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Organização CriminosaComentários à Lei de processo que na Itália ficou conhecido como mani pulite (“mãos limpas”), o qual levou aos tribunais centenas de pessoas acusadas

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OComentários à Lei de

Organização CriminosaLei n. 12.850/2013

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Comentários à Lei deOrganização Criminosa

Lei n. 12.850/2013

VICENTE GRECO FILHOProfessor Associado de Direito Processual e Titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Professor Titular de Direito Processual Civil da Faculdade de

Direito da Universidade Mackenzie. Professor Titular de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito de Sorocaba. Procurador de Justiça, aposentado, de São Paulo e Advogado.

Notas de João Daniel Rassi

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ISBN 978-85-02-

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

BrasilDireito tributário, 7 / Fernando F. Castellani;

coordenação geral Fábio Vieira Figueiredo, Fernando F. Castellani, Marcelo Tadeu Cometti. – São Paulo : Saraiva, 2008. – (Coleção OAB nacional. Primeira fase)

1. Direito tributário 2. Direito tributário – Brasil I. Figueiredo, Fábio Vieira. II. Castellani, Fernando F. III. Cometti, Marcelo Tadeu. IV. Título. V. Série

08-00347 CDU-34:336.2(81)

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1. Brasil : Legislação : Direito 34:336.2(81)

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Sumário

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 7

CAPÍTULO I – DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ..................................... 17Art. 1º ........................................................................................................ 17Art. 2º ........................................................................................................ 25

CAPÍTULO II – DA INVESTIGAÇÃO E DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA ................................................................................................. 34

Art. 3º ........................................................................................................ 34Seção I – Da Colaboração Premiada ............................................................ 37

Art. 4º ........................................................................................................ 37Art. 5º ........................................................................................................ 44Art. 6º ........................................................................................................ 46Art. 7º ........................................................................................................ 46

Seção II – Da Ação Controlada .................................................................... 49Art. 8º ........................................................................................................ 49Art. 9º ........................................................................................................ 57

Seção III – Da Infiltração de Agentes ........................................................... 57Art. 10 ........................................................................................................ 57Art. 11 ........................................................................................................ 59Art. 12 ........................................................................................................ 60Art. 13 ........................................................................................................ 62Art. 14 ........................................................................................................ 63

Seção IV – Do Acesso a Registros, Dados Cadastrais, Documentos e Informações ............................................................................................... 64

Art. 15 ........................................................................................................ 64Art. 16 ........................................................................................................ 66Art. 17 ........................................................................................................ 66

Seção V – Dos Crimes Ocorridos na Investigação e na Obtenção da Prova .......................................................................................................... 67

Art. 18 ........................................................................................................ 68Art. 19 ........................................................................................................ 69

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Art. 20 ........................................................................................................ 70

Art. 21 ........................................................................................................ 71

CAPÍTULO III – DISPOSIÇÕES FINAIS ....................................................... 72

Art. 22 ........................................ ................................................................ 72

Art. 23 ........................................ ................................................................ 74

Art. 24 ........................................ ................................................................ 75

Art. 25 ........................................ ................................................................ 77

Art. 26......................................... ................................................................ 77

Art. 27 ........................................ ................................................................ 77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 79

QUADROS COMPARATIVOS ........................................................................ 83

ANEXO – ROL DE TRATADOS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL............................................. 99

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Introdução

1. A nova lei contra o crime organizado

A Lei n. 12.850, de 2 de agosto de 2013, que entra em vigor decorridos

45 dias de sua publicação oficial, define organização criminosa, dispõe

sobre a investigação criminal, os meios de obtenção das provas especiais,

infrações penais correlatas e normas procedimentais.

A Lei revoga a Lei n. 9.034/95, diploma muito criticado por ser incom-

pleto e desatualizado1.

1 A Lei n. 9.034/95 introduziu no Brasil a figura da organização criminosa, sem defini-

-la, contudo, e muito menos tratá-la como um fato criminoso em si, diferentemente

do que ocorreu em outras legislações. Na sua versão original, chegou a equipará-la à

descrição do art. 288 do Código Penal, aspecto que só foi alterado pela Lei n.

10.217/2001, apresentando figuras com conteúdo diferente, lado a lado: quadrilha ou

bando e organização criminosa. Inicialmente festejada pela imprensa como meio para

instauração de uma “Operação Mãos Limpas” à brasileira, fazendo comparação àque-

le processo que na Itália ficou conhecido como mani pulite (“mãos limpas”), o qual

levou aos tribunais centenas de pessoas acusadas de atividades mafiosas, a lei foi ob-

jeto de várias críticas por parte da doutrina considerando sua ineficácia, chegando a

ser denominada ironicamente por Nogueira de lei da “caixa preta” por conta da ma-

neira como o sigilo das informações colhidas foi por ela tratada (NOGUEIRA, Carlos

Frederico Coelho. Lei da “Caixa Preta”. Revista dos Tribunais, n. 720, out./1995, p.

572-581). Para Franco, a lei, numa imagem menos formal, não passou “de estouros de

‘biribas’ para infundir medo em manadas de elefantes...” (FRANCO, Alberto Silva. Leis

penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. 7. ed. Coord. Alberto Silva Franco

e Rui Stoco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 578). Sob o aspecto processual

(crítico), conferir GRINOVER, Ada Pellegrini. A marcha do processo. Rio de Janeiro:

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Foi ela fruto do Projeto de Lei do Senado (PLS) n. 150/2006, de auto-

ria da Senadora Serys Slhessarenko, cujo objetivo era conceituar “crime

organizado”, disciplinar a investigação criminal e os meios de obtenção de

prova, sem desrespeito ao devido processo legal e às atribuições constitu-

cionais dos órgãos envolvidos na persecução criminal2. E, também, como

texto integralmente acolhido do substitutivo da Câmara dos Deputados,

PL n. 6.478/2009, procurou, além de criar novos institutos, adequar a le-

gislação aos ditames da Convenção das Nações Unidas contra o Crime

Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), e acolher as teses mais

modernas da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de

Dinheiro – ENCCLA3.

Dividida em três capítulos, no Capítulo I, cuidando do conceito e ti-

pificação da organização criminosa (arts. 1º e 2º), no Capítulo II, tratando

das atividades destinadas à obtenção da prova durante a investigação ou

não (Seção I, da colaboração premiada, arts. 4º ao 8º; Seção II, da ação

controlada, arts. 8º e 9º; Seção III, da infiltração de agentes, arts. 10 a 14;

Seção IV, do acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações,

arts. 15 a 17 e, finalmente, a Seção V, que cuida dos crimes ocorridos na

investigação e na obtenção da prova, arts. 18 a 21), deixando para o Capí-

tulo III, disposições finais, o procedimento (arts. 22 e 23), a nova Lei de

Organização Criminosa disciplina uma série de situações somente esboça-

das na Lei n. 9.034/95, resolvendo certos problemas, mas criando um

grande número de outros, como será comentado.

Forense Universitária, 2000, p. 87-99. Para uma posição moderada em relação à cons-

titucionalidade da lei, conferir MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Considerações

sobre a criminalidade organizada. Justiça Penal – críticas e sugestões. Coord. Jaques de

Camargo Penteado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 281-290). Síntese do

histórico legislativo, assim como as suas existentes críticas podem ser encontradas no

já publicado trabalho de Pitombo (PITOMBO, Antônio Sérgio Altieri de Moraes.

Organização criminosa – nova perspectiva do tipo legal. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2009, p. 89-115).

2 Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=

45738&tp=1>.

3 Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?c

odteor=1000226&filename=Avulso+-PL+6578/2009>.

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2. “O direito penal de criminalidade diferenciada”

A história do Direito Penal mostra uma evolução em dois planos: no

da espécie de bens jurídicos tutelados e no plano do perfil do criminoso.

Quanto aos bens jurídicos, salvo os delitos contra a majestade, predo-

minava a tutela dos bens jurídicos individuais. O furto já era previsto no

Código de Hamurabi; o estelionato, sob outra configuração, no Direito

Romano; o homicídio, no Gênesis da Bíblia. Modernamente, a preocupação

maior é a da tutela de bens jurídicos coletivos e difusos4 e o terrorismo,

enquanto crime contra vítimas indeterminadas.

Quanto ao criminoso, a preocupação era com o crime concebido e

praticado individualmente. Nosso Código Penal, na versão original, apenas

previa, basicamente, o concurso de pessoas e o crime de quadrilha ou ban-

do e a rixa para a criminalidade plurissubjetiva.

Na atualidade, a preocupação maior é a dos crimes praticados por

intermédio de empresas, como os delitos contra a ordem econômica, pre-

vendo-se, inclusive, a criminalização da pessoa jurídica. E, sem dúvida, os

crimes praticados por organizações criminosas como o tráfico de drogas,

o tráfico ilícito de armas, o tráfico de seres humanos, a lavagem de dinhei-

ro etc., verdadeiras empresas criminais que constituem real e altamente

danoso poder paralelo ao regular poder do Estado, e que pode não se limi-

tar a fronteiras constituindo a chamada criminalidade transnacional5.

4 Sobre o tema, ver, entre tantos, o recente trabalho de GRECO, Luís. Modernização do

direito penal, bens jurídicos coletivos e crimes de perigo abstrato. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 2011.

5 Digno de nota, a este respeito, o existente debate no plano da criminologia que pre-

cede ao tema da legitimação ou da justificação penal da criminalidade organizada, o

qual questiona sua própria existência (discurso do mito ou discurso norte-americano,

e teoria da conspiração ou discurso italiano). Para uma abordagem criminológica do

assunto, cf.: ZAFFARONI, Eugenio. “Crime organizado”: uma categorização frustra-

da. Discursos Sediciosos. Rio de Janeiro: Relume Dumará, ano 1, n. 1, 1º semestre de

1996, p. 45-67 e, na doutrina nacional, SANTOS, Juarez Cirino. Crime organizado.

Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 11, n.

42, p. 214-224; e GOMES, Luiz Flávio e CERVINI, Raúl. Crime organizado. 2. ed. São

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Não se quer dizer que desapareceram os crimes contra bens jurídicos

individuais nem que tenha desaparecido o crime individual. O que ocorre

é que o Direito Penal ainda não encontrou resposta adequada às modali-

dades modernas de criminalidade, constatando-se que os países ocidentais

de influência mundial têm adotado medidas especiais em face delas, me-

didas essas que são, queiram ou não queiram, a aceitação de que certa

criminalidade se põe como um poder paralelo, um Estado paralelo que

rejeita o Estado regular e que, portanto, precisa ser combatido com medidas

especiais. Basta lembrar, mais recentemente, no que diz respeito especial-

mente ao terrorismo, o Patriotic Act nos Estados Unidos da América do

Norte6.

Para fugir da polêmica a respeito do chamado “Direito Penal do Ini-

migo”, são adotadas medidas especiais em face da nova criminalidade,

Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 73-85. Sobre o estado atual do debate: BALTAZAR

JR., José Paulo. Crime organizado e proibição de insuficiência. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2010, p. 77-85.

6 A maior visibilidade da existência do poder paralelo se deu com a operação mãos

limpas, na Itália, consistente numa grande investigação que visava esclarecer casos de

corrupção. No âmbito mundial, com especial ênfase à realidade italiana, mapeamen-

to sobre as organizações criminosas pode ser encontrado no livro de Paulo José da

Costa Jr. e Angiolo Pellegrini, este último comandante da divisão antimáfia dos cara-

binieri italianos (<www.interno.gov.it/dip_ps/dia/>), trabalho publicado em portu-

guês, fruto de uma série de conferências realizadas no Brasil (Criminalidade organi-

zada. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999). Neste ponto, digno de nota é a diferença

do conceito entre máfia e crime organizado, embora muitos autores empreguem-nos

no mesmo sentido. Em linhas gerais, as diferentes máfias guardam em comum temas

que se repetem, como o papel central da família (em sentido amplo, podendo abran-

ger o povoado natal ou um grupo étnico), especial referência à honra (a qual o inte-

grante está submetido onde a prática de crimes como homicídio ou roubo é um dever,

em determinadas circunstâncias), a cultura da morte (em que o sacrifício da vida é

aceito em prol do interesse da organização) etc. No crime organizado, o que se iden-

tifica é a forma de uma empresa e de uma economia submersa e paralela, que se

aproveita do subdesenvolvimento e, principalmente, da consequência do desemprego,

para obter mão de obra com promessas de lucros rápidos (MONTOYA, Mario Daniel.

Máfia e crime organizado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 1 e s.).

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especialmente o terrorismo e os delitos contra a humanidade, constituindo,

então, um chamado “Direito Penal de criminalidade diferenciada” que não

se opõe ao Estado Democrático de Direito, porque se encontra dentro do

sistema democrático e exatamente visa preservar os seus valores. Aliás,

falharia o Estado em sua missão de preservar a convivência social e a dig-

nidade da pessoa humana se não adotasse medidas adequadas a coibir as

ações que atentam contra ela, entre as quais se destaca o terrorismo, os

crimes contra a humanidade, o tráfico de pessoas e o tráfico internacional

de drogas. A figura da “entrega” do acusado ao Tribunal Penal Internacio-

nal, independentemente do procedimento clássico da extradição, prevista

no Estatuto de Roma para os crimes contra a humanidade é exemplo mar-

cante de medida especial para uma criminalidade diferenciada.

Exemplos dessas medidas encontram-se, também, no que ocorreu na

Alemanha.

Nesse país, em reação a vários atentados terroristas empreitados por

Andreas Baader e Ulrike Meinhoff, na década de 1970, os legisladores ale-

mães editaram a Lei de 20 de setembro de 1974 que proibia a defesa de mais

de um cliente por advogado, bem como permitia a instrução sem a presen-

ça de advogado.

Em 18 de agosto de 1976, a edição da Lei Antiterrorismo, por um lado,

estabelece o controle das correspondências dos presos, o processo de advo-

gados cúmplices com seus réus e a prisão preventiva de suspeitos de práti-

cas terroristas e, de outro, prevê o arrependimento eficaz e a possibilidade

de perdão judicial no caso de prática de atos terroristas.

Num ato legislativo mais rigoroso, em combate ao terrorismo, foi

editada a Lei de 30 de setembro de 1977, a qual permitiu o isolamento total

dos presos, sem contato com o mundo exterior, pelo período de duas se-

manas, inclusive sem autorização judicial.

Mais ainda, levando ao extremo o combate ao terrorismo, na data de

13 de abril de 1978 foi promulgada a lei que exclui o defensor e permite a

detenção de qualquer suspeito.

Há, ainda, em países europeus forte tendência de se adotar um direito

penal diferenciado para os crimes econômicos e contra o ciberterrorismo.

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E é neste contexto, também, no âmbito do Direito Internacional, que

se encontra o fenômeno da criminalidade organizada, cujo marco legisla-

tivo é a chamada Convenção de Palermo.

3. A Convenção de Palermo

A Convenção de Palermo é um tratado multilateral voltado à coope-

ração entre os Estados-partes para prevenir e coibir o crime organizado

transnacional7. Foi aprovada em resolução da Assembleia Geral da ONU

em 15 de novembro de 2000, adotada em Nova Iorque, e, após 40 ratificações,

entrou em vigor a partir de 29 de setembro de 2003. Atualmente, a Con-

venção foi ratificada por 147 países. O Brasil promulgou-a mediante De-

creto Legislativo em 12 de março de 2004.

A Convenção definiu como grupo criminoso organizado aquele estru-

turado por três ou mais pessoas, existente há algum tempo e que atua de

forma concertada com o objetivo de praticar infrações graves (apenadas no

mínimo com 4 anos de reclusão) ou previstas na Convenção (lavagem de

dinheiro, corrupção e crimes contra a administração da justiça), com a

intenção de obter, direta ou indiretamente, benefício econômico ou mate-

7 No seio das Nações Unidas, foi no quinto Congresso sobre a Prevenção do Crime e o

Tratamento dos Delinquentes, de 1º a 13 de setembro de 1975, que se deu início ao

debate neste organismo sobre o crime organizado, tema que se repetiu nos demais

congressos. Mas foi em Nápoles, em novembro de 1994, que as Nações Unidas pro-

moveram a Conferência Mundial Interministerial sobre o Crime Organizado Trans-

nacional, evento mais importante sobre o tema, em que 142 Estados adotaram, por

unanimidade a Declaração Política de Nápoles e o Plano de Ação Global contra o

Crime Transnacional Organizado, aprovados pela Assembleia Geral mediante Reso-

lução n. 49/159, de 23 de dezembro de 1994. Desta iniciativa, após o trabalho de uma

Comissão especial sobre várias propostas, surgiu o Projeto de Convenção das Nações

Unidas contra a criminalidade transnacional organizada, que deu origem à Convenção

de Palermo (CORDERO, Isidoro Blanco y GARCÍA DE PAZ, Ma Isabel. Criminalidad

organizada. Reunión de la Sección Nacional Española preparatoria del XVI Congreso de

la AIDP en Budapest. Universidad de Castilla-La Mancha, Almagro, mayo de 1999, p.

17-52).

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rial (art. 2º). Posteriormente, foram acrescentados três protocolos acerca

do tráfico de pessoas8, contrabando por migrantes e tráfico de armas.

Aplica-se aos crimes mencionados sempre que tenham caráter trans-

nacional e envolvam grupo criminoso organizado (art. 3, 1). A transnacio-

nalidade do crime configura-se caso este seja: cometido em mais de um

Estado; cometido num Estado, mas preparado e controlado em outro;

cometido em apenas um Estado por grupo que pratica crimes em mais de

um Estado; cometido em apenas um Estado, mas que produza efeitos em

outro (art. 3, 2)9.

A Convenção possui diretivas a serem seguidas pelos Estados-partes

na adaptação da sua legislação interna. Assim, não contém um tipo penal

sobre organização criminosa. Dessa forma, prevê em seu art. 5, que:

Cada Estado-Parte adotará as medidas legislativas ou outras que sejam necessárias para caracterizar como infração penal, quando praticado inten-cionalmente:

a) Um dos atos seguintes, ou ambos, enquanto infrações penais distintas das que impliquem a tentativa ou a consumação da atividade criminosa:

i) O entendimento com uma ou mais pessoas para a prática de uma in-fração grave, com uma intenção direta ou indiretamente relacionada com a obtenção de um benefício econômico ou outro benefício material e, quando assim prescrever o direito interno, envolvendo um ato praticado por um dos participantes para concretizar o que foi acordado ou envol-vendo a participação de um grupo criminoso organizado;

ii) A conduta de qualquer pessoa que, conhecendo a finalidade e a ativi-dade criminosa geral de um grupo criminoso organizado, ou a sua in-tenção de cometer as infrações em questão, participe ativamente em:

8 A respeito do tema, cf. GRECO, Alessandra Orcesi; RASSI, João Daniel. Crime orga-

nizado transnacional e o tráfico internacional de pessoas no direito brasileiro. Crime

organizado. Coord. Ana Flávia Messa e José Reinaldo Gumarães Carneiro. São Paulo:

Saraiva, 2012, p. 617-647.

9 A criminalidade transnacional, “criminalidade sem fronteiras” ou “criminalidade in-

ternacional”, caracteriza-se pelo fato de que o criminoso se aproveita de certas oportu-

nidades para, além das fronteiras, praticar crimes, transferir bens ilegais ou assumir

riscos não permitidos (ALBRECHT, Hans-Jorg. Criminalidad transnacional, comercio

de narcóticos y lavado de dinero. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2001).

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a. Atividades ilícitas do grupo criminoso organizado;

b. Outras atividades do grupo criminoso organizado, sabendo que a sua

participação contribuirá para a finalidade criminosa acima referida;

b) O ato de organizar, dirigir, ajudar, incitar, facilitar ou aconselhar a

prática de uma infração grave que envolva a participação de um grupo

criminoso organizado.

Do mesmo modo, a Convenção possui diretivas sobre os seguintes

temas: criminalização e prevenção da lavagem de dinheiro (arts. 6 e 7);

criminalização e prevenção da corrupção (arts. 8 e 9); criminalização da

obstrução de justiça (art. 23); responsabilidade das pessoas jurídicas (art.

10); processo e sanções aos crimes (art. 11); confisco e apreensão de bens

(arts. 12, 13 e 14); territorialidade e extraterritorialidade das leis internas

(art. 15); extradição (art. 16); transferência de condenados (art. 17); assis-

tência judiciária recíproca (art. 18); investigações conjuntas (art. 19); téc-

nicas especiais de investigação (art. 20); transferência de processos (art.

21); antecedentes criminais no âmbito internacional (art. 22); proteção a

testemunhas e vítimas (arts. 24 e 25); cooperação entre autoridades aplica-

doras da lei (arts. 26 e 27); intercâmbio de informações (art. 28); assistên-

cia técnica (arts. 29 e 30); prevenção ao crime organizado transnacional

(art. 31); regras de direito internacional público, incluindo regras para a

solução de controvérsias entre Estados e de permanência na Convenção

(arts. 32 a 41)10.

Neste sentido, orientada pelas diretrizes da Convenção, a lei comen-

tada está longe de adotar as já mencionadas medidas especiais do “direito

penal diferenciado” em face da nova criminalidade, como está acontecen-

do no combate ao terrorismo.

Prevê algumas medidas especiais, como a ação controlada e a infiltra-

ção, mas pode-se dizer que é tímida porque poderia ter ido mais além,

acolhendo legislativamente, por exemplo, a responsabilidade pela estrutu-

ra de poder ou institucional aos chefes da organização criminosa.

10 Sobre o tema, na doutrina brasileira, consultar GOMES, Rodrigo Carneiro. O crime

organizado na visão da convenção de Palermo. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

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É mais um passo, porém, e precisa apoio, ainda que possa merecer objeções neste ou naquele ponto. Como um passo, todavia, que não seja o último, assumindo a sociedade brasileira que precisa impor-se diante dos ataques à democracia representados pelas organizações criminosas.

A lei encontra-se assim ementada:

Define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os

meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimen-

to criminal; altera o Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940

(Código Penal); revoga a Lei n. 9.034, de 3 de maio de 1995; e dá outras

providências.

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LEI N. 12.850, DE 2 DE AGOSTO DE 2013Capítulo IDA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSAArt. 1º Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.§ 2º Esta Lei se aplica também:I – às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;II – às organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em território nacional.

Em sentido contrário ao que vínhamos sustentando há vários anos, a

lei optou por definir organização criminosa11, suprimindo a omissão da lei

revogada12.

11 Segundo nosso entendimento, não é adequado que a lei dê os requisitos para que uma

associação ou grupo se constitua em organização criminosa, uma vez que as organi-

zações são muito diferenciadas e uma definição redigida restringiria o conceito, tor-

nando impossível, em princípio, a sua identificação em face de exigências rígidas e

expressas. Assim, entendemos que o conceito deva ser fluido, como fluido é o próprio

modo de ser de uma societas sceleris (cf., p. ex., nosso Tóxicos – prevenção e repressão.

13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 178). Isso porque é certo que a criminalidade or-

ganizada é, antes de tudo, um fenômeno social, econômico, político, cultural etc.,

fruto da sociedade contemporânea, como afirma Figueiredo Dias, e como tal é dinâ-

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mico (cf. DIAS, Jorge de Figueiredo. A criminalidade organizada: do fenômeno ao

conceito jurídico-penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista

dos Tribunais, ano 16, mar.-abr./2008, p. 11-30). Observe que o Anteprojeto de Códi-

go Penal acabou tipificando a criminalidade organizada nos seguintes termos:

“Organização Criminosa

Art. 256. Organizarem-se três ou mais pessoas, de forma estável e permanente, para

o fim específico de cometer crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro

anos, mediante estrutura organizada e divisão de tarefas, com hierarquia definida e

visando a auferir vantagem ilícita de qualquer natureza:

Pena – prisão, de três a dez anos, sem prejuízo das penas relativas aos crimes cometi-

dos pela organização criminosa.

§ 1º A pena aumenta-se até a metade se a organização criminosa é armada, se um ou

mais de seus membros integra a Administração Pública, ou se os crimes visados pela

organização tiverem caráter transnacional” (disponível em: <www.12.senado.gov.br/

noticias/Arquivos/2012/06/pdf-veja-aqui-o-anteprojeto-da-comissao-especial-de-

-juristas>).

A Lei n. 12.850/2013, no seu art. 2º, que será analisado adiante, também optou por

criar um tipo penal para punir quem promove, constitui, financia ou integra, pessoal-

mente ou por interposta pessoa, organização criminosa (para uma crítica da criação

de um tipo penal sobre organização criminosa, a qual não afetaria bem jurídico

constitucional, devendo a reprovação penal consistir na inclusão de uma causa de

aumento de pena no âmbito do concurso de pessoas (art. 29 do CP). Cf.: PITOMBO,

Antonio Sergio. Organização criminosa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 153

e s.; e Tipificação da organização criminosa. Tese de Doutorado apresentada à Facul-

dade de Direito da Universidade de São Paulo, 2007, p. 151-158 e p. 169). Ainda sobre

a questão da legitimidade da tipificação e sua forma, conferir DIAS, Jorge de Figuei-

redo. A criminalidade organizada: do fenômeno ao conceito jurídico-penal. Revista

Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, março/abril de 2008,

ano 16, p. 11-30).

12 No Brasil, considerando a ausência de definição legal na Lei n. 9.034, enquanto da sua

vigência, a jurisprudência não foi pacífica a este respeito, havendo quem adotasse o

conceito de crime organizado estabelecido na Convenção de Palermo. No HC 138.058-RJ

do STJ, de relatoria do Min. Haroldo Rodrigues (Des. Convocado do TJ/CE), j. 22-3-2011,

entendeu-se que a expressão “organização criminosa” ficou definida nos termos do

art. 2, a, da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional

(Convenção de Palermo), promulgada em nosso ordenamento jurídico pelo Decreto

n. 5.015, de 12 de março de 2004. Entendeu o Ministro relator também que “a defini-

ção de uma organização criminosa não se submete ao princípio da taxatividade, pois

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Já a Lei n. 12.694, de 24 de julho de 2012, que estabeleceu normas es-

peciais para o processo e julgamento de crimes praticados, segundo ela, por

organizações criminosas, define a figura, de forma ligeiramente diferente,

mas aplicável apenas para os fins daquela lei, que instituiu a possibilidade

de instauração de juízo colegiado para o julgamento envolvendo tal situa-

ção. A definição da Lei n. 12.694/2012, em seu art. 2º, é a seguinte:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a

associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e ca-

racterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com obje-

tivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza,

mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a

4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.

o núcleo do tipo penal previsto na norma é ‘ocultar ou dissimular a natureza, origem,

localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores

provenientes, direta ou indiretamente, de crime’, sendo a expressão ‘organização cri-

minosa’ um complemento normativo do tipo, tratando-se, no caso, de uma norma

penal em branco heteróloga ou em sentido estrito, que independe de complementação

por meio de lei formal”. Note-se que neste sentido é a Recomendação n. 3, de 30 de

maio de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, para a especialização de varas crimi-

nais para processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas. Ao revés,

no julgamento do HC 96.007, em 12-6-2012, a Primeira Turma do STF concedeu

ordem de habeas corpus a pastores de Igreja Evangélica, determinando o trancamento

de ação penal por lavagem de dinheiro proveniente de organização criminosa. A

Turma entendeu que inexistia a definição do crime de organização criminosa por meio

de lei em sentido estrito, o que impossibilitava a imputação. Segundo o voto do Rela-

tor, Ministro Marco Aurélio, os pacientes foram denunciados como incursos no então

vigente art. 1º, VII, da Lei n. 9.613/98, sendo que a definição de organização crimino-

sa estaria contida na Convenção de Palermo. Para o Relator, a denúncia afronta o

princípio da legalidade dos crimes e das penas do art. 5º, XXXIX, da Constituição

Federal, que atribui exclusivamente a definição de delito por meio de lei emanada pelo

Congresso Nacional. A referida Convenção não seria lei em sentido estrito e também

não conteria os preceitos primários (conduta proibida) e secundários (pena) de uma

norma penal válida. Logo, o ordenamento jurídico brasileiro não contém o tipo penal

específico de organização criminosa, o que inviabiliza denúncia formulada com base

no art. 1º, VII, da Lei n. 9.613/98. Tal entendimento foi seguido pelos demais Ministros

componentes da Turma.

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Como se vê, as diferenças estão no número de componentes (para os

fins da lei agora comentada o mínimo é de 4) e a quantidade da pena dos

crimes visados que deve ser maior de 4 anos.

São requisitos para que se caracterize a criminalidade organizada:

a) Associação (reunião com ânimo associativo, que é diferente de

simples concurso de pessoas) de quatro ou mais pessoas.

b) Estrutura ordenada que se caracteriza pela divisão de tarefas ainda

que informalmente.

c) O fim de obtenção de vantagem de qualquer natureza (portanto,

não apenas a econômica) mediante a prática de crimes (excluídas as con-

travenções).

d) Crimes punidos, na pena máxima, com mais de quatro ou que os

crimes tenham caráter transnacional, independentemente da quantidade

da pena.

A doutrina enumera características para a identificação de uma orga-

nização criminosa que continuam como parâmetros de orientação para a

identificação dos requisitos agora legais e que são os seguintes:

a) Estrutura organizacional, com células relativamente estanques, de

modo que uma não tem a identificação dos componentes da outra.

b) Especialização de tarefas, de modo que cada uma exerce uma ati-

vidade predominante. Tomando como exemplo uma organização crimi-

nosa para o tráfico ilícito de entorpecentes, dir-se-ia que tem ati vidade

definida o importador, o transportador, o destilador, o financeiro, o trafi-

cante de área e distribuidor e o traficante local, como uma rede, das artérias

aos vasos capilares.

c) A existência de vários níveis de hierarquia, em que os subordinados

nem sempre, ou quase nunca, conhecem a identidade da chefia de dois ou

mais escalões superiores ou ainda que conheçam a chefia mais elevada não

têm contato direto com ela e não podem fornecer provas a respeito.

d) A possível existência de infiltração de membros da organização em

atividades públicas, nos Poderes Executivo, Legislativo, Ministério Público

e Judiciário e corrupção de agentes públicos.

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e) A tendência de durabilidade.

f) A conexão com outras organizações, no mesmo ramo ou em ramo

diferente, quando não a atividade em vários ramos.

g) A coação, mediante violência, chantagem ou aproveitamento da

condição de pessoas não participantes, mas que passam a ser auxiliares ou

coniventes e que vivem sob a imposição de grave dano em caso de delação.

h) Mais de três pessoas.

Apesar da definição da lei, o conceito é fluido e será compreendido

também pela sua concepção independente da forma, aplicando-se, porém,

além dos limites da lei, para todos os casos em que outros diplomas refiram

a figura, como a Lei de Drogas.

O termo legal “associação” distingue a reunião de pessoas do simples

concurso, como ocorre com o crime de associação, art. 35 da Lei de Drogas

(Lei n. 11.343/2006)13. Há necessidade de um animus associativo, isto é, um

ajuste prévio no sentido da formação de um vínculo associativo de fato,

uma verdadeira societas sceleris, em que a vontade de se associar seja sepa-

rada da vontade necessária à prática do crime visado. Excluído, pois, está

o crime no caso de convergência ocasional de vontades para a prática de

determinado delito, que estabeleceria a coautoria. Outras considerações e

distinções serão feitas aos comentários ao art. 2º que o art. 1º integra na

qualidade de elementar e ao art. 288 do Código Penal com a redação dada

pela lei comentada.

A associação deve ser de, no mínimo quatro pessoas, contando-se

nesse número eventual membro menor ou o coagido a integrá-la. O coagi-

do pode vir a ser absolvido se se integrou à organização em situação de

irresistibilidade, mas é contado para compor o mínimo legal de membros.

Já diziam os romanos, coactus sed volui para a coação moral. Não pode ser

computado o agente infiltrado, porque é pressuposto da infiltração a exis-

tência de indícios do crime de organização criminosa, portanto o número

de quatro deve anteceder àquela.

13 Sobre o tema, consultar nosso Tóxicos – prevenção e repressão. 14. ed. São Paulo: Sa-

raiva, 2011.

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