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39 EM DEPOIMENTO EXCLUSIVO, LAERTE QUESTIONA PADRÕES E DIZ QUE O CONCEITO DE GÊNERO NÃO PASSA DE UMA CONSTRUÇÃO CULTURAL out / nov 2012 TEMPOS DE CRIAR EM CONJUNTO A cocriação potencializa a cultura do compartilhamento e põe em xeque questões como centralização de processos criativos e autoria PARA ALÉM DO SPRAY Intervenções artísticas de diferentes técnicas invadem as cidades e provam que arte urbana não é sinônimo de grafite RETRATO DA AUSÊNCIA Por meio de imagens, o fotógrafo Gilvan Barreto retorna a um lugar imaginário que marcou sua infância me trate com RESPEITO!

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Em dEpoimEnto Exclusivo, laErtE quEstiona padrõEs E diz quE o concEito dE gênEro não passa dE uma construção cultural

out / nov 2012

TEMPOS DE CRIAR EM CONJUNTOA cocriação potencializa a cultura do compartilhamento e põe em xeque questões como centralização de processos criativos e autoria

PARA ALÉM DO SPRAYIntervenções artísticas de diferentes técnicas invadem as cidades e provam que arte urbana não é sinônimo de grafite

RETRATO DA AUSÊNCIAPor meio de imagens, o fotógrafo Gilvan Barreto retorna a um lugar imaginário que marcou sua infância

“me trate com respeito!”

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COORDENAÇÃO EDITORIALAna de Fátima Sousa

EDIÇÃO EXECUTIVAMarco Aurélio Fiochi

PROJETO GRÁFICOMarina Chevrand

EDIÇÃO DE ARTEJader Rosa

Liane Tiemi Iwahashi

EDIÇÃO Roberta Dezan

ASSISTÊNCIA À EDIÇÃO DE CONTEÚDOSGabriela Rassy

EDIÇÃO DE FOTOGRAFIAAndré Seiti

DESIGNLu Orvat Design

COORDENAÇÃO DE REVISÃOPolyana Lima

REVISÃOCiça Corrêa

Karina HambraNelson Visconti

PRODUÇÃO EDITORIALCybele Fernandes

PAUTAAna de Fátima Sousa

André SeitiCybele Fernandes

Eduardo SaronGabriela Rassy

Jader RosaMarco Aurélio Fiochi

Maria Clara MatosRoberta Dezan

COLABORARAM NESTA EDIÇÃOAnna Carolina Mello

Bruno FernandesCarlos Costa

Cleiton de OliveiraDébora AlmeidaDimas Forchetti

Flavia BancherGilvan Barreto

Gustavo RanieriLaura GuimarãesLeonardo FolettoMariana Lacerda

Mariana LemeMicheliny Verunschk

Patrícia ColomboRenan Magalhães – Estúdio Lumine

Ricardo DarosRichner Allan

selvaSPVeronica Papoula Mendes

AGRADECIMENTOSBerenice Bento

Christian CravoEliane Bortolanza

itsNOONMaria Adrião

ISSN 1981-8084 Matrícula 55.082(dezembro de 2007)

Tiragem 10 mil – distribuição gratuita.Sugestões e críticas devem ser

encaminhadas ao Núcleo de Comunicação e Relacionamento

[email protected] Jornalista responsável

Ana de Fátima Sousa MTb 13.554

capa: laerte foto: andré seiti

Baixe o aplicativo da ConTINUUM em seu iPad e veja todas as matérias desta edição e das anteriores, além de conteúdos extras.

CARTA DO EDITOR

Há pouco mais de um ano, o cartunista Laerte resolveu tornar público seu prazer ao vestir roupas femininas. Bastou começar a usar saias, colares, brincos e outras peças do gênero, que ele passou a frequentar, aparentemente contra sua vontade, as páginas de jornais e revistas e a participar de uma infinidade de programas de TV. Em todos os meios, reafirmou sua opção, mais estética que sexual. Com isso, abriu na sociedade uma discussão sobre a necessidade de vincular a sexualidade de uma pessoa ao que ela veste.

Ávidas por rótulos, as pessoas batizaram de crossdressing o comportamento do cartunista e de outros tantos mundo afora. Faz tempo que a ConTINUUM queria entrevistar Laerte, a capa desta edição, para mostrar mais do que sua opção, sua atitude política. Afinal, trajar-se de maneira a confrontar o estabe-lecido é cutucar a sociedade, fazê-la passar do espanto para a reflexão e a aceitação do diferente. À par-te o alarido da mídia ao rotulá-lo de crossdresser, ele segue calmo em sua guerrilha pela preservação dos direitos individuais em tempos de crescente conservadorismo.

Se você está ou esteve em São Paulo deve ter percebido a força da arte urbana, espalhada nos muros, nos tapumes, no topo dos prédios e até em galerias que escoam o esgoto pelo poluído Rio Tietê. São grafites, pichações (sim, por que não?), ilustrações e, mais recentemente, microrroteiros – histórias cur-tas sobre fundos coloridos, qual pequenos cartazes. Em geral, são bem-humoradas e críticas, como as narrativas da artista Laura Guimarães apresentadas pela revista. Em uma reportagem especial fazemos um giro para mostrar algumas dessas criações.

Publicamos também um fragmento do ensaio fotográfico Moscouzinho, de Gilvan Barreto, lançado na 8ª Paraty em Foco. O fotógrafo criou, com imagens construídas, um lugar imaginário perdido na me-mória de sua infância. Moscouzinho foi o apelido que a cidade de Jaboatão dos Guararapes, vizinha do Recife, ganhou quando foi governada por um prefeito comunista e se transformou em um pedacinho da Rússia em pleno litoral pernambucano.

Cantor e compositor paulistano, Thiago Pethit lançou em agosto seu segundo trabalho, Estrela Deca-dente, que está disponível para download em seu site. Ele conta, na Entrevista, como é gerenciar quase todos os aspectos de sua carreira, indo muito além da atividade artística. Outro novo talento da música, o paulistano Leo Cavalcanti, falou à revista antes de subir ao palco do Auditório Ibirapuera para apre-sentar as canções de seu primeiro disco, Religar. Confira o papo na seção Acesso Restrito.

Boa leitura!

Se você é ilustrador, artista ou fotógrafo, envie o link de seu portfólio virtual para <[email protected]>. Queremos conhecer o seu trabalho!

Envie seu comentário sobre a ContinUUM para o e-mail [email protected] utilize os canais do Itaú Cultural no Twitter e no Facebook. Em caso de publicação na seção Carta do Leitor, a mensagem pode ser editada a critério da redação.

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EM DEPOIMENTO EXCLUSIVO, LAERTE QUESTIONA PADRÕES E DIZ QUE O CONCEITO DE GÊNERO NÃO PASSA DE UMA CONSTRUÇÃO CULTURAL

out / nov 2012

TEMPOS DE CRIAR EM CONJUNTOA cocriação potencializa a cultura do compartilhamento e põe em xeque questões como centralização de processos criativos e autoria

PARA ALÉM DO SPRAYIntervenções artísticas de diferentes técnicas invadem as cidades e provam que arte urbana não é sinônimo de grafite

RETRATO DA AUSÊNCIAPor meio de imagens, o fotógrafo Gilvan Barreto retorna a um lugar imaginário que marcou sua infância

“me trate com RESPEITO!”

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302422 R E p o r T A G E M | uma espécie cada vez mais comum

Longe da crise que abala outros países, o Brasil vê aumentar o número de pessoas que investem em arte.

E n S A I O F o T o G r Á F I C O | retrato da ausênciaUma cidade imaginária ganha forma com fragmentos de imagens.

R E p o r T A G E M | occupy pela arte!Duas galerias do eixo Rio-São Paulo se destacam pelo uso de lugares não pensados para esse fim: uma sauna mista e um hospital dentário.

COMPARTILhE SUA ConTINUUM

060810A C E S S o R E S T R I T O | vida e reflexãoOdair José, com 40 anos de profissão, e Leo Cavalcanti, no início da estrada, falam de suas carreiras, pouco antes de subirem ao palco do Auditório Ibirapuera.

R E p o r T A G E M | tempos de criar em conjuntoA cocriação, nova prática de produção, une talentos para potencializar experiências artísticas.

M U S E U S D O M U N D O | menestréis contemporâneosO Centre Pompidou, de Paris, democratiza o acesso ao seu acervo levando-o a cidades francesas distantes dos grandes museus da capital.

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R E p o r T A G E M | para além do sprayA arte urbana é muito mais do que grafite e pichação:

microrroteiros criam caminhos poéticos na travessia da cidade.

E n T r e v I S T A | a estrela sobeThiago Pethit evoca o clima de cabaré alemão dos anos

1930 como metáfora do momento atual em seu novo disco, Estrela Decadente.

R E p o r T A G E M | sabor com humorA arte da gastronomia ganha o tempero caipira em

pratos típicos do interior paulista conhecidos por nomes inusitados como João Deitado e Comida do Lobisomem.

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C A P A | “me trate com respeito!”A guerrilha de Laerte começou no vestuário e alcançou

outros patamares na defesa dos direitos individuais.

b A l a I O | primavera culturalSeleção do bimestre tem exposições sobre vários temas

como destaque.

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Se Odair José olha para fora ao compor suas canções, Leo Cavalcanti trilha caminhos inversos em busca de

autoconhecimento. Os cantores, de estilos diferentes e gerações distantes, foram duas das atrações do Auditório Ibirapuera nos

últimos meses

TEXTO patrícia colombo

FOTOS andré seiti (odair josé) e richner allan (leo cavalcanti)

Há seis anos sem lançar nada inédito, você divulga Praça Tiradentes. Como foi a elaboração do disco?Aconteceu de um jeito muito tranquilo, sem aquela preocupação de estar sendo genial. Vejo esse trabalho com bons olhos, gosto do resulta-do. O estímulo do amigo Zeca [Baleiro] foi fun-damental, pois naquele momento não estava realmente pensando em gravar. Como músico, o retorno financeiro foi bem grande e até poderia dizer que não preciso mais trabalhar, mas não é o caso. E também gosto muito de tocar, é uma das coisas que mais me dá prazer.

São 35 álbuns no currículo, mais de 400 músicas. Em algum momento da carreira você temeu o esgotamento criativo?Nunca cheguei a pensar nisso. Sou introvertido e é pela música que me expresso melhor. Eviden-temente, a idade chega e a gente passa a ter um olhar diferente sobre as coisas. Mas creio que conservo aquele jeito observador – e como es-crevo mais sobre o que vejo do que sobre o que sinto acho que não mudei muito o meu estilo. Fiz boas músicas, outras nem tanto. Mas enxergo um saldo bem positivo. O tempo mostrou isso.

ODAIR JOSÉDe “cantor das empregadas” nos anos 1970 a atual ídolo cult, Odair José não mudou a forma de fazer música, mas certamente sua imagem como artista não é mais a mesma. Se antes era visto por muitos como um artista popular (no sentindo mais pejorativo possível), um cantor “brega” que so-freu com a censura em canções como “Pare de Tomar a Pílula” e “O Motel”, hoje tem seu romantismo e simplicidade fortemente valorizados pelas no-vas gerações. Apresentado no Auditório Ibirapuera em junho, Praça Tira-dentes, seu novo disco, foi produzido por Zeca Baleiro e traz no conteúdo um pouco mais da observação característica de Odair.

Vidae reflexão

Odair José vê saldo positivo ao completar 40 anos de carreira

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Você trabalhou com o grupo Palavra Canta-da nos anos 1990. Como esse contato com o universo infantil o ajudou musicalmente?Eu tinha 14 anos e trabalhava como percussionis-ta. Foi maravilhoso, porque era um trabalho infan-til, mas ao mesmo tempo universal, com consis-tência, bem elaborado, benfeito. Foi legal, porque com aquela idade eu já estava fazendo turnê pelo Brasil. Só depois comecei a desenvolver minha linguagem musical em um estúdio caseiro.

O disco Religar foi lançado em 2010. Como chegou a esse trabalho em termos de sonoridade? Não só escrevi todas as canções como criei a com-posição musical. Tem energia e mistura gêneros, por isso uma identidade forte. Chamo de pop trans-cendental para comunicar melhor o teor da música. O pop em si é a mistura e o lado transcendental se refere ao teor das letras. Compor para mim é um exercício terapêutico. São canções, em boa parte, existencialistas, com esse aspecto de buscar o auto-conhecimento. “Religar” é uma palavra de que gos-to porque é o retorno à nossa verdadeira natureza. A arte tem a função de ligar, e mais do que nunca precisamos disso.

LEO CAVALCANTILeo Cavalcanti é um dos artistas da nova geração paulistana que não têm medo de misturar elementos em suas canções, sejam eles eletrônicos, ára-bes, africanos ou flamencos. Seu primeiro álbum, Religar, tem até um alaú-de turco executado por um músico egípcio que ele conheceu tempos atrás. Mas não se assuste: as canções são de fácil digestão. Filho do compositor Péricles Cavalcanti, Leo deve lançar um novo trabalho no ano que vem e, enquanto esse dia não chega, segue tocando seu debut em shows – como aconteceu no Auditório Ibirapuera, em setembro, para o lançamento da versão em vinil do material.

Leo Cavalcanti levou para o palco “canções existencialistas” 0

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Não é de hoje que a tecnologia digital e a internet estão dando um upgrade nas formas de trabalhar coletivamente. Primeiro, unificaram o que antes acontecia em plataformas físicas: criar, compar-tilhar e consumir passou, há algum tempo, a ser feito em poucos cliques. E segundo, disponibi-lizaram para milhões de pessoas uma base de informações gigantesca. Diante desse cenário, uma infinidade de iniciativas de criação coletiva (participativa, colaborativa ou outro nome que se queira dar) está sendo potencializada.

Algumas das mais interessantes são justamen-te plataformas apresentadas na rede, que apro-veitam a facilidade de juntar pessoas e ideias num mesmo lugar para promover o desenvolvi-mento de projetos, como é o caso do It’s Noon. Criado por Reinaldo Pamponet, ex-executivo

da Microsoft e fundador da Eletrocooperativa, o site funciona como uma rede social, no qual, por meio de um perfil, pode-se interagir, curtir e participar das chamadas de trabalho postadas, que vão desde resolver problemas de empresas até fazer trilhas sonoras para curtas ou poemas com escritores. Os melhores criadores nor-malmente são remunerados com valores que variam de 10 mil a 2 mil reais, dependendo do parceiro envolvido. A estratégia para estimular a participação é dividir o “prêmio” entre várias pessoas, em vez de pagar um valor alto a ape-nas um “vencedor”.

Uma das últimas chamadas criativas do It’s Noon convidava o internauta a remixar fotos do fotógrafo Christian Cravo. As pessoas baixavam uma das seis fotos disponíveis, trabalhavam a

imagem como preferissem e enviavam para o site. Das 137 inscritas, as 20 melhores – escolhi-das pelo próprio fotógrafo – ganharam 100 reais e foram publicadas no novo site do Itaú Cultural [novo.itaucultural.org.br].

O nome da plataforma explica um pouco da filo-sofia da rede: “It’s Noon” é o sol do meio-dia, mo-mento em que ninguém faz sombra para ninguém e todo mundo pode se expressar. “O importante num ambiente de cocriação é a explicitação do propósito. Nós estamos aqui não para destruir um ao outro ou ganhar uma competição intelectual,

TEXTO leonardo foletto

Seja on-line, seja presencial, a chamada cocriação tem se proliferado nos mais diferentes ambientes e práticas criativas, poten-cializando a cultura do compartilhar estabelecida na internet

de criar emconjunto

“A internet, Ao possibilitAr Acesso fácil A milhões de obrAs, está chAcoAlhAndo A noção de ‘todos os direitos reservAdos’ que o copirrAite estAbelece.”

tempos

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mas para encontrar aquilo em que concordamos e, com isso, tentar construir algo”, explica Pamponet.

Festival de ideiasOutra plataforma focada na criação coletiva é o Festival de Ideias. Em sua primeira edição, em 2011, selecionava algumas ideias sobre temas es-pecíficos que eram aprimoradas, cortadas e edita-das em uma plataforma on-line, durante cerca de um mês, e depois encaminhadas para uma etapa final, na qual eram retrabalhadas durante dois dias pelos participantes. Como num concurso, a ideia vencedora ganhava um prêmio predetermi-nado e a oportunidade de ser executada.

Neste ano, o festival passou a funcionar em tem-po integral, como uma plataforma em que as pes-soas inscrevem suas ideias e procuram parceiros – ou são procuradas por eles – para criar juntos, seja on-line [festivaldeideias.org.br], seja em en-contros presenciais. Esse processo dura meses, até que duas comissões escolhem as melhores iniciativas para ser trabalhadas de forma presen-cial. As escolhidas recebem um “investimento semente”, valor mínimo que varia de 1 mil a 8 mil reais, para que a ideia seja iniciada.

O cartógrafo Breno Castro Alves foi um dos pré-selecionados na primeira etapa do evento, com o Mapas de Vista [mapasdevista.com.br], um gerador de sites de mapeamento aberto e fle-xível baseado no sistema Wordpress. Seu projeto foi selecionado na primeira eliminatória e, com isso, ganhou um prêmio inicial de 3 mil reais. Al-ves participou da etapa de cocriação presencial com outras 20 pessoas em um final de semana de agosto, durante a programação do Festival RIA – Reflexão/Interação/Ação, que aconteceu no Au-

ditório Ibirapuera, em São Paulo. “A contribuição das pessoas nesses dois dias foi até mais impor-tante que a grana recebida”, conta Alves.

Iniciativas como o festival são exemplos de como o setor empresarial pode entender a cultura livre das redes. A própria origem do termo cocriação explica essa soma de forças, já que é originária do mundo dos negócios, popularizado a partir do best-seller O Futuro da Competição (Campus, 2004), de C. K. Prahalad e Venkat Ramaswamy. O objetivo do livro é orientar empresários a des-centralizar seus processos e descobrir formas de ação mais abertas e imprevisíveis.

ego e transparênciaUm pré-requisito importante na cocriação é acei-tar as críticas e despir-se do orgulho. “As pesso-as têm de, acima de tudo, trabalhar o ego”, diz Pamponet. Nessa etapa, é fundamental trabalhar pela coletividade e abolir a máxima “a ideia é mi-nha”. Carol Gutierrez, da organização do Festival de Ideias, concorda que alguns têm dificuldade de lidar com as críticas. “Muita gente que faz pro-postas não sabe trabalhar em grupo e aceitar um comentário que vá ‘contra’ a sua ideia. Normal-mente, suas ideias até são lançadas na platafor-ma, mas pouco se desenvolvem”, afirma.

Não é um caminho fácil para muitos se “despir” e aceitar intervenções. A noção romântica de cria-ção individual e do “gênio” que inventa coisas magníficas, solitário em seu quarto escuro, ainda persiste. “As escolas o educam para você ser ‘o cara’, aquele que vai ter ‘a ideia criativa’, e na vida não é assim”, acredita Pamponet. Até mesmo no mundo das leis que regulam a criação – os direi-tos autorais – estamos vendo como a internet, ao

possibilitar acesso fácil a milhões de obras, está chacoalhando a noção de ‘todos os direitos reser-vados’ que o copirraite estabelece e potenciali-zando a criação de licenças mais livres e abertas, que facilitam o processo de reprodução e remix, como as do Creative Commons.

Mesmo em setores artísticos mais acostumados ao trabalho coletivo, como o teatro, lidar com os egos e as críticas costuma ser o principal desafio para um grupo. Rubens Velloso, diretor da Cia. Phila7, que realiza espetáculos com presença constante da tecnologia digital e da internet, diz que essa questão individual tem de ser subver-tida. “Às vezes, falo só para provocar as pessoas: processos de criação coletiva são propriedades de uma inteligência coletiva, não de uma inteligên-cia individual que direciona tudo”, diz. A cultura da internet tem engrandecido essa inteligência coletiva falada por Rubens. E, com isso, a própria noção de “posse”, de autoria, está bagunçada na rede. Não é de hoje que textos de pessoas circulam com o nome de outras na internet ou que o plágio e o remix de trechos de obras têm se popularizado a ponto de virarem linguagens próprias.

O escritor carioca Leonardo Villa-Forte, editor do blog Mixlit (mixlit.wordpress.com) – que des-de março de 2010 apresenta pequenos contos a partir de samples de outras obras –, é um dos que acreditam que o ambiente de rede está alte-rando a relação que temos com as ideias. “Com o compartilhamento, certo documento ou arquivo adquire vida própria, independente do seu autor ou do formato original em que foi lançado ao mundo. A cerimônia, no sentido de um respeito excessivo perante um material ou uma ideia, vai se extinguindo aos poucos”, diz.

o importAnte num Ambiente de cocriAção é A explicitAção do propósito. nós estAmos Aqui não pArA destruir um Ao outro ou gAnhAr umA competição intelectuAl, mAs pArA encontrAr Aquilo em que concordAmos e, com isso, tentAr construir Algo.”Reinaldo Pamponet

Fotos de Christian Cravo remixadas por André Maximiliano (página anterior), Julia Cristofi (ao lado) e David D’Visant (abaixo)

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contemporâneosCom projeto itinerante, o Centre Pompidou, da França, leva obras de arte originais a pessoas que não têm a oportunidade de visitar museus

TEXTO anna carolina mello

Menestréis

Um dos mais renomados centros culturais da Fran-ça fez as malas e partiu em uma viagem que percor-re o interior do país. Na bagagem, levou Georges Braque, Pablo Picasso, Fernand Léger, Alexander Calder, Sonia Delaunay e Jean Dubuffet, para mos-trá-los a gente que, em muitos casos, nunca pôs os pés em um museu. Trata-se do projeto Centre Pompidou Mobile, que proporciona a experiência de visitar um museu a um público que não tem o costume de fazê-lo, seja pela distância dos grandes polos culturais, seja pelos entraves que ainda exis-tem para a difusão cultural, mesmo em um país tão produtivo e influente no mundo das artes. A em-preitada é inédita. O Centre Pompidou se propôs a exibir peças do seu acervo – extremamente rico – em uma estrutura móvel, desmontável e portátil, “bem ao espírito do circo ou de um parque de di-versões”, como define Alfred Pacquement, diretor da instituição, que visitou o Brasil no início de se-tembro para compartilhar as diversas experiências bem-sucedidas de descentralização cultural. Entre elas, o Mobile, que já caminha para sua quarta pa-rada e cujo balanço até agora, segundo o diretor, não poderia ter sido mais positivo.

“Pode parecer surpreendente, mas os dados mos-tram que um em cada dois franceses nunca foi a um museu”, conta Pacquement. “Diante dessa realidade, existe, portanto, a necessidade de pro-mover a difusão da arte, de democratizá-la. E isso não é nada mais do que a nossa função, a obriga-ção de um museu.” No caso do Mobile, o cami-nho escolhido lembra a andança de trovadores e menestréis medievais por vilarejos para levar música e poesia aos ouvidos dos habitantes.

Pacquement explica a dinâmica do projeto: “O ar-quiteto Patrick Bouchard, conhecido por projetar construções temporárias, concebeu um sistema museológico com vitrines que permitem apresen-tar as obras protegidas em ambiente climatizado”. Do lado de fora, a estrutura portátil se assemelha a uma tenda de circo colorida. Por dentro, o espaço reproduz com fidelidade o ambiente de um museu, tanto pela adequação às normas de preservação de obras tão preciosas quanto pela atmosfera, que as destaca e favorece a contemplação. Nas paredes móveis, 15 grandes obras do acervo estão reuni-das sob o tema Viagem pela Cor. Entre elas, Les

Grands Plongeurs Noirs, de Léger; Femme en Bleu, de Picasso; L’Estaque, de Braque; e Monochrome Orange, de Yves Klein. Há também uma instalação do contemporâneo Olafur Eliasson.

O projeto requer formas inovadoras de mediação entre as obras e o público. Além da visitação gra-tuita, uma abordagem “inédita e sensível”, segun-do os organizadores, acolhe os novos visitantes e dá a eles ferramentas para melhor compreender os originais. Os grupos de crianças são acompa-nhados por um guia equipado com uma “maleta pedagógica”, cheia de instrumentos que auxi-liam nas explicações. Adultos e adolescentes são acompanhados por um ator. Ainda assim, não fo-ram dispensados os audioguias, tradicionalmen-te usados pelos museus. “Não é um espetáculo”, explica Pacquement, “mas conta-se uma história a partir das obras apresentadas para deixar uma marca duradoura na prática cultural das regiões: em plena era da reprodução digital, o Mobile mostra que a experiência de estar diante de um original é insubstituível e, assim, estimula visitas frequentes a outros museus locais”.

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“em plena era da reprodução digital, o mobile mostra que a experiência de estar diante de um original é insubstituível e, assim, estimula visitas frequentes a outros museus locais.”

prudência orçamentÁriaIdealizado em 2007 pelo presidente da institui-ção, Alain Seban, o Mobile só começou sua via-gem em 2011, estreando em Chaumont en Hau-te-Marne, cidade histórica a 272 quilômetros de Paris, com população de 24 mil habitantes. Nos três meses em que esteve lá, o número de visitan-tes somou 35 mil – quatro vezes a frequentação anual dos museus da cidade; e estes viram, no trimestre, seu número de ingressos aumentar em 77%, em comparação ao mesmo período de anos anteriores. Neste ano, o projeto pegou a estrada em direção a Cambrai, no norte do país, onde fi-cou entre fevereiro e maio e foi visto por 48 mil

pessoas, aumentando a visitação do museu local em 31%. De junho a setembro, a parada foi em Boulogne-sur-Mer, no litoral atlântico. Saldo ex-celente, segundo Pacquement: “O público reagiu de maneira muito positiva à iniciativa. Todos os comentários que escutamos, vindos de todas as partes, foram extremamente favoráveis. Mas o mais importante é que muitas pessoas se viram diante de uma obra de arte moderna ou contem-porânea pela primeira vez”.

O circuito se encerrou no fim do verão europeu, em setembro, mas o projeto não dá sinais de can-saço. Longe disso, o entusiasmo dos organizado-

res e o sucesso de público, aliados à viabilidade financeira, fazem crer que o Mobile seguirá via-gem, com infinitas possibilidades curatoriais. O investimento de 2,5 milhões de euros foi finan-ciado pelos patrocinadores da instituição, em sua maior parte, e pelo Ministério da Cultura da Fran-ça. O custo de cada etapa, que inclui gastos com manutenção, segurança, eletricidade e paisagis-mo, é calculado em 200 mil euros e pago pela província anfitriã. O valor, considerado “modes-to” nas palavras do diretor, não onera os cofres das regiões em tempos de crise econômica. “Não é um projeto luxuoso e foi pensado dentro de uma mentalidade de prudência orçamentária.”

Visão aérea da estrutura montada pelo museu

para itinerar pela Françafo

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TEXTO cleiton de oliveira FOTOS selvaSP

Na cidade de São Paulo, durante muito tem-po, arte urbana foi quase sinônimo de grafite. No entanto, essa imensa galeria a céu aberto também abriga vários trabalhos, de diversos artistas, feitos com as mais diferentes técnicas e sempre com o mesmo objetivo: chamar a aten-ção dos apressados moradores da metrópole.

Esse é o caso do redator Zico Farina, que, com o irmão – o fotógrafo Tiago – e a amiga Patrícia Matzenbacher, realiza intervenções focadas nas calçadas paulistanas. O objetivo é atrair o olhar das pessoas para onde elas pisam e registrar todas as ações e ideias no site SidewalkingSP [sidewalkingsp.tumblr.com]. Tudo começou por causa de um carri-nho de bebê, quando Farina levava seu filho recém-nascido para o primeiro passeio e se de-parou com calçadas em péssimo estado.

O episódio fez nascer a vontade de protestar por meio da arte. “Uma cidade rica como São Paulo não pode ter calçadas tão pobres, pois elas fun-cionam como suas veias e artérias. Ninguém conhece uma cidade de verdade de dentro de um apartamento ou através do vidro fechado de um carro”, acredita.

Todas as obras de Farina têm as calçadas como ponto de observação e partida: olhos colados em árvores atentos ao chão, setas feitas de post-its apontando irregularidades, ou curativos em ra-chaduras, ação similar à criada recentemente pelo movimento Curativos Urbanos [facebook.com/curativosurbanos], que evidencia os bura-cos nas calçadas com grandes ataduras verme-lhas. Farina busca o apelo visual, mas, sobretu-do, a reflexão. “São Paulo deveria ter a pretensão de possuir as melhores calçadas e ciclovias do mundo. Se caminhamos olhando para o chão, nunca veremos o horizonte”, afirma.

COLAGENS PELO CAMINHOReflexivo também é o trabalho da roteirista Laura Guimarães, que, desde 2010, cola em pos-tes e pontos de ônibus pequenas histórias ba-tizadas de “microrroteiros” [veja uma delas na página 14]. As histórias são criadas por ela e por outras pessoas, redigidas quase como poemas, em letras minúsculas – fugindo do padrão de um roteiro tradicional –, e impressas em papéis coloridos “para fazer contraste com o cinza bur-ro quando foge da cidade”.

Sempre com seu material na mochila, ela prega os cartazes “quando dá vontade”, mas também promove sessões de colagens de onde saem muitas histórias. “Uma vez um cara discutiu co-migo dizendo que aquilo não era arte, era sujei-ra”, conta. Em outra ocasião, teve de “enfrentar” um cobrador de ônibus ofendido. Ele alegou ser uma discriminação contra a sua classe o se-guinte texto: “Você gosta de samba?”, pergun-tava o cobrador chamando os passageiros para formar uma roda junto à catraca. “Não consegui entender e aí duas mulheres se meteram e dis-seram que o problema era dele, que não estava interpretando o texto direito”, relembra.

Laura integra o coletivo Vértices Casa, do qual também faz parte Mozart Fernandes. Ele utiliza tinta acrílica, spray, nanquim e carvão para pintar em jornais desenhos com detalhes de corpos femininos intitulados Foda-me com Amor. A ideia surgiu quando ele e sua mulher,

Mônica Rodrigues Fernandes (diretora de arte do coletivo), começaram a conversar com gra-fiteiros que estavam expondo seus trabalhos na Vértices. Das conversas, surgiu uma pro-posta de ele, artista plástico de formação, fazer o caminho inverso e levar sua arte para as ruas.

Fernandes começou pintando mulheres, al-gumas com os rostos sangrando, em vários pontos da cidade, e foram indagações sobre as dificuldades e a impessoalidade amorosa e sexual entre as pessoas que o levaram ao tema. “Era uma época em que todo mundo estava meio doce, poético, mas ao mesmo tempo as pessoas não sabiam como lidar com a matéria, não podiam ligar no dia seguinte. Isso é uma violência social, de conduta, de re-lacionamento”, acredita.

Sozinho ele espalhou cerca de 120 obras pelas regiões de Pinheiros, de Vila Madalena, dos Jardins, da Bela Vista e do Centro. “Queria despertar esse desejo de a pessoa pensar no que realmente quer dizer o ‘foder com amor’’’, conta. O inusitado é que Fernandes acredita receber mais reações positivas das pessoas mais velhas. “Uma vez, uma senhora de 80 e poucos anos, judia, sobrevivente do Holocaus-to, que fugiu para o Brasil, falou que adorava o meu trabalho. Pessoas mais velhas não veem o título do projeto como palavrão. Sinto mais preconceito de gente nova, talvez por falta de vivência”, analisa.

para além do

Intervenções artísticas de diferentes técnicas e abordagens disputam o espaço urbano da capital paulista com o consagrado grafite

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Atualmente, apenas quatro obras dessa série ainda estão nas ruas – e isso não incomoda o artista. O que ele não aprova é a opressão. “Se você estiver colando e a polícia passar, eles nor-malmente não te levam preso, mas fazem você tirar a obra e pegam o que você tiver na bolsa. Isso é um roubo”, diz Fernandes, que só teve problemas com as autoridades uma vez. Levado à delegacia, foi questionado pelo delegado por que ele tinha sido acusado de atentado ao pu-dor. Resposta: estava colando seu trabalho em caixas de telefone. “Ao contar que minha obra se chamava Foda-me com Amor ele deu risada e pediu meu cartão; falou que iria a uma exposi-ção minha”, conta.

Entre agosto e setembro, o artista foi parar em Amsterdã e Berlim. Na bagagem, mais de cem obras feitas com jornal para colar pessoalmente na Europa. A oportunidade surgiu depois da en-trega de alguns de seus trabalhos ao fotógrafo francês Eric Marechal.

Há 20 anos, Marechal começou a observar a arte de rua e passou a registrar o que via logo depois de visitar Chicago, a trabalho, representando uma empresa de softwares. Hoje, ele já tirou mais de 70 mil fotos, mas seu destino só começou a mudar em 2004, durante um voo entre a Cida-de do México e Amsterdã. Enquanto organizava suas imagens no computador, a senhora sentada ao seu lado começou a puxar assunto sobre o ma-terial. Ela era professora da Universidad Autóno-

ma Metropolitana, uma das maiores do México, e propôs a ele a realização de uma exposição, pois também era pesquisadora do tema. Além de ter exposto 150 fotos ampliadas, ele criou o blog Ur-ban Hearts [urbanhearts.com].

Com mais de dez mostras ao redor do mundo (duas em São Paulo), Marechal tem a arte urbana como principal ocupação. Desde 2008 – quando colou e fotografou o trabalho de 15 artistas pari-sienses no Japão e na Coreia do Sul –, é responsá-vel por tocar o Street Art Without Borders. Com o projeto, colou e fotografou pessoalmente o traba-lho de mais de 365 artistas, em cerca de 35 países; e o que conta com mais representantes – em torno de cem – é o Brasil. “O que eu espero é que pes-soas de todos os cantos sejam vistas em lugares aonde elas não vão”, conta.

Desde 2001, o fotógrafo vem cerca de quatro vezes por ano ao Brasil, onde sempre encontra pessoas receptivas, como moradores de rua, dos quais ele ouviu agradecimentos. “Por eu deco-rar a casa deles”, explica. “Em Paris, as pessoas ficam nervosas, insultam o artista. A arte de rua é a parte principal da produção contemporânea e é considerada por muitos como vandalismo.”

ESPAÇOS COLORIDOS E COSTURADOSSão Paulo recebeu recentemente o Coletivo MUDA [coletivomuda.com.br], formado por cinco cariocas: os designers Bruna Vieira e João Tolentino e os arquitetos Diego Uribbe,

Duke Capellão e Rodrigo Kalache. Eles co-loriram espaços nos bairros Vila Madalena, Ibirapuera e Liberdade e nas avenidas Nove de Julho e Paulista. As intervenções utilizam módulos de azulejos e ladrilhos, que geram um trabalho abstrato e lúdico. “O MUDA faz composições únicas com revestimentos lisos e pintados com antecedência, com tinta spray ou até mesmo com azulejos levados ao forno, mais resistentes”, explica João Tolentino. De-pois de pronto, o material é aplicado com arga-massa. “Nosso objetivo é a rua e todos aqueles que por ela passam”, define.

Integrar pessoas e o espaço urbano também é o que pretendem artistas que utilizam agulhas e linhas para costurar a cidade, por meio das técnicas de tricô e crochê. O nome mais usual dado a essa arte é yarn bombing, e recentemen-te São Paulo recebeu uma das mais conhecidas artistas do gênero, a polonesa Agata Olek. Com ajudantes locais, ela cobriu um playground em formato de jacaré, no Sesc Interlagos.

Essa técnica também possui representantes locais, como o Clube do Útero [clubedoutero.blogspot.com.br], Tricotarde [tricotarde.com] e Letícia Matos. Professora de ioga, a gaúcha Letícia sempre tricotou e, depois de ter ido a um encontro mensal do Tricotarde, ensinou a técnica a duas amigas. Elas fizeram 13 pom-pons (que passou a ser o nome do trabalho) e fixaram o resultado em uma árvore.

“SINTO MAIS PRECONCEITO

DE GENTE NOvA, TALvEz POR fALTA

DE vIvêNCIA.”MOzART fERNANDES

Desenho da série Foda-me com Amor, de

Mozart Fernandes

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 De março até hoje, Letícia ultrapassou as cem intervenções e levou seu trabalho para Mendon-za, Buenos Aires, Porto Alegre, Paraty, Goiânia e Belo Horizonte, onde apresentou uma obra conceitual com mil pompons. Em São Paulo, co-locou seu trabalho em diversas árvores e postes, dos quais ela tem a medida. Para as árvores é ne-cessário planejamento: a largura do tronco varia e é preciso pedir autorização, quando ela fica na frente de uma casa ou estabelecimento.

A artista faz tudo sozinha, mas recebe posi-tivamente eventuais companhias. Em uma sexta-feira à noite, Letícia estava tricotando o poste de um orelhão na Avenida Paulista e um rapaz puxou conversa. “Ele perguntou se estava

atrapalhando. Eu disse que não e ficamos baten-do papo. No fim, ele me deu seu cartão e foi tudo muito engraçado”, conta.

Apesar de a interação espontânea ser bem-vin-da, não existe um público-alvo para a colorida arte tricotada de Letícia e, assim como para ou-tros artistas, a pouca durabilidade da obra é algo que também não a incomoda. “Eu faço e desape-go. Faço, dedico, tiro a foto e pronto.” O objetivo, assim como o da maioria dos artistas de rua, é chamar a atenção das pessoas para o lugar onde elas estão. E é certo que nem sempre isso é alcan-çado. “Há aqueles que nem sabem da existência de um orelhão na rua. As pessoas andam sem olhar para os lados, um atropelando o outro.”

UMA vez UM cARA DIscUTIU cOMIgO DIzenDO qUe AqUIlO nãO eRA ARTe, eRA sUjeIRA.”

Laura Guimarães

Intervenção yarn bombing feita pela

artista letícia Matos

Veja no iPad mais microrroteiros criados por Laura Guimarães.

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Thiago Pethit fala sobre teatro, crise e como é ser cantor

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Pethit: “O cabaré é a metáfora perfeita do

mundo em crise”

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TEXTO micheliny verunschk FOTOS bruno fernandes

Como surgiu a música em sua vida?THIAGO PETHIT: Meu pai era locutor e trabalhava na Rádio Excelsior. Sua rotina era bem pesada e o único mo-mento que tinha de folga eram as noites de sexta-feira. Quando chegava em casa, sempre ouvíamos discos e en-quanto isso ele ia me contando as histórias relacionadas às músicas e aos músicos. Era o auge da fase das discotecas. Mas ele me mostrou mais do que esse estilo. Aprendi sobre a tropicália, ouvi Os Mutantes, Rita Lee, Edith Piaf... Aos 9 anos, decidi ser ator de teatro, profissão de meus avós. Era uma criança muito séria e determinada. Foi por isso que ingressei na Escola de Teatro Célia Helena, para me profis-sionalizar. Fui ator até 2007 quando entrei em crise.

Crise financeira com o teatro ou crise pessoal?PETHIT: Não, não era algo que passasse pelo lado fi-nanceiro. Pelo contrário. Àquela altura, eu fazia parte do grupo Elevador de Teatro Panorâmico e já me susten-tava com o que o palco me dava. A crise se deu pelo fato de eu não conseguir enxergar mais possibilidades pessoais com o teatro. Comecei então a frequentar mú-sicos da nova cena brasileira, como Tulipa Ruiz e Tatá Aeroplano, e fui convidado para dirigir um espetáculo de Tiê, cuja inspiração era o cabaré. Dirigi, escrevi letras, fiz backing vocal e até costurei cortinas. Mas a estreia foi no dia que entrou em vigor a Lei do Psiu [Programa de Silêncio Urbano, implantado na cidade de São Paulo em 2008] e fecharam a casa.

A essa altura você já havia optado pela música?PETHIT: Só me dei conta de como havia me envolvido com esse universo ao sentir a frustração de não estrear. Mas foi uma frustração motivadora. Então decidi dar um tempo e morar em Buenos Aires. Chegando lá, eu me inscrevi num curso de literatura, para estudar a obra de Jorge Luis Borges. Um amigo me indicou a Academia Nacional de Tango. Fiz um ano de conservatório e logo fiquei numa encruzilhada. Ou me engajava num dos jovens grupos de tango que es-tavam surgindo na cena argentina ou voltava para o Brasil. Voltei para cá e gravei um EP com três músicas, produzido por Tatá Aeroplano e Maurício Fleury. E, de repente, meu trabalho estava na rua. Algo que era uma experimentação, um cartão de visitas, virou uma coisa pública.

Berlim, Texas teve uma aceitação quase imediata.PETHIT: Pois é. Mas eu não esperava. Tanto que quan-do ele ganhou o prêmio do Video Music Brasil (VMB), da MTV, na votação de júri popular, eu estava totalmente despreparado. Quase não fui à noite de premiação. Mas essa foi uma resposta do público, com o mercado foi mais difícil. O mercado musical brasileiro aposta ainda em coi-sas muito antigas. E o Brasil é um país machista, de mer-cado musical também machista. Basta lembrar o olhar fetichista que se lança para as cantoras. Aqui é o país da Ternurinha, do joelho da Nara Leão. Um lugar onde toda cantora vira diva e todo cantor tem de ser compositor. Pode parecer pretensioso, mas sinto que estou abrindo portas. Quando comecei havia pouquíssimas vozes mas-culinas da minha geração cantando. Assim, eu sou um cantor num país de cantoras. E mais: sou um cantor sensí-vel, delicado. Trabalho com referências que são estranhas. Embora perceba que as coisas estão mudando, o mercado não consegue ainda assimilar isso muito bem.

O tom confessional do primeiro disco foi estratégico?PETHIT: Era preciso que o público soubesse quem eu era, para que, em seguida, soubesse quem eu não era. O problema é que chegou um momento que as coisas co-meçaram a se inverter, e por uma falta de vocabulário e de repertório as pessoas começaram a confundir música de tom sensível com música fofa. O que é música fofa? Eu não sei. Não a faço.

Um James Dean de batom borrado. essa imagem, que remete ao teatro vaudeville americano e aos cabarés ale-mães do início do século, foi a referência para a estética do segundo álbum do cantor e compositor thiago Pethit, Estrela Decadente, lançado em agosto. É de batom borrado e cigarro no canto da boca que o paulistano de 28 anos aparece na capa do trabalho, numa foto em preto e branco. “[É] um disco sobre ser esquisito, sobre estar desajustado a um mundo que vê impassível a volta do nazifascismo, que está cada vez mais intolerante. [...] É uma afirmação sobre a beleza da estranheza, de não se encaixar, de não se deixar ser encaixado”, reflete o músico.

Ator de teatro com passagem por companhias de destaque na cena contemporânea, como a elevador de Teatro Panorâmico, Pethit decidiu dedicar-se exclusivamente à música em 2008. Antes, o cantar tinha uma importân-cia secundária para ele, sendo exercitado apenas em algumas peças em que atuou. A opção pelas artes cêni-cas foi feita precocemente, aos 9 anos, quando escolheu seguir a profissão dos avós. Mas a insatisfação com seu espaço de criação nesse ambiente o fez mudar de rota. em 2010, lançou o elogiado álbum Berlim, Texas e passou a administrar pessoalmente sua carreira. “Sou eu quem fecha shows, quem compra passagens para a banda, quem produz os clipes, quem libera papelada no ecad”, conta ele nesta entrevista em que discorre sobre motivações e frustrações, analisa o mercado musical brasileiro e expõe o processo de feitura do trabalho atual.

“O Brasil é um país machista, de mercadO musical tamBém machista. [...] um lugar Onde tOda cantOra vira diva e tOdO cantOr tem de ser cOmpOsitOr. [...] eu sOu um cantOr num país de cantOras. [...] e mais: sOu um cantOr sensível, delicadO.”

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Thiago Pethit fala sobre teatro, crise e como é ser cantor

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Isso tem a ver com a cena, que precisa ser rotulada?PETHIT: Quando o trabalho passa a ser mais conhecido, passa também a ser confundido com bandas de estética próxima. E a tendência é que o que você faz seja colo-cado numa cesta, como se tudo fosse um aglomerado e todo mundo estivesse fazendo a mesma coisa – o que não é o caso. O que existe é uma pluralidade. E se somos parecidos somos parecidos na diferença.

Como surgiu Estrela Decadente?PETHIT: Eu estava cansado, deprimido por administrar eu mesmo todos os aspectos da minha carreira. Sou eu quem fecha shows, quem compra passagens para a banda, quem produz os clipes, quem libera papelada no Ecad. Depois de uma turnê em Lisboa, no fim de 2011, pensei em parar. Já tinha avisado os músicos. Um dia estava caminhando e ou-vindo Cida Moreira no celular quando me veio a imagem da capa do Estrela Decadente: um James Dean de batom borrado. E é isso esse disco, um disco sobre ser esquisito, sobre estar desajustado a um mundo que vê impassível a volta do nazifascismo, que está cada vez mais intolerante.

E por que a imagem do cabaré para falar do mundo em crise?PETHIT: O cabaré é a metáfora perfeita do mundo em crise. Porque sempre que o mundo está decaindo o ca-baré brilha e a noção de classes se desfaz: a prostituta e o dândi bebem cerveja juntos. É da mistura dessa gente que nasce o vaudeville, quando a linguagem operística des-tinada à aristocracia se encontra com o circo. Bertolt Brecht era mestre nisso, em usar o entretenimento para dar lições sobre um mundo em decadência.

Como foi a participação especial de Cida Moreira e Mallu Magalhães no disco?PETHIT: Elas entraram no disco não apenas por uma questão afetiva, mas porque são personagens que com-pletam os quadrinhos da história. Personagens de si mes-mas. A Cida é uma mestra. Acompanho seu trabalho há pelo menos uns cinco anos. Fazemos parte um da vida do outro há quase dois anos. Somos muito, muito amigos. Já me considero um pouco parte de sua família. Passo mui-tos domingos na casa dela, falando de música em volta do piano, comendo bolo e fumando cigarros com a Julia, sua filha, que é uma garota incrível. A Cida é a pessoa e a artista mais generosa que conheci. Uma vez que abre sua vida a alguém, é como se fosse uma grande onda de afeto. E ela não poupa ninguém ao dividir sua sabedoria e sua música. Nesse tempo de convivência, o que aprendi so-bre música, cantar, ser um artista seria impossível apren-der em qualquer tipo de aula. A Cida foi uma inspiração para esse disco, pois uma das coisas que ela me ensinou, sem saber que estava ensinando, foi olhar a beleza e a for-ça que a diferença e o “fora do padrão” podem ter. Por isso, era inevitável que ela estivesse nesse disco.

E a Mallu Magalhães?PETHIT: Ela é uma garota de quem sou fã desde que sur-giu, ingênua, pela internet. Quanto mais o tempo passa, mais vou ficando encantado com a artista profunda e inten-sa que ela vem se tornando. É outra pessoa com carreira e vida completamente fora dos padrões e muito singulares. Cheia de uma beleza que reside nesse desajuste. A gente se conheceu de passagem no VMB de 2010, logo depois que ganhei o prêmio, entre uma entrevista e outra. Muito tem-po depois, começamos a trocar mensagens pelo Twitter, até que um dia ela me disse que tinha vontade de cantar um dueto do Serge Gainsbourg e da Brigitte Bardot comi-go. A música “Perto do Fim” já estava pronta, mas faltava coragem e intimidade para fazer o convite. Com essa men-sagem dela, aproveitei a deixa e enviei a música, dizendo:

“Olha, não é nenhum Serge, mas foi feita pensando na sua voz”. Ela topou sem mal ter escutado. Foi uma delícia ter trocado com ela tantas coisas ao longo do processo.

Como foi a escolha do repertório e a ideia de regra-var “Surabaya Johnny” com Cida?PETHIT: O repertório não chegou a ser exatamente esco-lhido. Não foi aquele caso em que se tem uma porção de canções e se escolhe algumas entre elas. Eram basicamen-te as músicas que já estavam prontas e, por coincidência, foram feitas no mesmo período. É como se elas represen-tassem aquele período ou tivessem uma mesma intenção. Minha vontade era fazer um EP de cinco músicas, sendo uma delas “Surabaya Johnny” [de Bertolt Brecht e Kurt Weill]. É uma música que amo desde os tempos do teatro, mas que é cantada por atrizes. Nesse disco, uma reinterpre-tação com a minha voz me pareceu possível, para brincar com os gêneros, as ambiguidades e a androginia. Podia bem ser uma música sobre uma travesti de 16 anos. O cli-ma psicodélico do arranjo permite essa digressão. Fica me-nos sério, ainda que seja bastante sério.

O que a produção do Kassin trouxe para o trabalho?PETHIT: O Kassin não é “O” Kassin à toa. É impressio-nante ele produzir há quase duas décadas e ser o mais atual de todos. E isso se deve ao fato de ele ser um cara de uma inteligência e uma sensibilidade absurdas. É muito difícil para mim entender o que surgiu das mãos dele e o que surgiu das minhas. O processo de gravação foi todo centralizado no Rio de Janeiro, dentro de um quartinho estúdio na casa dele, onde fiquei hospedado. E éramos só nós dois, dividindo histórias e ideias e falando sobre a vida enquanto fazíamos as músicas. Foi muito simbiótico esse processo. Ao mesmo tempo, somos pessoas bem di-ferentes e isso completou algumas pecinhas.

Como o teatro está presente em sua performance no palco?PETHIT: É algo inevitável. Sinto-me confortável no palco, muito mais do que em estúdio. Em cena, realizo minhas fantasias, dialogo, escuto as risadas, as vozes, as respirações. Sinto a troca, eu me sinto grande. Essas coisas aprendi com o teatro, certamente. Sinto simplesmente que sei o que fa-zer. Sabe aquela sensação de quando estamos tímidos e não sabemos muito bem o que fazer com as mãos? Se colo-camos no bolso, se cruzamos os braços ou se seguramos o queixo?! Assim é no estúdio para mim. Mas, quando estou no palco, parece que elas estão no lugar certo, seja lá onde for. Em geral, sempre estou, literalmente, de braços abertos.

Quais as histórias por trás dos clipes de “Night-walker”, com a atriz Alice Braga, e de “Pas de Deux”?PETHIT: O clipe de “Nightwalker” nasceu de uma festa em que encontrei a Alice, que não via fazia cinco anos. Ela ti-nha acabado de voltar para o Brasil e descobrir que eu era o

“sintO-me cOnfOrtável nO palcO, muitO mais dO que em estúdiO. em

cena, realizO minhas fantasias, dialOgO, escutO as risadas, as vOzes,

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cOm O teatrO, certamente.”

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“Pethit”, pois antes ela me conhecia pelo meu nome de ator, Thiago Fidanza. Foi ela quem sugeriu fazermos algo juntos e eu logo pensei que deveria ser um clipe. Escrevi para as di-retoras Vera Egito e Renata Chebel dizendo que tínhamos a Alice confirmada no elenco e, em um mês, montamos tudo. Ela chegou para gravar numa madrugada de fevereiro, com a letra decorada, colocou o vestido prateado e arrasou. Ela é uma menina especial. Um amor, doce, engraçada, desboca-da e muito espontânea. Adoro fazer trabalhos com ela, que é de uma competência ímpar e gosta de participar de proje-tos bacanas. Quando pensamos no clipe de “Pas de Deux”, tive vontade de brincar com essa ideia de “musas de Thia-go Pethit” – mulheres lindas que aparecem nos meus clipes me dublando, como a Alice fez. De cara, pensamos na Laura Neiva, belíssima, talentosa, com uma carreira brilhante pela frente na Maison Chanel – o que tinha tudo a ver com o cli-ma anos 1930. Mas Alice não podia faltar. Fui atrás do teatro, dos bailarinos, dos figurinistas, dos maquiadores, dos fotó-grafos e da outra parte do elenco. Fico bem maluco nessas horas. Sou um tanto megalomaníaco e, por mais que tente, não consigo fazer tudo. Quando me dou conta, já estou tele-fonando, agendando com pessoas...

Você foi testando algumas músicas do novo disco na temporada do Berlim, Texas. Como as novas canções entraram no repertório do show anterior?PETHIT: Meu trabalho muitas vezes tem essa faceta de work in progress. Como se nunca estivesse completa-

mente terminado, porque está em constante reavaliação e mutação. O show nunca é exatamente igual ao disco porque eu gosto da coisa viva. Gosto de sentir que cada coisa é importante por si só e que existem elementos que tornam isso ou aquilo mais especial. Passado um ano do lançamento de Berlim, Texas, sentia que o show precisava tornar-se vivo outra vez, apontar novos cami-nhos, experiências. As músicas do disco atual começa-ram a entrar nessa fase. E é sempre bom ir testando o que elas causam no público, ali ao vivo. Assim, na hora de gravar, fica mais fácil saber quais caminhos tomar e como transformar as músicas.

Não é complicado administrar a própria carreira?PETHIT: Sim, muito cansativo e isso me levou a uma autodepreciação: eu sou o cara que não tem empresá-rio nem produtor, não sou o queridinho de ninguém, o único que deu errado, que não conseguiu nada. Mas, quando surgiu o Estrela Decadente, percebi que a graça é que sou sozinho, louco e faço o que quero. Então esse disco é uma afirmação sobre a beleza da estranheza, de não se encaixar, de não se deixar ser encaixado.

E quais são suas expectativas?PETHIT: Aprendi a não esperar muito. Quero ser compre-endido e ser compreendido não é apenas ser amado, como se supõe. Quero ser amado pelas razões certas e ser odiado pelas razões certas. Sou artista porque quero dialogar.

“esse disco é uma afirmação sobre a beleza da estranheza, de não se encaixar, de não

se deixar ser encaixado”, reflete o cantor

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No festival da cultura paulista tradicional tem comida até para lobisomem

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João DeitaDo (Município De São FranciSco Xavier) – D. ciDaEsse João tem vários nomes, conforme a região, segundo a simpática quitu-teira D. Cida. Pode ser chamado de Pau a Pique, Mané Pelado, Corisco, Broinha ou Cobu. Descendente de índios e portugueses, D. Cida passa adiante a histó-ria dessa broa enrolada em folha de bananeira ou caetê, servida com café nos “mutirões”: nos trabalhos do roçado de pasto, na construção das casas de pau a pique ou nas festas da região. “A bisavó da minha bisavó acompanhou a vida dos escravos na senzala e, nessa época, já tinha esse quitute. Por isso, acho que vem tanto dos negros quanto dos índios”, explica.

Tradicionalmente, conta D. Cida, colocava-se o milho em sacos que permaneciam de molho no rio por uma semana, até amolecer. Depois, pilava-se o milho durante três dias no monjolo para virar fubá e ser peneirado sobre uma gamela. Naquela época, assim como hoje, juntava-se a esse fubá pilado ovos, leite, erva-doce (a planta), “açúcar preto” (rapadura) e uma pitada de sal para dar sabor. Então, a broa era enrolada e ia para a “fornalha” (forno a lenha), que devia estar sempre muito quente. Quando exalasse o seu aroma, bastava retirar e colocá-la sobre a peneira de bambu, mas coberta por um pano, “para não sair o sabor”.

A avó índia ensinou D. Cida assim e ela ainda dá uma dica para o fubá render: “É só misturar com produtos da época ralados, como batata-doce, abóbora, inha-me, mandioca e, hoje, se usa até pinhão”. E por que é João Deitado? Aí D. Cida se transforma, fica vermelha, diz que não é coisa de se dizer, que as mulheres no roçado tinham vergonha dessas “brincadeiras bobas”, vindas sempre depois de algumas bebidinhas tomadas. “É nome de malícia, de algazarra, compreende?”, diz, com um sorriso envergonhado. Mas algazarra mesmo é a das crianças, que não ligam a mínima para o nome do João e adoram levá-lo de lanche à escola, às vezes até recheado de goiabada ou pasta de amendoim. Com ou sem malícia, é só devorá-lo, entende?

O Revelando São Paulo, festival da cultura paulista tradicional, mudou-se há três anos do Parque da Água Branca para o Parque da Vila Guilherme – o antigo Parque do Trote – para abrir ainda mais espaço a grupos, estandes e público, tamanho é o sucesso do evento, que costuma ultrapassar a faixa de 1 milhão de visitantes nos seus dez dias de duração. O festival reúne, em sua diversidade, comunidades indígenas, aquilombadas, ciganas e outros grupos da cultura tradicional de 200 municípios de São Paulo. Um dos grandes destaques da festa é a pluralidade da gastronomia paulista. Nesta 16ª edição, 98 municípios apresentaram em seus estandes quitutes que deliciaram o público, tanto pelo aroma e sabor quanto por seus nomes inusitados. Afinal, em qual cardápio encontraríamos um João Deitado, um Buraco Quente ou o prato de uma ilustre figura do folclore, o lobisomem? Onde mais poderíamos saborear a Marvada Neide? Revelações sobre a criatividade gastronômica e a rica história de São Paulo, as quais se busca valorizar.

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Buraco Quente (Município De Mairiporã) – D. tereSinhaA invenção é de D. Teresinha, líder da comunidade de Nossa Senhora do Dester-ro, cuja festa se dá em 15 de setembro, em Mairiporã, e na qual, com a licença da santa, a iguaria está presente. Há 35 anos sucesso absoluto, a ideia do lanche lhe veio à cabeça ao ver o pessoal sem recursos, que vinha com seus filhos dos sítios para a festa carregando os andores e, ali, por falta de opção, comprava pão com linguiça calabresa ou bolos, mesmo assim tudo muito caro, e dividia em bo-cadinhos entre todos. Então ela e o ex-marido criaram o Buraco Quente, para que aquelas pessoas pudessem se alimentar melhor durante a festa. “Ganhávamos muitos ingredientes dos sitiantes mais abastados da região”, conta.

Para fazer esse quitute é preciso paciência. O segredo é o coração (ou flor) da bananeira, que deve ser aberto e deixado por volta de 15 minutos em água e bas-tante vinagre e sal para tirar o amargor. Mais um banho em água corrente e se aferventa em mais água, vinagre e sal. Novo banho em água corrente. Pica-se bem, “é como palmito”, e tempera-se com óleo e alho. Na chapa bem quente, coloca-se uma camada de repolho, tomate e cebola picados previamente. E en-tra o segredo: acrescenta-se “apenas em alguns pontos da chapa” o coração da bananeira e, em cima dele, um pouco de carne moída. Vai virando tudo até ficar al dente, “não pode ser superassado”, revela D. Teresinha. E, agora, o buraco quen-te: um pão francês, com uma das pontas cortadas, sem o miolo e preenchido com cinco colheres fumegantes de recheio. O pão cortado desse jeito mantém o recheio quentíssimo até a última mordida do lanche. “Tem de tomar cuidado para não queimar a língua, e assoprar do começo ao fim”, diz D. Teresinha, sorri-dente e triunfante. Filha, prima e netos também levam adiante a tradição e, jun-tos, serviram, em um único dia de festival, 800 unidades.

coMiDa Do LoBiSoMeM (Município De JoanópoLiS) – Sr. ceLSo “Os antigos da cidade dizem que Joanópolis é a capital do lobisomem”, afirma o Sr. Celso, que leva o prato ensinado pelos avós e tios a vários eventos culturais e culinários. “Contam que o lobisomem, quando se transformava durante a lua cheia de sexta-feira, ficava com muita fome. Então, ele procurava nos sítios o que comer e levava galinha, porco, arroz, feijão e milho do roçado. Ele corria sete cida-des a cada noite dessas – imagina a fome – e aí pegava esses produtos”, relata. É com esses ingredientes que o Sr. Celso e seus ajudantes preparam a famosa iguaria. O prato principal é um arroz que leva frango, milho, bacon, ovos, açafrão, alho e cebola. Acompanha feijão tropeiro, leitão frito, linguiça, torresmo e banana frita. Em 24 de junho, na festa de São João da cidade, é possível encontrar o Sr. Celso preparando o prato. Realmente é para lobisomem nenhum botar defeito.

MarvaDa neiDe (Município De paraiBuna) – D. neiDeUma bonequinha espevitada nos olha do rótulo de uma garrafa de cachaça de alam-bique. É a famosa Neide, a marvada. Ou a mardita seria simplesmente a pinga? D. Neide esclarece essa história do balcão do seu estande, na seção Rancho Tropeiro do evento, que apresenta a culinária originária do movimento tropeiro, entre os sé-culos XVIII e XIX. “Eu tinha um alambique no sítio e fui aprender a fazer cachaça. Eu produzia “em meia” com um fazendeiro amigo, que fornecia a cana-de-açúcar, e aí começamos a vender em eventos etc. Um belo dia, na festa dos fazendeiros – festa de São Sebastião – eu parei o carro para o desfile a cavalo passar e uma pessoa gri-tou por brincadeira ‘eh marvada’”, relembra. Bastou para Neide batizar a cachaça. Depois veio o rótulo em parceria com uma amiga. “Criamos duas bonequinhas, uma comportadinha e outra doidinha”. Não deu outra. A doidinha virou o xodó do pessoal e, hoje, reina absoluta no rótulo da cachaça. Também no aniversário da cidade, em junho, na festa de Santo Antônio, pode-se ver o reluzente alambique da Neide. E ainda no Revelando, no qual faz sucesso há 16 anos.

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Com o bom momento do país, cresce o número de jovens endinheirados que querem investir em arte. Mas como e no que investir?

TEXTO débora almeida

ILUSTRAÇÃO renan magalhães

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comum

“Dizem que a arte é elitista, mas isso nada tem a ver com questões financeiras. A arte é para uma elite de sensibilidade.” A frase quase poé-tica do colecionador João Carlos de Figueiredo Ferraz resume o momento em que uma popu-lação maior se insere nesse universo. Galerias foram por muito tempo espaços restritos à elite cultural e financeira do país, mas, uma vez que a economia se expandiu na última década e o po-der de compra passou a contemplar um número maior de pessoas, o mercado das artes recebeu um novo estímulo.

Uma juventude de sucesso, que enriqueceu cedo, principalmente no mercado de capitais, começou

a se interessar pela arte, explica o museólogo Fábio Magalhães. “Os primeiros colecionadores do Bra-sil só queriam saber de arte estrangeira. Isso mu-dou. Hoje o colecionador brasileiro só quer saber da arte produzida aqui. E isso é bom”, diz.

A curadora Leonor Amarante afirma que o Bra-sil nunca viveu um momento como este. Segun-do ela, várias galerias de Miami vendem quase tudo o que expõem, principalmente por causa dos clientes brasileiros. Para ter uma ideia da potência desse mercado, a SP-Arte, primeira fei-ra brasileira do ramo, saltou de 40 galerias em exposição, em 2005, para 110, em 2012, sendo apenas 27 estrangeiras. O número estimado do faturamento da edição deste ano foi de 245 mi-lhões de reais. Segundo a organização do even-to, o mercado de arte nacional movimenta cerca de 1 bilhão de reais por ano.

NOVOS ESPAÇOSUma série de galerias foi aberta nos últimos anos, principalmente nos bairros Vila Madalena e Pi-nheiros, em São Paulo. Para Eduardo Leme, da Galeria Leme, as feiras de arte ajudam a aumen-tar a visibilidade das galerias. “Sem dúvida, elas

ainda têm a função de conquistar novos colecio-nadores, ampliar o mercado e lançar artistas, ou mesmo mostrar novas obras”, afirma. O galerista acredita que o interesse do público brasileiro pela arte é crescente, e que o melhor indicador disso é possivelmente o número e a frequência de visitas em exposições. Segundo o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), os museus brasileiros recebem 80 milhões de pessoas anualmente.

O crítico de arte Guilherme Wisnik acredita que o Brasil produz arte de qualidade há muito tempo, mas tem um mercado que ainda parece iniciante. “A arte que se faz aqui sempre teve a ver com essa informalidade. De 10 a 15 anos para cá, a situação tem mudado, e esse novo quadro pede uma refle-xão, não só um juízo estético sobre a arte que se produz, mas um olhar crítico sobre o mercado, a legislação e a política cultural brasileiros”, diz.

“Esse crescimento na compra de arte por jovens colecionadores pode não representar muito ago-ra, mas daqui a uns anos teremos grandes cole-ções, e os museus poderão ser beneficiados com isso”, opina Leonor. Como esse jovem com poder aquisitivo é novo no mundo das artes, muitas vezes há um “gap” entre o interesse pela arte e a compra de arte, e esse espaço existe principal-mente pela falta de referência e conhecimento. Segundo Louie Martins, curadora do site Youngs Arts, que vende obras pela internet, há um desco-nhecimento na hora de comprar. “A ligação com a estética da peça ainda é muito forte e, como a informação artística é pouco ou nada aprofunda-da, a relação demora para sair desse nível”, afirma. Por isso, ela não vê a tendência de compra como interesse em investimento futuro.

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Uma exposição maior à arte pode ajudar a desen-volver o senso estético, acredita Figueiredo Ferraz. “Temos de dar oportunidade às pessoas para vi-venciarem uma obra de arte, senão elas nunca vão se interessar por cultura”, afirma o colecionador.

NÃO BASTA COmPRAR, TEm dE COLECIONARHá um consenso sobre estarmos em um bom mo-mento no mundo das artes, mas o que preocupa os especialistas é o que será feito dessas pequenas cole-ções individuais. “Não se coleciona arte contempo-rânea com intensidade. Temos de criar um círculo virtuoso de colecionismo de produções brasileiras recentes ou teremos de ver nossa arte contemporâ-nea em museus fora do Brasil”, afirma o presidente do Ibram, José do Nascimento Júnior. Ele polemiza ao analisar o bom momento do mercado de arte: “Em outros países é motivo de prestígio colecionar. O colecionador se coloca socialmente como colabo-rador do espaço público. Mas, no Brasil, talvez por uma ‘culpa católica’, as pessoas têm receio de dividir o que têm, preferem esconder”, afirma.

Para Figueiredo Ferraz, um dos motivos de o co-lecionador não mostrar o que tem é a informali-dade que ainda está presente no mercado de arte. As pessoas costumam comprar obras sem nota ou atestado, pois têm medo da fiscalização. “De fato, o Estado não está preocupado com a cultu-ra, ele quer saber quanto pode ganhar daquela coleção”, conclui.

Mas o valor público de mostrar uma coleção par-ticular não é algo que aflige apenas os brasileiros. Segundo Patrick Charpenel, diretor da Fundação Jumex, de Guadalajara, no México, toda coleção precisa ser feita com rigor e compromisso, e ser

sempre pública. “A arte tende a criar um fetiche, e isso é perigoso. As coleções são de todos, têm de servir de laboratório. No momento em que a arte estiver inacessível, acabará sua razão de ser.” Segundo ele, o colecionador não tem o papel de comprar a obra mais cara. Ele precisa identificar os códigos da sua geração e montar um mosaico que seja um reflexo daquele período.

A colecionadora Ella-Fontanals Cisneros faz coro: “Cada um pensa de uma forma diferente, mas todos têm a custódia de algo que pertence ao mundo. Podemos ter a ‘guarda’ e cuidar das obras, mas a filantropia tem de fazer parte do pensamento do colecionador. Tornar público ou não é uma questão pessoal, mas é muito impor-tante saber que esses artistas e essas obras têm, através de nós, a possibilidade de ser conhecidos e vistos ao redor do mundo”, defende. Figuei-redo Ferraz concorda: “A obra de arte é muito maior do que qualquer um de nós. Considero--me um ‘zelador’ de tudo que está no Instituto [Figueiredo Ferraz, em Ribeirão Preto]”.

Quem quiser começar a investir nesse campo deve ficar atento a algumas questões, como a

própria educação artística. É importante ter co-nhecimento sobre o artista e sua obra e sobre o momento em que vivemos. Outro ponto é que, apesar de a arte ser um ótimo investimento, ela não tem liquidez rápida, sua valorização acon-tece através das gerações. O supercolecionador britânico Charles Saatchi dá uma dica: há sem-pre um “dealer” espertinho que vende uma es-cultura sem mencionar que ela faz parte de uma série de várias peças idênticas. Em todos os ca-sos, quanto menos cópias circulando, maior o valor da obra. O ideal, por fim, é pedir tudo por escrito. O atestado de autenticidade tem a assi-natura do autor, imagens e dados técnicos e por isso certifica a importância da peça.

Temos de criar um círculo virTuoso de colecionismo de produções brasileiras recenTes ou Teremos de ver nossa arTe conTemporânea em museus fora do brasil”

José do Nascimento Júnior

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“Todo retorno é cheio de uma esperança besta e inútil. É um encontro com o vazio. É um retra-to da ausência.” É assim que o fotógrafo pernambucano Gilvan Barreto define seu novo ensaio fotográfico. Em Moscouzinho (Tempo D’Imagem, 2012), lançado no 8o Festival Internacional de Fotografias – Paraty em Foco, em setembro, Barreto se propôs um retorno a um lugar ima-ginário que marcou sua infância.

Moscouzinho foi o apelido dado ao município de Jaboatão dos Guararapes, na região me-tropolitana do Recife, ao eleger o primeiro prefeito comunista do Brasil, o médico alagoano Manoel Calheiros, em 1947. Nascido muitos anos depois, no final da década de 1970, em plena ditadura, Barreto ouviu de seu pai, militante de esquerda, as histórias daquele tempo distante, que sobrevivia na memória.

Ao trilhar uma viagem de volta a um não lugar, o fotógrafo se viu entre fronteiras. “Falo dessa linha que existe entre o posicionamento político e a própria liberdade de pensamento. Falo sobre o que existe entre o isolamento e o desejo de partir, entre o existir e o querer sumir, entre o que é terra e o que é mar.”

Para Barreto, Moscouzinho é uma ilha, que compreende o passado e sua interpretação. O exer-cício do fotógrafo foi então escapar desse espaço imaginário.

TEXTO mariana lacerda FOTOS gilvan barreto

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TEXTO gustavo ranieri

Projeto Pivô, em São Paulo, e a galeria Graphos: Brasil, no Rio, transformam áreas inusitadas em espaços permanentes para experimentação artística

Occupypela arte

Até o último dia de junho passado, a loja número 48 do edifício símbolo paulistano Copan e seus dois pisos superiores eram apenas um enorme espaço vazio. Ocupada antigamente por um hospital dentário, uma reserva técnica de ci-nema e pequenas lojas, a área de 3.500 metros quadrados (maior que o Masp, por exemplo) contava quase duas décadas sem inquilino. Ali, os pavimentos que jamais serviram a um fim se não o comercial tomaram outra direção pelas mãos de um pequeno grupo de cinco pessoas. Juntos, eles empreenderam de julho até a pri-meira semana de setembro uma força-tarefa para transformar o local e seus muitos pilares, vigas e passagens irregulares no Pivô, projeto dedicado 100% à experimentação artística. “A gente não vende nada aqui. A ideia é investi-gar mais os processos da produção contempo-rânea”, salienta a diretora de planejamento e comunicação Marta Ramos-Yzquierdo. “Assim como outras iniciativas, estamos reativando o centro de São Paulo. Nesse caso, um espaço que não era nada, estava fechado, e agora está aberto a todos, sem as regras de mercado que outros lo-cais têm. Essa liberdade que oferecemos ao cria-dor faz com que o Pivô seja uma coisa única.”

Não foi casual, portanto, que a frase “da próxi-ma vez eu fazia tudo diferente”, presente no curta-metragem experimental Documentário, dirigido por Rogério Sganzerla (1946-2004), em 1966, fosse escolhida como título da primeira ex-posição, que esteve aberta ao público até o dia 14 de outubro. “O Copan, cujo projeto original nunca se concluiu, foi a última grande galeria

de São Paulo, mas que não deu certo no final. A ideia, então, é falar um pouco sobre o que houve com a utopia brasileira (o edifício era apontado como marco do avanço do país e da ‘São Paulo moderna’ nos anos 1950) e como se reativa um espaço que foi o ícone dessa utopia. Para isso convidamos 14 artistas de várias gerações”, con-ta Marta, que ressalta ainda a presença simultâ-nea no espaço da mostra Alphabet of Magi, da galeria Mendes Wood.

Assim, quem se lança a percorrer a área quase labiríntica encontra a metrópole e a arquitetura famosa do prédio em constante dialética com os artistas. Amália Giacomini, por exemplo, se vale de fitas pretas coladas nos pilares e no chão para mudar a perspectiva da construção. Daniel de Paula reconstrói pontos de ônibus enquanto Vitor Cesar expõe sobre portões de ferro anún-cios publicitários indicando, por exemplo, cur-sos para quem é habilitado, mas tem medo de dirigir, ou oferecendo serviços a estrangeiros que almejam ganhar a cidadania brasileira. Há também um enorme neon rosa com a palavra Aurora, trabalho de Carmela Gross que já esteve em Moscou e no Rio de Janeiro.

E é do Rio, inclusive, que desponta outro curio-so e bom exemplo de ocupação e transforma-ção em espaço de arte de uma área que nun-ca serviu a esse fim. No segundo andar do Shopping Cidade Copacabana, os clientes da sauna L’Uomo Club não a encontram mais lá. O local, conhecido como ponto de prostituição, sofreu intervenção do Ministério Público em

junho passado e teve suas atividades encer-radas, depois de 32 anos de existência. Agora, quem atravessar as portas do espaço de 320 me-tros quadrados – correspondente a 11 lojas do shopping – verá, a partir do primeiro semestre de 2013, ainda sem data definida, exposições de arte. É ali o novo espaço da galeria Graphos: Brasil, aberta há um ano no mesmo centro de compras e sob o comando do galerista Ricardo Duarte, que durante 22 anos foi marchand de designers de mobiliário.

“Se vai dar certo comercialmente é secundário. A história da galeria foi pensada sempre com a ideia de apresentar artistas com novas propos-tas e não fazer mais do mesmo”, destaca ele, que aproveitará a área para realizar mais exposições, até mesmo não comerciais. A primeira pôde ser vista mês passado durante 15 dias. Fascina-do pelo trabalho da artista portuguesa Susana Anágua, o galerista interrompeu as obras para convidar a criadora a fazer uma videoinstalação no local. “A área ficou com uma característica de Berlim decadente, vamos dizer assim, e o traba-lho se encaixou perfeitamente”, conta ele. Duarte ainda não sabe se manterá algo da velha estrutu-ra da sauna no novo projeto arquitetônico, que lhe proporcionará dois salões expositivos, um de 145 metros quadrados e outro, interligado ao pri-meiro, de 60 metros quadrados. As novas insta-lações terão também uma reserva técnica de 80 metros quadrados – na qual poderão acontecer palestras – e um escritório. “Se não me fizer falta, talvez até mantenha como recordação a sala toda azulejada que foi a sauna úmida.”

Site specific de Julia Cristofi na mostra de abertura do projeto Pivô, em São Paulo

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SERVIÇOPivôAvenida Ipiranga 200 loja 48 Centro São Paulo [terça a domingo das 12h às 20h]entrada franca

Graphos: BrasilRua Siqueira Campos 143 sala 1/2 Copacabana Rio de Janeiro[segunda a sexta das 10h às 19h; sábado das 10h às 14h] entrada franca

OccupyPOntOS dE PaRtIdaPara o artista visual Nazareno, o Pivô é um espa-ço de grande potencialidade. “O desafio é você se integrar a um local já existente, mas interferir também. E essa ocupação é extremamente saudá-vel. Primeiro é uma cidade como São Paulo, onde esse tipo de experiência poderia acontecer muito mais. Ao mesmo tempo, estamos em uma região que vem sofrendo uma espécie de exílio, porque cada vez mais as pessoas estão saindo do centro e indo para outros bairros. Então é uma maneira de reintegrar isso”, analisa.

Lucas Simões, jovem artista que apresentou na mostra de abertura do Pivô a obra Dimensão Encer-rada, acredita que o espaço oferece uma “liberdade diferente”. “Na galeria há, querendo ou não, com-promisso em produzir trabalhos que sejam de al-gum jeito objetos para ser comercializados. Já aqui há a possibilidade de fazer só um acontecimento, uma experiência, o que gera outra sensação.” Para o curador Diego Matos, esse estar livre é percebido no que concerne ao processo de

ocupação do Copan. “Obviamente, a natureza experimental e a possível vocação do Pivô só poderão ser conferidas com maior solidez em projetos futuros. No entanto, pelo fato de haver uma ‘liberdade institucional’, os artistas tive-ram a chance de conjecturar sobre o espaço ge-rando possíveis situações de atrito, mesmo ao longo do processo de elaboração e construção de seus trabalhos.”

No caso da portuguesa Susana Anágua, a li-berdade para intervir na antiga sauna carioca foi igualmente o elemento mais importante por trás da exposição, sem título, que fez em setembro. “Na minha videoinstalação a ima-gem se transforma por meio de fios em corpo no espaço, então tem uma tridimensionalidade. Fiquei tão entusiasmada por meu trabalho ser apresentado em um espaço ‘destruído’ que em vez de montar uma peça montei dez. E decidi produzi-las em nichos e pedaços que criei de forma cenográfica, deixando-as suspensas en-tre a sofisticação e a destruição”, salienta.

A portuguesa Susana Anágua incorporou elementos da antiga sauna em sua instalação na Graphos: Brasil (fotos acima). No Pivô, a instala-ção Aurora, de Carmela Gross (acima), e cena do vídeo Robespierre e a Tentativa de Retomar a Revolução, de Guilherme Peters (à direita)

fotos: divulgação

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As questões de gênero não cabem mais em con-ceitos simplistas. Homens fazem a sobrancelha e mulheres governam nações. Mesmo assim, no guarda-roupa masculino não cabem laços, ren-das e babados e, para um garoto, ser feminino costuma gerar repreensão.

Imagine então ser um bem-sucedido profissio-nal, pai de família, e resolver vestir-se de mulher. Se a proposta parecer improvável, conheça mais sobre o cartunista Laerte Coutinho, de 61 anos.

Ele é um mito dos quadrinhos brasileiros, com uma trajetória de luta contra a ditadura militar e produção admirável. Acaba de concorrer ao Prê-mio de Melhor Atriz em um festival de cinema brasileiro e conversou com a Continuum sobre sua experiência pessoal e impressões a respeito de como a sociedade determina e tolhe o com-portamento das pessoas.

O encontro ocorreu na Casa de Cultura Japone-sa, no campus da USP, em São Paulo, onde ele participava de um seminário sobre ética animal. Vestia minissaia jeans, regata verde com renda e camisa xadrez e usava pulseiras, brincos e as unhas pintadas de azul – “Chow chow, da série com nomes de cachorros da Risquê”, precisa.

Em sua fala, mescla o próprio gênero, empregan-do ora o artigo masculino, ora o feminino, com naturalidade. “Estou farta de ouvir: ‘Não sei como devo chamar você, de ele ou de ela’. Isso não im-porta! Me trate com respeito!”

O que é crOssdressing?Detono o conceito crossdressing. É um termo que nasceu nos Estados Unidos para grupos de homens heterossexuais transgêneros. A transge-neralidade é um termo guarda-chuva, define pes-soas que manifestam conflito de gênero ou iden-tidade sexual e as separa das travestis. Ou seja, os caras mantiveram o estigma sobre a homosse-xualidade e criaram os clubes de crossdressing.

A palavra migrou para o Brasil. Perdeu muito do sentido sexista e ganhou um conteúdo classista, típico da nossa cultura. Quem se diz crossdresser quer manter um status de normalidade, não quer ser visto como travesti, homossexual. Aí, parece um hobby, do tipo ‘faço escalada e crossdressing’. Isso não me serve porque esse é o modo como me visto normalmente, não é mais algo que eu pratique, é o meu modo de expressão. Não tenho mais roupas masculinas.

Se você digitar CD ou crossdressing, no Google, vai achar sites de pessoas que fazem programa, implantes e modificações corporais. Se aprofun-dar o conhecimento sobre as travestis, vai saber que muitas não alteram o corpo, não fazem pro-grama, ou não gostariam de estar fazendo. São

contingências sociais que precisam ser reconhe-cidas. Não podemos fazer das palavras trincheiras ou usá-las para isolar determinados grupos.

Meu objetivo é uma situação na qual não existam separações. Essa vivência me leva a pensar e des-cobrir a dimensão do gênero. Por que as condições biológicas determinaram um edifício cultural tão absolutamente sólido e muros intransponíveis?

Gênero é uma construção social que faz parte da cultura e não da biologia. As possibilidades são inúmeras. Que tipo de futuro aguarda o ser humano em relação a esses costumes? Vamos continuar chamando determinadas coisas de fe-mininas e masculinas?

O cOmeçOEm 2004, comecei a fazer tiras mais poéticas, mas elas não tinham relação com o travestismo. Eu me lembro de uma entrevista em que Chico Buarque falava que via a canção historicamente limitada ao século XX. Que o ciclo havia se cumprido e brota-vam caminhos diferentes, como o rap. Concordei com o tom do raciocínio e pensei se a tira, o cartum, esta merda, não estava historicamente cumprindo seu ciclo. No meu trabalho pode estar. Eu sinto isso.

com “me

respeito!” trate

Em depoimento exclusivo, Laerte, um dos maiores cartunistas do Brasil, conta sobre sua opção de se vestir de mulher e, com esse ato, questiona a ditadura dos gêneros em nossa sociedade

TEXTO carlos costa e veronica papoula mendes

FOTOS andré seiti

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A transição de Laerte teve início em 2004, com a produção de tirinhas mais poéticas

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Dessa forma, fui acabando com meus persona-gens. Mantive só a Muriel. Comecei a dar ban-deira nas minhas tiras com o Hugo [personagem crossdresser]. Recebi um e-mail de uma pessoa, atualmente minha amiga, que me mostrou essa possibilidade. Que não é loucura se vestir com roupas femininas, usar salto. É legal. O Hugo é a Muriel, e agora está mais para a Muriel. Tanto que chamam as histórias de “O Blog da Muriel”. É uma reflexão sobre o que estou fazendo nesta direção [veja quadrinhos do personagem na página 36]. Levei muito tempo até que resolvi fazer uma ses-são de crossdressing em um estúdio que achei na internet [Studio Dudda Nandez – duddanandez.com.br]. Voltei outras vezes e fui criando vínculo.

O primeiro passo foi a depilação, com cera quente. Um momento de redenção, de se sen-tir descoberto. Ver meu corpo sem pelo foi como me ver sem uma coberta. Na segunda sessão, eu me vesti com tudo que ela propôs: sutiã com prótese, maquiagem etc. Ela foto-grafou, me deu liberdade.

Normalmente o homem transgênero não tem muita noção e explora determinados modelos, personagens. Tenta parecer Marilyn Monroe, atrizes, cantoras. Nesse ponto, está muito perto da realização de uma fantasia...

Tenho 61 anos e é agora que estou assumindo essa expressão. Roupas, maquiagem. Isso vem desde que me entendo por gente, mas sempre falou muito forte o lado da regra, da proibição, do crime e do pecado. Não só na questão de gênero como também na da orientação sexual. Demorei muito tempo até ficar em paz com a ideia de que também sou gay, que há isso em mim.

Provavelmente, muito do desejo de aproximação que sentia por mulheres era um desejo de aproxi-mação do modo de ser feminino. Eu me pergunto se isso também não é o que move os famosos “ca-sanovas” por aí. Quanto de um garanhão, come-dor, não é também transgeneralidade?

se me vejO cOmO parte dO mOvimentO transgênerO, LgBt, há um OBjetivO cLarO que é ver as travestis e Os transexuais cOm dignidade, cOm Os mesmOs direitOs que as Outras pessOas. nãO queremOs apenas nãO ser espancadas, queremOs sair peLas ruas, usar O BanheirO femininO, casar, quandO fOr O casO; queremOs tOdOs Os acessóriOs da nOssa especificidade, sem escândaLO.”

“A repercussão do meu gesto me surpreende”,

afirma o cartunista

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generalidade está sendo entendida, conquis-tando espaço. Em hotéis, eu me registro como Laerte Coutinho, sexo feminino.

As situações são óbvias. Se a pessoa está na sua frente com peito, brinco, maquiagem, é evidente que ela quer ser tratada como feminino. Na maior parte das vezes não há espaço para confusão e quem não souber como tratar que se foda! Não é uma questão de gênero. É respeito.

aceitaçãOA repercussão do meu gesto me surpreende. É evidente que as pessoas põem reparo e atenção em mim, não pela minha carreira como cartunis-ta, mas pelo meu modo de ser. Depois disso [de começar a se travestir], fui convidado para mais entrevistas do que havia sido na soma total da mi-nha carreira como cartunista.

Penso no que, exatamente, está por trás disso. Tal-vez seja um grito contido de apropriação masculi-na do vestuário feminino. Se me vejo como parte do movimento transgênero, LGBT, há um objetivo claro que é ver as travestis e os transexuais com dignidade, com os mesmos direitos que as outras pessoas. Não queremos apenas não ser espancadas, queremos sair pelas ruas, usar o banheiro feminino, casar, quando for o caso; queremos todos os acessó-rios da nossa especificidade, sem escândalo.

Se estou servindo de exemplo e ajudando, ótimo. Mas tenho muito mais o que aprender ou absorver das travessias de vida do que o contrário.

Laerte reverte uma questão contra a qual sempre luta-ram os movimentos feministas e libertários: por que há desonra em ocupar o lugar feminino em detrimento do masculino? na sua história, não há desonra. Há glória.

o cartunista concorreu ao Prêmio de Melhor Atriz de Curta-Metragem no 45º Festival de Brasília do Cine-ma Brasileiro como protagonista de Vestido de Laerte (Cláudia Priscilla e Pedro Marques, São Paulo, 2012). não levou o prêmio, mas infiltrou a mensagem e o curta ganhou como Melhor Filme e Melhor Direção de Arte. o produtor, Kiko Goifman, ao agradecer os tro-féus, lembrou que é preciso pensar em gênero, dentro e fora do cinema.

o diretor do filme, Pedro Marques, de 29 anos, se entu-siasma ao explicar por que Laerte foi tema de sua es-treia no cinema. “Ele é o auge da liberdade, o exemplo

hOnra e gLóriadocumentário sobre o cartunista mistura gêneros e é premiado como melhor filme no festival de Brasília

do que é um cara ser livre.” Colega de escola de Diogo, primogênito de Laerte, morto aos 22 anos em um aci-dente de carro, Marques resolveu ter o cartunista como tema por admirar seu trabalho e sua trajetória, na qual destaca dois momentos: o primeiro, entre 2004 e 2005, quando se dá o acidente e os quadrinhos de Laerte en-veredam pelo caminho da poesia, do experimentalismo. o segundo, com o travestismo.

no filme, Marques e sua parceira Cláudia Priscilla tam-bém brincam com gênero, fazendo uma ficção que pare-ce ser um documentário. o motivo da história é a busca de um certificado, em São Paulo. o caminho é o da fan-tasia. Laerte contracena com a transexual cubana Phe-dra D. Córdoba, que vive no Brasil e é tema de outro filme de Cláudia, Phedra, de 2008. Laerte inventa memórias e histórias em um contexto em que não importa se é ho-mem ou mulher, se é verdade ou mentira.

a transfOrmaçãO dO cOrpOExiste uma cultura de transformação corporal que, para mim, é meio assustadora. Adaptações ósseas, reconstrução facial, tirar o gogó. Tenho respeito e admiração pelas pessoas que fazem isso. Mas não sei se faria. Parece difícil e dolorido.

A prática me fez escolher melhor as roupas e o que visto. Por exemplo, tinha uma prótese de bunda que usava com calças, para ficar com o quadril maior. Não uso mais. Penso meu corpo como ele é e escolho roupas mais adequadas para minha expressão. O modo como a gente se veste é um modo de expressão.

Em casa tenho sutiã com prótese, mas não dá para usar com qualquer roupa. Depois, comecei a gostar do meu corpo sem peito também. O que tenho considerado é colocar próteses de silicone. Não colocaria bunda nem tomaria hormônio por-que, na minha idade, não funciona mais.

A gente gasta com o que precisa. Uso laser para fazer a barba e creme antirrugas, mas gasto mais grana com a minha gata, Celina, que é paraplégi-ca. Levou um tiro de chumbinho há cinco anos e perdeu o movimento das patas de trás.

a mudança de cOstumesDevagar ou rápido, aqui ou lá, dependendo do tempo e do lugar, os costumes estão se transfor-mando. Está ficando claro para todo mundo que orientação sexual e gênero são coisas distintas. Não há um vínculo único. A ideia de que todo cara

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que se vestir de mulher é gay não existe. Tenho muitas amigas que são travestis e são heterosse-xuais. Não gostam nem têm atração por homem.

Ver o gay como mulherzinha é um insulto antigo, fora de moda. Às vezes, tentam ser mais mascu-linos do que o próprio homem. Para a mulher, essa dinâmica é mais clara porque corresponde a uma mudança que vem do século XIX e abrange a conquista do direito civil, a inserção no mundo do trabalho. Hoje, as mulheres podem sair de ca-miseta e coturno e não serão questionadas sobre sua sexualidade.

Agora, a parte masculina dessa revolução não deslancha. Se um sujeito bota um vestido e vai para a rua, é imediatamente hostilizado e estig-matizado, ou colocado em uma espécie de redo-ma. No meu caso, eu posso porque sou artista, tenho filhos criados, uma namorada que entende.

meu nOme femininOToda pessoa nesse circuito tem um nome femi-nino. Gosto de usar Laerte. Quando abri o fato, o que sou e faço, achei que podia continuar Laerte. Não vi sentido em mudar de nome. Tenho identi-dade feminina e identidade masculina.

No Hospital das Clínicas, por exemplo, vou travestida, ou melhor, vou vestida. Na hora de fazer o cartão, perguntaram se eu queria usar meu nome social e eu disse que sim. Realizo exames masculinos, por isso me defini como homem. Mulheres não têm próstata. A trans-

Frame do premiado Vestido de Laerte

Veja no iPad uma seleção de quadrinhos de Laerte.

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GAstronomiA, fiGurino, músicA, Arte urbAnA e outros temAs nAs dicAs destA edição

ARTES VISUAIS Galeria Gramatura

A galeria paulistana Gramatura, em atividade desde setembro, em São Paulo, é focada exclusivamente em desenho contemporâneo. A segun-da mostra da casa, com curadoria de Renan Araujo, parte do tema “linha” para falar, de diversas maneiras, sobre desenho. São vídeos, instalações e, efetivamente, desenhos que discutem o conceito da própria galeria.Exposição Coletiva. Galeria Gramatura – Rua Dr. Acácio Nogueira, 104 – Pacaembu – São Paulo – até 15 de novembro, de terça a sábado, das 11h às 18h. Entrada franca. Saiba mais em <gramatura.art.br>. Ana Maria Pacheco, na Pinacoteca

do Estado de São Paulo

A artista goiana, que reside na Inglaterra, ganha a primeira montagem no Bra-sil desde que deixou o país, há 40 anos. Na mostra, a ênfase é o trabalho es-cultórico que Ana Maria desenvolveu no período em que foi artista associada da National Gallery, em Londres, espécie de residência artística que previa a utilização dos ateliês da instituição, no fim da década de 1990. As esculturas compõem uma instalação que transita entre o lúgubre e o religioso e místico. São seres disformes, que estão sob a ação de objetos de tortura, em uma releitura contemporânea de rituais da Idade Média. A obra de Ana Maria, de grande impacto visual, é hoje bastante valorizada no cenário internacional, com a aquisição de obras por coleções públicas e privadas.Ana Maria Pacheco. Pinacoteca do Estado de São Paulo – Praça da Luz, 2 – São Paulo – de 10 de novembro a 3 de fevereiro, de terça a domingo, das 10h às 17h30; às quintas, até as 22h (entrada franca das 18h às 22h e também aos sábados). Ingresso: 3 reais. Saiba mais em <pinacoteca.org.br>.

Primavera cultural

Bienal na Cidade

Nesta edição, em cartaz até 9 de dezembro, a Bienal de São Paulo saiu do Par-que Ibirapuera e ocupou outros pontos da capital, dentro da programação Bienal na Cidade. Entre as obras está a do artista argentino Leandro Tartaglia – uma viagem em dois atos chamada Tudo em Mente. Na ação, o público parte do Pa-vilhão da Bienal, no parque, em direção à Capela do Morumbi. No caminho, ouve uma gravação e, ao chegar ao local, vivencia a instalação sonora da composi-tora, artista visual e performer norte-americana Maryanne Amacher. Já o bra-sileiro Alexandre Navarro Moreira faz uma intervenção em displays de bancas de jornal na Avenida Paulista, e a alemã Charlotte Posenenske apresenta uma escultura minimalista na Estação da Luz.Bienal na Cidade. Saiba mais em <bienal.org.br>.

DESTAQUEEncontros de Arte e Gastronomia

Tratar a gastronomia como expressão artística é a proposta dos Encontros de Arte e Gastronomia, progra-mação do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP). A atividade dá início a uma nova linha curatorial do museu, que investe em cocriações entre duplas formadas por artistas visuais e chefs. Sob curadoria de Felipe Chaimovich e Laurent Suaudeau, cada dupla ocupa o espaço, de terça a sábado, da forma como achar melhor durante o horário de funcionamento do museu. Entre 30 de outubro e 10 de novembro, Renato Ca-rioni, do restaurante Cosi, de São Paulo, realiza sua experiência artístico-gastronômica com André Feliciano, jardineiro-artista. MAM/SP – Parque Ibirapuera – Avenida Pedro Álvares Cabral, s/nº – Portão 3 – São Paulo – de terça a domingo, das 10h às 17h30. Entrada franca. Saiba mais em <mam.org.br>.

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Cama de Romeu e Julieta, de Arthur Bispo do Rosário, obra que integra a 30ª Bienal

Sem Título, de Samson Flexor

A Modern Bestiary-Mouse, de Ana Maria Pacheco

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Noite na Taverna

Clássico da literatura brasileira publicado em 1855, Noite na Taverna, de Álvares de Azevedo, ganhou versão em qua-drinhos, que integra a série Clássicos Brasileiros em HQ, da Editora Ática. Na história original, cinco amigos se encon-tram em um botequim para, entre um gole e outro, narrar suas aventuras de juventude, misto de transgressão e per-versão. Para a adaptação em formato de desenho, com ro-teiro de Reinaldo Seriacopi, foram convocados alguns dos mestres brasileiros do HQ de horror: Arthur Garcia, Franco de Rosa, Rodolfo Zalla, Rubens Cordeiro, Sebastião Seabra e Walmir Amaral. Cada um assina os quadrinhos de um capítulo, criando uma atmosfera de terror que amplifica a densidade da obra de Azevedo.

MÚSICADVD A Dama Indigna, de Cida Moreira (Lua Music, 2012)

reverenciada por músicos da nova geração, como thiago Pethit [leia en-trevista nas páginas 16 a 19], a cantora cida moreira lançou seu primeiro dVd, aos 30 anos de carreira, no começo de 2012. É o registro audiovisu-al do show homônimo, que também gerou um cd ao vivo. intérprete for-temente influenciada pela linguagem do teatro, cida se notabilizou pela técnica apuradíssima e pela recriação de canções de Kurt Weill e bertolt brecht, chico buarque e tom Waits, entre outros. nesse recital de piano e voz, com clima de cabaré, a dramaticidade da interpretação de cida dá o tom a canções como “o ciúme” e “mãe”, de caetano Veloso, e até a uma inusitada releitura de “back to black”, de Amy Winehouse.

MODACápsula do Tempo: Identidade e Ruptura no Vestir de Ney Matogrosso, no Senac

O cantor Ney Matogrosso sempre se destacou por sua presença cênica em shows. A cada espetáculo que apresenta – desde os anos 1970, quando integrava os Secos & Molhados –, a performance desse cantor de voz cristalina e timbre raro se torna mais ousada e transgresso-ra. Isso se deve, em grande medida, aos figurinos, muitas vezes desenhados por importantes nomes da moda. A exposição, com curadoria do carnavalesco Milton Cunha, apresenta cerca de 30 indumentárias. A seleção foi feita entre as 220 peças que o cantor doou ao Senac, facul-dade paulistana que oferece curso de moda. Elas comporão o Espaço Ney Matogrosso, instala-do na biblioteca do campus. A instituição restaurou as peças, que são expostas em manequins com as medidas e feições do cantor.Cápsula do Tempo. Centro Universitário Senac – Campus Santo Amaro – Avenida Engenheiro Eusébio Stevaux, 823 – Santo Amaro – São Paulo – até 14 de dezembro, de segunda a sexta, das 9h às 21h; sábados, das 8h às 17h. Entrada franca.

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olheosmuros.tumblr.comos muros que delimitam os espaços público e privado também fun-cionam como suporte para que as pessoas se expressem. mensa-gens, palavras de ordem, frases irônicas, bem-humoradas ou de pro-testo, grafites e desenhos sempre encontraram nessas estruturas verticais uma tela para se deixarem ver. o projeto colaborativo olhe os muros convida os internautas a enviar imagens que tenham, de alguma forma, chamado sua atenção para o e-mail [email protected] ou um tweet para @olheosmuros. no tumblr, deve-se clicar no link “Viu um muro?” no topo da página.

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lisacongdon.com/blog/category/365-days-of-hand-letteringse você anda precisando de doses diárias de ânimo e beleza, com certe-za vai gostar de um dos trabalhos de lisa congdon. A artista norte-ame-ricana cria todos os dias uma nova ilustração com mensagens positivas ou apenas desenhos fofos no projeto intitulado 365 days of Hand lette-ring. todas as obras da série estão disponíveis em seu blog para inspirar cada dia do ano; e, como ainda faltam alguns meses para o final de 2012, corra até lá e acompanhe.

guerillasculpture.tumblr.comA artista norte-americana tesha lewis decidiu decorar a cidade de indianápolis, onde mora, com borboletas azuis. os pequenos insetos, feitos com materiais reciclados, são presos a estrutu-ras de metal por meio de ímãs. segundo tesha, a intenção não é comprometer os locais onde as borboletas são fixadas e sim re-vitalizar e transformar a arte feita em espaços públicos. no blog da artista é possível acompanhar a evolução do projeto, chama-do Guerilla sculpture, e aproveitar para inserir um pouco de ma-gia e beleza nas horas em frente à tela do computador.

songkick.comeste site, que também está disponível em aplicativo para aparelhos móveis, faz uma leitura do arquivo de músicas de quem o acessou para oferecer su-gestões de shows dos artistas presentes na lista, seja no brasil, seja em ou-tros países. A ideia é que o usuário seja o primeiro a saber das apresentações de seus artistas preferidos e se antecipe na compra de ingressos. Para os fãs de carteirinha é também uma chance de acompanhar passo a passo a trajetória de seus escolhidos. Artistas também podem alimentar o site com as informações de sua agenda, o que possibilita outro tipo de pesquisa, além daquela feita pela leitura da biblioteca musical.

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/itaucultural fone 11 2168 1777 [email protected] paulista 149 são paulo sp 01311 000 [estação brigadeiro do metrô]

estacionamento conveniado, com entrada pela rua leôncio de carvalho

Curadoria de Felipe Scovino e Paulo Sergio Duarte

ENTENDA POR QUE LYGIA CLARKÉ UMA DAS ARTISTAS BRASILEIRASMAIS RECONHECIDAS NO MUNDO

Você também pode ver as obras emnovo.itaucultural.org.br

ATÉ 11 DE NOVEMBRO DE 2012ENTRADA FRANCA

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[indicado para todas as idades]

NO ITAÚ CULTURAL

4 andares145 obrasRéplicas para manusearProjetos da artista nunca antes realizadosUm museu virtual criado especialmentepara a exposição

Foto: Edouard Fraipont