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B abi encontrou na Turquia uma for- ma de acrescentar experiência à car- reira de engenheira. Bárbara Bazílio Lie- dtke, de preferência Babi. Ainda que morando distante das suas origens, opta pelas coisas mais próximas, e encurtar o próprio nome traz a ideia de vizinhança, de “estar em casa”. A origem portugue- sa e alemã trazida nos sobrenomes Bazílio e Liedtke não a instigaram a conhecer os países de seus ante- passados. Ela foi escolhida pela Tur- quia. “Nunca pensei em vir parar na Turquia”, afirma, com um olhar de graça. O pensamento nunca trans- pôs a barreira da Inglaterra. Ela realmente acreditava que o destino seria a Terra da Rainha. Foram dois anos de entrega e preparo para então começar a esco- lher algumas vagas das milhares do sistema e se candidatar: “Fiz entre- vistas para Gana, Estados Unidos, Inglaterra, até que recebi um email da AIESEC de Bursa sobre uma vaga em uma empresa do ramo au- tomotivo.” Ela nunca ouvira falar de Bursa e a curiosidade nunca havia levado Babi a fuçar a história nem as características da Turquia, muito menos da cidade de 1.854.285 habi- tantes em uma área de 1.036 quilô- metros quadrados, do tamanho do Taiti. Na cidade de Bursa, Bárbara trabalha em uma empresa multinacional YASMINE - Perfis.indd 4 28/12/2011 15:04:52

Perfil Bárbara Liedtke - Estrangeiros

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MAtéria desenvolvida para a disciplina de Projeto Experimental em Jornal, na FAMECOS, sob a supervisão de Alexandre Elmi. 2011/2

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Page 1: Perfil Bárbara Liedtke - Estrangeiros

Babi encontrou na Turquia uma for-ma de acrescentar experiência à car-reira de engenheira. Bárbara Bazílio Lie-dtke, de preferência

Babi. Ainda que morando distante das suas origens, opta pelas coisas mais próximas, e encurtar o próprio nome traz a ideia de vizinhança, de “estar em casa”. A origem portugue-sa e alemã trazida nos sobrenomes Bazílio e Liedtke não a instigaram a conhecer os países de seus ante-passados. Ela foi escolhida pela Tur-quia. “Nunca pensei em vir parar na Turquia”, afirma, com um olhar de graça. O pensamento nunca trans-pôs a barreira da Inglaterra. Ela realmente acreditava que o destino seria a Terra da Rainha.

Foram dois anos de entrega e preparo para então começar a esco-lher algumas vagas das milhares do sistema e se candidatar: “Fiz entre-vistas para Gana, Estados Unidos, Inglaterra, até que recebi um email da AIESEC de Bursa sobre uma vaga em uma empresa do ramo au-tomotivo.” Ela nunca ouvira falar de Bursa e a curiosidade nunca havia levado Babi a fuçar a história nem as características da Turquia, muito menos da cidade de 1.854.285 habi-tantes em uma área de 1.036 quilô-metros quadrados, do tamanho do Taiti.

Na cidade de Bursa, Bárbara trabalha em uma empresa multinacional

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Page 2: Perfil Bárbara Liedtke - Estrangeiros

Há dois meses, acorda às 7h e trabalha das 9h às 18h em uma empresa multinacional que fabrica peças automotivas. Ao chegar na Balap Otomotiv, os sapatos permanecem em seus pés. Lá, não é obri-gatório abandoná-los na porta enquanto aplica os conhecimentos ma-temáticos, técnicos e científicos na fabricação de peças para a Renault, Fiat e Toyota.

O dia chega ao final na casa dos Şengül. O pai, a mãe, os dois fi-lhos e a Babi. A jornada acaba no apartamento 14 do Bloco K15. Um vilarejo familiar, exatamente na alameda Kayapa Tokı. No distrito de Nılüfer, em Bursa, na região de Mármara, noroeste da Turquia. Mes-mo considerando a residência um lar, minutos antes de dormir o pen-samento é remetido ao Brasil, no interior do Rio Grande do Sul, preci-samente em Glorinha, no sítio onde a família mora. No bem-estar dos pais e na vontade que a invade de estar na companhia deles. Na cama que ela deixou antes de fazer o mundo virar a sua casa.

Quando pergunto de fracassos, vejo ela retomar o passado em se-gundos, como se folheasse um livro rapidamente. Abandona a ideia com um balanço de leve na cabeça e impõe uma barreira nela mesma, sintetizando a decepção de não conseguir voltar ao Brasil sem falar a língua turca fluente. Mesmo assim, não vê perdas, enxerga somente ganhos. E complementa: “É aquela coisa: ver o copo meio cheio, ou meio vazio. O meu está sempre cheio.” É uma alegria espiritual, como definiu a animação e o sorriso que insistem em permanecer.

Foram noites do mês de setembro de muita conversa no computa-dor, pelo Messenger e Skype, para captar exatamente a energia que a envolvia nessa nova fase, e ela sempre me pareceu leve. Feliz.

“Consegui realizar o sonho da minha vida!”. Foi com essa frase cheia de sentimento e um sorriso que ocupou o rosto inteiro que Bár-bara expressou a experiência de ter escolhido viver em outro país.

“Me sinto vitoriosa!”.A adaptação tem sido fácil, e a ajuda da família que a acolheu,

fundamental. Sentada na cama com o computador sobre as pernas, Bárbara define como “a minha casa turca” quando pergunto onde ela está. A dificuldade está em somente os pais turcos falarem inglês. Eles são os mediadores da comunicação de Bárbara com os outros mem-bros da família.

A cultura diferente e a religião são o que mais causa estranheza. Acordar às 5h porque o sino toca para que a cidade reze em direção à Meca não a fascina. As mulheres rezam o dia inteiro. Os homens, quando o sino toca. Ela reza pra si, alguns minutos toda noite, deitada com as mãos perto do peito e as pernas junto aos braços e, como em posição fetal, pede proteção e agradece ao dia. “Na primeira semana de estada eles compraram um roupeirinho pra eu colocar minhas rou-pas, sem contar a preocupação deles para que eu me adapte e me acos-tume com a comida local. Sempre fazem pratos típicos, sem carregar no tempero”, exalta com o sorriso vibrante ocupando o rosto redondo.

A intensidade está em tudo. Desde as amizades instantâneas até os relacionamentos fugazes. A explicação da aventureira é que tudo lá se torna maior do que realmente é. “É como se fosse um capítulo à parte da minha vida”, complementa.

O imprevisível é o que motiva a mulher de 22 anos, pele branca, cabelo quase castanho querendo ultrapassar os ombros e olhos vi-brantes. Depois do capítulo turco, a pretensão está na África – traba-lhar voluntariamente e se descobrir ao se perder na Europa com uma mochila carregada de água e chocolate. Quando pergunto o cheiro que mais gosta, ela hesita. Olha para o lado direito. Vejo um sorriso vindo na minha direção e, saudosa, deixa sair: “cheiro de terra molha-da”. Que chova!

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A história de quem partiu

Por Yasmine Santos | Foto Arquivo pessoal

Um brasileira na Turquia e um alemão no Brasil. Um decidiu partir, e o outro, chegar. Adotaram uma nova cidade, adaptaram-se a uma nova cultura e ao desconhecido, conhecem-se a cada dia. No início desta revista, contamos a história de Uli Kaup,

bibliotecário que resolveu deixar a Alemanha para se aventurar em terras brasileiras. Agora, a história de Bárbara Liedtke, que adotou Bursa como sua cidade.

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