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ONDAS ELETROMAGNÉTICAS 9 TÓPICO Luiz Nunes de Oliveira 9.1 Introdução 9.2 Campo elétrico 9.3 Campo magnético 9.4 Formas alternativas de geração 9.4.1 Campo elétrico gerado por campo magnético variável 9.4.2 Campo magnético gerado por campo elétrico variável 9.5 Radiação eletromagnética 9.6 Características da radiação eletromagnética 9.6.1 Velocidade 9.7 Polarização 9.7.1 Interferência LICENCIATURA EM CIÊNCIAS · USP/ UNIVESP

ONDAS ELETROMAGNÉTICAS TÓPICO - midia.atp.usp.br · 9.2 Campo elétrico Muitas das partículas que constituem a matéria têm carga elétrica. Os elétrons, em particular, são

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ONDAS ELETROMAGNÉTICAS9 TÓPI

CO

Luiz Nunes de Oliveira

9.1 Introdução9.2 Campo elétrico9.3 Campo magnético9.4 Formas alternativas de geração

9.4.1 Campo elétrico gerado por campo magnético variável9.4.2 Campo magnético gerado por campo elétrico variável

9.5 Radiação eletromagnética9.6 Características da radiação eletromagnética

9.6.1 Velocidade9.7 Polarização

9.7.1 Interferência

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Objetivos do tópico:• Compreender como as ondas eletromagnéticas se propagam.

• Conhecer as características da radiação eletromagnética.

• Compreender a direção da força eletromagnética.

• Calcular o campo elétrico gerado por um campo magnético.

• Calcular o campo magnético gerado por um campo elétrico.

• Descrever imagens de campos elétricos.

9.1 IntroduçãoNeste tópico, veremos como se criam e se propagam as ondas eletromagnéticas. Estudaremos

também algumas de suas características.

9.2 Campo elétricoMuitas das partículas que constituem a matéria têm carga elétrica. Os elétrons, em particular,

são carregados. A carga do elétron é uma constante universal negativa. Já os prótons têm carga

positiva. Vamos denotar por e a carga do próton. A do elétron é −e. Se um pequeno objeto tiver

mais ou menos elétrons do que prótons, ele estará carregado com uma carga q. No sistema de

unidades MKS, a carga elétrica é medida em Coulombs, e a carga do próton vale 191,6 10 Ce −= × .

Verifica-se, experimentalmente, que cargas de mesmo sinal se repelem e cargas de sinal oposto

se atraem. Se a distância entre duas cargas q1 e q2 for r, a força elétrica Feletr entre elas terá módulo

9.11 22 ,eletr

q qF kr

=

onde k é uma constante que depende do meio que separa as duas cargas. No vácuo, 9 2 29 10 Nm / Ck = × . Como mostra a Figura 9.1, a força tem a direção do eixo que passa pelo

centro das duas cargas.

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Como a força é proporcional às cargas, a

Equação 9.1 pode ser dividida em duas:

9.22 ,eletrF q E=

onde

9.312 .qE k

r=

Embora seja uma operação matematicamente simples, essa separação constitui um grande

salto conceitual. A Equação 9.3 nos diz que a carga q1 cria um campo elétrico E

, que mo-

difica as propriedades elétricas do ponto onde se encontra a carga q2. A Equação 9.2 nos diz

que esta última sente o efeito do campo elétrico.

Com isso, o problema de calcular a força elétrica sobre uma carga q2 fica reduzido ao de cal-

cular o campo elétrico no ponto em que ela está. Na situação da Figura 9.1, é tão fácil calcular

a força que você poderá achar que não vale a pena o trabalho de dividir a Equação 9.1 em

dois. No entanto, em problemas mais complexos, a divisão permite concentrar nossa atenção na

parte difícil do problema. Superada esta, isto é, calculado o campo elétrico E

, a receita simples

da Equação 9.2 nos diz como computar a força.

Assim como a força, o campo elétrico é um vetor. O seu módulo é expresso pela Equação 9.3,

onde r é a distância entre a carga q1 e a posição P na qual se quer calcular o campo. A direção é de-

terminada pela reta que passa por P e pela carga. O campo de uma carga positiva foge radialmente

dela, como mostra a Figura 9.2. Se a carga q da figura fosse negativa, o campo em cada ponto seria

dirigido para a carga.

Figura 9.2: Campo elétrico em torno de uma carga positiva q / Fonte: USPSC

Figura 9.1: Força elétrica entre duas cargas de sinais opostos / Fonte: USPSC

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9.3 Campo magnéticoAssim como as cargas produzem campos elétricos ao seu redor, os ímãs, também chamados

de magnetos, produzem campos magnéticos ao seu redor. Como a expressão do campo mag-

nético de um ímã é bem mais complicada do que a Equação 9.3, não vamos escrevê-la aqui.

Preferimos ver uma ilustração, análoga à Figura 9.2, mostrando o campo magnético em torno

de um magneto.

É o que mostra a Figura 9.3. Assim como o campo elétrico foge de uma carga positiva, o

campo magnético foge do polo Norte do ímã e corre em direção ao polo Sul.

Figura 9.3: Campo magnético em torno de um magneto. O ímã tem dois polos. O polo Norte foi pintado de vermelho e o polo Sul, de azul. Para facilitar a visualização, o campo magnético foi mostrado em apenas um plano que atravessa o ímã / Fonte: USPSC

Conhecido o campo magnético B

em um ponto do espaço, é fácil calcular a força que age

sobre uma carga q que passa por aquele ponto com velocidade

v , como mostra a Figura 9.4.

O módulo da força é dada pela expressão

9.4 sen .magF q B= θv

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A direção da força é perpendicular a B

e a

v . A legenda da figura ajuda a encontrar o

sentido da força.

9.4 Formas alternativas de geraçãoA carga elétrica gera um campo elétrico e o magneto gera um campo magnético, mas há

outras formas de produzir campos. Um fio condutor, como os que estão escondidos nas paredes

de sua casa, produz um campo magnético ao seu redor. Mais importante, porém, do que fios,

cargas e magnetos é a geração dinâmica de campos, que discutiremos a seguir.

9.4.1 Campo elétrico gerado por campo magnético variável

A Figura 9.5 mostra um magneto que se aproxima de

uma espira, um fio condutor que forma um arco de cir-

cunferência. O fio está conectado a uma lâmpada, que se

mantém acesa enquanto o ímã está em movimento perto

do arco. Cessado o movimento, a luz se apaga.

Isso mostra que a variação de um campo magnético

produz um campo elétrico. Medidas precisas, feitas já na

primeira metade do século XIX, mostraram que, na geo-

metria da Figura 9.5, a variação do campo magnético B

através de uma circunferência de raio R produz um campo

elétrico E

ao longo da circunferência, cujo módulo é pro-

porcional à derivada do módulo do campo magnético. O

produto do comprimento da circunferência pelo campo

elétrico é igual ao produto da área da circunferência pela

derivada do campo magnético:

9.522 .dBRE Rdt

π = π

Figura 9.4: Força magnética sobre uma carga positiva que passa com velocidade

v por um ponto onde o campo magnético é B

. A força é perpendicu-lar à velocidade e perpendicular ao campo, e o seu sentido é dado pela regra da mão direita: posicione o polegar da sua mão direita no sentido da velocidade e posicione seus demais dedos no sentido do campo. A força será no sentido da palma de sua mão. Se a carga for negativa, empregue a mão esquerda / Fonte: USPSC

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Os dois lados podem ser divididos por πR para dar uma igualdade mais simples:

9.6.2R dBE

dt=

Quer da Equação 9.5 quer da Equação 9.6, vemos que um campo

magnético que varia produz um campo elétrico. Importantíssimo, porque

encontramos aí uma receita para gerar campos elétricos sem precisar de

cargas. É assim que é gerada a eletricidade que chega às nossas residên-

cias: em uma usina hidrelétrica, por exemplo, a força das águas move

um número muito grande de espiras em uma região onde o campo

magnético é forte. A variação do campo magnético dentro das espiras

gera um campo elétrico. Este último movimenta correntes elétricas ao

longo de fios de transmissão que distribuem a eletricidade pelas cidades.

Ainda mais importante, o resultado contido na Equação 9.5 per-

mite que, mesmo longe de qualquer carga, até mesmo no vazio do

espaço interestelar, sejam gerados campos elétricos. Para isso, porém, é

preciso levar campos magnéticos até o lugar onde o campo elétrico será gerado sem empregar

ímãs ou fios. E isso nos conduz à próxima seção.

9.4.2 Campo magnético gerado por campo elétrico variável

A Figura 9.6 mostra um dispositivo conhecido como capacitor. São duas placas condutoras

planas paralelas separadas por um espaço vazio. Se ligarmos um fio à placa de cima e outro à

de baixo, e conectarmos o par a uma bateria, o capacitor se carregará por algum tempo até as

placas ficarem saturadas com carga. Se, em seguida, invertermos a polaridade da bateria, ele se

descarregará e se carregará no sentido oposto.

As cargas que se acumulam nas placas geram um campo elétrico entre elas. Se a área das

placas for muito grande e a separação entre elas, pequena, o campo elétrico pode ser bastante

alto. Nesse caso, sempre que a carga positiva na placa de cima cresce, verifica-se que uma bússola

posicionada junto ao capacitor aponta na direção indicada na Figura 9.6(b): tangente à circun-

ferência centrada no capacitor que passa pelo centro da bússola. Se, ao contrário, a carga positiva

na placa de cima diminuir, a bússola se orientará no sentido oposto ao mostrado na figura.

Figura 9.5: Geração dinâmica de campo elétrico. Quando o magneto vermelho--azul se aproxima do arco condutor, a variação do campo magnético dentro do arco cria um campo elétrico ao longo do arco, como mostra a lâmpada acesa. O campo elétrico é proporcional à velocidade com que cresce (ou diminui) o campo magnético no interior do arco / Fonte: USPSC

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Em outras palavras, quando aumenta

o campo elétrico E

mostrado na Figura

9.6(a), a bússola aponta na direção mostrada

na Figura 9.6(b), indicando que se forma

um campo magnético ao redor do capacitor.

Já quando o campo elétrico diminui, o campo

magnético toma o sentido oposto. E se a

variação do campo elétrico cessar, a bússola

tomará a sua orientação normal: apontará para

o Norte. Um campo magnético é criado, por-

tanto, quando o campo elétrico varia.

Com base em medidas e na análise cuidadosa dos resultados, pode-se mostrar que o campo

magnético da Figura 9.6 é proporcional à derivada do campo elétrico. A relação é semelhante à

que descreve a criação do campo elétrico na Figura 9.5. Se o raio da circunferência sobre a qual

se mede o campo, como mostra a Figura 9.6(b), for R, então, o campo magnético será dado por

uma igualdade parecida com a Equação 9.5:

9.722 ,dERB Rdt

πγ = π

onde a constante γ depende do meio em que a medida é realizada; no vácuo

9.816 2 29 10 m / s .γ = ×

Para simplificar a Equação 9.8, dividimos os dois lados por 2πγR e obtemos uma expressão

explícita para o campo magnético:

9.91 .

2R dEB

dt=γ

Como γ é muito grande, a derivada à direita tem de ser também muito grande para que

o campo magnético seja apreciável. Isso significa que o campo elétrico precisa variar muito

rapidamente. Satisfeita essa condição, conseguiremos produzir um campo magnético longe de

magnetos ou fios. Falta ver como isso funciona na prática.

Figura 9.6: Geração dinâmica de campo magnético. As duas placas horizontais são condutoras. O painel (a) as mostra de frente, enquanto o painel (b) mostra a mesma cena vista de cima. Quando as placas são carregadas eletricamente, por meio de fios conectados a uma bateria, por exemplo, geram um campo elétrico E na região entre as placas. A variação desse campo dá origem a um campo magnético em torno do conjunto, que é capaz de orientar a agulha de uma bússola / Fonte: USPSC

a b

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9.5 Radiação eletromagnéticaQuando uma carga está parada, o campo elétrico que ela produz tem a forma exibida esque-

maticamente na Figura 9.2. Segundo a Equação 9.3, o campo é inversamente proporcional

ao quadrado da distância e, portanto, fica muito fraco logo que nos afastamos da carga. Na

representação precisa da Figura 9.7, os vetores se tornam praticamente invisíveis a partir da

metade da ilustração porque o campo se torna fraco demais para ser percebido.

Figura 9.7: Campo elétrico nas vizinhanças de uma carga positiva. Em contraste com o esboço esquemático da Figura 9.2, esta figura mostra o campo precisamente calculado a partir da Equação 9.3. Para não sobrecarregar, ela mostra somente uma janela retangular sobre um plano que passa sobre a carga / Fonte: USPSC

Se a carga se movimentar, o seu campo elétrico variará com o tempo e dará origem a um

campo magnético. Em particular, se a carga for acelerada, ela poderá movimentar-se continuamen-

te sem se afastar de uma pequena região do espaço. A massa presa a uma mola do tópico 8 é um

exemplo de uma partícula que sobe e desce sem nunca se afastar muito do ponto de equilíbrio. No

tópico 8, encontramos uma função periódica que descreve a sua posição y como função do tempo.

Em particular, no caso em que a massa está inicialmente parada na posição y0, a função periódica é

9.10( ) ( )0 cos .y t y t= ω

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Suponhamos que a posição de uma carga q seja dada pela mesma igualdade e, para fixar

ideias, vamos supor que y0=1cm. Com isso, a Equação 9.10 assume a forma

9.11( ) ( ) ( )cos em cm .y t t= ω

Vemos que a carga nunca está mais do que um centímetro da origem e que sua velocidade

varia continuamente.

Vejamos agora o campo elétrico produzido pela Equação 9.10. Como a carga está sempre

perto de y=0, o campo nas vizinhanças da origem é sempre forte. Quando a carga se movimenta,

o campo elétrico nessa região varia e, segundo a Equação 9.9, dá origem a um campo magnético.

O campo magnético também varia com o tempo. Isso acontece porque a derivada do campo

elétrico depende da velocidade da carga, a qual, por sua vez, varia ao longo do tempo. E, como o

campo magnético é proporcional à derivada do campo elétrico, B depende do tempo. A variação

do campo magnético, segundo a Equação 9.6, dá origem a um campo elétrico. E assim podería-

mos continuar a pensar para encontrar os campos elétrico e magnético em outras regiões do espaço.

Mas é mais fácil examinar a Figura 9.8, que mostra o comportamento do campo elétrico em

uma região que vai das vizinhanças da carga até distâncias moderadamente afastadas. A ilustração

retrata o campo elétrico em t=0, quando a posição da carga na Equação 9.11 é y=1cm, isto

é, quando a distância entre a carga e a origem é máxima. Nas proximidades da carga, o campo se

assemelha ao de uma carga parada, que está retratado na Figura 9.7. Mais à frente, percebemos

que ele adquire uma pequena componente vertical no sentido descendente, mas, a partir da

metade da figura, ele se torna virtualmente nulo.

A Figura 9.9 mostra o campo elétrico no instante t=T/4, onde T=2π/ω é o período da

oscilação da carga. Nesse ponto, o cosseno à direita da Equação 9.11 se anula, porque seu

argumento é π/2. Isso quer dizer que a carga está exatamente sobre a origem.

O campo continua a ser grande e radial nas proximidades da carga, mas agora ele deixa de

ser insignificante na região próxima à borda direita da figura. Um pouco de atenção mostra que,

nessa região distante da carga, o campo é vertical e dirigido para baixo. A evolução em relação

ao quadro desenhado na Figura 9.8 é notável. Vamos deixar o relógio correr um pouco mais.

A Figura 9.10 mostra o campo elétrico em t=T /2, momento em que a carga atinge a posi-

ção diametralmente oposta à inicial: segundo a Equação 9.11, a posição y chega a −1 cm nesse

instante. O campo continua a ser vertical e descendente na região da figura que está mais longe

da carga e continua a ser forte e radial nas proximidades da carga. Na região central, no entanto,

o campo se torna muito fraco, o que significa que uma mudança está começando a acontecer.

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Pouco mais tarde, quando t=3T /4, o campo, sempre intenso nas proximidades da carga,

volta a ser apreciável na região central da Figura 9.11. E agora, em toda a janela mostrada na

ilustração, a componente vertical do campo passa a ser ascendente, ao contrário do que ocorre

em t=T /4 (ver a Figura 9.8).

Quando t for igual ao período de oscilação da carga, isto é, quando t=T , a posição y

voltará a valer 1 cm e teremos completado um ciclo. O campo voltará a ser como retratado

na Figura 9.8 e tudo se repetirá.

Figura 9.8: Campo elétrico de carga positiva que se movimenta segundo a Equação 9.11 no instante t=0. Nesta e nas próximas sete ilustrações, vemos o campo elétrico através de uma janela, como na Figura 9.7 / Fonte: USPSC

Figura 9.9: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11 para t=T/4, onde T é o período de oscilação da carga / Fonte: USPSC

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As Figuras 9.12 a 9.15 mostram a mesma sequência de instantâneos, vista de um ponto

de observação mais distante, para oferecer visão panorâmica da evolução do campo elétrico.

Figura 9.10: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11 para t=T/2, onde T é o período de oscilação da carga.

Figura 9.11: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11 para t=3T/4, onde T é o período de oscilação da carga.

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Figura 9.12: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11, no instante t=0. Análoga à Figura 9.8, esta figura mostra o campo elétrico de ponto de vista mais distante / Fonte: USPSC

Basta examinar a primeira figura da sequência para perceber que o campo elétrico se en-

fraquece em mais de uma região. Exceção feita aos pontos próximos da carga, a figura mostra

regiões de campo mais nítido, que se alternam com regiões de campo fraco. O movimento

oscilatório da carga dá origem a uma onda. A sequência das Figuras 9.12 a 9.15 mostra que

a onda foge da região em que a carga se movimenta para sumir de vista no extremo direito das

figuras. Essa onda, que não precisa de um meio para se deslocar porque tem origem na relação

entre os campos elétrico e magnético, expressa pelas Equações 9.6 e 9.9, é a radiação eletro-

magnética. Uma análise matemática mais cuidadosa do que a que podemos fazer aqui mostra

que sua velocidade no vácuo é a raiz quadrada do coeficiente γ que aparece na Equação 9.7 e

é dado pela Equação 9.8. Assim, no vácuo, a velocidade da onda eletromagnética é

9.128c 3 10 m / s.= γ = ×

Foi essa igualdade, deduzida pela primeira vez em 1865, que levou Maxwell a concluir que

a luz é radiação eletromagnética. Para que a radiação seja visível, a sua frequência precisa estar

no estreito intervalo que vai de aproximadamente 400 THz a 700 THz.

A frequência da radiação emitida é determinada pela frequência com que a carga oscila. Como

vemos nas sequências das Figuras 9.8 a 9.11 e das Figuras 9.12 a 9.15, a cada ciclo do mo-

vimento da carga, o campo elétrico na região distante da carga completa um ciclo da sequência

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1. campo fraco;

2. campo mais forte com sentido descendente;

3. campo fraco;

4. campo mais forte com sentido ascendente.

Assim, a frequência da radiação é igual à frequência do movimento da carga. Para emitir

luz visível, a carga elétrica precisa vibrar com frequência da ordem de 500 THz.

Figura 9.13: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11, no instante t=T/4. Equivale à Figura 9.9 vista de ponto de observação mais distante / Fonte: USPSC

Figura 9.14: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11, no instante t=T/2. Equivale à Figura 9.10 vista de ponto de observação mais distante / Fonte: USPSC

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Figura 9.15: Campo elétrico de carga positiva que oscila segundo a Equação 9.11, no instante t=3T/4. Equivale à Figura 9.10 vista de ponto de observação mais distante.

9.6 Características da radiação eletromagnéticaComo aprendemos na Seção 9.4, uma carga em movimento periódico emite radiação ele-

tromagnética. A partir dessa noção, podemos agora entender melhor alguns dos conceitos que

discutimos nas aulas 1 e 2.

9.6.1 Velocidade

A velocidade das ondas eletromagnéticas no vácuo é dada pela Equação 9.12. Em outros

meios como a água ou o vidro, o coeficiente γ na Equação 9.8 é menor do que o valor na

Equação 9.8. Como consequência, a luz viaja mais devagar. Dizemos que o meio tem um

índice de refração n=c/v, onde v é a velocidade da radiação. De posse do índice, temos tudo

de que precisamos para aplicar a lei de Snell e Descartes.

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9.7 PolarizaçãoAs Figuras 9.8 a 9.11 mostram que, enquanto o campo na região próxima da carga é

radial, o campo na região distante é paralelo ao eixo vertical sobre o qual a carga se move. Mais

precisamente, o campo elétrico na região distante é paralelo à aceleração da carga. Se as figuras

mostrassem o campo magnético, veríamos que ele é perpendicular ao plano que contém o

campo elétrico e o eixo em que carga se movimenta — o plano da figura.

A onda eletromagnética nas Figuras 9.8 a 9.15 é como a onda que se forma numa corda:

transversal à direção de propagação. Aquelas figuras são um pouco especiais, porque, em todas

elas, a carga se move verticalmente. No entanto, mesmo que ela se movesse em outra direção —

na horizontal, por exemplo — o campo elétrico seria transversal, como mostra a Figura 9.16.

A radiação resultante é polarizada.

Figura 9.16: Polarização da onda eletromagnética. O campo elétrico E

é paralelo à direção em que a carga se move e o campo magnético B

, perpendicular ao plano onde estão o campo elétrico e a carga. O vetor k

é uma forma conveniente de indicar a direção de propagação da onda. Em (a), o movimento e o campo elétrico são verticais e a radiação é verticalmente polarizada. Em (b), o movimento horizontal dá origem a uma radiação horizontalmente polarizada / Fonte: USPSC

A onda da Figura 9.16(a) é polarizada verticalmente. A da Figura 9.16(b) é polarizada

horizontalmente. Os polarizadores, empregados para visualizar cinema 3D, por exemplo, são cons-

tituídos de material cujas moléculas absorvem a luz polarizada em uma direção e deixam passar a

luz polarizada na direção perpendicular. Corretamente posicionado, um polarizador deixaria passar

a radiação esquematizada na Figura 9.16(a), mas absorveria a esquematizada na Figura 9.16(b).

9.7.1 Interferência

Uma vez que é constituída de ondas, a radiação eletromagnética está sujeita à interferência.

Como vimos nas aulas 1 e 2, a interferência entre feixes de luz não é comum em nosso dia a

dia porque o comprimento de onda é muito inferior à dimensão da maioria dos objetos e seres

a b

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ao nosso redor. A interferência, entretanto, pode ser facilmente observada. Se você aproximar

cuidadosamente um de seus indicadores do polegar da mesma mão e olhar para uma lâmpada

através do vão entre eles, verá uma sombra entre os dois quando o vão ficar reduzido a uma

pequena fração de milímetro. A sombra indica que há interferência destrutiva.

À primeira vista, pode parecer muito difícil descrever matematicamente a interferência entre

ondas eletromagnéticas. Afinal, a interferência em geral resulta da adição de numerosas funções

tridimensionais que variam no tempo e no espaço. Felizmente, a nossa tarefa é simplificada por

um princípio enunciado por Huygens no século XVII.

Com base no que aprendemos na Seção 9.4, é fácil entender o princípio de Huygens. Suponhamos

que, conhecendo o comportamento de uma onda em uma região do espaço, queiramos saber o que

acontece fora dela. Na Figura 9.9, por exemplo, conhecemos o campo elétrico na janela exibida

e podemos querer prever a evolução do campo fora dela. Para isso, segundo o princípio, basta tratar

cada ponto na periferia da janela como se fosse uma fonte de radiação - como se houvesse uma

lâmpada infinitesimal irradiando luz a partir daquele ponto. A soma das contribuições de todas essas

lâmpadas imaginárias dará a evolução do campo na região externa à janela.

O princípio é particularmente prático

quando a luz tem de passar por uma fenda es-

treita ou por um número pequeno de fendas

estreitas. Conhecemos o comportamento da

luz antes de passar pelas fendas e queremos

saber o que acontecerá à frente delas. Em tais

casos, segundo Huygens, tudo se passa como

se existisse uma fonte de radiação em cada

fenda, e a interferência à frente delas resulta

da soma das ondas emitidas pelas várias fontes.

A Figura 9.17(a) mostra esquematicamente a aplicação do princípio a uma fenda simples.

A Figura 9.17(b) mostra o resultado matemático da aplicação do princípio de Huygens

ao mesmo problema. Conforme se esperava, a onda diverge radialmente a partir da fenda, uma

situação semelhante à retratada nas Figuras 9.12 a 9.15.

Vemos que, ao passar por uma fenda estreita, a radiação deixa de se propagar em linha reta.

Compare com o comportamento esperado de um feixe de partículas. Se a luz fosse constituída de

partículas, a fenda estreitaria o feixe sem alterar a direção de propagação. A Figura 9.17 mostra,

Figura 9.17: Passagem da luz por uma fenda. O painel (a) mostra esquemati-camente o arranjo. O painel (b) mostra o resultado de cálculo / Fonte: Cepa

a b

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no entanto, que quando a largura da fenda é da ordem do comprimento de onda da radiação, a

luz se propaga em outras direções após passar pelo bloqueio, um efeito conhecido como difração.

A difração não demonstra definitivamente que a radiação é uma onda. Um defensor da teoria

de partículas poderia argumentar que elas mudaram de direção porque colidiram com as bordas

da fenda. E como a onda da Figura 9.17(b) oscila mais de 1014 vezes por segundo, rápido

demais para ser vista, seria incorreto um observador descartar as partículas com base apenas no

resultado da experiência na Figura 9.17. Por isso, a experiência de Young foi decisiva.

A experiência de Young é o assunto da Figura 9.18. Como mostra o painel (a), um feixe de

luz atinge um bloqueio dotado de duas fendas. O princípio de Young recomenda que tratemos

cada uma delas como uma fonte de luz. O painel (b) mostra a soma das duas ondas assim

construídas. Vemos um padrão de interferência, com raias mais claras indicando interferência

destrutiva, separadas por regiões de interferência construtiva.

Os máximos e mínimos que se alternam na dire-

ção radial na Figura 9.18(b) oscilam com frequência

altíssima, mas o padrão de interferência é independen-

te do tempo. Em particular, praticamente nenhuma

luz é emitida nas direções de interferência destrutiva.

Assim, a projeção da luz proveniente das fendas sobre

um anteparo mostra a sequência de claros e escuros

alternados que discutimos no tópico 2, sequência essa

que constitui evidência inequívoca de interferência e,

portanto, da natureza ondulatória da luz.

Como terceiro exemplo, a Figura 9.19 mostra a passagem da luz por um bloqueio com

múltiplas fendas. De novo, invocamos o princípio de Young para tratar cada uma delas como

fonte de luz e adicionamos as ondas por elas emitidas. O resultado aparece na Figura 9.19(b).

Percebem-se alguns sinais fracos de interferência na região mais próxima da horizontal que

passa pelo centro do painel. São resquícios da interferência da Figura 9.18(b). Mais notáveis

do que eles são as duas sequências de máximos que correm perto do extremo esquerdo da

Figura 9.19(b), um dirigido para cima, outro dirigido para baixo. Esses máximos são efeitos de

interferência construtiva, que dão origem a dois feixes intensos de luz, que podem ser colhidos

quando um anteparo branco é posicionado em frente ao conjunto de fendas.

a b

Figura 9.18: Experiência de Young. O painel (a) mostra esquematica-mente o arranjo. O painel (b) é o resultado de cálculo / Fonte: USPSC

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Graças a esse efeito, um conjunto de fendas

igualmente espaçadas, cada fenda separada de suas

vizinhas por distância comparável com o compri-

mento de onda da luz, recebe o nome de grade

de difração. Os feixes resultantes da interferência

construtiva são raios difratados. As direções em

que eles correm dependem do comprimento de

onda da radiação. Por isso, as grades de difração

decompõem a luz branca em suas componentes

cromáticas da mesma forma que (por um meca-

nismo inteiramente diferente, como vimos no tópico 5) as gotas de chuva dão origem à

dispersão de cores no arco-íris.

Figura 9.19: Difração por múltiplas fendas. O painel (a) mostra esquematicamente o arranjo. O painel (b) é o resultado de um cálculo numérico / Fonte: USPSC

a b