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Pe. José Fausone * 11 /11/1871 † 01/03/ 1903 Caríssimos irmãos, Tribulationes cordis mei multiplicate sunt . . . de necessitatibus erue me . . . Deixem que eu clame com o rei e profeta Davi: «As tribulações do meu coração se multiplicaram; tu me livraste de minhas angústias». No mês passado os senhores receberam o anúncio fúnebre de três caríssimos irmãos, clérigos, professos perpétuos, e dois destes anúncios foram assinados e enviados pelo inesquecível e virtuoso Pe. José Fausone Diretor do Colégio São Joaquim e Mestre dos noviços

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Pe. José Fausone * 11 /11/1871 † 01/03/ 1903

Caríssimos irmãos,

Tribulationes cordis mei multiplicate sunt . . . de

necessitatibus erue me . . .

Deixem que eu clame com o rei e profeta Davi: «As tribulações do meu coração se

multiplicaram; tu me livraste de minhas angústias».

No mês passado os senhores receberam o anúncio fúnebre de três caríssimos

irmãos, clérigos, professos perpétuos, e dois destes anúncios foram assinados e

enviados pelo inesquecível e virtuoso

Pe. José Fausone

Diretor do Colégio São Joaquim

e

Mestre dos noviços

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e agora, devo dizer que esta flor tão bela e preciosa, do jardim místico de Maria

Auxiliadora, isto é, desta Inspetoria, no dia 1º do corrente mês foi raptada pelo pelo

seu glorioso Patrono e transportado para o jardim celeste.

Depois de poucos dias de cruel enfermidade, com a maior serenidade de

espírito e conformidade à vontade de Deus, feita a sua confissão geral, quis vestir-se,

e depois com o roquete e estola receber o santo Viático.

Assistido, nos últimos momentos pelo meu caro secretário, padre Atílio Cosci,

recebeu a Unção dos Enfermos, com breve agonia, sem perder os sentidos, e repetindo

não querer outra coisa senão que Deus aceitasse seus sofrimentos em desconto dos

pecados cometidos e com repetidas jaculátórias a Jesus, Maria e José, expirou depois

de ter pronunciado por três vezes Jesus... Jesus... Jesus...

O caro extinto nasceu no dia 11 de novembro de 1871 em São Benigno Canavese

(Piemonte - Itália), Diocese de Ivrea. Seus pais foram Miguel Fausone e Lúcia Fauzino.

Entrou no Oratório de São Francisco de Sales, em Turim, no dia 22 de outubro

de 1882. Fez o Noviciado em Foglizzo no ano 1888, vestindo o habito religioso o dia 2

de outubro do mesmo ano recebendo-o das mãos do padre Miguel Rua. Aos 11 de

outubro de 1889 fez sua Profissão religiosa perpétua, e foi logo depois a Roma para 3

anos de filosofia na Universidade Gregoriana, onde se distinguiu tanto na piedade

como no estudo obtendo os melhores resultados.

No ano de 1892 acompanhou o Revmo. P. Lourenço Giordani ao Brasil na qualidade

de professor dos noviços, e como Conselheiro escolar no Colégio S. Joaquim de Lorena.

As ordens sacras, ele as recebeu todas em São Paulo e em Guaratinguetá. No dia 18

de agosto de 1892, das mãos de Sua Ex.cia Dom Lino Deodato Rodrigues de Carvalho

recebeu a sagrada Tonsura, as primeiras e as segundas Ordens Menores: o Ostiariado,

o Leitorado, o Exorcitado e o Acolitado. No dia 21 de dezembro de 1894, em

Guaratinguetá, das mãos de Dom Luiz Lasagna, dispensado dos interstícios, o

Subdiaconado. No dia seguinte, 22 de dezembro foi ordenado Diácono pelo mesmo

Dom Luiz Lasagna na igreja de N. Senhora do Carmo. No dia 29 de dezembro de 1896,

em São Paulo, foi ordenado presbítero por Sua Ex.cia Dom Joaquim Arcoverde de

Albuquerque Cavalcante, bispo de São Paulo.

No dia 17 de março de 1897, aqui, cantou a sua primeira missa. Em 1898 foi eleito

diretor do Noviciado, portanto, Mestre dos Noviços.

Sendo mais tarde transferido o Noviciado, para maior economia, para junto do

Colégio São Joaquim, na casa anexa, entre o Colégio e o Santuário São Benedito, ficava

também diretor do Colégio uma vez que o padre Tomás Barale foi mandado para ser

diretor na nova casa do Rio Grande do Sul.

Caríssimos irmãos, ao falecerem seis virtuosos membros da nossa Inspetoria, de

3 de fevereiro a 3 de março, isto é, três antes do caro padre Fausone e dois logo em

seguida, nos dias 2 e 3 de março, devemos exclamar com Jó: “como são breves os dias

do homem, tu contaste o número de seus meses, e fixaste o fim, além do qual não

poderá ultrapassar.”

Inclinemos a cabeça e adoremos os imperscrutáveis decretos de Deus, beijemos

com amor aquela mão que nos fere porque nos quer curar; exclamemos com Davi:

«Não desvie o seu olhar de mim; nem retire de mim seu Santo Espírito. Seja meu auxílio, não me abandone e não me despreze, ó Deus, meu Salvador!

Senhor, não me repreenda o teu furor e não me corrija a tua ira. Tem piedade de mim porque estou sem forças, cura-me, ó Senhor, porque

esmagaste meus ossos e a minha alma está tão abatida; mas, Senhor, até quando? Volte-se para mim, Senhor, e liberta a minha alma; por misericórdia, dá-me a

salvação». Ao abrir, depois da morte do padre Fausone, o livro “Reflexões da alma sobre os

Evangelhos” que eu lhe havia emprestado, encontrei uma marca na página 426 e outra

na página 480.

O que se lê?

“O Senhor quer que a luz das boas obras sejam sempre resplendentes; luceat lux

vestra coram hominibus; sint lucernae ardentes in manibus vestris, mas observa Santo

Ambrósio, que a lanterna, então, mais ilumina quando está para extinguir-se; com isso

quer demonstrar que a alma, como, lanterna,deve resplender sempre, durante todo o

tempo de sua vida, agindo sempre bem, mas, deve perseverar até o fim; melhor ainda,

também para morrer deve resplender mais e mais.

Luceat ergo semper lucerna nostra sed maxime circa finem vitae.

Resplenda, então, sempre a nossa lanterna, mas especialmente em vista do fim

da vida.

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Diz também o Espírito Santo a este propósito: “Justorum semita quasi lux

splendescens, procedit et crescit usque ad perfectum diem”; declara São Gregório,

Papa: “idest quousque ad Celestia Regna perducantur.”

Isso quer dizer que não é quem comece a correr, mas quem chega bem ao final

que receberá o prêmio das fadigas humanas. Qui perseveraverit usque in finem hic

salvus erit.

Assim, a lâmpada da tua alma, ó caro padre José, sempre resplendente durante

toda a tua vida, mais do que nunca Jesus quis que resplendesse ao aproximar-se do fim

dos teus dias mortais.

E, eis que chego à pg. 480 onde se lê: “Amor quod amat non potest non videre”.

O amor não pode ver senão o que ama.”

Assim foi a tua alma, amante de Jesus, sempre caminhando durante toda a sua vida

entre os esplendores da caridade, porque o teu coração, sempre fixo no céu e sempre

cego para as coisas terrenas, não se preocupou nunca com as coisas do mundo.

A lanterna resplandeceu mais do que nunca nas tuas mãos e no teu corção, a

lanterna da caridade, a rainha das virtudes da qual brotam todas as outras virtudes.

Oh! Quanto é bela, caríssimos irmãos, a virtude da caridade!

Quem poderá explicar a força e o poder? Não há nada que vença a caridade,

nem o carinho, nem os elogios, nem as honras, como também a maior humilhação e

os mais terríveis padecimentos; Non querit quae sua sunt, sed quae sunt Iesu Christi.

Não houve dor nem tormento que o bom Jesus não tivesse sofrido pela caridade

para conosco, a mais ignominiosa morte de cruz não foi capaz de extinguir a sua

caridade.

A caridade fez os santos;

A caridade fez e fará sempre os mais valentes herois.

A caridade fez um Dom Bosco, o nosso saudoso e caríssimo Fundador e Pai.

A caridade fez o inesquecível bispo e missionário Dom Lasagna, um mártir.

A caridade fez e fará os verdadeiros Filhos de Dom Bosco. E não foi esta caridade

que impulsionou o nosso bom irmão, o padre Fausone, dizer (quando viu a necessidade

de correr em socorro dos caros irmãos de Niterói «Ecce ego mitte me?». Não foi a

caridade que o segurou lá quando chamado para retornar para Lorena, fez vir no seu

lugar dois superiores daquela casa, porque muito enfraquecidos e esmagados pelo

cansaço e dificuldades!

Não se revelam os esplendores desta caridade santa em toda expressão de seu

nobre coração, nas duas circulares feitas por ele sobre a morte dos inesquecíveis

irmãos clérigos, José Fagundes e Estêvão Georgis?

Não foi a caridade que o levou fora do Colégio ao leito de um moribundo, que,

sobre as suas vestes deixava cair o sinal mais certo e evidente da fatal enfermidade

que em poucos dias o haveria de tirar do nosso meio?

Não foi a caridade que o levou a retornar, e para não impressionar os Irmãos e os

jovens daquela casa (todos com boa saúde) escondendo suas agudas dores internas da

cruel doença que o fazia dizer: «Parto porque o senhor Inspetor me chamou?».

Não foi a caridade que o conduziu à cidade vizinha, ao Colégio São José, para não

afligir tanto a alma do seu inspetor e todo o pessoal da casa do São Joaquim, e

especialmente para não agravar o mal dos irmãos que de Niterói foram mandados para

Lorena para recuperação da saúde?

Sentindo-se gravemente doente não quis descer na estação de Lorena, não foi

caridade, verdadeira abnegação e desprendimento heroico do lugar e das pessoas que

lhe professavam tanta veneração e amor?

Não foi caridade ter docilmente reclamado com seu inspetor, por ter ido visitá-lo

em Guaratinguetá, aludindo que já tinhas outros afazeres e que devia atender outros

irmãos doentes?

Sim, caro padre José, terminaste os dias de sua vida e de sua missão neste vale de

lágrimas; foste fiel à tua vocação religiosa e sacerdotal; a tua lâmpada, agora, mais do

que nunca resplende, e o teu coração abundantemente provisionado com o óleo das

boas obras, era justo que o Esposo Celeste chamasse a tua bela alma para receber a

coroa da eterna glória, que há tanto tempo ele estava te preparando.

Reza por nós, por esta pobre Inspetoria, e nós continuaremos sufragando a tua

alma e a de todos os demais caríssimos irmãos chamados por Deus para a eternidade

em tão breve espaço de tempo.

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Exclame o nosso coração com Davi:”Tribulatio et angustia invenerunt me,

mandata tua meditatio mea est”.

Enquanto recomendo calorosamente às vossas orações a alma dos nossos

inesquecíveis irmão, peço que não se esqueçam de quem, com amor e estima se diz

Vosso afeiçoadíssimo

P. Carlos Peretto Inspetor Salesiano

Lorena, 07 de março de 1903.

DADOS PARA O NECROLÓGIO PADRE JOSÉ FAUSONE * São Benigno Canavese (Itália),11 de novembro de 1871 † Guaratinguetá (SP), 01 de março de 1903 com 32 anos de idade 15 anos de vida religiosa salesiana e 07 anos de sacerdócio

COLEGIO SÃO JOAQUIM

Lorena (Brasil)

AOS BENFEITORES

SNRS. COOPERADORES E COOPERADORAS SALESIANOS

AOS

IRMÃOS E AMIGOS E MENINOS CARISSIMOS

OFFERECE

ESTE MODESTO ELOGIO FUNEBRE

FEITO NA OCCASIÃO DO 30º DIA

DA MORTE DO PRANTEADO E SAUDOSO

P. JOSÉ FAUSONE

Pe. CARLOS PERETTO

Lorena (Est de S. Paulo), 31-3-1903. Brasil

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C.P.J.M.J.

S. Paulo: «Deus Charitas est et qui manet in Charitate in Deo

manet et Deus in eo.”

Irmãos e Amigos carissimos Benemeritos Snrs, Cooperadores e Cooperadoras

O convite que recebestes, as sacras ceremonias deste dia e este apparato lugubre vos dizem

bem claramente o que venho vos annunciar !...

No dia 1.° do corrente mez o Apostolo da caridade, o Pai espiritual de muitas almas, o

Director do Collegio S. Joaquim, o Mestre dos Noviços, nosso Irmão, nosso amigo, victima de

seu zelo sacerdotal, depois de poucos dias de cruel enfermidade, com a maior serenidade de

espirito e cheio de conformidade com a vontade de Deus, feita a sua confissão geral, vestindo

seu habito sacerdotal, com roquete e estola recebia com o maior fervor o Santo Viatico e

pouco depois a Extrema Uncção.

Breve foi a sua agonia, sem nunca perder os sentidos dizendo amiude: Nada pedir a Deus

senão que se cumprisse a divina Vontade — e que Deus se dignasse acceitar os seus

soffrimentos em desconto de seus pescados, e com repetidas jaculatorias a Jesus, Maria e

José, tendo pronunciado por tres vezes: Jesus! Jesus! Jesus!... essa flor tão viçosa, tão amada

e respeitada vinha transplantada pelo seu glorioso Patrono S. José do jardim mystico de N. S.

Auxiliadora desta Inspectoria para o Jardim Eterno.

Não eramos dignos de possuir tão bella flor!

Cada dia de nossa vida é uma nova prova que este mundo é um valle de pranto ! Disse

Job: “Homo natus de muliere, brevi vivens tempore, repletur multis miseriis”.

Cada dia tem a sua amargura! Cada instante seu gemido e sua lagrima. Emquanto

vivermos cá na terra sempre nos acompanharão as tribulações; isto se deu com aquelles que

nos precederam, dá-se comnosco e dar-se-á com os que vierem depois de nós.

Consolemo-nos, porém, porque as tribulações são sinal de predestinação. Dizia S.

Gregorio: “Viver neste mundo na afflicção é proprio dos eleitos”. O nosso grande Padroeiro S.

Francisco de Sales nos consola dizendo: “Quando N. S. esteve na Cruz foi chamado Rei e as

almas que estão na Cruz são declaradas Rainhas.” O Ven. Cura d'Ars dizia: “As adversidades

nos levam ao pé da Cruz e a Cruz nos leva ao Céo”.

Si profunda é nossa dôr, profunda seja também nossa conformidade!

Adoremos os insondaveis decretos de Deus!...

Colhem-se os fructos quando maduros, e Deus colhe os homens quando estão mais

sazonados.

O fruto, quando está maduro, se não é colhido, cae e apodrece; assim tambem os

homens já maduros para a vida eterna, si não fossem colhidos pela mão misericordiosissima

e sapientissima de Deus poderiam cahir e apodrecer.

Diz S. Francisco de Sales: “Nós somos como o coral que no oceano, logar de sua origem, é

um arbusto verdoengo, debil, ondeante, flexivel, porém, extrahido do mar, quasi que de sua

mãe, torna-se como uma pedra, ficando duro e inflexivel ao mesmo tempo que troca seu verde

pallido, em um vermelha assaz vivo: porque nós tambem até quando estamos no meio do mar

deste mundo, logar de nosso nascimento, sempre estamos sujeitos a extremas vicissitudes e

flexiveis a todas as bandas, á direita do amor celestial mediante a inspiração, e á esquerda do

amor terreno conforme a tentação. Mas si formos tirados uma vez desta misera mortalidade,

trocar-se-á o esverdinhado das nossas timidas esperanças no vermelho vivo da fruição segura,

não estaremos mais sujeitos a mudanças, mas firmes no Eterno Amor”.

Vêr a Deus e não Amal-O é impossivel. Mas neste baixo mundo, onde sem O vermos, só

o entrevemos na sombra da fé como num espelho, o nosso conhecimento não é tão grande,

que não deixe também entrada a surpreza de outros objectos e bens apparentes, os quaes

nas escuridões que se misturam com a certeza e a verdade da fé, insensivelmente, quaes

pequenas raposinhas se introduzem e derrubam a nossa vinha florescente. Em summa

quando temos a caridade, o nosso livre arbitrio fica ornado com a veste nupcial, e assim como,

se quizer, póde conserval-a obrando bem, póde despojar-se della, tambem, peccando.

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Oh! incançavel Pe. Fausone, estavas maduro para a vida eterna por isso foi que nesse dia

Deus para lá te transplantava! . . .

Snrs. Irmãos e Amigos.

A felicidade do homem não consiste pois em viver longos annos, mas em viver bem.

Homens ha que não tomam as edades pelo principio.

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Adão, por exemplo, foi homem sem nunca ser sido menino, tendo começado a vida já

varão.

O mesmo dizemos de Jesus Christo porque desde menino começou a ter trabalhos, como

se releva das palavras : “In laboribus a juventude mea”. Portanto vivendo trinta e tres annos,

morreu velho emquanto que muitos homens morrendo na mais avançada edade, morrem

meninos.

Do nosso inolvidavel e saudoso Pe. José Fausone diremos: “Brevi vivens tempore explevit

tempora multa, placita enim erat Deo anima illius”. Contando elle apenas trinta e dous annos

de edade, morreu velho, porque já maduro para aquella vida que não tem fim.

Mostrou seu maduro juizo o saudoso Padre Fausone:

Dando o adeus ao mundo aos 14 annos de edade para entrar no Oratório de S. Francisco

de Sales em Turim no dia 22 de Outubro de 1885; no Noviciado em 1888; fazendo sua vestição

clerical no dia 2 de Outubro do mesmo anno, sua profissão religiosa a 11 de Outubro de 1889.

Frequentando em seguida os tres anos de philosofia na Gregoriana, em Roma, sempre

brilhou pela sua piedade, pelos seus raros talentos e constante applicação aos estudos.

Em 1892 o Rev.mo Pe. Lourenço Giordani nos trazia tão rico presente!

Occupou desde então o logar de professor no Noviciado e pouco depois o de conselheiro

escolar neste Collegio.

Em 1896, aos 17 de Março nesta Egreja cantava sua primeira Missa e quem naquelle dia

num breve discurso, com jubilo e santo orgulho vos apresentava o novo e tão generoso Levita

do Senhor, hoje com o coração transpassado de dôr vem terce-lhe o elogio funebre.

Em 1898 era eleito Director do Noviciado; em 1902 tendo sido transferido o Noviciado

junto ao Collegio S. Joaquim, por motivo de economia, além de ser eleito pelos seus Superiores

e confirmado pela S. Sé, Mestre dos Noviços, aceitava tambem a direcção do Noviciado e do

Collegio em logar do Revmo Pe. Thomé Barale, nomeado este para dirigir a nova Casa do Rio

Grande do Sul.

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“Breves são os dias do homem, disse Job, Vós, Senhor, tendes contado o numero de seus

mezes. Vós lhe marcastes os limites dos quais elle não pode passar”.

Breves foram os teus dias, jovem Diretor e Pastor de tantas almas, decretado estava teu

fim, não podias ir além.

Irmãos, Snrs., e Amigos.

Os pastores não costumam ser mais valorosos do que os soldados e comtudo lemos na S.

Escriptura que tendo chegado o pastorsinho David ao exercito de Israel, embora achasse que

todos tinham mais habilidade do que elle no exercicio das armas, todavia, David foi achado

mais corajoso de todos.

Tu também, saudoso Irmão e Amigo, no meio de tantos outros que tu julgavas mais

habeis, foste achado por Deus, o mais corajoso de todos, quando pronunciaste com religiosa

generosidade o: “Ecce ego, mitte me!”

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David era entre seus irmãos o mais moço e foi elle o escolhido.

“Et unxit eum Samuel in medio fratrum ejus». E o ungiu Samuel no meio dos seus

irmãos.

Entre sete dos teus irmãos, collegas Directores eras tu tambem um dos mais moços e

mereceste que Deus te escolhesse para tomares assento lá no reino celestial junto com Jesus

no mesmo throno! Venceste... e por isso te coube a promessa que Jesus fizera, quando disse

: «Qui vicerit dabo ei sedere mecum in throno meo!”

Teu combate estava completo!

Cursum consummasti, fidem servasti, in reliquo reposita est tibi corona justitiae —

Acabaste o curso de tua vida nesta terra, tua missão findou, foste fiel a tua vocação religiosa

e sacerdotal, devias receber a côroa da justiça!

Bem podemos te applicar as palavras que lemos no Apoc: “Beati mortui qui in Domino

moriuntur. Amodo jam dicit Spiritus, ut requiescant a laboribus suis”. — Deus te chamou para

pôr termo aos teus trabalhos.

Quem poderá negar a desproporção que havia entre David e o gigante Goliath ?

Mas, mesmo assim David foi vencedor.

Quem poderá negar a desproporção que tambem havia entre o nosso jovem David, o Pe.

José Fausone, e os gigantes: o demonio, o mundo e a carne ?

Mas, porque elle sempre se manteve na caridade, manteve-se em Deus, como diz S.

Paulo: “Deus é caridade e quem vive na caridade, permanece em Deus e Deus nelle”, por isso,

o nosso pranteado Amigo apesar da tamanha desproporção, foi elle o vencedor!

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David foi admiravel na harpa e na funda. Com a harpa afugentava demonios, com a funda

derrotava gigantes. Sua peleja nem sempre era da mesma forma, pois umas vezes pelejava

com toda a mão e outras só com os dedos. Com os dedos tocava a harpa e fugia o demonio,

com a mão disparava a funda e cahia o gigante.

Taes foram as acções do nosso modesto David. Elle tambem foi admiravel na harpa e

funda, isto é, no côro e no pulpito, na musica e na pregação. Portanto o devemos chamar não

só amador da bela arte musical, mas valente defensor e propagador do canto gregoriano e

da musica liturgica. Na pregação, sua palavra cheia de unção, energia e ilustração, tinha um

não sei quê de arrebatadora que subjugava e captivava os corações ainda os mais duros.

Como a harpa de David não era só para recrear ou divertir os sentidos senão para lançar

do corpo e alma de Saul o espirito mau, que é pae da discordia e inimigo de toda harmonia;

assim tambem o amor e dedicação que o Padre José Fausone tinha para a musica não era só

para recrear ou divertir os sentidos, mas com ella cooperar a afugentar dos pecadores o

espirito mau da discordia, desavensas, inimizades, substituindo-o pelo espirito de caridade.

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Como a funda de David, não foi para fazer tiro ao ar ou espantar com estalo, mas sim,

para ferir, derribar, prostrar o gigante inimigo, assim tambem a funda ou prégação do Padre

José Fausone nunca foi para fazer tiro ao ar ou espantar com estalo, isto é, nunca foi para

fazer ostentação do seu saber e nem espantar com a sua eloquencia rethorica, mas sua

palavra despida de toda a vaidade procurava casar a philosofia com a simplicidade evangelica.

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Certo homem sisudo e perspicaz mandou pintar uma vela accesa, cujas chammas lhe

serviam de corôa e os raios de sua luz, de diadema e querendo animar tal pintura deu-lhe

alma com esta inscripção: «Non quaerit quae sua sunt». Com isto quiz dar a intender que a

tocha accesa para dar luz aos outros, nada trata dos seus augmentos e com suas chammas

procura as felicidades alheias, ainda que estas sejam com diminuição das proprias.

A chamma de uma tocha tem figura de lingua e de um coração.

Dois são os seus movimentos: o de estar sempre vôando para o céo, e o outro de estar

sempre, com a sua luz, beneficiando e alumiando aos que estão com ella.

Uma tocha accesa sendo a figura d’uma lingua e dum coração abrazado de amor, nella

está retratada uma alma que cheia d’amor divino, está sempre vôando com seus

pensamentos, desejos, affectos, palavras e obras para o Céo. Esta alma sem tratar do seu

aumento, isto é, sem tratar do seu interesse particular, só procura o bem alheio e sem

attender aos seus proprios commodos ou embaraços, com a luz da sua caridade só cuida de

beneficiar e alumiar aos que têm a felicidade de gozar da sua presença.

Assim foi, Snrs., Irmãos, e Amigos, a alma do sempre caridoso Padre José Fausone.

As chammas da sua caridade lhe sirvam de côroa, os raios da luz de suas boas obras lhe

sirvam de diadema!

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Disse um dia Jesus à Bemaventurada Baptista Varanni, que favorece as almas suas

queridas com estas tres graças principaes:

1.a A de não peccar.

2.a De praticar boas obras

3.º De soffrer por seu amor.

A tua acrysolada piedade, oh! inolvidavel amigo, a tua singular devoção ao S. Coração de

Jesus, á sua Paixão, ao SS. Sacramento, á Virgem SS. Maria Auxiliadora, ao teu Santo Patrono,

ao Anjo da Guarda, ás almas santas do Purgatorio, teu zelo invejavel no desempenho da tua

missão religiosa e sacerdotal, a luz sempre viva, dos teus tão bellos exemplos, teu

devotamento para com os teus superiores, teu constante amor aos padecimentos e á

obediencia são fructos bem evidentes de que a tua bella alma foi, cá na terra, uma dessas

favorecidas por N. S. Jesus Christo.

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Benemeritos Snrs., Irmãos e Amigos:

— Nunca reparastes como a borboleta amante e zeloza voa em busca da luz? Achando-a,

que faz ? Eil-a que com alegres vôos e voltas festeja aquella luz que delirante procurára, até

quando encendido seu coração em chammas e labaredas dos desejos do seu goso, e

antevendo que é preciso experimentar a tyrannia das chammas seguindo ella os impulsos do

seu amor, sempre mais se vae aproximando, e como meio necessario para gosar as delicias da

luz, sacrifica-se toda ao rigor das chammas. Assim procede a alma que desprendida das coisas

do mundo e de si proprio, guiada só pelos impulsos do seu ardente amor para a Luz Divina,

isto é, para a Caridade, só põe termo aos seus continuos vaivens e festivos vôos ao redor dessa

mesma luz, sacrificando-se ao rigor das chammas da sua caridade, como meio preciso, para

gozar eternamente as delicias da Luz Divina!

A alma que sae do corpo, mais que a borboleta aspira á luz, porém vendo-se com manchas

e faltas das quaes é necessario ser purificada, porque é de fé que nem a mais leve mancha

póde entrar no goso da Luz Divina, reconhecendo ser necessario experimentar a dolorosa,

porém consoladora tyrannia das chammas ou penas do Purgatorio nellas essa alma se

precipita para depois poder gosar da Eterna Luz, como disse S. Paulo : “Ipse autem salvus erit,

sic tamen quasi per ignem”.

Saudoso Padre Fausone: festivos foram os teus vôos para levar o balsamo do teu trabalho

e da tua palavra animadora aos teus caros Irmãos, aos bons meninos, e ao povo piedoso que

tanto te amavam e que hoje em pranto, saudosos te recordam!

Encendido teu coração em chammas e lavaredas de desejos da fruição da Luz Divina te

sacrificaste todo ao rigor das chammas dessa mesma Luz, a Caridade! Desprendido de todos

e de tudo, só cuidaste de beneficiar e alumiar aos outros, elegendo para ti quasi um completo

abandono!

Tu, que tanto amavas a nossa Inspectoria consagrada á Virgem SS.ma Auxiliadora; tu, que tanto

amavas os nossos benemeritos e benemeritas Cooperadores e Cooperadoras; tu, que tanto te des-

velavas pelo bem de tantas almas nesta boa Cidade; tu, que pelo teu zelo te ias multiplicando para

acudir ao progresso espiritual não só d’esta casa, mas tambem das virtuosas Filhas de Maria

Auxiliadora, da Santa Casa de Misericordia, da Pia União das Filhas de Maria Immaculada, da Asso-

ciação dos Anjos, da Conferencia de S. Vicente de Paula, das Damas de Caridade e da Santa Infancia,

intercede por nós perante a Sagrada Familia e nós, como tributo de amizade e gratidão

continuaremos com Missas, Communhões, obras de caridade e orações a suffragar tua alma e a dos

outros caros Irmãos, que Deus foi servido chamar a Si.

Disse o Apostolo S. João: “Non diligamus verbo neque lingua sed opere et veritate!”.

No mais apertado estado de sitio via-se o Rei Jorão, na Samaria, por Benadad, Rei da Syria, que

reduziu a cidade em tal angustia, que as mães comiam seus filhos e os soldados morriam de fome.

Indignado Jorão contra o Propheta Eliseu exclamava : “Haec faciat mihi Deus et haec addat si

steterit caput Elisei super ipsum hodie». Mas dizei-me qual mal positivo havia feito Eliseu ?

— Nenhum. — Como pois, ameaça-o com o maior castigo, como si fôra o maior inimigo ? —

Porque o Rei Jorão sabia quão poderosas eram as orações de Eliseu para alcançar de Deus o remedio

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d’aquella tão grande afflicção: e Eliseu com tão pouco custo o não livrara daquelle tormento, por

isso dizia Jorão: “Isto é ser tyranno, perseguidor e inimigo e como tal seja morto”.

Mais bem fundada é a queixa das Almas do Purgatorio, nos dizendo; “Miseremini, miseremini

mei, saltem vos, amici mei” — tende piedade de nós, compadecei-vos de nós, ao menos vós, nossos

amigos ! —

Ellas sabem muito bem que nós as podemos alliviar com actos de mortificação, com esmolas,

com orações, mandando celebrar Missas, fazendo boas Communhões, e quantos o não fazem,

custando não pequeno sacrificio!

Acceitae, piedosas Senhoras e caridosos Snrs, os mais cordiais agradecimentos pelas numerosas

Communhões que já, com tanta boa vontade, offerecestes!

__________________

Na Sagrada Escritura se lê como, tendo morrido Saul com seus tres filhos, os habitantes de Jabes

caminharam toda a noite; tomaram os corpos dos fallecidos, os enterraram e depois jejuaram por

7 dias.

Imitemos nós tambem os habitantes de Jabes, e, visto não ser preciso ir buscar o corpo do

Ungido do Senhor e enterral-o, porque já isto foi feito, concorramos para as despezas do seu tumu-

lo, e com mortificações ou jejuns suffraguemos a alma d’elle.

Quem póde penetrar nos arcanos de Deus ? Póde ser que precise ainda dos nossos suffragios,

e, dado o caso que não precisasse, irão em beneficio dos outros nossos caros irmãos, em beneficio

dos nossos Parentes e Amigos. O verdadeiro amigo é aquelle que na occasião de maior precisão e

abandono nos socorre e consola! Para as Almas do Purgatorio venit nox in qua nemo potest

operare.... chegou a noite na qual nada pódem mais fazer para si. —

Nossas saudades não sejam de palavras vãs e estereis lagrimas, mas produzam obras e verdade.

Digamos com a Egreja: “Hostias et preces tibi, Domine, laudis offerimus, tu suscipe pro

animabus illis, quarum hodie memoriam facimus”. — Hostias e preces nos offerecemos, Senhor,

dignae-Vos acceital-as as em favor das almas que hoje commemoramos.

Ricos e pobres, grandes e pequenos, conforme permittirem vossas posses, enviae uma esmola

em dinheiro, generos, viveres ou materiaes para manutenção dos meninos pobres que aqui se

educam e para a continuação das obras do Collegio, offerecendo isto tudo como sufrágio da alma

d’aquelle cuja morte cobriu de luto a cidade inteira.

Fac eas, Domine, de morte transire ad vitam.

Orae por mim!