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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE I

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE

I

A IMPORTÂNCIA DA IMPLEMENTAÇÃO DAS LEIS 10.639/03 E 11.645/08 E SUA ARTICULAÇÃO COM OS CONTEÚDOS ESTRUTURANTES

DA EDUCAÇÃO FÍSICA.

Autor: Tatiane Machado de Almeida1

Orientador: Alfredo Cesar Antunes2

RESUMO Contextualizar a implementação das leis que se referem ao ensino das culturas africanas e indígenas é ainda um desafio para as escolas. Neste trabalho discute-se a importância da articulação das Leis 10.639/03 e 11.645/08 com o ensino da Educação Física. Desta forma, o objetivo foi verificar quais são as dificuldades que os professores encontram em implementar e articular os conteúdos estruturantes com o ensino das culturas africanas e indígenas e propor atividades regulares que possam ser realizadas nas aulas de Educação Física. Foram utilizadas como instrumento de coleta de dados o questionário, a observação e o registro da participação dos professores. Através destes instrumentos de pesquisa, espera-se auxiliar os professores com sugestões de atividades que articulem os conteúdos estruturantes com as leis.A proposta foi executada por meio de oficinas no Colégio Estadual Jardim Alegre, na cidade de Telêmaco Borba, com professores de Educação Física, onde foram apresentadas estratégias e ações para realizar o trabalho de implementação das leis da melhor forma possível, fazendo a relação com diferentes conteúdos e abrindo novas possibilidades de compreensão, cumprindo assim seu objetivo de auxiliar aos professores com atividades teóricas e práticas para a articulação e implementação das leis com os conteúdos estruturantes da Educação Física. Palavras-chave: Articulação, leis, conteúdos

1.INTRODUÇÃO

Este trabalho é resultado da implementação do projeto de intervenção

pedagógica na escola, intitulada” A implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08

sobre o ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena na disciplina de

Educação Física “, no Colégio Estadual Jardim Alegre, no período de 2014 e 2015,

por ocasião do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) da Secretaria de

Estado da Educação do Paraná.

A intervenção pedagógica foi realizada com os professores de Educação

Física, com o objetivo de pesquisar como as leis 10.639/03 e 11.645/08 estão sendo

implementadas nas aulas de Educação Física. Além disso, através das pesquisas

realizadas pode-se verificar e identificar quais as dificuldades que os professores de

1 Professor QPM de Educação Física da Rede Estadual de Educação do Estado do Paraná. Núcleo Regional de Telêmaco Borba. Integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), 2014.

2 Doutor em Ciência do Desporto ( UNICAMP). Docente do Departamento de Educação Física da Universidade

de Ponta Grossa.

Educação Física encontram em relacionar a implementação das leis com os

conteúdos estruturantes da educação física, assim como,desenvolver atividades

referentes a implementação das leis articuladas com os conteúdos.

O trabalho proposto visa mostrar a importância do ensino das leis 10.639/03 e

11.645/08 no ensino da disciplina da Educação Física. Com a obrigatoriedade do

ensino dessas leis a partir de 2003, os professores passaram a ter que incluir o

ensino da cultura africana , afro-brasileira e indígena em seus planejamentos. A

pesquisa se deu através de um questionário onde pode-se verificar em um primeiro

momento quais as dificuldades que os professores encontravam em desenvolver

estes conteúdos, visto que muitas vezes, alguns professores acabavam trabalhando

apenas nas datas comemorativas como 13 de maio ou 20 de novembro, e de forma

fragmentada, como se fosse um conteúdo a mais, e não garantindo uma articulação

com os conteúdos propostos nas Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, para

cada disciplina.

As atividades desenvolvidas foram de grande valia para a implementação do

projeto proposto, visando uma maior variedade nas aulas de educação física.

Segundo Rangel (2006) favorecer o intercâmbio cultural é valorização da história de

diferentes países africanos. Ainda de acordo com as Diretrizes Curriculares

Estaduais os conteúdos:

Devem ser tratados, na escola, de modo contextualizado [...] propõe-se que tais conhecimentos contribuam para a crítica, ás contradições sociais, políticas e econômicas presentes nas estruturas da sociedade contemporânea ( DCE, 2008, p.14 ).

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. O Ensino das Culturas Africanas e Indígenas na Educação Física

A história da Educação Física retrata vários movimentos que contribuíram pa-

ra formar o currículo que hoje conhecemos. As primeiras sistematizações ocorreram

por influências vindas da Europa com as Escolas de Ginásticas ( Francesa, Sueca e

Alemã )3, que visavam apenas a manutenção do físico, baseados em moldes médi-

3 No século XIX, passou por um processo de sistematização, denominado de Movimento Ginástico Europeu, que objetivava romper seus vínculos com práticas populares, além de disciplinar a

cos-higiênicos. No Brasil com a proclamação da República começaram as discus-

sões sobre as instituições escolares e as políticas educacionais. Segundo as Diretri-

zes Curriculares do Estado do Paraná no ano de 1882, Rui Barbosa emitiu o parecer

n.224, sobre a Reforma Leôncio de Carvalho, decreto n. 7.247, de 19 de abril de

1.879, da Instituição Pública . Entre outras conclusões, a importância da ginástica

para a formação de corpos fortes e cidadãos preparados para defender a Pátria, e-

quiparando-a em reconhecimento, às demais disciplinas ( SOARES, 2004), pois a

Educação Física ainda buscava sua legitimação, para que não fosse vista apenas

como uma prática meramente esportiva. Conforme consta no próprio parecer, "[...]

com a medida proposta, não pretendemos formar acrobatas nem Hércules, mas de-

senvolver na criança o quantum de vigor físico essencial ao equilíbrio da vida huma-

na, á felicidade,da alma, á preservação da Pátria e á dignidade da espécie." (

QUEIRÓS apud CASTELLANI FILHO, 1994, p.53.) DIRETRIZES CURRICULARES.

PARANÁ, 2008.

Na década de 80 houve uma produção literária muito grande na área da edu-

cação, onde ocorreram várias transformações no modo de se pensar não só a Edu-

cação Física, mas todas as outras disciplinas. A Educação Física passou a dar im-

portância não só ao físico, mas a outros fatores que tratam o ser humano na sua

totalidade visando a formação integral. Essa visão humanista muito contribuiu para

quebrar a visão de que a Educação Física tratava somente de esporte. Daí surge o

termo psicomotricidade, que começa a ser divulgado aqui no Brasil no final dos anos

70, quando da introdução do discurso psicomotor na Educação Física brasileira, co-

mo movimento renovador. Nesse período, houve uma expansão dos cursos de pós -

graduação na área de Educação Física no Brasil, possibilitando o surgimento de no-

vas correntes e tendências que trouxeram críticas ao modelo de educação vigente

no país, todas elas trazendo questionamentos sobre a legitimação da disciplina co-

mo conhecimento escolar. Entre as principais tendências destacam-se:

1.DESENVOLVIMENTISTA: defende a ideia de que o movimento é o principal meio

e fim da Educação Física. Constitui o ensino de habilidades motoras de acordo com

uma sequência de desenvolvimento. Sua base teórica é, essencialmente, a psicolo-

gia do desenvolvimento e aprendizagem.( DCE's. PARANÁ. 2008, p.118)

população moral e fisicamente (SOARES, 2002). Deste processo, resultaram os Métodos Ginásticos.

2.CONTRUTIVISTA: defende a formação integral sob a perspectiva construtivista-

interacionista. Inclui as dimensões afetivas e cognitivas ao movimento humano. Em-

bora preocupada com a cultura infantil, essa abordagem se fundamenta também na

psicologia do desenvolvimento. (DCE's. PARANÁ. 2008, p.118)

Já na década de 90 com a ascensão das Pedagogias Progressistas ou Críti-

cas a Educação Física passou por momentos de indefinições e também pela busca

de sua identidade, como disciplina. Um grande passo para isso foi a inclusão na

proposta pedagógica da escola e a obrigatoriedade de ser um componente curricular

na educação básica assegurada na LDB de 1996. Nesse sentido, a Educação Física

valoriza-se crítica, para contribuir com a realidade do país, em resgate á cultura cor-

poral do movimento da população (MOREIRA, 2008 apud OLIVEIRA, 2012). Após

essas discussões a Educação passou a reconhecer o indivíduo como alguém que

influencia e que sofre as influências do meio em que vive, buscando-se, assim, um

currículo que desperte seu interesse, pois as aulas repetitivas onde só o professor

falava já não atendia as necessidades atuais do ser humano. Hoje ele interage nas

mais diversas formas de cultura, então os conteúdos também precisam ser repensa-

dos, eles precisam atender as expectativas dos educandos na atualidade.

A Educação Física escolar é uma área do conhecimento que trabalha o corpo

e o movimento como partes da cultura humana. Assim, não se devem associar seus

benefícios somente a propósito das questões fisiológicas dos seres humanos, mas

sobretudo, ao autoconhecimento corporal, melhoria da autoestima, do autoconceito,

entre outros. Ainda, a Educação Física deve ser " um espaço educativo privilegiado

para promover as relações interpessoais, a autoestima e a autoconfiança, valorizan-

do-se aquilo que cada indivíduo é capaz em função de suas possibilidades e limita-

ções pessoais" ( DE MARCO, 1995, p.77)

Compreender a Educação Física sob um contexto mais amplo significa en-

tender que ela é composta por interações que se estabelecem nas relações sociais,

políticas, econômicas e culturais dos povos. É partindo dessa posição que as Diretri-

zes Curriculares ( PARANÁ, 2008) apontam a Cultura Corporal como objeto de es-

tudo e ensino da Educação Física, evidenciando a relação estreita entre a formação

histórica do ser humano por meio do trabalho e as práticas corporais decorrentes.

A ação pedagógica da Educação Física deve estimular a reflexão sobre o acervo de formas e representações do mundo que o ser humano tem pro-duzido, exteriorizadas pela expressão corporal em jogos e brincadeiras,

danças, lutas, ginásticas e esportes. Essas expressões podem ser identifi cadas como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem (COLETIVO DE AUTORES, 1992 apud. PARANÀ, 2008.p.53.).

Assim, nas Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (PARANÁ,2008), re-

conhece-se que:

[...] além de seus conteúdos “mais estáveis”, as disciplinas escolares incor-poram e atualizam conteúdos decorrentes do movimento das relações de produção e dominação que determinam relações sociais, geram pesquisas científicas e trazem para o debate questões políticas e filosóficas emergen-tes. Tais conteúdos, nas últimas décadas, vinculam-se tanto à diversidade étnico-cultural quanto aos problemas sociais contemporâneos e têm sido in-corporados ao currículo escolar como temas que transversam as disciplinas, impostos a todas elas de forma artificial e arbitrária.(PARANÀ, 2008, p.26).

Esses temas são reconhecidos como Elementos Articuladores, que por sua

vez visam mudar a forma que os conteúdos vem sendo abordados, tentando integrar

de forma mais reflexiva e contextualizada. Com base nesses temas é que foi de-

senvolvido esse trabalho, mostrando que os conteúdos podem e devem exercer uma

transformação social e não somente pedagógica, buscando modificar os conteúdos

escolares de forma desafiadora e transformadora.

Segundo Oliveira ( 2012) o ensino da história e cultura afro-brasileira e africa-

na, mediante a implementação da Lei 10.639/03, a temática da pluralidade cultural

afro passou a ser valorizada, enriquecendo os conteúdos que possam ser desenvol-

vidos nas escolas. Nesse sentido, as vivências podem propiciar a preservação, o

respeito e a valorização da nossa cultura, diminuindo posturas preconceituosas, a

caminho da igualdade racial.

2.2. As leis 10.639/03 e 11.645/08

A criação dessas leis surgiram para que houvesse o verdadeiro reconheci-

mento, da importância no resgate das culturas africanas e indígenas, que tanto con-

tribuíram para a história e crescimento deste país.

A obrigatoriedade de inclusão de História de História e Cultura Africana nos currículos da Educação Básica trata-se de decisão política,com fortes re-percurssões pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta medida, reconhece-se que, além de garantir vagas para negros nos bancos escolares, é preciso valorizar devidamente a história e cultura do seu povo, buscando reparar danos, que repetem há cinco séculos, á sua identidade e á seus direitos. A relevância de estudos de temas decorrentes da história e cultura afro-brasileira e africana não se restringe a população negra, ao con-trário, dizem respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e pluri-étnica, capazes de construir uma nação democrática.

Nesta perspectiva, cabe às escolas incluir no contexto dos estudos e ativi-dades, que propicia diariamente, também as contribuições histórico-culturais dos povos indígenas e dos descendentes de asiáticos, além das de raiz a-fricana e européia. (CADERNOS TEMÁTICOS, GOVERNO DO PARA-NÁ.2008 p. 13).

A Lei 10639/03 vem alterar a Lei nº 9394/96 estabelecendo as diretrizes e

bases da educação nacional, tornando obrigatório o ensino da História e Cultura A-

fro-Brasileira nos estabelecimentos de ensino. A referida Lei traz os seguintes apon-

tamentos:

Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-brasileira. § 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, res-gatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. § 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão mi-nistrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.[...] Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Na-cional da Consciência Negra’."

Em 2008, a Lei 10.639 foi modificada pela Lei 11.645 que também incluiu no

currículo escolar o ensino da História e Cultura Indígena. Tais leis pretendem tirar os

afrodescendentes e os indígenas da escuridão a que eram renegados e mostrar sua

importância para a formação de nossa sociedade. E são fruto das lutas travadas pe-

lo Movimento Negro Brasileiro, em prol da igualdade e reconhecimento do valor des-

ses povos.

Assim como em outras disciplinas, a obrigatoriedade do ensino destas leis

também passou a ser obrigatório também nas aulas de Educação Física, porém,

pude perceber através do questionário aplicado com os professores e observações,

que ainda há uma dificuldade em se estabelecer uma relação com os conteúdos tra-

balhados nas aulas com estas leis, por isso, a necessidade de descobrir porque isso

ocorre. A importância da implementação destas leis, é muito grande, pois a Educa-

ção Física é uma área do conhecimento que estuda: o corpo inserido na sociedade,

ou seja na cultura e diversidade corporal.

Busca-se, assim, superar formas anteriores de concepção e atuação na es-cola pública, visto que a superação é entendida como ir além, não como negação do que precedeu, mas considerada objeto de análise, de crítica, de reorientação ou transformação daquelas formas. Nesse sentido, procura-se possibilitar aos alunos o acesso ao conhecimento produzido pela humani-

dade, relacionando-o ás práticas corporais, ao contexto histórico, político, econômico e social. ( Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná. PARA-NÁ,2008, p.125).

Como o Brasil sofre influências de várias etnias, não poderíamos deixar de

evidenciar essas questões em nossas aulas, valorizar as nossas origens é valorizar

o nosso povo e nossa história, os alunos precisam perceber a importância e a impli-

cação dela sobre o nosso processo histórico. A valorização do negro e do indígena

visa resgatar tudo o que foi esquecido ou apagado da nossa história, por serem con-

siderados povos primitivos ou inferiores, e faz-se urgente que os professores este-

jam preparados para trabalhar com as relações étnico-raciais tentando acabar com

as diferenças raciais existentes.

2.3. A Cultura Africana e Indígena no Ensino da Educação Física

Com a criação das Leis 10.639 e 11.645 e sua obrigatoriedade na Educação

Básica, os professores ficaram com a responsabilidade, não só de trabalhar esses

conceitos, mas de criar estratégias para que possa haver uma mudança de princí-

pios e de comportamento que será possibilitada através da articulação dos conteú-

dos diários com os temas abordados nas Leis.

É preciso que os professores, principalmente, compreendam que não se trata de substituir um modo de enfoque de um currículo por outro, substituir o enfoque eurocêntrico por um africano, mas "de ampliados currículos escolares para a di-versidade cultural, racial social e econômica brasileira". ( GONÇALVES E SILVA apud PARANÁ. 2008.p.25)

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), nos referencia quanto a legi-

timação das leis que garantem a obrigatoriedade dos ensinos das culturas africanas

e indígenas:

Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. § 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da so-ciedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, eco-nômica e política, pertinentes á história do Brasil. § 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo esco-lar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.

A obrigatoriedade do ensino das leis 10.639/03 e 11.645/08, ainda é muito

recente e causa uma certa insegurança aos professores, que precisam rever sua

práxis para atender á esses novos desafios. Os Parâmetros Curriculares Nacio-

nais(BRASIL,1996), ao reconhecerem a complexidade da prática educativa, buscam

auxiliar o professor na sua tarefa de assumir, como profissional, o lugar que lhe cabe

pela responsabilidade e importância no processo de formação do povo brasileiro. Os

Parâmetros visam a importância de se tratar nas aulas temas atuais que mostram

aos alunos que a escola e os conteúdos não estão isolados do resto do mundo, a

esses temas ele nominou de Temas Transversais que são documentos que visam

auxiliar a escola em seu papel social.

A temática das culturas africanas e indígenas, nos diz que a escola ao consi-

derar a diversidade, tem como valor máximo o respeito às diferenças e não o elogio

à desigualdade. Essa temática é abordada nas Diretrizes Curriculares do Estado do

Paraná (PARANÁ, 2008), ela trata esses conteúdos como Elementos Articuladores,

e também nos mostra a importância do ensino da Cultura Afro-brasileira ao incluir

como conteúdo básico a capoeira que não é meramente uma forma de luta, mas

sim, um movimento histórico que marcou a história dos negros no Brasil.

Assim como a dificuldade de trabalhar os conteúdos da cultura africana tam-

bém existe a dificuldade em trabalhar a influência da cultura indígena que tanto sig-

nifica para a identidade cultural do Brasil. A grande preocupação com a implementa-

ção dessas leis é justamente como elas vem sendo vivenciadas na escola. Através

de minhas observações e experiência como docente na escola, percebi que muitos

professores não se encontram abertos a novas perspectivas de aprendizado que

oportunize ao aluno olhar os conteúdos de forma diferente e fazendo a articulação

com o mundo onde vive. Bergamaschi e Gomes (2012), nos mostram a importância

da intercultura na escola:

Se os povos indígenas empreendem esforços para concretizar o diálogo in-tercultural, nos levam a pensar que se a proposta educacional é conviver e efetuar trocas com as sociedades indígenas, a escola terá que fazer um es-forço para conhecer esses povos, sua história e sua cultura e, mais especi-almente, afirmar uma presença que supere a invisibilidade histórica que se estende até o presente. Apesar da colonização, do genocídio, da explora-ção, da catequização, da tentativa de assimilar os indígenas à sociedade nacional, estes povos mantiveram-se aqui, resistentes, mesmo que por ve-zes silenciosos. Se apresentam fortes, num movimento político de afirma-ção étnica, mostrando que aqui estão e permanecerão.( BERGAMASCHI e GOMES.2012,p.55)

Através desses elementos interculturais contribuímos para uma formação

mais ampla do indivíduo tanto crítica como reflexiva, buscando reconhecê-lo como

agente histórico, político, social e cultural. Contextualizar o conteúdo é muito impor-

tante para esse processo, um exemplo é a capoeira que contempla não somente a

prática do esporte, mas todo o processo político e histórico que está inserido, abran-

gendo várias mudanças no modo de agir e pensar de uma sociedade.

2.4. A capoeira como manifestação cultural e esportiva

A capoeira representa uma manifestação cultural e de libertação, porém, ela

pode ser trabalhada abrangendo diversos conteúdos da Educação Física, como por

exemplo: a dança, lutas, lazer, esporte, identidade corporal,folclore, entre outros. Ela

surgiu como forma de defesa dos escravos e acabou tornando-se um elemento da

cultura afro-brasileira e hoje chega nas nossas escolas como conteúdo . Desde o

seu surgimento até os dias de hoje ela, assim como a Educação Física, ela passou

por diversas mudanças, apresentando várias divisões, e também regras para que

possa fazer parte do esporte. Mas apesar destas mudanças ela não perdeu a sua

origem, pois continua a encantar a todos pela beleza dos seus movimentos.

A Capoeira, manifestação de origem escrava, que no Brasil faz-se presente desde no mínimo, o início do século XIX, ocupou na sociedade colonial e imperial um papel ligado à marginalidade sendo perseguida e reprimida. Nesse período, sua prática era feita, majoritariamente, por escravos favore-cendo sua resistência cultural. Duramente perseguida com o início da Re-pública, numa proporção maior que nos anos anteriores, esta manifestação conseguiu se perpetuar até a década de 1930, quando o momento político favoreceu a Capoeira com o abrandamento da perseguição e com o olhar diferenciado do Governo de Getúlio Vargas sobre as práticas culturais popu-lares. Nesse período uma parcela de seus praticantes adequou-se aos dis-cursos esportivos e a Capoeira tomou novos rumos.( SILVA. 2011, p.03).

Como a capoeira passou a ser praticada abertamente, ela também tomou no-

vos rumos, surgindo então dois ramos distintos: a capoeira angola e a capoeira regi-

onal. Surgiram também os grandes mestres como: Mestre Pastinha e Mestre Bimba,

que foram responsáveis por atrair novos adeptos da capoeira.

A prática da capoeira na escola é muito fácil, é possível de ser realizada em

pequenos espaços e poucos materiais. Ela pode ser ensinada principalmente a partir

da vivência corporal do aluno, que já carrega consigo, na maioria das vezes, a ginga

necessária para a execução dos movimentos. A inclusão deste conteúdo nas aulas

de Educação Física foi muito valiosa, visto que, por se tratar de um movimento que

carrega consigo toda essa história, ela nos faz refletir sobre o papel que ocupa pe-

rante a sociedade, trazendo ao nosso cotidiano escolar todas essas indagações pa-

ra serem discutidas e com isso contribuirmos para a formação crítica do aluno.

Hoje ela é muito utilizada nas escolas para tratar da influência da cultura afri-

cana, porém não podemos ficar presos somente a um conteúdo, devemos procurar

novas formas de implementação dessas culturas nos conteúdos da Educação Física

explorando todas as possibilidades que esta temática pode nos oferecer.

3. A IMPLEMENTAÇÃO NA ESCOLA

O Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola foi realizado com professores

de Educação Física do Colégio Estadual Jardim Alegre, no município de Telêmaco

Borba, Paraná, no ano de 2015. Para se conseguir os objetivos propostos no

projeto, as atividades foram iniciadas no mês de fevereiro com a apresentação do

projeto para os professores do colégio na semana pedagógica que ocorreu nos dias

02 a 05 de fevereiro de 2015 e foram concluídas em julho de 2015.

Após a apresentação do projeto de implementação aos professores, eles

relataram que acharam o projeto muito interessante, e que irá atender a algumas

necessidades dos mesmos referentes a falta de materiais para se trabalhar sobre o

tema proposto.

A implementação começou com uma sondagem através de um questionário

aplicado com quatro professores de Educação Física sobre como eles implementam

as leis nas suas aulas, quais suas dificuldades, se consideram importante, e tam-

bém se existe a articulação da implementação das leis com os conteúdos estruturan-

tes da educação física. Como pudemos perceber com base nas respostas do ques-

tionário, todos acham muito importante saber sobre as leis, como exemplo o relato a

seguir:

"Considero importante pela valorização de sua raízes que há muito tempo influenci-

am em nossa cultura e que muitas vezes os nossos alunos e sociedade não tem co-

nhecimento sobre estes fatos.” ( Professor A)

Sobre a obrigatoriedade do ensino das leis 10.639/03 e 11.645/08 todos tam-

bém concordaram que é muito importante e que também trabalham a implementa-

ção nas suas aulas, porém muitas vezes não conseguem fazer a articulação como

deveria ser. Quando perguntado como se dava a implementação das leis nas aulas,

uma professora nos relatou que:

"No primeiro momento fala-se da lei e porque ela é importante, faz-se uma sonda-

gem com os alunos e leva-se a prática de várias atividades que a cultura em si nos

traz no esporte, na dança e nas lutas." ( Professor B).

Dando continuidade a implementação foram desenvolvidas as atividades pro-

priamente ditas, com a realização das oficinas 1, 2, 3, 4, 5 e 6, onde foram realiza-

das diversas atividades sendo:

Oficina 1: início da implementação do projeto com uma sondagem prévia do

que os professores conheciam sobre a implementação das leis de

obrigatoriedade do ensino das culturas africanas e indígenas e como faziam a

articulação desse tema com os conteúdos estruturantes da Educação Física.

A professora X relatou que: falava com os alunos sobre a importância das leis

e levava para os alunos aulas práticas que abordassem as culturas africanas

e indígenas, que estão inseridos dentro dos conteúdos de esporte, dança e

lutas. Após o questionário assistimos ao filme “Vista minha pele”4, que fala

sobre o preconceito entre brancos e negros, depois foi confeccionado um

cartaz que abordava o tema: Preconceito na Escola.

Oficina 2: realização da Oficina 2, onde falamos sobre a capoeira, a

discussão foi bastante rica e a troca de experiências também, pois a capoeira

é um conteúdo que engloba vários temas: a dança, lutas, lazer, esporte,

identidade corporal, entre outros. Este conteúdo é geralmente o mais

trabalhado nas aulas de Educação Física, por ser o mais conhecido. Então

primeiramente lemos um texto sobre a capoeira5, depois foi realizada uma

pesquisa na internet e foi respondido algumas questões sobre o assunto

proposto. Após a pesquisa, assistimos o filme sobre a vida de um dos

capoeiristas mais conhecidos na história da capoeira:” Mestre

Bimba:Capoeira Iluminada.6

Oficina 3: utilizando-se da ferramenta internet, os professores pesquisaram

em vários repositórios sites que sejam fontes de pesquisa para a capoeira, e

4 Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=LWBodKwuHCM. Acesso em 04/11/2014. 5 Fonte do texto: http://www.suapesquisa.com/educacaoesportes/historia_da_capoeira.htm. Acesso em

06/11/2014. 6 Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=EHnPkKZxcmQ. Acesso em 06/11/2014.

todos se surpreenderam ao encontrar uma quantidade significativa de sites

relacionados ao tema. Em seguida, os sites foram elencados e

compartilhados entre os professores de Educação Física e também das

demais disciplinas.

Oficina 4: realização de uma pesquisa utilizando-se da ferramenta internet,

sobre danças da cultura africana e indígena, após a pesquisa foi

confeccionado um cartaz sobre o tema. Foi também uma oficina muito

produtiva, pois uma das professoras possuía um bom conhecimento sobre

danças, inclusive as africanas e foi possível compartilhar seus conhecimentos

e experiências com os demais participantes.

Oficina 5: realização de uma pesquisa sobre jogos e brinquedos de

descendência africana, e confeccionamos brinquedos utilizando materiais

recicláveis.

Oficina 6: realização de uma pesquisa sobre jogos e brinquedos. Nesta

oficina o tema abordado foi jogos e brincadeiras indígenas e foi realizado a

confecção dos brinquedos com materiais recicláveis.

Para a avaliação final das oficinas houve a elaboração de um texto onde os

professores puderam relatar suas experiências após a vivência das atividades do

projeto de implementação, uma das professoras relatou que houve uma mudança na

forma de pensar e também de implementar as leis 10. 639/03e11.645/08. Este texto

serviu para avaliar o trabalho proposto, que segundo os professores participantes do

projeto, foi de grande valia para o enriquecimento nas aulas de Educação Física. Os

professores se mostraram abertos a novas perspectivas de aprendizado, onde

podemos oportunizar aos alunos um novo olhar frente aos desafios que temos para

acabar com as desigualdades culturais e existentes em nossa sociedade.

No dia 22/07/15, houve a exposição de todos os trabalhos realizados durante

a implementação do projeto para toda a comunidade escolar.

Na última oficina, houve a elaboração de um texto para o fechamento do tema

proposto, onde após a vivência de diversas atividades, os professores relataram que

houve uma mudança na forma de pensar e também de implementar as leis

10.639/03 e 11.645/08. Este texto serviu para avaliar o trabalho proposto, que

segundo eles foi de grande valia para o enriquecimento nas aulas de educação físi-

ca. Os professores se mostraram bastante abertos á novas perspectivas de aprendi-

zado, buscando sempre formas de oportunizar aos alunos um novo olhar frente aos

desafios que temos para diminuir as desigualdades culturais e raciais existentes em

nossa sociedade.

Para finalizar as atividades de implementação com os professores, todos os

materiais produzidos foram expostos no saguão do colégio para a apreciação da

comunidade escolar, para divulgar e dividir com os demais o conhecimento produzi-

do durante o processo de aprendizagem no desenvolvimento do trabalho proposto.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

A obrigatoriedade do ensino das leis 10.639/03 e 11.645/08 ainda é um tema

que traz muitas dúvidas aos professores de como ela deve ser implementada, com a

sua obrigatoriedade nas escolas buscou-se diminuir as diferenças sociais e culturais

existentes na nossa sociedade, e também valorizar a cultura africana e indígena que

tanto contribuíram para a formação do povo brasileiro. Negar essas raízes culturais

é o mesmo que negar a nossa cultura, pois elas estão presentes em nosso cotidia-

no, porém ficaram esquecidas e limitaram-se equivocadamente apenas as aulas de

história.

O tema da obrigatoriedade da implementação das leis 10.639/03 e 11.645/08

não é novo, porém ainda não conseguimos implementá-la de forma a abranger to-

das as disciplinas como determina a lei.

O tema deste trabalho procurou apresentar estratégias e ações para realizar o

trabalho de implementação das leis da melhor forma possível, fazendo a relação

com diferentes conteúdos e abrindo novas possibilidades de compreensão, cum-

prindo assim seu objetivo de auxiliar aos professores com atividades teóricas e prá-

ticas para a articulação e implementação das leis com os conteúdos estruturantes da

Educação Física. As estratégias usadas nas atividades de implementação foram de

fácil compreensão e aplicação oportunizando assim a contextualização do tema, po-

rém de grande valor para as discussões realizadas nas avaliações das atividades

propostas. O uso dos filmes para o aprofundamento teórico foi muito elogiado pelos

professores, pois os mesmos apresentaram a história da cultura africana e os parti-

cipantes puderam conhecer um pouco desta história tão rica e ao mesmo tempo tão

pouco valorizada.

Os participantes do projeto deixaram claro, que foi satisfatório a ampliação

dos conhecimentos adquiridos durante o tempo de implementação, pois na produção

de texto que foi solicitada para a avaliação do trabalho de implementação, eles cita-

ram o quanto é importante esta troca de experiências para que possa haver uma

mudança no modo de pensar e agir de algumas pessoas.

Com estes depoimentos, confirmaram a pertinência do trabalho, quando se

atingiu o objetivo que era contribuir para o aprimoramento dos professores e assim,

enriquecer a prática escolar.

5. REFERÊNCIAS

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