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HISTÓRIAS INFANTIS E MATEMÁTICA … A constituição de grupos colaborativos para a elaboração de livro infantil com conteúdo matemático era uma de nossas estratégias de ação

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HISTÓRIAS INFANTIS E MATEMÁTICA PROMOVENDO FORMAÇÃO E

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE PROFESSORES

Cármen Lúcia Brancaglion Passos/UFSCar

Rosa Maria Moraes Anunciato de Oliveira/UFSCar

Renata Prenstteter Gama/UFSCar

Apoio: CNPq e Proex/UFSCar

Resumo

O desafio de integrar a matemática com histórias infantis na formação inicial e

continuada de professores mobilizou pesquisadores, professores que atuam na educação

básica e licenciandos preocupados com o processo de ensinar e aprender matemática

nos anos iniciais. Diversas pesquisas foram realizadas no interior da Atividade

Curricular Integrada de Ensino Pesquisa e Extensão (ACIEPE) “Histórias Infantis e

Matemática nas Séries Iniciais” com o objetivo de: identificar e analisar obras de

literatura infantil que abordassem conceitos e noções matemáticas, produzir livros

infantis com conteúdo matemático integrado a outras áreas do conhecimento, utilizar

essas produções em contextos escolares e analisar a pertinência e adequação das

produções no ensino fundamental. Neste texto trazemos os resultados desse projeto

elencando algumas categorias que indicam a constituição de um programa de formação

de professores: integração entre os cursos de graduação; entre diferentes profissionais

da educação e entre universidade e escola; ampliação da base de conhecimento;

constituição de grupo com dimensões colaborativas como parte de uma metodologia de

formação de professores; utilização de uma metodologia de formação de professores

ancorada na reflexão; interdisciplinaridade entre língua materna e matemática –

desenvolvimento do raciocínio lógico e sua expressão discursiva e simbólica; a escola

como elemento central na formação docente; construção de livros infantis para o

desenvolvimento de uma cultura de produção do próprio material didático; aplicação do

próprio material didático com reflexão sistematizada em grupo - desenvolvimento da

cultura do compartilhar saberes sobre a prática docente. A participação no grupo de

pares promoveu o desenvolvimento em diferentes domínios, não apenas para os

professores e licenciandos, mas também para os professores formadores/pesquisadores.

Palavras-chave: histórias infantis e matemática; formação inicial e continuada de

professores; desenvolvimento profissional de professores.

Introdução

ACIEPE é uma modalidade de Atividade Curricular de Integração Ensino Pesquisa

e Extensão da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) oferecida semestralmente por

diferentes cursos de graduação envolvendo a comunidade acadêmica interna (graduandos, pós-

graduandos e pesquisadores) e a comunidade externa. Dentre as características gerais do

programa institucional da Universidade estão o seu objetivo de integrar ensino, pesquisa e

extensão, visando aproximar a universidade e da comunidade. Trata-se de uma atividade com

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ementa aberta de maneira a englobar diferentes temáticas durante o período de sua realização.

Há possibilidade de reedições e/ou continuidades a cada novo semestre. O planejamento

envolve a pesquisa e mostra-se aberto para reformulações durante o processo. Nas licenciaturas,

há possibilidade de oferecimento do aceso aos diversos membros da comunidade escolar externa

(professores, coordenadores, diretores, funcionários, pais). Ao final de cada ACIEPE são

atribuídos créditos acadêmicos para os alunos da graduação da UFSCar e emitidos certificados

de extensão para os demais participantes.

Dentre as diversas atividades curriculares normalmente oferecidas na UFSCar, a

ACIEPE intitulada “Histórias infantis e Matemática nas séries iniciais”, desenvolvida no

período de 2004 a 2010 envolveu, a cada ano, em um mesmo grupo professores universitários,

professores que ensinam matemática na escola básica e futuros professores. A atividade contou

com financiamento para custeio e um bolsista a cada oferta. No período de janeiro de 2008 a

janeiro de 2010 a pesquisa realizada no interior dessa ACIEPE passou a contar com o apoio do

CNPq com a aprovação projeto “O desenvolvimento profissional de professores em grupo de

estudo colaborativo: histórias infantis conectadas com a matemática na formação e na prática

docente”. Iniciamos este texto com a caracterização geral da ACIEPE, sua organização e os

aspectos teóricos-metodológicos e, em seguida, trazemos nossas considerações a respeito da

potencialidade formativa observada na ACIEPE e evidenciadas nas produções dos participantes,

que nos permitem, então, denominá-la como um programa institucional de formação de

professores.

Contextualizando a ACIEPE Histórias Infantis e Matemática

Desde seu início essa ACIEPE compôs grupos para que os participantes se envolvessem

em situações que tinham como objetivos: identificação e análise de obras de literatura infantil

que abordassem conceitos e noções matemáticas; produção de livros infantis com conteúdo

matemático integrado a outras áreas do conhecimento; utilização dessas produções em contextos

escolares; análise da pertinência e da adequação das produções às séries iniciais do ensino

fundamental. Para atingirmos tais objetivos, procuramos criar um ambiente de trabalho que

favorecesse práticas coletivas compartilhadas e reflexivas próprias de um grupo colaborativo. A

participação era voluntária, o grupo reunia-se na UFSCar, semanalmente, durante quatro horas.

Durante os dois anos do projeto que contou com apoio do CNPq, participaram 16 pessoas:

professores dos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental de escolas públicas e privadas da

região de São Carlos, SP, licenciandos dos cursos de Matemática, Pedagogia e Letras da

UFSCar, pós-graduandos do curso de Mestrado em Educação da UFSCar e professores

formadores/pesquisadores da universidade.

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A constituição de grupos colaborativos para a elaboração de livro infantil com conteúdo

matemático era uma de nossas estratégias de ação. Esse espaço de reuniões e pesquisa nos

ofereceu pistas sobre a forma como os futuros professores e professores em exercício vão

construindo sua maneira pessoal de se relacionar com o ensino.

A diversidade na formação inicial dos participantes trouxe desafios, muito próximos

daqueles revelados na prática docente. Fez-se necessária uma aproximação inicial com o

referencial teórico sobre as conexões entre matemática e literatura infantil compartilhando

significados e experiências num espaço de debate e reflexão possibilitando aos participantes

revisitar a formação matemática e ressignificar conceitos, tendo a experiência docente como

eixo das reflexões produzidas.

A dinâmica do grupo possibilitou aos professores em exercício, no convívio com os

estudantes e formadores-pesquisadores, reconstruir seus conhecimentos para a produção de

história infantil conectada com a matemática. Isso provocou o deslocar-se do seu lugar na sala

de aula, passando a ocupar outro lugar, o do “escritor” que escreve um texto tendo em mente um

leitor específico, os seus alunos. A coleta de dados do projeto que teve como instrumentos:

observações, registros escritos em diários de campo, filmagens das reuniões do grupo e de

episódios de ensino, entrevistas com os professores, futuros professores, produção de narrativas.

Pretendíamos nessa pesquisa identificar e analisar como são compartilhados

conhecimentos da docência, a partir de diálogos e reflexões entre os participantes no grupo e o

ambiente de trabalho visava favorecer práticas coletivas compartilhadas e reflexivas. Isso foi

alcançado como pode ser verificado em Passos et al. (2008) onde se conclui que essas dinâmicas

contribuíram para que fosse possível analisar as transformações na atribuição de significados

sobre o tema e conteúdos de diferentes naturezas abordados em livros infantis.

No início da ACIEPE, houve a realização de levantamentos de livros infantis em

bibliotecas escolares, catalogação de livros infantis com conteúdo matemático, possibilitando

aos participantes momentos de pesquisa e aprendizagem, com base em análises sobre os

diferentes conteúdos matemáticos, dos contextos das histórias, análise de características de

linguagem, adequação à faixa etária e ao nível de escolaridade. As discussões a respeito das

propostas dos livros infantis que seriam elaborados pelos participantes ocorriam nas reuniões do

grupo. A troca de pareceres entre os pares foi considerada uma das atividades mais importantes,

pois o olhar do outro dava pistas daquilo que precisava ser revisto ou ampliado ou mesmo

subtraído.

As dinâmicas desenvolvidas nos encontros apontam para a importância do compartilhar

durante os encontros, fórum onde se estabelece conversação, partindo da exploração das

experiências vividas pelos diversos participantes. Esse compartilhar de idéias favoreceu tipos de

reflexões no grupo e pelo grupo, que desencadearam um explicitar, contrastar e ressignificar de

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concepções e de práticas. Com isso foi possível nessa pesquisa, sob a ótica dos participantes,

analisar as contribuições para o desenvolvimento profissional a partir da participação deles no

grupo colaborativo, em que cada elemento estava em uma fase da carreira, possuíam objetivos e

formações diferenciados.

Nas reuniões do grupo os participantes se envolveram em processos de tomada de

consciência de seus saberes em uma perspectiva contínua que compreende desde sua trajetória

estudantil até sua fase de busca de autonomia profissional, quando passam a assumir a

responsabilidade de seu próprio desenvolvimento profissional. Para tal, foi necessário a

superação das situações que dificultam as práticas colaborativas na escola, como por exemplo a

falta de espaço no ambiente escolar para discussões com colegas de outra área do conhecimento.

As práticas desenvolvidas nas reuniões do grupo de certo modo possibilitaram a

reflexão compartilhada, ou seja, serviu como um espaço onde se colocavam e se discutiam as

questões que resultavam da prática dos participantes. Nessa perspectiva, consideramos que as

discussões tiveram conotações formativas, pois favoreceram esse processo reflexivo e

promoveram o desenvolvimento profissional dos participantes.

Dentre as práticas desenvolvidas no grupo e que consideramos serem promotoras de

desenvolvimento profissional destacamos o papel da escrita e a produção de materiais didáticos,

no nosso caso, livros de histórias infantis conectadas com conteúdos matemáticos.

Como destacado na literatura a respeito da formação de professores, a atuação

profissional é bastante complexa, a formação desse profissional – inicial ou contínua – em

termos de aquisição de conteúdo específico vai além do como ensinar, sua formação deve ajudá-

lo a desenvolver conhecimentos mais gerais que possam ser aplicados a novas situações. Nesse

sentido, a construção de materiais que auxiliem nesse desenvolvimento profissional parece ser

um promissor campo de investigação e de formação.

A utilização – ou a construção – de material pedagógico, no nosso caso - livros de

histórias infantis - não pode ser ancorada em uma concepção simplista na qual a formação do

profissional seja substituída por - ou se dê via - “kits” pedagógicos. As reflexões sobre o

material didático estão associadas a um projeto mais amplo de formação docente. A construção

e o uso de materiais didáticos passam primeiramente pela concepção sobre o papel dos

docentes. Esse tema está vinculado a dois aspectos interligados: a formação de professores e as

suas concepções pedagógicas que foram muito bem discutidos durante os encontros. Com essa

perspectiva foi possível analisar as atitudes em relação aos conteúdos de ensino, à profissão e a

carreira advindas da participação no grupo colaborativo. Buscamos ainda identificar e analisar

as mudanças na prática docente decorrentes do processo formativo vivido no grupo

colaborativo, na perspectiva dos participantes. Analisamos as aprendizagens dos professores em

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decorrência das situações de sala de aula em que os estudantes interagiam com o livro infantil

com conteúdo matemático.

Destacamos a importância dessa perspectiva de estudo e pesquisa, pois professores que

ensinam matemática nas escolas básicas, sozinhos, dificilmente conseguem problematizar suas

práticas. Eles necessitam de parceiros externos à escola que os ajudem a produzir

estranhamentos. Por outro lado, nem os professores da escola nem nós, formadores-

pesquisadores da universidade, possuímos condições para, independentemente uns dos outros,

dar conta do desafio de mudar as práticas escolares e formar professores competentes para

enfrentar a realidade complexa da escola atual.

A elaboração de livros de histórias infantis com conteúdo matemático era seguida de

ilustração e encadernação, o que representou mais um desafio aos participantes. Os participantes

produziram ainda textos, avaliando a própria aprendizagem e as possíveis contribuições para a

prática docente das temáticas debatidas. Todas as etapas desenvolvidas nos encontros do grupo

foram videogravadas. Houve ainda momentos em que os participantes apresentavam seus livros

para todo o grupo, socializando o produto final: o livro de história infantil com conteúdos

matemáticos. Posteriormente, o grupo novamente se reunia na Universidade para a etapa

dedicada ao planejamento da inserção do livro no contexto escolar. Nesses momentos, eram

elaboradas tarefas e atividades didáticas, tendo como recurso metodológico as histórias infantis

produzidas na primeira etapa do projeto. As reuniões do grupo contribuíram para reflexões e

aprofundamentos necessários para a construção das atividades. Esses momentos se tornaram um

rico espaço de troca de experiências e práticas que, por sua vez, proporcionaram melhores

condições para a implementação dessas produções no contexto escolar. Houve, portanto,

momentos de atuação dos participantes no contexto escolar, quando foram desenvolvidas

atividades em sala de aula utilizando as histórias infantis para ensinar matemática. Essas etapas

foram acompanhadas pelos pesquisadores e por outros integrantes do grupo, tendo sido feitos

registros em diário de campo e relatórios reflexivos bem como registros videográficos. Destaca-

se em Montezuma e Oliveira (2009a; 2009b) que o acompanhamento das atividades nas escolas

contribuiu sobremaneira na análise e possibilitou a identificação de indícios de desenvolvimento

profissional do professor, dos conhecimentos que foram construídos ou ressignificados nesse

processo e também trouxe valiosas contribuições para a aprendizagem da matemática dos

estudantes da escola envolvidos.

Ressaltamos ainda que o desenvolvimento da ACIEPE e das atividades decorrentes dela

deram origem várias outras pesquisas e artigos apresentados em eventos e publicados em

periódicos. Na próxima seção destacamos alguns dos resultados alcançados.

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A ACIEPE Histórias Infantis e Matemática como um programa instituição de formação

de professores

Como previsto, o trabalho envolveu a investigação em situações de produção de

histórias infantis com conteúdo matemático em forma de livro e o desenvolvimento profissional

dos participantes, a formação de recursos humanos foi um importante resultado. Nesse contexto,

de formação continua de professores e formação inicial de licenciandos, foram produzidas três

dissertações de Mestrado em Educação de participantes da equipe (SOUZA, R. D., 2007;

SOUZA, A. P. G. 2008; MONTEZUMA, 2010) e uma tese de doutorado em Educação em fase

de finalização (SOUZA, A. P. G., 2012). Diversos trabalhos de conclusão de cursos dos

licenciandos da universidade também foram desenvolvidos no interior desse projeto. Ressalta-se

ainda que pesquisadores, pós-graduandos, professores da educação básica e licenciandos

participantes produziram comunicações, em forma de relatos de experiências, que foram

apresentadas em eventos de extensão da UFSCar e em eventos da área de Educação e Educação

Matemática.

Tendo em vista o propósito do texto, elencamos algumas categorias que caracterizam a

ACIEPE como um programa institucional de formação de professores.

Integração entre os cursos de graduação; entre diferentes profissionais da

educação e entre universidade e escola.

Verificou-se que, de certo modo, ocorreu o que poderíamos chamar de atividade

compartilhada e desenvolvimento profissional compartilhado entre os professores

formadores, os alunos da universidade, os professores das escolas no momento de

planejamento e de construção das histórias infantis ocorridos na dinâmica do grupo de

estudo (PASSOS, OLIVEIRA e GAMA, 2009). Com isso, não houve separação entre

formação inicial e continuada e proporcionou-se a interdisciplinaridade entre várias

áreas de conhecimento. Isso fez com que se efetivasse a tão desejada aproximação dos

professores da escola das discussões acadêmicas, permitindo maior visibilidade das

discussões que ocorrem na área de formação de professores.

Ampliação da base de conhecimento

Com relação ao que Shulman e colaboradores denominam a base de

conhecimento para o ensino, especialmente com relação ao conteúdo específico, no

trabalho de Passos, Oliveira e Gama (2009) foi possível verificar que os alunos da

universidade e professoras participantes do grupo refletiam e debatiam a respeito da

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experiência matemática que haviam tido em sua escolarização anterior. Quando suas

concepções e crenças a respeito da matemática e seu ensino puderam ser explicitadas

pela reflexão a respeito da trajetória como estudante, observamos que essa vivência

possibilitou a explicitação de alguns equívocos na compreensão de alguns fundamentos

da matemática. Estas compreensões puderam ser resignificadas por meio de debates,

exemplificação, uso de materiais que permitiram a ampliação da base de

conhecimentos.

Constituição de grupo com dimensões colaborativas como parte de uma

metodologia de formação de professores.

A cada semestre grupos eram constituídos tomando como referência o que

Fiorentini (2004) indica ser favorável à formação de grupos colaborativos: a adesão era

voluntária; ocorria compartilhamento de saberes e experiências, inclusive da prática;

momentos de informalidade, de reciprocidade afetiva e confraternização se faziam

presentes nos encontros do grupo; os participantes sentiam-se à vontade para expressar

o que pensavam e estavam dispostos a ouvir críticas e a mudar; não existia uma verdade

ou orientação única; houve confiança e respeito mútuos; os participantes negociavam

metas e objetivos comuns; ocorria o compartilhamento de significados; foi oportunizado

aos participantes produção e sistematização de conhecimentos e bem como

reciprocidade de aprendizagem.

Utilização de uma metodologia de formação de professores ancorada na

reflexão

Em Passos, Oliveira e Souza (2009), com o objetivo de identificar indícios de

desenvolvimento profissional dos professores participantes do grupo de estudo

colaborativo, foram considerados os memoriais de formação, entrevistas, narrativas e

depoimentos. A escrita foi utilizada como elemento de reflexão sobre as aprendizagens

anteriores ou as que emergiam das dinâmicas proporcionadas pelo ambiente coletivo do

grupo. Verificou-se que através da escrita os participantes tornam seus conhecimentos

tácitos mais visíveis, levantam questões e suposições sobre práticas comuns. Eles

produziram informações que ajudaram a perspectivar novas alternativas de ação na

prática escolar. Esse seria um empreendimento promotor tanto de realização

profissional de cada um dos participantes, quanto de desenvolvimento, a longo prazo, da

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cultura profissional de toda a comunidade docente envolvida no processo. A análise

revelou ampliação da base de conhecimento para o ensino, investimento na própria

aprendizagem profissional e mudanças nas ações didáticas. O compartilhar de

experiências, com participantes de áreas diversas promoveu espaços promissores para a

reflexão a ampliação do repertório de metodologias, revelando sua potencialidade

formativas.

Interdisciplinaridade entre língua materna e matemática – desenvolvimento do

raciocínio lógico e sua expressão discursiva e simbólica.

Souza e Oliveira (2010) afirmam que a articulação entre matemática e literatura infantil

permite que o docente, juntamente com os alunos, coloque-se em movimento para concretizar

um processo educativo que potencialize a aquisição de conhecimento, possibilita a criação de

situações de ensino que permitem explorar as relações existentes entre a língua materna e a

matemática. Evidências desse aspecto foram observadas na pesquisa de Souza (2008) que

buscou investigar de que maneiras os alunos da 4ª. série do ensino fundamental (atual 5º

ano), em um contexto de ensino e aprendizagem que conectou literatura e matemática,

se apropriaram de conteúdos escolares, se relacionaram com esses conhecimentos e qual

foi sua receptividade a essa metodologia. Os resultados apontaram que os participantes

criaram e testaram hipóteses e estratégias, envolvendo-se num processo de compreensão

de conteúdos de diferentes áreas do conhecimento abordados. Os alunos interagiram

com as narrativas, construindo conhecimento e estabelecendo uma relação de

interioridade com saberes abordados nas aulas.

Nessa mesma perspectiva, em Oliveira e Passos (2008) observou se o

redimensionamento de conhecimentos profissionais por parte dos professores quando da

efetiva participação deles em uma tarefa que envolvia a interdisciplinaridade e a ação

criativa. As tentativas de aproximar diferentes áreas em um trabalho interdisciplinar,

além do acesso a outros conteúdos culturais, a atitudes e valores apontam também

possibilidades promissoras de mudanças na prática.

A escola como elemento central na formação docente.

Essa metodologia permitiu trabalhar com material disponível na escola e na

universidade (livros infantis) para conhecer e analisar sistematicamente o que já existem

nesses espaços e em outras mídias. A pesquisa de Montezuma (2010) investigou saberes

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mobilizados, construídos e/ou ressignificados por um grupo de professoras das séries

iniciais da educação básica diante do desafio de integrar a literatura infantojuvenil e a

Matemática. A análise dos dados sinalizou que os saberes mobilizados pelas professoras

foram múltiplos e de fontes de aquisição diferentes; indicou mudanças nos

conhecimentos tanto gerais, quanto específicos da matemática, ressignificação de

algumas concepções das professoras, com relação à postura docente, aos conteúdos, aos

valores, atitudes e procedimentos. Houve evidências de que os saberes profissionais das

professoras foram ressignificados com a prática, pois elas passaram a observar a

Matemática presente nos livros paradidáticos de forma diferente, concebendo uma nova

forma de mobilizar os alunos para a aprendizagem, o que implica em maior

flexibilidade na base de conhecimentos para o ensino e oferece potencialidades para o

desenvolvimento profissional.

Construção de livros infantis para o desenvolvimento de uma cultura de

produção do próprio material didático

A construção de materiais didáticos traz uma nova compreensão do papel do

professor e contribui com sua autonomia, permitindo a integração dos conteúdos

específicos e pedagógicos nos cursos de formação. O trabalho de Oliveira e Passos

(2008) toma como objeto de investigação, a formação docente e sua relação com os

materiais de ensino, sobretudo por esse tema ser frequentemente relegado, foram

analisadas contribuições da construção de livros com conteúdo matemático para o

desenvolvimento profissional de professores. Os resultados apontaram que a criação de

um material para ser utilizado na escola com seus alunos favoreceu tanto a

ressignificação de conteúdos específicos de matemática, como outras possibilidades de

desenvolvimento profissional dos professores. Constituiu-se em uma experiência que

exigiu dos participantes o pensamento crítico em todos os momentos e, algumas

aprendizagens puderam ser percebidas. A concepção de que é difícil estabelecer

relações entre a matemática e a língua portuguesa, declarada pelos participantes, foi

sendo redimensionada por eles ao longo do processo formativo desenvolvido. O

redimensionamento do conhecimento profissional em relação a conteúdos, estratégias

de ensino e de avaliação foi possível mediante a combinação de fatores como a reflexão

sobre a prática partilhada no grupo, que, em diferentes momentos, estimulou os

depoimentos, acatou as diferentes opiniões, referendou posicionamentos e escolhas,

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aplaudiu conquistas etc. Na definição do tema matemático, os participantes fugiam de

temáticas sobre as quais tinham pouco domínio, e isso só foi possível, no caso da

geometria, por exemplo, quando perceberam que era um tema pouco conhecido e

explorado por todos. Então, puderam compartilhar suas dúvidas e avançar nesse campo.

Aplicação do próprio material didático com reflexão sistematizada em grupo:

desenvolvimento da cultura do compartilhar saberes sobre a prática docente.

A pesquisa realizada como trabalho de conclusão de curso por Silva (2009)

refere-se ao processo de construção de um livro de literatura infantil contemplando

conteúdos matemáticos e sua posterior aplicação a uma turma de 6º ano do ensino

fundamental, portanto no segundo ciclo do Ensino Fundamental. Os alunos

participantes tiveram grande interesse e receptividade com a atividade desenvolvida. Ao

resolverem as atividades de resolução de problemas que emergiram do livro, a

graduanda percebeu que os alunos levantaram hipóteses, fizeram conjecturas e

ampliaram seus repertórios sobre as diferentes estratégias de resolução. Para a

graduanda o desenvolvimento dessa pesquisa foi bastante formativa, contribuiu para a

futura prática docente.

No relato Assunção (2009), uma das professoras participantes da ACIEPE,

observou-se que tanto o planejamento das atividades, a partir do livro escrito por ela,

quanto o desenvolvimento da proposta com a turma de 2º ano do Ensino Fundamental,

possibilitam o desenvolvimento de competências e habilidades relativas ao conteúdo

matemático para ela e para seus alunos. O envolvimento das crianças com a partir do

livro de histórias criado pela professora foi o ponto alto da experiência, pois estimulou a

autonomia e a socialização do conhecimento, elevando a auto-estima e refletindo

positivamente na prática docente.

Considerações finais

Foi possível identificar e analisar como são compartilhados conhecimentos da

docência, a partir de diálogos e reflexões entre os participantes. Acompanhamos e

analisamos as transformações na atribuição de significados sobre o tema e conteúdos de

diferentes naturezas abordados nos livros produzidos pelos participantes.

Acompanhamos e identificar mudanças na prática docente decorrentes do processo

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formativo vivido pelos professores quando implementaram em situações de sala de aula

atividades discutidas e elaboradas no grupo colaborativo.

Constatamos que quando professores e futuros professores se engajam na

construção conjunta de conhecimentos, estabelecem conversas e outras formas

colaborativas de análise e interpretação. Os dados apontam que mediante esse processo,

os participantes tornaram seus conhecimentos tácitos mais visíveis, levantaram questões

e suposições sobre práticas comuns e produziram informações que ajudaram a

perspectivar novas alternativas de ação na prática escolar. Esse é um empreendimento

que promoveu tanto realização profissional de cada um dos participantes, quanto o

desenvolvimento, a longo prazo, da cultura profissional de toda a comunidade docente.

Dessa forma, a ACIEPE com um programa institucional de formação de

professores integra ensino, pesquisa e extensão com vistas ao desenvolvimento

profissional dos envolvidos. Essa integração na formação dos professores contribui para

minimizar as dicotomias (teoria e prática, conteúdo específico e pedagógico...). Da

mesma forma, o grupo possibilitou a criação de estratégias formativas apoiadas em

práticas de reflexão, de investigação e de construção de materiais didáticos de forma

coletiva e colaborativa com os diversos membros.

Em síntese, pode-se afirmar que a participação no grupo de pares promoveu o

desenvolvimento em diferentes domínios, não apenas para os professores e

licenciandos, mas também para os professores formadores/pesquisadores. Com isso,

pode-se dizer que o desenvolvimento profissional dos professores depende de

investimento pessoal, e os dados indicam sucesso na mobilização dos participantes para

essas ações e satisfação pelos resultados alcançados.

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Junqueira&Marin Editores Livro 3 - p.005926