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entrevista com paulo bruskcy

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Alto retrato, 1978Fonte das imagens: Paulo Bruscky,arte, arquivo e utopia. São Paulo:Companhia Editora dePernambuco, 2006

Entrevista com Paulo Bruscky realizada por Arte & Ensaios, com Simone Michelin,Felipe Scovino, Maria Luisa Tavora, Ivair Reinaldim e Ronald Duarte no ateliê desteúltimo no Rio de Janeiro, em 19 de junho de 2009.

Simone Michelin Como se deu seu envolvimento com a arte postal?Paulo Bruscky A arte correio é uma das coisas mais importantes que aconteceu na minhavida. Minha trajetória enquanto artista iniciou-se quando entrei em contato com a artecorreio, porque nós já éramos uma internet antes da internet.SM Quando foi isso?PB Eu tinha feito parte do Poema/processo, um movimento integrado não por toda aAmérica Latina, mas por Uruguai e Argentina. O Poema/processo já contava com publica-ções tipo envelope que circulavam. Já tinha alguns contatos na América Latina e entãorecebi um [correio] de Robert Rehfeldt, que pertencia ao Fluxus na Alemanha, no início dosanos 70; entrei no circuito bem no início, quando ele começa a estourar no mundo, porqueera o único meio de comunicação não controlado. Hoje é um processo eletrônico, mas fizuma pesquisa no Recife, quando participei da Bienal de São Paulo de 1981, com curadoriado Walter Zanini, que demonstra que era preciso mais da metade da população para fazero controle do fluxo de correspondência que entrava e saía do Recife. É claro que haviapessoas que eram vigiadas, como eu, que recebiam muita coisa e estavam sempre abrindoe recebendo muitas correspondências violadas. Rehfeldt é alguém com quem mantive umacorrespondência constante, assim como Edgardo Antônio Vigo (correspondências, aliás,que estou emprestando para a próxima Bienal do Mercosul), Horácio Zabala, Ken Friedmane Dick Higgins. Uma coisa engraçada é que quando encontrei algumas dessas pessoas noexterior, a sensação era de que nos conhecíamos a vida toda pela quantidade de corres-pondência trocada e pelo fato de que discutíamos sobre tudo, porque a obra na verdadeera a informação. Hoje os colecionadores, as instituições estão correndo atrás da compro-vação dessa troca de informação, do registro que ficou. Isso foi muito importante, porquesempre morei em Recife, que é uma cidade isolada. Nunca senti necessidade de sair de lá,e, como Ezra Pound dizia, você tem que conhecer sua aldeia para depois chegar ao mundo.E, através desse contato, fui ampliando minha obra e trabalhando o próprio conceito. Artecorreio, na minha vida, na minha trajetória é fundamental.Felipe Scovino Quais foram seus parceiros?PB Tem Simone Michelin. No Rio de Janeiro tem Samaral, que editava um envelope fantás-tico chamado Experiências, desde o começo do movimento também. Tem o Almandradeem Salvador e o Leohard Frank Duch que era alemão e voltou há uns 20 anos para lá. J.Medeiros, de Natal, que criou um Núcleo de Arte e Cultura. Medeiros e Silva em Natal. Auniversidade lá foi muito ativa no movimento; o Instituto de Arte de Porto Alegre também.

Em outra vida acho que fui arquivista

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SM Lembrei de Bené Fonteles.PB Claro. Sem dúvida.SM E como a questão do livro de artista se insere em sua trajetória?PB O livro de artista é um meio de trabalho de que gosto muito. Tenho um acervo commais de mil livros de artista. Na arte correio, a importância é que você circulava tudo,incluindo poesia sonora. Você enviava a fita com seus trabalhos, o catálogo era uma fitacassete. Discos gravados na Europa, objetos, tudo veiculava. E eu aproveitei muito a legisla-ção questionando a própria burocracia dos correios com algumas intervenções que fiz,como o envelope de dois metros. É claro que sabia que ia ser barrado, mas fui num horáriode pique à agência, e os correios naquela época fechavam às seis. Às cinco horas fui peloCentro da cidade com o pessoal carregando o envelope e uma multidão foi acompanhandonaturalmente. Quando cheguei ao correio, a polícia foi chamada, e eu queria que me disses-sem por que não podia enviar a carta. A lei do correio modificou por causa disso, porquenão havia um limite de tamanho de envelope. Mandei o envelope para Zabala e para Vigo,que organizava uma exposição numa galeria na Argentina, e o mesmo foi pendurado comessa ação sendo projetada sobre o envelope. Fiz uma ação chamada Sem destino, realizadaentre 1975 e 1983, porque a lei do correio diz o seguinte: “se não encontrar o destinatário,é obrigado a devolver para o remetente”. Nos envelopes havia questionamentos sobre ogoverno militar brasileiro e ironias com a própria história da arte. Colocava os envelopes nascaixas de correio, selava e pedia para os amigos devolverem. Quando viajei para o exterior(primeiro para Nova York, em 1981, e depois Europa) continuei fazendo essa ação. Fiz umalista em que analisei que grande parte das cartas não foi devolvida, e países democratasviolaram. Comprei um selo na Alemanha Oriental e depositei a carta numa caixa naAlemanha Ocidental. A carta voltou, mas fizeram um retângulo ao lado do selo, como sedissessem que o selo era da outra Alemanha. Devolveram a carta para Recife porque atráshavia o endereço de minha caixa postal.SM Tinha a questão da cortina de ferro ainda? Não podiam ser trocadas correspondências?PB Teve um problema: quando cheguei na Alemanha Oriental, tinha escrito para Rehfeldtda Itália dizendo que ia visitá-lo; fui bem cedo porque eu não podia dormir, tinha que sair nomesmo dia, e o último trem era às 24h e então peguei o primeiro trem e, quando chegueina estação e liguei, ele disse que não estava sabendo e que não tinha recebido a correspon-dência. Perguntou se eu tinha o endereço do estúdio dele e eu disse que sim. Fui, me senteidefronte e daqui a pouco a cortina se abriu. Pensei que ele não tinha chegado ainda, mas elefez um sinal e, o engraçado é que a primeira frase que ele disse foi “Você foi preso no seupaís por ser considerado comunista e eu fui preso no meu país por ser considerado demo-crata, no entanto, mais de 10 anos que temos de correspondência, temos um pensamentomais ou menos parecido, e no nosso trabalho existe uma identificação também, como ficaisso?” Nossa discussão começou por aí. Ele ligou para os amigos dele, chegou um cara numtáxi, que era amigo dele, e eu entrei e ele disse que ia depois. Já estavam todos no estúdioe começamos a beber e a conversar sobre os trabalhos e, na cachaça, me esqueci dohorário. Cheguei 0h20m na estação, e a polícia já estava me esperando, me levaram parauma sala e me revistaram todo, abriram minha pasta e perguntaram o que era aquilo e eu

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Fotos do ateliê de PauloBruscky, Recife, 2004

disse que era dos artistas dali e que queria fazer uma exposição no Brasil, então eles disse-ram que não iam atrasar mais o trem e me mandaram entrar logo... Esse diálogo foi emconsequência de toda essa troca de informações que não tínhamos, e ele é um cara quetem um grande acervo. Na penúltima Bienal, aliás, eu passei todas as informações; conheçotoda a produção do leste europeu, tive contato com todo o pessoal da vanguarda dos anos70 e também tenho documentação. Cristina Freire foi a Recife, passei todos os endereços emostrei o material desse pessoal. Artpool, e na Hungria houve um centro, um dos maioresdo mundo, e György Galánti fazia tudo sozinho. A produção deles é interessante demais;como era proibido meio de reprodução naquela época no leste europeu, eles sobressaemna fotografia, na gravura, de uma forma que era a única maneira que eles tinham de fazer,uma produção maior de múltiplos para poder participar da arte correio. Fiz uma análise daprodução do leste europeu e é de um grafismo fora do comum.Maria Luisa Tavora Você tem isso escrito?PB Estou catalogando meu acervo; não tenho muita disciplina, mas estou organizando, emeu filho está me ajudando. Já está tudo informatizado. Tenho correspondências com oGrupo Gutai, com o Murakami e Choi Shozo Shimamoto. Murakami participou de umaexposição que fiz em 1981. Com o Shozo mantenho contato até hoje. Ele usa a cabeçacomo suporte; esteve recentemente em Paris, até me pediu um projeto para a cabeça dele,e eu mandei, e ficou no Pompidou executando os projetos que enviaram para ele. Certodia, passando numa rua perto de onde trabalho, havia uma construção e vi um buraco naparede que parecia com a cabeça dele. Fotografei e mandei para ele, mas ele passou umtempo sem me escrever; acho que não gostou muito da homenagem! [risos]MLT Seu pai era fotógrafo, russo e fez parte de uma trupe circense. De que forma essascaracterísticas podem associar-se a seu trabalho?PB Antes de 1964, as festas eram comuns lá em casa. Vários tripulantes dos navios queaportavam no Recife seguiam para o terraço de casa e ficavam dançando e se divertindo.Aquilo me deixava muito impressionado. Desde pequeno eu conhecia uma máquina foto-gráfica antiga, tipo Polaroid russa, porque papai tinha (até hoje tenho uma). Quando viajava,e ainda não existia a digital, levava a Polaroid e uma câmera normal. Fazia primeiro a foto naPolaroid, como experiência. Tenho muitos trabalhos feitos com ela. Papai desenhava e tinhaum restaurante, o Volga, de comida russa. Ele desenhava na própria bandeja. Tinha tambémum ateliê fotográfico defronte a esse restaurante. O restaurante faliu, porque em determi-nada hora ele fechava com os amigos russos e ficava festejando. Eu estudava pela manhã eà tarde ia para o ateliê; vivia de castigo, pois fazia muita traquinagem; e, naquela época ele

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Paulo Bruscky & DanielSantiagoFogueira, 1974

me dava umas fotos 3x4 para ampliar e depois eu colocava na moldura. Os amigos delechegavam lá e diziam “vim buscar meu retrato”, pagavam e nem sabiam que era eu que tinhafeito. Eu queria achar um desses retratos ampliados, devem ser terríveis!MLT Nesse momento começou sua relação com a fotografia, com a arte?PB Eu sempre desenhei, nos meus cadernos. A professora estava falando, e eu desenhan-do, inclusive ela. Fiz uma exposição no corredor na escola. Ela tinha uns peitões, e issodeu o maior rolo.MLT A ironia já estava presente. Você é um andarilho cotidiano; o artista circense tambémé um andarilho. Essa experiência teve influência, além da fotografia?PB Eu tinha muito contato com o pessoal estrangeiro que era amigo de papai; iam muito aorestaurante, e eu ficava ouvindo as conversas. Tudo isso teve importância na minha maneirade ser, de agir, na minha formação.Também vou buscar coisas na infância... era genial morar em rua descalçada. Outro dia fiz umagravura: quando criança, costumava pegar um ferro de construção afinado, que era para fechare aprisionar o adversário com linhas retas; a partir dessa memória, quando eu vi uns papéisem cima de uma chapa, peguei-os e fui para o ateliê, fiz uns furos com prego e fui para JoãoPessoa, no Clube da Gravura tirar cópias; saíram 12 cópias só; eu sabia que ia rasgar. E outrostrabalhos também vou buscar na infância – esse da capa do meu livro [Paulo Bruscky: arte,arquivo e utopia, organizado por Cristina Freire em 2006 e editado pela Companhia Editorade Pernambuco], uma instalação que fiz. A sentinela [Boa Noite], que se botava para espantarmuriçocas... e eu ficava sentado pela manhã; era bonito, batia um cinza em forma de espiral.Mamãe ou a menina que trabalhava lá em casa me chamavam e diziam que eu estava atrasado;e então fiz essa instalação no ano retrasado, chamada Boa noite, na vitrina da Galeria Amparo60, no Recife. Tive até um problema, eu e o fotógrafo, porque ficamos dentro da vitrinafazendo as fotos, em vários experimentos, e nos intoxicamos.

Dorsos da Liberdade,1989

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MLT A memória está sempre muito presente em sua obra. Você também trabalha o cotidiano.SM E o arquivo também.Ivair Reinaldim E a poesia? onde entra? Ela é uma constante em seu trabalho.PB Sempre tive mais amigos da literatura do que das artes visuais. Primeiro porque, hojemudou um pouco, mas evitava discutir, senão não ia ter mais nenhum amigo de artes. Além dapoesia visual, estou lançando este ano um livro de poesia, que escrevo desde os anos 60,chamado Fragmentos (Poesia de um artista). Não me considero um poeta; uma vida só écurta para tudo, você não consegue acompanhar, quanto mais querer ser duas coisas numavida só; é impossível. Eu gosto muito de ler poesia.Ronald Duarte Você e o Erickson Luna, o poeta maldito de Recife, compartilham essa ideia.PB Conheço toda a turma marginal. Tenho, aliás, um importante acervo da poesia marginal.Eles são muitos no Recife. O Mercado da Boa Vista é o lugar que eles frequentam, no sábadopela manhã, além do meu ateliê, que é onde encontro com amigos no sábado, e é sagrado: opessoal já vai com a cachacinha, leva poemas, filmes. Eu gosto de estar sempre conversando.FS Sua obra é muito marcada por um diálogo entre os meios de comunicação, a transitorieda-de e isso que estamos chamando de arte. Temos a artecorreio, depois a fax arte, artdoor, prática da qual você é opioneiro. E a internet? Como é que você se posiciona frentea esses novos meios de comunicação?

PB Nesse meu livro novo tem uns poemas que chamo dee-mail art. Há vários anos venho trabalhando isso; é ondeentra a ironia. Quando se começa a trabalhar com o cor-reio, entram todas essas questões que você levantou: tele-grama, telex e o fax, que para mim foi uma experiência, feitacom o Roberto Sandoval em São Paulo – ele lidava comdesmaterialização e rematerialização do objeto em qualquerlugar. Esse processo, até chegar a internet, é umaconsequência normal. É como o teletransporte: avião vaiser coisa do passado. Há alguns anos disse ao Newton Gotoem Curitiba durante uma mostra de vídeos: “aproveita efica com as cópias do meu filme”, porque, se você trabalhacom meios de comunicação, não deve elitizar seu trabalho.A Anna Bella Geiger pediu a palavra porque discordou demim quando doei os filmes. Ela afirmou que deixaria osdireitos autorais para o neto. E eu perguntei a ela: “o que éque você tem contra seu neto?” [risos]. Você querer viverde direito autoral de filme de artista? Os meios de comuni-cação sempre me fascinaram por essa abertura, de vocêestar informado e ser informado. Fiz jornalismo, sempre tiveemprego paralelo para fazer o que queria, como queria eonde queria, e nunca submeti meu trabalho a nenhum tipode coisa. Nunca procurei crítico nem galeria.

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MLT A propósito, certa vez você disse a seguinte frase: “Hoje a crítica é uma prostituição”.O que estava querendo dizer com isso? É uma observação geral à crítica? E a que se referiacomo prostituição?PB É claro que tem exceções, estou me referindo a 90%. É um táxi, você entra, diz paraonde quer ir e diz quanta grana tem. Você paga a corrida da genialidade de acordo com odinheiro que tem. Você diz que quer chegar em tal lugar; ele já tem a mídia junto com ele,já está incluído nessa corrida. Então, é muito fácil você ser um artista hoje conhecido atravésde um táxi.MLT Você nessa ocasião chamou a atenção para exemplos de críticos que seriam exceção.E nomeou Mario Barata. E mais recentemente?PB Cristina Freire e Tadeu Chiarelli são pessoas que você não vê muito. Você tem acesso acatálogos de críticos que não estão preservando o texto, a inteligência deles e estão escre-vendo sobre fatos que acho que não deveriam escrever.MLT Que crítica, a seu ver, tem mérito? Assim como você diz que hoje a crítica é umaprostituição, há outra crítica que para você não é prostituída. Como essa procede?PB Através de um estudo sério de movimentos, textos, da própria imprensa e publicação delivros. Destaco o livro Escritos de artistas, organizado pela Glória Ferreira, pois, se o artistaescreve, ele é capaz de fazer um texto mais sincero e objetivo do que a crítica, porque nãotem floreio. Acho que a contribuição da crítica é se aprofundar mais no que está se fazendo.Tem uma bibliografia muito pequena no Brasil sobre arte contemporânea. Agora que estãosendo publicados estudos sobre Flávio de Carvalho, por exemplo, que possui uma impor-tância fundamental dentro da arte brasileira. Eu e Cristina fomos lançar o livro em Brasília econheci o fotógrafo que viajou com o Flávio. Tenho um livro dele, Experiência número 2.SM Só tem a número 2.FS A número 1 supostamente seria um afogamento simulado na adolescência Ele se lançounum lago e quase morreu afogado. Isto ficou muito vivo na memória dele. A Experiêncianúmero 2, a de que você está falando, é a da procissão de São Paulo em 1931. E a número3 é o New Look, traje para o verão, de 1956.

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Seleção de envelopes,década de 1970arquivo Paulo Bruscky

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PB E tem a número 4 que foi a da viagem à Amazônia que ele fez com esse fotógrafo. Estátudo documentado. A Cristina expôs no MAC da USP. Penso que a crítica deveria pesquisarfatos importantes da história da arte brasileira. É claro que não existe uma arte brasileira,mas o que foi feito aqui no Brasil, artistas que têm importância na produção nacional. Recen-temente estava vendo a exposição de Duchamp, no MAM de São Paulo, e encontrei aAracy Amaral. Ela me disse que um americano esteve em São Paulo e comprou toda acorrespondência do Duchamp para Maria Martins.RD Deve ter sido o mesmo americano que comprou a coleção Leirner!PB Já não deveria ter sido publicado um livro com essa correspondência? Acho que precisa-mos investir em pesquisa, ir atrás de coisas que sabemos. Não sou crítico, mas vivo fuçando.Essa série que a Glória Ferreira está fazendo junto à Funarte é importante: estudar osnúcleos como o NAC da Paraíba, que contou com o Antonio Dias e o Paulo Sergio Duarte,assim como o NO de Vera Chaves Barcellos.MLT Você falou da história do táxi e, por outro lado, faz algumas críticas em relação aoartista que quer ser alguém consagrado esquecendo a verdade da arte. Qual é essa verdadeda arte que está referindo? Arte tem verdade?PB Não sei, nem quero saber o que é a arte! Acho o mercado de arte parecido com osupermercado e penso que essa ansiedade dos artistas é que batiza tudo. Essa preocupaçãode ter alguém escrevendo, de ter reconhecimento, de estar na mídia, em coleções. Essaansiedade assassina muitos artistas.MLT Você ainda acredita numa verdade da arte?PB Não sei, acredito na vida. É como a vida, uma coisa tão triste e bonita. Eu tirei a questãoda utilidade da ideia. Meu ateliê é cheio de coisas que não sei por que estão ali, coisas queapanho na rua. É como se eu fizesse a eles essa pergunta que você me fez.SM Você disse que não existe uma arte brasileira. Essa discussão é boa por conta da próxi-ma edição do Panorama da Arte Brasileira, que terá curadoria do Adriano Pedrosa, em quenão haverá nenhum artista brasileiro. O que você pensa disso?PB Acho que tem que perguntar a ele [risos].

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Xeroperformance, 1980

RD Talvez ele não saiba.PB Quando soube, me veio a questão da Bienal do Vazio. Acho que o Ivo Mesquita deveria terassumido a ideia inicial e no fim terminou sendo uma Bienal igual às outras, ou pior, porquemisturou a ideia básica que é a questão do vazio, do que é o nada e do que é o nunca, que sãoduas coisas diferentes. O Ivo recuou, ele não teve coragem de levar adiante a ideia, e aspressões foram grandes. Há uma coisa engraçada que acontece nas bienais, porque coinciden-temente as galerias estão sempre expondo os artistas que estão na Bienal. Faria essa perguntaa ele. Tanto artista bom, nunca vi uma produção tão boa sendo feita pelos artistas mais jovens,e sempre assistimos aos mais antigos. Sei disso porque viajo e procuro, em cada cidade quevou, procuro ir aos espaços, conhecer os artistas, vou a sebos, compro catálogos. Interessa-mesaber o que está sendo feito. Em outra vida acho que fui arquivista, se é que existe outra vida,pois não acredito. Gosto da coisa do arquivo, compro catálogos e aqui mesmo no Rio jácomprei catálogos do evento Interferências Urbanas que acontecia em Santa Teresa. Nosanos 60 e início dos 70 era o happening, depois vem a performance e aprisiona a ação; nosanos 80 devolve-se a ação para a rua de novo. Você tem que sacudir as pessoas para elaspoderem pensar, principalmente na época da ditadura, quando era proibido juntar duas, trêspessoas. Eles [censores] eram adestrados para ver subversão em tudo.FS Incomoda o fato de as interferências urbanas hojeem dia terem virado modelo ou uma categoria? O seutrabalho nos anos 70 é uma experiência que fica, decerta forma, à margem. Você não precisava da aprova-ção de um órgão competente do Estado para criarseus trabalhos. Hoje há editais para a realização de in-terferências urbanas, prêmios para intervenções na ci-dade. Projetos passam por avaliações de uma comis-são julgadora. Cada um é eleito como bom ou ruim,recebe notas, passa por uma oficialização que na épo-ca em que você fazia, e ainda faz, isso não acontecia.PB Não tenho nada contra. Às vezes são artistas quenão têm condições de realizar um projeto, e acho queé válido. Você obedece a determinadas normas, umaação com o regulamento de um salão, uma coisa maisaprisionada. Grande parte da minha geração, para rea-lizar uma intervenção urbana ou exibir filme de artista,tinha que pedir ao Serviço de Censura e DiversõesPúblicas. Nunca me submeti a isso. O dia que eu sofrercensura, me mato. Acho que uma pessoa não podeter censura nenhuma. Já fui preso, mas nunca submetimeu trabalho. Faço para não endoidecer. Não tenhopreocupação imediata em expor, é uma consequência.IR Quando você enviava trabalho para os salões, haviaa expectativa de poder diluir esses limites da institui-ção ou você já achava propriamente que não seria acei-to? Como se dava essa relação?

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Fluxus - I, 1993

PB Fui recusado a minha vida toda. Foram raros os salões de que participei, a não ser o doRio Grande do Sul. Mas fui tão recusado, que Cristiana Tejo tem um projeto para a produ-ção de um livro. O trabalho Expediente que Felipe Chaimovich viu e expôs, e que ganhouprêmio de aquisição no MAM-SP, foi recusado num salão em 1978. Fui recusado a vidatoda. No Salão da Eletrobrás realizado no Rio, o júri queria que o artista usasse elementosreferentes a eles. Peguei uma célula fotoelétrica e havia um alvo dentro do MAM com trêsplataformas em diferentes lugares. Havia as instruções e com elas você tinha conhecimentode que deveria ser rebatida a luz do sol, para que ela fosse jogada para uma plataforma doMAM e posteriormente para o interior do Museu na tentativa de acertar o alvo que por suavez ligava a célula fotoelétrica e acionava um rádio que, quando ligado, passava o projeto.Foi recusado pelo júri.SM Em que época foi isso?PB 1971. A curadora Victoria Noorthoorn está levando uns 12 ou 15 desses projetosrecusados para expor na próxima Bienal do Mercosul.RD Esse fato me lembra o trabalho que fiz em Recife chamado Brilho dos olhos, em que 16artistas usando espelhos tentam construir uma passagem do brilho do sol por cima do curso do rio.PB Recife tem uma geografia incrível para se trabalhar na rua. Eu trabalhei muito sobre aspontes. Fiz um projeto para ARoS [Aarhus Kunstmuseum], na Dinamarca, sobre a geografiada cidade, em 1978, que eram cinco artistastrocando correspondências: cinco de Recifee cinco de Aarhus, que, sem se conhecerem,escreveriam sobre o que quisessem. No mes-mo dia, de acordo com o fuso horário, sairi-am os aviões com os cinco de Aarhus paraRecife e os cinco de Recife para Aarhus. Fizisso aqui em Brusque, na exposição Brusckyem Brusque. Portanto, eles se cruzariam noespaço e, quando chegassem, os artistas pas-sariam uma semana vivenciando, sem falarcom imprensa nem com ninguém e depoisfariam um debate público: a cidade que elepensou e a cidade que ele vivenciou, ou aque-las questões que ele levantou sobre as pes-soas ou a própria geografia da cidade. O pro-jeto foi aprovado, mas no fim não hou-ve verba para realizar. Então eu fiz nacidade de Brusque, com apoio da pre-feitura. Peguei um avião até Curitiba,depois um carro e fui fotografando.Vai sair nesse livro novo que estoupublicando. Cheguei na cidade, mehospedei e depois fiz um debate dis-so “o que era Bruscky em Brusque”ou o que tinha pensado sobre

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Brusque. Pedi a prefeitura que mandasse endereço de pessoas que não fossem ligadas àarte, de profissões diferentes e troquei correspondência. Fiz o debate dessa vivência.MLT Mas, afinal, você tirou partido? Foi positivo para você o fato de ser sido recusado nos salões?PB Nada teve importância para modificar a minha maneira de ser ou pensar, tanto faz seraceito ou recusado. Cristina fez esse livro porque achou umas coisas minhas jogadas noMAC-USP da época do Walter Zanini. Ela ficou se perguntando: “quem é esse cara doRecife de quem nunca ouvi falar?”. Então começou nosso diálogo, em função dessas coisasque estavam em São Paulo. Eu tenho cerca de 60 cartas da correspondência com o Zanini.Eu era muito jovem, tinha 17 anos, e entrei no Jovem Contemporâneo [Jovem Arte Con-temporânea – JAC], e meu desenho saiu de cabeça para baixo no catálogo. Escrevi dizendoque tinha achado genial com 17 anos ter entrado no Salão e o desenho ter sido publicadode cabeça para baixo. Ele me escreveu e a partir daí começou nossa amizade. Aquilo queCristina Freire colocou no livro Poéticas do Processo e diz quando perguntou a ele o queera a crítica, o que ele achava, ele disse que aqueles que tiveram a coragem de subir a rampado MAC não entenderam. Vivem à margem da própria crítica. Os salões eram importantes,mas ao mesmo tempo eu fazia minhas intervenções urbanas e aarte correio. Um fato importante foi a criação de novos espaços.Tudo era espaço expositivo, principalmente vitrinas de lojas, livra-rias. Rompeu-se também com a ideia do espaço expositivo comolugar privilegiado. A primeira exposição no Brasil de arte correio,em 1978, ocorreu no hospital em que eu trabalhava, um lugar emque havia missa e velório.MLT Qual era a reação das pessoas nesse espaço?PB Trabalhei na década de 1970 com eletrocardiograma e radio-grafias. Havia um médico radiologista, Paulo Uchoa, que trabalhavano mesmo hospital, e Ypiranga Filho, que era operador de radiolo-gia e que tem importância também na arte correio; na hora doalmoço nós fechávamos a sala e fazíamos as experiências. GilsonEdmar me empresta o consultório, cancela tudo, uma manhã intei-ra ou tarde para fazer minhas experiências com eletroencefalograma.Transformo o consultório num estúdio. Ele sempre me emprestoulivros e me deu aulas sobre como funciona o cérebro. Uma dascoisas que Victoria está levando para Porto Alegre é meu projetoeletromusicado e uma experiência recentemente feita nos EUA, e amáquina de filmar sonhos. Santos Dumont tem uma frase de quegosto muito: “tudo que um homem pensar outros poderão realizar”.É uma pena que não avancem nas curas em determinados aspectosna medicina, como a diabetes; acho ridículo que em determinadasdoenças os laboratórios não tenham interesse.RD Você acompanha o avanço tecnológico?PB Fiz agora um filme, um projeto que foi aprovado no Second Life.

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Engenho doimaginário, 2002

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SM Tu fizeste algum avatar?PB Havia na equipe um profissional especialista específico para essa função. Essa junçãoentre cientista e artista é importante porque você não pode parar para se aprofundar emdeterminadas coisas, senão deixa de ser artista. Tem que procurar uma pessoa para traba-lhar junto com você naquilo que você quer. Eu transo mesmo com uma personagem [noSecond Life], que na vida real terminou a faculdade sendo prostituta para pagar o curso.FS Você fica incomodado com essas afirmações de aproximação entre arte e vida? Nãoconsigo conceber a diferença entre elas. Fico incomodado quando a crítica julga seu traba-lho como um projeto estético que aproxima arte e vida.PB É a mesma coisa. Desde Futurismo e Dadaísmo, essa era a questão. Um fato que recuseihá poucos anos, numa importante exposição em São Paulo, é me datar como artista dosanos 70. Estou vivo e produzindo, e vocês só me chamam por causa dos anos 70? Podemtirar meu nome!FS É a questão que a Simone colocou sobre o Panorama de Arte Brasileira: datar a produ-ção, ligar uma produção a uma identidade nacional ou país, criar associações como “arteconceitual latinoamericana”, “arte da performance sulamericana”. Penso que essa é umavisão da crítica de arte internacional sobre o Brasil. “Paulo Bruscky é aquele artista exótico,que carrega um envelope gigantesco pela rua”. A crítica cai nesse território dos clichês eacaba transmitindo uma potência menor ao seu trabalho, outro tipo de potência que nãointeressa a você e não interessa a nenhum de nós que somos críticos.PB Lidamos com esses estereótipos que vêm de um olhar de fora.RD Durante o período da ditadura no Brasil, onde você esteve escondido? Simone brincan-do disse “dentro dos arquivos dele, embaixo dos papéis”.PB Fiquei na casa de um amigo do meu irmão, que era cearense, em Piedade. Tirei abarba e fiquei lá.RD Uns quatro anos?PB Menos. Minha anistia estadual saiu há três anos, mas a federal só saiu agora.IR E você ficou escondido em que período?PB Entre 1973 e 76.IR Como foram os anos 60 no Recife durante o começo do golpe?PB Não foram ruins. O pessoal foi embora, e eu fiquei, principalmente porque era perigoso.Eu estava na lista dos que seriam mortos. Entreguei-me depois e disseram que eu tive sorte.Numa segunda oportunidade, cercaram a universidade e minha casa. Entraram armados, àpaisana. Eu escapei de morrer, fugindo. Sumi. Todo os meus amigos estavam sendo segui-dos. Foi quando fiz o Nadaísmo, por conta da denúncia que fiz. Quando fui solto, o coman-dante do quartel do Exército do Nordeste disse para eu ter cuidado porque havia especia-

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listas em acidente. Estavam me soltando, mas podiam me acidentar numa boa, como algonatural. Ele disse que havia pessoas treinadas no exterior só para isso. Falou para eu prestaratenção, que eu poderia me acidentar no mesmo dia e que algumas pessoas ficariam meseguindo. Saía de casa, e havia dois caras defronte. Ia para o trabalho ou para os bares, e elescontinuavam lá. Disse que ninguém poderia andar comigo, porque, se me matassem, mata-riam também quem estivesse comigo. Depois de seis meses, refleti que a única coisa quesabia na vida era ser artista; já tinha enfrentado tanta coisa, e se não os enfrentasse naquelemomento seria covardia. Foi quando vi os amigos que tinha. Pedi a galeria emprestada, aNega Fula, e comuniquei que ia fazer uma exposição que não teria obra. Perguntei aosamigos se poderia colocar o nome deles, porque seria uma exposição-denúncia. Alguns serecusaram, outros autorizaram. No dia da inauguração, com a galeria sem nenhuma obra,subi num banquinho e disse: “Esta exposição é uma denúncia, por isso o nome Nadaísmo.Aos dois canalhas que estão aqui dentro, digam para seu chefe, o comandante do QuartoExército, que não tenho medo de morrer. Vocês podem me matar. Não vou nem dizerquem são, porque não sou dedo-duro”. Meus amigos disseram que sairiam comigo, e eudisse que não queria ninguém andando comigo, porque agora que os tinha desafiado seriapior. Houve um período em que todo mun-do que olhava para mim era inimigo.IR Como foi a parceria com Daniel Santiago?PB Daniel foi preso em 1976. Cercaram mi-nha casa e o prédio dele. Ligaram para mim edisseram: “Você está cercado, não tem comofugir”. Respondi que não tinha feito nada parafugir, e ordenaram: “Coloque algumas roupasnuma sacola, não sabemos quanto tempo enem se você volta”. Disse à mamãe: “Estouindo preso, talvez me matem. Ligue para aimprensa e para o advogado”. Minha mãedesmaiou. Ela foi acordando, estava viva, pe-guei umas roupas e fui embora. A famosa ve-raneio estava em frente a minha casa, e opolicial disse: “Olhe pelo basculante, sua casaestá cercada”. Quando estava na prisão, che-gou Daniel. Ficamos em celas separadas. Eraescuro, não tinha luz; era apenas um buracono chão e um cano. Quando você ligava, ti-nha algum sistema que às vezes dava choque.No interrogatório me avisaram que poderiapegar não sei quantos anos de prisão. Disseque tudo bem e perguntei onde cumpriria apena se fosse condenado “Em Itamaracá”, meresponderam. Adoro Itamaracá. Contei aoDaniel que estava pensando em fazer umaexposição chamada Cicatrizartes. E ele dizia

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O que é arte? Paraque serve?, 1978

“cala a boca”; eu respondia: “Procuramos os caras que têm cicatriz, mandamos cortar aroupa e no dia de visita ficam todos com as roupas cortadas onde tiver cicatriz [risos].RD Vocês chegaram a fazer?PB Não. Depois nos separaram e nos levaram para outro lugar. Uma noite disseram quetinha chegado a minha vez, botaram um capuz e rodaram por uns 40 minutos, para que eunão pudesse saber onde estava. Em determinado momento, me empurraram e disseram“corra”. Era um lugar perto de uma desova conhecida. “Não vou correr, não; se vocêsquerem me matar, que me matem pela frente”, respondi, e os caras deram uma rajada. Sentiuma sensação indescritível e fez-se silêncio. Pensei que ia ser naquela hora, e enquanto elesficaram lá discutindo, eu escapei de morrer.SM Mas eles te prenderam depois de novo?PB Sim.RD Quanto tempo você ficou nessa agonia de prender, liberar, vigiar, prender de novo?PB Durante o governo do Fernando Henrique Cardoso, o SNI ainda possuía minha ficha.RD Ainda?PB Sim, eu estava na lista dos que seriam mortos. Participei da Passeata dos 100 mil, fuipreso, participei do movimento estudantil. Fazia os cartazes para os segmentos que havia naUniversidade Católica. Certa vez, a universidade foi cercada pelo Exército, e ficamos noúltimo andar. Eles quase nos mataram; se não fosse d. Hélder Câmara...IR Muitos conhecidos seus acabaram sendo mortos?PB Quando o reitor me deu asilo, eles cercaram a universidade. Meu irmão foi para láporque tinham cercado minha casa e disse que o Exército estava com cassetete e metralha-dora, dentro de casa. Na véspera, um colega da minha sala, que era espião, disse para eufugir porque se me pegassem me matariam. Pediu para não contar que tinha sido ele quetinha me avisado. Ele tinha aprendido a gostar de mim na convivência, nas farras, mas disseque se eu não fugisse me matariam. “Se você disser, sou o primeiro a ajudar a matá-lo”. Oreitor disse que se eu chegasse à Reitoria, teria asilo. Consegui me desvencilhar dos agentesno campus da universidade com a ajuda dos amigos e cheguei à Reitoria, onde o reitor meabrigou. Deixei terminarem as aulas e pedi um blackout em toda a universidade. Com issoconsegui fugir e cheguei no bar Mustang. Perguntaram o que tinha acontecido, e disse quenão tinha acontecido nada: tinha bebido e estava de ressaca. Fiquei bebendo e pensei quedeveria ir embora. Lembrei de uma namorada que morava na Vila dos Comerciários, ondeas casas eram todas iguais. Peguei um táxi, me deitei no carro segurando o [livro] ObraAberta e disse: “Casa Amarela, Vila dos Comerciários. Você não repare, mas quando bebotenho umas manias doidas. Eu gosto de ir deitado atrás no carro, lendo”. E o motoristarespondeu que não tinha perguntado nada. Cheguei à casa de Lucia e disse que queriaabrigo por apenas uma noite para não complicá-la. Contei a história e disse que não podiatomar uma decisão sem ser muito racional, pois era minha vida que estava em jogo. Ligueipara casa de manhã, sabia que estava sendo vigiado, meu irmão atendeu e eu disse: “Aqui é

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o Andrei, dançou dez horas”. Desliguei o telefone. Meu irmão achou que eu estava louco, etodos pensaram que eu tinha “dançado”, mas eu estava era marcando um encontro com ofotógrafo Edmond Dansot.Pausa e posterior retomada da entrevista.PB Vejo um perigo quando você não estuda a tecnologia que vai usar. Participei do Emoçãoart.ficial 2.0, mas 70% daquela mostra era showroom.FS O que você chama de showroom?PB Demonstração de marca. O ideal é você subverter a máquina, estudar, ver, fazer um tipode Frankstein: você deve humanizá-la, subvertê-la e trabalhar com o acaso e a ousadia. AXerox me deu uma semana de pesquisa gratuita em Nova York para fazer meus filmes, masa máquina enxerga com a luz. Pensei: se ela enxerga com a luz, vou devolver a luz a ela; etrabalhei com lentes e espelhos. Consegui encadeá-la e obter um campo de profundidadeque ela não dá, pois enxerga três milímetros à frente da luz. Isso você tem que saber, paratirar partido. Essa exposição no Itaú parecia um showroom dessas lojas de tecnologia.FS Você travou contato com Hudinilson Júnior?SM Aliás, parênteses, Paulo Bruscky inaugurou o espaço NO, naquela época do 3NOS3.PB Foi em 1979.FS O trabalho do Hudinilson é posterior ao seu, mas tem um diálogo muito fecundo.PB Fiz uma performance que se chama Xeroperformance, em 1980 na Universidade Cató-lica. Ateei fogo à máquina. Liguei para a Xerox dizendo que atearia fogo à máquina, e ogerente, que me conhecia e era legal, riu e eu desliguei. No dia seguinte liguei e pedi paramandar buscar a máquina, porque eu a tinha incendiado, e trazer outra. Fiz o filme, o títuloera LMNUNZ, fogo. Foram as letras que ficaram quando o fogo acabou. Juntei aleatoria-mente e dei o título, coloquei uma vírgula e a palavra fogo.Fiz cópia do corpo no começo dos anos 70, e a primeira vez que saiu publicado foi numlivro sobre xerografia nos EUA na década de 1970. Comecei com termofax, até hoje tenhoalguns, e nos EUA me incluíram nesse livro chamado Copyart.SM Os trabalhos não apagaram?PB Não; meus trabalhos de fax são todos guardados em sacos pretos. Adoro fax, fiz umaexposição em vários lugares chamada Cobra de várias cabeças, de acordo com o fusohorário do país. Ficamos trocando faxes entre os artistas, e depois de 24 horas havia 21exposições montadas. Fiz na Livraria Ipê Amarelo, de Curitiba. Na hora marcada mandei umfax em rolo; o fax estava pendurado e foi descendo meu trabalho. Fiz isso também emMadri, capital europeia da cultura; eles escolheram nove artistas para interpretar Juan Gris, eno fax pendurado foi descendo meu trabalho Natureza morta e fragmentada. Eu assassineia obra de Juan Gris, pois fiz uma série de cortes.

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SM Há uma interface entre a arte com fax e os atuais processos da arte que usam o temporeal. Pois o fax era exatamente isso: processo em tempo real.PB O fax me fascinou muito; tenho muita coisa feita com fax. Outro dia fiz uma espécie deretrospectiva na Torre Malakoff, no Recife, e me esqueci que Oriana Duarte, que dirigia oNAC/UFPE, tinha me convidado para uma exposição naquela instituição, no mesmo dia. Fizuma xeroperformance na Torre Malakoff e enviei na mesma hora por fax para a outra. Essaação foi filmada e transmitida para o NAC. Foi a solução que encontrei. Eu estive presentena abertura das duas.IR Essas experiências juntamente com os avanços da tecnologia ficaram estacionadas ouainda hoje há artistas que trabalham com arte postal?PB Tenho recebido recentemente trabalhos pelo correio de pessoas do começo domovimento.IR E fax?PB Não. De vez em quando tem algumas exposições envolvendo fax. Mas pelo correiotenho recebido do Bill Gaglioni, do Fluxus, que tem uma galeria especializada em carimbo naCalifórnia. Carimbo é outra coisa que me fascina. Em 1971 participei do Concurso deFormPlac de Pintura. Ganhei até o primeiro lugar porque ele foi dividido entre quatroartistas. Fiz um trabalho com pneu de carro. Eu pegava o pneu novo, dava um banho e, seassinasse, eles devolviam transformado em fórmica. Fiz 10 trabalhos individuais e 10 emequipe com o Daniel. Dei um à empregada quando ela casou. Certo dia fui almoçar na casadela e vi que ela tinha cortado a fórmica e feito uma mesa. Eu estava almoçando em cima domeu trabalho. Quando saiu o resultado, publicaram alguns trabalhos no jornal, inclusive esse,afirmando que alguns trabalhos foram inovadores. Menos de um ano depois, um artistaganhou um grande prêmio, numa exposição nos EUA com trabalho feito com pneu. Quan-do Agnaldo Farias chegou ao meu ateliê, vindo de uma Bienal na África, entreguei uma pastacom meus projetos. Ele pegou um telex de 1973 para um Salão de Curitiba e ficou exami-nando o trabalho. Não o conhecia e pensei que era pirado. Perguntou de quando era otrabalho e disse que aquele trabalho tinha acabado de ganhar o grande prêmio da Bienal. Aproposta era amontoar todas as embalagens das obras recebidas num canto do salão: “Artese embala como se quer”.MLT A perplexidade do Agnaldo era porque ele queria ter certeza de que era seu.PB Me lembrei porque essa história de coincidência de trabalhos existe. A produção maisjovem, além da ansiedade, não pesquisa a que já foi feita; alguns sim, mas a maioria não. Umacoisa com que sempre me preocupei é estar informado do que foi feito, para não perdertempo. RD Mas você há de convir que Paulo Bruscky é conhecido há pouco tempo. Você ficoumuito tempo fora da mídia.SM Mas acho também que mídia nunca foi o lugar do Paulo.FS Pensar no lugar onde o Paulo mora também; Recife é um lugar que está à margem doBrasil. É muito interessante terem descoberto seu trabalho no início dos anos 70 com umapublicação importante.

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PB É porque participei de muitas exposições nos EUA e na Europa com obras envolvendoheliografia, fax e xerox. Quando ganhei a Bolsa Guggenheim e cheguei na Xerox em NovaYork, me apresentei, e o gerente me perguntou se tinha trazido “o material”. Disse que não,mas que estava ali para pesquisar, e ele me respondeu que não era possível, pois naqueleespaço só havia máquina para showroom e não podia ceder para artista. Disse que estava alipara mostrar o que a máquina faz e ele não sabia. Discutimos, voltei para casa e liguei parauma amiga no Recife, que tinha sido secretária do presidente da Xerox no Brasil, explicandoo caso e solicitando auxílio. Ela conseguiu contornar a situação por intermédio do filho dogerente. Encontrei-me com o rapaz, e ele disse que me ajudaria. Fiz as pazes com o gerente.Quando estava fazendo o filme – me chamavam de Paulo Xerox – tive uma estafa, poisentrava quando abria e saía quando fechava. O gerente ficou muito amigo meu e impressi-onado com o trabalho que eu estava fazendo. Tinha que saber a cor e o efeito que queria,não podia parar porque a máquina quebrava. Chegava à noite em casa (um amigo deAntoni Muntadas, por sorte, me alugou seu loft de um andar inteiro no Soho; ele não levounada, deixou prancheta e tudo mais. Muntadas dissera-lhe que eu era muito amigo e que erao mesmo que alugar para ele), analisava o que tinha feito, elaborava as tarefas para o outrodia. Tive uma estafa no final da pesquisa.FS Qual foi o ano que você passou em Nova York?PB Foi em 1982. Muntadas foi uma pessoa muito legal: levou-me na loja de um amigo quetrabalhava com artistas que operavam com xerox. O fato é que é preciso explorar a máqui-na nesse sentido de humanizá-la, o que pode se tornar muito perigoso nessas mostras dearte e tecnologia.MLT Como se fosse a ilustração da tecnologia, ilustração da técnica.PB Na Bienal de São Paulo de 1989 tinha uma sala de eletrografia; fiz um faxperformance deuma máquina para outra e pedi patrocínio. Quando voltei para Recife, formalizei um pedidoe eles me negaram. Pedi o fax profissional porque o que eu tinha, por exemplo, era diferen-te daquele disponibilizado na Bienal.IR E a experiência da Bienal de 2004, quando seu ateliê foi transposto?PB Eu não conhecia o Alfons Hug, e Cristiana Tejo me ligou, disse que o curador da Bienalviria a Recife e perguntou se poderia incluir meu ateliê. Ele foi, entrou e ficou andando, paracima e para baixo. Ele voltou e propôs levar todo o ateliê para a Bienal. Foi o trabalho maiscaro da Bienal. Mas fiquei chateado com ele porque não cumpriu umas das coisas quepropus. Depois da Bienal, ele queria levar o ateliê para a Europa com a intenção de expor,e eu disse que não, pois a experiência tinha sido boa uma vez. Ele quis levar até os trabalhosque estavam na prancheta, e eu propus a ele fazer um diálogo duas vezes por semana entreSão Paulo e Recife, na quarta e no sábado, que é quando recebo meus amigos. Eu ficaria nomeu ateliê em Recife com o pessoal e haveria o meu ateliê na Bienal, com todos os objetose obras.MLT A partir do texto do Moacir dos Anjos em que ele fala em ateliê como arquivo, penseino arquivo como ateliê. É uma inversão dessa experiência. Você, como disse há pouco, é umarquivista, mas sabe-se que você montou um sistema de catalogação própria de sua obra.

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PB Da minha obra não. Criei um sistema de catalogação de muitos meios que não existiam.Conversei com bibliotecários, por exemplo, para catalogar a parte de arte correio, que sóem parte completei. A catalogação se dá por: país, artista e em ordem alfabética. Dentro daarte correio você tem selo de artista, envelope, conteúdo... por isso não gosto de chamararte postal porque você limita a um só elemento, a algo usado na arte correio. Criei umsistema de catalogação por sigla, por exemplo, xerografia XC (cor), XP/B (preto e branco).Se quero organizar uma exposição dentro do meu acervo de xerografia preto e branco,coloco “XP/B” e aparecem todos os artistas que usam essa técnica. As pessoas confundemmuito livro de artista com livro de arte, mas dentro do livro de artista você tem o catálogo,que é uma obra. Você tem dentro do próprio livro de artista, uma catalogação. Se queroabordar uma determinada linha do livro de artista, eu tenho. Se é livro de artista comofotografia, se é livro de artista conceitual, livro-objeto tridimensional. Dentro de cada umvocê tem uma especificidade.MLT Esse sistema já se estendeu a seu espaço?PB Não, foi meu irmão quem desenvolveu. Tenho um irmão que fez especialização decomputação no exterior, e foi ele quem organizou.MLT Só para uso próprio.PB Por enquanto.RD Mas você tem noção de tudo que tem? Consegue dizer quantos itens existem no ateliê?PB A UFPE passou uma semana no ateliê, porque fizeram um projeto para catalogação domeu acervo. Tem coisas no ateliê que só eu sei. Obras do Fluxus, como a de RobertRehfeldt que é o dinheiro de artista, que ele não assinou. A universidade ficou uma semanano ateliê pesquisando por conta da Petrobras. Encontrei Paulo Sergio Duarte durante aBienal, e ele disse que tinha lutado até o final para catalogação do meu ateliê, mas que tinhasido voto vencido. A intenção é disponibilizar o material na internet e divulgá-lo para pes-quisa. Tenho cerca de 500 trabalhos do grupo Fluxus.FS A sua coleção é a maior de arte Fluxus da América Latina.PB É uma das poucas do mundo. Eu quase editei um livro sobre a obra de Ken Friedman,mas não consegui. Entretanto, ele deixou sua obra conceitual dos anos 50 até 1981 comminha mulher, no hotel onde estávamos hospedados em NY. É até engraçado. Eu estavacom Regina Vater no lançamento de um disco de artista em Nova York quando ele entroue fez-se um silêncio. Eu era recém-chegado e não entendi o porquê daquele silêncio todo,mas Regina respondeu (sussurrando) que era o papa da arte conceitual que tinha entrado,Ken Friedman. Eu disse que ele era meu amigo, ela riu, e eu disse que estava falando sério!Depois de um tempo, eu o chamei e ele disse para irmos jantar no restaurante mexicano aliperto. Ela pediu para ir comigo e eu disse: “Você não acreditou!”. Fiz uma performance comele nesse dia que só ela viu. Fomos nesse restaurante e ele ficou desenhando na toalha depapel da mesa. Fomos os três andando pela madrugada. Passamos por um muro alto comum cachorro latindo do outro lado. Eu e ele combinamos de fazer uma performance com o

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cachorro. Havia um poste do outro lado da rua, e disse para Regina atravessar a rua e sentar,pois ela seria nossa única espectadora. Fui para uma ponta do muro, ele para outra e saímosdizendo coisas onomatopeicas. O cachorro corria de um lado a outro, e, quando nos en-contramos, fez-se silêncio. Continuamos calados, cada um seguindo a outra direção, e ocachorro, completamente desnorteado.MLT Tenho curiosidade sobre a obra MIJE, de 1982. Como você aproveitou a sigla?PB Estava em Paris, caminhando pela rua. Estava na calçada do outro lado do MinistérioInfanto-Juvenil para Educação e quando olhei não acreditei. Estava com minha mulher edisse para ela ficar com a máquina; estava vindo um guarda e tinha que ser rápido para elenão achar estranho.MLT O trabalho é você de costas como se estivesse urinando.RD: E o trabalho que você realizou na última edição da Bienal de Havana? Era uma homena-gem ao Hélio Oiticica?PB Eu levei o Hélio para Recife onde ele fez um Parangolé em 1979. Ele foi em julho emorreu em maio do ano seguinte. Ele queria comprar uns “negócios” e eu disse que noRecife não tinha a Mangueira, mas que o levava ao Morro da Conceição. Fomos eu, ele,Jomard Muniz de Brito e Almandrade de Salvador. Arrependi-me de não ter levado umgravador. Sabia que ele tinha sido deportado dos EUA, porque armaram uma armadilhacom cocaína, e ele caiu. Eu perguntei do que ele vivia, se não vendia nada. Ele me respondeuque vivia em uma casa que seus pais tinham deixado no Jardim Botânico, que era alugadapara estrangeiros. Disse-me que recebia em dólar, e era o que o sustentava. Perguntei sobrea história dos Parangolés, e ele respondeu: “Certa vez, indo deônibus receber o aluguel, estava na janela e começou a chover.Um gari pegou o saco de lixo, rasgou e vestiu”. Hélio disse quefoi a imagem que o impressionou. Tivemos várias conversas.Ele ficou louco pelos ônibus elétricos antigos, parecia um meni-no. Estávamos um dia na praia da Boa Viagem conversando, eele ficou olhando para o mar, disse que estava pensando noirmão que morava em Manaus, mas que a passagem para lá eramuito cara. Parecia que ele sabia que morreria. Eu coordenavao Festival da Universidade Católica e solicitei ao reitor umapequena mudança na passagem do Hélio; em vez de Recife-Rio, seria Recife-Manaus-Rio. O reitor concordou, e a passa-gem foi emitida. Quando fui buscar o Hélio no hotel para ir àuniversidade, disse-lhe que tinha dado um problema na passa-gem dele. Ele ficou resmungando que precisava encontrar-secom a Lygia Pape no Rio de Janeiro, e perguntou o que tinhaacontecido. Respondi que não sabia e sugeri que ele olhasse apassagem com os próprios olhos. Quando viu, não acreditou,ficou pulando no hall do hotel e logo ligou para o irmão.FS Vocês já se conheciam?

Mije, 1982

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PB Não. Ligara para ele logo depois de seu retorno de Nova York, convidando-o para fazeruma palestra no Recife. Ele resmungou dizendo que não faria palestra nenhuma. Informeique havia dinheiro para remunerá-lo e que ele poderia falar somente um minuto e não fazermais nada. Ele respondeu que assim era diferente e deu uma aula que nem todo professordá, com uma metodologia que todo mundo ficou bobo.MLT Há mais alguma coisa que você gostaria de dizer?PB Uma coisa que sempre digo é que você tem que ser contemporâneo de si próprio. Aquestão dos historiadores, por exemplo; tenho por eles todo respeito, mas eles mentemmuito, deixam o testemunho de uma época que não é verdadeiro; o artista não tem ocompromisso que o historiador tem.RD Qual é sua relação com os artistas mais jovens? E como sua produção se comporta nummomento em que estamos livres da ditadura, da censura e das dificuldades? Você se sentemais livre hoje? E qual o nível de liberdade de criação?PB Sempre fui muito livre, nunca me submeti a nenhum tipo de censura, nem estética, nemrepressora, sofri, mas lutei contra isso. Apesar dos patrocínios e dos perigos gerados poralgumas instituições, como comentamos, é fundamental que se produza.RD Continua tudo a mesma coisa?PB Sim, continuo trabalhando muito. Nara Roesler catalogará toda a minha obra, o que serámuito difícil porque nem mesmo eu sei o que tenho.RD O que você pensa que será da sua obra? Ela se tornará um museu? Uma fundação?PB Eu ainda estou vivo; depois que morrer podem fazer o que quiserem. Esse acervo quetenho eu gostaria que fosse disponibilizado porque reconheço o que tenho: é um acervomuito grande com mais de 75.000 itens catalogados segundo o levantamento feito pelauniversidade. Quero que o acervo auxilie artistas, pesquisadores e o público em geral. Nãodesejo a criação de uma fundação enquanto estiver vivo.MLT Nós todos estamos ligados à formação do artista, a pessoas jovens que estão estudan-do ou fazendo arte; o que você lhes diria?PB Na semana retrasada fui convidado pela Universidade Federal de Pernambuco paralecionar e recusei. É importante uma formação, mas, ao mesmo tempo, as pessoas termi-nam a faculdade, começam a ensinar e deixam de ser artistas. O melhor professor para mimé uma pesquisa diária: ler e trabalhar no que você faz. Isso para mim é muito bemcompartimentado. Vejo muito esse perigo porque alguns amigos fizeram faculdade e foramensinar. Acabaram como prisioneiros, mais professores do que artistas. À medida que tivenecessidade, fiz curso específico do que precisei; só uma noção, porque é no dia a dia quevocê aprende; não é a universidade que lhe dará o conceito pronto. Certa vez numa con-versa com Paulo Herkenhoff (a que Fernando Cocchiaralle também estava presente) sobrecinema, perguntei-lhe como, depois de ter feito o trabalho que fez, conseguiu deixar de serartista. Ele saiu pela tangente.

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