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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor Texto Apresentado ao Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo EPM, para Concurso de Livre Docência em Oftalmologia São Paulo 2003

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa

Paulo Schor

Texto Apresentado ao Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – EPM, para Concurso de Livre Docênciaem Oftalmologia

São Paulo

2003

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Schor, Paulo

Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa

77pp; 29,7 x 21 cm

Tese (Livre Docência em Oftalmologia) Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina

1. Córnea – Cirurgia. 2.Instrumentação

NLMC – WW200

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Este Trabalho apresenta um conjunto de realizações, iniciadas em 1992 e ainda não

finalizadas.

Durante o processo de amadurecimento e produção, os Setores de Córnea e

Doenças Externas Oculares, o Laboratório de Microbiologia, o Setor de Cirurgia

Refrativa, o Setor de Refração e Lentes de Contato, o Setor de Ultra-som e o Setor

de Bioengenharia Ocular do Departamento de Oftalmologia da UNIFESP, foram

envolvidos

Além do Departamento de Oftalmologia, o Núcleo de Propriedade Intelectual da

UNIFESP, o Grupo de Ótica da Universidade de Sâo Paulo – São Carlos, a Opto

Eletrônica e a Eyetec tiveram participação fundamental no avanço desta Linha de

Pesquisa

Também participaram o Schepens Eye Research Institute ligado a Harvard Medical

School, Massachussets Institute of Technology e Cornea Consultant of Boston.

O autor apresenta interesse comercial em alguns desenvolvimentos protegidos por

Patentes apresentados nesse estudo

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AOS MEUS AVÓS

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Agradecimentos

• À Ana e Marina, por darem sentido a vida

• A meu pai e a minha mãe, pelo que eu sou

• A todos os Pesquisadores, Estagiários, Estudantes e Pós-graduandos do

setor de Bioengenharia Ocular da UNIFESP pela dedicação e entendimento

de como ser criativo, objetivo e produtivo

• Aos meus pós-graduandos

• Ao sempre presente Rubinho

• Ao setor de Cirurgia Refrativa da UNIFESP nas pessoas do querido Walton

Nosé, Wallace Chamon e Mauro Campos

• À Maria Regina Chalita, Mirko Jankov e Marco Cesar Helena, pela superação,

adaptação e brilhantismo

• Aos meus irmãos e cunhados, Patricia, Breno, Jan Michiel e Valéria pelo amor

emitido e absorvido

• Ao amigo de todas as horas Wallace Chamon

• Ao amigo de todos os humores Edson Mori

• À Norma e Helena, pela inteligência e paciência com todos nós

• Ao Luis Alberto e Jarbas Castro pela transparência, lealdade e honestidade,

além da inigualável inteligência produtiva

• Ao tio Nestor e tio Daniel, por nos ensinarem que a estrada deve ser curtida

• À Iara Martins, Regina e Solange, pela proteção e eficiência

• A todos que fazem da Visus uma grande clínica

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Resumo

Schor, P. Óptica fisiológica e cirurgia refrativa. São Paulo, 2003. 77pp. Tese (Livre

Docência) – Departamento de Oftalmologia, Universidade Federal de São Paulo –

Escola Paulista de Medicina

A córnea foi o primeiro e mais bem sucedido exemplo de estudo multidisciplinar na

Oftalmologia. Seus aspectos ópticos, anatômicos, fisiológicos, patológicos, clínicos e

cirúrgicos foram interligados por mentes brilhantes como Isaac Newton, Hermann

von Helmhotz e José Inácio Barraquer. As propriedades de reflexão, refração e

difração aplicados ao dioptro mais eficiente do sistema ocular humano são um dos

alicerces da chamada Optica Fisiológica, que trata das consequências visuais da

Óptica Geométrica. Entre nós sobressaem-se estudiosos capazes de manter a

evolução tecnológica e criar ferramentas e raciocícios que dão vida a esse amplo

campo da ciência.

Tratamos nesse estudo de aspectos ligados à formação da imagem do ponto de

vista óptico, iniciando pela descrição do sistema visual; um sistema muito copiado e

pouco entendido e passando pela interface ar-lágrima, que torna-se sinônimo da

própria córnea. O crescimento ocular e seus mecanismos de controle são discutidos

como agentes da gênese de ametropias, bem como a forma corneana. Alterações

nessa forma, fenômenos ópticos, e uma ampla discussão sobre o poder corneano

são apresentados. Tanto a face anterior, como a recentemente compreendida face

posterior são discutidas e os pontos de referência do sistema visual são

determinados e avaliados.

O ápice da córnea, pupila de entrada, linha de visão e eixo pupilar tem sua

importância detalhada, bem como a pupila e o cristalino. Os princípios da avaliação

de distorções ópticas, denominadas aberrações, são delineados e os tratamentos

atualmente disponíveis, como óculos, lentes de contato e cirurgia fotorrefrativa

apresentados. Uma discussão abrangente sobre o princípio dos aparelhos de

aberrometria e seus sensores precede a explicação matemática da expressão de

seus resultados, e resulta na aplicação fisiológica e nos prejuizos visuais das

aberrações.

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O estudo termina com um debate sobre o presente e o futuro das correções

fotorrefrativas personalizadas e com a opinião, sempre presente, do autor, sobre o

papel da Universidade e da crítica na evolução tecnológica moderna.

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Summary Schor, P. Physiological optics and refractive surgery. São Paulo, 2003. 77pp. Thesys

(Post Doctorate) – Departament of Ophthalmology, Federal University of São Paulo –

Paulista School of Medicine

The cornea was the first and most succeeded example of interdisciplinary studies in

Ophthalmology. Its optics, anatomy, physiology, pathology, clinics and surgery have

been linked by brilliant minds as of Isaac Newton, Hermann von Helmhotz and José

Inácio Barraquer. Reflection, refraction and diffraction applied to the most efficient

diopter of the human optical system are the basis for what we know as Physiological

Optics, that translates Geometric Optics to the sense of vision. Among us are many

researchers capable of keep pace with the technology evolution and create rational

and solutions that maintains alive this broad science field.

In this study we present optical aspects of image formation, starting by a visual

system description, a system copied but not fully understood, following by the air-

tears interface, almost the synonym of the cornea itself.

Ocular growth mechanism and controls are discussed as part of the ametropia

genesis, besides the cornea shape itself. Abnormal shapes and its optical

consequences follows a discussion regarding corneal power. Both anterior and

posterior corneal surface are debated and its reference points determined.

Corneal apex, entrance pupil, line of vision and pupilary axis are detailed as the pupil

and the crystalline lens. Optics distortion (aberrations) evaluation principles are

summarized and its treatments, as eyeglasses, contact lenses and photorrefractive

surgery presented. A comprehensive discussion on the aberrometry principles and its

sensors precedes a mathematics explanation on its output and ends in the

physiological implication of aberrations.

In its last part a debate on the present and future of customized photorrefractive

correction, having the always present author opinion is given, emphasizing the role of

the University and the critics analysis on the modern technology evolution.

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Prefácio

O estudo e compreensão das bases dos fenômenos biológicos pemite a evolução e

desenvolvimento de novas tecnologias. Esta é a filosofia do setor de Bioengenharia

Ocular da UNIFESP, criado em agosto de 1996.

Originado a partir de um instrumento capaz de concretizar idéias até então

internalizadas em cada mente, a caneta, foi sob a inspiração do Dr. David Miller, e

do impulso constante do Prof. Rubens Belfort Jr. que este frutificou.

O presente estudo transmite a profundidade e abrangência da linha de pesquisa de

seu fundador, e fundamentalmente sua incapacidade de permanecer sereno frente

as transformações sociais e tecnológicas atuais.

A manutenção desse espírito investigativo e aberto a novas percepções atraiu

médicos, físicos, biólogos, engenheiros, tecnólogos, advogados, programadores e

matemáticos ao setor de Bioengenharia.

O domínio da linguagem inter-disciplinar tem sido a arma para a fertilização cruzada

que amplia a capacidade de ação do oftalmologista.

Esperamos expandir ainda mais as atividades, com registro de programas,

patenteamento de produtos, comercialização de métodos, construção de protótipos

e teste de aparelhos, sempre tendo uma sólida base teórica a suportar nossos

impulsos.

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SUMÁRIO

DESCRIÇÃO DO SISTEMA VISUAL 1

INTERFACE AR-LÁGRIMA 5

O CRESCIMENTO OCULAR 7

FORMA DA CÓRNEA 11

ASTIGMATISMO E CERATOCONE 14

DETERMINAÇÃO DO PODER CORNEANO 17

FACE ANTERIOR E ÍNDICE TEÓRICO 18

FACE POSTERIOR E ESPESSURA 20

O ÁPICE DA CÓRNEA 21

O CENTRO DA PUPILA DE ENTRADA 23

EIXO ÓPTICO E EIXO VISUAL 25

OS ÂNGULOS DA VISÃO 26

O TAMANHO DA PUPILA 27

O TERCEIRO ELEMENTO: CRISTALINO 29

AVALIAÇÃO DO SISTEMA VISUAL COMO UM TODO 31

AMETROPIAS E COMPRIMENTO AXIAL 33

TRATAMENTO DAS ABERRAÇÕES DE BAIXA ORDEM 36

ÓCULOS, LENTES DE CONTATO RÍGIDAS E GELATINOSAS 36

EXCIMER LASER 39

SENSORES E APARELHOS DE ABERROMETRIA 46

PRINCÍPIO DOS SENSORES 49

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CARACTERÍSTICA DOS SENSORES 51 TSCHERNING 51 HARTMANN-SHACK 52 MISTOS 54 TRACEY, OPD SCAN 54 CASTRO 54

CÁLCULO MATEMÁTICO DAS ABERRAÇÕES USANDO POLINÔMIOS DE ZERNIKE 56

CARACTERIZAÇÃO FISIOLÓGICA DAS ABERRAÇÕES 67

ABERRAÇÃO ESFÉRICA E O TAMANHO DA PUPILA 68

COMA E DESCENTRALIZAÇÕES 71

PREJUÍZO VISUAL DAS ABERRAÇÕES 73

CORREÇÃO CORNEANA GUIADA POR ABERROMETRIA 75

BIBLIOGRAFIA 79

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

Descrição do Sistema Visual - Página 1

Descrição do Sistema Visual

Em 1965, Gordon Moore observou que a eficiência dos circuitos integrados tendia a

crescer a uma taxa regular com o passar do tempo. Àquela época o número de

transistores em um circuito integrado duplicava a cada 18 meses 1. Tal tendência

ganhou a denominação de lei de Moore, e tem sido aplicada até os dias de hoje. O

debate de até quando tal “lei” será cumprida é extenso e apresenta a tendência atual

de ser substituído por questionamentos mais profundos acerca do uso e integração

do poder tecnológico com o ambiente humano em que vivemos.

Em 1997 o supercomputador Deep Blue ultrapassou o campeão mundial de xadrez

Garry Kasparov, ainda sem realizar o mesmo número de operações matemáticas

que o cérebro humano. Em 2020 o poder de cálculo de um supercomputador deverá

ser equivalente ao cérebro humano ao custo de 1000 dólares 2. A “façanha” porém

só será alcançada se forem gastos aproximadamente quatro milhões de dólares

para esfriar os processadores do futuro em cada um dos centros de processamento

de dados. No final da década, um microprocessador do tamanho de um selo, deverá

gerar a mesma temperatura que um foguete espacial 3.

Tal discussão futurista ganha espaço em nosso meio e passa a fazer parte de

nossas preocupações cotidianas porque a fronteira silício-carbono está sendo

cada vez mais estudada e entendida. Essa é a nova fronteira do conhecimento e

barreira real para a evolução humana 4.

Estamos em um estágio onde uma fonte de luz monocromática, unidirecional,

coerente e colimada pode atravessar uma área extensa de nossa córnea, sofrer

correção das imperfeições geradas pela mesma e pelo cristalino, e atingir um

minúsculo ponto da fovéola retiniana, sem distorções de cores ou forma. Os

instrumentos espaciais conseguem utilizar todo o potencial óptico dessa imagem

quase perfeita e montar representações nunca conseguidas do micro e macro-

cosmo. Os aparelhos médicos permitem obter os detalhes de cada dióptro ocular,

montar mapas de irregularidades quase instantâneos, e transmitir tais informações

a um aparelho de ablação tecidual acoplado opticamente ao olho real, de modo a

corrigir todas as aberrações visuais e formar imagens extremamente nítidas na

retina dos seres humanos.

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

Descrição do Sistema Visual - Página 2

Porém pouco entendemos da fronteira retiniana. Iniciamos a descrição do pré-

processamento retiniano e do processamento cerebral, e ainda não conseguimos

modulá-lo nem imitá-lo em aplicações laboratoriais. Nos valemos, isso sim, de sua

imensa maleabilidade, que permite a correção de borramentos ópticos e a

percepção de formas em imagens borradas. Antes de passarem de várias décadas,

pouco conseguiremos fazer com imagens tão nítidas como as entendidas como

20/10. A supervisão é a constatação de nossa cegueira em relação ao

processamento neuronal.

Numa ciência milenar como a óptica, que remonta aos tempos de Ibn al Haitan na

Mesopotâmia, os avanços em direção a essa fronteira são incríveis. A física teórica e

aplicada deixou preparado o alicerce para a evolução científica. Equipamentos,

teorias e experimentos pareciam estar à espera de processamentos mais evoluídos

que permitissem o maior poder de manipulação de dados. A computação ocupou

um local imprevisto há séculos, e possibilitou aplicações tão diversas como a

manipulação do código genético ou a cirurgia corneana personalizada a laser.

O sistema visual humano ainda se assemelha a uma máquina fotográfica, ou melhor,

as máquinas fotográficas ainda se assemelham a nosso sistema visual. A cópia e

adaptação de nosso sistema formador de imagem é secular, e os princípios de

refração e diafragmas bloqueadores da difração também. Pequenos avanços com

grande resultados mantiveram sua derivação a partir do invento original, como as

lentes anesféricas. Tais lentes possibilitaram magnificações importantes e a

ampliação da visão do cosmos, e em menor escala, a melhoria dos nossos exames

propedêuticos, com lentes anesféricas de observação da retina humana.

A descrição moderna da nossa visão, porém é complexa, pois mesmo antes da luz

atingir a retina e iniciar o processo pouco conhecido do “enxergar”, entendemos que

o trajeto luminoso não é mais retilíneo e uniforme, compreendido a partir de

instrumentos que detectam pontos isolados e montam o caminho da luz desde a

fonte luminosa até a retina. Adicionamos pontos de referência, áreas de

mensuração, elementos complexos de refração e bloqueios dinâmicos. Temos de

entender conceitos de aberrometria para definir limites ópticos.

Começamos pelos instrumentos que nos possibilitaram o entendimento da forma da

superfície anterior da córnea, os ceratômetros 5. Passamos para os ceratômetros

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Descrição do Sistema Visual - Página 3

de área, ou Videoceratômetros Computadorizados, também conhecidos como

Topógrafos Corneanos 6 (Ilustração 1).

Ilustração 1. Evolução temporal dos instrumentos capazes de medir a superfície anterior da córnea. Dos discos de Plácido aos ceratômetros clínicos e cirúrgicos, e novamente aos discos de Plácido

Adicionamos instrumentos capazes de fornecer indícios da espessura e forma da

superfície posterior da córnea, como os mapas de varredura em fenda,

comercialmente disponibilizados no aparelho denominado Orbscan (Ilustração 2); e

a forma do cristalino, como o sistema Scheimpflug (Ilustração 3).

Ilustração 2. Mapa teórico da superfície posterior de uma córnea normal, representando a elevação em relação a uma esfera de referência, obtido pelo método de análise de fendas ópticas e do aparelho Orbscan

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Descrição do Sistema Visual - Página 4

Ilustração 3. Fotografias obtidas a partir do princípio de Scheimflug, de um cristalino normal in-vivo. A direita aparelho comercialmente disponível, à esquerda fotografia experimental

Também nos aperfeiçoamos na determinação dos índices de refração dos diferentes

meios oculares, e hoje conseguimos analisar in vivo a forma da retina 7, e de seu

ponto mais importante, a mácula (Ilustração 4).

Ilustração 4. Corte anatômico das camadas da retina humana in-vivo, na região da mácula, obtidas a partir da tomografia de coerência óptica, ou OCT

Finalmente, conseguimos aplicar um conceito da óptica espacial aos olhos humanos,

e estendemos a compreensão da refração ocular para centenas de pontos dentro da

chamada pupila de entrada, montando mapas de aberrações de todo o sistema

óptico (Ilustração 5).

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Interface ar-lágrima - Página 5

Ilustração 5. Mapa Clinico de aberrações oculares de um olho humano obtido a partir de um sensor de Hartmann-Shack comercialmente disponível

Devemos utilizar todos esses conceitos para determinar e aprofundar nossos

conhecimentos em relação à moderna óptica fisiológica, desde o entendimento da

fisiologia, até o desenvolvimento de modernos sistemas de avaliação dinâmica do

aparelho visual humano.

Interface ar-lágrima

O olho humano possui fundamentalmente três formas de borramento, a difração, a

dispersão e a aberração. A difração ocorre quando um feixe de luz ou frente de

onda encontra um obstáculo, uma abertura ou outra irregularidade no meio; sendo

dependente do tamanho da abertura, e resulta em uma mudança na direção da luz

ou da onda. Quando a luz atinge um obstáculo, ela desvia em direção ao mesmo,

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Interface ar-lágrima - Página 6

como se fosse desacelerada (Ilustração 6). Tal evento tem sentido no olho humano

quando observamos pupilas pequenas (menores de 1mm). Na prática diária porém,

a difração é pouco importante e é amplamente compensada pelo poderosíssimo

processamento retiniano e cerebral. A dispersão é importante em condições

patológicas, como nos edemas de córnea e de cristalino 8. Nessas situações o

distanciamento entre as fibras de colágeno dessas estruturas aumenta, e a água,

com índice de refração distinto, determina mais um dióptro que a luz retilínea tem de

atravessar. A física teórica nos diz que a luz não sofrerá desvio se a distância entre

dioptros com índices de refração distintos for menor que o comprimento de onda da

luz incidente. Tal postulado permite inferir que caso o distanciamento entre as

lamelas corneanas ou cristalinianas seja menor que o comprimento da luz visível

(aproximadamente 600 nanômetros) a luz não sofrerá desvios, mas sim, será

anulada lateralmente pela interferência destrutiva das ondulações adjacentes, e

seguirá em linha reta. O postulado é diretamente observado na prática clínica, onde

notamos estruturas edemaciadas como dioptros nebulosos, ou borrados. Tais

dioptros dispersam as partículas de luz incidente, que perde a composição espacial

e torna-se desfocalizado. Algumas partículas de luz (fótons) mantêm seu trajeto e

formam a imagem originalmente composta na retina, porém com menos

luminosidade. O restante da massa luminosa irá interferir com a imagem composta,

diminuindo seu contraste e conseqüentemente sua nitidez 9.

Ilustração 6. Ilustração de uma frente de onda percorrendo um meio homogêneo e encontrando um obstáculo com um orifício central. Note-se a deflexão da onda (difração) em direção ao centro da abertura e sua periferia, a partir das bordas do orifício

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

O Crescimento Ocular - Página 7

As aberrações são, porém, o fenômeno que tem maior conseqüência clínica. Trata-

se de um comportamento que necessita de meios com diferentes índices de

refração, e quanto maior tal diferença, maior a refração, ou desvio dos raios ou

frentes de onda da normal, plano perpendicular ao dióptro em questão. No olho

humano a maior fonte de aberração é a interface entre o ar e a porção lipídica do

filme lacrimal. Em tal situação, a luz que vinha percorrendo um meio com índice de

refração de 1,000, passa a percorrer um meio com índice de refração de 1,376. Tal

passagem, considerando o perfil convexo da superfície, freia a luz e permite sua

aproximação da normal, causando sua convergência em direção à mácula. Após

essa primeira refração, a luz passa por centenas de micro-desvios, conseqüentes à

variação de índice de refração nas microestruturas intra-corneanas, como lípide-

água, água-muco, muco-epitélio, epitélio-camada basal, etc, etc, até atingir as

células endoteliais e adentrar o humor aquoso, que tem um índice medido de

refração de 1,336. Nessa condição a luz sofre ligeiro desvio voltando a se aproximar

da normal, afastando-se da mácula. O cristalino, porém não somente determina a

aproximação final da luz até a mácula, como controla com precisão o exato local de

focalização da mesma, utilizando seu mecanismo de acomodação.

Digamos que a aproximação inicial e grosseira da luz (promovida pela córnea) se

compara ao vôo de uma aeronave a 10,000 metros de altura, dirigindo-se para o

nordeste do Brasil, e a aproximação final (cristaliniana) trata da aterrisagem na pista

três, Sul, do aeroporto Internacional dos Guararapes em Recife.

O Crescimento Ocular

É impressionante o mecanismo natural e evolutivo que permitiu um sistema com

tamanha perfeição e ajustes finos, e mais eloqüente ainda são os meios pelos

quais o homem, durante seu crescimento, adquire e mantém o melhor local de

focalização de uma imagem. Trata-se do controle genético do crescimento ocular,

determinado por uma série de genes, proteínas e estímulos que fazem com que o

olho cresça continuamente até o foco da imagem. Desse modo as crianças nascem

como olhos pequenos e cristalino com alto poder de acomodação, ou de

abaulamento. Tal propriedade permite que o foco seja “arrastado” até a retina e que

as crianças enxerguem com nitidez, mesmo sendo hipermétropes. Pelos

mecanismos genéticos, há a percepção de que a luz incidente na retina quando o

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

O Crescimento Ocular - Página 8

cristalino está relaxado (não abaulado) não está focalizada, e a sinalização para que

haja formação de colágeno escleral e alongamento do olho 10. Tal alongamento

cessa quando o foco da luz paralela proveniente do cristalino em repouso coincide

com a retina, ou seja, quando o olho se tornou emétrope (sem vício refracional).

Curiosamente, se as crianças nascem com olhos muito grandes, ou miopia

patológica (Ilustração 7), não há sinalização para a parada do crescimento, e

geralmente esses olhos continuam crescendo e tendo cada vez mais miopia. O

mesmo acontece em primatas que são privados do estímulo luminoso 11.

Obviamente tal mecanismo é teórico, e outros estímulos ambientais e genéticos

contribuem para a população de amétropes no planeta.

Ilustração 7. Ilustração esquemática de um olho emétrope, em relação ao olho com alta miopia, e um olho hipermétrope. Note-se que a retina mantém-se no mesmo plano nos três casos, demonstrando que o poder de convergência da córnea deve ser o mesmo, e somente o comprimento axial determina a ametropia em questão

Como vemos, não somente a manutenção, mas o processo de obtenção de uma

imagem nítida é complexo e determinado não somente pelos meios de refração dos

dioptros, mas por sua forma relativa.

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

O Crescimento Ocular - Página 9

Existem importantes e conhecidas evidências de transmissão genética da miopia. As

miopias baixas e moderadas seguem padrão de transmissão multifatorial com

provavelmente mais de um gene envolvido, enquanto as altas miopias têm em geral

um comportamento autossômico dominante, com expressividade variável quanto à

intensidade (grau da miopia) e penetrância incompleta.

O esforço acomodativo crônico é considerado como uma das possíveis causas da

miopia. O aumento da incidência de míopes em escolares e em pessoas que

trabalham muito com visão para perto, já foi documentado, e uma das explicações

para este fato seria que o aumento do poder refrativo do cristalino as custas do

músculo ciliar poderia influenciar no aparecimento e desenvolvimento da miopia. A

acomodação aumentaria a pressão longitudinal na cavidade vítrea, por aumento

do volume do cristalino, promovendo o alongamento ocular gradativo, com

conseqüente miopização. No entanto, esta observação, não se firmou

epidemiologicamente como uma relação causa-efeito, mas indica uma associação

entre atividades que requeiram esforço acomodativo (visão para perto) e miopia.

A esclera tem como função criar uma proteção para os componentes internos do

olho e ao mesmo tempo opor-se às forças de expansão geradas pela pressão intra-

ocular. A esclera humana é uma camada fibrosa, com colágeno representando 50 a

75% de seu peso seco. O colágeno tipo I é mais comum (90-95%) na estrutura da

esclera, enquanto o colágeno tipo III pode ser encontrado em pequena quantidade.

Estudos in vitro, sugerem um aumento na proliferação de condrócitos e síntese de

matriz extracelular em olhos privados de luz. Essa síntese de fibras colágenas

diferenciadas (diâmetro menor), resultaria em afinamento e diminuição da resistência

escleral, principalmente no pólo posterior, explicando o aumento no comprimento

axial desses olhos. Alguns autores sugerem que o uso de substâncias como a 7-

metilxantina (um metabólito da cafeína), promove um aumento na concentração e na

espessura das fibras colágenas da região posterior da esclera de coelhos e que tais

substâncias poderiam ser analisadas quanto a uma possível prevenção no aumento

do comprimento axial.

Também se observou a indução de miopia em casos onde o efeito da acomodação

visual foi anulado por lesão do núcleo de Edinger-Westphal ou por secção da

inervação ocular aferente e eferente ou ainda em animais que não possuem sistema

de acomodação. Tais fatos reforçam a hipótese de o crescimento ocular e a

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O Crescimento Ocular - Página 10

progressão da miopia não estarem associados à inervação eferente (estímulo

cortical) ou aferente (estímulo acomodativo), mas sim a estímulos bioquímicos

locais, que se iniciariam na retina e atuariam na esclera. Há evidências de que a

regulação do ciclo circadiano – claro/escuro, com interferência de receptores de

dopamina, presentes nas células amácrinas da retina, poderiam atuar nesse sentido.

Recentemente foi estudado o papel da melanopsina nesse processo. Tal

substância controla grande parte do ciclo circadiano na presença do olho de

camundongos, mesmo sem função visual. A retirada de olhos sem função visual

deve então ser repensada? 12

Alguns autores propuseram que a administração de cicloplégicos

(parassimpatolíticos) como a atropina, poderia diminuir a progressão da miopia.

Sugeriu-se que a acomodação poderia ser um fator determinante do aparecimento

da miopia tanto em olhos humanos como em animais. No entanto, a diminuição da

progressão da miopia com a administração de atropina foi também observada em

olhos de galináceos (que possuem musculatura intra-ocular estriada, com receptores

colinérgicos predominantemente nicotínicos) e, portanto não influenciados pela

atropina (um antagonista colinérgico muscarínico). Ou seja, em galináceos a

administração de atropina promoveu um menor aumento do crescimento ocular e

menor miopia, provavelmente por um mecanismo não relacionado à acomodação,

uma vez que a mesma não provoca cicloplegia ou dilatação da pupila nestes

animais. Criou-se, então a hipótese de que a atropina atuaria de uma forma não-

acomodativa, na prevenção do aumento do comprimento axial do olho. Em estudos

com primatas e outros mamíferos, a atropina invariavelmente provoca bloqueio da

acomodação, através de seu efeito sobre receptores muscarínicos do músculo ciliar,

ficando difícil distinguir se a diminuição da progressão da miopia deveu-se a um fator

acomodativo ou não 10.

A atropina é um antagonista colinérgico muscarínico que se liga a todos os cinco

receptores muscarínicos conhecidos (M1, M2, M3, M4 e M5). Sabe-se que os

receptores M1 são normalmente encontrados em células neurais, como por

exemplo, em camadas da retina, enquanto que receptores M3 são encontrados em

músculos lisos (por exemplo, músculo ciliar). A pirenzepina é um antagonista

muscarínico, específico M1. Estudos in vitro utilizando olhos de mamíferos

envolvendo pirenzepina, demonstraram sua eficácia em diminuir o crescimento

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Forma da Córnea - Página 11

escleral (medido através da diminuição da síntese de glicosaminoglicanos e DNA).

Sabe-se que na retina, as células amácrinas possuem receptores muscarínicos M1

sendo a acetilcolina um dos seus neurotransmissores. Os receptores muscarínicos

M1 também são encontrados na coróide e epitélio pigmentar da retina. A pirenzepina

poderia intervir no crescimento ocular bloqueando estes receptores localizados no

globo ocular. A presença de receptores muscarínicos em camadas celulares de

processamento da imagem retiniana (células amácrinas) explicaria a indução de

miopia por privação de estímulo adequado mesmo em olhos com nervos ópticos

secionados.

Vários estudos clínicos prospectivos aleatórios sugerem que a administração de

atropina 1x/dia retarda a progressão da miopia (não progressão de até 0,50 dioptria

ao ano). A concentração 0,5% provou ser mais eficaz do que as concentrações

0,1% e 0,25%. Os efeitos colaterais imediatos (fotofobia) e relacionados ao uso

crônico (maior exposição à radiação UV, podendo levar a alterações maculares e

indução de catarata, perda prematura da acomodação, além de efeitos sistêmicos) e

a falta de seguimento quanto à própria progressão da miopia em longo prazo,

causam ainda bastante controvérsia no seu uso clínico.

O uso de beta-bloqueadores poderia atuar na prevenção da progressão da miopia,

através da diminuição da pressão ocular. No entanto nem estudos em animais, nem

estudos clínicos aleatórios demonstram tal relação de forma significativa até o

momento.

Forma da Córnea

Por ser a base para a camada lipídica do filme lacrimal, o arcabouço corneano tem a

forma determinante para a maior parte da refração ocular. Apesar do conhecimento

da forma convexa da Córnea existir desde 1600, bem como a noção de que a luz

deveria atravessar a mesma de modo a ser focalizada dentro do olho, a aplicação

desse conceito e a construção de lentes corretivas somente foi documentada mais

tarde.

As lentes parecem ter sido descobertas por artesãos venezianos que cortavam

garrafas de vidro, e ao olhar para objetos próximos através das mesmas, notaram

sua magnificação e descobriram o “tratamento” da presbiopia. A partir dessas lentes

esféricas foram se desenvolvendo lentes astigmáticas, espelhos convexos, etc 13.

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Forma da Córnea - Página 12

A observação do reflexo de objetos simétricos e de tamanho conhecido, aliado a

conceitos de trigonometria, permitiu cálculos relativamente precisos da curvatura

anterior da córnea. Como seqüência natural desses desenvolvimentos tivemos o

aparecimento de ceratômetros qualitativos manuais, ceratômetros quantitativos

manuais e automatizados 13, e ceratômetros qualitativos e quantitativos

automatizados. Os últimos permanecem como instrumentos padrão para a

determinação da forma da córnea, e estão em constante evolução, com

incorporação de funcionalidades e módulos adicionais desde sua concepção.

A córnea já havia sido dividida por ocasião da adaptação de lentes de contato

corneanas em apical, limbal e transicional 14. Tal subdivisão interessa a

contactologia, pois cada região deverá sofrer a pressão correspondente a uma

adaptação individual (Ilustração 8). Determinou-se que a melhor adaptação, ou seja,

a condição de maior tolerância objetiva e subjetiva, seria a de um toque paracentral,

livramento apical e alta mobilidade.

Ilustração 8. Esquema das curvaturas centrais, paracentrais e periféricas de uma lente de contato rígida

Como até esse evento os instrumentos responsáveis pela determinação do poder

corneano mediam quatro pontos em aproximadamente 2,5 mm centrais da córnea,

foi introduzido um conceito de Topogometria, onde o mesmo instrumento

(Ceratômetro tipo Javal ou Baush and Lomb) media diferentes regiões da córnea

alternadamente, na dependência da direção do olhar. Esses mapas de área se

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Forma da Córnea - Página 13

limitavam a dezenas de pontos e eram trabalhosos, pois obtidos de modo manual (Ilustração 9).

Ilustração 9. Topogômetro clínico utilizado para medir a curvatura corneana em diversos pontos de sua superfície

Em 1957 15 foi novamente utilizado o conceito de regularidade dos discos de

Plácido, e vários anéis iluminados foram apresentados à córnea, que promovia sua

reflexão. Posteriormente tais figuras regulares ou irregulares eram fotografadas e

analisadas manualmente. Na década de 1970 a tecnologia digital permitiu a análise

automatizada da forma destes discos refletidos 13, e mais tarde a captura,

determinação de bordas e cálculo de distâncias foram totalmente incorporados nos

Topógrafos Corneanos. Hoje em dia toda a área de reflexão dos anéis pode ser

analisada, com precisão de aproximadamente 0,50D e reprodutibilidade clinicamente

significante.

A intensiva cooperação entre o Grupo de Óptica da USP-São Carlos e o setor de

Bioengenharia Ocular da UNIFESP permitiu nosso posicionamento, sempre na

vanguarda dos desenvolvimentos e inovações nesse campo. Citamos o

desenvolvimento praticamente em paralelo do Ceratômetro Cirúrgico Quantitativo 13

e dos princípios computacionais com construção do primeiro, e ainda único

Topógrafo Corneano Nacional 16, ambos de 1998. Também é importante

mencionar o Topógrafo Intraoperatório 17, 18, e o atual desenvolvimento de Redes

Neurais e Programas de Diagnóstico Automatizado de Alterações Corneanas 19.

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Astigmatismo e Ceratocone - Página 14

O último desenvolvimento está em registro no Instituto Nacional de Propriedade

Intelectual (INPI), concretizando a produção intelectual em nossa área de atuação.

Astigmatismo e Ceratocone

A forma da córnea fisiológica se divide em anesférica com asfericidade positiva e

negativa, com ou sem astigmatismo; e irregular, ou sem padrão definido. A

asfericidade se refere ao aplanamento ou aumento de curvatura da córnea desde

seu ápice até sua periferia, e tem o valor aproximado de 0,25 D/mm. Córneas mais

anesféricas que isso podem apresentar ectasias localizadas, como as submetidas a

procedimentos foto-refrativos para a correção da hipermetropias, ou as pertencentes

a indivíduos portadores de ceratocone central.

A definição clássica de ceratocone 20 trata de uma doença genética, ectásica, que

cursa com afinamento estromal, quebras na camada de Bowman e eventual

progressão para hidropsia aguda. Existem descrições de tipos bizarros de ectasias,

que devem fazer parte da mesma manifestação sindrômica 21, e certamente levam a

uma visão distorcida.

Os astigmatismos coabitam com a asfericidade, e determinam meridianos mais

curvos ou mais planos de uma mesma córnea. Raros são os casos de uma ausência

completa de astigmatismo, e o tipo mais freqüente de alteração é chamada de

astigmatismo a favor da regra, com 70% dos indivíduos afetados 22. Nestes casos

os meridianos verticais são mais curvos que os horizontais, provavelmente devido à

pressão constante das pálpebras sobre a Córnea. Astigmatismos opostos aos

descritos são catalogados como contra a regra, e os intermediários são chamados

oblíquos.

A definição de regularidade e simetria pressupõe o ápice da córnea como divisor

entre os dois semi-meridianos mais curvos da córnea. Córneas com astigmatismos

regulares apresentam continuidade entre os dois semi-meridianos, e córneas com

astigmatismos simétricos apresentam uma imagem em espelho da porção superior

em relação à inferior (Ilustração 10).

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Astigmatismo e Ceratocone - Página 15

Ilustração 10. Exemplos de mapas de superfície anterior da córnea com astigmatismo irregular (a) e astigmatismo assimétrico (b)

Nos casos onde não há regularidade ou simetria de padrões, chamamos os

astigmatismos de irregulares, ou sem padrão definido. Os mapas topográficos têm

certa diversidade, e a familiaridade com padrões de cores gerados a partir de uma

escala determinada permite um diagnóstico relativamente constante (reprodutível e

confiável) dos examinadores.

Atualmente temos uma dificuldade grande na determinação de bons candidatos à

cirurgia refrativa. Não somente do ponto de vista de expectativa do paciente, mas

também do ponto de vista clínico e mais especificamente topográfico. Sabemos que

se tais pacientes forem submetidos a ceratotomia radial, provavelmente terão maus

resultados refracionais 23. Também sabemos que aproximadamente 5% dos

pacientes que procuram os serviços de cirurgia refrativa tem suspeita de

ceratocone. Tal fato talvez se explique exatamente pela visão distorcida com o uso

de correção convencional (óculos ou lentes de contato gelatinosas), e conseqüente

procura da cirurgia como alternativa para a distorção. Finalmente sabemos que os

pacientes com astigmatismos irregulares leves, que não são classificados como

ceratocone (Ilustração 11), quando submetidos a cirurgia refrativa a laser, quer seja

PRK ou LASIK, perdem ao menos uma linha de melhor visão corrigida, quando

comparados com pares normais 24.

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Astigmatismo e Ceratocone - Página 16

Ilustração 11. Mapas da superfície anterior da córnea de pacientes submetidos a cirurgia refrativa a laser (LASIK e PRK), que tiveram maior perda de linhas de visão quando comparados a pares com topografias normais

Pelas graves conseqüências da cirurgia em casos de diagnóstico duvidoso,

esforços estão sendo empreendidos no sentido de melhorar as ferramentas

computadorizadas para a identificação precoce e correta dessa patologia. Redes

neurais foram testadas e permitiram diferenciar topografias normais de ceratocones

clássicos 19.

Vamos ver adiante que hoje em dia a categoria dos astigmatismos irregulares está

sendo caracterizada com base em outros atributos que descrevem planos

tridimensionais específicos, chamados de polinômios de Zernique. A evolução

natural da refratometria clínica caminha no sentido de denominar de desvio da normalidade, ou aberração, qualquer alteração de forma. Tal enfoque também é

utilizado em Topografia Corneana 25, e adiciona detalhes e características

identificáveis aos clássicos astigmatismos, asfericidades, etc..

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Determinação do Poder Corneano - Página 17

Determinação do Poder Corneano

Para se calcular o poder refrativo real da córnea é preciso considerar que este

sistema é composto de duas superfícies ópticas (faces anterior e posterior)

separadas por uma distância entre elas (espessura) e de três meios ópticos (ar,

córnea e humor aquoso) cada um com um índice de refração diferente.

A limitação técnica de medir a superfície posterior da córnea sempre dificultou a

confirmação do valor conhecido como K, ou poder real da córnea. A ceratometria

(manual ou computadorizada) e a topografia convencional com discos de Plácido, só

conseguem medir o poder óptico da superfície anterior da córnea.

Chamamos o índice derivado de todos os dioptros corneanos, que considera a

córnea como uma lente fina, de índice de refração teórico padrão, ou IRC. O IRC

anula a face posterior da córnea, assumindo que a mesma diminui em cerca de 10%

o poder da face anterior. Portanto, para uma mudança de 0,50D no poder total, a

modificação da face posterior deveria ser de aproximadamente 5,00D.

A videoceratografia combinada com a varredura de fenda de luz permitiu uma

avaliação mais completa e precisa de todo o sistema óptico da córnea.

Dependendo do índice de refração usado ou da porção analisada da córnea,

diversos mapas de poder são obtidos no analisador de fendas de luz ou Orbscan,

como os mapas ceratométricos, anterior, posterior, total e de espessura.

Para os mapas de poder ceratométricos, o aparelho Orbscan-II utiliza

automaticamente o índice de refração teórico padrão (IRC) de 1,337. Para os mapas

de poder total, anterior e posterior da Córnea, utiliza-se a variação fisiológica dos

índices reais de refração do ar (1,000), da Córnea (1,376) e do humor aquoso

(1,336). O mapa de poder da espessura (thickness power map) representa a

contribuição, no poder refrativo total da córnea, da espessura da córnea no ponto de

medida.

Os mapas de poder médio (mean power maps) representam o equivalente esférico,

isto é, a média aritmética da convergência, em dioptria, de cada ponto das

superfícies, anterior ou posterior, da córnea, em todas as posições (meridianos). O

mapa de poder total médio é a soma dos mapas de poder médio anterior, posterior e

da espessura.

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Face Anterior e Índice Teórico - Página 18

Apesar da precisão desta tecnologia ter sido verificada, sua confiabilidade tem sido

questionada. Uma observação realizada por nosso grupo dá conta de que valores

distintos são obtidos a partir da análise de diferentes áreas 26.

O Orbscan-II tem nos permitido demonstrar que os valores indicados pelos mapas

de poder ceratométrico são sempre maiores (entre +0,75 e +2,00 D com quase

+1,50 D em média), que os encontrados nos mapas de poder total. Esta diferença foi

estatisticamente significante. Isto é, o poder da córnea, quando assumido a partir da

medição da superfície anterior usando o IRC, é superior àquele calculado com base

em todos seus componentes ópticos (superfícies anterior e posterior, espessura e

índices de refração fisiológicos).

Os diversos mapas de poder ceratométrico, e em especial o axial ceratométrico,

que é o mapa mais popular, são úteis para fins comparativos com os dados

fornecidos pela ceratometria manual, computadorizada ou pela topografia com

disco de Plácido 27.

A capacidade do Orbscan II de analisar a região central da córnea parece ter sido

pouco pesquisada de modo sistemático e pode ser um passo importante no cálculo

do poder das lentes intra-oculares (LIOs), mormente após cirurgias ceratorrefrativas.

Enquanto a ceratometria manual mede uma área paracentral única, a topografia

convencional por discos de Plácido infere o centro da córnea, sem medí-lo, a partir

de anéis paracentrais. Sem a limitação inerente aos ceratômetros citados, as fendas

de luz permitem obter medidas da elevação das superfícies da córnea e, portanto,

do seu poder (expresso como a média de todos os pontos), em áreas centrais. A

análise de uma área interpolada de dois milímetros, pelo mapa de poder total médio

ou de uma área de quatro milímetros, pelo mapa de poder total óptico, parece ser o

mais próximo a valores significantes do ponto de vista clínico 26.

Face Anterior e Índice Teórico

Como visto, somente recentemente houve a possibilidade do cálculo do poder

corneano com o auxílio das fendas de luz. Quando mencionamos que a forma da

córnea já era conhecida e logo após, que sua determinação seria relacionada com

seu poder de vergência, assim como o poder de lentes, omitimos que, para tais

cálculos, eram utilizados modelos de olhos, ou os olhos esquemáticos.

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Face Anterior e Índice Teórico - Página 19

Existem vários modelos propostos, dentre os quais o de Gullstrand 28 (Ilustração 12),

e em todos eles parte-se de uma superfície de curvatura anterior pré-determinada,

de um comprimento axial conhecido e limitado até o cristalino a após o mesmo, e de

uma lente ocular (cristalino) também conhecida. A partir dessas referências é

possível calcular os pontos próximos de cada lente envolvida e montar diagramas de

raios (ray tracing) capazes de explicar fenômenos ópticos oculares.

Ilustração 12. Modelo do olho esquemático de Gullstrand, mostrando as dimensões relativas de cada dioptro e sua distância relativa

Um dos fenômenos passíveis de explicação é exatamente o poder corneano, que,

se medido para os olhos esquemáticos, deve corresponder a aproximadamente

43,00 D das 58,00 D totais de refração ocular 28. Portanto mais uma lente

convergente deve se interpor entre o foco e a retina, de modo a trazer o mesmo

para o plano da retina. Como tal lente está mergulhada em um meio de índice de

refração similar ao da água, e a própria lente tem um índice de refração não muito

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Face Posterior e Espessura - Página 20

diferente de 1,336, devemos dar enorme importância à forma dessa lente para torná-

la clinicamente significante. Por tal razão o cristalino tem um poder no interior do

olho de aproximadamente 19,00 D, e se fosse medido fora do olho teria um poder de

quase 100,00 D.

Todas as superfícies referidas até aqui foram tratadas como sendo lentes delgadas,

apesar de termos visto que sua espessura e forma são fundamentais para seu

efeito. Ao tratarmos a córnea como uma lente delgada, reduzimos suas

características a curvatura e índice de refração, e seu índice de refração teórico é,

portanto de 1,337. Vale a pena enfatizar novamente que tal índice é fictício, e não

leva em conta a espessura nem a curvatura posterior da córnea para ser obtido e

aplicado, mas somente a face anterior.

Face Posterior e Espessura

Já citamos que a tecnologia que nos permite analisar a face posterior da córnea leva

a denominação de Orbscan. Assumimos clinicamente que sua precisão e

reprodutibilidade são suficientes em córneas sadias e não operadas. Também

assumimos com certo consenso , que as córneas opacas são mal interpretadas por

esse exame, e que as córneas submetidas a cirurgias ceratorrefrativas, devem ser

analisadas com cautela 29.

Tais limitações parecem estar relacionadas ao reconhecimento da interface opaca

como interface final, e determinação de espessuras menores em situações

patológicas 30. Vale lembrar que o Orbscan constrói seus mapas com base em 40

fendas ópticas que se movem, e aproximadamente 4000 pontos, tendo de interpolar

medidas entre os pontos, e que se houver uma variação brusca de espessura em

um ponto, sendo esta artificial ou real, todo o mapa daquela região irá sofrer, pois

não temos notícia de haver um limitador de variância de espessura nestes

aparelhos.

De qualquer modo, pelo menos em córneas normais, as fendas nos permitem inferir

valores de curvatura posterior e de espessura, e o próprio aparelho realiza as

operações matemáticas que devem resultar em áreas de poder refrativo.

Como em inúmeros desenvolvimentos tecnológicos, temos no Orbscan um

significante montante de segredos de fábrica. Um deles é a determinação do mapa

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O Ápice da Córnea - Página 21

de elevação anterior. Na versão I do aparelho, não havia acoplamento de discos de

Plácido, e a elevação da superfície anterior era baseada exclusivamente na porção

anterior da fenda óptica. Aparentemente tal determinação não é tão precisa quanto a

análise, já consagrada, dos anéis de Plácido, e por isso mesmo a companhia optou

por adicioná-los na versão II. Exatamente quais e quantos dados são utilizados de

cada princípio são segredos de fábrica do aparelho, que impossibilitam o

entendimento matemático dos resultados isolados, ou seja, o mapa de elevação

anterior parece “contaminado” com o mapa de curvatura axial, e o mapa de

elevação posterior é reflexo somente da porção posterior da fenda óptica.

Resultante desse raciocínio julgamos pouco pertinente tratar a elevação anterior e

posterior da mesma forma, uma vez que cada uma delas oferece um conjunto de

dados obtido de modos diversos. Há, porém um meio de fazer a comparação mais

próxima, que é a utilização da paquimetria.

A paquimetria derivada do Orbscan utiliza somente as fendas ópticas, assim como

um paquímetro óptico. Nesse princípio o algoritmo de identificação localiza a porção

anterior e posterior da fenda no mesmo local, e subtraindo seus valores absolutos

chega a um resultado relativo, sem interferência de discos de Plácido ou outros

artefatos, como esferas de referência teórica. Concluímos então que a paquimetria

em córneas normais deve fornecer dados fidedignos de espessura, e permitir sua

utilização para o entendimento de patologias que cursem com afinamentos

corneanos.

Também estamos sugerindo que os mapas de elevação teóricos não devam ser

avaliados sem críticas, sendo ainda objeto de estudos e comparações com

situações consideradas padrão em nossa prática diária.

O Ápice da Córnea

Por estarmos tratando de instrumentos capazes de fornecer dados sobre uma

estrutura transparente e de pequenas dimensões, como a córnea, devemos

diferenciar os dados fornecidos pelos aparelhos e suas limitações, dos dados

anatômicos e da óptica fisiológica que desejaríamos obter.

Um dos pontos de referência mais importantes para os aparelhos ópticos como os

Topógrafos é o ápice da córnea. Determinamos como o ápice da córnea, a porção

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O Ápice da Córnea - Página 22

mais próxima dos discos de Plácido, quase nunca coincidente com a região do

centro geométrico da córnea.

Pelo arranjo cônico dos anéis, o ápice da córnea é freqüentemente determinado no

primeiro anel de leitura, ou seja, o anel mais próximo fisicamente da córnea; ou no

ponto de fixação. Tal arranjo cônico é fundamental para a melhor localização das

irregularidades corneanas, caso contrário haveria necessidade de uma grande

compensação para a distância de cada anel em relação a porções anatômicas da

córnea. O ápice é, portanto uma referência anatômica, que por motivos técnicos é

utilizado pelos Topógrafos Corneanos como o ponto de partida para a construção de

mapas ceratométricos.

Quando dizemos que se deve retirar importância do ápice como região

fisiologicamente determinante, enfatizamos a inexistência de uma relação entre a

otimização ou prejuízo do aproveitamento luminoso em relação ao ápice da

córnea, e principalmente em relação ao seu centro geométrico. Em outra leitura

poderiamos dizer que o ápice corneano é uma necessidade técnica e o centro

geométrico uma referência anatômica, que utilizamos quando por exemplo,

desejamos manter uma eqüidistância relativa das bordas de um enxerto de córnea,

em relação à margem da córnea receptora. Isso, pois é fato que se houver pequena

distância entre a interface do enxerto e os vasos do limbo, há maior chance de

rejeição do mesmo.

Tais considerações já foram objeto de discussão quando das cirurgias incisionais

corneanas, onde havia marcação do erroneamente denominado “centro óptico”, e

determinação da colocação de incisões a partir do mesmo. Em um clássico artigo de

1987 31 tal discussão pareceu encerrada, com a constatação da inutilidade óptica do

então chamado centro óptico, e conseqüente substituição pelo centro da pupila de

entrada (Ilustração 13).

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O Centro da Pupila de Entrada - Página 23

Ilustração 13. Diagrama da localização dos pontos de referência óptica na córnea. Note-se a não coincidência dos quatro pontos demarcados. O reflexo corneano, dependente somente da curvatura da córnea, geralmente se localiza nasalmente

O Centro da Pupila de Entrada

A Pupila de entrada é a imagem que temos da pupila, ou do orifício iriano através da

córnea. Ela é maior aproximadamente 0,5 mm que a pupila real (a que podemos

tocar quando de uma cirurgia a céu aberto, como o transplante de córnea) e se

encontra em um plano mais anteriorizado que a pupila real. É essa estrutura que

deve nortear a óptica fisiológica, e tem papel central em nossa discussão (Ilustração

14).

Ilustração 14. Diagrama da pupila de entrada e da pupila natural, demonstrando que a primeira encontra-se aparentemente maior e mais anteriorizada em relação à segunda

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O Centro da Pupila de Entrada - Página 24

Alguns motivos que devem ser levados em consideração para tamanha importância

dessa estrutura incluem a natural barreira que a mesma impõe à passagem de luz,

bloqueando fisicamente os raios corneanos paracentrais e atuando como um

diafragma óptico dinâmico. Tal fato tem sido a justificativa de toda a centralização

dos procedimentos refrativos corneanos estar sendo realizada com base na pupila

de entrada. Outro argumento inclui o direcionamento retiniano dos cones em

relação a essa estrutura, também denominado de fenômeno de Stiles-Crawford. Tal

fato chama atenção para a otimização ocular do pincel luminoso que tem em seu

centro o chamado raio chefe, ou o raio de luz que passa pelo centro da pupila de

entrada. Tal pincel carrega consigo o maior volume luminoso, e tem a potencialidade

de formar a imagem mais brilhante na região da mácula.

Hoje em dia os Excimer laseres e demais instrumentos cirúrgicos tem o centro da

pupila de entrada como principal referência, e as empresas produtoras desses

equipamentos direcionaram esforços para o reconhecimento e acompanhamento

de movimentos do olho como um todo e especificamente da área corneana referente

à pupila de entrada antes e durante os tratamentos oculares.

Cabe a ressalva que os aparelhos que acoplam opticamente o olho ao feixe de

laser, necessitam de uma referência com alto contraste, capaz de ser

continuamente reconhecida por uma câmera infravermelha ou de luz visível, e

monitorado durante as cirurgias. A diferença de cor entre a íris e a pupila gera o

contraste suficiente para tal mecanismo. Assim atuam os laser que se guiam pela

pupila de entrada. Porém temos a possibilidade de utilizar o contraste da esclera em

relação à íris, ou ainda de adicionar outro elemento, como um anel circular de alta

reflexão, para ser reconhecido pela câmera filmadora.

Estamos diante de duas realidades e duas necessidades. Uma delas é a realidade e

necessidade técnica do aparelho, que para funcionar necessita de áreas com

contraste, e de outro lado a necessidade e realidade do sistema óptico humano,

que apesar de reconhecer na pupila de entrada a maior fonte luminosa, não tem

necessariamente no centro da mesma, o alinhamento entre o objeto de fixação e a

mácula.

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Eixo Óptico e Eixo Visual - Página 25

Eixo Óptico e Eixo Visual

Se houvesse um perfeito alinhamento dos elementos ópticos do olho poderíamos

nos referir a um eixo óptico, que unisse o centro óptico de todos os elementos

oculares. Mesmo se existisse tal condição, não haveria visão possível se a mácula

não se localizasse exatamente no final desse eixo óptico. Um eixo unindo

teoricamente a mácula ao objeto de fixação, e passando pelo ponto nodal dos

elementos intra-oculares, teria a denominação de eixo visual.

Tais condições não existem e, portanto são errôneas tais denominações na prática

clínica. Do ponto de vista de modelos ópticos, o deslocamento da mácula em relação

ao alinhamento óptico perfeito ganha o nome de ângulo alfa.

Na prática clínica devemos ter em mente a referência ao eixo visual como a linha

que teoricamente conecta a mácula e o objeto de fixação (linha de visão). O

intercepto de tal linha com a face anterior da córnea define o centro de visão da

córnea, ou centro visual (Ilustração 15).

Ilustração 15. Representação esquemática das linhas de referência da visão, enfatizando a diferença da definição de eixo pupilar de Salmon e de Roorda. Note-se que ambos tem como uma das referências o centro da pupila de entrada. A linha de visão une a mácula ao objeto de fixação e não depende da posição da pupila

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Os Ângulos da Visão - Página 26

Os Ângulos da Visão

O eixo pupilar, referência hoje largamente utilizada, tem o centro da pupila de

entrada como um de seus elementos determinantes, porém existem discordâncias

em relação à sua segunda referência, como sendo a mácula 32 ou o objeto de

fixação 33.

Temos, portanto uma linha que une o centro da pupila de entrada com uma

referência externa (objeto) ou interna (mácula), e traz consigo o maior volume de

informação luminosa possível, conforme discutimos anteriormente. Novamente

chamamos a atenção para o olho não ideal, mas sim real. O olho onde os dioptros

não são todos alinhados, mas sim deslocados. Nesse sistema a pupila exerce um

papel bloqueador de raios sem, contudo modificar sua vergência.

Os raios que atingem a córnea paracentral são todos direcionados para o cristalino

e daí para a mácula, independente do local onde atinjam a face anterior da córnea.

Não há, portanto, um melhor ponto corneano isolado para a formação da imagem.

Mas há, sim, uma região sobre a córnea que determina menor distorção, ou

aberração, dos raios luminosos incidentes na mácula 32. Isso tem sido comprovado

usando os modelos computacionais do olho esquemático com dados de córneas in

vivo 34.

Também pode não haver uma linha contínua que une o objeto à mácula se a pupila

for demasiadamente deslocada, e mesmo assim o objeto será visto. Nessa condição

(clínica), nem o eixo pupilar que tem o objeto como um dos vértices, nem o que tem

a mácula como um dos vértices, descreve corretamente o melhor caminho luminoso,

ou o caminho do raio chefe.

Deveríamos dividir o problema em duas partes. A primeira que trata da formação da

imagem, e que sofre somente com a posição relativa dos dioptros. Nessa discussão

é fundamental a localização do ponto remoto de cada lente. Nessa abstração, não

há um eixo, mas sim um trajeto do pincel luminoso. A segunda parte do problema é

exatamente a posição da pupila nesse trajeto, que serve como anteparo à luz.

Para entender a segunda parte do problema devemos nos valer da comparação do

eixo pupilar com a linha de visão, onde pode haver um pequeno ângulo relacionado

às duas, que originariamente denominou-se lambda, mas acabou por denominar-se

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O Tamanho da Pupila - Página 27

ângulo kappa 28. Tal angulação aparece em pacientes que dirigem o olhar para um

objeto de fixação puntiforme luminoso, porém demonstram o reflexo do mesmo

objeto em localização distante do centro da pupila de entrada, simulando um

estrabismo, mas efetivando uma condição de alinhamento ocular fisiológico.

Para discutir a primeira parte do problema devemos medir o ângulo que separa o

eixo pupilar de origem macular, do originado no objeto, de modo a compensar a

posição relativa do olho e permitir o entendimento do sistema de raios luminosos

independentemente da pupila de entrada.

Tal condição é o desafio atual no diagnóstico e tratamento dos vícios refrativos nos

serem humanos e já foi objeto de discussão e proposição por Mandel, que gerou

uma metodologia que permite a detecção do eixo pupilar e conseqüente alinhamento

do ângulo kappa a partir de dados do topógrafo corneano 35.

O Tamanho da Pupila

A natureza dotou a pupila de um movimento pulsátil denominado hippus, que é

determinado pelo balanço entre o sistema nervoso simpático e o parassimpático.

Várias drogas utilizadas em oftalmologia acabam por modificar o equilíbrio

fisiológico, efeito colateral de uma ação sobre os receptores muscarínicos

colinérgicos (no caso dos parassimpatomiméticos), ou da inibição da liberação de

catecolaminas (como no caso de agonistas alfa 2), ou ainda da inibição das ações

da acetilcolina (como os derivados sintético das drogas antimuscarínicas). Tais

drogas provocam miose, impedem a midríase ou provocam midríase

respectivamente.

A pupila pode ser medida em condições escotópicas (sem luz), mesópicas (a meia

luz) ou fotópicas (com luz). Tais medidas são fundamentais para a compreensão

posterior de fenômenos envolvidos em cirurgias refrativas corneanas, uma vez que a

pupila determina quais raios luminosos irão atingir a face anterior do cristalino, e daí

a retina.

A literatura aponta para medidas de pupila variáveis com a idade e com o sexo,

apresentando as seguintes medidas (em mm) representadas por equações em mais

de 1000 voluntários estudados em condições escotópicas: 5.83 + 0.181*idade em

anos - 0053*idade em anos ^2 (r2 = 0.897) para homens e 5.40 + 0.285*idade em

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O Tamanho da Pupila - Página 28

anos - 0.0109*idade em anos ^2 para mulheres (r2 = 0.945) 36. Uma média de

tamanho pupilar pode ser considerada como sendo de 5.90 ± 0.97 mm, porém há

grande variação destes números, com limites de 3.24 a 7.91 mm 37.

Tal variação reforça ainda mais a necessidade de conhecimento personalizado de

cada pupila para a programação de cirurgias refrativas, uma vez que as cirurgias são

realizadas na córnea, e tem uma zona óptica característica, determinada pela área

de aplicação central do laser e transição periférica. Aqui se unem as duas partes do

nosso problema: a linha de visão (posição óptica ideal) e a pupila de entrada (menor

incidência de aberrações)

Todos os equipamentos hoje disponíveis para pupilometria determinam a melhor

circunferência que interpola os pontos da bordas da pupila. Uma análise mais

precisa da forma da pupila deveria envolver a determinação da figura geométrica

ligada por pontos (polígono de múltiplos vértices), e não uma curva simples da

família das elipses. Tal polígono pode ser determinado com 360 vértices permitindo

a análise não somente do diâmetro da circunferência média, mas também de sua

forma composta.

O pupilômetro refrativo ideal deveria também permitir a descrição de uma curva de

resposta individual à luz para cada nível de iluminância (Ilustração 16). A partir da

velocidade e intensidade da constrição, e do ponto final e inicial da curva, teríamos

um bom parâmetro, tanto na avaliação pré-operatória, quanto no diagnóstico pós-

operatório de casos com queixas de halos ou diplopias monoculares 38.

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O Terceiro Elemento: Cristalino - Página 29

Ilustração 16. Resposta da pupila de um indivíduo submetido a condições crescentes de luminância. Dados obtidos a partir do protótipo desenvolvido em conjunto com a EyeTec, 2003

O Terceiro Elemento: Cristalino

Além da análise da posição relativa de todos os dioptros oculares, devemos levar em

consideração que algumas estruturas tem um comportamento dinâmico, como é o

caso do cristalino.

Seu estudo fisiológico tem bases que datam do século XXIX, com Frederich Von

Helmholtz 39 que primeiramente descreveu e quantificou o mecanismo de alteração

da vergência da face anterior ou posterior da lente, com estímulos externos. Tal

movimento ganhou o nome de acomodação, e hoje sabemos que ela é responsável

por parte das irregularidades de nosso sistema visual, ou aberrações de alta ordem.

A acomodação permite às crianças nascerem hipermétropes, e mesmo assim

desenvolverem visão, bem como fornece uma margem de segurança para as

cirurgias refrativas, principalmente se realizadas em indivíduos com menos de 40

anos.

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O Terceiro Elemento: Cristalino - Página 30

A perda da acomodação é dependente da posição relativa dos seres humanos no

globo terrestre. Quanto mais distante do equador, mais tarde tal efeito se dará.

Aparentemente há uma forte dependência da consistência do cristalino na

presbiopia, havendo um endurecimento progressivo da lente e conseqüente perda

de elasticidade e maleabilidade em resposta a estímulos do músculo ciliar. O maior

desafio para a óptica fisiológica e a cirurgia refrativa é, sem dúvida, a restauração da

acomodação 40.

Propostas tem sido feitas, como as cirurgias de expansão da esclera sob o corpo

ciliar, porém seus resultados não são reprodutíveis na clínica. As outras opções para

que pessoas com mais de 40 anos mantenham sua visão para perto se baseiam na

confusão 41.

Entenda-se por confusão, a chegada de mais de uma imagem no cérebro, ou na

retina do paciente. Podemos ter tal efeito baseado na anisometropia (monovisão),

ou em lentes multifocais. A primeira técnica é mais fisiológica e tem sido tolerada

em até 70% dos casos 42. A segunda técnica é tolerada em alguns casos de

pacientes présbitas motivados a usar lentes de contato, principalmente

hipermétropes mais idosos, acima de 50 anos 43, 44, e depende da centralização das

lentes em relação à linha de visão dos pacientes.

Há uma importante especulação em relação ao mecanismo de acomodação,

principalmente quando se trata de avaliar as distorções do sistema visual como um

todo e propor métodos cirúrgicos para sua correção, como os tratamentos corneanos

personalizados a laser. Tais tratamentos se baseiam no diagnóstico de

imperfeições de nosso sistema visual, e na sua correção.

Até pouco tempo tais imperfeições ficavam restritas às ametropias clinicamente

conhecidas como miopia, hipermetropia ou astigmatismo porém, com a incorporação

de instrumentos antes utilizados para a análise do espaço cósmico, pudemos

determinar e quantificar aberrações como coma, aberração esférica entre outras, em

nosso sistema visual. Tais aberrações podem ser muito sutis, e mesmo assim ser

quantificadas de um modo reprodutível a curto prazo.

Os tratamentos personalizados se propõem a reduzir tais aberrações ou ao menos

limitar seu aparecimento após as cirurgias refrativas corneanas, e aparentemente

tal feito já está sendo observado na literatura 45. O que não se apurou foi a

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Avaliação do Sistema Visual como um Todo - Página 31

contribuição da dinâmica cristaliniana na manutenção da estabilidade de tais

tratamentos, e a propriedade de alteração dinâmica de forma de porções do

cristalino, conhecida como microacomodação.

O estudo da microacomodação está sendo realizado também por nosso grupo, que

determinou uma diminuição significante nas aberrações de alta ordem quando o

cristalino está em funcionamento, em contraposição a um aumento das aberrações

quando da cicloplegia 46, 47. Tais estudos tratam de manter a midríase necessária

para a comparação de mesmos tamanhos de pupila, porém utilizam-se de drogas

que não inibem a acomodação, como a fenilefrina. Por tais resultados é de se supor

que a lente cristaliniana tem o poder de corrigir dinamicamente aberrações setoriais

do sistema óptico, porém tais afirmações carecem de comprovação em larga escala.

Avaliação do Sistema Visual como um Todo

A determinação do poder de vergência do sistema óptico pode teoricamente ser

obtida com a soma da vergência de todos os dioptros, porém tal metodologia é

complexa em vários sentidos. Inicialmente não possuímos ferramentas diagnósticas

precisas o suficiente para determinar as curvaturas anterior e posterior da córnea e

cristalino in vivo. Também não sabemos ao certo o índice de refração de cada

porção da córnea, e menos ainda de cada camada do cristalino. Ao lado disso,

sabemos que o deslocamento de uma lente em relação a outra produz um efeito

prismático e que a posição da mácula varia entre os indivíduos, bem como o

tamanho de sua pupila.

Para contornar tais fatos, emprestamos os conceitos de aberrometria da óptica

espacial e medimos a vergência do sistema e não de seus componentes. Para tanto

precisamos ter acesso ao feixe de luz que tem em seu centro o raio chefe, que leva

em conta a mácula e o objeto de fixação. Se iluminarmos com luz coerente,

monocromática, unidirecional e puntiforme (laser) a coróide, temos um reflexo

proveniente de um ponto de luz no centro de um espelho côncavo. Tal ponto de luz

emitirá fótons em todas as direções, porém somente os que atravessarem a retina,

humor vítreo, cristalino, pupila, humor aquoso e córnea serão observados

externamente. Se fizermos tal feixe de luz atravessar pequenas lentes dispostas em

um arranjo simétrico teremos vários focos de luz que podem ser projetados em um

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Avaliação do Sistema Visual como um Todo - Página 32

anteparo. A figura que se forma nesse anteparo é a representação da vergência do

sistema visual como um todo (Ilustração 17).

Ilustração 17. Posição bidimensional dos focos das lentículas do sensor do tipo Hatman-Shack, presente nos analisadores de frente de onda

Se tivermos uma figura de referência formada a partir de um sistema emétrope,

podemos dizer se nosso arranjo de pontos representa ou não um olho emétrope. Se

soubermos a relação entre o deslocamento de cada foco da figura emétrope, e sua

vergência relativa, podemos saber se o sistema é míope ou hipermétrope (Ilustração

18).

Ilustração 18. Deslocamento dos focos de luz de um padrão ideal em relação a um padrão real, obtido de um olho humano a partir do mesmo sensor de Hartmann-Shack

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Ametropias e Comprimento Axial - Página 33

Ao excluir sistematicamente as aberrações uniformes, chamadas de aberrações de

baixa ordem, nos deparamos com as imperfeições mais sutis em relação a figura

ideal e chamamos estas imperfeições de aberrações de alta ordem 48.

Ametropias e Comprimento Axial

Com a incorporação da aberrometria à nossa prática clínica, devemos chamar de

aberrações, e não ametropias, todos os vícios refracionais. Atualmente ainda

precisamos nos ater às ametropias clássicas para a compreensão universal. As

ametropias clássicas envolvem a miopia, hipermetropia e astigmatismo e são as

aberrações com possibilidade de correção por óculos convencionais. Às outras

manifestações chamávamos até então de astigmatismos irregulares.

A miopia é uma das manifestações refracionais mais estudadas e carrega consigo

várias características fisiológicas e patológicas importantes. O olho pode ser míope,

na dependência de ser maior que o local de seu foco remoto, ou possuir uma

vergência maior que seu comprimento axial. À primeira condição denominamos

miopia axial e à segunda miopia de índice.

A maioria dos indivíduos alto míopes tem um olho maior que o considerado normal,

e se reúnem em um grupo que denominamos de míopes patológicos.

Aparentemente míopes de mais de 6,00 dioptrias esféricas possuem achados

característicos da miopia patológica, que se refletem em sua retina, vítreo e coróide 49. Algumas alterações são facilmente entendidas às custas de um olho mais

alongado, com estiramento de esclera e conseqüente estiramento de coróide e

retina, levando a estrias angióides, estafilomas, eventual rotura retiniana, etc..;

outros achados são de etiologia mais complexa, como a maculopatia miópica, que

pode cursar com hemorragia, buraco de mácula e perda de visão central.

Por estas manifestações devemos ter em mente o alto risco cirúrgico nos alto

míopes. Também vale a pena ressaltar que as correções das altas miopias já foram

propostas na superfície da córnea 50. Pacientes com miopias acima de dez dioptrias

esféricas devem ter sua cirurgia corneana exaustivamente discutida e

eventualmente contra-indicada, face ao conhecimento atual em cirurgia refrativa

corneana 51. Um dos motivo para tal afirmação é a relação direta entre a quantidade

de tecido que deve ser retirado do estroma corneano e a ametropia a ser corrigida.

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Ametropias e Comprimento Axial - Página 34

Tal equação tem como termo adicional a área da ablação realizada, e na atualidade

são utilizadas áreas de ablação de pelo menos 5,50 mm. Com tais dados, calcula-se

em mais de 120 micra a quantidade de tecido a ser retirado para a correção de mais

de 10,00 dioptrias de miopia, o que acarreta como conseqüência uma fragilidade

corneana remanescente que pode levar a uma ectasia corneana iatrogênica.

Inúmeras publicações avaliaram a eficácia e segurança de cirurgias intra-oculares

em altas miopias e, em nosso meio, participamos do desenvolvimento das lentes de

câmara anterior e suporte angular para olhos fácicos 52. Tais lentes inicialmente

possuíam alças relativamente rígidas, bordas espessas e pouca angulação entre as

alças e o corpo da lente levando à perda endotelial eventual e irregularidade da

pupila em vários casos. Mesmo assim houve importante sucesso e grande número

de pacientes operados. O desenvolvimento subsequente permitiu a confecção de

lentes mais delgadas, com suporte flexível e boa angulação (Ilustração 19).

Informações obtidas hoje pela Biomicroscopia Ultra-sônica permitem a triagem de

pacientes bons candidatos a tais auxílios ópticos.

Ilustração 19. Modificação no desenho e produto final destinado a corrigir altas ametropias quando colocado na câmara anterior de olhos humanos. Note-se que o segundo produto, denominado de lente Nuvita, apresenta hastes mais delgadas e angulação diferenciada das sapatas, além de ter as bordas ópticas mais finas

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Ametropias e Comprimento Axial - Página 35

A hipermetropia, em contrapartida, caracteriza-se por um olho pequeno e/ou uma

córnea plana, e carrega consigo riscos como o glaucoma de ângulo fechado ou as

hemorragias de coróide durante cirurgias intra-oculares. Como já citamos, quase

todos nascemos hipermétropes e utilizamos a acomodação para trazer a imagem até

a retina enquanto nosso olho não cresce. Existem fatores já identificados que

determinam o crescimento ocular e fundamentalmente determinam a parada deste

crescimento.

Quando a córnea tem uma curvatura diferente em seus dois meridianos principais

denominamos tal olho como astigmata. O astigmatismo pode ocorrer se o cristalino

possuir tal característica, ou mesmo se a esclera tiver uma curvatura diferente em

cada um de seus meridianos principais. A maioria dos olhos possui algum grau de

astigmatismo, porém somente a partir de um certo limite esta aberração compromete

a visão. Já dividimos o astigmatismo em astigmatismo na regra (meridiano mais

curvo vertical), contra a regra (meridiano mais curvo horizontal) ou oblíquo

(meridiano mais curvo distante mais de 15 graus dos meridiano vertical e horizontal).

Temos como extremos de limitação da visão os astigmatismos maiores que uma

dioptria cilíndrica, porém os astigmatismos contra a regra e oblíquo podem se

manifestar clinicamente com até 0,75 dioptria cilíndrica, devido provavelmente ao

fato de borrarem em um olho com o meridiano oposto emétrope, somente as linhas

verticais, que tem grande importância para a formação e interpretação da imagem.

Com o advento da topografia corneana, podemos medir a curvatura da córnea ao

longo de sua superfície e classificamos os astigmatismos também quanto à sua

simetria em relação ao ápice da córnea e sua regularidade quanto aos seus

semimeridianos.

Chamamos de astigmatismo regular, ao astigmatismo que pode ser corrigido com

óculos e avançamos denominando tal aberração de aberração de baixa ordem, bem

como a miopia e a hipermetropia. Os astigmatismos assimétricos, que não mantém

um padrão especular tendo como referência o ápice da córnea, e/ou irregulares, que

não mantém um alinhamento contínuo dos dois semimeridianos, não podem ser

corrigidos com óculos e são parte das aberrações de alta ordem que hoje em dia

podemos subdividir, quantificar, comparar e eventualmente tratar cirurgicamente.

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Tratamento das Aberrações de Baixa Ordem - Página 36

Tratamento das Aberrações de Baixa Ordem

Há uma máxima entre os cirurgiões refrativos ligados à prática academica, que diz

que se os óculos não tivessem sido inventados mas somente a cirurgia refrativa, ao

seu inventor caberia o prêmio Nobel. Isso retrata a enorme eficiência da correção

por lentes na visão final dos indivíduos. A introdução das lentes de contato rígidas,

depois gelatinosas e das cirurgias refrativas corneanas e intra-oculares, se deu

basicamente guiada por mudanças comportamentais na sociedade, como padrões

estéticos e não pela ineficiência dos óculos.

Até hoje quando orientamos pacientes pré-cirúrgicos, enfatizamos que a cirurgia

refrativa deve ter como objetivo a diminuição da dependência aos óculos ou lentes

de contato, e que provavelmente a visão do paciente deverá ser ligeiramente inferior

à conseguida com a correção anterior.

Se de um modo grosseiro e pouco aprofundado estamos elevando os óculos ao

patamar de solução final dos problemas visuais, numa análise mais pormenorizada

vemos avanços tecnológicos e possibilidades futuras muito interessantes com as

novas técnicas de cirurgia refrativa, como os tratamentos personalizados, que

cursam com menor indução de aberrações esféricas que os tratamentos não

personalizados de pequenas zonas ópticas e menor deformação de imagem que os

óculos.

De todo modo, até agora, a oftalmologia obteve sucesso na correção da visão da

maioria esmagadora dos casos, prescrevendo óculos com lentes esféricas,

cilíndricas e esfero-cilíndricas para a correção das miopias e hipermetropias;

astigmatismos simples; astigmatismos compostos e mistos respectivamente.

Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas

Apesar da aparente incongruência, a qualidade da visão atingida com a correção

visual parece inversamente proporcional ao avanço temporal da humanidade. Após

o advento e consolidação dos óculos, surgiram as lentes de contato de apoio

corneano e material rígido, como alternativa para casos de córneas deformadas,

altas anisometropias ou afacias. Realmente tais indicações nunca foram baseadas

em mudanças de padrão social, mas repousam em benefício mensurável para a

qualidade de visão se comparadas aos óculos.

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Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas - Página 37

Após o aparecimento das lentes de contato rígidas, surgiram materiais com maior

permeabilidade mas semelhante dureza e finalmente materiais maleáveis, que

genericamente foram denominados de gelatinosos. As lentes de contato gelatinosas

contribuíram imensamente para a popularização do uso de lentes de contato, pois

não apresentam o incômodo causado pelo toque da pálpebra com a borda das

lentes rígidas. Com essa característica e boa segurança, milhões de indivíduos

passaram a usar lentes de contato, mesmo sem as indicações anteriormente

descritas. Na maioria dos casos as aberrações poderiam ser corrigidas com óculos,

porém a praticidade, comportamento social e disponibilidade determinaram a nova

escolha.

O fato de que milhões passaram a usar lentes gelatinosas não faz dessa opção a

melhor opção do ponto de vista de qualidade óptica, porém deve ser levado em

consideração como fato concreto e determinado, antes da apresentação da limitação

dessas lentes.

Cabe a redundância de que as lentes gelatinosas são maleáveis, ou seja, se

amoldam à superfície subjacente, no caso a córnea. Sendo, portanto, paralelas à

superfície da córnea, seu efeito só pode ser derivado de diferenças regulares de

espessura entre o centro e a periferia, o que limita seu uso a casos de miopias ou

hipermetropias. A correção de astigmatismos implica na utilização de lentes tóricas

que mantenham uma relação estável com um determinado meridiano corneano, o

que só foi conseguido mais tarde com as lentes de contato gelatinosas tóricas, que

mantém sua posição com o auxílio gravitacional (Ilustração 20).

Ilustração 20. Ilustração esquemática de uma lente de contato gelatinosa tórica comercialmente disponível, demonstrando a zona prismática peso inferior, que determinará a orientação da lente sobre a córnea

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Óculos, Lentes de Contato Rígidas e Gelatinosas - Página 38

Atualmente a produção de lentes de contato gelatinosas está direcionada para as

lentes gelatinosas simples, sem correção de cilindros refracionais. A opção por tal

lente é obviamente mercadológica, uma vez que são pouquíssimos os casos onde

não se observam astigmatismos. Por outro lado, não são poucos os casos com

pequenos cilindros, e mesmo cilindros maiores, de até uma dioptria, que prefiram a

conveniência social, com visão ligeiramente borrada, ao uso de óculos 53.

As lentes gelatinosas simples são, do ponto de vista estritamente óptico, uma

regressão de alguns séculos de história e prestam-se à correção de um tipo de

aberração, de baixa ordem. As lentes gelatinosas tóricas devem ser comparadas aos

óculos convencionais e permitem a correção de todas as aberrações de baixa

ordem, havendo somente a limitação em relação à quantidade de aberração que

pode ser corrigida dessa forma.

As lentes rígidas, criadas inicialmente para corrigir córneas irregulares ou situações

ópticas desfavoráveis aos óculos, nunca deixaram a prática de clínicos e cirurgiões

de córnea e segmento anterior e encontram cada vez mais indicações, à medida

que a prática da cirurgia corneana se amplia.

Devemos também recorrer na redundância da ausência de maleabilidade das lentes

de contato rígidas, que mantém sua curvatura anterior e posterior independente da

superfície onde estão apoiadas e das pressões que sofrem. Com a manutenção das

suas características de fabricação quando em contato com a córnea, é permitida a

mudança radical do comportamento óptico do olho humano. Córneas irregulares

passam a apresentar à luz incidente uma superfície regular, previsivelmente regular.

As irregularidades aqui mencionadas podem ser os astigmatismos, abaulamentos

periféricos, depressões paracentrais, etc.. que compõe, além das aberrações de

baixa ordem, várias aberrações de alta ordem. É por esse fato que pacientes

usuários de lentes rígidas usualmente apresentam visão excelente, e notam uma

sensível piora na sua visão quando passam a utilizar as lentes gelatinosas.

Também por esse fato os pacientes candidatos a cirurgia refrativa corneana

(mormente pela técnica convencional) devem ser exaustivamente orientados em

relação à piora relativa de sua visão, mesmo com o sucesso cirúrgico esperado.

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Excimer Laser - Página 39

Excimer Laser

Do mesmo modo que as lentes de contato gelatinosas são utilizadas por milhões de

pessoas mesmo resultando em uma visão pior que as lentes rígidas, a cirurgia

refrativa se popularizou. A visão dos pacientes submetidos a cirurgia refrativa é

freqüentemente pior que a apresentada com a correção anterior, mesmo assim a

popularidade da cirurgia aumenta diariamente e as explicações passam por

conveniência na prática de esportes, intolerância a lentes de contato ou óculos,

estética, comodidade, etc.

O Excimer laser foi a ferramenta que elevou a cirurgia refrativa corneana a um nível

científico aceitável. Anteriormente à mesma, a correção era realizada com base na

modificação da biomecânica da córnea, com a aplicação de cortes periféricos

radiais que resultavam no desarranjo da estrutura armada da abóbada corneana. Tal

desestruturação era parcialmente previsível a curto prazo porém, seu

comportamento não pôde ser previsto a médio e longo prazo até 1994 54 , quando foi

publicamente aceito o fato do aplanamento contínuo da curvatura central de uma

porcentagem significativa das córneas submetidas à chamada ceratotomia radial. A

partir de então, tratamentos alternativos com resultados inconsistentes foram

propostos e avaliados para a diminuição da hipermetropia progressiva secundária

a ceratotomia radial, como as suturas circulares 55 (Ilustração 21).

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Excimer Laser - Página 40

Ilustração 21. Gráfico da regressão do efeito refrativo observado na córnea de quatro pacientes operados com sutura de fio de aço para a correção de hipermetropia pós ceratotomia radial

Derivada de supostos experimentos militares 56, a radiação ultravioleta mostrou-se

promissora na vaporização de tecido corneano, tendo como conseqüência pequeno

dano térmico subjacente. Após experimentos em animais e conhecimento prévio do

mercado 57, empresas norte-americanas concentraram esforços na correção de

miopias simples. A ablação diferencial centro-periferia, indo até aproximadamente

4,5 mm do centro da ablação (Ilustração 22), parecia suficiente para o resultado

esperado. Inúmeros pacientes foram tratados com a chamada zona óptica de 4,5

mm que, diga-se de passagem, era maior que a obtida nas ceratotomias radiais, de

aproximadamente 3 mm.

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Excimer Laser - Página 41

Ilustração 22. Fotomicrografia corneana ilustrando o padrão de ablação em degrau para miopias, conseguido com laseres de área extensa e diafragma

Vários desses pacientes tiveram bons resultados, porém, como não era totalmente

conhecida a conseqüência da profundidade de ablação, casos de altas ametropias

desenvolveram formas anormais de cicatrização (chamadas à época de

pseudomembranas) com a formação de colágeno fetal e acúmulo de matriz

extracelular altamente hidratada, que causaram o chamado “haze” 58 (Ilustração 23).

Ilustração 23. Córnea com deposição de colágeno fetal após tratamento de alta ametropia na superfície da mesma (haze)

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Excimer Laser - Página 42

A constatação de que tratamentos profundos limitariam as ametropias a serem

corrigidas coincidindo com o litígio entre optometristas e oftalmologistas americanos

sobre a possibilidade de realizar procedimentos de baixa complexidade, fez ressurgir

a técnica de delaminação corneana estromal seguida da aplicação do excimer laser,

que ganhou a denominação de LASIK. Com tal tecnologia foi possível diminuir a

interferência de fatores da cicatrização como as interleucinas e fatores de

crescimento, e ampliar a gama de ametropias a serem tratadas. Além disso, foi

convenientemente ampliada a complexidade do procedimento, limitando a execução

do mesmo a médicos oftalmologistas.

Coincidente à introdução do LASIK, observou-se modificações na arquitetura do

feixe de laser, com modulação periférica e possibilidade de tratamentos de

hipermetropias e astigmatismos miópicos simples e compostos, além da ampliação

do diâmetro dos feixes. Novos laseres que necessitavam de menos potência e

baseavam-se na movimentação do pequeno feixe ou feixe estreito sobre a córnea,

foram fabricados. A cada modificação novos resultados eram esperados e novos

nomogramas eram construídos 59, o que implicava em significante imprevisibilidade

dos tratamentos.

Infelizmente, a evolução dos laseres não foi acompanhada pela evolução nos

aparelhos que possibilitavam a aplicação profunda dos mesmos, os microcerátomos.

Tais aparelhos tiveram sua origem remota nos anos 60, com José Ignácio Barraquer,

que utilizou-os para obter uma lamela corneana e torneá-la 60. Além do processo

ainda ser totalmente mecânico e o aparelho apresentar as mesmas partes móveis há

mais de 40 anos, suas lâminas de uso único não raramente são reutilizadas,

podendo comprometer o corte (Ilustração 24). Instrumentos capazes de analisar em

tempo real o fio de corte dessas lâminas foram idealizados e parcialmente

desenvolvidos por nosso grupo 61, e devem tornar-se realidade em um campo

guiado pela máxima qualidade e mínimo risco.

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Excimer Laser - Página 43

Ilustração 24. Captura digital do fio de corte de uma lâmina de LASIK submetida a trauma, determinação do perfil de corte e interpolação matemática da irregularidade central apresentada após impacto proposital

Mesmo após centenas de tratamentos seguidos e avaliados num mesmo aparelho,

ainda havia certa imprecisão e os pacientes deveriam (e devem) ser informados e

orientados em relação a essas cifras. Esperávamos inicialmente que 77% dos

pacientes apresentassem visão melhor ou igual a 20/40 62. Atualmente contamos

com até 97% 63 dos pacientes com visão de 20/40 ou melhor, após um mês da

mesma cirurgia (PRK).

Mesmo com tamanha evolução em relação aos resultados quantitativos,

continuamos a fundamentar as indicações de cirurgia refrativa corneana na

diminuição da dependência de óculos e mantemos a posição de nunca “indicar” uma cirurgia refrativa, mas sim deixar de contra-indicá-la. Vários de nós aguardam

tal mudança de filosofia, o que traria para a clínica milhões de felizes usuários de

óculos ou lentes de contato.

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Excimer Laser - Página 44

As lentes rígidas ainda dão melhor visão que a maioria das foto-ablações corneanas,

e nosso parâmetro de avaliação está migrando da quantidade de visão para a

qualidade de visão.

Questionários e a relação médico paciente dizem mais sobre a visão do que a tabela

de Snellen e expressões como “20/happy” são utilizadas para definir resultados

pós-operatórios. A necessidade de manipulação de dados pouco ortodoxos levou-

nos a realizar trabalhos de qualidade de visão e, principalmente, da qualidade de

vida relacionada à visão e ao uso de correção visual, o que é bem mais abrangente

por envolver fatores psicossociais. Tais estudos poderiam permitir a separação de

um paciente contente com visão 20/25 e um descontente com visão 20/25 64. Vários

fatores parecem influenciar nessa diferenciação, inclusive a expectativa pré-

operatória.

Do ponto de vista da óptica fisiológica, a atenção está voltada para a imagem

retiniana conseqüente à cirurgia corneana. Julgamos tal imagem como um ponto, e

simulamos seu borramento, denominando o resultado como a função de

espalhamento de ponto ou “PSF - point spread function” (Ilustração 25). Tal

borramento é conseqüência natural da somatória de todos os raios que atingem a

face anterior da córnea e não são bloqueados pela pupila, reforçando mais uma vez

a importância da localização, forma e comportamento da pupila na cirurgia refrativa

corneana.

Ilustração 25. Simulação experimental da função de espalhamento de ponto em um olho sem aberração e em um olho com aberração do tipo coma

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Excimer Laser - Página 45

Quanto mais difuso e maior for o borramento, menor deverá ser a definição visual

do indivíduo. As maiores causas de borramento são derivadas de miopia ou

hipermetropias, seguidas dos astigmatismos. A essas aberrações altamente

deletérias, pois presentes em maior quantidade, denominamos aberrações de baixa

ordem.

Tanto com lentes gelatinosas como após cirurgias foto-refrativas corneanas, temos

geralmente uma diminuição acentuada das aberrações de baixa ordem, o que leva

inexoravelmente a uma melhora da visão dos pacientes em relação à ausência de

correção, porém, nessas duas condições não chegamos a ter um ponto discreto na

retina, mas mantemos um borramento, tênue, mas presente. Tal persistência pode

ter conseqüências em determinados pacientes, que exprimem uma sensação visual

de halos, estrelas ou borramentos indeterminados em torno de fontes luminosas,

principalmente em condições escotópicas ou mesópicas (Ilustração 26).

Ilustração 26. Ilustração feita por um paciente operado com laser de área extensa e zona óptica pequena, exprimindo sua visão ao olhar para uma lâmpada oval e uma tubular, quando acesas à noite

Hoje em dia a prevenção dos sintomas com a identificação, seja por meio de

questionários ou do estudo da pupila, de tais indivíduos é um dos desafios maiores

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 46

na cirurgia refrativa 65. O tratamento desses sintomas também é desafiador, porém

aparentemente temos uma arma a ser testada para estes casos, que é o tratamento

personalizado.

Independente da atuação na prevenção ou tratamento, necessitamos do domínio da

tecnologia no diagnóstico da função de espalhamento de ponto. Já mencionamos

anteriormente que a avaliação do sistema visual como um todo se dá por meio da

avaliação das frentes de onda ou aberrometria e, para a realização da mesma, já

dispomos de algumas tecnologias.

Sensores e Aparelhos de Aberrometria

Apesar da óbvia presença da tecnologia de ponta para a análise de frentes de onda,

os seus princípios básicos foram postulados há quase quatro séculos.

O primeiro trabalho tratando o assunto da óptica do olho humano foi publicado por

Scheiner em 1619, quase 70 anos antes dos trabalhos do Newton e de Huygens,

considerados os fundadores da óptica física. Neste trabalho pioneiro “Oculus, sive

fundamentum opticum”, Scheiner descreveu um aparelho simples, desde então

conhecido como o disco de Scheiner, para medir as imperfeições do olho humano 66.

O disco de Scheiner é um disco opaco com dois buracos (Ilustração 27). Se o disco

for colocado na frente de um olho “sem imperfeições”, a luz de um objeto distante e

puntiforme como uma estrela ou uma luz distante mais de seis metros do olho

humano atravessando os dois buracos, formaria uma só imagem retiniana. Tal efeito

seria relatado pelo paciente como a visão de um objeto único. No entanto, caso o

olho tenha algum grau de erro refracional, formar-se-iam duas imagens, o que

poderia ser corrigido colocando-se uma lente simples correspondente ao erro

refrativo.

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 47

Ilustração 27. Disco de Scheiner, utilizado para identificar imperfeições de todo o sistema óptico do olho humano

Em outra linha de pesquisa independente do trabalho de Scheiner, Tscherning

(1894) descreveu um método para a medida das aberrações do olho humano. O

aberrômetro de Tscherning, descrito no trabalho “Die monocrhomatischen

Aberrationene des menschlichen Auges”, trata de uma lente positiva de + 5,00

dioptrias com uma grade gravada 67 (Ilustração 28).

Ilustração 28. Grade de Tscherning utilizada para revelar imperfeições de todo o sistema visual a partir da observação das distorções na retina humana. Atualmente a grade é iluminada e a imagem capturada é analisada digitalmente

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 48

O paciente, olhando para um objeto puntiforme através deste aberrômetro,

enxergaria a sombra da grade deformada pelas aberrações do olho, e poderia

descrevê-las ou mesmo desenhá-las. Somente sessenta anos mais tarde (1960),

nos trabalhos de Howland descrevendo o aberrômetro de cilindro cruzado, e

Howland & Howland em 1977, 68 aplicando-o na população humana, teríamos as

primeiras aplicações clínicas destes princípios, ainda com os aberrômetros

subjetivos.

A aberrometria baseada nos princípios de Tscherning foi aperfeiçoada por volta de

1977 com o uso conjunto de laseres, câmeras de vídeo ultra-sensíveis e micro-

computadores, tornando possível medidas objetivas mais precisas e consistentes,

no lugar das subjetivas.

Contemporaneamente a Tscherning, Hartmann modificou o disco de Scheiner

acrescentando mais perfurações ao disco. Desta forma, a luz, chegando de um

objeto distante, seria dividida em vários raios e a orientação de cada um ou o desvio

da posição ideal, seriam causados pelas aberrações de todo sistema visual e as

representaria 66.

Mais tarde, em 1971, Shack continuou com a modificação, substituindo o disco

perfurado por uma matriz de pequenas lentes (Ilustração 29), descrevendo o sensor

chamado de Hartmann-Shack 69. Desta forma, a luz é dividida em raios pelas

próprias lentes, e as aberrações ópticas podem ser detectadas medindo-se desvios

dos focos das lentes em comparação com as posições dos focos ideais.

Ilustração 29. Matriz de microlentes proposta por Shack e presente na maioria dos aparelhos de análise de frentes de onda comercialmente disponíveis

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 49

A primeira aplicação clínica do aberrômetro de Hartmann-Shack ocorreu com o

auxílio do uso de câmeras de vídeo ultra-sensíveis e micro-computadores por Liang,

em 1994 70.

Princípio dos Sensores Como as aberrações ópticas do olho humano têm como conseqüência a deformação

ou nitidez da imagem na mácula, o aberrômetro ideal deveria medir as aberrações

diretamente na mácula, avaliando a qualidade da imagem. Isso é impossível do

ponto de vista técnico, portanto todos os aberrômetros são obrigados a lidar com a

luz atravessando o sistema visual duas vezes, entrando e saindo do olho.

Existem duas maneiras de analisar o sistema óptico do paciente usando a tecnologia

de frente de onda, dependendo do sentido da luz (na entrada ou na saída do olho)

na qual as aberrações analisadas acontecem.

No primeiro grupo dos aberrômetros “de entrada”, baseados no princípio da imagem

retinoscópica simultânea (Tscherning) ou seqüencial (Tracey), um feixe de luz

paralelo atravessa o olho e sofre as aberrações enquanto a frente de luz está

entrando no olho.

Em outros aberrômetros, ainda “de entrada”, as aberrações de imagem são

avaliadas estimando-se a diferença do caminho óptico entre vários pontos,

baseando-se no princípio de retinoscopia (OPD scan).

Os métodos que analisam a luz que parte da retina do paciente têm como base a

reversibilidade da luz, avaliando assim as aberrações na “saída” do olho

(Hartmann-Shack e Castro). A lista dos aberrômetros comercialmente disponíveis

encontra-se na iIlustração 30.

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 50

Ilustração 30. Lista de analisadores de frente de onda disponíveis em janeiro de 2003. Seu nome comercial encontra-se na primeira linha, o princípio no qual se baseia na segunda, e a empresa produtora na terceira

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 51

Característica dos Sensores

Tscherning O aberrômetro baseado no princípio de Tscherning foi projetado por Mierdel e

colaboradores, na Universidade Técnica de Dresden, Alemanha 71. Atualmente duas

empresas alemãs disponibilizaram comercialmente aberrômetros baseados neste

princípio: WaveLight e Schwind.

Este aberrômetro é composto por três vias ópticas: via de entrada, via de saída e via

de centralização da imagem. A luz de laser vermelho (670nm) é colimada e

expandida para atingir uma boa homogeneidade. Este feixe de luz de secção

extensa atravessa uma máscara com uma grade de 168 pequenos furos, dividindo-

o em raios finos (diâmetro de 0,3 mm cada) e paralelos. Estes raios paralelos são

projetados com um diâmetro de 10 mm na córnea e atravessam todo o sistema

óptico de olho, formando o foco (área de menor confusão) alguns milímetros antes

da retina. Essa projeção gera uma imagem retiniana de um milímetro, real e

invertida, onde cada ponto representa a imagem de um raio originado da máscara

(Ilustração 31). Para que o tamanho da imagem retiniana seja sempre igual a um

milímetro, mesmo em olhos com diferentes poderes dióptricos, uma lente

aberroscópica é acoplada no caminho óptico do aberrômetro. Desta forma, o

paciente enxerga suas próprias aberrações percebendo a deformação seletiva da

grade entrando no olho, podendo até descrevê-las.

Ilustração 31. Imagem retiniana real e invertida, onde cada ponto representa a imagem de um raio originado dos raios puntiformes emitidos nos aparelhos que se baseiam no princípio de Tcherning

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 52

Após uma exposição de 60 msec, uma foto da imagem retiniana de 1 x 1 mm2 é

formada e capturada usando-se um esquema óptico baseado nos princípios da

oftalmoscopia indireta e uma vídeo-câmera. Um diafragma é colocado no caminho

óptico para assegurar que a imagem seja formada somente pelos raios paraxiais

atravessando a via de saída e passando exclusivamente pela área paraxial do

sistema óptico do olho. As coordenadas dos centros geométricos de todos os

pontos da imagem retiniana são determinados através do programa específico no

microcomputador.

O padrão ideal das coordenadas no olho sem aberrações é calculado usando-se o

modelo do olho simplificado de Gullstrand, onde o comprimento axial do olho é

calculado a partir da refração esférica medida pela função de refrator automatizado. A posição de cada ponto da imagem é comparada com a posição

ideal, e o desvio da frente de onda da sua forma ideal esférica pode ser calculada no

nível da pupila usando-se a relação entre posição dos raios na córnea e a posição

na imagem retiniana.

Hartmann-Shack O aberrômetro baseado no princípio de Hartmann-Shack é o mais utilizado

atualmente, sendo comercialmente disponível através de várias empresas: Alcon,

Bausch & Lomb, Topcon, VISX, Zeiss e Wavefront Sciences.

Um pulso curto de raio de laser infravermelho fino (diâmetro de 10 µm) é projetado

na mácula, e a luz é refletida pelas estruturas profundas da retina ou da própria

coróide, iniciando uma frente de onda perfeitamente esférica. No caminho de saída

do olho, a frente será modificada pelas próprias aberrações do olho, assumindo uma

forma irregular ou com aberrações. Esta frente é subdividida pela matriz de lentes

em vários pontos de foco que incidem sobre um CCD (sensor de luz presente em

uma câmera de vídeo) fotossensível.

Como os pontos de foco também sofrem de aberrações das lentes, existe um

borramento ao redor dos mesmos e o programa dos aparelhos aplica filtros para a

detecção do ponto de maior luminosidade, e para definí-lo como o foco da respectiva

lente (Ilustração 32). Uma vez encontrados todos os focos de cada lente, o mesmo

programa irá comparar a distribuição dos focos com uma distribuição padrão de

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 53

uma frente de onda plana determinada pela fábrica. A distância relativa de cada

foco ao ponto padrão determinará a aberração correspondente.

Ilustração 32. Determinação do brilho médio dos pontos de foco e obtenção das coordenadas da frente de onda a ser comparada com o padrão. Primera versão do programa a ser utilizado no sensor de Castro, desenvolvido pela Eyetec em 2002

Há de se notar que em todos os modelos de sensor, as distâncias relativas é que

determinam a perfeição ou imperfeição da frente de onda. Os polinômios de Zernike

são o modo que os engenheiros e físicos conseguiram traduzir essa deformação

para que elas tivessem um sentido para os observadores. Os polinômios são,

portanto, obtidos a partir da imagem deformada observada, e as imagens

deformadas são obtidas a partir dos sensores (Ilustração 33).

Ilustração 33. Ilustração da deformação de uma grade regular (em verde) após atravessar um sistema óptico (azul). A partir das distâncias entre as arestas da grade vermelha é possível fazer o cálculo dos termos do polinômio de Zernique e determinar a contribuição de cada aberração individual ou de todas as aberrações de alta ou baixa ordem

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 54

Mistos

Tracey, OPD Scan De modo a aproveitar a tecnologia bem estabelecida dos refratores automatizados

atuais, empresas como a Nidek e a Tracey Technologies utilizaram o caminho

óptico da luz e tomaram várias medidas em cada ponto da pupila.

Vale lembrar que sempre nos referimos à pupila como local de medida das

aberrações, isso porque a íris bloqueia qualquer raio de luz que incida sobre a

mesma, limitando a área de análise à pupila livre (Ilustração 34). Também por esse

motivo devemos sempre conhecer o tamanho da pupila onde o exame foi feito e

comparar exames realizados sempre com o mesmo tamanho de pupila.

Ilustração 34. Esquema da área da pupila a ser avaliada pelos analisadores de frente de onda. Somente a luz que retornar da coróide e atravessar a pupila será analisada, enfatizando a importância do tamanho e posição da pupila na análise de frentes de onda

O OPD ("optical path difference") mede aproximadamente 1440 pontos meridionais

na pupila do paciente, e o sensor utilizado no aparelho comercializado pela Tracey

obtém imagens não simultâneas de cada ponto de leitura, teoricamente tem a

vantagem do não cruzamento de raios de luz, o que na prática não foi ainda

demonstrado como superior aos sistemas concomitantes.

Castro O sensor de Castro é um sensor de saída e caracteriza-se pela obtenção de um foco

circular a partir de um conjunto de lentes circulares concêntricas de secção tórica.

Cada lente tórica circular se comporta como um anel de focalização, que forma uma

linha circular contínua de foco (Ilustração 35).

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Sensores e Aparelhos de Aberrometria - Página 55

Ilustração 35. Imagem das lentes tóricas circulares do sensor de Castro. Note-se a concentricidade das linhas circulares e a continuidade das mesmas. A partir dessa forma o programa deverá determinar as aberrações isoladas e agrupadas do sistema óptico

As lentes concêntricas têm um raio que possibilita a focalização em uma distância

conhecida e a imagem produzida é capturada por um CCD após o tratamento dos

raios para diminuir as imperfeições do sistema óptico do aparelho. Note que na

Ilustração 36 a posição 18 é onde fica o sensor, entre a luz que sai do olho e o

computador que irá trabalhar a imagem.

Ilustração 36. Diagrama opto-mecânico da posição dos componentes no aberrômetro baseado no sensor de Castro. A posição 8 está reservada ao sensor propriamente dito

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 56

O sensor de Castro tem como ferramenta de uso um programa exaustivamente

testado por uma empresa ligada a Opto Eletrônica, denominada EyeTec. A EyeTec

desenvolve há vários anos o videoceratógrafo Corneano CT-2000 16. Como os

topógrafos corneanos atuais, o CT-2000 utiliza-se de discos de Plácido para

representar a imagem da superfície anterior da córnea, e tais discos formam

imagens circulares semelhantes às obtidas pelo sensor de Castro, parte da

tecnologia na identificação dos anéis nas imagens digitalizadas foi aproveitada do

Topógrafo Corneano previamente desenvolvido pela empresa Eyetec e

comercializado pela Opto Eletrônica.

A partir dos anéis circulares determinam-se linhas contínuas e compara-se sua

deformação com um círculo perfeito. Porções mais afastadas de uma esfera ideal

representam regiões de frentes de onda mais divergentes (hipermétropes) que

porções mais próximas.

Tendo registrado as diferenças de forma entre a imagem obtida e uma imagem de

calibração artificial, é possível a composição dos polinômios de Zernike, que

definirão as aberrações de baixa e alta ordem.

Algumas vantagens do sensor de Castro incluem a relativa simplicidade na

manufatura do sensor e a menor possibilidade de leitura errônea de focos, pois os

mesmos algoritmos usados na topografia corneana servem para que o programa

“siga” a linha contínua circular e não misture a imagem de um anel com o outro. O

sensor de Castro encontra-se em processo de patenteamento 72 e deverá estar

disponível em futuro breve para uso clínico .

Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike

Os cálculos envolvidos na descrição das aberrações da frente de onda têm início a

partir das posições no plano cartesiano dos focos puntiformes provenientes da

lentículas, e formados no CCD. Os algoritmos para processamento de imagens nos

fornecem os centros de "massa" de tais pontos e, portanto temos as coordenadas

para pontos da imagem de calibração (olho artificial emétrope) e para imagens de

olhos in vivo ou artificiais com aberrações. Dadas as coordenadas destes pontos,

calculamos as derivadas parciais da função frente de onda. As funções matemáticas

que nos permitem com uma equação descrever uma superfície, foram propostas por

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 57

Zernike e publicados pela primeira vez em 1934.

Zernike foi inventor do microscópio que opera pelo princípio da diferença de fase 73,

especialmente útil na magnificação de imagens biológicas, sem a necessidade de

uso de corantes. Isto é muitas vezes vantajoso, pois em certos casos os corantes

deterioram a amostra. Ele recebeu o prêmio Nobel por esta invenção e, em um de

seus trabalhos relacionados a este instrumento, apresentou uma série de polinômios

com propriedades de simetria especialmente interessantes para descrição de

aberrações ópticas. Por suas características, estes polinômios adquiriram grande

aceitação e difusão entre os cientistas na área de óptica e são hoje amplamente

usados em astronomia, óptica adaptável e retinoscopia de alta resolução 74, 75.

O entendimento das aberrações pode ter duas abordagens denominadas óptica de

raio e óptica de ondas. Um sistema óptico gera uma imagem puntiforme se todos os

raios que formam essa imagem encontrarem-se em um mesmo ponto. No entanto,

essa situação ideal não existe na vida real devido à presença das aberrações. Na

abordagem pela óptica de ondas um sistema óptico perfeito gera uma onda

perfeitamente esférica centralizada na imagem puntiforme. As diferenças dessa

superfície ideal constituem as aberrações.

A análise de frente de onda tem como objetivo estudar a forma (distorções de um

plano de referência) de uma frente de onda. Uma das leis básicas da óptica

geométrica é a da reversibilidade dos raios e essa lei afirma que o caminho

percorrido por um raio luminoso de um objeto a uma imagem é reversível e,

portanto, idêntico àquele percorrido da imagem ao objeto. Dessa maneira um olho

humano teoricamente perfeito convergirá todos os raios provenientes de um ponto

no infinito para um único ponto na mácula e a frente de onda gerada por um ponto

na mácula será perfeitamente plana ao sair do olho (Ilustração 37). Portanto, na

maioria dos sistemas de análise de frente de onda estudamos as distorções

presentes na frente de onda gerada por uma fonte luminosa puntiforme localizada na

retina.

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 58

Ilustração 37. Representação esquemática de uma frente de onda gerada na mácula e se propagando pelas estruturas transparentes do olho. Note que nesse olho ideal a frente de onda emergente da córnea é plana

A descrição de uma superfície complexa como a de uma frente de onda com

aberrações requer ferramentas específicas. Os polinômios de Zernike são uma

maneira de caracterizar e quantificar superfícies, permitindo a sua comparação.

Para o entendimento dos polinômios de Zernike precisamos entender o que é uma

decomposição física. Para serem estudados, os fenômenos físicos devem ser

decompostos em um sistema convencional antes de serem comparados. Uma

decomposição perfeita é aquela que permite, a partir de um fenômeno, gerar uma

decomposição que é perfeitamente retrógrada, ou seja, a partir dos dados

decompostos possamos reconstruir o evento.

O raio de curvatura de uma circunferência é o único dado necessário para

compararmos circunferências e as medidas dos três lados de um sólido retângulo

são suficientes para compararmos o tamanho e volume de dois sólidos, pois com o

raio de curvatura da circunferência e as medidas dos lados do sólido podemos

reconstruir a circunferência e o sólido originais. A decomposição de uma superfície

pelos polinômios de Zernike implica em definirmos algumas características e

quantificarmos cada uma dessas características para aquela superfície, de tal

maneira que com essas informações possamos reproduzir a superfície original.

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 59

Para facilitar o entendimento vamos utilizar algumas características que podem estar

presentes em qualquer superfície e que são de fácil visualização: (a) componente

esférico e (b) componente cilíndrico. Imaginemos um plano perfeitamente horizontal

(plano de referência), ao acrescentarmos a ele um componente esférico côncavo

poderemos imaginar uma superfície em forma de calota. Se acrescentarmos agora

um componente cilíndrico poderemos imaginar uma superfície com a forma de uma

calota que tenha sido distorcida cilindricamente. Ou seja, com a informação de qual

a quantidade e orientação dos componentes esférico e cilíndrico, poderemos

reconstruir a superfície em questão e poderemos compará-la com qualquer outra

em cada um de seus componentes (Ilustração 38).

Ilustração 38. Demonstração da construção de superfícies por decomposição. (A): ao acrescentarmos um componente esférico a uma superfície plana esta assumirá a forma de uma calota. (B): ao acrescentarmos um componente cilíndrico a uma superfície plana esta assumirá a forma de um cilindro. (C): ao acrescentarmos um componente esférico e um componente cilíndrico a uma superfície plana esta assumirá a forma de uma calota distorcida. A superfície final pode ser decomposta em três componentes: a superfície plana (plano de referência), a superfície esférica e a superfície cilíndrica

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 60

Os polinômios de Zernike são os componentes das superfícies e variam de

componentes simples (como os descritos acima) até componentes altamente

complexos. O conhecimento de um conjunto de coeficientes de Zernike de uma

superfície permite a reconstrução da superfície sem a necessidade de outras

informações.

Por exemplo, se imaginarmos um plano definido pelas coordenadas cartesianas X e

Y e, para cada um de seus pontos, definirmos uma altura W, uma superfície será

plana e localizada sobre o plano referência se W for sempre igual a zero (Ilustração

39).

Ilustração 39. Superfície plana onde todas as alturas (W) são constantes no plano cartesiano (X e Y)

Se W aumentar com o aumento de X e Y teremos uma superfície côncava

(Ilustração 40), já, se W aumentar com o aumento de X e diminuir em função de Y

teremos uma superfície cilíndrica (Ilustração 41). Cada um dos polinômios de

Zernike determina um comportamento específico de W em função de X e Y.

Ilustração 40. Superfície côncava onde as alturas (W) aumentam em conjunto com X e Y. Note que o plano é mais elevado quanto mais ele se afasta da origem (X=0 e Y=0).

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 61

Ilustração 41. Superfície cilíndrica onde as alturas (W) aumentam em conjunto com o aumento de X e diminuem em relação a Y

Como os componentes de Zernike medem o distanciamento de um plano de

referência, a sua unidade é uma unidade de medida. Em oftalmologia a unidade

mais utilizada é o mícron.

Existem outros polinômios utilizados para a descrição de superfícies, como os

polinômios de Seidel, no entanto os polinômios de Zernike se mostraram mais

apropriados que os polinômios de Seidel para descrever as aberrações ópticas, pelo

fato de que cada tipo de aberração é representado de forma única e independente

pelo seu respectivo polinômio, como foi demonstrado em 1934 pelo próprio Zernike.

Desta forma, a aberração total de um sistema óptico pode ser representada por uma

soma apropriada, em termos destes polinômios, ponderados pelos seus respectivos

coeficientes. O valor do coeficiente indica a contribuição de cada aberração

específica na distorção total do sistema óptico.

Como vimos anteriormente, uma superfície é a soma das suas aberrações

específicas (polinômios de Zernike). Cada um dos polinômios representa a distância

do plano de referência causada por aquele componente de aberração, a soma das

distâncias de todos os componentes nos informa a aberração total de um sistema,

ou seja, o distanciamento total da frente de onda para o plano de referência.

Essas distâncias são ponderadas na forma de RMS (do inglês, Root Mean Square).

No cálculo do RMS as distâncias são elevadas ao quadrado para a retirada dos

sinais negativos e dessa maneira evitar que distâncias positivas anulem as

distâncias negativas.

Os polinômios de Zernike representam formas que variam de muito simples a muito

complexas. Cada um dos polinômios tem três componentes: um fator de

normalização, um componente radial (θ) e um componente azimutal (ρ) . Em uma

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 62

representação por coordenadas polares (ρ,θ), ρ é polinomial e varia de zero a um,

enquanto θ é sinusoidal e varia de zero a 2π . Cada polinômio tem duas

características: a sua ordem (n) e a sua freqüência angular (m).

A ordem está associada ao componente radial e representa a maior ordem

encontrada no polinômio, por exemplo: um polinômio de segunda ordem tem em sua

fórmula, no máximo, o expoente 2 (elevado ao quadrado) enquanto um polinômio de

sexta ordem terá no máximo o expoente 6. Um exemplo de polinômio de quarta

ordem seria o polinômio Z42(ρ,θ) = 10 (4ρ4 − 3ρ2)cos 2θ . Quanto maior a ordem de

um polinômio, menores serão as suas irregularidades.

A freqüência angular representa quantas vezes as alterações se repetem ao redor

de uma circunferência, portanto está associada ao componente azimutal do

polinômio. Um polinômio com freqüência angular de 4 significa que a cada 90 graus

o padrão da aberração irá se repetir (Ilustração 42).

Ilustração 42. Descrição dos componentes do polinômio de Zernike. Todos os polinômios de Zernike apresentam os mesmos componentes desse exemplo. Nessa representação por coordenadas polares , p é polinomial e varia de zero a um, enquanto θ é sinusoidal e varia de zero a 2π . Cada polinômio tem duas características: a sua ordem (n) e a sua freqüência angular (m). A ordem está associada ao componente radial e a freqüência angular está associada ao componente azimutal do polinômio

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 63

Idealmente os polinômios devem ser representados por um esquema de indexação

dupla com essas duas variáveis da seguinte maneira: Znm. Em algumas situações

opta-se pela indexação simples, onde o índice j é atribuído arbitrariamente e inicia-

se do zero (Tabela 1).

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 64

Tabela 1. Expressão matemática de todas as aberrações de ordem mais baixa e mais alta Índice

(j) Ordem

(n) Freqüência Angular (m)

Indexação Simples Z j

Indexação Dupla Znm

Nome Usual Znm (ρ,θ)

0 0 0 Z0 Z00 Pistão 1

1 1 -1 Z1 Z1−1 Inclinação (Tilt) 2ρ senθ

2 1 1 Z2 Z11 Inclinação (Tilt) 2ρ cosθ

3 2 -2 Z3 Z2−2 Astigmatismo 6 ρ2 sen 2θ

4 2 0 Z4 Z20 Defocus (Miopia ou

Hipermetropia) 3 (2ρ2 −1)

5 2 2 Z5 Z22 Astigmatismo 6 ρ2 cos 2θ

6 3 -3 Z6 Z3−3 Trifólio (Trefoil) 8 ρ3 sen 3θ

7 3 -1 Z7 Z3−1 Coma 8 (3ρ3 − 2ρ) sen θ

8 3 1 Z8 Z31 Coma 8 (3ρ3 − 2ρ) cosθ

9 3 3 Z9 Z33 Trifólio (Trefoil) 8 ρ3 cos 3θ

10 4 -4 Z10 Z4−4 Quadrifólio (Quadrifoil) 10 ρ4 sen 4θ

11 4 -2 Z11 Z4−2 10 (4ρ4 − 3ρ2) sen 2θ

12 4 0 Z12 Z40 Aberração Esférica 5 (6ρ4 − 6ρ2 +1)

13 4 2 Z13 Z42 10 (4ρ4 − 3ρ2) cos 2θ

14 4 4 Z14 Z44 Quadrifólio (Quadrifoil) 10 ρ4 cos 4θ

15 5 -5 Z15 Z5−5 12 ρ5 sen 5θ

16 5 -3 Z16 Z5−3 12 (5ρ5 − 4ρ3) sen 3θ

17 5 -1 Z17 Z5−1 Coma Secundário 12 (10ρ5 −12ρ3 + 3ρ) sen θ

18 5 1 Z18 Z51 Coma Secundário 12 (10ρ5 −12ρ3 + 3ρ) cos θ

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 65

19 5 3 Z19 Z53 12 (5ρ5 − 4ρ3) cos 3θ

20 5 5 Z20 Z55 12 ρ5 cos 5θ

21 6 -6 Z21 Z6−6 14 ρ6 sen 6θ

22 6 -4 Z22 Z6−4 14 (6ρ6 − 5ρ4 ) sen 4θ

23 6 -2 Z23 Z6−2 14 (15ρ6 − 20ρ4 + 6ρ2) sen 2θ

24 6 0 Z24 Z60 Aberração Esférica

Secundária 7 (20ρ6 − 30ρ4 +12ρ2 −1)

25 6 2 Z25 Z62 14 (15ρ6 − 20ρ4 + 6ρ2) cos 2θ

26 6 4 Z26 Z64 14 (6ρ6 − 5ρ4 ) cos 4θ

27 6 6 Z27 Z66 14 ρ6 cos 6θ

28 7 -7 Z28 Z7−7 4 ρ7 sen 7θ

29 7 -5 Z29 Z7−5 4 (7ρ7 − 6ρ5) sen 5θ

30 7 -3 Z30 Z7−3 4 (21ρ7 − 30ρ5 +10ρ3) sen 3θ

31 7 -1 Z31 Z7−1 4 (35ρ7 − 60ρ5 + 30ρ3 − 4ρ) sen θ

32 7 1 Z32 Z71 4 (35ρ7 − 60ρ5 + 30ρ3 − 4ρ) cosθ

33 7 3 Z33 Z73 4 (21ρ7 − 30ρ5 +10ρ3) cos 3θ

34 7 5 Z34 Z75 4 (7ρ7 − 6ρ5) cos 5θ

35 7 7 Z35 Z77 4 ρ7 cos 7θ

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Cálculo matemático das aberrações usando Polinômios de Zernike - Página 66

Na Ilustração 43 podemos ver gráficos, em três dimensões, dos 15 primeiros

Polinômios de Zernike da Tabela 1, gerados no programa Matlab 76. É a combinação

linear de cada um destes polinômios que permite gerar padrões que descrevem as

imperfeições ópticas do olho. Utiliza-se estes primeiros 15 termos para cálculo dos

coeficientes que descrevem a frente de onda do olho artificial.

Ilustração 43. Forma tridimensional dos quinze primeiros termos do polinômio de Zernique. A complexidade das formas é crescente a medida que os termos são mais elevados

A equação fundamental de Zernique pode ser utilizada com o número de termos que

se desejar. Quanto maior o número de termos, maior a precisão na interpolação da

frente de onda 77.

Para o cálculo dos coeficientes de cada polinômio, como vimos anteriormente,

utiliza-se o método da raiz quadrada média 78. Tal valor conforme já observado,

representa a distância entre dada aberração e um plano perfeito. Pode-se somar

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Caracterização Fisiológica das Aberrações - Página 67

em termos absolutos as aberrações de duas ou mais superfícies e chegar-se aos

RMS totais, ou à soma dos RMS das aberrações de baixa e de alta ordem.

Caracterização Fisiológica das Aberrações

A manipulação de dados derivados das irregularidades de cada superfície

matematicamente determinada não é um problema atual, porém seu entendimento

é. Os aberrômetros fornecem dados numéricos agrupados e isolados de quantas

superfícies forem necessárias para montar um quadro geral das irregularidades de

qualquer sistema visual. A diferença entre a superfície perfeita e a atualmente

reconhecida é denominada de raiz quadrada média, que entendemos como o desvio

absoluto do ideal (RMS). O RMS de cada superfície deve ser encarado com extrema

cautela, pois uma irregularidade pode anular outra. Por exemplo, um olho com

aberração do tipo coma, pode ter parte da mesma anulada pela aberração

denominada de tricorno, ou “trifoil”.

Clinicamente julgou-se pertinente dividir as aberrações em baixa e alta ordem, pois

em geral, as primeiras são maiores e mais significantes, inclusive do ponto de vista

de prejuízo visual, que as segundas. Vale lembrar que as primeiras (baixa ordem)

são as passíveis de correção com óculos. Temos então o RMS conjunto das

aberrações de baixa ordem, e o restante, que é o RMS das aberrações de alta

ordem.

Somente para motivos comparativos interessa ter RMS isolados, como quando

comparamos pré e pós-operatório de diferentes zonas ópticas de Excimer laseres, e

queremos, por exemplo, determinar qual zona óptica produz maior aumento da

aberração esférica. Para avaliações individuais é pouco importante o valor de cada

aberração isolada, uma vez que, como já dissemos, as irregularidades de uma

superfície, podem anular parcialmente as irregularidades da outra. Temos, portanto

um RMS que chamamos de RMS baixa (baixa ordem) e um RMS alta (alta ordem)

para cada tamanho de pupila (Ilustração 44).

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Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 68

Ilustração 44. RMS de baixa ordem (3 primeiros termos da esquerda para a direita) e RMS de alta ordem (próximos 9 termos), de um olho virgem de cirurgia corneana com pupila de 6 mm e de 9 mm. Note-se o aumento significativo do RMS, que na realidade represneta uma extrapolação de valores, pois o indivíduo não apresentava dilatação pupilar quando do exame

Como os RMS, que revelam as irregularidades das superfícies, são expressos em

unidades de tamanho, traduzidos por elevação em relação a um plano, devemos nos

familiarizar com o conceito de micra, em se tratando de RMS. Os RMS baixa tem

sistematicamente valores maiores que os RMS alta, e os aparelhos acabam por

sugerir uma escala própria para estes valores. Os RMS alta são geralmente mais de

8 valores, e possuem escala própria. Não há uma sistemática de valores maiores ou

menores no RMS alta, porém em geral os maiores termos de Zernique determinam

RMS menores, a partir de um certo valor.

Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila

A análise das frentes de onda materializa a importância da pupila no sistema visual.

Por se tratar de um obstáculo relativamente descentralizado no caminho óptico da

luz, a pupila irá determinar a forma final da superfície correspondente a cada

paciente. Ela irá bloquear raios ou frentes de onda periféricas, e permitirá a

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Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 69

observação de uma mapa da luz efetiva. Diferente da topografia corneana, onde

toda, ou quase toda a córnea é mapeada, a pupila irá restringir o mapeamento

óptico ocular.

Anteriormente citamos que o centro da pupila não determina o caminho mais efetivo

dos raios que unem o objeto à mácula, mas parece ser o ponto onde as aberrações

fisiológicas oculares tem menor importância. Isso pois a pupila bloqueia, como um

diafragma, os raios paracentrais, que carregam consigo a aberração esférica. A

aberração esférica faz parte de qualquer sistema óptico onde a lente seja

relativamente esférica, e naturalmente tenha maior vergência em sua periferia do

que em sua porção central (Ilustração 45), formando uma função de espalhamento

de ponto com borramento circunferencial.

Ilustração 45. Lente de 20D esférica sobre retícula impressa. Note-se a deformação periférica (aberração esférica) dos quadrados em relação ao centro da imagem

As aberrações esféricas são há muito conhecidas e combatidas nos sistemas

ópticos artificiais, principalmente com a interposição de diafragmas que bloqueiam

os raios paracentrais. Tal ato, porém diminui a eficiência luminosa do sistema,

limitando a entrada de luz e conseqüentemente diminuindo o contraste de nitidez do

mesmo. Outra forma de compensar a aberração esférica é o aplanamento periférico

de lentes positivas, que passam a refratar menos a luz paracentral (Ilustração 46),

diminuindo o borramento da função de espalhamento de ponto.

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Aberração Esférica e o Tamanho da Pupila - Página 70

Ilustração 46. Lente de 20D anesférica sobre retícula impressa. Note-se a menor deformação periférica (aberração esférica) dos quadrados em relação a lente esférica

As soluções apresentadas são literalmente copiadas da natureza, que as utiliza há

milhões de anos em animais. Nossa córnea não é esférica, mas relativamente

asférica, com a periferia mais plana que o centro, e nossa pupila é um diafragma

dinâmico, que bloqueia os raios paracentrais mais eficientemente em condições

fotópicas, onde há luz abundante para que não haja perda de contraste, e bloqueia

parcialmente os raios paracentrais em condições mesópicas e escotópicas, onde

deve haver um compromisso entre a quantidade de luz e o bloqueio paracentral.

Com base nisso entendemos a direta relação entre a pupila e a aberração esférica.

Também percebemos a extrema importância da determinação do tamanho da pupila

frente a qualquer exame de frentes de onda, sem o que estaríamos comparando

um sistema óptico com outro diferente. Devemos, portanto ter o melhor domínio

sobre a pupila para poder interpretar corretamente os dados das análises de frente

de onda. Não basta a medida externa do tamanho pupilar, há de se registrar a curva

de miose induzida por luz, a regularidade da pupila, seu estado de repouso e a

máxima miose (Ilustração 47), além de determinar e sobrepor seu centro ao centro

visual, e preferencialmente usar o último como referência para o tratamento foto-

refrativo.

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Coma e Descentralizações - Página 71

Ilustração 47. Imagem da pupila de um indivíduo normal, e gráfico da posição relativa do centro da pupila de entrada e da resposta a condições de luminosidade crescente

Coma e Descentralizações

A adaptação de um sistema de notação puramente físico, para o olho humano,

repleto de peculiaridades evolucionais e funcionais é problemática. Várias

aberrações de alta ordem não encontram explicação fisiológica cabível. Como

iremos relacionar as dobraduras quadráticas, ou quadrifoils, com algum fenômeno

perceptível na nossa visão? Eventualmente teremos abstrações que devem ser

entendidas como parte de um todo, sem relevância clínica por si só.

Entretanto é surpreendente a utilidade dos polinômios e aberrações decorrentes dos

mesmos em alguns fenômenos visuais. A aberração esférica já foi exemplificada

acima, e o coma faz parte do grupo de aberrações que podem ser encaixados em

algumas situações fisiológicas.

Uma superfície com coma caracteriza-se por uma elevação seguida de depressão

em um mesmo meridiano, determinando uma área da maior vergência adjacente a

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Coma e Descentralizações - Página 72

uma área de menos vergência. A função de espalhamento de ponto produz nessa

condição um borramento que lembra a cauda de um cometa, com uma porção mais

densa (o cometa) e um borramento triangular (Ilustração 48). A percepção deste

fenômeno aparentemente é o de uma duplicidade de objetos 38, sendo um deles

nítido, e o outro borrado e deslocado para uma direção definida.

Ilustração 48. Mapa clínico de aberrações totais com função de espalhamento de ponto de um sistema óptico com aberração do tipo coma significante. O mapa superior esquerdo simula a acuidade visual potencial desse sistema óptico. O mapa inferior esquerdo representa a distribuição bidimensional, com escala de cores, da aberrações de alta ordem. O mapa superior a direita exprime a função de espalhamento de ponto, podendo ser observada uma imagem identificada com coma. Na tabela inferior a direita observa-se o valor numérico dos RMS de cada aberração isolada

A percepção da imagem não depende somente da função de espalhamento de

ponto. Esta é somente uma representação artificial da suposta imagem retiniana,

que deverá ser previamente processada nas camadas retinianas, e posteriormente

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Prejuízo Visual das Aberrações - Página 73

processada no cérebro. Por tal motivo nem todos os tipos de coma são percebidos

como duplicidades. Comas presentes a mais tempo no sistema visual são

geralmente processados e interpretados como imagens relativamente nítidas, e

aberrações de aparecimento recente, como os induzidos por cirurgias, são notados

imediatamente e tendem a diminuir (sua percepção) com o tempo.

Duas situações interessantes que cursam com o coma são o ceratocone e as

descentralizações cirúrgicas. No primeiro caso temos o coma presente em todos os

ceratocones não centrais. A própria definição de ceratocone, que trata de um

abaulamento corneano localizado, carrega o coma consigo, pois a área abaulada

produz maior vergência, e a área adjacente produz menor vergência, coincidindo

com a figura teórica de tal aberração.

As descentralizações podem ser maiores que 2 mm ou menores que isso. Tal valor

aparentemente divide a significância clínica das mesmas 79. Tradicionalmente

mede-se a descentralização em relação ao centro geométrico da pupila de entrada,

mas como já vimos, idealmente deveríamos medir a descentralização em relação à

linha de visão, pois esta determina o caminho dos raios que unem o objeto á

mácula. Temos, portanto uma segunda fonte de erro, que geralmente é pequena

demais para ser considerada, que é a distância entre o centro da pupila de entrada e

o intercepto corneano da linha de visão (ângulo kappa).

Do ponto de vista clínico sabemos que existem sintomas quando a área mais

profunda do tratamento, que define o alinhamento dessa nova “lente” esculpida na

córnea, se encontra distante do centro da pupila de entrada. Novamente definimos

coma nessa situação, pois teremos uma região com alta vergência (no caso

divergência se for tratada miopia), adjacente a uma área com menor vergência. As

duas áreas devem obviamente contribuir para a formação da imagem, ou seja, não

ser bloqueadas pela pupila, para determinar o borramento em forma de cauda de

cometa, ou coma.

Prejuízo Visual das Aberrações

A correlação clínica das aberrações é tema complexo pois inclui a percepção de

cada indivíduo. Não há diferenciação possível entre o borramento de uma miopia e

de uma hipermetropia da mesma monta, na vigência da cicloplegia. O sistema visual

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Prejuízo Visual das Aberrações - Página 74

não entende se a luz que chega dispersa à retina provém de um ponto, ou se dirige-

se a um ponto. Só enxergamos um borrão.

Temos dificuldade em relacionar o astigmatismo a um sinal visual distinto. Dizemos

que o indivíduo com astigmatismo enxerga um borrão inclinado quando olha para

um ponto luminoso. Vimos anteriormente que o coma produz a mesma impressão, e

provavelmente o tricorno também permite tal interpretação. Se a aberração for de

longa data, então a percepção será diferente, podendo ser ainda menor.

Apesar disso, há uma certa correlação clínica entre as aberrações medidas

individualmente e sintomas específicos. A diplopia monocular aparentemente se

relaciona ao coma vertical (em todos os tamanhos de pupila), a diferença entre a

visão dupla do astigmatismo e a do coma, é que a primeira desaparece com a

correção dos óculos. O deslumbramento ou glare e o efeito de espalhamento ou

starburst se correlacionam com a aberração esférica e com a aberração total em

pupilas em condições escotópicas.

Talvez a evolução tecnológica produza comparadores diagnósticos individuais que

gerem padrões isolados, e que o paciente possa interpretar como sua queixa

principal, mas em se tratando de percepção visual, sabemos que os progressos e

implementações são lentos e difíceis.

Ainda mantemos crença nas tabelas de optotipos escritos em alto contraste, como a

presente nos projetores de optotipos de nossos consultórios. Pouco utilizamos as

tabelas de baixo contraste, os testes de ofuscamento ou questionários de função

visual. Tais instrumentos são restritos, pois a complexidade e o tempo de execução

geralmente não são compensados por medidas objetivas que possam ser utilizadas

para diagnóstico, e muito menos para terapêutica dos vícios refracionais, incluídas

as aberrações de alta ordem.

Um instrumento interessante a ser observado para a clínica refrativa é a tabela de

acuidade visual em baixo contraste onde as letras são iluminadas e o fundo escuro.

Tal arranjo maximiza o efeito deletério proveniente da luz sobre os optotipos, e

teoricamente determina melhor o prejuízo visual das aberrações, sem no entanto

discriminar a origem do mesmo.

A atual oftalmologia trata de aberrações de baixa ordem. Oferece visão compatível

com atividades diárias (em geral diurnas). Prefere soluções universais de praticidade

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Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 75

inquestionável. Trata de inovações tecnológicas como produto externo, sem uma

necessária aplicação clínica. É vulnerável a campanhas de marketing e interesses

laicos.

A função da Universidade é a de transformar criticamente a classe formadora de

opinião do amanhã, dotando-lhes de conceitos básicos fundamentais para que os

jovens possam determinar o caminho de sua ciência e de sua crença.

Correção Corneana Guiada por Aberrometria

As correções personalizadas devem ser entendidas a partir do final do parágrafo

anterior, com suas vantagens e limitações.

Devemos oferecer vantagens para indivíduos bem adaptados? Os riscos inerentes

ao procedimento são menores que a possibilidade de melhora de sintomas que

julgamos conhecer? Podemos acreditar na estabilidade do sistema visual ao longo

dos anos? Devemos consumir mais tecido para tratamentos de aberrações

individuais? Temos instrumentos para medir nosso resultados?

Estas e outras perguntas, ainda sem resposta absoluta, fazem-nos evoluir e nos

orgulhar de pertencer a uma geração que pode vivenciar transformações e

questionamentos científicos e éticos.

Os tratamentos guiados por aberrometria são uma revolução tecnológica na

instrumentação cirúrgica corneana. Foi possível, graças aos conceitos de livre

mercado e acirrada concorrência, importados pelo modelo capitalista de gestão,

desenvolver em tempo extremamente curto uma interface entre mapas diagnósticos

e ações terapêuticas.

A tentativa inicial de ligação foi realizada entre o mapa de curvatura corneana e o

excimer laser. Para tanto foi necessário modificar o mapa de curvatura para um

mapa de elevação, e deve-se entender tal mapa de elevação, como um modelo a

partir do primeiro sendo portanto, um mapa teórico. Mesmo assim, tais mapas foram

analisados e vários programas escritos para que ablações de feixes estreitos de

excimer laser pudessem rastrear os mesmos e gerar mapas mais homogêneos.

O chamado topo-link foi testado por nosso grupo há alguns anos, já com um dos

primeiros sistemas de acoplamento espacial, ou “eyetracking”, entre uma referência

no plano corneano, e o feixe de laser. Os resultados desses tratamentos foram

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restritos a poucos pacientes, nos quais observou-se uma diminuição da

irregularidade da córnea e discreta melhora da visão e das queixas de borramento

(Ilustração 49). A estratégia de tratar a córnea faz enorme sentido, uma vez que

essa superfície, como vimos anteriormente, é responsável por mais de 90% da

eficiência do sistema visual. Também é lembrado o fato de estarmos familiarizados

com os topógrafos corneanos há décadas, havendo inúmeros meios de avaliar

mapas corneanos, e determinar sua homogeneidade.

Ilustração 49. Mapa da curvatura anterior de um paciente submetido a ablação guiada pela topografia. O mapa da esquerda demonstra o estado pré-operatório e o da direita o estado pós-operatório de 3 meses após ablação personalizada sob flap (Topolink em LASIK)

Contudo o apelo mercadológico e mesmo a consistência de um argumento

científico fizeram a maioria das empresa optar pelo uso da análise de frentes de

onda como método diagnóstico a partir do qual o tratamento deveria ser realizado. O

apelo de mercado se justifica à medida que o topógrafo não geraria novas receitas,

pois é um instrumento já presente em inúmeras clínicas, e o argumento científico

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Correção Corneana Guiada por Aberrometria - Página 77

baseia-se em que os aberrômetros analisam todo o sistema visual, e não somente

93% dele. Na realidade há outro argumento que deve ser lembrado.

O aberrômetro avalia o sistema óptico alinhado fisiologicamente. Sua leitura se dá a

partir dos raios que deixam o olho e não são bloqueados pela pupila, porém nenhum

ponto de referência externa, como o ápice da córnea, é utilizado e temos, portanto,

um mapa pupilar com alinhamento do objeto à mácula (linha de visão). Um dos

desafios atuais é exatamente dotar os novos topógrafos desse alinhamento

fisiológico, e do bloqueio pupilar natural.

Com as ferramentas tecnológicas disponíveis, o mercado preparado, e o

entendimento dos processos fisiológicos em mente, desenvolvemos vários

raciocínios manifestos em congressos e artigos 66, 67, sobre as indicações e

limitações dos tratamentos personalizados.

Concordamos em haver hoje em dia indicações específicas para os tratamentos

personalizados, como estados pós-operatórios complicados com descentralizações,

por exemplo 79. Os retratamentos de córneas hipo ou hipercorrigidas, que antes

tinham resultados limitados com a técnica de PRK e depois tiveram melhorias na

previsibilidade com o LASIK 80, e especificamente as córneas com superfícies

irregulares, sem dúvida, também passam pelo tratamento personalizado.

Os resultados obtidos em córneas virgens de cirurgias são encorajadores, e

devemos rever as indicações de tratamentos personalizados após a publicação

desses resultados.

Estamos nos familiarizando com novos mapas de aberrações, e achamos ser

necessário o julgamento de condições psicofísicas previamente e posteriormente

ao procedimento, sob pena de concluirmos sobre valores científicos sem

correspondência clínica.

Graças ao espírito inovador desta instituição, pudemos testar tais tratamentos

personalizados em um número ainda restrito de indivíduos, e várias conclusões

foram de encontro às teorias apresentadas. Realmente há um aumento menor das

aberrações esféricas nos pacientes tratados de modo personalizado, porém não há

uma resposta inequívoca de preferência por tal tratamento em comparação com o

tratamento convencional. A literatura tem mostrado os mesmos resultados, sempre

apontando dados matemáticos e poucas intervenções sensoriais mais completas.

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Vemos na aberrometria um instrumento diagnóstico moderno que permite ampliar

várias fronteiras, desde a acomodação até a correção visual. Vários

desenvolvimentos estão sendo realizados e novas tecnologias serão apresentadas,

porém o mote continua.

Das mudanças ocorridas nos últimos anos em cirurgia refrativa e óptica fisiológica, a

maior foi a análise crítica do processo. Como em qualquer campo da tecnologia,

política e arte, a cada ação corresponde uma reação, e nosso espírito crítico

construtivo deve estar sempre presente, justificando nossa diferença no cenário

global.

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Óptica Fisiológica e Cirurgia Refrativa Paulo Schor

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