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Parâmetros para o entendimento das mídias emergentes e a formação de um público especializado no Brasil. Resumo Para a compreensão da criação atual em arte e tecnologia e a formação de um público específico no Brasil buscamos parâmetros como o paralelismo entre a situação econômica- social e as resoluções estéticas e o reflexo nos formatos artísticos das bases de produção material, sobretudo as relacionadas à industrialização do país. A atual efervescência se deve às iniciativas recentes. Mas também aos mecanismos implantados desde a década de 50 como a Bienal de São Paulo que divulgaram as vanguardas e formaram o público das artes. Não obstante a dificuldade de país periférico de acesso a bens culturais, os limitados recursos e as precárias condições de produção material que dificultam ainda mais a criação artística de ponta, são notáveis as antecipações cinéticas e minimalistas dos artistas latino americanos e os investimentos fundadores de uma computer art entre nós. Introdução O texto procura parâmetros que elucidem a criação atual em arte e tecnologia e a formação de um público específico no Brasil. Acreditamos que os alicerces desta produção devam ser buscados no projeto modernista da arquitetura e da poesia construtivista e nos respectivos modelos teóricos. Paralelamente aos mecanismos recentes e os do passado de divulgação e incentivo à formação do público de artes afloraram o debate local as novidades artísticas trazidas por teóricos e artistas, recém egressos da Europa como Mário Pedrosa e estrangeiros como Max Bill, que visitaram o país imprimindo a visão de alguém de fora. Também contribuiu a influência exercida por aqueles como Vilém Flusser que residiram em nosso país e que atuaram nas universidades formando gerações na Escola de Comunicação e Arte, ECA, da Universidade de São Paulo, USP, e na Fundação Armando Álvares Penteado, FAAP.

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Comparando-se a verso anterior do Emoo Art

Parmetros para o entendimento das mdias emergentes e a formao de um pblico especializado no Brasil.

Resumo

Para a compreenso da criao atual em arte e tecnologia e a formao de um pblico especfico no Brasil buscamos parmetros como o paralelismo entre a situao econmica-social e as resolues estticas e o reflexo nos formatos artsticos das bases de produo material, sobretudo as relacionadas industrializao do pas. A atual efervescncia se deve s iniciativas recentes. Mas tambm aos mecanismos implantados desde a dcada de 50 como a Bienal de So Paulo que divulgaram as vanguardas e formaram o pblico das artes. No obstante a dificuldade de pas perifrico de acesso a bens culturais, os limitados recursos e as precrias condies de produo material que dificultam ainda mais a criao artstica de ponta, so notveis as antecipaes cinticas e minimalistas dos artistas latino americanos e os investimentos fundadores de uma computer art entre ns.

Introduo

O texto procura parmetros que elucidem a criao atual em arte e tecnologia e a formao de um pblico especfico no Brasil. Acreditamos que os alicerces desta produo devam ser buscados no projeto modernista da arquitetura e da poesia construtivista e nos respectivos modelos tericos. Paralelamente aos mecanismos recentes e os do passado de divulgao e incentivo formao do pblico de artes afloraram o debate local as novidades artsticas trazidas por tericos e artistas, recm egressos da Europa como Mrio Pedrosa e estrangeiros como Max Bill, que visitaram o pas imprimindo a viso de algum de fora. Tambm contribuiu a influncia exercida por aqueles como Vilm Flusser que residiram em nosso pas e que atuaram nas universidades formando geraes na Escola de Comunicao e Arte, ECA, da Universidade de So Paulo, USP, e na Fundao Armando lvares Penteado, FAAP.

Assim a informao e a formao dos artistas e do pblico passou por vrias tendncias, confusas por vezes. O percurso das primeiras manifestaes construtivistas at s mais recentes das mdias emergentes digitais no linear, e sim, cheio de contradies.

Os artistas locais contriburam ao cenrio construtivista internacional no obstante as limitaes. fato que a poesia concreta esteve a par do que havia de mais vanguarda no cenrio internacional, superando as dificuldades tcnicas locais. Mas as caractersticas do imaginrio respondem a um passado pr-industrial mais remoto do Brasil colonial. O imaginrio brasileiro essencialmente jesuta e barroco (MAMMI, 1995, 1997). Embora nas palavras de Frederico de Morais o Brasil, de raiz barroca, estava impregnado do racionalismo de L Corbusier (MORAIS, 1979, p. 84).

Para Mrio Pedrosa (Apud ARANTES, 2004) somos anti-historicistas e, justamente por no termos uma tradio para ser quebrada, condenados a sermos modernos. Isto nos fez epidrmicos alterando os rumos da noite para o dia. Mas poderia ser o moderno sincretista?

Segundo o crtico contemporneo do final do sculo XIX, Gonzaga-Duque, em seu livro A Arte Brasileira, o que a primeira vista um dos empecilhos de uma arte genuinamente brasileira d um sotaque local a um gosto esttico acadmico internacional (CHIARELLI, 1995, p.18). O Brasil sem identidade pura torna-se palco de transfiguraes culturais que so uma soma de outras.

O passado colonial

Sempre sofremos influncias dos modelos culturais estrangeiros, desde a lngua at aos gneros artsticos, como a pintura paisagstica dos estrangeiros que retrataram nossa paisagem, como Eckhout e Pieter Post por exemplo. Entretanto alguns ganharam contorno de cultura local como o Barroco importado de Portugal.

A linguagem barroca do Brasil colnia foi vigorosamente autntica sobretudo no interior de Minas Gerais, com solues locais das formas e materiais. O barroco segundo Lorenzo Mammi (MAMMI, 1995, 1997) seria um acomodamento da pluralidade de linguagens. A cultura brasileira para o autor uma superposio de culturas, o espelho real da utopia multicultural, gerando justamente com a superposio de signos, no uma sntese, mas o sincretismo.

No processo de aculturao no Brasil os estrangeiros se defrontaram com uma natureza indcil, paradisaca e infernal ao mesmo tempo segundo os relatos. O processo de aculturao foi feito de sobressaltos e transposies inesperadas como a vinda de D. Joo VI ao Brasil, na poca prncipe regente de Portugal, que abandona Portugal diante da invaso das tropas napolenicas Pennsula Ibrica em 1807. O Brasil de colnia vira reino em 1815 sendo institudos em breve tempo, e durante a estadia de D. Joo VI no Brasil, o Museu Nacional, a Biblioteca Nacional, a Academia de Belas Artes, a Imprensa Rgia, o Banco do Brasil. Com a Imprensa Rgia o Brasil teve a introduo da litografia sem atraso em relao a outros pases da Europa (FERREIRA, 1976, p.180). Fato que sugere que certas tecnologias foram implantadas, queimando etapas, sem o devido contexto de evoluo tecnolgica e sem as instituies culturais estarem aparelhadas. preciso considerar que o direcionamento desta exceo veio de interesses polticos e econmicos. Mas mesmo com a criao e o aparelhamento das instituies como a Academia de Belas Artes em 1816, e a conseqente vinda dos visitantes estrangeiros ao pas, permanecemos isolados do continente europeu pelo oceano at que o primeiro cabo telegrfico transatlntico fosse instalado em 1874.

Talvez por esse mesmo insulamento as influncias do catolicismo dos jesutas, do fetichismo indgena e do animismo africano puderam se aprofundar em nosso imaginrio.

A criao do mecenato das artes e o projeto pedaggico da Bienal de So Paulo

com o movimento antropofgico de Oswald e Mario de Andrade de 1922 que temos a reflexo de como fundar uma cultura prpria, mesmo com posicionamentos distintos frente ao que seria prprio. Entretanto este marcou nos anos vinte um retorno figurao de cunho primitivista reabilitado esteticamente pelas vanguardas. Os exemplos de Portinari e de Di Cavalcanti, artistas que alcanaram renome internacional e que embora contemporneos no participaram da semana de 22, representavam um estgio do processo econmico social marcado por uma estrutura patriarcal e agrria.

No Brasil dos anos 20 a economia era dependente do ciclo do caf como produto de exportao oscilando com seu auge e depois com sua crise. Este crescimento gerou riquezas e foi atrelado importao de servios necessrios e de bens de luxo deixando chegar ao pas produtos e conhecimentos produzidos com tecnologia estrangeira. So Paulo o estado que mais se beneficia como cultivador e exportador de caf utilizando mo de obra estrangeira e ganha com a soma do conhecimento dos que vem de fora. Cria-se assim um entorno necessrio revertido como investimento em sua indstria como suporte tcnico, conhecimento dos funcionrios e fornecimento de peas. Com a indstria vem a necessidade de disseminao do conhecimento, mesmo que insignificante.

No incio dos anos 40, tem-se um grande reincio de investimento com a indstria de base por exemplo a siderrgica. Grandes transformaes ocorreram por o conhecimento em tecnologia ter se tornado mais acessvel chegando ao pas com menor defasagem de tempo .

Na medida em que a indstria de base se consolidava, tornava-se necessrio o desenvolvimento da pesquisa tecnolgica que se deu no pas tardiamente, e foi em seu incio, ainda , uma pesquisa voltada estrutura de base e de mquinas.

Fruto da condio econmica de uma sociedade em ascenso social, o carter de grande metrpole participante do cenrio artstico internacional foi vivido por So Paulo com a fundao da Bienal que teve investimento sobretudo norte-americano (OLIVEIRA, 2001). A abertura da primeira Bienal de So Paulo, na Avenida Paulista ocorreu em 20 de outubro de 1951. Com o final da Segunda Guerra, pontuado por importantes transformaes em toda a Amrica Latina, novos horizontes econmicos, polticos, intelectuais e artsticos anunciavam-se.

No ps-guerra, o jogo das foras internacionais tem suas regras alteradas e o capitalismo passa a propor o desenvolvimento transnacional ou associado. Deixava-se para trs as dcadas fundamentadas no desenvolvimento do pas com um projeto nacional e sustentada por uma burguesia local. Dentro desse contexto, nos anos 40 e 50 a cidade de So Paulo vislumbrava um cenrio favorvel ao seu desenvolvimento cultural, acelerando sua ascenso econmica e industrial como sntese do Brasil e vitrine do mundo.

Impunha-se uma linguagem metropolitana, especialmente em So Paulo (Arruda, 2000) permeada pela afirmao do progresso recm-iniciado, para a qual o presente e o futuro importavam mais que o passado.

A Bienal de So Paulo amenizava a defasagem dos reais avanos culturais que no acompanhavam a vida acelerada da metrpole de So Paulo, marcada pelo esprito de modernizao. A Bienal ( cuja pretenso era colocar o Brasil no cenrio internacional das artes tendo como referncia a cidade de Veneza, segundo o diretor do MAM-SP e diretor artstico da mostra Gomes Machado (1951, p. 4) ( fomentou de fato a produo artstica nacional, embora a modernizao advinda de suas mostras e atividades tivesse de pano de fundo a disputa pela hegemonia entre as cidades do Rio e de So Paulo (OLIVEIRA, 2001).Na primeira, a capital da Repblica, as iniciativas vinham basicamente do Estado; j na segunda, principal sede do surto de crescimento industrial e demogrfico, os novos empreendimentos culturais foram sustentados por um novo mecenato, proveniente dos setores emergentes da sociedade: a indstria e as organizaes da imprensa (Pedrosa, 1995, p.239).

Dois empresrios paulistas foram no ps-guerra responsveis pelo mecenato moderno: de um lado, Assis Chateaubriand (1891-1968), conhecido como Chat, empresrio ligado s comunicaes que se embrenhou pelos trmites artsticos; do outro, Francisco Matarazzo Sobrinho (1898-1977), o Ciccilo, industrial de ascendncia italiana, hoje considerado Presidente Perptuo da Fundao Bienal.

Inscreveram-se ainda outras iniciativas que procuravam fazer de So Paulo no final dos anos 40 um plo cultural: a criao do TBC (Teatro Brasileiro de Comdia) e da Cia. Cinematogrfica Vera Cruz, por Ciccilo Matarazzo e Franco Zampari. O empreendimento cultural se transformara em uma forma de luta hegemnica, na qual Chat se destacara como empresrio da cultura por ter inaugurado em 1947 o Masp. Mas no ano seguinte Ciccilo tambm funda seu museu de Arte Moderna, o MAM, que ter como extenso de suas atividades a fundao da Bienal de So Paulo em 1951.

Os visitantes e os recm egressos

Alm da visita ao Brasil de L Corbusier tivemos a de Max Bill em 1950, que realizou exposio individual no Museu de Arte de So Paulo e foi premiado no ano seguinte na I Bienal de So Paulo. A exposio de Max Bill exerceu impacto sobre os artistas brasileiros a ponto de Mary Vieira se mudar para a Sua para se unir a Bill no Grupo Alianza, e Almir Mavignier para a Alemanha, vivendo neste pas at os dias de hoje.

As colaboraes no contexto sul americano vieram de estrangeiros utopistas, mas tambm de nativos recm egressos da Europa, alm de Mrio Pedrosa. Carlos Villanueva e Torres Garcia, o primeiro regressando a Caracas em 1929 aps ter vivido 29 anos na Europa e o segundo em 1934 ao Uruguai, aps 43 anos de ausncia, so estrangeiros em seus pases de origem. Carlos Villanueva foi um aglutinador das artes plsticas nos anos 50 inserindo em seu projeto da Universidade de Caracas artistas renomados como Calder, Arp, Lger, Pevsner e Otero. Torres Garcia fundador da Associao de Arte Construtivista em Montevidu, alm de manter correspondncia com artistas internacionais divulgou textos seus e de outros construtivistas europeus na Amrica Latina, publicando a revista Crculo e Quadrado de 1943 e sua obra sntese Universalismo Construtivo em 1944, e escrevendo para a revista Arturo tambm no mesmo ano.

Talvez estas colaboraes expliquem as contribuies valiosas dos latino americanos ao cenrio construtivista internacional no obstante nossa dificuldade de acesso a bens culturais como pases perifricos. Como bem coloca Frederico de Morais no h como no dar espao no cinetismo presena dos argentinos Le Parc, Sobrino, Garcia-Rossi, Demarco, Marta Boto, dos venezuelanos Soto, Cruz-Diez e Debourg, e do brasileiro Srgio Camargo. E nem esquecer das antecipaes minimalistas de Amlcar de Castro, Franz Weissmann, Eduardo Ramirez Villamizar e Mathias Goeritz, e das antecipaes cinticas do j comentado Abraham Palatnik, e das plurisensoriais de Ligia Clark e Hlio Oiticica. Alm dos investimentos fundadores de uma computer art entre ns empreendidos por Waldemar Cordeiro.

Com as influncias trazidas pelos visitantes e pelos recm egressos a arte forosamente se internacionalizou, e logo se tornou visvel o contraste inevitvel desta arte internacional com a arte produzida aqui fora dos parmetros europeus. Diante do parmetro eurocntrico, e sobretudo aquele trazido pela Misso Francesa que inaugurou a Academia de Belas Artes de 1816, so inexistentes enquanto arte todas as manifestaes nativas anteriores vinda dos mestres da Misso Francesa, e mesmo dos colonizadores portugueses, como o design das cestarias altamente abstrato, a arquitetura, os objetos ritualsticos e a arte performativa dos ndios e sua pintura corporal. Por essa mesma razo difcil ver a tradio da representao figurativa como um modelo importado e no nativo.

A nova inclinao abstrao inserida pela industrializao do pas

A inclinao abstrao na camada culta da sociedade coincidiu com a acelerao industrial que se deu sobretudo depois da guerra quando muitos intelectuais retornaram ao pas. Como Mrio Pedrosa que trouxe de seus estudos de filosofia entre os anos de 1927 e 1929, na Universidade de Berlin, seu interesse pela Gestalt e pela abstrao. sua a tese apresentada em 1949 Da natureza afetiva das formas na obra de arte elaborada para defender a ctedra de Histria da Arte e Esttica da Faculdade Nacional de Arquitetura.

A arquitetura construtivista foi um modelo estrangeiro transplantado para o Brasil, podendo a viso social da utopia corbusiana ser testada no pas principalmente na formao de Braslia. J antes, na dcada de trinta, aderiram linhagem Loos-Bauhaus e melhor tradio construtivista Rino Levi, Warchavchik, Flvio de Carvalho seguido de Lcio Costa.

A arquitetura construtivista representava um projeto frio de implantao de uma concepo esttica estrangeira num pas com profundas desigualdades sociais. Braslia, inaugurada nos anos 60, segundo Otlia Arantes (ARANTES, 2004) marcava a viso utpica projetada por Lcio Costa da mquina de voar que pousa na aridez do Planalto Central rompendo com a letargia local. A forma de nave do planejamento urbano de Braslia expe, segundo Otlia Arantes, uma situao postia de uma cidade afastada das capitais com slida histria cultural e poltica como So Paulo e Rio de Janeiro, sedimentadas ao longo de um processo natural. Braslia cresceu de saltos e de implantaes e no sofreu uma naturalizao. A paisagem cortada para dar condio de pouso para a mquina de voar difere da deixada pela estrutura orgnica irradiadora da construo das estradas de ferro. As cidades que se comunicam somente atravs da via area aglutinam o elemento humano apenas em sua periferia no criando uma malha de povoados, que penetra na paisagem, caracterstica das que se utilizam das estradas de ferro para sua comunicao e que aglutinam o elemento humano ao longo da extenso das ferrovias.

A capital federal distante do litoral avanando cerrado adentro alertava para a necessidade de comunicao interna do Brasil. A cultura brasileira no desbravara suas prprias fronteiras nem seus preconceitos voltada que foi para o mar, e sobretudo para o continente europeu. Por esta mesma razo no seria um erro vermos na ideologia construtivista colocada em prtica em Braslia um exemplo anlogo ao projeto da Bauhaus de construo social atravs da arte. Entretanto, ver a inteno de uma arte integradora nos projetos arquitetnico de Niemeyer e o urbanstico de Lcio Costa em Braslia forar a justaposio do projeto Gesamtkunstwerk da Alemanha em um contexto social dspar, pois as contradies existentes do Brasil so impossveis de serem aplainadas.

O poeta como tecnlogo

Talvez por ser a poesia menos dependente das condies materiais de produo do que outras modalidades artsticas pode a poesia concreta estar a par do que havia de mais vanguarda no cenrio internacional, superando as dificuldades tcnicas e materiais locais.

A poesia concreta no Brasil teve como expoentes os irmos Campos, Haroldo e Augusto, e Dcio Pignatari, grupo que lanou a revista Noigandres formado em 1952. Mais tarde o grupo se aproximou dos pintores construtivistas denominados Grupo Ruptura, que no mesmo ano expunham no Museu de Arte Moderna de So Paulo lanando um manifesto programtico. O grupo composto por Fejer, Geraldo Barros, Sacilotto e outros era liderado por Waldemar Cordeiro. Desta aproximao nasceu a idia de fazer uma grande exposio intitulada Exposio nacional de arte concreta que aconteceu em 1956 no Museu de Arte Moderna, sendo a primeira no gnero mundialmente. Acompanhou a exposio o lanamento do nmero 3 da revista Noigandres com o subttulo: poesia concreta. Participaram do Rio os poetas Ferreira Gullar maranhense radicado naquela cidade, e Ronaldo Azeredo. A exposio foi levada no ano seguinte para o saguo do MEC-RJ (Ministrio da Educao e Cultura do Rio de Janeiro).

A poesia concreta fora desde seu nascimento uma tendncia pansemitica verbi-voco-visual marcada por um experimentalismo. Esse primeiro nmero ainda de poemas concretos, mas voc tem um experimentalismo que parece tentar, digamos assim, apropriar-se de vrias linguagens e vencer etapas rapidamente para chegar a alguma coisa (Campos, apud BARROS e BANDEIRAS, 2002, p.13).

Atinados ao que havia de mais novo, mantinham correspondncia com Max Bill da Escola Superior da Forma de Ulm, Alemanha, atravs de Dcio Pignatari que o encontrou pessoalmente em 1955. Das primeiras conversaes surge a idia de lanarem internacionalmente a Poesia Concreta nome proposto pelos poetas paulistas. Realizaram-se no decorrer da primeira exposio de 1956 outras em pases como Mxico, Japo, Estados Unidos, Itlia, Argentina, etc. Com a poesia concreta o Brasil estivera na ponta da vanguarda internacional, pois segundo Haroldo de Campos o modernismo brasileiro da Semana de 22, como ficou conhecido, tinha 10 anos de atraso em relao ao futurismo italiano.

Os modelos tericos

No construtivismo de tendncia abstrata temos as influncias das teorias da Gestalt e da semitica, sendo que esta segunda ficou mais fortemente arraigada no pensamento dos poetas do que no dos artistas plsticos. Tanto que o programa de Teoria Literria da PUC de So Paulo, na poca coordenado por Lucrecia DAlessio Ferrara, acolheu como colaboradores os poetas concretos Dcio Pignatari e Haroldo de Campos. O programa de mestrado e de doutorado mais tarde se chamar Programa de Ps-graduao em Comunicao e Semitica coordenado por Lcia Santaella, renomada semioticista de orientao peirceana. Deste acolhimento temos a slida base semioticista em especial a peirceana e a benseana de Max Bense da poesia concreta.

Os poetas concretos eram familiarizados com as teorias de Marshall McLuhan e com a Teoria da informao; a Teoria dos signos; a Semiologia; e a Semitica. So de Dcio Pignatari as primeiras tradues de Marshall McLuhan para o portugus como O meio a mensagem, e de se salientar a participao de Haroldo de Campos em uma mesa redonda composta entre outros por Buckminster Fuller e pelo prprio Marshall McLuhan sobre a condio do escritor na era eletrnica em 1966 em Nova York.

Voltados para a questo do aleatrio na arte permutatria, os poetas paulistas seguidores da geometria do esprito de Mallarm e da matemtica inspirada de Pound foram considerados pelos do Rio como cerebrais por cultivarem a matemtica da composio. Prosseguindo os poemas de cunho matemtico, que exploraram a frmula n-fatorial de Haroldo de Campos, com o Alea 1 e lea 2, os livros-objeto como os Caixa Preta e os Poemobiles que surgiram da colaborao entre Jlio Plaza e Augusto de Campos vo explorar mais as imbricaes entre os signos visual e semntico. Imbricaes tambm exploradas na poesia hologrfica de Moiss Baumstein, Augusto de Campos, Jlio Plaza e Wagner Garcia e exemplificada no Rio com a poesia hologrfica de Eduardo Kac.

Os poetas estiveram em colaborao com matemticos e fsicos como em Crtica, Criao, Informao publicada por Dcio Pignatari e Luis ngelo Pinto, um matemtico. Esta publicao propunha o uso de mtodos estatsticos e do computador para a produo e anlise de textos. Tambm de carter interdisciplinar foi o pioneiro Curso de Integrao Cincia e Arte de 1963 no qual o fsico brasileiro Mrio Schenberg e o poeta Haroldo de Campos estiveram envolvidos. O curso promovido pela UFRGS tinha como tema a indeterminao na fsica e a criatividade nas artes contemporneas (CAMPOS, apud DOMINGUES, 1997).

Outra colaborao na poca no realizada era a explorao do texto eletronicamente vislumbrada no exemplo de Palatnik. Aos poetas concretos, e em especial Augusto de Campos, a Mquina de Cores de Abraham Palatnik, que participou da Bienal de 1953, era um convite a uma colaborao frutfera. Palatnik desde os anos 40 desenvolvia mecanismos de experimentao com luz artificial e movimento, que esto entre as primeiras tentativas de arte cintica, e foi em 1951 que ele exibiu na Bienal seu Azul e Roxo em Primeiro Movimento. O almejado desenvolvimento multimiditico que unirira a visualidade sonoridade seria mais tarde levado a cabo por Augusto de Campos e o msico Cid Campos, e Arnaldo Antunes que atua entre a poesia e a msica.

As investigaes concreta e eletrnica na msica

Segundo Iazzetta durante as dcadas de 50 e 60 duas vertentes de produo musical criada a partir de meios tecnolgicos, a msica concreta francesa e a eletrnica alem, ganharam estmulo graas aos laboratrios e centros de pesquisa dedicados esta rea. Estas duas vertentes acabaram por se fundir na msica eletroacstica (IAZZETTA).

A msica eletroacstica do msico uruguaio, radicado no Brasil, Conrado Silva desempenha papel importante evidenciando a juno de duas modalidades: a eletrnica e a concreta. Como exemplo de msica concreta temos a de 1956 de Reginaldo de Carvalho e de msica eletrnica a de Jorge Antunes de 1961. Apesar dos trabalhos pioneiros de Carvalho e Antunes e, posteriormente, de Jocy de Oliveira e de Conrado Silva, a msica eletroacstica demorou a encontrar espao na produo artstica brasileira. Antes do Brasil a Argentina, o Chile e a Venezuela se anteciparam nas pesquisas de msica eletroacstica. Apesar disso, o Instituto Villa-Lobos do Rio de Janeiro dirigido por Reginaldo de Carvalho, que em 1956 comps as primeiras obras eletroacsticas brasileiras (Sibemol, Temtica e Troo I) aps seus estudos em Paris com Paul Le Flem e seu estgio de msica concreta no antigo Centre Bourdan com Pierre Schaeffer, se tornou uma referncia para a pesquisa e divulgao da msica experimental. No Instituto Villa-Lobos atuou o compositor Jorge Antunes, outro precursor da msica eletroacstica brasileira (IAZZETTA).

Estes eram exemplos de esforos individuais que enfrentavam fora a tradio, que acaba sendo um obstculo a inovaes, o alto custo dos equipamentos. Mesmo com a situao reinante em 1960 Joo Jos Neto usa o sintetizador para a criao musical e Luiz Roberto Oliveira projetou e construiu a primeira interface MIDI que foi o primeiro seqenciador para computador, com a colaborao do programador Carlos Freitas e do engenheiro eletrnico e professor da USP Guido Stolfi. Luiz Roberto Oliveira monta ainda o que se supe ter sido o primeiro curso de msica eletrnica do Brasil no MASP, em So Paulo, sob o patrocnio da Secretaria de Cultura, Cincia e Tecnologia do Estado de So Paulo.

Os primeiros cursos a nvel universitrio de criao eletroacstica que formaram nova gerao de msicos datam das dcadas de 70 e 80. A msica eletroacstica s se expandiu no pas com o barateamento dos equipamentos e o surgimento dos computadores pessoais depois da dcada de 80. Tim Rescala e Rodolfo Caesar so um dos nomes que passaram no Estdio da Glria, no Rio de Janeiro, de 1981, um nos estdios independentes que surgiram a partir dos anos 80 (IAZZETTA).

Os espaos artsticos de experimentao tecnolgica

Walter Zanini em Primeiro tempos da arte/tecnologia no Brasil justifica a acanhada produo em arte e tecnologia pela dificuldade de se estabelecer um espao de experimentao tecnolgica aberta aos artistas brasileiros. Alm do aparelhamento dos espaos experimentais determinou o florescimento da produo em arte e tecnologia a crise dos suportes tradicionais. O conceito nascente de obras participativas que s se completam ao serem manipuladas j desde os anos 40 e 50 era explorado nas obras de Mary Vieira e de Ligia Clark que convidavam o participante a interagir; e a ruptura da concepo de uma arte objetual era presente nas manifestaes de Hlio Oiticica e de Ligia Clark que se orientavam para uma arte processual.

Na dcada de 60 o primeiro espao experimental foi realizado no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, no qual pesquisaram Lygia Pape, Antnio Manuel, Cildo Meireles, Anna Bela Geiger, Barrio e Antonio Dias.

As exposies internacionais como a Bienal mantinham os artistas informados das pesquisas mais relevantes e traziam alguns exemplos em arte e tecnologia. Mesmo com o boicote das participaes internacionais devido presena dos militares no poder, a IX Bienal de 1969 abre timidamente uma seo chamada Arte/Tecnologia. Desta edio participaram entre outros artistas Chryssa Mavromichali, Utz Kapmann, Gyula Kosice, construtivista argentino pioneiro na utilizao de recursos tecnolgicos hidrulicos, Roberto Moriconi com experimentaes eletromecnicas, Efizio Putzolu e Maurcio Salgueiro que participou tambm da XI Bienal de 1971, da seo Arte, Cincia, Vida, Tecnologia.

No Brasil a Computer Art propriamente dita tem sua primeira exposio em 1971 organizada por Waldemar Cordeiro. A exposio se chamou Artenica ( nome achado da mescla entre arte e eletrnica. A Computer Art no Brasil encontra os antecedentes metodolgicos na arte concreta. A arte concreta entre ns foi a nica que utilizou mtodos digitais para a criao. Coincidindo com o perodo em que o pas apresentou o maior ndice de industrializao, a arte concreta forneceu no Brasil, principalmente nas reas urbanas, algoritmos largamente utilizados para a comunicao atravs de meios industriais de produo. (Cordeiro, apud Belluzzo; Amaral; Restagny e Pignatari, 1986). As primeiras e fenomenais experimentaes em arte e tecnologia na categoria de Computer Art no Brasil foram conduzidas por Waldemar Cordeiro, artista lder do grupo Ruptura, que mantinha uma aproximao estreita com o grupo dos poetas concretos. Waldemar Cordeiro associado ao fsico e matemtico Giorgio Moscati realizou na Faculdade de Fsica da Unversidade de So Paulo as primeiras tentativas de arte computacional em 1968.

Outra exposio que mostrava pesquisas mais recentes a JAC-72, Exposio VI Jovem Arte Contempornea da USP no Parque Ibirapuera, foi caracterizada pelas performances conduzidas por artistas que valorizavam prioritariamente o processo em relao s questes formais. As experincias comportamentais inflamaram as pesquisas com o uso experimental do Super 8 e do 16 mm. As investigaes temporais do vdeo pela participao mais expressiva de artistas plsticos se aproximavam do audiovisual, desenvolvendo uma linguagem que Hlio Oiticica denominou de Quase-cinema. Dentre os nomes destacaram-se Antnio Dias, Artur Barrio, Iole de Freitas, Raimundo Collares, Lygia Pape, Antnio Manuel, Luiz Alphonsus e Arthur Omar. Essas manifestaes foram mostradas na Expo-projeo, organizada por Aracy Amaral em 1973 em So Paulo.

No mesmo ano de 1973 a XII Bienal teve em sua seo Arte e Comunicao Waldemar Cordeiro sem muita repercusso entre seus pares. Analvia Cordeiro apresentou na mesma Bienal Uma Linguagem de Dana, M3x3, programada para a TV e registrada em 16 mm para nove danarinos, aplicando o mtodo de Laban.

A Bienal de 1973 teve sob a organizao de Regina Cornwall uma programao de projeo de fitas de vdeo de 17 artistas, embora estes por motivos tcnicos no puderam ser exibidos. Somente nas Bienais de 1975 de 1977 a participao da vdeo-arte obteve xito com a presena de Nam June Paik com Jardim de TV, Vito Acconci, Richard Serra, Bruce Nauman entre outros. Na Bienal de 1973 as articulaes internacionais ficaram a cargo de Vilm Flusser que trouxe Fred Forest. A proposta de Fred Forest foi gerir um escritrio de comunicao com o Passeio Sociolgico pelo Bairro do Brooklin. Acompanhado de estudantes e da TV Cultura Fred Forest registrou as situaes e os dilogos inesperados de seu encontro com a populao. Na edio seguinte de 1975 Fred Forest preparou uma ao meditica no MAC, a Bienal dos anos 2000, parodiando o evento da XIII Bienal.

Nos anos seguintes Prospectiva 74 e Poticas Visuais de 1977 ambas no MAC-Usp, do Parque Ibirapuera, reuniram exploraes com novas tecnologias como xerox, serigrafias, offset, postais, grficos, fotografias e diapositivos.

As inmeras conversaes empreendidas pelo MAC-Usp com a USP e com a Faap para a criao de um espao experimental de vdeo foram sem xito. Isso resultou que em 1976 o MAC-Usp acabou por adquirir o equipamento portapak da Sony. O equipamento viabilizou a realizao de vrios projetos de artistas como Regina Silveira, Julio Plaza, Carmela Gross, Gabriel Borba, Marcelo Nietsche e Gasto de Magalhes.

Os primeiros vdeo-makers eram provenientes em sua maioria das artes plsticas. Com a dcada de 80 a produo videogrfica contava com alguns egressos dos cursos de comunicao da USP que parodiavam a produo de massa da TV como Tadeu Jungle e Walter Silveira e outros como Pedro Vieira, e os integrantes do Olhar Eletronico: Fernando Meirelles, Jos Roberto Salatini, Paulo Morelli e Marcelo Machado, e Marcelo Tass e Renato Barbieri que aderiram ao grupo posteriormente. Coube a Arlindo Machado o desenvolvimento de um olhar crtico sobre esta produo. Ainda nesta gerao de video-makers surgem das artes plsticas da FAAP os nomes de Rafael Frana e de Otvio Donasci.

O I Encontro Internacional de Vdeo-arte de 1978, sediado no Museu de Imagem e Som de So Paulo, tinha o intuito de reunir apresentaes de arte e tecnologia que discutissem a interatividade e as telecomunicaes. Este propsito teve como continuidade as exposies de arte postal da XVII Bienal de 1981 e depois a de Arte e Videotexto de 1983, ambas organizadas por Julio Plaza.

Arte e telecomunicaes

A observao de Vilm Flusser muito acertada que tivemos no Brasil uma situao inusitada de implante dos meios eletrnicos udio-visuais sobre uma tradio ainda oral, pois o pas conheceu os meios de massa como o rdio e a televiso antes mesmo de ter resolvido o analfabetismo.

A precariedade da indstria cultural brasileira deu espao no processo de modernizao para a priorizao dos meios de comunicao de massa, que passaram a desempenhar um papel fundamental na busca da integrao nacional. Do ponto de vista cultural, o rdio consolidou-se como veculo de massa; o cinema tornou-se, de fato, um bem de consumo; o mercado de publicaes ampliou-se com o maior nmero de jornais, revistas e livros; a publicidade foi dinamizada com a introduo das multinacionais no pas.

A importncia dos meios eletrnicos para a cultura nacional, deve ser salientada pela varivel da extenso territorial. O sistema de comunicao, nos anos 50 e 60, em processo de expanso constitua um fator de relacionamento, aproximao e integrao. Essa mesma macro-infraestrutura da comunicao poderia oferecer os meios para o desenvolvimento de uma cultura artstica de mbito nacional e internacional. A cultura enfrentou no passado dificuldades fsicas provenientes de uma ocupao do territrio nacional por ncleos de diferentes dimenses, separados por distncias de milhares de quilmetros, reas com baixssimas densidades populacionais, s vezes praticamente vazias. Os recursos eletrnicos poderiam corrigir essas anomalias, permitindo um melhor equilbrio ecolgico entre o fator fsico e o comunicativo. (Cordeiro, apud Belluzzo; Amaral; Restagny e Pignatari, 1986). No Brasil, segundo Gilbertto Prado (PRADO apud ARAUJO), os experimentos que envolvem arte e telecomunicaes usando a televiso de varredura lenta se iniciaram em 14 de outubro de 1986, quando se estabeleceu a Sky Art Conference entre os grupos do Center for Advanced Visual Studies, coordenado por Otto Piene, e o da Escola de Comunicaes e Artes da USP, coordenado por Jos Wagner Garcia (PRADO, 1997). Depois o projeto Intercities de 1988 de Artur Matuck ligou as cidades de So Paulo e Pittsburgh usando tambm a televiso de varredura lenta. Entre as cidades de Viena, Lisboa, Boston, Baltimore, Pittsburgh, Chicago, Vancouver e Los Angeles, participaram So Paulo e Campinas do evento da celebrao do Dia da Terra atravs de transmisses de varredura lenta e fax. O Earthday 90 Global Telematic Network & Impromptu, como originalmente foi nomeado, foi organizado pelo grupo DAX situado na Universidade Carnegie Mellon de Pittsburgh. Entre os vrios artistas que participaram do evento, entre os dias 21 e 22 de abril de 1990, se destacam: Andr Petry, Anna Barros, Artemis Moroni, Artur Matuck, Carlos Bottesi, Carlos Fandon Vicente, DAX Group, Eduardo Kac, Elisabeth Bento, Ernesto Mello, Eunice da Silva, Gilbertto Prado, Hank Bull, Hermes Renato Hildebrand, Irene Faiguenboim, Karen ORourke, Mrio Ramiro, Milton Sogabe, Paulo Laurentiz e Roy Ascott. Mais tarde o projeto Reflux, concebido e coordenado por Artur Matuck, que participou da XXI Bienal de So Paulo em 1991, realizou transmisses entre localidades diferentes usando fax, televiso de varredura lenta e computadores.

Eduardo Kac teve presena marcante no cenrio brasileiro de arte e tecnologia usando a interatividade e os sistemas de telecomunicao junto telerrobtica desde 1986. Seu projeto Ornitorrinco, que se iniciou em 1989, funda, segundo Kac, a telepresena como projeto artstico. Ornitorrinco no den, sua verso mais elaborada e internacional, que estabeleceu por cinco horas a ponte entre as cidades de Seattle, Chicago e Lexington atravs da Internet de 1994. A instalao permitiu a observadores de diferentes pontos geogrficos observar o evento e controlar um telerrob em Chicago (http://www.ekac.org/kac2.html).

Implicaes das polticas da telecomunicao

A revoluo das novas tecnologias da informao encurtou consideravelmente a distncia dos fatos ocorridos sua divulgao miditica. As telecomunicaes segundo Silveira (SILVEIRA, 2001) mostram que a velocidade obtida na transferncia da informao e a velocidade da transferncia de capitais e de lucro so fatores imbricados. Existe uma relao direta entre as transferncias de dados e de lucro, ou seja, quanto maior a banda, maior o lucro. Por esta razo o setor financeiro o interessado em investir no setor de informao. Um setor que prima pela velocidade de circulao.

Desde a recente privatizao das empresas governamentais de telecomunicaes, ocorridas a partir da dcada de 90 na Amrica Latina e no Brasil a partir do governo Fernando Henrique, tivemos um aumento considervel da velocidade de acesso na Internet que ocasionou mudanas de operadoradoras regionais e de projetos que envolvem o design comunicacional.

A velocidade com a qual o conhecimento circula um privilgio que acumula poder aos que dela se beneficiam. As telecomunicaes esto no cerne da chamada revoluo das novas tecnologias da informao, tambm conhecida como revoluo digital e informacional, ou era do acesso que se inicia pelo livro da era de Gutenberg passando pelos meios massivos que incluem as mdias broadcasting audiovisual, televisiva e a do rdio, e pelas dialgicas como o computador, a Internet e os celulares. imensurvel a repercusso do poder que se articula com a informao, ainda mais que esta potencializada pela escala proporcionada pelos meios massivos.

Entretanto no h estudos e nem mapeamentos consistentes da produo de arte e telecomunicao atual que demonstrem uma implicao entre a privatizao e a resoluo esttica dos design comunicacionais em artes. Como tambm no temos como avaliar a influncia que as regulamentaes governamentais que subordinam as empresas de telecomunicaes acabam exercendo sobre os formatos.

Cultura e indstria transnacionais

Com a privatizao da indstria de telecomunicaes na Amrica Latina houve segundo LUGO; SAMPSON e LOSSADA (2006) uma entrada significativa de capital para os setores de mdia, telecomunicaes e computao propiciando um crescimento rpido e promissor. Embora o modelo aplicado beneficie pouco a inovao tecnolgica local, pois repete o clssico de transferncia a locais de menor custo da produo que na matriz passou a ser invivel pelos altos impostos e danos ambientais.

No processo de globalizao mesmo com a terceirizao que acabou por incluir a Zona Franca de Manaus como parte da produo das cmeras videogrficas, por exemplo, no podemos falar positivamente de uma transferncia tecnolgica e de autonomia, pois os vcios da cadeia de produo e a dependncia continuam. Os autores LUGO, SAMPSON e LOSSADA afirmam que mesmo as novssimas indstrias de games, que atuam nos pases em desenvolvimento, pouco refletem as razes culturais locais por estarem atreladas uma produo voltada a atender o perfil cultural do consumidor norte-americano.

Estas indstrias juntam-se a outras problemticas como a das exposies internacionais desde que estas se tornaram componentes da indstria do turismo cultural. So as Maquilladoras Culturais como Ydice (YDICE, 2004) as chama que unem os trs princpios-chave da era ps-fordista: primazia do conhecimento, flexibilidade trabalhista e mobilidade. Como por exemplo as exposies internacionais que vendem a idia de reciclagem do capital cultural local e fazem parte do turismo global. Estas so algumas das iniciativas que surgiram diante do abandono da cultura pelo Estado que obrigou os artistas a novas formas de agenciamento e a solues de auto sustentao de seus projetos artsticos, forando-os muitas vezes a discutirem diretamente com a classe empresarial.

O projeto Arte Cidade de Nelson Brissac usa o lema da renovao de reas urbanas de So Paulo antes ocupadas por indstrias ou por escritrios e hoje em deteriorao. O projeto cria um circuito alternativo de arte e procura interferir na populao das reas urbanas em runa focadas pelo evento atraindo pblico para estas redondezas justamente pelo convite participao de artistas renomados internacionalmente.

A formao de um novo pblico?

O papel de formao e instruo de um novo pblico desde os anos 50 coube principalmente Bienal e a outras instituies que foram sendo criadas.

Os projetos pedaggicos da Bienal de So Paulo eram voltados em sua misso civilizatria s massas. Estes tinham desde de 1953 a incumbncia de introduzir ao pblico as novas linguagens do cubismo e do abstracionismo. Desde ento, as novas linguagens como a arte hologrfica, video arte, arte e comunicao, etc.foram parte do repertrio de suas atividades pedaggicas trazendo ao Brasil um pouco da produo artstica europia e norte-americana.

Segundo Oliveira (2001) "nesse contexto, a Bienal de So Paulo no apenas possui projetos pedaggicos, como ela prpria um longo e bem-articulado projeto pedaggico com cinco dcadas de existncia".

Iniciativas mais recentes focadas na divulgao e formao de pblico das mdias digitais como m So Paulo o VideoBrasil criado em 1991 e seu Festival Internacional de Arte Eletrnica de 1994, o Festival Internacional de Linguagem Eletrnica, FILE, criado em 2000, o Italab e as exposies e simpsios como o Emoo Art.ficial promovidos pelo Itacultural, e o Prmio Cultural Sergio Motta de Arte e Tecnologia criado em 2000, e no Rio de Janeiro, a revista eletrnica Canal Contemporneo, o FILE Rio e o Centro Cultural Telemar, criado em 2005 e hoje conhecido como Centro Cultural Oi futuro. Comparando-se a verso anterior do Emoo Art.ficial 1.0 de 2002 com a 2.0 de 2004 o ttulo Divergncias Tecnolgicas parece apontar para as apropriaes divergentes da tecnologia digital. Na verso 1.0 de 2003 vimos a representao dos centros de pesquisa internacional. Dos centros e laboratrios que foram representados estavam o ZKM, MARS e ART+COM da Alemanha, Iamas do Japo, Ars Eletrnica do Future Lab de Linz, ustria, V_2 da Holanda, Mecad da Espanha, Experimenta Media Arts da Austrlia, Daniel Langlois Fondation e Banff New Media Institute do Canad, Wro Center for Media Art Foundation da Polnia, Sarai/CSDS/RAQS Media Collective da ndia, Laboratrio Arte Alameda do Mxico e o Italab do Brasil. Certamente importante para a formao do pblico, aquela exposio trazia bastante da vanguarda em termos de pesquisa em arte e tecnologia de ponta. A nica artista brasileira a compor junto aos estrangeiros o panorama de arte e tecnologia foi Regina Silveira que tinha seu trabalho Descendo a escada exposto representando o Italab. Os demais artistas brasileiros como Gilbertto Prado, Diana Domingues, Suzette Venturelli, Tnia Fraga, Silvia Laurentiz tiveram apenas no simpsio da verso 1.0. a chance de exporem seus trabalhos.

J na verso 2.0 expuseram muitos dos artistas brasileiros atuantes em arte e tecnologia como Diana Domingues, Tnia Fraga, Rejane Cantone e Daniela Kutschat, Lucas Bambozzi, Wagner Garcia, Giselle Beiguelmann, Simone Michelin, Maurcio Dias e Walter Riedweg, Suzette Venturelli, Eduardo Kac, Maria Luiza Fragoso, Ktia Maciel, Ccero Incio da Silva e Paulo Bruscky.

Diana Domingues apresentou em sua instalao multimdia, Imito Zapping Zone, um sistema robusto que respondia aos inputs do pblico em um espao penetrvel. O sistema permitiu ao pblico interagir com a obra. O pblico mesmo o no especialista se sentia atrado a experienciar seu espao. Isto se deve a vrios fatores que queremos comentar. Um deles o fato de que os mecanismos ilusionsticos das outras instalaes, quando rapidamente apreendidos, desmotivavam o pblico a retornar. Outro se deve ao hermetismo de certos trabalhos, como o de Minerva Cuevas ou o do Knowbotic Research tecnicamente mais complexo, que pareciam pouco convidativos ao pblico. Tambm tecnicamente mais complexo o de Christa Sommerer parecia requerer um pblico especialista e os trabalhos exibidos na sala de vdeo do artista Ressler, que mesmo no exigindo um pblico especialista requeriam um maior tempo de observao, aumentando a permanncia na sala, pareciam no reverter a impacincia dos visitantes. No de Christa Sommerer as pessoas no interagiam o suficiente para entender o quanto criar o texto implicava na criao gentica da planta digital.

As instalaes tinham de ser de fcil apreenso como a de Antoni Muntadas ou tinham de apresentar uma maior participao como a de Diana Domingues. O que nos leva a crer que o pblico de uma tal exposio pensa a cultura como entretenimento e navega na Internet pulando de site em site quando desmotivado.

Nesse sentido a lgica do Imito Zapping Zone muito apropriada. Um espao pop com bugigangas as mais variadas e dois teles nos quais eram projetados as imagens do mito referente ao objeto escolhido. O objeto escolhido pelo usurio quando passado no leitor de cdigo de barra disponibilizava lado a lado nos teles clips de vdeo, cones em 3D, e frases resgatadas da Internet sobre Evita Peron ou Sena, por exemplo. A miscelnea de atrativos aos sentidos da instalao no desvenda facilmente sua estratgia imersiva e faz do pblico um refm fcil. Imito Zapping Zone atrai por considerar corretamente o pblico como um vido consumidor e como tal enderea a ele a linguagem do mercado.

Numa exposio e simpsio que discutiu a politizao do debate das mdias digitais, que se propunha a denunciar as geopolticas, as estruturas de poder do capital que financiam os centros de pesquisa tecnolgica, e a formar um novo pblico, Imito Zapping Zone realmente provoca tanto os adeptos da exaltao puramente tecnolgica quanto os das discusses mais politizadas. Porque a instalao no usou uma linguagem erudita e hermtica da alta cultura das salas exibitivas da arte mais intelectualizada, que certamente estaria na contra-corrente do pblico vido das mdias seja o televisivo ou o da Internet.

Assim comparando a esttica de Diana Domingues com a de Minerva Cuevas, o que a primeira seduziu o pblico usando a mesma linguagem do mercado e a segunda instrumentou o pblico a lutar contra a estrutura deste mesmo mercado. Entretanto o Hobbin Hood de Minerva era pouco sedutor e a linguagem usada assptica, o que distanciou o pblico para o qual endereado e que se beneficiaria de sua proposta.

Atiando ou amainando o fogo

A cultura das mdias digitais com a predominncia do suporte eletrnico e o domnio cada vez maior da informtica, alteraria segundo Mario Pedrosa a percepo, sendo a expresso substituda pela comunicao, e a arte pelo Design a servio da ideologia industrial. Para o autor a relao cada vez mais estreita dos artistas com a esfera de produo material, caracterstica da produo miditica, s responderia s leis do mercado e serviria alienao, no se tornando nunca em instrumento de emancipao e de controle.

O cenrio atual se compe de um lado do lustre dos brasileiros cultuados e globalizados e do outro do surgimento das massas excludas da cidadania, que adquiriram o estatuto de consumidores em potencial ditando os gostos e os formatos a serem vingados como um mercado emergente consolidado. Por esse motivo so importantes os recentes esforos de incluso digital para reduzir a desigualdade de acesso aos bens e instrumentos de conhecimento informatizados.

As poticas das mdias digitais como na arquitetura dependem principalmente das condies materiais, mas sobretudo de um aparelhamento que inclua recursos humanos informatizados. H a obrigatoriedade de uma infraestrutura tecnologicamente cada vez mais sofisticada assim como de profissionais especializados. Paulatinamente a iniciativa mesmo que tmida de investir em pesquisa tem sido um fato. No Brasil podemos falar que a produo potica das mdias digitais, a exemplo da arquitetura que no passado foi um projeto construtivo vindo de fora, outro transplante estrangeiro sofrendo uma aclimatizao local, dada agora s massas emergentes. Cabe destacar que as solues diante das limitaes locais de acesso s tecnologias sofisticadas acabaram por gerar pesquisas inovadoras e poticas transgressoras que se utilizam dos meios low tech.

A atualizao da antropofagia do passado refletindo sobre a dificuldade de se criar um modelo cultural prprio se faz obrigatria na sociedade informacional globalizada. A reflexo mandatria pousa sobre as condies materiais de produo, as estruturas edificadas de distribuio e de circulao dos bens culturais como a arte.

A questo colocada pelo Emoo Art.Ficial 2.0 de 2004 no era apenas Como politizar o debate?, mas que atitude ter em relao a esse pblico que j no est mais interessado em alta ou baixa cultura, novas ou velhas mdias, e se a linguagem legitimada como artstica ou no.

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