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Revista da Biologia – www.ib.usp.br/revista ISSN 1984-5154

Sumário _____________________________ Volume 4

Junho de 2010

1

MECANISMOS DE EXPRESSÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS Emerson A. Castilho Martins e Paulo Roberto Maciel Filho

6

A INFLUÊNCIA TÉRMICA NA REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÉNICA E SUA AÇÃO NA DINÂMICA DAS MEMBRANAS CELULARES Cristiéle da Silva

10

REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA NA DEPRESSÃO METABÓLICA SAZONAL EM MAMÍFEROS Lilian Cristina da Silveira

16

REGULAÇÃO GÊNICA DOS RECEPTORES DOS HORMÔNIOS TIREOIDEANOS DURANTE A METAMORFOSE DE ANFÍBIOS ANUROS Vanessa Aparecida Rocha Oliveira Vieira

22

FATOR DE CRESCIMENTO DO ENDOTÉLIO VASCULAR (VEGF): REGULAÇÃO TRANSCRICIONAL E PÓS-TRANSCRICIONAL Luciana Alves de Fátima e Paula de Carvalho Papa

28

REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA NAS ENGRENAGENS DO RELÓGIO CIRCADIANO DE MAMÍFEROS Erika Cecon e Danilo Eugênio de França Laurindo Flôres

35

FATOR DE TRANSCRIÇÃO NUCLEAR KAPPA B NO SISTEMA NERVOSO CENTRAL: DO FISIOLÓGICO AO PATOLÓGICO Daiane Gil Franco

40

LIPOPOLISSACARÍDEO (LPS): ATIVADOR E REGULADOR DA TRANSCRIÇÃO GÊNICA VIA FATOR DE TRANSCRIÇÃO NFKB Sanseray da Silveira Cruz-Machado

44

ASPECTOS EVOLUTIVOS DO SPLICING ALTERNATIVO Barbara Mizumo Tomotani

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Revista da Biologia – www.ib.usp.br/revista

Expediente ____________________________________ Editor Executivo:

Welington Braz Carvalho Delitti Comissão Científica: Lucile Maria Floeter-Winter Coordenação:

Agustín Camacho Guerrero Pedro Ribeiro Rodrigo Pavão

Consultores desse volume: Amanda de Moraes Narcizo Claudia Lucia Martins da Silva Cristiane Lopes Daniel Carneiro Carrettiero Daniela Peres Almenara Eduardo Koji Tamura Fabio Passetti Ivan Prates José Eduardo de Carvalho Luiz Paulo Moura Andrioli Marcos Gonzaga dos Santos Mario Gustavo Mayer Merari de Fátima Ramires Ferrari Monique Nouailhetas Simon Pedro Augusto Carlos Magno Fernandes Valéria Fagundes

Foto da capa cedida por Elissa Lei:

Cromossomos politênicos altamente replicados, obtidos das glândulas salivares de uma mosca Drosophila e corados com DAPI (em azul) e anticorpos dirigidos contra proteínas

isolantes gypsy (Su(Hw) (em verde) e Mod(mdg4)2.2(em vermelho). http://www2.niddk.nih.gov/NIDDKLabs/IntramuralFaculty/LeiElissa.htm

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REVISTA DA BIOLOGIA – www.ib.usp.br/revista – volume 4 – junho de 2010

APRESENTAÇÃO

Lucile Maria Floeter-Winter Professora Titular do Departamento de Fisiologia do IB-USP e Editora do presente volume

Em seu “História do Cerco de Lisboa”, José Saramago nos conta as agruras e conflitos de um

Revisor que desvirtua um acontecido histórico ao acrescentar um “não” em uma frase. De maneira muito saborosa, Saramago nos coloca em contato com os pensamentos e dúvidas do Revisor em relação à verdade de um escrito, ao mesmo tempo em que pondera como seriam felizes, nos dias de hoje, Eça ou Balzac, ao ter em mãos os recursos de um computador que permite interpolar, transpor, recorrer linhas e trocar capítulos de lugar. Mais adiante ainda se refere ao uso do computador, no sentido de permitir uma ligação diuturna com bancos de dados, possibilitando um acesso umbilical a qualquer informação que leve à exatidão do informado, mas, ao mesmo tempo reforça que as sentenças não são imutáveis e que as variações do universo subitamente levam a outra interpretação de fatos.

Quando avaliava as monografias relativas ao processo de avaliação dos alunos na Disciplina de Pós-Graduação “Mecanismos de Regulação da Expressão Gênica em Processos Fisiológicos”, ministrada no primeiro semestre de 2009, fui surpreendida pela qualidade de alguns trabalhos resultante do desafio aceito pelos alunos em colocar o objeto da sua pesquisa dentro do contexto discutido na disciplina, seguindo o formato de levantar o conhecido no assunto em bancos de dados naquele momento. Diante desse quadro de excelência, logo pensei na oportunidade de divulgar os trabalhos, fomentando discussões e contribuindo para a busca da “verdade”. Assim, consultei os Coordenadores da Revista da Biologia e posteriormente seu Editor Executivo, Prof. Welington Delitti, sobre a possibilidade de aproveitarmos os textos e gerarmos um número temático da Revista. Dessa forma, os autores veriam seu exercício de redação divulgado recompensando seu esforço, os leitores usufruiriam da informação revisitada ao mesmo tempo em que a Revista atingiria seus objetivos de divulgação e fomento de discussões acadêmicas.

Acolhida a idéia, seguiu-se a modificação dos textos por seus autores, de modo a seguir as normas da Revista. Inclusive, em alguns casos, houve a fusão de textos que originalmente apresentavam objetivos sobrepostos. Após a revisão por especialistas e pares, a quem agradeço a enorme disponibilidade e colaboração, temos aqui o resultado deste processo; textos que abordam algum aspecto da regulação da expressão gênica que resulta em um processo fisiológico e que representa a constante troca de informações do organismo com o meio para manutenção da “ordem biológica”.

No papel de “revisor” do volume, senti a enorme responsabilidade em manter o rigor, sem, no entanto, resistir aos recursos de sugerir, indicar ou mesmo corrigir os textos enviados, com o consentimento dos autores. Ao mesmo tempo, procurei manter a consciência de que as sentenças aqui colocadas serão mutadas pela variação do universo à luz de novas contribuições ao conhecimento humano. No papel de “docente”, percebi que estendi a disciplina por mais um tempo, fazendo com que os alunos/autores revissem os conceitos discutidos em aula e trabalhassem na forma do como fazer a divulgação desses conceitos. Vale o processo como um todo, faltando apenas, aos leitores, aproveitar a leitura.

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MECANISMOS DE EXPRESSÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS

Emerson A. Castilho Martins*, Paulo Roberto Maciel Filho Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP

Apoio: FAPESP; CAPES; CNPq Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

[email protected] Resumo. Com raras exceções, as células de eucariotos pluricelulares apresentam o mesmo material

genético. Porém, com o decorrer das fases de desenvolvimento do organismo ou em diferentes tecidos, as exigências metabólicas são diferenciadas, e diferentes genes são ligados e desligados, expressando um conjunto distinto de proteínas. Existem vários mecanismos responsáveis por controlar a ativação e desativação de genes (controle da expressão gênica), em diferentes momentos da vida celular. Apresentamos nesta revisão alguns passos que são passíveis de controle, bem como uma breve descrição e exemplos ilustrativos de mecanismos de regulação de expressão gênica.

Palavras-chave. Controle de expressão, regulação gênica, adaptação fisiológica MECHANISMS OF GENE EXPRESSION IN EUKARYOTES Abstract. With rare exceptions, all cells of multicellular eukaryotes have the same genetic material.

However, metabolic requirements are different over the stages of their development or in different tissues. These requirements are satisfied by gene expression control in these organisms. In the present review we discuss some steps that are likely to be controlled, and a brief description and examples of mechanisms of gene expression.

Keywords. Expression control, gene regulation, physiological adaptation Introdução Basicamente, expressão gênica pode ser

descrita como o conjunto de processos que ocorrem para que um organismo, tecido ou célula inicie, aumente, diminua ou cesse a produção de produtos finais de seus genes, proteínas e/ou RNAs. No início dos anos 60, o grupo de Nirenberg começou a decifrar o código genético, permitindo correlacionar a sequência de aminoácidos das moléculas proteicas com as sequências de nucleotídeos do RNA mensageiro (mRNA), que por sua vez é determinada pela sequência dos nucleotídeos no DNA. No entanto, os mecanismos e estímulos que levam à produção das diferentes proteínas e RNAs, em diferentes células, são tão importantes quanto a própria sequência codificadora.

Com raras exceções, o material genético dos eucariotos pluricelulares é idêntico em todas as células. Isso decorre do fato de todas serem originadas da única célula-ovo. Os mecanismos de controle de expressão devem, então, começar por aí: as exigências das células, durante seu desenvolvimento, mudam. Consequentemente, os produtos de seu metabolismo devem responder a essas mudanças. Além disso, as células se diferenciarão em diferentes tecidos, que responderão a diferentes estímulos e apresentarão atividades específicas. Com isso, é possível notar quão importante é a regulação gênica.

A molécula de DNA é um polímero de nucleotídeos, unidades essas constituídas de uma molécula de açúcar (desoxirribose), um grupo fosfato e uma base nitrogenada, que pode ser adenina, guanina, timina ou citosina. A molécula é formada por uma fita dupla em hélice, unidas por pontes de hidrogênio entre as bases

nitrogenadas (Watson e Crick, 1953). Quando analisamos a sequência de bases nitrogenadas de uma fita, encontramos regiões que determinarão a sequência de aminoácidos. Essa região é, portanto, codificante. Como não se conhece produtos (RNA ou proteínas) de uma parte do genoma, se poderia pensar que essas não codificam nada, não têm função. Sabemos, no entanto, que não é o que acontece. Essas sequências são importantes porque nelas encontramos sinais pelos quais é possível regular a expressão, uma vez que apresentam sequências específicas para interação de proteínas que fazem a transcrição (no DNA) ou tradução (no mRNA). Há ainda espaçadores onde a sequência em sí não é importante, mas seu tamanho torna acessível as regiões a serem expressas.

A organização nuclear O núcleo apresenta um domínio

cromossômico com alta concentração de genes, chamado domínio central, e uma região chamada domínio periférico, com concentração menor de genes. Esse tipo de organização, contudo, não é estática, já que há reorganização dos cromossomos nas células de acordo com o nível de expressão dos seus genes (Verschure, 2004). Dessa forma, uma maneira de se controlar a própria expressão seria endereçar o cromossomo em regiões onde seus genes poderiam ser mais ou menos expressos (Singer e Green, 1997; Elias e col., 2002)

Aumentando o número de genes Um mecanismo que garante o aumento da

expressão de um determinado gene é aumentar o número de suas cópias no genoma. Dessa forma,

Revisão:

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maior quantidade de DNA molde, ao sofrer transcrição, gera uma quantidade maior de mRNA e, consequentemente, da respectiva proteína. Em alguns raros casos, acontece a amplificação gênica: a dupla fita de DNA se abre no gene e em seguida, a DNA polimerase sintetiza as fitas complementares, resultando então em duas duplas-fitas de DNA no local do gene. O processo pode se repetir, obtendo-se o crescimento exponencial do número de cópias do mesmo: de 2 para 4, 8 e assim por diante. A amplificação acontece somente naquelas células e não será transmitida para as gerações futuras. Alguns genes de produção de células foliculares de Drosophila são um exemplo desse tipo de estratégia (Claycomb e col., 2004).

Outro mecanismo que garante o aumento do número de genes é chamado de duplicação gênica. A sequência do gene é incorporada novamente ao genoma ou através de recombinação desigual, na qual o pareamento não é completamente homólogo, fazendo com que parte do cromossomo seja duplicada, ou através da ação de elementos transponíveis ou retrotransponíveis, que podem levar consigo parte da informação do hospedeiro e incorporá-lo em outra parte do genoma. Com isso, a cópia do gene poderá ficar incorporada ao genoma definitivamente. Quando mantida, essa cópia pode mutar, ou manter a estrutura original e ser transmitida aos descendentes. Apresenta a vantagem de conferir maior plasticidade ao organismo. Uma das cópias do gene se mantém sem alterações funcionais enquanto a outra pode sofrer mutações que podem levar ao aparecimento de novas formas da proteína com diferenças funcionais vantajosas ao organismo. Um caso de sucesso é observado em peixes antárticos da espécie Trematomus bernacchii, que apresentam três cópias do gene de pepsina A, decorrentes de dois eventos de duplicação. Esses genes passaram por mutações que geraram três formas diferentes de pepsina, proporcionando melhor funcionamento da digestão dos peixes na temperatura baixa em que vivem (Carginale e col., 2004).

A atividade das polimerases A transcrição dos genes é catalisada por

enzimas chamadas RNA polimerases. Essas enzimas reconhecem sequências no DNA às quais se ligam, chamadas de regiões promotoras, ou simplesmente promotores. No entanto, diferentes complexos proteicos podem estar ligados a esses promotores, interferindo indiretamente na expressão de genes.

Os genes que codificam o RNA ribossômico (rRNA), o RNA que constitui o ribossomo, organela responsável pela tradução, são transcritos pela enzima RNA polimerase I, comumente chamada de RNA polI. Essa enzima apresenta uma série de fatores das quais seu funcionamento depende, e a presença desses

conhecidamente altera a sua atividade. Além disso, alguns desses fatores são capazes de reconhecer sequências à montante do sítio de ligação da enzima - região conhecida como Espaçador Intergênico (IGS) - fazendo com que a eficiência da atividade enzimática aumente na presença de sequência específica na região não transcrita anterior ao sítio promotor (de Andrade Stempliuk e Floeter-Winter, 2002).

Sabe-se ainda que essa enzima apresenta associação com as proteínas motoras actina e miosina nucleares, o que interfere no funcionamento da mesma. A miosina nuclear participa do início da transcrição, enquanto a actina participa do elongamento do transcrito. No entanto, aparentemente o processo não depende de atividades motoras dessas proteínas, já que se consegue observar a importância das mesmas tanto in vitro quanto in vivo (Philimonenko e col., 2004).

Os mRNA são transcritos pela RNA polimerase II, chamada de RNA polII. Essa enzima também apresenta fatores ligados a ela que permitem sua atividade. Além disso, é fato conhecido, a interferência na atividade da RNA polII por proteínas que se ligam à montante do promotor e podem aumentar ou diminuir sua atividade (Kadonaga, 2004).

Splicing Chamamos de "splicing" o processamento

do pré-mRNA em que sua sequência é alterada, seja pela retirada de partes da molécula, seja pela adição de sequências específicas. No primeiro caso, denominamos de "cis-splicing" ou somente "splicing", porque todo o processo envolve uma única molécula. Quando se adiciona uma sequência transcrita a partir de outro gene a um pré-mRNA, denominamos o processo de "trans-splicing" (Alberts e col., 2002).

Cis-splicing Durante a transcrição, ainda no núcleo, um

complexo chamado spliceossomo liga-se ao pré-mRNA. Esse complexo lê a sequência do pré-mRNA e, caso encontre marcações para isso, retira parte da molécula, liga a parte anterior ao resto da mesma e continua o processo. As partes retiradas são chamadas de íntrons, enquanto que as regiões que farão parte do mRNA maduro e que, portanto, serão expressas, são chamadas de exons. As marcações para a retirada de íntrons são bastante variáveis, embora apresentem algumas características conservadas. Essa variabilidade confere ao sistema uma maior plasticidade de ação no processamento do mRNA (Abril e col., 2005).

Por algum tempo, acreditou-se que os íntrons não continham informações, e que faziam parte de resquícios evolutivos que perderam a função com o tempo. No entanto, hoje se reconhece que esse pensamento era equivocado: é sabido que a expressão pode depender da

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presença de íntrons, e ainda que esses íntrons têm sítios de ligação para reconhecimento indireto de condições ambientais. É o caso, por exemplo, do gene para a produção de arylalkylamina N-acetiltransferase (AA-NAT), que controla a produção do hormônio melatonina. Uma região no íntron 1 desse gene apresenta sítio de ligação de um elemento responsivo a AMP cíclico (AMPc). Esse elemento é chamado de CREB e aumenta a tradução do mRNA quando ocorre um aumento do AMPc, ou seja, quando a célula é estimulada. Quando estímulos chegam às células da glândula pineal, ocorre um aumento do AMPc, que permitirá a ligação do CREB no íntron 1 e levará a um aumento de mais de 5 vezes na quantidade de melatonina produzida na glândula. O mesmo efeito é muito diminuído com a retirada do íntron 1, como ocorre nas outras células do corpo (Baler e col., 1999). Com isso, a glândula pineal pode regular a produção de melatonina por responder de maneira indireta à presença de luz, o que torna possível regular o ritmo circadiano através de condições luminosas do ambiente.

Acoplamento de fatores de transcrição Outra característica interessante da RNA

polII é a presença de estruturas que permitem o acoplamento de fatores que agirão pós-transcrição, chamados fatores de processamento do RNA. Esse processamento transforma o mRNA recém transcrito em mRNA maduro, sem introns, com cauda de poli-A e CAP, que ajudam a manter a molécula mais estável. O CAP é uma guanidina metilada adicionada na extremidade 5' do mRNA, e a cauda de poli-A é a adição de dezenas de adenosinas na extremidade 3' da molécula (Alberts e col., 2002). A estrutura da RNA polII aumenta a eficiência de todos esse processos porque concentra os fatores necessários para o processamento próximo ao local da transcrição (Maniatis e Reed, 2002; Zorio e Bentley, 2004).

Splicing alternativo O número de genes encontrado no genoma

humano foi estimado em cerca de 25.000 genes, no entanto, esses guardam informações para a produção de um número muito maior de proteínas (Venter e col., 2001). Uma das explicações para essa discrepância está na flexibilidade dos sítios de reconhecimento de "splicing", o que permite ao sistema de processamento a criação de diferentes formas de proteínas a partir de uma mesma sequência de DNA. É o evento chamado "splicing" alternativo. Segundo Sharp (2009), mais da metade do DNA de células de vertebrados é expresso segundo diferentes formas de "splicing". É o caso, por exemplo, da imunoglobulina M, que, em peixes, tem a sequência de DNA expressa em linfócitos B no início de desenvolvimento sob a forma de proteína de membrana, enquanto que nos linfócitos B maduros o gene é expresso sob a

forma de proteínas plasmáticas. (Wilson e col., 1995). Outro exemplo conhecido é a expressão do gene de beta-tropomiosina do músculo esquelético, que ocorre de maneira diferenciada em fibroblastos e músculo liso por meio de "splicing" alternativo (Helfman e col., 1988).

O "splicing" alternativo também pode ser a chave para processos patológicos, dando origem a transcritos que não são funcionais ou tem função exacerbada. É o caso, por exemplo, do insulinoma humano, onde o mRNA da insulina apresenta como variante de "splicing" uma forma com a inclusão de parte do primeiro íntron na região 5`UTR. Com isso, tanto o RNA sem o íntron, variante mais comum, quanto o RNA com o íntron darão origem à mesma proteína viável, no entanto, a variante do mensageiro da insulina com a parte do íntron 1 é traduzida mais vezes do que a variedade nativa. Em células pancreáticas normais, a quantidade de variante com íntron não chega a 0,5%. No entanto, em insulinomas, as células do tumor aumentam significativamente a porcentagem de variantes do mensageiro com o íntron 1, chegando a produzir mais de 13% dos mRNA de insulina com o íntron conservado. Com isso, essas moléculas, por serem mais traduzidas, acabam gerando muito mais insulina por célula, gerando o quadro de hiperinsulinemia e, consequentemente, hipoglicemia (Minn e col., 2004).

Trans-splicing O "trans-splicing" consiste na união de

exons de diferentes transcritos em um único mRNA. Alguns organismos apresentam transcrição policistrônica, isto é, apresentam um promotor no cromossomo e em seguida a ele diversos genes. Esses organismos precisam, então, individualizar a informação, ou seja, processar o pré-mRNA em RNA com informação para a síntese de proteína. Assim, o "trans-splicing" permite a formação desses mRNA maduros. Esse tipo de "trans-splicing" é conhecido como SL "trans-splicing", porque adiciona uma sequência líder (SL) no início dos mRNA. Essa sequência vem acompanhada do CAP, o que permite a proteção dessas moléculas altamente instáveis. Esse mecanismo é responsável pelo controle de expressão em organismos com transcrição policistrônica, quando a individualização da informação só é possível com a adição da sequência SL. Embora o mecanismo seja comum em protozoários, o processo é também encontrado em metazoários, como em cnidários, platelmintos, nemátodes, insetos e inclusive em mamíferos (Mayer e Floeter-Winter, 2005).

Edição de RNA Outro processo pós-transcricional é a

edição do RNA, também chamado de RNA editing. O processo consiste na modificação do transcrito, e foi descrito em protozoários

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cinetoplastídeos. Esses organismos apresentam uma única mitocôndria, com seu material genético organizado na forma circular, concatenados em minicírculos e maxicírculos. Os maxicírculos contém a informação primária para a produção das proteínas mitocondriais, enquanto que os minicírculos codificam os chamados gRNA, que se associados aos transcritos dos maxicírculos e, junto com uma maquinaria chamada editiossomo, farão o processo de edição.

Basicamente, esse processo consiste na inserção e ocasionalmente na retirada de uridinas (U) dos pré-mRNA ou na troca de uma citidina (C) por uridina. Essas alterações provocam, muitas vezes, a alteração da fase de leitura do RNA, de forma que apenas os mRNA que passarem por esse editing serão lidos corretamente. Com isso, as moléculas de mRNA formadas são, na verdade, híbridos de sequência transcritas a partir de DNA de maxicírculos com sequências transcritas dos minicírculos (Simpson e col., 2000).

Estabilidade do mRNA As moléculas de mRNA apresentam, como

citado, estruturas nas extremidades 5' e 3' não traduzidas que aumentam sua estabilidade. No entanto, há uma ciclagem dessas moléculas na célula, através de degradação controlada por marcas presentes na própria molécula. Dentre os mecanismos para degradação, encontramos complexos enzimáticos capazes de detectar RNA dupla-fita. Esses complexos reconhecem as duplas-fitas de RNA e as cortam em fragmentos com aproximadamente 21 bases. Esses fragmentos são, então, usados como moldes na detecção de moléculas complementares de RNA. Quando uma molécula de mRNA se hibrida a esses fragmentos, ocorre sua degradação. Com isso, é possível inibir a expressão de um gene através da expressão de sua sequência complementar. Esse processo vem sendo explorado atualmente para o knockdown de genes em fases específicas do organismo (Fjose e col., 2001; Shoji e col., 2005).

Considerações finais A disposição de se obter o sequenciamento

do genoma humano estava baseada na ideia de que o conhecimento do conjunto de bases que compõem o DNA humano seria revelador de grande parte de seu funcionamento. Com o anúncio da composição do genoma, no entanto, se percebeu que, na verdade, a complexidade fisiológica envolvia muito mais do que apenas a predição de produtos codificados na sequência de bases. A regulação da expressão desses produtos e o entendimento da relação dos produtos e mecanismos alternativos associados à regulação são os pontos que fazem dos seres vivos em geral, incluindo o homem, organismos com diversos níveis de organização e complexidade.

Cada vez mais se reconhece a importância de diversas regiões do genoma, de sistemas enzimáticos de controle de transcrição e tradução e de sistemas pós-transcricionais de edição. Conceitos como o DNA “lixo”, de que sequências não codificadoras seriam apenas resquício evolutivo sem função nenhuma, estão, senão acabando completamente, ao menos diminuindo em grande escala com relação ao que se acreditava ainda há poucos anos, e o estudo da expressão gênica vem contribuindo para entendermos processos fisiológicos e suas variantes patológicas.

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Philimonenko V.V., Zhao J., Iben S., Dingová H., Kyselá K., Kahle M., Zentgraf H., Hofmann W.A., de Lanerolle P.,

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A INFLUÊNCIA TÉRMICA NA REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA E SUA AÇÃO NA DINÂMICA DAS MEMBRANAS CELULARES

Cristiéle da Silva Ribeiro

Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

[email protected] Resumo. A influência humana nos sistemas naturais tem aumentado continuamente, justificando a

importância de se investigar os aspectos antrópicos que causam estresse em animais em seus sistemas naturais. No ambiente aquático, as ações antrópicas são muito evidentes, levando os organismos muitas vezes a ficarem expostos a efeitos subletais que provocam conseqüências imprevisíveis. Variações na temperatura alteram a estrutura das membranas celulares podendo comprometer as atividades enzimáticas associadas às membranas e os processos de transporte. Nesse sentido este texto busca levantar hipóteses sobre o possível papel da temperatura em mudanças estruturais das membranas celulares.

Palavras-chave. Dessaturases, Elongases, Ácidos graxos, Regulação da expressão gênica. THERMAL INFLUENCE ON GENE EXPRESSION REGULATION AND ITS ACTION IN THE

DYNAMICS OF CELL MEMBRANES Abstract. The human influence on natural systems has been steadily increased, justifying the

importance to investigate the antropic factors that cause stress in animals in their natural systems. In the aquatic environment the human actions are very evident, leading the organisms sometimes to be exposed to sub lethal effects that can cause unpredictable consequences. Variations in temperature affect the structure of cell membranes and can compromise the enzymatic activity associated with the membranes and the transport processes. In this sense, this assay postulates some hypothesis about the possible role of temperature on structural changes of cell membranes.

Keywords. Desaturases, Fatty acids, Gene expression.

Ação da temperatura nas membranas biológicas e seu papel na regulação da expressão gênica

A faixa ótima de temperatura varia entre as espécies e as oscilações térmicas podem causar alterações nas propriedades estruturais e fisiológicas dos organismos (Hochachka e Somero, 2002).

Variações na temperatura alteram a estrutura das membranas celulares podendo comprometer as atividades enzimáticas associadas às membranas e os processos de transporte. O conjunto de alterações das propriedades químicas e físicas das membranas resulta, em última análise, em mudanças na fluidez das mesmas (Hazel, 1984). A queda de temperatura pode comprometer sua flexibilidade, devido a alterações na configuração dos seus lipídeos e proteínas, podendo limitar a sua estabilização. O grau de fluidez de membranas biológicas pode ser estimado por muitos métodos físicos, tais como: fluorescência, ressonância e espectroscopia. A extensão de insaturações dos ácidos graxos contidos na estrutura da membrana é o fator majoritário na manutenção do grau de fluidez (Kates e col., 1993).

Organismos vivos, em particular ectotérmicos respondem à diminuição da temperatura por dessaturação de ácidos graxos nos lipídeos de suas membranas. Essa resposta de aclimatação confere habilidade de manutenção da fluidez de membranas biológicas abaixo da temperatura crítica para o indivíduo. Esse fenômeno é conhecido como aclimatação

homoviscosa ou, alternativamente, aclimatação homeofásica (Buda e col., 1994; Lemieux e col., 2008). Os efeitos da temperatura no padrão de distribuição dos ácidos graxos e ação de enzimas que participam da manutenção da fluidez da membrana em diferentes organismos têm sido reportados por vários autores, sendo que a primeira observação foi feita em 1901 (Torrengo e Brenner, 1976).

Quando se analisa a exposição aguda de animais às baixas temperaturas é possível observar na maioria das vezes um aumento na porcentagem de ácidos graxos insaturados nas membranas celulares e redução na porcentagem de ácidos graxos saturados. Uma revisão da literatura mostra que, de forma geral, animais que vivem em temperaturas mais baixas apresentam uma maior porcentagem de ácidos graxos polinsaturados (PUFA) do que aqueles de clima tropical (Hazel e Willians, 1990). Essas variações alteram o ponto de fusão dos ácidos graxos esterificados nos fosfolipídios das membranas biológicas, alterando assim a fluidez das mesmas (Hazel, 1989).

A habilidade das células de modular características físicas de suas membranas é desempenhada pelas enzimas ácido graxo dessaturases, que operam em resposta a baixas temperaturas de forma a assegurar as propriedades físicas que atuam na manutenção do gradiente de íons e restauração de funções de enzimas associadas às membranas (Murata e Wada, 1995). Pensando nisso Murata e Los, (1997), em revisão sobre estrutura e expressão

Revisão:

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de ácido graxo dessaturases, postularam 2 questões importantes que deveriam ser respondidas a respeito dos mecanismos moleculares da regulação da expressão de genes de dessaturases em resposta à mudança de temperatura:

1- Como um organismo “sente” a mudança de temperatura?

2- Como esse sinal é transmitido para regiões reguladoras de genes de enzimas dessaturases para induzir sua ativação em condições de baixas temperaturas?

Tentando responder essas questões, aqueles autores formularam o seguinte modelo: abaixo de determinadas temperaturas a fluidez das membranas decresce. Esse sinal é detectado por um sensor de baixa temperatura e transmitido para mecanismos reguladores que direta ou indiretamente interagem com regiões reguladoras de genes que codificam enzimas dessaturases, ativando-os e levando a uma maior expressão das enzimas. Como resultado, o nível de enzimas aumenta e os ácidos graxos passam por processos de insaturação. Finalmente, o acúmulo de ácidos graxos insaturados leva à recuperação da fluidez de membrana e à restauração da atividade de enzimas membrana-associadas. Nesse modelo, as membranas assumem um papel chave na percepção e transdução de sinais de temperatura para regiões regulatórias de genes dessas enzimas. Porém, naquele momento (1997), não se sabia como esses sinais eram reconhecidos pela maquinaria de expressão e tradução das enzimas.

Após muitos anos de pesquisa alguns pontos dessa sinalização começaram a ser elucidados e em 2000 os mesmos autores, Los e Murata, descreveram alguns sinalizadores principais, a saber :

-Proteínas quinase C em fungos; -Mudanças na concentração de

adenosina 3’5’ monofosfato em humanos; -Aumento da concentração de Ca2+ em

peixes e anfíbios; -E, atividade aumentada dos receptores

de fosfolipase C em ratos (Los e Murata, 2000). Estrutura, função e regulação da

expressão gênica das enzimas dessaturases Dessaturases de ácidos graxos são

enzimas que convertem uma ligação simples (C-C) a uma dupla (C=C) entre dois átomos de carbono na cadeia de ácidos graxos, como por exemplo nas posições ∆6, ∆9 ou ∆12 (Cossins e col., 2002), alterando, em casos extremos a temperatura de transição das membranas plasmáticas de gel (sólido) para líquido cristalino, promovendo a fluidez (Russel, 1984) e comprovadamente estão presentes em todos os grupos de organismos (Los e Murata, 1998).

A reação desencadeada por essas enzimas requer oxigênio molecular e ocorre em condições aeróbicas (Los e Murata, 1998), sendo

uma reação de oxidação, que requer 2 elétrons em adição a uma molécula de oxigênio. Ferredoxina é o doador de elétrons na reação catalisada pela acil-ACP dessaturase em cianobactérias e por acil-lipídeos em plastídeos de plantas, em contraste, as acil-CoA de animais e fungos se utilizam de citocromo b5 como doadores de elétrons (Los e Murata, 1998). As acil-coA de animais são expressas de forma mais efetiva no retículo endoplasmático do fígado dos animais e podem responder a centenas de estímulos endógenos e exógenos (Trueman e col., 2000).

A temperatura é considerada o principal elemento regulador do aumento de expressão de enzimas dessaturases, porém, essa regulação é dependente da extensão da mudança termal em contraste com a simples queda ou elevação da temperatura, por exemplo, quando células aclimatadas a 38°C são levadas a 30°C existe um aumento de transcritos da desA (dessaturase A) , enquanto que em células aclimatadas a 36°C esse aumento começa a ser detectado somente a 26°C (Los e col.,1993).O trabalho de Podrabsky e Somero,(2004) ressaltou também a importância das flutuações diárias da temperatura na regulação da expressão gênica da enzima dessaturase, encontrando maior quantidade de RNA mensageiro da enzima em animais que passavam o dia na temperatura ambiental, sem controle (20 a 37°C aproximadamente) quando comparado a animais aclimatados a temperaturas constantes (20-30-37°C). Todas essas observações feitas pelos autores abriram um grande leque de conhecimento sobre a expressão gênica nos diferentes modelos experimentais nas diferentes condições metodológicas empregadas, e começou-se a desenhar, como ocorreram para todos os fenômenos de regulação da expressão gênica descobertos, modelos de como o controle da temperatura age sobre regiões regulatórias e genes codificadores chegando-se à hipótese de que, durante a aclimatação, e mais extremo, na adaptação frente a mudanças ambientais, 2 tipos de respostas de regulação são esperados:

- Regulação qualitativa - mudança no tipo de proteína expressa, como no caso de produção de isoformas que desempenhariam a mesma função, com algumas propriedades bioquímicas distintas;

- Regulação quantitativa - aumento da quantidade de transcritos de RNA mensageiro e consequentemente de proteínas produzidas (Schulte, 2004).

Para exemplificar esses dois tipos de regulação foi escolhida a enzima dessaturase mais estudada em relação à aclimatação a baixas temperaturas, a estearoil-CoA ∆9 dessaturase, que age acrescentando uma insaturação entre os carbonos 9 e 10 da cadeia de ácidos graxos, modificando assim, propriedades físicas da membrana e como resultado final aumentando a

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fluidez da mesma, sendo que essa enzima age em conjunto com acil-transferases específicas que posicionam esses ácidos graxos modificados nos fosfolipídeos (Trueman e col.,2000, Pereira e col., 2003 e Polley e col.,2003).

Polley e col., (2003) demonstraram que carpas apresentam a expressão de 2 isoformas de estearoil-CoA ∆9 dessaturase (SCD), sendo que cada uma dessas isoformas responde a um tipo de estímulo especifico, a SCD1 aparece como sendo responsiva a dietas enriquecidas com ácidos graxos saturados enquanto que a SCD2 apresenta aumento da expressão gênica em resposta a mudanças na temperatura ambiental. A diferença entre essas duas isoformas está relacionada a um processo de splicing alternativo em que a segunda isoforma perdeu cerca de 21 aminoácidos de sua cadeia.

Esse fenômeno de duplicação possivelmente ocorreu no genoma de teleósteos primitivos e foi evolutivamente conservado em alguns grupos, como é o caso dos Ciprinideos e de algumas espécies de peixes antárticos, possivelmente tendo divergido em suas regiões regulatórias, cada qual respondendo a diferentes estímulos fisiológicos, porém não divergindo em suas sequências codificadoras (Evans e col.,2008). Esse mecanismo promoveria a esses grupos, num contexto ambiental adverso a adição de enzimas complementares que confeririam maior plasticidade fisiológica, e como consequência capacidade de tolerância a amplas condições ambientais (Polley e col.,2003).

Exemplificando-se agora a regulação quantitativa, novamente verificou-se que dois tipos de regulação da expressão gênica são esperados, o primeiro em que RNAs mensageiros latentes são ativados em processos pós-transcricionais quando o animal é defrontado com condições ambientais adversas, e num segundo momento, por sinalização da primeira resposta, novos transcritos são produzidos e existe um aumento da expressão gênica das enzimas dessaturases, esse fenômeno foi verificado em muitos trabalhos, como por exemplo, Trueman e col., (2000) testando a aclimatação a frio de carpas encontrou alta expressão de RNA mensageiro (2 a 4 vezes maior que no grupo controle) somente no 2º dia de tratamento, enquanto que ação enzimática aumentada ocorreu em apenas algumas horas de aclimatação.

Outro trabalho relatando a regulação da expressão gênica quantitativa mostrou também a capacidade de diferentes espécies de suportar grandes mudanças de temperatura ambiental. Hsieh e Kuo, (2005) testaram a aclimatação a frio (25 15°C) em “milkfish” e carpa-comum, encontrando altas concentrações de RNA mensageiro de SCD no primeiro grupo nos primeiros 4 dias de experimento, enquanto que as carpas mantinham quantidades sempre constantes de transcritos ao longo do tempo,

porém, no 8º dia os “milkfish” morreram por falência metabólica enquanto que as carpas sobreviveram até o final do experimento, mostrando assim a plasticidade fenotípica das carpas em modificar sua temperatura de conforto de forma mais eficiente quando comparado à outra espécie testada.

Em animais de clima temperado marinhos muitos estudos descrevem a expressão gênica e funcional da enzima SCD dessaturase para peixes em ambiente natural e em condições ambientais alteradas (Kraffe, e col., 2007; Buda, e col.,1994; Tocher, e col., 2006; Hazel, e Willians., 1990).

No entanto, para animais nativos de clima tropical poucos trabalhos foram realizados e somente a composição de ácidos graxos teciduais é normalmente avaliada (Andrade e col., 2006), sendo que o único trabalho encontrado a respeito da ação de enzimas dessaturases atuando no metabolismo lipídico de peixes de ambiente tropical nativos da América do sul data de 1976 (Torrengo e Brenner, 1976). Esta escassez de informações reforça a necessidade de trabalhos nesses ambientes, principalmente em ecossistemas com grande ação antrópica, e, mais especificamente tratando de aclimatação a mudanças climáticas, sendo que um dos mais importantes e urgentes desafios da fisiologia atual é entender a natureza dos efeitos diferenciais dessas mudanças sobre diferentes espécies.

Os principais desafios enfrentados são: (1) entender como as mudanças ambientais interferem tanto da história de vida de um animal quanto nos níveis populacionais; (2) as vias limitantes as quais os organismos ajustam a sua fisiologia e diminuem o estresse gerado por modificações ambientais nocivas, induzidas ou aceleradas pela ação antrópica, predizendo o intervalo de respostas possíveis a tais mudanças, e finalmente, (3) revelar quais aspectos dos ciclos de vida dos indivíduos de uma população são mais afetados por mudanças ambientais.

Para a resolução de praticamente todos os desafios descritos acima o estudo da regulação da expressão gênica é uma ferramenta útil, principalmente quando se tenta entender qual variação na amplitude de temperatura é necessária para que a resposta de aclimatação seja iniciada nas membranas celulares de diferentes organismos e, quais são os sinais reconhecidos e como eles são traduzidos nesse tipo de resposta.

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REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA NA DEPRESSÃO METABÓLICA SAZONAL EM MAMÍFEROS

Lilian Cristina da Silveira

Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

[email protected] Resumo. Diversos animais exibem uma acentuada redução da taxa metabólica de repouso durante o

ciclo anual, associada a períodos de escassez de oxigênio, água, alimento, ou calor. Evidências sugerem que a inibição dos processos de transcrição e tradução contribui significativamente para a depressão metabólica sazonal, embora certas proteínas sejam mais expressas nessa fase. Em mamíferos hibernantes, a regulação da transcrição aparentemente envolve ajustes em diversos níveis, tais como estrutura da cromatina, atividade da RNA polimerase II, fatores de transcrição, splicing alternativo, microRNAs, além de ajustes na estabilidade do mRNA.

Palavras-chave – Depressão metabólica, expressão gênica, síntese proteica. REGULATION OF GENE EXPRESSION DURING SEASONAL METABOLIC DEPRESSION IN

MAMMALS Abstract. Many organisms exhibit a marked decrease of resting rates of metabolism during the annual

cycle, associated with lack of oxygen, water, food, or heat. Inhibition of the processes of transcription and translation may contribute significantly to the metabolic depression, although some proteins have increased expression during this condition. In hibernating mammals, regulation of transcription apparently occurs by adjustments at distinct levels, such as chromatin structure, RNA polymerase II activity, transcription factors, alternative splicing, microRNAs, besides changes in mRNA stability.

Keywords – Metabolic depression, gene expression, protein synthesis. 1. Introdução A habilidade de deprimir a taxa metabólica

de repouso e ingressar em um estado de dormência frente a condições ambientais desfavoráveis é de ampla ocorrência nos animais e é considerada um dos exemplos mais fascinantes de plasticidade fenotípica. A depressão metabólica é caracterizada por uma redução geral da atividade, por uma inibição coordenada dos processos que produzem e consomem energia nas células, além de ajustes específicos, como mudanças no tipo de substrato energético preferencial e de catabólitos acumulados (Carey e col., 2003; Storey e Storey, 1990; Storey e Storey, 2004).

Ao contrário da dormência sazonal contínua apresentada por alguns anfíbios e répteis, em pequenos mamíferos, a hibernação consiste de fases de torpor que duram de uma a três semanas, interrompidas por despertares que, geralmente, duram menos de 24 horas. Durante as fases de torpor o animal permanece inativo e a temperatura corpórea cai a valores tão baixos quanto 0ºC. Durante os despertares os animais retomam a temperatura corpórea da atividade (aproximadamente 37 ºC) e restabelecem todas as funções fisiológicas. Dada necessidade de rápido restabelecimento das funções fisiológicas no despertar, cada ciclo de torpor parece ser regulado em grande parte por mecanismos reversíveis, como fosforilação reversível de enzimas, e em menor proporção por mudanças dos padrões de expressão gênica (Storey e Storey, 2004).

Uma vez que as atividades de síntese protéica e transcrição gênica utilizam, respectivamente, 25%-30% e 1%-10% do ATP produzido nos tecidos de mamíferos no estado basal (Rolfe e Brown, 1997), a inibição desses processos contribui de maneira significativa para a economia energética durante a dormência (Carey e col., 2003). No tecido hepático de esquilos Spermophilus lateralis, durante o torpor, observa-se uma redução de duas vezes das taxas de iniciação da transcrição e inibição da elongação do transcrito nas baixas temperaturas típicas do período de hibernação (Van Breukelen e Martin, 2002). Dada a pronunciada inibição da transcrição, durante a depressão metabólica provavelmente não há grandes alterações ou ativação de muitos genes. De fato, têm sido relatadas poucas alterações, que são extremamente específicas e servem a necessidades pontuais (Carey e col., 2003; Storey e Storey, 2004).

Algumas das proteínas que têm a expressão ativada durante a hibernação estão envolvidas nos ajustes que permitem a mudança do substrato preferencial de carboidratos para lipídios. A isoforma 4 da piruvato desidrogenase quinase (PDK4), por exemplo, promove a mudança de substrato preferencial através da inibição da entrada de carboidratos no ciclo do ácido cítrico e encontra-se aumentada em vários tecidos (Andrews e col., 1998; Buck e col., 2002). Também já foi observada maior expressão das FABPs (fatty acid binding proteins), importantes para o transporte de lipídios dentro das células (Hittel e Storey, 2002) e da lipase pancreática no

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coração, possibilitando a lipólise em temperaturas reduzidas (Squire e Andrews, 2003). Adicionalmente, foi observada maior expressão de α2-macroglobulina no fígado, uma proteína que aumenta o tempo de coagulação sanguínea e inibe proteases (Srere e col., 1992), e expressão de diferentes isoformas de miosina no coração, que contribuem para a manutenção da contratilidade em temperaturas reduzidas (Fahlman e col., 2000).

Os mecanismos responsáveis pelo controle da expressão gênica durante o ciclo anual em mamíferos hibernantes só começaram a ser estudados recentemente e ainda são pouco compreendidos. De maneira geral, esses mecanismos já foram descritos em outros organismos e são conhecidos por atuarem em outras condições fisiológicas. Alguns dos poucos trabalhos que tratam do tema serão discutidos a seguir.

2. Mecanismos de regulação da

expressão gênica durante a depressão metabólica

2.1. Estrutura da cromatina As histonas são proteínas que se associam

à cromatina compactando-a nos cromossomos. Modificações covalentes das histonas, como acetilação, fosforilação, metilação e ubiquitinação, são determinantes da atividade de transcrição em determinada região do DNA (Verschure, 2004). Tem sido demonstrado que a acetilação das histonas facilita o acesso de fatores de transcrição ao DNA (Lee e col., 1993) e que a fosforilação também possui efeito positivo no processo de transcrição gênica (Nowak e Corces, 2004). Morin e Storey (2006) observaram que embora a quantidade total de histonas H3 não mude no músculo esquelético de esquilos entre os estados ativo e hibernante, a quantidade de histonas acetilatas e fosforiladas sofreu uma redução de 38-39% durante a hibernação e a atividade das deacetilases aumentou 1,82 vezes. Estes resultados sugerem que pelo menos esses dois mecanismos de modificação da estrutura da cromatina contribuem para a depressão das taxas de transcrição durante a hibernação no tecido muscular esquelético desses animais (Morin e Storey, 2006).

2.2. RNA polimerase II A RNA polimerase II (RNA pol II) é a enzima

que, juntamente com fatores de iniciação, elongação e cofatores, catalisa a síntese de uma molécula de mRNA a partir de um molde de DNA, nucleotídeos trifosfatos e ATP. No músculo esquelético de esquilos durante o período de hibernação, a atividade da RNA pol II encontra-se reduzida 57% em comparação com animais ativos, embora não tenha sido observada alteração da quantidade total da proteína (Morin e

Storey, 2006). Importante realçar que a atividade da RNA pol II foi medida a 37 °C e que a hibernação nesses animais geralmente acontece a temperaturas corpóreas entre 10 e 2 °C (Carey e col., 2003), nas quais essa inibição se tornaria ainda mais pronunciada em função do efeito termodinâmico da temperatura. A redução de 57% observada, portanto, provavelmente se deve a alterações na RNA pol II (Morin e Storey, 2006).

A RNA pol II possui um domínio C-terminal (CTD – C-terminal domain) composto por repetições de uma sequência de peptídeos (YSPTSPS) que apresenta propriedades de regulação e papel fundamental no processamento da molécula de pré mRNA (Morin e Storey, 2006; Zorio e Bentley, 2004). O CTD é substrato para diversas quinases e fosfatases que modificam resíduos de serina e produzem superfícies diferenciadas para a associação de diferentes fatores durante as diversas fases da transcrição e processamento simultâneo do mRNA (capeamento, splicing e poliadenilação) (Zorio e Bentley, 2004). O CTD é fosforilado no resíduo de serina 5 (Ser5) pela quinase associada ao fator de transcrição TFIIH no início do processo de transcrição favorecendo a associação das enzimas de capeamento ao CTD. Posteriormente esses fosfatos são removidos e outros são colocados no Ser2 por outras quinases, o que tem sido sugerido favorecer a associação de fatores relacionados à poliadenilação da extremidade 3’ do mRNA em Drosofila (Ni e col., 2004; Zorio e Bentley, 2004). Dessa maneira, os processos de transcrição e processamento do mRNA são intimamente relacionados e mutuamente regulados e, embora os mecanismos ainda sejam pouco compreendidos, pode-se assumir que a associação de enzimas relacionadas ao processamento do mRNA com o CDT da RNA pol II influencia a atividade de transcrição da enzima (Zorio e Bentley, 2004).

Com essas relações em perspectiva, Morin e Storey (2006) avaliaram a quantidade de RNA pol II fosforilada no Ser5 no músculo esquelético de esquilos e observaram um aumento de 1,79 vezes durante a hibernação. Este dado permite sugerir que provavelmente o controle da transcrição durante a hibernação também ocorre devido à modificação do estado de fosforilação do CTD da RNA pol II. Entretanto, sabe-se que a fosforilação de Ser5 e Ser2 não é obrigatória para a transcrição (Serizawa e col., 1993) e que pol II que não possui o CTD é capaz de realizar transcrição (Zorio e Bentley, 2004). Este aumento da quantidade de pol II fosforilada no Ser5 pode indicar que a RNA pol II no músculo do animal que está hibernando se encontra na posição de iniciação, pronta para transcrever os genes, mas não necessariamente ativa (Morin e Storey, 2006).

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2.3 Fatores de transcrição: Receptores nucleares

Receptores nucleares são fatores de transcrição ativados por uma variedade de ligantes, hormônios ou metabólitos, que atuam na regulação da expressão de genes envolvidos em diversos processos: reprodução, desenvolvimento, lipogênese, oxidação de ácidos graxos e carboidratos, ritmo circadiano entre outros. Dada a atuação dos receptores nucleares nessa variedade de processos, é muito provável que esses receptores participem dos ajustes fisiológicos relacionados à dormência sazonal (Chawla e col., 2001; Nelson e col., 2009).

Os receptores nucleares tipicamente possuem a seguinte constituição: um domínio amino-terminal, que mantém função de transcrição independente de ligante; uma região central de ligação ao DNA, que possui dois “zinc finger” altamente conservados; uma região de dobra, que proporciona flexibilidade à proteína e permite a dimerização do receptor e a ligação ao DNA simultaneamente; e uma região carboxi-terminal, que compreende a região de interação com o ligante (Chawla e col., 2001).

Embora a estrutura desses receptores seja bastante conservada evolutivamente, sua função e mecanismos de ação são bastante diversos (Germain e col., 2006). Os receptores nucleares podem se localizar constitutivamente no núcleo, independente da presença ou ausência de ligantes, ou no citoplasma, se deslocando para o núcleo quando associados a seus ligantes. A interação com o ligante desencadeia alterações conformacionais no receptor que favorecem a dissociação de co-repressores e o recrutamento de co-reguladores e proteínas que modificam a estrutura da cromatina. Os receptores nucleares podem se ligar à sua região específica no DNA como monômero, homodímero ou heterodímero formado com o RXR (retinoid X receptor), promovendo o recrutamento e ação da maquinaria de transcrição. Por outro lado, alguns receptores nucleares funcionam como silenciadores da transcrição na ausência de ligantes, devido ao recrutamento de co-repressores para as regiões promotoras dos genes alvo (Chawla e col., 2001; Germain e col., 2006).

O grupo dos receptores nucleares compreende os receptores de hormônios esteróides, como o receptor de estrógeno (ER) e de glicocorticóides (GR), os receptores órfãos, que possuem ligantes e função ainda desconhecidos, e os receptores órfãos adotados, cujo papel biológico e ligantes foram identificados recentemente. Na maioria dos casos os ligantes são moléculas lipofílicas, derivados de ácidos graxos ou são ácidos graxos. São exemplos de receptores órfãos adotados os FXRs (farnesoid X receptors), LXRs (liver X receptors) e PPARs (peroxisome proliferator activated receptors)

(Chawla e col., 2001; Nelson e col., 2009). Por serem mais discutidos na literatura relacionada à hibernação, embora ainda sejam poucos trabalhos, trataremos somente dessa última família de receptores: os PPARs.

Os PPARs têm papel fundamental na regulação do metabolismo de lipídios, coordenando os eventos de deposição e mobilização de lipídios e auxiliando na prevenção dos riscos inflamatórios associados a esses processos. São conhecidas três isoformas de PPARs: PPARα, mais expressa no fígado e nos músculos, PPARβ/δ, expressa em vários tecidos e PPARγ, predominante nos órgãos adiposos. Estes fatores de transcrição podem atuar por diferentes mecanismos, ativando ou inibindo a transcrição gênica, e formam heterodímeros com o RXR. A associação ao ligante, geralmente um ácido graxo insaturado, resulta na liberação de co-repressores e ligação de co-ativadores e outras proteínas auxiliares que promovem a transcrição do gene (Nelson e col., 2009). Membros da família do co-ativador-1 do PPARγ (PGC-1) são importantes co-reguladores de PPARs, assim como de vários outros receptores nucleares (Finck e Kelly, 2006) e estão envolvidos também na regulação da expressão dos próprios receptores nucleares com os quais se associam para regular a expressão de outros genes (Schreiber e col., 2003).

Aumento da expressão do mRNA e da proteína dos PPARs e PGC-1α em vários tecidos já foram relatadas em três espécies durante a o estado hipometabólico: no morcego Myotis lucifugus (Eddy e Storey, 2003), no esquilo terrícola Spermophilus tridecemlineatus (Eddy e col., 2005) e no roedor Jaculus orientalis (El Kebbaj e col., 2009). Da mesma maneira, a expressão de PPARα é induzida durante o jejum em camundongos não-hibernantes (Kersten e col., 1999) sugerindo que os PPARs participam de um padrão de ajustes que possibilitam a manutenção da homeostase energética durante o jejum em mamíferos em geral (Eddy e Storey, 2003; Kersten e col., 1999). Tais alterações da expressão dos PPARs são consistentes com alterações da expressão dos genes regulados por PPARs, como o da PDK4 (Andrews e col., 1998; Buck e col., 2002; Wu e col., 1998) e das FABP (Hittel e Storey 2002) e com a mudança do substrato energético preferencial durante o jejum associado ou não à hibernação.

2.4 Splicing alternativo O splicing é um dos passos no

processamento do pré-mRNA, através do qual acontece a retirada dos íntrons, regiões “não traduzidas”, e junção dos éxons, constituindo o mRNA maduro. O splicing alternativo permite que diferentes mRNA e potencialmente diferentes proteínas, sejam formados a partir de um mesmo pré-mRNA. Esse processo amplia a quantidade

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de proteínas que podem ser codificadas por um mesmo segmento gênico e propicia mais um nível na regulação da expressão gênica.

Gervois e col. (1999) identificaram em vários tecidos de humanos, inclusive hepático e adiposo, uma variante do PPARα humana (PPARαWT – 52kDa) que não possuía uma parte da região da dobradiça, que confere flexibilidade ao receptor, assim como todo o domínio carboxiterminal, região de interação com o ligante. Devido à sua estrutura rígida, essa proteína foi denominada PPARα truncada (PPARαTR – 29kDa). Os pesquisadores observaram que o mRNA do PPARαTR representava 20-50% de todo o conteúdo de mRNA de PPARα e era resultado de um processo de splicing alternativo no qual o éxon 6 estava ausente, resultando na presença de um códon de parada prematuro e consequentemente na produção de uma proteína incompleta. A proteína PPARαTR se localizava predominantemente no citoplasma e, apesar de não se associar ao DNA, quando presente no núcleo, interferia negativamente na função do PPARαWT, além de outros receptores nucleares, incluindo PPARγ, por competir por coativadores (Gervois e col., 1999).

Uma década depois, El Kebbaj e col. (2009) observaram que, assim como em humanos, os dois tipos de PPARα, PPARαWT e PPARαTR, são expressos no tecido hepático de um pequeno roedor hibernante, Jaculus orientalis, e que a razão PPARαWT/PPARαTR, que indica a quantidade efetiva de PPARαWT, se altera em função da fase do ciclo anual. Durante a pré-hibernação a razão PPARαWT/PPARαTR se eleva, concomitantemente à expressão de genes regulados pelo PPARα. Adicionalmente, durante a fase de hibernação, a quantidade do PPARαTR foi drasticamente reduzida chegando quase não ser identificado, o que resulta em uma maior fração de PPARαWT livre dos efeitos negativos do PPARαTR. Tais resultados são coerentes com o já conhecido papel do PPARα nas respostas de adaptação ao jejum e regulação da oxidação hepática de ácidos graxos (El Kebbaj e col., 2009) e sugerem o splicing como um importante mecanismo de regulação da expressão gênica durante o hipometabolismo.

2.5 MicroRNAS MicroRNAs (miRNAs) são pequenos RNAs

endógenos, que não codificam proteínas, constituídos de ~22 nucleotídeos e que formam uma das maiores classes de moléculas reguladoras da expressão gênica nos animais (Bartel, 2004). Em muitos casos as sequências que codificam os miRNAs são conservadas e estima-se que os miRNAs regulem cerca de 50% de todos os mRNA de vertebrados (Friedman e col., 2009; Sharp, 2009). Essas pequenas moléculas de RNA se ligam a uma sequência situada na região não traduzida da extremidade 3’

do mRNA alvo impedindo a tradução e promovendo a degradação desse mRNA em um processo que envolve sua clivagem pela enzima Dicer (Friedman e col., 2009; Morin e col., 2008; Sharp, 2009).

Morin e col. (2008) investigaram a expressão de alguns miRNAs de função conhecida em quatro órgãos de esquilos Spermophilus tridecemlineatus e encontraram evidências de que esse seria um importante mecanismo de regulação gênica durante a hibernação. Mir-21, um miRNA com função anti-apoptótica, encontra-se mais expresso no rim dos esquilos durante a hibernação, corroborando com dados encontrados para o tecido intestinal, no qual há um aumento de proteínas anti-apoptóticas durante a hibernação (Fleck e Carey, 2005). Transcritos de mir-24, um miRNA que afeta o crescimento celular, encontram-se reduzidos no coração (50%) e músculo esquelético (30%) durante a dormência, consistente com a supressão do crescimento como componente da depressão metabólica global (Morin e col., 2008).

A enzima responsável pela clivagem do mRNA, Dicer, aumentou significativamente no coração dos animais durante a hibernação, sugerindo um aumento do processamento de miRNAs no coração dos animais durante essa fase (Morin e col., 2008). De fato, em comparação com outros órgãos, a função do coração na hibernação é única: esse órgão deve continuar a bombear sangue, embora, muitas vezes, a uma temperatura corpórea muito menor e contra uma resistência periférica maior do que durante a fase ativa do animal (Andrews e col., 1998; Fahlman e col., 2000) e para isso, necessita de vários ajustes metabólicos e da maquinaria de contração. Os autores sugerem que uma maior quantidade de Dicer possa ser um indício de que miRNAs estão sendo produzidos em grandes quantidades durante a hibernação e são necessários para o silenciamento gênico, entretanto, no rim, um órgão que sofre depressão pronunciada durante a hibernação, os níveis da Dicer diminuíram em comparação com animais ativos (Morin e col., 2008). É possível que exista uma maior ênfase em determinados mecanismos de regulação da expressão gênica ou em outros em diferentes órgãos, de maneira que as necessidades específicas de cada tecido sejam alcançadas por diferentes combinações de mecanismos atuando juntos.

2.6 Estabilidade do RNA – Cauda poli-A As extremidades 3’ da maioria dos pré-

mRNA eucarióticos são complementadas pela adição de uma sequência de nucleotídeos adenina, denominada cauda poli-A, que possui importante papel no término da transcrição, transporte para o citoplasma, tradução e estabilidade do mRNA (Ross, 1995; Zorio e Bentley, 2004). A deadenilação, ou seja, a

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remoção da cauda poli-A, é o primeiro passo na degradação de muitos mRNA e a estabilidade dessa molécula pode ser inferida com base no tamanho da cauda poli-A (Knight e col., 2000).

Além da cauda poli-A, vários outros fatores, como estruturas primária e secundária, taxa de tradução e localização intracelular, influenciam a estabilidade do mRNA que, por sua vez, possui papel determinante na expressão gênica em todos os organismos. Nas células de mamíferos, a quantidade de um determinado mRNA pode sofrer flutuações em função de mudanças na meia-vida do mRNA sem que ocorra alterações na taxa de transcrição (Ross, 1995).

Knight e col. (2000) demonstraram que os níveis de mRNA permaneceram constantes durante o torpor no tecido hepático de esquilos Spermophilus parryii. Uma vez que a taxa de transcrição está extremamente inibida ou ausente nas baixas temperaturas típicas da hibernação (Van Breukelen e Martin, 2002), a manutenção de níveis constantes de mRNA foi atribuída à estabilização dos transcritos, como sugerem a conservação do tamanho da cauda poli-A e a presença de uma proteína (poly-A binding protein-PABP) que se liga à cauda poli-A protegendo-a contra degradação (Knight e col., 2000; Ross, 1995). Este mecanismo preserva o mRNA de maneira que ele pode ser prontamente traduzido durante os despertares periódicos, possivelmente diminuindo o intervalo de tempo durante o qual o animal permanece aquecido, e favorecendo maior economia energética (Knight e col., 2000).

3. Considerações Finais Assim como em todos os processos

fisiológicos, a regulação da expressão gênica é um importante aspecto do fenômeno da hibernação. Embora tenham sido discutidos separadamente, é importante ter em perspectiva que os diversos mecanismos abordados aqui atuam em conjunto, simultaneamente, de forma rigidamente controlada e que eles se comunicam entre si. A compreensão dos mecanismos de regulação da expressão gênica envolvidos nos ajustes à depressão metabólica pode auxiliar a identificação de princípios unificadores que permitam o entendimento de outras condições fisiológicas, como patologias, por exemplo.

A habilidade de hibernar é amplamente observada nos mamíferos, podendo ser considerada uma característica ancestral e uma propriedade básica da sua fisiologia e sugerindo que o fenótipo hibernante pode não ser resultado da expressão de genes exclusivos de hibernantes, mas sim da expressão diferenciada de genes comuns a todos os mamíferos (Heldmaier e col., 2004; Storey, 2004).

Agradecimentos Agradeço a Profa. Dra. Silvia Cristina

Ribeiro de Souza pela orientação durante a

elaboração do texto e revisão do texto final e a Profa. Dra. Lucile Maria Floeter-Winter pelo suporte oferecido pela disciplina “Regulação da expressão gênica em processos fisiológicos” e revisão do texto.

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REGULAÇÃO GÊNICA DOS RECEPTORES DOS HORMÔNIOS TIREOIDEANOS DURANTE A METAMORFOSE DE ANFÍBIOS ANUROS

Vanessa Aparecida Rocha Oliveira Vieira

Laboratório de Metabolismo e Reprodução de Organismos Aquáticos, Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP

Recebido 13out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10 [email protected]

Resumo. Anfíbios anuros apresentam adaptações morfológicas e fisiológicas para sua vida terrestre.

A glândula tiróide é a principal responsável pela metamorfose e esse processo é coordenado pelo eixo hipotálamo-hipófise-tireóide. A cronometragem da metamorfose é então uma função combinada de síntese de hormônios e enzimas e todo esse processo é regulado por expressão gênica de cada componente desse eixo, desde os próprios hormônios envolvidos bem como seus receptores. Neste trabalho foi abordado como ocorre a regulação gênica dos receptores dos hormônios tiroidianos e a importância desse processo para o sucesso evolutivo do grupo.

Palavras-chave. Glândula Tiróide, Maquinaria de transcrição, Metamorfose, Receptores de hormônios tiroidianos.

GENE REGULATION OF THYROID HORMONE RECEPTORS DURING METAMORPHOSIS OF

ANURAN AMPHIBIANS Abstract. Anurans amphibians developed several morphological and physiological adaptations to their

earthly life. The thyroid gland is primarily responsible for the metamorphosis and this process is coordinated by the hypothalamic-pituitary-thyroid axis. The timing of metamorphosis is therefore a result of combined functions of synthesis of hormones and enzymes, processes that are regulated by gene expression of each component of that axis from de own hormones involved and their receptors. In this paper was approached how is gene regulation of thyroid hormone receptors and the importance of this process for the evolutionary success of the group.

Keywords. Thyroid gland, Transcription machinery, Metamorphosis, Thyroid hormone receptors 1. Biologia de Anfíbios Anuros O termo anfíbio significa “duas formas de

vida”, esses animais apresentam um ciclo de vida bifásico, iniciando-se como uma larva aquática, sofrendo metamorfose para um adulto e esse retorna para a água durante a reprodução para colocar ovos. (Hickman e col., 2004)

Os ovos, larvas e girinos, muitas vezes, se tornam mais vulneráveis a predação em relação aos adultos devido ao tamanho reduzido e relativa falta de mobilidade. Esses são uns dos motivos pelos quais esse grupo passa por adaptações para possibilitar sua existência terrestre como, por exemplo, a troca gasosa, que passa de brânquias para cutânea sendo suplementada na maioria deles por pulmões. (Duellman e Trueb, 1994).

Houve também a necessidade de adaptações no sistema esquelético, especialmente costelas, cinturas pélvicas e escapular e membros. As modificações das características dos sistemas auditivo e visual e das regiões associadas ao encéfalo facilitaram a percepção sensorial na terra, porém os ovos e pele desses animais não apresentam proteção efetiva (do ponto de vista fisiológico) as condições de temperaturas variáveis, como muito frio e muito calor, e necessitam de ambientes frescos e úmidos para reprodução e sobrevivência dos ovos. (Hickman e col., 2004)

2. O processo de Metamorfose

A metamorfose é caracterizada por uma série de mudanças estruturais, biológicas e fisiológicas pós-embrionárias. Há três principais mudanças: regressão de estruturas e funções que são somente para sobrevivência da larva, transformação de estruturas de larvas para adultos e desenvolvimento de estruturas e funções essenciais para adultos (Gilbert e Frieden, 1981). As alterações morfológicas, fisiológicas e comportamentais que ocorrem durante a metamorfose são muito complexas e envolvem extensa reprogramação da expressão gênica da forma larval para a forma adulta (Brown e Cai, 2007)

A glândula tiróide é considerada a principal responsável pelo desencadeamento da metamorfose em anfíbios. Os produtos primários desta glândula são dois hormônios: tetraiodotironina (T4) e triiodotironina (T3). Esta glândula aumenta em tamanho durante o desenvolvimento larval para que esses hormônios sejam estocados.

A síntese desses hormônios dependem da presença de grandes quantidades de uma proteína especializadas produzida pela tiróide, as tiroglobulinas, e o processo de síntese ocorre pela ligação de uma molécula de iodo nos resíduos de tirosina desta proteínas (iodização) (Tata, 2006).

O processo de metamorfose é caracterizado por um aumento nas concentrações de tiroxina

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(T4) circulantes (Huang e col., 2000). O hormônio T4 que contém iodo é o hormônio primário circulante. Para se tornar ativo, o T4 é convertido a T3 através do tipo II da enzima deiodenase iodotironina (D2). A cronometragem da metamorfose é então uma função combinada de síntese de T4 e da expressão de D2, que acontece primeiro nos membros e cauda. As concentrações de T3 e a expressão da enzima D2 suprimem a expressão da subunidade β do hormônio liberador de tireotropina hipofisário (TSH) (Huang e col., 2000). Nesse eixo o hipotálamo secreta o hormônio liberador de tireotrofina (TRH) que estimula a hipófise a liberar o hormônio estimulante da tiróide (TSH) nos folículos do tecido da tiróide promovendo a síntese e liberação dos hormônios triiodotironina (T3) e tiroxina (T4),essa secreção é regulada pelo “feedback” negativo desses dois hormônios (T3 e T4) no hipotálamo e na hipófise.(Randall e col., 2000) (Figura 1).

Figura 1. Eixo Hipotálamo-Hipófise-Tiróide. O hipotálamo libera TRH que estimula a hipófise a liberar TSH. Esse hormônio estimula a tiróide a produzir e liberar T3 e T4. Modificado de: http://www.scielo.br/img/revistas/ca/v18n3/ a03fig01.gif. (10/05/2009 )

3. Apoptose durante a metamorfose Após o início da indução hormonal na

metamorfose as larvas dos anfíbios apresentam uma rápida e substancial perda de células em muitos tecidos, que continua até o processo ser concluído. Esta perda de células é em número ou de todo o órgão no caso de brânquias e cauda. Esse processo pode ser bastante extenso em tecidos que são morfologicamente re-estruturados, tais como o cérebro, intestino, pâncreas e pele, que mais tarde irão sofrer ainda mais o desenvolvimento (Webber, 1969; Tata, 1994)

Estudos anteriores para explicar a indução hormonal da tiróide na regressão tecidual durante a metamorfose foram baseados em processos como infiltração macrofágica, expansão lisossomal ou ativação lítica de enzimas (Weber, 1969; Tata, 1994; Yoshizato, 1996). Comprovados mais tarde que junto a isso ocorre

uma explosão de transcrição e síntese protéica (Weber, 1965; Tata, 1966). Com a indução do hormônio T3 ocorre a síntese de enzimas como catepsinas, RNases e DNases que acompanham a regressão da cauda.

É interessante citar que outros hormônios, como a prolactina, bcl-2, são conhecidos por potenciar ou inibir a indução de TH PCD. Por exemplo, quando se administra glucocorticóides com T3, há uma regressão da cauda no girino, enquanto que a indução com prolactina,suprime esse processo (Tata e col., 1991).

4. Transcrição dos Receptores dos

hormônios tiroideanos A transcrição do material genético é um

importante processo bioquímico que está regulado de modo a afetar o estado biológico da célula sendo que a ativação ou repressão de conjuntos de genes desencadeia uma cascata de eventos que acaba conduzindo alterações nesta célula. Muitos eventos biológicos são controlados por esse tipo de regulação, incluindo a metamorfose de anfíbios (Shi e col, 1996a).

O receptor é o elemento-chave de muitos mecanismos de sinalização celular. Os TRs (receptores de hormônios tireoidianos) pertencem à superfamília de receptores nucleares que compreende 49 genes que codificam 75 proteínas diferentes, que estão envolvidas na transdução de sinais hormonais extracelulares em respostas transcricionais (Robinson-Rechavi e col., 2001). Esses receptores têm sido caracterizados como homólogos do oncogene ErbA (C-erb A, receptores de alta afinidade para T4), muitas vezes estreitamente vinculado a cromatina e proteínas e funciona como ligante- ativador de transcrição (Mangelsdorf e col., 1995; Laudet e Gronemeyer, 2002; Tata, 2002; Benoit e col., 2004). Os TR se dividem em dois sub-grupos: os que fazem complexos com proteínas e podem ativar a transcrição dos genes como monômeros ou homodímero (os receptores de hormônios esteróides também fazem parte desse grupo) e os receptores dos hormônios da Tiróide (TH), ácido retinóico, PPARs (Receptor Ativado por Proliferadores de Peroxissoma),e vitamina D que são caracterizados por formarem heterodímeros com um membro do mesmo sub-grupo de receptores nucleares (Fondell e col, 1993), esta segunda classe de receptor se destaca pelo fato de serem fortes repressores de transcrição.

Os membros da superfamília de receptores nucleares são fatores de transcrição dependentes do ligante e atuam ligando-se seqüências específicas no DNA, denominadas elementos responsivos ao hormônio (HRE). Apesar de todos os receptores nucleares não ativarem a transcrição sem o seu ligante, esses receptores podem atuar como repressores no início de transcrição em virtude de sua interação com uma proteína da região Tata box (TBP) (Fondell e col.,

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1993). Esses receptores, na ausência do hormônio, estão localizados predominantemente no núcleo, em solução ou ligados ao DNA.

O grau de especificidade gene-alvo para um hormônio depende do espaçamento entre os nucleotídeos, do elemento de resposta hormonal (HRE), do promotor do gene-alvo, dos domínios DNAbinding (DBD) e do receptor que reconhecê-lo. Os HREs geralmente estão localizados na região promotora dos genes alvos, são específicos para cada receptor e possuem duas cópias imperfeitas de um hexanucleotídeo, que podem estar arranjadas em diferentes orientações, com espaçamento e seqüências flanqueadoras diferentes. Essa especificidade é o que confere a regulação de transcrição (Rastinejad e col., 1995).

A complexidade da regulação de transcrição, a organização dos genes no núcleo e as interações entre fatores reguladores têm demonstrado a importância do papel da estrutura da cromatina na regulação da expressão gênica por hormônios. Estudos demonstraram que a função do receptor glicocorticóide na regulação do gene promotor é determinada pela maneira em que ele está organizado dentro da cromatina, e tanto a inibição quanto a ativação do gene é determinada por processos que controlam a montagem do nucleossomo (Wong e col. 1995)

4.1 Esquema da maquinaria de

transcrição dos receptores A maquinaria é formada basicamente pelo

heterodímero do receptor da tiróide (TH) com um membro do mesmo sub-grupo de receptores nucleares vinculados a repetição + 4 (DR + 4, significa que se ligou a sequências de repetições direta, AGGTCA NNNN AGGTCA, espaçado por 4 bases) formando o complexo RxR. A esse complexo estão associados os elementos DBD e LBD que indicam os domínios de ligação do DNA e do hormônio respectivamente, por TR que é um outro grupo de receptores nucleares, pela maquinaria basal de transcrição formada por POL II e BFS (fatores de transcrição basais) e pelo TRE (elemento de resposta a tiróide). Na ausência do hormônio ligante, os receptores ligam-se diretamente ao DNA na forma de heterodímeros (RxR) e se associam a correpressores que reprimem a transcrição do gene. Em uma primeira etapa, SMRT (Mediador de silenciamento do ácido retinócio e do hormônio tiroidiano) pode ser associado a essa maquinaria, evitando assim qualquer transcrição (Mangelsdorf e col., 1995).

A ligação do T3 a TR causa mudanças conformacionais promovendo a dissociação do correpressor SMRT do complexo, levando a um baixo nível de atividade transcricional. Em uma segunda etapa, acontece a interação entre TR, co-ativador de transcrição e maquinarias basal que leva a um forte estímulo da transcrição (figura

2). Os co-ativadores, por possuírem atividade histona acetil transferase (HAT), estimulam a transcrição ao acetilarem as histonas. A hiperacetilação das histonas relaxa a cromatina e facilita o acesso dos fatores de transcrição basal ao promotor do gene alvo, estimulando a atividade transcricional. (Yen, 2001).

Figura 2. Esquema do complexo TR-RXR em associação com os fatores positivos (co-ativador) e negativo (SMRT) na maquinaria basal de transcrição. Modificado de Mangelsdorf e col. (1995).

4.2 Principais domínios funcionais dos receptores

O TR possui domínios estruturais distintos compostos pela região amino-terminal, a região de ligação ao DNA (DBD) e a de ligação ao ligante (LBD) e ainda uma pequena região que conecta o DBD ao LBD, que é conhecida como dobradiça hinge (figura 3). O domínio amino-terminal é extremamente variável exibe uma função de ativação transcricional independente do ligante, denominada função de ativação. O DBD é o domínio mais bem conservado entre todos os receptores nucleares e tem como função principal a ligação ao DNA. O domínio de ligação do hormônio ou ligante é menos conservado que o DBD, refletindo a variedade de ligantes que atuam nesses receptores. Esse domínio localiza-se na região carboxi-terminal e possui várias funções, como a homo e heterodimerização do receptor, localização nuclear, dissociação das HSPs (Ribeiro e col., 1995) e interação com proteínas correpressoras e co-ativadoras (McKenna e O’Malley, 2002). Além dessas funções, o LBD contém uma superfície que é fundamental para a ativação transcricional, que se forma com a ligação do hormônio ao receptor. Após a ligação do hormônio, essa região, denominada função de ativação 2 (AF-2), passa a interagir com os co-ativadores, que permitirão a formação do complexo protéico envolvido na ativação da transcrição (Wu e col., 2001).

Figura 3. Estrutura primária dos domínios funcionais dos receptores nucleares. DBD região de ligação ao DNA, LBD

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região de ligação do hormônio e H dobradiça de união entre os domínios. Modificado de Barra e col., 2004.

5. Regulação da transcrição dos

receptores A expressão dos dois genes receptores de

TH, TRα e TRβ, apresentam controle da expressão gênica quando analisado em girinos de X. laevis. Nesta fase de desenvolvimento, vários tecidos que estão programadas para sofrer grandes alterações durante metamorfose mostram alta concentrações de mRNA para TR, tais como cérebro, fígado, intestino delgado e cauda (Yaoita e Brown, 1990; Kawahara e col., 1991)

Até a conclusão da metamorfose, existe uma boa correlação entre o acúmulo de transcrições de TR e níveis de hormônios tireoidianos circulantes em girinos Os níveis endógenos de hormônios da tireóide começam a subir durante a fase 54 de desenvolvimento em Xenopus Laevis, o período conhecido como pré-metamorfose como pode ser visualizado na figura 4 (Leloup e Buscaglia, 1977). Conforme pode ser observado nas figura 4, as quantidades relativas de mRNAs TRα e TRβ variam de acordo com a fase de desenvolvimento do girino. TRα aumenta próximo à fase 58, enquanto que TRβ aumenta em uma fase diferente do desenvolvimento, ou seja, próximo a fase 60.

Figura 4. Desenvolvimento de Xenopus. TR e regulação da expressão gênica durante o metamorfose espontânea. RNA foi extraído da cabeça (h, preto), membros (m, cinzento escuro

ou não sombreamento) e cauda (t, pálido cinzento) em diferentes fases de girinos (St), antes (39, 44 e 52), durante (58 e 62) e depois (66) metamorfose. A quebra de linhas indicam os níveis circulantes de T3 durante esse período. TR mRNA acumula em todos os tecidos em todas as fases,níveis mais elevados de TR mRNA. Modificado de Kawahara e col. (1991).

Vários estudos de laboratórios baseados em

Northern blotting, proteção com RNase e ensaios de hibridização in situ com RNA com girino de Xenopus estabeleceram que a administração exógena de T3 nas fases pré-metamórfotica em qualquer tecido provocou uma indução substancial de mRNA de TR (Kawahara e col., 1991; Rabelo e col., 1994; Shi e col., 1996b; Tata, 1996, 2003). Uma regulação semelhante foi observada em girinos de Rana catesbeiana (Atkinson e col.,1996).

Figura 5. Expressão de TRs, analisadas por RT-PCR (2wk ph, pós-incubação), durante o processo de metamorfose. L8 (proteína ribossomal constantemente expressa durante o desenvolvimento) foi utilizado como controle. TS siginifica a fase de desenvolvimento em que foi analisado. Modificado de Callery e Elinson, 2000.

A indução da transcrição de TR é dependente do estágio de desenvolvimento do girino, TRα é de 10 a 20 vezes mais abundante que TRβ (figura 5). Em relação à cinética, após um determinado estágio a quantidade de TRα aumenta de dois a quatro vezes em 48 horas de exposição a T3. Em contraste com os numerosos estudos sobre a transcrição dos genes de receptores nucleares, há poucos relatos sobre a distribuição nos tecidos e regulação hormonal da expressão do receptor de proteínas. Apenas duas publicações tratam TRα e TRβ durante desenvolvimento e metamorfose (Elicieri e Brown, 1994; Fairclough e Tata, 1997).

Usando anticorpos policlonais para detectar TRs no embrião de tecidos de Xenopus, Elicieri e Brown (1994) detectaram TRβ no início da metamorfose ou quando T3 exógena foi administrado na fase pré-metamórfica. À montante de dois receptores protéicos, verificou-se um aumento do acúmulo de mRNAs, que os levou a sugerir que TRβ foi induzida por ligação de TRα. No entanto, quando Tata e Fairclough (1997) utilizaram anticorpos monoclonais específicos para detectar as duas isoformas

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demonstraram a presença de ambos no núcleo de todos os tecidos analisados antes e durante a metamorfose. Importante perceber que a upregulação de TR ocorre quatro horas após a exposição do girino a T3 exógeno sendo requisito para re-programação gênica durante indução hormonal na metamorfose. Considerando que ambas as isoformas TR são auto induzidas por TH durante a metamorfose, TRβ tem demonstrado ter uma resposta direta como gene funcional em resposta da tireóide ( Tata,2006).

6. Considerações finais A metamorfose em anfíbios fornece

questões biológicas intrigantes como por exemplo o fato de um único hormônio controlar diversos processos de desenvolvimento, ou seja, algumas células são induzidas a morte e outras a se desenvolverem, pela ação do mesmo hormônio. Sendo assim, os anfíbios podem ser considerados um modelo para estudos dos processos de regulação gênica.

A regulação da expressão gênica é portanto um marco decisivo para muitas funções biológicas, dentre elas a ação dos hormônios tiroidianos e seus receptores, sendo esse processo um dos principais passos na transição larva/adulto. Vale lembrar também a importância dos fatores ambientais nesse contexto, o que promove plasticidade ao processo. A reostasia possibilita a adaptação do indivíduo frente a alterações do seu ambiente externo e interno. A qualidade do hábitat, como fotoperíodo, temperatura, são determinantes para o sucesso da reprodução/desenvolvimento e ações antrópicas, como por exemplo a ação de xenobióticos, vem interferindo diretamente na ação dos receptores dos hormônios tiroidianos retardando ou até mesmo inibindo a metamorfose de muitos grupos o que evolutivamente poderá gerar mais adaptações nos processo afim de garantir a sobrevivência da espécie.

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FATOR DE CRESCIMENTO DO ENDOTÉLIO VASCULAR (VEGF): REGULAÇÃO TRANSCRICIONAL E PÓS-TRANSCRICIONAL

Luciana Alves de Fátima*, Paula de Carvalho Papa

Setor de Anatomia, Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, USP Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

*[email protected]

Resumo. O Fator de Crescimento do Endotélio Vascular (VEGF) desempenha importante papel regulador no desenvolvimento vascular fisiológico, sendo que tanto a diminuição nos seus níveis ou sua ausência quanto o aumento provocam danos na formação vascular sistêmica. É um fator angiogênico amplamente estudado, e em tecidos onde a angiogênese é aumentada sua expressão é consideravelmente alta. A expressão desse fator é regulada por processos transcricionais e pós-transcricionais incluindo o splicing alternativo, hipóxia, hormônios, outros fatores angiogênicos e microRNAs. Desse modo, esta revisão tem como objetivo relatar alguns dos principais mecanismos que controlam a produção do VEGF.

Palavras-chave. Angiogênese, microRNAs, regulação gênica. VASCULAR ENDOTHELIAL GROWTH FACTOR (VEGF): TRANSCRIPTIONAL AND POS-

TRANSCRIPTIONAL REGULATION Abstract. Vascular Endothelial Growth Factor (VEGF) plays an important regulatory role in

physiological vascular development, and either its levels reduction or its absence damages vascular formation. It is an widely studied angiogenic factor and in tissues where angiogenesis is increased, its expression is considerably high. The expression of this factor is regulated by transcriptional and post-transcriptional processes, including alternative splicing, hypoxia, hormones, other angiogenic factors and microRNAs. Thus the objective of this review is to report some of the most important mechanisms that control VEGF production.

Keywords. Angiogenesis, microRNAs, gene regulation. Quando se fala em VEGF, alude-se a uma

família de moléculas semelhantes (isoformas), codificadas por um único gene e constituída por diversas proteínas identificadas por letras (VEGF-A a F; Paavonen e col., 1996; Achen e col., 1998; Meyer e col., 1999; Suto e col., 2005; Yamazaki e col., 2005) e também pelo fator de crescimento placentário (Park e col., 1994). O VEGF nativo ou VEGF-A consiste de uma glicoproteína homodimérica básica de 45 kDa, ligante de heparina, codificada por um único gene diretamente relacionado à angiogênese, com habilidade de promover o crescimento das células endoteliais derivadas de artérias e veias (Ferrara, 2004). A angiogênese é definida como a formação de novos vasos sanguíneos a partir de vasos pré-existentes em um processo envolvendo migração e proliferação de células endoteliais já existentes. É um processo complexo e requer um delicado balanço entre promotores e inibidores (Schams e Berisha, 2004).

A importância crítica do VEGF na angiogênese foi demonstrada estudando-se camundongos, nos quais a deleção de ambos ou um único alelo do VEGF mostrou-se letal durante o desenvolvimento fetal devido à interrupção da angiogênese embrionária; sua expressão aumentada de maneira anormal também induz a morte fetal, devido à hiper-vascularização e conseqüentemente aumento da quantidade e do volume celular levando ao aumento do tamanho dos tecidos (Hanahan, 1997; Stouffer e col., 2001).

O VEGF age através dos receptores VEGFR-1/Flt-1 (Fms-like tyrosine kinase – 1; De Vries e col., 1992), VEGFR-2/KDR (Kinase insert domain containing region; Terman e col., 1992) e VEGFR-3/Flt-4 (Fms-like tyrosine kinase – 4; Kaipainen e col., 1995; Karkkainen e col., 2002). São receptores tirosina-quinase (RTKs) caracterizados por possuírem sete domínios semelhantes à imunoglobulina em sua porção extracelular, uma região transmembrânica única e uma seqüência tirosina-quinase interrompida pelo domínio de inserção a quinase em sua porção intracelular (Shibuya e col., 1990).

Regulação transcricional do VEGF A hipóxia é um dos mais potentes

estimuladores do VEGF (Sharkey e col., 2000). Recentemente foi demonstrado que no útero de ratos, o estradiol induz a produção de VEGF via indução da produção e o recrutamento do fator induzido por hipóxia 1 α (HIF-1α; Kazi e col., 2005). O hormônio luteinizante (LH), a gonadotrofina coriônica humana (hCG) e o fator de crescimento semelhante a insulina 1 (IGF-1) também são potentes estimuladores da expressão e da secreção da proteína VEGF em células granulosas de bovinos (Schams e col., 2001). O hormônio folículo estimulante (FSH) diminui a expressão do mRNA do VEGF no corpo lúteo (CL) de búfalos. (Papa e col., 2007; Fátima e col., 2008). Já a progesterona tem um efeito estimulatório na produção de VEGF, em vários tipos celulares como células de câncer de mama (Hyder e col., 1998), células da granulosa de rato

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(Shikawa, 2003) e de bovino (Robinson col., 2007).

Outros fatores que regulam a expressão do VEGF são citocinas tais como o fator de necrose tumoral (TNFα), o fator de crescimento tumoral α e β (TGF-α e β), fator de crescimento epidermal, interleucinas e fator de crescimento fibroblástico básico (bFGF; Stavri e col., 1995; Robinson e Stringer, 2001; Schams e col., 2001 Gabler e col., 2004).

A indução do VEGF pela hipóxia, parece ocorrer tanto pela ativação da transcrição como também através da estabilização do mRNA do VEGF. O HIF-1 α se liga a uma seqüência na região 5` flanqueada do gene do VEGF chamada de elemento responsivo a hipóxia (HRE), aumentando a transcrição do gene. Outras moléculas também têm sido implicadas no controle transcricional do VEGF com o Sp-1, o qual estimula a transcrição pela ligação nas regiões ricas em G/C presentes no promotor do gene VEGF (Shi e col., 2001). O AP-1 é um fator transcricional dimérico da família das proteínas com zíper de leucina que são compostas por subunidades jun/jun ou jun/fos. Hipóxia, estresse oxidativo, e citocinas podem aumentar a expressão do VEGF através da síntese das proteínas jun e fos e aumento da atividade de ligação do AP-1. Outros fatores de transcrição podem também contribuir para indução e regulação do VEGF, incluindo stat-3 (Niu e col., 2002).

Splicing alternativo

O VEGF-A existe em várias isoformas codificadas a partir de quantidade de exons variada e conseqüentemente propriedades e padrões de expressão contrastantes. Em humanos, existem pelo menos oito isoformas do VEGF-A já descritas (VEGF121, VEGF145, VEGF148, VEGF165, VEGF165b, VEGF183, VEGF189 e VEGF206) que são geradas por splicing alternativo de um único gene. O nome dado as diferentes isoformas baseia-se na quantidade de aminoácidos que cada molécula de proteína secretada possui (Leung e co.,1989; Tischer e col.,1991; Houck e col., 1991; Poltorak e col., 1997; Lei e col., 1998; Robinson e Stringer, 2001).

A quantidade de aminoácidos define características de cada molécula como, por exemplo, a capacidade de ligação a heparina e sua solubilidade (Houck e col., 1991; Lange e col., 2003).

No homem, o gene do VEGF-A está localizado no cromossomo 6p21, e está organizado em oito exons separados por sete introns (Ferrara e col., 2003). O domínio codificado pelos exons 1 – 5 é conservado em todas as isoformas do VEGF, contendo os locais obrigatórios de ligação dos receptores do VEGF. As isoformas do VEGF diferem entre si devido a

presença ou ausência dos exons 6a, 7b, 7a e 7b do gene VEGF e exibem diferentes padrões de secreção, o que sugere diferentes funções fisiológicas. O VEGF121 é uma proteína com caráter ácido que não se liga a heparina sendo livremente difusível. Em contraste, o VEGF189 e VEGF206 se ligam a heparina com alta afinidade e são quase completamente seqüestrados na matriz extracelular e em menor extensão na superfície celular. Os VEGF165 e VEGF145 apresentam propriedade intermediária; eles são predominantemente secretados, mas uma fração significativa permanece no limite da superfície celular e matriz extracelular (Robinson e Stringer, 2001).

Em 2002 uma isoforma adicional foi identificada, o VEGF-Ab, a qual tem uma função anti-angiogênica (Bates, 2002). Esta isoforma é gerada pela seleção do local de splicing distal (DSS) no exon 8, em lugar da escolha do local de splicing proximal, como ocorre para formação do VEGF-A. A escolha do DSS pode ocorrer em conjunto com a inclusão ou exclusão dos exons 6 e 7. Assim, o splicing no mRNA do VEGF gera duas famílias de proteínas que diferem pelos seis aminoácidos finais do C’ terminal (Woolard e col., 2004). Detalhes do controle molecular da escolha do local de sliplicing no C’ terminal e o balanço pró-angiogênico e anti-angiogênico, ainda não estão esclarecidos (Nowak e col., 2008).

Regulação pós-transcricional do VEGF

Instabilidade A meia-vida dos mRNAs de eucariontes

em geral é de 10-12 horas, mas a do VEGF é menor que 1 hora (Levy e col., 1996). No entanto, já foi demonstrado que em situações de hipóxia a expressão do mRNA do VEGF aumenta de 2 a 3 vezes, devido ao aumento de sua estabilidade (Ikeda e col., 1995).

Um motivo consenso de desestabilização (AUUUA) de 1,6 Kb ocorre 8 vezes na região 3’ não traduzida (3’UTR) do VEGF humano (Claffey e col., 1998). Proteínas de ligação aos elementos ricos em AU (ARE) como as AUF1 e tristetrapolina (TTP) foram mostradas como desestabilizadoras de proteínas em várias células de mamíferos (Bernstein e col., 1989; Gorgoni e Gray, 2004). Em adição a esse efeito desestabilizador, os elementos ARE podem contribuir para a desestabilização do mRNA através de interações com a família ELAV (Embryonic Lethal Abnormal Visual) de proteínas ligantes de RNA, as quais incluem Hel-N, HuC, HuD, e HuR (Fan e Steitz, 1998a; King, 2000). Interessantemente, proteínas ligantes da cauda poli-(A) (PABP) predominantemente estabilizadoras para RNAs poliadenilados, também podem ter um efeito desestabilizador (Gorgoni e Gray, 2004; Hwang e col., 2006).

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As proteínas ligantes de RNA que interagem com o elemento 3’ UTR incluem HuR, hnRNP A1, hnRNP L, PABP, PAIP2 e TI5IId (Levy, 1998). HuR e hnRNP são proteínas predominantemente nucleares que têm a capacidade de se moverem entre o núcleo e o citoplasma, especialmente em situações de hipóxia. Identificações prévias de uma estrutura de loop na 3’ UTR do mRNA do VEGF mostrou que esse elemento pode promover estabilidade de RNAs heterólogos induzida por hipóxia (Claffey e col., 1996).

Steiz e colaboradores (1998) estabeleceram pela primeira vez a associação entre a degradação do mRNA e proteínas ligantes de RNA. Foi observado que alguns mRNAs são alvos de rápida degradação pela presença das AREs na 3’ UTR, determinando que a HuR exibe afinidade por AREs, e os níveis de HuR se correlacionam com a degradação do RNA (Fan e Steitz ,1998b). Em relação ao VEGF, foi observado que o aumento na estabilidade do mRNA coincidiu com a ligação da proteína em um ARE, formando um complexo de RNA e proteína que se apresentou elevado em um modelo induzido de hipóxia (Levy e col., 1996). Foi utilizada uma linhagem de células tumorais com deficiência em um tipo selvagem do gene supressor de tumor Von Hippel-Lindal, nas quais o mRNA do VEGF é constitutivamente estabilizado. Mais tarde, esta proteína foi identificada como sendo a proteína HuR (Levy e col., 1998). A inibição da expressão de HuR por uma seqüência antisense inibe a estabilização do mRNA do VEGF por hipóxia, demonstrando que essas proteínas tem uma importante função na estabilização pós-transcricional da expressão do VEGF (Levy e col., 1998)

A proteína HuR está localizada no núcleo onde se liga provavelmente ao mRNA do VEGF recém transcrito, transporta-o para o citoplasma protegendo-o da via de degradação mediada por ARE (Fan e Steitz, 1998a). O mecanismo pelo qual a HuR protege o VEGF da degradação foi investigado: de acordo com Goldberg-Cohen e colaboradores (2002) os fatores estabilizadores do RNA podem se localizar em um sítio de ligação distinto ao que seria ocupado pelas endonucleases e assim alterar as estruturas secundária ou terciária do RNA, tornando um local específico indisponível para endonucleases.

IRES (Internal ribosome entry site) Os mRNAs de eucariontes, processam o

Cap 5’ formada por 7–metilguanosina na região 5'UTR que é essencial no modelo canônico de tradução. Nesse modelo, os fatores de iniciação (eIFS) reconhecem e se ligam ao cap 5', e desenrolam a estrutura secundária da 5'UTR tornando-a assim viável para o escaneamento do ribossomo através da 5'UTR e tradução do mRNA a partir do códon de início de tradução AUG

(Pain, 1996). A maioria dos mRNAs são susceptíveis a conter os sítios de reconhecimento do ribossomo que se chamam IRES (internal ribosome entry site) na região 5'UTR, como habilidade para manter a eficiência da tradução sem utilização dos mecanismos dependentes de cap 5’. O ribossomo se liga nos IRES e desliza até o AUG mais próximo, quando se inicia a síntese protéica. Esses sítios facilitam o carregamento do mRNA para o ribossomo e uma tradução eficiente (Johannes e col., 1999; Mcclusky e col., 2005). Estas seqüências ricas em G/C têm uma estrutura secundária predita que fazem o sítio de iniciação da tradução acessível (Nesbit e col., 1999); assim não é necessário a utilização da estrutura Cap 5’ ou o complexo de fatores de eIFs (Hellen e Sarnow, 2001).

Várias observações sobre a região 5' UTR do mRNA do VEGF levou à hipótese de que ela contenha elementos IREs. Em primeiro lugar, a tradução dependente de cap do VEGF é difícil porque a 5' UTR (1038 pb em humanos) é muito mais longa que 5' UTRs típicas de eucariontes (-300 nucleotídeos (nt) e não permite um eficiente escaneamento pelo ribossomo. Em segundo lugar, existe uma alta quantidade de G+C, predispondo-o a formar estruturas secundárias estáveis. Terceiro, a 5'UTR contem uma pequena fase de leitura aberta com o códon de início e de terminação (Stein e col., 1998).

Em 1998, foi demonstrado que o mRNA do VEGF possui dois locais IREs (IREs A e B) no 5' UTR (Stein e col., 1998). O IREs A está contido em um segmento de 293 nt a montante do códon AUG e acredita-se que controla a tradução iniciada nesse códon (Bornes e col., 2004). O IREs B está contido na primeira porção da 5' UTR (Huez e col., 1998). Nesses dois locais parecem se ligar diferentes proteínas, mas a função exata de cada um desses IREs no meio celular não está estabelecida. Segundo Bornes e colaboradores (2004) as diferenças na quantidade de exons, de acordo com as isoformas do VEGF geradas por splicing alternativo, podem levar a preferencial atividade de um IREs ou outro.

Regulação do VEGF por microRNAs MicroRNAS (miRNAS) são moléculas de

RNA de 19–25 nucleotídeos, não codificadoras de proteínas, reguladoras pós-transcricionais da expressão gênica em eucariontes (Kim, 2005). Em humanos, os genes de miRNAs representam aproximadamente 1-3% dos genes e podem regular mais que 90% dos genes (Bartel, 2004; Stefani e Slack, 2006; Farazi e col., 2008). Precursores de miRNA (pré-miRNA) sintetizados no núcleo pela RNA polimerase II, são transportados para o citoplasma, onde são processados pela RNAse III e Dicer, gerando miRNAs fita dupla de aproximadamente 22 nucleotídeos, que são então incorporados ao RISC (RNA-induced silence complex), um

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complexo multimérico, que inclui as proteínas agonautas como principais componentes. Esse complexo se liga a região 3’ UTR no gene alvo e induz sua degradação, repressão da tradução ou ambas (Stefani e Slack, 2006; Farazi e col., 2008).

Existe uma crescente evidência que miRNAs específicos são envolvidos em vários processos biológicos (Zhao e col., 2005; Chen e col., 2006; Giraldez e col., 2005). A função específica de miRNAs na biologia de células vasculares e endoteliais é ainda limitada. O perfil de expressão de miRNAs em células endoteliais revelou que miRNAs específicos são consideravelmente expressos incluindo let-7b, miR-16, miR-21, miR-23a, miR-29, miR-100, miR-221, and miR-222, entre outros (Suárez e col., 2007; Kuehbacher e col., 2007; Poliseno e col., 2006). Muitos desses miRNAs são também altamente expressos em artéria carótida de rato (Ji e col., 2007) sugerindo que esses miRNAs na verdade pertencem a miRNAS específicos da vascularização. Em relação a angiogênese, a alta expressão de let-7f e miR27b exerce efeito pró-angiogênico como evidenciado pelo bloqueio da angiogênese in vitro com oligonucleotídeos inibidores (Zhao et al., 2005).

O miR-210 é induzido por hipóxia em células endoteliais. Sua superexpressão realça a formação de estruturas parecidas com capilares e a migração de células endoteliais sob condições adequadas de oxigênio impulsionadas pelo VEGF, enquanto a inibição do miR-210 diminui a migração e formação de estrutura de tubo (Zhao et al., 2005).

Estudos realizados por Wang e colaboradores (2008) revelaram uma função essencial do miR-126 na angiogênese e manutenção da integridade vascular in vivo. A ação do mir-126 parece se refletir, pelo menos em parte, na via de sinalização da MAP kinase ativada pelo VEGF para regulação da angiogênese. Outro mecanismo seria via Spred-1, um inibidor intracelular da via Ras/MAP kinase que pode servir como um alvo para repressão via miR-126. Desse modo, na ausência de miR-126, a expressão de Spred-1 é elevada, resultando na repressão da sinalização da angiogênese. Inversamente, a superexpressão do mir-126 revela uma influência repressiva do Spred-1 na via de sinalização ativada pelo VEGF e outros fatores angiogênicos favorecendo a angiogênese.

Considerações finais O VEGF-A é uma proteína extremamente

importante na angiogênese e vem sendo estudada por vários grupos desde sua descoberta em 1989. A regulação gênica desse fator é bastante complexa, pois existem várias vias de regulaçã. Muitos trabalhos enfocam a regulação principalmente mediada por hipóxia, e a relação

com a angiogênese tumoral. Além disso, trabalhos com microRNAs específicos para esse fator vêm ganhando espaço entre os pesquisadores com o objetivo de se utilizar de forma mais eficiente o VEGF como alvo ou agente terapêutico em doenças onde a angiogênese está alterada.

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REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA NAS ENGRENAGENS DO RELÓGIO CIRCADIANO DE MAMÍFEROS

Erika Cecon*, Danilo Eugênio de França Laurindo Flôres

Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

*[email protected]

Resumo. A manifestação de ritmos biológicos nos mais diversos organismos é reconhecida desde a antiguidade, mas os princípios básicos responsáveis por sua geração começaram a ser desvendados somente no século passado, e continuam até os dias atuais. Nesse contexto, um grande marco foi a descoberta de uma rede de genes cujos processos de transcrição e tradução são regulados entre si e que constituem a maquinaria básica do sistema oscilatório endógeno. Esta revisão visa descrever o funcionamento desta maquinaria em mamíferos, detalhando seus atuais componentes e como isso se propaga para todo o organismo.

Palavras-chave. Ritmo circadiano, regulação gênica, núcleos supraquiasmáticos, genes relógios. REGULATION OF GENE EXPRESSION IN THE MAMMALIAN CIRCADIAN CLOCKWORK Abstract. The expression of biological rhythms in most organisms is recognized since antiquity, but the

basic principles responsible for their generation have only been unraveled from the last century on. In this context, a great mark was the discovery of a net of genes whose transcription and translation processes are regulated between each other and constitute the basic machinery of the endogenous oscillatory system. This review aim to describe how this machinery works in mammals, detailing its current components, and how it is propagated all over the organism.

Keywords. Circadian rhythm, gene regulation, suprachiasmatic nuclei, clock genes Introdução à cronobiologia Todos os seres vivos apresentam

variações rítmicas em sua fisiologia e comportamento: os ritmos biológicos. Muitos desses ritmos são importantes adaptações temporais a ciclos ambientais da natureza.

Os ritmos diários são os mais bem estudados dentro da cronobiologia (Moore-Ede e col., 1982) e, ao contrário do que se acreditava inicialmente, a maioria deles não é uma mera reação às variáveis ambientais diárias. Ritmos como de atividade/repouso de animais ou abertura e fechamento de folíolos em algumas plantas, continuam a ocorrer mesmo quando esses organismos são transferidos para locais sem variação nas condições ambientais, ou seja, em condições de iluminação, temperatura e umidade constantes (Marques e col., 2003). Acredita-se que a endogenicidade dos ritmos permitiria antecipação fisiológica aos ciclos da natureza, garantindo, por exemplo, que um animal diurno já esteja fisiologicamente preparado para acordar um pouco antes do nascer do sol (Enright, 1970).

Curiosamente, os ritmos diários, quando livres de referências ambientais temporais, possuem um período próprio levemente diferente de 24 horas, por isso são chamados circadianos (do Latim: circa = “cerca de”; dien = “dia”). Nessas condições em que o ritmo circadiano expressa seu período próprio, diz-se que está em livre-curso.

Com base nos fatos apresentados sobre a endogenicidade dos ritmos biológicos, foi idealizada a existência de um relógio biológico circadiano, de período intrínseco próximo de 24 horas. Esse relógio (marca-passo ou oscilador) deveria ser capaz de sincronizar-se com as 24 horas do dia externo por um processo denominado arrastamento. A sincronização com o ambiente é um requisito fundamental para a sobrevivência de muitas espécies, garantindo que processos importantes como forrageamento e acasalamento aconteçam no momento mais adequado do dia. Os ciclos ambientais responsáveis por arrastar o relógio endógeno são chamados de Zeitgeber (doadores de tempo) ou agentes arrastadores. Para a maioria das espécies estudadas, o Zeitgeber mais importante dos ritmos circadianos é a variação diária de claridade e escuridão (ciclo claro-escuro ambiental) (Moore-Ede e col., 1982).

A figura 1 apresenta um esquema do funcionamento do sistema circadiano. A informação dos ciclos ambientais é levada ao relógio endógeno por vias aferentes. O relógio, uma vez sincronizado, passa a informação para o resto do organismo por vias eferentes, gerando ritmos biológicos sincronizados em sua fisiologia geral. Quando o relógio é deixado em condições ambientais constantes, passa a expressar seu período próprio, e os ritmos por ele controlados entram em livre-curso.

Revisão:

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Figura 1 – Modelo de funcionamento do sistema circadiano. A) Sistema sincronizado por ciclos ambientais. B) Sistema em livre-curso. Alguns grupos de pesquisa foram aos poucos desvendando as bases anatômicas e fisiológicas do sistema circadiano. Em mamíferos, o marca-passo que controla o ritmo de atividade-repouso está localizado nos núcleos supraquiasmáticos (NSQs): um conjunto de aproximadamente 20 mil neurônios do hipotálamo. Os NSQs recebem informações do ciclo claro-escuro a partir de uma via aferente que os comunica com as retinas. As vias eferentes são tanto nervosas como humorais.

Em outros vertebrados, a glândula pineal e a retina podem atuar junto com os NSQs como marca-passos (Golombeck e Aguilar-Roblero, 2003). Em plantas, não foi possível identificar a existência de um marca-passo centralizado e, aparentemente, existem vários osciladores redundantes em um único indivíduo (Marques, 2003).

Análises mais aprofundadas demonstraram que, na verdade, mesmo em mamíferos existem osciladores periféricos além do marca-passo central (Yamazaki e col., 2000), que atuam de forma sincronizada com o oscilador central, mas em determinadas condições podem ser sincronizados por outros Zeitgebers.

Cronobiologia molecular Com as bases anatômicas mais ou menos

definidas em mamíferos, surgiu inevitavelmente a questão sobre qual variável dentro dos núcleos supraquiasmáticos seria o verdadeiro marca-passo. Inicialmente, foi observado que o órgão como um todo tem um ritmo circadiano de pulsos elétricos. Estudos com neurônios mostraram que cada neurônio dos NSQs é um oscilador individual e o ritmo final do órgão corresponde ao ritmo emergente da interação entre todos esses neurônios (Welsh e col., 1995).

Na busca pelos mecanismos celulares de geração do ritmo em cada neurônio, foi levantada a hipótese de que haveria uma oscilação molecular. Assim, na visão mais reducionista, o relógio seria resultante de moléculas que interagiriam entre si gerando uma oscilação auto-sustentável. De alguma forma a oscilação deveria responder a estímulos aferentes para se

sincronizar e, ao mesmo tempo, deveria emitir sinais eferentes para levar a informação para o resto do organismo.

A hipótese do relógio molecular foi inicialmente investigada em outros organismos não-mamíferos. Estudos preliminares utilizaram principalmente a mosca Drosophila melanogaster e o fungo Neurospora crassa, pelo vasto conhecimento que se tinha sobre sua genética e biologia molecular. O trabalho de Konopka e Benzer (1971) foi o primeiro a demonstrar o caráter genético dos ritmos endógenos em seus estudos com Drosophila melanogaster mutantes. Após avanços nos estudos com outras espécies (ex: cianobactéria Synechococcus e o camundongo Mus musculus), foi proposto um modelo geral de funcionamento do relógio molecular por alças de retroalimentação negativa, detalhadas a seguir (Dunlap, 1999).

De modo simplificado, o modelo é baseado em processos de transcrição, tradução, e interações proteína-proteína e proteína-DNA. Elementos positivos estimulam a transcrição de genes do relógio. Após transcrição e tradução, as proteínas codificadas por esses genes entram no núcleo e funcionam como elementos negativos. Elas interagem com os elementos positivos ou diretamente com o DNA, diminuindo a expressão dos próprios genes do relógio.

O relógio molecular em mamíferos Atualmente, a maquinaria do relógio central

de mamíferos é composta por pelo menos 12 proteínas distintas: PERIOD1, PERIOD2, PERIOD3, CLOCK, BMAL1 (do inglês, brain and muscle ARNT-like 1, onde ARNT= aryl hydrocarbon receptor nuclear translocator), CRYPTOCHROME1, CRYPTOCHROME2, CASEÍNA KINASE Iε, DEC1, DEC2 (Honma e col., 2002) e os receptores órfãos REV-ERBα (Pando e Sassone-Corsi, 2001) e ROR (receptor órfão relacionado ao ácido-retinóico) (Dardente e col., 2007). Essas proteínas encontram-se altamente relacionadas entre si, de modo a formarem alças de retroalimentação auto-sustentadas e auto-reguladas, atuando como fatores de transcrição que regulam a expressão gênica uns aos outros.

O gene per foi o primeiro a ser descrito, inicialmente em Drosófilas e mais tarde seu homólogo em mamíferos, e os estudos de seu RNA mensageiro (mRNA) e sua proteína (PER) indicaram que ambos apresentam ritmos circadianos robustos em sua expressão, mas que não estão em fase: os níveis de mRNA de per decrescem quando aumentam os níveis da proteína PER, e o mRNA aumenta quando PER diminui (Hardin, 1990). Esse dado foi o primeiro indicativo da existência de mecanismos auto-regulatórios na expressão do gene e da proteína, o que mais tarde seria verificado também para os

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demais componentes da maquinaria do oscilador circadiano.

Hoje se postula que o eixo central dessa maquinaria consista de duas alças principais de retroalimentação interligadas (figura 2). Na primeira, estão os elementos que são membros da família de fatores de transcrição que apresentam o domínio bHLH-PAS (do inglês, basic helix-loop-helix, Period-ARNT-Single-minded): CLOCK (CLK) e BMAL1 (Gekakis e col., 1998). A presença do domínio PAS permite que elas interajam entre si formando heterodímeros, enquanto que o domínio bHLH lhes garante a capacidade de se ligar a elementos E-box (sequências nucleotídicas) presentes na região promotora de diversos genes, entre eles os de period (per1, 2 e 3) e cryptochrome (cry1 e 2), regulando suas transcrições (Murre e col., 1989). A retroalimentação negativa é realizada pelo heterodímero recém-transcrito e traduzido PER:CRY (setas vermelhas na figura 2), que transloca-se ao núcleo e, após atingir determinada concentração, inibe a ação do heterodímero CLK:BMAL1, diminuindo então as transcrições dos próprios genes cry e per. Como consequência, os níveis de mRNA e de proteína de PER e CRY vão decrescendo até o ponto em que tornam-se insuficientes para reprimir a atividade de CLK:BMAL1, reiniciando um novo ciclo (Yoo e col., 2005).

Além disso, as proteínas DEC1 e DEC2 também parecem inibir a atividade de CLK:BMAL1 tanto por interação direta proteína:proteína quanto por competição pela ligação aos elementos E-box (Honma e col., 2002).

A outra alça de retroalimentação é iniciada também por CLK:BMAL1, que ativam a transcrição de rev-erbα e rorα, cujas proteínas competem entre si pela ligação aos elementos responsivos ao ROR (ROREs) presentes no promotor de bmal1, onde terão ações antagônicas: ROR ativa a transcrição de bmal1 enquanto que REV-ERB a inibe (setas azuis na figura 2; para revisão ver Ko e Takahashi, 2006). Além de bmal1, os promotores de clock e cry1 também apresentam sequências ROREs e camundongos deficientes em RORα ou RORβ apresentam comportamentos circadianos aberrantes (revisto por Jetten, 2009).

Todos os ciclos de alças de retroalimentação descritos ocorrem em fases consecutivas que, em conjunto, levam cerca de 24h para se completarem. A concentração fásica dessas diferentes proteínas que regulam de maneira rítmica seus próprios componentes é o que constitui a base molecular do relógio biológico capaz de gerar ritmos com períodos próximos de 24h (circadianos).

Figura 2 - O oscilador molecular de mamíferos. Em vermelho, a alça de retroalimentação CRY-PER; setas azuis delimitam a alça REV-ERB e ROR; setas verdes representam as vias de eferência molecular; e as setas amarelas mostram um possível ponto de atraso do sistema, pela fosforilação e degradação dos elementos negativos CRY e PER.

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O panorama descrito aqui certamente não é definitivo, já que os modelos de funcionamento do relógio molecular se modificam a partir da descoberta de novos genes, proteínas e suas funções.

Aferências A sincronização dessa maquinaria com o

ciclo claro-escuro se dá por meio de informações luminosas ambientais captadas pela retina e enviadas via trato retino-hipotalâmico até os NSQs. O estímulo luminoso interfere nos níveis do mRNA de period1, que aumentam rapidamente após um pulso de luz, enquanto os outros componentes da maquinaria não se modificam (Field e col., 2000; Paranjpe e Sharma, 2005). Esse é, portanto, o sinal que faz o reset diário do relógio.

Eferências Outros genes, que não os do relógio,

também apresentam o elemento E-box em sua região promotora, de modo que sua transcrição também está sob o comando da maquinaria do relógio: CLK:BMAL1 (setas verdes na figura 2). Esses genes foram denominados clock controlled genes (ccgs) e são genes que codificam para as mais diversas substâncias, podendo ser neuropeptídeos, como a vasopressina (Duffield, 2003), neurotransmissores, hormônios, fatores de transcrição, moléculas de sinalização intracelular, dentre outros. Considerando esta maquinaria nos NSQs, as proteínas codificadas pelos ccgs regulam a atividade dos neurônios que, por sua vez, sincronizam o restante do organismo através de inervações diretas sobre o tecido-alvo ou por secreção hormonal (Bosek e col., 2009). Assim, os ccgs constituem o mecanismo molecular de eferência do relógio circadiano, através do qual todo o organismo pode estar conectado à maquinaria básica do oscilador central.

O gene que codifica para a proteína DBP é um exemplo claro de ccg, com um E-box que permite controle pelo dímero CLK-BMAL1 (Ripperger e col., 2000). A proteína DBP se liga na região promotora de outros genes à jusante, em uma sequência do DNA conhecida como elemento D, e regula sua expressão (figura 2 canto superior direito). Assim, a informação rítmica do relógio é transmitida inicialmente para o gene da DBP e posteriormente para outros genes controlados por DBP.

Estudos de microarray identificaram centenas de genes, além dos genes do relógio central, cuja expressão oscila ao longo do dia nos NSQs. Nas regiões promotoras desses genes foram encontrados elementos E-box, RORE e CRE como possíveis locais de regulação direta e indireta pelas alças do relógio circadiano molecular (Hardin, 2004).

Modificações pós-transcricionais na maquinaria do relógio biológico

Poucos trabalhos estudaram poliadelinação, 5’CAP, splicing, transporte e meia-vida dos mRNA do relógio circadiano de mamíferos. Kojima e colaboradores (2003) verificaram que uma sequência da região 3’ UTR do mRNA de per1 é responsável pela inibição pós-transcricional da expressão do próprio per1. Os autores especulam que esta sequência de 196 nucleotídeos do mRNA deve se ligar a uma proteína que inibe a tradução. Eles também sugerem que esta inibição está relacionada com a diferença de fase entre transcrição e tradução dos genes per (descrita acima). Outro exemplo refere-se ao trabalho de Yu e colaboradores (1999) que mostra três diferentes produtos do gene bmal1, resultantes de splicings alternativos. Um desses produtos não contém o domínio PAS, apesar de reter o bHLH; sendo possível que esta proteína aja como um competidor que se liga ao E-box (por meio do bHLH), sem dimerizar com CLOCK (já que não possui o PAS), e impeça a ativação dos genes controlados por CLK:BMAL1.

Modificações pós-traducionais na

maquinaria do relógio biológico Os processos de regulação pós-traducional

são mais bem entendidos, principalmente no que diz respeito a eventos de fosforilação, que modificam as proteínas estrutural e funcionalmente. O exemplo mais bem descrito é a participação de caseínas kinase [CK I ε (épsilon) e δ (delta)] na rede de alças de retroalimentação descrita anteriormente e esquematizada na figura 2 (Ko e Takahashi, 2006). A fosforilação dependente destas enzimas propicia estabilidade e translocação nuclear adequadas das proteínas, principalmente PER, e sua relevância foi demonstrada em organismos mutantes que não expressavam essas quinases e apresentavam fenótipos com ritmos circadianos alterados (Gachon e col., 2004).

Além das caseínas quinases, outras quinases envolvidas com sinalização celular também parecem participar da modulação das proteínas do relógio, tais como a quinase dependente de cálcio/calmodulina II (CaMK II) e as MAP quinases (Mitogen-Activated Protein Kinase) (Weber e col., 2006).

Experimentos em cultura celular mostram que a expressão de proteínas fosforiladoras (CKIs) é importante para a atividade de BMAL1. Em contrapartida, fosforilação por MAP quinase leva à redução da atividade de BMAL1. Considerando que os dois sítios de fosforilação são parcialmente sobrepostos, é possível que as caseína quinases compitam com a MAP quinase na fosforilação de BMAL1, de modo que esta proteína seja hora ativada, hora inativada, dependendo do contexto (Hirayama e Sassone-Corsi, 2005).

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Além dos mecanismos de fosforilação descritos, outras regulações pós-traducionais passíveis de ocorrer são a ubiquitinação e a sumoilização. Essas vias também estão relacionadas à estabilidade da proteína alvo, uma vez que levam à sua degradação. A sumoilização refere-se ao complexo formado entre a proteína-alvo e a proteína SUMO, que assemelha-se à ubiquitina e ambas as vias a direcionam para degradação proteossomal (Cardone e col., 2005). A importância da proteína SUMO também já foi demonstrada em organismos mutantes que não a expressavam e cujos ritmos circadianos apresentavam um encurtamento em seus períodos (Cardone e col., 2005).

Como o relógio se baseia em fatores de transcrição protéicos que se inter-regulam, uma modificação pós-traducional em uma proteína reflete na transcrição dos genes por ela regulados. Ou seja, dentro do mecanismo central do relógio, a regulação pós-traducional é tão importante para os eventos de transcrição gênica quanto as regulações transcricional e pós-transcricional.

Modificações estruturais na cromatina Recentemente, muitos dados têm apontado

para o importante papel de enzimas acetilases, desacetilases e metilases nos processos de regulação da expressão gênica como um todo por alterarem a conformação da cromatina. Na transcrição dependente das proteínas do relógio isto não tem sido diferente. Além da necessidade de um elemento E-box na região promotora do gene alvo, a atuação do heterodímero CLK:BMAL1 parece requerer também o recrutamento de coativadores, como a histona acetiltransferase (HAT) p300, responsável por acetilar a histona H3 (Lee e col., 2001; Etchegaray e col., 2003). Entretanto, o fator chave responsável pela existência de uma acetilação rítmica na cromatina ainda não foi elucidado. Esse cenário torna-se ainda mais complexo após a demonstração de que a porção C-terminal da proteína CLOCK de mamíferos possui, por si só, atividade de HAT (Doi e col., 2006).

Sabe-se que, dentre os coativadores recrutados para a transcrição gênica, os mais comuns são o complexo CBP/p300, onde CBP significa Creb Binding Protein. A disponibilidade/afinidade desses fatores pela maquinaria transcricional dos genes do relógio também tem sido apontadas como fatores essenciais para o ajuste dos ritmos biológicos, de forma que os altos níveis de CLK:BMAL1 em determinada fase do dia recrutaria mais CBP, competindo com outras ativações transcricionais que necessitem desse fator, resultando numa regulação negativa indireta destas (Weber, 2009). De fato, a redução nos níveis de CBP pela técnica de RNA de interferência (RNAi) em

Drosófilas resultou em níveis diminuídos dos transcritos dependentes de CLOCK (Hung e col., 2007).

Conclusões Os genes do relógio constituem um dos

mais notórios exemplos da importância de uma regulação fina da transcrição e tradução gênicas. A complexidade com que os diferentes elementos dessa maquinaria se interligam e promovem a regulação de uma infinidade de ritmos perceptíveis tem sido um desafio constante aos estudiosos da área desde os séculos passados.

De acordo com dados obtidos por análises por microarrays, cerca de 5 a 10% de todo o nosso genoma é controlado pela maquinaria do relógio, o que inclui componentes de metabolismo, detoxificação, transdução de sinais, secreções, proliferação celular, atividades neuronais, respostas imunes, dentre outros processos vitais (revisto por Weber, 2009). Toda essa regulação depende do organismo e do tecido em questão, já que são altamente específicos funcionalmente. Por isso mesmo, não é de se estranhar a quantidade de estudos necessários para que se conclua a inserção de um novo componente geral nessa maquinaria já tão complexa.

De acordo com Hardin (2004), quanto mais promotores de genes expressos ritmicamente forem identificados e analisados, a lista de elementos regulatórios que medeiam ou modificam a expressão de ritmos em mamíferos irá, sem dúvida, crescer além de E-boxes, elementos RORE e CREs. Ressalta-se ainda que, mesmo que um gene seja constitutivamente transcrito, seu produto pode oscilar devido às regulações pós-traducionais sob controle circadiano, tais como a atividade de proteassomas, proteases e ubiquitina ligases (Akhtar e col., 2002). Além disso, evidências recentes apontam para uma intercomunicação entre as moléculas reguladoras do ciclo celular e as do relógio, indicando um novo papel destas últimas na mediação de processos importantes como reparo de DNA e até mesmo no desenvolvimento de câncer (Borgs et al., 2009).

Desta forma, descrevemos aqui uma pequena parte desse complexo cenário que é um dos mais ricos exemplos da importância da regulação gênica. Isso porque nos permite compreender a interação entre os mais diversos níveis organizacionais de um indivíduo: a interação com o ambiente induzindo modificações moleculares que, por sua vez, modulam todo o organismo até atingir o nível comportamental, adaptando-o a interagir da melhor forma possível com esse ambiente.

Agradecimentos. Agradecemos à

Professora Dra. Lucile Maria Floeter-Winter pela orientação na disciplina “Regulação da Expressão

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Gênica nos Processos Fisiológicos” e pelo apoio e iniciativa para a publicação desta revisão.

Contribuição dos autores. Redação do

artigo: Erika Cecon e Danilo Eugênio de França Laurindo Flôres. Figuras: Danilo Eugênio de França Laurindo Flôres.

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FATOR DE TRANSCRIÇÃO NUCLEAR KAPPA B NO SISTEMA NERVOSO CENTRAL: DO FISIOLÓGICO AO PATOLÓGICO

Daiane Gil Franco

Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP Recebido 13out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

[email protected] Resumo. Descoberto inicialmente em linfócitos T, o fator de transcrição nuclear kappa B (NF-kB) tem

sido descrito em todas as células de mamíferos, regulando a expressão de diversos genes, principalmente aqueles relacionados à resposta imunológica e inflamatória. No sistema nervoso central, a regulação da expressão gênica pelo NF-kB é de particular importância já que este fator pode estar envolvido tanto em condições fisiológicas (sinapse, desenvolvimento e plasticidade neural) como em condições patológicas que ocasionam em morte celular. Nesta revisão vamos descrever as duas principais vias de ativação do NF-kB e a participação deste fator em diferentes processos do sistema nervoso central.

Palavras-chave: vias canônica e não-canônica, sobrevivência celular, doenças neurodegenerativas NUCLEAR TRANSCRIPTION FACTOR KAPPA B IN THE CENTRAL NERVOUS SYSTEM: FROM

PHYSIOLOGICAL TO PATHOLOGICAL Abstract. First discovered in T cells, the nuclear transcription factor kappa B (NF-kB) has been

described in all mammalian cells, regulating the expression of several genes, mainly those related to immune response. In the central nervous system gene expression regulated by NF-kB is of particular importance since it may be involved in both physiological conditions (synapse, development and neural plasticity) and pathological conditions that result in cell death. In this review we describe the two main forms of NF-kB activation and the participation of this factor in different processes of central nervous system.

Keywords: canonical and non-canonical pathways, cell survival, neurodegenerative diseases Os fatores de transcrição são proteínas que

se ligam ao promotor e ao enhancer dos genes promovendo uma coordenação da iniciação da transcrição gênica (Xiao, 2004). Nesta revisão vamos destacar o papel do fator de transcrição nuclear kappa B, NF-kB (do inglês, nuclear factor kappa B) especificamente no sistema nervoso central (SNC), dando ênfase à sua atuação em processos fisiológicos ou fisiopatológicos.

O fator de transcrição NF-κB foi descoberto primeiramente em linfócitos T (Nabel e Baltimore, 1987) como um regulador da transcrição da cadeia leve da κ-imunoglobulina, mas está presente em todas as células de mamíferos. O papel mais bem conhecido e estudado desse fator de transcrição se dá na resposta imunológica, na qual regula expressão de genes essenciais no processo inflamatório e na defesa contra parasitas. Além disso, também atua na sobrevivência e proliferação celular, apoptose e funcionamento do SNC (Xiao, 2004).

A família do NF-κB (ou família Rel) consiste de cinco subunidades que incluem: p65 (RelA), c-Rel, RelB, p50 e p52. Esta família é caracterizada por conter uma porção N – terminal bem conservada com cerca de 300 aminoácidos (RHD – Rel homology domain), a qual se subdivide em uma região que se liga ao DNA e outra denominada de domínio de dimerização. Nesta última encontra-se um sinal de localização nuclear (NLS). A região C-terminal se difere entre cada subunidade, sendo que p65, c-Rel e RelB contém um domínio de transativação (TAD), necessária para iniciar a atividade transcricional. As subunidades p50 e p52 são sintetizadas como

moléculas grandes precursoras, p105 e p100, respectivamente (Meffert e Baltimore, 2005).

As subunidades do NF-κB se homo ou heterodimerizam para formar dímeros ativadores (p50-p65) ou repressores (p50-p50 e p52-p52). Estes se encontram no citoplasma da maioria das células, complexados com as proteínas inibitórias da família κappa Bs - Inhibitory kappa B: IκBα, IκBβ, IκBε, IkB-R, IκBγ (p105), IκBδ (p100) e Bcl-3. O heterodímero p50-p65 é comumente utilizado como sinônimo de p50-p65 por ser o mais abundante da família do NF-κB e em sua maioria está associado ao IκBα (Malek et al., 2007).

Existem duas vias descritas para a ativação do fator de transcrição nuclear NF-kB: clássica (via canônica) e alternativa (via não-canônica) (Figura. 1). A via clássica é a mais comum e está associada à expressão de genes relacionados à inflamação, à resposta imunológica inata, à anti-apoptose e à sobrevivência celular (Xiao, 2004). Já a via alternativa está associada à expressão de genes que atuam no desenvolvimento e manutenção de órgãos linfóides secundários (linfonodos, baço, tonsilas e placas de Peyer) (Alcamo e col., 2002).

Na via clássica (Figura 1), para que haja ativação do NF-κB, o IκB é fosforilado no resíduo de serina pelo complexo de proteína quinase IKK. Essa fosforilação é o sinal para a ubiquitinação e posterior degradação do IκB pelo proteassoma. No citoplasma um conjunto de proteínas adaptadoras e ancoradoras (TRAFs, MyD88 e TIRAP) e quinases (RIP, IRAK) formam um complexo quando há um estímulo, facilitando o

Revisão:

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recrutamento da IKK. Após a degradação do IκB os dímeros do NF-κB (por ex. p50-p65) são liberados e migram para o núcleo onde atuarão na regulação da transcrição de genes específicos (Kaltschmidt e col., 2005).

O complexo IKK contém duas subunidades catalíticas denominadas IKKα (IKK1) e IKKβ (IKK2) e uma subunidade não catalítica denominada NEMO (do inglês NF-κB essential modulator). Existem diversas combinações entre as subunidades do IKK, podendo ser homo ou heterodímeros de IKKα ou IKKβ, associados ou não ao NEMO (Mercurio e col., 1999). O mais comumente encontrado é IKKα-IKKβ-NEMO (Scheidereit, 2006).

Esta via é ativada por uma variedade de sinais inflamatórios, incluindo citocinas pró-inflamatórias e endotoxinas bacterianas, que leva a ativação do complexo IKK. Este fosforila o IκBα em uma maneira dependente de IKKβ-NEMO. O NEMO é uma subunidade regulatória do complexo IKK que possui um domínio MOD (do inglês minimal oligomerization domain) e um domínio de ligação à ubiquitina (UDB, do inglês ubiquitin-binding domain) associado ao MOD, essencial para a ativação do processo.

Aparentemente, o IKKα não participa da via clássica, apesar de estar ligado ao NEMO. Contudo, Solt e May (2008) pressupõem que é possível que o IKKα-NEMO atue nesta via clássica de ativação do NF-κB. Para corroborar essa hipótese, fibroblastos embrionários de murinos deficientes em algumas subunidades do

complexo IKK foram estimulados com TNF ou com IL-1 (interleucina 1). Ambas citocinas foram capazes de induzir a degradação de IκBα em fibroblastos selvagens e em IKKα-/-, mas não em células deficientes em NEMO. Por outro lado, TNF não induziu a degradação de IκBα em células deficientes em IKKβ, mas IL-1 induziu a degradação de IκBα e a migração do NF-κB (p50-p65) para o núcleo nestas células. Estes dados sugerem que IL-1 e TNF ativam por diferentes meios o NF-κB e, dependendo do sinal que é dado no início da cascata de sinalização através da ativação da proteína NEMO, é dado um perfil diferente de ativação.

A via não-canônica (Figura 1) é ativada pelo

conjunto de receptores da famíla do TNF (do inglês tumor necrosis factor), que incluem receptores de linfotoxina β (LTβR), BAFF (B cell-activating factor receptor), RANK (receptor activator of NF-κB) e CD40L (Ramakrishnan e col., 2004). Esta ativação é mediada pela quinase NIK (do inglês NF-κB-inducing kinase) que sinaliza para o homodímero IKKα fosforilar a p100 que está associada à RelB. Este é um sinal para que a p100 seja ubiquitinada e degradada. O proteassoma degrada somente a porção C-terminal, deixando a porção N-terminal para formar o peptídeo p52. O dímero formado p52-RelB desloca-se para o núcleo ativando a expressão de genes específicos nos órgãos linfóides (Xiao, 2004).

No SNC membros da família do NF-κB são ativados em função de uma neuropatologia e

Figura 1 – Vias de sinalização do NF-kB. À Esquerda, via clássica (via canônica) e à direita via alternativa (não-canônica). A via clássica é dependente de NEMO, enquanto que, na via alternativa a subunidade p100 é degradada pelo proteassoma para dar origem a p52 (baseado em Xiao, 2004).

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de apoptose, mas também tem se mostrado que estes fatores de transcrição podem participar da regulação de atividades neurais não-patológicas, como sinalizações sinápticas envolvidas no aprendizado e na memória.

O fator de transcrição NF-κB é expresso no sistema nervoso central e no periférico, tanto por neurônio quanto por células da glia. Diversos dímeros já foram descritos no SNC, porém os mais comuns são p50-p65 e p50-p50 (O’Neill e Kaltschmidt, 1997). Em condições não-patológicas a ativação do NF-κB pode estar envolvida na plasticidade, desenvolvimento neural e na atividade sináptica.

Uma grande variedade de estímulos que ativam NF-κB no sistema imunológico também podem atuar no SNC como, por exemplo: citocinas (TNF e IL-1), lipopolissacarídeo de bactérias gram-negativas (LPS), infecções virais e estresse oxidativo. Outros estímulos são específicos do SNC como a proteína precursora β-amilóide (APP), peptídeo β-amilóide (βA) e o fator de crescimento neural (NGF, do inglês nerve growth factor) (Tabela 1). Pouco se sabe dos genes que são ativados pelo NF-κB no SNC; alguns deles descritos são: moléculas de adesão de células neuronais, sintase de óxido nítrico induzida (iNOS), PPA, receptores µ-opióide e proteína quinase II dependente de Ca2+-calmodulina (CaMKII)δ (Barger e Mattson, 1996).

Schmidt-Ullrich e colaboradores em 1996, utilizando camundongos transgênicos que possuíam um constructo de um gene repórter lacZ associado à diversos promotores dependentes da atividade do NF-κB, demonstraram que há uma diferença no padrão de expressão do fator de transcrição no SNC, tanto temporal quanto espacial. Não foi observada diferença na expressão do NF-κB durante o desenvolvimento embrionário no dia zero após o nascimento. A primeira expressão do NF-κB observada se dá no primeiro dia após o nascimento no colículo superior e inferior. No córtex foi observada expressão no 6o. dia, no cerebelo no 8o. dia e no hipocampo apenas no final da segunda semana. A expressão no cerebelo é mais proeminente no lobo posterior do que no anterior. Esses resultados sugerem que a atividade do NF-κB inicia-se tardiamente no desenvolvimento ontogenético dos mamíferos.

A forma do NF-κB associada ao IκB pode ser encontrada na região sináptica, no citoplasma e nos dendritos (sítios pós-sinápticos) de neurônios do córtex, do hipocampo e do cerebelo. A quantidade do NF-κB na forma ativa encontrado no núcleo pode variar durante o desenvolvimento e como resultado da atividade sináptica (O’Neill e Kaltschmidt, 1997).

Estímulo Tipo celular Efeito

Neurônios Prevenção de apoptose

Astrócitos Prevenção de apoptose TNF

Microglia Produção de citocinas

Glutamato Neurônios Plasticidade sináptica e

prevenção de apoptose

NGF Neurônios Prevenção de apoptose

Estresse oxidative Vários Prevenção de apoptose

Peptídeo βA Neurônios e Microgila

Resposta ao estresse e

neuroproteção

APP Neurônios Neuroproteção

A aplicação do neurotransmissor

excitatório, glutamato e do agonista glutamatérgico NMDA (do inglês N-methyl-D-aspartate) em células granulares de cerebelo é capaz de ativar a translocação do NF-κB ao núcleo. E a utilização de antagonistas de receptores excitatórios diminui a ativação sináptica basal do fator de transcrição (Guerrini e col., 1995). O glutamato pode ativar o fator de transcrição NF-κB em preparações de compartimentos sinápticos através de uma via dependente de Ca2+. De fato, o aumento do Ca2+ intracelular causado pelo uso de ionóforo para Ca2+ é suficiente para ativar a translocação do NF-κB ao núcleo (Meffert e col., 2003). A ativação do NF-κB pelo glutamato parece ser relevante como um sinal transdutor durante a atividade sináptica e plasticidade neural em uma situação fisiológica normal. Foi demonstrado que não só a estimulação de alta frequência in vivo no hipocampo de rato, que tipicamente induz potenciação de longo prazo (LTP do inglês long-term potentiation), como também a estimulação de baixa frequência causa um aumento da expressão do RNAm das subunidades do NF-κB p65 e p50. Desta forma, a atividade do NF-κB pode ser modulada pelo aumento da ativação sináptica. A expressão de outros genes como c-fos, jun-B e zif/268 não apresentam este aumento após o estímulo de baixa frequência, indicando que o NF-κB deve ser um transdutor de sinal durante a atividade sináptica neural normal (Meberg e col., 1996).

Tabela 1 – Exemplos de estímulos que ativam NF-κB no sistema nervoso central (Baseado em Mattson e Camandola, 2001).

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Não há dúvidas quanto à importância do NF-κB na atividade sináptica, porém, se este fator está presente em regiões distantes do núcleo (sinapses e dendritos), como é possível que este consiga translocar para o núcleo sem ser recrutado pelo IκB? A resposta para este questionamento ainda é um mistério. Existem evidências de que o NF-κB possa translocar de regiões distantes para o núcleo, porém o mecanismo ainda não é conhecido (Meffert e Baltimore, 2005).

Se o NF-κB atua na atividade sináptica, então qual seu papel fisiológico no comportamento de mamíferos? Existem evidências de que o NF-κB participa dos processos de memória e aprendizagem. Em camundongos que não expressam a subunidade p65 do NF-κB o aprendizado da localização espacial é prejudicado (Meffert e col., 2003). A ausência da subunidade p50 também leva a uma diminuição do aprendizado, porém de uma forma menos severa. É possível que o fator de transcrição NF-κB possua um papel positivo na memória e no aprendizado (Meffert e Baltimore, 2005). Os estudos de cognição são feitos com animais knock out para p50 ou p65 ou, ainda, que super-expressam repressores da via do NF-κB. Apesar disso, os animais chegam à vida adulta com desenvolvimento normal do SNC, sem alterações na sobrevivência celular (Fridmacher e col., 2003).

A expressão constitutiva do NF-κB é mantida por diferentes neurotransmissores, como glutamato, dopamina, noradrenalina, fator neurotrófico derivado do cérebro, citocinas neurotróficas, entre outros. Em situações fisiológicas, o complexo do NF-κB atua na manutenção da sobrevivência celular e promove o crescimento de processos neurais durante o desenvolvimento. A redução da atividade do NF-κB por agentes que bloqueiam a via ou utilizando formas superrepressoras do IκB inibe o crescimento de dendritos e neuritos (Pizzi e Spano, 2006). A inibição da ligação do NF-κB ao DNA também causa danos à célula por reduzir a regulação de genes anti-apoptóticos como Bcl-2, Bcl-XL and Bfl-1/A1 (Bhakar e col., 2002).

A neuroproteção associada ao NF-κB foi primeiramente associada à neuroproteção do TNF (Tabela 1). Fernyhough e colaboradores (2005) mostraram que a ativação do complexo do NF-κB é essencial para sobrevivência de neurônios sensoriais ativados com TNF. No entanto, essa relação nem sempre é verdadeira. Células granulares de cerebelo que possuem uma ativação basal do NF-κB apresentaram uma curva de sobrevivência em forma de “U” invertido quando ativadas por TNF. Kaltschmidt e colaboradores (2005) propõem um modelo para explicar a dualidade do NF-κB quanto à sobrevivência celular (Figura 2). Outros trabalhos que reproduzem modelos experimentais em

condições patológicas que afetam neurônios apresentam resultados controversos.

Um bom exemplo dessa dualidade da atividade do NF-κB é na isquemia. Sabe-se que o efeito do pré-condicionamento da isquemia é protetor e mediado pelo NF-κB. No entanto, quando uma isquemia severa acontece, o NF-κB contribui para o dano cerebral por ativar genes relacionados a apoptose. O mecanismo de ação pelo qual o NF-κB é capaz de gerar um efeito ou outro, ainda necessita de mais estudos. Uma revisão recente de Ridder e Schawninger (2009) aponta quatro possíveis explicações da dualidade do NF-κB:

1. O efeito da especificidade celular. O efeito de uma forte reação inflamatória controlada pela ativação do NF-κB na microglia ou em outras células inflamatórias pode sobrepor um possível efeito anti-apoptótico do NF-κB em neurônios. Além disso, a natureza do estímulo é fundamental para definir a atividade do NF-κB.

2. A cinética de ativação do NF-κB. Uma ativação transiente pode levar a expressão de genes anti-apoptóticos, enquanto que uma ativação sustentada pode levar a indução de um conjunto de genes pró-apoptóticos.

3. Possivelmente as cinco subunidades do NF-κB exercem efeitos distintos na sobrevivência celular. Existem evidências de que a p65 e a cRel possuem efeitos contrários, sendo pró e anti-apoptótica, respectivamente.

4. Não apenas o NF-κB, mas todos os elementos presentes na sua via de ativação são

Figura 2 – Modelo de homeostase do NF-κB. A ativação sináptica parece ser o sinal permanente da ativação do NF-κB em neurônios. Uma perturbação dessa ativação fisiológica pode ser patológica resultando na morte celular. A subunidade p65 promove, em condições fisiológicas a sobrevivência celular. Sob condições fisiopatológicas a subunidade p65 pode se associar a complexos co-repressores de genes anti-apoptóticos (Baseado em Kaltschmidt e col.,2005).

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possíveis candidatos que modulam o efeito final do fator de transcrição.

Para Grilli e Memo (1999) o NF-κB é responsável pelo início da aceleração de vários processos neurodegenerativos como nas doenças de Parkinson (DP), doença de Alzheimer (DA) e infecções virais. Muitos estudos clínicos ou utilizando modelos experimentais descrevem um aumento da atividade do NF-κB em condições neuropatológicas.

Análise de imuno-histoquímica em secções de cérebros de pacientes com DA revelaram que a subunidade p65 do NF-κB estava ativada somente nas áreas afetadas pela doença, onde havia deposição do peptídeo βA (Terai e col., 1996). Sabe-se que o peptídeo βA é um potente ativador do NF-κB (Tabela 1). É interessante notar que a DA se caracteriza pelo aumento da citocinas pró-inflamatória IL-1 β e da citotoxidade provocada pelo glutamato, ambos capazes de modular a atividade do NF-κB (Grilli e Memo, 1999).

Por fim, o fator de transcrição NF-κB no SNC atua tanto em condições de injúria e estresse, modulando processos inflamatórios e de apoptose, como também está presente constitutivamente em neurônios participando de funções fisiológicas do SNC, como sinapse, desenvolvimento e plasticidade neural. Proteínas envolvidas na via de sinalização do NF-kB, são potenciais alvos para intervenções terapêuticas em doenças neurológicas, bem como em casos de déficit de aprendizado e de memória.

Agradecimentos. À Profª e Drª Lucile

Maria Floeter-Winter e ao Drº Eduardo Koji Tamura pela revisão crítica dessa revisão.

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LIPOPOLISSACARÍDEO (LPS): ATIVADOR E REGULADOR DA TRANSCRIÇÃO GÊNICA VIA FATOR DE TRANSCRIÇÃO NFKB

Sanseray da Silveira Cruz-Machado

Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP Recebido 19out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10

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Resumo. O LPS é o principal componente da membrana externa de bactérias gram-negativas e conhecido como importante ativador da resposta imunológica. Seus efeitos são mediados principalmente pelo NFKB, um fator de transcrição que se mantém inativo no citoplasma e que migra para o núcleo após a interação do LPS com seus receptores, promovendo a transcrição de diversos genes relacionados à resposta inflamatória aguda. Embora a resposta frente ao LPS seja bem compreendida, pouco se sabe a respeito dos pontos de regulação dessa resposta. Nesse sentido, descreveremos como o LPS se comunica com o meio intracelular, revisaremos os principais pontos conhecidos sobre a regulação da expressão de genes induzidos pelo NFKB e a participação desse fator e dos receptores de LPS na resposta inflamatória

Palavras-chave. Regulação de expressão gênica, Lipopolissacarídeo, NFKB LIPOPOLYSACCHARIDE (LPS): POTENT ACTIVATOR AND REGULATIOR OF GENE

TRANSCRIPTION THROUGH NFKB SIGNALING Abstract. LPS is the main component from membrane surface of gram-negative bacteria known as a

potent activator of immune response. This effect is mediated mainly through the NFKB signaling pathway. NFKB remains inactivated in cytoplasm due to interactions with repressor proteins and the triggering of LPS receptors allows NFKB dimmers to translocate to the nucleus and to promote gene transcription. Besides the response activated by LPS being well understood, the regulatory steps of this response remain obscure. Is this review, we will describe how LPS activates NFKB pathway and the main steps that regulate this signaling with focus on the regulation of gene expression.

Keywords. Regulation of gene expression, Lipopolysaccharide, NFKB

Lipopolissacarídeo (LPS) também conhecido como endotoxina é uma molécula altamente tóxica derivada da membrana celular externa de bactérias gram-negativas. Sua liberação ocorre quando a bactéria se multiplica ou quando é fagocitada e degradada pelas células de defesa (Tuin e col., 2006). Atualmente, LPS é considerado o principal fator responsável pelas manifestações tóxicas de infecções por bactérias gram-negativas bem como por inflamação sistêmica (Rietschel e col., 1994). Sua estrutura é composta por duas camadas de açúcar e uma camada lipídica, uma parte hidrofílica e outra hidrofóbica, respectivamente. A porção lipídica é considerada a responsável pela maior ação antigênica do LPS (Raetz e Whitfield, 2002).

Essa endotoxina desencadeia vias de sinalização intracelular através de sua ligação a receptores próprios. Os principais estão localizados na membrana celular, denominados receptores Toll-like 4 (TLR4). Desde sua descoberta, no final da década de 1990, os receptores Toll-like têm sido identificados como sensores primários de infecções microbianas e permitido avançados significativos na compreensão dos mecanismos envolvidos na imunidade inata e adquirida (Poltorak e col., 1998). O reconhecimento do LPS é mediado ainda por outras moléculas como LBP, a proteína ligante de LPS (do inglês, Lipopolysaccharide Binding Protein), a proteína CD14 que pode estar

sobre a forma solúvel na circulação ou ancorada à membrana celular (sCD14 e mCD14, respectivamente) e ainda a proteína mielóide diferenciadora 2 (MD-2) que também pode ser encontrada nas duas formas. As proteínas LBP, MD-2 e CD14 na versão solúvel atuam como proteínas auxiliares, responsáveis por transferir LPS para o receptor TLR4 ou para o complexo formado entre o receptor TLR4 e a proteína MD-2 (Shimazu e col., 1999; Akira e Takeda, 2004). Esse complexo é considerado como a principal forma de reconhecimento do LPS.

A ativação dos receptores TLR4 pode desencadear diversas vias de sinalização, como MAPK (do inglês mitogen-activated protein kinase), AP-1 (activator protein 1 ), STAT (signal tranducer and activator of transcription) IRF3 (interferon (IFN)-regulatory factor 3) entre outras. Uma das principais vias ativadas pelo LPS é a via do fator de transcrição NFKB (do inglês, Nuclear Factor kappa B) que ao se translocar ao núcleo, promove a transcrição de diversos genes que participam de processos fisiológicos e fisiopatológicos (para revisão, Raetz & Whitfield, 2002).

O fator de transcrição NFKB pertence à família dos fatores de transcrição NFKB/REL formada por cinco genes (NFKB1, NFKB2, RELA, c-REL e RELB) que dão origem a sete proteínas: p100, p105, p50, p52, RELA (também conhecida por p65), RELB e c-REL. O dímero p50 corresponde à metade amino-terminal de p105 e

Ensaio:

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é codificado pelo NFKB1 e o dímero p52 corresponde à metade amino-terminal de p100 que é codificado pelo gene NFKB2 (Chen e Greene, 2004).

O NFKB apresenta-se como homo ou heterodímeros constituídos por duas das subunidades mencionadas anteriormente (Baeuerle e Baltimore, 1996; Siebenlist, 1997). A composição do dímero é importante na regulação dessa via (tabela 1), visto que embora todas as subunidades possuam o domínio de homologia REL (RHD, do inglês, REL homology domain) responsável pela ligação ao DNA e a outros co-fatores (Gosh e col., 1998) apenas as proteínas p65, c-REL e REL-B possuem domínios de transativação (TAD, do inglês, transcription activation domain) na sua porção carboxiterminal (Hayden & Gosh, 2004) e, portanto, apenas dímeros que contenham uma copia dessas proteínas podem ativar diretamente a transcrição de genes. Por outro lado, acredita-se que homodímeros formados apenas pelas subunidades p50 e/ou p52 sejam repressores da atividade transcricional devido à ausência de domínios do tipo TAD (Gosh & Hayden, 2008). No entanto, se esses homodimeros estiverem associados à proteína BCL-3, que possui domínio TAD e localiza-se no núcleo, é possível que esses passem a apresentar atividades transcricionais positivas (Nolan e col., 1993).

Uma vez no núcleo, o NFKB promove o recrutamento de aumentadores kappa B, os quais contém uma ou mais sequências consenso 5’-GGGRNYYYCC-3’, onde R é uma purina, Y é uma pirimidina e N é qualquer acido nucléico (Chen e Greene, 2004). Esse ponto de regulação é importante, visto que pode caracterizar a resposta de acordo com a subunidade ativada.

Proteína REL Dímeros Genes Alvo REL-A Homodímeros

RELA – RELA RELA – p50 RELA – c-REL

IL8, Colágeno Tipo VII e molécula de aderência ICAM1 IkB-alfa, IL8, IL6, TNF-alfa, GM-CSF, HIV1 uPA, IL2R-alfa, MCP1

REL-B RELB – p50 RELB – p52

MDC SLC, ELC, MDC

c-REL Homodímeros c-REL – c-REL c-REL – p50

IL8 IL12/p40, IL12/p35, IL2R-alfa

p50 Homodímeros p50 – p50 P50 – BCL3

TNF-alfa, IL6 e MHC II BCL2

p52 Homodímeros p52 – p52 P52-BCL3

MHC II Ciclinas D1, BCL2

Tabela 1: A literatura relata uma resposta estereotipada em relação à subunidade do NFKB que se transloca ao núcleo e os genes alvo (para revisão Chen e Greene, 2004).

De modo geral, há consenso na literatura

de que a exposição à patógenos (vírus, bactérias, fungos), citocinas e outros fatores estressantes

ativam o fator de transcrição NFKB levando à indução transcricional de mais de 200 genes (Pahl, 1999). A desregulação na transcrição dependente do NFKB está relacionada com complicações associadas a desordens crônicas como diabetes, doenças cardiovasculares, desordens auto-imunes e certos tipos de câncer. Dentre as diversas respostas e atividades fisiológicas controladas pelo NFKB, sua ação sobre processos inflamatórios e imunes, apoptose, diferenciação celular e ativação da proliferação de células tumorais estão entre os mais bem estudados e entendidos até agora.

A sinalização intracelular induzida pela interação do LPS com seus receptores desencadeia o recrutamento de diversas proteínas citoplasmáticas, através de interações domínio-domínio especificas através de via uma dependente ou independente da proteína Myd88 (do inglês, myeloid differentiation primary-response protein 88). Ambas as vias que podem ser ativadas convergem para ativação do complexo de quinases IKKs, que por sua vez ativam a fosforilação, ubiquitinação e degradação proteassômica da proteína IkB-alfa (conhecida ainda como NFKBIA, figura 1). Essa proteína é responsável por manter o NFKB retido no citoplasma e sua degradação permite a liberação do fator de transcrição (ainda sob a forma de dímeros) e sua translocação ao núcleo da célula para se ligar aos elementos responsivos no DNA (Kawai e Akira, 2006; Carmody e Chen, 2007; Lu e col., 2008). Esse é um ponto importante de regulação da expressão de genes ativados pelo LPS, pois se não ocorrer a fosforilação do IkB-alfa e se não houver a degradação proteassômica, o fator de transcrição NFKB não será translocado ao núcleo (Gosh e col., 1998). Há ainda uma alça de retroalimentação negativa que retira a ligação do NFKB ao DNA, e que ocorre num momento mais tardio. Algumas características desse mecanismo ainda precisam ser elucidadas, mas o que se sabe é que a ligação do NFKB ao elemento responsivo no DNA promove a transcrição do RNAm do IkB-alfa. Após sua tradução no citoplasma, a proteína IkB-alfa migra do citoplasma ao núcleo para seqüestrar o fator de transcrição e inibir a cascata de ativação. Isto ocorre, pois a afinidade entre esta proteína ao NFKB é muito maior que a ligação do NFKB ao DNA (Gosh & Hayden, 2008).

O NFKB é um fator de transcrição central da resposta inflamatória em células imunocompententes (tanto as periféricas como macrófagos, quanto no sistema nervoso central, como as células da glia). A ativação por estímulos inflamatórios como a citocina TNF (fator de necrose tumoral) ou LPS culmina na repressão ou transcrição de vários genes, levando as células a um estado ativado pronto para responder a injuria e também para gerar proteínas que na fase antiinflamatória induzem a finalização adequada

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do processo (Meffert e Baltimore, 2005; Karin e Ben-Neriah, 2000).

Figura 1 – Via clássica da ativação dos receptores por LPS e a ativação da translocação nuclear do NFKB e de outros fatores de transcrição. Maiores detalhes ao longo do texto (Baseado em Gosh e col., 1998; Raetz & Whitfield, 2002; Kawai e Akira, 2006; Carmody e Chen, 2007; Lu e col., 2008; Gosh & Hayden, 2008).

O organismo está preparado para

detectar pequenas quantidades de LPS circulante para combater o foco infeccioso. Essa função é principalmente orquestrada por monócitos, que através de uma resposta imunológica inata passam a expressar diferentes moléculas. A participação do NFKB nessa cinética pode ser evidenciado, por exemplo, por mediar a transcrição de moléculas de adesão celular, como ICAM e PECAM, citocinas pró-inflamatórias como TNF, Interleucina 6 (IL-6), interleucina 1 (IL-1), enzimas como iNOS, COX-2, receptores como os de bradicinina do subtipo B1, e como já abordado anteriormente, a transcrição da proteína repressora IκB-alfa, o que resulta na auto-inibição do sistema (Gosh & Hayden, 2008). A produção dessas proteínas promove uma sinalização variada para outras células do organismo (por exemplo, células endoteliais, neutrófilos entre outras) permitindo o controle da resposta frente ao LPS. Entretanto, excesso de endotoxina circulante ou uma reação exacerbada pode levar a uma síndrome de resposta inflamatória sistêmica (Guha e Mackman, 2001). Na tabela 2 pode ser observada uma lista com os principais genes induzidos que o LPS induz em monócitos.

Citocinas TNF, IL-1, IL-6, G-CSF,

GM-CSF, M-CSF Quimiocinas IL-8, MCP-1 Fatores de Transcrição p50, c-Rel, IRF-1, Egr1

Tabela 2 – Principais genes expressos por monócitos/macrófagos após estímulo com LPS (Baseado em Guha e Mackman, 2001).

A ação pleiotrópica do LPS e seu padrão de expressão multi-mediado possibilitam que as

células do organismo tenham a capacidade de gerar diferentes respostas (Bonizzi e Karin, 2004). Um exemplo desse mecanismo pode ser observado nos efeitos do LPS ao promover a produção da citocina TNF e aumentar a expressão dos receptores para essa proteína em diferentes tecidos (Shen e col., 2009). É bem conhecido que TNF é uma das primeiras citocinas produzidas durante um processo infeccioso e desse modo fica claro que o LPS ao atuar em seus receptores próprios, ativa uma cascata de sinalização intracelular para promover um efeito que não é apenas mediado diretamente, mas indiretamente pela regulação de um pacote de genes alvo que permite um efeito posterior em um mecanismo bem regulado e estereotipado. Acredita-se ainda que esses efeitos ocorram para amplificação e propagação do sinal gerado inicialmente, visto que TNF também é um regulador importante da atividade do fator de transcrição NFKB (Meffert e Baltimore, 2005).

Esse último exemplo evidencia que o principal alvo do LPS são as células de defesa do organismo. Entretanto nos últimos anos vem crescendo o número de trabalhos que demonstram que o LPS promove regulação da expressão gênica no sistema nervoso central (SNC). A febre é um bom exemplo desse efeito, pois substâncias pirogênicas agem proporcionando liberação de prostaglandinas que agem no centro termorregulador localizado no hipotálamo anterior, reconfigurando o limiar da termoregulação para uma temperatura mais alta e ao fazê-lo promove mecanismos de aumento de temperatura do corpo acima dos níveis homeostáticos. Experimentalmente, essa resposta surge minutos após injeção sistêmica de LPS, mesmo quando citocinas ainda não são detectadas na circulação (Rivest, 2003). Além disso, é bem conhecido que áreas do cérebro expressam os receptores TLR4 e CD14, como os órgãos circunventriculares (Laflamme e Rivest, 2001), regiões encefálicas peculiares localizadas no lúmen do terceiro e quarto ventrículo com alta vasculatura composta por capilares fenestrados. Nessas áreas, a comunicação do tecido nervoso com o sistema vascular é mais acessível, o que permite a passagem de moléculas que não atingem outras áreas do cérebro (Duvernoy e Risold, 2007). Nesses locais, LPS promove a transcrição de genes de citocinas como TNF, IL-6 e IL-1 (Rivest, 2003) receptor CD14 e a proteína inibitória IkB-alfa (Laflamme e Rivest, 2001). Em relação à funcionalidade dessa produção central de citocinas desencadeada pelo LPS as hipóteses principais sugerem que esse processo possa modular a excitabilidade neuronal, e processos de neurodegeneração e/ou neuroproteção (Rivest, 2003).

Recentemente foi evidenciado que os receptores TLR4 e CD14, além de reconhecer o LPS, possuem função de reconhecer substâncias

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endógenas e estão envolvidas na neuroinflamação da doença de Alzheimer, visto que a ativação de células gliais no SNC depende da funcionalidade desses receptores e que a expressão desses receptores se co-localiza em áreas com formação de placas senis, característica dessa patologia (Walter et al., 2007). No entanto o que ocorre primeiro (neuroinflamação ou degeneração celular) não é totalmente claro (Rivest, 2003).

Em resumo, podemos concluir que a ativação da via de sinalização do NFKB pelo LPS ocorre de maneira estereotipada para a grande maioria dos tecidos e que os efeitos são decorrentes das subunidades do NFKB ativadas. Essa endotoxina é conhecida como potente ativadora de genes relacionados à resposta inflamatória aguda, como o TNF, uma das primeiras citocinas ativadas durante a fase pró-inflamatória. A possibilidade de gerar novas proteínas confere, portanto, a possibilidade de amplificação e perpetuação de um sinal inicialmente gerado pelo LPS. No entanto os sinais que chegam ao núcleo para finalizar essa sinalização são pouco compreendidos. Os efeitos dessa endotoxina não estão relacionados apenas à sinalização em células imunocompetentes periféricas, mas também com processos no SNC. O mais bem compreendido até o momento é a ativação da produção de citocinas em células gliais e neurônios dos órgãos circunventriculares. A participação dos receptores para LPS parecem ainda estar envolvidos no reconhecimento de substâncias endógenas no SNC e essa informação pode no futuro, ampliar a compreensão desse sistema e sua comunicação com o sistema imunológico.

De modo geral, o principal ponto de regulação da sinalização do LPS via NFKB é a regulação pós-translacional do adaptador citoplasmático IkB-alfa que reprime o NFKB no citoplasma e o libera após o estímulo na membrana ativar a sua fosforilação e degradação proteassômica. Outros pontos na regulação da sinalização ativada pelo LPS ainda precisam ser elucidados, bem como mecanismos que favorecem NFKB como principal via ativada pelo LPS em grande parte dos tecidos. Experimentos que avaliem essas e outras perguntas serão necessários para elucidar os pontos de que regulam a sinalização ativada pelo LPS.

Agradecimentos. À Profª Lucile Maria

Floeter-Winter.

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ASPECTOS EVOLUTIVOS DO SPLICING ALTERNATIVO

Barbara Mizumo Tomotani Departamento de Fisiologia, Instituto de Biociências, USP

Recebido 13out09 / Aceito 14jan10 / Publicação inicial 15abr10 [email protected]

Resumo. Os eucariotos apresentam mecanismos muito refinados para o controle de sua expressão

gênica, dentre eles, o splicing alternativo. Este mecanismo, abundante entre estes organismos, possibilita a geração de diferentes proteínas a partir de um único gene. Esta revisão pretende mostrar como as características do splicing alternativo podem torná-lo uma ferramenta interessante em estudos com enfoque evolutivo, em questões envolvendo tanto o surgimento do mecanismo quanto sua atuação na diversificação dos seres vivos.

Palavras-chave. Splicing alternativo, exons, EST, diversidade. EVOLUTIONARY ASPECTS OF THE ALTERNATIVE SPLICING Abstract. The eukaryotes present intricate mechanisms to control gene expression, as alternative

splicing. This mechanism is abundant in these organisms and permits the prodution of different proteins from a single percursor. This revision intends to show how alternative splicing can be an interesting tool in studies of evolution, comprising how the mechanism appeared and how it acts in the diversification of organisms.

Keywords. Alternative splicing, exons, EST, diversity. Introdução O controle da expressão gênica dos

eucariotos é muito refinado e complexo. Em um organismo multicelular praticamente todas as células diferenciadas possuem o mesmo potencial de expressão. Entretanto, o mecanismo de regulação gênica permite que a expressão seja seletiva e, assim, células carregando informações idênticas podem apresentar características distintas. Por exemplo, o processamento alternativo de precursores de RNAs mensageiros (mRNA) é capaz de gerar diferentes mRNAs maduros, dependendo do tipo de célula, local e função (Herbert e Rich, 1999; Alberts e col., 2002; Sharp, 2009).

O splicing é um tipo de processamento de RNA no qual as seqüências denominadas introns são removidas, enquanto as seqüêcias remanescentes (exons) são unidas formando um RNA maduro, que pode ser mensageiro ou não-codificante. Esta é uma forma de regulação importante, pois contribui, após o evento de transcrição, para o controle da expressão dos genes (Burge e col., 1999; Liu e col., 2005).

Pode-se considerar o splicing de um pré-RNA como um evento probabilístico no qual seqüências desse transcrito têm probabilidade que varia de 0 a 1 de uma seqüência de splicing participar da definição do intron. Esta característica oferece grandes oportunidades para a geração de diversidade, uma vez que essas variações podem acontecer em seqüências codificantes desse transcrito (Abril e col., 2005).

No processamento conhecido por splicing alternativo, diferentes exons de um mesmo pré-RNA podem ser utilizados na produção de diferentes RNAs maduros, e assim gerar proteínas distintas a partir de um único gene, caso essas variações encontrem-se em regiões

codificantes. Dessa forma, o splicing alternativo pode levar a um grande aumento na diversidade de proteínas. Sua ocorrência permite que informações específicas de um único gene se modifiquem dependendo de sinais do ambiente, gerando transcritos maduros distintos, e conferindo assim uma maior plasticidade à expressão gênica (Lareau e col., 2004; Sharp, 2009).

Existem cinco tipos principais de splicing alternativo (Figura 1): exon skipping (uso alternativo de exon), alternative 5´ splice sites (sítios doadores [5’] alternativos), alternative 3´ splice sites (sítios aceptores [3’] alternativos), intron retention (retenção de intron) e mutually exclusive exons (exons mutuamente excludentes). Além da possibilidade de ocorrer splicing alternativo nas seqüências iniciadoras e finalizadoras da transcrição (Ast, 2004; Blencowe, 2006).

Acreditava-se que a ocorrência desse evento seria muito restrita, porém atualmente se reconhece a alta freqüência e importância desse mecanismo: estima-se que, em humanos a proporção de genes de sofre splicing alternativo pode chegar a mais de 90% (Boue e col., 2003; Ast, 2004; Lareau e col., 2004, Wang e col., 2008). As características do splicing alternativo, bem como sua abundância entre os organismos, o tornam interessante para estudos com enfoque evolutivo. Como tal mecanismo poderia ter surgido? Quais seriam as diferenças encontradas em grupos distintos? Como o splicing alternativo atuaria na geração da diversidade biológica e especiação? Existem diversos modelos explicativos, mas tais questões ainda encontram-se em aberto.

Revisão:

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Figura 1 - Os cinco tipos principais de splicing

alternativo. Exons constitutivos em azul e alternativos em vermelho, linhas tracejadas representam as possíveis combinações de exons (modificado de Ast, 2004).

Modelos para o surgimento do splicing

alternativo Existem vários modelos que propõem como

o splicing alternativo poderia ter surgido, mas ainda não se chegou a um consenso sobre qual deles seria o mais provável.

Um dos mecanismos propostos para a evolução do splicing alternativo seria pela inserção de um novo exon em um gene existente ou pela duplicação de um exon dentro de um mesmo gene. Segundo Letunic e colaboradores (2002), no caso das duplicações em tandem, os dois exons poderiam levar à formação de produtos não funcionais caso ambos fossem incorporados ao mRNA maduro e, dessa forma, haveria a pressão de seleção para a regulação do mecanismo de splicing, levando ao splicing alternativo do tipo mutually exclusive exons (Figura 1b). Também seria possível a geração de novas proteínas funcionais pela inserção de novas seqüências, que poderiam, inclusive, ser originadas de introns. Dessa forma, a evolução de novas seqüências que codificam proteínas poderia ocorrer a partir de seqüências que previamente não eram codificantes, podendo ser este um mecanismo importante de evolução do genoma de um eucarioto (Letunic e col., 2002; Kondrashov e Koonin, 2003)

Outro mecanismo sugerido seria a formação de exons a partir de introns. A existência em

grandes proporções de elementos de transposição, apresentando inclusão relativamente recente, sugere que tais elementos contribuíram significativamente para a criação de novos exons ao longo da evolução (Ast, 2004; Xing e Lee, 2006; Kim e col., 2007a; Lev-Maor e col, 2007). Segundo Zhang e Chasin (2006), muitos exons novos seriam criados a partir de introns e poderiam ser eliminados por prejudicarem a função dos genes originais. Entretanto, a eliminação desses seria amenizada por dois processos: os exons novos formariam uma minoria dos transcritos ou seriam preferencialmente localizados em UTRs (do inglês, untranslated region, ou região não traduzida), deixando a proteína intacta. Segundo esse modelo, posteriormente esses exons seriam incorporados na região codificante e poderiam se tornar vantajosos.

Ast (2004) propõe um modelo para o aparecimento do splicing alternativo baseado na modificação de exons constitutivos (exons encontrados em cada transcrito de um gene) em exons alternativos (exons ausentes em pelo menos um dos transcritos que possa contê-lo). Nesse modelo, o sinal de sítio de splicing ancestral sofreria um acúmulo de mutações que fariam com que esse sítio passasse a ser sub-otimizado, permitindo a sua utilização também em splicing alternativo. Apesar de terem características próprias, exons constitutivos e alternativos apresentam um alto grau de similaridade, indicando que os constitutivos podem se tornar alternativos (em grande parte por exon skipping) ao longo da evolução. Assim, o autor afirma que o splicing alternativo provavelmente evoluiu devido a uma combinação de mutações no sítio de splicing que gerou um reconhecimento menos eficiente pela maquinaria de splicing, levando a mais eventos de exon skipping. Os outros tipos de splicing alternativo (5´ e 3´ splice sites; Figura 1c e 1d) poderiam consistir em uma adaptação específica do mecanismo, sendo um subgrupo da forma de splicing por exon skipping.

Análises posteriores (Lev-Maor e col., 2007) comparando genes ortólogos (genes homólogos localizados em diferentes espécies que evoluíram a partir de um ancestral comum único) de camundongos e humanos, deram mais suporte à teoria de que, além da inclusão de novos exons aos genes existentes, a mudança de splicing constitutivo para alternativo também ocorreria por um processo aleatório. Assim, a seleção se daria posteriormente, como no caso das mutações deletérias. Os autores ainda propõem que tal mecanismo seria ancestral e importante nos primeiros estágios da evolução dos eucariotos.

Su e colaboradores (2006) propõem um mecanismo de modificação do splicing alternativo associado a eventos de duplicação. Na análise, foram utilizados ESTs (Expressed Sequence

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Tags) e mRNA humanos, predizendo-se o número de cada produto protéico gerado por splicing alternativo e, posteriormente, repetiu-se a análise com outros organismos (camundongo, drosófila e o nematóide Caenorhabditis elegans). Nesse estudo, verificou-se que a ocorrência de splicing alternativo em genes duplicados tende a ser mais baixa do que de genes de cópia única e que a perda de formas de splicing alternativo poderia ocorrer logo após a duplicação gênica. Além disso, notou-se que o splicing alternativo poderia diferir entre as duplicatas gênicas. O cenário proposto para a evolução do splicing alternativo após a duplicação gênica seria: após a duplicação do gene/genoma, as duas cópias receberiam todas as formas de splicing alternativo do parental, porém poderiam começar a apresentar expressão diferencial e, devido à redundância funcional, uma forma poderia se tornar dominante em relação à outra. Tal transição evolutiva poderia ocorrer logo após a duplicação. Em estágios mais tardios, novos eventos de splicing alternativo poderiam ser adicionados, aumentando novamente o número de formas alternativas geradas (para mais detalhes, ver Su e col., 2006).

O splicing alternativo em diferentes

grupos Com seqüências do genoma e ESTs de

diversos organismos disponíveis em bibliotecas gênicas, muitos trabalhos foram realizados focando-se tanto na quantificação do splicing alternativo em diferentes grupos quanto no estudo da conservação do mecanismo entre esses grupos. A utilização de ESTs, que são curtas sub-seqüências de uma seqüência de cDNA (DNA complementar), possibilitou a realização de estudos baseados em bioinformática que diferem bastante dos estudos tradicionais de biologia molecular. Uma vez que os ESTs são derivados de mRNA já processado, eles oferecem uma ampla amostra da diversidade de mRNA. A maior parte dos estudos sobre splicing alternativo utilizando bioinformática depende das diferenças entre ESTs de um mesmo gene, como, por exemplo, a presença de grandes inserções ou deleções. Análises posteriores, alinhando as seqüências das ESTs com aquelas obtidas a partir do genoma podem revelar possíveis exons e introns e, com isso, é possível a detecção das possíveis formas de splicing (para mais detalhes, ver Modrek e Lee, 2002).

Diferentes estudos mostraram resultados distintos em relação à quantidade de eventos de splicing alternativo que ocorrem em diferentes espécies. Como tais estudos são dependentes das ESTs, a verdadeira variação entre os grupos pode aparecer mascarada pelas diferenças geradas pelo método, dificultando a comparação. Por exemplo, Brett e colaboradores (2002) e Kim e colaboradores (2004), utilizando tratamentos de

dados distintos apresentaram resultados discordantes sobre a taxa de splicing alternativo em diferentes eucariotos. Esses estudos, entretanto, utilizaram uma metodologia questionável, pois dependiam da amostragem das ESTs e, portanto, seus resultados poderiam ser devido à amostragem e não às diferenças reais entre os grupos (Harrington e col., 2004) (ver Quadro 1 para maiores detalhes).

Posteriormente, Kim e colaboradores (2007b) conduziram uma nova análise e sugeriram que, utilizando-se amostras aleatórias do EST total, obtém-se um resultado confiável e que o possível efeito de ESTs diferentes (nos quesitos qualidade e métodos de construção) é irrelevante. Entretanto, deve-se ressaltar que, mesmo com a melhoria da análise, a metodologia utilizada ainda não é livre de falhas. Nesse trabalho os autores verificaram que os diferentes eucariotos apresentam freqüências diferentes de splicing alternativo, considerando genes de dois mamíferos (homem e camundongo), uma ave (galo doméstico), uma ascídia (Ciona intestinalis), um inseto (Drosophila melanogaster), um nematóide (Caenorhabditis elegans) e uma angiosperma (Arabidopsis thaliana). As comparações mostraram que os grupos mais próximos (humanos e roedores) apresentam valores similares na porcentagem de genes que sofrem splicing alternativo, sendo que estes variam entre grupos mais distantes. Os autores concluem que as diferentes freqüências de splicing alternativo dos vertebrados e invertebrados sugerem que o surgimento da linhagem dos vertebrados foi acompanhado por um aumento no número de genes que sofrem splicing alternativo. Porém, a ascídia seria uma exceção, pois mesmo sendo filogeneticamente mais próxima aos vertebrados do que aos invertebrados, ela possui uma freqüência baixa de splicing alternativo. Os autores explicam tal diferença afirmando que esse organismo pode não ser um bom representativo do genoma de cordados basais, pois pode ter sofrido uma grande perda de genes e introns ao longo de sua evolução. Mas é necessário ressaltar que, como foram analisadas apenas duas espécies de mamíferos e uma de ave, não é possível fazer uma generalização sobre os vertebrados/cordados, e para tal, estudos com outros grupos seriam necessários. Tal característica poderia, por exemplo, consistir em uma convergência entre aves e mamíferos.

Kim e colaboradores (2007b) ainda propõem que, de uma forma geral na evolução dos animais, o intron retention seria o tipo mais raro de splicing alternativo e o exon skipping o mais comum. Segundo o autor uma das possíveis razões seria a presença de introns mais longos em mamíferos que poderiam levar a um reconhecimento menos eficiente de exons pela maquinaria de splicing. Já no caso da

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angiosperma Arabidopsis thaliana, o tipo de splicing com freqüência mais alta seria o intron retention, que, curiosamente, também é a forma mais comum de splicing alternativo em eucariotos unicelulares. Desse modo, o autor sugere que o intron retention possa ser uma forma ancestral de splicing, ou seja, que surgiu cedo na evolução.

A partir de seqüências gênicas é possível

realizar comparações da conservação do splicing alternativo em diferentes grupos como uma ferramenta em estudos de evolução. Uma das formas de estudo da sua conservação utiliza a informação das ESTs de duas espécies para identificar eventos equivalentes de splicing alternativo em genes ortólogos, com a ressalva de que, caso as bibliotecas estejam incompletas o método pode subestimar o grau de conservação, como salientado anteriormente A busca de eventos de splicing alternativo em duas espécies consiste em observar os padrões dos exons provenientes de genes ortólogos encontrados em bases de dados específicas, comparando-os para inferir a função do splicing alternativo na evolução. A conservação de um exon é

importante em estudos evolutivos uma vez que, a não ser no caso de homoplasias (similaridade devido a um evento de evolução convergente, ou seja, o aparecimento em linhagens distintas), um exon que sofre splicing alternativo presente em duas espécies indica que o ancestral comum dessas duas espécies deve também apresentar tal característica e, portanto, seu aparecimento é anterior à divergência das mesmas. Se o exon encontra-se no ortólogo de um dos genomas, mas não no outro, poderia indicar um evento de geração ou perda de exons (Boue e col., 2003; Modrek e Lee, 2003).

Existem diversos estudos que comparam a conservação do splicing alternativo em diferentes organismos. As análises de Modrek e Lee (2003), por exemplo, distinguem uma forma de splicing predominante (major), de uma forma rara de splicing (minor). Tal distinção é baseada no número de ESTs encontrados para cada forma de splicing. As formas raras são apoiadas por múltiplos ESTs e podem representar diferenças espécie-específicas de splicing funcional. Isso poderia indicar uma evidência da flexibilidade dos mecanismos de splicing que permitiria a evolução de novas formas funcionais, sugerindo que o splicing alternativo tem um papel importante na evolução do genoma ao permitir que novos exons evoluam com menos restrições. Os autores argumentam que as formas predominantes de transcritos são mais conservadas do que formas raras, sendo que, no caso de humanos e camundongos, 98% dos exons, pertencentes à forma predominante seriam encontrados em ambos genomas (proporção de conservação equivalente àquela dos exons constitutivos).

É importante ressaltar que existem valores de conservação distintos encontrados por outros autores, sendo que tais diferenças se devem, em parte, às metodologias utilizadas (Boue e col., 2003; Modrek e Lee, 2003; Lareau e col., 2004; para uma revisão sobre os estudos de conservação, ver Irrina e col., 2009). Além disso, Irrina e colaboradores (2009) afirmam que os vários estudos realizados tentando-se verificar a conservação dos eventos de splicing alternativo diferem também nos níveis de conservação considerados, apresentando resultados distintos. Segundo esses autores, a conservação do splicing alternativo poderia se dar em três níveis: 1- Genoma (genome-conservation): Nesse nível a conservação é dada em termos de presença/ausência de splicing alternativo. Caso exista a conservação entre duas espécies A e B, se A apresenta uma seqüência (exon, intron, grupo de exons, etc) que sofre splicing alternativo, B apresentará o potencial de gerar transcritos alternativos equivalentes. 2- Evento (event-conservation): Se uma seqüência é conservada em relação ao genoma de duas espécies, o splicing alternativo pode ou não ser similar entre elas. Se houver conservação

Quadro 1: As metodologias e suas limitaçõesA grande quantidade de informações

fornecidas pela análise de ESTs permitiu a identificação de diversos eventos de splicing alternativo. Existem, entretanto, problemas que envolvem desde diferenças de protocolos a erros devido à amostragem de ESTs. Modrek e Lee (2003) citam dois problemas principais: falha em detectar uma forma de splicing ou obter um resultado que não corresponde a uma real forma de splicing. É importante lembrar que a detecção de formas de splicing alternativo por bioinformática depende da detecção de formas diferentes de ESTs. Contudo, se algum evento raro que não o splicing alternativo for responsável pela modificação da EST, ele pode ser confundido com um splicing alternativo. Apesar dos estudos serem baseados no genoma total, eles podem falhar em detectar certas variantes protéicas como resultado da fragmentação da seqüência da EST (Modrek e Lee, 2002; 2003). Também se pode mencionar a baixa sensibilidade na detecção de eventos de splicing alternativo em genes com baixa taxa de expressão e a proporção de ESTs totais deslocada para os finais 5´ou 3´dos transcritos devido à forma de obtenção dos mesmos (Johnson e col., 2003; Blencowe, 2006, Ferreira e col., 2007).

A tecnologia de microarray é eficiente para análises de expressão gênica em larga escala, sendo apropriada para uma caracterização do perfil de expressão dos diferentes transcritos de um gene. O uso de microarrays possibilita a análise simultânea de uma grande quantidade de amostras e mostrou-se um bom candidato para a complementação dos estudos sobre splicing alternativo. Esse tipo de análise permite a detecção de eventos de splicing alternativo em milhares de genes e já foi utilizado em alguns estudos (Blencowe, 2006, Ferreira e col., 2007). Por exemplo, Johnson e col. (2003), detectaram eventos que a análise de ESTs não foi capaz de detectar, possibilitando assim a descoberta de novas regiões de genes (humanos) que sofrem splicing alternativo.

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do evento, significa que ambas espécies têm a capacidade de gerar isoformas equivalentes por splicing alternativo daquela seqüência. 3- Regulação (regulation-conservation): O splicing alternativo pode ser regulado em vários níveis: espacial, temporal, quantitativo (relacionado à abundância de determinado transcrito) ou condicional (dependente das condições ambientais). Nos casos em que a regulação é conservada, ocorre regulação similar em relação ao tempo, tecido e/ou quantidade de variantes protéicas geradas por splicing alternativo. Assim, duas espécies apresentariam as mesmas variantes de splicing expressos no mesmo tecido e/ou na mesma fase da vida, por exemplo.

O presente conhecimento sobre a evolução dos organismos é baseado em uma amostra muito pequena de espécies, mas o cenário está se modificando. Estudos em outros grupos são necessários para uma maior compreensão da abrangência do fenômeno, bem como para melhores inferências evolutivas (Copley, 2008).

O mecanismo de splicing alternativo e a

geração de diversidade Diferentemente de organismos procariotos,

mais dependentes de eventos de mutação ou transposição para a geração de novos fenótipos, em eucariotos a evolução por alteração no processamento de RNA é auxiliada pela manutenção de um genoma rico em introns, o que aumenta a probabilidade de formação de novos fenótipos. Tal genoma poderia ser considerado como uma fonte de aparecimento de variações que eventualmente se mostram funcionais a partir da união de antigos componentes em novas combinações. As modificações do DNA por mutação, conversão gênica, transposição, retrotransposição entre outras, podem alterar o perfil de transcritos e assim, aumentar a diversidade de produtos (Herbech e Rich, 1999).

Modrek e Lee (2003) propuseram uma hipótese para a importância do splicing alternativo na evolução: o mecanismo aumentaria a taxa de mudanças evolutivas em exons específicos. Para que um gene modifique sua atividade, sua seqüência deve passar por uma série de modificações, sendo que as formas intermediárias podem apresentar seu fitness (grau de sucesso reprodutivo, considerando a transmissão dos genes para as gerações seguintes) reduzido para ambas as atividades (inicial e modificada). Quando há uma incorporação de exon por splicing alternativo, este seria primeiramente incluso em poucos transcritos e estaria livre para acumular mutações, enquanto o transcrito original poderia continuar exercendo sua atividade sem perdas significativas de fitness. Assim, o splicing alternativo permitiria à seqüência sobressalente se converter de formas de baixo fitness para formas neutras onde modificações poderiam ser

acumuladas mais rapidamente. Possivelmente, isso geraria uma nova função, que poderia ser positivamente selecionada. Assim, o exon, produto de splicing alternativo, evoluiria sem prejudicar a função original do gene. Desse modo, o splicing alternativo “expandiria os caminhos para a evolução neutra” aumentando a taxa de modificações. Caso não existisse o splicing alternativo, os novos exons provavelmente não seriam selecionados, diminuindo a possibilidade de modificações serem geradas e acumuladas (Boue e col., 2003; Mordrek e Lee, 2003; Laureau e col., 2004).

Xing e Lee (2005), por outro lado, questionam a generalidade da ocorrência de redução da pressão seletiva por splicing alternativo, exemplarmente no caso do splicing alternativo que gera produtos claramente funcionais. Também alegam a falta de evidências para considerar o fenômeno como adaptativo. Em seu trabalho os autores analisaram diferentes tipos de pressão seletiva em diferentes mamíferos e mostraram que o splicing alternativo gera aumento na densidade de mutações em aminoácidos e diminuição na freqüência de mutações silenciosas dentro de exons (mutações sinônimas). Esse aumento na pressão seletiva contra mutações sinônimas em exons alternativos foi acompanhado por aumento na pressão seletiva para a preservação da fase de leitura da proteína, sugerindo que o splicing alternativo seria importante para criar os denominados hotspots evolutivos, nos quais uma porção da proteína poderia acumular mutações em seus aminoácidos em taxas muito mais altas do que as demais porções.

Conclusão Apesar de existirem discordâncias de

modelos teóricos/experimentais apresentados por diversos autores, é possível dizer que o splicing alternativo é um mecanismo abundante e funcionalmente importante: relevante na regulação da expressão gênica e no aumento da diversidade de transcritos e proteínas. Os padrões de exons alternativos podem ser mais ou menos conservados entre as espécies, tornando o splicing alternativo relevante também como um caráter auxiliar na investigação das relações filogenéticas entre os diversos grupos. Assim, o splicing alternativo pode ser uma ferramenta interessante nos estudos evolutivos. Entretanto, faz-se necessário ressaltar a importância de mais estudos nessa área, de forma a assegurar que erros metodológicos sejam minimizados.

Agradecimentos. Lucile Maria Floeter-

Winter (IB-USP); Cintia Etsuko Yamashita (IB-USP); Danilo Eugênio França Laurindo Flôres (IB-USP); Marie-Anne Van Sluys (IB-USP); Rodrigo Brincalepe Salvador (MZUSP); e aos revisores da Revista da Biologia.

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