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GRADUAÇÃO 2018.2 ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA PEQUENA EMPRESA AUTOR: JOÃO MANOEL DE LIMA JUNIOR

ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA PEQUENA EMPRESA · aula 9 – sociedade limitada ... aulas 20 e 21 – baixa do registro do empresÁrio individual e procedimentos de dissoluÇÃo , liquidaÇÃo

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GRADUAÇÃO2018.2

ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA

PEQUENA EMPRESAAutor: João MAnoel de liMA Junior

SumárioOrganização Jurídica da Pequena Empresa

1. ABERTURA .......................................................................................................................................................3

1.1. AUlA 1 – APRESEnTAÇÃO DO cURSO .....................................................................................................................3

2. InTRODUÇÃO À PEQUEnA EMPRESA ........................................................................................................................6

2.1. AUlAS 2 E 3 – InTRODUÇÃO À PEQUEnA EMPRESA ....................................................................................................6

3. REGIME JURÍDIcO DO EMPRESÁRIO InDIVIDUAl .......................................................................................................14

3.1. AUlAS 4 E 5 – REGIME JURÍDIcO DO MEI ..............................................................................................................14

3.2. AUlA 6 – REGIME JURÍDIcO DO EMPRESÁRIO InDIVIDUAl ........................................................................................17

3.3. AUlA 7 – REGIME JURÍDIcO DA EIRElI .................................................................................................................20

4. SOcIEDADES EMPRESÁRIAS ................................................................................................................................23

4.1. AUlA 8 – TIPOS DE SócIO ................................................................................................................................23

4.2. AUlA 9 – SOcIEDADE lIMITADA – ORIGEM, OBJETIVO E cARAcTERÍSTIcAS ....................................................................26

4.3. AUlAS 10 E 11 – SOcIEDADE lIMITADA – cARAcTERÍSTIcAS E DElIBERAÇõES SOcIAIS ......................................................29

4.4. AUlAS 12 E 13 – SOcIEDADE lIMITADA – ADMInISTRAÇÃO .......................................................................................38

4.5. AUlA 14 – SOcIEDADE lIMITADA – cOlIGAÇÃO SOcIETÁRIA, cOnSElhO fIScAl, PREPOSTOS ..............................................45

4.6. AUlA 15 – SOcIEDADE lIMITADA – cOncEnTRAÇÃO E DEScOncEnTRAÇÃO SOcIETÁRIA ....................................................51

5. TIPOS SOcIETÁRIOS ..........................................................................................................................................56

5.1. AUlAS 16 E 17 – clASSIfIcAÇÃO DAS SOcIEDADES ..................................................................................................56

6. PEQUEnAS EMPRESAS E O MERcADO DE cAPITAIS .....................................................................................................64

6.1. AUlA 18 – InSTRUMEnTOS JURÍDIcOS PARA A cAPTAÇÃO DE REcURSOS (PRóPRIOS E DE TERcEIROS) ..................................64

6.2. AUlA 19 – InVESTIDOR-AnJO E RElAÇõES cOM InVESTIDORES ..................................................................................67

7. EncERRAMEnTO DA ATIVIDADE EMPRESARIAl ........................................................................................................71

7.1. AUlAS 20 E 21 – BAIxA DO REGISTRO DO EMPRESÁRIO InDIVIDUAl E PROcEDIMEnTOS DE DISSOlUÇÃO, lIQUIDAÇÃO E ExTInÇÃO DA SOcIEDADE EMPRESÁRIA ......................................................................................................................................71

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1. ABERTURA

1.1. AUlA 1 – ApREsEnTAção do cURso

ApresentAção do professor

objetivo gerAl do curso

Capacitar os(as) estudantes para reconhecer e buscar soluções para os principais problemas jurídicos decorrentes do exercício de uma atividade econômica organizada de pequeno e médio porte.

objetivos específicos

Conhecer os aspectos legais, principais mecanismos de governança e as controvérsias relacionadas ao exercício da atividade empresária segundo os modelos e regimes jurídicos societários disponíveis para a pequena e média empresa (tais como as sociedades limitadas e as sociedades em conta de participação).

Analisar o regime jurídico das sociedades limitadas.Desenvolver o raciocínio jurídico com a análise de casos práticos e, sempre

que possível, a realização de atividades em sala de aula.

Método

O método preponderante do curso será o de encontros expositivos-dialogados. Contudo, poderão ser adotados outros tipos de encontros ou dinâmicas de grupo por ventura considerados mais adequados aos objetivos específicos de cada aula.

AvAliAção

A avaliação do curso será realizada por meio de duas provas.

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Cada prova valerá até 10.00 pontos, a nota final da disciplina será a média aritmética das notas obtidas pelo(a) aluno(a) nas duas provas.

Caso algum(a) aluno(a) perca uma das provas, poderá realizar a segunda chamada.

Os(as) alunos(as) que obtiverem média final maior ou igual à 5.00 e menor ou igual à 7.00, deverão realizar a prova final da disciplina.

notAs introdutóriAs

O presente material didático foi elaborado (e está em constante reelaboração) com base na modestíssima premissa de funcionar como uma primeira leitura, básica e deveras introdutória, de direito empresarial. A presente apostila terá atingido seu objetivo se conseguir levar o(a) seu(sua) leitor(a) a buscar o estudo e a análise detida do ordenamento jurídico comercial brasileiro, da doutrina jurídica comercialista nacional e da jurisprudência pátria sobre as atividades econômicas organizadas.

Com base na premissa acima identificada vale a pena colacionar, pela pertinência e atualidade, a seguinte lição do Prof. Theophilo de Azeredo Santos:

“PALAVRAS INICIAISOs Manuais Jurídicos, de largo uso na França (Précis, Leçons, Cours)

e na Itália (Lezioni, Corso, Appunti) são textos reduzidos e sistematizados dos conceitos fundamentais em que se inspira a disciplina versada.

Nos países em desenvolvimento, é patente a dificuldade de os alunos adquirirem as obras reclamadas pelos professores, em face do preço sempre crescente das obras didáticas, em função do custo do papel.

Além do mais, a extensão da disciplina, o despreparo, a falta de intimidade com o termos técnico-jurídicos, a ausência de estudos sistemáticos por parte dos alunos tornam o ensino difícil, sem objetividade e, para alguns, pode-se dizer, inútil, em virtude da impossibilidade de a matéria ser assimilada.

A redação deste trabalho tem por escopo levar ao corpo discente os princípios fundamentais, as noções básicas da disciplina que lecionamos, iniciar os alunos no estudo do Direito Comercial, abrindo-lhes perspectivas para estudo mais aprofundado.

Temos sustentado – e o correr dos anos aprofunda nossa convicção – que as Faculdades de Direito não têm por finalidade formar juristas, mas ajudar os alunos a estudar, a compreender os diversos ramos da ciência jurídica, facilitando-lhes a percorrer, no futuro, com maior profundidade, os mais diversos e complexos problemas que a vida profissional lhes possa apresentar.

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Este Manual – singelo no fundo e na forma – não tem a pretensão de fazer de cada aluno um comercialista. Trata-se de esforço pedagógico que tem por destinatário os alunos das Faculdade de Direito e por finalidade oferecer, de maneira metódica e em linguagem acessível, as noções básicas do Direito Comercial brasileiro, sem a pretensão se inovar ou levantar novas teorias.

Não compreendemos ensino jurídico divorciado da realidade, razão pela qual a parte prática (formulários, problemas, sínteses da jurisprudência de nossos tribunais) há de contribuir para a melhor compreensão dos ensinamentos teóricos.

A apreensão da legislação em vigor evitará, por parte dos alunos, a procura, às vezes difícil, do texto legislativo vigente.

É óbvio que o estudo deste Manual não implica no abandono, dos excelentes trabalhos de J. X. Carvalho de Mendonça, Waldemar Ferreira, João Eunápio Borges e muitos outros, pois traçamos, tão somente, um roteiro, a fim de facilitar os estudos e pesquisas posteriores.

E dos Mestres e comercialistas aguardamos as sugestões para tornar nosso trabalho à altura de suas finalidades. ” (Destaques no original)

SANTOS, Theophilo de Azeredo (1970) Manual de Direito Comercial. 3ª Edição. São Paulo: Forense.

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2. InTRodUção À pEQUEnA EMpREsA

2.1. AUlAs 2 E 3 – InTRodUção À pEQUEnA EMpREsA

conceitos de eMpresA, eMpresário, AtividAde e sociedAde eMpresáriA

Empresa é o objeto da atividade empresarial exercida pelo empresário (posição do código civil - Art. 966) em vez de sujeito da atividade empresarial (posição de Washington Peluso e José Gabriel Assis de Almeida).

A definição de empresa está implícita na definição de empresário prevista no artigo 966 do código civil.

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Na exposição de motivos do código civil (de Miguel Reale) é a “unidade econômica de produção” ou “a atividade econômica unitariamente estruturada para a produção ou a circulação de bens ou serviços”1. Será “econômica” a atividade que cria riqueza através da coordenação de capital e trabalho para produção de bens ou serviços com valor pecuniário. Será considerada como atividade econômica, inclusive, aquela exercida por pessoas que intermediam trocas econômicas, pois esses intermediários aumentam a utilidade do bem ou serviço negociado. Por outro lado, não são econômicas as atividades de mera fruição (ex.: administração de bens ou investimento próprios; religiosas ou profissionais liberais).

François Perroux define como “restritiva” a empresa capitalista essencialmente caracterizada pelo emprego de trabalho alheio e pelo móvel lucrativo que inspira seu exercício e “extensiva” a universalidade econômica e jurídica na qual são agrupados e coordenados os fatores materiais e humanos da atividade econômica.

1 reAle, Miguel. o projeto de Código Civil: situação atual e seus problemas fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1986.

1 reAle, Miguel. o projeto de Código Civil: situação atual e seus problemas fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1986.

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Em uma visão de direito econômico, a empresa seria o sujeito que exerce a política econômica. Se a empresa fosse considerada como sujeito dos atos que compõem a atividade a sua venda facilitaria o trespasse, pois todos os elementos particulares que compõem cada unidade produtiva seriam transferidos juntos, sem necessidade de realizar atos específicos de transferência de cada posição contratual. Porém, que se a empresa não chega a ser o sujeito de direito dos atos pode ser o instituto jurídico unificador de todos os elementos da atividade econômica. Neste sentido, Asquini (1943) no artigo clássico intitulado ‘Perfis da Empresa’ informa que a empresa é um conceito/fenômeno “poliédrico” que juridicamente tem vários significados (ou “perfis”): subjetivo (empresa como empresário); objetivo (empresa como estabelecimento); patrimonial (empresa como fundo de comércio ou azienda); funcional (empresa como atividade); e corporativo (empresa como instituição).

O empresário é movido pela busca do lucro. Segundo a concepção econômica de empresa, é o empresário quem organiza os fatores de produção: terra, capital, trabalho, tempo e “organização” (este último fator de produção foi introduzido em 1892 pelo economista Alfred Marshall no livro “Agents of Production: Land, Labour, Capital and Organization”).

O termo organização se refere a pôr e manter a empresa (composta por um ou mais estabelecimentos) funcionando organicamente e como um todo unitário, e gerenciar os recursos de capital e trabalho para exercício da atividade. Organização diferencia o empresário do trabalhador autônomo e do profissional liberal. Aliado à produção para a venda é o critério que confere “empresarialidade” à atividade econômica do empresário.

Segundo o artigo 966 do código civil, o empresário é a pessoa natural que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Podem ser empresários no Brasil as pessoas naturais (empresário individual) e as pessoas jurídicas (sociedades empresárias). As sociedades empresárias estão mencionadas no artigo 981 do CCB. Neste caso, o empresário será uma sociedade cujo objeto contemple o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 982).

Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

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Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados.Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.

Segundo o atual Código Civil Brasileiro - CCB (Livro II – Do Direito de Empresa, da Parte Especial) considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços (Art. 966 do CCB).

Obs.: Apesar da empresa ser a unidade econômica por excelência na economia capitalista e do fundamento constitucional da atividade econômica no Brasil (Art. 170, e seguintes, da CF/88), os artigos 966, 981 e 982 são os únicos pontos no CCB onde o termo “atividade econômica” aparece. A palavra “empresarial” só aparece relacionada com o nome/denominação da sociedade.

Segundo Tullio Ascarelli (2003), os conceitos de fato, ato e negócio jurídico são bem desenvolvidos pela doutrina, porém o conceito de atividade carece da atenção e aprofundamento devidos. Por isso, ele propõe que os seguintes elementos para o conceito de atividade:

• Composta por atos jurídicos coordenados;• A atividade deve ter finalidade lícita;• A atividade somente se sujeita ao regime jurídico do empresário quando

ligada ao objeto social (“escopo”). Porém, a atividade é imputável à pessoa jurídica mesmo se contrária ao objeto social (teoria da aparência);

• Nas pessoas físicas a atividade decorre da execução de uma série de atos, ao passo que nas pessoas jurídicas basta a definição do objeto social. (Obs.: Para Tulio Ascarelli, esse elemento qualifica o sujeito como empresário e determina a aplicação do ordenamento jurídico empresarial)

• A atividade pode ser autônoma ou subordinada (depende de outrem e resultados se vinculam a bens alheios, exemplo: sociedades empresárias que produzem bens ou fornecem serviços para outras sociedades empresárias do mesmo grupo societário);

• Atividade, composta por uma sucessão de atos jurídicos individuais, constitui um “fato jurídico”, de modo que a vontade é irrelevante na sua configuração;

• A atividade é objeto de avaliação jurídica independente dos atos jurídicos que lhe servem de base;

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• Não se aplicam às regras de nulidade e simulação à atividade;• O exercício da atividade pode exigir habilitação específica a ser obtida

pelo titular da atividade (pessoa natural ou jurídica)• Titular da atividade é o sujeito dos atos (pessoa jurídica ou natural)

(pode ser responsabilizado e imputado juridicamente) e não quem tem iniciativa econômica (diferença entre titularidade do capital social e poder de controle);

• A atividade se delimita no tempo, espaço e escopo por meio de um ou vários estabelecimentos;

• A atividade não depende de destinatários específicos, pois destina-se ao mercado de forma indiscriminada;

• A atividade não pode ser transferida, o objeto da transferência é do “complexo de bens” que lhe servem de instrumento (“asset deal” ou trespasse, art. 1143 do CCB) ou do controle do capital da pessoa jurídica titular da atividade (“share deal” ou cessão das cotas, art. 1.057 do CCB)

• A natureza da atividade define se determinado ato praticado pelos representantes legais da pessoa jurídica é de administração ordinária ou extraordinária, ou, ainda, se ato é abrangido pelo objeto social ou não (ultra vires societatis);

leiturA sugeridA

ALMEIDA, José Gabriel Assis de (1999) A noção jurídica de empresa. In: Revista de Informação Legislativa, vol. 36, nº 143. Brasília: Senado Federal, págs. 211 a 229.

ASCARELLI, Tullio (2003) A atividade do empresário. In: Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nº 132. São Paulo: Malheiros, págs. 203 a 215 (Trad. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França).

SOUZA, Washington Peluso Albino de (2003) O novo código civil, a empresa e o direito econômico. In: Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, nº 42. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, págs. 249 a 286.

conceitos de eMpresA Micro, pequenA e de pequeno porte

A ordem constitucional econômica brasileira prevê o tratamento diferenciado às pequenas empresas, nos termos do artigo 146, inciso III, alínea “d)”, e parágrafo único, artigo 170, inciso IX, e artigo 179 da CF/88:

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Art. 146. Cabe à lei complementar:(...)III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:(...)d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:(...)IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Inciso incluído pela EC nº 6/95)

Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.

Obs.: É importante distinguir o tratamento diferenciado conferido às pequenas empresas do tratamento diferenciado anteriormente conferido às “empresas brasileiras de capital nacional” (EBCN). O conceito de EBCN foi extinto do ordenamento jurídico brasileiro por meio da revogação do artigo 171 da CF/88 pela EC nº 6/95.

A receita bruta do empresário (pessoa natural ou jurídica) é adotada no direito brasileiro como critério para classificação da empresa segundo o seu porte. Sandroni (2001, p. 441) define receita como:

“Em termos contábeis, é a soma de todos os valores recebidos em dado espaço de tempo (um dia, um mês, um ano). Numa empresa comercial, a receita é formada pelas vendas à vista, pela parte recebida referente a vendas à crédito e pelos eventuais rendimentos de aplicações financeiras. (...) Os rendimentos de fonte certa compõem a receita ordinária, enquanto os incertos ou eventuais formam a receita extraordinária.” (Itálicos no original)

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A receita bruta compreende o resultado operacional global da atividade empresária com a suas vendas de bens ou prestação de serviços, ao passo que a receita líquida compreende o resultado operacional descontado dos valores que deverão ser pagos a título de despesas operacionais, juros, tributos e demais deduções.

O critério do faturamento para classificação das sociedades empresárias de acordo com o porte de suas atividades está previsto, principalmente, na lei complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 (LC 123), a qual aprimorou o sistema de tributação favorecida conhecido como “Simples Nacional”.

Neste sistema, as sociedades empresárias - que atuam em setores específicos da economia - e que tenham um faturamento abaixo de um determinado volume financeiro recebem um tratamento tributários duplamente favorecido. O primeiro favorecimento está no valor das alíquotas dos tributos e contribuições sociais que lhes são cobradas, o segundo se refere à facilidade no pagamento dos tributos devidos pelos microempreendedores individuais, que ocorre por meio de um carnê único mensal e em valor fixo independentemente de seu faturamento (o Documento de Arrecadação Simplificada do Microempreendedor Individual – DAS MEI, artigo 18-A da LC 123).

A LC 123 estabelece três categorias possíveis para a condução de pequenas atividades econômicas organizadas: uma para os empresários individuais (art. 966 do CCB e artigo 18-A da LC 123) – o Microempreendedor Individual – MEI - e outras duas para as sociedades empresárias, as Microempresas - ME (art. 3º, inciso I, da LC 123) e as Empresas de Pequeno Porte - EPP (art. 3º, inciso II, da LC 123).

Microempreendedor individual

O empresário individual (art. 966 do CCB) ou o empreendedor que exerça as atividades de industrialização, comercialização e prestação de serviços no âmbito rural, que (a) aufira receita bruta anual menor ou igual a R$ 81.000,00 (oitenta e um mil reais); (b) seja optante pelo Simples Nacional; e (c) não esteja impedido de optar pela sistemática prevista no artigo 18-A da LC 123.

Microempresa

Sociedade simples (artigo 997 a 1.038 do CCB) ou empresária, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário individual, devidamente registrados perante as juntas comerciais competentes (nos

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termos do artigo 3º da LC 123 e da Lei nº 8.934/94, Lei de Registro de Comércio, e de seu regulamento, o Decreto 1.800/96) que aufira receita bruta anual menor ou igual a R$ 360.000,00.

empresa de pequeno porte

Sociedade simples (artigo 997 a 1.038 do CCB) ou empresária, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário individual, devidamente registrados perante as juntas comerciais competentes (nos termos do artigo 3º da LC 123 e da Lei nº 8.934/94 e do Decreto 1.800/96) que aufira receita bruta anual maior que a R$ 360.000,00 e menor ou igual a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais.

sociedade de grande porte

No extremo oposto da classificação das sociedades empresárias pelo porte de suas atividades estão as sociedades de grande porte. As sociedades de grande porte, assim definidas pelo artigo 3º da Lei 11.638, de 28 de dezembro de 2007, são aquelas que devem adotar o mesmo regime de escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e de obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários aplicável às sociedades anônimas, nos artigos 176 a 188 da Lei 6.404/76 (Lei das S.A.), independentemente de seu tipo societário. A razão subjacente à esta regra é a relevância que tais sociedades empresárias (mesmo as de natureza jurídica contratual, como as sociedades limitadas) tem para a economia nacional vis-a-vis o porte, a complexidade de suas atividades e o seu faturamento, considerado substancial para os padrões das sociedades empresárias brasileiras.

Art. 3º Aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários.

Parágrafo único. Considera-se de grande porte, para os fins exclusivos desta Lei, a sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).

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jurisprudênciA

“O Simples Nacional surgiu da premente necessidade de se fazer com que o sistema tributário nacional concretizasse as diretrizes constitucionais do favorecimento às microempresas e às empresas de pequeno porte. A LC 123, de 14-12- 2006, em consonância com as diretrizes traçadas pelos arts. 146, III, d, e parágrafo único; 170, IX; e 179 da CF, visa à simplificação e à redução das obrigações dessas empresas, conferindo a elas um tratamento jurídico diferenciado, o qual guarda, ainda, perfeita consonância com os princípios da capacidade contributiva e da isonomia. Ausência de afronta ao princípio da isonomia tributária. O regime foi criado para diferenciar, em iguais condições, os empreendedores com menor capacidade contributiva e menor poder econômico, sendo desarrazoado que, nesse universo de contribuintes, se favoreçam aqueles em débito com os fiscos pertinentes, os quais participariam do mercado com uma vantagem competitiva em relação àqueles que cumprem pontualmente com suas obrigações. A condicionante do inciso V do art. 17 da LC 123/2006 não se caracteriza, a priori, como fator de desequilíbrio concorrencial, pois se constitui em exigência imposta a todas as pequenas e microempresas (MPE), bem como a todos os microempreendedores individuais (MEI), devendo ser contextualizada, por representar, também, forma indireta de se reprovar a infração das leis fiscais e de se garantir a neutralidade, com enfoque na livre concorrência. A presente hipótese não se confunde com aquelas fixadas nas Súmulas 70, 323 e 547 do STF, porquanto a espécie não se caracteriza como meio ilícito de coação a pagamento de tributo, nem como restrição desproporcional e desarrazoada ao exercício da atividade econômica. Não se trata, na espécie, de forma de cobrança indireta de tributo, mas de requisito para fins de fruição a regime tributário diferenciado e facultativo.” (Recurso Extraordinário 627.543, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado pelo Plenário em 30.10.13)

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3. REGIME JURÍdIco do EMpREsÁRIo IndIVIdUAl

3.1. AUlAs 4 E 5 – REGIME JURÍdIco do MEI

O objetivo das aulas 4 a 7 é compreender como se dá o exercício da atividade empresária por apenas um empresário assumindo todo o risco da atividade empresária. No direito positivo brasileiro existem três modalidades de organização jurídica desta modalidade de atuação empresarial: o Empresário Individual – EI, o Microempreendedor Individual e a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI.

As principais regras aplicáveis a tais modalidade de exercício da atividade empresária estão dispostas (1) nos artigos 966 a 980 do CCB para o EI, (2) na Lei Complementar nº 123/06 para o MEI; e (3) na Lei 12.441/11 para o EIRELI.

O Microempreendedor individual foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro em 2006, por meio do artigo 18-A da Lei Complementar nº 123, que trata do regime jurídico tributário conhecido como “Simples Nacional”. Neste regime facilitado de tributação os empresários individuais (pessoas naturais) e as sociedades empresárias (Microempresas ou Empresas de Pequeno Porte), podem exercer suas atividades com menor ônus tributário, tanto em termos de valor das alíquotas incidentes sobre as atividades econômicas organizadas exercidas, quanto em termos da burocracia necessária para o cumprimento das obrigações tributárias.

Isso porque, as sociedades empresárias integrantes dos Simples Nacional podem arrecadar uma série de impostos (IRPJ, IPI, ICMS, ISS) e contribuições (CSLL, COFINS, PIS/Pasep, CPP) em um Documento Único do Arrecadação – DAS (art. 13 da LC 123/06).

No caso do MEI que esteja devidamente enquadrado dentro do limite máximo de faturamento anual de R$81.000,00 (R$ 6.750,00 por mês), além de recolher os impostos e contribuições por meio de um documento único, o DAS, também existe a vantagem de pagar um valor fixo mensal independente do faturamento (Artigo 18-A, parágrafo 2º, Inciso V, da Lei complementar nº 123/06): (1) R$ 47,702 de INSS e (2a) R$ 1,00 (um real) de ICMS e/ou (2b) R$ 5,00 (cinco reais) de ISS (conforme o caso).

2 Valor atualizado para o salário mínimo vigente em 2018 (decreto 9.255/17).

2 Valor atualizado para o salário mínimo vigente em 2018 (decreto 9.255/17).

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A criação do regime jurídico do Microempreendedor Individual - MEI teve como foco principal, além de aumentar a arrecadação pelo fisco, reduzir a informalidade na condução da atividade empresarial na base da pirâmide econômica e social brasileira.

Inicialmente é importante destacar que o MEI é uma espécie do gênero empresário definida nos termos do artigo 966 do CCB, nos termos dos artigos 3º e 18-A do Lei Complementar nº 123/06. Esse destaque é importante porque, no Brasil, por fatores culturais e sociais, é comum identificar a separação das figuras do “Empreendedor” e do “Empresário”. Assim, quando se pensa em empreendedor, especialmente o microempreendedor, é comum vermos referências positivas ao brasileiro trabalhador (hipossuficiente) – logo, demandante de cuidados e auxílios – e quando se pensa em empresário é comum vermos referências negativas ao capitalista explorador e inimigo social. Uma análise “sociológica” das concepções sobre o empreendedorismo no Brasil está fora dos objetivos da aula, porém o destaque é relevante para identificar que, apesar das diferenças sociais e culturais, a diferença entre o empresário individual e o microempreendedor é de grau. Pois, na essência, do ponto de vista empresarial, ambos organizam a atividade econômica, assumem todos os riscos da atividade econômica na busca pelo lucro.

Apenas as atividades previamente definidas na tabela constante como Anexo XI da Resolução nº 140 expedida em 22 de maio de 2018 pelo Conselho Gestor do Simples Nacional podem se formalizar por meio da figura jurídica do MEI. Alguns exemplos de atividades (ocupações) permitidas são: comércio varejista, comércio de produtos farmacêuticos, fabricação de produtos para o consumo, assistência técnica, locação de maquinário e prestação de serviços, diversos (tais como artesanato, barbearia, entregas, comunicação, etc.)

As principais características do MEI são:

• Ausência de custos relativos à abertura, à inscrição, ao registro, ao funcionamento, ao alvará, à licença, ao cadastro, às alterações e procedimentos de baixa e encerramento (parágrafo 3º do artigo 4º da Lei Complementar nº 123/06);

• Registro e baixa integralmente pela internet e em portal único (http://www.portaldoempreendedor.gov.br);

• Pagamento de impostos e contribuições em valor fixo e por documento único (DAS);

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• Reduzido custo burocrático (desnecessidade de emissão de nota fiscal para consumidores pessoa física, escrituração simplificada em um documento mensal, o Relatório das Receitas Brutas Mensais)

• Possibilidade de contratação de apenas um empregado e manutenção de apenas um estabelecimento.

• Necessidade de apresentação da Declaração Anual do Simples Nacional do MEI (DASN-SIMEI).

leiturA sugeridA

FRANÇA, Julio Henrique do Carmo; LAGASSI, Verônica (2017) Microempreendedor Individual: vantagens e desvantagens. In.: Anais do Seminário Nacional de Formação de Pesquisadores e Iniciação Científica em Direito da FEPODI. Belo Horizonte: ESDH.

XXV ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI - BRASÍLIA/DF. Organização CONPEDI/UnB/UCB/IDP/UDF. Florianópolis: CONPEDI.

MELO , Cinira Gomes Lima; MAURO, Renata Giovanoni Di (2016) O instituto do Microempreendedor Individual e sua contribuição para o desenvolvimento econômico brasileiro. In.: Anais do V ENCONTRO INTERNACIONAL DO CONPEDI - MONTEVIDÉU - URUGUAI. Organização CONPEDI/UnB/UCB/IDP/UDF. Florianópolis: CONPEDI.

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3.2. AUlA 6 – REGIME JURÍdIco do EMpREsÁRIo IndIVIdUAl

A condição de comerciante ou, em sentido tecnicamente alinhado com a teoria adotada pelo CCB vigente, de empresário sempre foi uma questão chave do direito comercial ou empresarial. Inclusive, a forma como esta condição se estabelece foi durante muito tempo o critério determinante para a definição do âmbito de incidência do direito comercial.

Na fase subjetiva do direito comercial, a primeira fase, que teria se iniciado na Europa durante o período de desenvolvimento da burguesia e terminado com a Revolução Francesa, era considerado comerciante quem estivesse formalmente vinculado a uma corporação de ofício representativa dos interesses de determinada classe de comerciantes. O status de comerciante assegurava a aplicação do direito empresarial e a solução de demandas pelos tribunais consulares das corporações de ofício.

No final do Século XVIII, com a extinção das corporações de ofício teve início a fase objetiva, segunda fase do direito comercial. Nesta fase, inspirada pelos ideais do Iluminismo de uma nação, um povo e um direito, era importante para a consolidação do direito estatal como sendo o único direito válido (em contraposição aos direitos comerciais até então aplicáveis pelas corporações de ofício que tinham origem nos costumes e práticas comerciais de cada classe corporativa), extinção de privilégios de classe entre subgrupos sociais e de instâncias administrativas organizadas de nível intermediário entre os indivíduos e o Estado. Assim, o foco do direito comercial foi transferido da pessoa do comerciante para o ato de mercancia por ele praticado, originando a teoria dos atos de comércio para a definição do âmbito de incidência do direito comercial. Assim, o comerciante deixou de ser uma pessoa privilegiada porque vinculada à uma corporação para ser qualquer um praticasse os atos típicos do comércio.

Já no século XX, a teoria dos atos de comércio foi superada, especialmente na Itália após a promulgação do código civil italiano de 1942, para a adoção da teoria da empresa para a definição do empresário. Assim, o foco e objeto da análise do direito (agora empresarial) já não é mais o ato, mas toda a atividade organizada pelo empresário.

Assim, a passagem da primeira para a segunda e terceira fases do direito empresarial resultou em uma mudança da natureza jurídica do ato de registro do empresário perante uma determinada instituição pública.

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Pois, se na primeira fase do direito comercial o registro tinha a natureza jurídica constitutiva da condição de empresário, nas fases seguintes o registro passa a ter apenas a natureza jurídica declaratória. Neste sentido, veja-se, por exemplo, os revogados artigos 4º e 9º do antigo Código Comercial de 1850 (Lei 566/1850).

O empresário responde ilimitadamente com o seu patrimônio pelos riscos da atividade empresária.

O empresário pode ser uma pessoa natural ou pessoa jurídica. O empresário se diferencia também do profissional liberal e do autônomo. O profissional liberal de diferencia do empresário porque – nos termos do parágrafo único do artigo 966 do CCB – não pode exerce atividade empresária (ope legis) e, portanto, não pode ser empresário. O profissional liberal se diferencia do profissional autônomo pelo valor social atribuído às profissões científicas, literárias ou artísticas exercidas pelos profissionais liberais (médicos, advogados, contadores, engenheiros, etc.) e por exercer suas atividades em com base em legislação específica e na atuação de um conselho profissional. O empresário se diferencia do profissional autônomo porque o exercício da atividade empresária depende necessariamente da mobilização de fatores de produção (terra, capital, trabalho, tempo, organização, conhecimento especializado (know how, etc.) pelo empresário para a geração de riqueza. Por outro lado, o profissional autônomo emprega a sua própria força produtiva (trabalho) no exercício de sua prática profissional.

Uma exceção a regra da natureza jurídica declaratória do registro do empresário é o empresário rural. O empresário rural somente será considerado empresário se a sua atividade consistir elemento de empresa e se voluntariamente buscar o registro como empresário, nos termos dos artigos 968, 970 e 971 do CCB.

Nos termos do artigo 972 do CCB, somente podem ser empresários aquelas pessoas que estiverem no pleno gozo de sua capacidade civil e não estiverem legalmente impedidos de exercer a atividade empresária. Deste modo estão excluídos da possibilidade de exercer a atividade empresária o menor não emancipado, os interditos e os legalmente impedidos para tal – servidores públicos (inciso X do artigo 117 da lei 8.112/90), deputados e senadores (alínea “a)” do inciso II do artigo 54 e inciso IV do parágrafo único do artigo 95 da CF/88), membros do Ministério Público (alíneas ”c)” e “f)” do inciso II do parágrafo 5º do artigo 128 da CF/88) e os impedidos de administrar sociedades empresárias (art. 1.011 do CCB e item 1.3.3 do Regulamento constante como Anexo I à Instrução Normativa nº 38, expedida pelo DREI em 02 de março de 2017).

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leiturA sugeridA

NEVES, Thiago Ferreira Cardoso (2011) A nova empresa individual de responsabilidade limitada: memórias póstumas do empresário individual. In: Revista da EMERJ, vol. 14, nº 56. Rio de Janeiro: EMERJ.

REQUIÃO, Rubens (2015) Curso de direito comercial. Volume 1. 34ª Edição. São Paulo: Saraiva.

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3.3. AUlA 7 – REGIME JURÍdIco dA EIRElI

O instituto jurídico da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - EIRELI foi criado em 2011, por meio da lei 12.441, de 11 de julho, que introduziu o artigo 980-A no CCB.

Com a introdução da EIRELI no ordenamento jurídico brasileiro passou a ser possível a criação de um veículo jurídico que permitisse a limitação da responsabilidade do empresário e a segregação patrimonial, obrigacional e processual entre o empresário individual e a parcela de seus bens, patrimônio, estabelecimentos e obrigações referentes à sua atividade econômica.

A EIRELI representou uma inovação no direito empresarial brasileiro por que foi a primeira vez em que se reconheceu a própria empresa como sujeito de direitos e não como objeto da atividade da atividade exercida pelo empresário individual ou pela sociedade empresária (titular da empresa).

A discussão sobre a possiblidade de limitação da responsabilidade do titular da empresa pelos riscos da atividade econômica é antiga e encontra formas similares em outros países. Por exemplo, em Portugal existe tanto o instituto do Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada – EIRL, quanto a sociedade unipessoal por quotas (Número 5 do artigo 270º-A). Contudo, o EIRL não tem personalidade jurídica.

A principais características da EIRELI são:

• A EIRELI tem personalidade jurídica própria, constituindo um novo tipo de pessoa jurídica no direito brasileiro (inciso VI do artigo 44 do CCB);

OBS.: A maioria da jurisprudência e doutrina considera que a EIRELI constitui um novo tipo de pessoa jurídica. Vide, por exemplo, o Enunciado nº 3 da I Jornada de Direito Comercial, realizada em 2003: “3. A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI não é sociedade unipessoal, mas um novo ente, distinto da pessoa do empresário e da sociedade empresária”. Porém é possível defender que se trata, na verdade de uma sociedade unipessoal. Neste sentido, veja-se o seguinte posicionamento do Professor da Faculdade de Direito da USP Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França:

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“O nosso fértil legislador pátrio pode já ter criado muitas coisas, mas seguramente não conseguiu engendrar uma nova modalidade de organização finalística privada, o sempre conveniente tertium genus...Se assim é, por qual razão o nosso legislador não afirmou claramente tratar-se de sociedade unipessoal? Possivelmente, não o fez por conta de conhecido e ultrapassado constrangimento ou prurido jurídico em consagrar que, mesmo sendo a sociedade legalmente qualificada como contrato e resultar da reunião de pessoas (CC, art. 981), pode haver sociedade com um só sócio – questão essa, de resto, de há muito resolvida, e muito bem resolvida, no direito europeu continental através da 12ª Diretiva da CEE sobre Direito das Sociedades de 30.12.1989: a sua constituição pode se dar por ato unilateral e a sua arrumação dogmática é hoje dada pela teoria do contrato plurilateral associativo através do qual se constitui e se regra a organização.”

• Necessidade de capital social em valor no mínimo igual a cem vezes o maior salário mínimo vigente no Brasil. Em 2018, o capital social mínimo para a constituição da EIRELI é R$ 95.400,00 considerando o salário mínimo de R$ 954,00 (artigo 1º do Decreto 9.255/17);

• O titular da EIRELI pode ser pessoa física ou jurídica (artigo 980-A do CCB e item 1.2 do Regulamento constante como Anexo V à Instrução Normativa nº 38, expedida pelo DREI em 02 de março de 2017);

• O titular de uma EIRELI somente pode participar de uma única EIRELI (parágrafo 2º do artigo 980-A do CCB);

• A EIRELI pode resultar de um caso se unipessoalidade superveniente (parágrafo único do artigo 1.033 do CCB) (Vide aula 10, abaixo); e

• A EIRELI pode ser cessionária de direitos patrimoniais de autor atribuíveis ao seu titular.

A EIRELI, na forma como positivada no Brasil, pode ser criticada por exigir um capital social mínimo considerado elevado para os padrões das pequenas e médias sociedades empresárias brasileiras. Por exemplo, segundo o Prof. Mattos Filho et al. (2014, p. 2), 77,9% das sociedades limitadas ativas registradas no Estado de São Paulo têm capital social de até R$ 50.000,00 cinquenta mil reais.

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Logo, é possível afirmar que a instituição de um capital social tão elevado, por um lado, contribui para reduzir o número de “sociedades de fachada” (onde um sócio tem 99,99% do capital social e o outro tem 0,01%), por outro, se mostra ineficiente para aumentar a formalização de pequenos empreendimentos e fomentar a organização de pequenos e médios negócios.

leiturA sugeridA

FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes (2012) Empresa individual de responsabilidade limitada (lei 12.441/11): Anotações. In: Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, ano LI, nº 163. São Paulo: Malheiros.

LAGASSI, Verônica; JACOB, Paola Domingues (2016) EIRELI: tensões e perspectivas. In.: Anais do XXV ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI - BRASÍLIA/DF. Organização CONPEDI/UnB/UCB/IDP/UDF. Florianópolis: CONPEDI.

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4. socIEdAdEs EMpREsÁRIAs

4.1. AUlA 8 – TIpos dE sócIo

Em primeiro lugar é importe diferenciar a figura do sócio e da figura empresário. O empresário analisado anteriormente é o titular da empresa (atividade), ao passo que o sócio é membro de uma sociedade empresária, essa sim é a titular da empresa. Essa distinção é importante porque delimita o regime de responsabilidade do empresário e o regime de responsabilidade da sociedade empresária.

Um bom exemplo da diferença entre um sócio e um empresário é que pessoas impedidas de exercer a atividade empresária podem vir a ser sócias de sociedade empresárias. Vide, por exemplo, o disposto no artigo 974 do CCB que obriga as juntas comerciais a registrarem os atos societários das sociedades que tenham pessoas incapazes integrantes de seu quadro de sócios, desde que o incapaz: (1) não exerça a administração da sociedade; (2) o capital esteja totalmente integralizado; e (3) o sócio incapaz (relativamente ou absolutamente) seja assistido ou representado por seus representantes legais.

Uma vez feita a breve introdução acima, é importante destacar que do ponto de vista jurídico doutrinário não existe propriamente uma classificação rígida entre os sócios de sociedades empresárias. O que existe são características típicas de cada sócio definidas pelo tipo societário da sociedade em questão (como, por exemplo, as sociedades em conta de participação e em comandita simples ou por ações – que têm dois tipos de sócios diferentes. Respectivamente, os sócios ostensivos e ocultos e os sócios comanditados e comanditários) ou agrupamentos de sócios com base em comunidades de interesses próximos, por exemplo:

• sócios controladores – que tem a prerrogativa de eleger a maioria dos administradores da sociedade e a sua vontade prevalece nas deliberações.

• sócios integrantes de acordos de sócios ou de bloco de controle – sócios que se reúnem em contrato parassocial com a finalidade de exercer conjuntamente o poder de controle social. Estes sócios, mesmos reunidos contratualmente, podem ter interesses bastante divergentes entre si.

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Por exemplo, um investidor de private equity pode adquirir uma participação minoritária no capital social de uma sociedade investida e exigir participar do bloco de controle para conseguir exercer influência na administração da sociedade.

• sócios-administradores – os sócios que participam do capital social e que exercem atividades na administração das sociedades. Nas sociedades limitadas, costumam ser os sócios controladores, inexistindo separação efetiva entre a titularidade do capital social e o exercício do poder de controle.

• sócios que sejam membros de um grupo familiar – sócios que sejam integrantes de uma mesma família e, portanto, tem, no mínimo, três feixes de interesses que se intercruzam e devem ser balanceados, os interesses pessoais do próprio sócio, os interesses familiares de preservação do patrimônio e continuidade da família e os interesses de geração de caixa e administração da sociedade.

• sócios minoritários – sócios titulares de parcelas do capital social que são insuficientes para lhes assegurar a participação efetiva na tomada das decisões sociais e na administração da sociedade.

• sócios de serviço – sócios cuja a contribuição para a sociedade se dá apenas com o fator de produção trabalho e, por isso, não aportam recursos para a formação do capital social da sociedade. No direito societário vigente, somente sociedades simples podem ter sócios de serviço.

• sócios de capital ou rentistas – sócios que aportam recursos financeiros na sociedade, mas não participam da administração, podem ter interesses financeiros de curto prazo que se contrapõem aos interesses de longo prazo da sociedade.

A classificação didática indicada acima foi feita com base no pertencimento familiar e na participação no capital social ou na administração da sociedade. Porém, existem outros critérios para identificar os tipos de sócios de uma determinada sociedade que são relevantes para a identificação da dinâmica interna de funcionamento da sociedade. A dinâmica interna de funcionamento da sociedade depende fundamentalmente (1) dos interesses pessoais e profissionais de cada sócio e (2) dos alinhamentos e desalinhamentos de interesses entre os sócios e a sociedade.

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leiturA sugeridA

MARINS FILHO, Luiz Almeida (1985) Socorro! Tenho um sócio. 8ª Edição. São Paulo: Harbra.

SZTUTMAN, Henry (2013) Quem tem sócio tem patrão. In. Revista Capital Aberto. Disponível em: https://capitalaberto.com.br/temas/captacao-de-recursos/quem-tem-socio-tem-patrao/#.W1up29VKi00. Data de acesso: 25 de julho de 2018.

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4.2. AUlA 9 – socIEdAdE lIMITAdA – oRIGEM, oBJETIVo E cARAcTERÍsTIcAs

As sociedades contratuais por quotas de responsabilidade limitada tiveram origem na Alemanha no final do século XIX, mais especificamente em 1892, por meio da criação das Gesellschaft mit beschränkter Haftung (GmbH). Na Inglaterra, as sociedades de responsabilidade limitada tiveram origem em 1907 com a criação das Limited Partnerships por meio do Limited Partnerships Act de 1907.

No direito brasileiro, as sociedades por quotas de responsabilidade limitada foram criadas em 1919, por meio do Decreto 3.708, de 10 de Janeiro (o “Decreto das Limitadas”). Esse decreto fez com que o Brasil fosse o primeiro país das América Latina a ter uma legislação própria para as sociedades por quotas de responsabilidade limitada (Salama, 2014, O Fima de Responsabilidade Limitada no Brasil, p. 59).

Vale ressaltar, porém, que apesar da recorrente menção à GmbH alemã como inspiração para a sociedade por quotas de responsabilidade limitada brasileira, o debate sobre a introdução no direito brasileiro de um tipo societário de responsabilidade limitada teve início, pelo menos, a partir de 1865, com o projeto de lei apresentado pelo Ministro da Justiça Nabuco de Araújo. Esse novo tipo societário teria as seguintes vantagens (a) sobre as sociedades anônimas, não precisaria de autorização administrativa; (b) sobre a sociedade em nome coletivo, nenhum sócio teria responsabilidade ilimitada; e (c) sobre a sociedade em comandita, não teria nenhum sócio impedido de participar da administração da sociedade ou administrador solidariamente responsável.

O Decreto 3.708/19 foi revogado apenas com a entrada em vigor do atual Código Civil Brasileiro, em 2003.

Obs.: Tanto a Inglaterra, quanto a França já haviam adotado um regime próprio de limitação da responsabilidade dos sócios das sociedades anônimas (institucionais e que dependiam de autorização administrativa para a sua constituição e funcionamento). Na França, este regime de limitação foi previsto no Code de Commerce de 1807 e, na Inglaterra, a limitação da responsabilidade teve origem no Limited Liability Act de 1855.

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A criação das sociedades limitadas visou oferecer aos comerciantes uma opção de tipo societário onde os sócios tivessem limitadas as suas responsabilidades e riscos patrimoniais, mas sem as desvantagens burocráticas das sociedades anônimas que prevaleciam à época.

As atuais sociedades limitadas, que substituíram as “sociedades por quotas de responsabilidade limitada” apresentam as seguintes características:

• Seus procedimentos de formação e organização são mais simples do que os exigidos para as sociedades anônimas, nos termos do artigo 997 do CCB em contraposição aos artigos 80 a 99 da Lei das S.A.;

• A responsabilidade dos sócios é restrita ao valor das suas quotas (art. 1052 do CCB);

• Apesar da limitação da responsabilidade citada acima, os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital social (art. 1.052 do CCB);

• Os sócios têm flexibilidade para escolher o regime jurídico supletivo ao contrato social, podendo escolher entre as regras aplicáveis às sociedades simples (artigos 997 a 1.038 do CCB) ou as regras aplicáveis às sociedades limitadas (artigos 1.052 a 1.141 do CCB), conforme previsto no artigo 1.055, caput e parágrafo único, do CCB.

• A sociedade limitada tem feições híbridas entre sociedades de pessoas e sociedades de capitais (art. 1.057 do CCB);

• Os sócios não podem contribuir para a formação do capital social com serviços (art. 1.055, parágrafo 2º, do CCB);

• A sociedade limitada pode conduzir seus negócios (“girar”) sob firma ou denominação (art. 1.158 do CCB), desde que conste ao final a palavra “limitada” ou sua abreviatura “Ltda.”;

• As demonstrações contábeis das sociedades limitadas não precisam ser publicadas em jornal de grande circulação ou na imprensa oficial da localidade da sede da sociedade (artigos 1.179, 1.188 e 1.189 do CCB);

Obs.: Atualmente existe controvérsia quanto à necessidade de publicação das demonstrações contábeis elaboradas pelas sociedades limitadas de grande porte, nos termos do artigo 3º da Lei 11.638/07.

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Pois a Lei 11.638/07 menciona a obrigatoriedade das sociedades de grande porte seguirem as regras sobre a escrituração e a elaboração das demonstrações contábeis e a auditoria por auditor registrado perante a CVM, mas não menciona expressamente sobre a necessidade de publicação das demonstrações contábeis.

A discussão gira em torno de uma leitura literal do artigo 3º da Lei 11.638/07 (que não contém a palavra “publicação”) e as normas administrativas elaboradas pelas Juntas Comerciais que obrigam a publicação das demonstrações contábeis (Especialmente a Deliberação nº 2/2015 expedida pela Junta Comercial do Estado de São Paulo – JUCESP e Enunciado nº 39 expedido pela Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro – JUCERJA).

• Os sócios das sociedades limitadas têm flexibilidade na escolha do regime de circulação das quotas sociais. Assim, as quotas poderão ou não ser cedidas para os demais sócios ou para terceiros conforme previsto no contrato social. Caso o contrato social seja omisso, incidirão as seguintes regras: (a) cessão para sócio - pode ceder para outro sócio independentemente da autorização dos demais sócios (art. 1.057, caput, primeira parte); ou (b) cessão para terceiros – pode ceder para terceiros desde que mediante autorização de sócios representando 25% (1/4) do capital social (art. 1.057, caput, in fine).

leiturA sugeridA

CAMPINHO, Sérgio (2014) O direito de empresa à luz do novo código civil. 13ª Edição. Rio de Janeiro: Renovar.

BORBA, José Edwaldo Tavares (2017). Direito Societário. 15ª Edição. São Paulo: Atlas.

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4.3. AUlAs 10 E 11 – socIEdAdE lIMITAdA – cARAcTERÍsTIcAs E dElIBERAçõEs socIAIs

A principal característica das sociedades limitadas é o fato de se tratarem de sociedades contratuais, em contraposição às sociedades institucionais. Como uma sociedade contratual a sociedade limitada se constitui por meio da assinatura de um contrato social firmado entre os sócios fundadores da sociedade e o seu posterior registro perante o órgão competente (Junta Comercial, quando o objeto social tem elemento de empresa, e RCPJ, quando não o tem).

Assim, como todos os contratos firmados no Brasil, o instrumento particular de constituição de uma sociedade limitada deve, em primeiro lugar, obedecer aos requisitos de validade, existência e eficácia jurídica (a “escada ponteana”) previstos na legislação brasileira (art. 104 do CCB): objeto lícito, partes capazes e legítimas e forma prevista ou não proibida em lei.

No caso da constituição das sociedades limitadas, o CCB determina que sejam ainda observados alguns requisitos básicos previstos especialmente no artigo 997 do código, na Lei 8.934/94 e no Decreto 1.800/96 e, secundariamente, as disposições previstas na regulação administrativa prevista expedidas pelo Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI. No caso das sociedades limitadas, especialmente o Regulamento constante como Anexo II à Instrução Normativa nº 38, expedida pelo DREI em 02 de março de 2017 (“Regulamento das Sociedades Limitadas”).

Os principais requisitos do contrato social da sociedade limitada são:

1. Partes obrigatórias: (a) Título (Contrato Social); (b) preâmbulo; (c) corpo do contrato contendo, no mínimo, as cláusulas obrigatórias e o fecho (item 1.2.1 do Regulamento das Sociedades Limitadas).

2. Requisitos e conteúdos legais mínimos (artigo 104 do CCB, Incisos I a VIII do artigo 997 do CCB e mais regras específicas do tipo societário):

• Pluralidade de partes (Inc. I);

No Brasil, as sociedades são consideradas como de natureza contratual ou institucional, por isso a sua constituição depende necessariamente do concurso de duas ou mais partes.

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Obs: Em relação às sociedades simples, a única exceção a esta regra é a sociedade unipessoal de advocacia, introduzida no direito brasileiro pelos artigos 15, 16 e 17 da Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia), conforme alterado pelo artigo 2º da Lei nº 13.247, de 12 de janeiro de 2016. Em relação às sociedades empresárias, a única exceção à regra da pluralidade de sócios é a “subsidiária integral” (prevista no artigo 251 da Lei das S.A.).

Uma sociedade constituída por duas pessoas pode, ao longo de sua existência jurídica, vir a ter apenas um único sócio (por exemplo, em caso de falecimento de um dos sócios). Configurando uma hipótese de “unipessoalidade superveniente”, neste caso a pluralidade de sócios deve ser reconstituída dentro dos seguintes prazos:

(a) Para as sociedades em geral, regidas pelo CCB, em até cento e oitenta dias após a data em que a unipessoalidade superveniente se manifestou (inciso IV do artigo 1.033 do CCB); e

(b) Para as sociedades anônimas e sociedades em comandita por ações, regidas pela Lei das S.A., até a data da realização da próxima assembleia geral ordinária (AGO) da sociedade (alínea “d)” do inciso I do artigo 206).

Obs.: A data da reconstituição da pluralidade de sócios não necessariamente é até o ano seguinte em que se verificou a unipessoalidade superveniente, pois podem existir casos onde o exercício social da sociedade não coincida com o calendário civil.

Obs.: Nos termos do parágrafo único do artigo 1.033 do CCB, o sócio que tenha se tornado o único titular da integralidade do capital social de uma determinada sociedade poderá requerer a ‘transformação’ do registro da sociedade perante a Junta Comercial em um registro do próprio ex-sócio como empresário individual ou como Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI).

• Qualificação dos sócios;

Sócio pessoa natural – Nome, nacionalidade, naturalidade, estado civil, profissão, residência e domiciliado.

Sócio pessoa jurídica – denominação, tipo societário, nacionalidade, sede da sociedade.

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• Denominação, objeto, sede, prazo (Inc. II);

• Capital social (Inc. III);

O capital social deve ser expresso em moeda corrente nacional e pode ser formado por contribuições em dinheiro ou bens (artigos 1.005 e 1.006 do CCB)

• Quota de cada sócio (Inc. IV); Obs.: O CCB admite que sejam constituídas sociedades limitadas com quotas de valores diferentes (artigo 1.055 do CCB).

• Prestações do sócio de serviço (Inc. V); Nas sociedades simples é possível que a contribuição de um sócio para a formação da sociedade seja realizada por meio da prestação de serviços para a sociedade (artigo 1.006 do CCB).Nas sociedades empresárias é vedada a contribuição do sócio por meio da prestação de serviços (artigo 7º da Lei das S.A. e parágrafo 2º do artigo 1.055 do CCB).

Obs.: até a entrada em vigor do CCB, havia no Brasil um tipo societário onde um dos sócios contribuía com recursos para a formação do capital social e tinha responsabilidade solidária com a sociedade (sócio de capital) e um dos sócios contribuía exclusivamente com a prestação de serviços para a sociedade (sócio de serviços). Este tipo societário – Sociedade de Capital e Indústria – estava previsto no artigo 317 do Código Comercial, na parte que foi revogada pelo CCB.

• Pessoas naturais administradoras (Inc. VI);

Obs.: No direito brasileiro somente pessoas naturais podem figurar como administradores de sociedades, porém esta possibilidade existe em outras jurisdições (como os EUA, por exemplo).

• Participação nos lucros e perdas (Inc. VII); e

Independentemente de seu objeto social as sociedades empresárias são unidades que visam a produção de lucro. Por isso, nas sociedades com fins lucrativos, o direito ao recebimento de lucros é um direito essencial do sócio e não pode excluído por deliberação social ou pelos atos constitutivos.

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Como regra geral, os sócios que contribuem para a formação do capital social participam dos lucros e perdas na proporção de suas quotas e o sócio de serviço participa dos lucros na proporção média do valor das quotas (art. 1.007 do CCB). Porém, nas sociedades simples e limitadas, é admitida a distribuição desproporcional de lucros, conforme previsão em contrato social. A previsão de distribuição desproporcional dos lucros também pode estar expressa em acordo de sócios, caso a sociedade limitada tenha regência supletiva pela Lei das S.A. (artigo 1.053, parágrafo único, do CCB).

O artigo 1.008 do CCB veda a constituição de “sociedades leoninas”, ou seja, de sociedades onde um ou alguns dos sócios são excluídos da participação nos lucros ou nas perdas.

• Responsabilidade subsidiária ou não dos sócios (Inc. VIII).

Além das regras indicadas acima, é importante verificar no momento da constituição de cada sociedade a lei de registro de comércio (Lei 8.934/94), a Instrução Normativa nº 38/17 do DREI e os posicionamentos jurídicos adotados nos pareceres ou orientações divulgadas pela Junta Comercial competente no local da sede da sociedade. Para a constituição de sociedades simples, fundações e associações é importante analisar o disposto na lei 6.015/73 (Lei de registros públicos), uma vez que a constituição destas sociedades depende de registro perante o Ofício de Registro Civil de Pessoas Jurídicas – RCPJ.

deliberações sociais

O ato de deliberar significa chegar coletivamente a uma decisão após uma discussão informada e circunstanciada sobre um determinado tema. As deliberações dos sócios devem sempre ocorrer no interesse da sociedade.

O direito de participar da deliberação advém da condição de sócio da sociedade (status socii).

Tendo em vista que a deliberação é o ato necessário para a formação da vontade da sociedade, podem-se destacar duas linhas de pensamento sobre a sua natureza jurídica:

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(a) a primeira, que considera o ato de deliberar como um ato institucional (deliberação majoritária); e

(b) a segunda, que considera o ato de deliberar como uma espécie de negócio jurídico entre os sócios (deliberação contrato).

A diferença entre as duas teorias é que na primeira – deliberação majoritária – inspirada na teoria institucionalista das sociedades – todos os sócios (inclusive os ausentes e os dissidentes) se vinculam à decisão tomada pela maioria na deliberação. Na segunda teoria – deliberação contrato – cada sócio se vincula nos termos de sua própria manifestação na deliberação.

O direito brasileiro adotou a teoria da deliberação majoritária, nos termos do parágrafo 5º do artigo 1.072 do CCB.

Dois pontos sempre controverso são (1) como se chegar a decisão da sociedade em casos de empate na deliberação; e (2) a legalidade do voto em branco e da abstenção de voto. No caso de empate, o CCB determina que será escolhida a decisão aprovada pela maioria dos sócios (voto por cabeça) e, se o embate persistir, a questão deverá ser levada à conhecimento do Poder Judiciário.

Nos termos do artigo 1.072, o CCB prevê três formas de deliberação nas sociedades limitadas: (1) por reunião, (2) por assembleia, e (3) por instrumento deliberatório.

Para que as deliberações tomadas em reunião sejam eficazes perante terceiros, a forma de convocação, instalação e condução dos trabalhos da reunião deverá ser regida expressamente pelo contrato social. Caso o contrato social seja omisso, a reunião será realizada com base nas regras aplicáveis às assembleias (artigo 1.072, parágrafo 6º, do CCB).

A assembleia é obrigatória nas sociedades limitadas que tenham número de sócios superior à 10 (dez), nos termos do parágrafo 1º do artigo 1.072 do CCB.

A deliberação por meio de instrumento deliberatório formalizado pode ser realizada quando todos os sócios da sociedade limitada se manifestarem por escrito sobre a matéria objeto da deliberação.

As matérias previstas nos incisos I a VIII do artigo 1.071 do CCB são matérias de deliberação obrigatória pelos sócios. Além disso, o contrato social pode prever outras matérias para deliberação obrigatória dos sócios.

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34FGV direito rio

A convocação para que os sócios participem da reunião ou assembleia é regida pelos artigos 1.010, 1.072, 1.073 e 1.152 do CCB. O ato jurídico de convocação deve ser feito:

(1) Pelos administradores, nos casos previstos na lei ou no contrato social (art. 1.072 do CCB);

(2) Por sócio, caso os administradores atrasem por mais de sessenta dias para convocar a reunião ou assembleia ordinária (art. 1.073, inciso I, do CCB);

(3) Por sócio(s), que represente(m) mais de um quinto (20%) do capital social da sociedade caso os administradores atrasem mais de oito dias para realizar a convocação à pedido de sócio(s) (art. 1.073, inciso I, do CCB);

(4) Pelo Conselho Fiscal, caso os administradores atrasem mais de trinta dias para convocar uma reunião ou assembleia ordinária ou caso ocorra motivo grave e urgente para a sociedade (art. 1.069, inciso V, do CCB).

A convocação da reunião ou assembleia deve obrigatoriamente conter a descrição da pauta constante da ordem do dia para ser deliberada (artigos 1.072, parágrafo 2º, e 1.078, inciso III). Segundo Rubens Requião, a descrição da ordem do dia é importante porque ela delimita a responsabilidade e vinculação dos sócios sobre as matérias nela constantes. Assim, os eventuais dissidentes ou ausentes da deliberação não podem ser responsabilizados por deliberações tomadas sobre matérias que não estiveram expressamente indicadas na ordem do dia para a deliberação.

O instrumento de convocação para a assembleia deve ser publicado três vezes no diário oficial do estado e em jornal de grande circulação no local da sede da sociedade.

A primeira publicação do anúncio de convocação para a realização da assembleia deve ser realizada com oito dias de antecedência da data prevista para a realização da assembleia em primeira convocação. Para a realização da assembleia em segunda convocação, a antecedência mínima para a realização da assembleia após a primeira publicação do anúncio de convocação é de cinco dias.

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35FGV direito rio

A instalação da assembleia, a ser realizada em primeira convocação, depende da presença de sócios representando, no mínimo, três quartos do capital social (75%), conforme o artigo 1.074 do CCB. A assembleia realizada em segunda convocação pode ser instalada com qualquer número de sócios.

A mesa da assembleia é composta pelo presidente e pelo secretário. O presidente deve ser escolhido entre os sócios presentes na assembleia e o secretário poderá ser um sócio ou terceiro não sócio presente na assembleia. A principal responsabilidade do presidente da mesa é conduzir os trabalhos no conclave e ser o fiscal da legalidade das deliberações tomadas e aprovadas na assembleia. O secretário tem como principal responsabilidade auxiliar o presidente e lavrar a ata da assembleia.

A administração da sociedade deve proceder o registro da ata da assembleia perante a Junta Comercial competente e, para tal finalidade, devem ser lavradas duas versões da ata com conteúdo idêntico: a versão que será registrada no livro de registro de atas da sociedade (assinada pelos integrantes da mesa e pelos sócios presentes) e a versão que será levada a registro perante a Junta Comercial (assinada pelos integrantes da mesa da assembleia).

Obs.: a ata da assembleia é um documento de descrição e não de invenção. Deste modo, o conteúdo da ata deve refletir fielmente o que foi discutido e deliberado pelos sócios. Caso algum sócio considere que a ata da assembleia não corresponde ao que foi deliberado pelos sócios (ata infiel), poderá lavrar um instrumento de protesto por escrito e leva-lo a registro perante a Junta Comercial.

Nas sociedades limitadas cujo contrato social preveja a regência supletiva pelas regras das sociedades simples, estarão impedidos de participar das deliberações sociais os sócios que apresentem interesse pessoal contrário ao interesse da sociedade (artigo 1.010, parágrafo 3º, do CCB). Por outro lado, nas sociedades limitadas cujo contrato social preveja a regência supletiva pelas regras das sociedades anônimas, estarão impedidos de participar das deliberações sociais os sócios que apresentem interesse contrário ao da sociedade (artigo 115 da Lei das S.A.). Os sócios que participam da administração ou do conselho fiscal da sociedade estão impedidos de participar (“tomar parte”) nas assembleias que deliberem sobre a aprovação das contas da administração (artigo 1.078, parágrafo 2º, do CCB).

Obs.: Nas sociedades regidas pela Lei das S.A., merecem destaque duas correntes sobre a possibilidade de voto de sócios em reuniões/assembleias de sócios: a teoria do conflito material e a teoria do conflito formal.

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36FGV direito rio

Para os defensores da teoria do conflito formal, o sócio que tenha interesse pessoal potencialmente contrário ao interesse da sociedade não pode votar nas deliberações das matérias que apresentem hipóteses de conflitos de interesse pessoal e da sociedade.

Para os defensores da teoria do conflito material, o sócio que apresenta interesse pessoal potencialmente contrário ao interesse da sociedade pode votar nas deliberações das matérias que apresentem hipóteses de conflitos de interesse pessoal e da sociedade, porém a eficácia do seu voto está condicionada à confirmação posterior da inexistência de verificação de conflito de interesses. Ou seja, para esta segunda teoria, o acionista vota, mas o eventual interesse pessoal do sócio em detrimento do interesse da sociedade deve ser verificado em momento posterior à realização da assembleia.

Para que as decisões tomadas pelos sócios nas reuniões e assembleias das sociedades limitadas sejam válidas, devem ser atendidos os seguintes quóruns para deliberação:

MATéRIA fUnDAMEnTO lEGAl (ART. DO ccB) QUóRUM fUnDAMEnTO lEGAl

(ART. DO ccB)

Modificaçãodo contrato social 1.071, inc. V 3/4, no mínimo 1.076, inc. I

Incorporação, fusão, dissolução e cessação

do estado de liquidação1.071, inc. VI 3/4, no mínimo 1.076, inc. I

Remuneraçãodo Administrador 1.071, inc. IV 50% + 1 quota 1.076, inc. II

Falência, recuperação judicial ou recuperação

extrajudicial1.071, inc. VIII 50% + 1 quota 1.076, inc. II

Aprovação das contas 1.071, inc. I Maioria dos presentes* 1.076, inc. III

Nomeação/destituiçãode liquidante 1.071, inc. VII Maioria dos

presentes* 1.076, inc. III

Nomeaçãode administrador

(ato separado)1.071, inc. II

VER FLUXOGRAMA

DA AULA 121.076, inc. I e II +

1.061

Destituiçãode administrador 1.071, inc. III

VER FLUXOGRAMA

DA AULA 121.076, inc. I e II + 1.063, parágrafo 1º

* Salvo disposição diferente no contrato social.

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37FGV direito rio

Algumas das principais causas de impugnação de deliberações sociais são:

a) Ausência de convocação;b) Convocação irregular;c) Irregularidade da instalação ou funcionamento da reunião ou

assembleia;d) Deliberação sobre matérias fora da ordem do dia;e) Deliberação sobre matérias que dependiam de designação específica na

ordem do dia sob o item “assuntos gerais”;f) Violação de direitos essenciais dos sócios ou de terceiros (por exemplo, o

direito do sócio de ser acompanhado por um advogado e a prerrogativa do advogado de acompanhar o seu assistir ao seu cliente);

g) Deliberações aprovadas com simulação, erro, dolo ou coação;h) Abuso do direito de voto (por exemplo, nas situações de voto proferidos

por pessoas impedidas de votar);i) Destituição de administradores;j) Assembleia realizada fora da sede da sociedade;k) Exclusão de sócio (Dissolução parcial da sociedade em relação à um

sócio por justa causa, artigo 1.085 do CCB);l) Falecimento posterior de um sócio;m) Deliberação social tomada sem a disponibilização dos documentos

necessários para a análise das matérias constantes da ordem do dia pelos sócios; e

n) Irregularidades no balanço aprovado.

leiturA sugeridA

COSTA, Ari Boemer Antunes da (2013) Deliberações dos sócios nas sociedades limitadas. In: Revista JurisFIB, volume IV, ano IV. Bauru: FIB.

REQUIÃO, Rubens (2015) Curso de direito comercial. Volume 1. 34ª Edição. São Paulo: Saraiva.

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38FGV direito rio

4.4. AUlAs 12 E 13 – socIEdAdE lIMITAdA – AdMInIsTRAção

O administrador é a pessoa natural que recebe a prerrogativa de representar legalmente a sociedade para o exercício dos atos da vida civil a que as sociedades têm legalmente a capacidade e a legitimidade para praticar.

Por meio dos atos regulares praticados pelos seus administradores, as sociedades (dotadas de personalidade jurídica, nos termos do artigo 44, inciso II, do CCB) manifestam e expressam a sua tripla autonomia (obrigacional, patrimonial e processual) realizando atos e negócios jurídicos e econômicos.

Os atos regulares de gestão ordinária e extraordinária tomados pelos administradores das sociedades obrigam a sociedade, nos termos do artigo 47 do CCB. Serão considerados regulares os atos úteis, necessários e suficientes para a consecução do objeto social da sociedade (art. 1.015 do CCB).

Os administradores são os responsáveis pelo exercício no dia-a-dia da sociedade do poder de controle da sociedade, ou seja, pela tomada das decisões necessárias para o exercício dos direitos e uso, gozo, fruição, reivindicação, e disposição dos bens e patrimônio social.

Vale ressaltar que o administrador funciona como um órgão necessário e vital para que a sociedade funcione e exerça as suas atividades, assim Pontes de Miranda defende que a relação existente entre o administrador e a sociedade é de presentação e não de representação (algo posto diante de). Ou seja, o administrador faz presente a sociedade, sendo dela um órgão interna corporis, e não um representante externo ao corpo social. Em decorrência da relação de presentação e não de representação, é incorreto analisar a relação entre o administrador e a sociedade com base nos institutos do mandato, onde há um principal (mandante) e um mandatário (agente).

Nas sociedades limitadas, podem ser administradores as pessoas naturais, sócias ou não da sociedade, conforme for expressamente definido no contrato social (artigos 1.060 e 1.061 do CCB). Por outro lado, não podem ser administradores as pessoas impedidas por lei de administrar sociedades limitadas, nos termos dos artigos 1.011, parágrafo 1º, e 1.053 do CCB:

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39FGV direito rio

a) as pessoas impedidas por lei especial; e

b) enquanto perdurarem os efeitos da condenação, as pessoas condenadas:a. a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos

públicos;b. por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão,

peculato;c. por crimes contra a economia popular, contra o sistema financeiro

nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade.

Obs.: as pessoas naturais nomeadas para exercer cargos de administração nas sociedades limitadas devem firmar declaração de desimpedimento atestando que não incorrem em nenhuma das situações listadas acima previamente à assinatura do ato de posse na administração da sociedade.

Tendo em vista que os atos regulares dos administradores vinculam a sociedade é importante destacar que os administradores respondem pelos atos irregulares praticados na administração das sociedades. Duas importantes teorias sobre a vinculação ou não da sociedade pelos atos irregulares praticados pelos administradores são (1) a teoria dos atos ultra vires; e (2) a teoria da aparência. A teoria dos atos ultra vires foi originada na Inglaterra no Séc. XIX e resulta na impossibilidade de responsabilização da sociedade por um ato praticado pelo administrador com excesso dos poderes que lhe foram expressamente atribuídos pelo contrato social, ato de nomeação ou pela lei. Um ato irregular, portanto.

Segundo a teoria ultra vires, adotada no direito brasileiro, um ato praticado pelo administrador com excesso de poderes é um ato nulo em relação a terceiros, nos termos dos artigos 47 e 1.015 do CCB, ensejando ação de ressarcimento de danos contra os administradores que agiram irregularmente. Ressalta-se que os administradores das sociedades regidas pelo CCB respondem por culpa pelos atos praticados no desempenho de suas funções (art. 1.016).

Neste sentido, vale citar o Enunciado nº 219 aprovado na III Jornada de Direito Civil:

219 – Art. 1.015: Está positivada a teoria ultra vires no Direito brasileiro, com as seguintes ressalvas: (a) o ato ultra vires não produz efeito apenas em relação à sociedade; (b) sem embargo, a sociedade poderá, por meio de seu órgão deliberativo, ratificá-lo;

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40FGV direito rio

(c) o Código Civil amenizou o rigor da teoria ultra vires, admitindo os poderes implícitos dos administradores para realizar negócios acessórios ou conexos ao objeto social, os quais não constituem operações evidentemente estranhas aos negócios da sociedade; (d) não se aplica o art. 1.015 às sociedades por ações, em virtude da existência de regra especial de responsabilidade dos administradores (art. 158, II, Lei n. 6.404/76).

Pela teoria da aparência, são reconhecidos os poderes implícitos do administrador para praticar atos e negócios jurídicos em nome da sociedade. Assim, se a atuação do administrador demonstrar uma aparência de licitude, por exemplo, se é ele quem regularmente pratica atos em nome da sociedade perante terceiros – os atos irregulares praticados pelo administrador vincularão a sociedade.

A questão da responsabilidade do administrador pelos atos potencialmente irregulares praticados expressa uma tensão existente entre a proteção de direitos e interesses igualmente válidos e juridicamente relevantes (de terceiros contratantes, da sociedade, dos sócios minoritários, dos consumidores, etc.

A responsabilidade subjetiva do administrador pode decorrer de:

a) Infrações contra a ordem econômica (artigo 37, inciso II, da Lei 12.529/11);

b) Descumprimento de seus deveres de cuidado, diligência, vigilância, lealdade e evitar situações de conflitos de interesse com a sociedade (artigos 1.011, 1.016 e 1.017 do CCB);

c) Confusão patrimonial entre o patrimônio pessoal do administrador e da sociedade (artigo 50 do CCB);

d) Na esfera penal, de crimes praticados contra as relações de consumo (artigo 75 da Lei 8.079/90, o Código de Defesa do Consumidor – CDC);

e) Não pagamento de tributos em decorrência de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei ou contrato social (artigo 135, inciso II, da Lei nº 5.172/66, o Código Tributário Nacional – CTN); e

f) Qualquer uma das infrações indicadas acima que tenha sido apurada no processo falimentar (artigo 82 da lei 11.101/05)

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41FGV direito rio

Além dos casos citados acima, também pode ocorrer hipóteses de responsabilização pessoal do administrador de sociedades empresárias previstas na legislação trabalhista, ambiental ou previdenciária.

A administração da sociedade limitada, quando atribuída a todos os sócios no contrato, compete separadamente a cada sócio (art. 1.013 do CCB) e não é atribuída automaticamente aos sucessores (art. 1.060, parágrafo único). A administração da sociedade é uma função individual e personalíssima. Deste modo, mesmo quando existem vários administradores nomeados no contrato social, estes diretores não compõem um órgão colegiado, mas cada diretor é responsável por uma área ou escopo de atuação. Por exemplo, uma sociedade limitada pode funcionar com três diretores nomeados no contrato: um diretor presidente (representante legal da sociedade) e responsável pela condução dos negócios, um diretor financeiro (responsável pela tesouraria e planejamento financeiro da sociedade) e um diretor operacional (responsável pela governança e funcionamento interno da sociedade). Cada um responde por uma área específica e tem uma alçada decisória delimitada e independente dos demais.

Obs.: em órgãos colegiados de administração (como o Conselho de Administração nas sociedades anônimas, previsto no art. 140 da Lei das S.A.) membros se reúnem para chegar a uma decisão única que vincula a todos igualmente (princípio majoritário).

Vale ressaltar que a responsabilidade dos diretores entre áreas específicas não se confunde com o seu regime de responsabilidade civil por culpa no desempenho de suas funções, o qual prevê a responsabilidade solidária entre os administradores (art. 1.016 do CCB). Para que um determinado diretor não venha a ser responsabilizado por uma decisão da sociedade, é necessário que o diretor em questão deixe consignado por escrito a sua discordância em relação à decisão tomada.

O uso da firma ou denominação da sociedade é privativo dos diretores com os poderes expressamente atribuídos no contrato social (art. 1.064 do CCB). Os diretores podem ser nomeados no contrato social ou em ato separado. A nomeação do administrador nomeado no contrato social depende de uma alteração do contrato social (quórum de 75% do capital social para deliberação), para a nomeação e destituição do administrador nomeado em ato separado, devem ser observados os seguintes procedimentos:

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42FGV direito rio

Nomeação do administrador em ato separado (artigo 1.062 do CCB)

a) Assinatura do termo de posse no livro de atas da administração;b) Termo de posse deve ser assinado em até trinta dias após a nomeação,

sob pena de perda de ineficácia da nomeação;c) O ato de nomeação deve ser registrado perante a Junta Comercial

competente em até dez dias;d) O ato de nomeação levado à registro deve conter a nacionalidade, o

estado civil, a residência e ter como o anexo a cópia do documento de identidade do diretor nomeado (parágrafo 2º do art. 1.062).

Obs.: Segundo o Enunciado 66 da I Jornada de Direito Civil da Justiça Federal, o pré-requisito indicado na letra “d)”, acima, é o que obriga que somente pessoas naturais sejam nomeadas como administradoras de sociedades no Brasil. Veja-se:

66 – Art. 1.062: a teor do § 2º do art. 1.062 do Código Civil, o administrador só pode ser pessoa natural.

A nomeação e o tempestivo registro do termo de posse do administrador é importante porque marca o início do tempo de responsabilidade do administrador nomeado perante a sociedade e perante terceiros e serve para identificar claramente a presentação da sociedade.

O encerramento do período da administração se dá por (1) fim do prazo; destituição a qualquer tempo; ou renúncia do administrador (art. 1.063 do CCB). A destituição do administrador nomeado no contrato social depende de deliberação aprovada por sócios titulares de, no mínimo, dois terços do capital social da sociedade (art. 1.063, parágrafo 1º, do CCB).

A renúncia do administrador gera efeitos perante a sociedade a partir do momento em que a sociedade toma conhecimento e, perante terceiros, a partir do registro perante a Junta Comercial competente e da publicação do ato de renúncia.

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fluxograma 1 – quórum para nomeação de administrador

* Nomeado no contrato ou em ato separado

fluxograma 2 – quórum para destituição de administrador

* Obs.: O quórum para destituição do administrador nomeado no contrato é menor do que o quórum para alteração do contrato social.

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44FGV direito rio

leiturA sugeridA

CRUZ, Gisela Sampaio; LGOW, Carla Wainer Chalréo (2014) Notas da administração das sociedades limitadas. In: PERES, Tatiana Bonatti (Org.) Temas Relevantes de Direito Empresarial. Rio de Janeiro: Lumen Juris.

MENDES, Rodrigo Octávio Broglia (2014) Administração da sociedade limitada. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Org.) Tratado de Direito Comercial. Volume 2. São Paulo: Saraiva.

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45FGV direito rio

4.5. AUlA 14 – socIEdAdE lIMITAdA – colIGAção socIETÁRIA, consElho fIscAl, pREposTos

A condução das atividades empresárias no mundo moderno (especialmente, após o surgimento dos grupos empresariais transnacionais e conglomerados financeiros) adotar uma forma de organização jurídica que pode vir a reunir mais de uma sociedade integrante de um mesmo grupo societário.

Ou seja, várias sociedades, com personalidades jurídicas distintas, mas sob o controle comum de um mesmo grupo de pessoas (sócio controlador ou beneficiário final. Existe uma diferença relevante na organização da atividade econômica executada por uma ou várias sociedades: a relação entre o sujeito da atividade (a sociedade, sujeito de direitos e obrigações) e o seu objeto (a empresa, atividade econômica organizada). Isso por que o direito positivo brasileiro privilegia a atuação individual das sociedades para uma mesma finalidade. Apesar do fenômeno dos grupos societários ser mais aplicáveis à realidade das grandes empresas composta por uma ou várias sociedades institucionais, o código civil (que trata das sociedades contratuais) apresenta alguns dispositivos sobre a coligação societária por meio de participação de uma ou várias sociedades no capital social de outra(s) sociedade(s), conforme previsto nos artigos 1.097 a 1.101 do CCB.

Deste modo, o CCB, apesar de não trazer o conceito de grupo de sociedades (o que é feito no artigo 265 da Lei das S.A.), elenca quatro espécies de participação de uma sociedade no capital social de outra para fins de estudo do gênero coligação. As formas de participação reconhecidas pelo CCB, são as relações de (1) controle, (2) filiação, (3) simples participação e (4) participação recíproca.

Na relação de controle, tem-se a presença de uma sociedade controladora e uma sociedade controlada (art. 1.098, inc. I e II, do CCB). Haverá uma relação de controle toda vez que uma sociedade (a controladora) possuir a maioria dos votos nas deliberações dos quotistas ou da assembleia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores de outra sociedade (a controlada).

Obs.: o artigo 1.098 define os elementos necessários para identificação da relação de controle e, especificamente, da existência de uma sociedade controlada. Contudo, o conceito de poder de controle está definido no artigo 116 e tratado nos artigos 117 e 246 da Lei das S.A.

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46FGV direito rio

Haverá uma relação de filiação (ou coligação em sentido estrito) sempre que uma sociedade for titular de mais de dez por cento do capital social de outra sociedade, mas sem controlá-la (art. 1.099 do CCB).

Sociedade controlada (artigo 1.098, inc. I e II) é a sociedade cuja maioria de votos nas deliberações de seus sócios e o poder de eleger a maioria dos seus administradores é de titularidade de outra sociedade (poder de controle). A relação de controle pode se estabelecer de modo direto ou indireto. Na relação de controle direto, a sociedade controladora (holding) exerce o seu poder de controle por que a titularidade das ações ou quotas da sociedade controlada integra o seu patrimônio. Na relação de controle indireto, a sociedade controladora exerce o poder de controle na sociedade controlada por meio de outras sociedades que funcionam como veículos de investimento da sociedade controladora na sociedade controlada.

Como exemplo, pode-se citar (1) controle direto – o caso de uma sociedade (sociedade controladora) cujo objeto social seja exclusivamente adquirir participações no capital social de outras sociedades que exercem atividades econômicas organizadas ou não (sociedades operacionais) e (2) controle indireto – o caso de uma sociedade que sociedade constituída para gestão de um patrimônio familiar (sociedade controladora) que é titular da maioria das quotas representativas do capital social de uma sociedade veículo de investimentos (holding pura) que, por sua vez, é titular da maioria do capital social de outras sociedades que exercem atividades econômicas organizadas ou não (sociedades operacionais).

Na outra ponta da relação de controle, considera-se sociedade controladora a sociedade que direta ou indiretamente tem o direito de exercer a maioria dos votos nas deliberações sociais e de eleger a maioria dos administradores da sociedade controlada.

Duas ou mais sociedades são afiliadas (ou coligadas em sentido estrito) quando uma sociedade é titular de dez por cento ou mais do capital social de outra(s) sociedades sem que isso resulte na constituição de uma relação de controle societário entre ambas (art. 1.099 do CCB).

Tem-se uma relação de simples participação quando uma sociedade participa do capital social de outra sociedade em percentual inferior a dez por cento da parcela do capital social com direito de votar nas deliberações sociais (art. 1.100 do CCB).

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47FGV direito rio

Participação recíproca é quando duas sociedades que são sócias entre si participam do capital social uma da outra. Para as sociedades contratuais regidas pelo código civil esta participação mútua no capital social entre sociedades que mantém uma relação de sociedade somente pode ocorrer até o limite de suas próprias reservas de lucros (excluindo-se as reservas legais), conforme o artigo. 1.101 do CCB. Exemplo de participação recíproca:

Obs.: O direito positivo brasileiro adota a participação no capital social para identificação dos potenciais inter-relacionamentos e formação de grupos societários e para a identificação do poder de controle. Contudo, é possível observar na prática empresarial da organização da atividade econômica outras formas de atuação conjunta entre sociedades empresárias. Porém, existe, ainda, uma série de conceitos jurídicos, econômicos ou contábeis relevantes para a identificação de formas de atuação concertada entre sociedades para a formação de grupos societários, econômicos ou empresariais. Tais como os conceitos de grupo econômico, conglomerado financeiro, sociedades sob controle comum, bloco de controle e controle externo.

Alguns exemplos de conceitos relevantes para a definição de uma relação de controle empresarial/societário:

GRUPO DE CONTROLE: “pessoa, ou grupo de pessoas vinculadas por acordo de votos ou sob controle comum, que detenha direitos de sócio correspondentes à maioria do capital social de sociedade anônima ou a 75% (setenta e cinco por cento) do capital social de sociedade limitada.” (Art 6°, inciso II, da Resolução Nº 4.122/12 expedida pelo Conselho Monetário Nacional, que regula a constituição de instituições financeiras)

PARTICIPAÇÃO QUALIFICADA – “a participação, direta ou indireta, detida por pessoas naturais ou jurídicas, equivalente a 15% (quinze por cento)

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ou mais de ações ou quotas representativas do capital total das instituições do grupo de controle. (Res. CMN 4122/12, art. 6°, Inc. I).

INFLUÊNCIA SIGNIFICATIVA – Presume-se a partir de 20%, parágrafo 5º do artigo 243 da Lei das S.A., participação no capital que não caracteriza controle nem é especulativo, porém a sociedade detentora da participação participa das decisões de política financeira ou operacional da investida.

PODER DE CONTROLE – “poder de eleger a maioria dos administradores e de determinar a orientação dos negócios da companhia”.

VINCULO DE INTERESSE – “Verifica-se integração de atividade ou vinculo de interesse, quando as pessoas jurídicas referidas neste artigo [sociedades relacionadas com a instituição sob o regime de RAET, intervenção ou liquidação], forem devedoras da sociedade sob intervenção ou submetida liquidação extrajudicial, ou quando seus sócios ou acionistas participarem do capital desta importância superior a 10% (dez por cento) ou seja cônjuges, ou parentes até o segundo grau, consanguíneos ou afins, de seus diretores ou membros dos conselhos, consultivo, administrativo, fiscal ou semelhantes” (Art. 51, parágrafo único, Lei 6.024/74 – intervenção e liquidação de instituições financeiras.

PARTICIPAÇÃO ACIONÁRIA RELEVANTE – “controladores, diretos ou indiretos, e os acionistas que elegerem membros do Conselho de Administração, bem como qualquer pessoa natural ou jurídica, ou grupo de pessoas, agindo em conjunto ou representando um mesmo interesse, que atingir participação, direta ou indireta, que corresponda a 5% (cinco por cento) ou mais de espécie ou classe de ações representativas do capital de companhia” (Art. 12, Instrução CVM 358/02 – divulgação de informações ao mercado por companhias abertas)

conselho fiscAl

O Conselho Fiscal é o órgão da sociedade responsável por fiscalizar as contas apresentadas pelos administradores da sociedade.

O Conselho Fiscal é um órgão de instituição facultativa e deve ser composto por, no mínimo, três membros e seus respectivos suplentes. Os membros do Conselho Fiscal não precisam obrigatoriamente ser sócios da sociedade.

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49FGV direito rio

Por ser tratar de um órgão de controle da administração, a instalação e funcionamento do Conselho Fiscal pode ser um importante aliado dos sócios minoritários da sociedade no acesso e controle das informações financeiras da sociedade elaboradas e disponibilizadas pela administração da sociedade. Deste modo, sócios minoritários titulares de 1/5 (20%) do capital social da sociedade têm o direito de eleger separadamente um membro do Conselho Fiscal e seu respectivo suplente (art. 1.066, § 2º, do CCB).

O Conselho Fiscal é um importante órgão colegiado de controle e governança interna da sociedade. Por ser um órgão colegiado, os membros do Conselho Fiscal respondem solidariamente perante a sociedade e perante terceiros (nos termos dos artigos 1.016 e 1.070 do CCB).

Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - IBGC3 (2007, p. 9), as principais vantagens para os sócios da existência de um Conselho Fiscal são:

É órgão independente da administração;É uma instância de conforto para os administradores (por que os administradores dissidentes podem encaminhar suas queixas para o Conselho Fiscal);Contribui para o valor da sociedade por meio do monitoramento dos processos de gestão dos riscos e da criação de condições mais propícias à redução do custo de capital da sociedade; e Pode dedicar-se, com maior profundidade, ao exame de detalhes de matérias de interesse da sociedade

Os prepostos da sociedade são aqueles profissionais que, não sendo sócios da sociedade, exercem atividades auxiliares para o seu funcionamento e necessárias para que a sociedade exerça a sua atividade econômica organizada.

Como regra geral, os prepostos das sociedades regidas pelo código civil exercem as suas atividades em caráter personalíssimo (art. 1.169 do CCB) e têm dever de lealdade para com a sociedade para a qual exercem as suas atividades. Assim, os prepostos não podem exercer atividades concorrentes às da sociedade que representam (art. 1.170 do CCB).

O CCB trata especificamente de dois tipos de prepostos da sociedade: o gerente e o contabilista.

3 instituto Brasileiro de Governança Corporativa (2007, p. 9) Cadernos Governança Corporativa: Guia de orientação para o Conselho Fiscal. São Paulo: iBGC. 2ª edição.

3 instituto Brasileiro de Governança Corporativa (2007, p. 9) Cadernos Go-vernança Corporativa: Guia de orienta-ção para o Conselho Fiscal. São Paulo: iBGC. 2ª edição.

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50FGV direito rio

O gerente é aquele empregado da sociedade que está encarregado do exercício da empresa (art. 1.172 do CCB). Ou seja, é responsável pelas atividades de planejamento, organização, direcionamento e controle da execução do trabalho pelos demais empregados da sociedade.

O contabilista por sua vez é o profissional, devidamente capacitado e habilitado tecnicamente para o exercício profissional da atividade de contador (nos termos do Dec.-Lei nº 9.295/46) que é responsável pela escrituração contábil e financeira da sociedade. Os registros realizados por esse preposto, mesmo que seja um prestador de serviços contratado pela sociedade e não um empregado da sociedade (o que é de praxe) produzem efeitos jurídicos como se tivessem sido feitos pela própria sociedade (preponente), conforme o artigo 1.177 do CCB.

Os prepostos têm responsabilidade pessoal subjetiva perante a sociedade (preponente) por atos culposos e, perante terceiros, respondem de forma solidária com a sociedade por atos dolosos.

Obs.: A regra de responsabilidade dos prepostos está prevista no parágrafo único do artigo 1.177 do CCB. Apesar desta regra estar na Seção III (Do contabilista e outros auxiliares) do Capítulo III (Dos Prepostos) do Título IV (Dos Institutos Complementares) do Livro II (Do direito da Empresa) do CCB, é a mesma regra de responsabilidade aplicável à todos os prepostos por atos culposos cometidos contra a sociedade e dolosos cometidos contra terceiros.

A identificação do regime de responsabilidade da sociedade preponente pelos atos praticados pelos prepostos depende da identificação do local onde o ato foi praticado. Caso o ato que enseja a responsabilização tenha sido praticado pelo preposto dentro do estabelecimento da sociedade, a sociedade preponente responde por todos os atos praticados pelo preposto. Caso o ato tenha sido praticado pelo preposto fora do estabelecimento da sociedade, a sociedade preponente responde pelos atos praticados pelo preposto de acordo com os limites dos poderes outorgados ao preposto (Inciso III dos artigos 932 e 1.178, caput e parágrafo único, do CCB).

leiturA sugeridA

ABRAÃO, Eduardo Lysias Maia (2011) Acordo de Acionistas: típicos e atípicos. Curitiba: Juruá.

EIZIRIK, Nelson Laks (2011) A lei das SA comentada. Volume III. São Paulo: Quartier Latin.

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4.6. AUlA 15 – socIEdAdE lIMITAdA – concEnTRAção E dEsconcEnTRAção socIETÁRIA

O objetivo da presente aula é analisar as operações, reorganizações ou mutações societárias que têm como resultado (1) a mudança no tipo societário de uma determinada sociedade (empresarial ou não); ou (2) a combinação ou separação da estrutura patrimonial, societária e econômica de uma ou várias sociedades.

Como exemplo do primeiro caso citado no parágrafo anterior, tem-se o instituto jurídico da transformação societária e como exemplo do segundo caso, têm-se as operações societárias que resultam em (2a) “aglutinação” (Borba, 2017, p. 481) ou concentração ou em (2b) cissiparidade (Borba, 2017, p. 481) ou desconcentração societária ou patrimonial total ou parcial de uma ou de algumas das sociedades envolvidas na operação (art. 2.033 do CCB).

É possível incluir na segunda subcategoria citada acima as operações de cisão (art. 229 da Lei das S.A.).

trAnsforMAção

Na transformação societária os sócios de uma sociedade inicialmente constituída como um tipo societário (por exemplo, uma sociedade em nome coletivo) deliberam para que a sociedade havida entre eles passe a funcionar com base nas regras de um outro tipo societário (por exemplo, uma sociedade limitada). Assim, há uma conversão do tipo legal societário e, consequentemente, de regime jurídico aplicável à sociedade após a transformação. A transformação não é suficiente para afetar negativamente os eventuais direitos de crédito ou de qualquer outra natureza (fazer ou não fazer) contra a sociedade existentes no momento da transformação.

Em termos práticos, a transformação societária pode ser interessante ou necessária para readequar as regras de funcionamento interno ou externo (governança) da sociedade ou de relacionamento entre os sócios a uma nova configuração patrimonial, societária ou obrigacional da sociedade.

Por exemplo, uma sociedade que tenha experimentado valorização e crescimento de suas atividades econômicas, e, consequentemente, atraído o interesse de um novo sócio investidor, pode precisar ter alterado o seu tipo societário para conferir maior proteção ao investimento a ser realizado pelo novo sócio.

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Neste sentido é comum que as sociedades limitadas se transformem em sociedades anônimas fechadas para observar regras mais detalhadas de governança corporativa.

As regras aplicáveis à transformação das sociedades contratuais estão previstas nos artigos 1.113 a 1.115 do CCB e as regras aplicáveis à transformação das sociedades institucionais (por ações) estão previstas no artigo 220 da Lei das S.A.

Salvo previsão expressa em contrato social, a deliberação para a transformação do tipo societário depende de consenso unânime entre os sócios (art. 1.114 do CCB). Caso a transformação esteja expressa em contrato social e possa ser aprovada com quórum menor do que a unanimidade, os sócios dissidentes da deliberação tem direito de se retirar da sociedade. O valor das quotas de titularidade do sócio dissidente/retirante será apurado com base na situação patrimonial da sociedade na data da deliberação de transformação e do exercício do direito de retirada. O valor patrimonial da sociedade deverá ser verificado em balanço contábil levantado especialmente para essa finalidade, nos termos dos artigos 1.031 e 1.115 do CCB.

Obs.: Na formalização do ato jurídico de transformação, devem ser seguidas as regras aplicáveis para a constituição de sociedades do tipo societário a ser adotado (art. 1.113 do CCB).

Segundo o parágrafo 3º do artigo 968 do CCB, incluído pela Lei Complementar nº 128/2008, é possível que o empresário individual “aceite sócios” e, assim, transforme o seu registro como empresário individual em registro como sociedade contratual.

Nesta hipótese de transformação atípica, que Borba (2017, p. 470) chama de “transformação imprópria”, não se está trata tecnicamente de uma transformação societária. Pois, em uma sociedade necessariamente os elementos para a configuração de uma relação societária estão presentes (capital social, pluralidade de sócios, autonomia patrimonial, obrigacional e processual, etc.), mas sim da constituição de uma nova sociedade cujo o fundo social será formado a partir da parcela patrimonial e obrigacional do empresário que estava vinculada às atividades anteriormente exercidas diretamente pelo empresário individual.

Alternativamente, pode-se considerar que a transformação realizada nos termos do parágrafo 3º do artigo 968 do CCB não é um subtipo “impróprio” de transformação societária, mas uma transformação de outra natureza jurídica:

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registral em vez de societária, em linha com a posição manifestada pelo Departamento de Registro de Empresas e Integração – DREI por meio do inciso II do artigo 1º da Instrução Normativa nº 35 de 03.03.17.

incorporAção

Na operação societária de incorporação, uma ou mais sociedades são totalmente absorvidas por outra (a sociedade incorporadora).

Após a incorporação, as sociedades incorporadas se extinguem e a sociedade incorporadora sucede integralmente as sociedades incorporadas em todos os seus direitos e obrigações de qualquer natureza (civil, trabalhista, previdenciária, tributária, etc.). Os sócios da antiga sociedade incorporada passam a ser sócios da sociedade incorporadora.

Para a formalização da operação de incorporação a administração das sociedades incorporadora e incorporada(s) precisam aprovar um documento denominado “protocolo da incorporação” onde estão detalhadas todas as potenciais vantagens de desvantagens da operação, bem como os parâmetros negociais e administrativos para a realização prática da incorporação as regras aplicáveis à e as sociedades. O valor da sociedade incorporadas deverá estar fundamentado em um laudo de avaliação elaborado por peritos contábeis, nos termos do parágrafo 2º do artigo 1.117 do CCB.

fusão

Na operação societária de fusão duas ou mais sociedades se unem para formar uma nova sociedade. Com a fusão há extinção das sociedades fusionadas e, assim como na incorporação, há a sucessão universal de sociedade resultante da fusão em todas as obrigações das sociedades fusionadas. Antes da constituição da nova sociedade deve ser realizado laudo de avaliação e submetido para a aprovação dos sócios da nova sociedade, nos termos do parágrafo 1º do artigo 1.120 do CCB.

Para a realização da fusão, todos os sócios das sociedades envolvidas na fusão devem aprovar em reunião ou assembleia individual: (1) a realização da fusão; (2) o projeto de ato contrato social ou estatuto da nova sociedade; (3) o plano de distribuição do capital social da nova sociedade; e (4) o laudo de avaliação da(s) outra(s) sociedade(s) participante(s) da fusão (Parágrafos 1º e 3º do artigo 1.120 do CCB).

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Obs.: Caso a fusão envolva uma sociedade anônima, os acionistas da S.A. deverão aprovar um quinto documento além dos indicados acima: o protocolo da fusão (artigo 224 da Lei das S.A.).

cisão

Na operação societária de cisão o patrimônio da sociedade cindida é total ou parcialmente transferido para o patrimônio de outras sociedades novas ou existentes.

Na cisão total, a sociedade cindida se extingue o as duas ou mais parcelas do seu patrimônio são transferidas para outras sociedades (as sociedades receptoras). Caso as sociedades receptoras sejam novas, será necessário observar os procedimentos para constituição das novas sociedades de acordo com o seu tipo societário.

Na cisão parcial, há a responsabilidade solidária entre a sociedade cindida que permaneceu existente após a cisão e a(s) sociedade(s) receptora(s) de parcela do patrimônio da sociedade cindida. Na cisão total, as sociedades novas ou existentes que receberem parcelas do patrimônio da sociedade cindida respondem solidariamente pelas obrigações da sociedade cindida que se extinguiu. (art. 233 da Lei das S.A.).

Na cisão com versão do patrimônio para sociedades já existentes devem ser observadas as regras da incorporação (art. 229, parágrafo 3º, e art. 227 da Lei das S.A.). É possível realizar a cisão de sociedades com a versão de patrimônio para sociedades de tipos societários, natureza jurídica (simples ou empresária) ou objetos sociais diferentes.

Obs.: Os atos societários que aprovaram a cisão podem estipular limitações na regra geral de responsabilidade solidária entre as sociedades sobreviventes da cisão, porém os credores da antiga sociedade cindida poderão se opor à operação societária em até noventa dias após a publicação dos atos da cisão (parágrafo único do art. 233 da Lei das S.A.).

Obs.: As regras sobre a cisão de sociedades previstas na Lei das S.A. (art. 229) são aplicáveis às sociedades contratuais regidas pelo CCB porque o CCB não trata sobre o tema da cisão de sociedades.

Os atos de fusão, transformação, cisão e incorporação precisam ser registrados perante a Junta Comercial competente e publicados, nos termos da Instrução Normativa DREI nº 35/2017.

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A realização de mudanças na estrutura societária de uma ou várias sociedades por meio de operações de transformação, fusão, cisão ou incorporação não afetam, per se, a continuidade ou o funcionamento dos estabelecimentos (art. 1.142 do CCB) onde as atividades econômicas organizadas são desempenhadas.

Os credores das sociedades envolvidas em processos de fusão, cisão ou incorporação podem se opor à realização da reestruturação societária pretendida. Para tal finalidade, os credores afetados negativamente – dentro do prazo de noventa dias após a publicação dos atos relativos à fusão, cisão ou incorporação – pleitear judicialmente a anulação da reestruturação societária (art. 1.122 do CCB). Por exemplo, um credor poderia vir a ser prejudicado por uma operação de fusão, cisão ou incorporação se o seu risco de crédito for aumentado por conta da reestruturação societária.

leiturA sugeridA

SADDI, Jairo (Org.) (2002) Fusões e aquisições: aspectos jurídicos e econômicos. São Paulo: IOB.

BORBA, José Edwaldo Tavares (2017). Direito Societário. 15ª Edição. São Paulo: Atlas.

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5. TIpos socIETÁRIos

5.1. AUlAs 16 E 17 – clAssIfIcAção dAs socIEdAdEs

As sociedades reconhecidas pelo direito brasileiro podem ser classificadas com base em diversos critérios diferentes.

Os principais critérios de classificação são:

1. Quanto à espécie;

2. Quanto à personalidade jurídica;

3. Quanto ao tipo de ato constitutivo;

4. Quanto à pessoa dos sócios;

5. Quanto ao regime de responsabilidade dos sócios;

6. Quanto à nacionalidade; e

7. Quanto ao prazo de duração.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto à espécie:

Segundo este critério de classificação, as sociedades podem ser “simples” ou “empresárias”. As sociedades simples são aquelas que não detém o elemento de empresa, ou seja, a consecução de seu objeto social não exige o exercício de atividade econômica organizada.

OBS.: A distinção entre sociedades simples e empresárias adotada pelo CCB substituiu a antiga distinção que existia entre as sociedades civis (regidas pelo direito civil) e as sociedades comerciais (regidas pelo direito comercial) até a promulgação do CCB.

Nos termos do artigo 982 do CCB, são sociedades:

Sempre são empresárias: as sociedades anônimas (artigos 1.088 e 1.089 do CCB e Lei das S.A.) e as sociedades em comandita por ações (artigos 1.090 e 1.092 do CCB e Lei das S.A.); e

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Sempre são simples: as sociedades cooperativas (art. 982, parágrafo único, e arts. 1.093 a 1.096 do CCB e art. 3º da Lei 5.764/71) e quaisquer sociedades que não tenham o elemento de empresa (sociedade simples pura) ou que sejam consideradas como sociedades simples por força de lei (sociedade de advogados, por exemplo).

Podem ser sociedades simples ou empresárias: as sociedades em nome coletivo (arts. 1.039 a 1.044 do CCB), as sociedades em comandita simples (arts. 1.045 a 1.051 do CCB) e as sociedades limitadas (arts.1.082 a 1.087 do CCB).

Nas sociedades que devem obrigatoriamente adotar a espécie simples ou empresária, há uma presunção legal absoluta (juris et de jure) quanto à eventual (in)existência de elemento de empresa.

Os atos constitutivos e demais atos societários das sociedades simples são registrados perante o Registro Civil das Pessoas Jurídicas – RCPJ e os atos constitutivos e demais atos societários das sociedades empresárias são registrados perante a Junta Comercial competente. As Juntas Comerciais são órgãos da administração pública estadual que estão materialmente vinculadas à administração pública federal, pois seus procedimentos devem seguir as diretrizes estabelecidas nas instruções normativas do Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI, que é uma repartição vinculada ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços – MDIC.

Obs.: As sociedades de advogados são simples por força do artigo 15 da Lei 8.906/94 e devem ser registradas perante a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil da localidade da sede da sociedade de advogados. Desde 2016, os advogados podem constituir sociedades unipessoais de advocacia, conforme as alterações introduzidas pela Lei nº 13.247 na Lei 8.906/94. Esta inovação é importante porque marca o primeiro tipo de sociedade unipessoal reconhecida no direito societário brasileiro.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto à personAlidAde jurídicA:

Podem ser personificadas ou despersonificadas. Inicialmente, vale ressaltar que as sociedades, devidamente registradas perante o RCPJ ou Junta Comercial, constituem um dos tipos de pessoas jurídicas reconhecidas pelo direito brasileiro, nos termos do inciso II do artigo 44 do CCB.

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As sociedades têm fins econômicos e são formadas por sócios, ao passo que as associações (artigo 44, inciso I, do CCB) não têm fins econômicos e são formadas por associados e as fundações (artigo 44, inciso III do CCB) não têm fins econômicos e são formadas por um instituidor.

As sociedades personificadas têm o seu ato constitutivo registrado e as sociedades despersonificadas não. O registro empresarial tem natureza jurídica constitutiva e é essencial para conferir à nova pessoa jurídica a autonomia necessária para segregar a sociedade das esferas patrimonial, obrigacional e processual de seus sócios (arts. 45, 985 e 1.150 do CCB). Após o registro, a sociedade adquire a sua própria autonomia patrimonial, obrigacional e processual.

São sociedades NÃO personificadas, ou seja, que não têm contrato registrado perante o registro competente:

De modo temporário, as sociedades em comum (arts. 986 a 990 do CCB). De modo permanente, as sociedades de fato e as sociedades em conta de participação (arts. 991 a 996 do CCB). As sociedades de fato são aquelas onde os sócios começam a agir como se tivessem formalizado uma relação societária, porém não firmam contrato e o levam ao registro competente. Assim, os sócios aparentam ter uma sociedade (uma relação “fática”, portanto), mas não a tem formalizada juridicamente (sem uma relação “jurídica”, portanto). Vale ressaltar que as sociedades de fato não constituem um tipo societário, pois se trata de uma classificação doutrinária para uma situação observada na prática empresarial.

Obs.: A sociedade em conta de participação não adquire é personalidade jurídica nem mesmo se seus atos constitutivos forem levados à registro (art. 993 do CCB) ou se for registrada perante o Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas – CNPJ para fins tributários (Inciso XVII do artigo 4º da Instrução Normativa nº 1.634, expedida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB em 06 de maio de 2016.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto à pessoA dos sócios:

Segundo este critério as sociedades podem ser classificadas de acordo com os interesses predominantes dos sócios no momento do ingresso e permanência na sociedade.

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Nas sociedades de pessoas, prepondera o elemento pessoal, ou seja, o ânimo subjetivo dos sócios de compartilhar os riscos da atividade econômica entre si (affectio societatis).

Nas sociedades de capitais, prepondera o elemento financeiro, ou seja, apesar dos sócios também ter affectio societatis, a mera relação patrimonial que se estabelece entre os sócios e a sociedade é mais importante que qualquer relação pessoal que eventualmente (in)exista entre os sócios.

A sociedade anônima, cujo capital é constituído por ações e não por quotas é a sociedade de capitais por excelência. Contudo, a distinção entre as sociedades de capital e de pessoas vem perdendo força na medida em que passou a ser admitida a livre circulação das quotas (art. 1.003 do CCB) e, alguns institutos típicos das sociedades de pessoas vêm sendo admitidos nas sociedades de capitais. Por exemplo, cita-se a dissolução parcial das sociedades anônimas fechadas (Vide, o Recurso Especial nº 1.400.264 – RS, julgado pelo STJ em 24.10.17).

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto Ao tipo de Ato constitutivo:

As sociedades podem ser contratuais ou institucionais/estatutárias. As sociedades contratuais são constituídas por meio de contratos privados mantido entre os sócios, ao passo que as sociedades institucionais a sociedade é constituída e formalizada por meio de um estatuto. A distinção básica entre as sociedades contratuais e as institucionais está na proximidade e vínculo que existe entre os sócios e a sociedade, que são altos nas sociedades contratuais e podem ser baixos nas sociedades institucionais/estatutárias. Por exemplo, em uma sociedade contratual com dois sócios administradores, o falecimento ou a retirada de um terá um impacto muito grande nos negócios sociais, ao passo que em uma sociedade institucional constituída por centenas de sócios, o falecimento ou a retirada de um poderá ter impacto nulo nos negócios sociais.

São contratuais as sociedades simples (art. 997 do CCB), em nome coletivo (artigos 997 e 1.041 do CCB), comandita simples (artigos 997, 1.040, 1.045, parágrafo único, e 1.046 do CCB) e limitada (artigos 997, 1.053, parágrafo único, e 1.054 do CCB).

São institucionais as sociedades por ações: sociedade anônima e sociedade em comandita por ações (artigos 87, 94 e 251 da Lei das S.A.). Estas sociedades são constituídas por meio de decisão em assembleia geral de constituição e aprovação de um estatuto social.

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Obs.: É importante distinguir o instituto (contrato), acordo de vontades, do instrumento (meio físico) por meio do qual o contrato é formalizado. Deste modo, os contratos ou estatutos sociais podem ser firmados por instrumento particular ou por escritura pública.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto Ao regiMe de responsAbilidAde dos sócios

Para classificação das sociedades em relação ao regime de responsabilidade dos sócios, deve-se, primeiro, verificar se as sociedades em questão são personificadas ou não personificadas.

Para as sociedades personificadas, existem os regimes de responsabilidade ilimitada, limitada ou mista. Nas sociedades cuja responsabilidade dos sócios seja ilimitada, todos os sócios respondem pela integralidade das obrigações sociais. Deste modo, a esfera patrimonial de qualquer dos sócios poderá ser objeto de constrição judicial para cobrir qualquer passivo à descoberto da sociedade.

Nas sociedades cuja responsabilidade dos sócios seja limitada, os sócios somente responderão até o limite de sua participação no capital social da sociedade. Nas sociedades que adotem regime misto de responsabilidade financeira dos sócios, alguns sócios respondem ilimitadamente e outros respondem de forma limitada.

Entre as sociedades personificadas, tem responsabilidade ilimitada, os sócios da sociedade em nome coletivo (art. 1.039 do CCB) e os sócios das sociedades simples cujo contrato social seja omisso em relação à limitação da responsabilidade dos sócios (artigos 997, inc. VIII, 1.023 e 1.024).

Obs.: A regra geral de responsabilidade dos sócios nas sociedades simples, é de responsabilidade ilimitada e subsidiária (artigos 1.023 e 1.024 do CCB), porém o contrato social pode prever que a responsabilidade dos sócios é (a) ilimitada e solidária; ou (b) limitada. É importante diferenciar a previsão da limitação da responsabilidade dos sócios no contrato social da adoção do tipo societário da sociedade limitada. No primeiro caso, a responsabilidade é limitada, mas as regras aplicáveis à sociedade são os artigos 997 a 1.038 do CCB. No segundo caso, a responsabilidade é limitada, mas as regras aplicáveis à sociedade são os artigos 1.052 a 1.141 do CCB e, supletivamente, as regras aplicáveis às sociedades simples (regra geral do direito societário brasileiro).

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Entre as sociedades personificadas, tem responsabilidade limitada os sócios da sociedade das sociedades limitadas (art. 1.052 do CCB) e os sócios das sociedades anônimas (art. 1.088 do CCB). Também podem ter responsabilidade limitada os sócios das sociedades simples cujo contrato social preveja expressamente a responsabilidade limitada dos sócios (art. 997, inc. VIII, do CCB).

Entre as sociedades personificadas, as sociedades em comandita simples (art. 1.045 do CCB) e as sociedades em comandita por ações (art. 1.091 do CCB e art. 282 da Lei das S.A.) tem um regime misto de responsabilidade dos sócios. O regime é misto porque existem duas categorias diferentes de sócios, os comanditados (com responsabilidade ilimitada) e os comanditários com responsabilidade limitada ao valor de suas quotas. O artigo 1.045 do CCB ilustra bem a distinção entre as categorias:

Art. 1.045. Na sociedade em comandita simples tomam parte sócios de duas categorias: os comanditados, pessoas físicas, responsáveis solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais; e os comanditários, obrigados somente pelo valor de sua quota.

Obs.: a responsabilidade ilimitada dos sócios comanditados nas sociedades em comandita simples é solidária e em comandita por ações é subsidiária. Esta diferença resulta na impossibilidade de recurso aos bens dos sócios comanditado nas sociedades em comandita por ações sem que antes tenham sido esgotadas as possibilidades de cobrança judicial dos bens da sociedade.

Entre as sociedades não personificadas, todos os sócios da sociedade em comum têm responsabilidade ilimitada e solidária (art. 990 do CCB) e as sociedades em conta de participação têm um regime misto de responsabilidade (art. 991 do CCB).

Obs.: Com base na regra geral de direito societário brasileiro (a regra aplicável às sociedades simples), o sócio da sociedade em comum que contrata pela sociedade fica excluído do benefício de ordem (art. 1.024 do CCB), podendo ser demandando judicialmente ou extrajudicialmente pelo credor da sociedade independentemente de qualquer cobrança à própria sociedade.

O regime de responsabilidade dos sócios das sociedades em conta de participação é misto porque essa sociedade também tem duas categorias diferentes de sócios: os sócios ostensivos e os sócios ocultos (ou sócios participantes).

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O sócio ostensivo contrata em nome próprio e, por isso, responde perante terceiros não sócios de forma solidária e ilimitada (art. 991 do CCB). Por outro lado, os sócios ocultos respondem de forma limitada ao valor de suas quotas e exclusivamente perante o sócio ostensivo. Ou seja, os sócios participantes não podem ser demandados por terceiros credores da sociedade em conta de participação.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto à nAcionAlidAde

Com base no critério da nacionalidade da sociedade, as sociedades se dividem em sociedades nacionais (arts. 1.126 a 1.133 do CCB) e em sociedades estrangeiras (arts. 1.134 a 1.141 do CCB).

Segundo este critério, são consideradas nacionais as sociedades que tenham sido organizadas em conformidade com a lei brasileira e que tenham as sedes de sua administração no Brasil.

clAssificAção dAs sociedAdes quAnto Ao prAzo de durAção

Quanto ao prazo de duração, as sociedades se classificam em sociedades com prazo determinado ou indeterminado, conforme definido nos seus atos constitutivos.

A distinção das sociedades quanto ao prazo de duração ganha especial relevância nas deliberações dos sócios sobre a dissolução, prorrogação ou retirada do quadro de sócios da sociedade (arts. 1.029 e 1.033, inciso III, do CCB).

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TIPO SOcIETÁRIO PODE ADMInISTRAR nÃO PODE ATO DE nOMEAÇÃO

SimplesSócio ou não

(art. 997, inc. VI + art. 1.013)

Impedidos por lei(art. 1.011, § 1)

Contrato/ato separado (art. 1.012)

Nome coletivo Somente sócios(art. 1.042)

Impedidos por lei(art. 1.011, § 1° +

art. 1.040)

Contrato/ato separado (art. 1.040+

art. 1.012)

Comandita simples Sócios comanditados(art. 1.046 +1.047)

Sócios comanditários (art. 1.047)

Impedidos por lei (art. 1.011, § 1°)

Contrato/ato separado (art. 1.040 + art. 1.012 + art.

1.046)

Sociedade Anônima Acionista ou não (art. 146, LSA)

Impedidos por lei(art. 147, § 1°, LSA)

Conselho de Administração –

AGE (art. 140, LSA)Diretoria – AGE ou CA (art. 143, LSA)

Comandita por ações

Acionistas comanditados (art.

1.091 do CCB + art. 282, LSA)

Não acionistas (art. 280, LSA) / impedidos por lei

(art. 147, § 1°, LSA)

Estatuto social(art. 282, § 1°, LSA)

Limitada

Sócio ou não (conforme definido no contrato) (art.

1.060 + art. 1.061)

impedidos por lei (art. 1.053 + art.

1.011, § 1°)

Contrato/ato separado (art. 1.053 + art. 1.060 + art.

1.061)

leiturA sugeridA

BORBA, José Edwaldo Tavares (2011) Sociedade simples e sociedade empresária. A nova classificação das sociedades. A teoria da empresa. Sociedades simples e sociedades empresárias. O sistema de registro. (Parecer) Disponível em: http://www.tavaresborba.com.br/wp-content/uploads/2011/11/artigo02.pdf. Data de acesso: 28 de fevereiro de 2018.

MARCONDES, Sylvio (1970) Problemas de direito mercantil. 2ª Tiragem. São Paulo: Max Limonad.

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64FGV direito rio

6. pEQUEnAs EMpREsAs E o MERcAdo dE cApITAIs

6.1. AUlA 18 – InsTRUMEnTos JURÍdIcos pARA A cApTAção dE REcURsos (pRópRIos E dE TERcEIRos)

O contexto atual do mercado de valores mobiliários brasileiro ainda está muito distante da realidade da atuação das sociedades empresárias de menor porte (Majoritariamente as sociedades limitadas e as demais sociedades contratuais regidas pelo Código Civil).

As sociedades empresárias de menor porte, apesar de constituírem a maioria das sociedades empresárias em atuação no Brasil – segundo Simão Filho (2004, p. 9), as sociedades limitadas correspondem à 97% das sociedades brasileiras - as sociedades de pequeno e médio porte (middle market) ainda têm o acesso bastante restrito ao mercado de capitais.

As possíveis razões para esse afastamento entre o mercado de capitais (uma forma privilegiada de captação de recursos para a condução da atividade econômica) e as sociedades empresárias de pequeno e médio porte são: os custos necessários para a captação via mercado de capitais, a maior necessidade de adoção de práticas de governança corporativa, a pouca cultura brasileira com investimentos, a concentração do mercado de capitais brasileiro na região sudeste, etc.

Um dado importante para explicar a distância entre as sociedades empresárias de menor porte e o mercado de capitais é o volume de recursos captados por meio das operações de mercado de capitais realizadas no Brasil que giram em torno de cem milhões de dólares e são comparáveis, em volume de recursos captados, às ofertas realizadas em países desenvolvidos:

Fonte: CVM, http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/menu/acesso_informacao/serieshistoricas/estudos/anexos/GT-PMEs-Estudo-Experiencias-Internacionais.pdf. Data de acesso: 19.07.18.

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Contudo, uma forma de captação de recursos disponível para as sociedades empresárias de pequeno e médio porte é a emissão de notas promissórias (notas comerciais ou “comercial papers”) por meio de ofertas públicas (nos termos da Instrução CVM nº 566/15).

As notas promissórias são títulos de crédito que tiveram origem na Idade Média devido às dificuldades de circular com moedas no período entre diferentes cidades. A nota promissória constitui uma promessa de pagamento e, segundo Magarino Torres, pode ser definida como um “compromisso escrito e solene, pelo qual alguém se obriga a pagar a outrem certa soma em dinheiro”.

Para a configuração da relação jurídica consubstanciada pela emissão da nota são necessárias a participação de duas figuras: (1) o emitente (devedor principal) e o beneficiário (credor).

O regime jurídico das notas promissórias está definido na Lei Uniforme de Genebra – LUG, ratificada pelo Brasil introduzida no ordenamento jurídico brasileiro por meio de Decreto nº 57.663, de 21.01.1966, e pela Instrução CVM nº 566, de 31.07.2015 (Que regula as ofertas públicas de notas promissórias) e, excepcionalmente e no que couber, pelo Decreto nº 2.044, de 31 de dezembro de 1908 (“Lei Saraiva”) e nos artigos 887 a 926 do CCB.

Segundo os artigos 75 e 76 da LUG, os requisitos essenciais4 e supríveis5 das notas promissórias são:

essenciais

• Denominação “Nota Promissória” no texto do documento e na língua da emissão do título;

• Promessa pura e simples de pagar quantia certa;• Nome da pessoa a quem a nota deve ser paga;• Lugar do pagamento;• Data da emissão da nota promissória; e• Assinatura do emissor.

supríveis

• Época do pagamento6; e • Lugar da emissão7.

4 requisitos essenciais dos títulos de crédito são aqueles que necessariamente precisam estar presentes na cártula para que um determinado “documento de crédito” receba o tratamento jurídico de “título de crédito”.5 requisitos supríveis dos títulos de crédito são aqueles cuja ausência não afeta a existência do título de crédito e que, por isso, podem ser completados pelo credor depois da emissão do título (Súmula 387 do StF). 6 Se não tiver a indicação da data de pagamento será considerada como devida e pagável à vista.7 Se não tiver a indicação do lugar de emissão será considerado como tendo sido emitida (1) no local de pagamento; ou (2) no local transcrito ao lado do nome do emissor (devedor).

4 requisitos essenciais dos títulos de crédito são aqueles que necessaria-mente precisam estar presentes na cár-tula para que um determinado “docu-mento de crédito” receba o tratamento jurídico de “título de crédito”.

5 requisitos supríveis dos títulos de crédito são aqueles cuja ausência não afeta a existência do título de crédito e que, por isso, podem ser completados pelo credor depois da emissão do título (Súmula 387 do StF).

6 Se não tiver a indicação da data de pagamento será considerada como devida e pagável à vista.

7 Se não tiver a indicação do lugar de emissão será considerado como tendo sido emitida (1) no local de pagamen-to; ou (2) no local transcrito ao lado do nome do emissor (devedor).

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Nos termos da Instrução CVM nº 566/15, para que a nota promissória possa ser objeto de oferta pública é preciso observar as seguintes regras, principalmente:

• O emissor deve ser sociedade anônima, sociedade limitada ou cooperativa do setor agropecuário;

• Os recursos captados pela emissão das notas promissórias devem ser integralizados à vista no ato da emissão; e

• As notas promissórias devem ter prazo máximo de 360 dias para vencimento.

Obs.: caso o emissor contrate um agente para representar e zelar pela proteção dos interesses e direitos da comunhão dos titulares das notas promissórias (agente fiduciário), conforme o inciso II do artigo 5º da Instrução CVM nº 566/15.

leiturA sugeridA

IBRI – Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (2012) O Estado da arte das relações com investidores no Brasil. São Paulo: IBRI.

IBRI – Instituto Brasileiro de Relações com Investidores; CVM – Comissão de Valores Mobiliários (2015) Relações com investidores: da pequena empresa ao mercado de capitais. 2ª edição Rio de Janeiro: IBRI/CVM.

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6.2. AUlA 19 – InVEsTIdoR-AnJo E RElAçõEs coM InVEsTIdoREs

O investidor-anjo é uma modalidade de captação de recursos por empreendedores em estágio embrionário do desenvolvimento de suas atividades.

O investidor-anjo se caracteriza por ser uma forma de captação de recursos que não integra o capital social (art. 61-A da Lei Complementar nº 123/06). A figura jurídica do investidor anjo foi introduzida no Brasil por meio da Lei Complementar nº 155, de 27 de outubro de 2016, que incluiu os artigos 61-A a 61-D na Lei Complementar nº 123/06 (Lei do Simples Nacional).

A iniciativa da introdução desta figura jurídica no Brasil é louvável, porém é preciso ressaltar a má técnica legislativa na redação dos dispositivos legais referentes ao investidor-anjo. Esta má técnica legislativa resulta na imprecisão dos novos conceitos necessários para a introdução desta figura no ordenamento jurídico brasileiro e no mau uso dos conceitos jurídicos tradicionais. Por exemplo, cita-se o texto do caput do artigo 61-A da Lei Complementar nº 123/06:

Art. 61-A. Para incentivar as atividades de inovação e os investimentos produtivos, a sociedade enquadrada como microempresa ou empresa de pequeno porte, nos termos desta Lei Complementar, poderá admitir o aporte de capital, que não integrará o capital social da empresa.

Somente neste primeiro artigo pode-se observar duas imprecisões importantes:

(1) a declaração de “motivos” para a nova forma de captação de recursos (“Para incentivar as atividades...”), este tipo de declaração não deve estar incluído no texto legal (que tem caráter normativo e não didático), mas sim na exposição de motivos da lei; e (2) o uso da expressão “aporte de capital, que não integrará o capital social” gera dúvidas sobre a natureza jurídica da transferência de recursos do investidor para a sociedade. Pois, no direito societário, a rigor, inexiste o tertius genus do “capital não social”. Assim, a estrutura de capital das sociedades é composta necessariamente por (1) capital social (ações ou quotas); e

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(2) instrumentos de dívida (notas promissórias, debêntures, bônus de subscrição, etc.). Essa imprecisão abre margens para as mais diversas interpretações sobre a natureza jurídica do aporte feito pelo investidor-anjo na sociedade investida. Por exemplo, a Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB recentemente – por meio da Instrução Normativa nº 1.719 de 19 de julho de 2017 – considerou que o aporte feito pelo investidor-anjo na sociedade investida tem natureza jurídica tributária de empréstimo e, portanto, os rendimentos auferidos pelo investidor-anjo constituem hipóteses de incidência de imposto de renda.

Fonte: SEBRAE, http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/sebraeaz/capital-empreendedor- tipos-de-investidores,5040e3796beaf410VgnVCM1000004c00210aRCRD. Data de acesso: 19.07.18.

Nos termos dos artigos 61-A a 61-D da Lei Complementar nº 155/16, a figura jurídica do investidor-anjo apresenta as seguintes características essenciais:

• O investidor-anjo deve ser pessoa natural, pessoa jurídica ou fundo de investimento;

• Os recursos utilizados para o aporte devem ser do próprio investidor-anjo;• O investidor-anjo não é sócio da sociedade empresária, não pode

participar da administração da sociedade investida e não responde por qualquer dívida da sociedade;

• O aporte deve ser formalizado por meio de um contrato de participação;• O contrato de participação deve ter prazo máximo de sete anos;• O investidor-anjo pode transferir a sua posição no contrato de participação;

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• O investidor-anjo tem direito de preferência em caso de alienação do controle societário da sociedade investida;

• O investidor-anjo de observar um prazo de carência de dois anos para resgate total ou parcial do seu aporte.

Qualquer sociedade empresária, quando atinge um determinado nível de maturidade nos seus negócios, a ponto de atrair a atenção e, principalmente, o investimento a ser realizados por terceiros não integrantes do grupo de relacionamento prévio, comercial ou familiar com os fundadores da sociedade (family and friends), deve começar a adotar práticas de governança corporativa, com destaque para a prestação de informações para os novos investidores ou sócios.

Do ponto de vista do direito societário existem várias informações, registros e comunicações obrigatórias que a administração da sociedade deve manter. Por exemplo, os livros e registros contábeis (Livros diário e razão, art. 1.180 do CCB) e societários (Livros de atas da administração, de atas e pareceres do conselho fiscal, de atas da assembleia8) obrigatórios para uma sociedade limitada. Vale ressaltar que existem, ainda, outros livros que podem ser facultativamente adotados pelas sociedades, como, por exemplo, o livro de registro de duplicatas, previsto no artigo 19 da lei nº 5.474, de 18.07.68 (“Lei de Duplicatas”).

Porém, ao atrair investimentos profissionais (smart money) a sociedade deve estar apta a adotar práticas mais robustas de comunicação com seu público alvo e demais partes interessadas (sócios, credores, consumidores, comunidade afetada, etc.). Para tal finalidade, a sociedade poderá adotar voluntariamente outras práticas, informações e registros que evidenciem a adoção de melhores práticas de governança corporativa e transparência. Por exemplo:

• Relatório da administração – documento anual onde a administração da sociedade se esclarece as metas alcançadas e inalcançadas no exercício social;

• Diretoria ou função de relações com investidores – de acordo com o porte de suas atividades a sociedade pode estabelecer uma diretoria com competência exclusiva para prestar informações contábeis, administrativas e organizacionais para os seus investidores e partes interessadas;

• Assembleias de investidores-anjo e de credores da sociedade – a sociedade pode organizar um fórum de discussão para a defesa dos interesses específicos de seus investidores e credores perante a administração e sócios; ou

8 Caso a sociedade limitada tenha mais de dez sócios ou os sócios tenham escolhido por deliberar em assembleia.

8 Caso a sociedade limitada tenha mais de dez sócios ou os sócios tenham escolhido por deliberar em assembleia.

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• Conselho ou Protocolo de Família – sociedades que tenham controle familiar podem adotar um conselho específico para reunir os membros da família que tenham interesses nos negócios sociais para evitar que as questões familiares impactem negativamente nas atividades da sociedade e nos interesses dos sócios minoritários ou investidores.

leiturA sugeridA

CORRÊA, Gabriel Rios; ALBUQUERQUE, Isadora Ramos (2016) Conciliando o investimento-anjo e o regime do Simples Nacional. Disponível em: http://www.abvcap.com.br/Download/Artigos/3631.pdf. Data de acesso: 27 de julho de 2018.

SILVA, Lucas Caminha de Lima e (2017) Inovação, capital e seed gap: quem são os investidores anjos de acordo com o mercado e com a lei complementar nº 155? Disponível em: http://cfasociety.org.br/pdf/premio/MH2_Premio_CFA_Society_Brazil_2017.pdf. Data de acesso: 27 de julho de 2018.

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7. EncERRAMEnTo dA ATIVIdAdE EMpREsARIAl

7.1. AUlAs 20 E 21 – BAIxA do REGIsTRo do EMpREsÁRIo IndIVIdUAlE pRocEdIMEnTos dE dIssolUção, lIQUIdAção E ExTInção dA socIEdAdE EMpREsÁRIA

bAixA do registro do eMpresário individuAl

A formalização do encerramento da atividade empresarial conduzida sob a forma de microempreendedor individual (MEI) pode ser solicitada diretamente pelo empresário pela rede mundial de computadores no endereço: www.portaldoempreendedor.gov.br.

Para o encerramento do registro como MEI, o empresário deverá apresentar a Declaração Anual para o MEI - DASN-SIMEI de Extinção – Encerramento pela internet e proceder com a baixa dos demais registros necessários para o exercício de sua atividade.

Nos termos do artigo 9º da Lei Complementar nº 123/06, conforme alterada pela Lei Complementar nº 147/2014, é possível cancelar o registro como MEI sem a apresentação das certidões negativas de débitos tributários, trabalhistas ou previdenciários. Caso, após o encerramento do registro, sejam apurados débitos tributários, trabalhistas ou previdenciários anteriores ao encerramento do registro, eles poderão ser cobrados diretamente do empresário.

Nos termos do artigo 37 da Lei 8.934/94 e do item 9.3.2.1 do Regulamento constante como Anexo V à Instrução Normativa nº 38, expedida pelo DREI em 02 de março de 2017, para o cancelamento do registro como empresário individual e da EIRELI deverão ser apresentados principalmente os seguintes documentos:

• Requerimento de cancelamento do registro assinado pelo titular da EIRELI por procurador devidamente identificado (art. 1.151 do Código Civil);

• Deliberação do titular da EIRELI aprovando o encerramento da liquidação;• Se o requerimento ou a deliberação for assinada por procurador,

original ou cópia autenticada de procuração com poderes especiais;• Se o titular da empresa for analfabeto, a procuração deverá ser passada

por instrumento público.

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extinção dAs sociedAdes eMpresAriAis

A extinção das sociedades empresárias personificadas é um procedimento composto por três etapas: (1) dissolução da sociedade – marcada pela declaração do fim da affectio societatis; (2) liquidação – onde é feita a apuração dos haveres com a alienação dos ativos para o pagamento dos passivos; e (3) a extinção da pessoa jurídica com o registro do ato societário que aprovou a dissolução, liquidação e extinção da sociedade perante a Junta Comercial competente (a “baixa” do registro).

Após a extinção da pessoa jurídica com a baixa do registro perante a Junta Comercial (art. 51 do CCB) é necessário realizar o cancelamento dos registros até então mantidos pela sociedade perante todas as demais repartições públicas necessárias para o exercício da sua atividade empresarial. Por exemplo, cancelamento (a) do registro do alvará de funcionamento perante a prefeitura municipal, (b) os registros perante a Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB, (c) o registro perante as secretarias de fazenda estaduais e municipais, (d) o registro perante o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, (e) o registro perante o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, (f) o registro perante o Corpo de Bombeiros, (g) o registro perante eventual(ais) órgão(s) de classe, etc.

O conceito de “dissolução” da sociedade pode ser compreendido em dois sentidos: o amplo e o restrito. Em sentido amplo, significa todo o processo necessário para o encerramento da sociedade (e, consequentemente, da atividade) empresária. Neste sentido amplo, o conceito de dissolução se refere às três etapas mencionadas acima. Em sentido estrito, significa o ato societário que aprovou o fim da sociedade.

O processo de dissolução das sociedades está tratado nos artigos 1.033 a 1.038 do CCB. Estes artigos se situam topologicamente na seção VI do Capítulo I do Subtítulo II do Título II do Livro II do CCB. Na parte dedicada às sociedades simples e que funciona como regra geral de direito societário brasileiro.

A dissolução pode ocorrer em três formas: judicial, extrajudicial e convencional.

A dissolução judicial, tratado no artigo 1.034 do CCB, será requerida por sócio(s) em caso de anulação da constituição da sociedade, exaurimento do fim social ou caso a sociedade se torne inexequível (por exemplo, pela falta de affectio societatis).

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A dissolução extrajudicial da sociedade pode ocorrer nas hipóteses previstas no artigo 1.053: (a) vencimento do prazo previsto no contrato social; (b) consenso unânime entre os sócios; (c) nas sociedades com prazo indeterminado, deliberação dos sócios aprovada por sócios representando ¾ do capital social (art. 1.076, inciso I, e art. 1.071, inciso VI); (d) perda da autorização para funcionar; (e) unipessoalidade superveniente que perdure por mais de cento e oitenta dias9.

A dissolução convencional ocorre quando a hipótese que originou a dissolução esteja prevista em contrato social e ocorrerá de modo extrajudicial. A dissolução convencional deverá ser feita judicialmente sempre que algum dos sócios se manifestar de modo contrário a dissolução (art. 1.035 do CCB).

Obs.: Em relação à hipótese de dissolução extrajudicial indicada na letra “(d)”, acima, o Poder executivo pode cassar a autorização de funcionamento concedida a sociedade que praticar atos contrários a ordem pública ou aos fins declarados nos seus atos constitutivos. Havendo cassação da autorização para funcionar, o Ministério Público poder requerer, dentro do prazo de trinta dias, a liquidação judicial da sociedade (inciso V do artigo 1.033 e art. 1.037 do CCB).

Obs.: O Enunciado nº 67 da Primeira Jornada de Direito Civil, dispõe que “A quebra do affectio societatis não é causa para a exclusão do sócio minoritário, mas apenas para dissolução (parcial) da sociedade”. O propósito deste enunciado é pacificar um entendimento no sentido que a eventual desarmonia entre os sócios de sociedades limitadas pode resultar na dissolução judicial da sociedade (inciso II do art. 1.033 e artigo 1.034 do CCB), mas é insuficiente para ensejar a exclusão extrajudicial de um sócio minoritário (artigos 1.030, 1.053 e 1.085 do CCB).

A segunda fase do processo de dissolução (em sentido amplo) da sociedade é a liquidação, a qual se processará nos termos dos artigos 44, 1.038, parágrafo 2º, 1.102 a 1.112, 2.033 e 2.034 do CCB.

A primeira providência obrigatória para o processamento da liquidação da sociedade é a nomeação e investidura do liquidante. O liquidante será responsável por presentar a sociedade liquidanda em todos os atos e negócios inadiáveis e necessários para a alienação dos ativos e pagamento dos passivos da sociedade. Não é permitida a realização de novas operações para a consecução do objeto social da sociedade pelo liquidante (art. 1.036 do CCB).

9 em caso de unipessoalidade superveniente, o sócio remanescente pode requerer a alteração do registro de sociedade para a eireli (Vide aula 7, acima).

9 em caso de unipessoalidade super-veniente, o sócio remanescente pode requerer a alteração do registro de socie-dade para a eireli (Vide aula 7, acima).

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74FGV direito rio

Caso o liquidante realize novos negócios sociais em nome da sociedade, os administradores da sociedade responderão solidária e ilimitadamente com o liquidante pela prática destes atos.

O liquidante pode ser nomeado pelos sócios no contrato social da sociedade ou no ato societário que aprovou a dissolução, liquidação e extinção da personalidade jurídica.

Os administradores da sociedade não podem oferecer oposição à investidura no cargo pelo liquidante. O liquidante que não for administrador da sociedade será investido no cargo por meio do registro do ato de sua nomeação e do seu termo de posse perante o órgão de registro competente (art. 1036 do CCB).

Após a aprovação da liquidação, a denominação da sociedade passará a conter a expressão “em liquidação” (artigo 1.103, parágrafo único do CCB). A expressão “em liquidação” deverá constar na denominação social da sociedade liquidanda em todos os atos realizados a partir da aprovação da liquidação.

A fase final do processo de dissolução (em sentido amplo) é a extinção da pessoa jurídica, a qual se opera por meio do cancelamento do registro da sociedade perante o registro de comércio (no caso das sociedades empresárias) ou perante o ofício de registro civil das pessoas jurídicas (no caso das sociedades simples), nos termos dos parágrafos 1º e 3º do artigo 51 do CCB. Regularizar a extinção das pessoas jurídicas é um marco importante para a delimitação temporal da responsabilidade da sociedade e dos sócios pela prática de todos os atos necessários para formalizar regularmente a dissolução da sociedade. Vale ressaltar que a dissolução irregular pode ser considerada como um indício de má utilização da sociedade e do patrimônio social e, portanto, uma das hipóteses de desconsideração da pessoa jurídica caso se comprove que a irregularidade da dissolução (art. 50 do CCB) tenha sido motivada por ato doloso dos sócios (Resp. 1.395.288 – SP, julgado pela 3ª Turma do STJ em 11.04.14, Relatora Min. Nancy Andrighi).

jurisprudênciA

Neste sentido, vale ressaltar que em 16 de maio de 2017, a Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.526.287 / SP, Ministra relatora Nancy Andrighi, decidiu que a dissolução irregular per se não é suficiente para ensejar a responsabilidade dos sócios.

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75FGV direito rio

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE LUCROS CESSANTES. POSSE INDEVIDA DE IMÓVEL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. ART. 50 DO CC/02. TEORIA MAIOR. ATUAÇÃO DOLOSA E INTENCIONAL DOS SÓCIOS. UTILIZAÇÃO DA SOCIEDADE COMO INSTRUMENTO PARA O ABUSO DE DIREITO OU EM FRAUDE DE CREDORES. COMPROVAÇÃO CONCRETA. AUSÊNCIA. 1. O propósito recursal é definir se, na hipótese em exame, estão presentes os pressupostos para a desconsideração da personalidade jurídica, segundo a teoria maior, prevista no art. 50 do CC/02. 2. Nas relações jurídicas de natureza civil-empresarial, adota-se a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, segundo a qual a desconsideração da personalidade é medida excepcional destinada a punir os sócios, superando-se temporariamente a autonomia patrimonial da sociedade para permitir que sejam atingidos os bens das pessoas naturais, de modo a responsabilizá-las pelos prejuízos que, em fraude ou abuso, causaram a terceiros. 3. Para a aplicação da teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica exige-se a comprovação de que a sociedade era utilizada de forma dolosa pelos sócios como mero instrumento para dissimular a prática de lesões aos direitos de credores ou terceiros – seja pelo desrespeito intencional à lei ou ao contrato social, seja pela inexistência fática de separação patrimonial –, o que deve ser demonstrado mediante prova concreta e verificado por meio de decisão fundamentada. 4. A mera insolvência da sociedade ou sua dissolução irregular sem a devida baixa na junta comercial e sem a regular liquidação dos ativos, por si sós, não ensejam a desconsideração da personalidade jurídica, pois não se pode presumir o abuso da personalidade jurídica da verificação dessas circunstâncias. 5. In casu, a Corte estadual entendeu que a dissolução irregular da sociedade empresária devedora, sem regular processo de liquidação, configuraria abuso da personalidade jurídica e que o patrimônio dos sócios seria o único destino possível dos bens desaparecidos do ativo da sociedade, a configurar confusão patrimonial. Assim, a desconsideração operada no acórdão recorrido não se coaduna com a jurisprudência desta Corte, merecendo reforma. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.”

Apesar da decisão acima, nos termos do verbete número 435 da Súmula do STJ, caso a sociedade empresária deixe de funcionar em seu domicílio fiscal sem as devidas comunicações aos órgãos registrais competentes, presumir-se-á a dissolução irregular.

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76FGV direito rio

O liquidante da sociedade tem os seguintes deveres (art. 1.103 do CCB):

• Registrar e rubricar a ata, sentença ou instrumento que tenha aprovado a liquidação da sociedade;

• Arrecadar todos os bens, livros e documentos da sociedade necessários para identificação do acervo social durante a liquidação;

• Em até quinze dias após a sua investidura no cargo, realizar um inventário do acervo social e levantar um balanço geral identificando os ativos e passivos sociais;

• Apurar os haveres por meio da prática de todos os atos e negócios jurídicos necessários para tornar líquidos os ativos da sociedade;

• Exigir dos sócios remissos a total integralização das quotas emitidas pela sociedade;

• Semestralmente, convocar uma assembleia para prestação de contas sobre o estado da liquidação aos antigos sócios;

• Requerer a falência, recuperação judicial ou extrajudicial da sociedade liquidanda;

• Apresentar um relatório final da liquidação; e

• Registrar a ata do encerramento da liquidação perante a Junta Comercial competente.

Obs.: Para fins tributários, o registro da ata de encerramento da liquidação da sociedade é o ato jurídico que marca a extinção da personalidade jurídica (artigo 240 da Instrução Normativa nº 1.700 expedida em 14 de março de 2017 pela Secretaria da Receita Federal do Brasil - RFB);

Mediante autorização expressa no contrato social ou conferida pela maioria dos sócios, o liquidante da sociedade somente pode (1) contrair empréstimos em nome da sociedade ou constituir ônus reais sobre ativos da sociedade se forem indispensáveis ao pagamento de obrigações inadiáveis; e (2) prosseguir a atividade econômica organizada que era conduzida pela sociedade (Parágrafo único do art. 1.105 do CCB).

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77FGV direito rio

O liquidante deve observar a seguinte ordem de pagamento das dívidas da sociedade em liquidação: Primeiro, pagar os credores titulares de créditos preferenciais – conforme definido nos artigos 955 a 965 do CCB; segundo, pagar proporcionalmente os credores quirografários, sem distinção entre dívidas vencidas e vincendas. Caso o ativo da sociedade em liquidação seja superior ao passivo, o liquidante pode pagar todas as dívidas vencidas integralmente. O liquidante responde pessoalmente pelo pagamento integral dos credores quirografários (art. 1.106 do CCB).

Obs.: Nos termos do artigo 7-A da Lei 11.598/07, que estabeleceu procedimentos para a simplificação do processo de registro de empresários e de pessoas jurídicas e da Instrução Normativa nº 25 e da Instrução Normativa nº 26, expedida pelo DREI em 11 de setembro de 2014, é possível obter a baixa no registro de empresas e empresários individuais sem a apresentação das certidões negativas de débitos trabalhistas, tributários (Certidão Negativa de Débitos – CND emitida pela RFB) e previdenciários. A opção por encerrar o registro sem a apresentação das certidões negativas de débitos importa responsabilidade solidária dos titulares, dos sócios e dos administradores do período de ocorrência dos respectivos fatos geradores (parágrafo 2º do artigo 7-A da Lei 11.598/07) e configura uma hipótese de sucessão tributária (artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional – CTN).

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João MAnoEl dE lIMA JUnIoRdoutor em direito de empresa e Atividades econômicas pela uerJ, com bolsa da CAPeS/MeC. Mestre em direito econômico e Financeiro pela uSP, com bolsa do international Fellowship Programs/Ford Foundation. Bacharel em direito pelo iBMeC/rJ. Membro das Comissões de direito empresarial do iAB e da oAB/rJ. Professor da Graduação da FGV direito rio. Pesquisador do Centro de Pesquisa em direito e economia (CPde). Foi professor substituto de direito comercial da Fnd/uFrJ e pesquisador visitante na Georgetown law, euA.

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FINANÇAS PÚBLICAS

FGV DIREITO RIO 214

FICHA TÉCNICA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

Sérgio GuerraDIRETOR

Antônio Maristrello PortoVICE-DIRETOR

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAÇÃO

André Pacheco Teixeira MendesCOORDENADOR DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSINO