25
PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO http://www.efdeportes.com/efd144/periodizacao-tactica-sua-aplicacao-no-futebol.htm Raúl Oliveira – [email protected] Rodrigo Vicenzi Casarin RESEUMO A periodização táctica é uma metodologia de treino que privilegia a contextualização do treino em função das características, necessidades e princípios do nosso Modelo de Jogo, ou seja, da nossa organização colectiva, sectorial e elementar de jogo. Para trabalhar dentro destes moldes torna-se importantes para além de dominar o seu contexto teórico, estar ciente de alguns riscos em que podemos incorrer ao adoptar esta metodologia. Não existem receitas para o sucesso mas trabalhar de forma séria, organizada e com objectivos claros são bons ingredientes para o atingir. 1. INTRODUÇÃO O treino em futebol é de tal ordem complexo que permite que as mais variadas concepções conduzam de forma igualmente favorável ao sucesso desportivo. Muitas dessas, ainda buscam controlar o treino, pelo menos ao mais alto nível, através da dimensão fisiológica. Outras apararentemente evoluídas, procuram apenas integrar as dimensões, ou quase todas as suas dimensões, sem se preocuparem em entender o jogo como um sistema dinâmico de interação e inter-relação. Neste contexto, percebemos que essas concepções ainda se baseiam em parâmetros parcelados para responder aos problemas do jogo. Mas se observarmos o futebol atentamentente, na medida que nos defrontamos com novas realidades, uma ideia mais global, ampla, alargada parace demonstrar realmente as verdaderias características desse desporto. Precisamente em Portugal ao longo dos últimos anos surgiu uma metodologia que ultrapassou essas tendências

PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ER ROS

METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

http://www.efdeportes.com/efd144/periodizacao-tactica-sua-aplicacao-no-futebol.htm

Raúl Oliveira – [email protected]

Rodrigo Vicenzi Casarin

RESEUMO

A periodização táctica é uma metodologia de treino que privilegia a

contextualização do treino em função das características, necessidades e princípios do

nosso Modelo de Jogo, ou seja, da nossa organização colectiva, sectorial e elementar de

jogo. Para trabalhar dentro destes moldes torna-se importantes para além de dominar o

seu contexto teórico, estar ciente de alguns riscos em que podemos incorrer ao adoptar

esta metodologia. Não existem receitas para o sucesso mas trabalhar de forma séria,

organizada e com objectivos claros são bons ingredientes para o atingir.

1. INTRODUÇÃO

O treino em futebol é de tal ordem complexo que permite que as mais variadas

concepções conduzam de forma igualmente favorável ao sucesso desportivo. Muitas

dessas, ainda buscam controlar o treino, pelo menos ao mais alto nível, através da

dimensão fisiológica. Outras apararentemente evoluídas, procuram apenas integrar as

dimensões, ou quase todas as suas dimensões, sem se preocuparem em entender o jogo

como um sistema dinâmico de interação e inter-relação. Neste contexto, percebemos

que essas concepções ainda se baseiam em parâmetros parcelados para responder aos

problemas do jogo.

Mas se observarmos o futebol atentamentente, na medida que nos defrontamos

com novas realidades, uma ideia mais global, ampla, alargada parace demonstrar

realmente as verdaderias características desse desporto. Precisamente em Portugal ao

longo dos últimos anos surgiu uma metodologia que ultrapassou essas tendências

Page 2: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

citadas acima e começou a intrigar, confundir e apaixonar o ambiente futebolistico.

Apelidada como “Periodização Táctica” (PT) a abordagem é preconizada e defendida

por treinadores como Mourinho, Peseiro, Carvalhal, Queiroz, etc. …

É exclusivamente sobre esta abordagem metodológica de treino que este texto irá

se debruçar, procurando abordar alguns de seus pressupostos e identificar algumas

limitações e precipitações na implementação da Periodização Táctica (PT) como

modelo conceptual de treino.

2. ROMPENDO MITOS E PRECONCEITOS SOCIAIS NO TREINO

Quinta (2003) relativamente ao panorama desportivo português afirmava que

“treina-se pouco futebol e, quando se treina, tal realiza-se de uma forma aleatória, sem

objectivos, programações ou planeamentos a curto, médio e longo prazo. O ensino-

aprendizagem/treino do futebol, na maior parte dos casos, é efectuado sem um programa

e/ou métodos definidos, não se estipulando a concretização de objectivos individuais e

colectivos, ou seja, não se procurando que os jogadores e equipas atinjam determinado

nível ou saibam fazer da melhor forma esta ou aquela acção individual ou colectiva”.

Não são raros os casos em que imperou (e, por vezes, continua a imperar) a lei da

“corridinha e a pelada” como método de treino primordial de uma equipa de futebol. Em

alguns casos a “corridinha” evoluiu e/ou foi mascarada com a introdução de uma bola de

forma a ser visto como um treino “na moda” e quem o aplica ser considerado um

metodólogo sempre atento aos fenómenos evolutivos da performance desportiva, sendo

utilizada a metodologia do treino integrado de factores.

Aliás, este é um termo (treino integrado) que segundo Losa, et al. (2006) está já

quase desgastado de tanto uso, ainda que quase sempre, escassa, ambígua e

superfluamente abordado. Escasso porque a questão não é que tenha que incluir

percepção, decisão, etc., mas sim que os estímulos, podendo ser maiores ou menores,

devem ser sempre específicos do jogo. Ambíguo porque uma coisa é treinar com bola e

outra absolutamente distinta é treinar futebol. Por último, supérfluo porque a prática

sempre surgiu e surgirá da teoria prévia e profundamente organizada, e neste caso quase

sempre a proposta foi directamente prática. Para Oliveira et al. (2006) tal como é

normalmente utilizado o treino integrado não rompe verdadeiramente com a lógica da

Page 3: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

“norma de treinar”. O “treinar com bola” serve apenas como um meio de simular o treino

físico, e não como um imperativo para operacionalizar o modelo e os princípios de jogo

que se querem para a equipa.

Guilherme Oliveira (2003) afirma que antes de qualquer outra tarefa, o treinador

deve fazer uma introspecção acerca das suas ideias de futebol. Dessa auto-reflexão

devem ficar claras as ideias de como queremos que a “nossa” equipa jogue, tanto nos

aspectos mais gerais como nos aspectos mais particulares. O futebol é considerado como

uma modalidade desportiva eminentemente táctica (Teodorescu, 1984; Meinel y

Scnabell, 1988; Deleplace, 1994 citados por Oliveira, 2006). Considerando que o futebol

pode apresentar alguma regularidade, dentro da sua extrema complexidade e

aleatoriedade próprias de um jogo, ao treinador exige-se que modelize um tipo de jogo

(Fernandes, 2003).

Nesse contexto, segundo Garganta (2007) o futebol só faz sentindo entendido

dentro de uma proposta táctica, com o treino visando a implementação de uma “cultura

para jogar”. Para o autor, a forma de jogar é construída e o treino consiste em modelar os

comportamentos e atitudes de jogadores/equipes, através de um projecto orientado para o

conceito de jogo/competição.

Assim, antes da definição de uma qualquer metodologia ou “tipo” de treino o

treinador deve ter um modelo de jogo perfeitamente definido. Guilherme Oliveira (2003)

define modelo de jogo como uma ideia / conjectura de jogo constituída por princípios,

sub-princípios, sub-princípios dos sub-princípios, representativos dos diferentes

momentos / fases do jogo, que se articulam entre si, manifestando uma organização

funcional própria, ou seja, uma identidade. Esse Modelo, como Modelo que é, assume-se

sempre como uma conjectura e está permanentemente aberto aos acrescentos individuais

e colectivos, por isso, em contínua construção, nunca é, nem será, um dado adquirido.

Ou seja, o modelo de jogo deve ser entendido com um sistema auto-organizado e

autopoiético, algo em aberto e dinâmico, contemplando mudança, um aspecto

determinante para emergi-lo da criatividade dentro do sistema, que, tendo subjacente um

determinado padrão, permite ao jogadores, evoluírem para níveis de complexidade mais

elevados, sem perda de identidade (MACIEL, 2008). Nesse preceito, o Modelo final é

sempre inatingível, porque está sempre em reconstrução, em constante evolução.

Page 4: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Este aspecto é também defendido por Faria (2003) pois se o objectivo é ter uma

equipa organizada para competir, essa organização só se consegue através da utilização

de exercícios de jogo pertencentes a um modelo de jogo e que permitem exacerbar um

conjunto de princípios que definem esse modelo.

Relativamente ao modelo de jogo é importante salientar que a táctica não significa

apenas uma organização no espaço de jogo e uma repartição de missões específicas pelos

jogadores, mas sim a existência de uma concepção unitária para desenvolver o jogo, ou

em outras palavras, um tema geral sobre o qual permite aos jogadores estabelecerem uma

linguagem comum entre si (Martinez, 2003 citando Castelo, 1996). Para Faria (2003) o

futebol é táctica mas não um táctico qualquer. È um táctico modelo, táctico cultura, é

táctico como entendimento colectivo de uma forma de jogar e uma filosofia de jogo,

definida claramente pelo treinador e que tem que ser a relação entre cada um dos

elementos da equipa sob a qual todos se devem orientar. Portanto, táctico sim, mas como

modelo, cultura e linha de orientação em termos de organização do jogar. (Figura 1)

Figura 1 – Dimensão Táctica e suas inter-relacões

Page 5: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

È partindo deste pressuposto que nos permitimos a avançar para uma breve

introdução à especificidade. Gibson (1979, citado por Oliveira, 2006) define

especificidade como um conceito qualificador de uma relação entre variáveis. Essas

variáveis representam a informação específica de determinado contexto. No treino em

futebol de acordo com Castelo (2000) a especificidade pode ser definida como “um

processo pedagógico que visa desenvolver as dimensões tática, cognitivas-perceptivas,

técnicas, físicas, psicológicas, estratégicas e socio-culturais dos praticantes e das equipas

no quadro específico das situações competitivas através da prática sistemática e

planificada do exercício, orientada por princípios e regras devidamente fundamentadas

no conhecimento científico”. Mourinho (2001) afirma que no processo de treino deve

existir uma “exponenciação do princípio da especificidade. Uma especificidade/Modelo

de jogo e não apenas uma especificidade/modalidade.” Para Tamarit (2007) a

especificidade/Modelo de jogo relaciona-se com uma determinada forma de jogar,

distinta da especificidade/ modalidade que é apenas composta por exercícios físicos, as

vezes com bola.

Neste contexo, uma correcta metodologia de treino deve ser, segundo Mourinho

(2001), “orientada em função de grandes objectivos em que há uma relação íntima entre

o modelo de treino e o modelo de jogo, no qual, os jogadores, para perceberem o modelo

de treino, têm de perceber o modelo de jogo.” Ainda acerca do tema Losa et al. (2006)

consideram que quando se fala de treino físico-técnico-táctico, físico-técnico,… se trata

de unir ou somar coisas ou partes, que para tal tiveram que ser separadas previamente. É

aqui que reside o erro de base do planeamento convencional. Garganta et al. (1996)

refere de igual forma, que o futebol é um fenómeno multidimensional e, por isso, requer

uma interacção constante de suas dimensões. Ao referirem-se ao treino integrado, Losa

et al. (2006) remetem-no para a teoria dos sistemas dinâmicos, isto equivale a dizer de

que o todo é mais que a simples somas das partes pois, tal como refere Garganta (2001),

nos sistemas de alta complexidade que operam em contextos aleatórios, como aqueles

que coexistem num jogo de Futebol, a separação artificial dos factores que concorrem

para o rendimento desportivo parece revelar-se inoperante. Nesta ideia o futebol deve ser

entendido como um sistema complexo não linear, que se auto-organiza, tendo subjacente

um conjunto de padrões comportamentantais previamente definidos.

Page 6: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Jesualdo Ferreira (2006) refere que a grande alteração ao nível do treino foi quando

se viu, que para um jogador explorar todas as suas capacidades, era preciso pensar. Para

o mesmo autor, no futebol é preciso tomar decisões contantemente, ou seja, ter jogadores

inteligentes que saibam pensar nos vários momentos do jogo em busca de uma

identidade coletiva. Assim, a essência do futebol está na dimensão táctica, em treinar

exercícios que visem o implementação e organização de um jogar.

Mas o que devemos treinar? A organização do jogo da equipa, através de padrões

de acção, individuais e colectivas (nas diferentes escalas) com o objectivo de criar um

conjunto de referências decisionais para que os jogadores saibam o que fazer e possam

ser criativos nas diferentes situações do jogo (GUILHERME OLIVEIRA, 2009). Assim

o modelo de treino (PT), deve permitir que esses padrões de acção se transformem em

hábitos.

Atendendo a todos os pressupostos anteriormente expostos é importante

reflectirmos acerca de alguns aspectos que consideramos importantes para que exista

uma correcta utilização da PT. De forma a reforçar estas ideias, apresentamos abaixo os

princípios orientadores e alguns sub-princípios mais pertinentes da PT, contrastando com

seus erros e equívocos cometidos na aplicação destes pressupostos metodológicos.

3. PRINCÍPIOS E SUB-PRINCÍPIOS METODOLOGICOS DA

PERIODIZAÇÃO TÁTICA

Se observarmos os breves ideais apresentadas no tópico acima, percebemos a

importância na escolha de modelo de jogo e uma metodologia que operacionalize esse

jogar. Como citamos anteriormente, várias são metodologias que podem obter êxitos

desportivos, algumas sequer possuem em seu núcleo central um modelo de jogo

definido, outras até possuem, mas sem os estímulos específicos correctos para o

desenvolvimento do jogar pretendido.

A partir disso visualizando uma real evolução do treino em futebol, entendemos

que a Periodização Táctica (PT) disponibilizada um referencial inteligente para

operacionalização de uma forma de jogar. Em cima dessa idéia, selecionamos abaixo

alguns princípios metodológicos dessa abordagem e posteriormente contrastamos com

Page 7: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

alguns erros conceituais de aplicação. Em suma, pautamos todos os princípios

metodológicos, já que o morfociclo padrão (Figura 2) é somente atinjivel se esses

princípios estiverem interligados a todo instante e também contextualizamos alguns

sub-princípios mais impactantes, da mesma forma, interligados com os demais.

Figura 2 – Inter e Intrarelação entre os princípios e sub-príncipios metodológicos e

o Morfociclo

INTER E INTRA-RELAÇÃO

DOSdos dosDD dos

Page 8: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

3.1 PRINCÍPIO DA “DESMONTAGEM” E HIERARQUIZAÇÃO DO S

PRINCÍPIOS DE JOGO

Dentro de um modelo de jogo, tem-se vários princípios para serem trabalhados

durante os treinos. Segundo Brito (2003) os princípios de jogo são linhas orientadoras

básicas que coordenam as atitudes e comportamentos táticos dos jogadores quer no

processo ofensivo, quer no processo defensivo, bem como nas transições.

Assim, entra o conceito de desmontagem e hierarquização dos princípios para eleger

alguns objectivos parcelares a serem trabalhados. Nesse preceito, devemos entender

que apesar da supervalorização de alguns princípios o sistema de interação se mantém.

Em cima disso, os princípios são hierarquizados e desmontados para uma compreensão

didáctica dos participantes do processo, sendo que a essência do jogo e do jogar da

equipe não são alterados, apenas particularizados. (Figura 3)

Figura 3 – Redução da complexidade do jogo em estruturas complexas

Basicamente o que este princípio metodológico defende é uma “simplificação da

estrutura complexa do jogo” e uma constante relação construtiva alicerçada em

fundamentos tácticos progressivamente mais complexos com a finalidade última de

construir/consolidar o modelo de jogo adoptado. È a aquisição progressiva de vivencias

práticas de jogo que permitem um aumento da complexidade dos movimentos colectivos,

até porque ao mais alto nível a relação qualidade/complexidade é muito próxima.

Hierarquizar pressupõe também distinguir entre si os princípios mais e menos

Page 9: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

importantes em determinada situação/exercício pois só assim nos é possível intervir

coerentemente e seguir uma linha orientadora clara.

3.2 PRINCÍPIO DA ESPECIFICIDADE

Muita gente às vezes costuma dizer “ah, então não há nada mais específico do que

o jogo 11x11.” Não! Não é nada disso, isso é uma blasfémia. Porque se reconhecemos

que o nosso jogar tem X princípios e X sub-princípios, e deixamos em aberto a

possibilidade de acontecerem uma determinada quantidade de sub-princípios dos sub-

princípios, que são o resultado desta inter-relação concreta, portanto em termos de treino,

temos que lhes dar, de uma forma hierarquizada, sendo que umas são mais importantes

do que outras, mas temos que actuar sobre todas, sobre eles todos, para eles melhorarem.

A especificidade cumpre-se aí, é no respeito que tenho por todos os princípios, e o

respeito em termos metodológicos. Agora isto não é fácil, eu fazê-lo de modo a todos

melhorarem e sem se estorvarem, sem se contaminarem negativamente uns aos outros”.

(Frade 2006).

Frade (2006) considera este como um supra-princípio do treino em futebol. O

principio de especificidade da periodicação tática, segundo Oliveira (1991) deve criar

situações tácticas que o jogo da equipe requisita, impicando nos jogadores o

desenvolvimento de todas as dimensões, através do modelo de jogo adotado. Para Frade

(2002), o que condiciona a especificidade é o modelo de jogo da equipe e este possui

suas particularidades de acordo com cada contexto. Rocha (2003) afirma que essa

especificidade requer uma adaptaçao oriunda de exercicios específicos de determinada

forma de jogar. Neste contexto, devemos entender que cada jogar exige sua especificade

específica, ou seja, existem várias especificidades.

Esse conceito de especificidade remete-te a idéia de que os exercicos planejados,

deverão ser baseados na estrutura do jogo da equipe, na forma de jogar pertencente a

equipe ( TEODORESCU, 1977). Assim, percebe-se que todos os momentos do processo

serão contextualizados pelo jogar que pretendemos para a equipa, até nos pequenos

Page 10: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

princípios de jogo deve-se promover a linguagem comum, que o jogo da equipa deve

aspirar. (GOMES, 2006)

De acordo com Oliveira (2009), na Periodização Tática, só se considera algo

específico, se estiver relacionado com o modelo de jogo criado. Segundo o mesmo

autor, a sua operacionalização deve assumir várias dimensões/escalas: coletiva, inter-

setorial, setorial e individual. Além disso, o cumprimento do princípio de especificidade

da Periodização Tática é somente atingindo por inteiro se durante o treino: os jogadores

mantiverem um elevado nível de concentração durante o exercício; o treinador intervier

adequadamente e a antecipadamente perante o exercício e os jogadores entenderem os

objetivos e as finalidades do exercício. (OLIVEIRA, 2009) Frade (2006) sintetiza

afirmando que mais do que transmitir ideias, o treino é fundamental para fazer os

jogadores vivenciar essas ideias. A vivenciação das ideias do treinador só se consegue

através da criação de situações de treino que lhes permitam realizar inúmeras vezes uma

determinada acção.

3.3 PRINCÍPIO DA ALTERNÂNCIA HORIZONTAL EM ESPECIFI CIDADE

Segundo Gomes (2006), esse princípio reconhece que a operacionalização do

jogar tem exigências de esforço e, portanto, conseqüências específicas. Na concepção da

mesma autora, é fundamental que a gestão do processo assente numa relação de

desempenho-recuperação que permita a melhor adaptabilidade dos jogadores. Tamarit

(2007) confirma esse preceito ao afirmar que esse princípio é o encarregado de regular a

relação existente entre esforço e recuperação. Para que os jogadores se relacionem com

qualidade, tenham desempenhos positivos é preciso desenvolver o jogar por níveis de

organização, ou seja, variando a complexidade do jogar ao longo da semana. Assim, não

existe sobreposição porque dentro do mesmo jogar que se quer, as aquisições

comportamentais são de outro registo, em função da complexidade do jogo. (GOMES,

2006). Neste preceito, é necessário que se obedeça a uma alternância horizontal ao nível

do tipo de contracção dominante, segundo variáveis como tensão, velocidade e duração

da contracção muscular (TAMARIT, 2007). Percebe-se assim através desta abordagem

que a operacionalização incide em determinados aspectos do jogar tendo em contas as

exigências que cada “dimensão” comporta. Assim, ao longo da semana desenvolve

Page 11: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

diferentes escalas de organização (GOMES, 2006). A alternância tem que ser horizontal

e não vertical para escapar ao sobretreino (num dia uma coisa, noutro dia outra coisa, e

não um pouco de tudo em cada dia) – fazer alternância no mesmo treino não dá tanto

resultado.

Abaixo nas figuras (4 e 5), Aroso (2006) propõem um exemplo:

Figura 4 – Dimensões do esforço – 2 jogos semanais

Figura 5 – Dimensões do esforço – 3 jogos semanais

Page 12: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

3.4 PRINCÍPIO DA PROGRESSÃO COMPLEXA

Esse princípio pode ser caracterizado como a redução da complexidade ao Modelo

de Jogo, vivenciando princípios e subprincípios (TAMARIT, 2007). Assim procura-se

“montar” e “desmontar” os princípios e os subprincípios e hierarquiza-los durante o

padrão semanal e ao longo dos padrões semanais, consoante a evolução da

equipa.(OLIVEIRA,2009). A progressão deve fazer-se de acordo com estratégias de

aquisição de menor quantidade para maior quantidade. Para Frade (2001), os princípios

articulam-se entre si, mas há os princípios principais e os secundários em cada dia da

semana, e em cada exercício realizado.

Ao longo do padrão semanal de treino são transmitidas informações aos jogadores

que se pretendem transformar em aquisições de hábitos e padrões de jogo. Atendendo a

este facto a complexidade de informação transmitida deverá ser progressivamente

aumentada, ou seja, por exemplo, estratégia especifica para o jogo do fim-de-semana;

Inicialmente deverão ser transmitidas informações mais gerais de estrutura macro-

tactica de forma a dar uma visão global e abrangente daquilo que se pretende. Após uma

vivenciação deste tipo de informação pede-se ao treinador que vá pormenorizando as

suas informações a aumentando os seus critérios de exigência, até aos pormenores

micro-tacticos, para que os jogadores atinjam a performance desejada.

3.5 PRINCÍPIO DAS PROPENSÕES

Para Oliveira (2009) esse príncipio é definido com a densidade de princípios,

sub-princípios e sub dos subprincípios que se pretende treinar. Para Tamarit (2007), o

princípio das propensões consiste em fazer aparecer um grande número de vezes o que

queremos que os nossos jogadores adquiram, provocando assim a repetição sistemática.

Frade (2006) considera que se um determinado comportamento acontece 10, 20 vezes

no treino, até mais do que em jogo, é isso que me leva a maior facilitação em termos de

assimilação. Para Oliveira (2003) a repetição sistemática proporciona aos atletas uma

efetiva compreensão de determinados príncipios e padrões de jogo implemetados pelo

jogar da equipe.

Page 13: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Nesse contexto deve-se dar enfase em alguns aspectos que o treinador queira que

apareça no jogo da equipe, condicionando os jogadores a repetirem sistematicamente

jogando os comportamentos pretendidos.

3.6 SUB-PRINCÍPIO DA INTENSIDADE E CONCENTRAÇÃO DEC ISIONAL

A grande “conquista” da PT relativamente a outros métodos de treino está

relacionada com o tipo de estímulos a que os jogadores são sujeitos durante o padrão

semanal de treino. As questões relativas á intensidade de treino são fundamentais para

quem pretende aplicar esta metodologia pois a este conceitos está inerente não apenas as

questões de âmbito fisiológico mas, sobretudo, intensidades de concentração e de

constante pressão competitiva. Um exemplo muito fácil para percebermos relaciona-se

com a marcação de um penalty, por exemplo, este é um exercício ou acção de jogo que

em termos de intensidade fisiológica é quase insignificante é no entanto uma acção que

acarreta uma elevadíssima carga emocional e de grande intensidade para o sistema

nervoso central. Aquilo que se pretende é que independentemente do exercício provocar

ou não grande desgaste energético este seja capaz de provocar nos jogadores uma

pressão competitiva o mais próxima possível da realidade competitiva.

Devemos entender que a concentração também se treina e pode ser um factor

decisivo ao mais alto nível até porque a fadiga central é um dos grandes problemas do

Futebol, a denominada fadiga táctica (Carvalhal 2003) e que se caracteriza pela

incapacidade dos jogadores se concentrarem e dosearem o esforço resultando em perda

de entrosamento em situação de jogo. Para Carvalhal (2003) impõe-se ao nível do treino

uma inversão do binómio volume-intensidade, a intensidade é quem “comanda”, e o

volume deve ser gerido durante o microciclo como o somatório de fracções de máxima

intensidade (volume de qualidade) de acordo com o modelo de jogo adoptado. Podemos

construir um exercício surpreendentemente intenso fisiologicamente mas que dentro

daquilo que são as exigências do nosso modelo de jogo nada acrescenta o que para nós

significará zero em termos de intensidade na PT… Assim a intensidade resulta da

necessidade de criar dinamicas do jogar da equipe (Carvalhal, 2002)

Page 14: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Carvalhal (2003) afirma que o treinar com base em intermitências máximas de

acordo o modelo de jogo adoptado, vai criar o hábito no organismo de se cansar a

realizar neste tipo de esforço, mas também em função deste esforço a recuperar mais

rapidamente.

3.7 SUB-PRINCÍPIOS DA DESCOBERTA GUIADA

O processo de transmissão de informação em futebol, tratando-se de um sistema

complexo de interacção entre seres racionais com emoções e pensamentos distintos

deverá funcionar para além do simples processo de transmissão/assimilação de

conteúdos. O processo será tanto mais correcto quanto maior for a interacção entre os

intervenientes directos.

Mourinho (2002) descreve o seu processo de treino aquando da passagem por

Barcelona afirmando que “jogadores com este nível não aceitam o que lhes e dito

apenas pela autoridade de quem o diz. E preciso provar-lhes que estamos certos. A

velha história do mister ter sempre razão não é aqui aplicável. (...) O trabalho táctico

que promovo não é um trabalho em que de um lado esta o emissor e do outro o receptor.

Eu chamo-lhe a descoberta guiada, ou seja, eles descobrem segundo as minhas pistas.

Construo situações de treino para os levar por um determinado caminho. Eles começam

a sentir isso, falamos, discutimos e chegamos a conclusões. Mas para tal, e preciso que

os futebolistas que treinamos tenham opiniões próprias. Muitas vezes parava o treino e

perguntava-lhes o que eles sentiam em determinado momento. Respondiam-me, por

exemplo, que sentiam o defesa direito muito longe do defesa central. Ok, vamos então

aproximar os dois defesas e ver como funciona. E experimentávamos, uma, duas, três

vezes, ate lhes voltar a perguntar como se sentiam. Era assim ate todos, em conjunto,

chegarmos a uma conclusão. E a esta metodologia que chamo a descoberta guiada”.

O sucesso desta metodologia de ensino está no facto de os jogadores chegarem

às conclusões que nós queremos que eles cheguem, por isso é que se diz descoberta

guiada, porque terá que ser direccionada num sentido que é aquele que mais nos

convém a nós treinadores e á equipa em particular. O trabalho de um treinador em

última instancia será sempre assegurar que a sua equipa é autónoma e capaz de

Page 15: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

responder correctamente aos desafios que lhes vão surgindo ao longo da competição e

isto consegue-se tendo jogadores e uma equipa capaz de “pensar o jogo” e dando-lhes a

liberdade de, sempre dentro dos princípios de jogo definidos, tomarem livremente as

opções que mais consideram correctas perante determinadas situações. Com a

descoberta guiada, pretende-se criar jogadores inteligentes e críticos, condicionando-os a

descobrirem com suas próprias ações, reflexões e sentimentos os melhores caminhos para

chegar ao resultado final (jogar da equipa).

Assim, o trabalho diário deve primar por dar pistas e não respostas, responder a

questões com outras questões, obrigar os jogadores a reflectir e chegarem por eles

próprios às conclusões que pretendemos transmitir-lhes, mais que “dar um peixe,

devemos ensiná-los a pescar…”!

3.8 SUB-PRINCÍPIO DA LIDERANÇA

Sobre o tema liderança poderiam ser escritas várias teses pois é provavelmente

um dos temas mais sensíveis para quem comando um grupo ou equipa pois está

dependente de uma série de variáveis difíceis de controlar como personalidade, forma de

ser e estar de cada um, etc. Apesar disto, muito resumidamente, a meu ver, na PT

devemos funcionar implementando aquilo a que chamamos uma “Ditadura democrática”,

ou seja, sermos capazes de seguir o nosso plano de trabalho e as suas linhas orientadoras

de forma rigorosa mas sempre dando a ideia de que todos são parte fundamental no

desenrolar do mesmo. Para Goleman et al (2002), o objetivo central da liderença consiste

em gerar e compartilhar sentimentos positivos entre todos. Assim, o lider deve estar em

sintonia com os seus liderados, influenciando-os e motivando-os em todos os ambitos do

treinar/jogar.

O mesmo deve ter a capacidade de fazer com que as suas decisões pessoais

sejam encaradas ou compreendidas pelos jogadores como uma decisão de todos,

conduzi-los na direcção que mais nos convém, para tal é fundamental demonstrar

competência técnica e ser uma parte sempre activa no desenrolar das aquisições

vivenciadas de hábitos e padrões de jogo.

Page 16: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

Após a definição dos pilares da PT, expomos abaixo alguns “enganos” cometidos

por metodologos que afirmam utilizar alguns preceitos da PT.

Erros metodológicos na aplicação da PT

1. Modelo de jogo ambíguo

2. Planificação despormenorizada

3. Feedback generalista

4. Incorrecta “progressão pedagógica” de princípios de

jogo

5. Facilitismo

6. Excessivas preocupações com tempos de exercitação

e volumes/intensidades de treino

7. Perda de credibilidade como líder de

grupo/Liderança baseado na competência técnica

8. Monotonia no treino

9. Exercitação de exercícios e não de princípios

10. Controlo de evolução do processo de treino

1. Muitos são ainda os erros cometidos na introdução e conceptualização do termo

“Modelo de jogo” aliás este é definido com sendo “tantas coisas” que é difícil perceber

o seu real significado. A verdade é que o Modelo de Jogo de forma generalista trata-se

simplesmente de um projecto de organização colectiva de jogo, que deve ser

perfeitamente claro para todos os intervenientes do processo de jogo (treinador e

jogadores) envolvendo tudo aquilo que possamos considerar como importante para se

Page 17: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

jogar de determinada forma e/ou estilo. A verdade é que não existindo esta ideia clara

de organização de jogo torna-se difícil, senão impossível, aplicar a PT dado que esta só

é verdadeiramente eficaz se for aplicada tendo objectivos de introdução de hábitos e

comportamentos de jogo padronizados.

2. Usualmente as planificações são pouco pormenorizadas e não estão construídas

com as ramificações necessárias para abranger todos os fundamentos essenciais na

construção do jogo da equipa. A vivência no mundo do futebol leva-nos a afirmar que

são poucas as equipas técnicas que efectivamente definem, por exemplo, objectivos

específicos por posição, sector, corredor, etc. … em cada uma dos seus microciclos,

sessões e exercícios de treino. È importantes estarem claramente definidos e

programados objectivos ambiciosos e específicos para cada momento do jogo pois é

impossível percorrer um caminho se não soubermos como e para onde queremos ir…

3. Um dos principais problemas ao nível do treino e da investigação cientifica

baseia-se na influencia do feedback do treinador no treino, qual a sua importância e de

que forma influencia a prestação dos jogadores e da equipa. Este é sem dúvida um

aspecto que me parece fundamental na aplicação da PT pois o facto de a ênfase

fundamental do treino estar baseada na dimensão técnico-táctica leva a que o “habitual”

feedback de ordem simplesmente emocional e psicológico não possa ser considerada

uma solução q.b. para a resolução dos problemas levantados no treino. Exige-se de

quem lidera o treino uma observação meticulosa dos comportamentos individuais e

colectivos a sua constante e correcta correcção, assim como a valorização dos

comportamentos tidos como fundamentais para a construção de determinado processo

de jogo. È muito importante para um jogador ter informações in loco ou á posteriori

acerca da correcção das suas acções de jogo, pois só tendo essa informação ele poderá

corrigir/optimizar comportamentos. O feedback do treinador deve ser objectivo e ter um

significado claro para todos os jogadores baseado nas experiencias e vivencias de treino.

Habitualmente considera-se que “uma imagem vale por mil palavras” no entanto, o

papel dum treinador que utilize a PT como método de trabalho terá que ser “fazer com

que uma palavra signifique mil imagens” para o jogador e isto só se constrói com

intervenção específica e constante durante o processo de treino. (Exemplo, um jogador

ao ouvir o feedback “contenção” deverá rapidamente assumir uma postura corporal e de

interpretação de jogo que lhe deverá ter sido previamente transmitida e exercitada vezes

sem conta durante os treinos, a uma palavra ele deverá associar uma serie de momentos

de jogo e treino que deverão servir como linha orientadora de actuação perante aquela

Page 18: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

situação especifica). A verdade é que sem este tipo de atitude e forma de estar no treino

torna-se difícil a obtenção de resultados com esta metodologia.

4. Uma das tarefas mais difíceis que qualquer treinador tem é a de padronizar e

calendarizar correctamente os passos necessários para a obtenção de determinados

comportamentos individuais e colectivos. Qualquer hábito de jogo apenas surge com

uma intensa exercitação e com uma correcta introdução dentro dos processos de

organização de jogo da equipa. Todos nós treinadores, nos sentimos tentados a

introduzir novos processos colectivos na nossa forma de jogar no entanto muitas vezes

não somos capazes de precaver os efeitos nocivos que estes novos processos poderão

desencadear na qualidade de jogo da nossa equipa. De forma a minimizar os riscos é

importante que os processos de jogo sejam introduzidos de forma coerente e

progressivamente evitando precipitações. A tentação de avançar rapidamente com as

exigências e a complexidade dos movimentos por vezes impede sua correcta

assimilação e existindo erros nas bases tudo se torna mais difícil. (segundo a sabedoria

popular “Pau que nasce torto tarde ou nuca endireita”). De forma a conseguir uma boa

organização defensiva com método de jogo baseado numa defesa à zona é fundamental

que numa primeira fase os jogadores consigam dominar correctamente os princípios

defensivos individuais e colectivos elementares, por exemplo.

5. Um dos maiores riscos da utilização da PT como método orientador do processo

de treino encontra-se no facilitismo que habitualmente “corrompe” quer jogadores quer

técnicos em determinados momentos da época. A PT exige que se cumpra o princípio

da especificidade no treino aliado ao princípio das propensões, ou seja, a criação de

exercícios que “conduzam” os jogadores a determinados comportamentos e que

propiciem que os jogadores sejam colocados frequentemente em situações que os

obriguem a realizar os comportamentos pretendidos. O objectivo será que num breve

espaço de tempo um jogador seja colocado perante a “obrigação” de resolver uma

situação específica de jogo, só esta repetição sistemática e correctamente orientada

permite a sua correcta apreensão do comportamento desejado. A verdade é que a PT não

é assim entendida e por vezes cai-se na utilização frequente de jogo desproporcionado

de objectivos pedagógicos e sem uma orientação coerente. A utilização frequente de

jogo ou “formas de jogo” é um dos princípios fundamentais da PT no entanto este

principio tem sido subvertido e utilizado como um exercício que nada tem de especifico

e que serve apenas como um exercício quase anárquico ou pior ainda como uma forma

de manter os jogadores “entretidos a jogar uma pelada”.

Page 19: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

6. A PT assenta numa integração-interação de todas as dimensões do jogo

arrastadas em função de objectivos de índole táctica, ou seja, em função de um

objectivo previamente definido o exercício pode (aliás, deve) ser formatado através da

manipulação das suas componentes estruturais de forma a serem, também, atingidos os

objectivos relativos ás sub-dominantes do exercício, ou seja, imaginando que queremos

trabalhar uma cobertura defensiva; definimos um exercício com uma determinada

complexidade, tempo e espaço de forma a atingir objectivos relativos á dimensão física

e psicológica mas sempre subvertidos ao 1º objectivo que será sempre a correcta

realização da cobertura defensiva. A verdade é que esta lógica tem sido invertida e a

utilização de jogos reduzidos é feita, quase sempre, em função de parâmetros puramente

fisiológicos com uma excessiva preocupação com intensidades de treino e tempos de

exercitação deixando num plano muito pouco relevante a dimensão táctica que segundo

a PT deveria ser sempre a definidora da orientação do treino. Daqui advém em muitos

casos o falhanço na utilização desta metodologia de treino pois em muitos casos não se

conseguem atingir nenhum dos objectivos definidos pois o exercício acaba por não ser

específico para nada daquilo que pretenderíamos atingir.

7. O facto de a PT pressupor uma constante intervenção do treinador em função

dos objectivos tácticos e correcções frequentes de posicionamentos e formas de estar

leva, em vários momentos, a divergências de opinião com os jogadores pois enquanto o

treinador deverá em todos os momentos ponderar o melhor para o colectivo (que muitas

vezes não significa o melhor para cada um dos jogadores) o jogador tem tendência a

individualizar critérios de sucesso. A sensibilidade dos jogadores relativamente a

aspectos técnico-tácticos é maior do que relativamente a outras dimensões do jogo e as

correcções são sempre um foco de “desacordo” perante hábitos adquiridos e

experiencias de sucesso anteriores. O treinador terá que demonstrar, em todos os

momentos, competência técnica para que o jogador mesmo que tendo dúvidas siga as

suas indicações. Por exemplo um lateral que toda a vida tenha feito marcação individual

com sucesso vai-se sentir renitente com uma marcação á zona que o seu treinador

pretenda implementar no entanto faz parte do trabalho do treinador ser capaz de

argumentar e demonstrar através de exercícios de treino que os novos comportamentos e

hábitos de jogo são aqueles que mais interessam ao colectivo e que são realizados com

uma lógica que vai muito além daquilo que é o bem-estar individual do jogador. Não

conseguindo o treinador criar veículos de comunicação com os jogadores ser-lhe-á

colocada em causa diversas vezes a sua autoridade como líder do grupo. A competência

Page 20: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

e capacidade técnica do treinador terá que ser provada todos os dias, todos os treinos,

todos os exercícios… sendo difícil sobreviver apenas na base do carisma e da

capacidade de liderança psicológica pois a qualidade de intervenção no treino e no jogo

serão em última instância decisivas para ser um líder e não apenas um chefe.

8. A introdução constante de “jogo” como forma de treino sendo inicialmente

muito motivante poderá, a seu tempo, transformar-se num problema para o controlo do

treino dado que muitas vezes existe uma certa estagnação do processo de treino e este

torna-se monótono e previsível. Assim é importante que a complexidade dos exercícios

vá sendo reforçada/alterada ao longo do decorrer das sessões de treino. O jogo é

também “perigoso” pois causa nos jogadores uma grande fadiga ao nível do sistema

nervoso central e a “intensidade” de treino e de estímulos a que devemos dar resposta

devem ser ponderados antecipadamente. A fadiga do sistema nervosos central é uma das

maiores preocupações da PT e a incorrecta complexidade de estímulos pode ser

desastrosa para a equipa. Uma das estratégia utilizadas habitualmente de forma a evitar

este “burnout” é a introdução de diversas pausas na sessão de treino e a redução da sua

duração temporal, o importante não é o tempo que a sessão dura mas sim o números de

estímulos de elevado intensidade de concentração a que os jogadores foram sujeitos.

9. Uma ideia pré-concebida e que urge transformar é a de que existem exercícios

ideais para treinar um dado comportamento de jogo, a verdade é que, existindo

exercícios melhores ou piores, o objectivo do treino deve estar sempre definido em

função de princípios de jogo e não da correcta execução do exercício em si. Muitas

vezes exercita-se um exercício obsessivamente até que este decorra de forma perfeita

perdendo-se a noção de que o importante é que os princípios de jogo que o mesmo deve

exponenciar deverão ser o foco principal de treinador. A PT não pretende treinar

exercícios mas sim princípios de jogo, ou seja, tanto um mesmo exercício poderá ser

direccionado para diferentes princípios de jogo como diferentes exercícios poderão ser

direccionados para um mesmo comportamento ou hábito de jogo. O importante são os

objectivos finais estarem perfeitamente identificados e independentemente da forma de

lá chegar serem atingidos por todos. Muitas vezes existe a tentação em copiar de

exercícios sem se conseguir perceber verdadeiramente quais os objectivos que estão por

trás da sua realização e este é um caminho que raramente leva ao sucesso.

10. Como qualquer outro processo pedagógico têm que ser definidos parâmetros de

avaliação do trabalho desenvolvido e se segundo determinadas lógicas de treino o

controlo das variáveis é facilitado, o mesmo não acontece com a utilização da PT. Em

Page 21: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

metodologias que privilegiam aspectos físicos existem uma serie de testes e

metodologias de controlo de treino testadas cientificamente que nos permitem

estabelecer “fórmulas” de sucesso e ter uma noção clara da qualidade do processo de

treino. A fórmula mais fácil de avaliação numa equipa de futebol é simples:

RESULTADOS… No entanto nem sempre que se ganha tudo vai bem nem sempre que

se perde tudo vai mal, como tal o processo de treino terá que ser avaliável segundo

outros parâmetros de evolução que nos permitam ter dados relativamente á evolução do

processo. Este avaliação de processos deverá ser realizada em função da aquisição ou

não de determinados hábitos de jogo individuais, sectoriais e colectivos, esta será

sempre uma forma de avaliação sujeita alguma subjectividade e avaliação empírica no

entanto uma equipa que em cada dez estímulos de uma determinada natureza executa

oito vezes de uma forma padronizada será concerteza uma equipa que denota trabalho e

evolução de processo. Exige-se também uma avaliação em função da qualidade e não

apenas quantidade de acções resolvidas pela equipa e este tipo de controlo de treino é

muitas vezes negligenciado em função de objectivos de resultado ou curto prazo. A

análise simplista do processo de treino dificulta o diagnóstico dos problemas essenciais

e a correcta evolução do mesmo.

Page 22: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Transceder padrões instaurados na nossa sociedade, é uma inevitável batalha que

teremos que lutar incessantamente, especialmente no mundo no futebol, onde ideias

ultrapassadas presas a velhos paradigmas confusos e incoerentes ainda se fazem

presentes no seu processo de ensino-aprendizagem/treino.

Nesse preceito, buscamos atraves do presentre artigo demosntrar a nova tendencia

de treino Periodização Táctica, estabelecendo seus verdadeiros pilares e confirmar que a

mesma não tem nada a ver com integração de fatores, jogos reduzidos que visam

apenas evoluir físicamente e jogos anárquicos (peladões).

Assim, entendemos que o descobrimento e o entendimento da PT nos permite ser

realmente específicos e trabalharmos de acordo com as nossas crenças e ideias próprias,

condicionando os atletas a estarem aptos “por inteiro” para o jogar pretendido.

Como sabemos, uma concepção de treino absolutamente correcta e coerente nunca

existirá. Existem, concerteza, diversos caminhos para chegar ao objetivo pretendido;

caberá a cada profissional procurar aquele que melhor se adequa a sua realidade e aos

seus conhecimentos acerca do jogo e do treino. Não existem receitas, apenas o dia-a-dia

e a evolução das inter-relações estabelecidas nos darão as respostas que buscamos rumo

ao sucesso.

Page 23: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

5 -BIBLIOGRAFIA

• Brito, J. (2003) Documento de apoio à disciplina de Opção II - Futebol, UTAD, Vila Real.

Não publicado

• Carvalhal, C. (2003), “Periodização táctica. A coerência entre o exercicio de treino e o

modelo de jogo adoptado”. Documento de apoio das II Jornadas técnicas de futebol da

U.T.A.D

• Castelo, J. (2000): Formação continua. O treinador de futebol. Exercícios de treino no

futebol. Escola superior de desporto de Rio Maior. IPS.

• Castelo, J. et al. (2000) "Metodologia do Treino Desportivo", Edições FMH, 3ª edição

Lisboa

• Ferreira, J. (2006). Entrevista a Jesualdo Ferreira in revista Record Dez; Sábado 13 maio.

Nº 106.

• Fernandes, V. (2003): Implementação do modelo de jogo: Da razão à adaptabilidade com

emoção. Monografia de licenciatura. FCDEF-UP, Porto.

• Frade, V. (2000): Notas do curso, disciplina de metodologia aplicada I, opção de futebol.

FCDEF-UP, Porto. Não publicado.

• Frade, V. (2002): Notas do curso, disciplina de metodologia aplicada II, opção de futebol.

FCDEF-UP, Porto. Não publicado.

• Frade, V. (2003) Entrevista a Vítor Frade. In Martins, F. (2003): A periodização táctica

segundo Vítor Frade. Mais que um conceito, uma forma de estar e reflectir o futebol:

Monografia de licenciatura: FCDEF-UP, Porto

• Guilherme Oliveira, J. (1991): Especificidade, o pós-futebol do pré-futebol. Um factor

condicionante do alto rendimento desportivo. Monografia de licenciatura. FCDEF-UP,

Porto. Não publicado.

• Guilherme Oliveira, J. (2001): Programação e periodização do treino em futebol. Notas do

curso do 4º ano. FCDEF-UP, Porto. Não publicado.

• Guilherme Oliveira, J. (2003) “Organização do jogo de uma equipa de Futebol. Aspectos

metodológicos na abordagem da sua organização estrutural e funcional.” Documento de

apoio das II Jornadas técnicas de futebol da U.T.A.D.

• Losa, J., Moreno, O., Penas, D. (2006) “El valor de lo invisible. Fundamentación y

propuesta de organización y entrenamiento específico del fútbol” . in

www.efdeportes.com/ - revista digital, Buenos Aires

Page 24: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

• Martinez, L. (2003), “Organización de la fase de transición en el fútbol” Documento de

apoio das III Jornadas técnicas de futebol + futsal da U.T.A.D.

• Mourinho, J. (2000) “Um dia «à Benfica»”, Crónica no Jornal digital Maisfutebol

• Mourinho, J. (2001), “Programação e periodização do treino em futebol” in palestra

realizada na ESEL, no âmbito da disciplina de POAEF. Não publicado.

• Oliveira, R. (2005) “A planificação, programação, e periodização do treino em Futebol –

Um olhar sobre a especificidade do Jogo de Futebol”. in www.efdeportes.com/ - revista

digital, Buenos Aires

• Oliveira, B., Amieiro, N., Resende, N., Barreto, R. (2006) “Mourinho: Porquê tantas

vitórias?”. Gradiva Produções, lda., Lisboa.

• Quinta, R. (2003), “Modelo de jogo: da teoria á pratica” Documento de apoio das II

Jornadas técnicas de futebol da U.T.A.D.

• Faria, R. (2003): Entrevista a Rui Faria. in Fernandes, V. (2003): Implementação do modelo

de jogo: Da razão à adaptabilidade com emoção. Monografia de licenciatura. FCDEF-UP,

Porto

• Aroso, J. (2006); Periodização do treino em futebol. Documento de apoio Colóquio – O

treino em futebol

• GARGANTA, J. Modelação Táctica em Jogos Desportivos: A Desejável Cumplicidade

entre Pesquisa, Treino e Competição. I Congresso Internacional Jogos Desportivos.

FADEUP. 2007.

• MACIEL, J; A incorporacção precoce dum jogar de qualidade como necessidade

(eco)antroposocialtotal: Futebol um Fenómeno AntropoSocial Total, que primeiro se

estranha e depois se entranha e logo, logo, ganha-se! FADEUP. 2008. Monografia de

licenciatura

• OLIVEIRA, José Guilherme Granja; Periodização Tática: Um modelo de treino.

Universidade do Porto - PT . Sem data.

• Tamarit, X. (2007): Que es la “Periodización Táctica”? Vivenciar el “juego” para condicionar

el Juego

• Teodorescu, L. (1977): Teoria e Metodologia dos jogos desportivos – Monografia de

Licenciatura – FCDEF – UP

• Gomes, M. (2006): Do pé como técnica ao pensamento técnico dos pés dentro da caixa

preta da Periodização Táctica - Monografia de Licenciatura – FCDEF – UP

Page 25: PERIODIZAÇÃO TÁCTICA: PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES E ERROS METODOLÓGICOS NA SUA APLICAÇÃO

• Garganta, J., Maia, J. e Marques, A. (1996) Acerca da investigação dos factores de

rendimento em futebol. Revista paulista de educação física. São Paulo, 10 (2); 146-158.

• Garganta, J. (2001) “Futebol e ciência. Ciência e futebol”. In www.efdeportes.com/ -

revista digital, Buenos Aires

• Frade (2006) Entrevista a Vítor Frade em OLIVEIRA, R. (2006) "Alterações ao modelo de

jogo (?): A vertente estratágica do jogo - o scouting (observação e análise dos adversários)

e a sua influência na planificação de um jogo de futebol", Monografia final de Lic. em Ed.

Física e Desporto. UTAD, Vila Real.

• OLIVEIRA, R. (2006) "Alterações ao modelo de jogo (?): A vertente estratágica do jogo -

o scouting (observação e análise dos adversários) e a sua influência na planificação de um

jogo de futebol", Monografia final de Lic. em Ed. Física e Desporto. UTAD, Vila Real.