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EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1] Eixo: 1. Educação e Políticas públicas Elione Maria Nogueira Diógenes[2] Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estado compreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe” (POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm fina articulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção na sociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estado contemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porque contrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiu como queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a sua centralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticas públicas. Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade. Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as "the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS, 2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with the state, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37). In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in setting the new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes in specialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And if robusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation, implementation and evaluation of public policies. Keywords: Education, State, Public Policy, Society. I - INTRODUÇÃO O Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condições favoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste na conquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980). Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se está falando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS, 2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Com este texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociais Pág.1/70

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EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociais

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hegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, no

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contexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente sua

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força de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.

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A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:

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[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversas

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decisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,

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desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.ANDERSON, Perrry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo. (orgs.)Pós-neoliberalismo: as políticas e o Estado democrático. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.ARRETCHE, Marta Tereza da Silva. “Tendências no estudo sobre avaliação”. In: RICO, Elizabeth Melo.(org.). Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto deEstudos Especiais, 1999.BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre. Avaliação participativa de programas sociais. 2ª ed. São Paulo:Veras/CPIHTS, 2002.BLOCH, Ernest. O princípio esperança. Rio de Janeiro: EdUERJ: Contraponto, 2005.BOBBIO, Norbert et alii. O marxismo e o Estado. Rio de Janeiro, Graal, 1979.BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.BUCI-GLUCKSMAN, C. Gramsci e o Estado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.CASTRO, Maria Helena Guimarães de. Avaliação de políticas e programas sociais. Caderno de Pesquisa, n.12. Campinas: NEPP/UNICAMP, 1989.CODATO, Adriano Nervo e PERISSINOTTO Renato Monseff. O Estado como instituição. Uma leitura críticadas obras históricas de Marx. Revista Crítica Marxista, no 13, São Paulo, 2001.COHN, Amélia. Políticas sociais e pobreza no Brasil. Revista de Planejamento e Políticas públicas:IPEA, Brasília, n. 12&61484;&61472;jun-dez/1995.DIÓGENES. Elione Maria Nogueira. Pesquisas avaliativas em políticas públicas do ensino médio:concepções e abordagens Artigo apresentado à disciplina de Metodologia de Avaliação em PolíticasPúblicas: UFMA/PPGPP, 2007.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste na

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conquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominação

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política (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,

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1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,

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o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais de

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tais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelo

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governo. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento das

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questões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.ANDERSON, Perrry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo. (orgs.)Pós-neoliberalismo: as políticas e o Estado democrático. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.ARRETCHE, Marta Tereza da Silva. “Tendências no estudo sobre avaliação”. In: RICO, Elizabeth Melo.(org.). Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto deEstudos Especiais, 1999.BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre. Avaliação participativa de programas sociais. 2ª ed. São Paulo:Veras/CPIHTS, 2002.BLOCH, Ernest. O princípio esperança. Rio de Janeiro: EdUERJ: Contraponto, 2005.BOBBIO, Norbert et alii. O marxismo e o Estado. Rio de Janeiro, Graal, 1979.BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.BUCI-GLUCKSMAN, C. Gramsci e o Estado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.CASTRO, Maria Helena Guimarães de. Avaliação de políticas e programas sociais. Caderno de Pesquisa, n.12. Campinas: NEPP/UNICAMP, 1989.CODATO, Adriano Nervo e PERISSINOTTO Renato Monseff. O Estado como instituição. Uma leitura críticadas obras históricas de Marx. Revista Crítica Marxista, no 13, São Paulo, 2001.COHN, Amélia. Políticas sociais e pobreza no Brasil. Revista de Planejamento e Políticas públicas:IPEA, Brasília, n. 12&61484;&61472;jun-dez/1995.DIÓGENES. Elione Maria Nogueira. Pesquisas avaliativas em políticas públicas do ensino médio:concepções e abordagens Artigo apresentado à disciplina de Metodologia de Avaliação em PolíticasPúblicas: UFMA/PPGPP, 2007.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,

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implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração da

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classe burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?

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Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – e

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isto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamente

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ineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamente

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terreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Uma

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outra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.ANDERSON, Perrry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo. (orgs.)Pós-neoliberalismo: as políticas e o Estado democrático. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.ARRETCHE, Marta Tereza da Silva. “Tendências no estudo sobre avaliação”. In: RICO, Elizabeth Melo.(org.). Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto deEstudos Especiais, 1999.BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre. Avaliação participativa de programas sociais. 2ª ed. São Paulo:Veras/CPIHTS, 2002.BLOCH, Ernest. O princípio esperança. Rio de Janeiro: EdUERJ: Contraponto, 2005.BOBBIO, Norbert et alii. O marxismo e o Estado. Rio de Janeiro, Graal, 1979.BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.BUCI-GLUCKSMAN, C. Gramsci e o Estado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.CASTRO, Maria Helena Guimarães de. Avaliação de políticas e programas sociais. Caderno de Pesquisa, n.12. Campinas: NEPP/UNICAMP, 1989.CODATO, Adriano Nervo e PERISSINOTTO Renato Monseff. O Estado como instituição. Uma leitura crítica

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as

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"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação e

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subordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Ao

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desvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se manter

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como a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.

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Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço no

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âmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultados

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da luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.ANDERSON, Perrry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo. (orgs.)Pós-neoliberalismo: as políticas e o Estado democrático. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.ARRETCHE, Marta Tereza da Silva. “Tendências no estudo sobre avaliação”. In: RICO, Elizabeth Melo.(org.). Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto deEstudos Especiais, 1999.BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre. Avaliação participativa de programas sociais. 2ª ed. São Paulo:Veras/CPIHTS, 2002.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiu

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como queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

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2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de explorações

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florestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.

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140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é mais

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grave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda no

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século XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o caso

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de se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

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Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em que

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não faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedade

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capitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existência

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de relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduzir

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as relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinada

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sociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.

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A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde otempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:

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EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção dasrelações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na ótica

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marxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento doantagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

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Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organizaçãoburocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,

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opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentesEstados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estado

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burguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assim

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como, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

No interior dessas novas relações retomam-se as políticas Públicas não somente nos países de capitalismoavançado, mas nos países periféricos ou em desenvolvimento que são influenciados de uma forma ou deoutra pelas políticas econômicas dimanadas dos países economicamente dominantes mediatizadas pelasinstituições multilaterais «Existe, inegavelmente, uma estreita relação entre as instituições multilaterais eas políticas públicas nos países em desenvolvimento» (ALMEIDA, 2005, p. 184).Na relação entre políticas públicas e Estado, cabe destacar uma diferença cruciforme entre a perspectivaneoliberal e a crítica marxiana. Remete-se ao pensar a origem da questão social, na primeira ésimplesmente uma questão de teor individual e ponto. Já na filosofia marxista, tal situação (pobreza,

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miséria, exploração social) é resultante da relação de classes sociais. Do fato de que uns detêm apropriedade privada dos meios de produção e outros têm apenas a sua força de trabalho para vendê-la (ehoje, num mercado cada vez menos interessado, diga-se de passagem). A luta de classes se instalaexatamente aí e não apesar disto.No ponto de vista marxiano a pobreza não é natural e nem necessária, ao contrário é produto de relaçõessociais e econômicas historicamente forjadas. A questão da miséria está na expropriação de uma classesobre a outra e nunca esse antagonismo social ficou tão visível quanto na sociedade capitalista burguesa.A pobreza é resultado, então, da contradição fundamental entre capital e força de trabalho que impõe aesta última à produção de mais-valia (relativa e absoluta), possuindo desta forma um caráter estrutural(base econômica) que a perspectiva liberal e neoliberal – diga-se do capital – anula. Daí por que Marx sepreocupava em analisar o que está nova expropriação tinha a ver com as antigas formas de exploração, nosentido não de exaltar o seu caráter eterno (como assim o fazem os ideólogos do capitalismo do passado,do presente e de ad infinitum), mas de encontrar formas de luta política para teleologicamente superar asua própria contradição através da revolução social, da emancipação humana. Para Marx, não seria o casode se formular políticas públicas, mas de se organizar a resistência da classe expropriada para realizar atão sonhada revolução. Há tempo e condições históricas para isto? No próximo tópico daremos à resposta.

4. CONCLUSAOA vitória das ideias é a vitória dos portadores materiais das ideias. (Bertold Brecht).Coloca-se, de início, que as políticas públicas são estratégias de dominação da classe burguesa e/oufrações dela, no sentido de reproduzir as condições de acumulação capitalista. Enquanto tal são resultadosda luta de classes, e em sendo assim, configuram-se enquanto ação política historicamente determinada.As políticas públicas são, pois, um processo histórico e, deve-se considerar os aspectos econômicos epolíticos que lhe marcam a materialização. Não se erra quando se afirma o caráter classista das políticaspúblicas. A quem interessa, por exemplo, a atual política econômica do governo?A questão de saber para que e para quem são elaboradas, implantadas e executadas políticas públicas nãoé uma questão de cunho técnico-institucional, mas político. Neste sentido, a noção de luta socialpermanece válida, pois, possibilita apreender a presença da luta de classes no interior do Estado. Umaoutra questão fundamental a se problematizar é que desde a hegemonia neoliberal as políticas públicasimplantadas em prol da classe trabalhadora vêm – como num efeito dominós – caindo desastrosamente.O mais grave em toda essa história é que toda essa avalanche de medidas (políticas públicas) pró-capitale contra as mínimas conquistas da classe trabalhadora vem sendo colocada como necessária e parte deum ‘movimento avançado’ do capitalismo contemporâneo. Só não se diz que as tais políticas neoliberaisatendem a interesses exclusivos das frações da classe burguesa retentoras do já ‘crescido’ capitalfinanceiro e, por conseguinte, a ele pouco interessa o tão visível e nada ‘incômodo’ crescimento dasquestões sociais.Nesse tempo de poderio ilimitado da classe rentista, do capital financeiro e de “neoliberalismo” (políticaeconômica que serve de alicerce ao atual estágio do capitalismo) categorias como formação socialeconômica, modo de produção, contradição capital x trabalho, expropriação, exploração, luta de classes,luta social, socialismo, desenvolvimento histórico, estrutura e superestrutura, crises e muitos maisconceitos utilizados pela Economia Política tornaram-se propositalmente categorias fora de “moda”, emoutras palavras, esquecidas, e seu lugar foi sendo ocupado por pseudo-conceitos como globalização,desenvolvimento sustentável, movimentos sociais urbanos, políticas públicas, políticas sociais, exclusãosocial, inclusão social, desvalidos sociais, desfiliados que vêm sendo correntemente utilizados paralegitimar a atual ofensiva do capital contra os direitos das classes trabalhadoras em geral.Isto tudo é somente um começo... Não se pode esperar dias melhores... Há não ser com um amplomovimento de contestação a tudo que aí estar. Um amplo movimento de base popular e com fortecapacidade de luta social que seja capaz de afrontar a verdadeira face das políticas públicas neoliberaisimplantadas desde o final dos anos 70 até os nossos dias por parte do Estado capitalista atual. Ascircunstâncias históricas existentes atualmente estão a pedir medidas revolucionárias urgentes, a menosque se queira viver na barbárie contemporânea instaurada pela sede implacável do capital. O problema éem que tempo virão as tais medidas? Sabe-se que a situação política se modificou completamente desde o

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tempo de Marx e Engels com as complexas mudanças nas forças produtivas, mas o que sempre está emfoco é a capacidade de resistência e organização política das classes dominadas. Crê-se que ela espraia-sepela totalidade social, o seu poder de fogo hoje, não é o mesmo de outras determinações históricas que otempo nos informa, mas um outro mundo é possível, se é...

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASABREU, Haroldo. A trajetória e o significado das políticas públicas: um desafio democrático. Proposta, n.59, p.5-20, dez/1993.ABREU, Haroldo. Globalização, reestruturação e crise dos padrões de regulação sócio-estatal. Proposta,n. 64, p.8-28, mar/1995.ALMEIDA, Wellington. A trajetória das instituições financeiras multilaterais e suas relações com as políticaspúblicas. Revista de Políticas Públicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 173-216, jan./jun. 2005.ALMEIDA, Lucio Flávio Rodrigues de. Lutas sociais, direitos e políticas públicas. Revista de PolíticasPúblicas, São Luis, v 9, n. 1, p. 279-302, jan./jun. 2005.ANDERSON, Perrry. “Balanço do Neoliberalismo”. In: SADER, Emir & GENTILI, Pablo. (orgs.)Pós-neoliberalismo: as políticas e o Estado democrático. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.ARRETCHE, Marta Tereza da Silva. “Tendências no estudo sobre avaliação”. In: RICO, Elizabeth Melo.(org.). Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. 2ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto deEstudos Especiais, 1999.BARREIRA, Maria Cecília Roxo Nobre. Avaliação participativa de programas sociais. 2ª ed. São Paulo:Veras/CPIHTS, 2002.BLOCH, Ernest. O princípio esperança. Rio de Janeiro: EdUERJ: Contraponto, 2005.BOBBIO, Norbert et alii. O marxismo e o Estado. Rio de Janeiro, Graal, 1979.BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.BUCI-GLUCKSMAN, C. Gramsci e o Estado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.CASTRO, Maria Helena Guimarães de. Avaliação de políticas e programas sociais. Caderno de Pesquisa, n.12. Campinas: NEPP/UNICAMP, 1989.CODATO, Adriano Nervo e PERISSINOTTO Renato Monseff. O Estado como instituição. Uma leitura críticadas obras históricas de Marx. Revista Crítica Marxista, no 13, São Paulo, 2001.COHN, Amélia. Políticas sociais e pobreza no Brasil. Revista de Planejamento e Políticas públicas:IPEA, Brasília, n. 12&61484;&61472;jun-dez/1995.DIÓGENES. Elione Maria Nogueira. Pesquisas avaliativas em políticas públicas do ensino médio:concepções e abordagens Artigo apresentado à disciplina de Metodologia de Avaliação em PolíticasPúblicas: UFMA/PPGPP, 2007.

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[1] Pesquisa desenvolvida no doutorado em políticas públicas com o apoio do CNPq.[2] É professora adjunta II do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Alagoas e profesorapermanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da referida Universidade,. Atua como professoracolaboradora no Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. Líder doGrupo de Pesquisa: Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail:[email protected].

EDUCAÇÃO, ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS[1]

Eixo: 1. Educação e Políticas públicas

Elione Maria Nogueira Diógenes[2]

Resumo: Para se compreender o papel da educação é preciso fazer reflexões sobre o Estadocompreendido como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classe”(POULANTZAS, 2000, p. 130); e de outro lado: perceber o papel das políticas públicas que têm finaarticulação com o Estado, pois “Toda política pública é uma forma de regulação e intervenção nasociedade” (SILVA, 2001, p. 37). Neste sentido, realiza-se uma reflexão crítica sobre o papel do Estadocontemporâneo articulando sua atuação no cenário da nova fase de acumulação do capital. Isto porquecontrariamente ao que se divulgava e ainda se divulga na mídia especializada, o Estado não diminuiucomo queriam os neoliberalistas, antes se robusteceu. E se robusteceu justamente dada a suacentralidade na promoção, criação, formulação, implantação, implementação e avaliação das políticaspúblicas.

Palavras-chave: Educação, Estado, Políticas Públicas, Sociedade.

Abstract: To understand the role of education is necessary to make reflections on the state understood as"the material condensation of a relationship of forces between classes and class fractions" (POULANTZAS,2000, p. 130), and on the other side: notice the role of public policies that have thin conjunction with thestate, because "All politics is a form of public regulation and intervention in society" (SILVA, 2001, p. 37).In this sense, takes a critical reflection on the role of the contemporary state articulating its role in settingthe new phase of capital accumulation. This is because contrary to what is disclosed and still publishes inspecialized media, the state has not diminished as the neoliberals wanted before it robusteceu. And ifrobusteceu rightly given its centrality in the promotion, creation, formulation, implementation,implementation and evaluation of public policies.

Keywords: Education, State, Public Policy, Society.

I - INTRODUÇÃOO Estado é de fato concebido como o organismo próprio de um grupo, destinado a criar condiçõesfavoráveis para a maior expansão de classe [...]. A tarefa do proletariado, no momento atual, consiste naconquista dos poderes do Estado. (GRAMSCI apud BUCI-GLUCKSMANN, 1980).

Ao se discutir políticas públicas e suas especificidades o interesse é compreender de que Estado se estáfalando, trata-se de saber qual forma-Estado está em discussão, trata-se do Estado com frase (FARIAS,2001). Noutros termos, sugere-se fazer duas perguntas: quais políticas públicas? E para qual Estado? Comeste texto pretende-se contribuir criticamente para se pensar as bases em que às políticas sociaishegemônicas são implementadas, e quais os determinantes contextuais que as fizeram preferíveis aquaisquer outras. A esta altura, é importante ter clareza de que em tal determinação está presente certanoção de Estado e de política social que alicerça programas, projetos e ações interventivas.Compreendem-se políticas públicas como «formas de interferência do Estado, visando à manutenção das

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relações sociais de determinada formação social» (HÖFLING, 2001, p. 30). São, portanto, o ‘Estado emação’ (JOBERT, MULLER, 1987), em processo de implantação de um projeto de governo hegemônico, pormeio da criação, formulação e implantação de programas, de projetos e ações voltadas para tais ou quaisclasses sociais. Sob esta ótica, o Estado não se reduz à burocracia pública, em que os organismos estataisplanejam e programam as políticas públicas, agindo como mero instrumento de planejamento e execuçãodessas políticas. Muito menos um ente supra classista como na visão weberiana, mas é percebido na óticamarxiana de Poulantzas (2000).O entendimento dessa relação enquanto «síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso»(MARX, 1982, p. 14) e do referencial teórico quanto à perspectiva de Estado adotada, ressalta doisaspectos essenciais aqui considerados: 1) a relação orgânica entre Estado, classes sociais e políticaspúblicas; 2) a discussão sobre as referências teóricas que embasam as políticas públicas contemporâneas.Há que justapor um terceiro aspecto não menos importante: o caráter determinante das políticas públicasna fase atual (neoliberalismo), dominada pela financeirização e transnacionalização da economia, em quenão faltam ideólogos do capital colocando no centro das suas ideias, a necessidade de um Estado mínimopara o enfrentamento das questões sociais.O desenvolvimento desses três aspectos torna possível, pois, a finalidade essencial deste escrito: servir decontraponto as ideias em voga sobre políticas públicas, que as consideram apenas em seu aspectoinstitucional e burocrático, despolitizando o debate. Pretende-se opor a análise funcionalista das políticaspúblicas à análise de base dialética que confere relação contraditória a base e a superestrutura de umadada formação social, em que a luta de classes ainda não perdeu seu lugar na história.

2. CONCEPÇÃO DE ESTADO: classes sociais e dominação políticaNão se pretende neste tópico inicial do artigo fazer uma digressão analítica a partir das teorias clássicas doEstado, de Maquiavel (1469-1527) e Hobbes (1588-1679) até os nossos dias. Antes, é indispensáveldemarcar o arcabouço conceitual que permeia todo o texto. Ou seja, contrapõe-se a uma concepçãoburguesa de Estado – que o julga acima da luta de classes – à concepção desenvolvida por Marx(1818-1883), em que o Estado é uma relação historicamente determinada, uma relação de dominação esubordinação, uma relação mantida entre as classes sociais diferentes e antagônicas entre si. A não menosimportante formulação marxiana de que «A história de todas as sociedades existentes até hoje é a históriada luta de classes» (MARX, 1987, 102) serve de esteio das argumentações desenvolvidas aqui, uma vezque tampouco se comunga com a máxima ideológica do ‘fim da luta de classes’ propagada pelas teoriasneoliberais.No pensamento marxista, o Estado se manifesta como uma instituição «acima de todas as outras»(BOTTOMORE, 2001, p. 133), cuja função é a de assegurar e conservar a dominação e a exploração daclasse burguesa sobre o proletariado. Isto equivale a dizer que a categoria Estado expressa-se enquantoum ser social rico em determinações, cuja complexidade manifesta-se em dois níveis, no «fenomênicoquanto no essencial» (Farias, 2001, p. 30). No primeiro nível manifestam-se as relações sob a forma deaparência, que é a sua forma de governo, a legitimação do Estado por meio da democracia formalburguesa. No segundo, sob o aspecto de ocultação, encontra-se a forma-Estado, que é a sua essência,resultante da divisão capitalista do trabalho, cujo eixo é a manutenção da dominação política de umaclasse sobre as demais, onde a base de ação política é a luta de classes. Agregando-se à dominaçãopolítica (da classe dominante sobre a dominada) combinam-se, também, numa análise de classe doEstado, o jogo de contradições e de conflitos (referidos anteriormente) que existe entre a própria classeburguesa e as frações desta classe (POULANTZAS, 2000).Marx na análise feita nos textos As lutas de classes na França de 1848 a 1850 e O 18 de brumário de LuisBonaparte situa o Estado na arena da luta política entre as classes antagônicas (burguesia e proletariado)e as frações da classe dominante entre si. Ressalte-se que no texto sobre a Guerra Civil na França eleatribuía a gênese do Estado à Idade Média e o seu máximo desenvolvimento à sociedade burguesa, nocontexto da luta de classes, e na dominação política da burguesia sobre o proletariado e frações de suaprópria classe.No século XIX desenvolveu-se, vindo da Idade Média, o poder do Estado centralizado, com seus órgãosonipresentes – exército permanente, polícia, burocracia, clero, magistratura. Com o desenvolvimento do

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antagonismo de classe entre o capital e o trabalho, o poder de Estado foi adquirindo cada vez mais ocaráter de um poder público, para reprimir a classe operária, de uma máquina de dominação de classe.Depois de cada revolução, que caracteriza um processo de luta de classes, o caráter puramente repressivodo poder de Estado apresenta-se cada vez mais abertamente. O poder de Estado torna-se, depois darevolução de 1848-1849, “o instrumento nacional da guerra do capital contra o trabalho. O segundoimpério consolida isto”. (MARX, 1980, p. 249).

Ao fazer referência à instauração da República burguesa na França de 1848, na sua forma pura, o Estado,ratifica que o seu «fim confessado é eternizar a dominação do capital e a escravidão do trabalho» (1980,p. 113), e Engels completa este sentido na introdução ao Lutas de classes na França, deslanchando esteconceito de Estado, em pleno clima de efervescência revolucionária «todos os Estados modernos, éproduto de um pacto; primeiramente, de um pacto de príncipes entre si» (ENGELS, 1980, p. 109).Especialmente no primeiro texto o autor desvela o processo de dominação que caracteriza a sociedadecapitalista; analisando a relação entre a ação política da classe dominante e o aparelhopolítico-institucional, palco da relação entre sociedade e Estado, em outras palavras, o regime político. Masesse poder político não é homogêneo nem tampouco uma massa uniforme, na verdade, frações da classedominante se enfrentam e se combatem para fazerem valer o seu projeto particular de dominação. Assimanalisava Marx as lutas de classes na França de 1848 a 1850, sob o governo de Luís Filipe:Quem dominou sob Luís Filipe não foi a burguesia francesa, mas uma fração – os banqueiros, os reis dabolsa, os reis das estradas de ferro, os proprietários das minas de carvão e de ferro e de exploraçõesflorestais e uma parte da propriedade territorial aliada a ela – a chamada aristocracia financeira. Estaocupava o trono, ditava leis nas câmaras e distribuía cargos públicos, dos ministérios às lojas de tabaco.

Reconhecendo o Estado moderno como Estado da burguesia (frações) , ou seja, como Estado de classe,Marx e Engels (1987, p. 104) denunciam no Manifesto: «O governo do Estado moderno é apenas umcomitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia». Tal teoria refuta categoricamente aconcepção que diz ser o Estado um ente de interesse geral, do bem comum ou do interesse nacional. Aodesvendar o Estado enquanto comitê de negócios da burguesia, os autores do Manifesto buscavamdesmistificar as singularidades do Estado capitalista, nascido dos escombros da velha sociedade feudal epretenso arauto dos interesses gerais da comunidade nacional: “A sociedade burguesa moderna, surgidada ruína da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Apenas estabeleceu novas classes,novas condições de opressão, novas formas de luta em lugar das velhas”. (MARX, ENGELS, 1987, p. 103).Se os antagonismos de classe permaneciam, se a luta de classes continuava, a quem interessava ainstituição de um ente supraclassista?Ontem como hoje (observando-se devidamente as grandes transformações do início da era moderna aostempos do capitalismo transnacional), esse tipo de ideologia serve aos interesses da classe dominante. Eraesta equação que interessava a Marx resolver para instrumentalizar politicamente a classe trabalhadoraquanto aos caminhos da luta política, no sentido de emancipar-se do domínio da classe burguesa, pois emqualquer país onde se desenvolve a grande indústria, ou seja, relações capitalistas de produção «brota aomesmo tempo entre os trabalhadores deste país o desejo de explicar suas relações enquanto classe, comorelações da classe dos que vivem do trabalho com a classe dos que vivem da propriedade» (ENGELS,1987, p. 93). Independente do forte teor ‘utópico’ que existe na enunciação de Engels, não se pode deixarde apontar duas implicações determinantes numa tal construção: a primeira refere-se à questão dodesvendamento das relações de dominação política e a segunda trata especificamente da divisão social dotrabalho na sociedade capitalista, que, em suma, provoca uma incomensurável cisão social: de um lado osque têm apenas sua força de trabalho e de outro os que detêm os meios privados de produção.Nessa sociedade capitalista fixada na propriedade privada dos meios de produção e na exploração dosoperários assalariados despojados dos meios de produção e compelidos a vender invariavelmente suaforça de trabalho, a função do Estado é defender os interesses da classe dominante sobre o conjunto dasociedade. Ressaltam-se na teoria de Marx, dois aspectos diferentes de materialização e abstração doEstado: enquanto estrutura de poder e dominação política que absolutiza e absorve a dinâmica política daclasse burguesa, gerando em seu próprio seio teias reais de contradição. E enquanto organização

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burocrática, sistematicamente, formada por instituições e organismos, seções e subseções deespecialidades, cujas atribuições estão também relacionadas à manutenção de dominação através doarcabouço institucional de seus aparelhos. Isto dizia Engels em carta a Konrad Schmidt em 1890:(...) É do ponto de vista da divisão do trabalho que a coisa se concebe mais facilmente. A sociedade criacertas funções comuns, das quais não pode prescindir. As pessoas nomeadas para elas formam um novoramo da divisão do trabalho no seio da sociedade. Desta forma, assumem também interesses especiais,opostos aos seus mandatários, tornam-se independentes deles, e... eis o Estado. (ENGELS, 1987, p. 43).

Por isso, que muitos ideólogos adoram confundir propositalmente a essência da análise, colocando que talente (Estado) é uma instituição acima de todas as classes, supranacional, de forma a modificar os termosda relação. Não mais o Estado é produto das relações historicamente determinadas no interior de umadada formação social, mas é uma força sobrenatural sob a qual se subjuga todos os seres humanos, iguaisperante a lei. Ora, pensar assim é reificar o Estado, é tomar a criatura pelo criador, é negar a existênciade relações históricas, pior do que isto: é rejeitar num alto grau de alienação a historicidade das relaçõessociais, econômicas e políticas. Farias (2001) explica essa reificação como uma espécie de fetichismo doEstado em que este desempenha um papel mediador num dado território e em conseqüência sobre toda apopulação de duas formas ao mesmo tempo na «objetividade (sob a forma de uma máquina burocrática eadministrativa) e na subjetividade (sob a forma de democracia formal e de ideologia burguesacorrespondente)» (FARIAS, 2001, p. 31).Engels quando sustentava que: «A força de coesão da sociedade civilizada é o Estado» (ENGELS, 1980, p.140-141), e que é exclusivamente «o Estado da classe dominante» (ibidem) e, de todo modo,necessariamente «uma máquina destinada a reprimir a classe oprimida e explorada» (ibidem) estáchamando atenção para a segunda forma, ou seja, a dominação política, mas não está invalidando aprimeira (burocracia estatal) que não é menos dominadora. Muito ao contrário, tanto uma quanto a outrasão faces da mesma moeda, mas tem idiossincrasias distintas. Centrar análise na força política da classedominante é o cerne da concepção marxista sobre o Estado, contrapondo-se a uma análise formalista doEstado que só vai corroborar o domínio da classe dominante, que dentre outras coisas, precisa se mantercomo a mensageira da liberdade, da fraternidade e da igualdade, como se estes atributos estivessem jáconquistados de maneira a negar a luta de classes.Num outro momento, ao falar da relação entre economia e ordem jurídica (personificação peculiar doEstado), Engels afirma assim:O reflexo das condições econômicas sob a forma de princípios jurídicos é também, necessariamente, umreflexo invertido; dá-se sem que os sujeitos atuantes tenham consciência dele; o jurista acredita operarcom normas apriorísticas, sem perceber que estas normas são apenas simples reflexos econômicos – eisto porque tudo está de cabeça para baixo. (ENGELS, 1987, p. 45).

Se de fato, o Estado moderno capitalista aparece aos olhos, mentes e corações do grosso da populaçãoenquanto Estado de todos e não apenas de uma fração de classe ou classes, isto se dá porque, segundoMarx tal instituição tem quatro funções basilares, a especificar: em primeira ordem, o Estado exerce afunção de capitalista coletivo ideal, criando e mantendo as condições materiais gerais para a produção(infra-estrutura básica para o desenvolvimento do capital em seus diferentes ramos de atuação). Ou seja,o Estado garante, mantém e estimula o avanço das forças produtivas.A segunda função (no nível da superestrutura) é a personificação da ordem jurídica, ou seja, apresenta-seenquanto árbitro nas relações de produção, por meio de toda uma legislação, destinada a normatizar asrelações sociais constituídas no interior do processo de produção de mercadorias. O Estado é o mediadorpor excelência das relações entre capital e trabalho assalariado, intervindo como se não fizesse parte dasrelações de produção (neutro), isto é, age como um ente exterior no conflito de classes e assim completao círculo das condições internas para a produção e reprodução do capital.A terceira função é a da fisco-finança, isto é o Estado gera fundos coletivamente que lhe permite subsidiarsua ação estatal: «A permanência do Estado como forma particular e relativamente autônoma diante dasclasses sociais e, portanto, de sua existência para si depende da geração de fundos» (FARIAS, 2001, p.35). E a quarta e derradeira função consiste na política comercial externa preenchida pelos diferentes

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Estados nacionais contemporâneos no mercado internacional, cuja lógica é regida pelos ditames dos paísesde capitalismo avançado.Por fim, o Estado burguês realiza uma função estratégica no desenvolvimento, manutenção e conservaçãoda sociedade capitalista, é conditio sine qua non à formação do capital social coletivo, negando ascontradições inerentes e historicamente determinadas da relação capital e trabalho, em que a alienaçãomáxima ocorre da reificação entre o que é objeto e o que é sujeito. Com tais considerações sobre o Estadoburguês e entendendo-o como instrumento de opressão de classe sobre classe, e frações de classe entresi, as ações promovidas por tal Estado é caracterizada enquanto ação política da classe dominante queimpõe uma forma particular de dominação política cujas marcas são: a) manutenção, conservação ereprodução das relações econômicas e sociais da forma capital; b) criação e manipulação do poder deEstado pela burguesia ou frações desta; c) organização de uma burocracia estatal e especializada que seapresente como promotora do bem-estar comum e geral, institucionalizando a luta política em seu interiore “amenizando” a relação de conflito entre as suas diversas frações; e, d) pela necessidade de reproduziras relações capitalistas de produção e de dominação.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS: contrapontos em movimentoDiscutir políticas públicas significa entrar num terreno meio que permeado pelo “lugar-comum”.Explica-se: na literatura especializada sobre a temática existem poucos trabalhos de caráter crítico.Excetuando alguns bons autores que se pretende destacar, a grande maioria limita-se a entender“políticas públicas” no seu caráter fenomênico. Explica-se mais uma vez: na sua aparência. O que é maisgrave: há excelentes análises que a consideram na forma antinômica, isto é, de um lado políticaseconômicas e de outro, políticas sociais como se estas não estivessem profundamente articuladas com asprimeiras e fossem independentes na sua forma de ser, e ainda, como se não fossem instauradas elegitimadas no interior do Estado capitalista contemporâneo. Mais do que isto: como se as políticaspúblicas fossem produto de um ente supranatural, e não o resultado de uma correlação de forças entre asclasses sociais antagônicas entre si e frações da classe dominante, materializadas pelo aparelho Estatalnuma determinada formação social histórica.Políticas públicas são, pois, um termo que se pretende neutro, portanto, funcional à lógica dominante elegitimadora dos diferentes programas e ações implementadas pela máquina burocrática. Não à toa, odebate acerca das políticas públicas tem data recente. Década de 1990, símbolo histórico da vitória doideário neoliberal no Brasil. Assim, tal expressão foi utilizada para explicar o alto índice de desigualdadesocial no país mais desigual do mundo: a ineficiência das políticas públicas. É por que as “políticas públicassão ineficientes, se gasta muito e tem-se pouco retorno social”, tal retórica servia para tudo explicar. E defato, até hoje muita gente boa acredita que a “culpa” é das tais “políticas públicas” simultaneamenteineficientes e ineficazes. De toda forma, discutir políticas sociais na atual conjuntura brasileira é limitar-sea denunciar o alto nível de ineficiência do Estado e sugerir que substitua a racionalidade do desperdício eda ineficácia dos seus programas e projetos por uma lógica mais «igualitária, vale dizer, mais democrática» (COHN, 1996, p. 2).Figueiredo e Figueiredo (1986); Draibe (1989); Castro (1989); Arretche (1999); Frey (2000); Silva(2001); Gomes (2001) e Faria (2003) são alguns dos estudiosos que tem se dedicado aos estudos daspolíticas públicas no Brasil. No geral, suas abordagens destacam aspectos institucionais e processuais detais políticas, analisando os determinantes macroestruturais das políticas públicas, ou limitando-sedescrever os aspectos mecanicistas dos processos decisórios e administrativos a que as políticas dão lugarna fase de sua formulação, implantação e implementação. No entanto, o entendimento que se querenfatizar aqui é outro. Qual seja: o de que não é possível compreender a complexidade das políticaspúblicas fora da análise do Estado capitalista, vez que o Estado não é, sobre hipótese, uma forçasobrenatural, que vem do exterior e paira leviatanicamente sobre a sociedade (ENGELS, 1980). Num talsentido, consideram-se as políticas públicas:[...] como questões socialmente relevantes colocadas na agenda do governo num dado momentohistórico, numa formação sócio-econômica específica, e como o produto - sempre inacabado - da luta quese trava em torno da materialização de interesses contraditórios no arcabouço jurídico-institucional doEstado. (LABRA, 1988, p. 33-34).

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Colocando-se as políticas públicas como parte intrínseca da luta de classes que move a sociedadecapitalista, isto equivale a dizer também que dependendo da correlação de forças entre as classes sociais edo grau de organização da classe trabalhadora, ter-se-á mais ou menos políticas públicas favoráveis àssuas reivindicações. Daí que as políticas públicas atuais não são as mesmas, por exemplo, do períodopós-2ª guerra, considerando as relações estabelecidas entre o Estado capitalista e a sociedade civil, assimcomo, o grau de intervenção desse Estado nas questões sociais a partir da formulação e implementaçãodas políticas e programas sociais como potencializadores ou não de melhorias na estrutura social. Aprincipal reflexão de efeito, nesse caso, é a de que existem relações importantes a serem apreciadasquando se analisa essa ou aquela questão referente à avaliação de programas e políticas públicas. Höfling(2001) considera que:[...] uma destas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece entre Estado e políticas sociais,ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s) política(s) que este implementa, em uma determinadasociedade, em determinado período histórico. (HÖFLING, 2001, p. 30).

As relações entre Estado e políticas sociais tomam esse ou aquele contorno nessa ou naqueladeterminação histórica. De forma que, do desenvolvimento inicial do capitalismo concorrencial aocapitalismo monopolista e imperialista passando pela atual fase de reestruturação capitalista da produção,o Estado se metamorfoseou e as políticas públicas acompanharam essa dinâmica de transformação. Arelação entre este movimento e a «grande transformação» (POLANYI, 2000, p. 17) – iniciada ainda noséculo XIX e aguçada no contexto do pós-guerra –, que as sociedades de capitalismo avançado temexperienciado, é latente, ainda que possa parecer tardio. As políticas públicas atuais inscrevem-se nointerior de um tipo especial de Estado, são formas específicas de intervenções oficiais da classe dominantee/ou frações dela com vistas a manter o capitalismo rentista transnacional em pleno vigor. (HÖFLING,2001).Castro (1989), Silva (2001) e Barreira (2002) chamam a atenção para o fato de que nos Estados Unidosda América – EUA, a partir da década de 1960, as políticas públicas conheceu um estimável avanço noâmbito dos programas e projetos voltados para combaterem a pobreza. Bem contextualizadas astransformações sociais, é importante dizer que no período em foco o mundo era bipolar, ou seja, de umlado o capitalismo norte-americano e de outro o socialismo real da ex-República Soviética. Passados maisde trinta anos o socialismo do Leste Europeu ruiu frente à ofensiva capitalista dos EUA e o neoliberalismotornou-se hegemônico (PETRAS, 1999; MORAES, 1996; ANDERSON, 1995). A situação social da classetrabalhadora que não era confortável nas décadas do século XX anteriores às duas guerras mundiais, sótem se agravado desde então, quando o Estado de bem-estar social europeu foi perdendo paulatinamenteterreno para o Estado neoliberal, que ao redefinir as funções estatais formula programas «direcionadosaos mais pobres, tendo em vista a garantia de um mínimo de sobrevivência» (Silva, 2003, p. 239).Nesse contexto contraditório, em que o papel do Estado sofreu um reordenamento profundo, no sentido de“diminuir de tamanho” enquanto conditio sine qua non à liberdade extrema de funcionamento do mercado,implicando numa separação institucional das funções exclusivas e não exclusivas do Estado, as políticaspúblicas ganharam uma centralidade enquanto instrumento estratégico de gestão, com característicasdemarcadas no âmbito da administração e da gerência dos programas e projetos implantados pelogoverno. Esta realidade está inserida no contexto das respostas encontradas pela classe burguesadirigente à crise do Estado capitalista do pós-1970, que, no entanto só vai se expressar globalmente nadécada de 1990 do século XX. Nesse novo Estado,O novo padrão de acumulação não gera mais uma expansão do mercado (de trabalho e de consumo)como nos “anos dourados do desenvolvimento keinesiano-fordista”. O processo de globalização e deintegração regional vem progressivamente delimitando o espaço e os temas da soberania nacional ereduzindo – embora não eliminando – o poder de intervenção dos cidadãos e atores coletivos em diversasdecisões públicas nacionais. (ABREU, 1993, p. 8).

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