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ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS: Utopias e Inovações

ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS Utopias e Inovações · ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS – UTOPIAS E INOVAÇÕES Coordenação Editorial Joaquim Antonio Pereira Produção Lívia C. L

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ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS:

Utopias e Inovações

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ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEISUtopias e Inovações

TANIA MARGARETE MEZZOMO KEINERT (ORG.)

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ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS – UTOPIAS E INOVAÇÕES

Coordenação Editorial

Joaquim Antonio Pereira

Produção

Lívia C. L. Pereira – Paginação

CONSELHO EDITORIAL

Eduardo Peñuela CañizalNorval Baitello Junior

Maria Odila Leite da Silva DiasCelia Maria Marinho de Azevedo

Gustavo Bermardo KrauseMaria de Lourdes SekeffCecilia de Almeida Salles

Pedro Roberto JacobiLucrécia D’Alessio Ferrara

1ª edição: outubro de 2007

© Tania Margarete Mezzomo Keinert

ANNABLUME editora . comunicaçãoRua Padre Carvalho, 275 . Pinheiros05427-100 . São Paulo . SP . Brasil

Tel. e Fax. (011) 3812-6764 – Televendas 3031-9727www.annablume.com.br

Infothes Informação e Tesauro

K36 Keinert, Tania Margarete Mezzomo, Org.Organizações sustentáveis: utopias e inovações. / Organização de Tânia

Margarete Mezzomo Keinert. – São Paulo: Annablume; Belo Horizonte:Fapemig, 2007.

330 p.; 14 X 21 cm

ISBN 978-85-7419-748-7

1. Desenvolvimento Sustentável. 2. Organizações. 3. ResponsabilidadeSocial. 4. Responsabilidade Ambiental. 5. Governança Corporativa.

6. Educação Ambiental. 7. Consumo Sustentável. 8. Experiências Inovadoras.I. Título. II. Núcleo de Estudos em Administração da Inovação eSustentabilidade - NAIS.

CDU 634.41CDD 333

Catalogação elaborada por Wanda Lucia Schmidt – CRB-8-1922

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Aos que me apoiaram

Aos que me apóiamAos que eu apóio

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ÉS MENINA DO ASTRO-SOL,

ÉS RAINHA DO MUNDO-MAR

TEU LUZEIRO ME FAZ CANTAR

TERRA, TERRA, ÉS TÃO ESTRELADA

O TEU MANTO AZUL COMANDA,

RESPIRAR, TODA CRIAÇÃO,

E, DEPOIS QUE A CHUVA MOLHA,

ARCO-ÍRIS VEM COROAR.

A FLORESTA É TEU VESTIDO,

E AS NUVENS, O TEU COLAR,

ÉS TÃO LINDA, Ó MINHA TERRA,

CONSAGRADA EM TEU GIRAR.

NAVEGANTE DAS SOLIDÕES,

NO ESPAÇO A NOS LEVAR,

NAVE-MÃE E O NOSSO LAR,

TERRA, TERRA, ÉS TÃO DELICADA

OS TEUS HOMENS NÃO TEM JUÍZO,

ESQUECERAM TÃO GRANDE AMOR.

OFERECES OS TEUS TESOUROS,

MAS NINGUÉM DÁ O TEU VALOR.

TERRA, TERRA, EU SOU TEU FILHO,

COMO AS PLANTAS E OS ANIMAIS,

SÓ AO TEU CHÃO EU ME ENTREGO,

COM AMOR, FIRMO TUA PAZ...

“ESTRELADA”

(MILTON NASCIMENTO/ MÁRCIO BORGES)

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SUMÁRIO

Apresentação

Introdução: Sustentabilidade: Entre Utopias e a Inovações

PARTE I

1. Desenvolvimento Sustentável: Alternativas e Impasses

2. Negócios Sustentáveis e seus Indicadores

3. Globalização, Novas Tecnologias e Comunicação nasOrganizações

4. La Plaga Moderna : El Consumismo

5. Nuevos Enfoques Sobre Utopia Y Realidad

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PARTE II

1. Governança Corporativa como Fator de Sustenta-bilidade: as Influências sobre o Excesso de Controle eo Desempenho das Empresas da BOVESPA/SP

2. Aliando o Bom Desempenho Empresarial ao Desenvolvi-mento Sustentável: Um Estudo Sob a Ótica dasPerspectivas Ambiental, Social,Econômica e daGovernança Corporativa

3. Sustentabilidade e Efetividade de ONG´s Ambientais:a Influência do Processo Gerencial

4. Antecedentes da Intenção de Consumo de CosméticosEcológicos

5. A Imagem do Destino Turístico como Fator deSustentabilidade: O Caso de Ouro Preto/ MG

6. Educação Ambiental: A Percepção dos Empregadossobre as Práticas Adotadas em uma Organização doRamo de Mineração

7. A Contabilidade como Ciência Social: Aplicabilidadeda Contabilidade Ambiental para o DesenvolvimentoSustentável

8. Adaptação do Plano de Contas como Mecanismo paraGeração de Relatórios Gerenciais no Setor Ambiental

9. Diversidade Étnica e os Negros nas Organizações: umEstudo na Região Metropolitana de Belo Horizonte

10. Análise da Formulação e Implementação de EstratégiasInovadoras em Instituições Privadas do Ensino Superiorna Região Metropolitana de Belo Horizonte

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APRESENTAÇÃO

Este livro traz a “memória” das discussões e debates realizadosdurante o I ENCONTRO CIENTÍFICO INTERNACIONAL DONAIS (ECI) promovido pelo NÚCLEO DE ESTUDOS EMADMINISTRAÇÃO DA INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE(NAIS) do Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração(CEPEAD) ligado à Faculdade de Ciências Econômicas (FACE) daUniversidade Federal de Minas Gerais (UFMG), nos dias 14, 15 e 16de junho de 2007.

O caráter interdisciplinar e transdisciplinar do Núcleo de Estudosde Estudos em Administração da Inovação e Sustentabilidade – NAIS– refletiu-se no ECI, marcado por participantes que atuam nas maisdiversas áreas de conhecimento, lidando com aspectos teóricos emetodológicos distintos. Essa característica contribuiu para aorganização e estímulo à produção científica no campo temático deAdministração da Inovação e Sustentabilidade, que estamos aquitentando resgatar.

Gostaríamos de agradecer a valiosa contribuição que nos foidada através das conferências, palestras, apresentação de comunicaçõesde pesquisa e debates no I ECI/NAIS. A repercussão foi bastante positiva tanto junto à UFMG qunto à comunidade acadêmica emgeral, tanto que recebemos contribuições das mais diversasuniversidades e localidades.

Estamos agora apresentando o material resultante. Trata-se de“memória” porque se constitui apenas parcialmente em anais doevento, pois foram adicionadas contribuições enviadas pelosparticipantes, resultantes de preocupações relacionadas ao tema, nasquais estes pesquisadores já vinham se debruçando há algum tempo.Estes textos constituem a Parte I do livro.

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ï 12 ï Apresentação

Na Parte II são publicadas as Comunicações de Pesquisaapresentadas na sessão de mesmo nome no evento, as quais trazem ariqueza de reunir, por vezes num mesmo paper, professores de pós-graduação, orientandos de mestrado e doutorado; e, em alguns casosaté estudantes de graduação. Esta pluralidade de visões e de experiênciasmostrou ser muito rica e tem sido incentivada pelas agências defomento.

Cabe, por fim, agradecer à FAPEMIG (Fundação de Apoio àPesquisa de Minas Gerais) pelo apoio concedido à realização do eventoe a essa publicação, e ao CEPEAD pelo apoio financeiro e logísticoà realização do evento, à CRIA JR. pela criação artística das peçaspublicitárias de divulgação do ECI, e, finalmente, à UCJ e ao DA/FACE pelo apoio à realização do evento.

Aos “três mosqueteiros”, Alecia Nathana Motta Cunha, MarcosEduardo Maciel e Maurício Zanon, um especial agradecimento. Semo seu apoio o ECI/NAIS não teria sido possível realizar e, nestemomento, não teríamos a felicidade de concretizar esta publicação.

PROFA. DRA. TÂNIA MARGARETE MEZZOMO KEINERT

Coordenadora do NAIS/FACE-UFMGPresidente da Comissão Organizadora do ECI/NAIS

e-mail: [email protected]@face.ufmg.br

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INTRODUÇÃO

SUSTENTABILIDADE: ENTRE UTOPIAS E INOVAÇÕES

TÂNIA MARGARETE MEZZOMO KEINERT1

Sustentabilidade. Utopia. Inovação. Estas foram palavras muitoouvidas nas palestras e debates realizados durante I ENCONTROCIENTÍFICO INTERNACIONAL DO NAIS (ECI) promovido peloNÚCLEO DE ESTUDOS EM ADMINISTRAÇÃO DAINOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE (NAIS).

Isto pode nos levar a uma dedução simplória, talvez verdadeira,que a “utopia da sustentabilidade demanda inovações para concretizar-se”. Inovações estas de todo o tipo, quer sejam organizacionais, gerenciais,tecnológicas ou até no modo de vida pessoal e de interação social.

Foi assim com muitas das coisas que se consideraram “utópicas”no passado, como a jornada de oito horas de trabalho e quedemandaram sim inovações nos vários níveis de organizaçãopolítico-administrativa e social para se tornarem realidade. Conformecoloca o Prof. Bonilla, em seu texto “Nuevos Enfoques sobre Utopiay Realidad” é importante conceituar a palavra “utopia” como “aquiloque é considerado impossível... em um determinado contexto”. Obrade visionários antes de tornar-se real, tangível...

Como também coloca o Prof. José Eli da Veiga/USP, palestrantedo ECI/NAIS, a noção de sustentabilidade pode vir a ser entendidacomo um dos mais generosos ideais da humanidade, desde o adventodo socialismo, se entendida em seu sentido filosófico, como projeto

1. Profa. Dra./Coordenadora do NAIS/FACE-UFMG; [email protected],

[email protected]

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ï 14 ï Introdução

de futuro de determinada sociedade. Porém, adverte, não sem trazerconsigo inúmeras contradições.

Para (Veiga,2006) cada vez mais um provável futuro não-capitalista deixa de ser identificado com a utopia socialista. Nessecontexto, o “desenvolvimento sustentável”, com todas asambigüidades e insuficiências inerentes à expressão, certamenteanuncia a utopia que tomará o lugar do socialismo.

Importante papel neste cenário tem o fator consumo, pois eledefine e é definido pelo fator produção.Quais seriam os perfis epercursos da sustentabilidade ambiental, qual seria o cenário parauma sociedade sustentável, quais políticas, projetos e papéis os váriosatores sociais (stakeholders) deveriam desempenhar na definição doque deve ser produzido e, conseqüentemente, consumido?

Em sua essencialidade, o produto hoje não é mais consideradocomo um bem de consumo, mas sim, do ponto de vista do “serviço”que oferece. Manzini & Vezzoli (2005), propõem o conceito de“desmaterialização” da demanda social de bem-estar como base deum critério correto de desenvolvimento sustentável. Sob esse termoentende-se uma drástica redução do número e da intensidade material(quantidade de recursos ambientais necessários para gerar uma unidadede produto ou serviço) dos produtos e dos serviços requeridos paraatingir um bem-estar socialmente aceitável. E, conseqüentemente,uma radical mudança em toda a lógica operacional do sistema produtivo.

Importantes inovações foram introduzidas no mundoorganizacional a partir da emergência do conceito de sustentabilidade– o qual deriva daquele de desenvolvimento sustentável definido pelaComissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento(CMMAD) da Organização das Nações Unidas (ONU) e publicadono relatório Nosso Futuro Comum, em 1987.

Desenvolvimento sustentável é “aquele que atende àsnecessidades do presente sem comprometer a possibilidade de asgerações futuras atenderem as suas próprias necessidades”(CMMAD,1991, p.46).

Em pesquisa anterior (Keinert, 2007) apontamos para aemergência de um novo paradigma relacionado ao conceito de público,

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colocando a relação estado-sociedade no Brasil nas últimas duasdécadas não mais como estadocêntrica, mas sim, como sociocêntrica.

Neste sentido as empresas, bem como a sociedade civil - atravésde organizações não-governamentais(ong’s) e outras associações econselhos - assumem novo papel.

O modelo de desenvolvimento desejado passa a ser o baseadoem tecnologias limpas e energias renováveis ( e não mais o das“chaminés”) e passa-se a exigir das organizações responsabilidade sociale ambiental.

Neste contexto operacionaliza-se, nas empresas, através dochamado triple bottom-line, a idéia de que uma organização sustentável:aquela que, além de gerar resultados econômico-financeiros, tambémdeve engajar-se em ações sociais e zelar pelo meio ambiente (Hart;Milstein, 2004).

O próprio conceito de “governança corporativa” dá ênfase aeste papel mais amplo da empresa relacionado a todos os atores sociaisinfluenciados ou atingidos pelos processos da empresa. Assim podemaumentar ou diminuir o valor das ações da empresa o fato de elaapostar na comercialização de alimentos orgânicos, adotar umapolítica ambientalmente correta no tocante aos muitos milhões deembalagens que movimenta em suas lojas, ou no esforço de utilizaçãode milhões de lâmpadas de menor consumo energético ou, ainda,em investimentos voltados para energia renovável, por exemplo.Instituições de peso têm pressionado grandes empresas a tornartransparentes riscos e oportunidades de suas atividades relacionadasàs mudanças do clima no planeta, questão muito discutida nesteano.

Desta forma, sistemas administrativos tradicionais, como osregistros contábeis também inovam e se abrem para a geração derelatórios gerenciais ambientais, adaptando seus planos de contas paraempresas que queiram demonstrar seu desempenho sócio-ambiental,(e não somente o econômico-financeiro) não apenas para os seusstakeholders mas para toda a sociedade.

Responsabilidade sócio-ambiental, ética e transparência quepressupõem, inclusive, segurança no ambiente de trabalho como

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questão de qualidade da gestão, diversidade étnica e de gênero nacomposição do quadro de pessoal como políticas adequadas derecursos humanos.

Pode parecer sonho, mas estes fatores já são considerados nasbolsas de valores dos EUA, desde os anos 60, para avaliar as ações dasempresas, através do conceito de investimentos socialmenteresponsável (SRI, na sigla em inglês) e constituem os chamados“fundos éticos”. Estes fundos passaram a excluir de seus portfóliosações de empresas que mantinham relacionamento com o regime deapartheid na África do Sul, por exemplo.

Experiência interessante realizada no Brasil, e abordada em trêstextos neste livro, trata do uso do Índice de SustentabilidadeEmpresarial (ISE/BOVESPA) dos quais o Prof. Rubens Mazon, umdos palestrantes do ECI/NAIS, foi um dos idealizadores. O ISE/BOVESPA trabalha com três dimensões: econômica-financeira, sociale ambiental; as quais foram divididas em quatro conjuntos decritérios:• Políticas (indicadores de comprometimento);• Gestão (indicam planos, programas, metas e monitoramento);• Desempenho (indicadores de performance);• Cumprimento Legal (avaliam o cumprimento de normas nas áreas

de concorrência, consumidor, trabalhista, ambiental, entre outras).

Através deste tipo de iniciativa pode-se ir criando uma consciênciade que o investimento socialmente responsável e a criação de valorpara os acionistas podem andar de mãos dadas.

Para finalizar, retornemos ao início. Voltemos a falar sobresustentabilidade, utopia e inovação. Nada acontecerá sem a mudançade mentalidades e sem a crença que sim, “teremos um futuro comum”como pregava o Relatório Brundtland, especialmente se fizermos algumacoisa por ele, como pessoas, como cidadãos, como membros deorganizações, etc.

A Educação Ambiental pode contribuir para isso, como abordao texto sobre a percepção dos empregados de uma mineradora,constante neste livro. Porém, mais além, devemos louvar iniciativas

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como a Rede de Educação Ambiental, projeto que está sendoimplantado em escolas públicas de 30 cidades mineiras com o apoioda Unesco e do Conselho Mundial de Águas (O Estado de São Paulo,10.06.2007, p.A28).

Papel relevante na temática das organizações sustentáveis, dentreoutras iniciativas; cabe à inovação, que “reinventa” e põe em práticaidéias novas, superando a noção de organizações “predadoras”, típicasdo século XX. Através de melhorias nos processos gerenciais e deprodução, do uso de novas tecnologias, da reciclagem de resíduos,do uso da logística reversa, do desenvolvimento de produtos queconsomem menos matérias-primas, pode-se gerar uma produção maiseficiente e limpa, com preservação dos recursos naturais,competitividade para as organizações e benefícios para toda a sociedade.

Após 15 anos da importante mobilização da ECO-92 e de seudocumento decorrente, a Agenda 21; de passados 20 anos doRelatório Brundtland – Nosso Futuro Comum; e da realização, nesteano de 2007, da Cúpula Mundial do Clima, é impossível não perceberavanços, mesmo que pontuais e embrionários.

São pequenos passos na construção de inovações que tornem possívelconcretizar a idéia utópica de organizações e de uma sociedade sustentável.

BIBLIOGRAFIA

CMMAD. Nosso Futuro Comum.Rio de Janeiro, FGV, 1991.

HART, S. L., MILSTEIN, M. B. Criando valor sustentável. Revista de

Administração de Empresas. v. 3, n.2, maio/jul. 2004, p. 65-79.

KEINERT, T. M. M. Administração Pública no Brasil: Crise e Mudança

de Paradigmas. São Paulo: Annablume Editora/FAPESP, 2007, 2ª.

Ed.

MANZINI, E. & VEZZOLI, E. O Desenvolvimento de Produtos

Sustentáveis. São Paulo:EDUSP, 2005.

VEIGA, J.E. da. Desenvolvimento Sustentável: O Desafio do Século XXI.

Rio de Janeiro: Garamond, 2006, 2ª. Ed.

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PARTE I

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DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:ALTERNATIVAS E IMPASSES

JOSÉ ELI DA VEIGA1

Antes mesmo que a idéia de desenvolvimento humano começassea ser assimilada, também ganhava força uma expressão concorrente:desenvolvimento sustentável (DS). Já a partir de 1992, um movimentointernacional foi lançado pela Comissão para o DesenvolvimentoSustentável (CSD) das Nações Unidas com o objetivo de construirindicadores de sustentabilidade. Reunindo governos nacionais,instituições acadêmicas, ONG’s, organizações do sistema das NaçõesUnidas e especialistas de todo o mundo, esse movimento pretendepôr em prática os capítulos 8 e 40 da “Agenda 21” firmada na Eco-92, referentes à necessidade de informações para a tomada de decisões.

Em 1996, a CSD publicou o documento “Indicadores de desarollosostenible: marco y metodologías”, que ficou conhecido como “LivroAzul”. Continha um conjunto de 143 indicadores, que foram quatroanos depois reduzidos a uma lista mais curta, com apenas 57, masacompanhados de fichas metodológicas e diretrizes de utilização.Foram cruciais para que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) viesse a publicar - em 2002 e 2004 - os primeiros indicadoresbrasileiros de desenvolvimento sustentável.2

1. Professor Titular da FEA/USP- – www.zeeli.pro.br

2. IBGE. (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Indicadores de

desenvolvimento sustentável, Brasil 2002. IBGE – Diretoria de Geociências.

Rio de Janeiro: IBGE, 2002. (Estudos & Pesquisas – Informação Geográfica, n.

2); e Indicadores de desenvolvimento sustentável 2004 Brasil. IBGE

– Diretoria de Geociências. Rio de Janeiro: IBGE, 2004. Disponível em:

www.ibge.gov.br

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ï 22 ï Desenvolvimento sustentável – JOS⁄ ELI DA VEIGA

A importância desses dois pioneiros trabalhos do IBGE nãodeve ser subestimada pelo fato da maioria de suas estatísticas eindicadores se referir mais ao tema do desenvolvimento do que aotema da sustentabilidade. Foi a primeira vez que uma publicaçãodessa natureza incluiu explicitamente a dimensão ambiental ao ladoda social, da econômica e da institucional. Não se deve esquecer queos temas ambientais são mais recentes e por isso não contam comuma larga tradição de produção de estatísticas. Mesmo assim, e apesarda imensa dificuldade de encontrar informações confiáveis sobre osprincipais objetivos de conservação do meio ambiente, foi possívelapresentar 17 indicadores fundamentais, organizados em cinco temasessenciais: “Atmosfera”, “Terra”, “Oceanos, mares e áreas costeiras”,“Biodiversidade” e “Saneamento”.

ÍNDICE DE “DS”

Todavia, uma rápida consulta aos resultados desses dois primeirosesforços certamente provocará a seguinte indagação: poderá surgirdaí um índice sintético de desenvolvimento sustentável? A respostamais sensata parece ser negativa, porque índices compostos por váriasdimensões (que, por sua vez, resultam de diversas variáveis) costumamser contraproducentes, para não dizer enganosos ou traiçoeiros. Poroutro lado, sem um bom termômetro de sustentabilidade, o maisprovável é que todo mundo continue a usar apenas índices dedesenvolvimento (quando não de crescimento), deixando de lado adimensão ambiental.

Se o próprio desenvolvimento tout court não pode serrepresentado por um único número, o que dizer, então, sobre odesenvolvimento sustentável? Tanto quanto um piloto precisa estarpermanentemente monitorando os diversos indicadores quecompõem seu painel, qualquer observador do desenvolvimentosustentável será necessariamente obrigado a consultar dezenas deestatísticas, sem que seja possível amalgamá-las em um único índice.Talvez seja essa a razão que faz o Pnuma (Programa das Nações Unidas

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para o Meio Ambiente) não ter se lançado na construção de umíndice de desenvolvimento sustentável equivalente ao IDH.3

Isto não impede, contudo, que se procure elaborar um índicede sustentabilidade ambiental, em vez de desenvolvimento sustentável,para que possa ser comparado com outros índices de desenvolvimento,como os que foram mencionados no início deste livro. Ou ainda,que se prefira representações gráficas multifacetadas, em vez de umnúmero índice. A idéia foi apresentada em 2002 ao FórumEconômico Mundial por um grupo de trabalho formado porpesquisadores de duas universidades americanas.4

Com 68 variáveis referentes a 20 indicadores essenciais, o índicede sustentabilidade ambiental elaborado por pesquisadores de Yale eColumbia pôde ser calculado para 142 países. Esse índice consideracinco dimensões: sistemas ambientais, estresses, vulnerabilidadehumana, capacidade social e institucional, e responsabilidade global.O primeiro envolve quatro sistemas ambientais: ar, água, solo eecossistemas. O segundo considera estresse algum tipo muito críticode poluição, ou qualquer nível exorbitante de exploração de recursonatural. No terceiro, a situação nutricional e as doenças relacionadasao ambiente são entendidas como vulnerabilidades humanas. A quartadimensão se refere à existência de capacidade sócio-institucional paralidar com os problemas e desafios ambientais. E na quinta entram osesforços e esquemas de cooperação internacional representativos daresponsabilidade global.

As premissas básicas que norteiam essas cinco dimensões forambem explicitadas pelos pesquisadores. Em primeiro lugar, é necessárioque os sistemas ambientais vitais sejam saudáveis e não entrem emdeterioração. Também é essencial que os estresses antrópicos sejam

3. A página web do Pnuma é www.unep.org

4. Daqui em diante chamado de ESI-2002: 2002 Environmental Sustainability

Index. (Global Leaders of Tomorrow Environmental Task Force - World

Economic Forum). In collaboration with: Yale Center for Environmental Law

and Policy, Yale University; Center for International Earth Science Information

Network, Columbia University. http://www.ciesin.columbia.edu

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baixos e não causem danos aos sistemas ambientais. Em terceiro, aalimentação e a saúde não devem ser comprometidas por distúrbiosambientais. Em quarto, é preciso que existam instituições, padrõessociais, habilidades, atitudes e redes que fomentem efetivas respostasaos desafios ambientais. E, em quinto, há que cooperar para o manejodos problemas ambientais comuns a dois ou mais países, além dereduzir os “transbordamentos” de problemas ambientais de um paíspara outro.

Se a média aritmética tivesse sido usada na elaboração do ESI-2002, teria ido por água abaixo todo o esforço de encontrar em 142países os valores para essas 68 variáveis. Nesse caso, países tão diferentesquanto Holanda e Laos atingiriam um índice de sustentabilidademuito próximo, quase idêntico. O que não faria, evidentemente,nenhum sentido.

GRUPOS

No entanto, em vez do simplismo da média aritmética, a opçãodos criadores do ESI foi pelo método de análise estatística de clusters,que permite identificar os grupos de países com perfis semelhantes.E assim surgiram cinco tipos ou grupos, que são bem numerosos nosextremos: 47 de alta vulnerabilidade ambiental e 53 de moderadavulnerabilidade e média capacidade sócio-institucional de responderaos problemas ambientais. Entre esses dois extremos, surgiram trêspequenos grupos que se diferenciam essencialmente pela ocorrênciade estresses ou pela baixa capacidade sócio-institucional de resposta.

O grupo dos 47 mais vulneráveis é formado essencialmente porpaíses do continente africano, mas também estão entre eles a Bolívia,a Guatemala, a Nicarágua e o Paraguai. É bem mais heterogêneo ogrupo do outro extremo, formado por 53 países cuja situação poderiaser considerada “moderada”. Poder-se-ia dizer que a maioria dessespaíses faz parte da chamada “semi-periferia”. Nele estão incluídos osseguintes “latino-americanos”: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia,Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Honduras, Jamaica, México,Panamá, Peru e Uruguai.

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Um menor grupo, que poderia ser chamado de “razoável”, éformado por 11 países dos mais desenvolvidos: Austrália, Canadá,Estônia, Finlândia, Islândia, Irlanda, Israel, Nova Zelândia, Noruega,Suécia e Estados Unidos. Em seguida surge um grupo de 11 naçõesque se mostram, por enquanto, incapazes de lidar com seus problemasambientais. É formado essencialmente por países “petroleiros”, masinclui também a Coréia do Norte. E as principais surpresas estão nopior grupo, que poderia ser chamado de “estressado”. São 18 países,em maioria muito bem desenvolvidos pela ótica do IDH: Áustria,Bélgica, República Checa, Dinamarca, França, Alemanha, Hungria,Itália, Japão, Macedônia, Holanda, Polônia, Eslováquia, Eslovênia,Coréia do Sul, Espanha, Suíça e Reino Unido.

O mais interessante, contudo, é a comparação com os respectivosIDH. Ela permite identificar quais são os países de desenvolvimentomenos sustentável, e também os de desenvolvimento mais sustentável.

Apesar de terem tido sucesso em estabelecer esses cinco gruposde países em função de seu grau de sustentabilidade ambiental, osautores do ESI-2002 advertem que ainda faltam dados estatísticosrazoáveis sobre uma dúzia de fatores críticos: degradação dos solos,teor de chumbo no sangue, fragmentação dos ecossistemas, segurançade reatores nucleares, proporção de materiais reciclados, perda deterras úmidas (wetlands), concentração/emissão de metais pesados,impactos da disposição de resíduos e lixos, efetividades dasregulamentações ambientais, níveis de subsídios à conservação dosrecursos naturais, concentração/emissão de poluentes orgânicospersistentes, e proporção de cardumes explorados de formaspredatórias.

Diante o ESI-2002, chega a parecer irrisória a dimensãosocioambiental incluída em alguns índices criados por organizaçõesnão-governamentais, ou por governos estaduais. No máximo trêsindicadores fazem parte dessa dimensão: a) instalações adequadas deesgotamento sanitário; b) destino adequado do lixo urbano; e c)tratamento do esgoto sanitário. Eles até poderiam ser representativosdo componente “saneamento” que certamente faz parte da dimensãoambiental, mas não dizem nada sobre atmosfera, terra, biodiversidade,

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e oceanos, mares e áreas costeiras, os outros quatro componentespara os quais o IBGE já disponibilizou diversos indicadores em 2002e 2004.

Para o componente “atmosfera”, o IBGE fornece dois: oconsumo industrial de substâncias destruidoras da camada de ozônio,e a concentração de poluentes no ar em áreas urbanas. Para ocomponente “terra”, fornece sete: uso de fertilizantes, uso deagrotóxicos, terras aráveis, queimadas e incêndios f lorestais,desflorestamento na

Amazônia Legal, área remanescente de desflorestamento na MataAtlântica e nas formações vegetais litorâneas. Para o componente“oceanos, mares e áreas costeiras”, também fornece dois: produçãoda pesca marítima e continental, e população residente em áreascosteiras. E para o componente “biodiversidade”, outros dois: espéciesextintas e ameaçadas de extinção, e áreas protegidas.

CRÍTICAS

Muita água ainda vai rolar por baixo das pontes antes que apareçaum índice de sustentabilidade ambiental que possa produzir algumconsenso internacional. Construir um índice quando se dispõe derazoável matéria-prima (bases de dados) é uma tarefa bem mais fácildo que conseguir legitimá-lo. E a enxurrada de críticas já feitas aoESI-2002 indica que não está próximo o dia em que um índice desustentabilidade ambiental possa obter legitimidade comparável, porexemplo, à que o IDH hoje desfruta.

Dessas críticas, a mais sistemática foi elaborada pelos professoresRaghbendra Jha, da Universidade Nacional da Austrália, e K. V. BhanuMurthy, da Universidade de Delhi.5 Eles opõem ao ESI-2002 diversas

5. Raghbendra JHA & K.V. Bhanu Murthy. “A critique of the Environmental

Sustainability Index”, Australian National University Division of Economics,

Working Paper, 2003, http://ssrn.com/abstract=380160 . Ver também “An

inverse global environmental Kuznets curve”. Journal of Comparative

Economics, 31 (2003) 352-368.

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considerações de ordem filosófica e empírica. A principal limitaçãoapontada parece ser a falta de reflexão sobre as variáveis que estãocorrelacionadas, e principalmente as que mantêm relação de causa eefeito. Variáveis causais e variáveis de impacto não deveriam sermisturadas no mesmo índice, dizem Jha & Bhanu Murthy.

Além de fazerem uma crítica bem fundamentada do ESI-2002,esses dois professores, que trabalham em universidades da Austrália eda Índia, sugerem um outro índice, mais especificamente dedegradação ambiental. Segundo esse Environmental Degradation Index(EDI), os Estados Unidos estão na 83a posição, e não na 45a, comoindica o ESI-2002. E pior: nessa visão, o Brasil está na 103a em vezde ocupar o 20o lugar.

Mesmo que ainda esteja longe o surgimento de uma medidamais consensual de sustentabilidade ambiental, é imprescindívelentender que os índice e indicadores existentes já exercem papelfundamental nas relações de fiscalização e pressão que as entidadesambientalistas devem exercer sobre governos e organizaçõesinternacionais. Nos últimos anos houve pelo menos trêsacontecimentos mundiais em que expressivos contingentes de naçõesassumiram sérios compromissos nessa direção. Em 2002, quando serealizou em Joanesburgo a chamada Rio+10 (World Summit onSustainable Development). Em 2004, quando se realizou em KualaLanpur, o encontro das Nações Unidas sobre a convenção dabiodiversidade (United Nations Convention on Biological Diversity).Paralelamente, todos os 191 países membros da ONU assinaram asMetas do Milênio (Millennium Development Goals), que não apenasfocalizam algumas das causas sociais que estão na base da degradaçãoambiental, como também metas específicas de sustentabilidade ambiental.

Pensando nesses compromissos internacionais, pode-se considerara existência de vários índices de sustentabilidade ambiental comouma “oportunidade de ouro”. Segundo o Dr. Claude Martin, diretorgeral do World Wildlife Fund (WWF International), é a primeira vezque os cidadãos podem monitorar, controlar e cobrar seus líderespor sucessos, vacilações ou desastres usando medidas objetivas equantificáveis sobre as várias dimensões da sustentabilidade ambiental.

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No quinto relatório mundial do WWF sobre o impacto dahumanidade em seu finito planeta6 foram adotados dois índicesglobais: o Living Planet Index (LPI), e o Humanity’s Ecological Footprint(HEF). Enquanto o LPI é voltado para a avaliação do estado geral dascondições naturais do planeta, o HEF avalia a intensidade do usodos recursos naturais do planeta pela espécie humana. Entre 1970 e2000 houve uma redução de 40% no LPI, pois a “pegada ecológicatotal” passou de 7,81 para 13,33 bilhões de hectares. Segundo oWWF, a capacidade biológica da Terra já foi excedida em 20%,situação que certamente só pode ocorrer por limitado período. Em2001 o HEF chegou a ser 2,5 vezes maior do que em 1961. Mashavia, evidentemente, uma brutal diferença de comportamento entrepaíses ricos e pobres. Nesse período, enquanto nos ricos a “pegadaper capita” saltou de 3,8 hectares por habitante (ha/hab) para 6,6 ha/hab, nos pobres ela só aumentou de 1,4 ha/hab para 1,5 ha/hab. Deresto, o relatório do WWF também permite estimar o déficitecológico, pela comparação da “pegada” (Total Ecological Footprint)com a “biocapacidade” (Total biocapacity). Em 2001, o déficit ecológicoglobal era de 0,4 hectares por pessoa (2,2–1,8). Todavia, enquantonos Estados Unidos esse déficit já havia atingido 4,7 ha/hab (9,5-4,9), no Brasil ainda se encontrava um significativo superávit, isto é,negativos 8,0 ha/hab (2,2-10,2).

FAZER O BOLO CRESCER

O debate científico internacional passou recentemente a serpautado pela hipótese ultra-otimista de que o crescimento econômicosó prejudique o meio ambiente até um determinado patamar deriqueza aferida pela renda per capita. A partir dele, a tendência tenderia

6. WWF – World Wildlife Fund. Living Planet Report 2004. WWF

International, Global Footprint Network, e UNEP-WCMC (The Unep World

Conservation Monitoring Center). Publicado pelo WWF – World Wild Fund fort

the Nature (antes World Wildlife Fund), Gland, Suíça, Outubro de 2004. Veja

esse e outros trabalhos do WWF através do site http://www.wwf.org.br

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a se inverter, fazendo com que o crescimento passasse a melhorar a qualidadeambiental. Raciocínio idêntico à velha parábola sobre a necessidadede primeiro fazer o bolo crescer para depois distribuí-lo melhor.

Os precários dados estatísticos disponíveis no pós - 2a GuerraMundial, além de apenas sobre um punhado de casos, haviam levadoos economistas a achar que pudesse existir uma lei que regeria a relaçãoentre o crescimento do PIB e a desigualdade de renda. Piorava naarrancada, mas melhorava depois de ultrapassar certo patamar deriqueza. Para o desgosto dos que acham que o capitalismo é o fim dahistória, tal hipótese foi descartada quando estatísticas sobre umgrande número de países revelaram que as relações entre crescimentoe desigualdade foram das mais heterogêneas nos últimos cinqüenta anos.

Idêntica conjectura sobre a relação entre crescimento e meioambiente foi lançada na década de 1990. Alguns pesquisadoresconcluíram que as fases de desgraça e recuperação ambiental estariamseparadas por um ponto de mutação que se situaria em torno de 8mil dólares de renda per capita. Pelo menos foi o que mostrou arelação entre o comportamento da renda per capita e quatro tipos deindicadores de deterioração ambiental – poluição atmosférica urbana,oxigenação de bacias hidrográficas, e duas de suas contaminações (fecale por metais pesados).

O destino dessa hipótese certamente será idêntico à do“crescimento do bolo”. Quando um grande número de países tiverindicadores confiáveis sobre um leque mais amplo de variáveisecológicas, constatar-se-á que são tão diversos os estilos de crescimentoe as circunstâncias em que ele ocorre, que deve ser rejeitada a idéia detão linear relação ente qualidade ambiental e renda per capita. Aliás,já existem bons indicadores que revelam as tragédias ambientais depaíses riquíssimos. E ela já foi desmentida por experimento comvariáveis ambientais globais. Todavia, até que a comunidade científicase convença do contrário, será a panglossiana proposição mencionadaque continuará a pautar o debate. Centenas de sofisticadíssimos testesserão relatados até que ela possa cair em descrédito.

O crescimento econômico contínuo trará cada vez mais danosao ambiente da Terra? Ou aumentos da renda e da riqueza jogam as

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sementes de uma melhora dos problemas ecológicos? É com estaalternativa formulada em duas perguntas que os principais adeptosda hipótese panglossiana introduzem sua argumentação. Se osmétodos de produção fossem imutáveis, é óbvio que só seria possívelresponder afirmativamente à primeira pergunta. Todavia, há inúmerasevidências de que o processo de desenvolvimento leva a mudançasestruturais naquilo que as economias produzem. E muitas sociedadesjá demonstraram notável talento em introduzir tecnologias queconservam os recursos que lhe são escassos. Em princípio, os fatoresque podem levar a mudanças na composição e nas técnicas daprodução podem ser suficientemente fortes para que os efeitosambientalmente adversos do aumento da atividade econômica sejamevitados ou superados. E se houver evidência empírica que confirmeessa suposta tendência, será permitido concluir que a recuperaçãoecológica resultará do próprio crescimento.

Com o propósito de testar essa hipótese, seus adeptos investigama relação entre a escala da atividade econômica e a qualidadeambiental, utilizando metodologia consolidada e os dados disponíveismais confiáveis sobre qualidade do ar em grandes cidades e qualidadeda água em suas bacias hidrográficas. Além das séries publicadas pelaOrganização Mundial da Saúde (OMS) – o sistema GlobalEnvironmental Monitoring System (GEMS) – para o período 1977-84, alguns conseguiram dados inéditos para o período 1985-88, juntoà agência federal dos Estados Unidos para o meio ambiente (U.S.Environmental Protection Agency, EPA). Embora tais medidas estejammuito longe de constituir uma lista representativa das variáveis capazesde descrever a situação dos respectivos ecossistemas, tais economistasacreditam que a variedade dos tipos de poluentes considerados nainvestigação autoriza uma generalização para outros tipos deproblemas ambientais. E essa crença certamente é compartilhada pelamaioria de seus pares.

O dióxido de enxofre e a fumaça relacionam-se com o PIB percapita na forma de uma curva em “U” invertido. Na verdade, apoluição por dióxido de enxofre volta a subir quando são atingidosaltos níveis de renda per capita, mas considera-se que o reduzido

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número de observações de casos em que atingiu 16 mil dólares impedeque se tenha confiança na forma que a curva adquire nesse estágio.Para os particulados, constatou-se um monótono declínio da relaçãopoluição/renda. Todavia, foram encontradas boas “curvas em Uinvertido” para praticamente todos os outros principais indicadoresde poluição do ar e da água: BOD (demanda de oxigênio biológico),COD (demanda de oxigênio químico), nitratos, coliformes fecais,coliformes totais, chumbo, cádmio, arsênico, mercúrio e níquel. Eos picos de renda per capita variaram entre 3 e 11 mil dólares,respectivamente para os coliformes totais e cádmio.

Ao fazer a síntese dos resultados obtidos, os pesquisadoresafirmam que não encontraram evidência significativa de que aqualidade ambiental tenda a se deteriorar de maneira firme, constante,ou estável, com o crescimento econômico. Ao contrário, quase todosos indicadores apontaram para uma deterioração em fase inicial docrescimento, mas com subseqüente fase de melhoria. Foram levados,então, a “suspeitar” que essa recuperação posterior esteja em parteligada ao aumento da demanda (e da oferta) de proteção ambientalquando a renda nacional chega a níveis mais altos. Os pontos demutação variam bastante segundo o poluente considerado, mas namaioria dos casos eles ocorrem antes que o país atinja 8 mil dólares(de 1985) de renda per capita.

Assim, rechaçando gritos alarmistas de grupos ambientalistas,tais economistas afirmam que o crescimento econômico não causainevitável dano ao habitat natural. Segundo eles, isso só ocorre mesmoem países muito pobres. Todavia, seu meio ambiente será, aocontrário, beneficiado pelo crescimento econômico, assim queatingirem certos níveis críticos de renda per capita, próximos aopatamar de 8 mil dólares (de 1985).

Desde que essa contribuição empírica foi publicada, pululamconfirmações pela utilização de outras variáveis, outros países, outrosperíodos. É preciso lembrar, contudo, que há um pressuposto nessaanálise que só pode ser facilmente aceito pela comunidade doseconomistas convencionais, pois são todos inveterados otimistastecnológicos. Todos acreditam piamente que as inovações tecnológicas

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acabarão por superar qualquer impasse que venha a colocar em xequea continuidade do crescimento econômico. E tal pressuposto é deque os indicadores de poluição usados sejam termômetros daqualidade ambiental. Basta lembrar de alguns outros fenômenos jábem conhecidos – como, por exemplo, a erosão da biodiversidade,as perdas de patrimônio genético, o aquecimento global, adeterioração da camada de ozônio, a chuva ácida, ou a escassez deágua – para que se perceba o duvidoso valor científico da extrapolação.E ela ficaria ainda mais absurda se fosse evocado o inevitável aumentoda entropia. Mas esta é uma idéia que só preocupa um pequenogrupo de economistas heterodoxos, que constituem o extremo opostodo debate científico, e que com imensa dificuldade estão conseguindoromper o isolamento que lhes foi imposto pelo establishment da ciêncianormal.

UMA TESE INCONVENIENTE

As pesquisas do extremo oposto exigirão ainda mais paciência.Desde 1971, foi lançado um alerta sobre o inexorável aumento daentropia. As atividades econômicas gradualmente transformam energiaem formas de calor tão difusas que são inutilizáveis. A energia estásempre passando, de forma irreversível e irrevogável, da condição dedisponível para não-disponível. Quando utilizada, uma parte da energiade baixa-entropia (livre) se torna de alta entropia (presa). Para podermanter seu próprio equilíbrio, a humanidade tira da natureza oselementos de baixa entropia que permitem compensar a alta entropiaque ela causa. O crescimento econômico moderno exigiu a extraçãoda baixa entropia contida no carvão e no petróleo. No futurocertamente voltará a explorar de maneira mais direta a energia solar.Nem por isso poderá contrariar o segundo princípio datermodinâmica, o que um dia exigirá a superação do crescimentoeconômico. Em algum momento do futuro, a humanidade deveráapoiar a continuidade de seu desenvolvimento na retração, isto é,com o decréscimo do produto. O oposto do sucedido nos últimosdez mil anos, desde o surgimento da agricultura.

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É bom frisar que tão incômoda hipótese permanecesimplesmente esquecida pela esmagadora maioria dos economistas.Até referências aos seus adeptos passaram a ser evitadas nos principaismanuais pedagógicos usados no treinamento dos novos economistas.Mesmo assim, é a idéia da inexorável entropia que orienta os maisheréticos programas de pesquisa.

Para essa corrente mais cética só haverá alternativa à decadênciaecológica na chamada “condição estacionária” (“stationary state”) –que não corresponde, como muitos pensam, a crescimento zero. Aproposta é superar o crescimento econômico pelo resgate de umaidéia formulada por economistas clássicos, e principalmente JohnStuart Mill em 1857, agora chamada de “steady-state economy”.7

Para efeito pedagógico, pode-se usar uma analogia entreeconomias de ponta – como a dos EUA ou do Japão – e umabiblioteca que já esteja repleta de livros, sem espaço para absorvernovas aquisições. A melhor solução é estabelecer o princípio de queum novo livro só poderá entrar no acervo quando outro for retirado,em uma troca que só seria aceita se o novo livro fosse melhor que osubstituído. Ou seja, na “condição estacionária” a economiacontinuaria a melhorar em termos qualitativos, substituindo, porexemplo, energia fóssil por energia limpa. Mas nessas sociedades maisavançadas seria abolida a obsessão pelo crescimento do produto.

É pequeno o grupo de economistas hereges a considerar que aEconomia deva ser absorvida pela Ecologia por considerar que atermodinâmica é muito mais pertinente para a primeira do que amecânica. Foi assim que tal grupo entrou em colisão com o paradigmaque une todas as correntes do pensamento econômico, da maisconvencional à mais heterodoxa, e da mais conservadora à mais radical.Acham que assimilar o processo econômico a um modelo mecânicoé admitir o mito segundo o qual a economia é um carrossel que denenhuma maneira pode afetar o ambiente composto de matéria e deenergia. A conclusão evidente é que não há necessidade de integrar o

7. John Stuart MILL. Princípios de economia política: com algumas de suas

aplicações à filosofia social. (Vol. II). São Paulo: Ed. Abril Cultural, 1983 [c1857].

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ambiente no modelo analítico do processo. E a oposição irredutível entremecânica e termodinâmica vem do Segundo Princípio, a Lei da Entropia.

Na verdade, entropia é uma noção suficientemente complexapara que não seja às vezes compreendida pelos próprios físicos.Tentando trocar em miúdos, pode-se dizer que o aumento de entropiacorresponde à transformação de formas úteis de energia em formasque a humanidade não consegue utilizar. No limite, trata-se de algorelativamente simples: todas as formas de energia são gradualmentetransformadas em calor, sendo que o calor acaba se tornando tãodifuso que o homem não pode mais utilizá-lo. Para ser utilizável, aenergia precisa estar repartida de forma desigual. Energiacompletamente dissipada não é mais utilizável. A ilustração clássicaevoca a grande quantidade de calor dissipada na água dos mares quenenhum navio pode utilizar.

Todo organismo vivo está sujeito ao aumento de entropia, masprocura mantê-la constante pela extração de seu meio ambiente doselementos de baixa entropia necessários à compensação. Ocrescimento econômico moderno baseou-se na extração da baixaentropia contida no carvão e no petróleo. Como já foi dito, um diase baseará em formas de exploração mais direta da energia solar. Masnem por isso poderá contrariar o segundo princípio da termodinâmica,o que acabará por obrigar a humanidade a abandonar o crescimento.

A conclusão dos heréticos é por demais inconveniente. Um diaserá necessário encontrar uma via de desenvolvimento humano quepossa ser compatível com a retração, isto é, com o decréscimo doproduto. Por isso, no curto prazo é preciso que o crescimento seja omais compatibilizado possível com a conservação da natureza. Nãose trata de conseguir “crescimento zero”, ou “condição estacionária”,visões por eles consideradas ingênuas. Crescimento é sempre depleçãoe, portanto, encurtamento de expectativa de vida da espécie humana.Não é cinismo, ou pessimismo, reconhecer que os seres humanosnão querem abrir mão de seu presente conforto para facilitar a vidados que viverão daqui a dez mil anos. Trata-se apenas de entenderque a espécie humana está determinada a ter uma vida curta, porémexcitante. Em suma, esse pequeno grupo fica na dúvida entre rir ou

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chorar quando é obrigado a entrar na atual discussão entre oseconomistas convencionais sobre os dois gêneros de sustentabilidade,apresentada a seguir.

“ARENGA”

Para a teoria convencional sobre o crescimento econômico, anatureza jamais constituirá sério obstáculo à expansão. No longoprazo, os ecossistemas não oferecerão qualquer tipo de limite, sejacomo fontes de insumos, ou assimiladores de impactos. Qualquerelemento da biosfera que se mostrar limitante ao processo produtivo,cedo ou tarde, acabará substituído, graças a mudanças na combinaçãoentre seus três ingredientes fundamentais: trabalho social, capitalproduzido e recursos naturais. Isto porque o progresso científicotecnológico sempre conseguirá introduzir as necessárias alterações quesubstituam a eventual escassez, ou comprometimento, do terceirofator, mediante inovações dos outros dois, ou de algum deles. Emvez de restrição às possibilidades de expansão da economia, os recursosnaturais podem no máximo criar obstáculos relativos e passageiros,já que serão indefinidamente superados por invenções.

Os principais adeptos dessa tese simplesmente repudiam o quechamam de “arenga” sobre a intrínseca incompatibilidade entrecrescimento econômico e preocupação com o ambiente natural.Todavia, desse ultra-otimismo tecnológico, que sempre esteve na basedo raciocínio convencional, não decorre necessariamente um sériodesprezo pelo compromisso ético com as futuras gerações. A noçãode sustentabilidade é até considerada muito útil, pois a humanidadeprecisa evitar tudo o que possa ocorrer em detrimento de seusdescendentes. Não apenas dos mais diretos, mas também dos maisdistantes. Só que isto significa, em seu ponto de vista, a preservaçãoda capacidade produtiva para um futuro indefinido, pela ilimitadasubstituição dos recursos não-renováveis. O que exigirá,evidentemente, mudanças importantes na maneira de medir odesempenho das economias. Isto é, dos sistemas públicos decontabilidade, sejam eles nacionais, regionais ou locais. Será preciso

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calcular PIB e Produto Nacional Bruto (PNB) “verdes”, que preferemchamar de produtos interno ou nacional “líquido”.

Enxergam a sustentabilidade como capital total constante. Umaconcepção que acabou sendo batizada de “fraca”. Isto porque assumeque, no limite, o estoque de recursos naturais possa até ser exaurido,desde que esse declínio seja progressivamente contrabalançado poracréscimos proporcionais, ou mais do que proporcionais, dos outrosdois fatores-chave – trabalho e capital produzido – muitas vezesagregados na expressão “capital reprodutível”. Ou seja, nessaperspectiva de “sustentabilidade fraca”, o que é preciso garantir paraas gerações futuras é a capacidade de produzir, e não manter qualqueroutro componente mais específico da economia. É uma visão naqual a idéia de desenvolvimento sustentável acaba sendo absorvida ereduzida a crescimento econômico. O que permite entender a enfáticaadvertência sobre a inconveniência de se procurar uma definição menosvaga de sustentabilidade. Em suma: é o fortíssimo otimismotecnológico que leva a pregar pela fraqueza da sustentabilidade.

Os economistas convencionais que não concordam com talpostura também não se preocupam com definições mais precisas parao adjetivo “sustentável”. O que os diferencia é que são menos otimistassobre as possibilidades de troca-troca entre os fatores de produção,preferindo, por isso, propugnar o que chamam de “sustentabilidadeforte”. Entendem que o critério de justiça intergerações não deve sera manutenção do capital total, mas sim sua parte não reprodutívelque chamam de “capital natural”. E por não ignorarem que grandeparte desse “capital natural” é exaurível, propõem que os danosambientais provocados por certas atividades sejam de alguma formacompensados por outras.

Esse debate em torno da força relativa que deveria ter asustentabilidade é dos mais bizantinos. Afinal, na concepçãoconvencional, o objeto ciência econômica é o gerenciamento racionalda finitude dos recursos produtivos em sociedades marcadas pelainfinitude das necessidades humanas. O manejo dessa contradição sefaz por um sistema no qual os preços exprimem a escassez relativados bens e serviços, papel que tem sido desempenhado da maneira

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mais eficiente por mercados livres, sem restrições (embora quase todostenham exigido institucionalização de códigos de comportamento evários graus de regulamentação pública, principalmente estatal). Aeconomia convencional lida, portanto, com a alocação eficiente derecursos escassos para fins alternativos, presentes e futuros, por meiodo sistema de preços de mercado. Neste sentido, a questão dasustentabilidade corresponde à administração mais ou menos eficientede uma dimensão específica da escassez.

Se os mercados de recursos naturais funcionassem razoavelmentee gerassem seus preços relativos, nem teria surgido preocupação especialcom a sustentabilidade ambiental, pois eles estariam sendo alocadosde maneira eficiente ao longo do tempo. Como isso não ocorre, oproblema foi catalogado entre as “imperfeições de mercado”. E asaída que parece razoável para todos os convencionais é a criação denovos mercados para os bens ambientais, como, por exemplo,mercados de direitos de poluir ou de quotas de emissões. E para quetais mercados possam surgir, são adotados vários expedientes de“precificação”, mais conhecidos como técnicas de valoração.

Essa foi a maneira de responder à embaraçosa questão sobre ovalor econômico de bens que não adquirem valor de troca, não tendo,portanto, preços. Os economistas convencionais passaram a dizerque o valor de troca e o valor de uso são apenas duas das partes deum valor total. E que este também é formado por outros tipos devalores, entre os quais o “valor de existência”. Afinal, dizem eles, sealgumas pessoas conseguem satisfação somente por saber que algumecossistema particular existe em condições relativamente intocadas,o valor resultante de sua existência é tão real como qualquer outrovalor econômico, seja de uso ou de troca.

Esse valor começou então a ser medido por uma espécie deanálise de custo-benefício da alteração do bem-estar. Para umindivíduo, o valor da mudança para uma situação preferida serárevelado pela “dispa”: sua disposição a pagar por esse ganho. Se, aocontrário, houver perda, ela será revelada pela “disco”: sua disposiçãoem aceitar algo como compensação. Para a sociedade, o valor líquidode uma mudança ambiental pode ser avaliado pela diferença entre o

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total das “dispa” dos que esperam ganhar e o total das “disco” dosque esperam perder.

Os procedimentos para esse tipo de avaliação que se tornarammais usuais são bem semelhantes às sondagens de opinião. Propõemalternativas a uma amostra populacional afetada por um problemaambiental de maneira a que sejam registradas as “dispa” e “disco”.Assim, se os cidadãos estiverem bem informados sobre asconseqüências das opções propostas, podem ser calculados valoreseconômicos de bens para os quais não existem mercados. É dessaforma que costumam ser estimados, por exemplo, valores de existênciade espécies em extinção.

Nesse processo, os adeptos da economia ambiental convencionaltambém foram se convencendo de que a dificuldade de saber qual éo valor econômico da diversidade biológica, por exemplo, não decorrede limitações da ciência econômica e sim de limitações das ciênciasnaturais. Acham que seus métodos de avaliação só não trazem bonsresultados porque os ecólogos costumam ter pouca confiança emsuas estimativas sobre os impactos da alteração dos ecossistemas, alémde raramente chegarem a um acordo. Se os peritos não podemconstruir cenários fidedignos que descrevam os efeitos de políticasalternativas para a biodiversidade, as “dispa” e “disco” dos cidadãosreagirão a estes cenários refletindo aquela incerteza e desinformação,tanto quanto qualquer incerteza adicional que venha a ocorrer àssuas próprias preferências com relação à biodiversidade. A confusão,a ignorância e a apatia entre os leigos refletiriam, então, sinaisincompletos e dissonantes dos especialistas.

O PROBLEMA

Seria um imenso equívoco imaginar que só os economistasconvencionais utilizam essas técnicas de valoração dos elementos domeio ambiente que não têm preços. Por razões bem pragmáticas,ligadas ao maior poder de persuasão de argumentos baseados emvalor monetário, é comum que economistas da corrente mais céticatambém se sirvam desses expedientes de precificação. Por isso, empaíses de capitalismo maduro, já é comum sondar a opinião das

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pessoas para saber que tipo de valor elas atribuiriam a umadeterminada melhora da qualidade do ar, ou à preservação de um rio.

O maior problema é que esse malabarismo nem sempre conseguepersuadir. Qual poderia ser, por exemplo, o preço do ozônio emrarefação, ou o preço de uma função como a regulação térmica doplaneta? Será que a preservação da diversidade biológica e culturalpoderia ficar na dependência do aperfeiçoamento dessas tentativasde simular mercados? Questões que só aumentam a distância entreeconomistas convencionais e “ecológicos”, mesmo que usem asmesmas técnicas. Os mais otimistas consideram que a ciênciaeconômica só não respondeu a esses problemas no passado porqueeles não eram considerados prementes pela sociedade. Os outrosacham que esses problemas revelam a imaturidade da economia comociência, pois questionam a própria visão de sistema econômico que écomum a todas as teorias, das mais radicais às mais conservadoras.

Um bom exemplo foi o estudo realizado pela turma da“economia ecológica” sobre os benefícios proporcionados aos sereshumanos por dezesseis grandes ecossistemas terrestres, publicado em1997 pela revista Nature. Diz que as funções desempenhadas por essesecossistemas, que há milhões de anos vinham sendo usufruídasgratuitamente pela humanidade, na verdade valem quase duas vezestoda a riqueza produzida no mundo durante um ano, isto é, cerca de33 trilhões de dólares anuais. Para um dos pesquisadores envolvidos,esse resultado “pode até não ser muito preciso, mas serve para daruma dimensão da importância da natureza na atividade humana”.Segundo outro membro da equipe, “fica muito mais fácil para apopulação e para as autoridades compreender que, quando se usa anatureza, há um preço a pagar”.

Será que a atribuição de um preço fictício a um bem natural é amelhor maneira de ganhar a opinião pública para a preservaçãoambiental? Uma parte crescente dos economistas responde que sim.No fundo, eles estão convictos de que a racionalidade econômicasempre dominará as outras racionalidades. Como o Pequeno Príncipede Saint-Exupéry, eles acham que os adultos nunca valorizam umacasa porque ela tem tijolos rosados, com gerânios nas janelas e pombas

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ï 40 ï Desenvolvimento sustentável – JOS⁄ ELI DA VEIGA

no telhado. Só são capazes de admirar sua beleza quando ouvem queela custa tantos milhões.

O problema é que os adultos também não acreditam em “estóriasda carochinha”. Sabem que os preços são determinadossimultaneamente pela utilidade e pelo custo de produção. Percebemintuitivamente que não se pode saber se o preço é governado pelautilidade ou pelo custo de produção. Tanto quanto não se podeafirmar se é a lâmina inferior ou superior de uma tesoura que cortauma folha de papel.

Isto quer dizer que só podem ter valor econômico e, portanto,preço, bens que sejam produtíveis e apropriáveis. E tais bensrepresentam, por mais espantoso que possa parecer, uma ínfimaparcela do universo formado por todos os seres vivos e objetos quecompõem a biosfera. A aceitação dessa microscópica redução foiindispensável para que se chegasse à visão de sistema econômicorepresentado pelas contas sociais.

Ao nos perguntarmos como será possível contabilizarmonetariamente bens naturais que não têm preço, estamos nosperguntando se é possível estender a economia para um campo quenão é o seu. A noção usual de sistema econômico consolidou-sejustamente pelo crescente distanciamento da natureza. Por isso, todatentativa de incorporar variáveis ambientais nas contabilidades esbarraem obstáculos conceituais e práticos que acabam tornando osresultados muito suspeitos. Tão suspeitos quanto esses 33 trilhõesde dólares anuais atribuídos a dezesseis grandes ecossistemas terrestres.

O que realmente opõe os economistas ecológicos a todas asoutras correntes não é, portanto, o uso de técnicas de valoração. Overdadeiro pomo da discórdia é o seguinte: recursos naturais e capitaissão geralmente complementares e não substitutos. Pensar, como osconvencionais, que eles possam se substituir, é contrariar duas leis datermodinâmica. Imaginar uma economia sem recursos naturais – comochegaram a fazer alguns de seus expoentes – é simplesmente ignorar adiferença entre o mundo real e o Jardim do Éden. E a melhor defesados convencionais se baseia em argumento que é muito simples: osmodelos analíticos da economia convencional são feitos para ajudar

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em questões de médio prazo, isto é, para os próximos 50 ou 60anos. Um horizonte em que os recursos naturais ainda poderão serfacilmente substituíveis por capital.

IMPASSE

Não pode ser mais patente, então, a raiz do impasse. Quando seevoca a segunda lei da termodinâmica para evidenciar a fatalidadeentrópica, o horizonte temporal é evidentemente de longuíssimoprazo. Por isso prevalece um verdadeiro anátema entre os economistasconvencionais e os ecológicos a respeito da sustentabilidade, mesmona tal versão chamada de “forte”. E a questão que imediatamente secoloca só pode ser a seguinte: nada poderia preencher esse imensovazio que separa modelos de crescimento para algumas décadas damilenar fatalidade entrópica? Não há, neste caso, um “caminho do meio”?

O que existe de diferente, não chega a ser um “caminho domeio”, mas sim um incipiente desdobramento menos pessimista dasidéias dos hereges. O principal é entender que a esmagadora maioriados economistas contemporâneos é ultra-otimisma. Consideram quea economia mundial continuará desfrutando indefinidamente docrescimento intensivo e acelerado da produção, como vem ocorrendodesde a Revolução Industrial. No extremo oposto, a ínfima minoriaque repudia esse tipo de otimismo, insiste que os serviços da naturezaestão sendo usados a uma taxa superior àquela que a biosfera é capazde suportar no longo prazo. Preconizam políticas com o objetivo desustar o aumento do uso dos recursos naturais, principalmente nospaíses mais ricos. E apenas começam a surgir idéias que talvez atépossam abrir um “caminho do meio”. Uma delas é a necessidade deresgatar a grande diferença que existe entre PIB e riqueza.Principalmente porque o PIB não inclui a depreciação de ativos, comoé o caso da degradação de ecossistemas.8

8. Um bom exemplo está no “contraponto” de Partha Dasgupta às idéias de Herman

E. Daly na revista Scientific American Brasil, ano 4, nº41 (Outubro 2005), p.

92-98. E também o relatório do Banco Mundial intitulado Where is the wealth

fo Nations? Measuring capital for the XXI Century, (Julho 2005).

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NEGÓCIOS SUSTENTÁVEIS

E SEUS INDICADORES

RUBENS MAZON1

Retornos sustentados sobre o capital investido no longo prazoe, em certa medida, o crescimento dos negócios requerem, cada vezmais, o enfrentamento das questões de desenvolvimento social e desustentabilidade que influenciam e são influenciadas pelas ações dasempresas no mercado, por interesses setoriais, por demandas dascomunidades do entorno e pelo próprio sistema capitalista em suaversão neoliberal local. Na prática, a sustentação de resultados acimada média em prazos mais elásticos parece exigir formulações estratégicase direcionamentos operacionais que conjuguem, em uma mesmaunidade de performance, retornos econômicos, sociais, ambientais eculturais diferenciados. Assim como parece induzir a composição,com outros atores, de arranjos produtivos que potencializem ouampliem, por um lado, escala e participação de mercado; por outro,infra-estrutura, recursos, tecnologia apropriada, competências,sensibilidade social (social responsiveness) e capacidade de inovar. Amaximização das condições de produzir, comercializar, comunicar,oferecer produtos e serviços inovadores, promover desenvolvimento,valorizar direitos humanos, dar conta dos impactos no entornoinerentes ao negócio, lidar com a concorrência, abrir novos mercadose estar próximo aos clientes onde quer que eles estejam neste mundoglobalizado parece tender a se viabilizar, cada vez mais, a partir de

1. Professor da Universidade Ibirapuera. P.h.D em Gestão de Saúde Ambiental pela

Universidade de Cincinnati em Ohio (EUA). [email protected]

Diretor da Terra Mater Empreendimentos Sustentáveis.

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arranjos produtivos capazes de conjugar investidores, especialistas,empresas, financiadores, organizações da sociedade civil, instituiçõesde pesquisa e desenvolvimento e organismos de governo.

Entretanto, é preciso resolver antes e sempre, o curto prazo.Sem atingir o resultado do dia, da semana, da quinzena, do mês, dosemestre e do ano não haverá argumento válido para transformaçõesa longo prazo, menos ainda para a inclusão da perspectiva sócio-ambiental no ambiente de negócios. Até porque é difícil distinguirentre dispersão de recursos e investimentos em iniciativas voltadas aresultados de longo prazo; assim como é difícil decidir se a melhoralternativa está mesmo no horizonte do tempo. Os resultadosimediatos, portanto, precisam ser obtidos enquanto se constroem asplataformas do futuro. Presente e futuro são pensados e articuladosjuntos, no presente; e essa é uma tarefa que, em certa medida, podeenvolver diferentes atores.

Explorar sinergias e complementaridades é, portanto, fator decompetitividade, de promoção do desenvolvimento e deenfrentamento de questões de sustentabilidade. A melhor performancedepende, entretanto, da qualidade intrínseca dos arranjos produtivos.Em outras palavras, depende da natureza do engajamento(legitimidade, motivação, visão de futuro e compartilhamento decrenças, significados e valores dos diferentes atores), da capacidade deconstruírem, consolidarem e manterem em permanentedesenvolvimento um ambiente capaz de gerar resultados (econômicos,sociais, ambientais e culturais) sustentados a longo prazo, da qualidadedos vínculos (transparência, confiança e proximidade entre os atores),da eficácia dos mecanismos de interação e cooperação e da capacidadede reconhecimento sincero dos interesses legítimos dos atoresenvolvidos. No plano operacional, depende do empenho em seencontrar uma fórmula aceita para a responsabilização (accountability),o acompanhamento, controle e auditoria dos processos e aapropriação dos resultados e dos impactos decorrentes da açãoconjunta, tanto os de natureza econômico-financeira como os sociais,ambientais e culturais; tanto os tangíveis quanto os intangíveis. Trata-se de um desafio enorme para a gestão contemporânea por conta,

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principalmente, de alguns fatores: da baixa competência dasorganizações para se integrarem à lógica e às dinâmicas sociais típicasde ambientes multi-stakeholders, naturalmente inclusivas e, portanto,complexas; da prevalência do individualismo, mesmo quando hávalorização do teamwork; das dificuldades de formulação e legitimaçãode decisões complexas em ambientes organizacionais quesupervalorizam a lógica exclusiva e direta do capital, as relações depoder, o imediatismo, o autoritarismo e o pragmatismo, que sãoaspectos culturais cultuados no neoliberalismo. Soma-se a isso, aexistência de interesses imbricados de diferentes arranjos produtivoscom que os mesmos atores, ou parte deles, possam estar envolvidos,e que são cada vez mais prováveis pela necessidade de ampliação dasfontes de geração de riqueza e minimização dos riscos além dasincertezas impostas tanto pelo ambiente competitivo como peloambiente social.

Segundo o World Business Council for Sustainable Development(WBCSD): “Responsabilidade Social Corporativa (CSR) é ocomprometimento permanente das empresas em agir eticamente econtribuir para o desenvolvimento econômico ao mesmo tempo emque melhora a qualidade de vida da força de trabalho e de suas famíliasbem como da comunidade local e da sociedade em geral”.

Para Kellie A. McElhaney da Haas School of Business daUniversidade da Califórnia em Berkeley, os termos ResponsabilidadeSocial Corporativa, Desenvolvimento Sustentável e CidadaniaCorporativa são os mais comumente utilizados no mundo de negócios,sendo que em seus cursos em Berkeley bem como no Center forResonsible Business por ela dirigido o termo utilizado é “Corporate SocialResponsibility” o qual é considerado idêntico a “SustainableDevelopment”.

A aderência ao conceito ou a busca de se ter e desenvolver“Corporate Social Responsibility” (CSR) ou Responsabilidade SocialCorporativa será aqui usado alternativamente ou de maneiraintercambiável para identificar empresas que buscam ser sustentáveisconforme a seguir definido, ou seja, perseguindo o “triple bottom line”.Uma estratégia corporativa ampla e de longo-prazo, integrada com os

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objetivos centrais do negócio e com as suas competências essenciaisatuando para criar mudança social positiva e valor para o negócio eque está inserida nas operações negociais do dia a dia é o que se podechamar de CSR Estratégica ou ainda Sustentabilidade Estratégica.

1. O TRIPLE BOTTOM LINE (TBL)

De acordo com Elkington, um empreendimento pode ser con-siderado sustentável se contribuir para o desenvolvimento sustentávelproporcionando simultaneamente benefícios econômicos, sociais eambientais - o chamado “triple bottom line” ( www.sustainability.com/home.asp). Reconhecendo que embora a dimensão social tenhaentrado em cena em 1987 com o Relatório Bruntland (Nosso FuturoComum), ela não conquistou imediatamente os cérebros empresariais,e foi só a partir da concepção do termo “triple bottom line” que essalinguagem foi incorporada ao mundo dos negócios tratando da suaprestação de contas (“accountability”) em termos financeiros, ambientaise sociais.

Os resultados da pesquisa realizada por Jed Emerson (Emerson,2003) expressos no relatório denominado “Blended Value Map”identificam cinco tipos de ações ou programas que propiciam avançosem diferentes partes daquilo que pode ser considerado uma agendacompartilhada para valorizar simultaneamente equidade social,sustentabilidade ambiental e desenvolvimento econômico. Emborareconheça que essas ações, tratadas isoladamente como verdadeiros“silos”, mesmo estando organizadas ao redor de um sujeito comum eprofundo, não são necessariamente interconectadas ou integradasdeixando de se beneficiar das sinergias potenciais que poderiam sergeradas. Os cinco “silos” identificados por Emerson são os seguintes:• Responsabilidade Social Corporativa• Empreendimento Social• Investimento Social• Filantropia Estratégica / Efetiva• Desenvolvimento Sustentável

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Segundo Emerson, valor é gerado pela participação combinadaentre as partes componentes do desempenho social, econômico eambiental. Todas as firmas (tanto as que perseguem o lucro como asque não o fazem) criam o “Blended Value” – restando apenas poderavaliar em que grau cada uma delas maximiza os elementoscomponentes do valor, que são mais bem dimensionados ouentendidos através da utilização do arcabouço do “Triple Bottom Line”.Emerson sustenta ainda que o “silo” do Desenvolvimento Sustentávelpermeia os outros quatro e tem uma identidade muito próxima como da Responsabilidade Social Corporativa (RSC). Sob a bandeira daRSC, Emerson identifica os seguintes termos: cidadania corporativa,“corporate accountability”, negócios éticos, e sustentabilidade. RSC temtambém a ver com empresas e líderes empresariais que integramconscientemente estratégias que criam valor ambiental e social noâmago de seus modelos negociais principais, em suas operações ecadeias de suprimentos.

Emerson empresta a definição do Governo Inglês para descreverEmpreendimentos Sociais como um conjunto de organizações,perseguidoras de lucro ou não, que priorizam os objetivos sociais ecujos superávits são principalmente reinvestidos para esse mesmopropósito em negócios ou na comunidade ao invés de serem dirigidospara a necessidade de maximizar o lucro de acionistas e proprietários.

Como Investimento Social ele denomina aquele investimentoque busca gerar retornos e valor ambiental ou social e financeiro.Emerson ainda subdivide Investimentos Sociais em duas categorias,a saber: Investimentos Socialmente Responsáveis (SRI), eInvestimentos Comunitários e “Double Bottom Line Investing”. Oobjetivo dos SRI é obter retornos financeiros plenos a taxas demercado, com alguns componentes de valores sociais e/ ou ambientais.Para Emerson, Investimento Comunitário acontece através deestratégias focadas geograficamente.

Emerson define Filantropia Estratégica / Efetiva como umagrande variedade de práticas filantrópicas muitas das quais assentadasem tradicionais práticas de doação caritativa e outras que funcionamdentro de uma visão de investimento filantrópico que é voltado para

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a criação de valor social. Fundações e outras formas de organizaçãoparalelas ao negócio principal ou “core business” de uma empresa /corporação têm sido algumas vezes utilizadas para promover taispráticas. Isso significa, de modo geral, manter negócios tradicionaiscom baixos níveis de sustentabilidade enquanto promovem um certo“esverdeamento” ou seja, passam um pouco de verniz socioambientaltentando melhorar a imagem associada a sua marca.

Para Desenvolvimento Sustentável (SD), Emerson repete asdefinições da WECD e do WBCSD afirmando que SD pode serdefinido como um “silo” de atividade que permeia os outros quatro“silos” acima citados e conforme apresentados no Blended Value Map

( www.haas.berkeley.edu/NEWS/cmr ).

2. INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE

As análises realizadas através do uso de indicadores vêmganhando peso nas metodologias utilizadas para resumir a informaçãode caráter técnico e científico, permitindo sua transmissão de formasintética, desde que preservada a essência da informação e utilizadasapenas as variáveis que melhor servem os objetivos e não todas as quepodem ser medidas ou analisadas. A informação é assim maisfacilmente utilizável por tomadores de decisão, gestores, políticos,grupos de interesse ou pelo público em geral.

A formulação de indicadores pressupõe a disponibilidade deinformações e dados confiáveis e comparáveis num determinadoperíodo de tempo. Esse é o principal desafio que se apresenta, ouseja, apontar caminhos para a identificação de parâmetros confiáveise comparáveis no tempo para a averiguação do cumprimento e doprogresso das práticas de gestão sustentável de maneira custo-efetiva.Há grande variabilidade de tipos e qualidade de informações quepodem impedir sua comparação, daí ser necessário identificar algunsparâmetros comparáveis, legitimados pelas partes interessadas econvenientes para o sistema em questão.

Não se pode deixar de mencionar que a utilização de indicadorese índices não é uma abordagem pacífica. Sempre se recobre de alguma

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controvérsia, em face das simplificações que são efetuadas na aplicaçãodestas metodologias. As eventuais perdas (ou descontinuidade) deinformação têm constituído um entrave à adoção de formageneralizada e consensual dos sistemas de indicadores e índices.

“Indicadores - parâmetros selecionados e consideradosisoladamente ou combinados entre si, sendo de especial pertinênciapara refletir determinadas condições dos sistemas em análise(normalmente são utilizados com pré-tratamento, isto é, são efetuadostratamentos aos dados originais, tais como médias aritméticas simples,percentuais, medianas, entre outros)”. Definidos, aceitos e inseridosnos processos de gestão de uma instituição (governos, empresas ououtras organizações da sociedade civil) um dado conjunto deindicadores pode revelar a situação atual dessa instituição (e daípermitir compará-la com outras de mesma natureza) ou indicar suaevolução em relação a sua própria situação em algum momentoanterior.

A origem da palavra indicador (do latim indicare) representa algoa salientar ou a revelar. Indicadores de qualidade do ar ou da água,via de regra, baseiam-se num conjunto restrito de parâmetrosintrinsecamente relevantes, mas que são também representativos doconjunto, de forma que além de servirem para a mensuração eavaliação das concentrações de determinados poluentes no ambiente,comparação dos níveis detectados com os níveis consideradosaceitáveis e avaliação de tendências, fornecem evidências ou “pistas”confiáveis da evolução da qualidade ambiental, por exemplo.

Indicadores para Relatórios (Reporting) e Indicadorespara Índices (ISE, por ex.)

De natureza e finalidades distintas ambos devem ser precisos,repetitivos (chegam ao mesmo resultado caso se faça uma novaobservação do mesmo parâmetro), reprodutíveis (uma segunda pessoachega ao mesmo resultado fazendo sua observação independentementeda primeira), e estáveis (sua precisão e reprodutibilidade nãodeteriorarão ao longo do tempo). A simplicidade (inteligível para a

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maioria das partes interessadas), consistência (aplicável à maior partedas instituições) e comparabilidade (permite comparar o desempenhode diversas instituições) são também características desejáveis numindicador ou num conjunto de indicadores de sustentabilidade.Finalmente, a seleção de um conjunto de indicadores deve passarpelo teste da utilidade (seu valor para o fim a que se destina) e suapraticabilidade (quão factível ou possível é a observação de um dadoparâmetro) o que inclui, entre outros fatores, sua complexidade,resistências possíveis (“fator medo”) e os custos envolvidos em suaobservação.

Indicadores para Relatório (Reporting)

O conjunto de indicadores para relatórios mais antigo do Brasilé aquele desenvolvido pelo IBASE (Instituto Brasileiro de AnálisesSociais e Econômicas) de preenchimento voluntário para seusassociados e que pode, atualmente, conferir para as empresas queproduzirem seus Balanços Sociais segundo seu modelo, o SeloBalanço Social Ibase (www.ibase.org.br). Criado em 1981 peloeconomista e sociólogo Herbert de Sousa, o Betinho, o Ibase é umainstituição de utilidade pública federal, sem fins lucrativos, semvinculação religiosa e a partido político. Sua missão é a construçãoda democracia, combatendo desigualdades e estimulando aparticipação cidadã. Ele conta, desde 1997, com um banco de dadosde Balanços Sociais produzidos segundo seu conjunto de indicadorescomposto de dezenas das principais empresas do Brasil.

O Instituto Ethos de Responsabilidade Social tambémdesenvolveu e coloca à disposição da sociedade um conjunto deindicadores que permite às instituições realizarem em autodiagnósticode sua situação em termos de responsabilidade social bem como dámeios para a elaboração de um Balanço Social. Os indicadores Ethosde Responsabilidade Social são uma ferramenta de uso essencialmenteinterno, que permite a avaliação da gestão no que diz respeito àincorporação de práticas de responsabilidade social, além doplanejamento de estratégias e do monitoramento do desempenho

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geral da empresa (www.ethos.org.br ). Os indicadores abrangem ostemas Valores, Transparência e Governança, Público Interno, MeioAmbiente, Fornecedores, Consumidores e Clientes, Comunidade eGoverno e Sociedade.

Para comparar seus resultados com as melhores práticas deresponsabilidade social empresarial, a instituição deve enviar seusresultados ao Instituto Ethos. Os dados fornecidos pelas empresas eos relatórios de “benchmarking” elaborados pelo Instituto Ethos sãotratados com a máxima confidencialidade. O Instituto Ethos estádesenvolvendo indicadores setoriais, sendo que para alguns setores jáhá indicadores específicos. A partir de 2004 está havendo um processode integração dos Indicadores Ethos de RSE com iniciativas similaresde grande relevância como o Pacto Global, as Metas do Milênio, asDiretrizes para Relatórios de Sustentabilidade do GRI (Global Reporting

Initiative), com a Norma SA8000 (Social Accountability 8000) do SAI(Social Accountability International) e com a Norma AA1000(Accountability 1000) do ISEA (Institute of Social and Ethical

Accountability). Em 2005 cerca de 600 das maiores empresas do Brasilenviaram seu autodiagnóstico constando, portanto do Banco deDados do Instituto Ethos. A SA8000 é a primeira norma voltadapara a melhoria das condições de trabalho, abrangendo os principaisdireitos dos trabalhadores e é passível de certificação quanto ao seucumprimento por meio de auditores independentes.

GRI – “A JÓIA DA COROA”

Tendo lançado sua primeira versão em 2000, a Global Reporting

Initiative (GRI) lançou em outubro de 2006 sua terceira versão,conhecida como G-3, dos indicadores para relatórios ou Balanços deSociais ou ainda mais precisamente Balanços de Sustentabilidade. Omodelo desenvolvido pelo GRI já é, sem dúvida, o padrãointernacional para Balanços Sociais ou de Sustentabilidade. Asdiretrizes do GRI foram projetadas para incentivar o aprendizado e aresponsabilização (“accountability”). O propósito do GRI é fornecerum arcabouço para os relatórios de sustentabilidade que fortaleça as

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ligações entre os aspectos ambientais, econômicos e sociais dodesempenho de uma instituição / empresa / corporação.

Da mesma maneira que os relatórios financeiros, o GRIidentificou e incorporou uma série de características qualitativas quefortalecem a credibilidade dos dados que são reportados, a saber:• Relevância – para grupos de usuários com necessidades e

expectativas diversas;• Confiabilidade – livre de “bias” e erros materiais;• Inteligibilidade – para usuários informados;• Comparabilidade – para possibilitar monitoramento e

“benchmarking”;• Temporalidade – para identificar tendências e resultados de forma

expedita;• Verificável – fortalecer a credibilidade da informação reportada.

Pode-se afirmar que estamos vendo o emergir de uma nova eraem responsabilização e relatórios corporativos com a utilização dessearcabouço que permite avaliar o seu desempenho econômico, sociale ambiental – as três dimensões da sustentabilidade. A grande chavedo sucesso e aceitação mundial do GRI está no seu processo degeração, validação e legitimação dos indicadores a partir de umconsenso mundial com os mais diversos “stakeholders”, inclusive noBrasil (www.globalreporting.org ).

Indicadores para Índices (de Sustentabilidade)

Neste grupo encontram-se os indicadores componentes dosíndices utilizados pelas instituições financeiras especialmente as domercado de capitais como as Bolsas de Valores de São Paulo (ISE), ade Nova York (DJSI), a de Londres (FTSE4good) e a da África do Sul(JSE). Diferentemente dos indicadores para relatórios, onde há semprea possibilidade de se colocar notas explicativas quando algum aspectodeixar pontos de dúvida, os indicadores do ISE, por exemplo, sãocompletamente objetivos pois devem ser relatados ou respondidosindependentemente - via eletrônica, não havendo portantopossibilidade de dubiedades ou notas explicativas.

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Vale ressaltar que também no ISE, como no GRI, o processode construção dos indicadores não prescindiu de ampla consulta aosmais diversos grupos de interesse (stakeholders) que os validaram elegitimaram. É muito importante notar também que os indicadoressão dinâmicos, devendo ser revistos e atualizados periodicamente vistoque tratam de questões ligadas a avanços socioambientais e de aspectoseconômico-financeiros cuja natureza e amplitude ainda estão sendocompreendidas e assimiladas pelas empresas. O ISE, lançado no finalde 2005 já está revisto, e as empresas candidatas ao portfólio de2006 das empresas mais sustentáveis do Brasil já estão preenchendoum novo questionário com os indicadores que compõe este índice(www.bovespa.com.br/pdf/indices/ISE ).

Índices de Sustentabilidade no Mundo

Mantendo a liderança em índices, a Dow Jones foi o primeirogrande grupo do setor a incorporar sustentabilidade aos seus produtos.O Índice Dow Jones de Sustentabilidade (Dow Jones Sustainability Index

- DJSI) foi lançado em 1999 pela Dow Jones Indexes e a SAM(Sustainable Asset Management), gestora de recursos da Suíçaespecializada em empresas comprometidas com responsabilidadesocial, ambiental e cultural. O índice, que acompanha a performancefinanceira de empresas consideradas líderes no campo dodesenvolvimento sustentável, incluiu 318 empresas de 24 países naedição referente ao período 2004-2005. A seleção das companhiasparticipantes do índice é feita a partir de um amplo questionárioelaborado pela SAM centrado nos aspectos de desempenho ambiental,inovação, governança corporativa, relações com investidores ecomunidade em geral. O DJSI utiliza uma metodologia conhecidacomo “Best in Class” através da qual são selecionadas as empresas commelhor desempenho em cada um dos setores econômicos, excluindo-se apenas empresas do setor de defesa, com faturamento acima de50% oriundo da venda de armas (www.sustainability-indexes.com ).

Acompanhando de perto a experiência americana, a Bolsa deLondres e o Financial Times lançaram o FTSE4Good (www.ftse.com/

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ftse4good/ ) em 2001. A série, composta por quatro índices, foidesenvolvida pela empresa de pesquisa EIRIS e mede o desempenhode empresas na Inglaterra, Europa, América e resto do mundoutilizando critérios que envolvem meio ambiente, direitos humanose engajamento de stakeholders definidos pelo índice. Nesse índiceentram apenas empresas que atendam certas medidas pré-estabelecidasde boas práticas quanto a questões ambientais, sociais e humanitárias.O FTSE4Good exclui as indústrias bélica, nuclear e tabagista.

A África do Sul foi o primeiro mercado emergente a incorporara sustentabilidade em seu mercado de ações. A Bolsa de Valores deJohannesburg (Johannesburg Stock Exchange - JSE) lançou em 2003 seuíndice SRI ( www.jse.co.za/sri ), inspirando-se fortemente noFTSE4Good Index. A maior diferença entre os dois índices é que aJSE não exclui empresas como dos setores de tabaco, álcool, jogosde azar, etc. Em vez de excluí-las, o JSE categoriza estas empresascomo de alto impacto. O rating é feito a partir de critérios sociais,econômicos, ambientais e de governança corporativa. Cada categoriaé subdividida em política, gerenciamento, desempenho, e reporting.Consulta pública e alguns critérios são considerados basilares e,portanto, a empresa deve necessariamente pontuar nestas categoriaspara ser incluída no ranking do JSE.

3. OS SEIS (6) PILARES DO ISE

(ÍNDICE DE SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL DA BOVESPA)

Além de credibilidade, diversidade é o outro elementofundamental para o mercado de ações. Diversidade é essencial, poisinvestidores têm necessidades variadas e na busca contínua dedesenvolvimento, a possibilidade de incluir elementos que venham adepurar riscos e maximizar retornos é sempre bem-vinda.

A história moderna da incorporação de princípios desustentabilidade ao mercado de ações remonta aos anos 60. Aefervescente década recheada de protestos e berço da chamadacontracultura foi também terreno fértil para que a ética associada aomercado de ações fosse questionada. Conceitos como

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responsabilidade social corporativa e prestação de contas à sociedadeou a atores específicos (accountability) tiveram aí sua origem, embaladospelas discussões sobre a Guerra no Vietnã, a luta pelos direitos civisnos EUA e igualdade de direitos das mulheres. Estes temas foramampliados nos anos 70, com as discussões sobre as condições e outrasquestões laborais e dos protestos anti-nucleares.

O mercado potencial para investimentos socialmenteresponsáveis ampliou-se durante os anos 80 e 90, catalisado por umacrescente presença de temas como racismo na África do Sul e grandesacidentes ambientais como o de Bhopal na Índia, Chernobyl na antigaUnião Soviética e Exxon Valdez no Mar do Norte. Esses desastresecológicos, como mudança climática global e degradação da camadade ozônio trouxeram o meio ambiente para o centro das discussões eo mercado de ações não ficou imune a elas.

Em 1997, os investimentos que levam em consideração critériossócias e ambientais, chamados de Socially Responsible Investing (SRI),acumulavam um total de US$ 1 trilhão de dólares. Com o lançamentodos índices DJSI (1999) e FTSE4good (2001) e o licenciamentocrescente de produtos atrelados a eles, em 2003 já eram contabilizados200 Fundos SRI, produtos desenhados para investidores modernoscom os mais variados perfis. Encontra-se aí desde fundos éticos ereligiosos, como fundos com bases técnicas de última geração atraindomais de US$ 2.3 trilhões em aplicações.

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A experiência brasileira com Investimentos SocialmenteResponsáveis (SRI) teve início em janeiro de 2001, quando oUnibanco lançou o primeiro serviço de pesquisa para fundos verdes.Os relatórios dessas pesquisas, que apresentavam informações sociaise ambientais de empresas listadas na BOVESPA, eram enviadosexclusivamente para fundos socialmente responsáveis (SRI) no exterior.No final de 2001, o Banco Real ABN Amro lançou os Fundos EthicalFIA, primeiros dois fundos SRI em mercados emergentes. De lá atéhoje, o Ethical I, dirigido ao varejo, apresenta um desempenho de148% contra 116% do Ibovespa para o mesmo período. Em 2004,o Banco Itaú lançou o Itaú Excelência Social, com foco específicoem desempenho na área de responsabilidade social corporativa.

A partir deste momento, questões como performancesocioambiental, transparência e governança corporativa passaram afazer parte do vocabulário de alguns gestores brasileiros que,

Fonte: First Affirmative Financial Network, LLC

$ 4 4 5

$1,232

$1,429

$1,702

$ 6 5 2 $ 6 5 7

$ 3 0 5

$ 7$ 8 4

$ 2 6 5

$ 6 6 1

$ 4 4 1

$ 4 $ 5 $ 8 $ 1 4

$1,185

$2,343

$2,159 $2,164

2 0 0 32 0 0 11 9 9 91 9 9 7$2,500

$1,500

$500

Advocacy OnlyScreening Only Screening &Advocacy

CommunityInvesting

Total

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anteriormente encarariam estes temas como excesso de romantismo.As crises éticas enfrentadas por gigantes internacionais como Enron eWorldCom mostraram a fragilidade de demonstrativos financeiros eauditores independentes na ausência de governança e transparência,o que alavancou ainda mais o setor de SRI.

A liderança de protagonistas como a Associação dos Analistas eProfissionais de Investimentos do Mercado de Capitais (APIMEC)incentivando o debate sobre sustentabilidade no mercado de capitaisfoi fundamental para que analistas de investimentos cada vez maisampliassem o escopo de suas análises. O quadro formado por esteselementos não deixa dúvidas sobre o estágio de amadurecimento dosetor financeiro e empresarial no Brasil, que conta ainda com umsólido apoio de organizações da sociedade civil que atuam na área definanças sustentáveis e responsabilidade corporativa.

Conectada aos grandes movimentos de segmentação nosmercados internacionais, a BOVESPA lançou o Novo Mercado e é aprimeira bolsa a unir-se aos signatários do Pacto Global das NaçõesUnidas. Como parte deste processo, e instigada pelo setor financeiroprivado que carecia de um benchmark para os novos fundos SRI, aBovespa propôs a criação de um grupo de trabalho (GT) para aelaboração de um índice de sustentabilidade. Esse GT multi-stakeholder constituiu-se inicialmente de representantes de instituiçõesprotagonistas em temas relativos à Responsabilidade Corporativa(RSC), Governança Corporativa (GC), Meio Ambiente e Mercadode Capitais. Mais tarde, com apoio financeiro do IFC (InternationalFinance Corporation), braço privado do Banco Mundial, esse GTacompanhou e validou os trabalhos do CES (Centro de Estudos emSustentabilidade) da FGV-EAESP entidade contratada para elaborare implantar a metodologia de cálculo do ISE. Com a implantaçãodo Índice, o GT foi então transformado no Conselho Deliberativodo ISE (CISE).

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Metodologia

Não houve exclusão sumária de setores econômicos no Índice.Na primeira – e única - vez em que o CISE (Conselho do Índice deSustentabilidade Empresarial) da BOVESPA deliberou sobre este temafoi decidido, pela maioria de seus 9 membros, pela não exclusãoprévia de qualquer setor. Isto não significa que empresas de tabaco,bebidas ou armamentos seriam selecionadas para o Índicenecessariamente. Significa apenas que estas empresas têm aoportunidade de preencher o questionário e participar da seleção. O“positive screening”, i.e., a não-exclusão por princípio de nenhum setor,representa hoje o formato mais adequado e mais avançado para aavaliação com vistas à criação de índices. Todos os elementos relativosà sustentabilidade de cada setor são avaliados em profundidade,incluindo potenciais riscos e impactos adversos associados à naturezados produtos e serviços de cada empresa.

A primeira carteira de ações do ISE, lançada em primeiro dedezembro de 2005 contou com 33 ações de 28 empresas selecionadasa partir de questionário específico (www.bovespa.com.br/pdf/indices/ISE) respondido pela maior parte das empresas de capital aberto cujasações são negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo. A metodologiapara cálculo do ISE foi estruturada em quatro níveis, a partir deDimensões, passando por Critérios, definindo Indicadores eassociando-os a Questões objetivas a serem respondidas pelas empresascandidatas ao portfólio de ações de empresas sustentáveis da Bovespa.

Dimensões do ISE

O ISE afere o desempenho das empresas emissoras das açõesmais negociadas na BOVESPA através de um questionáriofundamentado conceito do “triple bottom line”. Esse conceito consideraa avaliação integrada de elementos sociais, ambientais e econômico-financeiros. Por questões de relevância os aspectos de governançacorporativa foram destacados formando um quarto grupo deindicadores. Fiel aos princípios do “positive screening” os idealizadores

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do ISE criaram ou deram destaque a mais dois grupos de indicadores:a) critérios de natureza do produto, que considera se o produto daempresa acarreta danos ou riscos à saúde dos consumidores); b)critérios gerais, que levam em conta, por exemplo, se a empresa publicabalanços sociais e sua posição face os acordos globais como o Global

Compact ( www.globalcompact.org ).Como balizador e “benchmark” para fundos de natureza

semelhante, o ISE mede o retorno total de uma carteira teóricacomposta por ações de empresas comprometidas com sustentabilidade(número sempre menor ou igual a 40 empresas). Ações sem liquideznão são consideradas para inclusão no ISE, mas tão somente aquelasmais negociadas na BOVESPA são selecionadas e ponderadas (nacarteira) pelo valor de mercado das ações disponíveis para negociação.

Assim, o ISE é composto pelos papéis das empresas melhorclassificadas em termos de sustentabilidade e também de liquidez,cujos critérios de seleção e classificação são referendados pelo CISE(Conselho Deliberativo do Índice de Sustentabilidade Empresarial).

Critérios de Inclusão de Ações no Índice

Para integrar a carteira do ISE as ações devem atendersimultaneamente aos seguintes critérios:a) ser uma das 150 ações com maior índice de negociabilidade

apurados nos doze meses anteriores á reavaliação;b) ter sido negociada em pelo menos 50% dos pregões ocorridos

nos doze meses anteriores à formação da carteira;c) atender aos critérios de sustentabilidade referendados pelo

Conselho do ISE.

Critérios de Exclusão

a) Uma ação será excluída de índice, nas reavaliações periódicas, sedeixar de atender a qualquer uma dos critérios de inclusão;

b) Se, durante a vigência da carteira, a empresa emissora entrar emregime de recuperação judicial ou falência, as ações de sua emissão

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serão excluídas da carteira do índice. No caso de oferta públicaque resultar em retirada de circulação de parcela significativa deações do mercado, suas ações serão excluídas da carteira. Nessaseventualidades, deverão ser feitos ajustes necessários para garantira continuidade do índice.

c) Se, durante a vigência da carteira, ocorrer algum acontecimentoque altere significativamente seus níveis de sustentabilidade, o CISEpoderá decidir pela exclusão desta ação da carteira do ISE.

Critério de Ponderação

O ISE mede o retorno de uma carteira teórica composta pelospapeis que atenderem a todos os critérios discriminadosanteriormente, ponderados pelo respectivo valor de mercado – notipo pertencente à carteira – de suas ações disponíveis para negociação(“free-float”), ou seja, serão excluídas as ações de propriedade docontrolador.

A participação de uma empresa no ISE (considerando todos ostipos de ações da empresa, se for o caso) não poderá ser superior a25%, quando das reavaliações periódicas. Caso isso ocorra, serãoefetuados ajustes para adequar o peso da empresa a esse limite.

A base do ISE foi fixada em 1.000 pontos na data de 30 denovembro de 2005, e suas divulgação teve início em 01 de dezembrode 2005. Para adequar-se à base inicial, o valor de mercado da carteirafor ajustado por um redutor (coeficiente de ajuste) designado por ana fórmula do índice ou seja:

Índice Inicial = Valor da Carteira / a = 1.000

O redutor do índice pode ser alterado sempre que necessáriopara acomodar inclusões ou exclusões de ações na carteira quandoocorrerem rebalanceamentos periódicos ou quando ocorrerem ajustesdecorrentes de proventos /eventos concedidos elas empresas de formaa que o índice se ajuste automaticamente. O peso específico de cadaação no índice poderá alterar-se ao longo da vigência da carteira, em

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função da evolução dos preços de cada ação e/ou da distribuição deproventos pela empresa emissora.

Quando da distribuição de proventos por empresas emissorasde ações pertencentes ao índice, serão procedidos ajustes para assegurarque o índice reflita não somente as variações das cotações da ação,como também o impacto da distribuição dos proventos. Em funçãodesta metodologia, o ISE é considerado um índice que avalia o retornototal (“total return”) das ações componentes da sua carteira.

Cálculo do Índice

A BOVESPA calcula o ISE ao longo do período regular denegociação, considerando os preços dos últimos negócios efetuadosno mercado à vista (lote-padrão) com ações componentes da suacarteira.

Suspensão de Negociação

No caso de suspensão de uma ação componente, o índiceutilizará o preço do último negócio registrado em bolsa, até anormalização dos negócios com o papel. Não havendo liberação paranegociação por 50 dias, a contar da data da sua suspensão, ou emcaso de ausência de perspectivas de reabertura dos negócios ou derebalanceamento da carteira, a ação será excluída da carteira. Nestaeventualidade, serão efetuados os ajustes necessários para garantir acontinuidade do índice.

Ajustes em Caso de Cisão e de Incorporação de Empresas

A situação de uma empresa componente do ISE que fizer umacisão ou incorporação será analisada caso a caso pelo Conselho doÍndice.

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Ajuste em Caso de Ofertas Públicas de Aquisição de Ações

Sempre que uma empresa efetuar uma oferta pública que resultena aquisição de parte expressiva de suas ações em circulação, aBOVESPA adotará um dos dois procedimentos a seguir:a) retirar do índice o percentual do capital em circulação que foi

comprado pela empresa; oub) retirar a ação do índice.

Em qualquer dos dois casos, será efetuado em ajuste no redutor(a) do índice.

Estrutura do ISE

Cada um dos três grupos temáticos clássicos (Dimensões noISE), o ambiental, social e o econômico-financeiro (o tradicional TBL)são compostos por quatro conjuntos de Critérios, a saber:a) Políticas (indicadores de comprometimento)b) Gestão (indicadores de programas, metas e monitoramento)c) Desempenho (indicadores para refletir a qualidade e eficácia da

Gestão)d) Cumprimento Legal ou “compliance” (se as políticas são corretas,

a gestão é competente e o desempenho é excelente, então não hárazão para que a empresa apresente desconformidades legais ouseja marcada por ações dessa natureza).

As demais Dimensões (Natureza do Produto, Geral eGovernança) também estão estruturadas a partir de determinadosCritérios. Cada um desses Critérios é representado por um conjuntode Indicadores traduzidos por Perguntas objetivas, sendo que o pesode cada Dimensão é igual (todas somam 100 pontos no final). Apenasa Dimensão Ambiental apresenta Indicadores e Perguntas diferentesconforme a natureza do negócio. Assim, as instituições financeirasrespondem a um questionário diferente das demais empresas quesão, por sua vez, divididas em empresas de alto impacto ou empresasde impacto (ambiental) moderado. A Dimensão de Governança

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Corporativa apresenta indicadores de melhores práticas organizadosem Propriedade; Conselho de Administração; Gestão; Auditoria eFiscalização; e Conduta e Conflitos de Interesses. Nesta dimensãoforam considerados transversalmente os princípios de transparência,equidade e prestação de contas definidos pelo Código de MelhoresPráticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa(www.ibgc.org.br ).

Internacionalmente, o mercado de capitais é hoje um poderosoindutor de práticas uma vez que se constitui numa fonte importantede recursos. Apesar das reduzidas proporções do mercado nacional,existe um trabalho forte e contínuo para sua ampliação e,possivelmente, o ISE será um poderoso instrumento de incentivo àsmelhores práticas no setor empresarial brasileiro. Mas é preciso ficarclaro que o índice de sustentabilidade empresarial da Bovespa é antesde tudo um indicador de desempenho de líderes, não apenas daquelescom as melhores práticas neste ou naquele aspecto. Ele representaum portfólio de vencedores no longo prazo. Uma carteira de empresasque estão prontas para enfrentar desafios planetários emultidimensionais sem perder o foco em seu negócio, respeitandofornecedores, público interno, clientes, acionistas, a comunidade e omeio ambiente.

A tendência é que este portfólio tenha um desempenhoeconômico financeiro acima do Ibovespa, seguindo os exemplos doDJSI e do próprio Fundo Ethical do Banco Real ABN AMRO.

Responsabilidade social, gestão ambiental de excelência,melhores práticas de governança corporativa e performance financeirasão variáveis altamente correlacionadas. Em geral, empresas queapresentam estas características minimizam riscos e passivos sócio-ambientais, desfrutam de acesso a crédito mais rápido e barato, têmmenores custos de seguro, apresentam um melhor climaorganizacional, têm maior lealdade do consumidor, retêm e atraemmelhores talentos, valorizam a imagem institucional e diminuemconflitos. Portanto: criam valor contribuindo para a sua perenidadee para o desenvolvimento sustentável da sociedade.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1)Emerson, J. 2003, “The Blended Value Proposition: Integrating Socialand Financial Returns”, California Management Review, Vol. 45, No.4, Summer.

2)Emerson, J.2003, “The Blended Value Map”: http://www.hass.berkeley.edu/NEWS/cmr.

3)Gladwin, T.N., Kennelly, J.J. e Krause, T.S. 1995, “Shiftingparadigms for sustainable development: Implications for managementtheory and research”, Academy of Management Review, vol. 20, no4,pg.874-907.

4)Purser, R.E., Park, C., e Montuori, A. 1995, “Limits toanthropocentrism: Toward an ecocentric organization paradigm?”Academy of Management Review, vol. 20, pg. 1053-1089.

5)Starik, M. e Rands, G.P. 1995, “Weaving an integrated web:Multilevel and multisystem perspectives of ecologically sustainableorganizations”, Academy of Management Review, vol.20, pg. 908-935.

6)World Comission on Environment and Development (WCED)1987, “Our Common Future”. Oxford: Oxford University Press.

7)Van den Bergh, J. e van der Straaten, J. 1994, “Toward SustainableDevelopment”. Washington, D.C. Island Press.

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GLOBALIZAÇÃO, NOVAS

TECNOLOGIAS E COMUNICAÇÃO

NAS ORGANIZAÇÕES

JOSÉ MARIA CARVALHO FERREIRA1

Falar ou escrever numa perspectiva analítica ou científica sobreas contingências da globalização e das novas tecnologias, no que sereporta à comunicação nas organizações, tornou-se um dilemahistórico irredutível.

Vários factores se conjugam para essa admissibilidade. Emprimeiro lugar, a natureza das mudanças originadas pela sociedade dainformação e da sociedade em rede (Castells, 2002; 2003a; 2003b).Em segundo lugar, a complexidade e o carácter abstracto do trabalhosocial que integra os mecanismos automáticos das novas tecnologiase as suas correspondentes manifestações em termos da socializaçãoda informação, que orienta e dá sentido à vida quotidiana dosindivíduos e grupos que constituem as sociedades contemporâneas.Para além disso, essa complexidade e abstracção do trabalho socialcoagulado nas novas tecnologias permite que o trabalho na suafuncionalidade organizacional se manifeste empiricamente numamultiplicidades de redes locais, regionais, nacionais e mundiais. Emterceiro lugar, o tempo real e o tempo virtual coincidem, cada vezmais, em termos espaciais e temporais, com a socialização dainformação correlacionada com a localização e deslocalização das

1. Professor Catedrático e Investigador do SOCIUS, Instituto Superior de Economiae Gestão, Universidadede Ténica de Lisboa. [email protected]

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actividades económicas e financeiras inscritas nos ditames daracionalidade instrumental do capitalismo.

Nesta assunção, do mesmo modo que temos que compreenderos contornos geográficos, territoriais, económicos, políticos, sociaise culturais que enformam a globalização, devemos, por outro lado,perceber e explicar as suas articulações, interdependências ecomplementaridades com as novas tecnologias. Estas, por sua vez, sósão passíveis de serem interpretadas e explicadas se as analisarmoscomo expressão genuína de uma criação humana que integra energia,conhecimento e informação. As linguagens das novas tecnologias,por sua vez, para serem codificadas e descodificadas, só podem servivificadas pelas cognições, emoções e comportamentos de qualquerser humano. Este, enquanto factor de produção de bens e serviçosnas organizações, ao executar qualquer tarefa ou função, ao preencheros requisitos dos papéis prescritos pela autoridade hierárquica formale pela divisão do trabalho, só pode subsistir se for emissor e receptorde informação. Pela sua incidência analítico-simbólica, cada actorindividual e cada actor colectivo é constrangido a interagir através dequalificações e competências comunicacionais.

A comunicação nas organizações, pelas razões descritas, assumeuma importância crucial no funcionamento de qualquer organização,na estrita medida em que a sua plasticidade social é visível, não só nasrelações interpessoais, intragrupais, intergrupais e intraorganizacionais,mas também porque está cada vez mais presente na estimulação eorientação dos comportamentos reportados à execução de tarefas,ao processo de tomada de decisão e ao processo de liderança.

1. GLOBALIZAÇÃO E NOVAS TECNOLOGIAS

Não obstante o tema da globalização funcionar já como umtema recorrente nos meios académicos e nos “mass media”, a suapertinência analítica não está de forma alguma esgotada. Não é este olugar para incidir a nossa análise em termos das visões maniqueístas edicotómicas a que habitualmente somos confrontados. Os conteúdose as formas da globalização, nesta óptica, são quase sempre

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diabolizados ou deificados. Ou são absolutamente maus e perversosou são absolutamente bons e positivos. Ideologias, religiões, valores,crenças, culturas e modelos de sociedades contrastantes assumem-sea favor e contra a globalização como se todas as causas e os efeitosgerados por esta estivessem totalmente identificados com amultiplicidade de imaginários colectivos que servem de projecção aessas ideologias, religiões, crenças, culturas ou a esses valores e modelosde sociedades contrastantes.

Vários factores estão na origem e no desenvolvimento daglobalização (Soros, 1999; Robertson, 2000; Wallerstein, 1979;Waters, 2002). Entre outros, há que analisar em primeiro lugar, opapel relevante das empresas transnacionais nas actividades deprodução, distribuição, consumo e troca de bens e serviços. Apadronização espacio-temporal dos bens e serviços que são vendidosno mercado formal e no mercado informal é o sintoma inequívocoda força estruturante do actual modelo de produção e consumo emmassa de mercadorias, baseado no sector terciário. Este modelo épersonificado pelas actividades das empresas transnacionais que estão,ainda, em parte, ligadas ao sector industrial fordista – automóveis,química, metalurgia e têxteis. Todavia, progressivamente, são cadavez mais a expressão de actividades económicas que se reportam àinformática, à micro-electrónica, à biotecnologia, à telemática e àrobótica. A produção destes bens e serviços é, em grande parte,produto de um tipo de conhecimento e de informação decorrentede novas modalidades de adaptação do factor trabalho às novastecnologias. São bens e serviços estruturados pelas tecnologias deinformação e de comunicação que permitem, em tempo real, a nívelmundial, padronizar as modalidades de produção e distribuição deconsumo corrente, como são os casos da alimentação, vestuário,habitação, bebidas, mas também serviços de natureza imaterial, ouainda da informática, da cultura, da informação, do conhecimento,da publicidade e do lazer (Goldfinger, 1998).

Em segundo lugar, a crescente integração da ciência e da técnicano quadro da racionalidade instrumental do capitalismo permitiuuma crescente racionalização da organização do trabalho. A capacidade

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inaudita de deslocalização territorial das novas tecnologias, da energia,da informação e do conhecimento personificados no factor deprodução trabalho, ao mesmo tempo permitem uma aproximaçãoquase infinita ou fazem coincidir o tempo virtual com o tempo real,permitem, por outro lado, um incremento gigantesco daracionalização da organização do trabalho à escala mundial,nomeadamente nos domínios da divisão do trabalho, dos níveishierárquicos da autoridade formal, dos processos de decisão e deliderança nas organizações (Ferreira, et al., 2001). Os métodos deconcepção, de planeamento e de controlo sobre o factor de produçãotrabalho complexificam-se e tornam-se cada vez mais abstractos.Perante os constrangimentos da competitividade e da concorrência,impostos pelo dinamismo das empresas transnacionais, assiste-se àgeneralização da polivalência, flexibilidade e, recentemente, daimprobabilidade, como formas de gestão e de racionalização doprocesso de trabalho e da organização do trabalho, como implicaçõesmanifestas no acréscimo de produtividade do factor de produçãotrabalho. Como resultado dessas tendências, as qualificações ecompetências do factor de produção trabalho, adstritas à execuçãode tarefas concernentes ao modelo de organização do trabalhotaylorista-fordista vão sendo progressivamente objecto de mudançasqualitativas e quantitativas (Boyer, 1986; Kergoat, et al, 1998). Estatendência espacio-temporal do modelo emergente de organização dotrabalho no processo de globalização das sociedades, ao mesmo tempo,permite que as formas de dominação e de exploração sobre o trabalhoassalariado se realizem num sistema de redes a nível local, regional,nacional e mundial. As empresas transnacionais podem usufruir,assim, de uma estrutura de custos de produção baseada em saláriosbaixos e diferenciados, da mesma forma que podem beneficiar debenefícios fiscais e da inexistência de regulamentação laboral e sindicalem países capitalistas menos desenvolvidos, como é caso emergenteda China. Os custos de produção, sendo diferenciados, permitemque a localização e deslocalização territorial de investimentos, decapitais, de tecnologias se realizem em tempo real e que asmodalidades de contrato de trabalho com duração temporária e a

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tempo parcial, e sobretudo contratos de trabalho atípicos segeneralizem à escala mundial (Boltanski e Chiapello, 1999; Pinard,2000).

Em terceiro lugar, perante a força avassaladora das actividadesdas empresas transnacionais, o Estado-Nação perde a sua capacidadede intervenção na regulação e controlo das actividades económicas,sociais, políticas e culturais. Incapaz de contrariar a crise que atravessa,limita-se, em muitos casos, a intervir na política administrativa e nasegurança do seu território nacional. Todavia, nem nestes domíniosé proficiente. A excessiva burocratização e centralização do aparelhode Estado, nas áreas da saúde, da segurança social, da política, daeducação, do crime e da violência, gera uma perda de credibilidade ede legitimação junto da sociedade civil (Rosanvallon, 1995). Por outrolado, em termos de segurança dos indivíduos e grupos que constituema sociedade civil e da perda de legitimidade político-administrativa, oEstado-Nação, para superar a crise endémica que atravessa, vaiabdicando da soberania que exercia sobre o seu território, funçõesque deram origem à formação de instituições e de organizaçõestransnacionais poliformes: ONU, OMC, NATO; Banco Mundial,FMI; UE, NAFTA, Mercosul, etc.

Em grande medida, a perda de legitimidade e de influência doEstado-Nação pode deduzir-se da crise política de governação e dosistema de representatividade formal assente nos princípios e naspráticas da democracia representativa. No entanto, esta crise éacompanhada pela crescente desintegração do modelo de produçãoe de consumo em massa de tipo fordista. É um facto incontestávelque Estado-Nação exerceu um papel preponderante nos domíniosda repartição de rendimentos, da protecção social, da políticaeconómica e na regulamentação das relações entre o capital e otrabalho, toda essa força estruturante é devida à capacidade deprodução de riqueza social no período histórico dos “trinta anosgloriosos” do capitalismo (Lallement, 1994). Todavia, desde entãopelas razões já sublinhadas tem-se assistido à perda de legitimidadedo Estado-Nação e da sua influência sobre a sociedade civil, porquea crise do modelo fordista não lhe permite aceder à riqueza social

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que é imprescindível para manter as políticas sociais e políticaseconómicas de um Estado-Providência. Não admira assim, que muitasdas suas funções e tarefas relativas ao controlo e regulamentação domercado de trabalho fossem drasticamente atenuadas ou extintas..

Em quarto lugar, enquanto força de estimulação da globalização,devemos referir a queda do muro de Berlim. A importância destefacto emerge fundamentalmente na abertura das fronteiras dos paísesque tinham enveredado pelo socialismo de tipo soviético ao comérciomundial e ao mercado de trabalho. A oportunidade histórica degeneralizar as relações sociais de produção capitalistas e, portanto, decapitalizar a socialização e a sociabilidade de centenas de milhões detrabalhadores assalariados, transforma radicalmente as potencialidadesde expansão da dominação e da exploração capitalista à escalamundial. Vencido o modelo socialista de tipo soviético, acabavam asresistência de um capitalismo de Estado que tinha sobrevivido durante7 décadas. O imaginário colectivo que congregava partidos de esquerdae de extrema-esquerda na luta contra o capitalismo, como resultado,extinguiu-se progressivamente. O capitalismo de mercado viu, enfim,a hipótese histórica de constituir-se como o “único” paradigmasocietário credível para a espécie humana no planeta Terra.Simultaneamente, centenas de milhões de milhar de novosconsumidores e de produtores dos países que tinham enveredadopelo socialismo de tipo soviético expandem as capacidades produtivasdas empresas transnacionais, nomeadamente através da implantaçãode novos mercados, novas tecnologias, fábricas, bancos, bens e serviçosdo sector terciário.

Por último, pode afirmar-se que o crescendo das TIC se temmanifestado como um dos grandes factores da visibilidade social daglobalização, nomeadamente no que concerne as actividadeseconómicas e financeiras, assim como a sua influência estruturanteno campo das actividades sociais, culturais e políticas. A constituiçãode redes de informação e de comunicação à escala mundial, não sendosemelhante em todos os países, permite, no entanto, que se materializeum modelo padrão de codificação e descodificação de linguagens,cujas simbologias e significados, implicam a adopção da mesma

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tipologia de valores, de moral, de política, de relações sociais e deprocessos de aculturação e de socialização. No imediato, contrariandoessa evolução hegemónica, emergem movimentos sociais de resistênciaà implementação do modelo padrão de globalização capitalista. Emgrande medida, os conflitos provocados pelos integrismos religiosos,as lutas nacionalistas, traduzidas nas guerras de tipo regional e local,e bem assim, os movimentos sociais de incidência mundial contra aglobalização são a expressão genuína dessa evolução. Claro que oprocesso de aculturação e os valores subjacentes à globalização incidemna transformação do homem num objecto de produção e de consumode mercadorias. O dinheiro, a competição e a concorrência,corporizados na luta pela sobrevivência do trabalho assalariado,tornam-se os valores primaciais que dão sentido e consistênciaidentitária aos indivíduos e grupos que habitam o planeta Terra. Nãoadmira, assim, que a grande massa dos indivíduos e dos grupos sociaisintermédios das sociedades capitalistas desenvolvidas, se transformemem objectos de adaptação dos desígnios normativos da globalização.A plasticidade social da influência dos “mass media”, da cultura, dolazer e do consumo é, nesse aspecto, deveras significativa.

Por outro lado, é necessário ter presente que as TIC têm umgrande impacto no processo de trabalho e na sua organização. Par oefeito, basta pensarmos nas mudanças cognitivas, emocionais ecomportamentais que resultam da exigência de novas competênciase qualificações do factor de produção trabalho em relação às funçõese tarefas que o constrangem a protagonizar papéis idênticos a umsistema processador de informações, nomeadamente no que se refereàs exigências de descodificação e codificação de linguagens analítico-simbólicas decorrentes da informação veiculada pelas novas tecnologias.

Após ter analisado os contornos dos principais factores queestimulam a evolução das sociedades no sentido da globalização,interessa agora perceber até que ponto se podem descrever os cenáriosprobabilísticos da globalização no futuro, nos domínios da economia,da política, da cultura e da sociedade.

Como realidade económica, a globalização é visível através deum sistema financeiro que tem capacidade de socializar o capital e o

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dinheiro em tempo real à escala mundial. As grandes metrópolesfinanceiras sedeadas em Nova Iorque, Londres e Tóquio, entre outras,lideram esse processo, através de uma rede sofisticada e abstracta,decidindo das formas e dos conteúdos das actividades bolsistas, dalocalização e deslocalização dos investimentos, das aquisições,concentrações e fusões dos grandes grupos económicos e, logicamente,da formação e expansão de uma rede de empresas transnacionais(Castells, 1998, 2002). Por força determinante das novas tecnologiase das mudanças operadas na organização do trabalho, assiste-se àpadronização das modalidades de produção, distribuição, troca econsumo de mercadorias.

As empresas transnacionais actuam no quadro da racionalidadeinstrumental do capitalismo, onde a competição e a concorrênciasão mais desenfreadas e sobretudo o sentido da maximização do lucroé a finalidade máxima das iniciativas do sistema financeirointernacional. O imaginário “lucrativista” dos accionistas deste tipode capital reside no curto prazo, em investimentos, na venda e comprade acções propiciadoras de enriquecimento fácil. É uma espécie decapitalismo abstracto que não tem rosto, mas tem uma expressãosignificativa na vida quotidiana das organizações e dos actuais epotenciais trabalhadores assalariados de todo o mundo (Sennett,2001). Perante as evidência empíricas já demonstradas (Paugam,2000), não há duvida de que, por via do impacto das fusões,concentrações e aquisições do sistema financeiro internacional,assistimos ao aumento drástico do desemprego, da precariedade dosvínculos contratuais, da pobreza e da exclusão social. A desgraça deuns é privilégio para outros (Luttak, 2000). Tudo isso, no entanto,não impede que se desenvolva um imaginário colectivo, baseado noconsumo padrão, desenvolvido pelo sistema financeiro internacional,em articulação estreita com a capacidade de localização e deslocalizaçãodas grandes empresas transnacionais a nível local, regional, nacional emundial. A criação e expansão do sistema financeiro internacionalatravés da expansão de empresas transnacionais não se coaduna comos limites territoriais e político-administrativos do Estado-Nação.Perante a força estruturante da globalização, o Estado-Nação é

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substituído paulatinamente nas suas funções clássicas de regulação econtrolo das políticas económico-financeiras por instituições estataistransnacionais – FMI, OMC, UE, NAFTA, Mercosul. No fundo,estas instituições não são mais do que uma tentativa histórica parasuperar a manifesta incapacidade do Estado-Nação em controlar eregulamentar uma realidade económica que importa sobremaneiraracionalizar à escala transnacional.

Enquanto que no domínio económico-financeiro a globalizaçãoevolui de forma imparável (Soros, 1999), em relação à actividadepolítica subsiste ainda uma série de condicionalismos. A crise deidentidade e de legitimidade da actividade política como vocação eprofissão, expressa na inexistência de modelos de sociedadescontrastantes e na degradação da vocação profissional, inscrita emtarefas políticas nos partidos e na governação das instituições estatais,revela-se um facto que tende a generalizar-se. A crise de legitimidadedas funções legislativas, executivas e jurídicas, subjacentes à governaçãodo Estado-Nação, é cada vez mais evidente. Por outro lado, perante ageneralização de conflitos à escala local, regional e nacional, o Estado-Nação revela uma manifesta incapacidade político-administrativa emilitar de controlar os conflitos que emergem no seu território. Osconflitos recentes e actuais no Kosovo, Burundi, Afeganistão, Iraque,Angola, Timor Leste, Ruanda, Médio Oriente, Sudão, etc., são umademonstração inequívoca dessa tendência. Perante a manifestaincapacidade do Estado-Nação em resolver os múltiplos conflitosque actualmente se desenvolvem nos seus territórios, nada mais lheresta do que abdicar de grande parte do poder de regulação e controloda violência que detinha sobre a sociedade civil. Perante este cenáriode fragilização institucional e de legitimação, o Estado-Nação vê-seconstrangido a adaptar-se e integrar-se numa rede de poder e controlotransnacional. Enquanto tendência e probabilidade, é sem dúvidaum tipo de evolução política padrão que se identifica com ospropósitos hegemónicos e normativos da globalização. A implantaçãode um modelo de democracia representativa identificado com osdesígnios das empresas transnacionais e, necessariamente, dos EUA edos países capitalistas mais desenvolvidos revela-se, assim, a solução

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mais adequada. Esta tendência configura-se na expansão e hegemoniade um poder político-militar transnacional: ONU, NATO, etc. Nocontexto dos modelos políticos contrastantes, sob a liderança doEUA e da UE, a força do modelo de democracia representativa revela-se, por tais motivos, como a solução mais adequada aos objectivosde expansão da globalização.

No que concerne à situação social decorrente do processo deglobalização em curso, denota-se que os seus efeitos são cada vezmais relevantes na vida dos indivíduos e grupos que trabalham nasorganizações que integram as sociedades contemporâneas. É evidenteque os efeitos da globalização são diferentes no que toca os paísescapitalistas desenvolvidos e os outros menos desenvolvidos. Todavia,nos grandes centros urbanos desenvolve-se um processo deindividualização e de atomização dos indivíduos, que se traduz naperda de referências éticas e morais, gerando a destruição progressivados valores assentes na solidariedade, na liberdade e na cooperação.Sem um sistema de representações colectivas suficientementeintegrador e estabilizador da ordem social, é natural observar umatendência crescente dos fenómenos sociais relacionados com o crime,a violência, a droga e a marginalidade social. Por outro lado, face àinexistência de um Estado-Providência com políticas de protecçãosocial visíveis na segurança social, na educação, na saúde e na habitação,não admira que se desenvolvam fenómenos tendentes ao aumentodo desemprego, da miséria, da pobreza e da exclusão social (Dupas,1999). A desintegração progressiva dos corpos sociais intermédios dasociedade civil – família, instituições religiosas, partidos, sindicatos eempresas – levam também à destruição dos laços de referência, departilha e de pertença dos indivíduos, no seio dos diferentes corpossociais intermédios, gerando situações de conflito, de anomia sociale de crise em relação aos sistemas de representação colectiva dasociedade.

Em termos sociais é importante também referir o trabalho e oemprego como elementos nucleares do processo de sociabilidade ede socialização dos indivíduos e dos grupos. O espaço-tempo dasactividades relacionados com o trabalho e o emprego são significativos

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para dinamizar relações sociais conducentes à integração social.Todavia, as manifestações perversas da globalização têm destruído asbases de socialização que resulta do trabalho assalariado assente naestabilidade intelectual, psíquica e física. O sentido criativo e asatisfação inerente às actividades do trabalho deterioram-se, ao mesmotempo que o posto de trabalho e a remuneração monetária decorrentesda vinculação contratual através do emprego sofrem uma erosãosistemática (Eme e Laville, 1994). Na estrita medida em que os laçossociais são extintos, quando não se trabalha ou não se tem umemprego para sobreviver, a exclusão social e a pobreza resultam numfenómeno migratório exponencial. Nesse aspecto, verifica-se que aglobalização está a provoca um desenvolvimento do processo deemigração, cujos contornos são difíceis de prever.

A globalização, na perspectiva cultural, é atravessada por umatendência que se corporiza na padronização dos significados veiculadospela força estruturante das TIC. Efectivamente, a simbologiacomunicacional das novas tecnologias leva a um processo de interacçãopadronizado entre os indivíduos e grupos na emissão, transmissão erecepção de informações que integram a sua vida quotidiana. Arepetição sistemática dos mesmos comportamentos, dos mesmosestímulos-respostas, reportados a um conjunto padrão de signos esignificados, leva necessariamente a um modelo padrão de codificaçãoe descodificação de linguagens com repercussões manifestas noprocesso de aculturação dos indivíduos e grupos que constituem associedades contemporâneas (Featherstone, 1998). É evidente queexistem ainda grandes diferenças nesse processo de aculturação,sobretudo se tivermos presente as diferenças de desenvolvimento daracionalidade instrumental do capitalismo entre os vários continentesdo planeta Terra. Não obstante, estando empregado oudesempregado, sendo pobre, miserável ou rico, todos os seres humanossão bombardeados no seu quotidiano por milhares de estímulosque têm a mesma origem e o mesmo significado cultural: guerra,crime, violência, catástrofes naturais, publicidade de bens e serviçosde todo o tipo.

Quando a informação e a comunicação se integram, através deum processo simbiótico, corporizam-se necessariamente em conteúdos

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e formas comportamentais que resultam da energia, do conhecimentoe da informação dos indivíduos nas múltiplas relações sociais quedinamizam nos locais de trabalho, na família, nos grupos de referência,nos bairros das cidades onde habitam, nos cafés ou jardins quefrequentam. Na actualidade, o imaginário individual e colectivo dosindivíduos e dos grupos é mediatizado pela força estruturante dasnovas tecnologias. O sistema de representações colectivas, emboraseja em parte objecto de partilhas e de referências baseadas em relaçõessociais informais, na sua essência, é veiculado por uma racionalidadeexterior à participação e decisão de quaisquer indivíduo ou grupo.Essa razão abstracta exterior aos indivíduos e aos grupos conjuga-secom uma cultura polarizada no audio-visual, nomeadamente apoiadana força estruturante da informática, dos “mass media” e da televisão.A descodificação das linguagens mais representativas das novastecnologias transformaram a língua inglesa no elemento crucial doprocesso de aculturação que acompanha a globalização. As linguagensda globalização não se circunscrevem à realidade linguística. Asimbologia e a disciplina normativa dos corpos são determinadaspor um tipo de globalização que se impõe através de padrões de vidaquotidiana, com conteúdos e formas de vestir, de lazer e de óciomuito específicos. Daqui resulta que, produzir e consumir objectosde incidência cultural tornou-se num dos factores mais representativosdo preenchimento do tempo livre e do tempo da lazer na era daglobalização.

2. A COMUNICAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

Se partirmos de princípio que, no contexto das tendênciasactuais, a grande maioria das actividades económicas circunscritas àprodução, troca, distribuição e consumo de bens e serviços são denatureza imaterial, simultaneamente, a socialização analítico-simbólicareportada a esse processo realiza-se instantaneamente com base nacoincidência do tempo virtual com o tempo real. Por outro lado, aestrutura actual dos custos de produção das actividades económicasde carácter material dos sectores agrícola e industrial é muito baseada

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na informação (Goldfinger, 1998). Nestas circunstâncias, a generalidadedos indivíduos que trabalham nas organizações são fundamentalmentesistemas processadores de informação.

No seu sentido amplo, partimos de princípio que qualquer actorem qualquer tipo de organização, seja ele presidente do conselho deadministração ou servente numa empresa de construção civil, é emtodas as circunstâncias objecto de um conjunto de estímulos denatureza analítico-simbólica em relação aos quais necessitaconcretamente responder. A sua capacidade de resposta, em termosda selecção e categorização da informação directamente reportada aqualquer tipo de tarefa ou a qualquer perfil profissional, por essasrazões, depende crucialmente da sua capacidade perceptiva e,logicamente, das suas sistematizações concretas em termos decapacidade/possibilidade cognitiva, emocional e comportamental.

Face às contingências de estímulos cada vez mais complexos eabstractos, o ser humano, não obstante usufruir de uma trabalhosocial gigantesco devidamente configurado e automatizado comoinformação e conhecimento nas TIC, para percepcionar e aceder aessa informação e conhecimento é constrangido a dar-lhe umsignificado. Desde que passa a integrar na sua cognição umasubjectividade específica devidamente organizada, qualquer actor naorganização está capacitado para exercer o seu papel e concretamentea executar as tarefas e funções que foram estipuladas pela divisão dotrabalho e a autoridade hierárquica formal.

Se nos situarmos no espaço-tempo do contexto-situação doprocesso comunicacional qualquer actor é simultaneamente emissore receptor de informação. Na estrita medida em que as organizaçõesinstitucionalizam e formalizam uma parte substancial das hipótesescomunicacionais dos actores que nelas trabalham, osconstrangimentos estruturais da divisão do trabalho e da autoridadehierárquica formal prescrevem e determinam, à partida, quem temcompetências e qualificações para exercer as funções primaciais decomunicante quando se é emissor ou receptor de informação. Estarealidade é ainda muito visível em organizações de grande dimensãopopulacional, cuja pirâmide organizacional é composta por muitos

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níveis de autoridade hierárquica formal e uma extensa divisão dotrabalho.

Todavia, se tivermos presente as contingências das TIC, dasociedade da informação e do conhecimento, as organizações tambémsão um espaço-tempo privilegiado da coincidência do tempo virtuale do tempo real. Esta coincidência temporal constrange todos osactores a exercerem os seus papéis e a executarem as suas tarefas deuma forma rápida e eficiente, a codificarem e a descodificarem ainformação pertinente reportada a esses papéis e tarefas de formadialógica, ou seja como peritos comunicacionais.

Não se pense que a representatividade comportamental destaevidência empírica é exclusivamente observável numa relaçãointerpessoal, cujos intervenientes básicos são o chefe e umsubordinado ou uma hipotética relação entre dois colegas de trabalhonum departamento de uma dada organização. A actualidade dasfunções adstritas ao processo comunicacional observa-se sobremaneiranas relações intragrupais decorrentes da dinâmica dos grupos enquantosubsistemas das organizações. As funções de coordenação, controlo eplaneamento, embora estejam articuladas, quase sempre, com umtipo de comunicação descendente, evidenciam o processo decomunicação baseado em relações intraorganizacionais.

Na impossibilidade de analisar com profundidade e extensãotodos os fenómenos concernentes ao processo comunicacional nasorganizações, destacarei três aspectos relevantes desse processo (Neves,2001): 1) a relação interpessoal como base de competências equalificações comunicacionais; 2) as relações intragrupais como basede eficácia comunicacional e desempenho dos grupos; 3) a eficáciado processo de tomada de decisão nas organizações e a sua correlaçãocom o processo comunicacional.

Os indivíduos são subsistemas dos grupos e estes, como járeferimos, são subsistemas das organizações. Em qualquer latitudecomportamental que nos possamos situar, é através de relaçõesinterpessoais que qualquer indivíduo pode afirmar a suaindividualidade. Esta é um compósito que integra personalidade,motivações e atitudes. Cada indivíduo quando está em interacção

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com outro indivíduo demonstra capacidades relacionais tipificadasem formas de sentir, pensar e agir. Essas capacidades são umcompósito de estímulos-respostas de tipo cognitivo, emocional ecomportamental.

Na estrita medida em que as linguagens e os estímulosprovenientes da sociedade de informação e de conhecimento têmcaracterísticas analítico-simbólicas e são cada vez mais complexas eabstractas, exige-se aos actores organizacionais capacidades cognitivasacrescidas, por forma a que estas possam, hipoteticamente, orientare dar sentido à emoção e às acções decorrentes do nossocomportamento. Nessa latitude, a comunicação é um elementoessencial para estimular a integração e o desenvolvimento das relaçõesinterpessoais. Para comunicar é preciso existir um emissor e umreceptor de informação. Para configurar proficientemente a informaçãoe o conhecimento de cada actor organizacional, este é constrangido apercepcionar e traduzir essa informação num saber-fazer específico aoseu papel e ao seu perfil profissional. Como exemplo, em qualquercontexto-situação, para qualquer chefe ou subordinado éimprescindível integrar a informação substantiva no seu cérebro queé reportada aos seus papéis e ao seu perfil profissional. Quando se échefe ou líder em qualquer organização, na generalidade dos casos,torna-se relevante percepcionar a informação que o pode qualificarpara as funções de emissor quando está numa relação interpessoalcom um subordinado. Todavia, este na condição de receptor deinformação quando executa uma dada tarefa também precisa dequalificações específicas para exercer seu papel de receptor deinformação. De facto pode ter ou não ter percepcionadoproficientemente a informação que foi veiculada pelo emissor. Asimples existência de barreiras ou omissões nas comunicações queemergem em qualquer relação interpessoal obriga a que os papéis doemissor e do receptor de informação sejam cada vez mais interactivose permutáveis.

Quando estamos a analisar as incidências das relaçõesinterpessoais com base nas cognições, emoções e comportamentosdevidamente institucionalizados e formalizados, inferimos que o

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processo comunicacional é determinado pelos constrangimentosestruturais padrão da divisão do trabalho e dos níveis de autoridadehierárquica formal subsistentes numa dada organização. Se pensarmosque a execução de uma tarefa e a comunicação em rede através dasTIC podem ser realizadas por um emissor e um receptor, com basenuma coincidência do tempo virtual e do tempo real, para que ascognições, as emoções e os comportamentos sejam eficientes, éfundamental que esses factores sejam dinamizados por relações sociaisespontâneas e informais. Os problemas actuais de polivalência,flexibilidade, concorrência, competitividade e de mobilidade dosindivíduos nas organizações situam-se a este nível.

Quer a divisão do trabalho quer a estrutura hierárquica formaldas organizações têm por função prescrever as relações interpessoaisno sentido da racionalidade instrumental desses actores. Por outrolado, enquanto realidade microssociológica, as organizações inscrevem-se numa racionalidade instrumental de natureza política decorrenteda democracia representativa e dos sistemas políticos vigentes nassociedade contemporâneas.

Nestes domínios assiste-se à emergência de contradições econflitos comunicacionais. As TIC exigem que a transmissão dainformação se faça em rede e que a comunicação seja imediata e eficaz.Os constrangimentos estruturais e institucionais, que já referimos,prescrevem, controlam e condicionam a socialização da informaçãoreportada às relações interpessoais, porque a rigidez e padronizaçãoespacio-temporal circunscritas aos seus papéis não se coadunam comas exigências de liberdade e criatividade cognitiva, emocional ecomportamental que, como já verificámos, são, na sua essência, denatureza espontânea e informal. Para que haja efectivamentecomunicação é fundamental que a horizontalidade substitua averticalidade relacional nas organizações. No mesmo sentido, seriafundamental que as relações interpessoais, para além da sua essênciaespontânea e informal, evoluíssem num processo de socializaçãoestimulado pela democracia directa.

Numa outra dimensão analítica, quando escrevemos ou falamosem dinâmica de grupo, estamos, logicamente, a visualizar a

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comunicação nas organizações com maior intensidade e profundidade.As lógicas interactivas circunscritas às relações intragrupais permitem-nos percepcionar a socialização da informação decorrente da execuçãodas tarefas, objectivos, coesão e normas que configuram aespecificidade e a identidade de qualquer grupo em qualquerorganização. A divisão do trabalho e a estrutura hierárquica daautoridade formal determinam os papéis e as relações de poder nointerior do grupo e, por consequência, o processo comunicacional.

As contingências da globalização e das novas tecnologias (Ferreira,2000) são muito significativas nas relações intragrupais, porque asinterdependências e as complementaridades comunicacionais são cadavez mais atravessadas por necessidades cognitivas, emocionais ecomportamentais. Os grupos, por esta via, são também cada vez maisestimulados a descodificarem e codificarem linguagens analítico-simbólicas, a socializá-las adequada e atempadamente, no sentido daconstrução da identidade colectiva e da execução de tarefas que lhesão específicas.

Maior participação dos actores subordinados e maiordescentralização na execução das tarefas não são suficientes para quea dinâmica de grupo e a comunicação seja uma realidade plausívelnas organizações. A polivalência e flexibilidade que procura adequaras cognições, emoções e comportamentos aos desígnios do aumentoda produtividade do trabalho são, nesta assunção, irrelevantes. Maisuma vez para que as relações intragrupais sejam efectivamentedialógicas, torna-se imprescindível que as várias linguagens dos actoresque integram o processo de comunicação sejam libertas doscondicionalismos das prescrições grupais induzidas pela divisão dotrabalho e pela autoridade hierárquica formal. A emergência derelações intragrupais de características informais e espontâneas são,por essa razão, cada vez mais representativas. A comunicação éviabilizada de forma proficiente entre os vários actores que compõemo grupo e, por outro lado, este enquanto subsistema da organização,resolve os problemas desta que, entretanto, surgiram das necessidadesde adaptação desta às contingências de concorrência e competiçãogeradas pela globalização e as TIC.

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Por fim, quando falamos ou escrevemos do processo de tomadade decisão, estamos, na generalidade dos casos, a raciocinar em termosde um nível de análise grupal. Todavia, quando analisamos aorganização como uma totalidade sistémica, somos obrigados a terpresente o processo de tomada de decisão como um processo decoordenação, de controlo e de planeamento circunscrito às tarefas,objectivos e resultados que são específicos a qualquer organização. Asocialização da informação, assim como a descodificação e codificaçãode linguagens inerentes a esse processo, permite-nos observar acomunicação como algo que lhe específico, mas também como algoque é crucial para produzir bens ou serviços e prosseguir os seusobjectivos primaciais.

O carácter abstracto e complexo da informação e dacomunicação aumenta significativamente quando nos situamos aonível da organização. Em primeiro lugar, porque os actores queintegram as relações intraorganizacionais são objecto de umasocialização prescritiva padrão que lhes impede de interagir de umaforam informal e espontânea. Podem evoluir para situações detransgressão e desvio, mas estão incapacitados de se adaptarem aosconstrangimentos decorrentes da institucionalização e formalizaçãodas suas cognições, emoções e comportamentos.

Por outro lado, qualquer organização está numa situação deinterdependência e de complementaridade sistemática com ainformação, a energia e o conhecimento do ambiente externo próximoe do ambiente externo longínquo. Por esta via reforçam-se ascontingências da globalização e das TIC sobre as organizações. Parapercepcionar e categorizar a informação substantiva que enforma oprocesso de tomada de decisão nas organizações, para que acomunicação funcione como factor crucial de socialização dessainformação em comportamentos efectivos e eficientes, é fundamentalque qualquer organização passe a integrar redes externas e internas.Redes externas para que a produção, troca, distribuição e consumodo bens ou serviços que lhe são adstritas sejam atempada eadequadamente socializados. Redes internas para que os actorespossam efectivamente ser livres e criativos e possam, desse modo,

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potenciar as suas cognições, emoções e comportamentos. Emqualquer das situações, sem a informalidade e a espontaneidade éextraordinariamente difícil integrar as actuais redes de comunicação.Estas revelam-se vitais para a sobrevivência histórica de qualquerorganização no contexto das hipóteses e probabilidades inscritas naracionalidade instrumental do capitalismo.

3. CONCLUSÃO

Em síntese, deste trabalho podemos extrair algumas ilaçõesanalíticas.

Em primeiro, no tempo histórico da sociedade de informação eda sociedade do conhecimento toda e qualquer organização éconstrangida cada vez mais a produzir, trocar, distribuir e a consumirbens ou serviços de natureza imaterial veiculados pelas TIC.

Em qualquer latitude que nos situemos na organizaçãodenotamos, cada vez mais, as contingências da competição e daconcorrência estimuladas pela globalização e as novas tecnologias,com especial incidência das tecnologias de informação e decomunicação.

Em segundo lugar, o processo de adaptação e de reacção a essacontingências não se realiza com base em comportamentos, cogniçõese emoções devidamente formalizados e institucionalizados. Para hajaque haja adaptação e reacção, atempada e adequada das organizações,é imprescindível uma comunicação eficiente entre os vários actoresque constituem qualquer organização. A divisão do trabalho quepadroniza e prescreve os papéis dos diferentes actores da organizaçãoe a autoridade hierárquica formal que prescreve e define o exercíciodo poder, por si só, não são compatíveis nem estão coadunados pararesponder aos desafios e problemas que resultam dessa contingências.

Em terceiro lugar, sendo a comunicação um factor vital para asobrevivência das organizações, é fundamental compreendê-la,interpretá-la e explicá-la em função da sua plasticidade social, mastambém da sua proeminência actual nas relações interpessoais,intragrupais e intraorganizacionais. Claro que existem outros níveis

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de analise que são necessários desenvolver – intrapessoal, intergrupale interorganizacional. Todavia, ao situar esta comunicação no interiordas organizações, orientei a minha análise para o processocomunicacional que considero mais pertinente para responder aosdesafios e problemas que se apresentam às organizaçõescontemporâneas.

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LA PLAGA MODERNA:EL CONSUMISMO

PROF. JOSE A BONILLA1

CONCEPTOS INTRODUCTORIOS

Podemos denominar sociedad de consumo a aquella cuyo rasgomás característico es la disponibilidad de innúmeros productos deconsumo, muchos de ellos completamente superfluos, que acabangenerando necesidades, en gran parte artificiales. Ellas sonintroyectadas en la mente humana, a través de una publicidad intensaen los diferentes medios de comunicación, planificada en formacientífica, con ayuda de psicólogos y sociólogos, de modo a incentivarla compra de los productos (de cualquier clase), martillando sobre lainseguridad de las personas, lo que - ciertamente - es altamentedestructivo, en términos de salud mental de la población. Esto ocurrehasta con niños pequeños, que acaban sintiéndose frustrados einfelices, si sus padres no tienen condiciones de comprar los vaquerosy los championes de marca X (cuatro veces mas caros que los sinmarca).

Ya hace casi 50 años que el entonces Presidente de los EEUU,el condecorado general Eisenhower, héroe de la Segunda GuerraMundial dijo: “Gustaría de pedirles a los fabricantes, cuyo nombreno daré, para que dejen de producir lo que ellos creen que precisamos

1. Professor da Faculdade de Ciências Econômicas (FACE)/UFMG. [email protected]

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y comiencen a producir lo que realmente queremos”. Es muy claroque la visión del Presidente (del país que es el corazón del capitalismomundial) estaba indicando, con su dedo acusador, la triste situacióndel consumidor, un verdadero prisionero, aplastado por la fuerza delas grandes empresas, especialmente las multinacionales, que acabanextrayendo de sus bolsillos, los recursos necesarios para pagar suincompetencia por no producir mejor y su deshonestidad intrínseca,a pesar de la recomendación presidencial.

La situación actual no ha mejorado substancialmente; apenas eltiempo ha pasado y la conciencia humana precisa ser engañada de unmodo más científico, más sutil, más “global”.

Algunos autores esclarecen más el significado de la sociedad deconsumo. Por ejemplo:• Smythe (1) dice: “Los medios de comunicación son propaganda

en su todo... Así, ambos, tanto la propaganda propiamente dicha,como los programas reflejan y mistifican, siendo esenciales para laventa de productos y servicios, a través de una nueva industria: laindustria de la conciencia”

• Souki (2) esclarece que: “La glorificación del consumo en los mediosde comunicación periféricos (Tercer Mundo) tiene comoconsecuencia la concentración de la renta. La presión generadapor el proceso de modernización, en lugar de promover eldesarrollo, tiende a incentivar las camadas más ricas, así como losdetentores del poder, a reproducir las formas de consumo,sofisticadas, de los países centrales (Primer Mundo).”

• Teixeira (3) describe con precisión lo que denomina: “Ciencia delas compras compulsivas” y justifica esta designación así: “Es unaciencia porque sus gurús son capaces de decir, con antecedencia,cuando y como cada compra compulsiva acontecerá”... “El primerpaso para una administración de compras bien sucedida es hacercon que todos lo que entran sean ligeramente sedados. El serhumano, guiña 32 veces por minuto. Pesquisa americana recientemuestra que en un comercio debidamente arreglado e iluminado,el número puede ser reducido para apenas 14 veces por minuto”...“El segundo paso es garantir que los sentidos de los compradores

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queden entorpecidos sin estar deprimidos, a través de la iluminaciónmás brillante y consistente, bloques simples, colores primarios,aroma suave, etc”. El tercer paso es volver a la normalidad... despuésde pasar por la caja.

¡Que derroche de energía, conocimiento y dinero! Para este tipode manipulación hay recursos abundantes, pero no para atender lasnecesidades reales de las personas. Precisamos despertar de este sueñohipnótico, que nos quieren hacer pasar por la Realidad y crear unanueva utopía: transformarnos en seres concientizados y activos,verdaderos focos de luz, rechazando el clonaje organizado por elsistema.

La procura individual por el sentido y el significado de la vida ,pasa a ser el nuevo divisor de aguas.

ASPECTOS NEGATIVOS DEL CONSUMISMO

SOBRE EL SER HUMANO

Tal vez una pregunta preocupante sea: “Vamos a consumir menosporque el dinero no alcanza y sufrimos por esto, o ¿es la hora depriorizar otras cosas?”

Por ejemplo, una de esas cosas es la concientización. Tal vez sealo más importante y no estamos dando suficiente espacio para ella,sofocados por el peso aplastante del tener (no interesa qué, y sí apenastener, para no quedarnos atrás del vecino o del colega).

No conocemos personalmente a usted, pero aún así, no tenemosdudas que es una persona maravillosa. ¿Será que estamos quierendoadularlo con propósitos ocultos o apenas conquistar su buenavoluntad para que difunda estas ideas?

Ciertamente muchas personas pueden no manifestar esamaravilla, ese esplendor del que acabamos de hablar. Pero ¿porquéesto puede ocurrir? ¿Será por que somos, realmente, vacíos,insignificantes y despreciables? No. Eso puede ocurrir apenas debidoa un motivo específico: no reconocer nuestro derecho de nacimiento,pues hay una partícula cósmica - maravillosa - dentro de todos y cadauno de nosotros.

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No estamos haciendo ninguna propaganda religiosa (incluso nopertenecemos a ninguna de ellas), pero el hecho es que, como dicenlos libros sagrados de varias religiones, el Creador nos hizo a su imageny semejanza. ¿Con que objetivos Él habrá hecho eso?

Creemos que ese objetivo es, ni más ni menos, que seamosauxiliares de Él en el mundo físico, en el cual sus Excelsas Energíasno pueden actuar, ya que podrían fulminar todo aquello que tocaren.Él precisa de transformadores capaces de reducir aquel altísimo voltajey así hacer útiles aquellas portentosas energías en el mundo físico.Ese es nuestro papel principal dentro de la sinfonía del Universo.

Así, a medida que crecemos interiormente, podremos pasar desdela posición de un humilde fósforo (que a pesar de su pequeñezproporciona luz), para la de un farol, después para una lámparaincandescente o fluorescente, hasta llegar a ser un reflector, un focodeslumbrante de luz, amor y esperanza).

Pero, probablemente esto parece un sueño, un cuento de hadas,una utopía. ¿Por que? Porque aquella partícula cósmica fue cubiertapor la vanidad, por el miedo, por la envidia y sobretodo por la“necesidad de aparecer” y de tener más que los otros. Así, el tenerasfixió el Ser.

De este modo, la maravilla, el esplendor, la riqueza interior delas personas pasa, en gran parte, desapercibida y cruelmentedesperdiciada. Por eso es que parece una adulación lo que fue dichoal principio de este ítem. Pero tenga certidumbre de una cosa: usted,como las otras personas, son seres maravillosos, en los cuales el Creadorcolocó inmensas potencialidades.

Entonces al asunto básico es: ¿cómo revertir esta situación demodo que la esencia, el contenido íntimo, lo principal, se presenterecuperando su verdadero valor, sobreponiéndose a lo que esenvoltorio, superficial, secundario? Para conseguirlo, precisamos, antesque todo, valorizar las personas y no, deslumbrarnos con los nuevosproductos de la moda. Pero, para eso es fundamental autovalorizarnos..

Esa auto valorización, clave para valorizar los otros, nos conducepor los soleados caminos de la solidaridad, de la armonía y del

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bienestar personal. Este es el gran desafío. Pero para poder transitarpor esta gloriosa avenida, precisamos, entre otras cosas, despegarnosde nuestro consumismo actual.

Para recorrer con éxito aquel fascinante bulevar, precisamosdesarrollar aceleradamente nuestros valores afectivos, éticos yespirituales, por lo que será necesario defenestrar el consumismoabsurdo y la competencia enfermiza que hoy nos agobian. Y comenzara trabajar la cooperación entre los seres humanos, estando cada unoen su nivel de concientización y biodiversidad, pero todossintonizados con las altas energías cósmicas. Es para eso que fuimoscreados, no para enriquecernos con bienes mal habidos, ni paraenvidiar los exitosos ni para exacerbar nuestro egoísmo, deseando- apenas - tener más y más.

En la medida en que vamos consiguiendo aumentar nuestraautovalorización, nuestras necesidades artificiales (ver adelante, eneste texto) se irán reduciendo. De este modo, comenzaremos adistinguir entre lo esencial y lo superfluo.

No estamos, sin embargo, proponiendo un culto a la pobreza.Podemos (y debemos) ser bien sucedidos y prósperos, pero noaplastando, explorando y destruyendo los otros y sí a través de accionesconstructivas, de pensamientos positivos y de sentimientosbienhechores.

Algunas personas nos dicen que el consumismo mueve muchodinero y que si fuese eliminado, la sociedad se hundiría en el caos y lapobreza. El caso es que el tabaco, el alcohol, las drogas, la prostitucióny las armas mueven billones de dólares en el mundo entero. ¿Y esoserá motivo suficiente para estimular su producción y consumo?

Parece bien más racional utilizar los recursos financieros de unasociedad, procurando el bienestar de ella, a través, básicamente, de lasalud, la alimentación y la educación y no derrocharlos en superfluos,que acaban agotando nuestros recursos naturales.

En un análisis rápido, podemos identificar el consumismo comomotivo principal de los siguientes perjuicios:• Perjuicios económicos directos. Generación de deudas y hasta de

quiebras, con su secuela indeseable de sufrimiento, sentimientode carencia, de impotencia y de inferioridad.

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• Perjuicios éticos. Se pierde el sentido de los valores universales.Así, el tener (lo que sea), desplaza el Ser; el egoísmo suplanta lasolidaridad, las ventajas individuales aplastan la cooperación, etc.

• Perjuicios familiares. Las personas de la familia se acostumbran adisputar para tener prioridad en la compra de productos. Por otrolado, los hijos son criados con una visión torcida de la vida, loque no les permite separar lo esencial de lo superfluo. Comoconsecuencia de esto, las personas, especialmente los padres (y lasmadres) de familia, precisan correr desesperadamente el tiempotodo, para ganar más y más dinero. La internet y la televisiónacaban, en ese contexto, transformándose en niñeras electrónicas,con todos los daños en la formación del carácter de los niños yadolescentes, que aquella actitud provoca.

• Perjuicios ambientales. El consumo exacerbado de superfluosconduce a una aceleración en el ya avanzado proceso destructivode los recursos naturales. Dentro de algunas pocas décadas, ¿Comovan a sobrevivir las personas, incluyendo nuestros descendientes yquien sabe, nosotros mismos? La falta de energía, hoy complicanuestra vida, pero también están amenazadas el agua, laproductividad de la tierra y del mar, la biodiversidad, etc.

• Perjuicios económicos indirectos. La insatisfacción de las personascon la sociedad como un todo acaba transformándose en unaenfermedad crónica. En realidad, no adelanta mucho ganar más(lo que ya está difícil), porque la avalancha de productos que“precisamos comprar” avanza exponencialmente. ¿Cuanto deja dealimentarse una familia de baja renta, cuando se quiere dar el “nuevolujo”: el celular?

Por otro lado, el consumismo como padrón de vida, acabaconduciendo a un camino peligrosísimo, estimulando directamente lacriminalidad y el tráfico de drogas, con efectos terribles sobre la juventud.

No se pretende proponer la eliminación de los superfluos, deforma radical y forzada. Creemos en la concientización humana através de la Educación. El camino más adecuado parece ser unareducción gradual de la tendencia consumista, hoy muy fuerte, loque podría resumirse en: Producir aquello que realmente es necesario,útil y de buena calidad.

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En particular para los padres, algunas recomendaciones podríanser hechas, a saber:• Precisamos sustituir el culto al derroche, por el culto de la

suficiencia.• Precisamos que nuestros hijos (y nietos) sean preparados y

educados:= No, para ser una generación de derrochadores, de personasinfelices, que terminarán de acabar con el planeta en poco tiempo.= Sí, para una generación de agentes de transformación de lasociedad, capaz de crear un mundo más humano, más digno ymás feliz. O sea, llevar a la práctica aquel sueño que la Humanidadguarda en su corazón hace milenios: la Gran Utopía.

• ¿No sería esa la mejor herencia que podemos dejar?• Recordar un hecho muy frecuente: ¡Muchas personas gastan el

dinero que no tienen, para comprar cosas que no necesitan, paraimpresionar personas que ni conocen! Parece una cosa absurda,pero es la triste realidad del día-a-día.

• Finalmente, precisamos recordar al sabio Confucio: “Para quiennada es lo bastante, lo suficiente es poco”

UNA POTENTE METODOLOGÍA AL SERVICIO DEL

CONSUMISMO: LA OBSOLESCENCIA PLANIFICADA

Obsolescencia significa algo que se torna anticuado o sale de uso.Sin embargo hay dos tipos de obsolescencia, la funcional y la planificada.

La obsolescencia de función ocurre cuando un nuevo productocumple su función específica bien mejor que los anteriores, de modoque estos se tornan necesariamente anticuados (obsoletos). Porejemplo: aviones a chorro comparados con aviones a hélice;locomotoras eléctricas en relación con locomotoras a carbón;calculadoras electrónicas en relación a las manuales, etc. Este tipo deobsolescencia es el único que está ligado realmente al progreso de latecnología y generalmente a un mayor bienestar social.

Ya la obsolescencia planificada implica en un esfuerzointencionado para declarar un producto obsoleto, cuando él podría

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ser bastante útil. Ella se presenta en la forma de dos modalidadesbásicas:

a) Obsolescencia de calidad. Ocurre cuando el producto sedesgasta o se deshace en un cierto momento, próximo a la fecha desu compra. Por ejemplo: lámparas incandescentes, cuya duración esreducida intencionadamente de 300 para 200 horas; piezas de bajacalidad en electrodomésticos, etc.

Esta obsolescencia tiene implicaciones bien más profundas, yaque para reducir la durabilidad de un producto es necesario desarrollarinvestigaciones científicas, o diciendo mejor: anti-investigacióncientífica, entendiéndose como tal la utilización intencionada de lametodología científica para perjudicar los consumidores.

Las consecuencias de estos hechos, también tienen que ver, conrelación a la llamada ciencia. En efecto, un buen número de científicosmodernos, utilizando la más avanzada tecnología disponible, losconocimientos teóricos más profundos y los computadores másveloces y sofisticados, están participando en esta tarea nefasta, aunquemuy bien paga.

¡Esto es terrible! ¿Cuantos Doctores (y Post-Doctores) de lasmejores Universidades del mundo estarán colaborando para aumentarel cautiverio del ser humano, amarrado a la sociedad de consumo,ahora globalizada?.

b) Obsolescencia de atractivo. En este caso, aunque el productopueda continuar siendo utilizado durante mucho tiempo, él estransformado en anticuado (obsoleto), debido al aparecimiento deun modelo más “moderno”. La Sra. Puckett, por ejemplo, magnatede la industria del vestuario, declara textualmente: “Nuestra tareaconsiste en hacer que las mujeres se sientan muy infelices con aquello(ropas) que poseen. ¡Debemos hacerlas tan desdichosas que susmaridos no puedan encontrar felicidad y tranquilidad, mientrasmantengan su excesiva tendencia al ahorro”!!! (Bonilla, 4).

En pocos pasajes, el sistema presenta en forma tan explícita ydescarnada, la idea central de la sociedad de consumo, hoy enriquecidapor la globalización “caníbal”. Según aquella, la felicidad no es unedificio que cada persona tenta construir, teniendo como base una

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adecuada combinación de elementos afectivos y sí un objeto de compray venta. No importa que aquel marido no sienta más amor por sumujer (o vice-versa). En efecto, con una buena reposición de vestuario.¡La felicidad entra alegremente por la ventana! ¡Que distorsión absurdade la vida humana! Ese marido para hacer “feliz” a su mujer precisatener un buen y cada vez mejor nivel de vida.

Ya la calidad de esa vida no interesa al sistema. Lo más triste esque muchas personas acaban aceptando esta idea, repetida millaresde veces en la pantalla de televisión, en los out-doors de las calles, enlos diarios, en las radios y ahora en la internet. De esta forma aquellaidea se transforma en una fuerza omnipotente que penetra nuestrasvidas desde todos los ángulos posibles.

Esa es la “realidad” que el sistema presenta como única, definitivay satisfactoria. Para desterrarla, precisamos ir al fondo de nuestroscorazones y allí rescatar la Gran Utopía, que no es otra cosa que unasociedad realmente humana. Este es el gran desafío, que implica encambiar de verdad, para lo que precisamos transformar aquella“realidad” triste, aparente y anti-humana, por otra, floreciente yarmoniosa. Marcuse (5) en su magnífico libro “Eros y Civilización”afirma: “Una sociedad está enferma cuando las institucionesfundamentales (o sea su estructura) son de tal naturaleza que nopermiten la utilización de los medios materiales existentes para eldesarrollo ideal de la existencia humana”. Y no tenemos más queabrir los ojos y mirar a nuestro alrededor para percibir que los bienesmateriales que nuestra civilización posee, son colosales y enormementesuperiores a los de cualquier otra época de la historia humana. ¿Yserá que la estructura social permite la utilización de los recursosmateriales y la opulencia disponible para un florecimiento humano?.

No hablemos de los muertos de hambre en Biafra, Pakistán oEtiopía en los últimos años, ni en la subnutrición de casi todo elTercer Mundo. Consideremos sólo los países más “desarrollados”(enla verdad, los más ricos). En las catedrales de la opulencia el índice desuicidios (especialmente de jóvenes) es muy alto; la droga corrompesin respetar edades o formación académica; la falta de idealismo hundeesos países en la mediocridad y en la perplejidad. La televisión es

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usada como fuga, a través de la identificación con los héroes yespecialmente las heroínas de las novelas. Obviamente, la falta deesperanza no es debida a la falta de recursos materiales, porinsuficiencia de alimentos y moradía y si porque la Vida se presentacomo una cosa hueca, como un vacío atroz y horroroso.

Ahí es que entra el papel clave del consumismo: aplacar elsentimiento de infelicidad (que es la causa principal de la obesidad) ymágicamente lo sustituye por la euforia que fluye del nuevo artefactoo producto, poseedor de bellos colores y modelos, así como cada vezmás aerodinámico. Sin embargo, esta euforia dura poco.

Esta situación de euforia aparente y hedonismo generalizado,también se extiende a las camadas más pobres (las que deslumbradascon la pose de nuevos artículos, como los celulares, pasan un pocomás de hambre para pagarlos).

Esto nos recuerda culturas antiguas que se derrumbaron porquesus clases dominantes redujeron sus preocupaciones a los placeres,las poses y las trivialidades (por ejemplo: el imperio romano, LuisXVI y Maria Antonieta, los Zares de Rusia).

Solamente la concientización creciente de las personas,acompañada por las correspondientes acciones tendrá la fuerzanecesaria para hacer recuperar su salud a la sociedad enferma, segúnla expresión de Marcuse. Esa es, precisamente, la idea básica que estelibro está transmitiendo.

LAS NECESIDADES HUMANAS: REALES Y ARTIFICIALES

Ahora precisamos introducir un principio básico: una vidahumana, realmente merece ser vivida, cuando es colocado comoobjetivo fundamental de la misma, satisfacer – aunque sea parcialmente– las necesidades reales y no las ficticias o artificiales, creadas porsectores interesados apenas en su propio beneficio financiero,sustentadas básicamente por la nefasta tecnología de la obsolescenciaplanificada, vista en el ítem anterior.

En este marco referencial, se entienden por necesidades reales,las siguientes, enumeradas en una lista no taxativa:

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• Necesidades físicas vitales: alimentos, vestuario, habitación, salud.• Necesidades afectivas: relación adecuada de pareja; buenas

relaciones familiares.• Necesidades sociales: relación placentera con el trabajo; relación

solidaria con el grupo humano adyacente y con el mundo engeneral.

• Necesidades educacionales, culturales y estéticas.• Necesidades de armonización con el medio natural.• Necesidades de expresión de sentimientos espirituales de plenitud

y auto-realización.En el esquema básico de la sociedad de consumo, el primer

punto – totalmente distorsionado – está tan supervalorizado, queacaba cubriendo todo el conjunto. Las grandes abandonadas son lasnecesidades afectivas, sociales, ambientales y espirituales. Ellas son,en realidad, las Cenicientas de la Historia humana. Cenicientas quesolo encontraron amor y reconocimiento en el Príncipe de la Leyenda,2

o sea los príncipes de la Sabiduría, los Maestros Espirituales de todaslas épocas.

En verdad, la historia de la especie humana es la historia de laopresión del hombre por el hombre; pero precisa ser subrayado queahora (siglo XXI), la moderna sociedad tecnológica dispone de todoslos medios necesarios para satisfacer – en todo el mundo – lasnecesidades básicas de la Humanidad, por lo menos a un nivelrazonable. Sin embargo, la sociedad humana no está caminando enesa dirección. La obscena mezcla de desnutrición y desperdicio, de“favelas”, “villas miseria” y “cantegriles” junto con rascacielos y lujosasmansiones a lo Silvio Santos, no existen apenas en nuestros países“subdesarrollados” y sí en los “super-desarrollados”, incluyendo elombligo del mundo globalizado, la orgullosa Nueva York.

El consumismo de productos nos conduce a otro tipo deconsumismo, mucho más peligroso: el consumismo de una manera

2. Leyenda que parece extremadamente simple e infantil, pero que tiene una esencia,un contenido bastante profundo.

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de pensar, sentir y actuar ya pre-definida por el sistema. En efecto, elsistema ya definió, con el apoyo decisivo de los medios decomunicación, como deben ser nuestras vidas. Pero, para disimular– como ya vimos – nos deja algunos grados de libertad, usando loscuales somos llevados a pensar que somos seres autónomos.

Zohar y Marshall (6) colocan este asunto de la siguiente forma:“Nuestra cultura es una cultura de multitud. Los medios decomunicación nos estimulan a tener los mismos pensamientos y lasmismas opiniones”... “No sabemos más como pensar conindependencia”... Uno de los principales criterios de una altainteligencia espiritual , es lo que los psicólogos llaman de“independencia del campo”. “Esto significa ser capaz de erguirse contrala multitud y defender una opinión impopular, sí es eso de lo queestamos convencidos”... “Desde una perspectiva centrada en mi YoInterior, a partir de aquello que podríamos llamar de ‘subversividadprofunda’, sé quien yo soy y sé en lo que yo creo. Eso no es egoísmoy sí individualidad auténtica y requiere mucho coraje”.

¿Y quien yo soy? Una partícula cósmica con inmensapotencialidad. ¿Y en que creo? En que esa potencialidad pode serusada – de las más diversas formas para transformar en Realidad, laGran Utopía: una sociedad más humana, mas justa y más digna.

La “independencia de campo” mencionada por Zohar y Marshall(6) significa que tenemos la autoconciencia suficientementedesarrollada, como para saber cual es nuestro papel y nuestra misióncósmica, que pueden batir de frente con el “status quo” y que, conseguridad, lo harán. Pero esto es lo que siempre hicieron los grandesy auténticos líderes, los “herejes” para aquellos que tienen la visióncorta y el corazón encogido. A la cabeza de estos “herejes” está elMaestro, crucificado con el apoyo de la multitud y del poder religioso.

Como aquellos autores dejan claro, la individualidad auténticano es una manifestación de egoísmo y sí de riqueza de la biodiversidadhumana. Está implícito en este raciocinio que, tratándose de personascon alto nivel de inteligencia espiritual, ese principio auto-afirmativo,deberá estar equilibrado con el principio integrativo, que busca launión en beneficio del conjunto, o sea de la sociedad y del planeta .

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Es interesante cerrar este ítem con una citación deSouki (2):“Al examinar el desarrollo de medios electrónicosen Brasil3 aparecen dos tendencias muy marcantes:una, promover la compra de bienes de consumo; laotra, divulgar y legitimar la ideología de losdominantes. Para sustentar estos objetivos, se precisaalcanzar públicos cada vez más vastos, en unatentativa de homogeneizar gustos, costumbres yhábitos. Esto llevó a la padronización de losprogramas y a la centralización de la producción(principalmente televisiva) en el eje Rio – San Pablo.De forma general las audiencias son apenas utilizadaspara realizar los objetivos de los sectores quecomandan el poder. Por lo tanto, las carencias yaspiraciones intrínsecas de la sociedad, tales como:mayores niveles de educación y valorización de lasculturas regionales, son raramente enfatizadas”.

O sea, en forma resumida: las necesidades reales de la sociedadson poco publicitadas. Ya las necesidades artificiales lo son profusamente,a través de análisis científico del comportamiento humano.

ENTONCES: ¿LO QUE PRODUCIR?

Según Kotler (7) uno de los componentes del marketing sociales: “evitar producir bienes y servicios que no se encuadren dentro delos mejores intereses del cliente”. Un ejemplo serían los productossuperfluos. Esto implica en una revolución conceptual, generalmenteno abordada en los textos sobre Gestión. Este inmenso agujero,impide la posibilidad de responder a preguntas esenciales, tal como:

3. Esto es también válido para toda América Latina. La primera tentativa organizadapara quebrar el monopolio existente, fue la creación de Telesur, en julio de 2005,patrocinada por Venezuela, Cuba y Uruguay.

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¿Lo que producir y lo que no producir? ¿Cuáles los criterios dediscriminación? Aquí hay un asunto crucial: de nada vale aplicartécnicas cada vez mas sofisticadas, si no somos capaces de ecuacionarlo.

El hecho es que los mejores libros de Gestión y especialmentelos de Gestión de la Calidad, como Deming (8), Juran (9), Ishikawa(10) o Falconi Campos (11), sólo se preocupan con metodologíastécnicas (así como insisten en la valorización de los funcionarios),capaces de alcanzar altos índices de calidad y productividad.

De cualquier forma, una cosa es clara: la estructura productivatal como hoy existe, tiene un interés prácticamente único: el lucro.Si no colocásemos anteojeras, veríamos lo que realmente ocurre: laNaturaleza es devastada, destruída y contaminada; los seres humanosson deshumanizados, uniformizados, triturados; los principios éticosy espirituales son ignorados y ridicularizados. Y el sistema productivocomo un verdadero Moloch4 nos devora, transformándonos enconsumidores compulsivos tan insaciables cuanto permite nuestrobolsillo, reforzado a corto plazo por el crédito fácil (cheque especial,tarjetas, préstamos etc).

En el ítem anterior, clasificamos en forma genérica las necesidadeshumanas en dos categorías: las reales y las artificiales. Sin embargo,algunos defensores del sistema productivo actual contraatacandiciendo: “¿Quién será capaz – y tendrá el derecho – de definir cualesson estas necesidades, supuestamente reales o verdaderas?”

La anterior es una pregunta teóricamente válida (aunquegeneralmente hecha con mala fé) y por eso tiene que ser respondida,aunque el inquiridor parece ignorar que el sistema ya hizodiscriminación – aunque en forma implícita – acerca de estasnecesidades y no se intimida en preguntarse si “será capaz de hacerloy con que derecho”. En efecto, el sistema ya decidió: todo lo que dálucro puede (y debe) ser producido.

No hay condiciones para hacer ahora un análisis profundo de laproblemática expuesta en este momento, que implicaría un estudiomuy detallado, pero algunas ideas básicas pueden ser ofrecidas, a saber:

4. Dios antiguo, que devoraba sus propios adoradores.

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a) En lugar de reservar las mejores tierras para los cultivos deexportación (como es usual en el Tercer Mundo), dedicarlas, enproporción razonable a disminuir rápidamente la desnutrición dela población local. Para esto será necesario elaborar un PlanNacional de Alimentación (ver Bonilla, 12).

b) En vez de fabricar productos superfluos innecesarios, ofensivos,no bio-degradables, o causadores de diferentes tipos decontaminación, utilizar los recursos materiales, financieros yhumanos al servicio de las necesidades reales (identificadas en elítem anterior) de la población, comenzando por las más esenciales.

c) En lugar de divulgar y promover cantores mediocres, telenovelasruines, revistas chismosas, diarios sensacionalistas y demásproductos negativos de los medios de comunicación, colocar todoslos recursos financieros utilizados (incluyendo los salarios absurdosde “showmen” de programas televisivos, que en Brasil superan500.000 dólares mensuales), para estimular la cultura y laeducación, a través de sus representantes auténticos.

No estamos aquí proponiendo una nueva teoría ni pregonamosquebrar el sistema productivo. Apenas estamos colocando aconsideración de las personas, la idea básica de que el sistema,aparentemente actuando a nuestro favor gracias a la creación y difusiónde productos cada vez más gratificantes y novedosos, acaba neutralizandonuestros mejores sentimientos y nuestros más altos valores.

Aún se puede oír los tecnócratas insensibles diciendo: “Estecambio nos llevará al enfriamiento de la economía, con sus terriblesconsecuencias; es necesario parar con esta locura”.

Y ellos podrán justificar su preocupación con argumentosracionales como estos: Si las fábricas de armamentos fueran cerradas;las plantaciones de tabaco prohibidas; la producción de autosparticulares fuera disminuida;5 si la devastación de las florestas fueseefectivamente controlada, en que niveles sería degradado el ProductoNacional Bruto e peor aún: ¿Cuántas personas quedarían desempleadas?

5. Lo sería en beneficio de otros medios de transporte, de modalidad colectiva.

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En verdad, el PNB no discrimina calidad, uso, motivo, esencia,utilidad, contenido o naturaleza de los productos comercializados;él solo se preocupa con las facturas y sus correspondientes valorespecuniarios, aunque entre ellos no contabiliza los costos sociales yambientales. Solo interesa contabilizar dinero.

Desde el punto de vista ambiental, un ejemplo: Brasil produjoen 2005, treinta millones de toneladas de soja, que exportó a buenprecio, lo que aumentó grandemente el PNB e incluso el superáviten su balanza de pagos. Pero... cada kilo de soja implicó (dada lametodología de monocultivo utilizado) en la pérdida de 10 kg desuelo, lo que totalizó 300 millones de toneladas de suelos fértiles.¿En que página del informe sobre el PNB está registrada esta pérdida?

En primer lugar, es importante decir que el PNB puede teneralguna utilidad como indicador para los tecnócratas, pero no para elciudadano común. En efecto, el PNB mide el volumen de las comprasy ventas de bienes y servicios, de modo que, cuanto más alto sea elnivel de éstas, más robusta sería la economía. Pero los números sonnúmeros: 1000 = 1000; 100 ¹ 500. Por lo tanto, resultan más“satisfactorios” 3000 pesos invertidos en el celular de la moda que2000, utilizados para alimentar una familia (es claro que muy mal),durante el mes.

Garaudy (13) para demostrar lo absurdo del sistema, presentauna parábola muy ilustrativa: “En pleno verano, un individuo vestidocon un pesado sobretodo, está bañado de sudor. Pero en lugar desacárselo (y así acabar o por lo menos aliviar el calor), compra unventilador. Así, ¡el PNB prospera dos veces: con la venta del sobretodoy con la venta del ventilador!”

La inadecuación del PNB como expresión del desarrollo de unacomunidad, puede ser mostrada a través de otro ejemplo: los gastosen salud, por constituir movimientos de dinero, son parte integrantede aquel, llegándose al absurdo de que, cuanto mayores fuesen estosgastos – y por lo tanto más enferma sea la respectiva sociedad -¡tanto más crecerá el PNB!

Aún queda pendiente el problema del desempleo. En efecto, elempleo debería ser la forma por la cual las personas cambian sus

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habilidades y conocimientos específicos por bienes y servicios queson necesarios para vivir en el seno de la sociedad.

Economistas lúcidos y no comprometidos con el sistemaeconómico, tanto en Estados Unidos como en Francia, han concluidoque el PNB puede ser reducido a la mitad en esos países, sin perjudicarlas condiciones de vida de la población, a través de cortes importantesen las áreas de armamentos, programas espaciales, número abusivode autos particulares, publicidad y burocracia. En el Tercer Mundo,prácticamente no tenemos programas espaciales; mientras tanto, sefabrican muchos productos superfluos, así como se usan técnicasgerenciales anacrónicas, que llevan a la producción de bienes y serviciosde pésima calidad.

Es evidente que si de un día para el otro, fuesen cerradas millaresde fábricas, agencias y empresas diversas, la economía podría volverserápidamente caótica, ocasionando grandes perjuicios sociales. Perolo que aquí se propone es otra cosa: ella tiene como base la ideafundamental, de la reformulación de la estructura productiva y no suestrangulamiento, por medio de una transformación gradual yplanificada de aquellas empresas que no atiendan prioritariamentelas necesidades reales de las personas, por otras que sí lo hagan.

Un ejemplo puede ser una fábrica de armas, que podrátransformarse en una industria de electrodomésticos, vehículos detransporte colectivo o mismo de maquinaria pesada. Otra, deproductos superfluos podrá convertirse en una fábrica de alimentosy una tercera, fabricante de sustancias nocivas podrá ser transformadaen un laboratorio de medicamentos.

Por lo tanto, queda claro que el camino aquí propuesto, notiene como meta un “enfriamiento” de la economía y mucho menos,el desempleo. Lo que es necesaria es la reformulación completa delos recursos disponibles a ser aplicados en la producción de bienes yservicios, procurando una utilización ideal de los mismos, para querealmente redunden en beneficio del ecosistema social y no apenasde un grupo de grandes propietarios o accionistas.

Esta reformulación exigirá el uso pleno de las potencialidadeshumanas, las cuales a través de la maximización de la creatividad con

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orientación ética y social, podrán proporcionar respuestas y solucionesbien avanzadas, no solo del punto de vista tecnológico y económico,pero también – y sobretodo – humano. Esto será posible si lapotencialidad interna de las personas fuese liberada, específicamenteen lo que se refiere a los empleados de las respectivas organizaciones.

Los grandes objetivos de los consumidores precisarían, entonces,ser de los siguientes tipos, a partir de su creciente autonomía:• Percibir que no son obligados a comprar todos los artículos que

el sistema económico pretende que compren.• Concientizarse que tienen derecho a exigir lo que desean, (pues

pagaron por eso) y no lo que el sistema desea imponer.• Comprender que los deseos humanos no deben ser orientados

apenas por caprichos y subjetivismos inducidos subliminalmentey sí por su utilidad social (y personal).

• Percibir racional y emocionalmente que nuestro espacio físico esfinito, por lo tanto debemos protegerlo y conservar suproductividad para generaciones futuras (sustentabilidad).

Este tipo de consumidor está en gestación; en poco tiempoestará suficientemente maduro para ejercitar sus exigencias. Y ¿quéexigencias son esas? Ellas son bastante simples: consumir solo bienesy servicios que atiendan nuestras necesidades reales; precios razonables,buen atendimiento; productos de buena calidad y que no causendaños ambientales; adecuada durabilidad.

¿Es tan difícil satisfacer estas exigencias, aún sabiendo que de sueficaz y honesta atención depende la sobrevivencia de las empresas yde la Humanidad?

ALGUNOS COMENTARIOS FINALES SOBRE CONSUMISMO

A continuación son colocados algunos comentarios sobreconsumismo, publicados en órganos de comunicación no académicos(diarios, revistas, internet). Por su simplicidad y falta de sofisticación,parecen bien comprensibles para todo público. Veamos:1) “El ‘Financial Times’ de Londres divulgó la lista de las diez marcas

más reconocidas (Coca-Cola, Disney, Nike, BMW, Porsche,

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Mercedes-Benz, Adidas, Rolls-Royce, Calvin Klein y Rolex). Ellasconstituyen la nueva religión. Las personas se vuelven para ellas enbusca de sentido “...” Esto haria a un Descartes neoliberalproclamar: “Consumo, luego existo”. Fuera del mercado no haysalvación, alertan los nuevos sacerdotes de la idolatría consumista”.“La apropiación religiosa es evidente en los “shoppings centers”.Allí, todo evoca el paraíso: no hay mendigos, infanto-juveniles,pobreza o miseria. Con mirada devota, el consumidor contemplalos venerables objetos de consumo, acariciados por bellassacerdotisas. Quien puede pagar se siente en el cielo; quien recorreal cheque especial o a la tarjeta de crédito, está en el purgatorio;quien no dispone de recursos, en el infierno. En la salida, sinembargo, todos se hermanan en la mesa “eucarística” del Mc.Donald’s”.“El pecado original de esa nueva “religión” es que, al contrario delas tradicionales, no es altruista; es egoísta. No favorece lasolidaridad y sí la competencia; no hace de la vida un don, y sí unapose. Y lo que es peor: ofrece el paraíso en la Tierra. De la “religión”de consumo no escapa ni el consumo de la propia religión.Mientras tanto “Él tiene hambre y no le dan de comer. (Mateus15, 31-40)” Frei Betto. Religião de Consumo. Belo Horizonte:Diário da Tarde, 04.04.01, p. 02.

2) Según investigación realizada por una ONG de Estados Unidosen 2004, se constató que 73% de los consumidores que tuvieronproblemas con productos o servicios y recurrieron a los serviciosde atendimiento al cliente, salieron aún más frustrados que en elacto de la reclamación.Para 51% que además de perjudicados se consideraron mal-atendidos al protestar, el rompimiento con la organización fueinmediato. De ellos 11% prometieron venganza y 3% entraroncon acciones jurídicas.“Esta crecimiento de insatisfacción ya aumentó cinco puntosporcentuales desde 2003 y es una pésima noticia para las empresas:Nada menos que 96% de los acometidos por la ‘ira del cliente’prometen utilizar todos los medios (desde la red de relaciones

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personales a todas los medios existentes) para propagar su furia.Solo 16% (un cliente en cada seis) declararon estar satisfechos conlos servicios de atendimento”. (Página de Invertía, internet.Maltratado por empresas, el consumidor de EEUU quierevenganza. Acceso en 11.03.05 en el Site: www.terra.com.br/invertia.

3) “El punto principal que quiero subrayar es que la cooperaciónhace parte de la vida y tanto cuanto la competición, y el ‘slogan’acerca de la supervivencia del más fuerte, tuerce ese hecho”.“La sociedad abierta global no sufre ninguna amenaza externa dealguna ideología totalitaria que esté procurando la supremacíamundial. La amenaza viene de adentro... es el propio capitalismo”(George Soros. Capitalista arrependido? Revista Exame, 26.02.97,p. 14).

4) “El otro día comencé a asistir la película ‘Los Monos’. En el primerdiálogo entre Bruce Willis y Brad Pitt, éste explica por qué laspersonas son colocadas en hospicios. De acuerdo con él, no espor el hecho de ser dementes y sí por no ser consumidoreseficientes. Quien no se somete a las imposiciones de los medios,solo puede ser loco”.“Ahora, sin intención de auto-ayuda, envío el consejo de mi madre:“Apaga la TV y va a leer un libro’. Diario también sirve”. (ViníciusMauro, alumno de tercer año de la Universidad Católica de MinasGerais. Estado de Minas. 02.03.04, p.12)

5) “Niños de 10 años ya están viciados en compras en Gran Bretaña,según el Consejo Nacional de Consumidores, que informan quea esa edad, los niños ya se transformaron en ‘shopaolics’ (viciadosen compras). Ese amor por las compras, continúa a aumentar enla adolescencia y es particularmente fuerte entre las mujeresjóvenes”.

6) “La tecnología es irreversible y puede tener efectos favorables comoconseguir que el trabajo sea hecho en forma más rápida y eficiente.Pero puede ser un problema grande cuando las personas ‘tienen’que cambiar constantemente de aparatos. Por ejemplo, cuandolas personas comienzan a aprender a operar los celulares que poseen,

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se ven tentadas por nuevos modelos. Y allá van ellas a gastar másdinero, porque éstos tienen más status”“Es una comunicación perversa la introyección en las personas dela idea que no serán felices, sí no tienen determinado producto.(Maranhao Pinto, T. Renovação tecnológica ou consumodesnecessário. Revista Administração Profissional, San Pablo. Nov.2004, p. 07)

7) “El chofer brasileño es bombardeado diariamente por una largalista de productos innecesarios para su auto. Y muchos acabanengañados por propaganda falsa y sed de ganancia, de losfabricantes, comercios, concesionarias, talleres, etc”. Algunos deesos “cuentos del tío” son:

• “¿Vale la pena llenar los neumáticos con nitrógeno? (Sí, si su auto va correr en la Fórmula 1...)”

• “Amortiguadores deben ser cambiados cada 30.000Kilómetros (Ellos deben ser cambiados cuando ya nocumplan su función; si se anda por buenas calles dehormigón y sin exceso de peso, pueden durar más de100.000 km.)”

• “El funcionario condenó mi extintor porque tenía más deun año. (El extintor solo debe ser cambiado cuando elpuntero de carga entre en la faja roja)”(Doze contos-do-vigário. Estado de Minas. SuplementoVeículos. 10.10.02, p. 02)

BIBLIOGRAFIA

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(5) MARCUSE H. Eros y Civilización. Barcelona : Seix Barral. 19269,293 p.

(6)ZOHAR D.e I.MARSHALL. Inteligência Espiritual. Rio de Janeiro:Record. 2000, 349 p

(7)KOTLER P. Marketing (edição completa). San Pablo : Atlas.1980,720 p.

(8) DEMING W.E. Qualidade : a revolução da administração. Rio deJaneiro : Marques Saraiva. 1990 ,367 p.

(9) JURAN J.M. Juran planejando a Qualidade. San Pablo :Pioneira.1990, 394 p.

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(12) BONILLA J.A Plano Nacional de Alimentação. Material nãopublicado, 13 p.

(13) GARAUDY R. O Projeto Esperança. Rio de Janeiro : Salamandra.1976, 116 p.

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NUEVOS ENFOQUES

SOBRE UTOPIA Y REALIDAD

PROF. JOSÉ A BONILLA1

JUSTIFICATIVA

La orientación que prevalece en nuestra sociedad está focalizadaen una visión lineal, cartesiana: producir más, vender más, lucrarmás. Por su vez, las instituciones académicas - como regla general -están más bien preocupadas con la producción de profesionales, yno con la formación de los mismos.

Un modo de vida, que hoy está siendo globalizado, nos oprimeen forma creciente, evidenciando cada vez más síntomas dedescomposición y decadencia social , así como de las relacioneshumanas en general.

El medio de comunicación más extendido, la televisión, a travésde su prioridad por la presentación repetida y masacrante de escenassórdidas, hechos de sangre, bajeza, programas para edad mental de 8ó 9 años, acaba modelando nuestra juventud (y a los adultos) para elconsumismo, la acomodación, la falta de valores y para la ausenciade ideales por los cuales luchar.

Las instituciones universitarias, en general, ofrecen un ampliocampo de aprendizaje de conocimientos técnicos y científicos bastanteavanzados, pero no acostumbran orientar sus alumnos para

1. Professor da Faculdade de Ciências Econômicas (FACE/UFMG) -

[email protected]

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comprender la Vida, la naturaleza humana, su relación con EnergíasSuperiores, etc. Como consecuencia, levas y levas de profesionalesson producidos sin una mayor preocupación por una discusión seriay razonablemente profundizada sobre cosas fundamentales para todapersona, tales como: la forma de ver el mundo, los valores humanos,el papel que como seres humanos debemos cumplir, etc.

En su lugar, los medios de comunicación, introducen falsosdioses en la mente humana. Ellos se llaman: poder, status,consumismo, así como todas las formas de conjugar los verbos tenery poseer (objetos, inmuebles, dinero, personas). Esta preponderanciadel tener sobre el Ser se expande cada vez más en la sociedad humanagracias a la alianza del poder económico, político y de lascomunicaciones con el conocimiento técnico-científico. Estaexpansión ya asume la forma de un tumor canceroso que precisa serextirpado rápidamente, si queremos evitar su avance hasta el colapso social.

No es nuestro objetivo ser alarmistas, pero el hecho es que lasnuevas tecnologías avanzan como un monstruo ciego. ¿Si nadahacemos, cuanto tiempo falta para que nuestras vidas reales seantransformadas en virtuales? Seguramente, unos pocos años.

Aumentar más y más nuestros conocimientos científicos ytecnológicos sin sustentarlos en los verdaderos valores humanos:libertad, igualdad, fraternidad (¡ya se fueron 200 años!), armonía,paz de espíritu, amor (¡ya se fueron 2000 años!), es correrapresuradamente en dirección al abismo. Estamos saturados debombas atómicas, mísiles, destrucción, venenos, artículos superfluosy contaminantes, carencias y lujos, hambre y desempleo. ¿Dónde estála racionalidad, tan cara al método científico, corazón de la enseñanzauniversitaria, de esta sociedad?

En ella, unos se regodean en el lujo, otros vegetan o malsobreviven. Unos cuantos acaban muriendo de hambre o deenfermedades fácilmente controlables (sí hubiera Sistemas de Saluddecentes); algunos reciben diplomas de hasta “Post-Doctor” y ¿paraqué? Para acelerar el proceso, o sea el “progreso”

Creemos, sin embargo, que muchas personas, dentro y fueradel recinto universitario se rebelan contra ese modo de vida, irracional

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e inhumano. Su sensibilidad, su inteligencia y su concientización lesindican que esta no puede ser la única forma de vivir. Mientras tanto,ellas sufren en silencio porque no consiguen percibir como salir de laprisión, ni cual la alternativa a ser tentada.

Esa es la justificación para este artículo: mostrar a las personasque hay espacio para planificar nuestras vidas y que estamos aquípara participar activamente de una trascendental actividad cósmica:asumir nuestra identidad más profunda y a partir de ella, contribuirdecisivamente para crear una nueva sociedad, profundamente humana.

Este texto, está dedicado a todas las personas, sin limitación de edad,género, raza o nacionalidad. Él está dirigido a todos los seres humanos.

ORIENTACIÓN BÁSICA

La sociedad humana ya atravesó la penosa fase de la sensibilizacióny está entrando de lleno en la de concientización. Es ahora necesariodar el salto cualitativo: actuar. Pero precisamos actuar no apenasrearreglando el mundo exterior y dejando como está el mundointerior. La Historia humana, especialmente la del siglo XX mostróque esto no resuelve la problemática básica de la Humanidad:comprender cual es nuestra misión cósmica y cumplirla.

Hasta ahora, creíamos que cambiando por la fuerza (o por laley) las instituciones políticas, sociales e económicas, se podría traerfelicidad a los pueblos. Sin embargo, dolorosas experiencias de guerrasinútiles y revoluciones fracasadas muestran claramente que no podemosmás trabajar apenas con la mente y sí que debemos colocar en juego,también el corazón y el alma.

Este enfoque nos lleva a la orientación básica: desarrollar lacapacidad de pensar, sentir y actuar en un marco referencial bastantediferente al utilizado tradicionalmente en el medio académico.

Se trata de un enfoque transdisciplinario orientado para laformación de personas capaces de liderar una nueva sociedad,centrada en la Vida.

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LO “POSIBLE” Y LO “UTÓPICO”

En la vorágine de elementos que nos hunden en la globalizacióntal como es actualmente entendida, se oye a los defensores interesados(y a algunos incautos), que han perdido la noción de “conjunto” enbeneficio de la “parte” (la de ellos), decir que debemos trabajar enfunción de “lo posible” y descartar las “utopías”. A pesar de su aparenteracionalidad, esto significa rendirse al nuevo dogma.

Esas personas, muchas veces liderando diversos campos de laactividad humana, incluso política y/o académica, se volvieron derepente - tal vez como consecuencia de la caída del muro de Berlín -excesivamente pragmáticas, dejando de lado las enseñanzas que laHistoria humana nos proporciona. Tal vez, el propio Marx,concentrándose exageradamente en el Homo economicus yolvidándose del Homo homus, preparó esas mentes para su actualestado de petrificación.

Es importante, en este momento, conceptuar la palabra utopía.Se trata, según el diccionario, de aquello que es imposible,considerando el “sentido común” de las personas. Pero si agregáramosa aquella definición un pequeño detalle, tal vez se abra un nuevomundo de comprensión. En efecto, podríamos conceptuar utopíacomo “aquello que es imposible... en un determinado contexto”

Así, en la época de Leonardo da Vinci era una utopía volar (porfalta de conocimientos científicos); en la época de las dictaduraslatinoamericana era una utopía pensar en el reestablecimiento de lademocracia y elecciones libres; en el siglo XV era utopía pensar en laexistencia de América y hace 40 años era utopía pensar en viajes a la Luna.

Tal vez uno de los primeros utópicos de la especie humana fueun agricultor primitivo, hace muchos millares de años. En esa épocalos cultivos se hacían a partir de semillas colocadas en agujeros hechosen la tierra, con las manos, lo que ciertamente daría origen a uñasquebradas, sangramiento e infecciones. Era, sin duda, un procesopenoso; pero era “lo posible”. Eso fue verdad hasta que un individuo,digamos Juan, uno entre millones, tuvo la idea utópica de construiralguna cosa como una azada de piedra.

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Comunicado este “descubrimiento” a sus colegas, seguramenteellos lo habrán clasificado como “loco” (pues la palabra utópico,bien más sofisticada, apareció mucho después). Sin embargo aquelgenio desconocido, Juan, persistió en su idea, y a partir de allícomenzaron a ser creadas diferentes herramientas agrícolas, hasta llegara las actuales.

Es interesante subrayar que todos los objetos creados por elhombre, sin excepción, comenzaron como utopías, antes detransformarse en realidades concretas, tales como: peines, lámparasincandescentes, lapiceras, zapatos, transistores, autos, computadoreso rayos laser. En efecto, todos esos productos - antes de su creaciónfísica - fueron ideas utópicas en la cabeza de algunos “trastornados”.Solo después, ellos consiguieron transformarlas en realidadesmanifiestas.

O sea : utopía no es otra cosa que una prefiguración de larealidad tangible. Esto significa, ni más ni menos, que precisamosconvivir con las dos, porque ellas no son otra cosa que dos aspectosde la misma esencia. Por un lado, a un cierto nivel (superficial) ellasse oponen; a otro nivel (profundo) ellos se complementan.

En efecto, el cartesianismo - molde de nuestra cultura occidental- nos condujo a una senda unilateral: la del mundo manifiesto, o sea,“lo real” sería apenas aquello que podemos percibir a través de nuestrapercepción sensorial. Y hoy en día, ese “real” está sepultado por unaavalancha irresistible de productos tangibles y consumo exacerbado,a los que su apología acaba mostrándolos como lo único válido. Así,el reino de lo intangible (donde vive lo más selecto del pensamientoy del sentimiento humano), pasa a ser desacreditado como un sueñoinconsecuente (una verdadera “utopía”).

Históricamente, el ser humano ha sido explorado por los gruposde poder, de las más diferentes formas posibles, gracias al uso de lafuerza. En la sociedad “global”, tan cara al neoliberalismo, la acciónes mucho más sutil. ¿En efecto, para que utilizar la represión, con sucosto y sus secuelas, si es posible manipular “científicamente” al serhumano?

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ï 114 ï Nuevos enfoques sobre utopia y realidad – JOS⁄ A BONILLA

Como sabemos, el ser humano es muy maleable. Por lo tanto,el sistema le ofrece anestesiantes que lo gratifican, y le hacen pensarque es un integrante autónomo de la sociedad, que actúa coninteligencia, que es moderno, que pasa una vida “mejor”, quecomprando se alcanza la “felicidad”, etc. Un resumen compacto deesto es el jingle: “¡Todo va mejor con Coca-Cola!”.

La ilusión de autonomía es, tal vez, la nueva y más potente armadel dogma globalizante. Es realmente un arma poderosísima, tal vezmayor que la propia bomba atómica. El imperio soviético, porignorarla se disolvió, sin derramar una sola gota de sangre, a pesar desu inmenso poder militar. Veamos un ejemplo para clarificar mejorlo que queremos decir.

Imaginemos dos círculos concéntricos: uno, el exterior es elmayor, ocupando 90% de la superficie; el menor está en el centro dela figura, ocupando apenas el restante 10%. Este, el menor, representael valor real de la autonomía humana; ya el primero, el mayorsimboliza las decisiones tomadas por el sistema. Por ejemplo, unapersona de la clase media, debe tener auto, por el simple motivo deque si no lo posee, será considerado como un troglodita o unalienígena. Esa es la decisión del sistema. Pero - y aquí esta la apretadade tuerca fundamental - cada individuo tiene una cuota de libertad(algo de autonomía, ejemplificada en 10%), o sea, se abre una especiede ventana - que el sistema soviético dejó cerrada - para que laspersonas no se asfixien en un mundo de imposiciones.

En efecto, durante semanas y meses, el individuo que se estápreparando para comprar un auto, utiliza todas sus energías enconsultar anuncios en los diarios, vendedores y amigos, informándoseacerca de las virtudes y de los defectos relacionados con marcas, tipos,modelos, colores, precios y planes de financiamiento. Esto es tanagotador que cuando la persona acaba el proceso de compra, suspiradoblemente satisfecho: porque tiene en su poder el ansiado productoy porque ejerció “plenamente” su autonomía humana.

Sin embargo, no se percibe que - en realidad - el compradorapenas dio el último paso de algo que ya estaba decidido por el sistema;este deja lo micro al individuo y mantiene el control de lo macro.

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No interesa al sistema global si el ciudadano compró un MercedesBenz, un Renault o un Gol; lo importante es que él compró un autoy al hacerlo, entró en la categoría de ciudadano “normal”. Pero ¿quenormalidad es esa, cuando otros piensan por nosotros?

Pero, ¿porque este hecho - en general - no es percibido nidiscutido, incluso en las mejores Universidades? Simplemente porquetodos - de izquierda, de derecha, de centro o apolíticos - fuimoseducados en Occidente según el enfoque cartesiano, el cual aplicadoa la actual coyuntura mundial actual, solo tiene una vía por dondetransitar: crecer en términos tangibles, o sea desarrollar cada vez másproductos concretos, perceptibles por nuestros órganos sensoriales,y después aplicar un lavaje cerebral encima de las personas, para queellos sean deseados, comprados y consumidos a lo largo de un cicloininterrumpido.

Este análisis nos lleva a un punto crucial: precisamos - tal vezantes que cualquier otra cosa - repensar nuestra forma de ver elmundo, o sea, nuestra forma de pensar, sentir y actuar. Ya hace 200años Stuart Mill dijo: “Ninguna mejoría en la suerte de la Humanidadserá posible hasta que ocurra un gran cambio en su modo de pensar.”Más recientemente, Stulman, asesor del Instituto Mundial confirma:“A pesar de los avances obtenidos, de ahora en adelante, no podemoshacer nada significativo, hasta que pensemos de forma diferente”

La nueva forma de ver el mundo se llama enfoque holístico , elcual permite completar la visión cartesiana, centrada apenas en lotangible y lo manifiesto, con los aspectos intangibles y subyacentes,que forman parte del ser humano y del Universo. En ese contexto,realidad es el aspecto visible de un conjunto mayor, cuyo resto -oculto a las miradas superficiales - está impregnado de posibilidadesinfinitas, que por no haberse manifestado aún, pueden ser llamadasde utópicas (o mejor: realidades potenciales)

O sea, la Realidad se compone de dos partes. Por un lado larealidad manifiesta, tangible y observable, que es lo único importantepara el cartesianismo y cuya exacerbación nos ha llevado a la actualglobalización “caníbal”. Por otro lado, está la contrapartida de aquella:la realidad potencial que siempre estuvo, está y estará esperando que

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el ser humano la utilice para resolver sus problemas, cada vez máscomplejos y más desanimadores.

El enfoque holístico lleva en cuenta ambas realidades, cada unaen su nivel propio de acción. Por lo tanto, cualquier asunto relacionadocon la problemática social, económica, tecnológica, educativa ocultural del ser humano implicará en el equilibrio entre las dosrealidades o principios básicos del Universo. De este modo, la realidadmanifiesta hoy teñida por el mercado global, el desempleo, lacorrupción, el consumismo, el hambre, el desperdicio y la destrucciónambiental (entre otros males), podrá ser transformada en una nuevarealidad (actualmente potencial).

Esta realidad potencial o Utopía podrá ser desarrollada, a pesarde los profetas del determinismo, que una vez más nos pretendendogmatizar, haciéndonos creer que solo hoy un camino único;definitivo... y ¡feliz! Es claro que ese es el camino que les proporcionagrandes beneficios, que acabamos pagando, al pasar por ese carísimopeaje.

El gran instrumento a ser creado es ni más ni menos, que laelaboración de una Nueva Utopía, a través de los recursos que estándisponibles en el seno de la realidad potencial. (Ver Bonilla,1)

La Humanidad siempre fué a procurar este recipiente escondidocuando lo necesitó: él fue abierto por el Maestro hace 2000 años,legándonos sus elevadísimos mensajes. Cuando ellos - a través delargos siglos - fueron deturpados por el poder dogmático, laHumanidad retornó a aquellas fuentes, privilegiando la razón en lugarde los dogmas vacíos, a través del método científico.

Más tarde, las utópicas palabras Libertad, Igualdad y Fraternidadresonaron en un mundo de pesada explotación. Hoy, en el amanecerdel Tercer Milenio, en un mundo donde aquella explotación directase conserva, aunque ahora superpuesta por una fina trama demanipulación y anestesia general, es necesario volver a ese reservatorioeterno.

En definitiva y sin perder la noción de realidad manifiesta (comolo hicieron, entre otros, los héroes de Chicago luchando por las ochohoras de trabajo; Mandela y Luther King contra el racismo, Gandhi

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contra la violencia; la resistencia francesa contra el nazismo, etc )precisamos levantar nuevas banderas a las que podemos llamas de“realismo utópico”, o quien sabe “utopía realista”) ¿Y cual sería laNueva Utopía?

Precisamente, la construcción de una nueva sociedad, a partirde nuestra riqueza interior. Sin embargo, existen problemas paradesarrollar esta idea (como otras, favorables al ser humano). Comoejemplo culminante de estas dificultades, tenemos el caso de Jesúsque, con lenguaje místico, vino a proponer la creación de un nuevomundo a partir de la identificación del “Reino de los Cielos”, que Éldijo estar dentro de cada uno de nosotros. Bien sabemos cual fue sufinal: murió crucificado.

Hoy, dos mil años después, el panorama no es muy diferente,apenas la metodología de resistencia usada es más sutil. Sin embargo,el camino sigue siendo el mismo. Quizás, en lugar de la metáfora“Reino de los cielos” debamos usar la expresión: Riqueza opotencialidad interior del ser humano.

Mead (2) dice: “Es instructivo notar que todo esfuerzo hechopara llevar los hombres a pensar, haciéndolos más auto-concientes,tuvo que enfrentar resistencia, bajo la forma de queja, desprecio yresentimiento. La resistencia a un nuevo ímpetu es, invariablemente,generada por la devoción a algo que en la época era renovador”...“Los pioneros de este mundo son siempre considerados herejes,porque son personas que procuran libertarse de la inercia del sistemaexistente”... “El amante de la sabiduría es, así, un hereje natural parael ortodoxo del momento, y sus concepciones deben, “naturalmente”,ser tenidas por los amantes de las “cosas como parecen ser”, comonocivas a sus convicciones más arraigadas”

El discurso de Mead muestra una faceta del ser humano (pocoevolucionado como tal, a pesar de que pueda poseer varios diplomas,hasta el de Post-Doctor) que lo acompaña desde tiempos lejanos. Setrata de la resistencia a ideas nuevas, a cualquier demostración deinnovación en la manera de pensar, sentir y actuar (Por otro lado, lainnovación tecnológica es muy procurada). ¿Por qué? Simplementeporque ella ayuda a ganar más y más dinero y la palabra “dinero” es lapalabra de pase, el sueño de la forma de pensar que prevalece.

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Giordano Bruno (y muchos otros) fueron quemados en lahoguera; Sócrates bebió la cicuta; millares han sido torturados ymuertos en las mazmorras; Gandhi fue asesinado; Jesús, crucificado.

Hoy no son necesarios esos métodos para el sistema imperante;hay vías más sutiles. No es necesario usar la violencia física, pues sedispone de un vasto arsenal psicológico. ¿Cuantas personas, inclusoprofesores universitarios, no hablan lo que piensan por miedo de sersegregados, estigmatizados, perjudicados o despedidos?

En este siglo (XXI), en este milenio (III) y en esta Era (de Acuario)que iniciamos recientemente, debemos abrir todas las compuertasracionales, afectivas e intuicionales para incursionar en todos los temas(sin exclusiones ni tabúes) que sean necesarios para una mayorcomprensión de nuestra condición de seres humanos. Esto sedenomina enfoque transdisciplinario

ENFOQUE COMPLETO

Un enfoque completo de esta temática precisaria un librocompleto para una exposición bien detallada. Precisamente, paraesto, el autor escribió un libro , titulado “ El Cambio de verdad : laGran Utopia se transforma en Realidad”.

Para un mayor esclarecimiento, informamos a continuación, elíndice del mencionado texto (Tabela I).

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TABELA I – El Cambio de verdade

Parte I : Los principales problemas de la sociedad actual

´ Capítulo 1. Consumismo

´ Capítulo 2. Agresión al medio ambiente y sustentabilidad

´ Capítulo 3. Crisis y cambios

´ Capítulo 4. Los valores humanos a promover

Parte II. Enfoque Transdisciplinario

• Capítulo 5. Conceptos básicos sobre Transdisciplinaridad

• Capítulo 6. Las áreas de conocimiento privilegiadas : la Ciencia y la

Tecnología

• Capítulo 7. Las áreas humanas, actualmente relegadas a un segundo

plano : la Afectividad, las Artes y la Espiritualidad

Parte III. La Utopía en marcha : Educación para la Vida

• Capítulo 8 . Visión holística.

• Capítulo 9. Redescubriendo las potencialidades internas del ser

humano.

• Capítulo 10. Proyecto de Vida Personal

• Capítulo 11. El Sentido y el Significado de la Vida Humana

• Capítulo 12 : La Formación de los Líderes para la Vida.

Parte IV : La Gran Utopía y su transformación en Realidad

• Capítulo 13. Las Bases de la Gran Utopía. Quien es, realmente, el ser

humano?

• Capítulo 14. La Gran Utopía involucra um impulso cósmico

• Capítulo 15. La Gran Utopía involucra una visión transdisciplinaria

• Capítulo 16. El proceso de manifestacióin de la Gran Utopía

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ï 120 ï Nuevos enfoques sobre utopia y realidad – JOS⁄ A BONILLA

BIBLIOGRAFIA

1.BONILLA J.A El Cambio de Verdad : La Gran Utopía se transformaen Realidad. Montevideo: Nordan. 2006, 254 p.

2.MEAD G.R.S. Reflexões místicas. Curitiba : Orden Rosacruz. 1982,318 p.

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PARTE II

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GOVERNANÇA CORPORATIVA COMO

FATOR DE SUSTENTABILIDADE: AS

INFLUÊNCIAS SOBRE O EXCESSO DE

CONTROLE E O DESEMPENHO DAS

EMPRESAS DA BOVESPA

DAVID JOHN GRUBERGER1

ISABELA TRAVAGLIA SANTOS2

ROBERT ALDO IQUIAPAZA3

HUDSON FERNANDES AMARAL4

INTRODUÇÃO

Em um contexto de separação entre propriedade e controle,como apresentado por Berle e Means (1932), apareceram mudançasconceituais em termos de finanças corporativas e desenvolveu-se umaárea de pesquisa para investigar o surgimento de problemas pela fortepossibilidade de haver divergência de interesses entre os proprietáriose administradores das empresas. Os conflitos de agência, como sãochamadas essas divergências, são abordados em vários trabalhos. Jensene Meckling (1976) enfatizam que seria impossível para o acionista que

1. NUFI/FACE/UFMG. [email protected]. NUFI/FACE/UFMG. [email protected]. NUFI/CEPEAD/UFMG. [email protected]. NUFI/CEPEAD/UFMG. [email protected]

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ï 124 ï Governança corporativa como fator de sustentabilidade – DAVID JOHN GRUBERGER et. al.

o agente administrador da empresa maximizasse seus interesses semcustos adicionais.

Os estudos sobre governança corporativa examinam osmecanismos usados para diminuir esses conflitos e os gastos geradospor eles, de forma a obter uma maior eficiência nas operações daempresa e uma maior geração de valor para os diferentes interessadosno funcionamento da empresa (stakeholders). Pressupõe-se assim queo maior nível de governança poderia gerar um maior valor ao reduziros custos de agência. Mas também é válido pensar que empresas maisvaliosas possuam maiores recursos e mecanismos para implementarmaiores níveis de governança.

MARCO TEÓRICO

Andrade e Rossetti (2004) afirmam que há várias posiçõesconceituais referentes a governança corporativa. Existem aqueles quese concentram nos direitos dos acionistas minoritários; outros nosistema de relação existente entre acionistas, conselho e diretoria; háainda os que se preocupam com os sistemas de governo, gestão econtrole, a estrutura de propriedade e a definição de estratégias; epor último, os que enfatizam o sistema de valores e o padrão decomportamento da firma. Importantes organizações têm seus própriosconceitos de governança corporativa.

Segundo o Relatório Oficial sobre Governança Corporativa naAmérica Latina da OECD (2003), há aspectos importantes a seremressaltados sobre o assunto na região. Entre eles estão as privatizações;a alta concentração de propriedade; a existência de grandes gruposindustriais; a reestruturação dos sistemas bancários com a entrada debancos internacionais; a incorporação de modelos de governançadevido a fusões em diversos setores; a crescente importância de registrosde valores mobiliários no exterior (ADRs); a importância dos fundosde pensão, obrigados a ter um alto grau de responsabilidade com opúblico; e as tradições jurídicas, com práticas relativamente novasem termos de arbitragem. Essas características deixam claro que hámuitos desafios a serem superados no caminho da adoção de melhorespráticas de governança corporativa.

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Uma discussão importante no estudo da estrutura depropriedade é a classificação dada á forma como ela é influenciadapor outras variáveis. A discussão da exogeneidade ou não das variáveisque envolvem estudos sobre governança corporativa, para aplicaçãono modelo econométrico, é trazida por Bøhren e Ødegaard (2005),os quais afirmam que, em sua maioria, os trabalhos tratam agovernança corporativa como uma variável exógena. Segundo osautores, os problemas de endogeneidade e causalidade reversafavorecem o uso de um sistema de equações simultâneas, mas aefetividade de tal modelo dependeria da maneira através da qual ateoria apresenta restrições bem fundadas ao modelo. A falta de umateoria geral definitiva, ou no mínimo mais consensual, de governançacorporativa traz a dúvida de qual modelo seria mais eficiente naestimação das variáveis influenciadoras da governança corporativa.

OBJETIVOS

Este projeto objetiva analisar a relação entre a governançacorporativa; a estrutura de propriedade, sob o aspecto daconcentração e excesso de controle; e o desempenho das empresasque fazem parte da amostra.

METODOLOGIA

Foi utilizado um modelo de regressão múltipla (a estimação foifeita pelo método de Mínimos Quadrados Ordinários). Esse métodofoi escolhido levando em conta a hipótese da exogeneidade.

Usou-se para cada equação o modelo de dados em painel deefeitos fixos, com a inclusão de variáveis dummy, para encontrar ainfluência de cada período no modelo e também para cada empresa.Isso permite o controle das características não observáveis de cadaempresa. Nessa especificação todas as observações são incluídasconjuntamente em uma cross-section e no tempo.

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Quadro 1 - Variáveis principais

Variáveis Definição das variaveis - Fórmulas

Governança Corporativa(IGOV)

Foi usada como proxy um índice proposto por Silveira,Barros e Famá (2004). É importante destacar quediferentemente de Silveira, Barros e Fama (2004), queutilizou o índice somente para 2002, no presente trabalhoampliou-se o cômputo do índice de qualidade dagovernança abrangendo todos os anos da amostra, de2002 a 2005.

Valor (Q)

É uma proxy para odesempenho-valorda empresa muito

usada nos trabalhosda área de finanças

Estrutura de Propriedadee Controle (ESTPROP)

Foi calculado da seguinte maneira:

iAT

iDiVMPNiVMON ++≅Tobin de Q

Excesso do direitode voto (EXC3,

levando em contaos três maiores

acionistas)

Como apresentado por Okimura,Silveira e Rocha (2004):

1PROP

CON−=EXC

∑ ∑∑5

1=l iε+siANOsµ4

1s=+liIDENTlγ+jiINDjδ

17

1=j+iADR*9β+iBOV*8β+iLIQ*7β+

iTANG*6β+iTAM*5β+iCREC*4β+iPAYOUT*3β+iVALOR*2β+iESTPROP*1β=IGOV

Equação 1

Pode-se notar que existe uma esperança de que a governançacorporativa tenha impacto positivo na atuação das empresas emvariados âmbitos, seja por um prêmio que os investidores estariamdispostos a pagar por empresas mais transparentes, seja porque essasempresas teriam vantagem interna, analisando por uma óticaadministrativa, podendo-se afirmar, então, que boas práticas degovernança corporativa teriam relação positiva com o valor e negativacom a concentração de propriedade.

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Fonte: elaboração própria

Quadro 2 - Variáveis de controle

Variáveis Definição das variaveis

Índice de Payout definido como dividendo pago por ação sobre lucrolíquido por ação ao final o exercício.

Tamanho da empresa(TAM)

definido como o logaritmo da receita operacional líquidada empresa ao final do exercício.

Oportunidades futurasde crescimento (CREC)

definida pelo crescimento percentual acumulado dareceita operacional, nos últimos três anos.

Natureza da operação(TANG)

definida como o ativo imobilizado bruto sobre a receitaoperacional líquida. É uma proxy para o nível detangibilidade das operações da empresa.

Liquidez da ação (LIQ)valor calculado pelo sistema Economática®, levandoem conta o volume de negócios com a ação da empresadurante o ano.

Setor da indústria (IND)

dummy para setores da empresa. Computa-se 1 àempresa que pertence a um determinado setor e 0àquelas que não pertencem a esse setor. Adotou-se ocritério de classificação setorial do sistemaEconomática®, que lista cada empresa e sua respectivaclassificação.

Identidade do acionistacontrolador (IDENT)

variável dummy para identidade do acionista controlador,sendo: 1) propriedade privada nacional (IDENT1); 2)propriedade estatal nacional (IDENT2); 3) propriedadeestrangeira (IDENT3); 4) propriedade nacional holding(IDENT4); 5) propriedade estatal holding (IDENT5); e 6)propriedade estrangeira holding (IDENT6).

Nível de governançacorporativa (BOV)

variável dummy para empresas listadas em algum dosníveis de melhores práticas de governança corporativada BOVESPA

Emissão de ADRs(American Depositary

Receipts)

variável dummy para empresas que têm ADRsemitidas.Uma empresa com emissão de ADRs éobrigada a cumprir regras de governança corporativarígidas, do mercado acionário norte-americano.

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RESULTADOS (ESPERADOS)

Os resultados preliminares indicaram significância estatística apelo menos 5% nas variáveis VALOR (Q), CREC, ADR, BOV, TAM,TANG, todas essas influenciando positivamente IGOV. EXC3, LIQforam significativas, mas tiveram coeficientes negativos. Os resultadosestão dentro do esperado teoricamente, já que o VALOR tem relaçãopositiva e significativa estatisticamente com IGOV, ou seja, agovernança corporativa é bem vista pelos investidores, que pagariamum bônus por essas ações; e EXC3 (excesso de concentração depropriedade) tem valor negativo, indicando que um maior excessode concentração de propriedade está conduz a um menor nível dequalidade de governança corporativa.

É importante notar, entretanto, que apesar de a maioria dessasvariáveis apresentarem alta significância estatística em relação à IGOV,ainda é necessária a estruturação de um modelo que verifique ahipótese de causalidade reversa entre VALOR, IGOV e ESTPROP.Esse modelo poderia fornecer de maneira mais confiável as relaçõesentre essas três variáveis, permitindo observar se de fato há a presençade endogeneidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERLE, Adolf Augustus; MEANS, Gardiner Coit. A moderna sociedadeanônima e a propriedade privada. 3. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988.322p.

BØHREN, Øyvind; ØDEGAARD, Bernt Arne. Governance andperformance revisited. In: ALI, Paul; GREGOURIU, Greg.International Corporate Governance after Sarbanes-Oxley. Willey,2005. p. 27-64. Disponível em: <http://finance-old.bi.no>. Acessoem: 01 abr. 2007.

DEMSETZ, H.; LEHN, K. The structure of corporate ownership:causes and consequences. Journal of Political Economy, v. 93, n. 6, p.1155-1177, Dec.1985.

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OKIMURA, Rodrigo Takashi ; SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da ;ROCHA, Keyler Carvalho . Estrutura de Propriedade e DesempenhoCorporativo no Brasil. RAC-Eletrônica, v. 1, n. 1, art. 8, p. 119-135,Jan./Abr. 2007, 2007.

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SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da; BARROS, Lucas Ayres B. C.;FAMÁ, Rubens. Determinantes do Nível de Governança Corporativa dasCompanhias Abertas Brasileiras. In: 4º Encontro Brasileiro de Finanças,2004, Rio de Janeiro, Anais ... 2004.

SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da; BARROS, Lucas Ayres B. C.;FAMÁ, Rubens. Atributos Corporativos, Qualidade da GovernançaCorporativa e Valor das Companhias Abertas no Brasil. In: 5º EncontroBrasileiro de Finanças, 2005, São Paulo, Anais ... 2005.

WOOLDRIDGE, J. M.. Introdução à Econometria: uma abordagemmoderna. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2006.684 pgs.

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1. Professor Doutor da Faculdade de Ciências Econônicas (FACE)- UFMG.carlos @face.ufmg.br

2. Graduando em Administração FACE/UFMG. [email protected]. Graduando em Administração FACE/UFMG. [email protected]. Graduando em Administração FACE/UFMG. [email protected]

ALIANDO O BOM DESEMPENHO

EMPRESARIAL AO DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL: UM ESTUDO SOB AÓTICA DAS PERSPECTIVAS

AMBIENTAL, SOCIAL, ECONÔMICA EDA GOVERNANÇA CORPORATIVA

CARLOS ALBERTO GONÇALVES1

FÁBIO ROBERTO FERREIRA BORGES2

GUSTAVO FERREIRA MENDES DE SOUZA3

JULIANE DE ALMEIDA RIBEIRO4

RESUMO

Tendo-se em vista o atual contexto mundial, reflexo do processode globalização iniciado na década de 50 e no qual desenvolveram-seas grandes multinacionais que possuem influência e poder em escalaglobal, é possível perceber quão importante se torna o termodesenvolvimento sustentável. A conscientização das organizações noque tange à responsabilidade em suas dimensões social, ambiental,

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ï 132 ï Aliando o bom desempenho empresarial ao desenvolvimento sustentável – CARLOS ALBERTO GON«ALVES et. al.

econômica e corporativa, previstas no Índice de SustentabilidadeEmpresarial (BOVESPA, 2005), revela-se um requisito para o alcanceda sustentabilidade. O presente projeto tem como principal objetivoentender a dinâmica da tomada de decisões por parte dos altosexecutivos e a visão de estudantes de graduação no que diz respeito àsquatro dimensões acima salientadas, analisando a relação desses fatorescom o bom desempenho das empresas. A metodologia utilizada paraa coleta dos dados será a realização de um estudo com ênfasequalitativa, multicaso, com uma estimativa inicial de entrevistar emmaior profundidade quatro empresas através da técnica Laddering. Oprojeto contará também com uma pesquisa quantitativa, na qualutilizar-se-á a modelagem de equações estruturais para a análise dossurveys, contando para isso com o auxílio dos softwares SPSS e AMOS.

Palavras-chaves: Desenvolvimento sustentável; Desempenho; Índicede Sustentabilidade Empresarial.

1. INTRODUÇÃO E MOTIVAÇÃO

No atual contexto mundial, as multinacionais são exemplos deempresas que possuem certa influência, às vezes até mesmo global(TAPIOLA, 1999). Hoje, uma grande multinacional pode ser, de fato,um conglomerado de empresas de pequeno e médio porte em 100 a150 países que, em decorrência, assume voluntariamente ouinvoluntariamente uma grande responsabilidade para com a sociedadeque não abrange apenas aspectos econômicos, mas também todosaqueles necessários para se alcançar o desenvolvimento sustentável.

Contudo, o tamanho e o poder das empresas multinacionaismostram-se tão grandes que são necessários instrumentos e aliançasfortes para fazer oposição às conseqüências sociais e ambientaisnegativas que às vezes causam. Nesse sentido, muitos estudiosos jáadmitem que é preciso fazer com que a globalização contribua para odesenvolvimento sustentável, defendendo a criação de um marco legalvinculante que regule a prestação de contas das empresas (TORRESet al., 2004). Assim também defende a Organização para Cooperação

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e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cujos membrosidentificaram o desenvolvimento sustentável como prioridadeessencial. O termo sustentável é interpretado por eles de modo aincluir considerações sociais, ambientais e econômicas.

Em 1975, a OCDE criou o Comitê sobre InvestimentoInternacional e Empresas Multinacionais (CIME) para investigar aspossibilidades de se criar um código de conduta para asmultinacionais. Foram criadas no ano seguinte as linhas de diretrizesda OCDE, as quais visam estabelecer princípios e normas voluntáriospara uma conduta responsável, voltada a potencializar a contribuiçãoque as empresas podem dar ao desenvolvimento sustentável. Comesse mesmo propósito pode-se citar também a Declaração Universaldos Direitos Humanos, a Declaração Tripartite da OIT sobre EmpresasMultinacionais e Política Social, a Declaração do Rio e a de Copenhague.

Todos esses esforços têm como objetivo evitar que empresaspoluam o meio ambiente, maltratem funcionários, pratiquem acorrupção ou a evasão fiscal – como foi o caso da empresaestadunidense ENRON –, desrespeitem os direitos humanos ouimpossibilitem, de outras maneiras, o chamado desenvolvimentosustentável. No entanto, é preciso estabelecer uma coerência entre odiscurso da empresa e suas práticas. Organizações que procurammostrar uma imagem verde ou social e não atuam em conformidadecom essa meta, praticam o chamado greenwash (lavagem verde) e nãoresponsabilidade social empresarial. Além disso, a transparência e oacesso à informação são aspectos indispensáveis à responsabilidadesocial empresarial.

Nesse sentido, faz-se necessário o estudo acerca da possibilidadede se alinhar o bom desempenho empresarial com o desenvolvimentosustentável. Esse não deve abranger somente as grandes corporaçõesmultinacionais, mas também grandes empresas nacionais ou locaisque igualmente podem contribuir para o desenvolvimento sustentávelda região na qual atuam, de forma ainda mais intensa do que astransnacionais. Além disso, incluir-se-á como uns dos critérios parase atingir o desenvolvimento sustentável a governança corporativa, asconsiderações sociais, ambientais e econômicas.

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ï 134 ï Aliando o bom desempenho empresarial ao desenvolvimento sustentável – CARLOS ALBERTO GON«ALVES et. al.

2. OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

Entender a dinâmica da tomada de decisões por parte dos altosexecutivos e a visão de estudantes de graduação no que diz respeito agovernança corporativa e aos aspectos econômico-financeiros,ambientais e sociais da organização, analisando a relação desses fatorescom o bom desempenho das empresas.

2.2 Objetivos específicos

• Identificar, através da técnica de modelagem de equações estruturais,como o bom desempenho das organizações reflete em cada umadas quatro dimensões analisadas.

• Identificar pontos comuns e discrepantes entre o discurso dosaltos executivos e a visão dos estudantes de graduação.

• Classificar a amostra de estudantes em um pequeno número degrupos mutuamente excludentes, de acordo com as similaridadesobtidas na análise das quatro dimensões – GovernançaCorporativa, Equilíbrio Ambiental, Justiça Social e EficiênciaEconômica.

• Observar as semelhanças e diferenças entre o discurso dos altosexecutivos nos diferentes setores da economia.

3. REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 Desempenho

A razão pela qual o desempenho é um objeto de estudopesquisado cada vez mais no âmbito das empresas e também daacademia decorre do fato de que sem a avaliação de desempenhoadequada não há sistema integrado e eficaz de gestão empresarial(ALMEIDA et al., 2004). Pode-se concluir, então, que a mensuraçãodo desempenho é uma ferramenta de grande valia para os gestores,

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ainda mais para aqueles que convivem em ambientes turbulentos ehiper-competitivos.

Ainda de acordo com Almeida et al. (2004) existem diversasmaneiras de classificar os indicadores de desempenho em umaorganização, sendo Rummeler e Barche (1994), Hronec (1994), Garvin(1998) e Parmenter (2002) alguns dos autores mais referenciados nessesentido. No entanto, a metodologia mais amplamente utilizada naatualidade é o Balanced Scorecard (BSC), desenvolvida em 1992 porKaplan e Norton.

Propõem-se aqui uma abordagem alternativa para o desempenho,sendo tal construída com seus alicerces formados a partir do Índicede Sustentabilidade Empresarial BOVESPA (2005). No entanto nãose pretende mensurar o construto desempenho e sim identificar comoo bom desempenho das organizações reflete em cada uma das quatrodimensões analisadas e estudadas nas seções seguintes. Serão elas: agovernança corporativa, eficiência econômica, justiça social e equilíbrioambiental. Dessa forma, as propostas do presente projeto possuemuma visão ampla voltada não somente para os processos internos,mas também para as relações estabelecidas para com o ambiente externo.

3.2 Governança corporativa

Historicamente, as firmas ao redor do mundo eram constituídase administradas pelos proprietários-fundadores e seus descendentes.Entretanto, a medida em que as firmas foram crescendo, esse quadrofoi alterado. Em decorrência desse fato percebe-se um distanciamento,cada mais visível, entre os donos do capital – proprietários doempreendimento – e os gerentes que decidem “onde” e “como” ocapital deve ser aplicado. Dessa forma, o controle que antes era feitoem grande parte pelos próprios donos da empresa passa agora a serexercido, cada vez mais, por administradores profissionais (OLIVEIRAet al., 1999).

Nesse novo cenário de maior complexidade administrativa, osproprietários passaram a contratar especialistas em assuntos de gestão,remunerados de acordo com sua eficiência na obtenção de resultados.

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Além disso, esse processo gerou a figura do acionista, o qual surge,portanto, da dissociação entre gerentes e proprietários.

Os acionistas se tornam especialistas em administrar o risco deseus investimentos e os gerentes em tomar decisões (HITT et al., 2002).Assim, soma-se à especialização dos administradores para tomardecisões à do proprietário para enfrentar o risco, o que torna acompanhia mais forte do ponto de vista da eficiência das decisõesestratégicas e da captação de recursos no mercado financeiro,respectivamente.

A relação entre acionistas e gerentes (ou executivos de alto nível)revela certas particularidades que os tornam bastante interligados.Isso ocorre porque as decisões tomadas no âmbito da empresainfluenciam diretamente o valor das ações no mercado. Essa disposiçãode interações entre proprietários, gerentes e acionistas motivou odesenvolvimento da Teoria da Agência, onde a separação entreproprietários e gerentes cria uma relação de agenciamento, como afirmaHitt et al. (2002).

Nesse cenário das grandes corporações modernas e da distinçãoentre controle e propriedade, surge uma relação chamada governançacorporativa. Segundo Hitt et al. (2002), a governança corporativarepresenta a relação entre os investidores, que é utilizada paradeterminar e controlar a direção estratégica e o desempenho dasorganizações. Em seu aspecto central, a governança corporativapreocupa-se com a identificação de formas que garantam que asdecisões estratégicas sejam tomadas eficientemente. Além disso, elapode ser imaginada como um meio utilizado pelas corporações paraestabelecer ordem entre as partes – os proprietários da firma e seusgerentes de alto nível –, cujos interesses possam estar em conflito.Assim, a governança corporativa reflete os valores da companhia.

A governança corporativa colocou uma significativaresponsabilidade e autoridade nas mãos de gerentes de alto nível (HITTet al., 2002). Isso porque eles, muitas vezes juntamente com oConselho de Administração, são os indicados para a formulação eimplementação de estratégias que resultem na maximização do valorda empresa e, portanto, da riqueza dos acionistas, quetradicionalmente são considerados os stakeholders-chave da empresa.

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3.3 Equilíbrio Ambiental

O relatório do Painel Intergovernamental de MudançasClimáticas – IPCC, no inglês – da Organização das Nações Unidas –ONU –, divulgado no início desse ano, aponta como muito provávelque o aquecimento global, registrado em meados do século XX atéos dias atuais, tenha sido causado pelo aumento das concentraçõesantropogênicas de gases do efeito estufa. Com a percepção da relaçãoentre as atividades humanas (econômicas em maior grau) comocausadoras de um efeito global de conseqüências naturais em grandeescala, a gestão ambiental estabelece-se como foco das discussões emfóruns e acordos internacionais, a fim de encontrar soluçõessustentáveis para o meio-ambiente, provocando (re)arranjosorganizacionais nos setores produtivos (CARRIERI, 1999).

Existem duas tendências no meio organizacional em respostaao projeto global da sustentabilidade ambiental. A primeira, parteda análise de que esta corrente de ações responsáveis empresariaisseriam uma adequação às regulações públicas ou privadas. A segundatendência é de que as empresas adotam políticas de gestão ambientalcomo estratégias de aumento da competitividade, explorandooportunidades de mercado e gerando novas demandas (CARRIERI,1999).

As empresas com grande inserção no mercado internacionalestão tomando decisões relacionadas às estratégias ambientais, poissão de efeito global em cadeia, as conseqüências nocivas das suasatividades econômicas. North (1992) afirma que existe uma dubiedadenas ações ambientais empresariais em países de centro e periféricos,pois essas ações geralmente estão atreladas à força dos movimentosambientalistas, pressões governamentais e opinião pública local. Comisso, empresas ambientalmente responsáveis em suas instalações naEuropa, por exemplo, podem ser ambientalmente irresponsáveis emoutras partes do mundo onde não existem pressões para decisõesnesse sentido, como é o caso dos Tigres Asiáticos.

Maimon (1992) diferencia estratégias de preocupação ambientalcomo reativas/defensivas e “competitivas”. Estratégias reativas/

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defensivas seriam ações como prevenção e limpeza da poluição,alinhando-se com normas anti-poluição e Relatórios de ImpactoAmbiental (Rima). Estratégias “competitivas” partem da visão de quea responsabilidade ambiental é um serviço a ser vendido, explorandooportunidades de mercado e gerando novas demandas (CARRIERI,1999).

3.4 Responsabilidade social no contexto organizacional

O conceito de Responsabilidade Social sofreu várias modificaçõescomo a idéia de que os empresários tinham o dever moral deimplementar as políticas, tomar as decisões ou seguir as linhas deação que sejam desejáveis em torno dos objetivos e dos valores denossa sociedade (BOWEN, 1957). Tal conceito se contrapunha aosprincípios da caridade e da custódia uma vez que impingia umalimitação nas ações, transferindo a ótica do que era objetivo e valordo empresário para a sociedade. Entretanto, alguns estudiososdefendiam a idéia de que a responsabilidade pelo suprimento de taisnecessidades sociais eram de organizações podendo ser denominadas“sem fins lucrativos” como igrejas, governo, organizações não-governamentais, sendo as corporações obrigadas somente a satisfazerseus acionistas (FRIEDMAN, 1963).

Para Lourenço e Schröder (2003), nas décadas de 1970 e 1980,a ética empresarial começou a se desenvolver e se consolidou comocampo de estudo através da contribuição de filósofos, das conferênciasrealizadas no intuito de discutir responsabilidades sociais e questõesmorais e éticas no plano dos negócios e nos semináriosinterdisciplinares e centros destinados a estudar tais assuntos.

O movimento da valorização da responsabilidade socialempresarial ganhou forte impulso no Brasil por meio da ação deentidades não-governamentais, institutos de pesquisa e empresassensibilizadas pela questão. Com uma maior participação de autoresna questão da responsabilidade social, o final da década de 90apresenta a discussão sobre as questões éticas e morais nas empresas,o que contribui de modo significativo para a definição do papel das

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organizações. Assim sendo, Richard Daft (1999: 88) define aresponsabilidade social como “(...) a obrigação da administração de tomar

decisões e ações que irão contribuir para o bem-estar e os interesses da sociedade

e da organização”.O Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e o

Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, são asorganizações que atuam de forma expressiva no Brasil, reunindoempresas preocupadas em desenvolver ações voltadas para acomunidade e praticar seus negócios de maneira ética e socialmenteresponsável. Tais empresas surgiram em 1995 e 1998, respectivamente,e embasam o desenvolvimento de tal conceito no Brasil, sendo assuntorecorrente na mídia nacional assim como no campo científico.Segundo o presidente do Instituto Ethos, Oded Grajew (2001),responsabilidade social é definida como

(...) a atitude ética da empresa em todas as suasatividades. Diz respeito às interações da empresa comfuncionários, fornecedores, clientes, acionistas,governo, concorrentes, meio ambiente e comunidade.Os preceitos da responsabilidade social podembalizar, inclusive, todas as atividades políticasempresariais.

3.5 Responsabilidade econômica no contexto organizacional

A lógica capitalista de redução de custos e aumento do lucrogerou efeitos devastadores sobre o ambiente social – encarando oâmbito global e considerando o contexto de centro-periferiaconstatado na globalização –, e, também, para o meio ambiente, namedida em que os recursos naturais utilizados na produção não foramextraídos de maneira sustentável e a poluição, gerada pela produçãodos mais diversos produtos, ultrapassou fronteiras e o seu efeitotambém se globalizou.

Com o agravamento da percepção dos efeitos gerados pela corridacapitalista, como nocivos social e ambientalmente, os países

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desenvolvidos, grandes responsáveis por esses efeitos, começaram adesenvolver raciocínios sustentáveis, tanto no âmbito governamentalcomo social. Leis e acordos internacionais como o “Princípio Valdez”,o “Relatório Brundtland” e a “Agenda 21” começaram a dar sinais deque o desenvolvimento tecnológico não poderia desprezar o contextoglobal (SOUZA, 1993). Enfim as empresas se encontraram inseridasno ambiente ao qual pertenciam, e a perspectiva exterior daorganização passou a ser ressaltada.

O lucro nunca deixou de ser base e motor para a sobrevivênciade uma organização. Uma organização que priorizasse açõesresponsáveis em termos ambientais e sociais, em detrimento do lucro,sem outra fonte de renda confiável, estaria destinada a extinção, eessas suas ações seriam simples filantropia.

As estratégias organizacionais recebem pressões governamentais,em forma de leis e regulamentos, interesses de grupos (como os lobbies),pesquisas públicas e da mídia, consensos éticos, para a sua tomadade decisão, de acordo com Mcgowan e Mahon (1992). Todos essesinteresses devem ser equacionados com a possibilidade dos custos, acadeia produtiva e dispêndio em pesquisa tecnológica, na tomadadas decisões estratégicas dos gestores. Variáveis de uma equação dedifícil equilíbrio racional.

As ações responsáveis social e ambientalmente encaradas tantosob a ótica de uma busca por vantagens competitivas, explorandooportunidades de mercado e gerando novas demandas, quanto pelaótica de simples adequação às regulações públicas ou privadas, nuncadevem desprezar que ações desse tipo são conseqüência e imagem davitalidade da empresa realizadora, que por sua vez mantém-seinvariavelmente sustentada pelo capital e lucro. O raciocínio cíclicosustenta o fato de que o lucro não deixa de ser foco organizacional,por conta de suas ações sociais e ambientais, mas passa a serindispensável para que essas ações continuem existindo.

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4. METODOLOGIA

Para a mensuração e respostas às questões anteriores e atingir osobjetivos propostos adotar-se-á como metodologia de pesquisa duasdiferentes linhas de análise, sendo a primeira qualitativa e a segundaquantitativa. Ressalta-se que as unidades de observação para ambasas fases acima citadas serão diferentes, sendo para aquela com ênfasequalitativa os altos executivos de grandes corporações mineiras dossetores energético, siderúrgico, cimenteiro e celulose e papel. Já paraa análise quantitativa a amostra será composta por alunos degraduação dos cursos de administração, engenharia ambiental, ciênciassociais e ciências econômicas. No que tange ao conteúdo a seranalisado, em ambas as fases do projeto serão utilizados os critériosestabelecidos pelo Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE),BOVESPA (2005).

As metodologias a serem utilizadas em cada uma das fasestambém são diferentes, na fase de caráter exploratório, o estudo serámulticaso e pretende-se entrevistar em maior profundidade quatroempresas, procurando identificar como o bom desempenho dasorganizações reflete em cada uma das quatro dimensões analisadaspelo ISE. Para as análises das entrevistas serão adotadas as técnicas deanálise do discurso e do conteúdo.

Na fase de natureza conclusiva descritiva far-se-á uma pesquisatipo survey com a aplicação de um questionário estruturado comindicadores que mensurem os conceitos propostos na pesquisa. Oquestionário a ser desenvolvido será composto por perguntas denatureza demográfica e indicadores estabelecidos pelo ISE para cadauma das quatro dimensões analisadas. O tratamento estatístico dosdados coletados abrangerá duas das técnicas multivariadas expostaspor Hair (2005), a análise de agrupamento e modelagem de equaçõesestruturais.

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5. RESULTADOS ESPERADOS

Na pesquisa qualitativa espera-se encontrar evidências quecomprovem a relevância das quatro dimensões do ISE para asorganizações, e a existência de uma estrutura hierárquica, comprofissionais e processos formalizados para atender às demandas decada dimensão. Na pesquisa quantitativa espera-se encontrar algunsgrupos que espelhem enfoques um pouco diferentes a respeito daimportância de cada dimensão, mas que apresentem em comum aintercomplementariedade dinâmica existente entre os quatro critérios.

REFERÊNCIAS

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SUSTENTABILIDADE E EFETIVIDADE

DE ONG´S AMBIENTAIS:A INFLUÊNCIA DO PROCESSO

GERENCIAL

DÉBORA NACIF DE CARVALHO1

IVAN BECK CKAGNAZAROFF 2

1. INTRODUÇÃO

As organizações do Terceiro Setor têm adquirido importantepapel na sociedade, tanto na prestação de serviços quanto no controlee mobilização social (LEWIS, 2001). Em conseqüência, novasexigências lhes têm sido impostas (ARMANI, 2003; FALCONER, 1999).

Segundo Falconer (1999), se nas décadas de 1970 e 1980 osmaiores desafios das organizações do Terceiro Setor eram asobrevivência em um ambiente político hostil e a conquista dereconhecimento público para suas causas, na década de 1990 alegitimidade e a credibilidade do setor advêm de sua competênciaem agir de forma eficiente e eficaz na prestação de serviços.

O aumento da visibilidade das organizações do Terceiro Setortrouxe maiores exigências quanto à sua capacidade de realizar umtrabalho de qualidade, de posicionar-se politicamente e de suprir as

1. Centro de Pós-graduação e Pesquisas em Administração – [email protected]

2. Centro de Pós-graduação e Pesquisas em Administração – [email protected]

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demandas sociais. Os desafios impostos se tornam mais difíceis edemandam efetividade destas instituições (ARMANI, 2003).

Neste contexto, a gestão das instituições da sociedade civiladquire grande relevância, merecendo a atenção da academia (LEWIS,2001). Enfatizando esta necessidade, Falconer (1999, p. 20) colocaque “paradoxalmente, para um setor que surge com tão elevadasexpectativas a respeito de suas qualidades e seu potencial de atuação,o Terceiro Setor brasileiro parece mal equipado para assumir estepapel”. O autor ressalta também a baixa capacidade de continuidadee sustentabilidade destas organizações.

Para Armani (2003), a capacidade de sustentabilidade dasorganizações do Terceiro Setor não está relacionada apenas a sua gestãointerna, mas também à gestão do seu relacionamento com o ambienteem que estão inseridas. Ou seja, a sustentabilidade enfoca questõesque dizem respeito ao funcionamento interno e à inserção sociopolíticadas organizações.

Considerando o relevante papel das organizações do TerceiroSetor na sociedade e os desafios enfrentados na busca de suasustentabilidade, o presente trabalho procurou responder à seguintepergunta de pesquisa: Como se dá a gestão de organizações do Terceiro

Setor sob a ótica da sustentabilidade?

Para tanto, foram discutidos os conceitos centrais da pesquisa -Terceiro Setor e sustentabilidade - bem como as dimensões dasustentabilidade que nortearam o trabalho: administração estratégica,gestão de pessoas, administração de recursos, gestão de impactos,capacidade de accountability, capacidade de advocacy, gestão da imagempública, administração de parcerias e sistema legal. Posteriormente,foram apresentados os procedimentos metodológicos adotados pelapesquisa, juntamente com os dados coletados e analisados. Por fim,foram tecidas as considerações finais, apontando os limites do estudoe sugestões para futuras pesquisas.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Contextualização histórica

Como defendem muitos autores (FALCONER, 1999;RODRIGUES, 1997; COELHO, 2002; GOHN, 1997; THOMPSON,1997; GONÇALVES, 1996), o fenômeno do Terceiro Setor não érecente no Brasil. Rodrigues (1997, p. 43) afirma que

[...] somente agora, nos anos 90, é que ele começa ase distinguir dos setores público e privado. Narealidade, constitui uma composição híbrida deambos, o que lhe confere características bemespecíficas e complexas (objetivos públicos econstituição privada).

A fim de realizar uma reconstituição da evolução histórica doTerceiro Setor brasileiro, faz-se a identificação de quatro momentosdistintos, a partir das colocações de Fernandes (1994) e Landim(1993).

No primeiro momento, compreendendo o período situadodesde a época da colonização até meados do século XX, as ações deassistência social, saúde e educação eram realizadas principalmentepela Igreja Católica, na forma de asilos, orfanatos, Santas Casas deMisericórdia e colégios católicos. As chamadas “associaçõesvoluntárias” eram permeadas por valores da caridade cristã,demonstrando como a noção de filantropia, inicialmente, era ligadaa preceitos da Igreja Católica.

O segundo momento foi marcado pelas diretrizes do governode Getúlio Vargas, apoiadas na intervenção estatal na economia e nasociedade. Neste período, o Estado assume o papel de formulador eimplementador das políticas públicas, contando com a colaboraçãode organizações sem fins lucrativos para sua implementação. Paratanto, é promulgada, em 1935, uma lei que declara de utilidadepública estas entidades. Em 1938, é criado o Conselho Nacional de

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Serviço Social (CNSS), que estabeleceu que as instituições neleinscritas poderiam receber subsídios governamentais. Quanto à Igreja,esta continua tendo papel importante na prestação de serviços sociais,recebendo, em alguns casos, financiamentos do Estado para as suas obras.

O terceiro momento da evolução histórica do Terceiro Setorno Brasil é caracterizado por uma intensa mobilização da sociedade.Na vigência do regime militar, muitas instituições de caráterfilantrópico e assistencial se juntam às organizações comunitárias eaos chamados “movimentos sociais” para serem porta-vozes dosproblemas sociais. É neste período que surgem as ONGs, instituiçõesligadas à mobilização social e à contestação política.

Com a redemocratização do País, a partir de 1980, e o declíniodo modelo intervencionista de Estado, a partir 1990, a questão dacidadania e dos direitos fundamentais passa a ser o foco das instituiçõessem fins lucrativos, configurando o quarto momento da evolução histórica.Neste período, começa a crescer a articulação do Terceiro Setor comogrupo, apesar da heterogeneidade das instituições que o compõe.

2.2 Conceito e características das organizações do Terceiro Setor

O conceito do Terceiro Setor ainda paira em terreno nebuloso,sendo alvo de intensas discussões. Definir um conceito para um grupode organizações de composição híbrida e de características complexascomo as organizações do Terceiro Setor não é tarefa fácil. Franco(1997) apud PEREIRA e GRAU (1999, p. 37) define-as como

[...] formadas por grupos de cidadãos na sociedadecivil, originalmente privados, mas cuja atuação ocorrecomo uma ampliação de uma (nova) esfera social-pública e cujo funcionamento, em termos coletivos,se caracteriza por uma racionalidade extramercantil,extracorporativa e extrapartidária [...].

Apesar de toda a diversidade do Terceiro Setor e daheterogeneidade de suas organizações, algumas características são

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bastante específicas, fazendo com que não sejam confundidas com asoutras organizações: 1) estão fora da estrutura formal do Estado; 2)não têm fins lucrativos; 3) são constituídas por grupos de cidadãosna sociedade civil como pessoas de direito privado; 4) são de adesãonão-compulsória; e 5) produzem bens e/ou serviços de uso ou interessecoletivo (FRANCO, 1999).

2.3 Dilemas do Terceiro Setor

Uma pesquisa realizada com dirigentes de instituições na regiãoda Amazônia Legal, sobre os problemas que mais dificultam a atuaçãodas entidades (SUDAM/PNUD, 1997 apud Falconer, 1999) revelaque a insuficiência de recursos é o problema mais freqüente dasorganizações, relatado por 63% dos entrevistados. As outrasdificuldades estão divididas entre questões internas/organizacionais,como recursos humanos insuficientes, gerenciamento inadequado ecarência de infra-estrutura da entidade; e fatores externos, como faltade apoio do poder local, inadequação da infra-estrutura comunitária,burocracia governamental e indefinição de políticas (FALCONER,1999).

Os resultados encontrados pela pesquisa mostram que os desafiosenfrentados abrangem não só o gerenciamento interno dasorganizações, mas também o ambiente em que elas estão inseridas.Ou seja, a sobrevivência das organizações envolve uma complexa redede relacionamentos entre as capacidades internas das entidades equestões políticas, sociais e econômicas do ambiente em que elasestão inseridas (FALCONER, 1999).

Falconer (1999) sugere que o enfoque apenas na administraçãointerna das organizações não é suficiente para capacitá-las a intervirefetivamente, sendo necessário um enfoque mais amplo, quecontemple também o ambiente em que elas estão inseridas.

Neste momento, cabe considerar a noção de sustentabilidadecomo uma perspectiva que aborda essa complexa rede derelacionamentos, assumindo a influência mútua entre as questõesinternas e externas da gestão das entidades, tratando-as como

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complementares e interdependentes (ARMANI, 2003) Asustentabilidade funciona aqui como referência, direcionando oestudo da gestão das organizações do terceiro setor para aspectosinternos e aspectos do relacionamento das entidades com seu ambiente.

2.4 A questão da sustentabilidade

Sustentabilidade é um tema que tem sido muito discutido emdiversas áreas. Governos, universidades, empresas e organizações doTerceiro Setor freqüentemente tratam deste tema, sem, no entanto,chegar a um consenso sobre o seu conceito exato. O propósito destaseção é fazer uma breve revisão teórica de autores que discutem aquestão da sustentabilidade e apresentar o conceito adotado pelapresente pesquisa.

A noção de sustentabilidade surgiu do conceito dedesenvolvimento sustentável definido pela Comissão Mundial sobreMeio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) da Organização dasNações Unidades (ONU) e publicado no relatório Nosso Futuro

Comum, em 1988. Desenvolvimento sustentável é “aquele que atendeàs necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras aatenderem as suas próprias necessidades” (SOUZA, 2000, p. 2). Esteé um conceito bastante simples, mas difícil de ser operacionalizado,principalmente pelos muitos fatores ecológicos, tecnológicos,macroeconômicos e outros, que afetam, em grande medida, seusprojetos de implementação (BRINKERHOHH & GOLDSMITH,1992). Segundo o Comitê de Assistência ao Desenvolvimento dasOrganizações para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento(OECD), o desenvolvimento sustentável depende da força e daqualidade das organizações de um país (BRINKERHOHH &GOLDSMITH, 1992). Dessa forma, desde a publicação do relatórioNosso Futuro Comum e das colocações da OECD, muitas entidadesempresariais têm sido pressionadas a se adequar às propostas dedesenvolvimento sustentável.

Muitos conceitos sobre o que é uma organização sustentávelsão defendidos por vários autores. O mais amplamente difundido

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no meio empresarial baseia-se na idéia de que as empresas devempossuir um triple bottom-line. Isso significa que, além de gerar resultadoseconômico-financeiros, as empresas também devem se engajar emações sociais e zelar pelo meio ambiente (HART; MILSTEIN, 2004).Sendo assim, uma organização empresarial é considerada sustentávelquando atende às expectativas financeiras de seus acionistas, tem umaatitude socialmente responsável perante a sociedade e possui medidasnão agressivas ao meio ambiente (COPESUL, 2001).

Além do meio empresarial, o conceito de sustentabilidade étambém abordado no ambiente das instituições sociais e ambientais.Segundo Kisil (1997), quando é trazido para o universo do TerceiroSetor, este conceito é utilizado para tratar da permanência econtinuidade de longo prazo dos esforços realizados para atingir-se odesenvolvimento humano. Dos autores estudados que tratam daquestão da sustentabilidade, alguns salientam aspectos internos eoutros salientam aspectos externos da organização.

Gibb e Adhikary (2000) defendem o conceito desustentabilidade sob a ótica dos stakeholders. Os autores acreditamque a sobrevivência de uma organização do Terceiro Setor dependede sua capacidade de atingir as expectativas de seus stakeholders maisimportantes. De acordo com esta idéia, sustentabilidade não é umconstruto que está ligado a uma capacidade restrita da organização.Este é um conceito que depende do quanto à instituição atende ametas preestabelecidas por atores que exercem influência sobre aorganização, sendo assim uma medida multidimensional e individualde cada organização (HERMAN; RENZ, 1999).

Incorporando a noção de planejamento estratégico à noção desustentabilidade, Brinkerhohh e Goldsmith (1992) enfatizam aimportância de a organização posicionar-se diante do ambienteexterno. Segundo os autores, duas questões principais permeiam oconceito de sustentabilidade organizacional. A primeira questão refere-se à influência das capacidades internas organizacionais e tambémdas dinâmicas do ambiente externo na sustentabilidade. Sendo assim,Brinkerhohh e Goldsmith (1992) apontam a necessidade de ainstituição fazer uma análise interna e externa para diagnosticar o seu

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grau de sustentação. As variáveis internas consideradas como principaissão a tecnologia utilizada e a estrutura organizacional. No que serefere às variáveis externas, o grau de hostilidade do ambiente éconsiderado relevante, e como tal deve ser avaliado. A segunda questãoque permeia o conceito de sustentabilidade diz respeito à importânciade uma estratégia organizacional que considere as forças e fraquezasinternas e também as oportunidades e ameaças do ambiente. Osautores enfatizam, dessa forma, a necessidade de um diagnóstico dascapacidades organizacionais e do contexto em que a instituição estáinserida, ressaltando também a importância do estabelecimento demedidas que posicionem adequadamente a organização para que elacontinue suas atividades de longo prazo.

Adicionando mais uma dimensão à noção de sustentabilidadedas organizações do Terceiro Setor, Fowler (2000) defende que parauma instituição sobreviver é necessário, além de capacidades internas,habilidade de ser ágil, de lidar com a instabilidade do ambiente e deser capaz de se adaptar. O autor propõe que para ser consideradasustentável uma organização do Terceiro Setor precisa gerir adequadamenteseus impactos e recursos, e possuir capacidade de regeneração.

É importante que a organização gere um impacto externo queseja valorizado socialmente e que seja duradouro. Para Fowler (2000)o que determina a sustentabilidade dos impactos é o grau departicipação dos beneficiários na implementação da ação, o grau deempowerment3 atingido pelos beneficiários e a competência daorganização em realizar a intervenção. Quanto à gestão dos recursos,o autor chama a atenção para a capacidade da organização em mobilizarfundos, adotando diferentes estratégias de captação. As decisões sobremissão e valores organizacionais irão condicionar as estratégiasadotadas que, por sua vez, determinarão o tipo de relação daorganização com seus doadores. É relevante que a instituição sejacapaz de gerir este relacionamento, resguardando sua autonomia. A

3. Empowerment é um termo impreciso que se refere a um processo de transformaçãoem que indivíduos e grupos passam da reflexão para a ação, buscando mudançasno exercício do poder (LEWIS, 2001, p. 201).

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última dimensão tratada por Fowler (2000) é a capacidade deregeneração da organização. O autor propõe a construção do espiralvirtuoso da sustentabilidade, que se inicia pela realização da missãoorganizacional, representada pela performance. Em função do alcancedos objetivos propostos, a instituição é reconhecida na sociedade,construindo boa reputação. A boa performance e a boa reputaçãoalimentam o processo de aprendizagem, criando continuamente novosconhecimentos. Se a organização é ágil, aliada às outras capacidadesdescritas anteriormente, será capaz de mudar e se regenerar. SegundoFowler (2000), a organização se adapta a produzir melhores e maisvaliosos impactos, que fortalecem uma boa reputação, que por suavez aumenta a obtenção de recursos e dessa forma, o espiral continua.

Diante de toda a discussão acerca do conceito de sustentabilidadeorganizacional, é evidente a falta de uma unanimidade entre os autores.Alguns argumentos privilegiam a perspectiva interna da organização,ao passo que outros elegem a perspectiva externa como foco centraldo conceito. É possível encontrar pontos em comum, entretantoum significado que seja partilhado por todos e que contemple todaa complexidade do termo ainda não foi construído. Apesar dasdivergências, a fim de que seja possível estudar a capacidade desustentabilidade de organizações do Terceiro Setor, é necessário adotar-se um conceito, tornando o objeto de estudo passível de observaçãona realidade.

Tendo em vista a diversidade de discussões e colocações, o quese pode entender, então, como uma organização do Terceiro Setorsustentável? O que é essencialmente importante para que umainstituição seja e permaneça sustentável? Brinkerhohh e Goldsmith(1992) chamam atenção, inicialmente, para o risco de que a idéia desustentabilidade organizacional seja redundante. Os autores acreditamque organizações, por definição, são formas sustentáveis de interaçãoentre as pessoas. Se a instituição existe é porque ela é sustentávelnaquele momento. Entretanto, os próprios autores defendem que aperspectiva a ser adotada é a de que a instituição não só sejasustentável, mas que permaneça sustentável, sendo capaz de continuarsuas atividades, sobrevivendo no longo prazo.

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A fim de optar por um conceito de sustentabilidade que sejapassível de observação na realidade e que também seja capaz decontemplar as dimensões mais importantes do construto, valerelembrar a natureza das atividades das organizações do Terceiro Setor,bem como suas especificidades. Essas instituições têm como fontede recursos doações e atividades de autogeração, sem, no entanto,visar o lucro. Como qualquer organização, estas entidades devemrealizar suas atividades com qualidade e competência. Porém,diferentemente dos outros tipos de instituições, as organizações doTerceiro Setor trabalham com valores, idéias. Sendo assim, suaexistência depende, em grande medida, de sua legitimidade eenraizamento em relação a seus beneficiários (RAMOS, 2003). Diantedessas peculiaridades, Ramos (2003) defende que a permanência e acontinuidade dos trabalhos de uma organização do Terceiro Setorestão condicionadas ao alcance de três pressupostos, que estãointerligados: a viabilidade financeira, que por sua vez depende dacapacidade da organização de executar as ações propostas e, também,da relevância destas ações para os grupos beneficiários. Sendo assim,a sustentabilidade contempla três níveis de abordagem: técnico,político e financeiro. Quando um deles está enfraquecido,compromete o desempenho dos outros (PERÔNICO, 2003).

Corroborando a visão de Ramos (2003) quanto àsustentabilidade de organizações do Terceiro Setor, Salamon (1997,p. 94) afirma que o “Terceiro Setor exige ‘amarras sociais’, isto é,circunstâncias sociais, econômicas e políticas favoráveis”. O autorresume a questão da sustentabilidade do Terceiro Setor em quatrodesafios críticos: 1) o desafio da legitimidade - ser reconhecido portodos os setores da sociedade; 2) o desafio da eficiência - mostrarcapacidade e competência operacional; 3) o desafio dasustentabilidade - possuir fundos que o permita prestar seus serviços;e 4) o desafio da colaboração - estabelecer parcerias estratégicas como Estado e com o setor empresarial.

Vale pontuar que Salamon (1997) acrescenta a capacidade deestabelecer parcerias como mais uma variável importante àsustentabilidade das entidades do Terceiro Setor, ressaltando arelevância da articulação entre as organizações.

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O governo norte-americano, por intermédio de sua AgênciaInternacional para o Desenvolvimento (USAID), em parceria comuma parcela da comunidade de ONGs locais do Centro e do LesteEuropeu e da Euroásia, possui uma ação que mede, por meio devariáveis, a sustentabilidade das organizações da sociedade civil nestespaíses. USAID (2002) apresenta fatores que tratam do relacionamentodas organizações com o seu ambiente, como ambiente legal,capacidade de advocacy e imagem pública, e fatores que abordam adinâmica interna das instituições, como capacidade organizacional,viabilidade financeira, provisão de serviços e infra-estrutura. Segundoos diretores do projeto, o acesso a variáveis que tratam do progressoe dos elementos que restringem o desenvolvimento das organizaçõesda sociedade civil permite que os executores dos programas deassistência do governo americano tomem melhores decisões econstruam estratégias mais efetivas para os projetos dedesenvolvimento (USAID, 2002). É interessante perceber que osfatores apresentados por USAID (2002) contemplam questõesinternas e externas às organizações, enfatizando que a sustentabilidadeestá relacionada a ações nos dois âmbitos.

Com uma visão semelhante à de USAID (2002) sobre a noçãode sustentabilidade, Armani (2003) apresenta um conceito que tratadas questões internas das organizações, no chamado “enfoquegerencial”, e das questões externas, no chamado “enfoque sistêmico”.

O autor propõe que a sustentabilidade deve ser entendida sobdois enfoques complementares: o sistêmico e o gerencial. No enfoquesistêmico, a atenção é dirigida para a inserção política, a credibilidadee o fortalecimento da base social das organizações, que são fatoresdeterminantes para sua capacidade de impulsionar processos demudança social duradouros. No enfoque gerencial, são enfatizadosos desafios da gestão e das condições de eficácia e eficiência dasorganizações. Segundo Armani (2003), o enfoque gerencial não ésuficiente para desenvolver o poder de sustentação política, social eeconômica das instituições do Terceiro Setor, e assim a noção desustentabilidade deve tratada sob duas perspectivas, a gerencial e asistêmica.

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O autor complementa afirmando

O enfoque sistêmico mostra-se apto e propenso aconsiderar não só a dimensão do desenvolvimentodas organizações individualmente (predominante noenfoque gerencial), mas também os desafios docampo não-governamental como um todo,considerando os fatores legais, políticos, culturais eeconômicos que circunscrevem suas potencialidadese limites em um determinado contexto histórico-social (ARMANI, 2003, p. 5).

A fim de se estudar a capacidade de sustentabilidade deorganizações do Terceiro Setor, Armani (2003) sugere algunsparâmetros que podem ser usados como eixos de análise. Sob aperspectiva gerencial, as seguintes dimensões são consideradas: 1)sustentabilidade financeira; 2) organização do trabalho e gestãodemocrática e eficiente; 3) quadro de recursos humanos; 4) sistemade planejamento, monitoramento e avaliação participativo e eficiente;e 5) capacidade de produção e sistematização de informações econhecimentos. Sob a perspectiva sistêmica, a qual integra o enfoquegerencial articulado ao enfoque sociopolítico, o autor privilegia asseguintes dimensões: 1) base social, legitimidade e relevância da missão;2) autonomia e credibilidade (stakeholder accountability); 3) poder parainfluenciar processos sociais e políticas públicas (advocacy); e 4)capacidade para estabelecer parcerias e ações conjuntas.

Diante das colocações feitas, considerou-se o conceito desustentabilidade organizacional concebido por Amarni (2003) o maisadequado ao presente trabalho, pois é capaz de contemplar asperspectivas interna e externa da organização, sem tomá-las comodimensões dicotômicas, assumindo o relacionamento e a influênciamútua entre elas.

O QUADRO 1 sistematiza os autores referenciados e asdimensões dos conceitos de sustentabilidade apresentados.

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QUADRO 1 - Autores e dimensões do conceitode sustentabilidade

AUTORES DIMENSÕES DO CONCEITO

Hart, Milstein (2004) Financeira, social e ambiental

Gibb, Adhikary (2000) Atendimento das expectativas dos

stakeholders importantes

Brinkerhohh, Goldsmith (1992) Administração estratégica, tecnologia e

estrutura interna

Fowler (2000) Gestão de recursos, de impactos e capa-

cidade de adaptação

Ramos (2003) Nível técnico, político e financeiro

Salamon (1997) Legitimidade,eficiência, sustentabilidade

financeira, colaboração (parcerias)

USAID (2002) Ambiente legal, capacidade organiza-

cional, viabilidade financeira, capa-

cidade de advocacy, provisão de

serviços, infraestrutura, imagem pública.

Armani (2003) Enfoque gerencial: sustentabilidade

financeira, organização do trabalho e

gestão democrática e eficiente, quadro

de recursos humanos, sistema de plane-

jamento, monitoramento e avaliação

participativo e eficiente, capacidade de

produção e sistematização de informa-

ções e conhecimentos. Enfoque sistê-

mico: base social, legitimidade e relevân-

cia da missão, accountability, capacidade

de advocacy, capacidade de estabelecer

parcerias.

Fonte: Elaborado pelos autores do artigo.

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2.5 Dimensões da sustentabilidade

Armani (2003) propõe muitos parâmetros como eixos de análiseda sustentabilidade organizacional de organizações do Terceiro Setor.Para a seleção das dimensões do conceito contempladas pelo trabalhoforam utilizados Fowler (1997) e Usaid (2002).

Sob a perspectiva gerencial, as dimensões selecionadas foramaquelas relacionadas com as áreas consideradas chave por Fowler(1997) para o desenvolvimento de uma organização do Terceiro Setor.São elas: administração estratégica, gestão de pessoas, administraçãode recursos e gestão de impactos. Para o enfoque sistêmico foramselecionadas as dimensões: capacidade de accountability, capacidadede advocacy, gestão da imagem pública, administração de parcerias esistema legal, tomando-se como base Usaid (2002).

• Enfoque Gerenciali) Administração estratégica: de acordo com Bennett et al. (1996), ocerne de toda organização é constituído por sua identidade, valores,crenças, cultura e motivação. No caso do Terceiro Setor esta questãoé ainda mais forte, pois as organizações são fundadas e movidas porvalores. Sendo assim, a administração estratégica, área responsávelpor transformar a missão e visão organizacionais em estratégias (Fowler,1997), assume extrema importância.ii) Gestão de pessoas: segundo Fischer (1998, p. 52), a gestão depessoas deve ser compreendida como “o conjunto de políticas,práticas, padrões atitudinais, ações e instrumentos empregados poruma organização para interferir e direcionar o comportamentohumano no trabalho”. As organizações da sociedade civil são,essencialmente, prestadoras de serviço, área em que a capacitaçãotécnica, o envolvimento e a dedicação pessoal das pessoas são essenciaisEntretanto, o que poderia ser considerado o diferencial da organizaçãopode ser sua maior limitação. Dessa forma, o desenvolvimentoprofissional dos colaboradores deve ser constante e estar sintonizadocom os objetivos estratégicos da instituição (Fischer, 2004).iii) Gestão de recursos: a gestão de recursos em uma organização doTerceiro Setor está muito pautada na gestão das ações de captação de

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recursos, já que este tipo de instituição não tem como finalidade osuperávit financeiro. Sendo assim, as organizações têm que procuraroutros meios para gerar fundos (FOWLER, 1997). A gestão das açõesde captação de recursos é entendida aqui como a capacidade daorganização de captar recursos de maneira suficiente e continuada(FALCONER, 1999). Valarelli (2002) acrescenta que este processoserá tão mais eficaz quanto mais ampla for a noção de recursos dainstituição e quanto mais diversificada e adequada às suas característicase ao ambiente externo for a ação de obtenção de fundos. O autordefende o entendimento de recursos não só como recursos financeiroscomo também recursos materiais, humanos entre outros. Ademais,aponta a conceituação de captação como sendo as diversas ações paraeste fim, como patrocínios, doações, parcerias, prestação de serviços,venda de produtos, entre outras, não limitando a obtenção de fundosa práticas de caráter mais permanente, como é comum acontecer.iv) Administração de impactos: a sustentabilidade da organizaçãodepende, dentre outros fatores, da plena realização do que ela sepropôs na sua missão. A administração dos impactos causados pelainstituição pretende gerenciar as mudanças na realidade decorrentesdas ações que visam cumprir a sua missão. Apesar da relevância destaavaliação, esta não tem sido uma atividade muito realizada pelasinstituições (FOWLER, 1997), o que é o reflexo da complexidadedos impactos gerados pelas ações, da ineficiência dos instrumentosde monitoração e de outros problemas de gestão.

• Enfoque Sistêmicov) Capacidade de accountability: significa “a responsabilidade de umapessoa ou organização perante uma outra pessoa, fora de si mesma,por alguma coisa ou por algum tipo de desempenho” (MOSHER,1968 apud CAMPOS, 1990, p. 33). O termo trata da responsa-bilização das organizações por suas atividades e resultados, sendotransparentes na alocação de seus recursos financeiros, materiais ehumanos (EDWARDS; HULME, 1995). Apesar de sua relevância, otermo accountability não possui tradução para o português. De acordocom Campos (1990), esta não é uma questão apenas relacionada àfalta de uma palavra correspondente ao termo em português. Segundo

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a autora, os brasileiros conhecem pouco do significado da palavra.No Brasil, os cidadãos não estão acostumados a cobraremresponsabilização, transparência e desempenho das organizaçõespúblicas e estas, por sua vez, também não adotam tal postura. SegundoCampos (1990), “somente a partir da organização dos cidadãosvigilantes e conscientes de seus direitos haverá condição para aaccountability”. Esse relacionamento demonstra uma influência mútuaentre processos de accountability e participação e cobrança dos cidadãosem relação às questões públicas.vi) Capacidade de advocacy: segundo Armani (2003), advocacy consisteem atividades em que a instituição planeja, promove e influenciaprocessos de mobilização, organização e articulação sociais sobre aconstituição de políticas públicas. Esta capacidade da instituição eminfluenciar os órgãos governamentais determina fortemente oambiente em que a organização está inserida, na medida em queestimula ou dificulta a implementação das ações organizacionais(Usaid, 2002). Sendo assim, a capacidade de advocacy também seconstitui em fator importante para a sobrevivência das instituiçõesdo Terceiro Setor.vii) Gestão da Imagem Pública: para que uma organização sejasustentável, o governo, o setor privado e a sociedade devem ter delauma imagem positiva, incluindo um amplo entendimento e apreciaçãodo seu papel (Usaid, 2002). Imagem é definida como a soma decrenças, atitudes e impressões que uma pessoa ou grupo de pessoastêm de um objeto. Essas impressões podem ser verdadeiras ou falsas,reais ou imaginárias (Barich; Kotler, 1991). Os valores internos dapessoa e as suas experiências com o objeto influenciam, em grandemedida, suas impressões sobre ele. Sendo assim, a imagem do mesmoobjeto difere em grupos de pessoas diferentes (Tavares, 1998).viii) Administração de parcerias: a capacidade de formação de parceriasé uma habilidade muito importante para as organizações hoje. Deacordo com Falconer (1999), a solução de problemas públicosdemanda esforços conjuntos de atores dos três setores da sociedade.As parcerias podem maximizar os impactos das ações das organizações,mas devem ser gerenciadas adequadamente. A análise da Administração

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de Parcerias das organizações estudadas apresenta algumas questõesimportantes, como os pontos positivos e negativos das parcerias comas organizações estudadas. Parceria é entendida aqui como umrelacionamento acordado entre duas ou mais organizações,envolvendo divisão de papéis, responsabilidades e riscos, e a busca deobjetivos comuns (LEWIS, 2001). O autor salienta que a parceriadeve ser entendida como um processo, sendo influenciada por fatoresexternos, como questões econômicas políticas e culturais, tendo queser constantemente revista e discutida.ix) Sistema legal: o sistema legal refere-se ao ambiente regulatório emque a organização está inserida. As instituições possuem uma série dedireitos e obrigações em relação aos seus membros e sofrem regulaçõesdo fisco quanto às contribuições que recebem. Sendo assim, todo oaparato jurídico que regula o funcionamento das organizações doTerceiro Setor estimula ou dificulta sua sobrevivência. (SALAMON;TOEPLER, 2000).

3. METODOLOGIA

O presente trabalho utilizou a estratégia qualitativa de estudomulticasos (YIN, 1994). Quanto à sua finalidade, a pesquisa possuicaráter descritivo (VERGARA, 2000) e objetiva descrever e analisarações de gestão sob a ótica da sustentabilidade organizacional.

Os dados primários foram coletados mediante a realização deentrevistas semi-estruturadas (YIN, 1994). Para a escolha dosinformantes, optou-se por realizar entrevistas com representantes dosstakeholders com quem as organizações estudadas tinham contato paracada dimensão da sustentabilidade contemplada na pesquisa, somandoum total de 36 entrevistas, conforme mostra a TAB.1. Com o intuitode preservar a identidade dos entrevistados, os mesmos não foramidentificados na apresentação e análise dos dados.

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Construiu-se um roteiro para cada tipo de informante contendoquestões sobre as dimensões da sustentabilidade com as quais serelacionavam, como mostra o QUADRO 1. O roteiro de entrevistafoi elaborado com base no conceito de cada dimensão dasustentabilidade discutida e no NGO Sustainability Index Executive

Summary (USAID, 2002).Além de dados primários, também foram coletados dados

secundários por meio da análise de documentos. A coleta de dadossecundários contemplou o levantamento de informações de interesseem relatórios, normas internas entre outros documentos que foramdisponibilizados pelos gestores das organizações estudadas.

TABELA 1 - Os informantes da pesquisa

INFORMANTE ORGANIZAÇÃO TOTAL

A B C

Dirigente 2 3 1 6

Doador 2 2 2 6

Beneficiário 2 2 2 6

Funcionário 3 1 2 6

Voluntário 2 - - 2

Parceiro 2 2 2 6

E. na legislação - - - 2

F. de pol. públicas - - - 2

TOTAL 17 10 9 36

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados da pesquisa.

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Os dados obtidos foram tratados de forma qualitativa, sendocodificados, examinados e analisados, a fim de atender às proposiçõesiniciais do estudo (QUIVY; CAMPENHOUDT, 1995).

3.1 A escolha das organizações do estudo

Optou-se por reunir entidades que atuam na mesma área, porestarem sob a regulação da mesma legislação e por possuíremsimilaridades no seu funcionamento, o que torna-se interessante diantedas dimensões do conceito de sustentabilidade adotado.

Optou-se pelas instituições que atuam na área ambiental porvários motivos. Segundo Fonseca; Pinto (1996), as ONGsambientalistas ocupam um nicho importante de atuação a partir do

QUADRO 2 - Tipos de informante e as dimensõesda sustentabilidade

Dimensõesda Susten-tabilidade

Tipos de Informante

Dirigente Doador Benefi-ciário

Volun-tário

Funcio-nário

E. legis-lação do

T. S

E. legis-lação do

M.A.

F. depol.

Públicas

Adm.EstratégicaGestão depessoasAdm. derecursos

Gestão deImpactos

Gestão daImagemPúblicaSistema Legal

Capacidadede

AdvocacyAdm. de

ParceriasCapacidade

deAccountability

Parceiro

Fonte: Elaborado pelos autores do artigo.

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momento em que há uma percepção generalizada da sociedade acercada degradação dos recursos naturais, em função da expansão daatividade econômica e de tendências relacionadas à dinâmicademográfica. Para os autores, este nicho ainda é ampliado pelaincapacidade do Estado de implementar medidas que regulam econtrolam a degradação ambiental.

A crescente preocupação com questões ligadas ao meio ambienteé refletida no seu ganho de visibilidade na mídia, no desenvolvimentoda legislação ambiental e na ocorrência de conferências sobre o temacomo, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente eDesenvolvimento (CNUMAD) – Eco-92 (FONSECA; PINTO, 1996).

Fonseca; Pinto (1996) afirmam que o universo de ONGsambientalistas é bastante heterogêneo. A grande maioria dasorganizações que são legalmente estabelecidas tem abrangência locale ações intermitentes. Há um segundo grupo que, embora de atividadecontínua, depende de profissionais contratados para projetosespecíficos. O último grupo é constituído por organizações emprocesso mais avançado de profissionalização, entretanto, segundodados do Cadastro Nacional de Instituições Ambientalistas,4 menosda metade destas organizações movimenta orçamentos anuaissuperiores a 300.000 dólares. Além das organizações brasileiras, atuamno Brasil subsidiárias de organizações internacionais que investemum valor agregado de oito a dez milhões de dólares anuais.

Os autores acreditam que as ONGs ambientalistas exercem umpapel fundamental em um país com tantas riquezas naturais, mascom um Estado com ações tão limitadas na conservação e preservaçãode tais riquezas. Dentre as estratégias de ação adotadas pelasorganizações, Fonseca; Pinto (1996) mencionam: a geração edisseminação de informação, a execução de projetos no campo queviabilizem a conservação dos recursos naturais e a atuação política,que busca mecanismos que influenciem os canais decisórios.

O estado de Minas Gerais, particularmente, possui tradição nadiscussão sobre as questões ambientais. A legislação mineira a este

4. < http:// www.edufa.com/ecolista/page/evol>. Acesso em 30/05/2005.

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respeito é considerada avançada e o Conselho Estadual de PolíticaAmbiental (COPAM) foi criado anteriormente ao Conselho Nacionalde Política Ambiental (CONAMA), o que demonstra umapreocupação do estado de Minas Gerais com a preservação do meioambiente.

As entidades estudadas foram selecionadas a partir de uma listade ONGs ambientalistas do estado de Minas Gerais presente nowebsite5 de uma das ONGs mais antigas do Estado, a AssociaçãoMineira de Defesa do Ambiente (AMDA). A lista continha 159organizações, sendo que 33 estavam localizadas em Belo Horizonte, edessas 27 possuíam telefone. Fez-se contato telefônico com todas as27 organizações, porém só foi possível falar com 7, pois os númerostelefônicos das demais estavam errados. Dentre as 7 entidades,verificou-se que apenas 4 possuíam um website institucional. Dessas,definiu-se pelas 3 organizações que tinham um escopo de atividadesmais amplo, não sendo restrito a apenas um nicho.

As organizações foram identificadas como Organização A,Organização B e Organização C, para que suas identidades fossempreservadas, e assim os autores pudessem gozar de maior liberdadena análise das informações coletadas.

3.1.1 Organização A

A Organização A, fundada em 1978, é uma associação sem finslucrativos e é uma das entidades ambientalistas mais antigas de MinasGerais e também uma das mais atuantes. É dirigida por um conselhode militantes, estando aberta à filiação de qualquer pessoa interessadana causa ambiental. Luta pelo aprimoramento das políticas públicasde meio ambiente e pela construção de uma sociedade responsável.

Para se manter, a entidade conta com centenas de doaçõesregulares de pessoas físicas e contribuições de 14 sócios pessoasjurídicas, além dos recursos vindos dos projetos realizados em parceriacom empresas privadas e um órgão público. Seu quadro de

5. < http// www.amda.org.br>. Acessado em 30/05/2005.

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colaboradores é composto de empregados, prestadores de serviço,estagiários e voluntários, perfazendo um total de 15 pessoas.

3.1.2 Organização B

A Organização B é uma fundação sem fins lucrativos e foi criadaem 1989 e é considerada um centro de referência em Minas Geraisno levantamento e aplicação do conhecimento científico para aconservação da diversidade biológica. Tem como missão a conservaçãoda biodiversidade brasileira, mediante ações de caráter técnico-científico. Seu programa de atuação é composto por seis linhas deação: conservação da biodiversidade, áreas protegidas, planejamentoambiental, educação ambiental, capacitação e divulgação e políticaspúblicas.

Grande parte dos recursos que capta vem de projetos em parceriacom empresas privadas e o governo, mas também recebe doaçõesregulares de pessoas físicas. Possui uma loja que vende camisetas,chaveiros e outros objetos com o seu logo. No momento da coletade dados, a organização desenvolvia 15 projetos. Sua equipe decolaboradores conta com 25 pessoas, dentre funcionários contratadose prestadores de serviço específicos para projetos.

3.1.3 Organização C

A Organização C é o braço brasileiro de uma entidadeambientalista internacional que tem como missão a preservação dabiodiversidade global e a conscientização das sociedades de que podemviver em harmonia com a natureza. No Brasil, foi fundada em 1987.Seu primeiro projeto de conservação teve início em 1988. AOrganização C tem sede em Belo Horizonte e conta com 4 escritórioslocalizados em diferentes estados brasileiros.

Mais de 95% dos recursos que mantêm a Organização C sãointernacionais, provindos de fundações americanas, agências bilateraise outros financiadores. Sua equipe conta com 52 funcionáriosdistribuídos nos cinco escritórios, além de 15 estagiários.

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A Organização C possui mais de 100 parceiros em todo o Brasil,dentre eles organizações sem fins lucrativos, empresas privadas, governoe universidades. Desta forma, é capaz de alavancar os seus recursos emultiplicar as ações para a conservação da biodiversidade.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

4.1 As dimensões da sustentabilidade

4.1.1 Administração Estratégica

Organização A

A discussão sobre as suas estratégias ocorre em reuniões semanaisdo Conselho Consultivo, onde são avaliadas as ações e propostasnovas medidas. O planejamento das ações, quando acontece, é feitopontualmente e apenas no curto prazo. Não há um planejamentointegrado e articulado das iniciativas organizacionais. No momentoda coleta de dados, a Organização A passava por um processo deplanejamento estratégico. Inúmeras tentativas já haviam sido feitas.

Apesar da não formalização de uma estratégica clara e definidapara a organização, existem “pontos de concentração” em ações quebuscam influenciar políticas públicas ambientais. Entretanto, taisações não podem ser consideradas o foco da organização, já que aindanão se finalizou o seu processo de planejamento estratégico.

Uma das causas da falta de direcionamento mais claro eformalizado da instituição é uma certa divergência existente entre osdirigentes da entidade quanto à missão, visão e estratégias a seremimplementadas. Este desacordo reflete-se na descontinuidade dosprocessos de planejamento estratégico e, conseqüentemente, na faltade direcionamento, dificultando a eleição de prioridades e tornandoa gestão da organização “casuística”.

Muitos stakeholders entrevistados chamaram a atenção para a faltade direcionamento da entidade, o que contribui para que aorganização não seja proativa diante das mudanças em seu ambiente.

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Conseqüências dessa falta de planejamento foram encontradasem várias dimensões do processo de gestão, como Gestão de Pessoas,Gestão da Imagem Pública, entre outras, as quais serão apresentadase analisadas em partes posteriores desta seção.

Organização B

A Organização B possui uma missão definida, percebida pelosstakeholders entrevistados e realiza projetos de acordo com adisponibilidade de recursos. Uma de suas estratégias é a geração edisseminação de informação, e para isso adota a política de estimulara troca de informações entre os pesquisadores que contrata paraexecutar seus projetos.

Toda a gestão da Organização B é realizada para que seus projetossejam executados. Para tanto, a entidade possui uma estruturaorganizada por projetos. Há reuniões anuais de planejamento, emque todos os funcionários participam. Entretanto, apenas osfuncionários técnicos opinam. Este planejamento não é muito rígido,devido à necessidade de se ter f lexibilidade para aproveitaroportunidades de financiamentos através de fundos, editais e outrasformas de captação de recursos.

A estruturação por projetos encontrada na Organização B geraconseqüências para outras áreas de gestão da entidade comoAdministração de Recursos, Capacidade de Accountability, entre outrasa serem discutidas posteriormente.

Organização C

A Organização C segue as diretrizes de sua matriz,compartilhando sua missão, visão e estratégias globais. No Brasil,todos os anos ocorrem reuniões para revisão do planejamentoestratégico, em que uma avaliação do ambiente interno e externo éfeita, as metas são revistas e é traçado um planejamento de longoprazo, estratégias para 5 e 10 anos, influenciado pela disponibilidadede recursos e pelas prioridades dos financiadores dos projetos

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desenvolvidos pela organização. Alguns parceiros importantes e, pelaprimeira vez em 2004, todos os funcionários participaram destasreuniões.

A Organização C é uma entidade co-executora de projetos, aquelaque financia, gera informações e capacita parceiros locais, criandocondições para que estes possam executar os projetos. Trabalhandoem parceria, há mais de 100 entidades executando projetosfinanciados e gerenciados pela entidade, que promove encontrosperiódicos para troca de informações, visando à disseminação e aocompartilhamento de conhecimento, o que ajuda a fortalecer seusparceiros. A Organização C possui a política de disponibilizar todosos relatórios de projetos e pesquisas em um banco de dados, ao qualos parceiros têm acesso.

Com o intuito de organizar e controlar o desempenho daorganização, anualmente uma empresa de auditoria externa écontratada para rever todos os seus procedimentos.

A forma como a Organização C trabalha, firmando parceriaslocais para a execução de seus projetos, configura os seus processosde gestão em outras áreas, como Administração de Parcerias,Administração de Recursos, entre outras, que serão analisadasposteriormente.

É interessante perceber que um indicador do seu grau deorganização e da importância que é dada aos processos de gestão sãoos próprios indicadores de desempenho. Na Organização A, na quala gestão não é prioridade e os processos administrativos são realizadosde forma casuística, não há indicadores que avaliem o seu desempenho,nem sequer há objetivos traçados. Na Organização B, totalmentevoltada para a área fim, a gestão é vista apenas como área de apoio,não como área estratégica da organização, e há indicadores dedesempenho dos projetos, exigidos pelos financiadores. Não háindicadores que avaliem o desempenho global da organização. Porfim, na Organização C, apesar de ser também uma entidade que vivedos projetos que realiza, a gestão é estratégica para a atuação daentidade. A organização, o planejamento e o controle dos processospermeiam todas as suas áreas.

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4.1.2 Gestão de Pessoas

Organização A

Não há um planejamento para os recursos humanos, bem comofunções definidas, metas individuais, avaliação de desempenho ouqualquer outra prática de gestão de pessoas que seja estabelecida eformalizada dentro da organização.

Organização B

Tanto para os prestadores de serviço quanto para os empregados,não há práticas de recursos humanos estabelecidas e formalizadas. Háincentivos ad hoc à participação em eventos, cursos e seminários comoforma de treinamento. Há uma hierarquização da remuneração dospesquisadores pela sua formação.

Organização C

As práticas de recursos humanos estabelecidas e formalizadasvigentes na Organização C são as seguintes: o recrutamento e a seleçãode empregados são regidos por uma série de normas e procedimentosestabelecidos; os treinamentos são apoiados, inclusive o treinamentode parceiros, mas são sob demanda; como forma de socialização paraos empregados, há uma apresentação da organização, de suas áreas eestrutura de funcionamento; quanto à remuneração, há uma estruturade cargos e salários, com linhas definidas de progressão vertical ehorizontal, apesar de não haver um plano de carreira; e, para avaliaçãode desempenho dos funcionários, são estabelecidas metas individuais,de acordo com as metas globais da organização, e são realizadas umaauto-avaliação e uma avaliação feita pelo supervisor do funcionário,que subsidia as decisões sobre incrementos salariais.

A análise da Gestão de Pessoas das organizações estudadas reiteraas idéias de Fisher (2004) quando defende que esta não é uma áreaque recebe grande atenção das organizações do Terceiro Setor. Apesar

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de ser mais organizada em termos dessas práticas, em comparaçãocom as outras, a Organização C também não possui uma pessoaexclusivamente responsável por esta área. Vale ressaltar que o grau deestruturação da área de RH das Organizações A, B e C coincide coma importância que estas organizações dão à sua gestão como um todo.

4.1.3 Administração de Recursos

Organização A

Não existe qualquer planejamento para a captação eadministração de seus recursos. Seus recursos provêm de três fontes:doador pessoa física, doador pessoa jurídica e projetos. Para as trêsfontes de recursos, há regras e normas claras, as quais formalizam osvalores doados, os direitos e deveres dos doadores e em que condiçõesa entidade realiza projetos em parceria com outras organizações.

O relacionamento da Organização A com seus doadores pessoasjurídicas é o mais próximo e o mais intenso dentre os relacionamentoscom seus apoiadores.Apesar da doação dos doadores pessoas jurídicasrepresentar mais ou menos 70% da receita da Organização A, estesnão interferem na posição e no direcionamento das atividades daentidade, e nunca houve conflito quanto a isso.

Na análise da área de Administração de Recursos da OrganizaçãoA, fica claro como o processo de captação de recursos de umaorganização sem fins lucrativos pode influenciar outras áreas da gestãoda entidade, como colocado por Bennet et al. (1996) e Fowler (1997).A imagem pública da organização está sendo negativamenteinfluenciada pela sua captação de recursos junto aos associados pessoajurídica, apesar de seu direcionamento e postura diante de questõesambientais não ter sofrido intervenções, graças à formalização de regrase procedimentos dos financiamentos.

Organização B

Para captar recursos, a Organização B busca parceiros para seusprojetos e patrocinadores para seus produtos que tenham boas práticas

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ambientais e que possuam objetivos em comum com a entidade. Porter um nome reconhecido na área ambiental pelos bons projetos querealiza, também é procurada por parceiros e financiadores, além departicipar de mailings de instituições financiadoras, de quem recebeinformativos sobre linhas de financiamento.

Por ser uma organização em que seus recursos já vêm direcionadosa projetos específicos, a Organização B possui grande dificuldade demanter sua estrutura administrativa e de apoio à sua equipe técnica.

Organização C

Praticamente 95% dos recursos recebidos pela entidade vêm desua sede mundial, que é quem capta a maioria dos recursos para aorganização em nível mundial. No Brasil, duas estratégias bastanteimportantes para o processo de captação de recursos da entidadesão: 1) o relacionamento interpessoal das pessoas que formam oconselho da entidade e 2) a participação da Organização C em mailings

de instituições financiadoras, devido à sua reconhecida competênciana execução de projetos ambientais.

A Organização C sobrevive de doações e financiamentos, de formaque todo o recurso recebido já vem direcionado a um projetoespecífico. Logo no início de cada ano, a organização já identifica osprojetos que serão contemplados e como será o financiamento decada um deles. Sendo co-executora de projetos, a Organização Cassume dois papéis: o de financiada e executora de projetos e o definanciadora de outras organizações que executam projetos.

Analisando a área de Administração de Recursos das trêsorganizações estudadas, vale pontuar que aquela que recebe recursos“não carimbados” é a que tem um gerenciamento menos adequadode seus fundos: a Organização A. Isso demonstra que, apesar dasrestrições colocadas às Organizações B e C, que possuem seuorçamento já direcionado, se não houver um planejamento das açõescomo um todo, a administração de seus recursos também não seráadequada.

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Outra questão que vale pontuar é a dificuldade de obtenção derecursos para a manutenção da parte administrativa das organizações.Esta questão interfere diretamente em sua capacidade de susten-tabilidade, já que o apoio administrativo subsidia a sua área fim.

4.1.4 Gestão de Impactos

Organização A

A Organização A não possui uma avaliação sistemática de suasações, até porque não realiza um planejamento integrado destas. Paraos projetos, há indicadores de desempenho, como o número departicipantes em palestras. Entretanto, não há um controle e umacompanhamento disto pela organização. Quanto a indicadores deimpacto que realmente revelem mudança no comportamento daspessoas, como indicadores que relacionem o aumento da preservaçãode certas áreas e o número de participantes de palestras, há tentativasde estabelecimento em alguns projetos.

É importante ressaltar que os stakeholders da Organização A nãocobram dela indicadores de resultado e impacto de suas atividades eprojetos.

Organização B

A Organização B possui indicadores de desempenho em seusprojetos, até por exigência das instituições financiadoras que liberamos recursos à medida que estes indicadores vão sendo atingidos comsucesso. Entretanto, a construção de indicadores de impacto não éprioridade para a entidade.

Vale ressaltar que muitos projetos realizados pela OrganizaçãoB, mesmo aqueles que contemplam os beneficiários entrevistados,são para diagnóstico de uma realidade, e portanto funcionam aindacomo subsídios para a construção de medidas que podem realizarmudanças. Este pode ser um dos motivos de a Organização B nãodar prioridade à construção de indicadores de impactos.

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Organização C

A Organização C possui tanto indicadores de impactosambientais, por exemplo, percentuais de regiões reflorestadas, quantoindicadores de impactos socioeconômicos em seus projetos, porexemplo, número de pessoas que deixaram de se dedicar a atividadesextrativistas para se dedicarem a outras atividades. Estes indicadoressão construídos pela equipe da entidade, por pesquisadores e porparceiros, sendo continuamente revisados quanto à sua aplicabilidadee efetividade.

A área de Gestão de Impactos da Organização C reflete apreocupação com a sua gestão global. A avaliação e o controle sãoprocessos que estão presentes em todas as suas áreas da gestão ecolaboram para a efetividade de suas ações.

Tentar administrar os impactos decorrentes das açõesempreendidas depende de grandes esforços em monitoramento,avaliação e controle, bem como da construção de ferramentas queconsigam realmente captar mudanças na realidade que sofreuintervenção. Toda esta estrutura é difícil de ser mantida, entretantoo propósito de uma entidade ambientalista não é realizar campanhaspara a preservação do meio ambiente, mas sim conseguir, efetivamente,que o meio ambiente esteja sendo preservado. Sendo assim, umsistema adequado de administração de impactos é necessário paraverificar se a organização está atingindo os seus objetivos ou apenasempreendendo esforços em ações não-efetivas.

4.1.5 Capacidade de Accountability

Organização A

A Organização A realiza uma prestação de contas financeira e deatividades minuciosa para o Conselho Fiscal, apresenta um relatórionão muito detalhado para os seus doadores pessoas jurídicas, nosencontros realizados semestralmente, e para os seus doadores pessoasfísicas, em seu website. Um de seus dirigentes acredita que a Organização

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A deveria ser mais transparente, não esgotando a sua accountability

apenas na apresentação de listagens de atividades e balançospatrimoniais. Entretanto, não há uma cobrança quanto a isso porparte de seus stakeholders.

Organização B

A Organização B apresenta relatórios de prestação de contasfinanceiros e de atividades aos seus financiadores, segundo regras jápreestabelecidas, ao seu Conselho e também ao Ministério Público,seguindo o que prevê a legislação sobre fundações de direito privado,já que a Organização B é uma fundação. Não há qualquer tipo deprestação de contas da entidade, publicada em seu website, apesar deela receber doações regulares de pessoas físicas.

Além das formas de prestação de contas descritas acima, aOrganização B ainda procura ser transparente com os beneficiáriosde seus projetos por meio de reuniões em que são divulgadas a fontedo financiamento, a perspectiva de uso e a aplicação dos recursos.Apesar disto, os beneficiários da Organização B não conhecem ofuncionamento da entidade como um todo, fato também observadono relacionamento com outros stakeholders.

Organização C

Os relatórios de prestação de contas da Organização C sãodirecionados aos seus financiadores, segundo regras já preestabelecidas.Alguns financiadores até realizam auditorias nos projetos financiadospor eles, apesar de a Organização C já possuir a política de contrataruma empresa de auditoria externa anualmente. Esta política decorreda existência de normas legais que exigem este procedimento emorganizações sem fins lucrativos no país em que fica situada a sedemundial da organização.

Além dos procedimentos já citados acima, a Organização realizareuniões, uma vez por ano, onde são reunidos todos os seus parceiros.Nestas reuniões são relatadas as atividades realizadas em parceria com

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a Organização C, como forma de troca de experiência e divulgaçãodo que tem sido realizado.

As questões levantadas na análise da Capacidade de Accountability

das organizações estudadas vai ao encontro do que coloca Campos(1990) quando afirma que a sociedade brasileira não conhece bem oconceito de accountability. Se de um lado, não faz muitas exigênciasquanto à transparência e responsabilização das organizações, de outro,estas também não têm uma postura que revele grande preocupaçãocom sua responsabilização pelas suas atividades com relação aospúblicos com quem ela interage. Este fraco elo entre a sociedade esuas organizações prejudica ambas as partes, na medida em quecompromete a credibilidade das instituições e não as pressiona paraque se tornem mais “accountable”.

4.1.6 Capacidade de Advocacy

Atualmente, há dois canais formais de comunicação entre asorganizações do Terceiro Setor e os formuladores de políticas públicas:o Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM) e o Fórum deONGs. O COPAM é constituído por representantes do primeiro,segundo e Terceiro Setores, sendo o espaço de discussão e formulaçãodas políticas públicas ambientais. O Fórum de ONGs é compostopor representantes de ONGs ambientais mineiras e por representantesde órgãos públicos relacionados com o meio ambiente. Neste fórum,discutem-se e formulam-se questões que são levadas ao COPAM.

Os entrevistados pontuaram que os participantes do fórum aindaestão aprendendo a utilizar este canal de comunicação, tanto por seruma arena de discussão criada recentemente (as primeiras reuniõesocorreram no final de 2003) quanto pelo fato de o fórum demandaruma postura de cooperação e parceria, diferente do lugar de embateque grande parte dos atores tomava.

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Organização A

Conforme colocado na seção sobre Administração Estratégicada Organização A, apesar da não formalização de uma estratégica clarae definida para a entidade, existem “pontos de concentração” parauma ação de influência de políticas públicas ambientais. A OrganizaçãoA foi a idealizadora do Fórum de ONGs e com o apoio do atualsecretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de MinasGerais, o fórum foi criado.

Pelo discurso dos entrevistados pôde-se perceber que a posturamais aberta e democrática do atual secretário de Meio Ambientefavorece a capacidade de advocacy da organização, já que esta aberturaestá ligada à pessoa do secretário.

Organização B

A atividade de advocacy não é prioridade para a Organização B.A entidade trabalha com planejamento ambiental. Um dos principaisprodutos da organização elege as áreas prioritárias para a conservaçãoda biodiversidade em Minas Gerais e mostra aos governos onde investirnos projetos de conservação e onde pode ser liberado paraempreendimentos econômicos.

Devido à sua competência técnica reconhecida na área ambiental,a Organização B, muitas vezes, é convidada a participar de assembléiase reuniões públicas, a fim de emitir seus pareceres sobre as questõesdiscutidas.

Organização C

A atividade de advocacy não está dentro do escopo de atuaçãoda Organização C. O que entidade faz é dar subsídios técnicos àtomada de decisão dos formuladores de políticas públicas, divulgandoresultados de pesquisas.

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A Organização C é freqüentemente convidada a participar deassembléias públicas6 sobre questões ambientais, e representantes deseu Conselho têm bom relacionamento com alguns formuladores depolíticas públicas ambientais. Por meio destes mecanismos, consegueexpor sua opinião sobre questões importantes.

Como a Organização B, a Organização C não realiza açõespolíticas para influenciar a formulação de políticas públicas,entretanto suas iniciativas não são menos efetivas.

As três organizações estudadas possuem ações distintas, masigualmente importantes no que tange à influência de políticas públicasambientais.

Como exposto no referencial teórico do trabalho, as atividadesde advocacy têm um grande peso no exercício do papel das organizaçõesdo Terceiro Setor, tratando de questões que configuram o ambientede atuação das entidades, fomentando ou dificultando suas ações.

4.1.7 Gestão da Imagem Pública

Organização A

A falta de um planejamento estratégico na Organização A trazconseqüências também para a imagem pública da entidade. Osdepoimentos mostram que a organização é personificada em um dosseus dirigentes. Outra conseqüência da falta de um planejamentoestratégico é a falta também de um planejamento para as atividadesde comunicação da organização.

Segundo os entrevistados, a imagem da Organização A peranteo público em geral, o setor privado e o setor público, é polêmica,odiada por uns e amada por outros. Este fato se deve, principalmente,à postura combativa da entidade, que zela pelo controle social,denunciando infrações do setor público e privado, e cobrando açõesdos órgãos competentes. Dessa forma, enquanto é admirada erespeitada por uma parte da sociedade, causa incômodo a uma outra.

6. Assembléias Públicas são reuniões abertas ao público realizadas na AssembléiaLegislativa para discutir questões consideradas polêmicas.

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A imagem da Organização A torna-se ainda mais polêmica devidoao fato de a maioria dos recursos que a financiam vir de doações deempresas privadas. Por isso, outras organizações do Terceiro Setor,empresas e órgãos governamentais, acreditam que a entidade foivendida e que não denunciaria as empresas que são suas doadoras.

Este quadro demonstra que medidas devem ser tomadas paraque a atuação da entidade não seja ainda mais afetada negativamente.Desenvolver a sua capacidade de accountability, tornando-a maistransparente nas suas tomadas de decisão e na sua alocação de recursos,pode aumentar a sua credibilidade na sociedade e melhorar sua imagempública.

Organização B

As atividades de comunicação realizadas pela Organização B sãobastante direcionadas a um público-alvo específico. De acordo comos stakeholders entrevistados, a Organização B não é conhecida pelopúblico em geral e deveria investir mais na divulgação de suasatividades. Na sua área de atuação, é reconhecida pelos seus produtos,pela competência que possui para realizar suas atividades e pelaspessoas que a compõe, sendo procurada para realizar parcerias eprojetos.

Organização C

A Organização C, conforme o discurso dos entrevistados, não éuma entidade conhecida pelo público em geral, apesar de ser muitoreconhecida e respeitada no meio em que atua. Este fato se deve, emgrande medida, aos poucos esforços que eram destinados àcomunicação. Como grande parte dos recursos recebidos vem de suasede mundial, não se priorizou sua divulgação.

Recentemente, foi criada uma equipe de comunicação,aumentando os investimentos na área. As atividades de comunicaçãotêm como foco divulgar a causa pela qual a entidade luta, a fim de

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informar as pessoas e de conscientizá-las, como também de buscarparceiros de médio e longo prazo que possam executar os projetosque financia. Esta divulgação é realizada por meio de newsletters paramailigs lists, do website da entidade, de seminários, congressos,publicações e, mais recentemente, de campanhas na televisão.

A análise da Gestão da Imagem Pública das organizaçõesestudadas reitera a importância do reconhecimento público e dacredibilidade para a ação da entidade, na medida em que influenciapositivamente a formação de parcerias, a obtenção de recursos e acaptação de recursos humanos (USAID, 2002).

4.1.8 Administração de Parcerias

Organização A

No momento da coleta de dados, a Organização A possuíaparcerias em projetos com um órgão público e duas empresas privadas.A entidade procura e é procurada para realizar parcerias. Segundo osparceiros entrevistados, é uma organização séria, comprometida coma preservação do meio ambiente e possui colaboradores bemqualificados.

Segundo os stakeholders entrevistados, estar ligado a umaorganização do Terceiro Setor é muito positivo para a imagem dasempresas, e este é um benefício da parceria com a Organização A. Aimagem positiva que possui perante alguns segmentos da sociedadeinfluencia em grande medida sua capacidade de realizar parcerias.

Organização B

A Organização B, no momento da coleta de dados, possuíaparcerias com entidades do setor público, do setor privado e doTerceiro Setor. Segundo os entrevistados, os parceiros buscam aparceria com ela pela boa imagem, por sua capacidade técnica e pelainfra-estrutura que detém para realizar projetos ambientais.

Foram levantados como pontos positivos das parcerias: afacilidade de relacionamento entre as pessoas, por já serem conhecidas

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dentro do meio ambiental; a experiência e a capacidade técnica daentidade; e seu bom relacionamento com outras organizações doTerceiro Setor e centros acadêmicos. Como ponto negativo, foienfatizada a dificuldade de se contemplar a taxa administrativa daentidade no financiamento dos projetos.

Organização C

Como colocado na análise da área de Administração Estratégicada Organização C, trabalhar em parceria é uma política da entidade.Seu quadro de parceiros compõe um rede de mais de 100 organizações.Um de seus dirigentes acredita que, por meio de ações conjuntascom empresas privadas e governo, é possível aumentar sua interlocuçãoe de ações conjuntas com outras organizações do Terceiro Setor,ampliar sua área de atuação, multiplicando suas ações.

As parcerias não incluem apenas repasse de verbas, mas troca deinformações também. No caso de parcerias com outras ONGsmenores, o relacionamento ainda inclui consultoria administrativa,entre outros recursos importantes para a capacitação dos parceiros.

Como pontos positivos da parceria, os parceiros da OrganizaçãoC apontaram: sua capacidade, estrutura e competência na áreaambiental. Como pontos negativos, foram levantadas as mesmasquestões: capacidade, estrutura e competência. Os parceirospontuaram que as pequenas organizações têm que tomar cuidadopara não serem “engolidas” pelas BINGOs,7 como a Organização C.Mesmo em uma relação de parceria, o parceiro mais fraco podedesaparecer aos olhos dos beneficiários.

Pela análise da Administração de Parcerias das Organizações A,B e C, percebe-se a importância das parcerias para maximizar osresultados das ações das entidades. Muitos projetos não atingiriamseus objetivos sem a contribuição de parceiros. Sendo assim, este

7. BINGO´s sigla em inglês que significa Big International NGO e faz referência àsgrandes ONGs internacionais.

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tipo de relacionamento merece atenção das instituições para que sejamadministrados adequadamente e sejam positivos para todas as partesenvolvidas.

4.1.9 Sistema Legal

Para o Especialista na Legislação do Terceiro Setor entrevistadoe os dirigentes das organizações pesquisadas, a legislação da área ébastante escassa, não objetiva e se concentra na fiscalização dasorganizações, e não no estímulo ao seu desenvolvimento. Esta questãotambém pode ser percebida nas leis que regulamentam as doaçõesrealizadas às entidades e a remuneração de seus dirigentes. Segundoos entrevistados, os incentivos fiscais permitidos por lei sãoinsuficientes para estimular as doações e a proibição da remuneraçãodos dirigentes, para alguns tipos de organizações do Terceiro Setor,dificulta ainda mais a profissionalização e a formação de um quadrocompetente de profissionais.

No que se refere à legislação ambiental, os entrevistados acreditamque há muitos profissionais capacitados na área e que a legislação doEstado de Minas Gerais é uma das mais desenvolvidas do País.Entretanto, esta não é efetiva, não sendo amplamente cumprida pelasorganizações.

4.2 As organizações e as dimensões da sustentabilidade

A Organização A por não apresentar uma AdministraçãoEstratégica adequada, tem todas as suas outras áreas prejudicadas. Semo estabelecimento de uma missão e de estratégias a serem seguidas, eum processo de avaliação constante do ambiente interno e externo daentidade, torna-se difícil a eleição de prioridades e a realização de açõesefetivas na realidade. A Gestão de Pessoas, Administração de Recursos,Gestão de Impactos, Gestão da Imagem Pública e Administração deParcerias ficam sem um direcionamento, sem um objetivo a serperseguido, tornando a gestão casuística, com iniciativas sem umaintegração entre si e também com a missão de toda a organização.

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A Organização B apesar de ter objetivos estratégicosestabelecidos, utiliza as ações de gestão apenas como atividadessecundárias, não como atividades estratégicas que podem maximizaros resultados da organização. A Organização B por estar estruturadapor projetos, direciona quase todos os seus esforços para as atividades-fim, não se preocupando tanto com as atividades-meio, como a Gestãode Pessoas e a Gestão da Imagem Pública, o que poderia melhorar aperformance da organização.

Por fim, a Organização C considera de grande importância asatividades voltadas para a sua gestão. Isto pode ser percebido pelapreocupação despendida no planejamento, organização, coordenaçãoe controle em todas as áreas da organização. Mesmo as áreas-meio,como a Gestão de Pessoas, Gestão de Impactos e Administração deParcerias possuem práticas que zelam pela administração dasatividades. O QUADRO 2 sistematiza as informações.

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QUADRO 3 - As organizações e as dimensões da sustentabilidade

DIMENSÕES DASUSTENTABILIDADE A B C

ORGANIZAÇÕES

AdministraçãoEstratégica

Não possui missão,visão e estratégiasdefinidas.

Possui direcionamentodefinido, mas não reali-za práticas sistemáti-cas de administraçãoestratégica.

Possui administraçãoestratégica com políti-cas sistemáticas edesenvolvidas.

Gestão de pessoas Não possui sistemasestruturados de ARH.

Possui algumas práti-cas para os colabo-radores contratadospara projetos especí-ficos.

Possui algumas políti-cas estruturadas eformalizadas de ARH.

Administração derecursos

O orçamento não épreviamente direciona-do, a falta de planeja-mento estratégicoprejudica o planeja-mento e controle naalocação de recursos.

O orçamento já vemdirecionado para proje-tos; as prioridades dosdoadores influenciamas prioridades daorganização.

O orçamento já vemdirecionado para proje-tos; as prioridades dosdoadores influenciamas prioridades daorganização.

Gestão de Impactos Não possui mecanis-mos para gerenciar osimpactos de suas ações.

Possui diversos instru-mentos para avaliar osimpactos de suasações.

Realiza a avaliação deimpactos só nos pro-jetos em que isto é exi-gido.

Capacidade deAccountability

Publica sua prestaçãode contas no website ea divulga para seusfinanciadores.

Envia sua prestaçãode contas ao MinistérioPúblico e aos seusfinanciadores.

Envia sua prestaçãode contas aos seusfinanciadores.

Capacidade deAdvocacy

Possui ações diretasde advocacy.

Possui ações indiretasde advocacy.

Possui ações indiretasde advocacy.

Gestão da ImagemPùblica

Possui uma imagempolêmica perante asociedade; a falta deplanejamento estraté-gico prejudica a gestãode sua imagem pública.

Possui uma positivaperante a sociedade.

Possui uma positivaperante a sociedade.

Administração deParcerias

Possui alguns projetosem parceria; poderiamaximizar os resultadosobtidos com uma me-lhor gestão.

Realiza muitos projetosem parceria.

Realiza muitos projetosem parceria; obtém,assim, capilaridade emsuas ações e alavancaseus recursos.

Sistema Legal Dificulta a contratação de bons dirigentes para algumas organizações;não estimula as doações, as parcerias e a transparência das entidades;possui ênfase excessiva na fiscalização.

Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados da pesquisa.

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5. CONCLUSÃO

A primeira consideração que deve ser feita é que, embora sejamde grande importância em sua área de atuação, as organizaçõespesquisadas apresentam falhas na sua gestão.

A Administração Estratégica, apesar de ser responsável por traçaros objetivos e as estratégias organizacionais, não é uma área que possuipráticas desenvolvidas na Organização A e na B. A primeira nem sequerpossui uma missão, visão e estratégicas definidas, o que dificulta muitooutras áreas como Gestão de Pessoas, Administração de Recursos,Gestão de Impactos e Gestão da Imagem Pública. A segunda possuium direcionamento mais definido, mas não realiza práticassistemáticas de Administração Estratégica, como um planejamentoestratégico reavaliado periodicamente. Ao contrário das demais, aOrganização C possui uma administração estratégica com políticassistemáticas e desenvolvidas. Esta preocupação com o planejamentoe organização se reflete em todas as outras áreas, onde as ações degestão dão suporte às atividades a serem desempenhadas.

A Gestão de Pessoas é a área que recebe menos atenção nasorganizações estudadas. O grau de desenvolvimento de suas práticase políticas coincide com a atenção dada à gestão como um todo nasentidades. A Organização A não possui sistemas estruturados de RH;a Organização B possui algumas práticas estabelecidas voltadas aoscolaboradores contratados para os projetos da entidade; e aOrganização C, a que tem a maior preocupação com os sistemas degestão, apesar de não possuir uma pessoa responsável apenas pelaárea de RH, já possui algumas políticas estruturadas e formalizadasde Gestão de Pessoas.

A Administração de Recursos é uma área complexa para asorganizações do Terceiro Setor. Pelo fato de sobreviverem de doações,parcerias e patrocínio de produtos e projetos, muitas vezes, asprioridades de seus doadores influenciam as suas prioridades, afetandoo seu planejamento estratégico. Este quadro pode ser encontradonas Organizações B e C, que, embora possuam uma missão jáestabelecida, traçam suas estratégias de ação de acordo com a

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disponibilidade de recursos. A Organização A, ao contrário, não possuium orçamento já previamente direcionado. A princípio, isto poderiaser considerado positivo, entretanto, devido à falta de umaAdministração Estratégica adequada, a Administração de Recursostambém não acontece corretamente, não havendo um planejamentoe controle na alocação dos recursos.

Por demandar muitos esforços, recursos humanos qualificadose métodos acurados de avaliação, a Organização A não dá conta degerenciar os impactos de suas ações e a Organização B apenas realizaavaliações de impacto quando o financiador de um projeto as exige.Já a Organização C, que possui ações de gestão mais acuradas, possuidiversos instrumentos para avaliar os impactos de suas ações emonitorar a performance dos projetos. A Gestão de Impactos dasorganizações estudadas reflete sua capacidade de monitorar a eficáciade suas ações, podendo-se inferir, assim, que a Organizações A e a Bpodem estar despendendo grandes esforços em ações que não trazemos resultados objetivados.

As organizações pesquisadas não possuem sua Capacidade deAccountability bastante desenvolvida. Uma das principais razões paraisso é a falta de mobilização e articulação dos seus stakeholders e dasociedade como um todo. A sociedade não tem o costume de cobrartransparência das organizações, e estas também não se mostram muitopreocupadas com sua prestação de contas, a não ser que sejamdemandadas. Esta é uma questão delicada, que pode afetar sua imagempública diminuindo sua legitimidade e credibilidade perante asociedade.

As entidades estudadas na pesquisa possuem ações diferentes deadvocacy. As Organizações B e C têm ações indiretas, em que tentaminfluenciar as políticas públicas mediante o fornecimento deinformações, e a Organização A tem uma ação mais direta, fazendoarticulações políticas com outras organizações do Terceiro Setor eempresas privadas. Mesmo sendo de natureza diferente, as ações dasOrganizações A, B e C são muito importantes para a configuraçãodas decisões na área ambiental e pressionam para a preservação domeio ambiente.

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A Gestão da Imagem Pública é uma área importante, mas nemsempre bem gerenciada pelas entidades estudadas. Em conseqüênciada forma como a Organização A capta seus recursos e da falta de umplanejamento estratégico, a sua imagem pública tem sidonegativamente afetada, diminuindo sua credibilidade perante asociedade. As Organizações B e C, apesar de não priorizarem osinvestimentos em comunicação, possuem uma imagem públicapositiva e atraem bons parceiros e doadores por isto.

A Administração de Parcerias é uma área importante dasorganizações pesquisadas, na medida em que é capaz de viabilizarações que não seriam possíveis para as entidades individualmente.Apesar disto, a Organização A não aproveita adequadamente asparcerias que possui, assumindo que uma melhor gestão poderiamaximizar os resultados obtidos. As Organizações B e C realizammuitos projetos em parceria, obtendo capilaridade em suas ações ealavancando seus recursos.

A última área contemplada pela pesquisa, o Sistema Legal, podefomentar ou dificultar a ação das organizações. Pôde-se perceber quea atual legislação dificulta a contratação de bons dirigentes, já quealgumas organizações do Terceiro Setor são proibidas de remunerá-los. Não há estímulos suficientes a doações, a parcerias e a transparênciadas entidades. E a legislação atribui ênfase excessiva à fiscalização,afetando negativamente a captação de recursos humanos, materiais efinanceiros, e não estimulando a transparência e responsabilizaçãopelas atividades.

Cabe dizer que a perspectiva da sustentabilidade enfoca orelacionamento entre as várias dimensões da organização, considerandoa influência mútua entre elas. Sendo assim, a sustentabilidade dasorganizações depende de decisões integradas, e que considerem ainterdependência entre as ações de gestão da entidade.

Percebe-se que, dependendo dos objetivos estratégicos daorganização, uma área receberá mais atenção, concentrando seusesforços. No caso da Organização A, seus “pontos de concentração”estão na sua Capacidade de Advocacy. Já a Organização C atrela seusobjetivos organizacionais à sua Administração de Parceiras. Dessa

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forma, as ações de gestão da organização serão moldadas por sua missãoorganizacional e por este motivo, também, que o estabelecimento ereavaliação constante da missão é tão importante para uma gestãoadequada e para a manutenção da sustentabilidade.

É importante reafirmar que as análises realizadas referem-se astrês organizações estudadas, não podendo ser generalizadas para umsetor tão heterogêneo como é o Terceiro Setor. Diante desta limitação,sugere-se a realização de pesquisas sobre a gestão na perspectiva dasustentabilidade de outras organizações do Terceiro Setor, em outrasáreas de atuação e com outro perfil.

Espera-se, a partir das conclusões tecidas no estudo, tercontribuído para o entendimento de que a perspectiva dasustentabilidade olha para o futuro das organizações, para as açõesque devem ser tomadas hoje, visando garantir sua performanceorganizacional no presente e no futuro. Para isso, é necessário que asentidades além de gerenciarem suas diversas áreas adequadamente,devem ser capazes de se adaptarem e de alterarem suas políticas epráticas de acordo com as demandas do ambiente. Dessa forma, asustentabilidade deve ser tratada como um processo, uma buscacontínua por recursos, pessoas, informação e mobilização, de modoa assegurar o fortalecimento e o desenvolvimento da organização.

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ANTECEDENTES DA INTENÇÃO DE

CONSUMO DE COSMÉTICOS

ECOLÓGICOS

RICARDO TEIXEIRA VEIGA1

DEBORAH OLIVEIRA SANTOS2

TALES LACERDA3

RESUMO DO TRABALHO

Duas amostras – uma de membros de uma associação de defesaambiental (N = 54) e outra de alunos e professores de um curso depós-graduação (N = 40) – foram submetidas a um questionário baseadona Teoria do Comportamento Planejado (TCP) (AJZEN, 1985). Olevantamento foi realizado pela Internet. Foram investigados osantecedentes comportamentais da intenção de usar cosméticosecológicos e as políticas dos fabricantes desses produtos relativas àproteção ambiental. Não obstante o caráter exploratório da pesquisa,os resultados parecem sustentar empiricamente a utilidade da TCPpara compreender os construtos cognitivos e atitudinais que explicamo comportamento-alvo. Entretanto, é necessário coletar mais dadospara examinar aspectos teóricos mais sutis, tais como o relacionamentoentre crenças e atitudes, bem como avaliar mais rigorosamente se ateoria deve ser aprofundada.

1. Professor Doutor - CEPEAD/FACE/UFMG. [email protected]. Aluna Mestrado 2007 CEPEAD/FACE . [email protected]. Mestre CEPEAD/FACE/UFMG. [email protected]

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ï 194 ï Antecedentes da intenção de consumo de cosméticos ecológicos– RICARDO TEIXEIRA VEIGA et. al.

1. INTRODUÇÃO

Cresce a consciência de que é preciso mudar os processos deprodução e nosso estilo de vida para evitarmos catástrofes ambientaisirreversíveis. Governos e empresas têm um papel importante nessastransformações, e o mercado consumidor pode exercer pressão sobreo mercado produtor, exigindo que a produção seja limpa(LAYRARGUES, 2000).

O objetivo desse trabalho é estudar o comportamento doconsumidor brasileiro quanto à preferência de produtos (cosméticos)ambientalmente corretos. O termo cosmético significa produtoaplicado no corpo humano para limpeza e embelezamento. Segundodados obtidos na (FCE Cosmetique, 2005), o Brasil é o sétimo maiorprodutor de cosméticos do mundo.

Na pesquisa realizada, foram considerados “cosméticosecologicamente corretos” aqueles cujas empresas fabricantes adotamprocessos de produção que não trazem riscos ao meio ambiente outêm baixo impacto ambiental.

Criados para prever e explicar o comportamento humano,alguns modelos teóricos são chamados de modelos de intençõescomportamentais, pois focalizam essa variável que antecedeimediatamente o comportamento real e, por isso, provavelmente temalto potencial para prognosticá-lo. Um deles é a Teoria doComportamento Planejado - TCP (AJZEN, 1985).

Neste estudo, investigaram-se os antecedentes comportamentaisda intenção de consumir cosméticos ecologicamente corretos,utilizando a TCP, para que se pudessem testar empiricamentehipóteses relativas a essa teoria. Considerou-se válida a idéia deamostrar membros de uma associação que luta pela defesa do meioambiente, bem como pessoas de alta escolaridade (alunos e professoresde mestrado e doutorado), supondo que esses grupos aceitariam aproposta da pesquisa com naturalidade.

Obtendo-se evidências da validade da TCP nessa aplicação, pode-se, identificar a importância relativa dos antecedentescomportamentais para explicar a intenção de consumo de cosméticosecológicos. Esse conhecimento pode servir como referência para

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órgãos do governo e associações de defesa ambiental, na elaboraçãode campanhas pelo consumo com preocupações ecológicas.

2. TEORIA DO COMPORTAMENTO PLANEJADO (TCP)

A TCP baseia-se no pressuposto que as pessoas se comportamde forma bastante racional e utilizam sistematicamente as informaçõesque lhes estão disponíveis, considerando as implicações de suas açõesantes de decidirem se devem ou não realizar determinadocomportamento. Segundo diversas meta-análises (e.g., ARMITAGEe CHRISTIAN, 2003), a TCP tem bastante suporte empírico.

Segundo Ajzen (2002b), o comportamento humano é guiadopor três tipos de crenças: crenças sobre as conseqüências prováveis deum comportamento (crenças comportamentais), crenças sobre asexpectativas normativas de terceiros (crenças normativas) e crenças arespeito da presença de fatores que podem impedir ou facilitar aperformance de um comportamento (crenças de controle). Em seusrespectivos agregados, crenças comportamentais produzem umaatitude favorável ou desfavorável em relação ao comportamento,crenças normativas resultam em pressão social perceptível ou normasubjetiva e crenças de controle podem facilitar ou impedir aperformance de um comportamento. Em combinação, atitude emrelação ao comportamento, norma subjetiva e percepção se ocomportamento está sujeito à vontade conduzem à formação de umaintenção comportamental. Como regra geral, quanto mais favoráveissão a atitude e a norma subjetiva e maior o controle percebido, maiordeve ser a intenção pessoal de realizar o comportamento. Finalmente,dado um suficiente grau de controle do comportamento, as pessoastendem a realizar suas intenções quando as oportunidades aparecem.

Segundo o autor, para modificar o comportamento, intervençõespodem ser direcionadas a um ou mais de seus três determinantes:atitudes, normas subjetivas ou controle percebido. Comoconseqüência da mudança nesses fatores, novas intençõescomportamentais podem ser produzidas e convertidas emcomportamento real.

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ï 196 ï Antecedentes da intenção de consumo de cosméticos ecológicos– RICARDO TEIXEIRA VEIGA et. al.

3. MÉTODO

Realizou-se um levantamento pela Internet nos meses de abril emaio de 2005, através de um questionário com 19 perguntas. Alémdas questões finais que pediam para o respondente informar sexo,faixa de idade e escolaridade, o questionário incluiu perguntas sobreatitude, norma subjetiva, controle percebido, intençãocomportamental, comportamento passado, avaliação de resultados,norma moral, antecipação de sentimento e conhecimento de empresaecologicamente responsável. A capacidade de explicação adicionaldos construtos em relação à TCP foi estudada através de regressõeshierárquicas.

Nas análises de regressões hierárquicas, investigaram-se sucessivosmodelos tendo, em todos os casos, a intenção comportamental deconsumir cosméticos ecológicos como variável dependente, a serexplicada. Iniciou-se por um modelo com três variáveis explicativas(ou variáveis independentes): as medidas de atitude, norma subjetivae controle percebido. A seguir, rodaram-se novas regressões para testarmodelos em que se acrescentaram construtos recentemente sugeridosna literatura para aumentar a variância explicada das intençõescomportamentais, em ampliações da TCP. Em todos os casos, testou—se a significância da variação de F e do coeficiente de determinação (∆R2).

Realizaram-se análises separadas para as duas amostras.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O perfil da amostra dos membros da associação ambientalista(N = 54) pode ser assim resumido: a maioria são mulheres (57%),têm 26 anos ou mais (80%), com curso de pós-graduação concluídoou em andamento (57%). Em comparação, a amostra de pessoasvinculadas ao programa de pós-graduação (N = 40) consistiu de igualquantidade de homens e mulheres, predominância de pessoas com26 anos ou mais (77,5%) e 100% de respondentes com pós-graduação

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ORGANIZAÇÕES SUSTENTÁVEIS: Utopias e inovaÁıes ï 197 ï

concluída (pelo menos curso de mestrado) ou em andamento(mestrado ou doutorado).

Estatísticas descritivas sobre as variáveis indicadoras foramobtidas. As medidas de atitude apresentaram médias muito altas,não se constatando diferenças estatisticamente significativas entre asduas amostras.

Para comparar as médias amostrais entre indicadores de intençãocomportamental, norma subjetiva, norma moral etc., foram utilizadostestes t para amostras independentes. No caso da amostra A (membrosda associação ambientalista), a intenção de utilizar cosméticosecologicamente corretos dali em diante é muito alta (média = 6,24),embora as pessoas não se sintam muito pressionadas socialmentepara isso (4,24 ≤ média

NS ≤ 4,85). Os respondentes parecem sentir-se

obrigados moralmente a usar cosméticos ecológicos (médiaNM2

= 6,02)e declaram desejar utilizar apenas esse tipo de cosmético (média

D =

6,15). No entanto, o controle percebido para esse comportamentonão é muito grande (3,94 ≤ média

CP ≤ 5,22). Por isso, os respondentes

não parecem condenar as pessoas que usam cosméticos não ecológicos(média

NM1 = 4,74). Como esperado, a atitude favorável ao

comportamento de usar cosméticos ecologicamente corretos é muitoalta (6,70 ≤ média

A ≤ 6,72).

O padrão de respostas da amostra B foi um pouco diferente.Pessoas vinculadas ao curso de pós-graduação apresentaram médiasignificantemente menor de intenção de usar cosméticosecologicamente corretos dali em diante, embora a média tambémfosse alta (média = 5,20). Aparentemente, sentem-se bem menospressionadas socialmente a utilizar cosméticos ecológicos (2,58 ≤média

NS ≤ 3,45). Parecem indiferentes quanto à questão de se sentirem

moralmente obrigadas a isso (médiaNM2

= 3,63, valor nãoestatisticamente diferente de 3,5, que corresponde à posição deneutralidade na escala Likert de 7 pontos). Não demonstram umdesejo muito forte de utilizar apenas cosméticos ecológicos (média

D

= 4,90). Além disso, aparentam percepção de controle sobre a intençãode realizar esse comportamento menor do que na amostra A, de fato,não significativamente diferente da posição de neutralidade da escala(3,60 ≤ média

CP ≤4,05).

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ï 198 ï Antecedentes da intenção de consumo de cosméticos ecológicos– RICARDO TEIXEIRA VEIGA et. al.

Para verificar empiricamente se havia sustentação para a TCP epara extensões da teoria, utilizou-se regressão linear múltiplahierárquica para testar as seguintes hipóteses.

H1: “Existe uma associação significativa e forte entre atitudes,

normas subjetivas e controle percebido com as intençõescorrespondentes (A + NS + CP → I)”.H

2: “A inclusão de uma medida do efeito residual do

comportamento passado na TCP aumenta o percentual devariância explicada das intenções pela teoria”.H

3: “A inclusão de medidas de normas morais e de antecipação

de sentimentos aumentam o percentual de variância explicadadas intenções”.No caso da amostra A, os resultados parecem corroborar a

hipótese 1, ou seja, medidas de atitude, norma subjetiva e controlepercebido explicam uma relevante proporção da variância da intençãocomportamental correspondente (47%), o que parece atestar avalidade preditiva da TCP.

Para testar H3, rodou-se nova regressão a partir do modelo

anterior. Esse passo parece sustentar a inclusão da norma moral paraexplicar a intenção comportamental, pois se constatou um aumentode cerca de 15% na variância explicada (R2 = 54%). A inclusão doconstruto antecipação de sentimentos (passo 3) aumentou o poderexplicativo do modelo para 59%, porém os coeficientes betas deatitudes e normas morais não foram significativos.

No quarto passo da série de regressões, o acréscimo da variávelindicadora de comportamento passado (“Já comprou cosméticoecológico”), representada como variável dicotômica, nada acrescentouna variância explicada (∆R2 = 0), implicando na rejeição de H

2.

Na amostra de pessoas ligadas ao programa de pós-graduação(amostra B), verificaram-se correlações razoáveis e significativas entrea intenção comportamental e os demais construtos da TCP, excetono caso do controle percebido.

No teste de H1

(poder explicativo da TCP), observa-se que,embora os construtos explicassem um elevado percentual da variânciada intenção comportamental correspondente (R2 = 0,53 no passo

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1), o controle percebido não apresentou coeficiente de regressãosignificativo. Na teste das demais hipóteses, não se comprovou autilidade das tentativas de extensão do modelo. Ou seja, para aamostra de pessoas ligadas ao curso de pós-graduação, apenas a atitudee norma subjetiva parecem relevantes para explicar a intenção deconsumir apenas cosméticos ecologicamente corretos.

Sinteticamente, podemos concluir que o estudo das duasamostras apresenta razoável sustentação empírica para a TCP, emborano caso da amostra B não se tenha constatado que controle percebidotem poder explicativo da intenção. Quanto a extensões do modelo,não se verificou a utilidade de incluir os construtos comportamentopassado e antecipação de sentimento, porém há indícios de que ainclusão da norma moral pode aumentar o poder da teoria de explicarvariação na intenção de uso de cosméticos ecologicamente corretos.

Na investigação realizada, há evidências consistentes de que aatitude tem maior peso para explicar a intenção de consumir apenascosméticos ecologicamente corretos, do que a norma subjetiva e ocontrole percebido. Para tornar mais positiva a atitude das pessoasem relação à realização desse comportamento, pode-se promover oaumento da consciência ecológica em geral e difundir amplamenteinformações sobre os problemas ambientais existentes.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O aumento do consumo de cosméticos tem crescido fortementenos últimos anos. No Brasil, alguns fabricantes de cosméticos, comoa Natura e o Boticário, têm-se posicionado como defensores do meioambiente. Por outro lado, no âmbito da pesquisa realizada,consumidores com alto nível de escolaridade, particularmente aquelescom maior sensibilidade para as questões ambientais, parecem ter aintenção de consumir apenas cosméticos ecologicamente corretos.Sua disposição de agir nessa direção parece explicar-se principalmentepor sua atitude relativa a essa intenção comportamental. Ademais,parece existir uma influência relevante da pressão social de pessoasque são importantes para esses indivíduos em sua eventual decisão

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ï 200 ï Antecedentes da intenção de consumo de cosméticos ecológicos– RICARDO TEIXEIRA VEIGA et. al.

de utilizar apenas esse tipo de cosmético. Além disso, pessoas quesupostamente têm maior envolvimento com as questões ambientais(amostra A) aparentam ter níveis mais elevados de percepção decontrole voluntário relativo à intenção de uso de cosméticosecológicos. Esse resultado é bastante razoável, tendo em vista quemembros de uma associação ambientalista devem possuir maisconhecimento e informações sobre questões ecológicas em geral eprodutos ecologicamente corretos em particular.

A avaliação da importância dos antecedentes comportamentaisnessa aplicação tornou-se possível devido ao uso da TCP comomoldura teórica. Os resultados do levantamento, embora nãoconclusivos, parecem confirmar o valor da teoria para explicar aintenção do consumo desse tipo de produto. Não obstante,recomenda-se que se façam estudos com amostras maiores e comoutros tipos de consumidores. É aconselhável também que se utilizemmais indicadores para os construtos teóricos e que se investiguem ascrenças, as quais, segundo a teoria, são as bases cognitivas dosantecedentes da intenção comportamental. Uma questão crucial éestudar a relação entre a intenção e o comportamento de consumocorrespondente, pois a TCP baseia-se no pressuposto de que a intençãoacarreta o comportamento na ausência de fatores alheios à vontade.

A oferta de produtos ecologicamente corretos é um requisitopara sua escolha. Consumidores com mentalidade ecológica parecempropensos a utilizar apenas cosméticos ecologicamente corretos. Umobjetivo de educação ambiental é disseminar os conceitos de produtoecológico e de produção limpa. Mostrando-se que existempossibilidades reais de mudanças nos processos de produção paratorná-los menos agressivos e prejudiciais ao meio ambiente, pode-secontribuir para que as pessoas se tornem mais conscientes dapossibilidade de terem um papel ativo nas transformações culturais,sociais e econômicas que contribuam para preservar a natureza.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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A IMAGEM DO DESTINO TURÍSTICO

COMO FATOR DE SUSTENTABILIDADE:O CASO DE OURO PRETO/ MG

MARLUSA GOSLING1

DANIELLE FERNANDES COSTA MACHADO2

INTRODUÇÃO

Os estudos sobre marketing de destinações turísticas apresentamuma grande relevância para o planejamento e a gestão do turismo.De acordo com McIntosh et. all. (2002), o gerenciamento dedestinações turísticas baseia-se em dois parâmetros essenciais: garantira competitividade e ao mesmo tempo zelar pela sustentabilidadeambiental, econômica e sócio-cultural da localidade turística. Dessaforma, as estratégias de marketing devem considerar esses parâmetroscom o objetivo de atender as necessidades e as expectativas dosconsumidores, antecipando-se aos seus desejos e buscando uma relaçãode trocas em equilíbrio com o conjunto da organização estrutural,das relações ambientais e das ações operacionais que formam o sistema

de turismo.3

1. Professora adjunta de Marketing da Universidade Federal de Minas Gerais. Doutoraem Administração pela UFMG e sub-coordenadora do Núcleo de Estudos emComportamento do Consumidor (NECC). [email protected]

2. Bacharel em Turismo e especialista em Gestão Estratégica em Marketing pelaUniversidade Federal de Minas e pesquisadora voluntária do NECC –[email protected]

3. Sistur (BENI, 1997).

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ï 204 ï A imagem do destino turístico como fator de sustentabilidade – MARLUSA GOSLING e DANIELLE F. COSTA MACHADO

Dentro desse cenário, as pesquisas sobre a imagem dos destinosturísticos tornaram-se objeto de estudo fundamental para a melhorcompreensão do fenômeno turístico. Embora os estudosinternacionais sobre o tema tenham-se iniciado ainda na década desetenta (Hunt,1975; Crompton, 1979), no Brasil, são raros ostrabalhos que dissertam sobre a questão, sendo que esses ainda sãobastante recentes, tais como os trabalhos de Santana (2001) e Bignami(2002). De modo geral, as pesquisas nessa área buscam demonstrar oefeito da demografia turística na imagem do destino percebida pelosturistas e propor modelos de escolha de destinações.

O presente trabalho tem como objetivo analisar a percepção daimagem do destino Ouro Preto pelos turistas e pelos atores do trade

turístico local, identificando-se a imagem difusa percebida e possíveiscontribuições para a sustentabilidade. A escolha da área de estudo sedeu em virtude da sua relevância no cenário turístico de Minas Gerais,sendo uma das principais cidades históricas do Brasil, tombada comoPatrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco desde 1980. Aeconomia de Ouro Preto gira em torno do turismo, sendo que olugar destaca-se como pólo receptor, possuindo sua imagem bastantedifundida e divulgada nos meios de comunicação de massa.

IMAGEM DO DESTINO

A definição da imagem do destino é problemática e possui umaextensa variedade de interpretações. Entre todas as definições pode-se destacar, por sua amplitude e precisão, a definição dada por Baloglue McCleary (1999) que considera a imagem como “a representação

mental das crenças, dos sentimentos e das impressões globais de um indivíduo

sobre um destino turístico.”

Crompton e Fakeye (1991) sugerem que o processo de formaçãode imagens de destino envolve três estágios: imagem orgânica, induzidae complexa. A imagem orgânica é formada por meio da exposição areportagens de jornais, artigos de revistas e outras fontes informaçõescujo caráter não está diretamente orientado para o turismo. A imageminduzida, por sua vez, é formada a partir de informações

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especificamente turísticas e que são influenciadas pelas organizaçõesenvolvidas na área como, por exemplo, os anúncios e pôsteres deviagem. Gunn (apud Crompton e Fakeye, 1991) afirma que todoindivíduo, mesmo aquele que nunca visitou o destino ou nuncaprocurou informações sobre o mesmo, possui algum tipo deinformação armazenada na memória, mesmo que incompleta, a qualele pode adicionar outras partes. Apesar de nem sempre as imagensserem representativas da realidade, elas sempre sugerem simpatia, oua falta dela, em relação a uma localidade e, portanto, servem de baseno processo de avaliação e seleção do destino, uma vez conciliadascom as motivações de viagem. A escolha do destino é feita baseando-se na percepção pessoal da imagem orgânica captada, da divulgaçãoboca a boca e das vantagens e das imagens retratadas pelos profissionaisdo turismo. Como resultado desse processo, o futuro visitantedesenvolve imagens mentais mais refinadas das alternativas dos destinose seleciona aquele cuja imagem orgânica ou induzida sugere maisbenefícios. Após visitar o destino escolhido, o turista desenvolve umaimagem mais complexa resultante do contato atual com a área.

Shet, Nwewman e Gross (apud Tapachai e Waysak, 2000)acrescentam que o processo de escolha do destino está relacionadocom cinco valores/ benefícios de consumo da imagem: funcional,social, emocional, epistemológico e condicional.

Echtner e Ritchie (1991, 1993) propõem três contínuos bipolarespara delimitar a imagem do destino turístico: a) atributo-holístico,b) funcional-psicológico, c) comum-único. O primeiro deles sugereque a imagem é composta não apenas pela percepção do indivíduoem relação aos atributos específicos do destino, mas também porsuas impressões holísticas (totais) do lugar. O contínuo funcional-psicológico refere-se às características, ou impressões, mais tangíveis(ex.: atrativos turísticos, cidades, acomodação, etc.) ou mais abstratas(ex.: hospitalidade, reputação, tranqüilidade, etc.) de uma destinação,respectivamente. Por sua vez, o contínuo comum-único estárelacionado às características que são freqüentemente encontradasou que são peculiares de algumas destinações. A imagem, portanto,apresenta um conceito de natureza multidimensional, cuja

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ï 206 ï A imagem do destino turístico como fator de sustentabilidade – MARLUSA GOSLING e DANIELLE F. COSTA MACHADO

interpretação deve apoiar-se na interação de todos os contínuosidentificados previamente.

METODOLOGIA

A imagem é cingida pela complexidade, multidimensionalidadee intangibilidade o que dificulta sua mensuração (CHI, 2005). Demodo geral, as técnicas quantitativas ou estruturadas predominamnas pesquisas turísticas, sobretudo nos estudos de imagem de destinoscom ampla utilização de questionários do tipo survey e da escala Likertou de diferencial semântico. Como resultado, esses estudos focalizamos atributos básicos e comuns da imagem. Entretanto, a técnicaqualitativa tem sido constantemente usada por alguns autores (Echtnere Ritchie, 1991; Deegan e O‘Leary, 2005) como um eficiente métodopara a mensuração dos componentes holísticos e das característicasespecíficas e únicas de cada destino. Com a finalidade de identificarpercepções mais profundas com sentimentos e emoções, optou-sepelo emprego de um estudo exploratório, utilizando-se a técnica deentrevistas semi-estruturadas que, segundo Malhotra (2005: 121),podem ser eficazmente empregadas em “situações em que a experiência

do consumo do produto é, por natureza, sensorial, afetando estado de humor e

emoções”.

Foram realizadas 22 entrevistas com turistas, moradores erepresentantes do trade turístico local, nos dias 07 e 08 de abril de2007, feriado da Semana Santa, em Ouro Preto. As entrevistas foramestruturadas de acordo com o seguinte roteiro:1- Quando você pensa em Ouro Preto, que imagens ou

características vêm a sua mente?2- Como você descreveria a atmosfera ou seus sentimentos ao

visitar Ouro Preto?3- Por favor, liste algumas atrações turísticas de Ouro Preto

que você considera como sendo únicas e singulares. 4- Por que você acha que as pessoas deveriam visitar Ouro

Preto?

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5- Por que você acha que as pessoas não deveriam visitar OuroPreto ou que aspectos negativos você observou na cidade?

As perguntas 1, 2 e 3 foram baseadas no estudo feito por Echtnere Ritchie (1991) sendo que as mesmas foram avaliadas e testadasempiricamente pelos autores. A primeira pergunta foi projetada demodo a permitir que os respondentes pudessem pensar livrementesobre o destino e descrever suas impressões totais acerca do mesmo.A experiência demonstrou que os entrevistados tendem a focalizarsuas respostas nas características mais funcionais da imagem. A segundapergunta buscou capturar o componente psicológico/holístico daimagem, descrita por meio da atmosfera do lugar ou sentimentos aele associados. Finalmente, a terceira questão visou identificar asatrações consideradas distintas e únicas. As perguntas 4 e 5,respectivamente, foram adicionadas à pesquisa com a finalidade deverificar os fatores de atração (benefícios que podem definir a escolhado destino) e de repulsão ao lugar em função da imagem percebida.Posteriormente, as entrevistas foram analisadas à luz do modeloproposto por Echtner e Ritchie (1991).

RESULTADO

A partir da análise das entrevistas foi feita a classificação dascaracterísticas percebidas da imagem de Ouro Preto, de acordo como modelo proposto por Echtner e Ritchie (1991) e mostrados nafigura 1.

O principal motivo apontado pelos entrevistados como fatorde diferencial competitivo na escolha do destino foi sua importânciacultural e histórica. O depoimento a seguir demonstra como a visitaa Ouro Preto é considerada uma experiência enriquecedora, o quevincula a imagem local a um valor de consumo evidentementeepistemológico, conforme descrito por Shet, Nwewman e Gross (apudTapachai e Waysak, 2000):

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As pessoas devem visitar Ouro Preto porque ela temuma grande importância cultural e histórica para aconstituição do país. A cronologia histórica, sabe?Além disso, é importante conhecer pra se ter maisresponsabilidade com a cultura. É a cidade maisimportante de Minas Gerais. Não há como nãoconvidar uma pessoa para conhecer Ouro Preto. Éimpossível sair daqui e não aprender alguma coisa.

Tal percepção ajusta-se ao princípio da sustentabilidade peloqual o turismo deve ser um fator de geração de satisfação capaz derepresentar aos visitantes uma experiência significativa que os tornemais conscientes dos problemas da sustentabilidade, incentivandopráticas turísticas sustentáveis.

De modo geral, os atrativos considerados mais expressivos esingulares foram a Casa dos Contos, as igrejas, sobretudo as de SãoFrancisco, N. S. do Rosário e N. S. do Pilar, o Museu da Inconfidência,a praça Tiradentes, o artesanato e as obras de arte.

No campo mais holístico e psicológico, destacaram-se as sensaçõesparadoxais:

“Acho a atmosfera de Ouro Preto única. Ao mesmotempo que sinto a cidade alegre, viva, principalmenteem dias de sol, também a sinto nostálgica, um poucocarregada com o peso da história. Eu me sinto muitobem quando vou a Ouro Preto, mas também ficobastante reflexiva. É muita arte e muita história numlugar só!”“Ouro Preto possui uma atmosfera pesada,tipicamente barroca. Quando a cidade não está muitocheia, me sinto em uma cidade antiga e maravilhosa.Quando ela está lotada, no entanto, com todas aslojas abertas e os ambulantes nas ruas, me sinto emum shopping center de decoração colonial.”Essa contradição decorre da forte associação feita

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com o passado do lugar marcado pela escravidão epela riqueza e legados históricos culturais que, deacordo com os entrevistados, conferem umaatmosfera pesada, emocionante, reflexiva, saudosistae nostálgica. Por outro lado, a atmosfera também épercebida como ora tranqüila ora agitada emdecorrência da dinâmica cotidiana da cidade marcadapela população jovem, eventos/festividades e,paralelamente, pelo clima interiorano e de grandebeleza cênica.

A experiência e o ganho proporcionado pela visita a Ouro Pretoforam considerados de grande valia por todos os entrevistados. Mesmoos respondentes que identificaram problemas na cidade ponderaramque os aspectos positivos sobrepõem-se aos negativos. Dentre osprincipais problemas apontados destacam-se os inconvenientes dotrânsito e da acessibilidade (falta de estacionamentos, tráfego caóticono centro histórico, dificuldade de acesso aos atrativos em função dorelevo acidentado e da ausência de meio de transporte adequado).Outros problemas também foram apontados, como a cobrança depreços abusivos e forte apelo comercial evocado pela cidade.

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CONCLUSÃO

Pode-se destacar como principal contribuição da pesquisa, aidentificação de atributos que vislumbram aspectos da autenticidadesociocultural de Ouro Preto. O conhecimento desses elementos éfundamental para a conservação dos ativos culturais e dos valorestradicionais que contribuem para o entendimento e para a tolerânciaintercultural, conforme os princípios da sustentabildade expressospela Organização Mundial de Turismo. O estudo pode servir de basepara a elaboração de planos de marketing mais eficientes e alinhadoscom os princípios da sustentabilidade, além de contribuir para aidentificação e preservação dos bens que caracterizam a unicidade dodestino. Dessa forma, é possível direcionar as campanhas publicitárias,

Funcional/Atributo

Figura 1 características da imagem de Ouro Preto

Psicológico/Holístico

Cultura barrocaHistóriaPersonagens históricos(Tiradentes, Tomás AntônioGonzaga, etc)Atmosfera pesada/ místicaSaudosismo/ nostalgiaAtmosfera reflexiva

CarnavalMuseu da InconfidênciaIgrejas do Pilar/ SãoFrancisco/ RosárioCasa dos ContosPraça TiradentesArte e artesanato

Calma/tranqüilidadeAlegria/ angústiaComunidadehospitaleira edescontraída

Preços abusivosArquitetura colonialRuas estreitas e comladeiradasPopulação jovemTrânsito desorganizadoEntretenimento e eventos

Comum Único

Fonte: Adaptado de Echtner e Ritchie (1991)

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tornando-as mais esclarecedoras, diferenciadas e atraentes para opúblico-alvo de modo e permitindo o posicionando dos benefíciosdo local apoiado na imagem existente. No momento da compra, oturista não tem como avaliar o produto, por isso ele compra umaimagem antes de qualquer coisa. A imagem induzida deve focar-seno compromisso com a transmissão dos valores e da identidade local,evitando-se o distanciamento inadequado com a realidade que podecausar frustrações nos visitantes ou outras conseqüências indesejadascomo a redução da probabilidade de retorno e a propagação de bocaa boca negativa. Ressalta-se ainda que a pesquisa identifica apenasalguns componentes que caracterizam a representação do lugar namente do turista. Portanto, o trabalho pode servir de alicerce parapesquisas futuras que utilizem técnicas estruturadas e não estruturadasconjuntamente, visando a melhor captação de todos os componentesda imagem de Ouro Preto.

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL:A PERCEPÇÃO DOS EMPREGADOS

SOBRE AS PRÁTICAS ADOTADAS

EM UMA ORGANIZAÇÃO

DO RAMO DE MINERAÇÃO1

NÍBIA PALMA DE LIMA2

ARMINDO DOS SANTOS DE SOUZA TEODÓSIO 3

RESUMO

O mundo tem passando por grandes transformações devido aoalto crescimento populacional. Consequentemente, o consumo noplaneta aumentou significativamente ocasionando uma maiorexploração dos recursos. Diante deste quadro, a terminologia

1. O presente trabalho é relativo a monografia do curso de graduação emAdministração, e constitui-se em uma primeira etapa da construção do marcoteórico e da definição de aspectos metodológicos referente à monografia: “EducaçãoAmbiental: a Percepção de Empregados sobre as Práticas Adotadas em umaOrganização do Ramo de Mineração” desenvolvida no período de fevereiro adezembro de 2007.

2. Graduanda do curso de Administração da Pontifícia Universidade Católica deMinas Gerais – PUC Minas em Betim, 8o. período do curso de Administraçã[email protected]

3. Doutorando em Administração/EAESP/FGV/SPProfessor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas emBetim. [email protected]

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Desenvolvimento Sustentável virou o centro de debates em todo omundo. As grandes organizações estão procurando se desenvolver deforma sustentável, pois a degradação que provocam no meio ambientedeve ser minimizada. Para que tal processo seja eficaz, diversasorganizações estão inserindo em sua estrutura organizacional o sistemade gestão ambiental e para envolver os seus empregados neste modelo,o fazem através da Educação Ambiental.

O objetivo deste trabalho é discutir as práticas de EducaçãoAmbiental na organização privada. O debate sobre o tema EducaçãoAmbiental começou a partir do século XX, quando a UNESCOtratou deste assunto como sendo de caráter socioambiental. Em 1992,na Conferências das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente eDesenvolvimento foi aprovado um documento, a Agenda 21. Emum de seus programas incentiva a promoção do ensino, daconscientização pública e do treinamento baseado em umdesenvolvimento sustentável. Portanto, a educação ambiental deveproporcionar um pensamento crítico e inovador para promovermudanças na sociedade, com cidadãos que se preocupam com o meioque os circunda. Ele parte do entendimento que as boas práticasambientais dos empregados se deve a co-participação ativa naorganização.

Neste trabalho, será realizado um estudo de caso em umaorganização que atua no ramo de mineração. A organização possuiem seus setores metas e objetivos relacionados com o meio ambientee os seus empregados são instruídos sobre a importância de cumpriros procedimentos e quais são os aspectos e impactos que suasatividades exercem sobre a natureza. A pesquisa coletará dados atravésda utilização de entrevistas, aplicação de questionário e coletadocumental de informativos, sites da empresa e artigos. As entrevistasserão abertas semi-estruturadas e direcionadas para o Gerente da áreaoperacional, ao empregado responsável pelo treinamento da gestãoambiental e para um empregado membro do Comitê de MeioAmbiente. O questionário será aplicado para a amostra da populaçãode empregados

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1. INTRODUÇÃO

O mundo nas últimas décadas tem passado por grandestransformações de ordem econômica, social e ambiental. Ocrescimento da população nos grandes centros urbanos proporcionouo surgimento de grandes problemas em diferentes esferas da vida, asaber econômica, desemprego; maior produção de bens e ambientais;e ambiental, como por exemplo a degradação da natureza. Estasmudanças ocasionaram alterações significativas no meio ambiente,que interferiram diretamente nas transformações climáticas de todoo mundo.

Algumas organizações privadas através de acordos com osgovernos, se comprometeram em diminuir os dejetos que despejamno meio ambiente e grande parte delas adotaram em seus processosorganizacionais o sistema de gestão ambiental com o intuito de educaros seus empregados e serem socialmente responsáveis perante acomunidade em que atuam.

Os governos, como medida corretiva, têm determinado taxasmáximas de emissão de poluentes no ambiente e também criado leisque regulamentam a exploração no meio ambiente. Regularmente,realiza-se perícia nas organizações para verificar se as mesmas têmatendido as normalizações sobre o meio ambiente.

O governo e algumas organizações não-governamentais (ONG’s)de diversos países da América, Europa, Ásia e África vêm debatendoem conferências, seminários e palestras, em todo o mundo, oaquecimento global, desmatamento, exploração de reservas minerais,derramamentos de óleos e emissão de gases na atmosfera. Uma dasmedidas para minimizar o caos ambiental global é a participação dasorganizações privadas em projetos socialmente responsáveis e oempenho do trabalho das ONG’s em lutar pela causa ambiental.

Para que um sistema de Gestão Ambiental seja efetivo, énecessário que haja mudanças profundas nos hábitos ecomportamentos das pessoas e isto só pode ser conseguido atravésda educação. Neste contexto, começou a ser tratado o termo

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“Educação Ambiental” como maneira de inserir na sociedade aspráticas ambientais por meio da educação.

Diante deste quadro, a organização em estudo adotou medidaseducativas para minimizar o grande impacto que provoca no meioambiente ao extrair estes recursos. Um dos principais focos daorganização é ser socialmente responsável por aquilo que gera, ouseja, ser totalmente responsável desde a extração até o tratamento dorecurso que foi consumido da natureza.

As políticas de gestão ambiental são implantadas em todas assuas unidades no mundo, independente da natureza da operação.Como forma de despertar o interesse do trabalhador em ser co-responsável com o meio ambiente, a organização procura treinar seusempregados a compreender a Política Ambiental para que possaminterpretá-la na sua rotina.

Todos os setores possuem metas e objetivos relacionados como meio ambiente e os empregados são instruídos sobre a importânciade cumprir os procedimentos e quais são os aspectos e impactos quesuas atividades exercem sobre o meio. A organização reforça o que écompromisso de todos na Política de Gestão ambiental: reduzir ageração de resíduos, evitar a poluição sobre todas as formas, utilizarprodutos menos poluentes, economizar água e energia, prevenir riscosde impactos ambientais e reaproveitar resíduos.

Além destas medidas educacionais e de gestão, a organizaçãodesenvolve projetos com a comunidade de forma a orientá-los emcomo devem se preocupar com o meio ambiente e como podemparticipar de projetos ambientais. Todo este processo é válido paraminimizar os impactos ambientais, mas são os trabalhadores queexecutam as atividades da organização, sendo a falta de compreensãoe engajamento um fator condicionante para deixarem de adotar taispolíticas em suas atividades ou vidas.

Com todo este quadro de preocupação com o meio ambiente,surge o seguinte questionamento: qual é a percepção e postura dosempregados em relação à estratégia de educação ambiental adotadapela organização?

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O presente trabalho foi estruturado em uma revisão conceitualdos temas, Gestão Ambiental e Educação Ambiental, para que sepossa problematizar as práticas e estratégias gerenciais desenvolvidaspela organização, o que possibilitará compreender a pratica exercida.Através desta leitura, possibilitou a construção dos objetivos dapesquisa e a elaboração da metodologia a ser utilizada, que visacompreender o caso estudado e para que possa futuramente serrealizado novos estudos sobre o tema.

2. GESTÃO AMBIENTAL

Há algumas décadas a Gestão Ambiental vem sendo discutidaem âmbito mundial. Trata-se de um processo, de acordo comSanandares e Quelhas (2005) e Giesta e Silva (2005), que correlacionaa prática de gestão, o bom relacionamento com o meio ambiente,bem como é uma tecnologia na área de administração paraimplementação global.

A Gestão Ambiental, conforme Barbieri (2004) possui umavariedade de instrumentos que podem ser aplicados em qualquertipo de problema ambiental, possuindo no mínimo três dimensões:a espacial, a temática e a institucional.

A dimensão espacial espera que o resultado alcançado com asações que foram aplicadas sejam eficazes. A dimensão temática demarcaas questões ambientais com as ações que se destinam. A dimensãoinstitucional se refere aos agentes que iniciaram a gestão.

Além das dimensões citadas anteriormente, Barbieri (2004)acrescenta mais uma dimensão: a filosófica. Esta dimensão correlacionaa visão do mundo com a relação entre o ser humano e a natureza.Podem-se citar duas vertentes decorrentes desta dimensão: osantropocêntricos e os ecocêntricos.

A vertente antropocêntrica se preocupa com o meio ambiente apartir do momento em que se torna um problema para o homem.Nesta concepção, conforme Barbieri (2004), o homem só se preocupacom o meio ambiente para satisfazer as necessidades humanas, sejam

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elas primordiais ou não. A vertente se restringe a atender as legislaçõesambientais, não se preocupando com a quantidade que é consumidada natureza pelo homem.

A vertente ecocêntrica, de acordo com Barbieri (2004), defendeque todos os seres vivos de um ecossistema são iguais, não existindonenhuma espécie melhor do que a outra. Compreendem que osrecursos são finitos, possuindo um limite para consumo ouexploração. Diante disto, sugere o consumo mínimo da natureza paranão afetar a própria regeneração do meio ambiente.

No meio destes dois extremos, Barbieri (2004) cita uma outravertente, a socioambiental, que considera a importância do meioambiente podendo o homem usufruir seus recursos desde que atendaas necessidades humanas presentes e futuras. É neste pensamentoque defendem o consumo sustentável para o ser humano.

De acordo com Leff (2001) o conceito de ambiente possibilita amobilização do potencial tecnológico, gera cultura e faz com que asociedade construa formas diversas de desenvolvimento sustentávelatravés da sua participação. Tanto as organizações quanto a sociedadetêm se interessado por assuntos relacionados com o meio ambiente,tendo cada uma um pensamento de acordo com as vertentes citadaspor Barbieri (2004).

As mudanças sociais que tem ocorrido, como o crescimentodas aglomerações urbanas, provocou na sociedade uma preocupaçãode preservar o meio ambiente. Muitas nações discutem odesenvolvimento sustentável como forma de atender as necessidadesda sociedade hoje com a possibilidade das gerações futuras satisfazeremsuas próprias necessidades (vertente socioambiental).

Contudo, diante de tanta degradação do meio ambiente, muitosdos recursos naturais têm se extinguido. Segundo Schenini, Silva ePereira (2005), ao compatibilizar o desenvolvimento sustentável como crescimento econômico é possível conseguir com que ambos sejaminterdependentes e produtivos, ou seja, a organização poderá continuara produzir gerando receitas que permitam a continuidade da execuçãodas estratégias competitivas, porém com o uso de tecnologias limpasvisando a minimização da degradação do meio ambiente.

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Algumas organizações, conforme Gomes e Taveira (2005),procuram levantar os impactos que provocam no meio ambientepara que possam adotar políticas de redução dos despejos de seusresíduos no ambiente. Como forma de minimizar este impacto,adotam em seu processo o sistema de gestão ambiental, para que osimpactos ambientais não sejam tão graves e o custo ambiental geradopelas mudanças sejam inseridos no planejamento organizacional.

Conforme Gomes e Taveira (2005), as medidas que são tomadasisoladamente não trazem o retorno desejado, surgindo questões comoatuação preventiva, indicadores ambientais e sustentabilidade dosresultados ambientais alcançados. A grande preocupação de umaparcela da sociedade era fazer com que as pessoas possam se interessarpela questão ambiental e tomar medidas para prevenir a degradaçãodo meio ambiente e não apenas para atenderem legislaçõesgovernamentais.

Conforme Jacobi (2005), em 1987 foi publicado a declaraçãoNosso Futuro Comum que orienta o indivíduo e a sociedade a realizarações que visam ao desenvolvimento sustentável. Apesar de váriossetores adotarem a prática de proteção do meio ambiente declarada,a economia encontrou barreiras para o crescimento, resultando: naperda de biodiversidade, degradação da qualidade ambiental nasgrandes cidades em desenvolvimento e redução dos recursos naturais.O progresso é priorizado pela economia se comparado com as questõesambientais, mas:

A postura de dependência e de não responsabilidadeda população decorre principalmente dadesinformação, da falta de consciência ambiental ede um déficit de práticas comunitárias baseadas naparticipação e no envolvimento dos cidadãos, queproponham uma nova cultura de direitos baseadana motivação e na co-participação na gestão do meioambiente, nas suas diversas dinâmicas. (JACOBI,2005, p. 241)

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A postura de dependência e de não responsabilidade dapopulação decorre principalmente da desinformação, da falta deconsciência ambiental e de um déficit de práticas comunitáriasbaseadas na participação e no envolvimento dos cidadãos, queproponham uma nova cultura de direitos baseada na motivação e naco-participação na gestão do meio ambiente, nas suas diversasdinâmicas. (JACOBI, 2005, p. 241)

A educação aponta para propostas que visam a mudanças dehábitos, atitudes e práticas sociais, para desenvolver competências,capacidade de avaliação e a participação das pessoas. (JACOBI, 2005,p.241). Loureiro citado por Jacobi (2005) ressalta que a educaçãoambiental é um meio que proporciona condições para a promulgaçãode uma nova consciência sobre a importância do meio ambiente.

3. EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Conforme Dias (2000), para que um modelo de gestão ambientalseja efetivo é necessário que haja mudanças profundas nos hábitos ecomportamentos das pessoas e isto só pode ser conseguido atravésda educação. Ainda há muitas barreiras em implantar este tipo deconhecimento na educação vigente devido à dificuldade de o ensinodebater as disciplinas com o assunto meio ambiente.

Devido a este impasse, surgiu o termo “Educação Ambiental”como maneira de inserir na sociedade as práticas ambientais por meioda educação. De acordo com a lei nº. 9.765/99 (BRASIL, 1999) nocapítulo 1, artigo 1º:

“Entendem-se por educação ambiental os processospor meio dos quais o indivíduo e a coletividadeconstroem valores sociais, conhecimentos,habilidades, atitudes e competências voltadas para aconservação do meio ambiente”.

A educação ambiental deve proporcionar um pensamento críticoe inovador para promover mudanças na sociedade, com cidadãos

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que se preocupam com o meio que os circunda. A prática ambientalsó será efetiva se as pessoas mudarem os seus comportamentos,inserindo no seu dia-a-dia (em casa ou no trabalho) a tomada dedecisões visando à proteção ambiental (SANANDARES e QUELHAS,2005; GOMES e TAVEIRA, 2005).

O debate sobre o tema Educação Ambiental começou a partirdo século XX, quando a UNESCO tratou deste assunto como sendode caráter socioambiental. Alguns teóricos e pensadores, de acordocom Barbieri e Teodósio (2005), consideram o pós-guerra como omarco inicial para este diálogo e apontam a educação ambiental comouma das soluções para reduzir os malefícios provocados no meioambiente, por serem ferramentas de divulgação e fundamentação depráticas ambientalmente responsáveis.

Em 1975 foi realizado pela UNESCO e PNUMA, de acordocom Barbieri e Teodósio (2005), o Seminário Internacional sobreEducação Ambiental na qual foi aprovada a Carta de Belgrado. Éestabelecido nesta carta como meta, a melhoria de todas as relaçõesecológicas, incluindo a do homem com a natureza e possui comoatributos centrais o conhecimento, a motivação, a atitude, acapacidade e o compromisso com o meio ambiente.

Barbieri e Teodósio (2005) afirmam que os objetivos da Cartade Belgrado são contribuir para que as pessoas e a sociedade adquiramconsciência e sensibilidade com o meio ambiente, disseminar para asociedade conhecimento básico o meio ambiente e como o homeminflui sobre o meio, propiciar a criação de valores e motivação naspessoas para haver uma participação mais ativa, possibilitar que aspessoas obtenham as habilidades necessárias para agirem ativamentena causa ambiental, estimular que as pessoas avaliem as ações queforam tomadas e os programas direcionados ao meio ambiente econtribui para que as pessoas e a sociedade desenvolvam o senso deresponsabilidade e de urgência para com a natureza.

Em 1992, na Conferências das Nações Unidas sobre o MeioAmbiente e Desenvolvimento foi aprovado um documento, a Agenda21. Foi estabelecido, conforme Barbieri (2003), a importância decada país em se comprometer a refletir globalmente e localmente

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sobre a forma pela qual governos, organizações privadas e não-governamentais e a sociedade poderiam cooperar no estudo desoluções para os problemas sócio-ambientais. Conforme Barbieri(2003, p.65), a Agenda 21:

“Contempla um conjunto enorme de contribuiçõesas mais variadas e procurando ordená-las de acordocom as grandes questões sobre desenvolvimento emeio ambiente, a Agenda 21 e uma espécie de manualpara orientar as nações e as suas comunidades nosseus processos de transição para uma novaconcepção de sociedade. Ela não é um tratado ouconvenção de impor vínculos obrigatórios aosestados (...), é um plano de intenções não mandatóriascuja implementação depende da vontade política dosgovernantes e da mobilização da sociedade.”

Em um de seus programas, citado por Barbieri e Teodósio (2005),a Agenda 21 incentiva a promoção do ensino, da conscientizaçãopública e do treinamento baseado em um desenvolvimentosustentável, de forma a modificar as atitudes da comunidade paraque valorizem o meio ambiente. Além da orientação da comunidade,as escolas e universidades podem tratar destes assuntos em sua gradede disciplina, expandindo para toda a sociedade a consciênciaambiental.

Para Sanandares e Quelhas (2005), a Educação Ambiental não ésimplesmente uma transmissão de conhecimento, ela é uma ideologia,ou seja, constrói valores junto com as pessoas, proporcionaconhecimento, gera atitudes e aprimora habilidades voltadas para aconservação do meio ambiente. “A educação ambiental deve ser vista,pelas organizações, como um instrumento de treinamento econscientização de empregados e contratados, que garantirá asustentabilidade dos seus resultados.” (Gomes e Taveira,2005, p.7).

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A educação ambiental deve oferecer a população condições quepermitem intervir na direção dos negócios (através de práticasambientalmente corretas) e na administração da empresa e não apenasser fonte econômica deste processo. O bem estar do indivíduo deveser valorizado e trabalhado, não apenas ser avaliado como umindicador econômico pela organização. (Sanandares e Quelhas, 2005).

As organizações privadas possuem uma capacidade enorme deinfluenciar os meios e induzir os comportamentos das pessoas. Porser um local onde as pessoas permanecem grande parte de sua vida eser um dos participantes da cadeia de consumo da sociedade(produtor), as organizações privadas influenciam as pessoas aconsumirem e a utilizarem cada vez mais os recursos naturais do meioambiente. (Barbieri e Teodósio, 2005)

Através da orientação sobre a importância de se preservar o meioambiente, as organizações iniciam o processo de endoculturação¹ doindivíduo. Os trabalhadores precisam absorver as políticas ambientaisem suas vidas não apenas para cumprirem normas exigidas para aexecução de suas atividades. Para que estas práticas sejam transformadasna vida do trabalhador, a organização deve conhecer como estes atuamno seu dia-a-dia para que possam contextualizar a visão da empresacom o que acontece na prática.

Com os treinamentos, é possível inserir na cultura organizacionalas práticas ambientais. Não basta apenas ensinar o trabalhador comolidar com o meio ambiente é necessário fazê-lo compreender o que émeio ambiente e qual a importância de sua ação para melhorar omeio em qual vive. É possível desenvolver, através destes trabalhos,momentos de ref lexão para que os trabalhadores possamcontextualizar na prática as ações ambientais que foram transmitidasnos treinamentos. (Gomes e Taveira, 2005)

Apesar dos constantes esforços de se reestruturar o ambienteexplorado, sempre haverá uma conseqüência negativa para o meioambiente: este nunca mais voltará à forma em que estava antes de serexplorado. É importante ressaltar que apesar de não ter o ambientecomo antes, as organizações devem se preocupar com a questão

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ambiental para serem socialmente responsáveis. (Schenini, Silva ePereira, 2005)

A educação ambiental na sociedade, tem por objetivo ampliar adiscussão das práticas ambientais e fazer com que as pessoas possamser responsáveis pelo meio que atuam e vivem, tendo um compromissocom a preservação do meio ambiente. Muitas pessoas têm interesseem contribuir com o meio ambiente, contudo não possuem ainstrução necessária para serem agentes ativos em programas depreservação ambiental.

Uma outra forma de expandir a política ambiental é levá-la paradentro da casa do trabalhador. De acordo com o estudo de Gomes eTaveira (2005), é envolver os seus filhos nas atividades ambientais.Com a elaboração de um calendário específico realizado pelaorganização, os filhos poderão participar de palestras ou se tornaremmonitores de grupos que irão visitar as dependências da organização.Com a inserção da família nessas atividades, a organização proporcionauma maior familiarização do trabalhador com a gestão ambiental,pois este assunto estará presente em seu dia-a-dia.

O aprendizado para ser eficaz deve ser contínuo e permanente enão em determinadas épocas ou esporadicamente. Do contrário, oprograma morre e as práticas ambientais que resultaram positivamentena natureza passam a não existir.

O que tem provocado dificuldade de divulgação e implantaçãoda educação ambiental é a visão técnica e fragmentada a respeito dotema. Segundo Barbieri e Teodósio (2005), para que se tenha umaabordagem socioambiental, a educação deve ter um pensamentocrítico e inovador, não devendo ser neutra e sim ideológica.

Se as pessoas se tornarem conscientes do seu papel diante domeio ambiente, tornando-se críticas, sabedoras e atuantes, a naturezapoderá encontrar o seu equilíbrio devido à minimização dos insumosque são despejados sobre ela. A construção deste pensamento só éefetiva quando as pessoas produzem idéias sobre o assunto eparticipam ativamente ao construir o próprio comentário, passandoa não reproduzir aquilo que ouviram. Com isto é visto a inteiraparticipação da pessoa: a sua própria construção crítica.

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Pode-se perceber que a prática ambiental somente é realizadaquando há participação de todos os atores envolvidos no processo.Se alguma parte deixa de executar a sua tarefa, o processo não setorna cíclico, ocasionando na perda de algum dado de sumaimportância para a consolidação do tema.

De acordo com Jacobi (2005), o meio ambiente e a educaçãotem que a cada dia assumir uma postura desafiadora, necessitando demaior conhecimento para compreender os complexos processosambientais. Isto demanda uma maior sensibilidade do educador paratransmitir o conhecimento necessário que possa proporcionar acompreensão dos problemas e riscos ambientais existentes.

4. OBJETIVOS DO TRABALHO

O presente trabalho tem como objetivo analisar algumasestratégias de educação ambiental adotada por uma organização privadado ramo de mineração e seus desdobramentos sobre a percepçãoambiental e postura dos empregados.

Para tal, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos:analisar a relação entre a política ambiental da organização e asatividades dos empregados; verificar a adoção de práticas ambientaisalém do meio organizacional para analisar o grau de consciênciaambiental dos empregados; identificar e discutir as diferentespercepções dos empregados sobre o sistema de gestão ambiental vigentee propor alternativas para o aprimoramento das estratégias e práticasde educação ambiental da organização.

5. METODOLOGIA

Será realizado um estudo de caso em uma organização que atuano ramo de mineração. Com a utilização deste tipo de estudo, espera-se o maior aprofundamento do tema, na qual os resultados nãopoderão ser generalizados por se tratar de apenas um caso.

Após conhecer e interpretar a realidade, será analisado as teoriasjá existentes para possibilitar a organização dos dados sociais

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(quantitativos e qualitativos). A pesquisa coletará dados através dautilização de entrevistas, aplicação de questionário e coleta documentalde informativos, sites da empresa e artigos. As entrevistas serão abertassemi-estruturadas e direcionadas para o Gerente da área operacional,ao empregado responsável pelo treinamento da gestão ambiental epara um empregado membro do Comitê de Meio Ambiente.

O questionário será aplicado para a amostra da população, sendocomposto por perguntas abertas e fechadas abordando os seguintestemas: visão da política ambiental pelos empregados, realização deatividades relacionadas ao meio ambiente fora do ambiente detrabalho, percepção do empregado quanto ao Sistema de Gestão daQualidade da organização e as atividades que são desempenhadas.

Para aprofundar no estudo do sistema gestão ambiental daorganização, serão realizadas pesquisas em documentos queapresentem como é adotada e praticada a política ambiental e a análisede artigos da organização que abordem este assunto.

6. RESULTADOS ESPERADOS

O presente estudo busca compreender se a filosofia da organizaçãoem estudo sobre educação ambiental corresponde com as práticasque são realizadas. Com as informações obtidas nas entrevistas, serárealizada uma análise da teoria de Educação Ambiental. Será estudadaa forma como é disseminada a cultura, como são planejadas ascampanhas voltadas para a preservação do meio ambiente, como éavaliada a eficácia dos treinamentos para verificar o nível deconhecimento e comprometimento que os empregados possuemsobre essa temática.

As informações extraídas serão correlacionadas com a teoria paraposicionar o nível de consciência ambiental, a postura e a percepçãodos empregados. Após definido o grau de consciência ambiental, opapel desempenhado pela organização e a postura do empregado, sediscutirá as práticas organizacionais à luz de diferentes correntes deeducação ambiental.

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O levantamento realizado nos documentos organização sobreGestão Ambiental e Educação Ambiental servirá para conhecer comosão divulgadas as práticas ambientais e se os empregados compreendemas comunicações realizadas pela organização. Essa pesquisa poderáinspirar novas investigações para verificar o relacionamento entreempregados e Comitê de Meio Ambiente da organização, permitindoum avanço na compreensão das formas concretas que a discussãoambiental vem assumindo na práxis organizacional contemporânea.

7. REFERÊNCIAS

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LEFF, Enrique. Saber Ambiental: sustentabilidade, racionalidade,complexidade, poder. Petrópolis: Vozes, 2001.

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A CONTABILIDADE COMO CIÊNCIA

SOCIAL: APLICABILIDADE DA

CONTABILIDADE AMBIENTAL PARA ODESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

GEOVÁ JOSÉ MADEIRA1

GLAUBER LIMA BARBOSA2

RESUMO

A contabilidade é conhecida como um sistema de informaçõesformal e estruturado, tendo como objetivo fornecer informações parao controle do patrimônio, a avaliação de desempenho e a tomada dedecisão. E de acordo com essa definição, neste trabalho realizou-seuma introdução à Contabilidade Ambiental, associando-a aospreceitos teóricos da contabilidade, mostrando o que vem a ser aimplantação da gestão ambiental dentro da visão de desenvolvimentosustentável, caracterizando e classificando os eventos ambientais. Comisso, será mostrada a principal forma de transição para a ideologiasustentável, ligado à questão ambiental, além dos principais relatóriosque estão relacionados ao estabelecimento de normas e a padronização

1. Mestre em Ciências Contábeis pela UFRJ. Professor-mestre da UFMG. Telefone:(031) 3279-9136. E-mail: [email protected]

2. Graduando do 6º período de Ciências Contábeis da Universidade Federal de MinasGerais e bolsista do Departamento de Ciências Contábeis da FACE/UFMG.Telefone: (031) 3279-9135. E-mail: [email protected]

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desses eventos. Neste trabalho mostrou-se como se dá a aplicabilidadeda Contabilidade Ambiental, explicando de quais formas devem serentendidos seus eventos para sua mensuração, esclarecendo como seapresentam os ativos, passivos, receitas, despesas, custos, contingênciase provisões ambientais, indispensáveis à estruturação de um Sistemade Contas e um Plano de Contas Ambientais.

1 – INTRODUÇÃO

A Contabilidade, principal sistema de informação de umaempresa, não pode, nos dias atuais, desconhecer e ficar à margem daspreocupações ambientais. Para isto precisa de um corpo de conceitose de uma metodologia que possam representar, de modo objetivo,os eventos econômicos e financeiros ocorridos. O ambiente ao redordas entidades empresariais, e em especial as ligadas à exploraçãoextrativa, vem sofrendo ações degradativas em função das mais diversasformas de atividades. Tais ações não estão sendo devidamentemensuradas nos demonstrativos financeiros, e dentre os diversosmotivos que as excluem das demonstrações, está o fato de que oambiente em que esses eventos estão ocorrendo sofre interferênciaspor variáveis que não eram objeto de classificação conceitual emetodológica pela contabilidade. Sendo assim, faz-se necessário quea contabilidade, como instrumento de informações para a tomadade decisões, possa desenvolver e incorporar em seus conceitos emétodos formas de registrar e mensurar os eventos econômicos efinanceiros relativos ao meio ambiente, com a utilização de políticasambientais concisas, para formar um Sistema de Gestão Ambientalque respeite a ideologia do Desenvolvimento Sustentável.

2 – CONTABILIDADE AMBIENTAL: SUA APLICAÇÃO

para ATINGIR a RESPONSABILIDADE SOCIAL

A partir da massificação da atividade comercial, do financiamentoàs expedições marítimas, e, sobretudo da introdução da atividade

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industrial, dois postulados ambientais servem de marco para odesenvolvimento da contabilidade: O Postulado da Entidade Contábilque segundo Hendriksen (1999) significa a unidade econômica queexerce controle sobre recursos financeiros e materiais, aceitaresponsabilidade por assumir e cumprir compromissos e conduz aatividades econômicas empresariais e o Postulado da Continuidade,que segundo Iudícibus (2004, p.53) trata-se da consideração dasentidades como empreendimentos em andamento. Estes postuladosdevem ser respeitados e considerados na classificação e mensuraçãoda Contabilidade Ambiental.

É fato que no final de cada exercício as seguintes demonstraçõespara as sociedades por ações, que por praticidade também são adotadaspela maioria, devem ser elaboradas o Balanço Patrimonial, aDemonstração de Resultado de Exercícios, a Demonstração de lucrosou Prejuízos Acumulados ou a Demonstração das Mutações doPatrimônio Líquido, as Demonstrações das Origens e Aplicações deRecursos e o Demonstrativo de Valor Adicionado.

O desafio do Contador está em mensurar nestes demonstrativos,informações que se apresentem de forma clara e eficaz e que estejamadequadas à crescente demanda por informações da posição ambientaladotada por determinada empresa. Essas informações são necessáriastanto para ajudar na tomada de decisão de terceiros que sintamnecessidade de aplicar em empresas ambientalmente responsáveis,quanto atender a um crescimento de demanda por informações deórgãos públicos e governamentais de proteção ao meio ambiente.Tais órgãos têm aumentado suas formas de fiscalizar e aplicar multasàqueles que descumprem a legislação vinculada à proteção dosrecursos ambientais.

Segundo Tinoco (2004, p.151) a Contabilidade Ambiental éuma abordagem combinada com a teoria da contabilidade que facilitaa transição de informação da contabilidade financeira e dacontabilidade de custos para aumentar a eficiência de materiais,ajudando a reduzir o impacto e o risco, diminuindo os custos, visandouma eficiência econômica com justiça social e prudência ecológica.

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Pode se citar três razões básicas para uma empresa adotar aContabilidade Ambiental:• A sua utilização na gestão interna das entidades;• As exigências legais;• A demanda dos parceiros sociais, econômicos e financeiros.

De acordo com Kraemer (2005), além da importância dasinformações para terceiros e os órgãos públicos e governamentais, aaplicação da Contabilidade Ambiental tem gerado uma exigência porparte da sociedade para que as empresas incorporem em sua gestão oobjetivo de preservação do entorno social e ambiental. Para tanto, épreciso que as entidades introduzam a variável ambiental em suagestão, mediante o estabelecimento de sistemas de gestão ambientale de políticas ambientais.

Os eventos ambientais devem ser objetos de registro,acumulação, mensuração, avaliação e divulgação pela contabilidadeempresarial e principalmente em empresas de mineração de carvão,produção de cal, cana-de-açúcar, papel e celulose, siderurgia e indústriapetrolífera.

2.1 – Gestão Ambiental

Segundo Motta (1995), implantar uma política de GestãoAmbiental significa o mesmo que aplicar um sistema que inclui naestrutura organizacional, atividades de planejamento,responsabilidades, práticas, procedimentos, processos e recursos paradesenvolver, implementar, atingir, analisar criticamente e manter apolítica ambiental.

Alguns princípios são essenciais para a atingir a excelênciaambiental:

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Dentre as empresas estudadas e que se preocupam em implantarum sistema de gestão ambiental, foi possível entender algumas dasdificuldades encontradas para se implantar um sistema de gestãoambiental e o mais importante, ter uma visão real das expectativascom relação à implementação de uma gestão ambiental. Resolvemoscitar neste trabalho tais expectativas, por sintetizarem muito bem oque se pode esperar de tal implementação. Segundo o estudo realizado,o objetivo para uma empresa implantar um sistema de gestãoambiental, e que pode servir como modelo para as demais, está em:

Figura 1 – Princípios Essenciais para o Estabelecimentodo Sistema de Gestão Ambiental

Focalizar aquilo que precisa ser feitoe assegurar o comprometimento aoSGA e definir sua política

Uma organização deve rever econtinuamente aperfeiçoar seusistem de gestão ambiental com oobjetivo de aprimorar sua performaceambiental em geral

Uma organização deveformular um plano paracumprir com sua políticaambiental, apoiada emobjetivos e metas

Excelência Ambiental

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Quadro 2 – Dicas Importantes para a Aplicaçãode uma Gestão Ambiental nas Entidades.

Aperfeiçoar seu sistema gerencial na área ambiental a fim de melhorarainda mais seu desempenho ambiental e seu gerenciamento de riscos.

Introduzir em todos os níveis de tomada de decisões da empresa o fatorambiental como preocupação com a rentabilidade organizacional futura.

Fortalecer ainda mais sua imagem comunitária, apresentado-se comoempresa comprometida com a qualidade ambiental dos locais onde atua.

Fortalecer suas estratégias de competitividade no mercado interno,apresentando produtos diferenciados, produzidos em processosecologicamente corretos.

Fortalecer ainda mais suas estratégias de competitividade no mercadoexterno, apresentando produtos diferenciados, produzidos em processosecologicamente corretos, mostrando como condição essencial para seter acesso.

Desenvolver um sistema de informações e interação participativa comseus colaboradores, clientes, fornecedores, parceiros comerciais e acomunidade, a fim de atingir as metas ambientais comuns.

2.2 – Desenvolvimento Sustentável

Fonte: Elaborado pelo Autor

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Dentre os fatos importantes envolvendo o assunto tivemos aconferência sobre o Meio Ambiente humano ocorrida em 1972, emEstocolmo, Suécia, com 113 países e 250 ONGs, surgiu na décadade 70 o conceito de desenvolvimento sustentável. Em 1978 surgi naAlemanha o “selo ecológico” utilizado na Europa como uma marcapara produtos de empresas ambientalmente responsáveis. Teve-setambém o relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundialsobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável das NaçõesUnidas (presidida pela Primeira-Ministra da Noruega, Gro HarlemBrundtland) e publicado em 1987 com o título Nosso Futuro Comum,e que apontou para a incompatibilidade entre o desenvolvimentosustentável e os padrões de produção e de consumo vigentes. Nessedocumento define-se o desenvolvimento sustentável como aquele que“satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidadedas gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. A partirdessa publicação, esse relatório tornou-se referência mundial para aelaboração de estratégias e políticas de desenvolvimento eco-compatível.

Estabelecer em uma entidade um crescimento atrelado a umdesenvolvimento sustentável significa padronizar em níveis satisfatóriosum crescimento econômico, respeitando níveis aceitáveis dedegradação ambiental, através do esforço institucional (ONGs, ÓrgãosPúblicos) e técnico (desenvolvimento de pesquisas), dentro de umcenário de continuidade da política ambiental, previamente elaboradaatravés de uma gestão ambiental interna, ou seja, buscar por objetivoprincipal demonstrar que é realmente possível dissociar a idéia deque a empresa só atinge o crescimento econômico com perdasambientais. O desenvolvimento sustentável, dentro dessa idéia podeser classificado em Fraca Sustentabilidade e Forte Sustentabilidade:

Fraca Sustentabilidade – Aceita a possibilidadetecnológica de crescimento contínuo, desde que parteda renda econômica seja reinvestida de forma amanter o nível total de capital (natural e material)de uma economia.

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Forte Sustentabilidade – O crescimento sustentávelsó se daria se o nível do estoque de capital naturalfosse mantido constante, acreditando assim que aspossibilidades tecnológicas de compensar perdas decapital natural por capital material são insuficientespara garantir o bem-estar de gerações futuras. Motta(1995, p.6).

Como formas de exemplos dos métodos de aplicação da idéiade sustentabilidade e os devidos benefícios potenciais à sociedade,devem as empresas desenvolver atividades diretamente à comunidadeem que está inserida. Essas atividades podem se apresentar na formade projetos comunitários que auxiliem na educação ambiental epreservem o meio ambiente urbano, visando diminuir os custosambientais, como em casos que visem o aproveitamento de material,como programas de coleta seletiva que permitam o uso mais eficientede recursos naturais incluindo a energia e a água.

Dentre as formas de aplicação da sustentabilidade está o auxiliofinanceiro na construção de redes de saneamento básico, odesenvolvimento de projetos de reflorestamento, a redução dos custosexternos relacionados à poluição da indústria, o fornecimento dainformação ambiental industrial nas avaliações do desempenho dascondições ambientais na economia da região geográfica atuante, eque são de suma importância para a tomada de decisão e omelhoramento da política pública.

Para Tinoco e Kraemer (2004), algumas das dificuldadesencontradas para se obter o reconhecimento da responsabilidadesocial para com o meio ambiente, são os altos custos, a inexistênciada legislação ambiental ou de rigor nas leis já existentes, a falta decoesão dos movimentos populares e o fato de que os consumidoresnão associam a atuação e o comportamento da empresa ao consumode seus produtos.

Chega-se à conclusão que a melhor forma para aplicar a ideologiado Desenvolvimento Sustentável passa por um importantecomponente educativo: a preservação do meio ambiente depende de

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uma consciência ecológica e a formação da consciência depende daeducação. Acredita-se que um meio eficaz de desenvolver a educaçãoambiental está na aplicação da ecopedagogia. A ecopedagogia pretendedesenvolver um nova visão sobre a educação, um olhar global, umanova maneira de ser e de estar no mundo, um jeito de pensar a partirda vida cotidiana, que busca sentido a cada momento, em cada ato,que “pensa a prática” (Paulo Freire), em cada instante de nossas vidas,evitando a burocratização do olhar e do comportamento. Desta formapode-se espalhar em todos os segmentos da sociedade a importânciada aplicabilidade da contabilidade nos registros dos eventosambientais, e que levará indiretamente a estar-se desenvolvendo aideologia da responsabilidade social por conseqüência dos relatóriosambientais gerados.

2.3 – Relatórios ambientais importantes: O GRI –(Global Reporting Initiative), o ISAR (Intergovernmental

Working Group of Experts on International Standards

of Accounting and Reporting)

O modo como se devem abordar relatórios e contas ambientaisdentro da contabilidade é uma questão muito discutida, mas, contudoincerta. Vários autores, assim como Paiva (2003) e Tinoco (1984)acreditam que seja realmente necessária a padronização dos relatóriosambientais divulgados pelas empresas, pois, segundo eles, somentedesse modo seria possível analisar cada empresa ou setor confirmandoa veracidade das informações ali divulgadas.

O Global Reporting Initiative (GRI), resultado de um acordointernacional, foi criado pela Coalition of EnvironmentallyResponsible Economies (CERES), uma associação de investidores,sindicatos, gestores de fundos de investimentos, fundações eassociações, em parceria com o Programa Ambiental das NaçõesUnidas (UNEP). Com uma visão de longo prazo o GRI, com a missãode elaborar e difundir diretrizes para a organização de relatórios desustentabilidade aplicáveis globalmente e voluntariamente. Ressalta-se que a GRI não oferece nenhum modelo de balanço social, são

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apenas proposições baseadas no conceito de sustentabilidade,abordando os três elementos internamente relacionados dasustentabilidade, para a elaboração dos relatórios sendo que oobjetivo central das idéias propostas é transformar a elaboração dessesrelatórios de sustentabilidade em uma rotina, para que, assim comoas demonstrações financeiras, possam atribuir-lhes credibilidade, rigore verificabilidade.

Quadro 3: Elementos e Indicadorespara a Preparação do Relatório GRI:

Econômico Inclui, por exemplo, os gastos e benefícios, produtividade notrabalho, criação de empregos, despesas em serviçosexternos, despesas em investigação e desenvolvimento,investimentos em educação e outras formas de capitalhumano. O aspecto econômico inclui, embora não se limitesó a ele, a informação financeira e respectivas declarações.

Ambiental Inclui, por exemplo, impacto de processos, produtos eserviços sobre o ar, a água, o solo, biodiversidade e saúdehumana.

Social Inclui, por exemplo, o tratamento que se dá aos gruposminoritários e às mulheres, o trabalho feito em favor dosmenores, a saúde e segurança ocupacionais, estabilidadedos empregados, direitos laborais, direitos humanos, saláriose condições de trabalho nas relações externas.

Fonte: http://www.globalreporting.org (2004)

Em 1998, foi disponibilizado o relatório pela IntegovernmentalWorking Group of Experts on International Standards of Accountingand Reporting (ISAR) com diretrizes básicas para divulgação deinformações ambientais nos relatórios contábeis da empresa. O ISARfoi elaborado por um grupo de especialistas em contabilidade devários países que são dedicados à harmonização das práticas contábeisno nível comparativo. Sobre este relatório ambiental afirma-se que:

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Este relatório se divide em dois capítulos queapresentam respectivamente guias de melhorespráticas para divulgação de custos e passivosambientais e para a divulgação de informaçõesambientais. Logo são apresentados indicadores-chavede performance ambiental (EPI), que se relacionamcom performance financeira das companhias; sãodefinidos ativos, passivos, custos e contingênciasambientais. No segundo capítulo do trabalho, sãoapresentadas as melhores práticas de divulgação deinformações ambientais. (Calixto, 2005, p.53).

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Quadro 4: Os Melhores Itens Recomendados pelo ISARque Poderiam ser Incluídos no Relatório Anual da Entidade

Elemento do Relatório Anual Evidenciação Ambiental Recomendado

Relatório do presidente >Compromisso da companhia para melhoria ambientalcontínua.>Melhorias significativas desde ultimo relatório.

Relatório por Segmento de >Dados do desempenho ambiental segmentado (se não fo-Negócios -ram fornecidos no relatório ambiental).

> Melhorias nas áreas-chave desde o relatório anterior>Demonstração da política ambiental da companhia.>Extensão da aderência às normas estabelecidas em nívelmundial.>Questões ambientais chave expostas pela companhia.>Responsabilidade organizacional.>Descrição do sistema de gerenciamento ambiental e padrõesinternacionais (ICC, ISO, e EMAS por exemplo).>Dados de desempenho segmentado baseado em: uso deenergia, uso de material, emissões (CO2, NOX, SO2, CFCsetc.) e destinação de residuos.

Relatório Ambiental >Dados de setor especifico, incluindo indicadores dedesempenho ambiental – EPIs (incluindo EPIs baseados emeco-eficiência).>Dados financeiros sobre custos ambientais (energia,resíduo, recuperação, dotação de pessoal, débitosexcepcionais ou redução de valor, multas e penalidades,pagamento de impostos verdes, investimento de capital).>Estimativas financeiras de recursos econômicos ebenefícios oriundos de esforços para com o meio ambiente.>Referencias cruzadas com outros relatórios ambientais.>Relatório de auditoria independente.

Relatório Financeiro >Questões ambientais chave expostas pela com-e Operacional panhia em curto e médio prazos e planos para tratamento

dessas questões.>Progresso na mudança de tratamento requerida por exigên-cia legal futura.>Nível atual e projetado de gastos ambientais.>Problemas legais pendentes.

Relatório da Diretoria >Demonstração da política ambiental (se ano foi fornecidaem outro relatório).

Políticas Contábeis >Estimativa de provisões e contingências.>Políticas de capitalização.>Políticas de deterioração (apropriação).>Políticas de recuperação do solo.>Políticas de amortização/ depreciação/ exaustão.

Demonstração do resultado >Débitos ambientais excepcionais.>Outros custos e benefícios ambientais (se não foramevidenciados em relatório ambiental separado).

Balanço Patrimonial >Provisões ambientais.>Custos ambientais capitalizados.>Recuperação esperada.

Notas Explicativas >Explicações sobre os passivos ambientais contingentes.Outros > Dados ambientais que também podem ser colocados nas

demonstrações contábeis resumidas.

Fonte: Adaptado de UNCTAD/ISAR (1998, p. 19).

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Dentre os relatórios ambientais o objetivo principal está emmanter informados todos os interessados quanto a informaçõesambientais, e estes foram os aparentemente mais importantes dentrodo cenário internacional e que podem vir a servir como modelospara a aplicabilidade da Contabilidade Ambiental no Brasil, que aindaapresenta um fraco sistema de informações para suprir a essa demanda.

3 – APLICABILIDADE DA CONTABILIDADE AMBIENTAL

Os contadores têm um papel fundamental nesse aspecto, umavez que este profissional é de suma importância para a elaboração deum modelo adequado para a entidade e para incentivar outrasempresas a entender e implementar a gestão ambiental, através dautilização de dados apresentáveis contabilmente. Cabe a ele elaborarum plano de contas levando-se em consideração o Sistema de contasambientais que possui uma forma de mensuração baseada nainterpretação dos tipos de recursos naturais que são utilizados durantesuas atividades. A classificação segundo Motta (1991) desses recursosé feita em: Recursos exauríveis e Recursos de fluxo.• Recursos exauríveis: São aqueles cuja exploração da atividade

humana leva a uma inevitável redução na sua disponibilidade futura(recursos minerais e florestais).

• Recursos de fluxo: São aqueles que podem ter suas condiçõesoriginais restauradas pela ação natural ou humana (ar e água).

Uma maneira de introduzir a utilização dos recursos de fluxodentro das contas nacionais é considerando o meio ambiente comoagente econômico, ou seja, como um bem produtivo e consumível,justificando dessa forma, uma contabilização econômico-ecológica.Esses recursos ambientais nessa ótica, devem ser tratadoscontabilmente como uma depreciação do patrimônio da natureza.Outro procedimento é encarar os recursos exauríveis como ativosque geram rendimentos enquanto durar sua exploração. Oesgotamento de recurso é considerado uma perda do ativo que podeser compensada, caso o rendimento obtido com a extração sejadestinada para compra de outros ativos.

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Segundo Motta (1992, p.19), o enfoque para a classificação dascontas ambientais deve ser intratemporal, ou seja, a preocupação deveestar centrada nas externalidades geradas pelos fluxos de emissão edescarga que ocorrem dentro de um período e não no potencialesgotamento do recurso ao longo do tempo.

Para Tinoco e Kraemer (2004), um controle apurado das contasambientais, leva ao contador estabelecer um Balanço da massa daempresa, que significa propor o registro e o acompanhamento dosfluxos de materiais, segundo uma análise de entrada e saída no processoprodutivo. As entradas e saídas neste processo são mensuradas nosativos e passivos ambientais, com suas respectivas despesas e receitase a consideração de possíveis contingências, gastos, custos e oacompanhamento de relatórios que demonstrem os possíveis riscosambientais. Para Motta (1995) a crédito devem ser computados ossubsídios que a meio ambiente presta a determinados agentes que sebeneficiam do uso gratuito dos recursos de fluxo. O que seria gastona recuperação dos recursos equivale ao serviço prestado pelo meioambiente e que deve ser acrescido ao produto como produçãoambiental. Já a débito devem ser considerados os custos impostosaos demais agentes econômicos que tiveram vedado o acesso aosrecursos de fluxo devido a sua degradação ocasionada por terceiros eque são denominadas perdas ambientais.

3.1 Sistema de Contas Ambientais

As contas ambientais além de servirem de base para informar eorientar os rumos a serem dados à política ambiental adotada, servemde argumentos para a administração decidir sobre o nível de recursosfinanceiros que deverão ser destinados à proteção ambiental, epesquisas na área que terão por conseqüência a diminuição dos custosambientais e suas respectivas despesas contingentes.

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A princípio, devido à insuficiência na experiência quanto àformação de sistemas de contas ambientais, sugere-se deixá-las abertaa modificações e ampliações.

Em um Plano de Contas que contenham os eventos ambientais,os custos de exploração devem vir seguidos pelos custos comrecuperação dos efeitos das atividades realizadas no meio ambiente eos custos reais para evitar novas degradações.

3.1.1 Objetivos básicos de um sistema de informações ambientais

Em primeiro lugar deve-se elaborar um banco de informaçõescom riquezas físicas e monetárias comparativamente. Desta forma, asContas Ambientais ficam responsáveis por apresentarem a situaçãodo meio ambiente, visando tornar as grandezas físicas mais palpáveispara o período contábil, de forma a haver a possibilidade de analisarquantitativa e qualitativamente essas informações.

Segundo Seixas e Brito (1992, p.10) um sistema de informaçõesambientais segue-se de três partes principais:• As Contas Ambientais devem compreender e apresentar

quantitativamente o “STATUS QUO” do meio ambiente e suaevolução. Devem ser incluídos tanto os efeitos das atividadeshumanas sobre o meio ambiente como os acontecimentos naturais.

• As Contas Ambientais devem abranger todos os dados relevantesà esfera ambiental e eles devem ser agrupados objetiva e regionalmente.

Figura 3 – Passos fundamentais para mensuraros fatos contábeis ambientais

Avaliação dos custos ebenefícios ambientais

Sanar os impactosnegativos atravésda utlização dossistemas de GestãoAmbiental

Avaliação,classificação emensuração doseventos ambientaisem um plano decontas ideal

Fonte: elaborado pelo autor

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• As Contas Ambientais serão independentes das Contas Nacionais,porem será observada a associabilidade de ambos os sistemas.

Dentre as dificuldades de criar um sistema de informaçõesambientais, verifica-se o destaque do fato de associar o campoconceitual com informações estatísticas fruto de comparações empadrões homogêneos, e transformar essa relação em realidade é semduvida maior desafio.

Figura 4 – Passos fundamentais para estruturaçãode demonstrativos ambientais

Evento ContábilAmbiental

Documento queatende o fato

contábil

Entrada de Eventos Ambientais na Contabilidade

Relação de Contas AmbientaisContas Correntes

Tabelas de Eventos Ambientais

Escrituração Contábil - Ambiental

Procede-se normalmente, respeitando-se as definições e característica teóricas da contabilidade,classificando os eventos em suas respectivas contas ambientais

ProcessamentoPelo Sistema de Contas Ambientais , estipulado de acordo com a política ambiental utlizada

SaídaNotas explicativas, Balanço Patrimonial, Balanço Social, Ecobalanço, Relatórios Ambientais, etc.

3.2 – Classificação de Ativos e Passivos Ambientaisem um Plano de Contas

Os ativos na visão teórica segundo Hendriksen (1999, p.303)(...) “incorpora um benefício futuro provável e contribui direta ou

Fonte: elaborado pelo autor

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indiretamente à geração de entradas líquidas de caixa futuras, podendocom isso conseguir o benefício e controlar o acesso de outras entidadesa esse benefício, os benefícios econômicos ou o direito ao seucontrole, e devem resultar de transações ou eventos passados”.Osativos ambientais dentro dessa ótica são os recursos financeirosaplicados em equipamentos de proteção a danos ecológicos e asdespesas de sua manutenção ou de correção. As empresas pagam trêsvezes pela introdução dos ativos ambientais: na compra, durante afabricação e na deposição, ou seja, são os gastos que, de alguma forma,guardam relação com meio ambiente, impactando-o no presente, ouque o farão no futuro.

Quadro 5 - Exemplos de ativos ambientais realizáveis a curtoe longo prazo para auxilio em um plano de contas

1. Direitos recebidos de uma receita ambiental.

2. Direitos de extração líquida de recursos naturais.

3. Os estoques ligados às atividades ambientais, sempre co-relacionados àgestão ambiental ou com produtos redirecionados no processo operacionalque façam com que essa mudança deixe de gerar uma despesa ou ao menosa diminua.

4. Investimento e gastos com manutenção de processos operacionais paramelhoria na exploração do meio ambiente;

5. Investimento e gastos com a preservação e/ou recuperação de ambientesdegredados;

6. Investimentos e gastos com a educação ambiental para empregados,terceirizados, autônomos e administradores;

7. Investimentos e gastos com educação ambiental para consumidores;

8. Investimentos com outros projetos ambientais;

9. Imobilizado: bens destinados à manutenção da gestão ambiental, como filtrosde ar, equipamentos da estação de tratamento de efluentes, etc.;

10. Diferido: gasto em desenvolvimento de tecnologia limpa (Clean Technologies)e sustentável, os gastos com implantação de Sistemas de Gestão Ambientalcomo a ISO 14000 e normas BS 7750.

11. Exaustão, amortização e depreciação ambientais deveram estar vinculadosa todas as suas respectivas contas ambientais patrimoniais.

Fonte: elaborado pelo autor

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Quanto ao passivo, em Hendriksen (1999, p.409). A definiçãodada pelo FASB (Conselho de Padrões de contabilidade financeira) éa de que passivos (...) “são os sacrifícios futuros prováveis de benefícioseconômicos resultantes de obrigações presentes de uma entidade nosentido de transferirem ativos ou serviços para outras entidades nofuturo em conseqüência de transações e eventos passados”. No quese referem aos passivos ambientais, eles ficaram conhecidos pela suaconotação negativa, ou seja, as empresas que os possuem agrediramsignificativamente o meio ambiente e, dessa forma, têm que pagarvultuosas quantias a título de indenização a terceiros e multas pararecuperar áreas danificadas. Para Tinoco e Kraemer (2004) são três ascategorias: 1- regulatório (leis) 2- corretiva (danos ecológicos) e 3-indenizatórios. As obrigações decorrentes do passivo ambiental sãoclassificadas em legais ou implícitas, construtivas e justas e comoexemplo típico de passivos ambientais temos os valores das multas edas indenizações de cunho ambiental, administrativa e /ou judiciais.

3.3 – Receitas Ambientais

Segundo definição do AAA (Associação Americana deContabilidade) encontrada em Henriksen (1999, p.224), receita é(...) “a expressão monetária de produtos ou serviços agregados,transferidos por uma empresa a seus clientes num período”. Criaruma definição de receita ambiental significa estabelecer um valoreconômico ao meio ambiente, ou seja, considerar o seu valor de usoacrescido do valor de opção dos recursos somados ao valor estimadoda sua existência. Calcular um Produto Sustentável que está sendocriado para gerar uma respectiva receita se dá estabelecendo o valordo produto calculado de forma convencional, e deste deduzindo-seo custo de uso dos recursos utilizados.

Os poupadores de recursos, segundo Motta (1995 p.19) atravésda aplicação das políticas ambientais, podem por analogia, seremconsiderados receitas, ou ainda todas as diminuições de ativo quenormalmente ocorreriam pela falta de tais políticas. Portanto, osimples fato de se evitar um gasto que anteriormente seria considerado

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como certo, ou a simples diminuição deste, pode e deve sercontabilizado como uma receita, respeitando a sua teoria e dandobase para a sua aplicabilidade dentro da visão de ContabilidadeAmbiental.

Quadro 6 - Exemplos Praticáveis de Receitas Ambientais:

1. Venda de produtos fabricados a partir de resíduos ligados à atividade principalda entidade;

2. Prestação de serviços na área de gestão ambiental tais como consultorias etreinamentos ambientais;

3. Participação no faturamento da parcela aplicada, respeitando a ideologia dodesenvolvimento responsável com o meio ambiente.

Fonte: elaborado pelo autor

3.4 – Despesas Ambientais

Por Hendriksen (1999, p.232) despesas constituem (...) “o usoou consumo de bens e serviços como fatores de produção. As despesasindicam o gasto de serviços de fatores relacionados direta ouindiretamente à produção e venda do produto da empresa”.

De acordo com Motta (1995, p. 20) a valoração das despesasambientais se dá pela estimativa de gastos que seriam necessários paramanter intacto o meio ambiente. Essa estimativa diz respeito ao custode recuperar os elementos degradados durante um período, baseadosem padrões técnicos determinados pela agência de fiscalizaçãoambiental.

O procedimento de valoração se dá através das perdas geradaspela degradação dos recursos naturais, que são obtidos através deestimativas de gastos necessários para evitar essas perdas. E é validoainda lembrar que é de extrema dificuldade a avaliação de danos eprejuízos ecológicos, e em principal às atividades explorativasdiretamente ao ambiente, como, por exemplo, estaria no fato demedir a redução de fertilidade do solo ou ainda a extinção das espécies

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da fauna e flora, pois estes eventos só poderiam estar sendo estimados.Exemplos de valoração de despesas ambientais se dão medindo ocusto da erosão da terra, avaliando através do custo de fertilizantenecessário para recompor a produtividade original, antes da ocorrênciade sua erosão. Mede-se também através da perda de água subterrâneaque é obtida pelo custo de reinjetar água dentro dos reservatóriossubterrâneos, ou ainda, nas perdas de ar e água superficiais que sãodeterminadas pelos gastos necessários para reduzir a poluição paraníveis aceitáveis.

3.5 – Custos Ambientais

Reconhecer um custo de degradação significa elaborar um sistemade contas ambientais a partir de relações análogas a sustentabilidadefraca, na qual as perdas de qualidade dos recursos de fluxo sãocompensados pelos ganhos econômicos. Esse esquema é baseado nadupla inserção do meio ambiente, como provedor gratuito deentradas (inputs) para a produção ou consumo (serviços ambientais)e como consumidor dos danos aos recursos naturais ocasionadospela sua utilização pelos agentes econômicos que são tratados comooutput negativo (perdas ambientais).

O preço líquido de custos, nada mais é do que uma aproximaçãodo rent (aluguel) (reflete na exploração a depreciação), ou seja,(desinvestimento) do recurso em questões que pode ser entendidocomo rendimento líquido do custo de operação e capital, pelométodo do custo de uso, auferido pelo detentor do recurso e querepresentaria o valor da parcela do capital natural que estaria sereduzindo em função da extração.

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O método do custo de uso, só determinaria a renda verdadeira,de acordo com Motta (1995, p.50), caso se estabelecesse relaçõesentre níveis de demanda efetiva e bem-estar dos indivíduos, assim, aimportância do custo de uso se restringe a introduzir no cálculoempresarial um componente especulativo sobre o sacrifício derendimentos futuros que se pode incorrer caso decida adotar umdeterminado volume de produção.

Existem poucos dados quantitativos disponíveis sobre o valoreconômico e social total da informação de custos ambientais, poismuitas empresas não os divulgam e muitas não os apuram. Adegradação e a destruição ambiental não são tratadas como custossociais do crescimento, devido à falta de consciência contábil-ambiental que causa uma distorção, “por exemplo”, no calculo doPSB (Produto Social Bruto), nas contas nacionais.

3.6 – Contingências Ambientais

Uma exigibilidade contingente é uma obrigação que pode surgirdependendo da ocorrência de um evento futuro. Mas existem exceçõescomo provisões com garantias, para abatimentos, etc. Uma obrigaçãocuja expectativa de sua liquidez não seja de caráter realizável, trás paraa Contabilidade Ambiental reflexos importantes na toma de decisões.Ela permite que a administração tome medidas tais como aconstituição de reservas destinadas exclusivamente ao capital que seráaplicado em determinado período diretamente na mensuração deativos e passivos ambientais.

Quadro 7 - Exemplos de Processamento de Custos Ambientais

1. A dessulfurização dos resíduos gasosos através da produção de energiacusta X centavos por kilowatt/hora.

2. A recuperação de solo contaminado em X reais por metro cúbico.

3. Os ganhos da extração mineral seriam, por exemplo, contabilizados no produtobruto, enquanto a dedução do valor do esgotamento seria contabilizada noproduto líquido (método do preço líquido) ou seja, custo de exaustão.

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A contingência ambiental pode ser considerara como um fatordeterminante das mudanças de mercado. Em tempos de globalização,onde as mudanças de mercado acontecem com velocidades cada vezmaiores, a adaptação é a palavra chave para a sobrevivência e ou ocrescimento das empresas, daí a necessidade de se implantar políticasambientais na formação de uma estrutura de gestão ambiental quepossa mensurar seus acontecimentos de forma adequada, e através desuas informações evitar que tais contingências tenham reflexos emgrande proporção no mercado em que a empresa está inserida.

3.7 – Provisões Ambientais

De acordo com o IASB (International Accounting StandardsBoard), provisão “é um passivo com prazo de pagamento oumontantes incertos”. A omissão das obrigações ambientais ocorrepela falta de conhecimento, conscientização, legislação, tecnologiaou interesse.

O IBRACON (Instituto Brasileiro de Contabilidade) recomendaque os gastos ambientais efetuados na forma de investimentos delongo prazo sejam classificados com ativos ambientais imobilizados ediferidos.

O ativo imobilizado ambiental diz respeito aos equipamentosadquiridos visando à eliminação ou redução de agentes poluentes,com vida superior a um ano. Os gastos com pesquisas edesenvolvimentos de tecnologias a médio e longo prazo, e queenvolvam benefícios e ação que se reflitam por exercícios futuros,serão valores integrantes do ativo diferido e deverão formar-se provisõesligadas aos gastos necessários na aquisição destes ativos, mediante atocomparativo de sua ocorrência nos períodos contábeis e de suanecessidade para entidade, visando sua classificação de forma idealem um plano de contas.

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4 – CONCLUSÃO

Relacionar os eventos ambientais à contabilidade no Brasil aindaapresenta pouco desenvolvimento. A correta utilização daContabilidade Ambiental de formas qualitativa e quantitativa nasdemonstrações contábeis, leva não só a um melhor estruturamentodo balanço comercial da empresa, mas dá direcionamentos corretosa custos, despesas e receitas ambientais que podem e devem influenciarna apuração de resultado de exercícios anuais, e que assim como oconstatado, não vêm sendo realizado na proporção necessária e muitasvezes nem ao menos são utilizados pelas empresas ligadas à extraçãomineral no Brasil, devido ao temido reflexo negativo que tais custosambientais podem vir a trazer aos seus stakeholders.

Reforçar a idéia de que vários projetos podem ser desenvolvidosem relação à Vida Sustentável é o maior desafio dentre todos, poisleva ao ponto chave do problema que está na educação, e aecopedagogia aparece como um instrumento poderoso para o avançoda ideologia do desenvolvimento sustentável. Além de envolver umaformação pedagógica adequada, deve-se estabelecer caráter éticoecológico com o intuito de mostrar que todos nós estamos dentrode uma biosfera global, e isso só se tornará possível com odesenvolvimento do conhecimento e revisão do sistema de valoresatrelados à economia global.

Observa-se hoje os efeitos da não-utilização dos custos eobrigações ambientais nos demonstrativos de resultados contábeis,estando inclusive ligados à aceitabilidade de determinados produtosno mercado. A contabilidade deve ampliar seus controles sobreaspectos ligados diretamente ao efeito constitutivo do produto daempresa, para garantir não só uma boa aceitação deste no mercado,mas também contribuir com suas informações para com a sociedadee o governo, trazendo desta forma, possíveis soluções a problemassociais e contribuir para a aplicação de um sistema de gestãoambiental.

Já é uma realidade a importância dada por tal assunto, e a GRI(Iniciativa de Relatório Global) vêm demonstrando isso, por se tratar

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de um acordo internacional cujo objetivo é difundir as Diretrizespara elaboração de Relatórios de Sustentabilidade aplicáveisglobalmente e voluntariamente pelas organizações, e a NBC T15(Norma Brasileira de Contabilidade referente às Informações deNatureza Social e Ambiental) aprovada e instituída pelo CFC(Conselho Federal de Contabilidade) e que entrou em vigor a partirde 1º de janeiro de 2006, veio no intuito de estabelecer procedimentospara evidenciação das informações de natureza social e ambiental paraas empresas que precisem demonstrar suas informações ambientais.Isso só vem reafirmar a infinda necessidade de aprimoramento doconhecimento do contador devido ao aumento de usuários de suasinformações produzidas. Será o contador a peça chave para garantir adisseminação de uma responsabilidade social e influenciar com suasinformações privilegiadas as tomadas de decisões, levando-se emconsideração a conscientização ecológica dentro de uma gestãoambiental ajudando a chegar ao esperado desenvolvimento sustentável.

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Comissão mundial sobre o meio ambiente e desenvolvimento. “Nossofuturo comum”. Nova York / Oxford, 1987.

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HENDRIKSEN, Eldon S. & BREDA, Michael F. Van. Teoria dacontabilidade. 5º ed. São Paulo: Atlas, 1999.

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KRAEMER, Maria Elizabeth Pereira – Contabilidade Ambiental:Fatores ambientais exógenos que interferem na riqueza celular. RevistaMineira de Contabilidade, 2º trimestre 2005 ANO VI, N 18.

MOTTA, Ronaldo Seroa da, Contabilidade Ambiental: Teoria,Metodologia e Estudos de Casos no Brasil. Rio de Janeiro, dezembro de1995 – IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

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Gestão Ambiental: Um enfoque no desenvolvimento sustentável. Disponívelem: <www.gestaoambiental.com.br/articles.php>. Acesso em15.nov.2005.

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ADAPTAÇÃO DO PLANO DE CONTAS

COMO MECANISMO PARA GERAÇÃO

DE RELATÓRIOS GERENCIAIS NO

SETOR AMBIENTAL

GEOVÁ JOSÉ MADEIRA1

GLAUBER LIMA BARBOSA2

ROMUALDO DOUGLAS COLAUTO3

RESUMO

A Gestão Ambiental envolve um sistema que inclui a estruturaorganizacional, atividades de planejamento, responsabilidades,práticas, procedimentos, processos e recursos para desenvolver,implementar, atingir, analisar criticamente e manter a políticaambiental. Para efetivação de um sistema de informação gerencialcom enfoque ambiental, faz-se necessário a implementação de umPlano de Contas contendo contas que possibilite o registro de

1. (Orientador) - Mestre em Ciências Contábeis pela UFRJ. Professor-mestre daUFMG. Telefone: (031) 3279-9136. E-mail: [email protected]

2. (Autor) - Graduando do 4º período de Ciências Contábeis da Universidade Federalde Minas Gerais e bolsista do Departamento de Ciências Contábeis da FACE/UFMG. Telefone: (031) 3279-9135. E-mail: [email protected]

3. (Autor) - Doutor em Engenharia de Produção e Sistemas pela UFSC, Mestre emEngenharia de Produção e Sistemas pela UFSC, Professor Adjunto e Pesquisadordo Departamento de Ciências Contábeis da FACE/UFMG.Telefone: (031) 3279-9056. E-mail: [email protected]

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transações específicas da área, em detrimento de apenas as tradicionaisempregadas na contabilidade financeira. Assim, o objetivo do trabalhoé delinear um plano de contas para evidenciar as principais transaçõesrelacionadas à gestão ambiental. O delineamento da pesquisa écaracterizado como exploratório e busca-se estruturar um Modelo dePlano de Contas Ambientais que englobe os fatos contábeis maisrelevantes da atualidade para a área ambiental. O estudo mostra queas contas adicionadas atendem a forma de acumulação, sintetização eclassificação de elementos patrimoniais necessários para incrementaro benefício de uma informação gerencial. Como contribuiçãomostrou-se a adição de contas que envolvem atividades ambientaisao tradicional plano de contas contábeis.

Palavras-chave: Plano de contas. Adaptação. Gestão ambiental.

1 INTRODUÇÃO

No núcleo da contabilidade está o processo de classificação,registro e sintetização dos eventos econômicos, comunicado por meiode demonstrações contábeis, de forma a possibilitar a melhorcompreensão dos fatos ocorridos nas entidades. Nesse processo ainformação configura-se como o componente básico das decisões, e acontabilidade assume a posição de um sistema de informaçõesespecializado de base financeira, que possibilita aos usuários alocaçõeseficientes dos recursos sob sua responsabilidade. A subjacência doprocesso contábil fundamenta-se na coleta, processamento ecomunicação de informações, estando diretamente relacionado aosinteresses peculiares dos usuários e as necessidades decisoriais.

Durante o último quarto do século XX, o ambiente competitivo,tornou-se mais desafiante e exigente. Conseqüentemente, as empresasdemandam por informações contábeis gerenciais. Padovese (2004)explica que se faz necessário criar contas adicionais nos demonstrativoscontábeis das companhias, para possibilitar a elaboração direta derelatórios com informações gerenciais.

A Contabilidade como uma Ciência Social Aplicada preocupa-se em sistematizar dados para garantir a continuidade das entidades.

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A efetivação de um sistema de gestão ambiental, como fruto de umapolítica estratégica da empresa, ajuda tomar decisões precisas quantoao desenvolvimento sustentável das entidades. Assim, o objetivo dotrabalho é delinear um plano de contas explicativo para evidenciar osprincipais eventos ambientais. Busca-se uma estrutura de Plano deContas que englobe fatos contábeis expressivos na atualidade, e quesão negligenciados no processo de escrituração das empresas. Nestesentido, sugere-se neste trabalho uma Estrutura de Plano de ContasAmbientais com o propósito de identificar e justificar a adição decontas ambientais no tradicional plano de contas contábeis.

Para compreensão do Plano de Contas Ambientais, deve-secontextualizar o meio em que ocorre sua inserção. Desse modo,explica-se o que vêm a ser a contabilidade gerencial e como ocorre ainclusão do Plano de Contas no Sistema de Informação Gerencial,para possibilitar a adoção do plano de contas ambientais no processode gestão ambiental empresarial.

O delineamento da pesquisa caracteriza-se como estudoexploratório com a finalidade principal desenvolver, esclarecer emodificar conceitos e idéias, a fim de fornecer hipóteses pesquisáveispara estudos posteriores. Inicialmente foi realizada uma pesquisabibliográfica acerca do Plano de Contas Tradicionais dos setoresextrativistas, consideradas Sociedades Anônimas de Capital Aberto.

2 ABORDAGEM CONCEITUAL DE GESTÃO

AMBIENTAL EMPRESARIAL

Atkinson et al (2000) afirmam que a Contabilidade Gerencial éo processo de produzir informações operacionais e financeiras parausuários internos. O processo deve ser direcionado pelas necessidadesinformacionais dos indivíduos internos da empresa e orientar decisõesoperacionais e de investimentos. De acordo com Padovese (2006) aContabilidade Gerencial se responsabiliza pela informação útil àadministração, excluindo desta forma, a participação dos funcionáriosem grau de importância para o usufruto de tais informações, e abarca

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todas as etapas evolutivas no processo de criação de valor por meiodo uso efetivo dos recursos empresariais. Tendo em vista que aorganização é estruturada de forma hierárquica, a ContabilidadeGerencial, para Padovese (2006), precisa suprir todas as áreas dacompanhia com a informação contábil gerencial.

Gestão Ambiental empresarial, de acordo com Tinoco (2004) éo sistema que inclui a estrutura organizacional, atividades deplanejamento, responsabilidades, práticas, procedimentos, processose recursos para desenvolver, implementar, atingir, analisar criticamentee manter a política ambiental. As normas ambientais influenciamdiretamente as relações comerciais, e que a observação das normasfacilitam tais relações. Isso ocorre devido ao aumento crescente daexigibilidade por comprovação de que o meio ambiente não estásendo degenerado, tanto dos clientes aos seus fornecedores, quantoda população capitalista na aquisição de bens diversos.

Paixão (1997) expõe que a implantação de um sistema de gestãoambiental representa um processo de mudança comportamental egerencial na organização. A implementação da norma deve serconduzida de modo participativo e integrado, do comprometimentoda alta direção, sensibilização dos colaboradores, treinamento derecursos humanos, estabelecimento de novos procedimentosambientais, mudança no comportamento individual, em fim,mudanças no comportamento da a organização.

Gray, Bebbington e Walters (1993) tratam as questões do meioambiente como um assunto de interesse para contadores eprofissionais de áreas afins, mencionando que para o gerenciamentodo meio ambiente o contador poderia contribuir: (1) modificado ossistemas de contabilidade existentes, como no custeio de energia; (2)eliminando os elementos conflitantes dos sistemas de contabilidade,como nos métodos de investimentos ambientais; (3) planejando asimplicações financeiras de uma agenda ambiental, como nas projeçõessobre as despesas de capital; (4) introduzindo medidas de desempenhoambiental nos relatórios externos e nos relatórios anuais; (5)desenvolvendo um sistema de informações fundamentado em umbalanço patrimonial ecológico.

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Assim, em março 2005, o Instituto Akatu em parceria com oInstituto Ethos, publicou um estudo desenvolvido junto a 630companhias, que aponta a necessidade de efetivar iniciativas dedesenvolvimento da Gestão Ambiental. Expõe que 73% dascompanhias envolvidas na pesquisa nunca discutiram a adoção deprogramas de proteção às áreas naturais; 64% não têm um plano degerenciamento ambiental. Isto contrasta com o objetivo principaldas companhias, de obter lucros maiores, uma vez que o mesmoestudo apontou que 43% dos consumidores têm compromissos comesses valores em níveis variados, em especial, se preocupam comimpacto sobre o meio ambiente e o efeito sobre a sociedade.

3 PROPOSTA DE ESTRUTURA DO

PLANO DE CONTAS AMBIENTAIS

O Sistema de Informações Gerenciais (SIG) de acordo comOliveira (2005), é o processo de transformação de dados eminformações para serem utilizadas na estrutura decisória da empresa eproporcionar a sustentação administrativa para otimizar os resultadosesperados. De acordo com Rocha (2006) para a empresa usufruir dasvantagens básicas do sistema de informações gerenciais é necessáriosobservar o envolvimento adequado da alta e média administraçãocom o SIG, sob a pena da inobservância provocar situação dedescrédito do sistema.

O plano de contas gerencial é um prolongamento do conceitode contrapartida de débito e crédito. Padovese (2006) afirma que osplanos de contas contábeis deverão ser construídos tendo em vista osrelatórios futuros que dele se originarão e da necessidade da integraçãode todo o sistema de informação contábil. Através da navegabilidadedos dados, dois aspectos são fundamentais na elaboração dos planosde contas gerenciais: a segmentação dos planos por áreas afins dosprincipais relatórios e criação de contas adicionais.

Padoveze (2006) defende ainda que além das informaçõestradicionais que a contabilidade financeira fornece para elaboração

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de relatórios básicos, estes devem conter as informações das contasadicionais que serão previamente utilizadas na estruturação do sistemade informação contábil gerencial. Com a utilização do plano de contasambientais pode-se organizar informações ambientais sintéticas paramostrar uma visão geral da entidade, assim como, para as unidadesde negócios que a entidade definiu como estratégicas para atingir osobjetivos institucionais.

Um sistema de informação contábil decisorial não deve se limitaràs contas tradicionais. Deve estar aberto a contas que nãonecessariamente são valorados por mensuração monetária eeconômica. Sempre que necessário, as contas contábeis informativas,quantitativas ou até visando à operacionalização de informações futuraspoderão e deverão ser criadas dentro do sistema contábil gerencial,objetivando atender às necessidades dos usuários da informaçãocontábil. (PADOVESE 2004).

A necessidade da integração entre o usuário da informaçãocontábil e o sistema contábil gerencial, a partir da construção dosplanos de contas, deverá propiciar a movimentação simultânea dascontas. Tais movimentações possibilitam a criação de relatórios einformações necessárias para caracterizar-se como um instrumentode gestão no processo decisório. Lopes de Sá (2002) afirma aindaque a primeira medida que se deve assumir para poder elaborar umplano de contas é o estudo da empresa para qual será ele destinado.Devem-se voltar as atenções para as variedades quanto às naturezas eas respectiva classificação das empresas. Ferreira (2003) discorre queo Plano de Contas deve evidenciar a natureza qualitativa das contaspara melhor identificar e restringir as transações contabilizadas emcada conta ou, pelo menos, ter uma estrutura flexível o suficienteque permita atualizações das contas que garantam a fidedignidadedos registros em comparação com as transações precedentes.

Para cada organização pode haver uma estrutura de plano decontas adaptado à realidade dos eventos econômicos de cadaorganização. No quadro 1 apresenta-se uma estrutura de plano decontas ambientais para o Ativo Circulante.

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Na conta Caixa contabiliza-se os Direitos recebidos de receitasambientais. Segundo a American Accounting Association (AssociaçãoAmericana de Contabilidade) AAA apresentado por Henriksen e VanBreda (1999), receita é “a expressão monetária de produtos ou serviçosagregados, transferidos por uma empresa a seus clientes num período”.A proposição da definição de receita ambiental envolve estabelecerum valor econômico ao meio ambiente, considerando o seu valor deuso acrescido do valor de opção dos recursos somados ao valorestimado da sua existência.

Quadro 1: Estrutura do Plano de contas ambientaispara o Ativo Circulante

I ATIVO CIRCULANTE1 DISPONÍVEL

CaixaBancos

2 CLIENTESDuplicatas a receberAplicações Financeiras

3 OUTROS CRÉDITOS4 INVESTIMENTOS TEMPORÁRIOS5 ESTOQUES

Matéria-PrimaMateriais RenováveisMateriais Não RenováveisMateriais RecicladosMateriais Reutilizáveis

Materiais Auxiliares (uso geral)Produtos terminados, semi-acabados ou em andamento

Materiais RenováveisMateriais Não RenováveisMateriais RecicladosMateriais Reutilizáveis

Retalhos e ResíduosMinerais

6 ATIVOS ESPECIAIS7 DESPESAS DO EXERCÍCIO SEGUINTE

Fonte: elaborado pelos autores.

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A conta Aplicações Financeiras destina-se ao registro dasaplicações financeiras em outras instituições. Em termos gerenciais aconta de Aplicações Financeiras ganha relevância quando se desejacalcular o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), referido pelaBovespa dezembro de 2005. O índice tem por objetivo refletir oretorno de uma carteira composta por ações de empresas com osmelhores desempenhos em todas as dimensões que medemsustentabilidade empresarial, sendo este índice criado para se tornarmarca de referência para o investimento socialmente responsável etambém indutor de boas práticas no meio empresarial brasileiro. Asações integrantes do ISE são selecionadas entre as ações maisnegociadas na Bovespa em termos de liquidez, ponderadas na carteirapelo valor de mercado dos ativos disponíveis para negociação.

A conta Outros Créditos deve ser usada para eventuais receitasambientais por comercialização esporádicas sem grande influênciano resultado operacional da entidade, Iudícibus, Martins e Gelbcke(2003) ressaltam que a conta Outros Créditos somente deve figurarno Plano de Contas quando houver necessidade de registro de valoresmontantes não significativos.

Especial atenção deve ser atribuída à conta de estoques. Henriksene Van Breda (1999) afirmam que a proporção dos custos operacionaisdo exercício destinado ao estoque e não às despesas do exercício,exerce forte impacto sobre o lucro bruto. Iudícibus, Martins e Gelbcke(2003) afirmam que em muitos casos as empresas como as de extraçãonatural (mineral ou florestal), adotam o método de avaliação dosestoques com base no valor de mercado. Essa prática está protegidapela Lei das Sociedades por Ações no § 4º do art. 183: “os estoquesde mercadorias fungíveis destinados à venda poderão ser avaliadospelo valor de mercado, quando esse for o costume mercantil aceitopela técnica contábil”. Tal prática restringe-se aos estoques destinadosà venda.

É possível subdividir a conta Estoques em Matéria-Prima,Produtos Terminados, Semi-acabados ou em andamento, Retalhos eResíduos e em Minerais . Nestas subcontas devem-se colocar os valoresatribuídos à matéria-prima ligada à exploração ou atividade principal

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das entidades, em contas analíticas segmentadas em materiaisrenováveis, não-renováveis, reciclados e reutilizáveis para diferenciá-los e melhor classificá-los. A mesma lógica se aplica à subconta demateriais semi-acabados ou em andamento. Vale explicar que osmateriais renováveis e os não renováveis, por fugirem à tradiçãocontábil cabe aqui reforçar suas definições, e que segundo Ferreira(2003), Motta (1991) e Paiva (2003) representam o recurso que anatureza consegue continuar produzindo, sem que se vislumbre ahipótese de seu desaparecimento em função do uso. Ou seja, sãoaqueles que podem ter suas condições originais restauradas pela açãonatural ou humana. Como ativo não renovável, entende-se ser aquelescuja exploração da atividade humana leva inevitavelmente a reduçãono futuro próximo, pois a natureza não consegue repor o estoque.Podem-se ainda considerar como contas analíticas, os Retalhos eResíduos provenientes das sobras de produção e ou exploraçãonatural, que sirvam de uso comercial para terceiros, assim como asubconta Minerais para as empresas que atuam no campo deexploração extrativista.

No Quadro 2 o grupo dos Ativos Realizáveis em Longo prazoapresenta como subconta os Créditos e Valores. Os CréditosCompulsórios Ambientais estão diretamente ligados à gestãoestratégica das companhias, como, por exemplo, a diminuição dedeterminado poluente em seu fator de produção em contrapartida auma diminuição futuramente de um imposto tradicional àcompanhia, como também ao crédito compulsório ligado às relaçõescom Stakeholders, que devem estar adaptados às práticas socialmenteresponsáveis.

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Os Gastos Ambientais é uma subconta dos InvestimentosTemporários a longo prazo, pois estarão sendo empregados com oobjetivo de obter melhores resultados quanto à gerência ambientalem períodos subseqüentes à data do período contábil, buscando evitarreflexos negativos às companhias. Paiva (2003) esclarece a importânciado reconhecimento desses gastos, quando afirma que os gastosambientais não reconhecidos no momento do seu fato gerador coma classificação pertinente se apresentaram no futuro como passivosnão reconhecidos, repercutindo negativamente. Como deduções daconta referente aos gastos aparece a amortização desses investimentos.

No Quadro 3 mostra-se as adaptações sugeridas para o grupodo Ativo Permanente. No grupo do Ativo Permanente procura-seevidenciar as contas do grupo Investimentos, e devem ser baseadosnos valores que foram acrescidos aos ativos imobilizados ambientaisdurante o período contábil, ou seja, todos os ativos adquiridos oucontratados para atender às necessidades das atividades de cunhoambiental nas companhias.

Quadro 2: Plano de contas ambientaisdo Ativo realizável a longo prazo

II ATIVO REALIZÁVEL A LONGO PRAZO1 CRÉDITOS E VALORES COMPULSÓRIOS AMBIENTAIS2 INVESTIMENTOS TEMPORÁRIOS A LONGO PRAZO

Gastos Ambientais efetuados no sentido preventivoCompulsoriedades legaisCompulsoriedades contratuais(-) Amortização dos gastos ambientais preventivos

3 DESPESAS ANTECIPADAS

Fonte: elaborado pelos autores.

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Entre as subcontas do Ativo Permanente destacam-se trêsprincipais: (a) Certificados negociáveis; (b) Reflorestamento paraseqüestro de carbono; e (c) Direitos sobre recursos naturais ou Direitosde subsolo. De acordo com Ferreira (2003, p. 98).

Os certificados negociáveis referem-se à aquisiçãode título negociáveis em mercado aberto que foramemitidos em decorrência de investimentos realizados

Quadro 3: Plano de contas ambientais do Ativo Permanente

1 INVESTIMENTOSCertificados negociáveis Reflorestamento para seqüestro de carbonoDireitos sobre recursos naturais

2 ATIVO IMOBILIZADO - TÉCNICOJazidasPropriedades Rurais

3 ATIVO IMOBILIZADO - IMATERIALTerrenosSistemas AplicativosInstalações(-) Depreciação, Amortização e Exaustão AcumuladasImobilizado em andamento

4 ATIVO DIFERIDOGastos de implantação e pré-operacionais

Gastos em desenvolvimento de tecnologia limpa e sustentávelPesquisa e desenvolvimento de produtos

Investimento e gastos com manutenção de processos operacionaisInvestimentos com outros projetos ambientais.

Gastos de implantação de sistemas e métodos - custosGastos com implantação de Sistemas de Gestão Ambiental(-) Amortização acumulada

Gastos de reorganização Investimentos e gastos com a educação ambiental(-) Amortização acumulada

Variação cambial5 ATIVOS AMBIENTAIS IMOBILIZADOS E DIFERIDOS

Gastos Ambientais efetuados na forma de investimentos de longo prazo(-) Amortização acumulada

Fonte: elaborado pelos autores.

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em reflorestamento para seqüestro de carbono. Suaavaliação e contabilização devem ser semelhantes ainvestimentos em outros tipos de papéis. Oreflorestamento para seqüestro de carbono refere-seao investimento em área de reflorestamento com oobjetivo de realizar o seqüestro de carbono. Suaavaliação deve ser feita pelos custos acumulados doinvestimento. Os direitos sobre recursos naturaisreferem-se ao registro dos direitos de exploração dejazidas de recursos minerais pelo total dos custosincorridos na obtenção desses direitos.

O grupo de contas do Ativo Imobilizado é utilizado para registraras atividades fins da entidade. Para tanto, pode-se dividi-lo emImobilizado Técnico e Imobilizado Imaterial. O Imobilizado Técnicocontempla os bens destinados à manutenção da gestão ambiental,como filtros de ar, equipamentos da estação de tratamento deefluentes. O Imobilizado Imaterial para abarcar os ativos intangíveisque influenciou o negócio da companhia, tal como a obtenção deuma titularidade relacionado à questões sócio ambiental ou aindaSoftwares de Sistemas de Informações Ambientais.

Os Ativos Diferidos envolvem gastos com implantação depolíticas ambientais e seus respectivos Sistemas de Informação eprojetos ambientais que venham a propiciar melhorias quanto a gestãodo ambiente como fonte de recurso das companhia e desta comoum todo. Uma conta que se identificou necessária no Ativo Diferido,dentro da visão de um desenvolvimento empresarial sustentável foitratada por Florestamento e Reflorestamento e sobre este assuntoIudícibus, Martins e Gelbcke (2003) defendem a classificação aquide todos os custos acumulados relativos a projetos de florestamentoe reflorestamento de propriedade da empresa. Para Ferreira (2003)os projetos liderados pela sociedade, como sócia ostensiva, emconjunto com outros acionistas, devem ser contabilizados à parte,de acordo com os critérios próprios previamente estabelecidos noplano de contas ambientais. Seguindo essa conduta, pode-se tratar

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também os Gastos Ambientais efetuados na forma de investimentosde longo prazo (por mais de um exercício) como uma subconta comcaracterísticas suficientes para serem tratadas como Ativos AmbientaisImobilizados e Diferidos.

No Quadro 4, apresenta-se o grupo de contas do Passivo. Astransações registradas nestas contas apresentam os Passivos ambientais,e que conforme defende Paixão (1997) não se restringem a obrigaçõeslegais, abrangendo-se também as de natureza social, podendo serdeterminadas por contratos ou por responsabilidade moral. PassivoAmbiental pode ser conceituado como toda agressão que se praticoue/ou se pratica contra o meio ambiente, e está intrinsecamente ligadoao valor dos investimentos necessários à sua reabilitação. As empresasque não reconhecerem os encargos potenciais do Passivo Ambientalpodem estar apurando custos e lucros irreais.

O grupo Débitos Diversos envolve as indenizações e multasambientais, que conforme tratado por Tinoco e Kraemer (2004)devem ser classificadas em três categorias: (1) regulatório, referente asleis; (2) corretiva, concernente aos danos ecológicos; e (3)indenizatórios. Aponta-se ainda um débito aqui tratado por asAposentadorias Precoces que ocasionalmente ocorre nas entidadesdevido às más condições de trabalho. O IBRACON (InstitutoBrasileiro de Contabilidade) atesta que a contabilização dos benefíciosa que os empregados farão jus após o tempo de serviço (benefícios depensão e aposentadoria, seguro de vida e assistência médica paraaposentados e pensionistas), pagos diretamente pelos empregadoresou indiretamente através de contribuições para uma entidade deprevidência devem estar de acordo com os reflexos que uma gestãoambiental negativa fez-se necessário a um adiantamento de tal situação.

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As provisões para uma conta são adaptáveis às realidades dasempresas , e tratadas no Plano de Contas Ambientais por Provisõespara Contingências Ambientais. De acordo com o IASB (1998),provisão é um passivo com prazo de pagamento ou montantesincertos. A contingência caracteriza-se nos casos em que aresponsabilidade da empresa, na consumação do fato gerador, dependeda efetivação de evento futuro e refere-se no caso do plano de contasambientais ao registro dos valores estimados das poluições realizadas,decorrentes do processo produtivo. A utilização da conta Provisãopara Contingências Ambientais faz-se necessária justamente devido

Quadro 4: Plano de contas ambientais do Passivo Circulante, doPassivo Exigível a longo prazo e Resultado de exercício futuros

I PASSIVO CIRCULANTE1 DÉBITOS DIVERSOS

Indenizações e Multas ambientaisAposentadorias precoces explicarCompensações diversas

2 EMPRÉSTIMOS E FINANCIAMENTOS3 DEBÊNTURES4 FORNECEDORES5 OBRIGAÇÕES FISCAIS6 OUTRAS OBRIGAÇÕES7 PROVISÕES

Provisão para Contingências AmbientaisProvisão para Benefícios Sociais a Empregados

II PASSIVO EXÍGIVEL A LONGO PRAZO1 DÉBITOS DIVERSOS2 EMPRÉSTIMOS E FINANCIAMENTOS3 DEBÊNTURES4 RETENÇÕES CONTRATUAIS5 PROVISÕES6 REFIS

III RESULTADOS DE EXERCÍCIOS FUTUROS1 RECEITAS AMBIENTAIS DE EXERCÍCIOS FUTUROS

Contratos para exploração mineral a longo prazo 2 (-) CUSTOS E DESPESAS CORRESPONDENTES ÀS RECEITAS

Fonte: elaborado pelos autores.

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ao risco de acidentes ambientais que a atividade empresarial apontecomo possível de acontecer.

No Passivo Exigível a Longo Prazo classificam-se os eventos comvencimentos a partir de 360 dias da data do Balanço Patrimonial.Apresenta-se no Quadro 5 o grupo de contas do Patrimônio Líquido.

IV PATRIMÔNIO LÍQUIDO1 CAPITAL SOCIAL2 RESERVAS DE CAPITAL.3 RESERVAS DE REAVALIAÇÃO

Reavaliação de Ativos Ambientais própriosReavaliação de Ativos Ambientais de coligadas e controladas

4 RESERVAS DE LUCROSReservas para Contingências Ambientais esperadas Reservas para Indenizações e Multas ambientais

5 LUCROS OU PREJUÍSOS ACUMULADOS6 AÇÕES EM TESOURARIA

Fonte: elaborado pelos autores.

Quadro 5: Grupo do Patrimônio Líquido

As Reservas de Reavaliação dos ativos ambientais quando decoligadas e controladas devem ser avaliadas pelo valor atribuído pelomercado. Dentro das possíveis reservas destaca-se a Reserva paraContingências Ambientais Esperadas. Ferreira (2003) explica que serefere ao valor do potencial de poluição dos equipamentos da entidadeque serão restrições a lucros futuros. À medida que a poluição ocorreseu valor específico passa a ser passivo contingente, devendo, portantoesse evento ambiental ser imediatamente reconhecido.

A consideração das Receitas, apresentada no Quadro 6, partedo princípio de que a companhia está adaptada à política ambiental.Sugere-se contas tais como Receita de Venda de produtos fabricadosa partir de resíduos ligados à atividade principal da entidade, Receitade material reciclado, Receita de prestação de serviços na área degestão ambiental tais como consultorias e treinamentos ambientaisalém de frisar que a participação no faturamento da parte aplicada

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terá importante papel informativo se feito de forma separada alem derespeitar-se a ideologia do desenvolvimento responsável com o meioambiente. Seixas e Brito (1992) defendem que havendo essa práticacontábil na gestão da companhia, outras receitas eventuais acarretarãoem conseqüências positivas e inevitáveis nos resultados operacionaistais como recuperações de sinistros, resultados s/ vendas de bens deuso e a recuperação de custos ambientais com os incentivosgovernamentais.

Quanto às contas de custos de produção e exploração Mineral,dentre as contas sugeri-se segmentar em Custo de Perfuração de Minas;Custo de Extração Mineral e a Exaustão das Minas. Lopes de Sá(2002) mostra algumas das contas que compõem o custo deperfuração de minas: a manutenção de máquinas; planificação eengenharia; pesquisas e sondagens; serviços de bombas; matérias-primas; seleção e treinamento de pessoal; encargos sociais e dotrabalho e gastos indiretos. Seixas e Brito (1992) citam exemplos decontas que compõem o custo de extração mineral: mão-de-obra naescavação; arrendamentos; recuperação de solo contaminado;tratamento dos resíduos gerados na produção através da produçãode energia; análise de minérios, materiais aplicados e gastos indiretos.Paiva (2003) explica que a exaustão ambiental deve ser calculada deacordo com a dedução do seu valor de esgotamento e ligadodiretamente ao Produto líquido (método do preço líquido). Sobreo custo matéria-prima para a companhia, ainda que disponível nomeio ambiente deve-se respeitar a idéia de DesenvolvimentoSustentável ao avaliá-lo pela incorporação, procurando estabelecervalor de mercado aos recursos finitos e variando este valor de acordocom o aparente esgotamento local ou global.

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Custos indiretos devem aparecer nas demonstrações contábeispara as companhias que adotam o Sistema de Gestão Ambientalconforme o pressuposto da Responsabilidade Social Empresarial taiscomo a Auditoria Externa Ambiental e o custo de reabilitação deeventuais passivos ambientais.

De acordo com Paixão (1997) a auditoria ambiental é o examesistemático, periódico, documentado e objetivo de operações e/oupráticas realizadas em uma empresa em relação a requisitos ambientais,resultando em uma opinião ou julgamento. É através dela que seconhecerão os riscos ambientais, quantificação e registro dos ativos

Quadro 6: Plano de contas ambientais das contasde resultado – Receitas e Custos

I RECEITA BRUTA DE VENDAS DE PRODUTOS E SERVIÇOS1 PRODUTOS FABRICADOS DE RESÍDUOS2 RECEITA DE VENDA DE MATERIAL RECICLADO3 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AMBIENTAIS4 PARTICIPAÇÃO NO FATURAMENTO DA PARCELA APLICADA5 RECEITAS EVENTUAIS

Recuperações de sinistrosResultados s/ vendas de bens de usoRecuperação de Custos ambientais

II DEDUÇÕES DA RECEITA BRUTAIII CUSTO DOS PRODUTOS VENDIDOS E SERVIÇOS PRESTADOSIV CUSTOS DE PRODUÇÃO / EXPLORAÇÃO MINERAL

1 CUSTOS DE PERFURAÇÃO DE MINAS2 CUSTOS DE EXTRAÇÃO MINERAL3 EXAUSTÃO DAS MINAS4 MATÉRIA-PRIMA DIRETA5 MÃO-DE-OBRA DIRETA

Assistência Médica e SocialAssistência SocialSeguro de acidentes de trabalhoAuxílio-alimentação

6 OUTROS CUSTOS DIRETOS7 CUSTOS INDIRETOS

Auditoria externa ambientalCustos de reabilitação de eventuais passivos ambientais.Insumos antipoluentes

Fonte: elaborado pelos autores.

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tangíveis e intangíveis, que possam se relacionar e sofrer os efeitos dapoluição além de certificar se a prática da empresa está condizentecom a política corporativa e com as legislações existentes. Além deser realizada por iniciativa voluntária de empresas pró-ativas e empresascujo histórico de suas atividades esteja vinculado a episódiosambientais negativos, têm sido aplicada em operações de fusão desociedades ou na venda de empresas, para que se constate um possívelpassivo ambiental.

Os custos de reabilitação de eventuais passivos ambientaisrepresentam uma mudança na natureza dos custos de exploração eprodução. Ribeiro e Martins (1998) explicam que os custosambientais são representados pelo somatório de todos os recursosutilizados pelas atividades desenvolvidas com o propósito de controle,preservação e recuperação ambiental. No Quadro 7 apresentam-se aEstrutura do Plano de contas ambientais para a formação do ResultadoOperacionais e demais contas complementares.

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Quadro 7: Estrutura do Plano de contas ambientais das contas deresultado – Despesas operacionais e contas complementares

I. DESPESAS DE VENDAS1 Despesa com pessoal2 Comissões de vendas3 Ocupação4 Utilidades e serviços5 Propaganda e publicidade ambiental6 Despesas gerais7 tributos e contribuições8 Provisão para créditos de liquidação duvidosa

II. DESPESAS ADMINISTRATIVAS1 Despesas com pessoal2 Ocupação3 Utilidades de serviços4 Honorários5 Despesas gerais6 Tributos e contribuições7 Constituição de provisão para despesas ambientais8 Reversão da provisão para despesas ambientais

III. RESULTADOS FINANCEIROS LÍQUIDOS1 Variação monetária prefixada de obrigações ambientais2 Receitas de títulos vinculados ao mercado aberto3 Resultado financeiro comercial4 Variações monetárias de obrigações e créditos5 Pis e Cofins sobre receitas financeiras

IV. OUTRAS RECEITAS E DESPESAS OPERACIONAIS1 Participações em outras sociedades2 Receitas do meio ambiente

Receita de venda de produto recicladoVenda de materiais e resíduos

3 Receita de serviços da gestão ambientalV. RESULTADOS NÃO OPERACIONAIS

1 Ganhos e perdas de capital nos investimentos2 Ganhos e perdas de capital no imobilizado3 Ganhos e perdas de capital no ativo diferido4 Outros ganhos e perdas

VI. IMPOSTO SOBRE A RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIALVII. PARTICIPAÇÕES E CONTRIBUIÇÕES

1 Debêntures2 Empregados3 Administradores4 Partes beneficiárias5 Instituições ou fundo de assistência ou previd. a empregados

VIII. REVERSÃO DOS JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIOIX. LUCRO (PREJUÍZO) LÍQUIDO DO EXERCÍCIO

Fonte: elaborado pelos autores.

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Quanto às despesas, cabe ressaltar que segundo Hendriksen eVan Breda (1999) despesas constituem o uso ou consumo de bens eserviços como fatores de produção. As despesas indicam o gasto deserviços de fatores relacionados direta ou indiretamente à produçãoe venda do produto da empresa. Por isso trata-se neste modelo somentedas despesas ambientais ligadas à produção ou exploração, partindodo pressuposto que todo e qualquer evento ambiental gira em tornodas atividades das companhias. Gray, Bebbington e Walters (1993)explicam que um sistema contábil existente poderia ser levementemodificado para identificar despesas e, até mesmo, receitasrelacionadas com o meio ambiente, considerando que as áreas emque isso ocorre com maior freqüência são energia, lixo, custos legaise recuperação do solo e, ainda, as exigibilidades.

De acordo com Motta (1995) a valoração das despesas ambientaisse dá pela estimativa de gastos que seriam necessários para manterintacto o meio ambiente. Está vinculada a uma prática da entidadepreviamente estabelecida por uma política da gestão ambiental. Paixão(1997) trata as despesas ambientais como eventos ligados aos Passivosambientais, ou seja, todos insumos ou serviços necessários à realizaçãodo processo de recuperação, e que sejam totalmente consumidospara aquelas consideradas do exercício atual, e parcialmenteconsumidos quando se tratar de fatos subseqüentes cuja dificuldadede identificação e quantificação dos custos ambientais não permita asua total mensuração. Destaca-se a sugestão de abertura da subcontaligada à publicidade e propaganda chamada aqui de gastos comveiculação de publicidade ambiental (Marketing Sócio-Ambiental),o fim de demonstrar as despesas ligadas à divulgação de suas conquistase realizações com a utilização de um Sistema de gestão ambiental.

No grupo de contas referentes a Outras Receitas e DespesasOperacionais, sugere-se a criação da conta Receitas do Meio Ambientepara alocar a economia com os custos tradicionais, as Receitas deVenda de Produto Ambientais, como os produtos reciclados ou aindaa venda de materiais considerados em exercícios anteriores comodejetos advindos da atividade principal da empresa.

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Para valorizar as informações ambientais Ferreira (2003) aconsideração da conta Receitas de Serviços da Gestão Ambiental faz-se necessário para alocar os valores referentes a serviços prestadospelas atividades de prevenção, recuperação e reciclagem. Esses serviçossão mensurados levando-se em conta os benefícios que trazem paraentidade. Em termos de economia de custos considera-se o tratamentode doenças evitadas, adicionais de salários que não necessários,impostos específicos sobre o meio ambiente.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Contabilidade Gerencial se responsabiliza pela informaçãoútil aos gestores para facilitar o processo decisório. Com relação aoobjetivo do trabalho de delinear um plano de contas para evidenciaros principais eventos ambientais, buscou-se apresentar uma Estruturade Plano de Contas que engloba os principais fatos contábeisexpressivos na atualidade.

No Plano de Contas Ambientais, as contas adicionadas atendema forma de acumulação, sintetização e classificação de elementospatrimoniais, sejam eles de Balanço ou na Demonstração doResultado, ambos necessários para incrementar o benefício de umainformação gerencial. Procurou-se atentar quanto às existênciasinformacionais específicas das empresas de forma global, sendo quea classificação das contas partiu do geral para o particular, além deserem flexíveis e operacionais.

Um dos objetivos possíveis de se alcançar com a corretautilização de um Plano de Contas Ambientais é a otimização daimplantação da Responsabilidade Social Empresarial. Entretanto, paragarantir o êxito de qualquer implementação de Sistema de InformaçõesAmbiental, deve-se observar a correta aplicação de políticas ambientaisem todas as áreas da empresa. Deve-se ainda obter o máximo departicipação dos colaboradores da entidade, através da préviaconscientização e treinamento de tais participantes.

Por fim, em cada entidade sempre haverá uma particularidade, ea necessidade de variedade de Planos de Contas ou pelo menos aabertura de suas contas para adaptar-se a essas diversas necessidades.

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TINOCO , João Eduardo Prudêncio. Balanço social: uma abordagemsocioeconômica da contabilidade. FEA-USP, 1984. (Dissertação demestrado) Disponível em: <www.portaldecontabilidade.com.br/obras/balancosocial.htm> Acesso em: 15 dezembro 2006.

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DIVERSIDADE ÉTNICA E OS NEGROS

NAS ORGANIZAÇÕES: UM ESTUDO

NA REGIÃO METROPOLITANA

DE BELO HORIZONTE1

JULIANA GERTRUDES BORGES2

RONALDO ANDRÉ RODRIGUES DA SILVA3

MARIA DE FÁTIMA PEREIRA ROSSI4

RESUMO

O objetivo deste trabalho consiste em apresentar a proposta deprojeto que visa identificar, analisar e mapear as trajetórias eexpectativas dos negros em relação às atividades profissionais e do

1. O presente trabalho constitui-se em uma primeira etapa construção do marcoteórico e definição dos aspectos metodológicos referentes ao projeto de pesquisa“Diversidade Étnica e os Negros nas Organizações: um Estudo na RegiãoMetropolitana de Belo Horizonte” financiado pela Pontifícia Universidade Católicade Minas Gerais – PUC Minas em Betim, no âmbito do programa de bolsas paraa pesquisa de iniciação científica (PROBIC) referente ao período de fevereiro adezembro de 2007. [email protected]

2. Graduanda do curso de Administração da Pontifícia Universidade Católica deMinas Gerais – PUC Minas em Betim, 6o. período do curso de Administração ebolsista de iniciação científica do PROBIC (Programa de Bolsas de IniciaçãoCientífica). [email protected]

3. Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas emBetim. [email protected]

4. Professora da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas emBetim. [email protected]

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trabalho nas organizações do município de Betim/MG. Procura, comisso, contribuir para com o debate sobre questões como a diversidadenas organizações, as oportunidades de trabalho, as expectativas e ainserção da raça negra no mercado de trabalho. Pelas estatísticas oficiaisos negros (pretos e pardos) representam 47% da população totalbrasileira (IBGE, 1991) e embora estejam presente culturalmente nasociedade brasileira, constituem uma categoria com graus elevadosde ausência e invisibilidade social, política e econômica. A pesquisaencontra-se em sua terceira etapa, que implica a definição da amostracom a seleção de empresas e trabalhadores a serem pesquisados. Apartir de tal escolha, passa-se ao contato com as organizações e inícioda coleta em campo e análise das variáveis influenciadoras dastrajetórias profissionais pesquisadas. Considerando-se que ainda sãopoucos os trabalhos sobre o tema, e, sobretudo na região, espera-secontribuir com informações para novos questionamentos e pesquisasna área.

1. INTRODUÇÃO

A desigualdade nas sociedades humanas pode ser considerada apartir de práticas sociais e econômicas nas quais as diferenças existentesentre indivíduos apresentam-se correlacionados com favorecimentosou prejuízos a um ou outro grupo. Assim, a formação de classes ecastas sociais e os diferentes fatores que envolvem as relações humanaslevam a considerar, dentre as variáveis, a cor da pele ou raça, a opçãosexual ou religiosa, o gênero, a origem social ou quaisquer outras“marcas” que se impõem aos indivíduos. Uma das esferas da vida naqual se torna possível mensurar os fatos da desigualdade está nomercado de trabalho, no contexto das relações estabelecidas noâmbito das organizações e mais especificamente na inclusão do negrono mercado de trabalho brasileiro.

Ao se considerar os dados apresentados em 2002, oDepartamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (DIEESE) e entidades regionais estimam a PopulaçãoTotal Nacional em 32.175 e População Negra em 14.483. Ainda

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segundo a estimativa da População Economicamente Ativa (PEA)total estima-se em 15.896 e da raça negra em 6.623. Entretanto,para este caso, percebe-se uma certa discrepância entre tais percentuaisno que diz respeito à inexpressividade de negros no mercado detrabalho nacional.

O ponto de vista histórico, a partir da hipótese de quinhentosanos do Brasil, pode-se orientar a partir de quase quatrocentos anosque foram construídos basicamente pela mão-de-obra escrava. Ouseja, para cada cinco anos de existência, quatro se devem à construçãode uma imagem histórica do trabalho a partir da escravidão, desde aeconomia colonial ao final do século XIX. O Estado brasileiro nasceucom o trabalho escravo e sua riqueza acumulada beneficiou-se, diretaou indiretamente, do trabalho dos afro-descendentes.

Essa parcela da população contribuiu para enriquecer o Brasil evivem ainda hoje a ambigüidades de conter, em parte, as mazelas dasociedade. Assim, percebe-se a desigualdade existente no mercado detrabalho brasileiro que para os negros apresenta maiores níveis dedesemprego e maior presença em postos de trabalho desqualificados,além de menores níveis de proteção e maiores graus de vulnerabilidadeno ambiente e no mercado de trabalho. Tal situação é apresentadaem dados de pesquisas de órgãos governamentais e privados, emqualquer metodologia adotada, e mostram que os negros tem umapresença inferior nas empresas brasileiras quando comparada a dosbrancos, e as oportunidades de ascensão profissional sãoreconhecidamente em menor número para os profissionais negros.

A evidência construída pela escravidão cristalizou-se na culturabrasileira como representação negativa do negro trabalhador atuandoainda como fator discriminatório no mercado de trabalho que, sendoparte integrante do sistema capitalista, emergiu politicamente com aascensão da burguesia e se consolidou como modo de produção.Como o próprio nome sugere, trata-se do espaço onde a força detrabalho se manifesta como a moeda de troca, aliás, a única que ostrabalhadores detêm. Ao longo da história moderna e contemporânea,as formas de inserção no mercado estabeleceram-se de maneiradiferenciada, especialmente no que se refere às questões de gênero,

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de faixa etária e raça. A partir destes recortes da populaçãoeconomicamente ativa, entretanto, deve-se considerar que a questãoracial se manifesta com veemência nas relações de trabalho e define-sede maneira considerável na estruturação das hierarquiasorganizacionais.

Portanto, de acordo com os dados históricos e estatísticosapresentados, não se pode considerar, integralmente, que se vive emuma democracia racial, pois os negros apresentam-se vulneravelmentediscriminados e, portanto, torna-se necessário avaliar tais aspectosque levam à discriminação. A não-privação às condições essenciais davida, dentre elas o trabalho, contribui para que uma parcela dapopulação de raça negra brasileira a ter esperança em conquistarmelhores condições de vida e desconsiderar a situação de marginalidadesocial. As condições de trabalho colocadas, em todas as situações eem especial às diversas formas de discriminação, em especial à racial,requerem posicionamento político e social, além de ações efetivas nosentido de ser enfrentado e solucionado o problema. A construçãode um futuro social paritário e igualitário a partir da incorporaçãono mercado de trabalho compreende um desafio para a busca daigualdade social no Brasil.

Assim, uma reflexão sobre a ordem da diversidade étnica procurarconcatenar uma série de idéias que partem do pressuposto de que ameta a ser atingida consiste em uma sociedade sustentável, caracterizadamodo como não-capitalista, em que a questão racial é entendida comoum fator de restrição ás atividades econômicas.

Uma das preocupações centrais deste trabalho encontra-se emrefletir sobre as perspectivas da posição do negro no mundo dotrabalho, em uma realidade na qual o acesso ao mundo do trabalhoapresenta-se demarcado por limitações ou barreiras. Para delimitar aanálise, a fase de avaliação do campo de atuação estará focalizada emum estudo na cidade de Betim, município de Minas Gerais, queapresenta uma participação significativa na arrecadação para o Estado.

Pode-se considerar, ainda, que a importância em conhecer talmercado de trabalho e as organizações de Betim consiste em umatentativa de identificar a participação do negro no mundo do trabalho,

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nas estruturas organizacionais e também o papel profissional por eledesempenhado em relação às organizações. Como base de apoio àsanálises serão utilizadas bases de dados estatísticos de instituiçõesdiversas, como fonte de dados, buscando-se traçar um paralelo entrea realidade local e a nacional, apesar da escassez de informações eestudos sobre o mercado de trabalho em Betim.

Ao final pretende-se tornar possível a construção de um perfilmínimo sobre a participação dos negros nas organizações inseridasna cidade. Tal estudo da posição do negro na sociedade busca permitirprojetar a possibilidade ou não de integração do trabalhador negrono mercado de trabalho e nas organizações e também apontarperspectivas concretas para o futuro da sua inserção no mercado detrabalho.

2. RAÇA, CLASSE, COR E ETNIA...E O CONTEXTO BRASILEIRO

A utilização do termo raça nos estudos acadêmicos constitui-seem objeto de discussões e pouco consenso entre autores das CiênciasSociais. Inicialmente, essa temática ocorre em torno da existência ounão de raças humanas que, para os biólogos, não se justifica aconstrução e utilização do termo raça, visto que não existem raçashumanas. Assim, diferenças fenotípicas, intelectuais, morais e culturaisentre indivíduos ocorrem em virtude de construções socioculturais,fora do campo biológico. Ou seja, os fenótipos ganham significado apartir de crenças e valores (Souza e Teodósio, 2005).

Em 1951 a UNESCO publicou uma declaração buscandodefinir o conceito de raça. Considerou-se então que os critérios declassificação podem legitimamente variar de acordo com “o objetivocientífico” que se tem em vista, que não há um caráter físico único –por exemplo, a cor da pele – que possa distinguir um grupo racial deoutro. Afirma-se também que não há evidência da existência daschamadas “raças puras” e que a hibridização tem ocorrido ao longoda história da humanidade, sendo responsável pelo surgimento ouabsorção de raças.

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O termo raça pode ser considerado, também, uma variávelexplicativa fundamental na reprodução da desigualdade social no Brasilque, assim como no conjunto da América Latina, tende a envolver ascaracterísticas fenotípicas e socioeconômicas dos indivíduos. Ocálculo racial brasileiro é influenciado pelo contexto social e apresentacerta ambigüidade referencial (Hansebalg et al, 1999) e as discrepânciasencontradas entre a ascendência biológica e a classificação racialmostram que no Brasil “a classificação racial se baseia principalmentena aparência” (Telles, 2002, p. 120).

Segundo Fernandes (1965), o conceito de raça, no Brasil, estariarapidamente se transformando em uma sociedade de classes e aestratificação por raça era uma herança do passado colonial quepersistia mas que seria aos poucos substituída por discriminações declasse. Embora a raça não seja absolutamente pertinente paraestabelecer diferenças, por exemplo, nas ciências biológicas, paraAzeredo (1991) tal conceito se destaca e continua a ser utilizado comoforma privilegiada de diferenciar culturas, línguas, crenças e grupos,os quais, na maioria das vezes, têm também interesses econômicosfundamentalmente diferentes. Outra discussão presente no debatedas relações étnicas compreende a substituição do termo raça por etnia.

Entende-se por etnicidade as diferenças culturais observada entreos indivíduos. Ao contrário da raça, a etnia é socialmente capaz dealterar comportamentos (Eriksen, 1983). Entretanto, o que torna otermo preocupante, para Sodré (1999), consiste em caracterizar asetnizações como fatores de controle das demandas e contradiçõessociais por parte dos grupos dirigentes, tratando-se assim de umapluralidade de mão única na qual os diversos grupos teriam o papelde cumpridores de normas e executores de modelos. Ainda segundoSantos (1997), a idéia de raça perde cada vez mais força no campo dasciências e a idéia de etnia deverá prevalecer sobre ela. Um grupo étnicopossui sentido de união e pertinência, pois compartilha a mesmacultura, história e valores.

Se considerar o Brasil Colonial, tem-se em seu contexto acondição de escravo estreitamente ligada à cor dos indivíduos.Passando à Itapetininga do fim dos anos 1940, Nogueira (1998)

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observa como muitos dos mulatos e dos pardos em posições dedestaque na estrutura social da cidade eram descendentes de, ou erameles mesmos, filhos da elite branca, o que lhes franqueou de algummodo à ascensão, a despeito da cor. A comunidade reconhecia-sedividida em três classes: alta, média e baixa – e, como nos demaisestudos, os pretos e os pardos encontravam-se sobre representadosna classe baixa. Isso era um sinal de que a cor era fator importante nadeterminação do status e das oportunidades de ascensão social.

Deve-se destacar, ainda, que no Brasil o ex-escravo é transformadoem negro, racial e biologicamente definido como inferior aos brancos,depois da abolição, quando o termo passa a ser usado na literaturaespecializada ao invés de preto. Uma visão diferente daquela em quea categoria negro passa a ser mais empregada na segunda metade doséculo XIX para designar o escravo rebelde, fujão (Schwarcz, 1987).

Pode-se atualmente, no Brasil, considerar a cor da pele comoapenas um dos elementos indicadores do grupo de afro-descendentes,já que a histórica miscigenação brasileira confere afro-descendênciaaté aos que não mais apresentam a cor negra ou parda (Souza eTeodósio, 2005). Assim, as discussões em torno da cor surgem apartir das análises acerca de levantamentos de dados sobre cor/raça/etnia da população. A coleta de informações sobre a cor da populaçãorealiza-se desde 1872 e a autoclassificação nesse quesito implicou que,na Pesquisa Nacional por Domicílios (PNAD) de 1976, houvesse 135registros diferenciados de cor. Apesar dessa grande variação, as respostasse concentravam em torno de sete formas de classificação: branca,preta, parda, amarela, morena clara, morena e clara.

O censo brasileiro de 1960 apresentou uma pré-codificação,estabelecendo cinco possíveis respostas: branca, preta, amarela, pardae índia. Da mesma forma que o censo anterior, todos aqueles que seautodeclarassem morenos, mulatos ou caboclos eram classificadosem pardos. Em 1980, o quesito cor foi apresentado ao respondentecom quatro classificações: branca, preta, parda e amarela e em 1991no IBGE a variável cor foi coletada, mas os únicos dados divulgadosreferiam-se a valores absolutos e percentuais de cada subpopulação.

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Torna-se importante registrar que a metodologia atual do IBGEutiliza a autoclassificação – branca, preta, parda, amarela, indígena –à pergunta que se refere à cor ou raça. Tal processo, ainda que comcríticas, geralmente é considerado aceito devendo-se avançar no debateacerca das políticas públicas e, por exemplo, no campo da discussãodas ações afirmativas.

Assim, conforme apresenta Nobles (1995), os censos derivamum poder de resultados baseado em duas fontes: às reivindicações deprocessos estatísticos isentos que permitem um acesso a dados quereproduzem a verdade e ao conhecimento verdadeiro de imperativospolíticos que apresentam números que devem ser produzidos. Masao se considerar as condições sociais e as oportunidades nos diversoscampos da vida humana, para os pretos, ou negros, ou qualquerhomem, não importa o tom da pele, mais clara ou escura, e sim a suacondição de igualdade ou desigualdade na sociedade.

Entretanto, Silva (2001) afirma que a classificação de cor revelaquestões importantes para as relações étnicas no Brasil. Evidenciaque, no país, a autodefinição pode apresentar significados diferentes,desde uma forma de falar sobre a identidade e a cultura, ao de marcardiferenças ou escondê-las, além de definir um tipo de classificação econstrução social.

Para o presente trabalho, utiliza-se o termo negro para caracterizara parcela da população que é de cor preta e também para fazer alusãoao grande número de mestiços que, dependendo do contexto, podemser “tanto pretos quanto brancos”. Quanto aos aspectos genéricos dapopulação brasileira, falar-se-á em negros, contemplando assim aspessoas de cor preta e parda.

2.1. O mito da democracia racial

A busca do ideal da igualdade, sem, entretanto, oreconhecimento do óbice que representam as desigualdadesestruturadas, acarreta a reprodução das diferenças, que se naturalizam,e o deslocamento da culpa da desvantagem para os ombros das vítimas,individualizando os resultados de processos macrossociais que se

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encontram fora da esfera de ação dos atores. Tratar os desiguais comose iguais fossem perpetua as diferenças, pois declarar a igualdade nãoé suficiente para reverter à orientação das estruturas sociais queproduzem desigualdades (Osório, 2006).

O tema da igualdade social, e se utilizado o termo democraciaracial, constitui-se em fator especialmente problemático no Brasil,país “multirracial e miscigenado”, em que se tem uma “sociedadealtamente hierarquizada desde a colonização... e uma profundadesigualdade [que] fundamenta o sistema em relação aos negros,principalmente no mercado de trabalho” (Carneiro, 2000).Caracteriza, ainda, uma resistência social e de discussão em torno aotema se considerar que a questão racial no Brasil pode ser atribuídaem parte ao racismo que permeia as interações sociais brasileiras.Existe uma

engenharia de igualdade no plano legal e a exclusãoabsoluta no plano das relações concretas, acobertadado mito da democracia racial”. Segundo ela, esta “éa forma mais perversa que existe no sentido de tirara questão racial do plano político,é um temaabsolutamente despolitizado. (Carneiro, 2000, p. 65)

Tal fato teria produzido o problema de baixa auto-estima daspessoas negras, que tem de ser enfrentado, através de interações viapolíticas públicas, meios de comunicação e uma revisão profunda nonosso sistema de educação. Por outro lado, Correa (2002) argumentaque é necessário prestar atenção à complexidade da questão racial,pois para uma análise a considerar tal variável deve-se levar em contaas transformações sociais, as relações sociais e as contribuições sociaisque afetam as interpretações acerca dos indivíduos e a respectiva“classificação ética” ou classificação social.

Nesse sentido, o trabalho de Foucault (1979), procura entenderas relações que possibilitem lutar contra a “submissão dasubjetividade” e propõe uma visão do sujeito que abre caminhospara se pensar sobre as possibilidades de mudança. Permite a

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proposição de novas perspectivas para se entender a noção deposicionamento que pode ser considerada sob a perspectiva dotrabalho a partir de forma ou instrumento para geração de mudançado negro em relação ao mercado de trabalho. O autor consideraainda que o intelectual é “alguém que ocupa uma posição específica”,de acordo com sua classe social, suas condições de vida e de acordocom “a política de verdade na sociedade contemporâneas” (p. 208-26).

Portanto, o espaço do político, segundo Costa (1989), torna-se“frágil e sua existência e permanência dependem de nossa ação e denossos discursos” (p. 151-79). Assim, uma das grandes dificuldadespara o enfrentamento das práticas discriminatórias no trabalho refere-se ao fato de estas práticas não serem assumidas culturalmente pelasociedade brasileira.

Buarque de Holanda (1994) afirma que o brasileiro está distantede ter uma noção ritualista da vida, sendo cordial e colocando sempreo privado acima do coletivo, mas adverte que “seria engano suporque essas virtudes possam significar ‘boas maneiras’, civilidade”(p.107)... “a palavra ‘cordial’ há de ser tomada, neste caso, em seusentido exato e estritamente etimológico” (p.106). Essa cordialidade“equivale a um disfarce que permitirá a cada qual preservar intactassuas sensibilidades e suas emoções”.

Assim ao se perceber a questão racial sob as perspectivas dereconhecimento de igualdades ou desigualdades sociais, de resistênciaou luta social, de construção de espaços sociais, profissionais oupolíticos ou ainda de construção de culturas tem-se uma amplitudede variáveis a se considerar que tornam o tema complexo einterrogante. Entretanto, a tendência, as vezes premente, em se negara existência do racismo, torna-se fator insustentável, principalmenteao se observar sua efetivação segundo fatos e ocorrências a partir derecentes acontecimentos internacionais, como a Organização dasNações Unidas (ONU) designou em 2001.

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2.2. A sociedade brasileira, as organizações e os negros

A segregação racial pode ser percebida como presente em váriasformas de expressão na sociedade brasileira. Ela se apresenta demaneira marcante no mercado de trabalho e se expressa a partir daeficiência de determinados mecanismos discriminatórios. Tais fatores,aparentemente objetivos, tornam-se, no mercado de trabalho,requisitos que hierarquizam as diferenças naturais entre trabalhadores/as e, no caso do Brasil, colocam os negros em desvantagem em relaçãoaos brancos. No entanto, deve-se procurar determiná-la a partir defatores explicativos e históricos ao invés de buscá-los a partir dasexplicações fáceis e óbvias.

Ao se considerar o Brasil um país multirracial e miscigenadoque durante mais de três séculos, a partir da colonização, estima-se“importou” cerca de quatro milhões de negros que foram trazidos evendidos como mercadorias para a execução do trabalho pesado,predominantemente na agricultura e mineração. Após chegarem,viviam em média sete anos, devido às condições precárias de vida esaúde às quais eram submetidos. A abolição dos escravos ocorridaem 1888 sem que houvesse uma construção social, econômica,política e de estrutura do trabalho para enfrentar o mercado laboralacarretou em grande escala em desemprego, subdesemprego emarginalidade da população negra. Segundo Ianni (1978), a aboliçãoconstituiu-se em um ato da população branca como forma de “superara imensa organização da repressão”. Entretanto, com a aboliçãoresolveu-se um problema dos brancos, sem um projeto de integraçãodos negros na sociedade.

Sendo assim, a cor preta sempre foi associada à posição inferior– social, econômica, intelectual – pois significa nascer em famílias debaixa posição social. Hansebalg (1979) mostra que, após mais de trêsséculos de escravidão, na época da Abolição, a grande maioria dapopulação negra estava fora da região onde uma sociedade urbana eindustrial se formava. O autor considera o elemento negro marginalà sociedade “branca” e, para se integrar a ela, buscou realizar o “idealdo branqueamento”, ou seja, assemelhar-se ao branco ou ir perdendo

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sua cor, transformando o grupo de origem em um grupo de referêncianegativa. Tal fato, refletiu-se na sociedade brasileira ao ocorrer a decisãoeconômica por raça, em que predominavam sujeitos brancos comoproprietários e/ou administradores e os negros como trabalhadoresessencialmente rurais. Assim, o trabalho qualificado, intelectual, eraexercido pela minoria branca, o negro se ocupava do trabalho não-qualificado, braçal. O setor intermediário de trabalhadoresespecializados, artesão etc. foi sendo ocupado pelos pardos, que, emmuitos casos, tinham sido escravos e, por causa da alforria, conseguiamestes empregos pela maior proximidade e tolerância de seus patrõesbrancos no que diz respeito à cor. Apesar de o sistema escravocratater sido abolido há mais de cem anos, esta divisão entre o trabalhomanual e intelectual ainda persiste em nossos dias de forma significativaatingindo, sobretudo, os negros (Moura, 1988).

Segundo os dados levantados pelo PNUD pelo sociólogo RafaelGuerreiro Osório, do Centro Internacional de Pobreza, tal diferençatem raízes no mercado de trabalho no qual, em média, os trabalhadoresbrancos ganham 3,8 salários mínimos por mês e os negros recebempouco mais que a metade, aproximadamente 2 salários mínimos pormês. Essa discrepância salarial, que na média fica em 90%, variabastante de Estado para Estado. Na Bahia, por exemplo, osrendimentos da população branca são 124% maiores que a da negra,enquanto que em Roraima a distância é de 8,7%.

Apesar de as taxas de desemprego oscilarem bastante entre 1992e 2003, os índices desagregados por cor/raça e gênero sempre estiveramna mesma ordem, com as mulheres negras sendo as mais afetadas —grupo em que o percentual de desempregadas só ficou abaixo de doisdígitos de 1992 a 1995. Em contrapartida, os menos prejudicadospela falta de postos de trabalho são os homens brancos — cujoindicador nunca superou 8%. No período analisado a taxa para apopulação negra foi, em média, 23% superior à da população branca,segundo o relatório do PNUD.

A partir de uma análise em relação às empresas, o relatório doInstituto Ethos revela, também, que o retorno de educação é menorpara os negros e que estes enfrentam mais barreiras para a promoção.

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Para cada ano de estudo a mais, os brancos têm sua renda elevada em1,25 salário mínimo, enquanto para os negros essa elevação é de 0,53salário mínimo. Tem-se ainda que a maioria dos negros dos quadrosexecutivos das organizações (53,8%) tem mais de quinze anos deempresa; somente 37,4% dos executivos brancos e 29,7% dosamarelos estão nessa mesma condição. Este fato pode ser interpretadoa partir das escassas oportunidades em que os negros atingem o topoda estrutura hierárquica das organizações. Além disso, eles demorarammais tempo para consegui-lo que os executivos de outras etnias. OInstituto Ethos também solicitou, em pesquisas, que o presidenteopinasse acerca da situação dos negros em cada nível hierárquico dasrespectivas empresas. Em 74% delas não há negros no quadro executivo(primeiro escalão) e 4% não têm essa informação. Observa-se tambémum alto índice de empresários que declaram não haver negros emnível de gerência (42%, segundo escalão); e 1% deles admitiu quenão há negros nem mesmo no quadro funcional.

Assim, a situação descrita pelos relatórios anteriormenteapresentados leva a questões de reflexão que se acercam às dediscriminação ou mesmo de exceção em relação à caracterização daraça negra em posições de destaque na hierarquia gerencial dasorganizações. O que se deve ressaltar, entretanto, refere-se ásexpectativas não correspondidas com relação às oportunidades detrabalho e de ascensão profissional e social da classe negra e porquenão trabalhadora em geral no que se refere às condições sociais, desdeaquelas relacionadas à vida pessoal e privada às condicionantes dasrelações sociais, profissionais e político-econômicas.

2.3. As relações raciais e as expectativas nas organizações

As relações sociais observadas sob a perspectiva da realidadebrasileira e em função do “pensamento social brasileiro” apresentam-se caracterizadas por Rosemberg (1997) em três grandes correntes: aprimeira, ligada a Freyre (1994), parte da referência da democraciaracial, e explica as desigualdades a partir da supremacia dos brancossobre os negros; a segunda, liderada por Fernandes (1965), evidencia

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a profunda desigualdade entre os segmentos branco e negro dapopulação e interpreta as relações raciais como provenientes do regimeda escravidão, tratando-as como incompatíveis com a nova ordemsocial, numa sociedade de classes, portanto, competitiva. Emborareconheça a discriminação racial, postula que esta tenderia adesaparecer com o desenvolvimento da industrialização; e a terceira,representada por Hansebalg (1979, 1999), analisa as articulações entreraça e classe, verificando de forma mais profunda a questão racial naanálise das desigualdades entre a população branca e negra.

Recentemente, alguns estudos apresentam críticas às duasprimeiras vertentes, em especial pelo caráter de reforçar a posiçãodesfavorável à população negra na sociedade. Mesmo considerando-se a contribuição de Florestan Fernandes para desmistificar ademocracia racial brasileira, não se pode dizer que se tenha escapadoao fortalecimento de estereótipos vigentes sobre os negros (advindosda obra de Gilberto Freire), inclusive criando outros, como o dadeformação do negro, que dificultaria sua integração à sociedade declasses. Embora a escravidão tenha envolvido dois segmentos dasociedade, a personalidade que se teria deformado no processo seriaapenas a do negro. (Bento, 1992).

Para Nogueira (1985, 1998), a discriminação efetuava-se pelaexclusão incondicional dos membros do grupo discriminado, opassado histórico do Brasil de Freyre e o presente com mestiços epretos, ainda que em pequena escala, nos estratos mais altos dasociedade, eram tidos como evidências da ausência de barreiras raciaisà mobilidade ascendente.

A existência de barreiras raciais nos processos de mobilidadesocial demonstram-se de formas triviais, desde a maior pobreza dosnegros à utilizada na defesa de um Brasil racialmente democrático ese provam insustentáveis. A nova teoria, baseada na idéia deacumulação inter e intrageracional das desvantagens causadas por nãoser branco no Brasil, mostrou a inadequação das explicações antigase provou dar conta das evidências tendo certo poder preditivo, sendoque até o presente momento, permanece sem qualquer teoriaconcorrente que a contradiga. A despeito do prognóstico otimista,

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Wagley (1952), a exemplo de Pierson (1945), alerta para o fato deque o progressivo aumento da competição, dos negros com os brancos,pelos canais de ascensão social, poderia levar à irrupção ou aoacirramento de tensões raciais.

Ao longo do século XX o Brasil conheceu um extraordinárioprocesso de crescimento; sua economia se industrializou e semodernizou, mas seu mercado de trabalho manteve-se fortementeseletivo para os negros. Durante muito tempo houve, por parte dosestudiosos sobre a situação do negro no Brasil, a expectativa otimistade que haveria uma incorporação paulatina da população negra aomercado de trabalho, á medida que o processo de industrializaçãodo país fosse se desenrolando. No entanto essa expectativa não seconfirmou.

No final dos anos 70, Hansebalg (1979) baseado em estatísticaoficiais, mostrou que a posição dos negros no mercado de trabalhoera mais desfavorável que a dos brancos nas mesmas condições. Oracismo revelava-se, desta forma, como um traço característico domercado de trabalho brasileiro e os negros estavam sujeitos a “umadesqualificação peculiar e desvantagens competitivas” querelacionavam-se à condição racial, indicando, com isso, que nomercado de trabalho brasileiro, independentemente de qualqueroutra qualidade, ser branco representava, por si só, uma vantagem nadisputa por um espaço.

Assim, os estudos relacionados ao mercado de trabalho contêmem si mesmos dificuldades e polêmicas peculiares a outros camposda economia. Uma dificuldade relativa em tratar tal assunto refere-seà definição do próprio trabalho como mercadoria transacionada nomercado e que por isso teria um preço definido por sua oferta edemanda. Segundo uma ótica mais estreita e pragmática, a importânciafundamental do mercado reside no fato de ser o local onde osindivíduos transacionam, aos preços assim determinados, o seuprincipal – e, na maioria das vezes, único – ativo, que é a suacapacidade laboral. Daí a importância desse mercado para assuntosligados a pobreza, eqüidade e bem-estar.

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Entretanto, não se pode perder de vista que além do aspecto denatureza econômica, o mercado de trabalho é antes de tudo um espaçode socialização do indivíduo. O trabalho tem em sua essência umvalor social que o acompanha desde as sociedades humanas menoscomplexas até o mundo atual. As profundas transformações verificadasno mundo da produção, sobretudo como surgimento damicroeletrônica e da revolução dos computadores, resultam por tornartal mercado ainda mais excludente, na medida em que modifica demodo significativo, o perfil do trabalhador, elevando as diversasexigências da força de trabalho.

Em termos quantitativos e estatisticamente, a exclusão existenteno mundo do trabalho também se dá no sistema educacional. Dos28.234.039 estudantes do ensino fundamental, 52,0 %são brancos,43,1% são pardos e 4,5%, pretos. No ensino médio, que tem3.760.935 alunos, as proporções correspondentes são 65,3%, 30,1%e 3,3%, para brancos, pardos e pretos, respectivamente, e, cursandoo ensino superior, existem 1.665.982 estudantes, sendo 78,6% delesbrancos, 17,4% de pardos e 1,4% de pretos, dados obtidos peloIBGE, em “Estatísticas do século XX”, tema ”Educação”. Assim,alguns estudiosos têm buscado dar visibilidade à situação da populaçãonegra no sistema educacional, nos seus diversos estágios.

Em diferentes pontos do país, estudos têm privilegiado aarticulação entre raça e educação em perspectivas diversas: desde odimensionamento das desigualdades entre negros e brancos ao acessoàs oportunidades educacionais; outros contemplam a análise dosmecanismos de discriminação racial presentes no interior da escola,investigam os preconceitos e estereótipos veiculados pelo livrodidático; denunciam o tratamento racialmente desigual no cotidianoescolar ou a exclusão de temas relativos à história e à cultura negrasdo currículo escolar.

Essas análises mostram que as condições da educação do negroresultam por reforçar a sua história de exclusão, seja porque oimpedem de ter acesso a graus mais elevados de escolarização, sejapor comprometer o processo de constituição da sua identidade. Noentanto, esse não é o único obstáculo para os estudantes negros.

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Outras condições materiais, aliadas à discriminação e ao preconceito,atuam sobre o estudante negro, em momentos de disputa como aque caracteriza o vestibular, comprometendo o seu desempenho. Porum lado, a condição de pobreza que atinge significativa parcela doseu grupo racial determina que o estudante negro necessite assumirmais cedo as responsabilidades com a própria sobrevivência, ou atémesmo com a sobrevivência de familiares, levando-o a regular suasexpectativas. Nesse quadro, os graus de escolaridade passam a assumiruma posição de forte centralidade no mercado de trabalho,constituindo-se em uma barreira adicional para os negros, para osquais o acesso e permanência representam problemas a se considerar.

Assim, as análises realizadas sobre o mercado de trabalho têmsinalizado para um aspecto discriminatório para a população negracom relação à escolaridade, demonstra que somente a escolaridadesuperior é capaz de igualar as oportunidades de negros e brancos deinserir-se no mercado de trabalho em igualdade de condições, o queevidencia o quanto a universidade é um espaço estratégico para ainserção do jovem negro no mercado de trabalho (Santos, 2000).

Sob o ponto de vista dos teóricos da modernização, Fernandes(2002) afirma que a expansão educacional seria apenas uma respostaàs exigências da modernidade, mas teria como conseqüência umaelevação nos níveis de qualificação, transformando o processoeducacional em uma competição estritamente meritocrática. Odesenvolvimento gradual da educação contribuiria para selecionarsempre os mais aptos, a partir de uma seleção “social” natural. Estetipo de conclusão é fortemente influenciado pelo processo atual deaumento da oferta do ensino médio e fundamental ocorrido,principalmente, nas últimas décadas no Brasil. Assim, na medida emque as sociedades tornam-se mais industrializadas o alcanceeducacional das crianças tende a igualar-se até o nível secundário,ainda que os pais tenham condições socioeconômicas diferentes.

Assim, a igualdade não pode ser alcançada apenas pormodificações “naturais” no sistema capitalista de produção, postoque no capitalismo moderno várias características geradoras dediscriminação, como raça e gênero, são utilizadas para reforçar

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diferenciações estruturais. Para o caso brasileiro, raça torna-se umdeterminante da estratificação educacional que não apresenta padrõesdecrescentes, ou seja, as transformações socioeconômicas provocadaspelo processo de industrialização não diminuíram os efeitos da raça.

Dessa maneira, percebe-se que as ações e processos a seremdesenvolvidos para minimizar as condições sociais vigentes e determinarmenores níveis de desigualdade ou propor mais possibilidades deigualdade social passam por políticas públicas e sociais. Semoportunidades torna-se difícil a promoção da igualdade racial no quese refere ao acesso às oportunidades sociais. No caso da sociedadebrasileira, as desigualdades sociais são perpetuadas como resultadodas relações de raça e se refletem nas questões pessoais e profissionais,desde a desigualdade de oportunidades para o nível superior dosistema educacional às de gestão e gerência nas organizações(Fernandes, 2002).

3. PERSPECTIVAS PARA A POPULAÇÃO NEGRA:AÇÕES AFIRMATIVAS

A construção de um futuro social paritário e igualitário a partirda incorporação no mercado de trabalho compreende um desafiopara a busca da igualdade social no Brasil. Por sua complexidade,não se pode resumir a reivindicações dos movimentos sociais emrelação ao Estado, nem ao conflito entre o capital e o trabalho. Deve-se estabelecer algo mais a partir de uma ampla negociação social, daqual participem movimentos sociais, partidos políticos, sindicatos,associações patronais, administrações públicas, que pactue umacláusula de inclusão racial em novo contrato social no Brasil.

Para modificar a situação de desigualdade existente são necessáriasestratégias voltadas especificamente para promover o grupo que seencontra em desvantagem, no caso, o negro. Essas estratégias sãoconhecidas pela denominação de ações afirmativas, que compreendemmedidas ou programas voltados para promover oportunidades oubenefícios para pessoas e grupos específicos (raciais, étnicos, sexuais,religiosos, entre outros), como compensação por discriminação sofrida.

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Entretanto, o debate público sobre o racismo ainda se revestede um grande tabu na sociedade brasileira que dificulta processos dediscussões sobre os problemas a serem enfrentados por meio depolíticas públicas específicas, às chamadas “ações afirmativas”. Parautilizar um exemplo de ação afirmativa na área de educação, pode-serecorrer à Lei do Boi, Lei nº. 5.465/68 que privilegia em seu conteúdoum determinado segmento da população. Nela, os estabelecimentosde ensino agrícola e as escolas superiores de Agricultura e Veterinária,mantidos pela União, reservarão anualmente, de preferência, 50%(cinqüenta por cento) de suas vagas a candidatos agricultores ou filhosdestes, proprietários ou não terras, que residem com sua família nazona rural, e 30% (trinta por cento) a agricultores ou filho destes,proprietários ou não de terras, que residem em cidades ou vilas quenão possuam estabelecimentos de ensino (Gomes e Martins, 2004).Além dessa prática de ação afirmativa na esfera educacional tambémhouve outras experiências no mundo do trabalho brasileiro como achamada Lei dos Dois Terços no período Vargas que destinava aostrabalhadores nacionais 2/3 (dois terços) das contratações em empresasinstaladas no país, além de políticas específicas para implantação deempresas em diferentes regiões do Brasil como a Nordeste (PólosPetroquímicos) e a Norte (Zonas Francas). Guardadas as devidasproporções pode-se dizer que essas leis foram uma iniciativa damodalidade de cotas, contudo, privilegiando outro segmento social.

Com relação ao debate brasileiro sobre as relações raciais noensino superior tem-se que a idéia de implementação de cotas nasuniversidades constitui-se no processo em discussão mais evidenciado,mas que não pode alijar a idéia mais ampla de Ações Afirmativas queconsiste no cerne da questão. Outros debates relacionados definemque a “ação afirmativa não é sinônimo de cotas”, sendo que estas nãosão a única, mas uma das estratégias das ações afirmativas (...) não sãouma fonte de discriminação, mas veículo para remover os efeitos dadiscriminação. As ações afirmativas constituem-se em propostas deiniciativas que visem despertar, formar e consolidar atitudes queestejam pautadas pelos princípios da igualdade de oportunidades nosseus mais diversos campos, sejam eles, pessoais ou profissionais,material ou imaterial, físico ou psíquico (Cappellin, 2000).

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Atualmente, duas novas propostas de lei que prometem avançosna promoção da inclusão estão no Legislativo à espera de aprovação:o Estatuto da Igualdade Racial e o Estatuto da Pessoa com Deficiência.Ambos garantem a adoção de políticas públicas específicas para aspessoas os indígenas, para os afro-brasileiros e para as pessoas comdeficiência, propostas de lei, do senador Paulo Paim (PT-RS). Outrasgarantias previstas nos documentos são políticas de cota nasuniversidades, no trabalho e na mídia. Para o senador, a criação desecretarias especiais também é um importante passo na luta pelaampliação dos direitos, pois esses órgãos são espaços de interlocuçãoentre a vontade dos brasileiros e o governo. É a diversidade que permiteuma ética da diferença, um sistema integração.

4. SOCIEDADE E MULTIETNICIDADE: RESPONSABILIDADE

SOCIAL EMPRESARIAL E A DIVERSIDADE

A futura competitividade de um país pode ser entendida a partirde uma imersão voltada para um processo de construção de umasociedade sustentável que está diretamente relacionado ao grau deradicalização da cidadania. Em última instância, significa a construçãode uma nova sociabilidade, caracterizada por relações sociais maisigualitárias. Certamente, outra característica dessa sociedade consistena redistribuição dos recursos e da produção tanto entre a geraçãoatual como entre esta e as seguintes, pois se sabe que tanto aconcentração de riqueza como a pobreza generalizada destroem odesenvolvimento social. (Viana e Diniz, 2001).

Em um país como o Brasil, com graus elevados em relação aosproblemas sociais e raciais, não se pode descartar dos papéis delegadosàs empresas, principalmente àqueles relacionados á responsabilidadesocial, o combate aos processos que levam à discriminação, princi-palmente quando levados à questão de gênero. A construção deoportunidades e sustentabilidade passa pelas questões do trabalho ede igualdade.

Com relação ao mercado de trabalho tem-se a presença de umapopulação ativa diversificada em termos de seus traços constitutivos,

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valores e modos de vida; em relação ás aspirações e à concepção demundo. As políticas de diversidade, neste contexto, têm por objetoadotar iniciativas, medidas e ações que compreendam, diferenciem eproporcionem a construção de valores positivos. Deve-se buscarprocessos de integração social aliados ao desenvolvimento dascomunidades, das empresas e das pessoas, além da igualdade deoportunidades, tanto pessoais como profissionais e a democratizaçãodo mercado de trabalho. (Alexim, 1999).

O combate à discriminação e a redução da desigualdade sãoduas das justificativas citadas pelas empresas por lançarem iniciativasde diversidade. Tais processos podem ser divididos em duas categorias:a ética e a vantagem competitiva, ou seja, há uma possibilidade de sepensar na promoção de diversidade a serviço de interesses econômicose sociais. Essas duas dimensões – uma baseada nos valores da cidadaniae outra na estratégia empresarial – são um reflexo do fato de que asempresas constituem-se tanto em instituições econômicas comoinstituições sociais que têm um impacto profundo nas comunidadesonde estão inseridas. O ambiente de trabalho, seus projetos, suasrelações e suas políticas de contratação oferece oportunidades únicaspara se tratar de temas como a diversidade e a inclusão; as inúmerasvantagens e sinergias que um ambiente diversificado traz para odesempenho da empresa e da sociedade são praticamente inexploradas(Carneiro, 2000).

Por um lado, a promoção da diversidade faz parte deresponsabilidade social empresarial. Segundo o Instituto Ethos(2000), a responsabilidade social empresarial constitui-se em umaforma de conduzir os negócios de tal maneira que as empresas tornam-se parceiras e co-responsáveis pelo desenvolvimento social. Aresponsabilidade social visa a uma sociedade mais próspera e justa eenvolve ações das empresas contra a pobreza e a desigualdade na própriarealização dos negócios, sendo que a ética compreende uma das basesda responsabilidade social e se expressa por meio dos princípios evalores adotados pela organização que passam pelo respeito às pessoase ao indivíduo.

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É importante notar que a promoção da diversidade e o combateà discriminação constituem-se em fatores complementares no processode construção da igualdade de oportunidades no mundo do trabalho.Assim, as estratégias organizacionais em atingir fatores como ética ecompetitividade passam por questões como a construção deoportunidades e a desmontagem de pré-conceitos ou preconceitos.

Estas questões situam-se em debates e práticas que procuramgarantir os direitos humanos que estão contidos na ConstituiçãoFederal brasileira no que se refere à igualdade de oportunidades e dedireitos e deveres de todos os cidadãos brasileiros. Entretanto, o quemuitos utilizam como argumento contrário às políticas afirmativas eque consta no relatório do PNUD, refere-se ao princípio dauniversalidade se trata dos objetivos finais das políticas públicas e omotivo pelo qual elas devem ser implementadas. “Isso não significaque os meios para atingi-los devam ser necessariamente iguais paratodos”, observa o relatório.

As políticas de ação afirmativa são não apenas recomendáveis,mas necessárias para que o Brasil consiga reverter a desigualdade racial.No curto e médio prazo, as ações afirmativas podem aumentar adiversidade e a representatividade dos grupos minoritários em diversossetores. Os resultados destas iniciativas, no entanto, somenteproduzem resultados a longo prazo, necessitando de desenvolver eadotar políticas de inserção do negro e demais grupos marginalizadosno mercado de trabalho de modo a quebrar a exclusão e pobrezadesses indivíduos.

5. ASPECTOS METODOLÓGICOS

A busca por identificar e avaliar as questões que interrelacionamo negro e o mercado de trabalho apontam em direção a umacompreensão dos problemas anteriormente levantados e centrais aoprojeto de pesquisa. Entendendo-se, assim, que se trata de umapesquisa descritiva, limitada a uma pesquisa de levantamento de dadosem organizações focada no município de Betim, tratando-se, assim,de um estudo de caso.

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O município de Betim, considerado industrial e moderno,guarda também, em suas origens, a exploração da força de trabalhonegra no período escravocrata. Entretanto, a origem histórica da cidadede Betim associa-se ao ciclo do ouro da Região das Minas Gerais noinicio do século XVIII. Nesse momento histórico, ocorreu umadisputa pelo domínio dos negros africanos, personagens da exploraçãomineral que se implantou na referida região. Mas a história econômicada cidade passou por muitas fases distintas (Pinto, 1996).

O Município fica a 30 km da capital mineira e pode serconsiderado um dos principais pólos de concentração industrial doEstado de Minas Gerais. Segundo dados, a população do municípiode Betim tem crescido em média 7,85% ao ano – taxa muito superiorà da população da Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH(2,09%) e de Minas Gerais (1,15%). A cidade tem importânciaeconômica visto que a arrecadação e a participação do município noPIB, em 2002, atingiram valores de R$ 11.052.646.000,00.

Pode-se considerar, desta maneira, a importância em conheceresse mercado de trabalho e as organizações do município de Betim/MG, além de identificar, analisar e mapear as trajetórias e asexpectativas dos negros em relação à trajetória profissional e dotrabalho. Uma das contribuições consiste, assim, em incrementar asanálises e o debate existentes sobre a questão da diversidade nasorganizações, as oportunidades de trabalho, as expectativas e a inserçãoda raça negra no mercado de trabalho. O estudo pretende entãoavaliar e propor uma visão acerca da atual posição do negro nasociedade e no mundo do trabalho betinenses, além de projetar apossibilidade ou não de integração do trabalhador negro no mercadode trabalho e nas organizações e, também, apontar perspectivasconcretas para o futuro da inserção desta comunidade no mercadode trabalho.

A pesquisa baseada em estudo de caso consiste em umainvestigação detalhada, por meio da coleta de dados durante umperíodo de tempo, de um ou mais organizações ou grupos deorganizações, com o objetivo de prover uma análise do contexto eprocessos envolvidos no fenômeno em estudo.

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Tal proposta de pesquisa, a partir do estudo de caso e de acordocom Gil (1999) caracteriza-se por buscar a investigação de fenômenose contextos segundo situações definidas a partir de certas evidências eque não apresentam uma homogeneidade quanto a critérios e análisesse realizados comparativamente a outras situações, podendo serutilizado tanto em pesquisas exploratórias quanto descritivas eexplicativas.

Desta maneira, para a proposta de pesquisa, o estudo de casomostra-se uma alternativa metodológica bastante apropriada e porser uma estratégia de pesquisa que abrange a lógica de planejamento,evidenciando a coleta e a análise de dados, caracterizando-se comoum processo global e não como sendo uma tática para coleta dedados.

O universo da pesquisa corresponde à população economica-mente ativa (PEA) negra no município de Betim e a partir dessainformação, serão escolhidos os grupos que compreenderão a amostra.Procurar-se-á adequar tal escolha em função das organizações e dossetores para a coleta dos dados, que inicialmente define-se pelo critérioprobabilístico estratificado, podendo ser proporcional ou não aogrupo da população (Vergara, 2005). Por tratar de uma pesquisa emdesenvolvimento, a etapa da coleta de dados encontra-se em andamento.

Para a coleta e análise dos dados, será utilizada uma metodologiamúltipla conhecida como triangulação, detectando tanto a dimensãomanifesta quanto a não manifesta de um fenômeno social. A seguirestão relacionados os instrumentos de coleta de dados pretendidos:a pesquisa documental, a entrevista pessoal, a aplicação dequestionário e a observação participante.

No entanto, apesar de conhecer as restrições dos critérios deauto-identificação na coleta de informações quanto ao pertencimentoracial utilizados pelo IBGE (preto, branco, amarelo, indígena), seráutilizada tal escala por restringir as opções de respostas disponíveis aapenas três categorias (brancos, negros e amarelos). Ao agrupar pretose pardos na categoria negros, os indígenas e os asiáticos na categoriaamarelos, procederemos intencionalmente, a fim de verificar osimpactos de tal procedimento.

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A partir da adoção destes instrumentos têm-se como objetivosespecíficos a serem cumpridos:– O levantamento de dados sobre o mercado de trabalho em Betim

quanto ao número total da PEA, número de trabalhadores negrose sua localização: dados estatísticos;

– O levantamento da proporção de trabalhadores negros nasorganizações selecionadas: relatórios organizacionais (RAIS -Relatório Anual de Informações Sociais, do Ministério do Trabalhoe Emprego e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE));

– A identificação dos cargos, o grau de escolaridade e as faixas salariaisdos trabalhadores negros nas organizações: entrevista semi-estruturada com os responsáveis pelas áreas de Recursos Humanosnas organizações visitadas;

– A identificação das trajetórias e expectativas dos trabalhadoresnegros em cargos diretivos nas organizações: entrevista não-estruturada;

– A avaliação das expectativas e das trajetórias dos indivíduos nasorganizações pesquisadas buscando construir um mapa dasprofissões e do trabalho do negro no município de Betim.

Os dados estatísticos servirão de base para traçar um mapa dadistribuição dos trabalhadores negros por setor e por empresas nomunicípio e fornecerão as informações básicas para a escolha dasorganizações a serem visitadas. As entrevistas com os profissionais deRecursos Humanos servirão para obter informações sobre a atuaçãoda área ou setor de RH enfocando o mapeamento do trabalho negroem Betim e visando proporcionar informações necessárias paraidentificar as os indivíduos-trabalhadores negros das organizações. Asentrevistas permitem as análises referentes ás trajetórias e expectativasprofissionais, almejando-se maior profundidade, mas, cujos resultadosnão podem ser generalizados.

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6. RESULTADAS ESPERADOS

No caso deste projeto, o artigo visa apresentar os possíveisresultados acerca da finalização da pesquisa. Como a mesma encontra-se em sua terceira etapa tal fato implica na definição da amostra coma seleção de empresas e trabalhadores a serem pesquisados. A partirde tal escolha, passa-se ao contato com as organizações e início dacoleta em campo e análise das variáveis influenciadoras das trajetóriasprofissionais pesquisadas. Considerando-se que ainda são poucos ostrabalhos sobre o tema, e, sobretudo na região, espera-se contribuircom informações para novos questionamentos e pesquisas na área.

Assim, através da operacionalização dos conceitos e da seleçãoas amostra com a seleção das empresas a serem pesquisadas pretende-se construir um conjunto de variáveis e fatores que determinem umaanálise e permitam avaliar os elementos que contribuem para o atualposicionamento do grupo estudado em relação ao mercado detrabalho.

Considerando-se que ainda são poucos os trabalhos sobre otema, e, sobretudo na região, espera-se contribuir com informaçõespara novos questionamentos e pesquisas na área, com isso, torna-sepossível traçar um perfil mínimo sobre a participação dos negros nasorganizações inseridas na cidade. Assim, o estudo da posição do negrona sociedade permite projetar a possibilidade ou não de integraçãodo trabalhador negro no mercado de trabalho e nas organizações; etambém realizar em função de apontar perspectivas concretas para ofuturo da sua inserção no mercado de trabalho.

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ANÁLISE DA FORMULAÇÃO EIMPLEMENTAÇÃO DE ESTRATÉGIAS

INOVADORAS EM INSTITUIÇÕES

PRIVADAS DO ENSINO SUPERIOR

NA REGIÃO METROPOLITANA

DE BELO HORIZONTE

TÂNIA MARIA ZAMBELLI DE ALMEIDA COSTA1

MARIA LETÍCIA DUARTE BRUSCHI2

RESUMO

O presente estudo pretende descrever a gestão de algumasinstituições privadas de ensino superior na região metropolitana deBelo Horizonte, tendo como objetivo analisar a formulação eimplementação de estratégias organizacionais inovadoras. Será realizadoum estudo entre seis instituições privadas de ensino superiorconsideradas universidades e centro universitário, na regiãometropolitana de Belo Horizonte, que possuam entre vinte e cinqüentacursos de graduação. Serão pesquisadas informações para verificar se

1. Coordenadora Adjunta do Curso de Administração, Professora Universitária,Consultora Organizacional e Coach.

[email protected], www.taniazambelli.com.br

2. Professora Universitária e Consultora Organizacional.

[email protected]

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nestas instituições existem estratégias inovadoras e qual aaplicabilidade das mesmas, analisar a função gerencial dos dirigentese qual a participação deles no desenvolvimento e implementação dasestratégias. Pretende-se com esta pesquisa, verificar como as instituiçõesprivadas de ensino superior na região metropolitana de Belo Horizontecontribuem com a educação, traçando estratégias competitivas einovadoras dentro das tendências globais e verificar a existência dedirigentes visionários na área da educação.

Palavras-Chave: Instituição de Ensino Superior, Dirigentes, EstratégiasInovadoras.

ABSTRACT

The present study intends to describe how some privateuniversity from Belo Horizonte are administered, with the purposeof analyzing the way innovative corporation strategies are created andapplied. Six private universities from Belo Horizonte with the numberof graduated courses between twenty and fifty will be studied.Information will be collected in order to investigate if there areinnovative strategies and how these strategies are applied. Furthermore,the role of the managers from each university and their participationwill be also analyzed. The intention of this research is to verify howthese universities contribute to the education, if competitive andinnovative strategies are being implemented according to the globaltendency, and to investigate the existence of visionary managers insidethe education area.

Key Words: private institution, managers, innovative strategies.

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INTRODUÇÃO

O tema deste trabalho é a estratégia das instituições privadas deensino superior e tem como objetivo responder à seguinte questão:Como ocorrem a formulação e o desenvolvimento de estratégiasinovadoras em Instituições Privadas do Ensino Superior?

Esta introdução está dividida em três partes. A primeira descrevea importância da adaptação das instituições privadas de ensinosuperior à nova realidade deste mercado, a segunda discute a relevânciado estudo, enquanto a terceira apresenta os objetivos do trabalho.

1 - DESAFIOS E MUDANÇAS PARA AS INSTITUIÇÕES

PRIVADAS DE ENSINO SUPERIO

A partir da década de 90 iniciou-se um aumento crescente naprocura por cursos de ensino superior em universidades particulares.Por outro lado, segundo Barbosa (2006), para atender a esta demandareprimida, surgiram diversas instituições de ensino que, de formageral, conseguiram obter altos índices de expansão e rentabilidade.

Nos dias atuais verifica-se que a oferta se tornou excessiva, levandoas instituições a encararem a adequada estruturação da gestão donegócio como um imperativo, para manterem-se vivas e competitivasno mercado (BARBOSA, 2006).

Portanto, para sobreviver neste mercado muito concorrido, asinstituições necessitam adotar práticas inovadoras de gestão quevenham a contribuir na competitividade, eficiência e lucratividadedo negócio. Neste enfoque, é aconselhável que os dirigentes utilizemmodelos gerenciais estratégicos e inovadores, assim como o meioempresarial vem adotando.

Segundo Barbosa (2006), uma prática muito utilizada porempresas vencedoras consiste em mobilizar os esforços da organizaçãocomo um todo para o alcance de resultados positivos para aorganização. Neste contexto, a responsabilidade pelos resultados nãofica restrita à alta direção, fazendo com que todos os níveis

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hierárquicos, respeitando, obviamente, os seus limites deresponsabilidades, se comprometam com as metas e resultados daorganização.

Trazendo esta abordagem para o âmbito educacional, tanto ocoordenador acadêmico como o professor universitário, podemcontribuir de forma abrangente na instituição, buscando soluçõespara melhorar os resultados em termos de evasão e entrada de novosalunos, qualidade do ensino e aprendizado, eficácia operacional,dentre outros aspectos.

Por outro lado, de acordo com Barbosa (2006), os diretoresdevem ter uma atuação mais estratégica e em sintonia com o mercado,no sentido de identificarem novas oportunidades que possam favorecera empresa, em termos de competitividade e eficácia operacional.

De acordo com Gilberto Teixeira em seu texto Gerenciamentode Mudanças nas Instituições de Ensino Superior, toda organizaçãoé formada por pessoas, assim a falha das mudanças resulta sempre deum problema de atitudes, que quase sempre são mais nos níveismédios de administração e chefia e menos nos níveis de execução.

Ainda em seu texto Gerenciamento de Mudanças nas Instituiçõesde Ensino Superior, Gilberto Teixeira explica que, o processo demudança só pode realizar-se sob controle e direção do administrador,exigindo dele um espírito alerta e criador, para que possa preenchero vazio entre uma organização cada vez mais estagnada e um meioambiente cada vez mais dinâmico.

Para viabilizar este cenário produtivo, Barbosa (2006) explicasobre a importância do ambiente de trabalho ser agradável, que inspireconfiança e estimule a participação e inovação. Além disso, sãonecessárias políticas e iniciativas que valorizem os bons funcionáriose que os incentive a manterem um vínculo forte e de longo prazocom a instituição e a adotarem uma postura orientada para resultados.

Diante disso, por considerar importante a aplicação de modelosestratégicos pelos dirigentes na gestão educacional, pretende-se comeste projeto analisar a formulação e implementação de estratégiasinovadoras em instituições privadas do ensino superior, e para isso,serão estudadas instituições da Região Metropolitana de Belo Horizonte.

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1.1 Justificativa

O ensino superior no Brasil vem crescendo radicalmente nosúltimos anos. De acordo com Édson Nunes em seu texto MarcoRegulatório, Universidades e Mercado,

desde a década de 70 o número de alunos matriculados

em instituições de educação superior (IES) privadas

excedia os 60%, mantendo-se neste patamar, com

variações insignificantes, até 1996, quando começa

um processo de expansão que trouxe tal proporção

para a casa dos 70% em 2003. Exercício estatístico,

com base na taxa pregressa de expansão, estima que

em 2008 será ultrapassada a marca de 75% e que em

2010 a cifra se aproximará dos 80%.

Assim, diante desta realidade de mercado, uma das formas paraobter destaque no mercado é mostrar que a instituição possui umdiferencial, apesar de não ser única. Para que isso ocorra é precisotraçar estratégias inovadoras e competitivas que visem um crescimentoconsistente e sustentável.

Vive-se atualização constante, em que os negócios se realizamem maior velocidade e ininterruptamente. Assim, não basta somentea solidez financeira da instituição ou a importância do nomeinstitucional, mas também, seu potencial para gerar uma demandacontínua. Frente à expansão do ensino superior no país, em sua páginana internet, o Ministério da Educação expressa algumas razões pelasquais considera que a reforma universitária é necessária. Para esteestudo destacamos a preocupação com a “expansão desenfreada dasuniversidades privadas” e o risco da “mercantilização” da educação.

Dados do Censo da Educação Superior, realizado em 2000 peloInstituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP),mostra um universo de 1.189 instituições. De acordo com olevantamento em 2005 o número de instituições pulou para 2.165instituições de ensino superior. Observa-se que os cursos de graduação

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presenciais superaram, a casa dos 20 mil. A maior parte das matrículas,73%, ainda está no setor privado. Mesmo assim, é o setor públicoque concentra maior número de doutores, 39,6% do quadro docente,enquanto as instituições privadas contam com apenas 12,2% deles.Estes dados são considerações relevantes sobre o impacto dessecrescimento na política do funcionamento das instituições e astendências de transformação que vêm ocorrendo no ensino superiorem todo o Brasil, nos formatos organizacionais das instituiçõeseducativas. Conforme Altmann ( 2005), a “democratização” do ensinonão pode ser comentada em si mesma. Para Marilena Chauí (apudAltmann, 2005), a democratização não pode ser confundida commassificação. Segundo ela, as conseqüências da expansão do ensinosuperior são basicamente duas:

De um lado, o descrédito da universidade. A

sociedade não vai distinguir as universidades, não

vai pensar nelas como um espaço crítico e formador.

Não vai valorizá-la, se em cada esquina tem uma;

por outro lado, haverá um rebaixamento da cultura

nacional e um empobrecimento do pensamento

crítico, além de um conseqüente enfraquecimento

da pesquisa, com a dependência da pesquisa

estrangeira. Além, é claro, de um número enorme

de mão-de-obra despreparada e desempregada.

Portanto, o crescimento do ensino superior no Brasil precisaser analisado em relação a diversos fatores, bem como, levando-se emconta a variação de seus efeitos em contextos diferenciados. Nessesentido, poderíamos afirmar que nossa pesquisa realiza uma análisequalitativa parcial dos efeitos desta expansão, que será abordado nodecorrer deste projeto.

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1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo Geral

Analisar a formulação e implementação de estratégiasorganizacionais inovadoras em instituições privadas de ensino superior.

1.2.2 Objetivos específicos

- Identificar as estratégias inovadoras utilizadas nas InstituiçõesPrivadas de Ensino Superior (IES).

- Conhecer a aplicabilidade das estratégias inovadoras utilizadas.- Analisar a função gerencial dos dirigentes.- Investigar a participação dos dirigentes no desenvolvimento e

implementação das estratégias organizacionais.

2 - DISCUSSÃO TEÓRICA

Este trabalho pretende fazer uma discussão sobre as diversasabordagens sobre a estratégia empresarial, tal como proposto porWhittington (2002), e também analisar a função gerencial dosdirigentes e qual a participação deles no desenvolvimento eimplementação das estratégias organizacionais inovadoras.

2.1. As abordagens sobre as estratégias empresariais

Whittington (2002) identifica quatro diferentes abordagensacerca da estratégia empresarial: a abordagem clássica, a abordagemevolucionária, a abordagem processualista e a abordagem sistêmica.Cada uma destas abordagens tem interpretações diferentes no quediz respeito ao processo de formulação estratégica e ao objetivo daestratégia. As suposições básicas das quatro abordagens são definidaspor Whittington como:

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As abordagens clássica e evolucionária vêem a

maximização do lucro como o resultado natural do

desenvolvimento da estratégia. As abordagens

sistêmica e processual são mais pluralistas,

pressentindo outros resultados possíveis do lucro.

As abordagens também se diferenciam com respeito

aos processos. Aqui, a evolucionária se alia à

processualista ao enxergar a estratégia como algo que

emerge dos processos governados por acasos,

confusão e conservadorismo. Por outro lado, embora

diferentes quanto aos resultados, as abordagens

clássica e sistêmica concordam em que a estratégia

pode ser algo deliberado (WHITTINGTON, 2002:2).

A seguir serão discutidas cada uma destas abordagens e suasconcepções sobre o objetivo da estratégia, como elas são formuladase quem são os estrategistas. Seguindo a classificação proposta porWhittington (2002), iniciaremos nossa análise pela abordagemclássica, por ser a mais conhecida, seguida pela análise das abordagensevolucionista, processualista e, finalmente, a sistêmica. Estasabordagens irão orientar o estudo de casos, dado que elas enfatizama importância da formulação e influência das estratégias empresariais.

2.1.1. A Abordagem Clássica

A Abordagem Clássica, de acordo com Whittington (2002:2),é a mais antiga e ainda a mais influente, contando com métodos deplanejamento racional predominantes na literatura. Dentro dessaabordagem, segundo Chandler (1962:13): “Estratégia é a determinaçãodas metas e objetivos básicos e de longo prazo de uma empresa e aadoção de ações e alocação de recursos necessários para atingir essesobjetivos”.

Ainda de acordo com Whittington (2002:15), a formulação eo controle da estratégia foram estabelecidos como a principal tarefada gerência executiva, enquanto a implementação da estratégia tornou-se responsabilidade dos gerentes operacionais das divisões.

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Segundo Porter (1998:11) a essência da formulação estratégica élidar com a competição. Entretanto, tende-se a perceber a competiçãode forma muito limitada. Qualquer que seja o esforço coletivo deuma empresa, o objetivo estratégico dela é encontrar uma posiçãono setor onde ela possa melhor se defender contra as forças básicas(rivalidade, ameaças de novos entrantes, poder de barganha dosclientes, ameaça de produtos ou serviços substitutos, poder debarganha dos fornecedores) ou influenciá-las a seu favor. O esforçocoletivo das forças competitivas pode ser dolorosamente aparentepara todos os antagonistas, mas para lidar com elas o estrategista temque cavar abaixo da superfície e analisar as fontes de cada uma.

No próximo item iremos discutir a abordagem evolucionista,que como a clássica, acredita que o objetivo da estratégia é amaximização dos lucros, mas contrariamente a esta mesma abordagemnão crê na efetividade do planejamento racional dos estrategistas.

2.1.2. A Abordagem Evolucionista

A Abordagem Evolucionista, de acordo com Whittington(2002), aconselha os estrategistas a manter custos baixos e opçõesabertas. Para os evolucionistas, os mercados são muito imprevisíveise difíceis para justificar grandes investimentos em planejamentoestratégico.

Segundo Whittington (2002:2), a abordagem evolucionista seapóia na metáfora fatalista da evolução biológica, mas substitui adisciplina do mercado pela lei da selva. Whittington (2002) citaHannan e Freeman (1988) e Oliver Williamson (1991), como teóricosevolucionistas e descreve o paradoxo cruel que os evolucionistasoferecem aos estrategistas:

A natureza dinâmica, hostil e competitiva dos

mercados não apenas implica que a sobrevivência

prolongada não pode ser planejada, mas também

assegura que somente as empresas que, de algum

modo, descobrem as estratégias de maximização de

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lucro sobreviverão. Portanto, do ponto de vista

evolucionário, é o mercado e não os gerentes, que

faz as escolhas mais importantes (WHITTINGTON,

2002:4).

Em relação aos evolucionistas, Whittington (2002:5) explicaainda que eles consideram o futuro como algo muito volátil eimprevisível para ser planejado e aconselham que a melhor estratégiaé concentrar-se na maximização das chances de sobrevivência hoje.

Para Henderson (1989), o desafio para a estratégia é que muitosteóricos evolucionistas duvidam da capacidade das organizações emalcançar a diferenciação e adaptar-se de um modo deliberado esustentável. Segundo Whittington (2002:21), com base nas visõesprocessualistas sobre as dificuldades em gerenciar mudanças, osteóricos evolucionistas enfatizam a capacidade limitada das empresasem prever e reagir apropriadamente às alterações no ambiente.

Os evolucionistas, ainda de acordo com Whittington (2002:21),em geral insistem que os mercados não apenas são muito competitivospara investir em estratégias caras, como também são muitoimprevisíveis. Portanto, a estratégia pode ser uma ilusão perigosa.

No próximo item, discuti-se a abordagem processualista que,como os evolucionistas, também questiona a abordagem clássica. Paraeles, as estratégias eficazes emergem diretamente do envolvimentoíntimo com as operações diárias e as forças básicas da organização(WHITTINGTON, 2002).

2.1.3. A Abordagem Processualista

De acordo com Whittington (2002:2), os processualistas, assimcomo os evolucionários, também questionam o valor doplanejamento racional no longo prazo, enxergando a estratégia comoum processo emergente de aprendizado e adaptação. Eles dão ênfaseà natureza imperfeita da vida humana e acomodam pragmaticamentea estratégia ao processo falível tanto das organizações quanto dosmercados. Ainda segundo esse autor, para os processualistas, os

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processos das organizações e dos mercados raras vezes sãosuficientemente perfeitos tanto para o planejamento estratégicodefendido pela teoria clássica, quanto para o princípio da sobrevivênciada abordagem evolucionária. De acordo com Mintzberg (1994), naprática a estratégia emerge mais de um processo de aprendizado ecomprometimento do que de uma série racional de grandes saltospara frente.

Whittington (2002:25) afirma que para os processualistas, tantoas organizações quanto os mercados, são com freqüência umfenômeno desordenado, do qual a estratégia emerge com muitaconfusão e a passos pequenos. Na verdade, os processualistasargumentam que os gerentes devem suas estratégias e vantagenscompetitivas às imperfeições dos processos organizacionais e dosmercados. O melhor conselho da abordagem processualista é não seempenhar na busca do ideal inacessível de uma ação racional fluida,mas aceitar e trabalhar com o mundo do jeito como ele é.

De acordo com Cyert e March (1963), a necessidade de mudançaserá reconhecida apenas de modo imperfeito. Além do mais, mudançassão vistas com suspeita porque elas tendem a dar início a um períodode guerra civil interna, até que uma coalizão dominante sejaestabelecida. Assim, o comportamento estratégico tende a ficarentrincheirado nas rotinas e procedimentos-padrão de operaçãoimpostos pelas exigências políticas e limites cognitivos. Em vez deestratégias perfeitamente racionais, as organizações optamsimplesmente pela racionalidade adaptável, o ajuste gradual das rotinasquando mensagens desagradáveis provenientes de um ambientedinâmico exijam a atenção dos gerentes sobre elas.

Para Mintzberg (1998), ao se questionar uma pessoa sobre osignificado da palavra estratégia, as definições girarão em torno dealgum tipo de plano e guia, como referência para comportamentosfuturos. Portanto, estratégia é uma dessas palavras que as pessoasdefinem de um jeito e usam de forma diferente, sem perceber adiferença.

Mintzberg (1998), embora reconhecendo a importância doestrategista de pensar antecipadamente e, especialmente, a necessidade

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da visão criativa, propõe uma visão adicional para o estrategista: comoreconhecedor de padrões. Ou seja, um profissional em constanteaprendizagem, que gerencia um processo no qual estratégias e visõespodem emergir, assim como ser deliberadamente concebidas.

Mintzberg (1998), desenvolveu uma tese simples: a imagem deuma criação artesanal é a que melhor representa o processo deelaboração de uma estratégia eficaz. Para o desenvolvimento dessatese, tomou como base a experiência de um artífice (no caso, umaescultora) e a comparou com os resultados de um projeto de pesquisaque acompanhou as estratégias de várias corporações durante muitasdécadas. Ele propõe uma análise onde o artífice é visto como umaorganização de um só indivíduo e deve solucionar um dos grandesdesafios que o estrategista enfrenta: conhecer as capacidades daorganização o suficiente para pensar profundamente sobre sua direçãoestratégica. Para Mintzberg (1998), da mesma forma que a escultoratem que gerenciar sua arte, os gerentes também têm que criarartesanalmente suas estratégias.

A escultora se senta, tendo à frente o torno e uma

quantidade de argila. Sua mente está voltada para a

argila, mas ela também tem consciência que está

situada entre suas experiências passadas e suas

perspectivas para o futuro. Ela sabe exatamente o

que funcionou e o que não funcionou no passado.

Tem um conhecimento íntimo do trabalho, de suas

capacidades e seus mercados. Como artífice, ela sente

mais do que analisa essas coisas; seu conhecimento

é “implícito”. Tudo isso está em atividade em sua

mente, à medida que ela lida com a argila. O produto

que toma forma no torno é provavelmente parte da

tradição de seu trabalho passado, mas ela pode se

afastar dele e seguir uma nova direção. Mesmo assim,

o passado não é menos presente que o momento

atual e se projeta no futuro (MINTZBERG, 1998).

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De acordo com Mintzberg (1998), nesta metáfora os gerentessão os artífices e a estratégia é sua argila. Como a escultora, eles situam-se entre o passado de capacidades empresariais e um futuro deoportunidades de mercado. E caso sejam artífices de verdade, levampara seu trabalho um conhecimento íntimo dos materiais que utilizam.Para o estrategista, isso é a essência da criação artesanal de umaestratégia. Segundo Mintzberg (1987), em um mundo tão complexoe cheio de surpresas, o estrategista precisa reter a proximidade, aconsciência e a adaptabilidade do artesão, em vez de repousar sobre oorgulho de grandes planejamentos de longo alcance. A estratégia doartesão é um processo contínuo e adaptável, no qual a formação e aimplementação estão indissoluvelmente ligadas. De acordo comMintzberg (1987) essa visão de estratégia não é fascinante: as mãos sesujam, os passos são pequenos e há poucos saltos ousados para odesconhecido longo prazo; o processo é lento, porém não deve serdesprezado.

A seguir discutiremos a abordagem sistêmica que enfatiza o reflexodos sistemas sociais sobre as estratégias empresariais.

2.1.4. A Abordagem Sistêmica

Segundo Whittington (2002:2), a abordagem sistêmica érelativista, considerando os fins e os meios da estratégia como ligadosàs culturas e aos poderes dos sistemas sociais dos locais onde ela sedesenvolve. Do ponto de vista dessa abordagem, a estratégia éimportante, mas não do mesmo modo como é vista pelos clássicos.Os teóricos sistêmicos são menos pessimistas que os processualistasquanto à capacidade das pessoas em conceber e implementarplanejamentos racionais de ação e bem mais otimistas que ospartidários da abordagem evolucionista no que diz respeito àhabilidade das pessoas em definir as estratégias ante as forças demercado. Os teóricos sistêmicos mantêm a fé na capacidade dasorganizações planejarem e agirem efetivamente dentro de seusambientes. O ponto em que eles diferem dos clássicos, no entanto, éem sua recusa de aceitar as formas e os fins da racionalidade clássica

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como algo mais que fenômenos específicos, do ponto de vista históricoe cultural. Os teóricos sistêmicos insistem em que as razões por trásdas estratégias são peculiares a determinados contextos sociológicos.O princípio central da teoria sistêmica é que aqueles que tomamdecisões não são simplesmente indivíduos imparciais, calculistas,interagindo em transações puramente econômicas, mas pessoasprofundamente enraizadas em sistemas sociais densamente entrelaçados.

Portanto, os teóricos sistêmicos propõem que as empresasdiferem de acordo com os sistemas sociais e econômicos em queestão inseridas. Elas não são todas perfeitas maximizadoras de lucros,como proposto pela teoria clássica e pela teoria evolucionária. Nemsão apenas as organizações particularistas da perspectiva processual,cujas idiossincrasias resultam de limites e acordos internos. Na visãosistêmica, as normas que orientam as estratégias não derivam tantode limites cognitivos da psique humana, como das regras culturais dasociedade local. As disputas internas de organizações envolvem nãosó as micro-políticas de indivíduos e departamentos, mas os grupossociais, interesses e recursos do contexto circundante. As variáveis daperspectiva sistêmica incluem classe e profissões, nações e estados,famílias e gênero (Whittington, 2002:31-32).

A Abordagem Sistêmica enfatiza que as metas e processosestratégicos refletem os sistemas sociais em que a estratégia está sendoelaborada. Variações no mercado, classe, estado e sistemas culturaissão relevantes para a estratégia corporativa. Nem todas as empresas,no entanto, dentro de determinado sistema social precisam serparecidas. As sociedades são complexas demais e as pessoas sãoindividualistas demais para se esperar uma uniformidade agradável.Os estrategistas individuais são capazes de construir, com os aspectosdiversos e plurais de seus sistemas sociais particulares, as própriasestratégias criativas e exclusivas (Whittington, 2002:40-42).

Whittington (2002:44) conclui que a perspectiva sistêmicadesafia a universalidade de qualquer modelo estratégico. Os objetivosda estratégia e os modos de formulação de estratégias dependem dascaracterísticas sociais dos estrategistas e do contexto social dentro doqual eles operam.

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No próximo item será feita uma discussão sobre quem são asdirigentes e quais suas inf luências nas tomadas de decisõesorganizacionais.

2.2. A Função Gerencial

A Função Gerencial, segundo Whittington (2002:49), naliteratura clássica projeta a imagem dos estrategistas como profissionaisda administração, dedicados a suas empresas, com julgamentosimpessoais e promovidos por seus méritos. São as expectativas eatitudes implícitas em todo diploma de MBA: a competência gerenciale a dedicação ao trabalho podem levar qualquer um aos postos dedireção.

Segundo Whittington (2002:117), sob a perspectiva sistêmica,chegar à direção não depende nem de mérito nem de heroísmo, surgemacusações de interesse gerencial próprio e privilégio social. Em vez decomemorar as qualidades pessoais dos líderes, os teóricos sistêmicosenfatizam as características sociais daqueles que chegam a posiçõesdestacadas. Os teóricos sistêmicos suspeitam de que a eficiênciaorganizacional muitas vezes seja definida em termos do que vai aoencontro de interesses da alta gerência, e ressaltam, de qualquer modo,como o que é eficiente varia amplamente de acordo com o contextosocial.

Ainda de acordo com Whittington (2002:142), para o estrategistasistêmico, a efetividade depende de se entender o contexto e jogarsegundo as regras locais, exigindo o diagnóstico claro da lógicaoperacional local. A esse respeito, a abordagem sistêmica da estratégianão abre mão da resposta racional; em vez disso, reconhece as váriasracionalidades segundo as quais os estrategistas podem atuar.

Mas segundo Motta (2003), a prática e a teoria mostraram depoisque as dissociações previstas entre dirigentes e executores são em grandeparte inexistentes. Executivos, gerentes, ou administradores trabalhamessencialmente na decisão e, mais que seus superiores, estabelecemsentidos de direção para suas empresas e instituições. Além do mais,na organização contemporânea, as funções administrativas têm

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adquirido maior semelhança entre níveis hierárquicos, reduzindo-seassim as separações nítidas entre gerência superior e inferior.

Seguindo uma linha semelhante, para Mintzberg (1978) tantoos clássicos quanto os sistêmicos estão convencidos de que o querealmente interessa é o que a alta gerência faz e pensa. Seja qual for aintenção da direção, a estratégia real da empresa muitas vezes emergede uma combinação de casualidade e rotinas que mudam lentamentedo meio da organização.

Após ter apresentado as quatro abordagens sobre estratégia e terdiscutido quem são os dirigentes de primeira linha nas organizações,pretende-se no próximo item detalhar a metodologia que será utilizadana pesquisa.

3 - METODOLOGIA A SER UTILIZADA NO

DESENVOLVIMENTO DO PROJETO

A presente pesquisa caracterizar-se-á do tipo qualitativa, poisbusca retratar uma realidade vivida pelos dirigentes das InstituiçõesPrivadas de Ensino Superior da região Metropolitana de BeloHorizonte. Percebe-se a necessidade de se utilizar desse tipo de pesquisa,para verificar se nestas instituições existem estratégias, se os altosdirigentes são os formuladores e qual a aplicabilidade das mesmas. Olevantamento e análise dos dados visam uma interpretação detalhadae fidedigna da realidade social em que os dirigentes das instituiçõesde ensino superior estão inseridos.

Quanto aos fins, esta pesquisa é descritiva, porque expõecaracterísticas das instituições privadas de ensino superior comabrangência na região metropolitana de Belo Horizonte, podendotambém estabelecer correlações entre variáveis e definir sua natureza.

Este trabalho é de cunho descritivo-explicativo, uma vez que édada ênfase à descrição e à compreensão se os altos dirigentes de umainstituição privada de ensino superior são os formuladores dasestratégias.

Para realização desta pesquisa utilizar-se-á da estratégia do Estudode Caso, que apresenta experiências em seis instituições privadas de

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ensino superior com abrangência na região metropolitana de BeloHorizonte, analisando como ocorrem as tomadas de decisões nestasorganizações.

Será adotado o estudo de caso, uma vez que, segundo Yin (2001),é apropriado para se examinarem acontecimentos contemporâneoscom duas fontes de evidência: observação direta e a sistemática deentrevistas podendo incluir tanto estudos de caso único, quanto decasos múltiplos.

Em um universo de cinqüenta instituições privadas de ensinosuperior, com abrangência na região metropolitana de Minas Gerais,a pesquisa será realizada em seis dessas instituições que foramselecionadas a partir dos seguintes critérios: 1) instituições quepossuem entre vinte e cinqüenta cursos de graduação e 2) instituiçõesconsideradas como universidades e centro universitário. Serãoentrevistados presidentes e diretores das seis instituições privadas deensino superior que possuem entre vinte e cinqüenta cursos degraduação, na região metropolitana de Belo Horizonte.

Para a realização do estudo, serão utilizadas entrevistas semi-estruturadas e análise de documentos, além da pesquisa bibliográfica.As entrevistas acontecerão a partir de um roteiro básico. Serão,também, analisados documentos, como atas de reuniões do conselhoe diretoria, estatutos, relatórios.

Ao fazer a análise dos dados da pesquisa, este trabalho pretendeconsiderar as seguintes variáveis: analisar a função gerencial dosdirigentes; identificar quem são os tomadores de decisões e suaparticipação no desenvolvimento e implementação das estratégiasorganizacionais.

4 - RESULTADOS ESPERADOS

Considerando-se a relevância social do tema em estudo, estapesquisa pretende trazer a tona discussões sobre o pensamentoestratégico inovador e seu impacto na educação superior eminstituições privadas na região metropolitana de Belo Horizonte. Osresultados serão disponibilizados para a comunidade cientifica, para

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que sirva de fonte de pesquisas futuras. A publicação dos resultadosnão se restringirá apenas a um relatório final, mas a divulgação nomaior número de veículos possíveis: congressos, fóruns e outrosrespeitando as exigências feitas neste programa de pesquisa.

Espera-se no final desta pesquisa, averiguar a premissa de quetraçar estratégias organizacionais inovadoras resulta em dirigentesvisionários com bom desempenho, desenvolvendo e implementandoestratégias competitivas dentro das tendências globais.

Com os resultados da análise da função gerencial dos dirigentesdestas instituições, da identificação de quem são os tomadores dedecisões e da participação deles no desenvolvimento e implementaçãodas estratégias organizacionais, a pesquisa tem como finalidade, gerarprodução de conhecimento na visão das instituições participantesdo estudo em questão, além de contribuir com a área da educação deum modo geral.

Esta pesquisa também poderá abarcar o estudo de outrosacadêmicos interessados no tema, trazendo novas contribuições.Assim poderão surgir outras pesquisas, formando uma rede deinformações e conhecimentos sobre o assunto, ampliando aspossibilidades de retorno positivo ao social.

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