Upload
duongthuan
View
218
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
Leitura e Dramatização de Obras Literárias no Ensino Médio:
Passagens Para a Leitura Literária
Neuza Maria Bertusso1
Carmen Teresinha Baumgärtner2
Resumo
Sabe-se que a leitura é importante formadora de cidadãos críticos, atuantes,
capazes de manifestar-se na sociedade em que vivem, por isso a necessidade de
oportunizar aos alunos o acesso a uma variedade de gêneros literários,visando ao
desenvolvimento e gosto pela leitura de literatura. Observa-se, um distanciamento
cada vez maior, dos alunos em relação aos livros, principalmente no Ensino Médio.
Acredita-se que, com o fácil acesso à tecnologia, substituiu-se a leitura de livros
(impressos) e textos por imagens, por exemplo,filmes. Nesse sentido, o teatro é uma
proposta que figura como um recurso pedagógico eficiente, que desperta no aluno o
gosto pela leitura e o leva a se tornar um leitor competente e crítico. Por meio dele é
possível perceber que a leitura literária aliada à dramatização do que se leu, é fonte
de magia, imaginação e principalmente, de conhecimento. É preciso reconhecer que
os textos teatralizados contribuem para o processo ensino/aprendizagem e
ampliação dos conhecimentos, pois para dramatizar o aluno precisa entender o que
leu,saber reproduzir oralmente aquilo que foi compreendido,apresentar expressões
corporais condizentes com os personagens e com os conteúdos a serem
representados, além de conhecer o contexto cultural da produção da obra.
Palavras chaves: Leitura; compreensão; dramatização.
1. Introdução
1Professora da rede estadual de ensino do estado do Paraná e atua no Colégio Estadual José de
Anchieta, em Ibema–PR. Endereço eletrônico: [email protected] 2Orientadora do artigo, professora da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE –
Campus Cascavel-PR.
O Presente artigo é a comunicação dos resultados obtidos no projeto de
implementação, que teve como foco o desenvolvimento do trabalho de leitura e
dramatização de obras literárias no Ensino Médio: passagens para a leitura literária
realizado no Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE do Governo
Estadual do Paraná, em parceria com a Universidade Estadual do Oeste do Paraná
– UNIOESTE/Cascavel. O objetivo deste é expor um relato reflexivo quanto às
atividades realizadas em sala de aula, no Colégio Estadual José de Anchieta, em
Ibema – PR, com a 3ª série do Ensino Médio, posto que as obras propostas para
estudo estejam relacionadas à segunda fase do Modernismo brasileiro. A
implementação contempla a leitura e dramatização de obras literárias nesse nível de
ensino. As informações do presente artigo estão organizadas de tal forma que,
inicialmente far-se-á uma breve apresentação do projeto a ser desenvolvido que
aborda a dificuldade de se trabalhar com literatura no Ensino Médio. Em nossa
prática educativa em sala de aula, observamos que a maioria dos adolescentes tem
acesso a diversas tecnologias de informação. Se, por um lado, isso poderia
promover maior interesse pela leitura e por leituras mais variadas, na perspectiva de
favorecer a formação de um leitor mais experiente e crítico, por outro, em sala de
aula, não conseguimos perceber esses efeitos. Ao contrário, observamos que nas
turmas em que atuamos o leitor de hoje não tem se mostrado mais competente do
que o leitor de ontem, cujo acesso à informação era mais restrito.
Outro aspecto que observamos, embora não tenhamos realizado um estudo
aprofundado sobre, é que, com o surgimento de novas ferramentas tais como
computadores, internet, dentre outras, a informação superficializou o conhecimento
e ocasionou o pouco interesse pela leitura. Por consequência, percebemos
dificuldades dos alunos quanto ao uso da língua, tais como: erros ortográficos,
empobrecimento do vocabulário, dificuldade de compreensão/interpretação, poucas
produções textuais significativas e conhecimento limitado. Temos clareza de que
esses problemas podem ter várias causas, todavia, entendemos que os tipos e
modos de leitura que os alunos vêm realizando podem estar contribuindo para esse
estado de coisas.
Pesquisas educacionais demonstram que os alunos não lêem 3 e é
incontestável que a leitura é a ponte maior para o conhecimento e para a própria
formação do educando. Na maioria das vezes, o trabalho com leitura literária
apresenta-se pouco lúdico, se comparado a outras ferramentas de acesso à
informação como, por exemplo, a internet. Em geral, os alunos se afastam da leitura
literária por considerá-la tediosa. Esse desinteresse é potencializado pela dificuldade
de compreensão/interpretação, poucas produções significativas, erros ortográficos e
conhecimento limitado.
Diante dessas dificuldades, é necessário buscar novas metodologias que
sejam motivadoras e que promovam no aluno o interesse pela leitura. Em vista
disso, nesse projeto propomos, como alternativa, o trabalho com a dramatização de
obras literárias, reconhecendo-o como uma forma de instrumentalizá-lo, despertar-
lhe a sensibilidade, motivá-lo a ler, reler, criar, opinar, transformar e extrapolar o
sentido do texto lido.
O trabalho foi fundamentado em autores como Paulo Freire (1989), Isabel
Solé (1998), J. L. Miranda, Marisa Lajolo (1993), além dos PCN (1998) e das
Diretrizes Curriculares da Língua Portuguesa (2008).
A seguir, apresentamos reflexões sobre a base teórica, após as quais
expomos o desenvolvimento do projeto implementado na escola, demonstrando as
experiências absorvidas no GTR e no programa PDE.
2. Leitura da literatura; busca de novas metodologias
A valorização da leitura, se considerada num sentido abrangente, surge dada
a sua importância para que o aluno seja inserido numa cultura de letramento. Para
que isso aconteça, é necessário oportunizar saberes que extrapolem a simples
decodificação. É imprescindível ir além, dar sentido ao que foi decodificado,
3 http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/203/um-lugar-sem-sentido-308062-1.asp
http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-06-25/mais-da-metade-dos-alunos-do-3%C2%BA-ano-do-ensino-fundamental-sao-analfabetos-funcionais-diz-pesquisa
relacioná-lo a outros saberes, compreender as informações, fazendo com que elas
possam ser analisadas e criticadas.
Para Marisa Lajolo (1993), “ninguém nasce sabendo ler: aprende-se a ler à
medida em que se vive. Se ler livros geralmente se aprende nos bancos da escola,
outras leituras se aprendem por aí, na chamada escola da vida”.
Para isso, é necessário que o educador prepare o aluno para uma leitura
autônoma, para que ele seja capaz de ler as linhas e as entrelinhas de um texto.
Dessa forma os domínios de habilidades leitoras se traduzem como um dos
aspectos que contribuirão para a ascensão do educando ao mercado profissional,
baixo índice de evasão escolar além do exercício pleno da cidadania.
Paralelamente ao trabalho com leitura, a inserção da dramatização do que se
leu é um recurso a mais na formação do leitor crítico, pois o emprego de técnicas de
jogos teatrais, utilizados para a familiarização do aluno com os textos literários,
contribui para o desenvolvimento da percepção.
O contexto atual exige constantemente o exercício pleno da leitura. Sendo
assim, temos como pressuposto a análise da sua produção e compreensão de
textos por parte dos educandos na disciplina de Língua Portuguesa, ancorados em
atividades de leitura como prática social na Educação Básica. Para que nosso aluno
se torne um usuário competente da língua, condição essencial para o exercício da
cidadania e, consequentemente, de maior participação social, a demanda pela
leitura e pelo domínio da linguagem escrita em nossa sociedade é cada vez maior.
Daí a importância de ressignificar o ato de ler, pois uma mesma sequência
discursiva tende a produzir diferentes efeitos de sentido, devido à constituição da
linguagem ser polissêmica e parafrástica. Assim define Orlandi:
“Leitura parafrástica, que se caracteriza pelo reconhecimento
(reprodução) de um sentido que se supõe ser o do texto (dado pelo
autor) e o que denominamos leitura polissêmica, que se define pela
atribuição de múltiplos sentidos ao texto” (ORLANDI, 2001, p.12).
Atualmente, o mercado de trabalho requer candidatos com domínio da língua
portuguesa, que saibam ouvir, escrever bem e que tenham domínio da fala. Saber
escrever com proficiência envolve um grau de letramento que vai além da
decodificação de códigos linguísticos. Nesse sentido, procuramos na Análise do
Discurso elementos que norteiam o desenvolvimento dessas reflexões.
Na concepção de linguagem presente nas Diretrizes Curriculares da
Educação Básica: Língua Portuguesa (2008), a leitura é vista como um ato dialógico,
interlocutivo, realizado por meio de diferentes textos produzidos em diversas esferas
sociais – jornalística, artística, judiciária, científica, didático-pedagógica, cotidiana,
midiática, literária, publicitária. Nesse sentido, o professor deve atuar como
mediador, provocando os alunos a realizarem leituras significativas, dando
condições para que o aluno atribua sentido ao que leu.
Isabel Solé, em Estratégias de leitura (1998, p.32), declara que “um dos
múltiplos desafios a ser enfrentado pela escola é o de fazer com que os alunos leiam
corretamente”. Quando a leitura é considerada “objeto de conhecimento”, seu
tratamento na escola não é tão amplo como seria de se desejar, pois em muitas
ocasiões a instrução explícita limita-se ao domínio das habilidades de decodificação
(SOLÉ, 1998, p. 36).
A escola não é o único, mas o principal local onde as atividades de leitura se
efetivam. Assim, compete a ela desenvolver inesgotáveis práticas e técnicas visando
ao desenvolvimento de competências que tornem o aluno um leitor autônomo,
apreciador das características estéticas e capaz de reconhecer e diferenciar as
características referentes a cada gênero.
Para Paulo Freire, “ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se
educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo
mundo”. Com essa afirmação, entendemos que a educação realmente se efetiva no
processo de interação entre as pessoas. Estas elaboram e reelaboram o
conhecimento nas relações interpessoais que são mediadas pelas condições
presentes no espaço e no tempo em que vivem.
Essa concepção é compartilhada por Maria Helena Martins, em O que é
leitura? (2003, p.12), quando a autora afirma que “[...] ninguém ensina ninguém a ler;
o aprendizado é, em última instância, solitário, embora se desencadeie e se
desenvolva na convivência com os outros e com o mundo” (MARTINS, 2003, p.12).
Ainda nessa linha de pensamento, a autora considera que:
“Aprender a ler significa também aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós próprios, o que, mal ou bem, fazemos mesmo sem ser ensinados. A função do educador não seria a de precisamente ensinar a ler, mas a de criar condições para o educando realizar a sua própria aprendizagem conforme seus próprios interesses, necessidades, fantasias, segundo as dúvidas e exigências que a realidade lhe apresenta” (MARTINS, 2003, p. 34).
Sendo assim, a escola precisa formar o leitor que interaja com o mundo e
esteja sempre disposto a ler com muita eficiência. Essa formação depende da
variedade de metodologias e apresentação de materiais diversos compatíveis com o
objetivo que se quer alcançar.
Para reafirmar o aqui exposto, destaca-se, ainda, este trecho, retirado dos
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (1998):
A leitura é o processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de compreensão e interpretação do texto, a partir de seus objetivos, de seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a linguagem etc. Não se trata de extrair informação, decodificando letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível proficiência. É o uso desses procedimentos que possibilita controlar o que vai ser lido, permitindo tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, avançar na busca de esclarecimentos, validar no texto suposições feitas (BRASIL, 1998, p. 69-70).
Com a análise do trecho acima, confirmamos o entendimento de que o leitor
deve ser um construtor de sentido do que leu, precisando, para isso, recorrer a
diversas estratégias, às quais devemos lhe proporcionar o acesso. Nesse sentido,
ao professor cabe a tarefa de promover meios e situações de leitura que estimulem
essa construção.
Uma técnica que se mostra motivadora e proporciona a interação entre os
alunos é o teatro. Aliar a dramatização às obras trabalhadas é uma ferramenta
motivadora para o aumento da capacidade de criação, organização de ideias,
planejamento, observação de situações cotidianas e movimentos, aumentando
assim a percepção, atenção e concentração.
O trabalho de encenar o texto lido é uma prática pedagógica instigante. Nela,
o educando desenvolve habilidades de suma importância para sua formação no que
se refere à sua imaginação, sensibilidade, auto-estima e criatividade, tornando-se
sujeito capaz de ampliar seus conhecimentos culturais e estéticos.
Paulo Coelho, em seu livro O teatro na educação (1978), faz a seguinte
afirmação:
Todo homem é potencialmente criador, mas a pressão do meio, os aspectos culturais, os valores morais, as condições socioeconômicas e as limitações psicológicas tendem a restringir consideravelmente a criatividade do indivíduo, chegando mesmo ao ponto de destruí-la por completo (COELHO, 1978, p. 1).
Temos dúvida sobre essa potencialidade como inerente, inata ao homem.
Pensamos que a criatividade também pode ser ensinada. E consideramos que o
trabalho com teatro, com dramatização, oferece elementos para o desenvolvimento
da criatividade, especialmente no campo da literatura. Portanto, dramatizar obras
literárias trabalhadas com o aluno é uma ferramenta indispensável para o trabalho
com literatura pois, no processo de representação, o aluno não está simplesmente
repassando uma informação a alguém ou exteriorizando um pensamento, mas
atuando sobre o seu interlocutor, desenvolvendo capacidades cognitivas por meio
da concentração, memorização, recriação e expressão corporal. Cabe a nós,
professores, o estímulo para transformar os conteúdos de literatura em uma prática
que ultrapasse métodos obsoletos, ampliem o conhecimento e tornem-se mais reais
aos olhos de quem os lê. Após a exposição dos fundamentos teóricos deste estudo,
passamos a abordar o projeto de implementação propriamente dito.
3. Desenvolvimento da implementação
O projeto de implementação aconteceu com os alunos da 3ª série A do
Ensino Médio do Colégio Estadual José de Anchieta de Ibema – PR, e a avaliação
ocorreu durante todo o processo de execução das atividades.
Num primeiro momento foi apresentado o Projeto de Intervenção à Direção da
Escola, Equipe Pedagógica e demais professores, a fim de que tomassem
conhecimento da proposta a ser desenvolvida e de que pudessem participar e
contribuir com ações de seu âmbito de atuação. Entendemos que projetos de leitura
(dentre outros) devem ser conduzidos coletivamente pela escola. Não deve ser
tarefa de um professor só, mas de um coletivo escolar que deseja de fato que os
alunos leiam mais e melhor. Em seguida, direcionamos a apresentação do projeto
aos alunos e lhes explicamos, na íntegra, o trabalho a ser realizado. Esta etapa foi
muito bem aceita pelos alunos, pois percebemos grande motivação em trabalhar
com dramatizações.
Após levantamento bibliográfico na biblioteca da escola, entregamos aos
alunos os exemplares da obra “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos e,
posteriormente, “Melhores Poemas”, de João Cabral de Melo Neto. Combinamos um
prazo de oito dias para a leitura da obra Vidas Secas. Nesse espaço de tempo,
apresentamos aos alunos a capa desse livro, xerocada e devidamente ampliada,
para análise dos elementos que a compõem (Desenho de Aldemir Martins, feito
especialmente para ilustrar Vidas Secas). Os alunos analisaram, refletiram e
expuseram suas opiniões respondendo às perguntas solicitadas. Na sequência,
apresentamos a sinopse do livro “Vidas Secas”, disponível em
http://www.sinopsedolivro.com/2008/04vidas-secas, para leitura, discussão e
reflexão sobre o tema.
Em outro momento, realizamos a leitura e análise do posfácio da obra “Vidas
Secas”, intitulado: “Valores e misérias das vidas secas”, de autoria de Álvaro Lins,
seguido de questões sobre o texto. Foram desenvolvidas questões escritas de
análise do texto, que levaram o aluno a questionar se o autor fez uma crítica
favorável ou desfavorável à obra, como o autor da crítica caracteriza os
personagens, se a crítica pode influenciar os leitores a lerem a obra e, por fim,
concluir: qual é a função da crítica literária?
Os alunos realizaram leitura prévia de todo o livro “Vidas Secas” e, em sala de
aula, escolheram para interpretação e discussão o capítulo “Fuga”. Apresentamos
aos alunos questões escritas, de interpretação, trabalho com dicionário para
esclarecer os termos contidos no fragmento e que geraram dúvida, para analisar que
a escolha lexical do primeiro parágrafo ajuda a construir com coerência a descrição
do ambiente e dos personagens.
Após essa fase, procedemos à leitura e áudio do poema “Operário em
Construção”, de Vinicius de Moraes. O objetivo da atividade era discutir com os
alunos os destinos próximos dos trabalhadores tanto de “Vidas Secas” quanto do
“Operário em Construção”. Trabalhamos questões interpretativas oralmente, num
grande círculo, para que os alunos pudessem realmente entender o tema do poema.
Os alunos puderam posicionar-se e entenderam que a voz do poema era de um
trabalhador que descobriu o valor do seu trabalho na sociedade da qual fazia parte.
Nesse momento conseguiram entender que eles mesmos são os “operários em
construção”, porque estão descobrindo o valor que têm na sociedade em que estão
inseridos.
Na próxima etapa realizamos a leitura do poema “Cidadão”, de Zé Ramalho e
ouvimos o clipe da música. Os alunos formaram um círculo e discutiram o conteúdo
da música por meio de questões orais: em nossa cidade, existem cidadãos que
passam pela mesma angústia do eu-liríco mencionado no poema? O que possuem
em comum o Operário, de Vinícius, Fabiano, de Graciliano Ramos e o Cidadão, de
Zé Ramalho? Quais as suas angústias e esperanças? Oportunizamos aos alunos
falarem livremente, levantarem hipóteses, tecerem comentários pessoais. Depois,
fizeram um fechamento das questões.
Com a audição da música “Construção”, de Chico Buarque, fizemos um
círculo e, por meio de questões orais, comentamos sobre as analogias entre a
música de Zé Ramalho, o poema de Vinicius de Moraes e o romance de Graciliano
Ramos. Solicitamos aos alunos de que forma podemos relacionar esse tema com a
nossa comunidade, com o ambiente em que estamos inseridos. Com isso, tivemos o
objetivo de levá-los a observar que, ao nosso lado, em nossas famílias, existem
muitos “Fabianos” que lutam todos os dias para serem notados. Essa reflexão foi
bastante importante para a continuidade do trabalho.
Complementando o trabalho, os alunos assistiram ao vídeo “Morte e Vida
Severina” de João Cabral de Melo Neto e fizeram uma reflexão sobre os “severinos”
de hoje em dia. Formaram um círculo de discussão sobre o filme assistido e
retomaram questões discutidas nos textos anteriores. Realizaram um levantamento
de ideias, reflexões e análise das imagens e do conteúdo do vídeo.
Para desenvolver o trabalho, foi necessária a apresentação da historicidade
do Gênero Dramático, bem como as técnicas básicas do teatro, para observarem
postura, dicção, incorporação e representação do personagem, além de outros
elementos técnicos como a organização do cenário, figurino, sonoplastia e demais
constituintes da peça teatral. Os alunos reuniram-se, em contra turno, para a
apresentação de suportes, organização e adaptação das peças a serem
dramatizadas.
Por sugestão dos próprios alunos, optamos por apresentar o poema “Operário
em Construção”, representando várias profissões: enfermeiro, doméstica, pedreiro,
professor, etc. Foi, também, montado um teatro baseado no livro “Vidas Secas”, de
Graciliano Ramos, intitulado “Meu Sertão”. O objetivo era fazer com que os alunos
adequassem as peças conforme a sua visão após trabalho em sala de aula. Os
ensaios das peças ocorreram em contra turno sob nossa coordenação e supervisão.
As peças encenadas foram “Operário em Construção” e “Meu Sertão”.
O trabalho foi prestigiado por pais, alunos e toda comunidade em geral. Foi
muito gratificante, pois reforçou a ideia principal apresentada no Projeto de
Implementação de que a dramatização é ferramenta indispensável para o
aprendizado dinâmico e prazeroso.
Os resultados obtidos durante e após a implementação nos permitiram
concluir que há a necessidade de se aliar as dramatizações ao trabalhar com
literatura, visto que essa dinâmica envolve muitos elementos imprescindíveis para o
desenvolvimento cognitivo da memória, atenção e concentração, dicção e postura.
Esse tipo de abordagem também possibilitou a ampliação do desenvolvimento
intelectual dos alunos, porque envolveu leitura, discussão, interpretação, oralidade.
Por meio da expressão corporal, também contribuiu para a perda da timidez e
melhora no relacionamento entre seus pares. Nesse sentido, retomamos os
ensinamentos de Freire (1989), sobre a importância do aprender na troca de
relações, interferindo positivamente no processo de constituição dos sujeitos entre
si.
Ao compartilhar o projeto com demais professores da Rede Estadual de
ensino por meio do Grupo de Trabalho em Rede (GTR), percebemos um grande
interesse, de sua parte, em adotar essa proposta do trabalho com literatura.
Concluímos, com esse trabalho, que a dramatização é uma forma dinâmica e
motivadora para tornar o conteúdo de Literatura mais concreto e, acima de tudo, um
estímulo para uma leitura consistente, tendo em vista a formação de leitores mais
críticos. Na próxima seção, refletimos sobre as atividades do Grupo de Trabalho em
Rede, um dos componentes do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE.
4. Atividades Desenvolvidas no GTR
Concomitantemente ao trabalho implementado na escola, realizamos o Grupo
de Trabalho em Rede (GTR), composto de professores de língua portuguesa de
escolas públicas do Paraná de diversos municípios paranaenses. Esse grupo
partilhou e acompanhou o plano de trabalho proposto por nós, no qual as
dramatizações fazem parte do processo de aprendizagem e também. Também
discutiu, trocou idéias, sugeriu várias atividades que podem ser incorporadas ao
projeto, ampliando o leque de possibilidades de trabalho que enriqueceram cada vez
mais a proposta.
Nessa interação a troca de experiências foi muito significativa, pois
observamos que a problemática apresentada não se restringe a uma escola, a um
determinado grupo de alunos, e sim, a uma geração toda e que a desmotivação para
a leitura literária é observada constantemente.
O GTR serviu de parâmetro para a conclusão de que o empobrecimento da
leitura é um fato que abrange várias escolas do Estado do Paraná, tendo em vista
que nesse Grupo participaram professores de várias regiões do Estado. Percebeu-
se que, em geral, nós, professores de língua portuguesa, enfrentamos muitas
dificuldades no que tange à leitura de obras clássicas da literatura no Ensino Médio.
Na interação com os participantes do GTR, percebemos que a maioria
aprovou e pretende utilizar a proposta, pois ela proporciona uma alternativa de
trabalhar literatura motivando a mobilização dos alunos para a leitura/aprendizagem.
É o que ressalta a cursista R.C.S.:
No projeto de intervenção pedagógica e implementação, foram
sugeridas novas estratégias e ações através da leitura e
dramatização de obras literárias no ensino médio e, desta forma, o
trabalho da professora tutora com a leitura é atrativo e prazeroso,
pois ler envolve o riso e a imaginação. Desta forma, o projeto vem
estimular o gosto pelas obras literárias, bem como despertar e tornar
os alunos leitores e críticos e que possam participar de forma ativa
na sociedade em que estão inseridos.
Esse depoimento mostra a sintonia entre as atividades do GTR e o que
propõem como tarefa para a escola as Diretrizes Curriculares para a Educação
Básica (DCEs). Atuando nesse espaço, portanto, nossa função é “formar sujeitos
que construam sentido para o mundo, que compreendam criticamente o contexto
social e histórico de que são frutos e que pelo acesso ao conhecimento, sejam
capazes de uma inserção cidadã e transformadora na sociedade” (PARANÁ, 2008,
p. 31).
E, ainda, R.C.S. afirma:
A leitura e dramatização de obras literárias leva o leitor a ampliação
do conhecimento da língua portuguesa e do mundo, pois a influência
dos autores se fará sentir na correção gramatical, na aplicação
correta dos vocabulários, permitindo assim, o cidadão ampliar seus
conhecimentos e obter condições para refletir sobre sua realidade e
começar a exercer controle sobre seu futuro.
Outra cursista do GTR, J. L. K, reafirma a importância do projeto quando diz
que:
É uma prática bastante eficiente trabalhar os diversos gêneros
literários relacionados a um mesmo tema. Deste modo, consegue-se
influenciar melhor o interesse da maioria dos alunos, pois alguns se
identificam mais com o teatro, outros com a música, têm aqueles que
preferem a poesia, assim como há os que gostam das artes plásticas
e assim por diante. Sem se falar que, durante o trabalho, muitas
vezes eles mesmos sugerem e lembram mais textos, filmes ou
músicas que dizem respeito ao assunto tratado. É muito bom
mesmo!
Concluímos a discussão sobre o GTR ressaltando que nós, professores,
devemos estar em constante busca de novas metodologias que nos auxiliem a
despertar o interesse pela leitura de modo amplo e efetivo, que há a necessidade de
um novo olhar na condução do aluno rumo à aquisição e ampliação do
conhecimento. Isso não pode prescindir de uma formação leitora consistente, a fim
de tornar nossos alunos leitores competentes e cidadãos críticos capazes de atuar
no meio em vivem transformando-o em seu benefício.
5. Considerações Finais
Ao encerrar a implementação desse Projeto, concluímos que a inclusão da
dramatização e do teatro como ferramenta de aprendizagem, além de promover a
qualidade na transmissão do conteúdo, facilita e estimula o educando à exposição
oral, promovendo o desenvolvimento da oratória e a concatenação de ideias.
O referido trabalho apresentou uma alternativa diferenciada no trato com
literatura de forma a torná-la menos enfadonha pela priorização dos principais
acontecimentos ou Escolas Literárias concentrado nos fatos históricos de cada
época ou Movimento Literário, atitude que deixa de lado a apreciação estética da
obra lida necessária para despertar no educando a ampliação dos seus horizontes
de conhecimento com vistas a melhorar sua criticidade. Observamos também que,
ao trabalhar o contexto histórico das obras lidas, os educandos entenderam melhor
o contexto em que estas foram produzidas e sua grandiosidade de produção.
Com base no exposto, chegamos à conclusão de que, a partir do momento
em que o aluno se vê como agente da aprendizagem, vivenciando personagens por
meio dos textos literários, passa a conceber a leitura de forma mais interessante e
prazerosa. Ficou evidente que os educandos interagem entre si e buscam a troca de
experiências, proporcionando o exercício da criatividade e da liberdade de
expressão, bem como o favorecimento e domínio de habilidades que os levam ao
preparo para lidar com situações que as relações humanas proporcionam tornando-
se um leitor competente, desde que possam se colocar como agentes de seu
processo de aprendizagem.
6. Referências
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio: língua portuguesa/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
COELHO, Paulo. O teatro na educação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1978.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. São Paulo: Cortez, 1989.
MARTINS, Maria Helena. O que é leitura? São Paulo: Brasiliense, 2003.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação; Superintendência da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação Básica: Língua Portuguesa. Curitiba: SEED/DEE, 2008.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 1998.
LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo, Ed. Ática,1993.
ORLANDI, Eni P. Discurso e Leitura. 6ª ed., São Paulo: Cortez, 2001.