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Pedro Henrique Barreto de Lima Rudimentos de Aristóteles para vagabundos antiperenialistas 1ª edição Belo Horizonte Edição do autor 2019

Pedro Henrique Barreto de Lima Rudimentos de Aristóteles para … · 2020-07-06 · Pedro Henrique Barreto de Lima Rudimentos de Aristóteles para vagabundos antiperenialistas 1ª

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Pedro Henrique Barreto de Lima

Rudimentos de Aristóteles para vagabundos

antiperenialistas

1ª edição

Belo Horizonte

Edição do autor

2019

Prefácio

Os antiperenialistas no seio dos meios sociais alegadamente conservadores, em particular alegadamente católicos; os

antiperenialistas, a despeito da sua pretensa piedade no rejeitar a escola

perenialista criada por René Guénon, não passam de pervertidos psicologicamente perigosos; ou, alternativamente e na melhor

das hipóteses, são pessoas inadvertidas e promotoras de chavões e cacoetes

espalhados pavlovianamente. Tal pretensão contra o perenialismo é um puro sentimentalismo satânico, arrogante ao

ponto do incrível, e ridículo ao ponto do

temível.

O assunto não seria tão premente se o

antiperenialismo não tivesse desenvolvido uma série de mecanismos de "lacração"

para neutralizar eristicamente toda discussão responsável a respeito do assunto. Para o meu espanto, essa

degeneração inclui a substituição até

mesmo da pretensão de parecer se

argumentar racionalmente; essa aparência substituída por uma trama discursiva criada

pelo puro sentimento, pela indução à hipnose pura e simples, quando não pela mentira facilmente desmentível do ponto

de vista jornalístico.

É uma coisa tão nojenta e safada, e tão apoiada em poses histriônicas de

indignação impertinente e candura auto-apaixonada, que esse teatro maluco merece

um zoom e um exame atento, que é dever de todo estudioso católico realizar; por ser

um dos fenômenos mais significativos do mundo contemporâneo. Eu tenho desenvolvido um estudo detido do assunto,

que espero poder publicar doravante.

Esse antiperenialismo, tão ávido de se afirmar, e tão concepcionalmente vazio; é

um forte sinal de que o perenialismo detém a hegemonia intelectual no mundo atual; de

modo similar a como, segundo algum

especialista, os governos e seus porta-vozes costumam protestar (em notas de

imprensa) em favor da estabilidade e segurança financeiras logo antes de

explodir alguma crise hiperinflacionária.

O antiperenialismo está fadado a um fim trágico, pelo simples fato de não ser nada mais que uma distração de momento, sem

valor perene (nenhum trocadilho intencionado). As cantoras americanas

chamadas "The Andrew Sisters", similarmente, eram uma febre nacional, e

se associaram à cultura americana fortemente nos anos quarenta; mas foram largamente esquecidas por causa do puro

caráter de entretenimento e apelo sensual (não necessariamente ou sobretudo sexual)

das suas performances e sugestões; tanto quanto haviam sido usadas como alívio sentimental no período de guerra etc. Existe

algo intrinsecamente trágico e sem alma nos apelos sentimentalistas, por mais que

tais apelos possuam momentâneo vigor e

propiciem momentâneo "rapto".

O presente livro, "Rudimentos de Aristóteles para antiperenialistas vagabundos", é

oferecido em nome da publicação do livro "O casamento do mundo e Babilônia, a

grande", primeiro livro em defesa dos irmãos Dimond e ensaio sobre filosofia da história. Com o presente livro eu pretendo

estender uma corda aos que receberam lavagem cerebral antiperenialista, a fim de

que saiam da sua bolha; e eu faço isso simplesmente explicando os rudimentos da

lógica de Aristóteles, ou de temas

correlatos.

É simplesmente um fato, capaz de deixar

qualquer estudioso sério bobo de ver, que os antiperenialistas ordinários são absolutamente ignorantes de noções de

lógica. Não sabem a diferença entre "definição", "acidente", "propriedade" e

"gênero"; não sabem o que é uma

"diferença específica", e assim por diante. Certa ou aparentemente (nos melhores

casos) ignoram ou boicotam, sobretudo no examinar o perenialismo, as mais elementares noções de congruência

discursiva ou filosófica. Eu não consigo entender como é possível a alguém ser tão

burro, e ao mesmo tempo tão orgulhoso

disso.

Este livro está sendo publicado por dó, mas

não só dos outros, também de mim mesmo, porque eu não estou seguro de estar imune

aos efeitos perniciosos de se ser desencorajado pela estupidez alheia. Se é necessário que essa estupidez desça ao

ponto mais chocante e sub-humano possível, o último instante lógico de um

naufrágio inevitável, a espera sobre a placa de madeira (os detritos do Titanic) em que se aguarda o resgate; ao menos possa eu

encarar a Morte face a face e, sem temer a lâmina afiada da sua foice, balbuciar com os

dentes a bater de frio "Eu estou vivo!"

Comentário a Aristóteles – 1

Em Da Interpretação é afirmado que, embora toda sentença seja significativa,

nem toda sentença é verdadeira ou falsa (bípede racional, para o autor, ainda não é uma sentença verdadeira ou falsa). Ela o é

se a um nome se adicionar um verbo; podendo haver um complemento. A

sentença verdadeira ou falsa é uma

declaração.

Pode ser uma afirmação: Pedro dorme. Uma negação: Pedro não dorme.

Pode ter complemento: Pedro é justo.

“Pedro e Paulo são justos” é mais de uma declaração, porque a declaração aí pode ser

decomposta:

Pedro é justo; Paulo é justo.

Nomes distintos adicionados ao verbo

podem configurar uma só declaração:

O bípede racional é justo.

Os nomes acima (bípede racional)

configuram uma definição.

A propriedade é conversível com a essência

de que decorre, porque só a ela pertence:

Se é capaz de aprender gramática é um

homem, se é um homem é capaz de

aprender gramática.

O que ocorre com “ser capaz de aprender

gramática” não ocorre com “adoecer” em

relação ao homem:

Se é um homem é capaz de adoecer, se é capaz de adoecer não é necessariamente

um homem.

E em relação ao gênero “seres biológicos”:

Se é um ser biológico é capaz de adoecer, se

é capaz de adoecer é um ser biológico.

Adoecer é, se toda propriedade é conversível com a essência, uma

propriedade de “seres biológicos”.

A definição também é conversível com a

essência:

Se é um bípede racional é um homem, se é

um homem é um bípede racional.

Se, querendo significar um determinado

indivíduo, eu lhe descrevo com algo que

não pertence somente a ele (“quem é aquele segurando o copo de uísque? —

Humphrey Bogart”), eu estou usando uma frase querendo significar uma essência, e

isso a princípio ainda me parece uma definição; além disso a frase no caso contém uma sentença declaratória, não

uma sentença não-declaratória (do tipo

“bípede racional”).

Em algumas passagens me pareceu que Aristóteles pretende que a definição seja, por sua natureza, capaz de substituir um

nome:

O homem é justo.

O bípede racional é justo.

É possível, mais ou menos, fazer a mesma

coisa com o exemplo do Humphrey Bogart:

O humphrey bogart é justo.

O que está segurando o copo de uísque é

justo.

Isso entra em conflito com o que o filósofo

diz sobre a definição; que nela entram o gênero e a diferenciação, mas não o

acidente. Certamente “segurar o copo de uísque” não é uma propriedade; tiremos a

prova real:

Se está segurando o copo de uísque não necessáriamente é o humphrey bogart; se é

o humphrey bogart não necessariamente está segurando o copo de uísque (embora

as más linguas possam dizer que sim).

No exemplo acima não há conversibilidade em nenhuma das duas vias. A mesma coisa

não acontece com o gênero:

Se é um homem é um bípede; se é um

bípede não é necessariamente um homem.

A diferenciação faz coro ao gênero:

Se é um homem é terrestre; se é terrestre

não necessariamente é um homem.

“Segurar o copo de uísque”, então, deve ser

um acidente, porque pode pertencer ou não ao objeto, e não é nem uma propriedade, nem um gênero, nem uma definição; sequer

uma diferenciação.

Eu pareço ter chegado a um método para

chegar à diferença entre as classes. Mas Aristóteles não admite o que acabo de fazer

com a definição, colocar como um de seus elementos um acidente (no caso, “segurar o copo de uísque”) . Considero, a título

provisório, que o motivo seja o caráter frágil da definição baseada no acidente. Se um

esquilo passar a segurar um copo de uísque, ou se o que o segura o largar, já não se pode falar de uma definição viável. E além disso,

“bípede racional” não é uma declaração, não é verdadeiro ou falso, ao passo que ou

o ator está segurando o copo, ou não, e não me parece ser bem assim que Aristóteles vê

a definição.

Talvez ele queira dizer que a definição em si

mesma não seja verdadeira ou falsa por natureza. Porque ser declaração implica

algum processo temporal, se vem com o verbo, e o que significa a essência de um objeto deve ser furtar à descrição de

processos temporais. A forma de um objeto contém já as suas possibilidade, e se as

implica não pode se confundir com elas.

Resta a pergunta, já abordada antes, bípede

é acidente ou diferenciação (propriedade relativa, do home em relação ao cavalo por ex., o que equivale a um acidente, por não

pertencer só ao homem) . A única resposta que me pode vir é a seguinte: que sob o

aspecto de não pertencer só ao homem, é um acidente; e sobre o aspecto de, ao contrário de “segurar o copo de uísque”,

poder ser meio conversível, meio não conversível com o homem (se é um homem

é um bípede, se é um bípede não é

necessariamente um homem), é uma

diferenciação.

A diferenciação e o gênero são menos

voláteis que o acidente, se se tomar como

exemplo deste “segurar o copo de uísque”.

O gênero e a diferenciação podem não pertencer só ao objeto, mas pertencem a ele. O acidente, como a própria definição do

tal que o filósofo dá, pode pertencer ou não.

Assim, embora seja verdadeiro que a

diferenciação e o gênero pertençam ao objeto ao qual podem ser atribuídos, eles

têm, marginalmente, um caráter acidental (porque o homem nem sempre tem pernas, pelo menos em alguns estágios da

gestação).

A propriedade possui, igualmente, um

caráter acidental, já que a capacidade de aprender gramática pode se verificar ou não; isto é, em certos indivíduos, tão raros

que nem acredito poderem existir, essa

capacidade, não obstante esforços, pode

não se verificar. Pode estar lá ou não, como segurar o copo de uísque.

Uma noção da retórica.

Segundo Aristóteles, na Retórica, quando a

um indivíduo cabe julgar o seu próprio interesse, a sua única dificuldade é saber se

determinados fatos são de tal ou qual maneira, ou não. Por exemplo, se alguém dissesse ao presidente americano depois da

Segunda Guerra: “invadamos a URSS, o seu exército está em frangalhos, a economia

arrasada etc.”. Supondo-se que fosse do interesse do presidente destruir um

potencial inimigo, caberia a ele simplesmente averiguar os fatos e, conforme o interesse seu, acatar a proposta

se baseada na verdade. Já, segundo o filósofo, se o que se deve julgar não são os

próprios interesses, uma certa pressão move o que deve julgar em direção à parcialidade, às considerações de amizade,

às reações emocionais. No primeiro caso se está mais próximo das escolhas de um

cidadão em uma assembléia, diante de um

orador político; no segundo caso, se está mais próximo da situação de um juiz que

decide entre litigantes, e não os próprios interesses (porque o juiz pode favorecer

uma parte injustamente, por conveniência,

e averiguar os fatos não predomina tanto

como no primeiro caso sobre suas

escolhas).

Essa noção de aristóteles me pareceu difícil de entender. Eu me lembrei da história de Otelo. Quando ele recebeu de Iago a

mentira segundo a qual Desdêmona lhe traia, ele estava na mesma situação, a

princípio, do presidente americano. O que lhe importava era saber se os fatos eram

assim ou não, e essa averiguação bastaria para orientá-lo. Ele não estava na posição de juiz, de quem pudesse, independente

dos fatos, julgar as coisas conforme uma conveniência, uma reação emocional etc. E

no entanto, em lugar de procurar averiguar os fatos o melhor que pudesse, ele teve uma reação de emocional de ira, que o impedia

de sondar a situação com a frieza necessária.

Vou repetir a noção:

Se eu tenho que julgar algo do meu próprio interesse, preciso apenas conferir os fatos

para me orientar.

Se tenho que julgar os interesses alheios,

não bastam os fatos; para Aristóteles, é necessário ainda uma legislação que me

obrigue a tomar determinada decisão caso os fatos indiquem isto ou aquilo; e portanto, se tenho que julgar os interesses alheios,

tendo a dar menos peso aos fatos do que a minha conveniência pessoal, a sentimentos

de amizade com uma das partes, a reações emocionais etc.

Em qual dos casos Otelo se enquadra?

Ele tinha de julgar um assunto de interesse próprio, mas na situação ele deu menos

peso aos fatos e mais foi levado por uma reação emocional.

Comentário a Aristóteles – 2

Introdução aos parônimos

Os parônimos são termos que apresentam uma diferente flexão. O que me pareceu

complicado é que o filósofo diz haver aí uma flexão de sufíxo, apenas. Na Oxford o termo é “ending”, não sufixo, e minha

gramática não é muito boa. Mas a diferença,

conforme exemplificada, diz respeito ao

sufixo que se cola ao radical.

Ex: Bárbaro; barbaridade, seriam

parônimos. A diferença está no que se cola

ao radical “barbar”.

Mas me parece que não há nada que torne

inviável, num sentido prático (e dando atenção à possibilidade de isso ter que ver

com o idioma grego), uma mudança de

prefixo.

Ex: Capitalista; metacapitalista.

A diferença de flexão nos dois exemplos não torna nula uma certa semlhança semântica,

por assim dizer, entre os termos. Porque, de certa maneira, barbaridade tem a ver com

bárbaros. E alguma coisa existe em comum

entre os capitalistas e os metacapitalistas.

A título de experimentação, talvez coubesse

mesmo se referir a dois tipos de parônimo. “Bárbaro” e “barbaridade” seriam

parônimos “leves”. “De-segurânça” e “securitário” seriam parônimos pesados,

porque neste caso se tem de ir mais fundo

etimologicamente para estabelecer a semelhança ontológica dos dois termos.

Não pensei muito a respeito, ainda. Há, imagino, algum tratamento da gramática a

respeito.

Mas o parônimo, no sentido gramátical, não parece ser o mesmo que o parônimo no

sentido aristotélico. Porque no sentido gramatical “caso” no sentido de “eu me

caso com ela amanhã” forma parônimo com “caso” no sentido de “vamos estudar o caso do latim”. Para o filósofo, me pareceu,

entre os parônimos deve haver alguma

semelhança ontológica.

Noção da retórica 2

Manzoni pode ajudar no caso do Otelo.

Recapitulando: há dois tipos de julgamento;

aquele em que sirvo diretamente meus interesses, quando peço algo em um

restaurante, ou quando aceito uma proposta política que me parece boa; e há o julgamento que eu faço a respeito de

interesses alheios, como em um caso em

que eu atuasse como juiz numa corte.

Otelo julgou mal a sua situação, se deixou

levar por julgamento errôneo a respeito da sua esposa, por causa das mentiras de Iago. em qual dos dois casos Otelo se enquandra

(porque quando julgo meus interesses, tenod a julgar bem, e quando não julgo os

meus interesses tendo a julgar mal, levado

por sentimentos de amizade, emoções etc)?

O caso do Otelo me lembra o romance Os noivos, do Manzoni, oprque o personagem Enzo, quando desconfiou da fidelidade de

sua esposa, logo refletiu melhor diante das alegações dela. Ela explicou que todo o

assédio que sofrera, havia confessado ao Frei Cristóvão. E enzo confiava muito no frei. No caso de Otelo, ele não confiou em

ninguém, senão em Iago. Ele não pediu contas à esposa friamente, mas referiu sua

suspeita já tomado de cólera.

No primeiro caso, Enzo tinha plena determinação de se casar com sua noiva, de

forma que ele claramente se enquandra no

caso daquele que conhece bem o seu

próprio interesse.

No caso de Otelo, não era bem assim, me

parece. Ele amava a Desdêmona, mas de certa maneira estava dividido. Porque ele tomara a Desdêmona sem consultar o pai

dela, e isso ocasionou um conflito. De forma que permanecer no casamento era, apesar

de suas alegações, permanecer em um estado de desconforto, como se não

estivesse tudo perfeito sem a benção do pai dela. Talvez isso signifique que, ainda que fosse seu interesse manter o casamento,

não era inteiramente do seu interesse manter o casamento tal qual ele estava

naquela situação. Ele se dividiu por causa disso, talvez, e talvez por isso tenha julgado mal a situação. Ainda vou refletir mais a

respeito.

Noção dos Tópicos

A dialética toma como matéria prima, para suas deduções, as opiniões adimitidas por

todos, pela maioria, ou por os sábios.

A proposição dialética é uma pergunta (se

entendi bem) que tem respeitabilidade para todos, para a maioria, ou para os sábios. A

proposição que não constitui uma pergunta, imagino, é uma proposição normal, podendo ser uma afirmação ou

negação.

Ex:

A vida do justo é a mais feliz?

De cada proposição se pode tirar um

problema, mudando o fim da sentença

Ex:

A vida do justo é a mais feliz, ou não?

O exemplo de proposição dialética acima virou um problema porque requeriu como

resposta uma de duas alternativas.

A proposição que tem respeitabilidade para a maioria pode gerar, por assim dizer, em

várias outras proposições com um grau semelhante, ou relativo, de

verossimilhança.

Opiniões respeitáveis e semelhantes

1) Se deve gerar a proposição incluindo as opiniões contrárias às que são contrárias às

respeitáveis.

a) Proposição respeitável:

Se deve fazer bem aos amigos.

b) Contrário da proposição respeitável:

Se deve fazer mal aos amigos.

c) Contrário de b):

Se deve não fazer mal aos amigos

A proposição c) é respeitável, porque é contrária à contrária da proposição

respeitável

2) Incluir as opiniões que se parecem com

as opiniões respeitáveis.

a) A percepção de contrários é a mesma (se entendi bem significa, por exemplo, que

perceber o frio é o mesmo que perceber o

calor).

b) Se há é verdade, então algo semelhante a

a) deve ser também: “o conhecimento (não a percepção, como no caso a) dos

contrários é o mesmo”.

Nota: Aristóteles diferencia a percepção do conhecimento, me pareceu por um trecho,

em que a percepção supõe a presença do objeto percebido, e o conhecimento não

necessariamente.

Abaixo vou deixar alguns exemplo que tirei dessa técnica de “gerar proposições”. Elas,

creio, não foram muito bem feitas, pelo menos não com muita consciência, mas se

estiverem erradas pelo menos as poderei

corrigir depois.

Eu tirei os exemplos de um fórum sobre o

setor imobiliário, porque eu trabalho com

algo indiretamente ligado a isso.

1) É difícil criar uma cultura empresarial no setor.

Não é difícil não criar uma cultura

empresarial no setor Não é fácil criar uma cultura empresarial no

setor É fácil se manter amador no setor É difícil achar os meios de criar uma cultura

empresarial no setor É difícil conservar os meios de de ter uma

cultura empresarial no setor É difícil garantir para o futuro os meios de

ter uma cultura empresarial no setor

2) Seria bom se diferenciar dos concorrentes pela fidelização dos clientes

Não seria ruim se diferenciar dos concorrentes pela fidelização dos clientes

Não seria bom não se diferenciar dos concorrentes pela fidelização dos clientes Seria ruim não se diferenciar dos dos

concorrentes pela fidelização dos clientes Seria ruim se parecer com os concorrentes

que não fidelizam clientes

Seria bom ser conhecido por se diferenciar

dos concorrentes fidelizando clientes

3) O corretor não quer passar por um longo treinamento

O corretor quer evitar passar por um longo

treinamento O corretor quer passar por um curto

treinamento O corretor não quer evitar um curto treinamento

O corretor aprecia um curto treinamento O corretor acha mais útil um curto

treinamento O corretor tem interesse em procurar curtos

treinamentos

4) A divulgação dos imóveis é importante A divulgação dos imóveis não é

desimportante A não-divulgação dos imóveis é

desimportante A divulgação de imóveis merece a atenção do corretor

O corretor deve fazer investimento em divulgação de imóveis

O corretor deve investir em conhecimento

sobre divulgação de imóveis

5) O corretor autêntico, por definição,

ganha muito bem O corretor não-autêntico, por definição, não

ganha muito bem

O corretor não-autêntico, por definição, ganha muito mal.

O corretor autêntico, por definição, não ganha muito mal O corretor autêntico tem algum diferencial

em relação ao corretor não-autêntico O corretor não-autêntico não tem algo que

o corretor autêntico tem O corretor autêntico é um modelo a ser

seguido

6) As leis trabalhistas dificultam o funcionamento das imobiliárias

As leis trabalhistas não facilitam o funcionamento das imobiliárias

As leis trabalhistas facilitam o não-funcionamento das imobiliárias As leis não-trabalhistas não dificultam o

funcionamento das imobiliárias As leis trabalhistas são fonte de desconforto

nas imobiliárias

As leis trabalhistas são discutidas nas imobiliárias

O desconforto das leis trabalhistas deve ser

superado nas imobiliárias

7) O corretor não tem muitas garantias nas

imobiliárias O corretor tem poucas garantias nas

imobiliárias O corretor não tem poucas garantias nas não-imobiliárias

O corretor deseja ter garantias nas imobiliárias

O corretor se satisfaria com garantias nas imobiliárias

O corretor precisa encontrar um meio de

adquirir garantias nas imobiliárias

8) Muitas pessoas estão saindo do setor

imobiliário Não poucas pessoas estão saindo do setor

imobiliários Poucas pessoas não estão saindo do setor imobiliário

Poucas pessoas estão saindo do setor não-imobiliário

É preciso ser competitivo para não sair do

setor imobiliário É preciso não ser competitivo para sair do

setor imobiliário Sendo competitivo é possível se manter no

setor imobiliário

É bom ser competitivo no setor imobiliário

se muitos estão saindo do setor

9) há muitas pessoas registradas no creci que são acomodadas Não há muitas pessoas registradas no creci

que não são acomodadas Há muitas pessoas não-registradas no creci

que não são acomodadas Há poucas pessoas no creci que não são

acomodadas Quem é registrado no creci não tem razão para ser acomodado

Quem é registrado no creci não deveria ser acomodado

Quem é registrado no creci seria melhor do que os não registrados se não fosse

acomodado

10) O bom corretor tem conhecimentos valiosos

O bom corretor não carece de conhecimentos valioso O mau corretor não tem conhecimentos

valiosos O mau corretor tem conhecimentos pouco

valiosos

O bom corretor é aquele que adquiriu conhecimentos valiosos

O bom corretor precisa dar atenção aos conhecimentos valiosos, O bom corretor nunca deixa de adquirir

conhecimentos valiosos

Comentário a Aristóteles – 3

Vou resumir todas as apresentações já

feitas.

Primeiro

Ao começar a leitura das categorias, me deparei com dificuldades, notando que

sinônimo, homônimo e parônimo são noções que em Aristóteles significam uma coisa e que em gramática significam outra

coisa.

(eu confundi parônimo no sentido

gramatical com homônimo no sentido

gramatical, na última apresentação)

Priberam dicionário on-line

parónimo

(grego paronumos, -os, -on) adj. s. m.

1. [Gramática] Que ou palavra que tem pronúncia e grafia muito semelhante a outra ou outras, mas que tem significado

diferente (ex.: absorção e adsorção são parónimos).

adj.

2. [Gramática] Relativo a paronímia.

» Grafia no Brasil: parônimo.

sinónimo (latim synonymum, -i, do grego

sunónumon, neutro de sunónumos, -os, -on, que tem o mesmo nome, que tem o

mesmo significado) s. m. 1. [Linguística] Palavra que tem o mesmo

significado que outra ou outras, ou significado semelhante ou aproximado (ex.:

acabar, concluir, terminar são sinónimos). adj. 2. [Linguística] Que tem o mesmo

significado que outro.

Antónimo Geral: ANTÓNIMO

» Grafia no Brasil: sinônimo.

homónimo (grego homónumos, -os, -on)

adj. s. m. 1. Diz-se de ou palavra que, com sentido diferente, se escreve e pronuncia do mesmo

modo que outra (ex.: um caso complicado [= substantivo], eu caso este ano [= verbo]).

2. Que ou quem tem o mesmo nome que outrem ou que outra coisa.

Confrontar: homófono, homógrafo.

» Grafia no Brasil: homônimo.

Para recuar procurei achar as definições de

“nome” e “definição”, a fim de melhor abordar os antepredicamentos (sinônimo

etc.)

O nome é um som falado significativo por convenção (e que pode ser representado

por uma grafia). Quando o chinês grita “ai!”, você o entende, mas não quando ele fala a

língua dele, porque é significativa por

convenção.

Se constatou que o verbo é um nome que,

adicionalmente, significa tempo, mesmo no infinitivo, e que diz algo de algo (“bebe

água” diz da água que é bebida). Esta definição de verbo é mais universal que aquela que diz que o verbo indica ação,

porque há os verbos de ligação (“Pedro é pedra”). Depois se constatou que o filósofo

chama de flexão de verbo o verbo em tempos verbais fora do presente indicativo

(“bebe água” é presente indicativo se não me engano). E a flexão de nome é como o substantivo, mas enquadrado em casos,

semelhantemente, suponho, aos casos latinos. Portanto, se há o nome Pedro, de-

Pedro é uma flexão de caso, e uma flexão de nome, provavelmente o genitivo (que dá a

ideia de possessão).

Depois verifiquei que a definição é uma frase significando o que uma coisa é, isto é,

sua essência. A definição e a propriedade

são coisas próprias à essência.

É uma definição “bípede racional”.

É uma propriedade “ser capaz de aprender

gramática”.

A definição e a propriedade são conversíveis

com o objeto dos quais derivam.

Se é um bípede racional é um homem, se é

um homem é um bípede racional.

Se é capaz de aprender gramática é um homem, se é um homem é capaz de

aprender gramática.

A definição (uma frase querendo significar o

que a coisa é) é viável quando resiste à

evocação de semelhanças e diferenças:

Se é definido homem como “bípede

terrestre”, basta evocar que 1) o canguru é bípede 2) o homem é racional, o canguru

não; assim, se derruba a definição “bípede

terrestre”.

Existem três tipo de semelhança:

1) Numérica:

É quando se dá nomes diferentes à mesma

coisa:

Exemplo: Aos seis anos seu filho te chama

de “papai”. Aos dezesseis ele te chama de “pai”, apenas. O objeto é o mesmo, mas recebeu dois nomes diferentes. A

semelhança é numérica, no caso.

2) Semelhança genérica:

É quando certas coisas não são as mesmas, mas se pode dizer, predicar, uma mesma

coisa delas.

Exemplo: Se pode predicar “animal” de “homem” e “boi”; de Sea Biscuit, o cavalo

de corrida, e Tobey Maguire, o ator.

3) Semelhança específica:

É quando certas coisas não são as mesmas, mas se pode dizer, predicar, uma mesma

coisa delas. A diferença em relação à

semelhança genérica é que a semelhança específica é um predicado (coisa atribuída)

mais próximo do objeto individual, e mais o esclarece. “Homem” está mais próximo de

“Pedro”, e mais o esclarece (mais do que

“animal”). A espécie, ao que parece, é o

predicado menos universal do objeto.

Exemplo: Pedro e Paulo são homens.

Nota: Universal é aquilo que se pode dizer

de um número de coisas que não são

numericamente semelhantes.

Os sinônimos são aqueles nomes que,

desde os casos concretos em que são empregados, têm a mesma definição. Como

quando se chama “homem” e “boi” de animais. “Animal”, no caso, é sinônimo. Este é o exemplo dado nas Categorias, e é um

exemplo de semelhança genérica. Pode haver sinônimo com os outros tipos de

semelhança. E pode haver sinônimo para todas as categorias, embora eu diga isso sem haver testado. “Homem” e “boi”

pertencem à categoria da substância. Mas

também se pode conceber sinônimos para a

categoria da ação, por exemplo (“eu

engalobei ele”; “eu enganei ele”).

Se eu digo “terminar” querendo dizer

simplesmente “levar a cabo”; e depois “terminar” querendo dizer “dar o retoque

final a uma coisa praticamente concluida”, creio que se possa dizer que não há sinônimo. Portanto, o sinônimo, me

pareceu, depende do caso concreto em que os termos são usados. Embora os nomes do

exemplo aceitem uma mesma definição, se pode evocar semelhanças e diferenças para

derrubá-la.

As opiniões respeitáveis são aquelas de todos, da maioria ou dos sábios. A tese é a

opinião de um sábio em particular. A discussão minuciosa do que seja tese ainda

não fiz.

A tese sinonímica (termo que acredito ter inventado esse termo) é a opinião de um

sábio, da seguinte maneira: a constatação de uma definição viável para coisas que até

então se cria diferentes. Como quando o Prof. Olavo define o comunismo como cultura no sentido antropológico (“sistema

de crenças, símbolos, reações

emocionais…”). Assim, o comunismo e a

cultura Ioruba são culturas.

Homônimo é quando há definições

diferentes para o mesmo nome. Uma figura de homem, ou uma foto, e um homem de verdade; são ambos chamados homens.

Mas a definição da figura ou foto (e não a definição do que representa a figura ou

foto) e do homem não é a mesma.

Tese homonímica: quando Max Weber

chama “sociais” as relações inter-individuais. Para Ortega y Gasset isso fora um erro; porque, para si, o social dizia

respeito ao uso, e portanto seria necessariamente impessoal, como quando

se aperta a mão de alguém em uma festa.

O uso tem um aspecto etimológico. Apertar a mão teria significado, no início (como

agora, mas menos conscientemente), “eu

não te farei mal, nem tu a mim, certo?”. O

significado do uso acaba por ficar implícito,

ou talvez variar.

O entimema é um elemento da retórica (a

dedução na retórica). É um argumento baseado em uma premissa que o

interlocutor aceita. É entimema, para mostrar que alguém é rico, apontar que esse alguém joga no Manchester United

(porque todos sabem que quem lá joga é rico).

Na Poética há o preceito de que a imitação artística é boa na medida em que é capaz de

evocar experiências vividas. De forma que quanto mais agradável uma peça de teatro, ou um romance, mais a peça de teatro ou

romance alude ao real. O homem se realiza na medida em que conhece, e a evocação

abundante faz conhecer, ou reconhecer, ativando a memória. Nem toda sentença é verdadeira ou falsa.

Ela só o é se a um nome se adicionar um

verbo.

Exemplo: Pedro dorme.

Esta sentença é verdadeira ou falsa. A sentença verdadeira ou falsa é uma

declaração, ou sentença declaratória. Eu confundi declaração com proposição, nas

últimas notas, e não pensei muito a

respeito. Mas creio que toda proposição seja verdadeira ou falsa, e portanto uma

declaração.

A declaração pode ser uma afirmação:

Pedro dorme.

Pode ser uma negação:

Pedro não dorme.

“Pedro e Paulo dormem” é mais de uma declaração, porque a frase pode ser

decomposta.

Pedro dorme.

Paulo dorme.

Pode acontecer de mais de um nome colado ao verbo configurar uma só

declaração:

O bípede racional dorme (que é o mesmo

que “o homem dorme”).

A propriedade e a definição são conversíveis

com os objetos de que derivam. O gênero e a diferenciação podem entrar na definição.

O acidente não é conversível com o objeto e não pode entrar na definição. O gênero e a diferenciação, em alguma medida, se

confundem; Aristóteles reduz a segunda ao primeiro, nos Tópicos, a fim de simplificar,

segundo me pareceu.

Portanto há quatro classes (porque me

pareceu que o filósofo chama-os de classes): definição, propriedade, gênero e acidente. A importância delas está, segundo

o filósofo, em que de cada uma decorre um

tipo de investigação, segundo me pareceu.

A definição se converte com o objeto:

Se é um bípede racional é um homem, se é

um homem é um bípede racional.

A propriedade se converte com o objeto:

Se é capaz de aprender gramática é um

homem, se é um homem é capaz de

aprender gramática.

O gênero se converte com o objeto, mas fica

a meio caminho (e entra na definição, como

animal entra em “animal racional”).

Se é um homem é um animal, se é um

animal não necessariamente é um homem.

Com a diferenciação sucede o mesmo:

Se é um homem é um bípede, se é um

bípede não necessariamente é um homem.

Nota: em alguma passagem a diferenciação foi referida como uma maneira de separar

os seres dentro do mesmo gênero (bípede, quadrúpede, separam os seres dentro do gênero “animal”). O caráter genérico da

diferenciação está em que se pode predicar a diferenciação de seres que não são

numericamente idênticos, e não são espécies; porque a diferenciação não é o predicado mais próximo do indivíduo. Mas

ainda não pensei o suficiente a respeito,

posso ter cometido algum erro.

No acidente, segundo me pareceu, não há

conversão em nenhuma das vias:

Se segura um copo de uísque não

necessariamente é um homem (embora seja provável), se é um homem não

necessariamente segura um copo de

uísque.

Se está grávida não necessariamente é uma

mulher, se é uma mulher não

necessariamente está grávida.

O acidente é definido como aquilo que pode pertencer ou não ao objeto, e que não é

nem definição, nem propriedade, nem

gênero.

Colocar o acidente como definição do

objeto não é viável (“Quem é ‘aquele que segura o copo de uísque’? — Humphrey

Bogart.”). O acidente, ao que parece, é volátil. E parece depender de algum

processo, de algum tempo.

A definição de homem, para o filósofo (“bípede racional”), ainda não é uma

sentença declaratória, isto é, ainda não é verdadeira ou falsa. Porque não há um verbo ligado a ela. Isso sugere que a

definição tem que independer de processos

temporais, mais deve implicá-los como

possibilidades.

Parônimo

Os parônimos são palavras que apresentam

diferenças na flexão do sufixo.

Bárbaro; barbaridade.

Mas creio que não faz mal acrescentar como

possibilidade a flexão de prefixo:

capitalista; metacapitalista.

Bárbaro tem algo a ver com barbaridade. Capitalista tem algo a ver com metacapitalista.

Retórica

Uma noção da retórica coloca que se eu

tenho que julgar o meu próprio interesse,

eu o julgarei provavelmente bem. Se julgo os interesses alheios, julgarei mais

precariamente. Me pareceu que a personagem Otelo, de Shakespeare, julgou

mal por não estar seguro do próprio

interesse (tinha um conflito interno). Enzo,

personagem de Manzoni, julgou bem (não o tempo todo, é verdade) porque manteve

aceso o seu próprio interesse.

O juiz, portanto, julga mais precariamente, e pode ser levado por emoções e

considerações de amizade.

O ouvinte de um discurso político julga

melhor, pelo menos no contexto de Aristóteles, porque tem em vista atender

seu próprio interesse.

Tópicos

As deduções dialéticas se baseiam na

opinião de todos, da maioria, dos sábios.

A vida do justo é a mais feliz?

Talvez o nome mais apropriado para a proposição acima seja “proposição

dialética”, porque me pareceu que o

filósofo chamou a proposição interrogativa

de proposição dialética.

A vida do justo é a mais feliz, ou não?

Quando a proposição passa a pedir uma de

duas respostas, se chama problema. Da mesma maneira me pergunto se o

problema acima é mais especificamente um problema dialético, por ter uma interrogação. Ainda não sei, de modo geral,

o que ele quer entender por problema.

Opiniões respeitáveis e semelhantes

As deduções dialéticas se baseiam não apenas nas opiniões respeitáveis, mas nas

opiniões que se parecem com as opiniões respeitáveis; se baseiam, também, nas opiniões contrárias às contrárias das

opiniões respeitáveis. Outros detalhes a

respeito vou deixar para depois.

1) Se deve gerar a proposição incluindo as opiniões contrárias às que são contrárias às

respeitáveis.

a) Proposição respeitável:

Se deve fazer bem aos amigos.

b) Contrário da proposição respeitável:

Se deve fazer mal aos amigos.

c) Contrário de b):

Se deve não fazer mal aos amigos

A proposição c) é respeitável, porque é

contrária à contrária da proposição

respeitável

2) Incluir as opiniões que se parecem com

as opiniões respeitáveis.

a) A percepção de contrários é a mesma (se entendi bem significa, por exemplo, que

perceber o frio é o mesmo que perceber o

calor).

b) Se a) é verdade, então algo semelhante a

a) deve ser também: “o conhecimento (não a percepção, como no caso “a)” ) dos

contrários é o mesmo”.

Nota: Aristóteles diferencia a percepção do conhecimento, me pareceu por um trecho,

em que a percepção supõe a presença do objeto percebido, e o conhecimento que

não supõe, ou não necessariamente.

Notas para as análises de conotação — dos

Tópicos

Para saber se um termo é usado de várias

maneiras: 1) Se o contrário do termo pode significar coisas distintas, então o termo pode ser

usado em mais de uma maneira. A diferença no emprego do termo pode ser

inteiramente homonímica ou ter alguma semelhança, isto é, pertencer a um mesmo

tipo de coisa.

a) “Fica frio, cara!” (Neste caso o contrário de “frio” é “intranquilo”)

b) “O chá está frio.” (Neste caso o contrário de “frio” é “quente”)

c) “No inverno se usa roupas frias.” (Neste caso o contrário seria algo como “roupas leves”)

d) “Ele foi frio comigo, quando nos encontramos.” (Neste caso o contrário de

“frio” é compassivo)

Os exemplos a) e b) têm alguma semelhança, pois nos dois casos “frio” diz

respeito a alguma forma de agitação.

Agitação da matéria, em um caso, e de algo

como agitação dos sentimentos, em outro

caso.

Os casos a) e c) não têm semelhança, mas o caso c) de algum modo alude à realidade do

caso a).

2) Se um uso do termo tem contrário, e um

outro não, há homônimo:

Ex:

a) “Frio de rachar”: seu contrário é “calor

extremo”.

b) “Frio na espinha”; aqui não há contrário.

“Frio” em a) e b), portanto, é homônimo

(tem uma diferente definição). 3) Se os contrários têm intermediários

distintos, também os termos são diferentes.

Ex:

a) O intermediário entre “frio” e “quente” é

algo como “temperatura amena”.

b) O intermediário entre “frio” e

“intranquilo”, se existe, é algo como “mais

ou menos calmo”.

Como os intermediários são diferentes, o

emprego do termo também o é.

4) Se um par de contrários tem mais de um

intermediário (isto é, uma gradação), e um outro par não, o emprego do termo é

diferente.

a) Os contrários “frio” e “quente” têm

diferentes gradações, conforme a

temperatura.

b) Os contrários “frio” e “compassivo” não

têm gradação. Pelo menos me parece agora o seguinte: ainda que, em uma pessoa, uma

frieza exterior encubra uma compaixão interior, é difícil imaginar uma gradação entre esses contrários. É um ponto em que

cabe um estudo mais minucioso na área

psicológica.

5) Se um termo é relacionado a uma possessão, seu contrário será relacionado a

uma privação. Se esta privação pode ser

usada em mais de um sentido, a possessão

também pode.

Ex:

a) “Eu consigo ter frieza diante da cena de

injustiça”; aqui a frieza seria a possessão de

uma resistência, sendo seu contrário a privação dessa resistência (“Eu não consigo

ter frieza diante da cena de injustiça”). A resistência no caso é a um tipo de

desconforto moral.

b) “Eu tenho frieza diante das vergastadas que me dá o carrasco”. A possessão no caso

é uma espécie de resistência, e a privação uma espécie de fragilidade, em relação a

um desconforto físico, e também moral talvez. Os termos, portanto, são empregados de maneiras diferentes.

Porque uma coisa é ter resistência a um

desconforto moral; e outra ter resistência a

um desconforto físico, ou ao mesmo tempo

físico e moral.

Há outros métodos para diferenciar os

termos, mas eu não os estudei devidamente ainda.

Mais dicas para diferenciar o uso de um termo de outro uso. Depois é que eu vou

entrar na análise de textos:

1) Se a flexão de nome tem mais de um sentido, o nome tem mais de um sentido. E vice-versa, se o nome tem mais de um

sentido, a sua flexão tem mais de um

sentido.

Exemplo:

Se “justo” tem o sentido de “ter retidão

moral”, mas também de “quase apertado”; “justamente” terá mais de um emprego. Seja “ele agiu justamente”, seja “ele

amarrou o tênis justamente”.

2) Se a classe muda conforme esse ou

aquele empego do termo, o sentido do termo muda (aqui me falta uma melhor

compreensão do que seja “classe”).

Exemplo:

“Eu fiz voto de silêncio”; “Eu dei meu voto

ao atual prefeito”. No primeiro caso se trata de uma promessa solene de cunho

religioso, no outro da expressão de uma preferência política que tem algum efeito político (aproximadamente falando). As

duas coisas têm alguma semelhança, na medida que derivam de uma decisão. O

exemplo usado por Aristóteles, resumido, é o de “bom” no sentido do que faz bem à

saúde, e no sentido de uma qualidade da alma; aqui também se supõe uma semelhança. No caso, “bom” nos dois casos

pode ser visto como semelhantemente ligado a algum tipo de sanidade. Sanidade

do corpo, no primeiro caso, da alma no

segundo.

3) Se é possível predicar duas coisas de um

objeto (do burro, que é um motor e um animal), e esses predicados não se

subordinam um ao outro (porque motor

não pertence ao gênero dos animais, e vice-versa), então o termo ‘burro” terá um ou

outro emprego conforme vinculado a um ou

outro predicado.

Exemplo:

“Seriam precisos cem burros para transportar toda essa mercadoria”; “o meu

burro bebe muita água”.

4) Se o contrário do gênero é usado em mais

de uma maneira, o termo ao qual é

atribuído o gênero é usado em mais de uma

maneira.

Exemplo:

“Animal” se predica de “burro”. Animal tem

como possíveis contrários:

a) inanimado.

b) refinado, ou gentil-homem.

Logo “burro” pode ser usado como oposto a “inanimado”: “o meu burro bebe muita

água”.

Ou pode significar alguém grosseiro, como oposto a “refinado”: “ele não passa de um

burro, de um grosseirão”.

Se se replicar que “burro” é mais usado no

sentido específico de pouco inteligente, eu

não saberei o que dizer.

5) Quando um termo se liga a outros, dependendo do termo a que se ligar, pode

haver um emprego diferente.

Exemplo:

a) Pastor protestante.

b) Pastor montanhês.

Pastor em a) e b) significa coisas diferentes.

São homônimos.

6) Se algo é descrito por mais de um termo, não se deve deixar de analisar cada um dos

termos em separado, para ver se um

homônimo não se insinua ali.

“O programa do Chaves é simplório e

engraçado”.

a) Analisando o primeiro termo descritivo

em separado, “simplório”, pode ele ser entendido como algo sem nada de

extraordinário, sem graça, incapaz de

chamar a atenção.

b) Analisando o termo descritivo

“engraçado” em separado, se pode entender como “aquilo que foi bem

sucedido em entreter”.

Se b) está certo, a) tem que estar errado, e portanto a) é um homônimo, isto é, não é o

que se quis dizer com simplório. O que se quis dizer com simplório, então, não foi

“sem graça”; mas sim, talvez, algo como “que retrata a simploriedade pela imitação artística, tornando-a interessante, e

usando-a como técnica”.

Profissão de fé – Olavo Bilac

O poeta expõe no poema, que pretende

usar a escrita como meio de expressar o que

tem muito valor, mas sem pompa ou

grandeza extraordinária. Não quero o Zeus Capitolino, Hercúleo e belo,

Talhar no mármore divino

Com o camartelo.

“Querer” tem as seguintes conotações pelos

contrários dos seus contrários: escolher; intencionar; anuir; exigir ou ordenar; procurar; necessitar; dar motivos para algo;

tolerar; exprimir terminantemente; amar. Os contrários dos termos mencionados são

semelhantes por trazerem a conotação de “aquilo que se tem em mente”.

O contrário de desejar é enjeitar. O intermediário talvez seja “ter uma inclinação”. Há gradações ou

intermediários (no plural).

O contrário de escolher talvez não exista. O contrário de intencionar talvez não exista. O contrário de anuir é resistir

ou desconsentir. Talvez não haja intermediário.

O contrário de exigir é eximir. Talvez seja intermediário “eximir parcialmente”.

Procurar tem como contrário esquivar. Talvez sem intermediário.

Dar motivos para algo tem como contrário

“não-indicar”. Tem intermediário e gradação, porque eu posso dar mais ou

menos razões para, por exemplo, que me punam por um delito.

Tolerar tem como contrário “impedir”. Parece haver intermediário e gradação.

Exprimir terminantemente tem “calar” como contrário. Tem intermediário e

gradação, e é análogo a “dar razões para algo”.

Amar tem odiar como contrário. Sem intermediário, talvez.

Possessão talvez se mostre no caso. Porque “querer” expressa uma coisa que está no

campo de possibilidades do eu-lírico. Ele possui o poder de escolher tal coisa.

Ao mesmo tempo, como mostrará o poema,

essa escolha tem um caráter devocional, que compele, de forma que ela expressa o

paradoxo de se fazer aquilo que se quer e que se sente forçado a fazer, por uma força

atraente.

O termo “querer” não parece possuir uma flexão adverbial (ex: amar, amorosamente).

Uma mudança de classe se nota pela mudança de conotação em “te quero bem”; “quero dizer o seguinte”. O primeiro

“querer” é um sentimento, no outro uma intenção, nos dois casos o indivíduo, ao

falar, pode ser movido pelo mesmo sentimento, o que torna a coisa confusa.

Se pode dizer de querer que é uma escolha, e também uma declaração, quando for o caso. No primeiro caso o exemplo “ele quis

macarronada” serve; no segundo “o finado assim o quis em seu testamento” serve.

O termo “quero” se liga a uma ação, mais adiante no poema (“talhar no mármore divino”). Se se ligasse a uma substância

teria uma outra conotação (“quero sorvete”). Querer algo físico parece, pelos

exemplos, mais imediato e desimportante

do que fazer algo, porque neste último caso o querer parece dizer respeito a uma

realidade simbólica e de maiores consequências. É um ponto confuso para

mim.

“Não quero o Zeus Capitolino”

Zeus, em sentido literal, não tem contrário. No sentido de deidade, talvez tenha como contrário “mortal”. Como Zeus era o chefe

dos deuses, na mitologia, embora não fosse o primeiro deus, pode ter a conotação de

princípio ou causa das coisas; ou a conotação de eternidade, opondo-se a

temporal, secular, vulgar; também a conotação de chefe, oposta a de servo. Deidade tem como contrário “mortal”. Tem

intermediário, “semi-deus”, talvez sem graduação (apesar de que Homero diz que

Odisseu era descendente de Zeus, sem ser semi-deus).

Chefe tem como contrário “servo”, talvez sem intermediário.

Eterno tem como contrário “temporal”, sem intermediário talvez (pode ser que

“empregado” seja intermediário”).

Vulgar tem como contrário “aristocrata”.

Talvez com o intermediário “mais ou menos vulgar” (gradação).

Há possessão e privação.

“Ele fez isso por ser Zeus!”, pode conotar a possessão de poderes naturais ou

sobrenaturais. Pode conotar a possessão de qualidades morais da alma, ou da

percepção. Se o termo é tomado apenas na conotação

de deidade, se pode fazer uma flexão; como quando Sócrates às vezes diz nos diálogos:

“falastes divinamente, meu amigo!”. Divinamente significa aí “excelentemente”. E portanto, divino pode ter apenas a

conotação de excelente.

A junção de “Zeus” e “Capitolino” (que

deriva de capitólio, acho, um templo pagão), indica que se está falando de uma

representação, uma estátua de Zeus.

Se pode predicar de “Zeus” “símbolo”, ou

“mito”, e também “patrono”. Assim, há empregos diferentes para cada predicado.

“O personagem das Valquírias é o Zeus dos germanos antigos”. “Os gregos imolavam cabritos ao Zeus-

domiciliar”. “Não quero o Zeus Capitolino

Hercúleo e belo, Talhar no mármore divino

Com o camartelo.” Hercúleo tem a conotação da personagem

da mitologia, de algo que revela força extraordinária, de algo que exige muito

esforço (árduo), de uma beleza corporal masculina perfeita.

Hercúleo literal, sem contrário.

Força, tem como contrário fraqueza. Tem

intermediário e gradação. Árduo, tem como contrário fácil, possui

intermediário e gradação, e é semelhante à última conotação, pois diz respeito a uma

ação de grandes efeitos.

Beleza física, tem como contrário feiura física, possui intermediário e gradação.

Há, além da força e da paciência com os trabalhos árduos, a possessão de uma capacidade de impressionar pela beleza

física.

As diferenças na flexão (hercúleo, herculeamente) não trazem novas

conotações segundo me pareceu. Pode se predicar da ação hercúlea que é daquelas ações que são recompensadas

com a glória.

Ao se adicionar “belo” a hercúleo, talvez o poeta pretenda um superlativo, uma ênfase, porque “belo” já havia sido

insinuado.

Nota sobre a diferenciação

A diferenciação é uma característica de

caráter genérico (pode ser atribuída a coisas que apresentam diferenças entre si, bípede

pode ser atribuído ao homem e ao avestruz)

que diferencia os seres dentro de um

gênero (por exemplo, o gênero “animal”).

A diferenciação só faz sentido se ligada a

um gênero. Não se pode dizer de uma cadeira que é quadrúpede, porque a cadeira não tem pés no mesmo sentido que um

cachorro. “Pé”, aí, é homônimo.

Nota sobre o acidente

Se, dado um objeto (por exemplo “homem”), eu atribuo a ele vários nomes

(“bípede racional terrestre”), se esses nomes compuserem uma só coisa, nenhum deles é acidental em relação ao objeto

(“homem”).

Assim:

bípede racional branco — branco aqui é acidental, porque o homem enquanto espécie não é necessariamente branco. Eu

posso reduzir os nomes que compõem uma só coisa a um só nome (porque o gênero e a

diferenciação, para o filósofo, entram na definição, e é a definição que substitui um

nome, mas o acidente não entra)

bípede racional = homem

o bípede racional dorme = o homem dorme

o bípede racional branco dorme = o homem

branco dorme

Assim

o bípede racional letrado dorme = o homem

letrado dorme

“Letrado” é um acidente em relação ao

homem, portanto. Se está segurando um copo de uísque não

necessariamente é um homem, se é um homem não necessariamente segura um

copo.

Eu dissera que esse tipo de conversão, que não converte-se em nenhuma via, isto é,

nem a meio caminho, seria a marca de um

acidente. Mas veja-se o seguinte:

Se é letrado é um homem, se é um homem

não necessariamente é letrado.

“Letrado”, pelo que se disse no começo da

nota, é acidente, mesmo havendo conversão a meio caminho. Letrado pode

ser considerado uma diferenciação dentro da espécie “homem”, mas creio não ser possível dentro do gênero “animal”.

Há coisas ditas com e sem combinação:

Ex: homem; corre.

Ex: Homem corre.

Pergunta: Por que Aristóteles usou como exemplo um substantivo (nome) e um

verbo, e não dois verbos por exemplo?

a) ‘tá dominado (“dominado” é uma flexão

de verbo, porque está fora do tempo

presente).

Por que não uma flexão de nome e um

verbo?

b) Para-quem vencer (imagine-se isso como

resposta à pergunta “para quem é destinada essa medalha?”; “para-quem” é

uma flexão de nome, “vencer” é uma flexão

de verbo, porque está fora do presente, se bem que o filósofo não use o termo

infinitivo, nem se refira muito claramente a ele — razões filológicas eu receio. “Para quem vence”, também faria sentido, e não

haveria flexão de verbo — suspeito que

casaria melhor com o grego.

Os exemplos a) e b) não são declarações (declaração é a sentença verdadeira ou

falsa; além disso, também a eles talvez não se aplique as denominações “expressão” e

“sentença”).

A sentença é uma combinação de palavras (por exemplo, “bípede racional”) que, se

adicionalmente for verdadeira ou falsa, virará uma declaração. A declaração pode ser uma afirmação ou negação. (“ele

dorme”; “ele não dorme”).

A expressão, parece-me, é um nome

isolado, e talvez um verbo não ligado a um nome. “Homem” é uma expressão, eu acho, se bem que equivalha, se se quiser, a

“bípede terrestre racional”.

Pois bem, por que “‘tá dominado” não é

uma declaração (uma sentença verdadeira ou falsa)? E porque “homem corre” é uma

declaração?

É que “‘tá dominado” só faz realmente sentido se se acrescenta certos elementos a

si implicados.

Ex: Ele está dominado por mim.

Ou:

Ele está dominado por alguém.

Mesmo que “‘tá dominado” tenha força expressiva, depende que se preencha mais

ou menos certas lacunas.

Em “homem corre”, não se dá o mesmo. Se pode detalhar a declaração, mas desde já

ou ela é verdadeira ou ela é falsa (ou o

homem corre ou o homem não corre).

A mesma incompletude há em “para-quem

vencer”.

Assim:

Flexão de nome com verbo não é

declaração (ainda que eu não conheça as

flexões de nome do grego).

Verbo com verbo, ou flexão de verbo, não é

declaração.

Nome com verbo é declaração: “Eu durmo”.

Acidente e propriedade temporária Homem dorme = bípede racional terrestre

“polegaropositorino” dorme.

Eu me pergunto se dormir seria um acidente

do homem se o homem fosse o único

animal existente; parece que sim.

Acidente: uma de suas definições se resume

a “pertence ao objeto, e pode pertencer ou

não, como estar sentado”.

Ele diz que dormir se tornaria uma propriedade temporária do homem se

houvesse em um dado momento só o

homem dormindo, e só houvesse um homem (ele não diz “se houvesse só um

homem”, mas eu quero forçar um pouco).

Então, seria correto dizer:

Se está dormindo é um homem, se é um

homem está dormindo.

A mesma coisa, portanto, se houvesse um

só homem e ele segurasse um copo de

uísque sem que ninguém mais o fizesse.

Se é um homem está segurando um copo de

uísque, se está segurando um copo de

uísque é um homem.

Se a conversão é dupla, como nos últimos dois casos, então se trata mesmo de uma

propriedade.

Acho que agora entendo porque o filósofo distingue propriedade e propriedade

temporária, e diz que esta última se confunde com o acidente. O acidente é

volátil, eu posso estar sentado agora e dali a pouco não; e o dormir também, eu posso estar dormindo agora e dali a pouco não.

Quando eu não estiver dormindo, ainda que não haja outros animais no mundo, não

será o dormir uma propriedade, porque não haverá conversão completa como nas hipóteses anteriores:

Se está dormindo é um homem, se é um

homem não necessariamente está

dormindo.

Assim, agora parece-me especialmente verossímil que toda propriedade digna do nome seja uma potencialidade, ou se

pareça com uma virtualidade:

Se é capaz de aprender gramática é um

homem, se é um homem é capaz de

aprender gramática.

Se é capaz de se atrapalhar lendo Aristóteles é um homem, se é um homem é capaz de se atrapalhar lendo Aristóteles.

Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo, Talhar no mármore divino

Com o camartelo.

Belo tem como contrários a) belo – imperfeito

Emprego (Quão belo é esse palácio!) Talvez tenha intermediário e gradação (“mais ou menos perfeito”) b) belo – defeituoso (Eis aí um belo pastor alemão) Não possui intermediário, pois ou se tem um defeito ou não, no caso um defeito corporal; para os defeitos morais é do ponto de vista metafísico que se pode conber um contrário, isto é, uma perfeição. c) belo – feio (Essa mocinha está muito mais bela agora,

já crecida) Tem intermediário e gradação.

d) belo – malfeito (Picasso é bom, segundo dizem, mas para mim Rembrandt é mais belo)

Tem intermediário e gradação, mas também supõe uma perfeição metafísica,

isto é, uma perfeição absoluta que não se verifica, apenas é aludida.

e) belo – horrível

(Todos no baile diziam-no belo) O intermediário, se há, seria “não

extraordinariamente belo”, possui gradação.

f) belo – miserável (Aquele orador fez uma bela figura durante

a convenção) O contrário de miserável pode ser

“afortunado” e “ilustre”, entre outros, sendo os dois primeiros os empregos mais centrais. Pelo exemplo que usei o termo

melhor é “afortunado” no sentido de que “ele [o orador] contou com qualquer ‘graça’

favorável no discurar”. Nesse caso é para mim difícil haver um intermediário, porque os discursos públicos

nunca ou raramente são “mais ou menos” bem feitos, mas geralmente ou são bons ou

ruins. Mas provavelmente se deve dizer que

há contrários e intermediários.

g) belo – desarmonioso (O que me dizes dos traços daquela moça,

eram belos?)

Harmonioso pode se dizer de conjunto de

sons, ou quaisquer outros elementos, que juntos adquirem uma proporção que, por

um sentido que reflete a perfeição, é agradável. Há intermediário e gradação.

h) belo – desgracioso

(Como os modos daquele homem, embora não fosse nobre, eram belos!)

Aqui há intermediário, embora não seja provável que haja muitos homens que não sejam ou mais claramente desajeitados, ou

mais claramente graciosos, e também se deve levar em conta que essas qualidades

dependem de fatores como descanso, estado de espírito etc. Há gradação. Além disso essa característica das maneiras

de serem graciosas possuem semelhança com o exemplo g) (nos dois casos há

qualquer harmonia).

i) belo – desagradável

(Acabo de fazer uma bela refeição na hospedaria The Bell)

Aqui há intermediário, embora seja mais

sutil a sua identificação, porque o sentido do paladar talvez não seja tão propício

quanto o da visão para identificar as coisas, mas essa especulação não cabe aqui. Há gradação.

j) belo – irrelevante (Eu considero belo o exemplo daquele

homem de quem li a biografia) Aqui há intermediário e gradação.

— Com exceção, talvez, de i) todos os exemplos dizem respeito a uma perfeição ligadas a uma junção harmoniosa das

partes. Mas em i) também há isso, só que é mais sutil, porque o sentido da visão é mais

fácil de proporcionar o entendimento do dado apreendido. Se pode supor uma desarmonia no gosto de uma sopa que,

embora em si mesma gostosa, acaba por parecer imperfeita na proporção do sal

usado etc.

Voltarei a esse termo “belo”, mais adiante.

Nota para uma correção

Uma breve consulta me fez ver que “rico”,

cujo parônimo é “riqueza”, não deve pertencer à categoria da qualidade, mas da

relação. Um pequeno exemplo: menor do maior (relação: objeto que é dito de outro); rico da riqueza; asa do alado. Depois devo

conferir isso minuciosamente. [Obs: rico de fato é uma qualidade, tanto quanto um

termo relativo ou relacionado a outro].

Nota para a definição de termos

Parônimo: verifiquei que no correr das Categorias o parônimo, de acordo com o filósofo, aceita as flexões de prefixo (ao

menos na tradução) como eu havia imaginado. Ex: sentado; estar-sentado

(exemplo do autor). De modo que se tem a impressão de que o parônimo é toda relação entre palavras que se diferenciam

por alguma flexão, de modo que eu me pergunto se um verbo e uma flexão de

verbo de qualquer tipo são parônimos para Aristóteles (por exemplo, se é parônimo “vence; venceremos”). O parônimo não é,

portanto, apenas a relação entre um nome e sua flexão de tipo “substantivada” (bom;

bondade; rico; riqueza). O parônimo deve

admitir qualquer tipo de flexão, provavelmente. A “qualificação” também

sofreu aos meus olhos uma reviravolta.

Qualificação: Eu cheguei a pensar da “qualificação” que é a “substantivação”

paronímica (“bom; bondade”). Mas a verdade é que, em mais de um local, o

termo “qualificação” se refere a um termo complementar que esclarece um primeiro

termo. Assim, nas Primeiras Analíticas, quando o filósofo estabelece a distinção entre “dedução demonstrativa” (que é,

segundo me parece, a dedução da lógica, que prescinde de premissas externas) e a

“dedução dialética”; ele explica tal ou qual coisa sobre as deduções, “sem qualificação”, isto é, sem especificar se é

uma dedução lógica ou dialética, porque se aplica a ambas. A qualificação é um detalhe

esclarecedor, ou um elemento esclarecedor

de um objeto.

Nota das proposições: Nas Primeiras Analíticas são distintos três tipos de

proposição, as universais (“toda novela da

globo é ruim”); as particulares (“algumas novelas da globo são ruins”); as indefinidas

(“o prazer não é bom”, “Pedro é pedra”, “Pedro assiste novela”). Nos Tópicos as proposições são tratadas como sinônimos

de posições sustentadas argumentativamente (segundo me

pareceu), de forma que a proposição é aquela posição ou opinião que serve de

argumento, ou que serve de matéria prima para um argumento. Ainda resta verificar a relação entre proposição e opinião, e

também a relação com o termo “premissa”.

Tese: A princípio a tese é tratada como a

opinião de um sábio que se opõe a outras opiniões (se me lembra com exatidão), embora o filósofo reconheça que quaisquer

opiniões conflitantes, em sua época, haviam passado a se chamar “teses”. Logo,

neste último sentido, a tese é um problema,

porque toda opinião conflitante configura um problema. Como a proposição é uma

opinião em si mesma, considerada separadamente de haverem opiniões

contrárias, a proposição parece ser, por

excelência, a matéria prima da dialética, se se considerar a dialética “a confrontação de

hipóteses” ou “a arte de raciocinar sobre as opiniões respeitáveis”. (O próprio filósofo considera a diferença entre o problema e a

proposição uma mudança na conclusão da frase: “o prazer é bom?” é uma proposição;

“o prazer é bom ou não?” é um problema.)

Declaração: É aquela sentença que ou é

verdadeira ou falsa (“Pedro assiste a novela”). Eu procurei imaginar se há alguma proposição que não seja uma declaração, e

uma declaração que não seja uma proposição. Me pareceu que toda

declaração é uma proposição (“Pedro dorme”; “Pedro não dorme”). Em compensação me parece que nem toda

proposição é uma declaração; se for interrogativa (“Pedro dorme?”) não é uma

declaração. “Pedro assiste a novela?”, me

parece, é aquilo que o filósofo chamaria “proposição dialética” (“a proposição

dialética consiste em perguntar algo que é respeitável para todos, para a maioria ou

para os mais sábios”). A necessidade de

apresentar uma proposição interrogativamente apresenta o seguinte

problema: eu havia definido a proposição como a posição sustentada argumentativamente, ou que serve como

matéria para um argumento; se a proposição é uma pergunta, ela não é um

argumento, e não é uma posição sustentada argumentativamente. A minha

definição de proposição, portanto, é muito precária. A necessidade de apresentar uma proposição interrogativamente eu

vagamente acredito que se relaciona com o fato de o dialeta necessitar de novas

proposições, o máximo de proposições que puder obter, isso garantido pelas opiniões respeitáveis e por certas técnicas que

espremem todas as proposições possíveis a partir de uma proposição em particular.

Que uma proposição dialética, ou

interrogativa, não seja uma declaração, parece razoável, porque ao se peguntar

algo nada é estabelecido; se eu digo “Pedro dorme?” não faz sentido perguntar se é

falso ou não o conteúdo explícito do que eu

disse; “Pedro não dorme”, por outro lado,

pode ser verdadeiro ou falso.

Sentença: É um conjunto de palavras, não

necessariamente verdadeiro ou falso (não necessariamente uma declaração). Me parece que o termo “frase”, para

Aristóteles, é sinônimo de sentença. Ele diz que é sentença uma reza, não sendo

adicionalmente uma declaração (o que me pareceu estranho). Na reza à divindade

pagã grega, talvez, as palavras fossem ditas “meio da boca pra fora”. Esse ponto fica

pendente.

Termo: Há pelo menos dois sentidos para o termo “termo”. Num primeiro caso,

corresponderia a nomes e verbos tomados separadamente. Em outro sentido, das Primeiras Analíticas, “termo” é usado para

referir-se aos elementos de uma proposição tomados em conjunto. Os elementos sendo

(não descartando da minha atenção certas dúvidas minhas a respeito): o “sujeito”; o

“predicado”; o “verbo de ligação”. Ex:

Pedro é pedra — sujeito: Pedro

— verbo de ligação: é

— pedra: predicado

Assim, no último sentido, “termo” é a

conjunção de três elementos.

Nota: “Termo” no primeiro caso varia

conforme o emprego ou conotação, permanecendo paradoxalmente o mesmo,

sendo chamado o mesmo. Ex: “bom” de eficiente e “bom” de bondoso, se diz que

são empregos do mesmo termo. “Caso” de “me caso com ela” e caso de “tenho um caso com ela” são homônimos, mas me

parece que talvez não sejam empregos do mesmo termo, porque em um caso se trata

de um nome( “tenho um caso com ela”), em outro se trata de um verbo (“me caso com ela”). Este me parece ser um exemplo de

“homônimo gramatical”, que eu caracterizo como aquele homônimo cuja semelhança é

apenas no som da palavra.

Nota das substâncias: O Ferrater Mora ajuda a definir as substâncias. A substância seria a

conjunção de forma e matéria (Pedro,

pedra, árvore, martelo). As substâncias, tais

quais encontradas sensivelmente, são individuais. Não se predica os indivíduos,

não se diz de Paulo que ele é um Pedro. Por outro lado as substâncias chamadas “secundárias” são predicados; o predicado

“homem” é uma substância secundária porque é um predicado de Pedro ou de

Paulo. As substâncias primárias são indivíduos, as substâncias secundárias são

universais que se predica de indivíduos ou de espécies. As substâncias secundárias podem ser a espécie (homem) ou o gênero

(animal). Aristóteles diz que as substâncias secundárias são uma espécie de

qualificação das substâncias primárias, a qualificação sendo, como visto antes, um termo complementar que esclarece um

primeiro termo; de fato, dizer de Pedro que ele é um homem o esclarece, esclarece a

substância (até porque se pode dar a um

cachorro o nome de “Pedro”, embora seja

incomum).

Nota das categorias: o verbete do Ferrater Mora é longo. Espero fazer esta clarificação:

“categoria” é como se chamam os 10

predicados do livros das Categorias (substância, relação, quantidade etc.). Mas

também se pode dar o nome categoria a qualquer predicado, ou talvez só a muitos outros predicados. Nos dois casos,

portanto, 1) categoria como um dos 10 predicados principais 2) categoria como

predicados em geral, ou alguns deles, o termo “categoria” é homonímico. Apesar da

semelhança a definição dos nomes não é a mesma (se pode derrubar uma definição evocando semelhanças e diferenças). Há

ainda, especialmente ligados à escolástica, os “predicáveis”, mas não sei quase nada a

respeito.

Nota sobre a propriedade: O filósofo diz que a propriedade (“ser capaz de aprender

gramática” é uma em relação ao homem) não indica a essência. Mas isso não significa

que, ao ouvir enunciar-se a propriedade, eu

não possa deduzir a essência estando ausente o objeto (por exemplo, seja

“homem” o objeto e eu ouça alguém dizer “pode aprender gramática”). Me parece

que, ao dizer que não indica a essência, ele

quis dizer que a propriedade não indica a essência em sua unidade, embora seja um

aspecto dela. A definição indica a essência na sua unidade (“bípede racional”). Ele não menciona a propriedade como entrando ou

não na definição, mas diz que a diferença e o gênero entram na definição (animal

racional). A verdade é que, se adicionado o seu enunciado a elementos pronomiais, a

propriedade passa a dizer da essência a sua unidade, ao menos na prática. Possivelmente porque neste caso a

propriedade junto aos elementos pronomiais substituiriam o nome (o filósofo

diz que a definição substitui o nome).

Por exemplo, no filme Piratas do Caribe se diz do personagem David Jones que é

“aquele que não deve ser denominado” (se

me lembro bem).

Não poder ser denominado é, se eu forçar um pouquinho, uma propriedade de “David Jones”, deixando de lado aqui o fato de

Aristóteles mencionar propriedades de universais apenas, e não de indivíduos

(talvez por ele acreditar que nenhum

conhecimento dos indivíduos é possível, porque ninguém pode conhecer todos os

indivíduos e as variações que apresentam).

A propriedade é conversível com o objeto:

Se não pode ser denominado é David Jones,

se é David Jones não pode ser denominado.

Ora, “aquele que não pode ser

denominado”, me parece, substitui o nome, como o faz a definição, e é a propriedade

enunciada em conjunto com os elementos

pronomiais “aquele que”.

David Jones é o capitão do Holandês

Voador Aquele que não pode ser denominado é o

capitão do Holandês Voador.

Eu dissera que a propriedade é um predicado, mas se se entender predicado

como aquilo que não somente se atribui ao objeto, também sendo um nome possível

para o objeto (“homem” é um predicado de “Pedro”: “aquele homem ali! [para Pedro]”), então a propriedade só será um predicado

de pleno direito quando unida a elementos

pronomiais como no caso de “aquele que não pode ser denominado”.

Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo,

Talhar no mármore divino

Com o camartelo.

Há outros contrários de belo

um deles é aborrecido (no sentido de cacete

ou maçante, porque no sentido de desprazeiroso, tal já fora assinalado pelo contrário “desagradável”), outro é violento

(neste último caso porque belo tem a conotação possível de “ameno”, ameno

sendo aquilo que deleita, no sentido específico de não inquietar e tirar o

sossego).

Belo — aborrecido

(Eu não podia perder aquele belo

espetáculo)

Possui intermediário e gradação, no caso

“mais ou menos tedioso”

Belo — violento

(A caminhada é um belo exercício)

Possui intermediário e gradação, que seria algo como “nem tumultuoso nem

perfeitamente não-agitado”.

Também há belo como contrário a nobre, e

a generoso

Belo – vulgar

(Seu nome é Alfred Lord Tennyson, um belo

nome)

Quase me inclino a pensar que não há

intermediário, porque o que é nobre não pode ser ordinário, e não pode ser menos

do que extraordinário, não consigo

raciocinar sobre se há intermediário e uma

gradação, mas talvez haja

Belo- parcimonioso

(Você me deu o mais belo presente do

mundo, uma Ferrari)

Admite intermediário, e gradação.

Um outro contrário de belo é errado, porque belo pode ter a conotação de

“certo”.

Belo – errado

(Foi uma bela jogada a sua, no pôquer, mas

você contou também com a sorte)

Creio que não há intermediários, porque

não há ações “mais ou menos certas”, ou talvez aja acertos parciais. Esse par de contrários tem alguma semelhança com o

par de contrários belo — defeituoso. Em todos esses casos, excetuando talvez a

conotação de belo oposta a parcimonioso, se trata de uma conjunção de elementos dispostos harmoniosamente. O

interessante, por esses exemplos, é que o belo pode assumir as mais diversas formas,

porque se ele se manifesta no generoso, também se manifesta no parcimonioso (para quem leu o ensaio de Montaigne, “Da

Parcimonia dos Antigos”, ou algo assim, a

modéstia ou parcimônia sendo uma manifestação, e conotação portanto, do

belo).

Por fim há o termo belo no sentido de feminino, porque há, segundo o dicionário

priberam, a expressão “belo sexo”, significando o feminino. Nesse caso, não

tenho certeza qual o contrário de feminino, segundo o dicionário de antônimos on-line,

masculino seria um contrário, mas creio talvez mais no sentido das características dos sexos; segundo Ortega y Gasset, a

mulher tem uma relação mais sensível com o próprio corpo e com o meio material, o

homem se orientando mais por universais ou termos racionais. Também, segundo ele, a personalidade feminina seria confusa, em

um sentido bem peculiar que ele não identificava exatamente com a

imbecilidade, enquanto o homem, mesmo

quando imbecil, ainda possui certa clareza que falta às mulheres. Outra indicação que

ele deixa, o homem ou masculino está associado sobretudo com a ação, o dever, e

ou afazer, importa pelo que faz; as mulheres

importam por si mesmas, independente do que façam e justamente por nada fazerem.

O caráter do homem necessita apenas dele próprio e suas ações, já o ser e a função da mulher gira em torno do homem. Se isso

configura ou não um chauvinismo despudorado, não é o que interessa para

este estudo, já que eu estou apenas seguindo a instrução de Aristóteles (tomar

as opiniões de todos, da maioria ou dos mais sábios, porque a dialética é a arte de raciocinar em cima das opiniões

respeitáveis).

Assim:

Belo – masculino/viril (belo no sentido de feminino, sob o aspecto da sensibilidade

material)

Não há esse emprego do termo “belo”, mas

há um quase sinônimo dele no português

do brasil, que é “frutinha”, o confuso é que ele é necessariamente aplicado a homens e não a mulheres, o que não serve para

exemplificar esse uso do termo “belo”,

porque se eu aplicá-lo a um homem não

será mais a expressão “belo sexo”, e eu queria tirar dessa expressão, e não de outra,

não de feminino diretamente, a conotação

específica do Ortega y Gasset.

Belo – masculino/viril (sob o aspecto da

confusão feminina, como oposta à clareza

masculina)

Essa expressão tem como sinônimo aproximado “burrinha”, o problema é que a

conotação do termo, que eu quero delinear, tem de fazer permanecer a conotação de “beleza”, que está na expressão original.

Talvez da expressão “belo sexo”, o belo aí considerado não admita outras conotações,

já sendo uma aplicação bem específica do termo “belo”. Ou seja, certos usos de um termo têm pouca “latidade”. No entanto,

não é difícil imaginar, na série Friends, o Chandler ironizando uma namorada do

Joey com a seguinte expressão, “ótima escolha, bonita, não?”, querendo dizer que Joey a namora sem se importar com sua

inteligência, mas essa conotação não é a mesma que o Ortega y Gasset tinha em

mente. Se pode imaginar, por outro lado, o

Michael Corleone, que acabava de casar com a Apollonia, ser felicitado por Dom

Tomasino nos seguintes termos “é muito bela Michael”, como se esperasse de uma boa esposa justamente aquela simplicidade

e pouca sofisticação da jovem italiana, o que também não dá a conotação

satisfatoriamente, nem é o que Ortega queria dizer na sua pureza, porque o tipo de

confusão a que ele se referia independe de a mulher ser uma socialite sofisticada ou

uma mocinha siciliana.

Enfim, não faz muito sentido continuar a espremer mais conotações, embora fosse

possível. Aristóteles diz que o entimema é a dedução

em que se utiliza as premissas do interlocutor, dadas implicitamente, para

convencê-lo. Por exemplo, para provar a um

torcedor do Manchester United que tal jogador de futebol é rico, basta argumentar

que (se for o caso) o jogador em questão acaba de ser transferido para o Manchester

United. O torcedor se convencerá, por isso,

de que o jogador é rico, porque ele sabe que todos os jogadores desse time são ricos.

Para Reuven Feuerstein, a primeira condição para que haja o que ele chama de EAM (experiência de aprendizagem

mediada) são a “intencionalidade” e a “reciprocidade”. A intencionalidade é o

apontar para um aspecto do objeto que se pretende ensinar. Por exemplo, suponha-se

alguém ensinando a um amigo o que é o Programa do Faustão: ele pode começar por apontar para as dançarinas, explicando

o que elas fazem ali. A intencionalidade é o chamar a atenção, a reciprocidade é

receber a atenção. Um sinal de que o entimema vai dar certo,

segundo a minha opinião pessoal, é a ocorrência da intencionalidade e

reciprocidade. Supõe que desejas explicar a

doutrina de Santa Catarina de Siena, a ela ditada no livro “O Diálogo”, para um

protestante. A maneira de fazer isso é lhe chamar a atenção (intencionalidade) com

alguma noção que ele considere aceitável, e

não aversiva (reciprocidade), e depois

aplicar o entimema. Em particular, desejas que ele aprenda que “todo mal é praticado

no próximo”, não havendo mal que se pratique sem prejudicar o próximo. Os nomes são fictícios.

Pedro: Supõe que seja um mal se ajoelhar diante da imagem de um santo.

Paulo: É o que a própria Bíblia fala: “Não farás para vós imagens”.

Pedro: Sim, sim, mas não é esse o ponto que vou discutir. Supõe que seja um mal se ajoelhar diante da imagem de um santo.

Paulo: Está escrito: “Adorarás o Senhor teu Deus, e só a ele prestarás culto”.

Pedro: Sim, sim, mas não é esse o ponto que vou discutir. Supõe que seja um mal se ajoelhar diante da imagem de um santo.

Fazendo isso faço mal a mim apenas, ou também a outrem?

Paulo: A tu apenas.

Pedro: Então há alguns pecados que se comete sem prejudicar o próximo, e outros

prejudicam o próximo. Paulo: Sim.

Pedro: Por exemplo, o furto prejudica o

próximo, ou a mentira, igualmente, prejudica o próximo?

Paulo: É claro que sim. Pedro: Mas o ajoelhar-se secretamente diante de uma imagem de santo prejudica

só àquele que se ajoelha. Paulo: Exato.

Pedro: Quando Paulo foi derrubado do cavalo, e o Senhor Jesus lhe disse “Por que

me persegues?”, significa isso que ele estava, de algum modo, ligado aos cristãos, e presente neles?

Paulo: Sim. Pedro: E portanto os pesares dos cristãos O

afetam? Paulo: Sim. Pedro: E vice-versa, os pesares d’Ele afetam

os cristãos, que ambos estão unidos? Paulo: Sim, eu acho…

Pedro: O pecado de idolatria, se o é de fato,

cometido diante de uma imagem de santo, ocasionará um pesar em Jesus Cristo, seja

cometido secretamente ou não? Paulo: Ocasionará, sem dúvida alguma.

Pedro: E portanto, também nos cristãos

ligados a Ele. Paulo: É verdade.

Pedro: Não excluindo outras possibilidades que possam não nos ocorrer a respeito de o pecado afetar o próximo, porque essas

realidades são mais sutis e difíceis de se apreender, não?

Paulo: De fato, agora me parece que o assunto é misterioso, e que não é possível

concluir muito a respeito. Pedro: Logo, todo mal é cometido no próximo?

Paulo: Sim.

Note-se que todo o diálogo, embora no final tenha confirmado Santa Catarina, se baseia em premissas que o interlocutor aceita, a

saber, 1) a ideia de que os católicos adoram os santos como os pagãos adoravam as

suas divindades; 2) a premissa bíblica de

que Cristo está misteriosamente ligado aos cristãos como se fossem um com Ele.

Há, em Feuerstein, um outro critério de mediação, chamado “significado”, que

consiste em atribuir a algum objeto um

valor cívico, ou social, motivando assim o

mediado, ou aluno. É mediar o significado ensinar à criança que ela deve usar o talher,

explicando que é o que todos fazem, que torna todos mais dignos, etc. Para que ocorre-se o diálogo acima, de certa

maneira, foi mediado o significado, porque Paulo estava convencido e motivado do

dever social de convencer o outro de uma verdade da qual depende seu destino

supra-temporal. Para formular entimemas é útil saber

estabelecer relação entre as coisas, estabelecer relações é o mesmo que mediar

o critério que Feuerstein chamava “transcendência”. Por exemplo, se uma criança pequena derruba um prato de

comida, e dizes “oh-oh”, e depois quando ela quebra a janela e dizes de novo “oh-oh”,

está mediada a transcendência, pela qual se

estabelece relação entre as coisas.

Indução e dedução

A indução parte de exemplos particulares

para uma conclusão universal. A dedução é tirar uma premissa de outras premissas já

dadas. Exemplo de indução: o melhor piloto de navio é o mais competente, o melhor médico é o mais competente, logo o melhor

em cada atividade profissional é o mais competente. Outro exemplo de indução: a

arte de navegar não procura tornar a si mesma mais perfeita, mas o navegar, a arte

da medicina não procura tornar a si mesma mais perfeita, mas a saúde do paciente, logo toda arte não procura aperfeiçoar a si

mesma, mas sim o seu objeto. Outro exemplo de indução: a vulgaridade do

programa do Faustão o torna chato, a vulgaridade do programa CQC o torna chato, logo a vulgaridade de cada programa

de televisão o torna chato.

Exemplo de dedução: o sangue humano é

vermelho, eu sou um homem, meu sangue é vermelho. Outro exemplo de dedução: a

minha mãe não gosta da presença de pessoas bêbadas, no momento presente

estou bêbado na presença dela, logo no

momento presente a minha mãe não gosta

da minha presença.

O entimema é a dedução da retórica, por contar com as premissas do interlocutor é mais curto de se formular. O exemplo é a

indução da retórica, e consiste em apontar uma semelhança entre casos, sem a

comparação de casos para chegar a uma conclusão universal, mas em certa medida

subentendendo esta última: o que torna o programa do Faustão chato é a sua vulgaridade, logo o que torna o programa

CQC chato é a sua vulgaridade. Os tipos de dedução são

1) as demonstrativas, que são baseadas

em premissas auto-evidentes (são

aquelas que não podem ser negadas sem se contradizerem, se não me

engano), por exemplo: eu vejo você,

você se chama Pedro, logo eu vejo Pedro.

2) as dialéticas, baseadas em opiniões

respeitáveis, de todos, da maioria, ou dos

sábios, por exemplo: nas cidades ter filho

custa muito dinheiro, eu tenho um filho na cidade, tê-lo custa muito dinheiro. O lado

do quadrado é incomensurável com a sua diagonal, eu desenhei um quadrado com 4 centímetros de lado, a sua diagonal não é

igual a 4 centímetros.

3) as contenciosas, que ocorrem seja porque as conclusões não decorrem das

premissas, por serem falsas deduções (nas cidades ter filho custa muito dinheiro; eu tenho um filho na cidade; logo não sou

capaz de sustentá-lo), seja porque as premissas não se baseiam em opiniões

respeitáveis (ter filho nas cidades custa pouco dinheiro; eu tenho um filho na cidade; logo ele me custa pouco dinheiro).

O universal do cubismo em Bruno

Tolentino; Graciliano Ramos e o esteriótipo.

Se há alguma utilidade no universal, é bom que se saiba o que é um universal; a

definição do universal “belo” permite que eu reconheça o belo quando me deparo

com ele no que não é comum se chamar

belo, o sendo. Essa seria a origem da “tese sinonímica” (por exemplo, se atribui ao

comunismo a mesma definição de cultura — no sentido antropológico — mesmo quando as pessoas não percebem que se aplica bem

o predicado “cultura”). O sinônimo é aquilo que admite o mesmo nome e a mesma

definição (Pedro e Paulo admitem “homem”; “Charles” e “Príncipe de Gales”

admitem “nobre”; homem e cavalo admitem “animal”; Tobey Maguire e Sea

Biscuit admitem “animal”).

Picasso, ou “picassiano” ou cubismo, significam talvez, tirando a definição:

“aquilo que perturba a aparência fenomênica sem tornar absolutamente

invisível a forma inteligível”.

O universal é aquilo que se diz de um número de coisas que apresentam

diferenças entre si, isto é, o universal não é individual, e também não é necessariamente uma substância

secundária como “animal” e “mineral”, porque há outras categorias. Eu não sei qual

é a diferença entre “predicado” e

“categoria”, a não ser talvez, que “predicado” diz respeito também à

denominação do objeto, ao seu título ou nome. Eu não sei qual é a diferença entre universal e predicado. Do predicado o

filósofo diz, aproximadamente: “é aquilo que responde à pergunta: ‘o que é o objeto

em questão?'”. Portanto o predicado se assemelha ao universal, e também,

segundo certos verbetes de dicionário, as categorias são chamadas predicados. Se eu chamo um homem de “homem” e “bípede

racional”, “homem” é predicado porque é dito do objeto, a definição do predicado

(“bípede racional” a definição, “homem” o predicado) é admitida ambos pelo predicado e pelo objeto (objeto sendo o

homem em particular que é chamado “homem”). Se eu chamo um homem de

“branco”, branco ainda é predicado em

relação a homem, embora o objeto não admita a definição de “branco”. Estranho,

não? Logo, isso difere o predicado do universal, já que o universal não pode ser

aplicado a um objeto que não admite a

definição do universal.

Bruno Tolentino escrevia sob a influência de

Picasso. Ao invés de escrever linearmente, sem precipitar o leitor em sobressaltos e hesitações, Tolentino costumava insinuar

por breves instantes algo que nada tinha a ver com o sentido da sentença, ou se punha

a adiar ao fim da sentença o sentido da mesma. Em alguma medida isso é “aquilo

que perturba a aparência fenomênica sem tornar absolutamente invisível a forma inteligível”. De que maneira Picasso ajudava

o mundo depreciando a matéria em favor da forma, talvez o próprio Tolentino

esclareça: ao depreciar a forma da língua, e se repetir usando sempre uma nova aparência fenomênica, ou linguagem no

sentido material, talvez esteja a insinuar que deseja do leitor que acompanhe as suas

preocupações e não a forma externa delas.

O universal “picassiano” se torna assim aplicável a outras realidades. O sentido

desse recurso também é potencializar a evocação, ainda que os elementos

evocados tenham de ser abandonados pelo

sentido adquirido ao fim da sentença.

O romance “Angústia”, do Graciliano

Ramos, é uma tentativa, segundo me pareceu, de expressar uma vida cotidiana irremediavelmente imersa em esteriótipos

que predominam sobre a linguagem e adquirem um poder autônomo que faz sua

intermediação senhoril entre todas as relações humanas. É o Brasil dos trinta, é o

Brasil de hoje. Por exemplo, mesmo cheio de compaixão e pesar pelo destino da ex-amante, Marina, Luís da Silva, a atormenta e

a expõe à humilhação. Ninguém diz para o outro o que realmente sente. Um amigo de

Luis finge que não o vê, quando se cruzam na rua, porque o último está devendo ao pai do primeiro e o primeiro não quer

constrangê-lo. A linguagem de todos é pateticamente pobre e grosseira (no

sentido de rude), grosseira (no sentido de

pouco sofisticada) demais para descrever o que se passa, e assim o outro é tratado

como um esteriótipo vivo, tão esquemático que nenhuma identificação verbal com ele é

possível. Se fala assim, mas a nível do

testemunho não se pensa assim. No final, enfermo e delirando na cama, Luís da Silva

vê desde a memória seus semelhantes em si, e a si neles. A identificação com o próximo é possível apenas quando há a

impossibilidade física e mental de acompanhar a linguagem do cotidiano. Esse

recurso se aplica ao universal “picassiano”.

Nota para correção.

Erro sobre Picasso: Talvez a característica essencial do cubismo, ou picassismo, não

seja exatamente o perturbar a aparência comum dos fenômenos para ressaltar-lhes

a forma, talvez não seja incorreto atribuir isso senão acidentalmente ao cubismo, se tanto, uma vez que toda imitação artística

deve fazer isso.

Erro sobre a qualidade: Aristóteles me fez ver, num dos trechos dos pós-predicamentos (esse é o nome da parte final

das Categorias segundo o wikipédia americano), que toda alteração que um

objeto sofre, ele sofre em função de uma

alteração da qualidade. Eu estava frio na neve, agora estou quente perto da lareira,

quente e frio são predicados da familia das qualidades. Logo, se antes eu estava pobre, e agora estou rico, eis aí uma mudança de

qualidade. Neste caso a qualidade está no objeto, mas de um modo diferente da cor

branca, por exemplo, supondo-se branco a cor de um objeto hipotético, branco é uma

qualidade.

Sentenças contraditória e contrária: Eu dissera que a sentença contraditória, por

exemplo a sentença B é contraditória de A, é a “negação no todo da sentença a que se

opõe”, isto é, B nega A como um todo, seja lá o que isso for. E dissera que a sentença contrária é aquela que afirma o predicado

contrário do mesmo objeto. Por exemplo, se eu digo que “Pedro acertou”, a contrária,

segundo eu dissera, será “Pedro errou”. A

verdade é que talvez eu tenha me deixado enganar por um erro de interpretação sobre

um trecho dos Tópicos, porque a diferênça entre contrária e contraditória é muito

claramente traçada em Da Interpretação. A

contraditória é a sentença, em relação a uma proposição universal (“toda novela da

globo é ruim”) que a nega de modo não-universal (“nem toda novela da globo é ruim”); que esta última afirmação não seja

universal é claro, porque “nem toda novela da globo é ruim” equivale a

“algumas/certas novelas da globo não são ruins” se eu não me engano. Dizer que um

certo predicado (digamos “filósofo”) se aplica a alguns indivíduos de uma espécie (digamos “homem”) e não a todos, é o

mesmo que uma afirmação não-universal; é, em vez disso, uma proposição particular,

se não me engano. Esta é a contraditória. A contrária é “Os filósofos não se cansam” em relação à sentença “os filósofos se cansam”.

Ou: “Os carros andam” e “os carros não andam”. Eu tenho que verificar melhor o

ponto, mas a contrária deve ser apenas uma

negação universal de uma afirmação universal.

Hieronymus Bosch (belga séc. XV) também

apresenta, como Picasso, uma imagem em mais clara descontinuidade com o

cotidiano, sendo a diferença que Picasso parece querer dissolver a essência e repudiá-la ao máximo. A descontinuidade

de Bosch é em outro sentido, se dá pela

mesclagem fantástica de objetos.

O fantástico seu está ilustrado em A Carroça de Feno

http://www.canvasreplicas.com/images/Haywain%20Hieronymus%20Bosch.jpg , o feno que todos da sociedade perseguem

significando as vaidades do mundo.

O contexto de Bosch é o final da Idade Média, a decadência moral e cultural. As Tentações de Santo Antão

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5c/Hieronymus_Bosch_-

_Triptych_of_Temptation_of_St_Anthony_-

_WGA2585.jpg é ilustrativa, fico aqui citando o fascículo da Folha, de onde tirei

os dados: “No painel central uma sinistra missa está no auge, quem a oficia é um

padre de feições animalescas, auxiliado por

um sacristão de rosto monstruoso, com o funil invertido — símbolo do charlatanismo

— sobre a cabeça. Atrás do santo, uma sacerdotisa coroada com uma mitra feita de serpente oferece a hóstia a um músico de

cabeça de porco, sobre o qual repousa uma coruja. Ao lado, uma criada negra carrega

num prato uma rã que ergue um ovo. Na parte inferior direita uma mulher-árvore

macilenta, de rosto azulado, cavalgando uma enorme ratazana, embala um feto enfaixado precedida de um tonel-animal e

de um alado personagem sem rosto.” Tríptico é o quadro com três faces distintas,

uma central, e duas laterais com um ângulo inclinado em relação à primeira.

No tríptico O Jardim das Delícias

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/co

mmons/6/6c/Hieronymus_Bosch_-_Triptych_of_Garden_of_Earthly_Delights_-

_WGA2505.jpg

(cujo tema é para mim obscuro, mas sei que

tem a ver com o juízo finale o destino humano desde a perspectiva sobrenatural)

sucedem-se três conjuntos de cenas, figurando “O paraíso terrestre”, “O jardim das delícias” e “inferno musical”.

Entre os quadros Cristo Carregando a

Cruz http://25.media.tumblr.com/tumblr_l1u449CPzE1qzb3a1o1_500.jpg e Coroação de

Espinhos http://www.unique-canvas.com/media/images/popup/hieronymus-bosch-dornenkroenung-christi-

00657.jpg , há uma diferença nas feições dos homens ao redor de Cristo: “Numa das

telas predomina uma atmosfera tensa mas quase extinta em torno do Senhor coroado de espinhos, com os carrascos de faces

ainda reconhecidamente humanas, que torturam o passivo e resignado Jesus até

mesmo com curiosidade (homem à

esquerda, em baixo) e contrição (homem à direita, ao alto).

No segundo, porém, o contraste é violento: a composição axial [axial, creio, é aquilo

relativo a um eixo ou centro], de cores

claras e brandas, cede lugar para a uma

composição achatada sobre um fundo todo negro. Duas linhas diagonais cortam o

quadro, formando uma cruz sutil: o lenho da cruz (da esquerda para a direita) e a linha (em sentido inverso) que reúne asúnicas

três figuras de traços humanos — o bom ladrão, ladeado por um dominicano

hediondo e por um mercador de feição suína, o Cristo, quase perdido naquele mar

de rostos grotescos e deformados pela podridão moral, e Santa Verônica, erguendo o sudário, que milagrosamente reproduz o

semblante do Senhor…”

Destaca-se O Filho Pródigo, São João Batista no Deserto, também São Jerônimo Penitente, cujo São Jerônimo tem atrás de

si a figura de um ídolo a cair no chão, simbolizando o abandono do paganismo.

As feições de pena e as “reconhecidamente

humanas”, na Coroação de espinhos, não mo pareceram tão claramente. Mas se nota

isso uma vez que é enunciado. O Fascículo mediou a “intencionalidade e a

reciprocidade” (que é chamar a atenção

para alo em particular do objeto e ganhar a

atenção, segundo Feuerstein). As feições, com seu sentido enunciado, parecem

extraordinariamente genuínas, numa faixa de realidade talvez impossível de se pôr em palavras.

Me chama a atenção, particularmente, o

tríptico A Epifania [termo que em certo sentido significa a visitação dos reis magos

ao Menino Jesus]; cada um dos patronos do quadro foi pintado em uma das faces laterais, junto, respectivamente, às figuras

de São Pedro e Santa Inês. A figura central traz a adoração dos três reis magos, alguma

alusão ao sacramento da eucaristia, entre outros elementos enigmáticos. A estabilidade cromática [relativa à cor] a que

o fascículo alude, e a amenidade da atmosfera psíquica e espiritual aludida por

essa cor moderada e agradável, contrasta

com a cena de batalha entre dois grupos de cavalaria mais acima. É que toda a cena

indica que o bem e os desígnios divinos absorvem em si os conflitos temporais entre

o bem e o mal. A pintura é um elogio da

altura e da majestade divinas no seu influxo

e desígnio sobre as criaturas e destinos. A estabilidade amena do drama interno do

quadro, absorvendo em si, por assim dizer, peripécias ( coisas inesperadas), conflitos etc., é um traço das histórias da Jane

Austen, em particular, na minha opinião, no romance Razão e Sensibilidade, onde a

estabilidade das vidas das personagens se mantém, e dignamente, apesar de

mudanças e decepções, e mesmo quando os personagens se tornam mais complexos. Se trata de algo parecido com um

cotidianismo feliz, elevado e inconsciente da própria elevação, cuja estabilidade

absorve tudo em si. A diferença é que o quadro é mais perfeito nesse sentido, porque é religioso, mais claramente

sobrenatural, amplo. No fundo, é difícil tirar da comparação um universal, mas se se

lembrar que o universal é justamente o que

se diz de coisas que apresentam diferenças entre si, não há muita dificuldade. Esse

universal também serve particularmente ao romance Esaú e Jacó, do Machado de Assis,

na minha modesta opinião o melhor

romance já escrito.

Peter Bruegel, pintor nascido possivelmente em Brabante

http://en.wikipedia.org/wiki/Duchy_of_Brabant ,

a cerca de 1525, atual Holanda. Atuou em

Bruxelas, visitou a Itália por alguns anos, local onde estava o centro da pintura renascentista. Foi influenciado por Bosch,

pelos temores religiosos deste, conforme a imaginação medieval. O estilo dos dois é

parecido. No quadro Margarida, a Louca, está retratada a avareza.

http://images2.bridgemanart.com/cgi-

bin/bridgemanImage.cgi/400wm.DGA.87763

50.7055475/533599.jpg

http://images2.bridgemanart.com/cgi-bin/bridgemanImage.cgi/400wm.DGA.06763

50.7055475/533581.jpg

http://images2.bridgemanart.com/cgi-bin/bridgemanImage.cgi/400wm.DGA.78763

50.7055475/533608.jpg A imensa bola de cristal que um homem

segura no barco simboliza a alquimia e o ocultismo; uma crítica aos “pequenos

mistérios”, o como vencer na vida, buscado pela via esotérica. As figuras absurdas têm

teor demoníaco, a mulher armada talvez simbolize a tentativa de se proteger contra a perda das posses. O pecado engendra um

mundo de horror e confusão. Jogos Infantis

http://chawedrosin.files.wordpress.com/2009/09/bruegel21.jpg ,

Ida ao Calvário

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4e/Pieter_Bruegel_d._%C3%84._

007.jpg

e Triunfo da Morte

http://mikemonaco.files.wordpress.com/2010/04/bruegel-triumph-of-death-

supersize.jpg são imagens elaboradas de multidões.

“Onde está o Wally?” talvez haja se inspirado em Bruegel.

Jogos Infantis (repare-se na quantidade

enorme de jogos) denota o espírito social, sóbrio, pouco individualizado, do autor. O seu cotidianismo é o documento

derradeiro, se diz, da vida e das maneiras medievais.

Em Ida ao Calvário o Cristo é um detalhe no centro da paisagem, a cruz tombada.

Em Triunfo da Morte é retratado um morticínio absurdo, como os do século XX

(segundo o fascículo da Folha). Segundo o

mesmo fascículo, a técnica de Bruegel é perfeita, em particular no retratar a

paisagem, e suas cores mais vivas e traçadas sem mistura lembram Van Gogh

(?).

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/66/VanGogh-

starry_night_ballance1.jpg Bruegel estava interessado na atmosfera

física e social das pessoas, no dia-a-dia; lhe interessavam os folclores, as festas (Dança

Campestre:

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/aa/Pieter_Bruegel_The_Peasant_Dance.jpg ).

As imagens, que retratam redes de relação

entre indivíduos se assemelham a certa forma embutida no romance Os Demônios, de Dostoiévski. Nos dois casos se narra a

simplicidade, submissão, ou ainda pertencimento, ao meio social, ao qual não

se pode ser de todo hostil. Mesmo

personagens como Stávroguin se submetem a exigências, pela força da

própria dinâmica social (é claro que não de um modo saudável). O romance não se

atem a um, ou a alguns, meios sociais, mas

abarca uma trama bruegeliana de relações.

Por fim, aquele ar de de felicidade sem entusiasmo, de contentamento sofrido e

sofrível, sobretudo mas não exclusivamente dos camponeses e pessoas simples do romance, é puro Bruegel.

Bruegel é o último suspiro de uma vida

fantástica, simples; ademais sensata e saudável (como a que é gravemente

ameaçada cultural e fisicamente, por assim dizer, em Os Demônios). A adequação ao mundo era o própria desejo do pintor, que

teria dito ao morrer: “sejam felizes”. Nota: o universal “trama bruegeliana”, se se

quiser, se pode dizer das narrativas artísticas que trazem em si uma imagem de relações sociais extensas marcadas pela

ênfase no caráter social dos acontecimentos, isso querendo dizer que o

artista enfatiza o arraigamento aos

costumes comuns, e sua verificação no cotidiano.

Tintoretto http://en.wikipedia.org/wiki/Tint

oretto

, nascido a 1518, pintor veneziano e que

sempre atuou em Veneza http://en.wikipedia.org/wiki/Venice

. Pintou os muros da Escola de São Roque; há outros detalhes que não tenho tempo ou

conhecimento para acrescentar.

A decadência política e econômica dos estados italianos, se diz, teria propiciado o

maneirismo

http://en.wikipedia.org/wiki/Mannerism do qual movimento se destaca Tintoretto:

“Os mestres do maneirismo se

concentravam sobretudo em quebrar uma harmonia excessivamente óbvia, substituindo sua normatividade por uma

interpretação mais subjetiva e mais sugestiva”, diz o fascículo da Folha, se isso

pode esclarecer algo. De um certo

Schiavone ele absorveu, no pincelar, um ritmo linear e o gosto pelas linhas sinuosas.

De Bonifácio, a capacidade de guiar a visão

do observador através da superfície da

obra, sugerindo um método de apreciação. Tintoretto foi chamado “caprichoso”, o que

talvez tenha algo a ver com o maneirismo (a definição de caprichoso é, segundo um dicionário, “aquele que resolve fazer as

coisas conforme lhe pareça, e tolamente”). Repare-se no quadro São Marcos Liberta um

Escravo

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0f/Jacopo_Tintoretto_-_The_Miracle_of_St_Mark_Freeing_the_Sla

ve_-_WGA22480.jpg :

“Há uma atmosfera de exceção http://www.priberam.pt/dlpo/ ,

um tom de epopéia na narração do acontecimento. Pintado para a Escola de

São Marcos, a tela reproduz um milagre. O

santo se dirige para o fundo da cena, e a composição se orienta numa diagonal que

sobe da esquerda para a direita, dividindo o quadro em partes iguais. O triângulo

inferior, mais próximo, ocupa o primeiro

plano, enquanto o outro focaliza a

personagem central e se afasta em distâncias luminosas, dominadas pela

perspectiva [Arte de figurar no desenho as distâncias diversas que separam entre si os objetos representados]. Os dois

triângulos obedecem a pontos de vista diferentes, e numerosas figuras participam

do evento, com seus contornos definidos por pinceladas nervosas.

Essa visão múltipla, assim como o espaço profundo, a composição articulada em áreas e grupos, as estrias

http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?

pal=estria luminosas ritmando as cores, a participação

popular com sentido coral, serão características constantes de Tintoretto.”

Agora outra citação, a respeito do admirável quadro São Jorge e o Dragão : “Novamente,

a pintura pode ser lida em tempos diferentes. A mulher de formas robustas e

trajes desfeitos retém nossa atenção. O olho

percorre o gramado, onde sucessivamente

descobre o cadáver, o dragão e enfim o cavaleiro de lança em punho, na arremetida

contra o monstro. Só depois levantamos a cabeça para ver o castelo que se afasta em perspectiva até o céu. E nas nuvens, entre

anéis concêntricos de várias tonalidades, deparamos com o Criador”.

Agora outro que gostei, Susana no Banho

(Susana é uma personagem bíblica, bela aristocrata judia no exílio, que foi salva pelo profeta Daniel da difamação-acusação de

dois juízes velhos e perversos que queriam dormir com ela; está a curtíssima história

no capítulo 13 do livro de Daniel, Antigo Testamento. Leia o leitor se puder. Leia. Leia. Essa insistência é um dos critérios de

mediação da aprendizagem do Feuerstein, o critério do desafio. Leia, leia, para extrair

da história, tão curta, alguma sabedoria.

Leia. Leia, pois o texto bíblico faz até mesmo uma descrição psicológica, me

parece, da tentação em que sucumbiram os juízes, é uma lição de sabedoria.)

http://www.artbible.info/images/tinto_susa

nna_grt.jpg :

“Neste, apesar do jardim e da linha de fuga situada no centro do quadro, a sebe

http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=sebe

de rosas cria um espaço interno cuja doce

intimidade é ressaltada pelos vidros de cosméticos. a luz acaricia levemente a pele de Susana, para transformar-se em brilho

no ancião que aponta numa das extremidades”.

Vejamos Reencontro do Corpo de São Marcos

http://uploads2.wikipaintings.org/images/tintoretto/finding-of-the-body-of-st-

mark.jpg :

“Acentuam-se os contrastes de luz e

sombra, prenunciando a síntese suprema a que o pintor chegará na maturidade,

quando usará raríssimas cores dividindo o

quadro entre uma parte escura e um faiscar

de lampejos. O espaço, como sempre, tem profundidade

abismal, e as linhas diagonais sustentam um episódio animado por intensa dramaticidade. As sombras, porém, são

maiores e mais marcantes do que nos quadros anteriores. Filamentos luminosos,

a invadir as quinas das sacadas

http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=sacada

e as nervuras da abóbada, constroem a arquitetura e desenvolvem a perspectiva.

Uma redução da cor em favor do claro-escuro também se nota na Piedade [outro quadro marcante] cuja tonalidade

homogênea ilumina amplamente as superfícies.

http://www.chinaoilpaintinggallery.com/oilpainting/Tintoretto/Pieta.jpg

Antes de procurar enunciar o universal que

achei, só mais um quadro

http://uploads6.wikipaintings.org/images/tintoretto/crucifixion-1565.jpg :

“A Crucificação, visão panorâmica plena de luz e cor, povoada por numerosos

personagens entretidos nas mais diversas tarefas. Aos pés da cruz, um pequeno grupo

se compunge, e nos cantos, cavaleiros se aproximam, fechando o grande círculo cujo

centro é o corpo de Jesus. Apesar da indiferença de alguns, o drama é intenso.” Tintoretto me lembrou de Lord Byron. No

poema famoso, She Walks in Beauty, o jogo tintorettiano de claro-escuro é evidente;

além disso, em ambos há um apelo popular e uma vitória popular, já que Tintoretto teve de suar e fazer muitos trabalhos para ser

reconhecido por todos, o que ao cabo aconteceu, e Byron foi muito amado pelo

público. O estilo de ambos é simpático ao

povo. Uma das obras principais de Byron, o poema longo Childe Harold’s Pilgrimage, de

fato lembra o veneziano caprichoso. O sombrio do reconhecimento dos pecados,

da morbidez das farras intermináveis, a

descrença em relação ao próprio destino e,

quase à vida e ao próprio caráter, entra em contraste com a inteligência aguda, o ar

bonachão e peculiarmente, nobremente, caridoso e sensível. O sarcasmo mórbido em relação à religiosidade não o é

exatamente, em Byron, é mais a impressão perplexa de um homem carnal ciente da

própria incompreensão. Esse sarcasmo é compensado por um reconhecimento,

quase dissimulado, da verdade e da seriedade da religião. Nesse sentido Byron e Tintoretto não são idênticos, porque a este

jamais ocorreria sequer pensar em ironizar a religião. Tintoretto é outro Michelangelo,

espírito devoto. Byron, em seus versos, é ainda cheio de “cores vivas” [eu tirei a expressão do

fascículo], o que o aproxima ainda mais de Tintoretto [São Jorge e o Dragão vem à

mente]. Eu não li Childe Harold todo, nem

um terço do livro, aliás. O universal, no caso, seria aquilo que se diz

das representações artísticas que têm em si uma atmosfera que une o escuro e cores

vivas, com certo capricho. O universal pode

se chamar “atmosfera tintorettiana”.

O que é uma relação afirmativa entre dois

termos, e o que é uma relação negativa?

“Pedro é mau”, seria uma relação afirmativa

entre dois termos, “Pedro” e “mau”, sendo o predicado “mau”, porque é aquilo que se

está dizendo de Pedro (o predicado é aquilo que se deve dizer em resposta a “o que é o

objeto em questão?”; e se pode dizer de Pedro que ele faz parte do conjunto das coisas que se diz são más. Pedro é algo

mau.)

“Pedro não é mau”, seria uma relação

negativa entre os termos “Pedro” e “mau”, sendo “mau” o predicado que não está

sendo atribuído.

Dizer que um predicado está em outro como um todo é o mesmo que dizer que o

predicado que está em outro o faz sem admitir exceção. Se todo prazer é bom, então “prazer” está em “bom” sem exceção,

e isso significa que não há nada que seja

prazer que não se possa dizer que é “bom”.

As relações afirmativas e negativas, entre

termos, podem ser universais ou não-universais, se são não-universais ou são particulares ou indefinidas (neste último

caso quando as particulares e universais não se insinuam, como em “o prazer é bom”

ao invés de “todo prazer é bom” ou “alguns prazeres são bons”; ou “ele trabalha” —

voltarei a isso depois). As particulares são aquelas em que se sabe, com certeza, 1) que um termo não está necessariamente

contido em outro como um todo, (e nisso a particular se aproxima da relação

indefinida) 2) ou que necessariamente não está contido em outro como um todo. “Alguns homens são bons”, essa sentença

indica que “homem” não necessariamente está contido em “bom” como um todo (caso

1) ).

“Nem todo homem é bom”, essa sentença indica que “homem” necessariamente não

está contido em “bom” como um todo (caso

2) ).

As relações particulares, portanto não-

universais, entre termos, configuram

proposições particulares.

As relações universais configuram proposições universais.

Pequena nota sobre os tópicos

Nos tópicos o autor aponta que se um termo não se predica do outro em um

sentido, ao menos, do conjunto de sentidos possíveis do termo, se deve procurar

demonstrar, num debate, que o termo se aplica a pelo menos um sentido. Ele acrescenta que em algumas ocasiões os

sentidos diferenciados do termo são óbvios, e num debate não podem render muita

coisa, mas em outras ocasiões os sentidos diferentes podem ajudar a debater. Eu vou

exemplificar e vai ficar claro.

Se um pastor protestante está sendo

processado por supostamente ter se

disfarçado de pastor, e não sê-lo realmente, alguém argumenta na corte: “O senhor nunca foi um pastor de verdade para nós, o

senhor nunca cuidou das suas ovelhas

como um pastor de verdade deve fazer”. A

isso o réu poderia argumentar: “Ora, eu não estou sendo processado por ser um bom ou

mau pastor, mas porque me acusam de sequer reter, realmente, o cargo nominal de

pastor”.

Um exemplo mais sutil em que se pode argumentar por meio dos sentido de um

termo. Suponha-se que um católico e um

espírita discutam.

Espírita: A bíblia em que você acredita tem contradição de fatos, um evangelho diz que ambos os ladrões ao lado da cruz ofendiam

Jesus, outro diz que um dos ladrões honrou Jesus. E assim por diante. A bíblia tem de

ser reinterpretada para se extrair dele o que tem de bom, e deixar de lado o que tem de

absurdo.

Católico: Me dize uma coisa: o senhor

acredita ver muitas verdades através de

Homero, por exemplo?

Espírita: Mas é claro.

Católico: Mesmo supondo uma certa

descontinuidade entre o texto e a sua

testemunha pessoal?

Espírita: Sim.

Católico: Assim, a descontinuidade é um

dos elementos que permitem ver bem a

realidade que Homero está

subentendendo?

Espírita: Como não?

Católico: Então não faz sentido rejeitar a

bíblia por esse mesmo tipo de descontinuidade, porque se o fizeres terás de rejeitar o texto de Homero no que

parecer descontínuo com a experiência

pessoal.

Espírita: Mas não é o mesmo tipo de descontinuidade, na bíblia os fatos se

contradizem.

Católico: A narração se contradiz, não os fatos a que se refere. A contradição mesma

enriquece o texto porque gera a tensão que subentende realidades que outra forma de

narração não tão ricamente retrataria. Mas

se isso não vai convencê-lo, porque estás convicto de que qualquer descontinuidade

entre o texto e a experiência denota um

engano, deixemos o assunto.

Espírita: Mas não é a mesma coisa.

Católico: E no entanto acreditas em Hermes

e Poseidon.

Espírita: Não acredito, deviam ser espíritos que se mostraram a Homero ou outrem, e

não deuses.

Católico: E não é isso uma descontinuidade entre a narração e aquilo de que estás

convicto?

Espírita: Bem, sim…

Católico: E essa mesma descontinuidade é rica de significado, aumenta a inteligência

ou sabedoria?

Espírita: Aumenta.

Católico: Logo, deves perceber que, dada a

estrutura do mundo qual se verifica, uma certa descontinuidade entre a narrativa e os

fatos, um pouco de desorganização em tudo, é um sine qua non, segundo li em um livro, para se expressar certas verdades. Nas

lendas sobre Santo Antônio, por exemplo, na idade média, certos milagres pareciam

vir repetidos, por serem muito, mas não inteiramente, semelhantes; isso denota, eu

suspeito, a dificuldade de relatar certas realidades, como se o querer demonstrar uma continuidade muito estreita e rigorosa

seja algo incompatível com a estrutura da realidade, e uma superposição de fatos

descontínuos seja mais apta a nutrir a inteligencia, para,entre outras vantagens, se conscientizar o limite mesmo das

narrações no conseguir retratar o seu

objeto.

Espírita: Agora começo a entender o seu

ponto, e vejo que você deve ter razão em alguma medida.

Um comentário breve a respeito do livro Da

Interpretação

“Homem” é um universal. Um universal

pode ser tomado universalmente em uma sentença. “Todo homem é mau”. Ou esta

sentença ou a sua contraditória (“nem todo homem é mau”) pode ser verdadeira, a não

ser que nenhum homem seja mau.

“Pedro” é um indivíduo. Um indivíduo não pode ser tomado universalmente em uma

sentença. “Pedro é mau”. Ou esta sentença ou a sua oposta (“Pedro não é mau”) é

verdadeira.

“Homem” é um universal. Um universal pode ser tomado não universalmente em

uma sentença. “Alguns homens são maus”. “Alguns homens não são maus” não

necessariamente se opõe a “Alguns homens são maus”. A sentença não está esclarecendo, por si mesma, se se trata dos

mesmo homens ou não. Então ambas as sentenças podem ser, de certo modo,

verdadeiras simultaneamente. “Todo homem é mau” e “nem todo homem é mau”, ao contrário, não podem ser

verdadeiras simultaneamente.

Vou citar os três parágrafos iniciais do

Gramática Metódica da Língua Portuguesa,

do Napoleão Mendes.

“Como todos os outros animais, nós agimos; mas, a diferença deles, manifestamos e externamos nossa ação,

mediante o dom que nos é próprio, a linguagem, que outra coisa não é senão a

propriedade que temos de, por meio de palavras, comunicar-nos entre nós,

exteriorizando o nosso pensamento, relatando fatos e coisas internas ou externas, acontecidas ou ainda por

acontecer.

Esse meio de comunicação poderá ser feito

com simples sons orais, com sinais, com arranjos convencionais, gestos, disposição dos objetos que nos cercam; teremos,

então, além da linguagem por meio de sons orais, que se denomina linguagem falada ou

glótica, a linguagem mímica, feita por gestos, e a linguagem escrita ou gráfica, feita por sinais, marcas, gravações, arranjos

etc.

Palavra é, pois, a parte de que se compõe a

linguagem, e pode ser constituída por um simples som ou pela combinação de sons,

ou, ainda, pela representação desses mesmos sons. Como a linguagem indica o pensamento, as palavras, como partes que

são da linguagem, indicam as partes do

pensamento, ou seja as ideias.”

O termo “glótico” vem da glotes [ Abertura da laringe circunscrita pelas duas cordas

vocais inferiores.]

https://aulasdialeticacienciaaristotelica.file

s.wordpress.com/2016/06/653d5-glote.jpg

O que o Sr. Mendes quis dizer com “arranjo”? http://www.priberam.pt/dlpo/de

fault.aspx?pal=arranjo

A aplicação mais cabível e, ao mesmo tempo, universal, seria “arranjo” no sentido

de manejo comunicativo. Nesse sentido um gesto com as mãos é um arranjo [ por

exemplo se você gira o dedo próximo da cabeça, como a dizer “a preocupação desse cara com tais detalhes de gramática é

maluca”], mas nem todo arranjo é um

gesto. O gesto é uma espécie do gênero dos arranjos. Ao mesmo tempo, se diz que é um

gesto tudo quanto dê a entender determinada coisa, por exemplo no romance Persuasão, da Jane Austen,

quando o parente dos Elliot não os procura mais, se pode diz que isso foi um gesto de

repúdio. Neste último sentido “gesto” é algo muito próximo de um sinônimo de

“arranjo”. Ao mesmo tempo me confunde o uso do termo “arranjo”, porque o emprego dele não me parece tão claramente ligado à

vida da linguagem, ao menos no contexto

cultural em que me vejo.

O autor também usou o termo ideia, e por isso vou citar o especialista dessa área, o

Ferrater Mora:

“As múltiplas significações da palavra têm dado origem a vários modos de considerar

as ideias. Três destas são particularmente importantes. Por um lado compreende-se ideia logicamente quando se compara com

um conceito. Por outro lado compreende-se a ideia psicologicamente quando a

equiparamos com certa entidade mental.

Finalmente, compreende-se a ideia metafisicamente quando se equipara a

ideia com certa realidade. Estes três significados têm se entrecruzado com frequência até ao ponto de se ter tornado

por vezes difícil saber exatamente que sentido tem uma determinada concepção

de ‘ideia’.

O termo foi usado por vários pré-socráticos,

mas apenas em Platão encontramos uma extensa dilucidação [Elucidação] do

problema.

Platão usou o termos ideia para designar a forma de uma realidade, a sua imagem ou

perfil ‘eternos’ e ‘imutáveis’. Por isso é frequente em Platão a visão de uma coisa ser equivalente à visão da forma da coisa

sob o aspecto da ideia. A ideia é, portanto, qualquer coisa como o espetáculo ideal de

uma coisa. Mas a significação de ‘ideia’ em

Platão não é simples e unívoca.

Platão trata do que são as ideias (ou as

‘formas’), de sua ‘relação’ com as coisas

sensíveis e com os números, das ideias

como causas, como fontes de verdade, etc.

Concebe com muita frequência as ideias

como modelos das coisas e, de certo modo, como as próprias coisas no seu estado de perfeição. As ideias são as coisas como tais.

Mas as coisas como tais não são nunca as realidades sensíveis, mas as realidade

inteligíveis. Uma ideia é sempre uma unidade de qualquer coisa que aparece

como múltiplo. Por isso a ideia não é apreensível sensivelmente, mas “visível” apenas inteligivelmente. As ideias ‘veem-se’

com o ‘olhar interior’.

Admitidas as ideias, é preciso saber de que

coisas pode havê-las.Em princípio, parece que pode haver ideias de qualquer coisa. Mas torna-se duvidoso que haja ideias de

‘coisas vis’ ou de ‘coisas insignificantes’ [?]. Por isso Platão tende cada vez mais a

reduzir as ideias a ideias de objetos matemáticos e de certas qualidades que hoje em dia consideramos como valores (a

bondade, a beleza, etc.). Além disso, tende a organizar as ideias hierarquicamente. Uma

ideia é-o tanto mais quanto mais exprime a

unidade de algo que aparece como múltiplo. É neste ponto que se expressa a

clássica divergência de opiniões entre Platão e Aristóteles. Este último escreve que ‘não é mister admitir a existência de ideias,

ou do Uno junto ao Múltiplo’ [releia esta frase para pegar melhor, isto que faço é

intermediar o critério feuersteiniano da intencionalidade e reciprocidade, que de

certo modo sempre consiste em apontar num objeto um aspecto, abordá-lo desde um aspecto]. Melhor sucede que ‘o Uno está

unido ao Múltiplo’. Por outras palavras, Aristóteles nega que as ideias

existam num mundo inteligível separado das coisas sensíveis. De outro modo não se compreenderia como as ideias podem

‘atuar’ e explicar a realidade sensível. Os escolásticos abriram caminho para

vários usos do termo ‘ideia’. Além do uso

ontológico [da ideia equiparada a uma realidade, como dito acima — aqui repito a

intencionalidade e reciprocidade], segundo o qual as ideias são concebidas como

modelos, fixaram um uso gnoseológico,

segundo o qual as ideias são princípios de

conhecimento. Neste último caso debateu-se com frequência a questão de se se

conhecem as ideias. Finalmente, um uso lógico, segundo o qual a ideia é a representação simples de uma coisa na

mente. estas distinções passaram em parte à filosofia moderna. Nos filósofos modernos

parece haver predominado cada vez mais o sentido de ‘ideia’ como ‘representação

mental’ de uma coisa. Muitos autores tenderam a conceber as ideias como resultados da atividade de um sujeito

cognoscente. Foi habitual considerar que por meio das ideias que um sujeito possui

(aspecto psicológico) pode conhecer-se racionalmente (aspecto lógico) [?] o que as coisas são verdadeiramente (aspecto

metafísico ou ontológico). O predomínio do ponto de vista que chamamos

‘gnoseológico’ tem sido comum tanto às

tendências racionalistas como às

empiristas.

Os racionalistas consideraram que as ideias (pelo menos as ideias verdadeiras e

adequadas) têm duas faces: uma, ser, como

diria Espinosa, ‘conceitos do espírito que este forma porque é uma coisa pensante’; a

outra, ser, como afirmava Descartes, as próprias coisas logo que vistas [?]. Este último levou a pôr as ideias verdadeiras em

Deus, já porque era considerado como ‘a única coisa pensante’, já porque fosse ‘o

ponto de vista absoluto’ do qual são vistas as coisas. Como consequência disso, os

racionalistas se inclinaram para o inatismo [Teoria que defende a existência de ideias, capacidades ou atitudes que nascem com o

homem, sem necessidade da experiência ou da aprendizagem.]. Quando os motivos

teológicos perderam importância, os racionalistas pensaram que as ideias (verdadeiras) podiam continuar a ser inatas

por corresponder a sua possessão ‘à natureza do homem’.no entanto, a partir do

momento em que se sublinhou o aspecto

subjetivo da ideia, as posições mantidas aproximaram-se às empiristas, e o

problema que permaneceu de pé foi o da

origem das ideias na mente.

Os empiristas usaram o termo ‘ideia’

abundantemente; em muitos casos, além disso, elaboraram as suas teorias do

conhecimento como uma espécie de ‘doutrina das ideias’. Assim sucede em Locke, Berkeley e Hume. Locke pede

perdão ao leitor no início do seu Ensaio pelo uso frequente da palavra ‘ideia’, mas

esclarece que é a palavra que melhor serve para indicar a função de ‘re-presentar’

qualquer coisa que seja o objeto do entendimento quando um homem pensa: ‘Ideia’ equivale a ‘fantasma’, ‘noção’,

‘espécie’. As ideias são para Locke apreensões e não propriamente

conhecimentos. A maior parte das ideias procede de uma fonte: a sensação. Podem ser simples (recebidas passivamente) ou

complexas (formadas por uma atividade do espírito). As simples podem ser ideias de

sensação (provenientes de um sentido,

como o sabor ou a dureza; ou de mais de um sentido, como a figura, o repouso, o

movimento) ou de reflexão (percepção ou

pensamento, vontade). […]”.

Eu vou transcrever o resto depois, porque é

mais longo que eu tinha pensado. Para o Napoleão Mendes a ideia é considerada a

parte de um pensamento, o que é abordá-la psicologicamente, mas nele também se subentendem os aspectos ontológico,

lógico e gnoseológico. Ele usa ideia de

maneira lata, e pouco específica.

Nota sobre o caráter dos opostos contraditórios e as relações negativas e

afirmativas entre dois termos

“Pedro é mau” configura uma relação afirmativa entre os termos “Pedro” e “mau”,

o caráter afirmativo da relação consistindo em que “mau”, positivo e operantemente se

aplica a Pedro, se predica de Pedro.

“Pedro não é mau” configura uma relação

negativa, porque o predicado não se aplica.

A relação entre termos, como eu referi na nota da semana passada, pode ser universal

ou particular.

“Todo homem é mau” configura uma

relação universal, e isso significa que o termo “homem” está em “mau” como um

todo, na sua totalidade, sendo por isso impossível, no caso, que haja alguma coisa que se possa dizer que seja homem e não se

possa dizer que seja mau.

“Alguns homens são maus” configura uma

relação particular entre termos, e nela não é impossível que haja alguma coisa que se

possa dizer que seja homem e não se possa

dizer que seja mau.

Os opostos contraditórios são as sentenças

em que uma afirma universalmente algo de algo, a outra nega particularmente, e não

universalmente, a primeira sentença na mesma coisa da mesma coisa (o algo de algo que a primeira sentença afirma). Por

exemplo, são contraditórias as sentenças:

Todo homem é mau — nem todo homem é

mau.

A primeira é uma proposição universal, e portanto traz uma relação universal entre

termos, isso significando que “homem”

pertence a “mau” como um todo. A segundo (“nem todo homem é mau”), é

uma proposição particular, e portanto traz uma relação particular entre termos, isso significando que “homem” não pertence a

“mau” como um todo, embora alguns

definitivamente pertençam.

Há outra expressão de contraditórios opostos. Nessa expressão se trata não de

uma afirmação universal confrontada com uma negação particular, como no último caso, mas de uma negação universal

confrontada por uma afirmação particular.

Nenhum homem é mau — alguns homens

são maus.

Se nem todo homem é mal, então alguns definitivamente são maus. De modo que as

proposições particulares que se opões às

duas últimas proposições universais podem

perfeitamente ser verdadeiras ao mesmo tempo. A única diferença entre as duas sentenças particulares é, “alguns homens

são maus” pode ser verdadeira ao mesmo

tempo que “todo homem é mau”, porque

do fato de que são todos maus se pode dizer igualmente que alguns em particular

são maus, sem contradizer a primeira afirmação, que é universal. Assim “alguns homens são maus” não pode ser a

contraditória de “todo homem é mau”, embora seja uma sentença particular como

“nem todo homem é mau”, e “parecida” com esta. Já “nem todo homem é mau” e

“nenhum homem é mau” não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Compare visualmente as sentenças acima e repare no

cruzamento entre a universal de um par e a

particular do outro.

Nota sobre o nome indefinido

O nome indefinido tem uma plasticidade ou universalidade curiosa, talvez com a

exceção de “não-finito”. “Não-finito”, que é o nome indefinido advindo do termo

“finito”, se refere a todas as coisas que não são finitas, mas isso soa absurdo porque só pode haver, segundo posições teológicas e

filosóficas, uma coisa apenas não-finita. Por outro lado o nome indefinido não-árvore se

aplica a mim e a uma janela, ao sol e a todas

as demais estrelas.

Nota sobre a visão de mundo de Aldous

Huxley, Feuerstein e os Tópicos

Há menção em um texto que uma fonte da

filosofia de Huxley, exemplificada no

romance Contraponto (não só eu gostei do romance, o Carpeaux também, embora

tenha criticado ferrenhamente o pobre do Huxley), consiste na ideia de que os

aspectos de um objeto não são unificados mentalmente por uma operação kantiana, mas a coesão deles está no objeto mesmo.

Assim, a tônica emocional da história se mantém a despeito dos vários aspectos

envolvidos. No texto dos tópicos, em mais de um lugar aliás, é dito que esclarece uma sentença o se tomar os vários termos

separadamente, e se verifica, ainda além disso, os sentidos possíveis dos sentidos

possíveis, ou os termos possíveis dos termos possíveis. Por exemplo, se eu digo que o programa do Chaves é engraçado e

simplório, é possível se perguntar qual o sentido dos termos em cada caso. Eu posso,

por exemplo, explicar que, na minha

opinião o “simplório” não quer dizer sem graça, embora o termo simplório em si

mesmo possa ter essa conotação. Assim, como em huxley, é a unidade do objeto que esclarece o seu aspecto particular, é a

unidade de “simplório” com “engraçado”, para usar uma abordagem linguística, que

esclarece o peso e o sentido de “simplório”. Se eu não houvesse captado o que é

“simplório” por essa descrição desde a unidade do objeto, como mais eu poderia

captar?

O verificar os vários sentidos de “simplório”, e apontar para o sentido que eu pretendi

com “simplório e engraçado” é o mesmo que intermediar o critério feuersteiniano das intencionalidade e reciprocidade,

porque essa verificação aborda o objeto, enfatiza o objeto e o conscientiza.

No começo das categorias estão discriminados certos tipos de universais, e o

individual, conforme uma certa tipologia. Eu vou tocar no assunta e fazer um

cruzamento entre essas tipologias e as

categorias, sem explorar muito as propriedades das categorias, o que é feito

no resto do livro, mas explorando as propriedades dos tipos mesmos. O curioso é que os tipos são definidos nos termos das

próprias propriedades, ou características,

pelos quais se os reconhece.

“Das coisas existentes algumas são: (a) as que se diz de um objeto, mas não estão em

nenhum objeto. Por exemplo, ‘homem’ se diz de um objeto, o homem individual [por exemplo, Pedro], mas não está em nenhum

objeto.”

Disso se conclui que nenhuma qualidade se

inclui nesse tipo. A qualidade é, por definição, aquilo em função de que as coisas se alteram. Por isso os estados e

condições, cuja diferenciação o autor fará mais tarde (o estado perdura mais e é mais

difícil de se alterar, a condição dura menos e é mais fácil de se aletrar, exemplos individuais serão dados depois), são

qualidades, portanto não se encaixam nessa tipologia. “Homem”, como “branco”

ou “quente” ou “engraçado”, se diz de

objetos. Se diz que um homem [digamos Pedro] é um homem, se diz que ele é

branco, se diz que está quente [de tanto correr ou permanecer na sauna, porque quando se corre a temperatura do corpo

aumenta etc.], se diz que ele é engraçado. No entanto, como os três últimos

predicados, a saber, “branco”, “quente” e “engraçado”, são coisas em função das

quais se diz que um objeto se altera, eles são qualidades. Ora, as qualidades estão no objeto. Embora se as possa dizer do objeto,

ao contrário de ‘homem” elas estão no objeto, como características dele. Para

esclarecer o que é estar no objeto, Aristóteles explica que estar no objeto é diferente de fazer parte do objeto; a minha

mão é parte de mim e não uma qualidade,

já a minha branquidão é uma qualidade.

A substância primária é individual [por

exemplo, Pedro], sendo a substância primária a conjunção de forma e matéria

[por exemplo, o cômodo em que você está sentado agora, ou o computador que você

está usando]. A substância secundária é

universal, e se diz das substâncias primárias [por exemplo “homem” ou “computador”,

este se no sentido não do computador individual, mas em geral]. Se aplica ao tipo citado a substância, quando secundária.

Por exemplo, “Pedro” é uma substância primária, e ele não está em nenhum objeto,

como é característico do tipo citado [não estar em nenhum objeto, mas se dizer de

objetos, como “homem”]; mas “Pedro” não se diz de nenhum objeto. Se você diz de Paulo que ele é um Pedro, você está

dizendo isso metaforicamente, você está atribuindo a Paulo algum aspecto mais

universal de Pedro [por exemplo, Pedro ser um sujeito bacana]. Quando Chesterton criticava Rudyard Kipling por não amar a

Inglaterra, por ela mesma, e sim uma qualidade dela (a Inglaterra na época ter

fábricas, uma indústria formidável), era

deste último exemplo que ele queria falar. Kipling amava não o “individuo” Inglaterra,

mas um aspecto mais universal da Inglaterra. Se uma nação é um indivíduo

(me parece que é um universal, mas ainda

preciso matutar isso um pouco), não vem

ao caso agora.

Aristóteles chama a substância secundária

“uma certa qualificação”, como não lhe parecesse ela inteiramente adequada ao termo “substância”, não tanto quanto a

substância primária. O problema é que um objeto não pode ser alterado desde a

substância secundária que o caracteriza. Um homem não pode deixar de ser homem,

embora ele possa deixar de ser branco, se pegar muito sol, deixar de ser quente, se morar na Sibéria, e deixar de ser engraçado,

se perder o bom humor. Aristóteles parece querer chamar de qualidade a substância

secundária, no sentido de que é característico da qualificação o esclarecer um objeto, se eu digo de alguém que é

branco, o estou esclarecendo, e o

diferenciando de outros objetos.

Um terceiro tipo de categoria é a da quantidade, que se divide em dois tipos. As quantidades contínuas e as discretas. O

filósofo cruza com essas duas primeiras subcategorias outras duas, a saber, as que

se compõem de partes que têm posição

relativa umas às outras (pense em geometria e terá uma vaga ideia do que o

filósofo quer dizer) e as que não se compões de partes que têm posição relativa umas às outras. Eu vou falar apenas das duas

primeiras categorias, por agora, porque as duas primeiras estão incluídas nas duas

ulteriores, quer dizer, abarcam as ulteriores (isso quer dizer que não há nada das duas

últimas que não posse ser reconhecido

entre as duas primeiras).

As quantidades discretas são o número (1,

2, 3 …) e a linguagem (Pe-dro, Ho-mem). Nestes dois tipos de número discreto, a

qualidade de número é atribuída porque são predicados que expressam quantidades determinadas. O número três expressa uma

quantidade determinada. Os termos “ditongo” [por exemplo, o “lios” de “cilios”],

“tritongo” [por exemplo o “guão” de

“saguão”] ou mesmo “sílaba”, expressam quantidades determinadas. A linguagem

aqui é considerada em um sentido mais material. Só o Napoleão Mendes para me

ajudar, e mesmo assim não prometo isso

para agora. As quantidades discretas se dizem de objetos, não estando nos objetos,

conforme a tipologia do começo deste texto? Eu acho que sim. Se eu empreguei três funcionários este ano na empresa, e

nenhum serviu, eu comento com o quarto funcionário: “você já é o quarto este ano”,

ou “você é o número quatro deste ano”. Aí a quantidade discreta é predicada de um

objeto, mas não está nele, e parece não estar nele pelo fato mesmo de que o que o tornou o “quarto” foi algo acidental à

definição dele. Nem toda qualidade é muito precária (no sentido de poder se desfazer de

uma hora pra outra, como estar quente ou frio), mas toda qualidade admite alguma alteração (estar frio antes e quente depois).

No caso do funcionário, ele é o quarto e sempre vai ser o quarto, no caso. Ainda que

venha um quinto, não será ele. Se ele for o

sétimo (for demitido e recontratado), ainda assim ele será o quarto. Isso não acontece

com a qualidade, que implica a possibilidade de alteração. Logo os

números, ou quantidade discreta, se diz de

um objeto, mas não está em nenhum

objeto, como “homem”.

As quantidades contínuas são linhas,

superfícies, corpos, espaço e tempo. Eu vou

me deter nelas depois.

Nota do Fra Angélico

Fra Angélico, nascido por volta de 1387 em Vicchio vila próxima a Florença, se entendi

bem.

Chamava-se Guido di Pietro e adotou o

nome de Giovanni ao ingressar em 1407, com cerca de 20 anos de idade, no Convento dos Dominicanos da Observância

de Fiesole. É recomendado esse homem devoto e humilde, aos Medici por certo

Domenico Veneziano [lembra do Piero, da semana passada, bing any bell?], com as palavras: “Um dos melhores mestres de

Florença”.

Fra Angelico procurou fazer duas coisas: um

discreto apostolado, mediante as pinturas que se-lhe encomendava; e uma adaptação

da tendência humanista reforçada pela

então recente técnica da perspectiva; a fim de que esta de adequasse à espiritualidade

tradicional. A perpectiva, de certa maneira, foi vista pelos humanistas como representando o domínio do homem sobre

o seu meio físico (ou algo assim).

O quadro O Juízo

universal http://neatnik2009.files.wordpress.com/2010/10/fra-angelico-the-day-of-

judgement.jpg : “A visão divina circundada pelos querubins e anjos, ladeada por Nossa Senhora e santos, irradiando uma luz

dourada, denota a concepção medieval, e a perspectiva dos túmulos vazios, orientada

quase verticalmente à semelhança de um campanário gótico, sugere o caminho do Céu. Mas o jogo da luz e da cor dá ideia clara

dos volumes, e tem-se a impressão de poder sentir o relevo se estendermos a mão

para tocar a superfície.”

Anunciação, de Cortona (Cortona é onde foi pintado, eu

acho) http://1.bp.blogspot.com/_ZYFOfcO01m8/TRB04GK_UgI/AAAAAAAAAJs/MH2xIWB

EkFA/s1600/annunciation-fra-

angelico+2.jpg : “[…] um retábulo [ retábulo: obra de arte de pedra ou madeira

esculpida, de encontro ao altar] onde o aproveitamento pa perspectiva é francamente renascentista. Adão e Eva são

vistos ao longe, expulsos do Éden, numa evocação simbólica bem entrosada com a

transparência luminosa dos trajes de Nossa Senhora e do anjo. A vibração do rosa e do

azul sugere a espiritualidade da cena, que transcende o tempo e mesmo o espaço

claramente circunscrito da tela”.

Imposição do Nome ao Batista http://www.backtoclassics.com/ima

ges/pics/fraangelico/fraangelico_thenamingofstjohnthebaptist.jpg : “[…] acentua-se […] o sentido luminoso da cor […] Se

Masaccio representava o volume dos objetos e dos personagens da da mesma

maneira tão

clara http://www.dezenovevinte.net/obras/ap_fc_arquivos/masaccio_tributo.jpg , Fra

Angélico não não escurecia os tons, mas sobrepunha cores bem diluídas, obtendo

sombras por meio de numerosas camadas

de tinta”.

Deposição http://www.casasantapia.com/i

mages/art/fraangelico/santatrinita/deposition640.jpg [achei muito bonita esta obra] : “[…] esse recurso, que já permitia uma

pintura discretamente luminosa, é alterado pela presença de tonalidades levemente

diferentes nas partes mais iluminadas, a fim de se acentuar o efeito de claridade […] à

primeira vista, poderia confundir-se com as obras da fase anterior, pelo formato vertical e pelo arco gótic da moldura. As finas listras

alaranjadas nas túnicas rubras e os tons pouco arroxeados nas vestes azuis

permitem uma leveza de volume e uma claridade geral, que não exclui a paisagem ao fundo e que se irradia como a graça

divina, dando assim à pintura um notável

sentido litúrgico”.

Fra Angélico infunde o espírito antigo nas coisas novas, representa o espírito de conservação; mas não só no sentido de um

mero receio de “ressaca” posterior às tentativas prometéicas de mudança. Fra

Angélico pretende a conservação da

verdade imutável que, de geração em geração, vai assumindo uma nova forma de

se representar. No fundo se trata da tensão entre o universal e o particular. Como os particulares, as coisas individuais, não

podem ser antevistas na sua totalidade, por serem muitos; de tempos em tempos, com a

mudança das circunstâncias, novas predicações, isto é, a atribuição de um

predicado antigo a uma coisa nova, confirmam a existência do predicado ou universal em questão. Atribuir um

predicado a uma coisa que não se pensava pusesse receber esse predicado, como

quando o professor Olavo atribui “cultura” [no sentido especificamente antropológico, e. g. antropológico sendo a qualificação do

termo “cultura”] ao comunismo; o nome dessa atribuição é “tese sinonímica”, ou

“tese sinonímia”. A tese sinonímica é uma

opinião que não é aceita por todos, mas é respeitável, por ser a opinião de um sábio.

Toda opinião é uma proposição, e toda proposição é uma predicação, porque na

proposição “comunismo é uma cultura” há

o predicado (cultura), e o “predicando”

(comunismo) [ainda não sei se “sujeito”, em lógica, é tudo quanto, desde uma

abordagem, recebe um predicado].

Fra Angélico atribuiu um predicado antigo dentro da nova técnica da pintura, a

perspectiva. De certo modo atribuiu o predicado “obra devota” a um objeto que

ninguém supunha fosse marcadamente admitir esse predicado, no caso o objeto é

“pintura que utiliza a perspectiva, imbuída de perspectiva”. O universal “predicação angelicana”, pode ser considerado um

sinônimo de “tese sinonímica”. Mas nem toda tese sinonímica, a rigor, vem de um

sábio filósofo. Pode vir de um pintor, de um gênio em qualquer arte. Ademais há uma coisa curiosa que me ocorre. Admitir algo

no espírito, admitir verdades que não se conhecia, é um ato de humildade, e vice-

versa, todo ato de humildade implica

admitir verdades, já que o humilde por definição está diante do que o abarca e do

que apreende. Toda ação boa é humilde, entre outros motivos, para se usar aqui um

pouco de retórica, porque é um ato

obediente ao Criador, e a obediência implica humildade. A humildade implica

uma tese sinonímica, porque o humilde é obrigado a predicar do que há pouco não antevia, mas sempre o abarcava, um

predicado antigo; nisso, pelo predicado, separando os seres novos que se lhe

apresentam conforme os já referidos predicados antigos. Portanto, toda´boa

ação parecer ser uma tese sinonímica, porque ao empreendê-la se está sendo humilde, e ao se ser humilde se está se

imbuindo no intelecto de uma tese sinonímica; e portanto toda boa ação tem

algo de paradoxal, por ser uma tese

sinonímica.

No livro Crime e Castigo Dostoiévski traça o

perfil de um socialista, “agregado” sustentado pelo advogado noivo da irmã de

Raskolnikov. Esse socialista não acredita na

esmola, crê que esmola é um mecanismo que avilta a sociedade, ou coisa assim. Isso

é uma tese sinonímica aceita por ele, se se considerar que ele não atribui o predicado

“caridade” ao gesto da esmola; é uma tese

sinonímica não porque “justiça” e “esmola” aceitam uma definição diferente, pelo

contrário. Eu chamo de tese sinonímica não a negação de um sinônimo socialmente aceito, mas a proposição positiva

[paradoxal] de que uma coisa admite um predicado, quando não admite. Lembrando,

o homônimo é a relação entre termos que não admitem a mesma definição. A tese

dele é sinonímica porque ele crê que a verdadeira caridade é “não dar esmola”, para avançar o socialismo etc. (eu não

lembro as ideias do personagem tão bem, por isso peço desculpas por qualquer

imprecisão). Por outro lado, quando esse personagem socialista, esqueci o nome do cara, vê a Sonia Siemionovna sendo

enganada pelo seu protetor, e acusada injustamente, embora ele não concorde

com a esmola que ela recebera do

acusador, ele não concordou com o acusador haver dado a esmola para acusá-

la, pondo dinheiro a mais despercebidamente, de tê-lo roubado.

Assim, contra o próprio interesse financeiro,

e despreocupadamente, acusa o seu

benfeitor de ter forjado uma fraude diante de um grupo numeroso. Esse caso ilustra a

opinião a que eu pareci chegar, de que a boa ação é sempre algum paradoxo. O fato de Dostoiévski estar ciente disso é muito

interessante, e aliás é um traço marcante dele, isso.

Revisão

Foi explicado anteriormente o que é uma relação positiva entre termos, e o que é uma relação negativa. A relação positiva

configura uma proposição afirmativa, que em Da Interpretação se confunde com a

declaração afirmativa. O mesmo com a relação negativa entre dois termos, se é uma relação negativa entre ambos, se trata

de uma proposição negativa, e de uma declaração negativa. Por exemplo, “Pedro é

mau” e “Pedro não é mau”, o termo “mau”

sendo predicado de Pedro positiva (primeiro caso) ou negativamente (segundo

caso).

Também foi explicado o que é uma relação

particular entre termos (“alguns homens são maus”), e que ela pode ser negativa

(“alguns homens não são maus”) ou positiva (“alguns homens são maus”). A relação universal entre termos é a que, no

jargão do filósofo, é tomada universalmente, isso querendo dizer que

não há nada do universo do sujeito que não aceite o predicado. Por exemplo, se todo

homem é mau, não há nenhum homem, Pedro por exemplo, que não se possa dizer que é mau. Aqui também há a possibilidade

de uma relação positiva (“Todo homem é mau”) e negativa (“nenhum homem é

mau”). Três tipos de relação entre termos 1) As proposições podem, no seu conteúdo

intrínseco, estabelecer que um predicado pertence a um sujeito. Ex: “Pedro é bom”.

Nesse caso se diz que o predicado “bom”

pertence ao sujeito “Pedro”. Eu vou repetir: As proposições podem, no seu conteúdo

intrínseco, estabelecer que um predicado pertence a um sujeito. Ex: “Pedro é bom”.

Nesse caso se diz que o predicado “bom”

pertence ao sujeito “Pedro”. 2) As proposições podem, no seu conteúdo

intrínseco, estabelecer que um predicado necessariamente pertence a um sujeito. Ex: “O homem necessariamente é mortal”.

Nesse caso se diz que o predicado, no caso “mortal” (se com isso se quer dizer que o

sujeito acabará por morrer), necessariamente pertence ao sujeito.

3) Há proposições que afirmam, no seu conteúdo intrínseco, que um predicado pode pertencer a um sujeito. Entretanto,

nesse caso, o sentido do “ser possível”, podendo significar o necessário e o

meramente possível ao mesmo tempo, dá a esse tipo de proposição uma complexidade maior, que o filósofo promete desbravar

satisfatoriamente, mais adiante, nas Primeiras Analíticas. Por enquanto eu vou

lidar com as proposições de número 1) e 2).

A diferença entre as proposições 1) e 2) é sutil. Aquilo que é necessariamente

predicável em um sujeito, o pode ser em sentido forçoso e menos forçoso. No

primeiro caso a proposição que usa o

“necessariamente” é mais literal, me

parece, e mais apropriada. Dizer que 2 + 2 = 4 é razoável. Dizer, mais ou menos como

Chesterton, que não importa quanto tempo passe, George Bernard Shaw não mudará suas convicções, não impõe a mesma

segurança. Dois mais dois é necessariamente quatro. É certo que

Bernard Shaw não vai mudar de opinião, embora se possa dizer que ele

necessariamente não vai fazê-lo apenas como figura de linguagem. Isso quer dizer que o necessário é algo que se apreendeu

como necessário (forçoso). Os quatro discurso lidam com isso, os níveis de

credibilidade, etc. Se pode dizer, sem aplicar o “necessariamente” –caso 2) –, por outro lado, que Bernard Shaw não mudará

de opinião, e que dois mais dois é igual a quatro.

De como cheguei neste ponto

Agora eu vou cometer o pedantismo de começar a explicar o que é a dedução em

geral, à luz das Primeiras Analíticas. Mas antes eu quero explicar porque estou

entrando nessas questões lógicas. É que eu

quero diferenciar, o mais claramente que eu

puder, a dedução em geral da dedução demonstrativa, e estas da dedução

dialética. Toda demonstração é uma dedução, mas nem toda dedução é uma demonstração. A dedução demonstrativa se

baseia nos princípios que se chama “auto-evidentes”, a dedução dialética se baseia

nas premissas que se tira das opiniões respeitáveis.

A demonstração é certa como dois e dois são quatro, a dialética é certa como Bernard

Shaw não mudará de opinião. Eu ainda não entendo essas diferenças, a não ser pela

brevíssima explicação que está no começo dos Tópicos. Eu quero estabelecer essas diferenças para melhor compreender a

matéria dos Tópicos e da Retórica. Estou de olho na dialética e na Retórica, e é a elas

que realmente quero me dedicar, tudo mais

é instrumento. Só que isso parece estar fugindo do meu controle, por causa das

dúvidas que aparecem. Estou habituado, no entanto.

Introdução à dedução em geral

Imagine uma relação afirmativa entre dois termos, “bom” e “virtude”. O predicado é “bom”, porque se diz que a virtude é boa.

Por outro lado, a paciência é uma virtude. Temos três termos, “bom”, “virtude” e

“paciência”. A “bom” damos o nome de A, a “virtude” damos o nome de “B”, a

“paciência” damos o nome de C. O termo B (virtude), está em A (bom) como

um todo, porque não há virtude que não se pode julgar seja boa. O termo C (paciência)

está em B (virtude) como um todo, a não ser que você esteja falando do jogo de baralho chamado paciência, ou de paciência em um

sentido mórbido, pejorativo (uma paciência indevida com o que é mal, por exemplo) etc.

O termo B (virtude) é chamado termo médio, e ele é chamado assim porque está

entre os dois termos que sobraram, na posição espacial com que se enuncia a

dedução, mas também porque ele está em

A (bom) como um todo, e C (paciência) está

nele como um todo. Se o que você chama termo médio não está em em algum termo

como um todo, e não tem ao mesmo tempo algum termo contido em si como um todo, não se trata do termo médio.

Os extremos, os termos que se diz são os

termos extremos, eles são A (bom) e C (paciência). Para ajudar a reconhecer um

extremo, pense assim: ele se parece com o termo médio (está contido em um termo e contém outro ao mesmo tempo)? Se não se

parece, é porque ele não é um termo médio, mas um extremo. O que torna o termo

médio o que ele é, é o caráter que ele assume em relação aos outros dois termos considerados. Por exemplo, no caso que eu

dei, virtude é o termo médio. Mas se ele for colado a outros termos deixa de sê-lo.

Considere outros termos. O termo A é virtude, o termo B é paciência, o termo C é o

particular “paciência de Jó”. Aqui virtude não é mais o termo médio, mas um dos

extremos, por exemplo é um indicativo

disso o fato de não ser contida por nenhum

termo, mas conter todos. A “paciência de jó” é uma virtude, mas nem tudo que é

virtude é “paciência de Jó”. Virtude contém “paciência de Jó”. A mesma coisa com a paciência em geral, o termo B do caso (nem

toda virtude é paciência, seja a de Jó, seja em sentido geral de paciência). virtude

contém paciência (paciência é o termo B do caso). Virtude, que é A, contém B e C, mas

não é contida por nenhuma destes, e portanto não é o termo médio.

Voltemos aos termos A (bom), B (virtude) e C (paciência). Se eu predico A [bom] de todo

B [virtude] (isto é, se eu predico A [bom] universalmente de B [virtude]), eu digo com isso que toda virtude é boa. Se eu predico B

[virtude] de todo C [paciência], eu digo com isso que toda paciência é uma virtude. Se

tudo que é virtude é bom, e tudo que é

paciência é virtude, então — e aí está uma dedução necessária — toda paciência é boa.

Se A [bom] pertence a todo B [virtude] , e B [virtude] a todo C [paciência], A [bom]

pertence a todo C [paciência]. Se A se

predica de todo B, e B se predica de todo C,

A se predica de todo C.

Agora vou formular outros termos. como nenhuma virtude é ruim, os termos que vou formular agora são: ruim é A, B é virtude, C é

paciência. Aqui também há dedução, mas se dá por uma relação negativa entre

termos. Se nenhuma virtude é ruim, e toda paciência é virtude, então nenhuma

paciência é ruim. Se A [ruim] não pertence a nenhum B [virtude], e B [virtude] pertence a todo C [paciência], A [ruim] não pertence a

nenhum C [paciência]. Se A se predica de nenhum B, e B se predica de todo C, A não

se predica de nenhum C. E por assim vai. Há outras muitas relações

analisáveis entre termos, cada página das Primeiras Analíticas dá um romance

de Dostoiévski. Eu continuo depois.

Nota de esclarecimento sobre a

proposição indefinida

Só queria notar, de passagem, que receio

ter cometido um erro a respeito da proposição indefinida. Esta é uma das três

categorias de proposição, quanto à medida de um termo conter o outro. Eu quero dizer que há as proposições universais, as

particulares, as indefinidas. A indefinida se define por não esclarecer se se trata de uma

proposição universal ou não.

O exemplo do filósofo é “o prazer não é bom”, também podia ser “o prazer é bom”, porque esses três tipos de proposição,

particular, universal, indefinida, não se definem por serem afirmações ou negações,

me parece. A indefinida, se é assim como acabo de dizer, não pode ser verificada na proposição “Pedro é bom”, como eu

pensara. Isso porque não resta dúvida nessa proposição. Mas se eu digo “o prazer é

bom”, não há aqui uma afirmação taxativa

de que haveriam ou não exceções, seja “todo o prazer é bom” (universal), seja

“alguns prazeres são bons” (particular). Se eu conseguir esclarecer melhor o ponto,

volto a ele.

Qualificação

Tudo em função de que um objeto se altera

é uma qualificação, mas nem tudo que é qualificação pode ser alterado em um

objeto.

Suponha a qualificação “quentura”. Meu corpo pode estar quente ou frio. Assim, a

qualificação se altera no objeto. Suponha a qualificação “dialética” para o

termo “dedução”. Se tenho uma dedução dialética, não é verdade que ela possa se alterar, se tornando por exemplo uma

dedução demonstrativa. Porque a dedução demonstrativa é por definição

baseada nos princípios auto-evidentes, enquanto a dedução dialética é baseada nas opiniões respeitáveis. Uma dedução

respeitável nunca será tão certa e necessária quanto a dedução auto-

evidente, e portanto permanecerá sempre dentro do campo da probabilidade. Por outro lado, faz parte das proposições

dialéticas, isto é, das opiniões respeitáveis, as opiniões extraídas das ciências

particulares (por exemplo, da geometria).

Se eu uso na dedução dialética a proposição de que a diagonal do quadrado

é incomensurável com o seu lado, a dedução adquirida dessa proposição é meramente provável; isso acontece, por

assim dizer, desde a ordem do conhecer, porque essa proposição vinda da geometria

não é meramente provável em si mesma, já que ela pode ser verificada e explicada

minuciosamente, por meio de um discurso científico; a proposição científica se torna dialética porque eu a amputo do corpo

sistêmico de origem e a insiro em um discurso que se articula para fora da lógica,

no reino dialético, que é o reino da probabilidade. Assim ocorre, como o professor Olavo mesmo comentou aulas

atrás, com os estudiosos que fazem crítica cultural. Dizer que o comentário no Jardim

das Aflições sobre Cantor é uma refutação,

se entendi bem, é algo inexato justamente porque não se tratou de verificar a

coerência lógica da tese de cantor, mas de tomar o contexto cultural no qual aquela

tese se inseriu como proposições dialéticas

a fim de assinalar a razoabilidade, ou

probabilidade, de Cantor haver figurado como um reflexo de uma série da

acontecimentos históricos. Se eu não estiver enganado, a “refutação” de Cantor ali realizada, é um ponto de um longo

discurso dialético que possuía coerência do princípio ao fim, mas não era uma coerência

marcadamente lógica, e sim uma coerência marcadamente dialética.

Isso significa que uma dedução pode se tornar dialética ou lógica, pode se alterar, ao menos se vier de um discurso científico,

a depender das outras premissas com as quais se cola (porque podem ser essas

premissas proposições dialéticas ou auto-evidentes)? Não sei dizer.

Apanho feio, passo vergonha, aqui. Mas é certo que algumas qualidades não

podem se alterar, num objeto. Por exemplo,

se se considerar “homem” ou “humanidade”, como o fazia Aristóteles,

uma certa qualificação, por seu caráter de substância secundária (isto é, o fato de a

espécie se tratar de um universal e não de

um indivíduo), a verdade é que essa

substância não pode se alterar. O homem não deixa de ser homem, mas ele pode

deixar de estar quente. Qualificação ainda, em relação às

quantidade discretas

Foi dito, sobre a categoria da quantidade,

que as quantidades discretas (a saber número e linguagem) se apresentam como aquele tipo de predicado que se diz de um

objeto, mas não está em nenhum objeto. Por exemplo, homem se diz de um objeto

(por exemplo Pedro), mas não está em nenhum objeto. À quantidade isso se aplica assim: Você vê que há apenas cinco pessoas

na sala de espera do dentista. Você pergunta ao dentista “qual daqueles cinco o

senhor vai atender agora?”. Você chamou as

pessoas de cinco, predicou por meio de uma quantidade discreta, de um número.

Como não se pode dizer que “cinco” está nelas, os números se diz de objetos, ou de

um objeto, mas não estão em nenhum

objeto. A mesma coisa se dá com a outra

quantidade discreta, a linguagem, você diz que tal verso é uma redondilha menor (eu

nem me lembro o que é uma redondilha menor), de forma que você atribui uma quantidade ou forma determinada ao

objeto, e o predicado usado (isto é, redondilha menor) não está em nenhum

objeto. Estar em um objeto é ser reconhecível no objeto, mas não como

parte (por exemplo a cor branca é reconhecível no caucasiano, e não é exatamente uma parte dele, como os seus

cabelos, ou sua mão).

É possível confundir, como suponho, um número com uma qualidade, se o número for tomado no sentido de uma qualidade.

Por exemplo, a quaternalidade da natureza (como quando se acreditava que havia

quatro elementos principais na natureza:

Fogo, água, terra, ar). A filosofia de Mario Ferreira dos Santos, embora seja

tremendamente embaraçoso falar sobre ela desde a minha pequenez, me parece tomar

os números mais no sentido de uma

qualidade. Assim, quando ele emprega

termos numéricos, esses predicados se diz de objetos e, ao contrário dos números

discretos tais quais exponho, eles também estão no objeto, como aspectos seus, não como partes (por serem qualidades, já que

é próprio da qualidade estar no objeto). “Dual”, ou dois no sentido de dual, é

qualificação. A característica da qualificação é ser uma característica, e

portanto algo que esclarece um objeto. Se eu digo que há cinco pessoas na sala de espera, aí já é um número discreto no

sentido mais quantitativo, e esse predicado, “cinco”, por si mesmo não vai esclarecer

muito o objeto, mas vai parecer bem claro em si mesmo.

O número no sentido de uma qualidade só esclarece bem um objeto se você inserir

uma segunda ou terceira qualificação, me

parece (por exemplo atribuindo a unidade de um objeto, digamos um país, à sua

centralidade, e portanto à sua virtude ou vontade de sobreviver). No caso da

quantidade como número no sentido mais

quantitativo, o seu caráter é mais claro e

independente do objeto para ser compreendido. No caso do número

enfatizado pela qualidade, se trata de um predicado que precisa de outras qualificações para ser compreendido,

sobretudo precisa da substância, seja uma substância primária (Pedro) ou secundária

(Inglaterra).

Ambiguidade quantidade-qualidade nas formas geométricas e corpos

Essa mesma ambiguidade entre o número e a qualidade, isto é, essa mesma dualidade,

existe com as formas geométricas. As formas como linhas, superfícies e corpos, junto ao tempo e ao espaço, formam as

quantidades contínuas (como um tipo separado das quantidades discretas).

Suponha uma linha; se pode dizê-la do

segmento de reta hipotético A-B. “Linha”, aí, é uma quantidade contínua, e um

predicado. Neste sentido, a verdade é que “linha” se enquadra naquele tipo de coisas

que você diz de um objeto, mas não está em

nenhum objeto. No entanto, se pode dizer

de um artigo de jornal que ele é bem linear, querendo-se dizer com isso que o colunista

vai direto ao assunto. “Linearidade” é uma qualificação aplicada ao objeto, está no objeto, e portanto é uma qualidade;

linearidade se diz do objeto e está no objeto. Mas a qualificação, aqui,

provavelmente só será extraída do predicado “linha”, e não dos objetos mais

particulares que admitem o predicado “linha”. Porque não se pode extrair com facilidade uma qualificação de “segmento

de reta A-B”.

Assim, o número de predicados que podem se tornar qualificações extraíveis das quantidades contínuas, pelo menos em um

primeiro momento, é menor que a quantidade de predicados das quantidades

discretas. A qualificação

“quadrilateralidade”, “circularidade”, “esfericidade”, se aplicam a predicados

advindos de superfícies ou formas tridimensionais (me parece que as formas

tridimensionais são o que o filósofo chama

de corpos, ao menos no contexto presente).

Categoria dos termos relativos Os termos relativos são aqueles termos que

existem simultaneamente. A categoria da relação (ou termo relativo) é um predicado

que se aplica a um termo que existe simultaneamente, e por natureza liado, a

outro termo. É o caso dos termos “rico” e “riqueza”. Não há rico sem riqueza, não há riqueza sem rico (porque a qualificação

aplicável à riqueza no sentido da riqueza que torna um homem rico, não é a mesma

qualificação aplicável à riqueza no sentido da mera abundância de um elemento — como quando se diz que uma terra é rica em

minerais). Outra característica do termo relativo é que ele se diz “de” outro termo,

ou “que” outro termo; porque se diz que o

menor é menor que o maior (a árvore X é maior que a árvore Y, sendo que por isso a

árvore Y admite o predicado “menor”); também se pode referir à riqueza do Conde

de Montecristo (porque se se diz que a

riqueza é dele, isso o torna rico; assim um

termo relativo é referido a outro por meio do termo “de”, “a riqueza do que é rico”).

O termo relativo, quando é predicado de um objeto, por exemplo quando se diz de

uma montanha que é maior do que outra (“maior” sendo predicado da primeira), faz

reconhecer nele que o relativo é simultaneamente uma qualificação,

sobretudo se não é um termo particular (ou seja, sobretudo se é “rico” em vez de “Conde de Montecristo”); porque se está

atribuindo uma qualidade à primeira montanha, se está esclarecendo uma

característica sua. Ainda que não exista um termo para referir

essa qualidade, se pode falar do caráter do que é maior do que outro, e todo caráter de

um objeto é qualificação (porque a

qualificação é sinônimo de característica). Sem falar que riqueza é uma qualificação,

além de um relativo, porque ela pode alterar no objeto, o rico pode ficar pobre, e

é uma característica de uma parcela das

qualificações se poderem alterar no objeto.

Por sinal, me parece que o único tipo de objeto no qual a qualificação pode se

alterar é a substância primária (por exemplo, Pedro), embora eu talvez tenha de abordar o assunto mais minuciosamente

adiante.

Sujeito na lógica

Para tirar minhas preocupações a esse

respeito, vou citar o verbete do Ferrater Mora a respeito do “sujeito”. Eu não terminei de citar o verbete sobre a ideia, e

creio que isso deva ficar para uma ocasião

de mais fôlego.

Diz o Ferrater Mora:

“1) Do ponto de vista lógico, aquilo de que se afirma ou nega algo. O sujeito chama-se

então conceito-sujeito e refere-se a um objecto que é, [aqui se interrompe o

período. Período é: [Gramática] Frase composta de vários membros cuja reunião forma um sentido completo e

independente.] 2) do ponto de vista

ontológico, o objecto-sujeito. Este objecto-sujeito é chamado também, com frequência

objeto, pois constitui tudo o que pode ser sujeito a um juízo. As confusões habituais entre sujeito e objeto, os equívocos a que

tem dado lugar o emprego destes termos, podem ser eliminados mediante a

compreensão de que ontologicamente todo o objecto pode ser sujeito de juízo, quer

dizer, mediante a advertência de que sujeito e objecto podem designar dois aspectos do objecto-sujeito. Com efeito, este último

pode não ser exclusivamente a primeira substância (v.), o ser individual, mas pode

ser qualquer das realidades classificadas pela teoria do objecto: um ser real, um ser ideal, uma entidade metafísica, um valor. 3)

Do ponto de vista gnoseológico, é o sujeito cognoscente, o que é definido como sujeito

para um objeto em virtude da correlação

sujeito objeto que se dá em todo fenômeno do conhecimento e que, sem negar a sua

mútua autonomia, torna impossível a exclusão de um dos elementos. 4) Do ponto

de vista psicológico, o sujeito psicofísico,

confundido [o termo “confundido” aqui não

tem claramente a conotação de erro, mas de uma prática, segundo me parece] às

vezes com o gnoseológico quando o plano transcendental em que se desenvolve o conhecimento foi reduzido ao plano

psicológico e até biológico. Poderia acrescentar-se a essas acepções de ‘sujeito’

5) o sujeito gramatical, diferente do conceito sujeito, o qual é exclusivamente

lógico e não gramatical, gnosiológico ou

ontológico.

Deve diferenciar-se assim o sentido em que

o termo é empregado e em particular deve distinguir-se entre as acepções lógica,

gnoseológica e ontológica, que são confundidas com grande frequência. Talvez o emprego das expressões ‘conceito-

sujeito’, ‘objeto-sujeito’ e ‘sujeito cognoscente’ pudessem evitar alguns

equívocos atrás citados.”

Portanto, segundo o verbete, o termo “sujeito” em lógica é parecido com o termo

“sujeito” no sentido ontológico. Nos dois casos se trata de tudo que pode ser

marcado pelo ferro quente do predicado; no

sentido lógico é um termo sob o aspecto de haver recebido um predicado, como

quando “Pedro” recebe o predicado “bom”. No sentido ontológico mais ou menos a mesma coisa, com a diferença de não se

tratar de um puro conteúdo significativo, segundo me parece, mas de uma atribuição

adequada, como quando se vê que Pedro é

de fato bom.

O sentido gnoseológico é o mais destacado em discursos filosóficos, segundo imagino. Sujeito, aqui, é aquele que apreende um

objeto, este (o objeto) sendo um sujeito no sentido anterior, pelo simples fato de que se

chama objeto (“objeto” é um predicado, e receber um predicado é ser um sujeito no sentido lógico, e no sentido ontológico, mas

não no sentido gnoseológico). O sentido psicológico é parecido com o anterior, isto

é, com o sentido gnoseológico, mas aqui

sujeito é aquele que apreende um objeto, talvez, apenas do ponto de vista mental, e

aqui eu deixo esse sentido, por não saber

como continuar.

O sentido gramatical de sujeito foi

abordado pelo Napoleão Mendes, e por ele

ter feito isso muito bem, vou citá-lo:

“Vamos ver o que vem a ser sujeito de uma oração [oração em Gramática = Proposição.]: Sabemos ser verbo toda

palavra que indica ação. Quem escreve, quem desenha, quem pinta, quem anda,

quem quebra, quem olha, quem abre, quem fecha pratica ações diversas: ação de

escrever, ação de desenhar, ação de pintar etc., ações expressas por palavras que se

denominam verbos.

Ora, sabemos todos que é impossível uma ação sem causa; se uma xícara, por

exemplo, aparece quebrada, alguém deverá ter praticado a ação de quebrar; ou uma pessoa, ou um animal, ou uma coisa

qualquer, como o vento, quebrou a xícara. Pois bem, essa pessoa ou coisa que praticou

a ação de quebrar é em gramática chamada

sujeito (ou agente) da ação verbal.”

É preciso, portanto, que algo pratique uma

ação para ser um sujeito, em gramática.

Isso aproxima este sentido de sujeito do

sentido gnoseológico e psicológico, porque se estes dois tipos apreendem um objeto,

esta ação mesma foi suficiente para merecerem o nome de sujeito. Em gramática o sujeito não precisa ter alma, ou

intenção, ou conhecer coisa alguma, já que o vento pode ser um sujeito. Em

gnoseologia e psicologia, a única ação, em última instância, que torna um sujeito

sujeito é a ação de conhecer. No sentido lógico o sujeito também não necessita ter intenção para ser sujeito, ou conhecer algo,

ele só precisa receber um predicado, como

“Pedro” recebe o predicado “bom”.

Latim – nominativo

Numa oração, diz o Napoleão Mendes, nós

podemos encontrar seis elementos

1) o sujeito

2) o vocativo

3) o adjunto adnomial restritivo 4) o objeto indireto 5) o adjunto adverbial

6) o objeto direto

O que se chama “caso”, em latim, é a

maneira de escrever a palavra em latim de acordo com a função, dessas seis listadas,

que a palavra exerce na oração. Se a palavra é um sujeito no sentido gramatical (“Pedro” de “Pedro quebrou o jarro”), ela é traduzida

ao latim para caso nominativo. O que é sujeito em português em latim vai para o

nominativo: “Os casos se distinguem pela terminação. Assim como em português a

mesma palavra tem terminação diferente para indicar o plural e o feminino (flexão de número e flexão de gênero), em latim a

mesma palavra tem terminação diferente para indicar a função que exerce na oração

(flexão de caso).”

É claro que o Napoleão Mendes toma as suas precauções para esse estudo parecer

mais simples, nesse começo do livro. No

entanto, é bem claro.

Gramática Metódica

“O conjunto de palavras próprias de um

povo chama-se língua ou idioma”.

“Pode a língua ser viva, morta e extinta”.

“Língua viva é a atualmente falada por um povo ou tribo. Assim, são línguas vivas o

português, o francês, o italiano etc.”.

“Chama-se língua morta a que já não é

usada por nenhum povo ou tribo, mas

sobrevive em documentos […]”.

“Língua extinta diz-se a que não é falada

nem deixou provas de sua existência. Tal é a língua dos etruscos, a dos celtas e a dos

primitivos habitantes da terra. Sabemos que tais línguas existiram porque alguma

língua devem ter falado esses povos.”

“A palavra, como representação material, isto é, como som ou aparência gráfica,

chama-se vocábulo. Como índice da ideia que ela encerra, chama-se termo. Por isso é que se diz: ‘Falar em bom termo’ e não:

‘Falar em bom vocábulo’, da mesma maneira que não se diz: ‘Pronunciar bem

um termo’, mas: ‘Pronunciar bem um

vocábulo’ (ou palavra).”

“A reunião de vocábulos forma o

vocabulário; quando dispostos os vocábulos em ordem alfabética e

acompanhados de suas significações, tal reunião é denominada dicionário ou

léxico”.

“[…] a reunião dos termos […] forma a frase ou locução [portanto frase é sinônimo de

locução, veja-se], que virá a ser a expressão do pensamento. A frase constitui, pois, o

elemento fundamental da linguagem.

O livro de Pedro — Os grandes olhos de Maria — são frases, porquanto constituem

reunião de termos ou ideias, sem nada

afirmar ou negar.

Se a frase encerrar uma declaração, isto é, se afirma ou nega alguma coisa, ela passará a chamar-se proposição, oração ou

sentença. Ex.s: O livro de Pedro é grande —

Os grandes olhos de Maria fecharam-se”.

Aqui Napoleão Mendes chama de frase aquilo que Aristóteles chama de sentença (embora em certas ocasiões Aristóteles use

o termo “frase” em sentido similar), isto é,

uma reunião de palavras que não necessariamente é uma declaração

(afirmação ou negação). Ele, depois chama de sentença a própria declaração, como se fossem sinônimos. Para Aristóteles não são

sinônimos. A reunião de palavras para o filósofo é uma sentença, e nem toda

sentença é uma declaração.

Tópicos O texto dos Tópicos usa a expressão

“maneiras em que um termo é usado”, no sentido de que que “frio”, por exemplo, é

usado tanto na sentença “ele foi frio comigo” quanto na sentença “o chá está frio”. Entretanto, segundo ouvi, o termo

“termo”, em lógica, é sempre unívoco e por isso não pode ter mais de um sentido ou

emprego. Significa, ainda pelo que ouvi,

que termo nas analíticas é homônimo, e não sinônimo, de “termo” nos Tópicos.

Isso faz sentido, sob o seguinte aspecto: Na dialética você tem que reunir proposições

(segundo Aristóteles reunir ou adquirir

proposições é a própria substância da

dialética), na lógica ou analítica se tem em vista a demonstração. Reunir

demonstrações, se bem entendo, é o mesmo que reunir deduções; já a reunião de opiniões respeitáveis não é a reunião de

deduções no mesmo sentido. Na demonstração se trata da dedução legada

por termos unívocos; na atividade dialética se trata das proposições legadas por termos

não-unívocos. É impossível deduzir linearmente, parece, quando os termos usados para falar do objeto ainda não são

unívocos (e isso indica que ainda não se observou o objeto sob todos os aspectos). É

claro que estou sendo pedante e indo além das chinelas, mas preciso continuar.

É possível reunir proposições a respeito de um objeto e através dessas proposições

extrair, das semelhanças, um universal

desse objeto, e do universal extraído a impossibilidade de atribuí-lo a um objeto

que recebe o mesmo predicado dos objetos que recebem o universal extraído.

É simples. Por exemplo, existem três

proposições a respeito do objeto “frieza, 1) “Fica frio, cara” 2) “o chá está frio” 3) “ele

entrou numa fria”. Se pode extrair um universal, pela semelhança, entre 1) 2 2). Se eu peço ao cara que fique frio, estou

pedindo que não agite seus sentimentos; se o chá não está frio a matéria está não-

agitada.

O universal “não-agitado” se aplica aos casos 1) e 2), embora no caso 1) seja uma agitação de sentimentos, e no caso 2) uma

não-agitação da matéria. O universal “não-agitado” não se aplica a

frio da sentença “ele entrou numa fria”, pelo contrário, já que “fria”, no caso, pode ter a conotação de situação agitada ou

tumultuosa. A reunião de proposições, que se pode chamar de dialética, tem como

função justamente separar os empregos

dos termos, e no caso acima isso se deu pela extração de um universal, a

discriminação do sentido específico que a atribuíção dele pode ter para os objetos;

por fim se deu pela verificação da

impossibilidade de predicar o universal

para o caso 3).

Se pode ir adiante e levantar a proposição de que “ele entrou numa fria” significa, em certo sentido, estar padecendo de uma

excessiva palidez por causa de stress. E portanto estar com o coração bombeando

pouco, e a temperatura do corpo diminuindo. Entrar numa fria, por causa

desta proposição acrescentada, implica o poder receber o predicado “não-agitação”. Entrar numa fria passa a adquirir dois

sentidos diferentes, entrar em situação tumultuosa ou estressante, ou

simplesmente receber um choque que empalidece devido a uma tal situação. São sentidos homônimos, porque não têm a

mesma definição. Para derrubar definições, no caso discriminar uma definição nova

para um termo, basta evocar semelhanças e

diferenças.

O discurso lógico manipula e predica universais. O dialético também. Mas por

enquanto me parece que o discurso lógico

não pode extrair universais através de

termos materialmente idênticos, aliás me parece que a lógica não pode extrair

universais de maneira alguma. A lógica não pode, ao que parece, esclarecer um objeto por meio da contradição, como no caso

acima.

O discurso dialético faz conscientizar-se os sentidos possíveis do emprego de um

termo, e de certo modo ele gera termos. O discurso lógico, até onde pude ver, e vi bem pouco, não gera sentidos possíveis de um

termo (embora eu suspeite que nas Analíticas Posteriores, do Aristóteles, não

seja bem assim). O discurso dialético, aparentemente, não

apenas reúne proposições; ele permite que se reúna proposições; portanto, é um

discurso que depende da catalogação das

opiniões respeitáveis, de um lado, e de um número de técnicas que fermentam, ou

catalizam, o confronto das opiniões respeitáveis. Essas técnicas são em maior

número, me parece, do que eu pude ilustrar

no exemplo.

Levando em conta a distinção que o Napoleão Mendes faz entre vocábulo e termo, se pode dizer que a dialética

discrimina o número de termos que um vocábulo pode assumir, sendo “termo”,

aqui, aquilo que possui um sentido unívoco.

Sujeito Sujeito, na lógica, é aquilo que pode

receber um predicado. Em ontologia é um ser enquanto

relacionado a algum universal que é a ele atribuído. Pelo menos é o que eu acho. No sentido gnoseológico, de acordo com a

filosofia do Prof. Olavo, não é necessário um sujeito ser dotado de alma ou

intencionalidade para conhecer. Ser sujeito,

aí, é simplesmente receber alguma informação sob qualquer modalidade que

seja. Por exemplo, uma Pedra recebe informações do vento, quando o vento o

empurra. É possível que eu esteja

cometendo algum erro nesse ponto.

Feuerstein Segundo Feuerstein, os três critérios

básicos para uma mediação de aprendizagem são 1) a “intencionalidade” e

reciprocidade 2) a significação 3) a transcendência.

Na primeira você aborda o objeto, chamando e recebendo a atenção; por

exemplo, quando alguém faz um trocadilho para introduzir um assunto: “Eu tenho duas

notícias, uma boa e uma má”. É preciso chamar a atenção, é preciso qualificar o objeto, abordá-lo desde algum ângulo

propício ao interlocutor. Por exemplo, se você está ensinando filosofia a alguém, uma

boa intermediação da intencionalidade e

reciprocidade seria começar a aula com a pergunta “você se considera sábio?”. Isso é

claro, sobretudo porque todas as pessoas gostam de procurar se identificar em

alguma tipologia. Ou então você pode dizer:

“Platão, um dos maiores filósofos,

considerou a filosofia uma loucura”; “ocorrerá ao interlocutor, provavelmente,

perguntar “em que sentido?”, e a atenção dele estará ganha, o assunto abordado, isto é, tocado desde a borda.

Na segunda se trata de um esforço

axiológico (“axio” vem de “tesouro”, ou “coisa preciosa”, “importante”, segundo

ouvi); um esforço por atribuir algum bem moral ou cívico, principalmente estes, ao conteúdo do que é ensinado.

Principalmente estes, eu repito. Por exemplo, quando se diz a alguém, “dê

orgulho aos seus pais, estude”. Eu posso fazer o mesmo com o leitor: prepare-se para os tremendos desafios de hoje e do futuro

próximo, estude Aristóteles para se orientar a si e aos outros, nossos pobres

semelhantes, na barafunda da cultural atual

no Brasil e no mundo. Eu estou tentando, embora apanhe muito.

O terceiro critério, da transcendência,

consiste apenas em, mais ou menos

claramente, tornar o mediado ciente de um

universal. Por exemplo, quando se diz “fica frio’ e “o chá está frio”, sucessivamente, e

querendo denotar a repetição do termo. A pessoa vai pegar o universal “não-agitação”, e a diferença dos objetos que ele

predica, sentimento num caso, matéria num outro caso.

Substância primária e secundária

Eu me pergunto: o que é a substância secundária? “Homem” é substância secundária, porque se diz da substância

primária, sendo ao mesmo tempo uma expressão universal desta última. Já o

termo “sociedade” é uma substância secundária? “Sociedade” se diz de uma substância primária? Se diz de “Inglaterra”;

mas “Inglaterra” se diz de uma substância primária? É ela própria uma substância

primária? Foi definido substância primária pela

conjunção de forma e matéria (Himalaia), e substância secundária pela imagem ou

ideia universal que se pode atribuir à

conjunção de forma e matéria (montanha).

Que se suponha dois critérios para estabelecer se um termo é uma substância secundária. O primeiro seria conferir se se

trata de um universal (aquilo que se diz das coisas que apresentam diferença entre si,

não sendo numericamente idênticas e. g. Charles e Príncipe de Gales são

numericamente idênticos, porquanto dois termos que falam do mesmo objeto desde aspectos diferentes). O outro critério é

verificar se se trata de uma forma (forma é aquilo que torna o objeto o que ele é). Se é

um universal e é uma forma, seria uma substância secundária.

Às vezes a substância secundária poderia se dizer de substâncias primárias, mas nem

sempre por talvez (como quando se diz do

Himalaia que é uma montanha). Ás vezes, talvez, não se diria, já que “Inglaterra” não

se diz de nenhuma substância primária, mas se diz de uma “síntese confusa” de

substâncias primárias e outros seres. Por

outro lado “Inglaterra” é um universal

porque se diz de coisas que apresentam diferença entre si [?] como quando se

diz que “a Inglaterra invadiu as Malvinas” ou “Inglaterra medieval”. O termo “Inglaterra” difere no seu sentido nos dois

casos, mas essa diferença existe em função de um universal sem o qual o emprego do

termo considerado faria sentido. Logo [?], se eu dei a entender antes que toda

substância secundária se predica de uma substância primária, eu errei.

Mas não se desvia essa conclusão da doutrina aristotélica?

Outra coisa: Se pode, de alguma maneira, predicar o indivíduo (substância primária)

de um aspecto do indivíduo, e. g. “Você, Pedro, é o mesmo Pedro de antes”, “Pedro-

de-antes” sendo o sujeito lógico e “Pedro” o

predicado, porque se pode dizer de “Pedro-de-antes” que é “Pedro”.

Outro detalhe é que existe uma dualidade

substância secundária-substância primária,

pelo menos quando uma substância

secundária é usada como sinônimo de uma substância primária, como quando se diz “o

homem está lá dentro, furioso!”. Pode parecer que é mais ou menos nesse sentido homônimo que se diz “a Inglaterra invadiu

as Malvinas”, um sentido metonímico (que toma a parte pelo todo), mas ainda que isso

fosse verdade, só o poderia ser problemáticamente [?], porque não é da

natureza do objeto (Inglaterra) ser uma conjunção de forma e matéria, e por isso o contraste com “o homem está lá dentro,

furioso!” não é tão claro assim.

Se a sociedade é uma arquitetura de costumes, como diz Ortega y Gasset, não há nela pessoalidade para “invadir” ou “agir”

literalmente. Assim, “Inglaterra” no sentido de uma sociedade é homônimo com

“Inglaterra” no sentido de “invasora”.

Ademais, não faz sentido dizer que um

objeto (“Pedro” por exemplo) se predique de seu aspecto (“Pedro-de-antes”), já que o

aspecto não tem a forma do objeto do qual

é abstraído, assim, se “Inglaterra” no

sentido de “Inglaterra medieval” é apenas um aspecto de “Inglaterra”, a predicação a

predicação não pode ser de espécie para indivíduo (“homem” para “Pedro”), e sim de objeto para aspecto (“Pedro” para “Pedro-

de-antes”). “Inglaterra”, portanto, não é universal no sentido aristotélico, mas um

tipo estranho de indivíduo. Os critérios que estabeleci para a definição de substância

secundária simplesmente estão certos, desde que se inclua que, além de ser uma forma e um universal, também seja a

substância secundária aquilo que, sem exceção, se predica da substância primária.

Para o Aristóteles a substância primária é o corpo imbuído de forma, e a substância

secundária é a imagem universal da primeira. Assim, ao que parece, não existe

uma categoria aristotélica para um objeto

como “Inglaterra”. Um dos motivos que tornam verossímil essa conclusão essa

conclusão é que a definição mesma do que seja uma sociedade não foi sequer

procurada pelos sociólogos, segundo

Ortega y Gasset. Além disso a substância

secundária talvez haja recebido a pecha de “síntese confusa de seres” na época da

escolástica, segundo uma alusão breve do livro Jardim das Aflições.

Categoria de lugar

A categoria de lugar, embora possua qualquer dualidade com as substâncias,

também tem sua diferença marcante. Quando digo que vou à montanha, o lugar em questão, na minha intenção, não é

apenas a montanha, mas a área logo acima da sua superfície, os seus arredores etc. Um

lugar é a substância e mais uma faixa dos arredores que o circunscreve.

Também o lugar possui uma dualidade com a substância no sentido escolástico [?] de

síntese confusa de realidades. Por exemplo,

se diz que o mercado é um lugar, mas esse lugar significa não apenas a substância

primária ou secundária em sentido aristotélico, significa também a atividade

que lá se pratica, que é trocar bens etc.

Declaração (ou proposição) tomada

universalmente, e a proposição indefinida.

“Um homem é mau” não significa, a

depender da conotação, “Os homens são maus”, mas o sujeito (sujeito no sentido lógico, isto é, o objeto) “homem” é um

indivíduo e não um universal.

Essa é uma maneira de usar, ou tomar, um

universal não universalmente.

“Alguns homens são maus” seria outro

exemplo.

Em “um homem é mau” o universal refere um indivíduo, a nível de semelhança

numérica praticamente, daí a dualidade

substância primária-substância secundária.

“Um homem é mau” tem uma certa semelhança com a proposição indefinida, a

qual, como fiz notar para me corrigir

semanas atrás, creio que faz mais sentido quando sujeito e predicado são universais

(e. g. em “o prazer é bom” o sujeito, “prazer”, e o predicado, “bom”, são

universais). A semelhança é que em “um

homem é mau” e “o prazer é bom” não há alusão ao sujeito pertencer ao predicado

como um todo, sem exceção, e nem a haver com certeza alguma exceção. É que “o prazer é bom” não equivale, no seu

conteúdo intrínseco, a “todo prazer é bom”, e nem a “alguns prazeres são bons” (neste

último caso se trata de uma proposição particular, como oposta a universal e

indefinida).

De como extrair novas proposições

Junto com a análise de conotação, que

pretendo retomar depois, se extrai proposições na dialética por três vias. A

primeira é supondo dialética (supondo respeitável ou aceitável) a proposição que se assemelha à proposição já adquirida (o

exemplo de Aristóteles é “se o conhecimento dos contrários é o mesmo a

percepção dos contrários é a mesma). Ele não indica uma técnica para facilitar essa via, implicando que ela deve ser

aperfeiçoada pela experiência. Entretanto ela tem, em alguns casos, semelhança com

a indução da retórica, que é o exemplo (o

exemplo compara dois casos, me parece, e não se cristaliza em uma proposição

universal; ao passo que a indução mesma não impõe um limite, senão material, para o número de casos que fomentam a

proposição) e. g. se a vulgaridade do CQC é o que o torna chato, é a vulgaridade do

programa pânico que o torna chato (a indução consistiria em, a partir desses dois

casos e outros, concluir que é, para cada programa de televisão, a sua vulgaridade que o torna chata; no exemplo se quer

apenas demonstrar que a vulgaridade do

programa pânico o torna chato).

Um exemplo claro de como extrair proposição por esa via seria dizer que, se é a vulgaridade de cada programa de tevê o

que o torna chato, deve ser o caráter vulgar de certas celebrações religiosas o que as

torna chatas.

A segunda via

É alcançada tomando as proposições que

contradizem, são contrárias, às que se

opõem às proposições dialéticas. Aqui eu

cometera um sério erro de hermenêutica, o qual já está resolvido. Acompanhe com

paciência, por favor, porque é bem fácil.

Ele chama, nos Tópicos, a sentença “não se deve fazer mal aos amigos” de contraditória

de “se deve fazer mal aos amigos”, embora, à luz do texto Da Interpretação, a

contraditória é explicada como uma declaração particular (proposição particular

e. g. alguns homens são maus ou nem todo homem é mau) oposta a uma declaração universal (e. g. todo homem é mau ou

nenhum homem é mau). E vice-versa, é contraditória uma declaração universal

oposta a uma particular.

A contraditória de 1) “todo homem é mau”, portanto, é 2) “nem todo homem é mau”.

Em 1) mau se predica de todo homem, e portanto se trata de uma declaração

universal. Em 2) mau não se predica de todo homem, mas de alguns, e portanto não é

uma declaração universal, mas particular.

A contraditória de “alguns homens são

maus”, portanto, é “nenhum homem é

mau”.

Voltemos ao par 1) “se deve fazer mal aos amigos” e 2) “não se deve fazer mal aos amigos”. Em 1) o predicado “a quem se

deve fazer mal” se predica de todos os amigos. em 2) o predicado “a quem não se

deve fazer mal” se predica de todos os

amigos.

A contraditória, nos dois casos, portanto, é

homonímica.

Para complementar, no texto Da

Interpretação, como já referi antes, os “opostos contrários”, “que diferem dos

opostos contraditórios”, são aqueles em que não há predicação particular, e nem indefinida, mas apenas universal (e. g. Todo

homem é mau — Nenhum homem é mau).

Mas o que ele quis dizer com essa segunda

via de adquirir preposições?

Que se deve opor a uma proposição

dialética uma outra proposição na qual um predicado é trocado por seu contrário, e

depois se deve contradizer esta última:

1) Todo homem é mau

2) Todo homem é bom

3) Todo homem não é bom

Logo, se é respeitável ou dialética a

proposição de que todo homem é mau, então também é dialética a proposição de

que Todo homem não é bom.

O predicado substituído também pode variar (se houver um contrário, o que não

sucede no último exemplo porque

“homem” não tem contrário):

1) Se deve fazer bem aos amigos

2) Se deve fazer bem aos inimigos

3) Não se deve fazer bem aos inimigos

A 3) é respeitável se a !) também o for.

1) Se deve fazer bem aos amigos

2) Se deve fazer mal aos amigos

3) Não se deve fazer mal aos amigos

Também há algum valor dialético mudar os

dois predicados ao mesmo tempo, sujeito e

termo que o predica:

1) Se deve fazer bem aos amigos

2) Se deve fazer mal aos inimigos

Terceira via

Consiste em usar proposições advindas das

ciências particulares. Esse é um campo fértil ao retoricismo homonímico, já que o Daniel Dennet chegou a declarar que o universo

“evoluiu”, quase em um sentido darwinista, como se a sua proposição de base

pertencesse à ciência física, e não à

biológica. A proposição de uma ciência cabe à sua ciência apenas, porque de outro modo

deveria ser considerada não uma proposição científica, mas um princípio das

ciências, ou proposição dialética (no

sentido de ser sustentada pela maioria, por

todos, ou pelos sábios ou notáveis). a proposição científica também é dialética,

mas no caso o Dennet a usou como se não fosse uma proposição científica, no sentido de pertencente a uma ciência particular. Há

proposições dialéticas sustentadas por sábios e não pela maioria, as quais, não

obstante, não pertencem ao reino das proposições das ciências particulares e. g. a

ideia de Dostoiévski de chamar de deísmo a espiritualidade profunda, quando muitos associavam o termo ao iluminismo-

racionalismo.

A natureza do problema

Para Aristóteles um problema é a apresentação de proposições discordantes, uma delas uma tese, se for proferida por um

sábio.

“Eu a amo” e “ela não me ama”, não é

exatamente um problema, de certo modo, para Aristóteles. É que ele diz que as proposições e os problemas são iguais em

número, diferindo quanto a se pedir uma de

duas alternativas ou não. é proposição “eu

a amo. O problema seria “eu a amo ou não?”, ou então “eu a amo” e “eu não a

amo”. O conflito em “eu a amo” e “ela não me ama”, que é suficiente, pode ser reduzido a uma formulação outra e. g. “eu

posso suportar que ela não me ame, ou não?” ou “eu devo fazer algo a respeito de

ela não me amar, ou não?”.

Preposição

Palavra invariável que serve para unir duas outras palavras indicando relação existente

entre elas [priberam].

A preposição “a” exprime várias relações [eu posso ter errado em algum dos

exemplos, de qualquer modo o priberam

não os deu]

1) movimento (“ele está a andar”)

2) extensão (ele chegou ao fim do percurso)

3) meio (Estou a cavalo)

4) semelhança (sou igual a todo brasileiro)

5) preço (a dez reais você não encontra em

outra loja)

6) lugar (estou ao pé do pé de laranja lima)

7) material [?] (vou ás compras)

8) fim (essa é uma batalha à morte; quero ir

à casa de praia)

9) tempo (às dez costumo dormir)

10) quantidade (este não será um jantar a

dois)

11) maneira de ação (estou a delicadamente

procurar convencer-te)

12) objeto de referência (caminhe à calçada

direita)

13) hipótese (a quem eu venderia o carro se

meu pai não o comprasse?)

A preposição é invariável.

A preposição é invariável.

A preposição é invariável.

O verbo é chamado predicado em

gramática, porque atribui algo a algo. Quando a ação fica toda no sujeito, diz-se

que o verbo é de predicação completa e. g o pássaro voou, porque não faz sentido perguntar ‘que é que ele voou?’. Quando a

ação não fica toda no sujeito, ou seja, quando a ação que o verbo exprime exige

uma pessoa ou coisa sobre que recair, diz-se que o verbo é de predicação incompleta

e. g. Pedro comeu bolo, aqui o verbo exige complemento, e se pode perguntar ‘que ele

comeu?’.

Como foi visto em Aristóteles, além de significar algum tempo, o verbo diz algo de

algo. Na predicação completa (“o pássaro voou”) ele diz algo do sujeito (sujeito no sentido gramatical) i. e. (i. e. significa id est,

ou isto é, quer dizer etc.) diz do pássaro que ele voou. Na predicação incompleta diz algo

do objeto (do objeto no sentido gramatical,

no caso objeto direto) i. e.diz do bolo que foi comido. O complemento (bolo) também

é chamado “paciente da ação verbal”. O paciente e o sujeito (sujeito no sentido

lógico) se equivale, porque em lógica o

sujeito é aquele que recebe o predicado.

Em “o pássaro voou”, que é de predicação

completa, o sujeito em sentido lógico também é sujeito em sentido gramatical, se se considerar que pássaro é o sujeito

gramatical. No caso o predicado é algo

como “algo que voou”.

A flexão de caso a que o objeto direto corresponde, no latim, é o acusativo ( o

caso chamado acusativo). O objeto direto pode ser acompanhado de um artigo (“Pedro comeu o bolo”; “Aristóteles amava

a verdade”), mas não de uma preposição (“Pedro comeu ao bolo”). É possível

confundir a oração que tem objeto direto (oração é sinônimo de proposição ou declaração, e é constitutivo em si existir em

função de um verbo) com a que tem verbo

de ligação.

Mas a diferença entre as duas é fácil de perceber: os verbos de ligação (creio que “ser” e “estar”) forçam o predicado a recair

sobre o sujeito gramatical. Nas demais

orações de predicação incompleta, ao que

parece, a predicação recai sobre o paciente da ação verbal. Os verbos de ligação não

indicam ação e. g. em “Pedro comeu bolo” o sujeito gramatical é Pedro, o sujeito lógico é bolo, este recebendo o predicado “que foi

comido”. Na oração com verbo de ligação e. g. “eu sou feliz” ou “eu fui feliz”, é o sujeito

gramatical que recebe o predicado, “eu” recebe o predicado “que foi feliz”, ao passo

que “feliz” não recebe nenhum predicado. A mesma coisa acontece em “Eu estou feliz”.

Cobrir o conteúdo da Retórica é ter de lidar com o levantamento e descrição das

premissas aceitas pelas pessoas, para cada tipo de audiência, para cada tipo de discurso. A audiência pode ser a elite

globalista. Os tipos de discurso de que eu falo são três, e existem por causa da

audiência.

1) O primeiro é o discurso deliberativo. É aquele usado comumente em uma

assembléia deliberativa, no congresso nacional etc. É o discurso que se utiliza das

premissas aceitas pelas pessoas no que diz

respeito a qual o curso de ação mais conveniente a se tomar. e. g. é melhor ser

bonito do que feio, logo se deve cuidar da beleza. e. g. é melhor ser rico do que pobre.

e. g. é melhor ter sorte do que azar.

Na retórica se diz algo curioso. Ele diz que é a respeito das nossas ações que nós

deliberamos, inquirimos, investigamos, é a respeito de qual seja a melhor ação a tomar

que nós fazemos essas coisas.

2) O segundo é o discurso forense. Ele não lida diretamente com o que é mais

conveniente a se fazer. Ele lida com o descobrir, ou evidenciar o que já se passou.

É o discurso dos advogados em uma corte de justiça, por exemplo. É o tipo de discurso que o monsieur Poirot usa muito nas

histórias da Agatha Christie. Ele sempre elucida o mistério. Eu nunca li essas

histórias, mas vi o filme Assassinato no Expresso do Oriente. O autor de Brotherhood of Darkness, o Dr. Stanley

Monteith sempre cita esse filme [there are

too many clues here — there are just too

many clues!].

3) O terceiro é o discurso epidíctico, e o

objetivo dele é prestar homenagem a alguém, ou a algo, se não me engano. De vez em quando os apresentadores do Oscar

fazem pequenas homenagens desse tipo. É um elogio de alguém.

Para a elite globalista ocidental eu vou tirar de um capítulo do Raymond Aron sobre

Auguste Comte. é um pequeno esboço.

Para a elite russo-chinesa eu vou usar A Arte da Guerra, e Rumo À Estação Finlândia, do

Edmund Wilson.

Para a Elite islâmica o Alcorão.

Auguste Comte.

Comte formulou uma espécie de filosofia da

história.

Ele opõe a sociedade teológico-militar medieval à sociedade científico-industrial

moderna. “Os cientistas substituem os sacerdotes e teólogos como a categoria

social que dá a base intelectual e moral da

ordem social”.

Para Comte o poder espiritual é

simplesmente o poder de fazer predominar um modo de pensar, o qual traga embutido em si alguma fórmula para a organização

social. Ora, segundo Ortega y Gasset “social” é tudo aquilo relativo aos usos, ou

costumes, que são termos sinônimos. Logo o poder espiritual é a doutrina que se

reflete, e de certo modo justifica, os costumes das pessoas. O costume é aquela fórmula de se agir que é impessoal e

disseminada entre as pessoas e adquire um peso e utilidade maior na comunicação

entre pessoas que não se conhecem bem, ou muito pouco (o aperto de mão, por

exemplo).

Um alemão me disse que é costume dos seus nunca fazerem nada sem terem

aprendido com a maior minúcia tudo a respeito. Se for fazer uma coisa, seja bom nela. Esse não é o tipo de costume que

serve à comunicação, mas é possível que sirva de algum modo, porque ajuda os

alemães a se identificarem, e a

reconhecerem uns nos outros os valores a que o costume alude. Eu suponho que o

valor embutido na fórmula “se for fazer uma coisa, seja bom nela” é a ideia de que buscar a perfeição é uma maneira de honrar

o Criador, como se tivéssemos a obrigação de fazer o melhor com os dons recebidos,

ou então a ideia de não se viver uma vida

precária mas digna.

Em Comte há a ideia de uma substituição progressiva da classe militar pela classe industrial (em sentido bem elástico, de

todos que contribuem para o fomento econômico, mas não se implicando aqui

também os trabalhadores).

Para Comte o grande desafio do futuro não será uma guerra, mas o desafio de se extrair

industrialmente o máximo da natureza. Uma exploração racional dos recursos

naturais uniria os homens.

Comte não quer uma revolução como Marx, mas também não quer se apoiar na ideia de

instituições livres, como Tocqueville ou

Montesquieu.

Ele advoga uma reforma, mas não através

de instituições determinadas, como se a democracia e a separação dos três poderes, por exemplo, possuíssem em si mesmas os

meios de reformar a sociedade.

A reforma a ser feita tem de ser de um tipo

que, em substância, acelere a formação da sociedade industrial e científica. Tudo o

mais, aparentemente, é acidental.

A sociedade industrial-científica é o destino

inexorável da humanidade.

A sociedade Européia é o modelo maior da humanidade, e seu desenvolvimento em

direção à sociedade científico-industrial

plena é o destino de toda a humanidade.

“Segundo a lei dos três estados, o espírito

humano teria passado por três fases sucessivas. Na primeira, o espírito humano

explica os fenômenos atribuindo-os a seres, ou forças, comparáveis ao próprio homem”.

Aqui Comte deve estar se referindo à

mitologia grega, ou a histórias do teor das que se encontram no texto As Mil e Uma

Noites. Ele considera essas formas poéticas, portanto, primitivas ou ultrapassadas. Isso significa que esses textos não têm valor

cognitivo para um positivista? Talvez não se possa negar que tenham ao menos o valor

de um entretenimento.

“Na segunda invoca entidades abstratas,

como a natureza”. A ideia da unidade da natureza é profundamente atacada pelo Chesterton, na biografia de São Francisco.

Entre essas entidades abstratas, me pergunto, o Comte assinalaria o átomo?

Segundo Ortega y Gasset o átomo é uma ficção. Ele era um filósofo erudito, afinal de contas, e sua opinião é dialética i. e.

respeitável. Augusto Comte talvez se refira a sistemas cosmológicos tradicionais, os

conceitos de diabo, inferno, Céu, anjos e

Deus. Não se trata de entidades hipotéticas que são, como se diz, taken for granted,

como o átomo. Ou talvez seja também, mas

não estou certo.

“Na terceira, o homem se limita a observar

os fenômenos e a fixar relações regulares que podem existir entre eles, seja num dado

momento, seja no curso do tempo; renuncia a descobrir as causas dos fatos e se contenta em estabelecer as leis que os

governam.” Esse se ater a uma descrição do mundo sensível excluiria a química, as

moléculas, os átomos? Provavelmente não, se, como o Aron aponta, Comte estava um

tanto satisfeito com as ciências da época (início do séc. XIX). ele queria excluir sobretudo as explicações últimas, as

especulações teológicas. Portanto ele considerava que todo conhecimento

legítimo tem como objeto os objetos que são puros objetos para o homem, ou para a maioria dos homens, e não aqueles objetos

a que se chega pela experiência da

participação, conceito platônico.

Alguém no chuveiro quente não percebe o

quanto a água está quente para os outros, porque ele está imerso no objeto (digamos

que a quentura seja o objeto no caso), da mesma maneira a pessoa irritada não

percebe os próprios juízos como a pessoa

tranquilo ao seu lado.

Isso significa que Comte não considera

legítima a esfera dialética da realidade, o se prover de vários testemunhos, o cruzar testemunhos, proposições. Ele parte de um

modelo ideal de testemunho e, disposto a ignorar as premissas dos testemunhos que

digam das entidade abstratas que ele descarta, erige esse testemunho acima de

todos os demais. Essa é uma forma de subjetivismo que, sendo parecida em toda uma classe, configura o advogar um

“coletivismo fichtiano” [coletivismo idealista], que é o predicado que o

professor Olavo atribuiu ao próprio

Marxismo.

Para Comte as ciências se tornam

sucessivamente mais positivas

[positivo

(latim positivus, -a, -um) adj. 1. Certo, real, notório.

2. Que não admite dúvida.

3. Que se apoia em factos e na experiência.

4. Afirmativo, decisivo. 5. Diz-se por oposição a ideal, que tem

carácter prático; que é praticamente

útil,susceptível de aplicações práticas.].

As matemáticas seriam as primeiras a

assumir esse caráter, depois a física, a

química, a biologia.

Quanto mais simples o objeto, mais fácil pensar positivamente nele, sem a

interferência da mentalidade “teológica”. Há fenômenos em que a observação é imediatamente positiva (por exemplo, eu

imagino, na concepção de que o cubo é

tridimensional).

Comte pretende, com sua descrição do crescente positivismo nas ciências, demonstrar que a política se tornará

positiva, daí a constituição da nova ciência

chamada sociologia.

Existem ciências que tendem a um caráter analítico, outras tendem a um caráter sintético (ou global). Um exemplo das

primeiras são a física e a química, onde

fenômenos isolados podem ser estudados separadamente de outros fenômenos e. g. o

empuxo de um corpo na água pode ser estudado separadamente do ângulo de refração da luz quando chega à água, a

tendência ao isolamento, dos gases nobres, pode ser estudada separadamente do

fenômeno pelo qual a água muda de volume quando assume a forma de gelo (os

termos “analítico” e “sintético” em Comte têm mais de uma significação). Na biologia isso não sucede, cada fenômeno está ligado

a diversos outros, de forma que não faz sentido estudar os sentidos sem estudar o

sistema nervoso, e não faz sentido estudar este sem estudar anatomia, e não faz sentido estudar anatomia sem diferenciar

entre músculos e estrutura óssea, sendo que os músculos a nível microscópico

comportam células, as quais têm

determinadas propriedades etc.

A sociologia é uma ciência sintética, ou

global.

Faz parte do objeto da sociologia um

fenômeno histórico, como uma revolução, ou um fenômeno particular, como um uso.

Mas como a ciência em questão é sintética, a revolução só pode ser compreendida à luz da totalidade da história (Comte levou sua

lógica às últimas consequências), e o uso só pode ser compreendido em relação à

totalidade da sociedade.

Segundo comte os cientistas têm o direito

de impor os veredictos de suas ciências aos ignorantes. Se alguém não quer tomar vacina contra o vírus ebóla, o biólogo tem o

direito de dizer que este alguém está errado e que sua vontade não pode ser respeitada.

Se o matemático provou que 2 + 2 = 4, então quem o negar tem de ser submetido (a força de lei?). A mesma coisa em sociologia, o que

pressupõe que a sociologia tem o direito de impor, nas palavras do Aron, “o que é, o que

será e o que deve ser”.

A lei histórica é inexorável, rumo ao positivismo, já que para ser uma ciência

sintética tem de dizer respeito à totalidade da história [ênfase acrescentada]. O

conhecimento da história, assim, é predito e

acelerado pela sociologia.

A realização da natureza humana está

ligada à realização da era positiva.

O comtismo surgiu, culturalmente, no

contexto de uma cultura européia já

acostumada ao protestantismo, à multiplicação de seitas ligadas ao

cristianismo. Segundo o historiador Belloc, a partir do séc. XIX, aproximadamente,

surgiu a ideia de que, afinal, como havia tanta discordância, as verdade são mesmo muito relativas; e se desenvolvem uma

certa tolerância para com os credos religiosos. Se pode ver isso nos escritos do

Arthur Conan Doyle, o Dr. Watson e o sherlock Holmes nunca discutem religião, são absolutamente indiferentes a isso,

mesmo o Watson sendo cristão, parece que anglicano. Se eles encontram um maçom,

não parece importar absolutamente a crença do sujeito. Cada um na sua. Me parece provável que a tentativa comtiana

de estabelecer uma explicação clara e irrevogável da unidade da história humana

inteira é uma reação a isso. Como eu vou

referir mais tarde, ele não dava importância às infinitas premissas que os historiadores

“analíticos” procuravam levantar; ele simplesmente não tinha fé nos objetos que não estavam ao seu alcance, mas procurava

reduzir tudo, ganhar a claridade máxima da maneira mais imediata possível. É como se

você estivesse cansado de montar um quebra-cabeças muito complexo e

preferisse se ater à forma que parecesse mais verossímil à mão, sem se preocupar com examinar cada peça separadamente.

Esse temor tem sua parcela de razão, a maior parte dos historiadores cometeram

erros monstruosos por falta de detalhes. Eu não tenho nenhuma erudição em história, mas, e. g. sei que o historiador Paul

Johnson criticou duramente o senador MacCarthy por este haver lançado

acusações sem provas, e no entanto ele

estava certo, coisa que o Paul Johnson descartou ao que parece.

Análise de Conotação

Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo,

Talhar no mármore divino Com o camartelo.

O termo/preposição “com” denota:

a) companhia: “Estou com o meu cachoro

no parque”.

b) modo: “Estou agindo com o pulso firme”.

c) instrumento [meio ?]: “Estou com o

dinheiro para tanto”.

d) causa: “Ele venceu a luta com a sua

garra”.

e) quantidade indeterminada [?]: “Ele viaja com os outros”.

Camartelo:

a) martelo que tem gumes

[gume

s. m. 1. Lado do fio dos objectos cortantes.

2. [Figurado] Agudeza; perspicácia.]

O termo não possui contrário, mas se extrai

um universal dele — objeto contundente. Ele pode ser visto sob o aspecto de ser um

objeto contundente, o que lhe dá uma segunda conotação. De outro lado pode ser visto sob o aspecto de ser um instrumento

de demolição.

b) Instrumento de demolição

Possui contrário, que seria objeto de

construção. Sem intermediários.

Visto sob o aspecto de ser eficaz, possuir eficácia em demolir, tem como contrário o termo “objeto precário para se demolir”, e

sob esse aspecto possui intermediário e

gradação.

A demolição é uma atividade da construção civil, de modo que pode ser visto sob o aspecto de ser um instrumento que demole

para erigir outra coisa no lugar.

Parece que terminei a primeira estrofe do

poema

Que outro – não eu! – a pedra corte

Para, brutal, Erguer de Atene o altivo porte

Descomunal.

Outro

a) Não-este. É um termo indefinido, para

Aristóteles, e seu conteúdo intrínseco consiste em que ele não é este. O seu

contrário não é “este”, da mesma forma que o contrário de mau é bom, e não “não-

bom”. Portanto não tem contrário. Apesar de não-bom não significar mau, pode ter

essa conotação.

b) Diferente, O contrário é “idêntico”, e não possui intermediário, porque não se pode

dizer que alguém é mais ou menos idêntico a outro, embora se possa dizer que seja mais ou menos semelhante. Eu não escolhi

semelhante como contrário porque algo

pode ser semelhante e diferente ao mesmo

tempo, ao passo que outros contrários não admitem essa simultaneidade, e. g. não se pode ser bom e mau ao mesmo tempo, e no

mesmo sentido.

c) Mais um. Se pode atribuir o predicado

“mais um” a um sujeito-objeto. Significa que ele possui a qualidade de quem se uniu

por último a um conjunto ou unidade. Isso equivale ao termo “extra”, de certo modo, mas o dicionário de antônimos não deu

resultado algum pra iso. Deve não ter

contrário.

d) Seguinte. Parece com o último termo mas possui uma diferença específica, e

portanto uma semelhança meramente genérica. É que neste caso se pode supor que é uma fila ou ordem de quem chega,

portanto devem ter chegado outros anteriormente. Em “mais um” essa ideia

também pode ser vislumbrada, talvez, mas eu não o fiz. O contrário é pregresso ou

anterior, sem intermediário.

Seguinte se diferencia de “mais um” também porque pode ser visto desde o

aspecto de conotar um movimento, se é seguinte, então segue, se segue se

movimenta.

e) precedente. Tem como contrário

seguinte, e portanto não tem intermediário. Mas preceder também tem a conotação de

movimento.

f) Restante. Não possui contrário.

Pode ser visto desde o aspecto de haver

sido deixado para trás ou ser inferior de

alguma maneira.

Eu vou começar com poemas do Rimbaud

Les Étrennes des Orphelins

Les significa o artigo definido plural, “os”.

Étrennes significa presente de Ano Novo.

des significa a preposição “de” ou “dos”.

Também pode “des” significar um pronome indefinido [algum] ou uma conotação

equivalente. Eu aconselho se abrir o

“google tradutor” para checar a pronúncia

http://translate.google.com.br/#en/pt/frec

kles .

“Avez-vous des oeufs?” [tem você alguns

ovos?]

Des enfants ont cassé les carreaux

[algumas/certas crianças quebraram a

vidraça da janela]

“Elle a des taches de rousseur” [ela tem

sardas/ela tem umas sardas]

Les Étrennes des Orphelins significa,

portanto, “Os presentes de Ano-novo de

uns/dos Órfãos”.

a) Étrennes significa presente de Ano-novo. Pode ser visto isso desde de o aspecto de ser um presente em geral. Em francês

“présent” [presente] equivale a “don” [dom], o que quer dizer que étrennes pode

ser visto desde o aspecto de ser uma graça espiritual. Por isso “don” também tem a conotação de “vocation”, porque uma

vocação é por definição uma graça espiritual ou sobrenatural.

Peripatético, ao menos em inglês, também

quer dizer a pessoa que viaja de um lugar a

outro constantemente.

Thomas Beckett, após o banho do rei da Inglaterra, tomou a toalha do criado e

passou a enxugar o rei. O rei disse:

— Beckett! Eu fiz de ti um nobre. Por que

você banca o meu criado?

— Eu sou o teu criado, milorde. —

Respondeu Beckett.

Aqui o rei usou “criado” conforme a definição A, Beckett respondeu usando criado na definição B. A significa “pessoa de

estrato social inferior, cuja obrigação profissional é servir domesticamente”. B

significa apenas “aquele que serve, aquele que se faz útil de algum modo”. São termos

homônimos.

Um criado em sentido A é uma realidade não-primária, já que não é possível

reconhecê-lo instantaneamente a cada vez que aparece. Alguém poderia ver Beckett

enxugando o rei e tomá-lo por um criado no

sentido de A. A, portanto, é um fenômeno

secundário.

O termo “sociedade”, também, é um fenômeno secundário. Ele se manifesta através dos costumes. Para se saber que se

está na sociedade inglesa é preciso dar voltas pelo quarteirão e observar as

pessoas. Algumas ali são muçulmanas, talvez, outras não têm o sotaque muito

caracteristicamente britânico, por haverem morado fora muito tempo. Por outro lado a convenção de dirigir no sentido contrário da

via também existe na Austrália.

É esse fenômeno secundário que o

professor Olavo chamou de Materia Secunda no Jardim das Aflições? Estou

suspeitando que sim.

A substância primária, para Aristóteles, é

aquela que não se diz de nenhum outro

objeto, por ser um indivíduo. Nesse sentido Inglaterra é uma substância primária. Por outro lado ele procurou associar a

substância primária a uma matéria e. g. o

homem ao corpo que o manifesta. Neste

sentido Inglaterra não é uma substância

primária.

A substância é o que um objeto é. A Inglaterra é algo. Logo, é uma substância. Por outro lado, a palavra substância é mais

literal, para Aristóteles, quando é individual e manifesta atualmente em uma matéria. Já

a Inglaterra parece mais uma virtualidade vislumbrada por um conjunto de elementos

sensíveis,