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Ilustríssima Justiça Penha Os direitos humanos e a lei 11.340/06 Sob a perspectiva prática da ação afirmativa. Belo Horizonte, 30 de Setembro de 2015 Ilustríssima Justiça Penha COMISSÃO TEMÁTICA V EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS

Os direitos humanos e a lei 11.340/06 - amb.com.br · Lei 11.340/06 – Maria da Penha I. Introdução Em sete de agosto de dois mil e seis, foi sancionada a Lei n o 11.340, que "cria

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Ilustríssima Justiça Penha

Os direitos humanos e a lei 11.340/06

Sob a perspectiva prática da ação afirmativa.

Belo Horizonte, 30 de Setembro de 2015

Ilustríssima Justiça Penha – COMISSÃO TEMÁTICA V – EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E FUNDAMENTAIS

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Os direitos humanos e a lei 11.340/06

sob a perspectiva prática da ação afirmativa.

“A violência doméstica contra as mulheres é talvez a mais vergonhosa violação dos direitos humanos. Não conhece fronteiras geográficas culturais ou de riqueza. Enquanto se mantiver, não podemos afirmar que fizemos verdadeiros progressos em direção À igualdade, ao desenvolvimento e à paz.”

Kofi Annan, ex-Secretário Geral das Nações Unidas

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Lei 11.340/06 – Maria da Penha

I. Introdução

Em sete de agosto de dois mil e seis, foi sancionada a Lei no

11.340,

que "cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a

mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da constituição federal, da convenção

sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres e

da convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra

a mulher; dispõe sobre a criação dos juizados de violência doméstica e familiar

contra a mulher; altera o código de processo penal, o código penal e a lei de

execução penal; e dá outras providências".

Esta lei, que ganhou o nome de "Lei Maria da Penha" como forma de

homenagear a mulher, Maria da Penha Maia Fernandes, símbolo da luta contra

a violência familiar e doméstica, representa um marco histórico na proteção da

família e um resgate da cidadania feminina, haja vista que as mulheres podem

denunciar seu agressor, sem temer que, no dia seguinte, possam vir a sofrer

consequências ainda mais gravosas.

II. Histórico

Historicamente, a mulher é discriminada, o que dá origem à violência,

pois ela é vista como um ser frágil, o que impediu que avançasse socialmente

ou profissionalmente na mesma proporção do homem (BARBOSA;

CAVALCANTI, 2007).

Percebe-se que a mulher sempre foi relegada há um segundo plano,

posta em um grau de submissão, discriminação e opressão. Tal opressão é

geralmente praticada pelo homem, sendo que se torna mais grave quando

cometida no ambiente doméstico e familiar (PORTO, 2012).

Porto (2012) professa que, nas últimas décadas, tem-se dado uma

atenção especial aos direitos humanos, sejam eles em coletividades

determinadas ou mesmo em interesses particularizados, tendo como exemplo

as várias legislações globais, conferências e declarações internacionais. Vale

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trazer para a presente discussão a Declaração da Conferência dos Direitos

Humanos de Viena de 1993, a primeira vez em que apareceu a expressão

“direitos humanos da mulher”, redefinindo fronteiras entre o público e o privado,

a partir da qual os abusos, estupros e violência doméstica passam a ser

interpretados como crimes ofensivos aos direitos humanos.

Em breves linhas, aquela mulher, Maria da Penha, sofreu duas tentativas

de homicídio por parte de seu ex-marido. Primeiro, levou um tiro enquanto

dormia e o agressor alegou que houve uma tentativa de roubo. Em decorrência

do tiro, ficou paraplégica. Como se não bastasse, duas semanas depois de

regressar do hospital, ainda durante o período de recuperação, Maria da Penha

sofreu um segundo atentado contra sua vida: seu ex-marido, sabendo de sua

condição, tentou eletrocutá-la no banheiro.

A punição do agressor só se deu dezenove anos e seis meses após o

ocorrido. Essa situação injusta provocou a formalização de denúncia à

Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA – órgão internacional

responsável pelo arquivamento de comunicações decorrentes de violação

desses acordos internacionais, pelo Centro pela Justiça pelo Direito

Internacional (CEJIL) e pelo Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos

da Mulher (CLADEM), juntamente com a vítima.

Mesmo sem ter esgotado os recursos da jurisdição interna, o caso foi

submetido à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 20/8/1998 e

recebeu o número 12.051.

Foram peticionários junto à Comissão: a vítima (Maria da Penha Maia

Fernandes), o Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional (CEJIL) e o

Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM). A

República Federativa do Brasil foi indicada como Estado violador.

Os peticionários alegaram a tolerância à violência contra mulher no

Brasil, uma vez que esse não adotou as medidas necessárias para processar e

punir o agressor. Fundamentaram o pleito alegando violação dos artigos: 1º(1);

8º; 24º; 25º da Convenção Americana, II e XVIII da Declaração Americana dos

Direitos e deveres do Homem, bem como dos artigos 3º, 4º a, b, c, d, e, f, g, 5º

e 7º da Convenção de Belém do Pará.

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Vale dizer que Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão tornou-

se o mais importante documento na direção dos direitos humanos, porque além

de recomendar avanços sociais, garantia direitos iguais para todos os

cidadãos.

O Estado Brasileiro não apresentou resposta à Comissão apesar das

solicitações formuladas em 19/10/98, em 04/08/99 e em 07/08/2000.

Em 2001 a Comissão emitiu o relatório nº 54/2001 – responsabilizando o

Brasil por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica

contra as mulheres. Entenderam que a violação seguia um padrão

discriminatório em razão da violência doméstica contra mulheres no Brasil.

Dessa forma, foram feitas recomendações ao Estado Brasileiro, a saber:

1. Completar rápida e efetivamente o processamento penal do responsável

pela agressão;

2. Realizar uma investigação séria, imparcial e exaustiva para apurar as

irregularidades e atrasos injustificados que não permitiram o

processamento rápido e efetivo do responsável;

3. Adotar, sem prejuízo das ações que possam ser instauradas contra o

agressor, medidas necessárias para que o Brasil assegure à vítima uma

reparação simbólica e material pelas violações;

4. Prosseguir e intensificar o processo de reforma para evitar a tolerância

estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica;

5. Medidas de capacitação/sensibilização dos funcionários judiciais/policiais

especializados para que compreendam a importância de não tolerar a

violência doméstica;

6. Simplificar os procedimentos judiciais-penais;

7. O estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e efetivas de

solução de conflitos intrafamiliares;

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8. Multiplicar o número de delegacias policiais especiais para a defesa dos

direitos da mulher e dotá-las dos recursos especiais necessários, bem

como prestar apoio ao MP na preparação de seus informes judiciais;

9. Incluir em seus planos pedagógicos unidades curriculares destinadas à

compreensão da importância do respeito à mulher e a seus direitos

reconhecidos na Convenção de Belém do Pará;

10. Apresentar à Comissão, dentro do prazo de 60 dias – contados da

transmissão do documento ao Estado, um relatório sobre o cumprimento

destas recomendações para os efeitos previstos no artigo 51(1) da

Convenção Americana;

Assim, depois de reiteradas reivindicações e clamor por justiça, o

legislador brasileiro positivou a norma supramencionada, sendo esta, fruto da

ação afirmativa do Estado em promover, com celeridade, a igualdade entre

homem e mulher, de modo que se torna inadmissível a continuidade da

discriminação do gênero (mulher), visando punir os crimes cometidos, em

regra, por seus companheiros, no “silêncio” do seio familiar.

A Lei 11.340/06 é uma ação afirmativa que têm forte aspecto pedagógico

para a promoção da paz social, com outros métodos de enfrentamento da

violência doméstica.

A sanção dessa lei representou, posteriormente, um avanço na proteção

da mulher vítima de violência familiar e doméstica, sendo, também, uma

inovação legal quanto às formas familiares já positivadas.

Foram muitos os avanços legais trazidos pela Lei Maria da Penha, entre

eles:

– a definição do que é violência doméstica, incluindo não apenas as agressões físicas e sexuais, como também as psicológicas, morais e patrimoniais; – reforça que todas as mulheres, independentemente de sua orientação sexual são protegidas pela lei, o que significa que mulheres também podem ser enquadradas – e punidas – como agressoras;

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– não há mais a opção de os agressores pagarem a pena somente com cestas básicas ou multas. A pena é de três meses a três anos de prisão e pode ser aumentada em 1/3 se a violência for cometida contra mulheres com deficiência; – ao contrário do que acontecia antigamente, não é mais a mulher quem entrega a intimação judicial ao agressor; – a vítima é informada sobre todo o processo que envolve o agressor, especialmente sobre sua prisão e soltura; – a mulher deve estar acompanhada por advogado e tem direito a defensor público; – podem ser concedidas medidas de proteção como a suspensão do porte de armas do agressor, o afastamento do lar e uma distância mínima em relação à vítima e aos filhos; – permite prisão em flagrante; – no inquérito policial constam os depoimentos da vítima, do agressor, de testemunhas, além das provas da agressão; – a prisão preventiva pode ser decretada se houver riscos de a mulher ser novamente agredida e;

- o agressor é obrigado a comparecer a

programas de recuperação e reeducação.

Deste modo verifica-se que a lei Maria da Penha emergiu da

necessidade de políticas públicas que afirmassem a igualdade entre os seres

humanos, garantindo, assim, sua dignidade.

O art. 2º da Lei supramencionada reafirma seu caráter humanístico:

Art. 2o Toda mulher, independentemente

de classe, raça, etnia, orientação sexual,

renda, cultura, nível educacional, idade e

religião, goza dos direitos fundamentais

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inerentes à pessoa humana, sendo-lhe

asseguradas as oportunidades e

facilidades para viver sem violência,

preservar sua saúde física e mental e seu

aperfeiçoamento moral, intelectual e

social.

A mulher, na situação de violência doméstica se via desvalorizada pois,

em muitas ocasiões é violentada, seja física ou psicologicamente, e não

possuía recursos para obter ajuda, visto que, na maioria das vezes, é

dependente daquele que a violenta, cabe a sociedade, por meio do judiciário,

voltar os olhos para esta realidade.

E cediço que a Lei, em sentido estrito, não reflete toda a realidade

vivenciada pelas famílias, no entanto cabe ao magistrado, vigilante à realidade

que o rodeia, aplicar, livre de preconceitos e estigmas, visando sempre na

prestação jurisdicional a finalidade social, os designos propostos por esta lei.

A título de comparação e posicionamento desta bandeira humanística

transcreveremos a ordem cronológica os eventos históricos de afirmação dos

direitos humanos em vários países.

A seguir, um apanhado histórico de acontecimentos principais que

contribuíram, a partir da Idade Moderna e ao longo dos séculos seguintes, para

a afirmação dos direitos humanos, em vários locais do mundo.

1628 Petição de Direitos – Inglaterra

1679 Lei do Habeas Corpus, Inglaterra

1688 Declaração de direitos da Inglaterra (Bill of Rights)

1690 Publicação do Segundo tratado sobre o governo, de John Locke

1712 Rebelião dos escravos em Nova York, Estados Unidos

1748 Publicação do livro O Espírito das Leis, de Montesquieu

1755 Publicação do livro Discurso sobre a origem e os fundamentos da

desigualdade entre os homens, de Jean-Jacques Rousseau

1762 Publicação do livro Do contrato social, de Jean-Jacques Rousseau

1763 Publicação do livro Tratado da Tolerância, de Voltaire DIREITOS

HUMANOS 47

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1776 Declaração de Independência dos Estados Unidos da América 1787

Constituição dos Estados Unidos da América

1789 Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão

1792 Abolição do tráfico de escravos (Dinamarca)

1794 Abolição da escravidão no Haiti (primeiro país da América Latina)

1804 Código Napoleônico

1807 Proibição do tráfico de escravos (Grã-Bretanha)

1808 Proibição do tráfico de escravos (Estados Unidos) 1821 Abolição da

escravidão na Colômbia 1826 Abolição da escravidão na Bolívia

1827 Abolição da escravidão no Peru e Guatemala

1828 Abolição da escravidão no México

1833 Abolição da escravidão em todo o território do Impé- rio Britânico

1858 Abolição da escravidão na Rússia

1863 Convenção de Genebra

1865 Abolição da escravidão nos Estados Unidos

1873 Abolição da escravidão em Porto Rico

1888 Abolição da escravidão no Brasil

1890 Conferência de Bruxelas sobre a repressão ao tráfico de escravos

africanos

1907 Conferência da Paz em Haia, na Holanda. Rui Barbosa é o delegado do

Brasil.

1917 Promulgada a Constituição Mexicana

1919 Imposição do Tratado de Versalhes

1919 Criação da OIT – Organização Internacional do Trabalho

1920 Criação da Liga das Nações

1923 Abolição da escravidão no Afeganistão

1924 Abolição da escravidão no Iraque

1926 Convenção de Genebra sobre a Escravatura 48 SINOPSES JURÍDICAS

1926 Abolição da escravidão no Nepal

1929 Abolição da escravidão na Pérsia (atual Irã)

1937 Abolição da escravidão em Bahrein

1943 Levante do Gueto de Varsóvia, contra a ocupação nazista e o genocídio

1945 Criação da Organização das Nações Unidas (ONU)

1945 Criação do Tribunal de Haia (Corte Internacional de Justiça)

1948 Proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos pela ONU

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1948 Assinatura da Carta Constitutiva da Organização dos Estados Americanos

– OEA (em Bogotá) 1948 Declaração Americana dos Direitos e Deveres do

Homem

1948 Convenção da ONU sobre a Prevenção e Repressão do Crime de

Genocídio

1949 Convenção de Genebra sobre a Proteção das Vítimas de Conflitos

Bélicos

1950 Convenção Europeia dos Direitos Humanos

1950 Convenção de Genebra sobre o Tratamento dos Prisioneiros de Guerra

1950 Convenção da ONU para a Repressão do Tráfico de Pessoas e do

Lenocínio e Protocolo Final 1950 Estatuto do Alto Comissariado das Nações

Unidas para os Refugiados

1955 Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades

Fundamentais – Sistema Europeu

1956 Convenção Suplementar da ONU sobre a Abolição da Escravatura, do

Tráfico de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas à Escravatura

1957 Convenção da ONU sobre Abolição do Trabalho Forçado

1959 Declaração Universal dos Direitos da Criança (ONU)

1960 Convenção da ONU Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do

Ensino DIREITOS HUMANOS 49

1961 Criação da Anistia Internacional (Londres), visando à defesa dos presos

por motivos políticos, religiosos, étnicos, ideológicos ou raciais

1965 Convenção da ONU Relativa à Escravatura

1965 Convenção Internacional da ONU sobre a Eliminação de Todas as

Formas de Discriminação Racial 1966 Pacto Internacional sobre os Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais

1966 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

1966 Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados

1967 Declaração Sobre Asilo Territorial – ONU

1968 Assassinato de Martin Luther King

1968 I Conferência Internacional de Direitos Humanos (Teerã)

1968 Conferência de Medellín (Colômbia)

1968 Convenção da ONU sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e

dos Crimes contra a Humanidade

1969 Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José)

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1971 Convenção da ONU sobre a Redução de Casos de Apátridas

1971 Convenção da ONU Relativa ao Estatuto dos Refugiados

1971 Declaração da ONU dos Direitos do Deficiente Mental

1972 Conferência sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo)

1972 Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural

1974 Conferência Mundial sobre Alimentação

1974 Declaração sobre a Erradicação da Fome e da Desnutri- ção

1974 Declaração da ONU sobre a proteção da Mulher e da Criança em

Estados de Emergência e de Conflito Armado 50 SINOPSES JURÍDICAS

1975 Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes

1975 Declaração da ONU sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra

Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

1976 Declaração Universal dos Direitos dos Povos

1977 Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e da Dignidade do

Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina – Sistema Europeu

1978 Declaração da ONU sobre a raça e os preconceitos raciais

1978 Conferência de Puebla

1978 Declaração da ONU sobre os princípios fundamentais relativos à

contribuição dos meios de comunicação de massa para o fortalecimento da paz

e da compreensão internacional para a promoção dos direitos humanos e a luta

contra o racismo, o apartheid e o incitamento à guerra

1979 Convenção Internacional da ONU sobre a Eliminação de Todas as

Formas de Discriminação contra as Mulheres

1979 Convenção Internacional da ONU contra a Tomada de Reféns

1979 Tribunal Permanente dos Povos

1979 Princípios da ONU de Ética Médica aplicáveis à função do pessoal de

saúde, especialmente aos médicos, na proteção de prisioneiros ou detidos

contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou

degradantes

1981 Declaração Islâmica Universal dos Direitos Humanos

1981 Declaração da ONU sobre a eliminação de todas as formas de

intolerância e discriminação fundadas na religião ou nas convicções

1981 Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos – Carta de Banjul

1981 Declaração da ONU sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a

Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas DIREITOS HUMANOS

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1982 Convenção da ONU sobre o Direito do Mar

1983 Convenção 159 da OIT sobre Reabilitação Profissional e Emprego de

Pessoas Deficientes 1984 Convenção da ONU contra a Tortura e outros

Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes 1985 Convenção

Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura

1987 Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e das Penas ou

Tratamentos Desumanos ou Degradantes

1988 Conjunto de Princípios da ONU para a Proteção de Todas as Pessoas

Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão

1988 Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em

matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

1989 Queda do Muro de Berlim

1989 Massacre da Praça da Paz Celestial (China)

1989 Convenção da ONU sobre os Direitos das Crianças

1989 Princípios da ONU relativos a uma eficaz Prevenção e Investigação de

Execuções Extralegais, Arbitrárias e Sumárias

1990 Protocolo à Convenção Americana sobre Direitos Humanos referentes à

abolição da Pena de Morte

1990 Convenção de Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores

Migrantes

1990 Declaração Mundial da ONU sobre Educação para Todos (Jomtien)

1990 Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens

Privados de Liberdade

1990 Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, Proteção e Desenvolvimento

da Criança nos Anos 90

1990 Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil

(Riad)

1991 Fim das leis do apartheid na África do Sul 52 SINOPSES JURÍDICAS

1992 Conferência sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio de Janeiro)

1992 Declaração da ONU sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os

Desaparecimentos Forçados

1992 Princípios de Paris (relacionados com o status de instituições nacionais

de direitos humanos) 1993 II Conferência Internacional de Direitos Humanos

(Viena)

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1995 IV Conferência Mundial sobre a Mulher – Pequim (China)

1995 Declaração da ONU de Princípios sobre a Tolerância

1995 Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administra- ção da Justiça da

Infância e da Juventude (Regras de Pequim)

1995 Convenção da ONU sobre Cooperação Internacional e Proteção de

Crianças e Adolescentes em Matéria de Adoção Internacional (Haia)

1996 Austrália é o primeiro país a lançar o Plano Nacional de Direitos Humanos

1996 Filipinas é o segundo país a lançar o Plano Nacional de Direitos Humanos

1996 Brasil é o terceiro país a lançar o Plano Nacional de Direitos Humanos

1997 Assinatura do Protocolo de Kyoto

1997 Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e da Dignidade do

Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina – Sistema Europeu

1998 Criação do Estatuto do Tribunal Penal Internacional – TPI

1998 Declaração sobre os Defensores de Direitos Humanos

1998 Princípios da ONU para Proteção de Pessoas Sujeitas a qualquer Forma

de Detenção ou Prisão 2000 Declaração da OEA de Princípios sobre a

Liberdade de Expressão DIREITOS HUMANOS 53 2000 Carta dos Direitos

Fundamentais da União Europeia

2001 I Fórum Social Mundial (Porto Alegre)

2001 Carta Democrática Interamericana

2001 Conferência Mundial sobre o Racismo (Durbham) 2002 II Fórum Social

Mundial (Porto Alegre)

2002 Resolução sobre as Diretrizes e Medidas para a Proibição e Prevenção

contra a Tortura e Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

na África (Robben Island)

2003 III Fórum Social Mundial (Porto Alegre)

2004 IV Fórum Social Mundial (Mumbai)

2005 V Fórum Social Mundial (Porto Alegre)

2006 VI Fórum Social Mundial (Caracas)

2007 VII Fórum Social Mundial (Nairobi)

2007 Tribunal Permanente dos Povos para Multinacionais, Recursos Naturais e

Guerra Suja

Adotando a primazia dos tratados na América do Sul, pelo menos cinco

países têm legislação semelhante à brasileira, em que os tratados que

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envolvem direitos humanos têm hierarquia constitucional.

É o caso das constituições da Argentina (art. 75, inc. 22), Paraguai (art.

145), Peru (art. 105), Uruguai (art. 7º) e Venezuela (art. 23). Na Europa, o

direito internacional tem primazia sobre o direito interno na Constituição de

vários países: Alemanha (art. 25), França (art. 55), Grécia (art. 28, § 1º) e

Espanha (art. 9.2). Finalmente, na Constituição dos Estados Unidos, o art. VI

diz: “Esta Constituição e as Leis complementares e todos os Tratados já

celebrados constituirão a Lei suprema do País

III. Aspectos Jurídicos Práticos

1) Medidas protetivas

A medida protetiva de urgência é uma inovação, haja vista que a Lei Maria

da Penha – Lei n. 11.340/06 – viabilizou o trabalho dos Magistrados, que até o

seu advento era bastante limitado. Os juízes podem, agora, determinar a

execução de medidas protetivas de urgência não somente para assegurar o

direito da vítima, mas também de sua família.

O colendo Superior Tribunal de Justiça e a doutrina majoritária entendem

que o procedimento de medidas protetivas elencado na supramencionada lei

possui natureza cível cautelar. E, observados os requisitos para a concessão

de cada medida, é possível que sejam intentadas de forma autônoma para fins

de cessação ou de acautelamento da violência doméstica contra a mulher.

Ressalte-se, para tanto, que é prescindível a existência, presente ou potencial,

de processo-crime ou ação principal contra o suposto agressor e, nessa

hipótese, as medidas de urgência terão natureza cautelar cível satisfativa.

Contudo, tem-se que as medidas protetivas, no contexto de violência

doméstica, possibilitou que o Magistrado se utilize de dispositivos de áreas

variadas do direito, já que a lei contempla instrumentos de caráter civil,

trabalhista, previdenciário, administrativo, penal e processual, sendo mais bem

adjetivada como de natureza heterotópica.

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1.1) Assistência à mulher em situação de violência doméstica

O art. 9° Lei 11.340/06, determina que a mulher em situação de violência

doméstica, deverá ser assistida e amparada, de forma harmônica pelos

princípios e diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no

Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública entre outras.

Nota-se que a assistência à mulher se subdivide em três, a Assistência

Social (Lei 8.742/93), a saúde (Lei 8.080/90) e por fim a segurança pública,

garantindo a vítima inclusão em programas assistenciais, fomentando o acesso

aos serviços de contracepção de emergência e ao conhecimento a profilaxia

das doenças sexualmente transmissíveis, assegurando que a vítima encontre

refúgio e proteção em casos de risco de vida e, em casos específicos

garantindo a retirada de seus pertences do domicílio ou local em que lá

estejam.

O Estado, se valeu de diversos ramos do direito, com intuito de fornecer

o aparato necessário para amparar as mulheres, vítimas da violência

doméstica, garantindo-lhes a relação de trabalho enquanto perdure a situação

de hostilidade bem como a preservação de sua saúde.

2) Casos práticos de agravamento

Na hipótese de ter sido o agressor intimado ao cumprimento de eventuais

medidas protetivas que lhe foram impostas e continuar importunando a vítima,

de modo a macular sua segurança e tranquilidade, é possível o agravamento

das referidas medidas. Com efeito, para que isso ocorra, é necessário levar em

consideração o caso concreto, bem como analisar o contexto histórico da

vítima e do acusado, prestigiando, com especial valor, o que está sendo

declarado por aquela.

Os agravamentos poderão variar de acordo com a gravidade do

descumprimento. Por exemplo, agrava-se a medida protetiva, com a

determinação de instalação de tornozeleira eletrônica nos casos em que a

vítima se mostra insegura e temerária pela procura do agressor, que ainda a

ameaça de causar-lhe mal injusto e grave. É possível que sejam os agressores

encaminhados a grupos reflexivos que possuem objetivo pedagógico de

conscientização, bem como, em observância ao art. 20 da Lei Maria da Penha,

que seja, em casos excepcionais, decretada a prisão preventiva do requerido.

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3) Dos grupos de reflexão

Conforme parâmetros previstos pela Lei n. 11.340/06, verifica-se que,

malgrado esta vise à proteção da violência de gênero, faz-se necessária

sobremaneira a conscientização dos agentes no próprio âmbito familiar, e,

evidentemente, na sociedade como um todo.

E, a sobredita lei, em seu artigo 35, estabelece como competência dos

entes federados a criação e promoção de: centros de atendimento integral e

multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de

violência doméstica e familiar; casas-abrigos para mulheres e respectivos

dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar;

delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de

perícia médico-legal especializados no atendimento à mulher em situação de

violência doméstica e familiar; programas e campanhas de enfrentamento da

violência doméstica e familiar; centros de educação e de reabilitação para os

agressores.

Mencionam-se determinados grupos reflexivos, tais como Instituto

Albam, CEAPA, Projeto Dialogar e outros que, abordando a desigualdade de

gênero, bem como as relações desiguais de poder, exercem o trabalho

pedagógico e de responsabilização de uma ação com caráter assistencial para

‘tratamento’ do agressor e ou acompanhamento familiar, uma vez que a

minimização da gravidade da violência cometida teria efeito contrário ao

esperado.

Verifica-se, entretanto, que os serviços ainda são insuficientes tendo em

vista a crescente demanda e o crescimento das denúncias, conforme aponta a

douta juíza Elaine Cristina Monteiro Cavalcante, da Vara Central da Violência

Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Paulo, que criou um projeto

especial para atuar nessa frente, o “Dialogando para a Paz”. A proposta do

projeto é encaminhar os homens que enfrentam processos pela Lei Maria da

Penha para os dois programas oferecidos na capital paulista – o Curso de

Reeducação Familiar da Academia de Polícia Civil do Estado de São Paulo e o

Grupo de Reflexão para Homens Autores de Violência da ONG Coletivo

Feminista Sexualidade e Saúde.

Este trabalho é de suma importância, pois oferece condições para que

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os indivíduos que cometem violências repensem seus papéis nas relações de

gênero e, consequentemente, adotem atitudes e comportamentos não

discriminatórios em seus relacionamentos familiares e afetivos.

Em razão do crescimento indiscriminado dos crimes relacionados à

violência familiar o judiciário, muitas vezes na pessoa de seus Magistrados,

tem buscado criar projetos que fomentam a cidadania e o acolhimento das

vítimas.

Um exemplo destas “boas práticas” é a ação elaborada pela Juíza

Adriana Mello, do 1º juizado de violência doméstica e familiar do Rio de

Janeiro, vencedor do prêmio Inovare de 2014, nominado como “projeto violeta”,

com ideal em conceder celeridade ao atendimento às mulheres em situação de

risco.

Nestes casos, uma vez feita a denúncia, os casos mais graves são

identificados e, em até 4 (quatro) horas, sai a sentença com a medida protetiva.

A mulher aguarda a decisão do juiz em uma sala especial do 1º juizado, onde

as paredes tem cor violeta, e lá recebe atendimento de uma equipe

multidisciplinar.

4) Casos de extinção

O procedimento judicial poderá, em alguns casos, ser extinto seja por

vontade da vítima ou por determinação legal, no entanto, antes de indicar as

formas de extinção faz-se necessário conceituar o procedimento atualmente

adotado.

O ponto de partida é quando a vítima, após sofrida a respectiva

violência, se dirige à autoridade policial competente e efetua o registro do

boletim de ocorrência, nesta hora, lhes são oferecidas as medidas protetivas

dispostas na Lei 11.340/06, ao indicar as que necessita assina os termos de

declaração e representação.

Noutro giro, em concomitância às medidas protetivas, instaura-se o

inquérito policial que tem por objetivo apurar os fatos que posteriormente

servirão de base para o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público.

Contudo, as vítimas, em alguns casos, por insegurança ou até mesmo

desconfiança na lei, desistem dos procedimentos. As medidas protetivas, por

seu caráter satisfativo e imediato podem, a qualquer momento requerer a

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extinção das referidas medidas, casos em que o juiz deverá aplicar o disposto

no art. 267 VIII do CPC (extinção por desistência).

Há, ainda, a possibilidade de extinção pela falta de interesse de agir

(art.267, VI do CPC), neste caso a vítima não colabora com o devido processo

legal e, diante da situação fática, fluido significativo lapso temporal desde o

requerimento, sem fatos novos, desaparecem os requisitos das medidas

protetivas de urgência, quais sejam, a existência da situação de risco e a

atualidade da agressão, não se admitindo que as medidas protetivas sejam

aplicadas “ad eternum”, por se tratar de sanção restritiva de direito do agressor.

Na realidade, diante da ausência de qualquer manifestação posterior da

ofendida, resta evidente que o ofensor não representa mais qualquer risco que

justifique as medidas protetivas depois de tanto tempo.

Assim se tem confirmado pelo entendimento pelo Egrégio Tribunal de

Justiças de Minas Gerais:

APELAÇÃO CRIMINAL – RECEBIMENTO

COMO AGRAVO DE INSTRUMENTO –

APLICAÇÃO – FUNGIBILIDADE

RECURSAL – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA –

LESÃO CORPORAL – LEI MARIA DA

PENHA – EXPEDIENTE APARTADO DE

MEDIDAS PROTETIVAS –

PROCEDIMENTO AUTÔNOMO –

CARÁTER SATISFATIVO – INDEPENDE

DO AJUIZAMENTO DE AÇÃO

PRINCIPAL – CONCESSÃO DAS

MEDIDAS PROTETIVAS –

NECESSIDADE – FUMUS BONI IURIS E

PERICULUM IN MORA

CONFIGURADOS.

– As decisões que extinguem ou

indeferem as medidas protetivas de

urgência não são definitivas e, por isso,

devem ser combatidas por meio de

agravo de instrumento, conforme

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disposição no art.13, da Lei

n°11.340/2006 c/c o art.162, § 2°, e art.

522 e seguintes do CPC.

– As medidas protetivas abarcadas pela

Lei Maria da Penha têm natureza

autônoma, de caráter satisfativo, devendo

por isso, produzir efeitos enquanto

perdurar uma situação de perigo que

ensejou o requerimento de proteção do

Estado e, não apenas enquanto for

manejada uma persecução criminal contra

o suposto ofensor.

– Constatando-se a presença dos

requisitos básicos à concessão da medida

cautelar – fumus boni iuris e periculum in

mora – forçoso se faz o deferimento das

medidas protetivas.

V.V. INDEFERIMENTO DE MEDIDAS

PROTETIVAS – FATOS OCORRIDOS HÁ

QUASE UM ANO – NÃO

COMPROVAÇÃO DE QUE A

SEGURANÇA DA VÍTIMA SE

ENCONTRA, ATUALMENTE,

COMPROMETIDA – AUSÊNCIA DE

SUPORTE PROBATÓRIO MÍNIMO –

NATUREZA CAUTELAR E ACESSÓRIA.

1. As medidas protetivas previstas na

Lei nº 11.340/06 tem seu deferimento

vinculando à observância dos

princípios da necessidade, atualidade e

razoabilidade, razão pela qual seria

temerário concedê-las, restringindo

direitos do suposto agressor, após

decurso de relevante lapso temporal

sem qualquer manifestação da vítima.

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(grifo nosso)

2. Considerando a sua natureza

acessória, a medida protetiva não pode

ser deferida se a ação principal, que se

tem em mira tutelar, após considerável

lapso temporal, não foi deflagrada. (TJMG

– Apelação Criminal 1.0433.14.032337-

2/001, Relator(a): Des.(a) Jaubert

Carneiro Jaques, 6ª CÂMARA

CRIMINAL, julgamento em 01/09/2015,

publicação da súmula em 11/09/2015)

Já no procedimento penal, as hipóteses de extinção são mais restritas, em especial nos casos em que o autor (agressor) vem a óbito (art. 107, inciso I, do Código Penal). Assim também entende o Colendo Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL –

CRIMES DO ART. 129, § 9º; DO ART. 147

E DO ART. 359, TODOS DO CÓDIGO

PENAL – EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

– MORTE DO AGENTE – ART. 107, I, DO

CÓDIGO PENAL – RECURSO JULGADO

PREJUDICADO

- Diante da comprovação da morte do réu,

resta prejudicada a apreciação do mérito

de seu recurso por falta de interesse

jurídico. Incidência do artigo 107, inciso I,

do Código Penal, nos termos do artigo 61

do Código de Processo Penal.

– Extinção da punibilidade em razão do

falecimento do réu, cujo recurso fica

prejudicado.

(TJMG – Apelação Criminal

1.0471.12.012732-2/001, Relator(a):

Des.(a) Flávio Leite, 1ª CÂMARA

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CRIMINAL, julgamento em 23/09/2014,

publicação da súmula em 03/10/2014)

Quando a Ação Penal é condicionada à representação da vítima que até o oferecimento da denúncia e em juízo poderá desistir do processo (art. 16 da Lei 11.340/06 – Lei Maria da Penha).

Nota-se conforme dispõe o eludido artigo:

Art. 16. Nas ações penais públicas

condicionadas à representação da

ofendida de que trata esta Lei, só será

admitida a renúncia à representação

perante o juiz, em audiência

especialmente designada com tal

finalidade, antes do recebimento da

denúncia e ouvido o Ministério Público.

IV – Ação Penal

Inicialmente, faz-se necessário distinguir ação penal pública

condicionada e ação penal publica incondicionada. Ambas são propostas pelo

Órgão Ministerial, todavia esta sem a manifestação de vontade de quaisquer

das partes envolvidas no processo, enquanto aquela depende da

representação da vítima. Ressalte-se, ainda, que, na ação penal pública

condicionada, existe a possibilidade de retratação da vítima ate o momento do

oferecimento da denúncia. Corrobora, inclusive, desse entendimento o art. 16

da Lei Maria da Penha.

1) Súmula 542 do Superior Tribunal de Justiça

A Lei Maria da Penha é a responsável pela diminuição da violência

praticada contra as mulheres em todo o país. Contudo, há registros de casos

que não foram avaliados pela Justiça porque as agredidas desistiram de levar

adiante o processo contra os agressores. Retirar a queixa já era proibido, mas

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não adiantava nada a queixa sem representação. Por esse motivo, vários

processos ficavam parados, pois se tratava de caso de ação penal pública

condicionada.

Então, a Procuradoria-Geral da República ingressou com Ação Direta de

Inconstitucionalidade (ADIn) para mudar de condicionada para incondicionada,

e o Supremo Tribunal Federal julgou procedente. O Procurador-Geral da

República, Roberto Monteiro Gurgel Santos alegou que:

Após dez anos da aprovação da Lei nº 9.099/95,

cerca de 70% dos casos que chegavam aos

Juizados Especiais envolviam situações de

violência doméstica contra mulheres. A lei

desestimulava a mulher a processar o marido ou

companheiro agressor e consequentemente

reforçava a impunidade presente na cultura e na

prática patriarcal.

A referida ação foi julgada no dia 09 de fevereiro de 2012 pelos Ministros

do STF, decidindo pela procedência da ação ajuizada pelo Procurador Geral da

República quanto aos artigos 12, inc. I, 16 e 41 da Lei Maria da Penha, por

maioria dos votos, vencido o Presidente, Ministro Cezar Peluso, conforme

segue a decisão:

O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação direta para, dando interpretação conforme aos artigos 12, inciso I, e 16, ambos da Lei nº 11.340/2006, assentar a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão, pouco importando a extensão desta, praticado contra a mulher no ambiente doméstico, contra o voto do Senhor Ministro Cezar Peluso (Presidente). Falaram, pelo Ministério Público Federal (ADI 4424), o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, Procurador-Geral da República; pela Advocacia-Geral da União, a Dra. Grace Maria Fernandes Mendonça, Secretária-Geral de Contencioso; pelo interessado (ADC 19), Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o Dr. Ophir Cavalcante Júnior e, pelo interessado.

(ADI 4424), Congresso Nacional, o Dr. Alberto Cascais, Advogado-Geral do Senado.

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A ação penal pública agora não será mais condicionada à representação

da vítima, significando que a vítima não precisa declarar o seu desejo de

processar o agressor.

Agora, qualquer pessoa, e não apenas a mulher, vítima de violência

doméstica, pode comunicar a agressão à polícia. Poderá também, além disso,

o Ministério Público apresentar denúncia contra o algoz mesmo contra a

vontade da mulher. Antes, apenas a vítima poderia representar contra o

agressor nos casos de lesões corporais leves e a denúncia ficava condicionada

à autorização da vítima que se dava com a representação.

Embora as alterações se dirijam apenas às lesões corporais, não se

aplicando aos casos de ameaça, calúnia e injúria, demonstra uma evolução

legislativa, no sentido de retirar da mente do agressor, quando condenado, o

entendimento equivocado, de que a sua punição é culpa exclusiva da mulher

que o representou e não da sua prática agressiva contra ela. Sendo assim tal

modificação retira da mulher o peso da condenação.

Outro ponto notável das alterações alude ao fato de exterminar com as

interrupções feitas nas investigações policiais, pois de nada adiantavam todos

os esforços despendidos para apuração do delito e da autoria se

posteriormente, não houvesse a representação da vítima para o início da ação

penal.

Além disso, a aplicação da Lei também vale à companheira que é

conivente com a prática da violência, seja contra seus próprios filhos ou

enteados e se mantém calada diante de tamanha desumanidade, acabando

como cúmplice de seu cônjuge.

O STF firmou entendimento, por meio da ADI 4.424/DF, de relatoria do

Ministro Marco Aurélio, de que a ação penal, no caso de crime de lesão

corporal contra a mulher no ambiente doméstico, possui natureza

incondicionada:

Deixar a cargo da mulher autora da

representação a decisão sobre o

início da persecução penal significa

desconsiderar o temor, a pressão

psicológica e econômica, as

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ameaças sofridas, bem como a

assimetria de poder decorrente de

relações histórico-culturais, tudo a

contribuir para a diminuição de sua

proteção e a prorrogação da

situação de violência,

discriminação e ofensa à dignidade

humana. Implica relevar os graves

impactos emocionais impostos pela

violência de gênero à vítima, o que

a impede de romper com o estado

de submissão.

Diante dos efeitos vinculantes dessa decisão, ao Superior Tribunal de

Justiça não restou alternativa, senão curvar-se a esse entendimento, como se

viu em decisões seguintes. Vindo, recentemente, em 26.08.2015, a editar

súmula no mesmo sentido.

Logo, bem se vê que a alteração da mudança de entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, com a aprovação da Súmula 542, representa um

avanço na garantia de proteção dos direitos da mulher.

V – Conclusão

A Constituição da República, de 1988 que, em seu artigo 226, no

parágrafo 8º, prima pela não violência familiar, sem fazer distinção entre

direitos de homens e mulheres.

Contudo, na maioria das vezes, são as mulheres as vítimas da violência

em casa, nessa perspectiva, em 2005, um projeto de lei que visava à proteção

das mulheres no âmbito doméstico foi aprovado na Câmara dos Deputados e,

em julho do ano seguinte, no Senado, surgia assim, a lei 11.340/06.

Atualmente, sua constitucionalidade vem sendo questionada por alguns

juristas que são contra a distinção de tratamento entre homens e mulheres em

relação à violência, porém as estatísticas são claras ao demonstrar que é a

mulher quem deve ser protegida, não podendo o judiciário e a sociedade

“fechar os olhos” para essa realidade.

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