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1 ANO I EDIçãO 1 JANEIRO 2015 grandes eventos Os primeiros DAS MODELOS Profissionalização COMO objeto de desejo Moda artesanal WALTER RODRIGUES Entrevista com da indústria Transformações A CARA DA Moda Piauiense

Piauhy Fashion Mag

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Revista sobre a história da moda piauiense - Ed. 1

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Ano I EdIção 1 JAnEIro 2015

grandes eventosOs primeiros

DAS MODELOSProfissionalização

COMO objetode desejo

Moda artesanal

WALTER RODRIGUESEntrevista com

da indústriaTransformações

A CARA DA Moda Piauiense

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CARTA

editordo

HHoje somos reflexo daquilo que vestimos. Mas hoje, somos também o reflexo de um passado. A moda é expressão: de um povo, de um período, de uma cultura, de um comportamento. A moda conta história. Faz parte do contexto de um de determinado período histórico, que a partir de um novo olhar nos faz compreender quem somos, o que nos levou a chegar até onde chegamos e, principalmente, para onde vamos. Ao passo que caminhamos para o fortalecimento de uma identidade de moda própria do Piauí, um olhar para o passado se faz cada vez mais necessário. É preciso uma pausa, antes de seguir nas rédeas de um mercado tão efêmero, para entender como tudo tem acontecido. Nesse processo, valorizar o modo como o cenário da moda local foi construído é imprescindível para se desenvolver o campo atual e projetar o futuro a partir de nossas potencialidades. Mas não é só isso, vai muito mais além. É preciso também preservar nosso rico passado, antes que ele se perca, e tomã-lo como referência para o que somos. É por tudo isso que a Piauhy Fashion Mag entra no mercado. Para dar voz a nossa história, a nossa identidade e a nossa moda. Para trazer para o debate uma análise do antes, e oferecer uma olhar de como ele tem se relacionado com o agora. Nesta primeira edição, mostramos a cara de quem já fez, faz e vai fazer moda no Piauí. Mostramos as mãos de quem construiu, usou e mostrou, o que se faz aqui. Ainda damos espaço para o trabalho de quem constroi e divulga hoje o cenário da moda que vivemos. A vocês, espero que embarquem nesse delicioso passeio que propomos, e que se deliciem tanto quanto nós. A moda também é isso, uma viagem. Essa é só a primeira parte, de muitas que virão em outras futuras páginas. Contamos com vocês. Até a número 2!

YURI RIBEIRO

EXPEDIENTEPiauí Fashion MagEdição 1 – Janeiro de 2015Editor-chefe – Yuri RibeiroRepórter – Yuri RibeiroDireção de Arte – Yuri RibeiroProjeto Gráfico – Yuri RibeiroProjeto Editorial – Yuri Ribeiro Diagramação – Miguel AraújoFotos – Junior Reis, Karina Lessa, Yuri Ribeiro e Acervo do Jornal O DiaTratamento de Imagem – Miguel AraújoColaboradores – Ana Cristina Lima, Augusto Dantas, Benildes Braga, Gizela Falcão, Kássia Honorato, Loly Baldoino, Mageca Chaves e Suzanne Nunes.Orientação – Elizângela Carvalho

Agradecimento à

Aline Chaves, Aline Souto. Andressa Leão, Ana Cristina Lima, Augusto Dantas, Cláudia

Cyléia, Elizângela Carvalho, Emanuel Soares, Georgina Nogueira, Gilvana Lima,

Gizela Falcão, Igor Leite, Joana D’arc, Kalina Rameiro, Laysa Feitosa Maciel, Loly Baldoino, Ludmila Olicar, Mageca Chaves, Maihara Brandão, Martins Paulo, Otávio

Meneses, Rita Prado e Ruth Cazuza e Suzanne Nunes

Por acreditarem nesta publicação, por todo o apoio prestado e pela

ajuda constante.

A Piauhy Fashion Mag é uma publicação com fins acadêmicos. Não possui objetivos lucrativos nem publicitários. É um trabalho apresentado para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social com Ha-bilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Piauí (UFPI).*As fotos não creditadas são imagens de divulgação ou possuem autoria desconhecida ** Todas as publicidades veiculadas neste trabalho são meramente ilustrativas e exemplificativas. Não tiveram vinculo financeiro com o autor.

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conteúdo

casaInglEsa

PERsOna

MãOs dE fada

PElOs PassOs das MOdElOs

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A renda de bilro é apresentada neste editorial em um cenário que transborda história e moda. As peças da estilista Georgina Nogueira ajuda a contar as lembranças da Casa Inglesa, palco das reuniões da alta sociedade piauiense há anos atrás.

O estilo inconfundível de Dona Genu Moraes, que no auge dos seus 87 anos ainda cultiva a vaidade e a elegância que lhe tornaram conhecida na adolescência

A filosofia e o novo estilo de consumir que preza pela moda mais lenta , sustentável e

eticamente correta, chega ao mercado piauiense

As mãos de costureiras memoráveis que ajudaram a construir a moda piauiense. Como funcionava e o que mudou no oficio que atravessou décadas e que continua até hoje.

Como as transformações no setor industrial da moda ajudaram a criar um novo público consumidor piauiense

De hobby a profissão. A atividade de modelar foi ganhando força ao longo dos anos. Hoje é vista como uma carreira promissora e reconhecida.

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PIaUIEnsIdadE

IntERvIEw

slOwfasHIOn

MOda aRtEsanal PEdE PassagEM

MadEIn PIaUÍ

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Embarcamos em uma viagem pelos mais variados cenários interioranos do Piauí para relembrar a figura do vaqueiro e do sertanejo que por aqui passaram a partir das criações dos estilistas da nova geração

O Estilista Walter Rodrigues conta detalhes da parceria criativa com as rendeiras do Morro da Mariana.O trabalho contribuiu para o desenvolvimento do oficio das artesãs

Do utilitário ao vestuário. O trabalho manual volta ao mercado como objeto de desejo a partir do trabalho de artesãos e designers

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MERcadOA moda uniu-se às redes sociais para apresentar uma nova maneira de vender, consumir e fazer marketing de moda

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ÁlBUMModa que conta história. Fotografias antigas mostram como a moda fazia parte do cotidiano das pessoas há algumas décadas atrás.

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It PEOPlEO estilista Martins Paulo, nome do cenário piauiense que projetou-se nacionalmente, revela detalhes do seu processo criativo e sua percepção para o futuro da moda local.

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aRtIgOGizela Falcão apresentam um panorama de mudanças surgidas após a instalação dos shoppings em Teresina.

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SOBRE MODAPIAUIENSE,

e pessoasA hIsTÓria

“Por que escrever uma história da moda piauiense?” Parece um questionamento simples e de caráter predominantemente subjetivo, afinal cada um escreve sobre aquilo que lhe convém. Porém, através dele deparamo-nos com a realidade pulsante de uma cultura que efervesce e se manifesta por meio de um setor até pouco tempo bem tímido, mas que atualmente – como num mosaico – apresenta uma heterogeneidade de cores e formas que propõe um diálogo harmônico, ainda em construção.

Uma análise sobre a moda no Piauí permite compreender um pouco sobre o crescimento e a pluralização da cultura do nosso estado. Se contabilizarmos (apenas para exemplificar) que na última década foram estabelecidos cerca de cinco cursos de formação (entre graduação e pós-graduação), que alguns nomes e marcas emergiram e se destacaram, que estilistas de outros estados firmaram parceria com a produção artesanal local, que eventos na área aconteceram e acontecem com relativa frequência, temos nisso aspectos concretos que mostram quanto desenvolvimento acadêmico e comercial tem acontecido por aqui.

Tal desenvolvimento reflete também um interesse mais evidente por parte das pessoas em relação à moda, não somente no que diz respeito a aspectos globais:

discussões sobre tendências ditadas em grandes centros urbanos, mas àquilo que é produzido no âmbito local, consumido por sujeitos locais e exposto nos locais onde estas pessoas circulam. Não que o interesse e a criatividade não existissem em décadas anteriores, mas talvez estivessem esperando o momento adequado para abandonarem uma postura tímida e se manifestarem nesse contexto.

E se do contexto local falamos, devemos considerar também suas peculiaridades. Pelo bem ou pelo mal, vivemos em uma capital onde as pessoas parecem estar bem próximas, onde vínculos são estabelecidos de forma mais rápida e segura. Isso reflete nas relações que permeiam a produção e o consumo de moda local. Estilistas e clientes se comunicam e trocam informações em uma rede cuja boa manutenção é a base para a realização de um trabalho eficiente. Desta forma, conhecer de perto as pessoas que consomem seu produto e/ou trabalham na sua área permite uma comunicação mais clara e imediata. “Camaradagem” é a palavra de ordem na produção da moda local, o seu tom reflete na cara da moda piauiense.

Assim, para contar essa história, precisamos escutar as pessoas que dela fazem parte. Criadores, consumidores, parceiros, acadêmicos, admiradores... Todos possuem uma história pessoal

que reflete no seu interesse e na sua intenção de fazer parte disso. O desenvolvimento da moda local carrega um pouco das escolhas na vida de cada um desses sujeitos. O somatório da vida de todos estes constrói uma determinada cultura num espaço e tempo. História, moda e cultura são, portanto, indissociáveis. Deixemos então que cada um dos personagens fale por si, sem dúvida muitas destas falas distintas encontrar-se-ão em vários pontos.

Estamos ainda colocando algumas peças e estruturando o mosaico da moda local, que já está bem sedimentado e permite ousadias bem pensadas. A moda anseia pelo novo, e nisso se retroalimenta. Podemos, afinal, correr riscos e com eles aprender: o que der certo fica, o que não der pode abrir espaço para novidades.

Concluo refletindo sobre uma fala da toda poderosa editora chefe da Vogue americana, Anna Wintour, no documentário The September Issue (2009): Já que “a moda criatividade sempre à frente do comodismo e do receio. E que ela seja um imperativo na história que contaremos durante os próximos anos.

[Augusto Dantas Jr.]PSICólOGO, MESTRE EM ANTROPOlOGIA, PESquISADOR DE MODA, CulTuRA, CORPOREIDADE E SINTOMAS CONTEMPORâNEOS.

“De olho no mundo ao redor, mas sempre com a certeza de

que na impossibilidade de ver ao vivo, uma história bem contada

é muito bem vinda.”

[SOBRE MODA PIAUIENSE, HISTÓRIA E PESSOAS][ARTIGO]

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rOuPaSTransformandoideias em

OOs estilistas e figurinistas foram personagens importantes na história da moda piauiense. Os primeiros a aturem de forma profissional, marcaram décadas com criações que avançavam no tempo

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[mãos de fada]

Pelas mãos deles nasce uma roupa. O planejamento da peça, o caimento que ela deve assumir no corpo, os detalhes da costura e como deve ser o acabamento. Tudo isso é pensado através da subjetivação dos estilistas e dos figurinistas. Antes de ir para a costura, são eles que projetam como o produto deve ficar ao final, assumindo um papel fundamental no processo produtivo de itens de vestuário. No Piauí sempre existiram as pessoas que pensavam nas peças de roupa antes de fazê-las, era algo nato e que se aprendia com a prática. Com o passar dos anos, despontaram exímios profissionais piauienses, que se tornaram celebres na área.

A residência em que Fabiano Campos vive hoje revela muito do que ele já foi há alguns anos. O ambiente, de uma casa que mais parece uma galeria de arte, tem um pouco da sua personalidade artística em cada canto. Quem olha para a imagem do senhor de sorriso fácil, de brilho nos olhos e que vive praticamente isolado, em uma praia no litoral do estado, não imagina que ele foi um dos maiores figurinistas do Brasil nos anos 1970.

Fabiano Campos é filho de Floriza de Alcobaça Campos, moça rica do interior do Piauí e uma das costureiras mais famosas do estado. Foi dela que ele herdou o gosto pela moda e a paixão pelas artes que tanto inspiraram seus trabalhos. Na lembrança, Fabiano ainda guarda os primeiros contatos com esses dois universos: os episódios em que era amarrado ao pé da mesa de costura da mãe, como castigo por não querer estudar, e as vezes em que roubava tinta do cavalete dela para pintar.

O pai queria que ele seguisse o caminho militar, mas foi nos retalhos das costuras de Dona Florisa que Fabiano descobriu seu dom. Desde cedo ele aprendeu a unir os tecidos e transformá-los em vestidos para as bonecas da irmã. O aprendizado veio apenas da observação

Famosos croquis

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De longe, e entre e idas e vindas entre o Rio de Janeiro e o Piauí, Fabiano Campos costurou para três gerações nos últimos anos. Deixou de trabalhar com moda quando retornou ao estado. Sobre o motivo que o levou a parar no auge de sua carreira ele revela: “Tudo tem seu dia. O sucesso é só naquela época, aquilo foi só naquele momento. Vive muito, tudo. E ninguém vive de sucesso. Se vive de viver e de descobrir as coisas”, acrescentando que hoje não tem pretensão alguma a não ser continuar vivendo feliz.

A moda sempre fez parte da vida do parnaibano Jorge Ferraz. Desde cedo desenhava e tinha um enorme desejo de concretizar seus croquis. Nem

do oficio da mãe. “Eu ficava fascinado com o modo como se fazia uma roupa. Acho que tinha um espirito que baixava nela. Ela fazia coisas que ninguém nunca havia feito e deixava todos de queixo caído. Eu nunca vi talento maior que aquele por aqui”, lembra.

Aos 17 anos, Fabiano foi estudar Belas Artes no Rio de Janeiro. Com o aperfeiçoamento do seu traço na escola, começou a desenhar croquis – foi um dos primeiros no Piauí a fazer isso de forma profissional. De lá, começou a enviar seus desenhos junto com cortes de tecidos que escolhia para o atelier de Dona Florisa, em Teresina. Sob encomenda, a mãe executava todas suas criações para a alta sociedade da época.

Anos mais tardes, em meados da década de 1970, Fabiano Campos começou a trabalhar na loja Tecelagem Moderna, do Rio de Janeiro, em Copacabana, que produzia estamparias próprias e confeccionava peças. Foi a partir daí que fez carreira na área e levou o nome do Piauí para o Brasil. Depois de candidatar-se a uma vaga de desenhista de moda no estabelecimento, ele começou a criar para o país inteiro. As criações nãos se restringiam apenas a vestidos e as pinturas de Fabiano começaram a virar estampas exclusivas.

Em um ano ele já estava gerenciando as duas unidades da loja e

Moda devanguarda

a fábrica. Passou a viajar pelo mundo inteiro conhecendo eventos de alta-costura internacionais e vendendo os tecidos que fazia para a loja. Fabiano Campos logo fez carreira no Brasil. Aproveitando o boom de figurinistas da época, ele também começou a criar peças para celebridades, emissoras e revistas. A partir do seu trabalho na loja de tecidos começou a vestir estrelas nacionais como Gloria Meneses, Regina Duarte, Arlete Sales e Yonná Magalhães.

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[mãos de fada]

O MERCADO DA CRIAçãO

Na década de 1970 a moda passou por transformações. Ela se modernizou a partir do foco no design das roupas. Essa preocupação e essa corrente de pensamentos tiveram início com movimentos de grupos de profissionais. Neste período, em Paris, surge o “Os estilistas”, organização que reunia designers, costureiros e artistas plásticos em prol da moda rejuvenescida. A iniciativa inspirou o aparecimento de um grupo também no Brasil. Na mesma época, 11 estilistas se uniam através do Grupo Moda Rio. Nomes como Sonia Gallota, Marco Rica, Suely Sampaio, Gregório Faganello e Ana Gasparini se juntaram para

restaurar a moda carioca. O objetivo era produzir, na cidade do Rio de Janeiro, um evento para apresentar uma moda de vanguarda. O trabalho de criação também ganhava o mercado através do entretenimento. A televisão atingiu seu auge ao lançar novidades da moda através das novelas e a partir da atuação do figurinista - que desenvolviam modelos e mandavam confeccionar. A profissão foi imprescindível para a pulverização da moda. Esse profissionais, que transformavam as celebridades, ajudavam o público a formar uma opinião ao inserir suas criações em uma mídia que se comunicava diretamente com a moda.Na década de 1970 a moda passou por transformações. Ela se modernizou

a partir do foco no design das roupas. Essa preocupação e essa corrente de pensamentos tiveram início com movimentos de grupos de profissionais. Neste período, em Paris, surge o “Os estilistas”, organização que reunia designers, costureiros e artistas plásticos em prol da moda rejuvenescida. A iniciativa inspirou o aparecimento de um grupo também no Brasil. Na mesma época, 11 estilistas se uniam através do Grupo Moda Rio. Nomes como Sonia Gallota, Marco Rica, Suely Sampaio, Gregório Faganello e Ana Gasparini se juntaram para restaurar a moda carioca. O objetivo era produzir, na cidade do Rio de Janeiro, um evento para apresentar uma moda de vanguarda.

mesmo quando foi estudar Relações Internacionais na UNB, em Brasília, deixou a paixão de lado. Quando retornava de férias ao Piauí, com criações no papel, buscava desenvolver todos os modelos mandando para a costura. Foi em 1985 que ele resolveu investir profissionalmente na carreira. Na época fazia sucesso tudo que Jorge fazia.

Sem saber explicar de onde vinham, exatamente, as inspirações para uma moda tão à frente do seu tempo, Jorge Ferraz conta que produziu pouco. Depois de um curso de corte costura, passou a atuar mais no campo comercial. Seu atelier era pequeno, nunca gostou de trabalhar com muita gente, e sempre supervisionava cada etapa da produção. No começo, gostava de criar os modelos e montar uma coleção – colocada em uma mala que o acompanhava em viagens pelo Brasil para serem vendidas.

As peças fabricadas por Jorge Ferraz também eram apresentadas em majestosos desfiles em Parnaíba e em Teresina. As apresentações eram consideradas ousadas e inovadoras na época. Segundo ele, esses desfiles eram uma boa maneira de chamar a atenção para o seu trabalho. Até hoje o estilista não sabe dizer se a sua forma de se expressar através de roupas era compreendida pela sociedade daqueles anos, mas ele garante que o público apreciava bastante. “Eu tinha um time muito bom, que pensava como eu, então era excelente’, conta.

Design e qualidade eram as

bases do trabalho de Jorge. O principal diferencial das criações era uma moda, que para época, respirava modernidade, a partir materiais naturais e que podiam ser encontrados regionalmente. Sem se preocupar se estaria atendendo ou não a um mercado consumidor, ele conta que tudo que criava era de forma intuitiva e seguindo o que ele acredita ser um dom.

Jorge Ferraz cria até hoje. O foco em matérias-primas naturais continua, como o uso de fibra natural, algodão e a seda pura. Atualmente, suas criações se estendem também para o nicho de acessórios. Ele transforma recursos inusitados em colares e brincos e expõe para venda no centro de Parnaíba. Sobre as mudanças da época que começou para os dias atuais ele não hesita em elencar: “Acho que hoje a maioria do consumidor está sem poder impor a vontade dele. Já no mercado, as coleções estão cada vez mais rápidas, o processo está mais rápido, isso tudo para movimentar o consumo”, finaliza.

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Esta é sem dúvida uma das profissões mais antigas do mundo. A arte de costurar - unindo duas partes de um tecido através de agulha e linha – teve início ainda com a própria necessidade do homem em cobrir o corpo com vestimentas. Este trabalho, base para a existência da cadeia da moda, aperfeiçoou-se com a industrialização surgida nos últimos séculos.

O aparecimento da máquina de costura foi o primeiro passo para o oficio sair de ateliers de costura para as indústrias. Apesar da criação de uma sociedade de consumo, com a cadeia de produção do prêt-à-porter no século XIV, o trabalho tradicional de ateliers de costureiras não foi extinto. Ele resiste até hoje à venda de roupas prontas, destinando-se a um cliente fiel ao atendimento personalizado feito em casa. No Piauí, grandes costureiras ajudaram a manter viva essa tradição e a inserir referências de moda no estado.

Dona Gercina Barbosa, hoje com 78 anos, foi uma das costureiras mais célebres de Teresina entre as décadas de 60 e 80. Ela aprendeu com a mãe o oficio da costura ainda quando era garota. Depois de vir para a capital com 15 anos, começou a costurar

fAdaMÃOS DE

OO trabalho de costurar em casa resiste à industrialização e mantem viva o hábito da ida aos ateliers de costuras piauienses. O atendimento exclusivo a um público sempre fiel faz com que a profissão atravesse décadas e continue tradicionalmente forte.

profissionalmente. Montou seu atelier em 1958, especializando em noivas, debutantes e vestidos de festa. Na época, ela conta que era comum as pessoas se dirigirem até as costureiras já com um “corte” de tecido para a fabricação de peças. Algumas, como era o caso dela, não desenvolviam desenhos, eram guiadas por figurinos ou moldes de revistas.

Com a costura, Dona Gercina tornou-se conhecida por construir peças para a alta sociedade da época e por vestir personalidades como as ex-primeiras-damas piauienses Florisa Silva e Maria José Arcoverde. Em 1972 passou a ser chamada de “Agulha de Ouro” graças a um título conseguido em um concurso que elegeria a melhor costureira do estado – a fama veio em seguida. Gercina Barbosa trabalhou como costureira durante 40 anos, mesmo durante o período que manteve aberta uma loja de aluguel de roupa, já nos anos 1990.

No mesmo período de atuação de Dona Gercina, outra grande costureira

Dona Gercina Barbosa na época em que abriu uma loja de aluguel de roupas

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expostas anualmente em mostras de bordados realizados por ela em casa. “Não pretendo parar tão cedo, porque isso aqui é o que me mantem viva, não tenho insônia, nem doença e os problemas da vida eu vou levando e entregando a Deus”, revela, entusiasmada com a arte de costurar.

Com o passar dos anos as mudanças de fato vieram. Isso é o que confirma Rosa Oliveira, costureira há pouco mais de 20 anos. Ela conta que a tradição das pessoas em frequentar ateliers de costura para encomendas de roupas sob medida não se perdeu com o surgimento de grandes marcas, lojas e inovações tecnológicas. Ao contrário, o hábito foi se alterando aos poucos de acordo com a necessidade do mercado e com o aparecimento de novidades.

Antes, ao ir a uma costureira, os clientes levavam recortes e revistas. A maioria frequentemente andava com modelos iguais as capas vigentes no mês. Hoje, Rosa conta que as pessoas já levam fotos de celulares. As inspirações são outras pessoas, e

[mãos de fada]

também fazia atendimentos em casa tão comuns no cenário da moda piauiense na época. Dona Etelvina Lago também construiu carreira no mundo da costura.

Chegando a fazer até 40 vestidos de primeira comunhão por ano, segundo ela, recebia clientes em sua residência, ainda nos aos 60, para encomendas de roupas de linho, bordados, vestido de noiva, debutante e também enxovais. O seu forte sempre foi o trabalho em renda e em pontos de linhas. Esse material em suas mãos se transforma também em blusas, camisolas de batizados, camisolas de dormir e colchas.

Dona Etelvina Lago conta que começou em um período em que tudo ainda era muito precário. A costureira avalia que as mudanças sofridas no setor de moda ao longo do tempo refletiram de forma positiva na profissão. De acordo com ela, houve um período em que no Piauí não havia luz durante o dia, as máquinas eram de pedal e as rendas eram caseadas a mão. Nos tempos atuais, ela acredita que além da tecnologia, a variedade de materiais disponíveis também beneficia quem vive desse oficio.

Com 76 anos, até hoje Dona Etelvina faz costuras, que são

celebridades vistas em redes sociais. Das publicações de moda mesmo, a costureira acredita que o público só absorve as dicas e as tendências de cada temporada.

“Hoje em dia as pessoas não levam mais o ‘corte’ ou molde porque não existe mais tradição. As mulheres de hoje não vestem aquelas modelagens antigas. Elas não querem mais aquele tipo de vestido tradicional. Elas desejam algo com material moderno visto na mídia. A própria matéria-prima, por exemplo, passou por mudanças. Atualmente as rendas já vêm prontas e os tules já bordados, o trabalho é facilitado, você só aplica no tecido. Antigamente a costureira tinha que fazer cada bordado”, detalha.

Perguntada sobre o porquê de as pessoas ainda serem ligadas ao hábito de ir às costureiras particulares, Rosa Oliveira prontamente responde:. “As pessoas continuam querendo coisas originais e exclusivas. Comprar pronto nem sempre é exatamente original e exclusivo”, destaca ela, acrescentando que “ costurar é tipo um dom, parece que já se nasce sabendo. É uma profissão que não vai se perder porque é muito tradicional. Uma costureira boa de verdade vai sempre acompanhar as mudanças da moda e dos materiais”.

Dona Gercina Barbosa exibindo o troféu que lhe deu o título de Agulha de Ouro

Dona Etelvina Lago, costureira de mão cheia que costura até hoje

Rosa Oliveira ajuda a manter vivo o hábito da ida aos ateliers de costura

Hábito queacompanha o tempo

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PElOs PassOs das

modelos

aA carreira surgiu ainda quando nem era de fato uma carreira. De forma despretensiosa, meninas da sociedade subiam às passarelas nos anos 1970 enquanto, a nível nacional a profissão já era solidificada. Depois de anos como uma atividade hobby, no Piauí, as garotas só começaram a almejar a carreira na década de 1990. Hoje o estado coleciona nomes de peso no cenário internacional da área.

[sOBRE MOda PIaUIEnsE, HIstÓRIa E PEssOas]

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No corpo, depois de cortadas e costuradas, as criações ganham alma e passam a assumir uma “cara”, uma significação. São as modelos as responsáveis por dar vida às roupas dos designers, seja em uma prova de ajuste, em uma campanha publicitária ou na passarela. Apesar de ser uma profissão antiga no universo da moda, no Piauí, a prática de modelar surgiu tardiamente sem nenhum caráter profissional. Visto em um primeiro momento como hobby, esse tipo de trabalho só se transformou em aspiração de carreira na década de 1990, com o aparecimento das primeiras agências profissionalizantes.

Eram meados dos anos 1970 quando a beleza de algumas meninas da sociedade piauiense sobe a passarela. A época era a transição de um padrão. De um lado, a silhueta corpulenta, com seios fartos, quadris

bem delineados e cintura fina – herança da década anterior, quando mulheres desse padrão apareceram. Do outro, nas revistas, garotas altas, magras e com pouco seio, a exemplo de Twiggy uma das mais famosas modelos do período. Apesar do contexto, por aqui não se seguia um padrão à risca. A única exigência era ser bonita.

Nos anos seguintes, já no início dos anos 1980, enquanto no cenário nacional já faziam carreira modelos como Silvia Pfeifer, Ísis de Oliveira, Débora Bloch, Monique Evans, Xuxa Lopes e Beth Lago, no Piauí, as primeiras garotas a modelar em eventos de moda emprestavam sua beleza sem pretensão e sem almejar fazer daquilo uma profissão. Joana D’arc era uma dessas piauienses, que eram chamadas para grandes eventos e via nessa atividade uma brincadeira que alimentava a vaidade.

Joana é natural de Parnaíba, litoral do estado, e foi lá que começou a aparecer nas passarelas. De acordo com ela, tanto em Teresina com em Parnaíba, existiam grupos de garotas que eram frequentemente convidadas por proprietários de lojas para

Joana D’arc é uma das piauienses que começou a modelar por hobby, antes da atividade se transformar de fato em uma profissão

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de mulheres magras, sem corpos exagerados e bem altas.

A figura de um profissional para selecionar, capacitar e cuidar dos compromissos das modelos só surgiu no Piauí na década de 1990. Ludmila Olicar foi uma das primeiras bookers, ou agente de modelos, do estado. Ela começou a desenvolver esse trabalho em 1990, quando treinava, produzia e gerenciava trabalhos para várias meninas. Dois anos depois surge sua agência de modelos, a Up To Date, representante local da agência nacional Elite Model. As seleções para a agência aconteciam através de cursos especiais e de concursos voltados para a área.

Esses foram os primeiros passos

modelar. Os eventos na maioria das vezes tinham performances, teatrais ou de danças, e eram as modelos que além de desfilar, também encenavam. Era uma prática que se tornou comum, mas não era remunerada, “Em troca a gente recebia roupas, era sempre alguma roupa que desfilou ou outro presente”, lembra.

Não havia grandes dificuldades para quem modelava na década de 80. Pelo contrário, o posto de modelo gerava visibilidade. Com uma cultura de concursos de misses ainda muito forte – depois do seu auge nos anos anteriores – aparecer nas passarelas gerava burburinhos e admiração. As meninas aceitavam os convites pelo que aquilo lhes proporcionava e pela mídia que gerava, saindo, por exemplo, nas colunas sociais da época.

Ao passo que a carreira se desenvolvia no estado, o padrão de beleza das modelos foi se solidificando. Com o aparecimento de mulheres como Naomi Campbell, Cindy Crawfor, Linda Evangelista e Kate Moss, na transição para a década de 90, se estabeleceu um estereótipo

Profissionalização das modelos

Schyneider e Milena Cardoso no início da carreira

Vanesca Damasceno é hoje uma das modelos piauienses mais conhecidas

Ludmila Olicar ao lado dasmodelos de sua agência

A booker Ludmila Olicar, uma das pioneiras na profissão

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dados para a profissionalização da carreira por aqui. Graças à agência, nesta época o Piauí passou a ter suas primeiras modelos profissionais. Segundo Ludmila, a principio elas não seguiam padrões vigentes, ainda eram manequim 40, enquanto o mercado cobrava por tamanhos 38. Mas em 1996 o estado entrou no circuito de modelos com Carol Falcão, de 1.80m no concurso Elite Model e no ano seguinte com Isa Calado, também com 1.80m, trazendo ao estado as medidas da época.

“Dai em diante com a projeção das duas no eixo Rio/São Paulo e em seguida, em 1998 com Raquel Andrade, a primeira piauiense a ir para fora do Brasil, começávamos a colocar o padrão correto no mercado piauiense”, conta Ludmila, acrescentando que a profissionalização foi se firmar de fato somente com a projeção dessas meninas para fora do estado, “Começaram a entender e dar valor à carreira”, pontua.

Foram os concursos de modelos, organizados por agências, impulsionaram a carreira e fizeram com que as meninas ganhassem projeção e trabalho.. A iniciativa tinha exclusivamente o objetivo de descobrir novos talentos, as chamadas “new faces”, e inseri-las no mercado. A organização desses eventos partia de agências internacionais. Não demorou muito para que agenciadores nacionais também aderissem à ideia. Com isso, as modelos piauienses ganharam vez.

Raquel Andrade foi uma das primeiras a alçar grandes voos. Descoberta pelo concurso Dakota Elite Models Look, ela deixou o Piauí com 13 anos para ir modelar em São Paulo e de cara já sentiu as dificuldades da profissão. “Cheguei a São Paulo e não sabia me mover pela cidade, eu tive que aprender a me virar sozinha. Minha mãe me ajudou financeiramente até eu pode me sustentar sozinha”, conta a piauiense, que logo ganhou projeção, tornou-se conhecida e levou o nome do estado para o mercado.

Ludmila Olicar lembra que um dos primeiros ápices das modelos piauienses foi em 2001, quando Schynaider Moura venceu o concurso Elite Model Look daquele ano no Brasil e classificou-se em quarto lugar na final do mundial na França – disputada por modelos de mais de 50 países. A projeção internacional de piauienses veio ainda com Milena Cardoso, terceiro lugar também em concurso nacional. Na época ela mudou-se para São Paulo e depois para Portugal aos 17 anos, tornando-se inspiração entre as garotas.

Os últimos dez anos têm sido de bons resultados para as modelos

piauienses. Vanessa Damasceno foi mais uma das garotas descobertas em concursos que ganhou projeção. Hoje, ela já estampa capas de revistas, editoriais de publicações nacionais e campanhas no exterior. Para ela, o cenário atual da profissão de modelo é bem diferente do de décadas passadas. “Antes não tinha tantas leis pra nos proteger, hoje em dia temos muitas coisas ao nosso favor em relação a tabelas de pagamentos e carga horária de trabalho”, afirma.

A booker Ludmila Olicar também vê mudanças na área. Ela conta que a profissão de modelo atualmente é mais facilitada. Além desses fatores regulamentários, a internet e a globalização contribuíram para o desenvolvimento do setor e até mesmo para mudanças nos padrões, que hoje são mais democráticos. “Com as redes sociais vejo certa facilidade em descobrir e projetar os modelos”.

Depois de mais de 30 anos, o mercado de moda para as modelos piauienses é, sem dúvida, mais próspero. O trabalho sem perspectiva de décadas passadas tem acumulado uma lista de profissionais de sucesso. Outras piauienses como Raylane Raysa, Larissa Barros e, a de maior sucesso entre elas, Laís Ribeiro, tem servido como modelos de carreira. O período de agora já permite que jovens garotas sonhem com um caminho parecido.

O boom das piauienses

Novas perspectivas

[Pelos passos das modelos]

Laís Ribeiro é uma das mais renomadas modelos piauienses da atualidade

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Muitas lojas alcançaram seus auges e ajudaram a direcionar os negócios de moda piauiense entre as décadas de 80 e 90. Naquele período, diante de um mercado recente – no qual em lugar de onde uma cultura de moda ainda estava sendo construída – elas assumiram o papel de levar informação desse setor para as pessoas. Além disso, foram fundamentais para levantar a bandeira do consumo e para movimentar a economia em torno da moda.

Ter acesso ao que era produzido por grandes marcas, na época, representou muitas vezes para algumas pessoas uma bagagem cultural. As lojas foram proporcionando novas experiências para os piauienses. Inserindo um pouco do nacional, e até do internacional, no âmbito local, as boutiques contribuíram para o desenvolvimento do setor. Tudo que as marcas nacionais disponibilizavam no mercado chegavam ao Piauí através dessas lojas.

Uma dessas famosas lojas do período, que foi responsável por oferecer uma nova percepção de se consumir moda para as pessoas, foi a Coquete. Fundada em meados dos

[A moda das boutiques]

bOUtiQueSa moda das

DDepois das percursoras lojas da década de 70, as boutiques multimarcas locais inseriram o piauiense no mercado de moda nacional. A informação de moda chegava ao estado através da comercialização de marcas renomadas. Esse contato movimentou o cenário local e impulsionou o consumo.

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anos 1980 pela empresária Mirna Ribeiro, a boutique multimarcas, junto com outras já existentes em Teresina como a Baú e a Biscuit, trazia para a capital a moda produzida fora do estado. Com isso, somada à mercadoria do eixo sul-sudeste, vinha também a informação de moda.

O público consumidor, de acordo com Mirna Ribeiro, passou a entender mais sobre moda a partir do contato com uma mercadoria vinda de outra realidade diferente da que localmente. Essas novas informações sobre moda e o desejo para consumir eram também repassadas através ações promovidas pelas boutiques, como desfiles grandiosos para a sociedade piauiense – uma nova experiência para o público local do período.

“Os desfiles eram verdadeiros acontecimentos, exigiam uma equipe enorme de profissionais. Planejávamos a música, a iluminação, a trilha sonora e os profissionais de passarela. A proposta era prestigiar seus clientes mostrando moda e fazendo um evento que levasse informação. A Coquete fez muitos desfiles, alguns com cunho beneficente e com apoio do governo. Realizamos dois com

Cláudia Raia e também com a atriz Isis de Oliveira”, lembra a empresária.

Os clientes que frequentavam as primeiras boutiques multimarcas do Piauí integravam a alta sociedade local. As mercadorias eram direcionadas a pessoas de renda mais alta e por isso as informações de moda transmitidas pelas lojas acabavam se tornando segmentadas. Nem todo mundo podia comprar as peças, e consequentemente, nem todo mundo podia conhecer o mercado e as novidades da moda.

A Coquete funcionou durante 25 anos em três pontos diferentes. Além da unidade do centro, na Avenida Frei Serafim, também funcionou nos dois shoppings nos anos 1990. Antes de fechar a boutique Mirna Ribeiro optou por dividir a loja em duas, assim, a Coquete deu lugar a Atitude e a franquia Unique Triton.

Mesmo em um período em que em lugar de onde a situação financeira do país era instável, as boutiques multimarcas, que deram seus primeiros passos nos anos 1970 e 1980, se tornaram febre no fim da década de 1990. No mesmo período de funcionamento da Coquete, a consultora de moda Gizela Falcão também atuava no comércio com uma

loja homônima oferecendo marcas como Yes Brasil, Blue Man e Carmin.

A boutique Gizela Falcão surgiu a partir de uma dificuldade da consultora em encontrar itens diferenciados para uso pessoal. A loja começou comercializando somente acessórios. Depois passou a atender a uma demanda de roupas. Para se abastecer de mercadoria, Gizela fazia viagens frequentemente em busca de novidades de marcas nacionais e também do segmento de moda autoral para inseri-las no consumo local.

Tendências nacionais no Piauí

Mirna Ribeiro, empresária responsável pela boutique Coqueteidade

A atriz Cláudia Raia foi uma das atrizes que desfilou em eventos realizados pela CoqueteUm dos desfiles da Coquete

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[A moda das boutiques]

Com esse garimpo, Gizela trazia a Teresina uma cultura de moda nacional e apresentava as novidades do setor. “Eu assistia os eventos de moda, via os desfiles e agendava o pedido. Montava uma coleção para a loja baseada na quantidade de peças que eu achava que venderia. Apostava em itens que

CrIsE fInAnCEIrA

A globalização foi um fenômeno inevitável entre o fim dos anos 80 e início dos anos 90. Depois do advento da industrialização e o crescimento das fábricas, o setor da moda passa a se voltar para o fashion business. Toda a produção impulsionada anteriormente agora precisava ser escoada de maneira ainda mais rápida para o público. Neste cenário, despontam as lojas de confecção.Embora os empreendimentos, nesse sentido, ajudassem a guiar os rumos da indústria da moda, a época não foi das melhores para os empresários. O Brasil atravessou um período financeiro conturbado e de atropelos políticos. Com a aceleração da globalização, as importações ganharam o mercado. A abertura de espaço para o exterior foi um dos fatores que levou a queda das fábricas têxteis.Aliado a isso, as políticas econômicas neoliberais implantadas pelos presidentes da época inflacionaram o mercado, transformando o setor comercial de moda em um campo de difícil atuação. A consequência foi uma desestabilização da cadeia produtiva de moda, que foi assolada pela alta inflação. Apesar disso, a indústria conseguiu avançar em relação a tecnologia.No Piauí, várias boutiques sentiram o abalo financeiro do país e passaram por difíceis momentos no decorrer desses anos. Até a estabilização da economia – que aconteceria somente no fim da década – muitas lojas tiveram seus negócios podados, outras não resistiram e acabaram fechando suas portas.

eram lançados na passarela como tendência e que eu achava que viraria moda aqui. Viajava no mínimo quatro ou cinco vezes por ano”, detalha.

O contato dos piauienses com uma cultura de moda nacional não se restringia apenas à aquisição de peças de grandes marcas. Gizela Falcão conta que as lojas da época tinha a preocupação de repassar informações de moda. Além da novidade em si, ela, por exemplo, apresentava ao público todo o contexto e o universo que envolvia as peças comercializadas. “Sempre gostei de passar informação na venda. Gostava de contar a história do estilista, explicar a história da coleção. Eu criava um desejo naquela peça”.

Após funcionar em um ponto fixo no centro de Teresina, a loja de Gizela Falcão abriu no Teresina Shopping. Depois disso foi transferida para o Riverside Shopping, onde continuou aberta por mais quatro anos, até o fim dos anos 1990. Para a consultora de moda, a crise financeira da época acabou por prejudicar muitos empresários, levando a extinção de algumas boutiques.

A Coquete fez sucesso em Teresina, tornando-se um sinônimo de moda na época em que esteve aberta

Gizela Falcão manteve aberta na década de 1990 uma loja que levava seu nome

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Era comum que na década de 70 e 80 as marcas brasileiras reunissem a sociedade, assim como seu público alvo, para a apresentação de suas criações em desfiles particulares – uma forma de aproximar-se dos consumidores. No Piauí, esses desfiles, que em um primeiro momento surgem dividindo espaço em festas nos clubes, só vão aparecer juntamente com as primeiras lojas multimarcas do estado. Anos depois disso tem inicio a formatação do que seriam eventos essencialmente voltados para a moda, direcionados para o fashion business.

A primeira ideia daquilo que se tornaria eventos e feiras de moda tem inicio com pequenos e seletos coquetéis para a sociedade. À medida em que no cenário nacional, feiras e salões de moda iam dando seus primeiros passos no fim dos anos 1980, no Piauí a sociedade era movimenta por festas efervescentes, com a presença de famosos e produzidas por donas de lojas. Eram

modaeles ditam

OOs eventos de moda nasceram da necessidade do mercado em promover o fashion business. Hoje assumem papel fundamental na engrenagem da moda. As feiras e as fashion weeks projetam as potencialidades criativas, capacitam profissionais e trazem a moda para o debate.

superproduções, com estruturas grandiosas, que para a época representavam os primeiros contatos do piauiense com uma grande passarela de moda.

Os salões de moda nacional começavam a impulsionar os produtos e com isso buscou-se por um retorno financeiro cada vez maior no setor da moda. Neste cenário nascem as primeiras Fashion Weeks, as semanas de moda voltadas para lançar novidades no cenário e incentivar o consumo. Em 1994 é criada a Phytoervas Fashion, vitrine para novos talentos, em 1996 a Morumbi Fashion, embrião da hoje chamada São Paulo Fashion Week e a Semana de Estilo Leslie, atualmente chamada de Fashion Rio. Junto com esses eventos surge um calendário de moda, que define duas datas de lançamento e que regula a produção modista.

Eventos do mesmo porte só apareceram em Teresina anos

depois. A necessidade de um retorno financeiro também era uma realidade no Piauí, segundo Francisco Marques, presidente do Sindicato das Indústrias do Vestuário no Estado do Piauí Sindvest (Sindvest), e por isso a indústria de moda local resolveu se unir através da fundação de um órgão associativo. Foi com a fundação do sindicato que se formatou as primeiras semanas de moda do Piauí, com o objetivo de mostrar os produtos feitos no estado e movimentar negócios.

O Teresina Moda foi a primeira inciativa da indústria da moda do

Na década de 1990 tem início também os eventos nos shoppings

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[Eles ditam moda!]

Piauí que realmente apresentava moda e tendências – tempos depois se transformou na Semana de Moda de Teresina. “Tínhamos a parceria da Prefeitura de Teresina, do SEBRAE, e da Federação Piauiense das Indústrias. O evento era composto pela mostra de produtos e tecidos. O objetivo era movimentar a área comercial por meio da divulgação daquilo que tínhamos de melhor, para isso montávamos toda uma estrutura para apresentar e debater moda” detalha Francisco Marques.

Naquele período, o presidente do sindicato conta que mobilizar os empresários e lojistas para a realização de um evento dessa natureza era muito complicado. Como era uma novidade na cena de moda local, boa partes deles não enxergava a importância daquela feira. Francisco Marques acredita que, para a época, as primeiras iniciativas de promover moda no estado foram de fundamental importância para adicionar uma dinâmica no setor piauiense e para capacitar os profissionais, inserido aos poucos uma cultura de moda nas pessoas.

Depois disso vieram feiras pelo interior do Piauí, a partir da iniciativa de órgãos de incentivo ao desenvolvimento do estado e semanas de moda com organização privada, como as realizadas nos shoppings da cidade e em salões de eventos. Aos

poucos, com o passar do tempo, as fashion weeks nacionais foram sofrendo alterações de formato, e o mesmo foi acontecendo também no Piauí.

Segundo a estilista Aline Souto, que coordenou a produção de algumas edições de eventos de moda locais, o formato que era apresentado em Teresina, com moldes de feira, foi ficando envelhecido e cansativo. Com isso, começou-se a pensar em pequenas mudanças – a maioria delas colocadas em práticas até hoje. “A partir daí os eventos começam a aprofundar a questão da capacitação, as feiras começaram a oferecer atividades além dos stands e desfiles. Na época estava todo mundo buscando informação, então mais informação começou a ser oferecida”, detalha a estilista.

Todos esses eventos que acompanharam o setor entre o fim dos anos 1990 e início dos anos 2000 foram determinantes para uma nova percepção de venda e consumo. Aline Souto acredita que foi a partir deles que o mercado piauiense passou a apresentar de fato a moda com o caráter comercial, trazendo também retorno financeiro e solidificando o mercado. Além disso, essas iniciativas na época foram fundamentais para uma profissionalização da cadeia produtiva, que se adequou as propostas das semanas de moda.

Atualmente o Piauí já possui seu próprio calendário de eventos de moda. Eles acompanham as temporadas nacionais e servem de orientação para as marcas e indústrias piauienses. Seja de iniciativa privada ou organizado pelo governo, os eventos de moda piauienses tem se tornado o principal palco para se apresentar e discutir moda, ainda que tenham seus formatos questionados, e de ditar comportamentos através do consumo. Hoje, assumem também o papel de, nas palavras de Aline Souto, “movimentar sempre o mercado”.

As primeiras iniciativas que levariam aos grandes eventos de moda tem início com

os desfiles organizados por lojas

No início dos anos 2000 as semanas de moda se popularizaram no cenário local

Hoje o Piauí já possui um cronograma anual de eventos de moda

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Aos 87 anos, Maria Genoveva de Aguiar Moraes, conhecida como

Genu Moraes ou simplesmente Dona Genu, conserva até hoje a vaidade

da época em que era adolescente e a elegância natural que a fez torna-se uma das mulheres mais sofisticadas e a frente do seu tempo. Seu estilo

inconfundível a acompanhou ao longo de toda sua vida. O rosto desde

sempre foi emoldurado por uma maquiagem bem feita, acompanhado do aroma de um doce perfume e do

colorido de um chapéu - seu acessório indispensável.

O chapéu, aliás, é uma das marcas fashions do seu estilo. Ela possuiu inúmeros das mais variadas cores,

materiais e aplicações. O primeiro da vasta coleção foi presente de Dona

Isaura Le Lonnés, figurinista famosa no Piauí entre as décadas de 50 e 60,

que costurou os inúmeros vestidos usados por Dona Genu. Na época, as costureiras Maria Benedita Pacheco,

conhecida como Dida Pacheco, e Dona Benedita Bomfim, também ajudaram

a rechear de vestidos o seu sofisticado e estiloso guarda-roupa.

Durante a adolescência, Dona Genu fazia frequentes passeios pela Praça Pedro II, no centro de Teresina. Esse era um dos hobbies das meninas da

época, que se produziam por completo para serem cortejadas pelos rapazes

através do “flerte”. Sempre uma apreciadora da moda refinada, para

confeccionar os seus vestidos de passeio, Dona Genu trazia de fora do

estado parte dos cortes de tecidos que eram enviados as costureiras -

não havia roupas prontas para serem comercializadas. A inspiração para a confecção das roupas das moças eram sempre as atrizes de cinema.Dona Genu Moraes sempre teve a

personalidade muito forte, e isso era transmitido através do modo que

se vestia. Dois looks marcantes são lembrados por ela de forma especial.

O primeiro, o vestido que usou quando ganhou o título de rainha de estudante em 1945. Este, com uma

imensa saia godê, enfeitado por um tecido crespo e cortado pela sua mãe. O segundo foi seu vestido de noiva, feito pela cunhada Maria Alice, que

fugiu dos padrões da época por conta do comprimento curto.

dOna

MORaEsgenu oO estilo único que

atravessou décadas e permanece até hoje

[ARTIGO]

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[CASA INGLESA][EDITORIAL]

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CASAinglesa

A construção imponente no centro de Parnaíba, no litoral do estado do Piauí, foi o marco do

inicio do desenvolvimento da região. o ano era de 1884 quando o capitão James Clark passou a ser proprietário do estabelecimento. Antes de tornar a Casa Inglesa sua residência fixa, o sr.

Clark desembarcou de seu navio na Ilha do Caju, em região próxima à cidade litorânea. Ele foi

o percursor na exportação de carne bovina e de cera de carnaúba para fora do Brasil, o que na época trouxe grande reflexos para a economia.

Ao longo dos anos e das gerações a Casa Inglesa tornou-se o ponto de encontro da

elite de Parnaíba, tanto para negócios como para lazer. o terraço superior da construção

recebia festas majestosas, por onde circulavam homens e mulheres exibindo seus melhores

trajes. A história pulsa pelas paredes da casa, que hoje segue conservada por uma herdeira, nas mobílias e nos quadros expostos. Por cada canto é possível sentir e ver parte do que por lá passou e ver como se comportava e se vestia a

elite piauiense do litoral.É em meio a esse cenário histórico que

apresentamos peças da estilista Georgina nunes, feitas a partir da renda de Bilro, uma das potencialidades da moda piauiense feitas por rendeiras do Morro da Mariana, na Ilha de

santa Isabel, no litoral. A técnica manufaturada é uma tradição regional e já era usada em

enxovais de cama e mesa e no vestuário na época que a família Clark habitava o local.

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Vestido vermelho Georgina NogueiraAcessórios Acervo PessoalSapato Carmem Steffens

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Blusa de seda pura pinkSaia BrancaCarteira de palha Georgina NogueiraPulseira Carola

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Blusa vermelhaColete Georgina NogueiraSaia de couroAcessórios Acervo PessoalSapato Carmem Steffens

Macacão PretoBlusa laranja Georgina NogueiraAcessórios Carola

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Vestido de broderi preto Georgina NogueiraAcessórios Acervo PessoalSapato My Shoes

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Camisa de seda pura nudeSaia Nude Georgina NogueiraAcessórios Acervo PessoalBolsa Carola

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Produção: Yuri Ribeirostyling: Ana Cristina LimaBeleza: Benildes BragaModelo: Loly Baldoinofotografia: Junior Reis

Vestido de noivaAcessórios Acervo Pessoal

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Sempre foi um apreciador da moda, da arte e da história do homem. Ao longo da carreira, Walter Rodrigues construiu seu próprio estilo de fazer moda. Suas criações, e a silhueta de suas modelagens, têm influên-cias nas décadas de 30 e 70. Hoje, desenvolve um trabalho ligado à identidade na moda.

Piauhy Fashion Mag – De que forma você conheceu o trabalho das ren-deiras do Morro da Mariana, em Ilha Grande, litoral do Piauí?Walter Rodrigues – Eu conheci o trabalho das rendeiras do Morro da Mariana de Ilha Grande, no Piauí, através do Museu A Casa de São Paulo. Fui convidado por eles para desenvolver um trabalho que propor-cionaria uma nova experiência para mim e para elas, já que elas nunca haviam trabalhado ao lado de um designer e nem eu com rendeiras.PFM – Porque você optou em tra-balhar com as rendas produzidas aqui no Piauí?WR – Num primeiro momento, a Paraíba era o local em questão, mas no

O fazer manual tradicional aliado a uma modelagem contemporânea e um design sofisticado. Essa foi a soma resultante da parceria criativa entre Walter Rodrigues e as rendeiras do Morro da Mariana, litoral do estado. O estilista desenvolveu sua coleção Primavera/Verão, em junho de 2001, em parceria com as artesãs. As peças criadas foram apresentadas durante o São Paulo Fashion Week.

O trabalho conjunto foi fundamental para o aprimoramento do trabalho das rendeiras. O intercâmbio de conhecimento entre Walter e as mulheres do morro permitiu um avanço técnico do ofício. Neste entrevista, o estilista conta detalhes dessa parceria, fala da repercussão das peças feitas e como esse trabalho reforça a identidade da moda piauiense.

“O FAZER

deveria ser uma marca do Piauí“

arteSANAL

ano de 2000 o estado tinha um volume grande de investimento na área de artesanato, sendo assim optou-se pelo Piauí, que era o segundo estado mais pobre da União, e representava um perfeito cenário para a inclusão de processos de design em comunidades que possuíam o saber dos ofícios e não tinham nenhum apoio.PFM – Como funcionou a parceria criativa entre você e a associação das rendeiras? Como foi o trabalho desenvolvido com elas?WR – Eu procurei entender a ma-neira que a renda era construída, até porque eu não conhecia o processo, depois fiz com que elas buscassem em suas memórias ou mesmo em seus guardados, amostras antigas de renda e me contassem suas histórias, assim conheci suas vivências e pude enfim escolher a aplicação no formato de um quadrado que seria a principal matéria de nosso trabalho. Eu propus desafios também, eu introduzi o fio de seda e o fio com elastano para a fabricação de rendas e o resultado foi espetacular.

PFM – Como foi a repercussão da coleção feita juntamente com as ren-deiras apresentada na SPFW em 2001?WR – Foi um sucesso, o trabalho foi maravilhoso, vestidos inesquecíveis. Vieram três rendeiras a SP, para a SPFW e elas foram entrevistadas, fizeram renda no espaço da Lycra para jornalistas e convidados e en-cantaram a todos com sua simplici-dade e sofisticação.PFM – Esse trabalho conjunto funcionou como um divisor de águas para as rendeiras. Para você, qual impacto esse trabalho gerou no oficio das rendeiras?WR – Hoje já tão distante perce-bo que fizemos sim a diferença, elas descobriram as cores, pois antes só era o branco, depois descobriram a modelagem de roupas, já que só se fazia bicos e toalhas em sua maioria, e também descobriram o encantamento de falar do seu trabalho. Toda esta exposição resultou na reforma da Casa das Rendeiras, na criação do Museu e na perpetuação do oficio de rendeira lá em Ilha Grande. Tenho grande respeito

[INTERVIEW]

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[WALTER RODRIGUES]

e carinho por Dona Maria do Socorro, que sempre esteve à frente do grupo, com uma liderança linda!PFM – Depois da coleção, você continuou fazendo outros trabalhos com as rendas produzidas no Piauí. Como surgiu a ideia, por exemplo, de fazer o vestido da primeira-dama Marisa com o que era produzido no Morro da Mariana?WR – Na segunda posse fui nova-mente convidado a desenvolver os looks de Dona Marisa Lula da Silva, e eu propus que usássemos a renda do Piauí, para divulgar o trabalho arte-sanal que é feito no Brasil, para falar de nossos saberes e de nossas coisas e deu super certo.PFM – Você acha que o trabalho das rendeiras é fundamental para a manutenção de uma identidade piauiense no que diz respeito à moda? Por quê?WR – O trabalho das rendeiras tem uma importância ainda maior que é a perpetuação dos saberes universais, aqueles que são passados de mãe para filha, de geração em geração. Ele representa o espirito destas mulheres guerreiras que tudo fazem para gerar renda. Acho que a identidade do es-tado do Piauí não se resume apenas nas rendas, tem outros incríveis e importantes fazeres, que estão se perdendo, ou estão sem apoio e que precisam ser apoiados urgentemente. O fazer artesanal deveria ser uma marca do estado do Piauí.PFM – E hoje, como você trabalha com a questão da identidade?WR – Hoje eu vejo esta questão como um manifesto, para provar que somos capazes de sobreviver às mesmices da moda. O fazer artesanal está em evidência no mundo todo, eu sempre pergunto: Em quantos lugares do mundo ainda se fazem renda? E são muito poucos, e então é preciso, divulgar, incentivar e apoiar estes projetos para que não se per-cam e nem desapareçam. Estas téc-nicas e saberes populares são funda-mentais para a preservação de nossa identidade como estado ou país.Peças e detalhes da coleção de Walter Rodrigues

desenvolvida em parceria com as rendeiras do Morro da Mariana

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Reunidas no salão de uma casa, no Morro da Mariana, em Ilha Grande do Piauí, litoral do estado, um grupo de mulheres se reúne diariamente para manter viva uma tradição de décadas. Em uma grande roda, elas se dispõem umas de frente às outras, todas concentradas e com o olhar fixo em uma única direção, nos bilros – artefato de madeira que conduz as linhas na fabricação dos pontos das rendas.

A rapidez dos movimentos das mãos mostra a habilidade conseguida através dos tempos e que foi herdada de geração para geração – algumas começaram a aprender o ofício ainda com quatro ou cinco anos e cresceram em meio as agulhas e as linhas. A quantidade de bilros aponta a complexidade da renda, e a agilidade com que cada uma constrói os pontos na almofada revela a quantidade de anos de experiência e de contato com a técnica.

A casa que abriga o encontro dessas mulheres durante o dia é a sede da Associação das Rendeiras do Morro da Mariana. Segundo Maria Socorro Galeno, presidente da organização, ela foi construída a partir de uma iniciativa do governo do estado através do Prodart, Programa de Desenvolvimento do Artesanato do Piauí. A proposta de organizar o trabalho das rendeiras foi lançada, acatada pelas artesãs e a casa então arquitetada. Somente um ano depois, em 1992, foi instituído o grupo.

Hoje o espaço organiza e acompanha o oficio das artesãs. São 120 rendeiras associadas, que em sua maioria trabalham em casa. Elas pagam mensalmente um valor simbólico para ajudar nas despesas da casa que sedia a organização. As encomendas chegam à associação e são repassadas a elas. Algumas se encontram todos os dias na sede do grupo com seu kit – formado pelas linhas, agulhas, bilros e a almofada. A remuneração é feita por produção, cada uma tem seus próprios trabalhos e receber por eles.

aA tradição da renda de bilro, que atravessou gerações, hoje se firma como um dos alicerces do sustento familiar de mulheres do litoral do estado. o trabalho minucioso das artesãs ganha projeção dentro e fora do Brasil, apresentando uma moda feita à mão, rica de cultura e exclusiva do Piauí.

bilroREnda-sE aO

dO MORROda MaRIana

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[bilro do Morro da Mariana]

Tecendo moda

O que por elas é fabricado, atualmente, já chega até a região sudeste do Brasil e a países como França e Holanda. De acordo com Maria Socorro, a projeção para o exterior, e para os demais estados, veio graças ao trabalhar desenvolvido junto ao estilista Walter Rodrigues, em 2001. Ele conheceu o trabalho das rendeiras, e desenvolveu em parceria com a associação, uma coleção de roupas desfilada no São Paulo Fashion Week.

“Passamos a ser reconhecidas quando participamos de um desfile do Walter Rodrigues em São Paulo. Na época tinha A Casa - Museu Virtual de Artes e Artefatos Brasileiros, que fazia projetos ligados a artesanato queria lançar uma coleção nas passarelas. Lá encontraram um catalogo que tinha algumas coisas das nossas rendas e vieram perguntar se a gente aceitava trabalhar com o Walter”, conta Maria Socorro, que também lembra que depois disso as rendeiras fizeram o vestido da ex-primeira-dama Marisa Letícia usado na posse do ex-presidente Lula.

A parceria criativa trouxe grandes mudanças para as rendeiras do Morro da Mariana. Além do reconhecimento

nacional, as artesãs puderam aprimorar o trabalho com as rendas, a partir da experiência técnica transmitida por Walter, e ampliar sua produção para artigos de moda.

Os pontos foram se adequando às modelagens das roupas. O desenho das rendas, o corte e o acabamento foram aperfeiçoados ainda mais para a moda depois do trabalho com Walter Rodrigues. Hoje, as artesãs também já trabalham juntamente com a estilista piauiense Georgina Nunes, uma apaixonada por trabalhos manuais.

Georgina começou a desenvolver peças com as rendeiras do Morro da Mariana, há dez anos, em 2004. Para ela, que cresceu vendo a mãe e avós comprando rendas e elaborando toalhas de mesa, optar por trabalhar com o bilro é uma maneira de valorizar e enobrecer o artesanato feito na região. A estilista acredita que o tipo de trabalho de moda que desenvolve recupera a autoestima desses grupos e resgata a essência da cultura piauiense.

O processo criativo da estilista parte de inspirações cotidianas. Para elaborar

novos moldes, pontos e texturas ela busca referências no que a cerca. Depois de pensadas, as ideias das tramas e os desenhos são levados para as rendeiras confeccionarem a peça piloto. Quando finalizada a renda, o item segue para o setor de costura para ser concluído com a aplicação de forro, zíperes e botões. Antes de ser exposta no atelier para encomenda, a roupa passa ainda por um controle de qualidade.

Ao desenvolver esse trabalho juntamente com as rendeiras do litoral do Piauí, Georgina busca mostrar que essa renda pode ser aliada à moda de uma maneira contemporânea e elegante, sempre de acordo com as informações do mercado da moda nacional e até internacional. Juntamente a isso, busca manter a identidade piauiense na moda que produz e reforçar as potencialidades locais. “Procuro sempre vincular a essência do meu trabalho na nossa cultura para celebrar a nossa legitimidade”, conclui.

Maria Socorro Galeno lidera a associação das rendeiras

Os pontos das rendas ganham as cores da moda

A estilista Georgina Nogueira hoje também já desenvolve trabalhos em parceria com as artesãs

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aRTeSAnAla moda

pede passagem

DDo utilitário ao vestuário. O trabalho artesanal agora vai às ruas, às lojas e ao guarda-roupa. O trabalho manufaturado, que já foi tão comum na moda antes da industrialização, retorna ao mercado nas mãos de artesãos e designers. Eles têm aliado as potencialidades regionais ao design, em um processo de preservação das tradições, na criação de itens de desejo

O processo de industrialização e a modernização de maquinários no último século refletiram diretamente na moda. O trabalho manufaturado e o artesanato utilitário foram se perdendo ao longo deste caminho. O tradicional cedeu lugar ao industrial. O regional foi substituído pela padronização. Aliado a isso, a própria economia globalizada e os novos modos de consumo levaram a grandes transformações no setor, tornando-o um ciclo mais volátil.

Mas a moda rápida tem pedido cautela. O atual boom das tendências tem novamente dado lugar ao personalizado e a cultura de raiz. A moda agora é não seguir uma moda. Não ir mais pelo caminho

comum parece ter se tornado uma alternativa. E é nessa lacuna que o segmento artesanal adentra para retornar à cena. Hoje, a moda artesanal tem deixado de ser coadjuvante para se transformar em artigo de luxo. Estão virando itens de desejo no meio de uma engrenagem industrial cada vez maior e mais comercial, em que em lugar de onde a reprodução em escala tem seu favoritismo questionado.

O caminho da moda artesanal embora anacrônico com a maioria do cenário industrial tem suma importância para o setor. É essa segmentação, segundo o estilista piauiense Otávio Menezes, que contribui para a manutenção e

preservação das tradições e de um contexto cultural. Para ele, esse é o ramo que permite apresentar uma identidade local ou nacional. “No Brasil tem uma corrente de pessoas que ainda não conhece a cultura brasileira e sua valorização”, afirma.

Otávio Meneses foi um dos primeiros profissionais de moda no estado a investir na moda artesanal. A opção foi baseada em um gosto pessoal do estilista por materiais manuais e na possibilidade de aliar tecidos rústicos a detalhes contemporâneos que despertem o desejo feminino. Ao longo da carreira ele já trabalhou com técnicas de tecelagem, renda de bilro, renda frivolité, bordado a mão, bordado a máquina e com pontos manuais,

Peças feitas pela artista plástica Kalina Rameiro

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[A moda artesanal pede passagem]

sempre atribuindo ao manufaturado o molde comercial moderno e contemporâneo.

Ele acredita que esse trabalho também tem um reflexo na sociedade. O estilista destaca que por trás da moda artesanal há todo um processo de valorização e preocupação também com o social, no contato com comunidades artesãs, por exemplo. A partir de uma produção que procura mesclar o resgate das tradições e o incentivo de pequenos artistas populares, ele já desenvolveu parceria com grupos de rendeiras do Morro da Mariana, do bairro Vermelha e com um grupo de artesãos do bairro Poti Velho.

Segundo a artista plástica Kalina Rameiro, que também é uma das vanguardistas piauienses a acreditar no artesanato ligado a moda, são essas parcerias, entre o designer de moda e os pequenos grupos de artesãos, que inserem no mercado um produto artesanal mais refinado, longe do rótulo do folclórico. Hoje, a moda handmade tem um olhar e uma produção aprimorada, se alia à criatividade, ao design e à funcionalidade e se desvencilha da imagem caricata preconcebida pelas pessoas.

“O mercado exige um produto de qualidade. O consumidor hoje quer que

um produto desperte um desejo nele. Ele quer um produto de qualidade. Por isso temos que trabalhar a questão do artesanato com a qualidade também. O produto de moda artesanal não pode ser descartável, pelo contrário, ele tem que ser aquela coisa atemporal e eternizada. A moda com artesanato virou objeto de desejo, por conta desse olhar mais profissionalizado que ganhou nos últimos tempos”, conta Kalina.

E um dos motivos para a moda artesanal ter reencontrado seu lugar no mercado pode ser atribuído ao nicho de pessoas que estão procurando fugir da velocidade do mercado fashion. A artista plástica crê que as pessoas passaram a explorar mais o segmento

por conta de uma cobrança do próprio mercado. “O mercado estava saturado daquela moda repetitiva, daquela moda que era a mesma o tempo inteiro, e por isso o mercado cobrou e as pessoas foram atrás de melhorar a qualidade do artesanato”.

Desenvolvendo acessórios há 16 anos, Kalina Rameiro tem um handmade fortemente ligado às raízes piauienses. Todos os seus trabalhos, desde os primeiros, sempre tiveram um DNA regional e um foco no artesanato. Ela sempre foi uma das defensoras desse segmento por apostar que um dia ele conseguiria conquistar seu lugar no mercado. No entanto, em sua opinião, apesar de já existir um desejo por esse tipo de produto, o artesanato ainda não é tão explorado como deveria ser.

Kalina Rameiro acredita, que aquela moda artesanal, que começou comercialmente mais acanhada, pode ser melhor aproveitada e reconhecida graças a uma grande perspectiva de crescimento no estado. O futuro para a moda artesanal piauiense pode revelar boas surpresas se sua potencialidade começar a ser reconhecida. “A partir do momento que as pessoas começaram a utilizar do artesanato piauiense para produzir acho que isso é um bom começo. É o primeiro passo”, conclui.

Ótavio Meneses sempre foi um incentivador da moda artesanal no Piauí

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Moda autoral de personalidade despretensiosa

OO cenário da moda local está em ascensão. A injeção de novos profissionais e a capacitação de quem já trabalhava com moda, impulsionou a cadeia produtiva, que hoje apresenta uma formatação bem mais competitiva. Cresce o número de ateliers, lojas e microempresas que movimentam essa engrenagem no estado. Na parte criativa, novos nomes da moda autoral surgem para fazer a diferença e para oferecer alternativas para um público cada vez mais exigente.

mOdAOS NOVOSNOMES DA

PIAUIENSE

É em uma sala de sua casa que Emanuel Soares recebe seus clientes, e também amigos. O cantinho é todo decorado por móveis do estilo vintage e quadros que inspiram as criações do designer. A ambientação aponta que ali há algo de diferente que vai além da mobília. O universo do seu atelier é o mesmo

que é refletido nas peças que cria: moda alternativa.

Emanuel Soares é um dos estilistas fruto da recente profissionalização. Depois de ter aberto mão do curso de arquitetura, ele resolveu dar uma oportunidade à sua paixão por criação ao entrar em um curso de Design de Moda, na época, uma novidade acadêmica. Foi na faculdade que ele se encontrou na área de desenvolvimento de produto. A afinidade por criar era tamanha que ele, logo que se formou, passou a integrar uma equipe de criação de uma empresa. Mas aquilo

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Produzir essa moda que se afasta do comum é um desafio que não desanima o designer. Para tornar seu trabalho conhecido dentro do seu nicho de clientes ele recorre à produção de editoriais como uma ferramenta de marketing. A cada coleção é feito um ensaio de fotos dentro do universo das criações. As imagens são divulgadas em redes sociais e se tornam as responsáveis por atrair as encomendas de clientes.

O caminho da moda autoral, e alternativa, ainda é aquele que Emanuel Soares pretende continuar seguindo, embora os rumos do mercado possam apontar para outros caminhos. Para ele, esta é uma via complicada, mas que deve ser percorrida sem pressa, sem ambições, somente com a paixão por criar. “É um caminho devagar e eu quero andra devarzinho mesmo. É mais difícil, mas é o que busco”.

É com um brilho no olhar que Maihara Brandão se lembra dos primeiros esboços de suas bijouterias.

[os novos nomes da moda piauiense]

Pelo caminho daspedras preciosas

ainda assim não pareceu o bastante para o designer.

O estilista não queria ter a criatividade podada, queria mais do que ser guiado por outras pessoas no seu processo criativo. Insatisfeito, Emanuel deixou o emprego e foi motivado, além do espírito empreendedor, pela necessidade de produzir algo dentro da sua identidade. Assim nasceu sua própria marca há um ano e meio, O Alfaiate, a qual ele mesmo define como uma grife que preza pelo estilo “leve, despretensioso, livre, desprendido do igualitário e versátil”. Tudo começou de forma tímida, e ganhar o apreço dos amigos mais próximos o levou a seguir adiante com a ideia.

De acordo com ele suas criações são guiadas por uma personalidade própria de quem as usa e por uma identidade alternativa. Em sua marca, Emanuel Soares tenta se distanciar das tendências de mercado e da obviedade da moda. E é por isso que ele tem se destacado entre os novos nomes da moda local, por produzir uma moda autoral bem particular e direcionada para um público novo, que procura fugir do ciclo mercadológico.

A inspiração para criar vem sempre da bagagem pessoal de Emanuel. O mood segue por vezes uma linha retrô, por outras uma linha contemporânea e até pela linha do “descombinadinho”. As características principais do seu trabalho são a forte presença de estamparias, que passam por um cuidadoso processo de garimpagem na hora da escolha, e a modelagem peculiar, cheia de recortes ousados ou de construções moderninhas.

“Tento trazer um diferencial, seja em mistura de estampas, seja em um recorte diferenciado ou aplicações. São peças que proporcionam uma liberdade, não de se vestir, mas de pensar. Tento transformar o comercial numa forma mais despojada, mais liberta desses contextos igualitários”, conta.

Em um processo natural, quase que instintivo, ela se via em meio às caixas de joias de mãe com uma necessidade de criação. O desejo por aquele universo era latente, e a criatividade pulsava dentro de si. Essa vontade logo a motivou a confeccionar aos dez anos peças de cintinhos de couro e miçangas, que anos mais tarde começariam a ser vendidas na escola. Ela não podia imaginar, mas dali já começara a desenrolar sua história com a criação de acessórios.

Maihara cresceu instigada pelo desejo da criação. A habilidade em desenhar curvas e encaixes de joias não foi posta de lado nem mesmo durante as faculdades que passou antes de chegar ao curso de Design de Moda, a qual fez o vestibular escondida dos pais. Foi durante as cadeiras acadêmicas da primeira turma do curso em Teresina, que ela reafirmou sua paixão pelo mundo dos acessórios, desenvolveu o que já era nato e aprofundou seus conhecimentos quanto a matérias-primas e técnicas.

Ainda enquanto passava pela faculdade, Maihara Brandão teve sua entrada no mercado de moda local. Ao passo que produzia bolsas, mimos, e bijouterias para a loja da mãe, ela foi sentindo a necessidade de trabalhar em cima de matérias-primas próprias e de desenvolver seu processo criativo a partir do básico,

Emanuel Soares produz uma moda autoral que preza pela linha alternativa

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com a etapa da metalurgia. Esse foi um dos motivos que a fez procurar em São Paulo cursos específicos. Lá, fez uma especialização em Gestão em Design de Joias, Acessórios e Complementos e um curso de Bancada de Design de Joias.

No período em que morou em São Paulo o hobby de Maihara começou a de fato a virar um ofício. Na capital paulista ela montou um atelier onde trabalhava, através de parceria, com a produção de peças em cobre e banhadas a ouro. O resultado era exposto e comercializado em salões de beleza de alto padrão. A aceitação era boa, mas a vontade de voltar ao Piauí falou mais alto. A designer viu no mercado de moda local uma oportunidade para retornar e lançar seu trabalho.

“Eu sinto que esse ramo da joalheiria em Teresina ainda é muito carente e eu vejo como uma oportunidade de negócios. Eu já trabalhei com minha mãe, e eu via o quanto as pessoas procuravam. Eu

sinto que aqui em Teresina temos a necessidade de algo personalizado, algo que já tem em São Paulo, no Rio de Janeiro e nas grandes cidades”, conta Maihara, que atualmente, com um trabalho ainda mais maduro nesta nova fase, é um dos novos nomes do mercado.

Hoje o trabalho da designer se divide entre suas duas marcas: Maihara Brandão e Mundo Bossa. Na primeira a produção é focada para o personalizado. O acabamento é refinado, os materiais são nobres – como prata e ouro - e o uso de pedras brasileiras é recorrente. É nesta marca que Maihara se permite adicionar histórias às peças a partir de um laço afetuoso. Como ela mesma define, “Não é um produto por ser produto. Mexe muito com a parte sentimental”.

Já em sua segunda marca, a Mundo Bossa, Maihara trabalha uma joalheria alternativa. São joias nas quais o trabalho no metal é mais ousado, mas possuem um preço mais acessível. As peças são confeccionadas com materiais alternativos como o cobre e o latão para a joalheria, que levam banho de ouro amarelo, rosê e branco. Eles são mesclados à matéria-prima industrializada e a itens naturais.

Desenvolver peças dentro de duas marcas diferentes é uma maneira que a designer encontrou de atender a demandas específicas

do público e de apresentar uma variedade maior de peças, que na sua essência, possuem características diferentes. Em ambas, Maihara conserva as características próprias do seu trabalho: a mistura de materiais e a piauiensidade. Todas suas peças levam itens inusitados e uma referência às raízes culturais locais. “Há preocupação de manter a identidade do Piauí. Mas é algo que eu não cheguei a buscar, veio naturalmente. Começava a trabalha e via que faltava algo pra ter uma identidade regional”.

Como uma forma de usufruir de recursos regionais, Maihara também volta sua produção para uma técnica desenvolvida por ela própria. A designer cria peças a partir do processo de petrificação da cerâmica e da renda. É como se ela pegasse esses materiais e os transformasse em uma pedra preciosa, em uma gema natural. Ao final, a pedra é trabalhada junto ao metal e transformada em joia.

Para o futuro, Maihara Brandão pretende expandir sua produção autoral e contemporânea e espera poder continuar levando as características do Piauí em seu trabalho por onde passar. “Tenho que mostrar de onde eu venho e porque eu estou fazendo isso. Não estou criando por criar. Tem um significado e um porque”, conclui.

[NOVOS NOMES]

Maihara Brandão desenvolve peças para suas duas marcas de acessórios

Maihara desenvolveu sua própria técnica de fabricar joias

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No setor da moda, uma nova segmentação foi aquecida com o boom da globalização e da industrialização. A grande quantidade de produtos e marcas disponíveis no mercado, ainda no fim da década de 1980, levou algumas empresas

[FAST FASHION MADE IN PIAUÍ]

fast fasHIOn

de dnaPIaUIEnsE

mMovidas pela competitividade com empresas nacionais, marcas locais voltam suas produções para esse mercado movido pela grande rotatividade de tendências.

a repensarem sua produção, tornando-a mais competitiva.

A partir disso, o ciclo de consumo foi se tornando cada vez mais curto e, já nos anos 1990, este fenômeno- associado a uma nova postura das empresas varejistas - passou a ser

conhecido como fast fashion. No Piauí, marcas locais agora assumem essa postura e entram na disputa com marcas nacionais por um lugar competitivo no mercado.

Segundo Cláudia Cyléia, professora do curso de moda da Universidade Federal do Piauí, a formatação adotada pelas redes de fast fashion é um modelo de produção e marketing baseado na velocidade - da própria produção e do abastecimento contínuo de novidades.

Em suma, “une-se um período curto de criação e produção à distribuição e divulgação igualmente rápidas”, explica a professora, acrescentando que “não é só a velocidade que caracteriza o sistema, mas também a redução do estoque (por conta da alta rotatividade das peças), o acompanhamento constante dos pontos de venda, a distribuição e, principalmente, a participação constante do consumidor”.

Nesta cadeia de produção, as marcas que priorizam essa postura costumam lançar mini coleções até mesmo semanalmente. É dessa maneira que novos produtos de moda são oferecidos com regularidade ao consumidor, que, aliás, conduz este tipo de sistema a partir das suas exigências e aspirações em relação à moda, obtidas pelas empresas por meio de pesquisas e monitoramento.

No segmento de fast fashion o foco sempre vai ser o cliente. A empresária Laysa Feitosa Maciel, que dirige a marca local La Vertu, uma das primeiras a assumir fielmente essa postura de moda rápida, conta que a opinião dos clientes é levada em conta diretamente no planejamento e no desenvolvimento dos produtos.

“Tenho contato direto com os clientes e eu, pessoalmente, ouço todas as exigências deles, as críticas, elogios, o que eles estão querendo. Então entro em contato direto com a produção. Pelo menos três vezes na semana estou na fábrica, para passar

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dela é feita pelo menos 60 dias antes. Os diretores criativos fazem viagens quase que mensalmente para investigar o que está sendo lançado na moda nacional e internacional. As peças obedecem a uma programação de produção e uma grade de reprodução.

Laysa revela ainda que, do ponto de vista empresarial, a opção de investir em um ciclo de moda mais rápido vem da necessidade da constante atualização do mercado. “A rotatividade da mercadoria é rápida, com isso não existe inadimplência. O fast fashion é uma forma de você estar atualizado no mercado o tempo inteiro, é uma forma de você não limitar coleções e ainda ter uma lucratividade alta”, explica.

E é justamente essa rotatividade de novidades que a empresária acredita que gera um impacto positivo em relação ao desenvolvimento do setor de moda local. “O grande impacto é disponibilidade de uma moda acessível com informação de moda de fora sendo feita aqui. O cliente consegue ver novidades de mercados internacionais aqui no Piauí de maneira rápida e por um preço acessível”, pontua.

Para a professora Cláudia Cyléia, mesmo a presença de redes de fast fashion nacionais no estado não inibe o

[FAST FASHION MADE IN PIAUÍ]

o que os clientes querem e não tem na loja. O importante é sempre ter o feedback direto do público”.

A marca La Vertu, dirigida por Laysa Feitosa Maciel, já trabalha com fast fashion no Piauí há três anos. Sendo uma das primeiras a assumir de fato essa postura no mercado piauiense, a empresa apresenta um ciclo produtivo acelerado. Para a mercadoria chegar à loja, a produção

Ciclo rápido

Competitividade

surgimento de empresas do segmento a nível local. “Essa realidade também desperta nos varejistas piauienses o desejo de se tornarem cada vez mais competitivos, o que não deixa de ter um caráter positivo. Para as marcas locais que já trabalham com o Fast Fashion, acredito que o grande desafio sejam maiores investimentos em pesquisa, criação e design, fugindo da armadilha da cópia e da rapidez pela rapidez, sem a preocupação com o processo e as pessoas envolvidas nele.”

Cláudia Cyléia, professora de moda Laysa Feitosa Maciel, empresária

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EEnquanto o ciclo da moda gira de maneira cada vez mais efêmera, cresce a parcela de pessoas que começam a questionar o consumo exagerado e desenfreado. A busca pelo estilo que preza o personalizado duradouro, o handmade, o artístico e valores sustentáveis tem sido uma constante. Em Teresina, este caminho voltado para a moda mais lenta já é uma realidade no mercado e tem conquistado adeptos.

fAsHiOnSLOW

A moda é um ciclo. Por vezes, assume um papel efêmero e sazonal para que possa atender a um mercado voraz, ávido por novidades e tendências. O público exige, e cobra, inovações a todo instante, e é esse o motor que impulsiona e faz girar esse ciclo. Com os crescentes debates atuais sobre sustentabilidade e responsabilidade social, a velocidade com que essa cadeia produtiva gira começa a ser questionada. De um lado, consumidores que são estimulados ao excesso, e do outro, uma parcela que tem passado a estimular um pensamento diferente do consumismo, pautando um discurso de uma moda mais lenta e responsável.

Este público que tem aderido a esta nova forma de enxergar a moda segue pelo caminho de um

movimento ainda pouco conhecido: o Slow Fashion. Esta é uma diretriz que vai à contramão da bandeira levantada pela moda Fast Fashion – aquela produzida em larga escala, movida pelas tendências, voltada para uma demanda mercadológica e para o consumismo. A primeira não se opõe à segunda, mas propõe um posicionamento contrário e um pensamento crítico diferente. Ela defende o consumo sustentável, e por isso, é atemporal e duradoura.

O slow fashion compreende ainda em uma série de ações conscientes que envolvem todo o processo produtivo da moda. Na criação ele se volta para o handmade, o exclusivo e para o valor agregado – a peça carrega consigo um significado e

[SLOW FASHION]

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uma história. Já na cadeia produtiva, vai desde a escolha de um tecido natural e duradouro até uma técnica de fabricação de menos impacto ambiental. O consumo desenfreado é repensado a partir de uma moda mais compassada e de vida longa, sem seguir regras ditadas pelo mercado. Em suma, não é instigada pelo ciclo volátil da indústria e está mais ligada à construção do estilo pessoal e ao personalizado do que à moda sazonal.

Este conjunto de pensamentos e práticas é algo ainda recente. De acordo com a professora de moda, e adepta do slow fashion, Aline Chaves, esta corrente voltada para um novo estilo de consumir e de se vestir, surgiu na metade do século XX – e na década de 80 ganhou essa denominação – junto com o fast fashion, justamente para atender a um grupo de pessoas que não se sentia contemplada pela moda rápida. Ela acredita que este é um tema que ultimamente vem ganhando espaço nos debates sobre moda por ter a sustentabilidade como uma de suas pautas.

Mesmo com uma indústria regida pelas leis de consumo, o interesse

pelo slow fashion tem aumentado à medida que um determinado grupo considerado vanguardista começa a levantar essa bandeira. “Há alguns anos atrás se alguém dissesse que guarda e usa roupas por mais de

É por acreditar que as roupas são capazes de contar histórias e que po-dem perdurar além das temporadas de moda que Gilvana Lima começou a desenvolver um trabalho peculiar dentro do segmento slow fashion. Com traços singulares, modelagens características e processo criativo próprio, a designer deixa-se levar pelo universo artístico e poético na concepção de peças, que carregam consigo uma consciência sustentável.

Trabalhando com atelier próprio há pelo menos dois anos, Gilvana Lima deixou um emprego fixo para se aventurar no caminho da criação na sua marca, a Garimpo by Gil.

Moda que traduz histórias

cinco anos, jamais consideraríamos essa pessoa digna de estar no topo da pirâmide dos movimentos de moda. Hoje é chique ter apego. É descolado comprar em brechó. É massa transformar uma roupa antiga em roupa nova. O slow fashion ganha adeptos como todo movimento que se propõe fazer do seu seguidor alguém especial e parte de um seleto clube de consumidores pensantes e preocupados com o futuro do planeta”, pontua Aline Chaves.

Em Teresina o slow fashion vem aos poucos conquistando espaço no guarda-roupa. É um nicho do mercado ainda pouco explorado, mas já latente. O público, que antes consumia involuntariamente, hoje tem compreendido o conceito e já consome por estar consciente do que ele representa. “Num futuro

próximo o apego estará mais presente em nossas escolhas. Os ateliers estão bombando! A moda sob medida, a forma de consumo e as propostas de marketing nos garantem dias lindos para o movimento slow”, conclui a professora

O qUE é SLOW FASHION?

“Slow Fashion”, ou a Moda Lenta é uma nova corrente de pensamentos. A filosofia propõe um novo olhar para a moda a partir de valores como sustentabilidade, ecologia e éti-ca. O movimento incentiva uma reeducação do consumo com base na diminuição da cadeia produtiva e do desperdício. O Slow Fashion é um estilo de vida, e de se vestir, que preza por peças feitas manual-mente, com tecidos naturais e duradouros. Com isso, lança ainda uma percepção para o meio ambiente e o esgotamen-to dos recursos.

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[SLOW FASHION]

O que para alguns poderia ser encarado como um desafio, para ela, investir em uma nova maneira de fazer moda, foi uma forma de refletir-se em cada peça criada. Movida pelo desejo de produzir algo longe das tendências de mercado, a estilista se encontrou nesse nicho da moda mais lenta.

“O slow fashion é mais uma questão de sustentabilidade. É um tipo de trabalho voltado para uma questão sustentável e de respeito com as pessoas envolvidas em todo o proces-so. É uma responsabilidade social, que envolve também a preocupação com a escolha do tecido e com a durabilidade das peças. Priorizo, por exemplo, o uso de linho, popeline, algodão, que são tecidos que não tem origem sintética e que de certa forma não poluem e agridem a natureza”, explica.

O processo criativo de Gilvana segue todo o caminho do slow fashion. Sua veia artística é responsável por conduzir as pinturas à mão – um dos pontos fortes do seu trabalho – as-sim como os bordados de linha. Suas peças se adequam a esse estilo por se manterem dentro de um shape clássico

e atemporal, não acompanhando, por-tanto, regras de mercado.

Tudo é pensado para contar histórias, de forma lúdica, a partir de um olhar poético e com amor no fazer. O trabalho é desenvolvido por meio de um intercâmbio entre a moda e a arte em um processo de captação de subjetivações de suas inspirações. Em seu DNA há a presença do mix de estampas e da alfaiataria.

Por mais difícil que seja seguir na contramão do ciclo comercial, Gil-vana acredita que esse pode ser um caminho possível em meio à ânsia por tendências. A designer defende que hoje há sim um público que espera por uma moda consciente e que con-some um estilo atemporal.. Questio-nada sobre este desafio, a designer prontamente responde, “Resolvi en-trar nessa área porque tenho prazer em vender um estilo de vida”.

Peças da última coleção da estilista Gilvana Lima

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O Piauí só viu nascer um setor industrial de moda em meados dos anos 1990. Enquanto isso, a nível nacional, a tecnologia do maquinário voltado para a fabricação modista já era uma realidade. Apesar disso, o processo de desenvolvimento no estado foi rápido. Em pouco tempo, a produção local torna-se uma das maiores do Brasil. A evolução não parou. Com a globalização, acompanhar o mercado tornou-se inevitável. Com isso, firmar uma identidade de moda local foi uma necessidade, e assim, o surgimento de um novo consumidor se transformou em consequência.

O advento da Guadalajara no Piauí foi o primeiro passo para uma produção local em escala industrial. A chegada da fábrica trouxe dinâmica a indústria piauiense e impulsionou o mercado da

NNa busca por uma produção de identidade própria, e em meio a um mercado competitivo, o setor industrial se fortalece e ajuda a desenvolver um novo perfil de público consumidor.

piAUíMADE IN

confecção de moda. Na época, as já existentes pequenas oficinas de roupa passaram a investir em maquinário, desenvolvendo a cadeia produtiva. A Guadalajara, segundo Francisco

Marques, presidente do Sindicato das Indústrias do Vestuário no Estado do Piauí (Sindvest), também funcionou no período como incubadora de mão de obra, com a capacitação de funcionários.

As mudanças até os dias de hoje não pararam. A profissionalização foi progredindo e um quadro de funcionários voltados para a indústria da moda foi surgindo. De lá pra cá profissionais como operadores de máquinas industriais e engenheiro de produção foram fazendo parte do mercado. Em pouco tempo este setor de confecção de roupa se desenvolveu tanto que, de acordo com dados do Sindvest, hoje o Piauí já conta com 1278 empresas formais – entre pequenas, micros e médias. Anualmente se fabrica no estado mais de 800 mil peças de roupa ao ano, gerando em torno de R$ 25 milhões a economia. O setor já é o terceiro que mais emprega, perdendo apenas para a construção civil e para o comércio.

Francisco Marques destaca que o desenvolvimento da indústria da moda no estado foi acompanhado pela evolução do setor a nível nacional. O mercado brasileiro foi influenciando a produção local à medida que os empresários iam pesquisar e buscar informações fora do estado. Tudo que foi trazido de outros lugares foi sendo absorvido

“A moda piauiense está construindo uma identidade ao passar desses anos” - Igor Leite

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Com o crescimento da indústria e a alta do comércio na década de 1990, a moda piauiense e o perfil do público consumidor foram se delineando. Para o empresário Igor Leite, que atua no setor há dez anos, as pessoas passaram a usar o artesanato, a história e a cultura local dentro da moda, construindo uma identidade própria voltada para o desenvolvimento da área. Ele considera que isso está começando a criar um desejo de consumo em cima da moda local.

“A moda piauiense está construindo uma identidade ao passar desses anos. Há 15 anos a gente não tinha nenhuma identidade

[Made in Piauí]

Surge um novo público consumidor

pelos profissionais piauienses. Para ele, o advento das escolas de moda também agregou conhecimento e facilitou a consolidação de uma rede produtiva, capaz de competir com outros polos de confecção.

Com uma indústria mais forte, o produto piauiense ganha espaço no mercado. Em 2004, Teresina chegou a ser o 9º polo da indústria de moda no Brasil, oferecendo itens muito mais competitivos. Para o presidente do sindicato, hoje o grande diferencial local é a capacidade de agregar valor às peças, o que tem permitido a criação de um novo perfil de consumidores de moda piauiense. “O que temos como base do setor moda é o valor agregado. Temos a capacidade muito boa de agregar determinados recursos, sejam naturais ou intelectuais”.

formada ainda em relação à moda. Diante disso, depois desse boom na década de 90, a moda piauiense começou a criar uma identidade a partir de novos estilistas e da própria história do Piauí”, ressalta o empresário, afirmando ainda que a busca por essa identidade foi algo que aconteceu em virtude das cobranças do mercado.

À medida que a indústria da moda piauiense avança, o rápido acesso à informação em tempos de redes sociais fez com que o público, que guia toda essa produção a partir do seu consumo, sofresse transformações. Igor acredita que o cliente hoje em dia está mais entendido e exigente. Essa é uma opinião também compartilhada pela estilista Rita Prado quem ao longo dos seus sete anos de carreira já percebe que o cliente busca um diferencial por entender melhor o que está comprando.

“Percebi que o perfil do público consumidor aqui de Teresina tem ficado mais exigente. O cliente já entende mais de modelagem, acabamentos e do diferencial da peça. Hoje ele está mais consciente, é como se buscasse uma consciência. O consumidor está mais atualizado e informado, por conta da internet e das redes sociais. Essa distância entre ele e a informação diminui muito”, conta Rita.

Esse interesse pela informação de moda é que faz com que designers e marcas piauienses busquem se especializar cada vez mais para apresentar novidades, faz a engrenagem continuar funcionado. Para que toda essa estrutura mercadológica seja um diferencial competitivo, Rita Prado acredita que o caminho é investir nas ligações com raízes regionais na identidade do Piauí. “Potencializar essa identidade é um caminho para fazer uma evolução no mercado. Isso já está acontecendo. Funciona como um processo de diferenciação muito grande”, finaliza.

“O perfil do público consumidor aqui de Teresina tem ficado exigente” – Rita Prado

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EnSINoQUEIMPULSIONA

OA instalação de cursos universitários voltados para a moda no Piauí fez com que o campo se profissionalizasse. O conhecimento aprendido na academia e a injeção de profissionais qualificados no mercado deu uma nova formatação ao setor.

O cenário da moda piauiense se transformou nos últimos dez anos. A cultura de moda, que aos poucos foi sendo construída ao longo do tempo, solidificou-se mais. Nesse período o mercado mudou, deixou de assumir as mesmas configurações de outras décadas, e passou a estimular novos anseios do público consumidor. Os profissionais envolvidos na cadeia produtiva da moda local tiveram que se preparar para enfrentar essa nova realidade. A implantação de cursos universitários de Design de Moda no estado ajudou a impulsionar esse processo de desenvolvimento e a descobrir novos talentos.

Nunca se debateu e questionou tanto a moda como nos dias de hoje. Esse cenário fez com que aumentasse a necessidade de profissionais mais qualificados. A demanda do mercado foi um dos fatores determinantes no estabelecimento dos cursos de Design de Moda no Piauí. Além disso, o próprio consumidor passou a exigir um setor com um perfil profissional muito diferente do que a indústria vinha adotando até então.

Para Polyanna Molina, professora do curso de Design de Moda, a demanda pela capacitação já existia naturalmente. Esta, aliada a cobrança do mercado, que precisava de uma formatação para atender os diversos nichos de

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[Ensino que impulsiona]

consumidores latentes, acabou por compor o contexto de implantação das escolas de moda. “Era uma demanda necessária, e uma cobrança necessária também, para uma diversificação e uma real configuração de um mercado de moda piauiense”, explica.

A professora avalia ainda que o setor de moda no Piauí atualmente está diferente, maior e com ainda mais profissionais atuando. Polyanna Molina aponta que o mercado local já está muito mais profissionalizado após anos de instalação dos cursos universitários. Ela percebe que algumas publicações direcionadas, que surgiram nos últimos anos, ajudaram a construir uma nova dimensão dessa realidade. São catálogos mais elaborados, revistas especificas para a área, um setor de fotografia e maquiagem voltado para a moda e uma explosão de projetos pessoais de grandes designers.

O principal requisito para fazer uma carreira de moda é participar de uma boa escola de moda. As academias acabam funcionam como um agente potencializador de um talento ou de uma inclinação para a área. A consultora de Ana Cristina Lima é uma das profissionais que hoje está inserida no mercado de trabalho após ter passado por um curso universitário de moda. Para ela, ter o talento e o dom é importante, mas, além disso, é imprescindível o estudo, o conteúdo, o conhecimento e a pesquisa.

“Com o curso, apesar de gostar de moda, vi que pouco sabia e que no máximo tinha uma pequena noção. Aprendi sobre tecidos, história da moda, arte, comportamento humano, consumo, indústria, cores, costura, entre outras coisas. Moda não é algo tão fácil quanto parece, ela está sempre se reciclando e se você não se reciclar junto, é difícil manter uma estabilidade. É preciso muito estudo, além de muita paixão”, conta.

Tudo tem acontecido muito rápido e em um curto período. Não faz muito tempo que quem quisesse seguir carreira como profissional da moda tinha de buscar aperfeiçoamento por conta própria em ateliers. Era bastante comum a profissionalização ocorrer a partir de um hobby. Atualmente o estudo superior é possível no Piauí, e é exigido como base. “Algumas empresas já exigem formação e especialização. O empresariado está indo trás de profissionais com conhecimento sólido, com repertório cultural e visão estratégica da moda, do mercado e dos negócios e isso vai refletir no mercado”, conta a consultora de moda.

Ana Cristina Lima acredita que essa nova realidade de capacitação do cenário é que vai contribuir para os rumos que a moda piauiense irá tomar no futuro. De acordo com ela, os profissionais que passam pelas escolas de moda levam todo conhecimento para o mercado local. Eles ajudam as produções locais a encontrarem uma identidade própria, a se aproximar do público consumidor e a conseguirem oferecer um padrão de qualidade exigido pelo mercado nacional.

Campo profissional

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PiAUiEnSIdADe

OO talento dos estilistas piauienses é apresentado neste editorial em cenários que imprimem a regionalidade do Piauí. As criações dos designers surgem em meio aos diversos cenários que compõem o interior do estado, propondo uma verdadeira viagem pela história e pela moda piauiense. Do rústico ao concreto, do regional ao contemporâneo, as texturas e as cores revelam ainda a figura do vaqueiro e do sertanejo que por estes caminhos andaram.

[PIAUIENSIDADE][EDITORIAL]

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editorial 2

Tailleur Otávio MenesesCalça Acervo Aline SoutoChapéu Homem do CampoBolsa Acervo Pessoal

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Vestido Otávio MenesesLamparinas Acervo Kalina RameiroAcessórios Acervo Pessoal

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Vestido Emanuel SoaresAcessórios Emanuel SoaresCouro de boi Central de Artesanato de TeresinaChapéuBota Acervo Pessoal

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Vestido MundopostoBlusão de couro Acervo PessoalTerço Acervo Kalina Rameiro

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Vestido Andressa LeãoChocalhosChapéu Homem do Campo

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Cropped AmareloShort Ipê Rita PradoChifre Kalina Rameiro

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Vestido Martins PauloSapato Martins PauloBolsa Acervo Aline Souto

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Cropped pintado à mãoBermuda de alfaitaria pink Gilvana LimaBota Acervo Pessoal

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[A MODA DAS REDES SOCIAIS]

Não se pode mais fechar o olhos para a rapidez com que as informações circulam na internet. A relação da moda com as plataformas online se estreita cada vez mais. Os empresários tem percebido isso e estão adequando seu marketing para essa modalidade de publicidade, aproveitando-se das pontencialidades oferecidas. Com isso, o formato tradicional de se fazer, divulgar e vender moda vem ganhando novas formatações. Uma abordagem digital hoje é quase que essencial.

As mídias sociais aproximaram a marca ou a loja do seu público-alvo. De acordo com a consultora de Moda Ruth Cazuza, todas as estratégias de vendas são elaboradas para que o produto divulgado seja exatamente aquilo que o consumidor almeja consumir. É assim que o espaço digital se torna um novo importante artificio para a formatação do mercado.

Para Ruth Cazuza, atender os anseios de um consumidor informado e que reserva tempo na atualização e conferência de mídias sociais é sem dúvida uma forte estratégia dentro de um plano de marketing. Ter a proximidade com esse público através dessas plataformas cria vínculos e

A MODA DAS

rEdEs socIaIs

OAs redes sociais entraram na moda e a moda entrou nas redes sociais. uma se apoderou da outra para apresentar novas estratégias para o marketing..

desenvolve laços de fidelidade, seja através de uma linguagem abordada, de um atendimento personalizado ou de uma atualização periódica.

“Atualmente, contar com uma equipe qualificada, jovem e antenada a tudo que nos cerca também é uma força que se alia a esses novos planos de venda. Saber alimentar as mídias sociais pode ser o grande diferencial entre o sucesso, o declínio e a estagnação de uma marca ou loja”, ressalva a consultora.

Atualmente o retorno do marketing digital para uma marca, tanto no setor de vendas como no de atendimento, é enorme. A empresária e designer de moda Beatriz Menezes revela que hoje as lojas já sentem a necessidade de ter uma rede competitiva. O cliente não precisa mais se locomover até o espaço físico para desejar o produto e se tornar cliente. “Para as lojas, usar essas ferramentas é a forma mais rápida de vender e de estar inserida no mercado”, pontua a lojista.

Percebendo a importância das redes sociais, as lojas estão adaptando sua forma de trabalhar. As empresas têm investido também em editoriais de moda específicos. Esses se mostram ferramenta

poderosa para alavancar novas possibilidades visuais de vender produtos com uma linguagem muito mais sedutora, atual e próxima do desejo do publico.

Beatriz Menezes é uma das empresárias que investe nessas produções por pensar em uma apresentação do produto voltada para o contexto virtual. “Já fazemos editoriais exclusivos para redes sociais e o retorno é absurdo. Planejamos uma pauta, uma produção e toda semana escolhemos novidades para serem fotografadas”, detalha.

[mercado]

Beatriz Meneses, designer de moda e empresária

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[MARTINS PAULO]

Graduado em Artes visuais e técnico em vestuário, Martins iniciou seu trabalhou autoral em 2007, quando priorizou a intercessão dos universos da arte, da cultura e da moda nas criações. No Rio Moda Hype, no Fashion Rio, Martins viu sua carreira deslanchar entre 2009 e 2012, sendo o vencedor da 11a edição. Ele também foi um dos participantes do quadro Estilista Revelação, no programa TV XUXA, na rede Globo, em 2011. Já neste ano, Martins Paulo apresentou seu trabalho no Vancouver Fashion Week, no Canadá, e também integrou o line-up da 36a edição da Casa de Criadores.

Na entrevista a seguir, Martins Paulo conta como funciona o seu processo criativo, desde inspirações até o de-senvolvimento de coleções, e comen-ta sobre o futuro da moda piauiense

Piauhy Fashion Mag – Martins, de onde surgem suas inspirações para criar?Martins Paulo - Do meu universo pessoal, das coisas que eu gosto, que eu desejo e que eu aprecio, entre elas a principal fonte que bebo é a arte, de todas as formas. Me inspiro muito em viagens que faço, livros que li e e leio, em filmes, em músicas, em artistas....tudo me apresenta um caminho de-pendendo do meu “estado de espíri-to”, do momento e da situação.PFM – Essas inspirações guiam toda sua produção. Como funciona então o seu processo criativo?MP - Antes de mais nada eu penso no que eu gostaria de passar para as pessoas naquele momento e como eu posso expressar aquilo, para só então criar a roupa em si. Tudo vai depender de uma sensação inicial que eu deseje expressar. Eu sempre tenho muitas ideias “acu-muladas” para diversos trabalhos, e vou usando-as no momento em que achar adequado, a última coleção, por exemplo, já havia sido pensada há muito tempo, mas nunca havia encaixado em nenhuma situação e agora eu usei esta proposta. PFM – A partir de que momento você viu seu trabalho sendo pro-

Martins Paulo sempre esteve inserido no mundo das artes, desde cedo fazia parte deste universo através do gosto por desenho. Aos 15 anos também se aproximou da moda, meio que por acaso. Ao desbravar esse caminho, através de um olhar apurado, conseguiu enxergar a arte como uma aliada para expressar-se através da criação de roupas. Foi nesse momento que ele descobriu que esses eram dois campos que caminhavam juntos.

jetado para fora do Piauí? Como isso ocorreu?MP - Eu sempre idealizei um tra-balho globalizado, nunca me prendi a limites geográficos ou regionais, não encaro meu trabalho como sendo só piauiense ou só brasileiro, penso nele como algo que possa se identificar ao máximo a diversos lugares, e é isso que eu busco. Por isso comecei a olhar para fora desde o começo. Mais um fator também contribuiu para isso, que foi a falta de possibili-dades aqui na época em que com-ecei meu trabalho. Naquele momento não tínhamos tantas oportunidades na área de moda como hoje.PFM – Em seu trabalho você procu-ra inserir características da iden-tidade cultural piauiense? De que forma você trabalha isso?MP - Busco inserir elementos sem que eles se tornem tão rústicos ou óbvios. Na última coleção, por exemplo, trabalhei com um grupo de artesãs e desenvolvi peças em que utilizei um trabalho incrível que lembra um croché e é realizado aqui, mas tentei agregar uma imagem dinâmica e globalizada inserindo cor e materiais novos, além dos materiais regionais que já são habituais.PFM – Como você imagina o futuro para a moda piauiense?MP - O Piauí esta engatinhando no que se refere à cultura de moda, nós já somos um polo relevante na confecção há muito tempo, este é

um setor que cresce a cada dia, mas roupa com essência e informação de moda é algo bastante recente. Uma cultura de moda leva anos para ser assimilada e levada a sério, e nós temos pouco mais que cinco anos do surgimento dos primeiros cursos profissionalizantes na área, é pouco tempo, por aí se tira o quanto a moda ainda tem pra alcançar no nosso es-tado. É preciso organizar este segui-mento que não é só glamour e sonhos, mas é também uma dos maiores geradores de renda e empregos. Eu venho observando um horizonte positivo: pessoas talentosas e com vontade de fazer, mais eventos que são importantes para este segmento, cursos e possibilidades de informação e instituições apoiando o setor.

COM ARTEmOda

[It people]

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[álbum]

moda que faz

hIStOriAAAs imagens podem revelar

muito de um tempo. Mostra como as pessoas se vestiam, se produziam e se compor-tava. A partir de um olhar para moda de época pode-mos conhecer um pouco da sociedade do passado.

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Os

eM TERESINAsHoPPinGs

Traduzir em palavras o comportamento de moda em nossa cidade nos últimos 17 anos - tarefa que traz excelentes lembranças profissionais e pessoais, e exige um olhar detalhado sobre as inúmeras transformações ocorridas. A missão não é fácil, mas irei começá-la com uma pequena e despretensiosa tentativa de reflexão sobre moda e mudança no contexto social de Teresina.

Sabemos que, historicamente, o homem traz em sua essência o desejo de desbravar e explorar novos espaços, de viver novas experiências. Trata-se de uma necessidade que desencadeia a transmissão de conhecimentos, as modificações nos hábitos culturais.

Assim, faço um recorte na ampla tessitura que o tema evoca: sugerir o início de um panorama sobre os dezessete anos de existência dos Shoppings na cidade de Teresina. Que tem a moda como um dos seus pilares. Propondo, então, alargar o olhar para além do glamour que a moda traz, buscando, ainda, ir além do “bom gosto”.

Em meados dos anos 1990, a moda já havia passado por vários processos e vinha adquirindo um caráter de mistura, absorvendo diversas referências vindas das mais distintas realidades.

Em nossa cidade nem todos entendiam ou conheciam estas informações de moda. Já existiam em Teresina algumas lojas de rua que faziam bastante sucesso, mas que, de certa forma, restringiam o seu público. As pessoas de classes sociais

menos favorecidas tinham até receio de entrar nessas lojas.

Com o avento dos Shoppings a partir de 1997, a situação começou a mudar, e não apenas pelo frisson causado pela novidade. Dentro de um espaço mais democrático, as lojas agora pareciam acessíveis. Com as facilidades de pagamento, aliadas a melhorias no poder de compra da população, diversas classes tinham oportunidade de consumir o que a moda oferecia. E, se não pudesse fazê-lo, ao menos apreciavam as vitrines mais à vontade, em um ambiente agradável e convidativo.

As pessoas, então, começam a conferir os hits da moda: aquela saia, o sapato do momento, o acessório que todos “tem-que-ter”. Mas, isso não é glamour? Claro que sim! Mas também é auto- estima e bem-estar. Com a chegada dos Shoppings a maioria dos teresinenses ganhou oportunidade de conhecer uma nova realidade. Era essa tal de “Moda”, que trouxe para alguns a possibilidade de ver um mundo que se apresentava de uma forma mais bonita, podendo, inclusive, fazer parte dele.

Aumentou o acesso às informações, provocado por eventos relacionados ao setor. Foram grandes desfiles coletivos, lançamentos de coleções, exposições, workshops e palestras abordando assuntos como estilo, tendência e comportamento - tudo isso no intuito de levar informação de moda.

Agora, tentar entender onde estamos e para onde vamos com todas

essas oportunidades de interpretação de moda e comportamento em nossa cidade é, no mínimo, maravilhoso. A moda sempre foi muito forte em Teresina, no sentido de que o bom gosto, a classe e o estilo dos teresinenses são notórios para quem vem à nossa cidade. Mas isso não é tudo. Já vivemos mais de uma década de um tempo que nos faz celebrar moda. Os Shoppings são de fundamental importância na construção dessa realidade e é impossível não associá-los ao desenvolvimento do mercado de moda piauiense.

Hoje temos lojas de prêt-à-porter de excelente qualidade, com variações de marcas locais, nacionais e internacionais. Temos um mercado que cresce a cada dia, exigindo profissionalização. E torna-se imprescindível lembrar que moda é expressão de um povo e de sua cultura e que “Cada um vê o que conhece”.

Torço por mais décadas de moda em nosso estado, pois elas certamente nos brindarão com incríveis momentos, que vão desde um simples passeio para olhar vitrines à honra de poder escrever este texto.

[Gizela Falcão]PóS-GRADuADA EM DESIGN TêxTIl EM MODA PElA FACulDADE CATólICA DE FORTAlEzA. FEz CuRSOS DE CONSulTORIA DE IMAGEM EM MODA (SENAC MODA – SãO PAulO), ANálISE DE CORES – MODA E ESTÉTICA (SEN-AC MODA – SãO PAulO) E PlANEjAMENTO E DESENVOlVIMENTO DE COlEçõES, NO STu-DIO BERçOT, EM PARIS. PROjETOu O PRIMEIRO CuRSO SuPERIOR EM DESIGN DE MODA DO PIAuí E A PRIMEIRA ESPECIAlIzAçãO EM GESTãO DE NEGóCIOS DE MODA DO PIAuí.

[ARTIGO] [os shoppings em teresina]

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