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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

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REFLEXÕES SOBRE A ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: UM ESTUDO COM ALUNOS DO CURSO FORMAÇÃO DE DOCENTES EM NÍVEL MÉDIO DO

COLÉGIO ESTADUAL CIANORTE - ENSINO FUNDAMENTAL, MÉDIO, NORMAL E PROFISSIONAL

Clarice Conceição Bongiorno1

Elsa Midori Shimazaki2

RESUMO

De acordo com os dados do Ministério da Educação – MEC, cerca de 700 mil crianças chegam anualmente no 6º ano do Ensino Fundamental não alfabetizadas e um outro número considerável de crianças com dificuldades de leitura, escrita e compreensão de texto, o que não permite ou dificulta a aprendizagem dos conteúdos escolares e consequentemente, a apropriação de conhecimentos, comprometendo assim a continuidade dos estudos. Diante destas constatações, o objetivo desse estudo foi refletir sobre o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - PNAIC no enfrentamento dos problemas de alfabetização e letramento. O mundo da escrita se dá simultaneamente por dois processos: aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização, e desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita – o letramento. Para tanto, foi ofertado um curso de extensão aos estudantes do Curso de Formação de Docentes, abrangendo o estudo de materiais do PNAIC e autores que estudam o tema alfabetização e letramento. Dos vinte e oito cursistas inscritos, vinte concluíram e adquiram conceitos que os tornaram melhores preparados para a realização de um trabalho de alfabetização e letramento que oportunizará às crianças o direito de aprender a ler e escrever até os oito anos de idade. Ressalta-se a necessidade de investir na formação inicial de alfabetizadores e dos que estão em serviço. PALAVRAS-CHAVE: Alfabetização; Letramento; Formação; Aprendizagem. INTRODUÇÃO

Participar do Processo de formação continuada por meio do Programa de

Desenvolvimento Educacional (PDE), da Secretaria de Estado da Educação do

Paraná (SEED/PR), foi uma experiência enriquecedora para minha formação como

pedagoga atuante na escola pública. Este espaço de formação oportunizou o retorno

à Universidade, podendo retomar os estudos por meio de novas leituras bem como a

1 Professora Pedagoga da Educação Básica de Cianorte/PR E-mail: [email protected]

2 Dr. Docente do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), realizado pelo Governo do

Estado do Paraná como uma concepção de formação continuada de valorização dos (as) professores (as) que atuam na Rede Pública Estadual de Ensino do Estado do Paraná.

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releitura de autores renomados estudados anteriormente, assim novos

conhecimentos foram adquiridos e outros ampliados.

As expectativas que tinha ao ingressar no PDE foram alcançadas, pois além

de acesso aos conhecimentos fundamentais para a formação continuada, também

foi uma oportunidade de ascensão na carreira o que é digno e necessário.

Este Artigo se propõe a apresentar a sistematização desse processo de

estudo realizado no decorrer dos anos de 2013 e 2014.

O Tema estudado foi a Alfabetização e Letramento a partir dos materiais

disponibilizados pelo Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC),

tendo como público alvo os estudantes do Curso Formação de Docentes,

entendendo ser necessário investir na formação das futuras alfabetizadoras. Foram

estudados os materiais disponibilizados pelo Pacto e autores como (Soares, 2003;

Rojo, 2004; Kato, 1985; Tfouni, 1995 e 2010 e Klein, 2002) que tratam desse tema.

O que motivou este estudo foram os resultados negativos que tem-se obtido

com o trabalho de alfabetização até aqui realizado, segundo os dados do MEC

(Ministério da Educação) cerca de 700 mil crianças chegam no 6º ano do Ensino

Fundamental não alfabetizadas (MEC, 2013) e um outro número considerável de

crianças com dificuldades de leitura, escrita e compreensão de texto, o que não

permite ou dificulta a aprendizagem dos conteúdos escolares e, consequentemente,

a apropriação de conhecimentos, comprometendo assim a continuidade dos

estudos. Diante dessa realidade faz-se necessário relembrar o papel da escola no

processo de formação de professores, e aprofundar estudos sobre o processo de

alfabetização e letramento, contribuindo com a formação de alfabetizadores.

A nossa experiência profissional e pessoal em escola pública e os resultados

obtidos por meio das avaliações oficiais (IDEB e Pisa) e Inaf (Índice de

Analfabetismo Funcional) indicam que a apropriação da leitura e escrita não tem

sido suficiente aos alunos nos três primeiros anos do Ensino Fundamental.

Diante dessa constatação, buscou-se compreender se as propostas de

formação destinadas ao professor descritas no PNAIC propiciam condições para

refletir a prática pedagógica, assim como se os materiais didáticos disponibilizados

pelo PNAIC, para a organização do trabalho de alfabetização, contribuem para a

melhoria do processo de ensino-aprendizagem.

Assim sendo, o objetivo geral deste estudo é refletir sobre o Pacto Nacional

de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) no enfrentamento aos problemas de

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alfabetização e letramento. Para atingir este propósito alguns objetivos específicos

foram definidos: estudar textos sobre a alfabetização e letramento; estudar os

materiais do PNAIC; selecionar encaminhamentos metodológicos organizados nos

materiais do PNAIC; disponibilizar os encaminhamentos aos estudantes do Curso

Formação de Docentes; elaborar planos de aulas junto aos estudantes a partir das

discussões, como possibilidades de ação; oferecer um curso de extensão; elaborar o

artigo final evidenciando as possibilidades e limites deste estudo, e dar continuidade

aos estudos, por meio de leitura de livros e textos que não foram possíveis de serem

lidos neste momento.

A seguir é apresentado a fundamentação teórica que embasou a formação

oferecida no curso de extensão, os resultados obtidos nos espaços de formação

curso e GTR e as considerações finais.

1 REVISÃO DE LITERATURA

As avaliações externas no Brasil tiveram início na década de 1990. Era

necessário tomar decisões para melhorar o alto índice de analfabetismo no país.

Para tanto, precisava conhecer a situação da educação brasileira, para que as

políticas públicas atendessem efetivamente essa demanda.

Atualmente, há vários instrumentos de avaliações oficiais, dentre eles estão:

IDEB, Pisa e o Inaf, que indicam que a apropriação da leitura e escrita não tem sido

suficiente em alunos nos três primeiros anos do Ensino Fundamental.

Em 2005 teve início a avaliação em larga escala, em que estudantes

matriculados na 4ª série e 8º série do Ensino Fundamental em escolas com mais de

20 alunos passaram a ser avaliados por meio de instrumentos de avaliação

elaborados MEC, a chamada Prova Brasil.

A Prova Brasil é uma avaliação educacional nacional que oferece o mais

completo e detalhado retrato da qualidade do aprendizado nas redes públicas de

ensino do Brasil. Ela faz parte do Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Básica (Saeb) e avalia duas competências dos alunos: a de leitura e interpretação

de textos (Língua Portuguesa) e a resolução de problemas matemáticos

(Matemática). Essa avaliação fornece resultados por escola, município, estado e

país. Seus resultados compõem o IDEB.

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O IDEB é calculado a partir de dois componentes: taxa de rendimento escolar

(aprovação) e médias de desempenho nos exames padronizados aplicados pelo

Inep. Os índices de aprovação são obtidos a partir do Censo Escolar, realizado

anualmente pelo Inep. As médias de desempenho utilizadas são as da Prova Brasil

e do Saeb.

A partir desse índice, viabiliza-se aos sistemas de educação proporem

políticas públicas e as Instituições de Ensino reverem suas práticas, assim esse

processo de avaliação mobiliza toda a sociedade para melhorar a educação pública

do país.

Em 2013 o IDEB apontou os seguintes números referentes ao Ensino

Fundamental - Anos Iniciais: Brasil 5,2 - Paraná 6,2 - Cianorte 6,4. Observa-se que

com relação ao Brasil e ao Paraná o Município de Cianorte apresenta um bom

índice, porém ainda há muito que fazer para melhorar a aprendizagem das nossas

crianças nos anos iniciais do Ensino Fundamental, especialmente no processo de

alfabetização. De acordo com Rojo (2004, p.1):

Se perguntarmos a nossos alunos o que é ler na escola, possivelmente estes dirão que é ler em voz alta, sozinho ou em jogral (para avaliação de fluência entendida com compreensão) e, em seguida, responder um questionário onde se deve localizar e copiar informações do texto (para avaliação de compreensão). Ou seja, somente poucas e as mais básicas das capacidades leitoras têm sido ensinadas, avaliadas e cobradas pela escola. Todas as outras são ignoradas. É o que mostram os resultados de leitura de nossos alunos em diversos exames, com o ENEM, ARESP, SAEB, PISA, tidos como altamente insuficientes para a leitura cidadã numa sociedade urbana e globalizada, altamente letrada, como a atual.

A partir de 2013 as crianças que concluem o ciclo de alfabetização do 1º ao

3º ano do ensino básico em escolas públicas farão a Avaliação Nacional da

Alfabetização (ANA). Esta Avaliação servirá para medir o conhecimento das crianças

e ajudará no cumprimento do Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa

(PNAIC), que estabelece que todas as crianças até os 8 anos de idade sejam

alfabetizadas. Servirá como ponto de partida para que se possa medir a evolução do

aprendizado das crianças nessa etapa do ensino. A ANA deverá produzir

informações sistemáticas sobre as unidades escolares, de forma que cada unidade

receba o resultado global. Será uma avaliação de larga escala e servirá para a

produção de índices sobre a alfabetização e letramento dos estudantes, também

fará parte do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb).

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Nos últimos 30 anos, as políticas públicas conseguiram melhorar o ingresso

dos brasileiros na escola, no entanto, tem-se ainda que superar a falta de qualidade

na aprendizagem. De acordo com os dados do MEC, cerca de 700 mil crianças

chegam anualmente no 6º ano do Ensino Fundamental sem estarem alfabetizadas

(MEC, 2013).

Propor uma discussão sobre alfabetização e letramento não é novidade no

meio acadêmico, porém ela continua sendo necessária para a superação dos

resultados insatisfatórios constatados por meio das avaliações internas e externas.

O que há de novo nesse processo e que nos propusemos a discutir por meio desse

projeto, é o PNAIC: “[...] acordo formal assumido pelo Governo Federal, Estados,

Municípios e entidades para firmar o compromisso de alfabetizar crianças até, no

máximo, 8 anos de idade, ao final do ciclo de alfabetização.” (Caderno de

apresentação do PNAIC, 2012, p. 5).

O Pacto se apóia em quatro eixos de atuação que demonstram a dimensão

da sua ação conforme descrito na Portaria MEC nº 867 art. 6º:

I- formação continuada presencial para os professores alfabetizadores e seus orientadores de estudo; II - materiais didáticos, obra literárias, obras de apoio pedagógico, jogos e tecnologias educacionais; III - avaliações sistemáticas e IV - Gestão, controle social e mobilização.

Ainda na Portaria nº 867 art. 5º fica expresso os objetivos do Pacto:

I - garantir que todos os estudantes dos sistemas públicos de ensino estejam alfabetizados, em Língua Portuguesa e em Matemática, até o final do 3° ano do ensino fundamental; II - reduzir a distorção idade-série na Educação Básica; III - melhorar ao índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB); IV - contribuir para o aperfeiçoamento da formação dos professores alfabetizadores; V - construir propostas para a definição dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças nos três primeiros

anos do ensino fundamental.

A partir do momento que a criança passou a ter um lugar de destaque na

sociedade, foram sendo criadas políticas públicas visando dar conta de suas

especificidades e garantindo-lhes direitos como a LDBEN 9394/96 Art 2º:

A educação dever da família e do estado inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

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O Art 3º da LDBEN trata de duas questões fundamentais: "VII - valorização

do profissional da educação escolar e IX - garantia de padrão de qualidade." Ainda

na LDBEN no Art. 32 esclarece que: "O ensino Fundamental obrigatório, com

duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos

de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: (Redação dada

pela Lei nº 11.274, de 2006)."

I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV – o fortalecimento de vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social.

A partir das fundamentações até aqui descritas e os objetivos a que se

propõe o PACTO, o trabalho foi concretizado, buscando a necessária relação da

teoria com a prática, contribuindo com a melhora do trabalho do professor

alfabetizador em formação. Diante da situação descrita fez-se necessário aprofundar

os estudos sobre alfabetização e letramento.

As formas de comunicação com o mundo se dão por meio da fala, audição,

leitura e escrita sendo elas as manifestações do uso criativo e produtivo da língua. A

aprendizagem da leitura e escrita, objeto de estudo neste projeto, não acontece de

forma espontânea e natural, mas sim por meio da relação com o outro.

De acordo com Vygotsky (1991, p.99) "[...] o aprendizado humano

pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as

crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam". Destaca-se aqui a

importância do outro na aprendizagem da criança.

Em se propondo a discutir a aprendizagem da leitura e da escrita, torna-se

fundamental falar sobre a linguagem:

[...] a capacitação especificamente humana para a linguagem habilita as crianças a providenciarem instrumentos auxiliares na solução de tarefas difíceis, a superar a ação impulsiva, a planejar uma solução para um problema antes de sua execução e a controlar seu próprio comportamento. Signos e palavras constituem para as crianças, primeiro e acima de tudo, um meio de contato social com outras pessoas. As funções cognitivas e comunicativas da linguagem tornam-se, então, a base de uma forma nova e

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superior de atividade nas crianças, distinguindo-as dos animais (VYGOTSKY, 1991, p. 31).

A linguagem está relacionada a fenômenos comunicativos, onde há

comunicação há linguagem. É a capacidade que os seres humanos possuem de

expressar os pensamentos, as ideias, as opiniões e os sentimentos.

A comunicação se dá por inúmeros tipos de linguagens tais como: sinais,

sons, símbolos e gestos. Enfim, a linguagem pode ser classificada como qualquer

sistema de sinais que se valem os indivíduos para comunicar-se. Para Vygotsky

(1991), o aprendizado e o desenvolvimento estão inter-relacionados, desde o

primeiro dia de vida da criança.

Se a criança aprende desde o dia que nasce, então não se pode

desconsiderar o que ela já aprendeu antes de iniciar sua vida escolar.

O ponto de partida dessa discussão é o fato de que o aprendizado das crianças começa muito antes delas frequentarem a escola. Qualquer situação de aprendizado com a qual a criança se defronta na escola tem sempre uma história prévia. Por exemplo, as crianças começam a estudar aritmética na escola, mas muito antes elas tiveram que lidar com operações de divisão, adição, subtração e determinação de tamanho. Consequentemente, as crianças têm a sua própria aritmética pré-escolar, que somente psicólogos míopes podem ignorar. (VYGOTSKY, 1991, p. 94)

Nesta perspectiva da psicologia histórico-cultural, a escola tem um papel

fundamental no processo de aprendizagem das crianças, é sua tarefa organizar e

sistematizar os conteúdos de modo que a crianças aprendam desde cedo fazer as

necessárias relações com o meio social em que vive, nesse processo o professor

tem o papel essencial de mediador entre o que a criança já aprendeu e o que ela

ainda não compreendeu, a esse momento Vygotsky (1991, p. 95) dá o nome de

Zona de Desenvolvimento Proximal: "[...] Para elaborar as dimensões do

aprendizado escolar, descreveremos um conceito novo e de excepcional

importância, sem o qual esse assunto não pode ser resolvido: a zona de

desenvolvimento proximal." O autor afirma também que:

[...] Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (VYGOTSKY, 1991 p. 96)

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Assim, fica evidente que a criança aprende a partir do que já sabe, da sua

leitura de mundo, sendo este mundo o meio social em que vive e na relação com o

outro que esse processo se dá, no caso específico da escola os mediadores desse

processo é o professor e os colegas com quem estabelece uma convivência.

Os estudos de Vygotsky encantam os educadores porque mesmo sendo da

área da psicologia trata de questões da escola, do professor e valoriza a intervenção

deste no fazer pedagógico.

Da mesma concepção teórica, Saviani (1982) educador brasileiro criou a

pedagogia histórico-crítica que através de um método específico orienta como deve

ser o trabalho do professor, para isso aponta um caminho organizado em cinco

passos: "[...] prática social, problematização, instrumentalização, catarse e prática

social" (SAVIANI, 1982, p. 61). A seguir é explicado conforme por Saviani (1982)

explica esses processos da seguinte forma.

O primeiro passo: prática social é entendida como inicial, "[...] que é comum

a professor e alunos. Entretanto, em relação a essa prática comum, o professor

assim como os alunos podem se posicionar diferentemente enquanto agentes

sociais diferenciados." É o ponto de partida do professor ao organizar e planejar a

aula respalde-se no que o estudante já sabe sobre o conteúdo, pois com uma visão

mais ampla dos conhecimentos prévios do estudante, fará então o papel de

"mediador" nesse processo com maior êxito. (SAVIANI, 1982, p.61)

O segundo passo: problematização "[...] trata-se de detectar que questões

precisam ser resolvidas no âmbito da Prática Social e, em consequência, que

conhecimento é necessário dominar". É o momento de levantar os problemas do

cotidiano, para que o conteúdo a ser trabalhado vá ao encontro à necessidade

percebida e que o significado esteja contextualizado, entendendo que o espaço de

resolução desses problemas é no espaço da sociedade. (SAVIANI, 1982, p.61)

O terceiro passo: instrumentalização, "[...] trata-se da apropriação pelas

camadas populares das ferramentas culturais necessárias à luta social que travam

diuturnamente para se libertar das condições de exploração em que vivem". Esse é

o momento em que o professor disponibilizará aos estudantes o acesso aos

conteúdos por meio de metodologias diferenciadas, visando responder ou resolver

as questões problematizadas da "prática social". (SAVIANI, 1982, p.61).

O quarto passo: catarse, é o momento em que o estudante demonstrará por

meio do processo de avaliação o que aprendeu e, se esse aprendizado contribuiu

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para a solução dos problemas levantados inicialmente, oportunizando ao professor

condição de perceber em que o estudante conseguiu avançar, servindo de ponto de

partida para a reorganização de seu trabalho, (SAVIANI, 1982).

O quinto e último passo: prática social, entendida como a final, pois é o

momento em que o estudante é orientado a voltar para as questões problematizadas

inicialmente a partir da realidade analisada. Nesse processo, professor e aprendiz

estão modificados, ambos cada um em seu papel passou por uma transformação na

maneira de ver e compreender o mundo (SAVIANI,1982):

A partir dos apontamentos feitos até aqui sobre a psicologia histórico-

cultural, destacando o papel do professor como mediador entre o que o estudante já

sabe e o que ainda não sabe e a pedagogia histórico-crítica, focando a importância

da realização de um trabalho contextualizado que parte do cotidiano, para que o

estudante uma vez instrumentalizado tenha condições de modificar essa realidade,

far-se-á uma análise sobre a alfabetização e letramento. Este é o ponto de partida

da discussão sobre a qualidade do ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Ler e escrever não são atividades passivas e reprodutoras se trabalhadas

numa perspectiva reflexiva. Para tanto, é importante rever o conceito de

alfabetização. Até muito recentemente, considerava-se que a entrada da criança no

mundo da escrita se fazia apenas pela alfabetização, pelo aprendizado das

“primeiras letras”, pelo desenvolvimento das habilidades de codificação e de

decodificação feito pela educação escolar. O uso da língua escrita, em práticas

sociais de leitura e produção de textos, seria uma etapa posterior à alfabetização,

devendo ser desenvolvido nas séries seguintes.

Ressalta-se que alfabetizar de fato, não se reduz ao domínio das letras do

alfabeto e formação de frases e palavras. Envolve também saber utilizar a língua

escrita nas situações em que esta é necessária, lendo e produzindo textos. É para

essa dimensão da entrada no mundo da escrita que se apresenta um novo conceito:

letramento. Ele serve para designar o conjunto de conhecimentos, de atitudes e de

capacidades necessários para usar a língua em práticas sociais. Mas, fazer com que

as crianças usem e explorem a língua, cada vez mais e melhor, com disposição e

curiosidade, tanto na modalidade oral como escrita, continua sendo um desafio para

os alfabetizadores.

A partir dos apontamentos feitos até aqui sobre a psicologia histórico-

cultural, destacando o papel do professor como mediador entre o que o estudante já

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sabe e o que ainda não sabe e a pedagogia histórico-crítica, focando a importância

da realização de um trabalho contextualizado que parte do cotidiano para que o

estudante uma vez instrumentalizado, tenha condições de compreender melhor a

realidade em que vive para nela interferir promovendo mudanças na sua vida, far-se-

á uma análise sobre a alfabetização e letramento. Este é o ponto de partida da

discussão sobre a qualidade do ensino nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Neste sentido, faz-se necessário o estudo e discussão acerca dos

problemas envolvidos na alfabetização e no letramento, conceito elaborado

recentemente no campo educacional, com ênfase na importância da leitura, ação

indispensável para fazer com que cada criança brasileira tenha assegurado o seu

direito a aprender a ler e a escrever e, assim, a participar do mundo da escrita. A

partir do ponto de vistas de conceituados autores, que se apresentarão de forma

descritiva é possível ter acesso às ideias que elucidam os conceitos.

Durante muito tempo, o ato de ler era concebido como a decodificação de

letras em sons. Freire (1984, p.12), chama a atenção para a importância desse

trabalho a partir do contexto em que vive o estudante, afirmando que a “[...]

compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção

das relações entre o texto e o contexto.” Assim, compreende-se que a partir do meio

social ao qual o indivíduo pertence é fundamental para que se estabeleça a

interação durante a leitura.

Apesar de causar estranheza, boa parte dos professores não traz consigo o

hábito de ler. É provável que isso contribua para formação de poucos leitores na

escola. Então, o ensino de leitura ocorre por imitação de processos uniformizados

suscitando um círculo vicioso e induzindo ao esquema de transferência de

responsabilidades sobre o assunto de um professor para o outro, de um nível de

ensino para o outro e nada é feito para mudar a situação (SILVA, 1991).

As experiências individuais do professor como leitor é o ponto de partida do

trabalho com a leitura, que levando em consideração o que o estudante já sabe e

em um constante diálogo entre colegas de profissão, o trabalho avança num sentido

mais elaborado e significativo. A história de leitura de cada um deve ser levada em

consideração, mesmo sendo nos anos iniciais do ensino fundamental, pois todos

têm sua leitura de mundo mesmo antes de começar a frequentar a escola.

Os primeiros professores tornam-se responsável por levar o estudante a

tomar gosto pelo aprender, entendendo que o processo de alfabetização é muito

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complexo para o aluno. Para que os objetivos a que se propõe o alfabetizador sejam

atingidos, é necessário que o professor reconheça seu papel nos primeiros anos da

criança na escola: "[...] o primeiro professor de uma criança tem grande importância

na atitude futura desse educando, não só durante a sua fase de aprendizagem, mas

na sua relação com os sucessivos professores”. (HILLAL, 1985, p. 19)

Nas questões de métodos de alfabetização, Kato (1985) coloca a

preocupação que os alfabetizadores têm por métodos de alfabetização como um

instrumento seguro para ensinar a ler e a escrever. Salienta que para a grande

maioria dos professores o método "[...] é definido meramente como um conjunto de

materiais, técnicas e procedimentos para se atingir um fim, isto é, um conjunto

programado de atividades para o professor e o aluno”. (KATO, 1985, p.3-4)

Não se quer com essa fala desconsiderar a importância de o professor

alfabetizador dominar os métodos de alfabetização, mas destacar a necessidade de

não ficar preso a uma só forma de ensinar a ler e escrever como verdades

absolutas, faz-se necessário buscar outras forma de ensinar, especialmente quando

algumas crianças demonstram dificuldades para aprender.

Entendendo que as aprendizagens se dão de forma processual e na relação

que o estudante estabelece com o professor, há que se resgatar o papel do "ensino",

conforme descreve Klein (2002, p. 121):

Evidentemente, em se tratando de processos, o ensino e aprendizagem não guardam identidade; um não é o mero reflexo do outro; o aprendido não é, mecanicamente o ensinado, na sua forma pura. Contudo, ensino e aprendizagem estão em relação, constituem uma relação necessariamente articulada, sim. O aprendiz pode não aprender exatamente o que foi ensinado e como foi ensinado, mas, evidentemente, o que aprendeu foi aprendido a partir do que foi ensinado. Para a devida apreensão do conteúdo dessa afirmação é preciso, no entanto, devolver à palavra "ensino" a amplitude que lhe cabe. [...].

Evidencia-se que o ato de ensinar, seja entendido em seu mais restrito

sentido, o de marcar, deixar sinal e de forma consciente promover a aprendizagem,

indo além da decodificação e adentrando ao entendimento de letramento.

Para Tfouni (2010, p. 32), “[...] a necessidade de se começar a falar em

letramento surgiu, creio eu, da tomada de consciência que se deu, principalmente

entre os linguístas, de que havia alguma coisa além da alfabetização, que era mais

ampla, e até determinante desta.” A autora distingue assim os termos alfabetização

e letramento: “Enquanto a alfabetização ocupa-se da aquisição da escrita por um

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indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos

da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade.” (TFOUNI, 1995, p. 20)

Soares (2003) defende a complementaridade e o equilíbrio entre

alfabetização e o letramento e chama a atenção para o valor da distinção

terminológica:

Porque alfabetização e letramento são conceitos freqüentemente confundidos ou sobrepostos, é importante distingui-los, ao mesmo tempo em que é importante também aproximá-los: a distinção é necessária porque a introdução, no campo da educação, do conceito de letramento tem ameaçado perigosamente a especificidade do processo de alfabetização; por outro lado, a aproximação é necessária porque não só o processo de alfabetização, embora distinto e específico, altera-se e reconfigura-se no quadro do conceito de letramento, como também este é dependente daquele. (SOARES, 2003, p. 90)

O conceito de alfabetização ampliou-se de mera capacidade de firmar ou de

ler uma mensagem simples, para leitura de novo material e recopilação de novas

informações a partir de um material. Esse novo conceito denomina-se letramento. A

alfabetização, como processo de aquisição do sistema convencional de uma escrita

alfabética e ortográfica, foi, assim, de certa forma obscurecida pelo letramento,

porque este acabou por freqüentemente prevalecer sobre aquela, que, como

consequência, perde sua especificidade. (SOARES, 2003)

Para Magda Soares (2003), dissociar alfabetização e letramento é um

equívoco porque, no quadro das atuais concepções psicológicas, linguísticas e

psicolinguísticas de leitura e escrita, a entrada da criança (e também do adulto

analfabeto) no mundo da escrita se dá simultaneamente por esses dois processos:

pela aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização, e pelo

desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e

escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita – o letramento.

Dessa forma, alfabetização e letramento são práticas indissociáveis. A

criança deve entrar no mundo letrado fazendo uso tanto da alfabetização como do

letramento, ou seja, precisa apropriar-se da tecnologia da escrita, pelo processo de

alfabetização, e precisa identificar os diferentes usos e funções da escrita e vivenciar

diferentes práticas de leitura e de escrita, pelo processo de letramento.

A criança já conhece algumas regras básicas da linguagem, que a

constituem como sujeito e como participante de relações com outros sujeitos,

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portanto traz para o ambiente escolar uma comunicação e interação com os demais

membros da comunidade em que se insere. Já domina uma série de normas e

procedimentos linguísticos que auxiliarão na aprendizagem da leitura e escrita. É no

mundo letrado que a criança já se encontra inserido, que se dará sua iniciação na

representação escrita.

A alfabetização levará em conta, portanto, a variedade da língua oral e

escrita como princípio básico da aprendizagem e desempenho, além do mais, o

falante de uma modalidade de língua, seja ela qual for, tanto será mais competente

quanto mais habilidoso em distinguir onde, quando e de que maneira poderá servi-

se dessa ou de outra qualquer modalidade.

Para refletir sobre a língua, e a partir dela, é preciso compreender que o

conceito de texto vai além da linguagem escrita; abarca enunciados orais, escritos e

a conexão da linguagem verbal com outras linguagens. O texto abrange todo o

processo de produção e elaboração, efetivação do discurso e a resposta ativa. Não

pode ser reduzido à simples materialidade linguística. Texto é linguagem em uso e

só ocorre por meio da interação. (BAKHTIN, 1999)

Dessa forma, a palavra, não deve ser compreendida como forma neutra ou

ingênua, pois está revestida de conteúdo ideológico resultante da visão de mundo

dos envolvidos no processo verbal.

[...] Toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige a alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. (...) A palavra é território comum do locutor e do interlocutor. (BAKHTIN / VOLOCHINOV, 1999, p. 113)

Ao promover experiências significativas de aprendizagem da língua, por

meio de trabalho com a linguagem oral e escrita, propiciam-se ao aluno espaços de

ampliação das capacidades de comunicação e expressão e de acesso ao mundo

letrado. Essa ampliação está relacionada ao desenvolvimento gradativo das

capacidades, associado às quatro competências linguísticas básicas: falar, escutar,

ler e escrever.

O domínio da linguagem oral e escrita é imprescindível, para o homem se

comunicar no mundo em que vive. É função da escola ensinar o estudante a ler, a

escrever e expressar-se oralmente em todas as situações do seu convívio social.

Pois, a leitura é um processo pelo qual o leitor realiza um trabalho ativo de

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construção de significado do texto, a partir de seus objetivos e de seus

conhecimentos. Assim, sendo tem como finalidade a formação de leitores

competentes e consequentemente a formação de escritores.

Discutidos os conceitos de alfabetização e letramento e os objetivos do

PNAIC, faz-se necessário uma reflexão sobre currículo no contexto de alfabetização

e letramento. Este tema é amplamente discutido na Unidade 1 Ano 1 (Brasil, 2012)

do material de formação para professores alfabetizadores disponibilizado no material

do PNAIC.

Esse estudo propõe a superação de um currículo fragmentado, sem relação

com o cotidiano da criança. Moreira e Candau (2007, p. 31) esclarece como deve ser

essa nova visão de currículo:

“Insistimos, inicialmente, na necessidade de uma nova postura, por parte professorado e dos gestores, no esforço por construir currículos culturalmente orientados. Propomos, a seguir, que se reescrevam os conhecimentos escolares, que se evidencie a ancoragem social desses conhecimentos, bem como que se transforme a escola e o currículo em espaços de crítica cultural, de diálogo e de desenvolvimento de pesquisas. Esperamos que nossos princípios possam nortear a escolha de novos conteúdos, a adoção de novos procedimentos e o estabelecimento de novas relações na escola e na sala de aula.”

O currículo não pode ser linear, nem tão pouco estático, de acordo com a

Unidade 1 Ano 1 ( Brasil, 2012, p. 7) do caderno de formação do PNAIC: "Currículo

refere-se, nessa perspectiva, a criação, recriação, contestação e transgressão."

Diante disso a proposta é a superação do uso engessado de materiais como

livros didáticos e apostilas. Faz-se necessário fazer o uso reflexivo desses materiais,

avançando quando o estudante der conta, recuando quando preciso e

reorganizando a prática na tentativa de atender a todos, garantindo o direito à

aprendizagem.

Ainda refletindo sobre currículo, não se pode desconsiderar que escola tem

uma função social que é "[...] de transmissão-assimilação do saber sistematizado,

que é a atividade nuclear da escola.” (SAVIANI, 2005, p. 15)

De acordo com esse autor a preocupação dos profissionais da escola deve

ser com o ensinar e o aprender os conhecimentos científicos acumulados

historicamente, para ele deve ser o "[...] cerne de uma prática pedagógica

compromissada com a socialização do conhecimento escolar para todos os sujeitos

da escola" (SAVIANI, 2005, p. 15). Interessante ressaltar que esse pesquisador da

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área da educação afirma que o conhecimento é para todos, ou seja, todos têm

direito à aprendizagem.

Saviani (1991) destaca que ao se conceber o saber sistematizado e

elaborado de currículo, então é preciso que a organização dos conteúdos se dê, a

partir desse saber, focado no conhecimento elaborado e não no conhecimento

espontâneo, no saber sistematizado e não no saber fragmentado, na cultura erudita

e não na cultura popular. Faz uma complementação esclarecedora:

Daí que a primeira exigência para o acesso a esse tipo de saber é aprender a ler e escrever. Alem disso, é preciso também aprender a linguagem dos números, a linguagem da natureza e a linguagem da sociedade. Está aí o conteúdo fundamental da escola elementar: ler, escrever, contar, os rudimentos das ciências naturais e das ciências sociais (historia e geografia humanas). (SAVIANI,1991, p. 32)

Saviani (1991) não deixa dúvida sobre qual é o papel da escola e em que

deve consistir seu currículo. Nesse mesmo material explicita ainda a necessidade da

escola priorizar sua tarefa principal em detrimento a eventos que nela ocorre, como,

por exemplo, a ênfase às datas comemorativas, que se não houver clareza e

organização ocupa o papel principal da escola restando pouco tempo para a efetiva

aprendizagem dos conhecimentos científicos.

2 METODOLOGIA

A partir do problema identificado e da pesquisa teórica que embasa o

trabalho, foi organizado um Curso de Extensão com certificação emitido pela

Universidade Estadual de Maringá, para o público alvo de objeto de intervenção:

"Educação: Reflexões sobre Alfabetização e Letramento". O Curso aconteceu ao

longo de quatro sábados totalizando trinta e duas horas (32 h) de duração, foram

inscritos vinte e oito (28) pessoas sendo a maioria estudantes do Curso Formação

de Docentes e alguns professores já atuantes na Rede Pública Estadual, das quais

vinte (20) pessoas concluíram com carga horária de 100%.

A divulgação foi feita por meio de um folder com todos os detalhes do Curso

e distribuído aos estudantes do Curso Formação de Docentes. Também foi enviado

email para as Instituições de Ensino da Rede Estadual com apoio do Técnico do

Núcleo Regional de Educação de Cianorte responsável pela pasta do PDE.

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Os conteúdos trabalhados no Curso de Extensão foram organizados na a

Produção Didático-Pedagógica - Unidade Didática, promovendo a reflexão sobre

diversos temas relacionados à Alfabetização e Letramento: as principais ideias de

Vygotsky e de Demerval Saviani; Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa;

estudo sobre alfabetização, letramento e currículo; a aprendizagem do sistema de

escrita alfabética; ludicidade na sala de aula; trabalhando com diferentes gêneros

textuais na alfabetização; elaboração de planos de aula e apontamentos sobre

avaliação na alfabetização.

Os temas foram trabalhados por meio de diferentes encaminhamentos

metodológicos: exposição do assunto por meio do uso slides, leitura de textos

previamente selecionados, trabalhos em grupo, debates, produção escrita,

exploração de vídeos e leitura de poemas e poesias nos início de cada dia de curso.

Momento em que foi possível contar com a colaboração dos profissionais da

Secretaria Municipal de Educação com a disponibilidade de materiais e a

apresentação de como está acontecendo o PNAIC no Município de Cianorte.

Todos os materiais utilizados, bem como o lanche servido em todos os

encontros foram feitos com recursos próprios.

A implementação também ocorreu por meio do Grupo de Trabalho em Rede

(GTR) para os pedagogos que se inscreveram para participar deste espaço de

formação continuada. Somente uma cursista não concluiu as atividades propostas.

Na Semana Pedagógica que ocorreu em fevereiro de 2014, foi possível

apresentar a todos os profissionais do Colégio o Projeto de Intervenção e a Proposta

de implementação.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir da pesquisa Bibliográfica e por meio da metodologia acima descrita, a

implementação se efetivou por meio da oferta de um Curso de Extensão e da

realização do Grupo de Trabalho em Rede (GTR).

O Curso de Extensão contou com vinte e oito pessoas inscritas e o conteúdo

trabalhado foi organizado na Produção Didático-Pedagógica, sistematizada por meio

de Unidade Didática.

A Produção Didático-Pedagógica promoveu a reflexão sobre diversos temas

relacionados à Alfabetização e ao Letramento: as principais ideias de Vygotsky e de

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Dermeval Saviani; Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa; estudo sobre

alfabetização, letramento e currículo. Esses temas proporcionaram aos cursistas a

reflexão sobre a concepção teórica que embasou essa pesquisa, como também

contribuiu para perceberem a necessidade de aprimorar os estudos. A partir do

contato com uma sequência didática perceberam a relação entre os estudiosos

Vygotsky e Saviani, evidenciando a necessidade de uma coerência de concepção.

Dando continuidade foram trabalhados a aprendizagem do sistema de escrita

alfabética; a ludicidade na sala de aula; o trabalho com diferentes gêneros textuais

na alfabetização; a elaboração de planos de aula e apontamentos sobre avaliação

na alfabetização. A partir da concepção teórica discutida anteriormente, percebeu-se

a tentativa da relação da teoria com a prática por parte dos cursistas.

Outra questão relevante foi a clareza percebida por meio de relatos dos

participantes ao final do curso de que alfabetização e letramento são indissociáveis,

porém é necessário partir do mais simples para o mais complexo, ou seja é preciso

primeiro que a criança aprenda a ler e a escrever para ter condições de ler e

interpretar os textos, bem como produzí-los e assim tornar-se letrado.

Foi possível contar com o apoio da direção e equipe pedagógica do Colégio

com relação a divulgação do Curso de Extensão e a disponibilidade do espaço físico

e recursos tecnológicos, bem como o apoio de um Agente Educacional que ficou a

disposição para assessorar na realização do evento.

Os objetivos propostos foram atingidos, porém em proporção diferentes. O

primeiro objetivo proposto foi estudar textos sobre a alfabetização e letramento, a

leitura de autores renomados que tratam deste assunto passou a ser um dos centros

de estudo. Foi possível ampliar a compreensão sobre o assunto, e sobretudo ficou

claro que são conceitos interdependentes.

O segundo objetivo foi o de estudar os materiais do PNAIC, que se efetivou

por meio dos cadernos disponibilizados pelo Ministério da Educação e Cultura

(MEC). O material ofereceu subsídios para conhecer a proposta do Pacto, bem

como forneceu elementos para a elaboração da Produção Didático-Pedagógica.

Considera-se que a proposta do PNAIC tem contribuído para a melhoria do

trabalho de alfabetização, especialmente por meio da formação oferecida aos

professores alfabetizadores e uma grande variedade de materiais pedagógicos

disponibilizados às escolas, pois com professores bem formados e materiais de

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qualidade, as possibilidades das crianças aprenderem mais e melhor aumenta de

forma significativa.

Participaram do curso de extensão estudantes do Curso Formação de

Docentes e professores da Rede Estadual atuantes no Ensino Fundamental e

Médio, dos vinte e oito inscritos, vinte concluíram. Considera-se que a participação

foi significativa tendo em vista que foram trinta e duas horas de curso realizadas ao

longo de quatro sábados.

No decorrer do curso, foi possível observar que os temas trabalhados

chamaram a atenção dos cursistas, fazendo-os perceber a necessidade de

aprofundar na compreensão dos conceitos relacionados a alfabetização e

letramento, bem como a necessária relação entre teoria e prática.

Outro espaço de implementação foi o Grupo de Trabalho em Rede (GTR), em

que fizeram parte desse grupo pedagogas que na sua maioria atuam no curso de

Formação de Docentes e foram unânimes em reconhecer a pertinência deste

trabalho, bem como a escolha do público alvo no enfrentamento aos sérios

problemas de alfabetização das crianças brasileiras.

Tão importante quando isso foram os depoimentos do quanto o Projeto de

Intervenção e a Produção Didático-Pedagógica contribuíram para a ampliação do

conhecimento melhorando a prática em sala de aula. Houve vários depoimentos de

resultados positivos observados por meio da aplicação dos materiais em sala de

aula no decorrer da realização do curso no GTR.

Foram abordadas questões fundamentais sobre o estudo da alfabetização e

letramento como: necessidade de superação de uma prática descontextualizada;

melhor compreensão sobre a relação entre alfabetização e letramento; a pertinência

do Projeto de Intervenção no enfrentamento ao alto número de crianças que não

conseguem aprender ler e escrever até oito anos de idade; o PNAIC como uma

política pública trazendo a possibilidade de enfrentamento a essa problemática e a

necessidade de investir cada vez mais na formação dos futuros alfabetizadores.

Com relação ao Material Didático-Pedagógico, as cursistas avaliaram como

adequado ao público alvo por apresentar uma sequência didática que estabelece

relação entre teoria e prática importante na formação inicial do professor; o material

tem contribuído com a reflexão dos professores participantes desse GTR, podendo

ser explorado em suas aulas, o estudo desse material oportunizou às cursistas a

releitura de autores renomados que fundamentam a prática pedagógica.

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Por fim, este estudo incentivou as participantes a continuar estudando e

perseverando no trabalho que vem desenvolvendo com os estudantes do curso de

Formação de Docentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De forma geral os objetivos traçados para este estudo foram alcançados. O

Curso de Extensão ofertado para o público alvo contribuiu e fará diferença na

formação e atuação dos futuros alfabetizadores. Isto foi possível porque oportunizou

o estudo de temas que proporcionou o aprofundamento teórico, além disso, a forma

como foi organizado e trabalhado, propiciou o estabelecimento de relação entre

teoria e prática, inclusive os depoimentos das professoras participantes do GTR,

demonstraram a pertinência e a importância do estudo proposto.

Cada vez mais, faz-se necessário investir na formação dos futuros

alfabetizadores, oportunizando a eles um conhecimento consistente que lhes dêem

subsídios para garantir um ensino de qualidade. Porém, isto deve ser feito com de

forma dinâmica, associando a teoria à prática, motivando os professores

alfabetizadores a desenvolverem um ensino consistente e transformador.

Cabe ressaltar que o estudo desse tema não se esgota aqui, esse foi um

momento privilegiado que deve continuar fazendo parte da vida dos profissionais da

educação, sejam eles em formação ou em serviço.

REFERÊNCIAS BAKHTIN, M.(Volochinov). Marxismo e filosofia da linguagem. Trad. de Michel Lahud e Yara Frateschi. 9 ed. São Paulo: Hucitec, 1999. BRASIL - Ministério da Educação. Reunião com os coordenadores do PNAIC: Brasília, 2013. ______. Ministério da Educação. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Brasília, 2012. ______. Ministério da Educação. Institui o Pacto Nacional pela Alfabetização da Idade Certa e as Ações do Pacto e define suas diretrizes gerais. Portaria n. 867 de 4 de Julho de 2012, Brasília, 2012.

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