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Os Segredos de Colin Bridgerton - Julia Quinn

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Há muitos anos Penelope Featherington frequenta a casa dos Bridgertons. E há muitos anos alimenta uma paixão secreta por Colin, irmão de sua melhor amiga e um dos solteiros mais encantadores e arredios de Londres.Quando ele retorna de uma de suas longas viagens ao exterior, Penelope descobre seu maior segredo por acaso e chega à conclusão de que tudo o que pensava sobre seu objeto de desejo talvez não seja verdade.Ele, por sua vez, também tem uma surpresa: Penelope se transformou, de uma jovem sem graça ignorada por toda a alta sociedade, numa mulher dona de um senso de humor afiado e de uma beleza incomum.Ao deparar com tamanha mudança, Colin, que sempre a enxergara apenas como uma divertida companhia ocasional, começa a querer passar cada vez mais tempo a seu lado. Quando os dois trocam o primeiro beijo, ele não entende como nunca pôde ver o que sempre esteve bem à sua frente.No entanto, quando fica sabendo que ela guarda um segredo ainda maior que o seu, precisa decidir se Penelope é sua maior ameaça ou a promessa de um final feliz.Em Os segredos de Colin Bridgerton, quarto livro da série Os Bridgertons, que já vendeu mais de 3,5 milhões de exemplares, Julia Quinn constrói uma linda história que prova que de uma longa amizade pode nascer o amor mais profundo.

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Há muitos anos Penelope Featherington frequenta a casa dos Bridgertons. E há muitos anos alimenta uma paixão secreta por Colin, irmão de sua melhor amiga e um dos solteiros mais encantadores e arredios de Londres. Quando ele retorna de uma de suas longas viagens ao exterior, Penelope descobre seu maior segredo por acaso e chega à conclusão de que tudo o que pensava sobre seu objeto de desejo talvez não seja verdade. Ele, por sua vez, também tem uma surpresa: Penelope se transformou, de uma jovem sem graça ignorada por toda a alta sociedade, numa mulher dona de um senso de humor afiado e de uma beleza incomum. Ao deparar com tamanha mudança, Colin, que sempre a enxergara apenas como uma divertida companhia ocasional, começa a querer passar cada vez mais tempo a seu lado. Quando os dois trocam o primeiro beijo, ele não entende como nunca pôde ver o que sempre esteve bem à sua frente. No entanto, quando fica sabendo que ela guarda um segredo ainda maior que o seu, precisa decidir se Penelope é sua maior ameaça ou a promessa de um final feliz. Em Os segredos de Colin Bridgerton, Julia Quinn constrói uma linda história que prova que de uma longa amizade pode nascer o amor mais profundo.

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Abril está quase chegando, e com ele começará uma novatemporadaemLondres.Portodaacidade,mãesambiciosasjápodemser vistas em lojas de vestidos com suas adoráveis debutantes,ansiosasporcompraremaqueletrajemágicoqueacreditamquefarátodaadiferençaentreomatrimônioeasolteirice.E quanto às suas presas – os solteiros convictos –, o Sr. Colin

Bridgertonmaisumavezocupaotopodalistademaridosdesejáveis,embora ainda não tenha retornado de sua recente viagem aoexterior.Elenãopossuitítulodenobreza,éverdade,masébelo,ricoe,como qualquer um que tenha passado ao menos um minuto emLondressabe,encantador.Oproblemaéqueelechegouàidadeumtantoavançadade33anos

sem jamaisdemonstrar interessepornenhuma jovememparticular,ehápoucarazãoparasuporque1824váserdiferentede1823nesseaspecto.Talvez as adoráveis debutantes – e, mais importante, as mães

ambiciosas – devam procurar em outra parte. Se o Sr. Bridgertonestáàcatadeumaesposa,escondebemessedesejo.Por outro lado, não é exatamente desse tipo de desa io que uma

debutantemaisgosta?

C

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PRÓLOGO

Nodia6deabrilde1812–doisdiasantesdeseuaniversáriode16anos–,PenelopeFeatheringtonseapaixonou.Foi, em uma palavra, emocionante. O mundo estremeceu. Seu coração

deu saltos. Ela icou sem fôlego e foi capaz de dizer a si mesma, comalgumasatisfação,queohomememquestão–umtaldeColinBridgerton–sesentiudamesmaforma.Ah,nãocomrelaçãoàparteamorosa.Comcertezaelenãoseapaixonou

por ela em1812 (nemem1813, 1814, 1815, nem–ora, ora! – nos anosentre1816e1822, e tambémnão em1823, quando, dequalquer forma,passou o ano todo fora do país). Mas o mundo dele estremeceu, seucoraçãodeusaltosePenelopesoube,semamenorsombradedúvida,queeleperdeuofôlego,assimcomoela.Porunsbonsdezsegundos.Éoquegeralmenteacontecequandoumhomemcaidocavalo.Aconteceuassim:elaestavacaminhandopeloHydeParkcomamãeeas

duas irmãsmaisvelhasquandosentiuumtrovejanteribombar(leracimao trecho sobre omundo estremecer). Amãe não estava prestandomuitaatençãonela(comosempre),entãoPenelopeseafastouumpoucoparaveroquehaviamaisadiante.AsoutrasFeatheringtonsestavamconcentradasemsua conversa comaviscondessadeBridgertone a ilha,Daphne,queacabara de iniciar a segunda temporada em Londres, de forma queingiam ignorar o barulho. Os Bridgertons eram, de fato, uma famíliaimportante,econversascomelesnãoeramalgoaserignorado.Ao contornar uma árvore especialmente grossa, Penelope avistou dois

cavaleirosvindoemsuadireção,galopandocomosenãohouvesseamanhã,ou seja lá qual fosse a expressão usada em relação a tolos montados acavaloquenãoseimportavamcomaprópriasegurançaoucomoprópriobem-estar. Penelope sentiu o coração batermais rápido (teria sido di ícilmanterapulsaçãonormaldiantede talagitação,e, alémdomais, isso lhepermitiriadizerqueseucoraçãodeuumsaltoquandoelaseapaixonou).Então, numa dessas inexplicáveis artimanhas do destino, o vento de

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repentesoproumaisforte,arrancandodesuacabeçaochapéu(que,paragrande desgosto damãe, ela não amarrara direito, já que a ita roçava eirritava o seu queixo) e,poft!, lançando-o bem no rosto de um doscavaleiros.Penelopearquejou ( icando, assim, semrespiração) eohomemcaiudo

cavalo, aterrissando de maneira muito deselegante numa poça de lamapróxima.Elaavançou,quasesempensar,grunhindoalgoquepretendiaquefosse

umapergunta sobrecomoele se sentia,masqueela suspeitava ter saídocomo um guincho abafado. Ele estaria, é claro, furioso com ela, uma vezque Penelope praticamente o derrubara do cavalo e o cobrira de lama –duas coisas que com certeza deixariam qualquer cavalheiro no pior doshumores.Noentanto,quandoeleen im icoudepéecomeçou,namedidadopossível,alimparalamadaroupa,nãopraguejou.Nãolhepassouumadolorosadescompostura,nãogritouenemmesmoafuziloucomoolhar.Eleriu.Eleriu.Penelope não tinha muita experiência com a risada masculina e nas

poucas ocasiões em que a presenciara, ela não fora gentil. Mas os olhosdaquele homem – de um tom muito intenso de verde – pareciam estarachando graça enquanto ele limpava umamancha de lama localizada deformabastanteembaraçosaemseurosto,paradepoisdizer:–Bem,aquilonãofoimuitohabilidosodaminhaparte,nãoémesmo?E,naquelemomento,Penelopeseapaixonou.Quando encontrou a voz (o que, era-lhe doloroso admitir, ocorreu uns

bons três segundos depois que qualquer pessoa com algum grau deinteligênciateriarespondido),elafalou:–Ah,não, eu équedeveriamedesculpar!Meu chapéuvooudaminha

cabeçae...Paroude falarao sedar contadequeelenão lhepediradesculpas,de

maneiraquenãofaziamuitosentidocontradizê-lo.– Não foi incômodo algum – retrucou ele, dando um sorriso um tanto

divertido.–Eu...Ah,bomdia,Daphne!Nãosabiaqueestavaaqui.Penelopedeumeia-voltaeseviufrenteafrentecomDaphneBridgerton,

depéaoladodaSra.Featherington,quenomesmoinstantesibilou:

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–Oquevocêaprontou,PenelopeFeatherington?Penelope não pôde nem responder seu “Nada” de sempre porque, na

realidade, o acidente fora totalmente culpa sua e ela acabava de fazerpapel de tola na frente de um homem que era, com toda a certeza – ajulgarpelaexpressãodamãe–umsolteiromuitocobiçável.Não que a Sra. Featherington considerasse que ela teria qualquer

chancecomele.Masamatriarcanutriagrandesesperançasmatrimoniaisemrelaçãoàssuas ilhasmaisvelhas.Alémdomais,Penelopenemmesmoforaapresentadaàsociedadeainda.No entanto, se a Sra. Featherington tinha a intenção de ralhar com ela

maisumpouco,nãopôde fazê-lo,pois isso teriaexigidodesviaraatençãodos importantíssimos Bridgertons, cuja família incluía o homem agoracobertodelama,segundoPenelopelogodescobriu.– Espero que seu ilho não tenha se machucado – disse a Sra.

FeatheringtonaLadyBridgerton.–Estouótimo– interferiuColin,esquivando-secombastantehabilidade

antesqueamãeocobrissedemimos.As devidas apresentações foram feitas, mas o resto da conversa foi

desinteressante, sobretudo porque Colin, de forma rápida e precisa,entendeuqueaSra.Featheringtoneraumamatriarcaansiosaporcasarasilhas.Penelopenão icounemumpouco surpresaquandoele logobateuemretirada.Masoestragojáforafeito.Penelopeagoratinhaummotivoparasonhar.Maistarde,naquelanoite,enquantorepassavaoencontropelamilésima

vezemsuacabeça,ocorreu-lhequeteriasidomaisapropriadopoderdizerque se apaixonara por Colin quando ele lhe beijara amão antes de umadança,osolhosverdescintilandocheiosdemalíciaenquantoeleseguravasuamão durante um tempomais longo do que o comum. Ou, talvez, quetivesse acontecido enquanto ele cavalgava, audaz, por campos açoitadospelovento,ojámencionadovendavalincapazdecontê-loenquantoele(ou,melhor, o cavalo) galopava cada vez mais rápido, sendo a sua únicaintenção(deColin,nãodocavalo)chegarpertodela.Mas não, ela teve que se apaixonar quando ele caiu do cavalo e

aterrissoucomotraseironumapoçadelama.Umfatobastanteincomumenem um pouco romântico, embora houvesse certa justiça poética nisso,

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umavezqueoacontecidonãoteriamaioresdesdobramentos.Paraqueperder tempocomumamorque jamais seria correspondido?

Melhor deixar os devaneios sobre os campos açoitados pelo vento parapessoasquedefatotivessemumfuturojuntas.EsehaviaalgoquePenelopesabia,mesmonaépoca,com16anosquase

completos, era que o seu futuronão incluía ColinBridgertonnopapel demarido.Ela simplesmentenãoerao tipodegarotaqueatraíaumhomemcomo

ele,etemiajamaisser.

Nodia10deabrilde1813–doisdiasapósoseuaniversáriode17anos–,PenelopeFeatheringtondebutounasociedadelondrina.Elanãooquisera.Implorara àmãe que a deixasse esperar um ano. Estava pelomenos 12quilosacimadopesoeaindatinhaapéssimatendênciaadesenvolverummontedeespinhasno rosto sempreque icavanervosa,oque signi icavaqueviviacomespinhas, jáquenadanomundoadeixavamaisnervosadoqueumbaileemLondres.Tentou lembrar a si mesma que a beleza era algo super icial, embora

isso não fosse uma desculpa útil quando ela não sabia o quedizer àspessoas. Não havia nada mais deprimente do que umamenina feia sempersonalidade. E naquele primeiro ano no mercado casamenteiro, eraexatamente isso que Penelope era. Uma garota feia sem nenhuma – ah,está certo, ela tinha que se daralgum crédito: com muito pouca –personalidade.Nofundo,elasabiaquemera:umagarotainteligente,generosaemuitas

vezes até mesmo engraçada, mas, de alguma forma, sua personalidadesempre se perdia em algum lugar a caminho da boca e ela acabavadizendoacoisaerradaou–oqueeramaiscomum–nada.Para tornar tudo aindamenos atraente, a mãe se recusava a permitir

quePenelopeescolhesseasprópriasroupas,equandoelanãoestavacomoindispensávelbrancoqueamaioriadasjovensusava(eque,éclaro,nãovalorizava emnada a suapele), era forçada a vestir amarelo, vermelho elaranja,coresqueadeixavamcomumaaparênciadeplorável.Aúnicavez

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que Penelope sugerira verde, a Sra. Featherington colocara asmãos noslargosquadrisedeclararaqueacoreramelancólicademais.O amarelo, argumentou a Sra. Featherington, era alegre, e uma moça

alegreconseguiriafisgarummarido.Penelope decidiu naquele instante, naquele local, que era melhor não

tentarcompreendercomoamentedamãefuncionava.Assim, ela se via vestida de amarelo e laranja, e às vezes vermelho,

embora tais cores a deixassem com uma aparência nada alegre e, narealidade, icassem assustadoras combinadas a seus olhos castanhos eseuscabelosavermelhados.Nãohavianadaquepudessefazerarespeito,no entanto, de forma que decidira sorrir e ser tolerante. Se nãoconseguissesorrir,aomenosnãochorariaempúblico.Algoque,porserorgulhosa,jamaisfazia.E como se isso não bastasse, 1813 foi o ano em que a misteriosa (e

ictícia)LadyWhistledowncomeçouapublicarsuasCrônicasdasociedade ,três vezes por semana. O jornal de página única se transformou numasensaçãoinstantânea.Ninguémsabiaquemeraautora.Durantesemanas–não, meses –, Londres não conseguia falar de outra coisa. O jornal foidistribuídogratuitamenteporduassemanas–temposu icienteparaviciarosmais sedentos por novidades –, e de repente não chegoumais – paraadquiri-lo, eranecessário comprá-lodasmãosdosentregadoresaopreçoexorbitantedecincopenniesporexemplar.No entanto, ninguém conseguia viver sem suas doses semanais de

mexericosequasetodospagavam.Emcertolugar,umamulher(outalvezumhomem,especulavamalguns)

estavaganhandobastantedinheiro.A diferença entre o jornal de Lady Whistledown e qualquer boletim

anterior sobre a sociedade era o fato de a autora informar o nomeverdadeiro de seus sujeitos. Não havia como se esconder por trás deabreviações como Lorde P. ou LadyB. Caso LadyWhistledowndesejasseescreversobrealguém,elausavaonomecompletodapessoa.E quando a colunista desejou escrever a respeito de Penelope

Featherington,ofez.Aprimeiramençãoàgarotanoperiódicofoiassim:“Oinfeliz vestido da Srta. Penelope Featherington deixou a pobre meninaparecidacomnadamenosqueumafrutacítricamadurademais.”

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Semdúvida,umaal inetadaparaládedolorosa,emboranadamenosdoqueaverdade.Asuasegundamençãonacolunanão foimelhor:“Nenhumapalavra foi

ouvida da Srta. Penelope Featherington, e não é para menos! A pobremeninapareceterseafogadonosbabadosdoprópriovestido.”Nadaque,temiaPenelope,fosseaumentarasuapopularidade.Mas a temporada não chegou a ser um desastre completo. Havia

algumas pessoas com quem ela parecia capaz de conversar. LadyBridgertonseafeiçoouaelaeagarota logodescobriuquepodiacontaràencantadora viscondessa coisas que jamais sonharia em dizer à própriamãe. Foi pormeio de Lady Bridgerton que conheceu Eloise, a irmãmaisnova de seu adorado Colin. A jovem também acabava de fazer 17 anos,mas a mãe sabiamente lhe permitira debutar no ano seguinte, emboraEloisepossuísseabelezadafamíliaefossecheiadeencantos.E,enquantoPenelopepassavaastardesnasaladevisitasverdeecreme

daCasaBridgerton(ou,commaisfrequência,noquartodeEloise,ondeasduas meninas se divertiam, davam risadinhas e falavam com bastanteconvicçãosobretudooquehaviaparafalar),àsvezestravavacontatocomColin,que,aos22anos,aindanãodeixaraacasadafamíliaparamoraremacomodaçõesdesolteiro.SePenelopeachavaquetinhaseapaixonadoporeleantes, issonãoera

nada comparado ao que passou a sentir depois de realmente conhecê-lo.Colin era espirituoso, bem-humorado, tinha um jeito brincalhão edespreocupadoquefaziaasmulheressuspirarem,mas,acimadetudo...ColinBridgertonerasimpático.Simpático. Uma palavrinha tão boba... Deveria ser algo banal, mas de

alguma forma combinava com ele à perfeição. Colin sempre tinha algoagradável para dizer a Penelope, e quando ela en im reunia coragemsu iciente para responder (além dos cumprimentos e despedidas maisbásicos), ele a escutava. O que acabava por tornar as coisas mais fáceisparaavezseguinte.Ao inal da temporada, Penelope achavaqueColin fora o únicohomem

comoqualconseguiraterumaconversainteira.Aquiloeraamor.Ah,eraamor,amor,amor,amor,amor,amor.Umatola

repetiçãodepalavras,talvez,masfoiexatamenteoquePeneloperabiscou

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numa folha de papel de carta caríssimo, junto com os nomes “Sra. ColinBridgerton”, “Penelope Bridgerton” e “Colin Colin Colin”. (O papel seguiuparaofogonoinstanteemqueameninaouviupassosnocorredor.)Que maravilha era amar – mesmo que o sentimento não fosse

correspondido–umapessoa simpática. Fazia comqueela se sentisse tãosensata...ÉclaroquenãoatrapalhavaemnadaofatodeColinpossuir,assimcomo

todos os homens da família, a mais fabulosa aparência ísica. Ele tinhaaquela famosacabeleira castanha, abocagrandee sorridente,osombroslargos,1,80metrodealturae,nocasodeColin,osmaisdevastadoresolhosverdesquejáadornaramumrostohumano.Eramolhosquedominavamossonhosdeumamoça.EPenelopesonhava,sonhavaesonhava.

Em abril de 1814, Penelope voltou a Londres para uma segundatemporadae,emboratenhaatraídoomesmonúmerodepretendentesdoano anterior (zero), para ser honesta, a temporada não fora tão ruim.Contribuiuparatalofatodeelaterperdidoquase13quiloseagorapoderse denominar uma “cheinha agradável” em vez de uma “gorduchahorrorosa”. Ainda não chegava nem perto do esbelto ideal femininoreinante à época, mas pelo menos mudou o su iciente para exigir umguarda-roupatodonovo.Infelizmente,amãemaisumavezinsistiuemtonsdeamarelo, laranjae

noocasional vermelho.E, destavez, LadyWhistledownescreveu: “ASrta.Penelope Featherington (a menos fútil das irmãs) usou um vestidoamarelo-limãoquedeixouumgostoazedonabocadequemoviu.”O que, pelo menos, pareceu sugerir que ela fosse o membro mais

inteligentedesuafamília,apesardeoelogiotersido,nomínimo,ambíguo.Mas Penelope não era a única alvejada pela ácida colunista. Amorena

Kate Shef ield, com seu vestido amarelo, fora comparada a um narcisochamuscado e acabou se casando com Anthony Bridgerton, irmão maisvelhodeColineumvisconde,aindaporcima!Assim,Penelopemantinhaasesperanças.

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Bem,naverdade,nãomantinha.SabiaqueColinnãosecasariacomela,masaomenos lheconvidavaparadançaremtodososbailes, fazia-arire,de vez em quando, também ria do que ela lhe dizia. Penelope sabia queaquiloteriadebastar.

E,assim,avidadelafoiemfrente.Participoudesuaterceiratemporada,edepoisdaquarta.Asduasirmãsmaisvelhas,PrudenceePhilippa,por imencontraramos própriosmaridos e saíramde casa. A Sra. Featheringtonmantinha a esperança de que Penelope ainda conseguisse se casar – asoutras ilhas haviam levado cinco temporadas para fazê-lo –, embora ajovem soubesse que estava destinada a permanecer solteira. Não seriajustocasar-secomalguémquandocontinuavatãoapaixonadaporColin.Etalvez, nos recônditos da sua mente, naquele cantinho mais distante,escondido por trás das conjugações de verbos em francês que jamaisdominara e da aritmética que nunca usara, ela ainda guardasse umminúsculofrangalhodeesperança.Atéaqueledia.Mesmohoje,seteanosdepois,aindasereferiaaelecomoaqueledia.TinhaidoàcasadosBridgertons,comofaziacomfrequência,paratomar

chácomEloise,as irmãsdelaeViolet. Isso foiumpoucoantesdeo irmãoda amiga,Benedict, se casar comSophie, emboranão soubessequemelaerade fatoe–bem, issonão signi icavanada, anão serpelo fatodequetalvez tenha sido o último grande segredo da década anterior que LadyWhistledownnãoconseguiradesvendar.Pois bem, ela vinha atravessando o saguão de entrada, ouvindo a

cadênciarítmicadosprópriospassosnopisodemármoreaoiremboradacasa sozinha. Ajeitava a capa e se preparava para caminhar a curtadistânciaatésuaresidência(que icavalogoaodobraraesquina)quandoouviuvozes.Vozesmasculinas.VozesdeBridgertonsdosexomasculino.Eram os três irmãos mais velhos: Anthony, Benedict e Colin. Estavam

tendo uma daquelas conversas que os homens costumam ter, em queicam grunhindo e ridicularizando uns aos outros. Penelope sempregostaradeobservá-losinteragiremdessaforma:eramtãofamília...

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Penelopepodiavê-losatravésdovidrodaportadafrente,masnãopôdeouviroquediziamatéchegaraovão.Ecomoprovadopéssimotimingquea assolara a vida toda, a primeira voz que escutou foi a de Colin, e aspalavrasqueouviunãoforamnadagenerosas:– ... eu não vou me casar tão cedo, e muito menos com Penelope

Featherington!–Ah!Apalavra simplesmente saiude seus lábiosemum lamentodesa inado

antesmesmoqueelapudessepensar.Os três Bridgertons voltaram-se para encará-la, horrorizados, e

Penelopesoubequeacabaradedarinícioaospioresinstantesdesuavida.Ficouemsilênciopeloquepareceuserumaeternidadeeentão,por im,

comumadignidadeque jamaissonharapossuir,olhoudiretoparaColineretrucou:–Eununcapediquesecasassecomigo.Orostodele,járosado,tornou-serubro.Eleabriuaboca,masnãoemitiu

nenhum som. Talvez, pensou Penelope com estranha satisfação, aquelativessesidoaúnicaveznavidaqueeleficousempalavras.–Eeununca...–acrescentouPenelope,engolindoemsecosemparar.–

Eununcafaleianinguémquequeriaquevocêmepedisseemcasamento.–Penelope–conseguiu,enfim,falarColin–,eusintomuito.–Nãotemdoquesedesculpar.–Não–insistiuele.–Tenho,sim.Euamagoei,e...–Vocênãosabiaqueeuestavaaqui.–Mesmoassim...–Vocênãovai secasarcomigo–declarouela,avozsoandoestranhae

falsaaosseusouvidos.–Nãohánadadeerradocomisso.EunãovoumecasarcomoseuirmãoBenedict.Até então, Benedict estava olhando para o outro lado, tentando não

encará-la,masapartirdessemomentopassouaprestaratenção.Penelopefechouasmãosaoladodocorpo.–Elenão icamagoadoquandoeudigoquenãovoumecasarcomele.–

Virou-separaBenedict e forçou-sea itá-lodiretamentenosolhos. –Fica,Sr.Bridgerton?–Claroquenão–respondeuele,comrapidez.

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–Entãoestáresolvido–disseeladecididamente, impressionadapor,aomenosumaveznavida,estarconseguindopronunciaraspalavrasexatasque queria. – Ninguém icou magoado. Agora, se me derem licença,cavalheiros,precisoirparacasa.Ostrêscavalheirosnomesmoinstantederamumpassoparatrás,a im

de que ela pudesse passar, e Penelope teria escapado ilesa se Colin, derepente,nãotivessegritado:–Nãotemumaacompanhante?Elanegoucomacabeça.–Eumorologodepoisdaesquina.–Eusei,mas...–Euaacompanho–ofereceuAnthonycomdelicadeza.–Realmentenãoénecessário,milorde.–Permita-me–insistiuele,numtomquedeixavaclaroqueelanãotinha

escolha.Ela assentiu e os dois partiram rua abaixo. Após umas duas casas,

Anthonycomentounumavozestranhamenterespeitosa:–Elenãosabiaquevocêestavaali.Penelopesentiuoscantosdos lábios icaremtensos–nãoderaiva,mas

deummistodecansaçoeresignação.–Eusei.Elenãoémau.Imaginoquesuamãeoestejapressionandopara

quesecase.Anthonyassentiu.OdesejodeLadyBridgertondevercadaumdosoito

rebentoscasadosefelizeseralendário.–Elagostademim–declarouPenelope.–Eumere iroàsuamãe.Temo

quenão consiga ver alémdisso.Mas a verdade é quenão importamuitoqueelagosteounãodanoivadeColin.– Bem, eu não diria isso – re letiu Anthony, soando menos como um

viscondemuitotemidoerespeitadoemaiscomoumfilhobem-comportado.–Eunãogostariadetermecasadocomalguémdequemaminhamãenãogostasse. – Ele balançou a cabeça num gesto que demonstrava grandeadmiraçãoerespeito.–Elaéumaforçadanatureza.–Asuamãeouasuaesposa?Elepensoupormeiosegundo.–Ambas.

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CaminharampormaisalgunsinstantesePenelopedeixouescapar:–Colindeveriasairdaqui.Anthonyaolhou,curioso.–Comoassim?– Ele deveria sair daqui. Viajar. Não está pronto para se casar e a sua

mãe continuará pressionando-o, ainda que sem querer. Ela tem boasintenções...Penelopemordeuolábioinferior,horrorizada.Esperavaqueovisconde

entendessequeelanãoestavacriticandoLadyBridgerton.Atéondesabia,nãohaviasenhoramaisdignaemtodaaInglaterra.–Minhamãesempre temboas intenções– comentouAnthony, comum

sorriso indulgente.–Mas talvezvocê tenharazão.TalvezeledevessesairdeLondres.Colindefatogostadeviajar.AcaboudevoltardoPaísdeGales.– É mesmo? – murmurou Penelope, educadamente, como se não

soubesse.– Chegamos – disse ele, depois de assentir em resposta. – É aqui que

vocêmora,certo?–É,sim.Obrigadapormeacompanhar.–Oprazerfoitodomeu,possolhegarantir.Penelope observou-o enquanto ele partia, então entrou e começou a

chorar.Nodiaseguinte,LadyWhistledownrelatouemsuacoluna:“Ora, mas quanta agitação se viu ontem em frente à casa de Lady

Bridgerton,naRuaBruton!Primeiro, Penelope Featherington foi vista na companhia não de um,

nemdedois,masdeTRÊSirmãosBridgertons,umfeitoatéentãoimpossívelpara a pobremenina, já um tanto conhecidapor ser bastante semgraça.Infelizmente (mas talvez de forma previsível) para a Srta. Featherington,quandoelaen impartiu,foiacompanhadapelovisconde,oúnicocasadodogrupo.SeaSrta.Featheringtonconseguisse,dealgumaforma,arrastarumdos

irmãos Bridgertons para o altar, isso seria o im do mundo como oconhecemos, e esta autora, que admite quenão entenderiamais nadadetalmundo,seriaforçadaarenunciaraoseupostonomesmoinstante.”Ao que parecia, até Lady Whistledown compreendia a inocuidade dos

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sentimentosdePenelopeporColin.

Osanossepassarame,dealguma forma, semperceber,Penelopedeixoudeserumadebutanteeocupavaagoraogrupodasdamasdecompanhiaeobservava a irmãmais nova, Felicity – a única das irmãs Featheringtonsabençoadacomgraçaebelezanatural–,desfrutardaprópria temporadalondrina.Colindesenvolveuumainclinaçãoespecialpelasviagensepassavacada

vezmais tempo foradeLondres.Pareciaqueacadamêsseguiaparaumdestinodiferente.Quandoestavanacidade,sempreguardavaumadançaeumsorrisoparaPenelope,eela,dealgumjeito,conseguia ingirquenadahavia acontecido, que ele jamais tinha declarado sua aversão a ela numaviapúblicaequeseussonhosnuncatinhamsidodespedaçados.Esemprequeeleestavanacidade,oquenãoocorriacomfrequência,os

dois pareciam desfrutar de uma amizade fácil, mesmo que não muitoprofunda. O que era tudo o que uma solteirona de 28 anos poderiaesperar,certo?Umamornão correspondidonãoeranada fácil de administrar,mas ao

menosPenelopeFeatheringtonjáestavaacostumadaaisso.

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CAPÍTULO1

Mamães casamenteiras, podem comemorar: Colin BridgertonretornoudaGrécia!Para os gentis (e ignorantes) leitores recém-chegados à cidade, o

Sr. Bridgerton é o terceiro da lendária série de oito irmãosBridgertons (por isso o nome Colin, que começa com a letra C: elenasceu depois de Anthony e Benedict e antes de Daphne, Eloise,Francesca,GregoryeHyacinth).Emborao Sr. Bridgertonnãopossuanenhum título de nobreza, e

talvez jamais venha a possuir (é o sétimo na linha de sucessão dotítulo de visconde de Bridgerton, atrás dos dois ilhos do atualvisconde,deseu irmãoBenedictedostrês ilhosdele),éconsiderado,apesar disso, um dos melhores partidos da temporada devido à suafortuna, à sua beleza, à sua forma ísica e, acima de tudo, aos seusencantos.Édi ícil,noentanto,prever seele irá sucumbiràsbênçãosmatrimoniaisnesta temporada.Semdúvida, tem idadeparasecasar(33 anos), mas jamais demonstrou interesse decisivo por nenhumadama apropriada e, para complicar ainda mais as coisas, possui aterríveltendênciadedeixarLondresaqualquerinstanteemdireçãoaalgumdestinoexótico.

C

–Olhesóparaisto!–guinchouPortiaFeatherington.–ColinBridgertonestádevolta!Penelope ergueuos olhosdobordado.Amãe segurava a última edição

doWhistledowndamaneiraquePenelope talvezsegurasse,digamos,umacorda,casoestivesseprestesadespencardeumpenhasco.–Eusei–murmurouela.Portia franziu a testa. Odiava quando alguém – qualquer um – icava

sabendodeumafofocaantesdela.

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–MascomovocêconseguiupôrasmãosnoWhistledownantesdemim?Eu pedi a Briarly que o separasse e que não permitisse que ninguém otocasse...– Eu não li noWhistledown – interrompeu Penelope antes que a mãe

saísseparaincomodaropobreejátãorequisitadomordomo.–Felicitymecontouontemàtarde.HyacinthBridgertoncomentoucomela.–AsuairmãpassamuitotemponacasadosBridgertons.– Assim como eu – observou Penelope, perguntando-se aonde aquele

comentárioiriadar.Portia tamborilava na lateral do queixo, como sempre fazia quando

tramavaalgumacoisa.– Colin Bridgerton está numa idade em que deveria procurar uma

esposa.Penelope conseguiu piscar para evitar que os olhos lhe saltassem das

órbitas.–ElenãovaisecasarcomFelicity!Portiadeudeombroslevemente.–Coisasmaisestranhasjáaconteceram.–Nãoqueeutenhavisto–murmurouPenelope.–AnthonysecasoucomKateShef ield,eelaeraaindamenospopulardo

quevocê.Aquilo não era exatamente verdade. Penelope achava que as duas

tinham ocupado omesmo lugar na base da pirâmide social. Mas parecianão adiantar dizer isso à mãe, que estava achando que tinha feito umelogio à ilha ao a irmar que ela não fora a menina menos popular datemporada.Penelopesentiuos lábios icaremtensos.Os“elogios”damãetendiama

teroefeitodeferrõesdevespassobreela.– Não pense que minha intenção é criticá-la – continuou Portia,

transformando-se de repente na própria imagem da preocupação. – Naverdade, ico satisfeita com a sua solteirice. Estou só nestemundo, a nãoserpelasminhas ilhas,eéreconfortantesaberqueumadevocêspoderácuidardemimnavelhice.Penelopeteveumavisãodofuturosegundoadescriçãodamãeesentiu

umsúbitodesejodesaircorrendoesecasarcomolimpadordechaminés.

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Fazia tempo que se resignara à vida de solteirona eterna, embora, dealguma forma, sempre tivesse se imaginadomorando na própria casinhacomvaranda.Outalveznumconfortávelchaléàbeira-mar.Mas, nos últimos tempos, Portia vinha pontuando as conversas com a

ilha com referências à sua velhice e à sorte que tinha pelo fato de quePenelope cuidaria dela. Não importava o fato de que tanto Prudencequanto Philippa haviam se casado com homens ricos e que possuíamdinheiromaisdoquesu icienteparaproporcionar todooconfortoàmãe.Ou que a própria Portia fosse umamulher de algumas posses: quando afamíliaestabeleceraoseudote,umquartodaquantiaforaseparadonumacontadeusopessoaldela.Não, quando Portia falava em ser cuidada na velhice, não se referia a

dinheiro.Oqueelaqueriaeraumaescrava.Penelopesuspirou.Estavasendomuitoduracomamãe,aindaquesóem

pensamento.Faziaissocomexcessivafrequência.Portiaaamava.Penelopesabiadisso.Eelatambémaamava.Aquestãoeraque,àsvezes,nãogostavamuitodela.Esperava que isso não a tornasse uma pessoa ruim.Mas, com efeito, a

mãetinhaacapacidadededesa iarapaciênciaatémesmodamaisafávelemeiga das ilhas, e Penelope era a primeira a admitir que podia ser umpoucosarcásticaemalgunsmomentos.–PorqueachaqueColinnãosecasariacomFelicity?–indagouPortia.Penelope ergueu os olhos, aturdida. Achou que aquele assunto já

estivesseencerrado.Deveriaterdesconfiado.Amãeerapersistente.–Bem–começouela,devagar–,parainíciodeconversa,elaédozeanos

maisnovadoqueele.– Pfff – fez Portia, descartando o comentário com um aceno demão. –

Issonãotemnenhumaimportância,evocêsabedisso.Penelope franziua testa,entãoespetouaagulhanodedosemquerere

deuumganido.–Alémdomais–continuouPortia,alegremente–,eletem...–olhououtra

vezparaoWhistledownprocurandoaidadeexata–33anos!Comoesperaque consiga evitar uma diferença de 12 anos entre ele e a esposa? ComcertezavocênãoachaqueColinvásecasarcomalguémdasuaidade.Penelope chupou o dedomachucado, mesmo sabendo que o gesto era

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bastante indelicado.Masprecisava colocar algonabocapara evitar fazeralgumcomentárioterrívelemaldoso.Tudooqueamãedisseraeraverdade.Várioshomensdaaltasociedade

– talvez até amaioria – se casavam commoçasmuitomais novasdoqueeles. Mas, de alguma forma, a diferença de idade entre Colin e Felicitypareciaaindamaior,talvezporque...Penelopefoiincapazdeesconderarepugnância.–Elaécomoumairmãparaele.Umairmãmaisnova.–Ora,Penelope,sinceramente,nãocreio...–Seriaquaseumincesto–murmurouPenelope.–Oquefoiquevocêdisse?Penelopepegouobordadooutravez.–Nada.–Estoucertadequedissealgumacoisa.Penelopebalançouacabeça.–Naverdade,eupigarreei.Talveztenhaescutado...–Euaouvidizeralgumacoisa.Tenhocerteza!Penelopegemeu.Visualizouavidalongaetediosaquetinhapelafrente.–Mamãe–retrucou,comumapaciênciaquesenãoeraadeumasanta

era, pelomenos, a de uma irmãde caridademuito devota. – Felicity estápraticamentenoivadoSr.Albansdale.Portiacomeçouaesfregarasmãosumanaoutra.–NãoficaránoivadeleseconseguirfisgarColinBridgerton.–ElaprefeririamorreracorreratrásdeColin.–Éclaroquenão.Éumameninainteligente.Qualquerumpodeverque

ColinBridgertonéumpartidomelhorqueoSr.Albansdale.–MasFelicityamaoSr.Albansdale!Portiamurchounapoltrona.–Issoéverdade.–Alémdomais–continuouPenelopedeformabastanteenfática–,oSr.

Albansdalepossuiumafortunabastanterespeitável.Portiabateucomoindicadornorosto.– Tem razão. Não tão respeitável quanto parte da fortuna dos

Bridgertons–continuou,bruscamente–,masnadadesprezível,suponho.Penelope sabia quedevia deixar o assuntode lado,masnão conseguiu

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evitarfazerumúltimocomentário:– Na verdade, mãe, ele é um ótimo par para Felicity. Devíamos estar

felicíssimasporela.– Eu sei, eu sei – rosnou Portia. – É que eu queria tanto que uma das

minhas ilhassecasassecomumBridgerton...Seriamaravilhoso!EuseriaoprincipalassuntodeLondresdurantesemanas.Anos,talvez.Penelope en iou a agulhana almofada a seu lado.Nãohavia dúvidade

quesetratavadeumaformabastantetoladedarvazãoàsuaraiva,masaalternativaseriase levantaregritar:“Eeu?”Portiapareciaacreditarque,uma vez que Felicity se casasse, sua esperança de uma união com osBridgertons estaria frustrada para sempre. Mas Penelope continuavasolteira–seráqueissonãoserviadenada?Seriapedirdemaisqueamãepensassenelacomomesmoorgulhoque

sentia das outras ilhas? Penelope sabia que Colin não a escolheria comonoiva,masseráqueumamãenãodeveriaserpelomenosumpoucocegacomrelaçãoaosdefeitosdasprópriascrias?EraóbvioparaPenelopequenem Prudence, nem Philippa e nem mesmo Felicity jamais tinham tidoqualquer chance com um Bridgerton. Então por que Portia parecia crerque os encantos das três eram tão maiores que os de Penelope a esseponto?Certo,Penelope tinhaqueadmitirqueFelicity eramaispopularque as

trêsirmãsmaisvelhasjuntas.MasPrudenceePhilippajamaishaviamsidomuito requisitadas. Tinham mofado às margens dos salões de baile damesmaformaquePenelope.Exceto, é claro, pelo fato de estarem, agora, casadas. Penelope não

gostaria de ter nenhumdos doismaridos,mas pelomenos as duas eramesposas.Porsorte,porém,amentedePortiajápercorriaoutroscaminhos.– Eu deveria fazer uma visita a Violet – dizia ela. – Deve estar tão

aliviadaporColintervoltado...– Estou certa de que Lady Bridgerton icará encantada em vê-la –

comentouPenelope.–Pobremulher– comentouPortia, comumsuspirodramático. –Ela se

preocupacomele,sabe...–Eusei.

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–Paraser sincera, achoqueémaisdoqueumamãedeveria suportar.Elevivevagandoporaí,sóDeussabeporonde,nessespaísessemfé...– Acredito que pratiquem o cristianismo na Grécia – murmurou

Penelope,comosolhosmaisumavezvoltadosparaobordado.– Não seja impertinente, Penelope Anne Featherington, e eles são

católicos!Portiaestremeceuaopronunciaraúltimapalavra.–Nãotêmnadadecatólicos–replicouPenelope,desistindodobordado

ecolocando-odelado.–PertencemàIgrejaOrtodoxaGrega.–Bem,nãosãodaIgrejaAnglicana–queixou-sePortia,fungando.– Considerando que são gregos, não imagino que estejam muito

preocupadoscomisso.Portiaestreitouosolhosemsinaldedesaprovação.–E,dequalquer forma,comovocêsabesobreessareligiãogrega?Não,

nãome diga – continuou em tomde lamento, comum gesto dramático. –Vocêleuemalgumlugar.Penelope se limitou a piscar enquanto pensava numa resposta

adequada.– Eu gostaria quenão lesse tanto – observouPortia comum suspiro. –

Talvezeu tivesse conseguido casá-laháanos sehouvesse se concentradomaisnoseutraquejosocialemenosem...menosem...Penelopetevequeperguntar:–Menosemquê?– Não sei. No que quer que faça com que você ique olhando para o

nada,sonhandoacordadacomtantafrequência.– Eu apenas penso – disse Penelope, baixinho. – Às vezes gosto de

simplesmentepararepensar.–Parardequê?–quissaberPortia.Penelopenãopôdedeixardesorrir.Aperguntadamãepareciaresumir

todasasdiferençasentreasduas.–Nada,mãe–respondeuPenelope.–Sério.Portiatinhaumardequequeriadizermaisalgumacoisa,entãopensou

duasvezes.Outalvezestivesseapenascomfome.Apanhouumbiscoitodabandejadecháeopôsnaboca.Penelope iapegandooúltimopara si,masdecidiudeixá-loparaamãe.

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EramelhormanterabocadePortiacheia.AúltimacoisaquedesejavaerasevernomeiodeoutraconversasobreColinBridgerton.

–Colinestádevolta!Penelopeergueuosolhosdolivroquelia–UmabrevehistóriadaGrécia

– e viu Eloise entrar em seu quarto. Como sempre, a amiga não foraanunciada.OmordomodosFeatheringtonsestava tãoacostumadoavê-laporaliqueatratavacomomembrodafamília.– Émesmo? – retrucou Penelope, conseguindo ingir (em sua opinião)

umaindiferençabastanterealista.ElatinhacolocadoUmabrevehistóriadaGrécia pordentrodeMathilda,o

romance de S.R. Fielding que fora um enorme sucesso no ano anterior.Todomundopossuíaumexemplarnamesinhadecabeceira.EeragrossoobastanteparaesconderolivroquePenelopeestavalendodefato.Eloisesentou-senacadeiradaescrivaninhadaamiga.– É. E está bronzeadíssimo. Também, era de se esperar, depois de ter

passadotantotemposobosol.–ElefoiàGrécia,nãofoi?Eloisefezquenãocomacabeça.–Eledissequeaguerrapiorouporláequeeraperigosodemais.Então,

acabouindoparaChipre.– Ora, ora – comentou Penelope, sorrindo. – Então Lady Whistledown

errou.Eloise deu um daqueles sorrisos insolentes típicos dos Bridgertons e,

mais uma vez, Penelope se deu conta da sorte que tinha em tê-la comomelhor amiga. Ela e Eloise eram inseparáveis desde os 17 anos. Tinhamdebutado no mesmo ano e, para consternação de suas mães, haviam setornadosolteironasjuntas.Eloiseafirmavanãoterencontradoapessoacerta.Penelope,éclaro,nãoreceberanenhumaproposta.–Eelegostoudelá?–perguntouPenelope.Eloisedeixouescaparumsuspiro.–Dissequeéumlugarimpressionante.Ah,comoeuadorariaviajar...Ao

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queparece,todomundojáfoiaalgumlugar,menoseu.–Eeu–lembrou-lhePenelope.–Evocê–concordouEloise.–GraçasaDeusvocêexiste.–Eloise!–gritouPenelope,atirandoumaalmofadanela.Mas ela mesma agradecia a Deus por Eloise. Todos os dias. Muitas

mulheres passavam a vida toda sem uma amiga próxima e ali estava elacomumapessoa aquempodia contarqualquer coisa.Bem,praticamentequalquercoisa.PenelopejamaislhedisseraoquesentiaporColin,emboraimaginasse que Eloise suspeitasse. A amiga era muito discreta paracomentaralgumacoisa,oquesócon irmavaacertezadePenelopedequeColin jamais a amaria. Se Eloise pensasse,mesmopor um instante, que aamiga tinhaalgumachancede isgaro irmãocomomarido, teria tramadoestratégias casamenteiras com uma tenacidade que impressionariaqualquergeneraldeexército.Quando necessário, Eloise era uma pessoa com bastante instinto de

liderança.– ... entãoelecontouqueomarsacudia tantoqueeledespejou tudono

oceano pela lateral do barco e... – Eloise fez uma careta. – Você não estáescutando.–Não–admitiuPenelope.–Bem,estou,emparte.Nãoconsigoacreditar

queColintenhalhecontadoquevomitou.–Ora,eusouirmãdele.–Eleficariafuriosocomvocêsesoubessequemedisseisso.EloisedescartouaqueixadePenelopecomumacenodemão.–Elenãoligaria.Vocêécomoumairmãparaele.Penelopesorriu,masaomesmotempodeixouescaparumsuspiro.–Éclaroquemamãequissaberseelepretende icarnacidadedurante

atemporada–continuouEloise–,eéclaroqueelefugiudapergunta,masquandoeuresolviinterrogá-lopessoalmente...–Muitoengenhosodasuaparte–murmurouPenelope.Eloiseatirouaalmofadadevoltanela.– ...conseguiqueeleadmitissequesim,quepassarápelomenosalguns

mesesaqui.Maselemefezprometernãocontarnadaamamãe.– Ora, mas isso não é muito inteligente da parte dele – comentou

Penelope, pigarreando em seguida. – Se a sua mãe achar que a estadia

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deleaquiserálimitada,iráredobrarosesforçosparavê-locasado.Imaginoqueelehaveriadequererevitarisso.–Defatoessepareceseroobjetivodevidadele–concordouEloise.– Se ele conseguir enganá-la, fazendo-a acreditar que não tem pressa

parairembora,talvezelanãoopressionetanto.– Uma ideia interessante – disse Eloise –, embora talvez seja mais

verdadeiraemteoriadoquenaprática.Minhamãeestátãodecididaavê-locasadoqueofatoderedobrarosesforçosparaissonãotemimportânciaalguma.Seuempenhonormaljáseráobastanteparalevá-loàloucura.–Serápossívelumapessoaser levadaduplamenteà loucura?–re letiu

Penelope.Eloiseinclinouacabeçaparaolado.–Nãosei,masachoquenãogostariadedescobrir.As duas icaram um momento em silêncio (algo bastante raro), então

Eloiseselevantouderepenteedisse:–Tenhoqueir.Penelope sorriu. Quem não conhecia Eloise muito bem achava que ela

tinha o hábito demudar de assunto do nada, mas Penelope sabia que averdadeeraoutra.Quandoaamigacolocavaalgonacabeça,simplesmentenão desistia até conseguir o que queria. O que signi icava que, se Eloisetinhaqueridoiremboraderepente,issodeviaestarrelacionadoaalgoqueconversarammaiscedo,naquelamesmatarde,e...–EstamosesperandoColinparaochá–explicouEloise.Penelopesorriu.Adoravaestarcerta.–Vocêdeveriavir–sugeriuEloise.Penelopefezquenãocomacabeça.–Eleiriapreferirquefossesóafamília.–Talvezvocêtenharazão–concordouEloise,assentindodeleve.–Muito

bem,então,estouindo.Sintomuitoporsaircorrendo,maseusóquerialhecontarqueColinvoltouparacasa.–EulinoWhistledown–lembrou-lhePenelope.– Certo. E onde é que essa mulher consegue as informações? –

considerou Eloise, balançando a cabeça, impressionada. – Juro que àsvezeselasabetantosobreaminhafamíliaqueeumeperguntosedeveriatermedo.

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– Ela não pode continuar com isso para sempre – comentou Penelope,levantando-separaacompanharaamigaatéaporta.–Emalgummomentoalguémhaverádedescobrirquemelaé,nãoacha?– Não sei. – Eloise colocou a mão na maçaneta e abriu a porta. – Eu

costumava achar isso,mas já faz dez anos.Mais que isso, na verdade. Sefosseparaelaserpega,achoquejáteriaacontecido.PenelopeseguiuEloiseescadaabaixo.– Em algum momento ela haverá de cometer um erro. Tem que

acontecer.Afinal,elaéhumana.Eloiseriu.–Eeuaquiachandoqueeraumasemideusa.Penelopesorriu.EloiseparoueseviroutãosubitamentequePenelopetromboucomelae

asduasquaserolaramosúltimosdegrausdaescada.–Sabedeumacoisa?–falou.–Nãoconsigonemimaginar.Eloisenemsedeuotrabalhodefazerumacareta.–Apostoqueelajácometeuumerro–declarou.–Comoassim?– Você mesma disse. Ela, ou ele, escreve essa coluna há mais de uma

década.Ninguémconseguefazer issoportantotemposemcometererros.Então,sabeoqueeuacho?Penelopeselimitouaabrirasmãosnumgestodeimpaciência.–Quetodosnóssomosburrosdemaisparanotarosseuserros.Penelopeafitouporuminstante,depoiscomeçouarir.–Ah,Eloise– falou,secandoas lágrimasdosolhos.–Eurealmenteamo

você.Eloiseriu.–Aindabemqueama, solteironaque sou.Vamosmorar juntasquando

fizermos30anosenostornarmosduasvelhasdeverdade.Penelope se apegou à ideia como quem se agarra a um barco salva-

vidas.– Acha que poderíamos? – retrucou. Em seguida olhou de maneira

furtiva de um lado para outro no corredor e continuou em voz baixa: –Minha mãe vem falando sobre a velhice dela com uma frequência

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alarmante.–Oquehádealarmantenisso?–Euestouemtodasassuasvisões,atendendoatodososseusdesejos.–Minhanossa.– O queme passou pela cabeça foi uma imprecaçãomenos branda do

queessa.–Penelope!MasEloiseestavarindo.–Euamoaminhamãe–afirmouPenelope.–Euseiqueama–assentiuEloise,numavozquaseapaziguadora.–Não,ésério,euamomesmo.O canto esquerdo da boca de Eloise começou a se curvar num meio

sorriso.–Euseiqueama.Sério.–Ésóque...Eloiseergueuumadasmãos.–Nãoprecisadizermaisnada.Euentendoperfeitamente.Eu...Ah!Bom

dia,Sra.Featherington!– Eloise – começou Portia, apressando-se pelo corredor em direção a

elas.–Nãosabiaqueestavaaqui.–Eufuifurtiva,comosempre–brincouEloise.–Mal-educada,até.Portialhelançouumsorrisoindulgente.–Eusoubequeseuirmãoestádevolta.–Sim,estamostodostransbordandodealegria.–Tenhocertezadisso,sobretudoasuamãe.–Semdúvida.Nãocabeemsidefelicidade.Acreditoqueestejafazendo

umalistaagoramesmo.Portia no mesmo instante icou mais atenta, como sempre ocorria à

mençãodequalquercoisaquepudesseserinterpretadacomoumaintriga.–Lista?Queespéciedelista?– Ora, a senhora sabe, do mesmo tipo que fez para todos os ilhos

adultos.Cônjugesempotencialetudoomais.– Fico me perguntando o que pode ser o “tudo o mais” – comentou

Penelopecomavozseca.–Àsvezesela incluiumaouduaspessoascompletamente inadequadas

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pararealçarasqualidadesdasreaispossibilidades.Portiariu.–QuemsabeelanãoacolocanalistadeColin,Penelope!Penelopenãoriu.NemEloise.Portianãopareceunotar.–Bem,émelhoreuirandando–disseEloise,pigarreandoparadisfarçar

omomentodesconfortávelparaduasdastrêspessoasqueseencontravamnocorredor.–EstamosesperandoColinparaochá.Mamãequerafamíliatodapresente.–Evocêstodosvãocaberlá?–perguntouPenelope.AcasadeLadyBridgertoneragrande,mas,contandocomoscônjugese

netos,osparentesjáeram21.Defato,umagrandefamília.–Bem,ocháseránaCasaBridgerton–explicouEloise.A mãe se mudara da residência o icial dos Bridgertons em Londres

depois que o ilho mais velho se casara. Anthony, visconde desde os 18anos,garantiraaVioletqueelanãoprecisavapartir,masela insistiraqueeleeaesposaprecisavamdeprivacidade.Comoresultado,AnthonyeKateviviamlácomostrês ilhos,enquantoVioletmoravacomos ilhossolteiros(com exceção de Colin, que tinha as próprias acomodações) a poucasquadras, na Rua Bruton, número 5. Após quase um ano de tentativasinfrutíferas de dar um nome ao novo lar de Lady Bridgerton, a famíliacomeçaraachamá-loapenasdeNúmeroCinco.– Divirta-se – disse Portia. – Preciso encontrar Felicity. Temos hora na

costureiraeestamosatrasadas.EloiseobservouenquantoPortiadesapareciaescadaacima,entãodissea

Penelope:–Suairmãtempassadobastantetemponacostureira.Aamigadeudeombros.– Ela está enlouquecendo com tantas provas de roupa, mas é a única

esperança deminhamãe para um casamento realmente grandioso. Achoque está convencida de que, com o vestido correto,minha irmã vá isgarumduque.–ElanãoestáquasenoivadoSr.Albansdale?– Imaginoqueele faráumpedido formalnasemanaquevem.Mas,até

lá,minhamãepreferemanterasopçõesemaberto.–Peneloperevirouosolhos. – É melhor avisar ao seu irmão que mantenha distância por

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enquanto.– Gregory? – indagou Eloise, incrédula. – Ele ainda nem saiu da

universidade.–Colin.–Colin?–Eloiseexplodiuemgargalhadas.–Ah,essaéboa.–Foioqueeufalei,masvocêsabecomoelaéquandoen iaumacoisana

cabeça.Eloisecontinuouarir.–Umtantocomoeu,imagino.–Tenazatéamorte.–A tenacidadepodeserumaqualidademuitoboa– lembrou-lheEloise

–,nomomentocerto.–Certo–retrucouPenelopecomumsorrisosarcástico.–Enomomento

erradopodeserumverdadeiropesadelo.Eloiseriu.–Alegre-se,minhaamiga.Pelomenoselapermitiuquevocêse livrasse

detodosaquelesvestidosamarelos.Penelope baixou os olhos para o vestido matinal que usava, de um

lisonjeiro–modéstiaàparte–tomdeazul.–Elaparoudeescolherasminhasroupasquandoen imsedeucontade

que eu não iame casar. Umamoça sem perspectivas dematrimônio nãovale o tempo nem a energia que lhe custam para oferecer conselhos demoda.Elanãomelevaàcostureirahámaisdeumano.Éumabênção!Eloise sorriu para a amiga, cuja pele adquiria um encantador tom de

pêssegocomcremequandoelausavacoresfrias.–Todomundonotouassimqueelaadeixouescolherasprópriasroupas.

AtéLadyWhistledowncomentou!– Escondi essa coluna de mamãe – admitiu Penelope. – Não quis que

ficassemagoada.Eloisepiscoualgumasvezesantesdedizer:–Bondadesua,Penelope.–Eutenhoosmeusmomentosdecaridadeeboavontade.–Imaginoquepartemuitoimportantedacaridadeedaboavontadeseja

a capacidade de não chamar a atenção para o fato de possuí-las – falouEloise,começandoarir.

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Penelopefezumacaretaeempurrouaamigaemdireçãoàporta.–Vocênãotinhaqueirembora?–Estouindo!Estouindo!Eelasefoi.

ErabastanteagradávelestardenovonaInglaterra,pensouColinenquantobebericavaumexcelentebrandy.Eraestranho,naverdade,gostarnamesmamedidadevoltarparacasae

de partir. Dentro de mais alguns meses – seis, no máximo – estaria secoçando para viajar outra vez, mas, por ora, sentia-se satisfeito: aInglaterranomêsdeabrileraabsolutamentemaravilhosa.–Bom,nãoémesmo?Colin ergueu os olhos. O irmão Anthony estava encostado na frente da

imensa escrivaninha de mogno, acenando com o copo do mesmobrandyqueelebebia.Colinassentiu.–Nãotinhamedadocontadafaltaquesentidistoatévoltar.O ouzo tem

láosseusencantos,masisto–falouerguendoocopo–éoparaíso.Anthonydeuumsorrisoirônico.–Equantotempoplanejaficarconoscodestavez?Colinseaproximoudajanelae ingiuolharparafora.Oirmãomaisvelho

não seesforçavamuitoparadisfarçar sua impaciênciaemrelaçãoà sededeColinporaventuras.Naverdade,Colinnãopodiaculpá-lo.Àsvezeseradi ícil fazer com que as cartas chegassem em casa – imaginava que comfrequência a família tivesse que esperar até mesmo um mês paradescobrir seele estavabem.Mas, embora tivesse consciênciadequenãogostariadeestarnolugardeles–semsaberseumapessoaamadaestavavivaoumorta,sempreàesperadabatidadeummensageiroàporta–,issonãoeraosuficienteparamanterseuspésfincadosnaInglaterra.Devezemquando,sentiaanecessidadedeestarlonge.Nãohaviaoutra

formadedescrever.Longedaaltasociedade,queoviacomoummolequeencantador e nada mais. Longe de seu país, que encorajava seus ilhosmais novos a entrar para o serviço militar ou para o clero, quando

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nenhumadasduasopçõesseencaixavaemseutemperamento.Atémesmolonge da família, que o amava de forma incondicional mas que nemdescon iavadequeoqueelemaisdesejava,nofundo,erateralgocomqueseocupar.O irmão, Anthony, era um visconde, e com o título vinham as mais

variadas responsabilidades. Ele administrava propriedades e as inançasdafamíliaesupervisionavaobem-estardeincontáveisinquilinosecriados.Benedict, quatro anosmais velho do que ele, ganhara fama como artista.Começara com papel e lápis, mas, encorajado pelamulher, passara paraóleo.Umadesuaspaisagensestava,agora,expostanaNationalGallery.Anthonyseriasemprelembradonasárvoresgenealógicascomoosétimo

visconde de Bridgerton. Benedict continuaria vivo por meio de seusquadrosmuitotempodepoisdeterdeixadoestemundo.MasColinnãotinhanada.Administravaapequenapropriedadequelhe

foraconcedidapela famíliae frequentava festas.Nãopodiadizerquenãosedivertia,masàsvezesqueriaumpoucomaisdoqueentretenimento.Queriaumobjetivo.Umlegado.Queria, se não saber, ao menos esperar que, quando morresse, fosse

celebradodealguma formaquenãocomumamençãonacolunadeLadyWhistledown.Suspirou.Nãoeradeestranharquepassassetantotempoviajando.–Colin?–chamouoirmão.ElesevirouparaAnthonyepiscou.Tinhaquasecertezadequeoirmão

mais velho lhe izera uma pergunta, mas, em algum momento de seusdevaneios,esquecera-sedoquefora.– Ah. Certo. – Colin pigarreou. – Vou passar pelo menos o resto da

temporadaaqui.Anthonynãorespondeu,masfoidi ícil ignorarasatisfaçãoexpressaem

seurosto.–A inal de contas – acrescentouColin, abrindo seu lendário sorriso de

lado –, alguém tem demimar os seus ilhos. Acho que Charlotte não temumnúmerosuficientedebonecas,porexemplo.– Apenas cinquenta – concordouAnthony, com a voz inexpressiva. – A

pobrecriançadefatoémuitonegligenciada.

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– O aniversário dela é no inal do mês, certo? Creio que terei quenegligenciá-lamaisumpouco.– E por falar em aniversários – começou Anthony, acomodando-se na

imensa cadeira do outro lado da escrivaninha –, o de nossamãe será nodomingo.–Eporqueachaqueantecipeimeuretorno?Anthonyergueuumadas sobrancelhas eColin teve clara impressãode

queoirmãotentavadecidirseelerealmenteseapressaraparavoltarparacasaa tempodoaniversáriodamãeouseestavaapenasseaproveitandodeumaexcelentecoincidência.–Vamosdarumafestaparaela–disseAnthony.–Elavaideixar?Na experiência de Colin, mulheres de certa idade não gostavam de

comemorações de aniversário. E, embora a mãe continuasse linda, jácontava,semdúvida,comcertaidade.– Fomos forçados a recorrer à chantagem – admitiu Anthony. – Ou ela

concordavacomafestaourevelávamosasuaverdadeiraidade.Colin estava em meio a um gole dobrandy; ele engasgou e, por muito

pouco,conseguiunãocuspi-lointeiroemcimadoirmão.–Euadorariatervistoisso.Anthonyabriuumsorrisobastantesatisfeito.–Foiumamanobrabrilhantedaminhaparte.Colinterminouodrinque.–Quaissãoaschances,nasuaopinião,dequeelanãouseafestacomo

pretextoparaencontrarumaesposaparamim?–Muitopoucas.–Foioquepensei.Anthonyrecostou-senacadeira.–Vocêtem33anos,Colin...Omaisnovoofitou,incrédulo.–Deusdocéu,nãocomecevocêtambém.–Eunempensariaemfazerisso.Apenassugiroquevocê iquedeolhos

bem abertos esta temporada. Não é preciso buscar uma esposaativamente, mas não há mal algum em se manter pelo menos atento àpossibilidade.

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Colinolhouparaaportacomtodaaintençãodepassarlogoporela.–Possolhegarantirquenãosoucontrárioàideiadocasamento.–Nãoacheiquefosse–concedeuAnthony.–Apenasvejopoucarazãoparapressa.–Nuncahá razãoparapressa.Bem, quasenunca, querodizer.Apenas

nãocontrarieamamãe,estábem?Colin não se dera conta de que ainda segurava o copo vazio até ele

escorregardeseusdedoseaterrissarnotapetecomumbaquesurdo.–MeuDeus–sussurrou–,elaestádoente?–Não!–garantiuAnthony,asurpresadeixandoavozaltaeenérgica.–

Vaivivermaistempodoquetodosnós,tenhocerteza.–Entãoquehistóriaéessa?Anthonydeixouescaparumsuspiro.–Eusóquerovê-lofeliz.–Euestoufeliz.–Está?– Ora, eu sou o homem mais feliz de Londres. Leia a coluna de Lady

Whistledown.Elalhedirá.Anthony baixou os olhos para o jornal que se encontrava na

escrivaninha.–Está certo, talveznãoessa,masqualquerumadoanopassado– falou

Colin.–Fuiclassi icadocomoencantadormaisvezesdoqueLadyDanburyfoichamadadeintrometida,enósdoissabemosqueissoéumfeitoetanto.–Encantadornãoquernecessariamentedizerfeliz–comentouAnthony

baixinho.–Eunãotenhotempoparaisto–murmurouColin.Aportanuncalhepareceratãoatraente.–Sevocêestivessemesmofeliz– insistiuAnthony–,nãopartiriaatodo

momento.Colinfezumapausacomamãonamaçaneta.–Anthony,eugostodeviajar.–Sempre?–Devogostar,ouentãonãoviajaria.–Estáaíafrasemaisevasivaquejáouvi.– E isto aqui... – retrucou Colin lançando um sorriso travesso para o

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irmão–éumamanobraevasiva.–Colin!Maselejádeixaraoaposento.

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CAPÍTULO2

Semprefoimodaentreaaltasociedadequeixar-sedotédio,massemdúvidaasafradefrequentadoresdefestasdesteanoelevouoenfadoaumanovacategoria.Nãosepodedardoispassosemnenhumeventoda sociedade por esses dias sem ouvir as expressões “terrivelmentetedioso”ou“desesperadamentebanal”.Naverdade,estaautorafoiatéinformada que Cressida Twombley garantiu que está convencida deque perecerá de enfado eterno se for forçada a comparecer a maisummusicalruim.(Esta autora tem que concordar com Lady Twombley desta vez.

Apesar de a seleçãode debutantes deste ano ser bastante agradável,nãoháumaúnicajovemdentreelasquesejaumamusicistadecente.)Seexistealgumantídotoparaadoençadotédio,comcertezaseráa

festadedomingonaCasaBridgerton.A família inteira irá se reunircomcercadecemamigospróximosparacomemoraroaniversáriodaviscondessaviúva.É considerado indelicado mencionar a idade de uma dama,

portanto esta autora não irá revelar quantos anos LadyBridgertoncelebrará.Masnãosepreocupem!Estaautorasabe!

C

Solteirona era umapalavra que costumava invocar pânico oupena,masPenelopecomeçavaaperceberquehaviamuitasvantagensemseuestadocivil.Em primeiro lugar, ninguém esperava que as solteiras dançassem nos

bailes, o que signi icava que ela não eramais forçada a icar à beira dapista de dança, olhando para cá e para lá, ingindo que não queria serconvidadaparaumadança.Agorapodia icarsentadanas lateraiscomasoutras solteironas e acompanhantes. Ainda queria dançar, é claro –

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adorava fazer issoedançavamuitobem,emboraninguémnotasse–,maserabemmais fácil ingirdesinteressequandoseestavamaisdistantedoscasaisvalsistas.Emsegundo lugar,onúmerodehorasdeconversasmaçantesdiminuiu

de maneira drástica. A Sra. Featherington desistira o icialmente daesperançadequea ilhaalgumdia isgasseummarido,portantopararadeatirá-la no caminho de todo e qualquer solteiro disponível do terceiroescalão.Portia jamaisconsiderava,de fato,quePenelopetivessequalquerchance de atrair um solteiro do primeiro ou do segundo escalão, o quetalvez fosse verdade, mas a maioria dos solteiros de terceiro time eraassimclassi icadaporummotivo,queinfelizmenteeraapersonalidade,ousuaausência.Oque,combinadocomatimidezdePenelopenapresençadeestranhos,nãolevavaaumaconversamuitoespirituosa.E,por im,elapodiavoltaracomer.Eradeenlouquecer,considerandoa

quantidadedecomidaemgeralexpostanasfestasdaaltasociedade,masofatoeraque jovensàcaçadeummaridodeviamdemonstraroapetitenomáximodeumpassarinho.Essa,pensavaPenelopecomalegria(enquantomordiaamelhorbombadechocolatequejátinhaexistidoforadaFrança)comcertezaeraamaiorvantagemdasolteirice.–MeuDeus–gemeuela.Seopecadoassumisseumaformasólida,semdúvidaseriaadeumdoce.

Depreferênciafeitodechocolate.–Estábomassim,é?Penelopeseengasgoucomabombaetossiu,cuspindoumfinoborrifode

cremeconfeitado.– Colin – ofegou, rezando com todas as forças para que as migalhas

maiorestivessemdesviadodaorelhadele.–Penelope.–Eledeuumsorrisocarinhoso.–Ébomvê-la.–Igualmente.Ele se balançou nos calcanhares para a frente e para trás uma, duas,

trêsvezes,entãodisse:–Vocêestácomumaaparênciaótima.– Você também – retrucou ela, preocupada demais em encontrar um

lugarondepousarodoceparaoferecerumarespostamaiselaborada.–Bela roupa – elogiou ele, gesticulando emdireção ao vestido de seda

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verde.Eladeuumsorrisosemgraçaeexplicou:–Nãoéamarelo.–Defato,nãoé.Elesorriueogelofoiquebrado.Foiestranho,poiseradeseesperarque

ela icassesempalavrascomohomemqueamava,mashaviaalgoemColinquedeixavatodomundoàvontade.Talvez,Penelopepensaraemmaisdeumaocasião,partedomotivopelo

qual ela o amava era o fato de ele a fazer sentir-se confortável consigomesma.–EloisemecontouquevocêsedivertiubastantenoChipre–comentou

ela.Elesorriu.–ComoresistiraolocaldenascimentodeAfrodite,afinal?Penelopetambémsorriu.Obomhumordeleeracontagiante,mesmoque

a última coisa que desejasse fosse ter uma conversa sobre a deusa doamor.–Fazsempre tantosolquantodizem?–perguntou.–Não,esqueçaque

lhepergunteiisso.Dáparaperceberpeloseubronzeadoquesim.–É,eumequeimeiumpouco–concordouele,assentindocomacabeça.

–Minhamãequasedesmaiouquandomeviu.–Dealegria,imagino–dissePenelopedeformaenfática.–Elamorrede

saudadesquandovocêestáfora.Eleinclinouocorpoparaafrente.– Ora, Penelope, não vá começar você também. Minha mãe, Anthony,

EloiseeDaphnejáfazemcomqueeumesintabastanteculpado.–EBenedict,não?Elanãoconseguiuevitarogracejo.Elelhelançouumolhardivertido.–Estáviajando.–Ah,bem,issoexplicaoseusilêncio.Colinestreitouosolhosecruzouosbraços.–Vocêsemprefoiinsolente,sabia?–Eudisfarçobem–retrucouela,modesta.–Éfácilperceberporqueétãopróximadaminhairmã–comentouele,

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seco.–Issodeveriaserumelogio?– Tenho quase certeza de que colocaria minha saúde em risco se a

intençãotivessesidooutra.Enquanto Penelope nutria a esperança de pensar numa resposta

espirituosa,ouviuumbarulhoestranhodealgocaindo.Olhouparabaixoedescobriuqueumaenormebolotadecremedespencaradabombaqueelanão terminara de comer e aterrissara no imaculado chão de madeira.ErgueuavistaoutravezedeucomosolhosverdíssimosdeColin,cheiosdehumor,aindaqueelelutasseparamanterumaexpressãodeseriedade.– Nossa, que constrangedor... – disse Penelope, decidindo que a única

formadenãomorrerdevergonhaeraafirmaroóbvio.– Eu sugiro – começou Colin, erguendo uma das sobrancelhas em um

arcopetulante–quedeixemosacenadocrime.Penelopeolhouparaacarcaçavaziadabomba,aindaemsuamão.Colin

lhe respondeu acenando com a cabeça em direção a um vaso de plantapróximo.–Não!–exclamouela,arregalandoosolhos.Eleinclinouocorpoparapertodela.–Euadesafio.PenelopelançouumolhardabombaàplantaedevoltaaorostodeColin.–Eunãopoderia.–Noquedizrespeitoatravessuras,essaéatéleve.Tratava-sedeumdesa io,ePenelopecostumavaserimuneaartimanhas

infantis,maseradifícilresistiraomeiosorrisodeColin.–Muitobem–retrucouela,endireitandoosombroseenfiandoodoceno

vaso. Deu um passo para trás, examinou a obra, olhou à sua volta paraveri icarsealguémalémdeColinavia,entãoseabaixouegirouovasodemaneiradeformaqueumgalhofolhosoescondesseaevidência.–Nãoacheiquefariaumacoisadessas–brincouColin.–Comovocêmesmodisse,nãoédaspiorestravessuras.–Não,maséapalmeirapreferidademinhamãe.–Colin!–Penelopevirou-senomesmoinstante,comaintençãodeen iar

amãonomeiodaplantaerecuperarabombadechocolate.–Comopôdepermitirqueeu...Espereaí.–Elaseempertigoueobservoumelhor.–Isso

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nãoéumapalmeira.Eleeraaprópriaimagemdainocência.–Não?–Éumalaranjeiraemminiatura.Elepiscou.–Émesmo?Ela o encarou, furiosa. Ou, pelo menos, esperava parecer furiosa. Era

di ícil fazer uma expressão raivosa para Colin Bridgerton. Até mesmo amãeobservara,certavez,queeraquaseimpossívelrepreendê-lo.Eleapenassorriacomumardearrependimento,diziaalgoengraçadoe

nãodavamaisparacontinuarzangadocomele.Simplesmentenãodava.– Você estava tentando fazer com que me sentisse culpada – acusou

Penelope.–Qualquerpessoapoderiaconfundirumapalmeiracomumalaranjeira.Elacontrolouavontadederevirarosolhos.–Anãoserpelaslaranjas.Elemordeuolábioinferior,comumaexpressãopensativa.–Hum,éverdade,seriadeimaginarquefossemumindíciorevelador.–Vocêéumpéssimomentiroso,sabia?Ele endireitou o corpo e ajeitou o colete de leve enquanto erguia o

queixo.– Na verdade, sou um ótimo mentiroso. Mas sou bom mesmo em me

mostrarapropriadamenteenvergonhadoeadorávelquandopego.O que ela podia dizer depoisdaquilo? Porque sem dúvida não havia

ninguém mais adoravelmente envergonhado (ou envergonhadamenteadorável?) do que Colin Bridgerton com as mãos cruzadas para trás, osolhosvasculhandootetoeoslábiosdandoumassovioinocente.– Quando você era pequeno, alguma vez foi castigado? – quis saber

Penelope,mudandodeassuntoderepente.Colinnomesmoinstanteseempertigou,prestandoatenção.–Comodisse?–Algumavez foicastigado,quandocriança?–repetiuela.–Écastigado

hojeemdia?Ele se limitoua itá-la, imaginandoseelaporacaso tinhaalgumanoção

doqueestavalheperguntando.Eraprovávelquenão.

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–Hã...–retrucouele,emgrandepartepornãotermaisnadaadizer.Eladeixouescaparumsuspiroumpoucocondescendente.–Imagineiquenão.Sefosseumhomemmenostoleranteeaquelafossequalquerpessoaque

não Penelope Featherington, que ele sabia que não era nem um poucomaliciosa,talveztivesseseofendido.MaseleeraumsujeitomuitotranquiloeaquelaeraPenelopeFeatherington,amigalealdesuairmãsóDeussabiahá quantos anos, então, em vez de assumir uma expressão dura e cínica(que,precisavaadmitir,jamaisdominara),apenassorriuemurmurou:–Oquequerdizercomisso?–Nãoacheque tenhoa intençãodecriticarosseuspais–começouela

comar inocente e zombeteiro aomesmo tempo. –Eu jamaispensaria emsugerirquevocêfoimimado.Eleassentiu,afável.– É só que... – Ela inclinou o corpo para a frente, como se estivesse

prestesacompartilharumimportantesegredo–acreditoquevocêpoderiasesafardeumhomicídiosequisesse.Ele tossiu – não para limpar a garganta ou porque não estivesse se

sentindo bem,mas por ter icado perplexo. Penelope era uma igura tãoengraçada...Não,nãoeraexatamenteisso.Elaera...surpreendente.Sim,issopareciaresumi-la.Poucaspessoasaconheciam–semdúvidaelanãotinhaareputaçãodeserumacompanhiaagradável.Colintinhaquasecertezadeque ela resistira a festas de três horas sem jamais dizer nada além demonossílabos.Mas quando Penelope estava com alguém com quem se sentia

confortável–eColinsedeucontadequepelojeitofaziapartedessegrupo–, possuía um humor seco, um sorriso malicioso e evidências de umainteligênciaadmirável.Nãoosurpreendiaofatodeelajamaisteratraídoqualquerpretendente

sério: não era nenhuma beldade, embora, analisando-a de perto, fossemaisatraentedoqueelerecordava.Oscabeloscastanhostinhamumtoqueavermelhado, realçado pela luz tremeluzente das velas. E a pele eraencantadora – daquele tom de pêssego e creme perfeito que muitasmulheresobtinhambesuntandoorostocomarsênico.Mas os atrativos de Penelope não eram do tipo que os homens

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costumavamnotar.Eseusmodostímidoseàsvezesatémesmovacilantesnãoserviamparaexibirasuapersonalidade.Aindaassim,eraumapenaquefossetãopoucopopular.Teriasidouma

esposaperfeitamenteadequadaparaalguém.– Então, você dizia – re letiu ele, voltando a atenção ao assunto que

discutiam–queeudeveriaconsiderarumacarreiranocrime?– Não, nada do gênero – respondeu ela, com um sorriso recatado. –

Apenasqueeudescon ioquevocê conseguiriausar a sua lábiapara sairdequalquertipodesituação.–Então,deformainesperada,ela icousériaeconfessoubaixinho:–Euinvejoisso.Colinsesurpreendeuaoestenderamãoeconvidar:–PenelopeFeatherington,achoquedeveriadançarcomigo.Então,elaosurpreendeuaorireresponder:– Émuito gentil da suaparteme convidar,mas nãoprecisamais fazer

isso.Elesentiuoorgulhoestranhamenteferido.–Quediaboquerdizercomisso?Eladeudeombros.–Agoraéo icial.Eusouumasolteirona.Nãoprecisamaisdançarcomigo

sóparaqueeunãomesintaexcluída.–Nãoerapor issoqueeudançavacomvocê–protestouColin,embora

soubessequeeraesseomotivoexato.E,metade das vezes, ele a convidara apenas porque amãe o cutucara,

comforça,nascostas.Elaoolhou comcertapena, oqueo irritou, porque jamais se imaginou

sendoobjetodapiedadedePenelopeFeatherington.–Sevocêacha–falouColin,seempertigando–queeuvoupermitirque

seesquivededançarcomigoagora,sópodeestardelirando.– Não precisa dançar comigo só para provar que não se importa em

fazê-lo–garantiuela.–Euquerodançarcomvocê–retrucouele,quaserosnando.–Estábem–concordouela,apósumapausaquepareceulongademais.

–Creioqueseriarudedaminhaparterecusar.–Provavelmente foi rudeda suaparteduvidardasminhas intenções–

comentouele,dando-lheobraço–,masestoudispostoaperdoá-lasevocê

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conseguirperdoarasimesma.Elatropeçou,oqueofezsorrir.– Acho que consigo – conseguiu dizer, mesmo que em meio a um

engasgo.– Ótimo. – Ele lhe ofereceu um sorriso afável. – Eu odiaria pensar em

vocêtendoqueconvivercomaculpa.Amúsicaacabaradecomeçar,entãoPenelope lhedeuamãoe fezuma

reverência ao iniciarem o minueto. Era di ícil conversar enquantodançavam, o que deu a ela alguns instantes para recuperar o fôlego ecolocarasideiasemordem.TalveztivessesidoumpoucoduracomColin.Nãodeviaterralhadocom

eleporconvidá-laparadançarquandoaverdadeeraqueaquelasdançasestavamentreassuas lembrançasmaisqueridas. Importava,de fato,queele tivesse feito aquiloporpurapena?Teria sidopior se jamais a tivesseconvidado.Ela fez uma careta. Pior ainda: será que isso queria dizer que ela

precisavasedesculpar?–Abombadechocolatenãoestavaboa?–indagouColinquandoopasso

dedançafezcomqueseaproximassem.Dez longos segundos se passaram antes que estivessem próximos o

suficienteparaelapoderperguntar:–Oquedisse?– Você está com uma expressão de quem comeu e não gostou –

comentou ele, bem alto dessa vez, pois estava claro que perdera apaciênciadeesperarcadaaproximaçãoparaquepudessemconversar.Diversaspessoasosolharam,entãoseafastaramdiscretamente,comose

Penelopepudessepassarmalevomitarbemali,nochãodosalãodebaile.–Precisagritarissoparaomundointeiroouvir?–sibilouPenelope.–Sabe–começouele,pensativo,inclinando-senumaelegantereverência

enquantoamúsicachegavaao im–,achoqueessefoiosussurromaisaltoquejáouvinavida.Ele era insuportável, mas Penelope não ia dizê-lo porque só a faria

parecer um personagem de romance ruim. Lera um apenas alguns diasantesnoqual aheroínausavaessapalavra (ouumde seus sinônimos) acadaduaspáginas.

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–Obrigadapeladança–falouela,aosaíremdapistadebaile.Quase acrescentou:Agora pode dizer à sua mãe que cumpriu sua

obrigação,maslogorefreouoimpulso.Colinnão izeranadaparamerecertanto sarcasmo. Não era culpado do fato de os homens só a convidarempara dançar quando eram forçados pelas mães. Pelo menos ele sempresorrira e fora agradável enquanto cumpria o seu dever, o que era bemmaisdoquesepodiadizersobreorestodapopulaçãomasculina.Ele assentiu educadamente e murmurou um agradecimento. Estavam

prestesasesepararquandoouviramumavozfeminina:–Sr.Bridgerton!Ambos icaram paralisados. Era uma voz que os dois conheciam. Que

todosconheciam.–Salve-me–gemeuColin.PenelopeolhouporcimadoombroeviuainfameLadyDanburyabrindo

caminhoemmeioaosconvidados,queiamfazendocaretasdedorcadavezque sua onipresente bengala aterrissava sobre o pé de algumamocinhainfeliz.– Quem sabe ela esteja se referindo a outro Sr. Bridgerton? – sugeriu

Penelope.–Háváriosdevocêspresentes,afinal,eépossível...–Eulhedoudezlibrasparanãosairdomeulado–sugeriuColin.Penelopeseengasgoucomoar.–Nãosejatolo,eu...–Vinte.–Feito!–concordouelacomumsorriso,nãoporqueprecisassedaquela

quantia,masporserestranhamentedivertidoextorquirdinheirodeColin.–LadyDanbury!–chamou,correndoparaoladodavelhasenhora.–Queprazeremvê-la.–Ninguémjamaisachaqueéumprazermever–retrucoueladeforma

brusca –, a não ser, talvez, pelo meu sobrinho, e metade das vezes nãoestoubemcertadisso.Masobrigadapormentir.Colin não disse nada,mas ela se virou em sua direção e bateu em sua

pernacomabengala.– Fez bem em escolher essa aqui para dançar – comentou. – Sempre

gosteidela.Émaisinteligentedoqueorestantedafamíliatodojunto.Penelope abriu a boca para defender ao menos a irmã mais nova

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quandoLadyDanburylatiu:–Rá!–Depoisdeumapausademenosdeumsegundo,acrescentou:–

Noteiquenenhumdosdoismecontradisse.–Ésempreumdeleitevê-la,LadyDanbury–comentouColin,dando-lhe

otipodesorrisoquetalveztivesseoferecidoaumacantoradeópera.– Muito eloquente, este rapaz – disse Lady Danbury para Penelope. –

Cuidadocomele.–Issoquasenuncaénecessário–retorquiuPenelope–,poiselepassaa

maiorpartedotempoforadopaís.–Viusó?–comemorouLadyDanbury.–Eudissequeelaeraesperta.–Notequeeunãoacontradisse–retrucouColin,habilmente.Avelhasenhorasorriuemaprovação.–Não,mesmo.Osenhorestáficandoespertonavelhice,Sr.Bridgerton.–Jáfoiditoqueeupossuíaalgumainteligêncianajuventude,também.–Humpf.Apalavramaisimportantedafrasesendoalguma,éclaro.Colin itouPenelopepelosolhosestreitados.Elapareciasesegurarpara

nãorir.– Nós, mulheres, precisamos cuidar umas das outras – declarou Lady

Danburyaninguémemespecial–, jáqueestámuitoclaroqueninguémofarápornós.Colindecidiuqueera,definitivamente,horadepartir.–Achoqueviminhamãe–comentou.–É impossívelescapar–avisouLadyDanbury.–Nemsedêotrabalho.

Alémdomais,euseiquevocênãoviusuamãecoisíssimaalguma.Elaestáajudandoumadesmioladaque rasgouabainhadovestido. –Ela seviroupara Penelope, que se esforçava tanto para controlar o riso que os olhosbrilhavamcomlágrimasnãovertidas.–Quantofoiqueelelhepagouparanãodeixá-loasóscomigo?Penelopesimplesmenteexplodiu.–Como?–arfouela,tapandoabocacomamão,horrorizada.–Não,não,podefalar–autorizouColin,muitoexpansivo–,vocêjámefoi

tãoútilmesmo...–Nãoprecisamedarasvintelibras–disseela.–Eunãoiamesmolhedar.–Apenasvintelibras?–indagouLadyDanbury.–Humpf.Imagineivaler

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pelomenos25.Colindeudeombros.–Souoterceirofilho.Nãotenhomuitodinheiro,sintoinformar.– Ora! Os seus bolsos vivem sempre tão recheados quanto os de três

condes, nomínimo – a irmou Lady Danbury. – Bem, talvez não condes –acrescentou, depois de pensar um pouco. – Mas alguns viscondes e amaioriadosbarões,semdúvida.Colindeuumsorrisoafável.– Não é considerado indelicado falar sobre dinheiro na companhia de

damas?Lady Danbury deixou escapar um som que podia ser tanto uma

respiração asmática quanto uma risada – Colin icou sem saber qual –,entãoretrucou:– É sempre indelicado perguntar sobre dinheiro, quer estejamos na

companhia de damas ou de cavalheiros, mas, quando se tem a minhaidade,pode-sefazerquasetudooquesequer.– Eu me pergunto o que uma pessoanão pode fazer na sua idade –

refletiuPenelope.LadyDanburyvirou-separaela.–Comodisse?–Asenhoracomentouquesepodefazerquasetudooquesequer.LadyDanburya itou,incrédula,depoissorriu.Colinsedeucontadeque

tambémsorria.– Gosto dela – observou a velha senhora dirigindo-se a ele, apontando

para Penelope como se fosse alguma espécie de estátua à venda. – Eu jálhefaleiquegostodela?–Creioquesim–murmurouele.Lady Danbury virou-se para Penelope e a irmou, com a expressão

bastanteséria:–Creioquenãoseria capazdeevitaras consequências casocometesse

umhomicídio,masétudo.No mesmo instante, tanto Penelope quando Colin explodiram em

ruidosasgargalhadas.–Oquefoi?–indagouLadyDanbury.–Oquehádetãoengraçado?–Nada–arfouPenelope.

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JáColinnãoconseguiadizernemisso.–Temqueseralgumacoisa–insistiuLadyDanbury.–Evou icaraquie

azucrinarosdoisanoitetodaatémecontaremoquefoi.Podemacreditarquandolhesdigoquenãoéoseumelhorplanodeação.Penelopesecouaslágrimas.–Équeeuacabodedizer–começouaexplicar,acenandocomacabeça

nadireçãodeColin –que eleprovavelmente conseguiriamatar alguémesesafar.– Foi mesmo? – Lady Danbury re letiu sobre aquilo, batendo com a

bengalanochãodeleve,damesmaformaqueoutrapessoatalvezcoçasseo queixo ao pensar sobre uma questão de grande profundidade. – Achoquetalvezestejacerta.AchoqueLondresnuncaconheceuumhomemtãoencantador.Colinergueuumadassobrancelhas.–Porque tenhoa impressãodequea senhoranãodiz issoem tomde

elogio,LadyDanbury?–Maséclaroqueéumelogio,seucabeçadevento.ColinsevirouparaPenelope–Aocontráriodisso,quefoi,semdúvida,umelogio.LadyDanburyestavaradiante.– Preciso admitir – comentou (na verdade,garantiu com veemência) –

quenãomedivirtotantoassimdesdeoiníciodatemporada.–Éumprazerservi-la–disseColin,comumsorrisosincero.–Esteanotemsidoespecialmentesemgraça,nãoacha?–perguntouela

aPenelope.Ajovemassentiu.–Oanopassadotambémfoiumpoucoentediante–completou.–Masnãotantoquantoeste–insistiuLadyDanbury.– Não perguntem minha opinião – disse Colin com amabilidade. – Eu

estavafora.– Humpf. Suponho que vá a irmar que a sua ausência é omotivo pelo

qualestivemos,todos,tãoenfadados.– Eu nem sonharia com uma coisa dessas – respondeu Colin, com um

sorriso desconcertante. – Mas sem dúvida, se a ideia lhe passou pelacabeça,deveteralgummérito.

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–Humpf.Sejaqualforocaso,estouentediada.ColinolhouparaPenelope,quepareciamuitoquieta–presumivelmente

prendendooriso.–Haywood!–gritouLadyDanburyde repente, acenandoparaqueum

cavalheirodemeia-idadeseaproximasse.–Nãoconcordacomigo?Umavaga expressãodepânico atravessouo rostode lordeHaywood e

então,quandoficouclaroquenãotinhacomoescapar,eledisse:–Eutenho,comoplanodeação,sempreconcordarcomasenhora.LadyDanburyvirou-separaPenelopeeperguntou:–Andoimaginandocoisasouoshomensestãoficandomaissensatos?AúnicarespostadePenelopefoiumdescompromissadodardeombros.

Colindecidiuqueelaera,defato,umamoçamuitosábia.Haywood,comseurostocarnudoeseusolhosazuis,pigarreouepiscou

semparar.–Hã...Comoqueestouconcordando,exatamente?– Com o fato de que esta temporada está monótona – respondeu

Penelope,solícita.–Ah,Srta.Featherington–comentouHaywood,comcertogracejonavoz.

–Eunãoaviaí.Colin a olhou de soslaio apenas o su iciente para perceber seus lábios

formaremumpequenosorrisodefrustração.–Bemaqui,aoseulado–murmurouela.– Claro, claro – retrucou Hayword, de maneira jovial. – E, sim, a

temporadaestásendoterrivelmenteenfadonha.–Alguémdissequeatemporadaestáchata?Colinolhouparaadireita.Outrohomemeduas senhorasacabavamde

sejuntaraogrupoeconcordavamdeformaveemente.–Umtédio–disseumdosintegrantesdotrio.–Umtédiocompleto.– Eununca frequentei festas tão banais – anunciou umadas senhoras,

comumsuspiroafetado.–Tereiqueinformarofatoàminhamãe–comentouColin,lacônico.Estavaentreosmaisserenosdoshomens,masalgunsinsultosnãodava

paradeixarpassar.– Ah, não esta – apressou-se em acrescentar a mulher. – Na verdade,

este baile é o único raio de luz numa série de eventos escuros e

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desoladores.Inclusive,euacabavadedizera...– Pare agora – ordenou Lady Danbury –, antes que engasgue com o

próprioveneno.Amulherobedeceunomesmoinstante.–Éestranho–murmurouPenelope.–Ah,Srta.Featherington–comentouamulherqueacabavadediscursar

sobreeventosescurosedesoladores.–Eunãoatinhavistoaí.–Oqueéestranho?–perguntouColin,antesquemaisalguémdissessea

Penelopecomoaachavapoucointeressante.Elalhelançouumpequenosorrisodegratidãoantesdeseexplicar:–Éestranhoqueasociedadepareçasedivertirobservandocomoanda

sedivertindopouco.–Como?–indagouHaywood,parecendoconfuso.Penelopedeudeombros.–Acreditoquevocêstodosestejamsedivertindobastanteaofalarsobre

quãoentediadosestão,sóisso.Seucomentáriofoirecebidocomsilêncio.LordeHaywoodcontinuouase

mostrar confuso e uma das senhoras parecia ter um grão de poeira noolho,poisnãoconseguiafazermaisnadaalémdepiscar.Colin não pôde evitar um sorriso. Não imaginara que a a irmação de

Penelopefosseumconceitotãocomplicadoassimdeseentender.– A única coisa interessante a se fazer é ler a coluna de Lady

Whistledown–observouaoutrasenhora,comosePenelopejamaistivessesepronunciado.Ocavalheiroaseuladomurmurousuaconcordância.Então,LadyDanburycomeçouasorrir.Colinficoualarmado.Avelhasenhoraestavacomumaraterrorizante.–Tiveumaideia–disseela.Alguémabafouumgrito.Outrapessoagemeu.–Umaideiabrilhante–continuou.–Nãoquesuasideiasnãosejamtodasbrilhantes–murmurouColinem

suavozmaisafável.LadyDanburyocaloucomumacenodemão.–Quantosgrandesmistériosexistemnestavida?Comoninguémrespondeu,Colinfezumatentativa:

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–Quarentaedois?Elanemsedeuotrabalhodefuzilá-locomosolhos.–Eulhesdigo,aquieagora...Todos inclinaram-separaa frente.AtémesmoColin.Era impossívelnão

compartilhardodramadomomento.–Vocêssãominhastestemunhas...ColinachouterouvidoPenelopemurmuraralgocomo“Vamos logocom

isso”.–Millibras–declarouLadyDanbury.Amultidãoqueacercavacomeçouacrescer.–Millibras–repetiuela,avoz icandomaisalta.Realmente,elatinhaum

talentoinatoparaopalco.–Millibras.Pareciaqueosalãodebaileinteiromergulharanumsilêncioreverente.–ParaapessoaquedesmascararLadyWhistledown!

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CAPÍTULO3

Esta autora estaria sendo negligente se não mencionasse que omomentomais comentadoda festadeaniversáriodeontemànoite,naCasaBridgerton, não foi o estimulantebrindeaLadyBridgerton(cujaidadenãohaverádeserrevelada),masaimpertinenteofertadeLadyDanburydemillibrasparaquemdesmascarar...Amim.Façamo seumelhor, senhoras e senhores da alta sociedade. Vocês

nãotêmamenorchancedesolucionarestemistério.

C

Foram necessários exatamente três minutos para que a notícia doescandaloso desa io de Lady Danbury se espalhasse pelo salão de baile.Penelopesabiaqueeraverdadeporque,poracaso,estavade frenteparaum imenso (e, segundo Kate Bridgerton, bastante preciso) relógio de péquando a senhora fez o anúncio. Nomomento emque ela pronunciou aspalavras “Mil libras para a pessoa que desmascarar LadyWhistledown”,ele marcava 22h44. O ponteiro dos minutos não avançara além de 47quandoNigelBerbrooketropeçoudeencontroaumcírculocadavezmaiorde pessoas que cercava Lady Danbury e elogiou a proposta dela: “Umsuculentodivertimento!”E se Nigel tinha ouvido a respeito, signi icava que todo mundo tinha,

porque o cunhado de Penelope não era conhecido pela inteligência,concentraçãooucapacidadedeouviroutrapessoa.Tampouco,pensouPenelope,comsarcasmo,pelariquezadevocabulário.

“Suculento”,francamente.– E quem você acha que vem a ser Lady Whistledown? – perguntou

LadyDanburyaele.–Nãotenhoamenorideia–admitiuohomem.–Euéquenãosou,ésóo

quesei!

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–Issoeuachoquetodosnóssabemos–replicouLadyDanbury.–Equemvocêachaqueé?–indagouPenelopeaColin.Eledeudeombros.–TenhopassadotempodemaisforadeLondresparaespecular.–Nãosejatolo–reclamouPenelope.–Ototaldotempoquevocêpassou

na cidade sem dúvida inclui festas e confusões o bastante para formularalgumasteorias.Maseleselimitouabalançaracabeça.–Eurealmentenãosaberiadizer.Penelope o encaroupor um instante amais do que o necessário oudo

que seria aceitável aos olhos da sociedade. Havia algo de estranho naexpressão de Colin. Algo de efêmero e evasivo. A alta sociedade comfrequência o via apenas como um homem encantador e sem grandespreocupações, nada mais, porém ele era muito mais inteligente do quedeixava transparecer e ela apostaria a vida se ele não tinha as suassuspeitas.Poralgummotivo,noentanto,nãoestavadispostoacompartilhá-lascom

ela.– E quemvocê acha que é? – quis saber Colin, esquivando-se da

pergunta dela. – Você frequenta os eventos da sociedade há quase tantotempoquantoLadyWhistledown.Semdúvidadeveterpensadoarespeito.Penelope relanceou o salão de baile à sua volta, detendo-se por um

instante a mais em uma ou outra pessoa antes de retornar o olhar àpequenamultidãoqueseformaraaseuredor.–EuachoquepoderiamuitobemserLadyDanbury–respondeu.–Não

seriaumapeçabrilhanteasepregaremtodos?Colin itou a velha senhora, que se divertia bastante discutindo o seu

mais recente projeto. Batia a bengala no chão, tagarelava cheia deentusiasmoesorriacomoumagatafelizcomumpeixeinteirinhonaboca.–Fazsentido–disseele,pensativo–,deumaformaumtantoperversa.Penelopesentiuoscantosdabocaseretorcerem.–Perversaéexatamenteoqueelaé.Colin observar Lady Danbury durante mais alguns segundos e depois

faloubaixinho:–Sóquevocênãoacreditaquesejaela.

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Ele virou a cabeça devagar para encará-la, erguendo uma dassobrancelhasnumaperguntasilenciosa.–Dáparaperceberpelasuaexpressão–explicouPenelope.Ele ofereceu-lhe aquele sorriso aberto e fácil que dava com tanta

frequência.–Eeu,aqui,pensandoserinescrutável.– Sintomuito em lhe informar que não é – retrucou ela. – Pelomenos,

nãoparamim.Colindeixouescaparumsuspiro.– Acho que jamais será meu destino ser um herói misterioso e

meditativo.– Talvez você ainda se veja no papel de herói de alguém – concedeu

Penelope.–Aindaháesperança.Masmisteriosoemeditativo?–Elasorriu.–Poucoprovável.–Quepenaparamim–comentouele,comvivacidade,dandomaisumde

seus famosos sorrisos, desta vez do tipo enviesado e infantil. – São osmisteriososemeditativosqueganhamtodasasmulheres.Penelope tossiu discretamente, um pouco surpresa por ele estar

discutindo aquele assunto com ela, sem falar do fato de Colin Bridgertonjamaistertidoqualquerdificuldadeematrairasmulheres.Elecontinuavasorrindoparaela,esperandoumaresposta,eelatentava

decidir se a reação correta seria o polido ultraje de uma dama ou umagargalhada e uma risadinha que signi icassemeu sou muito espirituosa,nãoémesmo?,quandoEloiseapareceucorrendoeparounafrentedeles.–Vocêssouberamdanovidade?–perguntouela,semfôlego.–Vocêestavacorrendo?–retrucouPenelope.Eraumfeitoetantonumsalãodebailetãoabarrotado.– Lady Danbury ofereceu mil libras para quem desmascarar Lady

Whistledown!– Nós sabemos – disse Colin, naquele tom de ligeira superioridade

exclusivodosirmãosmaisvelhos.Eloisesuspirou,desapontada.–Sabem?ColingesticulouemdireçãoaLadyDanbury, aindaapoucosmetrosde

distância.

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–Estávamosbemaquiquandotudoaconteceu.Eloise fez uma expressão irritada e Penelope soube exatamente o que

elaestavapensando(equecomcertezacontariaaelanatardeseguinte).Umacoisaeraperderummomentoimportante.Outraeradescobrirqueoirmãohaviaassistidoatudo.– Bem, as pessoas já estão comentando – prosseguiu Eloise. – Estão

arrebatadas,naverdade.Háanosnãovejotamanhaexcitaçãocoletiva.ColinsevirouparaPenelopeemurmurou:–Éporissoquesaiodopaíscomtantafrequência.Penelopetentounãosorrir.– Eu sei que você está falando demim e nãome importo – continuou

Eloise, mal parando para respirar. – Mas me escutem: a sociedadeenlouqueceu. Todos, todosmesmo, estão especulando sobre a identidadedela,emboraosmaisespertos iquemquietos.Nãoqueremqueosoutrosganhemàcustadeseuspalpites,éclaro.– Acho que não estou tão necessitado de mil libras para me importar

tantoassimcomisso–anunciouColin.–Émuitodinheiro–comentouPenelope,pensativa.Elesevirouparaela,incrédulo.–Nãomedigaquevaiparticipardessejogoridículo.Ela inclinou a cabeça para o lado e ergueu o queixo num gesto que

esperavaserenigmático–ou,senãoenigmático,aomenosumpouquinhomisterioso.– Não tenho tanto dinheiro que possa ignorar a oferta de mil libras –

observou.–Talvez,senosunirmos...–sugeriuEloise.–Salve-me,meubomDeus–retrucouColin.Eloiseoignorouesedirigiuàamiga:–...poderíamosdividirodinheiro.Penelope ia abrindo a bocapara responderquando a bengala de Lady

Danbury surgiu de súbito em seu campo de visão, agitando-sealucinadamente no ar. Colin teve que dar umpasso rápido para o lado afimdenãoteraorelhadecepada.–Srta.Featherington!–ribombouavelhasenhora.–Aindanãomedisse

dequemsuspeita.

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– Não, Penelope – provocou Colin, com um sorriso bastante afetado –,nãodissemesmo.O primeiro instinto dela foi resmungar algo inaudível e esperar que a

idadedeLadyDanburyativessedeixadosurdaobastanteparasuporquequalquer falta de compreensão fosse culpa dos próprios ouvidos, não dePenelope.Masmesmo sem olhar para o lado podia sentir a presença deColin,comseusorrisosagazeatrevidoaatiçá-la,eseempertigoumaisumpouco,levantandooqueixomaisdoquedecostume.Eleatornavamaiscon iante,maisaudaciosa,mais...elamesma.Ou,pelo

menos,aversãodelamesmaquedesejavapoderser.–Naverdade–dissePenelope, itandoLadyDanburyquasenosolhos–,

euachoqueéasenhora.Umarquejocoletivoecoouàsuavolta.Pelaprimeiraveznavida,PenelopeFeatheringtonseviubemnocentro

dasatenções.LadyDanburyaencaroucomosolhosazul-clarosastutoseavaliadores.

Então,acoisamaisimpressionanteaconteceu:oslábiosdelacomeçaramatremernoscantos.Emseguida,foramseabrindoatéPenelopesedarcontadequeosorrisonãoparavadecrescer.– Eu gosto de você, Penelope Featherington – a irmou a senhora,

batendocomabengalabemnapontadopédela.–Apostoquemetadedaspessoas neste salão pensa a mesma coisa, embora ninguém tenha acoragemnecessáriaparamedizer.–Naverdade, eu tambémnão tenho– admitiuPenelope, grunhindode

leveenquantoColinlhedavaumacotoveladanascostelas.–É claroque tem–a irmouLadyDanbury comumbrilhoestranhono

olhar.Penelopenãosoubeoqueresponder.OlhouparaColin,quelhesorriade

forma encorajadora, depois olhou outra vez para Lady Danbury, que lhepareceuquase...maternal.Oqueeraacoisamaisestranhadetodas.Penelopeduvidavamuitoque

Lady Danbury já tivesse olhado para os próprios ilhos com expressãomaternal.– Não é ótimo descobrirmos que não somos exatamente o que

pensávamosser?–disseavelhasenhora,aproximando-sedePenelopede

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maneiraquesóelapudesseouvirassuaspalavras.Entãoelaseafastou,deixandoa jovemaseperguntarse talvezelanão

fosseexatamenteoquepensavaser.Talvez–sótalvez–fosseumpouquinhomais.

O dia seguinte era uma segunda-feira, o que signi icava que Penelopedeveria tomar chá com as mulheres da família Bridgerton no NúmeroCinco. Não sabia ao certo quando dera início a esse hábito,mas o seguiahavia quase uma década e, se não aparecesse naquela tarde, imaginavaqueLadyBridgertonmandariaalguémbuscá-la.Penelope gostavamuitodo costumedasBridgertonsde tomar chá com

biscoitos naquele horário. Não se tratava de um hábito comum. Naverdade, Penelope não conhecia ninguém que izesse isso todos os dias.Mas Lady Bridgerton dizia que não conseguia se sustentar só com oalmoço, sobretudo quando se seguiam os horários da cidade, segundo osquaisojantareraservidobemtarde.Assim,todasastardes,àsquatro,ela,osfilhosqueestivessempresentese,comfrequência,umoudoisamigossejuntavamnasaladevisitasdosegundoandarparaumlanche.Choviadeleve,emboraodiaestivesseumpoucoquente,entãoPenelope

levouo guarda-chuvapretopara a curta caminhada até oNúmeroCinco.Era um caminho que já izera centenas de vezes: passava por algumascasas até a esquina da Mount com a Rua Davies, depois pela PraçaBerkeley e continuava até a Rua Bruton. Mas naquele dia estavadespreocupada, com um humor talvez até um pouco infantil, e decidiuatravessarapartenortedogramadodaPraçaBerkeleyapenasporgostardobarulhoqueasbotasfaziamnagramamolhada.A culpa era de Lady Danbury. Só podia ser. Ela andava com o humor

instáveldesdeaconversadanoiteanterior.– Não sou o que eu pensava ser – cantarolava para si mesma,

acrescentando uma nova palavra cada vez que as solas dos sapatosafundavamnaterra.–Algomais.Algomais.Chegouaumtrechoespecialmenteencharcadoepassouaandarsobrea

grama como se estivesse patinando, cantando (baixinho, é claro – não

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haviamudado tanto assim desde a noite anterior a ponto de querer quealguémaouvissecantarempúblico)enquantodeslizavaparaafrente:–Algomaaaaais.E foi, é claro (já que ela possuía, pelo menos em sua opinião, o pior

timingdahistóriadacivilização),bemnessemomentoqueouviuumavozmasculinachamaroseunome.Parou de repente e deu graças a Deus por conseguir recuperar o

equilíbrio no último instante antes que desabasse com o traseiro nogramadoencharcado.Éclaroquesópodiaserele.– Colin! – exclamou, meio envergonhada, permanecendo parada

enquantoeleseaproximava.–Quesurpresa.Elepareciaprenderoriso.–Estavadançando?–Dançando?–ecoouela.–Vocêpareciaestardançando.–Ah.Não.–Elaengoliuemseco,culpada,porque,emboranãoestivesse

mentindo,tecnicamente,tinhaasensaçãodeestar.–Éclaroquenão.Colinestreitouumpoucoosolhos.– Que pena. Eu me sentiria forçado a acompanhá-la. Nunca dancei na

PraçaBerkeley.Se ele tivesse lhe dito amesma coisa alguns dias antes, Penelope teria

ridoedeixadoqueele fosseoespirituoso,oencantadordosdois.Maseladeve ter ouvido a voz de Lady Danbury outra vez em algum lugar damemória, porque, de repente, decidiu que não queria ser a mesmaPenelopeFeatheringtondesempre.Decidiuparticipardabrincadeira.Abriu um sorriso de que nem se achava capaz, um do tipo travesso e

misterioso, e ela sabia que não estava imaginando coisas porque Colinarregaloubastanteosolhosquandoelamurmurou:–Quepena.Émuitodivertido.– Penelope Featherington – disse ele, arrastando cada sílaba. – Pensei

quetinhaditoquenãoestavadançando.Eladeudeombros.–Eumenti.

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–Nessecaso,queroteroprazerdeconduzi-la.De repente, Penelope se sentiu ridícula. Era por isso que não devia

permitir que os sussurros de Lady Danbury lhe subissem à cabeça. Atéconseguia ser audaz e sedutora por um curto período, mas não tinha amenorideiadecomosustentaressaimagem.Ao contrário de Colin, obviamente, que tinha um sorriso diabólico nos

lábioseosbraçosestendidosnumaperfeitaposedevalsa.–Colin–arfouela–,estamosnaPraçaBerkeley!–Eusei.Acabeidelhedizerqueeununcadanceiaqui,seesqueceu?–Mas...Colincruzouosbraços.– Tsc, tsc. Não pode lançar um desa io como este para depois se

esquivar. Além domais, dançar aquime parece o tipo de coisa que umapessoadevafazerpelomenosumaveznavida,nãoacha?–Alguémpoderiaver–sussurrouela,comdesespero.Ele deu de ombros, tentando esconder que estava se divertindo com a

reaçãodela.–Eunãomeimporto.Evocê?As faces dela icaram rosadas e, ao que pareceu, ela precisou de um

grandeesforçoparapronunciaraspalavras:–Aspessoasvãoacharquevocêestámecortejando.Ele a observou com atenção, sem compreender por que ela estava tão

perturbada.Quemseimportavacomofatodeaspessoasacharemqueelea estava cortejando? O boato logo se provaria falso e eles dariam boasrisadas à custa da sociedade. Estava prestes a dizer “Que se dane asociedade”, mas icou em silêncio. Havia algo pairando nas profundezasdaqueles olhos castanhos, uma emoção que ele não podia nem mesmocomeçaraidentificar.Umaemoçãoqueelesuspeitavajamaisterexperimentado.Então, Colin se deu conta de que a última coisa que queria fazer era

magoarPenelope.Elaeraamelhoramigadesuairmãe,alémdomais,era,puraesimplesmente,umameninamuitoamável.Ele fez uma careta. Supunha que não deviamais chamá-la demenina.

Aos28anos,elajátinhapassadodessafase,assimcomoele,aos33.Por im, de forma bastante cuidadosa e com uma boa dose de

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sensibilidade,Colinperguntou:– Há algum motivo pelo qual devamos nos preocupar se as pessoas

acharemqueeuaestoucortejando?Penelope fechouosolhose,porum instante,Colinachouqueela talvez

estivessesofrendo.Quandoosabriu,seuolhareraquaseagridoce.–Naverdade,seriamuitoengraçado–falou.–Aprincípio.Eleficouemsilêncio,esperandoqueelacontinuasse.– Por im, se tornaria óbvio que não é verdade e icaria... – Ela parou,

engoliuemseco,eColin sedeucontadequeelanãoestava tão tranquilaquanto queria transparecer – ... icaria subentendido que foi você queterminoutudo,porque...bem,simplesmenteficaria.Elenãodiscutiu.Sabiaquesuaspalavraseramverdadeiras.Penelopedeuumsuspirotriste.– Eu não quero me sujeitar a isso. Até mesmo Lady Whistledown

escreveria a respeito. E como haveria de não escrever? Seria um boatodeliciosodemaisparaqueelaresistisse.–Peçodesculpas,Penelope–disseColin.Nãosabiaaocertoporquesedesculpava,mas,aindaassim,lhepareceu

acoisacertaafazer.Eladeuumacenobrevecomacabeça,assentindo.–Euseiquenãodeveriameimportarcomoqueosoutrospensam,mas

meimporto.Eleseafastouumpoucodelaenquantopesavasuaspalavras.Outalvez

estivessepesandooseutomdevoz.Ou,quemsabe,ambos.Colin semprepensaraqueestivesseacimada sociedade.Não foradela,

vistoquefrequentavaasfestasecostumavasedivertirbastantenelas.Massempre partira do princípio de que a sua felicidade não dependia daopiniãodosoutros.Noentanto, talveznãoestivessepensandonoassuntoda formacorreta.

É fácil achar que não nos importamos com a opinião dos outros quandoelasnossãosemprefavoráveis.Seráqueeleignorariacomtantafacilidadeoqueosmembrosdasociedadeachavamseeleso tratassemdamaneiracomotratavamPenelope?Ela nunca fora vítima de ostracismo, jamais fora sujeitada a algum

escândalo.Apenasnãoera...popular.

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Sim, as pessoas a tratavam com educação e os Bridgertons a haviamacolhido,masamaiorpartedas recordaçõesqueColin tinhadePenelopeeram de sua igura nasmargens dos salões de baile, tentando não olharparaoscasaisquedançavam,claramente ingindoquenãodesejavaestaremseulugar.Emgeraleranessemomentoqueelemesmoseaproximavaeaconvidava.Elasempre lhepareciagratapelopedido,mastambémumpouco envergonhada, porque os dois sabiam que ele o fazia, pelomenosemparte,porsentirumpoucodepena.Colintentousecolocarnolugardela.Nãoerafácil.Elesemprehaviasido

popular.Naescola,osamigosoviamcomoummodeloa ser seguidoeasmulheresseaglomeraramàsuavoltaquandoeleingressaranasociedade.E, pormais que ele dissesse que não se importava com o que os outrospensavam,nofinaldascontas...Gostavamuitodeseradmirado.Derepente,nãosabiaoquedizer,oqueeraestranho,porqueelesempre

sabia o que dizer.Na verdade, era até umpouco famoso por isso. Talvezessafosseumadasrazõespelasquaisgostavamtantodele,refletiu.TeveasensaçãodequeossentimentosdePenelopedependiamdesuas

próximas palavras e, em algum momento dos últimos dez minutos, ossentimentosdelahaviamadquiridograndeimportânciaparaele.–Você temrazão–respondeu,por im,decidindoqueerasempreuma

boaideiadizeraumapessoaqueelaestavacerta.–Foimuitoinsensíveldaminhaparte.Quetalcomeçarmosdenovo?Elapiscou,aturdida.–Como?Elefezumgestolargo,comoseissopudesseexplicartudo.–Começardozero.Ela lhe pareceu adorável e confusa, o que o confundiu, porque jamais

acharaPenelopeadorável.–Masnosconhecemoshádozeanos–observouela.– Faz mesmo tanto tempo? – Ele vasculhou a memória, mas não

conseguiarecordaraprimeiravezqueosdoisseencontraram.–Issonãoimporta.Euquisdizerapenasporestatarde,suaboba.Elaconseguiusorrir,apesardoquesentia,eelesoubequechamá-lade

boba fora a coisa certa a fazer, embora não tivesse a menor ideia do

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porquê.– Então, lá vamos nós – começou ele, alongando as palavras enquanto

fazia um imenso loreio dos braços. – Você está passando pela PraçaBerkeleyemevêaolonge.Euachamoevocêrespondedizendo...Penelope mordeu o lábio inferior, tentando, por algum motivo

desconhecido,conterosorriso.SobqueestrelamágicanasceraColin,parasempre saber o que dizer? Ele parecia o lautista mágico, deixandocorações felizes e rostos sorridentes por ondepassava. Penelopepoderiaapostar bemmais do que asmil libras que LadyDanbury oferecera quenão era a única mulher em Londres perdidamente apaixonada peloterceirodosirmãosBridgertons.Eleinclinouacabeçaparaumladoe,emseguida,ergueu-anumgestode

encorajamento.– Eu respondo dizendo... – repetiu Penelope, devagar. – Respondo

dizendo...Colinaguardoudoissegundos,entãofalou:–Sério,quaisquerpalavrasservem.Penelope planejara cravar um sorriso luminoso nos lábios, mas

descobriuquejáestavasorrindo,equeogestoeraverdadeiro.–Colin!–exclamou, ingindoestarsurpresacomasuachegada.–Oque

estáfazendoaqui?–Excelenteresposta–elogiouele.Elabalançouodedoemsuadireção.–Estásaindodopersonagem.–Sim,sim,éclaro,medesculpe.–Elefezumapausa,piscouduasvezese

disse: – Pronto. Que tal isto: o mesmo que você, eu imagino. Indo aoNúmeroCincoparaochá.Penelopeentrounoritmodaconversa:–Dojeitoquefalou,parecequeésóumavisita.Nãomoramaislá?Elefezumacareta.–Esperoqueemumasemanaouduas,nomáximo,nãomoremais.Estou

procurando outro lugar. Tive que abrir mão do meu antigo alojamentoquandopartiparaoChipree aindanãoencontreiumsubstitutoà altura.Tinha assuntos para resolver em Piccadilly e senti vontade de voltarcaminhando.

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–Nachuva?Eledeudeombros.– Não estava chovendo quando saí hoje de manhã. E, agora, é só um

chuvisco.Sóumchuvisco,pensouPenelope.Chuviscoquegrudavanaquelescílios

obscenamente longos, que emolduravam olhos de um verde tão perfeitoqueinspiraramaisdeumajovemafazer(péssima)poesiasobreeles.Atémesmo Penelope, ajuizada como gostava de pensar ser, passara muitasnoitesnacama,fitandooteto,semvernadaalémdaquelesolhos.Sóumchuvisco,defato.–Penelope?Elaacordoudeseudevaneio.– Certo. Também estou indo tomar chá com a suamãe. Faço isso toda

segunda-feira. E, com frequência, em outros dias também – admitiu. –Quando não... hã... quando não há nada de interessante acontecendo naminhacasa.– Não precisa icar tão culpada a respeito disso. Minha mãe é uma

mulherencantadora.Sequerquevocêvátomarchácomela,deveir.Penelopetinhaopéssimohábitodetentarlernasentrelinhasdoqueas

pessoasdiziameachavaqueoqueColinqueriadizer,naverdade,eraquenão a culpava se o que ela desejava era fugir da própriamãede vez emquando.Oque,dealgumaforma,afezsentir-setriste.Ele icousebalançandosobreoscalcanharesporalgunsinstantes,então

disse:–Bem,eunãodeveriamantê-laaquinachuva.Ela sorriu, porque já estavam ali ao ar livre havia pelo menos quinze

minutos. Ainda assim, se ele tivesse desejado dar continuidade àbrincadeira,elateriafeitoomesmo.–Quemestásegurandooguarda-chuvasoueu–observou.Elesorriu.–Issoéverdade.Maseunãoseriamuitocavalheirosenãoaconduzisse

aumambientemaishospitaleiro.Efalandonisso...Elefranziuatesta,olhandoàsuavolta.–Falandoemquê?–Emsercavalheiro.Acreditoquesejanossaresponsabilidadecuidardo

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bem-estardassenhoras.–E...?Elecruzouosbraços.–Vocênãodeveriaestarcomumadamadecompanhia?–Eumoronomesmoquarteirão,dobrandoaesquina–retrucouela,um

pouco desapontada por ele não se lembrar disso. Ela e a irmã eram asmelhores amigas de duas de suas irmãs, a inal. Ele até a levara em casaalgumas vezes. – Na Rua Mount – acrescentou, quando a testa franzidadelenãovoltouaonormal.Ele estreitou um pouco os olhos em direção à Rua Mount, embora

Penelope não tivesse a menor ideia do que ele esperava conseguir comisso.–Ora, pelo amordeDeus, Colin. Fica quasena esquina daRuaDavies.

Ficaacincominutos,nomáximo,dacasadesuamãe.Quatroseeuandarrápido.–Eusóestavavendosehavialocaisescurosourecuadosnarua.–Elese

virouparaencará-la.–Ondeumcriminosotalvezpudesseficaràespreita.–EmMayfair?– Em Mayfair – repetiu ele, soturno. – Eu realmente acho que você

deveria ter uma dama de companhia para caminhar com você em seuspasseios.Eudetestariaquealgolheacontecesse.Ela icou estranhamente comovida com a preocupação dele, embora

soubesse que Colin teria demonstrado igual atenção para com qualquerdamaconhecidasua.Faziapartedeseucaráter.– Posso lhe garantir que sigo todas as convenções quando percorro

distâncias mais longas – disse ela. – Mas lá de fato é perto demais. Sãoapenasalgunsquarteirões.Nemaminhamãeseimporta.Colinpareceutravaromaxilarderepente.–Semcontarqueeutenho28anos–acrescentouPenelope.– E o que isso tem a ver com a questão? Eu tenho 33, se lhe interessa

saber.Elasabia,éclaro,jáquesabiaquasetudoaseurespeito.–Colin–retrucouPenelope,transparecendoalgumairritação.–Penelope–devolveuele,exatamentenomesmotom.Eladeixouescaparumlongosuspiroantesdefalar:

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– Meu status de solteirona já está bastante consolidado a esta altura,Colin. Não preciso me preocupar com todas as regras que meatormentavamaos17anos.–Eunãoacho...Penelopeplantouumadasmãosnoquadril.–Senãoacreditaemmim,pergunteàsuairmã.ColinderepenteadquiriuaexpressãomaissériaquePenelopejáovira

fazer.–Eufaçoquestãodenãoperguntaràminhairmãassuntosrelacionados

aobomsenso.–Colin!–exclamouPenelope.–Masquecoisahorríveldesedizer.–Eunãofaleiquenãoaamo.Nãofaleinemmesmoquenãogostodela.

EuadoroEloise,vocêsabemuitobem.Mas...– Qualquer frase que comece commas só pode terminar mal –

murmurouPenelope.–Eloise jádeveria estar casadaa esta altura – continuouele, comuma

arrogânciaatípica.Ora,aquilojáeraumpoucodemais,sobretudonaqueletomdevoz.–Algunspoderiamdizer– respondeuPenelope, inclinandooqueixode

leve em um gesto de superioridade – que você também deveria estarcasadoaestaaltura.–Ora,por...–Afinalvocêtem,comomeinformoucomtantoorgulho,33anos.UmvislumbrededivertimentoperpassouorostodeColin,apesardeseu

ligeiroardeirritaçãosugerirqueelenãoachariagraçapormuitotempo.–Penelope,nempense...–Ancião!–trinouela.Ele praguejoubaixinho, o que a surpreendeu, porquenão se lembrava

de já tê-lo visto fazer isso na presença de uma dama. Devia terinterpretado aquilo como um aviso, mas estava exasperada demais.Imaginavaqueovelhoditadofosseverdadeiro:coragemgeracoragem.Ou, em seu caso, talvez a imprudência gerasse imprudência, porque

Penelopesimplesmenteolhouparaelecomarmaliciosoedisse:–Osseusdoisirmãosmaisvelhosjánãoestavamcasadosaos30anos?Para a própria surpresa, Colin sorriu e cruzou os braços enquanto

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encostavaumdosombrosnaárvoresobaqualseencontravam.–Meusirmãoseeusomosmuitodiferentes.Aquela era, Penelope percebeu, uma a irmação muito reveladora, pois

diversos membros da alta sociedade, incluindo a lendária LadyWhistledown, sempre faziam grande alarde da semelhança dos irmãosBridgertons. Alguns haviam chegado a ponto de dizer que eramintercambiáveis.Penelopenuncaacharaquealgumdeles se incomodassecom isso – na verdade, supunha que icassem envaidecidos com acomparação, uma vez que se amavam tanto. Mas talvez estivesseenganada.Outalveznuncativesseolhadocomatençãosuficiente.O que era bastante estranho, pois tinha a sensação de que passara

metadedavidaobservandoColin.No entanto, se Colin tinha icado irritado, não a deixara perceber.

Penelope sem dúvida icara bastante satisfeita ao pensar que poderiaatingi-lo com sua pequena provocação, dizendo que os irmãos haviam secasadoantesdos30anos.Mas não: o método de ataque dele era um sorriso preguiçoso e uma

piadaperfeitamentecolocada.SeColinalgumdiaperdesseacompostura...Penelope balançou a cabeça de leve, incapaz até mesmo de imaginar

isso. Colin jamais perderia a paciência. Pelo menos não na frente dela.Teria que estar muito transtornado para se descontrolar. E esse tipo defúria só podia ser causado por alguém por quem a pessoa tivesse umaafeiçãoreal,verdadeira,profunda.Colin gostava dela – talvez até mais do que da maioria das pessoas –,

masnãotinhanenhumagrandeafeiçãoporela.Nãodaquelejeito.–Talvezdevamos,apenas,concordaremdiscordar–propôsela.–Sobreoquê?–Hã... –Ela jánão lembravadireito. –Hã... sobreoqueuma solteirona

podeounãopodefazer?Elepareciasedivertircomasuahesitação.– Isso provavelmente exigiria que eu acatasse em alguma medida a

opiniãodeminha irmãmaisnova,oqueseria,comopode imaginar,muitodifícilparamim.–Masnãoseimportaemacataraminhaopinião?

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Osorrisoqueelelhedeufoipreguiçosoemuitotravesso.–Não,seprometernãocontaristoamaisninguém.Elenãofalavasério,éclaro.Eelasabiaqueelesabiaqueelasabiaque

elenão falavasério.MasassimeraColin.Osensodehumoreumsorrisofacilitavamqualquer coisa. E –maldito fosse! – aquilo funcionou, pois elasuspirou,sorriue,antesdesedarconta,disse:–Jáchega!Sigamosparaacasadasuamãe.Eledeuumlargosorriso.–Achaqueelavaiservirbiscoitos?Peneloperevirouosolhos.–Euseiqueelavaiservirbiscoitos.– Que bom – retrucou ele, partindo a passos rápidos e praticamente a

arrastando junto.–Euamomuitoaminha família,masvoumesmoépelacomida.

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CAPÍTULO4

É di ícil imaginar que haja qualquer notícia a respeito do baile dosBridgertons mais importante que a determinação de Lady Danburyem descobrir a identidade desta autora, mas os seguintes itensprecisamserobservados:O Sr. Geoffrey Albansdale foi visto dançando com a Srta. Felicity

Featherington.ASrta.FelicityFeatheringtontambémfoivistadançandocomoSr.

LucasHotchkiss.O Sr. Lucas Hotchkiss foi visto dançando com a Srta. Hyacinth

Bridgerton.A Srta. Hyacinth Bridgerton também foi vista dançando com o

viscondedeBurwick.OviscondedeBurwicktambémfoivistodançandocomaSrta.Jane

Hotchkiss.ASrta. JaneHotchkiss também foi vistadançando comoSr. Colin

Bridgerton.O Sr. Colin Bridgerton também foi visto dançando com a Srta.

PenelopeFeatherington.E para inalizar essa incestuosa brincadeira de roda, a Srta.

Penelope foi vista conversando como Sr. GeoffreyAlbansdale. (Teriasido perfeito demais se ela tivesse dançado com ele, concorda, caroleitor?)

C

QuandoPenelopeeColinadentraramnasaladevisitas,EloiseeHyacinthjátomavamchá,juntocomVioleteKate.Aprimeiraencontrava-sesentadadiante do serviço de chá e a outra, esposa de Anthony, o atual visconde,tentava, semmuito sucesso,manter Charlotte, a ilha de 2 anos do casal,sobcontrole.

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–OlhemsóquemencontreinaPraçaBerkeley–anunciouColin.–Penelope–cumprimentouVioletcomumsorrisoacolhedor.–Sente-se.

O chá ainda está morno e a cozinheira fez os famosos biscoitosamanteigados.Colin partiu em direção à comida, mal parando para cumprimentar as

irmãs.Penelopeacomodou-seemumapoltronavizinhaàdeViolet.– Biscoitos estão gostosos – disse Hyacinth, empurrando um prato em

suadireção.–Hyacinth–chamouViolet,numavozquedenotava levedesaprovação

–,tentefalarcomfrasescompletas.Ameninaolhouparaamãecomexpressãodesurpresa.– Biscoitos. Estão. Gostosos. – Ela inclinou a cabeça para o lado. –

Substantivo.Verbo.Adjetivo.–Hyacinth.Penelope percebeu que Violet tentava demonstrar dureza enquanto

ralhavacomafilha,emboranãoestivessetendomuitosucesso.–Substantivo.Verbo.Adjetivo–repetiuColin,limpandoumamigalhado

rostosorridente.–Frase.Está.Correta.–Sósevocêforsemianalfabeto–retorquiuKate,pegandoumbiscoito.–

Estesbiscoitosestãomesmogostosos–falouparaPenelopecomumsorrisosemgraçatomando-lheoslábios.–Estejáéomeuquarto.–Euadorovocê,Colin–declarouHyacinth,ignorandoKateporcompleto.–Éclaroqueama–murmurouele.–Pessoalmente,pre irocolocarartigosantesdossubstantivosnosmeus

escritos–decretouEloise,muitosuperior.Hyacinthresfolegou.–Nosseusescritos?–Eu redijomuitas cartas – retrucouela, fungando. –Alémde escrever

umdiário,quepossolhegarantirserumhábitomuitobenéfico.– De fato nos mantém muito disciplinadas – contribuiu Penelope,

aceitandoumpirescomumaxícaradasmãosestendidasdeViolet.–Vocêtambémescreveumdiário?–perguntouKate,semolharparaela,

umavezqueacabaradesaltardapoltronaparaagarrarafilhaantesqueameninaescalasseumamesinhadecanto.

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– É uma pena,mas não – respondeu Penelope, balançando a cabeça. –Exigedisciplinademaisparaomeugosto.–Não achoque seja semprenecessário colocar umartigo antes de um

substantivo – insistiu Hyacinth, incapaz, como sempre, de abrir mão dopróprioargumento.Parainfortúniodorestantedogrupo,Eloiseeratãotenazquantoairmã.–Épossíveldeixardeladooartigoseestiversereferindoaosubstantivo

emquestãodeumamaneirageral–disse,franzindooslábioscomdesdém–,mas,nestecaso,umavezquesereferiaabiscoitosespecíficos...Penelope não estava certa disso, mas teve a impressão de ter ouvido

Violetgemer.– ... então, especi icamente – continuou Eloise, arqueando as

sobrancelhas–,vocêestáerrada.HyacinthsevirouparaPenelope.– Tenho certeza de que ela não usouespecificamente de forma correta

nessaúltimafrase.Penelopepegoumaisumbiscoito.–Eumerecusoaentrarnessaconversa.–Covarde–murmurouColin.–Não,apenasfaminta.–ElasevirouparaKate.–Estãomuitogostosos.Kateassentiu.–Ouviboatosdequesuairmãtalvezfiquenoiva–comentouemseguida.Penelopepiscou,surpresa.NãohaviaimaginadoquealigaçãodeFelicity

comoSr.Albansdalefossedeconhecimentopúblico.–Ecomovocêsoubedesseboato?– Por Eloise, é claro – explicou Kate, com grande simplicidade. – Ela

sempresabedetudo.– E o que eu não sei – completou a garota, com um sorriso fácil –

Hyacinthnormalmentesabe.Émuitoconveniente.–Vocês têm certeza de queumadas duas não é LadyWhistledown? –

brincouColin.–Colin! – exclamouViolet. –Comopode atémesmopensarnuma coisa

dessas?Eledeudeombros.– Sem dúvida ambas são inteligentes o bastante para realizar uma

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façanhadessas.EloiseeHyacinthficaramradiantes.NemmesmoVioletpôdeignoraroelogio.–Sim,bem...– faloudepoisdeumapausa–Hyacinthé jovemdemais,e

Eloise... – Ela olhou para a ilha em questão, que a observava com umaexpressãodivertida.–Bem,EloisenãoéLadyWhistledown,tenhocerteza.EloiseolhouparaColin.–EunãosouLadyWhistledown.–Quepena–lamentouele.–Ouestariapodredericaaessaaltura.– Sabe – começou Penelope, pensativa –, essa talvez fosse uma boa

formadedescobriraidentidadedela.Cincoparesdeolhosseviraramemsuadireção.–Elasópodeseralguémcommaisdinheirodoquedeveriateremteoria

–explicouPenelope.–Umbomargumento–concordouHyacinth–,anãoserpelofatodeque

eunãotenhoamenorideiadequantodinheiroaspessoasdeveriamter.– Eu tambémnão, é claro – concordouPenelope. – Embora, namaioria

das vezes, seja possível ter uma ideiageral. –DiantedoolharperdidodeHyacinth, ela acrescentou: – Por exemplo, se eu de repente saísse ecomprasseumconjuntodebrilhantes,issoseriamuitosuspeito.KatecutucouPenelopecomocotovelo.– E então, comprou algum conjunto de brilhantes nos últimos tempos,

hein?Umasmillibrasmepoderiamserúteis...Penelope revirou os olhos antes de responder, porque, como a atual

viscondessadeBridgerton,Katesemdúvidanãoprecisavademillibras.–Posso lhegarantirquenãopossuoumúnicodiamante–disse.–Nem

mesmoumanel.Katedeixouescaparum“puxa”dedesagradofingido.–Bem,entãovocênãonosserveparanada.–Nãoétantopelodinheiro–declarouHyacinth.–Émaispelaglória.Violettossiudentrodesuaxícaradechá.– Espere um instante,Hyacinth – falou em seguida. –O que acaboude

dizer?–Pensesónoslourosqueumapessoamereceriaporenfimdesmascarar

LadyWhistledown–sugeriuHyacinth.–Seriaaglória.

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– Você está dizendo que não se importa com o dinheiro? – perguntouColin,comumaexpressãodeafabilidadeforçada.–Eujamaisdiriaisso–retrucouHyacinthcomumsorrisoinsolente.OcorreuaPenelopeque,detodososBridgertons,HyacintheColineram

osmaisparecidos.TalvezfossebomColinpassartantotempoforadopaís.Se ele e a irmã caçula algum dia unissem forças, provavelmenteconquistariamomundo.–Hyacinth,euaproíbodetransformarabuscapelaidentidadedeLady

Whistledownnoseuobjetivodevida–decretouVioletcomfirmeza.–Mas...– Não estou dizendo que não possa ponderar sobre a questão e fazer

algumas perguntas – apressou-se em acrescentar Violet, erguendo umadasmãos para impedir quaisquer outras interrupções. – Por Deus, seriadeseesperarque,depoisdequasequarentaanosdematernidade,eunãoprecisasse mais impedi-los de fazer qualquer coisa com que cismassem,pormaiorquefosseatolice.Penelopelevouaxícaraaoslábiosparaencobrirosorriso.– Mas é que você sabe ser bastante cabeça-dura em determinadas

ocasiões–concluiuViolet.Emseguida,pigarreoucomtodaadelicadeza.–Mamãe!VioletcontinuoucomoseHyacinthjamaistivessesepronunciado:–Eeunãoqueroque seesqueçadequeo seuprincipalobjetivoneste

momentodeveserencontrarummarido.Hyacinthpronunciouapalavra “Mamãe”novamente, emboradessavez

tenhasidomaisumgemidodoqueumprotesto.Penelope olhou de soslaio para Eloise, que tinha os olhos ixos no teto,

claramente tentando não sorrir. Eloise resistira a anos de implacáveistentativasdamãedelheencontrarummaridoenãoseimportavanemumpoucocomofatodeelaparecerterdesistidoevoltado-separaHyacinth.Na verdade, Penelope estava surpresa por Violet en im ter aceitado o

statusdesolteiradeEloise. Jamaisesconderaqueoseumaiorobjetivonavida era ver os oito ilhos casados e felizes. Tivera sucesso com quatro.Primeiro,DaphnesecasaracomSimonesetornaraduquesadeHastings.No ano seguinte, Anthony desposara Kate. Houvera uma certa calmaria

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depois disso, mas tanto Benedict quanto Francesca haviam se casado nointervalodeumano:BenedictcomSophieeFrancescacomumescocês,ocondedeKilmartin.Francesca,infelizmente, icaraviúvaapenasdoisanosapósocasamento.

Agora, dividia o tempo entre a família domarido, na Escócia, e a sua, emLondres. Quando estava na cidade, porém, insistia em icar na CasaKilmartinemvezdenaCasaBridgertonounoNúmeroCinco.Penelopenãoa culpavapor isso. Se fosseviúva, também iriaquererusufruirde todaasuaindependência.Hyacinth costumava suportar as investidas casamenteiras damãe com

bomhumor,jáque,comoelamesmadisseraaPenelope,defatopretendiase casar em algum momento. Assim, permitia que Violet tivesse todo otrabalho para que ela pudesse escolher o próprio marido quando opretendentecorretosurgisse.Efoicomessadisposiçãoamigávelqueelase levantou,beijouamãeno

rosto e lhe prometeu, com obediência, que seu principal objetivo seriaprocurar um marido. Enquanto falava, lançou um sorriso insolente emalicioso para os dois irmãos presentes. Mal retornara à sua poltronaquandoperguntouaogrupo:–Eentão,achamqueelavaiserpega?–ContinuamosfalandosobreatalWhistledown?–gemeuViolet.–AindanãoouviramateoriadeEloise?–indagouPenelope.Todosolharamparaelae,emseguida,paraEloise.–Hã...equaléaminhateoriamesmo?–perguntouEloise.–Fazapenas... bem,não sei, talvezumasemana– começouPenelope. –

EstávamosasduasconversandosobreLadyWhistledownquandoeudisseque não achava que sua identidade pudesse continuar em segredo parasempre, que em algummomento ela haveria de cometer um erro. Então,Eloisefalouquenãoestavatãocertaassim,porquejáfazdezanosqueelamantém a coluna e que, se fosse cometer um erro, isso já deveria teracontecido.Entãoeudissequenão,queelanãopassadeumserhumano.Que, emalgummomento, vai escorregar, porqueninguémpode fazerumsegredodurarparasempre,então...– Ah, lembrei! – interrompeu Eloise. – Estávamos na sua casa, no seu

quarto,eeu tiveuma ideiabrilhante!DisseaPenelopequeapostavaque

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Lady Whistledown já havia cometido um erro e que nós é que éramosidiotasdemaisparapercebermos.–Achoqueissonãoémuitoelogiosoparaconosco–murmurouColin.–Bem,quandoeudissenós, estavamereferindoà sociedadecomoum

todo,nãosóanós,osBridgertons–objetouEloise.–Então,talvezaúnicacoisadaqualprecisemosparadesmascararLady

Whistledown seja vasculhar exemplares antigos da coluna – re letiuHyacinth.OsolhosdeVioletforamtomadosporumcertopânico.–Hyacinth,nãoestougostandodessasuaexpressão.Ameninasorriuedeudeombros.–Eupoderiamedivertirtantocommillibras...–QueDeusnosajude–foiaúnicarespostadamãe.– Penelope – chamou Colin de repente –, você não terminou de nos

contarsobreFelicity.Éverdadequeelavaificarnoivaembreve?Penelopeterminouocháqueestavabebericando.Colintinhaumaforma

deolhar, comosolhosverdes tão focadoseatentos,queapessoa tinhaasensaçãodequeosdoiseramosúnicosem todoouniverso. InfelizmenteparaPenelope, issotambémpareciateropoderdereduzi-laaumaidiotagaguejante. Quando estavam no meio de uma conversa, ela em geralconseguia se controlar, mas quando ele a surpreendia daquele jeito,voltandoa atençãopara elanomomentoemqueela já se convenceradetersemisturadocomperfeiçãoaopapeldeparede, icavacompletamenteperdida.–Hã...Sim,ébastantepossível–respondeu.–OSr.Albansdaletemdado

indicações das suas intenções. Mas se ele de fato decidir pedi-la emcasamento,imaginoqueiráàÂngliaOrientalparaterapermissãodemeutio.–Seutio?–indagouKate.–MeutioGeoffrey.ElemorapertodeNorwich.Énossoparentedosexo

masculino mais próximo, embora, na verdade, não o vejamos commuitafrequência.Mas o Sr. Albansdale é bastante tradicional. Acho que não sesentiriaconfortávelpedindoàminhamãe.– Espero que ele também peça a Felicity – comentou Eloise. – Sempre

pensoemquão ridículo éumhomempedir amãodeumamulher aopai

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delaantesdepediràprópria.Opainãoteráquevivercomele.– Essa atitude – começou Colin, com um sorriso divertido apenas

parcialmente oculto pela xícara – talvez explique por que você continuasolteira.Violet olhou para o ilho com severidade e disse seu nome em tom de

desaprovação.– Ah, não, mamãe – falou Eloise. – Eu não me importo. Estou muito

confortávelcomoumasolteirona.–ElaolhouparaColincomsuperioridade.– Pre iro mil vezes ser solteira a ser casada com um chato. Assim –acrescentou,comumfloreio–comoPenelope!Sobressaltada ao ver a mão a amiga acenando de repente em sua

direção,Penelopeseempertigoueconcordou:–Hã...Sim.Éclaro.Maselatinhaasensaçãodenãosertãofirmeemsuasconvicçõesquanto

Eloise. Diferentemente dela, não recusara seis propostas de casamento.Nãorecusaranenhuma,porquenãoreceberanenhuma.Convencera-se de que não teria aceitado, de qualquer forma, pois seu

coraçãopertenciaaColin.Masseráqueaquiloeramesmoverdadeouelaapenas tentavasesentirmelhorpor tersidoumfracasso tãoretumbantenomercadomatrimonial?Sealguémapedisseemcasamentonodiaseguinte–umhomemgentile

aceitável,queelajamaisviriaaamar,masdequempoderiaumdiagostarmuito–,seráqueaceitaria?Eraprovávelquesim.Pensar no assunto a deixou triste, porque admitir isso a si mesma

signi icavaquerealmenteperderaqualqueresperançaemrelaçãoaColin.Signi icava que não era tão iel aos seus princípios como esperava ser.Signi icavaquesedispunhaaaceitarummaridomenosdoqueperfeitoafimdeterumacasaeumafamíliaparasi.Nãoeranadaquecentenasdemulheresnão izessemtodoano,masera

algoqueelajamaispensaraemfazer.–Vocêficoutãosériaderepente...–comentouColin.Penelopedespertoudeseudevaneio.–Eu?Ah.Não,não.Sóestavaperdidaemmeusprópriospensamentos.Colin aceitou sua explicação com um breve aceno da cabeça e depois

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pegououtrobiscoito.–Temosalgomaissubstancialparacomer?–indagou,franzindoatesta.– Se eu soubesse que você vinha – respondeu Violet, seca –, teria

dobradoaquantidadedecomida.Eleselevantouefoiatéacampainhadoscriados.–Voupedirmais.–Depoisdedarumbompuxãonocordão,virou-see

perguntou:–SabequaléateoriadePenelopesobreLadyWhistledown?–Não,nãosei–respondeuViolet.– É muito inteligente, na verdade – comentou ele, parando para pedir

sanduíchesàcriadaantesdeconcluir:–ElaachaqueéLadyDanbury.– Aaaaah. – Hyacinth se mostrou visivelmente impressionada. – Muito

perspicaz,Penelope.Elaassentiuemagradecimento.–AlémdeserexatamenteotipodecoisaqueLadyDanburyfaria.–Acolunaouodesa io?–quissaberKate,agarrandoafaixadovestido

deCharlotteantesqueameninaconseguissefugir.–Asduascoisas–respondeuHyacinth.–EPenelopedisseissoaela–contouEloise.–Faceaface.Hyacinth icou boquiaberta e Penelope soube nesse momento que

acabavadesubir–emuito–noconceitodajovem.– Eu queria ter visto isso! – exclamou Violet com um sorriso largo e

orgulhoso. – Para ser franca, estou surpresa de não ter dado noWhistledowndehoje.–AchoqueLadyWhistledownnãofalariasobreasteoriasdaspessoasa

respeitodesuaidentidade–comentouPenelope.–Eporquenão?–indagouHyacinth.–Seriaumamaneiraexcelentede

darpistaserradas.Porexemplo–continuou,estendendoamãoemdireçãoàirmãnumaposebastantedramática–,digamosqueeuachassequefosseEloise.–NãoéEloise!–protestouViolet.–Nãosoueu–repetiuEloisecomumsorriso.–Masdigamosqueeuachassequefosse–insistiuHyacinthcomirritação

–equeafirmasseissoempúblico.–Oquevocêjamaisfaria–disseViolet,severa.–Oqueeujamaisfaria–ecoouHyacinthtalequalumpapagaio.–Mas,

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apenas comoumexercício de imaginação, digamos que eu o a irmasse. Edigamos que Eloise, de fato, fosse Lady Whistledown. Que ela não é –apressou-seemacrescentarantesqueamãepudesseinterrompê-laoutravez.Violetergueuasmãosemsilenciosaderrota.–Haveria formamelhorde enganar a todosdoque zombandodemim

nacolunadela?–concluiuHyacinth.– É claro que, se Eloise fosse mesmo Lady Whistledown... – re letiu

Penelope.–Elanãoé!–explodiuViolet.Penelopenãoconseguiuconteroriso.–Massefosse...–Sabem,agoraeurealmentegostariadeser–comentouEloise.–Você estaria rindomuitode todosnós – continuouPenelope. –Mas é

claro que, na quarta-feira, não poderia escrever a coluna zombando deHyacinth por achar que você é Lady Whistledown, porque senão todossaberíamosquesópoderiaservocê.–Anãoserqueseja você–brincouKate,olhandoparaPenelope.–Isso

seriaumtruquemuitoardiloso.–Deixe-meverseentendi–disseEloise.–PenelopeéLadyWhistledown

e ela vai escrever uma coluna na quarta-feira zombando da teoria deHyacinth de queeu sou Lady Whistledown apenas para fazer vocêspensaremqueeusoumesmoLadyWhistledown,porqueHyacinthsugeriuqueissoseriaumtruqueinteligente.– Estou completamente perdido – comentou Colin com ninguém em

especial.–AnãoserqueColinfosseLadyWhistledown...–declarouHyacinthcom

umbrilhoendiabradonosolhos.–Parem!–pediuViolet.–Euimploro.Dequalquerforma,àquelaalturatodosriamdemaisparaqueHyacinth

conseguisseprosseguir.– As possibilidades são in initas – observou Hyacinth, enxugando uma

lágrima.– Talvez todos devêssemos, simplesmente, olhar para nosso lado

esquerdo–sugeriuColin,sentando-seoutravez.–Quemsabeessapessoa

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sejaanossainfameLadyWhistledown.Todos obedeceram, com exceção de Eloise, que olhou para a direita...

diretoparaColin.–Vocêestavatentandomedizeralgumacoisaquandosesentouàminha

direita?–perguntouelacomumsorrisodivertido.– De modo algum – murmurou ele, estendendo a mão em direção ao

pratodebiscoitoseentãoparando,aosedarcontadequeestavavazio.MaselenãodeixouqueseuolharcruzassecomodeEloiseaofazê-lo.SealguémalémdePenelopenotouasuaevasão,nãopôdequestioná-loa

respeito, pois nesse momento os sanduíches chegaram e ele se tornouindisponívelparaqualquerconversa.

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CAPÍTULO5

ChegouaoconhecimentodestaautoraqueLadyBlackwoodtorceuotornozelonoiníciodasemanaenquantoperseguiaoentregadordestehumildeperiódico.Mil libras sem dúvida são uma bela quantia, embora Lady

Blackwoodnãoprecise dedinheiro.Alémdomais, a situação está setornandoabsurda.Comcertezaoslondrinostêmalgomelhorafazerdoqueperseguirpobres entregadoresnuma tentativa infrutíferadedescobriraidentidadedestaautora.Outalveznãotenham.Estaautorarelataasatividadesdosmembrosdaaltasociedadehá

mais de uma década e não encontrou a menor prova de que elestenham,defato,coisamelhorafazercomoseutempo.

C

Dois dias depois, Penelope estava, mais uma vez, atravessando a PraçaBerkeley a caminho do Número Cinco para ver Eloise. Desta vez, noentanto, era o im da manhã, fazia sol e ela não encontrou Colin nopercurso.Nãosoubedizerseissoeraruim.Ela e a amiga haviam combinado na semana anterior de fazerem

compras,masdecidiramseencontrarnoNúmeroCincoparasaíremjuntasepoderemdispensaracompanhiadesuascriadas.Eraumdiaperfeito–pareciamaisqueestavamem junhodoqueemabril –ePenelopeestavaansiosapelacurtacaminhadaatéaRuaOxford.Mas, quando chegou à casa de Eloise, foi recebida por um mordomo

confuso.– Srta. Featherington – disse ele, piscando de forma frenética antes de

conseguir concluir o raciocínio –, infelizmente a Srta. Eloise não está emcasanomomento.

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Penelopeentreabriuoslábiosemsinaldesurpresa.–Aondeelafoi?Combinamosesteencontrohámaisdeumasemana.Wickhambalançouacabeça.–Nãosei.MassaiucomamãeeaSrta.Hyacinthháduashoras.–Compreendo–retrucouPenelope,franzindoatestaetentandodecidir

oque fazer.–Possoesperar,então?Talvezela tenhaapenasseatrasado.NãoédofeitiodeEloiseesquecer-sedeumcompromisso.Elefezquesim,afavelmente,eindicouocaminhoatéasaladevisitasdo

segundo andar. Depois disse que lhe levaria um lanche e lhe entregou aúltimaediçãodoWhistledownparapassarotempo.Penelope já a lera, claro. O periódico chegava bem cedo e ela tinha o

hábitodelê-loduranteocafédamanhã.Comtãopoucoparalheocuparamente, ela foi até a janela e espiou as ruas de Mayfair. No entanto, nãohavianadadenovo:eramasmesmasconstruçõesque jáviramilvezes,einclusiveasmesmaspessoascaminhandopelarua.Talvezpor estarpensando sobreamesmicede suavida,notouoúnico

objetonovoaseusolhos:umlivroencadernadoqueseencontravaabertosobreamesa.Atémesmodealgunsmetrosdedistância,percebeuquenãoestava preenchido com palavras impressas, mas escrito à mão em umacaprichadacaligrafia.Aproximou-se e olhou para baixo sem tocar as folhas. Parecia uma

espécie de diário e, no meio da página da direita, havia um cabeçalhodestacadodorestantedotextoporumespaçoemcimaeumembaixo:22defevereirode1824MontesTroodos,Chipre

Levouumadasmãosàboca.Colinescreveraaquilo!Eledissera,poucosdias antes, que estivera em Chipre, não na Grécia. Penelope jamaisimaginaraqueelemantivesseumdiário.Ergueuopéa imdedarumpassoparatrás,masocorponãosemexeu.

Não devia ler aquilo, disse a simesma. Aquele era o diário particular deColin.Eladeviamesmoseafastar.–Afaste-se–murmurou,olhandoparaospésrecalcitrantes.–Afaste-se.Ospésnãosemoveram.

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Mastalvezaquilonãofossetãoerradoassim.A inaldecontas,seráqueestaria realmente invadindo a privacidade dele se lesse apenas o que seencontrasseàvista, semvirarapágina?Ele tinhadeixadoodiárioabertosobreamesa,paratodomundover.Mas, também, Colin tinha todos os motivos para achar que ninguém

dariacomseusescritos sedeixasseocômodoporalguns instantes.Deviasaberqueamãeeasirmãstinhamsaídopelamanhã.Amaioriadasvisitasera conduzida à sala de estar formal, no primeiro andar. Até ondePenelopesabia,elaeFelicityeramasúnicasnãoBridgertonsrecebidasnasala informal. E, como Colin não a estava esperando (ou, o que eramaisprovável, não estava pensando nela em absoluto), não teria imaginadohaver o menor perigo em deixar o diário aberto enquanto ia cuidar deoutracoisaporummomento.Poroutrolado,elehaviadeixado-oaberto.Aberto,santoDeus!Sehouvessequaisquersegredosrelevantesnaquele

diário, Colin sem dúvida tomaria o cuidado de escondê-lo ao sair doaposento.Afinaldecontas,nãoeraidiota.Penelopeinclinouocorpoparaafrente.Ah, que droga. Não conseguia ler daquela distância. Conseguira

compreenderocabeçalhoporquehaviamuitoespaçoembrancoemtornodele,masorestodotextoeraimpossíveldeserdecifradodelonge.De alguma forma, ela achava que não se sentiria tão culpada se não

tivessequeseaproximarmaisdodiárioparalê-lo.Apesar,éclaro,dejáteratravessadooaposentoparachegaraondeestavanomomento.Tamborilouodedona lateraldorosto,bemao ladodoouvido.Esseera

umbomargumento.Jáatravessaraoaposento,oquesigni icavaqueopiordeseuspecadosnaquelediaprovavelmentejáforacometido.Umpassinhoamaisnãoeranadacomparadoàextensãodasala.Chegou um pouco mais para a frente, decidindo que aquilo contava

apenascomoummeiopasso,entãoseaproximoumaiseolhouparabaixo,começandoaleiturabemnomeiodeumafrase.na Inglaterra.Aqui, aareia seondula entre tonsdebege ebranco etem uma consistência tão ina que desliza sobre o pé nu como osussurro da seda. A água é de um azul inimaginável na Inglaterra:

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água-marinha com um lampejo do sol e azul-cobalto profundoquando as nuvens cobrem o céu. E é cálida – surpreendente eestarrecedoramentecálida,comoumaáguadebanhoquetenhasidoaquecida, talvez,meiahoraantes.Asondassãosuavesequebramnapraia com delicados jatos de espuma, fazendo cócegas na pele etransformando a mais perfeita areia numa delícia macia queescorregaedeslizaentreosdedosdospésatéqueoutraondachegueparalimparaquelabagunçatoda.Éfácilentenderporquedizemqueesteéo localdenascimentode

Afrodite. A cada passo, quase espero vê-la como no quadro deBotticelli, surgindo do mar, perfeitamente equilibrada sobre umagigantescaconcha,oslongoscabelosruivosfluindoàsuavolta.Se algumdia já nasceu umamulher perfeita, semdúvida foi aqui.

Estounoparaíso.E,noentanto...E, no entanto, a cada brisa cálida e a cada céu sem nuvens sou

lembradodequeestenãoémeu larequenasciparaviveremoutrolugar. Isso não abranda o desejo – não, a compulsão! – de viajar, dever, de conhecer. Mas alimenta o estranho anseio por tocar umgramadocobertodeorvalhoúmidooudesentirabrisafrianorosto,ou mesmo de recordar a alegria de um dia perfeito depois de umasemanadechuva.O povo daqui não tem como conhecer tal alegria. Seus dias são

sempre perfeitos. É possível apreciar a perfeição quando ela éconstantenavidadealguém?22defevereirode1824montesTroodos,ChipreÉ impressionante que eu sinta frio. O mês, é claro, é fevereiro, e,

comoum inglês, estou bastante acostumado como frio de fevereiro(assim como como de qualquermês),mas não estou na Inglaterra.Encontro-me em Chipre, no coração do Mediterrâneo, e há apenasdoisdiasestiveemPaphos,nolitoralsudoestedailha,ondeosolbateforteeomarésalgadoemorno.Daqui,pode-severopicodomonteOlimpo,aindacobertodeumaneve tãobrancaqueécapazdecegar

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quandoosolrefletenela.Aescaladaatéaqui foi traiçoeira, comoperigo seescondendopor

trás de muitas curvas. A estrada é rudimentar e, no caminho,encontramos

Penelopedeixouescaparumsuavegrunhidodeprotestoaosedarconta

de que a página terminara no meio de uma frase. Quem ele teriaencontrado?Oqueteriaacontecido?Queperigoeraaquele?Ficouencarandoodiário,mortadevontadedevirarapáginaparavero

que acontecia em seguida. Mas, quando começara a ler, conseguirajusti icar seu ato dizendo a simesmaquenão estava de fato invadindo aprivacidadedeColin.A inaldecontas,eleéquedeixaraolivroaberto.Elaapenasviraoqueeledeixaraexposto.Virarapáginajáeratotalmentediferente.Estendeuamão,depoisarecolheu.Aquilonãoeracerto.Nãopodialero

diáriodele.Bem,nãoalémdoquejálera.Por outro lado, estava claro que aquelas eram palavras quemereciam

ser lidas. Era um crime que Colin as guardasse para si. Palavras deviamsercelebradas.–Ora,peloamordeDeus!–murmurouconsigomesma.Estendeuamãoemdireçãoaocantodapágina.–Oquevocêestáfazendo?Penelopevirou-se.–Colin!–Eumesmo!–vociferouele.Eladeuumsaltoparatrás.Jamaisoouvirausaraqueletom.Nemmesmo

oimaginaracapazdefalardaquelejeito.Eleatravessouasala,agarrouodiárioeofechouruidosamente.–Oqueestáfazendoaqui?–perguntou.– Esperando Eloise – conseguiu proferir Penelope, com a boca de

repentemuitoseca.–Nasaladevisitasdosegundoandar?–Wickhamsempreme trazpara cá. Suamãedisse a elequedeviame

tratarcomopartedafamília.Eu...hã...ele...bem...–Elasedeucontadequetorciaasmãoseseforçouaparar.–Omesmoacontececomaminhairmã

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Felicity. Por ela eHyacinth serem tão amigas. Eu... Eu sintomuito. Penseiquesoubesse.Eleatirouo livroencadernadoemcourosobreumapoltronapróximae

cruzouosbraços.–Evocêtemohábitodelerosescritosparticularesdosoutros?– Não, é claro que não. Mas o livro estava aberto e... – Ela engoliu em

seco, reconhecendo que a desculpa era péssima no instante em queproferiuaspalavras.–Éumaposentopúblico–murmurouela,dealgumaformaachandoquetinhaque inalizarasuadefesa.–Talvezvocêdevessetê-lolevadoquandosaiu.–Nãosecostumalevarumlivroaolugaraondeeufui–disseele,ainda

visivelmentefuriosocomela.–Masnãoéum livromuitogrande– insistiuPenelope,perguntando-se

porque,porque,porquecontinuavaafalarquandoestavatãoclaramenteerrada.–Pelo amordeDeus – explodiu ele. –Vocêquer queeudigaapalavra

urinolnasuapresença?Penelopesentiuasfacesesquentarem.–Émelhoreuir–falou.–Porfavor,digaaEloise...–Eu irei – retrucou Colin, quase rosnando. – De qualquer forma, esta

tardememudo daqui. Assim, aproveito e parto agora, porque pelo vistovocêjáseapossoudacasa.Penelope jamais achara que palavras pudessem causar dor ísica,mas,

bemnaquelemomento, teveasensaçãode tomaruma facadanocoração.Não se dera conta, até aquele exato instante, de quanto signi icava o fatodeLadyBridgertonterabertoacasaparaela.OudequantodoeriasaberqueColinseressentiadasuapresençaali.– Por que precisa tornar tão di ícil lhe pedir desculpas? – deixou

escapar, seguindo-o de perto enquanto ele recolhia o restante dos seuspertences.–Equermedizerporqueeudeveriafacilitarascoisas?–devolveuele,

semencará-laoudiminuiropassoaofalar.Nãoaencarounemdiminuiuopassoaofalar.–Porqueseriaomaisgentilasefazer–retrucouPenelope.Issochamouaatençãodele.Colinseviroupara itá-la,osolhoscintilando

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com tanta fúriaquePenelopedeuumpassoem falsopara trás.Colineragentil,sereno.Nuncaperdiaacompostura.Atéaquelemomento.–Porqueseriaomaisgentil a se fazer?–vociferouele.–Foinissoque

você pensou enquanto lia o meu diário? Que seria gentil ler os textosparticularesdeoutrapessoa?–Não,Colin,eu...–Nãohánadaquejusti iqueisso–exclamouele,cutucando-anoombro

comoindicador.–Colin!Você...Elesevirouparacontinuarrecolhendoseuspertences,dandoascostas

paraeladamaneiramaisrudequeconseguiuenquantodecretava:–Nãohánadaquepossajustificaroseucomportamento.–Não,éclaroquenão,mas...–AI!Penelopesentiuosangueseesvairdeseurosto.OgritodeColinerade

dor verdadeira. O nome dele escapou de seus lábios num sussurroapavoradoenquantoelacorriaparaoseulado.–Oque...Ah,meuDeus!Osanguejorravadeumcortenapalmadesuamão.Penelope nunca era muito articulada em momentos de crise, mas

conseguiudizer:–Ah!Ah!Otapete!Emseguida,saltouparaafrentecomumafolhadepapelqueencontrou

emcimadeumamesapróximaecolocou-asobamãodeleparaapararosangue,antesquearruinasseotapetedevalorinestimável.–Queenfermeiraatenciosa–disseColin,comavozvacilante.–Bem,vocênãovaimorrer–explicouela–,eotapete...–Estátudobem–afirmouele.–Euestavabrincando.Penelope ergueu os olhos para itá-lo. Ele lhe pareceu extremamente

pálido.–Achomelhorvocêsesentar–sugeriuela.Eleassentiu,soturno,earriousobreumapoltrona.Penelope experimentou um embrulho no estômago, como se estivesse

emalto-mar.Jamaissesentiramuitobemaoversangue.

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– Talvez seja bom eume sentar, também –murmurou, apoiando-se namesinhabaixaqueseencontravaàfrentedele.–Vocêestábem?–perguntouele.Elafezquesim,engolindoemsecoparaafastaraondadenáusea.– Precisamos arrumar algo para enrolar em seu dedo – declarou ela,

fazendoumacaretaaoolharparaamãodele.O papel não era absorvente e deixava o sangue se esvair enquanto

Penelopetentavadetodasasformasimpedirquepingassepeloslados.–Tenhoumlençonobolso–informouColin.Comtodoocuidado,elaen iouamãonobolsodacamisadele, tentando

não se concentrar nas cálidas batidas de seu coração enquanto tateavadesajeitadamenteembuscadopequenoretalhodefazendacordecreme.– Está doendo? – indagou, envolvendo o lenço em suamão. –Não, não

diganada.Éclaroqueestádoendo.Eleconseguiulhedarumsorrisomuitovacilante.–Estádoendo,sim.Ela espiou o corte, forçando-se a olhá-lo de perto apesar de o sangue

fazeroseuestômagoserevirar.–Achoquenãoprecisarádepontos.–Vocêentendealgumacoisasobreferimentos?Elafezquenão.–Nada.Masnãomeparecemuitosério.Anãoserpor...hã,essesangue

todo.–Épiordoqueparece–brincouele.Elaolhouparaorostodele,horrorizada.–Outrapiada–esclareceuColin. –Bem,naverdade,não.A sensaçãoé

realmente pior do que a aparência, mas posso lhe garantir que ésuportável.– Me desculpe – disse ela, aumentando a pressão sobre o corte para

estancarosangue.–Aculpafoiminha.–Poreutercortadoamão?–Senãootivessedeixadotãofurioso...Eleselimitouabalançaracabeça,fechandoosolhosdevidoàdor.–Nãoseja tola,Penelope.Seeunãotivessemezangadocomvocê, teria

mezangadocomoutrapessoa,emalgumoutromomento.

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–E,éclaro,teriaumafacadecartasaoseuladoquandoissoacontecesse–murmurouela, levantandoosolhosparaeleenquantosedebruçavaporcimadocorte.Quandoeleaencarou,seuolharestavacheiodehumore,talvez,umleve

toquedeadmiração.E alguma outra coisa que ela achou que jamais veria: vulnerabilidade,

hesitação e até mesmo insegurança. Penelope se deu conta, chocada, dequeelenãosabiacomoosseustextoserambons.Nãotinhaamenorideiae,narealidade,estavaenvergonhadoporelatê-losvisto.– Colin – começou ela, pressionando o lenço com mais força ainda,

instintivamente.–Euprecisolhedizer:você...Elaparouaoouvirpassosseaproximandopelocorredor.–ÉWickham–falou,olhandoemdireçãoàporta.–Eleinsistiuemtrazer

algumacoisaparacomer.Podemanterapressãoaqui,porenquanto?Colinassentiu.– Não quero que ele saiba quememachuquei. Vai acabar contando à

minhamãeeeununcamaistereipaz.– Bem, tome aqui, então. – Ela se levantou e atirou o diário em sua

direção.–Finjaqueestálendoisto.Colinmaltevetempodeabri-loecolocá-losobreamãomachucadaantes

queomordomoentrassecarregandoumaenormebandeja.– Wickham! – exclamou Penelope, virando-se para olhá-lo. – Como

sempre,trouxemuitomaiscomidadoquesoucapazdecomer.Porsorte,oSr.Bridgertonestáaquimefazendocompanhia.Tenhocertezadeque,comaajudadele,conseguireidarcontadetodosessesquitutes.Wickham assentiu e removeu as tampas dos pratos. Havia carnes,

queijosefrutas,alémdeumajarraaltadelimonada.Penelopeabriuumlargosorriso.– Espero que não tenha pensado que eu conseguiria comer isto tudo

sozinha.– Lady Bridgerton e as ilhas devem chegar daqui a pouco. Achei que

poderiamestarcomfometambém.– Comigo aqui, não vai sobrar nada para elas – a irmou Colin com um

sorrisojovial.Wickhamfezumadiscretareverênciaemsuadireção.

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– Se eu soubesse que estava aqui, Sr. Bridgerton, teria triplicado asporções.Querqueeufaçaumpratoparaosenhor?–Não,não–retrucouColin,abanandoamãoquenãoestavamachucada.

–Voulevantarassimque...hã...acabardelerestecapítulo.–Avisemseprecisaremdequalqueroutracoisa–acrescentouWickham,

antesdedeixaroaposento.– Aaaai – gemeu Colin assim que ouviu os passos de Wickham se

afastarempelocorredor.–Maldição!Querdizer,droga!Comodói!Penelopepegouumguardanapodabandeja.–Tome,vamossubstituiresselenço.–Elatirouopedaçodepanodamão

dele,mantendoosolhos ixosnotecidoemvezdenoferimento.Comisso,seuestômagonão icoutãoembrulhado.–Sintodizerqueoseulençoestáarruinado.Colin apenas fechou os olhos e balançou a cabeça. Penelope era

inteligenteobastanteparaentenderque issoqueriadizerqueelenãoseimportava. E era sensível o su iciente para não falar mais nada sobre oassunto.Nãohavianadapiordoqueumamulhertagarela.Ele sempre gostara de Penelope, mas como podia ter deixado de

perceber, atéaquelemomento,quão inteligenteelaera?Supunhaque, setivessem lhe perguntado sua opinião, teria dito que era esperta, mas naverdadenuncatinhapensadomuitosobreoassunto.Noentanto,tornava-secadavezmaisclaroparaelequeajovemera,de

fato, muito inteligente. E talvez a irmã tivesse comentado, certa vez, quetambémeraumaleitoravoraz.E,provavelmente,crítica.– Acho que o sangramento diminuiu – disse ela, envolvendo o

guardanapolimpoemtornodesuamão.–Naverdade,tenhocerteza,poisjánãoficotãoenjoadacadavezqueolhoparaoferimento.Ele teria preferido que ela não tivesse lido o seu diário, mas já que

tinha...– Hã, Penelope... – começou ele, surpreso com a nítida hesitação na

própriavoz.Elaergueuosolhos.–Desculpe.Estouapertandodemais?Por um instante, Colin só piscou. Como era possível que jamais tivesse

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notado como os olhos dela eram grandes? Sabia que eram castanhos, éclaro, e... Não, pensando bem, se fosse sincero, teria que admitir que, sealguém lhe perguntasse, antes daquela manhã, qual era a cor dos olhosdela,elenãoteriasidocapazderesponder.Mas,dealgumamaneira,sabiaquejamaisseesqueceriaoutravez.Eladiminuiuapressão.–Assimestámelhor?Elefezquesim.–Obrigado.Eumesmoofaria,maséaminhamãodireitae...–Nãoprecisadizermaisnada.Éomínimoqueposso fazerdepoisde...

depoisde...Penelopeolhoudiscretamenteparaoladoeelepercebeuqueelaestava

prestesapedirdesculpasdenovo.–Penelope–tentouelemaisumavez.–Não,espere!–bradouela,osolhosescuroscintilandocom...paixão?Semdúvidanãoeraotipodepaixãocomoqualeleestavaacostumado.

Mas havia outros tipos, certo? Paixão pelo aprendizado. Paixão pela...literatura?–Eutenhoquelhedizeristo–recomeçouela,comurgência.–Euseique

ler o seu diário foi uma intromissão imperdoável da minha parte. Eu sóestava... entediada... esperando... e não tinha nada para fazer, então viaquiloefiqueicuriosa.Ele abriu a boca para interrompê-la, para falar que o que estava feito

estavafeito,maselanãoparavaeelefoiobrigadoaescutá-la.– Eu deveria ter me afastado assim que percebi do que se tratava –

continuouPenelope–,mas,no instanteemque liumafrase,nãoconseguimaisparar!Colin,foimaravilhoso!Eracomoseeuestivesselá.Pudesentiraágua,esabiaexatamenteatemperaturaquetinha.Foitãointeligentedasuapartedescrevê-ladaquelaforma...Todomundosabecomoéaáguadebanhomeiahoradepoisdeabanheiratersidopreparada.Porummomento,Colinnãoconseguiufazernadaalémde itá-la.Nunca

viraPenelopetãoanimada,eeramuitoestranho–muitobom,naverdade–quetantaanimaçãosedevesseaoseudiário.–Você...vocêgostou?–perguntouele,porfim.–Seeugostei?Colin,euadorei!Eu...

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–Ai!Em sua animação, ela começara a apertar a mão dele um pouco forte

demais.–Ah,medesculpe–disseeladistraidamente.–Colin,euprecisosaber.

Qualeraoperigo?Nãoaguentoficarsemsaber.–Nãofoinada–retrucouele,commodéstia.–Apáginaquevocêleunão

foidasmelhores.–Defato,foiquasetodadescritiva–concordouela–,masadescriçãofoi

muitoenvolventeeevocativa.Euconseguiveracena.Aindaassim,nãofoi...Ah,meuDeus,comopossoexplicar?Colin percebeu que estava muito ansioso para que ela conseguisse se

expressar.– Às vezes – continuou Penelope –, quando lemos uma passagem

descritiva, ela é um tanto... bem, não sei... distante. Clínica, até. Você deuvida à ilha. Outras pessoas talvez dissessem que a água eramorna,masvocê a ligou a algo que todos conhecemos e compreendemos. Me deu asensaçãodeestarlá,mergulhandoodedodopébemaoseulado.Colinsorriu,ridiculamentesatisfeitocomoelogio.– Ah! E antes que eume esqueça, houve outra coisa brilhante que eu

queriamencionar.Agora ele estava sorrindo como um imbecil. Brilhante, brilhante,

brilhante.Quepalavraboa.Penelopeseaproximouumpoucodeleaodizer:– Também mostrou ao leitor como você reagiu à cena e como ela o

afetou.Tornou-sealgoalémdameradescrição,porquesoubemosqual foiasuareação.Colin sabiaqueestavapedindoparaserelogiado,masnãose importou

muitocomissoaoperguntar:–Oquequerdizer?–Bem,sevocêolharpara...Possoverodiáriooutravezpararefrescara

memória?– É claro – murmurou ele, entregando-o a ela. – Espere, deixe-me

encontrarapáginacertaparavocê.Assim que Colin lhe deu o caderno, Penelope vasculhou as linhas até

encontrarotrechoqueprocurava.

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–Bemaqui.Vejasóestaparte,ondevocêselembradequeaInglaterraéasuacasa.–Éengraçadocomoviajarpodefazerissocomumapessoa.–Fazeroquê?–quissaberela,comosolhoscheiosdeinteresse.–Fazerumapessoaapreciaroprópriolar–disseele,baixinho.Elaoencaroucomolhossérios,questionadores.–E,aindaassim,vocêgostadepartir.Eleassentiu.–Nãoconsigoevitar.Écomoumadoença.Elariuesuarisadasoouinesperadamentemelodiosa.–Não seja ridículo – falou. –Umadoença é algo nocivo. Está claro que

suasviagensalimentamasuaalma.–Elabaixouosolhosparaamãodeleepuxouoguardanapocomtodoocuidadoparainspecionaroferimento.–Jáestáquasemelhor–declarou.–Quase–concordouele.Na verdade, suspeitava que o sangramento tivesse estancado por

completo,masrelutavaempermitirqueaconversachegasseao im.Sabiaque,noinstanteemquePenelopeterminassedecuidardele,iriaembora.Elenãoachavaqueelaquisessepartir,mas,dealgumaforma,sabiaque

issoaconteceria.Considerariaqueeraomaisapropriadoe,provavelmente,tambémacreditariaqueeraissoqueeledesejava.Nadapoderiaestarmaislongedaverdade,elepercebeu,surpreso.Enadapoderiatê-loassustadomais.

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CAPÍTULO6

Todostêmsegredos.Sobretudoeu.

C

–Eu teria gostado de saber que você escrevia um diário – comentouPenelope,voltandoapressionaroguardanaposobreapalmadamãodele.–Porquê?– Não sei ao certo – respondeu ela, dando de ombros. – É sempre

interessante descobrir algo que não se imagina sobre uma pessoa, nãoacha?Colin não disse nada por vários instantes, então, de repente, deixou

escapulir:–Vocêgostoumesmo?Ela olhou para ele, achando graça, e Colin icou horrorizado. Lá estava

ele, considerado um dos homens mais populares e so isticados da altasociedade,reduzidoaumcolegialtímido,prestandoatençãoacadapalavrapronunciada por Penelope Featherington, apenas para receber algunselogios.PenelopeFeatherington,peloamordeDeus...Nãoquehouvessequalquercoisadeerradocomela,éclaro.Erasóque

elaera...bem...Penelope.–Éclaroquegostei–a irmouelacomumsorrisosuave.–Acabeidelhe

dizerisso.–Qualfoiaprimeiracoisaquelhechamouaatençãonotexto?–indagou

ele, decidindo agir comoum tolo completo, uma vez que já estava ameiocaminhodisso.Eladeuumsorrisomalicioso.–Naverdade,aprimeiracoisaquemechamouaatenção foiqueasua

letraébemmaiscaprichadadoqueeuteriaimaginado.

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Elefranziuatesta.–Comoassim?– Não consigo imaginá-lo debruçado sobre a escrivaninha praticando

caligrafia–respondeuela,tentandocontrolaroriso.Jamaishouveraummomentotãopropícioàindignaçãoquantoaquele.– Pois saiba que eu passei muitas horas naquela sala de aula, desde

muitopequeno,debruçadosobreaescrivaninha,comovocêdissedeformatãodelicada.–Tenhocertezaquesim–murmurouela.–Humpf.Elabaixouosolhos,claramentetentandonãosorrir.–Soumuitobomemcaligrafia–acrescentouele.Agoraaquilosetransformaranumabrincadeira,eerabastantedivertido

desempenharopapeldocolegialpetulante.–Maséclaroqueé–replicouela.–Gosteisobretudodosseusagás.São

muitobemfeitos.Muitobem...traçados.–Exatamente.Elafezamesmaexpressãodeseriedadedele.–Exatamente.Ele desviou o olhar do dela e, por um instante, sentiu uma timidez

inexplicável.–Ficocontentequetenhagostadododiário–falou.– Achei lindo – a irmou ela com delicadeza. – Encantador e... – Ela

desviouoolhar,ruborizando.–Vaimeachartola.–Nãovounão–prometeuele.–Bem,euachoqueumdosmotivospelosquaisgosteitantofoiquepude

sentir,dealgumaforma,oseuprazeremescrevê-lo.Colin passou um longo momento em silêncio. Jamais lhe ocorrera que

escreverfossealgoprazerosoparaele.Eraalgoquesimplesmentefazia.Fazia-oporquenãoconseguiase imaginarsemaquilo.Comoviajarpara

terras estrangeiras e não manter um registro do que via, do quevivenciavae,talvezomaisimportante,doquesentia?Mas,pensandoemretrospecto,sedeucontadequeexperimentavauma

estranhasatisfaçãosemprequeescreviaumafrasequesaíaperfeitamentecorreta, que expressava seus sentimentos com perfeição. Lembrava-se

Page 92: Os Segredos de Colin Bridgerton  - Julia Quinn

comnitidezdomomentoemqueescreveraapassagemquePenelopelera.Estiverasentadonapraiaaoanoitecer,osolaindaquentesobreapeleeaareia – de alguma forma grossa e macia ao mesmo tempo – sob os pésdescalços.Forauminstantemaravilhoso,repletodaquelasensaçãocálidaeindolenteque só épossível no augedo verão (ounaspraiasperfeitas doMediterrâneo),eelepensavanamelhorformadedescreveraágua.Ficarasentadoaliporumlongotempo–semdúvidaporcercademeia

hora – com a caneta posicionada sobre o diário, esperando a inspiração.Então, de repente, notara que a temperatura era exatamente igual à deuma água de banho já icando morna. Nesse momento, seus lábios seabriramnumsorrisolargoemaravilhado.Sim,elegostavadeescrever.Engraçadocomonuncasederacontadisso

antes.–Ébomteralgoquenosdêprazer–opinouPenelope,baixinho.–Algo

satisfatório, que preencha as horas com a sensação de um objetivo a seralcançado. – Ela cruzou as mãos sobre o colo e olhou para baixo,aparentemente muito interessada nos nós dos próprios dedos. – Nuncaentendiassupostasalegriasdeumavidaindolente.Colinsentiuvontadede levantaroqueixodela,deolhardentrodeseus

olhosaolheperguntar:Eoquevocêfazparapreencherassuashorascomasensaçãodeterumobjetivo? Masnãosemoveu.Teriasidoatrevidodemaiseoobrigariaaadmitirasimesmoquantoseinteressavapelaresposta.Assim,eledecidiufazerapergunta,masmanteveasmãosparadas.–Nada,naverdade–respondeuela,aindaexaminandoasunhas.Então,

apósumapausa,ergueuosolhostãoderepentequeelequase icoutonto.–Eugostodeler–revelou.–Leiobastante.Ebordoumpouco,devezemquando, embora não sejamuito boa. Gostaria que houvessemais do queisso,mas,bem...–Oquê?–insistiuColin.Penelopebalançouacabeça.– Não é nada. Você deve ser grato pelas suas viagens. Eu o invejo

bastante.Fez-seumlongosilêncio,nãoconstrangedor,masaindaassimestranho,

e,porfim,Colindisse,bruscamente:–Nãoéobastante.

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O tom de voz dele pareceu tão inadequado na conversa que Penelopenãopôdefazernadaalémdefitá-lo.–Oquequerdizer?–perguntou,porfim.Eledeudeombros.–Umhomemnãopode viajar para sempre. Isso comprometeria todo o

divertimentoinerenteaoatodeviajar.Elariu,entãoolhouparaeleesedeucontadequeelefalavasério.–Eusintomuito–retrucou.–Nãofoiminhaintençãosergrosseira.–Vocênãofoigrosseira–disseele,depoisbebeuumgoleda limonada.

Quandopousouo coponamesa, umpoucodo líquido se derramou; icouclaro que ele não tinha o costume de usar a mão esquerda. – As duasmelhores partes de uma viagem – começou a explicar, limpando a bocacomumdosguardanaposlimpos–sãoomomentodapartidaeodavoltapara casa. Além do mais, eu sentiria muita falta da minha família separtisseindefinidamente.Penelopenãotinharesposta,pelomenosnadaquenãosoassecomoum

clichê,portantoapenasesperouqueelecontinuasse.PorummomentoColin icoucalado,depoisdeuumsorrisodeescárnioe

fechouodiáriocomumsonorobaque.–Istonãoserveparanada.Ésóparamim.–Nãoprecisaser–disseela,comdelicadeza.Seeleaescutou,nãodeuamenorindicação.–Éótimoterumdiárioparaescreverduranteumaviagem–continuou

ele–,mas,quandochegoemcasa,nãotenhonadaparafazer.–Achodifícilacreditarnisso.Elenãorespondeu.Emvezdisso,limitou-seapegarumpedaçodequeijo

dabandeja.Então,depoisdeengoli-locommaisumgolede limonada,seucomportamento mudou por completo. Ele pareceu mais alerta, maisapreensivo,aolheindagar:–TemlidooWhistledown?Penelopepiscou,aturdidacomasúbitamudançadeassunto.–Sim,éclaro,porquê?Todomundolê,nãoé?Eledesconsiderouaperguntacomumacenodemão.–Jánotoucomoelamedescreve?–Bem,quasesempredemaneirafavorável,não?

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Ele começou a acenar com a mão outra vez – de forma bastantedesdenhosa,naopiniãodela.–Sim,sim,masnãoéessaaquestão–faloudistraidamente.–Sealgumavez tivessesidocomparadoauma frutacítricaquepassou

do ponto, talvez achasse que a questão é essa – replicou Penelope, umtantoirritada.Eleseretraiu,depoisabriuefechouabocaduasvezesantesdedizer:–Se issoa fazsesentirmelhor,eunãomelembravadequeelaatinha

chamado assim até agora. – Ele parou, pensou por um instante, entãoacrescentou:–Naverdade,continuosemlembrar.– Não tem importância – respondeu ela, assumindo sua melhor

expressãode“vejacomoeutenhoumótimoespíritoesportivo”.–Possolhegarantirquejápassou.Alémdomais,sempretiveumapreçoespecialporlaranjaselimões.Maisumavezeleabriuabocapara falar,masparou,emseguidaolhou

diretoparaelaefinalmentesepronunciou:– Espero que não ache o que vou dizer insensível ou insultante, dado

que,nofimdascontas,tenhomuitopoucodoquemequeixar.O que queria dizer, segundo Penelope entendeu, que talvez ela tivesse

muitodoquesequeixar.–Masvoulhedizermesmoassim–continuouele,comoolharcristalino

esincero–,porqueachoquetalvezcompreenda.Era um elogio. Um elogio estranho e incomum, mas ainda assim um

elogio.Penelopenãoqueriamaisnadaanãosercolocaramãoporcimadadele.Comonãopodiafazerisso,assentiucomacabeçaefalou:–Vocêpodemedizerqualquercoisa,Colin.– Meus irmãos – começou ele –, eles... – Colin se deteve e lançou um

olhar inexpressivo emdireção à janela antes de inalmente se virar paraela e prosseguir: – Eles realizaram grandes coisas. Anthony é visconde eDeussabequeeunãogostariade teressaresponsabilidade,masele temumobjetivonavida.Todaanossaherançaestánasmãosdele.–Maisdoqueisso,até,imagino–observouPenelope,baixinho.Eleafitoucomumardeinterrogação.– Eu acho que seu irmão se sente responsável pela família toda –

explicouela.–Imaginoquesejaumfardopesado.

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Colintentoumanterorostoimpassível,masoestoicismonuncaforaumade suas características e ele deve ter demonstrado seu assombro, poisPenelopequasepuloudacadeiraeseapressouemacrescentar:–Nãoqueeuachequeeleseimporte!Fazpartedequemeleé.– Exatamente! – exclamou Colin, como se acabasse de descobrir algo

muito importante, ao contrário daquela... daquela discussão inútil arespeitodaprópriavida.Elenãotinhanadadoquesequeixar.Tinhaconsciênciadisso.–VocêsabiaqueBenedictpinta?–perguntou.– É claro – respondeu ela. – Todos sabem. Há um quadro dele na

National Gallery. E creio que estejam planejando expor outro em breve.Outrapaisagem.–Émesmo?Elafezquesim.–FoioqueEloisemecontou.Eleseretraiuoutravez.–Entãodeveserverdade.Nãoacreditoqueninguémtenhamecontado.–Bem,vocêestevefora...–recordouPenelope.– O que estou tentando dizer – continuou ele – é que os dois têm um

objetivoemsuasvidas.Eunãotenhonada.–Issonãopodeserverdade–retrucouela.–Achoquequemsabedissosoueu.Penelopeserecostou,perplexacomarispidezdele.–Euseioqueaspessoaspensamdemim–prosseguiuColin.Embora Penelope houvesse dito a si mesma que permaneceria em

silêncio para ouvir o que ele tinha a dizer, não conseguiu evitarinterrompê-lo:–Todomundogostadevocê.Todosoadoram.–Eusei–gemeuele,parecendoangustiadoea litoaomesmo tempo.–

Mas...–Passouosdedosabertospeloscabelos.–MeuDeus,comofalarissosemparecerumimbecil?Penelopearregalouosolhos.–Estoucansadodemeconsideraremumsujeitoencantadoresemnada

nacabeça–disseele,porfim.–Nãosejatolo–respondeuelaimediatamente.

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–Penelope...–Ninguémoconsideraburro.–Comovocêpoderiasaberis...–PorqueestoupresaemLondreshámuitomaistempodoquequalquer

pessoadeveria icar–interrompeuela,ríspida.–Talvezeunãosejaamaispopulardacidade,masdepoisdedezanosjáouvimaisboatos,mentiraseopiniões idiotasdoqueprecisava,enunca,nemumavez,ouviquemquerquefossesereferiravocêcomoumburro.Elea itouporummomento,umtantoatordoadodiantedetãoacalorada

defesa.–Eunãoquisdizerburroexatamente–começouele,comavozbaixae,

esperava, humilde. – Quis dizer mais... sem substância. Até LadyWhistledownserefereamimcomoumsedutor.–Eoquehádeerradonisso?–Nada–replicouele,irritado–,seelanãoofizessediasim,dianão.–Acolunasóépublicadadiasim,dianão.– É justamente a isso que estoume referindo – devolveu ele. – Se ela

pensasse que eu tenho qualquer outra coisa de interessante além dosmeuslendáriosencantos,nãoachaqueaestaalturajáteriamencionado?Penelopepassouumlongomomentoemsilêncio,entãorefletiu:–Oqueelapensaémesmotãoimportante?Ele deixou o corpo pender para a frente e bateu com as mãos nos

joelhos,dandoumgritodedoraoselembrar(tardedemais)doferimento.– Você não está entendendo a questão – reclamou ele, fazendo uma

caretaaovoltarapressionarapalmadamão.–EunãodouamínimaparaoqueLadyWhistledownpensa.Mas,queiramosounão, ela representaorestantedasociedade.–Achoquemuitaspessoasdiscordariamdevocê.Eleergueuumadassobrancelhas.–Incluindovocê?– Na realidade, acho Lady Whistledown bastante astuta – disse ela,

cruzandoasmãoscomportadamentesobreocolo.–Amulherachamoudemelãomaduro!Duasbolotasvermelhaslhecoloriramasfaces.–Umafrutacítricamadurademais–corrigiuelaporentreosdentes.–

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Possolhegarantirqueháumaenormediferença.Colindecidiu,naquelemomento,queamentefemininaeraalgoestranho

e incompreensível – algo que um homem jamais deveria tentarcompreender. Não havia uma única mulher viva que conseguisse ir dopontoAaoBsemparardiversasvezespelocaminho.– Penelope – falou, olhando para ela estupefato –, amulher a insultou.

Comopodedefendê-la?– Ela não disse nada que não fosse verdade – respondeu a jovem,

cruzando os braços. – E, na verdade, tem sido bastante gentil desde queminha mãe passou a permitir que eu escolhesse as minhas própriasroupas.Colingemeu.–Tenhocertezadequeestávamos falandodeoutracoisa.Diga-meque

nãotínhamosaintençãodediscutiroseuguarda-roupa.Penelopeestreitouosolhos.–Creioqueestávamosdiscutindosuainsatisfaçãocomavidadehomem

maispopulardeLondres.ElaergueuavozaopronunciarasquatroúltimaspalavraseColinsedeu

conta de que estava sendo repreendido. Claramente. O que consideroumuitoirritante.–Nãoseiporqueacheiquecompreenderia–vociferou,odiandoo tom

meioinfantildaprópriavoz,masincapazdeevitá-lo.–Medesculpe–disseela–,masédi ícil icaraquisentadaouvindovocê

dizerquesuavidanãoénada.–Eunãofaleiisso.–Falousim!–Eudissequenãotenho nada– corrigiu ele, tentandonão se encolher

aoconstatarquãoidiotaaquilosoava.–Vocêtemmaisdoquequalquerpessoaqueeuconheço–retrucouela,

cutucando-onoombro.–Mas,senãosedácontadisso,talveztenharazão:suavidanãoénada.–Émuitodifícilexplicar–insistiuele,nummurmúriopetulante.–Seoquedesejaédarumnovorumoasuavida–começouela–,então,

pelo amor de Deus, escolha alguma coisa e faça. O mundo lhe pertence,Colin. Você é jovem, rico, e éhomem. – A voz de Penelope tornou-se

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amarga,ressentida.–Podefazeroquequiser.Ele franziu a testa, o que não a surpreendeu. Quando as pessoas se

convenciam de que tinham problemas, a última coisa que desejavam eraouvirumasoluçãoóbviaeobjetiva.–Nãoétãosimplesassim–afirmouele.–Claroqueé.Elao itouporumlongomomentoseperguntando, talvezpelaprimeira

veznavida,quemeraele,exatamente.Achavaquesoubesse tudoa seu respeito,masnão tinhaamenor ideia

dequeescreviaumdiário.Nemdequeera temperamental.Muitomenosdequeestavainsatisfeitocomavida.E sem dúvida não imaginava que era petulante e mimado o su iciente

para sentir essa insatisfação quando qualquer um sabia que não tinhamotivopara tal.Quedireitoele tinhade se considerar infeliz comavida?Comoousavasequeixar,sobretudoparaela?Penelope se levantou e alisou o vestido num gesto desajeitado e

defensivo.– Da próxima vez que quiser reclamar sobre os percalços e as

atribulaçõesdeseradoradoportodos,tenteserumasolteironaencalhadaporumdia.Vejaqualéasensaçãoedepoismeavisesedesejacontinuarselamentando.Então, enquanto Colin continuava esparramado no sofá, olhando para

Penelope como se ela fosse uma criatura bizarra de três cabeças, dozededoseumacauda,eladeixouoaposento.Foi,pensouela,enquantodesciaosdegrausexternosquelevavamàRua

Bruton,asaídamaisesplêndidadetodaasuaexistência.Eramesmoumapenaqueohomemque ela acabaradedeixar fosse o

únicoemcujacompanhiaelaquiseraterpermanecido.

Colinsesentiupéssimoodiatodo.Amãodoíahorrivelmente,apesardoconhaquequeeledespejarasobre

apeleegoelaabaixo.OcorretorquecuidaradocontratodaaconchegantecasinhacomvarandaqueeleencontraraemBloomburylheinformaraque

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o inquilino anterior ainda não tinha deixado o lugar e que Colin nãopoderia se mudar naquele dia, conforme planejado. Será que seriaaceitável?E,parapiorartudo,elesuspeitavaquetalveztivessecometidoumdano

irreparávelàsuaamizadecomPenelope.Issoo faziasesentirpéssimo,umavezquea)davaenormevaloràsua

relaçãocomelaeb)nãosederacontadequantovalorizavaaamizadecomela,oquec)odeixavanumleveestadodepânico.Penelopesempreestiverapresenteemsuavida.Amigadesuairmã,era

aquela que vivia à margem nas festas; por perto, mas nunca realmentefazendopartedascoisas.No entanto, o mundo parecia estar diferente. Só tinha voltado à

Inglaterra havia duas semanas, mas já podia perceber que Penelopemudara. Ou talvez ele tivesse mudado. Ou talvez ela não tivesse, mas aformacomoeleaolhava,sim.Elaeraimportante.Nãohaviaoutraformadeexpressar.E, depois de ela simplesmente estar ali havia dez anos, era um tanto

bizarroquetivessetantaimportânciaparaele.Ficaraincomodadocomofatodeteremsedespedido,naquelatarde,de

maneiratãodesajeitada.Nãoselembravadetersesentidodesconfortávelcom Penelope alguma vez na vida – não, isso não era verdade. Naquelaocasião... Por Deus, quantos anos fazia? Seis? Sete? A mãe começara aatormentá-lo para que se casasse, o quenão era novidade alguma, a nãoser pelo fato de, daquela vez em especial, ter sugerido Penelope comonoiva potencial. No dia em questão, Colin não estava no clima para lidarcomoespíritocasamenteirodamãecomoemgeral lidava:devolvendoasbrincadeiras.Então Violet se recusara a parar. Passara o dia inteiro falando sobre

Penelope, depois a noite toda, ao que parecera, até Colin en im deixar opaís.Nadaderadical,apenasumapequenaviagemaoPaísdeGales.Mas,pensandobem,oquederanamãedele?Quando ele voltara a Londres, ela quisera ter uma conversa comele, é

claro–sóque,dessavez,porqueairmã,Daphne,estavagrávidadenovoedesejava fazer o anúncio quando toda a família estivesse reunida. Mascomo ele poderia ter adivinhado? Assim, não ansiava pela visita, já que

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tinha certezadeque envolveria uma série de sugestõesnada sutis sobrecasamento. Então, ao encontrar com os irmãos, eles haviam começado aatormentá-loexatamentesobreomesmoassunto,daquelamaneiraquesóirmãosconseguemfazer,e,quandoelesedeuconta,estavaa irmando,emumtomdevozmuitoalto,quenãoiasecasarcomPenelopeFeatherington!Oproblema foique,poralgummotivo,Penelopeestavabemali,parada

no vão da porta, com a mão sobre a boca, os olhos arregalados de dor,vergonhae,provavelmente,umadezenadeoutrasemoçõesdesagradáveisqueeleficariaenvergonhadodemaisparapesquisarmaisafundo.Aquele fora umdos pioresmomento de sua vida. Um, na verdade, que

ele fazia o possível para não lembrar. Não acreditava que Penelopeestivesseinteressadanele–pelomenosnãomaisdoqueasoutrasmoças–, mas ele a envergonhara. Mencioná-la, especi icamente, ao fazer umanúnciodaqueles...Aquiloforaimperdoável.Ele pedira desculpas, é claro, e ela as aceitara, mas Colin jamais se

perdoaraporcompleto.E,agora,eleainsultaraoutravez.Nãodeformadireta,semdúvida,mas

deveriaterpensadomelhorantesdesequeixardaprópriavida.Diabos, como aquilo soara idiota, até mesmo para ele. Que motivo ele

tinhaparareclamar?Nenhum.E, no entanto, ainda sentia aquele vazio insistente. Um anseio, na

verdade,poralgoquenãoconseguiade inir.Tinha invejados irmãos,porteremencontradosuaspaixões,porestaremconstruindoseulegado.A únicamarca que Colin deixara nomundo se encontrava nas colunas

sociaisdeLadyWhistledown.Quepiada.Mas tudo era relativo, não era?Comparado aPenelope, tinhapoucodo

quesequeixar.Isso provavelmente signi icava que devia ter mantido as próprias

inquietações apenas para si. Não gostava de pensar em Penelope comoumasolteironaencalhada,massupunhaqueeraissomesmoqueelaera.Eaquelanãoeraumaposiçãomuitorespeitávelnasociedadeinglesa.Naverdade,eraumasituaçãosobreaqualmuitagentesequeixariacom

amargura.

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Mas Penelope sempre se mostrara bastante resignada – talvez nãosatisfeitacomoseudestino,porémaomenosaceitando-o.Equempoderiasaber?Talvezelativesseanseiosesonhosdeumavida

alémdaquecompartilhavacomamãeecomairmãnacasadaRuaMount.Talveztivesseplanoseobjetivosmasosguardasseparasiportrásdeumvéudedignidadeebomhumor.Talvezhouvessemaisaseurespeitodoqueparecia.Talvez, pensou ele com um suspiro, ela merecesse um pedido de

desculpas. Ele não sabia exatamente por que deveria se desculpar; nãoestavacertodequehouvesseummotivopreciso.Masasituaçãoexigiaalgumacoisa.Ora, diabos. Agora teria de comparecer ao sarau dos Smythe-Smiths

naquelanoite.Tratava-sedeumeventoanualsofridoedissonante;sempreque se acreditava que todas as meninas da família haviam crescido,alguma prima nova surgia para tomar o seu lugar, cada qual maisdesafinadadoqueaanterior.MaseraláquePenelopeestarianaquelanoite,oquesigni icavaqueera

ondeColinteriadeestar,também.

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CAPÍTULO7

Colin Bridgerton esteve cercado por um bom número de moças nosarau dos Smythe-Smiths na noite de quarta-feira, todas elasdemonstrandoumaenormepreocupaçãocomasuamãomachucada.Estaautoranãosabecomoocorreuoferimento–naverdade,oSr.

Bridgertonvemsemantendoirritantementediscretoarespeitodele.E, por falar em irritação, o cavalheiro emquestão pareceu bastanteincomodado com tanta atenção. Na verdade, esta autora o ouviudizer ao irmão, Anthony, que gostaria de ter deixado o (palavrairrepetível)curativoemcasa.

C

Porque,porque,porqueelafaziaaquiloconsigomesma?Ano após ano, o convite chegava via mensageiro e ano após ano

Penelopejuravaquenunca,emnomedeDeus,nuncamaiscompareceriaaoutrosaraudosSmythe-Smiths.E, no entanto, ano após ano ela se via sentada na sala de música da

família, tentando desesperadamente não se encolher (pelomenos não deformaperceptível) enquantoaúltimageraçãodemeninasSmythe-SmithstrucidavamascomposiçõesdopobreSr.Mozart.Eradoloroso.Horrível,pavoroso,hediondo.Naverdade,nãohaviaoutra

formadedescreveraexperiência.Maisassombrosoerao fatodequePenelope,dealgumaforma,sempre

acabava na primeira ileira, ou próxima a ela, o que era ainda maismartirizante.Enãoapenasparaosouvidos.Acadapoucosanos,umadasmeninas Smythe-Smiths parecia se dar conta de que estava participandodoquesópodiaserchamadodecrimecontraasleisauditivase,enquantoas outras atacavam violinos e pianos com um vigor inabalável, esse serímpar tocava com uma expressão de dor que Penelope conhecia muitobem.

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Era a expressão que se fazia quando se desejava estar em qualqueroutro lugar que não aquele. Podia-se tentar ocultá-la, mas o desconfortosempreficavaevidentenoslábiosrijoseesticados.Enosolhos,éclaro.DeussabiaquePenelopeforaamaldiçoadacomaquelaexpressãomuitas

vezes.Talvez fosse por isso que jamais conseguia icar em casa nas noites do

referidosarau.Alguémtinhadesorrirdeformaencorajadoraefingirestargostando damúsica. Alémdomais, só precisava ouvir aquilo uma vez aoano.Ainda assim, era impossível não pensar na fortuna que poderia ser

ganhacomafabricaçãodediscretostampõesdeouvidos.O quarteto de meninas se preparava – uma confusão de notas

dissonanteseescalasquesóprometiampiorarassimqueelascomeçassema tocar de fato. Penelope escolhera um lugar nomeio da segunda ileira,paracompletaafliçãodairmã,Felicity.– Mas há dois lugares ótimos no canto, ao fundo – sibilou ela, em seu

ouvido.– Agora é tarde – devolveu Penelope, acomodando-se na cadeira

levementeacolchoada.–QueDeusmeajude–gemeuFelicity.Penelopepegouoprogramaecomeçouafolheá-lo.–Senãonossentarmosaqui,outrapessoahaverádesesentar.–Éissoqueeuquero!Penelopeseaproximoudairmãdemaneiraqueapenaselaaouvisse.–Podemcontarconoscoparasorrirmosesermoseducadas. Imaginese

alguém como Cressida Twombley se sentar aqui e passar o tempo tododandorisadinhasdedesdém.Felicityolhouàsuavolta.–CressidaTwombleynãoseriavistaaquinemmorta.Penelopeescolheuignoraraobservação.–Aúltima coisadaqual elasprecisaméde alguémaquina frenteque

gostede fazer comentáriospouco lisonjeiros.Aspobresmeninas icariamtãoofendidas...–Vãoficarofendidasdequalquermaneira–murmurouFelicity.–Não,nãovão–discordouPenelope.–Pelomenosnãoaquela,aquelaou

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aquela – falou, apontando para as duas dos violinos e a do piano. Masaquela–continuou,fazendoumdiscretosinalemdireçãoàjovemsentadacomumviolonceloentreosjoelhos–jáestásesentindopéssima.Omínimoque podemos fazer é não piorar as coisas permitindo que uma pessoamaldosaecruelsesenteaqui.– Ela só vai ser arrasada mais para o inal da semana, por Lady

Whistledown–sussurrouFelicity.Penelopeabriuabocaparadizermaisalgumacoisa,masnaqueleexato

instantesedeucontadequeEloisechegaraeacabaradeocuparoassentodoseuoutrolado.– Eloise – exclamou Penelope, obviamente encantada. – Pensei que

tivesseplanejadoficaremcasa.Ajovemfezumacareta.–Nãoseicomoexplicar,masnãoconsigonãovir.Émaisoumenoscomo

umacidentedecarruagem.Éimpossívelnãoolhar.–Ouescutar–observouFelicity–,comopareceserocaso.Penelopesorriu.Nãofoicapazdeevitar.– Será que as ouvi falar de Lady Whistledown quando cheguei? –

indagouEloise.–EuestavacomentandocomPenelope–retrucouFelicity,debruçando-

seporcimadairmãsemumpingodeelegânciaparaconversarcomEloise– que asmeninas vão ser destruídas por LadyWhistledownmais para ofinaldasemana.–Nãosei–respondeuEloise,pensativa.–Elanãocostumaimplicarcom

asSmythe-Smithstodososanos.Nãoseiporquê.–Eusei–cacarejouumavozvindadetrásdelas.As três se viraram em suas cadeiras, então tiveram um pequeno

sobressalto quando a bengala de Lady Danbury chegou perigosamentepróximadeseusrostos.– LadyDanbury – grunhiuPenelope, incapaz de resistir ao impulso de

tocaropróprionariz,apenasparasecertificardequecontinuavanolugar.–EujáconseguientenderLadyWhistledown–afirmouavelhasenhora.–Émesmo?–provocouFelicity.– Ela tem o coração mole – continuou a outra. – Está vendo aquela –

falou, apontando a bengala na direção da violoncelista, quase furando a

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orelhadeEloiseaofazê-lo–bemali?–Sim–respondeuEloise,esfregandoaorelha–,emboraeujánãoache

queváconseguirescutá-la.– Provavelmente uma bênção – comentou Lady Danbury antes de

retornaraoassunto.–Podemeagradecermaistarde.–Estavadizendo algo sobre a violoncelista? –perguntouPenelope com

bastante habilidade, antes que Eloise izesse algum comentárioinapropriado.– É claro que estava. Olhem só para ela – prosseguiu LadyDanbury. –

Estáextremamenteinfeliz.Etemrazão.Éaúnicaquetemalgumanoçãodequãopéssimaselassão.Asoutras três têmasensibilidademusicaldeummosquito.Penelope olhou para a irmã com uma expressão de completa

superioridade.– Podem escrever o que digo – continuou Lady Danbury. – Lady

Whistledown não dirá uma palavra sobre este sarau. Não vai querermagoaraquelaali.Oresto...Felicity, Penelope e Eloise se abaixaram no instante em que a bengala

passou.–Ora,elanãodáamenorimportânciaaoresto.–Éumateoriainteressante–comentouPenelope.Satisfeita,LadyDanburyrecostou-seemsuacadeira.–Nãoémesmo?Penelopeassentiucomacabeça.–Eachoquetemrazão.–Humpf.Quasesempretenho.Ainda virada na cadeira, Penelope olhou primeiro para Felicity, em

seguidaparaEloise,edisse:– É o mesmo motivo pelo qual eu venho a esses saraus infernais ano

apósano.–ParaverLadyDanbury?–indagouEloise,piscandoaturdida.– Não. Por causa demeninas como ela – revelou Penelope, apontando

paraavioloncelista.–Porqueeuseiexatamentecomoelasesente.–Não seja tola, Penelope – retrucou Felicity. – Você nunca tocou piano

empúblicoe,mesmosetocasse,émuitoboapianista.

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Penelopevirou-separaairmã.–Nãotemavercomamúsica,Felicity.NessemomentoumacoisamuitoestranhaaconteceucomLadyDanbury.

Suaexpressãose transformouporcompleto.Osolhos icaramsembrilho,tristes. Os lábios, em geral levemente rijos nos cantos, e sarcásticos, sesuavizaram.–Eu tambémfuiaquelamenina,Srta.Featherington–con idenciou, tão

baixinho que tanto Eloise quanto Felicity foram forçadas a se aproximar,Eloise proferindoum “Comodisse?” e Felicity comumbemmenos polido“Oquê?”.MasLadyDanburysótinhaolhosparaPenelope.–Eéporissoqueeuvenho,anoapósano–prosseguiuavelhasenhora

–,assimcomovocê.Poruminstante,Penelopesentiuumaestranhaconexãocomela.Oque

eraumaloucura,poisnãotinhamnadaemcomumalémdogênero–nemidade, posição social ou qualquer outra coisa. E, no entanto, era quasecomoseacondessaativesseescolhido–comqueobjetivo,Penelopejamaisteriacomoadivinhar.Ocertoéquepareciadecididaaatiçarumfogosobavidaordeiraemuitasvezesentediantedajovem.EPenelopenãopodianegarqueestava,dealgumaforma,funcionando.Não é ótimo descobrirmos que não somos exatamente o que pensávamos

ser?AspalavrasditasporLadyDanburypoucasnoitesantesaindaecoavam

nacabeçadePenelope.Quasecomoumalitania.Quasecomoumdesafio.– Sabe o que eu acho, Srta. Featherington? – indagou LadyDanbury, o

seutomenganosamentesuave.– Não faço a mais vaga ideia – retrucou Penelope com bastante

franqueza,erespeito.–AchoquevocêpoderiaserLadyWhistledown.FelicityeEloisearfaram.Penelope entreabriu os lábios, surpresa. Ninguém jamais pensara em

acusá-ladetalcoisaantes.Erainacreditável...impensável...e...Bastantelisonjeiro,naverdade.Ela sentiu aboca formarumsorrisomalicioso, então se inclinouparaa

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frente como se estivesse prestes a compartilhar novidades muitoimportantes.LadyDanburychegouparaafrente.FelicityeEloisetambém.– Sabe o queeu acho, Lady Danbury? – disse Penelope, numa voz

sedutoramentesuave.– Bem – retrucou Lady D., com um brilho astucioso nos olhos –, eu

poderia responderque estou sem fôlegode tanta ansiedade,mas você jámefalou,certavez,queachavaqueeueraLadyWhistledown.–Eé?Avelhasenhoraabriuumsorrisoardiloso.–Talvez.FelicityeEloisesufocaramoutrogrito,aindamaisprementedestavez.Penelopesentiuoestômagodarumacambalhota.–Asenhoraestáadmitindoqueé?–sussurrouEloise.–É claroquenão! – ladrouLadyDanbury, se empertigando ebatendo

comabengalanochãocomforçasu icienteparafazercomqueasquatromusicistas amadoras parassem o aquecimento. – E, mesmo que fosseverdade, e eu não estou dizendo que seja, por acaso eu seria tola osuficienteparaadmitir?–Entãoporquedisse...–Porque,suatolinha,estoutentandoexplicarumargumento.EloiseficousilêncioatéPenelopeserforçadaaperguntar:–Equeargumentoseriaesse?LadyDanburylheslançouumolharexasperado.– Que qualquer pessoa poderia ser Lady Whistledown – exclamou,

batendocomabengalanochãocomvigorrenovado.–Qualqueruma.–Bem,excetoeu–atalhouFelicity.–Tenhocertezaabsolutaquenãosou

eu.LadyDanburynãosedignounemaolharparaela.–Deixem-melhesdizerumacoisa–falou.–Comosepudéssemosimpedi-la–observouPenelope,comtantadoçura

quepareceuumelogio.E, na verdade,era um elogio. Ela tinha bastante admiração por Lady

Danbury.Admiravaqualquerpessoaqueconseguissedizeroquepensavaempúblico.

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Avelhasenhorariu.– Você é bem mais profunda do que se percebe à primeira vista,

PenelopeFeatherington.–Éverdade–concordouFelicity,sorrindo.–Elasabeserbastantecruel,

porexemplo.Ninguémacreditarianisso,masquandoéramospequenas...Penelopelhedeuumacotoveladanascostelas.–Viusó?–reclamouFelicity.– O que eu ia dizer – continuou Lady Danbury – era que todos estão

agindodemaneiracompletamenteerradacomrelaçãoaomeudesafio.–Ecomosugerequeajamos,então?–indagouEloise.AsenhoraacenoucomamãobemàfrentedorostodeEloise.–Primeirotenhodeexplicaroqueaspessoasestãofazendodeerrado–

começou.–Ficamolhandoparaossuspeitosóbvios.Gentecomoasuamãe–declarou,virando-separaPenelopeeFelicity.–Nossamãe?–ecoaramambas.–Ora,porfavor–zombouLadyDanbury.–Estacidadejamaisconheceu

pessoa tão intrometida. É exatamente o tipo de pessoa de quem todomundodesconfia.Penelopenãotinhaamenorideiadoqueresponder.Amãe era,defato,

uma notória fofoqueira, embora fosse di ícil imaginá-la como LadyWhistledown.–Éporisso–continuouLadyDanbury,comumolharmuitoastuto–que

nãopodeserela.–Bem,isso–retrucouPenelope,comumtoquedesarcasmo–eofatode

queFelicityeeupodemosafirmar,comcerteza,quenãoéela.–Ora,sesuamãefosseLadyWhistledown,teriaencontradoumaforma

deimpedirquevocêssoubessem.–Minhamãe?–disseFelicity,comsériasdúvidas.–Nãocreio.–Oqueeuestavatentandoargumentar–insistiuLadyDanbury, icando

impaciente–,antesdetodasessasinterrupçõesinfernais...PenelopeachouterouvidoEloiseresfolegar.– ... era que se, Lady Whistledown fosse alguém óbvio, já teria sido

descoberta,nãoacham?Todas icaram em silêncio, até se tornar claro que a velha senhora

aguardavaumaresposta,entãoastrêsassentiramcomumarpensativoe

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ovigoresperado.– Deve ser uma pessoa de quem ninguém suspeitaria – sugeriu Lady

Danbury.–Sópodeser.Penelope assentiu. A teoria de Lady Danbury estranhamente fazia

sentido.–Épor isso–prosseguiuavelha senhora, triunfante–queeunão sou

umacandidataprovável!Penelope piscou repetidamente, aturdida, sem entender muito bem a

lógica.–Comodisse?– Ora,por favor. – Lady Danbury olhou para Penelope com o mais

absolutodesdém.–Achamesmoque foiaprimeirapessoaasuspeitardemim?Penelopeselimitouabalançaracabeça.–Eucontinuoachandoqueéasenhora.Isso lhe rendeuumadosede respeito.LadyDanburyassentiuemsinal

deaprovaçãoenquantodizia:–Vocêémaisinsolentedoqueparece.Felicityseinclinouparaafrenteefalou,numavozconspiratória:–Issoéverdade.Penelopedeuumtapanamãodairmã.–Felicity!–Achoqueosarauvaicomeçar–avisouEloise.–QueDeusnosajude–retrucouLadyDanbury.–Nãoseiporque...Sr.

Bridgerton!Penelope tinhaseviradode frenteparaopequenopalco,mas tornoua

sevoltarparatrása tempodeverColinpercorrera ileiraesesentaraolado de Lady Danbury, pedindo desculpas ao esbarrar nos joelhos daspessoaspelasquaisiapassando.Os pedidos de desculpa eram acompanhados, é claro, por um de seus

sorrisos fatais,enadamenosdoque trêssenhorassimplesmente icaramcompletamentederretidasemsuascadeiras.Penelopearqueouassobrancelhas.Eralamentável.–Penelope–sussurrouFelicity–,poracasovocêacabouderosnar?–Colin–disseEloise–,eunãosabiaquevinha.

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Eledeudeombros,orostoiluminadoporumsorrisodelado.– Mudei de ideia no último instante. A inal, sempre fui um grande

amantedemúsica.– Issoexplicaasuapresençaaqui–comentouEloisenumtombastante

irônico.Em resposta, Colin se limitou a arquear a sobrancelha. Em seguida se

virouparaPenelopeedisse:– Boa noite, Srta. Featherington. – Depois acenou com a cabeça para

Felicityecumprimentou:–Srta.Featherington.Penelope levou um instante para encontrar a voz. Os dois haviam se

despedido de forma bastante estranha naquela tarde, e agora, ali estavaelecomumsorrisosimpático.–Boanoite,Sr.Bridgerton–conseguiudizer,porfim.–Alguémsabequaléoprogramadestanoite?–indagouele,mostrando-

semuitointeressado.Penelope foi obrigada a admirar aquilo. Colin tinha a capacidade de

olhar para uma pessoa como se nada no mundo pudesse ser maisimportante do que aquilo que ela fosse dizer. Era um talento e tanto.Sobretudo naquele momento, em que todos sabiam que ele não dava amenorimportânciaparaoqueasmeninasSmythe-Smithsteriamescolhidotocar.–AcreditoquesejaMozart–opinouFelicity.–Elasquasesempretocam

Mozart.–Encantador–retrucouColin,recostando-senacadeira,comosetivesse

acabado de comer uma excelente refeição. – Sou um grande fã do Sr.Mozart.–Nessecaso–falouLadyDanbury,acotovelando-onascostelas–,talvez

queirafugirdaquienquantoapossibilidadeaindaexiste.– Não seja tola – disse ele. – Estou certo de que as meninas darão o

melhordesi.–Ah,nãohádúvidadequeasmeninasdarãoomelhorde si –atalhou

Eloise,emumtomdemauagouro.–Shhh–fezPenelope.–Achoquevãocomeçar.Ela não estava particularmente ansiosa para ouvir a versão Smythe-

Smith deEine Kleine Nachtmusik, admitiu para si mesma . Mas se sentiu

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muitopoucoàvontadecomColin.Nãosabiaaocertooquedizeraele,eoquequerquedevessedizernãodeviaserditonafrentedeEloise,Felicitye,sobretudo,LadyDanbury.Ummordomosurgiueapagoualgumasvelasdeformaasinalizarqueas

meninas estavamprontas para começar. Penelope se preparou e engoliuem seco para tentar entupir os canais auditivos (não funcionou), então atorturacomeçou.Econtinuou...econtinuou...econtinuou.Penelope não sabia o que era pior: a música ou a consciência de que

Colinestavasentadobematrásdela.Sentiuumarrepionanucaaopensarnisso e começou a se remexer como uma louca, os dedos tamborilando,implacáveis,sobreoveludoazul-escurodovestido.QuandooquartetoSmythe-Smith inalmenteterminoudetocar,trêsdas

meninas se mostraram radiantes com o aplauso educado e a quarta – avioloncelista–pareciaquererseesconder.Penelopedeixouescaparumsuspiro.Pelomenosela, em todasas suas

temporadas fracassadas, jamais havia sido forçada a exibir as suasde iciênciasdiantedetodaaaltasociedadecomoaquelasmeninas.Semprelhe havia sido permitido se ocultar nas sombras, icando em silêncio noslimites do salão, observando as outras moças se alternarem na pista dedança. Sim, a mãe a carregava para lá e para cá, tentando colocá-la nocaminhodesseoudaquelecavalheirodisponível,mas issonãoeranada–nada – comparado ao que as meninas Smythe-Smith eram forçadas aenfrentar.Embora, para ser sincera, três das quatro parecessem ignorar

alegremente sua inépcia musical. Penelope limitou-se a sorrir e a baterpalmas.Semdúvidaelanãoiaacabarcomafestadasmoças.E,seateoriadeLadyDanburyestivessecorreta,LadyWhistledownnão

haveriadeescreverumaúnicapalavrasobreosarau.Os aplausos logo diminuíram e em poucos instantes todos circulavam

pelo salão, puxando conversa uns com os outros, de olho na mesa depetiscosescassosnofundodoaposento.–Limonada–murmurouPenelopeparasimesma.Perfeito. Estava sentindomuito calor – ora, noque estavapensando ao

usar veludo numa noite tão quente? –, e uma bebida gelada era

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exatamente o que precisava. Além disso, Colin estava entretido numaconversa com Lady Danbury, fazendo daquele omomento ideal para elafugirdali.Mas,assimquepegouumcopocomabebida,ouviuavozdolorosamente

familiardeleàssuascostas,murmurandooseunome.Elaseviroue,antesdeteramenorideiadoquefazia,disse:–Eusintomuito.–Sente?–Sinto–garantiuela.–Pelomenos,achoquesim.Eleestreitouosolhos,epequenasrugasseformaramnoscantos.–Estaconversasófazficarmaisintriganteacadasegundo.–Colin...Elelheestendeuobraço.–Nãoquerdarumavoltacomigopelosalão?–Eunãoacho...Colinaproximouobraçoaindamaisdela–só2ou3centímetros,masa

mensagemeraclara.–Porfavor–insistiu.Elafezquesimepousouocoponamesa.–Estábem.Caminharamemsilêncioporquaseumminuto,entãoColindisse:–Eugostariademedesculparcomvocê.–Fuieuquesaídasaladeformatempestuosa–observouPenelope.Colin inclinouacabeçade leveeelapercebeuosorriso indulgenteque

brincavanoslábiosdele.–Eunãodiriaquefoi“tempestuosa”–retrucouele.Penelope franziu a testa.Nãodeveria ter ido emboramostrando-se tão

ofendida,masagoraqueo izera,sentia-seestranhamenteorgulhosa.Nãoeratodososdiasqueumamulhercomoelatinhaaoportunidadedefazerumasaídatãodramática.–Bem,eunãodeveriatersidotãogrosseira–murmurouela,semmuita

sinceridadedessavez.Ele arqueou uma das sobrancelhas, obviamente decidido a continuar o

quetinhaadizer.–Eugostariademedesculparporserumfedelhomimadoechorão.

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Penelopechegouatropeçarnosprópriospés.Eleaajudouarecuperaroequilíbrio,entãocontinuou:– Sei que há muitas coisas na minha vida pelas quais eu deveria ser

grato. Pelas quais eusou grato – corrigiu-se, um pouco acanhado. – Fuiimperdoavelmentegrosseiroaomequeixarcomvocê.– Não – insistiu ela –, passei a noite toda pensando no que disse, e

emboraeu...–Elaengoliuemseco,entãopassoualínguapeloslábios.Passaraodiatodoprocurandoaspalavrasadequadaseacreditavaque

as tivesse encontrado, mas agora que ele estava ali ao seu lado, nãoconseguiapensaremnada.– Está precisando de mais um copo de limonada? – perguntou Colin,

educadamente.Elafezquenão.– Você tem todo o direito de sentir o que quiser – disse de forma

atabalhoada. – Pode não ser o que eu sentiria se estivesse no seu lugar,mastodososseussentimentossãolegítimos.Noentanto...Ela se deteve e Colin se viu desesperado para saber o que ela estava

prestesafalar.–Noentantooquê,Penelope?–encorajou-a.–Nãoénada.–Paramim,é.Amãodeleestavasobreobraçodela,entãoeleoapertoude levepara

queelasoubessequeelefalavasério.Por um longo momento, Colin não achou que Penelope fosse de fato

responder, então, quandopensouque o rosto fosse rachar como sorrisoingido que abriu – estavam em público, a inal, e não seria de bom tomgerar comentários e especulações demonstrando ansiedade e agitação –,elasuspirou.Foi um somencantador, estranhamente reconfortante, suave e sábio. E

fez comque ele desejasse olhá-la commais atenção, olhar dentro de suamente,escutarosritmosdesuaalma.– Colin – começou ela –, se você se sente frustrado coma sua situação

atual,deveriafazeralgoparamudá-la.Naverdade,ésimplesassim.–É o que faço – disse ele, encolhendoo ombromais distantedela com

indiferença.–Minhamãemeacusadefazerminhasmalasedeixaropaís

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apenasporcapricho,masaverdadeéque...–Vocêfazissoquandosesentefrustrado–completouela.Elefezquesim.Elaocompreendia.Colinnãosabiaaocertocomoaquilo

acontecera,oumesmosefaziaalgumsentido,masPenelopeFeatheringtonocompreendia.–Euachoquevocêdeveriapublicarosseusdiários–opinouela.–Eunãoposso.–Porquê?Eleparouesoltouobraçodela.Naverdade,nãotinharespostaalémdo

estranhoribombardeseucoração.–Quemiriaquererler?–perguntou,porfim.– Eu iria – respondeu ela, com sinceridade. – Eloise, Felicity... Suamãe,

LadyWhistledown,semdúvida–acrescentou,comumsorriso travesso.–Elaescreveumbocadoaseurespeito.O bom humor dela era contagiante, e Colin não conseguiu conter um

sorriso.–Penelope,seasúnicaspessoasquecompraremolivroforemasqueeu

conheço,nãoconta.– Por que não? Você conhecemuitas pessoas. Ora, se considerar só os

Bridgertons...Eleagarrouamãodela.Nãosoubeporquê,masagarrou.–Penelope,pare.Elariu.–AchoqueEloisecomentouquevocêstambémtêmmontesemontesde

primose...–Jáchega–advertiuele,emboraestivessesorrindoaodizê-lo.Penelopeolhouparaamãodelesegurandoasuaefalou:–Muita gente vai querer ler sobre suas viagens. Talvez, no início, seja

apenas por você ser uma igura conhecida em Londres, mas não vaidemoraraté todossedaremcontadequeéumótimoescritor.Então,vãoclamarpormais.–Nãoquero serumsucessopor causadonomeBridgerton– retrucou

ele.Elasoltouamãodadeleeapousounoquadril.–Vocêouviutudooqueeudisse?Euacabeidefalar...

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–Doquevocêsdoisestãofalando?EraEloise,comumaexpressãomuito,muitocuriosa.–Denada–murmuraramosdois,aomesmotempo.Eloiseresfolegou.–Nãomeinsultem.Nãopodenãoserdenada.Penelopeestácomumar

dequemvaicomeçaracuspirfogoaqualquerinstante.–Seuirmãoestáapenassendoobtuso–dissePenelope.–Ora,nãohánadadenovonisso–brincouEloise.–Espereaí!–exclamouColin.– Mas a respeito de quê ele estava sendo obtuso – insistiu Eloise,

ignorando-oporcompleto.–Trata-sedeumassuntoparticular–respondeuColin,demávontade.–Oqueotornaaindamaisinteressante–retrucouEloise.Elaolhouparaaamiga,emexpectativa.–Eusintomuito–dissePenelope–,realmentenãopossocontar.–Nãoacreditoquevocênãovaimecontar!–exclamouEloise.– Não – respondeu Penelope, sentindo-se estranhamente satisfeita

consigomesma.–Nãovou.–Nãoacredito–repetiuEloise,virando-separaoirmão.–Nãoacredito.Colindeuomaisdiscretodossorrisos.–Acredite.–Você,guardandosegredosdemim.Eleergueuassobrancelhas.–Poracasoachouqueeulhecontavatudo?– É claro que não. – Ela fez uma careta. – Mas achei que Penelope

contasse.– Sóque este segredonão émeuparaque eu lhe conte –defendeu-se

Penelope.–ÉdeColin.– Acho que o planeta acaba de começar a girar para o outro lado –

resmungouEloise.–OutalvezaInglaterratenhasechocadocomaFrança.Sóseiqueestenãoéomesmomundoqueeuhabitavahojedemanhã.Penelopenãoconseguiuseconter.Soltouumarisadinha,divertida.–Evocêestárindodemim!–acrescentouEloise.–Não,nãoestou–garantiuPenelope,rindo.–Realmentenãoestou.–Sabedoquevocêestáprecisando?–indagouColin.

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–Eu?–indagouEloise.Eleassentiu.–Deummarido.–Vocêétãomauquantoamamãe!–Eupoderiaserbempior,sequisesse.–Nãotenhoamenordúvidadisso–devolveuEloise.–Parem,parem!–pediuPenelope,rindomuitoaessaaltura.Os dois olharam para ela em expectativa, como se perguntassem: e

agora?– Estou tão satisfeita por ter vindo esta noite... – disse ela, as palavras

saindo da boca a despeito de sua vontade. –Não consigome lembrar deumanoitemaisagradáveldoqueesta.Sinceramente,nãoconsigo.

Muitas horas depois, enquanto Colin itava o teto do quarto de seu novoapartamento em Bloomsbury, ocorreu-lhe que se sentia exatamente damesmaforma.

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CAPÍTULO8

ColinBridgertonePenelopeFeatheringtonforamvistosconversandonosarauSmythe-Smith,emboraninguémsaibadizer,aocerto,oquediscutiam.Estaautorasearriscariaadizerqueaconversagiravaemtornodaidentidadedesta,umavezquetodospareciamestarfalandosobre isso antes, depois e (um tanto grosseiramente, na estimadaopiniãodestacoluna)duranteaapresentação.Outras notícias: o violino deHonoria Smythe-Smith foi dani icado

quando Lady Danbury o atirou de cima da mesa, sem querer,enquantoagitavaabengala.Lady Danbury insistiu em comprar outro para substituir, mas

entãodeclarouquenão temohábitodecomprarnadaquenão sejado melhor, assim, Honoria terá um violino Ruggieri, importado deCremona,naItália.Noentendimentodestaautora,somando-seotempodefabricação,

deenvio,alémdalongalistadeespera,levaráunsseismesesparaqueoviolinochegueaténós.

C

Há momentos na vida de uma mulher em que seu coração dá umacambalhota nopeito, emque omundoparece atipicamente cor-de-rosa eperfeito, em que uma sinfonia pode ser ouvida no toque de umacampainha.PenelopeFeatheringtonvivenciouessemomentodoisdiasapósosarau

Smythe-Smith.Só foi preciso uma batida à porta de seu quarto, seguida da voz do

mordomo,lheinformando:–OSr.ColinBridgertonestáaquiparavê-la.No mesmo instante, ela caiu da cama. Briarly, que trabalhava para a

família Featherington havia tempo su iciente para nem mesmo piscar

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diantedafaltadegraçadePenelope,murmurou:–Devodizeraelequeasenhoritanãoestá?– Não! – Penelope praticamente guinchou, e se colocou de pé aos

tropeços.–Querdizer,não–acrescentounumtommaissuave.–Masvouprecisar de dezminutos parame arrumar. – Ela olhou para o espelho eestremeceudiantedaaparênciadesgrenhada.–Quinze.–Comodesejar,Srta.Penelope.– Ah, e por favor prepare uma bandeja com quitutes. O Sr. Bridgerton

deveestarcomfome.Eleestásemprecomfome.Omordomoassentiuoutravez.Penelope icou imóvel enquanto Briarly se retirava, então,

completamenteincapazdeseconter,começouadançarpulandodeumpéparaooutro,emitindoumsomestranhoquemaispareciaumganidoequetinhacerteza–oupelomenosesperava–quejamaisproduzira.Também,nãoconseguiaselembrardaúltimavezemqueumcavalheiro

avisitara,muitomenosumpeloqualestivessetãoapaixonadahaviaquasemetadedavida.–Acalme-se–disseela,espalmandoasmãose fazendoumgestomuito

parecido com o que usaria para conter uma pequena e ingovernávelmultidão.–Vocêprecisapermanecercalma.Calma–repetiu,comoseissofosse,defato,resolveralgumacoisa.–Calma.Mas,pordentro,seucoraçãodançava.Respiroufundoalgumasvezes,foiatéapenteadeiraepegouaescova.Só

levaria alguns instantes para prender os cabelos outra vez. Sem dúvidaColin não iria fugir se ela o deixasse aguardando por algum tempo. Eledeviaesperarqueelalevassealgunsminutosparasearrumar,não?Aindaassim,ajeitouoscabelosemtemporecordee,aoentrarnasalade

visitas, apenas cinco minutos haviam transcorrido desde o anúncio domordomo.–Querapidez–observouColin,comumsorrisomaroto.Eleestavadepéaoladodajanela,olhandoparaaRuaMount,esevirou

quandoelaapareceu.–Ah,vocêacha?–dissePenelope,esperandoqueocalorquesentiana

pelenãoestivessesetraduzindonumrubor.Uma mulher devia manter um cavalheiro esperando, embora não por

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muito tempo. Ainda assim, não fazia sentido ter esse tipo decomportamentologocomColin.Elejamaisseinteressariaporeladeformaromântica,e,alémdomais,eramamigos.Amigos. Parecia um conceito tão estranho e, no entanto, era isso que

eram.Semprehaviamsidoconhecidosquesetratavamcomfamiliaridade,mas,desdequeColinvoltaradoChipre,tinhamsetornadoamigos.Eramágico.Mesmoqueelejamaisaamasse–eelaachavaqueissonãoaconteceria

–,aquiloeramelhordoqueoquetinhamantes.– A que devo o prazer? – perguntou Penelope, sentando-se no sofá de

tecidoadamascadoamarelolevementedesbotadodamãe.Colin acomodou-se de frente para ela numa cadeira de espaldar reto

bastantedesconfortável.Inclinouocorpoparaafrente,apoiouasmãosnosjoelhos e Penelope soube, no mesmo instante, que havia algo errado.Aquela não era a pose adotada por um cavalheiro numa visita social. Elelhepareceuperturbadodemais,intensodemais.–Ébastantesério–disseele,orostosoturno.Penelopequaseselevantou.–Aconteceualgumacoisa?Alguémadoeceu?– Não, não, nada do tipo. – Colin fez uma longa pausa, expirou

profundamente, então passou as mãos pelos cabelos desalinhados. – ÉsobreEloise.–Oqueé?–Nãoseicomodizeristo...Temalgoparacomer?Penelopetevevontadedetorceropescoçodele.–PeloamordeDeus,Colin!–Medesculpe.Équenãocominadaodiatodo.–Umanovidade,estoucerta–comentouPenelope,impaciente.–Jápedi

a Briarly que nos trouxesse algo. Agora, poderiame contar o que há deerradoouquerqueeumorradeimpaciência?–EuachoqueelaéLadyWhistledown–disseele,atabalhoadamente.Penelope icou boquiaberta. Não sabia ao certo o que esperava ouvir,

masnãoeraaquilo.–Penelope,vocêmeescutou?–Eloise?

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Elefezquesim.–Nãopodeser.Colin se levantou e começou a caminhar de um lado para outro, tão

nervosoquenãoconseguiaficarsentado.–Porquenão?– Porque... porque... Porque não há amenor possibilidade de ela fazer

umacoisadessashádezanossemeusaber.A expressão dele se transformou de perturbação em desdém em um

instante.–NãocreioquevocêestejaapardetudooqueEloisefaça.–Éclaroquenão–devolveuPenelope, lançando-lheumolharbastante

irritado –, mas posso lhe dizer com absoluta certeza que Eloise jamaisesconderia de mim um segredo dessa magnitude durante dez anos. Elasimplesmentenãoseriacapaz.–Penelope,elaéapessoamaisenxeridaqueconheço.–Bem, isso é verdade – concordouPenelope. – Com exceção deminha

mãe.Masissonãoéosuficienteparacondená-la.Colinparoude caminhardeum ladoparaoutroeplantouasmãosnos

quadris.–Elaviveanotandocoisas.–Porqueachaisso?Eleergueuamãoeesfregouaspontasdosdedosenergicamenteumas

nasoutras.–Manchasdetinta.Sempre.– Muitas pessoas usam canetas e tinta. Você, por exemplo, escreve

diários. Estou certa de que ica com os dedos sujos de tinta de vez emquando.–Sim,maseunãodesapareçoquandoescrevonosmeusdiários.Penelopesentiusuapulsaçãoseacelerar.–Oquequerdizercomisso?–perguntou,ficandosemfôlego.–Querodizerqueelasetrancanoquartohoraapóshoraequeédepois

dessesperíodosqueosdedosficamcheiosdetinta.Penelope icou em silêncio por um período agonizantemente longo. A

“prova”deColinera,defato,signi icativa,sobretudosomadaàconhecidaebemdocumentadatendênciadeEloiseàintromissão.

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MaselanãoeraLadyWhistledown.Nãopodiaser.Penelopeapostariaaprópriavida.Porfim,elacruzouosbraçose,parecendoumacriançateimosa,disse:–Nãoéela.Nãoé.Colinvoltouasesentar,parecendoderrotado.–Eugostariadeteressacerteza.–Colin,vocêprecisa...–Droga,ondeestáacomida?–resmungouele.Eladeveriater icadochocada,masdealgumaformaafaltadeeducação

deleadivertiu.–TenhocertezaqueBriarlyjáestáchegandocomela.Eleseesparramounumacadeira.–Estoucomfome.–Sim,imagino–comentouPenelope,contraindooslábios.Eledeixouescaparumsuspiro,cansadoepreocupado.– Se ela for LadyWhistledown, vai ser um desastre. Simplesmente um

desastre.–Nãoseriatãoruimassim–retrucouPenelope,comcuidado.–Nãoque

eu ache que ela seja, porque não acho! Mas, se fosse, seria tão terrívelassim?Eu,particularmente,gostobastantedeLadyWhistledown.– Sim, Penelope – respondeu Colin, de forma um tanto ríspida –, seria

terrível.Elaestariaarruinada.–Nãoachoqueestariaarruinada...– É claro que estaria. Tem ideia de quantas pessoas aquela mulher já

insultouaolongodosanos?– Não sabia que você detestava Lady Whistledown tanto assim –

observouPenelope.– Eu não a detesto – contestou Colin, com impaciência. – Mas isso não

importa.Todomundoadetesta.–Nãocreioqueissosejaverdade.Todoscompramoseujornal.–Éclaroquecompram!Todoscompramoseumalditojornal.–Colin!–Desculpe–murmurouele,emboranãoparecesseestarsendosincero.Mesmoassim,Penelopeassentiu.– Seja lá quem for LadyWhistledown– disseColin, balançandoo dedo

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emsuadireção com tantaveemênciaqueela chegouo corpopara trás–,quandoelafordesmascarada,nãopoderámostrarorostoemLondres.Penelopepigarreoucomdiscrição.– Não tinha me dado conta de que você se importava tanto com as

opiniõesdasociedade.–Enãome importo.Bem,nãomuito,pelomenos.Qualquerumque lhe

disserquenãoseimportaéummentirosoeumhipócrita.Penelope achou que Colin estava certo, embora tenha icado surpresa

por ele admiti-lo. Ao que parecia, os homens gostavam de ingir sertotalmente independentes, não afetados pelos caprichos e opiniões dasociedade.Ele inclinou o corpo para a frente, os olhos verdes queimando de

intensidade.–Istonãotemavercomigo,Penelope.TemavercomEloise.E,seelafor

execradapelasociedade, icaráarrasada.–Eleserecostounacadeira,masseu corpo inteiro irradiava tensão. – Sem falar do que aconteceria comminhamãe.Penelopedeuumsuspirolento.–Eurealmenteachoquevocêestáseindispondoatrocodenada–falou.–Esperoquetenharazão–retrucouColin,fechandoosolhos.Nãosabiaaocertoquandocomeçaraadescon iardairmã.Talvezdepois

que Lady Danbury lançara seu agora famoso desa io. Ao contrário degrande parte de Londres, Colin jamais se interessara pela verdadeiraidentidadedeLadyWhistledown.Acolunaeradivertidaeelesemdúvidaa lia, assim como todo mundo, mas, a seu ver, Lady Whistledown eraapenas...LadyWhistledown,eissoerasóoqueelaprecisavaser.Masodesa iodeLadyDanburyo izeracomeçarapensar,e,comotodos

os Bridgertons, sempre que en iava uma ideia na cabeça, era incapaz deesquecê-la. De alguma forma, lhe ocorrera que a irmã possuía otemperamentoeashabilidadesperfeitosparaescreverumacolunacomoaquela, então, antes de conseguir se convencer de que estava delirando,notaraasmanchasdetintaemseusdedos.Desdeentão,forapraticamenteà loucura, sem conseguir pensar em mais nada que não fosse apossibilidadedeEloiseterumavidasecreta.Ele não sabia o que o irritava mais: que Eloise pudesse ser Lady

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Whistledown ou que tivesse conseguido esconder isso dele por mais deumadécada.Que coisamais enervante, ser enganado pela própria irmã. Gostava de

pensarqueeramaisespertodoqueisso.Masprecisava se concentrar no presente. Porque, se as suas suspeitas

estivessem corretas, como a família iria lidar com o escândalo quandoEloisefossedescoberta?Eela seria,sim,descoberta.ComtodaLondresansiandopeloprêmiode

millibras,LadyWhistledownnãotinhaamenorchance.–Colin!Colin!Ele abriu os olhos, perguntando-se quanto tempo fazia que Penelope o

estavachamando.–EurealmenteachoquevocêdeveriaparardesepreocuparcomEloise

–disseela.–HámuitaspessoasemLondres,eLadyWhistledownpoderiaserqualquerumadelas.Ora,considerandosuaatençãoaosdetalhes–elafezumgesto comamãopara lhe lembrardaspontasdosdedos sujosdetintadeEloise–,vocêpoderiaserLadyWhistledown.Elelhelançouumolharbastantecondescendente.–Anãoserpelopequenodetalhedeeuterestado foradopaísmetade

dotempo.Penelopedecidiuignorarosarcasmo.–Semdúvidavocêescrevebemobastanteparaserela.Colintevevontadededizeralgocômicoelevementeríspidopararefutar

osargumentosfracosqueelaapresentava,masaverdadeeraque,emseuíntimo, tinha icado tão encantado com o elogio à sua escrita que a únicacoisaqueconseguiufazerfoificaraliparado,exibindoumsorrisotorto.–Vocêestábem?–perguntouPenelope.– Perfeitamente bem – respondeu ele, voltando a si e tentando adotar

umsemblantemaissóbrio.–Porquê?– Porque, de repente, me pareceu estar passando mal. Com vertigem,

talvez.–Estoubem–repetiuele,talvezumpoucomaisaltoqueonecessário.–

Sóestoupensandonoescândalo.Penelopedeixou escapar um suspiro cansadoque o irritou, porque ele

nãoviamotivoparaelaseimpacientartanto.

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–Queescândalo?–perguntouela.–Oescândaloque iráexplodirquandoela fordescoberta–disseColin,

porentreosdentes.–ElanãoéLadyWhistledown!–insistiuPenelope.Derepente,Colinseempertigounacadeira,osolhosbrilhandocomuma

novaideia.– Sabe, não acho que tenha importância o fato de ela ser ou não Lady

Whistledown.Penelopeo itou,perplexa,durantetrêssegundosinteirosantesdeolhar

aoredordoaposentoemurmurar:–Ondeestáacomida?Achoqueestouzonza.Vocênãopassouosúltimos

dezminutoscompletamenteenlouquecidopelapossibilidadedequeseja?Como se aquela fosse a sua deixa, Briarly entrou na sala com uma

pesada bandeja. Penelope e Colin observaram em silêncio enquanto omordomoaapoiavanamesa.–Gostariamqueeuosservisse?–indagouele.– Não, não é preciso – respondeu Penelope. – Nós mesmos podemos

fazerisso.Briarlyassentiue,assimqueterminoudearrumarostalhereseencher

doiscoposcomlimonada,saiu.– Ouça – começou Colin, levantando-se para empurrar a porta até que

ela estivesse quase fechada (caso alguém resolvesse discutir as sutilezasdasconvençõessociais,tecnicamenteaportacontinuavaaberta).– Não quer algo para comer? – indagou Penelope, estendendo-lhe um

pratoqueencheracomdiversospetiscos.Ele pegou um pedaço de queijo, devorou-o em apenas duasmordidas,

entãocontinuou:–MesmoqueEloisenãosejaLadyWhistledown,e,aliás,aindaachoque

seja,não importa.Porque,seeususpeitodela,entãoalgumaoutrapessoatambémirásuspeitar.–Eoqueissoquerdizer?ColinesteveapontodechacoalharPenelopepelosombros,masdeteve-

sebematempo.–Nãoimporta!Seráquenãovê?Sealguémapontarodedoparaela,ela

estaráarruinada.

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–NãoseelanãoforLadyWhistledown!–exclamouPenelope,parecendoseesforçarmuitoparadescerrarosdentes.–Ecomoelapoderiaprovar?–devolveuColin.–Umavezqueumboato

teminício,oestragojáestáfeito.Criavidaprópria.–Colin,hácincominutosnãoestoumaisentendendovocê.– Preste atenção. – Ele se virou para encará-la e foi tomado por uma

intensidade tal que não poderia ter desviado os olhos dela ainda que acasa estivessedesabando ao seu redor. – Suponhamosque eudissesse atodomundoqueseduzivocê.Penelopeficoumuito,muitoquieta.– Você estaria arruinada para sempre – continuou ele, agachando-se

pertodabeiradadosofá,deformaque icassemmaisoumenosdamesmaaltura. – Não importaria que nós nem aomenos tivéssemos nos beijado.Isso,minhacaraPenelope,éopoderdapalavra.Elapareceuestranhamenteparalisada.E,aomesmotempo,ruborizada.–Eu...eunãoseioquedizer–gaguejou.E, então, algomuito estranho aconteceu. Colin se deu conta de que ele

mesmonão sabiaoquedizer. Porque se esqueceudeboatos, edopoderda palavra, e daquela podridão toda, e a única coisa na qual conseguiapensareraapartequeenvolviabeijare...E...E...Deusdocéu,elequeriabeijarPenelopeFeatherington.PenelopeFeatherington!Eracomoquererbeijaraprópriairmã.A não ser pelo fato – lançou-lhe um olhar discreto e ela lhe pareceu

encantadora,eeleseperguntoucomonãoohavianotadomaiscedo–dequeelanãoerasuairmã.Definitivamente,nãoerasuairmã.–Colin?O nome dele era um mero sussurro nos lábios dela, que piscava sem

parardeformaadoráveleconfusa.Comoerapossívelquejamaishouvessenotadoointrigantetomdecastanhodosolhosdela?Eramquasedouradospróximoàpupila.Nuncaviranadaparecidoe,noentanto,osviracentenasdevezes.

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Ele se empertigou subitamente. Era mais seguro que não estivessemnaqueleângulo.Decima,eramaisdifícilverosolhosdela.Penelopeselevantou.Maldição.–Colin?–disseela,avozquaseinaudível.–Possolhepedirumfavor?Pode ter sido intuição masculina ou insanidade, mas uma voz muito

insistentedentrodele gritavaque, fosse láoqueelaquisesse, sópoderiasermáideia.Eleera,noentanto,umidiota.Tinhadeser,poissentiuos lábiosseentreabrireme,emseguida,ouviu

umavozmuitoparecidacomasuadizer:–Éclaro.Elacontraiuos lábiose,porum instante,Colinachouque fossebeijá-lo,

masentãosedeucontadequesófizeraissoparaformarumapalavra:–Poderia...Apenas umapalavra.Nada alémde umapalavra começando compo. A

sílabaposempreseassemelhavaaumbeijo.–Poderiamedarumbeijo?

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CAPÍTULO9

Toda semana parece haver um convite mais cobiçado que todos osoutros,eodestasemanaé,semdúvida,odacondessadeMaccles ield,que irá oferecer um grande baile na segunda-feira à noite. LadyMaccles ield não é umaan itriã frequente emLondres,mas émuitopopular, assim como o seumarido, e espera-se quemuitos solteiroscompareçam, incluindo o Sr. Colin Bridgerton (supondo que nãosucumbaàexaustãoapósquatrodiaspassadoscomosdeznetosdosBridgertons), o visconde de Burwick e o Sr. Michael Anstruther-Wetherby.Estaautoraimaginaqueumgrandenúmerodesenhoritasjovense

solteiras também con irmará presença depois da publicação destacoluna.

C

Avidacomoeleaconheciachegaraaofim.–Oquê?–perguntou,cientedequepiscavasemparar.OrostodePenelopeassumiuumtomderubromaisprofundodoqueele

jamaisimaginaraserpossível,eelasevirou.–Deixeparalá–murmurou.–Esqueçaqueeudissequalquercoisa.Colinachouaquiloumaótimaideia.Mas então, quando pensou que seu mundo talvez tivesse retomado o

curso normal (ou pelo menos um que ele pudesse ingir ser o normal),Penelope subitamente virou-se, os olhos brilhando com uma luzapaixonadaqueoespantou.– Não, não vou deixar para lá – bradou ela. – Passei a vida inteira

deixandoascoisasparalá,semdizeràspessoasoquequerodeverdade.Colin tentou falar alguma coisa, mas o bolo que se formou em sua

garganta o impediu. Ele poderia cair morto a qualquer instante. Tinhacertezadisso.

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– Não vai signi icar nada, eu prometo – continuou ela. – Eu jamaisesperariaalgumacoisadevocê,maséqueeupoderiamorreramanhãe...–Oquê?Os olhos dela estavam imensos, liquefeitos em seu castanho profundo,

suplicantese...Elesentiusuacertezasedissolver.–Eutenho28anos–dissePenelope,comavozbaixaetriste.–Souuma

solteironaenuncafuibeijada.–Hã...err...b-bem...Colin tinha certeza que sabia falar: apenas alguns minutos antes, fora

uma pessoa perfeitamente articulada. Mas, agora, não conseguia formarumaúnicapalavra.EPenelopecontinuavaafalar,asfacesdeumencantadortomrosado,os

lábiossemovendotãorápidoqueelenãopôdeevitarimaginarqualseriaasensação de tê-los sobre a sua pele. Em seu pescoço, em seu ombro, emseu...Emoutraspartes.–Vouserumasolteironaaos29anos–continuouela–,eumasolteirona

aos30.Epoderiamorreramanhã,e...– Você não vai morrer amanhã! – conseguiu exclamar ele, de alguma

forma.–Maspoderia!Eissomemataria,porque...–Você jáestariamorta–argumentouele,pensandoque suavoz soava

umtantoestranhaeincorpórea.–Nãoqueromorrersemtersidobeijada–concluiuela.Colin podia pensar em cem razões pelas quais beijar Penelope

Featheringtoneraumapéssimaideia,eaprimeiradelaseraofatodequeelequeriabeijá-la.Abriu a boca na esperança de que algum som emergisse e que talvez

fosse um argumento inteligível, mas nada saiu, apenas o som de suarespiração.Então,Penelopefezaúnicacoisaquepodiaacabarcomasuaconvicção.

Ergueu os olhos para encará-lo e pronunciou duas únicas e simplespalavras:–Porfavor.Eleestavaperdido.Haviaalgodepartiro coraçãona formacomoelao

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olhava,comose talvez fossemorrerseelenãoabeijasse.Nãodecoraçãopartido, não de vergonha – era quase como se precisasse dele para senutrir,paralhealimentaraalma,preencher-lheocoração.E Colin não conseguiu se lembrar de mais ninguém que tivesse

precisadodelecomtantofervor.Aquilooencheudehumildade.Também o fez desejá-la com uma intensidade de deixar as pernas

bambas. Olhou para ela e, de alguma forma, não viu a mulher que viratantasvezesantes.Penelopeestavadiferente.Elabrilhava.Eraumasereia,uma deusa, e ele se perguntou como era possível que ninguém jamais otivessepercebido.–Colin?–sussurrouela.Eledeuumpassoà frente.Foiumpassopequeno,masquando tocouo

queixodela e inclinouo seu rostopara cima,os lábiosdosdois icaramapoucoscentímetrosdedistância.Seus hálitos se misturaram e o ar icou cálido e pesado. Penelope

estremeceu,eColinnãopôdetercertezadequeelemesmonãoestivessetremendo.Imaginou-se dizendo algo insolente e cômico, como o sujeito brincalhão

que tinha a reputação de ser. O que você quiser, talvez, ouToda mulhermereceaomenosumbeijo.Mas, ao eliminar a distância quase inexistenteentre eles, percebeu que não havia palavras que pudessem captar aintensidadedomomento.Palavrasparaapaixão.Palavrasparaanecessidade.Nãohaviapalavrasparaaepifaniadaquelemomento.Eassim,numasexta-feiraquedeoutra formateriasidocomoqualquer

outra,nocoraçãodeMayfair,numasilenciosasaladeestarnaRuaMount,ColinBridgertonbeijouPenelopeFeatherington.Efoiglorioso.Os lábios dele tocaram os dela a princípio com delicadeza, não porque

ele tentasse ser dócil, embora, se tivesse lhe ocorrido a presença deespíritoparapensaremtaiscoisas,provavelmenteeleterialembradoqueaquele era o primeiro beijo dela e que, portanto, deveria ser reverente,lindoetodasascoisascomasquaisumamoçasonha.Mas,comtodaasinceridade,nadadissopassoupelacabeçadeColin.Na

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verdade, ele mal pensava. Seu beijo foi suave e dócil porque ele aindaestava surpreso. Ele a conhecia havia anos, e jamais pensara em fazeraquilo.Agora,porém,nãopoderia soltá-lanemqueomundoseacabasse.Mal conseguia acreditar no que estava fazendo – ou que desejasse tantoaquilo.Não foi o tipo de beijo ao qual alguém dá início por estar tomado de

paixão,emoção, raivaoudesejo.Foialgomais lento,umaaprendizagem–tantoparaColinquantoparaPenelope.Eeleestavaaprendendoquetudooqueacreditarasabersobreoatode

beijarerabobagem.Todoo resto havia sido apenas lábios, línguas e palavrasmurmuradas,

massemomenorsignificado.Aquilo,sim,eraumbeijo.Haviaalgonoroçardoslábios,naformacomoelepodiaouviresentira

respiração dela ao mesmo tempo. Algo no fato de ela permanecertotalmente imóvel e, no entanto, ser possível sentir o seu coraçãoribombando.Haviaalgonofatodeelesaberqueeraela.Colinmordiscou,deleve,ocantodabocadePenelope,eentãoacariciou

o local exato onde os lábios dela se uniam. A língua dele mergulhava,delineava,aprendiaoscontornosdesuaboca,saboreandoaessênciadoceeaomesmotemposalgada.Aquiloeramaisdoqueumbeijo.As mãos dele, que estavam espalmadas nas costas dela, icaram rijas,

mais e mais tensas enquanto apalpavam o tecido do vestido. Ele podiasentir o calor do corpo dela na ponta dos dedos, brotando através damusselina.Eleapuxouparamaisperto,depoisaindamais,atéseuscorposestarem

colados.Podiasentirtodaaextensãodocorpodela,esentiuoseupróprioseincendiar.Percebeuseumembroenrijecer.Deus,comoadesejava.Colinsetornoumaisexigenteefezsualínguabrincarmaisàfrente,até

Penelope entreabrir os lábios. Ele engoliu o seu suave gemido deaquiescência, então foi adiante para saborear aquela boca. Era doce, umpoucoácidadevidoàlimonadaeclaramentetãoinebriantequantoumbomconhaque, pois ele começava a duvidar da própria capacidade de

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permanecerdepé.Percorreuasmãospelocorpodela–bemdevagar,paranãoassustá-la.

Elaeradelicada,curvilíneaeexuberante,domodoquesempreacharaqueumamulher devia ser. Os quadris eram largos, o traseiro, perfeito, e osseios...porDeus,osseioseramdeliciosos,pressionadosdeencontroaoseupeito.Elequeriamuitotomá-loscomasmãos,masforçou-asapermaneceronde estavam (muito bemposicionadas em seu traseiro, demaneira quenão era tanto sacri ício assim). Além do fato de que ele, realmente, nãodeveriaapalparosseiosdeumadamatãobem-criadanomeiodesuasaladevisitas,tinhaadolorosasuspeitadeque,seatocassedaquelamaneira,erabastanteprovávelqueseperdesseporcompleto.–Penelope,Penelope–murmurou,seperguntandoporqueonomedela

tinhaumsabortãodeliciosoemseuslábios.Estavafamintoporela,inebriadodepaixão,equeriadesesperadamente

que ela sentisse o mesmo. Tê-la nos braços era perfeito, mas, até omomento, ela não esboçara a menor reação. Ah, sim, havia oscilado emseusbraçoseabertooslábiosparaacolherasuainvasão,mas,alémdisso,nadafizera.E, no entanto, pelo respirar ofegante e pelas batidas aceleradasde seu

coração,elesabiaqueelaestavaexcitada.Colinseafastouumpouco,apenasalgunscentímetros,osu icientepara

tocar-lheoqueixoelevantarorostodelaparasi.Aspálpebrasseagitaramaté se abrirem, revelando olhos atordoados de paixão, em perfeitaconsonância com os lábios entreabertos, macios e túmidos pelos beijosdele.Elaestavalinda.Completamente linda,detirarofôlego.Nãosabiacomo

jamaisnotaraissoemtodosaquelesanos.Seráqueomundoestavacheiodehomenscegosouapenasestúpidos?–Você tambémpodemebeijar – sussurrou ele, encostando a testa, de

leve,nadela.Penelopenãofeznadaalémdepiscar.–Umbeijoenvolveduaspessoas–murmurouele,aproximandooslábios

dosdela,emboraapenasporuminstantefugaz.Elacorreuamãopelascostasdele.–Eoqueeudevofazer?–perguntou.

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–Oquequiser.Penelope levou uma das mãos ao rosto dele bem devagar. Os dedos

deslizaramdelevepelaface,roçaramoqueixoeentãoseafastaram.–Obrigada–sussurrouela.Obrigada?Eleficouimóvel.Não era isso que queria ouvir. Não queria receber um “obrigada” por

aquelebeijo.Aquiloofezsentir-seculpado.Esuperficial.Comosetivessefeitoaquiloporpiedade.Eapiorparteeraque,setudo

tivesseacontecidopoucosmesesantes,teriasido,defato,porpiedade.Oqueissodiziaaseurespeito?–Nãomeagradeça–disseele,rispidamente,afastando-sederepente.–Mas...– Eu dissenão – repetiu ele, dando-lhe as costas como se nãopudesse

olhá-laquando,naverdade,nãopodiasuportarasimesmo.E o mais impressionante era que ele não sabia muito bem por quê.

Aquela sensação desesperada e insistente – seria culpa? Porque não eraparaeletê-labeijado?Porquenãoeraparaeletergostado?–Colin–retrucouela–,nãofiquecomraivadevocêmesmo.–Nãoestou–vociferouele.–Eulhepediquemebeijasse.Euquaseoforcei...Queformaeficazdefazerumhomemsesentirmásculo...–Vocênãomeforçou–disparouele.–Não,mas...–Ora,peloamordeDeus,Penelope,jáchega!Elarecuou,comosolhosarregalados.–Medesculpe–sussurrou.Elebaixouosolhosparaasmãosdelaeviuquetremiam.Colinfechouos

olhos, agoniado. Por que, por que, por que estava sendo um idiotacompleto?–Penelope...–começou.–Não,estátudobem–disseela,depressa.–Nãoprecisafalarnada.–Não,eupreciso,sim.

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–Eurealmenteprefeririaquenãofalasse.Eentãoela lhepareceu tãodigna...Oqueo fezsentir-seaindapior.Ela

estavaparada,ali, comasmãoscruzadasde formarecatadaà sua frente,olhandoparabaixo – não exatamentepara o chão,mas tampoucopara orostodele.Penelopeachavaqueeleabeijaraporpiedade.E ele era um patife, porque uma pequena parte de si queria que ela

pensasseisso.Porquedessaformatalvezelepudesseseconvencerdequeeraverdade,quenãopassaradepena,quenãohaviapossibilidadedesermaisdoqueisso.–Émelhoreuir–disseelebembaixo,e,noentanto,suavozaindasoou

altademaisnasalasilenciosa.Penelopenãotentouimpedi-lo.Elefezumgestoemdireçãoàporta.–Émelhoreuir–repetiu,apesardeospésserecusaremasemexer.Elaassentiu.–Eunão...–começouadizerColin,eentão,horrorizadocomaspalavras

quequasesaíramdesuaboca,sedirigiuàporta.MasPenelope,éclaro,perguntou:–Nãooquê?Eelenão soubeoque responder,porqueoque começaraadizer fora:

Eunãoabeijeiporpena. Seelequisessequeela soubesse, sequisesse seconvencer, isso só poderia signi icar que ansiava pela sua boa opinião, oquesópoderiaquererdizer...– Eu preciso ir – falou atabalhoadamente, já em desespero, como se

deixaraquelasala fosseaúnica formade impedirqueseuspensamentospercorressemumaestradatãoperigosa.Atravessouadistânciaqueaindarestavaatéaporta,esperandoqueela

falassealgo,quechamasseoseunome.Maselanãoofez.Eelesefoi.Enuncaseodioutantonavida.

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Colin estava de péssimo humor antes de o lacaio surgir à sua porta comumaconvocaçãodesuamãe.Depois,seuhumorpiorou.Maldição. Ela ia voltar àquela conversa sobre ele ter de se casar. As

convocações dela eramsempre sobre isso. E ele não estava com omenorânimoparatalassunto.Maserasuamãe.Eeleaamava.Issosigni icavaquenãopoderiaignorá-

la. Assim, resmungando sem parar e praguejando bastante durante oprocesso,calçouasbotas,vestiuocasacoesedirigiuàporta.EstavamorandoemBloomsbury,quenãoeraapartemaiseleganteda

cidade para ummembro da aristocracia, embora a Praça Bedford, ondealugara uma pequena, porém elegante, casa com varanda, fosse semdúvidaumendereçocaroerespeitável.Colin gostava bastante de morar ali, onde os vizinhos eram médicos,

advogados, intelectuais e gente querealizava mais do que comparecer afesta após festa. Não estava pronto para trocar sua herança por umtrabalho – era ótimo ser um Bridgerton, a inal –, mas havia algo deestimulante em observar pro issionais com seus afazeres, advogadosrumando para o leste em direção ao Palácio de Justiça e médicos paranoroeste,nosentidodePortlandPlace.Teria sido fácil atravessar a cidade em sua pequena carruagem:

retornara à cavalariça apenas uma hora antes, após voltar da casa dasFeatheringtons. Mas estava sentindo a necessidade de um pouco de arpuro,semfalaremsuateimosia,queolevavaaquererdemoraromáximopossívelparachegaràcasadamãe.SeaintençãodeVioleteralhedarmaisumsermãosobreasvirtudesdo

matrimônio, seguido de um longo discurso sobre os atributos de cadasenhorita solteira de Londres, maldição!, então ela podia perfeitamenteesperarporele.Colin fechou os olhos e gemeu. Seu humor devia estar até pior do que

imaginava,paraamaldiçoaraprópriamãe,queele(etodososBridgertons,naverdade)tinhaemmaisaltaestimaeafeição.AculpaeradePenelope.Não, a culpa era de Eloise, pensou, cerrando os dentes. Melhor culpar

umairmã.Não,aculpaeradelemesmo,admitiu,atirando-sedevoltanacadeirada

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escrivaninha.Seestavademauhumor,prontoparaarrancaracabeçadealguémcomasprópriasmãos,aculpaerasódele.Não devia ter beijado Penelope. Não importava o fato de ter desejado

isso, emboraelenemaomenos tivesse sedado contade suavontadeatéumpoucoantesdeelaomencionar.Aindaassim,nãodevia ter feito isso.Embora,quandodefatopensavaarespeito,nãosoubesseaocertoporquenãodeveriatê-labeijado.Ele se levantou, então caminhou com passos pesados até a janela e

encostou a testa na vidraça. A Praça Bedford encontrava-se em silêncio,com apenas alguns homens caminhando pelas calçadas. Pareciam seroperários, provavelmente trabalhando na construção do novo museu naparte leste. (Tinha sido por isso que Colin alugara uma casa no oeste dapraça:asobraserambastantebarulhentas.)Eleolhouparaonorte,nadireçãodaestátuadeCharles JamesFox.Ali

estava um homem com um objetivo. Liderara os Whigs, pessoas queapoiavamoPartidoLiberal,duranteanos.Nemsempreforamuitoquerido–deacordocomalgunsmembrosdaaltasociedade–,masColincomeçavaacrerqueser tidoemaltacontapor todoseraalgosuperestimado.Deussabiaqueninguémeramaisqueridodoqueele,e,apesardisso,agorasesentia frustrado,descontente,mal-humoradoeprontoparadescontar emqualquerumquecruzasseoseucaminho.Deixouescaparumsuspiroenquanto seafastavada janela.Eramelhor

ir logo, sobretudo porque planejava caminhar até Mayfair. Embora, narealidade,nãofossetãolongeassim.Provavelmentenãomaisdoquetrintaminutos,semantivesseumritmoenérgico(esempreofazia),amenosqueascalçadasestivessemrepletasdegentelenta.Meiahoraeramaisdoqueamaioriadosmembrosda alta sociedade gostavade icar ao ar livre emLondresquandonãoestavafazendocomprasoupasseandocomelegânciapeloparque,masColinsentiaanecessidadedeclarearamente.E,emboraaatmosferadeLondresnãofossedasmaispuras,iaterdeservir.Do jeitoque iaasuasortenaqueledia,noentanto,aochegaràesquina

dasruasOxfordeRegent,osprimeirospingosdechuvacomeçaramacairem seu rosto.Ao virarnaPraçaHanoverparapegar a St. George, choviatorrencialmente. E já estava tão próximo da Rua Bruton que teria sidoridículotentarpararumcarrodealuguelparaorestodocaminho.

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Então,foiemfrente.Depois do primeiro instante de irritação, porém, teve uma sensação

estranhaemrelaçãoàchuva.Estavaquenteobastanteparaqueelenãosesentisse gelado até os ossos, mas ainda assim os pingos grossos lhepareceramumaespéciedepenitência.Tinhaaimpressãodequetalvezfosseoquemerecia.A porta da casa da mãe se abriu antes mesmo que Colin pisasse no

primeirodegrau.Wickhamdeviaestaràsuaespera.– O senhor aceitaria uma toalha? – entoou omordomo, entregando-lhe

umenormetecidobranco.Colin aceitou, perguntando-se comoWickham tivera tempo de ir pegar

aquela toalha. Não podia ter adivinhado que Colin seria tolo o bastanteparacaminharnachuva.Nãofoiaprimeiravezquelheocorreuqueosmordomosdeviampossuir

poderesestranhosemísticos.Talvezfosseumaexigênciadaposição.Colinsecouoscabelos,causandograndeconsternaçãoemWickham,queexalavadignidade e provavelmente esperara que Colin se retirasse para algumaposento privado e levasse pelo menos meia hora para recompor aaparência.–Ondeestáminhamãe?–perguntouele.Wickham contraiu os lábios de tensão e olhou direto para os pés de

Colin,queagoracriavampequenaspoças.–Noescritório–respondeu–,masestáconversandocomasuairmã.– Qual delas? – perguntou Colin, dando um ensolarado sorriso só para

irritarWickham,quesemdúvidatambémtentarairritá-loaoomitironomedairmã.Como se fosse possível dizer apenas “sua irmã” a um Bridgerton e

esperarqueelesoubessedequemsetratava.–Francesca.–Ah,sim.ElavoltaráàEscóciaembreve,não?–Amanhã.Colin devolveu a toalha a Wickham, que a olhou como se fosse um

imensoinseto.– Não a incomodarei, então. Quando ela terminar a conversa com

Francesca,apenaslheavisequeestouaqui.

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Wickhamassentiu.– Gostaria de trocar de roupa, Sr. Bridgerton? Creio que temos alguns

trajesdeseuirmãoGregorynoquartodele.Colin sorriu. Gregory estava terminando o último período letivo em

Cambridge.Eraonze anosmaisnovoqueColin e eradi ícil acreditarquepudessem usar as mesmas roupas, mas talvez fosse chegada a hora deaceitarofatodeseuirmãomaisnovoterfinalmentecrescido.–Éumaexcelente ideia–respondeu.Lançouumolharpesarosoparaa

mangaencharcada.–Deixareiestasroupasaquiparaseremlavadaseasbuscareimaistarde.Wickhamassentiuoutravez.–Comodesejar.Emseguida,desapareceupelocorredoratéalgumapartedesconhecida

dacasa.Colinsubiuaescadadedoisemdoisdegrausatéosaposentosdafamília.

Enquanto ia ensopando o corredor com seus passou, ouviu umaporta seabrir.Virou-seedeudecaracomEloise.Não era a pessoa que queria ver. Ela imediatamente trouxe de volta

todas as recordações de sua tarde com Penelope. De sua conversa. Dobeijo.Sobretudodobeijo.E,pior,daculpaquesentiradepois.Daculpaqueaindasentia.– Colin – disse Eloise, alegremente –, eu não sabia que... O que

aconteceu?Vocêveioandando?Eledeudeombros.–Gostodechuva.Ela o encarou, curiosa, inclinando a cabeça para o lado como sempre

faziaquandotentavadecifraralgumacoisa.–Estácomumhumorestranhohoje.–Estouensopado,Eloise.–Nãoprecisasergrosseiroporcausadisso–resmungouela, fungando.

–Eunãooforceiaatravessaracidadedebaixodechuva.–Nãoestavachovendoquandosaí–sentiu-seobrigadoadizer.Irmãossãocapazesdefazerafloraracriançade8anosqueviveemnós.

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–Comcertezaocéuestavanublado–devolveuela.Pelojeito,Eloisetambémestavacomacriançade8anosaflorada.– Podemos continuar esta discussão quando eu estiver seco? –

perguntouele,impaciente.– É claro – respondeu ela, mostrando-se bastante compreensiva. –

Esperareibemaqui.ColinvestiuasroupasdeGregorysempressa,levandomaistempononó

da gravata do que levava há anos. Por im, quando se convenceu de queEloisedeviaestarrangendoosdentes,despontounocorredor.–SoubequefoiverPenelopeestatarde–disseela,sempreâmbulos.Elenãoesperavaouvirisso.–Comovocêsabe?–perguntouele,cautelosamente.Sabiaquea irmãePenelopeerampróximas,masPenelopesemdúvida

nãoteriacontadoaEloisesobreaquilo.–FelicitycontouaHyacinth.–EHyacinthcontouavocê.–Éclaro.–Algoprecisaserfeitoarespeitodasfofocasquecorremnestacidade–

murmurouColin.–Nãoachoque isto conte como fofoca,Colin– retrucouEloise. –A inal,

vocênãoestáinteressadonaPenelope.Seelaestivesse falandodequalqueroutramulher,Colinteriaesperado

quefinalizassecomumafetadoEstá?eumolhardesoslaio.MassetratavadePenelope,e,emboraEloisefosseasuamelhoramigae,

portanto, a suamaiordefensora,nemmesmoela conseguia imaginarqueum homem da reputação e popularidade de Colin pudesse se interessarporumamulherdareputaçãoe(faltade)popularidadedePenelope.Ohumordelemudouderuimparapéssimo.– De qualquer forma – continuou Eloise, ignorando por completo o

estadodeespíritosombriodoirmão,emgeraltãoalegreejovial–,Felicitydisse a Hyacinth que Briarly lhe contou que você havia feito uma visita.Fiqueimeperguntandosobreoqueseria.–Nãoédasuaconta–retrucouColin,bruscamente,esperandoqueela

deixasseoassuntoporissomesmo,semacreditardefatoqueofaria.Dequalquer forma,deuumpassoemdireçãoàs escadas,preservando

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umpoucodootimismodesempre.–Ésobreomeuaniversário,nãoé?– sugeriuEloise, correndoà frente

delede forma tão repentinaqueapontado sapatodele se chocou comodela.Ela fez uma careta de dor, mas Colin não demonstrou qualquer

solidariedade.– Não, não é sobre o seu aniversário – respondeu ele, de maneira

áspera.–Oseuaniversáriosóé...Elesedeteve.Droga!–...nasemanaquevem–continuou,rosnando.Eloise deu um sorriso malicioso. Em seguida, como se tivesse se dado

conta de que chegara à conclusão errada, ela entreabriu os lábios,consternada, enquanto voltava um pouco o raciocínio e seguia em outradireção.– Então – prosseguiu ela, deslocando o corpo de leve, de maneira a

obstruirmelhorocaminhodele–,sevocênãofoiatéláparafalarsobreomeuaniversárioenãohánadaquepossadizeragoraparameconvencerdocontrário,porquefoiverPenelope?–Nãosepodemaisterumassuntoparticularnestavida?–Nãonestafamília.Colin decidiu que o melhor a fazer era adotar sua personalidade

amistosa,emboranãoestivessesesentindonemumpoucobem-humoradoemrelaçãoàirmãnaquelemomento.Assim,abriuseusorrisomaisafável,inclinouacabeçaeperguntou:–Estououvindonossamãemechamar?–Eunãoescuteinada–retrucouEloise,atrevidamente.–Eoqueháde

erradocomvocê?Estácomumaexpressãomuitoestranha.–Estouótimo.– Você não está ótimo. Está com um ar de quem acabou de sair do

dentista.–Ésempreótimoreceberelogiosdafamília–murmurouele.– Se você não pode con iar que a sua família seja franca com você –

devolveuela–,entãoemquempoderáconfiar?Comummovimentosuave,eleserecostounaparedeecruzouosbraços.–Prefiroalisonjaàfranqueza.

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–Nãoprefere,não.PorDeus, que vontade ele tinha de lhe dar um tapa. Era algo que não

faziadesdeos12anos.E foracastigadopor isso.Quese lembrasse, tinhasidoaúnicavezqueopaibateranele.– O que eu quero – falou, arqueando uma das sobrancelhas – é o im

imediatodestaconversa.– O que você quer é que eu pare de lhe perguntar por que foi ver

PenelopeFeatherington–al inetouEloise–,masnósdoissabemosquenãoémuitoprovávelqueissoaconteça.Efoientãoqueelesoube.Soube,nofundodocoração,quesuairmãera

LadyWhistledown.Todasaspeçasseencaixavam.Nãohaviapessoamaisteimosaeobstinada,ninguémquepodia–eiria–utilizaroseutempoparairafundoemtodoequalquerpequenoboatoeinsinuação.Quando Eloise queria uma coisa, não sossegava até consegui-la. Não

tinhaavercomdinheiro,ganânciaoubensmateriais.Noquediziarespeitoa ela, tinha a ver com conhecimento. Gostava de saber das coisas eal inetava,al inetavaeal inetavaatéqueapessoalhedissesseexatamenteoqueelaqueriaouvir.Eraummilagrequeninguémtivessedescobertoantes.Donada,eledisse:–Precisoconversarcomvocê.Agarrou-a pelo braço e a arrastou até o quartomais próximo, que por

acasoeraodela.– Colin! – guinchou Eloise, tentando se desvencilhar dele, em vão. – O

queestáfazendo?Ele bateu a porta, soltou-a e cruzou os braços, com uma expressão

ameaçadora.–Colin?–repetiuela,muitodesconfiada.–Euseioquevocêtemaprontado.–Oqueeutenho...Eentão,malditafosse,elacomeçouarir.–Eloise!–trovejouele.–Estoufalandocomvocê!–Claramente–retrucouela,comdificuldade.Elenãorecuou,continuoufuzilando-acomoolhar.Ela olhava para o outro lado, quase dobrada aomeio de tanto rir. Por

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fim,disse:–Oquevocê...Mas aoolharpara eleoutravez, apesarde sua tentativade icar séria,

explodiunagargalhadaoutravez.Se a irmã estivesse bebendo alguma coisa, pensou Colin sem achar a

menorgraça,olíquidoteriasaídopelassuasnarinas.–Quediaboseapossoudevocê?!–vociferouele.Isso inalmentechamouaatençãodela.Elenãosoubedizersefoiotom

de voz ou o fato de ter praguejado, mas Eloise voltou a si no mesmoinstante.–MinhaNossa,comovocêestásério–observouela,baixinho.–Poracasopareçoestarbrincando?– Não – respondeu Eloise. – Embora no início estivesse. Me desculpe,

Colin,masesseolharraivoso,essesberrosetudoomaisnãofazemmuitooseuestilo.VocêpareciaoAnthony.–Você...–Naverdade–corrigiu-seela,olhando-odeformamenoscautelosaque

oapropriado–,pareciavocêmesmotentandoimitaroAnthony.Ele iamatá-la. Bem ali no quarto dela, na casa damãe, ia cometer um

sororicídio.– Colin? – disse ela, hesitante, como se só então tivesse notado que ele

agora,emvezdeapenaszangado,estavafurioso.– Sente-se. – Ele fez um gesto brusco com a cabeça em direção a uma

cadeira.–Já.–Vocêestábem?–SENTE-SE!–rugiuele.Eloiseobedeceu.Rápido.–Não consigome lembrardaúltimavez emquevocê levantou a voz –

sussurrouela.– E eu não consigome lembrar da última vez emque tivemotivo para

fazê-lo.–Oquefoi?Eledecidiuqueeramelhorserdireto.–Colin?–disseela.–EuseiquevocêéLadyWhistledown.

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–Oquêêêêêê?–Nãoadiantanegar.Euvi...Eloiseselevantoudeumsalto.–Excetopelofatodequenãoéverdade!De repente, ele já não estavamais tão furioso. Em vez disso, sentiu-se

cansado,velho.–Eloise,euviaprova.–Queprova?–perguntouela,avoz icandoagudapelaincredulidade.–

Comopodehaverprovadealgoquenãoéverdadeiro?Eleagarrouumadesuasmãos.–Olheparaosseusdedos.Elafezoqueoirmãopediu.–Qualéoproblemacomeles?–Manchasdetinta.Eloiseficouboquiaberta.–DaívocêdeduziuquesouLadyWhistledown?–Porqueseusdedosestãosujos,então?–Vocênuncausouumapena?–Eloise...–Haviaumavisobemclaronavozdele.–Eunãotenhodelheexplicarporquemeusdedosestãomanchadosde

tinta.Colinrepetiuoseunome.–Eunão... – começouaprotestaragarota. –Eunão lhedevo...Ah, está

bem.–Elacruzouosbraços,contrafeita.–Euescrevocartas.Eleaolhoucomextremadesconfiança.–Escrevo,sim!–exclamouela.–Todososdias.Àsvezesduasvezespor

dia, quando Francesca está longe. Sou uma correspondente muito leal.Você devia saber disso. Já escrevi muitas cartas com o seu nome noenvelope, emboraduvidemuitoquemetadedelas tenha chegado às suasmãos.–Cartas?– indagouele,avozcheiadedúvida...eescárnio.–Peloamor

de Deus, Eloise, achamesmo que isso é crível? E para quem é que vocêandaescrevendotanto?Elaruborizou.Profundamente.–Nãoédasuaconta.

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Eleteria icadointrigadocomareaçãodelasenãocontinuassetãocertodequementiasobreserLadyWhistledown.–PeloamordeDeus,Eloise–cuspiuele–,quemvaiacreditarquevocê

andaescrevendocartastodososdias?Eu,semdúvida,nãoacredito.Elaofuziloucomosolhoscinza-escuroscintilandodefúria.–Nãome importa o que você acha – disse ela, numa voz bembaixa. –

Não,issonãoéverdade.Estoufuriosapornãoacreditaremmim.–Vocênãoestámeajudandomuitoaacreditar–retrucouele,cansado.Ela se levantou, seaproximoudelee lhedeuumcutucãonopeito.Com

força.– Você é meu irmão – vociferou ela. – Deveria acreditar emmim sem

questionamentos. Me amar incondicionalmente. É isso que signi ica fazerpartedeumafamília.–Eloise–disseele,emumsuspiro.–Nãotenteinventardesculpasagora.–Eunãoia.–Issoéatépior!–Elasedirigiucompassos irmesemdireçãoàporta.–

Deviaestarajoelhadoimplorandoomeuperdão.Ele não achou que conseguiria sorrir, mas, de alguma forma, aquilo

bastou.–Bem,issonãoseriamuitoomeuestilo,seria?Elaabriuabocaparadizeralgo,masaúnicacoisaqueconseguiuemitir

foialgocomo“Aaaahhhh”comumavozirada.Emseguida,deixouoquartodeformabastantetempestuosa,batendoaportaaosair.Colinafundounumapoltrona,perguntando-sequandoelasedariaconta

dequeseretiraradopróprioquarto.Essa ironia possivelmente era, re letiu ele, o único vestígio de luz num

diaqueestavasendoumdesastrecompleto.

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CAPÍTULO10

Caroleitor,É como coração surpreendentemente comovidoque escrevo estas

palavras.Apósonzeanosnarrandoosacontecimentosnavidadaaltasociedade,estaautoraestádeixandodeladoasuapena.Muito embora o desa io de Lady Danbury tenha, sem dúvida,

contribuído para a aposentadoria, a culpa não pode recair (porcompleto) sobre os ombros da condessa. A coluna vem se tornandomaçantenosúltimos tempos, gerandomenos satisfação emescrevere, talvez, icandomenosdivertidade ler.Estaautoraprecisadeumamudança.Nãoéalgotãodi ícilassimdeimaginar.Onzeanosémuitotempo.E, na verdade, a recente renovação de interesse pela identidade

destaautoratemsemostradoperturbadora.Amigosseviramcontraamigos, irmãos contra irmãs, tudo isso numa tentativa fútil dedesvendar um segredo insolúvel. Além do mais, essa brincadeira dedetetive promovida pela alta sociedade está se tornando claramenteperigosa. Na semana passada foi o tornozelo torcido de LadyBlackwood; esta semana a lesão, ao que parece, acometeu HyacinthBridgerton, que sofreu um ferimento leve na festa de sábado,realizada na residência londrina dos Riverdales. (Não escapou àatenção desta autora que lorde Riverdale venha a ser sobrinho deLady Danbury.) A Srta. Hyacinth deve ter suspeitado de algumpresente,poissemachucouaocairparadentrodabibliotecaquandoaportafoiaberta,sendoqueelaseencontravacomoouvidocoladoàmadeira.Conversas sendo escutadas atrás de portas, perseguição a

entregadores... E esses são apenas os detalhes que alcançaram osouvidosdestaautora!Aquepontochegouasociedadelondrina?Estaautora pode lhe assegurar, caro leitor, que jamais ouviu atrás deportaalgumaaolongodeseusonzeanosdecarreira.Todososboatosdesta coluna foram de proveniência legítima, sem ferramentas ou

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artimanhasalémdosolhosedosouvidos.Aurevoir,Londres!Foiumprazerservi-la.

C

Não foi surpresa alguma o fato de a coluna ter sido o assunto do baileMacclesfield.–LadyWhistledownseaposentou!–Dáparaacreditar?–Oquevoulernodesjejum?–Comovousaberoqueaconteceuseeuperderumafesta?–Agoranuncamaissaberemosquemelaé!–LadyWhistledownseaposentou!Umamulherdesmaiou,quasebatendoacabeçanaquinadeumamesa

emseucaminhodeseleganteatéochão.Aoqueparecia,nãoleraacolunadaquelamanhã, ouvindoanotíciapelaprimeira vezbemali, nobaile. Foireanimadacomsaisaromáticos,maslogoperdeuossentidosoutravez.– É uma ingida – murmurou Hyacinth Bridgerton para Felicity

Featherington no pequeno grupo formado, além delas, pela viúva LadyBridgertonePenelope.Esta última comparecera ao baile, o icialmente, como acompanhante de

Felicitydevidoàdecisãodamãedepermaneceremcasaporumproblemadeestômago.– O primeiro desmaio foi verdadeiro – continuouHyacinth. – Qualquer

umpodever issopelamaneiradesajeitadacomoelacaiu.Mas isto...–Fezum movimento rápido com a mão em direção à moça no chão, numademonstração de repulsa. – Ninguém desmaia como uma bailarina. Nemmesmoasbailarinas.Penelopeouviuaconversainteira,umavezqueHyacinthseencontrava

aseulado,àesquerda.Mantendoosolhosotempotodonapobremulher,que agora voltava a si agitando os cílios delicadamente enquanto alguémpassava, mais uma vez, os sais aromáticos abaixo de suas narinas,Penelopemurmurou:–Vocêjádesmaioualgumavez?

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–Deformaalguma!–exclamouHyacinthcommuitoorgulho.–Desmaiossão para os fracos de coração e para os tolos – acrescentou. – E se LadyWhistledown ainda estivesse na ativa, podem escrever o que digo,afirmariaexatamenteamesmacoisanapróximacoluna.–Ah,meuDeus!Nãohámaispalavrasparaseremescritas–comentou

Felicity,comumsuspirotriste.LadyBridgertonconcordou.–Éofimdeumaera–disse.–Sinto-meumtantoperdidasemela.– Bem, não faz tanto tempo assim que estamos sem ela – comentou

Penelope, sem conseguir resistir. – Recebemos uma coluna esta manhã.Porquesesenteperdida?–Éoprincípiodacoisa–retrucouLadyBridgertoncomumsuspiro.–Se

esta fosse uma segunda-feira como outra qualquer, eu saberia que iriareceberumnovorelatórionaquarta-feira.Masagora...Felicitychegouafungar.–Agoraestamosperdidas–completou.Penelopevirou-separaairmã,incrédula.–Estásendoumpoucomelodramática,não?Felicitydeudeombrosexageradamente,deformateatral.–Estou?Estou?Hyacinthlhedeuumsolidáriotapinhanascostas.–Nãoachoqueesteja,Felicity.Sinto-medamesmaforma.–Ésóumacolunademexericos–argumentouPenelope,olhandoàvolta

embuscadealgumsinaldesanidadeentreascompanheiras.NãoerapossívelqueachassemqueomundoiriaacabarsóporqueLady

Whistledowndecidirapôrfimàsuacarreira.– Você tem razão, é claro – concordou Lady Bridgerton projetando o

queixo para a frente e franzindo os lábios num gesto provavelmentedestinadoa transmitirumardepraticidade. –Obrigadapor ser avozdarazãoemnossopequenogrupo.–Mas,emseguida,pareceudesanimarumpoucoedisse:–Noentanto,tenhodeadmitirquejáhaviameacostumadoatê-laporperto.Sejaláquemfor.Penelopedecidiuquejápassavadomomentodemudardeassunto.–Eloisenãoveio?– Estava indisposta, eu sinto dizer. Dor de cabeça – explicou Lady

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Bridgerton,comrugasdepreocupaçãopreenchendoorostoque,deoutraforma, tinha a pele bem lisa. –Não se sente bemhá quase uma semana.Estoucomeçandoaficarpreocupada.Penelope tinha o olhar ixo em uma arandela na parede,mas voltou a

atençãoimediatamenteaLadyBridgerton.–Nãoénadasério,euespero.–Não,nãoé–respondeuHyacinthantesmesmoqueamãeconseguisse

abriraboca.–Eloisenuncaadoece.– E é por isso mesmo que estou preocupada – observou Lady

Bridgerton.–Elanãotemcomidomuitobem.–Nãoéverdade–retrucouHyacinth.–Estatardemesmo,Wickhamlhe

levou uma bandeja bem farta. Tinha bolinhos e ovos, e acho que senti ocheirodepresunto.–Elalançouumolharirônicoaninguémemespecial.–Equandoeladeixouabandejadevoltanocorredor,estavavazia.Hyacinth, decidiu Penelope, tinha um olho surpreendentemente bom

paradetalhes.– Ela tem andado de mau humor desde que brigou com Colin –

continuouHyacinth.– Ela brigou com Colin? – perguntou Penelope, com uma péssima

sensaçãocomeçandoalhereviraroestômago.–Quando?–Nasemanapassada–respondeuHyacinth.EMQUEDIA?,Penelopequisgritar,mascomcertezaseriaestranhoquerer

saberessedetalhe.Teriasidonasexta-feira?Será?Elasemprelembrariaqueseuprimeiro,etalvezúnicobeijo,acontecera

numasexta-feira.Tinha esse estranho hábito. Sempre recordava os dias da semana em

queascoisastinhamocorrido.ConheceraColinnumasegunda-feiraeobeijaranumasexta.Dozeanos

depois.Deixouescaparumsuspiro.Aquilolhepareceuumtantopatético.–Háalgodeerrado,Penelope?–perguntouLadyBridgerton.ElaolhouparaamãedeEloise.Seusolhosazuistransmitiamgentilezae

preocupação, e algo na maneira como inclinou a cabeça para o lado fezPenelope querer chorar. Andava muito emotiva. Chorando por ummeroinclinardecabeça...

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–Estoubem–respondeu,esperandoqueseusorrisoparecessesincero.–SófiqueipreocupadacomEloise.Hyacinthresfolegou.Penelope decidiu que precisava escapulir dali. Todos aqueles

Bridgertons–bem,pelosmenosduasdelas–estavamlevando-aapensaremColinininterruptamente.Não era nada que ela não tivesse feito a cadaminuto nos últimos três

dias.Mas,pelomenos,haviasidoemparticular,podendosuspirar,gemereresmungarquantoquisesse.Aqueladeviaserasuanoitedesorte,pois,bemnaquele instante,ouviu

LadyDanburyladraroseunome.(O que estava acontecendo com o mundo para ela se considerar uma

pessoa sortuda por se ver presa num canto com a língua mais ácida deLondres?)OfatoéqueLadyDanburylhedariaadesculpaperfeitaparaseafastar

deseugrupo,e,alémdomais,elacomeçavaasedarcontadeque,deumaformamuitoestranha,gostavamesmodeLadyDanbury.–Srta.Featherington!Srta.Featherington!Felicityimediatamentedeuumpassoparaolado.–Achoqueelaestásereferindoavocê–sussurrou,comurgência.– É claro que está se referindo a mim – disse Penelope, com um leve

toquedesuperioridade.–ConsideroLadyDanburyumaamigaquerida.Felicityarregaloutantoosolhosqueelesquasesaltaramdorosto.–Considera?–Srta.Featherington!–repetiuLadyDanbury,batendocomabengalaa

dois centímetros do pé de Penelope assim que a alcançou. – Não você –falouparaFelicity, emboraa garotanão tivesse feitonadaalémde sorrireducadamenteàaproximaçãodacondessa.–Você–exclamou,dirigindo-seaPenelope.– Errr... Boa noite, Lady Danbury – cumprimentou Penelope, o que

considerou um admirável número de palavras, tendo em vista ascircunstâncias.–Passeianoitetodaàsuaprocura–anunciouavelhasenhora.Penelopeachouaquiloumtantosurpreendente.–Émesmo?

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– Sim, quero conversar com você sobre a última coluna da tal LadyWhistledown.–Comigo?– Sim, com você – resmungou Lady Danbury. – Nãome importaria de

conversar com outra pessoa se você me izesse o favor de encontraralguémcommaisdoquemeiocérebro.Penelopeengasgounoiníciodeumarisadaenquantofaziaumsinalpara

suascompanheiras.–Hã...PossolhegarantirqueLadyBridgerton...Violetestavabalançandoacabeçafuriosamente.–Elaestáocupadademaisemcasaraquelaprolegigantescaque tem–

retrucou Lady Danbury. – Não dá para esperar que consiga ter umaconversadecentehojeemdia.Penelope lançou um olhar rápido para Lady Bridgerton, para ver se

tinha icadoofendidacomoinsulto–a inal,haviaumadécadaquetentavacasar a sua prole gigantesca. Mas Violet não parecia nem um poucoincomodada.Naverdade,pareciaestarprendendooriso.Prendendo o riso e se afastando pouco a pouco, levando Hyacinth e

Felicityconsigo.Eramtraidorasefurtivas,astrês!Bem,masPenelopenãopodiasequeixar.A inal, tinhamesmodesejado

escapardasBridgertons,nãotinha?SónãogostavamuitodasensaçãodeFelicity eHyacinth teremachadoquehaviam,de alguma forma,dadoumgolpenela.– Elas se foram! – comemorou Lady Danbury. – Ótimo. Nem juntas

aquelasduasconseguemdizeralgointeligente.–Ora, issonãoéverdade–protestouPenelope.–TantoFelicityquanto

Hyacinthsãomuitointeligentes.–Eununcafaleiquenãosãoespertas–devolveuLadyDanbury,ácida.–

Sócomenteiquenãotêmnada inteligenteadizer.Masnãosepreocupe–acrescentou, dando-lhe um tranquilizador (tranquilizador? Quem já tinhavisto, alguma vez que fosse, Lady Danbury fazer qualquer coisatranquilizadora?)tapinhanobraço.–Elasnãotêmculpa.Issohádemudar.Aspessoas são comovinhos. Se começamboas, só fazemmelhorar comaidade.

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Naverdade,nessemomentoPenelopeestavaolhandodiscretamenteporcima do ombro direito de Lady Danbury na direção de um homem queachou que pudesse ser Colin (mas que não era), porém o comentário davelhasenhoraatraiudenovoasuaatenção.–Bonsvinhos?–ecoouPenelope.–Humpf.Eeuaquipensandoquevocênãoestavaouvindo.– Não, é claro que estava. – Penelope sentiu os lábios esboçarem algo

quenãoeraexatamenteumsorriso.–Eusóme...distraí.–ProcurandoaquelerapazBridgerton,semdúvida.Penelopearfou.–Ora,não iquetãochocada–falouLadyDanbury.–Estáestampadono

seurosto.Sómesurpreendeofatodeelenãoternotado.–Imaginoquetenha,sim–murmurouPenelope.– Será? Humpf. – Lady Danbury franziu a testa, os cantos da boca

virados para baixo, formando duas longas rugas que desciam até aslaterais do queixo. – Se não fez nada a respeito, isso não diz boa coisasobreele.Penelope sentiu um aperto no coração.Havia algo estranhamente doce

naféqueavelhasenhoradepositavanela,comosehomenscomoColinseapaixonassempormulherescomoelacomfrequência.PorDeus,Penelopetiveradelheimplorarparabeijá-la.Evejasócomoaquilohaviaterminado.Eledeixaraacasadelafuriosoenãosefalavamhaviatrêsdias.– Bem, não se preocupe com ele – disse Lady Danbury de repente. –

Vamosencontraroutroparavocê.Penelopepigarreoucomdelicadeza.–LadyDanbury,asenhorafezdemimoseuprojeto?A senhorinha icou radiante, abrindo um sorriso brilhante e fulguroso

emmeioaorostoenrugado.–Éclaro!Ficosurpresaporterlevadotantotempoparadescobrir.– Mas por quê? – perguntou Penelope, verdadeiramente incapaz de

compreender.LadyDanburydeixouescaparumsuspiro.Osomnãoera triste; estava

maisparapensativo.–Importa-sedenossentarmosumpouco?Estesvelhosossosjánãosão

oqueforamumdia.

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– É claro que não – retrucou Penelope depressa, sentindo-se péssimapor não levado em consideração a idade de Lady Danbury nem mesmoumavezenquantoestavamnaquelesalãodebaileabafado.Masacondessaeratãovibrantequeeradi ícil imaginá-laadoentadaou

fraca.–Pronto–dissePenelope,tomando-apelobraçoeconduzindo-aatéuma

poltrona próxima. Quando a velha senhora estava acomodada, Penelopesentou-se ao seu lado. – Estámais confortável agora? Quer alguma coisaparabeber?Lady Danbury assentiu, grata, e Penelope fez um sinal para que um

criado lhes trouxesse dois copos de limonada, uma vez que não queriadeixaracondessasozinhaparecendotãopálida.–Jánãosoumaistãojovemcomofuiumdia–comentouLadyDanbury

assimqueolacaiopartiuapressadoemdireçãoàmesadebebidas.–Nenhumdenósé–respondeuPenelope.Poderia ter soado como um comentário insolente,mas foi pronunciado

com ternura e, de alguma forma, a jovem imaginou que Lady Danburyapreciariaosentimento.E estava certa. A velha senhora riu baixinho e lançou um olhar de

admiraçãoparaPenelopeantesdedizer:–Quantomaisvelhaeu ico,maismedoucontadequãotolaéamaioria

daspessoas.– A senhora só está descobrindo isto agora? – retrucou Penelope, não

com a intenção de zombar, mas porque, considerando o comportamentousual de Lady Danbury, era di ícil crer que não tivesse chegado a essaconclusãoanosantes.LadyDanburygargalhou.–Não, às vezes acho que já sabia disso antesmesmode nascer.O que

estoupercebendoagoraéqueéhoradefazeralgoaesserespeito.–Comoassim?–Nãome importo com o que aconteça com os tolos destemundo,mas

pessoas como você... – Na falta de um lenço, ela secou os olhos com osdedos.–Bem,eugostariadevê-laencaminhada.Porváriossegundos,Penelopeselimitouafitá-la.–LadyDanbury–falouen im,comcautela–,apreciomuitooseugesto...

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eosentimento...masasenhorasabequenãosoudesuaresponsabilidade.– É claro que sei – zombou LadyDanbury. – Não tenhamedo, nãome

sintoresponsávelporvocê.Sesentisse,issonãoseriatãodivertido.Penelope sabia que estava parecendo uma tola completa, mas a única

coisaqueconseguiupensaremdizerfoi:–Nãoentendi.Lady Danbury permaneceu em silêncio enquanto o criado retornava

comalimonada,então,apóstomaralgunspequenosgoles,continuou:–Gostodevocê,Srta.Featherington.Nãogostodemuitagente.Ésimples

assim.Equerovê-lafeliz.– Mas eu sou feliz – retrucou Penelope, mais por re lexo do que por

qualqueroutracoisa.Lady Danbury ergueu uma sobrancelha arrogante, expressão que

dominavaàperfeição.–Émesmo?–murmurou.Ela era? O que signi icava o fato de ela ter de parar para pensar na

resposta?Nãoera infeliz, disso tinha certeza. Tinha amigosmaravilhosos,umacon identenairmãmaisnova,Felicity,emesmoqueamãeeasirmãsmais velhas não fossem mulheres que teria escolhido como amigasíntimas...bem,aindaassimasamava.Esabiaqueelastambémaamavam.Suavidanãoeratãoruimassim.Faltavam-lheemoçãoeentusiasmo,mas

estavasatisfeita.Embora satisfação não fosse o mesmo que felicidade. Penelope sentiu

umadoraguda,umapunhaladanopeito,aosedarcontadequenãotinhacomo responder à pergunta carinhosamente feita por Lady Danbury demaneiraafirmativa.– Eu já criei aminha família – começouLadyDanbury. –Quatro ilhos,

todos bem casados. Já encontrei uma noiva até para omeu sobrinho, dequem, verdade seja dita – ela inclinou o corpopara a frente e sussurrouestas três últimas palavras, dando a impressão de que iria revelar umsegredodeEstado–,gostomaisdoquedosmeusprópriosfilhos.Penelope não pôde deixar de sorrir. Lady Danbury lhe pareceu tão

furtiva,tãotravessa...Foibastantegracioso,naverdade.– Isso pode surpreendê-la – continuou a velha senhora –,mas sou um

poucointrometidapornatureza.

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Penelopemanteveaexpressãoescrupulosamenteséria.– Sinto como se ainda tivesse projetos por inalizar – declarou Lady

Danbury,erguendoasmãoscomoemsinalderendição.–Gostariadeverumaúltimapessoafelizebemestabelecidaantesdepartir.– Não fale desse jeito, Lady Danbury – pediu Penelope, estendendo a

mãonum impulsoparapegar adela.Deu-lheumpequenoapertão. –Vaisobreviveranóstodos,tenhocerteza.– Pfff, não seja boba. – Mesmo que seu tom de voz refutasse o que

Penelopedissera,LadyDanburynãofezamenormençãoderetiraramãodadela.–Nãoestousendodepressiva–acrescentou.–Apenasrealista.Jápasseidos70anos, enãovou lhecontarháquantosanos issoaconteceu.Nãomesobramuitotemponestemundoeissonãomeincomodanemumpouco.Penelope esperava ser capaz de enfrentar a própria initude com a

mesmatranquilidade.–Masgostodevocê.Vocême lembraamimmesma.Não temmedode

falaroquepensa.Penelope só pôde olhá-la, perplexa. Passara os últimos dez anos sem

dizer exatamente o quedesejava. Comaspessoasque conhecia bem, eraaberta, francaeatémesmoumtantoengraçada,masentreestranhossualínguatravava.Lembrava-se de um baile demáscaras ao qual comparecera certa vez.

Na verdade, já fora a diversos bailes demáscaras,mas aquele tinha sidoúnicoporqueelaencontrarauma fantasia–nadadeespecial, apenasumvestido do século XVII – na qual sentira que sua identidade realmenteicaraoculta.Talvezfosseamáscara.Eraimensaelhecobriaquasetodoorosto.Sentira-se transformada. Livre, de repente, do peso de ser Penelope

Featherington, percebeu uma nova personalidade a lorar. Não é quetivesseadotadoumarfalso;naverdade,eracomoseoseuverdadeiroeu–aquele que ela não sabiamostrar a ninguém que não conhecesse bem –enfimtivesseselibertado.Elarira,fizerapiadas.Atéflertara.Ejuraraque,nanoiteseguinte,quandoasfantasiasfossemguardadase

elamaisumavezcolocasseoseumaisbelovestidodenoite,se lembraria

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decomoserelamesma.Mas issonão acontecera. Penelope chegara ao baile, cumprimentara as

pessoas comumacenode cabeça, sorrira comeducaçãoe,maisumavez,icaraparadaàsmargensdosalão,semqueninguémavisseetirasseparadançar.Aoqueparecia,serPenelopeFeatheringtonsignificavaalgumacoisa.Seu

destino fora decidido anos antes, durante aquela primeira temporadaterrível em que sua mãe insistira que ela debutasse, embora a jovemtivesse implorado pelo contrário. A menina gordinha. Desajeitada. A quesempre se vestia com cores que não lhe caíam bem. Não importava quetivesse emagrecido, se tornado graciosa e en im jogado fora todos osvestidos amarelos. Naquele mundo – a alta sociedade londrina –, elasempreseriaaantigaPenelopeFeatherington.Aculpaeratãosuaquantodequalqueroutrapessoa.Umcírculovicioso,

na verdade. Cada vez que entrava num salão de baile e via aquelaspessoasqueaconheciamhaviatantotempo,tinhaasensaçãodeencolher,transformando-senameninatímidaedesajeitadadetantosanosantes,emvez de ser a mulher con iante na qual gostava de achar que tinha setransformado–pelomenosnocoração.– Srta. Featherington? – chamou Lady Danbury em uma voz baixa e

surpreendentementegentil.–Háalgoerrado?Penelope teve consciência de que levoumais tempodo que devia para

responder,masprecisoudaquelessegundosamaisparaencontraravoz.– Acho que não sei falar o que penso – confessou, por im, virando-se

para itar Lady Danbury apenas ao pronunciar as últimas palavras: –Nuncaseioquedizeràspessoas.–Vocêsabeoquedizeramim.–Asenhoraédiferente.LadyDanburyatirouacabeçaparatrásegargalhou.–Issoqueéeufemismo...Ah,Penelope...Esperoquenãoseimporteque

eu a chame pelo primeiro nome... Se você é capaz de dizer o que pensaparamim,écapazdefazerissocomqualquerpessoa.Metadedoshomensadultosqueseencontramnestesalãosaicorrendoparaseesconderpeloscantosnoinstanteemquemevêchegar.– Eles só não a conhecem – retrucou Penelope, dando um tapinha

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carinhosoemsuamão.–Etampoucoconhecemvocê–observouLadyDanbury,semrodeios.–Não–concordouPenelope,comumtoquederesignaçãonavoz–,não

conhecem.– Eu diria que não sabem o que estão perdendo,mas isso seriamuito

arrogantedaminhaparte–disseavelhasenhora.–Nãoemrelaçãoaeles,mas a você, porque, pormais que eu os chame de tolos, o que faço combastante frequência, alguns são decentes, e é um crime que ainda não aconheçam...Hum,oqueseráqueestáacontecendo?Sem saber por quê, Penelope se sentou com as costas um poucomais

eretas.PerguntouaLadyDanbury:–Comoassim?Masestavaclaroquehaviaalgonoar.Aspessoassussurravamefaziam

gestosemdireçãoaopequenopalcoondeosmúsicosestavamsentados.–Ei,você!–exclamouLadyDanbury,en iandoabengalanoquadrilde

umcavalheiropróximo.–Oqueestáacontecendo?– Cressida Twombley deseja anunciar alguma coisa – retrucou ele,

afastando-se logo em seguida, presumivelmente para evitar qualqueroutrodiálogocomLadyDanburyoucomabengala.–DetestoCressidaTwombley–murmurouPenelope.LadyDanburyseengasgoucomumarisada.– E você alega que não sabe dizer o que pensa. Nãome deixe curiosa.

Porqueadetesta?Penelopedeudeombros.–Sempreseportoumuitomalcomigo.LadyDanburyassentiu,comconhecimentodecausa.–Todovalentãotemumavítimapreferida.–Hojeemdianãoémaistãoruim–dissePenelope.–Masnaépocaem

que éramos debutantes, quando ela ainda era Cressida Cowper, nãoresistia a nenhuma chance deme atormentar. E as pessoas... bem... – Elabalançouacabeça.–Deixeparalá.–Não,porfavor,continue–pediuLadyDanbury.Penelopesuspirou.–Nãoénada,sério.Ésóqueeujánoteiquemuitasvezesaspessoasnão

fazem questão de defender as outras. Cressida era popular, pelo menos

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com um determinado grupo, e era temível para as outras meninas danossaidade.Ninguémousavaircontraela.Bem,quaseninguém.IssochamouaatençãodeLadyDanburyeelasorriu.–Quemfoiasuaprotetora,Penelope?– Pretetores, na verdade. Os Bridgertons sempre saíam em minha

defesa. Certa vez, Anthony lhe deu um corte eme levou para jantar. – Avoz dela foi icando mais aguda enquanto recordava o entusiasmo daocasião.–Elerealmentenãodeveriaterfeitoaquilo.Eraumjantarformal,eeledeveriaterservidodecompanhiaparaalgumamarquesa,creioeu.–Elasuspirou,relembrandoomomentocomcarinho.–Foiencantador.–Eleéumbomhomem.Penelopeassentiucomacabeça.– A esposa dele me disse que foi o dia em que se apaixonou por ele.

Quandooviuseromeuherói.LadyDanburysorriu.– E o Sr. Bridgerton mais jovem, alguma vez ele já correu em seu

socorro?–Colin?–PenelopenemmesmoesperouqueLadyDanburyassentisse

antesde acrescentar: – Já, emboranuncademaneira tãodramática.Masdevo dizer que, por mais agradável que seja o fato de os Bridgertonsestaremsempreaomeulado...–Sim,Penelope?Ajovemsuspirououtravez.Aquelapareciaserumanoiteparasuspiros.–Eugostariaquenãotivessemdemedefendercomtantafrequência.Eu

deveriasercapazdefazer issosozinha.Ou,pelomenos,mecomportardemaneiraquenãofossenecessáriadefesaalguma.LadyDanburydeuumtapinhaemsuamão.– Acho que você se defende bem melhor do que imagina. E quanto a

Cressida Twombley... – LadyDanbury fez uma careta de aversão. – Bem,ela teve o que mereceu, se você quer saber. Embora – acrescentourispidamente–nuncaninguémtenhameperguntadonada.Penelopenãoconseguiuconterarisadinhadedesdém.–Vejasóasituaçãodelaagora–continuouLadyDanbury,ácida.–Viúva

e sem fortuna. Se casou com aquele devasso do Horace Twombley, queconseguiufazertodomundoacreditarquetinhadinheiro.Agorasórestou

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aelaessabelezadesgastada.AsinceridadefezPenelopecomentar:–Masaindaébastanteatraente.–Humpf.Paraquemgostademulheresespalhafatosas.–LadyDanbury

estreitouosolhos.–Euaachoóbviademais.Penelope olhou em direção ao palco, onde Cressida aguardava, com

enormepaciência,enquantoosalãoseaquietava.–Ficoimaginandooqueelavaidizer.–Nadaquepossameinteressar–retorquiuLadyDanbury.–Eu...Ah.Ela parou e seus lábios se curvaram em uma estranha mistura de

desaprovaçãoeummeiosorriso.–Oquefoi?–indagouPenelope.EsticouopescoçoparaseguiralinhadevisãodeLadyDanbury,masum

cavalheirobastantecorpulentobloqueavaocaminho.– O seu Sr. Bridgerton está se aproximando – falou Lady Danbury, o

sorriso vencendo a carranca de desaprovação. – E parece bastantedecidido.Penelopeimediatamentevirouacabeça.– Pelo amor de Deus, menina, não olhe! – exclamou Lady Danbury,

dando-lhe uma cotovelada no braço. – Ele vai saber que você estáinteressada.–Éprovávelquejásaiba–murmurouPenelope.E então ali estava ele, esplêndido, parado diante dela, mais parecendo

umdeusquetivessesedignadoaagraciaraterracomasuapresença.– Lady Danbury – cumprimentou, fazendo uma reverência suave e

graciosa.–Srta.Featherington.–Sr.Bridgerton–disseLadyDanbury–,queprazeremvê-lo.ColinolhouparaPenelope.–Sr.Bridgerton–murmurouela,semsaberoquemaisacrescentar.Oquesediziaaumhomemquesebeijararecentemente?Penelopenão

tinha a menor experiência no assunto, disso não havia dúvida. Semmencionaracomplicaçãoamaisdeeleterdeixadoacasadelaenfurecidodepoisdobeijo.– Eu gostaria de... – começou Colin, antes de parar e franzir a testa,

olhandoemdireçãoaotablado.–Oquetodosestãoolhando?

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–CressidaTwombleytemalgumadeclaraçãoafazer.AexpressãodeColinsetransformouemumacaretadereprovação.–Não consigopensar emnadaque ela tenha adizer queme interesse

ouvir–murmurou.Penelopenãopôdedeixardesorrir.CressidaTwombleyeraconsiderada

umalídernasociedade,oupelomenosoforaquandojovemesolteira,masos Bridgertons jamais haviam gostado dela e, de alguma forma, issosemprefizeraPenelopesesentirmelhor.Naquelemomentoumatrombetasooueosalãofoi icandoemsilêncioà

medidaquetodosvoltavamaatençãoparaocondedeMaccles ield,depéno tablado ao lado de Cressida, mostrando-se levemente desconfortávelcomtantaatenção.Penelope sorriu. Haviam lhe contado que o conde fora um verdadeiro

devasso,mashojeeraumtipointelectualededicadoàfamília.Noentanto,aindaerabonitoobastanteparaserumdevasso.QuasetãobonitoquantoColin.Massóquase.Penelopesabiaqueerasuspeitaparafalar,maseradi ícil

imaginarumacriaturatãobelaquantoColinquandosorria.–Boanoiteatodos–começouoconde.–Boanoite!–devolveuumavozembriagadavindadofundodosalão.O conde fez um simpático cumprimento com a cabeça e abriu um

tolerantemeiosorriso.–Minha,hã...estimadaconvidada,LadyTwombley–elefezumgestoem

direção a Cressida –, gostaria de fazer um anúncio. Então, se todospuderemprestaratençãoàsenhoraqueseencontraaomeulado...UmaondadesussurrosseespalhoupelosalãoenquantoCressidadava

umpassoàfrente,assentindo,comoumarainha,paraamultidão.Esperouquetodosestivessememsilêncioparadizer:– Senhoras e senhores, muito obrigada por interromperem as suas

festividadesparamedarematenção.–Vamoslogocomisso!–gritoualguém,provavelmenteamesmapessoa

queresponderaaoboa-noitedoconde.Cressidaignorouainterrupção.–Cheguei à conclusãodequenãoposso continuara fraudeque tomou

contademinhavidanosúltimosonzeanos.

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Osalãofoiinvadidoporsussurros.Todossabiamoqueelaiadizere,noentanto,ninguémconseguiaacreditarquefosseverdade.– Portanto – continuou Cressida, aumentando o tom de voz –, decidi

revelaromeusegredo.Senhorasesenhores,eusouLadyWhistledown.

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CAPÍTULO11

Colinnãoconseguiase lembrardaúltimavezqueentraranumsalãodebailesentindotamanhaapreensão.Os últimos dias não tinham sido os melhores de sua vida. Estivera de

péssimo humor, e o fato de ser bastante conhecido pelo bom humor sópioraraasituação,porquetodossesentiamnaobrigaçãodecomentarsuaterríveldisposição.Paraalguémmal-humorado,nãohavianadapiordoquesersujeitadoa

constantesquestionamentoscomo“Porquevocêestádemauhumor?”.A família parou de perguntar depois que ele rosnou – rosnou! – para

Hyacinthquandoela lhepediuqueaacompanhasseao teatrona semanaseguinte.AtéaquelemomentoColinnãosabianemqueeracapazderosnar.Teriadesedesculparcomairmã,oqueiaserumadordecabeça,jáque

Hyacinthsimplesmentenãosabiaaceitardesculpas–aomenosnãoasqueprovinhamdeoutrosBridgertons.Mas a caçula era o menor dos seus problemas. Ela não era a única

pessoaquemereciaumpedidodedesculpas.E era por isso que seu coração batia tão rápido e ele estava nervoso

como nunca ao entrar no salão dos Maccles ields. Penelope estaria ali.Sabiadissoporqueelasemprecompareciaaosprincipaisbailes,aindaqueagoraquaseexclusivamentecomoacompanhantedairmã.Sentir aquele nervosismo ao ver Penelope de certa forma o enchia de

humildade. Ela era... Penelope. Sempre estivera ali, sorrindo com polideznos limites do salão de baile. E ele achara que ela sempre estaria ali.Algumascoisasnãomudavam,ePenelopeeraumadelas.Sóqueelahavia,sim,mudado.Colinnãosabiaquandoaconteceraousealguémalémdelesederaconta

disso, mas Penelope Featherington não era a mesma mulher que eleconhecia.Outalveztivessesidoelequemhaviamudado.

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O que o fazia sentir-se ainda pior, porque se fosse esse o caso, issosignificariaquePenelopeerainteressante,encantadoraebeijávelháanoseelenãotiveraamaturidadenecessáriaparapercebê-lo.Não, era melhor achar que ela tinha mudado. Colin nunca fora fã da

autoflagelação.Qualquerque fosseocaso,precisavasedesculpar,e logo.Tinhaquese

desculparpelobeijo,porqueelaeraumadamaeeleera (namaiorpartedotempo,pelomenos)umcavalheiro.Eprecisavasedesculparporterseportado como um idiota logo depois, porque era, simplesmente, a atitudecertaasertomada.SóDeussabiaoquePenelopeachavaqueeleachavadelaagora.Não foi di ícil encontrá-la.Nem se deu o trabalhodeprocurar entre os

casais que dançavam (o que o deixava com raiva – por que os outroshomens não a convidavam para dançar?). Em vez disso, concentrou aatenção nas paredes e, com efeito, lá estava ela, sentada ao lado de... ah,Deus...LadyDanbury.Bem,nãohaviamaisnadaa fazersenão irdiretoatéelas.A julgarpela

maneira comoPenelopeeavelhabisbilhoteira seguravamamãoumadaoutra,nãoesperavaqueLadyDanburydesaparecessetãocedo.Aochegaratéasduas,virou-seprimeiroparaLadyDanburye fezuma

elegantereverência.– Lady Danbury – cumprimentou, antes de voltar a atenção para

Penelope.–Srta.Featherington.–Sr.Bridgerton–disseLadyDanbury,comumasurpreendentefaltade

rispideznavoz–,queprazeremvê-lo.Ele assentiu com a cabeça, então itou Penelope, perguntando-se o que

elaestariapensandoeseconseguiriaenxergá-loemseusolhos.Mas o que quer que estivesse pensando – ou sentindo – estava oculto

por baixo de uma grossa camada de nervosismo. Ou talvez o nervosismofosse a única coisa que ela estava sentindo. Não podia culpá-la.Considerandoaformatempestuosacomaqualeledeixaraasaladevisitasdela, sem uma explicação... ela só podia estar confusa. E Colin sabia porexperiênciaprópriaqueaconfusãosemprelevavaàapreensão.– Sr.Bridgerton–murmurouela, en im, suapostura transmitindouma

polidezescrupulosa.

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Ele pigarreou. Como extraí-la das garras de Lady Danbury? Colinrealmentepreferianãoterdeexportodaasuahumildadediantedavelhaabelhuda.–Eugostariade...–começouele,comaintençãodedizerquegostariade

falarcomelaemparticular.LadyDanbury podia ser a criaturamais curiosa que ele conhecia,mas

nãohaviaoutralinhadeaçãoaseguir,etalvezserdeixadanoescuroumaveznavidafizessebemaela.Mas, no instante exato em que ele ia continuar a frase, percebeu que

algoestranhoacontecianosalão.Aspessoassussurravameapontavamemdireçãoàpequenaorquestra,cujosintegranteshaviamacabadodebaixaros instrumentos. Além disso, nem Penelope nem Lady Danbury estavamlhedandoamenoratenção.–Oquetodosestãoolhando?–indagouColin.LadyDanburynemsedeuotrabalhodeolharparaeleaoresponder:–CressidaTwombleyvaifazerumadeclaração.Quecoisamais irritante.ElenuncagostaradeCressidaTwombley.Fora

máe intolerantequandosolteirae icaraaindapiordepoisquesecasara.Mas era linda e inteligente, apesar de cruel, de maneira que ainda eraconsideradaumalíderemalgunscírculosdasociedade.–Não consigopensar emnadaque ela tenha adizer queme interesse

ouvir–murmurouColin.Espiou Penelope tentar conter um sorriso e lhe lançou um olhar de

“pegueivocê”.Masoolhartambémdizia“econcordoplenamente”.–Boanoiteatodos–cumprimentouocondedeMacclesfield.–Boanoite!–gritoualgumbêbadonofundodosalão.Colinsevirouparaverquemera,masamultidãotornouissoimpossível.Ocondefaloumaisumpouco,entãoCressidatomouapalavra,momento

emqueColindeixoudeprestaratenção.Oquequerqueeladissessenãoiaajudá-loasolucionarseumaiorproblema:descobrircomosedesculparcomPenelope.Tentaraensaiaraspalavrasnacabeça,masnuncasoavamcertas,entãoestavacontandocomsuatãofamosa luênciaparaconduzi-lona direção correta quando chegasse a hora. Sem dúvida Penelopecompreenderia...–Whistledown!

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ColinsóouviuaúltimapalavradodiscursodeCressida,masnãohaviaamenorformadeignoraracomoçãoquetomoutodoosalão.As pessoas sussurravam sem parar, todas aomesmo tempo e sobre o

mesmo tema, o que só acontecia quando alguémera lagrado empúblicoemposiçãomuitoembaraçosaecomprometedora.–Oquê?–perguntoueleatabalhoadamente,virando-separaPenelope,

queficoubrancacomoumavela.–Oqueeladisse?MasPenelopeestavasemfala.EleolhouparaLadyDanbury,porémavelhasenhoratinhalevadoamão

àbocaepareciaqueiriadesmaiaraqualquermomento.Oque era um tanto alarmante, pois Colin seria capaz de jurar que, em

seusquase80anos,LadyDanburyjamaisperderaossentidos.–Oquê?– insistiuele,naesperançadequeumadasduasdespertasse

deseuestupor.– Não pode ser verdade – sussurrou Lady Danbury, por im, mal

conseguindopronunciaraspalavras.–Nãoacredito.–Oquê?Ela apontou em direção a Cressida, o dedo indicador tremendo à luz

bruxuleantedeumavela.–EssasenhoranãoéLadyWhistledown.Colin virava a cabeçadeum ladopara outro. ParaCressida. Para Lady

Danbury.ParaCressida.ParaPenelope.–ElaéLadyWhistledown?–cuspiuele,finalmenteentendendo.– É o que ela diz – respondeu Lady Danbury, a dúvida estampada no

rosto.Colin também tinha suas dúvidas. Cressida Twombley era a última

pessoaqueeleteriaimaginadoserLadyWhistledown.Queelaeraesperta,nãohaviacomonegar.Masnãoeraengenhosanemespirituosa,anãoserqueestivessezombandodosoutros.LadyWhistledowntinhaumsensodehumorbastante ferino, porém, comexceçãode seus comentários infamescom relação à moda, nunca parecia implicar com os membros menospopularesdasociedade.No inaldascontas,ColineraobrigadoaadmitirqueLadyWhistledown

tinhabomgostonoquediziarespeitoàspessoas.–Nãopossoacreditarnumacoisadessas–declarouLadyDanburyem

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umtomderepulsa.–Seeutivesse imaginadoque istoaconteceria, jamaisterialançadoaqueledesafioabominável.–Istoéhorrível–sussurrouPenelope.Avozdelatremia,eissodeixouColinapreensivo.–Vocêestábem?–perguntouele.Elafezquenão.–Achoquenão.Naverdade,estouumpoucoenjoada.–Querirembora?Penelopebalançouacabeçamaisumavez.–Senãoseimportar,vouficarsentadaaqui.–Éclaro–assentiuele,olhandoparaelacompreocupação.Continuavaterrivelmenteabatida.– Ora, pelo amor de... – blasfemou Lady Danbury, pegando Colin de

surpresa,mas,emseguida,elasoltouumverdadeiroimpropério,oqueeleachouquepoderiamuitobemtertiradooplanetadoeixo.–LadyDanbury?–disseele.– Ela está vindo nesta direção –murmurou a velha senhora, virando a

cabeçaparaooutrolado.–Eudeveriasaberquenãoescaparia.Colin olhou para a direção de Cressida, que tentava abrir caminho em

meioàmultidão,aparentementeparaconfrontarLadyDanburyeresgataro seu prêmio. Ia, como era de se esperar, sendo abordada a cada passopelos convidados. Parecia estar adorando o assédio, o que não eranenhumasurpresa–Cressidasempreadoraraserocentrodasatenções–mastambémpareciabastantedecididaachegaratéLadyDanbury.–Nãoháqualquerformadeevitá-la,sintodizer–observouColin.–Eusei–resmungouela.–Venhotentandoevitá-laháanosejamaisfui

bem-sucedida. – Ela olhou para Colin, contrariada. – Achei que estavasendo tão esperta... Pensei que fosse ser divertido expor LadyWhistledown.–É,bem...foidivertido–disseColin,masnãoestavasendosincero.LadyDanburylhedeuumaestocadanapernacomabengala.– Não está sendo nem um pouco divertido, seumenino tolo. Olhe só o

que eu vou ter de fazer agora! – Ela agitou a bengala em direção aCressida,queestavacadavezmaisperto.– Jamaissonheiemterde lidarcomalguémdalaiadela.

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–LadyDanbury–cumprimentouCressida,aproximando-secomabarradovestidoroçandonochão.Paroubememfrenteàvelhasenhora.–Queprazeremvê-la.Lady Danbury nunca fora conhecida por sua graciosidade, mas se

superou ao ignorar qualquer tentativa de saudação e dizer direto,asperamente:–Imaginoqueestejaaquiparacobraroseudinheiro.Cressidainclinouacabeçaparaoladonumgestoencantadoreensaiado.– A senhora disse que daria mil libras a quem desmascarasse Lady

Whistledown.–Eladeudeombros,numgestodefalsahumildade.–Jamaisestipulouqueelanãopoderiadesmascararasimesma.LadyDanburyselevantou,estreitouosolhosedisparou:–Nãoacreditoquesejavocê.Colin gostavade acharque era ino e imperturbável,mas até ele arfou

diantedaquilo.Os olhos de Cressida brilharam de fúria, mas ela logo se recompôs e

retrucou:– Eu icaria chocada se a senhora não reagisse com algum grau de

ceticismo,LadyDanbury.A inaldecontas,nãoédoseufeitiosercrédulaebondosa.Avelhasenhorasorriu.Bem,talvezaquilonãofosseumsorriso,masos

seuslábiossemoveram.–Vouencararissocomoumelogio–falou–edeixareiquemeconvença

quefoiessaasuaintenção.Colin assistiu ao impasse atentamente – cada vezmais alarmado –, até

LadyDanburysevirarderepenteparaPenelope,queselevantarapoucossegundosdepoisdela.–Oqueacha,Srta.Featherington?–perguntou.O corpo inteiro de Penelope tremeu, ainda que de leve, enquanto ela

gaguejou:–Oq-quê...e-eu,eu...c-comodisse?– O que acha? – repetiu Lady Danbury. – Acha que Lady Twombley é

LadyWhistledown?–Eu...Eurealmentenãosei.–Ora,vamos,Srta.Featherington.–Avelhasenhorapousouasmãosnos

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quadris e olhou para Penelope com uma expressão que beirava aexasperação.–Semdúvidavocêtemumaopiniãosobreoassunto.Colininvoluntariamentedeuumpassoàfrente.LadyDanburynãotinha

direitodefalarcomPenelopedaquelejeito.E,alémdomais,elenãoestavagostandodaexpressãodePenelope.Pareciasesentiracuada,olhandonadireçãodelecomumpânicoqueelejamaisvira.Ele já vira Penelope desconfortável, já a viramagoada,mas jamais em

pânico.Entãolheocorreuqueelaodiavaserocentrodasatenções.Sim,elazombava da própria solteirice e do fato de parecer invisível em meio àsociedade,etalvezfossegostardereceberumpoucomaisdeatenção,masaqueletipodeatenção...Todosolhandoparaelaeesperandoquefalasse...Elaestavacompletamenteinfeliz.– Srta. Featherington – disse ele com delicadeza, passando para o seu

lado–,asenhoritamepareceindisposta.Gostariadeseretirar?–Gostaria–respondeuela,masentãoalgoestranhoaconteceu.Elamudou.Colinnãoconseguiupensaremoutrapalavraparadescrever

o que viu. Ela simplesmente mudou. Bem ali, no salão de baile dosMaccles ields, ao lado dele, Penelope Featherington se transformou emoutrapessoa.Suacoluna icoueretaeelepodiajurarqueocalorqueemanavadeseu

corpoaumentouquandoelafalou:–Não.Não,eutenhoalgoadizer.LadyDanburysorriu.Penelopeolhoudiretoparaavelhacondessaeafirmou:–AchoqueelanãoéLadyWhistledown.Achoqueestámentindo.Colin instintivamente puxou Penelope um pouco mais para perto. A

expressãodeCressidalevavaacrerqueelapoderiapularemseupescoçoaqualquerinstante.– Eu sempre gostei de Lady Whistledown – continuou Penelope,

erguendooqueixoeadotandoumaposturaquase régia.FitouCressidaeosolharesdasduassecruzaramquandoelaacrescentou:–EmeucoraçãoficariapartidoseeudescobrissequeelaeraalguémcomoLadyTwombley.Colintomouamãodelaeaapertou.Nãoconseguiudeixardefazê-lo.– Muito bem dito, Srta. Featherington! – exclamou Lady Danbury,

batendo palmas de puro contentamento. – Era exatamente isso que eu

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estavapensando,masnãoconseguiencontraraspalavras.–Virou-separaColincomumsorriso.–Elaémuitointeligente,sabe?–Eu sei – respondeu ele, comumestranho e inédito orgulhobrotando

dentrodesi.– A maioria das pessoas não nota – prosseguiu Lady Danbury, de

maneiraquesuaspalavrassófossemouvidaspelorapaz.–Eusei–murmurouele–,maseunoto.Teve de sorrir diante do comportamento de Lady Danbury, que tinha

certezaqueforaproposital,apenaspara irritarCressida,quenãogostavadeserignorada.– Não admito ser insultada por essa... por essa... por essaninguém! –

exclamouCressida,furiosa.Virou-separaPenelopecomumolharfuzilanteesibilou:–Exijoumpedidodedesculpas.Penelopelimitou-seaassentirlentamenteeretrucou:–Vocêpodeexigiroquequiser.Então,ficouemsilêncio.Colintevequeseesforçarmuitoparatirarosorrisodorosto.Estava claro que Cressida desejava continuar discutindo (e, talvez,

cometerumatode violêncianoprocesso),mas se conteve, talvezpor seróbvioquePenelope se encontravaentre amigos.Noentanto, sempre foraconhecida por sua segurança e seu equilíbrio, portanto Colin não sesurpreendeu quando ela se recompôs, virou-se para Lady Danbury eperguntou:–Oqueplanejafazercomrelaçãoàsmillibras?Lady Danbury a encarou por um longo instante, então se virou para

Colin – por Deus, a última coisa que ele queria era se envolver naquelaconfusão–eindagou:–Oqueacha, Sr.Bridgerton?AchaqueLadyTwombleyestádizendoa

verdade?Colinsorriu.–Asenhoradeveestarloucasepensaquevouofereceraminhaopinião.– O senhor é um homem surpreendentemente sábio, Sr. Bridgerton –

retrucouLadyDanbury,emtomdeaprovação.Eleassentiucommodéstia,entãoarruinouoefeitoaodizer:–Meorgulhodisso.

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Ora, não era todos os dias que um homem era chamado de sábio porLady Danbury. A inal, a maior parte dos adjetivos usada por ela tinhaconotaçãonegativa.Cressida nem se deu o trabalho de olhar para ele. Como Colin sabia

muito bem, ela não era idiota, apenasmá, e depois demais de dez anosfrequentando a alta sociedade, devia ter consciência de que ele nãogostava muito dela e que sem dúvida não se tornaria vítima de seusencantos.Então, ignorando-o, elaencarouLadyDanburyemanteveavozperfeitamentecalmaaoperguntar:–Oquefazemosagora,milady?A velha senhora icou em silêncio por um longo instante e em seguida

decretou:–Precisodeprovas.Cressidapiscou,aturdida.–Oquedisse?– Provas! – Lady Danbury bateu a bengala no chão com uma força

incrível. – Que parte você não compreendeu? Não vou lhe entregar umafortunasemterprovas.– Como semil libras fosse uma grande fortuna... – comentou Cressida,

competulância.LadyDanburyestreitouosolhos.–Entãoporqueestátãoansiosapararecebê-las?Cressida icoucaladaporum instante,massuapostura, seurosto, cada

ibradeseuserestavamtensos.Todossabiamqueomaridoadeixaraempéssima situação inanceira, mas aquela era a primeira vez que alguémtocavanoassuntocomeladeformatãodireta.– Arranje-me as provas – falou Lady Danbury – e eu lhe darei o

dinheiro.–Estádizendo–retrucouCressida(epormaisqueadetestasse,Colinfoi

forçado a admirar a sua capacidade de manter a voz serena) – que aminhapalavranãoéosuficiente?–Sim,é issoqueestoudizendo– ladrouLadyDanbury.–Peloamorde

Deus,menina,ninguémchegaàminhaidadesempermissãoparainsultarquembementender.Colin achou ter escutadoPenelope engasgar,mas, ao olhá-lade soslaio,

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ela estava impassível, apenasobservandoodiálogo. Seusolhos castanhosbrilhavam e ela recuperara a cor que perdera quando Cressida izera oanúncio inesperado. Na verdade, agora Penelope parecia estarverdadeiramenteintrigadapelosacontecimentos.–Muitobem–disseCressida,avozgravee letal.–Eulhetrareiprovas

nodecorrerdospróximosquinzedias.– Que tipo de provas? – indagou Colin, para logo em seguida se

arrepender.A última coisa que desejava era se envolver naquela confusão, mas a

curiosidadetomaracontadele.Cressida se virou para ele com o rosto notavelmente plácido, a julgar

pelo insulto que acabara de escutar de Lady Danbury diante de váriastestemunhas.–Saberáquandoeuasentregar–disseela,irônica.Entãoestendeuobraço,esperandoqueumdeseussabujosotomassee

aconduzisseparalonge.Oquefoidefatoimpressionante,porqueumjovem(umtoloapaixonado,

pelojeito)sematerializouaoseuladocomoseelaotivesseinvocadocomamerainclinaçãodobraço.Uminstantedepois,haviamdesaparecido.–Bem,quecoisadesagradável–comentouLadyDanbury,quebrandoo

silêncio meditativo, ou talvez atordoado, em que todos se encontravamhaviaquaseumminuto.–Eununcagosteidela–declarouColin,paraninguémemespecial.Umapequenamultidãoseformaraemtornodostrês,entãoaspalavras

delenãoforamouvidasapenasporPenelopeeLadyDanbury,maselenãoseimportou.–Colin!Ele se virou e deparou com Hyacinth, que arrastava Felicity

Featherington consigo enquanto deslizava em meio à aglomeração atéchegaraoseulado.–Oqueeladisse?–perguntousuairmãcaçula,semfôlego.–Tentamos

chegaraquiantes,masestavatãotumultuado...–Disseexatamenteoquevocêesperariadela–respondeuele.Hyacinthfezumacareta.–Homenssãopéssimosemintrigas.Queroaspalavrasexatas.

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–Émuitointeressante–comentouPenelope,derepente.Seutompensativochamouaatençãodamultidãoe,emsegundos,todos

fizeramsilêncio.–Fale–pediuLadyDanbury–,estamosouvindo.Colin esperava que isso fosse deixar Penelope desconfortável, mas a

ondadeautocon iançaquea tomaraalgunsminutosantescontinuavaemação,poisseempertigouorgulhosamenteedisse:–PorquealguémhaveriadeserevelarcomoLadyWhistledown?–Pelodinheiro,éclaro–retrucouHyacinth.Penelopefezquenãocomacabeça.– É de imaginar que Lady Whistledown estaria bastante rica a esta

altura.Temoscompradoseusjornaisháanos.–MeuDeus,elatemrazão!–exclamouLadyDanbury.–Talvezsóquisesseatenção–sugeriuColin.Não era uma hipótese tão impensável: Cressida havia passado amaior

partedesuaidadeadultatentandoestarnocentrodasatenções.–Penseinisso–admitiuPenelope–,masseráqueelaquermesmoesse

tipode atenção?LadyWhistledown insultouumbomnúmerodepessoasaolongodosanos.– Ninguém que signi ique qualquer coisa para mim – brincou Colin.

Então, ao verque todos esperavamumaexplicação, acrescentou: –VocêsnuncanotaramqueLadyWhistledownsóinsultagentequemerece?Penelopepigarreoudelicadamente.–Elajásereferiuamimcomoumafrutamadurademais.ElefezumgestocomamãodescartandoainquietudedePenelope.–Comexceçãodosdetalhessobremoda,éclaro.Penelope deve ter decidido não insistir no assunto, pois se limitou a

avaliarColincomumlongoepenetranteolharantesdeseviraroutravezparaLadyDanburyedizer:–LadyWhistledownnãotemnenhummotivoparaserevelar.Cressida,

obviamente,sim.Lady Danbury icou radiante, mas depois, de repente, seu rosto se

transformounumacaretadedesaprovação.– Acho que preciso lhe conceder os quinze dias de prazo para que

apareçacomatal“prova”.Paraserjusta.

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– Eu, particularmente, estou muito interessada em ver o que ela vaiinventar – comentou Hyacinth. Então, virou-se para Penelope eacrescentou:–Nossa,vocêémesmomuitoesperta,sabia?Peneloperuborizou,modesta,emseguidavirou-separaairmãedisse:–Émelhorirmosandando,Felicity.–Tãocedo?–retrucouagarota.Colin, consternado, se deu conta de que articulara, silenciosamente, as

mesmaspalavras.–Mamãequeriaquechegássemoscedoemcasa–explicouPenelope.Felicityassumiuumardeperplexidade.–Émesmo?– É, sim – disse Penelope, com irmeza. – Além domais, não estoume

sentindomuitobem.Felicityassentiu,acontragosto.–Voupediraumcriadoquetraganossacarruagematéafrentedacasa.–Não, não– falouPenelope, colocandoamão sobreobraçoda irmã. –

Podedeixarqueeuprovidencioisso.–Euofarei–anunciouColin.Ora, de que servia ser um cavalheiro quando as damas insistiam em

fazertudosozinhas?E então, antes mesmo de se dar conta do que estava fazendo, ele

facilitara a partida de Penelope e ela acabou indo embora sem que eletivesselhepedidoperdão.Talvez devesse considerar a noite um fracasso por esse único motivo,

mas,naverdade,nãoconseguiapensardessaforma.Afinal,passaraquasecincominutossegurandoasuamão.

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CAPÍTULO12

Na manhã seguinte, assim que acordou, Colin lembrou que não sedesculpara com Penelope. Estritamente falando, era provável que já nãofossenecessário:emboramaltivessemsefaladonobailedosMacclesfields,na noite anterior, pareciam ter chegado a uma trégua implícita. Aindaassim, Colin achava que não se sentiria confortável consigo mesmo atépronunciaraspalavras“Medesculpe”.Eraocorretoafazer.Eleeraumcavalheiro,afinal.Alémdomais,estavacomvontadedevê-lanaquelamanhã.FoiaoNúmeroCinco tomarcafédamanhãcoma família,masqueria ir

diretoparacasaapósverPenelope,entãosubiunacarruagemparafazeraviagematéacasadosFeatheringtons,naRuaMount,apesardeadistânciasercurtaobastanteparaqueelesentissepreguiçadepercorrê-la.Sorriu,satisfeito,eserecostounoassentoparaobservaraencantadora

paisagemprimaverilqueiaserevelandopelajanela.Eraumdaquelesdiasperfeitos nos quais tudo parecia correr bem.O sol brilhava, ele se sentiabem-disposto,tiveraumaexcelenterefeiçãomatinal...Eraquaseimpossívelqueavidaficassemelhordoqueaquilo.EestavaacaminhoparaverPenelope.Colinescolheunãoanalisaromotivopeloqualsesentiatãoansiosopara

encontrá-la:esseeraotipodecoisaemqueumhomemsolteirode33anosemgeralescolhianãopensar.Emvezdisso,apenasdeliciou-secomodia:osol, o ar, até mesmo as três elegantes casinhas por que passou na RuaMount antes de vislumbrar a porta de Penelope. Não havia nada dediferentenemdeoriginalemqualquerumadelas,maseraumamanhãtãoperfeita que lhe pareceram encantadoras, encostadas umas nas outras,altas, estreitas e imponentes, com sua fachada de pedras Portlandcinzentas.Eraumdiamaravilhoso,cálidoesereno,ensolaradoetranquilo...Anãoserpelofatodeque,quandocomeçouaselevantardoassento,um

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pequenomovimentodooutroladodaruachamouasuaatenção.Penelope.Ela estava na esquina das RuasMount e Penter, onde não poderia ser

vista por ninguém que estivesse olhando de dentro da residência dosFeatheringtons.Eestavasubindonumacarruagemdealuguel.Interessante.Colin franziu a testa. Aquilonão era interessante. Que diabo ele estava

pensando? Não eranada interessante. Talvez pudesse ser se ela fosse,digamos, umhomem. Ou se a carruagem em que acabara de entrarpertencesseaosFeatheringtons,emvezdeserummaltrapilhotransportedealuguel.Mas não, aquela era Penelope, que não era umhomem, em absoluto, e

queentravanumacarruagemsozinha, talvezemdireçãoa algumdestinocompletamente inadequado, porque, se estivesse prestes a fazer algoapropriado e normal, estaria a bordo de um transporte da famíliaFeatherington. Ou,melhor, na companhia de uma de suas irmãs, de umadama de companhia ou de qualquer outra pessoa, e não, maldita fosse,sozinha.Aquilonãoerainteressante,eraumaidiotice.–Masquemulhertola–murmurouColin,saltandodacarruagemcoma

intenção de correr em direção ao carro de aluguel, escancarar a porta earrastá-laparafora.Porém,noinstanteemquecolocouopédireitoparafora,foitomadopela

mesmaloucuraqueolevavaaperambularpelomundo.Acuriosidade.Elemurmurou vários impropérios, todos direcionados a simesmo.Não

pôdesecontrolar.EratãoatípicodePenelopedesaparecerdaquelaforma,numcarrodealuguel,queColinprecisavasaberaondeelaestavaindo.Assim,emvezdetentarcolocaralgumjuízonacabeçadela,mandouque

o chofer seguisse a carruagem, que foi para o norte, em direção àmovimentada Rua Oxford, onde, re letiu Colin, provavelmente Penelopepretendiafazercompras.PodiahaverinúmerasrazõespelasquaiselanãoestavausandoacarruagemdosFeatheringtons.Talvezestivessequebradaou, quem sabe, um dos cavalos tivesse adoecido, ou talvez ela fossecomprarumpresenteparaalguémequisessefazersegredo.

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Não, aquilo não fazia muito sentido. Penelope jamais sairia para fazercompras por conta própria. Levaria uma dama de companhia, uma dasirmãs, ou até uma das irmãsdele. CaminharpelaRuaOxford sozinha erapedir para ser alvo de fofocas. Umamulher naquela posição certamenteseriaoassuntodapróximacolunadeLadyWhistledown.Se Lady Whistledown ainda existisse, ele lembrou. Era di ícil se

acostumaràvidasemela.Aindanãosederacontadequantosehabituaraaverseujornalsobreamesadocafédamanhãquandoestavanacidade.E, por falar em LadyWhistledown, estavamais certo do que nunca de

queelasópodiaserEloise.Naquelamanhã, foraaoNúmeroCincoparaodesjejumcomoúnicointuitodequestioná-la,masforainformadodequeairmãcontinuavaindispostaequenãosejuntariaàfamília.Colin não deixara de notar, no entanto, que uma bandeja repleta de

comidaforalevadaaoquartodela.Oquequerqueestivessefazendomalàirmã,nãohaviaafetadooseuapetite.Ele não mencionara as suas suspeitas à mesa do café: não via motivo

paraperturbaramãe,quesemdúvida icariahorrorizadadiantedaideia.Eradi ícilacreditar,porém,queEloise, cujadisposiçãopara fofocarsobreum escândalo só era menor que sua empolgação em descobrir um,perderia a oportunidadede comentar a revelaçãodeCressidaTwombleynanoiteanterior.AnãoserqueEloisefosseLadyWhistledown,motivopeloqualestariano

quarto,bolandoopróximopasso.Aspeçastodasseencaixavam.TeriasidodeprimenteseColinnãofosse

tomadoporumestranhoentusiasmoemdescobri-la.Após algunsminutos, en iou a cabeça para fora da carruagem para se

certi icardequeochofernãotinhaperdidooveículodePenelopedevista.Lá estava ela, bemà sua frente.Ou, pelomenos, ele acreditava ser ela.Amaioriadosautomóveisdealugueleraparecida,entãoteriadecon iarqueestava atrás do correto. No entanto, ao olhar para fora, constatou quehaviam seguido bem mais para o leste do que havia se dado conta. Naverdade, acabavam de passar pela Rua Soho, o que signi icava queestavamquaseemTottenhamCourtRoad,oquequeriadizerque...Por Deus, será que Penelope estava indo até a casa dele? A Praça

Bedfordficavapraticamentelogodepoisdaesquina.

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Foitomadoporumadeliciosasensação,porquenãoconseguiuimaginaroqueelaestariafazendonaquelapartedacidadesenãoindovê-lo.Quemmais umamulher como Penelope conheceria emBloomsbury?Não podiaimaginar que sua mãe lhe permitisse se relacionar com pessoas quetrabalhavam para viver, e os vizinhos de Colin, embora fossem bem-nascidos,nãofaziampartedaaristocraciaeemraroscasospertenciamatémesmoàpequenanobreza.Erammédicos,advogadosou...Colin fez uma careta de desaprovação. Acabavam de passar por

TottenhamCourtRoad.Masquediaboelaestariafazendotãoparaoleste?Talvez o condutor não conhecesse a cidade muito bem e tivesse achadomelhorpegaraRuaBloomsburyatéaPraçaBedford,apesarde icarumpoucoforadocaminho,mas...Eleouviuumbarulhomuitoestranhoe sedeu contadequeerao som

dosprópriosdentesrangendo.AcabavamdepassarpelaRuaBloomsburyeagoradobravamàdireitaemHighHolborn.Masquediabo!EstavampraticamentenaregiãodeCity.PorDeus,oque

Penelope planejava fazer ali? Aquilo não era lugar para umamulher. Elemesmo jamais ia até lá.Omundoda alta sociedade icavabemmaisparaoeste,nossagradosprédiosdeSt. JameseMayfair.NãoemCity,comsuasruasestreitas,serpenteantesemedievais,esuaperigosaproximidadecomascasasdecômodosdoEastEnd.Colin icavacadavezmaisperplexoàmedidaemque iamemfrente...e

emfrente...eemfrente...atéquepercebeuqueestavamdobrandonaShoeLane.Esticou a cabeçapara forada janela. Só estivera ali umavez, aos9anos,quandoseututoroarrastara,juntocomBenedict,paralhesmostrarondeoGrandeIncêndiodeLondrestiverainício,em1666.Colinlembrava-se de ter icado um pouco desapontado ao saber que o culpado fora umsimplespadeiroquenãomolharaascinzasdofornodaformacorreta.Umincêndiocomoaquelesópodiatersidocriminoso.Noentanto, aquela tragédianãoeranada comparadaaoqueele sentia

agora. Era bomque Penelope tivesse uma excelente razão para ir até alisozinha.Elanãodeviairalugarnenhumdesacompanhada,muitomenosaCity.Então, justo quando Colin estava convencido de que ela iria prosseguir

até a costa deDover, a carruagem atravessou a Rua Fleet e parou. Colin

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icouimóvel,esperandoparaveroquePenelopeiaaprontar,emboracadaibra do seu ser gritasse para ele saltar da carruagem e abordá-la alimesmonacalçada.Por intuição ou por loucura, de alguma forma ele sabia que, se falasse

comelanaquelemomento, jamaisdescobriria o verdadeiromotivode elaestarali.Quandoelajátinhaseafastadoosu icienteparaqueelepudessesaltar

semsernotado,desceudacarruagemeaseguiurumoaosul,emdireçãoaumaigrejaquemaispareciaumbolodenoiva.–PeloamordeDeus–murmurouColin,semsedarcontadaquantidade

deblasfêmiasqueproferia–,issonãoéhoradeserreligiosa,Penelope.Ela desapareceu igreja adentro e ele foi atrás, diminuindo o ritmo

apenas ao chegar à porta da frente. Não queria surpreendê-la cedodemais.Nãosemantesdescobriroqueelapretendia.Nãoacreditavanempor um instante que Penelope tivesse sentido um súbito desejo deaumentarafrequênciaàigrejacomvisitasnomeiodasemana.Entrou na igreja, andando o mais silenciosamente possível. Penelope

seguiapelocorredorcentral,encostandoamãoesquerdadeleveemcadaumdosbancos,comoseestivesse...Contando?Colinfranziuassobrancelhasquandoelaescolheuobancoquequeriae

andou até omeio dele. Sentou-se imóvel por um instante, então en iou amão dentro da bolsa e sacou um envelope. Fez um movimento quaseimperceptívelcomacabeçaparaaesquerda,depoisparaadireita,eColinimaginou sua expressão ao fazer isso, os olhos escuros dardejando nasduas direções enquanto procurava saber se havia outras pessoas ali. Eleestavaasalvonofundodaigreja,ocultonassombras,quaseencostadonaparede.Alémdomais,elaestavamuitoconcentradaemserdiscretaenãovirouacabeçaosuficienteparavê-loàssuascostas.Haviabíblias e livrosdeoraçãoen iados empequenosbolsos às costas

dosbancos,eColinobservouenquantoPenelopeenfiavasorrateiramenteoenvelopeatrásdeumdeles.Entãoelase levantouesedirigiudenovoaocorredorcentral.Nessemomento,eledeuobote.Saiu das sombras e caminhou direto até ela, sentindo uma cruel

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satisfaçãoaoverohorrorestampadoemseurostoaodepararcomele.–Col...Col...–gaguejouPenelope.– Acho que está querendo dizer Colin – retrucou ele, estendendo cada

sílabaenquantoapegavapelocotovelo.O toqueera suave,mas irme, enãohavia amenor formadeela achar

quepoderiaescapar.Inteligentecomoera,elanemmesmotentou.Mas,inteligentecomoera,tentousefazerdeinocente.–Colin!–conseguiufinalmentedizer.–Masque...masque...–Surpresa?Elaengoliuemseco.–Isso.–Tenhocertezaquesim.Penelopelançouumolharrápidoemdireçãoàporta,depoisànave,em

seguidaatodososlugaresexcetoobancoemqueesconderaoenvelope.–Eu...Eununcaoviporaquiantes.–Eununcavimaqui.Penelopeabriuefechouabocaváriasvezesantesdeconseguirdizer:–Naverdade,éótimoqueestejaaqui,porquenaverdade...naverdade...

err...vocêconheceahistóriadeSt.Bride?Eleergueuumadassobrancelhas.–Éondeestamos?Penelopeclaramente tentavasorrir,maso resultado foiumaexpressão

mais embasbacada e boquiaberta. Em geral isso o teria divertido, masainda estava zangado com ela por ter saído sozinha, sem considerar aprópriasegurançaoubem-estar.Mas,acimadetudo,estavafuriosoporelaterumsegredo.Pormais irracional que fosse, ele simplesmente não tolerava esse fato.

AquelaeraPenelope.Eladeviaserumlivroaberto.Eleaconhecia.Sempreaconhecera.E,agora,pareciaqueseenganaraaesserespeito.– Sim – respondeu ela, en im, nervosa. – É uma das igrejas de

Christopher Wren, as que ele construiu após o Grande Incêndio e queestãoespalhadasportodaparteaquiemCity.Estaéaminhapreferida.Eurealmenteadoroocampanário.Nãoachaquepareceumbolodenoiva?

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Elatagarelava,oquenuncaeraumbomsinal.Emgeralsigni icavaqueapessoatinhaalgoaesconder. Já tinha icadobastanteóbvioquePenelopeestavasendodissimulada,masarapidezatípicadesuafaladiziaaelequeosegredoeramuito,muitoimportante.Fitou-aporumbomtempo,apenasparatorturá-la,atéenfimperguntar:–Éporissoqueachaótimoqueeuestejaaqui?Elasemostrouconfusa.–Obolodecasamento...–instigouele.–Ah!–guinchouela, comovermelhoprofundodaculpase insinuando

emsuapele. –Não!Demodoalgum!É sóque...Oquequerodizer équeesta é a igreja para os escritores. E editores. Acho. Com relação aoseditores,digo.Ela tentava de tudo, em vão. E sabia disso. Colin o percebia em seus

olhos, em seu rosto, namaneira como ela retorcia asmãos ao falar.MasPenelopecontinuavatentandomanterafarsa,eeleselimitoualhelançarumolharsarcásticoenquantoelaprosseguia:–Mas tenho certezaemrelaçãoaos escritores. –Então, comum loreio

que talvez tivesse sido triunfante se ela não tivesse estragado tudoengolindoemsecosemparar,acrescentou:–Evocêéescritor!–Entãoestáquerendodizerqueestaéaigrejaparamim?–É...–Elalançouumolharrápidoparaaesquerda.–Estou.–Ótimo.Penelopeengoliuemseco.–Émesmo?–É,sim–a irmouele,imprimindoumtomserenoeinformalàspalavras

comaintençãodeapavorá-la.Ela relanceoumais umavez à esquerda... emdireção ao banconoqual

esconderaoenvelope.Atéali,conseguiramanteraatençãolongedaprovaincriminadora.Elequasesentiuorgulhodelaporisso.–Umaigrejaparamim–repetiuele.–Queideiaencantadora.Penelopecomeçouaarregalarosolhos,assustada.–Achoquenãoentendioquequerdizer.Ele tamborilou um dos dedos no queixo, então estendeu a mão num

gestopensativo.–Achoquevenhodesenvolvendoumgostoespecialpelaprece.

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–Prece?–ecoouela,comavozfraca.–Você?–Sim,eu.–Eu...Bem...eu...eu...– Sim? – disse ele, começando a gostar daquilo de forma um tanto

doentia.Jamais izeraogêneroirritadiçoerancoroso.Claramentenuncasoubera

o que estava perdendo. Havia algo de muito satisfatório em fazê-la secontorcer.–Penelope?Queriadizeralgumacoisa?Elavoltouaengoliremseco.–Não.–Quebom.–Eledeuumsorrisoafável.–Sendoassim,achoquepreciso

dealgunsmomentosasós.–Como?Eledeuumpassoparaolado,nadireçãodobanco.–Estounumaigreja.Logo,gostariaderezar.Elatambémdeuumpassoparaolado.–Comodisse?ColinolhouparaPenelopecomumardeindagação.–Faleiquegostariaderezar.Nãoéalgotãodifícildeentender.Percebeu que ela lutava de todas as formas para não morder a isca.

Tentava sorrir, mas o maxilar estava tenso, e ele podia apostar que osdentesiriamsetransformarempóaqualquerinstantedetantoranger.– Não achei que você fosse uma pessoa especialmente religiosa –

comentouela.–Enãosou.–Ficouemsilêncioporuminstanteeacrescentou:–Minha

intençãoérezarporvocê.Agoraelaengoliaemsecodescontroladamente.–Pormim?–guinchou.–Porque–começouele,depoisaumentouo tomdevozacadapalavra,

semconseguirseconter–apreceéaúnicacoisacapazdesalvá-la!Em seguida, empurrou-a para o lado e se dirigiu ao local onde ela

esconderaoenvelope.–Colin!–gritouPenelope,correndo,desesperada,atrásdele.–Não!Elearrancouoenvelopedetrásdolivrodeoraçõescomumpuxão,sem

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oolharporora.–Quermecontaroqueéisto?Antesqueeumesmoveja?–Não–respondeuela,avozsumindonomeiodapalavra.Ocoraçãodelesepartiuàvisãodopavornosolhosdela.–Porfavor–implorouPenelope.–Porfavor,medêisso.Então,quandoelenadafezalémdeencará-lamuitosério,elasussurrou:–Émeu.Éumsegredo.–Umsegredoquevaleoseubem-estar?–retrucouele,quaserugindo.–

Asuavida?–Doquevocêestáfalando?–Temalguma ideiadecomoéperigosoumamulherandarsozinhapor

aqui?Ouporqualquerlugar?Aúnicarespostadelafoi:–Colin,porfavor.Estendeuamãopedindooenvelope,aindalongedoseualcance.E,derepente,elejánãosabiamaisoqueestavafazendo.Aquelenãoera

ele.Aquelafúriainsana,aquelairanãopodiamserdele.E,noentanto,eram.Masapartemais inquietanteera... erao fatodePenelope tê-lodeixado

assim.Eoqueela izera?AtravessaraLondressozinha?Eleestavairritadocomela por sua falta depreocupação coma própria segurança,mas issonão era nada comparado à raiva que sentia por ela estar escondendosegredos.Suaraivaeracompletamenteinjusti icada.Nãotinhaomenordireitode

esperarquePenelopecompartilhasse seus segredos comele.Não tinhamcompromissoalgumumcomooutro,nadaalémdaamizadeeumúnico–ainda que comovente, de uma forma bastante inquietante – beijo. Semdúvida ele não teria lhe mostrado seu diário se Penelope não o tivesseencontradoporacaso.–Colin–sussurrouela.–Porfavor...nãofaçaisso.Penelopeviraseusescritossecretos.Porqueelenãohaveriadeveros

dela?Seráqueelatinhaumamante?Todaaquelahistóriasobrejamaistersidobeijadaseriamentira?Por Deus, o que era aquele fogo que queimava em seu estômago?

Ciúme?

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–Colin–repetiuela,agoraengasgando.Pousouamãosobreadele, tentandoimpedi-lodeabriroenvelope.Fez

issocomdelicadeza,poisjamaisseriacapazdevencê-lopelaforça.Só que não havia a menor forma de ele conseguir se conter naquele

momento.Prefeririamorreralhedevolveraqueleenvelopesemveroquecontinha.Abriu-ocomumrasgão.Penelope deixou escapar um grito estrangulado e saiu correndo da

igreja.Colinleuoqueestavaescrito.Entãodesabounobancodaigreja,ficandosemar.–Ah,meuDeus–sussurrou.–Ah,meuDeus.

Ao chegar aos degraus externos da igreja de St. Bride, Penelope estavahistérica.Ou, aomenos, omais histérica que já icara. Tinha a respiraçãoentrecortada,aslágrimaspinicavam-lheosolhos,eseucoração...Bem, seu coração lhe dava a sensação de querer vomitar, se tal coisa

fossepossível.Comoelepodiater feitoumacoisadaquelas?Eleaseguira.Seguira.Por

quê?Oquetinhaaganharcomisso?Porqueele...Derepente,elaolhouemvolta.–Ah,droga!–gemeu,semseimportarsealguémaouviria.Acarruagempartira.Eladerainstruçõesespecí icasparaqueochofera

aguardasse,masnãooviaemlugarnenhum.Maisumpercalçopeloqual podia culparColin. Ele a izera sedemorar

na igreja e agora a carruagempartira, deixando-apresa ali, na escadariadaSt.Bride,amuitosquilômetrosdecasa.Agoraaspessoasaencaravameela tinha certezadeque a qualquer instante alguéma abordaria, porqueprovavelmente ninguém ali nunca vira uma mulher de tão ina estirpesozinha nas redondezas, muito menos uma que se encontrava tãoclaramenteàbeiradeumataquedenervos.Porque,porque,porqueforatãotolaemacreditarqueeleeraohomem

perfeito?Passara ametadeda vida venerando alguémquenemera real.

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PorqueeramuitoclaroqueoColinqueelaconhecia–não,oColinqueelapensaraconhecer–nãoexistia.E,quemquerquefosseaquelehomem,elanem sabia ao certo se gostava dele. O rapaz que ela amara com tantalealdadeaolongodosanos jamaisteriasecomportadodaquelaforma.Elenunca a teria seguido. Bem, teria, sim, mas apenas para garantir suasegurança.Noentanto,elenãoteriasidotãocruelesemdúvidanãoteriaabertoasuacorrespondênciaparticular.Elahavia lidoduaspáginasdodiáriodele, era verdade,maso caderno

nãoestavadentrodeumenvelopelacrado!Penelope desabou sobre as escadas e sentiu a pedra fria através do

tecidodovestido.Nãohaviamuitooquepudessefazeragoraalémde icarali,sentada,àesperadeColin.Sómesmoumatolasairiaapé,sozinha,porumlugar tão longedesuacasa.Pensouquepoderia fazersinalparaumacarruagem na Rua Fleet, mas e se estivessem todas ocupadas? Além domais,qualeraa inalidadedefugirdeColin?Elesabiaondeelamoravae,anãoserquePenelopedecidissesemudarparaasÓrcades,nãoeramuitoprovávelquefosseconseguirescapardeumconfrontocomele.Deu um suspiro. Colin provavelmente a encontraria nas Órcades,

viajanteexperientequeera.Eelanemaomenosqueriairparaasilhas.Conteveumsoluço.Agoraelanãoestavanempensandodireito.Porque

aideiafixanasÓrcades?Nessemomento,ouviuavozdeColinatrásdesi.–Levante-se–foisóoqueeledisse,rápidoecomfrieza.Entãoelaselevantou,nãoporqueeletivessemandado(pelomenosfoio

quedisse a simesma), e nãoporque tivessemedodele,mas porquenãopodiapermanecersentadanasescadasdaSt.Brideparasempre,emesmoque fosse adorar passar os próximos seis meses escondida de Colin,naqueleinstanteeleerasuaúnicaformaseguradechegaremcasa.Eleindicouaruacomumgestorudedacabeça.–Entrenacarruagem.Elaobedeceue,enquantosubia,ouviuColindaroendereçodesuacasa

aochofer,instruindo-lheair“pelocaminhomaislongo”.Ah,Deus.Depois de quase um minuto, ele lhe entregou a folha de papel que

estiveradobradadentrodoenvelopequeeladeixaranaigreja.

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–Acreditoqueistolhepertença–falou.Ela engoliu em seco e olhou para o papel. Não que precisasse fazê-lo:

sabia as palavras de cor. Escrevera e reescrevera aquelas frases tantasvezes na noite anterior que achava que elas jamais lhe sairiam damemória.

Não há nada que eu deteste mais do que um cavalheiro que achadivertido dar um tapinha condescendente na mão de uma senhoraenquantomurmura“Umamulhertemodireitodemudardeideia”.E,de fato, como acredito que devemos respaldar nossas palavras comações,meempenhoparamanterminhasopiniões edecisões irmeseverdadeiras.É por isso, caro leitor, que quando escreviminha coluna de 19 de

abril, realmente tinhaa intençãodeque fosseaúltima.No entanto,acontecimentos fora de meu controle (ou, na verdade, que nãocontam com aminha aprovação)me forçaram a levar a caneta aopapelumaúltimavez.Senhorasesenhores,estaautora NÃOÉLadyCressidaTwombley.Ela

nadamaisédoqueumaimpostoraintrigueira,emeucoração icariapartido ao ver anos do trabalho árduo serem atribuídos a alguémcomoela.

C

Penelopedobrouopapeloutravezcomtodaaconcentração,aproveitandoo instante para tentar se recompor e descobrir o que devia dizer nummomentocomoaquele.Porfim,tentousorrir,semencararColin,ebrincou:–Vocêimaginava?Ele icouemsilêncio,entãoelafoiforçadaaergueravistae,assimqueo

fez, se arrependeu. Colin lhe pareceu completamente diferente. O sorrisofácilquesemprebrincavaemseuslábios,obomhumorquepermeavaseuolhar – tudo isso havia sumido, sendo substituído por rugas profundas eumafriezaabsoluta.Ohomemqueelaumdiaconhecera,ohomemqueelaamarapor tanto

tempo...Penelopejánãosabiaquemera.

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–Vouinterpretarissocomoumnão–falou,vacilante.–Sabeoqueestoutentandofazernesteinstante?–perguntouele,avoz

atemorizanteealtaemmeioaobarulhoritmadodoscascosdoscavalos.Ela abriu a boca para dizer que não,mas um único olhar para o rosto

deledeixouclaroqueColinnãodesejavaumaresposta,entãoelaseguroualíngua.– Estou tentando decidir o que exatamenteme deixa commais raiva –

prosseguiuele. –Porquehá tantas coisasquenão consigome concentraremapenasuma.Estavanapontada línguadePenelopesugeriralgo–amentiraqueela

criara, por exemplo –, mas, pensando bem, aquele parecia ser umexcelentemomentoparaficarcalada.– Em primeiro lugar – disse Colin, com o tom comedido demonstrando

que ele de fato tentava se controlar (e isso era, por si só, bastanteinquietante, pois ela jamais se dera conta de que ele pudesse perder ocontrole)–,nãopossoacreditarquevocêtenhasidoestúpidaapontodeseaventurarsozinhaatéaqui.Enumacarruagemalugada,aindaporcima!–Como se eupudesse vir emumadas nossas carruagens... – devolveu

Penelope,antesdeselembrarquedecidirapermaneceremsilêncio.Colinmoveuacabeçadoiscentímetrosparaaesquerda.Elanãosoubeo

que aquilo signi icava, mas não podia ser boa coisa, sobretudo porque opescoço dele parecia se enrijecer cada vez mais enquanto ele virava acabeça.–Oquedisse?–quissaberele,aindanaqueleterríveltomdevoz.Bem,agoraeladeviaresponder,certo?– Err... não foi nada – falou, esperando que ele não prestasse tanta

atençãoaorestodaresposta.–Ésóquenãomedeixamsairsozinha.–Eusei–ladrouele.–Eháumótimomotivoparaisso.–Então,seeuquisessesairsozinha–continuouela,escolhendoignorar

a segunda frase dele –, não poderia usar uma de nossas carruagens.Nenhumdenossoscondutoresconcordariaemmetrazeratéaqui.– Os seus condutores são, claramente, homens sábios e sensatos –

vociferouele.Penelopenãorespondeu.– Tem alguma ideia do que poderia ter acontecido com você? –

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prosseguiuColin,amáscaradeautocontrolecomeçandoasedesmanchar.–Err...nãoexatamente,naverdade–admitiuela,engolindoemseco.–Já

estiveaquiantese...–Oquê? –Ele fechouamãoaoredordobraçodelacomforça.–Oque

vocêfalou?Penelope não teve coragem de repetir, então se limitou a itá-lo na

esperança de que ele se acalmasse e voltasse a ser o homem que elaconheciaequetantoamava.– Sóquandoprecisodeixar umamensagemurgentepara o tipógrafo –

explicou. – Envio uma mensagem em código, então ele sabe que tem depegaromeubilheteaqui.–E,porfalarnisso–disseColin,rudemente,agarrandoafolhadepapel

dobradadesuasmãos–,quediaboéisto?Penelopeolhouparaele,confusa.–Imagineiqueestivesseóbvio.Eusou...–Sim,éclaroquevocêéamalditaLadyWhistledownedeveestarrindo

demimhásemanasenquantoeuinsistoqueéEloise.Colincontorciaorostoenquantofalava,quasepartindoocoraçãodela.–Não!–gritouPenelope.–Não,Colin,nunca.Eujamaisririadevocê!Mas o rosto dele deixou claro que ele não acreditava. Seus olhos

esmeralda transbordavamhumilhação, algo que ela jamais vira, algo quenunca esperara testemunhar. Ele era um Bridgerton. Popular,autocon iante, autossu iciente. Nada podia envergonhá-lo. Ninguém podiahumilhá-lo.Anãoser,aoqueparecia,ela.– Eu não podia lhe contar – sussurrou Penelope, tentando

desesperadamente fazer com que aquela expressão desaparecesse. – Éclaroquevocêentendequeeunãopodialhecontar.Colin icou em silêncio por um longo e agonizante momento. Depois,

como se ela não tivesse dito nada, como se não houvesse tentado seexplicar, ele ergueu a folha de papel incriminadora no ar e a balançou,ignorandoporcompletooclamordela.–Istoéestupidez–exclamou.–Vocêenlouqueceu?–Nãoentendi.–Você tevea fugaperfeitaaoalcancedasmãos.CressidaTwombleyse

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dispôsalevaraculpaporvocê.Eentão,derepente,asmãosdeleestavamsobreosombrosdelaeelea

seguravacomtantaforçaquePenelopemalconseguiarespirar.–Porquenãodeixouoassuntoporissomesmo,Penelope?A voz dele era urgente, os olhos ardiam. Era a expressão máxima de

sensibilidadequeelajáviraemColin,elhepartiuocoraçãoofatodeestarsendodirecionadaaelanummomentoderaiva.Edevergonha.– Não pude permitir que ela izesse isso – sussurrou ela. – Não pude

permitirqueelafosseeu.

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CAPÍTULO13

–Porquenão,droga?Penelope não conseguiu fazer nada além de itá-lo durante vários

segundos.– Porque... porque... – Ela se debatia por dentro, perguntando-se como

explicaraquilo.Seu coração estava sendo partido, seu segredo mais apavorante – e

emocionante – havia se estilhaçado e ele ainda achava que ela tinhapresençadeespíritoparaseexplicar?–Eutenhoconsciênciadequetalvezelasejaamaiorcadela...Penelopesufocouumgrito.–...queaInglaterrajáproduziu,aomenosnestageração,mas,peloamor

deDeus,Penelope–elepassouosdedospelos cabelos, entãoa itoucomseveridade–,elaialevaraculpa...–Ocrédito–interrompeuPenelope,irritada.– A culpa – insistiu ele. – Você tem alguma ideia do que vai acontecer

comvocêseaspessoasdescobriremquemé,defato?Ela contraiu os lábios com impaciência e irritação diante da

condescendênciacomqueestavasendotratada.–Játivemaisdeumadécadaparapensarsobreisso.Eleestreitouosolhos.–Estásendosarcástica?–Nemumpouco–devolveuela.–Vocêrealmenteachaquenãopassei

boa parte dos últimos dez anos contemplando o que aconteceria se eufossedescoberta?Euseriaumaidiotasenãootivessefeito.Ele a agarrou pelos ombros e segurou irme até mesmo enquanto a

carruagemsaltavaporcimadaspedrasirregulares.– Você icará arruinada, Penelope. Arruinada! Entende o que estou

dizendo?–Seeuaindanãotivesseentendido–retrucouela–,possolhegarantir

que você me teria feito compreender agora, após seus longos sermões

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sobreoassuntoenquantoacusavaEloisedeserLadyWhistledown.Ele a olhou, mal-humorado, obviamente aborrecido com o fato de ter

seuserrosevidenciadosdaquelaforma.–Aspessoasvãoparardefalarcomvocê–prosseguiu.–Vãoignorá-la...– As pessoas nunca falaram comigo – interrompeu ela, ríspida. – Na

metadedotempo,nemnotamminhapresença.Comoachaquefuicapazdemanter a farsapor tantos anos, para iníciode conversa?Eu era invisível,Colin.Ninguémmevia,ninguémfalavacomigo.Eusimplesmente icavaaliescutandoeninguémpercebia.–Issonãoéverdade.–Maseledesviouosolhosdosdelaaodizê-lo.– Ah, é verdade, sim, e você sabe disso. Apenas nega – disse ela,

cutucando-onobraço–,porquesesenteculpado.–Nãosinto,não!–Ora,porfavor–zombouela.–Tudooquevocêfazéporculpa.–Pene...–Tudooquediz respeito amim,pelomenos– corrigiu-se ela. Sentia a

respiraçãoseacelerar,osanguecorrermaisrápidoe,umaveznavida,aalmaseincendiar.–Vocêachaquenãoseiquantoasuafamíliasentepenademim?Achaquenãoperceboquenasfestasvocêeseusirmãossempremeconvidamparadançar?–Somoseducados–disseele,entreosdentes–egostamosdevocê.– E sentem pena de mim. Você gosta de Felicity, mas não o vejo

dançandocomelasemprequeseencontram.Eleasoltousubitamenteecruzouosbraços.–Bem,eunãogostodelatantoquantodevocê.Ela piscou, desconcertada com a eloquência dele. Sómesmo Colin para

elogiá-lanomeiodeumadiscussão.Nadapoderiatê-ladesarmadomaisdoqueaquilo.– Além disso – continuou ele, erguendo o queixo com ironia e ar de

superioridade–,vocêaindanãofalousobreaminhaquestãooriginal.–Queera?–QueLadyWhistledowniráarruinarvocê!–PeloamordeDeus–murmurouela–,vocêfalacomoseelafosseoutra

pessoa.– Ora, desculpe se tenho di iculdade em conciliar a mulher à minha

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frentecomamegeraqueescreveacoluna.–Colin!–Ofendida?–zombouele.–Sim!Eutrabalheimuitonaquelacoluna.Ela fechouasmãosemtornodotecido inodovestidoverde, ignorando

aspregasquecriava.Precisavafazeralgumacoisacomasmãosoupoderiaexplodir como nervosismo e a raiva que corriam em suas veias. A únicaopçãoque lhe ocorria era cruzar os braços, e ela se recusava a dar umademonstração tãoóbviadepetulância.Alémdomais,ele estavadebraçoscruzadoseumdosdoisprecisavaagircomosenãotivesseapenas6anos.– Eu nem sonharia em denegrir o que você realizou – disse ele,

condescendente.–Éclaroquesonharia–retrucouela.–Não,nãosonharia.–Entãooqueachaqueestáfazendo?–Sendoadulto!–respondeuele,avoz icandoaltaeimpaciente.–Umde

nóstemdeser.–Nãoouse falar comigo sobre comportamentoadulto! – explodiuela. –

Logovocê,quesaicorrendoàmenormençãoderesponsabilidade.–Quediabovocêquerdizercomisso?–vociferouele.–Achoquefuibastanteóbvia.Elerecuou.–Nãopossoacreditarqueestejafalandocomigodessamaneira.– Não pode acreditar que o esteja fazendo ou que tenha coragem

suficienteparaisso?–escarneceuela.Eleselimitouaencará-la,claramentesurpresocomapergunta.–Vocênãomeconhecetãobemquantoacha,Colin–concluiuela.Então,

num tommais baixo, acrescentou: –Eu nãome conheço tão bem quantoachava.Ele icouemsilêncioporum longomomentoeentão, incapazdemudar

deassunto,perguntouentreosdentes:–Oquequisdizerquandofalouqueeufujodasresponsabilidades?Ela contraiu os lábios, depois os relaxou enquanto expirava bem

devagar.–Porquevocêachaqueviajatanto?

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–Porquegosto–respondeuele,sucinto.–EporquemorredetédioaquinaInglaterra.–Eporqueissofazdemimumacriança?–Porquevocênãosedispõeacrescerefazeralgoqueomantenhanum

únicolugar.–Comooquê?Elaergueuasmãosnumgestodotipo“nãoéóbvio?”.–Comosecasar.– Está me pedindo em casamento? – zombou ele, abrindo um sorriso

bastanteinsolente.Elasentiuasfacesruborizarem,masseforçouaprosseguir:– Você sabe que não, e não tente mudar de assunto sendo cruel. –

Esperou que ele dissesse alguma coisa, talvez um pedido de desculpas.Tomou o silêncio que se seguiu como um insulto, então simplesmenteresfolegouefalou:–PeloamordeDeus,Colin,vocêtem33anos.–Evocêtem28–observouele,emumtomdevoznadagentil.Foicomolevarumsoconoestômago,maselaestavaexasperadademais

paraserecolheràconchacomodecostume.– Ao contrário de você – retrucou –, não tenho o privilégio de poder

propor casamento a alguém. E, ao contrário de você – acrescentou,querendo despertar a culpa da qual o acusara apenas alguns minutosantes –, não tenhoumaampla gamadepretendentes empotencial, entãonuncativeoprivilégiodepoderdizernão.Oslábiosdeleficaramrijos.–EvocêachaquecontaratodosqueéLadyWhistledownvaiaumentar

oseunúmerodepretendentes?– Você está sendo desagradável depropósito? – disse ela, com grande

esforço.–Estoutentandoserrealista!Algoquevocêparecenãoconseguir.– Eu nunca falei que pretendia contar a todos que sou Lady

Whistledown.Eleagarrouoenvelopequecontinhaaúltimacoluna.–Entãooqueéisto?Elapegouoenvelopedevoltaeretirouafolhadepapeldedentrodele.–Espereuminstante–falou,cadasílabacarregadadesarcasmo.–Devo

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terpuladoafrasequerevelavaaminhaidentidade.–Vocêachaqueesse seubelodiscursovai acalmaro frenesi em torno

da identidade de LadyWhistledown?Ah,me desculpe – ele colocou umamão sobre o coração, com insolência –, talvez eu devesse dizer a suaidentidade.Afinal,nãoqueroprivá-ladoseucrédito.– Agora você só está sendodesagradável – comentou ela, uma vozinha

no fundo de sua mente lhe perguntando por que não estava chorandoàquelaaltura.Ali estava Colin, a quem amaria para sempre, e ele agia como se a

odiasse. Será que havia qualquer outra coisa no mundo mais digna delágrimas?Ou talvez não fosse isso. Talvez toda aquela tristeza que se acumulava

emseu coração fossepelamortedeumsonho.Da imagemque criaradeColin.Construíraaimagemdequeeleeraperfeitoe,comcadapalavraqueele cuspia emseu rosto, tornava-se cadavezmaisóbvioqueo seu sonhoestavaerrado.– Estou demonstrando um argumento – insistiu ele, agarrando o papel

mais uma vez das mãos dela. – Olhe só para isto. É praticamente umconvite a maiores investigações. Você está zombando da sociedade,desafiando-aadesmascará-la.–Nãoénadadissoqueestoufazendo!– Pode não ser a sua intenção, mas com certeza a consequência será

essa.Pareciaumbomargumento,maselanãoiriaadmitirisso.–Éumriscoquetereidecorrer–falou,cruzandoosbraçosedesviando

oolhardodeledeformaacintosa.–Passeionzeanossemserdescoberta.Nãovejoporquemepreocuparagora.Elachegouaperderofôlegopelaexasperação.– Você conhece uma coisa chamada dinheiro? Tem alguma ideia de

quantas pessoas adorariam colocar as mãos nas mil libras de LadyDanbury?–Conheçomaisdoquevocê–respondeuela,irritada.–Alémdomais,o

prêmio de Lady Danbury não torna omeu segredo nem um poucomaisvulnerável.– Torna todomundomais determinado, e isso a deixamais vulnerável.

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Semmencionar–acrescentouele,retorcendooslábioscomironia–,comoobservouminhairmãmaisnova,queháaglória.–Hyacinth?–perguntouela.Elefezquesimsombriamente,colocandoopapelsobreoassentoaoseu

lado.–SeHyacinthacreditaqueaglóriadedescobrirasuaidentidadeéalgo

aserinvejado,entãopodetercertezadequeelanãoéaúnica.TalvezsejaesseomotivopeloqualCressidacriouesseestratagemaridículo.–Cressidaestáfazendoissopelodinheiro–resmungouPenelope.–Não

tenhodúvidas.– Que seja. Não importa o motivo. A única coisa que interessa é que,

assimquevocêadesmascararcomasuaidiotice–eledeuumtapasobreopapel, fazendo Penelope estremecer com o barulho –, outra pessoaocuparáolugardela.– Issonão énadaque eu jánão saiba – retrucou ela, emgrandeparte

pornãotolerarqueeletivesseaúltimapalavra.– Então, pelo amor de Deus, mulher – explodiu ele –, permita que

Cressida se safe com o esqueminha que criou. Ela é a resposta às suaspreces.Penelopeoencarou.–Vocênãoconheceasminhaspreces.Algo no tom de Penelope atingiu Colin bem no coração. Penelope não

mudara de ideia, não chegara nem perto disso, mas ele não conseguiuencontrar as palavras certas para preencher omomento.Olhoupara ela,então desviou o olhar para a janela e focou, mesmo que de maneiraausente,nacúpuladacatedraldeSãoPaulo.–Nós realmente estamos fazendo o caminhomais longo até em casa –

comentou.Ela não disse nada. Ele não a culpou. Fora um comentário idiota para

quebrarosilêncio,nadamais.–SevocêpermitirqueCressida...–começouele,denovo.– Pare – implorou ela. – Por favor, não diga mais nada. Não posso

permitirqueelacontinuecomafarsa.–Vocêjápensoudefatonoqueiriaganhar?Elaoencaroucomolhosseveros.

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–Achamesmoqueconseguipensaremoutracoisanosúltimosdias?Eletentououtratática:– Será que é tão importante que as pessoas saibam que você é Lady

Whistledown? Você sabe quanto foi esperta e que enganou a todos nós.Issonãobasta?–Vocênãoouviuoqueeufalei!–exclamouPenelope,incrédula,comose

não conseguisse aceitar a incompreensão dele. – Eu não preciso que aspessoassaibamqueeraeu.Sóprecisoquesaibamquenãoeraela.– Mas você claramente não se importa que todos pensem que Lady

Whistledown é outra pessoa – insistiu ele. – A inal, vem acusando LadyDanburyhásemanas.– Eu tinha de acusaralguém – explicou ela. – Lady Danbury me

perguntou,diretamente,quemeuachavaqueera, e eunãopodiadizer averdade.Alémdomais,não seria tão ruimassimseaspessoasachassemqueeraela.PelomenoseugostodeLadyDanbury.–Penelope...–EcomovocêsesentiriaseosseusdiáriosfossempublicadoscomNigel

Berbrookecomoautor?–argumentouela.–NigelBerbrookemalconsegue juntarduas frases–disseele,comum

resfolegodeescárnio.–Ninguémacreditariaqueelepudesseescreverosmeusdiários.Pensandomelhor, ele fez um pequeno aceno com a cabeça, à guisa de

desculpas,afinalBerbrookeeracasadocomairmãdela.– Tente imaginar – insistiu ela, entre os dentes. –Ou então o substitua

porqualquerpessoaqueacharparecidacomCressida.– Penelope – retrucou ele com um suspiro. – Eu não sou você. Não dá

paracompararosdois.Alémdomais,seeufossepublicarosmeusdiários,achoqueelesnãoiriammearruinaraosolhosdasociedade.Ela afundou no assento, calada, e ele soube que seu argumento havia

sidobemconstruído.–Muitobem,entãoestádecidido.Vamosrasgar istoaqui...– falouColin,

estendendoamãoemdireçãoàfolhadepapel.–Não!–gritouPenelope,quasesaltandodobanco.–Nãofaçaisso.–Masvocêacaboudedizer...–Eunãodissenada! – retrucouela, comavozestridente. –Euapenas

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suspirei.– Ora, pelo amor de Deus, Penelope – reclamou ele, irritado. – Você

claramenteconcordoucom...Elaficouperplexadiantedaaudáciadele.– Quando foi que eu lhe dei permissão para interpretar os meus

suspiros?Ele olhou para a folha incriminadora, manteve as mãos no lugar e se

perguntouquediabodeviafazercomelanaquelemomento.– E, de qualquer forma – continuou Penelope, os olhos brilhando com

uma raiva e um fogo que a deixavam quase deslumbrante –, até parecequeeunãoseidecorcadapalavra.Vocêpodedestruiressafolhadepapel,masnãopodemedestruir.–Eubemquegostaria–murmurouele.–Oquedisse?–Whistledown–retrucouele,entreosdentes.–Eugostariadedestruir

LadyWhistledown.Você,euficosatisfeitoemdeixardojeitoqueé.–MaseusouLadyWhistledown.–QueDeusnosajude.Nessemomento, algodentrodela simplesmente atingiuo limite. Toda a

fúria, todaafrustração,cadasentimentonegativoquemantiverapresoaolongodosanos, tudo isso transbordouemcimadeColin,que,de todososmembrosdaaltasociedade,talvezfosseoquemenosmerecia.–Porqueestácomtantaraivademim?!–gritouela.–Oque izdetão

grave? Fui mais inteligente que você? Guardei um segredo? Dei boasrisadasàcustadasociedade?–Penelope,você...–Não– interrompeuela,com irmeza.–Fiquequieto.Éaminhavezde

falar.Ele icou boquiaberto, como choque e a incredulidade perpassando os

seusolhos.–Eutenhoorgulhodoque iz–conseguiudizerPenelope,avoztrêmula

deemoção.–Não importaoquevocêdisser.Não importaoquequalquerumdisser.Ninguémpodetirarissodemim.–Eunãoestoutentando...– Eu não preciso que as pessoas saibam da verdade – continuou ela,

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ignorando o protesto inoportuno dele. – Mas pre iro ir direto para oinferno a permitir que Cressida Twombley, a mesmíssima pessoa que...que...A essa altura, seu corpo inteiro tremia, enquanto as péssimas

recordaçõessesucediamemsuamente.Cressida, famosa pela graça e elegância, tropeçando e derramando

ponchenovestidodePenelopenaqueleprimeiroano–oúnicoqueamãelhepermitiracomprarquenãoeranemamarelonemlaranja.Cressida, toda doce, implorando aos jovens solteiros que convidassem

Penelopeparadançar,pedindocomtantofervorquePenelopesópodiasesentirhumilhada.Cressida,anunciandoperanteumamultidãoquantosepreocupavacom

aaparênciadePenelope.“Simplesmentenãoésaudávelpesarmaisdoque60quilosnessaidade.”PenelopenuncasoubeseCressidaconseguiaesconderosorrisoafetado

que se seguia às al inetadas, porque sempre saía emdisparada do salão,cega pelas lágrimas, incapaz de ignorar o balanço dos próprios quadrisenquantocorria.Cressidasempresouberaexatamentecomoatingi-la.Nãoimportavaque

Eloise continuasse sendo sua protetora ou que Lady Bridgerton tentasseaumentarasuaautocon iança.Penelopechoraraatédormirmaisvezesdoque conseguia lembrar por causa das investidas maldosas de CressidaCowperTwombley.Haviadeixadoqueelasesafassedetantacoisanopassado,tudopornão

ter coragemde se defender.Mas não podia permitir que ela icasse comaquilo. Não a sua vida secreta, não aquele cantinho da sua alma que eraforte,orgulhosoedestemido.Talvez Penelope não soubesse se defender, mas, por Deus, Lady

Whistledownsabia.–Penelope?–chamouColin,cautelosamente.Elaolhoupara ele, confusa, e levoualguns segundospara lembrarque

estavam em 1824, não 1814, e que ela se encontrava numa carruagemcom Colin Bridgerton, não agachada no canto de algum salão de bailetentandofugirdeCressidaCowper.–Vocêestábem?–perguntouele.

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Elafezquesim.Ou,pelomenos,tentou.Ele abriu a boca para dizer alguma coisa, então se deteve, os lábios

permanecendo entreabertos por um longo momento. Por im, apenascolocouamãosobreadelaepediu:–Podemosfalarsobreissodepois?Dessavezelaconseguiufazerquesim,deleve.E,defato,sóqueriaque

aquela tarde horrível chegasse ao im, embora houvesse algo que aindanãopodiadeixarparatrás.–Cressidanãoficouarruinada–comentou,baixinho.Elesevirouparaela,confuso.–Oquedisse?Penelopefalouumpoucomaisalto:–CressidadissequeeraLadyWhistledownenãoficouarruinada.–Porqueninguémacreditounela–argumentouColin.–Alémdomais–

acrescentou,sempensar–,elaé...diferente.Penelopesevirouparaelebemdevagar,comoolharfirme.–Diferentecomo?Algomuitoparecido compânico começoua ribombarnopeitodeColin.

Ele soubera que não estava dizendo as palavras certas no momento emqueelassaíramdeseuslábios.Comopodiaumafrasetãopequenasertãoequivocada?Elaédiferente.Ambos sabiam a que ele se referia. Cressida era popular, Cressida era

linda,Cressidapodiasesafardaquilotudocomamaiorfacilidade.Penelope,poroutrolado...ElaeraPenelope.PenelopeFeatherington.Nãotinhaain luêncianemas

conexõesparasalvá-ladaruína.OsBridgertons icariamaoseuladoeiamlhe dar apoio, mas nem mesmo eles poderiam impedir sua queda.Qualquer outro escândalo poderia ser administrável, mas LadyWhistledown tinha, num momento ou em outro, insultado praticamentetodasaspessoasdasIlhasBritânicas.Assimqueaspessoassere izessemdasurpresa,viriamasobservaçõesindelicadas.Penelopenãoseriaelogiadaporsuainteligênciaouousadia.Seriachamadademá,mesquinhaeinvejosa.Colinconheciabemaaltasociedade.Sabiacomoagiamosseuspares.A

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aristocraciaeracapazdegestosgrandiososindividuais,mascoletivamentetinhaatendênciadeafundaratéomaisbaixodenominadorcomum.Oqueerarealmentemuitobaixo.–Entendi–dissePenelope.–Não–apressou-seeleasecorrigir–,nãoentendeu.Eu...–Não,Colin–retrucouela,comumdolorosotomdesabedorianavoz –,

euentendi,sim.Achoquesóesperavaquevocêfossediferente.Os olhos dele encontraram os de Penelope e, de alguma forma, suas

mãos foram parar nos ombros dela, segurando-os com tanta intensidadeque ela não poderia desviar o olhar nemmesmo se quisesse. Não dissenada,permitindoqueseusolhosperguntassemporele.– Pensei que acreditasse em mim – explicou ela –, que conseguisse

enxergaralémdopatinhofeio.Orostodelalheeratãofamiliar...Eleoviramilvezesantese,noentanto,

até asúltimas semanas,nãopodiadizerqueo conheciadeverdade. Seráque lembrava que ela tinha uma pequena marca de nascença perto dolóbulo esquerdo? Já havia notado o ardor de sua pele? Ou que os olhoscastanhoscontinhamsalpicosdouradosbempertodapupila?Comopodiaterdançadocomelatantasvezesenuncaternotadoqueos

lábioseramcheios,largosefeitosparabeijar?Penelopeumedeciaos lábioscoma línguaquandoestavanervosa.Colin

avira fazer issoumdia.Certamenteo izeraemalgummomentoao longode todos os anos emque se conheciam,mas só agora, à simples visãodesualíngua,ocorpodeleseenrijeceudedesejo.–Vocênãoéfeia–falouele,avozgraveeurgente.Elaarregalouosolhos.Então,elesussurrou:–Élinda.–Não–retrucouela,baixinho.–Nãodigacoisasquenãoquerdizer.Eleapertouosombrosdelaaindamais.–Vocêélinda–repetiu.–Eunãoseicomo...Nãoseiquando...–Tocouos

seus lábios, sentindo o hálito quente na ponta dos dedos. – Mas é... –sussurrou.Inclinouocorpoparaafrenteeabeijou,devagarecomreverência,não

mais tão surpreso que aquilo estivesse acontecendo, que a desejasse tão

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intensamente.Ochoquedesaparecera,substituídopelosimpleseprimitivodesejodereclamá-laparasi,demarcá-lacomferroembrasacomosua.Sua?Eleseafastoueolhouparaelaporuminstante.Porquenão?–Oquefoi?–sussurrouela.–Vocêélinda–disseele,balançandoacabeça,confuso.–Nãoseicomo

ninguémmaisenxergaisso.Algocálidoeencantadorcomeçoua tomaropeitodePenelope.Elanão

conseguia explicar: era quase como se alguém tivesse esquentado o seusangue.Começouemseucoraçãoeentão,lentamente,percorreuosbraços,oventre,edesceuatéaspontasdosdedosdospés.Deixou-atonta.Satisfeita.Eplena.Não era linda. Sabia disso. Tinha total consciência de que nunca seria

maisdoqueapenasaceitável,eissonosdiasbons.Maseleaachavalinda,equandoolhavaparaela...Penelopesesentialinda.Jamaisexperimentaraessasensação.Ele a beijou outra vez, os lábiosmais famintos dessa vez,mordiscando,

acariciando,despertandooseucorpo,acordandoasuaalma.Oventredelacomeçou a formigar e a pele emitia uma sensação de calor e denecessidadenoslocaisondeasmãosdeletocavamotecidoverdee inodovestido.Penelope não parou uma única vez para pensar Isto é errado . Aquele

beijo era tudo o que ela fora criada para temer e evitar,mas sabia – decorpo, mente e alma – que nada em sua vida jamais estivera tão certo.Havianascidoparaaquelehomem,epassaramuitoanostentandoaceitarofatodequeelehavianascidoparaoutrapessoa.Ter uma prova do contrário era o mais profundo prazer que poderia

imaginar.Elaoqueria,queriaaquilo,queriaaformacomoeleafaziasesentir.Desejavaserlinda,aindaqueapenasaosolhosdeumúnicohomem.Eram,pensavaela,sonhadora,enquantoColinadeitavasobreoassento

estofadodacarruagem,osúnicosolhosqueimportavam.Elaoamava.Sempreoamara.Atémesmoagora,quandoestavatãoirada

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comelequemaloreconhecia,quandoeleestavatãoiradocomelaqueelanemaomenossabiasegostavadele,oamava.Equeriasersua.Naprimeiravezemqueeleabeijara,Penelopeaceitaraosseusavanços

com deleite passivo, mas agora tinha decidido ser uma parceira ativa.Aindanãoconseguiaacreditarqueestivessealicomele,ecertamentenãosepermitiasonharquealgumdiaelepassasseabeijá-lacomregularidade.Aquilo podia nunca mais voltar a acontecer. Talvez ela nunca mais

sentisse o delicioso peso dele sobre ela, ou a escandalosa comichão dalínguadeledeencontroàdela.Tinhaumachance.Umaúnicaoportunidadedecriarumalembrançaque

durasseportodaavida.Umachancedeatingiroêxtase.Odiaseguinteseriahorrível,sabendoqueeleencontrariaoutramulher

comquemriria,fariapiadaseatémesmosecasaria,mashoje...Hojepertenciaaela.E,porDeus,iatornaraquelebeijoinesquecível.Ergueu a mão e alisou os cabelos dele. Começou hesitante – o fato de

estar decidida a ser ativa naquela situação não signi icava que tivesse amenor ideia do que estava fazendo. Os lábios de Colin, pouco a pouco,esvaziavamamentedelade todaarazãoe inteligência,mas,aindaassim,nãopôdedeixardenotarqueoscabelosdeletinhamamesmatexturadosde Eloise,que ela escovara inúmeras vezes durante os anos de amizadedasduas.E,queDeusaperdoasse...Elariu.Isso chamou a atenção dele, que ergueu a cabeça com um sorriso

divertido.–Oquedisse?–perguntou.Penelope balançou a cabeça, tentando lutar contra a risada, mas

conscientedequeestavaperdendoabatalha.– Ah, não, tem deme contar – insistiu ele. – Não posso continuar sem

saberomotivodarisadinha.Ela sentiu as faces esquentarem, o que lhe pareceu ridiculamente

inoportuno.Ali estava ela, fazendo algo bastante condenável no bancodetrásdeumacarruagem,esóagoratinhaadecênciaderuborizar?–Conte-me–murmurouele,mordiscandoasuaorelha.

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Elafezquenão.Os lábios dele encontraramopescoçodela bemnabase, onde sentiu a

pulsaçãodeseusangue.–Conte.Aúnicacoisaqueelaconseguiufazerfoigemer,arqueandoopescoçoe

oferecendo-oaele.O vestido, que ela nem percebera que estava com os primeiros botões

abertos, deslizou até a clavícula icar exposta, e ela observou comatordoadafascinaçãooslábiosdelepercorreremalinhadoossoatéorostoestaraninhadoperigosamentepróximoaosseusseios.–Vaimecontar?–sussurrouColin,passandoosdentesnapeledela.–Contaroquê?–arfouela.Elemoveuoslábiosmaisparabaixodeformaimplacável,edepoismais

ainda.–Porqueestavarindo?Duranteváriossegundos,Penelopenemmesmosoubedoqueelefalava.Colinpôsamãonoseiodelaporcimadovestido.–Nãovoudeixá-laempazatéquemeconte–ameaçou.A resposta de Penelope foi arquear as costas, colocando o seio ainda

maisfirmementenamãodele.Estavaadorandoqueelenãoadeixasseempaz.– Entendi – murmurou Colin, ao mesmo tempo em que empurrou o

corpetedelaparabaixoeroçouomamilocomapalmadamão.–Então,talvezeupare–falou,afastandoamãoedepoisaerguendo.–Não–gemeuela.–Entãomeconte.Ela olhou para o próprio seio, hipnotizada à visão dele nu e livre aos

olhosdeColin.– Conte-me – insistiu ele, soprando de leve, de forma que o hálito

chegasseatéela.Penelope sentiu algo repuxar profundamente dentro dela, em lugares

quejamaiserammencionados.–Colin,porfavor–implorou.Ele deu um sorriso lento e preguiçoso, satisfeito e, de alguma forma,

aindafaminto.

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–Porfavoroquê?–incitou.–Metoque–sussurrouela.Eledeslizouoindicadorpeloombrodela.–Aqui?Elabalançouacabeçafreneticamenteemumanegativa.Elefoidescendopelobraço.–Estouchegandomaisperto?Elafezquesim,semjamaisdesviarosolhosdoseio.Colin encontrou o mamilo outra vez e traçou com os dedos espirais

lentos e torturantes ao seu redor, em seguida sobre ele, enquanto ela oobservava,ocorpoficandomaisemaistenso.A única coisa que Penelope ouvia era a própria respiração escapar

quenteepesadadeseuslábios.–Então...–Colin!–exclamouelacomumgritosufocado.Elecertamentenãopoderia...Colin tomou os lábios dela nos seus e antes mesmo que Penelope

pudesse sentir algo mais que o calor que emanava deles, ela ergueu osquadris do assento, surpresa com o próprio comportamento, e ospressionou contra os dele sem nenhuma vergonha. Então, se acomodououtravezenquantoele sedeitava sobreela, imobilizando-ae enchendo-adeprazer.– Ah, Colin, Colin – arfou, agarrando as costas dele, apertando os

músculos com desespero, não querendo nada além de segurá-lo, deguardá-loparasienuncamaissoltá-lo.Elepuxouacamisa,soltando-adocósdacalça,eelaen iouasmãospor

debaixodotecido,correndo-aspelapelequente.Nuncatocaraumhomemdaquele jeito; nunca tocaraninguém daquele jeito, a não ser, talvez, a simesma,enãoeramuitofácilalcançarasprópriascostas.Colin gemeu quando ela o tocou, então enrijeceu o corpo quando os

dedosdelacomeçaramaroçarasuapele.Ocoraçãodeladeuumsalto.Elegostavadaquilo,damaneiracomoelaotocava.Penelopenãoeranemumpoucoexperiente,maseleestavagostando,aindaassim.–Vocêéperfeita–sussurroudeencontroàsuapele,oslábiosdeixando

umrastroquenteenquantovoltavamnadireçãodoqueixodela.

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Colin exigiu aquela boca para si, desta vez com fervor aindamaior, asmãos deslizando para segurar o traseiro dela, apalpando, esfregando eapertando-adeencontroaoseumembroereto.– Meu Deus, como eu a quero – arfou ele, pressionando os quadris

contra os dela. – Quero deixá-la nua,mergulhar dentro de você e nuncamaisdeixá-laescapar.Penelopegemeudedesejo, incapazdeacreditarnoprazerqueaquelas

simples palavras lhe causavam. Ele a fazia se sentir tão devassa, tãotravessa,etão,mastãodesejável!Nãoqueriaqueaquiloterminassenuncamais.–Ah,Penelope–gemeu,os lábioseasmãoscadavezmais frenéticos–

Ah,Penelope.Ah,Penelope,ah...Entãoeleergueuacabeça.Deformamuitoabrupta.–Ah,Deus.–Oquefoi?–perguntouela,tentandolevantaracabeçadoassento.–Nósparamos.Ela levou um certo tempo para reconhecer o signi icado daquilo. Se

haviam parado, queria dizer que provavelmente tinham chegado ao seudestino,queera...Acasadela.–Ah,Deus!–Elacomeçouapuxarocorpetedovestidoparacimacom

movimentosfrenéticos.–Nãopodemospediraochoferquecontinue?Elajáseprovaraumalibertinacompletamesmo.Parecianãohavernada

de mais, àquela altura, em acrescentar “sem vergonha” à sua lista decaracterísticas.Eleagarrouocorpeteporelaeocolocounolugar.– Qual é a possibilidade de sua mãe ainda não ter notado minha

carruagemnafrentedacasa?–Bemforte,naverdade–disseela–,masBriarlycomcertezajáviu.–Eseumordomoconseguiriareconheceraminhacarruagem?–indagou

ele,incrédulo.Elafezquesim.–Vocêveioaquioutrodia.Eleselembradecoisas.Colinretorceuoslábiosdemaneiradecidida.–Muitobem,então–falou.–Componha-se.

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–Possocorrerdiretoparaomeuquarto–dissePenelope.–Ninguémirámever.– Duvido muito – retrucou ele, desanimado, en iando a camisa para

dentrodacalçaeajeitandooscabelos.–Não,eulhegaranto...– Eeu lhe garanto – interrompeu ele – que você será vista, sim. – Ele

lambeuosdedoseentãoospassoupeloscabelos.–Estouapresentável?–Está–mentiuela.Na verdade, estava muito corado, com os lábios inchados e os cabelos

totalmentedesgrenhados.–Ótimo.Eledesceudacarruagemdeumsaltoeestendeuamãoparaela.–Vaientrar,também?–perguntouPenelope.Eleaolhoucomoseelativesseenlouquecidoderepente.–Éclaro.Ela não se mexeu, perplexa demais com as ações dele para dar às

pernas o comando necessário. Não havia nenhummotivo para que ele aacompanhasseatédentrodecasa.Asconvençõessociaisnãooexigiame...– Pelo amor de Deus, Penelope – disse ele, agarrando-lhe a mão e

puxando-aparaforadoveículo–,vocêvaiounãovaisecasarcomigo?

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CAPÍTULO14

Seuspéstocaramochão.Penelopeera– aomenosnaprópriaopinião–umpoucomais graciosa

do que as pessoas costumavam reconhecer. Sabia dançar, tocava pianobem e em geral conseguia atravessar um salão sem esbarrar em umnúmeromuitograndedepessoasoumóveis.Mas quando Colin fez a sua singela proposta, o pé dela – naquele

instante apenas na metade do caminho para fora da carruagem – sóencontrou o ar, o quadril esquerdo encontrou o meio- io e a cabeçaencontrouaspontasdospésdeColin.–MeuDeus,Penelope–exclamouele,seabaixando.–Vocêestábem?–Estouótima – conseguiudizer ela, procurandoumburaconoqual se

enfiaremorrer.–Temcerteza?– Não foi nada, verdade – insistiu ela, segurando o rosto certa de que

agoraexibiaamarcaperfeitadabotadeColin. –Estouapenasumpoucosurpresa,sóisso.–Porquê?–Porquê?–Sim,porquê?Elapiscou,aturdida.Uma,duas,trêsvezes.– Err... Bem, talvez tenha a ver com você ter mencionado algo sobre

casamento.Ele a puxou sem a menor cerimônia para colocá-la de pé, quase

deslocandooseuombroenquantoofazia.–Bem,oqueimaginouqueeudiria?Elaofitou,incrédula.Seráqueeletinhaficadolouco?–Nãoisso–respondeu,porfim.–Eunãosouumselvagemcompleto–murmurouele.Penelopelimpouapoeiraeaspedrinhasdasmangasdovestido.–Eununcafaleiqueera,só...

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– Posso lhe garantir – continuou ele, mostrando-se agoramortalmenteofendido – que jamais me comporto da forma como acabei de mecomportarcomumamulherdasuaestirpesemlhefazerumapropostadecasamento.IssodeixouPenelopeboquiaberta,comosolhosarregaladoscomoosde

umacoruja.–Nãotemumaresposta?–perguntouele.–Aindaestoutentandoentenderoquevocêdisse.Eleplantouasmãosnosquadriseolhouparaelacomclaraimpaciência.– Você tem de admitir – começou Penelope, dirigindo-lhe um olhar

incerto–quepareceu...comofoimesmoquedisse...quejáfezpropostasdecasamentoantes.Elelhelançouumolharbastanteirritado.–Éclaroquenãofiz.Agoramedêobraçoantesquecomeceachover.Elaergueuavistaparaocéuazulelímpido.–Nesseritmo,vamosficaraquipordias–explicouele,impaciente.–Eu... bem... –Elapigarreou. –Você certamentepodeperdoaraminha

confusãodiantedetalsurpresa.Colinsegurouobraçodelacommaisforça.–Vamoslogo.– Colin! – exclamou Penelope, tropeçando nos próprios pés enquanto

subiaaescada.–Temcerteza...–Nãohámomentomelhordoqueopresente–disseelealegremente.Pareciabastantesatisfeito,oqueadeixouaindamaisconfusa,poisteria

apostado a fortuna inteira – e como LadyWhistledown havia acumuladouma boa fortuna – que ele não pensara em pedi-la em casamento até omomentoemquesuacarruagempararadiantedacasa.Talvezatéoinstanteemquetinhapronunciadoaspalavras.Colinsevirouparaela.–Temosdebateràporta?–Não,eu...Elebateu,oumelhor,esmurrouaporta,mesmoassim.– Briarly – falou Penelope, tentando sorrir quando omordomo abriu a

portaparaeles.–Srta.Penelope–murmurouohomem,erguendoumadassobrancelhas

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emsinaldesurpresa.CumprimentouColincomacabeça.–Sr.Bridgerton.–ASra.Featheringtonestáemcasa?–perguntouColinbruscamente.–Está,mas...–Ótimo.–Colinfoiadentrandonacasa,puxandoPenelopeareboque.–

Ondeelaestá?–Nasaladeestar,masdevolheavisar...No entanto, Colin já estava na metade do corredor, com Penelope um

passo atrás de si. (Não que ela pudesse estar em qualquer outro lugar,vistoqueeleasegurava,combastanteforça,até,pelobraço.)–Sr.Bridgerton!–gritouomordomo,parecendoligeiramenteempânico.Penelopevirouacabeçapara trásenquantocontinuavaseguindoColin.

Briarlynuncaentravaempânico.Pornada.SeachavaqueelaeColinnãodeviamentrarnasaladeestar,deviaterumaboarazãoparaisso.Talvezatémesmo...Ah,não.Penelope tentou interromper o passo, enterrando os calcanhares no

chão e deslizando pelo assoalho de madeira enquanto Colin a arrastavapelobraço.–Colin–disse,engolindoemsecodepois.–Colin!–Oqueé?–perguntouele,semdiminuiroritmo.–Eurealmenteacho...Aaaaah!Enquanto ela deslizava, tropeçouna barra de um tapete e vooupara a

frente.Eleapegoueacolocououtravezdepé.–Oquê?Ela olhou, nervosa, para a porta da sala de visitas. Encontrava-se

entreaberta, mas talvez estivesse barulhento demais lá dentro e a mãeaindanãoostivesseouvidoseaproximar.–Penelope–exigiuColin,impaciente.–Err...Aindapodiamescapar,não?Elaolhou freneticamenteàsuavolta, como

se fosse possível encontrar a solução para os seus problemas em algumlugardocorredor.–Penelope–repetiuColin,jábatendocomopénochão–,quediaboestá

acontecendo?

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Ela olhou para trás de novo, para Briarly, que se limitou a dar deombros.–Talvezestenãosejaomelhormomentoparafalarcomaminhamãe.Ele ergueu uma das sobrancelhas em uma expressão bastante

semelhanteàqueomordomoesboçaraapenasalgunsmomentosantes.–Nãoestáplanejandorecusaromeupedido,está?–Não,éclaroquenão–disseela,apressada,emboraaindanemtivesse

aceitado realmente o fato de que ele tinha a intenção de pedi-la emcasamento.– Então este é um excelente momento – a irmou ele, o tom deixando

claroquenãodeveriahavermaisnenhumprotesto.–Maséque...–Oquê?Terça-feira, pensou ela, infeliz. E passava um pouco domeio-dia, o que

significava...–Vamos–disseColin,prosseguindocaminho.Eantesqueelapudessedetê-lo,eleempurrouaporta.

A primeira coisa que ocorreu a Colin ao entrar na sala de estar foi que,embora o dia não estivesse transcorrendo em absoluto como ele talveztivesse previsto ao se levantar da cama naquela manhã, estava sendobastante produtivo. Casar-se com Penelope era uma ideia bem sensata etambém muito atraente, se a recente interação dos dois na carruagemservissedeindicativo.Asegundacoisaque lheocorreu foiqueacabavadeentrarnoseupior

pesadelo.Porque amãe de Penelope não estava sozinha na sala. Absolutamente

todos os Featheringtons, jovens e velhos, encontravam-se ali,acompanhadosdoscônjuges,ehaviaatémesmoumgato.Era o grupodepessoasmais assustador queColin já vira. A família de

Penelope era... bem... com exceção de Felicity (por quem sempre nutriracerta descon iança, a inal, como con iar em alguém tão próximo deHyacinth?),afamíliadelaera...bem...

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Ele não conseguia encontrar a palavra certa para descrevê-la. Semdúvidanadadeelogioso (emboraquisesseacreditarquepodia evitaruminsulto direto), mas será que existia algum termo que combinasselevementecomobtusa,demasiadofalante,bastanteintrometida,maçantee– não se podia esquecer isto, não com o recente acréscimo de RobertHuxleyaoclã–excepcionalmenteruidosa?Então Colin apenas deu aquele seu sorriso lindo, amigável e um pouco

travesso. Quase sempre funcionava, e hoje não foi exceção. OsFeatheringtons todos sorriramde volta para ele e – graças aDeus – nãofizeramnenhumcomentário.Pelomenos,nãodeimediato.– Colin – disse a Sra. Featherington, com considerável surpresa. – Que

delicadeza a sua em trazer Penelope para casa para a nossa reunião defamília.–Reuniãodefamília?–ecoouele.OlhouparaPenelope,queestavaaoseuladoparecendopassarmal.–Todaterça-feira–falouela,comumsorrisofraco.–Eunãomencionei?– Não – respondeu ele, embora estivesse óbvio que a pergunta havia

sidofeitaemconsideraçãoàplateiaqueosobservava.–Nãomencionou.–Bridgerton!–berrouRobertHuxley,casadocomairmãmaisvelhade

Penelope,Prudence.–Huxley–retrucouColin,dandoumdiscretopassoparatrás.Era melhor proteger os tímpanos, caso o cunhado de Penelope

resolvessedeixarseulugarpertodajanelaeseaproximar.Por sorte, Huxley icou onde estava, mas outro cunhado, o bem-

intencionado porém aéreo Nigel Berbrooke, atravessou o aposento ecumprimentouColincomumbelotapanascostas.–Nãooestávamosesperando–comentouele,jovial.–Não–murmurouColin–,nãoimagineiqueestivessem.– A inal, é só a família – disse Berbrooke –, e você não faz parte da

família.Nãodaminha,pelomenos.– Ainda não – falou Colin baixinho, então olhou rapidamente para

Penelope,queruborizou.Em seguida, ele olhou outra vez para a Sra. Featherington, que lhe

pareceu prestes a desmaiar de emoção. Colin gemeu. Não tinha sido sua

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intenção que ela escutasse este último comentário. Por algum motivo,quiseramanteroelementosurpresaantesdepediramãodePenelope.SePortia soubesse de sua intenção antes da hora, era capaz de distorcer asituação (aomenos na própria cabeça) demodo a fazer parecer que elaprópriahouvesseorquestradotudo.E,semsaberexplicarporquê,Colinnãogostarianemumpoucodisso.– Espero não estar sendo inconveniente – disse, dirigindo-se à Sra.

Featherington.–Não,éclaroquenão–retrucouela,rápido.–Estamosencantadosem

tê-loaqui,numareuniãodefamília.Noentanto, suaexpressãoerabastanteestranha,nãoporqueestivesse

indecisaarespeitodapresençadeleali,masporqueclaramentenãosabiaque passo dar a seguir. Mordeu o lábio inferior, então lançou um olharfurtivoparaFelicity.ColinsevirouparaFelicity,que itavaPenelopecomumpequenosorriso

enigmático.JáPenelopefuzilavaamãecomosolhos,abocaretorcidanumacaretadeirritação.ElealternouavisãoentreastrêsFeatheringtons.Semdúvidahaviaalgo

acontecendo ali, e se Colin não estivesse tão ocupado tentando descobrircomo se livrar de uma conversa com os parentes de Penelope enquantotentava fazer uma proposta de casamento, icaria bastante curioso parasaberomotivodosolharesdiscretossendotrocadossempararentreelas.A Sra. Featherington lançou um último olhar para Felicity e fez um

pequeno gesto que Colin poderia jurar que queria dizerSente-se direito ,depoisvoltouafixaraatençãonele.– Não quer se sentar? – indagou com um sorriso amplo, dando um

tapinhanoassentoaoseuladonosofá.– É claro – murmurou ele, porque realmente já não havia como sair

daquelasituação.Ainda tinha de pedir amão de Penelope, e embora não quisesse fazer

issonafrentedetodasasirmãsdela(edosdoiscunhadosinúteis),estavapresoali,pelomenosatéquesurgisseumaoportunidadepolidadefugir.EleseviroueofereceuobraçoaPenelope:–Penelope?–Err...sim,claro–gaguejouela,colocandoamãonocotovelodele.

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–Ah!–exclamouaSra.Featherington,comose tivesseseesquecidodapresença da ilha. – Me desculpe, Penelope. Não a vi. Que tal ir pedir àcozinheira que faça mais comida? Sem dúvida precisaremos, com apresençadoSr.Bridgerton.–Éclaro–concordouPenelope,contraindooslábios.–Elanãopodetocaracampainhaepedir?–perguntouColin,bemalto.– Como? – indagou a Sra. Featherington, com o olhar distraído. – Bem,

achoquepoderia,maslevariamaistempoePenelopenãoseimporta,nãoé?Penelopebalançouacabeçabemdeleve.–Eumeimporto–declarouColin.A Sra. Featherington deixou escapar um pequeno “Ah” de surpresa,

entãodisse:–Muitobem.Penelope,hã...Porquenãosesentaali?Ela fez sinal para uma cadeira que icava meio à parte do círculo da

conversa.Felicity,queestavasentadanafrentedamãe,selevantouefalou:–Aqui,Penelope,fiquecomomeulugar,porfavor.–Não–exclamouaSra.Featherington,com irmeza.–Vocênão temse

sentidomuitobem,Felicity.Precisasesentar.Colin achou que Felicity era o retrato da saúde perfeita, mas ela

obedeceuàmãe.–Penelope– chamouPrudence, bemalto, depertoda janela. –Preciso

falarcomvocê.Penelopeolhou,impotente,deColinparaPrudence,depoisparaFelicity,

emseguidaparaamãe.Colinapuxouparamaispertoainda.–Eutambémprecisofalarcomela–disse,comdelicadeza.–Certo.Bem,suponhoquehajalugarparavocêsdoisaqui–concedeua

Sra.Featherington,chegandoparaolado,nosofá.Colin icou meio indeciso entre as boas maneiras que haviam sido

marteladas em sua cabeça desde o nascimento e o enorme desejo deestrangular a mulher que um dia seria a sua sogra. Não tinha a menorideia do motivo que a levava a tratar Penelope como uma enteadaindesejada,masaquiloprecisavaparar.

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–Oqueotrouxeatéaqui?–berrouRobertHuxley.Colinlevouamãoàorelha–nãoconseguiuevitar–,entãodisse:–Euia...– Minha nossa – interrompeu a Sra. Featherington, alvoroçada –, não

queremosinterrogarnossoconvidado,queremos?Colin não pensara que a pergunta de Huxley caracterizava um

interrogatório,masnãoqueriainsultaraSra.Featheringtonaodizê-lo,porissoselimitouaassentiredizeralgocompletamentesemsentido:–Sim,bem,éclaro.–Éclarooquê?–indagouPhilippa.Ela era casada com Nigel Berbrooke e Colin sempre acreditara que

formavamumótimocasal.–Como?–indagouele.–Vocêdisse“Éclaro”–retrucouPhilippa.–Oqueéclaro?–Nãosei.–Ué,entãoporquevocê...–Philippa–repreendeuaSra.Featherington,bemalto–, talvezdeva ir

buscaracomida, jáquePenelopeseesqueceudetocaracampainhaparapedi-la.– Ah, me desculpem – disse Penelope rapidamente, começando a se

levantar.–Nãosepreocupe–falouColincomumsorrisosereno,agarrandoamão

dela e a puxando outra vez para baixo. – Sua mãe disse que Prudencepodiair.–Philippa–corrigiuPenelope.–OquetemPhilippa?–EladissequePhilippapodiair,nãoPrudence.Eleseperguntouoqueteriaacontecidocomocérebrodela,porqueem

algum momento entre a carruagem e aquele sofá, ele havia claramentedesaparecido.–Issotemalgumaimportância?–perguntou.–Naverdade,não,mas...–Felicity–interrompeuaSra.Featherington–,porquenãocontaaoSr.

Bridgertonsobresuasaquarelas?Colin não conseguia imaginar um assunto menos interessante (exceto,

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talvez,pelasaquarelasdePhilippa),masaindaassimvirou-separaamaisnovadasFeatheringtonscomumsorrisosimpáticoeperguntou:–Comovãoassuasaquarelas?Mas graças a Deus a garota apenas sorriu para ele de maneira

igualmentesimpáticaelimitou-seadizer:–Achoquevãobem,obrigada.A Sra. Featherington fez uma expressão de quem acabara de engolir

umaenguiavivaeexclamou:–Felicity!–Sim?–respondeuFelicity,solícita.–Vocênãocontouaelequevenceuumprêmio.–ElasevirouparaColin.

– As aquarelas de Felicity são bastante exclusivas. – Voltou-se outra vezparaafilha.–ConteaoSr.Bridgertonsobreoprêmio.–Ah,euachoqueelenãoestáinteressado.–Éclaroqueestá–retrucouaSra.Featheringtoncomalgumesforço.Em uma situação normal, Colin teria ditoÉ claro que estou , já que era,

a inal de contas, um sujeito muito afável, mas fazer isso seria validar aa irmaçãodaSra.Featheringtone, talvezomaisgravedetudo,estragarodivertimentodeFelicity.Eagarotapareciaestarsedivertindoavaler.–Philippa–disseaSra.Featherington–,vocênãoiaatrásdacomida?–Ah,émesmo!Esquecicompletamente.Vamos,Nigel,assimvocêmefaz

companhia.–Éparajá!–exclamouohomem,exultante.Comisso,eleePhilippadeixaramasala,rindoocaminhotodo.Colinrea irmou,então,acertezadequeocasamentodosdoistinhasido

umaótimadecisão.–Achoquevouatéojardim–anunciouPrudencederepente,tomandoo

braçodomarido.–Penelope,porquenãovemcomigo?Penelopeabriuabocaporalgunssegundosantesdedecidiroquedizer,

oque lheconferiuumaaparênciaumpoucoparecidacomadeumpeixeconfuso (mas, na opinião de Colin, um peixe bastante cativante, se issofossepossível).Por im,empinouoqueixocomumaexpressãodecididaefalou:–Agoranão,Prudence.

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–Penelope!–exclamouaSra.Featherington.–Precisoquememostreumacoisa–insistiuPrudence,falandoentreos

dentes.– Eu realmente acho que sou necessária aqui – devolveu Penelope. –

Possomejuntaravocêlogomais,àtarde,sedesejar.–Precisodevocêagora.Penelope olhou para a irmã, surpresa, claramente sem esperar tal

resistência.–Medesculpe,Prudence–falou.–Creiosernecessáriaaqui.– Bobagem – disse a Sra. Featherington, em um tom muito jovial. –

FelicityeeupodemosfazercompanhiaparaoSr.Bridgerton.Felicityselevantouderepente.– Ah, não! – exclamou, os olhosmuito redondos e inocentes. – Esqueci

umacoisa.– O que você poderia ter esquecido? – perguntou a Sra. Featherington

entreosdentes.–Err...asminhasaquarelas.–ElasevirouparaColincomumsorrisoao

mesmotempodoceetravesso.–Vocêqueriavê-las,nãoqueria?–É claro –murmurouele, decidindoque gostavamuitoda irmã caçula

dePenelope.–Considerandoquesãotãoexclusivas.–Pode-sedizerque são exclusivamente comuns – a irmouFelicity com

umacenodecabeçamuitoconvicto.– Penelope – começou a Sra. Featherington, e era claro que tentava

esconder a irritação –, poderia me fazer a gentileza de ir buscar asaquarelasdeFelicity?–Elanãosabeondeestão–retrucouFelicity,apressada.–Porquenãolhediz?–PeloamordeDeus–explodiuColin, inalmente–,deixequeFelicityvá.

Dequalquerforma,precisodeummomentoasóscomasenhora.O silêncio reinou. Era a primeira vez que Colin Bridgerton perdia a

paciênciaempúblico.Aoseulado,eleouviuPenelopesufocarumpequenogrito,mas,quandoolhouparaela,viuqueescondiaumminúsculosorrisoportrásdamão.Eissoofezsentir-semuitobem.– Um momento a sós? – ecoou a Sra. Featherington, levando a mão

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trêmulaatéopeito.OlhouparaPrudenceeRobert,quecontinuavamdepéaoladodajanela.

Imediatamenteosdoisdeixaramoaposento,aindaquecomumbocadoderesmungosdapartedePrudence.– Penelope – chamou a Sra, Featherington –, talvez deva acompanhar

Felicity.–Penelopefica–retrucouColin,comconvicção.–Penelope?–repetiuaSra.Featherington,indecisa.– Sim – con irmou Colin, bem devagar, caso ela continuasse sem

compreenderoqueelequeriadizer.–Penelope.–Mas...Colinaolhoucomtal ferocidadequeelachegouaseencolherecolocar

asmãossobreocolo.–Jáestouindooo!–cantarolouFelicity,deixandooaposento.Antes que a garota fechasse a porta às suas costas, porém, Colin a viu

darumarápidapiscadelaparaPenelope.E Penelope sorriu, o amor pela irmãmais nova icandomuito evidente

emseuolhar.Colin relaxou. Não se dera conta de como a infelicidade de Penelope o

deixaratenso.Eelaestava,semdúvida,sentindo-seaúltimadascriaturas.PorDeus,malpodiaesperarparatirá-ladoseiodaquelafamíliaterrível.A Sra. Featherington esticou os lábios numa débil tentativa de sorrir.

OlhoudeColinparaPenelope,depoisdevoltaparaelee,porfim,indagou:–Queriafalarcomigo?–Queria–respondeuele,ansiosopordarlogoumfimàquilo.–Euficaria

imensamentehonradoseasenhorameconcedesseamãodesua ilhaemcasamento.Por um instante, a Sra. Featherington não esboçou reação alguma.

Depois ela arregalou os olhos, que icaram bem redondos, abriu a boca,que icoubemredonda,in louocorpo,que icou...bom,ocorpojáerabemredondo. Então começou a bater palmas, incapaz de dizer qualquer coisaalémde:–Ah!Ah!–Emseguida:–Felicity!Felicity!Felicity?Portia se levantou de um salto, correu até a porta e gritou feito uma

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vendedoradepeixe:–Felicity!Felicity!–Ah,mamãe–gemeuPenelope,fechandoosolhos.–PorqueestáchamandoFelicity?–indagouColin,pondo-sedepé.ASra.Featheringtonvirou-separaele,confusa.–OsenhornãoquersecasarcomFelicity?Colinachouqueiapassarmal.– Não, pelo amor de Deus, eu não quero me casar com Felicity! –

vociferou. – Se quisesse me casar com ela, por acaso a teria mandadobuscarasmalditasaquarelas?ASra.Featheringtonengoliuemsecodesconfortavelmente.–Sr.Bridgerton–falou,retorcendoasmãos.–Eunãocompreendo.Eleafitouhorrorizado,sensaçãoquelogosetransformouemrepulsa.–Penelope–disse, agarrandoamãoda jovemepuxando-apara si até

queestivessebemcoladaaele.–EuqueromecasarcomPenelope.–Penelope–ecoouaSra.Featherington.–Mas…–Masoquê?–interrompeuele,comavozmuitoameaçadora.–Mas...mas...–Estátudobem,Colin–apaziguouPenelope,apressada.–Eu...– Não, não está tudo bem – explodiu ele. – Eu jamais dei a menor

indicaçãodeestarinteressadoemFelicity.Felicity surgiu à porta, levou amão à boca e sumiudenovonomesmo

instante,sabiamentefechandoaportaaopassar.–Eusei–retrucouPenelopedeformaapaziguadora,lançandoumolhar

rápidoparaamãe–,masFelicityésolteirae...–Vocêtambémé–observouele.–Eusei,masestouvelhae...–EFelicityéumbebê–cuspiuColin.–MeuDeus,casar-mecomelaseria

comomecasarcomHyacinth.–É,anãoserpelofatorincesto–lembrouPenelope.Eleaencaroucomosenãotivesseachadoaquilonadaengraçado.–Certo–disseela,emgrandeparteparapreencherosilêncio.–Foisó

umgrandemal-entendido,nãoémesmo?Comoninguémrespondeu,PenelopeolhouparaColin,suplicante.–Nãoé?

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–Éclaro–murmurouele.ElasevirouparaaSra.Featherington.–Mamãe?–Penelope?–murmurouela.Penelope sabia que a mãe não lhe fazia uma pergunta. Na verdade,

aindaexpressavaincredulidadeporColindesejarsecasarcomela.E,ah,comoaquilodoía,emborajádevesseestaracostumada.–EugostariademecasarcomoSr.Bridgerton– falou, tentandosoaro

maisdignapossível.–Elemepediueeuaceitei.–Ora,é claroqueaceitou– retorquiuamãe.–Teriadeser idiotapara

nãoaceitar.– Sra. Featherington – começou Colin, irritado. – Sugiro que comece a

tratarminhafuturaesposacomumpoucomaisderespeito.–Colin,issonãoénecessário–dissePenelope,colocandoumadasmãos

sobreobraçodele,emboraseucoraçãovoassenaquelemomento.TalvezColinnãoa amasse,mas se importava comela.Nenhumhomem

defenderiaumamulhercomtamanha ferocidadesenãose importasseaomenosumpouquinhocomela.– É necessário, sim – retrucou ele. – Pelo amor de Deus, Penelope, eu

chegueicomvocê.DeixeiperfeitamenteclaroqueexigiaasuapresençanasalaequaseempurreiFelicityportaaforaparaquebuscasseasaquarelas.Porquediaboalguémachariaqueeuqueromecasarcomela?ASra.Featheringtonabriuefechouabocadiversasvezesantesdedizer,

porfim:–EuamoPenelope,éclaro,maséque...– Mas a senhora a conhece? – devolveu Colin. – É encantadora,

inteligenteetemumótimosensodehumor.Quemnãogostariadesecasarcomumamulhercomoela?Penelopeteriaderretidonochãosenãoestivessesegurandoamãodele.–Obrigada–sussurrou, semse importarcomapossibilidadedeamãe

tê-laouvidoenemmesmoligandoseColinaescutara.Dealgumaforma,precisavapronunciarapalavraparasimesma.Elanãoachavaquefossetudoaquilo.Lembrou-se de Lady Danbury, com sua expressão amável e só um

pouquinhoardilosa.

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Algomais. Talvez Penelope fosse algomais, e talvez Colin fosse a únicaoutrapessoaasedarcontadisso,também.Oquesófaziacomqueoamasseaindamais.A mãe pigarreou, então inclinou o corpo para a frente e abraçou

Penelope.Aprincípiofoiumgestohesitantedepartedeambas,maslogoaSra. Featherington apertou os braços ao redor da ilha e, com um gritoengasgado, Penelope se pegou retribuindo o afeto com a mesmaintensidade.– Eu a amo, sim, Penelope – disse a Sra. Featherington –, e estou

satisfeita por você. –Afastou-se e enxugouuma lágrima. –Voume sentirsolitária sema suapresença, é claro, porque imagineiquepassaríamosorestodavidajuntas,masistoéomelhorparaoseufuturo,ecomomãeeuprecisoaceitar.Penelope deu uma leve fungada, então tateou cegamente à procura do

lençodeColin,queelejásacaradobolsoeestendiaàsuafrente.–Umdiavocêiráentender–dissePortia,dandoumtapinhanobraçoda

ilha.EntãosevirouparaColinedisse:–Estamosencantadosemrecebê-loemnossafamília.Eleassentiucomacabeça,semgrandeentusiasmo,masPenelopeachou

que ele fez um belo esforço, considerando a raiva que sentira apenasalgunsinstantesatrás.Elasorriueapertouamãodele,cientedequeestavaprestesaembarcar

namaioraventuradesuavida.

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CAPÍTULO15

–Sabe–começouEloise,trêsdiasdepoisdeColinePenelopefazeremoseuanúnciosurpresa–,émesmoumapenaqueLadyWhistledowntenhaseaposentado,porqueessateriasidoanotíciadadécada.–DopontodevistadeLadyWhistledown,semdúvidaseria–murmurou

Penelope, levandoaxícaradecháaos lábiosemantendoosolhoscoladosnorelógiodeparededasaladevisitasinformaldeLadyBridgerton.PensouqueseriamelhornãoolhardiretoparaEloise.Elatinhaumjeito

todoseudedescobrirsegredosnosolhosdaspessoas.Era engraçado. Penelope passara anos sem se preocupar – ao menos

nãomuito–queaamigadesvendasseaverdadesobreLadyWhistledown.Mas agora que Colin sabia, de alguma forma parecia que o seu segredolutuava no ar, como partículas de poeira, apenas esperando para setransformaremnumanuvemdeconhecimento.Agora que um dos Bridgertons a tinha descoberto, talvez fosse só

questãodetempoantesqueosoutrosfizessemomesmo.–Oquequerdizer?–perguntouEloise,interrompendoospensamentos

nervososdePenelope.– Seme lembro bem – começou Penelope, com cautela –, ela escreveu

certa vez que teria de se aposentar se eu algumdiame casasse comumBridgerton.Eloisearregalouosolhos.–Escreveu?–Oualgodotipo–retrucouPenelope.–Vocêestábrincando–disseEloise,descartandoaideiacomumaceno

demão.–Elajamaisseriacruelaesseponto.Penelope tossiu, sem achar que poderia dar im ao assunto ingindo

estar com uma migalha de biscoito na garganta, mas tentando mesmoassim.–Não,sério–insistiuEloise–,oquefoiqueeladisse?–Nãolembroaspalavrasexatas.

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–Tente.Penelope tentou ganhar tempo pousando a xícara e pegando outro

biscoito. Estavam tomando o chá sozinhas, o que era estranho.Mas LadyBridgerton havia arrastado Colin para irem tomar alguma providênciarelacionada ao casamento iminente – marcado para dali a um mês! –, eHyacinth estava fora fazendo compras com Felicity, que ao ouvir anovidade de Penelope havia atirado os braços ao redor da irmã e dadogritinhosestridentesdealegriaatéosouvidosdelaficassementorpecidos.Tinhasidoummaravilhosomomentoentreirmãs.–Bem–dissePenelope,mordiscandoumbiscoito–,achoquefalouque,

seeumecasassecomumBridgerton,seriao imdomundoconformeelaoconhecia e, como ela não saberia entender ummundo assim, teria de seaposentar.Eloiseafitouporummomento.–Eissonãoéumalembrançaprecisa?–Nãohácomoesqueceralgoassim–comentouPenelope.–Humpf.–Eloisefezumacaretadedesdém.–Bem,eudiriaqueissofoi

terríveldapartedela.Agoramesmoéqueeuqueriaqueaindaestivesseescrevendo,porqueteriadeengolirasprópriaspalavras.–Vocêéumaboaamiga,Eloise–dissePenelope,baixinho.–Sou,sim–retrucouEloise,comumsuspiroafetado.–Euseidisso.Das

melhores.Penelopesorriu.Aresposta jovialdeEloisedeixouclaroquenãoestava

com disposição para emoção ou nostalgia. O que era bom. Tudo na vidatinhaseumomentoelugar.Penelopedisseraoquesentiaesabiaqueerarecíproco da parte de Eloise, ainda que a amiga preferisse brincar ezombardelanaquelemomento.– Devo confessar, no entanto – continuou Eloise, pegando mais um

biscoito–,quevocêeColinmesurpreenderam.–Nóstambémmesurpreendemos–admitiuPenelope,irônica.–Nãoqueeunãoestejaencantada–apressou-seemacrescentarEloise.

–Nãoháninguémqueeugostariamaisde tercomo irmã.Bem,alémdasque já tenho, é claro. E se algum dia eu tivesse sonhado que vocês doisdemonstrariamqualquerinclinaçãonessadireção,teriaconspiradoafavorsemqualquerpudor.

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–Eusei–dissePenelope,semconseguirseguraroriso.–Sim,bem...Nãosouexatamenteconhecidaporcuidardaminhaprópria

vida.– O que é isso nos seus dedos? – indagou Penelope, chegando o corpo

paraafrenteparapodervermelhor.–Oquê?Isso?Ah,nada.–Maspousouasmãossobreocolo,aindaassim.–Nãoparecenão ser nada – insistiu Penelope. –Deixe-me ver. Parece

tinta.–Bem,éclaroqueparece.Étinta.–Entãoporquenãodisselogo,quandoperguntei?–Porquenãoédasuaconta–retrucouEloise,cominsolência.Peneloperecuou,chocadacomotombruscodaamiga.–Medesculpe–disse,secamente.–Nãofazia ideiadequetinhatocado

emumassuntotãodelicado.–Ah,masnãoé–apressou-seemnegarEloise.–Nãosejaboba.Ésóque

sou desajeitada e não consigo escrever sem sujar os dedos todos. Eupoderia usar luvas, é claro, mas elas icariammanchadas e eu teria quetrocá-las sempre, e posso lhe garantir que não tenho omenor desejo degastartodaaminhapequenamesadaemluvas.Penelopeafitou,considerandoalongaexplicação,entãoperguntou:–Oqueandouescrevendo?–Nada.Apenascartas.Penelope percebeu, pelo tom enérgico da amiga, que ela não queria

estender o assunto, mas estava sendo tão atipicamente evasiva quePenelopenãoconseguiuresistir:–Paraquem?–Ascartas?–Sim–respondeuPenelope,emboraachassequefosseóbvio.–Ah,paraninguém.–Bem, a não ser que sejamumdiário, não podem ser paraninguém –

atalhouPenelope,aimpaciênciaacrescentandoumtomríspidoàvoz.Eloiseolhouparaelacomumaleveexpressãodeafronta.–Vocêestáumpoucointrometidahoje.–Sóporquevocêestámuitoevasiva.–SãoparaFrancesca–disseEloise,comumpequenoresfolegar.

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–Ora,entãoporquenãofalouantes?Eloisecruzouosbraços.–Talveznãotenhagostadodevocêficarmequestionando.Penelope icouboquiaberta.Nãoconseguiase lembrardenenhumavez

emqueelaeEloisehaviamtidoqualquercoisaqueseassemelhasseaumabriga.–Eloise,oquehádeerrado?–Nãohánadadeerrado.–Euseiquenãoéverdade.A garota icou em silêncio, limitando-se a franzir os lábios e olhar em

direçãoàjanela,numaclaratentativadeencerraroassunto.–Estázangadacomigo?–insistiuPenelope.–Porquehaveriadeestarzangadacomvocê?–Nãosei,masmeparececlaroqueestá.Eloisedeixouescaparumpequenosuspiro.–Nãoestouzangada.–Bem,estáalgumacoisa.–Eusó...eusó...–Elabalançouacabeça.–Nãosei.Estouinquieta,acho.

Estranha.Penelopepermaneceu em silêncio enquantodigeria aquilo, entãodisse,

baixinho:–Háalgoqueeupossafazer?–Não.–Eloisesorriu,soturna.–Setivesse,podetercertezadequeeujá

terialhepedido.Penelopesentiuumarisadabrotandodesi.EratãotípicodeEloisefazer

umcomentáriocomoaquele...– Acho que... – prosseguiu Eloise, erguendo o queixo, perdida em

pensamentos.–Não,deixeparalá.–Não–retrucouPenelope,estendendoamãoe tomandoadaamiga.–

Fale.Eloisepuxouamãoedesviouoolhar.–Vocêvaimeachartola.–Talvez–atalhouPenelope, sorrindo–,mascontinuarásendoaminha

melhoramiga.–Ah,Penelope,nãosoudignadisso–disseEloise,triste.

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–Eloise,nãodigatamanhaloucura.Euteriaenlouquecidoporcompleto,tentandomesituaremLondres,emmeioàaltasociedade,semvocê.Eloisesorriu.–Nósbemquenosdivertimos,nãofoi?–Bem, sim, quando estávamos juntas – admitiu Penelope. –O resto do

tempofoiumatristezadosinfernos.–Penelope!Achoquenuncaaouvipraguejarantes.Penelopesorriu,encabulada.– Escapuliu. Além domais, não consigo pensar numa formamelhor de

descreveravidadeumamoçainvisívelnaaltasociedade.Eloisedeixouescaparumarisadainesperada.– Eis aí um livro que eu adoraria ler: Uma moça invisível na alta

sociedade.–Sósegostardetragédias.– Ora, vamos, não pode ser uma tragédia. Tem de ser um romance.

Afinal,vocêvaiterumfinalfeliz.Penelope sorriu. Pormais estranho que parecesse, ia, sim, ter um inal

feliz. Colin estava sendo um noivo encantador e atencioso, aomenos nostrêsdiasemquevinhadesempenhandoessepapel.Esemdúvidanãoeranada fácil: estavam sujeitos a mais especulação e escrutínio do quePenelopepoderiaterimaginado.Mas não estava surpresa; quando ela (como Lady Whistledown)

escreveraqueomundocomooconheciaterminariaseumaFeatheringtonsecasassecomumBridgerton,acharaestarecoandoosentimentogeral.Dizer que a alta sociedade icara chocada com seu noivado seria, no

mínimo,umeufemismo.No entanto, por mais que Penelope gostasse de antecipar as coisas e

re letir sobre o casamento iminente, continuava perturbada com otemperamentoestranhodaamiga.–Eloise–começou,séria–,queroquemedigaoqueaestáincomodando

tanto.Ajovemdeixouescaparumsuspiro.–Tinhaesperançadequevocêesquecesseoassunto.–Aprendiaserperseverantecomumamestra–retrucouPenelope.IssofezEloisesorrir,mesmoquesóporuminstante.

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–Eumesintotãodesleal–disseelaemseguida.–Oquevocêfez?–Ah,nada.–Ela levouamãoaopeitonaalturadocoração.–Estátudo

aquidentro.Eu...Ela parou e olhou para baixo, na direção das franjas do tapete, mas

Penelope achava que a amiga não estava enxergando muita coisa. Aomenosnadaalémdoqueatormentavasuamente.– Estou tão feliz por você... – disse Eloise, despejando as palavras em

uma explosão estranha, pontuada por pausas embaraçosas. – E acho, dofundodocoração,quenãoestoucomciúme.Noentanto,aomesmotempo...Penelope esperou enquanto ela organizava os pensamentos. Ou talvez

estivessereunindocoragem.– Ao mesmo tempo – prosseguiu, tão baixinho que Penelope mal

conseguia ouvi-la –, acho que sempre imaginei que você icaria solteiracomigo.Euescolhiestavida.Seiqueescolhi.Eupoderiatermecasado.–Eusei–falouPenelope,comavoztambémbaixa.–Mas nuncame casei, porque jamais pareceu certo, e eu não quisme

acomodar por menos do que os meus irmãos e irmãs conseguiram. Eagora, Colin também – continuou ela, fazendo um sinal na direção dePenelope.Penelope não mencionou que Colin não dissera que a amava. Não

parecia o momento certo ou, francamente, o tipo de coisa que desejassecompartilhar. Além domais, mesmo que não a amasse, ela ainda achavaqueseimportavacomela,eissoeraobastante.– Eu jamais desejaria que você não se casasse – explicou Eloise. – Só

acheiquenão fosseacontecer. –Ela fechouosolhos, comumaexpressãodeagonia.–Nãofoiissoqueeuquisdizer.Nãofoiminhaintençãoinsultá-la.–Não, não insultou – atalhou Penelope, com sinceridade. – Eu também

nuncaacheiquemecasariaumdia.Eloiseassentiu,triste.– E, de alguma forma, isso fazia com que tudo icasse... bem. Eu tinha

quase 28 anos e era solteira, você já tinha 28 anos e era solteira, e nóssempreteríamosumaàoutra.MasagoravocêtemoColin.–Tambémtenhovocê.Pelomenos,esperoquesim.

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–Éclaroque tem!–exclamouEloise.–Masnãovai seramesmacoisa.Vocêprecisaser ielaoseumarido.Ou,pelomenos,éoquetodosdizem–acrescentouelacomumbrilhotravessonosolhos.–Colinviráemprimeirolugar,eéassimquedeveser.E,parasersincera–acrescentou,osorrisotornando-seumpoucozombeteiro–,euteriadematá-lasefossediferente.A inal, ele é o meu irmão preferido. Realmente, não seria justo que eletivesseumamulherdesleal.Peneloperiualtoaoouviraquilo.–Vocêmeodeia?–indagouEloise.Penelopebalançouacabeça.–Não– retrucou,baixinho.–Se forpossível, euaamoaindamais,pois

seicomofoidifícilfalarsobreissocomigo.–Ficotãofelizporterditoisso!–comemorouEloise,comumsuspiroalto

e dramático. – Estava morrendo de medo que você falasse que a únicasoluçãoseriaeutambémarrumarummarido.Aideiahavia,defato,passadopelacabeçadePenelope,maselafezque

nãoeafirmou:–Éclaroquenão.–Quebom.Porqueaminhamãenãoparadefalarisso.Penelopesorriu.–Euficariasurpresaseelanãoofizesse.–Boatarde,senhoras!As duas ergueram a vista e depararam com Colin entrando na sala. O

coraçãodePenelopedeuumpequenosaltoaovê-loeela icousemfôlego.Jásentiaissohaviaanos,semprequeeleentravaemalgumaposento,masagoraeradiferente,maisintenso.Talvezporelasaber.Sabercomoeraestarcomele,serdesejadaporele.Saberqueeleseriaseumarido.Seucoraçãodeuoutrosalto.Colindeixouescaparumgemidoalto.–Vocêsacabaramcomtodaacomida?–Sóhaviaumpratopequenodebiscoitos–disseEloiseemdefesadas

duas.–Nãofoiissoquemelevaramacrer–resmungouele.

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PenelopeeEloiseseentreolharamecomeçaramarir.–Oquefoi?–quissaberColin,seabaixandoparadarumbeijorápidoe

atenciosonorostodePenelope.–Vocêfoitãodramático...–explicouEloise.–Ésócomida.–Nuncaésócomida–retrucouColin,atirando-seemumapoltrona.Penelope continuava a se perguntar quando sua bochecha pararia de

formigar.–Eentão–disseele,pegandoumbiscoitocomidopelametadedoprato

deEloise–,sobreoqueasduasestavamfalando?–LadyWhistledown–respondeuEloiseprontamente.Penelopeengasgoucomochá.–Émesmo?–perguntouColin,comdelicadeza,emboraPenelopetivesse

detectadoumaindiscutívelimpaciênciaemsuavoz.–É–confirmouEloise.–EudiziaaPenelopequeémesmoumapenaque

ela tenha se aposentado, jáqueo seunoivado teria sidoomexericomaisdignodenotadestatemporada.–Interessantecomoissofoiacontecer–murmurouColin.– Aham – concordou Eloise. – Sem dúvida ela dedicaria uma coluna

inteiraaoseubailedenoivadoamanhã.Penelopenãoafastouaxícaradaboca.–Quermaisumpouco?–perguntou-lheEloise.Ela fez que sim com a cabeça e lhe passou a xícara, embora tenha

sentidomuitoa faltadoobjetoqueestivera lheservindodeescudo.SabiaqueEloisetinhatocadononomedeLadyWhistledownporquenãoqueriaque Colin soubesse de seus sentimentos ambíguos com relação aocasamento, mas ainda assim desejava com todas as forças que a amigahouvesseditoqualqueroutracoisaemrespostaàperguntadoirmão.–Porquenãopedemaiscomida?–sugeriuEloiseaColin.–Jápedi.Wickhammeinterceptounocorredoreperguntouseeuestava

comfome.–JogouoúltimopedacinhodobiscoitodeEloisenaboca.–Sábio,esseWickham.– Aonde foi hoje, Colin? – indagou Penelope, ansiosa por desviar o

assuntodeLadyWhistledowndeumavezportodas.Elebalançouacabeça,agoniado.–Comosefossepossívelsaber.Mamãemearrastoudelojaemlojaodia

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inteiro.–Vocênãotem33anos?–indagouEloise,todadoce.Elelherespondeucomumolharfuzilante.–Eusóachoquevocê jápassouda idadedeteramamãeoarrastando

poraí,sóisso–murmurouela.– Mamãe nos arrastará por aí mesmo quando formos velhos tolos e

senis,evocêsabedisso–replicouele.–Alémdomais,estáencantadapormevercasado,eeurealmentenãoconsigoestragarodivertimentodela.Penelope suspirou. Devia ser por isso que amava aquele homem.

Qualquer um que tratasse a mãe tão bem sem dúvida daria um ótimomarido.–Ecomoestãoindoosnossospreparativosdocasamento?–perguntou

ColinaPenelope.Elafezumacaretainvoluntária.–Nuncamesentitãoexaustaemtodaaminhavida–admitiu.Eleestendeuamãoecatouumamigalhadopratodela.–Devíamosfugir.–Ah,podemosmesmo?–perguntouPenelope,pronunciandoaspalavras

numímpeto.Elepiscou,aturdido.–Naverdadeeuestavabrincando,emboramepareçaumaótimaideia.– Vou providenciar uma escada – disse Eloise, batendo palmas de

contentamento.–Assimvocêpoderáchegaratéoquartodelaesequestrá-la.– Tem uma árvore – argumentou Penelope. – Colin não terá a menor

dificuldade.–MeuDeus!–exclamouele.–Nãoestáfalandosério,está?–Não–suspirouela.–Maspoderia.Sevocêestivesse.–Nãopossoestar.Tem ideiadoque isso fariacomaminhamãe?–Ele

revirouosolhos.–Semfalarnasua.Penelopegemeu.–Eusei.–Elasairiaàminhacaçaememataria–disseele.–Aminhaouasua?–Asduas.Uniriamforças.–Eleesticouopescoçoemdireçãoàporta.–

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Ondeestáacomida?–Vocêacaboudechegar,Colin–comentouEloise.–Aprendaaesperar.– E eu pensando que Wickham fosse alguma espécie de feiticeiro –

resmungouele–capazdefazeracomidaaparecercomumsimplesestalardosdedos.–Aquiestá,senhor!Era a voz de Wickham, que entrava elegantemente na sala com uma

enormebandeja.– Viu só? – comentou Colin, erguendo as sobrancelhas primeiro para

EloiseedepoisparaPenelope.–Eulhesdisse.–Porqueseráqueestoupressentindoqueouvireiessaspalavrassaindo

dasuabocamuitasvezesnofuturo?–falouPenelope.– Muito provavelmente porque ouvirá – respondeu Colin. – Você logo

descobrirá–eaquiele lhe lançouumsorrisomuito insolente–queestouquasesemprecerto.–Ora,porfavor–gemeuEloise.–VouterqueconcordarcomEloisenestecaso–dissePenelope.– E icar contra o seu marido? – Ele levou uma das mãos ao coração

(enquantoaoutraapanhavaumsanduíche).–Issomemagoou.–Vocêaindanãoémeumarido.ColinsevirouparaEloise.–Agatinhatemgarras.Eloiseergueuassobrancelhas.–Nãosedeucontadissoantesdepedi-laemcasamento?–Éclaroquesim–respondeuele,dandoumamordidanosanduíche.–

Sónãopenseiqueasusariacontramim.Então ele a olhou com uma expressão de tanto desejo e domínio que

Penelopeficoucompletamentederretida.–Bem–anunciouEloise, levantando-sederepente.–Vouconcederaos

futurosrecém-casadosalgunsmomentosdeprivacidade.–Masquantaconsideraçãodasuaparte–murmurouColin.Eloiseolhouparaelecomumsorrisoirritado.–Qualquercoisaporvocê,meuqueridoirmão.Oumelhor–acrescentou,

aexpressãotornando-sesarcástica–,qualquercoisaporPenelope.Colinselevantouesevirouparaanoiva.

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–Parecequeestoudespencandonaordemdeprioridades.Penelopesorriuportrásdaxícaraedisse:– Jamais icarnomeiodeumarusgaentreBridgertonsagora fazparte

daminhapolíticapessoal.–Haha! – riuEloise. – Sinto informarquenão conseguirámanteressa

política por muito tempo, Srta. Quase-Bridgerton. Além do mais –acrescentou,comumsorrisomalicioso–,seestápensandoqueistoaquiéumarusga,malpossoesperarquenosvejaemplenaforma.–Estáquerendodizerqueeununcavi?–perguntouPenelope.Tanto Eloise quanto Colin balançaram a cabeça de uma forma que a

deixoumuitotemerosa.Ah,céus.–Háalgoqueeudevasaber?–perguntouPenelope.Colindeuumsorrisoardiloso.–Tardedemais.Penelope olhou para Eloise com uma expressão de impotência, mas a

amigasóriuenquantosaíadasala,fechandoaportaaopassar.–IssofoirealmentesimpáticodapartedeEloise–murmurouColin.–Oquê?–indagouPenelope,comumardeinocência.Osolhosdelebrilharam.–Aporta.–Aporta?Ah!–exclamouela.–Aporta.Colinsorriuenquantoseaproximavadosofáparasesentaraoseulado.

HaviaalgoencantadorarespeitodePenelopenumatardechuvosa.Elemala tinha visto desde que icaram noivos – os preparativos para umcasamentotinhamumjeitotodoespecialdefazerissocomumcasal–,e,noentanto,elanãosaíradesuamente,nemmesmoduranteosono.Engraçado como aquilo acontecera. Havia passado anos sem jamais

pensarneladeverdade,anãoserqueestivessebemdiantedele,eagoraelapermeavacadaumdeseuspensamentos.Cadaumdeseusdesejos.Comoaquilohaviaocorrido?Quandoocorrera?Etinhaalgumaimportância,defato?Talvezaúnicacoisaqueimportasse

eraqueeleadesejavaequeelaera–oupelomenosiaser–sua.Umavez

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que colocasse a aliança no dedo dela, os comos, porquês e quandos setornariamirrelevantes,contantoqueaquela loucuraqueelesentia jamaispassasse.Levouodedo aoqueixodePenelope e inclinou seu rosto emdireção à

luz.Osolhosdelabrilhavamdeansiedadeeoslábios...PorDeus,comoerapossível que os homens de Londres jamais tivessem notado como eramperfeitos?Ele sorriu. Aquela era uma loucura permanente. E ele não podia estar

maissatisfeito.Colin jamais fora contrário ao casamento. Só era contra um casamento

entediante. Não era exigente; apenas desejava paixão, amizade, umaconversaestimulanteem termos intelectuaiseumaboarisadadevezemquando.Umaesposaaquemnãoquisessetrair.Surpreendentemente,encontraraissoemPenelope.SóoqueprecisavafazeragoraerasecertificardequeoGrandeSegredo

delapermanecesseassim.Umsegredo.PorqueachavaquenãoaguentariaveradornosolhosdePenelopecaso

fosserejeitadapelasociedade.–Colin?–sussurrouelacomarespiraçãoentrecortada,fazendocomque

elerealmentedesejassebeijá-la.Elechegoumaisperto.–Hum?–Estavatãocalado...–Estavasópensando.–Emquê?Elelhedeuumsorrisotolerante.–Vocêandapassandotempodemaiscomaminhairmã.– O que isso quer dizer? – indagou ela, os lábios estremecendo de tal

formaqueelepercebeuqueelajamaisdeixariadezombardele.Aliestavaumamulherqueomanteriasempreemestadodealerta.–Vocêpareceterdesenvolvidocertatendênciaàinsistência.–Tenacidade?–Também.–Masissoébom.Oslábiosdosdoiscontinuavamapoucoscentímetrosdedistância,maso

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impulsodedaremcontinuidadeàconversaprovocanteeramuitoforte.– Quando vocêinsiste em proclamar obediência ao seu marido –

murmurouele–,éumacoisaboa.–Émesmo?Colin moveu o queixo muito de leve para cima e para baixo, na

insinuaçãodeumsim.–Equandovocêagarraomeuombrocomtenacidadequandoeuabeijo,

issotambémébom.Elaarregalouosolhosescurosdeformatãoencantadoraqueeletevede

acrescentar:–Vocênãoacha?Entãoelaosurpreendeu.–Assim?–falou,colocandoasmãosnosombrosdele.Seutomdevozeradesafiador,eosolhos,puroflerte.Deus,comoeleadoravaofatodeelaconseguirsurpreendê-lo...–Issoéumcomeço–falou.–Talvezvocêtenhade...–eledeslocouuma

dasmãosdemaneiraacobriradePenelope,pressionandoosdedosdelanaprópriapele–meabraçarcomumpoucomaisdetenacidade.–Entendi–murmurouela. –Entãooqueestádizendoéqueeu jamais

deveriasoltá-lo?Elepensounaquiloporummomento.– Issomesmo–respondeu,dando-secontadequehaviaumsigni icado

mais profundo nas palavras dela, quer fosse a intenção ou não. – Éexatamenteoqueestoudizendo.E então as palavras já não erammais necessárias. Levou os lábios aos

dela,aprincípiocomdelicadeza,masemseguidaoardortomoucontadele,e Colin a beijou com uma paixão que nem elemesmo sabia que possuía.Nãoeraumaquestãodedesejo–ou,pelomenos,nãoapenas.Eraumaquestãodenecessidade.Experimentouuma sensaçãoestranha, ardentee ferozqueo incitavaa

reivindicá-la,adealgumaformamarcá-lacomosua.Desejava-a desesperadamente e não tinha a menor ideia de como

haveriaderesistirummêsinteiroantesdocasamento.–Colin?–arfouPenelope,enquantoeleadeitavadecostasnosofá.Ele beijava seu queixo e seu pescoço, e os lábios estavam ocupados

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demaisparaqualquercoisaalémdeummurmúrio:–Hum?–Nós...Ah!Ele sorriuaomesmo tempoquemordiscavao lóbulodaorelhadela. Se

ela conseguisse terminar uma frase, então ele claramente não a estavadeixandotãotontaquantodeveria.–Oqueestavadizendo?– sussurrou, então lhedeuumbeijoprofundo

naboca,somenteparatorturá-la.Depois afastou os lábios dos dela apenas o su iciente para que ela

retrucasse:–Eusó...Logoelea interrompeucomoutrobeijoe icou tontodeprazerquando

elagemeudedesejo.–Me desculpe – falou Colin, correndo asmãos por baixo da bainha do

vestido dela e, em seguida, as usando para fazer todo tipo de coisasperversascomaspanturrilhasdela.–Oquevocêestavadizendomesmo?–Eu?–indagouela,comosolhosembaçados.Elesubiuasmãosumpoucomais,atéapartedetrásdosjoelhosdela.– Você estava dizendoalguma coisa – respondeu ele, pressionando o

quadril contraodelapor acharque explodiria emchamasnaquele exatomomento se não o izesse. – Eu acho – sussurrou, deslizando amão pelapelemaciadesuacoxa–queiamepedirparatocá-laaqui.Elaarfou,depoisgemeueentão,dealgumaforma,conseguiuretrucar:–Achoquenãoeraissoqueeuiadizer.Elesorriudeencontroaoseupescoço.–Temcerteza?Elafezquesim.–Querqueeupare?Elafezquenão.Freneticamente.Elesedeucontadequepoderiapossuí-lanaquele instante.Podia fazer

amor com ela bem ali, no sofá da mãe, e ela não só permitiria comoadoraria.Nãoseriaumaconquista.Nãoserianemmesmoumasedução.Seriamaisdoqueisso.Quemsabeatémesmo...Amor.

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Eleficouparalisado.–Colin?–sussurrouela,abrindoosolhos.Amor?Nãoerapossível.–Colin?Outalvezfosse.–Háalgoerrado?Nãoéqueele temesseoamor,ounãoacreditassenele.Apenas... nãoo

esperara.Semprepensaraqueoamorcaíssesobreaspessoascomoumraio,que

umdia, ao lanarporumsalãoemuma festa,mortode tédio,umhomemdeparassecomumamulhere soubesse,nomesmo instante,quesuavidaestava mudada para sempre. Fora isso que acontecera com o irmão,Benedict, e Deus sabia que ele e a esposa, Sophie, eram imensamentefelizeslevandoumavidarústica,nocampo.Mas Penelope... Ela chegara de mansinho, sem ser vista. A mudança

haviasidolenta,quaseletárgica,eseeraamor,bem...Seeraamor,seráqueelenãosaberia?Observou-a com toda a atenção, talvez esperando encontrar a resposta

em seus olhos, ou nomovimento de seus cabelos, ou namaneira como ocorpete do vestido se entortava levemente para um lado. Talvez, se aobservasseportemposuficiente,soubesse.– Colin? – sussurrou ela, começando a demonstrar um pouco de

ansiedade.Eleabeijououtravez,agoracomumadeterminaçãoferoz.Seaquiloera

amor,seráquenãoficariaóbvioquandosebeijassem?Masseasuacabeçaeoseucorpofuncionavamseparadosumdooutro,

então era claro que o beijo estava ligado ao corpo, porque, enquanto amente era um borrão confuso, a necessidade do corpo estava bastanteevidente.Droga,agoraeleestavasentindopontadasagudasnobaixo-ventre.Enão

podia fazernadaarespeitonasaladeestardacasadamãe,nemmesmosePenelopeparticipassedebomgrado.Começou a se afastar dela, deslizando a mão da coxa em direção ao

joelho.

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–Nãopodemosfazeristoaqui.–Eusei–concordouela,tãotristequeelemanteveamãoemseujoelho

equasedesistiude fazeroqueeracorretodeacordocomasconvençõessociais.Pensou rápido. Era possível fazer amor com ela sem que ninguém os

lagrasse. É claro que, em seu estado atual, seria um atoconstrangedoramentecurtodequalquerforma.–Quandoéocasamento?–rosnouele.–Daquiaummês.–Oquepodemosfazerparaadiantá-loparadaquiaquinzedias?Elapensouporummomento.–Subornoouchantagem.Talvezambos.Nossasmãesnãomudariamde

ideiacomtantafacilidade.Elegemeu,mergulhandooquadrildeencontroaodelaporumdelicioso

últimomomentoantesdeseafastar.Nãopodiapossuí-laagora.Elairiasersuaesposa.Haveriamuitotempoparaamassosaomeio-diaemsofás,maselequeriausarumacamapelomenosnaprimeiravez.Deviaissoaela.– Colin? – disse ela, ajeitando o vestido e os cabelos, embora não

houvesse a menor maneira de conseguir que o último icasse nemremotamenteapresentávelsemousodeumespelho,umaescovaetalvezatémesmoumadamadecompanhia.–Algumproblema?–Euquerovocê–sussurrouele.Elaoolhou,aturdida.–Sóqueriaquesoubessedisso–continuou.–Nãoqueroqueacheque

pareiporquenãoadesejo.– Ah. – Ela fez uma expressão de quem queria dizer alguma coisa;

parecia extremamente feliz com as palavras dele. – Obrigada por dizerisso.Eletomouamãodelaeaapertou.–Estoumuitodesmazelada?Elefezquesim.–Maséaminhadesmazelada–sussurrouele.Esesentiumuitosatisfeitoporaquilo.

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CAPÍTULO16

ComoColin gostavade caminhar e costumava fazer isso com frequênciapara desanuviar a mente, não foi nenhuma surpresa ter passado tantotempo do dia seguinte atravessando Bloomsbury, Fitzrovia, Marylbone ediversosoutrosbairroslondrinosatéergueravistaeperceberqueestavabemnocoraçãodeMayfair,naGrosvenorSquare,parasermaisexato,nafrente da CasaHastings, residência na cidade do duque deHastings, queporacasoeracasadocomsuairmãDaphne.Já fazia algum tempo que os dois irmãos não dialogavam sobre nada

além da corriqueira conversa de família. Daphne era a irmã que tinha aidade mais próxima da sua e os dois sempre haviam tido uma ligaçãoespecial, embora não se vissem mais com muita frequência, tanto porcausadas viagens frequentesdeColinquantoda atribulada vida familiardeDaphne.A Casa Hastings era uma das enormes mansões que pontilhavam

Mayfair e St. James. Construída com pedras de Portland, era grande,quadradaemuitoimponenteemseuesplendorducal.Oquesó faziacomque fosseaindamaisdivertidoqueaatualduquesa

fosse a sua irmã, pensou Colin, com um sorriso irônico. Não conseguiapensar em ninguém menos altiva ou imponente. Na realidade, Daphnetinha tido di iculdade em encontrar um marido exatamente por ser tãosimpática e afável. Os cavalheiros costumavam vê-la apenas como umaamiga,enãocomoumanoivaempotencial.Mas tudo issomudou quando ela conheceu Simon Bassett, o duque de

Hastings, eagoraDaphneeraumarespeitável senhoradaalta sociedade,com quatro ilhos de 10, 9, 8 e 7 anos. Colin às vezes ainda achavaestranhoquea irmã fosseumamãede famíliaenquantoelecontinuavaateravidalivreedesimpedidadeumhomemsolteiro.Comapenasumanode diferença entre eles, os dois irmãos tinham passado pelas diversasfases da vida juntos. Mesmo depois de casada, as coisas não icaram tãodiferentes: ela e Simon continuaram frequentando asmesmas festas que

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eleetinhammuitosdosmesmosinteresseseatividades.Mas então ela começara a ter ilhos, e embora Colin sempre icasse

encantado em ganhar mais uma nova sobrinha ou sobrinho, cadanascimentodestacavao fatodequeDaphnederacontinuidadeàsuavidadeumaformamuitodistintadadele.No entanto, elepensou, sorrindo enquantoo rostodePenelope invadia

osseuspensamentos,embreveissomudaria.Filhos.Eraumaideiabastanteagradável,naverdade.Não tinha pensado em visitar Daphne,mas agora que estava ali achou

quepoderiaentrarparacumprimentá-la,entãosubiuasescadasebateuàportacomaaldravadelatão.Jeffries,omordomo,abriuquasedeimediato.–Sr.Bridgerton–disseele.–Suairmãnãooesperava.–Não,decidilhefazerumasurpresa.Elaestáemcasa?– Vou ver – respondeu o homem com um aceno da cabeça, embora

ambossoubessemqueDaphnejamaisserecusariaareceberummembrodaprópriafamília.Enquanto Jeffries informava a Daphne sobre sua presença, Colin

aguardounasaladeestar,vagandopeloaposento,inquietodemaisparasesentaroumesmopara icarparado.Algunsminutosdepois,Daphnesurgiuàportaparecendoumpoucodesarrumada,masfeliz,comosempre.E por que não deveria estar? Tudo o que ela sempre desejara na vida

forasecasareter ilhos,eaoquepareciaarealidadeconseguirasuperarosseussonhos.– Olá, minha irmã – cumprimentou Colin, com um sorriso, enquanto

atravessavaasalaparalhedarumabraçorápido.–Seuombroestácom...Elaolhouparaopróprioombro,entãosorriuenvergonhadaaoperceber

quehaviaumenormeborrãocinza-escurosobreorosa-pálidodovestido.– Carvão – explicou, pesarosa. – Estava tentando ensinar Caroline a

desenhar.–Você?–indagouColin,emtomdedúvida.– Eu sei, eu sei – respondeu ela. – Ela realmente não poderia ter

escolhidoprofessorapior,massódecidiuontemqueadoraarte,entãoeusoutudooqueelatem,assim,deumahoraparaoutra.– Porque você não arruma as malas dela e a manda passar uma

temporada com Benedict? – sugeriu Colin. – Tenho certeza que ele

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adorarialhedarumaouduasaulas.–A ideia jámepassoupelacabeça,masnão tenhonenhumadúvidade

que ela já vai ter passado para alguma outra atividade até eu conseguirtomar as devidas providências. – Ela fez um sinal em direção ao sofá. –Sente-se. Está parecendo um felino enjaulado, andando de um lado paraoutrodessejeito.Eleobedeceu,emboraestivessesesentindoincomumenteirrequieto.– E, antes que peça – acrescentou Daphne –, já solicitei a Jeffries que

providencieumlanche.Sanduíchesserãoobastante?–Deuparaouviromeuestômagoroncardooutroladodasala?–Dooutro ladoda cidade, sintodizer – retrucouela, rindo. –Todavez

quetroveja,Daviddizqueéasuabarriga,sabiadisso?–Ah,meuDeus–murmurouColin,emboranãoparassederir.Osobrinhoeramesmoummeninoesperto.Daphne sorriu enquanto se acomodava entre as almofadas do sofá e

pousavaasmãoselegantementesobreocolo.– O que o traz aqui, Colin? Não que precise de um motivo, é claro. É

sempreumprazervê-lo.Eledeudeombros.–Sóestavapassando.–FoiverAnthonyeKate?–indagouela.ACasaBridgerton,ondeoirmão

mais velho morava com a família, icava em frente à Casa Hastings, namesmapraça.–BenedicteSophiejáestãolácomascrianças,paraajudaraprepararoseubailedenoivado,hojeànoite.Elebalançouacabeça.–Não,sintodizerquevocêfoiaminhavítimaescolhida.Elasorriudenovo,masdessavezaexpressãofoimaissuave,atenuada

porcertadosedecuriosidade.–Háalgodeerrado?–Não,éclaroquenão–respondeuele,rapidamente.–Porquê?–Nãosei.–Elainclinouacabeçaparaolado.–Vocêmepareceestranho,

sóisso.–Apenascansado.Elaassentiu,compreensiva.–Porcausadospreparativosparaocasamento,imagino.

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– Isso – retrucou ele, aproveitando a desculpa, embora não tivesse amenorideiadoquetentavaesconderdela.–Bem,lembre-sedeque,sejaláoquevocêestiverpassando–disseela,

comumaexpressãoirritadiça–,émilvezespiorparaPenelope.Ésemprepiorparaasmulheres.Podeacreditar.–Paracasamentosouparatudo?–indagouele,comdelicadeza.–Tudo–falouDaphne,deimediato.–Seiquevocês,homens,achamque

têmascoisassempresobcontrole,mas...– Eu nem sonharia em pensar nisso a sério – disse Colin, sem estar

sendointeiramentesarcástico.Elafranziuatesta,irritada.– As mulheres têm muito mais a fazer do que os homens. Sobretudo

quando se trata de casamentos. Com todas as provas de vestido quePenelope semdúvida temmarcadas, jádeve estar se sentindo comoumaalmofadaparaalfinetes.– Eu sugeri que fugíssemos para nos casarmos – comentou Colin, com

normalidade –, e acho que ela até teve esperança de que eu estivessefalandosério.Daphneriu.–Ficotãofelizqueestejasecasandocomela,Colin...Ele assentiu, sem planejar lhe dizer nada, então de repente se pegou

falando:–Daphne...–Sim?Eleabriuabocae...–Nãoénada.–Ah,não,vocênãovaifazerisso–retrucouela.–Agoraaguçouaminha

curiosidade.Eletamborilounosofá.–Seráqueacomidajáestáchegando?–Estámesmocomfomeousótentandomudardeassunto?–Estousemprecomfome.Elaficouemsilêncioporalgunssegundos.–Colin,oqueiadizer?–perguntou,porfim,avozbaixaesuave.Ele se levantou de súbito, inquieto demais para permanecer parado, e

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pôs-sea caminhardeum ladoparaoutro.Então,paroue sevirouparaairmã,paraoseurostopreocupado.–Nãoénada–falou,emboraissonãofosseverdade.–Comoéqueuma

pessoa sabe? – perguntou atabalhoadamente, sem ao menos saber quehaviacompletadoafraseatéelaresponder.–Sabeoquê?Eleparoudianteda janela.Pareciaque iriachover.Teriadepegaruma

carruagememprestadadeDaphne,anãoserquequisessechegaremcasaencharcadoapósalongacaminhada.Noentanto,nemsabiaporqueestavapensandonisso,poisoquequeriamesmosaberera...–Comoumapessoasabeoquê,Colin?–repetiuDaphne.Eleseviroueresolveudeixaraspalavrassaírem,livres:–Comoumapessoasabeseéamor?Por um instante ela apenas o itou, os olhos castanhos arregalados de

surpresa,oslábiosentreabertos.–Deixeparalá–murmurouColin.–Não!–exclamouela,levantando-senomesmoinstante.–Ficosatisfeita

porterperguntado.Muitosatisfeita.Sóestou...surpresa,devodizer.Elefechouosolhos,indignadoconsigomesmo.–Nãoacreditoquelhepergunteiisso.–Não,Colin,nãosejabobo.Érealmentebastante...gentildasuaparteter

perguntado. E não consigo expressar como estou envaidecida por termeprocuradoquando...–Daphne...–retrucouele.Airmãtinhaumjeitoespecialdeseafastardoassunto,eelenãoestava

comdisposiçãoparaasdivagaçõesdela.Derepente,Daphneestendeuosbraçoseoabraçou.Depois,aindacom

asmãosemseusombros,disse:–Eunãotenhoideia.–Como?Elabalançouacabeçadeleve.–Eunãotenhoideiadecomoumapessoasabequeéamor.Achoqueé

diferenteparacadaum.–Comovocêsoube?Elamordeuolábioinferiorporváriossegundosantesderesponder:

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–Nãosei.–Oquê?Eladeudeombros,numgestodeimpotência.–Eunãomelembro.Jáfaztantotempo...Euapenas...soube.–Então,oqueestádizendo–começouColin,encostando-senopeitorilda

janela e cruzandoos braços – é que se umapessoanão souber que amaoutra,éprovávelquenãoame.–Isso–retrucouela,com irmeza.–Não!Nãofoi issoqueeuquisdizer

dejeitonenhum.–Entãooquequisdizer?–Eunãosei–respondeuela,semmuitaconvicção.Eleafitou.–Eháquantotempoestácasadamesmo?–murmurouele.–Ora,Colin,nãozombedemim,estoutentandoajudar.–Eeuagradeçoatentativa,mas,realmente,Daphne,você...– Eu sei, eu sei – interrompeu ela. – Eu souuma inútil.Mas ouça: você

gosta de Penelope? – Então ela sufocou um grito, horrorizada. – EstamosfalandodePenelope,certo?–Éclaroqueestamos–retrucouele,comimpaciência.Daphnesuspiroualiviada.–Quebom,porque, senão fosse,possogarantirquenão terianenhum

conselhoparalhedar.–Vouembora–anunciouele,deformaabrupta.–Não,nãová–implorouela,colocandoamãosobreoseubraço.–Fique,

Colin,porfavor.Ele olhou para a irmã e suspirou, experimentando uma sensação de

derrota.–Estoumesentindoumidiota.–Colin–disseela,guiando-oatéosofáefazendocomquesesentasse.–

Ouça:oamorcresceemudatodososdias.Nãoécomoumraioquecaidocéuetransformavocênumhomemdiferentedeformainstantânea.Euseique Benedict costuma dizer que foi assim com ele, e isso é encantador,mas,bem,Benedictnãoénormal.Colin teve uma vontade imensa demorder a isca e começar a falar do

irmão,masficouemsilêncio.

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–Nãofoiassimcomigo–completouDaphne–enãoachoquetenhasidocomSimon,emboraeunãomelembredejáterperguntado.–Deviaperguntar.Ela icou boquiaberta por um instante, com os olhos arregalados,

parecendoumpássarosurpreso.–Porquê?Eledeudeombros.–Paramecontar.–Porquê?Vocêachaqueédiferenteparaoshomens?–Assimcomotudo.Elafezumacareta.–EstoucomeçandoaterbastantepenadePenelope.–Bem,achoquevocêdeveriamesmo–retrucouele.–Semdúvidavou

serumpéssimomarido.–Nãovai,não–disseela,dandoumtapaemseubraço.–Porquediabo

haveriadefalarumacoisadessas?Vocênuncaseriainfielaela.– Issoéverdade–concordouele.Ficouemsilêncioporummomentoe,

quandoen imvoltouafalar,avozsaiubaixa:–Mastalveznãoaamecomoelamerece.–Outalvezame.–Elaatirouasmãosparacimanumgestoexasperado.–

PeloamordeDeus,Colin,osimplesfatodevocêestaraquiperguntandoàsuairmã sobreo amorprovavelmente signi icaque já estánametadedocaminho.–Vocêacha?– Se nãoachasse, não teria falado nada – retrucou ela, então deu um

suspiro. – Pare de pensar tanto, Colin. Vai achar o casamento algo bemmaisfácilsedeixarquetudoaconteçanaturalmente.Eleaolhoudesconfiado.–Quandovocêficoutãofilosófica?– No momento em que você apareceu aqui e me forçou a pensar no

assunto – respondeu ela, de imediato. – Vai se casar com a pessoa certa.Paredesepreocupartanto.– Não estou preocupado – disse ele, de forma automática, embora

estivesse, sim, preocupado, então nem tentou contestar quando Daphnelhedirigiuumolharsarcástico.

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Noentanto,suaapreensãonãoerasePenelopeeraamulhercerta.Dissotinhacerteza.Tambémnãoeraemrelaçãoaocasamentoserbomounão.Estavacerto

dequeseria.Não, sua preocupação era ridícula. Estava apreensivo com relação a

amarPenelopeounão,masnãoporque seria o imdomundo se amasse(ounãoamasse),esimporestarmuitoincomodadocomasensaçãodenãosaberexatamenteoqueestavasentindo.–Colin?Ele olhou para a irmã, que o encarava com uma expressão bastante

confusa. Levantou-se, antes que dissesse algo tão embaraçoso que lhecausassearrependimento,entãoseabaixoueabeijounorosto.–Obrigado–falou.Elaestreitouosolhos.–Nãoseiseestáfalandosérioouseestázombandodemimportersido

inútil.– Você foicompletamente inútil – concordou ele –,mas ainda assim foi

umagradecimentosincero.–Peloesforço?–Podemosdizerquesim.–VaiàCasaBridgerton?–Paraquê?FicarenvergonhadonafrentedeAnthonytambém?–OudeBenedict.Eletambémestálá.Oproblemadasfamíliasgrandeseraquenuncafaltavamoportunidades

parafazerpapeldetolonafrentedeumirmão.–Não – retrucou ele, comum sorriso irônico –, acho que vou andando

paracasa.–Andando?–ecoouela,surpresa.Eleolhouemdireçãoàjanela.–Achaquevaichover?– Pegue aminha carruagem, Colin, e, por favor, espere os sanduíches.

Comcertezavaihaverumamontanhadeles.Sevocê foremboraantesdechegarem,acabareicomendometadeedepoisvoumeodiarpelorestododia.Ele assentiu e se sentou outra vez. Foi amelhor coisa que fez. Sempre

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adorara salmão defumado. Na verdade, levou um prato consigo nacarruagem para comer no caminho até sua casa, debaixo da chuvatorrencial.

QuandoosBridgertonsofereciamumafesta,faziam-noemgrandeestilo.E quando ofereciam um baile de noivado... Bem, se LadyWhistledown

aindaestivessenaativa,terialevadonomínimotrêscolunasparanarraroevento.Até mesmo aquele baile de noivado, planejado às pressas (nem Lady

BridgertonnemLadyFeatheringtonestavamdispostasacorreroriscodequeos ilhosmudassemdeideiaapósumlongonoivado),podiafacilmenteserclassificadocomoobailedatemporada.Embora parte disso, pensou Penelope, sombria mas irônica, tivesse

poucoavercomafestaemsie tudoavercomaespeculaçãodeporquediaboColinBridgertonescolheraumaninguémcomoelaparadesposar.Osrumores não foram tão graves nemquandoAnthony se casara comKateShef ield,que,assimcomoPenelope,jamaisforaconsideradaumdiamantede primeira grandeza. Mas ao menos Kate não fora considerada velha.Penelopenãotinha ideiadequantasvezesouviraapalavra solteirona sersussurradaàssuascostasnosúltimosdias.Mas, embora os mexericos fossem um tanto entediantes, não a

incomodavam,porqueelacontinuavanavegandoemummardefelicidade.Era impossível para umamulher não icar completamente boba de tantaalegriadepoisqueohomemporquempassaraavidainteiraapaixonadaatinhapedidoemcasamento.Ainda que ela não conseguisse compreender exatamentecomo tudo

aquilotinhaacontecido.Bem,oimportanteéquetinhaacontecido.Colin era tudo o que qualquer pessoa podia sonhar numnoivo. Passou

quaseanoiteinteiraaseulado,ePenelopenemteveaimpressãodequeoizera para protegê-la dos boatos. Na verdade, ele parecia ignorar porcompletotodoofalatório.Eraquasecomose...Penelopesorriu.EraquasecomoseColinestivesse

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aoseuladoporquequeria.– Você viu Cressida Twombley? – sussurrou Eloise em seu ouvido

enquantoColindançavacomamãe.–Estáverdedeinveja.– É só o vestido dela – retrucou Penelope com impressionante

impassibilidade.Eloiseriu.–Ah,comoeuqueriaqueLadyWhistledownestivessenaativa.Iaacabar

comela.–AcheiqueelafosseLadyWhistledown–dissePenelope,comcautela.–Ora,masquebesteira.NãoacreditonemporuminstantequeCressida

sejaLadyWhistledown,etampoucoacreditoquevocêacheisso.–É,temrazão–concordouPenelope.Sabiaqueseusegredo icariamaisbemprotegidosea irmasseacreditar

nahistóriadeCressida,masqualquerumque a conhecesse considerariaissotãosemsentidoquepareceriasuspeitodemais.– Cressida só queria o dinheiro – continuou Eloise, com desdém. – Ou,

talvez,anotoriedade.Provavelmente,osdois.Penelope observou a inimiga sendo paparicada pelos súditos do outro

lado do salão. Seus seguidores de sempre se amontoavam a seu redor,juntocompessoasnovas,quedeviamestarcuriosassobreoboatodeLadyWhistledown.–Bem,pelomenosnotoriedadeelaconseguiu.Eloiseassentiu.–Nãoconsigonemimaginarporquefoiconvidada.Comcertezanãohá

nenhumlaçoentrevocêduasenenhumdenósgostadela.–Colininsistiu.Eloisesevirouparaela,boquiaberta.–Porquê?Penelopesuspeitavaqueoprincipalmotivofosseaa irmaçãorecentede

Cressida de que era LadyWhistledown; a maioria dos membros da altasociedade não sabia ao certo se ela estava mentindo, mas ninguém sedispunha a lhe negar um convite para um evento, caso tivesse dito averdade.E Colin e Penelope teoricamente não tinhammotivo algum para saber

comcerteza.

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Noentanto,Penelopenãopodiarevelar issoaEloise,entãolhecontouorestodahistória,quecontinuavasendoverdade:– Suamãenãoqueriadarmargemanenhum tipodeboato cortando-a

dalista,eColintambémdisse...Elaruborizou.Narealidade,tinhasidomuitagentildapartedele.–Oquê?–quissaberEloise.Penelopenãoconseguiufalarsemsorrir:–EledissequequeriaqueCressidafosseforçadaameassistiremmeu

momentodetriunfo.–Ah.Meu.Deus.–Eloisedeuaimpressãodequeprecisavasesentar.–

Meuirmãoestáapaixonado.OrubordePenelopeaumentouaindamais.–Está – exclamou Eloise. – Só pode. Ah, você tem deme contar. Ele já

falou?Havia algo maravilhoso e terrível em ouvir Eloise se entusiasmar

daquele jeito. Por um lado, era sempre ótimo compartilhar osmomentosmais perfeitos da vida com a melhor amiga, e a alegria e animação deEloiseeramcontagiantes.Mas, por outro lado, não eram necessariamente justi icadas, pois Colin

nãoaamava.Ou,pelomenos,nãoodissera.No entanto, agia como se a amasse! Penelope se agarrava a esse

pensamento, tentandose concentrarneleemvezdeno fatodeelenuncaterpronunciadoaquelaspalavras.Açõeserammaisimportantesdoquepalavras,certo?Easaçõesdeleafaziamsesentircomoumaprincesa.–Srta.Featherington!Srta.Featherington!Penelope olhou para a esquerda e icou exultante. A voz que tinha

ouvidosópodiaserdeLadyDanbury.– Srta. Featherington – repetiu a velha senhora, enquanto cutucava as

pessoascomabengalaatéconseguirpassarpelamultidãoeestarbemnafrentedePenelopeedeEloise.–LadyDanbury,queprazeremvê-la.–He,he,he.–OrostodeLadyDanbury icouquasejovemdevidoàforça

deseusorriso.–Ésempreumprazermever,nãoimportaoqueasoutraspessoasdigam.Evocê,suadiabinha?Vejasóoquevocêfez.

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–Nãoéomáximo?–comentouEloise.Penelope olhou para a melhor amiga. Mesmo com toda a confusão de

emoções que expressara, Eloise estava sinceramente feliz por ela. Desúbito, o fato de estarem nomeio de um salão de baile abarrotado, comtodos a olhá-la como se ela fosse algum espécime num experimento debiologia,nãotevemaisimportância.ElasevirouedeuumabraçoapertadoemEloise,sussurrando:–Euaamomuito.–Euseiqueama–murmurouEloise.LadyDanburybateucomabengalacomforçanochão.–Aindaestouaqui,senhoras.–Ah,desculpe–dissePenelope,envergonhada.– Não há problema – retrucou Lady Danbury, com um atípico grau de

paciência. – Se querem saber, é muito agradável estar diante de duasmoçasquepreferemseabraçaraseesfaquearnascostas.–Obrigadaporviratéaquimedarosparabéns–falouPenelope.– Eu não teria perdido isto por nada neste mundo – comentou Lady

Danbury. –He,he,he.Estebandode tolos tentandodescobrir comovocêconseguiuqueeleapedisseemcasamentoquandoaúnicacoisaquefezfoiservocêmesma.Penelopeentreabriuoslábioseaslágrimasarderamemseusolhos.–Ora,LadyDanbury,deveseracoisamaisgentil...– Não, não – interrompeu a velha senhora, em voz bem alta. – Nada

disso.Nãotenhotempoouinclinaçãoparasentimentalismo.Mas Penelope notou que ela sacara o lenço e secava os olhos

discretamente.– Ah, Lady Danbury – disse Colin, retornando ao grupo e passando o

braçopelodePenelopenumgestodepossessividade.–Queprazeremvê-la.–Sr.Bridgerton–retrucouela,numbrevecumprimento.–Sóvimdaros

parabénsàsuanoiva.–Ah,massemdúvidaquemmereceosparabénssoueu.–Hum,sábiaspalavras–elogiouLadyD.–Achoquetemrazão.Elaéum

prêmiomuitomelhordoquetodospercebem.–Eupercebo – retrucou ele, numa voz tão grave e séria quePenelope

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achou que poderia desmaiar de emoção. – Agora, com sua licença –acrescentou, com educação –, preciso apresentar minha noiva a meuirmão...–Eujáconheçoseuirmão–interrompeuPenelope.– Considere isto uma tradição – explicou ele. – Temos de dar as boas-

vindasoficiaisavocênafamília.– Ah. – Ela icou emocionada diante da ideia de se tornar uma

Bridgerton.–Queencantador.–Comoeuiadizendo–continuouColin–,Anthonygostariadefazerum

brindee,emseguida,eudançareiumavalsacomPenelope.–Muitoromântico–observouLadyDanbury,emtomdeaprovação.–É,bem,eusouromântico–concordouColin.Eloisedeixouescaparumresfolegaralto.Ele se virou para ela com uma sobrancelha arqueada de forma

arrogante.–Maseusou.– Pelo bem de Penelope – replicou sua irmã –, eu espero que seja

mesmo.–Elessãosempreassim?–indagouLadyDanburyaPenelope.–Namaiorpartedotempo.Avelhasenhoraassentiu.– Que bom.Meus ilhos quase nunca se falam. Não pormá vontade, é

claro,maspornãoteremnadaemcomum.Étriste,naverdade.ColindeuumpequenoapertãonobraçodePenelope.–Realmentetemosdeir.–Éclaro–murmurouela.Mas, ao se virar para caminhar em direção a Anthony, que estava do

outro lado do salão, parado próximo à pequena orquestra, ouviu umtumultoàporta.–Atenção!Atenção!Osanguefugiu-lhedorostoemmenosdeumsegundo.–Ah,não–sussurrou.Aquilonãodeviaacontecer.Nãonaquelanoite,pelomenos.Segunda-feira, sua mente gritou. Ela pedira ao tipógrafo na segunda-

feira.NobailedosMottram.

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–Oqueestáacontecendo?–quissaberLadyDanbury.Dezmeninoscorreramsalãoadentro–nãoerammaisdoquemoleques,

na verdade – carregando maços de papéis e atirando-os para todos osladoscomoimensosconfetesretangulares.–AúltimacolunadeLadyWhistledown!–gritarameles.–Leiamagora!

Leiamaverdade.

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CAPÍTULO17

ColinBridgertonerafamosopormuitascoisas.Primeiropelabeleza,oquenãoera surpresaalguma: todososhomens

dafamíliaBridgertoneramfamososporisso.Era conhecido também pelo sorriso enviesado, capaz de derreter o

coraçãodeumamulherdooutro ladodeum salãodebaile abarrotado eque, certavez,de fato, levarauma jovemadesmaiarecairduranochão.Naverdade,a izera icartontae,então,batercomacabeçanumamesa,oqueacaboutendocomoconsequênciaodesmaio.Era famoso, além disso, por seu temperamento tranquilo, pela

capacidadededeixarqualquerpessoaàvontadecomumsorrisoafáveleumcomentáriodivertido.Elenão era famoso por ser genioso – na realidade, muita gente teria

juradoqueissoeramentira.E naquela noite, devido ao seu notável (e, até então, inexplorado)

autocontrole,ninguémhaveriadeconheceressasuacaracterística,emborasua futura esposa talvez acordasse no dia seguinte com um sériohematoma.–Colin–arfouela,olhandoparaolocalemqueeleseguravaoseubraço.Mas ele não conseguia soltá-lo. Sabia que amachucara,mas estava tão

furioso com ela naquele momento que, se não apertasse seu braço comtodaaforça,perderiaacomposturanafrentedequinhentosdosseusmaispróximosequeridosconhecidos.Nofimdascontas,acreditavaestarfazendoaescolhacerta.Iria matá-la. Assim que descobrisse alguma forma de tirá-la daquele

malditosalãodebaileiria,simplesmente,matá-la.HaviamconcordadoqueLadyWhistledownpertenciaaopassado,quedeixariamoassuntomorrer.Não era para aquilo acontecer. Ela estava abrindo as portas para odesastre.Paraaruína.– Isto é fabuloso! – exclamou Eloise, agarrando um jornal no ar. –

Sensacional! Aposto que ela deixou a aposentadoria de lado só para

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comemoraroseunoivado.–Nãoseriasimpático?–comentouColin.Penelopenãorespondeu,masestavamuito,muitopálida.–Ah,meuDeus!Colin se virou para a irmã, que icava cada vez mais boquiaberta

enquantoliaacoluna.– Pegue um desses para mim, Bridgerton! – ordenou Lady Danbury,

batendo na perna dele com a bengala. – Não acredito que ela tenhapublicadonumsábado.Essacolunadeveestarótima.Colin se abaixou e apanhoudois jornais do chão. Em seguida, entregou

umaLadyDanbury e baixou a vistapara o que ainda segurava, emborativessequasecertezadoqueleria.Estavacerto.Não há nada que eu odeie mais do que um cavalheiro que achadivertido dar um tapinha condescendente na mão de uma senhoraenquantomurmura“Umamulhertemodireitodemudardeideia”.E,de fato, como acredito que devemos respaldar nossas palavras comações,meempenhoparamanterminhasopiniões edecisões irmeseverdadeiras.É por isso, caro leitor, que, quando escreviminha colunade 19de

abril, realmente tinhaa intençãodeque fosseaúltima.No entanto,acontecimentos fora de meu controle (ou, na verdade, que nãocontam com aminha aprovação)me forçaram a levar a caneta aopapelumaúltimavez.Senhorasesenhores,estaautora NÃOÉLadyCressidaTwombley.Ela

nadamaisédoqueumaimpostoraintrigueira,emeucoração icariapartido ao ver anos do trabalho árduo serem atribuídos a alguémcomoela.

C

– Esta é a melhor coisa que eu já vi – exclamou Eloise, num sussurroalegre. – Talvez eu seja, no fundo, uma pessoa ruim, porque nunca mesentitãofelizdiantedaruínadealguém.

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–Bobagem!–retrucouLadyDanbury.–Eu seiquenãosouumapessoaruimeacheiistodelicioso.Colin icouemsilêncio.Nãocon iavanaprópriavoz.Nãocon iavaemsi

mesmo.–OndeestáCressida?–perguntouEloise,esticandoopescoço.–Alguém

consegue vê-la? Aposto que já fugiu. Deve estar morta de vergonha. Euestaria,sefosseela.–Vocêjamaisseriaela–comentouLadyDanbury.–Édecentedemais.Penelopenãodissenada.–Aindaassim–acrescentouEloise,emtomjovial–,quasedáparasentir

penadela.–Massóquase–completouLadyDanbury.–Ah,sim.Umquasebempequenininho.Colinselimitouaficaralirangendoosdentes.– E eu posso icar com as minhas mil libras! – comemorou Lady

Danbury.–Penelope!–exclamouEloise,cutucando-acomocotovelo.–Vocêainda

nãodisseumapalavra.Nãoémaravilhoso?Penelopefezquesimerespondeu:–Nemacredito.Colinapertouoseubraçoaindamais.–Lávemoseuirmão–sussurrouela.Eleolhouparaadireita.AnthonycaminhavaemsuadireçãocomViolete

Katelogoatrásdesi.–Bem,issocertamentenosdeixaemsegundoplano–disseele,parando

ao lado de Colin. Cumprimentou as senhoras comum aceno da cabeça. –Eloise,Penelope,LadyDanbury.–AchoqueninguémvaiescutarobrindedeAnthonyagora–comentou

Violet,olhandoemvolta.Oburburinhoera incessante.Aspessoasescorregavamnos jornaisque

haviam aterrissado no chão sem ninguém tê-los pegado. O falatório eraquaseirritante,eColintinhaasensaçãodequesuacabeçairiaexplodir.Tinhadeescapardaliomaisrápidopossível.Sentia o corpo inteiro arder. Parecia paixão,mas na verdade era fúria,

ultraje, um sentimentohorrível por ter sido traídopela únicapessoaque

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deveriaterficadoaoseuladosemperguntas.Eraestranho.SabiaqueosegredoeradePenelope,equeeraelaquem

mais tinha a perder. Aquilo tinha a ver comela, não comele. Sabia dissoracionalmente, pelo menos. Mas, de alguma forma, isso deixara de terimportância.Agoraosdoisformavamumtime,eelahaviaagidosemele.Não tinha o menor direito de se colocar em posição tão delicada sem

consultá-loprimeiro.Colineraseumarido,ouiaser,etinhaodeverdivinodeprotegê-la,querelaodesejasseounão.– Colin? – ouviu a mãe dizer. – Você está bem? Parece um pouco

estranho.– Faça o brinde – pediu ele, virando-se para Anthony. – Penelope não

estásesentindobemeeuprecisolevá-laparacasa.–Vocênãoestásesentindobem?–perguntouEloiseaPenelope.–Oque

há?Porquenãocomentounada?Elaconseguiupronunciarumadesculpabastanteverossímil:–Umpoucodedordecabeça,eusintodizer.– Isso, isso, Anthony – concordou Violet. – Vá em frente, faça o brinde

paraqueColinePenelopepossamdançar logoavalsa.Elarealmentenãopodeiremboraantesdisso.Anthony assentiu, então fez um gesto para que o irmão e a futura

cunhadaoseguissematéafrentedosalãodebaile.Umtrompetistafezumguincho agudo com o instrumento, sinalizando para que os convidadosizessem silêncio. Todos obedeceram, talvez por achar que a declaraçãoseriasobreLadyWhistledown.–Senhorasesenhores–começouAnthony,bemalto,pegandoumataça

dechampanhedabandejadeumcriado.–Compreendoquetodosestejamintrigados com a mais recente intrusão de Lady Whistledown em nossafesta,maspeçoque se lembremdoquenos levouanos reunir aqui estanoite.Eraparaserummomentoperfeito,pensouColin.Eraparaseranoitede

triunfodePenelope,asuanoiteparabrilhar,paramostraraomundoquãolinda,encantadoraeinteligenteera.Devia ser a noite dele também, o momento de tornar suas intenções

verdadeiramente públicas, de dizer a todos que a escolhera e, tãoimportantequanto,queelaoescolhera.

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No entanto, a única coisa que ele queria naquelemomento era pegá-lapelos ombros e chacoalhá-la até não termais força. Ela estava colocandotudoemrisco.Estavacolocandooprópriofuturoemrisco.– Como o chefe da família Bridgerton – continuou Anthony –, sinto

grandealegriaquandoumdemeusirmãosescolheumanoiva.Ounoivo–acrescentoucomumsorriso,fazendoumsinalcomacabeçanadireçãodeDaphneeSimon.Colin olhou para Penelope. Ela estava parada com a colunamuito reta,

em seu vestido de cetim azul. Não sorria, o que deve ter parecidomuitoestranho às centenas de convidados que a itavam. Mas, talvez, apenasachassem que era nervosismo. A inal, qualquer pessoa estaria nervosacomtantagenteaencarando.Se qualquer um estivesse de pé bem ao lado dela, porém, como Colin

estava, veria o pânico em seus olhos, o peito subindo e descendo rápidoenquantoarespiraçãosetornavamaisaceleradaeentrecortada.Elaestavacommedo.Ótimo. Devia mesmo estar com medo. Com medo do que poderia

acontecer com ela se seu segredo fosse revelado. Commedo do que iriaacontecerassimqueelaeColintivessemaoportunidadedeconversar.–Assim,écomgrandeprazerqueergominhataçaaomeuirmãoColine

suafuturaesposa,PenelopeFeatherington.AColinePenelope!–concluiuAnthony.Colinbaixouosolhosparaaprópriamãoesedeucontadequealguém

colocaraumataçadechampanhenela.Ergueu-anadireçãodoslábios,maspensoumelhore,emvezdisso,levou-aaoslábiosdePenelope.Amultidãogritou alucinada e então ele a observou tomar um gole, depois outro, emseguidaoutro,sendo forçadaacontinuarbebendoatéqueeleafastasseataçadesuaboca,oquesófezquandoelaterminou.Quando Colin se deu conta de que aquela exibição infantil de poder o

deixarasembebida,daqualprecisavadesesperadamente,pegouataçadePenelopedesuamãoeavirounumúnicogole.Amultidãogritouaindamaisalto.Eleseabaixouesussurrouemseuouvido:–Agoravamosdançaratéorestodosconvidadosse juntaranósenão

sermosmaisocentrodasatenções.Então,vamos lápara fora.Eaívamos

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conversar.Penelopemoveuoqueixodeformaquaseimperceptívelparaassentir.Colin pegou amão dela e a conduziu até a pista de dança, colocando a

outra mão em sua cintura enquanto a orquestra começava a tocar osprimeirosacordesdeumavalsa.–Colin–sussurrouela.–Nãofoiminhaintençãoqueissoacontecesse.Ele deu um sorriso forçado. A inal, aquela era a primeira dança o icial

comsuaprometida.–Agoranão–ordenou.–Mas...– Daqui a dezminutos, eu terei muitas coisas para lhe dizer, mas por

enquantovamosapenasdançar.–Eusóqueriadizer...Eleapertouaindamaisamãodela,num inquestionávelaviso.Penelope

franziuoslábiose itouorostodeleporumbreveinstante,entãoafastouoolhar.–Eudeveriaestarsorrindo–sussurrou.–Entãofaçaisso.–Vocêdeveriaestarsorrindo.–Temrazão–disseele.–Deveria.Maselenãosorriu.Penelope teve vontade de chorar, mas de alguma forma conseguiu se

manterimpassível.Omundointeiroestavaolhando–omundointeirodela,pelomenos–,eelasabiaque todosexaminavamcadaumdeseusgestos,atentosacadaexpressãoqueseurostoassumia.Ela passara anos tendo a sensação de ser invisível e odiando aquilo.

Agora,dariaqualquercoisaporalgunsinstantesdeanonimatooutravez.Não,nãoqualquercoisa.Não teriaabertomãodeColin.Se tê-loparasi

signi icavapassarorestodavidasoboescrutíniodaaltasociedade,entãotudobem.E,sefaziapartedocasamentoterdetolerarasuaraivaeoseudesdémnummomentocomoaquele,tudobemtambém.Sabia que ele icaria furioso com ela por publicar uma última coluna.

Estivera apavorada durante todo o tempo que passara na igreja de St.Bride (assim comodurante a viagemde ida e de volta), certa de que eleapareceria diante dela a qualquer instante cancelando o casamento

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porque não podia tolerar a ideia de se casar com uma pessoa que todossaberiamserLadyWhistledown.MasPenelopeforaemfrenteaindaassim.Tinhaconsciênciadequeeleachavaqueelaestavacometendoumerro,

mas simplesmente não podia permitir que Cressida Twombley levasse ocrédito pela obra de sua vida. Seria pedir muito que Colin ao menostentasse enxergar a situação de seu ponto de vista? Teria sido bastantedi ícil deixar que qualquer pessoa ingisse ser Lady Whistledown, masCressidaera insuportável.Penelopeaguentaradesaforosdemaisdapartedela.Além disso, sabia que Colin jamais romperia o noivado quando este se

tornassepúblico.Essaerapartedarazãopelaqualelainstruíraotipógrafoadistribuiros jornaisnasegunda-feira,nobailedosMottrams.Bem,issoeo fato de lhe parecer muito errado fazê-lo durante o próprio baile denoivado,sobretudoquandoColintinhaseopostodeformatãoveementeàideia.Maldito Sr. Lacey! Sem dúvida ele izera aquilo para maximizar a

circulaçãoeaexposição.AprenderabastantesobreaaltasociedadelendooWhistledownparasaberqueobailedenoivadodeumBridgertonseriaoevento mais cobiçado da temporada. Por que aquilo seria importante,Penelope não sabia, já que o interesse pelo jornal não signi icaria maisdinheiro em seu bolso. A coluna estava terminada de verdade, e nemPenelope nem o Sr. Lacey receberiam um único centavo pela suapublicação.Anãoser...Penelopefranziuatestaedeixouescaparumsuspiro.OSr.Laceydevia

teresperançadequeelamudassedeideia.SentiuamãodeColinapertaraindamaisasuacinturaeergueuavista

outravez.Eleaencaroucomosolhossurpreendentementeverdesmesmoà luz de velas. Ou talvez fosse o fato de ela saber que eram tão verdes.Deviaterpensadoquenapenumbraelesseriamcordeesmeralda.Ele fez um gesto na direção dos outros convidados na pista de dança,

agorarepleta.–Horadefugirmos–disseele.Penelope assentiu. Já haviam dito à família dele que ela não se sentia

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bem e que queria ir para casa, então ninguém descon iaria por terempartidotãocedo.E,emboranãofosseexatamenteaconselhávelqueosdoisicassem sozinhos na carruagem dele, às vezes as regras eram maislexíveis quando se tratava de casais já noivos, sobretudo em noites tãoromânticas.Ela deixou escapar uma risada ridícula e cheia de pânico. A noite ia

acabarporseramenosromânticadetodaasuavida.Colin olhou para ela com uma sobrancelha erguida em uma expressão

dedúvida.–Nãoénada–dissePenelope.Eleapertouasuamão,emboradeformanadaafetuosa.–Euquerosaber–falou.Ela deu de ombros, resignada. Não havia nada que pudesse fazer ou

dizerquetornasseanoitepior.–Sóestavapensandoqueeraparatersidoumanoiteromântica.–Podiatersido–disseele,cruelmente.Ele soltou a cintura dela, mas continuou segurando a outra mão,

tomando-lhe os dedos com delicadeza de forma a avançar com ela porentre a multidão até atravessarem as portas francesas que levavam aoterraço.–Aqui,não–sussurrouPenelope,olhandocomansiedadeemdireçãoao

salãodebaile.Elenemsedeuo trabalhoderesponder,epuxou-acadavezmaispara

dentrodaescuridão.Depoisdeumrápidoolharparasecerti icardequenão havia ninguém por perto, Colin abriu uma pequena e discreta portalateral.–Oqueéisto?–perguntouPenelope.Ele continuou em silêncio, limitando-se a conduzi-la para o interior do

corredorescuro.–Suba–faloufinalmente,indicando-lheosdegraus.Penelopenãosabiasedevia icarassustadaouentusiasmada,massubiu

as escadas ainda assim, ciente da impetuosa presença de Colin às suascostas.Depoisdevárioslanços,elepassouàsuafrente,abriuumaportaeolhou

paradentrodocorredorquelevavaaosaposentosparticularesdafamília,

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comoagoraPenelopesedavaconta.Estavavazio,entãoeleapuxouatrásdesiatéchegaremaumquartoondeelajamaisentrara.Oquartodele.Penelope sempre souberaonde icava.Durante todosos

anosemquevisitaraEloise,nunca izeramaisdoquecorrerosdedospelamadeira pesada da porta. Já fazia anos que Colin semudara,mas amãeinsistiraemmanteroquarto.SegundoViolet,nuncasesabiaquandoofilhopoderia precisar dele, e ela provara ter razão no começo daquelatemporada,quandoColinvoltaradoChipresemterumacasaalugada.Ele abriu a porta com um empurrão e a puxou para dentro depois de

entrar.Oquartoestavaescuroeelanãoviaporondeandava,atéquederepentepercebeuqueeleseencontravabemàsuafrenteeparou.Colin tocou os seus braços para ajudá-la a irmar o corpo. Em seguida,

em vez de soltá-la, a abraçou no escuro. Na verdade, não foi exatamenteum abraço, mas o corpo dele estava encostado por inteiro no dela.Penelope não via nada,mas podia senti-lo, assim como a seu perfume, eouvirasuarespiraçãoacariciando-lheafacedeleve.Eraagonia.Eraêxtase.Colin deslizou asmãos devagar pelos seus braços nus, provocando-a, e

então,derepente,seafastou.Emseguida...silêncio.Penelope não soube ao certo o que esperar. Que ele gritasse com ela,

quearepreendesse,queamandasseseexplicar.Maselenãofeznadadisso.Só icoualiempé,noescuro,forçando-a,com

seusilêncio,adizeralgumacoisa.–Vocêpoderia...poderiaacenderumavela?–pediuela,porfim.– Não gosta da escuridão? – perguntou ele, demorando-se em casa

sílaba.–Nãoagora.Nãodestaforma.– Compreendo – murmurou ele. – Está dizendo, então, que talvez

gostassesefosseassim?De repente os dedos dele estavam sobre a sua pele, percorrendo a

beiradadocorpete.Nomomentoseguinte,nãoestavammais.–Nãofaçaisso–pediuela,comavoztrêmula.

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– Não quer que eu a toque? – A voz dele era zombeteira, e Penelopeficousatisfeitapornãopoderverseurosto.–Masvocêéminha,nãoé?–Aindanão.–Ah,é,sim.Vocêsecerti icoudisso.Otimingfoibastanteinteligente,na

verdade. Esperar até o nosso baile de noivado para fazer o seucomunicado inal. Você sabia que eu não queria que publicasse aquelaúltimacoluna.Euproibi!Nósconcordamos...–Nósnuncaconcordamos!Eleignorouaexplosãodela.–Vocêesperouaté...– Nós nunca concordamos! – bradou Penelope outra vez, precisando

deixarclaroquejamaisvoltaraatrásnasuapalavra.Nãoimportavaoquetivessefeito,elanãomentiraparaele.Bem,eraverdadequetinhamantidooWhistledown em segredo por mais de dez anos, mas sem dúvida Colinnãoforaoúnicoaserenganadonessafarsa.–E,sim–admitiuela,porquenão lhe pareceu certo começar amentir agora. – Eu sabia que você nãoterminariaonoivado.Maseuesperava...Avozficouembargadaeelanãoconseguiuprosseguir.–Esperavaoquê?–indagouColin.– Que você me perdoasse – sussurrou ela. – Ou, ao menos, que

compreendesse.Sempreacheiquefosseotipodehomemque...–Quetipodehomem?–perguntouele.– A culpa foiminha, na verdade – disse ela, soando cansada e triste. –

Coloquei-o num pedestal. Sempre foi tão bondoso durante todos essesanos...Achoqueeuoimaginavaincapazdeagirdeoutraforma.– E que diabo eu iz que não tenha sido bondoso? – exigiu ele. – Eu a

protegi,pediasuamãoemcasamento,eu...– Você não tentou enxergar a situação do meu ponto de vista –

interrompeuela.– Porque você está agindo como uma idiota! – exclamou ele, quase

rugindo.Fez-sesilênciodepoisdisso,o tipodesilêncioque irritaosouvidos,que

corróiaalma.–Não consigo imaginaroquemaispossa serdito– retrucouPenelope,

finalmente.

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Colindesviouoolhar,semsaberporquê–nãoconseguiaenxergá-lanoescuro, de qualquer forma. Mas havia algo no tom de voz dela que oinquietava.Soavavulnerável,cansada.Desejosaedecoraçãopartido.Faziacom que ele quisesse compreendê-la, ou que aomenos tentasse, emborasoubesse que ela cometera um erro terrível. Cada vez que a voz delaembargava,a fúriadelesedissipavamaisumpouco.Continuavazangado,mas,dealgumaforma,perderaoímpetodedemonstrá-lo.–Vocêvaiserdescoberta,sabia?–falou,comavozbaixaecontrolada.–

Humilhou Cressida, e sem dúvida ela está furiosa neste momento. NãosossegaráatédesmascararaverdadeiraLadyWhistledown.Penelopeseafastou;eleouviuofarfalhardeseuvestido.– Cressida não é inteligente o su iciente para me descobrir. Além do

mais, não vou escrever nenhuma outra coluna, então não haverá outraoportunidadede cometeralgumerroe revelaralgumacoisa. –Depoisdeuminstanteemsilêncio,elaacrescentou:–Eulheprometoisso.–Étardedemais–disseele.–Nãoé tarde–protestouela. –Ninguémsabe!Ninguémalémdevocê,

quetemtantavergonhademimqueeunãoconsigosuportar.–Ora,peloamordeDeus,Penelope.Nãosintovergonhaalgumadevocê.–Poderiaacenderumavela,porfavor?Colin atravessou o quarto e tateou dentro de uma gaveta em busca de

umavela.– Eu não sinto vergonha de você – reiterou –,mas acho, sim, que está

agindocomoumatola.–Talvezvocêtenharazão,masprecisofazeroqueachocerto.– Você não está pensando direito – disse ele, ignorando o argumento

dela.Entãosevirouparaolhá-laenquantoacendiaumavela.–Esqueça,sepuder, embora eunão consiga, o que acontecerá coma sua reputação sedescobrirem sua outra identidade. Esqueça que as pessoas a destruirão,quefalarãomaldevocêpelascostas.– Não vale a pena se preocupar com gente assim – retrucou Penelope

comascostascompletamenteeretas.– Talvez não – concedeu ele, cruzando os braços e a itando. – Mas

haverádedoer.Vocênãovaigostar,Penelope.Eeutambémnãovou.Ela começou a engolir em seco sem parar. Ótimo. Talvez aquilo tudo

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estivessecomeçandoaentraremsuacabeça.–Masesqueçaissotudo–continuouele.–Vocêpassouaúltimadécada

insultandoaspessoas.Ofendendo-as.–Euescrevimuitascoisasagradáveis, também–protestouela,osolhos

escurosbrilhandocomlágrimasnãovertidas.–Sim,masnãosãoessasaspessoascomasquaisterádesepreocupar.

Estou falandodasqueestão furiosas,dasque foram insultadas.–Eledeuum passo à frente e a segurou pelos braços. – Penelope, haverá gentedesejandomachucá-la.Aspalavraseramparaela,masacabaramferindoocoraçãodele.Colintentouimaginaravidasemela.Eraimpossível.Apenas algumas semanas antes ela fora... O quê? Uma amiga? Uma

conhecida?Alguémqueelevia,masquenuncanotaradeverdade?E,agora,erasuanoiva.Embreveseriasuaesposa.Talvez... talvez fosse

algomaisdoqueisso.Algomaisprofundo.Algoaindamaisprecioso.–Oqueeuquerosaber–recomeçouele,forçando-seaseconcentrarno

temaprincipaldemodoqueaprópriamentenãodivagasseporcaminhostãoperigosos–éporquevocênãoaproveitouoálibiperfeitoseoobjetivoépermaneceranônima.–Porqueo objetivonão é permanecer anônima! – exclamou ela, quase

gritando.–Vocêquerserdescoberta?–indagouele,perplexo.–Não,éclaroquenão–respondeuela.–Masesseéomeutrabalho.Éa

obradaminhavida.Éoquetenhocomosímbolodetodaumaexistência,esenãopossolevarocréditoporisso,ninguémmaisvai.Colinabriuabocapararetrucar,mas,paraaprópriasurpresa,nãotinha

nadaadizer.Obradaminhavida.Penelopetinhaumaobra.Ele,não.Talvez ela não pudesse assinar a obra, mas, sozinha em seu quarto,

podiaolharosexemplaresantigosdojornal,apontarparaelesedizerasimesma:Éisto.Éassimquetemsidoaminhavida.–Colin?–sussurrouela,claramentealarmadacomosilênciodele.Ela eramaravilhosa. Ele não sabia comonãohavia se dado conta disso

antes, quando já sabia que era inteligente, encantadora, espirituosa etalentosa.Mas todosessesadjetivos, assimcomoummontedeoutrosnos

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quais ainda nemhavia pensado, não davama verdadeiramedida do queelaera.Eramaravilhosa.Eeleestava...PorDeus,estavacominvejadela.– Vou embora – disse Penelope, baixinho, virando-se e se dirigindo à

porta.Poruminstante,elenãoreagiu.Amentecontinuavagirandoemmeioa

tantasrevelações.Mas,quandoviuamãodelanamaçaneta,soubequenãopodiadeixá-lapartir.Nãonaquelanoite,nememnenhumaoutra.– Não – pediu, com a voz rouca, aproximando-se dela em três passos

largos.–Não–repetiu.–Queroquefique.Elaergueuavistaparaolhá-lo,confusa.–Masvocêdisse...Eletomouoseurostoternamentenasmãos.–Esqueçaoqueeudisse.EfoientãoqueelesedeucontadequeDaphneestavacerta.Oseuamor

nãotinhasidocomoumraiocaídodocéu.Começaracomumsorriso,comuma palavra, com um olhar zombeteiro. A cada segundo que passara nacompanhiadela,cresceraatéchegaremàquelemomento,ederepenteelesoube.Eleaamava.Ainda estava furioso com ela por ter publicado aquela última coluna e

tinhavergonhadesimesmoporestarcominvejadelaporterencontradosuaobraeseuobjetivodevida,mas,mesmocomtudoisso,eleaamava.Eseadeixassepassarporaquelaporta,jamaisseperdoaria.Talvez aquilo fosse a de inição do amor, a inal. Querer uma pessoa,

precisar dela e a adorar até mesmo nos momentos de fúria, quando setinhavontadedeamarrá-laàcamasóparaqueelanãosaísseecausasseaindamaisproblemas.Aquelaeraanoite.Aqueleeraomomento.Eletransbordavadeemoção

etinhadelhedizerisso.Tinhadelhemostrarisso.– Fique – sussurrou, puxando-a para si com força, faminto, sem

desculpasouexplicações.–Fique–repetiu,conduzindo-aatéacama.Ecomoelanãorespondeu,elepediupelaterceiravez:–Fique.

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ElaassentiueColinatomounosbraços.AquelaeraPenelope,aqueleeraoseuamor.

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CAPÍTULO18

NomomentoemquePenelopeassentiu–uminstanteantes,naverdade–,teveconsciênciadequeconcordaracommaisdoqueumbeijo.Nãosabiaaocertooque izeraColinmudardeideia,porquenumminutoestavatãofuriosocomelaenoseguinte,tãocarinhosoeterno.Nãosabiaaocerto,masaverdadeeraquenãoprecisavasaber.Deumacoisatinhacerteza:elenãoestavabeijando-acomtantadoçura

para castigá-la. Alguns homens até podiam usar o desejo como arma, atentaçãocomovingança,masColinnãoeraumdeles.Simplesmentenãofaziapartedesuapersonalidade.Pormaislibertinoetravessoquefosse,apesardetodasasbrincadeiras,

do jeito zombeteiro e dohumor sonso, era umhomemnobre. E seria ummaridobomehonrado.Sabiadissotãobemquantoconheciaasimesma.Se ele a estava beijando com tanta paixão, deitando-a em sua cama,

cobrindo-lhe o corpo com o seu, era porque a desejava, porque seimportavacomelaosuficienteparasuperararaiva.Importava-secomela.Penelope correspondeu ao beijo com cada ibra do seu ser, com cada

canto da sua alma. Amava aquele homemhaviamuitos anos, e o que lhefaltavaemexperiênciaeracompensadoemfervor.Agarrava-lheoscabelosesecontorciaembaixodele,semseimportarcomaprópriaaparência.Agoranãoestavanumacarruagem,etampouconasaladevisitasdamãe

dele.Nãohaviao temordadescoberta,nenhumanecessidadedeparecerapresentáveldaliadezminutos.Aquelaeraanoitenaqualpodiademonstrar tudooquesentiaporele.

Corresponderia a seu desejo e, silenciosamente, faria as própriaspromessasdeamor,fidelidadeedevoção.Quando a noite chegasse ao im, ele saberia que Penelope o amava.

Talvez ela não pronunciasse as palavras – talvez nem mesmo assussurrasse–,maselesaberia.

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Ou talvez já soubesse. Era engraçado. Fora tão fácil esconder suaidentidade secreta como Lady Whistledown, mas tão di ícil ocultar ossentimentoscadavezqueolharaparaele.– Quando foi que comecei a precisar tanto de você? – sussurrou Colin,

encostandoapontadonariznodela.Penelopefitouosolhosdele,queaencaravam,escurosàluzindistintada

vela, mas muito verdes em sua memória. O hálito dele era quente edespertavapartesdeseucorponosquaiselanuncasepermitirapensar.Os dedos dele viajaram até as costas do seu vestido, movendo-se com

habilidadepelosbotõesatéqueela sentiuo tecidoafrouxar,primeiroemtornodoseios,depoisaoredordascostelase,emseguida,nacintura.Então,jánãoestavamaislá.–MeuDeus,vocêétãolinda–sussurrouele.Pelaprimeiraveznavida,Penelope realmenteacreditouquepodia ser

verdade.Havia algomuitoperverso e excitante sobre estarquasenuadiantede

outro ser humano, mas ela não teve vergonha. Colin a olhava com tantoafetoeatocavacomtantareverênciaquePenelopenãosentiunadaalémdeumaavassaladorasensaçãodequeestavadestinadaàquilo.Osdedosdeleroçaramapelesensíveldoseio,primeiroprovocandocom

aunha,depoisacariciandodemodomaissuaveeemseguidaretornandoàposiçãooriginal,próximoàclavícula.Algo dentro dela enrijeceu. Ela não soube dizer se era o toque ou a

formacomoeleaolhava,masalgoafezmudar.Elasesentiuestranha.Maravilhosa.Colin estava ajoelhado ao lado dela na cama, ainda completamente

vestido,olhandoparaseucorpocomumaexpressãodeorgulho,dedesejo,depossessividade.– Jamais sonheiquevocê seriaassim– sussurrouele, roçandoapalma

damãodelevenomamilodela.–Nuncaimagineiqueadesejariaassim.Penelopesorveuoarenquantoumespasmodesensaçõesapercorreu.

Masalgonaspalavrasdeleainquietarameeledeveterpercebidoissoemseusolhos,porqueindagou:–Oquefoi?Oquehádeerrado?

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–Nada–retrucouela,entãosearrependeu.Ocasamentodelesdeveriasebasearnafranqueza,enãoseriabompara

nenhumdosdoisseelaescondesseoquesentiadeverdade.–Comoimaginouqueeuseria?–perguntou,baixinho.Eleselimitouafitá-la,claramenteconfusocomapergunta.–Vocêdissequenuncasonhouqueeuseriaassim–explicouela.–Como

imaginouqueeuseria?–Nãosei–admitiuele.–Parasersincero,atéasúltimassemanasacho

quenuncatinhapensadoarespeito.–Edesdeentão?–insistiuela,semsaberaocertoporqueprecisavaque

elerespondesse.Comummovimentoágil,Colinseesparramousobreela,fazendootecido

docoleteroçarsobreoseuventreeseios,atéonariztocarodelaeohálitoesquentarasuapele.–Desdeentão–sussurrouelecomavozrouca–,penseinestemomento

mil vezes, imaginei cem pares de seios diferentes, todos encantadores,desejáveis, cheios e implorando a minha atenção, mas nada, e me deixerepetirparavocêentenderbem,nadachegoupertodarealidade.–Ah.–Issofoitudooqueelaconseguiupensaremdizer.Eleselivroudopaletóedocolete,ficandosócomafinacamisadelinhoe

acalça,eolhouparaelacomumsorrisomuitotravesso,quefezsubirumdos cantos de seus lábios, enquanto Penelope se contorcia embaixo dele,cadavezmaisquenteefaminta.Então, quando ela já estava certa de que não aguentaria nemmais um

segundo,Colinestendeuosbraçosecobriuseusseioscomasduasmãos,apertandodeleve,sentindoopesoeoformatodeles.Elesoltouumgemidorouco, então sorveu o ar enquanto ajustava os dedos demaneira que osmamilossurgissementreeles.–Queroquevocêsesente–murmurouele–,parapodervê-loscheios,

grandes e lindos. E depois quero icar atrás de você e segurá-los. –Aproximouoslábiosdoouvidodelaeacrescentou:–Equerofazerissonafrentedeumespelho.–Agora?–guinchouela.Ele icou pensativo por um instante, então balançou a cabeça numa

negativa.

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–Maistarde–falou,edepoisrepetiunumtombastantedecidido:–Maistarde.Penelope abriu a boca para lhe perguntar alguma coisa – não tinha a

menorideiadoquê–,masantesquepudesseproferirqualquercoisa,elesussurrou:–Vamoscomeçarpelocomeço.Emseguida,levouabocaaumdosseios,provocando-aprimeirocomum

suave sopro e depois fechando os lábios em torno do mamilo, rindobaixinhoenquantoelagemia,surpresa,arqueandoascostas.Colin continuouaprovocaçãoatéPenelopeestarprestesagritar, então

passoupara o outro seio e repetiu todo o processo. Só que dessa vez, aomesmotempo,percorreuquaseocorpo inteirodelacomumadasmãos–provocando, tentando, instigando. Tocou seu ventre, seu quadril, seutornozelo,edepoisdeslizoupernaacima.– Colin – arfou Penelope, remexendo-se por baixo de seu corpo

enquantoelelheacariciavaapeledelicadadetrásdosjoelhos.–Estátentandofugirouseaproximar?–murmurouele,semafastaros

lábiosdoseiodela.–Eunãosei.Eleergueuacabeçaeabriuumsorrisomalicioso.–Aindabem.Saiudecimadelae,bemdevagar,tirouorestantedasroupas,primeiroa

camisa, em seguida as botas e as calças. Não desviou os olhos dos dePenelope nem por um momento. Depois, começou a tirar o vestido delacomtodoocuidado,descendo-opelacintura,pelosquadris,entãoergueuotraseiromacioparadeslizarotecidoporbaixodela.Agoraela estavana frentedelevestindoapenasmeias transparentes e

macias como um sussurro. Ele parou por um instante e sorriu, com suamasculinidadeexigindoqueapreciasseoquevia,entãosoltouasmeiasdaspernas dela e deixou-as ondularem até o chão antes de deslizá-las porcimadosdedosdeseuspés.Penelope tremia ao ar da noite, e Colin se deitou a seu lado,

pressionandoocorpocontraodela,transferindo-lheoseucalorenquantosaboreavaamaciezsedosadesuapele.Precisavadela.Experimentouumasensaçãodehumildadeaopensarem

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quantoprecisavadela.Estava rijo, tão in lamado e enlouquecido de desejo que era

impressionanteaindaconseguirenxergardireito.E,noentanto,aomesmotempoqueseucorpoclamavaporalívio,estavapossuídoporumaestranhacalma, uma inesperada sensação de controle. Em algummomento, aquilodeixaradesersobreele.Erasobreela–não,erasobre eles,sobreaquelamaravilhosaunião,aquelemaravilhosoamorqueColinsóagoracomeçavaaapreciar.Ele a queria – Deus, como a queria –, mas também queria que ela

estremecessesobele,quegritassededesejo,que jogasseacabeçadeumladoparaoutroenquantoeleaconduziaaoprazercompleto.Queriaqueelaadorasseaquilo,queoamasseequesoubesse,quandose

deitassemnosbraçosumdooutro,suadoseexaustos,quepertenciaaele.Porqueelejásabiaquepertenciaaela.–Avise se não gostar de algo que eu izer – pediu ele, surpreso como

tremornaprópriavoz.– Você não conseguiria fazer algo que me desagrade – sussurrou ela,

tocando-lheaface.Ela não compreendia. Se ele não estivesse tão preocupado em fazer

daquela experiência, a primeira dela, algo inesquecível, teria sorrido. Aspalavrasmurmuradasporelasópodiamsigni icarumacoisa:queelanãotinhaamenorideiadoquesignificavafazeramorcomumhomem.– Penelope – disse ele, baixinho, cobrindo a mão dela com a sua. –

Precisolheexplicarumacoisa.Eupossomachucá-la. Jamaisseriaaminhaintenção,masépossívele...Elafezquenão.–Vocênãofaria isso–repetiuela.–Euoconheço.Àsvezesachoqueo

conheçomelhordoqueamimmesma.Evocê jamais fariaqualquercoisaquepudessememachucar.Elecerrouosdentesetentounãogemer.– Não de propósito – insistiu, com uma minúscula sugestão de

exasperaçãoperpassandoavoz.–Maspoderia,e...–Deixe que eu decida isso – retrucou ela, então pegou amãodele e a

levou aos lábios para um beijo profundo e sincero. – E quanto à outracoisa...

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–Queoutracoisa?PenelopesorriueColinpôdejurarqueelapareciaestarsedivertindoà

suacusta.– Você me pediu para avisar se não gostar de algo que você izer –

lembrouela.Ele observouo rosto dela com cuidado, subitamente hipnotizado coma

maneiracomoseuslábiosiamformandoaspalavras.–Euvougostardetudo–garantiuela.–Prometo.Umaestranhaondadefelicidadecomeçouatransbordardedentrodele.

NãosabiaqualdeusbenevolenteescolheracolocarPenelopeemsuavida,masachavaqueprecisariasermaisatenciosodapróximavezquefosseàigreja.–Vougostardetudo–repetiuela–,porqueestoucomvocê.EletomouorostodePenelopeentreasmãoseafitoucomoseelafossea

criaturamaismaravilhosadaterra.–Euteamo–sussurrouela.–Euteamoháanos.–Eusei–disseele,surpreendendo-secomasprópriaspalavras.Colinachavaquesempresouberadaquilo,masafastaraaideiaporqueo

amordelaodeixaradesconfortável.Eradi ícilseramadoporalguémcomoPenelope quando não se retribuía o sentimento. Não podia rejeitá-laporque gostava dela e não teria conseguido se perdoar se houvessemenosprezado os seus sentimentos. E não podia lertar com ela, pelasmesmasrazões.Assim, convencera a si mesmo que o que ela sentia não era amor de

verdade, e sim uma paixonite. Obrigara-se a pensar que ela nãocompreendiaoqueeraoverdadeiroamor(comoseelecompreendesse!)eque em algum momento conheceria outra pessoa e acabaria tendo umavidafelizesatisfatória.Agora,talideia–dequeelatalveztivessesecasadocomoutro–quaseo

deixavaparalisadodepavor.Estavam lado a lado e ela o olhava com o sentimento estampado nos

olhos,orostointeiroiluminadodefelicidadeedesatisfação,comoseen imsesentisselivreporterpronunciadoaspalavras.Derepente,Colinsedeuconta de que aquela expressão não guardava um único traço deexpectativa.Elanãodisseraqueoamavaapenasparaouviromesmo.Nem

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mesmoestavaàesperadeumaresposta,qualquerquefosse.Eladeclararaseuamorsimplesmenteporquequeria.Porqueeraoque

sentia.–Eu tambémteamo–sussurrouele,dando-lheumbeijoprofundonos

lábiosedepoisseafastandoparaverasuareação.Penelope o olhou por um bom tempo antes de esboçar qualquer

resposta.Porfim,apósengoliremsecodeformaconvulsiva,retrucou:–Nãoprecisadizerissosóporqueeudisse.–Eusei–respondeuele,sorrindo.Elaapenasoencaroucomosolhosbemabertos.–Evocêtambémsabedisso–continuouele,baixinho.–Você falouque

meconhecemelhordoqueasimesma,esabequeeujamaispronunciariaaspalavrassenãofossemsinceras.Naquelemomento,deitadanuanacamadele,embaladaemseusbraços,

Penelopesedeucontadeque,defato,sabia.Colinnãomentia,nãoquandose tratava de algo importante, e ela não conseguia pensar em nadamaisimportantedoqueomomentoquecompartilhavam.Eleaamava.Nãoeranadaqueelativesseesperado,nadaquetivessese

permitido esperar, e no entanto ali estava, como ummilagre brilhante eresplandecenteemseucoração.–Vocêtemcerteza?–sussurrouela.Elefezquesim,puxando-aparamaispertoainda.–Dei-mecontaestanoite.Quandolhepediqueficasse.–Como...?Mas ela não terminou a pergunta, porque nem aomenos tinha certeza

dequalera.Comoele sabiaqueaamava?Comoaquilohaviaacontecido?Comoofaziasesentir?De alguma forma, Colin deve ter entendido o que ela não conseguia

colocarempalavras,poisfalou:–Nãosei.Nãoseiquando,nãoseicomoe,parasersincero,nãoimporta.

Só sei que te amo eme odeio por não ter enxergado quem você era deverdadeportodosessesanos.– Colin, não – pediu ela. – Nada de recriminações. Nada de

arrependimentos.Nãoestanoite.Eleapenassorriuecolocouumdedosobreos lábiosdela,silenciandoo

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apelo.– Não creio que você tenha mudado – prosseguiu. – Pelo menos, não

muito. Mas então, certo dia, ao olhar para você, percebi que estavaenxergando algo diferente. – Deu de ombros. – Talvez eu tenhamudado.Talvezeutenhacrescido.Penelopecolocouumdedosobreoslábiosdele,silenciando-odamesma

formaqueelefizeracomela.–Talvezeutambémtenhacrescido.–Euteamo–repetiuele,inclinando-separaafrenteafimdebeijá-la.Dessa vez ela não teve como responder, porque os lábios dele

permaneceramsobreosdela,famintos,exigentesemuito,muitosedutores.Colinpareciasaberexatamenteoque fazer.Cadamovimentoda língua,

cada mordiscar, enviava arrepios até a essência de seu ser, e ela seentregouàpuraalegriadomomento,àchamaardentedodesejo.Asmãosdeleestavampor todasaspartesdeseucorpoeelaosentiaonipresente,com os dedos percorrendo a sua pele e as pernas abrindo caminho porentreassuas.Ele a puxou para mais perto, rolando-a para cima de si enquanto se

deitavadecostasnacama.Asmãosdeleestavamnotraseirodela,eosdoisagora estavam tãopróximosque aprovadedesejodeColin se imprimiu,comoseaferroefogo,sobreapeledela.Penelopearquejoudiantedaespantosa intimidadedaquilo, entãoo seu

hálito foi capturado pelos lábios dele, que a beijou mais uma vez comferocidadeeternura.Agora,de repente, eraelaqueestavadeitadade costas, comopesode

Colin sobre o seu corpo, prendendo-a contra o colchão, espremendo o arde seus pulmões. Ele deslocou os lábios para a orelha dela, em seguidapara o pescoço, e Penelope arqueou as costas como se de alguma formapudessecurvarocorpoparachegaraindamaispertodele.Nãosabiaoquedeviafazer,massabiaqueprecisavasemexer.Amãejá

tivera a “conversinha”, como a chamara, com ela, e dissera quePenelopedeviaficarimóvelembaixodomaridoepermitiraeleosseusprazeres.Masnãohaviaamenorchancedeela icarparada,deconseguirimpedir

os quadris de se movimentarem ou as pernas de enlaçarem as dele. EPenelopenãoqueriapermitir a eleos seusprazeres:queria encorajá-los,

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compartilhá-los.E também os queria para si. O que quer que fosse aquilo que crescia

dentrodela–atensão,odesejo–,precisavadealívio,ePenelopenãopodiaimaginarqueaquelemomentonãofosseseromaisdeliciosodesuavida.–Diga-meoquefazer–pediuela,avozroucadeurgência.Colinafastoubemaspernasdela,depoisdeslizouasmãospelaslaterais

atéchegaràscoxaseasapertou.–Deixequeeufaçotudo–falou,ofegante.Elaagarrouotraseirodeleeopuxouparamaisperto.–Não–insistiu.–Diga-me.Eleparoudesemexerporuminstanteeolhousurpresoparaela.–Toqueemmim–pediu.–Onde?–Emqualquerlugar.Elarelaxoulevementeasmãossobreotraseirodeleesorriu.–Maseuoestoutocando.–Movaasmãos–grunhiuele.–Movaasmãos.Penelopedeixouqueosdedospercorressemocaminhoatéascoxasdele

etraçoucírculossuavescomelasenquantosentiaospelosmacios.–Assim?Eleassentiudeformafrenética.As mãos dela deslizaram para a frente até se aproximarem,

perigosamente,domembro.–Assim?Elecobriuumadasmãosdelacomasuademaneiraabrupta.–Agoranão–falou,taxativo.Elaolhouparaele,confusa.– Você entenderá depois – grunhiu ele, abrindo aindamais as pernas

delaantesdedesceramãoentreoscorposdosdoisetocá-laemseulugarmaisíntimo.–Colin!–arfouela.Elesorriucommalícia.–Achouqueeunãoatocariaassim?Como se para ilustrar o que queria dizer, começou a remexer um dos

dedospelacarnesensível,levando-aaarquearocorpo,contorcendo-sede

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desejo.Elelevouoslábiosaoouvidodela.–Hámuitomais–sussurrou.Penelopenãoousouperguntaroquê.Aquilo já erabemmaisdoquea

mãemencionara.Colindeslizouumdosdedosparadentrodela, levando-aaofegaroutra

vez(oqueofezrir,deliciado).Então,começouamassageá-lalentamente.–Ah,meuDeus–gemeuPenelope.–Você já estáquaseprontaparamim–disse ele, a respiração icando

maisrápida.–Tãomolhada,mastãoapertada...–Colin,oqueestá...Ele deslizou outro dedo para dentro dela, acabando com qualquer

capacidadequeelaaindativessedeseexpressardeformainteligível.Penelope sentiu-se abrir, e estava adorando.Devia sermuitomaliciosa,

uma libertina na essência, porque a única coisa que queria era abrir aspernasmais emais, até estar completamentedisponívelpara ele.Noquelhe dizia respeito, ele podia fazer o que quisesse com ela, tocá-la damaneiraquedesejasse.Contantoquenãoparasse.–Nãovouconseguiresperarmuitomais–arfouele.–Nãoespere.–Precisodevocê.Elaestendeuosbraçoseseagarrouaele,forçando-oaolharparaela.–Eutambémprecisodevocê.De repente, os dedos dele desapareceram. Penelope se sentiu

estranhamenteocaevazia,masapenasporumsegundo,poishaviaoutracoisanaentradadeseucorpo,algorijo,quenteemuito,muitoexigente.– Istotalvezdoa–avisouColin,cerrandoosdentes,comoseelemesmo

esperassesentirdor.–Nãoimporta.Eleprecisavafazercomqueaexperiênciafosseboaparaela.– Eu irei com calma – falou, embora o seu desejo estivesse agora tão

feroz que ele não tinha a menor ideia de como poderia cumprir apromessa.–Euoquero–disseela.–Euoqueroeprecisodealgumacoisa,embora

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nãosaibadoquê.Eleempurrouomembroparaafrente,apenas2centímetros,mastevea

sensaçãodequeelaoengoliaporinteiro.Penelope icou em silêncio sob o corpo dele, a respiração escapando

irregularpeloslábios.Mais2centímetros,maisumpassoemdireçãoaoparaíso.–Ah, Penelope – gemeuColin, usandoos braços para semanter acima

delademaneiraanãoesmagá-lacomoseupeso.–Porfavor,medigaqueestáachandoistobom.Porfavor.Porqueseeladissessequenãoeraeeletivessequesairdedentrodela,

Colinmorreria.Elafezquesim,masfalou:–Euprecisodeuminstante.Eleengoliuemseco,forçandoarespiraçãopelonariz.Eraaúnicaforma

possível de se concentrar em não explodir de uma só vez. Penelopeprecisava relaxar o corpo à volta do membro dele, permitir que osmúsculos se expandissem. Nunca estivera com um homem, e era tãodeliciosamenteapertada...Dequalquer forma,elenãopodiaesperaraté teremaoportunidadede

fazeraquilocomtantafrequênciaqueelenãoprecisassesecontrolar.Quando a sentiu relaxar levemente, empurrou um pouco mais, até

atingiraprovaincontestáveldainocênciadela.–Ah,Deus–gemeuele.–Istovaidoer.Nãohánadaqueeupossafazer,

maseulheprometo,ésódestavez,enãovaidoerdemais.–Ecomovocêsabe?–indagouela.Elefechouosolhos,emagonia.SómesmoPenelopeparaquestioná-lo.–Confieemmim–respondeu,esquivando-sedapergunta.Então, deu um impulso para a frente, arremetendo até o fundo,

mergulhandoemseucaloratésaberquetinhaatingidoasuameta.–Ah!–arquejouela,orostoemchoque.–Vocêestábem?Elaassentiucomacabeça.–Achoquesim.Elesemexeuumpouco.–Estábemassim?

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Elaassentiuoutravez,mas seu rosto registrava surpresa, talvezalgumatordoamento.Os quadris de Colin começaram a se mover por vontade própria,

incapazes de se manterem parados quando ele estava tão claramentepertodoclímax.Elaeraaprópriaperfeição,equandoelesedeucontadequeosseusarquejoseramdeprazerenãodedor,en imsedeixoulevareseentregouaodesejoavassaladorqueopercorriacomoumaonda.Abaixo dele, Penelope ganhava mais e mais ritmo, e ele rezava para

conseguir se segurar atéque ela atingisseoorgasmo. Sua respiraçãoerarápida, seu hálito, quente, e ela apertava os ombros dele sem tréguaenquanto movimentava os quadris, levando a necessidade de Colin aoápice.Então, aconteceu. Um som saiu dos lábios dela, mais doce do que

qualquer coisaque ele já tivesseouvido.Ela gritou seunomeenquantoocorpo inteiro enrijecia de prazer, e Colin pensou: Um dia eu a observarei.Olhareioseurostoenquantochegaaoclímax.Mas não naquele momento. Ele já estava atingindo o orgasmo e seus

olhosestavam fechados com todoaqueleêxtase.Onomedelaescapoudeforma espontânea de seus lábios enquanto ele mergulhava dentro delamaisumavezedespencava sobreo seu corpo, completamentedestituídodeforças.Por um minuto inteiro, o silêncio dominou o ambiente e o único

movimentoeraosubiredescerdeseuspeitos, lutandoparanormalizararespiração,aguardandooscorposseacalmaremparaentãoseentregaremàquele formigamento abençoado que se sente nos braços da pessoaamada.Ou, pelo menos, foi o que Colin imaginou que fosse aquilo. Já estivera

com outras mulheres, mas só se deu conta de que nunca izera amorquandodeitouPenelopeemsuacamaedeuinícioàqueladançaíntimacomumúnicobeijonoslábiosdela.Elejamaissentiraaquilo.Eraamor.Eelehaveriadeagarrá-locomasduasmãos.

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CAPÍTULO19

Nãofoimuitodifíciladiantaradatadocasamento.OcorreuaColin,enquantovoltavaparacasa,emBloomsbury(depoisde

sorrateiramente deixar Penelope, toda descomposta, na casa dela emMayfair),quetalvezhouvesseumótimomotivoparasecasaremmaiscedodoqueoprogramado.Éclaroqueseriamuitoimprovávelqueelaengravidasseapósumaúnica

vez.E,mesmoqueissoacontecesse,obebênasceriadepoisdeoitomeses,o que não era nada suspeito num mundo repleto de crianças nascidasapenas seis meses depois do casamento dos pais. Sem contar queprimogênitoscostumavamatrasar(Colintinhasobrinhososu icienteparasaberqueeraverdade),oque fariadobebêumrebentodeoitomesesemeio,algonadaincomum.Então, de fato, não havia qualquer necessidade urgente de adiantar o

casamento.Anãoserpelofatodequeelequeria.Assim, teve uma “conversinha” com a mãe e a sogra, durante a qual

comunicou muita coisa sem revelar nada de explícito, e elas logoconcordaramcomoplanodeledeapressaroenlace.Sobretudoporeletalvezasterlevadoaentender,equivocadamente,que

e rapossível que as intimidades entre os dois tivessem ocorrido váriassemanasantes.Ah, bem, mentirinhas inocentes não eram uma transgressão tão grave

assimquandocontadasparaserviraumbemmaior.E um casamento às pressas, re letiu Colin, deitado na cama, noite após

noite, revivendoomomento vivido comPenelope edesejando com fervorqueelaestivesseali,aseulado,definitivamenteserviaaumbemmaior.Violet e Portia, que haviam se tornado inseparáveis nos últimos dias,

enquanto planejavam o evento, protestaram com relação à mudança,preocupadascomboatosmaliciosos (quenessecasoseriamverdadeiros),masLadyWhistledownveioemseuauxílio,mesmoquedeformaindireta.

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OsrumoresquegiravamemtornodeLadyWhistledownedeCressidaTwombley – se de fato as duas eram a mesma pessoa – dominavamLondres como jamais acontecera com outro assunto. Na verdade, omexericoeratãopoderosoqueninguémparouparapensarqueadatadocasamentoBridgerton-Featheringtonforatrocada.Oqueconvinhaperfeitamenteàsduasfamílias.Exceto,talvez,aColinePenelope,poisnenhumdosdoissesentiamuitoà

vontadequandoo tópicoda conversaeraLadyWhistledown.Penelope jáestavaacostumada,éclaro:nãosepassaraumaúnicasemananosúltimosdez anos sem que alguém especulasse sobre a identidade de LadyWhistledown na sua presença. Mas Colin continuava tão transtornado eirritadoemrelaçãoàsuavidasecretaqueelamesmapassaraasesentirdesconfortável. Tentara trazer o tema à tona algumas vezes, mas ele setornara taciturno e lhe dissera (num tom que não combinava nada comele)quenãoqueriafalarsobreoassunto.Aúnicaconclusãoaquepodiachegareraqueelesentiavergonhadela.

Ou,senãodela,precisamente,entãodesuaobracomoLadyWhistledown.Oquedecertaformalhepartiaocoração,poisosseusescritoseramumapartedesuavidadaqualelaseorgulhavamuito.Penelopehaviarealizadoalgumacoisa.Aindaquenãopudesseassinaropróprio trabalho, tinhasetornadoumsucessoestrondoso.Quantosdeseuscontemporâneos,homensoumulheres,podiamdizeromesmo?Ela talvez estivesse pronta para deixar LadyWhistledown para trás e

viverumanovaetapadesuaexistênciacomoSra.ColinBridgerton,esposaemãe,masissonãosigni icava,demaneiraalguma,queseenvergonhassedoquefizera.EqueriaqueColintambémseorgulhassedassuasrealizações.Sim, ela acreditava com cada ibra de seu ser que ele a amava. Colin

jamais mentiria sobre uma coisa dessas. Podia pronunciar palavras deefeitoeoferecerossorrisosmaisprovocantesparafazerqualquermulherfeliz e satisfeita semdizerpalavrasdeamorquenão sentisse.Mas talvezfossepossível–narealidade,depoisdeavaliarocomportamentodeColin,elaagoratinhacertezadequeerapossível–alguémamaroutrapessoae,ainda assim, sentir vergonha dela. Penelope só não havia esperado queissodoessetanto.

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PasseavamporMayfaircertatarde,diasantesdocasamento,quandoelatentoumencionaroassuntooutravez.Nãosoubeporque fez isso, jáqueimaginavaqueaatitudedelenãoteriamudadopormilagredesdeaúltimavez,masnãoconseguiuevitar.Alémdomais,teveesperançadequeofatode estarem em público, à vista de todos, fosse forçar Colin amanter umsorrisonorostoeouviroqueelatinhaadizer.ElacalculouadistânciaatéoNúmeroCinco,ondeeramaguardadospara

ochá.–Euacho–começou,imaginandoquetinhacercadecincominutospara

falarantesqueeleaconduzisseparadentrodacasaemudasseorumodaconversa–quetemosumassuntopendentequeprecisaserdiscutido.Ele ergueu uma das sobrancelhas e olhou para ela com um sorriso

curioso, mas ainda bastante brincalhão. Ela sabia muito bem o que eletentava fazer: usar a sua personalidade encantadora e espirituosa paraconduziraconversanadireçãoquedesejava.Aqualquerminuto,elediriaalgo planejado paramudar de assunto sem que ela se desse conta, algocomo:–Masquecoisamaissériaparaumdiatãoensolarado.Ela franziu os lábios. Não era exatamente o que esperara, mas sem

dúvidatinhaafunçãoqueimaginara.– Colin – disse, tentando manter a paciência –, eu gostaria que não

tentassemudardeassuntotodavezqueeumencionoLadyWhistledown.Elerespondeucomavozserena,controlada:– Acho que não a ouvi mencionar o nome dela, ou suponho que deva

dizeroseunome.Alémdomais,aúnicacoisaque izfoielogiarodialindoqueestáfazendo.Penelope teve uma vontade enorme de parar ali mesmo e obrigá-lo a

ouvi-la,masestavamempúblico(porsuaprópriaculpa,jáqueforaelaqueescolheracomeçaraconversadaquelaforma),entãocontinuouacaminharcom elegância e tranquilidade, ainda que estivesse com os punhoscerradosdetensão.–Naoutranoite,quandoaminhaúltimacolunafoipublicada,você icou

furiosocomigo–disseela.Eledeudeombros.–Jápassou.

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–Eunãoacredito.Elesevirouparaelacomumaexpressãobastantecondescendente.–Agoravaiquerermedizercomomesinto?Umgolpetãobaixonãopodiaficarsemresposta:–Nãoéissoqueseesperadeumaesposa?–Vocêaindanãoéminhaesposa.Penelopecontouatétrês–não,atédez–antesderetrucar:–Medesculpeseoquefizodeixouirritado,masnãotiveescolha.– Você teve todas as escolhas domundo,mas eu não vou discutir isso

aquinomeiodarua.PenelopesedeucontadequejáestavamnaRuaBruton.Calcularamuito

mal a rapidezde seuspassos.Tinhaapenasmaisumminuto,nomáximo,antesdechegaremaoNúmeroCinco.–Eupossolhegarantir–disseela–,que“vocêsabequem”nuncamais

deixaráaaposentadoria.–Malconsigoexpressaroalívioquesinto.–Gostariaquenãofossetãosarcástico.Ele se virou para encará-la com olhos faiscantes. A expressão era tão

diferente da máscara de impassividade de alguns momentos antes quePenelopequasedeuumpassoparatrás.– Cuidado com o que deseja, Penelope – avisou ele. – O sarcasmo é a

única coisa quemantém osmeus verdadeiros sentimentos escondidos, epodeacreditarquevocênãovaiquererqueelesvenhamàtonaàvistadetodos.–Achoquequero, sim– respondeu ela coma vozmuitobaixa, pois na

verdadenãotinhatantacertezaassimdequedesejavaisso.–Todososdias,souforçadoapararepensarnoquefareiparaprotegê-

la caso o seu segredo seja descoberto. Eu amo você, Penelope. QueDeusmeajude,masamo.Ela teria preferido que ele não implorasse pela ajuda de Deus, mas a

declaraçãodeamorfoibastantesimpática.– Em três dias – continuou Colin –, eu serei seu marido. Farei um

juramentosolenedeprotegê-laatéqueamortenossepare.Compreendeoqueissoquerdizer?–Quevocêvaiterquemesalvardeminotaurossaqueadores?–sugeriu

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ela,tentandofazergraça.Aexpressãodeledeixouclaroquenãoacharaaquiloengraçado.–Gostariaquevocênãoficassetãozangado...–murmurouela.ColinsevirouparaPenelopecomarde incredulidade,comoseachasse

queelanãotinhaodireitodefalarnada.– Se estou com raiva, é porque não gostei de descobrir sobre a sua

últimacolunaaomesmotempoquetodomundo.Elaassentiu,mordendoolábioinferior,edepoisdisse:–Peço-lhedesculpaspor isso.Semdúvidavocê tinhaodireitodesaber

antes,mascomoeupoderiaterlhecontado?Vocêteriatentadomedeter.–Exatamente.Agora estavam bem próximos do Número Cinco. Se Penelope quisesse

lheperguntarqualqueroutracoisa,teriadeserrápida.– Você tem certeza... – começou, então se interrompeu, sem saber ao

certosedeviaprosseguir.–Certezadequê?Elabalançouacabeçadelevenumanegativa.–Denada.–Éóbvioquenãoédenada.–Eusóestava imaginando... –Elaolhouparao lado, comosea imagem

dacidadepudesse,dealgumaforma,lhedaracoragemnecessáriaparairemfrente.–Eusóestavaimaginando...–Falelogo,Penelope.Nãoeradofeitiodelesertãocurtoegrosso,eissoaincitouacontinuar:– Eu estavame perguntando se talvez o seu desconforto em relação à

minha...err...–Vidasecreta?–sugeriuele,prolongandocadasílaba.–Seéassimquequerchamá-la...–retrucouela.–Ocorreu-mequetalvez

oseudesconfortonãotenhaorigeminteiramentenodesejodeprotegeraminhareputaçãocasoeusejadescoberta.–Oquevocêquerdizercomisso?–quissaberele.Ela jáverbalizaraapergunta;nãohaviamaisnadaa fazeragorasenão

sertotalmentefranca.–Euachoquevocêtemvergonhademim.Eleaolhouporumlongomomentoantesderesponder:

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–Eunãotenhovergonhadevocê.Jálhedisseissoumavez.–Qualéoproblema,então?Os passos de Colin falharam e, antes que ele se desse conta do que o

corpo fazia, estavaparadodiantedonúmero3daRuaBruton.A casadamãe icava apenas a duas construções de distância e ele tinha quasecertezadequeosaguardavamparaocháhaviacincominutose...Nãoconseguiafazercomqueospéssemexessem.– Eu não tenho vergonha de você – repetiu, em grande parte por não

conseguir dizer a verdade a ela: que tinha inveja de suas realizações,invejadela.Eraumsentimentotãorepugnante,umaemoçãotãodesagradável...Isso

oconsumia,criandoumavagasensaçãodevergonhacadavezquealguémmencionavaLadyWhistledown,oquenosúltimostemposocorriacercadedezvezesaodia.Eelenãosabia,aocerto,oquefazerarespeito.Daphnecomentara,certavez,queelesemprepareciasaberoquedizer

e como deixar os outros à vontade. Pensara nisso por vários dias depoisque a irmã o dissera e chegara à conclusão de que essa sua capacidadedeviaterorigemnaformacomoelepercebiaasimesmo.Era um homem que sempre se sentira muito confortável sendo quem

era. Não sabia por que era tão abençoado – talvez bons pais ou, quemsabe,purasorte.Masagoraexperimentavaumasensaçãodedesconfortoeisso se mostrava em cada área da sua vida. Vinha sendo rude comPenelope,malfalavaemfestas...E tudo isso por causa daquela inveja detestável e da vergonha que a

acompanhava.Ou...Seráque ele teria invejadePenelope se jánão estivesse sentindouma

ausêncianaprópriavida?Era uma interessante pergunta psicológica. Bem, seria interessante se

dissesserespeitoaqualqueroutrapessoaquenãoele.–Minhamãeestánosesperando–disseele,ríspido,sabendoqueestava

fugindodaverdadeeseodiandoporisso,massentindo-seincapazdeagirdeoutra forma.–Easuamãe tambémestarápresente,entãoébomquenãonosatrasemos.–Jáestamosatrasados–observouela.

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EletomouoseubraçoeapuxouemdireçãoaoNúmeroCinco.–Maisummotivoparanãoperdermostempo.–Vocêestámeevitando–acusouela.–Comoissoépossívelsevocêestábemaqui,debraçodadocomigo?Elafranziuatesta.–Estáfugindodaminhapergunta.– Vamos falar sobre isso depois – disse ele –, quando não estivermos

paradosnomeiodaRuaBruton,comsóDeussabequemolhandoparanóspelajanela.E então, para demonstrar que não aceitaria mais nenhum protesto,

colocouamãoemsuascostaseaconduziu,semmaioresdelicadezas,pelaescadaquelevavaàentradadacasa.

Uma semana mais tarde, nada mudara, a não ser o sobrenome dePenelope.Ocasamentoforamágico.Umacerimôniaíntima,paraaconsternaçãoda

altasociedadelondrina.Eanoitedenúpcias...Bem,tambémforamágica.Naverdade,ocasamentocomoumtodoeramágico.Colineraummarido

maravilhoso:provocativo,gentil,atencioso...ExcetoquandoonomedeLadyWhistledowneramencionado.Então ele se tornava... Na verdade, Penelope não sabia ao certo o que

Colin se tornava; só tinha certeza que não era ele mesmo. Ocomportamento descontraído, a luência, tudo de maravilhoso que faziadeleohomemqueamavahaviatantosanosdesaparecia.De certa forma, era quase engraçado. Durante muito tempo, todos os

seus sonhos estavam relacionados a se casar com Colin. Em algummomento, esses sonhos haviam incluído lhe contar sobre a sua vidasecreta. E como poderia ser diferente? Na imaginação dela, o casamentocomeleeraumauniãoperfeita,eissosignificavasinceridadeabsoluta.Em seus pensamentos, ela o fazia sentar-se e, timidamente, revelava o

seu segredo. A princípio ele reagia com incredulidade, em seguida comdelicadeza e orgulho. Como ela era extraordinária por ter enganadoLondres inteira por tantos anos! Como era espirituosa, por ter escrito

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inúmeras frases com nuances tão inteligentes! Ele a admirava por suacriatividade,aelogiavapeloseusucesso.Àsvezesatésugeriasetornarseurepórtersecreto.Aquilo lhe parecera o tipo de coisa da qual Colin teria gostado, um

trabalhodivertidoeinsidiosoqueeleapreciaria.Masnãofoiassimqueasituaçãosedesenrolara.Ele a irmara não ter vergonha dela e talvez acreditasse mesmo nisso,

masPenelopenãoconseguia se convencer.ViraaexpressãodelequandoColin juraraqueaúnicacoisaquequeriaeraprotegê-la.Osentimentodeproteçãocostumaserferozeardente,esemprequeelefalavasobreLadyWhistledown,seusolhosescureciameficavaminexpressivos.Ela tentavanão icar tãodesapontada.Procuravadizera simesmaque

não tinha o direito de esperar que ele correspondesse aos seus sonhos,queasuaformadevê-loforainjustamenteidealizada,mas...Aindadesejavaqueelefosseohomemqueimaginara.No entanto, sentia-se culpada por cada sensação de desapontamento.

Aquele era Colin, pelo amor de Deus! Colin, que chegava mais perto daperfeição do que qualquer ser humano poderia esperar chegar. Ela nãotinhaomenordireitodeencontrardefeitosnele.Aindaassim...Aindaassim,encontrava.Queriaqueele seorgulhassedela.Desejava issomaisdoquequalquer

outra coisa nomundo,mais até do queo desejara durante todos aquelesanos,adistância.Mas,aomesmotempo,tinhaprofundaconsideraçãopeloseucasamento,

e, deixando de lado os momentos di íceis, tinha grande consideraçãotambémpelomarido.Assim,decidiupararde falardeLadyWhistledown.Cansou-sedaexpressãosombriadeColin.Nãoqueriamaisverasrugasdecontrariedadeaoredordesuaboca.Nãoqueelapudesseevitaroassuntoparasempre;qualquereventoda

alta sociedade parecia trazer à tona alguma menção à sua identidadesecreta.Masnãoprecisavatocarnoassuntoemcasa.Assim, ao se sentarem para tomar café juntos certa manhã, enquanto

liamojornaldaqueledia,elabuscououtrostemas.– Acha que devemos fazer uma viagem de lua de mel? – indagou,

espalhando uma generosa camada de geleia de framboesa sobre um

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bolinho.Talvez não devesse comer tanto, mas a geleia era deliciosa e, além do

mais,Penelopesempreficavagulosaquandoestavaansiosa.Franziuatesta,primeiroemdireçãoaobolinho,emseguidaparaonada.

Não se dera conta de que estava tão ansiosa. Achara ser capaz deempurraroproblemadeLadyWhistledownparaofundodasuamente.–Talvezmaisparao inaldoano–respondeuColin,pegandoageleia.–

Podemepassarastorradas,porfavor?Elaofez,emsilêncio.Ele ergueu a vista, para ela ou para o prato de peixe defumado –

Penelopenãosoubedizeraocerto.–Vocêpareceterficadodesapontada–comentouColin.Elapensouquedevia se sentir lisonjeadaporele terdesviadoosolhos

dacomida.Outalvezestivesse itandoopeixeeelaapenasseencontrassenocaminho,oqueeramaisprovável.Eradi ícilcompetircomcomidapelaatençãodeColin.–Penelope?–chamouele.Elapiscou.–Vocêmepareceudesapontada–repetiuele.– Ah. Sim. Bem, acho que estoumesmo. – Ela lhe ofereceu um sorriso

vacilante.–Nuncasaídaqui,evocêjáesteveemtodasaspartes.Acheiquepudesse me levar a algum lugar do qual tivesse gostado especialmente.Como a Grécia, talvez. Ou, quem sabe, a Itália. Sempre quis conhecer aItália.–Vocêiriagostardelá–murmurouele,distraído,concentradomaisnos

ovosdoquenela.–SobretudodeVeneza,imagino.–Entãoporquenãomeleva?– Eu levarei – disse ele, espetando um pedaço rosado de bacon e

atirando-onaboca.–Masnãoagora.Penelope lambeu um pouco de geleia do bolinho e tentou disfarçar a

decepção.– Se você quer mesmo saber – prosseguiu Colin, com um suspiro –, o

motivo pelo qual não quero viajar é... – Ele olhou para a porta aberta efranziuoslábios,irritado.–Bem,nãopossofalaraqui.Penelopearregalouosolhos.

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–Estáquerendodizer...–Eladesenhouumimenso Wsobreatoalhademesa.–Exatamente.Elao itou,surpresa,umtantoaturdidaporele ter levantadooassunto,

atéporquenãopareceutãocontrariadoporisso.–Masporquê?–indagou.– Se, por acaso, o segredo for revelado – respondeu ele, atento à

presença de algum dos criados, que costumavam circular por ali àquelahora–,eugostariadeestarnacidadeparacontrolarodano.Penelope sentiu-se afundar na cadeira. Nunca era agradável ser

chamadadedano,queeraoqueelehavia feito, aomenos indiretamente.Fitou o bolinho, tentando decidir se estava com fome. Constatou que, naverdade,tinhaperdidooapetite.Aindaassim,ocomeu.

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CAPÍTULO20

Alguns dias depois, Penelope retornou de uma tarde de compras comEloise,HyacintheFelicityeencontrouomaridonoescritório,sentadoatrásda escrivaninha. Ele lia alguma coisa, atipicamente curvado, com umaexpressãomeditativa.–Colin?Eleergueuacabeçadesúbito.Nãodeviatê-laouvidochegar,oqueera

surpreendente, uma vez que ela não izera o menor esforço para sersilenciosa.–Penelope–disseele, levantando-seenquantoelaentravanoaposento

–,comofoio...err...oquequerquetenhaidofazernarua?– Compras – respondeu ela, com um sorriso zombeteiro. – Fui fazer

compras.– Isso.Foi isso.–Ele transferiuopesodocorpodeumpéparaooutro,

discretamente.–Comproualgumacoisa?– Um gorro – retrucou ela, tentada a acrescentar “e três anéis de

diamantes”,sóparaverseeleestavaescutando.– Muito bem, muito bem – murmurou Colin, claramente ansioso por

voltaraoquequerqueestivessesobreasuamesa.–Oqueestálendo?–perguntouPenelope.– Nada – falou ele, quase sem pensar, então acrescentou: – Bem, na

verdade,éumdosmeusdiários.Em seguida assumiu uma expressão esquisita,meio envergonhada por

tersidopegoemeiodesafiadora,quaseaincitandoaperguntarmais.– Posso dar uma olhada? – pediu ela, mantendo a voz suave e não

ameaçadora.EraestranhopensarqueColinpudessesesentirinsegurocomrelaçãoa

qualquer coisa. Qualquer menção aos seus diários, no entanto, pareciasuscitarumasurpreendenteetocantevulnerabilidade.Penelope passara tanto tempo vendo-o como uma torre invencível de

felicidade e animação... Era autocon iante, bonito, querido e inteligente.

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ComodeviaserfácilserumBridgerton,elacostumavapensar.Houveratantasvezes–maisdoqueconseguiacontar–quevoltarapara

casaapósochácomEloiseesuafamíliae,encolhidanacama,desejaraternascido uma Bridgerton... A vida era fácil para eles. Eram inteligentes,atraentes,ricos,epareciaquetodomundogostavadeles.E nem era possível odiá-los por isso, porque eram todos pessoas

maravilhosas.Bem,agoraelafaziapartedafamília,aindaqueporcasamentoenãopor

nascimento,eviaqueeraverdade:avida eramelhorcomoumBridgerton,embora isso tivessemenos a ver com qualquer grandemudança do quecom o fato de estar perdidamente apaixonada pelo marido e, por algumfabulosomilagre,elesesentirdamesmaforma.Aindaassim,avidanãoeraperfeita,nemparaosBridgertons.AtémesmoColin–omeninodeouro,ohomemdesorrisofácilehumor

contagiante–tinhaláosseusfantasmas.Eraperseguidoporsonhosjamaisrealizados e inseguranças secretas. Como havia sido injusta ao ponderarsobreavidadeleenuncalhepermitirfraquezaalguma...– Não preciso ler tudo – prosseguiu ela. – Só um ou dois trechos

pequenos.Vocêescolhequais.Algodequevocêgosteespecialmente.Elebaixouosolhosparaocadernoaberto,fitando-ocomarinexpressivo,

comoseaspalavrasestivessemescritasemchinês.– Eu não saberia o que escolher – resmungou. – Na verdade, é tudo a

mesmacoisa.–Éclaroquenãoé.Compreendoissomelhordoqueninguém.Eu...–De

repenteelaolhouàsuavolta,viuqueaportaestavaabertaefoifechá-la.–Jáescrevi inúmerascolunas–continuou–,eposso lheassegurarquenãoeram todas a mesma coisa. Algumas, eu adorei. – Ela sorriu, nostálgica,recordando a onda de satisfação e de orgulho que a invadia quandoescreviaoqueconsideravaumaediçãoespecial.–Eradelicioso,entendeoquequerodizer?Elefezquenão.– A sensação desaber que escolheu as palavras perfeitas – prosseguiu

Penelope, tentando explicar. – Só é possível apreciar isso depois de icarhorasolhandoparaumafolhadepapelembrancosemteramenor ideiadoqueescrever.

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–Issoeuentendo–comentouele.Penelopetentounãosorrir.–Euseiquevocêtambémconheceasensaçãodeprazer.Éumescritor

esplêndido,Colin.Jálioseutrabalho.Eleergueuavista,assustado.– Só um pedaço, naquela vez – assegurou-lhe ela. – Eu jamais leria os

seus cadernos sem você saber. – Ela ruborizou, recordando que leraescondidaotrechosobreaviagemdeleaoChipre.–Bem,nãoatualmente,pelo menos – acrescentou. – Mas estavabom, Colin. Quasemágico, e, emalgumlugardoseuíntimo,vocêsabedisso.Ele se limitou a itá-la, parecendo não saber o que dizer. Era uma

expressão que ela já vira diversas vezes, mas nuncanele, e era tãoestranho... Quis chorar, depois quis abraçá-lo. Acima de tudo, foi tomadaporumaintensanecessidadedefazê-losorrirdenovo.–Euseiquevocêjáexperimentouasensaçãoquedescrevi–insistiu.–A

certezadequeescreveualgobom.–Elaoolhou,esperançosa.–Entendeoqueeuquerodizer,nãoentende?Colinficouemsilêncio.– Entende, sim – a irmou ela. – Eu sei que entende. Não pode ser um

escritorenãosaber.–Nãosouescritor–retrucouele.–Éclaroqueé.–Elafezumgestoemdireçãoaodiário.–Aprovaéessa.

–Deuumpassoàfrente.–Colin,porfavor,medeixelerumtrecho.Pelaprimeiravez,elelhepareceuemdúvida,oquePenelopeconsiderou

umapequenavitória.–Vocêjáleuquasetudooqueeujáescrevinavida–argumentouela.–

Éjustoque...Penelope parou quando viu a expressão no rosto dele. De repente o

maridolhepareceufechado,distante,inalcançável.–Colin?–sussurrou.–Senãose importa,euprefeririamanter issoparamimmesmo–disse

ele.–Não,éclaroquenãomeimporto–garantiuela,masambossabiamque

estavamentindo.Colinpermaneceutãoimóvelesilenciosoqueelanãoteveescolhasenão

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pedirlicençaedeixá-losozinhonoaposento,fitandoaporta,impotente.Eleamagoara.Nãoforasuaintenção,masissonãoimportava.Elalheestenderaamãoe

ele fora incapaz de aceitá-la. E a pior parte era que Colin sabia quePenelope não compreendia. Achava que ele sentia vergonha dela. Ele lhedissera que não, mas como não conseguira lhe contar a verdade – quesentiainvejadela–,imaginavaqueelanãotinhaacreditadonele.Ora, ele também não teria acreditado. Colin parecera estar mentindo

porque, de certa forma, estavamentindo. Ou, pelo menos, omitindo umaverdade que o deixava desconfortável. Mas, no instante em que ela lhelembrara que ele lera tudo o que ela já escrevera, o incômodo cresceradentrodele.Colin lera tudo o que ela escrevera porque ela havia publicado tudo,

enquanto as incursões literárias dele permaneciam foscas e sem vidadentro dos seus diários, guardadas num lugar onde ninguém jamais asveria.Será que o que um homem escrevia tinha importância se ninguém

jamaislesse?Aspalavrastinhamsentidosejamaisfossemvistas?Ele jamais considerara publicar os diários até Penelope sugerir isso,

várias semanas antes. Agora a ideia o consumia (quando não eraconsumido por Penelope, é claro). Só que ele morria de medo. E seninguém quisesse publicar o seu trabalho? E se alguém publicasse, masapenas porque ele vinha de uma família rica e poderosa? Colin queria,mais do que tudo, brilhar por si mesmo, ser conhecido pelas própriasrealizações, não pelo sobrenome, pela posição social, pelo sorriso ou pelopoderdesedução.Então, ele pensava na possibilidademais assustadora de todas: e se os

seusescritosfossempublicados,masninguémgostassedeles?Comolidariacomaquilo?Comopoderiaexistircomoumfracassado?Ouseriapiorpermanecercomoagora:umcovarde?

Mais tarde, naquela mesma noite, depois que Penelope se obrigara alevantar da poltrona, bebera uma restauradora xícara de chá e icara

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andando deum lado para outro do quarto até en im se acomodar nostravesseiros com um livro no qual não conseguiu se concentrar, Colinapareceu.Aprincípioelenãodissenada,limitou-sea icaraliparadosorrindopara

ela; só que não era um de seus sorrisos de sempre, daqueles queiluminavam o ambiente e levavam quem estivesse presente a sorrir devolta.Eraumsorrisotímido,envergonhado.Umsorrisodedesculpas.Penelopeapoiouolivronocolo.–Posso?–perguntou,fazendoumgestoemdireçãoaolocalvazioaolado

dela.Elachegouparaolado.– É claro – murmurou, e em seguida colocou o livro na mesa de

cabeceira.– Marquei alguns trechos – disse ele, estendendo-lhe o diário. – Se

quiser lerpara... –Pigarreoupara limpar a garganta –dar a suaopinião,euacharia...–Tossiu.–Euachariabom.Penelopeolhouparaodiárioelegantementeencadernadoemcourocor

decarmimnamãodele,entãoergueuavistaparaencará-lo.Colinestavasério,comumarsombrio,e,emboranãomovesseumcentímetrodocorpo,elasabiaqueestavanervoso.Nervoso.Colin.Pareceu-lheacoisamaisestranhapossível.–Seriaumahonra–disseela,baixinho,puxandoocadernodamãodele

comtodoocuidado.Notouquealgumaspáginasestavammarcadase,comcautela,abriuem

umdoslocaisselecionados.

14demarçode1819AsTerrasAltasencontram-seestranhamentecastanhas.

–IssofoiquandovisiteiFrancescanaEscócia–interrompeuColin.Penelopelhedeuumsorrisoindulgente,comoumaleverepreensãopor

tê-lainterrompido.–Desculpe–murmurouele.

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Seria de imaginar, ou pelo menos alguém vindo da Inglaterra

imaginaria, que os montes e vales seriam verde-esmeralda. A inal, aEscócia está localizada na mesma ilha e, segundo todos os relatos,sofrecomasmesmaschuvasqueafligemaInglaterra.Conta-se que estas estranhas colinas bege são chamadas de

planaltos e que são áridas, castanhas e ermas. E, no entanto,tumultuamaalma.

–Issofoiquandoeuestavaemumaaltitudebemelevada–explicouele.

–Maisbaixo,pertodoslagos,ébastantediferente.Penelopesevirouparaeleséria.–Desculpe–disseColinmaisumavez.– Talvez você se sintamais confortável se não icar lendo por cima do

meuombro–sugeriuela.Elepiscou,surpreso.– Com certeza, você já conhece todos estes textos. – Diante do olhar

perplexo dele, ela acrescentou: – Então, não precisa lê-los de novo. –Esperou uma reação e Colin continuou em silêncio. – Logo, não precisaficarcoladoàsminhascostas,lendoporcimadomeuombro–concluiu.–Ah.–Eleseafastouumpouco.–Perdão.Penelopelhelançouumolharambíguo.–Levante-sedacama,Colin.Ele obedeceu e em seguida afundou numa poltrona na outra

extremidade do quarto. Cruzou os braços e icou batendo o pé no chãonumaimpacientecadência.Taptaptap.Taptaptap.–Colin!Eleergueuavista,genuinamentesurpreso.–Oquefoi?–Paredebateropénochão!Eleolhouparaosprópriospéscomoseoelesfossemumcorpoestranho.–Euestavabatendocomopénochão?–Estava.– Ah. – Ele apertou os braços ainda mais de encontro ao peito. –

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Desculpe.Penelopeseconcentrououtraveznodiário.Taptap.Elaergueuacabeça.–Colin!Eleplantouospésfirmementedevoltasobreotapete.–Nãopudeevitar.Nempercebioqueestavafazendo.Ele descruzou os braços e os apoiou na poltrona, mas não parecia

relaxado:osdedosdasduasmãosestavamtensosearqueados.Penelope o encarou por vários instantes, checando se de fato ele seria

capazdepermanecerquieto.–Nãovoufazerdenovo–garantiuele.–Prometo.Elasustentouoolharpormaisummomentoevoltouaprestaratenção

aotexto.

Comopovo,osescocesesdetestamos ingleses, emuitosdiriamquecom razão. Individualmente, no entanto, são calorosos, afáveis esempre ávidos por compartilhar um copo de uísque, uma refeiçãoquente, ou para oferecer um local bem aquecido para se passar anoite.Umgrupode ingleses–naverdade,qualquer inglês–trajandoqualquer tipo de uniforme não terá uma boa acolhida em qualquervilarejo do país.Mas caso um inglês solitário esteja caminhando poralguma de suas ruas principais, a população local o receberá debraçosabertosecomimensossorrisos.Foi assim quando cheguei a Inveraray, às margens do Lago Fyne.

Uma cidadezinha bem organizada e bem planejada, projetada porRobert Adam quando o duque de Argyll decidiu transferir a cidadeinteira para acomodar o seu novo castelo, encontra-se à beira daágua, seus prédios caiados de branco en ileirados em ângulos retos(semdúvidaumadisposiçãoestranhamenteorganizadaparaalguémcomoeu,criadoemmeioàsencruzilhadastortasdeLondres).EuestavajantandonoGeorgeHotel,deleitando-mecomumuísque

de qualidade excepcional em vez do comum que poderia serencontrado em qualquer estabelecimento semelhante na Inglaterra,quando me dei conta de que não tinha a menor ideia de como

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chegaria ao meu próximo destino, nem mesmo de quanto tempolevariaatélá.Abordeioproprietário(umcertoSr.Clark),expliqueiaminhaintençãodevisitaroCasteloBlaireemseguidanãopudefazernadamaisquepiscarsemparar,maravilhadoeconfuso,enquantoosdemais ocupantes da pousada se intrometiam na conversa, dandoconselhos.– Castelo Blair? – ribombou o Sr. Clark. (Era mesmo o tipo de

homem a ribombar, nada dado a falas mansas.) – Bem, se a suaintençãoéirparalá,comcertezadeveseguirparaoeste,emdireçãoaPitlochry,edepoisparaonorte.A resposta foi recebida por um coro de aprovações – e um eco

igualmenteruidosodedesaprovações.– Claro que não! – gritou outro, cujo nome era MacBogel,

conformedescobrimaistarde.–DessejeitoelevaiterdeatravessaroLagoTay,ejamaisseconheceureceitamelhorparaodesastre.Melhorrumardiretoparaonorteedepoisvirarparaoeste.– Sim – interrompeu um terceiro –, só que, assim, ele terá Ben

Navis no caminho. Está querendo dizer que uma montanha é umobstáculomenordoqueumlaguinhominúsculo?–EstáchamandooLagoTaydeminúsculo?Ouçabem:eunasciàs

margens do Lago Tay, e não admito que ninguém o chame deminúsculonaminhapresença.Não tenho amenor ideia de quem disse isso, ou, para ser sincero,

qualquer coisaque tenha sidoditaa seguir, embora tudo tenha sidopronunciadocomgrandeemoçãoecerteza.– Ele não precisa seguir até Ben Navis. Pode virar para oeste em

Glencoe.–Ora,essaéboa!Émelhorlevarumagarrafadeuísque,então.Não

há uma única estrada decente em Glescoe que vá para oeste. Estátentandomataropobrerapaz?E assim por diante. Se o leitor se deu conta de que parei de

informarquemdisseoquê, foiporqueabarulheirade vozes era tãointensa que icou impossível discernir quem era quem, e issocontinuounomínimopormaisdezminutos,até, inalmente,ovelhoAngusCampbell,quedeviateruns80anos,falare,porrespeito,todos

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secalarem.–Oqueeleprecisafazer–arquejouAngus–éviajaratéosul,até

Kintyre, rumar outra vez para o norte e atravessar o estuário deLorne atéMull, depois seguir em direção a Iona, velejar até Skye, iraté o continente em Ullapool, descer até Inverness, prestar as suashomenagens em Culloden e, dali, pegar o sul até o Castelo Blair,parandoemGrampian, seassimescolher,paravercomoé feitaumagarrafadeuísquedecente.Umsilêncioabsolutoseseguiuaoseupronunciamento.Por im,um

homemcorajosoobservou:–Masissoirálevarmeses.–Equemdissequenão?– concordouo velhoCampbell, comuma

leve belicosidade. –O inglês está aqui para conhecer aEscócia.QuerdizerqueelevaiconseguirfazerissoseseguiremlinharetadaquiatéPertshire?Aoouvirisso,sorrietomeiaminhadecisão:seguiriaexatamentea

rota traçadaporelee,quandovoltasseaLondres, teriaacertezadequeconheceraaEscócia.

Colin observara Penelope enquanto ela lia. De vez em quando, sua

esposa sorria e o coração dele dava um salto. Então, percebeu que osorriso se tornara permanente e que ela franzia os lábios como seprendesseoriso.Nessemomento,Colinsedeucontadequeeletambémsorria.Ficaramuitosurpresocomareaçãodelanaprimeiravezemquelerao

seu diário: tinha sido uma reação totalmente apaixonada,mas aomesmotempomuitoanalíticaeprecisa.Agoratudofaziasentido,éclaro.Penelopetambém era escritora, talvez até melhor do que ele, e tinha plenacompreensãodotextoescrito.Eradi ícilacreditarquelevaratantotempoparapediraopiniãodela.O

medo, supunha, o impedira.Medo, preocupação e todas aquelas emoçõesidiotasqueelefingianãosentir.Quem teria imaginado que a opinião de uma mulher se tornaria tão

importante para ele? Colin se empenhara em escrever os seus diáriosdurante anos, registrando todas as viagens com cuidado, tentando captar

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alémdascoisasquevia,faziaesentia.Ejamais,nemumavez,osmostraraaquemquerquefosse.Atéagora.Nuncatinhahavidoninguémaquemdesejassemostrá-los.Não,nãoera

verdade.No fundo, quiseramostrá-los amuitas pessoas,mas omomentonunca lhe parecera oportuno, ou então achara quementiriam para ele ediriamquehaviamadoradoapenasparanãomagoá-lo.MasPenelope era diferente. Era escritora. E umaótima escritora, aliás.

Se ela dizia que as suas anotações eram boas, ele quase conseguiaacreditar.Elafranziuos lábios levementeaotentarvirarapágina,entãofranziua

testa quando não conseguiu. Umedeceu o dedo médio com a língua, fezoutratentativa,dessavezbem-sucedida,ecomeçoualeroutravez.Easorrir,outravez.Colindeixouescaparoarsemsedarcontadequeoestiveraprendendo.Por im,elabaixouodiáriosobreocolo,deixando-oabertonapassagem

queacabaradeler.OlhouparaColinefalou:–Vocêqueriaqueeuparassedeleraofinaldoregistro,certo?Nãoeraoqueeleesperavaqueeladissesse,eissooconfundiu.–Hã...sevocêquiser–balbuciou.–Sepreferircontinuar,achoquenão

háproblema.Penelopeabriuumsorrisocapazdeiluminarocômodointeiro.– Éclaro que pre iro continuar – exclamou ela, entusiasmada. – Mal

possoesperarparasaberoqueaconteceuquandovocêchegouaKintyre,e Mull, e... – Com uma careta, ela consultou o caderno aberto. – Skye,Ullapool, Culloden e Grampian. – Olhoumais uma vez para o texto. – Ah,sim, e aoCasteloBlair, é claro, se équealgumdia chegouaté lá. Imaginoqueestivesseplanejandovisitaramigos.Elefezquesim.–Murray – falou, referindo-se a umamigode escola que era irmãodo

duque de Atholl. – Mas devo lhe avisar que acabei não seguindoexatamenteocaminhorecomendadopelovelhoAngusCampbell.Primeiro,porque não encontrei estradas que ligassemmetade dos lugares que elemencionou.–Talvezdevêssemos ir até lánanossaviagemde luademel– sugeriu

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ela,comarsonhador.– À Escócia? – perguntou ele, surpreso. – Não quer ir a algum lugar

quenteeexótico?– Para alguém que nunca se afastoumais do que 100 quilômetros de

Londres,aEscóciaéexótica–retrucouela.– Eu posso lhe garantir que a Itália émais exótica. Emais romântica –

disse ele, sorrindo, enquanto atravessava o quarto e se acomodava nabeiradadacama.Elaruborizou,oqueodeixouencantado.–Ah–murmurou,levementeenvergonhada.Ele se perguntou por quanto tempo ela ainda icaria constrangida ao

ouvi-lo falar de romance, amor e todas as esplêndidas atividades queacompanhavamambos.– Iremos à Escócia em outra ocasião – garantiu. – Costumo ir para o

nortedetemposemtemposparavisitarFrancesca,dequalquerforma.–Fiqueisurpresaporterpedidoaminhaopinião–comentouPenelope,

apósumbrevesilêncio.–Aquemmaiseupediria?–Nãosei–respondeuela.–Aosseusirmãos,suponho.Elecolocouamãosobreadela.–Eoqueelessabemsobreescrever?Ela ergueu a cabeça e o itou com seus olhos castanhos, límpidos e

afetuosos.–Euseiqueaopiniãodeleséimportanteparavocê.–Éverdade–concordouColin–,masasuaémais.Ele observou o rosto dela com cuidado enquanto avaliava as emoções

queoperpassavam.–Mas você não gosta do que eu escrevo – prosseguiu Penelope, a voz

hesitantee,aomesmotempo,esperançosa.ColintocouafacedePenelopecarinhosamente,fazendo-aolharparaele.– Nada poderia estar mais longe da verdade – declarou, com uma

intensidade abrasadora. – Considero você uma escritora maravilhosa,capaz de chegar à essência de uma pessoa comuma simplicidade e umaespeci icidadeímpares.Durantedezanos,feztodosrirem.Tambémosfezse encolherem, sobressaltados. Você os fez pensar, Penelope.Não consigo

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imaginarrealizaçãomaior.Semfalarqueescreviasobreasociedade,efaziaissodeformadivertida, interessanteeespirituosa,quandotodossabemosqueesseassuntomuitasvezesémaisdoqueentediante.Por um longo momento, Penelope não conseguiu dizer nada. Sentira

orgulhodoprópriotrabalhoduranteanosesorriraemseuíntimocadavezqueouviaalguémse referiraumade suas colunasou rirdeumde seuscomentários sarcásticos.Masnão tiveraninguémcomquemcompartilharostriunfos.Oanonimatolhederaumaperspectivasolitária.Mas, agora, tinha Colin. E, embora omundo jamais viesse a saber que

Lady Whistledown era, na verdade, a sem graça e invisível PenelopeFeatherington, que tinha escapado por um triz de ser para sempre umasolteirona,Colinsabia.Elacomeçavaasedarcontadequemesmoquenãofosseaúnicacoisaqueimportava,semdúvidaeraamaisimportante.Apesardisso,continuavasemcompreenderasaçõesdele.–Porque,então–começouela,bemdevagar–,você ica tãodistantee

friosemprequeeumencionooassunto?Quandoelerespondeu,suavozerapoucomaisqueumsussurro:–Édifícilexplicar.–Eusouumaboaouvinte–retrucouela,baixinho.Colin afastou a mão que segurava o rosto dela com tanto carinho e

deixou-adespencar sobreo colo. Então, disse a única coisa quePenelopejamaisteriaesperado:–Eutenhoinvejadevocê.–Eledeudeombros,mostrando-seimpotente.

–Sintomuito.–Nãoentendioquequerdizer–retrucouela.Nãoteveaintençãodesussurrar,masnãoconseguiufalarmaisaltoque

isso.– Olhe só para você, Penelope. – Ele tomou asmãos dela nas suas e a

encarou.–Éumenormesucesso.–Umsucessoanônimo–lembrouela.–Masvocêsabe,eeusei.Alémdomais,nãoédissoqueestoufalando.–

Elesoltouumadasmãosdelaepassouosdedosentreoscabelosenquantoprocuravaaspalavras.–Vocêrealizoualgo.Possuiumaobra.–Masvocêtem...

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–Oquê,Penelope?–interrompeuColin,levantando-se.Entãocomeçouacaminhardeumladoparaoutro.–Oqueeutenho?–Bem,vocêtemamim–disseela,deformadébil.Massabiaquenãoeraaissoqueelesereferia.Colinolhouparaela,fatigado.–Nãoédissoqueestoufalando,Penelope...–Eusei.–Precisodeumameta–a irmouele.–Deumobjetivo.Anthonytemum,

Benedicttambém,maseusótenhocoisasavulsas.–Colin,nãoéassim.Você...– Estou cansado de pensarem em mim como nada além de... – Ele se

deteve.–Oquê,Colin?–perguntouela,umtantosurpresacomaexpressãode

desgostoquederepenteatravessouorostodele.–Droga–praguejouele,baixinho.Elaarregalouosolhos.Colinnãocostumavablasfemar.– Não posso acreditar – murmurou ele, balançando a cabeça numa

negativa,claramentesofrendo.–Noquê?–indagouela,suplicante.–Eumequeixeicomvocê–disseele,incrédulo.–Queixei-mecomvocêa

respeitodeLadyWhistledown.Elafezumacareta.–Muitagentejáfezisso,Colin.Estouacostumada.– Não posso acreditar. Eu me queixei com você sobre o fato de Lady

Whistledowntermechamadodeencantador.– Elame chamou de fruta cítricamadura demais – devolveu Penelope,

tentandosuavizaraconversa.Eleinterrompeuopassoapenasparaencará-la,irritado.–Estavarindodemimotempotodoenquantoeumelamuriavadizendo

queas gerações futuras só se lembrariamdemimpor causadas colunasdeLadyWhistledown?– Não! – exclamou ela. – Espero que vocême conheçamelhor do que

isso.Elebalançouacabeça,incrédulo.– Não posso acreditar que iquei reclamando por não ter nenhuma

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realizaçãoprópriaquandovocêtinhatodasassuascolunas.Ela se levantou da cama. Era impossível icar ali, sentada, assistindo-o

andardeumladoparaoutrocomoumtigreenjaulado.–Colin,nãotinhacomovocêsaber.–Ainda assim. –Ele suspirou. – Seriauma ironiaperfeita, se não fosse

dirigidaamim.Penelopeentreabriuos lábiospara falar,masnãoconseguiudarvozao

que estava em seu coração. Colin tinha tantas realizações que ela nãoconseguianemcomeçaraenumerá-las.Nãoeramalgopalpável, comoumexemplar doCrônicas da sociedade de Lady Whistledown , mas eramigualmenteespeciais.Talvezatémaisespeciais.Ela se lembrou de todos os momentos em que ele izera as pessoas

sorrirem,detodasasvezesquepassaradiretopelasgarotaspopularesemumbaile e convidara para dançar a que estava tomando chá de cadeira.Pensounoelo forteequasemágicoquecompartilhavacomos irmãos. Seessascoisasnãoeramrealizações,entãoelanãosabiaoquemaisseria.No entanto, entendia que não eram o tipo de marco ao qual ele se

referia. Tinha consciência do que ele precisava: de um objetivo, umavocação.Algo para mostrar ao mundo que ele era mais do que pensavam que

fosse.–Publiqueassuasmemóriasdeviagem–sugeriuela.–Eunão...–Publique-as–insistiuela.–Arrisque-seevejaoqueacontece.Ele a encarou, então olhou para o diário, que ela ainda segurava com

força.–Elasprecisariamsereditadas–murmurou.Peneloperiu,porquesabiatervencido.Eeletambémvencera.Aindanão

tinhaconsciênciadisso,masvencera.–Todo textoprecisasereditado–comentouela,osorrisosealargando

maisemaisacadapalavra.–Bem,excetoosmeus,imagino–brincouela.–Outalvezprecisassem,sim–acrescentou,dandodeombros.–Masnuncasaberemos,poisnãohavianinguémparafazerisso.Eleergueuavista,derepente.

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–Comovocêfazia?–Comoeufaziaoquê?Elefranziuoslábios,impaciente.– Você sabe. Como fazia a coluna? Era preciso mais do que apenas

escrever.Haviaaimpressãoeadistribuição.Alguémtemdetersabidosuaidentidade.Ela deuum longo suspiro. Guardara aqueles segredos por tanto tempo

quesesentiaestranhaemcompartilhá-los,atémesmocomomarido.–Éumalongahistória.Talvezvocêdevasesentar.Osdois se acomodaram, recostando-senos travesseiros, comaspernas

estendidasàfrente.–Eueramuitojovemquandotudocomeçou–relatouPenelope.–Tinha

apenas17anos.Eaconteceuporacaso.Elesorriu.–Comoalgoassimpodeacontecerporacaso?– Escrevi de brincadeira. Estavamuito infeliz durante aquela primeira

temporada. – Ela o encarou com honestidade nos olhos. – Não sei selembra,maseupesavauns6quilosamaisdoquehoje,eolhequenãosouesbelta,deacordocomamodavigente.–Euaachoperfeita–retrucouele,deimediato.Isso era, pensou Penelope, um dos motivos pelos quais ela própria o

achavaperfeito.–Mas, como ia dizendo – continuou –, eu não estava numa fasemuito

feliz, então redigiumrelatobastantemordaz sobreuma festaàqual forana noite anterior. Então escrevi outro, e mais outro. A princípio não osassinei como Lady Whistledown; apenas os escrevi por diversão e osescondinaminhaescrivaninha.Daí,umdia,meesquecideescondê-los.Colininclinouocorpoparaafrente,absortopelanarrativa.–Oqueaconteceu?– Toda a família tinha saído, e eu sabia que icariam fora por algum

tempo, porque na época mamãe ainda achava que poderia transformarPrudence num diamante de primeira linha e as compras das duasduravamodiatodo.Colin rolava a mão pelo ar, indicando que ela devia chegar logo à

essênciadahistória.

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–Dequalquerforma–continuouPenelope–,eudecidiescrevernasalade estar, porque o meu quarto estava úmido e cheirando a mofo, poisalguém, suponho que eu mesma, tinha deixado a janela aberta duranteumatempestade.Masentãoeutivede...Bem,vocêsabe.–Não–disseColin,deformabrusca–,nãosei.– Tive de cuidar de um assunto particular – sussurrou Penelope,

ruborizando.–Ah,certo–retrucouele,semprestaramenoratenção,claramentenem

umpoucointeressadonessapartedahistória.–Continue.–Equandovolteioadvogadodemeupaiestavalá.Eestavalendooque

euhaviaescrito!Fiqueihorrorizada.–Eaí,oqueaconteceu?–Duranteumminuto inteiro eunem consegui falar.Mas, então, vi que

ele estava rindo, enãopor acharque eu eraboba,maspor considerarotextobom.–Bem,seustextossãobons.–Agoraeu seidisso– retrucouela comumsorriso irônico–,masvocê

precisalembrarqueeutinha17anos.Edisseracoisasbemhorrendas.–Sobrepessoashorrendas,imagino–disseele.– Bem, claro, mas ainda assim... – Ela fechou os olhos enquanto as

lembranças a loravam. – Eram pessoas populares. In luentes. Gente quenãogostavamuitodemim.Ofatodeseremterríveisnãoimportariamuitoseoqueeutinhaescritofossedescoberto.Naverdade,seriabempior.Euteriasidoarruinada,assimcomotodaaminhafamília.–Eoqueaconteceu, então?Suponhoqueapublicação tenha sido ideia

dele.Penelopefezquesimcomacabeça.– Foi. Ele tomou todas as providências junto ao tipógrafo, que, por sua

vez,encontrouosmeninosparafazeremaentrega.Etambémfoiideiadelea distribuição gratuita nas primeiras duas semanas. Disse queprecisávamosviciaraaltasociedade.–Euestava foradopaísquandoa colunacomeçou–disseColin–,mas

minhamãeeminhasirmãsmecontaramtudoarespeito.– As pessoas resmungaram quando o jornal começou a ser cobrado –

relatouPenelope.–Mastodaspagaram.

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– Uma ideia muito inteligente da parte do seu advogado – murmurouColin.–Sim,eleeramuitoesperto.Elereparounousodopretérito.–Era?Elaassentiu,triste.–Ele faleceuháalgunsanos.Massabiaqueestavadoente,então,antes

demorrer,meperguntou se eu queria continuar. Eu poderia ter parado,mas não tinhamais nada na vida, e, certamente, nenhum pretendente. –Elaergueuavista,rápido.–Eunãoquero...Estouquerendodizer...Colincurvouoslábiosnumsorrisoautodepreciativo.–Podemecriticaràvontadepornãotê-lapedidoemcasamentoháanos.Peneloperetribuiuosorriso.Comonãoamaraquelehomem?–Mas sódepoisde terminarahistória–acrescentouele, combastante

firmeza.–Certo–assentiuela, forçando-sea retomaroassunto.–Depoisqueo

Sr... – Penelope ergueu a vista, hesitante. – Não sei ao certo se deveriadizeroseunome.Colin sabia que ela estava dividida entre o amor e a con iança que

depositava nele e a lealdade por um homem que tinha, muitoprovavelmente,sidoumpaiparaeladepoisqueoseudeixaraestemundo.–Tudobem–disseele,baixinho.–Onomedelenãoimporta.Elasoltouarespiração.–Obrigada– falou, depoismordeuo lábio inferior. –Não éque eunão

confieemvocê.Eu...–Euentendo–garantiuele,tranquilizando-a.–Sequisermecontarem

outraocasião,tudobem.Esenãoquiser,nãoháproblema.Penelopeassentiucomoslábiostrêmulos,tentandosegurarochoro.– Depois que ele morreu, passei a trabalhar diretamente com o

tipógrafo. Idealizamos um sistema de distribuição e os pagamentoscontinuaram a ser feitos da mesma forma: numa conta aberta em meunome.Colin respirou fundo, pensando em quanto dinheiro ela devia ter

ganhado ao longo dos anos. Mas como ela poderia tê-lo gastado semsuscitarsuspeitas?

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–Fezalgumsaque?–perguntouele.Elaassentiu.– Quando a coluna completou quatro anos, minha tia-avó faleceu e

deixou o que tinha paraminhamãe. O advogado demeu pai escreveu otestamento.Elanãopossuíamuitacoisa,entãonósdois ingimosqueomeudinheiro era dela. – O rosto de Penelope se iluminou enquanto elabalançava a cabeça. – Minha mãe icou tão surpresa... Jamais imaginaraque tiaGeorgette fosse tãorica.Passoumesessorrindo.Eununcaa tinhavistodaquelamaneira.–Foimuitogentildasuaparte–comentouColin.Penelopedeudeombros.–Eraaúnicaformadeeupoderusaromeudinheiro.–Masvocêodeuàsuamãe–observouele.–Elaéminhamãe–retrucouPenelope,comoseaquiloexplicassetudo.–

Sempremesustentou.Davatudonamesma.Ele quis dizer mais, mas não o fez. Portia era mãe de Penelope, e se

Penelopequisesseamá-la,Colinnãotentariaimpedi-la.–Desdeentão–continuouPenelope–,nãotoqueimaisnodinheiro.Bem,

nãoparamimmesma.Fizalgumasdoaçõesparainstituiçõesdecaridade.–Elafranziuorosto.–Doaçõesanônimas.Colin icou em silêncio por ummomento, pensando em tudo o que ela

fizeranaúltimadécada,completamentesozinha,emsegredo.–Sequiserodinheiroagora–disseele,por im–,deveusá-lo.Ninguém

irá questionar o fato de você de repente ter recursos. A inal, é umaBridgerton. – Ele deu de ombros, com modéstia. – Todos sabem queAnthony estabeleceu umpadrão de vidamuito confortável para todos osirmãos.–Eunemsaberiaoquefazercomtantodinheiro.–Comprealgumacoisanova–sugeriuele.Nãoeraverdadequetodasasmulheresgostavamdefazercompras?Elaolhouparaelecomumaexpressãoestranhaequaseindecifrável.– Acho que você não imagina quanto dinheiro eu tenho – retrucou

Penelope,comcautela.–Achoquenuncaconseguiriagastá-loporinteiro.–Guarde-oparaosnossos ilhos,então–sugeriuColin.–Tiveasortede

meu pai e meu irmão me proporcionarem todos os recursos, mas nem

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todososfilhosmaisnovostêmesseprivilégio.– E ilhas – lembrou Penelope. – Nossas ilhas devem ter o próprio

dinheiro.Separadodosdotes.Colin teve de sorrir. Arranjos do tipo eram raros, mas é claro que

Penelopeinsistiriaemalgoassim.–Comovocêquiser–faloudeformaafetuosa.Penelope sorriu, deixou escapar um suspiro e se ajeitou nos

travesseiros.Passouosdedospreguiçosamentesobreodorsodamãodele,masseuolharestavadistanteeColinduvidouqueela tivesseconsciênciadosprópriosmovimentos.–Tenhoumacon issãoafazer–disseelaemumavozmuitobaixaeaté

mesmoumpoucotímida.Eleolhouparaela,curioso.–MaiordoquesobreLadyWhistledown?–Diferente.–Oqueé?Penelopevirouorostoparaeleefitou-ocomumolharintenso.–Eu tenhomesentidoumpouco... –Elamordeuo lábioenquanto fazia

uma pausa e procurava as palavras certas. – Acho que tenho andadoimpacientecomvocênosúltimostempos.Não,nãoéisso.Naverdade,andodesapontada.Umasensaçãoestranhainvadiuopeitodele.–Comoassim,desapontada?Eladeudeombrosdeleve.–Vocêpareciatãozangadocomigo...PorcausadeLadyWhistledown.–Jálheexpliqueiqueeraporque...–Não,por favor–pediuela,pousandoamãonopeitodele.–Deixe-me

terminar. Você sabe que eu pensei que tivesse vergonha demim. Tenteideixar para lá, mas doeumuito, de verdade. Pensei que soubesse quemvocêera,enãopodiaacreditarqueseconsiderariatãomelhordoqueeuapontodesentirtantavergonhadasminhasrealizações.Eleaolhouemsilêncio,esperandoquecontinuasse.–Masomaisengraçadoéque...–Elasevirouparaelecomumsorriso

sábio.–Nãoeraporquevocêestivesseenvergonhado.Vocêsimplesmentequeriateralgoparecido.Algoqueseassemelhasseàminhacoluna.Agora

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parece bobagem, mas tive tanto medo de que você não fosse o homemperfeitodosmeussonhos...–Ninguéméperfeito–retrucouele,baixinho.– Eu sei. – Ela chegou para a frente e lhe deu um beijo impulsivo no

rosto. – Você é o homem imperfeito domeu coração, e isso é atémelhor.Sempreoconsiderei infalível, sempreacheiquea suavida fosseperfeita,quevocênãotivessepreocupações,medosousonhosirrealizados.Masissonãofoimuitojustodaminhaparte.–Nuncasentivergonhadevocê,Penelope–sussurrouele.–Nunca.OsdoispermaneceramemumconfortávelsilêncioatéPenelopedizer:–Lembraquelhepergunteisepoderíamosfazerumaviagemdeluade

meltardia?Elefezquesim.–Porquenãousamosumpoucodomeudinheiroparaisso?–Euvoupagarpelaviagemdeluademel.–Ótimo – exclamou ela, comuma expressão altiva. – Pode tirar da sua

mesadatrimestral.Colinolhouparaela,chocado,depoispôs-seagargalhar.– Agora também vai querer deixar dinheiro em casa para as

emergênciasdodiaadia?–indagouele,sorrindoabertamente.– Não, para as penas – corrigiu ela. – Para poder escrever nos seus

diários.–Hum,gosteidisso–refletiuele.Elasorriuecolocouumadasmãossobreadele.–Eugostodevocê.Eleapertouosdedosdela.–Tambémgostodevocê.Penelopesuspirouenquantopousavaacabeçaemseuombro.–Éparaavidasertãomaravilhosaassimmesmo?–Euachoquesim–murmurouele.–Achodeverdade.

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CAPÍTULO21

Uma semana depois, Penelope estava atrás da escrivaninha na sala devisitas,lendoosdiáriosdeColinefazendoanotaçõesnumafolhadepapelàparte sempre que tinha uma pergunta ou um comentário. Ele lhe pediraajudaparaeditarostextos,tarefaqueelaachavaemocionante.Estava, é claro, felicíssima por ele lhe ter con iado uma função tão

importante. Signi icava que con iava em seu julgamento, que a achavainteligenteeesperta,capazdetransformaroqueescreveraemalgoaindamelhor.Massuafelicidadenãosedeviaapenasa isso.Penelopetambémestava

precisandodeumprojeto,dealgoparafazer.Nosprimeirosdiasdepoisdeabrir mão do Whistledown, tinha comemorado o tempo livre recém-conquistado.Eracomoterfériaspelaprimeiravezemdezanos.Havialidocomoumalouca–todososromanceselivrosquecompraraejamaistiveraa oportunidade de ler. Fizera longas caminhadas, andara a cavalo noparque, sentara-senopequenopátioque icavaatrásdesuacasanaRuaMountparasedeliciarcomoagradávelclimaprimaverilecomocalordosol.Aseguir,vieramocasamentoeainfinidadededetalhesqueconsumiram

o seu tempo. Assim, não tivera muitas chances de se dar conta do quetalvezestivessefaltandoemsuavida.Quandoredigiaacoluna,atarefaemsinãolevavatantotempo,masela

precisava icar sempre em estado de alerta, observando, escutando. Equandonãoestavaescrevendo,estavapensandoemescreveroutentandodesesperadamente chegar a alguma maneira inteligente de formulardeterminadafraseatépoderchegaremcasaeanotá-la.Havia sido intelectualmente envolvente, e elanãopercebera até aquele

momentoquantosentirafaltadeserdesafiada.Estava anotandoumapergunta sobre a descrição de Colin de umavilla

toscana na página 143 do volume 2 de seus diários quando o mordomodeuumabatidinhadiscretaàportaabertaparaalertá-ladesuapresença.

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Penelope sorriu, encabulada. Tinha a tendência de mergulhar porcompletono trabalho, eDunwoodyaprendera, comaexperiência,que, sequisessechamarasuaatenção,tinhadefazeralgumbarulho.–Temumapessoaaquiquedesejavê-la,Sra.Bridgerton.Penelope ergueu a vista, sorrindo. Devia ser uma das irmãs ou, talvez,

umdoscunhados.–Émesmo?Quem?Eledeuumpasso à frente e lhe entregouumcartão.QuandoPenelope

viu o que estava escrito, sufocou um grito, primeiro devido ao choque,depoisà infelicidade.Gravadoempretoclássicoe imponentesobre fundocreme,haviaduaspalavrassimples:CressidaTwombley.CressidaTwombley?Porquediaboelairiavisitá-la?Penelope começou a se inquietar. Cressida jamais apareceria em sua

casa a não ser que fosse comumobjetivodesagradável. Amulher nuncafazianadaquenãofosseparaalcançarumobjetivodesagradável.–Querqueeuamandeembora?–indagouDunwoody.– Não – respondeu Penelope, com um suspiro. Não era covarde, e

CressidaTwombleynãoiriatransformá-laemuma.–Vourecebê-la.Sómedêuminstanteparaguardarosmeuspapéis.Mas...Dunwoodyparouondeestavaeesperou.–Ah,deixeparalá–murmurouPenelope.–Temcerteza,Sra.Bridgerton?– Tenho. Não. – Ela gemeu. Sentia-se perturbada, e esta eramais uma

coisa desagradável a ser acrescentada à já longa lista de inconveniênciasdeCressida:elaestavatransformandoPenelopenumaimbecilgaguejante.–Oquequerodizeréqueseelaaindanãotiveridoemboradepoisdedezminutos,poderiainventaralgumaemergênciaqueexijaaminhapresença?Aminhapresençaimediata?–Creioquepossoatendê-la.–Ótimo,Dunwoody–exclamouPenelope,comumsorrisodébil.Aquela podia ser a saída mais fácil, mas Penelope achava que não

conseguiria reconhecer o momento perfeito para insistir que Cressidafosseembora,eaúltimacoisaquedesejavaera icarpresanasalacomelaatardeinteira.Logo,precisavadaajudadeDunwoody.O mordomo assentiu e se retirou. Penelope juntou os papéis em uma

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pilha,fechouodiáriodeColinecolocou-osobreelademaneiraqueabrisaque entrava pela janela não izesse as folhas voarem de cima da mesa.Então se levantou e foi se sentar no sofá, esperando parecer relaxada etranquila.ComoseumavisitadeCressidaTwombleypudesseserrelaxante.Um instante depois, Cressida entrou na sala após ser anunciada pelo

mordomo.Comosempre,estava linda, comcada iodecabelodouradonolugar perfeito. A pele era impecável, os olhos, brilhantes, as roupasseguiamaúltimamodaeabolsacombinavaperfeitamentecomelas.–Cressida,quesurpresa!–dissePenelope.“Surpresa” era a palavramais educada que ela conseguiu pronunciar,

dadasascircunstâncias.OslábiosdeCressidasecurvaramnumsorrisomisteriosoequasefelino.–Tenhocertezaquesim–murmurou.–Não quer se sentar? – perguntouPenelope, em grande parte porque

tinhadefazê-lo.Passaraavidatodasendoeducada;eradi ícildeixardesê-loagora.Fez

sinalparaumacadeirapróxima,amaisdesconfortáveldasala.Cressidasentou-senabeirada.Suaposturaeraelegante,osorriso, irme,

eelaaparentavaumaserenidadeimpressionante.–Semdúvida,estáseperguntandooquevimfazeraqui–falou.Penelopenãoviumotivoparanegar,entãoassentiu.–Oqueestáachandodavidadecasada?–perguntouCressidadeforma

abrupta.Penelopepiscou,aturdida.–Oquedisse?–Deveserumamudançaderitmoimpressionante.– Sim, mas uma mudança muito bem-vinda – retrucou Penelope,

cautelosamente.–Claro,claro.Devetermuitotempolivreagora.Imaginoquemalsaibao

quefazercomotempolivre.Penelopecomeçouasentirumformigamentoseespalharpelocorpo.–Nãoentendioquequerdizer–falou.–Não?Ao ver que Cressida esperava uma resposta, Penelope disse, um tanto

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irritada:–Não,nãoentendi.Cressida icouemsilêncioporuminstante,masseuardegataperigosa

era bastante expressivo. Varreu a sala com os olhos e se deteu naescrivaninhaàqualPenelopeestiverasentada.–Oquesãoaquelespapéis?–indagou.Penelopeolhounomesmoinstanteparaasfolhasempilhadasdebaixodo

diário de Colin. Não havia nenhuma forma de Cressida saber que setratava de algo especial. Penelope já estava sentada no sofá quando elaentraranoaposento.– Não vejo como os meus documentos pessoais poderiam ser da sua

conta–disse.– Ora, não se ofenda – retrucou Cressida, com uma risadinha que

Penelopeachouapavorante.–Estavaapenaspuxandoconversa.Tentandosaberdascoisasquelheinteressam,poreducação.– Compreendo – falou Penelope, apenas para preencher o silêncio que

seseguiu.–Soumuitoobservadora–continuouCressida.Penelopeergueuassobrancelhasinterrogativamente.–Naverdade,meusaguçadospoderesdeobservaçãosãomuitofamosos

entreosmelhoresmembrosdaaltasociedade.–Eunãodevofazerpartedessegrupo,então–murmurouPenelope.MasCressidaestavaenvolvidademaiscomoprópriodiscursoparaouvir

ocomentáriodePenelope.–Efoipor isso–prosseguiu,comumaexpressãopensativa–queachei

que talvez fossecapazdeconvenceraalta sociedadedequeeueraLadyWhistledown.OcoraçãodePenelopebatiaforte.–Entãovocêadmitequenãoéela?–indagou,comcautela.–Ora,euachoquevocêsabequenãosou.Penelopecomeçoua icarsemar.Dealgumaforma–ela jamaissaberia

como–,conseguiumanteracomposturaeperguntar:–Comodisse?Cressidasorriu,masdemaneirasonsaecruel.–Quandoinventeiessahistória,penseiquenãotinhanadaaperder.Ou

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convenceria todomundo de que era LadyWhistledown ou ninguém iriaacreditar em mim e eu pareceria muito astuta quando dissesse que sóestavafingindoserelaparafazeroverdadeiroculpadoserevelar.Penelopenãomoviaumsómúsculo.–Mas as coisas não aconteceram como eu planejei. LadyWhistledown

acabou sendo bem mais perversa e cruel do que eu teria imaginado. –Cressida estreitou os olhos até que o seu rosto, sempre tão encantador,assumisseumaexpressãosinistra.–Aúltimacolunaqueelaescreveumetransformouemalvodoridículo.Penelopeficouemsilêncio,malconseguindorespirar.– Então... – continuou Cressida, baixando a voz até que ela se tornasse

umsussurro.–Entãovocê...vocêteveadesfaçatezdemeinsultarnafrentedetodaaaltasociedade.Penelopedeixouescaparumpequenosuspirodealívio.TalvezCressida

nãosoubesseoseusegredo.Talveztudoaquilotivesserelaçãocomo fatodeelatersidoinsultadaporPenelopeempúblico,queaacusaradementire dissera... Por Deus, o que fora mesmo que dissera? Algo muito cruel,dissotinhacerteza,massemdúvidamerecido.–Talvezeutivesseconseguidotoleraroinsultosetivessevindodeoutra

pessoa–prosseguiuCressida.–Masdealguémcomovocê...Bem,issonãopodiaficarsemresposta.–Vocêdeveriapensarduasvezesantesdemeofenderdentrodaminha

casa – avisou Penelope, em voz baixa. Então acrescentou, emboradetestasse usar o nome do marido para se proteger: – E eu sou umaBridgertonagora.Carregoopesodesuaproteção.AadvertênciadePenelopenãoteveomenorefeitosobreamáscarade

satisfaçãoquemoldavaolindorostodeCressida.– Eu acho melhor você ouvir o que eu tenho a dizer antes de fazer

ameaças.Penelope sabia que tinha de escutar. Eramais importante descobrir o

queCressidasabiadoquefingirqueestavatudobem.–Continue–falou.– Você cometeu um erro essencial – a irmou Cressida, balançando o

indicador na direção de Penelope. – Esqueceu que eu jamais perdoo uminsulto,nãofoi?

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–Oqueestátentandodizer,Cressida?Penelopequeriaqueaspalavrassaíssemnumtomforteedecidido,mas

elasforamapenassussurros.Cressidase levantoueseafastoubemdevagardePenelope,osquadris

numlevebalanço,quaseumrebolado.–Deixe-meverseconsigo lembrarassuaspalavrasexatas–continuou

ela,batendocomumdosdedosna face.–Ah,não,nãoprecisameajudar.Tenho certeza de que recordarei. Ah, sim! – Ela se virou para encararPenelope. – Creio que tenha dito que sempre gostara de LadyWhistledown.Então,eaquieudevo lhedarocréditodevido,pois foiumafraseevocativaememorável, você falouqueo seucoração icariapartidoseelaacabassesendoalguémcomoeu–concluiuCressida,sorrindo.Penelopesentiuaboca icarseca,seusdedoscomeçarematremereseu

corpoficargelado.Porque, embora não se lembrasse exatamente do que dissera ao

desmascarar Cressida, recordava muito bem o que escrevera naquelaúltima e derradeira coluna – a que fora distribuída, por engano, no seubailedenoivado.Aque...aqueCressidaagoraestendiabemàsuafrente.

Senhorasesenhores,estaautora NÃOÉLadyCressidaTwombley.Elanadamaisédoqueumaimpostoraintrigueira,emeucoração icariapartido ao ver anos do trabalho árduo serem atribuídos a alguémcomoela.

Penelopeolhou ixamenteparaaspalavras,emborasoubessecadauma

delasdecor.–Oquequerdizer?–perguntou,apesardeterplenaconsciênciadeque

atentativadefingirinocênciaseriainútil.– Você é mais inteligente do que isso, Penelope Featherington –

respondeuCressida.–Vocêsabequeeusei.Penelope itou a folha de papel incriminadora, incapaz de desviar os

olhosdaquelaspalavrasfatais:Meucoraçãoficariapartido.Meucoraçãoficariapartido.Meucoraçãoficariapartido.

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Meucoração...– Não vai dizer nada? – provocou Cressida, e apesar de Penelope não

estarolhandoparaela,pôdesentirosorrisorancorosoearrogante.–Ninguémvaiacreditaremvocê.– Eu mesma mal posso acreditar – retrucou Cressida. – Você, dentre

todas as pessoas. Mas, pelo visto, você era um pouco mais esperta eprofundadoquedeixavatransparecer.Espertaosu iciente–acrescentouenfaticamente–parasaberque,umavezqueeuacenderafagulhadesseboato,anotíciavaiseespalharcomofogoempalha.Penelopesentiuamenterodardeformavertiginosaedesagradável.Ah,

Deus,oquediriaaColin?Comohaveriadelhecontar?Sabiaquetinhadefazê-lo,masondeencontrariaaspalavras?–Noinícioninguémvaiacreditar–falouCressida.–Quantoa isso,você

tem razão.Mas logo todos começarão a pensar e aos poucos as peças doquebra-cabeçaseencaixarão.Alguémlembraráquelhedissealgumacoisaquefoipararnacoluna.Ouquevocêesteveemdeterminadafestanacasadetalpessoa.OuqueviramEloiseBridgertonxeretandoporaí,eseráquetodosnãosabemquevocêscontamtudoumaparaaoutra?– O que você quer? – perguntou Penelope, a voz baixa e assustada,

quandofinalmenteergueuacabeçaparaenfrentarainimiga.–Ah,eisaperguntaqueeuestavaesperando.–Cressidajuntouasmãos

atrás das costas e começou a caminhar de um lado para outro. – Venhopensandomuitonoassunto.Naverdade,proteleiaminhavisitaemquaseumasemanaatétomarumadecisão.Penelopeengoliuemseco,desconfortávelcomaideiadeCressidasaber

seusegredomaisíntimohaviaquaseumasemanaenquantoelacontinuavavivendo alegremente sua vida, sem saber que o céu estava prestes adesabarsobresuacabeça.– Eu sabia desde o início, é claro, que queria dinheiro – continuou

Cressida.–Masaquestãoera:quanto?SeumaridoéumBridgerton,entãoé evidente que tem recursos su icientes, mas, por outro lado, é um dosilhos mais novos, de modo que não tem os bolsos tão cheios quanto ovisconde.–Quanto,Cressida?–dissePenelope,entreosdentes.Sabia que Cressida estava estendendo o assunto só para torturá-la e

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tinhapoucaesperançadequeela falasseumvalor antesdeestarprontaparafazê-lo.– Aí, eu me dei conta – prosseguiu Cressida, ignorando a pergunta (e

provando o que Penelope imaginara) – que você também deve serbastanterica.Anãoserquesejaumatolacompleta,econsiderandooseusucesso em esconder esse segredinho por tanto tempo, repensei minhaopinião a seu respeito e agora acho que você não é nenhuma idiota.Portanto,sópodeterganhadoumafortunaescrevendoacolunaportodosesses anos. E, levando em conta as aparências – ela olhou com debochepara o vestido vespertino de Penelope –, não a vem gastando. Assim, sóposso deduzir que todo o dinheiro esteja escondido numa discretacontinhabancária,apenasaguardandosersacado.–Quanto,Cressida?–Dezmillibras.Penelopesufocouumgrito.–Vocêélouca!–Não.–Cressidasorriu.–Apenasmuito,muitoesperta.–Eunãotenhodezmillibras.–Achoqueestámentindo.–Possolheassegurarquenãoestou!E,de fato,nãoestava.AúltimavezquePenelopeveri icarao seu saldo

bancário, tinha 8.246 libras, embora imaginasse que, com os juros, essaquantiativesseaumentadoumpoucodesdeentão.Eraumasomaenorme,sem dúvida, o su iciente para qualquer pessoa viver com conforto porvárias gerações, mas não eram dez mil libras, e não era nada que eladesejasseentregardemãobeijadaaCressidaTwombley.Cressidasorriuserenamente.– Tenho certeza que descobrirá o que fazer. Entre o dinheiro que tem

guardadoeodoseumarido,dezmillibrassãoumasomainsignificante.–Dezmillibrasnuncasãoumasomainsignificante.– De quanto tempo precisa para juntar os recursos? – perguntou

Cressida,ignorandoaexplosãodePenelope.–Deumdia?Dois?– Dois dias? – ecoou Penelope, boquiaberta. – Não conseguiria nem

mesmoemduassemanas!–Arrá!Entãotemodinheiro.

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–Nãotenho!–Umasemana–decretouCressida,comavozáspera.–Queroodinheiro

emumasemana.–Nãoodareiavocê–sussurrouPenelope,maisparasimesma.–Vaidar,sim–devolveuCressida,confiante.–Senãoder,euaarruíno.–Sra.Bridgerton?PenelopeergueuavistaedeucomDunwoodydepénovãodaporta.– Há um assunto urgente que exige a sua atenção – disse ele. –

Imediatamente.– Tudo bem – falou Cressida, encaminhando-se para a porta. – Já

terminamosaqui.–Aochegaraocorredor,virou-sedemodoquePenelopefosseforçadaaencará-la.–Tereinotíciassuasembreve,certo?–indagou,com a voz suave e inocente, como se não estivesse falando de nadamaisimportantedoqueumconviteparaumafestaoudadatadeumareuniãoparaumeventofilantrópico.Penelopeassentiudeleve,apenasparaselivrardela.Masnãoimportava.Cressidapodiateridoembora,porémosproblemas

dePenelopenãoiamalugaralgum.

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CAPÍTULO22

Três horas depois, Penelope continuava na sala de visitas, sentada nosofá,olhando ixamenteparaonadaetentandodescobrircomoresolveriaaquelasituação.Nãoeraumapessoaagressivaenãoconseguiaselembrardaúltimavez

quetiveraumpensamentoviolento,masnaquelemomentopoderiatorceropescoçodeCressidaTwombleycomprazer.Olhou em direção à porta com uma sensação sombria de fatalidade,

esperando o marido chegar em casa, sabendo que a cada segundo seaproximavaomomentoemqueteriadeconfessartudoaele.Colinnãodiria“Eulheavisei”.Jamaisseriacapazdealgoassim.Maspensaria.Não ocorrera a Penelope, nemmesmopor umminuto, esconder aquilo

dele.AsameaçasdeCressidanãoeramotipodecoisaqueseocultavadomarido,e,alémdomais,iriaprecisardaajudadele.Não sabia ao certooque teriade fazer,masoquequerque fossenão

saberiafazê-losozinha.No entanto, havia algo de que estava certa: não queria pagar nada a

Cressida.Nãohaviaamenorpossibilidadedesuainimigasesatisfazercomdez mil libras, não quando achava que poderia conseguir mais. SePenelopecedesseagora,teriaquesustentarCressidapelorestodavida.Issosigni icavaque,dentrodeumasemana,ela contariaparaomundo

quePenelopeFeatheringtoneraainfameLadyWhistledown.Penelopeachavaterduasescolhas.Podianegar,chamarCressidadetola

eesperarque todosacreditassemnela,oupodiaencontraralguma formadeusararevelaçãoaseufavor.Mas,portudooquelheeramaisprecioso,nãosabiacomo.–Penelope?EraavozdeColin.Queriaseatiraremseusbraçose,aomesmotempo,

malconseguiasevirarparaele.–Penelope?–Agoraelepareciapreocupado,ospassossetornandomais

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rápidosenquantoatravessavaasala.–DunwoodymecontouqueCressidaesteveaqui.Elesesentouaoladodelaetocouasuaface.Elaseviroueviuasrugas

depreocupaçãonorostodele.Nessemomento,elafinalmentesepermitiuchorar.Eraengraçadocomoforacapazdesecontrolaratéover.Masagoraque

elehavia chegado, aúnica coisaqueconseguia fazereraenterraro rostono calor de seu peito e se aninhar em seus braços, como se de algumaformaelepudesse fazer todosos seusproblemasdesapareceremapenascomasuapresença.–Penelope?–disseele,avozbaixaepreocupada.–Oqueaconteceu?O

quehádeerrado?Ela se limitou a balançar a cabeça enquanto tentava reunir coragem

parafalarecontrolaraslágrimas.–Oqueelafezcomvocê?–Ah,Colin–retrucouela,dealgumaformaconseguindoseafastardele

osuficienteparafitá-lo.–Elasabe.Colinficoupálido.–Como?Penelopefungou,emseguidaenxugouonarizcomodorsodamão.–Aculpaéminha–sussurrou.Elelheentregouumlençosemdesviarosolhosdela.–Aculpanãoésua–falou,deformarude.Penelopeabriuoslábiosnumsorrisotriste.Sabiaqueotomríspidoera

direcionadoaCressida,maselamesmaomerecia.–É,sim–insistiuela,avozcheiaderesignação.–Aconteceuexatamente

oque vocêdisse que aconteceria. Eunãoprestei atençãonoque escrevi.Cometiumerro.–Oquevocêfez?Ela lhecontoutudo,desdeomomentoemqueCressidaapareceraatéa

chantagem.Confessouquea suapéssimaescolhadepalavras seriaa suaruína,oquenãoeranadairônico,poisPeneloperealmentesesentiacomocoraçãopartido.Duranteo relato, percebeuque a atençãodeColin sedispersava. Ele a

escutava, mas era como se não estivesse ali. O olhar estava estranho e

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distante,masaomesmotempofocado,intenso.Eleestavaplanejandoalgumacoisa.Penelopetinhacertezadisso.Aquiloaapavorou.Eaexcitou.NoquequerqueColinestivessepensando,tinhaavercomela.Penelope

odiavao fatodetersidoaestupidezdelaqueoenredaranaqueledilema,masnãoconseguiuevitaroformigamentodeentusiasmoquelhepercorriaocorpoenquantooobservava.–Colin?–chamou,hesitante.Já tinha terminado o relato havia um minuto e ele ainda não dissera

nada.–Voucuidarde tudo–garantiuele.–Nãoqueroquesepreocupecom

nada.– Posso lhe garantir que isso é impossível – retrucou ela, com a voz

trêmula.– Levo osmeus votosmatrimoniaismuito a sério – replicou ele, com a

vozserenadeumaformaquaseassustadora.–Ecreioqueprometihonrá-laeprotegê-la.– Deixe-me ajudá-lo – pediu ela, impulsivamente. – Juntos, podemos

resolverisso.Umdoscantosdoslábiosdeleseergueunumasugestãodesorriso.–Vocêtemumasoluçãoemmente?Elabalançouacabeçaemnegativa.–Não.Passeiodiatodopensandoenãosei...embora...–Embora,oquê?Penelope abriu a boca, depois a fechou, então a abriu outra vez e

sugeriu:–EseeupedisseaajudadeLadyDanbury?–EstápensandoempediraelaquepagueCressida?–Não.Voupedirqueelasejaeu.–Comoassim?–TodomundojáachaqueelaéLadyWhistledown–explicouPenelope.

–Bem,aomenosamaioriadaspessoas.Seeladissesse...–Cressidaadesmentirianomesmoinstante–interrompeuColin.–EquemacreditarianapalavradeCressidaemdetrimentodadeLady

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Danbury?SeiqueeunãoousariacontrariarLadyDanbury,qualquerquefosse o assunto. Se ela dissesse que é LadyWhistledown, é provável queeumesmaacreditasse.–O que a faz pensar que pode convencer LadyDanbury amentir por

você?–Bem,elagostademim.–Gostadevocê?–ecoouColin.– Sim, bastante. Acho que iria gostar de me ajudar, sobretudo por

detestarCressidaquasetantoquantoeu.– Acha que a afeição dela por você a levará amentir para toda a alta

sociedade?–perguntouColin,emtomdedúvida.Penelopeafundounoestofado.–Valeapenaperguntar.Eleselevantoubruscamenteefoiatéajanela.–Prometa-mequenãoiráaela.–Mas...–Prometa.–Euprometo,mas...–Nada de “mas” – decretou Colin. – Se for necessário, recorreremos a

ela,mas não até eu ter a chance de pensar em algumaoutra coisa. – Elepassouosdedospeloscabelos.–Devehaveroutrasolução.– Temos uma semana – disse ela com a voz suave, embora não tenha

considerado as próprias palavras tranquilizadoras e duvidasse de queColintivesse.Elesevirouesedirigiudecididamenteàporta.–Euvoltarei–falou.–Masaondevai?–quissaberPenelope,levantando-sederepente.–Precisopensar.–Nãopodepensaraqui,comigo?–sussurrouela.Aexpressãodelesesuavizoueelevoltouaoseulado.Murmurouonome

delaelhetomouorostoentreasmãos.–Eu teamo– falou, comavozbaixae ardente. –Eu teamoagorae te

amareiparasempre.–Colin...–Euteamomaisdoquetudo.–Elese inclinouparaafrenteeabeijou

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suavemente nos lábios. – Pelos ilhos que teremos, pelos anos quepassaremosjuntos.Porcadaumdosmeussorrisosemaisaindapelosteus.Penelopesedeixouarriaremumacadeirapróxima.–Euamovocê–disseelemaisumavez.–Sabedisso,nãosabe?Ela fez que sim, fechando os olhos enquanto roçava o rosto nas mãos

dele.– Tenho coisas para fazer – decretou Colin –, e não vou poder me

concentrarseestiverpensandoemvocê,preocupadoseestáchorando,meperguntandoseestámagoada.–Euestoubem–sussurrouela.–Agoraquelhecontei,mesintomelhor.–Vouresolveressasituação–prometeuele.–Sóprecisoquecon ieem

mim.Elaabriuosolhos.–Comaminhavida.Elesorriueela tevecertezadequeaspalavrasdeleeramverdadeiras.

Tudo icaria bem. Talvez não naquele dia nem no próximo, mas logo. AtragédianãopodiacoexistirnomundojuntocomumdossorrisosdeColin.–Nãocreioquechegaráatanto–disseeleafetuosamente,acariciandoa

facedelaumaúltimavezantesdeseafastar.Entãofoidenovoatéaportae,noúltimomomento,virou-separaaesposa.–Nãoseesqueçadafestademinhairmãhojeànoite.Penelopedeixouescaparumpequenogemido.–Temosmesmoqueir?Aúltimacoisaquequeroéaparecerempúblico.– Temos – disse Colin. – Daphne não oferece bailes com frequência e

ficariamuitomagoadasenãofôssemos.– Eu sei – concordou Penelope, com um suspiro. – Eu sei. Sabia até

mesmoenquantomequeixava.Medesculpe.Elesorriu.–Nãotemimportância.Vocêtemdireitoaumpoucodemauhumorhoje.–Éverdade–retrucouela,tentandoretribuirosorriso.–Euvoltomaistarde–prometeuele.–Ondevocê...–começouelaaquestionar,masentãoseconteve.Era óbvio que ele não queria responder a nenhuma pergunta naquele

momento.Nemmesmodela.Noentanto,paraasuasurpresa,elerespondeu:

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–Veromeuirmão.–Anthony?–Sim.Elaassentiu,encorajando-o,emurmurou:–Vá.Euficareibem.Os Bridgertons sempre haviam encontrado forças uns nos outros. Se

Colinachavaqueprecisavadosconselhosdoirmão,entãodeviair.–NãoseesqueçadesearrumarparaobailedeDaphne– lembrouele

maisumavez.Elaassentiusemmuitadisposiçãoe icouolhandoenquantoeledeixava

asala.DepoisqueColinsaiu,elafoiatéajanelaparavê-lopassar,maselenão

apareceu. Devia ter ido direto à cavalariça. Ela suspirou, apoiando-se noparapeito.Nãosederacontadequantodesejaraolharparaeleumaúltimavez.Desejousaberoqueomaridoestavaplanejando.Desejoutercertezadequeelesabiaoquefazer.Ao mesmo tempo, sentia-se estranhamente tranquila. Colin daria um

jeitonasituação.Dissequeofaria,ejamaismentia.Ela sabia que a ideia de pedir a ajuda de Lady Danbury não era a

soluçãoperfeita,mas,anãoserqueColintivessealgomelhoremmente,oquemaispoderiamfazer?Por hora, podia tentar afastar tudo da cabeça. Estava tão chateada, tão

cansada,queaúnicacoisaqueprecisavaerafecharosolhosenãopensaremmaisnadaalémdosolhosverdesdomarido,dobrilholuminosodeseusorriso.Amanhã.AmanhãajudariaColinaresolverosproblemasdeles.Hoje, ela descansaria. Tiraria um cochilo e rezaria para encontrar uma

formadeenfrentartodaasociedadenaquelanoite,sabendoqueCressidaestaria observando-a e ansiando que ela izesse qualquermovimento emfalso.Era de esperar que após tantos anos ingindo ser apenas a invisível

Penelope Featherington, estivesse acostumada a esconder a verdadeiraidentidade.

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Elaseencolheunosofáefechouosolhos.Tudo era diferente agora, mas isso não queria dizer que tinha de ser

pior,certo?Tudoficariabem.Tinhadeficar.Nãotinha?

Colincomeçavaasearrependerdadecisãodetomarumacarruagematéacasadoirmão.Aprincípio,elepretenderaircaminhando–ovigorosousodosmúsculos

daspernasedospéspareciaseroúnicoescapesocialmenteaceitávelparaa sua fúria.Noentanto, admitiraqueo tempoerapreciosoeque,mesmocom o trânsito, uma carruagempoderia levá-lo aMayfairmais rápido doqueosprópriospés.Mas agora as laterais dos veículos pareciam próximas demais, o ar,

sufocante, e,maldição,seriaaquiloumcarrodeentregade leitecapotado,parandootrânsito?–MeuDeus–murmurou,olhandoacena.Haviacacosdevidroespalhadospelarua, leitederramadoportodasas

partes,eelenãosaberiadizerquemguinchavamaisalto:oscavalos,aindaenredadosnasrédeas,ouasmulheresnascalçadas,cujosvestidoshaviamficadocompletamentemolhados.Colinsaltoudacarruagemcomaintençãodeajudaraliberarolocal,mas

logo icouclaroqueaRuaOxfordcontinuariaintransitávelporpelomenosuma hora, com ou sem a sua ajuda. Certi icou-se de que os cavalos dacarruagemde leite estavam sendobem tratados, informou ao chofer quecontinuariaopercursoapéepartiu.Fitava de forma desa iadora cada pessoa que passava, sentindo um

prazer perverso quando elas desviavam o olhar ao notar sua óbviahostilidade.Quasedesejouquealguém izesseumcomentário sópara terquem agredir. Não importava que a única pessoa que queria de fatoestrangular fosse Cressida Twombley; àquela altura, qualquer um teriasidoumótimoalvo.A raiva o estava deixando desequilibrado, irracional, transformando-o

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emalguémquenãoera.Ainda não sabia ao certo o que sentira quando Penelope lhe contara

sobreachantagemdeCressida.Aquiloeramaiordoqueira,maiordoquefúria.Erafísico:corriapelassuasveias,pulsavasobasuapele.Queriabateremalguém.Queriachutarascoisas,atravessarumaparedecomopunho.Ficara furioso quando Penelope publicara a sua última coluna. Na

verdade,acharaquejamaissentiriaraivamaior.Enganara-se.Ou talvez fosse apenas um tipo diferente de raiva. Alguém estava

tentandomachucarapessoaqueelemaisamava.Comopodiatolerarisso?Comopodiapermitirqueacontecesse?Arespostaerasimples:nãopodia.Tinhadedarumfimàquilo.Precisavafazeralgumacoisa.Chegaraahoradeagir.Ergueuavista,umtantosurpresoporjáterchegadoàCasaBridgerton.

Eraengraçadonãovermaisaconstruçãocomolar.Cresceraali,masagoraeraaresidênciadoirmão.SeularficavaemBloomsbury.SeulareracomPenelope.QualquerlugarcomPenelope.–Colin?Ele se virou. Anthony estava na calçada, obviamente retornando de

algumcompromisso,efezumsinalcomacabeçaemdireçãoàporta.–Pretendiabater?Colinolhouconfusoparaoirmão,sóentãosedandocontadequeestava

paradonosdegraussóDeussabiahaviaquantotempo.–Colin?–chamouAnthonyoutravez,franzindoatesta,preocupado.–Precisodasuaajuda–retrucouColin.Eratudooqueprecisavadizer.

Penelope jáestavavestidaparaobailequandoadamadecompanhia lhelevouumbilhetedeColin.–Dunwoodyrecebeudomensageiro–informouajovem.

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Então fez uma breve reverência e deixou Penelope sozinha para lê-locomprivacidade.Ela abriu o envelope e tirou lá de dentro a folha única que continha a

caligra iaeleganteecaprichadaquesetornaratãofamiliarparaeladesdequecomeçaraaeditarosdiáriosdeColin.Irei por minha conta ao baile desta noite. Vá para o Número Cinco.

Mamãe, Eloise e Hyacinth estão à sua espera para acompanhá-la à CasaHastings.Comtodooamor,Colin.

Paraalguémqueescreviadiários tãobem,bilhetesnãoeramseu forte,

pensouPenelopecomumpequenosorrisoirônico.Levantou-se e ajeitou o vestido. Escolhera um modelo verde, sua cor

preferida, na esperança de que talvez lhe desse coragem.Amãe sempredissera que, quando uma mulher estava bem-vestida, se sentia bem;achavaquePortiatinharazão.Deussabiaqueelapassaraquasedezanossesentindobastantemalnosvestidosqueamãeinsistiratantoqueusasse.Os cabelos estavampresosnumpenteadoque lhe realçavao rosto, e a

dama de companhia havia até passado alguma coisa nos ios (Penelopetemeraperguntaroquê)quepareciadestacarasmechasruivas.Cabelosruivosnãoestavammuitoemvoga,éclaro,mas,certavez,Colin

dissera que gostava da maneira como a luz das velas realçava os dela,então Penelope decidira que aquele era um caso no qual ela e a modateriamdediscordar.Quandochegouláembaixo,acarruagemestavaàsuaesperaeochofer

jáhaviasidoinstruídoalevá-laaoNúmeroCinco.Colinprovidenciaratudo.Penelopenãosabiaporqueissoasurpreendia,

a inal ele não era o tipo de homem que se esquecia dos detalhes. Masestivera preocupado com outras coisas, então ela estranhou que tivessegastado tempo enviando instruções aos criados sobre como deveria serlevadaàcasadamãequandoelamesmapoderiatê-lofeito.Ele só podia estar planejando alguma coisa. Mas o quê? Será que ia

interceptarCressidaTwombleyedespachá-laparaalgumacolôniapenal?

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Não,melodramáticodemais.Talveztivessedescobertoalgumsegredoaseurespeitoeplanejadouma

contrachantagem.Silêncioporsilêncio.Penelope assentia, em sinal de aprovação, enquanto a carruagem

percorriaaRuaOxford.Arespostasópodiaseraquela.Erabemdo feitiodeColin inventar algo tão diabolicamente apropriado e inteligente.Mas oqueseráque teriadesencavadosobreCressidaem tãopouco tempo?EmtodososseusanoscomoLadyWhistledown,jamaisouviranemmesmoumsussurro de qualquer coisa de fato escandalosa ligada ao nome daquelamulher.Cressidaeramáemesquinha,masnuncaderaumpassoquefossefora

dasregrasestabelecidaspelasociedade.AúnicacoisaousadadeverdadequejáfizeraforaafirmarserLadyWhistledown.Acarruagemrumouparaosul,entrandoemMayfair,e,poucosminutos

depois, pararamdiantedoNúmeroCinco.Eloisedevia estarolhandopelajanela, pois desceu as escadas quase voando e teria se chocado com acarruagem se o chofer não tivesse descido naquele momento exato,bloqueandoasuapassagem.Eloise icou saltando de um pé para outro enquanto esperava que o

choferabrisseaportadoveículo.Naverdade,pareciatão impacientequePenelope icousurpresacomofatodeaamiganãoterpassadodiretoporele e aberto a porta por si mesma. Finalmente, ignorando a ajuda dohomem, entrou na carruagem sozinha, quase tropeçando na barra dovestido e caindo no chão do carro no processo. Assim que recuperou oequilíbrio,olhouparaumlado,depoisparaooutro,atestafranzidanumaexpressão furtiva, e fechou a porta com um puxão, quase arrancando onarizdochoferaofazê-lo.–Oqueestáacontecendo?–exigiusaberela.Penelopeselimitouaencará-la.–Eupoderialheperguntaramesmacoisa.–Poderia?Porquê?–Porquequasederrubouacarruagemnasuapressadeentrar!– Ah – resmungou Eloise, descartando o comentário. – A culpa é toda

sua.–Minha?

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–Sim,sua!Querosaberoqueestáacontecendo.Equerosaberagora.Penelope tinha certeza que Colin não tinha contado à irmã sobre a

chantagem de Cressida, a não ser que o seu plano fosse a irmã dar umsermãotãolongoemCressidaquedurariaatésuamorte.–Nãoseidoquevocêestáfalando.– Vocêtemde saberdoqueestou falando!– insistiuEloise,olhandode

volta para a casa. A porta da frente estava se abrindo. – Ora, mas quechateação.MamãeeHyacinthjáestãochegando.Conte-me!–Contar-lheoquê?–PorqueColinnosenviouaquelebilhetetãomisteriosonosinstruindoa

grudaremvocêcomocolaanoitetoda.–Elefezisso?–Fez,eaindasublinhouapalavracola.–E eu aqui achandoque a ênfase fosse toda sua – devolveuPenelope,

secamente.Eloisefezumacareta.–Penelope,istonãoéhoradezombardemim.–Equandoé?–Penelope!–Desculpe-me,nãopuderesistir.–Sabesobreoqueéotalbilhete?Penelope fez que não. O que não era umamentira completa, disse a si

mesma.ElarealmentenãosabiaoqueColinplanejaraparaaquelanoite.Nessemomento,aportaseabriueHyacinthentrounoveículo.– Penelope! – exclamou, com grande entusiasmo. – O que está

acontecendo?–Elanãosabe–respondeuEloise.Hyacintholhouparaairmãcomumarirritado.–Éclaroquevocêtinhadecorreraquiparaforaantes.Violetenfiouacabeçaparadentrodoveículo.–Elasestãobrigando?–perguntouànora.–Sóumpouco–respondeuPenelope.VioletsesentouaoladodeHyacinth,emfrenteaPenelopeeEloise.– Bem, eu não conseguiria mesmo detê-las. Mas agora, por favor, nos

conte o que Colin quis dizer quando nos instruiu a grudarmos em você

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comocola.–Eulhesgarantoquenãosei.Violetestreitouosolhos,comoseavaliasseasinceridadedePenelope.–Elefoibastanteenfático.Atésublinhouapalavracola...–Eusei–retrucouPenelope.Aomesmotempo,Eloisedisse:–Euconteiaela.–Sublinhouduasvezes–acrescentouHyacinth.–Seele tivessesidosó

umpoucomaisenfáticoeuteriaidopessoalmentebuscá-laemcasacomacarruagem.–Hyacinth!–exclamouViolet.Hyacinthdeudeombros.–Étudomuitointrigante.–Naverdade–começouPenelope, tentandomudardeassunto–,estou

aquimeperguntandooqueColinhaverádevestir.Issocapturouaatençãodetodas.–Elesaiudecasacomroupasvespertinas–explicouPenelope–,enão

voltou. Imagino que sua irmã não aceitaria nadamenos que um traje denoitecompletoparaobaile.–Eledeve terpegadoalgumemprestadodeAnthony–retrucouEloise,

com ar despreocupado. – Os dois vestem o mesmo tamanho. Gregorytambém,naverdade.SóBenedictédiferente.–Cincocentímetrosmaisalto–comentouHyacinth.Penelope fezquesim, ingindo interesseenquantoolhavapela janela.O

chofer acabara de diminuir a velocidade, presumivelmente para tentarcontornar o grande número de carruagens que abarrotava a PraçaGrosvenor.–Quantaspessoasforamconvidadas?–quissaberPenelope.–Acreditoquequinhentas–respondeuViolet.–Daphnenãodámuitas

festas,maselacompensaemtamanhoafaltadefrequência.– Concordo – murmurou Hyacinth. – Detesto multidões. Não vou

conseguirrespirardireitohoje.–Sorteminhaquevocêfoiaúltima ilha–comentouVioletcomafeição,

apesardoardecansaço.–Eunãoteriaenergiaparamaisninguémdepoisdevocê,tenhocerteza.

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– Pena que não fui a primeira – retrucou Hyacinth, com um sorrisoinsolente.–Pensesónaatençãoqueeuteriatido.Semfalarnafortuna.–Vocêjáéumaherdeiraetanto–devolveuViolet.–E semprearrumauma formade sero centrodasatenções– zombou

Eloise.Hyacinthselimitouasorrir.–Sabia–começouViolet,virando-separaPenelope–quetodososmeus

ilhosestarãopresentesestanoite?Nãoconsigomelembrardaúltimavezqueestivemostodosjuntos.–Enoseuaniversário?–perguntouEloise.Violetbalançouacabeça.–Gregorynãopôdedeixarauniversidade.–Não está esperando que façamos uma ila de acordo com o tamanho

para entoar uma canção festiva, está? – perguntou Hyacinth, nãototalmente de brincadeira. – Já consigo nos ver: os Bridgertons Cantores.Ganharíamosfortunasnospalcos.–Vocêestáanimadaestanoite–comentouPenelope.Ameninadeudeombros.–Sóestoumeaprontandoparaatransformaçãoeminenteemcola.Pelo

vistoissorequercertotipodepreparaçãomental.–Umestadodeânimogrudento?–indagouPenelope,comleveza.–Exatamente.–Temosdecasá-lalogo–disseEloiseàmãe.–Vocêprimeiro–devolveuHyacinth.–Estoutrabalhandonisso–retrucouEloise,misteriosa.–Oquê?O volume da pergunta foi bastante ampli icado pelo fato de ter sido

pronunciadaportrêsbocasaomesmotempo.– É só isso que vou dizer – avisou Eloise com tal seriedade que todas

souberamquefalavasério.– Podem acreditar que eu conseguirei mais detalhes – assegurou

HyacinthàmãeeaPenelope.–Nãotenhodúvidas–replicouViolet.PenelopesevirouparaEloiseedisse:–Vocênãovaiteramenorchance.

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Eloiseselimitouaergueroqueixoeolharparaforadajanela.–Chegamos–anunciou.Asquatroesperaramatéqueo choferabrisseaportae,umaporuma,

saltaram.– Minha nossa – exclamou Violet, em tom de aprovação. – Daphne

realmentesesuperou.Eradifícilnãoparareolhar.ACasaHastingsestavatodailuminada.Cada

umadas janelashavia sidoadornada comumavelae arandelasexternassustentavamtochas,assimcomoograndegrupodecriadosquerecebiamascarruagens–QuepenaqueLadyWhistledownnãoestáaqui– comentouHyacinth,

sem qualquer vestígio de insolência, ao menos dessa vez. – Ela teriaadorado.–Talvezestejaaqui–disseEloise.–Nãoduvidonada.–SeráqueDaphneconvidouCressidaTwombley?– Tenho certeza que sim – retrucou Eloise. –Não que eu ache que ela

sejaLadyWhistledown.– Acho que ninguémmais acredita nisso – completou Violet, enquanto

subia o primeiro degrau da escadaria. – Vamos, meninas, a noite nosespera.Hyacinth foi em frente para acompanhar a mãe, enquanto Eloise

caminhavaaoladodePenelope.–Háalgomágiconoar–comentouEloise,olhandoàsuavolta,comose

nuncativessepresenciadoumbailelondrino.–Estásentindo?Penelope apenas a olhou, temendo deixar escapar todos os seus

segredos se abrisse a boca. Eloise tinha razão. Havia algo de estranho eeletrizantenanoite,umaenergiacrepitante,dotipoquesesenteumpoucoantesdeumatempestade.–Parecequaseummomentodecisivo–re letiuEloise–,comoseavida

deumapessoapudessemudarporcompletonumaúnicanoite.–Doquevocêestáfalando,Eloise?–indagouPenelope,assustadacoma

expressãodaamiga.– De nada – respondeu Eloise, dando de ombros. Mas um sorriso

misteriosocontinuouemseuslábiosenquantoelapassavaobraçopelodePenelopeemurmurava:–Vamos.Anoitenosespera.

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CAPÍTULO23

PenelopeestiveranaCasaHastingsmuitasvezes,tantoemfestasformaisquanto em visitas informais,mas nunca vira a imponente construção tãoencantadora–oumágica–quantonaquelanoite.Junto à sogra e às duas cunhadas, ela estava entre os primeiros

convidados a chegar. Violet sempre dissera que era grosseiro quemembrosdafamíliasequercogitassemchegarelegantementeatrasados.EPenelope achou bom chegar tão cedo: ela teve a oportunidade de ver adecoraçãosemterdeenfrentaroempurra-empurradamultidão.Daphnedecidiraqueseueventonãoseriatemático,aocontráriodobaile

egípciodasemanapassadaedogregodasemanaanterioraesta.Emvezdisso,decoraraa casacomamesmaelegância simples comaqualviviaodiaadia.Centenasdevelasbruxuleantesadornavamasparedesemesas,re letindo os imensos candelabros que pendiam do teto. As janelasestavamenvoltasemumpanobrilhosoeprateado,otipodetecidoquesepodiaimaginarvestindofadas.Atéouniformedoscriadosestavadiferente.Penelope sabia que eles costumavamvestir azul e dourado,mas naquelanoiteoazulvinhaadornadocomprateado.Eraquasepossívelparaumamulhersesentircomoumaprincesanum

contodefadas.–Euimaginoquantoistotudoterácustado–comentouHyacinth,comos

olhosarregalados.–Hyacinth!–ralhouViolet,dandoumtapinhanobraçoda ilha.–Você

sabequeédeselegantefazeressetipodepergunta.–Eunãoperguntei.Sóimaginei.Alémdomais,édeDaphnequeestamos

falando.–AsuairmãéaduquesadeHastings–retrucouViolet–,e,comotal,tem

certasresponsabilidadescomquearcar.Seriabomquevocêselembrassedisso.–Masa senhoranãoconcorda–disseHyacinth,passandoobraçopelo

damãeeapertandodeleveamãodela–queébemmaisimportanteque

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eumelembre,simplesmente,queelaéminhairmã?–Agoraelaapegou–comentouEloise,comumsorriso.Violetdeixouescaparumsuspiro.–Hyacinth,eudeclaroquevocêseráaresponsávelpelaminhamorte.–Não,nãoserei–replicouajovem.–Gregoryserá.Penelopesepegouprendendooriso.–NãovejoColinemlugaralgum–disseEloise,esticandoopescoço.–Não?–Penelopevarreuosalãocomosolhos.–Issoésurpreendente.–Elelhedissequeestariaaquiantesdevocêchegar?–Não,mas,poralgummotivo,acheiqueestaria.Violetdeuumtapinhatranquilizadoremseubraço.–Estoucertadequechegaráembreve,Penelope.Então,logosaberemos

quegrandesegredoéessequeo fez insistirquenãodesgrudássemosdevocê.Não–acrescentou,apressada,osolhosarregaladosdealarme–queestejamos encarando isto como um sacrifício. Você sabe que adoramos asuacompanhia.Penelopelhelançouumsorrisotranquilizador.–Eusei.Osentimentoérecíproco.Havia poucas pessoas à frente delas na ila de recepção, então não

demorou muito para que pudessem cumprimentar Daphne e o marido,Simon.–OqueestáacontecendocomColin?–perguntouDaphne,semqualquer

preâmbulo, tão logo teve certeza de que os outros convidados nãopoderiamouvi-la.Comoaquestãoparecia,primordialmente,dirigidaaela,Penelopeseviu

forçadaadizer:–Eunãosei.–Eletambémlhemandouumbilhete?–perguntouEloiseàirmã.Daphnefezquesim.–Mandou.Segundoele,éparaficarmosdeolhoemPenelope.–Podia ter sidopior – falouHyacinth. –Nós trêsdevemos grudarnela

comocola.–Elainclinouocorpoparaafrente.–Eelesublinhoucola.–Eeuachandoquenãoeraumsacrifício–ironizouPenelope.– Ora, e não é – garantiu Hyacinth, com leveza –, mas há algo muito

prazeroso em pronunciar a palavra cola. Ela escorrega da língua de

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maneiramuitoagradável,nãoacha?Cola.Cooooolaaaa.–Soueu,ouelaenlouqueceudevez?–perguntouEloise.Hyacinthaignoroucomumdardeombros.–Semfalarnoaspectodramáticodissotudo.Parecequesomospartede

algumagrandetramadeespionagem.–Espionagem–gemeuViolet.–QueDeusnosajude.Daphneinclinouocorpoparaafrente,comaexpressãograve.–Bem,elenosdisse...–Nãoéumacompetição,meuamor–interrompeuSimon.Ela lhe lançou um olhar bastante irritado antes de se virar outra vez

paraamãeeasirmãsecontinuar:– Ele nos pediu que não a deixássemos chegar nem perto de Lady

Danbury.–LadyDanbury!–exclamaramtodas.Todas,menos Penelope, que tinha uma boa noção domotivo pelo qual

Colinqueriaqueela icasselongedacondessa.Deviaterboladoumplanomelhor que o dela de convencer Lady Danbury amentir e dizer a todosqueelaeraLadyWhistledown.Só podia ser a teoria da contrachantagem. O quemais haveria de ser?

SemdúvidaeletinhadescobertoalgumsegredoterrívelsobreCressida.Penelopeestavaquasetontadealegria.– Achei que você fosse bastante próxima de LadyDanbury – disse-lhe

Violet.–Esou–retrucouPenelope,tentandomostrar-seperplexa.–Issoémuitocurioso–comentouHyacinth,batendocomoindicadorna

face.–Muitocuriosomesmo.–Eloise–chamouDaphne,derepente–,estámuitoquietahoje.–Sónãoestavaquandomechamoudelouca–destacouHyacinth.–Hummm?–Eloiseestavaolhandoparaonada,outalvezparaalgoque

se encontrava atrás de Daphne e de Simon, e não estava prestandoatenção.–Ah,bem,creioquenãotenhonadaparadizer.–Você?–perguntouDaphne,incrédula.–Exatamenteoqueeuestavapensando–acrescentouHyacinth.PenelopeconcordavacomHyacinth,masdecidiuguardaraopiniãopara

si. Não era do feitio da amiga permanecer em silêncio por tanto tempo,

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sobretudo numa noite como aquela, que icava mais misteriosa a cadasegundo.–Vocêstodosvinhamfazendocolocaçõestãoboas...–comentouEloise.–

Oqueeupoderiateracrescentadoàconversa?Isso pareceumuito estranho a Penelope. O sarcasmo estava dentro do

contexto, mas sua melhor amigasempre achava que tinha algo aacrescentaraumaconversa.Eloiseapenasdeudeombros.– É bom irmos andando – disse Violet. – Estamos começando a

atrapalharosseusoutrosconvidados.–Euasvereimaistarde–prometeuDaphne.–E...Ah!Todasseaproximaram.–ProvavelmentevãoquerersaberqueLadyDanburyaindanãochegou

–sussurrouela.–Oque tornaminha tarefamaissimples–comentouSimon,parecendo

umtantoentediadocomtantaintriga.– Mas não a minha – queixou-se Hyacinth. – Ainda tenho de grudar

nela...–Comocola–exclamaramtodas,inclusivePenelope.– Por falar em cola... – começou Eloise, enquanto se afastavam de

DaphneeSimon.–Penelope,achaque icarábemcomdoistubos,apenas,porumperíodo?Eugostariadedarumavolta.–Euvoucomvocê–anunciouHyacinth.–Nãopodemirasduas–disseViolet.–TenhocertezaqueColinnãoiria

quererquePenelopeficassesozinhacomigo.– Posso ir quando ela voltar, então? – perguntou Hyacinth com uma

careta.–Nãoéalgoqueeupossaevitar.Violetvirou-separaEloise,emexpectativa.–Oquefoi?–quissaberajovem.–Estavaesperandoquevocêdissesseomesmo.–Eusoudignademais–fungouEloise.–Ora,porfavor...–murmurouHyacinth.Violetsoltouumgemido.–Temcertezaquedesejaficarconosco?–perguntouaPenelope.– Não achei que tivesse escolha – respondeu Penelope, divertindo-se

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comodiálogo.–Vá–disseVioletaEloise.–Masnãodemore.Eloise assentiu e então, para a surpresa de todas, se aproximou de

Penelopeelhedeuumabraçorápido.–Porqueisto?–indagouPenelopecomumsorrisocarinhoso.– Por nada – retrucou Eloise, retribuindo o sorriso com um muito

parecido com os de Colin. – Só acho que esta vai ser uma noite muitoespecialparavocê.– Acha mesmo? – disse Penelope, cautelosamente, sem saber o que a

amigajápoderiaterintuído.– Bem, é óbvio que alguma coisa está prestes a acontecer – declarou

Eloise.–NãoédofeitiodeColinagirde formatãomisteriosa.Eeuqueriaofereceromeuapoio.–Vocêvaivoltaremalgunsminutos–observouPenelope.–Oquequer

queváacontecer, seéquealgovaiacontecerde fato,nãoéprovávelquevocêperca.Eloisedeudeombros.–Foiumimpulso.Umimpulsonascidodemuitosanosdeamizade.–EloiseBridgerton,estáficandosentimental?– A esta altura da vida? – indagou Eloise, ingindo-se ultrajada. – Não

creio.– Eloise – interrompeu Hyacinth. – Quer ir logo? Não posso esperar a

noitetoda.Comumrápidoacenodacabeça,Eloiseseafastou.Durante a hora seguinte, elas apenas caminharam pelo salão,

misturando-seaosoutrosconvidadosesedeslocando–Penelope,VioleteHyacinth–comoumserúnicoegigantesco.– Três cabeças e seis pernas, é o que temos – observou Penelope,

andandoemdireçãoàjanelacomasduasBridgertonssealvoroçandoparachegaremlogoaoseulado.–Oquedisse?–perguntouViolet.–Vocêrealmentequeriaolharpela janelaousóestavanos testando?E

ondeestáEloise?–murmurouHyacinth.–Emgrandeparte,euasestavatestando–admitiuPenelope.–Etenho

certeza que Eloise foi detida por algum outro convidado. Você sabe tão

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bemquantoeuqueémuitodi ícilescapardeumaconversacomváriasdaspessoaspresentesaqui.–Humpf–resmungouHyacinth.–Pelojeitoelanãoconhecemuitobem

adefiniçãodecola.– Hyacinth, se precisar se ausentar por alguns minutos, vá em frente,

por favor – disse Penelope. Então se virou para Violet. – A senhoratambém. Se precisar ir, prometo icar bem aqui, neste canto, até o seuretorno.Violetaolhou,horrorizada.–EvoltaratrásnanossapalavracomColin?– Err... Vocês chegaram a prometer alguma coisa a ele? – observou

Penelope.–Não,mas semdúvida issoestava implícitonopedidodele.Ah,olhe! –

exclamouela,subitamente.–Láestáele!Penelope tentou fazer um sinal discreto para o marido, mas todas as

suastentativasdecircunspecçãoforamabafadaspelosvigorososacenosegritosdeHyacinth:–Colin!Violetgemeu.–Eusei,eusei–disseHyacinth,semomenorsinaldearrependimento.–

Devoagirmaiscomoumadama.–Sesabe,porquenãoofaz?–queixou-seViolet.–Qualseriaagraça?– Boa noite, senhoras – cumprimentou Colin, beijando a mão da mãe

antesdetomaroseulugar,elegantemente,aoladodePenelope,epassarobraçoemtornodesuacintura.–Bem...?–disseHyacinth,emtomdeexpectativa.Colinselimitouaerguerumadassobrancelhas.–Nãotemnadaparanoscontar?–insistiuela.–Tudoemseudevidotempo,queridairmã.–Vocêéumhomemmuito,muitomau–resmungouHyacinth.–Nãopossonegar –murmurouele, olhandoà sua volta. –Eonde está

Eloise?– Boa pergunta – resmungouHyacinth aomesmo tempo que Penelope

dizia:

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–Estoucertadequelogoestarádevolta.Eleassentiu,semparecerrealmenteinteressado.–Mamãe–começou,virando-separaViolet–,comotempassado?–Vocêenviabilhetesmisteriosospelacidadeinteiraequersabercomo

eutenhopassado?–retrucouViolet.Elesorriu.–Quero.Violet começou a balançar o dedo para ele, algo que proibira

terminantementeosprópriosfilhosdefazerempúblico.–Ah,não,nadadisso,ColinBridgerton.Nãovaisesafarassim.Vocême

deveumaexplicação.Eusousuamãe.Suamãe!–Estoucientedisso–murmurouele.–Nãovaientraraquivalsandoemedistraircomumafraseinteligentee

umsorrisotravesso.–Achaomeusorrisotravesso?–Colin!–Masdefatoasenhoratrouxeàtonaumaexcelentequestão.Violetpiscou,aturdida.–Eutrouxe?–Trouxe.A respeitodavalsa. –Ele inclinoua cabeça levementeparao

lado.–Creioestarouvindooiníciodeumavalsa.–Nãoestououvindonada–comentouHyacinth.– Não mesmo? Que pena. – Ele agarrou a mão de Penelope. – Vamos,

minhaesposa.Creioquesejaonossonúmerodedança.–Masninguémestádançando–observouHyacinth,entreosdentes.Elelhelançouumsorrisodesatisfação.–Maslogoestarão.Então, antes que alguém tivesse chancede retrucar, ele deuumpuxão

namãodePenelopeelogoosdoisavançavampelamultidão.– Você não queria dançar a valsa? – perguntou Penelope, sem fôlego,

logo depois de passarem pela pequena orquestra, cujos integrantespareciamfazerumapausaprolongada.–Não,sóqueriaescapar–explicouele,passandocomelaporumaporta

lateral.Algunsmomentosmaistarde,depoisdesubiremumaescadariaestreita,

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estavam escondidos numa pequena sala, cuja única iluminação provinhadastochasbruxuleantesqueardiamdoladodeforadajanela.–Ondeestamos?–perguntouPenelope,olhandoàsuavolta.Colindeudeombros.–Nãosei.Pareceu-meumlugartãobomquantoqualqueroutro.–Vaimecontaroqueestáacontecendo?–Não.Primeirovoubeijá-la.Antesqueelapudessereagir(nãoquePenelopetivesseprotestado),os

lábios dele encontraram os seus num beijo que foi, ao mesmo tempo,faminto,urgenteeterno.–Colin!–arquejouela,duranteodécimodesegundoemqueeleparou

pararespirar.–Agoranão–sussurrouele,beijando-aoutravez.–Mas...–Apalavrasaiuabafada,perdidadeencontroaoslábiosdele.Eraotipodebeijoqueaenvolviadacabeçaaospés,desdeomodocomo

Colin mordiscava os seus lábios até a forma como ele apalpava o seutraseiro e deslizava as mãos por suas costas. Era o tipo de beijo quepoderiafacilmentetê-ladeixadodepernasbambas,fazendo-adesmaiarnosofáepermitirqueele izessequalquercoisacomela,apesardeestaremapenasaalgunsmetrosdedistânciadecercadequinhentosmembrosdaaltasociedade,anãoser...–Colin!–exclamouela,dealgumaformaconseguindoafastarabocada

dele.–Shhhh.–Colin,precisaparar!Aexpressãodeleeraadeumcachorrinhoconfuso.–Preciso?–Sim,precisa.– Imaginoquevádizerque épor causade todas aspessoasque estão

aquiaolado.–Não,emborasejaumótimomotivoparaconsideraroautocontrole.–Paraconsideraredepois...ignorar,talvez?–disseele,esperançoso.–Não!Colin... –Elasedesvencilhoudosbraçosdelee seafastouvários

metros, apenas por precaução. – Colin, você precisame dizer o que estáacontecendo.

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–Bem–começouele,lentamente.–Euaestavabeijando...–Nãofoiissoqueeuquisdizerevocêsabedisso.–Muitobem.–Colinseafastou,comospassosecoandoaltonosouvidos

dela.Quandoelesevirououtravez,aexpressãose tornaramuitoséria.–DecidioquefazercomrelaçãoaCressida.–Decidiu?Oquê?Querosaber.Colinfezumacareta.–Naverdade,achomelhornãolhecontaratéoplanojáestaremcurso.Elaofitoucomincredulidade.–Nãopodeestarfalandosério.–Bem...–Eleolhavaparaaportacomansiedade,claramenteesperando

ummotivoparaescapar.–Conte-me–insistiuela.–Muitobem.Eledeixouescaparumsuspiro,eoutroemseguida.–Colin!–Voudarumadeclaração–disseele,comoseaquiloexplicassetudo.AprincípioPenelope icouemsilêncio,achandoquetudo icariaclarose

elaesperasseuminstanteepensassearespeito.Masnãofuncionou,entãoelaperguntoubemdevagar,comtodaacautela:–Quetipodedeclaração?Colinassumiuumaexpressãodecidida.–Voucontaraverdade.Elasufocouumgrito.–Ameurespeito?Elefezquesim.–Masnãopode!–Penelope,achoqueéomelhorafazer.O pânico começou a brotar dentro dela e seus pulmões lhe deram a

sensaçãodeestaremimpossivelmentecomprimidos.–Não,Colin,nãopode fazer isso!O segredonão lhepertenceparaque

vocêorevele!–QuersustentarCressidapelorestodavida?–Não,éclaroquenão,maspossopediraLadyDanbury...–NãovaipediraLadyDanburyquemintaemseunome–disseele,com

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rispidez.–Issonãoécondizentecomasuapessoaevocêsabemuitobemdisso.PenelopearquejoudiantedotomrudedeColin.Mas,nofundo,sabiaque

eletinharazão.– Se estava tão disposta a permitir que alguém usurpasse a sua

identidade–continuouele–,entãodeviasimplesmente terpermitidoqueCressidaofizesse.–Eunãopodia–sussurrouPenelope.–Nãoela.–Muitobem.Entãochegouahoradeenfrentarmosarealidade.–Colin–sussurrouela–,istovaimearruinar.Eledeudeombros.–Podemosnosmudarparaocampo.Elabalançouacabeça,tentandodesesperadamentesaberoquedizer.Colintomouasmãosdela.–Issotemmesmotantaimportância?–perguntouele,deformaafetuosa.

–Penelope,euamovocê.Contantoquefiquemosjuntos,seremosfelizes.– Não é isso – disse ela, tentando desvencilhar asmãos das dele para

secarasprópriaslágrimas.Maselenãoassoltou.–Oqueé,então?–Colin,vocêtambémficaráarruinado–sussurrouela.–Eunãomeimporto.Ela o itou, incrédula. Colin lhe soou tão insolente, tão relaxado com

relaçãoaalgoquepoderiamudarasuavidadeumaformaqueelenãoeracapaznemdeimaginar...– Penelope, é a única solução – disse ele num tom tão sensato que ela

achouquaseintolerável.–Ounóscontamosaomundo,ouCressidaconta.–Podemospagarpelosilênciodela.–Érealmenteoquevocêquer fazer?–perguntouele.–Dar-lhe todoo

dinheiroquevocêtrabalhoutantoparaganhar?EntãopoderiaterdeixadotodosacreditaremqueelaeraLadyWhistledown.– Não posso permitir que você faça isso – insistiu ela. – Acho que não

compreendeoqueéviverforadasociedade.–Evocêcompreende?–devolveuele.–Melhordoquevocê!

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–Penelope...– Está tentando agir como se não importasse,mas não se sente assim.

Ficoucomtantaraivademimquandopubliqueiaquelaúltimacoluna,tudoporque achava que eu não deveria ter arriscado o meu segredo dessamaneira...–E,nofinaldascontas,eutinharazão–observouele.–Viusó?Continuacomraivademimporisso!Colindeuum longo suspiro.A conversanãoestava evoluindoda forma

que esperara. Semdúvida ele não imaginara que a esposa lhe jogaria nacarasuainsistênciaanteriordequeelanãocontasseaninguém.–Sevocênãotivessepublicadoaquelaúltimacoluna–argumentouele–,

nósnãoestaríamosnestaposição,éverdade,masissoagoranãotemmaisamenorimportância,nãoconcorda?–Colin,sevocêcontarparaomundoqueeusouLadyWhistledowneas

pessoas reagirem da forma como acho que reagirão, você nunca verá osseusdiáriospublicados.Ocoraçãodeleparouporummomento.Porquefoinesseinstantequeelefinalmenteacompreendeu.Ela já lhe dissera que o amava e também demonstrara o seu amor de

todasasformasqueelelheensinara.Masessesentimentonuncaestiveratãoclaro,tãofranco,tãocru.Durantetodootempoqueelalheimploraraquenãocontasseaverdade,

foraporele.Eleengoliuoboloquecomeçavaaseformaremsuagarganta,lutoupara

encontraraspalavras,lutouatémesmopararespirar.Penelope estendeu o braço e tocou a sua mão, os olhos suplicantes, o

rostoaindamolhadodaslágrimas.– Eu jamais poderiame perdoar – falou. – Não quero destruir os seus

sonhos.–Nuncaforammeussonhosatéconhecervocê–sussurrouele.– Não quer publicar os diários? – indagou ela, piscando, perplexa. –

Estavafazendoissosópormim?– Não – disse ele, porque Penelope não merecia nada além da mais

completasinceridade.–Euquero,sim.Éomeusonho.Maséumsonhoquevocêmedeu.

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–Oquenãosignificaqueeupossatomá-lodevocê.–Enãovai.–Sim,eu...– Não – exclamou ele, decidido –, não vai. E ter o meu trabalho

publicado... Bem, não chega aos pés do meu verdadeiro sonho, que épassarorestodavidacomvocê.–Vocêsempreteráisso–retrucouela,baixinho.–Eusei.–Elesorriuedepoisacrescentoudeformabastantearrogante:

–Eentão,oquetemosaperder?–Possivelmentemaisdoquejamaispoderemosimaginar.–E,possivelmente,menos–retrucouColin.–Nãoseesqueçadequesou

um Bridgerton. E agora, você também. Exercemos certo poder nestacidade.Penelopearregalouosolhos.–Oquequerdizer?Eledeudeombros,commodéstia.–Anthonyestápreparadoparalhedartodooapoio.–ContouaAnthony?–arquejouela.– Tive de contar. Ele é o chefe da família. E há muito poucas pessoas

nesteplanetaqueousariamseindisporcomele.– Ah. – Penelope mordeu o lábio inferior, considerando aquilo tudo.

Então,porqueprecisavasaber,perguntou:–Oqueeledisse?–Ficousurpreso.–Imagino.–Ebastantesatisfeito.Orostodelaseiluminou.–Émesmo?– E achou graça. Disse que só podia admirar alguém que conseguiu

guardarumsegredocomoessedurantetantosanos.EfalouquemalpodiaesperaratécontaraKate.Elaassentiu.– Imagino que teremos de dar essa declaração agora. O segredo não é

maissónosso.–Anthonynãocontaránada,seeulhepedir–disseColin.–Issonãotem

nadaavercomomotivodeeuquerercontaraverdadeaomundo.

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Elaolhouparaelecomummistodeexpectativaedesconfiança.– A verdade é que sinto orgulho de você – explicou Colin, puxando as

mãosdelaetrazendo-amaisparaperto.Penelopeseviusorrindo,oquefoiestranho,poisapenasalgunsminutos

anteselanãoconseguiraseimaginarjamaisvoltandoasorrir.Colinbaixouorostoatéosseusnarizessetocarem.– Quero que todos saibam como sinto orgulho de você. Quando eu

terminar,nãohaveráumaúnicapessoaemLondresquenãoreconhecerácomovocêéinteligente.–Talvezcontinuemmeodiando–observouela.–Talvez–concordouele–,masissoseráproblemadelas,nãonosso.–Ah,Colin–suspirouela.–Euamovocê.Quemaravilhasentirisso.Elesorriu.–Eusei.–Não,nãosabe.Acheiqueoamavaantes,etenhocertezadequeamava,

masnãoeranadacomparadoaoquesintoagora.– Ótimo – disse ele, com um brilho bastante possessivo surgindo nos

olhos.–Éassimqueeugosto.Agora,venhacomigo.–Aonde?–Poraqui–retrucouele,abrindoumaporta.ParasurpresadePenelope,ela seviunumapequenasacada,quedava

paratodoosalãodebaile.– Meu. Deus. Do. Céu – falou, engolindo em seco, tentando puxá-lo de

voltaparaoquarto.Ninguémosviraatéomomento,entãoaindapodiamfugir.–Tsc,tsc–ralhouele.–Coragem,minhaquerida.–Quetalsevocêpublicassealgumacoisanojornal?–sussurrouela,com

urgência.–Oucontasseaalguémedeixassequeoboatoseespalhasse?–Nadacomoumgrandegestoparacomunicaramensagem.Penelopecomeçouaengoliremsecosemparar.De initivamenteaquele

seriaumgestodosgrandiosos.–Nãosoumuitoboaemserocentrodasatenções–disseela, tentando

normalizaroritmodarespiração.Eleapertouasuamão.–Nãosepreocupe.Euéquevouser.

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Ele itou a multidão e trocou um olhar com o an itrião da festa, seucunhado, o duque de Hastings. Diante do aceno da cabeça de Colin, oduquesedirigiuàorquestra.–Simonsabe?–arfouPenelope.–Eu lheconteiquandocheguei–murmurouColin.–Comoachaqueeu

encontreiasalacomasacada?Então,algonotávelaconteceu.Umverdadeirotropeldecriadossurgiudo

nada e começou a entregar compridas taças de champanhe aosconvidados.– Aqui estão as nossas – disse Colin, em tom de aprovação, enquanto

pegavaduastaçasqueosaguardavamnocanto.–Exatamentecomopedi.Penelopeaceitouadelaemsilêncio,aindaincapazdecompreendertudo

oqueestavaacontecendo.– A esta altura as borbulhas já devem ter se desfeito – brincou Colin,

num sussurro conspiratório que, ela sabia, tinha o intuito de fazê-la seacalmar.–Masfoiomelhorqueconseguifazer,dadasascircunstâncias.EnquantoPenelopeseguravaaterrorizadaamãodomarido,observava,

impotente,Simonsilenciaraorquestraegesticularparaqueamultidãodeconvidadosvoltasseaatençãoparaoirmãoeairmã,nasacada.Irmão e irmã, pensou ela, maravilhada. Os Bridgertons realmente

inspiravam um elo. Ela jamais pensara ver o dia em que o duque serefeririaaelacomosuairmã.– Senhoras e senhores – começou Colin, a voz forte e con iante

ribombandoatravésdosalão–,eugostariadeproporumbrindeàmulhermaisextraordináriadomundo.Um discretomurmúrio se espalhou pelo salão e Penelope permaneceu

imóvelenquantotodosaobservavam.– Sou um recém-casado – continuou ele, encantando a todos os

presentescomseusorrisoenviesado–,e,portanto,todosvocêsaindatêmdetolerarmeucomportamentodehomemapaixonado.Umasimpáticaondadegargalhadasseespalhoupelamultidão.– Eu sei que muitos se surpreenderam quando pedi Penelope

Featheringtonparaserminhaesposa.Eumesmomesurpreendi.Algumas risadinhas abafadas e indelicadas se izeram ouvir, mas

Penelopesemanteveperfeitamente imóveleorgulhosa.Colinsabiaoque

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estavafazendo.Elatinhacertezadisso.Elesemprediziaacoisacerta.–Eunãomesurpreendicomofatodetermeapaixonadoporela–frisou

ele, olhando para todos com uma expressão que os desa iava a tecerqualquercomentário–,esimporissoterdemoradotantoparaacontecer.A inal,euaconheciahaviatantosanos–continuou,avoztornando-semaissuave–,mas,dealgumaforma,jamaishaviamedadootrabalhodenotaramulherlinda,brilhanteeespirituosanaqualelasetransformou.Penelopesentiuas lágrimasescorrendopelas faces,masnãoconseguiu

semexer.Mal era capaz de respirar. Esperara que Colin revelasse o seusegredo e, em vez disso, ele estava lhe dando aquele presente incrível,aqueladeclaraçãodeamorespetacular.– Assim – prosseguiu ele –, tendo todos vocês como testemunhas, eu

gostariadedizeroseguinte:Penelope...–Virou-separaela,tomousuamãolivre e exclamou: –Eu amovocê!Veneroo solo sobreoqual vocêpisa. –Então,dirigindo-seoutravezàmultidão,ergueua taçae falou:–Àminhaesposa!–Àsuaesposa!–gritaramtodos,capturadospelamagiadomomento.Colinbebeu ePenelopeo imitou, emboranão conseguissedeixar de se

perguntar quando ele iria lhes contar o verdadeiro motivo daqueladeclaração.–Baixeasuataça,minhaquerida–murmurouele,depoisatiroudesua

mãoecolocou-adelado.–Mas...–Vocêmeinterrompedemais–ralhou,emseguidaacaloucomumbeijo

apaixonado,bemali,nasacada,diantedetodaaaltasociedade.–Colin!–arfouela,assimqueelelhedeuaoportunidadederespirar.Ele lhe lançou um sorriso malicioso enquanto a plateia rugia a sua

aprovação.–Ah,maisumacoisa!–anunciouColinparaamultidão.Todosestavamentusiasmados,atentosacadapalavraqueeledizia.– Vou deixar a festamais cedo. Agoramesmo, na verdade. – Olhou de

soslaioparaPenelopecomumaexpressãomuitotravessa.–Tenhocertezaquecompreendem.Os homens presentes assoviaram e gritaram enquanto Penelope icava

vermelhacomoumtomate.

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–Mas, antes disso, tenho uma última declaração a fazer. Algo simples,paraocasodeaindanãoacreditaremquandolhesdigoqueminhaesposaéamulhermaisespirituosa,inteligenteeencantadoradeLondres.–Nãããão!–gritouumavozvindadofundodosalão,quePenelopesoube

serdeCressida.MasnemmesmoCressidaerapáreoparaamultidão,quenãopermitiu

queelapassassenemdeuouvidosaosseusgritosangustiados.– É possível dizer que minha esposa tem dois nomes de solteira –

começou ele, pensativo. – É claro que todos vocês a conheciam porPenelopeFeatherington,assimcomoeu.Masoqueninguémsabia,enemmesmoeufuiespertoobastanteparadescobriratéelamesmamecontar...Elefezumapausa,esperandoqueosilêncioreinassenosalão.– ... é que ela também é a brilhante, a espirituosa, a magní ica... Ora,

vocês todos sabem de quem estou falando... – continuou ele, fazendo umgestoabrangentecomobraçoemdireçãoàmultidão.–Eulhesapresentominhaesposa,LadyWhistledown!–exclamouele, comtodooseuamoreorgulho.Poruminstantenenhumdospresentesemitiuqualquersom.Eraquase

comoseninguémnemousasserespirar.Então, começou.Clap. Clap. Clap. Devagar,mas de formametódica, com

tanta força edeterminaçãoque todos tiveramde se virarpara verquemousavaromperosilêncioescandalizado.EraLadyDanbury.Ela tinhadadoabengalaparaoutrapessoa segurareerguiaosbraços

noalto,aplaudindosonora,radianteeorgulhosamente.Emseguida,outrapessoatambémcomeçouaaplaudir.Penelopeviroua

cabeçaparaverquemera...AnthonyBridgerton.Depois,SimonBasset,oduquedeHastings.Então,asBridgertons,easFeatheringtons,eoutros,eoutros,ecadavez

maisgente,atéosalãointeirodarvivas.Penelopenãoconseguiaacreditar.No dia seguinte talvez se lembrassem de sentir raiva dela, de icar

irritadosporteremsidoenganadosportantosanos,masnaquelanoite...Naquelanoite,aúnicacoisaafazereraadmirá-laedarvivas.

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Paraumamulherquetiveraderealizaroqueelarealizaraemsegredo,aquiloeratudooquesonhara.Bem,quasetudo.Tudocomoquesonharaestavadepébemaoseulado,comobraçoem

torno de sua cintura. Quando ela ergueu os olhos para itá-lo, para itaraquele rosto tão amado,Colin a encarou com tanto amoreorgulhoquearespiraçãoficoupresaemsuagarganta.–Meusparabéns,LadyWhistledown–murmurouele.–EuprefiroSra.Bridgerton.Elesorriu.–Excelenteescolha.–Podemosir?–pediuela.–Agora?Elafezquesim.–Éclaroquepodemos–respondeuele,enfaticamente.Eninguémviuocasalporváriosdias.

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EPÍLOGO

PraçaBedford,Bloomsbury

LONDRES,1825

–Chegou!Chegou!Penelope ergueu os olhos dos papéis espalhados sobre a sua

escrivaninha. Colin estava no vão da porta do seu pequeno escritório,saltandodeumpéparaooutrocomoummenino.– O seu livro! – exclamou ela, levantando-se com toda a rapidez que o

corpo desajeitado lhe permitiu. – Ah, Colin, deixe-me ver! Deixe-me ver!Estouansiosa!Elenãoconseguiaparardesorrirenquantolheentregavaaobra.– Ahhhh – disse ela, com reverência, segurando o fascículo ino e

encadernado em couro. – Minha nossa... – Levou o livro até a altura dorostoerespiroufundo.–Vocênãoadoraessecheirodelivronovo?–Olhesópara isto,olhe sópara isto–disseele, impaciente, apontando

paraopróprionomenacapa.Penelopeficouradiante.– Olhe só. E tão elegante, também. – Correu o dedo pelas palavras

enquantolia.–UminglêsnaItália,ColinBridgerton.Elepareciaprestesaexplodirdeorgulho.–Ficoubonito,nãoficou?–Maisdoquebonito.Ficouperfeito!QuandosaiUminglêsnoChipre?–Oeditordissequevão lançarumacadaseismeses.Querempublicar

UminglêsnaEscóciadepois.–Ah,Colin,estoutãoorgulhosadevocê...Eleatomounosbraçosedescansouoqueixonotopodacabeçadela.–Eunãopoderiatê-lofeitosemvocê.–Poderia,sim–respondeuela,comconvicção.

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–Apenasfiquequietaeaceiteoelogio.– Muito bem, então – retrucou Penelope, sorrindo, embora ele não

pudesse ver o seu rosto –, não poderia. É claro que jamais teria sidopublicadosemumaeditoratãotalentosa.–Quemsoueuparadiscordar?–disseele,beijando-lheotopodacabeça

antesdesoltá-la.–Vásesentar.Nãodeviapassartantotempodepé.–Estoubem–garantiuela,masobedeceumesmoassim.Colinvinhasendoexcessivamenteprotetordesdeo instanteemqueela

disseraqueestavagrávida;agora,aapenasummêsdadataprevistaparaonascimentodobebê,eleandavainsuportável.– O que são esses papéis? – perguntou ele, olhando para os rabiscos

dela.– Isso?Ah,nada.–Ela começoua juntaraspáginasempilhas. –Sóum

pequenoprojetonoqualestoutrabalhando.–Émesmo?–Elesesentoudiantedela.–Oqueé?–Err...bem...naverdade...– O que é, Penelope? – insistiu ele, achando cada vez mais graça da

gagueiradela.– Tenho andado ansiosa desde que acabei de editar os seus diários –

explicouela–,edescobriqueestavasentindofaltadeescrever.Elesorriaenquantochegavaocorpoparaafrente.–Oqueestáescrevendo?Semsabermuitobemporquê,elaruborizou.–Umromance.–Umromance?Ora,masquesensacional,Penelope!–Achamesmo?–Maséclaroqueacho.Comosechama?–Bem,sóescrevialgumaspáginas–respondeuela–,eaindahámuitoa

serfeito,masachoqueseeunãodecidirmudarmuitacoisa,vaisechamarAmoçainvisível.Osolhosdeleseencheramdeafeto,ficandoquaseembaçados.–Émesmo?–Éumpouquinhoautobiográfico–admitiuela.–Sóumpouquinho?–Sóumpouquinho.

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–Mastemfinalfeliz?–Ah,éclaro–disseela,fervorosamente.–Temqueter.–Temqueter?Elaestendeuamãoporcimadaescrivaninhaeacolocousobreadele.– Eu só escrevo inais felizes – sussurrou. – Não saberia escrever

qualqueroutracoisa.

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CONHEÇAOPRÓXIMOLIVRODASÉRIE

PARASIRPHILLIP,COMAMOR(Títuloprovisório)

PRÓLOGO

Fevereirode1823

G

Erarealmenteirônicoquetivesseacontecidoemumdiatãoensolarado.O primeiro dia de sol em – quanto tempo mesmo? – seis semanas

inteirasdecéunublado, acompanhadodeocasionais rajadasde chuvaounevefraca.AtéPhillip,queseachavaimuneaoscaprichosdotempo,sentiuseu espírito mais leve, seu sorriso mais aberto. Ele saíra, tivera de sair.Ninguémpoderiacontinuardentrodecasaduranteumdiatãoesplêndidodesol.Principalmentenomeiodeuminvernotãocinzento.Mesmoagora,maisdeummêsdepoisdoque aconteceu, ele aindanão

podiaacreditarqueosoltiveraaousadiadeprovocá-lo.Ecomopuderaser tãocegodenãoesperarpor isso?ViviacomMarina

desdeocasamentodeles.Tiveraoitolongosanosparaconheceramulher.Eledeviaterimaginado.E,parafalaraverdade...Bem,para falar a verdade, ele tinha imaginado.Sónãoquiseraadmitir.

Talvezestivessesótentandoseiludir,atémesmoseproteger.Tentandoseesconder do óbvio, esperando que, se não pensasse a respeito, aquilonuncaaconteceria.

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Masaconteceu.Eemumdiaensolarado,parapiorar.Deuscomcertezatinhaumsensodehumorestranho.Olhou para seu copo de uísque, que estava, inexplicavelmente, vazio.

Devia ter tomado a maldita bebida, e ainda assim não lembrava. Não sesentia embriagado, pelo menos não tanto quanto devia estar. Ou tantoquantogostaria.Pela janela olhou o sol, que já estava baixo no horizonte. Aquele tinha

sidomaisumdia ensolarado, oqueprovavelmenteexplicava suaenormemelancolia. Pelomenos, era o que ele esperava. Queria uma explicação...precisavadeuma... paraaquele terrível cansaçoqueparecia tomar contadele.Amelancoliaoapavorava.Maisdoquequalquer coisa.Maisdoqueo fogo,maisdoquea guerra,

mais do que o próprio inferno. A ideia de se afundar na tristeza, de sercomoela...Marinaeraumapessoamelancólica.Foramelancólicaavida inteira,ou

pelomenosdurante todoo tempoemqueaconhecera.Elenãoconseguiase lembrar do som da risada dela e, para ser sincero, não tinha nemcertezasealgumdiachegaraaouvi-lo.Eraumdiadesole...Ele fechou os olhos com força, sem saber se aquilo instigaria a

lembrançaouaafastaria.Eraumdiadesole...

–Estavaachandoquenuncamaissentiriaessecaloremsuapeledenovo,nãoémesmo,SirPhillip?PhilipCranevirouorostoparaaluz,fechandoosolhosedeixandoqueo

soloaquecesse.–Éperfeito–murmurouele.–Ouseria,senãofosseessefriomaldito.MilesCarter,seusecretário,riu.–Nãoestátãofrioassim.Olagonemcongelouesteano.Sóunspedaços

aquieali.Relutantemente,Philipseafastoudosoleabriuosolhos.

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–Masnãoéprimavera.– Se estava esperando a primavera, senhor, talvez devesse ter

consultadoocalendário.Philipolhoumeiodeladoparaele.–Eu,poracaso,lhepagoparatamanhaimpertinência?–Sim.Egenerosamente.Philipriupordentroenquantoosdoishomensaproveitavamumpouco

maisosol.– Achei que não se importasse com os dias nublados – disse Miles,

jogando conversa fora, quando voltarama caminhar, emdireção à estufadePhillip.– Não me importo – disse Phillip, caminhando a passos largos com a

desenvoltura de um atleta natural. – Mas não é porque nãome importocom dias nublados que não pre iro o sol. – Ele parou e pensou por uminstante. – Lembre-sede falar coma babáMillsbypara levar as criançasparadarumavoltaforadecasahoje.Elesvãoprecisardecasacos,éclaro,chapéuseluvasetodasessascoisas,mastêmdepegarumpoucodesolnorosto.Jáficaramconfinadospormuitotempo.–Assimcomotodosnós–murmurouMiles.Phillipriu.– É verdade. – Olhou, então, por cima do ombro para a estufa. Ele

provavelmente devia cuidar da correspondência, mas também precisavaexaminar algumas sementes, e, sinceramente, podiamuito bem tratar deseusassuntoscomMilesdaliacercadeumahora.– Váfalarcoma babá.Nós dois podemos conversar mais tarde. A inal, você detesta mesmo aestufa.–Nãonestaépocadoano–disseMiles.–Ocalorémuitobem-vindo.Philliparqueouasobrancelhaenquantoinclinavaacabeçaemdireçãoa

RomneyHall.–Vocêestádizendoqueacasaqueherdeidosmeusancestraisécheia

decorrentesdear?–Todasascasasantigassãocheiasdecorrentesdear.–Issoéverdade–dissePhillip,comumsorriso.GostavadeMiles.Eleocontratarahaviaseismesesparaajudá-locoma

papelada e todos os detalhes sobre a administração de sua pequena

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propriedadequepareciamseacumular.Mileseramuitobom. Jovem,mascompetente. E seu senso se humor sarcástico com certeza era bem-vindoem uma casa onde nunca havia muita risada. Os criados nunca seatreveriam a fazer piadas com Phillip, e Marina... bem, é desnecessáriodizerqueMarinanãoriamuitonembrincavadeprovocá-lo.As crianças às vezes faziam Phillip rir, mas era um tipo diferente de

humor e, além disso, na maioria das ocasiões ele não sabia o que dizerpara elas. Até tentava, mas, perto delas, se sentia muito estranho, muitogrande, muito forte, como se isso izesse algum sentido. E acabavaenxotando-as,elhesdizendoquevoltassemparaababá.Eramaisfácilassim.–Vá logo resolver issoentão– dissePhillip,mandandoMiles cuidar de

umatarefaqueeraeleprovavelmentequemdeviaterfeito.Aindanãotinhavistoos ilhosnaqueledia,eachavaquedeviaprocurá-

los,masnãoqueriaestragarodiadizendo-lhesalgosevero,oquepareciaacontecersempre.Iriaseencontrarcomelesquandoestivessemfazendoseupasseioaoar

livre com a babá Millsby. Era uma boa ideia. E então poderia apontaralgumaplantaefalarcomelessobreela,etudocontinuariaperfeitamentesimplesetranquilo.Phillip entrou em sua estufa e fechou a porta, respirando fundo o ar

agradáveleúmido.TinhaestudadobotânicaemCambridge,e se formadocom louvorcomoumdosmelhoresda turma.Naverdade,provavelmenteteria seguido uma vida acadêmica se seu irmão mais velho não tivessemorrido em Waterloo, deixando para Phillip o papel de proprietário deterrasearistocratarural.Achava que podia ter sido pior. A inal, podia ser um proprietário de

terras e aristocrata da cidade. Pelo menos ali tinha a chance de darprosseguimentoàssuasatividadesbotânicascomrelativatranquilidade.Inclinou-sesobreabancadadetrabalho,examinandoseuúltimoprojeto

–tentavacriarumavariedadedeervilhasquesedesenvolvesseaindamaisdentro da vagem. Só que não tinha tido sucesso até o momento. Aqueleúltimolote,alémdetermurchado,tambémhavia icadoamarelo,oque,deformaalguma,eraoresultadoesperado.Phillipfranziuasobrancelha,depoisabriuumsorrisodiscretoenquanto

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seguia para os fundos da estufa para reunir seu material. Nunca sofriamuitoquandoseusexperimentosnãodavamoresultadoesperado.Nasuaopinião,anecessidadenuncaforaamãedainvenção.Acidentes.Eramquasesempreacidentes.Nenhumcientistaadmitiria, é

claro, mas a maioria das grandes invenções acontecia quando alguémestavatentandoresolverumproblemacompletamentediferente.Deu uma risada enquanto tirava as ervilhas murchas dali. Naquele

ritmo,iriadescobriracuraparaagotaatéofinaldoano.De volta ao trabalho. De volta ao trabalho. Curvou-se sobre suas

amostras de sementes, examinando-as com cuidado. Só precisava dasementecertapara...Ele levantouacabeçaeolhoupara fora,atravésdovidrorecém-lavado.

Uma movimentação pelo campo chamou sua atenção. Um vulto emvermelho.Vermelho. Phillip riu sozinho, balançando a cabeça. Devia ser Marina.

Vermelho era sua cor preferida, algo que ele sempre achara estranho.Qualquerumquepassassealgumtempocomelacomcertezaachariaqueelaprefeririaalgomaisescuro,maissombrio.Acompanhouaesposacomoolharatéeladesaparecernobosque,então

voltou ao trabalho. Era raro Marina se aventurar do lado de fora. Nosúltimosdias,elanemmesmodeixavaoabrigodeseuquarto.Phillip icoufeliz por vê-la do lado de fora, no sol. Talvez issomelhorasse seu ânimo.Não por completo, é claro. Phillip achava que nem o sol era capaz disso.Mas talvezumdiaquenteeensolarado fossecapazde tirá-ladecasaporalgumashoras,decolocarumsorrisodiscretoemseurosto.Deussabequeissofariabemàscrianças.Eles iamatéoquartodamãe

paravê-laquasetodasasnoites,masnãoeraosuficiente.EPhillipsabiaquenãopodiacompensarisso.Suspiroueumaondadeculpaoinvadiu.Sabiaquenãoeraopaideque

seus ilhos precisavam. Tentava se convencer de que estava fazendo omelhorquepodia, deque estava se saindobemnaúnicametaque tinhacomopai–nãosecomportarcomoseuprópriopai.Massabiabemquenãoeraobastante.Afastou-se da bancada de trabalho com movimentos decididos. As

sementespodiamesperar.Seusfilhosprovavelmentetambémpodiam,mas

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isso não queria dizer que deveriam. Era ele quem devia passear com osdoisaoarlivre,enãoababáMillsby,quenãosabiaadiferençaentreumaárvore caducifólia e uma conífera, e provavelmente lhes diria que umarosaeraumamargaridae...Olhoupelajaneladenovo,lembrando-sedequeestavamemfevereiro.A

babáMillsbydi icilmente encontraria alguma lor comaquele tempo,masaindaassimissonãoeradesculpa.Eleéquemdeverialevaros ilhosparapassearaoarlivre.Dasatividadesquepodiafazercomascrianças,aquelaera a única em que ele era realmente bom, e não devia se esquivar daresponsabilidade.Saiuapassoslargosdaestufa,masderepenteparou,semterpercorrido

nem um terço do caminho até Romney Hall. Se estava indo buscar ascrianças,devia levá-losparaveramãe.ElesansiavampelacompanhiadeMarina, mesmo quando ela não fazia mais do que dar um tapinha nacabeçadeles.Sim,elesdeviamiratrásdeMarina. Issoseriaaindamelhordoqueumacaminhadapelanatureza.Mas ele sabia por experiência própria que não podia fazer suposições

sobreoestadodeespíritodamulher.Sóporqueelahaviaseaventuradoasairnãosigni icavaqueestavasesentindobem.Eeledetestavaquandoosfilhosaviamdeprimida.Phillip então se virou e seguiu em direção ao bosque onde tinha visto

Marina desaparecer algunsminutos antes. Caminhava praticamente duasvezesmais rápido do que ela, e não demoraria para alcançá-la e checarcomo ela estava. Podia voltar ao quarto das crianças antes que elassaíssemcomababáMillsby.Andava pelo bosque, seguindo facilmente o rastro da esposa. O chão

estava úmido, e ela devia estar combotas pesadas, porque suas pegadastinham icadonitidamentemarcadasnaterra,seguindopelodeclivesuaveeparaforadobosque,eentrandodepoisemumaáreagramada.–Droga – resmungouPhillip, a voz quase inaudível em razão do vento

queaumentavaàsuavolta.Era impossível ver as pegadas dela na grama. Ele usou a mão para

protegerosolhosdosoleseesforçouparaveratéondeavistaalcançava,procurandoalgumsinaldevermelho.Nada perto da cabana abandonada, nada no campo de grãos

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experimentais de Phillip, nem na imensa pedra que ele passara tantashorasescalandoquandoeracriança.Virou,então,paraonorte,estreitandoosolhosquandofinalmenteaviu.Elaseguiaemdireçãoaolago.Olago.Os lábios de Phillip se entreabriram quando viu que ela caminhava

lentamente para a beira d’água. Ele não exatamente congelou, foi maiscomo se tivesse icado... suspenso... enquanto sua mente absorvia aestranha cena.Marinanãonadava.Phillipnem tinha certeza seela sabia.Ele achava que ela já devia ter ouvido falar sobre o lago no terreno dapropriedade,mas,naverdade,nunca soube seela já tinha idoaté lá,nãonosoitoanosemqueestavamcasados.Começouaandaremdireçãoaela,os pés de alguma forma reconhecendo o que sua mente se recusava aaceitar.QuandoMarina entrouna parte rasa, ele acelerou o passo, aindamuitodistanteparafazerqualqueroutracoisaquenãofossegritarporela.Mas, se Marina o ouviu, não demonstrou, apenas continuou sua

caminhadalentaedecididaemdireçãoàpartemaisfunda.– Marina! – gritou ele, saindo em disparada. Ainda estava um bom

minutolonge,mesmocorrendoomaisrápidoquepodia.–Marina!

FIM

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SOBREAAUTORA ©RexRystedt/seattlephoto.com

JuliaQuinn começou a trabalhar em seu primeiro romance ummêsdepoisdeterminarafaculdadeenuncamaisparoudeescrever.Seuslivros já atingiram amarca de 8milhões de exemplares vendidos, sendo3,5 milhões da sérieOs Bridgertons. O visconde que me amava, segundotítulodacoleção,foifinalistadoprêmioRITA.É formada pelas universidades Harvard e Radcliffe. Seus romances já

entraram na lista de mais vendidos doThe New York Times e foramtraduzidospara26idiomas.Julia foi a autora mais jovem a entrar para o Romance Writers of

America’sHallofFame,aGaleriadaFamadosEscritoresRomânticosdosEstadosUnidos,eatualmentemoracomafamílianoNoroestePacífico.