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O(s) significado(s) dos objetos em novos contextos: duas exposições em museus de arte parisienses. 1 Francieli Lisboa de Almeida/Unicamp Resumo O projeto em torno da criação do museu do quai Branly de “artes primeiras” em Paris a partir dos anos 90 (mas que veio a ser inaugurado em 2006) promoveu todo um debate em torno das artes ditas primitivas, primeiras, tribais, étnicas, etc, que mobilizou e tem mobilizado dentro e fora da França não apenas museólogos, mas também antropólogos, historiadores da arte, marchands (comerciantes especializados), curadores, colecionadores, dentre outros. A alteração no estatuto do objeto 2 de testemunho etnográfico para obra de arte acaba trazendo a tona diversas questões. Desde a validade da mudança deste estatuto até questões relacionadas à autoria dos objetos (individual/coletiva), sua autenticidade, as somas vultuosas na comercialização, os pedidos de repatriamento pelos grupos de origem, assim como a própria identificação ora como arte tradicional ora contemporânea. Pretendo neste trabalho apresentar duas exposições temporárias ocorridas em Paris no inverno de 2008/2009 para a partir delas propor alguns pontos para a reflexão no campo da antropologia da arte. As exposições são:“Jackson Pollock et le chamanisme” e "Recettes des dieux, ocorridas respectivamente na Pinacoteca de Paris e no museu do quai Branly. Palavras-chave: antropologia da arte; exposições de arte; objetos etnográficos. Introdução Em minha estada em Paris há quase dois anos atrás fui afetada por máscaras esquimós, pinturas aborígenes australianas, bolis africanos, ornamentos plumários bororo. Esses objetos estão em diversos lugares da cidade, seja em museus e galerias de arte ou então em lojas especializadas na comercialização de artes ditas primitivas. É possível perceber diferenciações nos status dos objetos. Nos museus e galerias ora são apresentados aos visitantes como objetos etnográficos, que procuram testemunhar a existência de grupos e sociedades sem registros escritos e distantes da sociedade ocidental (não necessariamente 1 Trabalho apresentado na 27ª. Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de agosto de 2010, Belém, Pará, Brasil. 2 Aqui estou sempre me referindo ao objeto, mas não me limito às produções materiais. Mas essas acabam sendo mais recorrentes nos contextos de museus e galerias de arte devido a sua materialidade. 1

O(s) significado(s) dos objetos em novos contextos: duas ... · na comercialização de artes ditas primitivas. ... O motivo superior do trabalho mostra um ser humano e cabeça de

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O(s) significado(s) dos objetos em novos contextos:

duas exposições em museus de arte parisienses.1

Francieli Lisboa de Almeida/Unicamp

Resumo

O projeto em torno da criação do museu do quai Branly de “artes primeiras” em Paris a

partir dos anos 90 (mas que veio a ser inaugurado em 2006) promoveu todo um debate em torno das

artes ditas primitivas, primeiras, tribais, étnicas, etc, que mobilizou e tem mobilizado dentro e fora

da França não apenas museólogos, mas também antropólogos, historiadores da arte, marchands

(comerciantes especializados), curadores, colecionadores, dentre outros.

A alteração no estatuto do objeto2 de testemunho etnográfico para obra de arte acaba

trazendo a tona diversas questões. Desde a validade da mudança deste estatuto até questões

relacionadas à autoria dos objetos (individual/coletiva), sua autenticidade, as somas vultuosas na

comercialização, os pedidos de repatriamento pelos grupos de origem, assim como a própria

identificação ora como arte tradicional ora contemporânea.

Pretendo neste trabalho apresentar duas exposições temporárias ocorridas em Paris no

inverno de 2008/2009 para a partir delas propor alguns pontos para a reflexão no campo da

antropologia da arte. As exposições são:“Jackson Pollock et le chamanisme” e "Recettes des

dieux”, ocorridas respectivamente na Pinacoteca de Paris e no museu do quai Branly.

Palavras-chave: antropologia da arte; exposições de arte; objetos etnográficos.

Introdução

Em minha estada em Paris há quase dois anos atrás fui afetada por máscaras esquimós,

pinturas aborígenes australianas, bolis africanos, ornamentos plumários bororo. Esses objetos estão

em diversos lugares da cidade, seja em museus e galerias de arte ou então em lojas especializadas

na comercialização de artes ditas primitivas.

É possível perceber diferenciações nos status dos objetos. Nos museus e galerias ora são

apresentados aos visitantes como objetos etnográficos, que procuram testemunhar a existência de

grupos e sociedades sem registros escritos e distantes da sociedade ocidental (não necessariamente

1 Trabalho apresentado na 27ª. Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de agosto de 2010, Belém, Pará, Brasil.

2 Aqui estou sempre me referindo ao objeto, mas não me limito às produções materiais. Mas essas acabam sendo mais recorrentes nos contextos de museus e galerias de arte devido a sua materialidade.

1

no espaço) e ora como obras de arte, transitando entre uma arte mais tradicional e a contemporânea.

Tais nuances chamam a atenção.

O meu incômodo inicial era ser uma espectadora brasileira que pela primeira vez estava

vendo inúmeros objetos provenientes de diversos grupos indígenas brasileiros fora do meu país,

assim como objetos de diversos grupos tidos por “não ocidentais”. E ainda, objetos que em sua

maioria foram levados para a França a partir de missões realizadas nas antigas colônias da Europa,

sendo algumas justamente para fins de coleta de material etnográfico, como a missão francesa

Dakar-Djibouti (1931-1933). A própria coleção Lévi-Strauss no museu do quai Branly me chamou

especialmente a atenção. Ela possui 1457 objetos, sendo em sua grande maioria objetos das etnias

Nambikwara, Bororo e Kaduveo3 (mas há também objetos de grupos indígenas da costa noroeste

americana colecionada no período que ele lá esteve).

Foi a partir desse estranhamento que procurei olhar mais atentamente cada objeto, procurá-

los nos museus menos evidentes (como a princípio me parecia ser os de arte contemporânea), assim

como também pesquisar bibliograficamente o que antropólogos, historiadores da arte, curadores e

marchands (comerciantes de arte) estavam dizendo sobre o tema que pudesse ajudar na minha

reflexão sobre o sentido daqueles objetos nesses espaços.

Realizando um percurso um pouco atento pela cidade é possível notar a quantidade de

galerias que expõem ao lado das já tradicionais pinturas e esculturas de artistas ocidentais, objetos

produzidos por grupos não ocidentais, identificados nos termos “primitivos”, “étnicos”, “tribais”,

“primeiros”, etc, sendo a maioria desses objetos, máscaras e esculturas. Há inclusive galerias

especializadas neste tipo de arte, localizadas em regiões de prestígio na cidade, como é o caso da

Rive Gauche.

Além disso, pode-se encontrar essas produções em diversos museus. E não apenas naqueles

que se dedicam a este tipo de arte, como no caso do museu do quai Branly (“des arts premiers”),

Dapper (“arts d’Afrique”) ou Guimet (“des arts asiatiques”). Também estão presentes em museus

como o d’Orsay, cujos acervos são de arte moderna, como é o caso da peça “Idole à la coquille”,

presente na sala que apresenta a obra de Paul Gauguin, adquirida pelo pintor em sua primeira estada

no Taiti no fim do século 19; no Centre Georges Pompidou - arte moderna e contemporânea – onde

puderam recentemente ser vistos os objetos que fazem parte do seu acervo permanente (na sala

dedicada a André Breton, uma das importantes referências do surrealismo4), mas também aqueles

presentes na exposição “Donations Daniel Cordier. Les désordres du plaisir”5; as peças de “art

3 Disponível para consulta no site do museu: http://www.quaibranly.fr.4 CLIFFORD, J. “Sobre o surrealismo etnográfico”. A experiência etnográfica. Antropologia e literatura no século

XX. Ed. UFRJ, 1998.5 No inverno europeu (2008/2009).

2

nègre” da coleção particular de Picasso presentes no Museu Nacional Picasso-Paris; as máscaras

esquimó Inupiak, os artigos de xamãs Tlingit, as figuras totêmicas de diversos grupos da América

do Norte na exposição “Jackson Pollock et le chamanisme” na Pinacoteca de Paris e finalmente, a

exposição dos “chefs-d’oeuvre” do museu do quai Branly no Pavillon des Sessions6 do Louvre.

Essa é apenas uma pequena amostra do que pôde ser visto mais recentemente em Paris. E

com isto, já é possível ter uma ideia de quão disseminados esses objetos estão por lá, além dos

lugares que têm especialmente ocupado neste início de século 21: os espaços de arte.

A forma e os sentidos das exposições desses objetos são diferentes uma das outras, de um

museu para outro, de uma curadoria para outra, o que implica em diferenças importantes nas

significações dadas a eles. Essas diferenciações ficarão mais evidentes quando tratar das duas

exposições que escolhi trazer para a discussão.

O devir-xamã em Pollock

A exposição “Jackson Pollock et le chamanisme” aconteceu na Pinacoteca de Paris a partir

do dia 15 de outubro de 2008 foi até 15 de fevereiro de 2009. A curadoria ficou a cargo de Stephen

Polcari e Marc Restellini, que propuseram um diálogo da obra do artista estadunidense Pollock

(1912-1956) com o universo mítico do xamanismo de diversos grupos indígenas da América do

Norte.

Máscaras (eskimo Inupiak, Tlingit), cajados, estátuas (Thulé), totens (Haida, Nootka),

amuletos (Tlingit), faca de combate (Tlingit), esculturas de animais (Inuit), eram parte de um todo

formado também pelos vídeos etnográficos de rituais xamânicos, textos explicativos em cada sala

da exposição e as telas que não eram apenas de Pollock, mas também de André Masson (pintor

surrealista francês que viveu entre os anos de 1896-1987). Era esse conjunto que deveria permitir

que o espectador pudesse acessar a releitura da obra de Pollock proposta pela curadoria da

exposição.

E tal proposta era a seguinte, segundo Marc Restellini: realizar uma “releitura revolucionária

de sua obra” (RESTELLINI, 2008:07) tendo em vista que o período dos “drippings” - conhecido

como o do expressionismo abstrato americano - é geralmente tido como o momento em que o artista

abandona a sua referência ancorada na arte indígena, principalmente a do noroeste americano,

6 Esses objetos fazem parte do acervo do Museu do quai Branly São 120 “chefs d’oeuvre”, em sua grande maioria esculturas, organizadas por “aires géographiques” em 1200 m2 do prestigiado museu parisiense. Esta “antena” do museu do quai Branly como foi chamada, foi inaugurada pelo então presidente francês Jacques Chicac em abril de 2000. Vale destacar que dez anos antes, Jacques Kerchache (colecionador de “arte primitiva” e marchand, e que anos depois faria parte do projeto que concebeu o Museu do quai Branly) organizou um manifesto pela entrada das “artes primeiras” no Louvre, manifesto que foi assinado por diversos antropólogos franceses e publicado no jornal Libération do dia 15 de março de 1990 (GOLDSTEIN, 2008: 294; GROGNET, 2007:177.

3

conhecida por Pollock a partir da exposição “Indian Art of the United States” do Museu de Arte

Moderna de Nova Iorque em 1941(idem: 28).

Assim, a curadoria da exposição pretendeu conduzir o observador a olhar os “drippings”

não como arte puramente abstrata

[...] mas também obras simbólicas com elementos de referência ao xamanismo ou aos rituais xamânicos. (...) a lógica abstrata se desmorona em proveito de uma intenção deliberada do artista de acreditar na extinção do tema para, exatamente como no ritual xamã de iniciação, aceder aos portais míticos que nem todos poderiam ver, mas que seria reservado a alguns iniciados. Assim, o trabalho de Pollock chamado 'abstrato' é abstrato somente para esconder o tema secreto, visível apenas aos iniciados". (RESTELLINI, 2008:09 – tradução minha).

Para Laymert Garcia dos Santos (2009) a partir de seu referencial deleuzeano, é como se

Pollock tivesse acessado na fase dos drippings um “devir-chamã” (2009:26). Depois de ter sido

iniciado, a partir dessas referências indígenas que o afetaram, o artista estadunidense pôde aceder

aos “portais míticos”, momento a partir do qual a sua pintura vem a ser aquela onde os temas se

dissolveram.

Reconstruindo aqui brevemente o percurso da exposição essa foi organizada em nove

ambientes, sendo eles: i) início – obras de juventude; ii) o sacrifício e a morte; iii) a fusão do

homem e do animal; iv) a fusão do homem e da mulher; v) germinação e nascimento; vi) a pintura

gráfica – os pictogramas; vii) as abstrações; viii) a dança e finalmente, ix) o êxtase.

Untitled, c. 1939-1940. Colored pencils and crayons, 36,2x27,9 cm. Collection Mandy and Jonathan O’Hara, New York

Amuleto, apanhador de alma - Um amuleto“apanhador de alma” xamânico Tlingit esculpido em dente de baleia.7

7 Ambas imagens foram retiradas do flyer de divulgação da exposição disponível na internet em pdf. PINACOTHÈQUE DE PARIS. Press kit. 2008.

4

Cada uma dessas salas da exposição foram montadas com as telas de Pollock assim como

com os objetos. Um simples exemplo disso que trago aqui são o das figuras acima, que formam

junto com outras obras a sala 3: “a fusão do homem e do animal”.

A da esquerda é de uma tela de Pollock, que segundo comentários da curadoria:

O motivo superior do trabalho mostra um ser humano e cabeça de um animal angular, que poderia pertencer a um cavalo ou, mais provavelmente, a um pássaro. A metade inferior mostra um homem ajoelhado, também assimilada a um cavalo. O desenho sugere que o homem adormecido ou em transe, dá à luz uma figura totêmica, e é, portanto, submetido a uma transformação, permitindo-lhe atingir um nível superior de elevação. (PINACOTHÈQUE DE PARIS, 2008:07 – tradução minha)

Já a figura da direita é a de um amuleto xamânico do grupo Tlingit que também segundo a curadoria:

O Xamã é mostrado com as mãos cruzadas entre duas figuras de espíritos sobrenaturais: em uma extremidade, um salmão ou mais provavelmente, uma baleia corcunda, e na outra a cabeça de um pássaro. A cabeça do Xamã é colocado sobre o aparelho respiratório da baleia. Aos lados, podemos ver a barbatanas, bem como a espinha da baleia, símbolos recorrentes no espírito totêmico. Os olhos são incrustados com casca de conchas haliote. (PINACOTHÈQUE DE PARIS, 2008:07 – tradução minha)

Nessa exposição os objetos indígenas não são mobilizados para demonstrar uma influência

formal na obra de Pollock. Sinal disso pode-se dizer que é a maneira como a exposição está

organizada, ou seja, por temática. Os curadores vão fazendo as aproximações a partir de temas que

procuram estabelecer links entre as obras da trajetória de Pollock e os objetos, vídeos e música que

remetem ao xamanismo indígena da costa noroeste americana.

Para Santos (2009) a proposta da curadoria de uma nova leitura do artista estadunidense só

foi possível a partir da organização e disposição do conjunto que faz parte da exposição. Como o

autor vai afirmar, as telas de Pollock e os objetos das etnias indígenas neste contexto:

“[...] são convocados a revelar a potência de uma dimensão mítica que se atualiza em ambos embora de modo diferenciado. Portanto, neste caso, o chamanismo não é uma noção abstrata que quadros e objetos representariam, mas aquilo que se incorpora nas pinturas e nos fetiches e instrumentos rituais como imagens chamânicas, cuja ‘resolução’ é operada por métodos e técnicas diferentes quando ‘trazidas’ (rendered) pela via de Pollock ou pela via dos índios. Assim, a exposição é montada de tal modo que a percepção do expectador seja deslocada, e sua perspectiva ocidental habitual desconstruída, para que as imagens sejam vistas não como se apresentam, mas como se presentificam, isto é, como vetores da visualização de um outro mundo possível,

5

isto é, como ‘imagens do invisível’, na expressão precisa de Stephen Polcari.” (SANTOS, 2009:24).

Nessa longa mas necessária citação Santos procura defender de que forma a curadoria da

exposição “ajuda o expectador a ver” (SANTOS, 2009:25) (pela constituição de uma atmosfera

propícia) aquele conjunto de uma forma diferente, que não apenas telas e objetos, mas numa relação

significativa que atualiza as potências de ambos, conferindo ao conjunto um novo sentido que é o

que possibilitaria essa “releitura revolucionária” da obra de Pollock.

O foco da exposição sem dúvida é Pollock e não os objetos indígenas. Tanto que a ideia dos

curadores é fazer a nova leitura da obra desse artista, embora essa passe neste caso necessariamente

pelo xamanismo. A minha questão é: os objetos neste contexto “representam” o xamanismo ou

“são” o xamanismo? Pois se numa nova antropologia da arte a partir de Alfred Gell em que se

concebe que os objetos efetivamente “agem”, como poderíamos pensar no contexto dessa exposição

aqui apresentada? Ou por outra, esses objetos atualizam suas potências quando em outros

contextos? Aqui entendendo “potência” como define Overing (1996) como sendo as capacidades

dos objetos de transmitir efeitos no mundo.

Uma outra questão que pode-se pensar nesse contexto é a respeito da relação arte/artefato8,

pois aqui parece que não está em questão se os objetos indígenas são peças de arte, questionamento

que geralmente está por trás dessa relação. O status do objeto não é posto em questão. O artista

nessa exposição é Pollock, embora os objetos não sejam meros coadjuvantes.

E nesse sentido e a ela relacionado está a questão em torno do anonimato dos artistas nativos

(nos termos de Price, 2000). Pois os objetos são apresentados como sendo de tais ou tais grupos,

como por exemplo: machado haïda; amuleto tlingit; máscara inupiak, escultura thulé, etc. Mas em

alguns casos não há tampouco nos objetos a indicação da etnia em que foi encontrado, como é o

caso por exemplo de um mastro totêmico onde está somente a indicação do nome do colecionador:

Steven Michaan Collection ou a máscara de morte do xamã (espírito do pássaro-falcão) do mesmo

colecionador, sendo esta última a máscara que está no cartaz de divulgação da exposição, como

podemos ver a seguir.

8 GOLDSTEIN (2008), LAGROU (2007, 2009), PRICE (2000), VIDAL (2001), etc. Para uma distinção um tanto quanto breve a partir de Lagrou: arte como objetos que foram produzidos para serem contemplados e artefato como os que foram produzidos para serem usados. (2009:14).

6

Máscara de morte do xamã, espírito do pássaro-falcãoc. 1840-1870Esculpida e pintada em madeira, com dentes de conchas de haliote20,5 cmSteven Michaan Collection

© Steven Tucker © ADAGP Paris 2008. Conception et création graphique: Gilles Guinamard

Com as imagens acima vou concluindo esse momento do trabalho para tratar da exposição

seguinte.

O objeto fetiche ou o fetiche do objeto

De 03 de fevereiro a 10 de maio de 2009 o museu do quai Branly realizou a exposição

“Recettes des dieux. Esthétique du fetiche” (“Receitas dos deuses. Estética do fetiche”), cuja

curadoria foi de Nanette Jacomijn Snoep9. Foram apresentados 92 “objetos divinatórios” (“objets

de divination”) que foram concebidos pela curadoria como fetiches de diferentes grupos africanos.

Parte deles nunca havia saído do acervo de reserva do museu, de forma que ainda não haviam sido

expostos ao público mais amplo.

O tema central dessa exposição foi a estética “informe” dos objetos (QUAI BRANLY,

2008:05). Parte considerável deles foi produzida com materiais orgânicos, materiais “considerados

não nobres”, nas palavras da curadora10, como ossos, terra, fibras vegetais, sangue coagulado,

conchas, dentre outros.

De acordo com a curadora

Chifres ou sacos mágicos, objetos de proteção ou de adivinhação, essas obras são vestidas, amarradas, furadas de pregos e lâminas, envolvidas por fios de algodão ou pele, ou revestidas de crostas de elementos sacrificiais, ao ponto que a forma original nem

9 É responsável pela unidade patrimonial das coleções do museu e professora de História da arte africana na universidade Paris X e na escola da Louvre. Musée du quai Branly. Recettes des dieux, esthétique du fétiche et Mangareva, Pantheón de Polynésie. Paris, 2008. p. 07. (material de divulgação das exposições com entrevistas aos respectivos curadores).

10 Idem, p. 05.

7

sempre é reconhecida. A exposição explora essas diferentes maneiras de representar o invisível sem recorrer à representação humana.

Refazendo aqui brevemente o percurso da exposição, logo abaixo do título de apresentação

da exposição havia uma breve citação da obra de Hamlet de Shakespeare (ato III, cena IV) como

prólogo do que seria visto.

Hamlet: Ne voyez-vous rien là? (A senhora não vê?)La reine: Rien du tout; pourtant tout ce qui est, je le vois. (Não vejo nada; e vejo tudo que há.)

Ao adentrar o espaço destinado a exposição havia antes de tudo uma reprodução em tecido

quase transparente do desenho do inglês Henry Moore intitulada “Multidão contemplando um

objeto revestido muito alto e amarrado com barbante” (1942).

Segundo a curadora: “[...] Este prólogo sozinho resume o tema desta exposição que não é

etnográfico no sentido em que ela não explica o que é um objeto de adivinhação. Eu preferi destacar

a ‘gramática visual’ que estas formas nos convidam a descobrir.”11.

Neste sentido Snoep vai afirmar ainda que os objetos foram organizados em função “de la

gestuelle”, ou seja, estavam expostos juntos objetos que haviam sido concebidos a partir de técnicas

próximas. Como por exemplo os que eram envoltos por outros materiais ou que continham outras

substâncias, os que eram formados por nós e outras formas de ligadura, os que levavam aplicações

de pregos e outros objetos e os formados por sobreposições de elementos orgânicos.

Para se ter uma ideia mais precisa, no primeiro espaço da exposição havia os seguintes

dizeres para introduzir os objetos expostos:

Objeto mágico Bo, Fon12, BéninMaxilar inferior humano, amarrado a uma cabeça de iguana13.

Atar, amarrar e juntarA morte, a doença, os acasos da natureza ou a violência dos homens estão na origem das práticas rituais que fizeram surgir esses objetos, fazendo a ligação entre aqui e lá.Reunir os elementos com a ajuda de fios para criar uma nova figura, aprisionar uma forma e um emaranhado de nós: o nó ata e desata, religa e separa. É assim que fazem os adivinhos para captar e depois controlar as potências as quais eles dominam a arte de manipulação.Atando, amarrando e juntando os elementos, captura-se as forças, domando-lhes e restaura-se o equilíbrio.

11 Recettes des dieux, esthétique du fétiche et Mangareva, Pantheón de Polynésie. Paris, 2008. p. 05. Tradução minha.12 Grupo africano que o produziu.13 Imagem retirada de informativo de divulgação da exposição. MUSÉE DU QUAI BRANLY. Recettes des dieux.

Esthétique du fetiche. Exposition dossier. Paris, 2008. p. 06.

8

Além deste primeiro espaço em que há os objetos que são predominantemente amarrados

por fios, unindo outros objetos por sua vez, há também os que foram divididos pelos seguintes

títulos dados pela curadoria: ii) envolver, untar e cobrir (nesta parte que está o Boli que é o objeto

do cartaz de divulgação); iii) estofar, empilhar e conter (onde há por exemplo sacos de tecido com

diversos objetos dentro que seriam ingredientes mágicos); iv) pregar, perfurar e fixar (como as

estátuas mágicas que levam diversos pregos); v) acumular e reunir (como a cruz fetiche em que há

pendurados diversos objetos para espantar o mau olhado); vi) objetos da natureza (como nós

vegetais que são encontrados já desta forma) e, finalmente, vii) objetos achados, objetos

deformados (que fazem referência às peças de vidro deformadas pela erupção do Monte Pelée na

Martinica em 1902 que formavam a coleção de André Breton).

Segundo informações do museu: “‘Recettes des dieux’ é uma instalação de objetos e

matérias: a exposição é inspirada em uma instalação de arte contemporânea, assim como em um

altar de um adivinho africano.”14.

Um dos objetos de maior destaque desta exposição, com lugar a parte reservado em outro

ambiente, é o “Boli”. Sem dúvida é o que mais se adequa a concepção de “informe”. É um objeto

de fetiche da população Bamana (Mali) de fins do século XIX ou meados do XX formado por

sangue animal coagulado, madeira, cera, terra, fibra vegetal e demais materiais orgânicos15. Foi

colocado numa sala com pouca iluminação, onde ocupa o lugar central e de destaque, no interior de

uma vitrine iluminada. Segundo as informações que o identificavam, sua origem é de um “santuário

da sociedade de iniciação Kono”. A etiqueta de identificação do objeto trazia o seguinte aos

espectadores:

Amálgama de terra, pedra, minérios, metal, madeiras, cortiças, raízes e folhas, couro, garras, dentes, chifres, ossos, cabelos, fragmentos dos corpos de antepassados, placenta, cada boli distingue-se pelo seu conteúdo, sua forma e sua dimensão. Devido às aspersões de cerveja de painço, às projeções das nozes cola mastigadas, aos jatos das cinzas e dos pós e ao pagamento de sangue, o boli está perpétua mudança (devenir). Conservada geralmente ao abrigo dos olhares, a sua receita é secreta16

[destaque meu].

O boli exposto é semelhante ao que foi roubado por Griaule e Leiris nos anos 30 durante a

missão Dakar-Djibouti e foi relatado no diário de Leiris que seria publicado um ano após o retorno

da expedição (em 1934) sob o título de “A África fantasma”, tendo sido o trecho em que relata o 14 Disponível no sítio do museu na internet: http://www.quaibranly.fr/fr/programmation/expositions/expositions-

passees/recettes-des-dieux/index.html - acesso em 15 de junho de 2009. Tradução minha do trecho. 15 Imagens e outras informações disponíveis no sítio do museu na internet: http://www.quaibranly.fr/es/collections/la-

vida-de-las-collecciones/adquisiciones/adquisiciones-recientes/index.html - acesso em 15 de junho de 2009.16 Texto copiado no local pela autora do dia 22 de fevereiro de 2009. Tradução minha.

9

roubo motivo de grande polêmica na época. É importante destacar que neste período a antropologia

francesa buscava a sua institucionalização enquanto disciplina científica, sendo que as missões

etnográficas tinham por objetivo formar o acervo de museus como o do Trocadéro até 1938 e depois

o museu do Homem (L'ESTOILE, 2007). É importante destacar aqui que a etnologia francesa

esteve fortemente vinculada aos museus principalmente em seus primórdios.

O espectador está olhando neste contexto algo que deveria ser mantido para além dos

olhares dos Bamana não iniciados (nos dizeres da legenda da exposição referente ao objeto), o que

pode tornar incômoda a sua visualização, ainda mais como obra de arte, ou seja, no sentido de mera

fruição.

Abaixo segue imagens do Boli, sendo uma retirada da seção de catálogo dos objetos de

pertencentes ao museu e a outra da seção de informações da referida exposição.

© musée du quai Branly, photo Patrick Gries

© musée du quai Branly, material de divulgação

Além do Boli, há objetos como o caso de uma máscara-marionete M’Bouri do território téké

(Congo) que deve cobrir todo o corpo de quem o veste, possuindo vestígios de terra e sangue, sendo

que na parte interna há pequenos sacos contendo substâncias mágicas a base de minerais, vegetais e

restos animais pulverizados; uma cruz-fetiche berbere que está envolta em tecidos, com diversos

elementos pendurados, como fragmentos de espelho e outros pequenos objetos, sendo que ao seu

centro está uma luva branca repleta de sal, que seria para espantar o mau-olhado próximo de onde

são construídas as casas; e finalmente, como exemplo, cito um objeto divinatório Bo (Benin) que é

composto pelo esqueleto de uma cabeça de iguana encaixada em um maxilar humano encontrado

sobre o corpo de uma amazona morta em combate (armada francesa contra a de Béhanzin, rei de

10

Abomey, março de 1890).

Este último objeto a que me refiro acima, assim como vários outros da exposição, para não

falar de quase todos os objetos do museu, foram trazidos para a França por missionários e militares

europeus, principalmente no período em que as colônias não tinham ainda conquistado suas

independências. Segundo Snoep, isso era evidência e testemunho “[...] da fascinação que os

militares franceses experimentaram: o ‘fetiche dos outros’ toma um novo significado. Ele guarda

sua parte de mistério ao mesmo tempo em que leva os nossos olhos para uma outra dimensão.”.

(musée du quai Branly, 2008:09, tradução minha).

Segundo Bonnot (2009), em artigo sobre a exposição:

[…] Em nenhum momento os textos da exposição pretendem dar uma última interpretação de um fetiche e do ritual ao qual está associado: essa receita é intimamente tributária das ações dos homens que os manipulam e os constituem ao mesmo tempo. Extrair o objeto desta situação sempre singular é cortar o efeito produzido pela interação que reúne lugares, homens e mulheres, objetos, animais, vegetais, sol e chuva. Pretender ressuscitar este efeito diante das vitrines de um museu teria sido ilusório. A coleta, qual foi a sua natureza – achado, roubo, requisição, doação -, interrompeu um processo no qual os objetos se encarregam de matérias, mas também de narrativas, palavras e gestos. Sua metamorfose pára, portanto? A janela de configuração, nos diz Jacomijn Snoep, 'é assim como a fixação do último gesto realizado sobre o objeto.'. Talvez, apesar da retenção na reserva e da atribuição de um número do inventário, certos aglomerados orgânicos continuem a trabalhar em surdina, perpetuando assim a dinâmica da coisa?” (BONNOT, 2009 – tradução minha).

Esse trecho levanta aspectos e questões interessantes, que penso também suscitadas por

certos espectadores. Acrescento: qual o poder de ação dos objetos para os fins da exposição quando

são 'fixados' no tempo e no espaço objetos com capacidade altamente transformativas? E aí o

próprio uso de materiais orgânicos na sua elaboração dão noção dessa dimensão dinâmica da vida

dos objetos, que por sua vez se relaciona com suas potências mágicas e divinatórias.

Há um momento anterior que afetou a minha percepção desta exposição. Antes mesmo de

vê-la, participei de uma oficina promovida pelo próprio museu a respeito da restauração e

conservação dos objetos expostos nesta exposição. A profissional responsável por coordenar este

trabalho no museu, procurou demonstrar de que forma a sua equipe trabalhava para paralisar

processos de decomposição dos materiais, para que os objetos tivessem uma vida longa. Mas até

que ponto a paralisação ou o retardamento da decomposição não intervem na tão cuidada e

perseguida pelos museus e galerias autenticidade do objeto? Ou ainda: será que a decomposição não

faria parte da trajetória de vida desses objetos de fetiche que em sua grande maioria foram feitos

11

justamente com matéria orgânica que tem em si uma vida mais curta?

E neste ponto volto à questão final de Bonnot sobre o trabalho silencioso dos materiais e a

perpetuação da dinamicidade do objeto para lançar a minha hipótese: de que este trabalho dinâmico

não segue, foi interrompido e que o trabalho de “fixação do último gesto realizado sobre o objeto”,

nas palavras da curadora, acabam por transformá-lo em qualquer outra coisa, quem sabe, agora, em

fetiche para a sociedade ocidental como um objeto de arte conceitual.

E sendo assim, até que ponto esses objetos atualizam suas potências agindo nesta realidade?

De que forma esses objetos podem informar/afetar o espectador a respeito da feitiçaria nas distintas

etnias africanas?

Penso em que medida os fetiches ao serem expostos como obras de arte não acaba

exotizando a magia, confundindo o espectador, distanciando-o dos objetos, da feitiçaria e quem

sabe ainda mais do continente de origem destes objetos. Pois não sejamos ingênuos, o museu que os

abriga parece servir em certa medida para brancos europeus observarem dimensões desconexas de

outrem.

Conclusão

Diversas questões foram propostas ao longo do texto e a ideia aqui era justamente instigar e

não concluir ou resolver. Nelas estão pontos que tem mobilizado não apenas a antropologia (como

um todo17), mas também a história da arte, a museologia, curadores de exposições, comerciantes de

arte.

O ponto que eu quero levantar aqui para finalizar é no sentido de como pode ser possível

apresentar objetos advindos dos mais diversos grupos do mundo em exposições de arte sem exotizá-

los? E como compreendermos os objetos sem termos acesso aos pensamentos que os

elaboraram/elaboram? As legendas costumam trazer informações da curadoria somente e nada

muito além de: título, ano/período em que foi fabricado, material e etnia. Raramente há mais que

isso. E aqui estou elegendo o caso do recente museu do quai Branly de apresentação das peças.

Esses objetos, portanto, podem transmitir algo para além dos seus atributos estéticos?

Lagrou, antropóloga que tem se dedicado há anos a compreender o universo estético

kaxinawa, em seu livro sobre as artes indígenas brasileiras faz a seguinte afirmação: “Com relação

17 Penso que evidência disso pode ser o debate que ocorreu em 1993 na universidade de Manchester que contou com a participação de antropólogos renomados que trabalham com antropologia da arte e antropologia estética, assim como também com etnologia indígena, como eram os casos de Joanna Overing e Peter Gow, sendo amazonistas. Este debate ocorreu em torno da seguinte proposição: “A estética é uma categoria transcultural”. Mas não deixou de ser uma reflexão sobre a própria antropologia num sentido mais amplo. Sinal disso é o volume em que se encontra: Key Debates in Anthropology. Organizado por Ingold e publicado em 1996 junto com outros debates contemporâneos da antropologia.

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às artes visuais surge a questão da percepção nativa que somente pode ser entendida se captarmos a

maneira como o pensamento nativo concebe a realidade.” (LAGROU, 2009:82). Portanto aqui me

parece que está um dilema: como o espectador em exposições de arte pode apreender os objetos

produzidos por sociocosmologias distintas da sua (ocidental) sem ter elementos para saber de que

forma os “pensamentos nativos” elaboraram (ou são) tais objetos?

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