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clubedoconcreto.com.br http://www.clubedoconcreto.com.br/2014/01/para-cada-tipo-de-solo- um-tipo-de-radier.html Para cada tipo de solo, um tipo de radier 11 de dezembro de 2013 Para projetar e dimensionar esse tipo de laje, é preciso fazer o equilíbrio entre cálculo estrutural e análise do terreno onde ele será construído Por: Altair Santos O engenheiro civil Fábio Albino de Souza é um dos principais estudiosos de radier no Brasil. Recentemente, no 55º Congresso Brasileiro do Concreto, promovido pelo Ibracon (Instituto Brasileiro do Concreto) ele promoveu curso sobre essa tecnologia que, no país, ainda é pouco explorada. Sua preocupação é mostrar que um radier resistente depende de que o projeto saiba fazer o equilíbrio certo entre cálculo estrutural e estudo do solo. O terreno é que irá definir se o radier será estaqueado ou não, que tipo de concreto será usado para fabricar a laje e até se ele poderá ter armação ou não. É sobre esses critérios técnicos que Fábio Albino de Souza concedeu a entrevista a seguir: Fábio Albino de Souza: falta uma normativa específica para radier no Brasil Qual seria a melhor definição para radier? Durante anos pesquisei a origem do termo radier e tenho fundamentado que a origem é romena, onde no passado foi muito utilizada nas fundações dos aquedutos. Uma definição mais atual, própria para nossos dias, é a fornecida pela ACI 360R-10 (2010) que define radier como uma laje sobre solo cuja principal finalidade é suportar as cargas aplicadas através da tensão admissível de suporte do solo (capacidade do solo). No Brasil, o radier ainda é usado, em sua maioria, para a construção de casas e sobrados ou ele já é aplicado em obras de maior porte? É muito importante comentar que até o momento o Brasil não possui uma normativa específica para radier. Essa restrição dificulta muito a utilização desse sistema de fundação. De uma maneira geral, no nosso país a maioria dos radiers são para casas de baixo custo, seja térrea ou sobrado, o que no meu ponto de vista é um preconceito com o sistema. Em outros países, a primeira opção a se avaliar é o radier; no Brasil, é a última opção. Isso,

Para Cada Tipo de Solo Um Tipo de Radier

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Para cada tipo de solo, um tipo de radier

11 de dezembro de 2013Para projetar e dimensionar esse tipo de laje, é preciso fazer o equilíbrio entre cálculo estruturale análise do terreno onde ele será construído

Por: Altair Santos

O engenheiro civil Fábio Albino de Souza é um dos principais estudiosos de radier no Brasil.Recentemente, no 55º Congresso Brasileiro do Concreto, promovido pelo Ibracon (Inst itutoBrasileiro do Concreto) ele promoveu curso sobre essa tecnologia que, no país, ainda é poucoexplorada. Sua preocupação é mostrar que um radier resistente depende de que o projetosaiba fazer o equilíbrio certo entre cálculo estrutural e estudo do solo. O terreno é que irádef inir se o radier será estaqueado ou não, que t ipo de concreto será usado para fabricara laje e até se ele poderá ter armação ou não. É sobre esses critérios técnicos que FábioAlbino de Souza concedeu a entrevista a seguir:

Fábio Albino deSouza: falta umanormat iva específ icapara radier no BrasilQual seria a melhor def inição para radier?Durante anos pesquisei a origem do termo radier e tenho fundamentado que a origem éromena, onde no passado foi muito ut ilizada nas fundações dos aquedutos. Uma def iniçãomais atual, própria para nossos dias, é a fornecida pela ACI 360R-10 (2010) quedef ine radier como uma laje sobre solo cuja principal f inalidade é suportar as cargas aplicadasatravés da tensão admissível de suporte do solo (capacidade do solo).

No Brasil, o radier ainda é usado, em sua maioria, para a construção de casas e sobradosou ele já é aplicado em obras de maior porte?É muito importante comentar que até o momento o Brasil não possui uma normat ivaespecíf ica para radier. Essa restrição dif iculta muito a ut ilização desse sistema de fundação.De uma maneira geral, no nosso país a maioria dos radiers são para casas de baixo custo, sejatérrea ou sobrado, o que no meu ponto de vista é um preconceito com o sistema. Em outrospaíses, a primeira opção a se avaliar é o radier; no Brasil, é a últ ima opção. Isso,

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independentemente do porte da construção. Felizmente hoje já temos edif ícios com 12andares feitos no Brasil comradier, mas necessitamos divulgar mais essas realizações.

Radier armado, comconcretoprotendido, geraeconomia de até30%Até que ponto o t ipo de solo inf luencia no t ipo de radier que se deve usar?Gosto de dizer que o projeto e o dimensionamento de um radier é metade cálculo estrutural emetade uma análise de solo. Não adianta conhecer 100% de análise estrutural e 0% de solo etambém não adianta conhecer 100% de análise de solo e 0% de análise estrutural. Deve-se teras duas coisas em 100%, ou seja, você tem que saber muito bem de análise estrutural e muitobem de solos. O t ipo de solo inf luência diretamente na escolha do t ipo de radier. Por exemplo:vamos imaginar que tenho solo expansivo e necessito construir uma residência comportadacom essas característ icas. Provavelmente o t ipo de radier mais adequado vai serum radier nervurado, com mais rigidez, pois posteriormente, nas verif icações delevantamentos devido ao comportamento do solo, se for ut ilizado um radier de espessurauniforme, estaríamos contra a segurança ou gastando mais que o necessário. Somente a f imde complemento desse tema, muitos casos de insucessos no Brasil com relaçãoa radier foram cometidos por ignorar os t ipos de solo e tentar implantar um método de outropaís nas condições brasileiras. Um dos meus grandes objet ivos é adaptar essa transferência detecnologia que outros países oferecem para as nossas condições, no intuito de reescrever umnovo capítulo deradier no nosso país.

Um radier pode ser estaqueado? Caso sim, em que t ipos de construção ele é usado?Temos muitas situações onde a opção do radier estaqueado é adequada. Vou citarduas: 1) Est ive recentemente na Cidade do México, e somente para referendar é um dos pioressolos do mundo, se não for o pior. Lá vi muitas construções com radier estaqueado, inclusivecom estacas de pedra nas construções mais ant igas. Como o solo é muito ruim, e tembaixíssima capacidade de suporte, faz-se uma laje de t ransferência com estacas. Como opróprio nome diz, a laje t ransfere a carga para as estacas. Dá para levar em consideração essacapacidade de suporte dalaje no solo ou não. Inclusive pode ser considerado isso ao longo davida út il da estrutura, uma vez que na Cidade do México inicialmente o solo estaria contribuindomuito pouco. Porém, depois de um tempo, o solo descolaria do radiere não estariacontribuindo, fazendo só funcionar as estacas. Mas tudo isso deve ser t ratado com muitocuidado e muito critério, pois o comportamento estrutural do radier vai mudar.

2) Existem casos de edif ícios altos onde as cargas nas fundações são elevadas, e comisso o diâmetro das estacas é grande. Consequentemente, o tamanho dos blocostambém. Assim avalia-se a área total dos blocos pela área de projeção do edif ício. Seesse valor for maior que 50%, não é recomendado fazer blocos isolados e simum radierestaqueado. Esse é o caso do edif ício mais alto do mundo, o Burj Khalifa.

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Estudo do t ipo desolo é que vai def iniro modelo de radier aser usadoExiste radier com armação e sem armação? Qual a diferença e para quais obras épossível usar o sem armação?Primeiramente, é plausível explicar que muitas normat ivas no mundo proíbem ouso deradier sem armadura, embora seja possível fazer. Basicamente, o cálculo de um radier nãoarmado é limitado ao módulo de ruptura do concreto, que é o quanto o concreto resiste detração na f lexão. De uma maneira grosseira, podemos dizer que essa parcela é 10% daresistência à compressão, ou seja, o concreto não é um material que resiste bem à tração.Como mencionado, é possível fazer um radier não armado com essa técnica, mas digosempre: será que as condições de projeto são as condições reais no campo? Esse é o grandexis da questão e posso af irmar categoricamente que esse t ipo de radier não aceita um mínimorecalque. Qualquer mínimo recalque, todo aquele cálculo vai por água abaixo e o radier vaif issurar. Outro ponto importante para radier sem armadura é que você deve ter uma excelenteequipe de execução, bem como um engenheiro tecnologista doconcreto pronto paracombater as f issuras de retração plást ica e não deixar esse radier f issurar após aconcretagem. Sobre o radier armado com aço CA 50 ou CA 60, é uma laje sobre base elást icacomum, sem muitos segredos. É o nosso concreto armado de cada dia. Hoje não recomendoo uso de radier sem armadura nenhuma. Talvez o uso de f ibras possa ajudar, mas vale lembrarque as f ibras não são armaduras. É uma outra técnica com conceitos e critérios diferentesonde o t ipo de f ibra, tamanho da f ibra, relação de aspecto da f ibra, entre outros fatores,podem inf luenciar.

Com relação ao concreto, quais os mais usados para se fabricar radier?Com relação aos concretos, além das propriedades básicas, como resistência à compressão emódulo de elast icidade, acho muito importante estudar a retração plást ica. O problema é quetemos um abacaxi para descascar, que é a correlação de tudo isso. Corriqueiramente, seaumento a resistência do concreto consequentemente estarei aumentando a retração plást icapor ut ilizar mais cimento. Embora haja pesquisas avançadas que conseguem aperfeiçoar isso,o processo torna-se mais oneroso. Portanto, aumentar indiscriminadamente a resistência àcompressão do concreto não é uma boa alternat iva, mesmo porque algumas pesquisasmencionam que se dobrar a resistência à compressão vai-se diminuir a espessura do radier em15% em determinados casos. Outro ponto que temos que garant ir é o módulo de elast icidadedo concreto, aspecto que causa muitas discussões e que depende de inúmeros fatores assimcomo a retração plást ica. Já f iz o dimensionamento de alguns radiers ut ilizando concreto leveestrutural e t ive bons resultados. No entanto, o controle para sua fabricação também é rígido.Um outro t ipo de concreto que talvez possa contribuir sobremaneira é o concreto de retraçãocompensada. Nos Estados Unidos é largamente ut ilizado, inclusive com revisão de normarecente. Só para nossos leitores não f icarem sem parâmetros, comecem o dimensionamentodos radiers armados com resistência à compressão do concreto de 25 MPa e radiers deconcreto protendido com 30 MPa.

O concreto protendido é o mais recomendado?Sou suspeito para falar sobre o radier protendido, pois é a técnica que mais gosto dedimensionar. Não seria questão de recomendação, e sim de economia, que está em torno de30%. Isso depende de alguns fatores que fazem até algumas construtoras optarem pelo radier

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armado, mesmo sabendo que estão gastando mais. Acontece, em muitos casos, daconstrutora não se adaptar com o radier protendido e isso acabar ref let indo até noorganograma da obra. Então, nesses casos, o protendido não é ut ilizado. Mas que éeconômico e seguro não tenho dúvidas.

Para se construir um radier exige-se mão de obra qualif icada?Depende. Se for um radier armado, acho que é muito t rivial e as construtoras estãopreparadas para fazer. Se for um radier com f ibras, depende. O t ipo de f ibra muda a logíst icado concreto, pois o controle tecnológico no momento do lançamento é diferente. No caso doradier protendido também, mas neste caso, normalmente, é uma empresa terceirizada que faza protensão ou a construtora recebe um treinamento para fazer a protensão e tem todos osequipamentos.

Quais são as principais inovações usadas na construção de radier?O uso de radier já é uma inovação no Brasil, por subst ituir fundações mais t radicionais.Falando de uma maneira global, digamos radier x radier, acho que o uso da protensão no radierestá possibilitando cada vez mais a ut ilização racional do sistema, bem como a possibilidadede termos placas cada vez maiores sem juntas. Isso também vale para as técnicas de concretode retração compensada, e em certos casos de radier pré-moldado.

Entrevistado

Engenheiro civil Fábio Albino de Souza, mestre em engenharia de estruturas, professorem uma série de inst ituições de ensino em São Paulo e com experiência no cálculo deradiers em solos expansivos e solos compressíveis. Atualmente, é Specialist SOG(Slab-on-Ground) da ADAPT Corp. No Brasil e dedica-se à conclusão do livro Radier:Simples, armado e protendido.Contato: [email protected]://www.cimentoitambe.com.br/para-cada-t ipo-de-solo-um-t ipo-de-radier/