229
AUTOR: JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO COLABORADORES: AMANDA PERES FERNANDES; ANA CAROLINA MELMAN; GABRIEL M. DIAS; PEDRO ARMANDO CASTELAR PINHEIRO; LARISSA CAMPOS; SOFIA MANDELERT; LUCIANO CHAVES; DÉBORA MIRANDA; MARIA BEATRIZ GOMES. ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA GRADUAÇÃO 2019.1

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GRADUAÇÃO2018.1

AUTOR: JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTOCOLABORADORES: AMANDA PERES FERNANDES; ANA CAROLINA MELMAN; GABRIEL M. DIAS; PEDRO ARMANDO CASTELAR PINHEIRO;

LARISSA CAMPOS; SOFIA MANDELERT; LUCIANO CHAVES; DÉBORA MIRANDA; MARIA BEATRIZ GOMES.

ORGANIZAÇÃOJURÍDICA DA

GRANDE EMPRESA

GRADUAÇÃO2019.1

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

INtRODUÇÃO. ....................................................................................................................................................11

1. EMENtA DO CURSO. ..........................................................................................................................................11

2. ObJEtIvOS GERAIS. ..........................................................................................................................................11

3. MEtODOlOGIA. ...............................................................................................................................................11

4. PROGRAMA. ...................................................................................................................................................12

5. AvAlIAÇÃO. ...................................................................................................................................................13

6. AtIvIDADES COMPlEMENtARES. .........................................................................................................................13

7. bIblIOGRAfIA báSICA. .....................................................................................................................................13

8. bIblIOGRAfIA COMPlEMENtAR. .........................................................................................................................13

AUlA 1: A ERA DAS GRANDES EMPRESAS ...................................................................................................................14

1. O qUE é EMPRESA? REtROSPECtIvA hIStóRICA. ......................................................................................................14

2. O qUE é A GRANDE EMPRESA? .............................................................................................................................18

AUlA 2: SOCIEDADE ANôNIMA: EvOlUÇÃO hIStóRICA, NOÇõES GERAIS E CARACtERÍStICAS PRINCIPAIS ....................................25

1. EvOlUÇÃO hIStóRICA. ......................................................................................................................................25

2. SOCIEDADE ANôNIMA: DEfINIÇÃO lEGAl................................................................................................................27

3. CARACtERÍStICAS ESSENCIAIS DA SOCIEDADE ANôNIMA.............................................................................................27

3.1. DIvISÃO DO CAPItAl SOCIAl EM AÇõES................................................................................................................28

3.2. PADRONIZAÇÃO DAS POSIÇõES DE SóCIO. ............................................................................................................28

3.3. POSIÇõES DE SóCIOS NÃO PERSONAlIZADAS. ........................................................................................................28

3.4. NAtUREZA CORPóREA DA AÇÃO. ........................................................................................................................28

3.5. lIvRE CIRCUlAÇÃO DAS AÇõES. .........................................................................................................................29

3.6. lIMItAÇÃO DOS RISCOS DO ACIONIStA. ...............................................................................................................29

3.7. SOCIEDADE DE CAPItAl vS. SOCIEDADE DE PESSOAS................................................................................................29

4. SIStEMA JURÍDICO DAS COMPANhIAS. ..................................................................................................................32

4.1. CONCEItO E ESPéCIES DE NORMAS. .....................................................................................................................32

4.2. NORMAS DO EStAtUtO SOCIAl. .........................................................................................................................33

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

4.3. NORMAS DA lSA............................................................................................................................................34

4.4. OUtRAS NORMAS lEGAIS. ................................................................................................................................34

4.5. CONtRAtOS PARASSOCIAIS. .............................................................................................................................34

5. óRGÃOS SOCIAIS. .............................................................................................................................................35

5.1. ASSEMblEIA GERAl. ......................................................................................................................................36

5.2. DIREtORIA. .................................................................................................................................................36

5.3. CONSElhO fISCAl. .........................................................................................................................................36

5.4. CONSElhO DE ADMINIStRAÇÃO. ........................................................................................................................36

6. ESqUEMA. .....................................................................................................................................................37

AUlA 3: COMPANhIA AbERtA E fEChADA. MERCADO DE vAlORES MObIlIáRIOS.COMISSÃO DE vAlORES MObIlIáRIOS - CvM. NOÇõES GERAIS. ....................................................................................38

1. COMPANhIAS AbERtAS vS. COMPANhIAS fEChADAS. ................................................................................................38

2. DIStRIbUIÇÃO DE vAlORES MObIlIáRIOS. .............................................................................................................39

3. MERCADO DE CAPItAIS: O ACESSO à POUPANÇA POPUlAR. ..........................................................................................41

4. A COMISSÃO DE vAlORES MObIlIáRIOS. ................................................................................................................41

5. CANCElAMENtO DE REGIStRO (I.E., fEChAMENtO DE CAPItAl). ...................................................................................43

6. SqUEZEE OUt (RESGAtE COMPUlSóRIO). ...............................................................................................................44

7. NORMAS ESPECIAIS DA lSA EM RElAÇÃO àS COMPANhIAS AbERtAS. .............................................................................45

7.1. REGIStRO E ClASSIfICAÇÃO DAS COMPANhIAS AbERtAS. .........................................................................................45

7.2. AÇõES. .......................................................................................................................................................45

7.3. CONStItUIÇÃO E lIvROS SOCIAIS. ......................................................................................................................46

7.4. ACIONIStAS E ACORDO DE ACIONIStAS. ...............................................................................................................46

7.5. ASSEMblEIA GERAl. ......................................................................................................................................46

7.6. CONSElhO DE ADMINIStRAÇÃO. ........................................................................................................................47

7.7. ADMINIStRADORES. ......................................................................................................................................47

7.8. MODIfICAÇÃO DO CAPItAl SOCIAl .....................................................................................................................49

7.9. DEMONStRAÇõES fINANCEIRAS E DIvIDENDO ObRIGAtóRIO. ....................................................................................49

7.10. INCORPORAÇÃO, fUSÃO E CISÃO ......................................................................................................................50

7.11. SOCIEDADE DE ECONOMIA MIStA. ....................................................................................................................50

7.12. SOCIEDADES COlIGADAS, CONtROlADORAS E CONtROlADAS. ..................................................................................50

7.13. PUblICAÇõES. ............................................................................................................................................51

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

7.14. REDUÇÃO DE PORCENtAGEM ...........................................................................................................................51

8. NORMAS ESPECIAIS DA lSA EM RElAÇÃO àS COMPANhIAS fEChADAS. ...........................................................................52

8.1. AÇõES. .......................................................................................................................................................52

8.2. lIMItAÇõES à CIRCUlAÇÃO DAS AÇõES. ...............................................................................................................52

8.3. CONvOCAÇÃO DA ASSEMblEIA GERAl. ................................................................................................................52

8.4. ASSEMblEIA GERAl ORDINáRIA. .......................................................................................................................53

8.5. DIREItO DE PREfERêNCIA. ...............................................................................................................................53

8.6. ExClUSÃO DO DIREItO DE PREfERêNCIA. .............................................................................................................53

8.7. DEMONStRAÇÃO DAS ORIGENS E APlICAÇÃO DOS RECURSOS. ....................................................................................53

8.8. COMPANhIA DE PEqUENO PORtE. ......................................................................................................................53

9. COMPANhIAS AbERtAS: b3. ...............................................................................................................................53

9.1. ADESÃO vOlUNtáRIA. ....................................................................................................................................54

9.2. NOvO MERCADO, NÍvEl 1 E NÍvEl 2. ...................................................................................................................54

9.3. GOvERNANÇA CORPORAtIvA. ...........................................................................................................................57

AUlA 4: AÇõES E OUtROS vAlORES MObIlIáRIOS. .......................................................................................................59

1. vAlORES MObIlIáRIOS – NOÇõES INtRODUtóRIAS ..................................................................................................59

2. vAlORES MObIlIáRIOS: CONCEItO .......................................................................................................................60

3. vAlORES MObIlIáRIOS EM ESPéCIE. .....................................................................................................................61

3.1. AÇõES. .......................................................................................................................................................61

3.1.1. AÇõES ORDINáRIAS. ....................................................................................................................................62

3.1.2. AÇõES PREfERENCIAIS. ................................................................................................................................62

3.2. DEbêNtURES. ..............................................................................................................................................63

3.3. bôNUS DE SUbSCRIÇÃO. ..................................................................................................................................63

3.4. PARtES bENEfICIáRIAS. .................................................................................................................................64

3.5. CUPONS, DIREItOS, RECIbOS DE SUbSCRIÇÃO E CERtIfICADOS DE DESDObRAMENtOS. .....................................................64

3.6. CERtIfICADOS DE DEPóSItO DE vAlORES MObIlIáRIOS (DEPOSItARy RECEIPtS). ...........................................................64

3.7. COtAS DE fUNDOS DE INvEStIMENtO EM vAlORES MObIlIáRIOS OU DE ClUbES DE INvEStIMENtO EM qUAISqUER AtIvOS. ..........64

3.8. NOtAS COMERCIAIS (COMMERCIAl PAPERS). ........................................................................................................65

3.9. CONtRAtOS fUtUROS, DE OPÇõES E OUtROS DERIvAtIvOS, CUJOS AtIvOS SUbJACENtES SEJAM vAlORES MObIlIáRIOS. ..............65

3.10. OUtROS CONtRAtOS DERIvAtIvOS. ..................................................................................................................65

4. CONCEItO AbERtO. ..........................................................................................................................................65

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

AUlA 5. CAPItAl SOCIAl .......................................................................................................................................67

1. CAPItAl SOCIAl. .............................................................................................................................................67

1.1. CONCEItO. ...................................................................................................................................................67

1.2. ORIGEM DO CAPItAl SOCIAl. ............................................................................................................................68

1.3. NOÇÃO JURÍDICA E CONtábIl. ...........................................................................................................................68

1.4. fUNDO SOCIAl E PAtRIMôNIO. .........................................................................................................................69

1.5. PRINCÍPIOS DO CAPItAl SOCIAl. .......................................................................................................................69

1.6. SUbSCRIÇÃO DE AÇõES (ARt. 7º DA lSA). .............................................................................................................70

1.7. CAPItAlIZAÇÃO DE RECURSOS Já ExIStENtES NO PAtRIMôNIO DA EMPRESA. ................................................................72

1.8. CAPItAl SOCIAl MÍNIMO: bRASIl. .....................................................................................................................72

1.9. qUEStÃO PARA DISCUSSÃO. .............................................................................................................................72

2. AUMENtO DE CAPItAl. ......................................................................................................................................73

2.1. AUMENtO DE CAPItAl E MODIfICAÇÃO DO EStAtUtO SOCIAl. ...................................................................................76

2.2. CAPItAl AUtORIZADO. ...................................................................................................................................77

2.3. MODAlIDADES DE AUMENtO DE CAPItAl. ............................................................................................................77

2.4. PARâMEtROS PARA AUMENtO DE CAPItAl. ..........................................................................................................78

2.5. óRGÃO COMPEtENtE. .....................................................................................................................................80

2.6. DIREItO DE PREfERêNCIA. ...............................................................................................................................81

3. REDUÇÃO DE CAPItAl .......................................................................................................................................81

3.1. MODAlIDADES. .............................................................................................................................................83

3.2. REDUÇÃO vOlUNtáRIA vS. ObRIGAtóRIA. ...........................................................................................................83

3.3. OPOSIÇÃO DE CREDORES. .................................................................................................................................83

3.4. EfICáCIA DA REDUÇÃO. ...................................................................................................................................84

AUlA 6: ASSEMblEIA GERAl. .................................................................................................................................86

1. ASSEMblEIAS GERAIS – NOÇõES GERAIS. ...............................................................................................................86

2. COMPEtêNCIA DAS ASSEMblEIAS GERAIS. ..............................................................................................................86

3. ESPéCIES DE ASSEMblEIAS .................................................................................................................................87

3.1. ASSEMblEIA ESPECIAl....................................................................................................................................88

3.2. ASSEMblEIA GERAl .......................................................................................................................................88

3.2.1. ASSEMblEIA GERAl ORDINáRIA (AGO). .............................................................................................................88

3.2.2. ASSEMblEIA GERAl ExtRAORDINáRIA (AGE). .....................................................................................................90

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

4. CONvOCAÇÃO DAS ASSEMblEIAS. .........................................................................................................................92

4.1. REGUlARIDADE NA CONvOCAÇÃO. .....................................................................................................................92

4.2. lEGItIMIDADE PARA CONvOCAR. .......................................................................................................................92

4.3. PUblICIDADE DA CONvOCAÇÃO. ........................................................................................................................93

5. CARACtERÍStICAS E fUNCIONAMENtO DAS ASSEMblEIAS GERAIS. ................................................................................93

5.1. DElIMItAÇÃO DAS MAtéRIAS qUE SERÃO ObJEtO DE DElIbERAÇÃO. ...........................................................................93

5.2. INStAlAÇÃO DA ASSEMblEIA. ..........................................................................................................................94

5.3. MESA. ........................................................................................................................................................95

5.4. lEGItIMAÇÃO PARA PARtICIPAR DA ASSEMblEIA. .................................................................................................95

5.5. REPRESENtAÇÃO DO ACIONIStA. .......................................................................................................................95

5.6. bOlEtIM DE vOtO A DIStâNCIA – INStRUÇÃO 561 CvM............................................................................................96

5.7. PRINCÍPIO MAJORItáRIO E O qUORUM DE DElIbERAÇÃO. .........................................................................................97

5.8. lOCAl DE REAlIZAÇÃO. ...................................................................................................................................98

5.9. AtA DE ASSEMblEIA. ......................................................................................................................................98

AUlA 7. CONflItO DE INtERESSES E NUlIDADES ASSEMblEARES(vÍCIOS DO vOtO; vÍCIOS DA DElIbERAÇÃO; E vÍCIOS DA ASSEMblEIA). .............................................................................99

1. INtRODUÇÃO ................................................................................................................................................100

2. INtERESSE SOCIAl .........................................................................................................................................100

2.1. RElEvâNCIA PARA DISCUSSÃO ........................................................................................................................100

2.2. tEORIAS INStItUCIONAlIStAS ........................................................................................................................101

2.3. tEORIAS CONtRAtUAlIStAS ...........................................................................................................................101

2.4. INtERESSE SOCIAl NA lSA: REGIME DUAlIStA .....................................................................................................102

3. O ARtIGO 115 DA lSA ......................................................................................................................................103

3.1. AbUSO DE DIREItO DE vOtO E AS hIPótESES DE vEDAÇÃO AO ExERCÍCIO DO DIREItO DE vOtO ..........................................106

3.2. CONflItO fORMAl x CONflItO SUbStANCIAl .....................................................................................................107

4. CONClUSÃO .................................................................................................................................................108

5. JURISPRUDêNCIA ..........................................................................................................................................109

6. NUlIDADES ASSEMblEARES .............................................................................................................................109

7. vÍCIOS DA PRóPRIA ASSEMblEIA; vÍCIOS DAS DElIbERAÇõES; vÍCIOS DE vOtO; ..............................................................112

AUlA 8. óRGÃOS ADMINIStRAtIvOS: CONSElhO DE ADMINIStRAÇÃO E DIREtORIA. ............................................................116

1. óRGÃOS ADMINIStRAtIvOS. .............................................................................................................................116

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

2. CONSElhO DE ADMINIStRAÇÃO. ........................................................................................................................118

3. DIREtORIA. ..................................................................................................................................................119

4. CONSElhO fISCAl. .........................................................................................................................................120

4.1. fUNCIONAMENtO E CONvOCAÇÃO. ...................................................................................................................121

5. DEvERES E RESPONSAbIlIDADES DOS ADMINIStRADORES. .......................................................................................121

5.1. DEvER DE DIlIGêNCIA. ..................................................................................................................................121

5.2. DEvER DE lEAlDADE. ...................................................................................................................................123

5.3. DEvER DE EvItAR CONflItO DE INtERESSES. ......................................................................................................124

5.4. DEvER DE INfORMAR. ..................................................................................................................................124

5.5. DEvERES DO ACIONIStA CONtROlADOR ADMINIStRADOR. .....................................................................................125

6. INSIDER tRADING. .........................................................................................................................................126

7. RESPONSAbIlIDADE DOS ADMINIStRADORES. .......................................................................................................127

7.1. RESPONSAbIlIDADE ADMINIStRAtIvA: .............................................................................................................127

7.2. RESPONSAbIlIDADE PENAl: ...........................................................................................................................127

7.3. RESPONSAbIlIDADE CIvIl. ............................................................................................................................128

7.3.1. RESPONSAbIlIDADE CIvIl PERANtE A SOCIEDADE..............................................................................................128

7.3.2. RESPONSAbIlIDADE CIvIl PERANtE OS ACIONIStAS. ..........................................................................................128

7.3.3. RESPONSAbIlIDADE CIvIl PERANtE tERCEIROS EM GERAl. ..................................................................................129

7.4. AÇÃO DE RESPONSAbIlIDADE CIvIl CONtRA OS ADMINIStRADORES. .........................................................................129

7.5. RENúNCIA DO ADMINIStRADOR. .....................................................................................................................131

7.6. DEStItUIÇÃO DO ADMINIStRADOR. ..................................................................................................................131

7.7. SEGUROS...................................................................................................................................................131

8. CASO PRátICO:..............................................................................................................................................132

AUlA 9: CONSElhO fISCAl. ..................................................................................................................................133

1. CONSElhO fISCAl ..........................................................................................................................................133

2. ElEIÇÃO, REMUNERAÇÃO E REStRIÇõES. ..............................................................................................................134

3. COMPEtêNCIAS. ............................................................................................................................................135

4. ExERCÍCIO SOCIAl. .........................................................................................................................................136

5. DEMONStRAÇõES fINANCEIRAS: NOÇõES GERAIS. ..................................................................................................137

6. DEMONStRAÇõES fINANCEIRAS E A lEI 11.638/07 ..................................................................................................138

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

AUlA 10: lUCROS, RESERvAS E DIvIDENDOS. ............................................................................................................139

1. CONCEItO DE lUCRO, RESERvA E DIvIDENDOS........................................................................................................139

2. DIvIDENDO ObRIGAtóRIO (ARtIGO 202, lSA): .......................................................................................................140

3. RESERvAS OU REtENÇÃO DE lUCROS: ..................................................................................................................141

4. RESERvA lEGAl (ARt. 193, lEI DAS SA): ...............................................................................................................141

5. RESERvAS EStAtUtáRIAS (ARt. 194, lEI DAS SA): ...................................................................................................141

6. RESERvAS ASSEMblEARES: ..............................................................................................................................141

7. RESERvA PARA CONtINGêNCIAS (ARt. 195, lEI DAS SA): ...........................................................................................141

8. REtENÇÃO DE lUCROS A REAlIZAR (ARt. 196, lEI DAS SA): ........................................................................................142

9. RESERvA DE lUCROS A REAlIZAR (ARt. 197, lEI DAS SA): ..........................................................................................142

10. lIMItES DAS RESERvAS DE lUCROS: ..................................................................................................................143

11. DEStINAÇÃO DO SAlDO REMANESCENtE: ............................................................................................................143

12. DIvIDENDO PRIORItáRIO DAS AÇõES PREfERENCIAIS: ...........................................................................................143

13. DIvIDENDOS INtERMEDIáRIOS: .......................................................................................................................143

14. PAGAMENtO DE DIvIDENDOS (ARt. 205, lEI DAS SA): .............................................................................................143

15. bREvE RESUMO DO fIM DO ExERCÍCIO SOCIAl: .....................................................................................................144

AUlA 11: ACIONIStAS E ACIONIStA CONtROlADOR. ....................................................................................................145

1. ACIONIStA. ..................................................................................................................................................145

2. PODER DE CONtROlE. .....................................................................................................................................147

2.1. CONCEItOS báSICOS. ....................................................................................................................................148

3. ACORDO DE ACIONIStAS. .................................................................................................................................151

3.1. ACORDO DE vOtO. .......................................................................................................................................154

3.2. REUNIÃO PRévIA. ........................................................................................................................................155

3.3. qUORUM qUAlIfICADO .................................................................................................................................156

3.4. DIREItO DE vEtO. ........................................................................................................................................157

3.5. ACORDOS DE CONtROlE. ...............................................................................................................................158

3.6. ACORDOS SObRE REStRIÇõES à CIRCUlAÇÃO DE AÇõES. .........................................................................................158

3.7. REStRIÇÃO à tRANSfERêNCIA DE AÇõES (lOCk-UP). .............................................................................................159

3.8. DIREItO DE PREfERêNCIA. .............................................................................................................................160

3.9. DIREItO DE PRIMEIRA RECUSA (RIGht Of fIRSt REfUSAl). .....................................................................................161

3.10. DIREItO DE PRIMEIRA OfERtA (thE RIGht Of fIRSt OffER). .................................................................................162

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

3.11. DIREItO DE vENDA CONJUNtA (tAG AlONG). .....................................................................................................162

3.12. DIREItO DE ObRIGAR A vENDA EM CONJUNtO (DRAG AlONG). ................................................................................163

3.13. OPÇÃO DE COMPRA (CAll OPtION). ................................................................................................................164

3.14. OPÇÃO DE vENDA (PUt OPtION). ....................................................................................................................164

3.15. RESOlUÇÃO DE IMPASSE MEDIANtE bUy OR SEll (ShOtGUN). ...............................................................................164

4. EStRUtURA SOCIAl DE UM ACORDO DE ACIONIStAS ................................................................................................167

5. CASO GERADOR 1: fRIGORÍfICOS ........................................................................................................................167

6. CASO GERADOR 2: lANNIStARk .........................................................................................................................169

AUlA 12: SOCIEDADES COlIGADAS, CONtROlADAS E CONtROlADORAS. RESPONSAbIlIDADE.GRUPOS DE SOCIEDADES. SUbSIDIáRIA INtEGRAl. ....................................................................................................170

1. CONCEItOS E NOÇõES GERAIS. ...........................................................................................................................170

2. GRUPO DE SOCIEDADES: GRUPO DE fAtO E DIREItO. ................................................................................................171

3. SUbSIDIáRIA INtEGRAl. ..................................................................................................................................174

4. JURISPRUDêNCIA. .........................................................................................................................................174

AUlA 13: AlIENAÇÃO E AqUISIÇÃO DE CONtROlE. ......................................................................................................182

1. AqUISIÇÃO, tRANSfERêNCIA E PERDA DO CONtROlE. ..............................................................................................182

1.1. fORMAS DE AqUISIÇÃO E tRANSfERêNCIA DO PODER DE CONtROlE. .........................................................................182

1.2. PERDA DO PODER DE CONtROlE ......................................................................................................................183

2. CONtROlE INtERNO E ExtERNO .........................................................................................................................184

2.1. CONtROlE INtERNO (SUbDIvISõES). ................................................................................................................185

2.2. téCNICAS DE ORGANIZAÇÃO DO CONtROlE INtERNO .............................................................................................186

2.3. CONtROlE DIREtO E INDIREtO. .......................................................................................................................187

3. vAlOR DO CONtROlE. .....................................................................................................................................187

4. ExERCÍCIO DO PODER DE CONtROlE. ...................................................................................................................187

5. O ACIONIStA CONtROlADOR ADMINIStRADOR.......................................................................................................188

6. CASO GERADOR 1: COPESUl (PAS CvM Nº RJ2007/7230) ............................................................................................190

7. CASO GERADOR 2: SUZANO (PAS CvM Nº RJ-2008-4156) ............................................................................................191

8. JURISPRUDêNCIA. .........................................................................................................................................194

AUlA 14: GOvERNANÇA CORPORAtIvA. ...................................................................................................................197

1. CONtExtO hIStóRICO. ....................................................................................................................................197

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SumárioORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

AUlA 15: tRANSfORMAÇÃO, INCORPORAÇÃO, fUSÃO E CISÃO. ......................................................................................201

1. INtRODUÇÃO E CONtExtO hIStóRICO. .................................................................................................................201

2. PROtOCOlO E JUStIfICAÇÃO. ............................................................................................................................203

2.1. PROtOCOlO. ..............................................................................................................................................204

2.2. JUStIfICAÇÃO ............................................................................................................................................204

3. fORMAÇÃO DO CAPItAl NAS OPERAÇõES DE REORGANIZAÇÃO SOCIEtáRIA. ...................................................................205

4. tIPOS DE OPERAÇõES DE REORGANIZAÇÃO SOCIEtáRIA. ...........................................................................................207

4.1. INCORPORAÇÃO ..........................................................................................................................................207

4.2. INCORPORAÇÃO DE COMPANhIA CONtROlADA. ...................................................................................................209

4.3. INCORPORAÇÃO DE AÇõES. ............................................................................................................................210

4.4. fUSÃO. .....................................................................................................................................................211

4.5. CISÃO. ......................................................................................................................................................213

4.6. tRANSfORMAÇÃO........................................................................................................................................215

4.7. DROP-DOwN DE AtIvOS (CONfERêNCIA DE AtIvOS AO CAPItAl SOCIAl). ....................................................................216

5. DIREItOS DOS CREDORES. ................................................................................................................................216

AUlA 16: DISSOlUÇÃO, lIqUIDAÇÃO E ExtINÇÃO DA SOCIEDADE ANôNIMA .......................................................................218

1. INtRODUÇÃO. ...............................................................................................................................................218

2. DISSOlUÇÃO tOtAl. .......................................................................................................................................219

2.1. MODAlIDADES. ...........................................................................................................................................219

3. DISSOlUÇÃO PARCIAl. ....................................................................................................................................221

4. lIqUIDAÇÃO. ................................................................................................................................................223

5. ASPECtOS ECONôMICOS. .................................................................................................................................224

6. ExtINÇÃO. ...................................................................................................................................................226

7. qUEStÃO PARA REflExÃO: INOvAÇÃO lEGISlAtIvA. ...............................................................................................227

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

11FGV DIREITO RIO

Introdução.

1. EmEnta do Curso.

A Era das Grandes Empresas; Sociedade anônima: evolução histórica, no-ções gerais e características principais; Companhia aberta e fechada. Merca-do de valores mobiliários. Comissão de Valores Mobiliários. Noções gerais; Ações e outros valores mobiliários; Capital social: formação, aumento e redu-ção; Assembleia Geral: Noções Gerais; Características, espécies, competência e funcionamento; Órgãos administrativos: Administração. Conselho de Ad-ministração e Diretoria: características, composição, funcionamento e com-petência. Deveres e responsabilidades dos administradores; Conselho Fiscal. Exercício Social. Demonstrações financeiras; Lucros, reservas e dividendos. Dividendos obrigatórios e dividendos intermediários. Dissolução, liquidação e extinção da sociedade anônima; Acionistas e Acionista Controlador: No-ções Gerais; Direitos e obrigações; Poder de controle; Acordos de acionistas; Sociedades coligadas, controladoras e controladas. Responsabilidade. Gru-pos de sociedades. Subsidiária integral; Alienação de Controle e Aquisição de controle Governança Corporativa Transformação, incorporação, fusão e cisão; Dissolução, Liquidação e Extinção da Sociedade Anônima.

2. objEtivos GErais.

Esta disciplina tem como objetivos: (i) proporcionar aos alunos apren-dizado de diversos institutos do Direito Societário, com especial enfoque às sociedades anônimas; (ii) provocar o interesse dos alunos para questões jurí-dicas atinentes ao ambiente empresarial e à dinâmica econômica, abordando questões jurídicas à luz da aplicação prática das mesmas; e (iii) desenvolver as habilidades dos alunos para identificar e compreender problemas inerentes à situações concretas e conceber soluções para superá-las.

3. mEtodoloGia.

Suporte teórico, através do estudo de material didático (sugestão de livros, artigos, pareceres, comentários à legislação, dentre outros).

Suporte prático, através do estudo de casos concretos (selecionados de acordo com diversas operações societárias).

Método socrático (e/ou – de qualquer outro modo – participativo), com incentivo ao envolvimento e colaboração ativa dos alunos.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

12FGV DIREITO RIO

4. ProGrama.

AULA ASSUNTO

Aula 1 A Era das Grandes Empresas.

Aula 2Sociedade Anônima: Evolução História,

Noções Gerais e Características Principais.

Aula 3Companhia Aberta e Fechada. Mercado

de Valores Mobiliários. Comissão de Valores Mobiliários – CVM. Noções Gerais.

Aula 4 Ações e Outros Valores Mobiliários.

Aula 5 Capital Social.

Aula 6 Assembleia Geral.

Aula 7 Conflitos de Interesses e Nulidades Assembleares

Aula 8Órgãos Administrativos:

Conselho de Administração e Diretoria.

Aula 9 Conselho Fiscal.

Aula 10 Lucros, Reservas e Dividendos.

Aula 11Acionistas e Acionista Controlador.

Casos Geradores: Frigoríficos e Lannistark

Aula 12Sociedades Coligadas, Controladas

e Controladoras. Responsabilidade. Grupo de Sociedades. Subsidiária Integral.

Aula 13Alienação e Aquisição de Controle.Casos Geradores: Copesul e Suzano

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

13FGV DIREITO RIO

Aula 14 Governança Corporativa.

Aula 15 Transformação, Incorporação, Fusão e Cisão.

Aula 16Dissolução, Liquidação

e Extinção da Sociedade Anônima.

5. avaliação.

Serão realizadas 02 (duas) provas escritas, em sala de aula, compreenden-do toda a matéria ministrada até a data de cada prova. Os alunos poderão consultar os textos de lei sem comentários ou anotações. Poderão, também, ser feitas avaliações baseadas em atividades complementares ou em trabalhos sobre temas específicos a serem indicados pelo professor. A média aritmética referente à disciplina será obtida com base em tais avaliações.

O aluno que obtiver média aritmética inferior a 7 (sete) deverá realizar uma terceira prova, que compreenderá toda a matéria do semestre.

6. atividadEs ComPlEmEntarEs.

Poderão ser propostas atividades adicionais que valerão pontos para a mé-dia aritmética (obtida com base nas duas primeiras provas) referente à disci-plina, a critério do professor.

7. biblioGrafia básiCa.

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017.

8. biblioGrafia ComPlEmEntar.

Será indicada bibliografia complementar específica para cada aula do presente curso.

A leitura complementar indicada é voluntária, sendo recomendada para aprofundamento nos temas abordados.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

14FGV DIREITO RIO

AulA 1: A ErA dAs GrAndEs EmprEsAs

biblioGrafia básiCa:

LAMY FILHO, Alfredo e Al. A Lei das S.A. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 1995, Vols. I – pp. 139- 152.

biblioGrafia ComPlEmEntar:

COMPARATO, Fábio Konder. Aspectos Jurídicos da Macroempresa. São Pau-lo: Editora Revista dos Tribunais. 1970.

HANSMANN, Henry e KRAAKMAN, Reinier. The End of History for Corporate Law. Harvard Law School, 2000. Disponível em: <http://www.law.harvard.edu/programs/olin_center/papers/pdf/280.pdf>.

KRAAKMAN, Reinier et al. The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and functional approach. Oxford: Oxford University Press. 2004, Chap-ter 1: What is Corporate Law, pp. 1-20.

Sobre a teoria de empresa ver: ASCARELLI, Tullio. “A atividade do empresá-rio”, RDM n. 132, pp. 203 a 215.

rotEiro:

Preliminarmente à analise da organização jurídica das grandes empresas, é necessário revisitar o conceito de “empresa”, abordado anteriormente em Teoria Geral da Empresa.

1. o quE é EmPrEsa? rEtrosPECtiva históriCa.

Em um primeiro momento, o direito comercial começa a se desenvolver a partir da necessidade de um regramento jurídico mais célere, capaz de aten-der às necessidades dos mercadores. Observa-se a dicotomia entre, de um lado, o direito comum e, de outro lado, o direito especial, criado para (e pela) classe dos mercadores, com seus tribunais consulares1.

1 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 32-33.

1 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mer-cancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 32-33.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

15FGV DIREITO RIO

Do ponto de vista prático, era necessário definir “(i) quem estava efetiva-mente sujeito à jurisdição particular dos mercadores e, portanto, também ao seu direito especial, bem como (ii) os casos em que os juízes vinculados às comunas po-deriam aplicar os estatutos das corporações de ofício a pessoas não matriculadas”.2

a. teoria Estatutária e Período subjetivo

Dá-se lugar à chamada “teoria estatutária”, pela qual os estatutos mercan-tis deveriam vincular apenas os membros das corporações. Inicialmente, as regras comerciais eram aplicadas somente àqueles que estivessem nelas inscri-tos. Posteriormente, passou a aplicar-se também às relações entre seus mem-bros e os que para eles trabalhavam. Com o aumento do poder econômico das corporações, as regras comerciais passaram a abranger todos que, de fato, praticavam atos relacionados à “matéria de comércio”.

Observa-se que, nesta época, a definição do objeto do direito comercial ligava-se a problema processual, de fixação de competência. Foi o período subjetivo, pois a matéria de direito comercial era determinada a partir de um sujeito: o membro da corporação.

b. atos de Comércio e Período objetivo

O perfil subjetivo foi mantido durante o período do mercantilismo. Com a ascensão do liberalismo e a necessidade de conquista de outros mercados, fez-se necessária a libertação das amarras das corporações. Com o Código Comercial francês, a competência especial firmou-se na prática de determi-nados atos: os assim chamados atos de comércio. Sujeitavam-se às leis e à jurisdição especial os que praticassem esses atos com habitualidade e os que com eles entabulassem contratos.3

Tal foi o período objetivo: a matéria comercial vinha delimitada pela prá-tica de certos atos, e não mais pelo agente que os praticava.

Observada a imprecisão científica e a insuficiência da teoria dos atos de co-mércio4, era necessário construir um novo sistema, que se adequasse aos avanços da economia e que delimitasse o âmbito de aplicação das normas comerciais, de forma a adaptar a disciplina às necessidades das sociedades contemporâneas.

Atualmente, a grande empresa desempenha papel fundamental na ordem econômica globalizada. Conforme Fábio Konder Comparato:

2 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 33.3 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 35.4 Conforme J. X. Carvalho de Mendonça, que propõe a seguinte classificação dos atos de comércio: “Os códigos e tratados de direito comercial não oferecem conceito jurídico unitário e completo sobre os atos de comércio. Legislação e doutrina não se harmonizam em tão relevante assunto, o que multiplica os embaraços à construção de sólido sistema científico.” (J.X. Carvalho de Mendonça, “Tratado de Direito Comercial Brasileiro”, vol. I, livro I, 6ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1957, p. 419). Na mesma obra, o autor revela a amplitude do problema no direito comparado, citando entre os que compartilham de seu entendimento, Lyon Caen et Renault, na França, Vidari, Vivante e Navarrini, na Itália, além do suíço Muzinger, do espanhol Estaséne e do argentino Segovia (pp. 419-421).

2 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mer-cancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 33.

3 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mer-cancia ao mercado; prefácio Eros Grau. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. pp. 35.

4 Conforme J. X. Carvalho de Mendon-ça, que propõe a seguinte classificação dos atos de comércio: “Os códigos e tra-tados de direito comercial não oferecem conceito jurídico unitário e completo sobre os atos de comércio. Legislação e doutrina não se harmonizam em tão re-levante assunto, o que multiplica os em-baraços à construção de sólido sistema científico.” (J.X. Carvalho de Mendonça, “Tratado de Direito Comercial Brasilei-ro”, vol. I, livro I, 6ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1957, p. 419). Na mesma obra, o autor revela a amplitude do problema no direito comparado, citan-do entre os que compartilham de seu entendimento, Lyon Caen et Renault, na França, Vidari, Vivante e Navarrini, na Itália, além do suíço Muzinger, do espanhol Estaséne e do argentino Se-govia (pp. 419-421).

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

16FGV DIREITO RIO

“Se se quiser indicar uma instituição social que, pela sua influência, dinamismo e poder de transformação, sirva de elemento explicativo e definidor da civilização contemporânea, a escolha é indubitável: essa instituição é a empresa.”5

Tal constatação é também com frequência apontada por diferentes eco-nomistas. Referindo-se especificamente às sociedades anônimas, assevera-se que “o capitalismo moderno não teria podido se desenvolver se a sociedade por ações não existisse”6.

Sob a égide da teoria objetiva, diversas atividades de caráter intrinseca-mente empresarial não eram disciplinadas pelo Direito Comercial, visto não se enquadrarem nas acepções legais de “ato de comércio”7.

c. teoria subjetiva moderna

A migração do objeto do direito comercial do ato de comércio para a empresa dá-se por meio do advento do Código Civil Italiano de 1942. A teoria subjetiva moderna apresenta como núcleo fundamental o con-ceito de empresa8.

Ocorre que, mesmo entre os adeptos da Teoria da Empresa, em especial os italianos, marcados pelo seu pioneirismo9, o conceito jurídico da em-presa permanece, de certo modo, indeterminado, não obstante sua pacífica conceituação nas ciências econômicas. Neste sentido, Rubens Requião:

“Em vão, os juristas têm procurado construir um conceito jurídico pró-prio para tal organização. Sente-se em suas lições certo constrangimento, uma verdadeira frustração por não lhes haver sido possível compor um conceito jurídico próprio para a empresa, tendo o comercialista que se valer do conceito formulado pelos economistas. Por isso, persistem os ju-ristas no afã de edificar em vão um original conceito jurídico de empre-sa, como se fosse desdouro para a ciência jurídica transpor para o campo jurídico um bem elaborado conceito econômico.”10

Alguns autores, entre eles Giuseppe Ferri, entendem ser a noção econô-mica de empresa a assentar o seu conceito jurídico11, incorporando-se a em-presa na organização dos fatores de produção, em princípios técnicos e em leis econômicas, propondo-se à satisfação de necessidades alheias, isto é, do mercado. A este propósito, faz-se referência a Sylvio Marcondes:

5 COMPARATO, Fábio Konder. Direito Empresarial: Estudos e Pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990. P. 3.6 LIPPKANN, Walter. A Cidade Livre. 1938. P. 329 apud Georges Ripert, Aspectos Jurídicos do Capitalismo Moderno. Campinas: RED livros, 2002. P. 67.7 Exemplificativamente, tem-se que o setor de serviços, por não se enquadrar nas definições elaboradas para os atos de comércio, não era regulado pelas normas comerciais, o que, per se, demonstrava a necessidade de uma nova sistemática para a disciplina.8 Tullio Ascarelli vê a manutenção de um critério objetivo, pela importância que se dá à atividade na qualificação do empresário (“O empresário” (Tradução de Fábio Konder Comparato, in “Corso di Diritto Comerciale — Introduzione e Teoria dell’Impresa”, 3ª ed., Milano: Giuff rè, 1962; pp. 145-160). Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro n.º 109/183-189, São Paulo: Malheiros, janeiro/março, 1998).9 Constata Rubens Requião que “são juristas italianos os que mais se dedicam ao estudo da empresa. Já sabemos que o moderno direito privado da Itália funda-se sobre a teoria da empresa. Mas, antes mesmo da reforma de 1942, os comercialistas peninsulares indagavam, como Vivante, sobre o seu conceito, em face das referências a ela feitas na enumeração dos atos de comércio” (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2000. P. 53).10 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 50.11 O jurista italiano Vivante igualou o conceito jurídico ao conceito econômico, consoante apontado por Rubens Requião. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 53.

5 COMPARATO, Fábio Konder. Direito Empresarial: Estudos e Pareceres. São Paulo: Saraiva, 1990. P. 3.

6 LIPPKANN, Walter. A Cidade Livre. 1938. P. 329 apud Georges Ripert, As-pectos Jurídicos do Capitalismo Moder-no. Campinas: RED livros, 2002. P. 67.

7 Exemplificativamente, tem-se que o setor de serviços, por não se enquadrar nas definições elaboradas para os atos de comércio, não era regulado pelas normas comerciais, o que, per se, de-monstrava a necessidade de uma nova sistemática para a disciplina.

8 Tullio Ascarelli vê a manutenção de um critério objetivo, pela importância que se dá à atividade na qualificação do empresário (“O empresário” (Tradução de Fábio Konder Comparato, in “Corso di Diritto Comerciale — Introduzione e Teoria dell’Impresa”, 3ª ed., Milano: Giuff rè, 1962; pp. 145-160). Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro n.º 109/183-189, São Pau-lo: Malheiros, janeiro/março, 1998).

9 Constata Rubens Requião que “são juristas italianos os que mais se dedi-cam ao estudo da empresa. Já sabemos que o moderno direito privado da Itália funda-se sobre a teoria da empresa. Mas, antes mesmo da reforma de 1942, os comercialistas peninsulares indaga-vam, como Vivante, sobre o seu conceito, em face das referências a ela feitas na enumeração dos atos de comércio” (RE-QUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comer-cial. Vol. I. 24ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2000. P. 53).

10 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Sa-raiva, 2000. P. 50.

11 O jurista italiano Vivante igualou o conceito jurídico ao conceito econô-mico, consoante apontado por Rubens Requião. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 53.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

17FGV DIREITO RIO

“O conceito econômico de empresa está na organização dos fatores de produção de bens ou de serviços para o mercado, coordenada pelo empre-sário, que lhe assume os resultados. Sobre este conceito econômico nin-guém põe dúvida. Mas, como o Direito trata este conceito econômico?”12

Alberto Asquini indica que as dificuldades de conceituação jurídica da empresa derivam do fato de esta ser um “fenômeno poliédrico”. Para o autor, se a empresa, de um lado, apresenta um conceito econômico unitário, por outro lado possui um conceito jurídico plural, recebendo tratamentos legis-lativos diversos13: é a chamada Teoria dos Perfis da Empresa14, bem resumida por Rubens Requião:

“Vislumbra, então, Asquini a empresa sob quatro diferentes perfis: a) o perfil subjetivo, que vê a empresa como o empresário; b) o perfil funcio-nal, que vê a empresa como atividade empreendedora; c) o perfil patri-monial ou objetivo, que vê a empresa como estabelecimento; d) o perfil corporativo, que vê a empresa como instituição.”15

O Codice Civile italiano de 1942, pioneiro ao sugerir um modelo que superasse o sistema francês, não chega a estabelecer um conceito jurídico de empresa, preferindo definir o seu perfil subjetivo — o empresário — em seu art. 2.08216, como sendo aquele que exerce profissionalmente uma atividade econômica organizada para a produção e circulação de bens ou serviços.

O legislador brasileiro, inspirado pelo modelo italiano, não apresenta ino-vações em relação ao Codice Civile de 1942, ao definir, em seu artigo 966, o empresário como sendo “quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.17

Das definições legais supracitadas decorrem os elementos essenciais à empresa: (i) o sujeito de direito, (ii) a sua atividade particular, (iii) a fina-lidade produtiva e (iv) o caráter profissional18.

Para Waldírio Bulgarelli, os quatro elementos da empresa seriam (i) a organização, (ii) a atividade econômica, (iii) o fim lucrativo e (iv) a profissionalidade19. Bugarelli acrescenta o fim lucrativo como elemento essencial à empresa, sob o argumento de que não há empresa que não vise à obtenção de lucro.

Observa-se que o conceito jurídico de empresa pouco se afastou da noção econômica:

12 MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977. P. 8. No mesmo sentido, temos a lição de Waldírio Bulgarelli, nos seguintes termos: “Os economistas vêm se esforçando desde a Revolução Industrial em conceituar a empresa, nem sempre com êxito. Hoje, contudo, é quase unânime a ideia de que a empresa é uma unidade organizada de produção e comercialização de bens e serviços para o mercado”. BULGARELLI, Waldírio. Sociedades, Empresa e Estabelecimento. São Paulo: Atlas, 1980. P. 19. O mesmo autor, em obra diversa, demonstra o seu aceite pelo conceito econômico de empresa: “Uma vez, portanto, que há verdadeira unanimidade em relação ao conceito econômico de empresa, como aliás assinala muito bem Sylvio Marcondes, nada há de errado na sua aceitação por parte do Direito, e foi nessa conformidade que a legislação veio regulando os seus vários aspectos (...)”.BULGARELLI, Waldírio. Estudos e Pareceres de Direito Empresarial: o Direito das Empresas. São Paulo: Ed. RT, 1980. P. 17. 13 Apud MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977. P.8.14 A tese foi publicada na Rivista del Diritto Commerciale, fascs. 1 e 2, em 1943, sob o titulo “Profi lidell’Imprensa”, conforme REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 71. Em português, a tese foi publicada, com tradução de Fábio Konder Comparato, na Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro n.º104/109-126, São Paulo: RT, outubro/ dezembro, 1996.15 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. 16 Art. 2.082 do Codice Civile italiano de 1942: “Imprenditore — È imprenditore chi esercita professionalmente una attività economica organizzata al fi ne della produzione o dello scambio di beni o di servizi”.17 Art. 966 do Novo Código Civil: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.18 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 55.19 BULGARELLI, Waldírio. Sociedades, Empresa e Estabelecimento. São Paulo: Atlas, 1980. P. 22.

12 MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977. P. 8. No mesmo sentido, temos a lição de Waldírio Bulgarelli, nos seguintes termos: “Os economistas vêm se esforçando desde a Revolução Industrial em conceituar a empresa, nem sempre com êxito. Hoje, contudo, é quase unânime a ideia de que a empresa é uma unidade organizada de produção e comercialização de bens e serviços para o mercado”. BULGARELLI, Waldírio. Sociedades, Empresa e Estabelecimento. São Paulo: Atlas, 1980. P. 19. O mesmo autor, em obra diversa, demonstra o seu aceite pelo conceito econômico de empresa: “Uma vez, portanto, que há verdadeira unanimidade em relação ao conceito econômico de empresa, como aliás assinala muito bem Sylvio Marcon-des, nada há de errado na sua aceitação por parte do Direito, e foi nessa conformi-dade que a legislação veio regulando os seus vários aspectos (...)”.BULGARELLI, Waldírio. Estudos e Pareceres de Direito Empresarial: o Direito das Empresas. São Paulo: Ed. RT, 1980. P. 17.

13 Apud MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Sarai-va, 1977. P.8.

14 A tese foi publicada na Rivista del Diritto Commerciale, fascs. 1 e 2, em 1943, sob o titulo “Profi lidell’Imprensa”, conforme REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Pau-lo: Saraiva, 2000. P. 71. Em português, a tese foi publicada, com tradução de Fábio Konder Comparato, na Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro n.º104/109-126, São Pau-lo: RT, outubro/ dezembro, 1996.

15 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Sa-raiva, 2000.

16 Art. 2.082 do Codice Civile italiano de 1942: “Imprenditore — È imprenditore chi esercita professionalmente una attività economica organizzata al fi ne della produzione o dello scambio di beni o di servizi”.

17 Art. 966 do Novo Código Civil: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circu-lação de bens ou de serviços”.

18 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. I. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 55.

19 BULGARELLI, Waldírio. Sociedades, Empresa e Estabelecimento. São Paulo: Atlas, 1980. P. 22.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

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“Dessume-se, assim, o conceito de empresa daquele de empresário, po-dendo-se conceituá-la como a organização da atividade econômica para o fim de produção ou de troca de bens ou serviços. Verifica-se, portanto, a transmutação que ocorreu no conceito econômico na sua passagem para o âmbito jurídico, sob a égide do empresário, ou seja, de organiza-ção da atividade econômica para o de exercício profissional da atividade econômica organizada.”20

2. o quE é a GrandE EmPrEsa?

Relembrado o conceito de empresa, pergunta-se: o que é precisamente a grande empresa? É notório que a grande empresa exerce atualmente influ-ência dominante no cenário econômico-social contemporâneo. Mas quais são os critérios para definir uma grande empresa? O que a diferencia da pequena empresa?

Há diferentes critérios para tal diferenciação. Por exemplo, o SEBRAE classifica o tamanho da empresa em função do número de pessoas emprega-das. Ao definir a micro e pequena empresa, entender-se-ia, a contrario sensu, que o SEBRAE classifica como grandes empresas aquelas que, na indústria e na construção, empregam mais de 100 (cem) pessoas, e que, no comércio e serviços, empregam mais de 50 (cinquenta)21 pessoas.

Também, por via indireta, a interpretação conjunta da Lei nº 9.841/1999 (Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte) e do Decreto nº 5.028/2004 conduziria à conclusão de que são grandes empresas aquelas que obtiverem uma receita bruta anual superior a R$2.133.222,00 (dois milhões, cento e trinta e três mil, duzentos e vinte e dois reais).

A Lei 11.638/2007, que estende às sociedades de grande porte as disposi-ções da Lei das Sociedades Anônimas sobre escrituração e elaboração de de-monstrações financeiras, define como sendo de grande porte “a sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo total superior a R$240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$300.000.000,00 (trezentos milhões de reais)”.

O conceito de grande empresa é histórico, variando de acordo com cada época e lugar. Na verdade, constata-se que, apesar da noção quase intuitiva acerca do que é a grande empresa, é difícil a tarefa de apresentar critérios objetivos e precisos que a definam. Em geral, podem-se utilizar parâmetros comparativos: compara-se uma empresa com outra de uma mesma região, ou, ainda, faz-se uma confrontação com os dados do país ou do mundo.

20 LAMY FILHO, Alfredo. A reforma da Lei de Sociedades Anônimas. IN: Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. P. 18.21 Disponível em <http://www.sebraecom.br/br/aprendasebrae/estudosepesquisas.asp.> Acesso em 01 de fevereiro de 2018.

20 LAMY FILHO, Alfredo. A reforma da Lei de Sociedades Anônimas. IN: Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. P. 18.

21 Disponível em <http://www.sebraecom.br/br/aprendasebrae/estudosepesquisas.asp.> Acesso em 01 de fevereiro de 2018.

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A grande empresa de Moçambique poderá ser uma pequena ou média em-presa nos Estados Unidos.

De forma geral (e sujeito a inúmeras exceções e ressalvas), o tipo societá-rio das sociedades anônimas é o que possui características mais alinhadas às necessidades das grandes empresas. Algumas de tais características são: (i) a existência de mecanismos para captação de recursos sem necessidade de paga-mento de juros, nem de constituição de dívidas; (ii) limita a responsabilidade da sociedade e de seus participantes e (iii) a livre transferibilidade das ações. Para Alfredo Lamy Filho:

“(...) admitindo a limitação de responsabilidade de todos os sócios, a S/A tornou possível a mobilização de recursos em montante ilimitado, através de junção de capitais das mais variadas procedências de gran-des e pequenos investidores, movidos pelas mais diversas inspirações, embora com o denominador comum da colimação de lucros. Por outro lado, a livre transferibilidade do papel que incorporava essa partici-pação tornava-o extremamente atraente porque possibilitava liquidez imediata. Com esses atributos, revela-se a S/A dotada de explosiva força de expansão”22

Embora a sociedade anônima seja a forma jurídica mais adotada para a grande empresa, não é a única. São muitas as grandes empresas no Brasil que adotam a forma de limitadas e até mesmo de consórcios, cooperativas e sociedades profissionais.

Kraakman e Hansmann, em seu artigo “What is Corporate Law?” trazem os resultados de seus estudos feitos em jurisdições as mais diversas, em que puderam reunir um núcleo de características basilares, comuns às empresas de muitos ordenamentos jurídicos ao redor do mundo23.

Tais características são apresentadas como frequentemente encontradas no direito societário. São elas: (i) a personalidade jurídica, permitindo às socie-dades serem elas próprias titulares de direitos e deveres; (ii) unidades de capi-tal social dotadas de transmissibilidade; (iii) gestão delegada aos administra-dores, organizados em órgãos de administração, atuando como agentes dos proprietários; e (iv) e a propriedade da sociedade detida pelos investidores.

Estas cinco características, é afirmado, delineiam a estrutura relativamente comum das sociedades empresárias no mundo globalizado. Ainda se acres-centa que todas as grandes empresas possuem estes cinco elementos.

22 LAMY FILHO, Alfredo. A Reforma da Lei de Sociedades Anônimas. IN: Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. P. 39.23 KRAAKMAN, Reinier; HANSMANN, Henry. Chapter 1: What is Corporate Law? em The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and functional approach. Oxford: Oxford University Press. 2004, pp. 1-20.

22 LAMY FILHO, Alfredo. A Reforma da Lei de Sociedades Anônimas. IN: Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. P. 39.

23 KRAAKMAN, Reinier; HANSMANN, Henry. Chapter 1: What is Corporate Law? em The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and functional approach. Oxford: Oxford University Press. 2004, pp. 1-20.

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Atendo-nos especificamente ao âmbito do direito empresarial como está positivado no Brasil, já se vê que o conceito de empresa atualmente privile-giado juridicamente é sobretudo relacionado ao perfil subjetivo de Asquini. Ou seja, define-se empresa em função da pessoa do empresário. É o que faz o art. 966 do Código Civil24.

Esta definição se aplica a pessoas, físicas ou jurídicas. O art. 44 do CC, por sua vez, elenca as pessoas jurídicas de direito privado do nosso ordenamento jurídico. Dentre elas estão as sociedades25. As sociedades podem ser, confor-me a atividade que exerçam, simples ou empresárias – exceto a sociedade anônima, que sempre será empresária. As que produzirem ou circularem bens ou serviços serão deste último tipo.

As sociedades são, por excelência, pessoas jurídicas criadas para o exercício de atividade econômica, o que não significa que sempre serão empresárias. Esta classificação refere-se à finalidade lucrativa.

A sociedade é conveniente para o exercício de atividade empresarial dentre outros motivos, por permitir a união de esforços individuais buscando o lucro.

A multiplicidade de tipos societários permitidos pelo direito brasileiro pode causar questionamentos sobre qual é o melhor para a atividade empresarial.

Criou-se o estigma de que a sociedade limitada é a melhor roupagem para os negócios pequenos, em contraposição às sociedades anônimas mais ade-quadas para os grandes.

No entanto, esta separação é bastante questionável. Como já exposto, em “What is corporate law?”, são apresentadas cinco características comuns às empresas em muitos ordenamentos jurídicos. E ainda se afirma que todas as empresas de grande porte as apresentam.

É curioso notar, nessa toada, que tais cinco “elementos” estão todos pre-sentes no regime jurídico de uma sociedade limitada. Este tipo societário apresenta personalidade jurídica, propriedade detida pelos investidores, de-legação da gestão a um órgão administrativo que atua como agente dos pro-prietários e também unidades de capital social dotadas de transmissibilidade.

Este último elemento é frequentemente usado para desmerecer a socie-dade limitada como tipo societário adequado à empresa de grande porte. Porém, está equivocada esta posição. As unidades de capital social neste tipo societário são denominadas quotas. E estas não são valores mobiliários. 24 Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. (Código Civil Brasileiro)25 Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as fundações IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos; VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada. (Código Civil Brasileiro)

24 Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente ati-vidade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. (Código Civil Brasileiro)

25 Art. 44. São pessoas jurídicas de di-reito privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as fundações IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos; VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada. (Código Civil Brasileiro)

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Assim, não podem ser negociadas no mercado destes bens. Enquanto isto, a sociedade anônima pode abrir seu capital e se beneficiar do barato financia-mento do mercado de capitais, se comparado com o mercado de crédito. A limitada não tem esta possibilidade.

Mas o fato de uma sociedade limitada não negociar seu capital social em bolsa não significa que este não é dotado de transmissibilidade. A diferença é o modo como se dá a transmissão, através de instrumento particular entre alienante e adquirente.

A impossibilidade de acesso ao crédito barato do mercado de capitais não é impeditivo ao crescimento de uma sociedade limitada. Diferentemente das sociedades anônimas, as limitadas podem fazer captação de investidores de forma privada e individual, e trazer para a empresa a figura do sócio capita-lista, aquele que prefere não se envolver no dia-a-dia, na gestão do negócio, e se interessa basicamente pelo lucro.

Tanto é falaciosa a afirmação de que somente a sociedade anônima tem vocação para ser uma grande empresa que a lei 11.638/2007 acrescentou o art. 195-A à LSA, o qual prevê que aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não sejam sociedades anônimas, as obrigações de elabo-ração, escrituração e auditoria das demonstrações financeiras previstas na própria lei. Este diploma normativo traz o conceito de sociedade de grande porte no art. 3º, p. ú26.

Em “The End of History for Corporate Law”, também Kraakman e Hans-mann apresentam uma evolução histórica das perspectivas sob as quais o direito empresarial, ao longo do tempo, concebeu seu objeto, a empresa e os atores de relevo na realidade negocial, bem como finalidades e funções.

Os autores trazem modelos que representam as posições acerca desses as-pectos pelas quais o direito empresarial já passou.

O chamado “shreholder-oriented model” é apresentado como o paradigma segundo o qual o papel da empresa é, primordialmente, atender aos interesses dos sócios (shareholders): lucrar.

Este modelo gozou de considerável predominância e guiou inclusive a elaboração de normas de direito empresarial que não se preocupavam em dar atenção substancial a interesses de outros atores que não sejam sócios27.

Mas surgiram modelos alternativos ao primeiro. Neles não se abandona o papel de gerar lucro aos sócios, mas é abordada a importância de outros atores.

26 Sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exercício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).27 The End of History for Corporate Law. Hansmann, Henry e Kraakman, Reinier. Yale Law School. 2000.

26 Sociedade ou conjunto de sociedades sob controle comum que tiver, no exer-cício social anterior, ativo total superior a R$ 240.000.000,00 (duzentos e qua-renta milhões de reais) ou receita bruta anual superior a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais).

27 The End of History for Corporate Law. Hansmann, Henry e Kraakman, Reinier. Yale Law School. 2000.

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No “manager-oriented model”), ganha destaque a figura do administrador, entendido como agente desinteressado que, através de sus deveres fiduciários, conseguiria atender ao interesse do público em geral. No âmbito normativo, esta visão resultou em normas ampliando os poderes dos gestores.

Já a visão do “labor-oriented model” reconheceu a importância do trabalho para a empresa. No direito empresarial, esta perspectiva trouxe, como exem-plo, a regra da representação dos empregados na administração.

O “state-oriented model” trouxe à luz a participação do Estado no con-texto empresarial. Entende-se ter havido, por exemplo, redução do poder dos sócios sobre os administradores para que estes tendam a submeter-se às interferências estatais, como a regulação administrativa.

Por fim, é trazido o “stakeholder-oriented model”. Stakeholder é todo aquele que é afetado de alguma forma pela atuação empresarial. A responsabilidade da empresa com a comunidade em que atua tem como base esta perspectiva.

As grandes empresas têm um relevante papel na economia mundial. Em algumas situações, o poderio econômico de determinadas empresas é tamanho que ultrapassa o PIB de inúmeros países. Nas palavras de Gustavo Franco:

“Países e empresas vivem em dimensões diferentes, e são medidos com escalas próprias, os primeiros por meio do PIB, ou seja, pelo valor adi-cionado total gerado dentro de suas fronteiras, enquanto o tamanho das empresas é medido pelo faturamento. Conciliando as escalas, um cálculo para o ano 2000, feito pela Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), mostrou que, entre os cinquenta maiores países e empresas, há apenas duas empresas, mas, dentro dos cinquenta seguintes, 27 são empresas. Ou seja, para o total dos 100 maiores países e empresas, 29 eram empresas, sendo que a maior delas, a Exxon Mobil, tinha um “PIB” estimado em cerca de 63 bilhões de dólares, ligeiramente inferior ao do Chile e das Filipinas e maior que o do Paquistão”28.

Percebe-se que o poder econômico das grandes empresas pode, em última instância, influenciar social e politicamente uma determinada sociedade e, até mesmo, a ordem mundial.

Esta constatação se mostra ainda mais presente quando se verifica a ex-pansão do fenômeno da concentração. A concentração, em seu sentido eco-nômico, representa a aquisição de mais meios de produção. A tendência à 28 FRANCO, Gustavo. Globalização e Poder. IN: VEJA, Edição 1857, de 09 de junho de 2004. IN: <http://www.econpuc-rio.br/gfranco/VEJA121.htm> Acessado em 2 de fevereiro de 2016.

28 FRANCO, Gustavo. Globalização e Poder. IN: VEJA, Edição 1857, de 09 de junho de 2004. IN: <http://www.econpuc-rio.br/gfranco/VEJA121.htm> Acessado em 2 de fevereiro de 2016.

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concentração e à necessidade de crescimento de empresas refere-se, em última instância, à capacidade de realizar de forma mais adequada os investimentos de que determinada empresa necessita para a realização da sua atividade.

De acordo com Fábio Konder Comparato:

“(...) a evolução da economia capitalista nos últimos 40 anos, e no-tadamente a partir da Segunda Guerra Mundial, tem sido coman-dada pelo fenômeno da concentração empresarial. Desde a primeira Revolução Industrial as vantagens da constituição dessas ‘economias internas de escala’, segundo expressão consagrada por Alfred Marshall, eram de todos conhecidas: baixa do custo unitário de produção com o aumento do volume de unidades produzidas; possibilidade de autofi-nanciamento, libertando a empresa das injunções do mercado finan-ceiro; multiplicação de estabelecimentos, permitindo que atingissem diretamente os diferentes centros de consumo, com a supressão dos in-termediários; estocagem de matéria-prima, atenuando as variações de preços; estudos de mercado e publicidade em larga escala”.29

Quanto maior uma empresa, mais vantagens, portanto, ela retira de sua posição dominante no mercado, pois maior é a sua capacidade de diminuir custos de produção, angariar lucros e aumentar seus investimentos.

Atualmente, além do processo de integração econômica internacional, por meio das grandes empresas e da concentração, percebe-se uma nova onda de crescimento das empresas, por meio do fenômeno da pulverização de capi-tal, em que se estabelece uma difusão das ações entre milhares de acionistas, sendo o controle da companhia exercido não mais por acionistas, mas por meio de órgãos de administração, fenômeno que classicamente se denomina “controle gerencial”.

A pulverização do controle acionário existe em todos os países em que há um mercado de valores mobiliários forte, que atrai a poupança popular e que é acessado em grande escala pelas sociedades anônimas locais (as corporations americanas, ou public limited companies inglesas).

Em geral, as empresas nascem por iniciativa e capacidade de um líder, o empreendedor sob a qual crescem e se afirmam. Para se expandirem, con-tudo, precisam de recursos financeiros, recorrendo ao mercado de capitais, onde encontram capital farto e barato30.

29 COMPARATO, Fábio Konder. Aspectos Jurídicos da Macroempresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1970. Pp. 4 e 5.30 COMPARATO, Fábio Konder. Aspectos Jurídicos da Macroempresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1970. Pp. 4 e 5.

29 COMPARATO, Fábio Konder. Aspec-tos Jurídicos da Macroempresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1970. Pp. 4 e 5.

30 COMPARATO, Fábio Konder. Aspectos Jurídicos da Macroempresa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1970. Pp. 4 e 5.

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24FGV DIREITO RIO

Mas com quem essas grandes empresas devem alinhar os seus interesses? O meu grupo de pessoas que vem às nossas mentes é o dos acionistas dessas sociedades. Mas será que apenas os interesses deles devem ser respeitados? Será que a lei deve condutas que contrariem esses interesses?

O artigo “The End of History of Corporate Law” deixa claro que as socie-dades devem se organizar e operar para servirem aos interesses da sociedade como um todo e que os interesses dos seus acionistas não devem pesar mais do que os interesses de qualquer outro membro da sociedade31.

Contudo, a partir de um raciocínio baseado na lógica e na experiência, é de comum entendimento de que a melhor maneira de se buscar o bem-estar social é alinhando os interesses da companhia com os de seus acionistas, e (pelo menos em certos sentidos) apenas aos esses interesses.

Isso não quer dizer que o resto da sociedade ficará desprotegida. Isso ape-nas indica que o mecanismo legal mais eficiente para proteger os interesses de todos – trabalhadores, consumidores, público em geral – é alinhando os seus interesses com o de seus acionistas.

Os únicos que não teriam os seus interesses protegidos seriam os credores, mas a exclusão dos interesses dos credores já é uma prática no meio corporati-vo. Com exceção do momento de falência, incluir os credores na governança corporativa não é algo costumeiro e nem estimulado pela legislação.

Importante destacar que quando se menciona os interesses dos acionistas, inclui tanto os dos majoritários quanto os dos minoritários. Há, inclusive, uma preocupação especial com os interesses daqueles acionistas que não pos-suem qualquer poder de controle na empresa.

Essa preocupação deriva de duas razões baseadas unicamente na eficiência. O primeiro motivo é que a ausência de proteção aos acionistas sem poder de controle dificulta que aquela empresa tenha um aumento de oferta de capital no mercado acionário. A segunda razão é que os meios pelos quais os acionistas controladores contraem para si uma parcela desproporcional dos benefícios corporativos geralmente envolvem escolhas de investimento e políticas de gestão ineficientes.

31 The End of History for Corporate Law. Hansmann, Henry e Kraakman, Reinier. Yale Law School. 2000.

31 The End of History for Corporate Law. Hansmann, Henry e Kraakman, Reinier. Yale Law School. 2000.

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AulA 2: socIEdAdE AnônImA: Evolução HIstórIcA, noçõEs GErAIs E cArActErístIcAs prIncIpAIs

lEitura básiCa:

LAMY FILHO, Alfredo et al. A Lei das S.A. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 1995, Vols. I – pp. 19-60 e pp. 203-219.

lEitura ComPlEmEntar:

MICKLETHWAIT, John; WOOLDRIDGE, Adrian. The Company: A Short History of a Revolutionary Idea. Editora Modern Library Chronicles. 2005.

rotEiro:

No tópico anterior, foi avaliada a importância da grande empresa no atual cenário econômico e social. Ainda, concluiu-se que a sociedade anônima é a principal forma jurídica adotada, em escala mundial, pelas grandes organiza-ções empresariais.

Passaremos, agora, a analisar as principais características que distinguem as sociedades anônimas — também denominadas “companhias” — dos de-mais tipos societários no ordenamento jurídico brasileiro.

1. Evolução históriCa.

A doutrina diverge quanto à origem das sociedades anônimas. Em um breve resumo, há quem diga que a Casa di San Giorgio, uma associação de credores da cidade de Gênova, criada para financiar a guerra contra Veneza na Renascença italiana foi o “embrião” da Sociedade Anônima, na medida em que os credores trocaram seus créditos por frações ideais dessa associação e passaram a administrar seus créditos conjuntamente. Muitos, contudo, re-jeitam a ideia que a Casa di San Giorgio foi a origem das S.A.s, por asseme-lhar-se mais a uma comunhão de credores.

Na verdade, a sociedade anônima como conhecemos hoje se originou

nas grandes sociedades coloniais do Século XVII, que financiaram o comér-cio com o oriente e a exploração de colônias, empreendimentos com custos

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26FGV DIREITO RIO

elevadíssimos e forte interesse do Estado. A primeira dessas grandes em-presas foi a Companhia das Índias Orientais holandesa, fundada em 1602. Em 1621 foi fundada a Companhia das Índias Ocidentais, que teve grande importância na história do Brasil, tendo patrocinado a invasão holandesa no Nordeste brasileiro.

Várias sociedades similares foram criadas na França, Inglaterra e Portugal,

sempre com o intuito de financiar grandes empreendimentos ultramarinos. O primeiro grande movimento especulativo com ações de uma sociedade anônima aconteceu em 1720 com as ações da South Sea Company, uma com-panhia formada para explorar o monopólio do comércio entre a Inglaterra e a América espanhola. Esse movimento especulativo, conhecido como “South Sea Bubble”, gerou o famoso “Bubble Act”, obrigando todas as novas empre-sas a serem formadas apenas mediante um ato de outorga do parlamento.

No seu início, portanto, as sociedades anônimas começaram como verda-deiras sociedades de economia mista, com forte participação e interesse esta-tal, buscando a poupança privada para financiar grandes empreendimentos de interesse público. As sociedades eram criadas por outorga estatal, criando um mecanismo de controle da captação de recursos da poupança popular.

No Brasil, exemplos de sociedades constituídas sob o regime de outorga

são a Companhia Geral do Grão Pará, criada para colonizar o norte do país e o Banco do Brasil.

Na França, por sua vez, o Código Civil napoleônico instituiu, em 1807,

um sistema de autorização governamental para a constituição de uma socie-dade por ações, que passou a vigorar em todo o continente. Para a constitui-ção de uma sociedade anônima não era mais necessária a outorga estatal, mas apenas uma autorização regulatória.

Em meados do Século XIX, Inglaterra e Estados Unidos, em plena Re-

volução Industrial, buscavam maneiras de facilitar o acesso ao capital para o financiamento dos empreendimentos, o que fizeram mediante a abolição do sistema de outorga, substituindo-o por um sistema de regulamentação. Em outras palavras, desde que seguisse a regulamentação vigente, a constituição de uma sociedade anônima não dependia mais da autorização governamen-tal. Esse sistema foi adotado pela França em 1867, após o acordo de livre comércio com a Inglaterra firmado em 1862, que fez com que as sociedades anônimas constituídas na França ficassem em desvantagem comercial em re-lação às sociedades anônimas constituídas na Inglaterra.

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27FGV DIREITO RIO

No Brasil, o regime de outorga da colônia e do primeiro reinado foi subs-tituído pelo regime de autorização primeiro por Decreto de 1849, confirma-do depois no Código Comercial de 1850. Em 1882 o regime de autorização foi abolido e o Brasil passou a adotar o regime de regulamentação, sendo necessária autorização apenas em casos excepcionais, como bancos, segura-doras, sociedades estrangeiras, etc.

Com a Lei das S.A., de 1976, e a criação da CVM, o Brasil passou

a conviver com um regime dualista: regulamentação para as sociedades fechadas e autorização para as companhias abertas, que precisam de au-torização prévia da CVM para se constituírem ou terem suas ações nego-ciadas em bolsa de valores.

2. soCiEdadE anônima: dEfinição lEGal.

Segundo o art. 1º da Lei nº 6.404/76 (“LSA”), companhia é a pessoa jurí-dica de direito privado, cujo capital social é dividido em ações e na qual a res-ponsabilidade de cada sócio é limitada ao preço de emissão das ações que subs-creveu ou adquiriu. Companhia e sociedade anônima são termos sinônimos.

A divisão do capital social32 em ações, conforme aludido pelos arts. 1º da LSA e 1.088 do Código Civil (“CC/02”), significa que “as participações socie-tárias designadas ações são padronizadas e incorporadas em valores mobiliários”, conforme ensina José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho33.

Junto com a sociedade em comandita por ações, a sociedade anônima forma o gênero das “sociedades por ações”. Ambas, independentemente de seu objeto, são consideradas empresárias, em conformidade com o §único do art. 982 do CC/02.

3. CaraCtErístiCas EssEnCiais da soCiEdadE anônima.

Como toda forma de sociedade, a companhia possui características mar-cantes que a diferenciam das demais e, em seu caso particular, fazem dela o modelo jurídico mais sofisticado e completo no direito brasileiro para união de capital proveniente de indivíduos desconhecidos, os quais, no entanto, desejam a concretização de um fim comum.

Eis, a seguir, breves considerações acerca das características mais básicas das sociedades por ações.

32 Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho definem capital social como “a cifra, fixada no estatuto social, do montante das contribuições prometidas pelos sócios para formação da companhia que a lei submete a regime cogente, cujo fim é proteger os credores sociais. Os fundadores (na constituição da companhia) e os órgãos sociais (durante a vida da sociedade) estipulam no estatuto o valor do capital social, que somente pode ser modificado com observância das normas legais. PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P.143. Este será um tema melhor abordado no tópico 7.33 idem.

32 Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho definem capital social como “a cifra, fixada no estatuto social, do montante das contribuições pro-metidas pelos sócios para formação da companhia que a lei submete a regime cogente, cujo fim é proteger os credores sociais. Os fundadores (na constituição da companhia) e os órgãos sociais (durante a vida da sociedade) estipulam no estatuto o valor do capital social, que somente pode ser modificado com observância das normas legais. PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Compa-nhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P.143. Este será um tema melhor abordado no tópico 7.

33 idem.

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3.1. divisão do Capital social em ações.

Os direitos e obrigações dos acionistas, nascidos de contribuições para o capital social, são incorporados em valores mobiliários, organizados de forma jurídica padronizada, dos quais se abstrai a identidade dos titulares das ações.

É importante ter em mente que a ação é um conjunto padronizado de direitos e obrigações. A divisão do capital social em ações permite: a alocação de risco, a livre circulação das participações e facilita um 2º mercado. Por se tratar de uma mesma unidade para todos, a transferência é facilitada, o que permite o comércio e a acumulação de riquezas.

A diferença entre o acionista majoritário e o minoritário não está ligada a alguma característica intrínseca de uma ação, já que as ações são padroni-zadas. O elemento que distingue esses dois é o acúmulo das ações, que dão àquele acionista mais poder nas decisões.

3.2. Padronização das Posições de sócio.

A padronização das posições de sócio significa conferir igualdade de direi-tos às ações da mesma classe e espécie. Deste modo, a possibilidade de dife-rentes direitos e características dos acionistas de uma Companhia é condicio-nada às classes ou espécies de ações. Entretanto, dentre as mesmas espécie ou classe não há distinção de direitos.

3.3. Posições de sócios não Personalizadas.

Nas sociedades por ações, o Estatuto Social fixa o número, espécies e clas-ses das ações sem identificar a pessoa do acionista.

Nesse contexto, o acionista pode transferir a ação para outra pessoa sem a necessidade de se alterar o estatuto da companhia. Por isso, não se considera, nas sociedades anônimas, diferentemente de outros tipos societários, perso-nalizadas as posições dos sócios, o que revela o seu caráter institucionalista.

3.4. natureza Corpórea da ação.

Em relação às ações, veja-se que elas são incorporadas em título de crédito (em sentido lato), designado valor mobiliário, o que lhe confere natureza corpórea. A função dos títulos de crédito é facilitar a circulação de direitos.

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Nesse sentido, a incorporação da ação em título de crédito funciona como excelente instrumento para reunir capitais de grande número de pessoas e desenvolver o mercado.

Também vale registrar que a sociedade anônima está autorizada, por lei, a emitir outros títulos, além das ações, que conferem ao seu titular o direito de participar nos lucros (partes beneficiárias), o direito de subscrever ações (bô-nus de subscrição), ou créditos pecuniários contra a companhia (debêntures).

3.5. livre Circulação das ações.

As ações e demais títulos emitidos pela companhia seguem a regra da livre circulação, sem a identificação da pessoa de seu titular.

3.6. limitação dos riscos do acionista.

Como se disse, o art. 1º da LSA limita a responsabilidade do acionista perante terceiros ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas. Por assim dizer, limita-se o risco financeiro do acionista. Essa característica incen-tiva o empresariado.

3.7. sociedade de Capital vs. sociedade de Pessoas.

Qualifica-se, de uma maneira geral, a sociedade anônima como “sociedade de capitais”, isto é, intuitu pecuniae, pois nela o vínculo entre os sócios tem por base a aglutinação de recursos, independentemente da pessoa de seus só-cios. Neste tipo societário a figura dos sócios não predomina para a formação do vínculo societário, tal como ocorre nas sociedades limitadas, por exemplo. A relação entre os sócios nas sociedades anônimas ancora-se, precipuamente, na disposição para aporte de capital visando a obtenção de resultados econô-micos, independente das características pessoais de seus sócios.

Em oposição às sociedades de capitais, as sociedades de pessoas são aque-

las em que a pessoa do sócio tem papel fundamental na realização do objeto social. As sociedades de pessoas são constituídas com intuitu personae, razão pela qual o desentendimento entre os membros, quando torna insuportável a vida em sociedade, implica a quebra da affectio societatis. As sociedades de pessoas estão previstas no Código Civil.

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Nas sociedades anônimas fechadas, isto é, aquelas cujos valores mobiliá-rios não estão admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários, cf. art. 4º da LSA, embora de cunho eminentemente patrimonial, em diversas ocasiões concentra-se na pessoa de seus sócios um de seus elementos funda-mentais. Exemplo disso são as sociedades anônimas familiares, inacessíveis a estranhos, cujas ações circulam entre os poucos acionistas que as adquirem.

Na realidade, essas sociedades são constituídas intuitu personae, uma vez

que o animus que se requer dos sócios não é só material: a realização do ob-jeto social depende fundamentalmente dos atributos individuais dos sócios.

Fábio Konder Comparato entende que a companhia fechada, tanto inter-na quanto externamente, é uma verdadeira sociedade de pessoas, dominada pelo princípio da identificação dos acionistas (sejam eles pessoas físicas ou jurídicas), de sua colaboração pessoal no exercício da empresa e da boa-fé em seu relacionamento recíproco. No mesmo sentido, entendem Rubens Re-quião e Sérgio Campinho.

A distinção das sociedades em de pessoas/contratuais ou de capitais/ins-titucionais traz relevantes consequências, como é o caso de se saber se o ins-tituto da dissolução parcial, em razão da quebra da affectio societatis, ou seja, da vontade dos sócios em constituir a sociedade, aplicado às sociedades de pessoas do Código Civil, pode ou não ser aplicado às sociedades anônimas de capital fechado. Ainda, a distinção é relevante para saber se o instituto da exclusão de sócio, previsto no art. 1.085 do Código Civil, pode ser aplicado às sociedades anônimas fechadas.

A LSA, ao cuidar dos casos de dissolução da sociedade anônima, a partir

do art. 206, sempre pressupõe a dissolução integral da companhia. Com efei-to, a regra prevista em lei para esse tipo societário é a dissolução total, tendo em vista a sua natureza e estruturação jurídica. Portanto, não há dúvidas de que as sociedades anônimas abertas estão sujeitas à dissolução total, nos ter-mos do referido artigo.

Contudo, no que se refere às sociedades anônimas fechadas, a doutrina e a jurisprudência não encontram óbices à adoção da dissolução parcial, fundada na quebra da affectio societatis.

O instituto da dissolução parcial erigiu-se baseado nas sociedades de pes-soas/contratuais, como alternativa à dissolução total, como medida mais con-sentânea ao princípio da preservação da sociedade e sua função social. Con-tudo, com a complexa realidade das relações negociais, vem se admitindo a

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extensão do referido instituto às sociedades anônimas fechadas, que ostentem caráter familiar, nas quais as qualidades pessoais dos sócios adquirem relevân-cia para o desenvolvimento das atividades sociais.

A posição que tem prevalecido, atualmente, é a possibilidade de disso-lução parcial de uma sociedade anônima fechada, com traço nitidamente personalista, fundada na quebra da affectio societatis. Assim, possibilita-se ao acionista dissidente a sua retirada do empreendimento, mediante o justo pa-gamento de seus haveres, sem que a companhia e a empresa por ela desenvol-vida sofram solução de continuidade.

Em julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça34 reco-nheceu-se que:

“Caracterizada a sociedade anônima como fechada e personalista, o que tem o condão de propiciar a sua dissolução parcial – fenômeno até recentemente vinculado às sociedades de pessoas –, é de se enten-der também pela possibilidade de aplicação das regras atinentes à exclusão de sócios das sociedades regidas pelo Código Civil, máxime diante da previsão contida no art. 1.089 do CC: “A sociedade anô-nima rege-se por lei especial, aplicando-se lhe, nos casos omissos, as disposições deste Código”.

Em seu voto, o Ministro Luis Felipe Salomão reconheceu que, em regra, as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuitu pecuniae), mas que, diante da complexidade das relações negociais, não é possível enquadrá-las de forma apriorística numa ou noutra classificação.

Nesse sentido, reconheceu o STJ a possibilidade tanto da aplicação do instituto da dissolução parcial às sociedades anônimas de capital fechado, que apresentem natureza personalista, quanto a possibilidade de aplicação do instituto da exclusão de sócios, previsto no art. 1.085 do Código Civil, àquelas sociedades.

Diante disso, pode-se concluir que, em relação às sociedades anônimas de capital aberto, prevalece o entendimento de que estão são sociedades de capi-tal, com feição institucional, sujeitas, portanto, apenas às disposições da LSA Entretanto, em relação às sociedades de capital fechado, atualmente não é mais possível um rígido enquadramento destas como sociedades de capitais, pois, dependendo de sua feição, se personalista, poderão a ela ser aplicados institutos próprios das sociedades de pessoas.

34 Recurso especial nº 917.531/RS, Quarta Turma, acórdão publicado em 01.02.2012.

34 Recurso especial nº 917.531/RS, Quarta Turma, acórdão publicado em 01.02.2012.

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4. sistEma jurídiCo das ComPanhias.

O sistema jurídico da companhia é formado pelo conjunto de todas as normas jurídicas que se aplicam a cada companhia existente, compreendendo as normas:

(i) do seu estatuto social;

(ii) da LSA e sua regulamentação;

(iii) de outras leis; e

(iv) estipulações de contratos parassociais ou preliminares.

Fala-se em sistema porque suas normas se acham inter-relacionadas por referência a uma mesma companhia.

4.1. Conceito e Espécies de normas.

A primeira tarefa para se conhecer o sistema jurídico de determinada com-panhia é ler e interpretar o seu estatuto social. Além do estatuto social, o sistema de cada companhia compreende também as normas cogentes da LSA e sua regulamentação. Geralmente, o estatuto social da companhia reproduz apenas algumas dessas normas.

Por esse motivo, a segunda tarefa para conhecer o sistema jurídico da com-panhia é comparar o estatuto social com a LSA e sua regulamentação, a fim de verificar se o estatuto contém dispositivos inválidos (porque incompatíveis com normas cogentes ou por ultrapassarem os limites de normas legais) e in-terpretar as estipulações estatutárias à luz das normas da LSA, pois essa inter-pretação sistemática pode modificar o conteúdo das estipulações estatutárias consideradas de forma individual.

O conhecimento do sistema jurídico da companhia pode requerer, ainda, uma terceira tarefa, consistente na verificação dos efeitos da interpretação sistemática que abranja leis gerais (como, por exemplo, o Código Civil), as leis especiais sobre institutos referidos na LSA e as leis de direito público que contenham normas aplicáveis à classe a que pertence a companhia, ou à ati-vidade que constitua seu objeto social.

O conhecimento do sistema jurídico da companhia poderá compreen-der, por fim, uma quarta tarefa, no caso de haver contratos coligados ao da companhia, ou dele dependentes, ou se a constituição da companhia foi pre-cedida de contrato preliminar, que consiste na interpretação sistemática que tenha em conta as estipulações desses contratos.

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4.2. normas do Estatuto social.

As normas do estatuto social formam o chamado sistema jurídico parti-cular da companhia. A LSA dispõe, no art. 83, que o estatuto social “deverá satisfazer a todos os requisitos exigidos para os contratos das sociedades mercan-tis em geral e aos peculiares à companhia, e conterá as normas pelas quais se regerá a companhia”.

O estatuto social compreende as normas particulares ou individuais cria-das pelas partes do contrato de companhia, como ocorre em qualquer outro contrato, mas apresenta duas peculiaridades:

(i) a LSA, além de regular o contrato de companhia, é a legislação de organização das companhias; e

(ii) suas normas são genéricas, no sentido de que não são dirigidas a pessoas identificadas.

Tais peculiaridades resultam da característica de que os direitos e as obri-gações dos acionistas são definidos no estatuto como elementos das ações, com abstração de seus titulares. O acordo de vontades que cria a companhia tem por destinatários quaisquer pessoas que ocupem e venham a ocupar as posições jurídicas de acionistas ou os cargos dos órgãos sociais.

Pode-se dizer, portanto, que o estatuto social tem a mesma natureza do direito objetivo, no sentido de que é um sistema de normas jurídicas gené-ricas, obrigatórias e permanentes, que somente podem ser modificadas ou extintas com a observância das normas jurídicas que regulam sua produção, vigência e eficácia.

A LSA reserva aos subscritores das ações (na constituição) e à Assembleia Geral dos acionistas (durante a existência da companhia) a competência para, respectivamente, criar e modificar o estatuto.

A norma do estatuto somente deixa de viger:

(i) por nova deliberação da Assembleia Geral, adotada com a ob-servância dos preceitos legais aplicáveis; ou

(ii) por decisão judicial que declare a sua invalidade.

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4.3. normas da lsa

As normas da LSA consistem em um sistema de normas que regulam o contrato de sociedade e integram o estatuto legal da organização social. Algumas dessas normas são cogentes (definem características essenciais das companhias ou excluem a autonomia de vontade das partes contratantes); dispositivas (sua aplicação pode ser afastada pelas partes ao exercerem a liberdade de contratar); supletivas (aplicam-se na ausência da manifestação de vontade dos contratantes) ou interpretativas dos preceitos legais e das estipulações contratuais.

4.4. outras normas legais.

O Código Civil integra o sistema jurídico da companhia, na medida em que contém disposições sobre diversos institutos que se aplicam à companhia (pessoas jurídicas, negócios jurídicos, atos ilícitos, prescrição e decadência, direitos das obrigações, responsabilidade civil, entre outros).

Há, ainda, leis de direito público que contêm normas aplicáveis às com-panhias, como as que regulam os mercados de valores mobiliários (lei nº 6.385/76) e dispõem sobre companhias abertas, e as do Código Penal, cujo art. 177 tipifica os crimes praticados pelos fundadores, administradores e acionistas de companhias.

4.5. Contratos Parassociais.

A expressão “contratos parassociais” significa gênero de contratos coliga-dos ao de sociedade, ou dele dependentes, pelos quais os sócios contraem obrigações sobre exercício de seus direitos de sócio e de dispor de suas parti-cipações societárias, ou sobre obrigações de prover recursos à sociedade. São contratos distintos do contrato de sociedade, mas a ele acessórios. A modali-dade de contrato parassocial mais estudada é o acordo de acionista.

Na definição de Carlos Augusto da Silveira Lobo, os acordos de acionistas são modalidades de “contrato parassocial”, que compreendem contratos em que as partes regulam ou complementam seus direitos e obrigações como sócios de determinada sociedade e por isso são considerados coligados ao contrato social, ou acessórios deste.

Por força de expressa disposição legal (art. 118 da LSA), o acordo de acio-nistas integra o sistema jurídico da companhia quando arquivado na sua sede.

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A lei 10.303/2001 reforçou a eficácia da referida norma ao acrescentar ao art. 118 da LSA o parágrafo 8º que determina que: “o presidente da assem-bleia ou do órgão colegiado de deliberação da companhia não computará o voto proferido com infração de acordo de acionistas devidamente arquivado”.

Ainda, o parágrafo 9º define que:

“O não comparecimento à assembleia ou às reuniões dos órgãos de ad-ministração da companhia, bem como as abstenções de voto de qual-quer parte de acordo de acionistas ou de membros do conselho de ad-ministração eleitos nos termos de acordo de acionistas, assegura à parte prejudicada o direito de votar com as ações pertencentes ao acionista ausente ou omisso e, no caso de membro do conselho de administração, pelo conselheiro eleito com os votos da parte prejudicada.”

5. órGãos soCiais.

A sociedade anônima, como qualquer outra pessoa jurídica, manifesta a vontade social através de seus órgãos. Nesse sentido, a LSA prevê a existência de, ao menos, quatro órgãos sociais:

(a) Assembleia Geral;

(b) Diretoria;

(c) Conselho Fiscal, o qual, entretanto, não precisa funcionar continuamente; e

(d) Conselho de Administração nas companhias abertas (art. 138, §2º, LSA), nas sociedades de capital autorizado (art. 138, §2º, LSA) e de economia mista (art. 239 LSA) (na sociedade anônima fechada, o conselho de administração é facultativo)35.

Ainda, de acordo com o art. 160 da LSA, permite-se que o estatuto crie outros órgãos com funções técnicas ou de aconselhamento.

Melhor análise desse tema se dará nos tópico 6, 8 e 9. Por ora cabe mencionar brevemente o seguinte a respeito da cada um dos órgãos sociais legalmente previstos:

35 Lei 6.404/76: “Artigo 138. A administração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao conselho de administração e à diretoria.§1º O conselho de administração é órgão de deliberação colegiada, sendo a representação da companhia privativa dos diretores.”§ 2º As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoriamente, conselho de administração.”

35 Lei 6.404/76: “Artigo 138. A admi-nistração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao con-selho de administração e à diretoria.§1º O conselho de administração é ór-gão de deliberação colegiada, sendo a representação da companhia privativa dos diretores.”§ 2º As companhias abertas e as de ca-pital autorizado terão, obrigatoriamen-te, conselho de administração.”

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5.1. assembleia Geral.

É o órgão supremo da sociedade, no qual reside a fonte maior de todo o poder. Formada pela reunião de todos os acionistas, tem com-petência irrestrita para deliberar sobre todos os assuntos de interesse da sociedade. Subdivide-se em ordinária ou extraordinária, de acordo com os temas abordados.

5.2. diretoria.

É o órgão executivo da sociedade, sendo seus membros detentores do poder da representação social, competindo, além disso, a direção da so-ciedade, desde o desenvolvimento dos negócios e abertura de mercados ao comando dos empregados.

5.3. Conselho fiscal.

É o órgão da companhia destinado a fiscalizar os atos dos administrado-res e o cumprimento dos seus deveres estatutários e legais. A Lei não impõe o seu funcionamento permanente, podendo o estatuto dispor sobre o mes-mo. Este órgão social será melhor abordado no tópico 9.

5.4. Conselho de administração.

Sua existência só é exigida pela lei nas companhias abertas, de capital autorizado e nas sociedades de economia mista, sendo opcional na socie-dade anônima fechada. O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa estabelece como melhores práticas que toda organização considere a imple-mentação de um Conselho de Administração. Trata-se de órgão colegiado, deliberativo, que se coloca entre a assembleia geral e a diretoria na estru-tura hierárquica da companhia, tendo como função orientar os negócios da companhia, eleger, acompanhar e fiscalizar os diretores, entre outras atribuições definidas no art. 142 da LSA.

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37FGV DIREITO RIO

6. EsquEma.

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AulA 3: compAnHIA AbErtA E FEcHAdA. mErcAdo dE vAlorEs mobIlIárIos. comIssão dE vAlorEs mobIlIárIos - cvm. noçõEs GErAIs.

lEitura básiCa:

LAMY FILHO, Alfredo et al. A Lei das S.A. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 1995, Vols. I – pp. 129-183

EIZIRIK, Nelson et al. Mercado de Capitais- Regime Jurídico, Rio de Janei-ro, Editora Renovar, 2011, Capítulos 1 e 2 pp.1-24

rotEiro:

No tópico passado, vimos algumas noções gerais e características próprias das sociedades anônimas. Também identificamos a importância estratégica, do ponto de vista econômico, social e político, da constituição de uma socie-dade anônima quando comparada com a sociedade limitada36.

Assim, passaremos ao exame mais detido da Sociedade Anônima, suas clas-sificações e tipos, bem como sua forma de constituição. O conceito de valores mobiliários e as suas noções gerais serão aprofundados nos tópicos subsequentes.

1. ComPanhias abErtas vs. ComPanhias fEChadas.

O art. 4 da LSA considerou a existência de duas espécies de sociedade anôni-ma: sociedade anônima de capital aberto e sociedade anônima de capital fechado. Segundo o referido dispositivo, “a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários”. É o que se verifica no esquema abaixo37:

36 Nesse sentido, oportunas são as lições de Alfredo Lamy Filho: “As características da companhia - incorporação dos direitos dos acionistas em títulos de massa e responsabilidade limitada dos sócios- têm origem e fundamento em sua função no mercado de capitais:é modelo de organização de grupo empresário que as economias de livre empresa desenvolveram, adaptado ao funcionamento desse mercado, cuja expansão moderna é, por sua vez, efeito da difusão do modelo de companhia. As demais formas de sociedade comercial foram inventadas e são reguladas como esquemas de associação de pequeno número de pessoas e não se prestam à captação de capitais no mercado.” PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 95.37 O mercado de valores mobiliários brasileiro / Comissão de Valores Mobiliários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014. P. 122.

36 Nesse sentido, oportunas são as lições de Alfredo Lamy Filho: “As carac-terísticas da companhia - incorporação dos direitos dos acionistas em títulos de massa e responsabilidade limitada dos sócios- têm origem e fundamento em sua função no mercado de capitais:é modelo de organização de grupo em-presário que as economias de livre empresa desenvolveram, adaptado ao funcionamento desse mercado, cuja expansão moderna é, por sua vez, efeito da difusão do modelo de companhia. As demais formas de sociedade comercial foram inventadas e são reguladas como esquemas de associação de pequeno número de pessoas e não se prestam à captação de capitais no mercado.” PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 95.

37 O mercado de valores mobiliários brasileiro / Comissão de Valores Mobi-liários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014. P. 122.

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Portanto, a distinção entre uma companhia “aberta” e uma “fechada” re-pousa basicamente numa situação formal, representada pela admissão de tí-tulos da companhia em bolsa.

Por sua vez, a admissão de negociação dos títulos em bolsa dá-se por meio do respectivo registro da companhia na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, consoante dispõe o art. 4, §1º, da LSA, nos seguintes termos: “So-mente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de Valores Mobiliários podem ser negociados no mercado de valores mobiliários.”38 Exige-se o Registro de Emissão Pública e o Registro de Companhia Aberta para negociação em Bolsa ou no Mercado de Balcão Organizado, consoante discriminados nas Instruções CVM nº 13/80 e 202/93.

Além das ações, outros valores mobiliários são passíveis de emissão para nego-ciação no mercado, consoante expressa lista feita no artigo 2º da Lei 6.385/7639.

2. distribuição dE valorEs mobiliários.

Como se viu, a sociedade anônima confere diversos mecanismos para o financiamento da atividade empresarial, mediante a emissão e distribuição de títulos e valores mobiliários.

Nesse sentido, a distribuição de valor mobiliário pode ser feita de forma pública ou privada. A distribuição “privada” consiste na distribuição de títu-los voltada para um grupo restrito, com ou sem intermediação financeira, e dispensada de registro na CVM, podendo, portanto, ser realizada por com-panhias fechadas.

A distribuição pública de valores mobiliários, por seu turno, afigura-se o meio pelo qual as companhias ou os titulares de valores mobiliários de sua emissão, realizam, mediante apelo ao público, a colocação destes ativos no mercado de capitais. Nesse caso, a companhia deverá ser de capital aberto. O termo utilizado para identificar a primeira vez em que uma companhia emite valores mobiliários ao mercado é IPO – Initial Public Offer. As ofertas de ações podem ser primárias ou secundárias.

A oferta pública primária ocorre mediante a emissão de novas ações, oferta-das ao mercado, cujo ingresso de novos recursos, em contrapartida à aquisição das novas ações emitidas, destina-se à própria companhia emissora. Este tipo de oferta atende a principal função econômica do mercado de capitais, consistente no financiamento de médio e longo prazo da sociedade e é denominada subs-crição de ações. A aquisição dessas ações dá-se por meio de subscrição (cash-in).

38 No mesmo sentido, dispõe o artigo 22 da Lei 6.835/76: “Art. 22. Considera-se aberta a companhia cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação na bolsa ou no mercado de balcão.”39 Artigo 2º da Lei 6.385/76: Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:  I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;  II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;  III - os certificados de depósito de valores mobiliários;  IV - as cédulas de debêntures;  V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;  VI - as notas comerciais;  VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários;  VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros. § 1o Excluem-se do regime desta Lei:         I - os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal;  II - os títulos cambiais de responsabilidade de instituição financeira, exceto as debêntures.  § 2o Os emissores dos valores mobiliários referidos neste artigo, bem como seus administradores e controladores, sujeitam-se à disciplina prevista nesta Lei, para as companhias abertas.  § 3o Compete à Comissão de Valores Mobiliários expedir normas para a execução do disposto neste artigo, podendo: I - exigir que os emissores se constituam sob a forma de sociedade anônima; II - exigir que as demonstrações financeiras dos emissores, ou que as informações sobre o empreendimento ou projeto, sejam auditadas por auditor independente nela registrado; III - dispensar, na distribuição pública dos valores mobiliários referidos neste artigo, a participação de sociedade integrante do sistema previsto no art. 15 desta Lei;  IV - estabelecer padrões de cláusulas e condições que devam ser adotadas nos títulos ou contratos de investimento, destinados à negociação em bolsa ou balcão, organizado ou não, e recusar a admissão ao mercado da emissão que não satisfaça a esses padrões.  § 4o  É condição de validade dos contratos derivativos, de que tratam os incisos VII e VIII do caput, celebrados a partir da entrada em vigor da Medida Provisória no 539, de 26 de julho de 2011, o registro em câmaras ou prestadores de serviço de compensação, de liquidação e de registro autorizados pelo Banco Central do Brasil ou pela Comissão de Valores Mobiliários.

38 No mesmo sentido, dispõe o artigo 22 da Lei 6.835/76: “Art. 22. Considera-se aberta a companhia cujos valores mobili-ários estejam admitidos à negociação na bolsa ou no mercado de balcão.”

39 Artigo 2º da Lei 6.385/76: Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:  I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;  II - os cupons, direitos, recibos de subs-crição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referi-dos no inciso II;  III - os certificados de depósito de valores mobiliários;  IV - as cédulas de debêntures;  V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;  VI - as notas comerciais;  VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subja-centes sejam valores mobiliários;  VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos sub-jacentes; e IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendi-mentos advêm do esforço do empre-endedor ou de terceiros. § 1o  Excluem-se do regime desta Lei:                I - os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal;  II - os títulos cambiais de responsabili-dade de instituição financeira, exceto as debêntures.  § 2o Os emissores dos valores mobiliá-rios referidos neste artigo, bem como seus administradores e controladores, sujeitam-se à disciplina prevista nesta Lei, para as companhias abertas.  § 3o  Compete à Comissão de Valores Mobiliários expedir normas para a execução do disposto neste artigo, podendo: I - exigir que os emissores se cons-tituam sob a forma de sociedade anônima; II - exigir que as demonstrações finan-ceiras dos emissores, ou que as infor-mações sobre o empreendimento ou projeto, sejam auditadas por auditor independente nela registrado; III - dispensar, na distribuição pública dos valores mobiliários referidos neste artigo, a participação de sociedade integrante do sistema previsto no art. 15 desta Lei;  IV - estabelecer padrões de cláu-sulas e condições que devam ser adotadas nos títulos ou contratos de investimento, destinados à negocia-ção em bolsa ou balcão, organizado ou não, e recusar a admissão ao mercado da emissão que não satis-faça a esses padrões. 

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40FGV DIREITO RIO

§ 4o  É condição de validade dos contra-tos derivativos, de que tratam os incisos VII e VIII do caput, celebrados a partir da entrada em vigor da Medida Provi-sória no 539, de 26 de julho de 2011, o registro em câmaras ou prestadores de serviço de compensação, de liquidação e de registro autorizados pelo Banco Central do Brasil ou pela Comissão de Valores Mobiliários.

Já a oferta pública secundária acontece quando são ofertadas ao mercado ações já existentes, pertencentes, geralmente, aos seus sócios. Nesse caso, os recursos pagos, em contrapartida da aquisição dessas ações, destinam-se aos sócios vendedores. A aquisição dessas ações dá-se por meio de compra e ven-da de ações (cash-out).

Para facilitar a visualização do que está escrito acima, segue uma tabela ilustrativa.

Distribuição Privada Distribuição Pública

- Voltada para um grupo específico

- Com ou sem intermediação financeira

- Dispensa registro na CVM (por isso pode ser realizada por Cia. Fechadas)

- Não há formalidade adicional

- Colocação de ativos no mercado de capitais

- Companhias abertas (ou seja, precisa do registro da CVM). Para investir em Cia. Aberta é preciso corretor.

- IPO – Inicial Public Offer (primeira vez que uma companhia emite valores mobiliários ao mercado)

Oferta PúblicaPrimária

Oferta PúblicaSecundária

Muda o capital social da Cia. Emissão de

novas ações que serão ofertadas ao mercado,

com ingresso de recursos na própria companhia emissora (subscrição de ações). O dinheiro aportado vai para o caixa da

Cia. Atende a função do financiamento de

médio e longo prazo da sociedade.

São ofertadas ações já existentes. Os recursos vão para os acionistas vendedores e não para

a companhia em si (compra e venda). É o que promove a

liquidez (faz os grandes milionários).

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41FGV DIREITO RIO

3. mErCado dE CaPitais: o aCEsso à PouPança PoPular.

A admissão da negociação de valores mobiliários de uma companhia no mercado de capitais apresenta uma série de vantagens à companhia, nota-damente relacionadas à captação de recursos. Isso porque no mercado de capitais (ou mercado de valores mobiliários) são efetuadas operações que não apresentam a natureza de negócio creditício, nas quais a companhia contrai dívidas perante instituições financeiras, obrigando-se a devolver os recursos à taxas de juros expressivas.

No mercado de capitais, a canalização de recursos da companhia ocorre, em regra, mediante a aquisição de participação acionária (aquisição das ações admitidas à negociação em bolsa). Por conta disso, o retorno do investimento está, a rigor, relacionado à lucratividade da companhia e à valorização dos títulos. Tem-se um novo sócio, em vez de um credor, ao contrário do que ocorre quando o financiamento dá-se mediante assunção de mútuos para com instituições financeiras.

Daí decorre a natureza do mercado de capitais como um mercado de “ris-co”, uma vez que seus investidores não possuem qualquer garantia de retorno do investimento, o qual dependerá do resultado positivo da companhia.

E mesmo nos casos em que a companhia oferta papéis que não conferem aos investidores participação acionária, mas verdadeiro direito de crédito, v. g. debêntures, a emissora pode, consoante dispõe o art. 56 da LSA, espe-cificar as condições de remuneração do título de acordo com o seu perfil e capacidade financeira, em contraste com as duras condições impostas pelas instituições financeiras no mercado de créditos.

Além disso, diversamente do que ocorre no mercado de crédito, no mercado de capitais, a mobilização de poupança é realizada diretamente entre a unidade econômica deficitária – entidade emissora – e a unidade econômica superavitá-ria – o investidor. Inexiste, nesta hipótese, intermediação financeira, porquanto os recursos fluem diretamente dos adquirentes dos valores imobiliários para as empresas que os emitem. Confere-se o acesso direto à poupança popular.

4. a Comissão dE valorEs mobiliários.

Por conta do acesso direto à poupança popular conferido pelo mercado de capitais às companhias emissoras, criou-se a Comissão de Valores Mobi-liários – CVM, a fim de regular o mercado de capitais, tendo por princípio básico defender os investidores e o mercado de valores mobiliários em geral.

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42FGV DIREITO RIO

Nesse sentido, conforme apontam Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira:

“Essa orientação é originária dos Estados Unidos, no nível dos Estados--Membros, como prolongamento da legislação sobre companhias que, naquele país, é de competência dos Estados. As leis estaduais que regu-laram a oferta e venda de valores mobiliários ficaram conhecidas como “blue sky laws”, porque objetivavam coibir esquemas especulativos que não tinham maior base do que uma pequena área de “céu azul”.

A legislação federal de caráter geral, com o objetivo de proteger os in-vestidores, surgiu em 1933, como conseqüência do grande “crash” fi-nanceiro de outubro de 1929 e da depressão econômica que se seguiu. Os prejuízos extraordinários sofridos pelo público investidor, após longo período de supervalorização do mercado, e os baixos padrões técnicos e éticos revelados em inquéritos públicos realizados naquela época con-duziram, no governo de Franklin Roosevelt, à intervenção do Governo federal no mercado de capitais, com o fim de regular a venda de valores mobiliários e proibir as manipulações de preços.

Por iniciativa de Roosevelt e como conseqüência das investigações do Congresso foram editados o Securities Atc, de 1933, e o Security Ex-change Act, de 1934, aos quais se seguiram pouco depois o Public Uti-lity Holding Company Act, de 1935, o Trust Indenture Act, de 1939, o Investment Company Act, de 1940 e o Investment Advisors Act, de 1940, todos administrados pela Security Exchange Commision, criada pela lei de 1934.

Essa solução de criar órgão público especializado para policiamento do mercado de valores mobiliários - veio, depois da Grande Guerra, in-fluenciar diversas outras legislações, inclusive a brasileira.”40

A CVM é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Fazenda com personalidade jurídica e patrimônio próprio. Foi criada pela Lei nº 6.385/76, que fixou suas funções especificas, sempre correlacionadas ao mercado de títulos emitidos pelas sociedades anônimas.

A CVM visa a consolidar o mercado de valores mobiliários como instru-mento dinâmico e eficaz na (i) formação de poupanças; (ii) capitalização de companhias abertas; e (iii) dispersão de renda e propriedade. Busca a parti-cipação do público de forma crescente, assegurando acesso às informações sobre valores mobiliários negociados e sobre os emitentes.

40 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 101.

40 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 101.

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43FGV DIREITO RIO

A CVM tem como atribuições disciplinar e fiscalizar as atividades pre-vistas no art. 1º da Lei nº 6.385/76, a saber: I - a emissão e distribuição de valores mobiliários no mercado; II- a negociação e intermediação no merca-do de valores mobiliários; III - a negociação e intermediação no mercado de derivativos; IV - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Valores; V - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Mercadorias e futuros; VI - a administração de carteiras e a custódia de valo-res mobiliários; VII - a auditoria das companhias abertas; e VIII - os serviços de consultor e analista de valores mobiliários.

Por sua vez, as competências da CVM estão estabelecidas no art. 8º da Lei nº 6.385/76: I - regulamentar, com observância da política definida pelo Conselho Monetário Nacional, as matérias expressamente previstas nesta Lei e na lei de sociedades por ações; II - administrar os registros instituídos por esta Lei; III - fiscalizar permanentemente as atividades e os serviços do mer-cado de valores mobiliários, de que trata o Art. 1º, bem como a veiculação de informações relativas ao mercado, às pessoas que dele participem, e aos valo-res nele negociados; IV - propor ao Conselho Monetário Nacional a eventual fixação de limites máximos de preço, comissões, emolumentos e quaisquer outras vantagens cobradas pelos intermediários do mercado; V - fiscalizar e inspecionar as companhias abertas.

5. CanCElamEnto dE rEGistro (i.E., fEChamEnto dE CaPital).

De outra ponta, caso a companhia pretenda cancelar o registro junto à CVM, regressando à condição de sociedade anônima fechada, hipótese na qual seus valores mobiliários não serão mais admitidos à negociação em bol-sa, exige-se que a companhia emissora proponha oferta pública para aquisi-ção da totalidade das ações em circulação, assim como o resgate das debên-tures, bônus de subscrição ou outros valores mobiliários levados ao mercado.

Também devem ser cumpridas as exigências da Instrução CVM nº 361/2002, a qual exige a aceitação da oferta ou a concordância com o fecha-mento do capital por no mínimo dois terços do total correspondente às ações que de alguma forma se manifestaram sobre o tema.

A esse respeito, vale registrar também, a inclusão do §4º ao art. 4º da LSA, por meio da Lei nº 10.303 de 2001:

“§ 4o O registro de companhia aberta para negociação de ações no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou

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44FGV DIREITO RIO

indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios, adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil, de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa descontado, de comparação por múltiplos, de cota-ção das ações no mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A.”

O referido dispositivo optou por não estabelecer um único critério para a mensuração do preço da ação da companhia que pretenda o cancelamento de seu registro. A Lei apenas impôs que o preço seja justo, procurando impedir qualquer mensuração arbitrária e vil das ações, em proteção aos acionistas minoritários.

Sobre o dispositivo legal em comento assevera Nelson Eizirik:

“Um dos objetivos essenciais das normas que regulam os procedimentos de fechamento de capital, além de assegurar o direito de saída, é o de conferir aos minoritários titulares de percentual relevante das ações em circulação no mercado a possibilidade de impedir o cancelamento de registro de com-panhia aberta. A pessoa que investe em determinada companhia aberta tem a expectativa de que os valores mobiliários adquiridos poderão ser, a qualquer momento, negociados no mercado. Logo, seria extremamen-te prejudicial ao próprio desenvolvimento do mercado de capitais se tal expectativa pudesse ser frustrada por decisão discricionária dos acionistas controladores ou dos administradores da companhia.41”

Apesar da notória preocupação com os acionistas minoritários, tão im-portantes para o desenvolvimento do mercado de capitais, por se tratar de um conceito jurídico indeterminado, a definição de “preço justo” pode gerar graves desentendimentos.

6. squEzEE out (rEsGatE ComPulsório).

Já o novo § 5º do artigo 4º da LSA determina o resgate compulsório das ações pertencentes aos acionistas minoritários, se, terminado o prazo da ofer-ta pública referido no § 4º, remanescerem em circulação menos de 5% do total das ações emitidas pela companhia. A decisão de resgate compulsório é tomada em assembleia geral, e o preço de resgate é o da oferta pública, de-vendo ser depositado em estabelecimento bancário autorizado pela CVM, à disposição dos seus titulares.

41 EIZIRIK, Nelson. Lei das S.A Comentada. Vol. I. Quartier Latin: São Paulo, 2011. Pp. 75-76.

41 EIZIRIK, Nelson. Lei das S.A Comen-tada. Vol. I. Quartier Latin: São Paulo, 2011. Pp. 75-76.

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45FGV DIREITO RIO

Norma Parente42 esclarece e justifica a implementação do instituto:

“Encerrada a oferta pública, se remanescerem em circulação menos de 5% do total das ações emitidas pela companhia, a assembleia geral po-derá deliberar o resgate dessas ações pelo mesmo valor da oferta de fecha-mento de capital. A lei parte do princípio de que a aprovação de 95% dos acionistas referenda os termos da oferta. Evita-se, assim, que, numa sociedade em que 95% dos sócios aceitaram a oferta, esta se veja obriga-da a manter pequena quantidade de acionistas, em situações, como, por exemplo, quando se desconhece o paradeiro dos acionistas.”

A preocupação deste artigo é fazer valer a decisão da grande maioria do capital social que deseja fechar o capital. Afinal, se a grande maioria dos acio-nistas aceitou o valor deliberado para o resgate, entende-se que esta vontade deve predominar em detrimento dos 5% que não desejam vender suas ações.

7. normas EsPECiais da lsa Em rElação às ComPanhias abErtas. As normas a seguir aplicam-se, unicamente, às companhias abertas.

7.1. registro e classificação das companhias abertas.

¾ lsa, art. 4º e parágrafos.

Todos os valores mobiliários que a companhia queira negociar ou distribuir no mercado devem ser registrados na CVM (art. 4º, §§ 1º e 2º, LSA). Feito isso, o registro apenas pode ser cancelado após oferta pública para compra da totalidade dos valores em circulação no mercado (art. 4º, §§ 4º e 5º, LSA).

Caso um determinado acionista ou sociedade controladora adquira ações de companhia, elevando sua participação além das margens fixadas pela CVM, configurando aquisição de controle, é obrigado a fazer oferta pública para compra das ações remanescentes no mercado (art. 4º, §§ 4º, LSA).

A CVM pode classificar as companhias abertas em categorias e especificar as normas aplicáveis a cada categoria (art. 4º, § 3º, LSA).

7.2. ações. De acordo com o parágrafo 1º do art. 17 da LSA, as ações preferenciais

sem direito de voto ou com restrição ao exercício deste direito, somente serão

42 2002, Parecer CVM/SJU/Nº361 P. 20.

42 2002, Parecer CVM/SJU/Nº361 P. 20.

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46FGV DIREITO RIO

admitidas à negociação no mercado de valores mobiliários se a elas for pre-vista pelo menos uma das preferências ou vantagens previstas nos incisos seguintes do referido dispositivo.

As ações a serem negociadas devem, claro, obedecer às normas da CVM (art. 30, § 2º, LSA) e estarão admitidas para tal uma vez realizados 30% do preço de emissão.

7.3. Constituição e livros sociais. A constituição da companhia deverá ser feita por subscrição pública, regu-

lada nos artigos 82 e seguintes da LSA.

Seus fundadores e a instituição financeira que participar da subscrição pública responderão, no âmbito das respectivas atribuições, pelos prejuízos resultantes da inobservância de preceitos legais. Os primeiros, além disso, responderão solidariamente pelo prejuízo decorrente de culpa ou dolo em atos ou operações anteriores à constituição.

A companhia precisa, de modo a registrar suas operações, possuir determi-nados livros, afora àqueles já obrigatórios aos comerciantes, listados no art. 100 da LSA. Os livros sociais de registro e transferência de ações poderão ser substituídos por registros mecanizados ou eletrônicos, consoante disponham as regras da CVM a respeito (art. 100, § 2º, LSA).

7.4. acionistas e acordo de acionistas.

Dando efetividade ao dever de informação a que estão intitulados os acio-nistas, principalmente os minoritários, a lei societária prevê que os acionistas controladores e aqueles que elegerem membros do conselho de administra-ção ou fiscal deverão informar imediatamente as modificações na sua parti-cipação acionária (art. 116-A, LSA) e, ainda, que os órgãos da companhia devem informar anualmente o disposto no acordo de acionistas a respeito de reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos (art. 118, § 5º, LSA).

7.5. assembleia Geral.

Os prazos de convocação para as assembleias serão de 15 dias (em 1ª con-vocação) e 8 dias (em 2ª convocação – art. 124, § 1º, LSA). No entanto, é lícito à CVM aumentar o prazo de convocação da assembleia que tiver por

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47FGV DIREITO RIO

objeto deliberar sobre operações complexas ou suspender os prazos mencio-nados, observado o disposto no art. 124, § 5º, I e II, LSA.

Pode a CVM, também, reduzir o quórum qualificado de deliberação da assembleia, atendendo ao contido no art. 136, §§ 2º e 3º, da LSA.

Os documentos postos à disposição dos acionistas para fins de deliberação da assembleia de acionistas deverão ser entregues à bolsa de valores na data da publicação do anúncio de convocação da assembleia (art. 124, § 6º, LSA).

A representação de acionistas poderá ser feita por procurador que seja instituição financeira (art. 126, § 1º, LSA).

O direito de retirada não poderá ser exercido pelos sócios que detiverem ações de espécie ou classe que tenha liquidez no mercado (art. 137, II, LSA), nos casos de fusão, incorporação ou participação em grupo de sociedades pela companhia.

7.6. Conselho de administração. As companhias abertas são obrigadas a terem um conselho de administração

(art. 138, § 2º, LSA), cujas funções estão enumeradas no art. 142 da LSA.

Visando a proteger os acionistas minoritários, incluiu-se na Lei Societária o instituto do voto em separado, que permite aos acionistas que o requererem (cuja participação em relação ao capital social deve ser de pelo menos 15% das ações com direito a voto ou 10% das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito) o poder de eleger ou a faculdade de destituir um membro do conselho de administração e seu suplente (art. 141, §§ 4º a 6º e 8º, LSA).

7.7. administradores. Nas companhias abertas, são inelegíveis para os cargos de administração as

pessoas inabilitadas por ato da CVM (art. 147, § 2º, LSA).

O administrador da companhia possui diversos deveres e obrigações, tais como o dever de sigilo sobre qualquer informação não divulgada (art. 155, §§ 1º a 4º, LSA). Isso inclui, ainda, o dever de não utilizar essas informações para obter vantagens na compra e venda de valores mobiliários, o que carac-terizaria o chamado Insider Trading.

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48FGV DIREITO RIO

A) Caso Ambev – Processo Administrativo CVM nº 13/2000, Rel. Dir. Marcelo Fernandez Trindade, j. em 17.04.2002: Trecho do relatório: “O presente processo administrativo sancionador foi instaurado para “apurar o eventual uso de informação privilegiada relacionada aos negócios com ações de emissão da Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV realizados no período de maio de 2003 a março de 2004, e ao fato rele-vante por ela divulgado em março de 2004” e teve por origem oscilações significativas de preço, volume e quantidade de negócios das ações de emissão da AMBEV, ocorridas em 27/02 e 03/03/04, detectadas pela Gerência de Acompanhamento de Mercado – GMA-2, envolvendo notícias divulgadas nos meios de comunicação com referência à pos-sível fusão da empresa com a cervejaria belga INTERBREW e fato relevante publicado pela AMBEV em 03/03/04.”

(...) Absolvição, diante da ausência de indícios que permitissem a proce-

dência da ação.

B) Caso Bahema - Processo Administrativo CVM nº 24/2005, Rel. Dir. Sergio Weguelin, j. em 07.10.2008: “Suposta prática de insider tra-ding. Eventual uso indevido de informação privilegiada na aquisição de ações da Bahema Equipamentos S.A. Os acusados teriam adquirido as opções sabendo antecipadamente que estava em curso a negociação do controle da companhia e o fechamento de seu capital. Advertência a um dos acursados (arts. 10 e 11 da ICVM nº 31/84, art. 13, caput, da ICVM nº 358/02, e 155 § 1º da LSA). Multa a 3 dos acusados (art. 155, § 4º, da LSA e §1º do art. 13 da ICVM nº 358/02). Meros indí-cios foram suficientes para a configuração do insider.”

C) Caso Sadia-Perdigão – Processo Administrativo CVM nº 07/2007, Rel. Dir. Marcos Barbosa Pinto, j. em 16.03.2009: “Suposta prática de insider trading. Eventual uso indevido de informação privilegiada em negócios com ações de emissão de Sadia S.A. e Perdigão, ocorridos na Bovespa, nos dias anteriores ao lançamento, pela Sadia, de uma oferta pública de aquisição do controle acionário da Perdigão. Condenação do acusado, por infração ao art. 155, § 4º, da LSA, ao pagamento de multa no valor de R$ 500.000,00.”

9 Dever de prestar informação aos acionistas a respeito dos valores móveis da companhia que porventura detenha e de outros direitos a ela ligados, caso haja pedido de acionistas que representem, no mínimo, 5% do capital social (art. 157, §1º, LSA).

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

49FGV DIREITO RIO

9 Dever de comunicar fato relevante à Bolsa de Valores e à imprensa (art. 157, §§ 4º e 5º da LSA).

9 Dever de informar as modificações em suas posições acionárias na companhia (art. 157, §§ 6º, LSA).

Por fim, a responsabilidade solidária do administrador (art. 158, §§ 3º e 4º, LSA) é restrita àqueles que, por disposição expressa do estatuto, tenham atribuição específica de cumprimento de deveres de que depende o funcio-namento normal da companhia (art. 158, §§ 3º e 4º, LSA).

7.8. modificação do Capital social O órgão competente para deliberar sobre emissão de ações mediante

subscrição particular deverá dispor sobre as sobras de valores mobiliários não subscritos (art. 171, § 7º, LSA).

Se no estatuto da companhia houver autorização para aumento de ca-pital, este poderá prever, também, a emissão (sem direito de preferência ou com redução do prazo de preferência) de ações, debêntures conversí-veis em ações e bônus de subscrição, que terão a colocação referida no art. 172 e incisos I e II da Lei.

7.9. demonstrações financeiras e dividendo obrigatório.

As demonstrações financeiras das companhias abertas serão feitas de acordo com as normas contábeis expedidas pela CVM, e serão auditadas por auditores independentes (art. 177, § 3º, LSA).

Somente as companhias abertas exclusivamente para a captação de re-cursos por debêntures não conversíveis em ações podem distribuir dividen-do inferior ao obrigatório (art. 202, LSA) ou deixar de distribuir lucros (art. 202, § 3º, LSA).

A companhia pode deixar de distribuir dividendos obrigatórios tam-bém quando isto for incompatível com a sua situação financeira, devendo encaminhar à CVM exposição justificada contida na ata da assembleia que assim deliberou.

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50FGV DIREITO RIO

7.10. incorporação, fusão e Cisão

Nas operações societárias acima, quando envolverem companhia aberta, as sociedades que as sucederem deverão observar o disposto no art. 223, § 3º:

“Art. 223, § 3º: Se a incorporação, fusão ou cisão envolverem com-panhia aberta, as sociedades que a sucederem serão também abertas, devendo obter o respectivo registro e, se for o caso, promover a admis-são de negociação das novas ações no mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data da assembleia-geral que aprovou a operação, observando as normas pertinentes baixadas pela Comissão de Valores Mobiliários.”

Caso não seja observado o procedimento acima, aos acionistas é garantido o direito de retirada (art. 223, § 4º, LSA).

7.11. sociedade de Economia mista.

Estão sujeitas às normas expedidas pela CVM (art. 235, §1º, LSA). Os de-veres, responsabilidades e obrigações de seus administradores são os mesmos dos administradores de companhias abertas (art. 239, parágrafo único, LSA).

7.12. sociedades Coligadas, Controladoras e Controladas.

A CVM poderá solicitar informações adicionais a respeito de sociedades controladoras e coligadas da companhia aberta, que deverá prestá-las, como dispõe o art. 243, § 3º da LSA.

Além disso, a CVM poderá expedir normas sobre demonstrações finan-ceiras consolidadas (art. 249, par. único). Nesse campo, há que se registrar também que, na avaliação do investimento em coligadas e controladas, a di-ferença entre o valor do investimento e o custo de aquisição somente poderá ser registrada como resultado do exercício observadas as normas da CVM a respeito (art. 248, III, ‘c’, LSA).

Quanto à alienação/compra de controle dessas companhias:

9 A alienação ficará sujeita à condição de oferta pública para aquisição das ações com direito de voto de propriedade dos minoritários, de modo que lhes seja assegurado preço mínimo de 80% do valor pago por ação integrante do bloco de controle (art. 254-A e parágrafos).

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51FGV DIREITO RIO

9 Em se tratando de companhia aberta que dependa de autorização governamental, a alienação está sujeita à prévia autorização do órgão competente para aprovar a alteração do seu estatuto.

9 A compra, por companhia aberta, do controle de qualquer sociedade mercantil dependerá de deliberação da assembleia geral da compradora para os casos listados no art. 256, ressalvando-se o disposto no § 1º do citado artigo. Verificada a hipótese do § 2º do referido dispositivo, o acionista dissidente poderá exercer o direito de retirada.

Tanto no caso de oferta pública para aquisição de controle de companhia aberta quanto no caso de incorporação, pela controladora, de controlada, há necessidade de participação de outras empresas para, respectivamente, garantir o cumprimento das obrigações assumidas pelo ofertante no pri-meiro caso (arts. 257 a 263, LSA) e avaliar os dois patrimônios (art. 264, § 1º, LSA), no segundo.

7.13. Publicações.

Obedecendo à onda de inovação tecnológica, a Lei Societária passou a auto-rizar a disponibilização de suas comunicações na internet (art. 289, § 7º, LSA).

7.14. redução de porcentagem

Segundo o artigo 291 da LSA, “A Comissão de Valores Mobiliários poderá reduzir, mediante fixação de escala em função do valor do capital social, a por-centagem mínima aplicável às companhias abertas”, estabelecida nos seguintes artigos da Lei:

• Art. 105 à exibição de livros;

• Art. 123, §único, ‘c’ à convocação da assembleia geral pelos acionistas;

• Art. 141, caput à pedido de votação pelo voto múltiplo na eleição de conselheiros;

• Art. 157, § 1º à pedidos de informações de acionistas na assem-bleia geral;

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52FGV DIREITO RIO

• Art. 159, § 4º à propositura de ação de responsabilidade contra administradores;

• Art. 161, § 2º à pedido de instalação do conselho fiscal, quando seu funcionamento não for permanente;

• Art. 163, § 6º à pedido de informações ao conselho fiscal;

• Art. 246, § 1º, ‘a’ à ação contra sociedade controladora;

• Art. 277 à pedido de instalação do conselho fiscal das filiadas do grupo de sociedades; e

• Art. 249 à valor do patrimônio líquido da companhia aberta que torna obrigatória a elaboração de demonstrações consolidadas (art. 291, par. único, LSA).

8. normas EsPECiais da lsa Em rElação às ComPanhias fEChadas.

As normas a seguir aplicam-se, por sua vez, somente às companhias fechadas.

8.1. ações.

Podem ser de uma ou mais classes nesse tipo de companhia, observado o art. 16 da Lei Societária (art. 15, § 1º, LSA).

8.2. limitações à Circulação das ações. O estatuto da companhia fechada pode limitar a circulação das ações no-

minativas, observado o art. 36 da LSA.

8.3. Convocação da assembleia Geral.

Primeira convocação à 8 dias de antecedência (art. 124, § 1º, LSA). O acionista que representar mais de 5% do capital social será convoca-do por carta ou telegrama, caso ele assim o requeira, observado o art. 124, § 3º, LSA.

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53FGV DIREITO RIO

8.4. assembleia Geral ordinária.

Os diretores da companhia fechada podem votar os documentos da admi-nistração se forem os únicos acionistas (art. 134, § 6º, LSA).

8.5. direito de Preferência.

As ações restantes por ocasião da subscrição de ações deverão ser rateadas nos termos do art. 171, § 8º, LSA.

8.6. Exclusão do direito de Preferência.

É possível em apenas uma hipótese: na subscrição de ações nos termos de lei especial sobre incentivos fiscais (art. 172, par. único, LSA).

8.7. demonstração das origens e aplicação dos recursos.

A companhia fechada com patrimônio líquido não superior a R$1.000.000,00 (um milhão de reais) não é obrigada a elaborar nem muito menos a publicar as referidas demonstrações (art. 176, § 6º, LSA).

8.8. Companhia de Pequeno Porte.

As companhias fechadas, que tiverem menos de 20 (vinte) acionistas e, ao mesmo tempo, possuírem patrimônio líquido inferior a R$1.000.000,00 (um milhão de reais), poderão valer-se das normas especiais previstas no art. 294 da LSA, que simplifiquem requerimentos relacionados às convocações de suas assembleias, da mesma forma em que simplificam exigências de regis-tros e publicidade de atos societários.

9. ComPanhias abErtas: b3.

A B343 é a principal instituição brasileira de intermediação para operações do mercado de capitais, que desenvolve, implanta e provê sistemas para a ne-gociação de ações, derivativos de ações, títulos de renda fixa, títulos públicos federais, derivativos financeiros, moedas à vista e commodities agropecuárias.

43 “A B3 foi criada em março de 2017 como fruto da combinação entre a BM&FBOVESPA e a Cetip, dando origem a uma companhia de infraestrutura de mercado financeiro de classe mundial e consolidando a atuação da BM&FBOVESPA na negociação e pós-negociação de produtos listados e da Cetip no registro e depósito de operações de balcão e de financiamento” Disponível em: http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/ Acessado em: 27 de dezembro de 2017.

43 “A B3 foi criada em março de 2017 como fruto da combinação entre a BM&FBOVESPA e a Cetip, dando origem a uma companhia de infraestrutura de mer-cado financeiro de classe mundial e con-solidando a atuação da BM&FBOVESPA na negociação e pós-negociação de produtos listados e da Cetip no regis-tro e depósito de operações de balcão e de financiamento” Disponível em: http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/ Acessado em: 27 de dezembro de 2017.

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54FGV DIREITO RIO

Tendo em vista sua área de atuação, a B3 está sujeita à regulação e à su-pervisão da Comissão de Valores Mobiliários e do Banco Central do Brasil.

9.1. adesão voluntária.

Para que as sociedades sejam listadas na B3, é necessário que sejam, pri-meiramente, companhias abertas registradas na CVM. Paralelamente a este registro, devem as sociedades solicitar a listagem na B3 de acordo com o seg-mento desejado (Tradicional, Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2).

Ressalta-se que o registro é imprescindível para que a companhia tenha suas ações e debêntures negociadas em Bolsa (note-se que, caso não queiram se registrar, as sociedades sempre possuem a opção de negociar seus ativos em mercado de balcão).

A adesão a qualquer um destes segmentos é absolutamente voluntária, o que gera a possibilidade de a companhia optar por aquele que melhor se adequar ao seu perfil e objetivos.

9.2. novo mercado, nível 1 e nível 2.

Os chamados segmentos especiais de listagem do mercado de ações (Novo Mercado, Nível 2, Nível 1) foram criados pela B3 há mais de 10 anos, no momento em que a Bolsa percebeu que, para desenvolver o mercado de capitais brasileiro, atraindo novos investidores e novas so-ciedades, seria preciso ter segmentos de listagem com regras rígidas de governança corporativa.

Essas regras vão além das obrigações que as companhias têm perante a Lei das Sociedades por Ações. Com isso, disponibilizam maior transparên-cia aos investidores, agregando-se valor à companhia, segundo as pesquisas realizadas pela B3.

Além disso, as regras mais rígidas para as sociedades reduzem o risco dos investidores que decidem adquirir suas ações, graças aos direitos e garantias asseguradas aos acionistas e às informações mais completas divulgadas, que reduzem as assimetrias de informações entre acionistas controladores, gesto-res da companhia e os participantes do mercado.

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55FGV DIREITO RIO

O Novo Mercado e os Níveis Diferenciados de Governança Corpora-tiva44 – Nível 1 e Nível 2 – são segmentos especiais de listagem desenvol-vidos com o objetivo de proporcionar um ambiente de negociação que estimulasse, ao mesmo tempo, o interesse dos investidores e a valorização das companhias.

Embora tenham fundamentos semelhantes, o Novo Mercado é dire-cionado principalmente à listagem de sociedades que venham a abrir ca-pital, enquanto os Níveis Diferenciados 1 e 2 destinam-se a sociedades que já possuem ações negociadas na Bolsa B3.

Cada segmento possui exigências específicas para a admissão de uma sociedade, relacionadas à divulgação de informações (financeiras ou não), à estrutura societária, à estrutura acionária, ao percentual de ações em cir-culação e aos aspectos de Governança Corporativa. As normas do Novo Mercado são mais rígidas, variando entre os segmentos de Nível 2, Nível 1 e Tradicional.

O site do IBGC apresenta de forma clara e sintética diferenciação entre os segmentos:

“Basicamente, o segmento de Nível 1 caracteriza-se por exigir práticas adicionais de liquidez das ações e disclosure. Enquanto o Nível 2 tem por obrigação práticas adicionais relativas aos di-reitos dos acionistas e conselho de administração.  O Novo Merca-do, por fim, diferencia-se do Nível 2 pela exigência para emissão exclusiva de ações com direito a voto. Estes dois últimos apresen-tam como resultado esperado a redução das incertezas no processo de avaliação, investimento e de risco, o aumento de investidores interessados e, consequentemente, o fortalecimento do mercado acionário. Resultados que trazem benefícios para investidores, empresa, mercado e Brasil.”

Segue quadro comparativo extraído do site da B3 que sintetiza as princi-pais diferenças entre cada segmento:

44 Os tópicos 22 e 23 tratarão exclusivamente da “Governança Corporativa”.

44 Os tópicos 22 e 23 tratarão exclusiva-mente da “Governança Corporativa”.

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56FGV DIREITO RIO

NOVO MERCADO NÍVEL 2 NÍVEL 1 BOVESPA MAIS TRADICIONAL

Característicasdas Ações Emitidas

Permite a existência

somente de ações ON

Permite a existência de

ações ONe PN

(com direitos adicionais)

Permite a existência de ações

ON e PN (conforme legislação)

Somente ações ON podem

ser negociadase emitidas,

mas é permitidaa existência de PN

Permite a existênciade ações

ON e PN(conforme legislação)

Percentual Mínimode Ações em Circulação(free float)

No mínimo 25% de free float

25% de free float até o 7º ano de listagem, ou

condições mínimas de liquidez

Não há regra

Distribuições públicas de ações Esforços de dispersão acionária Não há regra

Vedação adisposições estatutárias(a partir de 10/05/2011)

Limitação de voto inferior a 5% do capital, quorum qualificado e “cláusulas pétreas” Não há regra

Composição doConselho de Administração

Mínimo de 5 membros, dos quais pelo menos 20% devem ser independentes com mandato

unificado de até 2 anos

Mínimo de 3 membros(conforme legislação)

Vedação àacumulação de cargos(a partir de 10/05/2011)

Presidente do conselho e diretor presidenteou principal executivo pela mesma pessoa

(carência de 3 anos a partir da adesão)Não há regra

Obrigação doConselho de Administração(a partir de 10/05/2011)

Manifestação sobre qualquer oferta pública de aquisição

de ações da companhiaNão há regra

Demonstrações Financeiras Traduzidas para o inglês Conforme legislação

Reunião públicaanual e calendáriode eventos corporativos

Obrigatório Facultativo

Divulgação adicionalde informações(a partir de 10/05/2011)

Política de negociação de valores mobiliáriose código de conduta Não há regra

Concessão de Tag Along

100% para ações ON

100% para ações ON

e PN 80% para ações ON (conforme legislação)

100% paraações ON

80% para ações ON (conforme

legislação)

100% para ações ON

e 80% para PN (até

09/05/2011)

Oferta públicade aquisição de açõesno mínimo pelovalor econômico

Obrigatoriedade em casode fechamento de capital

ou saída do segmento

Conforme legislação

Obrigatoriedade em caso de

fechamento de capital ou saída do

segmento

Conforme legislação

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57FGV DIREITO RIO

9.3. Governança Corporativa.

O fortalecimento do mercado de capitais brasileiro, especialmente no pe-ríodo compreendido entre 2004 e 2008, inseriu-se em contexto de prosperi-dade econômica global e abundância de investimentos em países emergentes (notadamente Brasil, Rússia, Índia e China), mas, como pondera a doutrina nacional45, tal fortalecimento também deve ser creditado a uma série de ini-ciativas coordenadas.

Dentre elas, destacam-se o esforço empreendido nas reformas das Leis nº 6.404/76 e 6.385/76 para aprimorar e fortalecer os direitos dos acionistas minoritários, e a criação, pela B3, de segmentos especiais de negociação de ações, de adesão voluntária, reservados para companhias que adotem práticas diferenciadas de governança corporativa, com a gradual e crescente adoção de tais práticas diferenciadas pelas companhias abertas brasileiras.

O emprego da expressão “governança corporativa” é severamente criticado pela doutrina. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França e Mauro Moisés Kertzer46, por exemplo, sustentam que a expressão “governança corporativa” não é tradução adequada para corporate governance, propondo que tal expres-são estaria traduzida de forma mais adequada para o nosso vernáculo pela expressão “governação compartilhada da companhia” ou mesmo “governo das sociedades”, tal como este conceito é utilizado em Portugal.

Arnold Wald47 também critica a utilização do termo “governança cor-porativa”, por tratar-se “de um anglicismo condenável, não só por res-peito à língua nacional como também pela associação de ideia que pode acarretar. Na língua portuguesa, corporação tem o sentido de associação profissional, sendo inclusive uma reminiscência medieval”. E conclui ser “mais adequado usar a expressão ‘governo das empresas’, que é corrente nos países de língua latina, nos quais a corporação não se confunde com a sociedade anônima.

Entretanto, nesta apostila, tendo em vista a consolidação deste jargão na prática empresarial do Brasil, quando fizermos referência aos Regulamen-tos do Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2 da B3, licenciar-nos-emos para utilizar a expressão “governança corporativa”, ainda que contaminada de imprecisão conceitual, a fim de seguir a terminologia adotada pela B3.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC tem adotado a seguinte definição em relação ao conceito de “governança corporativa”:

45 Neste sentido, destacamos especialmente: (i) MUNHOZ, Eduardo Secchi. Desafios do Direito Societário Brasileiro na Disciplina da Companhia Aberta: Avaliação dos Sistemas de Controle Diluído e Concentrado. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro; ARAGÃO, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário: Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009. Pp. 119-155; e (ii) AZEVEDO, Luis André Negrelli de Moura. A Oferta Pública para Aquisição de Controle sob a Perspectiva da Companhia Aberta Ofertante. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro; ARAGÃO, Leandro Santos de (coord.), op. cit., Pp. 74-114. 46 HOPT, Klaus J. Deveres Legais e Conduta Ética de Membros do Conselho de Administração e de Profissionais. Tradução de Erasmo Valladão A. e N. França e Mauro Moisés Kertzer. RDM. São Paulo: Malheiros, n. 144. Pp. 107-119, out./dez. 2006, P. 117.47 (WALD, Arnoldo. O governo das empresas. RDB. São Paulo: RT, n. 15, jan./abr. 2002, p. 53)

45 Neste sentido, destacamos es-pecialmente: (i) MUNHOZ, Eduardo Secchi. Desafios do Direito Societário Brasileiro na Disciplina da Companhia Aberta: Avaliação dos Sistemas de Controle Diluído e Concentrado. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro; ARA-GÃO, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário: Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009. Pp. 119-155; e (ii) AZEVEDO, Luis André Negrelli de Moura. A Oferta Pública para Aquisição de Controle sob a Perspectiva da Companhia Aberta Ofertante. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro; ARAGÃO, Leandro Santos de (coord.), op. cit., Pp. 74-114.

46 HOPT, Klaus J. Deveres Legais e Con-duta Ética de Membros do Conselho de Administração e de Profissionais. Tradução de Erasmo Valladão A. e N. França e Mauro Moisés Kertzer. RDM. São Paulo: Malheiros, n. 144. Pp. 107-119, out./dez. 2006, P. 117.

47 (WALD, Arnoldo. O governo das empresas. RDB. São Paulo: RT, n. 15, jan./abr. 2002, p. 53)

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58FGV DIREITO RIO

“Governança Corporativa é o sistema que assegura aos sócios-proprie-tários o governo estratégico da empresa e a efetiva monitoração da di-retoria executiva. A relação entre propriedade e gestão se dá através do conselho de administração, a auditoria independente e o conselho fiscal, instrumentos fundamentais para o exercício do controle. A boa Gover-nança assegura aos sócios eqüidade, transparência, responsabilidade pe-los resultados (accountability) e obediência às leis do país (compliance). No passado recente, nas empresas privadas e familiares, os acionistas eram gestores, confundindo em sua pessoa propriedade e gestão. Com a profissionalização, a privatização, a globalização e o afastamento das famílias, a Governança Corporativa colocou o Conselho entre a Pro-priedade e a Gestão.”

Destaque-se que, a tendência moderna no que tange à aplicação da gover-nança corporativa é transpô-la também às relações institucionalistas (e não apenas às contratualistas, que se restringem ao relacionamento dos sócios enquanto sócios).

Na abordagem institucionalista da governança corporativa, há uma pre-ocupação, cada vez maior, com os “stakeholders”, que são todos aqueles ter-ceiros que mantém relacionamento com a sociedade (i.e., credores, traba-lhadores, comunidade, consumidores e sociedade civil em geral, na qual a companhia se insere).

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59FGV DIREITO RIO

AulA 4: AçõEs E outros vAlorEs mobIlIárIos.

lEitura básiCa:

EIZIRIK, Nelson et Al. Mercado de Capitais- Regime Jurídico, Rio de Janei-ro, Editora Renovar, 2011, pp. 25-59

1. valorEs mobiliários – noçõEs introdutórias

No último tópico foram estudadas as principais classificações das socieda-des anônimas, suas características mais significativas e alguns aspectos acerca da regulação do mercado de capitais.

Assim, observou-se que a sociedade anônima possui duas alternativas prin-cipais no que tange à obtenção de recursos para o desenvolvimento de sua atividade econômica, quais sejam, (i) contrair financiamento junto a terceiros ou (ii) buscar recursos adicionais dos sócios ou de investidores no mercado de capitais. Em regra, a segunda hipótese se viabiliza pela emissão dos chamados valores mobiliários, que são títulos emitidos pelas companhias — sejam abertas ou fechadas — para a captação de recursos e financiamento da companhia.

A Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, enumera as diversas espécies de valores mobiliários, nos seguintes termos:

“Art. 2º: São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobra-mento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;III - os certificados de depósito de valores mobiliários;IV - as cédulas de debêntures;V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;VI - as notas comerciais;VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários;VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; eIX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contra-tos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de par-ceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.”

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

60FGV DIREITO RIO

Apesar do extenso rol acima apresentado, as principais espécies de valores mobiliários emitidas pela sociedade anônima são (i) ações, (ii) debêntures, (iii) partes beneficiárias, e (iv) bônus de subscrição.

Vale destacar que o tipo de valor mobiliário emitido apresenta relevantes consequências práticas. Com efeito, dependendo da espécie subscrita, o in-vestidor pode, por exemplo, se tornar acionista da companhia ou, então, pas-sar a deter outros direitos perante a companhia emissora, não se confundindo com os direitos assegurados aos acionistas, como é o caso dos debenturistas.

2. valorEs mobiliários: ConCEito

A doutrina define os valores mobiliários como ações de companhia e tí-tulos emitidos por companhia ou pelo Estado, representativos de direitos de participação ou créditos a longo prazo. Significa, portanto, o gênero dos títu-los de emissão pela companhia. Sua natureza jurídica é de título de crédito.

Uma vez que são emitidos em larga escala, têm por finalidade precípua servir como instrumentos de investimento de capital para gerar renda. Suas características são a emissão em massa (não são emitidos singularmente) e a fungibilidade (podem ser trocados uns pelos outros porque têm igual valor).

Entretanto, o conceito legal de valores mobiliários precisa ser comple-mentado pelo doutrinário, uma vez que aquele passou a representar, além de títulos, outros negócios jurídicos que, quando ofertados ao público, ficam sujeitos à disciplina legal do mercado de valores mobiliários fiscalizado pela CVM. Sua natureza jurídica deve, portanto, ser precisada a partir do concei-to doutrinário de títulos de crédito.

Com efeito, além dos títulos expressamente previstos no artigo 2° da Lei nº 6.385/1 976, também deverão ser considerados valores mobiliários, se-gundo Nelson Eizirik, aqueles incluídos no conceito de contrato de investi-mento coletivo, a que se refere o inciso IX do artigo 2º da Lei nº 6 385/1976, os títulos ou contratos que apresentem as seguintes características:

“(a) caracterizem modalidade de investimento coletivo;(b) em que haja fornecimento de recursos (dinheiro ou outros bens sus-cetíveis de avaliação econômica) por parte do investidor;(c) em que haja gestão dos recursos por parte de terceiros, não controlan-do o investidor o negócio no qual seus recursos foram empregados;(d) tratem de um empreendimento comum, cujo sucesso é almejado tan-to pelo investidor quanto pelo gestor, havendo entre ambos uma comu-nhão de interesses econômicos interligados juridicamente;

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61FGV DIREITO RIO

(e) em que exista uma expectativa de obter lucros, ou seja, o investidor, ao decidir pela alocação de seus recursos em um valor mobiliário, visa à obtenção de algum tipo de ganho, benefício ou vantagem econômica, em função do contrato de investimento de risco realizado. Esses lucros podem ser auferidos através de participação, parceria ou remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços; e(f ) em que o investidor assuma os riscos de financiador do negócio(ou os riscos do empreendimento) , que são diversos dos riscos comuns co-merciais, ou seja, os riscos poderão resultar na perda total ou parcial dos recursos investidos.”

Ainda, os títulos da dívida pública dos entes da federação foram ex-pressamente excluídos da definição legal (art. 2º, parágrafo único da Lei nº 6.385/76), continuando sob fiscalização direta do BACEN – diferen-temente dos valores mobiliários, cuja regulação é feita pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Abaixo, uma abordagem superficial sobre os principais valores mobiliários usualmente utilizados pela prática societária no Brasil:

3. valorEs mobiliários Em EsPéCiE.

3.1. ações.

Base Legal: Art. 2º, inciso I da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2º - São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;”

Neste tópico, pretende-se explorar as classificações das ações e sua relevân-cia prática. Conforme mencionado, a ação representa uma fração do capital social de uma sociedade anônima, por meio da qual se atribui ao seu titular a qualidade de acionista.

Existem vários critérios para classificação das ações de emissão de uma companhia. Inicialmente, cabe assinalar que as ações podem ter ou não valor nominal, conforme dispuser o estatuto de cada sociedade anônima.

De um modo geral, cada ação tem um valor ideal, resultado da divisão do capital social pelo número de ações emitidas. Se este valor é declarado estatu-tariamente, tem-se uma ação com valor nominal. Caso contrário, trata-se de ação sem valor nominal.

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Na prática empresarial, difundiu-se a adoção da ação sem valor nomi-nal, tendo em vista a simplificação que tal opção representa na operacio-nalização de sociedades com grande número de acionistas. Isso porque a ausência do valor nominal das ações dispensa a constante atualização de tal informação nos documentos das companhias, além de permitir uma maior flexibilidade nos aumentos de capital social da companhia.

Com efeito, nas companhias cujas ações possuem valor nominal, a LSA veda a emissão de ações por preço inferior ao seu valor nominal, embora seja expressamente admitida a possibilidade de emissão de ações com preço de emissão superior ao valor nominal. Uma das principais for-mas de classificação das ações gira em torno de suas diferentes espécies. Embora a LSA estabeleça três espécies diversas — ações ordinárias, prefe-renciais e de fruição —, interessa-nos, tendo em vista a sua importância prática, apontar as características gerais aplicáveis às ações ordinárias e às ações preferenciais.

Segundo definição de José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho:

“Ação é o valor mobiliário emitido pela companhia que confere ao seu titular o conjunto de direitos e obrigações de uma partici-pação societária na companhia, ou seja, de uma posição jurídica de acionista.”

3.1.1. ações ordinárias.

As ações ordinárias são aquelas que conferem ao acionista os direitos de um sócio comum. Não possuem, em regra, vantagens ou restrições no que tange aos direitos e deveres normalmente atribuídos aos acionistas da sociedade anônima. Desta forma, em geral faz-se desnecessária a previsão estatutária de suas prerrogativas, já que estas decorrem diretamente da lei.

3.1.2. ações Preferenciais.

As ações preferenciais conferem necessariamente aos seus titulares algu-ma espécie de vantagem relativamente às ações ordinárias, embora o seu di-reito de voto possa ser limitado ou excluído. Faculta-se a cada companhia, seja aberta ou fechada, ter uma ou mais classes de ações preferenciais, bem como simplesmente não emitir tal espécie de ações.

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3.2. debêntures.

→ Art. 2º, incisos I e IV da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;(...)IV - as cédulas de debêntures;”

A debênture é o valor mobiliário que confere ao seu titular direito de cré-dito contra a companhia que o emite, nos termos da escritura de emissão. É semelhante a um mútuo e se constitui em importante forma de financiamen-to de curto e médio prazo para a companhia.

3.3. bônus de subscrição.

→ Art. 2º, inciso I da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;”

→ Art. 75 da Lei das S.A:

“Art. 75. A companhia poderá emitir, dentro do limite de aumento de capital autorizado no estatuto (artigo 168), títulos negociáveis denomi-nados “Bônus de Subscrição”.Parágrafo único. Os bônus de subscrição conferirão aos seus titulares, nas condições constantes do certificado, direito de subscrever ações do capital social, que será exercido mediante apresentação do título à com-panhia e pagamento do preço de emissão das ações.”

Segundo José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho:

“Bônus de subscrição é o valor mobiliário que confere a seu titular o direito de subscrever, mediante pagamento de preço de emissão determi-nado ou determinável, certo número de ações da companhia de capital autorizado emitente do título.”

O bônus de subscrição é um direito de uma ação para o futuro; dá direito ao seu titular de subscrever suas ações no futuro por um preço pré-determina-do. Isso é bom para uma empresa que ainda vai crescer e é uma aposta na va-lorização da Companhia. Vantagem para a Cia: fomentar um novo mercado.

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Ex. fomentar o mercado de ações preferenciais (“Comprando uma ação pre-ferencial ganha um bônus de subscrição de uma ação ordinária”).

3.4. Partes beneficiárias.

Segundo José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho:

“Partes beneficiárias são valores mobiliários emitidos pela companhia, sem valor nominal e estranhos ao capital social, que conferem a seus titulares direito de crédito eventual contra a companhia consistente na participação dos lucros anuais (art. 46, § 1º [LSA]).”

Por serem títulos estranhos ao capital social, não conferem direitos de acionista a seus proprietários, apenas os direitos de participação nos (eventu-ais) lucros e de fiscalização.

3.5. Cupons, direitos, recibos de subscrição e Certificados de desdo-bramentos.

→ Art. 2º, inciso II da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobra-mento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;”

3.6. Certificados de depósito de valores mobiliários (depositary receipts).

→ Art. 2º, inciso III da Lei nº 6.385/76.

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)III - os certificados de depósito de valores mobiliários;”

3.7. Cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de Clubes de investimento em quaisquer ativos.

→ Art. 2º, inciso V da Lei nº 6.385/76:

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“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;”

3.8. notas Comerciais (Commercial Papers).

→ Art. 2º, inciso VI da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)VI - as notas comerciais;”

3.9. Contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários.

→ Art. 2º, inciso VII da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários;”

3.10. outros Contratos derivativos.

→ Art. 2º, inciso VIII da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes;”

4. ConCEito abErto.

→ Art. 2º, inciso IX da Lei nº 6.385/76:

“Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:(...)

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IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contra-tos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de par-ceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.”

O rol legal de valores mobiliários é meramente exemplificativo, uma vez que a lei se refere a “quaisquer outros títulos ou contratos de investimento cole-tivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração” (art. 2º, I, Lei nº 6.385/76).

tabela com os principais valores mobiliários

Tipo De Valor Mobiliário

Legislação Definição Com relação ao valor nominal

AçõesArt. 2º, inciso

I da Lei nº 6.385/76

A ação representa uma fração do capital social de uma sociedade anônima, por meio da qual se atribui ao seu titular a qualidade de acionista. As ações podem ser divididas em ordinárias,

preferenciais ou por fruição. As ações ordinárias são aquelas que conferem ao acionista os direitos

de um sócio comum. As ações preferenciais conferem necessariamente aos seus titulares

alguma espécie de vantagem relativamente às ações ordinárias, embora o seu direito de voto possa ser limitado ou excluído. Pode existir ou não dentro das companhias; pode ter mais de

uma classe.

Podem ter ou não valor nominal, conforme

dispuser o estatuto de cada sociedade anônima.

Debêntures

Art. 2º, incisos I e

IV da Lei nº 6.385/76

A debênture é o valor mobiliário que confere ao seu titular direito de crédito contra a companhia que o emite, nos termos da escritura de emissão.

O valor nominal da debênture é o valor,

expresso em moeda (art. 54, LSA) do crédito que

confere a seu titular, e que este terá direito de receber no vencimento do título.

Partes Beneficiárias

Art. 46, LSA.

As partes beneficiárias são valores mobiliários emitidos pela companhia. Por serem títulos

estranhos ao capital social, não conferem direitos de acionista a seus proprietários, apenas os direitos de participação nos (eventuais) lucros

e de fiscalização.

Não possuem valor nominal.

Bônus De Subscrição.

Art. 2º, inciso I da Lei nº

6.385/76; Art. 75 da Lei das

S.A:

O bônus de subscrição é um direito de uma ação para o futuro. Este dá direito ao seu titular

de subscrever suas ações no futuro por um preço pré-determinado. Isso é bom para uma

empresa que ainda vai crescer e é uma aposta na valorização da Companhia.

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AulA 5. cApItAl socIAl

lEitura básiCa:

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 143-154.

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 989-996 e 1060-1086.

FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. A Proteção aos Credores e aos Acionistas em Aumento de Capital. Re-vista do Advogado, v. 96, 2008. Pp. 32-40.

lEitura ComPlEmEntar:

ROSMAN, Luiz Alberto Colonna. Incompatibilidade de regras do IFRS sobre a apuração do lucro distribuível com o princípio da intangibilidade do ca-pital social. em VENANCIO FILHO, Alberto, LOBO, Carlos Augusto da Silveira e ROSMAN, Luiz Alberto Colonna (Coordenadores) Lei das S.A. em seus 40 anos. Rio de Janeiro: Forense, 2017. Pp. 365-410.

1. CaPital soCial.

Conforme clássica lição de Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedrei-ra, os “direitos dos acionistas estão organizados em conjuntos padronizados de direitos e obrigações” (i.e., as ações) nas companhias. As ações são os valo-res mobiliários em que se subdivide o capital social.

1.1. Conceito.

Segundo José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho:

“[É] a cifra, fixada no estatuto social, do montante das contribuições prometidas pelos sócios para formação da companhia que a lei submete a regime cogente, cujo fim é proteger os credores sociais”.

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“Os fundadores (na constituição da companhia) e os órgãos sociais (du-rante a vida da sociedade) estipulam no estatuto o valor do capital social, que somente pode ser modificado com observância das normas legais.”

1.2. origem do Capital social.

O capital social surgiu como ficção jurídica capaz de separar o patrimônio dos sócios e da sociedade, em resposta à necessidade de investimentos, cada vez maiores à medida que o capitalismo mercantil e industrial foi se consolidando.

Isso porque, antigamente, os sócios respondiam com seus bens pessoais pelas obrigações da sociedade. O conceito de separação patrimonial decor-reu, em grande parte, da noção de capital social.

O capital social é capaz de, idealmente, corresponder aos valores do ativo da sociedade, constituindo-se em verdadeira garantia de credores. Contudo, será que é de fato uma garantia para os credores? Na verdade, a garantia de um cre-dor é a capacidade de solvência da empresa. Essa capacidade de solvência não pode ser observada com o capital social, mas com o patrimônio líquido. O pa-trimônio líquido, ao contrário do capital social, varia de acordo com o mercado.

1.3. noção jurídica e Contábil.

O capital social é uma “cifra convencional fixa”, diferentemente do patri-mônio social, que é mutável. Tem existência de direito, diferentemente do patrimônio social, que tem existência fática. É fixado no ato de constituição da sociedade, e pode ser aumentado ou reduzido ao longo de sua vida, uma vez cumpridas as formalidades legais. Deve ser inscrita no lado passivo do balanço patrimonial da sociedade, por tratar-se de “cifra de retenção”.

Traduz-se, portanto, em uma noção jurídica e contábil capaz de, idealmen-te, corresponder aos valores do ativo da sociedade, constituindo-se em verda-deira garantia de credores. Senão, vejamos as palavras de Bulhões Pedreira:

“Se os sócios tivessem liberdade ilimitada de promover a transferência de bens da sociedade para seus patrimônios, inclusive em prejuízo dos cre-dores sociais, o regime de responsabilidade patrimonial deixaria de ser eficaz nas sociedades. Daí as disposições sobre responsabilidade solidária dos sócios de alguns tipos de sociedade, e sobre o capital social – como mecanismo de garantia dos credores – nos tipos de sociedade em que a responsabilidade de todos os sócios é limitada”48

48 BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia: Conceitos e Fundamentos. Rio de Janeiro, Forense, 1989, p. 419.

48 BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Fi-nanças e Demonstrações Financeiras da Companhia: Conceitos e Fundamentos. Rio de Janeiro, Forense, 1989, p. 419.

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Assim, há uma série de princípios que regem o instituto do Capital Social e que o tornam um conceito jurídico complexo, cujo estudo é de grande im-portância para o direito societário.

1.4. fundo social e Patrimônio.

Fundo Social é o conjunto de bens inicialmente contribuídos pelos sócios.

Patrimônio é o conjunto de bens e dívidas da pessoa, compreende o capital social.

Sobre a diferenciação entre capital social e patrimônio, esclarece Ascarelli:

“Temos, pois, de um lado, o conjunto dos bens da sociedade, isto é, o seu patrimônio; o valor real desses bens muda necessariamente com as oscilações do mercado e com o andamento dos negócios; a sua avaliação, juntamente com a indicação do passivo, é fixada nos balanços sociais; de outro lado, o capital social, resultante não só dos balanços, mas do esta-tuto social, e que não pode ser modificado a não ser que observadas as normas a respeito. Se os sócios tivessem liberdade ilimitada de promover a transferência de bens da sociedade para seus patrimônios, inclusive em prejuízo dos credores sociais, o regime de responsabilidade patrimonial deixaria de ser eficaz nas sociedades. Daí as disposições sobre responsabi-lidade solidária dos sócios de alguns tipos de sociedade, e sobre o capital social – como mecanismo de garantia dos credores – nos tipos de socieda-de em que a responsabilidade de todos os sócios é limitada.”49

1.5. Princípios do Capital social.

Explicam e condicionam as funções exercidas pelo capital social no me-canismo das sociedades anônimas.

• Unidade: Toda sociedade deve ter apenas um capital social, mesmo que tenha diversos estabelecimentos e/ou filiais.

• Fixidez: O capital social estipulado no estatuto é fixo, somente podendo ser alterado por ato solene, nos casos previstos em lei e com observância das normas legais. Visa a proteger os credores contra a redução do capi-tal pelos acionistas.

49 ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. São Paulo: Quorum, 2008. P. 469.

49 ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Compa-rado. São Paulo: Quorum, 2008. P. 469.

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• irrevogabilidade: O capital social constitui fundo perpétuo e, por isso, não pode ser devolvido aos sócios, total ou parcialmente, antes de pagos todos os credores, mesmo na hipótese de liquidação da socieda-de (arts. 206-219, LSA).

• realidade: O capital social fixado no estatuto social deve efetivamente existir no ativo da companhia, a partir das contribuições dos subscrito-res das ações. Há necessidade de efetiva correspondência entre a cifra representativa do capital e o total subscrito e o valor real das prestações a que se obrigaram os sócios. Exemplos de corolários: art. 80, I, LSA (subscrição integral do capital para a constituição da sociedade); e art. 8º, LSA (avaliação dos bens para incorporação ao capital social).

• intangibilidade: O capital social deve permanecer intangível, isto é, insuscetível de apropriação, enquanto a sociedade continuasse operando e seus credores não tivessem sido pagos. Uma das funções do capital social é garantir a proteção dos credores contra atos dos acionistas e administradores que resultem na transferência de bens do ativo para o patrimônio dos acionistas, em prejuízo da solvência da companhia.

1.6. subscrição de ações (art. 7º da lsa).

Aplicável tanto na formação do capital social, por ocasião da constituição da companhia, quanto no seu aumento posterior. Subscrever o capital é pro-meter o aporte de capital. A subscrição já permite que a empresa possa cobrar o aporte (caso nunca integralize, torna-se sócio remisso). A subscrição pode se dar em dinheiro ou em bens.

a) Em dinheiro:

Feita a subscrição por meio de contribuição em dinheiro, deve ser equivalente ao valor nominal da ação ou, caso não haja, ao preço de emissão ou a parte dele destinada à formação do capital social. Se o preço de emissão for maior do que a contribuição para o capital, a diferença constitui reserva de capital.

Deve ser prestada no ato da subscrição, salvo estipulada integralização a prazo (art. 106, LSA), quando devem ser pagos ao menos 10% do preço de emissão da ação (art. 80, II e art. 170,§ 6º, LSA), estando o acionista obri-gado a realizar o saldo nas condições previstas no estatuto ou no boletim de subscrição (art. 106, LSA).

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b) Em bens:

Realizada, de outro lado, por meio de bens (ou seja, tudo o mais que não seja dinheiro), deve-se ter em mente a dificuldade de mensuração do valor do bem subscrito – o que pode colocar em risco a realidade do capital social, afetando acionistas e terceiros que contratem com a companhia.

Diante disso, a lei prescreveu diversas formalidades, destinadas a coibir fraudes e assegurar, da melhor maneira possível, que o bem corresponda à sua avaliação.

Exemplos de normas criadas com esse fim são:

a. avaliação isenta do bem por três peritos (art. 8º e 170, § 3º, LSA) escolhidos pelos subscritores ou acionistas;

b. laudo fundamentado, com indicação de critérios e elementos de comparação adotados (art. 8º, § 1º, LSA);

c. subscritor que confere bens não pode votar o laudo de avaliação (art. 115, § 1º, LSA);

d. responsabilidade civil e penal dos avaliadores e subscritores perante a companhia, acionistas e terceiros, pelos danos causados por culpa ou dolo na avaliação dos bens (art. 8º, § 6º, LSA); e

e. bens não poderão ser incorporados ao patrimônio da companhia por valor superior ao de avaliação.

A integralização do capital já é um segundo momento em que há efetiva-mente o aporte do capital. Para integralização do capital social, admitem-se quaisquer bens suscetíveis de avaliação em dinheiro, em conformidade com o artigo 7º da LSA.

A lógica da integralização do capital se altera dependendo se é uma empre-sa S.A. ou Ltda. Nas limitadas, se 1 sócio não integralizou, os outros sócios respondem solidariamente pelo capital não integralizado. Já nas S.A., caso 1 sócio não integralize os outros não respondem pelo capital não integralizado; respondem apenas ao limite do seu aporte.

àDiscussão: (i) bens gravados com direitos reais de garantia?; (ii) di-reitos de uso?

A deliberação sobre sua avaliação compete, privativamente, à assembleia geral, à luz do artigo 122, inciso IV da LSA

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1.7. Capitalização de recursos já Existentes no Patrimônio da Empresa.

Na companhia em funcionamento, o capital social pode ser formado com a capitalização de recursos financeiros que já existem no ativo patrimonial da sociedade. Essa modalidade é chamada de “incorporação ao capital social” e há apenas a troca do regime jurídico a que estão submetidos o dinheiro ou os bens incorporados.

Exemplos: incorporação de lucros ou de reserva de capital.

1.8. Capital social mínimo: brasil.

Alguns países estabeleceram, em suas respectivas legislações societárias, que há uma limite mínimo de capital social necessário à constituição e/ou à ma-nutenção de uma sociedade anônima (i.e., requisito de capital social mínimo).

A legislação brasileira não prescreve essa exigência, no pressuposto de que muitas companhias apenas conseguiram sucesso porque, tendo sido constitu-ídas anônimas, lhes foi mais fácil captar recursos para a expansão.

Existe, contudo, a possibilidade de que certas atividades econômicas, quando estiverem em setores regulados, possuam conjuntos específicos de regras para que as companhias possam ser elegíveis à concessão. Temos, como exemplo, o caso da companhias aéreas, que são obrigadas pelo art. 181, II do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86) a ter pelo menos 4/5 de seu capital com direito a voto pertencente a brasileiros, mantendo essa proporção após aumento de capital.

1.9. questão para discussão.

O Capital Social é necessário a uma Companhia?

A doutrina internacional há muito vem discutindo a questão a respeito da (des) necessidade do conceito do capital social para o direito societário. Com efeito, Rubens Requião sintetiza o debate:

“Em seu livro sobre Legal Capital, Capítulo V, diz o Prof. Bayless Maning que se pode afirmar, com segurança, que a maquinaria do capital social produz pouca ou nenhuma proteção aos credores, e eles, sabendo disso, buscam outras garantias. E as razões seriam muitas entre as quais aponta:

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a) a cifra que traduz, num balanço, o lucro, é fruto de um sem-nú-mero de prévias decisões contábeis, que, se houver interesse, serão fa-cilmente fraudadas; b) os credores não são ouvidos sobre as decisões de alterar a cifra do capital social, e esta é sempre arbitrária e irrelevante c) não há nenhuma lógica em tomar-se um número qualquer (o capi-tal) e fazê-lo de medida para distribuição de dividendos e bonificações a acionistas; d)o sistema contábil não leva em conta a dimensão do tempo, e não distingue entre um crédito a realizar-se em 20 anos e o realizável na próxima semana”50

Assim, levando em consideração os princípios do Capital Social e as suas funções, reflita acerca das seguintes questões:

(i) as funções atribuídas ao capital social são efetivamente desem-penhadas por ele?;

(ii) os benefícios associados ao capital social superam seus custos para prática empresarial?;

(iii) as funções do capital social são desempenhadas por outros ins-titutos societários de maneira mais eficiente?51

2. aumEnto dE CaPital.

O capital social das companhias pode sofrer aumentos (com aporte e sem aporte de novos recursos).

Os aumentos de capital sem aportes de novos recursos ocorrem:

(i) mediante capitalização de lucros ou reservas (art.169 LSA), quando os acionistas ao invés de distribuírem lucros, os in-corporam ao capital social, preservando-se as proporções das participações acionárias de cada um deles. Caso as ações de emissão da companhia não tenham valor nominal não será preciso mudar o número de ações existentes (art.169, §1º, LSA). Como não há alteração no número de contribuidores, não ocorre diluição; e

(ii) mediante conversão de debêntures ou partes beneficiárias em ações (art. 171, §3º, LSA). Nesse caso pode haver diluição.

50 REQUIÃO, Rubens. “Curso de Direito Comercial”. Vol. II. 2ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003.51 Tais questões foram parte do problema de pesquisa trazido em: MELO FILHO, Augusto Rodrigues Coutinho de. A (Des)necessidade do Conceito de Capital Social no Direito Societário Brasileiro: Uma Análise à Luz dos Direitos Norte-Americano e Europeu. In Coleção Jovem Jurista / Marjorie Gressler Afonso. [et al.]. Rio de Janeiro: Escola de Direito FGV Direito Rio.

50 REQUIÃO, Rubens. “Curso de Direito Comercial”. Vol. II. 2ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

51 Tais questões foram parte do pro-blema de pesquisa trazido em: MELO FILHO, Augusto Rodrigues Coutinho de. A (Des)necessidade do Conceito de Capi-tal Social no Direito Societário Brasileiro: Uma Análise à Luz dos Direitos Norte--Americano e Europeu. In Coleção Jo-vem Jurista / Marjorie Gressler Afonso. [et al.]. Rio de Janeiro: Escola de Direito FGV Direito Rio.

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74FGV DIREITO RIO

Os aumentos de capital com aporte de novos recursos ocorrem:

(i) com a subscrição de ações para integralização em dinheiro e/ou bens (inclusive capitalização de créditos) (art. 171, §2º, LSA);

(ii) com exercícios de direitos relativos à bônus de subscrição ou opção de compra de ações (apenas nas companhias de capital autorizado).

Os aumentos de capital social para aporte de novos recursos poderão ser re-alizados para subscrição pública e/ou subscrição privada, dependendo de quais sejam os destinatários das ações a serem emitidas, esclarecendo-se que somente as companhias abertas devidamente registradas na CVM (registro de compa-nhia aberta) estão autorizadas a promover aumentos de capital para subscri-ção pública, os quais deverão ser igualmente submetidos ao registro perante a CVM (registro de emissão de ações / registro de oferta pública de ações).

Ao menos 3/4 (três quartos) do capital social deverá estar integralizado para que a companhia possa realizar novo aumento de capital (art. 170, caput, LSA).

O preço de emissão das ações em aumentos de capital deverá ser fixado sem diluição injustificada da participação dos antigos acionistas, observando-se os parâmetros previstos no art. 170, §1º, LSA, quais sejam: (a) perspectiva de rentabilidade da companhia; (b) valor de patrimônio líquido da ação; e (c) cotação de suas ações em Bolsa de Valores e/ou mercado de balcão organizado.

Caso o aumento de capital venha a ser realizado para a subscrição com bens, far-se-á necessária a realização de avaliação na forma do art. 8º da LSA (em observância, dentre outros, aos Princípios da Integridade e Realidade do Capital Social), devendo os acionistas deliberarem posteriormente sobre o laudo de avaliação destes bens, sendo certo que o acionista cujos bens estive-rem sendo avaliados para contribuição ao capital social da companhia estará proibido de votar nesta deliberação, na forma do art. 115, §1º, LSA.

A competência para deliberar sobre o aumento de capital é ordinaria-mente da Assembleia Geral, que é o órgão social responsável por deliberar sobre eventuais reformas/alterações estatutárias (art. 122 LSA). Entretanto, o estatuto social poderá conter autorização para aumento do capital social independentemente de reforma estatutária (art. 168 LSA), estabelecido com base em limite de aumento fixado em valor de capital ou em número de ações (i.e., capital autorizado).

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75FGV DIREITO RIO

Nas companhias com capital autorizado (i.e., autorização para aumento de capital sem reforma estatutária, observadas as regras do art. 168 LSA), o Conselho de Administração poderá ser competente para deliberar sobre o aumento de capital, conforme dispuser o Estatuto Social.

Na hipótese de o Conselho Fiscal estar em funcionamento, este deverá ser previamente consultado em todos os casos de aumento de capital (exceto o disposto no art. 166, inc. III, LSA – i.e., aumento de capital para conversão de debêntures ou partes beneficiárias e/ou exercício de direitos conferidos por bônus de subscrição ou opção de compra de ações).

Nas companhias em que houver capital autorizado poderá ocorrer a emis-são de bônus de subscrição (art. 75 e seguintes LSA), valores mobiliários que conferirão aos seus titulares o direito de subscrever ações do capital social da companhia. Estes valores mobiliários têm como finalidade, dentre outras, a captação de recursos para a companhia e/ou o incentivo/liquidez para a subscrição de outros valores mobiliários da companhia (podem ser atribuídos como vantagem adicional, por exemplo, na subscrição de outros valores mo-biliários admitidos à negociação no mercado). Quando a companhia lança bônus de subscrição, antigos acionistas têm preferência para comprá-los.

Também nas companhias com capital autorizado, existe a possibilidade de a companhia outorgar opções de compra de ações aos seus administradores, empregados e/ou pessoas que prestem relevantes serviços para a companhia (art. 168, §3º, LSA). O propósito neste caso é envolver os beneficiários destas opções de compra no crescimento/desenvolvimento/valorização da compa-nhia. O plano de outorga da opção de compra de ações (Stock Option Plan) deverá ser aprovado pela Assembleia Geral.

Nos bônus de subscrição, assim como na opção de compra, os benefi-ciários possuirão o direito de subscrever ações em aumentos de capital da companhia, por valores usualmente pré-estabelecidos, seja no âmbito do lan-çamento dos bônus de subscrição e/ou na outorga das opções de compra. Os beneficiários deverão aportar os recursos correspondentes ao aumento.

Em regra, os acionistas da companhia terão direito de preferência para a subscrição das ações emitidas no âmbito dos aumentos de capital (art. 171 LSA), exceto nos casos em que este direito é expressamente afastado por lei (art. 172 LSA), sendo certo que o direito de preferência é direito essencial do acionista, conforme previsto no art. 109 LSA, os quais não podem ser exclu-ídos pelo estatuto social e/ou pela assembleia geral.

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76FGV DIREITO RIO

Conforme previsto no art. 171, §3º, LSA, não haverá direito de prefe-rência na conversão de debêntures ou partes beneficiárias ou no exercício de bônus de subscrição, sendo certo que já haverá existido o direito de pre-ferência no momento da aquisição das debêntures ou partes beneficiárias ou bônus de subscrição. Da mesma forma, não há preferência na outorga nem no exercício das opções de compra de ações, que serão atribuídos aos administradores ou empregados de acordo com plano aprovado pela assem-bleia geral (Art. 171 §3o LSA).

No caso de aumento de capital com capitalização de créditos e/ou subs-crição e integralização com bens, os acionistas que exercerem o direito de preferência deverão pagar o valor proporcionalmente ao acionista que esti-ver aportando o crédito e/ou o bem.

O prazo para o direito de preferência, o qual não pode ser inferior a 30 (trinta) dias, é (a) decadencial (não se interrompe nem suspende e fulmina o direito material); (b) definido pelo estatuto social, conforme previsto no §4º art. 171 da LSA.

2.1. aumento de Capital e modificação do Estatuto social.

Caso a companhia não possua capital autorizado, o capital social somente poderá ser modificado mediante alteração estatutária da assembleia geral.

O art. 166 da LSA lista as hipóteses em que isso pode ocorrer:

“Art. 166: O capital social pode ser aumentado:

I - por deliberação da assembleia-geral ordinária, para correção da ex-pressão monetária do seu valor (artigo 167);

II - por deliberação da assembleia-geral ou do conselho de administra-ção, observado o que a respeito dispuser o estatuto, nos casos de emissão de ações dentro do limite autorizado no estatuto (artigo 168);

III - por conversão, em ações, de debêntures ou parte beneficiárias e pelo exercício de direitos conferidos por bônus de subscrição, ou de opção de compra de ações;

IV - por deliberação da assembleia-geral extraordinária convocada para decidir sobre reforma do estatuto social, no caso de inexistir autorização de aumento, ou de estar a mesma esgotada.

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77FGV DIREITO RIO

§ 1º Dentro dos 30 (trinta) dias subsequentes à efetivação do aumento, a companhia requererá ao registro do comércio a sua averbação, nos casos dos números I a III, ou o arquivamento da ata da assembleia de reforma do estatuto, no caso do número IV.

§ 2º O conselho fiscal, se em funcionamento, deverá, salvo nos casos do número III, ser obrigatoriamente ouvido antes da deliberação sobre o aumento de capital.”

2.2. Capital autorizado.

Desde que haja previsão expressa no estatuto, poderá haver aumento do capital social dentro do limite autorizado mediante capitalização de reserva de lucros ou de capital. Neste caso, diz-se que a companhia tem capital au-torizado.

Previsto no art. 168 da LSA, o capital autorizado tem sido uma impor-

tante ferramenta de capitalização de recursos, conferindo maior agilidade às companhias, pois permite que a decisão sobre aumento de capital mediante emissão de ações ocorra por decisão do conselho de administração, sem a necessidade de deliberação assemblear e alteração estatutária.

Dispensando a realização de assembleia geral (com todas as formalidades inerentes à realização da mesma), reduz-se o prazo verificado entre a decisão de aumentar o capital e a efetiva emissão de ações, possibilitando à compa-nhia aproveitar o momento mais apropriado do mercado de capitais.

Registre-se, entretanto, que o conselho de administração poderá deliberar sobre aumento de capital, desde que haja previsão estatutária.

O capital social, por deliberação da assembleia geral ou do conselho de ad-ministração, poderá ser majorado sucessivamente até alcançar o teto previsto no estatuto social. Alcançado o limite do capital autorizado, caso a compa-nhia tenha interesse em continuar usando essa ferramenta, será necessária alteração do estatuto, para que se estabeleça novo limite.

2.3. modalidades de aumento de Capital.

(i) Subscrição de Ações: O subscritor aceita a oferta da companhia para ad-quirir as ações, contribuindo para o aumento do capital social em dinhei-ro ou bens, ou mediante capitalização de crédito contra a companhia;

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78FGV DIREITO RIO

(ii) Conversão de Debêntures em Ações: A cláusula de conversibilida-de (art. 57, LSA) assegura ao titular das debêntures a opção de subs-tituir o seu investimento em título de dívida por ações da companhia emissora. Essa conversão implica aumento de capital da companhia emissora, para criar as ações que caberão ao debenturista que exercer o direito à conversão, e extinção do crédito incorporado na debêntu-re que possuía;

(iii) Exercício de Bônus de Subscrição e Opção de Compra: Com o exer-cício do direito e pagamento do preço de emissão das ações completa--se o contrato de subscrição subjacente à emissão do título e, tal como previsto no art. 166, item III, o capital é aumentado pelo seu exercício. Na opção de compra e venda, negócio jurídico pelo qual a companhia outorga direito de adquirir ações a outros, há aumento do capital social quando da emissão das ações objeto da opção, caso em que há negócio de alteração do contrato da companhia;

(iv) Capitalização de Lucros e Reservas: “Art. 169: O aumento mediante capitalização de lucros ou de reservas importará alteração do valor nomi-nal das ações ou distribuições das ações novas, correspondentes ao aumen-to, entre acionistas, na proporção do número de ações que possuírem”

“§ 1º Na companhia com ações sem valor nominal, a capitalização de lucros ou de reservas poderá ser efetivada sem modificação do número de ações”; e

(v) Efeitos de Outras Operações: Na incorporação de sociedade, a in-corporada subscreve aumento de capital da incorporadora para criar as ações que substituirão as ações extintas da incorporada, e o aumento do capital da incorporadora dá-se pela versão do patrimônio líquido da incorporada. O mesmo ocorre no caso de cisão com transferência de parcela do patrimônio líquido da incorporada.

2.4. Parâmetros para aumento de Capital.

legítimo vs. abusivo.

Reputar-se-á legítimo o aumento de capital quando realizado em circuns-tâncias em que a companhia esteja precisando do aporte de tais recursos, de tal modo que, em sentido contrário, será considerado abusivo o aumento de capital realizado em ocasiões nas quais não há a necessidade da realização do aumento de capital.

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79FGV DIREITO RIO

O art. 117 da LSA prevê que:

“Art. 117 O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.

§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:

(...)

c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emi-tidos pela companhia;”

Tanto o acionista quanto o administrador, seja em deliberações de assem-

bleias ou em reuniões do conselho de administração, tem o dever legal de votar e agir no interesse da companhia (arts. 115 e 154 da LSA).

Na votação em que se discute majoração do capital social, não é diferente: a deliberação pelo seu aumento só é legítima se e quando tomada no interesse da companhia (art. 115; e 117, §1º, LSA). Do contrário, entende-se que a mesma é abusiva, respondendo o acionista controlador pelo danos causados.

Na subscrição de novas ações ocorre aumento do estoque de recursos pró-prios da sociedade, mas nem por isso deve-se concluir que todo aumento de capital social é realizado no interesse da companhia, pois o fim da sociedade empresária não é acumular recursos próprios, e sim auferir lucro em prol dos acionistas.

Logo, concluem Bulhões Pedreira e Lamy Filho, o interesse social somente requer o aumento de capital quando (a) a sociedade sofre perdas extraordi-nárias; (b) ocorrem modificações nas condições de operação que obrigam ou recomendam a redução do grau de endividamento; ou (c) a empresa em-preende expansão da capacidade instalada ou da produção que não pode ser financiada apenas com reinvestimento de lucro e empréstimos.

Caso o aumento planejado não se enquadre em nenhuma das três hipó-teses acima, o aumento é abusivo, e seu objetivo velado cinge-se em esmagar o acionista minoritário, eliminando o incômodo de prestar contas e consoli-dando-se no poder isolado.

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80FGV DIREITO RIO

Em razão disso que a deliberação a esse respeito é cercada de formalidades, tais como:

(i) quorum especial para instalação da assembleia geral extra-ordinária que altera o estatuto: art. 135, LSA;

(ii) direito de preferência assegurado: art. 171, LSA;

(iii) fixação de regras para o exercício de voto, inclusive dos ad-ministradores, quando lhe é delegada essa função: arts. 115; 168, LSA.

diluição justificada x injustificada.

É intuitivo que o aumento do número de ações em que se divide o capital reduz a fração do lucro e do patrimônio líquido cabível a cada ação, o que acarreta a diminuição de seu valor econômico. A esta diminuição se dá o nome de diluição.

Nem mesmo o direito de preferência para subscrever novas ações (art. 109, IV, LSA) evita a diluição das ações antigas, mas apenas permite que o acionista preserve o valor de sua participação societária caso ele deseje realizar o investimento adicional.

A diluição justificada, a contrariu sensu, ocorre quando o aumento de capi-tal for justificável do ponto de vista do interesse da companhia.

Não basta que o valor econômico das ações seja formado sem observância de um dos três critérios elaborados com esse fim (tópico 6.1). Isso porque é normal para a companhia que a mesma – a fim de obter subscritores para as novas ações – seja obrigada a fixar o preço de emissão abaixo do valor econômico da ação.

Esse tipo de diluição a lei não veda, ao contrário daquela com o objetivo de fraudar o interesse social.

2.5. órgão Competente.

O aumento de capital pode ser deliberado pela Assembleia Geral ou pelo Conselho de Administração (no caso de companhias com capital autoriza-do, em que a competência para aprovação dos aumentos de capital tenha sido atribuída ao Conselho de Administração, na forma do art. 168, §1º, alínea “b”, da LSA).

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81FGV DIREITO RIO

2.6. direito de Preferência.

“Art. 171 Na proporção do número de ações que possuírem, os acionis-tas terão preferência para a subscrição do aumento de capital.”

O direito de preferência (para subscrever ações) é um dos direitos essen-ciais dos acionistas (art. 109, IV, LSA) e só pode ser suprimido pelo estatuto da companhia aberta nos casos listados no art. 172.

“Art. 172 O estatuto da companhia aberta que contiver autorização para o aumento do capital pode prever a emissão, sem direito de pre-ferência para os antigos acionistas, ou com redução do prazo de que trata o § 4o do art. 171, de ações e debêntures conversíveis em ações, ou bônus de subscrição, cuja colocação seja feita mediante:

I - venda em bolsa de valores ou subscrição pública; ou

II - permuta por ações, em oferta pública de aquisição de controle, nos termos dos artigos 257 a 263.

II - permuta por ações, em oferta pública de aquisição de controle, nos termos dos arts. 257 e 263.

Parágrafo único. O estatuto da companhia, ainda que fechada, pode excluir o direito de preferência para subscrição de ações nos termos de lei especial sobre incentivos fiscais.”

Nos casos de aumento de capital, sempre se dá esse direito de preferência aos sócios já existentes na companhia. Ou seja, esses sócios poderão subscre-ver as ações emitidas em igual proporção o valor que eles participavam.

Só há direito de preferência com relação a novas ações. Não se aplica à tro-ca de ações já emitidas (compra e venda). Isso é diferente quando se trata de debêntures conversíveis em ações. No caso das debêntures, na hora em que elas foram emitidas, os acionistas tinham o direito de preferência para subs-crever debêntures. Como já houve no momento da emissão, isso não ocorre também no momento a conversão.

3. rEdução dE CaPital

O capital social da companhia poderá ser reduzido, por deliberação da Assembleia Geral, (a) se houver perda, até o limite dos prejuízos acumulados; ou (b) se julgá-lo excessivo em relação ao objeto social (art. 173 LSA).

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82FGV DIREITO RIO

Na primeira hipótese (redução de capital para reconhecer perdas), os acio-nistas visam a reduzir a cifra do capital social para sanear as perdas observadas e adequar o valor do capital social, em observância ao Princípio da Realidade do Capital Social. O propósito é sanear a contabilidade da companhia para legitimá-la a promover distribuições de lucros que provierem a partir de en-tão, o que não seria possível sem a referida redução de capital, em virtude do Princípio da Recomposição do Capital Social (referindo-se neste ponto à clássica lição de Cesare Vivante em seu famoso exemplo da “caixa d’água” ou “silo de trigo”).

Na segunda hipótese (redução de capital excessivo em relação ao objeto social), os acionistas projetaram o capital social acima do necessário, tor-nando-se antieconômico mantê-lo excessivo, por diversas razões (inclusive contábeis e operacionais). Nesta hipótese de redução de capital, ou haverá restituição (devolução) aos acionistas de parte do investimento realizado na companhia ou haverá dispensa de montantes que eventualmente ainda não tenham sido aportados.

Nesta segunda hipótese de redução do capital social (excessivo em relação ao objeto social), a redução ficará condicionada à não oposição dos credores (art. 174, §1º, LSA), os quais poderão se opor em até 60 dias após a publica-ção da ata da assembleia que aprovar a redução do capital social. A redução de capital é válida, mas ainda não é plenamente eficaz (condição suspensiva de eficácia é a não oposição dos credores no prazo legal).

Nestas duas hipóteses de redução de capital (por perda ou por excesso), a operação de redução do capital social opera-se de forma voluntária (são os acionistas que deliberam/aprovam). Quando de iniciativa dos administrado-res, deverá ser ouvido o Conselho Fiscal (quando em funcionamento) antes da realização da Assembleia Geral. Se a iniciativa for da Assembleia Geral, isso não é necessário (Art. 173, §1o, LSA).

Há ainda as hipóteses obrigatórias de redução do capital social, quais sejam: (a) reembolso dos acionistas em caso de recesso (Art. 45, §6º, LSA). Se a companhia não possuir reservas de lucros para fazer o reembolso aos acio-nistas, deverá fazê-lo às custas de redução do capital; e (b) acionista que não integraliza suas ações (Art. 107, §4º, LSA). Se a Companhia não conseguir executar nem vender as ações na bolsa, após 01 (um) ano, as ações caem em comisso e deverá ser reduzido o capital na razão do capital não integralizado.

Veja-se o artigo 173 da LSA, conforme abaixo:

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83FGV DIREITO RIO

“Art. 173 A assembleia-geral poderá deliberar a redução do capital social se houver perda, até o montante dos prejuízos acumulados, ou se julgá-lo excessivo.”

3.1. modalidades.

a. absorção de Prejuízo.

Neste caso, o capital da sociedade é superior ao seu patrimônio, gerando uma irrealidade, uma vez que esse capital não tem correspondência patrimo-nial. A sociedade é, portanto, deficitária.

b. restituição aos acionistas de Capital Excessivo.

Traduziria uma situação em que a sociedade estaria mantendo, na conta de capital social, valores muito superiores às suas necessidades, em prejuízo de sua utilização, levando-se em conta o objeto social e a atividade desenvolvida.

3.2. redução voluntária vs. obrigatória.

São voluntárias as modalidades de redução deliberadas pela assembleia ge-ral em razão da perda ou excesso de capital (art. 173, LSA) e, ainda, no caso de outras deliberações assembleares, tais como cancelamento de ações em te-souraria (art. 30, § 1º, ‘b’, LSA); resgate de ações com redução do capital (art. 44, § 1º, LSA); e extinção de ações adquiridas nas operações de incorporação, fusão ou cisão (art. 226, § 1º, LSA).

São obrigatórias as reduções do capital nos casos de ações caídas em co-misso (art. 107, LSA) ou reembolsadas (art. 45, § 6º, LSA).

3.3. oposição de Credores.

A princípio, não seria possível a restituição aos acionistas de parte do capital social, em respeito ao princípio da intangibilidade do capital social – que somente a admite a título de distribuição do lucro ou restituição de capital com lucros apurados pela sociedade, sem prejuízo do capital social. Essa é a ratio do art. 174 da LSA, abaixo transcrito, que prevê que a redução ficará subordinada à não oposição dos credores, que deverão manifestar-se em até 60 dias:

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84FGV DIREITO RIO

“Art. 174. Ressalvado o disposto nos artigos 45 e 107, a redução do capital social com restituição aos acionistas de parte do valor das ações, ou pela diminuição do valor destas, quando não integralizadas, à im-portância das entradas, só se tornará efetiva 60 (sessenta) dias após a publicação da ata da assembleia-geral que a tiver deliberado.

§ 1º Durante o prazo previsto neste artigo, os credores quirografários por títulos anteriores à data da publicação da ata poderão, mediante notificação, de que se dará ciência ao registro do comércio da sede da companhia, opor-se à redução do capital; decairão desse direito os cre-dores que o não exercerem dentro do prazo.

§ 2º Findo o prazo, a ata da assembleia-geral que houver deliberado à redução poderá ser arquivada se não tiver havido oposição ou, se tiver havido oposição de algum credor, desde que feita a prova do pagamento do seu crédito ou do depósito judicial da importância respectiva.

§ 3º Se houver em circulação debêntures emitidas pela companhia, a redução do capital, nos casos previstos neste artigo, não poderá ser efeti-vada sem prévia aprovação pela maioria dos debenturistas, reunidos em assembleia especial.”

3.4. Eficácia da redução.

Como dito acima, a eficácia da redução do capital fica sujeita à condição suspensiva consistente no transcurso do prazo de 60 dias da publicação da ata que a tiver deliberado, caso não haja oposição ou se tiver havido oposição de algum credor desde que feita a prova do pagamento do seu crédito ou do depósito judicial da importância respectiva. No decurso do prazo, a eficácia da deliberação fica sob efeito suspensivo.

Quanto ao momento em que a redução do capital passa a gerar efeitos, a

despeito de antiga controvérsia doutrinária, a questão encontra-se hoje relati-vamente pacificada em razão dos §§ 2º e 3º do art. 174 e pode ser resumida da seguinte maneira:

à Após o prazo de 60 dias, não havendo notificação de nenhum credor, a deliberação produz seus efeitos e a companhia pode iniciar a restitui-ção do capital; salvo se houver debêntures em circulação, caso em que a eficácia depende da aprovação da assembleia geral de debenturistas, ainda que após o decurso dos 60 dias; e

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85FGV DIREITO RIO

à Se a companhia tiver recebido, durante o prazo mencionado, alguma notificação de oposição de credor, a eficácia apenas ocorre (verificado o transcurso do prazo) após o depósito judicial do crédito ou do paga-mento da quantia respectiva.

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86FGV DIREITO RIO

AulA 6: AssEmblEIA GErAl.

lEitura básiCa:

LAMY FILHO, Alfredo et Al. A Lei das S.A. Rio de Janeiro: Editora Reno-var. 1995, Vols. I. Pp. 871-1.029.

Relatório de Análise Audiência Pública SDM nº 09/2014 – Processo CVM nº RJ-2011-13930 Objeto: Alterações na Instrução CVM nº 480, de 7 de dezembro de 2009, e na Instrução CVM n° 481, de 17 de dezem-bro de 2009 – Participação e votação a distância em assembleias gerais (Disponível no Site da autarquia).

1. assEmblEias GErais – noçõEs GErais. A Assembleia Geral é o órgão supremo da sociedade. Forma-se pela reu-

nião dos acionistas, inclusive daqueles sem direito a voto, convocada e ins-talada na forma da lei e do estatuto, para deliberar sobre qualquer assunto de interesse da companhia (art. 121, LSA).

Nesse sentido, é importante ressaltar que a soberania da Assembleia Ge-ral encontra-se limitada pelo objeto social, pelas normas da lei, bem como pelo Estatuto Social da companhia.

2. ComPEtênCia das assEmblEias GErais.

O artigo 121 da Lei das Sociedades Anônimas dá à Assembleia Geral extensivos poderes ao permiti-la deliberar e decidir sobre “todos os negócios relativos ao objeto da companhia e tomar as resoluções que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento”.

Hierarquicamente, a Assembleia Geral se põe acima dos demais órgãos

sociais, que possuem, portanto, competência residual.

O artigo 122 da LSA, cuja natureza é de norma cogente, enumerou as matérias de competência privativa da Assembleia Geral, sob as quais não podem deliberar os demais órgãos sociais:

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

87FGV DIREITO RIO

“Art. 122. Compete privativamente à assembleia geral:

I - reformar o estatuto social;

II - eleger ou destituir, a qualquer tempo, os administradores e fiscais da companhia, ressalvado o disposto no inciso II do art. 142;

III - tomar, anualmente, as contas dos administradores e deliberar sobre as demonstrações financeiras por eles apresentadas;

IV - autorizar a emissão de debêntures, ressalvado o disposto nos §§ 1o, 2o e 4o do art. 59;

V - suspender o exercício dos direitos do acionista (art. 120);

VI - deliberar sobre a avaliação de bens com que o acionista concorrer para a formação do capital social;

VII - autorizar a emissão de partes beneficiárias;

VIII - deliberar sobre transformação, fusão, incorporação e cisão da companhia, sua dissolução e liquidação, eleger e destituir liquidantes e julgar-lhes as contas; e

IX - autorizar os administradores a confessar falência e pedir concordata.

Parágrafo único. Em caso de urgência, a confissão de falência ou o pe-dido de concordata poderá ser formulado pelos administradores, com a concordância do acionista controlador, se houver, convocando-se ime-diatamente a assembleia-geral, para manifestar-se sobre a matéria.”

Esse rol privativo pode ainda ser alargado por disposição legal ou estatutá-ria, sendo pacífica a jurisprudência em torno da sua indelegabilidade, que só cede diante de norma legal expressa.

3. EsPéCiEs dE assEmblEias

Cumpre esclarecer que existem duas espécies de Assembleia: Geral e Es-pecial. A diferença básica entre estas se refere aos membros que as compõem.

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88FGV DIREITO RIO

àDiferenças…

Assembleia Especial Assembleia Geral

Reunião apenas de acionistas de uma determinada classe Reunião de todos os acionistas

3.1. assembleia Especial

São chamadas Assembleias Especiais aquelas assembleias destinadas a reu-nir os acionistas de uma mesma classe de ações, como, por exemplo, os de-tentores das ações preferenciais, chamados a deliberar nos casos do art. 136, § 1º, LSA. Sendo assim, seu objeto de deliberação serão as matérias de interesse específico desses acionistas.

Um exemplo recorrente é a Assembleia Especial dos proprietários de ações

preferenciais da companhia, nos termos do art. 136, § 1º, LSA. O dispositi-vo determina que a eficácia das deliberações sobre as matérias de que tratam os incisos I e II – exclusivamente acerca do regime de ações preferenciais –, encontra-se sujeita à aprovação de mais da metade dos titulares de ações pre-ferenciais, cuja deliberação ocorre em Assembleia Especial.

3.2. assembleia Geral

São chamadas Assembleias Gerais aquelas assembleias nas quais todos os acio-nistas podem participar, inclusive aqueles sem direito a voto (art. 125, §único, LSA), aos quais é dada a oportunidade de manifestar-se durante a congregação.

As Assembleias Gerais, por sua vez, subdividem-se em Ordinárias e Ex-traordinárias, de acordo com as matérias que serão objeto de deliberação. Conforme nitidamente se apreende do caput do artigo 131 da LSA, será ordinária a assembleia que tenha em sua ordem do dia as matérias indicadas no artigo 132 da LSA.

3.2.1. assembleia Geral ordinária (aGo).

A Assembleia Geral Ordinária (AGO) obrigatoriamente deve se reunir uma vez por ano, sendo nula qualquer disposição estatutária, ou deliberação de acionistas, em contrário.

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89FGV DIREITO RIO

Segundo o art. 132 da LSA, a reunião anual deve ocorrer nos quatros pri-meiros meses seguintes ao fim do exercício social. Caso este prazo transcorra sem que esta seja realizada, a apreciação dos temas continua sendo necessária e, consoante o entendimento da doutrina majoritária, sua realização intem-pestiva não à torna extraordinária.

De qualquer forma, vale observar que, independentemente da espécie adotada, o atraso na realização do conclave pode acarretar responsabilização dos administradores por eventuais prejuízos (art. 155, LSA), bem como san-ções à companhia impostas pela CVM.

Segundo o caput do art. 133, além da obrigação de convocar a AGO, os administradores deverão disponibilizar aos acionistas os documentos que serão objeto de deliberação, com antecedência mínima de 1 mês à realização da assembleia, bem como publicá-los em órgãos da imprensa. A necessidade da publicação é dispensada nas companhias fechadas de que cuida o art. 294 (patrimônio líquido inferior a R$ 1.000.000,00), desde que os documentos sejam arquivados no registro de comércio, juntamente com a ata da AGO cinco dias antes da reunião.

A lei também torna indispensável o comparecimento de algumas pessoas encarregadas de prestar esclarecimentos aos acionistas na AGO, são elas: a) os administradores, ou ao menos um deles (art. 134, 1º, LSA); b) o audi-tor independente (art. 134, § 1º, LSA); c) os membros do conselho fiscal, ou ao menos um deles (art. 164, LSA). A ausência de uma das pessoas mencionadas, salvo dispensadas pelos acionistas, acarreta o adiamento das deliberações dependentes dos esclarecimentos dos ausentes e enseja a sua responsabilização pelos prejuízos causados à companhia em decorrência de sua falta. A aprovação da dispensa deve ser feita pela maioria dos acionistas presentes à assembleia.

Quanto às atribuições da AGO, como já mencionado, estão taxativamen-te definidas no art. 132 da LSA, a saber:

“Art. 132. Anualmente, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, deverá haver 1 (uma) assembléia-geral para:I - tomar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras;II - deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distri-buição de dividendos;III - eleger os administradores e os membros do conselho fiscal, quando for o caso;IV - aprovar a correção da expressão monetária do capital social (artigo 167).”

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90FGV DIREITO RIO

3.2.2. assembleia Geral Extraordinária (aGE).

A Assembleia Geral Extraordinária tem competência residual em rela-ção às matérias objeto de deliberação pela AGO, cabendo-lhe discutir sobre qualquer tema que não esteja elencado em um dos incisos do art. 132, LSA (como por exemplo: modificar o estatuto, criar valores mobiliários, aumentar o capital social, etc.).

A AGE, não só não tem um objeto de deliberação delimitado, como tam-bém não tem data marcada para sua realização, podendo ser convocada a qualquer tempo, no momento em que houver necessidade.

De acordo com o parágrafo único do artigo 131, LSA, uma AGE pode ser convocada e realizada cumulativamente com uma AGO, no mesmo local, data e hora, instrumentadas em ata única. Na prática, haverá uma única reu-nião acumulando todas as matérias a serem tratadas, sendo, contudo, obede-cidas as regras próprias de cada uma.

Quanto ao regime jurídico aplicável, pouco difere a AGE da AGO, ca-bendo apenas algumas ressalvas: (a) o quorum de instalação da AGE que contemplar na ordem do dia a alteração do estatuto será distinto da regra geral do art. 125, LSA; (b) o quorum de deliberação também será diverso do previsto no art. 129, LSA, caso trate de matéria presente no art. 136, LSA. Além disto, a realização da assembleia geral extraordinária não é obrigatória.

O art. 135, LSA especifica que a AGE que tiver como proposta a modifi-cação do estatuto social deve observar a regra do quorum de instalação de dois terços, no mínimo, do capital votante, na primeira convocação. A exigência do artigo justifica-se na medida em que a reforma do estatuto social pode afetar as bases das relações sociais e a estrutura da sociedade. Não obstante, frustrada a primeira tentativa, a assembleia pode ser instalada com qualquer número de presentes.

A respeito disso, convém lembrar que o § 1º do mesmo artigo impõe que os atos de alteração do estatuto para serem oponíveis contra terceiros devem ser arquivados na junta comercial.

O outro ponto de distinção se refere ao quorum de deliberação qualificado de metade, no mínimo, das ações com direito a voto, exigido para deliberação sobre as matérias elencadas no art. 136, LSA. Parece evidente que a justifica-tiva para isto é o fato do legislador ter entendido que as matérias tratadas no dispositivo são de extrema importância para a companhia e seus acionistas.

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Neste sentido, vale lembrar que a maioria delas, caso aprovadas, conferem o direito de recesso (art. 137, lLSA).

Assembleia Geral Ordinária Assembleia Geral Extraordinária

Deve se reunir uma vez por ano obrigatoriamente sendo proibida qualquer disposição em contrário

Pode ocorrer a qualquertempo, no momentoque tiver necessidade.

Tem prazo para ocorrer (quatros primeiros meses seguintesao fim do exercício social).

Não tem prazo para ocorrer.Pode até nem ocorrer.

Temas estão delimitadosno art. 132, LSA.

Possui como temas aqueles que não estão elencados no art. 132, LSA.

Se não ocorrer enseja possíveis retaliações ao administrador da

Companhia.

Se não ocorrer nada acontece,pois esta não é obrigatória.

Tem obrigatoriedade de comparecimento de determinadas pessoas, são elas: administradores (ou ao menos um deles); auditor

independente; membros do conselho fiscal (ou ao menos um deles).

Vale ressaltar que a dispensa destes membros pode ocorrer por maioria

se assim for a vontade da maioria dos acionistas presentes na assembleia.

Não tem obrigatoriedadede comparecimento

de nenhum tipo de pessoa.

Quórum de instalação: em primeira convocação, com a presença de acionistas que representem, no

mínimo, 1/4 (um quarto) do capital social com direito de voto; em

segunda convocação instalar-se-á com qualquer número (art. 125, LSA).

Quórum de instalação: A assembléia-geral extraordinária

que tiver por objeto a reforma do estatuto somente se instalará em

primeira convocação com a presença de acionistas que representem

2/3 (dois terços), no mínimo, do capital com direito a voto, mas

poderá instalar-se em segunda com qualquer número (art. 135. LSA).

Quórum de deliberação: As deliberações da assembléia-geral,

ressalvadas as exceções previstas em lei, serão tomadas por maioria absoluta

de votos, não se computando os votos em branco (art. 129, LSA).

Quórum de deliberação: será diverso do previsto no art. 129,

LSA, caso trate de matéria presente no art. 136, LSA.

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4. ConvoCação das assEmblEias.

A convocação, segundo a precisa definição de Valverde “é o convite feito pela imprensa aos acionistas para se reunirem, em Assembleia Geral, no lugar, dia e hora designados, a fim de discutirem e deliberarem sobre determinadas matérias de interesse social.” Note-se que a convocação afigura-se um dever, não uma faculdade à administração ou a quem quer que seja legitimado para convocar a assembleia.

4.1. regularidade na Convocação.

A regularidade na convocação, cuja observância afigura-se de caráter co-gente, baseia-se em três requisitos:

(i) legitimidade de quem a convoca;

(ii) publicidade da convocação; e

(iii) delimitação das matérias que serão objeto de discussão.

4.2. legitimidade para Convocar.

A legitimidade para convocar a Assembleia Geral originariamente per-tence ao Conselho de Administração. Inexistindo este órgão, os diretores passam a ser os legitimados, observando-se no que couber o estatuto social (art. 123 da LSA).

Eventualmente, se a companhia não possuir um Conselho de Administra-ção e os cargos da diretoria encontrarem-se vacantes, estão aptos a efetuar a convocação o Conselho Fiscal, porventura instalado, ou qualquer acionista.

Também, vale registrar que o art. 123,§ único, da LSA permite às seguin-tes pessoas convocar a assembleia, nas seguintes hipóteses excepcionais:

“Art. 123. Compete ao conselho de administração, se houver, ou aos diretores, observado o disposto no estatuto, convocar a assembléia-geral.Parágrafo único. A assembléia-geral pode também ser convocada:a) pelo conselho fiscal, nos casos previstos no número V, do artigo 163;b) por qualquer acionista, quando os administradores retardarem, por mais de 60 (sessenta) dias, a convocação nos casos previstos em lei ou no estatuto;

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c) por acionistas que representem cinco por cento, no mínimo, do capital social, quando os administradores não atenderem, no prazo de oito dias, a pedido de convocação que apresentarem, devidamente fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas; d) por acionistas que representem cinco por cento, no mínimo, do capi-tal votante, ou cinco por cento, no mínimo, dos acionistas sem direito a voto, quando os administradores não atenderem, no prazo de oito dias, a pedido de convocação de assembléia para instalação do conselho fiscal”.

Já na hipótese de liquidação da companhia, compete ao liquidante convo-car a Assembleia (art. 210, IV c/c 213, caput).

Pode, ainda, a própria Assembleia, na qualidade de órgão supremo, deli-berar nova convocação determinando que os administradores tomem as pro-vidências que se fizerem necessárias para tanto.

4.3. Publicidade da convocação.

O caput do artigo 124 da LSA exige a publicação do anúncio da convo-cação por, no mínimo, três vezes no diário oficial e num jornal de grande circulação (art. 289 da LSA), observando-se a antecedência mínima prevista no art. 124, § 1º, da LSA.

Pode-se, no entanto, excepcionar a exigência de publicação da convocação quando se tratar de companhia fechada que tenha menos de 20 acionistas e cujo patrimônio líquido seja de até R$ 1 milhão, consoante prevê o art. 294 da LSA.

Especificamente nesta situação, a publicação do edital de convocação po-derá ser substituída por aviso entregues a todos os sócios, com a mesma ante-cedência prevista no §1º do art. 124 da LSA.

5. CaraCtErístiCas E funCionamEnto das assEmblEias GErais.

5.1. delimitação das matérias que serão objeto de deliberação.

A Assembleia só poderá deliberar sobre as matérias constantes do edital de convocação, salvo as exceções previstas em Lei. O objetivo da norma consiste em proteger os interesses dos ausentes, permitindo-lhes ter a segurança de que a Assembleia não tratará de matérias estranhas ao edital de convocação, para qual não fora intimado.

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Se determinada convocação deixar de observar os requisitos acima, será considerada irregular e, portanto, passível de anulação. Já se inexistir con-vocação, a assembleia será considerada nula, salvo no caso em que todos os acionistas compareçam à mesma (art. 286 da LSA).

5.2. instalação da assembleia.

Feita a convocação de acordo com a Lei, a instalação da assembleia ainda dependerá de outras formalidades, são elas:

i. a identificação dos acionistas ou de seus representantes, que devem assinar o livro de presença, de forma não só a confirmar sua legiti-midade, mas também a garantir o quorum de instalação;

ii. a garantia de que o quorum de instalação tenha sido atingido; e

iii. a eleição da mesa que dirigirá os trabalhos, caso o estatuto não espe-cifique seus integrantes.

Consoante esclarece o artigo 125 da LSA, o quórum para instalação da assembleia geral, em primeira convocação é, em regra, de um quarto do capital votante, prevendo-se a instalação com qualquer número em segunda convocação.

Se, porventura, a Assembleia Geral tiver por objeto a reforma do Estatu-to Social, aplicar-se-á o artigo 135 da LSA, sendo que a instalação somente ocorrerá, em primeira convocação, se contar com a presença de acionistas que representem 2/3 (dois terços), no mínimo, do capital com direito a voto. Em segunda convocação, a assembleia instala-se em qualquer número.

Entende a melhor doutrina que a exigência da Lei para o quorum míni-mo para a instalação da assembleia tem caráter protetivo. Por esse motivo, não se pode reduzir estatutariamente o quorum exigido para a primeira, nem elevar o da segunda, pois estar-se-ia cerceando o direito do acionista de participar da Assembleia, ou o interesse geral no funcionamento eficien-te da companhia, respectivamente.

A confirmação do quorum para instalação da Assembleia Geral se dá mediante a assinatura do Livro de Presença, procedimento obrigatório des-crito no artigo 127 da LSA:

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“Art. 127. Antes de abrir-se a assembléia, os acionistas assinarão o “Li-vro de Presença”, indicando o seu nome, nacionalidade e residência, bem como a quantidade, espécie e classe das ações de que forem titulares.Parágrafo único. Considera-se presente em assembleia geral, para todos os efeitos desta Lei, o acionista que registrar a distância sua presença, na forma prevista em regulamento da Comissão de Valores Mobiliários.”

5.3. mesa.

A mesa compõe-se, salvo disposição diversa no estatuto, com o presidente e o secretário, escolhidos pelos acionistas presentes. Sua função consiste em disciplinar, dirigir a Assembleia e redigir a ata.

5.4. legitimação para Participar da assembleia.

Impõe o artigo 126 da LSA que apenas acionistas podem participar da Assembleia, salvo os seguintes casos em que devem estar presentes: o auditor independente e pelo menos um dos administradores (art. 134, §1º, LSA); um dos membros do Conselho Fiscal, quando instalado (art. 163, LSA).

Além disso, no entendimento de Ricardo Tepedino, com a concordân-cia da maioria, podem também participar “empregados, prestadores de ser-viços da sociedade ou pessoas que mantenham negócios ou queiram negociar com a companhia, desde que necessário ao esclarecimento de temas relaciona-dos à ordem do dia.”

5.5. representação do acionista.

Segundo o §1º, do art. 126 da LSA, os acionistas podem ser representados:

“por procurador constituído há menos de 1 (um) ano, que seja acionis-ta, administrador da companhia ou advogado; na companhia aberta, o procurador pode, ainda, ser instituição financeira, cabendo ao adminis-trador de fundos de investimento representar os condôminos.”

A esse respeito, é pacífico o entendimento de que uma mesma pessoa pode receber procurações de dois ou mais acionista e, inclusive, votar de forma diferente nas deliberações postas em pauta.

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Naturalmente, os representantes legais dos acionistas (p. ex., pais do me-nor impúbere, curador ou tutor de incapaz, administrador de sociedade, etc) também são legitimados para participar da Assembleia em seu nome. Caio Mario da Silva Pereira admite ainda a participação daquilo que classificou como representação imprópria: inventariante, administrador da massa falida, curador de herança jacente.

5.6. boletim de voto a distância – instrução 561 Cvm

O poder de controle de uma Companhia está diretamente ligado ao exercício de voto dos seus acionistas. Conforme assinala Fabio Konder Comparato:

“Ao contrário do que se sucede nos demais tipos societários, a eco-nomia interna da sociedade anônima não é deixada à livre decisão de seus fundadores ou acionistas. O legislador discriminou poderes--funções considerados fundamentais, atribuindo-os a órgãos próprios, insuprimíveis e inconfundíveis: o poder-função deliberante à assem-bleia geral, o poder-função administrativo à diretoria, o poder-função sindicante ao conselho fiscal. A liberdade negocial dos particulares, na organização de uma companhia, é, pois, limitada pelo respeito devido a essa estrutura básica.”

Assim, a participação dos detentores de ações ordinárias nas assembleias gerais é de importância vital para que uma Sociedade Anônima ofereça aos seus acionistas a oportunidade de participar da vida da companhia.

Nesse sentido, para que as Assembleias Gerais tenham a efetividade desejada, é importante que a legislação e o órgão regulador do Mercado de Capitais forneçam mecanismos que possibilitem a participação daqueles acionistas que tenham dificuldade em estar presentes no local de instalação da assembleia.

Sendo assim, em abril de 2015, foi criada a Instrução CVM 561, altera-dora da Instrução CVM 481, para permitir o voto a distância em assembleias gerais. Com efeito, a Instrução 561 prevê:

a. a criação de um boletim de voto a distância, por meio do qual o acionista poderá exercer seu direito de voto previamente à data de realização da assembleia;

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b. a possibilidade de inclusão de candidatos e propostas de deliberação de acionistas minoritários no referido boletim, observados determinados percentuais de participação socie-tária, como forma de viabilizar a participação de acionistas nas assembleias; e

c. os prazos, os procedimentos e as formas de envio desse docu-mento, que poderá ser encaminhado pelo acionista

i. diretamente à companhia ou

ii. a seu custodiante (caso as ações que detiver sejam objeto de depósito centralizado) ou ao escriturador das ações de emissão da companhia (caso tais ações não sejam ob-jeto de depósito centralizado).

Sobre a norma, a Diretora Luciana Dias afirmou: “Nosso intuito é facilitar a participação dos acionistas em assembleia gerais, tanto por meio do voto quanto por meio de apresentação de propostas. Desta forma, também aprimoramos os instrumentos de governança corporativa no mercado brasileiro”

5.7. Princípio majoritário e o quorum de deliberação.

O art. 129 da LSA consagrou o princípio majoritário para as delibera-ções tomadas em assembleia: “As deliberações da assembleia-geral, ressalvadas as exceções previstas em lei, serão tomadas por maioria absoluta de votos, não se computando os votos em branco.”

Já na companhia fechada, consoante dispõe o art. 129, §2º, da LSA, “O estatuto da companhia fechada pode aumentar o quorum exigido para certas deliberações, desde que especifique as matérias.”

No entanto, o art. 136 da LSA estabeleceu quorum qualificado, consisten-te na metade do capital votante para aprovar sobre as seguintes matérias, com maiores repercussões no âmbito da companhia:

“I - criação de ações preferenciais ou aumento de classe de ações prefe-renciais existentes, sem guardar proporção com as demais classes de ações preferenciais, salvo se já previstos ou autorizados pelo estatuto;

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II - alteração nas preferências, vantagens e condições de resgate ou amor-tização de uma ou mais classes de ações preferenciais, ou criação de nova classe mais favorecida; III - redução do dividendo obrigatório; IV - fusão da companhia, ou sua incorporação em outra; V - participação em grupo de sociedades (art. 265); VI - mudança do objeto da companhia; VII - cessação do estado de liquidação da companhia; VIII - criação de partes beneficiárias; IX - cisão da companhia;X - dissolução da companhia.”

O quorum de metade do capital pode levar ao empate. Neste caso, resolve-se o problema seguindo a orientação do art. 129, §2º, da LSA, segundo a qual:

“se o estatuto não estabelecer procedimento de arbitragem e não contiver norma diversa, a assembleia será convocada, com intervalo mínimo de 2 (dois) meses, para votar a deliberação; se permanecer o empate e os acionistas não concordarem em cometer a decisão a um terceiro, caberá ao Poder Judiciário decidir, no interesse da companhia.”

5.8. local de realização.

O lugar de realização da assembleia deve ser o edifício-sede da sociedade (art. 124, §2º, da LSA), salvo os casos de força maior em que se admite a sua transferência para outro local.

5.9. ata de assembleia.

Dispõe o artigo 130, caput, da LSA, que os trabalhos e o resultado das deliberações devem ser lavrados em ata, em livro próprio, a ser assinada por todos os membros da mesa e acionistas presentes.

A ata de realização da Assembleia é, nas palavras de Carvalho de Men-donça, a “memória escrita das ocorrências”, a prova documental do que se sucedeu na reunião, nas relações entre os acionistas e entre estes e a sociedade anônima, detendo assim, presunção relativa de veracidade.

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AulA 7. conFlIto dE IntErEssEs E nulIdAdEs AssEmblEArEs (vícIos do voto; vícIos dA dElIbErAção; E vícIos dA AssEmblEIA).

lEitura básiCa:

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Conflito de Interesses no Exercício do Direito de Voto nas Sociedades Anônimas (1ª Parte). Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. vol. 24.   São Paulo. abr.-jun./2004. pp. 140-157.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Conflito de Interesses no Exercício do Direito de Voto nas Sociedades Anônimas (2ª Parte). Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. vol. 25.   São Paulo. jul.-set./2004. pp. 82-103.

FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses: For-mal ou Material? Nova Decisão da CVM sobre a questão (jurisprudência comentada). In Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nº 128, 2002, pp. 225/ 262.

lEitura ComPlEmEntar:

FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas Assembleias de S.A.(e outros escritos sobre conflito de interesses). São Paulo. 2ª Edição. Malheiros Editores Ltda. 2014.

FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembleia das S/A e outros escritos sobre o tema da invalidade das deliberações sociais. São Paulo. 2ª Edição.

FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Acionista Controlador –Impedimento ao Direito de Voto (jurisprudência comentada). In Revis-ta de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nº 125, 2002, pp. 139/ 172.

FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes . Lineamentos da reforma do direito societário italiano em matéria de invalidade das deliberações assem-bleares. Revista de Direito Mercantil Industrial, Econômico e Financei-ro, São Paulo, n. 134, 2004, pp. 12/24.

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1. introdução

Em regra, as sociedades anônimas são compostas por uma pluralidade de acionistas, os quais, por determinadas razões, se unem envidando recursos e esforços em prol do desenvolvimento de um empreendimento em conjunto. Na dinâmica do anonimato há entre os acionistas uma comunhão voluntária de interesses, quais seja, o propósito de cumprir com seu objeto social e pro-duzir lucros para a sua posterior repartição.

Mas, apesar da existência dessa comunhão voluntária entre os acionistas, elemento que permite a perseguição dos fins sociais comuns, releva-se tam-bém interesses particulares, que alguns acionistas frequente e oportunamente buscam satisfazer, a fim de se beneficiarem, ao máximo, na condução da prática empresarial52.

Ocorre que, para a condução harmoniosa do negócio social, não se pode conceber que determinados acionistas primem por interesses particulares, quando a satisfação desses interesses sacrificar os interesses da companhia e do negócio social.

Daí resulta a questão relativa ao conflito de interesses dos acionistas, que ocorre na tomada de deliberação dos negócios sociais, nos caso em que o acionista possuir interesses antagônicos e colidentes com o interesse da companhia53.

Sobre o ponto, existe acalorado debate, para determinar as diretrizes capazes de controlar os interesses pessoais dos acionistas, os quais em determinadas situações podem vir a prejudicar a condução dos negócios da companhia.

2. intErEssE soCial

2.1. relevância para discussão

Em relação ao tema, a LSA estabelece limites no exercício do direito a voto dos acionistas, a fim de impedir que interesses pessoais dos acionistas venham a prejudicar a companhia. Em suma, o controle dá-se por (i) limita-ção do exercício do voto ou (ii) orientação legal de como este direito deve ser exercido. A esse respeito, o caput do artigo 115, dispõe que “o acionista deve exercer o direito de voto no interesse da companhia”.

52 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 140.53 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 141.

52 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 140.

53 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 141.

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Trata-se, como se vê, de norma de cunho limitador e orientador do exercício do direito de voto, aplicável à universalidade dos acionistas com direito a votos, sejam eles minoritários ou controladores54.

Feitas essas considerações, indaga-se: no que consiste esse interesse da companhia, que se convencionou chamar de interesse social?

A resposta para essa profunda discussão divide eminentes doutrinadores. As teorias elaboradas em torno do interesse social, pode-se dizer, dividem--se em dois grandes grupos: as teorias institucionais e as contratualistas.

2.2. teorias institucionalistas Em linhas gerais as teorias institucionalistas concebem o interesse so-

cial como um interesse superior ao interesse dos sócios, apresentando-se absolutamente soberano e independentemente dos interesses dos pró-prios sócios. De acordo com essa teoria, o interesse social não constitui privilégio exclusivo dos acionistas e também, não por outro motivo, sustentam que as sociedades anônimas, sobretudo as grandes compa-nhias, exercem função pública fundamental para o desenvolvimento dos países em que atuam.

Sendo assim, em virtude da característica de interesse público o qual as teorias institucionalistas atribuem às companhias, estas deverão ser pro-tegidas contra a ação de quaisquer elementos, inclusive contra a ação de seus próprios acionistas.

De acordo com essa teoria, o interesse da companhia poderá ser con-trário ao interesse comum da totalidade dos seus acionistas, uma vez que aquele transcende aos interesses destes tendo em vista o seu caráter insti-tucional e soberano.

2.3. teorias Contratualistas

Ao contrário das teorias institucionalistas, as teorias contratualistas sus-tentam que o interesse social consiste em um interesse comum dos acionistas e, portanto, se recusam “a ver na sociedade anônima uma instituição, con-figurando-a, ao revés, como uma relação contratual que não envolve outro interesse senão das partes contratantes”55.

54 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 148.

54 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte I. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 24. P. 148.

55 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas as-sembleias de S.A. São Paulo: Malheiros, 1993. P. 34.

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Calixto Salomão Filho esclarece que “o contratualismo é a concepção do interesse social que sustenta ser ele coincidente com o interesse do grupo de sócios”56. Nesse sentido, as teorias contratualistas encontram unidade no que se refere à compreensão de que o interesse social se constitui como interesse comum dos sócios.

A divergência existente entre as escolas contratualistas reside, basica-mente, na conceituação do que constitui o “interesse comum dos sócios”. Isto por que existem hipóteses nas quais os acionistas terão interesses par-ticulares convergentes, absolutamente estranhos à condução dos negócios sociais. Em outras palavras, “os sócios, além dos seus interesses individuais, podem ter vários interesses comuns, não necessariamente ligados à sua po-sição de sócios”57.

Todavia, em geral, as teorias contratualistas sustentam que o interesse so-cial consiste no interesse comum dos sócios enquanto sócios, existente em decorrência do status de sócios de um negócio em comum. Dessa forma, os interesses particulares de cada sócio estranhos à companhia não se inserem no conceito de interesse social.

2.4. interesse social na lsa: regime dualista

A legislação brasileira estabelece um regime dualista no que se refere à tutela do interesse social. Como se viu, o artigo 115 da LSA prescreve ao exercício do direito de voto no interesse da companhia.

Fica claro nesse dispositivo o caráter contratualista imposto pela LSA ao acionista, o qual compete exclusivamente perseguir o interesse social, ou seja, o interesse comum dos sócios enquanto sócios.

Entretanto, isso não significa que a LSA não tenha reconhecido o ca-ráter institucional das sociedades anônimas. Nesse sentido, prescreve ao acionista controlador o dever de zelar por interesses que transcendem a órbita interna da companhia. Confira-se a redação do parágrafo único do artigo 116: “O acionista controlador tem o dever de usar o poder com o fim de a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social , e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela tra-balham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.”

56 SALOMÃO FILHO, Calixto. Interesse social: concepção clássica e moderna. O novo direito societário. São Paulo: Malheiros, 1998. P. 14.57 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas assembleias de S.A. São Paulo: Malheiros, 1993. P. 27.

56 SALOMÃO FILHO, Calixto. Interesse social: concepção clássica e moderna. O novo direito societário. São Paulo: Ma-lheiros, 1998. P. 14.

57 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas as-sembleias de S.A. São Paulo: Malheiros, 1993. P. 27.

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Pode-se entender, dessa forma, que para a LSA o interesse social não se constitui simples somatório dos interesses privados dos sócios que integram a sociedade. Tampouco, pode-se entender que a intenção da Lei é atribuir ao interesse social o conceito de um interesse autônomo e desvinculado dos interesses da pluralidade dos acionistas da companhia.

Assim, parece acertada a definição de Luiz Gastão Paes de Barros Leães, pelo qual compreende o interesse da companhia “(...) não como somatório dos interesses privados dos sócios, nem como um interesse autônomo des-vinculado dos interesses dos acionistas da companhia, mas como o interesse comum dos sócios (qua socii e não enquanto indivíduos), norteado no sen-tido da realização do objeto social”58.

À luz da LSA, o interesse social não constitui mero somatório de in-teresses dos acionistas, nem inteiramente autônomo dos interesses deles, estando vinculado a 2 (dois) elementos básicos: (i) a consecução do obje-to social, ou seja, a realização das atividades empresariais para as quais a companhia foi constituída; e (ii) a produção de lucros a serem repartidos entre os acionistas59.

Portanto, ainda que os interesses dos acionistas sejam distintos ou até mesmo conflitantes com os da companhia, eles têm o dever de perseguir o interesse social quando no exercício do seu direito de voto.

3. o artiGo 115 da lsa

Viu-se até agora que o direito de voto deve ser exercido no interesse da companhia: prevalece o interesse social sobre o interesse individual dos acionistas. Embora os objetivos dos acionistas possam ser diversos e mes-mo conflitantes, o acionista vota na condição de membro de determinada comunidade acionária, não com vistas ao atendimento de interesses que a ela são estranhos. Havendo eventual conflito entre o interesse do acio-nista enquanto sócio e do acionista enquanto terceiro, o primeiro deve ser privilegiado60.

Registre-se que o acionista não é obrigado a exercer seu direito de voto, nem a comparecer à assembleia geral; mas, se comparecer e decidir votar, deve fazê-lo visando ao interesse da companhia. Trata-se, assim, de um direito-função, limitado à consecução do objeto social61.

58 LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Conflito de interesses e vedação de voto nas assembleias das sociedades anônimas. Revista de Direito Mercantil, Industrial e Econômico e Financeiro 92/107. São Paulo: RT, ou-dez. 1993.59 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 654.60 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 653.61 PIMENTA DA CUNHA, Rodrigo Ferraz, O Exercício de Voto na Sociedade Anônima. In: Rodrigo R. Monteiro de Castro e Leandro Santos de Aragão (Coord.). Direito Societário. Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.249.

58 LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Conflito de interesses e vedação de voto nas assembleias das sociedades anô-nimas. Revista de Direito Mercantil, Industrial e Econômico e Financeiro 92/107. São Paulo: RT, ou-dez. 1993.

59 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Pau-lo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 654.

60 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Pau-lo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 653.

61 PIMENTA DA CUNHA, Rodrigo Ferraz, O Exercício de Voto na Sociedade Anôni-ma. In: Rodrigo R. Monteiro de Castro e Leandro Santos de Aragão (Coord.). Direito Societário. Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.249.

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Eis, então, a regência da matéria pelo artigo 115 da LSA:

“Abuso do Direito de Voto e Conflito de Interesses

Art. 115. O acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o voto exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas. § 1º o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia--geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem be-neficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

§ 2º Se todos os subscritores forem condôminos de bem com que concorreram para a formação do capital social, poderão aprovar o lau-do, sem prejuízo da responsabilidade de que trata o § 6º do artigo 8º.

§ 3º o acionista responde pelos danos causados pelo exercício abusi-vo do direito de voto, ainda que seu voto não haja prevalecido.

§ 4º A deliberação tomada em decorrência do voto de acionista que tem interesse conflitante com o da companhia é anulável; o acionis-ta responderá pelos danos causados e será obrigado a transferir para a companhia as vantagens que tiver auferido.”

A doutrina critica a redação do artigo 115 por tratar, em um mesmo dis-positivo legal, de três institutos jurídicos distintos, quais sejam (i) o abuso do direito de voto; (ii) as hipóteses taxativas de proibição do exercício do direito de voto; e (iii) as hipóteses de benefício particular e conflito de interesses. A concentração de questões tão antagônicas em um mesmo dispositivo legal suscita divergências na interpretação das matérias nele previstas, como se vê, sucintamente, a seguir.

Primeiramente, importante recapitular que nosso sistema societário admi-te a contratação entre os acionistas e a companhia, entre os administradores e a companhia, ou ainda, entre controladora e controlada desde que respeita-das algumas condições, conforme os artigos 117, §1º, alínea “f ”, 156, §1º e 264 da LSA, cujas redações seguem transcritas abaixo:

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“Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.

§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder: (...)

f ) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favoreci-mento ou não equitativas;

(...)

Art. 156. É vedado ao administrador intervir em qualquer operação social em que tiver interesse conflitante com o da companhia, bem como na deliberação que a respeito tomarem os demais adminis-tradores, cumprindo-lhe cientificá-los do seu impedimento e fazer consignar, em ata de reunião do conselho de administração ou da diretoria, a natureza e extensão do seu interesse.

§ 1º Ainda que observado o disposto neste artigo, o administrador somente pode contratar com a companhia em condições razoáveis ou equitativas, idênticas às que prevalecem no mercado ou em que a companhia contrataria com terceiros.

(...)

Art. 264. Na incorporação, pela controladora, de companhia con-trolada, a justificação, apresentada à assembléia-geral da controlada, deverá conter, além das informações previstas nos arts. 224 e 225, o cálculo das relações de substituição das ações dos acionistas não controladores da controlada com base no valor do patrimônio lí-quido das ações da controladora e da controlada, avaliados os dois patrimônios segundo os mesmos critérios e na mesma data, a preços de mercado, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, no caso de companhias abertas

(...)”

Dessa forma, não são proibidas nem condicionadas, a priori, à autorização de qualquer órgão, as negociações entre o acionista controlador ou adminis-trador e a companhia, desde que concluídas em bases equitativas, semelhan-tes às que ocorreriam em contratos com terceiros62.

62 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 653.

62 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Pau-lo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 653.

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3.1. abuso de direito de voto e as hipóteses de vedação ao Exercício do direito de voto

De acordo com o artigo 115 da LSA “considerar-se-á abusivo o voto exer-cido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas”.

Dessa forma, embora o direito de voto constitua um direito do acionista, não pode ser exercido com fim diverso daquele para o qual é reconhecido, na medida em que sua legitimidade decorre da conformidade com o interesse social. Assim, o abuso do direito do voto consiste na desconformidade entre a finalidade do direito e a do seu exercício diante de um caso concreto63.

A esse respeito, a LSA prescreve no §1º do artigo 115 quatro hipóteses em que o acionista não poderá exercer o direito de exercício de voto nas de-liberações das assembleias gerais relativas: (i) ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social; (ii) à aprovação das suas contas como administrador; (iii) a que possa beneficiá-lo de modo particular; e (iv) em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

Pode-se perceber que o §1º do art. 115 prevê hipóteses objetivas na qual o acionista estará previamente impedido de votar, quais sejam, as deliberações relativas: (i) ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a forma-ção do capital social; e (ii) à aprovação das suas contas como administrador. Trata-se de hipóteses taxativas, em que a legislação societária considera, por presunção absoluta, o conflito de interesses do acionista, vedando-o o exercí-cio do direito de voto.

A discussão mais acirrada reside nas duas outras hipóteses previstas no art. 115, §1º, da LSA, relacionadas (i) às deliberações sobre matérias que pude-rem beneficiar o acionista de modo particular; e (ii) às deliberações em que o acionista tiver interesse conflitante com o da companhia.

Indaga-se, nesse sentido, se nessas hipóteses (i) a lei veda ex ante factum, o exercício do direito de voto, por se tratar de um conflito de interesse for-mal, na qual o acionista está de antemão impedido de votar, assim como o fez nas duas primeiras hipóteses do §1º do art. 115; ou (ii) se, ao contrário, a proibição legal se refere à existência de um conflito substancial, o qual somente poderá ser verificado ex post factum, após um exame casuístico da situação conflituosa64.

63 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 654.64 Veja, entretanto, que respeitável parte da doutrina capitaneada por Fabio Konder Comparato e Nelson Eizirik sustentam que a hipótese referente às deliberações sobre matérias que possam beneficiar o acionista de modo particular, deve ser interpretada de maneira formal, ou seja, na opinião desses juristas trata-se de hipótese de impedimento absoluto de voto, conforme a lição aqui transcrita: “O entendimento dominante entre nós, tanto no regime anterior como no atual, da mesma forma que ocorre nos sistemas jurídicos francês e alemão, é no sentido de que o beneficio particular constitui uma vantagem lícita, um favor concedido ao beneficiário, em sua condição de acionista, mas que rompe o princípio da igualdade entre os acionistas. Tal vantagem pode ser outorgada estatutariamente, mas o acionista beneficiário não pode votar, pois ela lhe trará beneficio “particulares”, não conferidos aos demais acionistas. Se a sociedade resolve atribuir uma bonificação a determinado acionista, ele não poderá votar naquela deliberação, pois ela estará a beneficiá-lo de modo particular, quebrando a regra de igualdade entre todos os acionistas. Da mesma forma, constituem exemplos de benefícios particulares: a concessão de opções de compra ou parte beneficiárias, a criação de planos de aposentadoria, e outras hipóteses em que se caracterize o favor a determinados acionistas, mas não a outros”. Entretanto, colocam-se de outro lado, os doutrinadores, como Luiz Gastão Paes de Barros Leães e Luiz Antonio Campos Sampaio, que entendem o benefício particular como sendo uma hipótese de conflito substancial, uma vez que a aprovação de matéria em que exista “interesse conflitante” proporcionará para o acionista um “benefício particular”, sendo, portanto, os dois conceitos intimamente conexos. EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 658/659.

63 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Pau-lo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 654.

64 Veja, entretanto, que respeitável parte da doutrina capitaneada por Fa-bio Konder Comparato e Nelson Eizirik sustentam que a hipótese referente às deliberações sobre matérias que pos-sam beneficiar o acionista de modo particular, deve ser interpretada de maneira formal, ou seja, na opinião desses juristas trata-se de hipótese de impedimento absoluto de voto, conforme a lição aqui transcrita: “O entendimento dominante entre nós, tanto no regime anterior como no atual, da mesma forma que ocorre nos sistemas jurídicos francês e alemão, é no sentido de que o beneficio particu-lar constitui uma vantagem lícita, um favor concedido ao beneficiário, em sua condição de acionista, mas que rompe o princípio da igualdade entre os acionistas. Tal vantagem pode ser outorgada estatutariamente, mas o acionista beneficiário não pode votar, pois ela lhe trará beneficio “parti-culares”, não conferidos aos demais acionistas. Se a sociedade resolve atribuir uma bonificação a determi-nado acionista, ele não poderá votar naquela deliberação, pois ela estará a beneficiá-lo de modo particular, quebrando a regra de igualdade entre todos os acionistas. Da mesma forma, constituem exemplos de benefícios particulares: a concessão de opções de compra ou parte beneficiárias, a criação de planos de aposentadoria, e outras hipóteses em que se caracteri-ze o favor a determinados acionistas, mas não a outros”. Entretanto, colocam-se de outro lado, os doutrinadores, como Luiz Gastão Paes de Barros Leães e Luiz Antonio Campos Sampaio, que entendem o benefício particular como sendo uma hipótese de conflito substancial, uma vez que a aprovação de matéria em que exista “interesse conflitante” propor-cionará para o acionista um “benefício particular”, sendo, portanto, os dois conceitos intimamente conexos. EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 658/659.

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Note-se que a discussão cinge-se tão somente ao exercício do direito de voto, não impedindo o acionista de comparecer à assembleia e discutir as matérias postas em deliberação. Além disso, as ações do acionista impedido são contadas para a formação do quorum de instalação da assembleia, o qual não se confunde com o quorum de votação65.

3.2. Conflito formal x Conflito substancial

Pelo critério formal, verifica-se a ocorrência do conflito do exercício do direito de voto a priori. Para esse critério, não importa se o voto seria exer-cido à luz do interesse social ou se o mesmo causaria danos à companhia. A vedação é absoluta, sendo assim, o acionista encontra-se impedido de votar, independentemente do conteúdo que seria manifestado pelo seu voto.

Por outro lado, o critério substancial pressupõe a análise casuística das circunstancias em que o voto foi exercido. O acionista poderá votar ainda que se encontre em situação de conflito de interesse. Contudo, a validade do seu voto será controvertida caso não tenha sido exercido em prol do interesse social e tenha motivado dano efetivo ou potencial à companhia. Sendo assim, qual critério deve ser adotado na interpretação do §1º do art. 115?

Há um consenso de que o critério formal está em plena conformidade com as duas primeiras hipóteses do §1º do art. 115 da LSA, pois se tratam de hipóteses objetivas de vedação, as quais não dão margem para interpretações. Por outro lado, as duas últimas hipóteses consistem em padrões gerais exemplificativos, po-dendo ocorrer, na prática, diversas situações em que possam ser caracterizadas.

Por isso, a doutrina, em geral, coincide na interpretação – (à exceção de Carvalhosa) -, segundo a qual o art. 115 exige a avaliação casuística para que reste configurado o conflito de interesses nos dois últimos casos regulados pelo referido dispositivo.66

Os que defendem a adoção do critério substancial sustentam ainda que a prática empresarial revela hipóteses nas quais acionistas em conluio subtraem o voto do acionista em suposto conflito, impedindo-o de fazer prevalecer sua vontade em determinada deliberação assemblear.67

Neste sentido, argumentam que o critério formal de avaliação do conflito e a consequente vedação a priori do exercício do direito de voto, por vezes, em vez de tutelar o interesse social, que fundamenta a existência do §1º do art. 115 da LSA, pode colocá-lo em risco, invertendo a ordem de poderes na companhia, ao atribuir ao minoritário o exame de impedimento do acionista controlador, por exemplo.68 69

65 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 656.66 LAMY FILHO, Alfredo. Temas de S.A. Exposições e Pareceres. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 355 67 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25. P. 88.68 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25. P. 88.69 Nesse sentido, confira a lição de Luiz Antônio Sampaio Campos: “se o voto proferido pelos acionistas a quem seria permitido votar contrariasse o interesse social, o máximo que se obteria seria a desconsideração do voto, jamais a aprovação da deliberação, já que nessa hipótese não haveria a possibilidade de uma decisão judicial que suprisse a manifestação – ou a não manifestação – de vontade dos acionistas. Não se atingiria jamais o conteúdo positivo de uma deliberação, mas apenas a desconstituição dos votos viciados.

65 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Pau-lo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 656.

66 LAMY FILHO, Alfredo. Temas de S.A. Exposições e Pareceres. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 355

67 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25. P. 88.

68 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25. P. 88.

69 Nesse sentido, confira a lição de Luiz Antônio Sampaio Campos: “se o voto proferido pelos acionistas a quem seria permitido votar contrariasse o interesse social, o máximo que se obteria seria a desconsideração do voto, jamais a aprovação da deliberação, já que nessa hipótese não haveria a possibilidade de uma decisão judicial que suprisse a manifestação – ou a não manifesta-ção – de vontade dos acionistas. Não se atingiria jamais o conteúdo positivo de uma deliberação, mas apenas a des-constituição dos votos viciados.

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Assim, a conflituosidade, segundo o critério substancial, deverá ser apu-rada em cada caso concreto, conforme as circunstâncias, de modo que o voto do acionista que privilegie o seu interesse pessoal em detrimento ao interesse social, somente poderá ser verificado a posteriori, através da análise de mérito da deliberação e do impacto causado nas atividades da companhia.

Para Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França, o acionista estará im-pedido de votar quando visar obter vantagem individual a que não faz jus, aliado ao dano atual ou potencial para a companhia. Nesse caso, estaria caracterizado o conflito de interesse capaz de determinar o impedimento de voto do acionista70.

Entretanto, registre-se que esse entendimento não é absoluto. Há quem argumente pela interpretação do §1º do art. 115 da LSA unicamente atra-vés do critério formal. Segundo esse entendimento, as hipóteses em que o acionista aufere “benefício particular” ou se encontre em situação de “con-flito de interesse” devem ser equiparadas às duas primeiras hipóteses do mencionado dispositivo. Nesse caso, o acionista estará impedido de votar em toda e qualquer situação em que figurar nessas hipóteses.

4. ConClusão

Neste capítulo foi abordada a divergência que gira em torno da matéria referente ao conflito de interesses no exercício do direito de voto nas socie-dades anônimas. Observou-se que o art. 115 da LSA reuni em um mesmo dispositivo legal institutos jurídicos distintos, os quais suscitam divergências na interpretação das matérias nele previstas.

Além disso, revelou-se o amplo debate que permeia a interpretação do artigo 155 da LSA, na qual se deparam questões como: Qual interpretação do mencionado dispositivo é a mais adequada, o critério formal ou subs-tancial? A quem incumbe determinar se o acionista está ou não diante de uma situação de impedimento de exercer seu direito de voto? Quais são as consequências do acionista que exerceu o direito de voto em situação que se encontrava impedido?

A intenção da aula é apenas introduzir o debate ao aluno, sendo certo de que esses pontos e outros não abordados neste capítulo são enfrentados e debatidos de maneira mais profunda pela doutrina e jurisprudência.

70 NOVAES E FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo. Conflito de Interesses Formal ou Substancial? Nova Decisão d a CVM sobre a Questão. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. V. 128. P.225.

70 NOVAES E FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo. Conflito de Interesses Formal ou Substancial? Nova Decisão d a CVM sobre a Questão. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Fi-nanceiro. V. 128. P.225.

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109FGV DIREITO RIO

5. jurisPrudênCia

• Inquérito Administrativo CVM n. TA/RJ2001/4977; e

• Inquérito Administrativo CVM TA/RJ2002/1.153.

6. nulidadEs assEmblEarEs

No âmbito do direito das sociedades por ações aplica-se restritivamente a teoria das nulidades do direito civil, regida pelo princípio “quod nullum est, nullum producit effectum.” Isso se dá diante do interesse da “continui-dade das empresas”, do interesse da estabilidade das deliberações da com-panhia, aliados à tutela do interesse de terceiros, que com ela contratam, confiando na regularidade da prática de seus atos.

Nesse sentido, o especial regime de invalidade aplicável às companhias, se assenta, em grandes linhas no seguinte, como bem aponta ERASMO VALLADÃO NOVAES e FRANÇA: (i) Prazos muitos mais exíguos de prescrição e decadência; (ii) irretroatividade dos efeitos da invalidade; (iii) ampla possibilidade de sanação do vício, ainda que se trate, por ve-zes, de defeito que, segundo o direito comum, acarretaria a nulidade do ato; (iv) diverso enfoque da distinção entre atos nulos e anuláveis.

Assim, é que a LSA estabelece no art. 285 que “a ação para anular a constituição da companhia, por vício ou defeito, prescreve em 1 (um) ano, contado da publicação dos atos constitutivos.” Mais ainda, o pará-grafo único, em clara reverência ao princípio da sanação dispõe que “Ainda depois de proposta a ação, é lícito à companhia, por deliberação da assembléia-geral, providenciar para que seja sanado o vício ou defeito.” E, nos termos do art. 206 da LSA, a anulação da constituição da compa-nhia acarreta tão somente a sua dissolução. Além disso, a regra geral de anulação das deliberações tomadas em assembleia geral ou especial, “ir-regularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulação,” prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberação.

O Superior Tribunal de Justiça, em algumas oportunidades, já ma-nifestou entendimento pela aplicação restrita da teoria das nulidades às sociedades anônimas:

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110FGV DIREITO RIO

PROCESSO CIVIL. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. PRIN-CÍPIOS JURA NOVIT CURIA E DA MIHI FACTUM DABO TIBI JUS. PREQUESTIONAMENTO. PRODUÇÃO DE PROVA MEDIANTE REPRODUÇÃO MECÂNICA. POS-SIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DEVER DE GUARDA SUJEITO AO PRA-ZO PRESCRICIONAL.EXISTÊNCIA DE ATO OU NEGÓCIO JURÍDICO. SÚMU-LA N. 7/STJ. AÇÃO DECLARATÓRIA E PRETENSÃO CON-DENATÓRIA OU CONSTITUTIVA. PRESCRIÇÃO.INEXISTÊNCIA OU NULIDADE. NÃO CONTAMINAÇÃO DE ATOS SEPARÁVEIS, CONCOMITANTES OU SUBSE-QUENTES. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊN-CIA DE SIMILITUDE.(...)8. A teoria das nulidades de Direito comum não se aplica, de ordinário, em matéria de sociedades anônimas, de modo que os atos societários nulos prescrevem nos prazos previstos na lei societária.9. A eventual nulidade ou inexistência de um ato não contami-na os atos e negócios jurídicos dele separáveis, concomitantes ou subsequentes.10. A não demonstração da existência de similitude das circuns-tâncias fáticas e do direito aplicado no acórdão recorrido e nos arestos paradigmas implica o desatendimento de requisitos indis-pensáveis à comprovação do dissídio jurisprudencial, a teor dos arts. 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil e 255, § 2º, do Regimento Interno do STJ.11. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1046497/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 24/08/2010, DJe 09/11/2010 – grifou-se)

* * *DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE ANONIMA. EMPRE-SA DE RADIODIFUSÃO E TELECOMUNICAÇÃO. EXI-GENCIA DO ORGÃO PUBLICO FISCALIZADOR. COM-PROVAÇÃO DA NACIONALIDADE BRASILEIRA DOS ACIONISTAS. CONVOCAÇÃO EDITALICIA DOS SOCIOS, MARCANDO PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE CERTI-

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111FGV DIREITO RIO

DÃO DE NASCIMENTO OU CASAMENTO. DELIBERA-ÇÃO ASSEMBLEAR DE VENDA DAS AÇÕES DOS QUE NÃO ATENDERAM A CONVOCAÇÃO. ILEGALIDADE. LAPSO PRESCRICIONAL ESPECIFICO (ARTS. 156 DO DL 2.627/40 E 286 DA LEI 6.404/76). AUSENCIA DE IMPUG-NAÇÃO TEMPESTIVA. CONVALIDAÇÃO. PRESCRIÇÃO TAMBEM DO DIREITO A HAVER DIVIDENDOS DISTRI-BUIDOS SOB A FORMA DE BONIFICAÇÃO (ART. 287, II, “A”, DA LEI 6.404/76). INAPLICABILIDADE DA TEORIA GERAL DAS NULIDADES. RECURSO PROVIDO.I - EM FACE DAS PECULIARIDADES DE QUE SE REVES-TE A RELAÇÃO ACIONISTAS “VERSUS” SOCIEDADE ANONIMA, NÃO HA QUE SE COGITAR DA APLICAÇÃO, EM TODA A SUA EXTENSÃO, NO AMBITO DO DIREITO SOCIETARIO, DA TEORIA GERAL DAS NULIDADES, TAL COMO CONCEBIDA PELAS DOUTRINA E DOGMATICA CIVILISTAS.II - EM FACE DISSO, O DIREITO DE IMPUGNAR AS DELI-BERAÇÕES TOMADAS EM ASSEMBLEIA, MESMO AQUE-LAS CONTRARIAS A ORDEM LEGAL OU ESTATUTARIA, SUJEITA-SE A PRESCRIÇÃO, SOMENTE PODENDO SER EXERCIDO NO EXIGUO PRAZO PREVISTO NA LEI DAS SOCIEDADES POR AÇÕES (ART. 156 DO DL 2.627/40 ART. 286 DA LEI 6.404/76).III - PELA MESMA RAZÃO NÃO PODE O JUIZ, DE OFI-CIO, MESMO NOS CASOS EM QUE AINDA NÃO ATINGI-DO O TERMO”AD QUEM” DO LAPSO PRESCRICIONAL, RECONHECER A ILEGALIDADE DA DELIBERAÇÃO E DECLARA-LA NULA.IV - TAMBEM O EXERCICIO DO DIREITO DE HAVER DIVIDENDOS, COLOCADOS A DISPOSIÇÃO DOS ACIO-NISTAS SOB A FORMA DE BONIFICAÇÃO, SE SUBME-TE A CONDIÇÃO TEMPORAL (ART. 287, II, ‘A’, DA LEI 6.404/76). (REsp 35.230/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEI-REDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/1995, DJ 20/11/1995, p. 39597 – grifou-se)

Fixadas as premissas do regime especial aplicável à anulação das delibe-rações sociais, passa-se, sumariamente, ao delineamento da natureza do ato consistente na da deliberação de assembleia.

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112FGV DIREITO RIO

7. víCios da PróPria assEmblEia; víCios das dElibEraçõEs; víCios dE voto;

Como se disse, estabelece o art. 286 da LSA “A ação para anular as deli-berações tomadas em assembléia-geral ou especial, irregularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulação, prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberação.”

Para logo, verifica-se que o legislador tratou de três hipóteses distintas num mesmo dispositivo:

a) Vícios da Assembleia – hipótese na qual a assembleia fora convo-cada ou se instalou irregularmente, em desacordo com a lei ou o estatuto, ocasião em que o vício atingirá todas as deliberações que nela forem tomadas;

b) Vícios das Deliberações – dizem respeito às próprias deliberações as-sembleares, as quais podem ter sido tomadas, todas ou algumas de-las, com violação à lei ou ao estatuto;

c) Vícios de Voto – caso em que um ou mais votos que concorreram para a deliberação do conclave encontravam-se viciados em razão de erro, dolo, fraude ou simulação (ou mesmo em virtude da incapa-cidade dos votantes – art. 115, §1º, art. 134, §1º ou art. 228, §2º);

Contudo, muito embora o art. 286 da LSA tenha agrupado todas as hipó-teses acima num mesmo dispositivo, culminando-o apenas a anulabilidade do respectivo ato, como bem ensina ERASMO VALLADÃO, os institutos são completamente distintos, não podendo levar as mesmas consequências jurídicas. Muito ao contrário, as consequências jurídicas, no caso de ocorrên-cia de uma ou de outra hipótese acima, são bastante diversas.

Em relação aos vícios de assembleia, em regra geral, sua ocorrência acar-reta apenas a anulabilidade do ato, na medida em que se acham em jogo apenas os interesses e direitos dos acionistas. Pelo mesmo motivo, a mesma consequência se aplica aos casos de vício de voto.

Já em relação aos vícios de deliberação é preciso distinguir entre (a) a deliberação que atinge ou é passível de atingir direitos ou interesses de acionistas atuais assim como futuros e (b) as deliberações que extravasem o âmbito da companhia.

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113FGV DIREITO RIO

Relativamente ao item (a), seguindo a orientação de Erasmo Valladão: “1º) é absolutamente nula a deliberação que criar disciplina estatutária ou situação de caráter duradouro em contraste com norma imperativa; 2º) é meramente anulável a deliberação que, no caso concreto, violar direitos inderrogáveis dos acionistas; 3º) é meramente anulável a deliberação que infringir estatutos, salvo quando a lei autorizar a prática do ato, subordi-nando-o. contudo, ao consentimento dos acionistas interessados, hipótese em que se tratará de eficácia; 4º) é ineficaz a deliberação que criar disciplina estatutária que afete direitos especiais dos acionistas, antes que estes consin-tam; 5º) é meramente anulável a deliberação que, no caso concreto, atingir direitos especiais dos acionistas.

Relativamente a (b):1º) é absolutamente nula a deliberação que atentar contra a ordem pública ou os bons costumes, ou contiver objeto impossível; 2º) é absolutamente nula a deliberação que infringir disposições legais que têm por objeto a proteção de interesses de terceiros; 3º) é absolutamente nula a deliberação que objetivar dispor dos direitos de terceiros ou dos acionis-tas enquanto terceiros; 4º) é absolutamente nula a deliberação que atentar contra o interesse público; é ineficaz a deliberação que criar disciplina es-tatutária que afete os direitos dos credores titulares de partes beneficiárias e debêntures, ou dos credores em geral diante de redução de capital, transfor-mação ou cisão da companhia.”

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114FGV DIREITO RIO

¾ nulidades, anulabilidade e ineficácia das deliberações assembleares.

NULIDADE ANULABILIDADE INEFICÁCIA

VÍCIOS DA ASSEMBLEIAa) Ocorrência de Assembleia não

convocada;71

Assembleia com irregularidades de convocação e/ou

instalação (ex: falha de publicação/prazo ou quórum insuficiente,

inobservância da ordem do dia etc);72

VÍCIOS DAS DELIBERAÇÕES

a) criação de norma estatutária contrária

aos dispositivos legais aplicáveis e normas

cogentes73;

b) deliberação contrária à ordem

pública e bons costumes ou de

objeto impossível74;

c) deliberação atentatória de

normas protetoras de direitos e interesses

de terceiros (ex: integridade do capital social)75;

d) deliberação que vise excluir direitos de acionistas mediante reforma estatutária (ex: Art. 109 LSA);

e) disposição de direitos de terceiros e acionistas nessa

qualidade (ex: extinção de direitos ou criação de novas

obrigações nesse sentido)76 77;

f ) contrária ao interesse público78;

g) deliberações violadoras de normas proibitivas, tratadas de forma genérica;

a) Aprovação que violar ou excluir

direitos irrenunciáveis de acionistas

(ex: preferência, requerimento de voto

múltiplo – Art. 109)79 80;

b) decisão contrária ao Estatuto Social

ou que altere direitos especiais de acionistas, salvo autorização legal e consentimento dos

acionistas interessados;

c) Aprovação de matérias com fotos

proferidos em conflito de interesses (Art. 115,

§ 4º LSA).

d) “A nulidade ou a anulação do voto só influirá na validade da deliberação da

assembléia quando alterar a maioria necessária”181;

a) Assembleias que exijam ratificação e

não sejam retificadas dentro de um ano, na forma do Art.

136, §§ 1º e 4º da LSA82;

b) decisão contrária ao Estatuto Social com autorização

legal, ou que altere direitos especiais

dos acionistas, sem consentimento dos acionistas

interessados (ex: Art. 16, parágrafo único

LSA)83;

c) Criação de norma estatutária que viole

direitos de detentores de debêntures e

partes beneficiárias, ou de credores, diante de redução de capital,

transformação ou cisão da companhia

(Art. 174, §§ 1º e 2º); e

d) ineficácia perante terceiros pela falta

de publicação e arquivamento de atas de deliberações que aprovem reformas estatutárias (Art. 135, § 1º LSA)84.

71 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 89.

72 Idem.

73 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 98.

74 Esta nulidade visa proteger valores e princípios da sociedade, que preva-lecem aos interesses dos acionistas e da sociedade empresarial. FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Invalidade das Deliberações de Assem-bléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 105.

75 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 107.

76 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 109.

77 Túllio Ascarelli considera que esse tipo de deliberação é ineficaz, confor-me ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Com-parado. Campinas: Bookseller, 1999. pp. 535 – 537.

78 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 110.

79 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 103.

80 Túllio Ascarelli entende que as deli-berações que excluam direitos dos acio-nistas são nulas, mas não radicalmente, pois dependem de impugnação por parte dos acionistas. ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. Campinas: Booksel-ler, 1999. p. 541.

81 ASCARELLI, Tullio. Problemas das So-ciedades Anônimas e Direito Compara-do. Campinas: Bookseller, 1999. p. 553.

82 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 112.

83 Idem.

84 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 113.

85 A classificação feita pelo § 4º do Art. 115 da LSA sobre o voto proferido em conflito de interesses como sendo anulável confronta com o disposto no

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115FGV DIREITO RIO

§ 1º do mesmo artigo, posto que este traz norma de caráter proibitivo, carac-terizada pela expressão “não poderá”, de modo que se pode entender que os votos em conflito de interesses são tanto nulos quanto anuláveis. O enten-dimento de Erasmo Valadão e Novaes França é o de que a proibição legal deve prevalecer, portanto, a nulidade. FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas As-sembléias de S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. p. 93.

86 Nas hipóteses elencadas no pará-grafo primeiro do Art. 115 o legislador dedicou cuidado especial, prevendo de maneira taxativa a proibição do exer-cício do direito de voto. O exercício do direito de voto nesses casos acarretará, ipso facto, a nuludade de voto e a anu-labilidade da deliberação, caso o voto conflitante tenha sido determinante para a aprovação da matéria. NASCI-MENTO, João Pedro Barroso do. Conflito de Interesses no Exercício do Direito de Voto nas Sociedades Anônimas (2ª Parte). Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. Coordenação: Arnoldo Wald. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. pp. 82 – 103.

87 Conforme caracterizado por Marcelo von Adamek em ADAMEK, Marcelo Viei-ra von Adamek. Abuso de Minoria em Direito Societário. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. p. 183 – 209.

88 FRANÇA, Erasmo Valladão de Azeve-do e Novaes. Invalidade das Delibera-ções de Assembléia das S.A.. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 117.

VÍCIOS DE VOTO

a) Voto proferido em violação à lei (ex: artigo 115, parágrafo

1º, LSA).

a) Vício de voto e de manifestação de vontade (ex: coação,

simulação);

b) Voto proferido com abuso de poder (Art.

117 LSA);

c) Voto proferido em conflito com os

interesses da companhia (Art. 115, § 4º LSA)85 86; e

d) Abuso do direito de voto pela minoria (ex: casos em que a maioria está impedida ou abuso do poder de veto – Art.

17, §§ 2º e 7º)87.

a) Voto contrário ao disposto em Acordo

de Acionistas que esteja arquivado na sede da companhia

(oponível a terceiros) (Art. 118 LSA)88.

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116FGV DIREITO RIO

AulA 8. órGãos AdmInIstrAtIvos: consElHo dE AdmInIstrAçãoE dIrEtorIA.

lEitura básiCa:

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 563-586 e 790/914.

lEitura ComPlEmEntar:

ADAMEK, Marcelo Vieira von. Responsabilidade Civil dos Administradores de S/A e as ações correlatas. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. Pp. 17-52 e 112-184.

1. órGãos administrativos.

A sociedade anônima é estruturada em órgãos sociais que funcionam como centros de poderes. A distribuição de atribuições específicas aos diver-sos órgãos da companhia visa promover maior eficiência administrativa. O termo “centros de poderes”, utilizado frequentemente pela doutrina89, remete à ideia de que diante da complexidade da administração das empresas, é ne-cessário fracioná-las em órgãos, distribuindo-se entre cada órgão determina-das atribuições, a fim de tornar a dinâmica social mais eficiente.

Essa noção da sociedade anônima como um grande corpo dividido em vá-rios órgãos sociais decorre da adoção pela LSA da teoria organicista. Os órgãos não são sujeitos de direito nem tampouco possuem personalidade jurídica própria, de modo que as obrigações pactuadas e a eventual responsabilização por quaisquer atos praticados por algum deles é imputável unicamente à sociedade anônima.

Como se disse, embora o estatuto social possa criar outros órgãos, a LSA prevê a existência de quatro órgãos sociais na sociedade anônima: (i) assem-bleia geral, (ii) conselho de administração, (iii) diretoria e o (iv) conselho fiscal.

A LSA impõe a obrigatoriedade de todos os órgãos acima listados, com a exceção do conselho de administração, o qual somente será obrigatório nas companhias abertas, na sociedade com capital autorizado e na sociedade de economia mista (art. 138, § 2º e 239 respectivamente), sendo facultativo nas sociedades anônimas de capital fechado.

71 olhar final das notas. a VÁLIDA É A 89.72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, Vol. II., 23ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003, P. 166.

89 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, Vol. II., 23ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003, P. 166.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

117FGV DIREITO RIO

Em relação ao conselho fiscal existe uma particularidade, pois a sua exis-tência é sempre obrigatória, mas o seu funcionamento é facultativo, exceto no caso das sociedades de economia mista (art. 240).

Os órgãos sociais podem ser classificados90 a partir do tipo de poder que deles emana: a) órgão de deliberação, que reflete a vontade da so-ciedade; b) órgão de execução, que realiza a vontade social; c) órgão de controle, que fiscaliza a fiel execução da vontade social. Outra classifi-cação doutrinária aplicada pela doutrina91 aos órgãos sociais refere-se à forma como pode ocorrer a sua atuação, assinalando-os como órgãos divisíveis e indivisíveis.

Nesse sentido “são divisíveis os que podem atuar tanto como colegia-do como mediante iniciativa individual de seus membros; e são indivisí-veis os órgãos que atuam somente como colegiado.”92 O conselho fiscal é órgão divisível, e seus membros podem atuar, observadas as delimitações legais, como colegiado ou por atuação individual, ao passo que a assem-bleia geral e o conselho de administração são sempre órgãos indivisíveis. Em relação à diretoria ela é, via de regra, um órgão divisível, entretanto, o estatuto pode estabelecer determinadas matérias em que sua atuação será indivisível.

Por último, é importante destacar que entre os órgãos da companhia existe uma estrutura hierarquizada. A Assembleia Geral é o órgão supre-mo, com poderes para decidir todos os negócios relativos ao objeto social (art. 121), exercendo poder hierárquico sobre o Conselho de Administra-ção e o Conselho Fiscal.

Em relação aos poderes da assembleia ressalta Fabio Konder Comparato93:

“No modelo legal, é, incontestavelmente, a assembleia geral o órgão primário, ou imediato, que investe os demais, elegendo seus membros e podendo demiti-los. Nesse sentido estritamente jurídico, nem sempre coincidente com a realidade econômica, ela é, sem dúvida, o poder supremo da companhia.”

Eis, adiante, a descrição mais fundamentada das competências e funções de cada um dos órgãos da companhia, com a exceção da assembleia geral, para a qual se reservou tópico específico.

90 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercia”, Vol. II., 23ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003, P. 166. e por Comparato em: COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. P. 16.91 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. 14ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, P. 201. 92 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, P. 201. 93 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. P. 16.

90 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercia”, Vol. II., 23ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2003, P. 166. e por Comparato em: COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. P. 16.

91 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. 14ª Ed. São Paulo: Sa-raiva, 2010, P. 201.

92 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. 14ª ed. São Paulo: Sa-raiva, 2010, P. 201.

93 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. P. 16.

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118FGV DIREITO RIO

2. ConsElho dE administração.

O Conselho de Administração, como já dito, é opcional, exceto para as companhias de capital aberto, autorizado (art. 138, §2º), ou misto (art. 239 da LSA; art. 173, §1º, da CF).

Este órgão social, também deliberativo, é eleito pela Assembleia Geral. Hierarquicamente ele se posiciona entre a Assembleia Geral e a Diretoria.

Os conselheiros formam um colegiado com a função de orientar os ne-gócios da companhia, eleger, acompanhar e fiscalizar os diretores, os quais detêm o poder executivo. Uma das razões para a existência do órgão é a limi-tação da Assembleia, que se reúne poucas vezes, para exercer com eficiência a função de orientação e controle da administração da sociedade.

Sua composição se dá em número fixado no estatuto, sendo este, no mí-nimo, de três membros. A lei exige que o estatuto defina também o prazo de gestão, que será de, no máximo, três exercícios sociais, e o modo de substitui-ção dos conselheiros, assim como disponha sobre a convocação, instalação e modo de funcionamento do órgão (art. 140, I a IV).

Por se tratar de um órgão colegiado, a grande maioria de suas atribui-ções se realiza por deliberação. O quorum necessário para aprovações, igual à maioria dos votos, é fixado pelo art. 140, IV, sendo facultada ao estatuto a exigência de quorum qualificado em certas situações.

Sua competência está delimitada pelo artigo 142 da LSA que lista como principais atribuições do órgão:

“Art. 142. (...)

I - fixar a orientação geral dos negócios da companhia;

II - eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribui-ções, observado o que a respeito dispuser o estatuto;

III - fiscalizar a gestão dos diretores, examinar, a qualquer tempo, os livros e papéis da companhia, solicitar informações sobre contratos celebrados ou em via de celebração, e quaisquer outros atos;

IV - convocar a assembleia-geral quando julgar conveniente, ou no caso do artigo 132;

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119FGV DIREITO RIO

V - manifestar-se sobre o relatório da administração e as contas da diretoria;

VI - manifestar-se previamente sobre atos ou contratos, quando o es-tatuto assim o exigir;

VII - deliberar, quando autorizado pelo estatuto, sobre a emissão de ações ou de bônus de subscrição;

VIII – autorizar, se o estatuto não dispuser em contrário, a alienação de bens do ativo não circulante, a constituição de ônus reais e a pres-tação de garantias a obrigações de terceiros;

IX - escolher e destituir os auditores independentes, se houver.”

3. dirEtoria.

A diretoria é o órgão executivo da sociedade, sendo, seus membros, ne-cessariamente pessoas físicas residentes no Brasil, os detentores exclusivos da representação social. Compete-lhes a direção da sociedade, desde o desenvol-vimento dos negócios e abertura de mercados ao comando dos empregados.

Trata-se de órgão, obrigatório, criado pela lei. Sua composição, prazo de gestão de seus membros, modo de substituição dos diretores, atribuições e poderes de cada diretor, assim como modo de funcionamento devem estar regulamentadas no Estatuto Social (art. 143 da LSA).

A diretoria deve ser composta por, no mínimo dois membros eleitos, e passíveis de destituição a qualquer tempo, pela Assembleia Geral ou, se hou-ver, pelo Conselho de Administração. Em princípio, os membros da diretoria têm amplos poderes para praticar todos os atos que sejam compatíveis com o objeto social e com o interesse da empresa. Suas atribuições são indelegáveis.

O Estatuto ou o Conselho de Administração podem disciplinar os po-deres dos diretores, fixando as atribuições de cada um ou especificando e outorgando denominações às respectivas áreas de atuação, tal como: diretor financeiro, diretor operacional, diretor comercial, dentre outros.

Neste sentido, pode, ainda, o Estatuto exigir a assinatura de um ou mais membros da diretoria para a prática de determinado ato.

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120FGV DIREITO RIO

O mandato do administrador tem prazo máximo de três anos, sendo ad-mitida sua reeleição. Além disso, de acordo com o art. 143, §3º, da LSA, até um terço dos membros do conselho de administração podem integrar também a administração.

A remuneração dos diretores é fixada pela Assembléia Geral, levando-se “em conta suas responsabilidades, o tempo dedicado às suas funções, sua compe-tência e reputação profissional e o valor dos seus serviços no mercado”, consoante prescreve o art. 152 da LSA.

4. ConsElho fisCal.

O Conselho Fiscal é o terceiro órgão de existência obrigatória em todas as companhias e tem como função fiscalizar os administradores. Deve, por-tanto, acompanhar a atuação da empresa, verificando a regularidade dos procedimentos e dos negócios, opinando sobre os relatórios financeiros, as-sim como sobre eventuais operações, como modificação do capital, emissão de debêntures, distribuição de dividendos, etc (art. 163 da LSA).

Para execução de seu papel, faculta-se ao conselho a possibilidade de so-licitar esclarecimentos dos administradores e denunciar à assembléia ou ao conselho de administração os erros, fraudes ou crimes descobertos.

O conselho fiscal será composto por no mínimo três e, no máximo, cinco membros. A LSA exige que os membros do Conselho Fiscal sejam brasileiros, possuam nível universitário ou experiência mínima de três anos como administrador de empresa ou conselheiro fiscal. Ademais, os conse-lheiros fiscais estão impedidos de atuar como membros de órgãos de admi-nistração ou empregados de outra companhia ou de sociedade controlada ou do mesmo grupo, nem cônjuge ou parente até terceiro grau do adminis-trador da companhia.

A remuneração dos conselheiros é fixada pela assembléia geral, observado o limite mínimo fixado em lei (art. 162, §3º), igual a dez por cento da média da remuneração dos administradores.

Os deveres dos conselheiros são iguais aos dos administradores, podendo ser responsabilizados por seus atos de omissão quanto à estes, assim como pelos atos de violação à lei ou ao estatuto (art. 165).

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121FGV DIREITO RIO

4.1. funcionamento e Convocação.

Este órgão, embora obrigatório, jamais funcionou eficientemente na prá-tica societária. Grande parte das empresas adota o funcionamento não per-manente, optando frequentemente pelas auditorias independentes, as quais, inclusive, são obrigatórias nas companhias abertas (art. 177, §3ª).

Sendo seu funcionamento não permanente, o pedido de instalação pode ser formulado em qualquer Assembleia Geral, por 10% das ações com direi-to de voto ou 5% das ações sem direito a voto (art. 161, §2º), devendo esta imediatamente eleger seus membros (art. 161, §3º).

5. dEvErEs E rEsPonsabilidadEs dos administradorEs.

Como acima exposto, os administradores são eleitos pelos acionistas, ou grupo de acionistas da sociedade. Apesar disso, os administradores devem agir sempre no interesse da sociedade, devendo cumprir com os deveres e as responsabilidades previstas na legislação. Na classificação dos deveres dos administradores, o legislador adotou um critério misto, descrevendo-os de forma específica em alguns casos, bem como utilizando standards ou referên-cias abstratas em outros.94

Os principais deveres estipulados pela LSA, e previstos nos artigos 153 a 157 são: (i) dever de diligência (art. 153) ;(ii) dever de lealdade (art.155); (iii) o dever de informar (art. 157); (iv) o de cumprimento das finalidades da companhia (art.154) ; e (v) o de evitar situações de conflito.

5.1. dever de diligência.

O dever de diligência decorre do Art. 153 da LSA, que dita:

Art. 153. O administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios.

Antes de tudo, é preciso comentar que a redação do referido artigo com-porta uma visão ultrapassada sobre a sociedade sequer prevendo a possibili-dade de uma mulher em cargo de administração.

Dito isso, voltamos para o dever de diligência.

94 EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádina B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUE, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 3ª Ed. revista e ampliada – Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

94 EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádina B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUE, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 3ª Ed. revista e ampliada – Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

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122FGV DIREITO RIO

Atualmente, exige-se dos administradores uma atuação mais compe-tente e profissional, tendendo a afastar-se cada vez mais da diligência da administração de um lar.

De forma a simplificar a verificação do cumprimento do dever de dili-

gência pelos administradores, a doutrina, especialmente a partir da aná-lise e estudos dos precedentes americanos, dividiu esse dever em cinco pontos diferentes:

(a) o dever de se qualificar para o exercício do cargo de admi-nistrador, cabendo a este possuir ou adquirir o conheci-mento mínimo necessário para o desenvolvimento de suas atividades junto à sociedade;

(b) o dever de bem administrar, que consiste na consecução do interesse social da companhia;

(c) o dever de se informar, cabendo ao administrador buscar todas as informações necessárias para o bom desenvolvi-mento de suas atividades;

(d) o dever de investigar, segundo o qual os administradores devem avaliar criticamente as questões que lhe são apre-sentadas; e

(e) o dever de vigiar, o qual impõe aos administradores o de-ver de, constantemente, monitorar o desenvolvimento das atividades sociais.95

O dever de se qualificar determina a necessidade do administrador possuir ou adquirir os conhecimentos mínimos sobre as atividades que são ou serão exercidas pela sociedade. O dever de bem administrar evi-dencia-se na atuação buscando a consecução do interesse social pelo administrador.

O dever de se informar, por sua vez, consiste na necessidade de o admi-nistrador buscar e obter as informações e os dados necessários para atingir o fim social da companhia. O dever de investigar determina a necessidade de uma análise crítica pelo administrador dos dados e informações que lhe foram fornecidas. Por fim, o dever de vigiar constitui o dever de mo-nitoramento do desenvolvimento das atividades pela sociedade.

95 PARENTE, Flávia. O Dever de Diligência dos Administradores de Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. Pp. 102.

95 PARENTE, Flávia. O Dever de Diligên-cia dos Administradores de Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. Pp. 102.

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123FGV DIREITO RIO

Desta forma, é possível verificar que o conceito de dever de diligência não é claro nem delimitado, mas um conceito abstrato, cabendo à doutrina e a jurisprudência delinear padrões e limites de comportamento. Buscando garantir maior segurança jurídica e delinear de forma mais clara os padrões de comportamento dos administradores, foi desenvolvido nos EUA a teoria do business judgment rule.

Esta teoria desenvolveu-se a partir da análise pelos tribunais do cumpri-mento dos deveres de diligência dos administradores. Segundo essa teoria, se as decisões dos administradores foram tomadas de forma (i) independente, (ii) desinteressada, (iii) informada e (iv) no interesse da companhia elas não podem ser revistas pelo judiciário e o os administradores não poderão ser res-ponsabilizados, ainda que tais decisões venham a ser mal-sucedidas. Ou seja, os administradores não têm o dever de tomar a decisão correta, mas sim de tomar a decisão corretamente.

A ideia por trás da teoria do business judgment rule é que as regras não podem ser tão rígidas a ponto de afastar a vontade das pessoas de serem admi-nistradores. Há uma certa presunção de boa-fé. Os administradores não po-dem ser punidos pelos atos que não tiveram êxito, mas que foram cumpridos de forma adequada (diligente, leal, bem informada). Em resumo, a obrigação não pode ser de resultado, mas de meio. Afinal, o empreendedorismo está ligado à tomada de risco.

5.2. dever de lealdade.

O dever de lealdade, por sua vez, decorre do artigo 155 da LSA e com-preende a reserva que deve ser feita sobre os negócios da companhia, não havendo aproveitamento do cargo em benefício próprio ou de outrem. As-sim, é vedado usar em benefício próprio ou de outrem, com prejuízo para companhia, oportunidades comerciais que surjam em decorrência do exer-cício do cargo. Importante ressaltar que só estará configurada violação à lei quando a companhia possui interesse, real ou potencial, na operação ou deve estar em condições de aproveitá-la. Desse modo, o administrador deverá, na condução dos negócios da companhia, exercer suas atividades sempre obser-vando a boa-fé os interesses da sociedade. Sobre o dever de lealdade, afirma MODESTO CARVALHOSA:

“O dever de lealdade (duty of loyalty) decorre basicamente da obrigação de agir de acordo com o interesse comum dos acionistas.

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124FGV DIREITO RIO

Ainda que exista um interesse particular que possa ser atendido conjun-tamente com o interesse dos acionistas, o administrador deve desconside-rar o primeiro para atender exclusivamente ao segundo. Recomenda-se, igualmente, que o administrador não se envolva em situações em que deva negociar consigo mesmo, ou seja, em transações em que, de um lado, deva agir de acordo com seu interesse particular e, do outro, de acordo com o interesse dos acionistas.”96

A forma mais comum da quebra do dever de lealdade em companhias abertas é a prática de insider trading, que consiste na utilização de informa-ções privilegiadas e que possa influenciar na cotação do preço das ações, para benefício próprio ou de outrem (art. 155, § 1º).

5.3. dever de Evitar Conflito de interesses.

O dever de evitar conflito de interesses veda que o administrador interfira em operação social que possua interesses conflitantes. Trata-se de uma obri-gação de não fazer, de abster-se, que decorre do dever de lealdade (art. 156).

Tal dever consiste na obrigação do administrador em se abster de atos que possam vir a caracterizar hipóteses de conflito de interesses. “Configura-se o conflito de interesses quando a satisfação do interesse meramente individual so-mente poderá ocorrer mediante o sacrifício do interesse coletivo, e vice-versa”97.

Desta forma, quando houver um duplo interesse na decisão a ser tomada pelo administrador (interesse social e particular) recomenda-se a abstenção da prática de tal ato. O conflito pode ser formal ou substancial. O primeiro é aquele em que o administrador e a companhia são as partes contratantes, e, portanto, possuem interesses diversos. Já o conflito substancial é caracteriza-do quando a tomada de decisão do administrador é realizada com desvio de finalidade, objetivando interesses particulares em detrimento e/ou incompa-tíveis com os fins sociais.

5.4. dever de informar.

O dever de informar encontra seu fundamento em manter a isonomia de informações que é divulgada ao mercado em geral, impedindo o uso de informações privilegiadas para benefício de poucos e para manter os acionistas informados dos negócios da sociedade, de modo que tenham o subsídio necessário para a tomada de decisão de investir ou não em deter-minada companhia (art. 157).

96 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2011. P.321.97 EIZIRIK, Nelsom; GAAL, Ariádina B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUE, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 3ª Ed. Revista e Ampliada – Rio de Janeiro: Renovar, 2011. P. 468.

96 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2011. P.321.

97 EIZIRIK, Nelsom; GAAL, Ariádina B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUE, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 3ª Ed. Revista e Ampliada – Rio de Janeiro: Renovar, 2011. P. 468.

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125FGV DIREITO RIO

O cumprimento desse dever exige do administrador que, ao tomar pos-se, declare os valores mobiliários de emissão da companhia e de outras em-presas do mesmo grupo de que seja titular, ficando, daí por diante, obriga-do a revelar à assembléia geral, a pedido de 5% dos acionistas, os negócios em torno destes.

Além disso, os administradores são obrigados a comunicar à bolsa de va-lores e à CVM, assim como divulgar pela imprensa todas as deliberações ou fatos ocorridos que possam influir na cotação das ações (157 §4º, LSA). Não há aqui conflito algum com o dever de sigilo, pois este evita o vazamento para pessoas específicas, enquanto aquele estimula a difusão geral.

No caso de sociedade de capital aberto, as informações relevantes para o mercado podem não ser divulgadas, caracterizando uma exceção ao dever de informar, como explicita o artigo 6º da Instrução Normativa da CVM nº 358, de 2002:

“Art. 6º Ressalvado o disposto no parágrafo único, os atos ou fatos relevantes podem, excepcionalmente, deixar de ser divulgados se os acionistas controlado-res ou os administradores entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia.

Parágrafo único. As pessoas mencionadas no caput ficam obrigadas a, dire-tamente ou através do Diretor de Relações com Investidores, divulgar imediata-mente o ato ou fato relevante, na hipótese da informação escapar ao controle ou se ocorrer oscilação atípica na cotação, preço ou quantidade negociada dos valores mobiliários de emissão da companhia aberta ou a eles referenciados.”

5.5. deveres do acionista Controlador administrador.

Conforme disposto no art. 117, § 3º da LSA, o acionista controlador que exerce cargo de administrador ou fiscal terá os deveres e responsabilidades próprios do cargo.98

Neste sentido, caso o acionista controlador venha a também acumular funções na administração da sociedade, ser-lhe-ão aplicáveis igualmente os deveres atribuíveis aos administradores de companhia, conforme previstos nos artigos 153 a 157 da LSA (i.e., dever de diligência; dever de cumprimen-to das finalidades da sociedade; dever de lealdade; dever de evitar conflitos de interesses; e o dever de informar).

98 Neste sentido, verificar AC 700006446447, Rel. Des. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, j. 15.10.2003, TJRS, 6ª Câmara.

98 Neste sentido, verificar AC 700006446447, Rel. Des. Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, j. 15.10.2003, TJRS, 6ª Câmara.

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126FGV DIREITO RIO

A este respeito, a Lei nº 6.404/1976 estabelece um louvável sistema des-critivo dos deveres dos administradores, por meio dos artigos 153 a 157, para na sequência disciplinar a responsabilidade dos administradores no artigo 158 e tratar da ação de responsabilidade, que é o mecanismo jurídi-co próprio para a responsabilização in casu dos administradores, conforme artigo 159 da LSA.

6. insidEr tradinG.

“Insider trading é toda negociação de compra e venda de valores mobi-liários feita pelos administradores ou por quem deles obteve de qualquer forma informações relevantes, no período em que tais informações não foram ainda divulgadas junto ao mercado, de forma ordinária ou ex-traordinária, conforme as circunstâncias”99

Com efeito, o uso de informação privilegiada, ainda não divulgada no mercado, enseja, a depender do caso, responsabilidades nas esferas civis, ad-ministrativas e até penais.

Além dos deveres ressaltados, são expostas pela lei algumas expressas proi-bições. O parágrafo 2º do artigo 154 da LSA veda ao administrador:

(i) a prática de ato de liberalidade à custa da companhia;

(ii) sem autorização da assembleia geral ou do conselho de admi-nistração, tomar por empréstimo recursos ou bens da compa-nhia, ou usar em proveito próprio, de sociedade em que tenha interesse, ou de terceiros, os seus bens, serviços ou crédito;

(iii) sem autorização estatutária ou da assembleia geral, receber de terceiro qualquer modalidade de vantagem pessoal, direta ou indireta, em razão do exercício de seu cargo.

A proibição do item (i) só pode ser afastada quando se tratar de liberalida-de razoável, que tenha como beneficiários os empregados ou a comunidade de que participa a empresa, por deliberação do conselho ou da diretoria.

Caberá ao administrar, ainda, o exercício do cargo objetivando o cumpri-mento das finalidades da companhia. Desta forma, o administrador deverá exercer suas atividades de forma a atender ao bem público e a função social da empresa, mas sempre observando as finalidades e os interesses da companhia.

99 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2011, P. 370. Em julgamento proferido pelo colegiado da CVM foi proferido voto no seguinte sentido: “Com efeito, a própria definição de prática não-eqüitativa prevista na Instrução CVM nº 08, traduz, na essência, em que consiste o “insider trading”, que nada mais é do que uma negociação com valores mobiliários em que uma das partes, por ser conhecedora de informação privilegiada, coloca-se em posição de vantagem em relação à outra que, por não deter essa mesma informação, encontra-se em uma indevida posição de desequilíbrio ou de desigualdade” (CVM. Processo Administrativo Sancionador nº 17/02. Relator Diretor Wladimir Castelo Branco Castro. Julgamento em 25.10.2005)

99 CARVALHOSA, Modesto. Comentá-rios à Lei de Sociedades Anônimas. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2011, P. 370. Em julgamento proferido pelo colegiado da CVM foi proferido voto no seguinte sentido: “Com efeito, a própria defini-ção de prática não-eqüitativa prevista na Instrução CVM nº 08, traduz, na essência, em que consiste o “insider trading”, que nada mais é do que uma negociação com valores mobiliários em que uma das partes, por ser co-nhecedora de informação privilegiada, coloca-se em posição de vantagem em relação à outra que, por não deter essa mesma informação, encontra-se em uma indevida posição de desequilíbrio ou de desigualdade” (CVM. Processo Administrativo Sancionador nº 17/02. Relator Diretor Wladimir Castelo Bran-co Castro. Julgamento em 25.10.2005)

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127FGV DIREITO RIO

Tal dever se traduz em duas obrigações:

(i) Produção de lucros para a partilha entre seus acionistas;

(ii) Atender aos interesses da sociedade.

Assim, se por um lado o administrador deve buscar o lucro na condução dos negócios, deverá também atender aos interesses dos stakeholders.

7. rEsPonsabilidadE dos administradorEs.

Os administradores, agindo dentro dos padrões de regularidade exigidos pela lei e dos limites de suas respectivas atribuições, não respondem pessoal-mente pelos atos praticados, mesmo que venham a causar prejuízo à sociedade. Haverá, no entanto, responsabilidade caso atuem com dolo ou culpa, mesmo que dentro de suas atribuições, e/ou quando violarem a Lei ou o Estatuto.

Antes de adentrarmos mais especificamente nas formas de responsabilização dos administradores, é importante ressaltar que a responsabilidade dos admi-nistradores perante a sociedade, em vista a teoria organicista, não constitui uma obrigação contratual ou negocial, mas sim uma obrigação extracontratual (ou aquiliana), com regras e princípios distintos. Isto é, não é necessário que o Es-tatuto Social das sociedades repita os deveres legais, específicos ou gerais, para que os imperativos legais sejam exigíveis dos administradores100.

Como visto acima, caso os administradores atuem com dolo ou culpa ou violem a Lei ou o Estatuto Social, eles podem vir a ser responsabilizados. A análise dessas condutas deve ser avaliada sob três óticas:

7.1. responsabilidade administrativa:

Decorre da má gestão pura e simples, podendo acarretar, por exemplo, a destituição do administrador. Esta medida, embora no campo da responsabi-lização, não exige um processo formal, visto que pode ser tomada a qualquer tempo pela sociedade.

7.2. responsabilidade Penal:

A irregularidade cometida pelo administrador pode se enquadrar também em uma das condutas tipificadas em lei como criminosas.

100 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Responsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as Ações Correlatas). São Paulo: Saraiva, 2009.

100 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Res-ponsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as Ações Correlatas). São Pau-lo: Saraiva, 2009.

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128FGV DIREITO RIO

A título de exemplo, têm-se os crimes financeiros (Lei nº 7.492, de 16.06.86), os crimes contra a ordem tributária (Lei nº 8.137 de 27.10.92), crimes no mercado de capitais, como uso de informação privilegiada ou manipulação de mercado, os crimes contra o patrimônio, previstos no Có-digo Penal, entre muitos outros.

7.3. responsabilidade Civil.

Consiste na obrigação do administrador de indenizar aquele que so-freu um dano por perdas e danos, nos casos em que proceda com violação da lei ou do Estatuto ou, dentro de suas atribuições e poderes, com culpa ou dolo, causando prejuízos à sociedade, aos acionistas ou a terceiros. A seguir analisaremos as responsabilidades decorrentes do prejuízo a cada um desses sujeitos.

7.3.1. responsabilidade Civil Perante a sociedade.

Visa a que o exercício das atribuições dos administradores seja direcio-nado ao desenvolvimento correto das atividades da sociedade. Abaixo vere-mos quem são os legitimados para propositura desta ação, que possui como exemplos de atos ilícitos: (i) a prática de atos de liberalidade à custa da companhia (art. 154, §2º, a da LSA); (ii) o descumprimento das vedações expressamente impostas pelo dever de lealdade em detrimento da socie-dade (art. 155, I, II e III da LSA); (iii) a venda de bens sociais por preços inferiores ao valor de mercado ou sem estar devidamente autorizado, (iv) a distribuição indevida de dividendos, atividade que resulta na responsabili-dade solidária (art. 201 da LSA), (v) o favorecimento indevido de sociedade coligada, controladora ou controlada (art. 245 da LSA); (vi) a elaboração de contas e demonstrações financeiras falsas ou viciadas, para, com exem-plo, com base nelas, dentre outros.101

7.3.2. responsabilidade Civil Perante os acionistas.

Decorrente da violação dos deveres legais, esta responsabilidade perante danos diretos causados aos acionistas pode apresentar como exemplos as se-guintes condutas: (i) impedimento ilícito de ingresso de acionista ou procu-rador em assembleia (art. 125, par. ún. e 126 da LSA); (ii) exclusão ilegítima do acionista na distribuição dos dividendos; (iii) impedimento do exercício de direito de preferência (art. 109, IV da LSA), dentre outros.

101 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Responsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as ações correlatas). São Paulo: Saraiva, 2009, pg. 200.

101 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Res-ponsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as ações correlatas). São Paulo: Saraiva, 2009, pg. 200.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

129FGV DIREITO RIO

7.3.3. responsabilidade Civil Perante terceiros em Geral.

Os terceiros que tenham relação preexistente com a sociedade (ex. credo-res, contratantes, empregados e fornecedores) e que sofreram danos decor-rentes de uma conduta ilícita por parte de qualquer administrador poderá ser indenizado, sendo exemplo de condutas que ensejam tal responsabilidade:

(i) uso indevido de informação ainda não divulgada, do qual re-sulte dano a investidores do mercado de capitais (art. 155, § 3º da LSA);

(ii) a divulgação de balanço falso ou inexato com base no qual terceiros sejam induzidos a subscrever valores mobiliários de emissão da sociedade por valor superior ao real;

(iii) a criação de condições artificiais de mercado, para manipular o preço dos títulos em negociação;

(iv) dissolução e liquidação irregular da sociedade;

(v) a emissão e a distribuição irregular de valores mobiliários, além de outros.

7.4. ação de responsabilidade Civil Contra os administradores.

Uma vez analisado os deveres dos administradores, estudaremos agora como se dá o sancionamento nos casos de eventuais descumprimentos desses deveres. Existem duas espécies de ação de responsabilidade civil dos adminis-tradores: (i) ação social; e (ii) ação individual. Estas duas espécies de ação se diferenciam pela “titularidade do patrimônio diretamente atingido pela atuação ilícita dos administradores; o sujeito prejudicado” 102.

Desta forma, tendo sido o prejuízo sofrido pela sociedade estaremos dian-te de uma ação social, cuja titularidade competirá à sociedade; já se o sujeito prejudicado tiver sido um acionista ou qualquer terceiro, a ação será indivi-dual, competindo a titularidade àquele que sofreu o dano.

O objeto das ações sociais será sempre a recomposição do patrimônio so-cial, enquanto nas ações individuais o objeto será a reembolso dos prejuízos diretamente sofridos pelos acionistas ou terceiros. Importante ressaltar que a ação social não exclui a possibilidade da propositura de ação individual, já que os titulares e o objeto da ação são diferentes.

102 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Responsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as Ações Correlatas). São Paulo: Saraiva, 2009, P. 306.

102 ADAMEK, Marcelo Vieira von. Res-ponsabilidade Civil dos Administradores de S/A (e as Ações Correlatas). São Pau-lo: Saraiva, 2009, P. 306.

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130FGV DIREITO RIO

São legitimados para propor a ação de responsabilidade civil dos adminis-tradores: (i) a própria sociedade – ação social ut universi – ou os acionistas, na condição de substitutos processuais – ação social ut singuli, que poderá ser proposta na condição de substitutos processuais originários (art. 159, §4º da LSA) ou derivados (art. 159, §3º da LSA). (ii) os acionistas e terceiros que tenham sido diretamente prejudicados.

A sociedade tem o prazo de três meses para propor a ação de reparação civil em face do administrador, cabendo à assembleia deliberar sobre o tema. Tal ação busca o ressarcimento dos prejuízos sofridos pela sociedade em de-corrência dos atos dos administradores e possui como fundamento a manu-tenção dos interesses sociais, não sendo possível a persecução de interesses individuais dos acionistas (ação social ut universi). Se for deliberada a propo-situra da ação em face do administrador, este será declarado automaticamen-te impedido, fato semelhante ao impeachment na seara política.

Passado o prazo trimestral previsto acima, e caso a sociedade não tenha deliberado acerca da ação de responsabilização do administrador, qualquer acionista adquire legitimidade extraordinária para fazê-lo em nome próprio e em benefício da sociedade (ação social ut singuli substitutiva). Se, todavia, a sociedade tiver deliberado pela não propositura da ação, podem ainda, acionistas representantes de, pelo menos, cinco por cento do capital social, ajuizar a ação, como substitutos processuais da sociedade (ação social ut singuli derivada).

Os administradores respondem ainda perante os terceiros e os acionistas a quem causem prejuízos diretos, (i.e. que não sejam reflexos dos danos au-feridos pela sociedade) hipótese na qual o interessado terá ação individual contra o culpado.

A responsabilidade dos administradores, em regra, é pessoal, exceto quan-do houver conivência ou negligência em relação às irregularidades de que os demais administradores tiverem conhecimento. Quanto às providências necessárias para o funcionamento da empresa, salvo nas companhias abertas, todos os administradores são solidariamente responsáveis, assim como nos casos de distribuição irregular de dividendos.

A exclusão da responsabilidade é prevista na lei, sempre que ação tenha sido realizada de boa-fé e com vista ao interesse da empresa (art. 159, §6º), circunstância que, embora a redação do artigo diga que deve ser reconhecida pelo juiz, pode também provir da assembleia.

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131FGV DIREITO RIO

7.5. renúncia do administrador.

A renúncia torna-se eficaz contra a companhia, desde o momento em que lhe for entregue a comunicação escrita do renunciante, mas só produzirá efeitos em relação a terceiros, após o respectivo arquivamento no Registro do Comércio (art. 151).

7.6. destituição do administrador.

Como exposto no art. 122 da LSA, inciso II, é de competência privativa da Assembléia Geral eleger e, da mesma forma, destituir os membros do Conselho de Administração e diretores da empresa. Tais atos devem sempre ser praticados de acordo com o previsto no estatuto da companhia. Para o preenchimento da vaga, prevê o art. 150 que os conselheiros remanescentes devem, a não ser que expressamente previsto em contrário do estatuto, eleger administrador substituto até que se realize próxima Assembleia Geral.

7.7. seguros.

É bastante comum a contratação de seguros de responsabilidade civil (co-nhecidos como D&O – directors and officers) para administradores de so-ciedades, especialmente em sociedades abertas. Por meio desses contratos, em caso de eventuais sinistros, a seguradora estaria obrigada a recompor o patrimônio despendido pelos administradores em indenizações, gastos com processos judiciais e administrativos, termos de compromisso e outros.

Outro mecanismo de proteção dos administradores, ainda que bastante controverso, são os contratos de indenidade. Por meio desses instrumentos, firmados entre os administradores e a própria sociedade, esta estaria obriga-da a ressarcir aqueles em caso de gastos não cobertos nas apólices de seguro contratada. Diferente dos contratos de seguros, os contratos de indenidade são raros no Brasil, mas já levantam discussões acerca dos limites de proteção dos administradores.

Os contratos de seguro, em regra, servem como um mecanismo para incentivar o regular exercício das atividades dos administradores, tendo em vista que eles se encontram resguardados em caso de eventuais res-ponsabilidades. Todavia, se a blindagem for excessiva demais, pode-se estimular a tomada de decisões e a conduta sem a observância atenta aos deveres legais exigidos.

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132FGV DIREITO RIO

8. Caso PrátiCo:

insider trading

Em pesquisa realizada pela Direito GV103 foi constatado que entre 2003 e 2011, ao total, foram 171 indiciados pelo uso de informação privilegiada, dos quais 38 foram punidos e 133 absolvidos.

Além disso, verificou-se que o ilícito de insider trading, não representa mais do que 5% da atividade punitiva do regulador do mercado de valo-res mobiliários.

Considerando o conteúdo aprendido em sala de aula, a jurisprudência da CVM, a doutrina nacional e estrangeira, identifique quais são os crité-rios necessários à configuração da prática de insider trading em uma S.A e quais são os desafios do regulador para prevenir e/ou punir essa prática.

103 Pesquisa realizada por Viviane Muller Prado e Renato Vilela do Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. Disponível em <http://media.wix.com/ugd/66710c_e1b69e3f3f6843b092456f8551464531.pdf>. Acessado em 2 de fevereiro de 2016.

103 Pesquisa realizada por Viviane Muller Prado e Renato Vilela do Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos - Direito GV. Disponível em <http://media.wix.com/ugd/66710c_e1b69e 3f3f6843b092456f8551464531.pdf>. Acessado em 2 de fevereiro de 2016.

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133FGV DIREITO RIO

AulA 9: consElHo FIscAl.

lEitura básiCa:

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 1.263-1.293

EIZIRIK, Nelson. Conselho fiscal. In: LOBO, Jorge (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Forense, 2002. pp. 453-471.

lEitura ComPlEmEntar:

MÜSSNICH, Francisco Antunes Maciel. Limites à atuação do Conselho Fis-cal. In VENANCIO FILHO, Alberto, LOBO, Carlos Augusto da Sil-veira e ROSMAN, Luiz Alberto Colonna. Lei das S.A. em seus 40 anos. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2017. Pp. 157-176.

1. ConsElho fisCal

O Conselho Fiscal é o órgão fiscalizador da companhia. Embora sua exis-tência seja obrigatória, seu funcionamento se dá conforme a vontade dos acionistas, estabelecendo-se de forma permanente ou não.

Conforme determina a Lei das S.A, o Conselho Fiscal é composto de, no mínimo, 3 e no máximo, 5 membros, e suplentes em igual número, acionis-tas ou não, eleitos pela Assembleia Geral (art. 161, § 1°)104.

Da mesma forma, estabelece a LSA quorum para que (i) acionistas mino-ritários detentores de ações com direito a voto (10%) e (ii) titulares de ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito (5%) elejam, respectiva-mente, um conselheiro cada. Garante a lei, no entanto, ao acionista contro-lador o direito de eleger sempre a maioria dos membros do conselho fiscal.

O Conselho Fiscal é instalado a pedido de voto dos acionistas (art. 161, §2º, LSA e Instrução CVM 324). Costuma ser pedido pelos minoritários ou pelos preferenciais. O majoritário não costuma pedir porque o Conselho Fiscal torna as ações mais controladas e formalizadas. A instalação pode ser requerida em qualquer AGO ou em qualquer AGE, se for uma consequência dos temas do dia.

104 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição: 2017. P. 919-920.

104 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição: 2017. P. 919-920.

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134FGV DIREITO RIO

A primeira e evidente observação que se deve fazer é a de que o direito de fiscalizar é desdobramento necessário do direito de participar nos resultados e no acervo social. Isto é, interessa aos acionistas de uma sociedade fiscalizar a atuação dos seus administradores, pois é esta atuação que possibilitará o alcance de determinado resultado e a sua repartição entre todos os acionistas.

Desta constatação, retira-se que, para o acionista majoritário, este poder de fiscalização não é, em regra, de todo essencial, haja vista que é o próprio majoritário que tem, em última instância, o poder de indicar e eleger os administradores de uma sociedade. Os maiores interessados no poder fisca-lizatório são, portanto, os acionistas minoritários, que, em tese, encontram no Conselho Fiscal um mecanismo para garantir que a administração atenda também a seus interesses. Neste sentido, afirma Waldírio Bulgarelli:

“não se pode deixar de notar que a fenomenologia societária revela que quem, na verdade, costuma estar interessado em fiscalizar a adminis-tração é o minoritário, já que evidentemente o controlador confia em si mesmo quando dirige a companhia pessoalmente ou nos administrado-res que escolheu.”105

Ocorre que, tendo em vista a predominância de membros eleitos pelo acionista controlador, a atuação do Conselho Fiscal é, na grande maioria das vezes, residual e desprestigiada.

Ainda que haja a possibilidade de participação de membros eleitos por acionistas minoritários em sua composição — e que, conforme será indicado a seguir, permite-se, em certos casos, uma atuação individual dos conselhei-ros —, o Conselho Fiscal em geral atua de forma não permanente e sem uma efetiva atividade fiscalizatória.

2. ElEição, rEmunEração E rEstriçõEs.

No caso de o Conselho Fiscal ser colocado em funcionamento em razão de pedido formulado pelos acionistas, os conselheiros serão eleitos na mesma assembleia em que tal pedido for formulado, e o mandato dos mesmos per-durará até a próxima Assembleia Geral Ordinária.

Cumpre assinalar que os conselheiros serão remunerados com um salário de, no mínimo, um décimo do salário médio atribuído aos diretores da com-panhia. Busca-se, assim, assegurar maior efetividade à atuação dos membros do Conselho Fiscal. Nas palavras de Fran Martins:

105 BULGARELLI, Waldirio. Regime Jurídico do Conselho Fiscal das S/A. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. P. 58.

105 BULGARELLI, Waldirio. Regime Jurí-dico do Conselho Fiscal das S/A. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. P. 58.

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135FGV DIREITO RIO

Só poderão ser eleitos para o cargo de conselheiro fiscal pessoas físicas, residentes no país, com diploma universitário ou experiência de três anos, no mínimo, no cargo de administrador de empresa ou conselheiro fiscal.

No tocante aos impedimentos para exercício do cargo de membro do Conselho Fiscal, além do previsto no artigo 147 da LSA, também estarão proibidos de exercer as funções de conselheiro fiscal os administradores ou empregados de qualquer sociedade controladora, controlada ou coligada à companhia, bem como os cônjuges ou parentes, até o terceiro grau, de admi-nistrador da companhia.

Estes impedimentos visam a resguardar o interesse da companhia em de-trimento dos interesses individuais de seus acionistas, de maneira genérica, e de seus conselheiros, de forma específica.

3. ComPEtênCias.

Percebe-se pelo que já foi exposto que compete ao Conselho Fiscal fiscalizar a atuação dos órgãos administrativos da companhia. Segundo Tavares Borba:

“Compete-lhe acompanhar a atuação da empresa, afim de verificar a regularidade dos procedimentos adotados e dos negócios realizados, opi-nando sobre o relatório anual dos administradores, as demonstrações financeiras da companhia e, especialmente, sobre propostas de modifi-cação do capital, emissão de debêntures ou bônus de subscrição, planos de investimento ou orçamentos de capital, distribuição de dividendos, transformação, incorporação, fusão e cisão.”106

Importa ressaltar que a atuação do conselheiro deve ser orientada de forma a sempre atender aos interesses da companhia, pois, apesar de ser eleito por um grupo de acionistas, sua atuação deve ser em prol e no in-teresse da sociedade.

Se a atuação do conselheiro for abusiva — como, por exemplo, se pri-vilegiar os interesses de determinado grupo de acionistas em prejuízo da sociedade ou agir com o intuito de obter vantagens para si ou para terceiros —, surge para ele individualmente o dever de reparar eventuais prejuízos que tenham sido causados à sociedade e a outros.

Assim assevera Nelson Eizirik:

106 BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 433.

106 BORBA, José Edwaldo Tavares. Di-reito Societário. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 433.

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136FGV DIREITO RIO

(...) se o Conselheiro Fiscal age exclusivamente no interesse dos acio-nistas que o elegeram, sacrificando o interesse social e impedindo ou dificultando a companhia de atingir seu objeto social e lograr seus fins lucrativos, evidentemente, pode ser responsabilizado pelos prejuízos cau-sados por tal conduta antijurídica.”

E resume o autor:

“para configurar-se o abuso do conselheiro fiscal deve ficar demonstrado que a sua atuação visa a: causar dano à companhia, aos seus acionistas controladores ou minoritários, ou aos seus diretores e membros do Con-selho de Administração; ou a obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a com-panhia, seus acionistas ou administradores. Em qualquer das hipóteses deve estar presente o elemento subjetivo, ou seja, a utilização dos poderes legais inerentes à função com a intenção de causar dano ou de obter vantagem indevida.”

4. ExErCíCio soCial.

O exercício social constitui determinado período que se destaca da vida da sociedade para a verificação do resultado econômico e financeiro de sua atividade e para aferição do resultado do fim social.

O exercício é delimitado a um prazo de 12 meses. Embora não coincida necessariamente com o ano civil, na prática o exercício social da maioria das companhias inicia-se em 1º de janeiro e termina em 31 de dezembro.

Deve-se destacar, entretanto, que certas companhias — por questões estra-tégicas ou em razão da sazonalidade característica de suas operações (como, por exemplo, em virtude de safras agrícolas) — optam por delimitar o exer-cício social de forma diversa, devendo observar sempre o referido período de 12 meses. Nesse sentido, aponta BULHÕES PEDREIRA:

“A melhor época do ano-calendário para apurar o resultado da empresa é o término de cada ciclo operacional, e na grande maioria das ativi-dades esse ciclo é igual ou inferior a um ano. Há, todavia, empresas em que é mais longo, como em alguns tipos de agricultura, fabricação de grandes equipamentos ou contratos de empreitada. Nesses casos a con-tabilidade adota critérios que permitem determinar o resultado em pe-ríodos inferiores ao do ciclo operacional. Ciclo operacional é o período de uma série completa das etapas do processo produtivo da empresa.

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137FGV DIREITO RIO

Na empresa comercial, cuja atividade consiste em comprar e revender mercadorias, o ciclo operacional (medido em função dos fluxos de moe-da) inicia-se com o pagamento do custo de aquisição das mercadorias e termina quando a receita de venda dos produtos é recebida em dinheiro. Na empresa industrial, inicia-se com o pagamento do custo de aquisição das matérias-primas, bens intermediários e serviços produtivos aplica-dos na produção e termina quando o valor dos produtos vendidos é recebido em dinheiro”107

5. dEmonstraçõEs finanCEiras: noçõEs GErais.

Em sucintas palavras, as demonstrações financeiras são a expressão da situ-ação econômico-financeira da companhia e as mutações patrimoniais ocorri-das em um determinado espaço de tempo.

De acordo com Rubens Requião:

“as demonstrações financeiras constituem, pois, claras peças que deixam retratar a real situação econômico-financeira da sociedade, para infor-mação dos seus próprios órgãos, dos acionistas, dos credores e do público em geral. Por isso, serão elas complementadas por notas explicativas e outros quadros analíticos ou demonstrações contábeis necessárias para esclarecimento da situação patrimonial e dos resultados do exercício.”108

As demonstrações financeiras são compostas por quatro documentos:

a) balanço patrimonial;

b) demonstração de lucros ou prejuízos acumulados;

c) demonstração do resultado do exercício; e

d) demonstração das origens e aplicações de recursos. Estes docu-mentos, por sua vez, são apresentados aos acionistas para fins de escrituração mercantil da companhia de forma a dar publi-cidade da higidez da sociedade, demonstrando se o resultado de determinado período configura um lucro ou um prejuízo.

O primeiro destes documentos — o balanço patrimonial — é composto por créditos e débitos que deverão ser recebidos ou pagos pela sociedade. O resultado do somatório de um com o outro representa a existência de um ativo ou um passivo. Segundo leciona Túlio Ascarelli:

107 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 1.088.108 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. II. São Paulo: Saraiva, 2003. P. 236.

107 PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 1.088.

108 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. II. São Paulo: Saraiva, 2003. P. 236.

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138FGV DIREITO RIO

“(...) visa, com efeito, o balanço, a verificar o ativo e o passivo da socie-dade, à vista da gestão do exercício; os lucros (ou a perdas) realizados; os lucros distribuíveis. (...) A aprovação do balanço é, de um lado, o pressuposto para que se aperfeiçoe o direito do acionista à distribuição do lucro do exercício; de outro lado, enquanto não seja anulado, de-verá o balanço ser atendido na disciplina jurídica das relações sociais que respeitam ao exercício ao qual se refere (disto resultando o caráter negocial da deliberação que o aprova, apesar da declaratoriedade de sua função) (...).”109

6. dEmonstraçõEs finanCEiras E a lEi 11.638/07

O crescente impacto da globalização da economia e a necessidade de captação de recursos financeiros internacionais levam a uma exigência cada vez maior de uniformidade na apresentação das informações financeiras e contábeis.110

Reconhecendo a necessidade do Mercado de Capitais brasileiro em se ade-quar a dinâmica internacional, foi editada a lei 11.638/07 que trouxe uma série de invoações aos dipositivos da lei das S.A que tratavam das demonstra-ções financeiras.

Podem ser citados como principais objetivos desta lei:111

a) Adequar os dispositivos contábeis da LSA de forma a proporcio-nar maior transparência e qualidade às informações contábeis;

b) Adequar a lei às melhores práticas contábeis internacionais, conforme disposições do International Accounting Standards Board (IASB);

c) Eliminar ou diminuir as dificuldades de interpretação e de aceitação das informações contábeis utilizadas no Brasil;

d) Reduzir o custo e o risco provocado por essas dificuldades de interpretação e aceitação.

Com efeito, ainda em 2007, foi publicada a Instrução CVM 457, que es-tabeleceu em seu art. 1º que “As companhias abertas deverão, a partir do exer-cício findo em 2010, apresentar as suas demonstrações financeiras consolidadas adotando o padrão contábil internacional, de acordo com os pronunciamentos emitidos pelo International Accounting Standards Board – IASB.”

109 Apud REQUIÃO, Rubens. Op. cit., Pp. 237-238.110 O Mercado de Valores Mobiliários Brasileiro / Comissão de Valores Mobiliários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014135.111 O Mercado de Valores Mobiliários Brasileiro / Comissão de Valores Mobiliários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014135

109 Apud REQUIÃO, Rubens. Op. cit., Pp. 237-238.

110 O Mercado de Valores Mobiliários Brasileiro / Comissão de Valores Mobili-ários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014135.

111 O Mercado de Valores Mobiliários Brasileiro / Comissão de Valores Mobili-ários. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Comissão de Valores Mobiliários, 2014135

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139FGV DIREITO RIO

AulA 10: lucros, rEsErvAs E dIvIdEndos.

lEitura básiCa:

LAMY FILHO, Alfredo; BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. A Lei das S.A., Vol. I — 3ª edição. Rio de Janeiro, Renovar, 1997, pp. 156 a 164; pp.249-251.

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 1.207-1.258.

1. ConCEito dE luCro, rEsErva E dividEndos.

Os conceitos que trataremos se referem ao resultado do empreendimento societário e são necessários para que se compreenda como é realizada a distri-buição de lucros entre os acionistas.

Note-se, assim, a relevância prática do tema, tendo em vista que um dos objetivos primordiais de uma sociedade, seja ela limitada ou anônima, é a obtenção de lucros.

Toda exploração econômica pode ser associada, em algum momento, a um resultado positivo. Entretanto, estes ganhos não se traduzem automati-camente em lucratividade. Antes de se contabilizar o lucro final da operação, existem itens obrigatórios e necessários na agenda financeira, como a folha de pagamentos, o investimento em novas atividades ou a melhoria da própria estrutura da companhia.

Em todo caso, a finalidade lucrativa é elemento permanente na estrutura societária, sendo, inclusive, garantido legalmente, como se observa do dis-posto no artigo 2º da LSA. Não apenas o lucro, mas a partilha deste entre os acionistas139. É o que se denomina interesse comum. Vamos analisar, portanto, as denominações usualmente utilizadas para qualificar o estado econômico-financeiro de determinada sociedade, assim como suas funções.

Resultado do exercício: O resultado do exercício é obtido por meio da diminuição das receitas pelas despesas de uma companhia, em um deter-minado exercício.

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140FGV DIREITO RIO

Lucro: O lucro pode ser final (após a liquidação da sociedade) ou de exercício (resultado do balanço contábil das contas no fim do exercício social). Note-se que o lucro do exercício “é o sobre valor que a sociedade pode produzir, como resultado da aplicação do capital e outros recursos na atividade produtiva”.

Já o lucro líquido do exercício é a parcela do resultado do exercício que remanescer após a dedução dos prejuízos acumulados, provisão para o imposto sobre a renda e participações estatutárias previstas no artigo 190 da LSA.

Dividendo é a parcela do lucro da companhia que é distribuída aos acio-nistas. A principal fonte dos dividendos é o lucro do exercício, ou aquele auferido pela companhia em períodos anteriores e que estejam contabiliza-dos sob a forma de reservas de lucros.

Verificado o lucro líquido da companhia, a administração da socie-dade deve propor à assembleia geral o destino que se lhe deva dar. Se esse lucro for distribuído aos acionistas, de acordo com sua participação acionária, nasce o dividendo. Deve-se observar, no entanto, que, na ad-vertência da doutrina:

“A sociedade anônima não é inteiramente livre para decidir sobre o destino dos seus ganhos. A lei determina que uma parcela destes deve ser repartida entre os acionistas (os dividendos obrigatórios), e que outra deve permanecer em seu patrimônio (as reservas). A companhia decide, com liberdade, o destino de seus ganhos apenas após o atendimento des-sas destinações forçadas”112

2. dividEndo obriGatório (artiGo 202, lsa):

O dividendo obrigatório representa a parcela do lucro líquido que deve ser obrigatoriamente distribuída aos acionistas em cada exercício, desde que o lucro líquido exista em montante suficiente para tal distribuição. Note-se que, eventualmente, mesmo na existência de lucro líquido, não haverá a distribuição de dividendos entre os acionistas em prol da higidez financeira da sociedade que, para atingir seu fim social, necessitará dos recursos obtidos no exercício social para, por exemplo, reinvestir na conse-cução dos objetivos da sociedade, conforme disposto nos parágrafos 3º e 4º do mencionado artigo 202.

112 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial, v. II. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 239.

112 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial, v. II. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 239.

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141FGV DIREITO RIO

3. rEsErvas ou rEtEnção dE luCros:

Segundo classificação doutrinária corrente, as reservas ou retenção de lu-cros podem ser divididas em (i) legal, (ii) estatutária e (iii) assemblear.

4. rEsErva lEGal (art. 193, lEi das sa):

A reserva legal possui a função de assegurar a integridade do capital social, sendo limitada a 20% desse capital. Chama-se legal por ser estabelecida em lei e, portanto, obrigatória.

Deve-se alocar à reserva legal 5% do lucro líquido do exercício, até que se atinja o montante equivalente a 20% do capital social. Cumpre assinalar que a reserva legal somente poderá ser utilizada para compensar prejuízos ou para aumentar o capital social.

Cumpre assinalar que a reserva legal somente poderá ser utilizada para compensar prejuízos ou para aumentar o capital social.

5. rEsErvas Estatutárias (art. 194, lEi das sa):

A LSA faculta aos acionistas a possibilidade de introduzir no estatuto da so-ciedade a previsão de reservas de lucros, desde que se indique a sua finalidade, a parcela dos lucros que será destinada à sua constituição e o seu limite máximo.

6. rEsErvas assEmblEarEs:

As reservas assembleares são aquelas criadas na própria assembleia de acio-nistas que deliberar sobre a alocação do lucro líquido. Essas reservas devem ser aprovadas pela assembleia geral, por proposta justificada dos órgãos da administração. São três as espécies de reservas assembleares: reserva para con-tingências, retenção de lucros e reserva de lucros a realizar.

7. rEsErva Para ContinGênCias (art. 195, lEi das sa):

A reserva para contingências tem por finalidade compensar a diminuição do lucro decorrente da perda julgada provável, cujo valor possa ser estimado, e durará enquanto existirem as razões que justificaram a sua constituição.

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O saldo da reserva para contingências será revertido no exercício em que deixarem de existir as razões que justificaram a sua constituição, ou será dada baixa quando ocorrer a perda.

No exemplo de Fábio Ulhôa Coelho:

“Imagine que a sociedade anônima esteja respondendo a um processo de indenização por acidente de capital, desde que o orçamento total seja previamente aprovado em assembleia de quantia considerável. Para fazer frente a essa eventualidade, ela pode reservar, dos seus lucros, a parte correspondente à estimativa da perda provável. Claro que ela pode ganhar o processo, e, assim, não ser condenada a desembolsar nem um centavo. Nesse caso, a reserva deve ser revertida, deliberando, então, a companhia sobre a sua destinação.”113

8. rEtEnção dE luCros a rEalizar (art. 196, lEi das sa):

A companhia pode reter lucros para aplicar em orçamento de capital, desde que o orçamento total seja previamente aprovado em assembleia de acionistas, com base em proposta dos órgãos da administração, contendo a justificativa da retenção de lucros proposta com todas as fontes de recursos e aplicações de capital, fixo ou circulante.

O orçamento de capital deve ter sua duração limitada a 5 exercícios, salvo para projetos de investimento com prazo maior.

Note-se que, sempre que o orçamento de capital tiver duração maior que um exercício social, deverá ser revisado anualmente pela assembleia geral ordinária.

9. rEsErva dE luCros a rEalizar (art. 197, lEi das sa):

A reserva de lucros a realizar tem por finalidade impedir a distribuição de dividendos sobre lucros que não tenham sido efetivamente realizados — como, por exemplo, se a companhia houver alienado uma grande quanti-dade de determinado produto, mas o pagamento somente for realizado em um momento futuro. A reserva de lucros somente poderá ser utilizada para absorção de perdas em exercícios subseqüentes, e, ainda, para pagamento do dividendo obrigatório.

113 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de direito comercial, v. 2. 6. ed. São Paulo: Saraiva,2003. p. 352.

113 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de di-reito comercial, v. 2. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 352.

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10. limitEs das rEsErvas dE luCros:

As reservas estatutárias e a retenção de lucros somente poderão ser cons-tituídas após a dedução da parcela relativa ao dividendo obrigatório (artigo 198 da Lei n. 6.404/76). Adicionalmente, nos termos do artigo 199 da LSA, “o saldo das reservas de lucros, exceto as para contingências e de lucros a rea-lizar, não poderá ultrapassar o capital social”.

11. dEstinação do saldo rEmanEsCEntE:

Os lucros não destinados à constituição de reservas deverão ser distribuí-dos como dividendos discricionários ou utilizados para aumento de capital, com ou sem emissão de ações.

12. dividEndo Prioritário das açõEs PrEfErEnCiais:

Os titulares de ações preferenciais podem ter, entre suas vantagens, o rece-bimento prioritário de dividendos, ou seja, devem recebê-lo antes dos titula-res de ações ordinárias, e antes da constituição das reservas de lucros, exceto a legal, na forma do estipulado no artigo 203 da LSA

13. dividEndos intErmEdiários:

Além do dividendo anual distribuído com base no resultado do exercício, o artigo 204 da LSA prevê outras possibilidades de distribuição de dividen-dos, que podem ser assim definidas: (i) dividendos distribuídos com base no resultado de balanço semestral; (ii) dividendos distribuídos com base no re-sultado de balanços levantados em períodos inferiores143; e (iii) dividendos distribuídos à conta de lucros acumulados e/ou reservas de lucros apurados constantes do último balanço levantado pela companhia.

14. PaGamEnto dE dividEndos (art. 205, lEi das sa):

Os dividendos deverão ser pagos à pessoa que, na data da declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária ou usufrutuária da ação, no li-vro de registro de ações da companhia, no prazo de 60 dias da data em que for declarado, salvo se a assembleia geral estipular outro prazo, que não po-derá exceder o exercício social em que foi declarado.

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144FGV DIREITO RIO

15. brEvE rEsumo do fim do ExErCíCio soCial:

Caso o Exercício Social termine com prejuízo →Prejuízos Acumulados;

Caso o Exercício Social termine com lucro, duas opções:

1) Se o lucro não superar o prejuízo acumulado → Amortização do Lucro

2) Se o lucro superar o prejuízo acumulado, há lucro líquido. Então, seguem as opções:a. Dividendosb. Reinvestimentoc. Capitalização

Contudo, antes de escolher a sua “opção” acima, há a destinação obri-gatória legal (Reserva Legal, art. 193, LSA). Além disso, o Estatuto Social (destinação obrigatória estatutária) pode criar (a criação é voluntária) reservas (art. 194, LSA). Uma opção de reserva é uma Reserva de Reinvestimento com o objetivo de fomentar a atividade da empresa. Outra reserva possível é a Reserva de Contingências.

Depois das destinações obrigatórias, o que sobrar é que pode ser distribuí-do. O que sobrar precisa ser distribuído 100% (ou, caso exista, parte pode ser destinada ao Orçamento de Capital). Orçamento de Capital é uma proposta da Administração aceita pelos acionistas que visa a criação de um plano de retenção de lucros da Cia. Esse plano de retenção uma vez criado passa a ser uma Reserva Assemblear Momentânea.

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AulA 11: AcIonIstAs E AcIonIstA controlAdor.

lEitura básiCa:

COMPARATO, Fábio Konder e SALOMÃO FILHO, Calixto. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2008. 5ª Ed. Pp. 51-103.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Medidas defensivas à tomada de controle de companhias. São Paulo: Quartier Latin, 2011, pp. 33-48

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 321-364.

1. aCionista.

É intuitiva a noção de que o acionista é o titular de ações de emissão de determinada sociedade. Da mesma forma, percebe-se que são do interesse do acionista — em diferentes gradações, de acordo com seu perfil — o desenvol-vimento e a prosperidade da companhia, podendo ser esta um instrumento de renda permanente, de lucros imediatos ou, então, de poder e influência social.

Ao passar a ser titular de participação acionária, o acionista passa a gozar de uma série de direitos, os quais podem se apresentar de forma essencial ou não-essencial, conforme sejam inerentes à condição de titular de participação acionária ou não.

Os direitos essenciais dos acionistas não podem ser afastados nem pelo estatuto nem pela assembleia geral. Conforme dispõe o artigo 109 da LSA, os direitos essenciais dos acionistas são:

(i) participar dos lucros sociais;

(ii) participar do acervo da companhia, em caso de liquidação;

(iii) fiscalizar a gestão dos negócios sociais;

(iv) ter preferência para a subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêntures conversíveis em ações e bô-nus de subscrição; e

(v) retirar-se da sociedade nos casos previssem lei.

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Nesse contexto, percebe-se que o direito de voto dos acionistas nas assem-bleias gerais da companhia não é considerado um direito essencial, uma vez que a lei faculta, em certos casos, a possibilidade de o estatuto restringi-lo.

Tal fato se realça com o fortalecimento do fenômeno de dispersão acioná-ria, em que o acionista, cada vez mais preocupado com a renda de suas ações, perde o interesse nos processos decisórios da companhia. Sobre a limitação do direito de voto nas deliberações sociais de uma companhia, José Edwaldo Tavares Borba afirma:

“No silêncio do estatuto, todas as ações terão direito de voto, inclusive as preferenciais. Permite-se, no entanto (art. 111), que o estatuto retire às ações preferenciais, ou a uma classe destas, o direito de voto, ou ainda que, embora admitindo-o, faça-o com restrições, estabelecendo matérias ou situações em que essas ações não votarão”114

Ocorre que a propriedade das ações não assegura apenas direitos aos acio-nistas. Com efeito, todos os titulares de ações de emissão de uma companhia possuem diversas e relevantes obrigações.

Entre as obrigações dos acionistas estipuladas em lei ou no estatuto social, destaca-se aquela referente à integralização das próprias ações. De acordo com o artigo 106 da LSA, “o acionista é obrigado a realizar, nas condições pre-vistas no estatuto ou no boletim de subscrição, a prestação correspondente às ações subscritas ou adquiridas”.

O acionista que não cumprir com tais obrigações financeiras fica constituído em mora, de pleno direito, sujeitando-se ao pagamento de juros, correção mone-tária e da multa que o estatuto determinar, além das sanções previstas em lei.115

O artigo 107 da LSA estabelece que,

“verificada a mora do acionista, a companhia pode, à sua escolha:

I - promover contra o acionista, e os que com ele forem solidariamente responsáveis (artigo 108), processo de execução para cobrar as impor-tâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou

II - mandar vender as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista”.

114 TAVARES BORBA, José Edwaldo. Direito Societário. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 347. No entanto, as ações preferenciais sem direito a voto adquirem o exercício desse direito se a companhia deixar de pagar aos seus titulares os dividendos fixos ou mínimos no prazo previsto no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios consecutivos, consoante previsto no art. 111, § 1º, da Lei das S.A.115 O artigo 107 da Lei das S.A. estabelece que, “verificada a mora do acionista, a companhia pode, à sua escolha: I - promover contra o acionista, e os que com ele forem solidariamente responsáveis (artigo 108), processo de execução para cobrar as importâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou II - mandar vender as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista”.

114 TAVARES BORBA, José Edwaldo. Di-reito Societário. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. P. 347. No entanto, as ações preferenciais sem direito a voto adquirem o exercício desse direito se a companhia deixar de pagar aos seus titulares os dividendos fixos ou míni-mos no prazo previsto no estatuto, não superior a 3 (três) exercícios con-secutivos, consoante previsto no art. 111, § 1º, da Lei das S.A.

115 O artigo 107 da Lei das S.A. estabele-ce que, “verificada a mora do acionista, a companhia pode, à sua escolha: I - promover contra o acionista, e os que com ele forem solidariamente responsáveis (artigo 108), processo de execução para cobrar as importâncias devidas, servindo o boletim de subscri-ção e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou II - mandar vender as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista”.

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2. PodEr dE ControlE.

De acordo com Luiz Gastão Paes de Barros Leães:

“Embora só tenha sido identificado no seio das sociedades anônimas, com o advento da Lei 6.404/76, o poder de controle se faz presente em toda e qualquer sociedade. Pois todas as sociedades pressupõem uma certa organização dos poderes sociais — umas mais, outras me-nos estruturadas. Nas sociedades anônimas, a lei impõe rígida distri-buição de poderes-funções a órgãos próprios: o órgão de deliberação, que expressa a vontade da sociedade; o órgão de execução, que reali-za a vontade social; e o órgão fiscalizador, que vela pela fiel execução da vontade social. Dotados de poderes próprios, esses órgãos básicos se ordenam hierarquicamente, sendo o órgão supremo a assembleia geral dos acionistas. Nem sempre, porém, esse modelo coincide com a realidade econômica subjacente: muitas vezes, o poder supremo da companhia se localiza fora da assembleia, embora as decisões nela se formalizem. Com frequência, esse poder de comando é exercido pelos acionistas em outra instância, no seio da administração, ou à mar-gem dos órgãos societários [ ... ] A esse poder supremo de comando da companhia, que transcende as prerrogativas legais da assembleia geral, dá-se o nome de poder de controle. [ ... ] para a configuração do poder de controle, exige a lei que: 1°) quando ele for exercido por duas ou mais pessoas, essas pessoas devem estar vinculadas por acordo de voto ou sob controle comum; 2°) essa vinculação ou subordinação devem ser de tal ordem que seus direitos de sócios assegurem, de modo permanente, a maioria das deliberações sociais; e 3°) esse comando das atividades sociais, para representar o controle, deve ser efetiva-mente exercido. Outras conclusões podem ser extraídas desses dispo-sitivos: a lei brasileira 1°) exclui, da sua regulamentação, o controle externo e o controle interno administrativo e gerencial; 2°) faz uma equiparação entre `maioria dos votos nas deliberações sociais’, a fim de enfatizar que o fenômeno do controle é comum a todo tipo social; 3°) abrange, em qualquer das hipóteses, o chamado controle minori-tário, posto que não exige, para a sua caracterização, a detenção da maioria do capital votante”116.

Berle e Means: Clássica Separação entre Propriedade e Gestão. Fenômeno da dissociação entre propriedade e gestão nas companhias:

à Gestão (usar e fruir) X Propriedade (dispor).

116 LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Poder de Controle. In: Estudos e Pareceres Sobre Sociedades Anônimas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, Pp. 279-283.

116 LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. Poder de Controle. In: Estudos e Pare-ceres Sobre Sociedades Anônimas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, Pp. 279-283.

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Claude Champaud: De modo a precisar a noção de controle é, necessária, antes de mais nada, a existência de um patrimônio, cujo titular encontra-se na impossibilidade de geri-lo. Existência de três níveis de poder nas companhias: (i) Participação no Capital Social/Investimento; (ii) Direção; e (iii) Controle.

2.1. Conceitos básicos.

a) Poder de controle, por José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho:

“É o poder supremo da estrutura hierárquica da companhia exercido pelo acionista controlador – titular da maioria pré-constituída dos votos na Assembleia Geral.”

O poder de controle é uma situação de fato e não de direito. É preciso usar efetivamente esse controle. Isso (situação de fato) não existe na Socie-dade Controlada (art. 243, §2º, LSA) porque ela é o sujeito passivo (ela não precisa fazer nada).

b) Controlar: governar, dirigir ou pilotar.

c) Poder: capacidade de um agente de intencionalmente fazer algo ou pro-duzir um resultado. Pressupõe (i) relação entre o agente que detém o po-der e o objeto a ele submetido e (ii) uma fonte de poder.

d) Companhia: grupo de pessoas que se associam com o fim de exercer a função empresarial. Possui uma estrutura hierarquizada. Seu órgão supre-mo é a Assembleia Geral, ao qual competem as decisões mais importantes. Órgãos de administração são subordinados à Assembleia Geral que pode destituí-los a qualquer tempo.

e) Discussão: como é a relação da Assembleia com os administradores nos EUA? E no mundo?

f) Acionista controlador:

“Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:

a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e

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149FGV DIREITO RIO

b) usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orien-tar o funcionamento dos órgãos da companhia.”

“Art. 243 LSA:

(...)

§ 2º. Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, di-retamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas delibera-ções sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores.”

A redação dos dispositivos da LSA que conceituam o acionista controla-dor e a sociedade controlada adotam, em essência, o conceito de titularidade de direitos de sócios que assegurem, de modo permanente, a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores. Mas para a caracterização do controle, consoante a alínea ‘b’ do art. 116, é necessário o efetivo dos direitos de sócio para dirigir as atividades sociais e orientar os rumos da companhia. Isso se dá porque o poder de controle decorre não só de uma relação jurídica, mas pressupõe um estado de fato.

g) Poder Político:

Nas companhias, o poder político compete à Assembleia Geral e, dentro desse órgão, à maioria dos acionistas com direito de voto. Convoca-se, regu-larmente a assembleia para deliberar acerca de diversos temas, o que se faz por meio do voto (claro, quando este direito é conferido pelas ações que têm essa prerrogativa).

A soma dos votos que majoritariamente prevalecerem apontará para uma ou outra deliberação, definindo a vontade social. Há hipóteses em que o quórum para a tomada de decisões afigura-se qualificado – isto é, exige-se a aprovação da maioria do capital votante, mas a ideia é atender ao interesse da maioria predominante dos acionistas presentes nas Assembleias Gerais.

O poder de controle existe, portanto, quando a maioria da Assembleia Geral é pré-constituída mediante reunião, na mesma pessoa ou grupo de pessoas, da titularidade de direitos de voto que assegurem permanentemente a maioria nas reuniões a Assembleia Geral. Obtido o controle, o acionista (ou grupo de acionistas) tem a capacidade de determinar as deliberações da As-sembleia Geral, eleger e destituir os administradores da companhia (ou, pelo menos, sua maioria) e orientar ou determinar as ações praticadas por eles no exercício das respectivas funções.

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h) Bloco de controle – natureza jurídica

O bloco de controle é outra forma de se referir ao controle da companhia, consoante menciona o art. 116 da LSA. O bloco significa o conjunto de ações de propriedade do acionista controlador, considerado como coisa cole-tiva. Esse conjunto, por sua vez, pode ser fonte de poder de controle.

Para que exista efetivamente, é necessário haver vinculação das ações que assegurem a maioria dos votos nas deliberações da Assembleia Geral. Pode nas-cer tanto da reunião das ações em um mesmo patrimônio quanto de acordo de acionistas ou até mesmo a titularidade por pessoas distintas, mas sob controle comum, como no caso de subsidiária integral e empresa controladora.

O bloco de controle é uma universalidade de fato. É considerado coisa cole-tiva apenas em razão da identidade da pessoa titular das ações que o compõem.

i) Fonte do Poder de Controle

A fonte do poder de controle é o próprio bloco de controle, e não as ações dele componentes (consideradas singularmente), nem seus respectivos direi-tos de voto (considerados singularmente), uma vez que cada ação do capital social é objeto distinto de direito de propriedade, que permanece inalterado ainda que um acionista possua diversas delas.

O que importa para a sua configuração é a titularidade da maioria dos di-reitos de voto nas deliberações da Assembleia Geral (e não a propriedade das ações). Assim, por exemplo, o nu-proprietário de ações gravadas com usufru-to de direito de voto poderá não ser o controlador, mas sim o usufrutuário no caso em que se lhe confere o direito de voto.

j) Poder de Controle – Natureza Jurídica

O poder de controle é um poder de fato e não um poder de direito. Nasce, portanto, não de uma prescrição legal que o confira ou assegure, mas de uma si-tuação fática, qual seja, a reunião, em uma pessoa (ou grupo de pessoas – o blo-co de controle) da quantidade de ações cujos direitos de voto, quando exercidos no mesmo sentido, formam a maioria nas deliberações da assembleia geral.

Além disso, o poder de controle não pode ser objeto de direito, no sentido de que não pode ser adquirido nem transferido independentemente do bloco de controle (sua fonte), nem é direito subjetivo, pois o acionista controlador não pode pedir a tutela do estado-juiz para ver respeitado esse poder, salvo quando ele é manifestado nas deliberações de voto na Assembleia Geral.

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151FGV DIREITO RIO

Pode ter natureza transitória, uma vez que a composição do bloco de con-trole está sujeito às oscilações naturais do mercado ou prazo de vigência de determinado acordo.

3. aCordo dE aCionistas.

Os acordos de acionistas são contratos parassociais (i.e., paralelos ao Es-tatuto Social e demais atos societários das companhias), por meio do qual os acionistas signatários dos mesmos estabelecem termos e condições gerais para regrar seu relacionamento, enquanto acionistas da companhia a que o acordo se referir.

Os acordos de acionistas possuem caráter convencional, com efeitos tanto na esfera do Direito Civil quanto do Direito Empresarial (em que se insere o Direito Societário), dizendo-se, inclusive, que os direitos e obriga-ções decorrentes de acordos de acionistas são regulados substancialmente pelo Direito Civil e não pelo Direito Societário117, embora seus efeitos jurídicos sejam relativos à participação acionária em determinada compa-nhia. A qualificação jurídica do acordo de acionistas, aliás, é de um con-trato nominado típico.118

Apesar do caráter convencional dos acordos de acionistas, a lei, através do caput do artigo 118 da LSA, determinou as matérias que serão observa-das pela sociedade sempre que o acordo de acionistas estiver devidamente arquivado na sede social. Desta forma, não é qualquer matéria estipulada no acordo de acionistas que terá efeitos perante a sociedade nem oponíveis a terceiros. Ao analisar o tema, Fran Martins concluiu que:

“Não significa isso que os acionistas não possam estabelecer normas ul-trapassando essa limitação; apenas, em tais casos, ainda mesmo que a sociedade arquive acordos com as cláusulas não mencionadas na lei, tais acordos não serão observados pela sociedade nem oponíveis a terceiros quando averbados nos livros de registro e nos certificados de ações se emitidos (art. 118 §1º da LSA)”119

O “acordo de acionistas”, conforme previsto na atual lei societária, é aque-le celebrado entre acionistas da companhia, os quais poderão ser titulares de ações ordinárias ou preferenciais. Se outras pessoas que não acionistas da companhia forem parte integrantes do acordo, não se estará diante de um acordo de acionistas.

117 Entendimento sutilmente diferente apresenta Modesto Carvalhosa: “Assim, embora a fonte formal seja a lei societária, a fonte substancial do acordo de acionistas, nas suas três categorias, está no Direito das Obrigações. Não obstante, o acordo de controle tem sua fonte substancial também no próprio Direito Societário. Isto porque o acordo de acionistas que tem por objeto o voto minoritário e o de disponibilidade das ações pertence à esfera privada dos seus subscritores, não obstante, neste último, poder também vincular-se como parte a própria sociedade (art. 30 da lei societária) (...)” CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho. São Paulo: Saraiva, 2011. P.164.118 Na visão de Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira: “A expressão acordo de acionistas não significa um único negócio jurídico típico, que apresente sempre a mesma natureza e estrutura e as mesmas modalidades de prestação, mas uma categoria de negócios jurídicos de diferentes espécies, cuja característica comum é o fato de que uma ou mais partes assumem obrigações sobre o modo de exercer direitos conferidos por ações da companhia.” LAMY FILHO, Alfredo e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. A Lei das S.A. Pareceres, Vol. I. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2ª Ed., 1996, P. 287.119 MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. Revista e atualizada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2010. P. 419.

117 Entendimento sutilmente diferente apresenta Modesto Carvalhosa: “Assim, embora a fonte formal seja a lei socie-tária, a fonte substancial do acordo de acionistas, nas suas três categorias, está no Direito das Obrigações. Não obstante, o acordo de controle tem sua fonte subs-tancial também no próprio Direito Socie-tário. Isto porque o acordo de acionistas que tem por objeto o voto minoritário e o de disponibilidade das ações pertence à esfera privada dos seus subscritores, não obstante, neste último, poder tam-bém vincular-se como parte a própria sociedade (art. 30 da lei societária) (...)” CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho. São Paulo: Saraiva, 2011. P.164.

118 Na visão de Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira: “A expres-são acordo de acionistas não significa um único negócio jurídico típico, que apresente sempre a mesma natureza e estrutura e as mesmas modalidades de prestação, mas uma categoria de negócios jurídicos de diferentes espécies, cuja característica comum é o fato de que uma ou mais partes assumem obri-gações sobre o modo de exercer direitos conferidos por ações da companhia.” LAMY FILHO, Alfredo e BULHÕES PE-DREIRA, José Luiz. A Lei das S.A. Parece-res, Vol. I. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2ª Ed., 1996, P. 287.

119 MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. Revista e atualizada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Fo-rense, 2010. P. 419.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

152FGV DIREITO RIO

Além disso, nos casos em que a companhia figura como interveniente do acordo (como ocorre, por exemplo, em “acordos de controle” e “acor-dos de bloqueio”), embora a companhia seja signatária, a mesma não é considerada parte do acordo, para os fins e efeitos de se descaracterizar o acordo de acionistas.

Como bem analisado por Modesto Carvalhosa, os acordos entre acionistas e administradores, bem como aqueles entre a sociedade e os acionistas, são considerados ilícitos, já que tais avenças constituem fraude à lei (chamadas pela doutrina de “consórcios de administração”).

Tal conclusão decorre do fato de que, com o crescimento de companhias abertas com dispersão acionária no mercado de capitais (i.e., companhias em que a estrutura de capital está tão distribuída entre os acionistas que não há a prevalência de nenhum acionista controlador definido), os administradores, por meio desses acordos de acionistas, poderiam assumir o controle das po-líticas empresariais da companhia (i.e., controle gerencial), com o continuís-mo deles no exercício de seus cargos.

Situação análoga ocorre nos acordos entre os acionistas e a sociedade, já que, por meio dessas avenças, a vontade prevalecente seria, indiretamente, a dos administradores. Nas palavras de Modesto Carvalhosa:

“Não se trataria, no caso, de mera cessão do direito de voto. Na espécie, o acordo celebrado entre os administradores ou a companhia, de um lado, e acionistas, de outro, configuraria claramente o tráfico de voto, estando, no caso, inserida uma vantagem qualquer, direta ou indireta, presumida ou efetiva, como contrapartida à submissão de acionistas mi-noritários aos interesses pessoais daqueles.”120

Por força do art. 114 da L.S.A., o entendimento sobre a qualidade de acio-nista de que trata o art. 118, é visto de forma extensiva, de modo a abranger, também, o usufrutuário a quem tenha sido atribuído o direito a voto quando da constituição do usufruto.

Frise-se que, pelo princípio da funcionalidade, somente as ações expressa-mente mencionadas encontrar-se-ão vinculadas ao acordo (i.e., esclareça-se que, em inúmeros casos, os acordos de acionistas contemplam previsão de que seus efeitos serão extensivos e igualmente aplicáveis às ações das quais os signatários vierem a se tornar titulares após a assinatura do contrato).

120 CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 32.

120 CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 32.

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Outra característica importante dos acordos de acionistas diz respeito à sua oponibilidade erga omnes e à sua observação e cumprimento pela compa-nhia. Para tanto, na forma do art. 118, caput e §1º da LSA, deve-se cumprir dois requisitos, respectivamente: (i) arquivar o acordo na sede da companhia (art. 118, caput, LSA); e (ii) averbar o livro de ações (art. 118, §1º, LSA).

Ainda nesse sentido, o art. 118, §4º, LSA estabelece que “as ações averba-das nos termos deste artigo não poderão ser negociadas em bolsa ou no mercado de balcão”, de tal forma que as ações de companhias abertas que estejam efetivamente circulando no mercado de capitais não estejam vinculadas a acordos de acionistas, cujas regras, termos e condições não estarão sujeitas ao conhecimento dos potenciais investidores de mercado.

Também é válida a constituição de mandatário para representação dos acionistas signatários dos acordos nas Assembleias Gerais, para proferir votos nos termos do acordo de acionistas (art. 118, §7º, da LSA). Em relação ao prazo de vigência, conforme estipulou o artigo 118, §6º, da LSA, os acordos podem ter prazos indeterminados ou determinados em função de termos ou condições resolutivas. O referido dispositivo veda a denúncia unilateral do acordo de acionista sempre que o prazo for fixado em função do termo, ou de condição resolutiva, reforçando o argumento de que é possível a renúncia unilateral sempre que o acordo for por prazo indeterminado121.

Quanto à forma do acordo de acionistas, a lei não determina nenhuma especificidade, apenas aponta a necessidade da forma escrita para que seja devidamente arquivada na sede da companhia e averbada no livro de registro e certificados de ações e, mesmo assim, tal determinação é feito no sentido de evitar que tal contrato produza efeitos apenas entre os seus signatários.

Em relação ao exercício do direito de voto, a LSA requer que o voto mani-feste a vontade do acionista e não de terceiros. Neste sentido não é válida a ven-da, a cessão ou transferência de votos a terceiros e, a depender da forma e das características como tal negociação do voto vier a ser realizada, a mesma poderá caracterizar inclusive uma conduta delituosa tipificada no Código Penal122.

Como vimos acima, é vedada a manifestação de voto de modo que, no futuro, este voto venha a ser determinado por outro acionista, pela admi-nistração da companhia ou por terceiro. Deve-se ressaltar a possibilidade do acionista pactuar em linha com seus direitos individuais. Contudo, deve-se lembrar que não é permitida a violação do dever legal do acionista em votar em acordo com os interesses da companhia, por ser, os interesses desta, o que deve ser perseguido em último grau (cf. artigo 115 da LSA).

121 MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. Revista e atualizada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2010.122 O artigo 177 do Código Penal prevê expressamente condutas lesivas que podem vir a ser caracterizadas como criminosas e, inclusive, contempla no §2º, previsão de que: “incorre na pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, o acionista que, a fim de obter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembleia geral”.

121 MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. Revista e atuali-zada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2010.

122 O artigo 177 do Código Penal prevê expressamente condutas lesivas que podem vir a ser caracterizadas como criminosas e, inclusive, contempla no §2º, previsão de que: “incorre na pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, o acionista que, a fim de ob-ter vantagem para si ou para outrem, negocia o voto nas deliberações de assembleia geral”.

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Por fim, destaca-se que o direito de voto e do poder de controle são re-gulados pela LSA e, portanto, os acionistas somente podem validamente se obrigar com relação a esse exercício se observados as normas legais, ou seja, não podem dispor sobre questões contra legem.

O art. 118, § 3º, da LSA, prevê expressamente a possibilidade de os acio-nistas promoverem a execução específica das obrigações constantes de acordo de acionistas. Em outras palavras, a parte prejudicada pelo descumprimento do acordo poderá postular sentença judicial com os mesmos efeitos constantes do cumprimento integral ao acordo, por exemplo, o cômputo ou a abstenção de determinado voto. Trata-se de tutela significativamente mais efetiva do que a recomposição patrimonial, sobretudo nos casos de “acordo de voto”.

A previsão legal afigura-se louvável, pois o mero ressarcimento em perdas e danos da parte prejudicada, na maioria das vezes, não se mostra suficiente para sanar os danos causados por inadimplementos a acordos de acionistas.

O objeto do acordo de acionistas deve estar adstrito à previsão no art. 118 LSA, de tal modo que se refira aos direitos conferidos pela propriedade de determinada ação.

Usualmente, sob a perspectiva acadêmica, os acordos de acionistas são classificados em 3 (três) classes específicas, quais sejam:

(i) Acordos de Voto (i.e., exercício de direitos políticos);

(ii) Acordos de Controle (i.e., coordenação de acionistas que, em conjunto e mediante a formalização do acordo de acionistas, assumem a condição de controladores da companhia; e

(iii) Acordos de Bloqueio (que também são usualmente referidos como Acordo sobre Restrição à Circulação de Ações).

Sob o ponto de vista prático, o que se observa é que usualmente os acor-dos de acionistas combinam elementos e características de cada uma destas espécies, sendo esta divisão importante para a compreensão do tema, porém pouco relevante na aplicação efetiva dos acordos de acionistas.

3.1. acordo de voto.

O acordo de voto é a obrigação que assume o acionista perante um ou mais acionistas da companhia sobre seu direito de voto. A obrigação estipu-lada tem natureza de facere: o voto deve ser proferido estritamente em conso-nância com o previsto no acordo.

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O mais usual dentro de um acordo de voto formado por acionistas mino-ritários é a formação de um bloco. Por serem muitas as partes, o objetivo do bloco é uma união entre os acionistas para que se tenha uma atuação con-junta dentro da sociedade (no direito norte-americano: pooling agreements).

Há algumas cláusulas que são características dos chamados Acordos de Voto, como, por exemplo, previsão de “Reunião Prévia”; “Quorum Qualifi-cado” e/ou “Direito de Veto”.

3.2. reunião Prévia.

Os acordos de acionistas que contemplam cláusula de reunião prévia, usu-almente, preveem que antes da realização de Assembleia Geral e/ou Reunião do Conselho de Administração da companhia (i.e., antes de qualquer de-liberação societária colegiada), os acionistas signatários do acordo deverão realizar Reunião Prévia, a fim de determinar o conteúdo e a forma do voto a ser proferido e exercido, em bloco e de forma consistente, pelos mesmos em Assembleia Geral e/ou pelos membros do Conselho de Administração, que tenham sido indicados por eles, em Reunião do Conselho de Administração.

Há inúmeras variações possíveis em tal cláusula, que, inclusive, pode pre-ver que a coordenação prévia do voto só é necessária em relação a matérias específicas (e não em toda e qualquer Assembleia Geral e/ou Reunião do Conselho de Administração).

Os administradores eleitos pelos acionistas pertencentes ao acordo estarão vinculados às deliberações das Reuniões Prévias.123-124

Como exemplo prático, a Cláusula de Reunião Prévia é usualmente refle-tida da seguinte maneira em acordos de acionistas:

“Os Acionistas reconhecem e concordam, em caráter irrevogável e irre-tratável, que as deliberações tomadas em Reuniões Prévias vincularão a todos os Acionistas, ainda que tais Acionistas (a) tenham sido dissidentes em relação à deliberação tomada em Reunião Prévia; (b) tenham se ausentado da respectiva Reunião Prévia; ou (c) tenham se abstido em relação à deliberação tomada.

As deliberações tomadas nas Reuniões Prévias constituirão acordos de voto e vincularão o voto de todos os Acionistas na respectiva assembleia geral e membros do conselho de administração eleitos com base neste

123 Interessante destacar que, em regra, antes das reuniões do conselho de administração da companhia, os conselheiros eleitos pelos acionistas pertencentes ao acordo de acionistas deliberam acerca da ordem do dia em reuniões prévias, de forma a tomar decisões de modo uniforme.124 Como bem ressaltou Modesto Carvalhosa, a vinculação não poderá abarcar matérias da administração ordinária, já que, neste caso prevalece o “poder-dever de independência dos administradores”. CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011.

123 Interessante destacar que, em re-gra, antes das reuniões do conselho de administração da companhia, os conselheiros eleitos pelos acionistas pertencentes ao acordo de acionistas deliberam acerca da ordem do dia em reuniões prévias, de forma a tomar de-cisões de modo uniforme.

124 Como bem ressaltou Modesto Carva-lhosa, a vinculação não poderá abarcar matérias da administração ordinária, já que, neste caso prevalece o “poder-de-ver de independência dos administra-dores”. CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011.

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Acordo na respectiva reunião do conselho de administração, devendo ser rigorosamente observadas pela Companhia, sendo certo que:

(a) os votos exercidos em assembleia geral ou reunião do conselho de administração em descumprimento à instrução de voto havida em Reunião Prévia serão considerados nulos de pleno direito e não poderão ser computados pelo Presidente da assembleia geral ou do conselho de administração; e

(b) a instrução de voto estabelecida em Reunião Prévia funcionará como mandato legal e autorizará os Acionistas a exercerem o direi-to de voto das ações pertencentes ao outro Acionista na assembleia geral, na hipótese deste último se ausentar ou se omitir na assem-bleia geral, sendo esse mesmo procedimento aplicável aos conselhei-ros de administração eleitos na forma prevista neste Acordo.”

3.3. quorum qualificado

Outra cláusula bastante comum em Acordos de Voto é a cláusula que estabelece um quórum qualificado (i.e., superior ao previsto em lei) para a aprovação de determinadas matérias a serem submetidas à Assembleia Geral e/ou à Reunião do Conselho de Administração.

Por meio destas cláusulas, os acionistas pactuantes determinam que certas matérias relevantes, somente poderão ser aprovadas se acionistas represen-tando participação acionária superior a determinado quórum de deliberação houverem sido favoráveis à aprovação das mesmas.

O ideal seria que todos os acionistas fossem signatários. Nas companhias abertas esse quórum não pode ser superior ao determinado em lei, já nas fechadas, o quórum pode ser alterado. Como em nenhum dos dois casos o quórum pode ser menor do que o estipulado em lei porque um acordo pri-vado não pode se opor a uma norma pública, conclui-se que essa cláusula só pode existir nas companhias fechadas.

Como exemplo, pode-se conceber a seguinte hipótese de cláusula de Quó-rum Qualificado sendo refletida nos acordos de acionistas:

“As deliberações em assembleias gerais da Companhia seguirão as regras de quórum de deliberação previstas na Lei nº 6.404/76, bem como as normas estabelecidas no Estatuto Social e neste Acordo.

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Todas as matérias serão deliberadas por maioria de votos dos acionistas presentes, não sendo computados os votos em branco, exceto as matérias sujeitas a quorum qualificado por força de lei ou do Estatuto Social.

As matérias a discriminadas nos itens [XPTO] serão necessariamente submetidas à aprovação da assembleia geral e/ou das reuniões de con-selho de administração da Companhia e/ou das Controladas, confor-me o caso, e somente serão aprovadas nas Reuniões Prévias mediante o voto afirmativo de acionistas representando x% do capital social da companhia.”

3.4. direito de veto.

As cláusulas de Direito de Veto são bastante semelhantes àquelas de quó-rum qualificado, mas possuem características e sistemática de funcionamento diferente das cláusulas de quórum qualificado.

Em vez de estipularem que determinada matéria a ser submetida à delibe-ração em Assembleia Geral e/ou em Reunião do Conselho de Administração somente reputar-se-ão aprovadas se contarem os votos favoráveis de acionis-tas representando participação acionária superior a quórum X de deliberação houverem sido favoráveis à aprovação das mesmas, tais cláusulas de Direito de Veto usualmente preveem que, em relação a tais matérias, determinado acionista em específico e/ou acionistas que venham a ser titulares de parti-cipação acionária superior a X percentual julgado relevante, poderão vetar e impedir que tal matéria seja julgada/apresentada. Trata-se de atribuição de um direito negativo (o poder de vetar e proibir!).

“Enquanto a [ACIONISTA XPTO] detiver ao menos [15%] do ca-pital social da Sociedade, a ARGO terá direito de veto em relação à aprovação das seguintes matérias a serem submetidas à deliberação em Assembleia Geral:

[LISTAR MATÉRIAS]

Para exercer o direito de veto em qualquer das matérias listadas aci-ma, a [ACIONISTA XPTO] deverá comparecer à respectiva Assem-bleia Geral, que venha a deliberar sobre tal matéria e, de modo fun-damentado, rejeitar a matéria, expondo as razões pelas quais entende que a mesma deverá ser revisada e novamente submetida à deliberação da Assembleia Geral.”

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3.5. acordos de Controle.

Os Acordos de Controles são aqueles que tem por objetivo principal esta-bilizar o exercício do poder de controle em relação à companhia. A lei permi-te que o poder de controle da sociedade esteja expresso em único patrimônio ou pulverizado em diversos, porém unificado através de acordo de acionistas (art. 116 da LSA).

O acordo de controle é necessariamente um acordo de voto. Contudo, a isto não se resume, pois, o acionista, além de regular seu voto na assembleia geral, pode também dispor sobre o funcionamento dos órgãos da administra-ção da companhia. Sobre esse tema, Modesto Carvalhosa assim dispõe:

“Temos assim que o acordo de controle, na conformidade do caput e dos parágrafos do art. 118, tem por objeto o exercício do poder-dever de controle, que é exercido, primeiro nos órgãos da administração da com-panhia para, depois, exprimir-se na assembleia geral. Em consequência, estão vinculados ao acordo, no que respeita a seus votos sobre matérias relevantes e extraordinárias, os membros do conselho de administração eleitos pela comunhão dos controladores e também os diretores, em reu-nião regular da diretoria (art. 143, §2º, da Lei nº 6.404, de 1976).” 125

Em regra, o acordo de voto, como se disse, é ajustado em reunião pré-via à assembleia. Contudo, se eventualmente algum acionista vinculado ao acordo, devidamente arquivado, ou administrador da companhia, eleito pelo bloco de controle, não votar em conformidade com a comunhão dos contro-ladores, o presidente do conselho de administração (ou o diretor presidente, caso não haja conselho de administração) deverá desconsiderar o voto profe-rido (art. 118, §9º, da LSA).

3.6. acordos sobre restrições à Circulação de ações.

Acordos sobre restrições à circulação de ações, ou acordos de bloqueio, nada mais são do que os direitos e obrigações contratados pelas partes relati-vos à compra e venda, ao direito de preferência ou criação de ônus reais sobre as ações da sociedade.

Antes de analisarmos mais profundamente as características dessa terceira classe de acordos, é necessário ter em mente que tanto o termo compra e ven-da quanto o direito de preferência devem ser interpretados de forma extensiva.

125 CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 214.

125 CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 214.

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Desta forma, inclui-se no termo compra e venda qualquer ato regular que implique na transferência de propriedade das ações ou de títulos con-versíveis em ações, seja ela de forma onerosa ou não. Na mesma linha segue o termo direito de preferência, que inclui a perempção, a opção e o prévio consentimento subjetivo (cláusula de aceitação pessoal).

Em regra, os acordos de bloqueio são celebrados para assegurar o ca-ráter pessoal dos acionistas, seja por questões econômicas, familiares ou para resolver impasses caso uma das partes pretenda se desfazer da sua participação acionária. Todavia, as cláusulas previstas no acordo devem observar alguns princípios, de forma a não violar direitos fundamentais de quaisquer acionistas.

Neste sentido, por exemplo, o acordo de bloqueio que verse sobre a alie-nação de ações não poderá, em observância ao princípio da livre transmis-sibilidade das ações, vedar a venda de ações dos acionistas pactuantes. Pode, entretanto, exigir o prévio consentimento dos demais acionistas do acordo, sempre com a previsão de uma cláusula liberatória em caso de impasse.126

Os acordos sobre restrições à circulação de ações, muitas vezes, afigu-ram-se acessórios aos acordos de voto ou de controle.

De forma a tornar o presente estudo mais prático, analisaremos abaixo as principais cláusulas presentes em acordos de bloqueio.

3.7. restrição à transferência de ações (lock-up).

A cláusula de Lock-Up, quando prevista em acordos de acionistas, estabe-lece que os acionistas pactuantes estão impedidos de alienar e/ou de qualquer outra forma transferir as suas ações durante determinado período contratu-almente previsto.

Durante a vigência deste prazo, caso qualquer acionista deseje alienar suas ações deverá notificar os demais acionistas pactuantes. Caso os demais pactu-antes não desejem adquirir essas ações, o acionista vendedor estará proibido de alienar suas ações.

Importante ter em mente que quanto menor o período contratualmente previsto, maior é a sua força de enforcement. E o ideal é que este período esteja relacionado a alguma situação operacional da empresa.

126 Sobre o assunto, ver CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Homenagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 122, e MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. Revista e atualizada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2010. P. 420.

126 Sobre o assunto, ver CARVALHOSA, Modesto. Acordo de Acionista: Home-nagem a Celso Barbi Filho – São Paulo: Saraiva, 2011. P. 122, e MARTINS, Fran. Comentários à Lei das Sociedades Anôni-mas. Revista e atualizada por Roberto Papini. – 4ª Ed., ver. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2010. P. 420.

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Como exemplo, pode-se conceber a adoção da seguinte de cláusula de Lock-Up:

“Durante o prazo de [nº de meses / anos] contados desta data (“Perí-odo do Lock-Up”), nenhum Acionista (“Acionista Bloqueado”) pode-rá Alienar, sob qualquer forma, direta ou indiretamente, suas Ações, total e/ou parcialmente, entre si e/ou para quaisquer terceiros, sem a prévia e expressa concordância dos demais Acionistas Bloqueados, na forma desta Seção I (“Lock-Up”).

Para todos os fins e efeitos desta Seção I, se qualquer Acionista Blo-queado desejar Alienar suas Ações, total e/ou parcialmente, durante o Período de Lock-Up (“Acionista Bloqueado Ofertante”), este deverá notificar por escrito os demais Acionistas Bloqueados (“Acionistas Blo-queados Ofertados”).

Caso qualquer dos Acionistas Bloqueados Ofertados responda negati-vamente ou não responda a Notificação de Transferência no Período de Lock-Up, rejeitando assim a Alienação proposta pelo Acionista Bloque-ado Ofertante, este último estará expressamente proibido de promover a referida Alienação. Adicionalmente, ainda que os Acionistas Bloquea-dos aprovem a Alienação, esta não poderá ser realizada sem a observân-cia das disposições acerca do direito de preferência e de venda conjunta.”

3.8. direito de Preferência.

O direito de preferência previsto em acordos de acionistas não é o mesmo direito previsto no art. 109 da LSA e nos diversos dispositivos atinentes às regras sobre aumento de capital (i.e.,a LSA somente regula o direito de preferência para a subscrição de novas ações em aumentos de capital, que no regime anglo saxão é referido como preemptive right, mas não possui nenhuma estipulação em relação a eventual preferência em transferências de ações).

O direito de preferência cria uma dupla obrigação ao ofertante, quais sejam:

(i) de comunicar aos demais pactuantes a intenção de vender, em concorrência com terceiros; e

(ii) a de preferir o os demais convenentes como beneficiários.

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Portanto, o acionista vendedor obriga-se a oferecer as ações ofertadas antes aos signatários do acordo, nas mesmas condições do que foi oferecida a terceiros.

O direito de preferência é gênero, que contempla a existência de 02 (duas) espécies distintas, quais sejam:

(i) o Direito de Primeira Recusa (Right of First Refusal), que é o direito de preferência clássico em circulações de ações, onde o beneficiário tem preferência para a compra de ações, tendo somente que oferecer um preço igual a maior oferta recebida pelo titular. Esse tipo de direito de preferência garante vanta-gem expressiva ao seu beneficiário, visto que poucos atores es-tarão dispostos a fazer ofertas sabendo que existe alguém que está apenas esperando para igualar o preço e fazer a compra. Dessa forma, as ações em questão ficam depreciadas, dimi-nuindo seu preço e custo para o beneficiário.

(ii) o Direito de Primeira Oferta (Right of First Offer), onde o be-neficiário adquire o direito de fazer a primeira oferta para o titular que desejar alienar suas ações. O titular pode aceitar ou recusar essa oferta, sendo livre para voltar a ela caso não encontre uma melhor.

Essas duas espécies de direito de preferência estão ligadas a um terceiro. Esse terceiro pode ser um acionista não signatário do acordo, um signatário do acordo ou até um não acionista.

3.9. direito de Primeira recusa (right of first refusal).

Consiste na obrigação de oferecer aos acionistas pactuantes as ações que foram alvo de uma oferta de compra por um terceiro. Neste caso, o acionista vendedor deve oferecer as ações ao demais acionistas membros do acordo, nos mesmos termos e condições da oferta do terceiro. Ou seja, os signatários dão o lance em momento posterior.

O Direito de Primeira Recusa prejudica a liquidez da companhia porque os signatários do acordo podem criar dificuldades para que ocorra a venda.

Em regra, a cláusula estipulando o direito de preferência apresenta a seguinte redação:

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“Os Acionistas terão direito de preferência nas Alienações de Ações re-alizadas por qualquer dos Acionistas, seja em relação às Alienações de Ações realizadas entre os próprios Acionistas ou naquelas realizadas en-tre Acionistas e eventuais terceiros (o “Direito de Preferência”).

Caso qualquer dos Acionistas deseje Alienar suas Ações e/ou direitos de subscrição, os demais Acionistas terão o Direito de Preferência para ad-quirir estas Ações ou direitos de subscrição ofertados, na mesma propor-ção de suas respectivas participações no capital social da Companhia (excluída, para fins e efeitos de determinação de tal participação societá-ria, as ações de propriedade do Acionista Ofertante), pelo mesmo preço e demais condições negociais.”

3.10. direito de Primeira oferta (the right of first offer).

Ocorre quando o acionista vendedor deseja alienar suas ações, sem que tenha sido proposta a aquisição delas por terceiros. Neste caso, o acionista alienante deve oferecer as ações aos acionistas pactuantes antes de terceiros.

“(…) a Transferring Shareholder must provide written notice (a “Firs-tOfferNotice”) to the Beneficiary of its intention to make a Permitted Transfer of its HoldCo shares to a Third Party, setting forth the number of HoldCo shares it proposes to Transfer as part of the proposed Permit-ted Transfer (the “ProposedShares”).

The Beneficiary shall have thirty (30) days (the “Offer Period”) in whi-ch to deliver an offer setting forth the cash price per share that the Bene-ficiary proposes to pay for all (but not less than) the Proposed Shares and any other material terms sought by the Beneficiary (the “Offer”). If the Beneficiary fails to deliver an Offer prior to the expiration of the Offer Period, the Beneficiary shall be deemed to have declined to exercise its rights under this Section with respect to the Proposed Shares.”

O Direito de Primeira Oferta não garante muito “affectio societatis” porque depois da oferta dos signatários, qualquer valor mais alto de terceiros já leva.

3.11. direito de venda Conjunta (tag along).

É o direito conferido aos acionistas signatários do acordo (ou somente a parte deles) de, caso um acionista signatário decida vender suas ações a terceiro, ter estendida a oferta, geralmente nas mesmas condições, às ações

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detidas pelos demais signatários. Desta forma, ao invés de, por exemplo, exercer o direito de preferência, os demais acionistas pactuantes exigem o direito de alienar suas ações em conjunto com a do acionista vendedor. De forma geral, a cláusula de tag along apresenta as seguintes características:

“Cada um dos Acionistas Ofertados terá a faculdade de, ao invés de exercer o Direito de Preferência que lhes é assegurado, exigir que o Acio-nista Ofertante aliene, juntamente com as Ações Ofertadas, as Ações de propriedade dos Acionistas Ofertados (as “Ações do Tag Along”), pelo mesmo preço por ação e nas mesmas condições constantes da Notificação de Oferta (“Direito de Venda Conjunta”).

O Acionista Ofertado que desejar exercer o seu Direito de Venda Con-junta deverá comunicar ao Acionista Ofertante, com cópia para os de-mais Acionistas, no mesmo prazo previsto para o exercício do Direito de Preferência.

Havendo o exercício do Direito de Venda Conjunta, a Alienação passa-rá a ter por objeto não apenas as Ações Ofertadas, mas também as Ações do Tag Along, sob pena de invalidade da operação, que não poderá ser realizada, devendo a administração da Companhia recusar-se a lançá--la nos livros societários correspondentes.”

3.12. direito de obrigar a venda em Conjunto (drag along).

Neste caso, o acionista que pretende vender suas ações, tem direito a obri-gar, “arrastar”, os demais acionistas signatários do acordo consigo, na venda, nas mesmas condições de oferta de suas ações. Geralmente, estipula-se um preço mínimo. Esta modalidade facilita a venda se o comprador condiciona a aquisição à totalidade das ações vinculadas ao acordo. Em termos gerais, a cláusula de drag along assim dispõe:

“Caso qualquer dos Acionistas obtenha de um terceiro interessado uma proposta firme, irrevogável e irretratável para adquirir a totalidade das Ações, por valor igual ou superior a R$ [•], este Acionista (“Acionista Proponente”) estará investido do direito de exigir que todos os demais Acionistas alienem, juntamente com o Acionista Proponente, a totali-dade das suas Ações, observado o disposto nesta Seção X (“Direito de Obrigar a Venda em Conjunto”), de modo a que o terceiro interessado possa adquirir a totalidade das Ações.”

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3.13. opção de Compra (Call option).

A Opção de Compra (call) é a prerrogativa de que o beneficiário de tal opção (i.e., o outorgado) possa, na forma estipulada no acordo e sujeito às eventuais condições previstas, comprar as ações daqueles demais acionistas (i.e., dos outorgantes), por preço determinado e/ou determinável, de acordo com as regras do acordo.

O outorgado (titular da opção de compra) pode exercê-la para obrigar que os demais acionistas (outorgantes) lhe vendam as ações que possuem, sendo que em tal hipótese os outorgantes estarão obrigados a fazê-lo.

3.14. opção de venda (Put option).

A Opção de Venda (put) é a prerrogativa de que o beneficiário de tal opção (i.e., o outorgado) possa, na forma estipulada no acordo e sujeito às condi-ções eventuais previstas, vender as ações que detém na companhia para os demais acionistas (i.e., para os outorgantes), com base em preço determinado e/ou determinável de acordo com as regras do acordo.

O outorgado (titular da opção de venda) pode exercê-la para obrigar que os demais acionistas (outorgantes) lhe comprem as ações, sendo que em tal hipótese os outorgantes estarão obrigados a fazê-lo.

Ou seja, é o contrário da Call Option, que dá o direito de compra a alguém, já que a Put Option dá o direito (mas não a obrigação) de vender um montante especificado de ações em um momento e por preço tam-bém determinado.

3.15. resolução de impasse mediante buy or sell (shotgun).

Os acordos de acionistas usualmente preveem regras tendentes a lidar com situações em que, durante a vigência do acordo, caso os acionistas es-tejam em discordâncias recorrentes em relação a questões que são essenciais ao relacionamento societário dos mesmos enquanto acionistas da compa-nhia, de tal maneira que seja instaurado impasse na companhia, há previsão de solução contratual tendente a evitar que tal situação se prolongue no tempo indefinidamente.

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Usualmente, a solução tradicional é a previsão da cláusula de shotgun (também referida como buy or sell), em que qualquer dos acionistas pode iniciar um procedimento para comprar e/ou vender a sua participação acionária para o outro, de acordo com preço definido pelo acionista que iniciar tal procedimento. Ou seja, um dos acionistas oferece suas ações à outro por um preço X e, se ele não desejar comprar, será obrigado a vender suas ações pelo mesmo preço X da oferta. Isso faz com que os acionistas pensem com cuidado sobre o preço que irão ofertar suas ações, obrigando-os a fazê-lo a preço justo, já que não sabem de antemão se o outro irá aceitar ou recusar.

O Shotgun é problemático quando há uma grande diferença financeira (capacidade econômica) entre as partes porque nesses casos essa cláusula acaba se tornando uma opção de compra.

“Section II – Deadlock Resolution (Shot Gun)

6.7. In case, by any means, the Shareholders or the Directors, as the case may be, are unable to reach a corporate decision on a Signifi-cant Matter submitted to Shareholders’ Meetings or Board Meetings, as the case may be, when exercising their voting rights with respect to the Company, this will be characterized as a deadlock between the Sha-reholders (“Deadlock”).

6.8. In case of a Deadlock, each Shareholder will designate a senior executive with corporate authority to resolve the Deadlock. The designa-ted executives will meet in person and attempt to resolve the Deadlock in good faith. If the designated executives are unable to resolve the De-adlock within thirty (30) days after their in-person meeting, then each Shareholder shall have the option, exercisable within thirty (30) days after the end of the foregoing 30-day period, to trigger the process to pur-chase all, and not less than all, of the Shares that the other Shareholder holds or to sell all and not less than all of its Shares (“Buy-Sell Process”).

6.9. Either Shareholder (“Initiating Shareholder”) may deliver a notice to the other Shareholder (“Receiving Shareholder”) triggering the Buy-Sell Process (“Option Notice”), in which the Initiating Shareholder must communicate to the Receiving Shareholder the price per share, which shall necessarily be paid in cash and in a lump sum, for which it is willing to purchase all (and not less than all) of the Shares held by the Receiving Shareholder (“Receiver’s Holding”).

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6.9.1. Once an Option Notice is served by the Initiating Shareholder, the right of the Receiving Shareholder to initiate a Buy-Sell Process shall no longer be applicable in respect of the relevant Deadlock.

6.9.2. In accordance with the provisions of item 6.9.1 above, if both Shareholders issue an Option Notice, the Op-tion Notice that will trigger the Buy-Sell Process shall be the one received first as evidence by proof of receipt from the over-night courier. In any such case the other Option Notice shall be consider null and void.

6.10. The Receiving Shareholder shall have right to sell the Receiver’s Holding in accordance with the Option Notice or to purchase the Ini-tiating Party’s Shares on the same terms contained in the Option Notice and this Agreement.

6.11. The Receiving Shareholder shall have thirty (30) days from the date of receipt of the Option Notice to respond to the Initiating Shareholder, electing if it will buy the Initiating Shareholder’s Shares or sell the Receiver’s Holding, on the same terms and conditions contained in the Option Notice, and such election shall be binding upon the Sha-reholders. In any case, the sale of the Shares and payment of the purchase price shall be completed within sixty (60) days from the date of receipt of the Option Notice.

6.12. In the absence of such response from the Receiving Sharehol-der, the Receiving Shareholder shall be obliged to sell the Receiver’s Holding to the Initiating Shareholder in accordance with the Op-tion Notice.”

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4. Estrutura soCial dE um aCordo dE aCionistas

5. Caso GErador 1: friGorífiCos

Enredo do caso:

Los Pollos Hermanos Frigoríficos S.A. é uma sociedade anônima brasilei-ra, de capital fechado, que atua no ramo de frigoríficos (“Pollos Hermanos”). A atividade, de forma geral, é desenvolvida no Brasil através de pequenas empresas familiares, que mantêm produção de frangos em pequena escala. Quando de qualidade, seus produtos ganham pequenos nichos de mercado nas cidades vizinhas.

A Pollos Hermanos tem, nos últimos anos, adquirido diversas outras so-ciedades de frigoríficos, seja por meio de incorporações, fusões, aquisições e demais formas de combinação de negócios.

Heisenberg Frigoríficos Ltda. é uma sociedade limitada familiar que explora a produção de frangos há décadas (“Heisenberg”). Atualmente, a sociedade enfrenta dois grandes desafios: (a) apesar do grande crescimento e reconhecimento no mercado local da qualidade de seus produtos, a socie-dade está crescendo para além da expertise dos sócios, e (b) o maquinário e infraestrutura para otimizar a produção é de alto custo.

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Recentemente, Heisenberg e Pollos Hermanos iniciaram tratativas para combinação de negócios. Os principais pontos de negociação são:

1. Os sócios de Heisenberg desejam permanecer atuantes e com poder decisório sobre a criação de frangos que desenvolveram, tendo em vista, entre outros, a sua criação e consolidação de cunho familiar;

2. A Pollos Hermanos, apesar de aceitar conferir certo poder deci-sórios aos sócios da Heisenberg, deseja ter poder gerencial sobre as demais criações de frango que já possui, e sobre a criação da Heisenberg.

3. As partes acordaram, inicialmente, que a operação seria realizada mediante (a) a transformação da Heisenberg de sociedade limi-tada em sociedade anônima e (b) a incorporação de ações da Hei-senberg pela Pollos Hermanos.

Com a incorporação de ações, os sócios da Heisenberg passariam a deter 30% do capital social total e votante da Pollos Hermanos, e os atuais sócios da Pollos Hermanos passariam a deter ações representativas de 70% do ca-pital social total e votante da Pollos Hermanos.

Diante do exposto, a Pollos Hermanos lhe procura para, na qualidade de seu advogado:

a. Enunciar quais os atos societários necessários à operação; e

b. Elaborar Acordo de Acionistas e apontar, de forma justificada, as principais cláusulas que deverão ser elaboradas.

Premissas do caso:

a. Há acionista controlador?

b. Como é o relacionamento entre os acionistas?

c. Há concessão de prerrogativas aos minoritários pelo acionista con-trolador?

d. De que forma seria possível harmonizar os interesses em Assem-bleia Geral?

e. Como seria o Conselho de Administração da Companhia?

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questões envolvendo o caso (cláusulas para um acordo de acionistas):

a. Quais seriam as principais cláusulas a serem inseridas no Acordo e por quê?

b. Tag-Along?

c. Drag-Along?

d. Direito de veto?

e. Indicações dos membros do Conselho de Administração?

f. Quais outras seriam úteis ou convenientes?

6. Caso GErador 2: lannistark

A Lannistark Armas S.A., sociedade anônima de capital fechado que ex-plora a indústria de armamentos bélicos (“Companhia”), conta com apenas 2 acionistas: Stark e Lannister. Cada um detém 50% do capital social total e votante da Companhia.

Stark é conhecido no mercado pela qualidade de seus serviços, pela sua ótima reputação, prestígio e respeitabilidade. Desta forma, promove a Com-panhia na conquista de novos clientes, consegue melhores preços dos forne-cedores e atribui valor à marca da Companhia.

De outro lado, a Lannister always pays his debts! Com grande número de recursos, Lannister tem plena capacidade de capitalizar e injetar recursos necessários à Companhia, seja para aumentar a produção, investir na distri-buição dos produtos ou diversificar investimentos.

Os Lannister e os Stark o procuram para celebrar Acordo de Acionistas da Companhia, a fim de disciplinar sua interação na qualidade de seus acionistas.

Considerando que:

a. Não há acionista controlador nem acionista minoritário na Com-panhia;

b. Os acionistas têm conflitos de forma recorrente; e

c. Nenhum dos acionistas tem interesse de, em um primeiro momen-to, alienar sua participação na Companhia;

Elabore o Acordo de Acionistas, apontando suas principais cláusulas e explicando qual a utilidade de cada uma delas para ambos.

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AulA 12: socIEdAdEs colIGAdAs, controlAdAs E controlAdorAs. rEsponsAbIlIdAdE. Grupos dE socIEdAdEs. subsIdIárIA IntEGrAl.

lEitura básiCa:

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2003. Pp. 267-278.

1. ConCEitos E noçõEs GErais.

O movimento de concentração do capital já era observado na segunda metade do século XIX, na forma de trustes e cartéis. Entretanto, é apenas a partir da II Guerra Mundial, com a economia capitalista moderna, que ob-servamos a concentração empresarial e a formação dos grupos econômicos, movidos pela racionalização da produção, ou seja, aumento da produtividade e redução dos custos.

Com o mundo em acelerada transformação e progresso e multinacionais

com receitas superiores a orçamentos de vários Estados, é natural que tam-bém tenha havido, ao longo do tempo, mudanças na estrutura das sociedades anônimas de modo a se adequarem às novas necessidades.

Um dos fenômenos societários de maior relevância para o desenvolvimen-

to econômico e para o incremento da qualidade da administração societária é a coligação entre companhias, isto é, a agregação de empresas em torno de um ou vários objetos sociais.

De acordo com Fábio Konder Comparato:

“[...]os grupos econômicos foram criados exatamente para racionalizar a exploração empresarial, harmonizando e mesmo unificando as ativi-dades das várias empresas que os compõem. É graças a essa racionaliza-ção administrativa que o lucro marginal é elevado, com baixa do custo unitário de produção. Eles propiciam a criação de ‘economias internas de escala’, já assinaladas pelos economistas desde fins do século XIX. Todos os sistemas econômicos, qualquer que seja o regime político que os acompanha, tendem a esse mesmo objetivo de agrupamento e coor-denação empresarial. A empresa isolada é, atualmente, uma realidade condenada, em todos os setores, máxime naqueles em que o progresso está intimamente ligado à pesquisa tecnológica”127

127 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. Pp.355-356.

127 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. Pp.355-356.

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As holdings são sociedades — que podem se constituir sob a forma de qualquer dos tipos societários existentes — as quais possuem, como ativida-de principal, a participação acionária majoritária em uma ou mais empresas. Podem ser também conceituadas como holdings as sociedades que possuem a maioria das ações de emissão de outras sociedades e que detêm o controle de sua administração e políticas empresariais.

A respeito do tema, José Edwaldo Tavares Borba:

“Existem sociedades que não têm nenhuma outra atividade que não seja a de controlar sociedades, sendo por isso chamadas holdings puras. Ou-tras, além das atividades de controle, desenvolvem operações de natureza diversa (comerciais, industriais, financeiras), recebendo a designação de holdings mistas ou operativas.”

2. GruPo dE soCiEdadEs: GruPo dE fato E dirEito.

As sociedades mudam, seguindo a tendência da evolução do capitalis-mo global. Cada vez mais, observa-se uma aglomeração societária, for-ma de organização que retrata o desafio da atual conjuntura: aumentar a produtividade e lucratividade ao mesmo tempo em que os riscos e custos devem ser reduzidos.

Tal evolução faz surgir sociedades cada vez maiores, verticalizadas e mais complexas, com uma crescente separação entre propriedade e gestão. No mercado, identificam-se incentivos para se fazer concentração empresarial por meio de crescimento orgânico ou aquisições fortalecendo e engrande-cendo companhias. Assim, a formação dos grupos de sociedade é sempre associada a ganho de competitividade e aumento da dimensão dos negócios.

Nestes grupos, as sociedades seguem relação de subordinação ou coorde-

nação, podendo ser, respectivamente, do tipo controlada ou coligada, confor-me visto acima. A este respeito, pondera Bulhões Pedreira:

“A vinculação de duas ou mais sociedades por relações de participação dá origem a uma estrutura de sociedades, e quando essa estrutura é hie-rarquizada (ou seja, uma sociedade tem o poder de controlar as outras), é designada ‘grupo de sociedades’, que pode ser ‘de fato’ (baseado ape-nas nas relações de participação societária e de controle) ou ‘de direito’ (se, além disso, é regulado por uma convenção de grupo acordada entre sociedades)”128

128 PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Acordo de Acionistas Sobre Controle de Grupo de Sociedades. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, 15/226, São Paulo, 2002. Apud WALD, Arnold. Caracterização do Grupo Econômico de Fato e Suas Consequências Quanto à Remuneração dos Dirigentes de Suas Diversas Sociedades Componentes. Revista do Direito Bancário e do Mercado de Capitais, nº 25, Ano 7, jul.-set. 1994, Revista dos Tribunais, P. 148.

128 PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Acor-do de Acionistas Sobre Controle de Gru-po de Sociedades. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, 15/226, São Paulo, 2002. Apud WALD, Arnold. Caracterização do Grupo Econômico de Fato e Suas Consequências Quanto à Remuneração dos Dirigentes de Suas Diversas Socie-dades Componentes. Revista do Direito Bancário e do Mercado de Capitais, nº 25, Ano 7, jul.-set. 1994, Revista dos Tribunais, P. 148.

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Por um lado, os grupos de coordenação se caracterizam pela unicidade de direção estabelecida pelas partes não havendo hierarquia entre elas. O obje-tivo comum é o somatório de capacitações e não o controle. Existe um grau mínimo de orientação comum das diversas sociedades em prol da consecução de um determinado objetivo.

Por outro lado, os grupos de subordinação seguem a lógica inversa sendo caracterizados pela figura do controlador que exerce poder de dominação e su-bordinação em relação às demais vinculadas. São mais propícios à formação de um processo decisório mais centralizado em razão do uso do poder de controle.

De forma resumida, as sociedades controladoras são aquelas que exercem efetivamente o poder de controle. As controladas são sobre quem se exerce o poder de controle. E as coligadas são sociedades em que há apenas uma influ-ência. A participação é significativa, mas não é forte o suficiente para possuir controle (art. 1099, CC e art. 243, §1º, LSA).

Os grupos de sociedades podem ser classificados em grupos de fato e gru-

pos de direito. São grupos de fato as sociedades que mantêm entre si parti-cipação acionária recíproca, sem que haja a necessidade de se organizarem juridicamente. Há “de fato” uma relação de subordinação/coordenação entre as empresas, mas não há nenhuma convenção assinada entre elas.

De acordo com Rubens Requião, estes grupos “relacionam-se segundo o regime legal de sociedades isoladas, sob forma de coligadas, controlado-ras e controladas, no sentido de não terem necessidade de maior estrutura organizacional”

Já os grupos de direito — regulados nos artigos 265129 e seguintes da LSA — requerem uma organização jurídica, determinada por meio de uma convenção celebrada entre a sociedade controladora e suas controladas, pela qual se obrigam a conjugar recursos e/ou esforços para a realização dos seus respectivos objetos sociais, ou para participação em atividades ou empreendimentos comuns.

A Convenção de Grupo é um contrato que regula entre as sociedades os fins almejados pela formação do grupo, os recursos que serão combinados, as atividades que serão empreendidas em comum, as relações entre as socie-dades, a estrutura administrativa do grupo, as condições de coordenação ou subordinação dos administradores das filiadas à administração geral, entre outros. A convenção estabelece ainda a designação do grupo que deve ser registrada na junta comercial.

129 Art. 265. A sociedade controladora e suas controladas podem constituir, nos termos deste Capítulo, grupo de sociedades, mediante convenção pela qual se obriguem a combinar recursos ou esforços para a realização dos respectivos objetos, ou a participar de atividades ou empreendimentos comuns.

129 Art. 265. A sociedade controladora e suas controladas podem constituir, nos termos deste Capítulo, grupo de socie-dades, mediante convenção pela qual se obriguem a combinar recursos ou es-forços para a realização dos respectivos objetos, ou a participar de atividades ou empreendimentos comuns.

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Destaque-se, por relevante, que a sociedade controladora do grupo, também denominada de sociedade de comando, deve ser brasileira e exer-cer, direta ou indiretamente e de modo permanente, o controle das socie-dades filiadas, como titular de direitos de sócio ou acionista, ou mediante acordo com outros sócios ou acionistas.

Entretanto, é da natureza do grupo de sociedades a independência das personalidades jurídicas de seus componentes, conservando assim patri-mônios distintos. O grupo não possui personalidade jurídica própria, sendo apenas uma relação interempresarial formalizada por contrato. Cada uma das sociedades agrupadas sob o comando de companhia bra-sileira conserva a sua personalidade, sendo muito importante a indepen-dência patrimonial das empresas.

A respeito do grupo de sociedade propriamente dito, assinala Nelson Eizirik:

“(...) somente no grupo de direito existe a possibilidade de uma ad-ministração centralizada de todo o grupo, o que retira a autonomia de gestão de cada um dos seus integrantes. Ademais, somente no grupo de direito existe a possibilidade de, uma vez previsto na con-venção, ter uma das companhias preteridos seus interesses em favor de outra integrante do mesmo grupo.”130

Ainda sobre o mesmo tema, oportunas são as palavras da Min. Nancy Andrighi no Recurso Especial nº 1.259.018 – SP julgado pela 3ª Turma do STJ em 09.08.2011:

“Entretanto, o próprio professor Fábio Ulhôa Coelho reconhece no parecer que, mesmo nos países de modelo contratual, seria possível identificar a coexistência de duas categorias: os grupos de fato e os grupos de direito. Para ele, “embora elejam certas formalidades cujo cumprimento é indispensável à configuração jurídica do grupo, eles [os países que adotam o modelo contratual] não podem ignorar a existência de sociedades que, de fato, estão articulando seus esforços na realização de seus respectivos objetivos sociais sem o atendimento daquelas” (fl. 2611, e-STJ). Um grupo de fato, assim, “seria aquele que atender às mesmas características de um grupo de direito, exceto as de ordem formal” (fl. 2613, e-STJ)”.

130 EIZIRIK, Nelson. Op. cit., p. 39.171

130 EIZIRIK, Nelson. Op. cit., p. 39.171

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3. subsidiária intEGral.

Como vimos nos tópicos anteriores, em regra, as sociedades anônimas constituem-se com, no mínimo, 02 (dois) acionistas. Admite-se, no entanto, a constituição, por escritura pública, de subsidiária integral que é uma socie-dade — anônima, por exigência legal — cujo capital pertence integralmente a outra sociedade.

Cumpre observar que a subsidiária integral se apresenta como a única situação, não patológica, em que se permite que a totalidade do capital social de uma sociedade pertença a um só acionista, o qual deverá ser necessaria-mente uma sociedade brasileira. Além da referida constituição originária por escritura pública, a subsidiária integral pode ser criada por meio da conversão de uma companhia mediante aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suas ações, ou nos termos do artigo 252 da LSA

4. jurisPrudênCia.

PROCESSO CIVIL. FALÊNCIA. EXTENSÃO DE EFEITOS. SOCIEDADES COLIGADAS. POSSIBILIDADE. AÇÃO AU-TÔNOMA. DESNECESSIDADE. DECISÃO INAUDITA AL-TERA PARTE. VIABILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.

1. Em situação na qual dois grupos econômicos, unidos em torno de um propósito comum, promovem uma cadeia de negócios formalmen-te lícitos mas com intuito substancial de desviar patrimônio de empresa em situação pré-falimentar, é necessário que o Poder Judiciário também inove sua atuação, no intuito de encontrar meios eficazes de reverter as manobras lesivas, punindo e responsabilizando os envolvidos.

2. É possível ao juízo antecipar a decisão de estender os efeitos de sociedade falida a empresas coligadas na hipótese em que, verifican-do claro conluio para prejudicar credores, há transferência de bens para desvio patrimonial. Inexiste nulidade no exercício diferido do direito de defesa nessas hipóteses.

3. A extensão da falência a sociedades coligadas pode ser feita inde-pendentemente da instauração de processo autônomo. A verificação da existência de coligação entre sociedades pode ser feita com base em elementos fáticos que demonstrem a efetiva influência de um grupo societário nas decisões do outro, independentemente de se constatar a existência de participação no capital social.

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4. Na hipótese de fraude para desvio de patrimônio de sociedade falida, em prejuízo da massa de credores, perpetrada mediante a uti-lização de complexas formas societárias, é possível utilizar a técnica da desconsideração da personalidade jurídica com nova roupagem, de modo a atingir o patrimônio de todos os envolvidos.5. Recurso especial não provido.131

[Trecho do Voto]: A caracterização de coligação de empresas, por sua vez, é, antes de mais nada, uma questão fática. Portanto, o que tiver decidido o Tribunal a esse respeito não pode ser revisto nesta sede por força do óbice da Súmula 7/STJ.

De todo modo, para além de seus contornos fático, a coligação con-substancia um conceito societário. A coligação se caracteriza, essen-cialmente, na influência que uma sociedade pode ter nas decisões de políticas financeiras ou operacionais da outra, sem controlá-la.

Antigamente, a Lei das S/A dispunha, em seu art. 243, §1º, acerca de um montante fixo de participação no capital para que fosse auto-maticamente caracterizada coligação entre empresas.

Dizia que “são coligadas as sociedades quando um participa, com 10% (dez por cento) ou mais, do capital da outra, sem controlá--la”. Esse percentual, contudo, era fixado para estabelecer, conso-ante a disposição contida no caput desse artigo, a obrigatoriedade de menção dos investimentos nessa sociedade no relatório anual da administração . Na prática, contudo, independentemente de um percentual fixo, o conceito de coligação está muito mais ligado a atitudes efetivas que caracterizem a influência de uma sociedade so-bre a outra. Há coligação, por exemplo, sempre que se verifica o exercício de influência por força de uma relação contratual ou legal, e em muitas situações até mesmo o controle societário é passível de ser exercitado sem que o controlador detenha a maioria do capital social. Basta pensar, nesse sentido, na hipótese de uma empresa com significativa emissão de ações preferenciais sem direito a voto.

No parecer subscrito pelo i. Prof. Fábio Ulhoa Coelho, juntado pela recorrente aos autos a e-STJ fls. 2.594 a 2.632, os grupos econômicos são tratados pela legislação interna dos diversos países que os reco-nhecem segundo dois amplos modelos: o modelo orgânico, segundo o qual o grupo é caracterizado mediante a análise de meras circuns-tâncias de fato que evidenciem a existência de direção econômica

131 No mesmo sentido: STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 1.266.666. RJ. Rel. Min. Nancy Andrighi. 3ª Turma. Julgamento em 09.08.2011. Unânime.

131 No mesmo sentido: STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 1.266.666. RJ. Rel. Min. Nancy Andrighi. 3ª Turma. Julgamento em 09.08.2011. Unânime.

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unitária para diversas sociedades formalmente autônomas; e o mo-delo contratual , segundo o qual, em vez disso, o grupo se formaria mediante um acordo expresso de vontades.

O Brasil teria adotado o modelo contratual para a caracterização de um grupo econômico, de modo que sua caracterização, nos termos do art. 265 e seguintes da LSA, submete-se à convenção celebrada para sua caracterização, cuja celebração é regulada pelo art. 269 da mesma lei. Assim, no Brasil a caracterização do grupo econômico seria jurídica , não meramente fática.

Entretanto, o próprio professor Fábio Ulhôa Coelho reconhece no parecer que, mesmo nos países de modelo contratual, seria possível identificar a coexistência de duas categorias: os grupos de fato e os grupos de direito. Para ele, “embora elejam certas for-malidades cujo cumprimento é indispensável à configuração jurídi-ca do grupo, eles [os países que adotam o modelo contratual] não podem ignorar a existência de sociedades que, de fato, estão articu-lando seus esforços na realização de seus respectivos objetivos sociais sem o atendimento daquelas” (fl. 2611, e-STJ). Um grupo de fato, assim, “seria aquele que atender às mesmas características de um grupo de direito, exceto as de ordem formal” (fl. 2613, e-STJ).

Os grupos, ainda segundo Fábio Ulhoa Coelho, também podem ser subdivididos em grupos de subordinação e de coordenação. Nos primeiros, de subordinação, a estrutura é piramidal, com uma so-ciedade exercendo o controle sobre as demais. Nos segundos, de coordenação, há apenas articulação de atividades e investimentos (fl. 2612, e-STJ). Mas a caracterização de grupo repousa na carac-terística essencial de combinação de esforços das sociedades para realização dos respectivos objetivos ou participação em atividades ou empreendimentos comuns (art. 265 da Lei das S/A).

Essa característica, que já estava presente na Lei das S/A desde antes das reformas implementadas mais recentemente, hoje se encontra prevista de maneira clara. Ao tratar de coligação de sociedades, a Lei modificou o critério anterior, de atribuição de montante fixo de participação no capital social. Com a modificação empreendi-da pela Lei 11.941/2009, o art. 243, §1º da Lei das S/A passou a simplesmente prever que “são coligadas as sociedades nas quais a investidora tenha influência significativa”. Tal influência, segundo o

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§5º desse artigo, incluído pela mesma Lei 11.941/2009 em con-sonância com a redação anteriormente dada pela MP 449/2008, é presumida “quando a investidora for titular de 20% (vinte por cen-to) ou mais do capital votante da investida, sem controlá-la”, mas a influência significativa, para além disso, caracteriza-se “quando a investidora detém ou exerce o poder nas decisões das políticas finan-ceira ou operacional da investida, sem controlá-la”STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 1.259.018 – SP. Rel. Min. Nancy Andrighi. 3ª Tur-ma. Julgamento em 09.08.2011. Unânime

* * *

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXE-CUÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊN-CIA. VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211⁄STJ. INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. AUSENTE. SÚMULA 284⁄STF. DISSÍDIO JU-RISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO E SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. DESCONSIDERAÇÃO INCIDENTAL DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA SOCIEDADE EXE-CUTADA. POSSIBILIDADE. REEXAME DE FATOS. IN-TERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INAD-MISSIBILIDADE.

1- Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração.

2- A interposição de recurso especial não é cabível quando ocorre violação de dispositivo constitucional ou de qualquer ato normativo que não se enquadre no conceito de lei federal, conforme disposto no art. 105, III, “a” da CF⁄88.

3- A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declara-ção, impede o conhecimento do recurso especial.

4- O recurso especial não pode ser provido quando a indicação ex-pressa do dispositivo legal violado está ausente.

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5- As conclusões do acórdão recorrido – quanto (i) ao cabimento da desconsideração da personalidade jurídica em razão da confusão patrimonial detectada; (ii) à admissibilidade da adoção dessa medi-da incidentalmente no processo de execução; e (iii) à possibilidade de se atingir o patrimônio de sociedades integrantes do mesmo grupo econômico quando evidenciado que sua estrutura é mera-mente formal – se coadunam com a jurisprudência consolidada deste Superior Tribunal.

6- O reconhecimento da formação de grupo econômico e a ve-rificação da presença dos pressupostos exigidos para desconsi-deração da personalidade jurídica decorreram de detida análise do acervo fático-probatório que integra os autos, circunstâncias que não podem ser reexaminadas em recurso especial. Incidên-cia dos óbices das Súmula 5 e 7 do STJ.

7- Recursos especiais não providos.

[Trecho do Voto]: Alterar as conclusões alcançadas pelo Tribunal de origem, conforme se percebe diante de tudo que foi exposto, de-pende de incursão no acervo fático-probatório constante dos autos, sobretudo de análise dos diversos contratos firmados entre as socie-dades empresárias devedoras, os quais serviram de substrato para o reconhecimento da ocorrência de confusão patrimonial e de seu propósito fraudulento.

Verifica-se, como consequência, que o exame da pretensão dos recor-rentes - no que se refere à presença ou não dos requisitos autorizado-res do deferimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, bem como acerca da formação de grupo econômico - exige o reexame de fatos, de provas e de cláusulas contratuais, o que é vedado em recurso especial por expressa previsão das Súmulas 5 e 7 do STJ. STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 1.326.201 – RJ. Rel. Min. Nancy Andrighi. 3ª Turma. Julgamento em 07.05.2013. Unânime.

* * *

EXECUÇÃO FISCAL – DÉBITOS PREVIDENCIÁRIOS – PENHORA DE BENS DE EMPRESA QUE NÃO FIGURAVA INICIALMENTE NO PÓLO PASSIVO – NECESSIDADE

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DE MANIFESTAÇÃO JUDICIAL A RESPEITO DA EXIS-TÊNCIA DE GRUPO ECONÔMICO – VIOLAÇÃO DO ART. 535, II DO CPC.

1 - O art. 30, IX da Lei n. 8.212⁄91 determina que a responsabili-dade do grupo econômico por débitos previdenciários é solidária, motivo pelo qual, no caso concreto, é de fundamental importância saber se as empresas do agravante fazem parte de um conglomera-do empresarial.

2 - O Tribunal de origem limitou-se a analisar a questão posta, apenas sob o enfoque da não-existência de confusão patrimonial. Silenciou-se, contudo, quanto à eventual configuração de grupo econômico formado pelas empresas do agravante, violando o art. 535, II do CPC.

3 - A fundamentação do acórdão, de que as empresas do agravante possuem personalidade jurídica distintas, em nada, nem implicita-mente, enfrentou a questão da existência, ou não-existência, de gru-po econômico entre elas, principalmente quando se sabe que uma das principais características do grupo é justamente a existência de entidades autônomas, com personalidades jurídicas distintas, sob o comando de uma única direção.

4 - Desta forma, a questão de se saber se as empresas do agravante constituem grupo econômico apresenta-se imprescindível para o deslinde da controvérsia, motivo pelo qual necessário se faz o retorno do autos ao Tribunal de origem para que seja suprida omissão sobre referido ponto.

Agravo regimental improvido. STJ. AgRg no RECURSO ESPE-CIAL Nº 1.097.173 – RS. Rel. Min. Humberto Martins. 2ª Turma. Julgamento em 23.04.2009. Unânime

***

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO RECORRIDO. INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL E TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.

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INEXISTÊNCIA. REVISÃO. SÚMULA N. 7 DO STJ. GRU-PO ECONÔMICO. COMANDO ÚNICO. EXISTÊNCIA DE FATO. SOLIDARIEDADE. ART. 124, INC. II, DO CTN C/C ART. 30, INC. IX, DA LEI N. 8.212/91. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL. ARTIGO 173, I, DO CTN. AJUDA DE CUSTO. DIÁRIAS. DESCARACTERIZA-ÇÃO. NATUREZA SALARIAL CONFIGURADA. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. COMPEN-SAÇÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 306 DO STJ.

1. Não havendo no acórdão omissão, contradição ou obscuridade capaz de ensejar acolhimento da medida integrativa, tal não é ser-vil para forçar a reforma do julgado nesta instância extraordinária. Com efeito, afigura-se despicienda, nos termos da jurisprudência deste Tribunal, a refutação da totalidade dos argumentos trazidos pela parte, com a citação explícita de todos os dispositivos infra-constitucionais que aquela entender pertinentes ao desate da lide.

2. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que não constitui cerceamento de defesa o indeferimento da produção de prova testemunhal e pericial quando o magistrado julgar suficiente-mente instruída a demanda, esbarrando no óbice da Súmula n. 7 do STJ a revisão do contexto fático-probatórios dos autos para aferir se o acervo probatório é ou não satisfatório. Precedentes.

3. O Tribunal de origem declarou que “é fato incontroverso nos au-tos que as três embargantes compartilham instalações, funcionários e veículos . Além disso, a fiscalização previdenciária relatou diversos negócios entre as empresas como empréstimos sem o pagamento de juros e cessão gratuita de bens, que denotam que elas fazem parte de um mesmo grupo econômico. O sócio-gerente da Simóveis, Sr. Écio Sebastião Back tem um procuração que o autoriza a praticar atos de gerência em relação às outras empresas , sendo irmão do sócio--gerente delas. Ou seja, no plano fático não há separação entre as empresas , o que comprova a existência de um grupo econômico e justifica o reconhecimento da solidariedade entre as executa-das/embargantes” (grifei).

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4. Incide a regra do art. 124, inc. II, do CTN c/c art. 30, inc. IX, da Lei n. 8.212/91, nos casos em que configurada, no plano fático, a existência de grupo econômico entre empresas formal-mente distintas mas que atuam sob comando único e compar-tilhando funcionários, justificando a responsabilidade solidária das recorrentes pelo pagamento das contribuições previdenciárias incidentes sobre a remuneração dos trabalhadores a serviço de to-das elas indistintamente.

5. “O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o cré-dito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efe-tuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito” (REsp 973733/SC, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 18.9.2009, submetido à siste-mática do art. 543-C do CPC e da Res. STJ n. 8/08).

6. A Corte a quo, soberana no delineamento das circunstâncias fá-ticas, observou que, apesar de denominadas como diárias e ajuda de custo, as verbas eram pagas de forma habitual, em valores fixos e expressivos, aos mesmos empregados e sem que fosse comprovada a execução dos serviços a que elas se destinavam ou a realização de viagens, “simplesmente para aumentar a sua remuneração”. Correta, pois, a conclusão pela natureza salarial para fins de incidência da contribuição previdenciária.

7. “Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte” (Súmula n. 306 do STJ).

8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não pro-vido. STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 1.144.884 – SC. Rel. Min. Mauro Campbell Marques. 2ª Turma. Julgamento em 07.12.2010

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182FGV DIREITO RIO

AulA 13: AlIEnAção E AquIsIção dE controlE.

lEitura básiCa:

GRAVA, J. William. Fusões e Aquisições: Motivadores Econômicos e Estraté-gicos. In: SADDI, Jairo (Org.). Fusões e Aquisições: Aspectos Jurídicos e Econômicos. São Paulo: IOB, 2002. Pp. 5-42.

rotEiro:

Nesse tópico, trataremos brevemente da relevância jurídica da aquisição do controle de sociedades, assim como analisaremos algumas das possíveis formas através das quais tal operação pode ser implementada.

Inicialmente, deve-se destacar a importância do fenômeno, tendo em vista que o adquirente do controle de determinada sociedade passa a deter o poder de eleger a maioria dos seus administradores e de dirigir as atividades sociais, orientando, assim, o funcionamento dos órgãos da sociedade. Assim, o novo titular do poder de controle passa a ter tanto os direitos quanto as obrigações inerentes ao controlador.

1. aquisição, transfErênCia E PErda do ControlE.

Adquirir, transferir ou perder o bloco de controle é adquirir, transferir ou perder a propriedade das ações, coisas singulares que formam o bloco de controle, enquanto universalidade de fato.

1.1. formas de aquisição e transferência do Poder de Controle.

Adquirir o poder de controle é obter, assumir ou passar a ter o poder de fato de controlar a companhia.

Sua verificação pressupõe a aquisição de um bloco de controle, mas os conceitos não se confundem: o acionista pode ser membro do bloco de controle sem tê-lo adquirido, apenas sendo proprietário de parte das ações que o compõem.

A aquisição do poder de controle pode ser originária ou derivada.

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É originária quando resulta da formação, no patrimônio do acionista con-trolador, de bloco de controle que não existia previamente, como universali-dade, no patrimônio daquela pessoa.

São exemplos de aquisições originárias do poder de controle:

(i) a compra, por um acionista que já detinha algumas ações de uma companhia, sem ter seu controle, de quantidade apta a, em conjunto com as que já possuía, formar um bloco de controle;

(ii) constituição de sociedade holding; e

(iii) formação mediante acordo de acionistas.

É derivado o modo de aquisição, por outro lado, quando uma pessoa já detinha o controle e apenas transfere a propriedade das ações componentes do bloco de controle. Nessas hipóteses, onde há (i) um bloco de controle, como universalidade, no patrimônio de pessoa(s), e (ii) um fato jurídico cujo efeito seja a transmissão da propriedade desse conjunto de ações, ocorre a transferência do poder de controle.

A distinção entre a aquisição originária e a derivada é relevante em diver-sos momentos da vida societária. Um deles, e que será explorado nos casos gerados desse tópico, é para saber se a Oferta Pública de Aquisição (OPA) de ações é obrigatória ou facultativa.

A Instrução 361 da CVM prevê 6 modalidades de ofertas públicas, sendo 3 obrigatórias e 3 facultativas. As obrigatórias são: (i) OPA para cancela-mento de registro, (ii) OPA para aumento de participação e (iii) OPA por alienação de controle. As facultativas são: (i) OPA voluntária, (ii) OPA para aquisição de controle de companhia aberta e (iii) OPA concorrente.

A distinção entre aquisição originária e derivada é relevante nesse caso porque a alienação de controle só terá OPA obrigatória se a aquisição for derivada. Se for originária, a OPA será facultativa. Como será observado nos casos geradores desse tópico, nem sempre a classificação da aquisição em ori-ginária ou derivada é simples.

1.2. Perda do poder de controle É modificação da situação de fato que pode ocorrer independentemente de

negócio jurídico de transmissão de ações. Exemplo: o acionista que controla

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a companhia com menos da metade das ações com direito de voto (sendo que as demais são titularizadas por diversos acionistas) e vê seu controle perdido em razão da união original de outros acionistas ou concentração de ações em um novo acionista.

2. ControlE intErno E ExtErno

O poder de controle é, portanto modalidade de poder próprio da estru-tura interna da companhia, que tem por fundamento os direitos de voto conferidos pelas ações.

A doutrina distingue em duas as formas de controle:

Controle Interno: O titular exerce o poder de controle e atua internamente a sociedade. Funda-se, na maioria das vezes, na proprie-dade acionária.

Controle Externo: Poder de dominação exercido externamente (ab extra), por pessoa que não componha qualquer órgão social. Casos Clássicos: credor relevante; dependência no su-primento de matéria-prima; dependência no escoamen-to da produção; dívida creditaria.

Segundo Fabio Konder Comparato:

“À primeira vista, o controle interno, isto é, aquele cujo titular atua no interior da própria sociedade, parece fundar-se, unicamente, na pro-priedade acionária. Sua legitimidade e intensidade dependeriam, em última análise, do número de ações ou votos de que se é titular, propor-cionalmente à totalidade dos sufrágios possíveis.”

De acordo com Orcesi da Costa:

“Em suma, o controle interno (natureza associativa) redunda no exer-cício de uma soberania, enquanto que o controle externo (natureza contratual) outorga ao credor o exercício de um poder naturalmente contratual ou às vezes legal de constrição, o que implica tão-somente na possibilidade de responsabilização do controlador externo, por da-nos causados à sociedade em geral, quando e se houver agido além de seus limites contratuais.”

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2.1. Controle interno (subdivisões). à Totalitário:

Caracterizado pela concentração da totalidade das ações com direito de voto na propriedade de uma única pessoa. Ex: Subsidiária Integral (artigo 251 da LSA).

à Majoritário:

Caracterizado pelo controle exercido por quem é titular de mais da metade das ações com direito de voto. Pode ser isolado ou em conjunto (joint control):

(a) Isolado: Acionista detém mais de 50% das ações votantes.

(b) Conjunto: Acionistas se unem para exercer o controle conjun-tamente, através de diversas técnicas. Uma das técnicas mais usuais é o Acordo de Acionistas (Exemplo: 3 acionistas juntos, cada um com 20% do capital votante. Unindo-se suas par-ticipações acionárias alcançam a maioria do capital votante podendo exercer o controle da companhia).

Também pode ser simples ou absoluto:

(a) Simples: Decisões que exigem quorum de maioria simples (artigo 129 LSA) (mais de 50% das ações votantes presen-tes na Assembleia Geral).

(b) Absoluto: Decisões que exigem quorum de maioria qua-lificada (artigo 136 LSA) (mais de 50% do capital social votante).

à Minoritário (working control ou minority control):

O acionista/conjunto de acionistas que possuem menos da metade do capital votante, mas dirigem os negócios sociais e elegem a maioria dos administradores. Este fenômeno ocorre nas grandes companhias, com alto grau de dispersão de ações e decorre do “absenteísmo” nas Assem-bleias Gerais.

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186FGV DIREITO RIO

à Gerencial (management control):

Também em decorrência do alto grau de dispersão acionária somado ao absenteísmo nas assembleias possibilitam o controle gerencial da companhia. Nessas condições, os próprios administradores assumem o controle da com-panhia e perpetuam-se nos seus respectivos cargos. É característico de em-presas norte-americanas, nas quais ocorre o fenômeno da “proxy machinery” (maquinismo das procurações).

à Mediante Expediente Legal (through a legal device):

Poder de dominação exercido através de algum artifício legal. Problema: altamente discutido e criticado no ambiente doutrinário. Exemplos citados por Berle Means: controle piramidal; ações sem direito de voto; ações com número de votos limitados; e voting trust).

2.2. técnicas de organização do Controle interno

à Institucional:

Criação de organismo, personalizado ou não, com o objetivo de consoli-dar a titularidade do poder soberano na sociedade e disciplinar-lhe o exercí-cio. Exemplos citados por F.K. Comparato:

(a) comunhão acionária;

(b) voting trust; e

(c) sociedade holding.

à Estatutário:

Disposições estatutárias para assegurar estabilização do exercício do con-trole. Exemplos citados por F.K.Comparato:

(a) cláusulas restritivas à circulação de ações;

(b) limitações de votos das ações;

(c) voto censitário e dispensa de comparecimento em assembleias; e

(d) privilégios de eleição de administradores e fiscais.

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àContratual: decorre de contratos, de pactos parassociais, com eficácia limitada às partes que o celebram (ex: Acordo de Acionistas).

2.3. Controle direto e indireto.

à Controle direto:

Modalidade de poder própria da estrutura interna da sociedade. Art. 116, LSA.

à Controle indireto:

Art. 243, § 2º, LSA. Hipótese do grupo de sociedades.

3. valor do ControlE.

O bloco de controle, por ter a vantagem intrínseca do poder de dirigir a companhia, tem valor em regra maior do que a mera soma das ações que lhe compõem. Isso porque o controle constitui, para o investidor, fator de segurança do seu investimento. Ele está disposto a pagar um valor maior pelo bloco de controle do que pelas ações singularmente consideradas porque assim adquire a capacidade de influir decisivamente – mediante determinação das deliberações sociais e escolha dos administradores – no seu investimento, ao invés de esperar que terceiros o façam.

Não é apenas, portanto, a soma do valor das ações, como coisas sin-gulares. No entanto, esse valor somente pode ser quantificado mediante alienação, no mercado, do bloco de controle.

Corresponde, por definição, à diferença entre o valor econômico das ações que o compõem e o preço que o mercado se dispõe a pagar pelo bloco de controle.

4. ExErCíCio do PodEr dE ControlE.

Pode revestir-se de formas diversas, ainda que não excludentes, como por exemplo:

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188FGV DIREITO RIO

(a) nas matérias de competência privativa da assembleia geral ou submetidas à sua deliberação à voto;

(b) acionista controlador é também administrador à atos de administração;

(c) ordens aos órgãos de administração ou fiscalização.

5. o aCionista Controlador administrador.

O art. 116 da Lei 6.404/1976 estabelece como requisitos para a carac-terização do poder de controle: (i) a titularidade de direitos de sócios; (ii) o caráter permanente do exercício da maioria dos votos nas deliberações da assembleia geral; (iii) o poder de eleger a maioria dos administradores; e (iv) o uso efetivo deste poder para dirigir e orientar os negócios da companhia.

O exercício do poder de controle se manifesta, mormente, de três formas: (i) nas deliberações da assembleia geral; (ii) nos atos de administração, quan-do o acionista controlador for também o administrador da companhia; e (iii) nas instruções e comandos aos órgãos da administração, quando o controla-dor não for administrador.132

O exercício abusivo do poder de controle é tratado de forma exemplifi-cativa no Art. 117 da LSA, mas, para além das hipóteses específicas previs-tas exemplificativamente no art. 117, § 1º, da Lei 6.404/1976 (e, conforme aplicável, no art. 1º da Instrução CVM n. 323/2000), o tratamento dedicado pelo Código Civil ao abuso de direito (de acordo com os artigos 186 a 188 do Código Civil) serve como parâmetro para a interpretação e identificação dos casos em que, na esfera do direito societário, há abuso do poder de controle.

José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho133 ensinam que:

“O abuso do poder do controlador somente pode existir, ser conhecido e ter efeitos jurídicos, quando se manifesta sob a forma de atos dos ór-gãos sociais: a Lei não dispõe sobre ilicitude de uma política, conside-rada abstratamente, ou apenas formulada, mas de atos concretos que são ilícitos porque orientados para fins extras sociais; o caput do artigo 117 é expresso em declarar que o acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder, e não pela for-mulação e políticas globais cuja execução ou adoção não se manifesta sob a forma de atos ilícitos.”

132 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; e FILHO, Alfredo Lamy (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 605.133 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; e FILHO, Alfredo Lamy (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 617.

132 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; e FILHO, Alfredo Lamy (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 605.

133 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; e FI-LHO, Alfredo Lamy (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. P. 617.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

189FGV DIREITO RIO

A responsabilidade do acionista controlador consubstanciada nos artigos 116 e 117 da Lei 6.404/1976 é de ordem civil e administrativa134.

A responsabilidade pelos atos praticados em abuso do poder de controle é do acionista controlador e não da companhia, sendo certo que a correspon-dente obrigação de reparar eventuais perdas e danos é atribuível ao acionista controlador e não à companhia. Ao estudar o tema, Alfredo Lamy Filho e José Bulhões Pedreira, assim dispuseram: “A lei é expressa, no art. 117, quanto à responsabilidade do controlador pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder. Não declarou, por supérfluo, que tais atos, sempre que violadores da lei, importam em anulabilidade”.135

A ação para responsabilizar o acionista controlador também guarda ana-logia com a responsabilização dos administradores, tratada pelo art. 159 da Lei n.6.404/1976 e se enquadra nesse dispositivo legal por conta da regra contida no art. 160 da mesma Lei.

Tal analogia busca garantir aos acionistas minoritários e à própria compa-nhia a possibilidade de ajuizarem ação de responsabilidade frente a ato ilícito do acionista controlador. Se assim não o fosse ter-se-ia que transpor obstácu-lo intransponível, já que o controlador, agindo em prol de seus interesses ex-clusivamente pessoais, deve responder perante a companhia e os minoritários que não teriam contra ele legitimidade extraordinária prevista na regra. 136

Além da equiparação para efeitos de responsabilização, o artigo 246 da LSA estabelece os procedimentos para a promoção da ação de responsabilização do acionista controlador. Contudo, antes de analisarmos em detalhes o procedi-mento para responsabilização do acionista controlador, é necessário nos aten-tarmos aos requisitos essenciais para responsabilização do acionista controlador.

Preliminarmente, quando se fala em responsabilização do acionista con-trolador, condiciona-se esta ação à prova de qualidade de controlador, di-reto ou indireto, da companhia, de acordo com a definição do art. 116 da Lei 6.404/1976.

O segundo ponto a se observar consiste em determinar os sujeitos que, em decorrência de ato do acionista controlador, incorreram em dano. Neste sentido, o ato do acionista controlador poderá ter prejudicado a própria so-ciedade, os acionistas minoritários ou outros stakeholders (i.e., empregados, fornecedores, credores, comunidade em geral, dentre outros), sendo certo que, em relação aos stakeholders, tal como mencionamos anteriormente, não há sistema jurídico próprio para a responsabilização do acionista controlador.

134 Neste sentido, o clássico Parecer CVM/SJU n. 088/82.135 LAMY FILHO, Alfredo e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz, A Lei das S.A., Renovar, 1992, p.471.136 MAGALHÃES, Rodrigo Almeida. O Controlador e Sua Responsabilidade na Sociedade Anônima em: Sociedades Anônimas e Mercados de Capitais. São Paulo: Editora Quarter Latin do Brasil, 2011. P.236.

134 Neste sentido, o clássico Parecer CVM/SJU n. 088/82.

135 LAMY FILHO, Alfredo e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz, A Lei das S.A., Re-novar, 1992, p.471.

136 MAGALHÃES, Rodrigo Almeida. O Controlador e Sua Responsabilidade na Sociedade Anônima em: Sociedades Anônimas e Mercados de Capitais. São Paulo: Editora Quarter Latin do Brasil, 2011. P.236.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

190FGV DIREITO RIO

Além dessas duas condições prévias, na ação de responsabilidade civil do acionista controlador, dever-se-á observar os requisitos necessários para a res-ponsabilidade civil, quais sejam:

(i) a prática do ato ilícito;

(ii) o nexo causal entre a conduta e o dano reclamado; e

(iii) o dano efetivo.

Neste sentido (e em consonância com o exposto anteriormente acerca da aplicação das regras do Código Civil sobre abuso de direito), caso o acionista controlador “por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência”, viole direito e cause dano a outrem, ainda que exclusiva-mente moral, terá cometido ato ilícito, na forma do art. 186 do Código Civil e, consequentemente, ficará obrigado a reparar, na forma do art. 927 do Código Civil.

O abuso do poder de controle, na maioria dos casos, verifica-se em hi-póteses em que há excesso por parte do acionista controlador no exercício de direitos de que é titular, ultrapassando os limites impostos pelo fim eco-nômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, de tal maneira que o conhecimento do comando legal do art. 187 do Código Civil é de grande importância à correta compreensão da matéria.

6. Caso GErador 1: CoPEsul (Pas Cvm nº rj2007/7230) Pergunta Central:

“Há alteração do Controle quando ele deixa de ser exercido por Acordo de Acionistas firmado entre o Braskem e o IPQ e passa a ser exercido apenas pelo Braskem (através de participação direta e indireta)?”

Parte legal do Caso:

- Arts. 254-A e 116 da Lei das S.A- IN CVM 361/02, art. 29

imagens para ilustrar o caso:

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

191FGV DIREITO RIO

imagem 1:

imagem 2:

7. Caso GErador 2: suzano (Pas Cvm nº rj-2008-4156) Pergunta Central:

“Deverá haver Oferta Pública de Aquisição nos casos de incorporação? O art. 254-A se aplica a casos de alienação indireta de controle?”

Cenários para ilustrar o caso:

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192FGV DIREITO RIO

momento 1:

momento 2: aquisição do Controle da Pramoa pela Petrobrás

momento 3: incorporação da Pramoa pela Petrobrás

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193FGV DIREITO RIO

momento 4: sociedade Petroquímica entre Petrobrás e unipar: aporte de ativos

momento 5: sociedade Petroquímica entre Petrobrás e unipar: incorporação da fasciatus pela dapean

momento 6: Controle indireto da suzano pela unipar

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194FGV DIREITO RIO

8. jurisPrudênCia.

SOCIEDADE ANÔNIMA. TRANSFERÊNCIA DO PODER DE CONTROLE. CONTEÚDO ECONÔMICO. SOBRE VALOR PRETENDIDO EM FAVOR DE HOLDINGS ABERTAS, SOB A ALEGAÇÃO DE QUE LHES FOI USURPADA A OPORTU-NIDADE COMERCIAL DE ALIENAR O CONTROLE DI-RETAMENTE AO COMPRADOR. CONTROLE INDIRETO. EXERCÍCIO REGULAR DA FUNÇÃO DE CONTROLADOR. INEXISTÊNCIA.DE.DANOS

Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, di-retamente ou por meio de outras controladas, é titular de direi-tos de sócios que lhe assegurem, de modo permanente, prepon-derância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores.

Ao controlador indireto é permitido apropriar-se do sobreva-lor correspondente ao seu poder de controle, bem de conteúdo econômico autônomo e independente. Inexistência no caso de venda a non domino, tampouco da alegada subtração de opor-tunidade comercial, de que seriam titulares as holdings abertas. Exercício regular da função de controlador.Não ocorrência de dano, quer das holdings abertas, quer dos acionis-tas minoritários. Sem a prova da existência de prejuízo, não há lugar para a indenização pretendida. Existência dos danos alegados a de-pender do reexame de matéria fático-probatório (Súmula n. 7.-STJ). Recurso especial não conhecido. (RECURSO ESPECIAL Nº 556.265 - RJ (2003/0115717-2, RELATOR: MINISTRO BARROS MONTEIRO Quarta turma- STJ Brasília, 4 de outubro de 2005)

* * *

RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO SOCIETÁRIO. ART. 117 , § 1.º , DA LEI N.º 6.404 /76 (LEI DAS SOCIEDADES). MODALIDADES DE ABUSO DE PODER DE ACIONISTA CONTROLADOR. FORMA EXEMPLIFICATIVA. CARACTERIZAÇÃO DO ABUSO DE

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195FGV DIREITO RIO

PODER. PROVA DO DANO. PRECEDENTE. MONTANTE DO DANO CAUSADO PELO ABUSO DE PODER DO ACIO-NISTA CONTROLADOR. FIXAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. POSSIBILIDADE. – O § 1.º, do art. 117, da Lei das Sociedades Anônimas enumera as modalidades de exercício abusivo de poder pelo acionista controlador de forma apenas exemplificati-va. Doutrina. - A Lei das Sociedades Anônimas adotou padrões amplos no que tange aos atos caracterizadores de exercício abu-sivo de poder pelos acionistas controladores, porquanto esse cri-tério normativo permite ao juiz e às autoridades administrativas, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), incluir outros atos lesivos efetivamente praticados pelos controladores. - Para a caracterização do abuso de poder de que trata o art. 117 da Lei das Sociedades por ações, ainda que desnecessária a prova da intenção subjetiva do acionista controlador em prejudicar a companhia ou os minoritários, é indispensável a prova do dano. Precedente. - Se, não obstante, a iniciativa probatória do acio-nista prejudicado, não for possível fixar, já no processo de co-nhecimento, o montante do dano causado pelo abuso de poder do acionista controlador, esta fixação deverá ser deixada para a liquidação de sentença. Recurso especial provido. (STJ REsp 798264 SP 2005/0190864-1 Ministro CARLOS

* * *

ALBERTO MENEZES DIREITO T3 - TERCEIRA TURMA STJ DJ 16/04/2007)AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. DESCONSI-DERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SOCIEDA-DE ANÔNIMA. ACIONISTA MINORITÁRIO. PARTICIPA-ÇÃO EM ASSEMBLEIAS. ACIONISTA CONTROLADOR E ADMINISTRADORES. RESPONSABILIDADE. DECISÃO REFORMADA.

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DE SOCIEDADE ANÔNIMA NÃO PODE ATINGIR PATRI-MÔNIO PESSOAL DE ACIONISTA MINORITÁRIO, QUE NÃO OCUPA CARGO DE DIREÇÃO OU ADMINISTRAÇÃO, E CUJA PARTICIPAÇÃO EM ALGUMAS ASSEMBLEIAS

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196FGV DIREITO RIO

LIMITOU-SE A DELIBERAÇÕES CONCERNENTES A AS-PECTOS FORMAIS DA SOCIEDADE..A TEORIA DA DES-CONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - DIS-REGARD DOCTRINE - FICA POSITIVADA NO NOVO CÓDIGO CIVIL MANTIDOS OS PARÂMETROS EXISTEN-TES NOS MICROSSISTEMAS E NA CONSTRUÇÃO JURÍ-DICA SOBRE O TEMA. INTELIGÊNCIA DO ENUNCIADO 51, APROVADO NA I JORNADA DE DIREITO CIVIL - STJ. NOS TERMOS DA LEI Nº 6.404/76, QUE DISPÕE SOBRE AS SOCIEDADES POR AÇÕES, OS ACIONISTAS CONTRO-LADORES, QUE DETÉM A MAIORIA DOS VOTOS NAS DELIBERAÇÕES EM ASSEMBLEIAS, E OS RESPECTIVOS ADMINISTRADORES, É QUE DEVERÃO RESPONDER, PESSOALMENTE, PELOS ATOS DE MÁ GESTÃO QUE OCASIONARAM PREJUÍZOS A TERCEIROS, EM DECOR-RÊNCIA DE OBRIGAÇÕES CONTRAÍDAS EM NOME DA SOCIEDADE. (TJDF AI 252663720118070000 DF 0025266-37.2011.807.0000, GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 4ª Tur-ma Cível, 30/05/2012, DJ)

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197FGV DIREITO RIO

AulA 14: GovErnAnçA corporAtIvA.

lEitura básiCa:

CAMPESTRIN, Flavio. Governança Corporativa: Fundamentos Jurídicos e Regulação. São Paulo: Quartier Latin, 2008, Pp. 19-30 (Capítulo 1: Go-vernança Corporativa, Conceituação).

lEitura ComPlEmEntar.

BETTARELLO, Flavio PARGENDLER, Mariana, “O Estado Brasileiro como Acionista”, in Evolução do Direito Societário: Lições do Brasil. São Pau-lo: Saraiva, 2013, Pp. 169-222.

1. ContExto históriCo.

No decorrer do século XX, a expansão das transações financeiras em es-cala global acarretou a crescente integração do comércio internacional. A complexidade das operações envolvendo diferentes jurisdições e mercados de ações globalizados deu origem à necessidade de alinhamento de processos e preservação da reputação corporativa.

A Governança Corporativa surgiu para criar um conjunto eficiente de

mecanismos de controle, tanto de incentivos quanto de monitoramento, as-segurando o alinhamento entre os administradores e o melhor interesse da empresa e seus acionistas e clientes137.

Assim, nos últimos anos, o tema da governança corporativa invadiu o uni-verso jurídico e econômico138, ensejando discussões acaloradas, diversificada produção acadêmica e relevantes reformas legislativas.

Apesar de criticada por alguns por ser apenas um novo rótulo para o sis-tema de relacionamentos entre os acionistas e a administração da empresa, é inegável sua relevância prática, tendo em vista que a adoção de boas práticas de governança corporativa tem atraído a atenção dos investidores na hora de direcionar suas aplicações no mercado de valores mobiliários.

As raízes da governança corporativa ligam-se à tradição anglo-saxônica,

embora se possam verificar distinções entre as abordagens da Inglaterra e 137 Disponível em: <http://www.ibgc.org.br/index.php/governanca/origens-da-governanca> Acesso em: 14/08/2017138 Assim observam João Laudo de Camargo e Maria Isabel do Prado Bocater: “[A governança corporativa] desperta interesse, portanto, não apenas dentre os estudiosos do Direito, mas também entre os que se dedicam a outros campos, como Economia, Administração e Finanças” (Conselho de administração: seu funcionamento e participação de membros indicados por acionistas minoritários e preferencialistas. In: LOBO, Jorge (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Forense, 2002; p. 387). Reconhecendo a interdisciplinaridade da matéria, a doutrina Ibérica aponta que “não se trata [...] de um tema estritamente jurídico” (SAN PEDRO, Luis Antonio Velasco. O governo das sociedades cotadas (corporate governance) em Espanha: o “Relatório Olivencia”. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, v. 75, p. 279-314, Coimbra, 1999, p. 279).

137 Disponível em: <http://www.ibgc.org.br/index.php/governanca/origens-da-governanca> Acesso em: 14/08/2017

138 Assim observam João Laudo de Ca-margo e Maria Isabel do Prado Bocater: “[A governança corporativa] desperta interesse, portanto, não apenas dentre os estudiosos do Direito, mas também entre os que se dedicam a outros cam-pos, como Economia, Administração e Finanças” (Conselho de administração: seu funcionamento e participação de membros indicados por acionistas mi-noritários e preferencialistas. In: LOBO, Jorge (Coord.). Reforma da Lei das Sociedades Anônimas. Rio de Janeiro: Forense, 2002; p. 387). Reconhecendo a interdisciplinaridade da matéria, a dou-trina Ibérica aponta que “não se trata [...] de um tema estritamente jurídico” (SAN PEDRO, Luis Antonio Velasco. O go-verno das sociedades cotadas (corpora-te governance) em Espanha: o “Relató-rio Olivencia”. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, v. 75, p. 279-314, Coimbra, 1999, p. 279).

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

198FGV DIREITO RIO

dos Estados Unidos ao tema. A explicar tal pioneirismo, surgem dois fatores, quais sejam, a força do mercado de capitais norte-americano e a ocorrência de diversos escândalos financeiros no seio das companhias.

Evidenciou-se, assim, a necessidade de serem revistas as atribuições e as responsabilidades dos agentes das companhias. Nesse cenário, surgiram di-versos códigos ao redor do mundo visando a estudar e propagar as práticas de boa governança corporativa. Tais códigos, embora lhes falte coercibilidade legal, vêm se tornando cada vez mais necessários para uma atuação compe-titiva no mercado acionário globalizado, em face da pressão exercida pelos investidores. As bases da boa governança variam de acordo com o ambiente corporativo – regulatório e social – em que as organizações estão inseridas.

Embora muito se comente acerca da importância da boa governança cor-porativa, escassos são os estudos em que efetivamente se define seu significa-do. Com efeito, não é simples a tarefa de delimitar o conceito da expressão ‘governança corporativa’, tanto que ainda não se encontra uma noção jurídi-ca do termo, apesar do esforço envidado pela doutrina.

O conciso conceito proposto pelo Cadbury Report — um dos importan-tes códigos de governança corporativa — é talvez um dos que melhor traduz a abrangência do termo: “Governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são administradas e controladas”139.

Já segundo o IBGC140, Governança Corporativa pode ser definida como:

“Governança corporativa é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de scalização e controle e demais partes interessadas. As boas práticas de governança corporativa convertem princípios básicos em recomendações objetivas, alinhando interesses com a nalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum.”

Busca-se com as boas práticas de governança corporativa garantir transparên-cia às relações de poder nas companhias, de forma a assegurar maior controle (prestação de contas, ou accountability) e equilíbrio societário (eqüidade). Tudo visando melhorar o desempenho e, com isso, o acesso da empresa ao capital. 139 No original, “Corporate governance is the system by which companies are directed and controlled. Boards of directors are responsible for the governance of their companies” (Cadbury Report, section 2.5). 140 Definição de Governança Corporativa no “Código das melhores práticas de governança corporativa.” 5.edição / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. - São Paulo, SP: IBGC, 2015.

139 No original, “Corporate governance is the system by which companies are directed and controlled. Boards of directors are responsible for the governance of their companies” (Cadbury Report, section 2.5).

140 Definição de Governança Corpora-tiva no “Código das melhores práticas de governança corporativa.” 5.edição / Instituto Brasileiro de Governança Cor-porativa. - São Paulo, SP: IBGC, 2015.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

199FGV DIREITO RIO

Trata-se de um olhar mais acentuado ao controle e direção dos negócios, que, em última instância, ajuda a trazer novos investimentos, ao mesmo tempo em que atrai novos sócios. Ou seja, facilita o cumprimento da fina-lidade da sociedade.

No Brasil, o fortalecimento da Governança Corporativa e a aproxima-ção das empresas às boas práticas decorre principalmente da criação dos segmentos de listagem da BM&FBovespa – Bovespa Mais, Bovespa Mais Nível 2, Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1 – que se adequam aos dife-rentes perfis de empresas. Todos os segmentos prezam por rígidas regras de governança corporativa e têm como objetivo melhorar a avaliação das companhias que decidem aderir, voluntariamente a um deles para atrair os investidores com a redução dos riscos141.

São princípios básicos da Governança Corporativa142:

• Transparência: mais do que a obrigação de informar é o desejo de disponibilizar informações relevantes para a tomada de decisões; A transparência resulta em confiança aumentando a credibilidade, proporciona maior acesso aos mercados. As informações devem estar amplamente disponíveis não apenas os acionistas (sharehol-ders), mas para todos que se relacionam com a organização– clien-tes, fornecedores, investidores, governo e sociedade (stakeholders).

• Equidade: tratamento justo e igualitário de todos os sócios e demais partes interessadas (stakeholders), considerando seus di-reitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas;

• Accountability: prestação de contas pelos agentes de governança por sua atuação devendo assumir integralmente a consequência de seus atos e omissões; os relatórios periódicos devem ser com-pletos, objetivos e correspondentes à veracidade, é necessário re-fletir adequadamente os fatores positivos juntamente com os que ainda precisam ser melhorados. O objetivo é de evitar surpresas para investidores.

• Responsabilidade Corporativa: zelar pela sustentabilidade da organização, visando a sua longevidade, incorporando conside-rações de ordem social e ambiental nos negócios e operações; Boas práticas de governança envolvem toda a estrutura interna da organização;

141 Disponível em: < http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/listagem/acoes/segmentos-de-listagem/sobre-segmentos-de-listagem/> Acesso em: 26/07/2017.142 Definição de Governança Corporativa no “Código das melhores práticas de governança corporativa.” 5.edição / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. - São Paulo, SP: IBGC, 2015.

141 Disponível em: < http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/listagem/acoes/segmentos-de-listagem/sobre-segmentos-de-listagem/> Acesso em: 26/07/2017.

142 Definição de Governança Corpora-tiva no “Código das melhores práticas de governança corporativa.” 5.edição / Instituto Brasileiro de Governança Cor-porativa. - São Paulo, SP: IBGC, 2015.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

200FGV DIREITO RIO

Entre as boas práticas de governança corporativa, podem-se destacar, den-tre inúmeras outras:

9 É recomendável que a assembleia geral ordinária realize-se na data mais próxima possível ao fim do exercício fiscal a que ela se refere;

9 A companhia deve tornar plenamente acessíveis a todos os acionistas quaisquer acordos de seus acionistas de que tenha conhecimento, bem como aqueles em que a companhia seja interveniente;

9 O conselho de administração deve ter de cinco a nove membros tecnica-mente qualificados, com pelo menos dois membros com experiência em finanças e responsabilidade de acompanhar mais detalhadamente as prá-ticas contábeis adotadas. O conselho deve ter o maior número possível de membros independentes da administração da companhia; Os presidente do conselho não deve acumular funções de direção.

9 O conselho deve adotar um regimento com procedimentos sobre suas atribuições e periodicidade mínima das reuniões, além de dispor sobre comitês especializados para analisar certas questões em profundidade, no-tadamente relacionamento com o auditor e operações entre partes relacio-nadas;

9 As decisões de alta relevância devem ser deliberadas pela maioria do capi-tal social, cabendo a cada ação um voto, independentemente de classe ou espécie;

9 O conselho de administração deve se certificar de que as transações entre partes relacionadas estão claramente refletidas nas demonstrações finan-ceiras e foram feitas por escrito e em condições de mercado; e

9 O estatuto da companhia deve estabelecer que as divergências entre acio-nistas e companhia ou entre acionistas controladores e acionistas minori-tários serão solucionadas por arbitragem;

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

201FGV DIREITO RIO

AulA 15: trAnsFormAção, IncorporAção, Fusão E cIsão.

lEitura básiCa:

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordena-dores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 1259-1312.

lEitura ComPlEmEntar.

CANTIDIANO, Luiz Leonardo. Incorporação de Sociedade e Incorporação de Ações. In. CASTRO, Rodrigo R. Moteiro de; MOURA AZEVE-DO, Luiz André N. de (Coord.). Poder de Controle e Outros Temas de Direito Societário e Mercado de Capitais.São Paulo: Quartier Latin, 2010. Pp. 135-158.

1. introdução E ContExto históriCo.

A consolidação do modelo econômico capitalista, especialmente após a 2ª Guerra Mundial, a evolução dos mercados de capitais internacionais, a modernização das economias de mercado e, até mesmo, os avanços tec-nológicos que encurtaram distâncias e propiciaram mecanismos eficientes para que agentes de mercado, localizados em regiões diferentes, praticas-sem negócios entre si, são alguns dos fatores que impulsionaram o desen-volvimento e destacaram a importância do direito empresarial.

A concentração empresarial firmou-se como uma das principais ten-dências do capitalismo moderno. Os fenômenos econômicos da globali-zação e da extensão e/ou exclusão das “fronteiras mercantis e comerciais” estimulam para que as companhias se associem e concentrem empresas, a fim de ganharem escala e competitividade no mercado capitalista.

Como consequência deste movimento, a atividade das companhias passou a influenciar e fazer parte do cotidiano da vida de todos. Prova disso são as operações societárias frequentemente noticiadas nos veículos da mídia. Contudo:

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

202FGV DIREITO RIO

1. Como essas operações são realizadas?

2. Quais medidas são importantes para a implementação dessas operações?

3. Qual é a participação dos advogados nessas operações?

4. Como saber diferenciar os diferentes tipo de operações societárias?

É, neste contexto, que se inserem as operações societárias de fusão, cisão, transformação, incorporação e incorporação de ações, que são instrumentos jurídicos oriundos de um fenômeno econômico.

Estas operações podem envolver sociedades de tipos societários diferentes, devendo ser respeitadas as disposições constantes do estatuto ou contrato so-cial das sociedades envolvidas, de acordo com o caput do artigo 223 da LSA.

Anteriormente ao advento da Lei nº 10.406/02 (“CC 2002”), a Lei nº 6.404/76 (“LSA”) funcionava como lei geral das sociedades empresárias, regulan-do as referidas operações societárias (incorporação, fusão, cisão e transformação), independentemente do tipo societário que estivesse envolvido em tais operações.

Entretanto, o CC 2002 (severamente criticado pela melhor doutrina, pela ausência de tecnicismos e maneira assistemática como regula o Direito de Empresas) pretendeu capitular a integra das sociedades empresarias, atribuin-do à LSA a condição de lei especial.

Devido ao fato do CC 2002 ser incompleto, assistemático e inadequado à regulação deste tópico, embora não se possa negar sua aplicação às operações de reorganização societária, recorre-se à LSA em qualquer hipótese. Além disso, é inegável a aplicação da LSA sempre que as operações envolveram sociedades anônimas.

O artigo 223, §3º, da LSA, uma das regras previstas na LSA que se aplica tão somente às companhias abertas, prevê que no caso da incorporação, fusão ou cisão envolver companhia aberta, as sociedades que a sucederem serão também abertas, devendo obter o respectivo registro e, se for o caso, promover a admis-são de negociação das novas ações no mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data da assembleia geral que aprovou a ope-ração, observadas as normas pertinentes baixadas pela CVM, notadamente a Instrução CVM nº 319/1999, que disciplina as operações de incorporação, fu-são e cisão envolvendo companhias abertas, e a Instrução CVM nº 480/2009, que dispõe sobre o registro de emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários.

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203FGV DIREITO RIO

Em relação às operações de incorporação, fusão e cisão envolvendo com-panhias abertas, a Instrução CVM nº 319/99 regula, especialmente:

i. a divulgação de informações (conforme a Instrução CVM nº 358/2002, essas operações configuram Fatos Relevantes);

ii. aproveitamento econômico e o tratamento contábil do ágio e deságio;

iii. relação de substituição das ações dos acionistas não controladores, nas operações de incorporação;

iv. obrigatoriedade de auditoria independente das demonstrações fi-nanceiras;

v. conteúdo do relatório da administração;

vi. hipóteses de exercício abusivo do poder de controle; e

vii. fluxo de dividendos dos acionistas não controladores.

Ainda no que diz respeito à legislação aplicável às companhias abertas, tem-se o Parecer de Orientação CVM nº 34/2008, mera recomendação, não sendo, portanto, norma.

Ele visa a estabelecer parâmetros em relação ao tratamento do “impedi-mento de voto em casos de benefício particular em operações de incorpo-ração e incorporação de ações em que sejam atribuídos diferentes valores para as ações de emissão de companhia envolvida na operação, conforme sua espécie, classe ou titularidade”.

Esse parecer tem causado muita “polêmica na doutrina jurídica”, uma vez que conforme muda a composição do Colegiado da CVM, a interpretação desta recomendação também é alterada.

2. ProtoColo E justifiCação.

Segundo a Exposição de Motivos da LSA, tanto o Protocolo quanto a Jus-tificação visam a assegurar “o conhecimento de todas as condições da operação, das repercussões que terá sobre os direitos (dos acionistas) e do valor de reembolso que lhes caberá, caso prefiram usar o direito de retirada”.

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204FGV DIREITO RIO

2.1. Protocolo.

O protocolo é o documento, firmado pelos órgãos de administração ou sócios das sociedades interessadas, por meio do qual são apresentados os ter-mos e condições das operações de incorporação, fusão ou cisão com incorpo-ração em sociedade existente.

É, desta forma, o instrumento de manifestação da vontade das sociedades elaborado por seus administradores e obriga, por força de sua natureza pré--contratual, as sociedades envolvidas a avaliar seus patrimônios líquidos e submeter seus termos para deliberação da assembleia geral e/ou dos sócios das sociedades envolvidas, conforme o caso.

De acordo com o artigo 224 da LSA, no Protocolo deverão constar obri-gatoriamente as seguintes disposições, observado que eventuais valores ainda sujeitos a determinação serão indicados por estimativa:

“I - o número, espécie e classe das ações que serão atribuídas em substi-tuição dos direitos de sócios que se extinguirão e os critérios utilizados para determinar as relações de substituição;II - os elementos ativos e passivos que formarão cada parcela do patri-mônio, no caso de cisão;III - os critérios de avaliação do patrimônio líquido, a data a que será re-ferida a avaliação, e o tratamento das variações patrimoniais posteriores;IV - a solução a ser adotada quanto às ações ou quotas do capital de uma das sociedades possuídas por outra;V - o valor do capital das sociedades a serem criadas ou do aumento ou redução do capital das sociedades que forem parte na operação;VI - o projeto ou projetos de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão ser aprovados para efetivar a operação;VII - todas as demais condições a que estiver sujeita a operação.”

Essas informações representam o conteúdo mínimo que deve constar no Protocolo, sendo possível a adição de informações suplementares.

2.2. justificação

Além do Protocolo, as operações de incorporação, fusão e cisão serão submetidas à deliberação da assembleia geral das companhias interessadas mediante justificação, contendo todos os esclarecimentos necessários a uma tomada de posição.

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205FGV DIREITO RIO

Com base no artigo 225 da LSA, os seguintes esclarecimentos deverão constar do documento:

“I - os motivos ou fins da operação, e o interesse da companhia na sua realização;II - as ações que os acionistas preferenciais receberão e as razões para a modificação dos seus direitos, se prevista;III - a composição, após a operação, segundo espécies e classes das ações, do capital das companhias que deverão emitir ações em substituição às que se deverão extinguir;IV - o valor de reembolso das ações a que terão direito os acionistas dissidentes.”

Assim como no Protocolo, outras informações além daquelas previstas no art. 225 da LSA podem constar na Justificação.

3. formação do CaPital nas oPEraçõEs dE rEorGanização soCiEtária.

O artigo 226 da LSA dispõe que:

“As operações de incorporação, fusão e cisão somente poderão ser efetivadas nas condições aprovadas se os peritos nomeados determinarem que o valor do patrimônio ou patrimônios líquidos a serem vertidos para a formação de capital social é, ao menos, igual ao montante do capital a realizar.”

Tal medida visa à proteção dos credores. Isto porque as sociedades são livres para convencionar a relação de substituição de ações e o valor atribuído ao patrimônio líquido da sociedade a ser incorporada

.Entretanto, em obediência ao princípio da realidade do capital social, a lei

requer que a avaliação do patrimônio líquido da incorporada seja realizada com as mesmas cautelas adotadas na avaliação para a formação/subscrição de capital em bens, em conformidade com as disposições do art. 8º da LSA.

O objetivo da lei foi o de impedir que o patrimônio líquido forme capital social por valor superior ao real. Caso as sociedades acordem em transmiti-lo por valor inferior, não há o que impedir, uma vez que, quanto mais o patri-mônio líquido tiver o seu valor subestimado, maior a garantia dos credores, que é a razão de ser do requisito legal de avaliação. De qualquer forma, o valor do patrimônio líquido a ser vertido não poderá ser inferior ao montante do capital a realizar.

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206FGV DIREITO RIO

Conforme o art. 226, §3º, LSA, nas operações envolvendo incorpo-ração, fusão e cisão, os ativos e passivos a serem incorporados ou decor-rentes de fusão e cisão devem ser avaliados a preço de mercado quando realizadas entre partes independentes e vinculadas à efetiva transferên-cia de controle.

A tendência internacional nas operações de combinação de empresas (business combination) é:

i. reconhecer o patrimônio da sociedade adquirida pelo seu valor de negociação; e

ii. mensurar os negócios por “valor justo”.

No Brasil, o Pronunciamento Técnico do Comitê de Pronunciamen-tos Contábeis - CPC nº 15, tem por objetivo fundamental definir o tratamento contábil aplicável ao reconhecimento, à mensuração e às di-vulgações decorrentes de operações de “combinação (ou concentração) de negócios”, sendo elas a aquisição de participações societárias, aqui-sição de negócios, fusão, incorporação, incorporação de ações, cisão e alteração de controle.

De acordo com o CPC nº 15, a entidade adquirente deverá reconhecer o valor justo dos ativos e passivos da entidade fusionada ou incorporada ou derivada de uma cisão, no momento da transação de fusão, incorpo-ração ou cisão.

Por fim, ainda no que toca às operações de combinação de empresas, a partir da nova Lei do CADE (Lei nº 12.529/2011), as operações de fusão que resultarem em concentração econômica deverão observar as determi-nações do direito concorrencial. Dentre as principais alterações, tem-se o controle prévio desses tipos de operações pelo CADE.

Na antiga lei, a operação poderia ser submetida ao órgão de defesa da concorrência somente após a sua efetivação. Hoje, é necessária a autori-zação do CADE para que a operação possa se consolidar. Além disso, via de regra, os atos societários de operações de fusões e incorporações que impliquem em concentração econômica sujeitam-se também à aprovação da Secretaria Nacional de Defesa Econômica (SNDE).

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207FGV DIREITO RIO

4. tiPos dE oPEraçõEs dE rEorGanização soCiEtária.

4.1. incorporação

A incorporação é a operação através da qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede universalmente em todos os direitos e obrigações. Do ponto de vista econômico, por meio da incorporação bus-ca-se o aproveitamento de sinergias entre as sociedades, o ganho de escala e competitividade no mercado em que se inserem as sociedades envolvidas na operação de incorporação.

Como resultado da incorporação, a sociedade que vier a ser incorporada será extinta, para todos os fins e efeitos legais, operando-se a sua sucessão universal pela incorporadora. Ou seja, a transferência patrimonial resultan-te da incorporação efetua-se não em relação aos acionistas, mas sim em re-lação à sociedade incorporadora (ou sobrevivente), que se torna sucessora, por força de lei, da sociedade incorporada (e agora extinta).

Como regra geral, a incorporação implementa-se com o aumento de capital na sociedade incorporadora, no valor correspondente ao acervo lí-quido da sociedade incorporada (que está sendo absorvido). Os acionistas da sociedade incorporada receberão ações de emissão da sociedade incorpo-radora, em conformidade com a relação de troca estabelecida.

Em tese, só não ocorrerá o aumento de capital na: (i) controvertida hi-pótese de incorporação de sociedade com patrimônio líquido negativo; e (ii) na incorporação de subsidiária integral.

Nas companhias, assumindo que a incorporação envolverá modificação do estatuto social, a mesma deverá ser deliberada em Assembleia Geral Extra-ordinária, com quorum de instalação de acionistas representando 2/3 (dois terços) do capital social com direito a voto, em 1ª convocação, e com qual-quer número em 2ª convocação, conforme prevê o artigo 135, caput, da LSA.

Para sua aprovação, o quorum de deliberação necessário será de acionis-tas representando a maioria absoluta do capital votante da companhia (i.e., 50% +1), se maior quorum não for exigido pelo estatuto social, conforme prevê o artigo 136, inciso IV, da LSA.

Não obstante as proteções específicas previstas na legislação aplicável, a incorporação ainda enseja o direito de retirada dos acionistas da sociedade

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incorporada, exceto nas hipóteses em que as ações de emissão da companhia incorporada tiverem liquidez e dispersão no mercado. O direito de retirada, no entanto, não é conferido aos acionistas da sociedade incorporadora.

Sem prejuízo destas hipóteses de exclusão do direito de recesso, há quem sustente que mesmo nas demais hipóteses somente haverá direito de recesso na incorporação se desta operação resultar “prejuízo” para os acionistas da sociedade incorporada.

quadro demonstrativo:

incorporação da sociedade b na sociedade a:

resultado final:

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209FGV DIREITO RIO

4.2. incorporação de Companhia Controlada.

Outra situação peculiar que merece destaque é a incorporação, pela con-troladora, de sociedade controlada, a qual está prevista no artigo 264 da LSA. Nesta operação, somente serão incorporadas as ações não pertencen-tes ao controlador.

Por essa razão, para salvaguardar o minoritário, o caput do referido ar-tigo estabelece que os valores dos patrimônios líquidos das sociedades de-verão ser calculados pelos mesmos critérios e na mesma data, a preços de mercado ou com base em outro critério aceito pela CVM, no caso das com-panhias abertas, para o fim de se determinar qual é a relação de substituição das ações. Sobre este tema, há o Parecer de Orientação CVM nº 35/2008 que faz recomendações acerca dos deveres legais dos administradores nas incorporações de controladas.

No que diz respeito à aplicabilidade do artigo 264 da LSA às opera-ções entre sociedades coligadas e/ou sociedades sobre controle comum, há muita discussão. O Parecer CVM/SJU nº 16/1985 recomenda a obriga-toriedade da avaliação de dois patrimônios somente nos casos envolvendo incorporação de controlada.

Consta no parecer que “A lei societária não estabeleceu para a incorporação de companhia não-controlada, a avaliação do patrimônio da incorporadora. A avaliação relativa dos dois patrimônios, a preços de mercado, apenas é manda-tória nas incorporações de companhias controladas, conforme previsto no caput do art. 264”.

Assim, quando se tratar da incorporação de companhia controlada, dois cálculos devem ser apresentados aos acionistas das companhias envolvidas na incorporação. São eles: i. o cálculo da relação de troca segundo os critérios avençados entre as companhias contratantes da operação, e ii. o cálculo da rela-ção de troca segundo o valor patrimonial das companhias a preço de mercado.

Seguindo entendimento semelhante, o Parecer CVM/PJU nº 08/2001 recomenda que o art. 264 da LSA tenha sua aplicação restrita à hipótese de incorporação, pela controladora, de companhia controlada.

O parecer recomenda ainda que “Incorporação de companhia sem relação de controle uma(s) com a(s) outra(s) não se sujeita ao art. 264, ainda que as companhias integrantes da operação estejam sobre controle comum de terceira companhia (holding), que, entretanto, não tomará parte da incorporação.”

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210FGV DIREITO RIO

Assim, se observados ambos os pareceres, conclui-se pela inaplicabilida-de das regras do art. 264 da LSA às operações entre sociedades coligadas e/ou sociedades sob controle comum.

4.3. incorporação de ações.

É muito importante fazermos a distinção entre duas operações societá-rias absolutamente diferentes, mas que muitas vezes são comparadas em virtude da semelhança entre as nomenclaturas que as designam, quais se-jam: (a) a incorporação de sociedades (artigo 227 da LSA); e (b) a incorpo-ração de ações (artigo 252 da LSA).

De um lado, a “incorporação de sociedades”, conforme já abordamos acima, caracteriza-se pela absorção de uma ou mais sociedades pela socie-dade incorporadora, deixando de existir as sociedades incorporadas.

De outro lado, a “incorporação de ações” consiste na incorporação de todas as ações do capital social de uma determinada companhia, ao patri-mônio de outra companhia brasileira, passando a companhia incorporada a ser subsidiária integral da companhia incorporadora.

Na prática, na incorporação de ações, os acionistas de determinada companhia conferem as ações de que são titulares ao patrimônio de outra companhia, necessariamente brasileira, em processo de substituição de au-mento de capital desta última. Ocorre que a sociedade incorporada não se extingue, mas continua a existir como subsidiária integral, nos termos do caput do artigo 252 da LSA.

É interessante notar que na incorporação de ações haverá direito de re-cesso para os acionistas de ambas as sociedades (incorporada e incorpora-dora), conforme preveem os §§1º e 2º do artigo 252 da LSA.

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211FGV DIREITO RIO

quadro demonstrativo:

incorporação das ações de emissão da sociedade b pela sociedade a.

resultado final:

4.4. fusão.

A fusão é a operação pela qual duas ou mais sociedades se unem para formar uma sociedade nova, que lhes sucederá universalmente em todos os direitos e obrigações (artigo 228 da LSA).

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212FGV DIREITO RIO

A operação de fusão possui diversas semelhanças procedimentais com a incorporação, aplicando-se a esta igualmente a necessidade do já referido Protocolo e Justificação e o mesmo procedimento de direito de recesso refe-rido acima.

Na prática de mercado, as operações de fusão são menos usuais do que as operações de incorporação, por gerarem a extinção de todas as sociedades envolvidas (que perdem inclusive suas inscrições e CNPJ), elemento que gera dificuldades procedimentais para condução dos negócios.

Além disto, a incorporação de sociedades muitas vezes é capaz de alcançar os mesmos propósitos pretendidos com a fusão, com vantagens de aproveita-mentos de benefícios fiscais e planejamentos tributários.

quadro demonstrativo:

fusão da sociedade a com a sociedade b:

resultado final:

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213FGV DIREITO RIO

4.5. Cisão.

De acordo com o artigo 229 da LSA, a cisão é a operação pela qual a com-panhia se divide e transfere seu acervo líquido para duas ou mais sociedades.

A cisão poderá ser:

i. total, que importará na extinção da sociedade cindida que resultará em duas ou mais novas sociedades; ou

ii. parcial, preservando-se a sociedade cindida, que será dividida e redu-zida pela parcela que houver sido cindida. Em tal caso, a parcela cin-dida poderá ser utilizada para a formação de sociedade nova, na forma do artigo 229, §2º, da LSA, ou poderá ser incorporada em sociedade existente, na forma do artigo 229, §3º, da LSA (i.e., cisão parcial com incorporação de parcela cindida).

Igualmente as operações de incorporação e fusão, far-se-ão necessários na cisão os documentos de Protocolo e Justificação da operação.

A cisão poderá ser proporcional (quando os acionistas participarem da parcela cindida na mesma proporção em que participavam da sociedade cin-dida) ou desproporcional (quando os acionistas participarem da parcela cin-dida em proporção diferente da que participavam da sociedade cindida). A cisão parcial desproporcional é matéria de unanimidade na LSA, tal como dispõe o artigo 229, §5º, LSA.

De acordo com o §1º do artigo 229 da LSA, a sociedade que absorver par-cela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obriga-ções relacionados no ato da cisão, sendo que no caso de cisão com extinção da companhia cindida (i.e., cisão total) as sociedade que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.

Em conformidade com o art. 233, § único da LSA, os atos de cisão parcial poderão estipular que as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida serão responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida.

A operação de cisão ensejará direito de recesso, na forma do artigo 137 combinado com o artigo 136, inciso IX, da LSA. O direito de recesso na cisão foi reintroduzido na reforma à LSA promovida pela Lei nº 10.303/01, uma vez que havia sido suprimido na reforma à LSA promovida pela Lei nº 9.457/97, por conta de interesses relacionados às privatizações.

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É importante esclarecer que somente haverá direito de recesso na cisão nas hipóteses referidas no artigo 137, inciso III, LSA (i.e., quando resultar em mudança do objeto social da sociedade cindida, redução do dividendo obrigatório ou participação em grupo de sociedade).

quadros demonstrativos:

quadro 1 - Cisão total da sociedade a:

resultado final:

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quadro 2 – Cisão Parcial Proporcional da sociedade a com a consequente incorporação da Parcela Cindida pela sociedade b

resultado final:

4.6. transformação.

Por fim, referimo-nos à operação de transformação (arts. 220 a 222 da LSA), que é aquela em que a sociedade muda de tipo societário, in-dependentemente de dissolução e liquidação, obedecendo os preceitos aplicáveis à constituição do tipo societário para o qual a sociedade está se transformando.

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A transformação é matéria de unanimidade na LSA (art. 221 LSA), exceto se expressamente previsto em sentido diverso no estatuto social, hipótese em que os acionistas estarão investidos do direito de recesso se disentirem da deliberação.

4.7. drop-down de ativos (Conferência de ativos ao Capital social). Devido a inúmeras razões, principalmente as relacionadas às questões tri-

butárias-contábeis e comerciais-mercadológicas, em muitos casos, em vez de se realizar a cisão parcial com incorporação da parcela cindida, promove-se a capitalização de ativos entre sociedades envolvidas em reorganizações.

Nestes casos, aplica-se o regime da “subscrição de ações mediante capitali-zação de créditos ou subscrição em bens”, tal como disposto no art. 171, §2º da LSA. As formalidades exigidas a fim de promover a exata estimação dos bens a serem contribuídos ao capital social são aquelas previstas nos artigos 7º e 8º da LSA. O intuito dessas formalidades é assegurar o cumprimento do princípio da realidade do capital social.

5. dirEitos dos CrEdorEs.

Os direitos dos credores são tutelados tanto nas operações de fusão e in-corporação quanto na cisão.

De acordo com o artigo 232 da LSA, que regula os direitos dos credores na incorporação e na fusão, até 60 (sessenta) dias depois de publicados os atos relativos à incorporação ou à fusão, o credor anterior por ela prejudicado poderá pleitear judicialmente a anulação da operação; findo o prazo, decairá do direito o credor que não o tiver exercido. A depender do caso, o valor do crédito poderá ser consignado em pagamento em juízo de modo a evitar anulação (art. 232, §1º da LSA).

De acordo com o artigo 233 da LSA, que regula os direitos dos credores na cisão, na cisão com extinção da companhia cindida, as sociedades que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da companhia extinta. A companhia cindida que subsistir e as que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da primeira anteriores à cisão.

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Em caráter excepcional, o artigo 233, parágrafo único, da LSA prevê que o ato de cisão parcial poderá estipular que as sociedades que absorverem par-celas do patrimônio da companhia cindida serão responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida, mas, nesse caso, qualquer credor anterior poderá se opor à estipulação, em relação ao seu crédito, desde que notifique a sociedade no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação dos atos da cisão.

Mais uma vez, ressalta-se que nas operações de fusão e incorporação que resultarem em concentração econômica deverão ser observadas as de-terminações do direito econômico concorrencial (i.e., Lei nº 12.529/2011 – Nova Lei do CADE).

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218FGV DIREITO RIO

AulA 16: dIssolução, lIquIdAção E ExtInção dA socIEdAdE AnônImA

lEitura básiCa:

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2ª Edição, 2017. Pp. 1313-1377.

lEitura ComPlEmEntar.

JACKSON, Thomas H. The Logic and Limits of Bankruptcy Law. Washing-ton, D.C: Beard Books,1986 [reimpressão de 2001].

KIRSCHBAUM, Deborah. Cláusula Resolutiva Expressa por Insolvência nos Contratos Empresariais: uma Análise Econômico- Jurídica. Revista Direito GV, v.2 n.1. p.037-054.

CAVALLI, Cassio e AYOUB, Luiz Roberto. A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p.219.

1. introdução.

Em geral, manter uma sociedade por longo período exige saber admi-nistrar bem variações externas na economia, sustos internos decorrentes de atritos entre os sócios, falta de capital de giro e tantos outros problemas e dificuldades que podem surgir.

Supondo impossível levar a sociedade adiante — seja por incapacidade de se atingir o fim social ou outro motivo qualquer —, os acionistas podem optar por sua dissolução, que poderá ser:

(i) Total, como contemplado na LSA, ou

(ii) Parcial, tentativa observada na prática, em certos casos, para que seja mantido o funcionamento da sociedade.

A dissolução total costuma representar um caso extremo: põe fim a to-das as atividades geradoras de lucro, pode comprometer o desenvolvimento

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econômico da região e gerar perda de empregos, dentre outros prejuízos que devem ser previamente estudados.

Já a dissolução parcial, em regra, não tem efeitos tão radicais: atende-se ao interesse do sócio descontente, mas é assegurada a manutenção da função social da empresa.

Neste sentido, sobre a dissolução parcial, José Waldecy Lucena afirma: “dissolução parcial de uma sociedade deve-se entender como dissolução da relação social limitada a um sócio, com liquidação da quota social”.143

A companhia totalmente dissolvida conserva a sua personalidade jurídica até a sua extinção, para que se possa realizar sua liquidação, como estabeleci-do pelo legislador no artigo 207 da Lei das S.A144. Vejamos cada um dos dois tipos de dissolução a seguir.

2. dissolução total.

A dissolução das pessoas jurídicas encontra-se regulada pela LSA e, tam-bém, pelo artigo 51 do Código Civil.

Como já mencionado, na hipótese de dissolução total a sociedade cessa suas atividades e o patrimônio dos sócios é inteiramente liquidado.

A dissolução é a primeira fase do processo de extinção de uma dada socie-dade, que abrange a dissolução propriamente dita, a liquidação e a extinção, podendo conceituar-se como o “momento da vida social em que se desfazem as relações associativas decorrentes do contrato plurilateral”145.

2.1. modalidades.

O artigo 206 da LSA enumera as causas de dissolução das sociedades anô-nimas, utilizando como critério classificatório a forma de rompimento da convenção social, da seguinte forma:

“Art. 206. Dissolve-se a companhia:

I - de pleno direito:a) pelo término do prazo de duração;b) nos casos previstos no estatuto;

143 LUCENA, José Waldecy. Dissolução e Liquidação de Sociedades. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 794. Apud BRITO, Cristiano Gomes de. Dissolução Parcial de Sociedade Anônima. Revista de Direito Privado, São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 7, ano 2, jul.-set. 2001, P. 18.144 Artigo 207 da Lei das S.A.: “Art. 207. A companhia dissolvida conserva a personalidade jurídica, até a extinção, com o fim de proceder à liquidação.”145 TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREIRO, José Alexandre Tavares. Das Sociedades Anônimas no Direito Brasileiro. Vol. 2. São Paulo, Bushatsky, 1979. P. 612.

143 LUCENA, José Waldecy. Dissolução e Liquidação de Sociedades. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. P. 794. Apud BRITO, Cristiano Gomes de. Dissolução Parcial de Sociedade Anônima. Revista de Direito Privado, São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 7, ano 2, jul.-set. 2001, P. 18.

144 Artigo 207 da Lei das S.A.: “Art. 207. A companhia dissolvida conserva a per-sonalidade jurídica, até a extinção, com o fim de proceder à liquidação.”

145 TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREI-RO, José Alexandre Tavares. Das Socieda-des Anônimas no Direito Brasileiro. Vol. 2. São Paulo, Bushatsky, 1979. P. 612.

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c) por deliberação da assembleia-geral (art. 136, X); d) pela existência de 1 (um) único acionista, verificada em assembleia--geral ordinária, se o mínimo de 2 (dois) não for reconstituído até à do ano seguinte, ressalvado o disposto no artigo 251;e) pela extinção, na forma da lei, da autorização para funcionar.

II - por decisão judicial:a) quando anulada a sua constituição, em ação proposta por qualquer acionista;b) quando provado que não pode preencher o seu fim, em ação pro-posta por acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social;c) em caso de falência, na forma prevista na respectiva lei;

III - por decisão de autoridade administrativa competente, nos casos e na forma previstos em lei especial.”

A dissolução, portanto, pode se dar de pleno direito por decisão judicial e por decisão administrativa. A dissolução de pleno direito é a que se realiza por motivos estabelecidos em lei ou no estatuto social. Pode ocorrer pelos seguintes fatores:

9 Término do prazo de duração: o estatuto social deve prever o prazo de duração da sociedade, estabelecendo se indeterminado ou determinado. Nesta última hipótese, define-se uma data para que a companhia cesse suas atividades, a partir da qual se pode iniciar a sua liquidação.

9 Nos casos previstos no Estatuto Social: O estatuto da companhia pode prever, de forma facultativa, causas de dissolução da sociedade, como, por exemplo, a conclusão de determinado projeto ou obra.

9 Por deliberação da Assembleia Geral: Por quórum qualificado (art. 136, X146), pode a assembleia geral deliberar no sentido de dissolver a socieda-de, observada a responsabilidade para o acionista controlador, na forma do art. 117, § 1º, b147.

9 Pela redução do quadro social a um único acionista: A companhia será dissolvida caso verificada, em assembleia-geral ordinária, a existência de apenas um acionista, e se o mínimo de dois não for reconstituído até a AGO do ano seguinte. Tal dispositivo, porém, não se aplica às subsidiárias integrais, previstas no artigo 251148 da LSA

146 Artigo 136, inciso X da Lei das S.A.: “Art. 136. É necessária a aprovação de acionistas que representem metade, no mínimo, das ações com direito a voto, se maior quorum não for exigido pelo estatuto da companhia cujas ações não estejam admitidas à negociação em bolsa ou no mercado de balcão, para deliberação sobre:(...)X - dissolução da companhia.”147 Artigo 117, §1º, alínea “b” da Lei das S.A.: “ Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:(...)b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;”148 Artigo 251 da Lei das S.A.: “Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.§ lº A sociedade que subscrever em bens o capital de subsidiária integral deverá aprovar o laudo de avaliação de que trata o artigo 8º, respondendo nos termos do § 6º do artigo 8º e do artigo 10 e seu parágrafo único.§ 2º A companhia pode ser convertida em subsidiária integral mediante aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suas ações, ou nos termos do artigo 252.”

146 Artigo 136, inciso X da Lei das S.A.: “Art. 136. É necessária a aprovação de acionistas que representem metade, no mínimo, das ações com direito a voto, se maior  quorum  não for exigido pelo estatuto da companhia cujas ações não estejam admitidas à negociação em bolsa ou no mercado de balcão, para deliberação sobre:(...)X - dissolução da companhia.”

147 Artigo 117, §1º, alínea “b” da Lei das S.A.: “ Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.§ 1º São modalidades de exercício abu-sivo de poder:(...)b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorpo-ração, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos de-mais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;”

148 Artigo 251 da Lei das S.A.: “Art. 251. A companhia pode ser constituída, mediante escritura pública, tendo como único acionista sociedade brasileira.§ lº A sociedade que subscrever em bens o capital de subsidiária integral deverá aprovar o laudo de avaliação de que tra-ta o artigo 8º, respondendo nos termos do § 6º do artigo 8º e do artigo 10 e seu parágrafo único.§ 2º A companhia pode ser converti-da em subsidiária integral mediante aquisição, por sociedade brasileira, de todas as suas ações, ou nos termos do artigo 252.”

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221FGV DIREITO RIO

9 Pela extinção, na forma da lei, da autorização para funcionar: Se a compa-nhia depender de autorização do governo para funcionar, a cassação dessa autorização determina o fim da sociedade.

Já a dissolução por decisão judicial dar-se-á em casos em que for reque-rida, judicialmente, a desconstituição de determinada sociedade. Depende, portanto, de sentença judicial transitada em julgado. Pode ocorrer pelos seguintes fatores:

¾ Por anulação da sua constituição: Qualquer acionista pode propor ação para ver declarada a existência de vícios ou defeitos na constituição da sociedade. Uma vez anulada, por decisão judicial, a constituição da com-panhia, é esta dissolvida.

¾ Quando a companhia não puder preencher o seu fim: Em ação propos-ta por acionistas que representem, no mínimo, 5% do capital social, pode-se determinar a dissolução de uma companhia, se ficar plenamente provado que ela não preenche o seu fim social. Note-se que não se exige, para fins de legitimidade de tal pleito, que os acionistas sejam titulares de ações com direito a voto.

¾ Em caso de falência: Não havendo por parte da companhia como efe-tuar de maneira regular e pontual o pagamento de suas dívidas, abre-se o processo de falência da sociedade. Uma vez decretada a falência, a companhia é dissolvida.

Por fim, a dissolução pode se dar por decisão administrativa, isto é, quan-do há deliberação extrajudicial por parte de autoridade governamental com-petente em retirar da sociedade a sua autorização para funcionamento. É o que ocorre, por exemplo, com as instituições financeiras, que podem ser liquidadas extrajudicialmente pelo Banco Central.

3. dissolução ParCial.

Inicialmente, importante apontar que o instituto da dissolução parcial foi, a priori, elaborado como mecanismo de aplicação exclusiva às sociedades li-mitadas. Entretanto, aos poucos a jurisprudência passou a considerar possível a execução de dissolução parcial em casos envolvendo sociedades anônimas.

Na hipótese de um acionista pretender dissolver determinada sociedade anônima por entender que não mais existe a affectio societatis, a doutrina e

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jurisprudência nacionais vêm reconhecendo, em certos casos, a possibilidade de se promover uma dissolução parcial da sociedade, permitindo, desta for-ma, a continuidade das atividades sociais.

A aplicação deste instituto às sociedades anônimas é tema bastante polê-mico, já que, para alguns doutrinadores, a affectio societatis não é um elemen-to determinante para a formação do vínculo societário das companhias.

Outros doutrinadores, no entanto, entendem que podem existir tanto so-ciedades anônimas de pessoas como sociedades anônimas de capital. Assim, sustentam que naquele tipo de companhia, em que a affectio societatis é carac-terística essencial da sociedade, seria possível a dissolução parcial.

A partir da vigência do novo Código de Processo Civil, de 16 de março de 2015, o ordenamento jurídico brasileiro passará a autorizar a aplica-ção da dissolução parcial das sociedades anônimas de capital fechado nos seguintes termos:

“Art. 599:

(...)

§ 2º - A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim.”

Importante apontar que a hipótese trazida pelo Novo CPC não é a mes-ma hipótese construída pela doutrina e jurisprudência com relação à que-bra da affectio societatis.

Observando a sociedade da perspectiva de sua função social, fica clara a vantagem deste tipo de dissolução, em detrimento da dissolução total, pois fica garantida a manutenção das riquezas geradas, dos empregos e do ciclo econômico local, em respeito, ainda, à função social da empresa. Ademais, equacionam-se os interesses tanto dos sócios retirantes e contratantes, como da própria companhia.

Para que seja requerida a dissolução parcial, dois são os pré-requisitos:

a) Que a sociedade tenha sido constituída por tempo indeterminado149; e

b) Que não se trate de exercício de direito de recesso150.

149 Nas sociedades de prazo determinado, a retirada do sócio só poderá ocorrer mediante justificativa, em conformidade com o artigo 1.077 do CC/02: “Art. 1.077. Quando houver modificação do contrato, fusão da sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra, terá o sócio que dissentiu o direito de retirar-se da sociedade, nos trinta dias subsequentes à reunião, aplicando-se, no silêncio do contrato social antes vigente, o disposto no art. 1.031”. Quando tratar-se de sociedade por prazo indeterminado, a dissolução parcial poderá ocorrer mesmo sem a apresentação de qualquer justificativa, À luz do artigo 1.029 do CC/02: “Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa”.150 Com relação ao direito de recesso, Modesto Carvalhosa ensina que: “o recesso é a faculdade legal do sócio de retirar-se da sociedade mediante o recebimento de seus haveres. Trata-se de um negócio jurídico em virtude do qual a sociedade é obrigada a pagar ao sócio dissidente o valor de suas quotas. Constitui resolução unilateral ou denúncia. Trata-se de instituto nitidamente contratualista, próprio das sociedades de pessoas, nas quais se incluem, ainda que atenuadamente, as limitadas”. CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: parte especial: do direito de empresa (artigos 1.052 a 1.195). Vol. 13. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 248.

149 Nas sociedades de prazo determina-do, a retirada do sócio só poderá ocorrer mediante justificativa, em conformida-de com o artigo 1.077 do CC/02: “Art. 1.077. Quando houver modificação do contrato, fusão da sociedade, incor-poração de outra, ou dela por outra, terá o sócio que dissentiu o direito de retirar-se da sociedade, nos trinta dias subsequentes à reunião, aplicando-se, no silêncio do contrato social antes vi-gente, o disposto no art. 1.031”. Quando tratar-se de sociedade por prazo inde-terminado, a dissolução parcial poderá ocorrer mesmo sem a apresentação de qualquer justificativa, À luz do artigo 1.029 do CC/02: “Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da so-ciedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa”.

150 Com relação ao direito de recesso, Modesto Carvalhosa ensina que: “o recesso é a faculdade legal do sócio de retirar-se da sociedade mediante o recebimento de seus haveres. Trata-se de um negócio jurídico em virtude do qual a sociedade é obrigada a pagar ao sócio dissidente o valor de suas quotas. Constitui resolução unilateral ou denúncia. Trata-se de instituto ni-tidamente contratualista, próprio das sociedades de pessoas, nas quais se incluem, ainda que atenuadamente, as limitadas”. CARVALHOSA, Modes-to. Comentários ao Código Civil: parte especial: do direito de empresa (arti-gos 1.052 a 1.195). Vol. 13. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 248.

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Em companhias com baixo grau de liquidez a solicitação de dissolução parcial é mais recorrente, uma vez que é mais difícil, para o acionista que deseja retirar-se da companhia, vender suas ações no mercado secundário.

Além disso, tal pedido também é comum em casos de sociedades com pequeno número de acionistas, sociedades de capital fechado e sociedade em que se caracteriza a falta de efetivo poder deliberativo.

Contudo, são inúmeros os obstáculos legais e conceituais para a aceita-ção da dissolução parcial para as sociedades anônimas. Em primeiro lugar, a sociedade anônima é constituída visando a segurança patrimonial, e não os interesses individuais dos acionistas, de modo que tal companhia consiga atingir sua finalidade lucrativa.

Ainda, é possível argumentar que, nas companhias, exatamente por sua natureza capitalista e não pessoal, há ausência da affectio societatis entre os acionistas. E, mesmo que se argumentasse o caráter pessoal — como, por exemplo, ocorre em muitas das sociedades anônimas de capital fechado, de caráter estritamente familiar—, o regime jurídico próprio impediria a adoção da dissolução parcial.

Apesar dos argumentos supracitados e em que pese o rol do artigo 206 da LSA, a jurisprudência vem concedendo, em determinadas situações, de-cisões favoráveis à dissolução parcial de companhias.

Por fim, outro aspecto a ser considerado é o montante a ser recebido pelo sócio retirante quando do momento da apuração de haveres e liqui-dação das suas ações. A depender do caso concreto, o pagamento de tais valores pela companhia pode ser de tal forma onerosa, que inviabilizaria a continuidade da sociedade. Nestes casos, de forma geral, costuma prevale-cer o Princípio da Preservação da Empresa151.

4. liquidação.

A liquidação é a continuidade do processo iniciado com a dissolução.

Na liquidação, apura-se o ativo (bens, direitos, créditos e valores per-tencentes à companhia), paga-se o passivo (conjunto das exigibilidades e origem dos recursos dos sócios de uma sociedade), rateando-se, ao final, os ativos remanescentes entre os acionistas na proporção de suas respec-tivas participações.

151 Princípio extraído pela doutrina e jurisprudência do caput do artigo 170 da CRFB/88, que estabelece como um dos fundamentos da ordem econômica a livre iniciativa, e que ganhou maiores contornos através do artigo 47 da Lei nº 11.101/05 (Lei de Falências e Recuperação Judicial).

151 Princípio extraído pela doutrina e jurisprudência do caput do artigo 170 da CRFB/88, que estabelece como um dos fundamentos da ordem econômica a livre iniciativa, e que ganhou maiores contornos através do artigo 47 da Lei nº 11.101/05 (Lei de Falências e Recupe-ração Judicial).

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224FGV DIREITO RIO

Ao longo da liquidação, as dívidas da sociedade são pagas gradativamente, proporcionalmente, considerando-se tanto as vencidas como as vincendas.

O procedimento de liquidação de uma Companhia, em regra, assume grande relevância não só em momentos de dissolução da sociedade, mas tam-bém na falência e na recuperação judicial da Sociedade.

Neste sentido, é interessante destacar os aspectos econômicos que justifi-cam a existência de tais procedimentos jurídicos.

5. asPECtos EConômiCos.

Uma companhia pode ser acometida por crises passageiras e, portanto, superáveis. Sem embargo, muitas vezes os obstáculos para se manter no mer-cado serão intransponíveis. Em ambos os casos, o Direito Concursal confere subsídios para que os reflexos dessas crises impactem os credores da empresa da forma menos danosa possível.

Neste sentido, aduzem Rasmunssen e Skeel:

“at the heart of the economic analyses of corporate bankruptcy law is the direction between economic distress and financial distress. A firm that is experiencing economic distress is one in which its operating revenues are less than it operating costs. Such a firm should not continue in business. Its con-tinued existence drains the economy. Indeed, in some instances, allowing the firm to continue in operation under the protection of the bankruptcy law may lead to widespread losses in the industry in which operates.”

Neste cenário, quando a reestruturação da Empresa não se mostrar viável, a melhor opção oferecida pelo Direito Concursal, para que cumpra o seu objetivo, é o processo de Falência da Empresa.

No caso de a crise ser contornável por meio de alguma das alternativas de reestruturação do Devedor, a Recuperação Judicial será o procedimento mais adequado na persecução do objetivo do Direito Concursal.

O procedimento da Falência ou Liquidation é aquele no qual todos os ativos da empresa são arrecadados e alienados para o pagamento dos credores do Devedor. A soma obtida com tal alienação é conhecida por Liquidation Value (valor de liquidação). A avaliação de uma empresa também pode ser dimensionada conforme sua previsão de fluxo de caixa, decorrente do seu conjunto de ativos operacionais152.

152 CAVALLI, Cassio e AYOUB, Luiz Roberto. A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p.219

152 CAVALLI, Cassio e AYOUB, Luiz Ro-berto. A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p.219

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O resultado desta análise é conhecido como Going Concern Value da em-presa. As empresas que demonstram um Going Concern maior do que o Liquidation Value são aquelas que têm alguma chance de reerguimento, e por isso podem/devem ser submetidas ao processo de Recuperação Judicial.

Para esclarecer tais conceitos, convém recordar a parábola da peixaria:

Em um primeiro cenário, a venda da totalidade dos peixes da peixaria geraria uma receita de R$100.000,00 (cem mil reais). Porém, tal alienação impossibilitaria a continuidade da pesca.

Paralelamente, a venda da propriedade, sem os peixes, geraria um ganho financeiro de R$150.000,00 (cento e cinquenta mil reais).

Assim, a operação que representaria a liquidação do Açude geraria uma receita total de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) ao seu dono.

Por outro lado, a manutenção dos peixes na peixaria permitiria um be-nefício financeiro, em dez anos, de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), que, descontados a valor presente, representariam digamos, R$ 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil reais).

Portanto, se o seu dono desistisse da pesca para trabalhar no mercado financeiro e quisesse vender a peixaria, com todos os seus peixes, poderia fazê-lo por um preço maior do que pelo valor de liquidação.

Com efeito, esse seria o valor de going concern153 da peixaria. Desta for-ma, manter o açude em atividade geraria um beneficio maior do que liquidá--lo, ou seja, seu going concern é maior do que o seu liquidation value.

Para os fins da Análise Econômica do Direito concursal, os valores de going concern e liquidation value são essenciais na tomada de decisão entre os processos de Falência ou Recuperação Judicial.

Essa questão é esclarecida pelos ensinamentos de Kordana e Posner154:

“The standard justification for a bankruptcy system is that it maximi-zes the value of the debtor’s assets in case of default. In the absence of a bankruptcy system, creditors would exercise their state court remedies individually, and this would result in the debtor being liquidated in piecemeal fashion although sometimes value would be maximized if the debtor’s assets were sold together or the debtor were reorganized(…)

153 “Going Concern” é uma projeção de natureza contábil. Foi incorporada no American Institute of Certified Public Accountants’ Statement on Auditing Standards No. 1 Codification of Auditing Standards and Procedures, Section 341, da seguinte forma: “The Auditor’s Consideration of an Entity’s Ability to Continue as a Going Concern”(AU Section 341). The ‘going concern’ concept assumes that the business will remain in existence long enough for all the assets of the business to be fully utilized. Utilized assets means obtaining the complete benefit from their earning potential. (i.e. if you recently purchased equipment costing $5,000 that had 5 years of productive/useful life, then under the going concern assumption, the accountant would only write off one year’s value $1,000 (1/5th) this year, leaving $4,000 to be treated as a fixed asset with future economic value for the business).”154 KORDANA, Kevin, POSNER, Eric A;. A Positive Theory of Chapter 11. Jonh M. Olin & Economics Working Paper nº61. (2nd Series) Disponível no endereço: <http://www.law.uchicago.edu/files/files/61.Eposner.Chpt11.complete.pdf>. Acesso em 2 de fevereiro de 2016.

153 “Going Concern” é uma projeção de natureza contábil. Foi incorporada no American Institute of Certified Public Accountants’ Statement on Auditing Standards No. 1 Codification of Auditing Standards and Procedures, Section 341, da seguinte forma: “The Auditor’s Consideration of an Entity’s Ability to Continue as a Going Concern”(AU Section 341). The ‘going concern’ concept assumes that the business will remain in existence long enough for all the assets of the business to be fully utilized. Utilized assets means obtaining the complete benefit from their earning potential. (i.e. if you recently purchased equipment costing $5,000 that had 5 years of productive/useful life, then under the going concern assumption, the accountant would only write off one year’s value $1,000 (1/5th) this year, leaving $4,000 to be treated as a fixed asset with future economic value for the business).”

154 KORDANA, Kevin, POSNER, Eric A;. A Positive Theory of Chapter 11. Jonh M. Olin & Economics Working Paper nº61. (2nd Series) Disponível no endereço: <http://www.law.uchicago.edu/files/files/61.Eposner.Chpt11.complete.pdf>. Acesso em 2 de fevereiro de 2016.

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226FGV DIREITO RIO

If the liquidation value exceeds the going concern value, the firm should be liquidated; otherwise the firm should be reorganized. The optimal system of corporate reorganization captures the going concern surplus, if any, and distributes the firm’s value to the creditors in the form of money or securities (without at the same time increasing the probability of bankruptcy or causing other ex ante distortions). How might a system of reorganization maximize the going concern surplus? It must ensure that information is aggregated properly. The debtor, the creditors, and independent parties like examiners and trustees will generally have in-complete and only partly overlapping information about the value of the firm. If they can be forced to reveal their information, the latter can be used todetermine whether the firm should be liquidated or reorganized, and if reorganized, how.”

Por fim, importante ressaltar que a liquidação da empresa aos “pedaços” (ou por partes) (piece meal) é prejudicial do ponto de vista da satisfação dos créditos da maior parte dos credores, uma vez que, em regra, há um valor agregado aos ativos quando analisados conjuntamente.

Em suma, o processo da falência deverá dispor de meios para maximizar o liquidation value da empresa, enquanto que, o processo de Recuperação Judi-cial será útil na medida em que auxiliar na preservação do seu going concern.

6. Extinção.

Na expressão da doutrina, “a extinção da companhia é (...) o encerramento final e definitivo de suas atividades e de suas responsabilidades, salvo as decorren-tes da liquidação, quando for o caso”.

O artigo 219 da LSA prevê as possibilidades de extinção da sociedade, da seguinte maneira:

“Art. 219. Extingue-se a companhia:

I - pelo encerramento da liquidação;

II - pela incorporação ou fusão, e pela cisão com versão de todo o patri-mônio em outras sociedades.”

Vale destacar que, na hipótese elencada no inciso II, a extinção se dá sem que haja um processo de liquidação da companhia.

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

227FGV DIREITO RIO

7. quEstão Para rEflExão: inovação lEGislativa.

Conforme aduzem Humberto Dalla e Paulo Cezar Pinheiro Carneiro :

“Finalmente, resta positivado que não só as sociedades empresárias con-tratuais ou simples podem ser parcialmente dissolvias em juízo, mas, também, em visão excepcional, a sociedade anônima de capital fechado - geralmente com caráter familiar - em condições especiais.”

O dispositivo em comento determina que:

“A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acio-nista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim.”

À luz do discutido neste tópico, elabore parecer direcionado ao juízo em-presarial da Comarca da Capital fixando orientação interpretativa acerca des-te novo dispositivo legal.

Quais seriam os requisitos necessários à aplicação do instituto da dissolu-ção parcial a sociedade anônima fechada?

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

228FGV DIREITO RIO

João pEdro bArroso do nAscImEntoDoutorando e Mestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Pós-Graduado em Direito Empresarial, com concentração em Direito Societário e Mercado de Capitais, pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ). PON em Harvard Law School. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).Diretor do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (IBRADEMP). Docente dos Cursos de Graduação e de Pós-Graduação da FGV Direito RioProfessor das Disciplinas: “Organização Jurídica da Grande Empresa”; “Regulação do Mercado de Valores Mobiliários”; “Direito Societário Avançado”; “Ofertas Públicas, Tomadas de Controle e Medidas Defensivas” e “Contratos Empresariais”.Autor do livro “Medidas Defensivas à Tomada de Controle de Companhias” e de diversos artigos em obras coletivas e revistas especializadas155.

155 http://lattes.cnpq.br/2359909105908495

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ORGANIZAÇÃO JURÍDICA DA GRANDE EMPRESA

229FGV DIREITO RIO

FINANÇAS PÚBLICAS

FGV DIREITO RIO 214

FICHA TÉCNICA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

Sérgio GuerraDIRETOR

Antônio Maristrello PortoVICE-DIRETOR

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAÇÃO

André Pacheco Teixeira MendesCOORDENADOR DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSINO