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28/10/2015 ‘Para os indígenas, o pior momento é agora’ Jornal O Globo
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‘Para osindígenas, o
pior momento éagora’
Líder político e ativista Ailton Krenakcritica modelo de desenvolvimento
apoiado em extração abusiva de recursosnaturais
POR DANDARA TINOCO08/05/2015 6:00 / atualizado 08/05/2015 12:23
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O líder indígena Ailton Krenak no Parque Lage, onde livro com entrevistas edepoimentos será lançado Guito Moreto / Agência O Globo
RIO A face
que ficou
conhecida
pintada com
tinta preta de
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Veja tambémVÍDEO Três perguntas de Perfeito Fortunapara Ailton Krenak
‘A hostilidade enfraquece amobilização’, dizespecialista sobreliderança do Brasil em
ranking de violência contra ambientalistas
Onze regiões concentrarão80% do desmatamento
mundial até 2030
jenipapo em
protesto
durante a
Assembleia
Constituinte,
em 1987,
carrega as
marcas das
três décadas de militância por direitos indígenas, mas a
eloquência do discurso continua a mesma:
— Vamos confirmar nossa vocação para um país
extrativista? Estamos no século XXI e continuamos
lotando navios e mandando para fora — critica o líder
político indígena Ailton Krenak, afirmando que o país tem
associado seu crescimento econômico a um modelo de
desenvolvimento que esgota recursos naturais.
A proteção de
tais recursos, e
não interesses
políticos e
econômicos,
motiva a
incessante briga
pela
demarcação de
territórios
indígenas,
assegura:
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Devastação da Amazôniaaumentou 195% em marçode 2015
— Quando os
índios insistem
nessa
demarcação, estão insistindo em preservar áreas naturais
para gerações futuras — defende.
A história do líder político, nascido na baía do Rio Doce,
se entrelaça com a de organizações como a União das
Nações Indígenas e a Aliança dos Povos da Floresta. Aos
61 anos, Krenak tem agora entrevistas e depoimentos
reunidos em livro. O volume, da série “Encontros”, da
Azougue Editorial, será lançado hoje, às 18h, no Parque
Lage, Zona Sul do Rio.
Os krenaks foram expulsos de seu território e
muitos ficaram sem saber as suas origens. Como
foi a redescoberta desse povo?
Esse caso reflete uma realidade histórica do Brasil inteiro.
Os tupinambás, que viviam no litoral, foram considerados
extintos na virada do século XIX. Mas, na década de 90,
houve um grande ressurgimento dessa população em
Olivença, na Bahia. Eles reivindicavam sua autonomia,
seus direitos territoriais, e isso causou uma verdadeira
indignação nos políticos em geral. No caso dos krenaks,
não foi muito diferente. Quando Dom João VI chegou ao
Brasil com a família real, foi estimulado pelos colonos a
editar uma declaração de guerra contra os botocudos,
nossos antepassados. Houve política de extermínio contra
o povo indígena de Norte a Sul. A ocupação do Brasil é
feita em cima das terras indígenas, com o argumento
28/10/2015 ‘Para os indígenas, o pior momento é agora’ Jornal O Globo
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recorrente de que os índios não promovem o progresso
dessas regiões e que eles precisam ceder seus territórios
para o progresso. Essa é uma visão que está no núcleo da
ideia do Brasil, da ordem e do progresso.
O senhor começou a militar na década de 1980.
Qual a maior conquista dos povos indígenas de lá
para cá?
O grande momento foi a Constituição de 1988. Os povos
indígenas conseguiram cravar, no texto, um capítulo que
fala dos direitos dos índios e, pela primeira vez, a
Constituição brasileira afirmou a presença do povo
indígena como uma possibilidade perene. Na década de
1990, diante do risco que se abateu sobre os direitos dos
povos indígenas, fiz uma profecia dizendo que, quando
não houver mais lugar para os índios na Terra, não haverá
lugar para mais ninguém. A crise climática que o planeta
vive hoje é um atestado disso.
28/10/2015 ‘Para os indígenas, o pior momento é agora’ Jornal O Globo
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E o pior momento de lá para cá?
Para os indígenas, acho que o pior momento é agora. Eu
me pergunto se vamos transformar o Brasil num garimpo.
Vamos confirmar nossa vocação para um país
extrativista? Estamos no século XXI e continuamos
lotando navios e mandando para fora. Diante de uma
crise, a única esperança que nossos administradores
enxergam é vender o país em troca de uma melhor
posição no ranking das economias mundiais.
Como se
situa, neste
momento, a
PEC 215,
que
transfere
do
Executivo
para o
Legislativo a aprovação de demarcação de terras
ocupadas por indígenas?
A PEC 215 é uma caricatura do momento político que o
Congresso está vivendo. Junto com ela, há um elenco de
umas 90 propostas de emenda à Constituição que
dissertam sobre o mesmo tema: acabar com os direitos
sociais. As pessoas não entendem a demanda que os
índios têm pela demarcação de suas terras, acham que os
índios têm uma demanda econômica, política, mas não é.
Quando os índios insistem na demarcação dos seus
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territórios, estão insistindo em preservar áreas naturais
para gerações futuras. Não só para os índios, mas para
todas as pessoas, que vão continuar tendo água, floresta e
rios.
Relatório recente da ONG Global Witness
mostrou que cerca de 40% dos ambientalistas
assassinados no mundo são de origem indígena.
Os chamados povos indígenas guardam os últimos
redutos de florestas, de água, de recursos naturais. Hoje, é
como se estivéssemos experimentando um novo ciclo de
renovação das economias globais, que está sendo feito na
forma do saque. Diante desse saque, os primeiros que
morrem são os guardiões da natureza: povos indígenas,
seja na Ásia, na Oceania ou nas Américas.
Com frequência, discutese a existência de uma
identidade indígena. É possível e desejável a
construção dessa identidade, uma vez que o
Brasil tem mais de 300 etnias?
Os portugueses chamaram as pessoas que encontraram
aqui de “índios” porque pensavam que estavam indo para
a Índia. Mas não existem índios. Esses povos têm
designação própria. Os krenaks se chamam “burun”, que
significa “seres humanos”. O povo xavante é “a’uwe
uptabi”, que tem significado parecido. Todos esses povos
se autodesignam “seres humanos”. Quando penso na
possibilidade de diálogo e de respeito à demanda dessas
populações, não penso num punhado de gente querendo a
mesma coisa. Penso numa imensa pluralidade, em
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estágios diferentes de relação com o mercado, com a
tecnologia, com a língua portuguesa. Essa é uma
variedade que, se fosse percebida em sua potência,
poderia contribuir muito para sermos uma sociedade
mais rica.