20
PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A FOTOGRAFIA NOS E.U.A. DO SÉCULO XIX E IMAGENS DE DEBRET NO PARANÁ. ALUISIO DE ALMEIDA ANDRIOLLI. UNESPAR Campus de Curitiba II. Resumo: A idéia de escrever um texto sobre Debret e a produção de imagens tendo paisagens paranaenses como tema, surgiu após a descoberta de um trabalho publicado no início da década de 1980 pelo governo do Paraná, sobre a pintura de paisagens tendo locais do estado como representações, e a constatação de que Debret pode ter sido o primeiro a realizar trabalhos pictóricos sobre esta região do Brasil. Utilizamos na confecção deste texto as concepções de uso imagético da territorialidade presentes no trabalho de Joel Snyder, daí a proposta se relacionar ao uso fotográfico do território que este autor traz, sobre a fotografia nos E.U.A. do século XIX; com a produção imagética de Debret sobre a paisagem do Paraná, mesmo com a constatação de que técnicas utilizadas pelos produtores de imagens foram diferentes (representação pictórica e fotográfica).

PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A

FOTOGRAFIA NOS E.U.A. DO SÉCULO XIX E IMAGENS DE

DEBRET NO PARANÁ.

ALUISIO DE ALMEIDA ANDRIOLLI.

UNESPAR – Campus de Curitiba II.

Resumo:

A idéia de escrever um texto sobre Debret e a

produção de imagens tendo paisagens paranaenses

como tema, surgiu após a descoberta de um

trabalho publicado no início da década de 1980 pelo

governo do Paraná, sobre a pintura de paisagens

tendo locais do estado como representações, e a

constatação de que Debret pode ter sido o primeiro

a realizar trabalhos pictóricos sobre esta região do

Brasil. Utilizamos na confecção deste texto as

concepções de uso imagético da territorialidade

presentes no trabalho de Joel Snyder, daí a proposta

se relacionar ao uso fotográfico do território que este

autor traz, sobre a fotografia nos E.U.A. do século

XIX; com a produção imagética de Debret sobre a

paisagem do Paraná, mesmo com a constatação de

que técnicas utilizadas pelos produtores de imagens

foram diferentes (representação pictórica e

fotográfica).

Page 2: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Palavras-chave: Paisagem; Territorialidade;

Fotografia nos E.U.A.; Debret.

A idéia de escrever um texto sobre Debret e a

produção de imagens tendo paisagens paranaenses

como tema, surgiu após a descoberta de um

trabalho publicado no início da década de 1980 pelo

governo do Paraná, sobre a pintura de paisagens

sobre o estado, e a constatação de que Debret pode

ter sido o primeiro a realizar representações de

imagens sobre esta região do Brasil.

Preocupado em acumular esboços para o seu projetado

livro Voyage Pittoresque et Historique au Brésil, Debret

percorreu o território paranaense em 1827, produzindo

número considerável de desenhos e aquarelas de boa

qualidade pictórica (como todas as suas obras),

sobretudo de extraordinário valor documental para o

Paraná. O roteiro seguido pelo artista viajante é o velho

caminho das tropas até Curitiba (desde Itararé, na divisa

atual com São Paulo), descendo à Paranaguá e

Guaratuba para alcançar o litoral de Santa Catarina.

(Paraná, 1982, p.13).

Utilizamos na escrita deste texto as concepções de

uso imagético da territorialidade presentes no

trabalho Fotografia Territorial de Joel Snyder, daí a

proposta de relacionar o uso fotográfico do território

Page 3: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

que este autor traz, com a produção imagética de

Debret sobre a paisagem do Paraná, mesmo com a

constatação de que as técnicas utilizadas pelos

produtores de imagens foram diferentes

(representação pictórica e fotográfica).

Segundo o texto de Joel Snyder, Fotografia

Territorial, o estabelecimento de práticas de

fotografia de paisagem ocorreu simultaneamente à

reflexões sobre a própria técnica fotográfica, na sua

relação com a representação da pintura, no fascínio

pela origem mecânica da fotografia, que teve a

conseqüência de uma crença de que a

representação fotográfica fosse perfeita, como se ela

não pudesse ter erros como poderia haver em outros

meios de apresentação de imagens.

A caracterização da origem tecnológica do meio

fotográfico, por outro lado, reforçou a idéia da

superioridade da representação de imagens feita

pelas artes visuais, idéia defendida por artistas e

críticos devido a interesses econômicos. Snyder

argumenta que na época, os fotógrafos não eram

competidores dos pintores e ilustradores na mídia

estabelecida, provavelmente o impacto da fotografia

no mundo da arte foi causado por um reflexo da

industrialização e o aparecimento de uma nova

classe média urbana ávida por consumir novidades.

Page 4: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Por que os fotógrafos aceitaram essa visão

mecanicista da fotografia? Porque ela criou um

mercado de consumo na época – o da

representação factual, onde se pensa que a imagem

capturada é idêntica ao modelo original, sem ter a

obrigação de lhe conferir um caráter particular.

Assim uma visão acompanhou o início da fotografia

de viagem, arquitetônica ou de paisagem: uma

representação passiva de algo pré-existente.

Ironicamente, a origem, da fotografia de paisagem,

um gênero proeminente na história da prática

fotográfica, iniciou-se de forma que os fotógrafos

não pudessem refletir sobre uma estética inerente a

ela. No entanto, muito pouca atenção foi dada para

os trabalhos fotográficos com o tema da paisagem

feitos nos anos de 1860 e 1870, pesquisas que

definiram boa parte do estilo dominante da fotografia

panorâmica, a fase em que ela foi inventada e

refinada.

Snyder está interessado na análise dos fatores que

levaram duas práticas de fotografia de paisagem

entre os anos de 1860 e 1870, procurando entender

por que estas fotografias de paisagem foram feitas

dessa forma. O autor revela que essas práticas

fizeram sucesso junto às audiências que elas

Page 5: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

serviram, mas no entanto, ele esclarece que isso

não significa que elas pudessem ser simplificadas

apenas para o deleite de audiências particulares.

Por fim, ele enfatiza a especificidade dessas

pesquisas sobre a fotografia de paisagem dessa

época, o que requer o entendimento sobre suas

funções e seu alcance como um todo.

A primeira geração de fotógrafos da paisagem, entre

1840 e 1850, foi dependente das convenções da

representação plástica desse gênero na época,

como as várias formas de gravura, da pintura sobre

tela, isto ocorreu principalmente nas primeiras

produções de fotógrafos franceses e britânicos,

normalmente influenciados pelo meio artístico da

época. Não havia ainda um mercado consumidor e

nem produção em massa da impressão fotográfica.

No fim dos anos de 1850 e durante os anos 1860,

começou a se formar um mercado de consumo de

fotografias de paisagem, com a fundação de casas

especializadas na publicação e venda deste tipo de

fotografia, especialmente para turistas. Inicialmente

na Europa e depois nos E.U.A. as fotografias de

paisagem se popularizaram, principalmente quando

passaram a ser enviadas pelo correio.

Page 6: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Há uma centralidade no questionamento da

produção fotográfica para o consumo por que isso

denota os motivos que guiaram a produção

fotográfica no período. Percorre esta idéia, a

sugestão que isso teria servido para satisfazer a

demanda de uma classe média crescente, mas isso

somente não explicaria toda a extensão do

fenômeno, até porque, a primeira geração de

fotógrafos veio de classes privilegiadas,

familiarizadas com as descrições plásticas de

paisagens, eles enfatizaram uma devoção ao

pitoresco com todos os seus detalhes. O autor

coloca este ponto para mostrar que a crença no

naturalismo determinou a prática da primeira

geração de fotógrafos da paisagem.

Como exemplo do pensamento dominante nestas

classes altas sobre a fotografia, Snyder apresenta o

pensamente de Lady Elisabeth Eastlake, uma

escritora especializada em arte e fotografia na

década de 1850: de acordo com ela, uma

representação imagética só teria mérito estético se

mostra-se “nossa própria experiência da natureza”,

como a fotografia é um produto de um mecanismo,

não teria como representar a experiência humana do

mundo, isso significa que a fotografia não teria

potencial artístico. O autor ressalta que a opinião

dessa senhora refletia fielmente a opinião corrente

na intelectualidade em sua época.Na metade da

década de 1850, a fotografia foi separada em termos

Page 7: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

conceituais das outras artes visuais e esta

separação foi descrita não em termos de meios

diferentes, mas sim em termos ontológicos. A pintura

e as demais artes gráficas eram descritas como o

domínio do imaginativo, cognitivo e ideal, enquanto a

fotografia era, dependendo do interesse do escritor,

rebaixada ou elevada para o domínio do factual,

material, o fisicamente real. Assim, quando um

intelectual consagrado como Baudelaire criticava a

fotografia como corruptora do “desenvolvimento da

pureza material da cultura”, alguém como Oliver

Wendel Holmes defendia que a fotografia era o

“honesto raio de sol”: uma “pintura externada da

natureza, a melhor e sempre verdadeira”.

Snyders coloca que a divisão de opinões sobre o

valor da fotografia como um meio de produção de

trabalhos artísticos teve um efeito singular: os

fotógrafos ganharam respeito por seu trabalho

revelar transparência e verdade. Por volta de 1860,

a fotografia já fazia parte da cultura popular

caracterizada como um meio útil para o propósito da

documentação dos ambientes naturais. A nova

geração de fotógrafos paisagísticos podia trabalhar

sem a obrigação de produzir arte, segundo eles

próprios, poderiam fotografar o que eles viam, sem

seguir nenhuma convenção. Em termos práticos,

estes fotógrafos poderiam desenvolver pesquisas

para a produção de imagens paisagísticas,

escapando de motivos sancionados e fórmulas de

Page 8: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

representação consagradas, procurando manter as

qualidades da singularidade, fatualidade e

materialidade, mas ao mesmo tempo tentando fazer

fotografias que fossem belas e atraentes, sem

dixarem de ser um produto do ofício fotográfico.

O fotógrafo Carleton Watkins desenvolveu uma

técnica virtuosística com fórmulas derivadas, mas

não co-extensivas com o pitoresco e o sublime na

representação da paisagem. Suas fotografias

ficaram muito conhecidas e ele foi considerado por

muito tempo o mais importante fotógrafo americano.

Watkins via o seu trabalho como a gravação de um

momento evanescente da realidade física e não

como a construção de uma paisagem idealizada, um

exemplo disso é a foto The Tree Conicall in the

Yosemite Park (figura 1):

Page 9: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Fig. 1. YOSEMITE PARK 2. Carleton Watkins.

Paradoxalmente, a obra de Watkins acabou por

influenciar pintores como Albert Bierstadt, Willian

Keith e Thomas Moran, que valorizaram sua

“contribuição científica”. Com isso se construiu uma

retórica que impossibilitou a visão do trabalho de

Watkins como representações artísticas de

paisagens.Watkins passou a reproduzir paisagens

do oeste americano para fins de propaganda, como

lugares para se visitar, mas também para morar,

viver. As paisagens de Watkins passaram a mostrar

a costa do Pacífico como um local potencialmente

bom para o desenvolvimento e investimento de

capitais. Ele começa a trabalhar para empresas de

Page 10: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

mineração e ferrovias, mostrando a paisagem

modificada pelo homem de uma maneira a valorizá-

la. (figura 2).

Fig. 2. THE MALAKOFF DIGGINS. Carleton

Watkins.

As fotos de Watkins eram monumentais, ele era

devotado à idéia de progresso, pensamento

dominante em sua época. Seu esquema

representativo combina uma possibilidade de dupla

salvação: um retorno à inocência intocada e a

oportunidade de realizar a violação da inocência, já

que o jardim do éden pode e deve ser explorado.Na

Page 11: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

mesma época outro fotógrafo, Timothy O’ Sullivan,

fotografa o oeste americano de maneira contrária ao

estilo de Watkins. Sullivan participou como fotógrafo

da guerra civil americana, desenvolvendo um viés de

realidade jornalística em seu trabalho. Ele participou

também de expedições geológicas financiadas pelo

governo americano entre 1867 e 1874, seu trabalho

fotográfico é singularmente oposto ao de Watkins,

seus retratos são enegrecidos, de regiões nada

hospitaleiras, paisagens inóspitas e estéreis. (figura

3).

Fig. 3. SAND DUNES NEAR CARSON CITY,

NEVADA TERRITORY. Thimoty O’ Sullivan.

Page 12: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Em 1939, suas fotografias foram redescobertas e

estão no acervo do MOMA em Nova York,

consideradas precursoras do modernismo, com

toques de surrealismo por Beaumont Newhall, crítico

e curador do Departamento de Fotografia daquela

instituição nessa época. As fotos com formas

grotescas e desmesuradas das paisagens de

Sullivan sugerem que “o homem não é a medida de

todas as coisas”, já que demonstram a existência da

esterilidade e a perda de civilizações. (figura 4).

Page 13: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Fig.4. ENIGMA. Thimoty O’ Sullivan.

Para Snyder, a diferença entre os trabalhos de

Watkins e o de Sullivan é a diferença entre o

familiar, conhecido, inteligível e o estranho,

desconhecido, ininteligível. O autor defende que a

fotografia de paisagem de Sullivan não delineia um

território possivelmente com potencial exploratório,

mas sim um tipo diferente de território, o local a ser

estudado, investigado, carente de uma explicação

que só pode ser dada pela pesquisa científica. Em

resumo é uma nova concepção de território, que só

pode ser explorado por uma nova elite, a elite do

pensamento científico. Com isso, ele também

exprime um valor de classe.

Tendo o texto de Snyder como referência, podemos

pensar o papel de Debret na representação pictórica

do Brasil de sua época. Vimos que ambos os

fotógrafos comentados por Snyder tem uma coisa

em comum, ambos colocaram seu trabalho a serviço

de empresas ou de expedições financiadas por

governos, com isso ambos podem ser considerados

produtores de imagens “oficiais’ de seus patrões,

mesma situação em que Debret se encontra em

1827, ano que acompanha Dom Pedro I, em cuja

corte é pintor “oficial”, em uma viagem de

reconhecimento ao sul do Brasil, produzindo as

imagens do Paraná citadas neste trabalho. Ressalte-

Page 14: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

se por isso o provável interesse do Império Brasileiro

nessa representação territorial. O domínio do espaço

nacional e seu controle faz parte de suas

atribuições, como nos lembra Focault em um de

seus textos sobre o poder de polícia do estado:

Enfim, último objeto da polícia, a circulação: a

circulação das mercadorias, dos produtos oriundos da

atividade dos homens. E essa circulação deve ser

entendida antes de mais nada no sentido dos

instrumentos materiais que é necessário lhe proporcionar.

(...) O espaço da circulação é portanto um objeto

privilegiado para a polícia. Por “circulação”, porém, deve-

se entender não apenas essa rede material que

possibilita a circulação de mercadorias e eventualmente

dos homens, mas a própria circulação, isto é, o conjunto

dos regulamentos, imposições, limites ou, ao contrário,

facilidades e incentivos que vão possibilitar a circulação

dos homens e das coisas no reino e, eventualmente, fora

das fronteiras. (Focault, 2008, p.p 436-437).

Com isso, fica delimitado o papel de localizador e

produtor de imagens representativas para o Império

Brasileiro que Debret teve nesta viagem, como

exemplos podemos citar as pinturas de Paranaguá e

Curitiba (figuras 5 e 6), principais centros urbanos da

Quinta Comarca da Província de São Paulo, na

época (nome oficial da região que hoje compreende

o Paraná).

Page 15: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Fig. 5. PARANAGUÁ. S.D. Debret.

Fig. 6. CURITIBA 1827. Debret.

Page 16: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Outra imagem importante feita por Debret nesta

viagem, e que é bastante representativa da

necessidade do Governo Imperial Brasileiro de

domínio e controle do território, é a que mostra a

fronteira dos atuais Estados de São Paulo e Paraná,

juntamente com a circulação de mercadorias por

tropeiros nesta fase histórica. (figura 7).

Fig. 7. LIMITE DA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO E

CURITIBA. Debret.

Além de demonstrar o domínio humano sobre o

território paranaense na época, as aquarelas de

Debret, também testemunharam modificações que

os homens fizeram sobre o meio ambiente das

regiões retratadas por ele. Modificações ambientais

Page 17: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

que podem ser consideradas de acordo com a visão

de Sevcenko sobre uma obra de Paulo Prado.

(figura 8.).

Paulo Prado (...) escreveu um livro, Retrato do Brasil,

no qual todo um capítulo é dedicado à paisagem, onde

identifica que não há outro destino para a paisagem no

Brasil que não seja o de desaparecer, e que essa é a

condição da construção da modernidade no país e não

outra. (...) Acho que nessa breve consideração podemos

ver a transição da natureza brasileira do paraíso para a

carcaça, e considerar que o que ficou da paisagem talvez

seja (...) essa vontade de gozar e tocar o que já sabemos

de antemão que está irremediavelmente e para sempre

perdido. (Sevcenko, 1996, p.119).

Muito embora estas considerações de Sevcenko

possam se consideradas muito pessimistas, a

representação que Debret fez de uma queimada de

floresta de Araucárias pareceu profética, pois este

ecossistema talvez tenha sido o mais destruído de

todos os biomas brasileiros. Talvez assim, a

representação imagética de Debret sobre o Paraná

possa dar uma contribuição sobre o papel de refletir

nosso território nacional.

Page 18: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Fig. 8. PROVÍNCIA DE SÃO PAULO (Território da 5ª

Comarca, Curitiba – Queimada de Pinheiros). 1827.

Debret.

REFERÊNCIAS.

FOUCAULT, Michel. Segurança Território e

População. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

KERN, Maria Lucia. Barros. Paisagem,

Conhecimento e Ideologia: O Mediterranismo de

Page 19: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

Joaquín Torres-Garcia. In: Salgueiro, Heliana A.

(Org.). Paisagem e Arte. São Paulo: CBHA, 2000.

LIMA, Valéria. J.- B. Debret, Historiador e Pintor.

Campinas: EDUNICAMP, 2007.

PARANÁ, Governo do Estado do Paraná. Pintores

da Paisagem Paranaense. Curitiba: Secretaria de

Estado da Cultura e do Esporte, 1982.

SCHAMA, Simon. Paisagem e Memória. São Paulo:

Cia. das Letras, 1996.

SCHWARCZ, Lilia. O Sol do Brasil: Nicolas

Antoine Taunay e as desventuras dos artistas

franceses na corte de D. João. São Paulo: Cia. das

Letras, 2008.

SNYDER, Joel. Territorial Photography. In . Mitchell,

W. J. T. (Org.).Landscape and Power. Chicago:

Univ. of Chicago Press, 1994.

Page 20: PAISAGEM E TERRITORIALIDADE: REFLEXÃO SOBRE A … · paisagem e territorialidade: reflexÃo sobre a fotografia nos e.u.a. do sÉculo xix e imagens de debret no paranÁ. aluisio de

SEVCENKO, Nicolau. “O front brasileiro na Guerra

verde: vegetais, colonialismo e cultura”. In: Revista

USP, São Paulo, n.30, pp.108-119, 1996.