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SIDNEI TURCZYN O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

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SIDNEI TURCZYN

O SISTEMAFINANCEIRONACIONAL

E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

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O SISTEMA FINANCEIRO NACIONALE A REGULAÇÃO BANCÁRIA

SIDNEI TURCZYN

© desta edição: 2005

EDITORA REVISTA DOS TRIBUNAIS LTDA.

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Impresso no Brasil ( 02 - 2005 )

ISBN 85-203-2715-X

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SUMÁRIO

PREFÁCIO – CARLOS ARI SUNDFELD .......................................... 9

UMAS POUCAS PALAVRAS – EDUARDO DOMINGOS BOTALLO 13

INTRODUÇÃO .......................................................................... 23

1. A ATIVIDADE FINANCEIRA ............................................ 29

1.1 Vicissitudes da atividade financeira ............................ 29

1.2 A atividade financeira e as demais atividades econô-micas ............................................................................ 33

1.3 As diversas modalidades de atividades financeiras .... 34

1.3.1 Atividade financeira pública ............................ 34

1.3.1.1 Poder estatal: emissão de moeda ...... 35

1.3.1.2 Poder estatal: controle do crédito ..... 39

1.3.1.3 Políticas públicas .............................. 41

1.3.1.4 O custeio do funcionamento do Estado 44

1.3.2 Atividade financeira privada ............................ 47

2. A ATIVIDADE BANCÁRIA ............................................... 51

2.1 Conceituação de banco ................................................ 51

2.2 Atividade bancária e criação de moeda escritural ...... 55

2.3 Atividade bancária e sistema financeiro ..................... 57

2.4 Razões para o tratamento específico da atividade ban-cária .............................................................................. 59

2.5 Os riscos da atividade bancária ................................... 62

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16 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

2.5.1 Risco de liquidez (vulnerabilidade a corridas) 63

2.5.2 Risco de mercado ............................................. 65

2.5.3 Risco de crédito ............................................... 67

2.5.4 Risco operacional ............................................. 69

2.5.5 Risco regulatório ou legal ................................ 70

2.5.6 Riscos fora do balanço..................................... 72

2.5.7 Risco moral ...................................................... 73

2.6 O risco sistêmico ......................................................... 74

3. O SISTEMA MONETÁRIO-FINANCEIRO ...................... 78

3.1 Conceito ....................................................................... 78

3.2 Sistema monetário-financeiro e banco central ............ 79

4. O DIREITO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS E SUAPOSIÇÃO NO SISTEMA JURÍDICO ................................ 85

4.1 Definição terminológica: direito bancário ou direito dasinstituições financeiras ............................................... 85

4.2 O direito das instituições financeiras e a dicotomia entredireito público e privado ............................................. 89

5. A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL ..................... 93

5.1 Sinopse histórica ......................................................... 93

5.1.1 O período de 1808 a 1930 ............................... 94

5.1.2 O período de 1930 a 1945 ............................... 97

5.1.3 O período de 1945 a 1964 ............................... 100

5.1.4 O período de 1964 a 1994 ............................... 106

5.1.5 O período de 1994 a 2003 ............................... 107

5.1.6 O período que se inicia em 2003 ..................... 110

5.2 Retrospectiva constitucional ....................................... 110

5.2.1 As Constituições de 1824 e de 1891 ............... 111

5.2.2 A Constituição de 1934 ................................... 111

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17SUMÁRIO

5.2.3 A Constituição de 1937 ................................... 112

5.2.4 A Constituição de 1946 ................................... 112

5.2.5 A Constituição de 1967 e atos institucionais pos-teriores .............................................................. 113

5.2.6 A Constituição de 1988 ................................... 113

5.2.6.1 A polêmica relativa à regulamentaçãodo art. 192 da Constituição Federal .... 115

5.2.6.2 A Emenda Constitucional n. 40/2003 117

6. A REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO DOBRASIL ................................................................................ 121

6.1 A estrutura anterior à Lei 4.595/1964 ......................... 121

6.2 Criação do Sistema Financeiro Nacional e sua evolu-ção: a Lei 4.595/1964 .................................................. 125

6.2.1 O Conselho Monetário Nacional ..................... 132

6.2.1.1 Competências .................................... 132

6.2.1.2 Composição e autonomia .................. 136

6.2.2 O Banco Central do Brasil .............................. 138

6.2.2.1 O Banco Central como autoridade mo-netária ................................................ 145

6.2.3 As instituições financeiras públicas ................ 148

6.2.3.1 O Banco do Brasil ............................. 160

6.2.3.2 O Banco Nacional do Desenvolvimen-to Econômico e Social ...................... 165

6.2.3.3 O Banco Nacional da Habitação – OSistema Financeiro da Habitação ..... 169

6.2.3.4 As caixas econômicas ....................... 172

6.2.3.4.1 A Caixa Econômica Fede-ral ...................................... 175

6.2.4 As demais instituições financeiras públicas eprivadas ............................................................ 176

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18 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

6.2.4.1 Os bancos comerciais ........................ 178

6.2.4.2 Os bancos de investimento ............... 179

6.2.4.3 Os bancos de desenvolvimento ......... 182

6.2.4.4 As sociedades de crédito, financiamen-to e investimento ............................... 183

6.2.4.5 As cooperativas de crédito ................ 185

6.2.4.6 As sociedades de crédito imobiliário eas associações de poupança e emprés-timo.................................................... 187

6.2.4.7 As companhias hipotecárias ............. 188

6.2.4.8 Os bancos múltiplos .......................... 189

6.2.4.9 As sociedades de arrendamento mer-cantil (leasing) ................................... 190

6.2.4.10 As agências de fomento .................... 191

6.2.4.11 As sociedades de crédito ao microem-preendedor ......................................... 193

6.3 O regime legal da insolvência das instituições finan-ceiras ............................................................................ 194

6.3.1 O período de 1864 a 1974 – Sinopse evolutiva 194

6.3.1.1 A constitucionalidade dos procedi-mentos de liquidação extrajudicial ... 196

6.3.2 A sistematização da intervenção e da liquida-ção extrajudicial das instituições financeiras –A Lei 6.024/1974 ............................................. 200

6.3.3 O regime de administração especial temporária(RAET) – Decreto-lei 2.321, de 25.02.1987 ..... 207

6.3.4 O aperfeiçoamento do regime – A Lei 9.447, de14.03.1997 ....................................................... 209

6.3.4.1 A efetividade da aplicação da legisla-ção...................................................... 212

6.4 Medidas de fortalecimento do Sistema Financeiro Na-cional ........................................................................... 213

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19SUMÁRIO

6.4.1 Medidas legislativas ......................................... 214

6.4.1.1 O PROES: Medida Provisória 1.514,de 07.08.1996 .................................... 214

6.4.1.2 O novo Sistema de Pagamentos Bra-sileiro (SPB) – Lei 10.214, de 27.03.2001 ................................................... 216

6.4.2 Medidas não legislativas .................................. 219

6.4.2.1 O PROER .......................................... 221

6.4.2.2 O Fundo Garantidor de Créditos ...... 226

6.4.2.3 Adesão aos acordos e princípios doComitê da Basiléia ............................ 232

6.4.2.4 A Central de Risco de Crédito .......... 236

7. INDAGAÇÃO SOBRE O PAPEL DO ESTADO NA ATI-VIDADE BANCÁRIA ......................................................... 239

8. ATUAÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO 240

8.1 Gênese e evolução da atuação do Estado no domínioeconômico.................................................................... 240

8.2 Formas de atuação econômica do Estado brasileiro... 246

8.2.1 Os antecedentes constitucionais ...................... 246

8.2.2 A Constituição de 1988 ................................... 252

8.2.2.1 A ordem constitucional econômica .. 253

8.2.2.2 A finalidade atribuída à ordem econô-mica ................................................... 255

8.2.2.3 Posição do Estado em relação à res-ponsabilidade pela iniciativa econômi-ca ........................................................ 256

8.2.2.4 A ordem econômica e o Sistema Fi-nanceiro Nacional ............................. 262

8.3 Classificação das formas de atuação econômica doEstado .......................................................................... 264

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20 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

8.4 A reforma do Estado brasileiro ................................... 274

8.5 Atividade bancária e serviço público .......................... 279

8.6 Atividade bancária e poder de polícia ......................... 287

9. REGULAÇÃO ECONÔMICA ............................................ 303

9.1 Regulação econômica: conceituação .......................... 303

9.2 Justificativas para a regulação econômica .................. 313

9.3 Modalidades e instâncias de regulação ....................... 327

9.3.1 A regulação autônoma e os bancos centrais ... 332

10. A ATIVIDADE BANCÁRIA COMO ATIVIDADE REGU-LADA .................................................................................... 340

10.1 Caracterização da atividade financeira como atividaderegulada........................................................................ 340

10.2 Justificativas para a regulamentação bancária ............ 348

10.3 Evolução das modalidades de regulação bancária ...... 350

10.4 Formas específicas de regulação do sistema financeiro 352

10.5 Análise do Sistema Financeiro Nacional sob o aspectoregulatório .................................................................... 357

10.5.1 Submissão da atividade financeira ao poder doEstado ............................................................... 357

10.5.2 Regulamentação bancária ................................ 359

10.5.2.1 Regulamentação bancária e delegaçãonormativa ........................................... 359

10.5.2.2 A regulamentação bancária propria-mente dita .......................................... 366

10.5.3 Regulação prudencial ....................................... 368

10.5.4 Fiscalização bancária ....................................... 371

10.5.5 Regulação sistêmica......................................... 379

10.5.6 Regulação concorrencial .................................. 382

10.5.6.1 Regulação e concorrência ................. 382

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21SUMÁRIO

10.5.6.2 Regulação concorrencial no SistemaFinanceiro Nacional .......................... 386

10.5.6.3 A disputa entre CADE e BACEN..... 389

10.6 Regulação bancária e defesa do consumidor .............. 396

CONCLUSÕES .......................................................................... 403

BIBLIOGRAFIA ........................................................................ 413

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A ATIVIDADE FINANCEIRANO BRASIL

SUMÁRIO: 5.1 Sinopse histórica: 5.1.1 O período de 1808 a 1930;5.1.2 O período de 1930 a 1945; 5.1.3 O período de 1945 a 1964; 5.1.4

O período de 1964 a 1994; 5.1.5 O período de 1994 a 2003; 5.1.6 Operíodo que se inicia em 2003 – 5.2 Retrospectiva constitucional: 5.2.1

As Constituições de 1824 e de 1891; 5.2.2 A Constituição de 1934;5.2.3 A Constituição de 1937; 5.2.4 A Constituição de 1946; 5.2.5 A

Constituição de 1967 e atos institucionais posteriores;5.2.6 A Constituição de 1988.

5.1 Sinopse histórica

A evolução do Sistema Financeiro Nacional é marcada pelaedição de uma grande quantidade de leis cujos efeitos, por maisque se busque um critério de sistematização, se projetam no tem-po e ultrapassam quaisquer períodos evolutivos que se possamdelimitar.

Por outro lado, como não poderia deixar de ser, essa evolu-ção envolve situações econômicas e políticas diversas que a in-fluenciaram, deixando marcas profundas que, ainda hoje, sãoidentificadas na configuração do Sistema.

Para facilitar a compreensão desse processo evolutivo, é fei-ta, abaixo, uma sinopse que, quase de forma esquemática, pre-tende servir como base de apoio para a compreensão do SistemaFinanceiro como um todo e de sua configuração atual.

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94 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

5.1.1 O período de 1808 a 1930

Em artigo sobre a evolução do Sistema Financeiro Nacio-nal, Luiz Alfredo Paulin divide-a historicamente em 8 fases dis-tintas: 1808/1845, 1845/1889, 1889/1898, 1898/1930, 1930/1945,1945/1964, 1964/1994 e 1994 até os dias atuais, salientando, noentanto, que apenas a partir da fase 1898/1930 o Estado passa aregular organizadamente o setor.1

Essa menção ao início da regulação estatal organizada ape-nas a partir de 1930 faz com que se possa prescindir, para efeitodo presente trabalho, do exame individualizado das fases ante-riores.

A irrelevância do estudo, neste trabalho, dos períodos ante-riores decorre, também, do fato de que a economia brasileira, até1930, se baseava na exploração agrícola de monocultura em regi-me fundiário de latifúndios, de modo que pouco diferia da eco-nomia colonial.

O estágio de subdesenvolvimento econômico fazia com quea execução direta da política econômica pelo Estado fosse sufi-ciente para a coordenação dos interesses dos grupos econômicosque detinham o poder político.

O capital necessário para o desenvolvimento da atividadeagrícola era proveniente do exterior e canalizado diretamente peloEstado para essa atividade. Todo o aparelhamento de base mo-derno para a economia brasileira, até as vésperas da SegundaGuerra Mundial, foi também, quase todo ele, fruto do capital fi-nanceiro internacional (incluindo estradas de ferro, portos mo-dernos, serviços urbanos e grandes empresas industriais).2

(1) PAULIN, Luiz Alfredo. A evolução do sistema financeiro nacional.Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitra-gem, v. 17, p. 76-89.

(2) PRADO JR., Caio. História econômica do Brasil. p. 282.

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97A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL

a maioria dos quais concentrados no financiamento do comércioexterior.5

A partir da década de 1920 passam a surgir os bancos esta-duais em Minas Gerais, Paraíba, Piauí, São Paulo, Paraná e RioGrande do Sul, e, a partir de 1930, passam a surgir manifestaçõeslegislativas esparsas e assistemáticas destinadas a socorrer situa-ções emergenciais ligadas ao mercado financeiro e a buscar solu-ções tópicas.

Dentre essas manifestações é de referir a criação: a) da Car-teira de Emissão e Redesconto (CARED) do Banco do Brasil, porforça da Lei 4.182, de 13.11.1920, e da Lei 4.230, de 30.12.1920,destinada a fazer do Banco o emprestador de última instância dosistema bancário;6 b) da Inspetoria-Geral dos Bancos, pelo De-creto 14.728, de 16.03.1921; e c) da Câmara de Compensação,em 1921.7

5.1.2 O período de 1930 a 1945

A ruptura política e as profundas mudanças ocorridas nocenário econômico nacional e mundial justificam que se consi-dere o ano de 1930 como início de uma fase distinta no processoevolutivo do Sistema Financeiro Nacional.

Sob o aspecto econômico, a crise econômica mundial de 1929fez cessar o fluxo de capitais estrangeiros, reduziu a zero as reser-vas internacionais do País, determinou um brusco e profundodesequilíbrio nas contas externas, um déficit considerável, e tevecomo conseqüência a indispensabilidade de uma mudança deenfoque da economia, que se volta, então, para a criação de ummercado interno e lança as bases para o início do desenvolvimen-

(5) BAER, Werner. A economia brasileira. p. 319-20.(6) NOVELLI, José Marcos Nayme. Op. cit. p. 53.(7) PAULIN, Luiz Alfredo. Op. cit. p. 82.

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99A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL

Nayme Novelli também ressalta que as questões de políticamonetária eram com pouca freqüência discutidas nas reuniões dediretoria do Banco do Brasil, que “tratavam, majoritariamente,das operações comerciais do banco”.12

Além dessas funções próprias de banco central, o Banco doBrasil passou também a exercer a fiscalização bancária, a partirde 1931, quando foi extinta a Inspetoria Geral de Bancos, subor-dinada ao Ministério da Fazenda (que havia sido criada pelo De-creto 14.728, de 16.03.1921).13

No aspecto substancial do exercício da atividade financeira,merece especial destaque, neste período, a edição do Decreto22.626, de 07.04.1933, conhecido como Lei da Usura (em vigorincontestavelmente até a entrada em vigor do novo Código CivilBrasileiro em janeiro de 2003),14 que estabeleceu o limite máxi-mo de 12% ao ano para a cobrança de juros.

dade econômica, mas provinham diretamente dos cofres públicos eaté da emissão de moeda. Logo, a criação de moeda escritural sobreessa base distorcida, porque irreal em termos de exigibilidade, é queveio a causar empobrecimento social pela política distorcida em-pregada.

(12) NOVELLI, José Marcos Nayme. Op. cit. p. 55.(13) Idem. p. 53.(14) Existem entendimentos no sentido de que o art. 406 do novo Código

Civil, ao estabelecer como juros legais aqueles em vigor para a morano pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, teria revo-gado as disposições da Lei de Usura, uma vez que, atualmente, taisdébitos são sujeitos à incidência da taxa Selic, cujo valor atual é su-perior ao limite de 12% ao ano. Essa discussão envolve o estudo danatureza da taxa Selic, misto de juros e correção monetária, tantoassim que os débitos fiscais sobre os quais incide a taxa Selic não sesujeitam à incidência de correção monetária. Em sentido contrário,acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Agravo Inter-no 7006436018 da 1.ª Câmara Cível) entende que a taxa de juros aque se refere o Código Civil é a taxa de 12% ao ano prevista no art.161, § 1.º, do Código Tributário Nacional, sustentando, inclusive, essaposição com base em decisão do STJ reconhecendo a inconstitucio-

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100 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E A REGULAÇÃO BANCÁRIA

Esse decreto foi um grande obstáculo ao desenvolvimentoda atividade financeira no País e só deixou de ser aplicado às ins-tituições financeiras quatro décadas depois, por força de decisãodo Supremo Tribunal Federal. Durante essas quatro décadas, essalegislação impediu a concessão de créditos de médio e longo pra-zos, indispensáveis ao processo de desenvolvimento econômico.

5.1.3 O período de 1945 a 1964

A situação acima descrita só começou a se alterar com a cria-ção, em 1945, por força do Decreto-lei 7.293, de 2 de fevereiro,da SUMOC – Superintendência da Moeda e do Crédito, precur-sora do Banco Central que surgiria vinte anos mais tarde, supe-rintendência essa criada “com o objetivo imediato de exercer ocontrole do mercado monetário e preparar a organização doBanco Central” e de executar a política monetária da administra-ção federal, incumbindo-lhe, também, autorizar e fiscalizar ofuncionamento das instituições de crédito.

Esta inovação legislativa, por si só, é justificativa bastantepara que se a considere como início de uma fase distinta no pro-cesso de desenvolvimento do Sistema Financeiro Nacional.

A vinculação direta do corpo diretivo da Superintendência àPresidência da República15 retirava-lhe qualquer possibilidade deatuação técnica, configurando-a como mera extensão do Poder

nalidade de utilização da taxa (Selic inclusive para débitos fiscais),dentre outros motivos, pela impossibilidade de equiparar contribuin-tes a aplicadores. Sem maior aprofundamento no exame da matéria,que, ademais, não cabe no âmbito do presente trabalho, resta demons-trado que a polêmica a respeito da revogação ou não da lei da usuraestá longe de terminar.

(15) O conselho da Superintendência era composto pelo Ministro da Fa-zenda, seu presidente, pelo diretor executivo da SUMOC e pelosdiretores de câmbio, CARED e CAMOB do Banco do Brasil, poden-do ser demitidos a qualquer tempo.

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105A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL

Por fim, a Lei 2.973, de 26.11.1956, prorrogou, por mais dezanos, a cobrança dos adicionais constitutivos dos recursos do Banco,aperfeiçoou os mecanismos de arrecadação e de alocação desses re-cursos e fixou a prioridade de distribuição destes, criando mais fon-tes complementares de recursos consistentes de até 4% dos depósi-tos da Caixa Econômica Federal e de 25% do aumento anual das re-servas técnicas das empresas de seguros e de capitalização.

O Gráfico 1, apesar da sua atecnicidade, demonstra que, ape-sar de no período entre 1951 e 1963 ter havido um grande aumen-to na quantidade de estabelecimentos bancários (matrizes e filiais),os valores efetivos de empréstimos ao setor privado reduziram-se sensivelmente a partir de 1961. Esse é um forte indicativo deanomalias na economia e de fraco desempenho do setor financei-ro, fato esse confirmado por Werner Baer, que menciona um pro-cesso de estagnação econômica que se iniciou em 1961 em de-corrência da crise política vivenciada pelo País após a renúnciade Jânio Quadros, o que deu início a um período turbulento, des-tituído de qualquer linha de política econômica.21

(21) BAER, Werner. Op. cit. p. 91.

GRÁFICO 1 – NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS VERSUSEMPRÉSTIMOS (SETOR PRIVADO) – VALORES CONSTANTES

Fonte: Serviço de Estatística Econômica e Financeira do Ministério da Fazenda e Relatórios Anuaisdo Banco do Brasil. In: LOPES, João do Carmo; ROSSETTI, José Paschoal. Economia monetá-ria. São Paulo: Atlas, 1995.

170 -160 -150 -140 -130 -120 -110 -100 -90 -

1951 1953 1955 1957 1959 1961 1963

Empréstimo ao setor privado Número de estabelecimentos

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109A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL

Houve também, no período, uma evolução na participaçãodos bancos controlados por capitais estrangeiros, mas mesmoassim a participação dos bancos públicos (exceto o BNDES) per-maneceu relevante.

As crises econômica e bancária, suas conseqüências e os ris-cos a que foi submetido o Sistema Financeiro fizeram as atençõesse voltarem para o assunto relativo à regulamentação desse Siste-ma, de modo a dotar o País de mecanismos hábeis a fazer frente àsnovas exigências do mercado financeiro nacional e internacional.

As tentativas mais efetivas de uma reestruturação do Siste-ma Financeiro Nacional foram impedidas pela redação originaldo art. 192 da Constituição Federal de 1988 e pela interpretaçãoque supostamente recebeu do Supremo Tribunal Federal no sen-tido da exigência de uma lei complementar única para regulamen-tar o Sistema.

Essa exigência deixou de existir com a Emenda Constitucio-nal n. 40/2003, que abriu ao Legislativo a possibilidade de umaefetiva reestruturação do Sistema. Isso permite fixar essa data

GRÁFICO 2 – PARTICIPAÇÃO DA PORCENTAGEM DASINSTITUIÇÕES NOS ATIVOS BANCÁRIOS

Fonte: Relatório Econômico – O novo perfil do sistema financeiro, 2001, ANDIMA.

100%

50%

0%

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

bancos públicos bancos nacionais bancos com controle estrangeiro

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111A ATIVIDADE FINANCEIRA NO BRASIL

5.2.1 As Constituições de 1824 e de 1891

As Constituições de 1824 e de 1891, em razão das épocas emque foram promulgadas, de caráter eminentemente liberal, nãotrataram de qualquer aspecto da atividade financeira. As princi-pais notas de cunho econômico da Constituição de 1824 foram aabolição das corporações de ofício e a consagração do princípioda livre iniciativa,27 bem como a consagração do direito de pro-priedade, inclusive dos inventores, no que foi acompanhada pelaConstituição de 1891.

Nessas Constituições, nota-se presente apenas a preocupa-ção com a função institucional relativa à emissão de moeda. Nes-se sentido, a Constituição de 1824 outorga ao Poder Legislativo,através da Assembléia Geral, as funções de determinar o peso,valor, inscrição, tipo e denominação das moedas, assim como opadrão dos pesos e medidas (art. 15, XVII), e a Constituição de1891 outorga à União competência exclusiva para a instituiçãode bancos emissores (art.7.º, § 1.º, 1.º).

5.2.2 A Constituição de 1934

Na Constituição de 1934, dentro do título relativo à ordemeconômica e social, o art. 117 dispunha que “a lei promoverá ofomento da economia popular, o desenvolvimento do crédito e anacionalização progressiva dos bancos de depósito. Igualmenteprovidenciará sobre a nacionalização das empresas de seguros(...)”. O parágrafo único arrematava: “É proibida a usura, que serápunida na forma da lei”.

A proibição da usura, alçada a dispositivo constitucional, jáera objeto do Decreto 22.626, de 07.04.1933, ao qual antes já se

(27) Sob inspiração direta da Constituição francesa de 1814, de acordocom André Ramos TAVARES (Direito constitucional econômico, p.107).

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da lei ordinária, o art. 5.º, II: “ninguém será obrigado a fazer oudeixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

No aspecto substancial, um forte argumento contrário à tesede exigência de lei única é o fato de que no voto do relator (Minis-tro Sydney Sanches), que serviu de base para o acórdão, o minis-tro admitiu expressamente que uma lei ordinária deveria criar ostipos penais de usura, como se extrai da 2.ª parte do § 3.º do art.192. Caso se exigisse, efetivamente, lei única, esta deveria, obri-gatoriamente, tratar de todos os aspectos constantes “do caput,dos incisos e dos parágrafos do art. 192”, como consta da parte daementa antes transcrita.28

Por fim, não se pode deixar de mencionar que, apesar da teseda lei complementar única, vários assuntos relevantes relativosao Sistema Financeiro foram objeto de regulamentação por meiode leis ordinária e até mesmo de medidas provisórias, sem quetivessem tido sua constitucionalidade questionada. Esses assun-tos serão abordados mais adiante, ao se tratar da regulamentaçãoinfraconstitucional do Sistema Financeiro Nacional.

5.2.6.2 A Emenda Constitucional n. 40/2003

Por trás da discussão relativa à exigência de lei complemen-tar única para a regulamentação do art. 192 da Constituição seescondia, na verdade, uma outra relevante questão, de naturezaeminentemente política, qual seja a do tratamento a ser dado à“organização, [ao] funcionamento e [às] atribuições do BancoCentral”, prevista no inciso IV do art. 192. Prevalecendo a tese dalei complementar única, impedir-se-ia que a questão da “indepen-dência” do Banco Central fosse tratada em separado das demais

(28) A discussão resumida no presente trabalho, a respeito da tese da leiúnica, baseou-se em trabalho inédito de Luis Virgílio Afonso da Sil-va e de Jean Paul Cabral Veiga da Rocha, A regulamentação do sis-tema financeiro nacional: o art. 192 e o mito da lei complementarúnica.

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mento constante da versão anterior do art. 192 e de seus comple-mentos restaram, além do art. 192 propriamente dito, apenas asseguintes referências ao Sistema Financeiro Nacional, a seus ór-gãos e a assuntos a ele correlatos: a) competência exclusiva daUnião para emitir moeda e administrar as reservas cambiais doPaís, bem como para fiscalizar as operações de natureza finan-ceira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, segu-ro e previdência privada (art. 21, VII e VIII); b) competência le-gislativa privativa da União (art. 22) no tocante a sistema mone-tário e de medidas, a títulos e garantias dos metais (inciso VI),política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores(inciso VII) e sistemas de poupança, captação e garantia da pou-pança popular (inciso XIX).

Além disso, o art. 164, mantido, tornou constitucionalmen-te consagrada a existência de um banco central com função emis-sora, ao dispor que “a competência da União para emitir moe-da será exercida exclusivamente pelo Banco Central” e ao fixar,em seus parágrafos, parte da competência desse mesmo BancoCentral.

Mais ainda, utilizou-se o dispositivo da expressão “institui-ções financeiras oficiais” para designar o local de depósitos dasdisponibilidades de caixa de Estados, Distrito Federal, Municí-pios, órgãos ou entidades do Poder Público, e empresas por elecontroladas. Tornou, também, obrigatório o depósito das dispo-nibilidades de caixa da União no Banco Central.

Outra expressão que diz respeito ao Sistema Financeiro Na-cional é aquela encontrada no art. 159, I, c, que impõe à União odever de entregar parte do produto da arrecadação dos impostossobre a renda e sobre produtos industrializados para aplicação emprogramas de financiamento ao setor produtivo das regiões Nor-te, Nordeste e Centro-Oeste, “através de suas instituições finan-ceiras de caráter regional”.

Por fim, não se pode deixar de fazer menção às disposiçõesdos arts. 48 e 52 da Constituição, que, mesmo sem tratarem do

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