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OFÍCIO IDC 2021 Belo Horizonte, 17 de maio de 2021. Ao Exmo. Sr. Deputado Sargento Rodrigues Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Com nossos cordiais cumprimentos, o INSTITUTO DEFESA COLETIVA e o PROCON DA ASSEMBLEIA - ALMG, servimo-nos do presente para informar e solicitar o que se segue: O Instituto Defesa Coletiva e o Procon da Assembleia de Minas Gerais atuam há mais de 10 anos em parceria em prol da defesa do consumidor, especialmente, no que tange ao combate do superendividamento idosos e dos abusos relacionados à concessão do crédito consignado. Neste ato, vimos à presença de Vossa Excelência e dos dignos Deputados Mineiros membros da Comissão de Direito do Consumidor, com o objetivo de encaminhar Proposta de Projeto de Lei para regulamentação da publicidade de oferta empréstimos, bem como contratação de empréstimo e cartão de crédito consignado e saque vinculado ao limite do cartão de crédito consignado, para aposentados, pensionistas e servidores públicos do Estado de Minas Gerais. A temática aqui proposta é tema de grande relevância para a sociedade mineira, e está em voga em razão dos constantes abusos cometidos pelas instituições financeiras. Para melhor análise da proposta encaminhamos a justificativa necessária à sua apresentação, em documento anexo, no sentido de que ela integre ao Projeto de Lei, ora apresentado. Esperamos que a presente Proposta de Lei seja apreciada pela comissão de defesa do consumidor, discutida e ao final aprovada pelos Ilustres Deputados Mineiros. LILLIAN JORGE SALGADO PRESIDENTE DO COMITÊ TÉCNICO DO INSTITUTO DEFESA COLETIVA MARCELO RODRIGO BARBOSA COORDENADOR DO PROCON DA ASSEMBLEIA - ALMG

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OFÍCIO IDC 2021

Belo Horizonte, 17 de maio de 2021.

Ao Exmo. Sr. Deputado Sargento Rodrigues Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Com nossos cordiais cumprimentos, o INSTITUTO DEFESA COLETIVA e o PROCON DA

ASSEMBLEIA - ALMG, servimo-nos do presente para informar e solicitar o que se segue: O Instituto Defesa Coletiva e o Procon da Assembleia de Minas Gerais atuam há mais de 10

anos em parceria em prol da defesa do consumidor, especialmente, no que tange ao combate do superendividamento idosos e dos abusos relacionados à concessão do crédito consignado.

Neste ato, vimos à presença de Vossa Excelência e dos dignos Deputados Mineiros membros

da Comissão de Direito do Consumidor, com o objetivo de encaminhar Proposta de Projeto de Lei para regulamentação da publicidade de oferta empréstimos, bem como contratação de empréstimo e cartão de crédito consignado e saque vinculado ao limite do cartão de crédito consignado, para aposentados, pensionistas e servidores públicos do Estado de Minas Gerais.

A temática aqui proposta é tema de grande relevância para a sociedade mineira, e está em

voga em razão dos constantes abusos cometidos pelas instituições financeiras. Para melhor análise da proposta encaminhamos a justificativa necessária à sua apresentação,

em documento anexo, no sentido de que ela integre ao Projeto de Lei, ora apresentado. Esperamos que a presente Proposta de Lei seja apreciada pela comissão de defesa do

consumidor, discutida e ao final aprovada pelos Ilustres Deputados Mineiros.

LILLIAN JORGE SALGADO PRESIDENTE DO COMITÊ TÉCNICO DO INSTITUTO DEFESA COLETIVA

MARCELO RODRIGO BARBOSA COORDENADOR DO PROCON DA ASSEMBLEIA - ALMG

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JUSTIFICATIVA

O Instituto Defesa Coletiva e o Procon Assembleia - ALMG, vêm percebendo que a

concessão de empréstimo consignado, cartão de crédito consignado e produtos a eles vinculados, direcionados aos idosos, aposentados, pensionistas e servidores públicos, tem gerado uma oferta exacerbada de crédito, sem, muitas vezes, observar as normas que regulam a temática, as formalidades necessárias para essas contratações, tampouco os princípios da boa-fé, equidade e transparência, tão esperados na fase pré-contratual, o que tem causado diversos transtornos a milhares de consumidores mineiros.

As considerações aqui apresentadas possuem o escopo de fazer uma análise

jurídica acerca das várias vertentes envolvendo o empréstimo e o cartão consignado e os seus produtos derivados, quando contratados por telefone, e, também, sob a perspectiva dos malefícios do marketing ativo realizado pelas instituições financeiras.

Atualmente, observamos que os principais produtos bancários relativos à

concessão de crédito consignado são: Empréstimo Consignado, Cartão de Crédito Consignado e Telessaque.

Essa última modalidade, talvez seja a mais lesiva e necessita de informações

adicionais, as quais passamos a expor. A prática denominada como “telessaque” trata-se de uma funcionalidade atrelada

ao cartão de crédito consignado em que o consumidor autoriza via telefone (ou solicita) um depósito em conta, utilizando o limite do cartão de crédito consignado. Tal produto, nada mais é do que “empréstimo”, cujo valor é creditado em sua conta e as parcelas são lançadas em uma suposta fatura e descontadas da reserva de margem consignada do cartão, ou seja, do benefício de previdenciário recebido do INSS.1

Como o desconto previsto para o cartão de crédito consignado em folha é de

apenas 5% (cinco por cento), muitas das vezes o consumidor não entende que deve ser paga uma fatura adicional, haja vista que pelo vício de seu consentimento, acredita estar adquirindo um empréstimo consignado, o qual seria descontado diretamente em seu benefício.

Conforme será apresentado a seguir, em algumas situações, o consumidor sequer

recebe a fatura do cartão de crédito, deixando-o em situação de inadimplemento, o que, consequentemente, poderá ocasionar o superendividamento.

Em linhas gerais, o telessaque nada mais é do que uma operação financeira realizada por meio de ligação telefônica, que pode estar atrelada ao limite do cartão de crédito

1 Conceito extraído do artigo “Telessaque: prática lesiva dos bancos é descortinada pelo Poder Judiciário”, escrito por Lillian Salgado e Camila Oliveira Souza. Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2020-nov-20/opiniao-telessaque-pratica-lesiva-descortinada-judiciario>

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consignado ou ao empréstimo não autorizado. Vejamos as duas situações em que, geralmente, identificamos a realização da prática lesiva que vem se alastrando em nosso Estado:

Na primeira modalidade, o banco, mediante ligação telefônica, oferece um limite

disponível para compras no cartão de crédito consignado para os consumidores, em especial aposentados e pensionistas, como se fosse um empréstimo comum e extremamente vantajoso, creditando na conta corrente ou poupança do consumidor o montante em dinheiro.

Segundo se constata, a maioria dos aposentados e pensionistas aceitam o

telessaque sem possuírem a mínima ideia da operação de crédito que estão celebrando. E muitos sequer contrataram o referido cartão de crédito consignado.

Como é uma operação que pode ser liquidada em até 84 meses (sete anos), o limite

de crédito para saque é, em regra, maior que o benefício do cliente. Assim, o desconto máximo permitido (5%) no benefício não liquida o empréstimo efetuado pelo TELESSAQUE na primeira fatura mensal, haja vista que para haver a liquidação do débito deveria ser realizado o pagamento integral e complementar da fatura de cartão de crédito.

Na maioria das vezes, consoante as reclamações registradas nos órgãos de defesa

do consumidor, o banco não envia o cartão de crédito, tampouco as faturas para dar a possibilidade do pagamento integral sem a incidência dos juros do “rotativo”. Além do que, o consumidor não é informado que os juros no telessaque chegam a ser o dobro dos juros do empréstimo consignado.

A segunda modalidade de atuação é caracterizada pela liberação de empréstimo

mediante depósito em conta dos consumidores, sem qualquer autorização ou solicitação prévia. Em alguns momentos, a instituição financeira entra em contato oferecendo o empréstimo consignado, o consumidor recusa, mas, ainda sim, recebe o depósito de valores em sua conta.

Infere-se das reclamações existentes nas plataformas de resolução de conflitos que

os consumidores enfrentam muitas dificuldades para saber de onde surgiu o depósito não autorizado e depois enfrentam desafios para devolver aos bancos os valores creditados em sua conta corrente, sem a devida autorização e referentes a um contato que jamais foi celebrado.

Para findar a elucidação da temática acerca do modus operandi das instituições

financeiras, tem sido possível constatar casos ainda mais graves, em que o cartão de crédito jamais foi contratado, tampouco a operação do telessaque e o consumidor jamais recebeu o crédito em sua conta, mas, ainda assim, tem valores descontados de seus benefícios previdenciários.

Portanto, observamos que tanto na concessão de empréstimo consignado, como

nos contratos de cartão de crédito consignado ou telessaque, o problema é iniciado no momento da oferta pelo telefone, pois não possibilita ao consumidor ter plena ciência do que está contratando, bem como as condições daquela operação que está realizando.

Sabemos que marketing é um modelo de gerenciamento empresarial que estuda e

visa a penetração no mercado. Entendendo isso, os estrategistas de comunicação procuram aplicar

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das mais brandas às mais agressivas táticas de marketing sobre os consumidores, a fim de persuadi-los a comprar seus produtos ou serviços.

Ao trazer essa questão para os consumidores hipervulneráveis e idosos, a situação

se torna ainda mais predatória. Na hora de elaborar estratégias para este determinado público, os profissionais de comunicação recorrem ao princípio da repetição e aplicação da teoria psicanalítica para maior eficácia no momento da persuasão, ou seja, vencem o consumidor pelo "cansaço". Sabemos que é justamente o que fazem as instituições financeiras.

Então como os consumidores são convencidos? Por meio de ligações incessantes,

utilização de palavras-chave que estimulam os desejos inconscientes, insistência durante as ligações, ou até mesmo pela falta de conhecimento técnico do consumidor, direcionando-o a contratar um serviço não desejado.

Assim, o cliente para cessar determinada circunstância incômoda, acaba por

beneficiar o vendedor, comprando ou fechando contrato com a empresa em questão, sem se atentar aos detalhes do contrato.

As instituições financeiras, ao oferecerem o empréstimo consignado, cartão de

crédito consignado e produtos derivados, por telemarketing ativo, também acabam por omitir taxas capciosamente embutidas, sendo o aposentado induzido a fornecer seus dados pessoais e ficando à mercê de ações de golpistas, podendo até mesmo realizar negócios contrários ao seu próprio interesse.

Segundo se infere de massivos relatos de consumidores, constantes das

plataformas de solução de conflitos (consumidor.gov e reclame.aqui), Procons Municipais instalados nas diversas cidades mineiras, Procon da Assembleia e das denúncias recebidas pelo Instituto Defesa Coletiva a contratação desses produtos bancários não são tão benéficos quanto supostamente demonstrados pelas instituições financeiras e não ocorre nos termos literais em que são anunciados.

Por conta dessa situação, o Instituto Defesa Coletiva percebendo o alto número de

reclamações e a homogeneidade das denúncias, ajuizou seis Ações Civis Públicas relacionadas a essa temática (saque vinculado ao limite do cartão de crédito e depósito em conta sem a autorização) em face dos Bancos Olé consignado2, Ficsa3, Pan4, BMG5, Safra6 e Cetelem7, sendo que em cinco destas demandas foram obtidas decisões liminares para obstar a prática abusiva.

Ao nosso ver, a contratação de empréstimo consignado, cartão de crédito

consignado e produtos derivados, via telefone, constitui um grave problema estrutural de violação ao direito básico do consumidor, consagrado no artigo 6º, inciso III, do CDC, qual seja, o direito à informação, uma vez que em razão da ausência de informação, clara, precisa e ostensiva, o

2 5041991-58.2020.8.13.0024 3 5155846-15.2020.8.13.0024 4 5155410-90.2019.8.13.0024 5 5154588-04.2019.8.13.0024 6 5155455-94.2019.8.13.0024 7 5155320-82.2019.8.13.0024

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consumidor acaba adquirindo compromissos, muitas vezes contra sua vontade, gerando transtorno a sua vida financeira e emocional.

Sabemos que as operações do consignado realizadas por telefone, ocorrem pela

precariedade da fiscalização por parte dos órgãos de proteção e defesa do consumidor, e pela facilidade dos meios de comunicação e em razão da tecnologia. Porém, a tecnologia que facilita a vida dos consumidores, ao mesmo tempo cria situações inusitadas e traiçoeiras. O crédito fácil que permite a realização dos sonhos, quando desacompanhado da devida informação, orientação e respeito, leva a um quadro de superendividamento e desestabilização familiar.

De acordo com a última pesquisa do CNC - Confederação Nacional do Comércio de

Bens, Serviços e Turismo 64,7% do total de famílias entrevistadas relatou ter dívidas, o que equivale a 60 milhões de brasileiros endividados, sendo que 30 milhões encontram-se em situação de superendividamento8.

Segundo aponta a Agência Brasil9, em meio à pandemia do novo coronavírus, a

renegociação de dívidas tem crescido em razão da redução da renda familiar. O estudo aponta que o saldo das operações de composição de dívidas, que é a renegociação de mais de uma modalidade de crédito em conjunto, chegou a R$ 50,448 bilhões em maio, crescimento de 6,6% no mês e de 40,6%, em 12 meses.

Em uma análise de tudo que foi aqui apresentado, acredita-se que minimizar o

assédio aos consumidores impactará na diminuição de fraudes relacionadas ao consignado, e, consequentemente, na redução do superendividamento.

Em que pese já haver disposição expressa na Instrução Normativa nº 28 do INSS e

no artigo 6º da Lei 10.820/2003, quanto as normas do crédito consignado e quanto à vedação de contratar empréstimo consignado, cartão consignado e produtos derivados, por telefone, é nítido que as instituições financeiras se esquivam de cumprir a norma, por encontrar lacunas na legislação vigente.

Logo, embora tenhamos normas em vigor, estas não têm sido suficiente para

proteger o consumidor, assim, acreditamos que a existência de legislação estadual sob a temática, com penalidades severas, e com o preenchimento dessas lacunas, possibilitará soluções e estabelecerá critérios preventivos, como por exemplo, a regulação da oferta relativa ao crédito consignado por telefone, bem como estabelecer disposição expressa sobre a impossibilidade de contratação por aplicativos de mensagens.

A possibilidade de tal norma já foi apreciada pelo Poder Judiciário. Em recentíssimo

julgamento, em decisão unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) validou a lei do

8 https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/especiais/56a-legislatura/pl-3515-15-superendividamento-do-consumidor/expedientes-recebidos/MocodeapoioaoPL351515.pdf 9 https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-07/bc-superendividamento-afeta-de-forma-duradoura-qualidade-de-vida#:~:text=Segundo%20os%20dados%20do%20BC,mais%20do%20que%20podem%20pagar.

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Paraná que proíbe a oferta e a celebração de contrato de empréstimo bancário com aposentados e pensionistas por ligação telefônica. Na sessão virtual concluída em 11/5, o colegiado julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6727.

A Ministra Carmen Lúcia entendeu pela possibilidade de que uma Lei Estadual

proibisse que as instituições financeiras realizassem oferta publicitária via telefone para aposentados e pensionistas, com o intuito de fomentar a contratação de empréstimo consignado.

A relatora, ministra Cármen Lúcia, considerou em seu voto que é possível extrair da

lei paranaense nº 20.276/2020 que as instituições financeiras foram proibidas de realizar qualquer tipo de publicidade de empréstimos dirigida a aposentados e pensionistas, apenas sendo possível a contratação após sua solicitação expressa.

Para a ministra, a proibição contida na norma não conflita com os princípios e

normas do CDC. "Pela lei estadual se suplementam as normas e os princípios da Lei n. 8.078/1990, reforçando-se a proteção a consumidores em situação de especial vulnerabilidade econômica e social: aposentados e pensionistas."

Consoante alhures mencionado, o Instituto Defesa Coletiva já propôs diversas

ações, assim, a título de exemplo, colacionamos o entendimento exarado pelo Desembargador Manoel dos Reis, ao apreciar o recurso manejado pela instituição financeira, Banco Pan, o qual negou provimento, pacificando, também, o tema na Corte Mineira:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO COLETIVA – DIREITO DO CONSUMIDOR – PRELIMINARES DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA E AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR – REJEIÇÃO – CRÉDITO EM CONTA SEM A ANUÊNCIA DO CORRENTISTA – ILEGALIDADE – OPERAÇÕES DE CRÉDITO VIA TELEFONE – “TELE SAQUE” – ABUSIVIDADE. O ajuizamento de ação coletiva se justifica quando constatada absoluta identidade de situações individuais, que afronta a dignidade e os interesses econômicos de uma plêiade de consumidores, consoante art. 81 do CDC; por conseguinte, devem ser rejeitadas as preliminares de inadequação da via eleita e de ausência de interesse processual. A Instrução Normativa do INSS n. 39, de 2009, que estabelece critérios e procedimentos operacionais para a consignação de descontos para pagamento de empréstimos pessoal e cartão de crédito contraídos pelos beneficiários da Previdência Social, prevê em seu art. 3º que a autorização do consumidor deve ser expressa, por escrito ou meio eletrônico. Conforme entendimento do e. STJ, o produto cartão de crédito consignado assemelha-se à contratação de empréstimo; porém, no caso dos cartões, o crédito concedido está atrelado ao uso do cartão emitido com o fim de conceder crédito rotativo, sendo possível ao consumidor realizar empréstimos pontuais descontados da fatura e na sua RMC, operação esta denominada “tele saque” (STJ, AREsp n. 1274207). Ainda que a contratação do cartão de crédito siga a forma prescrita em lei, a oferta desse serviço “facultativo” de saque ocorre via telefone, induzindo-se à contração de novo empréstimo, bastando mera autorização para o lançamento do crédito na conta do consumidor. Referida prática viola o direito à informação, a boa-fé e à função social do contrato, sobretudo porque geralmente os consumidores a ela sujeitados – pensionistas ou aposentados – são pessoas idosas e vulneráveis em inúmeros aspectos (saúde, conhecimento, condição social etc.) (art. 39, IV do CDC). A abusividade não reside propriamente na opção de saque atrelada ao cartão de crédito consignado, mas sim na oferta deste tipo de crédito pela via da ligação telefônica. Ademais, a norma do art. 39, III do CDC também veda ao fornecedor a execução de serviços ou a entrega de produtos “sem prévia autorização” ou “solicitação do cliente”, o que torna

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abusivo o crédito na conta bancária do consumidor sem sua clara, informada e insuspeita autorização ou anuência. Não cabe fixação de prazo para cumprimento de obrigação de não fazer. Recurso desprovido. (TJMG – Desembargador Relator Manoel dos Reis - AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.19.145399-2/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): BANCO PAN S/A - AGRAVADO(A)(S): INSTITUTO DEFESA COLETIVA, FUNDACAO MUNICIPAL DE PROTECAO E DEFESA DO CONSUMIDOR, DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS – DJ 19/08/2020). (Sem grifos no original).

Essa proposta tem como objetivo proteger a população dessa tática vil de

telemarketing ativo, sobretudo os idosos, pensionistas e servidores públicos. Diante de todo o exposto, o Instituto Defesa Coletiva e o Procon Assembleia,

sugerem a discussão e aprovação do tema, pela Comissão de Direito do Consumidor, apresentando nesta oportunidade a minuta do projeto de lei, a seguir:

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PROPOSTA DO INSTITUTO DEFESA COLETIVA E DO PROCON ASSEMBLEIA-ALMG

PROJETO DE LEI Nº _________

Dispõe sobre a proibição de instituições financeiras de realizar publicidade, oferta e celebração de crédito consignado, por ligação telefônica ou por aplicativo de mensagens, com idosos, aposentados, pensionistas e servidores públicos, ativos e inativos vinculados ao INSS e ao IPSEMG, no âmbito do Estado de Minas Gerais, sob pena de multa em caso de descumprimento.

Art. 1º Se sujeitam as normas desta lei:

a) instituições financeiras;

b) correspondentes bancários;

c) sociedades de arrendamento mercantil;

d) operadoras de cartão de crédito.

Art. 2º Serão beneficiários desta lei:

a) idosos;

b) aposentados e pensionistas do RGPS e do RPPS;

c) aposentados e pensionista da administração direta, autárquica e fundacional do Legislativo, Executivo e do Judiciário, bem como do Ministério Público e do Tribunal de Contas e outros órgãos públicos;

d) servidores públicos civil ou militar, ativos ou inativos.

Art. 3º É vedado assediar ou pressionar o consumidor beneficiário desta lei, para contratar o

fornecimento de produto, serviço ou crédito bancário, principalmente, o consumidor idoso,

analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada;

Art. 4º Fica vedada a realização de publicidade em qualquer mídia (impressa, eletrônica e digital),

que não conste a advertência aos consumidores de empréstimo e cartão de crédito consignado,

quanto ao risco do superendividamento decorrente do consumo de crédito.

§1º A publicidade deverá conter abordagem de forma clara, precisa e ostensiva sobre

comprometimento da renda, a impossibilidade de desvincular as despesas da conta benefício, o

limite de crédito e a utilização consciente.

Art. 5º Fica expressamente vedado aos operadores de crédito, indicados no artigo 1º, celebrar contratos de empréstimo consignado, cartão de crédito consignado e saque vinculado ao limite do cartão, por meio de ligações telefônicas ou por aplicativo de troca de mensagens.

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Art. 6º Fica proibido que os operadores de crédito, indicados no artigo 1º, celebrem contratos de empréstimo consignado, cartão crédito consignado e produtos ou serviços vinculados, que não tenham sido expressamente solicitados pelos beneficiários desta lei.

§ 1º A celebração de empréstimos consignado e cartão de crédito consignado, deve ser realizada mediante a assinatura de contrato com apresentação de documento de identidade idôneo, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência, tampouco por aplicativo de troca de mensagens.

§ 2º As instituições financeiras poderão celebrar contrato de empréstimo e cartão de crédito consignados por meio digital, desde que a operação seja realizada no aplicativo da instituição financeira ou por internet bank, mediante a disponibilização de senha eletrônica.

§ 3º Nas hipóteses do parágrafo 2º, a instituição financeira contratada se obriga a enviar as condições do contrato por e-mail e, em caso de impossibilidade, por via postal ou outro meio físico que possibilite o correto acompanhamento dos termos contratuais, podendo o consumidor desistir da contratação em até 7 (sete)dias após a assinatura do contrato.

§4º A realização de saque vinculado ao limite do cartão de crédito somente será possível se realizada em terminal eletrônico em ambiente físico da instituição financeira (caixa eletrônico), após o desbloqueio do cartão plástico e mediante senha;

Art. 7º A disponibilização de qualquer quantia na conta do consumidor, sem o requerimento expresso e o devido consentimento, será caracterizado como amostra grátis, devendo a quantia ser revertida ao beneficiário;

Art. 8º Em caso de descumprimento do disposto nesta Lei, o infrator será penalizado de acordo com as normas previstas no artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor, sem prejuízo das normas de natureza civil e penal.

§1º O importe da multa observará as disposições do parágrafo único, do artigo 57, do CDC.

§2º Constatadas irregularidades nas operações de consignação e seus produtos vinculados, sem prejuízo de aplicação da multa, referente aos segurados do INSS, a autarquia previdenciária deverá ser notificada, a fim de que tome as medidas cabíveis relacionadas ao convênio, consoante disposição do artigo 52, da Instrução Normativa nº 28.

§3º Constatadas irregularidades nas operações de consignação e seus produtos vinculados, em que os beneficiários desta sejam vinculados ao IPSEMG, sem prejuízo de aplicação da multa deverão ser tomadas as seguintes providências:

I - suspensão do recebimento de novas consignações/retenções/RMC pelo prazo de cinco dias úteis, nos casos de:

a) reclamações ou recomendações oriundas de órgãos de fiscalização e/ou de defesa do consumidor, por prática lesiva ao beneficiário, referente à concessão de créditos; ou

b) sentenças judiciais transitadas em julgado em que a instituição financeira tenha sido condenada por prática lesiva ao segurado;

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II - suspensão do recebimento de novas consignações/retenções/RMC, pelo prazo mínimo de cinco dias e enquanto perdurar o motivo determinante, nos seguintes casos:

a) descumprimento das cláusulas do convênio;

b) descumprimento das instruções emanadas pelo IPSEMG;

c) em caso de descumprimento dos artigos 3º ao 8º desta lei.

III - suspensão do recebimento de novas consignações/retenções/RMC por um ano, na hipótese de reincidência, a contar da notificação formal à instituição financeira; e

IV - rescisão do convênio e proibição de realização de um novo termo pelo prazo de cinco anos, contados da data da notificação, na hipótese de ocorrência de dez incidências consecutivas ou concomitantes no caso de descumprimento de qualquer dispositivo desta lei.

Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Belo Horizonte, 17 de maio de 2021.