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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6 OS POVOS INDÍGENAS, AS NOVAS TERRITORIALIDADES E A REDEFINIÇÃO DO ESPAÇO LOCAL NO ESTADO DE RORAIMA/BRASIL Josinaldo Barboza Bezerra Universidade Estadual de Roraima [email protected] Patrícia Moreira Herksedek Universidade Estadual de Roraima [email protected] Elizangela Santos Basto Rede Municipal de Ensino de Boa Vista/RR [email protected] INTRODUÇÃO O Estado de Roraima está situado no extremo norte do Brasil, possui fronteira no plano internacional com a República Cooperativa da Guiana e a República Bolivariana da Venezuela. Nos limites internos, o Estado possui divisas com o Amazonas e Pará, apresenta características geográficas distribuídas entre áreas de floresta tropical (floresta amazônica), onde predomina o clima equatorial, e áreas de savanas (regionalmente chamadas de lavrados), marcadas pelo clima tropical. O Estado é composto predominantemente por populações de origem migratória recente, vindos especialmente do Nordeste e com forte presença de agricultores oriundos da região sul. Segundo dados do IBGE (2013) Roraima possui 488.072 habitantes. Destes 308.996 moram na Capital Boa Vista, que corresponde a 63,30% do total da população do Estado. Dados o censo do IBGE (2010) dão contam que Roraima tem 49.637 autodeclarados indígenas. Isto corresponde a 11% da população, sendo o Estado proporcionalmente de população indígena País. Os autodeclarados indígenas em Roraima correspondem a 6,1% do 3710

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OS POVOS INDÍGENAS, AS NOVASTERRITORIALIDADES E A REDEFINIÇÃO DO

ESPAÇO LOCAL NO ESTADO DE RORAIMA/BRASIL

Josinaldo Barboza Bezerra

Universidade Estadual de Roraima

[email protected]

Patrícia Moreira Herksedek

Universidade Estadual de Roraima

[email protected]

Elizangela Santos Basto

Rede Municipal de Ensino de Boa Vista/RR

[email protected]

INTRODUÇÃO

O Estado de Roraima está situado no extremo norte do Brasil, possui fronteira

no plano internacional com a República Cooperativa da Guiana e a República Bolivariana da

Venezuela. Nos limites internos, o Estado possui divisas com o Amazonas e Pará, apresenta

características geográficas distribuídas entre áreas de floresta tropical (floresta amazônica),

onde predomina o clima equatorial, e áreas de savanas (regionalmente chamadas de

lavrados), marcadas pelo clima tropical.

O Estado é composto predominantemente por populações de origem migratória

recente, vindos especialmente do Nordeste e com forte presença de agricultores oriundos

da região sul. Segundo dados do IBGE (2013) Roraima possui 488.072 habitantes. Destes

308.996 moram na Capital Boa Vista, que corresponde a 63,30% do total da população do

Estado. Dados o censo do IBGE (2010) dão contam que Roraima tem 49.637 autodeclarados

indígenas. Isto corresponde a 11% da população, sendo o Estado proporcionalmente de

população indígena País. Os autodeclarados indígenas em Roraima correspondem a 6,1% do

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total da população indígena nacional.

Os dados do IBGE apresentam divergência em relação aos dados apontados pelo

Conselho Indígena de Roraima – CIR/RR, que já em 2009 contabilizavam aproximadamente

53.167 indígenas no Estado. Essa diferença é compreensível, considerando que o IBGE parte

do critério da autodeclaração e muitos indígenas das áreas urbanas se identificarem como

pertencentes a outros grupos éticos e não se sentem indígenas (BEZERRA e COSTA 2010).

Em Roraima predominam os indígenas descendentes do caribe, distribuídos nas

etnias Macuxi, Taurepang, Ingarikó, Patamona, Waiwai e Waimiri-Atroari, apesar da presença

da etnia de origem Arwak como no caso dos Wapixanas, e ainda os de origem Ianomâmis

que constituem um tronco próprio de base cultural e linguística (BEZERRA e COSTA, 2011).

Os primeiros habitantes indígenas chegaram a região do rio Branco antes dos

colonizadores europeus, que só adentram a região no século XVIII. O processo de

colonização de Roraima teve início com as missões religiosas e a busca das drogas do

sertão, partindo das margens dos rios em direção ao lavrado e desencadeando inúmeros

conflitos com os povos indígenas. Conflitos estes que ainda se reproduz enfrentamento

entre índios e não índios na disputa da terra em Roraima e faz surgir novas territorialidades

ou reconfiguração das já existentes, interferindo na produção do espaço local.

Neste entendimento, o presente artigo tem como objetivo analisar o surgimento

de novas territorialidades e o reordenamento do espaço local na terra indígena Canaunim.

Comunidade habitada por indígenas das etnias Makuxi e Wapixana, situada no Município do

Bomfim – Estado de Roraima/Brasil, cuja área foi homologada como terra indígena pelo

Governo Federal em 1996, por força do Decreto nº 15, da Presidência da República.

A redefinição das territorialidades que atuam e determinam as mutações no

espaço local, com consequência nem sempre previsíveis, justificam a realização do estudo

sobre a temática em debate. Parte-se do método dialético na busca de compreender a

relação de forças convergentes e divergentes na disputa do território e na formação dos

novos modelos que atuam na comunidade de forma explicita ou camuflada.

Não se tem a pretensão de construir verdades prontas e acabadas, mas,

sobretudo, instigar o debate e a reflexão sobre as questões indígenas que afloram na

proporção do avanço das forças capitalistas em direção as terras tradicionalmente ocupadas

pelos povos indígenas.

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O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO NA REGIÃO DO RIO BRANCO E OS POVOS INDÍGENAS

A realidade que permeia o cotidiano dos espaços locais é decorrente de forças

que tiveram início no passado e se confrontam com as forças do presente projetando as

tendências do futuro. Tendências estas, nem sempre perceptíveis por aqueles que

participam da construção das estruturas espaciais (BEZERRA e BEZERRA, 2012).

Compreender as bases da colonização na Região do Rio Banco, área que

atualmente compõe o Estado de Roraima, é importante para pensar a trajetória das

territorialidades fundamentadas na cultura capitalista, frente às formas de organização dos

povos indígenas, assentadas na cultura do espaço coletivo e desprovidas de sentimento de

propriedade individual.

Não se pode perder de vista, que a colonização da Região do Rio Branco se

constituiu como resultado do avanço das forças portuguesas pelo interior da Amazônia,

fixando as estratégias de exploração econômica e domínio militar no contexto do sáculo

XVIII.

Os portugueses, após expulsarem os franceses da região de São Luiz no

Maranhão em 1615, partiram em direção a Amazônia instituído a partir de 1916 a politica de

estratégica militar para consolidar o domino português sobre as terras da Amazônia, que

inspirava os aventureiros em busca da lenda do El-Dourado.

Encontrar viabilidade econômica e garantir o domínio exclusivo da Cora

Portuguesa constituíam os grandes desafios na Amazônia, haja vista que a região era

cobiçada pelos ingleses, holandeses franceses e espanhóis, além dos conflitos com diversos

povos indígenas que resistiram à chegada dos invasores.

A região do Rio Branco ingressou no projeto colonial do século XVIII português

por meio da exploração das drogas dos sertões (especiarias), capturas de índios para o

trabalho escravo e criação do Forte de São Joaquim em 1775, na confluência dos rios

Uirariquera e Tacutu. O forte destinava-se fazer frente às invasões dos ingleses, holandeses,

franceses e espanhóis, alguns deles já haviam chegado à região antes mesmo dos

portugueses (VIEIRA, 2007).

A falta de colonos na Região do Rio Banco agravava ainda mais a vulnerabilidade

territorial de Portugal, que buscou submeter os indígenas, pela força ou pelas missões

religiosas, aos interesses coloniais portugueses. As missões religiosas cumpriram papel

fundamental do projeto de dominação, que através do cristianismo foram substituindo a

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base cultural indígena pelos valores culturais e econômicos dos colonizadores.

As ordens religiosas foram distribuídas as margens dos rios e serviram de apoio

direto ao projeto colonial do século XVIII. A criação dos aldeamentos indígenas além de

facilitar a exploração da mão-de-obra indígena no extrativismo das drogas do sertão,

também exercia papel indispensáveis na proteção das terras ocupadas contras as invasões

estrangeiras.

Segundo Farage (1991) a Região do Rio Branco no século XVIII assumiu dois

papéis bem definidos, quais sejam: abastecimento de mão-de-obra escrava indígena ao

mercado do Pará e proteger a colônia contra as ameaças de invasão dos espanhóis e

holandeses.

Os indígenas eram capturados para o trabalho escravo através das tropas de

resgates que adentravam não apenas no rio Branco, mais também em seus tributários,

tornando-se prática corriqueira nessa região da Amazônia.

As mazelas as comunidades indígenas decorrentes do contato com os

colonizadores não advinham apenas da submissão ao trabalho escravo, doenças até então

desconhecido na região provocaram verdadeiros extermínios, sendo este o caso do

sarampo se espalho ao longo do rio Negro (FARAGE, 1991).

Santos A. (2010), ao relacionar as etnias indígenas que ocupavam o vale do Rio

Branco, destaca pelo menos 22 dois grupos distintos, sendo eles: Amaribá; Aoaqui; Aracapi;

Arina; Aruak; Atoari; Aturahi; Baraúna; Caripuna; Karib; Chapero; Crichaná; Guachuró;

Guayacá; Guimare; Guaribo; Irimissana; Ingarikó; Jaricuna; Jawapery; Kirishana e Macuxi.

Porém, relatos dão conta que a região da Bacia do Rio Branco, na época da

chegada dos colonizadores, possuía a aproximadamente 45 etnias indígenas, sendo que

atualmente correspondem apenas 08 grupos.

A mercantilização dos índios e o trabalho forçado ocasionavam a instabilidade

dos aldeamentos e até mesmo rebeliões contra os maus tratos. Santos A. (2010, p. 173)

afirma que “[...] os índios eram tratados como animais de trabalho: desrespeitados,

discriminados, seviciados e explorados até os últimos alento de suas vidas.”

Por volta de 1780 a 1781 ocorreram diversas revoltas indígenas nos

aldeamentos que estes foram completamente destruídos, restando apenas o povoamento

religioso de Nossa Senhora do Carmo que não aderiu ao levante (FARAGE, 1991).

Portugal se via diante do desafio de ampliar as áreas de ocupação na Região do

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Rio Branco, como estratégia de garantir o domínio territorial com base no Tradado de Madri

de 1750. Segundo as regras do Tratado a posse era requisito para o reconhecimento do

direito sobre as terras ocupadas, instituído o chamado princípio do jus possidendi.

Todo o processo de Colonização na Região do Rio Branco esteve dependente de

forma direta do contato com o rio, de forma que as margens foram às primeiras áreas a

serem ocupadas pelos colonizadores que depois avançaram para as áreas de lavrado com a

implantação das fazendas nacionais. Assim, as atividades de pecuária, já cogitada pelos

portugueses, tiveram início no final do século XVIII no alto rio Branco, com a fundação das

primeiras fazendas estatais, também chamadas de Fazendas Reais (CIRINO, 2008).

As Fazendas foram implantadas entre o rio Branco e Uraricoera, no caso da

Fazenda de São Bento; nas proximidades do Forte de São Joaquim foi criada a Fazenda São

José. Entre os rios Uraricoera e Tacutu a Fazenda São Marcos (IBGE, 2009).

As fazendas foram criadas pelo militar Manoel Lobo D’Almada com o objetivo de

fortalecer o domínio português na região do rio Branco e suprir o mercado ao longo do rio

Negro e Amazonas.

Com a criação das fazendas nacionais diversos indígenas foram recrutados para

trabalhar nas atividades da pecuária, enquanto outros se refugiavam em espaços afastados

do contato com os colonizadores, como afirma Santos A. (2010, p. 175/176) “Após

emboscada e mataram mais dois soldados, os insurretos fugiram para as serras deixando

todos os povoados em total abandono.

Farage (1991) relata a escala de prioridade dos abastecimentos de mão de obra

indígena, sendo primeiro destinados ao suprimento das necessidades das fazendas

nacionais, seguindo dos aldeamentos religiosos, das próprias tropas e por último os

agricultores individuais que possuíam licença para aquisição de mão de obra escrava

indígena.

Barbosa (1993, p. 129) ao discorrer sobre a relação entre as fazendas nacionais e

as comunidades indígenas afirma que:

Estimular a permanência do branco e tentar ‘civilizar’ uma quantidade

significativa de índios talvez fosse o processo mais indicado de fixação

espontânea dos núcleos populacionais e nas fazendas recém-criadas. A reação

esperada pelo poder central não coincidiu com as ações reais na região. [...] Na

verdade, as fazendas não se tornaram centros de atração, mas centros de

concentração de mão-de-obra indígena.

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Fazenda passou a ser o ponto de recrutamento indígena, sendo eu a

rentabilidade econômica da região propiciou ocupação imediata pelos portugueses na

busca de proteger o território e suas fronteiras. Com o povoamento, devido a pecuária, a

região do rio branco tornou-se uma importante fonte de economia na época, ampliando

ainda mais os vínculos com os indígenas. Contudo, o autoritarismo deixado pela herança da

política colonialista Pombalina oferecia maus tratos aos índios e os afastavam dos

aldeamentos. A atividade pecuária sustentava a economia na região, mas o fator humano

para desempenhar o papel de proteção não estava estabelecido.

A atividade pecuária foi fundamental para o cumprimento da geopolítica de

ocupação da região do Rio Branco, seja no final da colonização ou no contexto do Brasil

independente. De fato a efetivação da “pata do Boi” consolidou a colonização desse

território (FREITAS, 1986), ganhando destaque com o fornecimento de produtos da pecuária

para região de Barcelos, no Amazonas – durante o período de produção da borracha no final

do século XIX e início do século XX.

Neste sentido, são os ensinamentos de Frank e Cirino (2010, p. 17):

Apesar de algumas iniciativas pontuais anteriores, esta expansão somente se

efetivou a partir de 1870, desencadeada pelo crescimento explosivo da demanda

de carne ‘verde’ no mercado de Manaus, em consequência do ‘boom de caucho’,

entre 1870 e 1920, que repercutiu nas savanas de Roraima [...].

A economia da borracha foi importante fator para expansão da pecuária em

Roraima. Quando a as atividades de produção e exploração das seringueiras entram em

crise em decorrência da produção de seringueiras na Região da Malásia a economia da

região do rio Branco foi duramente afetada. Isto provocou efeito dominó na economia

Amazônica, eis que a queda do comércio da borracha brasileira levou a redução do

consumo de carne no mercado Amazonense. Pode-se afirmar que este foi um dos primeiro

efeitos da globalização na economia regional da Amazônia, ainda que não recebesse essa

denominação à época.

O cultivo da pecuária extensiva na região do rio Banco não foi capaz de garantir

ao Brasil o domínio das terras situadas na fronteira com a antiga Guiana Inglesa, que se

estendia além do rio Tacutú. A disputa na bacia do Tacutu ficou conhecida como a questão

do Pirara, quando o Brasil e a Inglaterra submeteram o litígio ao juízo arbitral representado

pelo Rei da Itália. Ao final, o Brasil perdeu cerca de 20.000km² para a Guiana Inglesa em

1904 (BARBOSA, 1993).

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Porem, isto não reduz a importância da pecuária para consolidação do projeto

colonial, inclusive no contexto do Brasil independente. A partir da decadência da pecuária as

atividades econômicas da bacia do rio Branco foram direcionadas à explosão de diamante

nas áreas de serras. Os garimpos foram implantados próximos ou dentro às comunidades

indígenas e os impactos foram tão intensos quanto a expansão pecuária.

A exploração mineral nas terras indígenas gerou na redução dos recursos

naturais disponíveis, dos quais dependiam os índios para sobrevivência. Situação que sofreu

agravamento na década de 80 do século XX, com a exploração do ouro na região dos índios

Ianomâmis.

Os conflitos entre índios e não índios ganharam destaques em decorrência das

novas ocupações através da expansão da agricultura irrigada e das demarcações de terras, a

exemplo da terra indígena Raposa Serra do Sol.

Neste cenário, fica evidenciado que a ocupação do extremo norte do país não se

deu de forma pacífica e homogênea. A ocupação econômica das terras e a chegada de

novos habitantes têm gerado na ampliação dos ritmos de exploração dos recursos naturais

e alterado as características de organização cultural dos indígenas na região, exigindo novas

reflexões.

TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADES EM RORAIMA

O estudo do território no quadro do pensamento geográfico recebe significados

que abrangem a ideia de domínio e controle, sendo a área onde ocorrem as relações entre

os agentes sociais e econômicos. Conjecturas a respeito do tema permeiam, além da

Geografia, os campos da Ciência Política e Antropologia. Embora o conceito de território

possua elementos norteadores, que em regra aparece em várias definições, este assume

significados distintos para sociedade ou grupo que o define (SAQUET, 2010).

As relações de poder que atuam na produção do espaço são historicamente

estabelecidas conforme as peculiaridades de cada sociedade. “As questões do controle, do

“ordenamento” e da gestão do espaço têm sido sempre centrais nas discussões sobre

território” (HAESBAERT, 2011, p. 52). Assim, as concepções de território se associam com as

relações sociais, a natureza e as formas de propriedade dentro da articulação teórica.

O território unido à sociedade e a soberania são os elementos formadores do

estado-nação que tem como característica principal a propriedade territorial. “A sociedade

que consideramos, seja grande ou pequena, desejará sempre manter sobretudo a posse do

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território sobre o qual e graças ao qual ela vive. Quando esta sociedade se organiza com

esse objetivo, ela se transforma em Estado” (RATZEL, 1990 apud SAQUET, 2010, p.30). O

Estado então somente surge a partir da dominação e apropriação do solo e dos recursos

nele presentes, fatores que visam também garantir sua manutenção.

Nesta perspectiva, o território é então delimitado por suas fronteiras físicas com

outras nações e comandado por um poder político que garanta seu progresso e

legitimidade. Logo, a ideia de apropriação remete a organização e interação dos agentes

sociais com a natureza atribuindo aos territórios um caráter de produto espacial.

Pode-se, portanto aceitar como regra que uma grande parte dos progressos da

civilização são obtidos mediante um desfrute mais perspicaz das condições

naturais, e que neste sentido esses progressos estabelecem uma relação mais

estreita entre povo e território. Pode-se dizer ainda, em um sentido mais geral,

que a civilização traz consigo o fortalecimento de uma ligação mais íntima entre

a comunidade e o solo que a recebe. (RATZEL, 1990 apud SAQUET, 2010, p. 30)

As relações de poder conferem corpo ao território simultaneamente com as

manifestações dos grupos sociais que o habitam. O resultado das ações políticas e sociais

decorrentes da apropriação de uma porção do espaço, este enquanto ambiente, refletem as

oportunidades e desafios propostos pelas características da realidade local.

Em que pese existência de definição do território como base física do

Estado-Nação, admite-se no presente ensaio outra visão conceitual desta categoria de

análise. Neste sentido, compreende-se território como espaço apropriado pelas forças

econômicas de produção e disputa das classes sociais, sejam elas indígenas ou não

indígenas. Tal conceito é entende-se possível de aplicação considerando a diversidade de

ocupação espacial de Roraima (BEZERRA e COSTA, 2010).

A história de Roraima é caracterizada por diversos acontecimentos de ordem

política e econômica que levaram a configuração atual. Grupos indígenas disputam o

domínio territorial sobre espaços em que foram expulsos no passado em decorrência da

ocupação colonial. A ocupação deste território, como já abordado anteriormente, ocorreu a

partir do estabelecimento de aldeamentos indígenas nas proximidades dos rios Uraricoera,

Tacutu e Branco (SOUZA, A. 1969). Como as condições impostas aos índios pelos

portugueses lhes eram demasiadamente severas, tais aldeamentos foram abandonados.

Uma nova tentativa de se construir aldeias para a efetivação da colonização do território

resultou na revolta dos indígenas denominada “Revolta da Praia de Sangue” (BARROSO,

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2009). Os índios não toleravam submeter-se aos colonizadores e isso repercutia em

confrontos.

Assim, o processo de formação dos territórios distintos territórios em Roraima

passou por fases de conflitos pelas ameaças de invasão de espanhóis, ingleses, holandeses,

franceses, portugueses e/ou indígenas inimigos.

Dos estados que integram a Amazônia brasileira, Roraima sobressai-se pela sua

localização geográfica e por apresentar uma diversidade paisagística com florestas e

lavrados (savanas). O estado abriga diferentes etnias (Wapixana,Yanomani, Taurepang,

Macuxi, Patamona, Wai-Wai, Ingaricó, Ye’cuana, Waimiri-Atroari) e cada etnia disputa a

construção espacial de seu território, as vezes atuando em conjunto com outros grupos

indígenas, as vezes agindo de forma isolada. De toda a área do estado de Roraima

(224.298,980km²), 45,18% consiste em terras indígenas que no total somam trinta e duas,

demarcadas em áreas contínuas ou ilhas (IBGE, 2009).

As áreas das terras indígenas são demarcadas pela Fundação Nacional do

Índio/FUNAI (Art. 1, Decreto nº 1.775/96), órgão federal de assistência ao índio. Conforme

previsto no Art. 231 da Constituição Federal Brasileira de 1988.

A identificação, delimitação e homologação dos espaços ocupados pelos povos

indígenas lhes garantem, pelo menos no papel, a posse e o direito sob as terras

tradicionalmente por eles ocupadas, com direito a usufruto ainda que relativizado pelo

Supremo Tribunal Federal no julgamento da terra indígena Raposa Serra do Sol. Assim, as

terras indígenas constituem-se em territórios essenciais à sobrevivência das comunidades,

pois essas dependem do usufruto de seus recursos.

Designa-se por território uma porção da natureza e, portanto, do espaço sobre o

qual uma determinada sociedade reivindica e garante a todos ou a parte de seus

membros direitos estáveis de acesso, de controle e de uso com respeito à

totalidade ou parte dos recursos que aí se encontram e que ela deseja e é capaz

de explorar. (GODELIER, 1984 apud HAESBAERT, 2012, p.56)

Tradicionalmente a sociedade indígena depende das condições físicas dos

ambientes onde se situam. Daí a importância da manutenção de seus territórios para a

preservação da identidade, cultura e modos de vida. A história dos povos indígenas quanto

à requisição de seus direitos é marcada pelas conquistas das terras decorrentes de séculos

de lutas e embates com as forças produtivas e especulativas do capital.

A demarcação das terras indígenas é uma questão comumente geradora de

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conflitos, pois é considerada, aos olhos do capital, como atraso ao desenvolvimento

econômico, sob justificativa que as áreas identificadas como reservas compõem fazendas e

propriedades particulares.

Os povos indígenas são dependentes diretamente das terras. “A ligação do

território com a natureza é explícita e, nessa ligação, o território se torna, antes de mais

nada, uma fonte de recursos, ‘meios materiais de existência.’” (HAESBAERT, 2011, p. 47).

Tal embate leva ao entendimento de que o território não é apenas uma área

vinculada ao estado-nação. Para Souza, M. (1995, p. 81) “os territórios são construídos e

desconstruídos nas mais diversas escalas espaciais e temporais”. Isto não implicar dizer que

ocorra sobreposição de território. O que poderá ocorrer é a sobreposição de

territorialidade, jamais de território. A base territorial é qualificada por relações sociais, de

dominação e poder que implicam na derivada territorialidade, constituída como produto da

coletividade (RAFFESTIN, 1993).

Dentro da análise do território, as territorialidades possuem gêneses na

geografia política, embora também sejam abordadas nas demais ciências sociais. A

princípio, constitui-se territorialidade a síntese das relações dinâmicas no espaço apropriado

que conferem corpo ao território.

Não há território sem uma trama de relações sociais; o território é um lugar

substantivado por essas relações ou territorialidades e é constituído histórica e

geograficamente. Nesta trama, há interações entre a Terra e o território, o que

indica uma proposição múltipla considerando, principalmente, as relações

economia-política-natureza. (SAQUET, 2010, p. 81)

A organização do espaço em territórios, definidos como campos de influencia

decorrentes do comportamento dos seus ocupantes estabelece as territorialidades. As

ações dos agentes, as relações de poder e as relações sociedade-natureza caracterizam

historicamente o território, como espaço apropriado e deste não podem ser dissociadas.

As interações sociais estão na base da efetivação do território em diferentes

dimensões, como fatores determinantes da territorialização e no aspecto em que lhe

atribuem identidade. Há, portanto, uma apropriação simbólica, econômica, cultural e

política idiossincrática determinada pelas ações cotidianas dos diversos grupos sociais sobre

o espaço de vida.

As forças sociais efetivam o território, o processo social, no (e com o) espaço

geográfico, centrado na territorialidade cotidiana dos indivíduos e emanando

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dela, em diferentes centralidades, temporalidades e territorialidades, que

condicionam nossa vida cotidiana. Formam-se territórios heterogêneos e

sobrepostos fundados em desigualdades e diferenças. Cristalizam-se

territorialidades e interesses predominantemente econômicos e/ou políticos

e/ou culturais que dão uma certa forma e determinados conteúdos ao território

e aos territórios. (SAQUET, 2010, p.128)

Como uma articulação, a territorialidade envolve as expressões humanas e suas

representações na sociedade. Ao mesmo tempo também se constitui de sistemas opostos e

vinculados que se afetam mutuamente. Deste modo, o uso da terra é vinculado a ações

politicas, econômicas e culturais que manifestadas pelo desejo de viver no espaço consolida

a configuração territorial.

Especificamente, as áreas geográficas do estado de Roraima abrigam pessoas

oriundas de várias partes do país e estrangeiros, além da população indígena já

estabelecida. De algum modo, existem tentativas por parte destes grupos de manutenção

dos rituais e tradições das regiões de origem. As relações inerentes à existência humana são

todas “relações de poder, visto que há interação entre os atores que procuram modificar

tanto as relações com a natureza como as relações sociais” (RAFFESTIN, 1993, p. 158-159).

A territorialidade presente na produção do espaço possui múltiplas expressões

cada uma com suas particularidades. Assim, em Roraima, devido a posição geográfica e a

baixa densidade demográfica essa multiplicidade aflora perceptivelmente. Nos campos

político, econômico e cultural os agentes sociais manifestam suas ideologias e saberes

históricos coletivamente criados, na expectativa de manter suas identidades territoriais. As

demonstrações culturais presentes no estado, por exemplo, atualmente constituem-se uma

amálgama de identidades regionalistas, estrangeiras e indígenas.

O contraste de relações presentes nas territorialidades “se originam num

sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo em vias de atingir a maior autonomia

possível, compatível com os recursos do sistema” (RAFFESTIN, 1993, p. 160).

Neste entendimento, os territórios, além de instrumentos de dominação, são

apropriados pela dinâmica das ações dos agentes sociais que os constituem, podendo

sofrer interferência em decorrência das características naturais. As relações estabelecidas

nos territórios evidenciam as territorialidades e seu caráter humano conservador de poder.

As territorialidades para que se exerçam em sua plenitude necessitam de uma

base física, ainda que as vezes possam ocorrerem em espaços imateriais. Ademais, não se

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pode perder de vista que a territorialidade é condição de existência do território, que

constitui uma relação historicamente construída entre as velhas e as novas forças de poder.

AS NOVAS TERRITORIALIDADES E O REORDENAMENTO NO ESPAÇO LOCAL NA TERRA INDÍGENA CANAUNIM – ESTADO DE RORAIMA/BRASIL

O Estado de Roraima possui 32 terras indígenas demarcadas, que corresponde a

45,18% da extensão física territorial. Apresenta população de aproximadamente 38 mil

indígenas distribuídas ente oito etnias distintas (IBGE, 2009). Dentre as 32 terras indígenas,

inclui-se a comunidade indígena do Canaunim, situada no Município do Bomfim, cujo

Município possui divisas com a República Cooperativa da Guiana.

A terra indígena do Canaunim foi demarcada por força do Decreto da

Presidência da República, de 15 de fevereiro de 1996, e abrange área de superfície de

11.182,4372 ha (onze mil, cento e oitenta e dois hectares, quarenta e três ares e setenta e

dois centiares) e perímetro de 50.479,64 metros (cinquenta mil, quatrocentos e setenta e

nove metros e sessenta e quatro centímetros) – (IBGE, 2009).

A comunidade do Canunim está situada na faixa de fronteira de que trata a

norma do inciso II do art. 20 da Constituição Federal de 1988, conforme definição contida no

próprio decreto de demarcação datado de 15 de fevereiro de 1996. A área é habitada por

índios das etnias Wapixana e Makuxi, sendo esta última a principal etnia numericamente do

Estado de Roraima.

Segundo dados de IBGE (2010), a etnia Wapixana é originária do tronco

linguístico Arwak, tendo sido contabilizados 10.572 indivíduos, já os Makuxis são de origem

Carib. A etnia Wapixana ocupa base territorial tanto do Brasil como da República

Cooperativa da Guiana, sendo a fronteira política entre os dois países, até certo ponto, de

pouca relevância dos indígenas na região.

Os Makuxis por sua vez constitui a principal etnia do Estado de Roraima estão

situados tanto no Brasil como na Venezuela. Em Roraima, a ocupação dos Makuxis ocorre de

forma descontinua, porém estão presentes tanto nas áreas de serra como nas regiões de

lavrados. Neste sentido, são as palavras de Santos A. (2010, A. p. 91/92):

Até o ano de 1905, os índios Macuxi e os Jaicuna dominavam a região dos altos

da Serra de Pacaraima (Pacaraima), enquanto os Wapixana dominavam as

fraldas da mesma serra Nessa época[....]. Sua ocupação foi, aos poucos, se

tornando muito extensa. Do Leste da Serra de Pacaraima (Pacaraima), desceram

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para as terras altas das cabeciras do Maú, de onde avançaram para regiões do

rio Tacutu, Serra do Cuano-Cuano, rio Majari (Amajari) e Oeste da ilha de Maracá.

Essa expansão territorial dos Makuxi, em direção as terras ocupadas pelos

Wapixana, constituíram motivos de diversas disputas entre as duas etnias. Assim, a

convivência entre eles não era tão amistosa como se pode imaginar, e os registros históricos

dão conta que os dois grupos eram rivais entre si.

Santos A. (2010, p. 92) ao discorre sobre os índios Makuxis afirma que:

[...] por muitos anos, continuou inimiga dos Wapixana. Vez ou outra, cinco índios

dessa etnia costumavam aparecer na Fortaleza de São Joaquim. Contudo,

somente dois desses ficaram permanentemente na povoação de Santa Maria e

fizeram parte da fundação de um novo aldeamento destinado a substituir a

primitiva povoação de S. Felipe.

Na atualidade, verifica-se que as rivalidades do passado foram superadas e não

se tem registro atualmente de conflitos entre as duas etnias decorrentes de questões

étnicas. Isto possibilita a convivência reativamente harmônica entre os dois grupos

indígenas na terra do Canauami, no Estado de Roraima.

As duas etnias citadas acima, no processo de ocupação territorial da região que

compõe o Estado de Roraima, podem ser apontadas como antigas territorialidades que

conseguiram se afirmar no decurso do espaço-tempo, ainda que tenham implicado em

perdas substancia de territórios tradicionalmente ocupados pelos seus ancestrais.

No processo histórico de ocupação da Região do Rio Branco, aí compreendida o

conjunto espacial que integra atualmente toda a base territorial do Estado de Roraima,

pode-se apontar diversos tipos de territorialidades, cujas forças poderiam ser agrupadas em

duas classificações: as forças advindas dos povos indígenas, alguns já extintos, e as forças

oriundas dos colonizadores. Ambas classificadas como antigas territorialidades.

Os movimentos para demarcação das terras indígenas, aí incluída a terra

indígena do Cauanim, fizeram ressurgir das velhas territorialidades uma nova roupagem e

forças que podem ser chamadas de novas territorialidades, ainda que não exclusivas na

disputa do espaço local.

Santos M. (2012a, p. 70) afiram que: “ A produção do espaço é resultado da ação

dos homens agindo sobre o próprio espaço por meio dos objetos, naturais e artificiais.” No

caso das comunidades indígenas os elementos naturais prevalecem sobre os artificialmente

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construídos. Porém, o avanço do capitalismo muitas vezes caminha na contramão dos

interesses das comunidades locais, o que gera a necessidade da demarcação das terras

indígenas. Essa nova conjuntara de força, se por um lado possibilita maior autonomia das

comunidades indígenas frente ao embate com os grupos não índios, por outro, intensifica a

dicotomia entre os processos de ocupação tradicional e as novas vertentes de organização

social.

No caso da Terra Indígena do Cauanim é facilmente perceptível o avanço de

forças capitalistas em direção aos limites internos da área demarcada. No trajeto até a

comunidade indígena, partindo-se da BR 432 que interliga a BR 401 a Cidade de Cantá,

nota-se a existência de propriedades completamente demarcadas por cercas, sem qualquer

utilização produtiva. A ocupação dessas terras destina-se exclusivamente a especulação

fundiária a serviço do capital e pressionam as comunidades indígenas em espaços cada vez

mais confinados.

Harvey (2013, p.73) ao analisar a renda sobre a terra e acumulação especulativa

afirma que: “O poder do monopólio que se acumula para os proprietários de terra mediante

a apropriação privada da terra é a base da renda como uma forma de mais-valor. No

entanto, o poder que esse privilégio confere não seria nada não fosse o fato de a terra ser

uma condição de produção em geral necessária.”

Se a terra é importante no contexto da economia capitalista, quando dispõe de

elevado grau de evolução técnica-cientifica e diversos equipamentos produtivos, o que dizer

das comunidades indígenas que encontram na terra sua única fonte se subsistência e

reprodução cultural da comunidade? Assim, cria uma relação inseparável entre o homem e

a natureza. “A separação entre o ‘humano’ e o ‘natural’ é encarada como uma separação

dentro de uma unidade, porque a ‘vida física mental do homem está interconectada com a

natureza não tem sentido senão que a natureza está interconectada consigo mesma, pois o

homem é parte da natureza” (Marx, 2010 apud Harvey, 2013, p. 160).

Neste sentido, são os ensinamentos de Santos M. (2012a, p. 30/31) quando fala

sobre a integralidade espacial como dados de um mesmo conjunto entre objetos sociais e

naturais: “O espaço deve ser considerado como um conjunto indissociável, de que

participam, de um lado, certo arranjo de objetos geográficos, objetos naturais e objetos

sociais, e, de outro, a vida que os preenche e os anima, ou seja, a sociedade em movimento.”

Os movimentos sociais que dão impulso a dinâmica local na comunidade indígena do

Canaunim têm suas bases em rituais simbólicos advindos de períodos anteriores a própria

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chegada dos europeus na região do rio Branco. Contudo, vem sofrendo diversas pressões

de forças capitalistas que vão aos poucos minando as formas de organização do espaço

local fundados no valor da posse coletiva das terras.

As diferentes pressões sobre as terras demarcadas resultam em novos desafios

a Comunidade Indígena do Cauanim. Pressões estas aparentemente não perceptíveis aos

olhos da sociedade local. A comunidade indígena vem passando por um processo de

reordenamento do espaço local.

Em visita a comunidade, verifica-se claramente a presença de áreas demarcadas

com aparente objetivo de isolamento territorial da família. Ainda que se possa falar na

continuidade dos espaços públicos, fica claro que estes são cada vez mais reduzidos, em

partes determinados pelas práticas capitalistas de organização social. Um processo

aparentemente pouco percebido no dia a dia da comunidade, mas que na verdade essas

práticas vão se enraizando e tendem a alterar completamente o modo de vida e organização

social dos indígenas.

As residências apresentam espaços claramente demarcados, muitas delas com

cercas que lembram os muros das cidades, em evidencia das mudanças introduzias na

comunidade. Também é possível observar existência de horta em ambientes cercados e

próximo da residência, comprovando a visão de apropriação individual da terra.

Uma das primeiras formas de infiltração da cultura capitalista, de forma quase

imperceptível, na comunidade do Canaunim ocorre através do funcionamento da Escola

Estadual Tuxaua Luiz Cadete. Ainda que haja uma preocupação para que os professores

sejam prioritariamente profissionais com certa identidade cultural com os indígenas, isto

não é suficiente para afastar os elementos claros da cultura capitalistas.

Para demonstrar essa visão camuflada do capitalismo, basta citar a

obrigatoriedade de cumprimentos de horários de funcionamentos, sejam em relação à

carga horária diária, seja em relação ao cumprimento dos 200 dias letivos durante o ano.

A instituição de horário fixo é própria do sistema capitalista. Sistema em que os

trabalhadores são condicionados ao relógio e controlados em função do tempo, com foco a

avaliar a produtividade do individuo dentro da estrutura de produção econômica do capital.

Uma das características do capitalismo é a produção de riquezas a serviço de

poucos (BEZERRA e BEZERRA, 2012). Assim, a fixação de horário de funcionamento da

escola, que aparentemente é algo completamente desvinculado dos finis capitalistas,

constitui-se na verdade nas primeiras formas de incorporação dos valores e modos de

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organização capitalista, que nem todas as lideranças indígenas mais críticas tem se dado

conta.

Santos M. (2012b, p. 65) ao discorrer sobre os novos arranjos espaciais e as

conexões entre eles afirma: “[...] todos os espaços são espaços de produção e de consumo

[...]. Por outro lado, atingido um novo patamar da divisão internacional do trabalho, todos os

lugares dela participam, sejam na produção, seja no consumo.”

Nesta analise, deve-se considerar que as crianças indígenas estão sendo

formadas sobre outro projeto de organização social e sobre outra ótica de formação bem

distintas das gerações indígenas anteriores. Não se está a defender a ausência da escola na

comunidade indígena. Ao contrário, entende-se de fundamental importância o processo de

formação intelectual das crianças indígenas, porém há preocupação com práticas

capitalistas projetadas sobre a ótica não indígena.

Há de se considerar que mudanças significativas já ocorreram no perfil das

escolas indígenas em Roraima, porém não ao ponto de proporcional autonomia das

comunidades nos processos de decisão dos conteúdos e modos de funcionamento da

escola. Por outro viés, a escola tem como base a formação do individuo preparando-o para

o exercício de atividades individuais, ainda que dentro dos espaços indígenas, mas que,

sobretudo, criam expectativas de remuneração salarial pela retribuição dos serviços

prestados, como ocorre com os próprios professores indígenas que atuam na comunidade.

Santos M. (2012b, p. 63) ao discorrer sobre a desculturização dos espaços locais

alerta que:

Isso conduz, às vezes muito rapidamente, a uma terceira consequência

importante, isto é, à tendência a ‘desculturização’ da área, na medida que a

substituição das pessoas, a alteração dos equilíbrios sócias de poder, a

introdução de novas formas de fazer geram desequilíbrios dos quais resultam,

de um lado, a migração das lideranças locais tradicionais e a quebra de hábitos e

tradições, e, de outro lado, a mudança de formas de relacionamento produzidas

lentamente durante largo tempo e que vêem, de chofres, substituídas por novas

formas de relações cuja raiz é estranha e cuja adaptação ao lugar tem

fundamento puramente mercantilista.

O trabalho remunerado representa claramente estas novas formas mercantis de

que trata o autor, caracterizando o modo de infiltração capitalista na comunidade. O salário

é pago sobre uma ótica individual e considerando os dias trabalhados, ao contrário do

modelo tradicional de organização comunitário em que o trabalho era coletivo, sem a

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existência do aspecto privado de apropriação.

A nova configuração espacial que tem resultado na redefinição do espaço local,

também apresenta territorialidades aparentemente invisíveis, mas com forte poder de

influência na formação cultural das crianças e dos próprios adultos. Estas territorialidades

chegam à comunidade através das redes sociais e através da televisão, que necessitam

serem discutidos abertamente na escola, como forma de alertar para as diferenças de

contextos entre a realidade da comunidade e o mundo não indígena.

Não se pode imaginar que a comunidade indígena permaneça isolada no espaço

local, até porque isto seria impossível como afirma Santos M. (2012b, p. 30): “É por essa

razão que cada lugar constitui na verdade fração do espaço total, pois só esse espaço total é

o objeto da totalidade das relações exercidas dentro de uma sociedade.”

Em rápido passeio a comunidade, percebe-se a conexão do espaço local com as

demais áreas espaciais. Isto se comprova através da rede de energia e das antenas

receptoras de sinais de TV, ainda que exista apenas corrente de chegada e pouca ou

inexistência de corrente de saída. Diga-se de passagem, que as informações produzidas na

comunidade raramente não ouvidas ns centros urbanos de onde emanam as decisões do

capital.

Todos esses elementos que constituem, novas forças de interferência espaço

local, podem ser chamados de novas territorialidades e necessitam ser compreendidas para

que se possam monitorar sua atuação, sem perder a autonomia politica, econômica e

cultural do território, que justificou a demarcação da terra indígena do Cauanim.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No final do século XVII as preocupações com a posse do território na região do

Rio Branco, frente à vulnerabilidade geopolítica, levou o governo colonial a implantar o

modelo de ocupação conhecido como a pata do boi. Modelo este que consistia na criação

das fazendas nacionais na região de lavrado (savanas) e permitia a dispersão do gado por

vasta região de território, pressionando as comunidades indígenas a espaços confinados.

Estas comunidades se viram obrigadas fugirem para áreas de florestas e serras, em outros

casos fazerem o enfrentamento aos colonizadores ou servirem de mão de obra barata nas

fazendas.

Após séculos de lutas e exploração, as comunidades indígenas em Roraima

conseguiram se organizar iniciar o processo de reivindicação pela demarcação das terras

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tradicionalmente ocupadas pelas diferentes etnias. Neste contexto, inclui-se a terra indígena

Cauanim, demarcada em 1996 e destina-se a ocupação das etnias Wapixana e Makuxi. Está

localizada no Município do Bomfim que faz fronteira com a República Cooperativa da

Guiana.

Na atualidade, a comunidade indígena do Cauanim vem passando por um

processo de reordenamento do espaço local, caracterizado pela criação de cercas em torno

da residência e separando os espaços destinados ao convivo coletivo. O próprio povoado

onde está situada a Escola Estadual Tuxaua Luiz Cadete já apresenta claros sinais de

formação de futuro núcleo urbano, bem como a presença de elementos da cultura

capitalista que interfere de forma direta na organização social da comunidade.

A escola, se por um lado representa a possibilidade de criação de um espaço de

discussão, por outro, é uma porta aberta as práticas capitalistas do modelo de consumo e

produção. Isto se verifica através da imposição de horários de funcionamento e da forma de

vinculação da relação de trabalho com os funcionários da escola.

A relação como os funcionários da escola ocorre claramente dentro ótica do

capital, com controle de frequência e remuneração privada dos funcionários. Estes, por sua

vez, estão submissos as ordens do diretor da escola que fica encarregado de enviar as faltas

dos dias não trabalhados em caso de ausência do professor. Não se está a dizer que deva

ser assim ou que deva ser ao contrário, o que se buscou neste caso foi analisar a infiltração

de praticas capitalistas na comunidade e o surgimento de noras territorialidade ou até

mesmo a redefinição das territorialidades já existentes de origem remota.

Cumpre destacar, que a comunidade indígena do Cauanim se divide com

extensas áreas de terras apropriadas pelo capital privado, cujas áreas se encontram

cercadas sem qualquer utilização produtiva e destina-se exclusivamente a especulação do

capital. Além do mais, não se pode perder de vista que a chegada da televisão na

comunidade poderá, no futuro próximo, promover uma verdadeira revolução cultural dos

indígenas, em especial, dos jovens e crianças que estão mais suscetíveis às influências do

modelo capitalista de consumo e organização social. Isto por si só, é suficiente a justificar a

necessidade de futuras pesquisas e debates sobre a questão em análise.

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OS POVOS INDÍGENAS, AS NOVAS TERRITORIALIDADES E A REDEFINIÇÃO DO ESPAÇO LOCAL NO ESTADO DE RORAIMA/BRASIL

EIXO 1 – Transformações territoriais em perspectiva histórica: processos, escalas e contradições

RESUMO

Parte dos povos indígenas que habitam o Estado de Roraima, situado no extremo norte do Brasil,

é descendente de origem caribenha e chegou à região antes dos colonizadores europeus no

século XVIII. O processo de colonização de Roraima teve início com as missões religiosas e a

busca das drogas do sertão, cuja ocupação foi estabelecendo suas bases fixas às margens dos

rios, áreas tradicionalmente ocupadas pelas comunidades indígenas. A relação de conflito e

exploração estabelecida pelo contato entre os europeus e os povos indígenas levou estes a

migrarem para regiões afastadas das margens dos rios, já que dificultava o acesso dos

colonizadores que dependiam diretamente da navegação fluvial. Desta forma, muitas

comunidades indígenas em Roraima conseguiram manter elementos culturais fundamentados na

posse coletiva das terras, através do sistema de cooperação entre seus membros. No final do

século XIX, as preocupações com a posse do território, frente à vulnerabilidade geopolítica da

região, levou o governo brasileiro a implantar o modelo de ocupação conhecido como a pata do

boi. Modelo este que consistia na criação das fazendas nacionais na região de lavrado (savanas)

que permitia a dispersão do gado por vasta região de território, pressionando as comunidades

indígenas a espaços confinados cada vez mais restritos. A estas comunidades restavam apenas

dois caminhos: ou servir de mão de obra barata nas fazendas ou migrarem para regiões de

florestas, incluindo as áreas de serras, que dificultava a chegada das atividades de pecuárias. O

esgotamento da ocupação e apropriação privada das áreas de lavrado tem levado a disputa pelas

terras em áreas tradicionalmente ocupadas pelas comunidades indígenas, fazendo surgir novas

territorialidades no espaço local. Estas novas territorialidades vão se infiltrando na comunidade de

forma camuflada, até fincarem suas raízes de bases capitalistas e aos poucos vão alterando a

estrutura organizacional das comunidades indígenas no processo aparentemente sem retorno e

incentivado pelas políticas custeadas pelo Governo Federal e Estadual. Neste entendimento, o

presente artigo tem como objetivo analisar o surgimento de novas territorialidades e o

reordenamento do espaço local na terra indígena Canaunim. Comunidade habitada por indígenas

das etnias Makuxi e Wapixana, situada no Município do Bomfim – Estado de Roraima/Brasil, cuja

área foi homologada como terra indígena pelo Governo Federal em 1996, por força do Decreto nº

15, da Presidência da República. A redefinição das territorialidades que atuam e determinam as

mutações no espaço local, com consequência nem sempre previsíveis, justificam a realização do

estudo sobre a temática em debate. O trabalho adota o método dialético na busca de

compreender a relação de forças convergentes e divergentes das territorialidades que atuam no

espaço local, em especial, o confronto entre as antigas formas de organização sócio espaciais e

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os novos modelos que atuam na comunidade de forma explicita ou camuflada. O método de

procedimento está fundamentado no estudo de caso, com visitas a comunidade, entrevistas e

observação direta. Dentre os resultados é possível destacar que o espaço local da comunidade

indígena Canaunim, no Município do Bomfim – Estado de Roraima/Brasil vem sofrendo profundas

modificações na organização interna. Mudanças que ganham força com a implantação de escolas

públicas estruturadas sobre a ótica não indígena. Passam a instituírem horários de funcionamento

e frequência obrigatória, alterando de forma brusca a liberdade indígena, que tradicionalmente

não esteve condicionada a horários e nem aos valores capitalistas de organização social. Surge

ainda às primeiras formas de propriedades privadas, fundamentadas nos interesses individuais em

detrimento dos interesses coletivos.

Palavras-chave: territorialidades; espaço-local; terra indígena Canaunim

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