosos seus salários reais voltaram ao nível que se verificava antes da alteraçãonos preços efectivos.

No painel (c) da Figura 3.10 apresentamos uma situação em que a partirde = 10 os preços efectivos aumentam todos os anos em 5%. Nesta situaçãoos preços esperados passam a aumentar também todos os anos somenteque numa percentagem inferior em virtude de = 0 6. Assim, a partir de= 10 os preços esperados passam a estar sempre a baixo do nível dos preçosefectivos de forma permanente, verificando—se também que o hiato entreestes dois preços tende a aumentar de forma gradual. Como é facilmentecompreensível, este método não parece ser de forma alguma um métodoracional para os trabalhadores evitarem perda dos salários reais causadapor alterações imprevistas no nível geral de preços.

Portanto, parece claro que existe uma séria contradição entre o principalobjectivo dos trabalhadores quando pretendem formular expectativas sobrea evolução do nível de preços efectivos (não perder poder de compra dos seussalários reais) e o resultado que surge quando utilizam o método adaptativo.Este processo produz um erro sistemático de previsão, o que não é razoávelpara os interesses dos trabalhadores.

Como existe na prática todos os anos uma subida dos preços efectivos, aoseguirem este processo em situações inflacionistas é precisamente uma perdasistemática do poder de compra dos seus salários reais que se obtém comoresultado. Assim, se os agentes económicos seguissem este processo, istorevelaria alguma irracionalidade por parte dos mesmos e é pouco provável,portanto, que este seja o método que os trabalhadores e as suas associaçõesutilizem para conceberem expectativas sobre a evolução dos preços ou deoutra variável macroeconómica.

Irracionalidade. A irracionalidade não se limita ao erro sistemáticoacima referido. Neste processo a única informação utilizada pelos agenteseconómicos para processarem as expectativas é o valor dos preços efectivos,e os seus valores verificados no passado. Mas não existirão outras variáveiseconómicas, como por exemplo as decisões de política económica do Governoou do Banco Central, que possam ter um maior peso para a evolução dospreços do que os valores que estes assumiram dois ou três anos atrás? Aresposta deve ser afirmativa e, portanto, a incapacidade dos agentes paraincorporarem outro tipo de informação ao efectuarem as suas expectativassobre o nível geral de preços revela também alguma irracionalidade porparte dos mesmos e representa outra limitação significativa do processo deexpectativas adaptativas.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 46

3.3.3 As limitações do modelo

A hipótese das expectativas seguirem um processo adaptativo acaba porconstituir o exemplo claro de que os trabalhadores não conseguem superar oproblema da ”ilusão monetária” que o modelo herdou desde Keynes, mesmousando métodos sofisticados de cálculo. Como vimos acima, a ”ilusão mo-netária” leva a que, perante um aumento da procura agregada, só se veri-fica um aumento da produção, da oferta de bens e serviços, e do empregose se verificar uma descida dos salários reais dos trabalhadores. Ou seja,neste modelo os salários reais serão necessariamente contra—cíclicos. No en-tanto, este resultado é facilmente refutado em termos empíricos e a crítica aeste resultado (bem como ao comportamento dos trabalhadores associado aomodelo) é um dos pontos fundamentais em que assenta a revolução dos ”Ci-clos Económicos Reais”. Inúmeros estudos empíricos têm demonstrado queos salários reais não são contra—cíclicos como o modelo standard previa (en-tre outros vide, Solon et al. 1994, Bils 1985, McCallum, 1986, e Fleischman1999). Como McCallum torna claro no seu artigo de 1986: ”If wage stick-iness alone were responsible for the real e ects of monetary actions, withproduct prices adjusting flexibly, then we should observe countercyclicalmovements in the real wage. That we do not has recently been reconfirmedby Bils (1985).”

Um exemplo muito simples permite mostrar o erro grosseiro associadoà perspectiva do velho modelo Keynesiano. Na Figura 3.11 apresentamos aevolução dos salários reais e do PIB real para os EUA para o período entre1947 e 2000. Como se pode verificar no painel superior direito, onde a taxade crescimento do PIB é definida por G(RealGDP) e a dos salários reais porG(RealWages), os salários são pró—cíclicos e relativamente menos voláteis doque o PIB. No painel inferior direito pode—se ainda mais facilmente constatarque existe uma elevada correlação entre os salários reais e o PIB real –de facto, os desvios padrões das taxas de crescimento são = 0 102 e

= 0 096 e o coeficiente de correlação é de 2 = 0 79 – pelo que oresultado do modelo é difícil de aceitar, bem como o tipo comportamentodos trabalhadores que o modelo preconiza.8

Em termos de conclusão, da análise do bloco da oferta e do mercado detrabalho retiramos dois pontos fundamentais:

8Note—se que uma saída possível para o modelo Keynesiano standard evitar o com-portamento contra—cíclico dos salários reais poderia residir numa de duas hipóteses: (i)se a margem de mark—up for contra—cíclica, eliminado assim a necessidade dos saláriosreais serem forçados a descer perante um aumento da procura agregada, conforme mode-los desenvolvidos por Rotemberg and Saloner (1986) e Rotemberg and Woodford (1991);(ii) os salários mínimos reais fossem contra—cíclicos, o que produziria o mesmo efeito. Noentanto é pouco provável que a margem de mark—up seja contra—cíclica e que os trabal-hadores aceitem salários mínimos mais baixos em períodos de expansão económica. Porisso, estas duas hipóteses não ganharam credibilidade para explicar o puzzle do modeloKeynesiano standard e foram abandonadas nos últimos anos.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 47

1950 1960 1970 1980 1990 2000

2500

5000

7500

PIB real

Salários reais

GDPC1 WASReal

1950 1960 1970 1980 1990 2000

-.02

0

.02

.04 G(RealGDP) G(RealWages)

1000 2000 3000 4000

2500

5000

7500

GDPC1 x WASReal

-.02 -.01 0 .01 .02 .03

-.02

0

.02

.04 G(RealGDP) x G(RealWages)

Figura 3.11: Os salários reais e o PIB real para os EUA: 1947—2000.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 48

Limitação 9 Os trabalhadores são irracionais já que produzem um erro sis-temático na formulação de expectativas, usando apenas parte da informaçãodisponível (informação sobre o passado)

Limitação 10 Mesmo com a incorporação de expectativas sobre a evoluçãode preços no comportamento dos trabalhadores, os salários reais continuama ser contra—cíclicos.

Da conjugação destes dois aspectos cruciais do mercado de trabalho re-sulta a mensagem fundamental do modelo Keynesiano em termos macro-económicos:

Limitação 11 É possível gerir a política fiscal e a política monetária deforma a obter uma relação permanente entre a taxa de inflação e a taxa dedesemprego, enquanto a economia não chegar à situação de pleno emprego.Ou seja, mesmo a própria política monetária pode produzir efeitos reais nolongo prazo, pelo menos até que a taxa natural de desemprego seja alcançada.A lógica associada à condução das duas políticas é muito simples:

= = = ( ) = ( ) = =

= = = ( ) = ( ) = =

Infelizmente, a simplicidade desta lógica não corresponde à evidênciado poder efectivo da política fiscal, nem sobretudo da política monetária.Caso os trabalhadores não se deixem iludir de forma permanente pelo meroaumento dos salários nominais, a partir do momento em que abandonemosas expectativas adaptativas ou qualquer outro método baseado em iteração”backwards”, o resultado lógico deste tipo de política económica é gerarsituações de elevada inflação, com efeitos bastante reduzidos ou nulos sobreas variáveis reais. Como Phelps (1967) e Friedman (1968) salientaram, acurva de Phillips ”backward looking” só permitiria efeitos reais às políti-cas económicas caso os seus choques não fossem antecipados. Caso fossemantecipados, os únicos efeitos seriam nominais, gerando inflação e nenhumaumento do emprego, mesmo se a economia estivesse num equilíbrio abaixodo pleno emprego. Esta possibilidade não está consagrada no modelo básicoKeynesiano porque os trabalhadores não têm a possibilidade de anteciparemde forma perfeita os choques resultantes de políticas económicas. Uma Curvade Phillips de acordo com este tipo de comportamento por parte dos trabal-hadores pode ser apresentada através da seguinte expressão

= ( 1 ) + (˜ ) + , (3.12)

com 0 1 0 e representando ˜ e , respectivamente, ataxa de inflação, operador de expectativas, taxa de desemprego, taxa natural

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 49

uu0

4% A

B

Curva de Phillips: Deslocamentos de curto prazo

• C

u~

•6%

Curva de Phillips de longo prazo

e%5e

%4

e%6

u1

• D

Figura 3.12: A Curva de Phillips no modelo Keynesiano com expectativasadaptativas.

de desemprego, e choques de oferta com média nula e variância constante,(0 2) Esta função está representada na Figura 3.12.Suponha que a taxa de inflação inicial era de 4%, o valor esperado dos

preços é de 4% e a taxa de desemprego 0.9 Se o Banco Central pretenderdiminuir a taxa de desemprego para o nível da taxa natural de desemprego,˜, através de um aumento na massa monetária, isso irá provocar um au-mento de preços. Caso os trabalhadores continuem com expectativas de 4%,o novo equilíbrio será em B, perdendo 2% nos salários reais. Na hipótese deanteciparem os efeitos da decisão do Banco Central, e conceberem expecta-tivas em como os preços irão aumentar em 5% (portanto, exigindo aumentosdos salários nominais de 5%), o novo equilíbrio será C, vendo os seus saláriosreais diminuírem 1%, e o nível da taxa de desemprego superior à taxa na-tural. Finalmente, se anteciparem correctamente o aumento dos preços, onovo equilíbrio será em D, manterão os seus salários reais inalterados, bemcomo o nível da taxa de desemprego.

No entanto, o cenário mais provável no modelo Keynesiano standardserá o que leva ao equilíbrio no ponto C, já que em B teríamos expectati-

9Note que expressamos o valor esperado dos preços por No entanto e 1

representam a mesma variável. Infelizmente, a introdução de símbolos matemáticos emfiguras ainda é bem mais complicada do que no texto.

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 50

vas míopes, enquanto que D é um resultado condizente com expectativasracionais. A questão pertinente que se coloca é a seguinte: sendo o movi-mento A B C o mais favorecido pelo modelo, porque razão a Curva dePhillips ”backward looking” não pode ser utilizada no sentido da políticaeconómica eliminar o desemprego (ou melhor, manter a taxa de desempregoao nível da taxa natural ˜) mesmo que seja à custa de elevada inflação? Istoé, após a economia ter alcançado o ponto C, o Banco Central pode iniciaruma nova política expansionista no sentido de deslocar a economia para umponto a noroeste de C, com taxas de inflação mais elevadas, mas com umataxa de desemprego mais próxima de ˜. A explicação para o provável in-sucesso desta política prende—se com a evidência na década de 70, a qualfavorecia mais o cenário conduzente ao ponto D, do que o movimento para C,ou mesmo para noroeste de C, pelo que mais inflação não levava necessaria-mente a uma diminuição do desemprego. Portanto, caso esta política fosseimplementada, o resultado mais provável seria uma taxa de desemprego de0, contra expectativas inflacionistas cada vez mais elevadas, o mesmo severificando com a taxa de inflação. Ou seja:

Limitação 12 A realidade mostrou (e mostra) que a hipótese dos decisoresde política económica serem racionais e conhecerem com precisão o fun-cionamento da economia, enquanto que os trabalhadores são irracionais edesconhecem os aspectos fundamentais deste funcionamento – tal que osprimeiros podem assim explorar o trade—o permanente entre a inflação e odesemprego (pelo menos até que o pleno emprego seja alcançado) – nãotem razoabilidade nem em termos lógicos, nem em termos empíricos.

Esta foi a razão fundamental que acabou por levar todo o modelo Key-nesiano a sucumbir durante a década de 70 e que permitiu ao principalimpulsionador na revolução das Expectativas Racionais proclamar no finalda década de 70 ”The Death of Keynesian Economics”:

”One cannot find good, under—forty economists who identify them-selves or their work as ’Keynesian’. Indeed, people even take ofense ifreferred to as ’Keynesians’. At research seminars, people don’t takeKeynesian theorizing seriously anymore; the audience starts to whisperand giggle to one another.”Robert Lucas (1980, 18).

Não se pense que este ”debacle” do modelo Keynesiano é exageradonas palavras de um economista que, à partida, se situava num espaço ondeo Keynesianismo não era bem visto. Um insuspeito Keynesiano de longadata, Alan Blinder, tornava a questão clara quando escrevia em 1988:

”By about 1980, it was hard to find an American academic macro-economist under the age of 40 who professed to be a Keynesian. That

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CAP 3. O VELHO MODELO KEYNESIANO 51

was an astonishing intellectual turnabout in less than a decade – anintellectual revolution for sure – the young were recruited dispropor-tionatelly into the new classical ranks .... By 1980 or so, the adage’there are no Keynesian under the age of 40’ was part of the folkloreof the (American) economics profession” (1988, 278).

De seguida passamos a apresentar os aspectos fundamentais de uma novarevolução que acabou por recuperar o espírito Keynesiano como uma cor-rente dominante no seio da teoria macroeconómica. Perante a falta de imag-inação, e levando em consideração que não aprecio muito o termo ”NovaSíntese Neoclássica”, designo esta nova corrente dominante por ”Novo Key-nesianismo”. De facto, a essência do novo consensus é em espírito totalmenteKeynesiana, apesar de na forma poder parecer um pouco diferente.

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Capítulo 4

O Novo Modelo Keynesiano:O Consensus

”The field of macroeconomics has witnessed in recent years the de-velopment of a new generation of small-scale monetary business cyclemodels, generally referred to as New Keynesian (NK) models or NewNeoclassical Synthesis models. The new models integrate Keynesian el-ements (imperfect competition, and nominal rigidities) into a dynamicgeneral equilibrium framework that until recently was largely associ-ated with the Real Business Cycle (RBC) paradigm. They can be used(and are being used) to analyze the connection between money, infla-tion, and the business cycle, and to assess the desirability of alternativemonetary policies”.

Jordi Gali, 2000; 1

4.1 Introdução

Depois do leitor ter passado pela secção anterior deverá ficar com a ideiade que o consensus que referimos nas primeiras páginas deste texto deveráter muito pouco de Keynesianismo, e muito de ideias do lado mais con-servador em termos de orientação filosófica quanto aos princípios gerais deorganização social e económica. Deverá também pensar que os conceitosfundamentais da herança histórica do Keynesianismo que acabámos de ap-resentar (e criticar) – como as funções IS, LM, Curva de Phillips, rigidezde preços e de salários, etc. – são erradicados da nova terminologia e dosaspectos formais da modelização. Caso tenha porventura concebido estaideia: ela está errada e a culpa talvez seja do redactor deste texto.

O Novo Modelo Keynesiano é o velho modelo Keynesiano mas sem osaspectos que acabaram por o empurrar para a falência no fim da década de60. Tem as mesmas funções, mas com alguns novos argumentos; não temexpectativas adaptativas porque as mesmas não fazem logicamente sentido;

52

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 53

tem expectativas que à falta de melhor termo poderão chamar—se ”forwardlooking”,1 e tem um papel crucial para a política monetária, para a inde-pendência dos bancos centrais, e para o combate à inflação. Continua a terum papel para a política fiscal, mas em moldes mais reservados, embora as”regras” de conduta do Governo ainda não estejam tão clarificadas como asque deverão guiar a condução da política monetária, pelo que os resultadossobre a conduta óptima da política fiscal podem trazer algumas novidadesno futuro.

Existem muitas questões que ainda dividem o mundo dos economistasque têm estado na origem do desenvolvimento do novo consensus. Nem aterminologia, nem o verdadeiro alcance da nova revolução, nem as fideli-dades dos vários actores (pelo menos os mais activos no debate) por escolasde pensamento estão totalmente clarificadas. Os últimos dez/doze anosforam absolutamente notáveis em termos do debate travado entre RBC eNovos Keynesianos. No entanto, as dúvidas que subsistiam no início da dé-cada passada sobre os prováveis caminhos da macroeconomia foram ficandosolucionadas com o peso da lógica dos argumentos e o peso dos resultadosempíricos. Por isso, será interessante verificar o que pensam alguns daquelesque, no meu entender, mais de perto contribuiram para este processo.

Talvez a melhor forma seja começar com um economista consagrado,Costas Azariadis, que escrevia no seu conhecido livro texto sobre ”Intertem-poral Macroeconomics” uma opinião inequívoca sobre o poder do modeloIS—LM:

”It is fair to warn the reader that the once very popular IS-LMframework by now belongs to the history of economic thought as an un-successful attempt to analyze purely short-run macroeoconomic events,often by mean of reasonable looking behavioral relationships such asthe aggregate consumption function, the investment function and theliquidity preference schedule. Because none of these schedules followsfrom any small set of consistent axioms about rational economic be-havior, economists often say that IS-LM structure lacks microeconomicfoundations.”Costas Azariadis (1993, 46).

No entanto, Paul Krugman não vê a questão do mesmo modo. Como humor conhecido, e com a também conhecida peculiaridade de não ter

1Embora muitos lhe prefiram chamar ”expectativas racionais”. Pessoalmente, nãoaprecio nem a conotação nem o sentido do conceito pois ele encarna a hipótese de queos agentes económicos não cometem erros em termos médios. Considero imprescindívelque as expectativas sejam ”forward looking”, mas penso que não é necessário ir tão longecomo considerar que os agentes nunca se enganam. A realidade está cheia de provas emcomo todos nós pretendemos acertar no futuro, mas raramente acertamos. No entanto,isto não significa que passemos apenas a olhar para o passado, neste caso raramente nosenganamos, mas também de pouco ou nada serve.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 54

receio de dizer em público aquilo que muitos economistas preferem manterem privado, Krugman ridiculariza os anos dourados de ”aversão” à filosofiaeconómica associada ao Keynesianismo bem como à velha terminologia:

”You see, younger macroeconomists – say, those under 40 or so– by and large don’t know this stu [the IS—LM model]. Their teach-ers regarded such constructs as the IS—LM model as too ad hoc, toosimplistic, even to be worth teaching – after all, they could not serveas the basis for a dissertation. Now our younger macro people arecertainly very smart, and could learn the material in order to teachit – but they would find it strange, even repugnant ... Now youmight say, if this stu is so out of fashion, shouldn’t it be droppedfrom the curriculum? But the funny thing is that while old—fashionedmacro has increasingly been pushed out of graduate programs ... outthere in the real world it continues to be the main basis for seriousdiscussion. After 25 years of rational expectations, equilibrium busi-ness cycles, growth and new growth, and so on, when the talk turns toGreenspan’s next move, or the prospects for EMU, or the risks to theBrazilian rescue plan, it is always informed – explicitly or implicitly– by something not too di erent from the old-fashioned macro.”Paul Krugman (1999, pag. 1).

Um caso interessante de mudança de opinião relativamente ao poder doKeynesianismo para explicar os fenómenos económicos parece—me ser o deRobert King. Um dos principais impulsionadores da corrente dos CiclosEconómicos Reais, King criticava abertamente o modelo Keynesiano tãolonge no passado como em 1993:

”Economists should not be led astray by this advertising campaign[to ressurect the IS—LM model], sophisticated and recurrent though itis. The IS—LM model has no greater prospect of being a viable analyticalvehicle for macroeconomics in the 1990s than the Ford Pinto has ofbeing a sporty, reliable car of the 1990s. Because of its treatmentof expectations, the IS—LM model, as traditionally constructed andcurrently used, is a hazardous base on which to build positive theoriesof business fluctuations and to undertake policy analysis.Robert King (1993, pag. 68)

Em 1997 King juntamente com Marvin Goodfriend apresentariam aquiloque pode ser considerado como o primeiro ”survey” relativamente à novacorrente Keynesiana.2 Em 2000, Robert King publica aquele que irá sercertamente um dos mais lidos ”surveys” sobre o novo consensus. O título

2Vide Goodfriend and King (1997).

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 55

é sugestivo: ”The New IS—LM Model: Language, Logic, and Limits” e aposição do autor parece ser bastante favorável ao novo modelo IS—LM:

”The distinguishing characteristic of the NewIS-LM model is thatits key behavioral relations can be derived from underlying choice prob-lems of households and firms and that these relations consequently in-volve expectations about the future in a central manner. The IS curverelates expected output growth to the real interest rate, which is a cen-tral implication of the modern theory of consumption. The aggregatesupply/Phillips curve component of the model relates inflation todayto expected future inflation and an output gap. This relationship canbe derived from a monopoly pricing decision that is constrained by sto-chastic opportunities for price adjustment together with a consistentdefinition of the price level. The New IS-LM model is increasingly be-ing utilized to illustrate macroeconomic concepts that are robust acrossa variety of more detailed models and to exposit the implications ofalternative monetary policy rules.”Robert King (2000, pag. 87)

Outro aspecto interessante do processo de evolução da teoria económicaao longo da última década diz respeito à questão concreta da utilidade davelha terminologia do modelo IS—LM. Faz sentido/não faz sentido continuara utilizar estas funções para modelizar o comportamento da economia nestenovo período da teoria económica? É útil do ponto de vista científico, ouapenas ao nível pedagógico? A Curva de Phillips tem alguma relevância nomundo actual? Um exemplo relevante é a posição de Greg Mankiw, autorde dois livros de texto de teoria económica (que se tornaram best—sellers)e um dos mais relevantes elementos do Novo Keynesianismo ao longo dasúltimas décadas:

”The textbook IS—LM model, augmented by the Phillips curve, con-tinues to provide the best way to interpret discussions of economic pol-icy in the press and among policy makers ... The observation thatrecent developments [in Real Business Cycles] have had little impacton applied macroeconomics creats at least the presumption that thesedevelopments are of little use to applied macroeconomists. ”Gregory Mankiw (1990, 1645—46)

Mankiw editou, conjuntamente com David Romer, um dos principaiscompêndios da corrente Nova Keynesiana em 1991. Dois volumes designa-dos por ”New Keynesian Economics”. Será no mínimo curiosa a posiçãorecente de David Romer sobre o modelo IS—LM—AS, pois considera—o total-mente irrelevante para a investigação e mesmo para o ensino (!) da novamacroeconomia:

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”Changes in both the macroeconomy and in macroeconomics sug-est that the IS—LM—AS model is no longer the best baseline model ofshort—run fluctuations for teaching and policy analysis. This paperpresents an alternative model that ... is simpler, more realistic, andmore coherent than the IS—LM—AS, not just in its treatment of mone-tary policy but in many other ways.”David Romer (2000, pag.1)

Para terminar, o caso mais interessante. Martin Eichenbaum e LarryChristiano são dois dos mais respeitados macroeconomistas da nova geração.São colegas na mesma universidade, do mesmo departamento de economia(Nortwestern, Evanston—Chicago),3 têm uma posição muito próxima sobreas principais questões da macroeconomia, tanto mais que a maior parte daprodução científica dos dois é conjunta. Recentemente foram entrevistadossobre o ”Estado da Macroeconomia”.4 Facto curioso: os dois apresentamposições bem diferentes quanto à importância ou relevância do modelo IS—LM. Vejamos as suas respostas (as perguntas em itálico):

”[10] Is there still some advantage to studying the IS-LM model?”No. It’s just a way of not being explicit about the important as-sumptions you’re really making. Is it possible to introduce the recentmacroeconomic developments (real business cycle, endogenous growthand so on) in the IS-LM framework? Why bother? Economics shouldbe tied to people and institutions. The IS—LM framework isn’t. Whenall is said and done, it’s a bunch of curves that represent someone’shunch about various decision rules. I want to know about the actualproblems that real people are solving. I just don’t see these things inan IS—LM diagram. I’m not alone in this perspective. What frontierresearch can you think of that actually uses the IS—LM framework?People like Greg Mankiw, David Romer and I may disagree about lotsof things. But we’re not talking about the slope of the LM curve.We’re talking about what’s going on in product markets, labor mar-kets, assets markets and so on. The way we resolve our disagreementsis by expressing our views in models and then assessing the modelsusing the best data we can get. There’s little to be gained fromhiding behind the skirts of IS and LM curves.Martin Eichenbaum (1997, Resposta à pergunta 10, in Usabi-

aga (Ed.)

”[7] Is there still some advantage in studying the IS-LM model?Absolutely. I think that the IS-LM model is a very useful

3Nenhuma relação com a Universidade de Chicago.4Vide Carlos Usabiaga, (Ed.), ”The Current State of Macroeconomics: Methodology,

Theory and Economic Policy”, McMillan, forthcoming.

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language for talking about macroeconomics with undergrad-uates. All the ideas of economics that have been discussed inthe past couple of decades can be articulated with this frame-work, with minimal setup costs for the student. [8] However,many graduate students say that their professors criticize the IS—LMmodel ... The IS—LM model is a language. Its strength is its ex-treme flexibility, it can accommodate di erent elements, you can useit to express almost any idea. That’s an advantage for undergraduateteaching, it may also be an advantage when thinking casually. But, itis probably not appropriate for research.

The big development since the seventies, in my view, is not so muchsubstantive. The basic ideas of the pre-rational expectations revolutionare still there: the economy needs some kind of institutional design toimprove the performance of the business cycle. The economy, left toitself, is not going to necessarily end up in a good place. The basicideas are still here. But there is a very important di erence. It isthat now we are able to talk about those ideas with a level of precisionthat no one could have dreamt of before. And that level of precisionis important for two reasons. First of all, we can make clear, when wediscuss with each other, what are we talking about. The second thingis that it allows us to quantify things.

For example, suppose someone wants to argue that business cyclesare triggered by infectious waves of optimism in investment. In thepast, a researcher might have explained this idea with a sudden shift tothe right in the IS curve. This is now not considered appropriate. Now,the research must explain in detail how an infectious wave of optimismmight take hold among people. The answer may involve externalitiesin production. If so, then the researcher must provide evidence thatthe externalities are su ciently large empirically to justify the notionthat infectious waves of optimism can occur. The new macroeconomicframework introduced by Lucas, Prescott, Sargent and Wallace madeit possible to impose high standards on the degree of precision andclarity expected of researchers. As a result, it is easier than beforeto weed out bad ideas, and to build confidence and understand moredeeply, the good ones. So, the lack of precision and clarity in theIS—LM model renders it inappropriate for economic research and theteaching of future economic researchers. Still, at the undergraduatelevel it can be very useful because of its simplicity and the absence oftechnicalities.”Larry Christiano (1998, Resposta 7 e 8, in Usabiaga (Ed.))

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 58

4.2 O Novo Modelo IS—LM—CP

No sentido de simplificar a exposição, suponha a existência de uma econo-mia fechada, onde, portanto, existem apenas três grandes mercados: bens eserviços, financeiro e monetário, e de trabalho. Caso pretenda um modelocom economia aberta, vide Razen and Yuen (2001) e McCallum and Nelson(2001).5

O primeiro conceito fundamental é o de ”output gap” ou ”hiato do pro-duto”, o qual é definido como a diferença entre o nível do produto efectivo( ) e o nível do produto potencial (¯)

= ¯ (4.1)

sendo ¯ definido como o nível do produto que resultaria de uma situaçãoonde todos os preços nominais fossem totalmente flexíveis, mas distorções denatureza real subsistissem na economia (imperfeições de mercado de váriostipos: poder de mercado de empresas, de sindicatos, ”menu costs”, etc.).Devemos realçar que esta relação que designámos por ”output gap” temuma relação estreita com o hiato entre a taxa natural de desemprego (˜) e ataxa de desemprego efectiva ( ), bastando para tal assumir a existência deuma função de produção em que o factor trabalho seja um dos argumentos.Ou seja, podemos igualmente apresentar o output gap expresso em termosda diferença entre as taxas de desemprego

= ( ¯) , 0 0 (4.2)

Um segundo conceito fundamental é a chamada equação de Fisher

= +1 (4.3)

sendo e +1 , respectivamente, a taxa de juro real, a taxa de juronominal e a taxa de inflação esperada em + 1. Note que esta equação éextremamente importante para o novo modelo porque as expectativas deinflação podem influenciar a taxa de juro real, e através dela a procuraagregada de bens e serviços, e consequentemente, o nível do ”output gap”.Por outro lado, o ”output gap” determina o hiato entre a taxa de desempregoefectiva e a taxa natural de desemprego.

Passemos agora para as equações fundamentais do modelo: Função IS,Função LM, Curva de Phillips. Existe uma terceira equação fundamentalque pretende representar a actuação do Banco Central ao nível da esco-lha do óptimo ”trade—o ” entre inflação e desemprego (ou ”output gap”).Contrariamente aos modelos dos Ciclos Económicos Reais, o Banco Cen-tral preocupa—se não somente com a inflação, mas também com o nível dedesemprego existente na economia.

5Uma óptima fonte para este tipo de análises é Obstfeld and Rogo (1996), cap. 9 e10.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 59

4.2.1 A Nova Função IS

Esta nova função pode ser apresentada pela equação

= ( +1) + +1 + (4.4)

onde 0 sendo a única novidade , o qual é assumido como um choqueda procura agregada: = 1 1+ , com (0 2) e 0 1 1 6 Duasquestões importantes relativamente a esta equação.

A primeira é que ela pode ser derivada de um processo de optimizaçãodinâmica por parte dos agentes económicos, o qual engloba dois ”trade—o s”:poupança versus consumo, e lazer versus trabalho. Os dois aspectos funda-mentais que são requeridos para obter esta função são: moeda na funçãode utilidade e mercados com empresas em competição monopolística compreços parcialmente ajustados ou ”staggered prices”.7 Por uma questão deeconomia de espaço não a derivamos aqui, no entanto as fontes que poderãoser consultadas são várias. Vide, por exemplo, Woodford (1996), Sims (1999,2000), Yun (1996) ou McCallum (2001).

A segunda característica importante da nova função IS consiste no factoda mesma ser muito semelhante à velha função, já que a taxa de juro, orendimento, e os choques da procura agregada continuam a ser os factoresexplicativos. No entanto, existe uma diferença fundamental: em vez dataxa de juro nominal temos a taxa de juro real esperada, e em vez do rendi-mento corrente temos o nível esperado do rendimento no futuro. Ou, seja,a grande novidade consiste na incorporação de expectativas ”forward” nobloco da procura agregada de bens e serviços. Apesar da diferença pare-cer pouco significativa, no entanto, ela é crucial pois permite introduzir umvasto conjunto de novas considerações como iremos verificar.

Na Figura 4.1 apresentamos a representação gráfica desta nova função.Note que poderíamos ser tentados a representar também um deslocamentoda função no sentido contrário causado por um aumento em +1 Noentanto, isto seria errado já que a condução da política monetária de formaeficaz faz com que uma subida da taxa de inflação esperada implique umasubida das taxas de juro nominais, deixando assim a taxa de juro real inal-terada e, consequentemente, a posição da função no plano ( ).

A função IS pode ser reescrita de uma forma equivalente mas mais útilpara os passos seguintes. Sabendo que o nível do produto potencial é deter-minístico, podemos subtrair ˜ ao lado esquerdo e ˜ +1 ao lado direito da

6Este choque pode ser interpretado como o nível das despesas públicas, sendo estasutilizadas para estabilizar a economia. Portanto, tanto podem aumentar como diminuir.

7 Infelizmente não consegui encontrar um termo em português que possa traduzir fiel-mente o conceito de ”staggered prices”. Este conceito pretende transmitir a ideia de queem cada período de tempo, apenas uma proporção das empresas actualiza os seus preços,sendo o preço de mercado determinado pela média ponderada dos que mudam e dos quepermanecem inalterados.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 60

r

y

IS1

y0 y1

r0B

A

IS0

Efeitos de subida emEt yt+1

Figura 4.1: A nova função IS.

equação (3.3), ficando com uma nova expressão para a IS

= ( +1) + +1 + (4.5)

Esta equação é em todo semelhante à primeira expressão, sendo agoraexpressa em termos do ”output gap” em vez do nível efectivo do produto.

4.2.2 A Nova Curva de Phillips

A nova Curva de Phillips (CP) é obtida a partir de mercados imperfeitos,onde as empresas se comportam como monopolistas concorrenciais. Estefacto implica que as empresas não podem ajustar os preços de forma per-manente, ou seja existe um período mínimo entre duas actualizações depreços. O modelo mais utilizado é o de Calvo (1983), onde 1 produ-tores actualizam os preços num dado período, enquanto que uma proporçãodos mesmos deixam os preços inalterados. Assim, o nível geral de preços

comporta—se de acordo com (variáveis expressas em logaritmos)

= 1 + (1 ) (4.6)

sendo o logaritmo do preço desejado pelas empresas que ajustam preçosno período .

O nível de é determinado utilizando uma regra de ”mark—up” de formasemelhante à antiga curva de Phillips. No entanto, existe uma pequena

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 61

nuance que acaba por ser crucial. A margem de lucro é fixada sobre os custosmarginais, mas é fixada em relação aos seus valores esperados futuros, cujosvalores médios em cada período são descontados para o presente atravésde uma taxa constante. Esta hipótese é bastante razoável pois a empresaquando ”fixa” preços não deve levar apenas em consideração os custos (ouos lucros) do exercício em questão, mas sim os valores médios que pretendeobter ao longo de um determinado horizonte temporal. Esta ideia pode serapresentada matematicamente através da expressão

= (1 )X=0

( ) { + } (4.7)

onde representa os custo marginais em termos nominais e 0 1Aplicando logaritmos a , obtemos os custos marginais em termos reais

= . Combinando as equações (4.6) e (4.7), podemos obter umaexpressão semelhante à curva de Phillips 8

= ( +1) +

sendo (1 ) (1 ) 1 Assumindo que existe uma relação estreitaentre o custo marginal e o hiato entre o nível da taxa de desemprego e dataxa natural de desemprego ( ˜) – uma forma de expressar que quantomais a economia se aproximar do pleno emprego, maiores tenderão a ser oscustos unitários de trabalho e maiores tenderão a ser os custos marginaisdas empresas – podemos expressar a nova função por

= ( +1) + (˜ )

Como sabemos que = ( ˜) 0 0 então = ( ) e podemosfinalmente chegar à expressão da Curva de Phillips, à qual podemos acres-centar um choque de oferta = 2 1 + , com (0 2) 0 2 1.

= +1 + + (4.8)

em que 0 1.Um aspecto fundamental desta nova Curva de Phillips consiste em que

a determinação de preços neste novo modelo é ”forward looking”, ou seja,a inflação depende apenas de factores económicos que ocorrem no presenteou que são esperados ocorrer no futuro. O passado pode determinar o nívelde stock de activos que uma economia detém num certo momento mas nãoinfluencia a determinação de preços das empresas. Esta hipótese parece bas-tante realista, pois é pouco provável que os factos do passado possam afectar

8Vide King (2000), páginas 59—64, para uma derivação bastante detalhada destaequação.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 62

y

CP1

y0

0

B

A

CP0

1

Subida nas expectativas inflacionistas

Figura 4.2: A nova Curva de Phillips.

directamente as decisões dos agentes económicos sobre a gestão dos seus ac-tivos. Este resultado pode ser facilmente confirmado através da iteração”forward” da equação (9)

=

"X=0

( + + + )

#

em que + reflecte o aumento de custos marginais que resultam sempre quea economia ”sobre—aqueça” devido ao excesso de procura agregada, enquantoque + representa choques do lado da oferta como alterações nas margensde lucro, choques petrolíferos, ou outros. Na Figura 4.2 temos representadaa nova Curva de Phillips.

4.2.3 Mercado Monetário

A análise do mercado monetário é mais exigente em termos analíticos doque os dois blocos anteriores. Até agora temos três variáveis endógenas{ } ==0 mas apenas duas equações (IS e CP). Poderíamos resolvero problema como no antigo IS—LM—AS através da igualdade entre a ofertareal de moeda e a procura também em termos reais. Aplicando logaritmossobre a oferta nominal de moeda ( ) teremos o equilíbrio no mercadomonetário dado pela função LM

= + (4.9)

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 63

sendo o logaritmo do produto, a taxa de juro nominal (não expressa emlogaritmos) e um choque da procura de moeda com média nula e variânciaconstante (0 2). Com esta equação tínhamos o modelo fechado einteiramente determinado.

No entanto, uma solução consistente do modelo impõe a seguinte questão.Qual é o melhor instrumento de política monetária que o Banco Central temà sua disposição: é a taxa de juro ( ) ou a quantidade de moeda ( )? Comovimos no antigo modelo Keynesiano, o Banco Central controlava a oferta demoeda e deixava o mercado determinar o nível da taxa de juro nominal.Esta solução não é hoje considerada óptima porque os erros decorrentes daacção do Banco Central serão maiores do que no caso do mesmo pretendercontrolar a taxa de juro de curto prazo e deixar o mercado determinar onível da quantidade de moeda oferecida pelo sistema bancário.

A afirmação acima apresentada pode ser rigorosamente demonstrada, noentanto isso implicaria algum espaço neste texto pelo que, correndo o riscode parte do argumento ser perdido, passamos directamente para a aplicaçãoprática das conclusões.9 O Banco Central tem por objectivo controlar a taxade juro de mercado e tem de tornar claro aos agentes económicos quais sãoos ingredientes dessa regra. Por agora fiquemos com a noção que a regraserá do tipo

= (· ·)Note—se que se o Banco Central decide ”fixar” a taxa de juro de mercadonum determinado valor, então o Banco acabará por determinar o equilíbriode toda a economia. Por isso deve—o fazer tentando tomar uma decisão quemaximize o bem estar da sociedade.

É razoável admitir que o Banco Central tente ponderar duas variáveisfundamentais do funcionamento da economia: a inflação e o desemprego. Noentanto, como se sabe existe uma relação inversa entre estas duas variáveispelo que o objectivo do Banco Central será obter um ”trade—o ” aceitávelpara estas duas variáveis. Uma função que permite exprimir este problemaé uma equação quadrática do tipo

min1

2

"X=0

¡2+ + 2

+

¢#(4.10)

sendo um parâmetro que reflecte a ponderação que o banco atribui entreinflação e desemprego. Esta função quadrática está representada na Figura4.3. O ”trade—o ” entre a inflação e o desemprego está claramente visívelna base da figura, onde o plano ( ) está representado.

Portanto, o problema para o Banco Central é escolher { } ==0 o

9A demonstração deste ponto com todos os detalhes pode ser encontrada em McCallum(1989), cap. 11, pag.230—235.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 64

−2−1.5

−1−0.5

00.5

11.5

2

−2

−1

0

1

2

0

0.5

1

1.5

2

2.5

output gaptaxa inflação

obje

ctiv

o

Figura 4.3: O trade—o entre a inflação e o desemprego que o Banco Cen-tral pretende minimizar. Quanto mais próxima a curva de nível estiver domínimo da fun ção objectivo, menores serão as perdas para toda a economia.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 65

que pode ser feito através do seguinte processo de optimização

min1

2

"X=0

¡2+ + 2

+

¢#(Objectivo)

= ( +1) + +1 + (IS)

= +1 + + (CP)

Existe hoje um conjunto de resultados extremamente interessantes rela-tivamente a este problema básico da política monetária. O problema podeser atacado sob duas perspectivas: (i) o Banco Central pode actuar ”withcommitment” ou ”without commitment”, ou seja, actua ”com compromisso”ou ”sem compromisso”. A diferença entre estes dois tipos de actuação estárelacionada com o facto do Banco Central no segundo caso não se compro-meter de forma irreversível com uma determinada actuação em termos dacondução da política económica. Ou seja, pode mudar as suas opções depolítica monetária em função de um seu julgamento sobre a evolução daeconomia. No primeiro caso isto não se verifica: o Banco Central defineum objectivo (por exemplo, não tolerar inflação superior a 2%) e não sedesvia minimamente deste objectivo independentemente de choques adver-sos à economia.

Vamos resolver o problema do Banco Central actuando de acordo coma regra ”sem compromisso”.10 Numa situação ”com compromisso” o BancoCentral sabe que os agentes económicos levam em consideração a posição deforça do Banco para formularem expectativas sobre os preços e, portanto,tenta usar esta informação para alcançar os objectivos de política monetária.No entanto, quando este banco sabe que não consegue comprometer—se a nãoalterar os objectivos de política monetária previamente anunciados peranteo surgimento de situações adversas, neste caso não é aconselhável que oBanco tente influenciar as expectativas dos agentes privados, pois pode cairna armadilha de esgotar qualquer possibilidade de influenciar o equilíbriono próprio mercado monetário porque os agentes privados acabam por an-tecipar o comportamento ”permissivo” do Banco Central. Portanto, numasituação tipo ”sem compromisso”, o Banco Central não tenta influenciar asexpectativas dos agentes privados, o que significa que as deve tomar comoum dado.

Assim a melhor forma de resolver o problema consiste em assumir queas expectativas sobre a inflação dos agentes económicos privados são umdado à partida para o Banco Central, e este resolve depois o problema deoptimização acima apresentado

+1 , dado10Vide Svensson and Woodford (1999) e Woodford (1999b) para uma solução do pro-

blema de acordo com o comportamento ”with commmitment”.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 66

Portanto, o Banco Central determina o valor de e de tal que(4.10) é minimizada.11 Após um processo de cálculo simples o resultado virá

= (4.11)

Substituindo (4.11) em (4.8) obtemos a solução do modelo na formareduzida. Aqui o processo de cálculo é moroso, e após vários passos ondetem de se levar em consideração que = 2 1 + , tendo [ ] = 0chegamos ao seguinte resultado

= (4.12)

= (4.13)

sendo definido como¡2 + (1 2

¢ 1.

Substituindo as duas soluções acima na Curva de Phillips poderemosobter o valor de

+1 = ( 2) (4.14)

Finalmente, substituindo as equações (4.12) e (4.13) na função IS podemosobter o valor da taxa de juro que o banco central deverá pretender fixar deforma a optimizar o bem estar social. Neste caso o resultado é imediatobastando para tal notar que [ ] = 0, devido à hipótese de normalidadenos choques da oferta, (0 2) Portanto teremos

= ( 2) +1

com 1 +h(1 2) ( 2)

1i

1 já que 0 2 1. Substituindo a

equação (4.14) na equação anterior, pode—se finalmente obter o valor óptimopara a taxa de juro

= +1 +1

(4.15)

Portanto, a política monetária óptima pode ser caracterizada pelas trêsresultados que obtivémos acima:

=

=

= +1 +1

Desta política óptima, há a realçar as seguintes conclusões:11Note que a taxa de juro nominal não entra neste primeiro passo do processo de opti-

mização. As únicas variáveis endógenas são as que se encontram na função objectivo doBanco Central, e , já que +1é um dado.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 67

Conclusão 1 Só existe um trade—o de curto prazo entre a inflação e oproduto se existirem choques do lado da oferta, ou seja se a variância desteschoques for diferente de zero.

Proof. Como foi assumido que (0 2) então [ ] = 0 Se 2 = 0teremos que = 0, Sendo = 0, então = = 0 Ou seja, o produtoefectivo é igual ao produto potencial, e a inflação é nula, em qualquer períodode tempo.

Conclusão 2 A política monetária óptima impõe ”inflation targeting”, ouseja, ter a ”inflação como alvo”, o que implica que o Banco Central deveráactuar no sentido de garantir um processo de convergência para a taxa deinflação para o seu valor óptimo ao longo do tempo.

Proof. Como da equação (4.14) temos que +1 = ( 2) então

lim + = lim 2 = 0

Conclusão 3 A política monetária óptima requer que, se se verificar umaumento nas expectativas inflacionistas, o banco central deverá subir a taxade juro nominal num montante superior à subida no valor destas expecta-tivas, no sentido de subir a taxa de juro real e travar assim a tendênciainflacionista na economia.

Proof. Da equação (4.15) sabemos que = +1 +1 , com

1 +h(1 2) ( 2)

1i

1 Portanto +1

Conclusão 4 A política monetária óptima requer que o banco central ajustea taxa de juro de forma a contrabalançar os efeitos de choques do lado daprocura ( ), mas esta taxa deverá permanecer inalterada perante choquesdo lado da oferta ( ).

Proof. A política óptima leva a um nível óptimo para a taxa de juroque não é afectado por choques da oferta, mas é afectado por choques daprocura. Da equação (4.15) sabemos que = +1 +

1 , com 0Portanto 0 = 0

4.2.4 Exemplo

Suponha que uma dada economia se encontra numa situação com o produtoefectivo ao nível do produto potencial, a taxa de inflação é de 2% ao ano, ataxa de desemprego é de (por exemplo) 4%, enquanto que os agentes priva-dos concebem expectativas relativamente à evolução dos preços no período

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 68

CP1

1

Shock da procura negativo

C

CP0

0

r

y

IS1

y0

r 0B A

IS0

r 1

uu0

Relação entre inflação e desemprego

1

0

tttt gEr )/1(1

C

y1

yy0y1

B

A

CB

A

u1

Nova Curva de Phillips

Nova IS e Nova LM

Figura 4.4: A representação gráfica do novo equilíbrio macroeconómico.

seguinte de 2% também. Suponha ainda que existe repentinamente umchoque da procura negativo, causado por exemplo por uma onda de pes-simismo dos consumidores, ou por uma necessidade de reduzir as despesaspúblicas de forma drástica. Vamos exemplificar os impactos deste choquesobre o equilíbrio macroeconómico através do recurso à Figura 4.4.

A situação inicial é caracterizada pelo ponto A nos três painéis. No cantosuperior esquerdo temos o equilíbrio entre a IS e LM, sendo esta últimahorizontal e ditada pela regra óptima de condução da política monetária.Como se pode ver, a taxa de juro deve responder apenas a dois efeitos:alterações nas expectativas de inflação ( +1) e aos choques da procura( ). A taxa de juro no equilíbrio inicial é 0, e o nível do produto é 0. Comeste nível do produto pode—se obter de forma imediata o nível da taxa deinflação que é compatível com este equilíbrio, sendo esta igual a 0, conformepainel inferior esquerdo. No painel inferior direito é apresentado o valor dataxa de desemprego que resulta deste processo de optimização por parte do

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 69

banco central.Vejamos o que acontece após o choque negativo da procura surtir os

seus efeitos. A função IS desloca—se para a esquerda no plano ( ), levandoa economia para o ponto B nos três paineis. O produto diminui, a taxade inflação diminui, a taxa de desemprego aumenta. Caso o banco centralnada fizesse, isto iria levar a uma situação de recessão económica, pois ospreços ajustam—se apenas parcialmente12 e, portanto, as empresas iriamlevar algum tempo para alterar os preços até que a nova taxa de inflaçãofosse alcançada e o novo equilíbrio se re—estabelecesse no ponto C (em todosos painéis). Portanto, o ponto de equilíbrio final seria sempre o ponto C, casoassumíssemos que as expectativas são ”forward looking” com o estamos afazer. No entanto, como os preços apresentam alguma rigidez, a oferta levarásempre algum tempo a percorrer o caminho entre A B C. Aqui entra apolítica monetária. Pretendendo compensar a rigidez de preços, e fazer comque o choque produza efeitos mais suaves sobre a economia, o banco centraldeverá intervir de forma drástica na economia, diminuindo para tal a taxade juro e deve—o fazer num montante superior à diminuição que se esperavir a verificar—se na taxa de inflação. Ou seja, deve descer a taxa de jurode 0 para 1. As alterações processadas no equilíbrio inicial são apenas denatureza nominal, já que em termos reais os valores do novo equilíbrio sãoiguais aos valores iniciais.

Note—se no entanto que, caso o choque fosse do lado da oferta, a políticamonetária não deveria actuar. A razão é muito simples: a política monetáriaé útil para actuar sobre choques da procura devido à rigidez de preços, e oque a mesma acaba por fazer não é mais do que contrabalançar os efeitospositivos e negativos deste choque no sentido de manter a economia tão pertoquanto possível do seu produto potencial. No entanto, a política monetáriapouco pode fazer para contrabalançar choques do lado da oferta que alterema posição do produto potencial porque a natureza destes choques é de longoprazo. Ou seja, como o produto potencial é determinado pelo lado da oferta– pela qualidade dos factores produtivos e pelas opções fundamentais dosagentes económicos relativamente à acumulação de activos – a políticamonetária não consegue influenciar este sector da economia. Caso o con-seguisse, por exemplo através da emissão de maiores quantidades de moeda,bastaria imprimir cada vez maiores quantidades de moeda para tornar onível de riqueza mais e mais elevado, acabando por eliminar totalmente odesemprego, mesmo que a inflação tivesse atingido níveis incomensuráveis.Ou seja, nesta hipótese que para nós é absurda, uma economia poderia terum stock de capital físico muito baixo, uma população com baixos níveis dequalificação, uma baixa eficiência na combinação destes factores produtivos,

12Lembre—se que uma das hipóteses fundamentais do modelo consiste em que apenasuma parte dos preços se ajustam em cada período de tempo, o que faz com que o nívelgeral de preços apresente alguma rigidez.

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CAP 4. O NOVO MODELO KEYNESIANO 70

mas se aumentasse o montante de moeda, levaria a que esses mesmos par-cos recursos se tornassem bastante mais produtivos. Isto não tem sentidoeconómico.

Como é óbvio, se a política monetária fosse eficaz no longo prazo, se-ria como produzir energia à temperatura ambiente, e, como é sabido, essahipótese não tem sido considerada como minimamente viável. Acumu-lar conhecimento, acumular activos físicos, acumular activos económicosqualquer que seja a sua natureza, não é fácil para nós humanos: exigetempo, esforço, dedicação e consumo de bens económicos. Por exemplo,para preparar um engenheiro é necessário consumir—se 20 anos (ou mais) dade uma vida, não falando dos custos económicos directos associados a estapreparação. Produzir papel—moeda tem um custo insignificante e leva muitopouco tempo: caso a moeda de per si pudesse ter efeitos sobre a capacidadeprodutiva de uma economia no longo prazo, certamente não existiriam níveisde pobreza como aqueles a que assistimos diariamente nas nossas televisões.Portanto, quando se apela ao papel da política monetária para interferirsobre choques cuja natureza está ligada ao comportamento da economia nolongo prazo, não só é totalmente errado, como bastante perigoso. O re-sultado mais provável é não produzir quaisquer efeitos reais positivos, pro-duzir sim elevadas taxas de inflação, as quais vão depois diminuir a capaci-dade competitiva da economia (portanto, efeitos reais negativos) devido àdiminuição das exportações e aumento das importações.

Portanto, as diferenças fundamentais relativamente ao antigo modelo sãoevidentes. Primeiro, o modelo incorpora expectativas ”forward” em todosos mercados, contrariamente às expectativas ”backward” ou adaptativas doantigo modelo Keynesiano. Segundo, a função LM é horizontal, já que obanco central tem de reagir rapidamente aos choques e, portanto, utiliza ataxa de juro como o instrumento fundamental da política monetária. Ter-ceiro, o banco central deve apenas reagir a choques do lado da procura,devendo deixar a taxa de juro inalterada perante choques do lado da oferta.Quarto, existe um trade—o entre inflação e desemprego mas apenas no curtoprazo. Quinto, no longo prazo, os choques da procura têm um valor médionulo, pelo que este ”trade—o ” entre inflação e desemprego é também nulo.Sexto, o banco central deve ser bastante agressivo no combate à inflação,isto é, deve proceder a alterações na taxa de juro em montantes percentuaissuperiores às alterações nas expectativas sobre inflação. Sétimo, o bancocentral não deve preocupar—se com choques da oferta que interfiram com o”trend” de longo prazo, ou seja, com o seu produto potencial.

Quais são os factores que determinam o crescimento do produto poten-cial? Como iremos ver no próximo capítulo, esses factores são fundamental-mente factores de natureza real, não monetária.

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Capítulo 5

Dinâmica, Crescimento eProduto Potencial

5.1 Introdução

No que diz respeito à análise do crescimento económico de longo prazo,existem seis pontos que são fundamentais para o ensino da macroeconomiamoderna:

1. Tornar muito claro que é bastante fácil confundir ”efeitos de transiçãodinâmica” com ”equilíbrios de longo prazo”;1

2. Que a evolução de um determinado tipo de comportamento no longoprazo pode afectar de forma crucial (e, nalguns casos, irreversível) asustentabilidade desse processo. Por exemplo:

(a) acumulação da dívida publica

(b) sistema de segurança social

(c) recursos naturais

3. Tornar muito claro qual é a diferença entre ”crescimento endógeno” e”crescimento exógeno”;

4. Evidenciar quais os tipos de política económica que podem ser uti-lizadas para fomentar o crescimento de longo prazo;

1Dentro da análise do equilíbrio de longo prazo (ELP) existem ainda outras questõesimportantes, mas que, por uma razão de espaço, não serão individualizadas neste relatório.Por exemplo:Será que existe equilíbrio de longo prazo? Se existe, será ele único, ou podem existir

vários? Será um equilíbrio estável ou instável?Se existir ELP como se comportam as variáveis endógenas? Crescem a que taxa:

Positiva / Negativa / Nula?

71

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 72

5. Ensinar a modelizar e a utilizar ”packages” computacionais para im-plementar simulações numéricas dos vários modelos estudados.

Existe a convicção de que este tipo de matérias é mais exigente do pontode vista analítico do que a análise dos ciclos económicos de curto prazo, nãodevendo portanto ser apresentado como parte integrante de um programade macroeconomia a nível intermédio. No entanto, a experiência de ensinodestas matérias aos alunos do segundo ano da licenciatura em economia noISCTE ao longo dos últimos anos demonstra o contrário. Surpreendente-mente, os alunos preferem o estudo das questões relacionadas com o longoprazo do que com os ciclos económicos de curto prazo! A razão apresen-tada pelos alunos consiste no facto da análise de longo prazo ser um poucomais exigente do ponto de vista analítico, mas muito menos exigente emtermos dos ”detalhes” relacionados com a análise do comportamento dosvários agentes económicos ao nível dos vários mercados. Ou seja, enquantoque a análise dos ciclos económicos é feita com modelos ”grandes”, embora”simples”, o crescimento económico é analisado com modelos ”pequenos”,embora um pouco ”menos simples”. No entanto, o ”trade—o ” parece serbem mais favorável aos modelos de longo prazo. Portanto, não será pordificuldades analíticas que o ensino do crescimento económico não se podeprocessar na macroeconomia de nível intermédio. Os resultados têm sidotão satisfatórios que se passou de uma passo inicial onde apenas eram apre-sentados os modelos de Solow e de Harrod—Domar, para uma segunda etapaonde são agora apresentados os modelos de Solow com capital humano, evários perspectivas sobre o crescimento endógeno, onde se incluem o modelode ”learning—by—doing”, o modelo com externalidades, o modelo e I&D, omodelo clássico, e a análise da sustentabilidade da dívida pública.

Por outro lado, a discussão dos seis pontos acima referidos exige umperíodo dilatado de estudo das matérias envolvidas, o que, na experiênciado redactor deste texto, deverá aproximar—se de um semestre. Uma formaprática de tornar esta tarefa útil deverá incluir pelo menos os seguintes trêspassos.

Primeiro, devemos atribuir uma grande importância a um bloco que de-signamos por ”introdução à análise dinâmica”. O objectivo consiste em eli-minar grande parte das insuficiências ao nível dos conhecimentos matemáti-cos básicos e dotar os alunos com a intuição para a análise e aplicaçãode equações diferenciais ou às diferenças. É de facto notável que, ape-sar da maioria dos alunos terem conhecimento sobre este tipo de equaçõesdinâmicas, eles não sabem para que estas equações ”servem”, não têm anoção de como as poder usar como um instrumento poderoso para analisarquestões concretas (económicas ou outras). Por outro lado, como a intu-ição dos alunos sobre aspectos dinâmicos é praticamente nula – apesar dapalavra ” dinâmica” surgir em grande parte dos textos, mesmo nalguns ondea dinâmica é difícil de encontrar – torna—se crucial que os alunos apreendam

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 73

aqui a diferença fundamental entre equilíbrio de longo prazo e processos detransição dinâmica.

Numa segunda etapa, devem ser apresentados de forma bastante de-talhada o modelo de Solow e o modelo de Solow aumentado com capitalhumano. Estes dois modelos são os mais simples e, portanto, os mais fáceisde perceber pelos alunos, devido ao facto de só um (dois) factores produtivosserem acumulados endogenamente. Deve—se atribuir uma grande importân-cia à discussão do equilíbrio de longo prazo em cada uma destes dois modelos.A partir daqui, todos os restantes modelos são facilmente apreendidos pelosalunos. Relativamente à discussão dos efeitos de transição dinâmica, eladeve ser rigorosa ao nível da análise gráfica, mas deve ser suave e facultativaem termos algébricos, devido ao aumento da parte matemática envolvida.

Numa terceira fase surgem os modelos de crescimento endógeno. Nestafase, a apresentação dos modelos já é extremamente fácil pois os alunosjá dominam praticamente todos os aspectos técnicos relacionados com amodelização dinâmica e já têm uma intuição bastante desenvolvida sobre aessência da ”novidade” envolvida em cada modelo que vai sendo acrescen-tado.

Finalmente, numa quarta fase os alunos elaboram um trabalho de gruposobre uma matéria directamente envolvida com a análise de comportamentosdinâmicos. Por exemplo, simular numericamente os principais resultados deum dos modelos teóricos estudados, ou analisar a sustentabilidade da dívidapública de um ou vários países da OCDE recorrendo a dados estatísticossobre as referidas economias.

De seguida vamos exemplificar como é fácil analisar cada um dos cincopontos acima referidos, sem necessidade de recorrer a grandes exigênciasmatemáticas. Devido à extensão do relatório, existirão partes do texto quenão serão explicadas de forma detalhada. No entanto, os capítulos do livrode macroeconomia, Mendes e Vale (2002), podem mostrar todos os detalhes.

5.2 Sustentabilidade, Transição Dinâmica e Equi-líbrio de Longo Prazo

Vamos clarificar aqui a diferença existente entre equilíbrios de longo prazoe efeitos de transição dinâmica, bem como os problemas relativos à sus-tentabilidade da acumulação de um processo económico no longo prazo. Aanálise da dívida publica permite exemplificar estes dois pontos de formarápida e simples, se utilizarmos tempo discreto em vez de tempo contínuo.2

A variação da dívida pública é dada pela diferença entre as receitaspúblicas e as despesas públicas, de forma a equilibrar o orçamento em cada

2Parte deste texto é retirado do capítulo 23 do livro de macroeconomia de Mendes eVale (2002).

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 74

ano. Assim( + ) + · 1 = 0 (5.1)

representado os símbolos o seguinte: = Dívida pública (em termos no-minais), = Gastos públicos (em termos reais), = Transferências doEstado para as famílias (em termos reais). = Impostos sobre o rendimento,= Taxa de juro nominal, = Nível geral de preços.Como sabemos que = 1, e utilizando a taxa de juro real

em vez da taxa de juro nominal, então podemos escrever

1 = ( + ) + · 1 (5.2)

Dividindo a equação (5.2) pelo nível do rendimento no período , , e de-signando a expressão ( + ) como o défice orçamental primário( ) 3 obtemos

1 = +· 1 (5.3)

Agora aplique o seguinte truque: multiplique o segundo termo do ladoesquerdo e do lado direito da equação (5.3) pelo seguinte termo 1

1, e

re—arrange os termos do seguinte modo

1 · 1

1= + · 1 · 1

1(5.4)

Defina a taxa de crescimento anual do rendimento ou do produto por, isto é,

1= 1 + , e para simplificar a exposição utilize as seguintes

definições: ; . Note que não é mais do que a proporçãoda dívida pública relativamente ao rendimento no ano , e a proporçãodo défice orçamental primário relativamente ao rendimento no ano . Então,obter—se—á de forma imediata o seguinte resultadoμ

1

1 +

¶1 = + ·

μ1

1 +

¶1

o qual pode ser re—escrito de forma mais elucidativa como

= +

μ1 +

1 +

¶1 (5.5)

A equação (5.5) não é mais do que uma equação às diferenças de primeiraordem expressa em ordem à dívida pública, a qual é muito fácil de resolver

3O défice orçamental primário é o défice que resulta da diferença entre as receitas públi-cas e as despesas públicas mas excluindo os juros da dívida pública. O termo ”primário”pretende reflectir o défice que é estritamente gerado pela actividade do Governo relativa-mente ao ano corrente; a dívida pública acumulada e os juros pagos sobre a mesma dizemrespeito à actuação do Governo mas no passado.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 75

quer em termos algébricos quer em termos gráficos. Em termos algébricosa solução da equação é obtida através da condição = 1 = sendoesta bastante simples de perceber numa base intuitiva: quando se chegar aum determinado ano em que a dívida pública se mantenha igual ao valorda mesma no ano anterior (isto é: = 1) então teremos determinado ovalor de longo prazo para a dívida pública. Portanto, escrevendo

= +

μ1 +

1 +

nós iremos obter a seguinte expressão

=

μ1 +

¶(5.6)

As equações (5.5) e (5.6) são as expressões fundamentais que nos per-mitem analisar a sustentabilidade da dívida pública no longo prazo. Trêsresultados são fundamentais:

(i) Se a taxa de crescimento do PIB for superior à taxa de juro real aolongo do tempo (isto é, se ), então:

— se 0 = 0 , constante, e estável. (Figura 5.1)

— se 0 = 0 , constante, e estável.

(ii) Se a taxa de crescimento do PIB for menor que a taxa de juro real aolongo do tempo (isto é, se ), então:

— se 0 = 0 , constante, mas instável Note que sendoinstável, é provável que o nível de tenda a crescer indefinida-mente se , ou a diminuir indefinidamente se .

— se 0 = 0 , constante, e instável Note que sendo in-stável, é provável que o nível de tenda a crescer indefinidamentese , ou a diminuir indefinidamente se . (Figura 5.2)

(iii) Se a taxa de crescimento do PIB for igual à taxa de juro real ao longodo tempo (isto é, se = ), então:

— se 0 = + (Figura 5.3)

— se 0 =

Das diferentes situações acima descritas, qual é a que é mais normal-mente encontrada nas economias modernas? Primeiro, é muito comumencontrar—se economias onde se verifica a existência de défices orçamen-tais, portanto, 0 Nestas condições, a única forma destas economias

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 76

dt

dt-1d*

d*

45º

dt = + (1+r / 1+g) dt 1

d0 d1

Figura 5.1: Dívida pública cresce até um dado limite: 0, e

manterem a dívida pública sob controle é através da obtenção de uma taxade crescimento económico superior à taxa de juro real. No caso do governogerar um superavit orçamental corrente ( 0), e se , então o governoirá levar a que o Estado se transforme em credor em vez de devedor. Todasas restantes situações são casos em que o governo perde a capacidade decontrolar a dívida pública em proporção do PIB.

Para perceber bem a enorme importância que a prudência fiscal temem termos de uma boa gestão macroeconómica a longo prazo, podemosapresentar um exemplo numérico do primeiro caso acima (Figura 5.1). Osjuros que o Estado terá de pagar com a dívida pública em cada ano sãodados pela seguinte expressão: = · Em proporção do PIB, estes

juros podem ser escritos como =· Portanto, como

podemos escrever= · (5.7)

Utilizando o resultado da equação (5.6), os juros da dívida pública emproporção do PIB podem ser escritos como

= · ·μ1 +

¶(5.8)

Suponha que = 3% = 2% = 3% Este exemplo dá um valor deequilíbrio de longo prazo para a proporção do PIB que terá de afectada ao

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 77

dt

dt-1d*

d*

45º

dt = + (1+r / 1+g) dt 1

d0

d1

Figura 5.2: A dívida pública pode crescer sem limite, ou o Estado podeacumular créditos sem sem limite. 0 e

dt

dt-1

45º

dt = + (1+r / 1+g) dt 1

d0

d1

Figura 5.3: A dívida pública cresce sem limite. 0 e =

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 78

pagamento dos juros da dívida pública perto dos 30% (mais precisamente,= 6 18%). Pode facilmente verificar também que os mesmos valores para

os parâmetros darão um valor para = 3 09; isto é no longo prazo, a dívidapública será 3.09 vezes superior ao valor do PIB. Como deverá certamenteperceber, um país onde 6.2% do rendimento seja destinado a cobrir o dese-quilíbrio financeiro de um dos principais elementos da economia (o Estado),e onde a dívida pública seja 3 vezes superior ao PIB, não será seguramenteum país à beira de se tornar ingovernável.

No entanto, a situação será bem diferente se a taxa de juro real forsuperior à taxa de crescimento económico e se o Estado gerar um déficeprimário superior a zero. Neste caso, a dívida pública e os juros da mesmacrescerão sem limite, chegando a um ponto em que os juro consumirão todo onível de rendimento, o que é uma situação aberrante. Por isso, é convenienteperceber bem que a sustentabilidade da dívida pública depende de 3 factores:, , e . O défice pode ser sustentável no longo prazo, mas também é fácilperder o control do mesmo caso as finanças públicas não sejam bem geridas.

Conclusão 5 A sustentabilidade da dívida pública depende de 3 factores:taxa de crescimento económico, taxa de juro real, e défice primário. Odéfice pode ser sustentável no longo prazo, mas também é fácil perder ocontrol do mesmo caso as finanças públicas não sejam bem geridas. Estetipo de conclusão é válido para a dívida pública, no entanto, o mesmo tipo deraciocínio pode ser aplicado a outros processo dinâmicos, como por exemplo,ao sistema de segurança social, à extracção de recursos naturais, etc..

Agora é fácil mostrar como a confusão entre equilíbrios de longo prazo eefeitos de transição dinâmica podem surgir. Basta utilizar um exemplo doprocesso que temos vindo a examinar. Suponha os seguintes dados

Cenário 1 Cenário 2

0 = 0 01 0 = 0 01= 3% = 3%= 2% = 2%= 0 02 = 0 01

Suponha ainda que o nível do défice primário (DP) aumenta nos doiscenários para = 0 08 quando [ = 700 = 720] para o cenário 1 e quando[ = 600 = 620] para o cenário 2, voltando depois para os seus respectivosvalores iniciais. Vamos proceder à simulação dos dois cenários em duassituações: (i) sem choques sobre o défice primário, portanto com = 0 02 e= 0 01; (ii) incluindo os choques sobre os défices primários. O resultado

pode ser visto na Figura 5.4.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 79

0 150 300 450 600 750

.5

1

1.5

2 DP=0.02

DP=0.01

(a)

d(t) d(t)

0 150 300 450 600 750 900

1

2

3 aumento temporário do DP

(b)d(t) d(t)

50 60 70 80 90

.5

.75

1DP=0.02

DP=0.01

(c)

d(t) d(t)

580 600 620 640

1.5

2

aumento temporário do DP

(d)

d(t)

Figura 5.4: A comparação entre o curto e o longo prazo na evolução dadívida pública em percentagem do PIB ( ). No painel (a) verificamos queconverge para um limite no longo prazo. No painel (c) parece que

tenderá a aumentar sem limite, o que está errado. No painel (b) e (d)verificamos o que acontece se houver um aumento brusco do défice primárioao longo de 20 anos. Como podemos constatar convergirá novamentepara o seu valor de equilíbrio de longo prazo que tinha antes do choque.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 80

Como se pode facilmente verificar nesta figura, analisar uma questãodinâmica sob o ponto de vista do curto prazo (o que acontece num curtoperíodo de tempo) pode dar resultados totalmente diferentes dos que serãoobtidos numa análise do problema na óptica do longo prazo. Por exemplo, senos fixássemos no painel (b) seríamos levados a concluir que a dívida em per-centagem do PIB tenderia para infinito, o que não é correcto se considerar-mos o problema numa óptica temporal mais dilatada (painel a). Da mesmaforma a análise de um choque sobre a dívida pública pode dar diferentesperspectivas dependendo do período que considerarmos para analisarmos oproblema (paineis b e d). Torna—se claro através de uma mera inspecçãodestes paineis que um choque temporário sobre um processo dinâmico pro-duz efeitos apenas temporários (de curto prazo) e não de longo prazo (noentanto, isto nem sempre é verdadeiro).

Conclusão 6 Existe uma diferença fundamental entre equilíbrios de longoprazo de um modelo dinâmico e os processos de transição dinâmica associa-dos a estes modelos. Normalmente, é fácil confundir estas duas característi-cas dos modelos dinâmicos, mas isto é errado, e mesmo perigoso em termosda condução da política económica.

Equilíbrio de longo prazo. Este equilíbrio é definido como um estadoem que as variáveis endógenas crescem a uma taxa constante, a qual podeser positiva, nula, ou negativa, no processo de acumulação de capital naeconomia, em que o tempo pode variar entre 0 e

Processo de transição dinâmica. Este processo representa o ajusta-mento da economia, e das variáveis endógenas, entre dois períodos de longoprazo. Este processo resulta da alteração num dos parâmetros (ou em vários)que reflectem o comportamento dos agentes económicos. Neste processo, asvariáveis económicas endógenas podem crescer a taxas crescentes ou decres-centes.

5.3 Crescimento Endógeno vs Crescimento Exógeno

As duas diferenças fundamentais entre estes dois tipos de crescimento podemser sintetizadas do seguinte modo:

1. Quais os factores que explicam o crescimento do PIB no longo prazo,quer em valores absolutos, quer em termos per capita?

(a) Modelos de crescimento exógeno: são forças totalmente exógenas.

(b) Modelos de crescimento endógeno: são forças endógenas.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 81

Modelo de Solow

• Externalidades: não existem

• Acumulação de Capital (K ) tem Rendimentos Decrescentes

• Armadilha da pobreza não existe

• Riqueza e pobreza dependem apenasdas características individuais: não existe qualquer razão para que a economia possa beneficiar da concentração de riqueza ou pobreza

• Países pobres convergem para o nível dos países ricos

• Condições iniciais são irrelevantes

• O capital flui dos países ricos para os países pobres

• Políticas nacionais têm pouco ou nenhum efeito sobre o crescimento de longo prazo

Modelo de Conhecimento Tecnológico Endógeno

• Externalidades: existem e são relevantes

• Acumulação de Capital (K e A ) temRendimentos Constantes/Crescentes

• Armadilha da pobreza existe

• Riqueza e pobreza estão concentradas em áreas ou zonas específicas: a existência de externalidades faz com que a economia possa beneficiar (sofrer) com a concentra-ção de riqueza ( pobreza)

• Países pobres podem não convergir para os países ricos: armadilha da pobreza

• Condições iniciais são relevantes

• O capital flui dos países pobres para os países ricos

• Políticas nacionais têm normalmente um grande efeito sobre o crescimento de longo prazo

Figura 5.5: Os principais pontos de divergência entre os modelos de Solowe de I&D com externalidades.

2. O que explica o processo de convergência económica de alguns paísespobres para níveis de vida semelhantes aos países desenvolvidos? E oretrocesso económico de outros?

(a) Modelos de crescimento exógeno: não têm resposta.

(b) Modelos de crescimento endógeno: boas/más decisões dos agentesque conduzem a política económica; boas/más opções dos agentesprivados.

Para exemplificar estes dois pontos podemos pôr em confronto dois mo-delos que encerram praticamente todas as questões possíveis da análise docrescimento de longo prazo: modelo de Solow (com ou sem capital humano),e modelo de I&D com externalidades. Na Figura 5.5 apresentamos uma sín-tese onde confrontamos os vários aspectos inerentes aos pontos fundamentaisdos dois modelos.

Uma breve apresentação dos modelos pode ser resumida às hipótesesem que cada um assenta, à equação fundamental de cada um, às soluçõespara as taxas de crescimento de longo prazo, e, finalmente, aos processos de

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 82

convergência entre países pobres e países ricos.

5.3.1 Modelo de Solow

O modelo dinâmico assenta em seis hipóteses fundamentais:

(H1) Rendimentos constantes à escala relativos a: capital ( ) e trabalhoem termos de eficiência ( ) em que ( ) representa serviços dotrabalho e ( ) o nível do conhecimento tecnológico;

(H2) Rendimentos marginais decrescentes na acumulação de capital ( );

(H3) cresce a uma taxa constante, positiva e exógena ( );

(H4) cresce a uma taxa constante, positiva e exógena ( )

(H5) A taxa de poupança é constante, positiva e exógena (0 1);

(H6) Os mercados do produto e dos factores produtivos funcionam de formaperfeita

Destas hipóteses podemos deduzir uma equação diferencial que permiteestudar todo o comportamento dinâmico do modelo:

˙ = · ( ) ( + + )

em que utilizamos as seguintes definições: ˙ ; ; 0( ) 0e 00( ) 0 O parâmetro é a taxa de amortização do capital (0 1)O equilíbrio de longo prazo pode ser obtido graficamente – vide Figura5.6 – ou em termos algébricos, sendo o valor de equilíbrio para o stock decapital em termos intensivos dado por (admitindo uma função de produçãotipo Cobb—Douglas, com ( ) = )

=

μ+ +

¶ 11

Deste equilíbrio podemos retirar algumas conclusões importantes:

Conclusão 7 O equilíbrio de longo prazo no modelo de Solow existe e éúnico.

Conclusão 8 O equilíbrio de longo prazo do modelo é estável, já que inde-pendentemente do ponto de partida, a economia converge para uma trajec-tória de crescimento equilibrado.

Conclusão 9 No equilíbrio de longo prazo, cada variável cresce a uma taxaconstante.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 83

s . f ( k )

kk1

( + n + m ) k

A

i = s . f ( k )( + n + m ) k

k*k2

B

Figura 5.6: O equilíbrio de longo prazo no modelo de Solow.

Conclusão 10 No equilíbrio de longo prazo, o produto per capita e o capi-tal per capita crescem apenas se existir crescimento no nível do conhecimentotecnológico, isto é, se 0. Portanto, a melhoria das condições médias devida depende inteiramente da taxa de crescimento da tecnologia.

Conclusão 11 O crescimento económico não depende de qualquer forçaeconómica de natureza endógena, isto é, como a taxa de crescimento daprodução é igual a + , e estas duas taxas são assumidas como exógenaspelo modelo, então a política económica pouco ou nada pode fazer no sentidode fomentar o crescimento económico no longo prazo.

Conclusão 12 No equilíbrio de longo prazo, os salários reais crescem à taxade crescimento do conhecimento tecnológico, enquanto que a taxa de lucroreal permanece constante

Conclusão 13 No equilíbrio de longo prazo, a distribuição do rendimentoentre remunerações do capital e do trabalho permanece constante.

5.3.2 Modelo de I&D com Externalidades

A diferença fundamental entre as novas teorias do crescimento endógeno eas teorias do crescimento exógeno reside no tratamento que é dado ao activo

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 84

que se considera como o motor do crescimento de longo prazo. No modelode Solow, por exemplo, o aspecto fundamental do modelo era a acumulaçãode capital físico (porque era endógeno), enquanto que o conhecimento tec-nológico – sendo o factor por detrás da melhoria das condições de vida emtermos médios – era tratado como se fosse um bem livremente disponívelem todo o mundo, sem custos de produção, ou seja, era um bem totalmenteexógeno.

Nos novos modelos de crescimento, o factor fundamental do crescimentoeconómico passa a ser considerado como um activo, o qual requer tempoe custos económicos para ser produzido. Por outro lado, a produção desteactivo está normalmente dependente de situações de imperfeições nos merca-dos. Estes novos modelos estão baseados fundamentalmente em ideias, ondea acumulação de capital humano (ou conhecimento tecnológico) passa a sero aspecto fundamental do crescimento económico. No entanto, contraria-mente aos bens privados (os quais, na maioria são bens com uma naturezaprivada), o conhecimento apresenta características de bem público devidoàs elevadas externalidades associadas à sua produção.

Em relação ao modelo anterior temos duas novidades fundamentais. Aprimeira consiste na existência de dois sectores de actividade ( e ˙ ),e não apenas um como o modelo anterior. A segunda novidade consisteno facto do conhecimento tecnológico ser tratado como um bem ”público”,contrariamente aos bens materiais ou físicos que são na sua maioria bens”privados”. Esta segunda novidade assume uma importância crucial e éaquela que acaba por permitir obter resultados bem diferentes dos modelosanteriores.

A natureza do conhecimento tecnológico como um bem público leva aosub—investimento na produção do mesmo porque os produtores não con-seguem internalizar grande parte dos benefícios sociais que derivam da suaexistência. Este problema pode ser reduzido através da concessão de patentessobre as descobertas tecnológicas. Uma patente coloca o conhecimento deprincípios tecnológicos no domínio público, os quais podem ser de factousados para se produzir novo conhecimento e, portanto, contribuir assimpara o benefício social. No entanto, a patente restringe temporariamentea utilização dos mesmos princípios para benefício dos agentes que não osdesenvolveram no que diz respeito à produção de bens e serviços por partedestes.

Este duplo aspecto do processo de produção de conhecimento tecnológicoestá representado graficamente na Figura 5.7. A parte oval da mesma ap-resenta os fluxos no domínio da existência do bem público, ou seja o ní-velde é o somatório de todo o conhecimento produzido por cada firma in-dividualmente ( ), e tornado público pelo registo e atribuiçãoda respectiva patente a cada empresa, o qual fica depois à disposição detodas para produção de novo conhecimento. A parte rectangular da figurarepresenta o lado privado da produção de conhecimento. Cada empresa em

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 85

A

Ai Aj Ap ...

Qi Qj Qp ...

Utilização daspatentespor cada empresa

Domínio privado do conhecimento tecnológico (sua aplicação)

Domínio público do conhecimento tecnológico (sua produção)

Registo de patentes

Registo de patentes

Figura 5.7: A representação gráfica da dupla faceta do conhecimento tec-nológico. A parte oval reflecte o domínio público do conhecimento tec-nológico, enquanto que a parte rectangular mostra a aplicação privada doconhecimento na produção de bens materiais. As linhas a tracejado re-flectem a utilização do conhecimento previamente existente para produzirnovo conhecimento.

termos individuais possui as patentes do conhecimento que desenvolveu, esó ela o pode utilizar para produzir bens materiais ( ). Obviamente que ogrande benefício para toda a economia resulta do conjunto de relações quese encontram representadas na parte oval da figura, e este tipo de relaçõessó é possível devido à natureza particular do conhecimento tecnológico comoum bem público.

Os elementos acima apresentados podem ser passados para a formamatemática no sentido de estudar a dinâmica que pode resultar de um talmodelo. As equações que expressam o comportamento descrito podem serapresentadas na seguinte tabela

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 86

= (L )1 , produção da empresa

˙ = · · , variação do capital físico

˙ = R · , variação do conhecimento tecnológico.= · , = n empresas que fazem I&D

= L +R , L = trabalho não qualificado, R = trabalho qualificado

é mantido constante variação de é nula ( = 0)

A dinâmica do modelo pode ser reduzida a duas equações de movimentoexpressas em termos das taxas de crescimento ( ) dos dois factores produ-tivos endogenamente acumulados em cada empresa Portando estas taxassão designadas por e

= 1 (L )1

= R ·

Destas duas equações equação chegamos à condição de equilíbrio de longoprazo que é dada por

= = R

= 0 se R

o que poderá levar à ”Armadilha da Pobreza” ou ao ”Círculo Virtuoso”conforme Figura 5.8

Deste modelo podemos retirar um conjunto de conclusões, das quais asmais importantes são as seguintes:

Conclusão 14 A taxa de crescimento do PIB per capita é uma função posi-tiva dos recursos investidos em I&D,: portanto, este modelo explica o cresci-mento de longo prazo de forma endógena.

Conclusão 15 Esta taxa é positivamente afectada por: (i) número de em-presas que façam investigação científica e tecnológica ( ) devido à existên-cia de externalidades positivas associadas à produção de conhecimento tec-nológico; (ii) recursos afectos à investigação científica e tecnológica ( )

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 87

A

aNRiLimiar da armadilha da pobreza

N A

Rimin

gAi

Ri

.gAi > 0

gAi < 0

Figura 5.8: A taxa de crescimento do nível do conhecimento em termosmédios por empresa. O ponto A reflecte o patamar mínimo a partir do qualas economias podem obter taxas de crescimento positivas e obter sucessoeconómico.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 88

Conclusão 16 As economias mais pobres só convergirão para o nível derendimento das economias mais ricas se investirem na produção de conhe-cimento científico e tecnológico.

Conclusão 17 Existe um nível mínimo de recursos afectos à investigaçãocientífica e tecnológica que permite evitar a armadilha da pobreza.

Conclusão 18 As economias mais pobres necessitam de apoio internacionalpara conseguirem evitar a armadilha da pobreza. Apoios internacionaiscanalizados para a educação e produção de conhecimento tecnológico sãoa forma mais fácil de ajudar estas economias a saírem dos níveis de pobrezaem que se encontram.

Conclusão 19 Políticas económicas nacionais, no sentido de favorecer acanalização de recursos económicos para a educação e a produção de co-nhecimento científico e tecnológico, favorecem o crescimento económico. Istoé válido para os países ricos, mas também o é para os países pobres.

5.4 Convergência e Computação: Um Exemplo

Os dois modelos que apresentámos nas secções anteriores são bastante úteispara explicar o problema da convergência económica porque eles represen-tam os dois marcos opostos do debate. Como vimos o modelo de Solowprevê a convergência económica entre países, independentemente do pontode partida das economias e dos níveis de investimento inicial. Por outrolado, o modelo de I&D explica a convergência/divergência com base nas de-cisões dos agentes privados, das decisões de política económica interna, e nasajudas internacionais. Relativamente a este último modelo, existe ainda umaspecto interessante: os países podem ficar prisioneiros da armadilha da po-breza, ou seja, não somente não convergem, como podem inclusive estagnarem termos económicos.

Para além das questões teóricas, as quais podem ser analisadas em ter-mos algébricos ou em termos gráficos, existe hoje em dia um instrumentoextremamente poderoso para ajudar à compreensão dos principais aspec-tos relacionados com toda a macroeconomia, e muito particularmente, coma análise de sistemas dinâmicos: a computação. O caso da convergênciaeconómica é um exemplo bastante útil para mostrar a utilidade deste novoinstrumento. Em virtude da convergência requerer análises fora do equi-líbrio de longo prazo (portanto, nos processos de transição dinâmica), oestudo da mesma é muito mais exigente do que o dos equilíbrios de longoprazo. No entanto, este problema desaparece com a utilização de um simples”package” de computação numérica tipo EXCEL ou, de forma muito maissignificativa, com MATLAB.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 89

A experiência do redactor no ensino destas matérias no ISCTE ao longodos últimos anos tem mostrado que os alunos conseguem excelentes resul-tados com o uso do EXCEL, até porque a simulação com este ”package”impõe que os mesmos dominem bastante bem todos os aspectos do mod-elo teórico. A simulação com MATLAB é muito mais poderosa e rápida.Basta uma simples rotina construída para simular o modelo, a qual podeser depois alterada de acordo com os objectivos pretendidos, para obterresultados extremamente poderosos do ponto de vista numérico e gráfico.Obviamente que não se espera que os alunos de um segundo ano de licen-ciatura em economia saibam programar num software como MATLAB. Noentanto, se a rotina estiver construída é extremamente fácil fazê—la correr nocomputador e obter os resultados em termos gráficos e numéricos, como fácilserá alterar valores dos parâmetros e das condições iniciais para comparardiferentes cenários.

Apresento agora um exemplo muito simples sobre o poder da com-putação, com base nos dois modelos que analisámos: Solow e I&D com exter-nalidades. O problema das dificuldades analíticas da convergência pode ficarresolvido com um simples toque do rato do meu computador. Nas Figuras5.9 e 5.10 apresentamos diferentes cenários relativamente à convergência, re-spectivamente, no modelo de Solow e no modelo de I&D. Como se pode vera convergência no primeiro modelo verifica—se sempre, independentementedo ponto de partida, e é bastante rápida.

No segundo modelo existem três situações possíveis para explicar a ar-madilha da pobreza numa situação em que a economia tem uma taxa decrescimento do conhecimento tecnológico negativa ( = 3% ao ano): (1)

0; (2) 3% 0%; e (3) 3% Em todos estes casosas condições médias de vida vão—se degradando ao longo do tempo. Nastrajectórias tipo 1, a economia estagna no tempo, começando o processode acumulação de capital com taxas de crescimento positivas, tendendo es-tas para valores nulos com o passar do tempo. Na trajectórias tipo 2, aeconomia inicia o processo com taxas de crescimento negativas, e estas vãoconvergindo para um valor também nulo no longo prazo. Nas trajectóriastipo 3, a economia dispara para taxas de crescimento cada vez mais negati-vas, o que não terá grande aderência à realidade económica em que a maioriadas economias vive, mas que serve para ilustrar o risco que decisões políticase económicas podem incorporar em sistemas económicos dinâmicos.

A ilustração deste tipo de resultados em termos algébricos é totalmentedesaconselhável ao nível do ensino da macroeconomia a nível intermédio.Não o é, se o recurso for a computação. Neste caso, o grau de dificul-dade não é maior do que estudar o velho modelo IS—LM! É minha convicçãoque dentro de alguns anos será comum encontrar o ensino de métodos decomputação informática ao nível de um primeiro ano dos cursos de econo-mia (e não me refiro a meras introduções (!!) ao uso do ambiente Windowscomo é agora feito na maioria das licenciaturas em economia). O poder (e

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 90

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

0.5

1

1.5

2

2.5

3

3.5

4

4.5

5

tempo

Sto

ckde

capi

tale

mte

rmos

inte

nsiv

os(k

)

Equilíbrio estável

Trajectória 1

Trajectória 2

Figura 5.9: Diferentes trajectórias no modelo de Solow. A trajectória 1 é ade um país pobre, enquanto que a trajectória 2 reflecte a situação de um país rico que sofreu um shock positivo no seu stock de capital. Neste modeloexiste convergência económica entre países pobres e ricos.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 91

0 50 100 150 200 250 300 350 400-0.05

-0.04

-0.03

-0.02

-0.01

0

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0.02

0.03

tempo

Taxa

decr

esci

men

to

Equilíbrio estável

Equilíbrio instável

trajectória 2

trajectória 1

trajectória 3

Figura 5.10: Três casos para explicar a existência da armadilha da pobreza.Considerando—se uma taxa de crescimento do conhecimento tecnológico ne-gativa ( = 3% ao ano) e apresentam—se três alternativas para : (1)

0; (2) 3% 0%; e (3) 3% Em todos estes casos ascondições médias de vida vão—se degradando ao longo do tempo.

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CAP 5. DINÂMICA E CRESCIMENTO 92

a beleza) de ”packages” de cálculo numérico e simbólico, tipo MATLAB,MAPLE, ou MATHEMATICA, é hoje tão impressionante que o ensinoda microeconomia, macroeconomia, economia pública, economia industrial,etc., passará pela larga utilização dos mesmos no futuro.

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