5

PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

5/14/2018 PIAGET E EXERC CIOS DE LIVROS - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/piaget-e-exercicios-de-livros 1/5

(1986)29,237.

26 Berger, RL.; Chick, F.Y. e Davida, N. Rev. Sci. Inst.,

(1968)39,362.

27 Beezer, A.E.; Volpe, P.L.O., Miles; RG.; Hunter, H.H.

J. Chern. Soc. Faraday Trans I, (1986) 82,2929.

EDUCAf;AO

28 Stoesser, P.R; Gill, S.l. Rev. Sci Instr. (1967) 38,

422.

29 Leydet, P.; Rose O. J. Chern. Phys. (1969) 66, 1777.

30 Sturtevant, 1.M.; Lyons, P.A. J. Chern. Thermodyn.

(1969)1,201.

A TEORIA DE PIAGET E OS EXERCfcIOS DOS LIVROS nmcncos DE QUWICA

Leda Verdiani Tfouni, *Dair Aily Franco de Camargo * e Elia Tfouni**

Departamento de Quimica - Faculdade de Filosofia, Ciencias e Letras de Ribeirrfo Preto- USP

14.049 - Ribeirao Preto - (SP)

Recebido em 22/04/86

Copia revista e recebida em 22/04/87

ABSTRACT

In this paper, exercises activities proposed to students

by highschool Chemistry textbooks are examined and

discussed according to being, or not, adequate for effective

teaching. Piaget's concepts of "operative knowledge" served

as theorical background. A nonquantitative analysis of

"figurative" exercises is carried out, and their negative

aspects, as well as the most commom mistakes they induceboth teachers and students into, are stressed.

INTRODUf;AO

A teoria de lean Piaget tern sido usada de maneira siste-

matica e proveitosa por pesquisadores educacionais ja ha al-

gum tempo. ESIDl.C.ificamentecom relacao ao ensino de

Ciencias, as varias aplicacoes da psicologia genetica foram

revisadas por Good et alii", e cobrem urn total de 131 pu-

blicacoes, relacionadas as seguintes areas de pesquisa:

10) - Relacao entre conteudos especificos de Ciencias e

o nivel cognitivo dos estudantes;

20) - Pesquisas sobre 0 nivel cognitivo de estudantes

com diferentes graus de escolaridade;

30) - Relacao entre instrucao formalizada, desenvolvi-

mento cognitivo e sucesso escolar;

40) - Tecnicas de avaliacao do nivel cognitive, com en-

fase especial ao estagio operatorio formal;

50) - Relacao entre 0 raciocinio formal de estudantes

de Ciencias e fatores tais como: sexo, Q.I., etc.;

60) - Relacao entre treinamento em tarefas piagetianas

especificas e melhora no desempenho escolar;

70) - Replicas dos estudos classicos realizados por Pia-

get e colaboradores.

Todos esses trabalhos tern urn ponto em comum: centra-

lizam seu interesse no grau de desenvolvimento cognitivo do

aluno, e estao voltados, aparentemente, para urn tipo de tra-

balho de apoio aos professores, visando promover, ou "me-

lhorar" 0desempenho escolar.

Uma critica que se pode fazer a esses trabalhos e que ne-

les a situacao ensino/aprendizagem fica simplificada, na me-

dida em que, de uma certa forma, 0binomio professor-alu-

no e considerado ai como 0 eixo central ao redor do qual

gira a instrucao formal dos conteudos especificos. A tare-

fa de ensinar/aprender parece reduzir-se a saber qual e 0es-

tagio cognitivo dos alunos e, consequsntemente, tentar ade-

quar, em funcao desse estagio, os conteudos a serem ensina-

dos.

o professor de 20grau n[o tern, dentro da realidade edu-

cacional, urn papel tllo central relativamente If conduzir pes-

quisas e preparar seu proprio material de ensino. Isto ocorre

porque atualmente uma terceira variavel interfere na relacso

professor-aluno de maneira forte, e, muitas vezes, negativa.

Trata-se do livro didatico, 0 qual frequentemente assume

urn papel central em sala de aula, colocando 0 professor

muitas vezes em segundo plano.

Com efeito, a funcao do professor em muitos casos pare-

ce estar reduzida a seguir 0 livro junto com os alunos.

Herron? faz algumas apreciacces pertinentes dos livros

textos utilizados pelas escolas americanas, que podem apli-

car-se a nossa realidade educacional.

Diz 0 autor, em primeiro lugar, que os livros didaticos

&[0 produzidos por editoras, as quais visam, naturalmente,

obter 0maior lucro possivel com 0menor investimento. As-

QU , l. 'I 'CA NOVA 10(21 (18871 127

Page 2: PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

5/14/2018 PIAGET E EXERC CIOS DE LIVROS - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/piaget-e-exercicios-de-livros 2/5

sim, de ano para ano, muito pouco e modificado no mate-

rial editado. Tampouco se leva em consideracao as diferen-

cas porventura existentes quanta ao tipo de alunos a quem

se destina esses manuais.

Com relacao a estrutura e conteudo dos livros didaticos,

acrescenta 0 autor que, como os livros sao, na realidade, in-

dicados aos alunos pelo professor, entao as editoras elabo-

ram livros que agradem aos professores. Ora, os criterios de

escolha do livro nem sempre incluem 0 aluno como referen-

cial basico, Deste modo, muitas vezes os livros-textos sao

inadequados, pois contern conceitos que estao acima da ca-

pacidade de compreensao dos alunos, ou entao utilizam-se

de gravuras, graficos, formulas que, ao inves de facilitar, di-

ficultam a compreensao dos alunos.

Por estes motivos, julgamos oportuno que se realize uma

analise dos livros didaticos a fim de detectar os eventuais

aspectos negativos dos mesmos e, deste modo, alertar os

professores para que deles facam uso com maior cautela e

parcimonia.

Neste trabalho, pretendernos abordar urn aspecto dos li-

vros didaticos que, do nosso ponto de vista, apresenta-se

muitas vezes inadequado com relacao a facilitacao ou mes-

mo compreensao dos conceitos que estao sendo ensidados:

os exercicios.

A fu n de mostrar essa inadequacao, escolhemos uma dis-

ciplina especifica, a Qufrnica, e procuramos fazer urn "le-

vantamento" dos tipos de exercicios que ocorrem em li -

vros didaticos de 29 grau para depois fazermos uma analise

qualitativa dos mesmos. Embora outros tipos de exercicios

e atividades possam ser encontrados, entendemos que os

que escolhemos para analise merecem urn exame devido a

ocorrerem com frequencia e ao seu carater predominante-

mente figurativo.

Utilizamos, como referencial teorico, os conceitos deco -

nhecimento operativo e conhecimento figurativo de Pia-

gee .4

Queremos ressaltar que os conceitos utilizados, no entan-

to, nao restringem suas possibilidades de aplicacao aenas a

Quimica, ou mesmo aos livros didaticos de uma disciplina

especifica. Por se tratar de uma teoria geral sobre a apren-

dizagem humano do ponto de vista da construcao do co-

nhecimento, os conceitos piagetianos tern irrestrito alcan-

ce e, podem, por esse motivo, ser usado em qualquer area

do conhecimento. 0 aspecto original deste artigo esta no

fato de que Piaget nao elaborou uma teoria sobre a educa-

~lro e aspectos especificos da situacao ensino-aprendizagem

em sala de aula, e e isto que estamos tentando fazer.A seguir, descrevemos brevemente os conceitos de

conhecimento operative e conhecimento figurativo para

Piaget.

Os aspectos figurativos do conhecimento estao relaciona-

dos as representacoes estaticas do mundo exterior, aos as-

pectos descritiveis, particulares e observaveis dos objetos.

Em virtude de sua propria natureza, que e de origem per-

ceptual e imitativa, 0 conhecimento figurativo, apesar de

sempre existir, predomina no estagio sensorio-motor e no

pre-operatorio. Esse predominio esta intimamente relacio-

nado ao desenvolvimento da capacidade simbolica da crian-

ca. A medida em que os objetos vao sendo internalizados, e

128 QUIMICA NOVA 10(2) (1987)

a imagem mental aparece, entao 0 individuo passa a ser ~a-

paz de lidar com objetos ausentes, e pode, portanto, dis-

pensar as caracteristicas puramente perceptuais que antes

eram necessarias para que 0objeto fosse conhecido. Por ou-

tro lado, 0 conhecimento figurative nao e invariavel, nem

garantido pelo real, uma vez que M fatores culturais, cog-

nitivos e emocionais que interferem no conhecimento esta-

tico que 0 sujeito tern do objeto. ~ atraves das representa-

~t'5esfigurativas, portanto, que 0 individuo pode represen-

tar-se a realidade e ao mesmo tempo descreve-la. Por ulti-

mo, vale dizer que no conhecimento figurativo M urn pre-

dominio da acomodacao sobre a assimilacao, 0 que equi-

vale a dizer que os objetos se lmpoem ao sujeito enquan-

to configuracces, e tern sua estrutura pouco modificada

pelo organismo.

Para Piaget", a acomodacao ocorre quando " ... ao in-

corporar os novos elementos aos esquemas anteriores,

a inteligencia modifica incessantemente os ultimos para

ajusta-los aos novos dados" (p.l8). Deste modo, 0 obje-

to predomina sobre 0 sujeito durante a acomodacao, e os

aspectos figurativos sA'0 muito mais enfatizados, resultando

disso urn conhecimentoe statico do objeto.

o conhecimento operative, por sua vez, tern sua origem

nos esquemas de acao e nas operacoes realizadas pelo sujei-

to sobre 0 objeto, a~t'5ese operacoes essas que identificam e

interpretam 0 objeto. 0 produto dessa atividade do sujeito

e algo inexistente no mundo exterior. No entanto, 0conhe-

cimento operativo esta intimamente relacionado ao figura-

tivo, uma vez que 0 primeiro serve para transformar, atra-

yes de inferencias, as representaoes figurais e particulares

do objeto, tipicas do segundo. Ao contrario do figurativo,

entretanto, que tern sua origem no proprio objeto, 0conhe-

cimento operativo origina-se internamente, sendo urn pro-

duto da assimilacao, e da necessidade logica de coerencia dosujeito.

A assimilacao e definida por Piaget'' como" ... a estru-

turacao por incorporacao da realidade exterior a formas de-

vidas a atividade do sujeito" (p. 17). Isto significa que a as-

similacao e 0 mescanismo responsavel pela interpretacao

dos dados da realidade, dentro das possibilidades cogniti-

vas do sujeito. Por este motivo, 0 conhecimento operativo

possibilita a transferencia, a generalizacao logica da inte-

l igencia.

Pode-se dizer, entso, que a verdadeira aprendizagem esta

intimamente relacionada ao conhecimento operativo. Por-

tanto, ao lado do conhecimento figurativo, factual, envoi-

vendo os conteudos especificos da disciplina que ensina, 0

professor deve propiciar aos alunos oportunidades para que

coloque em ~[o, e desenvolvam seu saber operativo. Isto

implica em favorecer 0 aparecimento de situacoes, experi-

mentais ou nao, que facam com que os alunos infiram, de-

duzam, comparem, interpretem, estabelecam relacoes en-

tre fenomenos, eventos ou dados, etc.

Queremos assinalar que nao e 0uso de exercicios figura-

tivos em si que estamos criticando. 0 que deve ser conde-

nado, do nosso ponto de vista, e 0 seu uso macico e incon-

dicional. De acordo com 0 quadro teorico apresentado nes-

te artigo, 0 conhecimento figurativo s o faz sentido quando

colocado contra urn pano de fundo operative.

Page 3: PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

5/14/2018 PIAGET E EXERC CIOS DE LIVROS - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/piaget-e-exercicios-de-livros 3/5

Analisando-se os livros didaticos, observa-se, no entan-

to, que muitas das atividades propostas requerem apenas

que 0 aluno use seu conhecimento figurativo do conteudo.

Para ilustrar, mostraremos casos tipicos em que isso ocor-

reo Os tipos de exercicios que serao apresentados a seguir

foram retirados de alguns livros-textos de Qufmica, os mais

adotados em escolas do 20grau da regiao de Ribeirao Preto.

Nosso trabalho na o pretende ser inferencial; 0 objetivo

do presente levantamento e antes, veneer uma etapa que de-

ve pre ceder a realizacao de tais trabalhos, segundo nossa

maneira de ver: conhecer alguns dados da populacao em es-

tudo. Fica pois explicado porque desconsideramos 0 tama-

nho(n) a casualidade e representatividade da amostra, aspec-

tos essenciais dos estudos inferenciais.

TIPOS DE EXERC(CIOS QUE EXIGEM

CONHECIMENTO FIGURA TIVO

1. Preenchimento de Lacunas

a) 0 atomo e constituido de tres particulas elementares:0 , 0 , e 0

b) os acidos reagem com as bases, forman do _

___ e Estas reacoes

recebem 0 nome de reacoes de _

pois originam solucoes , ou reacoes

de _

Comentarios: 0 trabalho do aluno aqui reduz-se a procurar

num texto anterior do livro a(s) palavra(s) "que cabe(m)" e

copia-lafs) no espaco correspondente. Em muitos caos, as

s en te ncao s ao id ent ic as a que la s do texto.

2. Aplica~o Automatica de Formulas j8 conhecidas

Calcular os equivalentes-grama dos elementos quimicos

abaixo. Sl£odados, entre parenteses, as massas atomicas doselementos.

a) Calcic (40)

b) Sodio (23)

c) Iodo (127)

d) Cloro (35,5)

e) Cobre (63,5)

Comentarlos: neste caso, a f6rmula e fomecida imediata-

mente antes e 0 trabalho se resume em identificar os sim-

bolos, substituir os valores e resolver 0exercicio de aritme-

tica. Como as val en ci as s ao em geral fornecidas por tabe-

las, 0 trabalho do aluno no exercicio acima reduz-se a pro-

curar os valores na tabela e substitui-los nas f6rmulas de

equivalente-grama. Logo, esses exercicios podem ser re-

solvidos sem que 0 aluno tenha compreendido 0 conceito

de equivalente-grama. No entanto, se 0 professor assegu-

rar-se de que esse conceito ja foi aprendido, 0 tipo de exer-

cicio acima pode perfeitamente ser usado como tecnica

complementar para a f ixacao da aprendizagem.

3. Memoriza~o do Conte6do

a) Enuncie a lei peri6dica.

b) De a de fi ni cao de molecula-grama.

c) A expressao matematica da lei de Raoult e:

Coment3rlos: este exercicio e bastante semelhante ao

do tipo 1. As mesmas observacoes feitas ali aplicam-

se neste caso.

4. Questaes de M61tipla Escolha

Assinale a proposicao correta:

a) isomeria funcional e aquela em que os isomeros per-

tencem a funcoes quimicas diferentes.

b) isomeria de compensacao ocorre quando os isome-

ros diferem pela posicao de urn carbono assirnetrico na

cadeia ca rboni ca . .

c) tautomeria e 0 caso particular de isomeria funcional on-

de osdois isomeros estao em equilibrio quimico dina-

mico.

d) isomeria de cadeia e aquela em que os isorneros tern ca-deias diferentes.

e) isomeria de posicao e aquela em que os isomeros tern a

mesma cadeia carbonica, mas diferem pela posiyiio de

radicais ou de ligayoes duplas ou triplas.

Comentarlos: este tipo de exercicio tern carater predomi-

nantemente figurativo nos casos em que somente exige do

aluno 0 reconhecimento da alternativa "correta", Depen-

dendo das proposicoes, os exercicios de multi pia escolha

podem requerer dos alunos urn trabalho mais operativo.

Alem disso, este tipo de teste pode assumir diversas for-

mas: "Associe a coluna da esquerda com a coluna da di-

reita"; "Assinale verdadeiro (V) ou falso (F)"; etc.

s. Siga 0mode1o

Exercicio Resolvido:

- 50 rnl de uma sQluyl£ode hidr6xido de s6dio neutra-

lizam completamente 20 ml de HNOJ 2N. Pede-se: a)

a normalidade da solucao de hidr6xido de s6dio utili-

zada e b) a massa de hidr6xido de s6dio existente nessa

solucao,

QUIMICA NOVA 10{2) (1987) 12 9

Page 4: PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

5/14/2018 PIAGET E EXERC CIOS DE LIVROS - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/piaget-e-exercicios-de-livros 4/5

Resolucao:

a) Usando a equacao VI NI = V2N2, temos:

V. =50ml

NI = ?

V2 = 20ml

N2 =2 N

portanto: VINI = V2N2 50. NI = 20.2

N2 =0,8 N

b) Pode ser ca1culada de duas maneiras:

i) primeiro calcula-se 0 numero de eq-g de NaOH

e = VN e = 0,050. 0,8 ==-e = 0,04 eq-g de NaOH

para, em seguida, ca1cular-se a massa de NaOH

e = ~ =-m = e. E = 0,04 x 40 ==-

m = 1,6g NaOH

ii) Este calculo sera mais facil utilizando a formula.

mN=EV

m=-0,8 = 40 x 0,050 ==-m = 0,8 x 40 x 0,050

~ m = 1,6 g NaOH

Exercicio Proposto:

40ml de solucao de KOH 0,6 N reagem completamen-

te com 20 ml de HO. Calcule: a) a normalidade do aci-

do e b) a massa de HCI presente na solucso original.

Comentarios:

Comentarios: neste caso, fornece-se ao aluno urn exerci-

cio resolvido etapa por estapa ("modelo") e em seguida pro-

poe-se urn exercicio que, para ser resolveido, deve passar

pelas mesmas etapas, ou semelhantes. Neste caso, 0 exer-

cicio resolvido passa a funcionar como urn algoritmo para

o aluno.

Comentarios Gerais:

A classificacao apresentada acima nao esgota as formas

que urn exercicio fiturativo pode assumir, nem teve a in-

tencao de propor "categorias".

Na verdade, pode-se observar que alguns tipos de exerci-

cios se sobrepoem, enquanto outros podem ser classifica-

dos em mais de urn tipo. Nossa intencao foi tlo somente

mostrar algumas formas sob as quais freqiientemente s[o

encontrados os exercicios de carater predominantemente

figurativo.

Tambem nao e 0 caso de se interpretar 0 que esta es-

crito como urn conselho para abolir completamente 0 co-

nhecimento figurativo. Conforme dito no inicio, os conhe-

cimentos figurativo e operativo nao existem sozinhos; eles

130 QUIMICA NOVA 10(2) (1987)

sao complementares. Nossa intencao foi apenas a de alerta

contra 0 uso indiscriminado de atividades predominante-

mente figurativas em salas de aula e no livro-texto adotado

Acrescente-se ainda que muitas vezes nao e a estrutura

do exercicio em si que determina seu aspecto figurativo

mas sim 0 trabalho intelectual que ele exige do aluno. Em

linhas gerais, sempre que se tratar de copias, memorizacao

pura do conteiido, ou "receitas", 0 exercicio sera mais fig

rativo: e, em contra partida, sempre que existir reelabora~[o, analise, sintese, interpretacao, etc., 0 exercicio ser

mais operativo.

Apresentamos abaixo urn exemplo de exercicio que r

quer predominancia do aspecto operativo do conhecimen

to:

Carbonato de sodio (NA2C03), clore to de amom

(NH4 C1) e nitrato de potassic (KN03) foram dissolv

dos em agua, A adicso de acido cloridrico (HCl), a est

solucao, ocasiona uma efervescencia devida a formaca

de gas carbonico (C02), A qual dos componentes in

cialmente dissolvidos se deve a formacao de CO2 ?

Para resolver esse exercicio, 0 aluno devera elaborar ur

raciocinio do tipo dedutivo, tomando como ponto de pa

tida a lei da conservacao da materia. Isto significa que e

deve saber que numa reacao qufrnica os atomos sso conse

vados. Ele precisara ainda saber estabelecer relacoes entr

os dados contidos no problema e comparar esses dados com

outros conhecidos ( por exemplo, 0 aluno pode fazer um

analogia entre esse problema e 0conhecimento previo ace

ca da formacao de uma molecula de agua, que so pode ocor

rer at raves da combinacao de hidrogenio e oxigenio, e nun

ca, por exemplo, de carbono e hidrogenio), Deste modo

mesmo nao conhecendo a reacao, ou 0processo envolvido

o aluno inferiria que, como so 0 carbonato de sodio ter

carbono, somente ele (no caso) poderia dar origem a ga

carbonico. Todas essas operacees apoiam-se no conhecimen

to operativo.

Esse mesmo exercicio, no entanto, pode adquirir carate

mais figurativo se, por exemplo, 0 aluno ja tiver visto su

resolucao em classe ou em algum livro, mesmo que de fo

ma ligeiramente alterada. Neste caso, apenas da memori

para configuracoes estaticas dependeria a resolucao do pro

blema.

A exemplificacao acima ilustra tambem como 0 carate

contextual 'dos exercicios pode toma-les mais operativos o

mais figurativos.

Cabe ao professor saber identificar e dosar adequada

mente as atividades figurativas que apresentara a seus alu

nos, a fun de prevenir que seu curso se transforme num re

ceituario ou mesmo em mero exercicio da memoria.

CONCLUSOES

Nossa intencao, nestas conclusoes, e redimensionar

questao da aprendizagem do ponto de vista construtivista.

Por esse motivo, nao estaremos nos atendo apenas a aspec

Page 5: PIAGET E EXERCÍCIOS DE LIVROS

5/14/2018 PIAGET E EXERC CIOS DE LIVROS - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/piaget-e-exercicios-de-livros 5/5

tos especificos do ensino de Qufrnica, mas a uma analise

mais geral daqueles aspectos que, do nosso ponto de vista,

servem como suporte teorico para uma atividade de ensi-

no mais apoiada numa enfase do conhecimento figurativo

do que no operativo.

o uso exclusivo de exercicios e atividades figurativas pe-

10professor apresenta alguns aspectos negativos, que passa-

mos a analisar:

19 ) - Nao conduz ao verdadeiro conhecimento, visto

que este, para Piaget, esta relacionado com as transforma-cees dinamicas e com a construcao do conteudo, qualquer

que seja ele;

29) - NlIo conduz a verdadeira aprendizagem, pois, na

medida em que bl i predominio da acomodacao, pode-se di-

zer que 0 conteudo "aprendido" corresponde a uma "co-

pia" do que foi "ensinado". Em muitos casos, 0 resulta-

do e a memorizacao pura, 0 "habito relativo ao manejo de

simbolos" sem qualquer participacao ativa, assimiladora do

aluno;

39) - Tambem nao propicia a transferencia de aprendi-

zagem, visto que na o leva a formacao de esquemas de assi-

m il ac ao , c uja principal caracteristica e possibilitar a gene-

ralizacao e a identificacao de novos eventos da mesma na-tureza.

Uma q ue sta o que pode ser formulada neste ponto e : Por

que se usam exercicios, tecnicas de ens ino, ava l iacoes , etc.,

que levam a utilizacao e construcao de conhecimento do ti-

b figurativo?

De urn modo geral, a aula inform ativa (que e 0 veiculo

privilegiado do conhecimento figurativo), alem de facilitar

o trabalho do professor, particularmente quando este con-

ta com 0 recurso do livro didatico, parte do seguinte pres-

suposto: a formacao do aluno e decorrencia da quantida-

de de informacao que ele traz armazenada na mente. Nao

resta duvida de que existem fatores i deo log icos subj acen-

tes a essa posicao, os quais, por sua vez, e st ao ligados a umaconcepcao especifica que 0 professor fa z a respeito do pro-

cesso de ensino-aprendizagem. Na o cabe aqui aprofundar

este aspecto, pela sua complexidade. Indicamos aos inte-

ressados no tema a leitura do artigo de Kohlberg e Mayer".

Retomando a questao acima, compete-nos acrescentar

que nao existe uma resposta, mas varias, e todas elas com-

plexas. Examinaremos, a seguir, algumas asseveracoes que

podem servir como respostas, e, ao mesmo tempo expli-

citam algumas posi~Oes dos professores com relacao ao

processo de e du ca cao . O s comen tario s que acompanham

cada asseveracao foram formulados tambem considerando

como referencial a teoria piagetiana:

10) - Ensinar e transferir 0conhecimento - aqueles que

acreditam nesta afirmativa creem tambem que a organiza-

~lIo do conteudo (no caso, a Qufrnica) de mane ira "didati-

ca" e suficiente para garantir a aprendizagem; que a organi-

zacao psicologica garante a logica. Em decorrencia, acredi-

tam que basta "relatar" 0 conteudo para que ele seja

"aprendido", e que, a area figurativa instrumentara 0 aluno

a compreender a realidade e atuar sobre ela. Ora, para a psi-

cologia genetica, nao existe essa transferencia de conheci-

mento do livro (ou do professor) para a cabeca do estudan-

teo 0desenvolvimento da inteligencia nao se faz so a partir

do conhecimento figurativo, mas sim atraves da aplicacao

dos esquemas de assimilacao a realidade a ser conhecida.

29 ) - Aprender e saber reproduzir conteudos - A

"aprendizagem" levada a efeito pelo uso de esquemas de

a comoda cs o, a tra ve s da enfase sobre 0 conhecimento fi-

gurativo reduz-se a incorporacao pelos alunos, dos dados

vindos de fora. A consequencia mais imediata disso e urn

acumulo das informacoes transmitidas, sem organizacao,

interrelacao, sequenciacao, 0 que transforma 0 aluno emurn deposito de conhecimento, de opiniOes alheias, ao

mesmo tempo em que 0 aliena de suas proprias opinioes,

experiencias, criatividade e espfrito crftico,

39) - Educar e evitar 0 "erro" - Muitos professores e

muitos livros-textos direcionam suas atividades para 0

"correto", e preocupam-se muito em fazer com que os

alunos "acertem", Em nosso sistema educacional, 0 er-

ro muitas vezes e visto como algo que deve, necessaria-

mente, ser evitado, algo proibido, quase pecaminoso. Ora,

quando se propoem aos alunos atividades relacionadas ao

conhecimento operativo (do tipo: estabelecer compara-

c oe s, c omp os ic ao e decomposicao, formular hipoteses,

etc.) entao a incidencia de "erros", ou respostas ines-peradas sera incontrolavel pelo professor. lei quando

se propoem atividades figurativas, reprodutivas, e mais

facil controlar e corrigir os erros cometidos. No entan-

to, Piaget considera 0 "erro" como fundamental para 0

processo da educacao, po is e quando 0 aluno erra que

se pode perceber 0 seu funcionamento intelectual, quais

operacoes mentais estao por baixo daquele raciocinio.

Deste modo, 0 "erro", no sentido comum, na o existe,

quando se considera 0 conhecimento operativo; somen-

te com relacao ao conhecimento figurativo. Craig 7 afirma,

com rezao, a respeito, que:

"In the study of chemistry, ( ... ) incorrect answers

would give the teacher important feedback, not only on

how is students think, but on his teaching and on the text

used".

Referencias

1 Good, R.; Krornhout, R.A.; Mellon, E.K.; J. Chem. Ed.

1979) 56,426.

2 Herron, J.D.;J. Chem. Ed., (1983) 60,888.

3 Piaget, J.; Problemas de Psicologia Genetica, Cia. Edit.

Forense, Rio de Janeiro, 1973.

4 Furth, H.G. Os aspectos operativo e figurativo do co-

nhecimento na teoria de Piaget. In: B.A. Geberfed)

Psicologia do Conhecimento em Piaget, Rio de Janei-

ro,1979.

5 Piaget, J. 0 Nascimento da Inteligencia na Crianca.

Rio: Zahar, 1975.

6 Kohlberg, L; Mayer, R.; Development as the Aim 0/Education, Harvard Educational Review. (1972) 42

(4),449.

7 Craig, B.S.;J. Chem. Ed., (1972) 49,807.

aUIMICA NOVA 10(2) (1987) 131