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Opinião - Agência ECCLESIA€¦ · sua escolha como fotografia do ano”, Stuart Franklin, presidente do júri da 60.ª edição do World Press Photo, no jornal ‘The Guardian’

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04 - Editorial: Paulo Rocha06 - Foto da semana07 - Citações08 - Nacional14 - Internacional20 - Opinião José Luis Gonçalves22 - Opinião Pedro Jerónimo24 - Semana de... Luís Filipe Santos26 - Dossier Quaresma 2017

50 - Multimédia52 - Estante54 - Concílio Vaticano II56 - Agenda58 - Por estes dias60 - Programação Religiosa61 - Minuto Positivo62 - Liturgia64 - Fátima 201768 - Fundação AIS70 - LusoFonias72 - Cuidados Paliativos

Foto de capa: DRFoto da contracapa: DR

AGÊNCIA ECCLESIA Diretor: Paulo Rocha | Chefe de Redação: Octávio CarmoRedação: Henrique Matos, José Carlos Patrício, Lígia Silveira,Luís Filipe Santos, Sónia NevesGrafismo: Manuel Costa | Secretariado: Ana GomesPropriedade: Secretariado Nacional das Comunicações Sociais Diretor: Padre Américo AguiarPessoa Coletiva nº 500966575, NIB: 0018 0000 10124457001 82.Redação e Administração: Quinta do Cabeço, Porta D1885-076 MOSCAVIDE.Tel.: 218855472; Fax: [email protected]; www.agencia.ecclesia.pt;

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Opinião

Papa, peregrinoem Fátima[ver+]

Irmã Lúcia, maisperto dabeatificação[ver+]

Quaresma 2017,mensagem doPapa[ver+] José Luís Gonçalves | PedroJerónimo | Paulo Rocha |Luís FilipeSantos | Manuel Barbosa | PauloAido | Tony Neves

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Pontificado em ritmo quaresmal

Paulo Rocha Agência ECCLESIA

Construir pontes em vez de muros, estar nafronteira e não no interior de muralhas, habitaras periferias recusando a auto-referencialidade.É este o programa do Papa Francisco, expressoinsistentemente desde a primeira hora pormensagens e sobretudo por gestos, pelasurpresa dos seus gestos. Em causa estãoatitudes que permitem o abandono deestratégias de poder como meio de consolidaçãode um grupo, elegendo a atenção ao outro, aqualquer outro, com todas as fragilidades ediferenças, como a melhor opção para darvitalidade a uma família que segue uma Pessoa,Jesus Cristo.O Papa que veio “quase do fim do mundo” viveesta determinação e força a mudança deparadigma naqueles que com ele colaboramdiretamente e na instituição que anima, nodecorrer deste pontificado. Uma insistência quedá relevância crescente à palavra “reforma”. Eexige uma outra, a palavra conversão, para quese compreendam os meios e os fins propostospor Francisco e sobretudo sejam dados passosefetivos nesse itinerário.No último discurso à Cúria Romana, nasproximidades do Natal, Francisco dizia quereformar dá vida, é sinal de vitalidade e a únicaforma de apagar manchas do passado, ou sejaos erros e os pecados. Dirigindo-se aos cardeaise outros responsáveis pelos órgãos do Vaticano,o Papa sublinhou que “a reforma não é fim em simesma, mas constitui um processo decrescimento e sobretudo de conversão”, não temuma “finalidade estética, como se se quisessetornar mais bela a Cúria” através de qualquer“maquilhagem”

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para “embelezar o velho corpocurial” ou de uma “operação plásticapara tirar as rugas”. E concluiu:“Amados irmãos, não são as rugasque se devem temer na Igreja, masas manchas!”O Papa Francisco sugere, assim,uma autêntica caminhadaquaresmal para o seu pontificado,propondo reformas que exigemconversão, pessoal e pastoral. E vaisugerindo pistas, nos encontros quemantém, nos documentos quepublica,nos projetos queconcretiza.A Mensagem do Papa para aQuaresma, que se publicaintegralmente neste semanário, aque se seguem análises dosdiferentes temas sugeridos porFrancisco, contém mais um conjuntode sugestões que possibilitam oacontecer da conversão e, por essavia, a concretização de umprograma de reformas. Uma vezmais em torno do rico e do pobre,primeiro referindo a parábola deJesus e depois aplicando-a aoquotidiano de cada tempo onde ahistória é constantemente reescrita.Só o nome dos intervenientes e oenredo, porque as conclusõespermanecem com a mesmaacuidade, agora como há dois milanos.

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Não é a foto da semana mas do ano. A 60.ª edição do World PressPhoto distinguiu a foto de Burhan Ozbilici que retrata a expressão do

assassino do embaixador russo em Ancara, na Turquia.

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“A fotografia de Özbilici é uma imagem de impacto,

sem dúvida. Contudo, apesar de ter sido totalmente afavor de lhe atribuir o prémio de spot news [notíciaslocais], que também venceu, opus-me firmemente àsua escolha como fotografia do ano”, Stuart Franklin,presidente do júri da 60.ª edição do World PressPhoto, no jornal ‘The Guardian’ “Vejo o mundo a caminhar em direção a um abismo.Este é um homem que claramente chegou a um pontode rutura”, fotojornalista luso-sul-africano João Silva,júri desta edição do World Press Photo (Público) “Completar a prestação de contas com osportugueses”, Cavaco Silva, antigo presidente daRepública, com o novo livro ‘Quinta-feira e outros dias’ “O direito ao consentimento prévio deve sempreprevalecer. Só então é possível garantir umacooperação pacífica entre as autoridadesgovernamentais e os povos indígenas”, PapaFrancisco recebeu participantes de fórum do FundoInternacional de Desenvolvimento Agrícola (RádioRenascença) “[Custo ] integralmente suportado através das receitasaeroportuárias, mantendo a competitividade destesaeroportos face aos principais aeroportosconcorrentes”, ministro do Planeamento dasInfraestruturas, Pedro Marques, na assinatura domemorando de entendimento entre o Estado e a ANA-Aeroportos de Portugal para a expansão dacapacidade aeroportuária de Lisboa (JN)

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Coimbra em festa no final doinquérito diocesano paracanonização da Irmã Lúcia

A igreja do Carmelo de Coimbraencheu-se para a sessão solene declausura do inquérito diocesanopara a canonização da Irmã Lúcia(1907-2005), vidente de Fátima, 12anos após a sua morte. O processoimplicou a análise de milhares decartas e textos, além da auscultaçãode 61 testemunhas, resultando emmais de 15 páginas dedocumentação que segue agorapara a Congregação das Causasdos Santos (Santa Sé).

A cerimónia de encerramento foipresidida pelo bispo de Coimbra, D.Virgílio Antunes, na presença dosresponsáveis da causa decanonização, do Santuário deFátima e do Carmelo de SantaTeresa, onde a irmã Lúcia residiudurante décadas.Esta fase do processo decanonização da vidente de Fátimareuniu todos os escritos da IrmãLúcia, os depoimentos dastestemunhas ouvidas acerca da suafama de santidade e das suas

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virtudes heroicas, passando agorapara a competência direta da SantaSé e do Papa.A sessão incluiu uma série dejuramentos dos responsáveisenvolvidos no processo, bem comoa assinatura de decretos e atas,posteriormente selados e lacrados.D. Virgílio Antunes falou num dia“histórico” para a Diocese deCoimbra, elogiando o empenho detodos os que contribuíram para umprocesso que visou chegar à“certeza moral” da santidade daIrmã Lúcia. O bispo de Coimbraespera que “tudo avance comsegurança” e a “bom ritmo” e desejaque a conclusão do processo seja“tão breve quanto possível.“Que do céu venham sinais paraconfirmar o que se tem vindo a

fazer cá em baixo na terra”, afirmouD. Virgílio Antunes à AgênciaECCLESIA. Para o bispo de Coimbra, a clausurada fase diocesana do processo decanonização da Irmã Lúcia é “um diade festa” pelo “trabalho longo” quefoi realizado e pelas “expectativas,esperanças e o olhar” de muitaspessoas que “está posto na IrmãLúcia, em Fátima e na Igreja”.

O responsável pela Causa de Canonização da Irmã Lúcia disse àAgência ECCLESIA que o processo exige “calma”, face à dimensão dotrabalho realizado. “A Igreja faz bem em ir com calma, é umaoportunidade para todos nós”, sublinhou o padre RomanoGambalunga, postulador da causa, para quem é necessário eliminarquaisquer equívocos sobre “a vida e a missão” da vidente de Fátima.“Lúcia já é santa para as pessoas, também muitos clérigos, mas ocaminho prudente da Igreja é para que seja proposta a todos, não só aquem já acredita” na sua santidade.

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Igreja ao encontro dos jovensA Conferência EpiscopalPortuguesa (CEP) vai debater nasua próxima Assembleia Plenária(24-27 de abril) um documentodedicado à catequese e àtransmissão da fé às novasgerações. O secretário da CEP,padre Manuel Barbosa, disse emconferência de imprensa que o textopropõe "reflexão de fundo" após umano de debate nas dioceses eorganismos, numa consulta das"bases", seguindo o "bom exemplo"do Papa Francisco.O documento "A alegria do encontrocom Jesus Cristo" procura aindapromover a "autenticidade" nabusca de um sentido para a vida."Não é uma questão quantitativa, éuma questão qualitativa, no sentidode as pessoas aderirem, fazerem odiscernimento da sua vida, da suavocação", sublinhou o porta-voz doepiscopado católico, após a reuniãomensal do Conselho Permanente daCEP, em Fátima.Os resultados do trabalho levado acabo junto das várias comunidadesmostram a necessidade de que acatequese seja "mais deexperiência" e não "tão escolar".O texto teve o "parecer de jovens",assinalou o padre Manuel Barbosa,após ser questionada sobre os

alertas que o Papa Francisco deixouaos bispos portugueses, na últimavisita 'ad Limina', relativamente à"debandada da juventude"."Esperemos que esse processo,esse movimento continue", e que"não haja uma debandada tãogrande como isso", observou.A próxima Assembleia Plenária daCEP vai ainda analisar uma notapastoral sobre os incêndios, paramanifestar a intenção, por parte daIgreja Católica, de colaborar "com asautoridades no terreno",apresentando "princípios práticos".Esta reunião magna vai incluireleições para a presidência e ascomissões episcopais da CEP.O Conselho Permanente analisouainda as propostas lançadas peloVaticano para o Sínodo dos Bisposde 2018, dedicado aos jovens e aodiscernimento vocacional.

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Cáritas Portuguesa refugiados naGréciaUma equipa da Cáritas Portuguesapartiu esta quinta-feira para aGrécia, onde vai estar seis dias como objetivo de conhecer a situaçãodos milhares de refugiados aliradicados e avaliar novas formas deajuda. Em entrevista à AgênciaECCLESIA, o presidente da CáritasPortuguesa, que lidera a comitiva,destacou a importância de emprimeiro lugar “perceber aquilo queas pessoas desejam”.“A solidariedade passa por esseconhecimento, que nos faz depoiscomungar melhor a vida daquelagente, os seus problemas eanseios”, salientou.O destino da equipa da CáritasPortuguesa será o campo derefugiados da Ilha de Lesbos, bemcomo outros centros de acolhimentoexistentes no território grego.Para Eugénio Fonseca, esta visitaserá também uma forma de estar aolado da Cáritas grega, “uma Cáritasminoritária no contexto da Grécia,mas que está a fazer um trabalhoextraordinário”. “Esse trabalhopassa por um conjunto de projetos enós estamos ligados a dois, noâmbito do programa Linha daFrente, da Plataforma de Apoio aosRefugiados, que é o apoio aoscampos de

refugiados propriamente dito”,adiantou.As duas referidas estruturas sãoespaços habitacionais, já fora doscampos de refugiados, hotéisgeridos pela Cáritas, que visamfavorecer a integração de pessoas efamílias na sociedade grega, istonuma fase já mais adiantada doprocesso de acolhimento.Ainda recentemente, a CáritasPortuguesa enviou um apoiomonetário de 11 mil euros paraajudar refugiados na Grécia eSérvia. A organização tem lançadotambém apelos à solidariedade nosentido de ajudar estas pessoas aultrapassar as dificuldades em quese encontram, sobretudo no pico doinverno.A visita de seis dias da CáritasPortuguesa à Grécia, e aos camposde refugiados existentes no país, vaiser acompanhada no terreno pelareportagem da Agência ECCLESIA.

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A Agência ECCLESIA escolhe sete acontecimentos que marcaram aatualidade eclesial portuguesa nos últimos dias, sempre atualizadosem www.agencia.ecclesia.pt

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Hospitaleiras: «Nunca tivemos um pedido de eutanásia»

Postulado da causa de canonização da Irmã Lúcia pede «calma»

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Francisco, peregrino em Fátima

O reitor do Santuário de Fátima,padre Carlos Cabecinhas, vai ser ocoordenador geral da visita do PapaFrancisco a Fátima, por indicaçãoda Conferência EpiscopalPortuguesa. O responsável disseaos jornalistas, em conferência deimprensa, que o Papa virá “comoperegrino, para rezar com osperegrinos” de Fátima,privilegiando, “por vontadeexpressa” de Francisco a dimensãoespiritual.“O Papa vem para rezar, para rezarem Fátima”, insistiu.O padre Carlos Cabecinhasassinalou que os preparativos, em

conjunto com o Estado português,estão a decorrer "em bom ritmo".O reitor de Fátima tinha sido odiretor nacional das celebraçõespontifícias durante a visita de BentoXVI a Portugal, em maio de 2010.O padre Carlos Cabecinhasadiantou que o “programadetalhado” da visita do Papa, nosdias 12 e 13 de maio, por ocasiãodo Centenário das Aparições, sóserá divulgado cerca de “doismeses” antes da viagem, “em dataainda a anunciar”, tendo referido, noentanto, que Francisco não irá aLisboa. "O Papa virá diretamente

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para Fátima, portanto, a visita nãocomeçará em Lisboa", referiu.A escolha do aeroporto de MonteReal, acrescentou o sacerdote, tema ver com "o foco desta visita", dadoque Francisco se apresenta "comoperegrino que vem para rezar comos portugueses em Fátima".Segundo este responsável, oSantuário de Fátima tem aexpectativa de receber “muitosperegrinos” para a viagempontifícia, admitindo que a afluênciade peregrinos seja "muitosignificativa" e "maior" do que em2010.O recinto vai ser equipado comecrãs gigantes em váriaslocalizações, nos espaços anexosao Santuário. O padre CarlosCabecinhas lamentou, por outrolado, a "especulação" à volta dosalojamentos, embora entenda

que essa não é uma prática "geral".A peregrinação aniversáriainternacional vai seguir o horáriohabitual destas grandescelebrações, que decorrem de maioa outubro.Para preparar esta visita, aConferência Episcopal Portuguesadesignou também o padre VitorCoutinho, vice-reitor da instituição,como coordenador da Comissão deAcompanhamento dos Media para avisita do Papa Francisco.Já o padre Joaquim Ganhão, daDiocese de Santarém, é ocoordenador da Comissão deLiturgia. O sacerdote, atual diretordo Museu Diocesano de Santarém edo Secretariado de Liturgia destadiocese, é representante daConferência Episcopal Portuguesano Conselho Pastoral do Santuáriode Fátima.

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O mal no coração humanoO Papa Francisco disse no Vaticanoque os insultos, o adultério e amentira são manifestações de“escolhas erradas”, numaintervenção em que abordou oensinamento de Jesus sobre o malno coração humano. “O adultério,como o furto, a corrupção e todosos outros pecados, são concebidosem primeiro lugar no nosso íntimo e,uma vez cumprida a escolha errada,no coração, são levados a cabonum comportamento concreto”,alertou, perante milhares depessoas reunidas na Praça de SãoPedro para a recitação da oraçãodo ângelus.Francisco disse que Jesus Cristo dáum novo “cumprimento” à leimatrimonial, que deixa de ser vista àluz do “direito de propriedade dohomem sobre a mulher”. “Jesus,pelo contrário, vai à raiz do mal: damesma forma que se chega aohomicídio através das injúrias e dasofensas, assim também se chega aoadultério através das intenções deposse em relação a uma mulherdiferente da esposa”, precisou.Francisco recordou que noensinamento cristão, todo aqueleolha para uma mulher, que não asua própria, com sentimento deposse, “é um adúltero no coração”.

A intervenção alertou ainda para asconsequências do “insulto”,lamentando que esta seja umaprática generalizada. “Quem insultaum irmão, mata o seu próprio irmãono coração”, assinalou.O Papa falou da “insegurança” e da“dupla cara” nas relações humanaspara pedir uma linguagem deverdade e um clima de “limpidez”, deforma a que todos possam ser vistoscomo pessoas “sinceras” sem ter defazer juramentos ou de recorrer a“intervenções superiores”.Francisco observou que a justiçaproposta por Jesus vai para além do“formalismo”, em que se debate oque cada um pode ou não fazer,sendo animada “pelo amor, acaridade, e portanto capaz derealizar a substância dosmandamentos”.

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Papa pede respeito por comunidadesindígenasO Papa apelou Vaticano ao respeitopelas “comunidades autóctones” porparte dos governos, ao receber umadelegação de 40 representantes depovos indígenas. Franciscosublinhou que estes povos são umaparte da população que merece ser“valorizada e consultada”,promovendo a sua “plenaparticipação” a nível local enacional.O encontro decorreu à margem do3.º Fórum de Povos Indígenas,convocado pelo Fundo Internacionalde Desenvolvimento Agrícola(IFAD), no 40.º aniversário destaagência da ONU.“O principal desafio é conciliar odireito ao desenvolvimento com atutela dos povos e territóriosindígenas”, sustentou o Papa, numaintervenção divulgada pela sala de

imprensa da Santa Sé. Franciscoalertou em particular para o impactode atividades económicas que“interferem com as culturasindígenas e a sua relação ancestralcom a terra”.Nesse sentido, o Papa convidou afazer prevalecer ‘o direito aoconsenso prévio e informado’,assegurado na Declaração dosDireitos dos Povos Indígenas. “Osindígenas devem ser valorizados econsultados, ter plena participação,local e nacionalmente”, assinalou.Francisco afirmou que o IFAD podecontribuir com financiamento eassistência técnica, pois “umdesenvolvimento tecnológico eeconómico que não deixa um mundomelhor e uma qualidade de vidaintegralmente superior não se podeconsiderar progresso”.

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A Agência ECCLESIA escolhe sete acontecimentos que marcaram aatualidade eclesial internacional nos últimos dias, sempre atualizadosem www.agencia.ecclesia.pt

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Papa elogia papel do desporto na inclusão de pessoas com deficiência

Crianças interrompem audiência do Papa

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Perfil dos alunos à saída daEscolaridade Obrigatória

José Luís Gonçalves Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti

Promovido pelo Ministério da Educação, foiapresentado e colocado em discussão públicaum documento intitulado “Perfil dos alunos àsaída da Escolaridade Obrigatória”. Odocumento propõe um quadro de referência dascompetências a desenvolver pelos alunos, aolongo da escolaridade obrigatória de doze anos,traçando o seu perfil para o século XXI a partir dointerior das sociedades complexas que desejammanter em equilíbrio equidade e diversidade.Não sendo possível aprofundar, neste espaço,todo o alcance deste documento, optamos pordestacar-lhe telegraficamente duas virtualidadese uma limitação.A simplicidade da estrutura do documento –organizado em princípios, visão, valores,competências e respetivas aprendizagens, bemcomo os seus descritores operativos -, denotauma clarividência de intencionalidadeseducacionais só ao alcance de pessoas dacultura e de ideais como o é Guilherme d’OliveiraMartins, coordenador do grupo de trabalhoresponsável pelo documento. Este sublinhado saitanto mais reforçado quanto é afirmado, noprefácio, que “um perfil de base humanistasignifica a consideração de uma sociedadecentrada na pessoa e na dignidade humanacomo valores fundamentais”. Coerentemente,pese embora não separe, o documento há defazer a pessoa do aluno preceder a do cidadãona ordem destas esferas.

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Por outro lado, a tríade“conhecimentos, capacidades eatitudes”, retirada do esquemaconceptual de definição decompetências da OCDE “Education2030”, permite explicitar o perfil decompetências desejado. Odocumento, no entanto, não seidentifica nem com merascompetências operacionais/práticas– com foco no resultado e assentesnum conhecimento reduzido aosaber instrumental do ‘como’ – nemcom competências teóricas rígidascentradas nas proposições insípidasde um conhecimento cumulativo eestratificado. Pelo contrário,convoca os mundos de vida doaluno para dentro do seu processode aprendizagem – criatividade,reflexividade, emoção, sensibilidadeestética e ética – e outorgaresponsabilidades formativasespeciais aos atores do seucontexto, atribuindoao ethos escolar uma funçãoaxiologicamente determinante nesteâmbito. As implicações práticasdesta ótica estão descritas nodocumento e exigirão muito trabalhoaos professores…O documento, no entanto, omiteuma

dimensão fundamental da educaçãocontemporânea e que é a de levar apessoa à compreensão de si na suaintegralidade, promovendo nela aunidade do conhecimento com aespiritualidade (não confundir comreligiosidade), para além da suarealização como cidadão através deum laço social de natureza solidário.Se é verdade que o documentoassinala a necessidade de aqueleser capaz de “utilizar de modoproficiente diferentes linguagenssimbólicas”, e nos descritoresoperativos se explicita que estasdevem ajudar o aluno a“compartilhar sentidos nasdiferentes áreas do saber e exprimirmundividências”, a verdade é quenão se assume a dimensão daespiritualidade como estruturante naeducação. Educar para ainterioridade como forma de escutade si e de algo/alguém maior do quesi mesmo – um sentido último ouuma pertença –, e ser capaz de oidentificar e de o comunicar,constitui uma competência de maiorimportância. Há literacias que nãopodem deixar de ser promovidaspela escola do século XXI.

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Afirmar o jornalismo (ou fazer deconta)

Pedro Jerónimo Professor universitário e investigador de media e jornalismo

Passou um mês desde que os jornalistasportugueses se reuniram em congresso, coisaque já não acontecia há quase 20 anos. Foramtrês dias de (re)encontros, muito debate epropostas – para recuperar emwww.congressodosjornalistas.com. E depois?Uma das resoluções que de lá saiu foi o boicotea conferências de imprensa sem direito aperguntas. Mereceu aplausos, que entretanto seampliaram quando o Jornal de Barcelos decidiudeixar uma página em branco, guardadaprecisamente para dar conta do sucedido numaconferência de imprensa para o qual foraconvocado e na qual as perguntas deveriam deficar à porta. Muitos apelidaram de “coragem”,fazendo eco nas redes sociais online e daírapidamente chegou aos media nacionais. Masfoi sol de pouca dura. Dias volvidos, eram algunsdesses media a tratar e publicar notíciasresultantes de conferências de imprensa onde osjornalistas não puderam questionar osintervenientes – primeiro o antigo primeiro-ministro José Sócrates e depois a apresentadorade televisão Cristina Ferreira. Então e aresolução do congresso? Esquecimentogeneralizado (jornalistas a editores)?Procurando estar atento ao que se passa nosmedia e no jornalismo português em geral, e nosregionais e locais em particular, levei algumaspropostas para aquele congresso. É preciso: 1)Afirmar o jornalismo, junto dos jornalistas.Porque, entre outras coisas, é difícil decompreender e aceitar que jornalistas de meiosnacionais se sirvam de trabalhos desenvolvidospor colegas de meios

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regionais, sem indicar a origem –algo que já não sucede quando setrata de citar a concorrência ou osmeios internacionais, inclusivamenteregionais estrangeiros. 2) Afirmar ojornalismo, junto do poder central,organismos estatais e públicos. Nãoé admissível que seja vedado ouretardado o acesso a informaçãodaquelas instituições aosjornalistas, só porque trabalham emmeios

Durante a sessão “O jornalismo deproximidade e a profissão fora dosgrandes centros”, onde foi oradorprincipal.Foto: Joana Ochoa/ESCS

regionais ou locais. 3) Afirmar ojornalismo, no acesso aos títulosprofissionais. Por um lado, temosdiretores de publicações – comcarteira profissional de equiparado ajornalista – sem qualquer formaçãoou prática jornalística. Nunca leramo estatuto ou o código deontológicodo jornalista, mas dirigemjornalistas. Ou então criampublicações e fazem tudo sozinhos,desmultiplicando-se com frequênciapor atividades incompatíveis –segundo o estatuto do jornalista,este não pode angariar publicidade,por exemplo. Por outro, tambémtemos este tipo de cenárioenvolvendo pessoas com formaçãoe carteira profissional de jornalista.Resumindo, é preciso analisar casoa caso e não “meter tudo dentro domesmo saco”. A bem do rigor,honestidade e credibilidade.Volvido este mês, importará lembrarque o estado das coisas, que vaimuito além dos exemplos aquireferidos, não tem a ver só com osjornalistas ou com os responsáveisdos media. Envolve-nos a todos.Porque há coisas que osprofissionais têm a obrigação defazer e o público de exigir. E empleno ano de eleições autárquicas,toda a atenção é pouca. Aos media,aos jornalistas, aos partidospolíticos e aos candidatos.

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As palavras do ventríloquoe as ações de Francisco

Luís Filipe Santos Agência ECCLESIA

A ventriloquia é a arte de projetar a voz sem quese abra a boca ou se movam os lábios. Quandoisso acontece, até parece que o som sai de outrafonte falante. Quando vi a foto dos cartazes doPapa Francisco com um semblante carregado,pensei que ele estava a assistir a um espetáculodessa natureza: o ventríloquo e o seu «boneco»falante.Acredito que o Papa argentino – quase acompletar quatro anos de pontificado – goste doventríloquo, mas desconheço se acha graça aosbonecos que o artista tem – numa das suasmãos – para dar a noção que aquela figurapronuncia palavras. Mas pelo rosto, JorgeBergoglio não deve gostar de «bonecosfalantes» porque lhes falta o sopro dacriatividade e a ousadia necessária para ostempos contemporâneos.A voz metálica que parece sair da boca do«boneco» não ajuda a construir o bem comum,apenas se limita a repetir o que o ventríloquopretende. Os movimentos desarticulados do«companheiro» do artista mostram um deambularsigiloso e enigmático. O «boneco» faz tudo paraser o centro das atenções… Uma caricatura daatualidade egocêntrica. O «ajudante» doventríloquo pensa que o espetáculo gira à voltadele. Pobres «bonecos» que fazem tudo paraatrair atenções, mas não têm ideias.Terminada a atuação do ventríloquo e do seu«amigo falante», o boneco coloca-se em bicosdos pés para receber as palmas… Não fez nada,mas

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esteve no palco para receber osaplausos. Sintomas narcisistas quevisualizamos ao virar de cadaesquina. Agora percebo o rostosisudo do Papa. Vê muitos bonecosfalantes… Figuras que dizem: “Eunão sou contra nem a favor, muitopelo contrário!”No entanto, acredito, plenamente,que o seu rosto se transfigurava, deforma célere, se estivesse a assistiraos artistas do trapézio. Ajovialidade – uma das suas imagensde marca – voltava a brilhar nosseus olhos. A ousadia dostrapezistas tatuava naquele rostouma expressão de espanto. O papaargentino prefere a criatividade dosmovimentos e a forma arrojadacomo os corpos voam até encontrarum lugar seguro. Exercíciosousados… autênticas lições. Otrapézio é um vício. Apesar da ténuesegurança, os artistas aventuram-se

e voltam a saltar. Não ficam noprimeiro porto a pensarem nosaplausos.Suponho também que o rosto deFrancisco ficaria fascinado com osdomadores das feras enjauladas docirco. Pessoas que não têm medodo perigo e de arriscar, ao contráriodos bonecos «falantes» que seexibiam quando tiraram aquela fotoao cardeal Jorge Bergoglio.Em maio próximo, o homem vestidode branco aterra em Monte Real –um local periférico – para ir aocentro do catolicismo em Portugal,Santuário de Fátima. Tenho quase acerteza, que na bagagem traz umafotografia sorridente. Todavia, épreciso sublinhar que multidão rimacom cristão, mas não é sinónimo decristão.Um poeta português escreveu: «Nãohá caminhos fáceis para quem éresponsável».

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O Papa Francisco e a sua mensagem para a Quaresma de 2017estão no centro deste dossier do Semanário ECCLESIA.O texto deixa apelos à defesa da vida “frágil” e alerta paraas consequências negativas de uma vida centrada no “dinheiro”.A mensagem parte de uma passagem do Evangelho, sobre umhomem rico e um pobre, chamado Lázaro, que lhe pede ajudamas é ignorado.A partir destas ideias centrais, propomos uma série de questõespara ajudar a viver o tempo de preparação para a Páscoa,já com algumas indicações vindas de responsáveisdiocesanos em Portugal.

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A Palavra é um dom. O outro é umdomMensagem do Papa Francisco para a Quaresma de2017Amados irmãos e irmãs!A Quaresma é um novo começo,uma estrada que leva a um destinoseguro: a Páscoa de Ressurreição,a vitória de Cristo sobre a morte. Eeste tempo não cessa de nos dirigirum forte convite à conversão: ocristão é chamado a voltar paraDeus «de todo o coração» (Jl 2,12), para não se contentar com umavida medíocre, mas crescer naamizade com o Senhor. Jesus é oamigo fiel que nunca nos abandona,pois, mesmo quando pecamos,espera pacientemente pelo nossoregresso a Ele e, com esta espera,manifesta a sua vontade de perdão(cf. Homilia na Santa Missa, 8 dejaneiro de 2016).A Quaresma é o momento favorávelpara intensificar a vida espiritualatravés dos meios santos que aIgreja nos propõe: o jejum, a oraçãoe a esmola. Na base de tudo istoestá a Palavra de Deus, que somosconvidados a ouvir e meditar commaior assiduidade neste tempo.Aqui gostaria de me deter, emparticular, na parábola do homemrico e do pobre Lázaro (cf. Lc 16,19-31). Deixemo-nos inspirar poresta página tão

significativa, que nos dá a chavepara compreender como agir paraalcançarmos a verdadeira felicidadee a vida eterna, exortando-nos auma sincera conversão. 1. O outro é um domA parábola começa com aapresentação dos dois personagensprincipais, mas quem aparecedescrito de forma mais detalhada éo pobre: encontra-se numacondição desesperada e sem forçaspara se levantar, jaz à porta do ricoe come as migalhas que caem dasua mesa, tem o corpo coberto dechagas que os cães vêm lamber (cf.vv. 20-21). Enfim, o quadro ésombrio e o homem é degradado ehumilhado.A cena revela-se ainda maisdramática, se se considera que opobre se chama Lázaro: um nomecarregado de promessas, queliteralmente significa «Deus ajuda».Assim, este personagem não éanónimo, tem traços muito precisose apresenta-se como um indivíduo aquem podemos associar umahistória pessoal. Enquanto que parao rico ele é invisível, torna-seconhecido e quase

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familiar para nós, torna-se um rosto;e, como tal, um dom, uma riquezainestimável, um ser querido, amado,recordado por Deus, apesar da suacondição concreta ser a dumaescória humana (cf. Homilia naSanta Missa, 8 de janeiro de 2016).Lázaro ensina-nos que o outro é umdom. A justa relação com aspessoas consiste em reconhecercom gratidão o seu valor. O própriopobre à porta do rico não é umempecilho fastidioso, mas um apeloa converter-se e a mudar de vida. Oprimeiro convite que nos faz estaparábola é o de abrir a porta donosso

coração ao outro, porque cadapessoa é um dom, seja o nossovizinho seja o pobre desconhecido.A Quaresma é um tempo propíciopara abrir a porta a cadanecessitado e nele reconhecer orosto de Cristo. Cada um de nósencontra-o no próprio caminho.Cada vida que vem ao nossoencontro é um dom e mereceacolhimento, respeito, amor. APalavra de Deus ajuda-nos a abriros olhos para acolher a vida e amá-la, sobretudo quando é frágil. Mas,para se poder fazer isto, énecessário tomar a sério tambémaquilo que o Evangelho nos revela apropósito do homem rico.

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2. O pecado cega-nosA parábola põe em evidência, sempiedade, as contradições em que seencontra o rico (cf. v. 19). Estepersonagem, ao contrário do pobreLázaro, não tem um nome, équalificado apenas como «rico». Asua opulência manifesta-se nasroupas que usa, de um luxoexagerado. De facto, a púrpura eramuito apreciada, mais do que aprata e o ouro, e por

isso estava reservada para osdeuses (cf. Jr 10, 9) e os reis(cf. Jz 8, 26). O linho fino era umlinho especial que ajudava aconferir à posição da pessoa umcaráter quase sagrado. Assim, ariqueza deste homem é excessiva,até porque era exibida todos os diasde modo habitual: «Fazia todos osdias esplêndidos banquetes» (v.19). Entrevê-se nele,dramaticamente, a corrupção

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do pecado, que se realiza em trêsmomentos sucessivos: o amor aodinheiro, a vaidade e asoberba (cf. Homilia na SantaMissa, 20 de setembro de 2013).O apóstolo Paulo diz que «a raiz detodos os males é a ganância dodinheiro» (1 Tm 6, 10). Esta é omotivo principal da corrupção efonte de invejas, litígios e suspeitas.O dinheiro pode chegar a dominar-nos até ao ponto de se tornar umídolo tirânico (cf. Exortaçãoapostólica Evangelii gaudium, 55).Em vez de ser um instrumento aonosso dispor para fazer o bem eexercer a solidariedade com osoutros, o dinheiro pode-nossubjugar, a nós e ao mundo inteiro,numa lógica egoísta que não deixaespaço para o amor e dificulta apaz.Depois, a parábola mostra-nos quea ganância do rico torna-o vaidoso.A sua personalidade vive deaparências, fazendo ver aos outrosaquilo que se pode permitir. Mas aaparência mascara o vazio interior.A sua vida está prisioneira daexterioridade, da dimensão maissuperficial e efémera da existência(cf. ibid., 62).O degrau mais baixo destadeterioração moral é a soberba. Ohomem veste-se como se fosse um

rei, simula a posição de um deus,esquecendo-se que é um simplesmortal. Para o homem corrompidopelo amor das riquezas, nada maisexiste além do próprio eu e, porisso, as pessoas que o rodeiam nãoentram no seu olhar. Assim, o frutodo apego ao dinheiro é uma espéciede cegueira: o rico não vê o pobreesfomeado, chagado e prostrado nasua humilhação.Olhando este personagem,compreende-se por que motivo oEvangelho é tão claro ao condenaro amor ao dinheiro: «Ninguém podeservir a dois senhores: ou nãogostará de um deles e estimará ooutro, ou se dedicará a um edesprezará o outro. Não podeisservir a Deus e ao dinheiro» (Mt 6,24). 3. A Palavra é um domO Evangelho do homem rico e dopobre Lázaro ajuda-nos aprepararmo-nos bem para a Páscoaque se aproxima. A liturgia deQuarta-Feira de Cinzas convida-nosa viver uma experiência semelhanteà que faz de forma tão dramática orico. Quando impõe as cinzas sobrea cabeça, o sacerdote repete estaspalavras:

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«Lembra-te, homem, que és pó daterra e à terra hás de voltar». Defacto, tanto o rico como o pobremorrem, e a parte principal daparábola desenrola-se no além. Osdois personagens descobremsubitamente que «nada trouxemosao mundo e nada podemos levardele» (1 Tm 6, 7).Também o nosso olhar se abre parao além, onde o rico tem um longodiálogo com Abraão, a quem tratapor «pai» (Lc 16, 24.27), dandomostras de fazer parte do povo deDeus. Este detalhe torna ainda maiscontraditória a sua vida, porque atéagora nada se tinha dito da suarelação com Deus. Com efeito, nasua vida não havia lugar para Deus,sendo ele mesmo o seu único deus.Só no meio dos tormentos do além éque o rico reconhece Lázaro equeria que o pobre aliviasse osseus sofrimentos com um pouco deágua. Os gestos solicitados aLázaro são semelhantes aos que orico poderia ter feito, mas nunca fez.Abraão, porém, explica-lhe:«Recebeste os teus bens na vida,enquanto Lázaro recebeu somentemales. Agora, ele é consolado,enquanto tu és atormentado» (v.25). No além restabelece-se umacerta equidade

e os males da vida sãocontrabalançados pelo bem.A parábola continua, apresentandouma mensagem para todos oscristãos. De facto o rico, que aindatem irmãos vivos, pede a Abraãoque mande Lázaro avisá-los; masAbraão respondeu: «Têm Moisés eos Profetas; que os oiçam» (v. 29).E face à objeção do rico acrescenta:«Se não dão ouvidos a Moisés eaos Profetas, tão-pouco se deixarãoconvencer, se alguém ressuscitardentre os mortos» (v. 31).Deste modo se manifesta overdadeiro problema do rico: a raizdos seus males é não escutar aPalavra de Deus; isto levou-o adeixar de amar a Deus e,consequentemente, a desprezar opróximo. A Palavra de Deus é umaforça viva, capaz de suscitar aconversão no coração dos homense de orientar de novo a pessoa paraDeus. Fechar o coração ao dom deDeus que fala tem comoconsequência fechar o coração aodom do irmão.Amados irmãos e irmãs, aQuaresma é o tempo favorável paranos renovarmos no encontro comCristo vivo na sua Palavra, nosSacramentos e no próximo. OSenhor – que nos quarenta diaspassados no deserto venceu asciladas do Tentador

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– indica-nos o caminho a seguir.Que o Espírito Santo nos ajude arealizar um verdadeiro caminho deconversão, para redescobrir o domda Palavra de Deus, ser purificadosdo pecado que nos cega e servirCristo presente nos irmãosnecessitados. Encorajo todos osfiéis a expressar esta renovaçãoespiritual, participando também nasCampanhas de Quaresma quemuitos organismos eclesiais, emvárias partes do mundo, promovempara fazer crescer

a cultura do encontro na únicafamília humana.Rezemos uns pelos outros para que,participando na vitória de Cristo,saibamos abrir as nossas portas aofrágil e ao pobre. Então poderemosviver e testemunhar em plenitude aalegria da Páscoa. Vaticano, 18 de outubro de 2016,Festa do Evangelista São Lucas

Papa Francisco

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Deus ajuda

A mensagem do Papa para aQuaresma intitula-se muitosugestivamente “A palavra é umdom. O outro é um dom”. Duasasserções unidas pelo ideal dajustiça e pelo amor a Deus. Ou, poroutras palavras, juntando tempo derenovação, de conversão e depurificação.No texto, Francisco chama,veementemente, a atenção para omal que advém da idiolatria dodinheiro, do egocentrismo dopossuir e da

indiferença perante o outro. Paraisso, recorda-nos a parábola deJesus sobre o homem rico (semnome) e o homem pobre (comnome, Lázaro, que quer dizer “Deusajuda”).O Papa adverte para a primazia dodinheiro e da ostentação materialcomo “o motivo principal dacorrupção e fonte de invejas, litígiose suspeitas. O dinheiro pode chegara dominar-nos até ao ponto de setornar um ídolo tirânico”.

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O nosso viver confronta-seinvariavelmente entre a liberdade dese ser, a necessidade de se ter, aresponsabilidade de se dar, acapacidade de se fazer, a exigênciade se saber, o impulso de se amar.Num tempo cada vez mais dominadopelas tecnologias poderosas e pelaobsessão da circunstância, é,sobremaneira, entre o ser e o terque nos vemos constantementedesafiados.A economia da troca, tantas vezessem regras morais e sem umaaragem sequer de sensibilidadepara com os mais pobres, tem deser completada com a economia dodom de que Francisco nos fala nasua Mensagem.O dom do outro está associado auma ética generosamenteassimétrica: eu e o outro, eu e otodo. Não só dando ao outro o quedele é (justiça), como dar ao outro oque nosso é (caridade). Mastambém, fortalecendo uma autênticaeconomia do dom, que promova oprincípio ético da gratuitidade (darsem perder e receber sem tirar).No fundo, estamos sempreconfrontados com os princípiosfundamentais do ensinamento socialda Igreja: centralidade e dignidadeda pessoa, prossecução plena dobem

comum, destinação universal dosbens e opção preferencial pelosúltimos, pelos Lázaro da parábola.“Em vez de ser um instrumento aonosso dispor para fazer o bem eexercer a solidariedade com osoutros, o dinheiro pode-nossubjugar, a nós e ao mundo inteiro,numa lógica egoísta que não deixaespaço para o amor e dificulta a paz”, sublinha o Papa Francisco.Por isso, é imperativo combater aindiferença e o relativismo, aditadura da aparência, o vazio dointerior. O dinheiro e o progressotecnológico são meios para o bemcomum, não fins que escravizempelo excesso (o rico da parábola) oupela carência (o Lázaro daparábola).Investiu-se no progresso, mas tem-se desinvestido no espírito. Só apartir do nosso interior se faz amudança exterior. Ou, como concluio Papa, “a raiz dos seus males énão escutar a Palavra de Deus”. António Bagão Félix (por decisão do autor, texto escritocom a grafia anterior ao AcordoOrtográfico)

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Em busca da Ressurreição!"O próprio pobre à porta do rico não é um empecilho fastidioso,mas um apelo a converter-se e a mudar de vida."(Da mensagem do Papa Francisco para a Quaresma de 2017) Alguém que nos atrapalha,incomoda ou estorva é,normalmente, um “empecilho”. E, seesse “empecilho” é fatigante,maçador e rabugento, podemosqualificá-lo de “fastidioso”. Evejamos se esses “empecilhosfastidiosos” não abundam por aí: osfamintos, os sem abrigo, osdrogados, os alcoólicos, osimigrantes, os presos, os quepertencem a minorias étnicas, osque têm outra religião, os que nãofazem as manobras certas e emtempo real na azáfama do trânsito,alguns que trabalham a nosso lado,alguns que nos batem à porta e atéalguns que estão dentro da nossaprópria casa. E assim vamosvivendo no meio de tantos“empecilhos fastidiosos” oraocultando-os da nossa vista, oravociferando contra eles, ora,simplesmente, sendo-lhesindiferentes. E assim se vãopassando os dias, meses, anos, avida, sem darmos conta que estaparábola do Além é bem daqui. O“empecilho fastidioso”, mais do queuma categoria, é um ser particular,

com um nome concreto e umahistórica concreta. O que oconsidera como tal, também, peseembora a sua indefinição. O“empecilho fastidioso” é um desafioà nossa capacidade de atenção e,sobretudo, à nossa identidadehumana e cristã. O “Lázaro” emparticular e o rico em geral, tocam-se a cada momento, sem que estequeira dar conta daquele. Noentanto, a relação entre ambos,como diz o Papa Francisco, é “achave para compreender como agirpara alcançarmos a verdadeirafelicidade e a vida eterna”. O outroque se encontra, sobretudo, nasituação de fragilidade, é aoportunidade para dar sentido àvida do rico, pois, o do “pobre” estágarantido. O “empecilho fastidioso”é um autêntico “dom” para aqueleque se encontra com ele. Nesteencontro com o outro podeacontecer o encontro de si. Aqui sepoderá perscrutar, atrevo-me adizer, uma espécie de Teologia do“empecilho fastidioso” como coraçãodo Evangelho. Aqui podemosenquadrar

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o “pobre”, o “frágil” e o “excluído”.Aqui podemos enquadrar o “rico”, o“soberbo” e o “vaidoso”. Aquipodemos dar conta de uns e deoutros. Aqui podemos dar conta denós. Assim queiramos ver. Assim

queiramos ouvir. Assim queiramosdar conta. Nesta quaresma e nãosó. Em busca da Ressurreição!…

Paulo Neves

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A fragilidade como valor da vidahumana

O que é ser humano? Esta não éuma mera pergunta teórica,reservada a diálogos filosóficos ousociológicos ou a quaisquerinvestigações científicas. Esta é apergunta. A pergunta a que cadaum de nós tem de dar uma respostaconcreta na vida de todos os dias eque a nossa história individualexprime e concretiza. É esta,também, a pergunta central queorganiza uma sociedade e aconstrói.

Ser humano é ser frágil; é ser finito!Condições que não estão apenaspresentes em situações-limite dedoença ou da proximidade com amorte, mas que são próprias dacondição humana desde que senasce. Não passamos a ser frágeise finitos; somos frágeis e finitos. Elimitados. Assim, assumir a nossafragilidade não é assumir umfracasso, mas entender umarealidade que nos é própria,

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que nos define e nos confere umadignidade que necessita decuidado, como tarefa da vida decada pessoa e de uma sociedadeque se quer verdadeiramentehumana.Assistimos, hoje, contudo, aprofundas e vertiginosastransformações culturais, quealteram a relação entre os sistemasde organização da sociedade e avida humana concreta, com gravesproblemáticas e perigosasconsequências. Marcada por umavisão negativa do ser humano,acompanhada de uma ausência desentido para a vida, a sociedadedeixa de tratar cada ser humanocomo um dom irrepetível, parecendohaver vidas ou momentos da vidaque já não fazem sentido servividas.Centrada e promovendo o sucessoe a “performance” em todas asáreas da vida, a sociedade actualvê-se incapaz de lidar com asfragilidades do ser humanoconcreto, sendo mais fácil e maisbarato descartá-lo quando já nãotem “utilidade” para a “economiaprodutiva”.Importa, então, reflectir sobre apretensão que o poder político temvindo a manifestar em legalizar aeutanásia, mostrando como,também neste campo, o “sistema”pretende

colonizar o “mundo da vida”,sobretudo a vida dos maisvulneráveis, os doentes, físicos oupsíquicos e, sobretudo os maisidosos, porque menos produtivos emais onerosos, numa sociedadeonde impera o valor do dinheiro.Nesta quaresma, o Papa Francisco,chama a atenção do mundo para a“riqueza inestimável” que é o outro,seja qual for a sua condiçãoconcreta, desafiando-nos, nessesentido, para a necessidadeimperativa de “abrir os olhos paraacolher a vida e amá-la, sobretudoquando é frágil”.Aos médicos é dado o privilégio depoder ver e tocar a fragilidade decada pessoa que se confia aos seuscuidados, reconhecendo a imensadignidade de cada ser humano (quea doença não modifica nemtransforma), a ela dedicando a suaactividade profissional, entendendoque a prática da eutanásia é, emtodas as circunstâncias, umaagressão radical contra a vidahumana, não podendo nuncaaceitar uma visão limitada e,sobretudo, uma visão negativa dela;a sua missão é sempre cuidar davida.

Sofia Reimão

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“Cada vida que vem ao nosso encontro éum dom e merece acolhimento,respeito, amor”Esta frase do Papa Francisco, tiradada sua mensagem para a quaresmadeste ano, é profundamenteinspiradora para a nossa vivênciacristã e um verdadeiro suporteespiritual para muitas instituiçõesque se dedicam ao acolhimento dosmigrantes e refugiados no nossopaís.Quando o Papa recorda ostradicionais meios, como a oração, ojejum, a esmola, como caminho deconversão no seguimento de Jesus,é necessário entender hoje, deforma adequada, o conteúdo destasrealidades. Para isso, ele escolhecomo ponto de partida a tãoconhecida parábola do homem ricoe do pobre Lázaro (Lc.16,19-31)que nos dá a chave parapercebermos melhor o convite auma verdadeira conversão. 1 – O Outro é um dom – Estaparábola apresenta-nos como queduas cenas com dois personagens:o rico e o pobre, chamado Lázaro.São dois estilos de vida totalmenteopostos. A primeira cena desenrola-se no mundo presente em que umhomem vive na riqueza e naopulência. É um homem cego pelodinheiro que vai

corrompendo a sua vida a tal pontoque para ele não existe maisninguém, nem sequer o pobreesfomeado, prostrado e humilhadoque, à sua porta, pede ajuda ecompaixão. 2 – O pecado cega-nos - OEvangelho faz notar que este riconão tem nome! Porquê? Porque asua identidade de ser humano,criado à imagem e semelhança deDeus, está completamente destruídapelo egoísmo que domina e esvaziaa sua vida. Ele vive para as riquezase o dinheiro; vive para si mesmo.Deus e os outros não têm lugar nasua relação.É curioso notar que o Evangelhodedica uma longa apresentação dopobre chamado Lázaro (quer dizer“Deus ajuda”). Este homem temnome porque embora sendo pobre,tem a sua história pessoal marcadapelo infortúnio, desprezo emarginalização. Ele está à porta dorico na esperança de ao menoscomer as migalhas que caem damesa dele, mas é recebido peloscães que vêm lamber-lhe as feridas.O rico não lhe abre a porta para oescutar e perceber o seu problema.Simplesmente o despreza.

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3 – A Palavra é um dom –Entramos na segunda cena daParábola que nos recorda arealidade da vida humana, isto é,somos mortais. O homem rico e opobre Lázaro morrem. É isso quenos recorda o gesto da imposiçãodas cinzas sobre as nossas cabeçasna quarta-feira de cinzas. Nestacena, o nosso olhar abre-se aoAlém, à Eternidade. Agora sim, orico mostra-se só e abandonado. Eclama por Deus, a quem nuncaligou, a Abraão, a Lázaro…paraaliviarem as suas dores e enviaremalguém para advertir os seusenquanto é tempo. Mas a respostaé

clara: “Têm Moisés e os Profetas,que os oiçam”, o mesmo é dizer quetêm a Igreja e é preciso escutá-la.A reflexão do Papa Francisco à luzdesta parábola é muito oportunapara percebermos o rumo do mundocontemporâneo e os desafios quecoloca a todos nós cristãos sequeremos mesmo ser discípulos deCristo.Vivemos num mundo que nospreocupa. Os radicalismosideológicos e religiosos que levam àintolerância parecem acentuar-secada vez mais. Como consequênciadisso, vemo-nos

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envolvidos numa situação derutura das relações humanas entrepovos e nações. Daí, a deslocaçãode povos em massa para buscarsegurança e melhores condições devida. Estes migrantes e refugiadossão, na verdade os “Lázaros” donosso tempo que vêm bater àsportasdos países mais estáveis e ricos.Mas o que acontece? Algunscomportam-se como o “homem rico”e negam-se a abrir-lhes as portasdas fronteiras reforçando-as commuros inultrapassáveis… É esteespetáculo vergonhoso a queestamos assistindo, mas nãopodemos ficar insensíveis. Quepodemos fazer?O Papa Francisco convida-nos aolhar para estes “Lázaros” que sãoum grande dom para nós. Estaspessoas são um forte convite avivermos a quaresma inquietos coma sua situação e aprendermos aviver na prática o sentido doverdadeiro jejum e esmola. Hojegastamos tanto tempo na utilizaçãodas redes sociais, internet…talveztenhamos de jejuar

reduzindo esse tempo gasto, muitasvezes sem interesse, para nosdedicarmos mais à escuta daPalavra de Deus, à oração e a fazero bem a quem precisa; darmos “esmola”, ou seja, um pouco de nósmesmos para minorarmos osofrimento dos outros ajudando-oscom os nossos dons e capacidadespessoais, mesmo de ordem materiale trabalharmos para darmos overdadeiro nome a estas pessoasno respeito pela sua identidade depessoas humanas.É este o objetivo do Centro PadreAlves Correia -CEPAC[1] que acolhemigrantes e refugiados que, pelofacto de não terem documentos(como se não tivessem “nome”), têmmais dificuldade em se inserir nasociedade portuguesa. Por issomesmo, estas pessoas encontram-se em situação muito difícil eprecisam de todo o tipo de ajuda:assistência médica, logística,alimentação, vestuário…Atualmente, o CEPAC acolhe eajuda cerca de 400 famílias

[1] O Centro P. Alves Correia nasceu nos anos 60 para acolher, sobretudo osmigrantes de Cabo Verde, Angola, Guiné… Hoje, mais estruturado, com instalaçõespróprias, acolhe migrantes e refugiados do mundo inteiro que buscam no nosso paíssegurança e melhores condições de vida - www.cepac.pt.

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em colaboração com o bancoalimentar, banco de roupa próprio,escola de costura, assistênciamédica, documental e busca detrabalho através de um gabinetepara esse efeito. É um serviçoprestado à base de voluntariado.Felizmente temos um bom grupo deprofissionais voluntários que sededicam na gratuidade, nadiscrição, muito na linha do quepede o Papa Francisco para queestas pessoas sejam reconhecidasna sua dignidade.Apesar de tantas dificuldades e

limitações, sobretudo, de ordemfinanceira contamos com a ajuda daSegurança Social e a partilha demuitos benfeitores, muitos delescanalizam para esta causa os tais0,05 do seu IRS, sensíveis a estacausa humanitária. Isto é muitogratificante e dá-nos força ecoragem para continuarmos esteserviço de amor ao próximoquaisquer que sejam as dificuldadese desafios.

P. José Lopes de SousaDireção do CEPAC

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Da hostilidade à hospitalidade“O amor pelo nosso país é umacoisa maravilhosa. Mas por quedeve o amor parar na fronteira?”(Pablo Casals) Hostilidade e Hospitalidade são doisconceitos foneticamentesemelhantes, mas que não podiamser mais antitéticos. As constantesviolações dos direitos humanos faceaos refugiados levam-me, enquantoresponsável pelo Serviço Jesuítaaos Refugiados (JRS), a fazer umabreve reflexão sobre a hostilidadeexercida sobre estas pessoas e, emoposição, sobre a importância detrazer para o espaço público a ideiada hospitalidade como valorfundamental a defender e a colocarem ação nas nossas sociedades. Ahospitalidade tem sido a bandeirasobre a qual se encontram váriasdimensões do trabalho a favor daspessoas migrantes que o JRSdesenvolve.É importante, antes de mais,começar por refletir sobre o próprioconceito de fronteiras. Estasconverteram-se em lugares de dor emorte, representando o conceito emsi mesmo um duplo paradoxo. Pormais altas e reforçadas, asfronteiras não

param o fluxo de migrantes. Osmuros têm maior poder simbólico doque efetivo, mantêm a aparência decontrolo, mas sabemos que aspolíticas de controlo são muitoineficazes. Sabemos, igualmente,que perante uma fronteira física ousimbólica, quem procura salvar avida e obter proteção acaba porencontrar caminhos alternativos. Asfronteiras serviram também parafavorecer o negócio dos traficantese passadores, apesar de a retóricaque constrói a hostilidade querertransmitir a ideia contrária.Perguntam-nos então,legitimamente, se devemos abrir asfronteiras. Esta questão levantasempre medo e insegurança. Nãohá dúvidas que cabe ao estado odever de controlar as suasfronteiras, mas cabe também aosestados o dever de respeitar eproteger os direitos humanos.É por isso, essencial, que exijamosque qualquer medida de regulaçãoda circulação de pessoas sejacompatível com os direitos humanose seja sujeita a um controlo legal,judicial e político que seja efetivo. Éfundamental situar a questãotambém em termos de justiça socialinternacional.Além da construção efetiva ou

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simbólica destas fronteiras e doendurecimento das suas políticas decontrolo, temos vindo a assistir,igualmente, à construção da ideiade hostilidade face aos refugiados,através de discursos públicos e depráticas que estigmatizam e que seautoalimentam. Não é necessárioelencar exemplos, porque todossomos testemunhas do que tem sidofeito e dito na Europa e que temcontribuído para a indignação facea estas pessoas.Por outro lado, e felizmente, temosassistido também a uma respostasocial que envia sinais positivos deacolhimento e de solidariedade que,em parte, podem contribuir para quealgumas políticas sejam mudadas.Talvez a crise das pessoasrefugiadas atual e, obviamente, agravidade e a urgência de açõesque em si encerra, nos possa levara perceber que a mobilidade depessoas, e não só causada pelaguerra, venha a pautar o futuro docontinente europeu. E que, comisso, virá uma inadiável urgência dereplantar os princípios, valores epolíticas que afetam esta realidadee sobre os quais a ideia europeia foifundada.É aqui que a tradição dahospitalidade surge e encontra oseu lugar. Aquele que pode parecerhoje um valor em desuso, renegadopara segundo plano, tem mostradoserenamente

que não está esquecido, atravésdos inúmeros gestos de pessoas ecomunidades que abrem as portasde casa e os seus corações aoestrangeiro. Hospitalidade é alargaro conceito de “nós”. É o acolhimentodo diferente de mim, é lembrarmo-nos que acolhemos porque fomosacolhidos pelos nossos pais,comunidade e sociedade. Perante oideal de uma vida segura contratodos os riscos, a ideia dehospitalidade recorda-nos a nossacondição de dependentes enecessitados.E esta é a primeira condição para aconstrução da hospitalidade:ligarmo-nos à nossa condição deseres vulneráveis e necessitados decuidados sem nos esquecermos deque precisamos do outro, dosoutros, para viver. Não sóindividualmente, mas enquanto umanação ou sociedade.A segunda prende-se com o valorda hospitalidade enquantoexpressão pública, através das leise instituições. As práticas pessoais ecomunitárias são o substrato para aconstrução da política pública. Éurgente questionarmo-nos como sepode fazer a ponte entre estasiniciativas pessoais, comunitárias,locais e as responsabilidadespúblicas.Fazendo esta ponte, a hospitalidadepode dissolver fronteiras. André Costa Jorge, diretor-geral do

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Fazer da Quaresma um tempo demisericórdia centrado nos maisnecessitadosO bispo de Bragança-Mirandadesafiou as comunidades católicasda região transmontana a fazeremda preparação para a Páscoa umtempo aberto à misericórdia, tendocomo modelo Maria, e propôs comosinal concreto que a renúnciaquaresmal deste ano seja destinadaà Cáritas Diocesana e ao apoio amilhares de pessoas necessitadas.De acordo com um comunicadoenviado à Agência Ecclesia, aqueleorganismo sociocaritativo da IgrejaCatólica presta atualmente auxílio “amais de 17 mil pessoas”, comoindicam os dados relativos a 2016.D. José Cordeiro destaca sobretudoas pessoas que enfrentam o“desenprego sem subsídio”, assituações de “trabalho precário” oude “baixos salários” e as famíliascujo “rendimento é insuficiente” parafazer “face a despesas essenciais”.No território transmontano existemainda outros desafios, apontadospelo bispo de Bragança-Miranda,como “a baixa escolaridade” e o

“analfabetismo” que marca umafranja da população, “e problemasrelacionados com a saúde”.“Muitas das situações, são oschamados casos de pobrezaenvergonhada, devido aodesemprego e extinção de postosde trabalho”, e que “têm aumentadode forma significativa”, apontou D.José Cordeiro.O responsável católico recorda queos tempos da Quaresma e daPáscoa, além de oportunidades de“oração”, de “expetativa pelo domdo Espirito da Igreja nascente” e defesta pela “ressurreição do Senhor”,são também ocasiões propícias àconcretização das obras damisericórdia.D. José Cordeiro pede por isso “oenvolvimento de todos” no auxílioaos mais necessitados da regiãotransmontana, ainda mais numaaltura em que “muitos dos apoiosexistentes foram extintos, o quedificulta o atendimento a situaçõesmuitas vezes de desespero”.O programa da Diocese de

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Bragança-Miranda para a vivênciada Quaresma e da Páscoa 2017tem como tema ‘Celebrar e viver aPáscoa, com Maria e como Maria’, einclui propostas de reflexão acercada

Palavra de Deus (lectio divina)dinamizadas por grupos de jovens,instituições de acolhimento decrianças e jovens e pelosmovimentos diocesanos.

A Quaresma, que começa com a celebração de Cinzas (1 de março, em2017), é um período de 40 dias, marcado por apelos ao jejum, partilha epenitência, que serve de preparação para a Páscoa, a principal festa docalendário cristão. Neste contexto, surge a renúncia quaresmal, práticaem que os fiéis abdicam da compra de bens adquiridos habitualmentenoutras épocas do ano, reservando o dinheiro para finalidadesespecificadas pelo bispo da sua diocese.

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Quaresma com visita do Papa nohorizonte

O bispo do Porto desafiou ascomunidades diocesanas a preparara vinda do Papa Francisco aPortugal e ao Santuário de Fátima,por ocasião do Centenário dasAparições, durante o próximo tempoda Quaresma e da Páscoa. “Temospresente o desejo já manifestado doPapa Francisco de ser peregrinocom os peregrinos de Fátima, emPortugal, no próximo

mês de maio”, escreve D. AntónioFrancisco dos Santos, que convidaas suas paróquias a uma caminhadade aprofundamento da fé, a partirdos sacramentos de iniciação cristã.Numa carta pastoral publicadaonline, o prelado destaca trêsatitudes essenciais que os cristãosdevem ter neste tempo, “saborear”,“partilhar” e “revitalizar” as graçasrecebidas

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através dos sacramentos dobatismo, do crisma e da primeiracomunhão.D. António Francisco dos Santosrealça que, “para aqueles que jásão batizados, crismados ealimentados na Eucaristia, aQuaresma é oportunidade de sedeixarem renovar nas fontes daalegria”. Já a Páscoa é um tempo“propício” para levar a todos, com“chave missionária”, o que significaser cristão, para que esses sinais“transbordem e irradiem, ao longe eao largo”.O responsável católico recorda que“Maria tem um lugar insubstituívelneste caminho” e sustenta que avisita do Papa ajudará acompreender melhor aquilo “que amensagem de Fátima oferece àIgreja e ao mundo”. Nesse contexto,D. António Francisco

espera que “cada grupo,comunidade ou movimento, a seujeito, e no seu ritmo, mas todosjuntos” aproveite esta oportunidadede caminho.Para que ele ajude “a fortalecer acomunhão diocesana e a intensificara aprendizagem pastoral, nestaamada Diocese do Porto, quedeseja avançar, com Maria, emcaminho sinodal”, exorta o bispo. Napágina online da Diocese do Porto,é possível encontrar e descarregaros materiais da caminhada propostapara a Quaresma e a Páscoa, queinclui a meditação do Rosário.D. António Francisco dos Santospede a “meditação de, pelo menos,um mistério do rosário por semana,de modo a revitalizar a família, comoIgreja orante”.

Os secretariados diocesanos de Catequese de Leiria-Fátima, Lisboa,Portalegre-Castelo Branco, Santarém e Setúbal desafiam crianças eadolescentes a uma preparação da Páscoa centrada em Maria e noCentenário das Aparições de Fátima.Segundo a campanha apresentada pelo Secretariado Nacional daEducação Cristã, a ideia é que os mais novos “vivam a Quaresma e aPáscoa ao ritmo da liturgia dominical e iluminados pelas Aparições deNossa Senhora”. Um caminho em que vão ter oportunidade de“aprofundar o conhecimento” acerca das aparições marianas na Cova daIria, e o seu significado 100 anos depois.

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Por uma Internet Mais Segurahttp://www.internetsegura.pt/

Sob o lema “Marca a Diferença:Unidos por uma Internet Melhor”celebrámos, no passado dia 7 defevereiro, o Dia Europeu da InternetMais Segura. O objetivo destajornada passou por “promover asensibilização e aconsciencialização para umautilização mais segura da Internetpelos cidadãos, em particularcrianças e jovens”.Porque cada vez mais temos deestar alerta para esta realidade quenos acompanha diariamente, estasemana sugiro uma visita ao espaçovirtual da responsabilidade doconsórcio coordenado pela FCT –Fundação para a Ciência eTecnologia. O projeto InternetSegura tem como principaisobjetivos: combater os conteúdosilegais; minimizar os efeitos deconteúdos ilegais e lesivos noscidadãos; promover a utilizaçãosegura da Internet e consciencializara sociedade para os riscosassociados à utilização da Internet.Quanto entramos no sítiowww.internetsegura.pt, além dashabituais notícias sobre estudos

e programas em curso na área dasnovas tecnologias no âmbito doprojeto internet segura, e oseventos mais próximos, o grandedestaque é dado ao espaço “LinhaInternet Segura”. Uma visibilidadeque faz sentido pois este novoserviço tem como objetivos: “Prestarapoio telefónico ou online, de formaanónima e confidencial, a crianças,jovens, pais e professores, sobrequestões relacionadas com o uso datecnologia; Informar ativamente osutilizadores (crianças, jovens, pais eprofessores) sobre a atividade dalinha de apoio e de como entrar emcontacto; Dispor de um sistema pararemeter ocorrências graves àsautoridades competentes quandouma criança parecer estar emperigo; Analisar, discutir e fornecerresultados que contribuam para asestratégias de sensibilização naárea da Internet Segura”..Para conhecer melhor todo esteextraordinário projeto, basta queclique em “sobre internet segura”.Aqui pode perceber qual a suamissão e visão, qual a estratégiaassociada, quais os projetos em

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desenvolvimento e ainda quem sãoos parceiros.Na opção “riscos e prevenção”, sãoexplicadas, de uma forma bastanteelucidativa, algumas ferramentasdigitais usadas pela maioria daspessoas (redes sociais, blogues,smartphones, chats, jogos, vírus,etc.). Uma área vital porque énecessário conhece-las e sabercomo as devemos usar para que anossa segurança não esteja postaem causa.Na secção “recursos online”, temosacesso a vários conteúdos que têmcomo mote a disponibilização de“um conjunto de recursos quepodem ser mobilizados para aaprendizagem pessoal, mas tambémsensibilizar outros”, como forma decriar “mais

familiaridade com as temáticas dasegurança na utilização da Internete das tecnologias da informação eda comunicação”.Usem e abusem na leitura e estudodeste projeto, pois as atividades quesão desenvolvidas por adultos,adolescentes e jovens, com orecurso da internet, são múltiplas.No entanto, como a sua utilizaçãopode envolver alguns riscos, aprevenção e a sensibilização parauma navegação mais segura econsciente, é a melhor forma de seevitarem eventuais problemas.

Fernando Cassola [email protected]

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O Visionário de NampulaA obra «Manuel Vieira Pinto: OVisionário de Nampula», da autoriado padre José Luzia, vai serlançada, no dia 21 deste mês, noCentro de Cultura Católica no Porto.Com a chancela da PaulinasEditora, o livro vai ser apresentado,pelas 21h00, por Mário Robalonuma sessão que conta com apresença de D. António Franciscodos Santos, bispo do Porto, lê-seem nota enviada à AgênciaECCLESIA.

D. Manuel Vieira Pinto, nascido em1923 em Aboim, Amarante, foiordenado presbítero da diocese doPorto em 1949, vindo a trabalharpastoralmente na introdução emPortugal do Movimento por umMundo Melhor.Em 1967 foi nomeado para bispo deNampula, em Moçambique, diocese“que pastoreou até à sua jubilaçãono ano 2000” e foi “aindaadministrador apostólico de Pembade 1992 a 1998”.

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O Patriarcado de Portugal

O cardeal patriarca de Lisboa, D.Manuel Clemente, e Jorge BacelarGouveia, professor da UniversidadeNova, apresentam o livro «OPatriarcado de Portugal» da autoriade Luís Salgado de Matos.A obra vai ser apresentada dia 20deste mês, às 18h30, no auditório Bda Faculdade de Direito daUniversidade Nova de Lisboa, nocampus de Campolide, lê-se numanota enviada à Agência ECCLESIA.A sessão vai presidida pelopresidente da Comissão deLiberdade Religiosa, José VeraJardim, e após as duasapresentações “haverá debate como público”, realça o comunicado.O livro propõe “uma novainterpretação do Patriarcado dePortugal, articulando-o com opassado e o futuro do país” e assuas teses “desafiam tanto católicoscomo não católicos”.

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II Concílio do Vaticano: Quandoacabouo clima de asfixia intelectual

O II Concílio do Vaticano encerrou no mês dedezembro de 1965, mas só no ano seguinte (14 dejunho), se abria para muitos católicos uma nova fasecom a abolição do índice dos livros proibidos.Na passada semana fiz referência a livros deintelectuais e filósofos que foram apanhados na rededas proibições. Desta vez, irei entrar no campo dahistória da igreja, exegese e teologia. Os catálogosdos livros proibidos começaram a surgir em Paris(1544); Veneza (1549); Lovaina (1550); Florença(1552) e Milão (1554). Mas “o primeiro índice de livrosproibidos de origem papal só aparece em 1559quando presidia aos destinos da Igreja o Papa PauloIV” revela Manuel Augusto Rodrigues num artigopublicado no jornal «Correio de Coimbra» (22-08-96).Depois surgiram mais de 40 índices atualizados. Ainquisição e os tribunais diocesanos representaramoutro meio de controlar o livro e aquele que lia a obra.Em Portugal, o primeiro rol de livros defesos apareceuem 1547; em 1561, 1581 e 1642 foram promulgadosoutros índices expurgatórios. Com o Papa Leão XIII,dado o cada vez maior número de livros proibidos,determinou-se (1896) que deixavam de o ser os queforam editados antes de 1600.No caso de um livro ser proibido, os católicos nãopodiam lê-lo nem editá-lo, nem vendê-lo ou guardá-lo.Semelhantes atitudes eram consideradas pecado e,por vezes, os seus promotores eram excomungados.Mas sucedia que uma pessoa podia pedir umaautorização especial para ler determinado livrocondenado por

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motivos especiais e então oordinário diocesano podia concedera dispensa requerida. “Os teólogose filósofos eram os maisinteressados em obter talconcessão”, escreveu ManuelAugusto Rodrigues.Dos livros mais censurados figuramos relativos à história da Igreja e àexegese bíblica. O Santo Ofício e aComissão Bíblica (criada pelo PapaLeão XIII para promover os estudosnesta área) encarregaram-se deexcluir da leitura importantes obraspublicadas na última parte do séculoXIX e inícios do século passado.Questões vitais para a interpretaçãode determinados livros bíblicos(Pentateuco, Salmos, Isaías,Sinópticos e São João) eramsempre objeto de grande vigilânciapor parte dos responsáveis daIgreja.No fundo era a busca daautenticidade da verdade reveladaque se procurava

por meio do contributo da razão eda ciência. Teólogos como Congar,Chenu, Rahner, Schillebeeckx eKung merecem ser evocados nestecontexto pelo corajoso trabalhodesenvolvido tantas vezes sob o“olhar céptico e até mesmocondenatório de Roma”, lê-se noartigo citado. Com odesaparecimento do índice de livrosproibidos em 1966 encerrou-se umapágina da história da Igreja que teveimplicações de vária ordem na vidadas instituições e das pessoas.De notar que, em geral, os seusautores não tinham oportunidade depessoalmente se poderem defenderem Roma, esclarecendo, porexemplo equívocos deinterpretação. A condenaçãoassentava apenas na obra escritapelo seu autor. Um clima de asfixiaintelectual pairava sobre osespíritos.

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fevereiro 2017. 18 de fevereiro de 2017. Fátima - Centro Paulo VI - Aperegrinação nacional ao Santuáriode Fátima dos Centros dePreparação para o Matrimónio(CPM) realiza-se nos dias 18 e 19de fevereiro e tem como tema «AMensagem de Fátima naEspiritualidade da Família». . Coimbra - Colégio da RainhaSanta Isabel - Reflexão sobre «OMeu Imaculado Coração triunfará»pelo padre Dário Pedroso epromovido pelo Movimento daMensagem de Fátima. . Santarém - Encontro diocesanoda Liturgia . Lisboa - Torres Vedras -Jornada de comunicação doPatriarcado de Lisboa com otema «Se o Papa fosse à suaparóquia? Como comunicava?» . Ourém - A Paróquia de NossaSenhora da Piedade, em Ourém,promove três iniciativas, de 18 a 20deste mês, relacionadas com ospastorinhos de Fátima e ocentenário das aparições da Covada Iria.

. Alcochete - Núcleo de Arte Sacrado Museu Municipal - A ComissãoDiocesana de Arte Sacra de Setúbalpromove no Núcleo de Arte Sacra doMuseu Municipal de Alcochete, umasjornadas sobre «Arte e Família:representações, expressões erelações». . Lisboa – Sintra, 15h00 - ODepartamento da Pastoral Familiardo Patriarcado de Lisboa promoveuma caminhada para namorados, nalocalidade de Sintra. Com o tema«Somos templos de Deus (1 Cor3,16)», os participantes vão teroportunidade de dialogar e refletir,entre as 15:00 e as 19:00 sobreesta frase bíblica. . Lisboa - Convento de SãoDomingos, 15h30 - Conferência «Oatual mapa político-religioso daEuropa» por Adriano Moreira epromovida pelo O Instituto SãoTomás de Aquino. . Lisboa - Centro de Congressos deLisboa, 19h00 - Edição do «Faith'sNight Out» promovida movimentocatólico das «Equipas de Jovens deNossa Senhora».

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19 de fevereiro. Lisboa - Cascais (Hipódromo),11h00 - Bênção de imagem deNossa Senhora de Fátima para serenviada para o Iraque por D.Manuel Clemente. . Porto - Paços de Ferreira, 09h30 - A vigararia de Paços de Ferreira(Diocese do Porto) e o padreSamuel Guedes vão lançar os«Encontros de Vida Cristã: umacaminhada com a Venerável SílviaCardoso». Trata-se da “primeirarecoleção para leigos, inspirada nosretiros que Sílvia Cardosoorganizava” e o primeiro decorre, a19 deste mês, no centro Paroquialde Ferreira, Paços de Ferreira,entre as 9.30 e as 17.00, orientadopelo padre Samuel Guedes, vice-postulador da causa de Beatificaçãoe Canonização da venerável SílviaCardoso. . Évora - Coruche (Parque doSoraia), 15h30 - O Movimento daMensagem de Fátima daArquidiocese de Évora organiza,com o apoio do município deCoruche, uma mostra com 2017pares de sapatos de peregrinosdevotos de Fátima e 6051 terçosoferecidos pelas crianças daqueleconcelho. . Fátima - Basílica de NossaSenhora do Rosário de Fátima,15h30 - Concerto evocativo dosTrês Pastorinhos estreia obra deEugénio Amorim

20 de fevereiro. Porto - Gaia (Seminário dosRedentoristas) - Semana de reflexão«Pastoral Online» promovida peloCentro de EspiritualidadeRedentorista (até dia 24 defevereiro) . Lisboa - Capela do Rato, 18h15 - Sessão do curso «grandescorrentes da ética ocidental» naCapela do Rato . Lisboa - Auditório B da Faculdadede Direito da Universidade Nova deLisboa, 18h30 - O cardeal patriarcade Lisboa, D. Manuel Clemente, eJorge Bacelar Gouveia, professor daUniversidade Nova, apresentam olivro «O Patriarcado de Portugal» daautoria de Luís Salgado de Matos. Aobra vai ser apresentada noauditório B da Faculdade de Direitoda Universidade Nova de Lisboa, nocampus de Campolide. 21 de fevereiro. Fátima - Domus Carmeli - «A VidaHumana - Interpelações a partir dadoença e da morte» é o tema docurso, a realizar na Domus Carmeli,em Fátima, de 21 a 23 deste mês,para capelães hospitalares eassistentes espirituais. A ação deformação é uma iniciativa dacoordenação nacional de capelãese da Associação Portuguesa deCapelães e Assistentes EspirituaisHospitalares.

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Este sábado o Departamento da Pastoral Familiar do

Patriarcado de Lisboa promove uma caminhada paranamorados, em Sintra. Com o tema «Somos templosde Deus (1 Cor 3,16)». Os participantes vão teroportunidade de dialogar e refletir, entre as 15:00 e as19:00 sobre esta frase bíblica. Já por Torres Vedrasacontece a Jornada de comunicação do Patriarcadode Lisboa com o tema: «Se o Papa fosse à suaparóquia? Como comunicava?» Por Fátima acontece a peregrinação nacional dosCentros de Preparação para o Matrimónio (CPM), nosdias 18 e 19 de fevereiro, e tem como tema «AMensagem de Fátima na Espiritualidade da Família».Este encontro peregrinação, promovido pelaFederação Portuguesa dos CPM, tem como oradoreso casal António Costa e Maria Vilas-Boas; o padrePaulo Jorge; Padre Carlos Cabecinhas; a irmã MariaAmélia Costa e D. José Cordeiro. No domingo a vigararia de Paços de Ferreira (Diocesedo Porto) e o padre Samuel Guedes vão lançar os«Encontros de Vida Cristã: uma caminhada com aVenerável Sílvia Cardoso». Trata-se da “primeirarecoleção para leigos, inspirada nos retiros que SílviaCardoso organizava” e o primeiro decorre no CentroParoquial de Ferreira, Paços de Ferreira, entre as9.30 e as 17.00, orientado pelo padre SamuelGuedes, vice-postulador da causa de Beatificação eCanonização da venerável Sílvia Cardoso. Já pelas 15h30, em Coruche, o Movimento daMensagem de Fátima da Arquidiocese de Évoraorganiza, com o apoio do município de Coruche, umamostra com 2017 pares de sapatos de peregrinosdevotos de Fátima e 6051 terços oferecidos pelascrianças daquele concelho.

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Programação religiosa nos media

Antena 1, 8h00RTP1, 10h30Transmissão damissa dominical

11h00 -Transmissão missa

Domingo:10h00 - Porta Aberta;11h00 - Eucaristia;23h30 - Entrevista deAura Miguel Segunda-feira:12h00 - Informaçãoreligiosa Diariamente18h30 - Terço

RTP2, 13h00Domingo, 19 de fevereiro,13h30 - Festival TerrasSem Sombra Segunda-feira, dia 20, 15h00 - Entrevista a Aura Miguel:Perspetivas sobre a visita do"peregrino" Papa Francisco aPortugal. Terça-feira, dia 21, 15h00 - Informação e entrevista a António Marujo sobre o livro"A Senhora de Maio" Quarta-feira, dia 22, 15h00 - Informação e entrevista a Rita Caetano da Fundação GOnçalo da Silveirasobre o projeto Bailado Solidário. Quinta-feira, dia 23, 15h00 - Informação e entrevistaà irmão Bernardino Frutuoso sobre os 50 anos darevista Audácia. Sexta-feira, dia 24, 15h00 - Análise à liturgia dedomingo com os padres Robson Cruz e VitorGonçalves. Antena 1Domingo, dia 19 de fevereiro - 06h00 Segunda a sexta-feira, dias 20 a 24 de fevereiro - 22h45

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Ano A – 7.º Domingo do TempoComum Ser santo éser de Cristo

A liturgia do sétimo domingo do tempo comumconvida-nos à santidade. Sugere que o caminhocristão é um caminho nunca acabado, que exige decada homem e mulher, em cada dia, um compromissosério e radical, feito de gestos concretos de amor epartilha com a dinâmica do Reino de Deus.A primeira leitura apresenta um veemente apelo àsantidade: ser santo é viver na comunhão com Deus eno amor ao próximo. «Sede santos, porque Eu, oSenhor, vosso Deus, sou santo. Amarás o teu próximocomo a ti mesmo. Eu sou o Senhor».Na segunda leitura, Paulo convida-nos a sermos deCristo, a sermos o lugar onde Deus reside e Se revela,a renunciar definitivamente à sabedoria do mundo eoptar pela sabedoria de Deus, qual dom da vida, amorgratuito e total. «Não sabeis que sois templo de Deuse que o Espírito de Deus habita em vós? Tudo évosso; mas vós sois de Cristo, e Cristo é de Deus».No Evangelho, Jesus propõe, de forma muito concreta,a Lei da santidade, no contexto do sermão damontanha. «Amai os vossos inimigos e orai poraqueles que vos perseguem, para serdes filhos dovosso Pai que está nos Céus... Sede perfeitos, como ovosso Pai celeste é perfeito».O convite à santidade pode soar como algo deestranho para as pessoas de hoje. Uma certamentalidade contemporânea vê os santos comoextraterrestres, seres estranhos que pairam um poucoacima das nuvens sem se misturar com os seus irmãose que passam ao lado dos prazeres da vida, ocupadosem conquistar o céu a golpes de renúncia, desacrifício e de longos trabalhos ascéticos. A santidadenão é uma anormalidade, mas uma

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exigência da comunhão com Deus.É o estado normal de quem seidentifica com Cristo, assume a suafiliação divina e quer caminhar aoencontro da vida plena em Cristo. Asantidade deve estar no horizontediário que procuramos construir semdramas nem exaltações, comsimplicidade e naturalidade, nafidelidade aos compromissos.Ser santo não significa viver deolhos voltados para Deusesquecendo as pessoas. Asantidade implica um realcompromisso com o mundo, passapela construção de uma vida deverdadeira relação com os irmãos,implica a eliminação de qualquer

tipo de agressividade, vingança erancor, implica amar o outro como asi mesmo.Aí está a santidade que é caminhopara todos. O Concílio Vaticano IIveio repor este essencial dinamismoda vida cristã. A santidade é paratodos, o que foi esquecido duranteséculos na Igreja, e não apenaspara o grupo de consagrados,religiosos e clérigos. Há queprocurar no quotidiano da existênciaesse dom de Deus para cada um denós. Ser santo, afinal, ésimplesmente ser de Cristo.

Manuel Barbosa, scjwww.dehonianos.org

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Santuário apresenta cartaz oficialda visita do Papa

O reitor do Santuário de Fátimaapresentou em conferência deimprensa a identidade visual para avisita do Papa à Cova da Iria, nosdias 12 e 13 de maio, elaboradapelo designer FranciscoProvidência.O cartaz para a visita tem umaimagem do Papa em fundo, onde sedesenha um coração com ainscrição 'Papa Francisco' e 'Fátima2017', a "assinatura motivacional"'Com Maria peregrino na esperançae na paz'

e o logótipo do centenário dasAparições de Fátima.Para o designer FranciscoProvidência, a identidade visualpara a visita do Papa a Fátima quercomunicar "o estilo de simplicidade eclareza que o caracteriza", propostapela escolha dos diferenteselementos que a compõem,nomeadamente a fonte tipográfica."No cartaz procurámos valorizar aproximidade física e simpática doPapa que, a sorrir, acena com amão

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num gesto de saudação e bênção",acrescenta o texto de explicação daidentidade visual para a visita doPapa distribuído pelo Santuário deFátima , elaborado a partir da notado autor.Francisco Providência acrescentaque a visita do Papa foi caraterizadacom a ideia do Coração Imaculadode Maria, através de um desenhode coração, que se pudessevincular mais "ao vazio recetor deMaria, do que à inflamaçãopassional que muitas vezessimboliza, propondo, por isso, aconstrução geométrica da figura emdupla elipse simétrica econvergente". "Pretendia-se que ocoração (em vez da cruz), pudessecaraterizar mais o amormisericordioso do Pai do que osofrimento redentor do Filho",sublinha."A intenção projetual foi a detraduzir pela comunicação gráfica,um Papa mensageiro damisericórdia e da paz, tão simples eacessível como o Santo que lhe deunome, mas associando a sua visitaao Santuário Mariano de Fátima,recorrendo para isso aos seussinais mais universais (coração erosário)", conclui o designerFrancisco Providência.

O Papa vai estar na Cova da Iria de12 a 13 de maio de 2017, na suaprimeira visita ao santuárioportuguês, em "peregrinação",segundo anunciou o Vaticano noúltimo mês de dezembro.

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Imagem de Nossa Senhoracoroada em Inglaterra

A catedral católica de Westminstervai receber este sábado a cerimóniainaugural da peregrinação daimagem nacional de Nossa Senhorade Fátima pelas dioceses daInglaterra e País de Gales. Aimagem vai ser abençoada ecoroada pelo cardeal VincentNichols,

arcebispo de Westminster, que irádepois presidir à Missa.A coroa, em prata dourada, foioferecida por uma joalhariaportuguesa, a mesma que, em 1942,elaborou a obra oferecida pelasmulheres portuguesas com a qual

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a imagem venerada na Capelinhadas Aparições foi solenementecoroada.A ‘imagem nacional da VirgemPeregrina de Nossa Senhora deFátima’ foi oferecida à IgrejaCatólica na Inglaterra e País deGales em 1968, pelo bispo deLeiria, D. João Pereira Venâncio,após ter sido abençoada por PauloVI um ano antes; o gesto seriarepetido por João Paulo II em 1982.Durante a celebração deste sábado,o cardeal Nichols vai renovar aconsagração do país ao CoraçãoImaculado de Maria.

Além da imagem, a peregrinação vaicolocar à veneração dos católicosrelíquias dos Beatos Francisco eJacinta Marto, em catedrais, abadiase igrejas inglesas e galesas, comoforma de assinalar o Centenário dasAparições (1917-2017).O calendário da visita da imagemperegrina estende-se até outubrodeste ano. A iniciativa é promovidapelo Apostolado Mundial de Fátimana Inglaterra e País de Gales.

Capelinha Das ApariçõesO verdadeiro coração do Santuário foi o primeiro edifício construído naCova da Iria, no lugar das Aparições de Nossa Senhora. O local exatoestá assinalado por uma coluna de mármore sobre a qual é colocada aimagem de Nossa Senhora.A imagem que se venera na Capelinha é feita em cedro do Brasil, mede1,04 metros, é obra do escultor José Ferreira Thedim e foi oferecidapor Gilberto Fernandes dos Santos. Encontra-se neste local desde 13de junho de 1920. Nos dias mais solenes é adornada por uma coroapreciosa, na qual está encastrada a bala do atentado ao Papa JoãoPaulo II, em 13 de maio de 1981. Nos outros dias, a coroa encontra-seem exposição no edifício da Reitoria.A azinheira grande é a única árvore que restou das que existiam nolocal em que Nossa Senhora apareceu.

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Populações aterrorizadas com guerra sem fim no Sudãodo Sul

“Os ataques foram brutais…”É um conflito tribal que jáprovocou mais de 10 mil mortose dois milhões de refugiados.Ninguém está a salvo. Aviolência parece imparável.Quase todos os dias há relatosde violações de mulheres, derapazes recrutados à força porgrupos armados, de populaçõesem fuga. Do Sudão do Sulchegam-nos lamentos e pedidosde ajuda. No Sudão do Sul, ninguém está asalvo. A guerra no mais jovem paísdo mundo tem vindo a ganhar umacrueldade sem precedentes e é raroo dia em que não se conhecealguma história de horror, deviolência, de pessoas em lágrimas.A história deste conflito é também ahistória do fracasso do Sudão doSul como país. A independênciachegou em Junho de 2011, maslogo em 2013 começaram a escutar-se os primeiros tiros quando opresidente Salva Kiir, de etnia dinka,afastou o vice-presidente RiekMachar, do povo Nuer. Na verdade,tudo se resume a isso: a um conflitoentre tribos rivais, que tem levado opaís para o desastre absoluto.Monsenhor Roko Taban nunca

mais irá esquecer os dias de horrorque se abateram sobre as cidadesde Bentiu, Malakal e Bor, em Julhode 2014. Calcula-se que, então,cerca de 30 mil casas ficaram emruínas e mais de 100 mil pessoasforam obrigadas a fugir. Foi comouma descida aos infernos. “Osataques foram brutais. Muitas dasnossas igrejas e casas foramdestruídas e tudo o que tínhamos foisaqueado. Estamos num estadomiserável.” Perante a violênciademente de quem mata, viola,destrói tudo à sua passagem, quefazer? O Bispo de Malakal pede-nosajuda: “Por favor, lembrem-se denós nas vossas orações. Não nosabandonem!” História de conflitosA Fundação AIS falou recentementecom uma irmã que nos pede parapreservarmos a sua identidade, poistodos por ali correm risco de vida.Vamos chamar-lhe Judith. Nestaguerra tribal não há bons nemmaus. Todos têm as mãosmanchadas de sangue. “O exércitoé responsável pelo assassinato decivis inocentes e pela

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destruição das suas casas”,denuncia a irmã Judith. Cidadesdevastadas, campos abandonados,miséria total.Por causa da guerra, quase todosperderam tudo o que tinham: gado,casas, terra. Como diz a Irmã Judith,“as pessoas, agora, estão apenas atentar sobreviver”. Todos conhecemalguma história terrível. “Algunsforam recrutados à força, atémesmo crianças”, diz a irmã. “Asmulheres são muitas vezes violadase depois são estigmatizadas porcausa disso…” No Sudão do Sulninguém está a salvo. Nem a Igreja.A própria comunidade da irmã Judithfoi atacada. “Houve até mesmo umcaso de violação.” As irmãs foramforçadas a fechar uma

das missões. Era demasiadoarriscado. Mas, apesar da violência demente,há ainda esperança de que a guerravenha a terminar. Todos os dias, aIrmã Judith, assim como MonsenhorTaban, procuram contrariar o horror,auxiliando as populações em fuga.Com o apoio da Fundação AIS, aIgreja tem vindo a trabalhar naconstrução da paz e reconciliação.Há sempre esperança. Diz ainda aIrmã Judith, que agradece,comovida, a ajuda que a FundaçãoAIS tem feito chegar ao seu país:“Continuamos empenhados emservir o povo do Sudão do Sul,porque esta é a nossa missão evocação.”

Paulo Aidowww.fundacao-ais.pt

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Fátima no planalto central de Angola

Tony Neves Espiritano

Cheguei a Angola no auge da guerra civil quedizimava o povo, sobretudo no interior do país.As cidades tinham sido mais ou menos poupadasaté à minha chegada. A destruição veio depois.O Kuito-Bié (antiga cidade de Silva Porto) foi aminha primeira Missão, naquele ano em que caiuo muro de Berlim: 1989. Só se chegava ali deavião, em descida em espiral que metia medo.Uma vez aterrados, bastou vir a primeira noitepara ouvir o festival de tiros que acompanhavaos ataques da UNITA para se abastecer nosarmazéns da cidade e dizer que estávamos emguerra! O centro da pequena cidade era ummodesto oásis de calma no coração de umaguerra fratricida e cruel.Fui enviado para o Kuito, antes de mais e acimade tudo, para uma experiência de imersão nacultura e na língua deste povo. Mas oscompromissos pastorais tomaram logo conta deminha agenda e, para surpresa, foi-me confiadaa Paróquia da Fátima, fundada nas periferias dacidade por missionários espiritanos portugueses.Lá havia uma leprosaria que tinha uma capela,mas a Igreja Paroquial funcionava numas oficinasde carpintaria e serração. Durante um ano, alicelebrei quase diariamente e ali rezávamos aNossa Senhora de Fátima que trouxesse a paz aeste povo.Há quatro anos, voltei, mais uma vez ao Kuito efiquei emocionado quando pude visitar umaenorme Igreja em construção, dedicada a NossaSenhora de Fátima. Será a futura IgrejaParoquial. E mais: no Chinguar, a meio caminhoentre o

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Huambo e Kuito, o P. AgostinhoLoureiro, espiritano de Barcelos,construiu um santuário belíssimo nocimo do Monte Chibango. Falareideste santuário noutro comentário.Do Kuito segui para o Huambo,onde os Seminários esperavam pormim. Ali encontrei logo a grandeIgreja de Nossa Senhora de Fátima,um santuário enorme, no coraçãoda cidade, fundado pelo P. ManuelMoutinho, espiritano, com umaenorme devoção a Nossa Senhorade Fátima. Ainda no tempo colonial,este espiritano lançou-se naaventura da construção da Igreja ede um centro social e pastoral paraa evangelização e o apoio aospobres. Celebrei muitas vezes nestaIgreja e senti-me sempre em casa.Em Março passado estive noHuambo. Celebrei, no Domingo deRamos, na minha comunidade deperiferia (a

Tchiva que foi erigida comoParóquia no domingo de Páscoa!).Mas não pude deixar de participarna Via-Sacra que concluiu na Igrejade Nossa Senhora de Fátima.Fátima conta muito para os católicosdo planalto central de Angola. Égrande a devoção deste povo quefoi confiando, ano após ano, a pazaos cuidados de Nossa Senhora.Quando lá vou, muitas pessoas meperguntam: o Padre não trouxe umterço de Fátima para mim? Tenholevado muitos terços, pagelas emedalhas, mas o mais importante jáestá no coração deste povo: umadevoção enorme à Senhora queveio à Cova da Iria explicar oscaminhos da Paz.

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Resposta à campanha para denegrirCuidados Paliativos e sobre SedaçãopaliativaCiclicamente, quase sempre emtorno do debate da eutanásia,assistimos a declarações públicaspor parte de pessoas com supostaresponsabilidade profissional ecívica, sobre a prática dos CuidadosPaliativos e sobre a realização dasedação paliativa. Lamentamos quese lancem afirmações que sãofalsas, facilmente rebatíveis pelaevidência científica e pela prática.Lamentamos, sobretudo, que sequeira assim confundir edesinformar os portugueses. Não ésério e não vale tudo em nome daluta política. Diz-se que a sedação paliativa é omesmo que eutanásia, diz-se queela apressa a morte e é irreversível,diz-se que a maioria dos doentesnos Cuidados Paliativos morreobnibulado, “zombie”. Falará agora quem conhece deperto e trabalha na realidade dosCuidados Paliativos há muitos anos,com milhares de doentes tratados eacompanhados, dentro e fora doSNS. A sedação paliativa (chamá-la determinal é errado!) é uma

intervenção bem fundamentada eestudada, com indicações médicasprecisas e procedimentosrecomendados. Não é uma medidauniversal, é aplicada nos sintomasque não cedem às medidasterapêuticas de primeira linha. Faz-se recorrendo a sedativos e não àmorfina. Deverá ser realizada porquem tem competência e treino paratal, nunca com a intenção de tirar avida. Não deve ser confundida commás práticas de fim de vida (dosesindevidas de morfina, por exemplo),que não cumpram asrecomendações rigorosas para estaintervenção. A sedação não seaplica à larga maioria dos doentesque recebem Cuidados Paliativos dequalidade (realiza-se a menos de15% dos doentes) e são vários osestudos científicos credíveis quedesmistificam a ideia errada que asedação paliativa antecipa a mortedo doente. E porque é de ciência enão de opinião que se trata, conviráa esse respeito estudar e ler, porexemplo, Maltoni M, Scarpib E,Nannib O; Palliative sedation forintolerable

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suffering; Curr Opin Oncol 2014;26:389–394.O que se lamenta mais é o profundodesconhecimento técnico ecientífico da realidade, do processode morrer e da realidade dosCuidados Paliativos, prestadossempre por profissionaisqualificados e com a devidacompetência para tal (não falamosde sucedâneos). É bastante grave,para não dizer mais, pelodesconhecimento que revela e pelairresponsabilidade que comporta, aforma infeliz e enganosa como sesugere que os Cuidados Paliativos“arrastam para um estadovegetativo” e deixam as pessoas“num estado obnibulado ouzombie”. Somos médicos/as, trabalhamoscom Ciência e Evidência, e o temados Cuidados Paliativos não é umaquestão de fé ou crença, como porvezes se sugere. É de cuidados desaúde que falamos, umaintervenção técnica global nosofrimento dos doentes graves e emfim de vida, que não pode serdistorcida em nome do “vale tudo”, eum tema do maior interesse para asociedade, até

porque a maioria dos portuguesescontinua a não ter acesso a eles.Exige-se mais responsabilidade everdade nas afirmações que sedifundem quando se pretende emitiropinião. É preciso conhecer bem arealidade que se comenta e,sobretudo, ter mais respeito pelosdoentes tratados em CuidadosPaliativos, pelas suas famílias e, jáagora, pelos profissionais queefectivamente os acompanham. Ana Bernardo (Azeitão); CatarinaAmorim (Lisboa); Cristina Galvão(Beja); Edna Gonçalves (Porto);Hugo Domingos (Lisboa); IsabelDuque (Castelo Branco); IsabelGalriça Neto (Lisboa) José EduardoOliveira (Porto); Licínia Araújo(Funchal); Rita Abril (Lisboa);Rosário Vidal (Ponta Delgada); RuiCarneiro (Porto); Vilma Passos(Funchal)

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